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Ivani Fazenda (Org.

)
índices para catálogo sistemático:
1. Metodologia: Pesquisa educacional 370.78018
2. Pesquisa educacional: Metodologia 370.78018
Celestino Alves da Silva Junior • Dea Fenellon • Elcie Masini • Gaudêncio Frigotto • Ivani Fazenda • Joel Martins •
Marli André • Olinda Noronha • Sérgio Luna • Silvio Gamboa
Dados Internacionais de Catalogação na Publicação (CIP) (Câmara Brasileira do Livro, SP,Brasil)
Metodologia da pesquisa educacional / Ivani Fazenda (org.).

- 12. ed. - São Paulo: Cortez, 2010. METODOLOGIA ISBN 978-85-249-1638-0

1. Pesquisa educacional- Metodologia r. Fazenda, Ivani,

DA PESQUISA EDUCACIONAL
CDD-370.78018
10-08390

12a edição 4a reimpressão


'\
I'If!1!CORTEZ ~EDITOR~
12 IVANI FAZENDA impossível delinearmos caminhos para pensar
a prática educativa sem adentrarmos ao nível
de abstração teórica e das generalizações.
Os textos aqui coletados constituíram um
recurso inicial ao que foi trabalhado no curso no Apesar de árduo e solitário, o processo de
que se refere à pesquisa empírica e pesquisa pesquisar é tam- bém um desafio, pois a paixão
qualitativa em seus diferentes enfoques: pelo desconhecido, pelo novo, pelo inusitado
etnográfico, fenomenológico, dialético histórico acaba por invadir o espaço do educador,
e participante. Havia muitas dúvidas sobre trazendo-lhe alegrias inesperadas.
pesquisa do cotidiano escolar e estudos de sala
de aula, além de outras de natureza genérica Ivani Catarina Arantes Fazenda
sobre as dificuldades comuns encontradas no
ato de pesquisar. Alguns desses aspectos São Paulo, outubro de 1989
foram incluídos nesta coletânea. ~~ 13

Colocado perante diferentes tendências


metodológicas, o educador/pesquisador deve
re-inventar seu caminho, que será único.
Pretendemos mostrar apenas algumas das
possibilidades, os cuidados a tomar e os
avanços já conquistados.
Apesar de haver diferentes formas de pesquisa
r em educa- ção, a lógica que deve presidir a
pesquisa é a lógica da erudição, pois é
educação

Ivani Catarina Arantes Fazenda


- PUC-SP

1
Dificuldades
comuns entre os ,
que pesquisam
Iíi!!!!CORTEZ ~EDITORR

P retendemos refletir sobre algumas das dificuldades mais co-

muns encontradas pelos alunos dos cursos de pós-graduação em Educação, tentando compreendê-Ias
em suas origens e traçando alguns caminhos para superá-Ias.
Muitas destas dificuldades acompanham o aluno desde a escola de 1 e 2 graus, sem que tenham muita
0 0

consciência do fato. Por paradoxal que pareça ser, conseguem vencer com alguma tranquilidade certos
cursos de graduação, onde sua contribuição pessoal não é muito solicitada. Entretanto, no momento da
elabo- ração de monografias para o cumprimento dos créditos nos cursos de pós-graduação, essas
dificuldades se evidenciam, agravando-se nomomento da definição da pesquisa de dissertação de
mestrado ou tese.A mais frequente é a dificuldade para escrevq, pois a expres- S,10 escrita requer, antes
de mais nada, uma apropriação do objeto da escrita.
O ato de apropriação do objeto da escrita pressupõe uma exaustiva pesquisa anterior sobre o tema, que
deve ser compreen- liid~m seus vários aspectos. Somente depois disso será possível comunicá-lo a
outros.
Um dos produtos da dificuldade para escrever é a chamada "colcha de retalhos". Nela, o pesquisador,
por não possuir ainda um discurso escrito próprio, utiliza-se ou apropria-se do discursolS
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alheio, e, ao somar textos, não percebe que muitas vezes estes são desconexos ou conflitantes.
Esta dificuldade, que redunda numa escrita fechada epouco clara, muitas vezes provém da dificuldade
em compreender e interpretar textos. Tão difícil quanto o domínio da escrita, não se resolve da noite para
o dia, num passe de mágica ou muito menos num curso de pós-graduação.
Entendemos que o objetivo da pós-graduação não é solucio- nar estas dificuldades, mas sim ajudar os
que já têm o hábito da pesquisa e o exercício da escrita.
Diante da dificuldade para escrever, opesquisador necessita antes de mais nada parar para pensar em
como ocorreu sua forma- ção acadêmica. Certamente, encontrará uma série de lacunas para preencher,
antes mesmo de esboçar o seu projeto de pesquisa para mestrado.
ma.das formasaeinvestigar as falhas no processo d~ prmação.é.a. revisão €los pressupostos teóricos
que sustentam ou encaminham o raciocínio inicial do pesquisador. Assim, se o caminho escolhido foi o
estudo da sala de aula, o pesquisador precisa ter antes decidido: qual concepção de educação pretende
investigar, como se realizaria a aprendizagem nesta concepção, quais os agentes que a determinariam,
que interferências pode- riam ocorrer em seu percurso, qual a ideologia subjacente a tal concepção. É
necessário também realizar um levantamento das possíveis categorias que eventualmente emerjam no
processo da pesquisa, bem como o suporte teórico adequado à análise dessas categorias, ao lado de
uma disponibilidade em substituí-Ias se o desenvolvimento do projeto assim o determinar.
Esses pressupostos teóricos resultam de uma formação aca- dêmica sólida e anterior ao processo de
pesquisa, sem a qual esse trabalho seria inviável.
Em alguns casos, entretanto, a origem da dificuldade est na falta do hábito de escrevEf. Pode-se
presumir que seja esta a origem, quando o pesquisador consegue verbalmente expressar com clareza
suas ideias, e quando se percebe em suas colocações
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orais uma coerência de raciocínio. Nestes casos, costumo sentar com meus orientandos egravar um
diálogo sobre oscaminhos que pretendemos empreender na pesquisa. Em seguida, o orientado
transcreve a fita, refazendo a escrita até torná-Ia "transparente".
Escrever é um hábito que vai sendo aprimorado apenas no seu contínuo exercício e que infelizmente
nem sempre se consolida naescolaridade anterior àpós-graduação.
Dificuldade semelhante à da escrita é às vezes encontrada na expressão oral; comumente uma escrita
trunca da decorre de bloqueios no falar.
Talcomo a escrita, a expressão oral também requer contínuo exercício. Somos produto da "escola do
silêncio", em que um gran- denúmero de alunos apaticamente ficasentado diante do professor,
esperando receber dele todo oconhecimento. Classes numerosas, conteúdos extensos, completam
oquadro desta escola que se cala. Isso se complica muito quando já se é introvertido ...'
Uma das formas que considero eficiente para vencer essas IIificuldades é a formação de grupos de
estudos.
Nos grupos de estudos que tenho coordenado, percebo que as IIificuldades iniciais vão sendo
gradativamente superadas. Entre- 1.1I1to,um grupo de estudos só se consolida se houver a intenção IIt'
estruturar um projeto de trabalho conjunto e requer a orienta- ~.\o contínua esistemática do coordenador
do grupo, bem como o vnvolvimento total de todos os seus membros. O número ideal de 11.1rticipantes
é de no máximo dez pessoas, para que todos possam .rpresentar suas ideias oralmente.
Tão fundamental quanto o tempo é a limitação do espaço I",('rito;este precisa ser compatível com o
tempo disponível para <11,1posterior análise. Cada elemento do grupo deve possuir có- 111,1dos
escritos de seus companheiros, para indicar sugestões de ilprir&ramento do texto individual. Espera-se
de cada elemento

1. A esse respeito, consultar Suely G. Moreira, Da clínica à sala de aula. São 1',11110: Loyola, 1989,que discute como trabalhar
introversão eextroversão na sala '!Pllula.
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do grupo uma disponibilidade em ouvir críticas (que também pode ser apreendida) e em reescrever o
texto tantas vezes quantas o grupo solicitar.
Pesquisar em educação exige, além de uma formação acadê- mica restrita (relativa ao tema que será
desenvolvido), uma sólida e profunda formação acadêmica geral, pois a dificuldade em inter- pretar e
compreender textos indicados nos cursos de pós-graduação somente será vencida se, ao lado de um
trabalho com o texto básico, proceder-se à leitura de vários textos complementares.
Entretanto, infelizmente, muitos pesquisadores apenas se dão conta disso ao procurarem desenvolver
suas dissertações. Nesse sentido, todo o itinerário da formação acadêmica geral não cumprido
necessariamente precisará acontecer na hora em que a pesquisa individual se desenvolver.
Essa dificuldade em ler,interpretar ecompreender advém de uma formação inadequada na escola de 1 e 0

2 graus.
0

Considero a superação destas dificuldades um dos atributos básicos para o exercício do pesquisar, ao
lado do aprimoramento do gosto por conhecer, a inquietude no buscar e o prazer pela perfeição. Quem
não se propuser a desenvolvê-los dificilmente conseguirá terminar uma dissertação de mestrado!
Outro conjunto de dificuldades comumente citado está na es colha do tema, no enunciado do problema,
e em seu encaminhamento.
Seohábito em pesquisar já estivesse presente desde o 1 grau, evidentemente não haveria dificuldade em
0

encontrar o tema, e ingressar em um curso de pós-graduação seria apenas uma forma de


aprofundamento teórico-metodológico de temas já iniciados ou trabalhados.
Um pesquisador familiarizado com o tema teria menores difi- culdades em enunciar o seu problema de
pesquisa. O interesse pelo tema pode ser próximo - visando solucionar questões presentes no cotidiano
de seu trabalho - ou remoto - quando o objetivo é pes- quisar um assunto polêmico ou pouco discutido
em Educação.
É importante tanto para o orientador como para o orientando conhecer a origem do problema a ser
pesquisado. É interessante
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que o pesquisador coloque isto num pequeno texto. A análise desse texto poderá indicar ao orientador a
forma como o orientado se coloca enquanto sujeito do projeto que pretende desenvolver; revela com
mais segurança o caminho a ser perseguido em seu projeto de pesquisa.
Outra dificuldade ao desenvolvimento da pesquisa é o :,!ydo de não ter_oproblema plenamente
delimitado no projeto <! Ill'squisa inicialkNeste caso, é interessante lembrar que o projeto primeiro acaba
passando por inúmeras transformações, e vários pesquisadores só conseguem definir seu problema com
maior clareza ao final da pesquisa.
O importante aqui é que o pesquisador tenha a coragem de n-definir seu projeto inicial sempre que
necessário, sem abandoná- 1o,mas sempre voltado a ele para perceber com clareza o porquê dos
desvios pretendidos e em que direção pretende avançar.
Temas muito ou pouco explorados também provocam difi- I 11Idades.

Ao proceder à revisão bibliográfica do tema escolhido, muitas \ I'/<.'S opesquisador pode defrontar-se com
um grande número de nhras sobre ele. Isto poderá suscitar-lhe o sentimento de que sua Iuntribuição
poderá serredundante ou inoportuna. Considero que 11 11 ri las vezes um tema muito pesquisado pode ser
relevante para I Hducação. A abertura a novas formas de investigação poderá "'\'l'lar aspectos ainda não
desvelados, mas importantes.
Temas muito pesquisados muitas vezes necessitam de uma I til h'nação em subtemas quando da revisão
bibliográfica. Essa di- 1"'.10 ou classificação poderá indicar ao pesquisador quais os itens I ',I-n-rn melhor
explorados. Evidentemente, a forma de exploração ri" item vai depender das ponderações de ordem

metodológica 11',,:tI1 pesquisa suscitar. ~onheçomuitos pesquisadores que, diante de um grande

uunu-ro de obras para estudar sobre determinado terna, decidi- líllll optar por um estudo compilatório ou
classificatório. Considero
I"'mamente úteis estudos dessa natureza, pois possibilitam a
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outros pesquisadores avançarem no aprofundamento dos itens não adequadamente explanados ...2
Em meu itinerário de pesquisadora, defrontei-me com essa dificuldade no início da década de 1980.
Minha intenção era pes- quisar os efeitos da Educação no Brasil na década de 1960.
Ao levantar abibliografia sobre otema, encontrei uma quan- tidade enorme de títulos referentes à
situação política eeconômica do Brasil na época, mas pouco se falava sobre Educação. O material
existente, além de escasso, nem sempre estava completo, pois não há interesse em preservar os
documentos sobre Educação no Brasil. Ao final de cada gestão, estes são queimados, e começa-se tudo
da estaca zero - isto constitui uma dificuldade imensa ao pesquisador e ao educadores de maneira geral.
Aintenção da referida pesquisa - que seria inicialmente um anúncio de proposta para trabalhar-se a
educação na década de 1980 - passou a ser uma denúncia dos motivos que conduziram os educadores
da década de 1960 ao silêncio.
Percebi que não poderia ir além sem um estudo compilatório inicial, que seria impossível pular etapas,
que embora as questões econômico-políticas já houvessem sido amplamente discutidas pelos
economistas e cientistas sociais, as relativas à Educação ain- da eram muito pouco exploradas.' O tema
inicial, que me parecia demasiado amplo, acabou se tornando bastante restrito.
A década de 1960 foi a época da denúncia velada. Somente em 1970 o que era velado começou a ser
explicitado. Sem essa explicitação é difícil entender o movimento de avanços e recuos da Educação na
década de 1980.
Temas pouco explorados também geram dificuldades na pes- quisa. Neles opesquisador age como
ogarimpeiro que de repente,

2. Sobre Escola Normal, tema que atualmente venho pesquisando, encontrei estudos compilat6rios muito interessantes, entre eles:
ZÉLIA MEDIANO, Marli André et al. Revitalização da Escola Normal. Rio de Janeiro: pue, 1988;GArrI, B.A formação do professor
de 1°grau, 1988 (material de estudo).
3. O referido trabalho encontra-se publicado sob o nome de A educação no Brasil- anos 60: o pacto do silêncio. São Paulo: Loyola,
1985.
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110meio do cascalho, encontra uma pedra valiosa. Pedras valiosas .,,10raras, tanto nos temas muito
explorados como nos pouco explo- r.idos, pois algo se torna valioso, na medida do interesse específico
do indivíduo que pesquisa.
Pessoalmente já enfrentei essa dificuldade com o tema Inter- disciplinaridade no ensino. Embora já
pensasse no tema desde 1965, Ipenas em 1973 comecei atrabalhar nele, epude constatar que era
I

11111tema muito pouco pesquisado tanto pelos educadores do Brasil 101110nos de outros países.
Durante muito tempo apenas pude 1'l1contrarapalavra enunciada em um ou em outro texto, sem que
01tcmática fosse desenvolvida. Então foi lançado o livro Interdis- II/J/inaridade e patologia do saber de H.
Japiassú - e com ele pude «onhecer outros pesquisadores na área como Gusdorf, Palma de, Iloutart.
Entretanto, passei grande parte da pesquisa compilando IISestudos desenvolvidos na época, para
chegar auma conclusão l'I'ssoal sobre a interdisciplinaridade. Isto possibilitou-me indicar ,llguns
equívocos quanto a ela, na legislação educacional brasileira 1101década de 1970.4
Desde essa época, continuo pesquisando essa temática, .-mbora ainda a considere muito pouco
pcsquisada. Há dois anos 11 pós-graduação em supervisão e currículo da PUC-SP vem se- .h.mdo um
grupo de pesquisadores, por mim coordenado, sobre lnlcrdisciplinaridade no Ensino. Entretanto, como
todo tema 1"I\lçoexplorado, exige dos que a ele se dedicam muito empenho 1111construir novos
caminhos.

onclusão

1\0assumir a tarefa de investigar, o educador se depara com i'~l"semuitas outras dificuldades. Sóum
trabalho contínuo esério

I Esse trabalho foi publicado sob o título: Integração e interdisciplinaridade no /I~ill"lunsileiro. São Paulo: Loyola, 1979.
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pode vencê-Ias. Muitas delas poderiam ser inicialmente corrigidas, a partir de uma escolaridade eficiente,
desde o 1 grau. Algumas escolas já trabalham para isso, mas são poucas. Em geral, o nosso aluno é
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mal preparado tanto para enfrentar o cotidiano de seu trabalho como os desafios da vida acadêmica.
A formação do pesquisador, desde cedo, precisaria desen- volver o compromisso por "ir aléifi" - além do
que os livros já falam, além das possibilidades que lhe são oferecidas, além dos problemas mais
conhecidos.
Como esta formação não é outorgada pela escola, ela neces- sitaser conquistada; é.a conquista da
autonomia, tarefa de cada um, em particular dos que buscam obter um saber mais elaborado e uma
titulação.
A tarefa não termina aí. Consciente desta problemática e tendo em parte vencido suas dificuldades
próprias, o educador tem a obrigação de incentivar e propiciar a formação de novos pesquisadores.
Mas as dificuldades não param por aí, apenas mudam de nome ou enfoque. Em consequência, penso
que um caminho bas- tante promissor àpesquisa em educação éocontato constante com outros
pesquisadores da área ou de áreas correla tas.

Referências bibliográficas

FAZENDA, Ivani C.A. Integração einterdisciplinaridade no ensino brasileiro. São Paulo: Loyola, 1979.

__ o Educação no Brasil - anos 60: o pacto do silêncio. São Paulo: Loyola,1985.

GATII, B. Aformação do professor de 1° grau, 1988 (material de estudo).

MEDIANO, Zélia; ANDRÉ, M. et al. Revitalização da Escola Normal. Rio de Janeiro: pue, 1988. (Mimeo.)

MORElRA, Suely G. Da clínica à sala de auLa. São Paulo: Loyola, 1989.


@~ 23

2 o falso conflito entre tendências


metodológicas

Sérgio V. de Luna - PUG·SP /Unicamp


~

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