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Dedicamos este registro de vivências à memória de Demetre Anastassakis e
Marielle Franco, que tanto lutaram para que as pessoas mais pobres tivessem
o direito à cidade e à moradia digna; à memória do mestre Clóvis Ilgenfritz,
que começou essa experiência toda e nos instigou a pensar modelos para
garantir que o direito à assistência técnica exista de fato e a Gilson Paranhos,
que nos liderou e muito nos ensina.
FICHA TÉCNICA Assistência Técnica em Urbanismo e Arquitetura de Interesse Social
Anotações sobre o processo de imersão da equipe técnica da CODHAB
nas periferias do Distrito Federal - 2015-2018
O Instituto de Arquitetos do Brasil - Departamen- no início dos anos 1960; a criação do capítulo Por isso, apoia esta publicação, que registra um recorte temporal de um
to do Distrito Federal tem a honra de inaugurar pelas políticas urbanas na Constituição de 1988; trabalho, encabeçado por agentes e lideranças que estão em nossas fileiras
sua editora com o lançamento deste livro As- a criação do Estatuto das Cidades; e finalmente a de luta, profissionais que aproveitaram a oportunidade e os instrumentos
sistência Técnica em Urbanismo e Arquitetura edição da Lei 11.888/08, conhecida como Lei da de que dispunham, entre 2015 e 2018, e conseguiram colocar em prática
de Interesse Social - anotações sobre o proces- Assistência Técnica, tema central desta publicação. bandeiras históricas da instituição.
so de imersão da equipe técnica da CODHAB
nas periferias do Distrito Federal 2015-2018. Como entidade mais antiga dos Arquitetos e Urba- As gestões do IAB/DF de 2017 a 2019 e de 2020 a 2022 têm orgulho de editar
nistas brasileiros, o IAB segue na luta pela demo- parte da memória da implantação da assistência técnica em arquitetura e
Ao longo de sua história, o IAB sempre lutou por cracia, pela cultura e pelo direito ao acesso irrestrito urbanismo no DF, cientes de que a ATHIS é um caminho que precisa ser, a cada
cidades mais justas e pela democratização da aos serviços dos profissionais arquitetos e urbanis- dia, incentivado e debatido, para que a prática emergente em nosso campo
arquitetura. Nesse contexto, o IAB/DF protagonizou tas. Enquanto instituição e principal braço político profissional possa encontrar mais terrenos férteis para sua disseminação.
ou fez parte de alguns importantes marcos na e cultural da categoria, o IAB reafirma, portanto,
história do país, a saber: as manifestações contra o que uma de suas principais funções é reverberar O IAB/DF reitera que segue, sem medir esforços, na luta por uma arquitetura
golpe de 1964; as manifestações pela Universidade práticas que vão ao encontro daquilo que acredita e urbanismo sociais, executando e apoiando projetos que reposicionem a pro-
de Brasília e por sua autonomia; a idealização do ser papel dos profissionais perante a sociedade. fissão ao encontro das necessidades da maior parte da população brasileira,
Seminário de Habitação e Reforma Urbana, ainda que é de baixa renda e não encontra soluções para seus problemas sócio-espa-
ciais na prática hegemônica da arquitetura. O Instituto acredita que é possível
avançar na luta pela qualidade arquitetônica, por cidades mais inclusivas e
pela ampliação do conhecimento, da ciência, da democracia e da tecnologia
em relação ao espaço edificado, à construção e ao planejar e transformar.
Boa leitura.
O Deficit Habitacional Urbano no Distrito Federal previsto para 2020 está entre Um exemplo dessa interação é a realização da Jornada de Assistência Téc-
125.990 e 133.839 domicílios. Para 2025, a situação tende a se agravar e nica em Habitação de Interesse Social – JATHIS pelo CAU/DF e entidades
a previsão é que esse haja uma demanda de 151.276 novos domicílios. Os parceiras que, em 2019, alcançou sua terceira edição. Foram sensibilizados
dados são da Companhia de Planejamento do Distrito Federal (Codeplan) e estudantes, professores e coordenadores de Instituições de Ensino Superior
mostram que profissionais, instituições e governantes precisam se mobilizar do Distrito Federal de Arquitetura e Urbanismo e áreas afins em oficinas,
para assegurar a qualidade e o direito à moradia nas cidades. palestras e ações comunitárias que proporcionaram melhorias habitacionais
em Áreas de Regularização de Interesse Social (ARIS).
A Assistência Técnica em Habitações de Interesse Social – ATHIS é um ca-
minho a ser considerado, apesar de ser uma conquista recente da população A repercussão do trabalho desenvolvido e os resultados alcançados com a
brasileira que, em 2008, presenciou a promulgação da Lei Federal n° 11.888 JATHIS têm contribuído não apenas para melhorar a qualidade de vida de
(Lei de Assistência Técnica Pública e Gratuita) assegurar o direito das famílias famílias, trazendo dignidade e moradia adequada a elas, mas também des-
de baixa renda à assistência técnica pública e gratuita para o projeto, cons- pertado uma reflexão nos arquitetos e urbanistas sobre o seu papel social
trução, reforma e ampliação de habitação de interesse social. Anos antes, e suas responsabilidades, ampliando sua percepção dos espaços, a fim de
o Estatuto da Cidade (Lei Federal n° 10.257) regulamentava os instrumentos atender demandas profissionais sem territorialização ou qualquer distinção.
de política urbana da Constituição Federal de 1988. No papel de agentes transformadores das realidades urbana e social, arqui-
tetos e urbanistas têm o compromisso de prestar serviços técnicos sem
Apesar de caminharmos a passos lentos, no intuito de transformar a ATHIS barreiras, porque o valor que a ATHIS traz aos seus beneficiários é mais que
em uma Política de Estado há tempos, de maneira a sistematizar a promoção material, é humanitário. E essa afirmação pode ser constatada no conteúdo
permanente de moradia digna a populações de baixa renda, temos conseguido desta publicação, que está em suas mãos. O livro retrata a história da ATHIS
algumas vitórias importantes. Diante da relevância do tema, os Conselhos no país, com foco no Distrito Federal, seus principais desafios e conquistas,
de Arquitetura e Urbanismo (CAU) de todo o país têm dedicado, desde 2017, mostrando o quão importante e necessária é a assistência técnica para
um percentual de seu orçamento para apoiar iniciativas nessa área no Brasil, a sociedade. Façam uma boa leitura desse material, pois ele pode mudar
tornando a Assistência Técnica mais acessível ao seu público-alvo. também a sua vida pessoal e profissional.
6 APRESENTAÇÃO
8
10 PALAVRA DO IAB/DF
12 PALAVRA DO CAU/DF
16 PRIMEIRAS IMPRESSÕES
20 A CONSTRUÇÃO DO TERRITÓRIO DE BRASÍLIA A CONSTRUÇÃO
696 PALAVRA DOS ARQUITETOS DO ARCABOUÇO
698 AGRADECIMENTOS LEGAL E AS
1 2 4
PERSPECTIVAS
PARA O FUTURO
5
682 A CONSTRUÇÃO DO
ARCABOUÇO LEGAL
E AS PERSPECTIVAS
7
PARA O FUTURO
ASSISTÊNCIA 690 PROGRAMA DE
3
ASSISTÊNCIA
TÉCNICA ATORES E
TÉCNICA AO
AÇÕES EXPERIÊNCIAS ESTRATÉGIAS DA PROJETO E
6
CONSTRUÇÃO
36 HISTÓRICO DA URBANAS NO TERRITÓRIO CONSTRUÇÃO
DE MORADIA
ASSISTÊNCIA
COMUNITÁRIAS 140 POSTOS DE POPULAR ECONÔMICA - ATME
TÉCNICA NO BRASIL
ASSISTÊNCIA (1999)
74 AÇÕES URBANAS 536 A ARQUITETURA ENTREVISTAS
TÉCNICA
COMUNITÁRIAS PÚBLICA E SEUS
50 ATHIS — MELHORIAS E DEPOIMENTOS 691 PROGRAMA DE
ATORES
INTRODUÇÃO À ASSISTÊNCIA
78 O PROGRAMA HABITACIONAIS 148 SOL NASCENTE 632 UM PAPO COM
EXPERIÊNCIA NO TÉCNICA À
TRECHO 1 GILSON PARANHOS
DISTRITO FEDERAL 79 OBJETIVOS 114 MELHORIAS 544 ASSISTÊNCIA MORADIA
HABITACIONAIS TÉCNICA COMO ECONÔMICA - ATME
84 QUEM PARTICIPA 218 SOL NASCENTE INVENTÁRIO 662 CONVERSA COM
EXTENSÃO (2002)
TRECHO 2 DONA CHICA
54 ASSISTÊNCIA 84 COMO SE DÁ A 115 O DIREITO À DO COTIDIANO
TÉCNICA NA PARTICIPAÇÃO MORADIA
246 SOL NASCENTE 556 O PONTO DE VISTA 564 SÉRIE DE 694 LEI NACIONAL
CODHAB —
TRECHO 3 + QNR DAS ENGENHARIAS PERCEPÇÕES DE ASSISTÊNCIA
2015-2018 86 A ESCOLHA DO 118 O PAPEL DA
SOBRE O TÉCNICA PÚBLICA
LOCAL COMPANHIA E
274 PÔR DO SOL 560 MOBILIZAÇÃO NA COTIDIANO NA E GRATUITA EM
A ASSISTÊNCIA
COMUNIDADE E PONTA ARQUITETURA E
60 DA IMPORTÂNCIA 88 AS FRENTES DE TÉCNICA COMO 300 ESTRUTURAL
INTERDISCIPLINARIDADE URBANISMO (2008)
DE O PROFISSIONAL TRABALHO PROGRAMA DE
334 PORTO RICO
DE ARQUITETURA GOVERNO
E URBANISMO 104 VOLUNTÁRIOS 380 VILA CAUHY
ESTAR IMERSO:
105 RESULTADOS 122 ESTABELECENDO 420 BURITIZINHO
DA ARQUITETURA E
UMA METODOLOGIA
URBANISMO PARA 110 COMUNIDADES QUE 434 FERCAL
DENTRO DOS
O URBANISMO E CONTINUARAM O
TRÂMITES 486 BRAZLÂNDIA
ARQUITETURA PROCESSO DA AÇÃO
GOVERNAMENTAIS
URBANA 500 SÃO SEBASTIÃO
PRIMEIRAS
IMPRESSÕES
20 21
Brasília foi erguida do zero, e antes de sua construção, a área era ocupada Segundo o antropólogo James Holston, Brasília foi definida para ser uma
predominantemente pelo Cerrado – um dos maiores biomas brasileiros e cidade cujo propósito essencial é administrativo, “com uma absoluta predo-
considerado um dos mais ricos tipos de savana do mundo. Esse bioma foi minância dos interesses dos servidores públicos e suas famílias” (HOLSTON,
tratado como uma tabula rasa, completamente destruído e remodelado para 1989, p. 279, tradução nossa), não havendo a preocupação em receber
que a cidade fosse edificada. Houve muita polêmica em relação ao desloca- outros tipos de moradores. Ignorando o fato de as cidades serem locais de
mento da capital do Brasil a um território antes pouco explorado e distante construção coletiva, a Lei Orgânica de Brasília, à época, privava os habitantes
dos principais núcleos urbanos existentes. Naquele tempo, existiam alguns de qualquer tipo de participação social. Destacava-se o fato de não haver
pequenos municípios ao redor da área onde o Plano Piloto de Brasília seria eleições diretas para os representantes locais, sob o argumento de que “a
construído, que agora fazem parte da cidade de Brasília ou de sua região participação direta dos habitantes do DF em campanhas políticas impediria
metropolitana. Hoje em dia, Brasília é a terceira cidade mais populosa do que o governo federal se dedicasse inteiramente às soluções dos grandes
país e mais um triste reflexo da profunda desigualdade socioeconômica no problemas nacionais” (Ibidem, p. 276, tradução nossa). Até os anos 1990, a
tecido urbano brasileiro. figura do prefeito de Brasília, posteriormente governador do Distrito Federal,
era uma indicação direta do Presidente da República.
Grande parte das cidades do mundo foi e continua a ser desenvolvida sem
participação social. Brasília não apenas seguiu o mesmo modelo, como O Plano Piloto, principal núcleo da cidade, foi planejado de acordo com o
também teve aspectos peculiares que agravaram a falta de democracia ao projeto urbanístico de Lúcio Costa, que seguia os conceitos modernistas
longo de sua história. Os trabalhadores que se deslocaram para a construção de Le Corbusier e os manifestos dos Congressos Internacionais de Arquite-
de Brasília não tinham condições financeiras de adquirir um imóvel na nova tura Moderna (CIAMs). Os conceitos modernistas aplicados ao urbanismo
cidade, e a eles não era permitido viver no Eldorado que haviam construído. visavam produzir um espaço urbano cujas funções fossem setorizadas:
Grande parte das unidades habitacionais construídas nas superquadras do moradia, lazer e trabalho deveriam ocupar locais separados dentro da cida-
Plano Piloto eram financiadas pelos Institutos de Aposentadoria e Pensões de, a cidade máquina. Para o cidadão brasiliense, é evidente essa definição
e destinados aos trabalhadores associados, fossem eles bancários, indus- em seu cotidiano com endereços como Setor Comercial Sul, Setor de Áreas
triários, comerciários, dentre outros. Isoladas Norte, Setor de Habitações Individuais Norte, Setor de Diversões
Sul, entre outros. Brasília foi construída exclusivamente para ser uma cida-
de burocrática, habitada por trabalhadores do setor público. Essa decisão
definiu quem, mesmo trabalhando na construção, teria seu direito à cidade
negado, e quem, chegando posteriormente à cidade, teria a ela todos os
direitos. A segregação não deixou margem a outra interpretação: a primeira
cidade satélite, Taguatinga, foi construída dois anos antes do Plano Piloto,
* Trechos publicados no site <https://fabiofelix.com.br/projetos/a-construcao-da-metropole-brasiliense/> em 1958, e até o fim de 1961 outras três foram fundadas (HOLSTON, 1989).
A maior parte do território do Distrito Federal foi desapropriada pelo governo A criação de cidades satélites deu aos migrantes o direito à propriedade,
federal na época da construção, com exceção das áreas de Planaltina e refutando simultaneamente o cenário sociopolítico de participação e luta
Brazlândia, dois assentamentos existentes; outras áreas foram apropriadas desenvolvido pelas pessoas para alcançar esse objetivo. “A rebelião dos
pelo Estado, e os antigos donos posteriormente deram entrada em processos pioneiros forçou o Estado a reconhecer seu direito à cidade. Entretanto, não
contra o governo, havendo até hoje diversos processos na Justiça desenro- foi ao Plano Piloto em si, e sim às cidades da periferia da capital” (HOLSTON,
lando questões fundiárias locais. Essa decisão foi tomada para que as áreas 1989, p. 257, tradução nossa). Durante muitos anos, o Plano Piloto permaneceu
ao redor do Plano Piloto, que em seguida se tornaria a capital do Brasil, não com pouquíssimos habitantes. A construção de sua infraestrutura foi viabi-
ficassem disponíveis ao mercado e se mantivessem sob o controle do governo lizada pelos impostos pagos por todos os brasileiros, enquanto as pessoas
federal. Entretanto, com a posse das terras, o Estado passou a gerir o território que se mudavam para a cidade eram assentadas em locais sem conexão
protegendo de maneira feroz os interesses do mercado, dando privilégios de com o que era construído. Assim, garantiu-se a estratificação da sociedade
acesso às terras urbanas de acordo com o poder aquisitivo dos ocupantes e e, consequentemente, a intolerância à diversidade. Até hoje o Plano Piloto
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dessa forma também conseguiu manter as disputas de classe bem distantes não chegou ao número de habitantes para o qual foi planejado, esperava-se
dos locais de poder. A segregação socioespacial que aconteceu em Brasília 500 mil pessoas e atualmente habitam menos de 300 mil.
foi promovida pelo próprio Estado para manter o controle e a ordem.
A narrativa da expansão urbana de Brasília é guiada por “ciclos de rebelião e
No início da construção da capital, as áreas destinadas a acampamentos dos legitimação, de mobilizações e dissoluções” (HOLSTON, 1989, p. 298, tradução
trabalhadores eram planejadas para serem destruídas posteriormente. Um nossa). Dez anos após a fundação de Brasília, cerca de 100 mil migrantes
dos primeiros assentamentos para os trabalhadores que chegaram a Brasília haviam se mudado para a cidade procurando por melhores condições de
é hoje o Núcleo Bandeirante, anteriormente chamado de Cidade Livre, por vida. A Região Administrativa do Guará foi construída pelos funcionários da
ser o único lugar onde era permitido o livre comércio, sem impostos, e onde Companhia Urbanizadora da Nova Capital do Brasil (NOVACAP) entre 1967 e
os novos habitantes poderiam experimentar a cidade. Era à Cidade Livre que 1972, em sistema de mutirões, por isso sua localização era mais próxima do
chegavam os ônibus que transportavam trabalhadores em busca de emprego; centro da cidade. Em 1971, cerca de 80 mil pessoas foram movidas para a
também era onde estes compravam suas ferramentas e buscavam empresas cidade satélite de Ceilândia, cujo nome deriva de Campanha de Erradicação de
de recrutamento para trabalhar nas obras. De acordo com Holston (1989), os Invasões seguido do sufixo “lândia”, com origem na língua inglesa para designar
candangos, primeiros habitantes de Brasília, traziam para a capital a esperança terra. Atualmente, Ceilândia é a mais populosa região administrativa, com
de uma cidade diferente das demais, mas foram traídos pelos fundadores ao mais de 500 mil habitantes (PDAD, 2015) e, junto a Taguatinga e Samambaia,
serem censurados em suas demandas por melhores condições. forma a maior conurbação que existe no território fragmentado de Brasília.
26 27
Níveis de segregação de renda nas cidades por país: maiores níveis de entropia indicam maior segregação
Fonte: OECD (2018), Divided Cities: Understanding Intra-urban Inequalities, OECD Publishing, Paris
(http://dx.doi.org/10.1787/9789264300385-en, p. 28)
Planaltina
30.144 habitantes
viagem diária de 40km
para o trabalho
Taguatinga
8% dos postos de trabalho
95.244 postos de trabalho
Ceilândia
51.428 habitantes
viagem diária de 30km Plano Piloto
para o trabalho 43% dos postos de trabalho
513.882 postos de trabalho
Samambaia
32.239 habitantes
viagem diária de 35km
para o trabalho Ceilândia
6.7% dos postos de trabalho
80.842 postos de trabalho
Deslocamento diário para o trabalho Densidade versus áreas urbanas com maior disponibilidade de postos de trabalho
Fonte: PDAD, 2013 Fonte: IBGE, Censo 2010; PDAD, 2013
Mapa: Mariana Bomtempo (editado) Mapa: Mariana Bomtempo (editado)
As desigualdades socioespaciais e as distâncias são barreiras difíceis de
superar, de forma a subverter a utopia da cidade sem diversidade que Bra- Referências
sília deveria ser. Os desafios da capital brasileira são imensos para que a
cidade, ao invés de ser um retrato da realidade do país, seja um exemplo BRASIL. Instituto Brasileiro de Geografia e Estatística (IBGE). Censo Demo-
de construção urbana que reflita o futuro que não chegou nos primeiros 60 gráfico, 2010. Disponível em: <http://www.ibge.gov.br>. Acesso em setembro
anos depois da sua inauguração. Entretanto, há potencial na cidade princi- de 2015.
palmente partindo-se das forças sociais que atualmente buscam seu espaço
e identidade. Essas forças são necessárias para ocupar o espaço político COMPANHIA de Planejamento do Distrito Federal. Pesquisa Distrital por
de decisões e gestão para uma Brasília mais inclusiva para todos. Será um Amostra de Domicílios: Fercal. Distrito Federal, 2013. Disponível em: <https://
longo processo até que seja provado que a mudança necessária se dá pela goo.gl/fGRaeD>. Acesso em novembro de 2017.
inclusão social e ocupação da cidade, de modo a torná-la menos injusta com
seus habitantes. Será um longo processo até que seja provado que Brasília _____. Pesquisa Distrital por Amostra de Domicílios: Fercal. Distrito Federal,
32 33
pode continuar sendo patrimônio com diversidade e densidade. Vale a pena 2015. Disponível em: <https://goo.gl/u3oV3G>. Acesso em novembro de 2017.
deixar os candangos tomarem Brasília de volta.
HARVEY, D. Rebel Cities: from the right to the city to the urban revolution.
Londres: Verso, 2012.
São criados o Serviço Federal de Habitação e Ocorre na favela Brás de Pina uma das primeiras
Urbanismo e o Banco Nacional de Habitação experiências em assistência técnica em arquitetura
(BNH), banco esse que incorpora parte das pro- e urbanismo no país, coordenada pelo professor
postas elaboradas pelo Seminário Nacional de Carlos Nelson Ferreira dos Santos e pelo escritó-
Habitação e Reforma Urbana em um projeto de rio Quadra. No local, são desenvolvidos projetos
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financeirização da questão da moradia de inte- participativos para a consolidação da comunida-
resse social pelo regime militar, em clara oposição de, com a qualificação dos espaços públicos e o
A Declaração Universal dos Direitos Humanos às propostas de reforma urbana integrantes do assessoramento para melhoria habitacional. Este
reconhece a moradia digna como um direito da projeto Reformas de Base do governo João Gou- é um simbólico contraponto às constantes remo-
pessoa humana. lart, deposto pelo golpe militar desse mesmo ano. ções de favelas que ocorriam no Rio de Janeiro.
O Decreto-Lei 9.218, de 1º de maio de 1946, Realiza-se o Seminário Nacional de Habitação e Institui-se o Fundo de Garantia por Tempo de Serviço (FGTS), que objetiva
institui a Fundação da Casa Popular, que, com Reforma Urbana (SHRU), encontro promovido pelo financiar a construção de imóveis para os trabalhadores. O fundo, porém,
o objetivo de “proporcionar a brasileiros ou es- Instituto dos Arquitetos do Brasil (IAB/BR) com substitui alguns direitos trabalhistas relevantes como os que, em alguns casos,
trangeiros com mais de dez anos de residência apoio do Instituto de Previdência e Assistência, garantiam estabilidade no emprego aos trabalhadores de empresas privadas.
no país ou com filhos brasileiros a aquisição ou no intuito de elaborar novas bases de uma política
construção de moradia própria, em zona urbana de habitação e urbanização nacional e de com-
ou rural”, estabelece que estatutos devem limitar preender as mudanças sociais e demográficas Da esquerda para a direita, de cima para baixo:
1. Seminário de Habitação e Reforma Urbana - SHRU
o valor dos imóveis para garantir seu caráter brasileiras. O Seminário do Quitandinha, como Fonte: Revista Arquitetura - IAB , n. 15, setembro de 1963, p. 17 a 24, em que o documento final do
social e veda “obras que não possam ser quali- fica conhecido, é base para políticas públicas Seminário de Habitação e Reforma Urbana de 1963 foi publicado [Arquitetura n. 15, setembro, 1963] (editada)
2. Golpe militar de 1964
ficadas como de tipo genuinamente popular”. A subsequentes e norteador conceitual para vários Fonte: Arquivo Público/DF
ideia da Fundação da Casa Popular começou a movimentos sociais de luta por moradia e direito 3. Vista aérea do Conjunto Zézinho Magalhães - Cecap em construção, 1975.
Projeto de João Batista Vilanova Artigas, Fábio Penteado e Paulo Mendes da Rocha. Artigas repetia que
ser gestada no governo de Getúlio Vargas, como à cidade. “a casa não termina na soleira da porta” em uma tentativa de convencer o BNH a implantar equipamentos
forma de enfrentar a grave crise de moradia que públicos no Conjunto.
Fonte: Arquivo Histórico Municipal de Guarulhos/SP (editada)
afligia principalmente o então Distrito Federal
4. Favela Brás de Pina
e de garantir condições mínimas de vida aos Fonte: SANTOS, Carlos Nelson Ferreira dos. Movimentos urbanos no Rio de Janeiro. Rio de Janeiro (editada)
trabalhadores.
Luiza Erundina é eleita prefeita de São Paulo e cria
o Fundo de Financiamento de Habitações (FU-
NAPS Comunitário), visando à disponibilização
de recursos para o financiamento da produção
de conjuntos de moradia feitos por autogestão,
e garantindo condições a fim de que a popu-
lação organizada possa: contratar assessoria
técnica em engenharia, arquitetura e urbanismo;
implantar o canteiro de obras, adquirir materiais e
ferramentas para construção das unidades; além
Publica-se a proposta do programa de Assistência da contratação de alguma mão-de-obra de apoio
Técnica à Moradia Econômica, (ATME), coordenado aos mutirões. O FUNAPS permite a consolidação
38 39
pelos arquitetos Clóvis Ilgenfritz da Silva, Newton É promulgada a Constituição Federal que traz de escritórios de assessoria, como o Usina – Cen-
Burmeister, Carlos Maximiliano Fayet e Claudio avanços em relação ao direito à cidade; porém, tro de Trabalhos para o Ambiente Habitado, e a
Casaccia e pelos advogados André da Rocha e O BNH é extinto e o direito à moradia, enquanto um direito social, construção de um grande número de edificações
Madalena Borges. Assim, acontece a primeira incorporado à Caixa só seria considerado com a aprovação de uma com maior qualidade e custos significativamente
experiência com a prefeitura de Porto Alegre. Econômica Federal. emenda no ano 2000. mais baixos que os do mercado da construção.
Aprova-se a Lei Federal nº 5.762/71, que transfor- O engenheiro Guilherme Coelho organiza exi- Estabelece-se o Fórum Nacional da Reforma
ma o BNH em empresa pública de direito privado. bições de um filme produzido por ele sobre os Urbana (FNRU), com o objetivo de promover a
conjuntos habitacionais do Uruguai, construídos reforma urbana visando à garantia do direito a
por cooperativas e autogeridos. O filme motiva a moradia, ao transporte e a equipamentos pú-
Associação de Moradia Unidos de Vila Nova Ca- blicos. Sua constituição se dá graças a grupos
choeirinha, comunidade localizada no município e movimentos sociais engajados na luta pelo
de São Paulo, a pressionar a Cohab-SP para a direito à cidade.
construção de moradias. Uma casa-protótipo é
executada em regime de mutirão, transforman-
do-se em um marco da organização comunitária
e da autogestão na luta e produção de moradias. Da esquerda para a direita, de cima para baixo:
1. Capa do livro “Programa ATME” publicado em 1976 pelo Sindicato dos Arquitetos do Rio Grande do Sul
Fonte: Site <http://iab-rs.org.br/noticia/programa-atme-sus-urbano> disponível em outubro de 2018 (editada)
2. Prefeita de São Paulo Luiza Erundina na inauguração do Centro de Convivência Popular da Vila Clara
Fonte: Soma (editada)
3 e 4. Obra do Mutirão 26 de Julho
Fonte: USINA CTAH (editadas)
Inicia-se o Programa de Urbanização de Assenta- O Favela-Bairro é formulado entre 1993 e 1995, em
mentos Populares do Rio de Janeiro (PROAP), mais uma parceria entre a Prefeitura do Rio de Janeiro, a
conhecido como Favela-Bairro, quando o arquiteto e Faculdade de Arquitetura da UFRJ e o Instituto de
urbanista e ex-presidente do IAB Luiz Paulo Conde Arquitetos do Brasil. O IAB organiza um concurso
é Secretário Municipal de Urbanismo e Sérgio Ma- público para definição de metodologias para nortear
galhães, também ex-presidente do IAB é Secretário as intervenções nas favelas.
de Habitação. O programa, financiado pelo Banco Criam-se os Escritórios Modelo de Arquitetura e
41
Interamericano de Desenvolvimento (BID), visa a Urbanismo, propostos pela Federação Nacional
O arquiteto e urbanista Clóvis Ilgenfritz, eleito integrar as favelas à cidade oficial e promove a ur- dos Estudantes de Arquitetura, com a intenção
vereador dois anos antes, consegue inserir a as- banização dos espaços públicos das favelas, obras de oferecer serviços de assistência técnica
sistência técnica para a moradia econômica na de infraestrutura urbana, acessibilidade e melhorias para comunidades de baixa renda e organizar a
Lei Orgânica de Porto Alegre (art. 233). habitacionais. extensão universitária.
1992 1997
Ocorre a Conferência Mundial das Nações É criado o Movimento dos Trabalhadores Sem
Unidas pelo Meio Ambiente, que reconhece o Teto (MTST), pelos integrantes do Movimento
conceito de desenvolvimento sustentável. dos Trabalhadores Rurais Sem Terra (MST),
para organizar a luta pela reforma urbana.
O direito a moradia passa a ser reconhecido como Clóvis Ilgenfritz, então deputado federal pelo Promulga-se a Lei nº 11.124/2005, que dispõe sobre
direito social perante a Constituição de 1988, Partido dos Trabalhadores, propõe o Projeto de o Sistema Nacional de Habitação de Interesse Social
segundo a nova redação de seu art. 6°. Lei nº 6.223/2002, o primeiro referente à assis- e cria o Fundo Nacional de Habitação de Interesse
tência técnica pública e gratuita em engenharia, Social (FNHIS).
arquitetura e urbanismo no Congresso Nacional.
Ocorre em Campo Grande (MS) o seminário Assis-
tência técnica, um direito de todos: construindo uma
política nacional. Em 2007, a relatoria desse evento
é publicada em livro: Experiências em habitação de
interesse social no Brasil. Organizada por Eglaísa
Micheline Pontes Cunha, servidora do Ministério
das Cidades, por Ângelo Marcos Vieira de Arruda,
arquiteto e urbanista da Federação Nacional dos
Arquitetos e Yara Medeiros, a publicação relaciona
experiências em assistência técnica que precedem
a Lei nº 11.888/2008.
A Lei de Assistência Técnica Pública e Gratuita
nas áreas de arquitetura, urbanismo e engenharia
entra em vigor.
2008 2011
É sancionada pelo presidente Luís Inácio Lula da Inicia-se a primeira experiência em implemen- Institui-se o Conselho de Arquitetura e Urba-
Silva, em 24 de dezembro, a Lei Federal nº tação da Lei de Assistência Técnica em Brasília, nismo do Brasil (CAU/BR) pela Lei nº 12.378, de
11.888/2008, que assegura o direito à assistên- organizada pelo arquiteto e urbanista Gilson dezembro de 2010.
cia técnica pública e gratuita para a construção Paranhos e pela equipe de seu escritório, na re-
de habitação de interesse social, abrangendo cém-formada favela do Itapoã.
todos os trabalhos de
projeto, acompanhamento e execução da obra por Inicia-se o projeto Arquiteto de Família, com ex-
profissionais das áreas de arquitetura, urbanismo periências em melhorias habitacionais no Morro
e engenharia, os quais devem elaborar os projetos Vital Brazil, em Niterói (RJ), por meio de um acordo
necessários para edificação, reforma, ampliação de cooperação técnico-científico com o Instituto
ou regularização fundiária da habitação. Vital Brazil.
2016
2015 2017
ABRAHÃO, S. L. O espaço público urbano na perspectiva de Carlos Nelson BRASIL. Decreto-Lei 9.218, de 1º de maio de 1946. Autoriza a instituição
Ferreira dos Santos. In: ENCONTRO DA ASSOCIAÇÃO NACIONAL DE PESQUISA da Fundação da Casa Popular. Câmara dos Deputados, Poder Legislativo,
E PÓS-GRADUAÇÃO EM ARQUITETURA E URBANISMO, 4, 2016, Porto Alegre. Brasília, Distrito Federal. Disponível em: <https://goo.gl/h32NPC>. Acesso
Anais... Porto Alegre: Universidade Federal do Rio Grande do Sul, Faculdade em outubro de 2018.
de Arquitetura e Urbanismo, 2016. Disponível em: <https://goo.gl/LCmThj>.
48 49
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e 183 da Constituição Federal, estabelece diretrizes gerais da política urbana
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ATHIS — INTRODUÇÃO À EXPERIÊNCIA
NO DISTRITO FEDERAL
50 51
A precariedade das condições de moradia se impõe atualmente como um Paralelamente às ações institucionais, a população não atendida encontrou
desafio a ser enfrentado, demandando ações de caráter multidisciplinar e a sua solução habitacional ocupando locais que são rejeitados pelo mercado,
articulação de saberes em prol da população menos favorecida. Esse contexto como áreas de proteção ambiental ou de risco. O resultado tem se apre-
resulta de um processo histórico de exclusão socioespacial e inadequação sentado como territórios nas cidades em que a moradia se estabelece de
de soluções, agravado pela rápida urbanização pela qual passou o país. forma inadequada, caracterizada pela precariedade das construções, pela
ausência de infraestrutura e serviços urbanos e por riscos provenientes da
O direito à moradia digna é assegurado a todos os cidadãos brasileiros ocupação. Esse contexto não é diferente no Distrito Federal, em que cidades
como preceito constitucional. Significa garantir o acesso à habitação e a se consolidaram a partir da ocupação irregular do solo.
espaços urbanos adequados, visto que a dignidade do habitar se estabelece
pela satisfação de necessidades humanas nos âmbitos privado e público. Diante desse cenário, a prestação de assessoria técnica para melhoria das
Entretanto, parcela significativa da população encontra-se à margem desse condições de moradia apresenta-se como alternativa. Iniciativas relevantes
direito, mesmo com a diversidade de formas de atendimento à habitação foram observadas no Brasil a partir da década de 1970, sendo desenvolvidas
que têm sido implementadas. metodologias de escuta das famílias e a observação de redes estabelecidas.
Reconheceu-se que nos aglomerados habitacionais as famílias estabelecem
Ao longo do século XX, programas públicos voltados à Habitação de Inte- laços sociais e de apoio mútuos responsáveis pelo suporte em situações de
resse Social (HIS) promoveram o acesso a unidades habitacionais ou, em dificuldades. No espaço da casa são acolhidas atividades geradoras de renda
momentos específicos, a oferta de lotes urbanizados, muitas vezes exigin- diante da informalidade e instabilidade das relações de trabalho.
do reassentamentos ou regularização fundiária. Realizaram-se soluções
quantitativamente significativas, embora com alcance limitado em face das Esses saberes orientaram a articulação da produção de habitações com a
proporções da demanda. urbanização desses assentamentos precários. Entendeu-se que a solução
habitacional perpassava a fixação das famílias onde as condições físicas e
Na última década, as ações caracterizaram-se, predominantemente, pela ambientais permitissem. Gestores públicos em parceria com movimentos
produção de empreendimentos em grande escala construídos nas periferias populares viabilizaram a emergência de experiências distintas. Ações volta-
das cidades. As soluções pautaram-se pela repetição de padrões urbanísticos das à prestação de assessoria técnica para a construção, ampliação ou a
e arquitetônicos que desconsideram as particularidades regionais e locais. regularização de habitações foram observadas a nível nacional.
O público alvo é composto pelos excluídos do mercado formal da habitação
e o atendimento resulta, em muitos casos, no afastamento de famílias de No Distrito Federal, em fins da década de 1990 foram criados programas
seus núcleos sociais prévios e de vínculos de trabalho, sem a oferta de uma para ampliação do acesso a soluções habitacionais. No âmbito do “Programa
estrutura urbana e de serviços adequada. Morar Legal” promoveu-se a prestação de assessoria técnica a movimentos
organizados para a construção de moradias com qualidade e baixo custo por
meio do regime de autoconstrução em terrenos ou projeções administradas A implementação da Lei da Assistência Técnica no Distrito Federal destaca-se
pelo gestor público. Para famílias residentes em ocupações irregulares no cenário nacional a partir da instalação de dez escritórios de prestação de
históricas o programa previu a urbanização com regularização fundiária ou serviços nas comunidades mais carentes, viabilizando o acesso à assistência
reassentamento com solução adequada de moradia. O “Programa Casa da social, de arquitetura e engenharia, para elaboração de projetos e execução
Gente” consistiu na prestação de assessoria técnica para construção de de obras. As equipes em Postos Avançados disponibilizaram soluções téc-
novas habitações e qualificação de moradias inseguras e insalubres situ- nicas para os problemas urbanos e de arquitetura, facilitando o atendimento
adas em áreas passíveis de regularização, com financiamento de material à população e promovendo métodos participativos e democráticos para a
de construção. gestão territorial.
Experiências pontuais para a prestação de assessoria técnica à população São experiências que apontam a prestação de assistência técnica pública
menos favorecida foram continuadas em contextos específicos do país, e gratuita como ação efetiva para se viabilizar condições de moradia digna,
fortalecendo o debate em torno das dificuldades legais e operacionais para contemplando-se necessidades e expectativas no âmbito da habitação e
52 53
sua implementação. Em 2008, a aprovação da Lei Federal nº 11.888 – Lei do espaço urbano. Respeitadas as restrições físicas e ambientais, a asses-
da Assistência Técnica - coroou um histórico de lutas para se assegurar às soria técnica favorece a fixação das famílias em seus locais de ocupação,
famílias de baixa renda o direito à assistência técnica pública e gratuita para permitindo a preservação de laços sociais e, em muitos casos, do acesso a
o projeto e a construção da HIS, estabelecendo o marco regulatório para sua oportunidades de geração de renda, fundamentais à sustentação da vida.
realização. Percorridos dez anos de vigência, a implementação se restringe a Um caminho de consolidação da dignidade da moradia para a população
programas administrados por governos locais, destacando-se o pioneirismo menos favorecida.
das ações em maior escala realizadas entre 2015 e 2018 pela Companhia de
Desenvolvimento Habitacional do Distrito Federal (CODHAB/DF).
ASSISTÊNCIA TÉCNICA NA CODHAB
2015-2018
54 55
“Assistência técnica” é uma expressão difícil de ser entendida como algo Em 2015, o Governo do Distrito Federal definiu a gestão do território como um
relacionado à melhoria de espaços edificados, ainda mais por comunidades de seus eixos estratégicos de ação. Enquanto território que possui situação
em áreas de vulnerabilidade social que estão tão distantes dos serviços da ocupacional singular, o DF necessitava, além de engajamento político, do olhar
profissão de arquitetura e urbanismo. O termo é ainda muito comumente técnico de profissionais que tivessem sensibilidade para a causa. O governo
entendido como atividade de conserto de equipamentos eletrônicos, como distrital nomeou então dois arquitetos renomados para gerir e executar as
o celular ou a TV. No entanto, no Distrito Federal esse entendimento pôde decisões referentes à ocupação do território e ao deficit de habitação do
ser trabalhado por um período, e muitas pessoas puderam compreender a Distrito Federal: Thiago Andrade e Gilson Paranhos.
assistência técnica como um direito constitucional básico, que prevê o acesso
de todo e qualquer brasileiro à moradia digna. De maneira mais robusta entre Thiago Andrade foi nomeado Secretário da Secretaria de Estado de Gestão
2015 e 2018, a Codhab desenvolveu um trabalho com muitos desafios que do Território e Habitação (Segeth, atual Seduh) e Gilson Paranhos, diretor-pre-
permeiam a segregação socioespacial nas cidades brasileiras, trabalho esse sidente da Companhia de Desenvolvimento Habitacional do Distrito Federal
que concede ao território do Distrito Federal a sua função social. (Codhab). Criada em 2007 pela Lei nº 4.020/2007, a Codhab foi incumbida de
coordenar e executar ações relativas à política de desenvolvimento habitacional
Ao longo das últimas décadas, a preocupação com a qualidade de moradia do DF, garantindo provisão, regularização e requalificação de moradias, bem
nas principais áreas de vulnerabilidade social foi pauta de discussões impor- como fornecimento de assistência técnica às mesmas.
tantes no Brasil. Os anos 2000 mostraram grandes avanços e sensibilidade
quanto ao problema quando consolidaram, por meio da legislação, a Reforma Diante da realidade do terceiro maior deficit habitacional do Brasil, o presi-
Urbana e os debates oriundos ainda da década de 1960. Em 2001, a criação dente da companhia decidiu por fazer uma política de gestão inédita no DF.
do Estatuto das Cidades pela Lei Federal nº 10.257/2011 disciplinou o solo Com visão técnica aguçada de arquiteto e urbanista e sensibilidade social,
urbano quanto à função social da cidade e da propriedade. Em 2008, a Lei resolveu focar não apenas em fazer construções, mas em fazer cidades.
Federal nº 11.888 legitimou os serviços de assistência técnica como sendo Talvez a sua principal decisão gerencial tenha sido a implantação da as-
públicos e gratuitos para famílias com renda de até três salários mínimos. sistência técnica pública e gratuita em arquitetura no âmbito da Codhab,
Pode-se acrescentar que a criação do Conselho de Arquitetura e Urbanismo investindo em compor uma equipe de profissionais engajados na causa da
(CAU), por meio da Lei Federal nº 12.378/2011, possibilitou que os profissio- vulnerabilidade habitacional.
nais arquitetos – historicamente engajados com a problemática da moradia
no Brasil – pudessem atuar mais diretamente na busca por soluções para Implantar a assistência técnica no tempo proposto pelas circunstâncias
prover condições mínimas de habitabilidade a todas as famílias brasileiras políticas foi desafiador, pois, decorridos sete anos da promulgação da Lei
em áreas de interesse social. de Assistência Técnica naquele momento, poucos eram os modelos implan-
tados no Brasil que poderiam ser aplicados no Distrito Federal. Ademais,
os materiais existentes limitavam-se a propostas de atuação dentro da
unidade habitacional; enquanto isso, no Distrito da Cidade) Sol Nascente, na Região Administrativa Os trabalhos desse escritório se destacavam O escritório da ARIS Pôr do Sol, também em Cei-
Federal os arquitetos identificaram in loco grandes de Ceilândia, em 4 de abril de 2015. A localidade sobremaneira, se comparados aos dos outros lândia, foi aberto quando uma especial líder co-
problemas circunstanciais, urbanísticos, sociais e passava por um início de urbanização, cujo projeto Postos de Assistência Técnica instalados, devido munitária, Dona Chica, protocolou um ofício na
ambientais, que agravavam a questão inerente à fora desenvolvido em 2009 para uma realidade à ao diferencial no acompanhamento das obras de Codhab solicitando a abertura da unidade no local;
habitação em si. qual não mais se aplicaria. Isso causou forte im- urbanização de projetos que foram definidos quase o mesmo fez a comunidade da ARIS Vila Cauhy,
pacto social e espacial na área – a execução das uma década antes da execução. A assistência no Núcleo Bandeirante. A Codhab identificou nas
Fez-se necessária uma atuação no aspecto macro- obras desse projeto afetaria a vida de quase 100 técnica se configurava como um forte elo entre duas comunidades problemas em potencial que
habitacional. Não é possível atuar em melhorias mil famílias. O apelo popular ao Governo ensejou o Governo e a comunidade local e passava então justificavam a presença da companhia: a iminência
habitacionais quando a maior parte das habitações maior presença da Codhab na execução das obras, a ser um importante instrumento para reuniões de a comunidade do Pôr do Sol receber obras de
existentes não corresponde ao projeto urbanístico na tentativa de amenizar os impactos sociais e e decisões governamentais cujas pautas eram o urbanização e o impacto ambiental na Vila Cauhy,
aprovado, ou quando tal projeto inexiste para uma habitacionais. próprio Sol Nascente. que dificultava o processo de regularização da área.
área já densamente ocupada. Diante do desafio, Considerando a oportunidade única de atuar junto
56 57
a Codhab tentava responder à seguinte questão: à comunidade como um agente direto nas ações,
como levar dignidade e qualidade habitacional para não hesitou em abrir os dois postos.
as famílias que tanto necessitam delas, a partir de
circunstâncias totalmente adversas?
A implementação da assistência técnica pública e gratuita em arquitetura As equipes foram enviadas às comunidades, inicialmente, para colocar em
e urbanismo pela Companhia de Desenvolvimento Habitacional de Brasília funcionamento um escritório de arquitetura que deveria atender os moradores
iniciou-se em 2015, momento em que a presidência da companhia foi as- como seus clientes. Ao mesmo tempo, algumas das localidades estavam
60 61
sumida pelo arquiteto Gilson Paranhos, nomeado pelo então governador do em obras de drenagem e pavimentação urbana, como Sol Nascente e Porto
Distrito Federal, Rodrigo Rollemberg, no início de sua gestão. As atividades Rico. O Posto pôde então acompanhar de perto o andamento dessas obras,
foram iniciadas quando um pequeno grupo de jovens arquitetos, que já havia já que a Codhab é a instituição pública responsável pelo projeto urbanístico
trabalhado com Paranhos anteriormente, foi convidado a incorporar a equipe e regularização fundiária dessas localidades.
da companhia e buscar formas de levar o trabalho às comunidades e aos
assentamentos informais de menor renda no DF. No princípio, a falta de infraestrutura e de capacidade técnica para desen-
volver o trabalho eram os principais desafios à equipe. Não faz parte da
O primeiro Posto foi aberto no Sol Nascente, em um espaço cedido por um formação do arquiteto lidar com as demandas de comunidades em situação
morador da comunidade. O Posto iniciou seus trabalhos em 06 de abril de de vulnerabilidade, apesar de tais comunidades necessitarem do suporte
2015, e a primeira equipe de arquitetos composta foi enviada para trabalhar desse tipo de profissional. Além disso, há o estigma social de serem lugares
no local. Por se tratar de uma área que não está regularizada, não é possível perigosos e inacessíveis a pessoas que moram em outros locais da cidade,
que o governo possua ou alugue espaços nesses assentamentos, o que atra- agravando-se a circunstância pela falta de conexão de transporte público
palha bastante não só a existência do Posto de Assistência Técnica (PAT) da entre esses pontos e os demais.
Codhab no local, como também a chegada de qualquer outro equipamento
público necessário à qualificação do assentamento. Dentro da companhia, essa nova estratégia também não era vista com bons
olhos por todos. Muitos funcionários temiam ser enviados para trabalhar
No início, não havia infraestrutura adequada ao trabalho, a qual foi chegando dentro das comunidades; outros achavam que esse tipo de trabalho era
aos poucos com a instalação de mobiliário, computadores, internet móvel, uma grande perda de tempo ou demagogia; e havia os que simplesmente
placa de sinalização e água potável. Ao final do ano de 2016, a Codhab alugou não queriam que a ideia desse certo, fazendo o possível para dificultar o
contêineres que foram instalados em algumas das comunidades nas quais cotidiano da equipe que estava na ponta. Essa equipe, cabe ressaltar, era o
o espaço de trabalho teve de ser devolvido ao responsável. Internet de alta principal alvo das demandas da população em relação à falta de compro-
velocidade e impressoras para todas as equipes representaram um feito misso e qualidade de trabalho que o Estado tem representado ao longo dos
alcançado na segunda metade de 2017. Diante das dificuldades, não foram anos para essas pessoas.
poucas as vezes em que os arquitetos responsáveis pelos Postos tiveram
de arcar com recursos próprios os custos de infraestrutura, manutenção e Outra barreira a ser transposta pela equipe foi a resistência da própria co-
funcionamento do local de trabalho. munidade em receber uma instituição do governo no local, principalmente
porque até aquele momento a presença do Estado era apenas repressiva: tanto
em relação à violência urbana quanto à própria existência das ocupações,
que já haviam sido derrubadas por diversas vezes de maneira truculenta e
* Apresentado no III Seminário Nacional sobre Urbanização de Favelas - UrbFavelas, Salvador, 21 a 23 de novembro de 2018. inconsistente.
Posto Posto Posto Posto Posto Posto
Sol Nascente Trecho 1 Estrutural Pôr do Sol QNR Porto Rico Vila Cauhy
(Ceilândia/DF) (Estrutural/DF) (Ceilândia/DF) (Ceilândia/DF) (Santa Maria/DF) (Núcleo Bandeirante/DF)
aberto em abril/2015 aberto em abril/2015 aberto em setembro/2015 aberto em setembro/2015 aberto em abril/2016 aberto em janeiro/2016
O cotidiano de uma sala aberta dentro da comunidade foi capaz de apazi- Apesar das dificuldades, desde o início a equipe foi movida a paixão e a ideais
guar os ânimos, conforme a população foi questionando e entendendo o de que o trabalho do arquiteto e urbanista também deve estar nas áreas mais
trabalho a ser realizado naquele espaço. Além disso, algumas reuniões foram desprovidas da cidade, e há muito a ser feito nesses locais. Faltam espaços
convocadas pelas lideranças comunitárias, e assim a ponte entre governo e públicos de qualidade, não há infraestrutura ou equipamentos públicos, e as
moradores passou a ser direta. Para alguns membros da equipe que estudam casas possuem sérios problemas construtivos que implicam insegurança
e desenvolvem trabalhos sobre participação popular, foi muito interessante e insalubridade para as numerosas famílias que se abrigam sem dignidade.
a vivência cotidiana dentro da comunidade, a partir da compreensão de que Conviver e levar esses problemas às gestões do Governo do Distrito Federal
muitas vezes não há real representatividade por parte das pessoas que se foram a raiz do trabalho da equipe de arquitetos, que buscou meios de mitigar
intitulam lideranças comunitárias, e muitos cidadãos não têm seus anseios a realidade existente.
repassados às camadas mais altas do governo.
64 65
UMA FORMA DE SERMOS BEM-VINDOS:
CUIDAR DO ESPAÇO PÚBLICO PARA ENTÃO
CUIDAR DA CASA DAS PESSOAS
Uma vez dentro da comunidade, algumas ideias que fazem parte do enten-
dimento da assistência técnica foram sendo remodeladas e revistas. Muitas
vezes fomos questionados pelos moradores se faríamos “só o projeto” ou se
Dona Irene em sua residência - Sol Nascente, Ceilândia/DF, 2015
seria fornecido o material de construção, seja por doação, seja por financia- Fonte: Acervo Equipe de Assistência Técnica CODHAB
mento. Além disso, a falta de compreensão do papel do arquiteto e urbanista
é recorrente na sociedade, o que faz da profissão um “bibelô” que reforça
A arquiteta Mariana Bomtempo com dona Luzia em frente a seu novo lote - Porto Rico, Santa Maria, 2016
a desigualdade econômica entre aqueles que podem ou não podem pagar Fonte: Mariana Bomtempo
esse profissional. Portanto, aos olhos da sociedade, o projeto arquitetônico
de uma moradia é só um papel, e o arquiteto um profissional que cuida da
estética. Para as famílias que não possuem condições financeiras de exe-
cutar os projetos, esses papéis representam um sonho distante que não se
tornará realidade tão cedo.
Inicialmente, a Codhab possuía uma verba de 10 mil reais por família para Mesmo com todos os percalços do processo de instalação dentro da co-
pagamento de material e mão de obra, seguindo a tabela do SINAPI e o munidade e de entendimento da lógica daquele espaço para conseguir
percentual dos benefícios e despesas indiretas (BDI). Posteriormente, após propor intervenções urbanas, estabelecer relações de confiança com os
constatado que o desconto do BDI atrapalhava o bom resultado das obras, moradores do local, ouvir as infinitas demandas que existem e confrontar
o valor do subsídio foi aumentado para 13,5 mil reais, que, com o desconto diariamente a realidade da maior parte da população brasileira, somente
do BDI, resultava em aproximadamente 10 mil reais em material e mão de vivenciando o cotidiano do local a equipe técnica passou a compreender
obra. Esse valor conseguiu melhorar significativamente o conflito entre a riqueza de iniciativas e propostas que poderiam ser feitas para aqueles
expectativa e realidade do projeto; entretanto, os valores orçados para os lugares. É essencial uma postura ativa dos profissionais da Arquitetura para
insumos costumam ser superiores ao valor com que os moradores arcam buscar meios de transformar as moradias e as cidades. Somente quando se
por meio da autoconstrução, e há desconfiança em relação à equipe técni- coloca em prática o que está na lei é possível identificar estratégias e definir
ca. Quando esse trabalho é comparado com aquele desenvolvido por uma metodologias que melhor se adequem à realidade das pessoas e dos locais.
iniciativa de empresa social, a compreensão dos limites do que pode ser Desenvolver projetos que visem à qualidade das áreas públicas é primordial
feito dentro de um orçamento é claro e tangível, pois é a família que arca à aplicação do trabalho de assistência técnica de maneira holística, pois não
com os próprios custos da construção. Dessa forma, tem sido realizado o faz sentido aplicar dinheiro público para melhoria da habitação das famílias
programa Melhorias Habitacionais, cujo processo será detalhado em outro se os moradores, ao saírem de casa, encontram ruas sem pavimentação e
capítulo desta publicação. esgoto a céu aberto.
MUDANÇA DE PERSPECTIVA: DE ATHIS PARA ATUAIS
(ASSISTÊNCIA TÉCNICA EM URBANISMO E ARQUITETURA DE INTERESSE SOCIAL)
Existe muita ignorância entre os responsáveis pelas cidades que estão no E dessa prática inovadora, propomos que o trabalho de assistência técnica
topo. Não há escapatória, pois as grandes cidades são simplesmente grandes deve ativar as nesgas de espaço urbano que sobram dos assentamentos
e complexas demais para que sejam compreendidas em detalhe de qualquer informais, para torná-las espaços públicos de qualidade; criar arborização
perspectiva - quer a das altas esferas, quer a de qualquer ser humano. Mesmo urbana que acompanhe as ruas e calçadas, contribuindo para cidades mais
assim o detalhe é fundamental. Os integrantes de um grupo distrital do East bonitas e com temperaturas mais amenas; desenvolver meios para a mobi-
Harlem, antes de um encontro com o prefeito e seus secretários, (...) fizeram lidade coletiva e principalmente para a mobilidade ativa, a fim de que não se
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o seguinte comentário: ‘Devemos salientar que constatamos frequentemente dê preferência ao transporte individual; desenvolver projetos de melhorias
que nós, que moramos e trabalhamos no bairro, o vemos de maneira bem habitacionais de forma a qualificar e valorizar o esforço das pessoas que
diferente (...) daqueles que apenas passam por ele a caminho do trabalho ou recorreram à autoconstrução; promover meios de buscar a educação urbana,
leem a respeito dele nos jornais ou, mais ainda, acreditamos, daqueles que para que as pessoas se tornem mais conscientes e ativas quanto à realidade
tomam decisões sobre ele em repartições no centro da cidade.’ (...) É uma de nossas cidades e sobre como torná-las melhores. Todas essas e outras
queixa que não deixa de se repetir em todas as nossas grandes cidades. atividades não são necessariamente atribuições de uma mesma pessoa:
o trabalho complexo exige uma equipe e redes multidisciplinares que não
– JACOBS, J. 2009, p. 133 dependam somente das forças do governo, mas que envolvam iniciativas
privadas, terceiro setor, coletivos, empresas sociais, organizações não go-
vernamentais, entre outros. Nesse contexto, o entendimento da assistência
técnica deve passar a ser mais amplo, e é papel dos arquitetos e urbanistas
valerem-se de sua formação generalista para serem capazes de costurar as
A partir da experiência de campo, acreditamos que Como dito por Jane Jacobs, as decisões sobre a relações entre tantos campos disciplinares, de maneira a promover cidades
a assistência técnica em habitação de interesse cidade não devem ser feitas a partir de repartições de qualidade e mais justas com seus habitantes.
social deve ter sua prática reformulada. Deve ser públicas no centro da cidade onde não há convi-
assistência técnica de urbanismo e arquitetura de vência com a realidade, e a assistência técnica
interesse social, pois a intervenção dos arquitetos deve abordar essa necessidade como estratégia
apenas na moradia não é o suficiente. Esse fenôme- em sua raiz. O profissional de Arquitetura que trata
no tem sido recorrente desde os tempos do Banco de questões urbanas deve ser um articulador de
Nacional de Habitação (BNH) e foi ampliado pelo processos complexos, que se entrelaçam de ma-
Programa Minha Casa Minha Vida (PMCMV). A neira transdisciplinar. Esse trabalho faz parte da
moradia sem cidade não funciona e é desumana, disciplina de assistência técnica e deve ser feito de
a casa não deve ser desvinculada das relações baixo para cima, em parceria com a comunidade,
sociais que compõem a cidade. Os problemas a costurando os diversos segmentos que compõem
serem tratados pelos profissionais técnicos que os complexos sistemas que articulam a lógica
estão dentro de comunidades de baixa renda são urbana. O entendimento da assistência técnica
complexos, mas somente a partir de uma pers- precisa, portanto, ser atualizado.
pectiva de imersão se torna possível abordá-los Referências
de maneira mais próxima da realidade.
JACOBS, J. Morte e vida das grandes cidades. São Paulo: Martins Fontes, 2009.
2
equipe arq. urb. Luiz Sarmento // abr 2015 - dez 2018
arq. urb. Manuella Coelho // jun 2016 - dez 2018 ações
urbanas
arq. urb. Daniel Melo // jan 2016 - dez 2018
ass. social Telma Souza // jun 2018 - dez 2018
ass. social Késsia Santana // mai 2018 - dez 2018
comunitárias
ass. social Renata Fonseca// ago 2018 - dez 2018
74 75
a ação é atividade
política por excelência
– HANNAH ARENDT
A necessidade de apropriação do espaço urbano pela comunidade é um Ao contrário do pensamento mais “higienista” defendido por Robert Moses
assunto que ganhou importância nos debates sobre as cidades ao longo amplamente seguido, inclusive nos países periféricos, um dos argumentos
do século XX, após as consequências de uma profunda transformação dos defendidos por Jacobs é o entendimento de que o sentimento de segurança
espaços urbanos com a revolução industrial e a popularização do automóvel, nas cidades se dá pelos “olhos na rua” e pelo uso dos espaços urbanos, ou
que modificaram substancialmente a relação das pessoas com o espaço seja, quanto mais diversas são as possibilidades de uso do espaço - que não
público onde vivem, gerando um processo de abandono das áreas comuns deve ser entendido apenas pela lógica dos fluxos - mais protegidas estão
e a propagação de uma quantidade enorme de áreas residuais no tecido as diferentes pessoas que habitam a cidade. Os olhos na rua representam
urbano. O livro da jornalista estadunidense Jane Jacobs - Morte e Vida das a presença de moradores que exercem o papel de vigilantes do espaço pú-
Grandes Cidades, publicado em 1961 - foi um dos principais contrapontos ao blico, de cuidadores e observadores da comunidade, algo fundamental para
pensamento tecnicista e segregador do urbanismo modernista impulsionado combater a principal razão da não ocupação das áreas urbanas nos países
por Le Corbusier. Lançado exatamente um ano após o último grande ato do mais pobres: a violência urbana e o discurso do medo que a acompanha.
modernismo internacional, que foi a inauguração de Brasília, o livro estabele- Um desafio atual é garantir cidades com características impulsionadoras
ceu um novo olhar sobre as cidades e uma ruptura com a lógica modernista do uso da rua para permanência e não somente para passagem, retomando
de pensar e fazer cidades. Os debates de Jacobs sobre a vida cotidiana das uma tradição de vida pública que o Brasil possui e que foi se perdendo por
cidades partiam principalmente de suas observações e vivências de seu bairro, influência dos países hegemônicos na forma de se fazer e viver as cidades.
Greenwich Village em Nova York. Na época, eram recorrentes processos de Esses territórios populares, em grande parte, não são violentos ou a origem
remodelação das cidades americanas para permitir maior fluxo de carros, o da violência urbana, e sim são territórios violentados pelo Estado, por sua
que para Jacobs era o principal motivo de morte das cidades. O urbanista ausência ou presença militarizada.
Robert Moses conduzia essas iniciativas rodoviaristas em Nova York, e, por
isso, o título original do livro em inglês é “Life and Death of the Great American Muitas estratégias podem ser pensadas para favorecer e melhorar o uso
Cities”, já que a autora identificou que essa lógica funcionalista destruía a dos espaços públicos, mas é essencial que se desenvolva a diversidade. O
vida cotidiana urbana. incentivo a múltiplos usos leva mais gente para a rua, já que as dinâmicas
no tempo e os interesses de ali estar são diferentes.
Atualmente, existe um enorme conjunto de práticas de projeto, planejamento
urbano que pensam, planejam e desenvolvem cidades com o foco no usuá-
rio e na sua participação em todas essas etapas, norteados por processos
colaborativos de construção urbana que optam por estruturas horizontais
e reconhecem os valores e a abundância da diversidade de saberes. Os
métodos participativos apresentam a vantagem de incluir a população nas
tomadas de decisão e na construção dos espaços públicos, reforçando a
ideia de que o que é público é de todos e não de ninguém, sendo talvez a
parte mais importante do processo justamente por desenvolver processos
cognitivos que, não sendo facilmente mensurados, são muitas vezes descon-
siderados por iniciativas públicas ou privadas quando tratam da reabilitação
dos espaços urbanos.
76 77
A participação e construção colaborativa de espa-
ços urbanos objetivam atendimento às demandas
comunitárias bem como ao caráter técnico exigido
pelos órgãos de controle e planejamento da cidade.
A conexão dos atores que atuam no processo de
construção urbana se faz eficiente quando propor-
ciona a abertura aos interesses e necessidades
diversos, empoderando efetivamente os usuários
do espaço como parte ativa no processo de trans-
formação. Tais usuários, ao estarem inseridos nas Nas zonas de regularização de interesse social do DF, em geral assentamen-
atividades decisórias, sentem-se reconhecidos, tos formados por processos céleres de urbanização informal, as áreas livres
contemplados e integrantes da comunidade. comuns não são formalmente construídas ou delimitadas, sendo formadas
por pequenas áreas residuais em um tecido urbano parcelado de modo a
garantir a maior quantidade possível de lotes. Há também casos em que
glebas maiores são entendidas como espaços públicos e reservadas pela
comunidade para que sejam consolidados como tal. Eles existem por algum
acordo informal coletivo firmado entre seus moradores que conseguiram
garantir que não fosse ocupado. Essas áreas maiores apresentam maiores
chances de conflitos territoriais entre os moradores que as protegem e os
grileiros.
No intuito de promover melhores cidades e contribuir para processos de O programa tem como objetivo prioritário qualificar os moradores a se fazerem mais presentes e a
regularização mais participativos e próximos à população, durante a gestão áreas livres que ainda não dispõem de elementos ocuparem também esses espaços, construindo
2015-2018 da Codhab iniciou-se um programa de (re) qualificação urbana que favoreçam ou prejudiquem seu uso, bem como possibilidades para uma revisão das noção acerca
baseado na participação social: as Ações Urbanas Comunitárias. O objetivo identificar e intervir em áreas residuais para melho- do espaço público, usualmente compreendido
foi intervir em vazios urbanos para consolidá-los enquanto áreas verdes rar seus atributos. Assim, duas grandes linhas de como espaço de violência. Não existe o vácuo,
de uso público e melhorá-los, por meio da participação da comunidade, atuação estiveram presentes: consolidar espaços sempre haverá alguém se utilizando dos espaços
a fim de protegê-los de parcelamentos e ocupações irregulares futuras, públicos com condições precárias de utilização e públicos, nesse sentido, é fundamental garantir os
bem como combater depósitos irregulares de resíduos urbanos e permitir a ainda identificar locais nas periferias com poten- usos mais adequados e a maior diversidade de
78 79
apropriação das pessoas para seu uso de acordo com seus reais desejos. cial para serem áreas comuns dotadas de lazer pessoas usufruindo desses locais.
As Ações permitiam a colaboração entre organizações sociais, voluntários, e arborização, além de garantir, por meio do uso
moradores e poder público por meio da presença dos técnicos do Posto de imediato, que não sejam ocupadas irregularmente. Um primeiro mutirão das Ações Urbanas Comunitá-
Assistência Técnica. Além dos ganhos físicos e urbanos, o programa rias ocorreu no Sol Nascente trecho 1 ainda sob o
busca, também, trabalhar com os moradores o nome de Se Essa Rua Fosse Minha1 em outubro de
A ausência de áreas urbanas de uso comum com o mínimo de qualidade, e entendimento da cidade e da rua enquanto espa- 2015. Foram realizadas pinturas de fachadas e um
a falta de entendimento sobre o papel do arquiteto do Posto de Assistência ços de vivência comunitária, além de noções de painel artístico. Essa experiência foi bastante exito-
Técnica na comunidade convergiram para estabelecer as primeiras relações educação ambiental e alfabetização urbana. sa, principalmente em relação a mobilização social
entre as equipes da Codhab e a comunidade local por meio das iniciativas e entrosamento entre os técnicos e a comunidade.
para esses espaços. Essa atuação também tinha como objetivo estabelecer Dentro da lógica capitalista, o ócio no espaço A partir dessa primeira ação, ficou clara a eficácia
e reforçar vínculos dos moradores com a rua e promover condições de mo- urbano não é considerado produtivo, somado à dos mutirões para iniciar um processo participativo
radia mais saudáveis e seguras, uma vez que a rua e as relações humanas alienação promovida pelas distâncias entre o tra- mais amplo, e foi estabelecida uma coordenação
que se dão nesses espaços fazem parte do habitar a cidade. Ter acesso à balho e a moradia, sobra pouco tempo para os para desenvolver um programa, que ficou a cargo
moradia é também ter acesso à cidade e seus serviços como transporte, moradores da periferia viverem a sua cidade, e do arquiteto e urbanista Luiz Eduardo Sarmento.
infraestrutura, equipamentos de educação, saúde, bem como áreas comuns os encontros acabam prejudicados pela falta de Após a formulação do Programa Ações Urbanas
de lazer com qualidade. tempo e espaço. Nessa perspectiva, comumente Comunitárias (AUC) a partir dessa experiência
quem utiliza a rua é visto como desocupado, o que inicial, foi composta uma pequena equipe para ficar
A Lei de Assistência Técnica, Lei Federal nº 11.888, foi aprovada 11 anos após gera desconfiança entre os que estão dentro e fora à frente dos mutirões que deveriam ocorrer com
a inclusão da moradia como direito social na Constituição e é uma das ferra- de casa. Essa visão é reforçada por programas regularidade nas áreas onde existiam postos de
mentas para o acesso a esse direito. Ainda que o foco da legislação esteja na sensacionalistas de televisão, e mais recentemente Assistência Técnica. Ficou estabelecido que todos
habitação, a lei também afirma que é objetivo da assistência técnica “propiciar por vídeos de redes sociais, que repetem casos deveriam adotar a mesma base metodológica,
e qualificar a ocupação do sítio urbano em consonância com a legislação ur- de violência urbana à exaustão, esvaziando ainda criando uma unidade para o projeto, inclusive em
banística e ambiental”. Este aspecto da lei reforça um entendimento de que a mais as ruas daqueles que realmente podem fazer suas visualidades.
moradia urbana faz parte de um contexto que deve ser entendido de forma um uso mais saudável.
unitária. Por isso, a estratégia de atacar primeiramente os problemas das áreas
coletivas foi importante para dar início ao processo de implementação da lei O processo de mobilização é, assim, ferramen-
nas comunidades, funcionando como uma etapa prévia às ações de melhorias ta de mudança de paradigma na cultura urbana 1 Inicialmente, o Ações Urbanas Comunitárias se chamava Se
Essa Rua Fosse Minha. Com o passar o tempo e a ampliação
habitacionais, em um processo de construção de confiança e aprendizado entre brasileira frente ao que se entende e como se das atividades de atuação além de pintura em fachadas,
técnicos e moradores, já que as intervenções dentro das moradias requeriam utilizam os espaços públicos na cidade. O discur- optou-se por alterar a denominação do programa e conside-
rar o nome inicial apenas como um dos eixos de atuação do
uma relação de maior familiaridade entre as partes. so de apropriação da rua vem, assim, convencer trabalho.
A partir da segunda experiência do mutirão, o programa definiu a ação como
estratégia de mobilização social e introdução do programa de ATHIS nas co-
munidades, reforçando o entendimento da atuação por meio de parcerias entre
diferentes agentes, tendo sempre na uma coordenação governamental, uma
coordenação técnica voluntária (ONGs, Coletivos, etc.) e uma coordenação
formada por lideranças locais. Entes governamentais como a Companhia
Urbanizadora da Nova Capital (Novacap) e a Administração Regional da
Ceilândia se mostraram valiosos e interessados em apoiar a transformação
do local escolhido com mão de obra e insumos.
80 81
cuidados importantes:
_ tempo para envio de ofícios;
_ cronograma para adequação
dos trabalhos com capacidade
da equipe de obra;
_ escolher áreas compatíveis
com os prazos internos e
recursos humanos para
execução;
_ quando um mutirão não for
suficiente para concluir a ação,
ela deve ser planejada em
etapas.
Fluxograma das etapas do programa Ações Urbanas Comunitárias, 2016 Ação-piloto do programa Ações Urbanas Comunitárias - Sol Nascente, 2016
Fonte: Acervo Equipe de Assistência Técnica CODHAB Fonte: Luiz Eduardo Sarmento
82 83
reunião para
apresentação do projeto
COMO SE DÁ A
PARTICIPAÇÃO
AUC #8, 2016
A participação da comunidade se dava, inicialmente, pela Numa segunda reunião, também com ampla divulgação,
Um bom exemplo ocorreu na
criação, manutenção e fortalecimento de vínculos entre era apresentado o anteprojeto para avaliação e discus- comunidade de São Sebastião
os técnicos e as lideranças comunitárias por meio do são com a comunidade. São alinhadas as expectativas para a realização de intervenção
na praça central do Residencial
contato cotidiano com a presença do Posto. Os locais e, caso o projeto fosse aprovado, dava-se início à or- Vitória, posteriormente denominada
com potencial de se tornarem espaços verdes de per- ganização das próximas etapas, visando promover o pelos moradores como Praça da
Vitória. Em encontros promovidos
manência eram identificados via imagens de satélite e mutirão, definindo as frentes de trabalho e a logística pelo programa Ações Urbanas
apresentados aos moradores que, juntamente com os da ação. Se, durante a reunião, surgissem necessidades Comunitárias com caráter
educativo e participativo, a
técnicos, escolhiam o local mais estratégico para a Ação a de alteração da proposta, o projeto era ajustado e então arquiteta responsável à época,
ser realizada, avaliando conjuntamente alguns fatores. Ao reapresentado à comunidade até que houvesse um Sandra Marinho, desenvolveu
atividades interativas no sentido
se definir o local da ação, os moradores da proximidade consenso. Outras dinâmicas também eram realizadas de elaboração de desenho para a
são convidados a conversar sobre o espaço, seja por para absorver dos moradores suas principais deman- praça e identificação de desejos
para a transformação do lugar. Foi
meio de visitas de casa em casa, convites distribuídos, das, ainda que muitas vezes elas não estivessem claras feita maquete colaborativa e um
carros de som, rádios comunitárias, cartazes, ou grupos para os próprios moradores. Construção de maquete “varal dos sonhos” para as crianças
compartilharem seus anseios em
em redes sociais, visando validar o local escolhido por colaborativa, apresentação de imagens de referência forma de desenho. Também foi
uma quantidade maior de pessoas da região, além de para o projeto, visitas in loco mediadas pelos técnicos, desenvolvida árvore dos desejos com
os adultos a fim de demonstrarem
elaborar um programa de necessidades para a área, entre outras metodologias, eram utilizadas para garan- suas vontades mais importantes
bem como um diagnóstico, mapeando pontos fortes tir amplo entendimento do espaço, das necessidades, para o espaço).
e fracos para a qualificação do sítio. A partir de então, potencialidades e possibilidades para o local.
Fonte: Acervo Equipe de
algum desenho síntese era esboçado. Assistência Técnica CODHAB
A ESCOLHA DO LOCAL INTERESSE E ARTICULAÇÃO DA COMUNIDADE
E DA ADMINISTRAÇÃO LOCAL
1 Inicialmente as Ações tinham o nome Se Essa Rua Fosse Minha e foi realizada de maneira
piloto no Sol Nascente. Após percepção da necessidade de atuação ampliada no espaço público,
o programa ganhou o nome Ações Urbanas Comunitárias, visando absorver demandas de plantio,
paisagismo e instalação de mobiliários urbanos.
90 91
Se Essa Rua Fosse Minha: Estrutural, 2017 Se Essa Rua Fosse Minha: Fercal, 2017
Fonte: Mariana Bomtempo Fonte: Acervo Equipe de Assistência Técnica CODHAB
BOTANDO VERDE
94 95
Reciclo Urbano: eixo de mobiliário urbano com material reciclado do programa AUC Reciclo Urbano: eixo de mobiliário urbano com material reciclado do programa AUC
Fonte: Luiz Eduardo Sarmento Fonte: Luiz Eduardo Sarmento
Reciclo Urbano: Buritizinho, 2016 Reciclo Urbano: Pôr do Sol, 2016
Fonte: Acervo Equipe de Assistência Técnica CODHAB Fonte: Luiz Ferreira
98 99
GALERIA URBANA
Galeria Urbana: Sol Nascente Trecho 2, 2017 Galeria Urbana: Vila Cauhy, 2016
Fonte: Acervo Equipe de Assistência Técnica CODHAB Fonte: Luiz Eduardo Sarmento
VOLUNTÁRIOS RESULTADOS
104
De maneira geral, a maioria dos voluntários que participavam de uma Ação
eram jovens estudantes de arquitetura que buscavam experiência pessoal
1 25 39 8
ação urbana ações urbanas ações urbanas ações urbanas
no trabalho social e, ainda, experiência profissional no tocante à realização
em 2015 em 2016 em 2017 em 2018
de trabalho em urbanismo de caráter emergente e colaborativo.
227 4995
famílias famílias
beneficiadas beneficiadas
diretamente indiretamente
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DISPONÍVEL:
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02 109
03
04
Diversas comunidades, imbuídas do desejo de intervir do córrego Riacho Fundo, que separa a comunidade Inicialmente, a praça era tida como terreno baldio e Mais de uma dezena de palmeiras imperiais adultas
em seus bairros e torná-los melhor habitáveis, deram do bairro oficial. As margens do córrego, tratadas por isso acumulava resíduos urbanos e funcionava foram salvas e, ao executar por completo o projeto
prosseguimento ao processo de transformação do como espaço violento que deveria ser evitado, foram como depósito de materiais de construção para lojas desenvolvido junto aos moradores em contraponto
espaço após a finalização da Ação Urbana. Além da o local escolhido para as ações, que tiveram caráter vizinhas, além de servir como estacionamento de ao projeto de 2008 que desconsiderava o local e
visão de cuidado e manutenção dos itens instalados educativo e ambiental. Equipes especializadas em caminhões. Ainda que apresentasse um parquinho as palmeiras, reflete a importância de ter técnicos
e/ou renovados em mutirão, novos elementos foram preservação ambiental foram convidadas a integra- infantil e uma parada de ônibus e contasse com arquitetos e urbanistas atuando em conjunto com as
110 111
inseridos na dinâmica dos espaços a partir de inicia- rem os trabalhos, dando apoio em oficinas educati- enorme fluxo de pessoas (praticamente toda a co- comunidades na defesa dos interesses locais e no
tivas próprias da vizinhança. vas, no plantio de mudas de árvores nativas de matas munidade que utiliza transporte coletivo passava por desenvolvimento de projetos e obras mais sensíveis
ciliares e no fornecimento de mudas. ali), a área não contava com qualquer infraestrutura, aos desejos, necessidades e espírito do lugar.
A primeira experiência em que isso pôde ser percebi- sendo, inclusive, alvo de ocupações irregulares por
do foi na comunidade Buritizinho, em Sobradinho 2. Durante o primeiro mutirão, o espaço de intervenção grileiros por diversas vezes, existindo um conflito As Ações Urbanas Comunitárias também apresen-
A área estava passando por obras de infraestrutura passou por extensa limpeza e transformou-se em permanente entre os moradores e os posseiros que taram bons resultados na governança do território,
urbana que tornavam o momento propício para a área de estar e passagem de pedestres à beira do reivindicavam a terra. ao promover intervenções que elucidavam o caráter
construção comunitária de áreas públicas já que o córrego. Algumas semanas após a Ação, a equipe público do lugar, e, portanto, foi potente ao evitar ocu-
sentimento de renovação e esperança tomava con- técnica do Posto, em visita de monitoramento, iden- Após reiteradas denúncias de tentativas de grilagens, pações irregulares, mantendo sem edificações esses
ta dos moradores. Foram feitas, assim, três Ações tificou que novas mudas de árvores haviam sido o Posto, atendendo a demandas e denúncias dos espaços identificados como relevantes do ponto de
Urbanas Comunitárias em uma das praças do bairro plantadas no local pelos moradores, demonstrando moradores, desenvolveu projeto urbano e paisagístico vista urbano, ambiental ou que foram categorizados
em que os moradores, sem auxílio de técnicos ou do que faltava apenas uma energia de ativação para participativo e iniciou processo de mobilização com como zonas de risco. O Estado exerceu então suas
governo, já estavam executando. O projeto potenciali- desencadear um processo de ressignificação da a comunidade para criar meios para a utilização da atribuições de ser informativo, educativo e profiláti-
zou o processo ao conectar o conhecimento técnico área coletiva. Ainda que potencialmente algumas área (afastando os grileiros) enquanto atuava junto à co, evitando a necessidade de remoções futuras e
ao desejo e engajamento da população, qualificando das mudas, plantadas ou não na Ação, não tenham Administração Regional para viabilizar a execução do garantindo espaços minimamente qualificados para
os resultados e acelerando o trabalho. sobrevivido, a iniciativa dos moradores reafirmou o projeto. Assim, foram realizadas quatro Ações Urba- o usufruto coletivo no presente.
entendimento daquele vazio outrora residual como nas, objetivando a mudança da leitura e compreensão
Alguns dias após o grande mutirão final, em visita espaço de estar e de preservação ambiental a ser daquele espaço pelos moradores do bairro. Nessas
ao local, a arquiteta responsável pela área identificou apropriado por eles. ações, dentre outras várias atividades, foi construído
novos bancos na praça que não estavam lá quando campinho de futebol utilizando pneus reutilizados
foi realizada oficialmente a Ação Urbana. O aspecto Outro caso emblemático a ser citado para ilustrar para definição dos limites. Em apenas um dia, a área,
artesanal de produção deixava claro o improviso e esse sucesso é o processo de consolidação da Praça que era depósito de resíduos de construção civil,
carinho que haviam sido empregados para elabora- da Vitória, entrada da comunidade Residencial Vitória tornou-se ponto de encontro e lazer dos moradores
ção daqueles mobiliários. em São Sebastião. Fruto de ocupação irregular, o que não possuíam outro equipamento de esporte.
bairro praticamente não dispõe de espaços na cidade
Outra situação ocorreu na comunidade Vila Cauhy, que possam ser convertidos em praças públicas e A Rua das Palmeiras, no Trecho 1 do Sol Nascente,
pertencente no Núcleo Bandeirante, com localização áreas coletivas de lazer. Assim, com olhar técnico e que talvez tenha sido o mais bem sucedido resultado
privilegiada em relação ao centro. Seu processo de apurado, a equipe do Posto de São Sebastião pron- do projeto Ações Urbanas Comunitárias, consolidou
regularização é complexo, tendo em vista a localiza- tamente reconheceu a área como passível de se um largo que foi organicamente construído pela po-
ção ambiental sensível, interferindo na preservação transformar em uma gregária praça urbana. pulação e que seria transformado em uma via banal.
3
equipe arq. urb. Lucélia Duda
arq. urb. Sandra Marinho
// abr 2015 - jul 2017
// jul 2017 - dez 2018 melhorias
habitacionais
adm. Rosane Almeida // jun 2015 - mai 2018
adm. Stéphany Moura // jan 2017 - dez 2018
adm. Amanda Santos // out 2017 - dez 2018
adm. Mozzer Andrade // jun 2017 - dez 2018
ass. social Rosalina Couto // jan 2018 - dez 2018
1 MELHORIAS HABITACIONAIS
2 O DIREITO À MORADIA
3 O PAPEL DA COMPANHIA E A ASSISTÊNCIA TÉCNICA
COMO PROGRAMA DE GOVERNO
4 ESTABELECENDO UMA METODOLOGIA
DENTRO DOS TRÂMITES GOVERNAMENTAIS
MELHORIAS O DIREITO À MORADIA
HABITACIONAIS
O deficit habitacional brasileiro é estimado em 5,572 milhões de domicílios O direito à moradia foi estabelecido no âmbito internacional como direito
nas áreas urbanas, sendo que no Distrito Federal esse número é de 131.537 humano desde a Declaração Universal dos Direitos Humanos proclamada
114 115
unidade habitacionais, segundo a Fundação João Pinheiro (FJP) . Outros 1
em 1948. No Brasil, foi definido como um dos direitos sociais por meio da
15,476 milhões de domicílios são considerados inadequados, ou seja, são Emenda Constitucional nº 26, de 14 de fevereiro de 2000, ao ser inserido de
moradias já existentes que não oferecem condições saudáveis para os usu- forma expressa no caput do art. 6º o direito à moradia, in verbis:
ários. É primordial que haja a melhora na habitabilidade dessas edificações.
Estima-se, ainda, que cerca de 70% das moradias são construídas de maneira ART. 6º
informal por meio da autoconstrução e/ou da autogestão, bem como 77% São direitos sociais a educação, a saúde, a alimen-
das operações de reforma e ampliação2. tação, o trabalho, a moradia, o lazer, a segurança,
a previdência social, a proteção à maternidade e
Segundo pesquisa realizada pelo CAU/BR e Instituto Datafolha (2015), no à infância, a assistência aos desamparados, na
Brasil, mais de 80% das construções são executadas sem suporte profissio- forma desta Constituição.
nal de um engenheiro e/ou arquiteto. Dessa forma, é recorrente problemas
técnicos oriundos da autoconstrução desassistida que têm consequências Isso configura a moradia como um direito fundamental que deve ser as-
como insegurança ou insalubridade da residência para as famílias. segurada pelo Estado a todos os cidadãos brasileiros. A moradia pode ser
assegurada por meio de programas de construção de novas unidades, como
Problemas estruturais, instalações elétricas e hidrossanitárias inadequadas, também por estratégias políticas de fomento à moradia como aluguel social,
alagamento da residência, além de excesso de pessoas por dormitório, falta urbanização e regularização de assentamentos precários, e assistência téc-
de ventilação e iluminação naturais em cômodos de longa permanência nica gratuita para mitigar os problemas da autoconstrução.
foram problemas oriundos da autoconstrução desassistida que a Política
Habitacional aplicada pela equipe de Assistência Técnica da CODHAB durante No intuito de viabilizar a assistência técnica, a sua instrumentalização legal
a gestão 2015-2018 buscou resolver. foi viabilizada no âmbito Federal por meio do Estatuto das Cidades – Lei n°
10.257 de julho de 2001 e no âmbito Distrital por meio do Plano de Habitação
Tais problemas colocam em cheque a habitabilidade dessas casas e, muitas do Governo Federal (PLANHAB). Mais recentemente, também foi aprovada
vezes por conta dessas características, engrossam os números do deficit uma lei específica sobre o assunto, a Lei Federal nº 11.888 – Lei de Assistên-
habitacional. cia Técnica, de 2008, que garante às famílias com renda de até três salários
mínimos assistência técnica gratuita para legalização, construção, reformas
e ampliações nas residências1.
1 FUNDAÇÃO JOÃO PINHEIRO (2015)
2 ANAMACO & LATIN PANEL. (2008). Tendências Latin Panel - Para onde caminha o consumi-
dor? Disponível em: <http://www.anamaco.com.br/resumo_dados_materiais.ppt> [Consult. 18 1 MICHELLI GARRIDO SILVESTRE E LUIZ REYNALDO DE AZEVEDO CARDOSO,
março 2010]. Incentivo À Melhoria Habitacional
ALVENARIA EXPOSTA ESGOTAMENTO INADEQUADO COBERTURA DANIFICADA AUSÊNCIA DE FECHAMENTOS
116 117
INSTALAÇÕES INADEQUADAS
118 119
A Companhia de Desenvolvimento Habitacional comunidades, uma vez que possuem relações observando-se que nesse último caso obrigato- Já na segunda etapa da ATHIS, o subprograma
do Distrito Federal (CODHAB-DF) é uma empresa estabelecidas entre seus habitantes. riamente deveria haver o atendimento a critérios “Melhorias Habitacionais” tinha como objetivo tirar
pública que tem por finalidade executar a Política vinculados à questão de insegurança e insalubri- a proposta de reforma do papel e transformá-la em
de Desenvolvimento Habitacional do Distrito Fe- A partir de uma mudança de postura quanto ao dade, inexistência mínimas de habitabilidade ou obra executada com recursos públicos, conside-
deral abarcando a execução de projetos sociais e real propósito da companhia, foram definidas re- inadequação em relação ao número de integrantes rando um valor de subsídio para todas as famílias
intervenções urbanas de forma a proporcionar a gras para operacionalizar Assistência Técnica em da família e/ou número de cômodos utilizados para o custeio do material e da mão de obra para
otimização da qualidade da habitação. A lei que Habitação de Interesse Social (ATHIS) por meio da como dormitórios. No caso das novas unidades, execução dessas intervenções habitacionais.
estabelece o papel da companhia estipula também sua equipe técnica de arquitetos e urbanistas que a maior parte dos projetos desenvolvidos estavam
que os programas habitacionais de interesse social, atuavam, naquele momento, em dez escritórios relacionados a situações de reassentamentos de Esse programa almejava sanar ou mitigar proble-
além de outras atribuições, devem abranger a me- técnicos instalados nas comunidades mais pobres famílias devido às obras de infraestrutura urbana mas relacionados à salubridade e à segurança das
lhoria habitacional e o fornecimento de Assistência do Distrito Federal. Esses escritórios ficaram mais ou ao risco que suas moradias expunham a seus habitações que foram construídas sem o devido
Técnica (AT). conhecidos como Postos, em alusão aos Postos ocupantes anteriormente. suporte técnico. Apenas as famílias que recebes-
dos SUS, tendo em vista o papel que deveriam sem até três salários mínimos poderiam ser alvos
Ao longo das suas gestões, na maior parte do tem- cumprir dentro do território. Assim, esse programa foi operacionalizado para dessa política. O programa foi estabelecido nesse
po, a companhia produziu somente habitação em que as famílias, conforme determina a Lei Fede- formato no último semestre de 2016, inicialmente,
larga escala por meio de programas como BNH e A ATHIS para as famílias do DF foi dividida em ral nº 11.888/08, tivessem acesso a uma equipe em cinco localidades nas quais estavam implanta-
Minha Casa Minha Vida (MCMV). Entretanto, esses duas fases bem distintas. Na primeira, o objetivo técnica multidisciplinar, composta por arquitetos, dos os Postos de Assistência Técnica, sendo: Porto
formatos não se enquadram nas necessidades das era fornecer o projeto arquitetônico por meio da engenheiros e assistentes sociais que tinham a fun- Rico (Região Administrativa de Santa Maria), Fercal,
populações que vivem nas áreas de interesse social iniciativa “Projeto Na Medida” que resumidamente ção de realizar o levantamento da situação social QNR e Sol Nascente (Região Administrativa da
já consolidadas e que ainda fazem parte do deficit visava a qualificar o uso e o aproveitamento racio- da família e da construção, quando existente, de Ceilândia/DF), e Estrutural (Região Administrativa
habitacional devido à precariedade das constru- nal do espaço edificado de modo a formalizar o forma a possibilitar o desenvolvimento de projeto do SCIA). Esse primeiro contrato durou até o início
ções das residências. Para esses, seria necessário processo da edificação, podendo ser ofertado para de arquitetura personalizado às necessidades de de 2018. Já no fim 2018, o programa passou a
prover a melhoria das suas construções em suas (i) novas habitações ou (ii) habitações existentes, seus usuários. atender as cidades de São Sebastião e Estrutural.
FERCAL
120 121
ESTRUTURAL
QNR
SÃO SEBASTIÃO
PORTO RICO
ESTABELECENDO UMA
METODOLOGIA DENTRO DOS
TRÂMITES GOVERNAMENTAIS
Em março de 2015, os arquitetos iniciaram o processo de ATHIS por meio dos Esse primeiro contrato conseguiu abarcar as cinco comunidades licitadas,
Postos dentro das comunidades socialmente mais vulneráveis e passíveis de entretanto, nem todas as empresas que venceram a licitação compreenderam
regularização do Distrito Federal. Desse modo, foi possível iniciar o relaciona- que se tratavam de projetos personalizados à demanda de cada família e
mento com os moradores, lideranças comunitárias e demais membros que colocaram seus preços muito abaixo do que seria viável para a prestação de
participavam desses territórios e, assim, identificar as principais demandas um serviço adequado. Alguns contratos passaram por muitas dificuldades
desses locais. A experiência comprovou que é de suma importância esse e algumas empresas foram punidas. Os contratos bem sucedidos foram
122 123
contato inicial para esclarecimento da comunidade quanto à finalidade do primordiais para desenvolvimento e consolidação de uma metodologia para
trabalho, visando estabelecer relações de confiança, de forma que a equipe o provimento de assistência técnica por meio do Estado em parceria com
não seja vista como um elemento estranho àquele ambiente. empresas privadas.
Assim, após identificado que havia problemas de irregularidade e risco aos As falhas e dificuldades encontradas puderam ser ajustadas para a segunda
moradores em relação às suas habitações, foi realizada uma parceria, por licitação, já em 2018. Nessa nova contratação, passou-se a utilizar a con-
meio de licitação, com empresas do setor privado para atuar nessas locali- corrência por técnica e preço, de maneira que as empresas concorrentes
dades como representantes da Companhia. Essa contratação foi necessária deveriam comprovar experiência com atendimento de assistência técnica
devido à diversidade de procedimentos estabelecidos para possibilitar o uso de baixa renda para participar do processo. Os pagamentos foram mantidos
de verba pública nas obras de melhorias residenciais. por área do projeto, e foram acrescidos custos para o pagamento quanto à
elaboração dos orçamentos, memorial descritivo, levantamento arquitetô-
A primeira licitação foi realizada por meio de pregão eletrônico pela técnica nico e coordenação/compatibilização de projetos. Além disso, ao invés de
de menor preço. Foram estimados cerca de 40m² de reforma por residência determinar um limite de metragem de atuação por residência, determinou-se
e estabelecidos valores máximos de pagamento por metragem quadrada um limite de valor por projeto e assim uma estimativa de residências para
para os projetos arquitetônico, estrutural e complementares, e fiscalização estabelecer o valor global de contrato. Esse valor total é consumido conforme
de obras. Também foi estimado uma meta de residências para serem aten- desenvolvimento dos projetos e suas complexidades, podendo abarcar a mais
didas por comunidade, além da obrigatoriedade da empresa em abrir um ou menos unidades conforme andamento do atendimento.
escritório no território, contratar parte administrativa e assistente social. O
contrato era para prestação de serviço por empreitada global, levando-se em A partir do firmamento do contrato, iniciavam-se as contagens dos prazos. A
consideração a metragem a ser atendida por residência, multiplicada à quan- empresa parceira primeiramente operacionalizava um escritório físico na comu-
tidade de residências previstas, e paga à empresa conforme desenvolvesse nidade para a qual venceu a concorrência, e por meio das redes estabelecidas
e entregasse os projetos para as famílias e para a Companhia. O pagamento pela equipe de Assistência Técnica iniciava os atendimentos àquelas pessoas
com limite de área dificultava uma justa remuneração das empresas que que tivessem interesse em participar do projeto, atendendo aos critérios es-
muitas vezes lidavam com obras muito maiores que 40m² e que precisavam tabelecidos em lei. A metodologia utilizada para implementar o programa de
de um projeto como um todo para atacar o que seria mais viável dentro do projetos e obras foi desenvolvida e aperfeiçoada pela própria equipe de arqui-
orçamento pré-definido. tetos que ao decorrer do programa buscaram superar os gargalos do processo
para obter melhores resultados e eficácia na prestação do serviço, bem como
adaptar o programa às leis que regulamentam obras públicas, pois não era
possível a aplicação da legislação ipsis litteris de algo tão delicado quanto a
reforma de casas construídas completamente fora de norma.
antes onde acontecem as
melhorias habitacionais
6
11
4 2
10
9
1
3
8
durante
5
depois
Localidades atendidas
pelo programa em 2016/17
124 Localidades com programa em 125
andamento durante 2017 e 2018
Localidades a serem atendidas
pelo programa em 2018
132 133
Entregas dos projetos para as famílias beneficiárias Entregas dos projetos para as famílias beneficiárias
Fonte: Mariana Bomtempo Fonte: Acervo Equipe de Assistência Técnica CODHAB
134 135
ACESSE ACESSE
O VÍDEO: O VÍDEO:
Caso Luiza Rosa: depoimento da moradora, 2017 Matéria sobre Assistência Técnica com destaque para o programa implementado pela CODHAB/DF no Fantástico, 2017
Fonte: Agência Brasília Fonte: Rede Globo
Caso Wilson de Souza Santos: depoimento do morador, 2017 Matéria sobre o programa de Assistência Técnica da CODHAB/DF no Jornal Hoje, 2017
Fonte: Agência Brasília Fonte: Rede Globo
ACESSE ACESSE
O VÍDEO: O VÍDEO:
Por se tratar, na época de um programa muito ino- Dentro do subsídio, eram considerados os gastos da Construção Civil), que também não possui uma foram atendidas pelo programa encontravam-se
vador e com poucas referências dentro do campo com material, mão-de-obra e o BDI da empreiteira relação tangível com os moradores que encontram em situação de extrema vulnerabilidade social, e
prático, a equipe de arquitetos detectou algumas credenciada para a execução da reforma de cada material e mão de obra a preços mais acessíveis provavelmente esse investimento em suas habita-
dificuldades para uma boa execução do trabalho. famílias. De acordo com o acórdão 2369 do Tribunal no mercado quando se trata de obras de menores ções seria o único em uma perspectiva de alguns
A principal delas foi a restrição orçamentária por de Contas da União, eram utilizados valores de refe- proporções. Dentro desse contexto, infelizmente era anos a frente. Outras já se animavam com a obra e
família que primeiramente era de R$10.000 para rência segundo o risco, o porte e demais custos das recorrente que os moradores atendidos ficassem com algumas economias avançavam na melhoria
intervenções em aproximadamente 40m² (2016). empresas executoras para estabelecer o BDI de uma desconfiados quanto à execução das obras de suas de suas residências.
Depois, esse valor foi aumentado para R$13.500 obra de reforma de melhoria habitacional conforme residências e quanto à idoneidade da equipe técnica.
em 2017, e ao final de 2018 para R$15.000 com o programa. Para atender a esses parâmetros, era
a intervenção podendo chegar em até 50m². Em adotado um BDI por volta de 25% do total do custo Mesmo com os aumentos orçamentários e a me-
todos os casos, dentro desse orçamento deveriam por domicílio, restando à família a tangibilidade de lhoria dos procedimentos para o desenvolvimento
ser considerados mão-de-obra, material e o BDI um investimento de 75% em materiais e mão-de-o- do projeto, a situação precária da maioria das casas
136 137
(Benefícios e Despesas Indiretas) necessário para bra, ambos orçados de acordo com a tabela SINAPI atendidas necessitava de um investimento muito
a contratação da empresa por um órgão público. (Sistemas Nacional de Pesquisa de Custos e Índices maior que o estipulado. Muitas das famílias que
É importante ressaltar que, ao longo da realização da obra, a família era acom-
panhada pela equipe multidisciplinar que buscava atender e dar encaminha-
mentos às necessidades e dificuldades encontradas. Esse era o momento mais
delicado, pois infelizmente é na obra que o cliente acaba entendendo o projeto.
Independentemente da classe social, essa falha de comunicação é recorrente.
A equipe técnico-social deveria estar preparada para buscar meios de mitigar
os desentendimentos de maneira a mediar os conflitos com os moradores,
principalmente para não agravar uma situação de vulnerabilidade social.
Uma vez que a intervenção era concluída dentro do orçamento disponível pelo
programa de Melhorias Habitacionais, a equipe reforçava os potenciais da
família em ter em mãos o projeto completo da residência para dar continuidade
138 139
às obras conforme sua necessidade. Dessa forma, com o projeto completo,
as famílias passavam a ser capazes de se planejar melhor para concluir sua
construção e evitar gastos de serviços não previstos ou mal-planejados.
Não houve edição de conteúdo nos textos. Por isso, algumas informações
são apresentadas por mais de um autor. A repetição incidental é resultado da
POSTOS DE
ASSISTÊNCIA TÉCNICA
NO DISTRITO FEDERAL
9
11
3
1 Sede CODHAB
Plano Piloto - RA I
2 ARIS Sol Nascente - Trecho I
Ceilândia - RA IX
5 1 3 ARIS Estrutural
SCIA/Estrutural - RA XXV
6 4 ARIS Pôr do Sol
13 Ceilândia - RA IX
5 ARINE QNR - Quadras 2, 3 e 5
2 Ceilândia - RA IX
4 6 ARIS Sol Nascente - Trecho III
Ceilândia - RA IX
8
7 ARIS Ribeirão - Porto Rico
Santa Maria - RA XIII
8 ARIS Vila Cauhy
Núcleo Bandeirante - RA VIII
12
9 ARIS Vila Buritizinho
Sobradinho II - RA XXVI
10 ARIS Fercal
Fercal - RA XXXI
11 ARIS Expansão Vila São José
Brazlândia - RA IV
12 ARIS São Sebastião
São Sebastião - RA XIV
13 ARIS Sol Nascente - Trecho II
Ceilândia - RA IX
7
SOL NASCENTE + QNR
CEILÂNDIA / DF
SOL NASCENTE TRECHO I
CEILÂNDIA / DF
33 km
SOL NASCENTE TRECHO I
CEILÂNDIA / DF
início da ocupação Final dos anos 1990, intensificada nos primeiros anos dos anos 2000
população Aproximadamente 20 mil habitantes
área Aproximadamente 250,00 hectares
densidade 78,8 habitantes por hectare
renda média mensal R$ 622,30 per capita (PDAD, 2015)
equipe coordenação arq. urb. Isabela Gardés // abr 2015 - out 2016
arq. urb. Erick Mendonça // abr 2015 - abr 2016
arq. urb. Luiz Sarmento // jan 2017 - ago 2017
arq. urb. Lucélia Duda // jan 2017 - abr 2017
eng. Edson Cordeiro // ago - 2017 - dez 2018
As tensões entre a cidade real e a cidade planejada ficaram ainda mais evi-
dentes, sendo enorme o contraste entre o urbanismo sofisticado que surgia
da prancheta e aquele que nascia espontaneamente pelas mãos dos próprios
moradores. As cidades informais “maculavam” a imagem que deveria ser
transmitida de Brasília: cidade ordenada que mirava o futuro. Os acampa-
mentos representavam a imagem de um Brasil passado muito presente. Os
assentamentos informais evocavam as enormes desigualdades sociais de
um país que queria se mostrar moderno, mas que continuava absolutamente
arcaico em muitos aspectos.
156 157
Ceilândia foi planejada simplesmente para erradicar as “invasões”, diferen-
temente do Plano Piloto, que teve sua origem em um concurso público de
projetos, envolvendo em seu planejamento e execução diversos intelectuais,
arquitetos e urbanistas notáveis, com cuidado para construir uma cidade que
fosse referência em espaços urbanos.
A ocupação urbana do Sol Nascente se iniciou A execução do projeto coincidiu com o lançamento
no final dos anos 1990, quando chácaras de agri- do Programa Minha Casa Minha Vida (MCMV),
cultura familiar, implantadas em terras cedidas que, graças aos vultosos recursos investidos pelo
temporariamente pelo Governo do Distrito Fede- Governo Federal, fez com que grande parte dos
ral começaram a ser parceladas irregularmente esforços da estrutura do GDF voltada ao desen-
em pequenos lotes urbanos. Sem que o Estado volvimento urbano e habitacional para áreas de
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interviesse nesse processo de transformação de interesse social ficassem voltados à projetos de
áreas públicas rurais em áreas urbanas irregulares, provimento habitacional, deixando os projetos de
a urbanização se intensificou no início dos anos regularização de favelas em segundo plano, já
2000, quando a região se consolidou como área que esses eram mais complexos e contavam com
urbana ocupada majoritariamente por famílias menos recursos.
de baixa renda.
De 2009 à 2014, a CODHAB, empresa pública res-
Em 2006, atendendo ao Estatuto das Cidades, que ponsável pelas áreas de interesse social do DF,
regulamentou o capítulo Política Urbana da Cons- se especializou em executar grandes empreendi-
tituição de 1988, a Secretaria de Desenvolvimento mentos do Programa MCMV, fazendo a gestão de
Urbano e Habitacional do GDF elaborou levanta- obras de enorme escala e impacto territorial como
mento e mapeamento das ocupações irregulares o Paranoá Parque, na Região Administrativa do
de todo o Distrito Federal, o que permitiu a con- Paranoá - região nordeste de Brasília e o Parque
tratação de um estudo dos impactos ambientais do Riacho, que margeia impressionantes 9 km da
da ocupação urbana nas áreas de preservação DF-001, a Estrada Parque Contorno, na Região do
ambiental das Bordas da Ceilândia - que eram Riacho Fundo. Com obras dessa magnitude, não
basicamente as áreas planas que terminavam em é de se estranhar que a regularização fundiária
vales e bordas de chapada, permitindo o início das tenha ficado em segundo plano.
tratativas para a regularização da área.
A mudança significativa desse quadro acontece
Em 2008, a empresa Saint Germain Consultores em 2015 devido a dois fatores principais. O pri-
Associados foi contratada para elaborar o Projeto meiro deles foi a abrupta queda de contratação
Integrado de Regularização Fundiária, sendo o de novas unidades habitacionais, impactando no
projeto urbanístico de regularização do Trecho 1 funcionamento e nas atividades que a CODHAB
registrado em cartório nesse mesmo ano. havia planejado e estava habituada a executar.
162 163
2012 2016
2015 2017
Processo de urbanização:
Nota-se na primeira imagem,
de 2003, as palmeiras imperiais
marcando a entrada de uma das
várias chácaras da região. Na
sequência é possível identificar
a transformação de áreas de
2018 2018 produção agrícola familiar em
área urbana.
Fonte: Google Maps
A CODHAB NA COMUNIDADE
Em 4 de abril de 2015, foi aberto o Posto de As- A busca por um espaço físico passou por várias
sistência Técnica da companhia, localizado no possibilidades, como a de criar uma unidade mó-
prolongamento da Avenida P4, no Trecho 1 do vel - um ônibus adaptado para funcionar como um
Sol Nascente. escritório de arquitetura e urbanismo, ou um trailer,
o que teria um custo relativamente alto, com tempo
Essa foi a ação inicial da implementação de um significativo para elaboração de projeto e licitação,
164 165
programa de assistência técnica pública e gratuita e ainda criaria a necessidade de contratação de mo-
em engenharia, arquitetura e urbanismo. O objetivo torista. Não havia cargos e muito menos dinheiro
foi aproximar os técnicos do território e da popu- disponível para isso. Também foi cogitado instalar
lação para a qual deveriam trabalhar, facilitando o o Posto em uma das administrações regionais ou
desenvolvimento dos programas de acordo com em outros equipamentos do governo existentes na
as necessidades dos moradores a serem contem- região. O problema dessa segunda opção foi que
plados, bem como o acompanhamento das obras. praticamente nenhuma das comunidades possuía
Posto de Assistência Técnica do Sol Nascente Trecho 1, 2015
algum equipamento público governamental, e as Fonte: Bento Viana - Acervo CODHAB
Nessa etapa inicial, foi preciso enfrentar desafios administrações regiões estavam localizadas nas
significativos, como a impedimento de uma entida- áreas já regularizadas, portanto fora e distante
Apresentação do projeto de regularização fundiária para lideranças comunitárias no PAT Sol Nascente Trecho 1, 2015
de pública construir uma edificação para receber alguns quilômetros das comunidades. Havia ainda Fonte: Luiz Eduardo Sarmento
as equipes. Também não era possível alugar um o óbvio risco de existir uma interferência das admi-
espaço no local para o escritório, já que a área nistrações no trabalho emergente (e por isso ainda
ainda não estava regularizada, além de não possuir frágil) que deveria ser eminentemente técnico e
abastecimento legal de água, energia elétrica e em contato direto com os moradores, sem outros
coleta de esgoto. Outra questão foi convencer os intermediários nem interferência política.
servidores públicos a atuarem em regiões periféri-
cas (finalidade de seus cargos), estigmatizadas e A solução para o problema foi alcançada com
com alarmantes índices de violência. Além disso, os próprios moradores após a apresentação dos
foi preciso enfrentar toda a sorte de problemas objetivos do programa e da intenção de realizar pro-
processuais em uma estrutura estatal que não jetos e obras de melhorias habitacionais, além de
estava habituada, e muito menos possuía rotina e coordenar os processos relativos à regularização
caminhos jurídicos-burocráticos, para atuar dentro fundiária e a obras de infraestrutura e urbanismo.
dessas comunidades. As lideranças comunitárias perceberam a potencia-
lidade do projeto para sanar diversos problemas,
tanto cartoriais quanto físicos da comunidade, e
conseguiram que um dos moradores emprestasse
uma sala comercial que estava sem uso para a
implementação do escritório.
Em poucos dias, a CODHAB fez algumas melhorias no espaço e realocou
equipamentos e móveis de escritório de sua sede, no Setor Comercial Sul,
no coração do Plano Piloto de Brasília, para seu novo posto avançado, no
coração do Sol Nascente.
166 167
Essa capacidade de articular com a comunidade e iniciar de forma imediata
um trabalho de assistência técnica, com poucos recursos, apenas realocando
equipamentos e cargos, realizando o trabalho em parceria com os moradores
atendidos e com os técnicos imersos na realidade em que atuam, talvez seja
a mais importante contribuição da Companhia para a implementação da Lei
Federal nº 11.888/2008.
PAT Sol Nascente Trecho 1 em seu primeiro ano de funcionamento, 2015 PAT Sol Nascente Trecho 1 depois da reforma, 2016
Fonte: Acervo Equipe de Assistência Técnica CODHAB Fonte: Acervo Equipe de Assistência Técnica CODHAB
UM TERRITÓRIO MARGINALIZADO
EM URBANIZAÇÃO ESPRAIADA
O Posto de Assistência Técnica da Codhab estava As distâncias a serem vencidas para o acesso Mas a distância mais significativa é impossível de ser vencida à pé (a não ser
localizado no prolongamento da Via P4, a principal aos equipamentos públicos eram significativas e que quem tente seja um maratonista disposto a se arriscar em acostamen-
via da região conhecida como P-Sul, na Ceilândia, refletem a escala territorial da comunidade do Sol tos de vias de alta velocidade). É aquela que melhor simboliza a segregação
e foi o primeiro equipamento público do governo a Nascente: absolutamente espraiada, como cresce socioespacial da metrópole brasiliense: a distância entre o Sol Nascente e o
chegar à região após o processo irregular de urba- a metrópole brasiliense. Para melhor compreen- Plano Piloto de Brasília (30 km), com essa distância é possível cruzar toda a
nização. Em todo o Trecho 1 do Sol Nascente não são da escala do território da comunidade e das ilha de Manhattan (21km) em sua maior extensão, e ainda sobrariam apro-
168 169
havia qualquer tipo de serviço público permanente distâncias a serem percorridas para os trajetos ximadamente 9 km para serem caminhados até chegar ao Plano Piloto. Isto
para seus mais de 20 mil habitantes. O transporte cotidiano dos moradores, é interessante comparar é, a população do Sol Nascente está a mais de uma Manhattan de distância
coletivo passava apenas por uma rua, localizada na com outras cidades. da área central da metrópole brasiliense.
borda do assentamento, a única onde um ônibus
convencional conseguia fazer as curvas (algo até Adotando o Largo das Palmeiras, na Rua das Pal- Essa enorme distância é tão marcante para os moradores que foi ironizada
então impossível no interior da comunidade). Não meiras no Sol Nascente, como ponto de partida, pelo cineasta Adirley Queirós no filme Branco sai, Preto fica, de 2015, em
existiam escolas, posto de saúde, coleta regular de é possível perceber que as distâncias equivalen- que a população da Ceilândia precisa apresentar passaporte para entrar no
lixo, sistema de abastecimento e nem esgotamento tes às percorridas em caminhos precários pelos Plano Piloto de Brasília.
sanitário. Mesmo a iluminação pública era inexistente moradores da comunidade seriam considerados
em diversos trechos. Os moradores do Sol Nascente excepcionais em cidades mais densas como di-
Sol Nascente Trecho 1, 2015
dependiam dos serviços públicos de Ceilândia para versas grandes capitais mundiais. Fonte: Acervo Equipe de Assistência Técnica CODHAB
praticamente todas as suas atividades rotineiras.
170 171
33 km
SOL NASCENTE
(TRECHOS 1, 2 E 3)
95 mil habitantes PLANO PILOTO
220,3 mil habitantes
Situação das vias encontrada antes da instalação do PAT no Sol Nascente Trecho 1, 2015
Fonte: Alfredo Bezerra
Situação das vias locais no Sol Nascente Trecho 1 após obras de urbanização, 2018 Simulação da proposta de 2008 para as vias locais “compartilhadas” no Sol Nascente Trecho 1. A lógica do
Fonte: Acervo Equipe de Assistência Técnica CODHAB automóvel se impõe. Arborização urbana, ciclistas e pedestres não são priorizados, 2016
Fonte: Luiz Eduardo Sarmento e Daniel Melo
174 175
Pensar ruas completas: espaços de permência para as pessoas, calçadas acessíveis, arborização e
paisagismo. Propostas de redesenho urbano para vias locais compartilhadas, 2016
Fonte: Luiz Eduardo Sarmento e Daniel Melo
O POSTO COMO PRIMEIRO
EQUIPAMENTO PÚBLICO
INSTALADO NA COMUNIDADE
É muito simbólico que o primeiro equipamento público instalado em uma Esse processo inicial foi extremamente interessante. O contato direto com os
comunidade seja um Posto de Assistência Técnica Pública e Gratuita em moradores foi capaz de gerar soluções e projetos que não seriam possíveis se
Arquitetura, Urbanismo e Engenharia. Analisando a quantidade enorme de os técnicos estivessem distanciados do objeto de trabalho. O Programa Ações
planos, projetos e obras de que essas comunidades precisam, nada mais Urbanas Comunitárias, que apresentou excelentes resultados exatamente
lógico que o Estado reconhecer seu passado de ausência no local e iniciar por ter sido criado em parceria com a população e para responder questões
suas ações na área com uma proposta de transformação da realidade. In- urbanas específicas das favelas, é um exemplo de proposta emergente e
176 177
felizmente, sabemos que essa não é a metodologia estatal usual para lidar imbuída do caráter de urgência que as soluções urbanas e os conflitos sociais
com esses territórios, privilegiando e preferindo sempre ações punitivas às demandam nessas localidades.
propositivas.
No decorrer do processo, sempre dizíamos, com certa ironia, que o Posto era
a nossa versão das UPP1, só que ao invés de serem unidades repressoras
do Estado que se espalharam pelas comunidades no Rio de Janeiro (cuja
violência e contradições foram tão bem analisadas na dissertação de mes-
trado da vereadora carioca assassinada Marielle Franco), nossas UPP eram
“Unidades de Projetos Participativos”, espaços propositivos e participativos
implementados nas favelas do DF.
178 179
IMPLEMENTAÇÃO DO PROGRAMA
— EXPERIMENTAÇÕES E RESULTADOS
O posto começou a funcionar contando com três que estávamos ali para mapear as edificações iniciadas em 2014. O Posto, por ser o governo na propostas para o prolongamento da via P4 (onde
arquitetos, uma assistente social, uma auxiliar com intenção de levantar dados para remoção comunidade, passou a desempenhar o papel de o posto estava localizado), do parque urbano e da
administrativa e estagiários. Nessa fase inicial, da comunidade. gestor de todas as operações na área, compatibi- Rua das Palmeiras.
praticamente todos os arquitetos da companhia lizando as atividades e cronogramas e mediando
atuavam direta ou indiretamente no posto. Isso Nos casos em que não havia esse receio, havia ou- eventuais conflitos entre os agentes do governo Na medida em que as obras se desenvolviam,
porque a CODHAB, apesar de ser uma companhia tra questão: a ausência de recursos para financiar e comunidade. ficava ainda mais clara a necessidade de se focar
180 181
com atribuições bastante técnicas, possuía poucos as obras, que deveriam ser arcadas pelos próprios nos espaços públicos, criando vínculos com a
profissionais arquitetos e urbanistas na época. moradores. Sendo assim, garantir os recursos para O início de programa de ATHIS nesse momento comunidade a partir das áreas compartilhadas e
a execução do projeto foi um elemento fundamen- em que estava ocorrendo a regularização e urba- apresentando resultados que impactariam positi-
Essa primeira etapa foi marcada por uma ruptura tal para a consumação do processo. nização foi bastante oportuno, já que as melhorias vamente várias pessoas da comunidade simultane-
da zona de conforto na instituição. Ao aproximar habitacionais iriam acontecer em um ambiente em amente e com grande visibilidade, diferentemente
os servidores e a atuação da Companhia do seu Resumindo: apesar da boa intenção, do planeja- que os problemas locais estavam sendo tratados das intervenções dentro das moradias, que tinham
público alvo, o trabalho enfrentou dificuldades tí- mento e da capacidade técnica, o desejo de iniciar em sua globalidade, resolvendo questões do espa- baixo potencial de comunicação. Ao se dedicaram
picas de um território novo e estigmatizado. Tanto a ATHIS na comunidade por meio de projetos de ço público e simultaneamente as insalubridades e às melhorias do espaço urbano, os arquitetos e
a equipe quanto a empresa pública não possuíam melhorias habitacionais não foi bem-sucedido. o risco estrutural das edificações privadas. urbanistas iniciaram diálogo e um processo partici-
experiência em trabalhar dentro de comunidade Quando existia entendimento entre o técnico e o pativo com os moradores, apresentando resultados
que, por sua vez, desconhecia o trabalho. Os pri- morador, e a fase de levantamento e projeto era Entretanto, a urgência das obras de infraestrutura, e diminuindo os receios. Foi um momento em que
meiros meses foram, portanto, um momento de concluída, dificilmente o que estava no papel se que incluíam a construção de bacias de retenção e os técnicos mediaram muitos conflitos, negociando
aclimatação, de superação de preconceitos, bem tornava obra. Apenas um projeto avançou: a Casa galerias para águas pluviais, sistema de abasteci- remoções para abertura de vias e infraestrutura e
como de elaboração de procedimentos de trabalho. da Dona Irene, que era vizinha do Posto e já pos- mento de água e coleta de esgoto e pavimentação, acompanhando as obras urbanas.
suía reservas financeiras para a obra, que ainda seguindo o projeto de regularização urbanística de
Na época, foram elencados alguns problemas das contou com significativas doações de materiais 2008, que não tinha sido elaborado com participa-
habitações que deveriam ser combatidos, como pela arquiteta responsável pelo Posto à época. ção social e que desconsiderava aspectos impor-
a construção de fossas, reforço ou reconstrução tantes do assentamento, demandaram enormes
de estruturas com risco de colapso, reparos ou Apesar de ter sido o único projeto concretizado esforços e foco da equipe do Posto nas adequa-
reconstrução de telhados, reforma ou construção no período, foi bastante relevante para divulgar ao ções e melhorias do projeto e na mediação dos
de banheiros e cozinha, nessa ordem de prioridade. restante do governo as possibilidades de atuação conflitos, ficando a proposta de executar melhorias
e os resultados que poderiam ser alcançados se habitacionais em segundo plano.
Apesar dos esforços, o programa não obteve o o programa tivesse recursos financeiros para as
êxito esperado. A desconfiança que ainda existia obras. Um dos primeiros trabalhos iniciados foi o de
por parte da comunidade em relação aos técnicos atualização desse projeto, com enfoque nas áre-
era uma barreira considerável. Desconstruir os Ao mesmo tempo, a questão urbana gerava de- as com maiores potencialidades para criação de
receios em relação ao governo por parte de uma mandas permanentementes. O Posto iniciou suas espaços públicos qualificados e que na proposta
população acostumada a só encontrar o lado re- atividades trabalhando em uma ação maior de inicial haviam sido tratados como qualquer outra
pressor do Estado não foi tarefa fácil. Nos primeiros intervenção na comunidade, cujo projeto foi fina- área, sem levar em conta o genius loci, o espírito
meses do trabalho, muitas pessoas imaginavam lizado em 2008 e as obras de urbanização foram do lugar. Nesse período, o foco foi desenvolver
182 183
Equipes de Harvard e da UnB em visita Equipes de Harvard, UnB e lideranças comunitárias em visita ao
ao Sol Nascente Trecho 1, 2015 Sol Nascente Trecho 1 durante as obras de infraestrutura, 2015
Fonte: Acervo Equipe de Assistência Técnica CODHAB Fonte: Acervo Equipe de Assistência Técnica CODHAB
ETAPA 1 ETAPA 2
184 185
ETAPA 3 ETAPA 4
Se na etapa inicial do processo de criação e implementação de um programa Rapidamente percebemos que deveríamos ocupar essas áreas antes que
de assistência técnica realizar melhorias habitacionais era algo difícil, seja alguém as ocupasse como um espaço privado ou como depósitos irregu-
pela desconfiança dos moradores ou pela falta de recursos para financiar as lares de lixo ou ainda como estacionamento, reduzindo o potencial social e
obras, as questões relativas ao espaço público criavam demandas urgentes, ambiental desses espaços.
tanto pelas equipes do governo, pela população ou mesmo pela sensibilidade
dos arquitetos e urbanistas em contato com a comunidade. Há um caráter de emergência no trabalho de urbanização de favelas. Essas
188 189
áreas surgem, dentre outras razões econômicas, sociais e políticas, também
Oriundas de um processo de ocupação informal e processos de grilagem pela morosidade do Estado e seus processos burocráticos desconectados
de terras públicas, as áreas de regularização de interesse social no DF são da realidade de nossas cidades e da maioria da população. Ficou muito claro
carentes de espaços de uso comum e de áreas verdes, o que faz com que para a equipe que as estratégias utilizadas até então não se aplicavam a
as poucas áreas vazias tenham enorme importância para viabilizar espaços um território produzido pela autoconstrução que alcançou uma população
gregários. Esses espaços livres ganharam maior nitidez com as obras de de 100 mil habitantes em um período de pouco mais de dez anos. Por isso,
urbanização e, por isso, passaram a ser visados por grileiros ou utilizados precisamos adotar métodos que gerassem resultado na mesma velocidade
pelos moradores para expandirem seus lotes. com que essas pessoas iam construindo sua comunidade.
Ação Urbana Comunitária na Praça da Quadra 501 - Sol Nascente Trecho 1 (antes), 2016 Ação Urbana Comunitária na Praça da Quadra 501 - Sol Nascente Trecho 1 (depois), 2016
Fonte: Luiz Eduardo Sarmento Fonte: Luiz Eduardo Sarmento
Era preciso caracterizar todos os vazios urbanos identificados enquanto
áreas públicas. Com um crescimento populacional de aproximadamente
10% ao ano, “terrenos baldios” ficam nessa condição por muito pouco tempo,
principalmente quando se é implantado infraestrutura urbana.
Após a finalização das obras em uma rua próxima ao Posto, essa incom-
pletude da obra ficou bastante evidente. Provocada pela comunidade e pelo
presidente da Companhia, Gilson Paranhos, a equipe do Posto elaborou algu-
mas estratégias para, junto à comunidade, melhorar o aspecto da rua, com
tratamento das calçadas, inserção de vegetação e tratamento das fachadas.
Com o nome Se Essa Rua Fosse Minha, foi organizado o primeiro mutirão, em
24 de outubro de 2015. Com materiais de construção doados pela comunidade
e pela equipe, e reaproveitando itens encontrados em depósitos do GDF, o
mutirão começou pela manhã de um sábado e contou com mobilização da
comunidade nos dias anteriores. Alguns poucos moradores aceitaram ajudar
no projeto, inclusive cedendo suas casas como ponto de apoio logístico para
almoxarifado, acesso à água, uso de banheiros, montagem da mesa de café
e ponto de energia. A maioria da população estava descrente que a proposta
daria certo, lembrando o individualismo de seus vizinhos e frustradas tenta-
tivas anteriores de auto-organização.
Cartazes de
divulgação das AUC, 2016 Equipe de Assistência Técnica CODHAB, moradores, voluntários e Coletivo MOB
Fonte: Acervo Equipe de durante mutirão na AUC na Praça da Quadra 501, 2016
Assistência Técnica CODHAB Fonte: Acervo Equipe de Assistência Técnica CODHAB
194 195
Avenida das Palmeiras — Projeto do GDF de 2008: Avenida das Palmeiras — Projeto elaborado pela equipe do PAT Sol Nascente Trecho 1 em 2017:
Prolongamento do eixo viário preexistente, adequação dos lotes em função da via e retirada das palmeiras Desvio do eixo viário em função da preservação das palmeiras e das moradias construídas e tratamento do espaço público
Fonte: Luiz Eduardo Sarmento e Daniel Melo Fonte: Luiz Eduardo Sarmento e Daniel Melo
Em 18 de março de 2017, após as etapas de elaboração do projeto, que con- edificação, que possibilitou que o espaço fosse utilizado para a implantação
tou com a participação da comunidade e ampla divulgação do desenho final, de uma bacia de contenção e para a passagem da tubulação de drenagem
iniciaram-se novos mutirões para a construção de uma praça em um largo pluvial, identificamos ali a possibilidade de fazer uma edição ambiental do
da Rua das Palmeiras. Foram oito ações para finalização da praça. Poste- projeto, criando formas de confluir as intenções de agentes da comunidade
riormente, por demanda da própria população que pressionou o governador, na preservação ambiental, e experimentar metodologias participativas de
foram realizados outros quatro mutirões para reboco e pintura de todas as apreensão, valorização e conservação das APP, arborizando a área residual
fachadas da via. Por meio desse projeto e do empenho da comunidade, foi do entorno da bacia e da borda do córrego.
possível preservar as palmeiras imperiais existentes e consolidar a área verde,
complementando as obras com a execução de arborização e paisagismo, Também foi elaborado um projeto para a criação de um viveiro comunitário
além de mobilizar, pela primeira vez, uma grande parte dos moradores em para a produção de mudas de espécies ornamentais variadas para serem
um projeto comunitário. utilizadas nos logradouros públicos da comunidade e espécies arbóreas
nativas para a recomposição das APP. A ideia era propor um uso controlado
Houve ainda ações focadas na questão ambiental, visando a recuperar uma próximo à área de preservação, ocupando o espaço e evitando, assim, novas
área de preservação permanente às margens de um dos córregos que cortam construções irregulares e, em médio prazo, ampliar o projeto, arborizando
a comunidade. O local, localizado no final do prolongamento da Via P4, na também o entorno das lagoas de contenção e criando um espaço gregário
divisa entre o trecho 1 e 2 do Sol Nascente, até 2016 estava ocupado irregu- permanente para produção comunitária de mudas e educação ambiental:
larmente com um galpão que servia de depósito para uma loja de materiais o Centro de Convivência Ambiental do Sol Nascente. No entanto, devido a
de construção, sendo que a área é relevante do ponto de vista ecológico e conflitos entre lideranças da comunidade, não foi possível continuar o projeto.
de grande risco geológico, dada a topografia da gleba. Com a retirada da
eil
ân
di
a/
DF
196 197
198 199
2017
2018
204 205
A população de baixa renda que vive nas comunidades onde atuamos têm a comunidade e reduzindo a sensação de insegurança para a equipe técnica,
em comum uma enorme dificuldade de acessar serviços públicos. No caso visto que em alguns momentos do dia a região ficava pouco movimentada
dos moradores do Sol Nascente esse quadro é ainda pior, devido à extensão e já havia ocorrido um assalto à equipe.
de sua população e de seu território e à dependência dos equipamentos e
serviços públicos de Ceilândia, a região administrativa mais populosa do DF À medida que as obras de urbanização avançavam, os atendimentos foram
que também padece com equipamentos públicos precários e insuficientes. se tornando majoritariamente relativos à possibilidade de legalização fun-
206 207
diária dos lotes. Nessa época, tivemos a clareza da importância de existir
Após o reconhecimento pela população do Posto como equipamento público, marcos no território demarcando os limites da comunidade e de sua área
o número de atendimentos sociais passou a ser cada vez maior. Sem terem urbana; das áreas de preservação permanente; e das áreas reservadas para
conhecimento sobre a especificidade do serviço prestado, os cidadãos iam provimento habitacional.
ao posto em busca de informações e orientações sobre os mais diversos
tipos de serviços públicos. Algumas das demandas conseguíamos resolver, Os limites abstratos dos mapas funcionam muito bem para os técnicos, mas
mesmo não sendo de nossa atribuição imediata. Outros mais complexos são pouquíssimo eficazes na gestão local e na compreensão do território
encaminhávamos para o Centro de Referência de Assistência Social de pela população. As áreas de preservação permanente, absolutamente legíveis
Ceilândia. Esse tipo de atendimento tomou bastante tempo de trabalho nos mapas oficiais, são de difícil identificação no local, o que dificultava a
dos arquitetos, o que por vezes atrasou os trabalhos de projeto, mas foi apreensão desses limites pela população, já que grande parte já estava bas-
importante para fortalecer os laços com a comunidade e para compreender tante antropizada, prejudicando o entendimento desses locais como áreas
suas demandas, criando um canal de diálogo e confiança entre as partes. de interesse ecológico que precisavam ser mantidos como espaços non
aedificandi preservados ou reabilitados ambientalmente. Por não existirem
Nos primeiros meses, a população chegava com qualquer tipo de necessida- marcos claros e pelo fato da vegetação original ter sido removida, essas APP
des e dúvidas. Com o passar do tempo e o com o consequente entendimento eram compreendidas localmente como terrenos baldios “desperdiçados” que
acerca dos serviços prestados e dos limites de atuação dos técnicos e da poderiam ser ocupados por moradias.
própria CODHAB, a demanda de atendimento foi ficando mais específica e
relacionada principalmente a questões urbanísticas e arquitetônicas. A preservação ambiental “de prancheta” não evitou que centenas de famílias
se instalassem no local, e o que era uma área verde se transformou em área
Nesse processo de atendimento social, que ocorria mesmo de maneira de remoção, com enormes transtornos para todas as partes. É fundamental
precária, a movimentação do espaço foi importante para que a comunidade que as informações incluídas nos planos urbanísticos sejam traduzidas no
fosse se apropriando do escritório e criando ali um local de referência. O Posto território para a população, principalmente as relativas às áreas de preservação
foi ganhando ares de ponto de encontro, inclusive com a cotidiana visita de permanente, já que a preservação ambiental só irá ocorrer se os territórios
pessoas com mais tempo livre como idosos e desempregados que identifi- sensíveis forem identificados nos documentos burocráticos e mapas, mas
cavam ali um espaço gregário e acabavam passando diariamente algumas especialmente se houver a identificação e valoração dessas áreas pela co-
horas no local, aproveitando o fluxo de pessoas para conversar. Assim, a munidade. Isso pode ser promovido por meio de ações de educação urbana
equipe de obras da CODHAB fez uma pequena pracinha em frente ao posto, e ambiental e por meio de outras estratégias para demarcar essas áreas.
com bancos e jardineiras, aproveitando pneus descartados irregularmente na
região, formando um espaço de permanência na área de calçada, potenciali-
zando o local como ponto de encontro, ampliando os canais de contato com
208 209
Registro feito ao final da reunião com as lideranças comunitárias do Sol Nascente Trecho 1 Reportagem realizada pelo Fantástico sobre o trabalho
para tratar das áreas de preservação permanente e da implantação dos parques, 2015 da Equipe de Assistência Técnica nas ARIS do Distrito Federal, 2016
Fonte: Alfredo Bezerra Fonte: Luiz Eduardo Sarmento
Passada a etapa de obras com maior impacto no as- Com o processo de legalização fundiária e as obras Por fim, o Posto se consolidou como o ponto de Vários são os depoimentos de moradores que res-
sentamento, questões relativas à legalização fundiária de infraestrutura em fase de finalização, houve uma referência da comunidade para os assuntos relativos saltam as vantagens da CODHAB e suas equipes
continuaram recorrentes, com muitos atendimentos mudança no perfil das pessoas atendidas. Passamos a território e programas de moradia, de forma que foi técnicas estarem mais próxima de seus “clientes” e
sobre a entrega de escrituras e sobre o processo de a receber muitas pessoas que não moravam na natural que nos momentos de entrega de documen- das dificuldades que eles enfrentavam anteriormen-
escrituração em si. Nessa etapa, a presença do corpo comunidade e que, com a valorização fundiária de- tos e atualização cadastral para participar dos progra- te para se deslocaram ao Plano Piloto em horário
técnico da CODHAB in loco foi especialmente rele- corrente do processo de regularização e urbanização, mas de moradia do governo, o Posto centralizasse comercial para tentar um atendimento, que nem
vante para desenvolver o trabalho colaborativo com a buscavam informações sobre determinados lotes e o atendimento, não só dos habitantes da ARIS Sol sempre ocorria ou era incompleto, necessitando
população, visto que, ao identificar erros no processo áreas, com intenção de comprar imóveis no local. O Nascente, mas também aos moradores das regiões retorno. O acesso aos serviços e programas de re-
de endereçamento (o que era bem comum, dada a atendimento consistia em deixar claro a essas pes- administrativas mais próximas, como Ceilândia e gularização fundiária e moradia, a informações e aos
dinâmica urbana e o desmembramento constante soas a ilegalidade de se comprar imóveis em uma Samambaia. A criação de um aplicativo e a imple- responsáveis técnicos pelos projetos na comunidade
dos lotes, novas ocupações, etc) os moradores iam área de regularização de interesse social. Foi impor- mentação do SEI (Sistema Eletrônico de Informação) foram muito facilitados, permitindo que a CODHAB
ao Posto relatar tais inconsistências, o que permitiu tante identificarmos essa tendência para fazer um permitiram que todo o processo se tornasse digital, cumprisse suas funções legais de maneira mais
que o processo todo fosse muito mais rápido e eficaz, trabalho de educação urbana, munindo a população com a possibilidade de resolver todas as questões satisfatória para seu público-alvo. Com atendimentos
já que, relatado o equívoco, um técnico do Posto ia de informações sobre o processo de gentrificação, cadastrais sem sair de sua região ou comunidade. mais resolutivos, a busca pelos postos aumentou,
checar no local e já fazia as correções necessárias, especulação imobiliária e sobre as vantagens de Se antes essas pessoas precisavam percorrer cerca gerando a necessidade de haver um(a) servidor(a)
evitando que o processo prosseguisse com erro, o manterem o imóvel, garantindo a função social da de 30 km para esse tipo de procedimento, agora a dedicado exclusivamente a essas tarefas.
que iria comprometer toda a numeração das casas terra e valor justo em uma eventual venda posterior, proximidade facilitava muito o acesso a esses ser-
subsequentes e os documentos de escritura. dentro dos prazos legais estabelecidos. viços e o cumprimento dessas etapas burocráticas
para acessar as políticas de moradia social.
O trabalho mais próximo dos moradores gerou a Com a consolidação do programa de assistência As remoções, que até então eram feitas, não raras Se de modo geral as remoções são temidas, existiu
necessidade, não prevista inicialmente, de se fazer técnica da CODHAB, a comprovação da viabilidade vezes, sem aviso prévio aos moradores e aos fun- um caso em que a comunidade foi a principal de-
todo tipo de atendimento social. Isso demonstrou da proposta e o consequente aumento de pessoal cionários do Posto de Assistência Técnica, criavam fensora da medida: o de uma residência que bloque-
a eficácia do Posto enquanto ponto de encontro e recursos, em 2017 foi possível iniciar o trabalho situações complexas e que em vários momentos ava a rua, formando dois becos. Para a instalação
fixo entre o Estado e os moradores, avançando focado em Melhorias Habitacionais no Sol Nascen- fizeram retroceder o processo de construção de da rede de coleta de esgoto e de drenagem pluvial,
em práticas mais democráticas na gestão e con- te, com a abertura de mais dois postos na região, confiança entre os arquitetos e urbanistas e a co- essa casa deveria ser removida. Mesmo após acei-
solidação do território urbanizado, principalmente totalizando então três escritórios em atividade. munidade, já que esta, principalmente no primeiro tar os termos da negociação (que como em todas
nas periferias pobres. O Posto do Trecho 1 continuou concentrado em ano do Posto, acreditava que a CODHAB estava as negociações, por motivos de segurança, nunca
atender às enormes demandas de urbanismo, so- por trás das derrubadas. eram realizadas pela equipe de ATHIS) e de ter re-
Ficou evidente a importância de incluir atendimen- bretudo durante a fase de finalização das obras de cebido um novo lote na própria comunidade, dentro
tos para além do meramente urbanístico e a neces- infraestrutura, de modo que a gestão dos projetos O fato de existir jurisprudência e não existir uma da estratégia de reassentamento da Companhia,
sidade de uma pessoa trabalhando exclusivamente de melhorias habitacionais ficou a cargo da equipe lei que regulamentasse o processo de remoção o morador se negava a desocupar a residência.
210 211
para esse fim. Também ficou clara a efetividade da do Posto localizado no Trecho 2. Em 2018, ambos de edificações construídas em áreas irregulares, Segundo os moradores, ele estaria “segurando”
proximidade dos moradores - a parte mais interes- os Postos foram unificados, visando a otimizar o fazia com que as derrubadas de edificações mais o antigo imóvel na esperança de que, com uma
sada no processo - no acompanhamento de cada trabalho da equipe e permitir a transferência de recentes, que não eram incluídas na linha de corte possível mudança de governo, conseguisse ficar
etapa dos trabalhos técnicos, pois o controle social um dos arquitetos para ser responsável técnico do marco temporal da regularização, ocorressem com as duas casas. A comunidade temia que a
possibilitou que erros fossem sanados antes que o em outra comunidade. sem qualquer tipo de acompanhamento social. judicialização da questão atrasasse ainda mais as
processo avançasse, reduzindo a necessidade de Em um desses casos, o morador que teve sua obras ou as inviabilizasse. Após várias reuniões,
retrabalho, garantindo que os resultados fossem casa derrubada ficou, por vários dias, bastante foi estabelecido um cronograma entre as partes
aprimorados. perturbado psicologicamente e começou a fazer (consórcio da obra, GDF e moradores) e finalmente
ameaças constantes a equipe, como incendiar o a casa foi demolida e as obras concluídas. Mais
Posto, onde ele ia todos os dias. Por isso, tivemos uma vez, a pressão e capacidade de denúncia dos
de adotar medidas de segurança e tentar atender moradores, aliada a proximidade dos técnicos
sua principal demanda que era visitarmos o local do governo, permitiram que um problema fosse
PRINCIPAIS DESAFIOS onde era sua moradia. Isso foi feito com toda a resolvido da maneira mais justa e mais rápida,
214 215
Conseguimos (re)planejar vários espaços importantes, alguns cujas obras
foram concluídas, outros que ainda estavam em obras, e ainda há espaços
em que elas ainda não começaram. É fundamental que o resultado alcançado
no caso da Rua das Palmeiras possa servir de referência para outras vias
tão importantes quanto, como o prolongamento da Via P4 (que ainda não
conta com calçadas, ciclovias e nem arborização, apesar do enorme fluxo
de pessoas, o prolongamento da Via P1 (onde foram executadas apenas as
áreas carroçáveis, sem nenhuma obra que beneficie pedestres ou ciclista, e
nem a arborização urbana foi iniciada) ou a Avenida da Feira do Produtor, para
qual propusemos um redesenho que potencializasse sua vocação comercial
Projeto para o Sol Nascente Trecho 1
e garantisse espaços generosos para as pessoas, privilegiando pedestres e Fonte: Luiz Eduardo Sarmento e Daniel Melo
ciclistas em um fluxo lógico, prevendo espaços para que o comércio coloque
mesas nas calçadas que deveriam ser sombreadas por árvores de grande Vencidas as várias etapas de acomodação da receber um Centro Cultural que atenderia não só
porte. Infelizmente, com a mudança de governo, não conseguimos acom- equipe na comunidade, com as diferentes fases os moradores do Sol Nascente, como também
panhar o desenvolvimento dessas propostas, que por não serem usuais no do trabalho, o natural é que, nos próximos anos, a população da Ceilândia. Ainda na CODHAB,
padrão de obras do GDF e questionarem certos paradigmas, é provável que a CODHAB, por meio do Posto do Sol Nascente, propusemos um concurso público nacional de
não sejam concluídas. se dedique a acompanhar as obras urbanas ainda projeto para escolher a melhor proposta para o
não finalizadas, chegando na etapa de execução equipamento. Porém, o certame precisou ser
Uma maior presença de outros órgãos nesse território também se faz neces- de paisagismo e arborização por meio de mutirões suspenso em atendimento a um decreto do go-
sário. Infelizmente, a maior parte da estrutura governamental atua muito mais em todas essas áreas, na coordenação do desen- vernador que suspendia todos as contratações
enquanto órgãos punitivos que propositivos. O Posto de Assistência Técnica volvimento do projeto e implantação dos parques ainda não consumadas em seus últimos meses
tem vocação de sediar ações de outros órgãos, nem que em alguns dias do lineares por meio de processos participativos e na de governo. A retomada desse concurso seria
mês, consolidando o espaço como uma forma de iniciar os serviços públicos ampliação do programa de melhorias habitacionais, de extrema importância para reparar um pro-
nessas áreas em que eles não chegavam. O Instituto de Meio ambiente e a para atacar o deficit qualitativo que é bastante blema de gestão que nunca se preocupou em
Agência de Fiscalização poderiam ter ali um ponto de referência para pro- alto na região. oferecer espaços adequados para a pulsante
gramas de educação ambiental e urbana. A Defensoria Pública poderia fazer cena cultural local.
atendimentos, e as universidades e outros órgãos que realizam projeto e obra A ausência de equipamentos culturais também
deveriam estar mais presentes ali para desenvolverem métodos de trabalho deve ser resolvida. A existência de uma grande área
mais adequados a essa realidade urbana que os gestores e pesquisadores pública, anteriormente ocupada irregularmente
ainda pouco conhecem. por uma grande rede de supermercados, poderia
Referências
33 km
SOL NASCENTE TRECHO II
CEILÂNDIA / DF
potencialidades Tem limite norte com as quadras QNP e avenida P2 da Ceilândia, confronta-se
a leste com a feira do produtor da Ceilandia, e nordeste com o trecho 1 do
sol Nascente. A área é cortada pela Vicenal 311 que da acesso a DF -180
até a Ceilandia, sendo inserido em Zona Urbana de Expansão e Qualificação.
equipe coordenação arq. urb. Gustavo Guedes // out 2016 - dez 2018
arq. urb. Verônica Almeida // nov 2016 - jan 2017
A REGIÃO E
O ASSENTAMENTO
O Setor Habitacional Sol Nascente (SHSN) localiza-se na Região
Administrativa de Ceilândia – RA IX, 40 quilômetros a oeste do Plano
Piloto. Segundo o Plano Diretor de Ordenamento Territorial (PDOT) de
2009, a área está situada em Zona Urbana de Expansão e Qualificação e é
definida como Área de Regularização de Interesse Social (ARIS).
O Posto de Assistência Técnica (PAT) do sol Nas- Um ano após a abertura, o posto foi transferido para
cente Trecho 2 foi o décimo primeiro Posto da um contêiner na avenida principal (antiga VC-311),
companhia, inaugurado no dia 15 de outubro de o que possibilitou mais visibilidade e acessibilidade
2016, em um espaço cedido pela comunidade na dos moradores ao local.
parte leste do bairro. No mesmo dia, ocorreu a pri-
meira Ação Urbana no trecho e vigésima terceira da As atividades ali desenvolvidas foram: gestão do
224 225
gestão. No evento ocorreu uma mesa redonda da Projeto na Medida e do programa Melhorias Habita-
qual participaram a comunidade, o administrador cionais, promoção de Ações Urbanas Comunitárias
regional de Ceilândia e os arquitetos da equipe, para e atendimento sobre o urbanismo do bairro. Essas
tratar da importância de um ponto referencial da atividades foram desempenhadas pela Diretoria de
companhia dentro da localidade. Para adequar o Assistência Técnica (DIATE), e o atendimento dos
local às necessidades do trabalho, foi promovida cadastros dos programas de moradia.
uma pequena reforma visando atender melhor a
Instalação do PAT Sol Nascente Trecho 2, 2017
Fonte: Acervo Equipe de Assistência Técnica CODHAB comunidade.
Inauguração do PAT Sol Nascente Trecho 2, 2017 Segundo PAT Sol Nascente Trecho 2, 2017
Fonte: Acervo Equipe de Assistência Técnica CODHAB Fonte: Acervo Equipe de Assistência Técnica CODHAB
REGULARIZAÇÃO ESPAÇOS PÚBLICOS
E INFRAESTRUTURA E PARTICIPAÇÃO
O Trecho 2 do Sol Nascente encontrava-se em um processo intenso de ade- Durante o tempo em que esteve presente na comunidade, coube à equipe
quação da malha para viabilização de infraestrutura. Devido à magnitude e do posto o auxílio no desenvolvimento de projetos complementares para a
urgência das questões relevantes ao processo urbanístico do bairro, todo o urbanização do local. A partir de processos participativos com a comunidade,
procedimento técnico e jurídico ficou na sede da Companhia, de modo que foi conjecturada, por exemplo, uma saída de carros da avenida principal do
o Posto fornecia apoio no contato com a liderança local e a comunidade. Sol Nascente Trecho 2 (antiga Vicinal 311) para acesso à avenida P2 – adja-
Nesse aspecto, o PAT era um importante instrumento informativo, por meio cente à Escola Classe 40 de Ceilândia. Sendo essa uma escola primária, sua
do qual os moradores buscam saber sobre regularização, infraestrutura, áreas diretoria e a comunidade requisitaram evitar ao máximo a proximidade do
públicas previstas, áreas de proteção permanente, entre outros. tráfego junto à portaria. Diante disso, o projeto teve como diretriz a criação de
226 227
uma praça que possibilita uma distância segura para o acesso das crianças
à escola, e a rua foi proposta de maneira sinuosa para a desaceleração dos
carros na localidade.
Sol Nascente Trecho 2 - Etapas 1 e 2 Debate de projeto entre equipe técnica e comunidade, 2017
Fonte: Acervo Equipe de Assistência Técnica CODHAB Fonte: Mariana Bomtempo
PAT Sol Nascente
Trecho 2 Posto de Saúde
Escola Classe 40
Mapeamento da intervenção, 2017 Croqui do projeto elaborado em reunião com a comunidade, 2017
Fonte: Acervo Equipe de Assistência Técnica CODHAB Fonte: Acervo Equipe de Assistência Técnica CODHAB
Terreno livre adjacente à Escola Classe 40, 2017 Projeto para a área vazia adjacente à Escola Classe 40, 2017
Fonte: Acervo Equipe de Assistência Técnica CODHAB Fonte: Acervo Equipe de Assistência Técnica CODHAB
230 231
Pintura coletiva de painel artístico durante AUC, 2017 Equipe durante Ação Urbana Comunitária, 2017
Fonte: Mariana Bomtempo Fonte: Acervo Equipe de Assistência Técnica CODHAB
238 239
Caso Adriana:
Levantamento cadastral e projeto (à esquerda)
1 2 5m e banheiro - antes e depois da obra (acima)
Fonte: Acervo Equipe de Assistência Técnica CODHAB
FELIPE LÁZARO
240 241
242 243
Por ser uma experiência pioneira, muito foi debatido entre os próprios técnicos
da equipe e com as lideranças e população locais, foi importante iniciar as
experimentações e metodologias, principalmente para se compreender como
o poder público pode atuar nessa prática em uma legislação que já data mais
de dez anos. A iniciativa de assistência técnica e o programa Melhorias Habi-
tacionais podem, caso haja vontade política, evoluir para uma real alternativa
244 245
aos demais programas habitacionais propostos, movimentando a pequena
economia e tornando mais habitáveis e agradáveis os lares já existentes.
33 km
SOL NASCENTE TRECHO III + QNR
CEILÂNDIA / DF
por Fabiana Lemos
potencialidades Tem limite norte com as quadras QNR e QNP da Ceilândia, confronta-se a
leste com o setor P Sul e nordeste com o setor P Norte da Ceilândia. A área
está enter as rodovias BR 070, DF180 e DF 085 (EPTG), sendo inserido em
Zona Urbana de Expansão e Qualificação.
principais desafios Maior favela linear da América Latina. Maior, mais populoso e com menos infra-
estrutura entre os 3 trechos do Sol Nascente. Trecho com grande extensão de
APPs ocupadas por moradia (risco ambiental e social grave). Trecho densamente
povoado, inclusive população em áreas de risco (erosão grave). Áreas de equi-
pamento ocupadas. Pouca “folga” territorial para equipamentos públicos, o que
prejudica a regularização da área. Grande parte do solo formado por gleissolo
(solo imprório para construção). Lideranças descentralizadas e extremamente
politizadas. Aproximadamente 3000 famílias fora da poligonal de regularização.
Extensa área de chácaras (ainda que improdutivas), aguardando liberação da
SEAGRI para ocupação habitacional (espera desde fev/17). Áreas de afastamento
de córregos e veios d’água ocupadas por habitação. Região com alto índice de
periculosidade. Existencia de número expressivo de habitações em condições
graves de insalubridade e insegurança, abaixo da dignidade humana.
inauguração Setembro de 2015 (QNR) // Março de 2017 (Sol Nascente Trecho III)
equipe coordenação arq. urb. Frederico Barboza // set 2015 - jan 2016
arq. urb. Fabiana Lemos // jan 2016 - dez 2018
ar. urb. Nayanne Marques // out 2018 - dez 2018
Posto de Assistência Técnica na comunidade do Sol Nascente Trecho 3, 2017 Posto de Assistência Técnica na comunidade do Sol Nascente Trecho 3, 2017
Fonte: Acervo Equipe de Assistência Técnica CODHAB Fonte: Acervo Equipe de Assistência Técnica CODHAB
Distrito Federal, o Sol Nascente sofre constan- de alguma forma trouxe uma sensação de segu-
temente com a criminalidade, além da falta de rança para seguir o cotidiano de atendimento na
saneamento básico, poucas ruas pavimentadas e localidade, de segunda a sexta-feira, das 9h às 17h.
iluminadas e o crescimento desordenado. Conviver
com essa realidade diariamente demanda muita A maioria do público que procurava a equipe de
empatia por parte da equipe que muitas vezes não assistência técnica eram mulheres, e as principais
conhece essa realidade. demandas da população local são: participação no
programa Melhorias Habitacionais e do Projeto na
Apesar de o Posto se localizar em área de grande Medida, questionamentos sobre o início das obras
circulação de pedestres e veículos, a equipe passou de infraestrutura urbana, regularização fundiária,
por um assalto a mão armada, ocorrido em junho além de pessoas interessadas em conhecer a situ-
de 2017. O episódio foi traumático para a equipe, ação de lotes à venda na região, conforme sugere o
composta exclusivamente por mulheres à época, gráfico a seguir. Também é recorrente moradores
e fez com que o posto ficasse fechado por um que participam de algum programa habitacional
mês. O contêiner possui uma arquitetura que não encaminharem-se ao Posto para tirar dúvidas sobre
se relaciona com o espaço externo, o que faz com sua situação cadastral. A partir desse atendimen-
que não veja a rua e a rua não veja a equipe. Ao ser to e do contato com a comunidade, foi possível
reaberto, o posto passou a contar com o estagiário identificar as necessidades e as demandas locais
Gráfico de atendimento do PAT Sol Nascente Trecho 3, 2017
Caio Nascimento e o atendente Daniel Braz, o que a serem abordadas pelos técnicos. Fonte: Acervo Equipe de Assistência Técnica CODHAB
REGULARIZAÇÃO
FUNDIÁRIA
Informações do IBGE apontam que, em 2010, a região tinha 56,5 mil mora-
dores. Ainda segundo esses dados, o Sol Nascente estava abaixo somente Uso residencial unifamiliar
da favela da Rocinha, no Rio de Janeiro, em número de habitantes. Já de Uso misto
acordo com a Companhia de Planejamento do Distrito Federal (Codeplan), Equipamento público comunitário
em 2013 o Sol Nascente e o Pôr do Sol, também em Ceilândia, somavam Espaço livre de uso público
78.912 moradores. Líderes comunitários afirmam que a área é atualmente Parque
ocupada por mais de 110 mil pessoas que, em grande parte, vivem sem Uso condicionado
nenhum tipo de infraestrutura básica. APP
Evolução da ocupação do Sol Nascente Trecho 3, 2008 Evolução da ocupação do Sol Nascente Trecho 3, 2012
Fonte: Google Earth Fonte: Google Earth
Evolução da ocupação do Sol Nascente Trecho 3, 2014 Evolução da ocupação do Sol Nascente Trecho 3, 2016
Fonte: Google Earth Fonte: Google Earth
SOBRE A ÁREA DE
RESTRIÇÃO À OCUPAÇÃO
262 263
264
268 269
P=1.10
P=1.10
P=1.10
270 271
O trabalho dentro da assistência técnica é intenso Conquistar a confiança da população foi o desafio
e desafiador. Pela imersão na realidade da comuni- mais árduo, pois existe grande descrédito por par-
dade em que a equipe está atuando, fica-se com- te das comunidades – em especial das de baixa
pletamente vulnerável ao dia a dia do local. Dentro renda – em receber um serviço gratuito que visa
da comunidade, a equipe representa uma parcela aproximar os órgãos públicos das necessidades
do governo desprendida de rótulos ou burocracias, mais latentes da população. Além disso, muitos
272
e isso demonstra uma realidade extremamente moradores ainda têm o sentimento de que um
inovadora, que provoca curiosidade e desconfiança. posto não é capaz de resolver seus anseios, uma
Tal abertura, além de promover amadurecimento vez que em certas comunidades os problemas são
profissional e pessoal aos envolvidos nos postos, muito profundos. Além disso, é comum por parte
apresenta situações inesperadas, e as equipes são de quem esteve na ponta sentir-se desamparado
constantemente confrontadas por situações que por membros do governo, que estando fora de uma
fogem ao seu preparo emocional e profissional. perspectiva participativa, preferem omitir informa-
ções da população e do próprio corpo técnico. Deve
ser uma luta constante a construção de relações
entre técnicos e população para uma cidade mais
participativa e com qualidade.
Referências
SECRETARIA de Estado de Desenvolvimento Urbano e Habitação (SEDUH),
Subsecretaria de Análise de Parcelamentos Urbanos do Governo do Distrito
Federal (SUPAR). Diagnóstico Preliminar dos Parcelamentos Urbanos
Informais no Distrito Federal, Brasília, 2006.
FARIA, R. Cidade mais populosa do DF, Ceilândia sofre com violência e inse-
gurança. Correio Braziliense, Brasília, Caderno Cidades, 09 de outubro de
2017. Disponível em: <https://goo.gl/UaVUHs>. Acesso em novembro de 2017.
SAINT GERMAIN. Relatório das Atividades de Pesquisa Censitária do Trecho Painel artístico executado durante Ação Urbana Comunitária na QNR, 2017
3 do Sol Nascente. Brasília: Saint Germain, 2010. Fonte: Acervo Equipe de Assistência Técnica CODHAB
PÔR DO SOL
CEILÂNDIA / DF
33 km
PÔR DO SOL
CEILÂNDIA / DF
PÔR DO SOL
CEILÂNDIA / DF
potencialidades O Pôr do Sol localiza-se ao sul da cidade de Ceilândia, junto à Área de Desen-
volvimento Econômico - ADE de Ceilândia Sul, praticamente envolvendo toda
a porção sul do Setor P Sul. Ocupa uma área de aproximadamente 115,9396
hectares e pertence à Região Administrativa de Ceilândia (RA IX). Possui como
limites, a norte a EPCL (Estrada Parque Ceilândia) ou Avenida Elmo Serejo
de Farias e o setor QNP da Ceilândia; a leste a Área de Desenvolvimento
Econômico – ADE de Ceilândia Sul, parte da zona de amortecimento da ARIE
Parque JK e; ao sul e oeste a ZP2 - Zona de Preservação Melchior da ARIE
Parque JK. O principal acesso a ARIS Pôr do Sol é feito pela via P5 e Avenida
Elmo Serejo de Farias, continuação da EPCL - Estrada Parque Ceilândia.
principais desafios A ARIS está situada parcialmente sobre a região de relevo caracterizada
como borda de chapada, tambem conhecida como as Bordas da Ceilândia.
Algumas áreas que foram ocupadas após os parcelamentos das chacáras
rurais, sofrem com falta de infraestrutura e estão em grande parte em áreas
condenadas pela defesa civil. (Áreas de risco por erosão grave). Lideranças
comunitárias muito politizadas, porém, nem todas possuem boa comunica-
ção com a comunidade.
equipe coordenação arq. urb. Frederico Barboza // set 2015 - mar 2018
arq. urb. Nayanne Marques // mar 2016 - out 2018
arq. urb. Kariny Nery // out 2018 - dez 2018
O Pôr do Sol foi reconhecido pelo Governo do Distrito Federal como parcela-
mento irregular. Ocupado predominantemente por população de baixa renda,
após a definição do Plano Diretor de Ordenamento Territorial do Distrito
Federal (PDOT) de 2009 tornou-se a Área de Regularização de Interesse
Social (ARIS) Pôr do Sol, para a qual é prevista a regularização fundiária por
parte do poder público.
A comunidade do Pôr do Sol sempre foi muito Uma das principais qualidades do processo de des-
ativa quanto aos seus desejos para a cidade, lu- centralizar a Codhab nas áreas de interesse social
tando por seus interesses junto aos governantes. é vivenciar o local onde essas pessoas residem,
A regularização da área vem se arrastando há entendendo suas reais necessidades; deixar de en-
anos e passou por gestões de governo que não carar mapas e imagens de satélite e experimentar
conseguiram finalizar o processo. O projeto urba- a cidade como ela realmente é.
282 283
nístico teve início em 2008, feito por uma empresa
terceirizada, porém não foi aprovado, pois parte Inicialmente, o trabalho sofreu com a resistência
da região ocupava a Área de Interesse Ecológico da comunidade à atuação do governo dentro do
(ARIE) JK. Em 24 de julho de 2014, o Decreto nº 885 local. A partir daí, começou um período de trabalho
redefiniu a poligonal, fazendo uma readequação entre a equipe técnica e as lideranças comunitárias
da área que ocasionou a revisão do projeto, o qual para fortalecer o contato com os moradores e
aguarda licenças ambientais. buscar apoio para futuras ações. A mobilização
da comunidade foi feita inicialmente por meio das
O Posto de Assistência Técnica (PAT) do Pôr do Ações Urbanas Comunitárias, nas quais a Codhab
Sol foi o quarto Posto implementado pela Codhab requalificava espaços urbanos, com a recuperação
no Distrito Federal, a pedido direto de Dona Chica, de fachadas, pintura de painéis artísticos feitos pela
uma das lideranças comunitárias da região. Após equipe e parceiros; plantio de mudas; instalação
conhecer o Posto instalado no Sol Nascente Trecho de mobiliário urbano com materiais recicláveis,
1, ela buscou informações para compreender o entre outros.
motivo pelo qual a Codhab, enquanto representante
do governo, estaria alocada dentro de uma área A partir de fevereiro de 2018, o PAT passou a ser
de interesse social. Além disso, queria saber como supervisionado pela arquiteta e urbanista Nayanne
levar um Posto para a sua comunidade. A partir Moreira, fornecendo atendimento à comunidade
do seu interesse, ela redigiu um Ofício relatando por meio de projetos de arquitetura e urbanismo,
as carências da comunidade. Poucos meses de- atendimento cadastral nos programas de moradia,
pois, foi instalado o Posto de Assistência Técnica além de sanar dúvidas sobre o andamento do
dentro do Pôr do Sol e, a partir desse momento, processo de regularização fundiária e urbanização.
os problemas passaram a ser resolvidos dentro da
comunidade, com total participação das lideranças.
Como o trabalho de mutirão era algo novo para os moradores, a princípio eles
foram reticentes quanto ao funcionamento das atividades e ao trabalho em
conjunto com o governo. Como a maioria delas sofreu diversas desilusões
com o poder público, o trabalho da Codhab foi principalmente o de restabe-
lecer uma relação de confiança entre governo e população.
Reboco executado com ajuda dos moradores, 2016
Fonte: Acervo Equipe de Assistência Técnica CODHAB
O papel do arquiteto à frente desse trabalho se torna ainda mais importante,
pois o profissional pode explicar tecnicamente os problemas e conflitos das
Pinturas feitas pela equipe Codhab com a ajuda dos moradores, 2016
edificações. Muitas vezes, o técnico passa por momentos em que precisa Fonte: Acervo Equipe de Assistência Técnica CODHAB
conciliar as demandas dos moradores e os problemas no espaço público.
Dando continuidade à primeira Ação realizada em pelas suas moradias. O programa é um primeiro
maio do mesmo ano, foram feitas modificações passo para muitos deles, que dão continuidade
nas casas restantes da quadra 603, totalizando às melhorias, fazendo novos ajustes e finalizando
sete casas rebocadas e pintadas, beneficiando obras inacabadas.
aproximadamente 35 pessoas.
O mutirão também favorece o senso de bem co-
A pintura das residências pode parecer uma mu- mum, o pensamento comunitário e a valorização da
dança pouco significativa, já que elas possuem relação de vizinhança. Essa relação, intensificada
patologias mais urgentes. No entanto, pode-se nas reuniões e Ações Urbanas, faz com que os
286 287
perceber, em muitos locais que passaram por es- vizinhos discutam melhor sobre seus problemas
sas intervenções que os próprios moradores se e se preocupem mais com suas ações.
sentem mais valorizados e desejosos de fazer mais
Pinturas feitas pela equipe Codhab com a ajuda dos moradores, 2016
Fonte: Acervo Equipe de Assistência Técnica CODHAB
Pinturas feitas pela equipe Codhab com a ajuda dos moradores, 2016
Fonte: Acervo Equipe de Assistência Técnica CODHAB
No Pôr do Sol, foi escolhido um local destinado a uma futura praça, onde havia
significativa quantidade de lixo e mato alto, e grande incidência de doenças
na comunidade adjacente, como dengue e hepatite. A equipe da Codhab fez
a limpeza do local com o auxílio de máquinas da Administração Regional de
Ceilândia, e iniciou-se uma obra de terraplanagem para dividir a área em dois
288 289
níveis, de acordo com o projeto proposto pelo Posto de Assistência Técnica.
O local da Praça do Mirante foi denominado assim por ter uma vista privi-
Proposta de leiaute para a Praça do Mirante, 2016
Fonte: Daniel Melo - Acervo Equipe de Assistência Técnica CODHAB legiada. Além disso, possui imenso potencial como área de lazer para os
moradores da quadra 603. Até então, não era utilizado, por ser um ponto
baixo do terreno e com o perigo de erodir, havia muito mato e lixo.
O Setor Habitacional Pôr do Sol não possui nenhuma praça com equipamentos
de lazer adequados. Diante disso, são utilizadas as praças mais próximas,
como a do Setor P Sul de Ceilândia – um deslocamento de no mínimo 500
metros do Pôr do Sol, podendo chegar a 1 quilômetro da quadra 603, onde
está localizado o local de intervenção. Assim, estava justificada a necessidade
de uma área de lazer mais próxima para a comunidade.
Na Ação Urbana Comunitária do dia 9 de julho de 2016, foram reutilizados
120 pneus para a criação de um guarda-corpo para delimitar a área da praça,
devido à proximidade a uma borda de chapada, sendo necessário limitar por
segurança o acesso de crianças, por exemplo.
290 291
Foram instalados 55 metros de meio-fio para barrar a grande quantidade de
esgoto que escorria para o centro da praça. Com a instalação do meio-fio, a
água passou a ser recolhida nas bocas de lobo no ponto mais baixo do local.
Terraplanagem feita na Praça doMirante, 2016 Pneus reutilizados como barreira para o entulho de lixo na área, 2016
Fonte: Acervo Equipe de Assistência Técnica CODHAB Fonte: Acervo Equipe de Assistência Técnica CODHAB
292 293
Paredes de contenção feitas com a reutilização de pneus durante AUC #16, 2016
Fonte: Acervo Equipe de Assistência Técnica CODHAB
Pintura feita nos pneus da Praça do Mirante durante AUC #18, 2016
Fonte: Luiz Ferreira
Pintura feita nos pneus da Praça do Mirante durante AUC #18, 2016 Pintura feita nos pneus da Praça do Mirante durante AUC #18, 2016
Fonte: Acervo Equipe de Assistência Técnica CODHAB Fonte: Luiz Ferreira
AÇÕES URBANAS COMUNITÁRIAS #49 E #50 – REVITALIZAÇÃO DE FACHADAS NA RUA DO MEIO
Julho e Agosto de 2016
O trabalho realizado entre os anos de 2015 e 2018 foi de grande importância O trabalho de conscientização feito durante todo o período da presença do
para se pensar o futuro da comunidade. Além de buscar a aproximação do Posto dentro da comunidade tinha como objetivo solidificar a importância de
governo e facilitar a tomada de decisões sobre projetos, o Posto pôde auxiliar se ter o responsável técnico pelas decisões lidando e vivenciando as conse-
quanto a outras decisões a serem tomadas sobre o setor. A presença de um quências de suas decisões. Oferecia atendimento dirigido às demandas de
técnico dentro da comunidade também capacita os próprios habitantes a cada localidade, além de fazer com que os processos ganhassem celeridade
discutirem questões relevantes aos seus desejos e expectativas sobre re- e fossem melhor direcionados para que as necessidades dos moradores,
298 299
gularização e urbanização, entre outros assuntos que são de seu interesse de fato, fossem resolvidas. A equipe deixou um legado nas comunidades e,
para o local. com isso, todas as áreas que recebem a presença do Posto de Assistência
Técnica se tornaram mais capacitadas e prontas para buscar seus direitos,
A partir do momento em que o técnico passa a conviver com os moradores, embora enfraquecidas pela distância que separam a vida cotidiana desses
ele compreende melhor às necessidades e executa com maior qualidade espaços urbanos e as mentes que tomam as decisões.
o seu trabalho. Dentro da comunidade do Pôr do Sol, na qual as lideranças
já possuem melhor entendimento e discutem sobre diversos assuntos de
forma interessada e produtiva.
17 km
ESTRUTURAL
SCIA-ESTRUTURAL / DF
ESTRUTURAL
SCIA-ESTRUTURAL / DF
potencialidades Por volta de 1960, foi criado o “lixão da Estrutural”, lugar onde os moradores
do Setor Complementar de Indústria e Abastecimento (SCIA) começaram a
trabalhar com reciclagem de lixo, fator que estimulou o movimento migratório
de muitas famílias para próximo desse despejo sanitário. Assim, as primeiras
moradias foram barracos de madeira e papelão construídos pelos moradores
que catavam papel como meio de sobrevivência.
equipe coordenação arq. urb. Erick Mendonça // abr 2015 - jun 2015 | mar 2016 - mai 2016
arq. urb. Ana Cristina Ramos // jul 2015 - mar 2016
arq. urb. Isabel Alencar // jul 2016 - jul 2017
arq. urb. Aníbal Barbosa // out 2017 - mar 2018
eng. J. Maycon Estanislau // mar 2018 - ago 2018
arq. urb. Leandro Fernandes // abr 2018 - dez 2018
308 309
COMUNIDADE DE
SANTA LUZIA
acima:
Animais se alimentando e idosa coletando lixo em refugo na entrada de Santa Luzia, 2016
Fonte: Isabel Alencar
ao lado:
Criança brincando com cãozinho em Santa Luzia, 2016
Fonte: Isabel Alencar
Como o Estado é impossibilitado de garantir infraestrutura básica ao as- Tentaram executá-lo durante a noite dormindo e mesmo alcoolizado o idoso
sentamento devido à sua localização em glebas de caráter ambiental, seus reagiu contra os bandidos, resistindo às pancadas. Ele então conseguiu sair
moradores improvisam ligações clandestinas para o fornecimento de água, de casa, foi perseguido até uma esquina e brutalmente esfaqueado, próximo
energia elétrica e escavam fossas buscando condições mínimas para atender ao posto da assistência técnica. Seu barraco foi incendiado em seguida pelos
às cinco mil famílias, aproximadamente, de acordo com informações forne- bandidos, os vizinhos não o socorreram por medo, mas conseguiram conter
cidas em 2017 pela Associação de Moradores da Santa Luzia, colhidas por o fogo na madrugada. No dia seguinte, relataram em detalhes essa história
levantamento informal. Essas atividades servem para exemplificar os modos à equipe do posto, praticamente a única presença fixa do Estado no local.
de organização utilizados pelos moradores que buscam garantir soluções a
diversos problemas enfrentados, geralmente por meio de de grupos, asso- À primeira vista, Santa Luzia traz só desalento aos desavisados: vias improvi-
ciações e com iniciativas individuais. sadas por estradas de chão com muita poeira e lama que invadem os barracos
de madeirite - habitações em condições sub-humanas e com históricos de
Na contramão do bom senso e solidariedade dessas organizações, como muitos incêndios e outros problemas recorrentes de assentamentos infor-
relatado por diferentes moradores, existem também pequenas quadrilhas mais. Visivelmente sem infraestrutura, como a falta de iluminação pública
de grileiros que agem pontualmente, intimidam e ameaçam moradores noturna, por exemplo, além de muitos ratos e insetos transitando livremente.
sozinhos, famílias mais frágeis, toxicômanos, idosos, entre outros. Como Nesse contexto, a visão cotidiana que nos leva a refletir é a cena de crianças
exemplo para ilustrar o grau do terror sofrido pela comunidade, em meados brincando com lixo a céu aberto sobre o refugo localizado na entrada principal
de 2017 uma quadrilha detectou um morador idoso, alcoólatra e sozinho. da invasão, deixando escancarada e explícita a fragilidade dos pequenos.
Santa Luzia é povoada por muitas pessoas com histórias pessoais trágicas e
violentas. Mas ao se observar mais atentamente, em meio a essas histórias
de violência que se agravam mais ainda em meio à pobreza - relatos de as-
sédios, violência doméstica, abandono de lares entres outros - percebemos
a existência de exemplos de muita dignidade, solidariedade e bravura. Lá
existem aproximadamente 20 ONGs e entidades compostas por moradores
com iniciativas importantes como Educamar, Casa de Paternidade, Creche
da Tia Tata, Mjpop, entre outras. Elas atuam com atividades lúdicas e educa-
tivas às crianças, aconselhamento a jovens pais, atividades profissionalizan-
tes, etc. Também existem muitas iniciativas isoladas vindas de moradores
como, por exemplo, a catadora de lixo Rosânia que arrecada cestas básicas
para distribuir aos colegas de trabalho. Esse tipo de atitude individual não
314 315
é tão isolada como pode parecer, existe um sentimento de solidariedade,
é perceptível a amizade e companheirismo entre os vizinhos que temem a
ação de criminosos e protegem-se entre si. O próprio posto de assistência
técnica teve diversos voluntários residentes locais que buscam melhorias
à área, como os assistentes sociais Késsia Siqueira e Newton Souza. São
inúmeras essas histórias de luta, companheirismo e solidariedade dentro
desse contexto territorial complexo de Santa Luzia.
Arquiteta Isabel Alencar e Rosânia, amiga e entusiasta do posto, 2016
Fonte: Isabel Alencar
O primeiro posto de Assistência Técnica na Estrutural instalou-se na Adminis- A imersão na área rendeu frutos através da comunicação com a comunidade e
tração Regional da cidade sob a coordenação do arquiteto Erick Welson em seus líderes, sempre politicamente ativa. Houve muita troca de conhecimento
sala temporariamente cedida à CODHAB. Gilson Paranhos, então presidente com a população, e um esforço enorme de levar à luz do entendimento popular
companhia, definiu a mudança do posto para a ocupação de Santa Luzia como muita informação técnica e jurídica relativa à complexidade relacionada às
estratégia de imersão, visando auxiliar na resolução do problema fundiário lá questões territoriais. A assistência técnica foi também politicamente ativa ao
existente, além de mobilização e diálogo com a comunidade. Nesse momento, reconhecer, provocar e empoderar novas lideranças para grupos sem repre-
318 319
o posto ficou sob a coordenação da voluntária contratada posteriormente como sentatividade. Foram incitadas novas lideranças aos catadores de lixo de Santa
arquiteta: Isabel Alencar. Como não é permitido à companhia alugar imóveis Luzia, que não possuem um líder específico e também foram mediados muitos
em áreas não passíveis de regularização, foi gentilmente concedido o uso de conflitos entre governo e comunidade, além dos internos entre as próprias
um cômodo em um barraco de uma família em Santa Luzia para o funciona- lideranças comunitárias.
mento do posto durante oito meses até a instalação definitiva de containers.
Primeiro posto em Santa Luzia, 2016 Mais recente PAT em Santa Luzia; ao fundo, Protótipo, 2018
Fonte: Isabel Alencar Fonte: Niele Pires
Como detentores de certo conhecimento técnico A priori, o programa de Melhorias Habitacionais não
e político, temos o dever de não nos limitarmos poderia atender às casas em Santa Luzia, apenas
ao desígnio de nossa profissão como arquitetos e as áreas do DF passíveis de regularização, como é
urbanistas na atuação em assistência técnica, mas na Vila Estrutural, e que possuem posto de Assis-
buscarmos também conscientizar por completo a tência Técnica. A primeira impressão geral que se
população sobre sua situação fundiária, da situação tem das casas na Vila Estrutural, andando à deriva,
de suas moradias e da importância em questionar é que se tratam de habitações onde obviamen-
e enfrentar a manipulação política que sofrem nas te se preocupam com a segurança, além de não
áreas de regularização, que é comumente respal- aparentar estarem em situação tão precária. Mas
dada pelo apelo de alguns religiosos. Por exemplo, ao adentrarmos muitas dessas residências, prote-
em Santa Luzia alguns deputados e aspirantes a gidas do lado de fora pelos muros em alvenaria e
tal iludiam os moradores sobre a regularização da portões fechados, surpreendemo-nos com a grande
320 321
área exatamente como está, ignorando as impo- quantidade de barracos em madeirite com o nível
sições ambientais, a troco de votos. Diferente do abaixo do da rua (devido ao asfaltamento posterior
esperado, o complexo problema da região continua a ocupação) em situação extremamente insalubre.
sem resolução e traz consigo grandes incertezas e Em geral, os problemas das casas e as soluções a
receios à população. serem tomadas na Estrutural são bastante similares
a outros assentamento precários no DF.
Pintura do primeiro posto em Santa Luzia: Leiaute do primeiro PAT Santa Luzia, 2016
cal e sobras de tinta oferecidas pelas famílias dos moradores, 2016 Fonte: Isabel Alencar
Fonte: Isabel Alencar
AÇÕES URBANAS
COMUNITÁRIAS
Desde então, outras reuniões foram feitas com líderes locais e a maior parte
dos interessados aderiu à ideia do projeto, contribuindo criticamente com
ele. De fato, não existiu, nem existe unanimidade de apoio, ainda mais ao se
tratar de uma interferência dessa dimensão na realidade territorial dessas
pessoas. Nesse projeto, devido à complexidade dos impedimentos territo-
riais, não foi possível a implantação de um urbanismo mais colaborativo,
didaticamente junto à população, e dessa maneira foi apresentada a solução
desenvolvida pela CODHAB. Apesar dessas dificuldades descritas, com a
experiência de quem está na ponta desse processo, vivenciando a realidade
do local, tornou mais fácil obter maior aceitação da comunidade à solução
proposta pela companhia.
AÇÃO URBANA COMUNITÁRIA #28
Janeiro de 2017
2ª AUC na Estrutural: pintura de fachadas e portões, 2017 2ª AUC na Estrutural: plantio em manilhas para interdição de estrada vicinais, 2017
Fonte: Acervo Equipe de Assistência Técnica CODHAB Fonte: Acervo Equipe de Assistência Técnica CODHAB
AÇÕES URBANAS COMUNITÁRIAS #54 E #55
3ª AUC na Estrutural: novo mobiliário feito com pneus reciclados,
Setembro e outubro de 2017
plantio de árvores e pintura de fachadase e paineis artísticos, 2017
Fonte: Acervo Equipe de Assistência Técnica CODHAB
A terceira Ação Urbana da Estrutural aconteceu na Durante as ações urbanas, em meio às alegrias
rua em frente ao Centro Olímpico, em meados de das mudanças das cores externas nas casas, há
2017. Na época, o posto estava sob a coordenação integração entre técnicos e comunidade, contri-
de Aníbal Teixeira. Assim como na ação passada, buindo para mitigar a falta de informação quanto à
foram rebocadas e pintadas diversas fachadas e regularização do local, bem como ocorrem muitas
painéis, criado mobiliário urbano de pneus recicla- trocas de ideias que frequentemente nos levavam
dos, plantadas mudas além de entulhos retirados às reflexões em torno de políticas públicas mais
da área. Aníbal relatou enorme interesse nos dias efetivas e em um engajamento coletivo maior.
consecutivos à ação pelos moradores de ruas pró-
328 329
ximas, desejosos de uma organização, conforme
realizado pela CODHAB.
PRINCIPAIS PROJETOS,
DESAFIOS E CONFLITOS
Os dois eixos principais que norteiam as ativida- O segundo eixo de atuação da assistência técnica
des do posto de Assistência Técnica da Estrutural na Estrutural é o desenvolvimento e execução do
são o desenvolvimento do projeto arquitetônico/ programa Melhorias Habitacionais. Por se tratar
urbanístico para realocar moradores de Santa de uma área de regularização com muitos proble-
Luzia, cujos desdobramentos da decisão de seu mas sociais, a Vila Estrutural tem grande demanda
reassentamento ainda transcorrem em processo para a implementação desse programa que visa a
330
jurídico, assim como a execução do projeto pioneiro identificação de necessidades arquitetônicas para
de Melhorias Habitacionais na cidade Estrutural os lares e busca a devida resolução e execução
para trazer mais salubridade e segurança às famí- dos projetos e obras nessas residências. Essa
lias em suas residências na comunidade. Ambos experiência foi pioneira como iniciativa pública,
são estratégias de mitigar o deficit habitacional processo arduamente desenvolvido e aperfeiçoado
qualitativo da região. pela equipe. A despeito de alguns erros e falhas
no desenho inicial dessa metodologia pela equipe
Foram aproximadamente oito meses de intensa e em suas primeiras execuções, houve diversos
mobilização social feita pelo posto em Santa Lu- avanços positivos.
zia em meio a conflitos, para que a proposta do
edifício linear fosse compreendida e aceita, e os Algumas obras e projetos foram entregues em
projetos urbanístico e arquitetônico seguiram em 2018 no setor Oeste. Muitos desafios foram so- reassentamentos
desenvolvimento durante a gestão 2015-2018. Al- lucionados pela equipe, como o desenvolvimento
guns conflitos entre as próprias lideranças e delas dos projetos que excederam ao número máximo
com o governo ainda ocorreram. Sendo a maioria de contemplados previsto no contrato com a em-
dos conflitos de natureza de comunicação, foram presa de Melhorias, e que foram feitos pelo último
então solucionados pela então coordenadora do coordenador do posto, Leandro Fernandes. Outros
posto naquele momento, Isabel, e as dificuldades desafios ainda precisam ser vencidos para melhor
existentes em parte foram vencidas. Porém ainda atender aos beneficiários em termos gerais de pro-
resta uma grande parte que ainda está por vir: grama, como aumentar o limite da verba usada em
continuidade da obra e financiamento da mesma. cada melhoria de residência. Em síntese, apesar de
algumas dificuldades se repetirem em várias ARIS,
cada localidade possui suas particularidades com
seus desafios e conflitos próprios, e esses ajudam
a melhorar o processo como um todo, replicando
quando necessário as soluções em outras áreas.
Edifício Linear: proposta de reassentamento multifamiliar para as famílias de Santa Luzia, 2018
Fonte: Acervo Equipe de Projetos CODHAB
reassentamentos
PERSPECTIVAS
Antes de desenharmos um panorama geral da Longe de ter surgido ou ter se desenvolvido como Tal empreendimento pode ser um marco arquitetô- Enquanto sociedade, devemos voltar nossas pre-
atuação dos arquitetos na assistência técnica projeto autoral, o partido do Conjunto Linear St. nico na região e certamente aumentará a autoesti- ocupações também ao deficit habitacional quali-
da equipe, faz-se necessário mencionar o ama- Luzia resultou de um desdobramento feito pelo ma da população que muitas vezes é estigmatizada tativo. Muitas casas da Vila Estrutural, já regula-
durecimento de cada profissional durante suas ex-funcionário Lucas de Abreu de seu trabalho dentro da própria Vila Estrutural, que ironicamente rizadas, são bastante insalubres. Vemos famílias
imersões, trabalhando diariamente nos postos. final de mestrado na Universidade de Columbia, já foi invasão um dia. A ideia é que sejam entregues numerosas habitando (e coabitando) espaços que
Em tal imersão pudemos conhecer diariamente, EUA, pouco antes de ingressar na CODHAB, como aos moradores beneficiários unidades habitacio- os adoecem e deprimem, dificultando no trabalho
332 333
e com muita proximidade, outras realidades, de solução que alia necessidades ambientais e sociais nais com vedações externas e áreas molhadas e no desenvolvimento de atividades cotidianas.
classes sociais bem mais desfavorecidas. Certa ao complexo problema de Santa Luzia. Mas qual prontas, mas o restante da habitação ficaria seu Ao melhorar essas condições de pobreza e trazer
vez, uma moradora da Estrutural, Zulma, disse à é o significado da concretização desse projeto a cargo: que numa ocasião comum de realocação salubridade e mais autoestima a essas famílias
arquiteta Isabel sentir muita alegria em relação para as pessoas dessa ocupação e quais des- não ocorreria entrega similar. com as reformas, a Companhia foi uma impul-
à existência do posto, pois nós, funcionários da dobramentos pode ter? Significa uma chance de sionadora e provocadora do mercado regional de
CODHAB, “descemos do asfalto” e trabalhamos realocação em área próxima, respeitando o senso pequenas construtoras e escritórios de arquitetura
“onde a pobreza está”. Frase muito carregada de de pertencimento da comunidade ao local. Além e engenharia do Distrito Federal, abrindo alas e
simbolismos da segregação social sofrida pela de “entrar na legalidade”, como dizia um voluntário chamando a atenção a esse espaço de atuação
população. Na imersão, também rompemos muitas do posto conhecido como Ceará, é dignificante ter na Estrutural, assim como em todos os outros
concepções equivocadas sobre indivíduos, grupos acesso à infraestrutura básica que toda cidade assentamentos precários.
e problemas, aprendendo a relativizá-los mais e a deve ter para garantir mais segurança, salubridade
flexibilizar alguns conceitos diante dessas comple- e consequentemente muito mais saúde a seus
xas realidades que tentamos melhorar com boas moradores. Enfim, com essa mudança fundiária
Referências.
práticas em arquitetura e urbanismo. proposta e realocações para o Conjunto Linear, Estudo de Impacto Ambiental e Relatório de Impacto Ambiental - EIA/RIMA da Vila Estrutural. 2003.
será possível trazer a presença positiva do Estado,
SOUZA, Késsya Siqueira da Silva de. O (não) direito à educação da comunidade Santa Luzia - Cidade
que atualmente está impedido de implementar lá
Estrutural - Universidade de Brasília, 2016.
alguns serviços básicos à população.
PDOT - Plano Diretor de Ordenamento Territorial do Distrito Federal -
Documento Técnico – Versão Final – Novembro/2009.
Decreto nº 28.081/2007, de 29 de junho de 2007. Dispõe sobre a criação da Área de Relevante Interesse
Ecológico do Córrego Cabeceira do Valo e da Área de Relevante Interesse Ecológico da Vila Estrutural.
Diário Oficial, Brasília, Distrito Federal, 02 de julho. 2007. Disponível em: <https://goo.gl/jt2KZx>. Acesso
em Novembro de 2018.
RA 25, SCIA, Vila Estrutural. Disponível em: <https://goo.gl/jz38m1>. Acesso em Novembro de 2018.
37 km
PORTO RICO
SANTA MARIA / DF
PORTO RICO
SANTA MARIA / DF
potencialidades O Porto Rico encontra-se muito próximo à divisa do Distrito Federal com
o estado do Goiás, por isso é um local de intensa troca comercial não só
com a região de Santa Maria e Gama, como também com o Novo Gama e
Valparaíso, o que traz para a cidade a facilidade de acesso a essas regiões
e o potencial de intercâmbio regional.
principais desafios O maior desafio do Porto Rico é superar a questão fundiária. A área onde
se encontra a comunidade não foi desapropriado pelo Estado na época da
construção de Brasília e seus herdeiros entraram na justiça contra aqueles
que ocuparam. A quantidade de partes envolvidas no processo dificulta a
resolução de maneira que seja reconhecida e assegurada a posse daqueles
que moram na localidade.
equipe coordenação arq. urb. Sandra Marinho // set 2015 - jul 2016
arq. urb. Mariana Bomtempo // jul 2016 - mar 2018
arq. urb. Paulo Cavalcante // mar 2018 - dez 2018
O ASSENTAMENTO
Comunidade do Porto Rico, 2016
Fonte: Mariana Bomtempo
O Setor Habitacional Ribeirão, mais conhecido como Porto Rico, é um assen-
tamento informal surgido em meados dos anos 2000, resultado do parce-
lamento das chácaras 17 e 18 do Núcleo Rural da Região Administrativa de
Santa Maria. Segundo dados do Instituto Brasileiro de Geografia e Estatística
de 2010, foram contabilizados 6.822 habitantes, sendo que desse levanta-
mento mais de 70% se declararam negros (pardos e pretos), e hoje estima-se O processo de regularização fundiária e urbanização do Setor Habitacional
que morem no local cerca de 12 mil habitantes. Durante muitos anos, a área Ribeirão teve como marco inicial a contratação da empresa Topocart, por
foi palco de disputas e de resistência dos moradores, que mesmo com as meio de licitação por parte da Companhia de Desenvolvimento Habitacional
dificuldades encontradas lutaram pela permanência do assentamento. Com do Distrito Federal (Codhab). A empresa foi contratada para a elaboração
o Plano Diretor de Ordenamento Territorial (PDOT) de 2009/2012, passou a dos estudos geográficos, ambientais, topográficos e sociais da região, e a
ser considerada uma Área de Regularização de Interesse Social (ARIS), o que partir desses estudos foram desenvolvidos os primeiros projetos. O projeto
permitiu o avanço de algumas melhorias. As instalações de redes elétricas, de urbanístico chegou a ser aprovado em 2009, mas devido a pendências fun-
água potável e de iluminação pública foram realizadas em meados de 2008 e diárias não houve registro, de modo que perdeu sua validade. Desde então,
2009, quando também foi iniciado o processo de regularização urbanística da o foco da Codhab foi resolver a questão da dominialidade do local onde se
área. O esgotamento começou a funcionar em 2017 e as obras de drenagem encontra o assentamento, e pouco foi modificado ou revisado do projeto
e pavimentação foram concluídas em 2018. desenvolvido em 2009.
A CODHAB
NA COMUNIDADE
342 343
O Posto de Assistência Técnica (PAT) do Porto Rico O escritório é vizinho ao Posto anterior, encontran-
foi aberto em abril de 2016. Nos três primeiros do-se novamente na Avenida Principal – rota de
meses, a coordenadora Sandra Marinho se dividiu entrada dos moradores e do transporte público.
entre os Postos do Porto Rico, em Santa Maria, e do Ao final de 2017, o posto retornou para a adminis-
Residencial Vitória, em São Sebastião. Em julho de tração regional, onde ficou os primeiros meses de
2016, o Porto Rico passou a ter uma coordenação 2018, quando depois finalmente mudou-se para o
própria, com a presença da arquiteta e urbanista contêiner definitivo na entrada da comunidade. A
Mariana Bomtempo, contando ambas as arquitetas equipe foi toda desmantelada no início de 2019 e
com o auxílio da estagiária Luila Fernandes. No o contêiner está abandonado desde então. Com
primeiro semestre de existência, o Posto funcionou o novo governo os arquitetos foram exonerados,
na Avenida Principal, em um imóvel emprestado entretanto nenhum corpo técnico foi contratado,
por um morador que pertencia a uma das lideran- ficando apenas funcionários cuja formação em
ças da região e era amigo do administrador local. nada tem a ver com desenvolvimento habitacional.
Essa parceria inicial foi fundamental ao começo
do trabalho na comunidade e à compreensão das Além disso, ali se localiza a maior parte do comér-
relações locais. Ao final do sexto mês de operação, cio, o que traz visibilidade ao trabalho e atrai os
o morador solicitou o imóvel de volta, uma vez que moradores a procurarem espontaneamente enten-
precisava utilizá-lo. O Posto mudou-se para a sede der o que é oferecido pelo Posto. A maior parte do
da Administração Regional e permaneceu no local público que procura o PAT é composta de mulheres,
por três meses. Entretanto, apesar das facilidades e as principais demandas da população local são
advindas das instalações mais adequadas e da boa por obras de infraestrutura urbana, regularização
relação com a Administração, o local é de difícil fundiária e reassentamento de famílias moradoras
acesso aos moradores da comunidade do Porto das áreas de proteção ambiental permanente ou
Rico e distanciou a relação construída enquanto de risco. Também é recorrente moradores que
o trabalho era feito dentro da localidade. participam de algum programa habitacional da Co-
Fachada do Posto de Assistência Técnica quando foi inaugurado na comunidade do Porto Rico, 2016
dhab encaminharem-se ao Posto para tirar dúvidas Fonte: Alfredo Bezerra
Ao final do ano de 2016, o Posto da Codhab retor- sobre sua situação. A partir desse atendimento e
nou à comunidade e passou a dividir espaço com do contato com a comunidade foi possível identi-
a empresa contratada para dar andamento aos ficar as necessidades e demandas locais a serem
projetos de melhorias habitacionais no Porto Rico. abordadas pelos técnicos da companhia.
TRABALHOS REALIZADOS
NA COMUNIDADE
REGULARIZAÇÃO
FUNDIÁRIA
A regularização fundiária do Setor Habitacional Ribeirão é um assunto muito
delicado, pois depende da resolução de uma disputa fundiária de muitos anos
na Justiça, com um grande número de envolvidos. A terra onde está o Setor
foi ocupada sem a desapropriação pelo Estado, ainda na época da constru-
ção de Brasília, e os herdeiros dos antigos proprietários foram identificados
após uma extensa pesquisa, ultrapassando o número de 300 pessoas. Como
forma de mitigar o complexo enredo da posse do terreno, a Codhab estuda
maneiras de viabilizar de algum modo o reconhecimento da ocupação por
meio oficial, para que os moradores se sintam mais seguros em relação a
suas moradias. A permanência da ocupação e de toda a infraestrutura que
está em construção é assegurada por meio de um Termo de Ajustamento
de Conduta (Resolução nº 18, de 16 de dezembro de 2010). Esse documento
serve de base ao encaminhamento de uma solução para a questão fundiá-
ria local, uma vez que estabelece e reconhece a Área de Regularização de 2014 2016
Interesse Social Ribeirão como uma área de ocupação consolidada de baixa
Crescimento urbano de Porto Rico, 2005-2016:
renda que deve ser regularizada, a fim de evitar o agravamento do conflito
a linha roxa delimitava a área de remoção e demonstra que sempre houve ocupações no local
social entre os moradores, os proprietários e o Estado. Fonte: Acervo Equipe de Assistência Técnica CODHAB
DA INFRAESTRUTURA
Obras de urbanização em Porto Rico, 2017 Projeto (acima) e obra (abaixo) da casa de Dona Luzia, 2017
Fonte: Acervo Equipe de Assistência Técnica CODHAB Fonte: Acervo Equipe de Assistência Técnica CODHAB
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Área consolidada do Porto Rico em 2015 Área considerada para remoção do Porto Rico em 2015
Fonte: Luiz Eduardo Sarmento Fonte: Luiz Eduardo Sarmento
DA ÁREA DE RESTRIÇÃO
À OCUPAÇÃO
APP
Na comunidade do Setor Habitacional Ribeirão/ a questão, cuja etapa inicial se deu por meio de um infraestrutura que foram feitas com base no projeto
Porto Rico existem áreas que são consideradas de levantamento da situação legal que levou à condi- de 2009. A estação elevatória de esgoto foi instalada
proteção ambiental permanente ou de risco para ção mencionada. Nesse momento, identificou-se numa cota acima de algumas das moradias e a lici-
ocupação, as quais foram mapeadas pelo estudo que as restrições à ocupação do local estavam tação de pavimentação e drenagem não abarcava a
ambiental desenvolvido pela empresa Topocart, defasadas em relação à legislação vigente. área. O que traz ainda uma sensação de abandono
à luz da legislação vigente na época. Também para essas famílias que agora já investiram suas
350 351
fazia parte do escopo do estudo a orientação dos Na época do estudo desenvolvido pela Topocart economias ao construir moradias em alvenaria na
moradores quanto à situação, e por muito tempo havia uma restrição de ocupação em declividades esperança de ter sua área urbanizada. Entretanto,
uma grande área foi chamada de “área de remo- superiores a 10% – restrição essa revogada pelo as redes elétricas ainda são irregulares e o esgota-
ção” pela comunidade, gerando as mais diversas novo Código Florestal em 2013 –, e passou a ser mento é feito por fossas. A instalação das redes de
consequências para as pessoas que habitavam ou vigente a restrição de declividades acima de 30%. água se deu em 2017, quando em uma ação para
tentavam habitar aquela área. Foram recorrentes as Na Área de Regularização de Interesse Social do cortar ligações irregulares diante de uma crise hídri-
derrubadas no local, enquanto outras ocupações Porto Rico delimitada pelo PDOT 2009/2012, não ca, a concessionária de água chegou com a polícia
permaneceram ou tornaram a ser construídas; foi identificado nenhum local ocupado com declivi- desligando os “gatos” do moradores que em seguida
alguns lotes que continuaram vazios foram ven- dade superior a 25%. Portanto, a área de restrição acionaram o posto e a administração regional. A
didos mais de uma vez por grileiros, gerando dis- à ocupação, que continha 233 unidades em 2017 arquiteta do posto levou o ofício no momento em
putas entre os interessados, algumas envolvendo a serem removidas e reassentadas, foi reduzida que acontecia o desligamento que informava que a
violência; várias famílias que não ocuparam ou para 49 unidades que atualmente se encontram concessionária estava ciente de que deveria ligar as
tentaram ocupar aguardam serem reassentadas, em área de brejo e nascentes, o que coloca em casas para regularizar a situação daquelas famílias.
mas são de difícil identificação, uma vez que não risco essas moradias. A ação foi parada e nas semanas seguintes foram
estão na área; aos residentes que permaneceram cadastrados e instalados hidrômetros das residên-
e resistiram sempre foi negada a instalação de Grande parte das casas que estão na área é ante- cias. Esse evento só demonstra que a morosidade
infraestrutura básica, como água potável, energia rior a 2011, o que demonstra que a necessidade do governo é reflexo muitas vezes de funcionários
elétrica ou esgotamento. Mantinham-se então de moradia é maior que a falta de qualidade de que não entendem a importância de seu trabalho
instalações inadequadas, as quais expõem os vida no local, além disso, observa-se que quando para a comunidade.
habitantes ao risco. informados da remoção nenhuma das famílias in-
Redução da área de restrição a ocupação
vestiu suas economias na construção de uma casa no Porto Rico, 2016
Desde que o Posto foi aberto, houve uma forte permanente, aguardando seu reassentamento, e De cima para baixo:
pressão popular para que o contato mais próximo por estarem em construções de madeirite foram 1. Demarcação de APP baseada no antigo Código
de técnicos da Codhab com a comunidade aten- julgados diversas vezes pelos técnicos como in- Florestal, contemplando áreas com declividades
superiores a 10%;
desse melhor às demandas dos moradores locais. vasores recém-chegados.
O Posto promoveu reuniões com os habitantes e 2. Área com declividades inferiores a 30% APP
cujas 184 ocupações puderam ser preservadas
ouviu suas demandas, fez levantamentos e visitas Uma vez confirmado que não havia restrição de com base no novo Código Florestal;
de campo, sem que ficassem claros os parâme- ocupação naquele local, a equipe do posto informou
3. Demarcação de APP baseada no novo Código
tros que restringiam a ocupação de toda a área. aos moradores sobre o novo projeto de regulariza-
Florestal, contemplando áreas com declividades
Iniciou-se então um estudo que visou encaminhar ção, entretanto já era tarde demais para as obras de superiores a 30%.
Reunião com a comunidade para informar do estudo para a permanência das ocupações no local, 2016 Pintura de painel artístico durante Ação Urbana Comunitária, 2016
Fonte: Mariana Bomtempo Fonte: Luiz Eduardo Sarmento
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Plantio da horta comunitária, 2016 Rolos utilizados para pintura das fachadas da rua, 2016
Fonte: Alfredo Bezerra Fonte: Alfredo Bezerra
Comunidade dando seus toques criativos na horta comunitária, 2016 Horta comunitária mantida pela comunidade, 2017
Fonte: Mariana Bomtempo Fonte: Mariana Bomtempo
MELHORIAS HABITACIONAIS
Inauguração do escritório de Melhorias Habitacionais e assistentes sociais apresentando o programa Apresentação do projeto na associação de moradores, 2017
em um evento organizado pela comunidade na Escola Classe 1 do Porto Rico, 2017 Fonte: Mariana Bomtempo
Fonte: Mariana Bomtempo
Apresentações e entregas de projetos aos moradores, 2017
Fonte: Equipe ARQBSB
Apresentações e entregas de projetos aos moradores e vistorias de obras no Porto Rico, 2017 Apresentações e entregas de projetos aos moradores e vistorias de obras no Porto Rico, 2017
Fonte: Equipe ARQBSB Fonte: Mariana Bomtempo
Também fica a cargo da empresa ARQBSB desenvolver o orçamento para O trabalho com a equipe ampliada foi essencial para o crescimento da escala
execução da melhoria habitacional. Esse foi outro processo complexo, pois de produção do programa Melhorias Habitacionais. A empresa, depois de
apenas alguns serviços do projeto completo seriam passíveis de execução compreender a metodologia e o relacionamento com a comunidade, conse-
com a verba disponibilizada pela Codhab. Isso gera uma dificuldade de enten- guiu escoar o fluxo de projetos. A experiência também trouxe às empresas
dimento, não só para o morador, mas também para a própria equipe técnica, privadas a sensibilidade e a expertise necessárias para que mais práticas
que está habituada a desenvolver orçamentos completos. Inicialmente, o como essa se estabeleçam no mercado, e assim seja reduzido o percentual
programa previa uma verba de 10 mil reais de subsídio por família, sendo de problemas decorridos da autoconstrução, que atualmente corresponde
que desse valor também deveriam ser subtraídos os benefícios e despesas a 85% das construções nas cidades brasileiras. Essa experiência foi extre-
indiretas da empresa que executava os serviços. Depois de reconhecer que, mamente enriquecedora para o Posto, pois aconteceu por meio do auxílio
após o desconto, o valor materializado para a família estava muito abaixo de uma equipe composta de arquitetos, engenheiros e assistentes sociais,
da expectativa gerada, a Codhab alterou o valor total para 13.500 reais em permitindo uma troca de experiências e percepções da ecologia urbana do
2017 e para 15mil em 2018. Finalmente, toda a documentação compilada Porto Rico, além de melhorar o atendimento e ampliar a confiança da comu-
364 365
era apresentada à Codhab, que após análise contratava uma pequena em- nidade no trabalho que antes parecia tão utópico.
preiteira para executar grupos de três residências, respeitando o projeto e o
orçamento preestabelecidos.
367
Caso Ernesto:
1 2 5m Levantamento cadastral e projeto (à esquerda) e casa antes e depois da obra (acima)
Fonte: Acervo Equipe de Assistência Técnica CODHAB e Equipe ARQBSB
IVETE
368 369
Caso Ivete:
1 2 5m Levantamento cadastral e projeto (à esquerda) e casa antes e depois da obra (acima)
Fonte: Acervo Equipe de Assistência Técnica CODHAB e Equipe ARQBSB
MARIA FRAZÃO
15.00
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15.00
Caso Maria:
1 2 5m Levantamento cadastral e projeto (à esquerda) e casa antes e depois da obra (acima)
Fonte: Acervo Equipe de Assistência Técnica CODHAB e Equipe ARQBSB
PROJETOS
PARALELOS
Com a consolidação do Posto na comunidade e o crescimento da equipe, foi O estudo preliminar das unidades habitacionais dos edifícios multifamilia-
possível também abrir novas frentes de trabalho, sendo as principais delas: res foi desenvolvido pela voluntária Andressa Guedes, com a orientação da
(1) o estudo preliminar de unidades multifamiliares para a área do assenta- arquiteta Mariana Bomtempo e o apoio da equipe do Posto. O projeto tem
mento que ainda está desocupada; (2) o plano de vegetação para o Porto como objetivo estruturar a melhor proposta de unidades independentes, mas
Rico; (3) o plano de reassentamento de moradores; e (4) o desenvolvimento com qualidade arquitetônica e bioclimática. Foram desenvolvidas unidades
do plano de mobilidade ativa do Porto Rico. Todos esses trabalhos se tor- de dois e três quartos, com modelo adaptado à acessibilidade em alvenaria
372 373
naram viáveis com a ajuda de estudantes de Arquitetura voluntários, que se estrutural e passarelas externas, como calçadas elevadas para o acesso às
dispuseram a trabalhar no posto. Foram eles: Suely Sá, Cristina Nakamura, unidades. A implantação permitia aproveitar o que há de melhor em termos
Andressa Guedes e Nabil Lima. de insolação na área e facilitar os fluxos de pedestres no local.
Plano de vegetação desenvolvido para o Porto Rico, 2017 Planejamento de Ação Urbana Comunitária no Porto Rico, 2017
Fonte: Acervo Equipe de Assistência Técnica CODHAB Fonte: Acervo Equipe de Assistência Técnica CODHAB
376 377
Nabil Lima e Mariana Bomtempo, respectivamente: voluntário e coordenadora do Posto do Porto Rico, 2017
Fonte: Mariana Bomtempo
O trabalho do Posto de Assistência Técnica é desafiador todos os dias: há A atuação na comunidade é complexa exatamente por se tratar de relação
uma grande desconfiança da população, que já teve muitas expectativas entre pessoas, o que, ao mesmo tempo, é o ponto mais forte da assistência
frustradas por diversas gestões de governo; muitos membros da comuni- técnica. É enriquecedor trazer para a Administração Pública – responsável
dade acreditam que a equipe tenha interesse eleitoreiro; a falta de estrutura pela regularização do território de comunidades de baixa renda e pelos de-
para realizar determinados tipos de trabalho é cotidiana; a burocracia é um mais aspectos que visam à sua integração com as outras áreas urbanas – a
desafio, e muitas vezes faz a população se sentir abandonada pelo Estado; perspectiva da vivência do local e das relações sociais que acontecem nesse
378 379
além de diversos outros desafios que poderiam ser descritos e elaborados espaço, incluindo-a nos processos. Tal perspectiva frequentemente falta à
até a exaustão. gestão pública em Brasília, em que as decisões, na maioria das vezes, são
tomadas de maneira tecnicista e/ou política, de uma distância física imensa
É necessário à equipe desenvolver maturidade emocional para lidar com as e cuja observação não não passa de imagens de satélite, sem considerar as
dificuldades vividas pelos moradores, que estão às margens da sociedade. consequências para a vida cotidiana das pessoas que habitam esses locais.
São recorrentes os casos de famílias com problemas de violência doméstica
e sexual, abandono de menores, assassinatos, tráfico ou vício em drogas, O Posto é um local que aproxima o profissional arquiteto-urbanista, para que
prisões e todas as mazelas que assolam aquelas pessoas, exploradas e esque- as pessoas possam entender como este pode contribuir para transformar
cidas pelo capital, e deixadas de lado no jogo pelo espaço dentro da cidade. suas cidades e casas. Acreditamos que o Posto pode ser o início de um
extenso processo para democratizar as decisões relacionadas às cidades,
A construção da cidade é um processo extenso e contínuo. A vivência de um como um ponto de referência especializado para que os moradores possam
ano e meio dentro da comunidade foi só o começo, e o Estado deve reconhecer compreender como funcionam os processos burocráticos e como podem
a força que esse trabalho tem. É triste ver que uma equipe tão engajada foi se apropriar deles e intervir. Trata-se de um constante processo de cons-
cada vez mais desestimulada e posteriormente completamente exonerada cientização da população sobre seus direitos e deveres na construção das
pelo novo governo. Antes tivesse sido substituída por novos técnicos tão cidades de maneira coletiva, esse ponto territorial não deve ser abandonado.
engajados quanto, mas muitas vagas foram preenchidas por profissionais
que nem são engenheiros ou arquitetos. Essa constante descontinuidade de
programas de governo a cada gestão só demonstram o quão longe estamos
de entender a diferença entre política de governo e de Estado.
14 km
VILA CAUHY
NÚCLEO BANDEIRANTE / DF
VILA CAUHY
NÚCLEO BANDEIRANTE / DF
potencialidades A Vila Cauhy está muito bem localizada, entre o Núcleo Bandeirante e o Park
Way, com acesso fácil através da EPIA. Por conta dessa localidade privilegia-
da, as edificações previstas em projeto para realocação de moradores, após
estudos ambientais e projeto urbanístico aprovados, podem ter um grande
resultado, criando um excelente local de moradia próximo ao Plano Piloto.
principais desafios A questão ambiental certamente é a parte mais complexa da ARIS, já que
está situada próxima ao córrego Riacho Fundo e, além disso, possui algumas
nascentes, áreas com risco de enchentes, erosão, etc. Há, portanto, uma
enorme “área de risco”, obrigando que a área de projeto seja muito reduzida,
gerando grandes remoções e relocações.
equipe coordenação arq. urb. Frederico Barboza // jan 2016 - mai 2016
arq. urb. Fabiana Lemos // jan 2016 - mai 2016
arq. urb. Paulo Cavalcante // jun 2016 - dez 2018
VILA CAUHY
A Vila Cauhy é um assentamento irregular localizado na região administrativa
do Núcleo Bandeirante (RA VIII), entre a Estrada Parque Indústria e Abaste-
cimento (EPIA), o córrego Riacho Fundo e a via NB 03. A Vila encontra-se
em posição privilegiada, próxima ao Núcleo Bandeirante, ao Aeroporto JK
e ao Setor de Múltiplas Atividades Sul (SMAS) – principais polos geradores
de emprego e facilmente acessíveis, principalmente com a implantação do
BRT, que possibilita a chegada dos moradores ao Plano Piloto em no máximo
20 minutos. Tal localização é privilegiada em relação às demais áreas de
interesse social de Brasília que usualmente encontram-se bastante distantes
do centro econômico da cidade.
A área hoje ocupada pela Vila Cauhy era antigamente conhecida como Co-
lina do Lobo e, em 1961, foi destinada ao Clube de Regatas do Guará para a
construção do seu respectivo estádio. Ao longo do tempo, a área foi ocupada
por chácaras que aos poucos foram griladas e parceladas, o que gerou a
ocupação urbana existente. Sempre foi foco de interesse político devido à
sua localização, deixando a população por vezes esperançosa e por vezes
desapontada, o que torna cada vez mais difícil a construção de uma relação
com a comunidade. Além das questões políticas, e dentre outras restrições,
a questão ambiental sem dúvidas é o maior desafio para a regularização
fundiária e urbanização da Vila. Os estudos já desenvolvidos apontam que
a região tem grande quantidade de áreas de preservação, possui nascentes
Ponte da Obra de Maria, um dos acessos para a Vila Cauhy, 2017
Fonte: Acervo Equipe de Assistência Técnica CODHAB e é uma área de veredas com grande quantidade de água no solo.
A CODHAB
NA COMUNIDADE
390 391
Praça da Vitória: principal acesso da Vila Cauhy, 2017 Vila Cauhy, 2017
Fonte: Acervo Equipe de Assistência Técnica CODHAB Fonte: Acervo Equipe de Assistência Técnica CODHAB
Com as grandes chuvas do final de 2015 e início de 2016, a Vila Cauhy sofreu
muito com inundações e deslizamentos das margens do córrego Riacho
Fundo. Várias casas foram alagadas e seus moradores tiveram de ser retira-
dos pela Defesa Civil. Na ocasião, criou-se uma força-tarefa em todo o GDF
para recuperação da área e melhoria das condições para os moradores. Foi
Posto de Assistência Técnica da Vila Cauhy, 2017
Fonte: Acervo Equipe de Assistência Técnica CODHAB nesse contexto que a Codhab fundou seu sexto Posto de Assistência Técnica
(PAT), em janeiro de 2016. O PAT Vila Cauhy, que prestava uma homenagem
394 395
ao importante arquiteto Nauro Esteves, foi aberto para atuar em conjunto
com a comunidade, tendo como meta tanto ajudar no importante problema
da enchente daquele momento quanto assumir todo o processo de regulari-
zação da área, além de levar os outros trabalhos da companhia para o local.
O projeto urbanístico da Vila Cauhy tem por objetivo viabilizar a regularização Sabendo-se das imensas dificuldades ambientais, comunicadas por meio
das ocupações já existentes e possibilitar novas ofertas habitacionais, con- do estudo técnico, foi necessário separar uma área com medida próxima de
siderando ainda o grande deficit de habitação no Distrito Federal. Buscou-se metade da poligonal, por motivo das áreas de risco – sendo elas caracteri-
ordená-las, contribuindo positivamente para reparar os danos ambientais do zadas como Áreas de Proteção Permanente, incluídas a margem do córrego
setor e proteger os recursos naturais ali existentes. Para isso, é necessário Riacho Fundo e cinco nascentes, ou como áreas com risco de enchente ou
fixar padrões de ocupação do solo compatíveis, em termos de localização erosão. No perímetro restante, existe uma porção que, segundo a Agência
398 399
e densidade, com a sensibilidade físico-ambiental de todo o local, de modo de Fiscalização do Distrito Federal (AGEFIS), deveria ser livre, mas que hoje
a proporcionar aos seus habitantes uma elevação do padrão de qualidade constitui a chamada ocupação da Lona Branca. Tal área foi destinada no
de vida. projeto a novas habitações, as quais devem receber os moradores realocados
de áreas de risco e da referida ocupação, reduzindo o deficit quantitativo e
A área apresenta uma população de aproximadamente 2 mil habitantes e não qualitativo das habitações e justificando o adensamento. Destinou-se a área
dispõe de serviços de esgotamento sanitário e drenagem pluvial, porém conta de risco, dada toda a sua problemática, à construção de um parque extenso,
com pavimentação asfáltica parcial, além de redes de iluminação pública, porém de baixo impacto, onde ocorrerá a recuperação da vegetação e das
energia elétrica domiciliar e abastecimento de água potável parcialmente im- margens do córrego, além das atividades de lazer que ficarão disponíveis
plantadas. Todos esses elementos devem fazer parte do projeto urbanístico, para a população. A Praça da Vitória será preservada e outros espaços
inserindo os respectivos órgãos responsáveis no processo de regularização. públicos serão criados, melhorando a relação das áreas residenciais com
os espaços abertos.
O projeto, ainda em desenvolvimento, resultará na formatação de um total
de 204 lotes (contando com os já existentes a serem regularizados e com os Há grande preocupação com a mobilidade do local, já que as vias existentes
lotes criados pelo plano), sendo 197 para Uso Misto 1 (residencial, unifamiliar são estreitas, fazendo que com que algumas, após aprovação, virem ruas
e comercial), 5 para Uso Misto 2 (residencial coletivo e comercial) e 2 para compartilhadas, permitindo melhor circulação entre automóveis e pedestres
uso coletivo (equipamentos públicos comunitários – EPC). Os lotes com uso e garantindo segurança e fácil circulação. Está prevista também uma ciclo-
residencial coletivo serão ocupados por edifícios de quatro pavimentos, com via nas áreas novas, que será ligada às futuras ciclovias do Park Way e do
apartamentos de 50 metros quadrados. Conforme mencionado, a escolha Núcleo Bandeirante. Quanto aos equipamentos públicos, espaços voltados
desses usos se justifica pela característica atual da área – a qual se espera à segurança e educação serão criados, beneficiando os que moram na Vila.
que seja mantida após a regularização –, com grande foco residencial, porém
com um comércio que supra as necessidades cotidianas. Os lotes de uso O posto imerso consistia em propiciar total transparência ao processo de
misto devem, obrigatoriamente, ter a função residencial. regularização, incluindo os moradores de forma jamais ocorrida. Foram
feitas mais de dez reuniões com as lideranças comunitárias e a população,
buscando fornecer o máximo de informações possível sobre os aspectos
legais, burocráticos e projetuais. A partir das apresentações foram considera-
das as demandas da população e do Governo, para que seja viável começar
um trabalho conjunto – envolvendo a sociedade civil e a equipe técnica do
Estado –, a fim de chegar a um resultado positivo para todos.
400 401
Uso misto 1
Uso misto 2
Equipamento público comunitário
Espaço livre de uso público
Praças
Parque
APP
Área de remoção
Surgiu então a demanda para que o Posto de Assistência Técnica da Codhab Com o projeto finalizado e após reuniões com os Correios para organizar a
auxiliasse na resolução desse problema. Para isso, foi criada uma proposta de questão de novos CEPs, a proposta foi levada pela Codhab e pelos moradores
endereçamento provisório, a qual abrange todos os moradores atuais e tenta à Administração Regional do Núcleo Bandeirante. Lá ficou acertado que a
simplificar o endereçamento, reduzindo os danos causados pela falta dele. própria Administração se ocuparia do endereçamento novo, com fornecimento
Pretendeu-se criar um referencial para que a comunicação ocorra livremente. de placas e outros equipamentos.
Diversas reuniões e apresentações para a comunidade foram feitas, com o
objetivo de agregar ao plano o interesse dos moradores, e também para que
esse endereço provisório pudesse ser aproveitado e tornado oficial durante
o projeto urbanístico e o processo de regularização.
AÇÕES URBANAS
COMUNITÁRIAS
404 405
A área escolhida possui duas funções: passagem, pois liga a Vila Cauhy ao
Setor de Oficinas do Núcleo Bandeirante por meio de uma ponte de pedestres;
e espaço para manobra de automóveis no final da rua, em um cul-de-sac 1im-
provisado. O local era tomado por mato e lixo, deixando-o pouco convidativo
para uso da população, além de aumentar a insegurança de quem passasse ali.
Ainda que o cuidado não tenha sido totalmente efetivo em longo prazo, é fato
que o local pós-intervenção ganhou uma nova cara, muito mais colorida e
406 407
agradável para quem passava. O painel permaneceu sem nenhuma pichação
– coisa rara em qualquer outro muro da Vila –, o que sinaliza a importância
de ações como essa. A área virou também ponto de referência;
Pintura das lixeiras, 2016 Resultado da AUC #13: requalificação da zona que conecta a Vila Cauhy e o Núcleo Bandeirante, 2016
Fonte: Acervo Equipe de Assistência Técnica CODHAB Fonte: Luiz Eduardo Sarmento
AÇÃO URBANA COMUNITÁRIA #15 – AÇÃO AMBIENTAL #2
Agosto de 2016
Pouco depois da Ação Ambiental #1, ocorreu a segunda edição do projeto no O dia da Ação coincidiu com o Dia do Voluntariado e, juntamente ao programa
local. A área dessa outra também possui uma ponte de pedestre que conecta social Brasília Cidadã, do GDF, foram desenvolvidas diversas atividades, como
a Vila Cauhy ao Setor de Oficinas do Núcleo Bandeirante. A vantagem dessa batalha de rap, exposição de objetos da Polícia Militar, oficina da Empresa
área é a existência de um espaço com árvores grandes, que proporcionam de Assistência Técnica e Extensão Rural do Distrito Federal (Emater) de
uma sombra muito agradável. criação de jardineiras com garrafas pet, distribuição de mudas pelo Jardim
Botânico, entre outras.
Como na primeira Ação, o intuito principal era limpar uma parte do córrego
Riacho Fundo, a fim de promover a conscientização ambiental e despertar a A segunda ação teve maior participação popular que a primeira, devido à
população para o cuidado e a preservação deste, além de criar um pequeno associação dos outros órgãos com o evento, mostrando a importância de
408 409
espaço de convivência mais prazeroso nessa importante área de passagem. se elevar a escala dessa iniciativa. Muita gente ajudou a pintar os bancos e
A divisão por uma curva forma duas áreas separadas, das quais a menor é a o muro, realizou o plantio das mudas e participou das rodas de conversa.
entrada da garagem de um morador vizinho. Por isso, esse local foi definido A equipe de obras da Codhab finalizou o cercamento de toras de eucalipto
para o plantio de mudas, que, além de proporcionarem sombra, servem como antes do dia da Ação, para garantir a segurança no dia do evento. Além
barreira de proteção para a margem do córrego. A área maior é mais sombre- disso, a ponte que estava danificada, faltando um pedaço do corrimão, foi
ada, convertendo-se em espaço para a colocação dos bancos de pneus e a consertada pela própria comunidade com o intuito de evitar acidentes. O
pintura do painel, e em cujas margens foi erguida uma cerca para proteção. dia foi muito animado, com música e participação de equipes voluntárias
de dança e de hip-hop.
Plantio de árvores, 2016 Área de encontro com mural e bancos: produto da AUC #15, 2016
Fonte: Acervo Equipe de Assistência Técnica CODHAB Fonte: Acervo Equipe de Assistência Técnica CODHAB
AÇÃO URBANA COMUNITÁRIA #44
Junho de 2017
Já para a terceira Ação na Vila Cauhy, o foco foi mudado para o programa Se
Essa Rua Fosse Minha. A ideia foi transformar uma rua de muito movimento,
que funcionasse como passagem para boa parte de seus moradores, e fazer
a qualificação das fachadas e dos espaços abertos. A escolha do local se
baseou em conversas com os moradores, analisando as opções possíveis,
e chegando à conclusão de que a melhor escolha seria o início da rua que
leva à área da Ação Ambiental #1, criando um vínculo importante entre as
intervenções.
410 411
O eixo de ação Se Essa Rua Fosse Minha foi, então, aplicado na rua atrás da
Praça da Vitória, que possui 14 casas (sete de cada lado), fora um pequeno
beco com mais cinco casas. É uma área de bastante movimento, o que
tornaria o caminho agradável, além do fato de que todos poderiam visua-
lizar a atuação do Posto de Assistência Técnica. Dois outros eixos podem
ser combinados a esse: Botando Verde, com plantio de espécies nas áreas
verdes, e Reciclo Urbano, com a criação de bancos e mesas com caixas de
Equipe técnica com voluntários da AUC #44, 2017
madeira que seriam jogadas fora. Fonte: Acervo Equipe de Assistência Técnica CODHAB
Entre as demais atividades que ocorreram no Pos- aprofundado sobre a adequabilidade das soluções No primeiro semestre de 2017, com as fortes chuvas, ocorreram novamente
to, destaca-se o projeto de saneamento básico, que de esgotamento adotadas pela comunidade. problemas de drenagem das águas pluviais, que, dessa vez, afetaram a Rua da
foi baseado na dissertação de mestrado elaborada Mina. O problema se iniciou com a construção do muro de uma casa no final
por Viviane Virgolim, como conclusão do curso Durante a fase de coleta de dados, a Codhab dis- da rua, impedindo que a água seguisse seu percurso natural para o córrego.
de Saneamento Urbano, com especialização em ponibilizou uma lista de voluntários dispostos a Ficando acumulada, essa água invadiu as casas próximas, afetando inclusive
Esgotamento Sanitário, pelo Instituto UNESCO-IHE apoiar a aplicação da enquete na Vila, além de as fossas. O problema passou a ser pessoal entre os moradores, podendo
(Delft, Holanda). A dissertação, intitulada “Decen- iniciar a interlocução com os moradores. Em con- ter acabado em tragédia, haja vista as brigas constantes. Tal ocorrência
414 415
tralized sanitation in informal settlements: linking trapartida, os resultados e discussões da tese, resultou na presença do Centro de Referência de Assistência Social (CRAS)
technology to planning and management practices”, que são diretamente relacionados à Vila Cauhy, do Núcleo Bandeirante, para auxiliar na mediação do problema. A Codhab
datada de abril de 2017, tinha como objetivo en- contribuíram para um relatório de uso da Codhab, auxiliou os moradores no projeto de drenagem, para que a água pudesse
tender os fatores que afetam o desenvolvimento, ampliando a base de dados do Governo. O intuito ser desviada para a rua lateral, sem gerar acúmulo. O CRAS negociou junto
o fornecimento e a adoção de esgotamento sani- dessa parceria foi mostrar a necessidade de in- aos moradores e à Codhab para que o projeto pudesse ser implantado pela
tário urbano descentralizado em assentamentos vestimentos na comunidade, visando a melhorias própria comunidade.
informais de baixa renda no Brasil, a partir de um de infraestrutura, principalmente no que tange a
estudo de caso em Brasília. Para isso, a Vila Cauhy esgotamento sanitário.
foi escolhida como um dos locais para estudo mais
Requalificação da rua por meio de mutirão de reparo e pintura de fachadas, 2017 Enchente na Rua da Mina - Vila Cauhy, 2017
Fonte: Acervo Equipe de Assistência Técnica CODHAB Fonte: Acervo Equipe de Assistência Técnica CODHAB
PERSPECTIVAS CONCLUSÕES
Com o avanço dos trabalhos e pela presença na comunidade, foi perceptível O trabalho da assistência técnica, com a imersão do arquiteto dentro de
a diferença na relação entre esta e a companhia em nível pessoal, ao lidar uma comunidade, mostra-se cada vez mais importante para o nosso País
com os funcionários do PAT; a relação entre moradores e líderes comunitários – claramente na questão de mercado, mas principalmente no que se refere
também melhorou. Em termos de credibilidade, o Governo avançou em relação à necessidade da nossa população. Só estando presente é que se pode,
ao trabalho e à confiança dos moradores. Processos de imersão contribuem realmente, conhecer as demandas e os problemas da comunidade.
em localidades onde há disputas internas e permitem o acesso direto aos
416 417
técnicos de assistência técnica que podem fazer o contrabalanceamento de O que foi realizado na Vila Cauhy rendeu diversos frutos, como o desenvolvi-
forças. Para isso, a transparência no trabalho é fundamental para o enten- mento do processo de regularização, o novo endereçamento, a recuperação
dimento dos moradores em relação a todo o processo; da mesma forma, de espaços públicos. Ainda assim, o mais importante é a conscientização
é necessário que o trabalho da companhia seja claro, tornando possível a dos moradores acerca do trabalho do Estado e da imersão dos agentes
cobrança e o desenvolvimento constante, buscando o avanço da qualidade, públicos nesse objetivo. A continuidade do trabalho e sua expansão são
em todos os sentidos, da Vila Cauhy. fundamentais para um retorno ainda maior. Os percalços também devem
ser levados em conta, até para que o se aprimore as condições de trabalho
em imersão. Sem os riscos ou os erros cometidos, pouco se teria aprendido,
e menos teria sido feito.
30 km
VILA BURITIZINHO
SOBRADINHO II / DF
VILA BURITIZINHO
SOBRADINHO II / DF
início da ocupação -
população -
área 21,6762 ha (dado do PAT)
densidade 116 hab/ha (dado do PAT)
renda média mensal -
principais desafios Por estar em área de preservação ambiental, requer mais ateção em relação
as novas ocupações irregulares. Outro desafio é a aprovação do Projeto
Urbanístico URB 111 que já foi feito porém aguarda a avaliação da Central
de Aprovação de Projetos (CAP).
equipe coordenação arq. urb. Jessica Spehar // mar 2016 - dez 2018
Também faz parte da região a URB 099/2009, que foi ocupada a partir da
remoção de famílias da Vila Rabelo. Essa região é constituída pelos demais
426 427
conjuntos da quadra 3 e pelas quadras 4 e 5, cujo projeto encontra-se ainda
em processo de regularização. O principal problema é que o parcelamento
dessa área não faz parte da ARIS, ou seja, para dar andamento ao processo,
o Plano Diretor de Ordenamento Territorial precisaria passar por uma nova
revisão ou aprovação de Lei Complementar para que as duas áreas compo-
nham o mesmo projeto de regularização.
Área de Regularização de Interesse Social - ARIS
Áreas de atuação da CODHAB, 2017
Fonte: Acervo Equipe de Assistência Técnica CODHAB Novas Áreas de ZEIS
O posto de Buritizinho prestou serviços técnicos Devido à sobrecarga da equipe do posto, tendo As primeiras Ações realizadas em Buritizinho foram divididas em três etapas,
à comunidade, de março a outubro de 2016. Ini- que dividir a atenção entre Buritizinho e a Fercal, com a intenção de qualificar um espaço que estava abandonado e transfor-
cialmente, a Codhab contou com a ajuda do líder onde iniciou-se as obras do programa de Melho- má-lo em uma praça. Dessa forma, foi feito o projeto da Praça do Ipê, situada
comunitário local, o morador Jedson da Silva Nas- rias Habitacionais, optou-se por fechar o posto de na QR 4, com área de aproximadamente quatro mil metros quadrados. Os
cimento, que cedeu a garagem de sua residência, Buritizinho no final de 2016. Além disso, o bairro de moradores foram convidados a transformarem de forma colaborativa suas
localizada na QR 3, próxima ao canteiro de obras, Buritizinho passou por um processo de substitui- casas, em um grande mutirão de pintura das fachadas ao redor da praça.
428 429
para abrigar a equipe. Sob a coordenação da ar- ção da população de baixa renda, que viram seus
quiteta Jessica Spehar – também coordenadora lotes valorizados após as obras de infraestrutura Na Ação do dia 18 de junho, foram pintados cerca de 120 metros quadrados
das atividades na comunidade da Fercal –, com urbana, os venderam e saíram do local. Concluídas de fachadas. No dia 25 de junho, o trabalho com a pintura das fachadas foi
a contribuição das estagiárias Gabriela Heusi e as obras de drenagem e pavimentação, a principal continuado, contando com 30 participantes e 240 metros quadrados de novas
Naiara Farias, o Posto realizou estudos iniciais para demanda no Buritizinho era de escrituração. cores nas fachadas. Já no dia 2 de julho, além do eixo mencionado, também foi
residências, atendendo a demandas espontâneas, realizados um parquinho infantil com espaço para artistas criarem exposição
além de realizar Ações Urbanas Comunitárias, com as peças e painéis produzidos para o local. Foram reutilizados pneus,
responsáveis pela qualificação de algumas áreas manilhas e paletes doados. O evento contou com atividades educativas para
da região. as crianças e a ajuda de 150 participantes. Essas etapas geraram grandes
resultados para a comunidade e beneficiaram aproximadamente 1.600 pes-
Posto de Assistência Técnica da Vila Buritizinho, 2016
Fonte: Acervo Equipe de Assistência Técnica CODHAB soas. Depois do fim da Ação, os moradores se organizaram e prosseguiram
com algumas melhorias urbanas.
Local da Praça do Ipê antes da Ação, 2016 Praça do Ipê finalizada, 2016
Fonte: Acervo Equipe de Assistência Técnica CODHAB Fonte: Acervo Equipe de Assistência Técnica CODHAB
INFRAESTRUTURA
URBANA
AÇÃO URBANA COMUNITÁRIA #26
Novembro de 2016
Ocorrida na QR 3 – conjuntos E e F, a Ação visou a realizar o paisagismo No período em que o Posto esteve ativo, também foram desenvolvidas ati-
em um espaço sem ocupação pública. No mutirão, foi realizado o plantio vidades de acompanhamento de obras de infraestrutura no local, por meio
de mudas de árvores, hortaliças e mudas de flores; a implantação de uma de reuniões semanais com o órgão executor e os demais envolvidos no
horta; e a aplicação de grama. Foi também proposta a pintura de um painel processo. Foi feito o acompanhamento das obras de drenagem das águas
artístico de cem metros quadrados durante a Ação, que contou com a ajuda pluviais e da pavimentação, com limpeza e desobstrução de algumas áreas.
de cerca de 20 participantes.
Referências
30 km
FERCAL
FERCAL / DF
FERCAL
FERCAL / DF
potencialidades Está situada na APA Cafuringa, uma região muito rica em recursos minerais
e que se destaca pela beleza geográfica e outras riquezas naturais e cultu-
rais que servem de atrações turísticas. Considerada a “1ª Cidade Operária
do Distrito Federal”, Empresas produtoras de cimento, usinas de asfalto e
derivados, dentre outras, contribuem com a oferta local de emprego e com o
crescimento econômico da região, resultando em uma das maiores geradoras
de impostos do Distrito Federal.
Com 63 anos completados em 11 de setembro de trativa (RA) de Sobradinho – das quais seis são
2019, a Fercal está situada na Região Administrativa rurais. Em 2001, foi criada a RA XVI (Sobradinho
XXXI, próxima a Sobradinho. A área é marcada por II), e suas terras passaram a compor a cidade da
suas riquezas naturais e culturais, assim como pelas Fercal, que se tornou sede da RA XXXI a partir da
fábricas produtoras de cimento, que impulsionaram Lei nº 4.745, de 2012.
sua ocupação.
Segundo os dados da Pesquisa Distrital por Amos-
440 441
O turismo local, ainda tímido e pouco explorado, tra de Domicílios (PDAD) de 2015, realizada pela
conta com cachoeiras, trilhas, córregos, turismo Companhia de Planejamento do DF (Codeplan), a
rural e ecovilas, além de alguns eventos tradicionais população urbana estimada era de 8.746 habitantes,
como a Folia de Reis, a Folia do Divino, os Arraiais, possuindo a menor renda per capita – R$625,64 –
a Festa da Pamonha e a Feira de Empreendedores dentre as 16 regiões administrativas analisadas.
e a de Produtores Rurais. Essas festividades bus- Em relação aos trabalhadores residentes nessa
cam também resgatar e preservar culturas, como comunidade, 53,64% trabalhavam na própria Fercal,
o Grupo das Rezadeiras, os Grupos de Catiras e os 15,04%, no Plano Piloto e 11,85%, em Sobradinho.
Grupos de Cavalgadas. As demais regiões administrativas recebem parce-
las pouco significativas de trabalhadores oriundos
Pela abundância de recursos minerais encontrados dessa comunidade, assim como o Plano Piloto – ca-
em seu território, como é o caso do calcário, sua racterística muito peculiar, se comparada às demais
principal atividade econômica é extrativista. Orga- cidades do DF –, uma vez que tais trabalhadores
nizações produtoras de cimento, usinas de asfalto recorrem primeiramente a Sobradinho para atender
e derivados, dentre outras, contribuem para a oferta a suas necessidades básicas.
local de emprego e resulta em uma das maiores
gerações de impostos do Distrito Federal. A grande responsável por esse dado é a oferta de
empregos gerada pelas fábricas da região, igual-
A Fercal colabora, ainda, para o abastecimento de mente causadora da ocupação progressiva. Tal
Fercal, 2015
produtos agrícolas nas feiras da própria região e ocupação formou-se inicialmente pela chegada Fonte: Joana França - Acervo CODHAB
de Sobradinho I, Sobradinho II, Grande Colorado constante de migrantes, em sua maioria nordesti-
e Centrais de Abastecimento do Distrito Federal nos, buscando por trabalho e melhores condições
(Ceasa-DF). de vida – o que posteriormente provocou um cres- Atualmente, de acordo com a Administração Regional da Fercal, a região
cimento urbano desordenado. Além do contexto conta com os seguintes órgãos governamentais: dez escolas públicas, das
Trata-se de um local que tem como característica urbanístico inadequado, a região é considerada quais uma atende do 6º ao 9º ano e ensino médio, outra do 1º ao 9º ano, e as
particular a familiaridade entre habitantes, comu- imprópria para habitação, por estar em área de demais do 1º ao 5º ano; uma praça com espaço de eventos; um campo de
nidade escolar, empreendedores locais, líderes preservação ambiental e área de risco, estando grama sintética; seis quadras de esporte; quatro postos de saúde; um Centro
comunitários e governo. A cidade, que margeia também sujeita a grande poluição, devido à proxi- de Referência em Assistência Social (CRAS); um posto policial; uma feira livre;
as rodovias DF-150 e DF-205, é composta por 14 midade das fábricas de cimento, o que representa e uma feira cultural, que funciona todas as sextas-feiras à noite.
comunidades que pertenciam à Região Adminis- uma séria ameaça à saúde dos moradores.
A CODHAB
NA COMUNIDADE
442 443
[...] inseridas no setor Habitacional da Fercal são
caracterizadas por uma malha urbana irregular
e desconectada, com usos predominantemente
residenciais e a presença de alguns comércios
locais. O parcelamento irregular é desprovido de
infraestrutura urbana adequada, apresenta em sua
maioria, ruas não pavimentadas ou com pavimen-
tação precária além da inexistência de calçadas,
ciclovias e áreas livres públicas urbanizadas. (p. 9)
446 447
Constantes episódios de furto dos equipamentos ocorreram, tornando-se
necessário mudar o local de trabalho. Por fim, o escritório esteve em um
contêiner – ainda sem a infraestrutura ideal – localizado na Praça do Engenho
Velho e voltado para a rodovia DF-150, trazendo mais visibilidade à presença
da companhia e maior segurança aos serviços prestados.
Ainda segundo essa lei, as famílias com renda mensal de até três salários
mínimos, residentes em áreas urbanas ou rurais, têm direito a assistência
técnica pública e gratuita para o projeto e a construção de habitação de
interesse social, para sua própria moradia.
456 457
Caso Nair:
1 2 5m Levantamento cadastral e projeto (à esquerda) e casa antes e depois da obra (acima)
Fonte: Acervo Equipe de Assistência Técnica CODHAB
VERACI DOS SANTOS
458 459
Caso Veraci:
1 2 5m Levantamento cadastral e projeto (à esquerda) e casa antes e depois da obra (acima)
Fonte: Acervo Equipe de Assistência Técnica CODHAB
AÇÕES URBANAS
COMUNITÁRIAS
460 461
AÇÃO URBANA COMUNITÁRIA #17
Setembro de 2016
Diante disso, foi sugerida para essa Ação uma oficina de fossa sustentável,
constituída por três módulos. O primeiro funciona como sumidouro, o segundo
como fossa e o terceiro como reservatório de água parcialmente tratada, po-
dendo ser reutilizada para lavar garagens, carros e aguar o jardim. Os passos
seguidos durante o processo construtivo da fossa foram: execução da vala
com retroescavadeira; desativação da fossa antiga e conexão até a nova;
execução do desnível do piso e posicionamento dos pneus; perfuração dos
pneus, colocação da manta aluminizada entre eles. Esse processo se repetiu
nos dois outros módulos, até a finalização da fossa. A proposta do projeto
é tornar viável à própria comunidade executar a fossa sustentável em sua
casa, com um mínimo de recurso, e economizar água. Todo o trabalho foi
possível em uma parceria com funcionários da Administração Regional local.
Revitalização de parque feita pela equipe CODHAB com ajuda de crianças da comunidade, 2017 Revitalização de parque feita pela equipe CODHAB com ajuda de crianças da comunidade, 2017
Fonte: Acervo Equipe de Assistência Técnica CODHAB Fonte: Acervo Equipe de Assistência Técnica CODHAB
A ideia para esta ação foi qualificar a praça do ponto Nessa Ação, em especial, a presença das crianças
de encontro comunitário (PEC) da comunidade Alto da comunidade foi bem intensa, o que favoreceu
Bela Vista na Fercal e, consequentemente, fazer a execução de propostas mais lúdicas para a re-
com que a mesma voltasse a ser utilizada, visto vitalização da área. Alguns voluntários também
que estava totalmente degradada e já sem utilidade contribuíram positivamente para que os resulta-
para a população. Dessa forma, foram propostas dos fossem alcançados, algo muito significativo
a limpeza da praça, localizada na rua principal da para uma ação comunitária que visa à interação
comunidade, em situação crítica e utilizada como de pessoas de fora e de dentro da comunidade.
depósito de lixo das casas do entorno; a poda da
vegetação da área; a pintura do mobiliário, das
calçadas de acesso, da escada e das muretas
do campo de futebol e do parquinho; a pintura
de um painel na fachada de maior visibilidade da
praça; a restauração do parquinho; e a retirada dos
equipamentos danificados do PEC.
AÇÃO URBANA COMUNITÁRIA #39
Abril de 2017
A proposta da Ação #39, instigada pelo programa distrital Cidades Limpas, foi
promover uma intervenção na praça do Engenho Velho – a de maior visibilida-
de na Fercal –, que fizesse com que as melhorias executadas abrangessem
toda a comunidade. Tal objetivo se fez presente, porque essa praça contém
equipamentos públicos e instituições que atendem a toda a RA, como a Admi-
nistração, o posto policial, o posto da Codhab, as vias comerciais e as paradas
de ônibus de maior conectividade. Assim sendo, foi proposta a pintura dos
466 467
mobiliários da praça (13 bancos e 6 conjuntos de mesas e bancos); a pintura
do piso do pergolado e das calçadas das áreas de lazer (parquinho e PEC); e
a reforma das três paradas de ônibus da rodovia DF-150, que atendem a essa
área. Além da equipe da assistência técnica, a participação dos voluntários
e moradores da comunidade foi acentuada e de grande importância para o
desenvolvimento das atividades de forma satisfatória.
Revitalização de parada de ônibus durante Ação Urbana Comunitária, 2017 Resultado de pintura no piso após AUC, 2017
Fonte: Acervo Equipe de Assistência Técnica CODHAB Fonte: Acervo Equipe de Assistência Técnica CODHAB
AÇÃO URBANA COMUNITÁRIA #51 E #52
Agosto de 2017
O foco desta Ação Urbana se baseou no eixo Se essa Rua Fosse Minha,
abarcando a qualificação da rua principal da Fercal II e da praça do Pon-
to de Encontro Comunitário (PEC), adjacente a essa mesma rua, e, ainda,
468 469
a pintura das duas paradas de ônibus que mais atendem à comunidade.
Nessa etapa, foram executados o reboco e a pintura de 20 fachadas da rua
principal, que estavam em situação mais crítica, além da limpeza da rua e
pintura de meio-fio, fornecendo conforto e bem-estar aos transeuntes da
via de fluxo mais intenso da Fercal II. A praça do PEC, localizada no meio da
rua principal, também passou por mudanças e teve sua revitalização feita a
partir da limpeza e poda da vegetação, da pintura de painéis nas fachadas
mais imponentes da área – sendo um deles todo feito pelos moradores da
comunidade – e da construção de mobiliário com paletes doados pelas
fábricas a uma moradora.
Revitalização de
parada de ônibus, 2017
Fonte: Acervo Equipe de
Assistência Técnica CODHAB
CIRCUITO DAS
PARADAS DA FERCAL
DF 150
ARIS
paradas a revitalizar
Mapa do Circuito das Paradas da Fercal, 2017
paradas revitalizadas Fonte: Acervo Equipe de Assistência Técnica CODHAB
Nesse cenário, é importante reforçar o interesse manifestado por outras
regiões da Fercal na revitalização de suas paradas internas (fora da rodovia
DF-150). É o caso do pedido feito ao PAT por parte da liderança da Rua do Mato,
direcionado às paradas de ônibus dessa comunidade, onde recentemente o
artista brasiliense Toninho de Souza havia feito trabalho semelhante. Porém,
dado o uso de colagem, o trabalho desfez-se em pouco tempo, devido ao tipo
de técnica artística. Sendo assim, a coordenação do PAT entrou em contato
com Toninho e, pelo intermédio da vontade local, firmou-se uma parceria para
a pintura das três paradas de ônibus. Todos colaboraram: artista, comunidade
e governo. Tal interesse demonstra que o projeto estava alinhado às reais
necessidades dos moradores locais.
476 477
Para complementar o projeto, foi desenvolvido o Manual das Paradas de
Ônibus, com o intuito de expor à comunidade o processo de revitalização
das paradas, por meio de um passo a passo que descreve cada uma de suas
etapas. A ideia é facilitar os meios para que essas qualificações possam ser
realizadas pelos próprios moradores em suas comunidades.
Parada de ônibus #12 revitalizada, 2017 Parada de ônibus #18 (Rua do Mato) revitalizada com mural do artista Toninho de Souza, 2017
Fonte: Acervo Equipe de Assistência Técnica CODHAB Fonte: Acervo Equipe de Assistência Técnica CODHAB
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Parada de ônibus #15 revitalizada, 2017 Paradas de ônibus #9 e #10 revitalizadas, 2017
Fonte: Acervo Equipe de Assistência Técnica CODHAB Fonte: Acervo Equipe de Assistência Técnica CODHAB
Parada de ônibus #16 revitalizada com mural do artista Toninho de Souza, 2017 Parada de ônibus #17 revitalizada com mural do artista Toninho de Souza, 2017
Fonte: Acervo Equipe de Assistência Técnica CODHAB Fonte: Acervo Equipe de Assistência Técnica CODHAB
É um grande desafio lidar com tamanha precariedade e não ter recurso suficiente O trabalho de estagiária no posto da Fercal me
para atender a todas as necessidades, como também é um grande desafio con- engrandeceu muito. Lembro que, quando entrei,
viver com as famílias, saber de suas histórias e lutas sociais, e não se envolver já tinha ideia de como seria, devido à experiência
emocionalmente. Por essas razões é que a Assistência Técnica proporciona não que tive como voluntária na Ação Urbana da Vila
só crescimento profissional, como também pessoal, uma vez que essas comu- Cauhy; mas foi muito mais gratificante do que eu
nidades carentes – de recursos e infraestrutura – são ricas em seus saberes, em poderia esperar. Estar todos os dias em contato
sua simplicidade e de experiências de vida, tendo muito a ensinar. com uma comunidade que precisa e anseia pelo
trabalho que está sendo feito é muito motivador.
– Jessica Spehar, arquiteta coordenadora do Posto Seja no programa de Melhorias Habitacionais, no
qual pude vivenciar o cotidiano de famílias com
realidades tão diversas e inspiradoras; nas Ações
Urbanas, em que experienciei a força de um traba-
lho em equipe por uma causa tão nobre; ou até no
480 dia a dia no posto, com a equipe da Codhab e da Ter a oportunidade de estagiar em um dos postos 481
Petrus, todos estes momentos marcaram muito a da Codhab foi um divisor de águas na minha vida.
minha trajetória e me fizeram acreditar na Arqui- Em um momento em que estava desesperançosa
tetura como ponte para a melhoria da qualidade com o curso de Arquitetura e Urbanismo, entre ou-
de vida de uma comunidade inteira. tras dúvidas internas, a vaga de estágio abriu meu
horizonte de formas inimagináveis. A própria rotina
– Giovana Azevedo, estagiária do Posto do local, lidar com as famílias da Fercal, conhecer
outra realidade e poder fazer a diferença, mesmo
que mínima, nesse processo foi maravilhoso. Me
fez crescer e renovar esse amor pela Arquitetura
e Urbanismo em que eu acredito. Nada paga os
cafezinhos da comunidade, as histórias contadas
nas visitas de campo e a gratidão imediata após
alguma intervenção.
Participar como voluntária das ações urbanas na Fercal foi muito inspirador.
Além de ter a oportunidade de trazer mais cor e mais identidade para a cidade,
o que mais me marcou na Ação em que pintamos duas paradas de ônibus na
DF-150 foi a contribuição do Wendel, um rapaz em regime semiaberto que está
em processo de ressocialização. Ele participou da pintura de uma das paradas
desde sua concepção e foi muito gratificante o orgulho e a felicidade dele ao
ver o resultado final! Acredito que esse processo de requalificação do espaço
urbano dê uma sensação enorme de pertencimento a quem realmente vive a
cidade no dia a dia, inspirando a população a cuidar cada vez mais do espaço
que é de cada um e de todos nós.
As principais dificuldades encontradas referiam-se às condições do ambiente Durante os quase dois anos trabalhando diaria- res e lideranças procuravam o posto solicitando a
de trabalho, uma vez que não se tem uma estrutura física adequada nem o mente dentro da ARIS, foram criados laços de pintura das fachadas e paradas de ônibus de suas
apoio imediato quanto à manutenção. Essa descentralização dos serviços da confiança com a comunidade, conquistados por comunidades. Da mesma forma, o projeto inovador
companhia, por um lado, faz com que se consiga entender a real demanda da meio do diálogo, da transparência e da qualidade de melhorias habitacionais ganhou credibilidade,
comunidade, possibilitando trabalhar de maneira mais efetiva; porém, dificulta dos serviços prestados até então. As lideranças especialmente quando deixou de estar apenas no
os diálogos com outros setores quando há centralização das informações. passaram a entender que, embora ainda não te- papel e passou a ser executado.
484 485
nham alcançado a regularização urbana que tanto
Já em relação ao trabalho realizado na ARIS, situações de mediação de almejam, a companhia atua, dispondo de poucos A presença do arquiteto imerso na comunidade
conflitos não foram tão presentes, uma vez que essa região é considerada recursos, no sentido de promover melhorias na é de extrema importância para que seja possível
enfraquecida no sentido de lideranças comunitárias, que são desconectadas, cidade, contando com a colaboração da equipe vivenciar o funcionamento da malha urbana, bem
cada uma buscando por seus respectivos interesses. Na maioria das reuni- técnica e da excepcional equipe de obras, e com como a qualidade habitacional e realidade vivencia-
ões, os assuntos tratados eram relacionados à regularização da comunidade a parceria de outros órgãos governamentais, vo- da pelos moradores com quem esse profissional irá
Boa Vista, que, por ser rural, infelizmente não é de competência da Codhab. luntários e, principalmente, com os moradores da dialogar e para quem irá projetar e executar suas
região e seus representantes. atribuições. Difere-se muito da condição de se
Algumas mediações relacionadas ao programa Melhorias Habitacionais projetar no centro da cidade, distante da realidade
também ocorreram: houve situações em que os beneficiados alteravam o É interessante observar como, inicialmente, a co- e das demandas essenciais daqueles moradores.
projeto quando a obra já havia sido iniciada, causando desentendimentos munidade estava desacreditada, desconfiada e um Vive-se a cidade no chão e toma-se as decisões a
com a empresa executora credenciada e a empresa autora do projeto. tanto resistente a aceitar as novas propostas de partir de uma perspectiva muito mais humana do
trabalho e como o cenário ficou diferente: morado- que por meio de imagens de satélite.
Referências
50 km
EXPANSÃO - VILA SÃO JOSÉ
BRAZLÂNDIA / DF
EXPANSÃO - VILA SÃO JOSÉ
BRAZLÂNDIA / DF
por Erick Mendonça
início da ocupação Entre 1993 e 1995 (dado do PAT)
população Estima-se que 21 mil habitantes (dado do PAT)
área 163,47 ha (dado do PAT)
densidade 129,93 hab/ha (dado do PAT)
renda média mensal R$ 893,66 per capita (PDAD 2015)
potencialidades Hoje o setor apresenta-se bem estruturado, por suas quadras, vias e lotes, que
encontram-se bem consolidados, rigidamente dispostos e com infra-estrutura
já implantada. Sua potencialidade se dá então no trato dos espaços públicos
existentes. Há espaços disponíveis para oferta de equipamentos públicos,
serviços, lazer e entretenimento, além da circulação de pedestres que tem
potencial de melhoria. Também, segundo comentam os moradores, o grande
déficit da cidade de Brazlândia, como um todo, é em relação a opções de
lazer e entretenimento, além de não haver “ocupação sadia” para os jovens.
Outra potencialidade na região é a aplicação do programa de melhorias
habitacionais, pois, apesar de o setor já dispor de uma certa qualidade de
vida urbana, há muitos domicílios precários e famílias de baixa renda que
possuem esse direito conforme a lei.
principais desafios O maior desafio da Expansão da Vila São José é a questão do impasse fundi-
ário e ambiental. Há uma parte da ocupação já consolidada que se encontra
em conflito com uma área de proteção ambiental. O processo obteve êxito
em sua aprovação recentemente, mas com essas ressalvas. O anseio atual
da população é a emissão dos termos de escritura de suas casas, superando
uma espera de mais de 20 anos desta situação irregular.
equipe coordenação arq. urb. Erick Mendonça // jun 2016 - mar 2017
arq. urb. Verônica Almeida // abr 2017 - out 2017
arq. urb. Erick Mendonça // nov 2017 - dez 2018
HISTÓRICO
A Expansão da Vila São José é uma Área de Regularização de Interesse Social Apesar da ocupação sem planejamento, pode-se afirmar que grande parte
(ARIS) localizada na Região Administrativa de Brazlândia, a 50 quilômetros do da área seguiu o projeto desenvolvido pelo governo da época, e por essa
centro de Brasília. A expansão da Vila compreende atualmente dez quadras, razão é possível notar hoje que o setor habitacional possui um desenho
onde residem cerca de 15 mil habitantes em mais de 3.700 casas. Essa área urbano – tanto em termos de regularidade geométrica no parcelamento
é uma expansão da vila originária (menor e mais antiga, criada em 1984), e na hierarquia viária quanto de infraestrutura satisfatória, quando com-
denominada Vila São José, com quatro quadras e já regularizada. parado às outras comunidades irregulares e de baixa renda; é urbanizado,
possui iluminação pública, pavimentação, redes de água e esgoto, escolas
Em 1993, foi desenvolvido um estudo urbanístico preliminar para expandir e praças. De modo geral, trata-se de um cenário similar ao da ARIS QNR, em
Brazlândia, como parte de um programa de assentamento do Governo do Ceilândia, uma vez que ambos se distinguem de outras realidades predomi-
Distrito Federal à época. Não tendo sido viabilizada de modo oficial, em 1995 nantemente encontradas nas áreas irregulares e de baixa renda onde foram
a ocupação foi realizada por famílias de Brazlândia, bem como dos municí- instalados os demais postos da equipe de assistência técnica. Apesar dessa
pios de Goiás de Padre Bernardo, Águas Lindas, dentre outras localidades condição urbanística, as moradias refletem a limitada condição financeira
do entorno do Distrito Federal. A região foi escolhida para a experiência de seus moradores e as consequências da autoconstrução, tão recorrente
de assistência técnica devido à concentração de famílias de baixa renda, nas cidades brasileiras.
segundo os dados da Pesquisa Distrital por Amostra de Domicílios (PDAD),
elaborada pela Companhia de Planejamento do Distrito Federal (Codeplan).
Brazlândia, 2016
Fonte: Renato Araújo - Agência Brasília
494 495
Posto de Assistência Técnica da Expansão - Vila São José, 2016 Posto de Assistência Técnica da Expansão - Vila São José, 2016
Fonte: Acervo Equipe de Assistência Técnica CODHAB Fonte: Acervo Equipe de Assistência Técnica CODHAB
POSTO DE
ASSISTÊNCIA TÉCNICA
Em Brazlândia, a Codhab abriu o Posto de As- A rotina dos postos é tomada pelos três primei- pois muitos não tinham ideia do que faz um arquiteto. Após a compreensão,
sistência Técnica (PAT) em junho de 2016, para ros eixos técnicos em simultaneidade, além do também ficam surpresos com o fato de que o profissional está disponível
promover o acesso do arquiteto e urbanista ao atendimento à população, inclusive a respeito de gratuitamente pelo Estado. Ainda ssim, o Posto nessa comunidade foi ben-
cidadão de baixa renda, conforme preconiza a questões cadastrais no programa habitacional quisto, ainda mais por Brazlândia ser a cidade mais distante do centro de
Lei Federal nº 11.888/2008 (Lei da Assistência Minha Casa Minha Vida. Brasília, local onde está situada a sede da Companhia.
Técnica). As atividades desenvolvidas seguem três
eixos programados pela Diretoria de Assistência Por se tratar de Lei Federal pouco divulgada e ra- A população da Expansão da Vila José não possui representatividade formal
Técnica (DIATE) da Companhia, sendo eles: ramente colocada em prática, muitos membros própria; não existe nessa comunidade associação de moradores e/ou liderança
da comunidade não sabem o que é a assistência comunitária. O que existem são algumas pessoas-chave que se mobilizam e
1 – Elaborar projetos arquitetônicos de reformas técnica e sequer conhecem esse direito que pos- colaboram com demandas diversas. Era o caso da Dona Sabina, que pedia a
residenciais (programa Melhorias Habitacionais); suem. Geralmente, procuravam o Posto para tratar remoção das antigas placas de endereçamento, colocadas com informações
2 – Acompanhar o processo de regularização de questões outras da Companhia, como situação equivocadas, e que sempre procurava saber sobre os processos de escritura-
fundiária; cadastral e programa de oferta habitacional. Na ção e do projeto de subsídio para reformas das moradias. Há também a Dona
3 – Promover Ações Urbanas Comunitárias (AUC). oportunidade do atendimento, era esclarecida a Claudemira e a Madalena, colaboradoras nas Ações Urbanas Comunitárias
principal função do Posto, e explicava-se então o (quatro AUC foram realizadas), e que chamavam outros colaboradores co-
que é a assistência técnica oferecida pela compa- nhecidos da cidade para participarem das atividades. Outra personagem foi
nhia. Pode-se dizer que a reação era positiva: a co- Dona Joelma, que sempre esteve atenta às questões sensíveis às famílias
munidade se surpreendia com o serviço oferecido, que sofrem derrubadas na área rural, nas proximidades da Vila.
496 497
Pintura de pneus durante AUC #24 , 2016 Cata-ventos produzidos durante AUC #34, 2017
Fonte: Acervo Equipe de Assistência Técnica CODHAB Fonte: Acervo Equipe de Assistência Técnica CODHAB
Pintura de painel artístico e plantio de horta medicinal durante AUC #27, 2017 Pintura de calçadas, mesas e bancos durante AUC #40, 2017
Fonte: Acervo Equipe de Assistência Técnica CODHAB Fonte: Acervo Equipe de Assistência Técnica CODHAB
PERSPECTIVAS
Sem esse iniciativa, é possível que essas famílias nunca tivessem acesso
a um profissional em arquitetura, orientando-as quanto a construção de
seus lares. Além disso, essa relação encurta distâncias e contribui para a
informação da população, pois muitas pessoas não sabem como funcionam
os trâmites burocráticos que regem a cidade, como escrituração, alvarás,
habite-se, dentre outros; além das normativas que regem a documentação
de imóveis, essenciais à segurança jurídica do morador.
Vale ressaltar também que é preciso paciência por parte do arquiteto, acostu-
mado a lidar com seus termos técnicos pouco compreendidos pela sociedade
num geral. É preciso fazer-se entender, tirar todas as dúvidas com clareza e
explicar quais são as vantagens de um projeto arquitetônico. É igualmente
importante a criatividade nas soluções adotadas em projeto, pois a habitação
popular deve ser de boa qualidade, funcional e financeiramente viável. O que
é uma equação difícil, dada a complexidade social do programa de neces-
sidades, as dimensões do terreno e as condições da área de intervenção.
23 km
SÃO SEBASTIÃO
SÃO SEBASTIÃO / DF
SÃO SEBASTIÃO
SÃO SEBASTIÃO / DF
potencialidades A região tem grande potencial para geração de novos empregos, abertura de co-
mércios e prestação de serviços, caso seja realizada a regularização fundiária de
toda a cidade. A escrituração e doação dos lotes aos moradores permitiria uma
dinamização da economia, incentivaria setor da construção enquanto garantiria
maior segurança aos comerciantes locais para se desenvolver e investir. Também
é reinvidicação da cidade e de vários gestores e politicos da região, a construção de
uma zona industrial próximo à cidade. São Sebastião e o entorno também possui
grande potencial para o turismo ambiental, para o desenvolvimento do lazer na
natureza, nos parques, praças, córregos e cachoeiras no entorno e dentro da cidade.
principais desafios A regularização fundiária de São Sebastião é a maior urgência da cidade. Atual-
mente apenas um dos seis projetos de urbanismo foi aprovado e foram permitidas
a escrituração e a doação dos lotes. Os demais projetos devem ser aprovados de
forma que haja segurança jurídica para os moradores e comerciantes da cidade
construirem e empreenderem, além de permitir a negociação e a venda dos lotes
já ocupados há décadas, o que movimentaria a economia da cidade. Outro fator
é a ausência do controle sobre invasões e de um projeto de conscientização
das pessoas, a fim de orientar e evitar novas invasões. Os entraves políticos e
a morosidade dos demais órgãos, quando da denúncia de uma invasão ou da
solicitação de desobstrução, também atrapalha no processo de regularização,
que não protege nem mesmo as poucas áreas públicas remanescentes.
equipe coordenação arq. urb. Sandra Marinho // abr 2016 - mai 2017
arq. urb. Aníbal Barbosa // mai 2017 - jun 2017
arq. urb. Renan Davis // jul 2017 - dez 2018
As terras onde hoje constituem a XIV Região Ad- No princípio, o vilarejo era habitado por comercian- Outro diferencial da ocupação territorial desta área foi a total ausência do
ministrativa do Distrito Federal - Região de São tes de areia, cerâmica e olaria. Com a intensificação Estado, ao contrário do que ocorreu com a criação das demais cidades-
Sebastião - pertenciam, antes da mudança da da imigração, surgiram diversas ocupações de -satélites1, onde os operários e pessoas de baixa renda eram alocadas em
capital, às fazendas Taboquinha, Papuda e Cacho- áreas públicas, cujos moradores, posteriormente, grandes assentamentos pelo governo, cujas justificativas foram a contenção
eirinha. Essas fazendas foram desapropriadas
1
foram removidos para a localidade. do crescimento do Plano Piloto e conservação da bacia do Lago Paranoá.
com o início das obras da construção de Brasília.
508 509
A partir de 1957, várias olarias se instalaram ao A venda de lotes por preços baixos deu origem a Até 1993, a Agrovila São Sebastião passou a fazer parte da Região Admi-
longo do Córrego da Mata Grande e Ribeirão da vários bairros sem planejamento, tendo a prática nistrativa do Paranoá – RA VII e, por meio da Lei nº 167/93, de 25/06/1993,
Papuda, com vistas a suprir parte da demanda por do parcelamento se configurado ato corriqueiro criou-se a Região Administrativa de São Sebastião – RA XIV.
matéria nas obras da construção civil de Brasília. para aqueles que ali moravam.
Estas terras foram depois arrendadas através da Com o passar do tempo, e após a decisão de governo de regularizar a cidade,
Fundação Zoobotânica do DF (ARAUJO, Mara - São Assim, a grilagem das terras arrendadas nas áre-
2
iniciou-se a criação de bairros projetados e implantados pelo Estado - caso
Sebastião – DF do Sonho a Cidade Real, 2009). as rurais buscou resolver, naquele momento, por dos bairros Tradicional, Residencial Oeste, Centro, São Bartolomeu, Bonsu-
parte dos moradores, o problema do “onde morar” cesso, Morro Azul e Bora Manso.
Ao final dos contratos de arrendamento das áreas daqueles que antes residiam de forma provisória
das olarias e com a conclusão das obras da cons- próximos às olarias para quais trabalhavam. Assim, Devido à forma de ocupação, que alia as ocupações irregulares aos bairros
trução de Brasília, esses estabelecimentos foram com o passar do tempo, a ocupação – distante de projetados, a cidade apresenta traçado urbanístico distinto que atende à di-
aos poucos sendo desativados. Em consequência, qualquer planejamento urbano da administração ferentes faixas de renda, principalmente média baixa e baixa, resultando em
alguns dos arrendadores das olarias foram par- pública – foi se estruturando ao longo dos córregos um tecido urbano descontínuo e fragmentado, com elevados custos sociais
celando irregularmente as glebas, formando-se Mato Grande e Ribeirão Santo Antônio da Papuda, da organização territorial e a consequente degradação ambiental provocada
assim a parte original da Agrovila São Sebastião. trazendo vários impactos ambientais aos córregos pela ocupação desordenada.
Surge, neste momento, personagens históricos e às nascentes da região.
como o seu Sebastião, popularmente conhecido O desenvolvimento da cidade teve uma trajetória
como “Tião Areia”, que se tornou na época uma ligada à exploração da terra por parcelamentos
referência em liderança por reivindicar benfeitorias clandestinos voltados às classes médio-baixa e
para o então vilarejo. baixa, remanescente ainda da ocupação espontânea
motivada por oferta de comércio de areia e explo-
ração das olarias e cerâmicas para suprir parte da
demanda por materiais de construção civil à época
da construção de Brasília
BORA
MANSO
BAIRRO
NACIONAL SÃO
Segundo dados da Pesquisa Distrital por Amostra O projeto de regularização URB 056/2017 - o mais
GABRIEL
de Domicílios (PDAD,2016), São Sebastião possui recente dentro da cidade -, trata do bairro Residen- MORRO
AZUL
uma população aproximada de 115.256 pessoas, cial Vitória, local onde foi instalado um Posto de
distribuídas por uma área total de 35.571,37 hecta- Assistência Técnica (PAT) em Arquitetura e Enge- SÃO
BARTOLOMEU BAIRRO
res, sendo uma das regiões com maior densidade nharia Pública, da Companhia de Desenvolvimento TRADICIONAL
urbana do DF. Habitacional do Distrito Federal (CODHAB/DF), JOÃO
510 CANDIDO 511
no ano de 2016. No presente momento, além de
A cidade é composta por 21 bairros com con- passar por uma revisão, o citado projeto guarda RESIDENCIAL
OESTE VILA NOVA
figurações de ocupação e situações fundiárias manifestação das concessionárias e posiciona-
BAIRRO
distintas, sendo eles: Centro, Residencial Oeste, mento quanto ao licenciamento ambiental, etapas CENTRO
BONSUCESSO
Tradicional, São Bartolomeu, Bonsucesso, Morro que, conclusas, permitirão a chegada das obras de RESIDENCIAL
SÃO DO BOSQUE
Azul, Vila do Boa, Nacional, Bora Manso, São José, infraestrutura urbana ao bairro.
EXPANSÃO JOSÉ
São Francisco, Vila Nova, Residencial do Bosque, BONSUCESSO
João Candido, São Gabriel, Residencial Vitória, Bela Os bairros Vila do Boa, Bora Manso e a quadra
Vista, Morro da Cruz, Zumbi dos Palmares, Capão 12 do Morro Azul estão inseridos no projeto URB RESIDENCIAL
VITÓRIA
Comprido e Crixás. 137/10, o qual já tinha sido elaborado pela empresa
SÃO
TOPOCART, em 2010; no entanto, o projeto não foi FRANCISCO BELA
Na região, a maioria das construções é permanente, aprovado e hoje a ocupação é irregular, principal- VISTA
dentre as quais 38,62% encontram-se em terrenos mente o parcelamento denominado Expansão da
não regularizados. Na documentação de posse dos Vila do Boa. Tal parcelamento impossibilita a im-
imóveis, verificou-se que: apenas 2,51% declararam plantação do projeto, devido à ocupação de áreas
possuir escritura definitiva; 62,85% detêm contrato públicas, grande parte em uma Área de Relevante MORRO
DA CRUZ
de compra e venda; 19,72% adquiriram residência Interesse Ecológico (ARIE), caracterizada pelo solo
CAPÃO
por programas como o Minha Casa Minha Vida hidromórfico, altamente argiloso e encharcado, CRIXÁ COMPRIDO
ou o Morar Bem; e 12,41%, por concessão de uso totalmente impróprio para construção de habita-
(PDAD, 2016). ções. Devido a esse impasse da ocupação dentro
da ARIE, está pendente a manifestação do Instituto
São Sebastião possui atualmente seis projetos Brasília Ambiental (IBRAM) acerca da permanência
urbanísticos, dentre os quais apenas dois foram ou não dos moradores na área e também a elabo- Zonas urbana e rural e
bairros de São Sebastião
aprovados e licenciados, enquanto os demais se ração de um novo estudo ambiental que verifique
Fonte: Acervo Equipe de ZUMBI DOS
encontram em processo de revisão para a aprova- e confirme as características do solo da região. Assistência Técnica CODHAB PALMARES
ção ou o licenciamento. O único projeto de regula-
rização aprovado e parcialmente executado, a URB Núcleo Rural
114/09, já entregou 4.971 escrituras, desde 2016, Núcleo Urbano
nos bairros Residencial Oeste, Tradicional e Centro. Lote Registrado
Ocupação 2016
A URB 138/10 contempla os bairros João Cândido e São Gabriel, localizados Os setores de chácaras Morro da Cruz, Zumbi dos Ao longo de 2018, a equipe iniciou os trabalhos
entre São Sebastião e os condomínios do setor Jardim Botânico. Assim Palmares e Núcleo Rural Capão Comprido estão que subsidiarão a regularização fundiária de Morro
como as demais áreas, esse local foi alvo de grilagem e ocupação irregular localizados em áreas rurais, ou seja, fora da poli- da Cruz e Zumbi dos Palmares, por meio de um
de terras, porém o bairro está parcialmente localizado em terras particulares, gonal urbana da cidade definida pelo Plano Diretor trabalho de cadastramento das construções e dos
dificultando a aprovação do projeto e a doação dos lotes temas a serem tra- de Ordenamento Territorial (PDOT) de 2009. Essas moradores - procedimento denominado selagem
tados junto à Agência de Desenvolvimento do Distrito Federal (TERRACAP), áreas são especialmente críticas em relação à -, com o suporte de drone - para o devido mapea-
de forma que a terra seja incorporada ao patrimônio do Governo do Distrito grilagem de terras no Distrito Federal, tendo a sua mento aéreo. Na época do levantamento, esta ação
Federal (GDF) antes de ser doada aos moradores. ocupação intensificada a partir de 2014. Em 2019, registrou aproximadamente 5.080 construções
com a revisão do PDOT, espera-se que haja uma existentes. Este cenário de ocupação irregular se
O Bairro Crixá, em se tratando do segundo projeto urbanístico aprovado, faz grande pressão política, bem como das respectivas intensificou bastante nos últimos meses de 2018,
parte de um empreendimento do Programa Morar Bem - Programa Habitacional comunidades locais, para que passem a fazer parte principalmente devido ao período eleitoral.
do Governo do Distrito Federal -, vinculado ao Programa Minha Casa Minha da poligonal urbana da cidade.
512 513
Vida. O citado bairro conta com acesso pela DF 473, também conhecida como
Avenida São Sebastião, está localizado entre o núcleo urbano e a zona rural
da cidade, e possui 82,21 hectares; para ele, fora proposto a criação de 65
lotes destinados à habitação multifamiliar, comércio, prestação de serviços,
uso institucional, uso industrial e equipamentos públicos. Projetado para uma
população de até 15.368 habitantes, no empreendimento são ofertados 3.670
unidades habitacionais, sendo 550 de uso misto e 3.120 de uso residencial,
voltado à famílias inscritas na faixa de renda 1 do Programa Morar Bem -
famílias estas cuja renda máxima seja de até 3 salários mínimos. No entanto,
a área prevista para o bairro está parcialmente ocupada de forma irregular,
o que impossibilita a construção completa do empreendimento e requer
dedicação para resolução da situação de permanência ou não das famílias.
O Bairro Bela Vista fica no limite entre o Núcleo Urbano de São Sebastião e
a zona rural, mais especificamente o Capão Comprido. O bairro está dentro
de uma Zona de Ocupação Especial de Interesse Ambiental (ZOEIA), que faz
parte da zona urbana da cidade, porém possui características e restrições Poligonal de Regularização
ambientais similares às da zona rural, o que dificulta a elaboração e aprovação URB 114/09
do projeto urbanístico. URB 137/10
URB 138/10
URB 139/10
URB 056/17
Projeto de regularização fundiária de São Sebastião, 2018
Fonte: Sandra Marinho URB Belavista/18
O PROCESSO DE ENTRADA
NA COMUNIDADE
O parcelamento do Residencial Vitória encontra- Esclarece-se que, nesta primeira pesquisa, não É necessário compreender que a Companhia propunha uma nova forma de
-se a 30 minutos do centro do Plano Piloto e está foram encontrados registros, documentos ou re- prestação de serviço público em território não legalizado, motivo pelo qual,
delimitado, ao norte, pela DF-473 e por áreas com ferências suficientes para se precisar o histórico aliado ao caráter inovador do projeto - ainda embrionário -, a instrução de
restrições à ocupação urbana, sendo que o seu de formação original do assentamento. Por meio processo administrativo para o aluguel de um imóvel, naquele momento, não
trecho mais ao sul faz divisa com o bairro Morro da de imagens de satélite retiradas do Google Earth, foi possível. Assim sendo, chegou-se à uma solução primária para a conti-
Cruz. Além disso, em sua proximidade localizam- mapeou-se algumas poucas casas por volta dos nuidade dos serviços propostos na região: que o escritório fosse instalado
516 517
-se ocupações em área alagadiça, entre as Áreas anos 2000 e identificou-se que, entre os anos de dentro da comunidade e, caso imperioso, que de lá pudesse ser retirado.
de Preservação Permanente (APPs) do Córrego 2014 e 2015, houve um crescimento significativo
Santo Antônio da Papuda e do Córrego do Açude. no número de ocupações irregulares, o que acabou Entretanto, a solução definitiva - dada no início de 2018 - estabeleceu-se
Ambientalmente, trata-se de uma região delicada, impactando diretamente a qualidade urbanística da seguinte forma: primeiro, com a contratação de um escritório de arqui-
para a qual não se recomenda a expansão urbana da localidade, assim como o processo de regula- tetura para a elaboração de projetos personalizados para atendimento das
- a despeito do processo de ocupação irregular de rização fundiária - que estava em andamento à demandas originárias da comunidade; segundo, com a aquisição, mediante
terras, que consolidou novos conjuntos e expandiu- época. Interpretando-se as imagens, percebe-se licitação, de 02 (dois) contêineres, que seriam utilizados da seguinte forma:
-se para a zona rural, formando o Morro da Cruz. que o crescimento vertiginoso deste bairro ocorreu 01 (um) deles exclusivo dos técnicos e 01 (um) exclusivo para atendimento
em uma transição governamental - o que é fato de questões gerais, tais como Morar Bem, Minha Casa Minha Vida (MCMV)
Considerando que o citado bairro, em se tratan- comum -, porque, cientes de que um novo governo e a famosa “lista” da CODHAB/DF.
do da regularização fundiária e da situação ali necessita de tempo para identificar a problemática,
constatada, das “moradias à margem da dignidade os grileiros encontram uma brecha, nesse ínterim,
humana”, carecia de atenção especial, a arquiteta para a prática da grilagem.
e urbanista Sandra Maria França Marinho, à época
técnica da CODHAB/DF, auxiliada pelo estagiário Em maio de 2016, após reuniões realizadas com
Matheus Rocha, realizou visitas, in loco, com vistas um pequeno grupo de moradores, inaugurou-se o
ao reconhecimento da área, bem como visando a Posto de Assistência Técnica em uma sala comer-
observação das características físicas da localida- cial localizada em frente ao único espaço livre do
de - topografia, densidade e infraestrutura, assim bairro. Inicialmente, o espaço foi subsidiado pelos
como dos aspectos sociais e identificação de li- moradores, contudo, após poucos meses, tendo
deranças que pudessem potencializar o processo esse acordo sido desfeito, a arquiteta responsável
de imersão no bairro. A partir desse conjunto de pelo citado Posto - ciente da importância do projeto
informações, foi possível traçar a melhor estratégia e zelosa por sua continuidade - se incumbiu de
para iniciar o diálogo com a comunidade local. custear, até meados de 2017, as despesas para a
manutenção do escritório descentralizado.
Na execução do trabalho, percebeu-se que, para efetivar o resgate do papel com os moradores sobre o benefício, os técnicos fundiária devido à incompatibilidades existentes
social da arquitetura junto às comunidades do Distrito Federal, seria neces- da Companhia perceberam que, para os cidadãos entre o projeto urbanístico (URB 139/10), desenvol-
sário um estreitamento de laços entre os profissionais técnicos da CODHAB/ do Residencial Vitória, mais necessário se fazia a vido em 2009 pela empresa TOPOCART - no qual
DF e os moradores das regiões atendidas - com o intuito de que, da nossa regularização fundiária da região - uma vez que, o Bairro Residencial Vitória estava incluído - e a
parte, os técnicos presenciassem a situação alarmante vivida pelos cidadãos sem ela, as obras de infraestrutura urbana, como realidade do local. Entretanto, com a não aprovação
e, da parte dos beneficiários, que estes compreendessem a relevância e o esgoto, água, pavimentação, e equipamentos pú- do projeto urbanístico nos anos seguintes e devido
518 519
pioneirismo do projeto, que, em suma, pavimentava um novo caminho para blicos, não seriam possível para o bairro. a um processo de invasão e grilagem de terras no
a execução da política habitacional desta capital. local, a aprovação do projeto foi inviabilizada por
Percorrendo ruas e vielas, a equipe técnica perce- interferir diretamente no arruamento, loteamento
Na primeira imersão efetuada, embora se pretendesse atuar diretamente nas beu que a ligação elétrica de várias ruas, utilizan- e principalmente na manutenção das áreas des-
moradias com proposta de projetos e reformas de requalificação - conforme do-se postes precários de madeira, foram feitas tinadas a equipamentos públicos comunitários e
prevê a Lei Federal nº 11.888/08 - a equipe se deparou com barreiras não pelos próprios moradores. Além disso, existiam urbanos. Essas áreas foram invadidas, tanto para
previstas, dentre as quais a falta de confiança dos moradores na figura do constantes interrupções no fornecimento de água construção de moradias próprias, quanto para
técnico, bem como na seriedade do projeto - pois, sendo precursor, o Projeto e não havia tratamento do esgoto - sendo este especulação e construção de grandes empreen-
não era conhecido da população atendida. Momento em que, dialogando lançado diretamente em fossas negras ou na rua. dimentos comerciais.
A inexistência de drenagem pluvial acarretava a
Arquiteta Sandra Marinho em reunião com a comunidade do Residencial Vitória, 2016
Fonte: Sandra Marinho formação de buracos e crateras nas ruas e o car- De posse das informações e estando o escritório
regamento de terra, entulho, lixo e esgoto para as técnico estabelecido, deu-se início ao trâmite buro-
proximidades do córrego que ficava em um dos crático pretendido para a localidade, cuja finalística
limites da poligonal do bairro. era torná-lo independente dos demais bairros que
compunham o projeto inicial, ou seja, dar andamen-
Vários foram os relatos de moradores informando to à sua regularização fundiária. Configurou-se este
que, em ano de eleições, inúmeros políticos visi- um passo importante, porque compreendeu-se
tavam o bairro, prometendo um sem número de que, a partir dele, seria possível dar celeridade
melhorias - que nunca se concretizavam -, causan- às possibilidades de acesso a todas as obras de
do indignação da população, alheia aos processos estrutura e, por consequência, à titulação do lote
técnicos requeridos para a execução da obra se - permitindo dirimir a situação de clandestinidade
efetivasse no local. vivenciada pelos moradores.
Diante disso, o primeiro passo para dar início ao É prudente destacar outra iniciativa empreendida
trabalho foi a realização de um levantamento de pela equipe técnica da CODHAB/DF: trabalhar, jun-
dados e processos administrativos referentes à tamente com os moradores, por meio de reuniões
localidade, de modo a identificar a situação jurí- e oficinas - cuja temática envolvia o debate sobre o
dica em que se encontrava a citada área. Como projeto urbanístico e os impactos socioambientais
resultado das buscas, descobriu-se que o bairro gerados pela construção de desordenadas -, para
havia sido retirado do processo de regularização a melhoria do espaço em que viviam a população.
SOBRE ESPAÇOS PÚBLICOS
E PARTICIPAÇÃO
De modo geral, a comunidade de São Sebastião não de demandas e na resolução das problemáticas Tais iniciativas denotam o quanto uma população participativa e coesa contribui
foge do padrão das demais áreas onde a CODHAB/ comunitárias, em acordo com as necessidades para a efetividade de uma projeto público como o lançado pela CODHAB/DF.
DF atuou, as quais cresceram de forma desorde- estabelecidas pelo Posto de Assistência Técnica.
nada e em curva ascendente, pela ausência de um Portador de um sorriso largo e benfazejo, também merece destaque a atuação
acompanhamento e/ou fiscalização do Estado. Quanto aos moradores, é imperioso ressaltar que do senhor Anízio, morador da comunidade há mais de 20 anos. Desde a pri-
estes se tornaram parceiros na luta pelo direito à meira reunião, trajando calça branca e Chapéu Panamá - a despeito da poeira
520 521
No trabalho desenvolvido pela arquiteta Sandra cidade e à moradia, fato que surpreendeu a CO- -, ele se mostrou participativo e interessado. Segundo relatou, nutria o sonho
Marinho - assim como em todos os outros da DHAB/DF em demasia. Desse modo, nesse recorte, de que o seu bairro fosse asfaltado e gozasse de calçadas, para que “pudesse
CODHAB/DF - destacou-se o espaço concedido estampa-se a figura do senhor Emanoel, conhecido desfilar a sua elegância e simpatia”. No Posto de Assistência Técnica, projetava
para a participação dos atores locais - moradores -, como “Mineiro” - devido ao seu estado de origem muitas esperanças de que a situação da sua comunidade melhorasse, de que
tendo a metodologia adotada se baseado em uma -, serralheiro, cuja casa localizava-se ao lado do a “civilidade”, como dizia, pudesse chegar antes do seu falecimento, motivo
perspectiva cujo foco incidia no estabelecimento primeiro Posto de Assistência Técnica da região. O pelo qual aceitava todos os convites para reuniões internas na região, assim
de uma relação horizontal, que buscava trazer a “Mineiro” configurou-se um personagem importante como em outros órgãos do Distrito Federal.
comunidade para o debate sobre o espaço público, o porque, além de ter sido o primeiro morador com
que provocou uma relevante e valiosa aproximação quem a equipe técnica discorreu sobre a finalidade
entre os técnicos e a população. do trabalho, foi ele fundamental para a convocação
A relação da comunidade com o espaço público foi o foco inicial dos trabalhos no Residencial Vitória
dos moradores para as primeiras reuniões de apre- Fonte: Sandra Marinho
A tarefa social emancipatória proposta exigiu com- sentação do Projeto.
prometimento, insistência, perseverança e muito
trabalho, tanto da equipe técnica como dos mora- De tal modo contribui para o Projeto que, nas reu-
dores da localidade, para que o processo fosse bem niões mensais organizadas pela arquiteta Sandra
sucedido e permitisse a evolução dos trabalhos. Marinho - oportunidade em que se prestava contas
das atividades realizadas naquele mês -, o senhor
Assim, nos dois primeiros anos de instalação do Emanoel assumia o papel de liderança local. Um
escritório, o espaço público foi o foco do desenvol- fato que marcou o seu engajamento com o Projeto
vimento das atividades, por meio do diálogo entre ocorreu quando, no mês de dezembro de 2016,
atores governamentais e a Administração Regional ele nos alertou sobre a grilagem de terras que se
de São Sebastião, além daqueles postulados por iniciara numa praça pública utilizada por crianças e
grupos da própria cidade, como o Projeto Espaço adolescentes como área de lazer. A área em questão
Limpo Uma Iniciativa Verde – PELIV, o Instituto estaria dentro do percentual mínimo de 15% de
Nivaldo Nunes e Horta Girassol, bem como demais áreas públicas para novos parcelamentos urbanos
entidades públicas, tais como estabelecidos no Plano Diretor de Ordenamento
Territorial (PDOT), mais precisamente no seu artigo
o Instituto Federal de Brasília — IFB/Campus São 43, inciso I. Cônscios da situação, a equipe técnica
Sebastião. Todos esses personagens e lideran- da Companhia acionou os órgãos competentes, que
ças locais apoiaram e trabalharam na captação se incumbirão da resolução do caso.
AÇÕES URBANAS
COMUNITÁRIAS
Foi por meio das Ações Urbanas Comunitárias Da iniciativa, surgiram pessoas relevantes, como
(AUC) que se abriu o diálogo, tanto com a comu- o artista Gersion de Castro, indicado pelos mora-
nidade do Residencial Vitória, como com toda a dores do Bairro Residencial Vitória para a criação
cidade de São Sebastião. Esse eixo de atuação do painel da primeira Ação Urbana Comunitária
apoiava-se em intervenções urbanas pontuais, realizada na localidade, em maio de 2016. Na obra,
realizadas em espaços residuais, visando à requa- ele retrata, em primeiro plano, casas coloridas, e,
522 523
lificação urbana de maneira célere e impactante. em segundo plano, um grande Sol, demonstrando
Uma de suas metas foi o melhoramento do en- o cotidiano dos moradores do bairro, cuja espera
torno das residências, incentivando a criação de por dias melhores é contínua.
vínculos afetivos entre os moradores e o próprio
entorno imediato. No bairro Vila do Boa, de modo semelhante, o ar-
tista Nivaldo Nunes, utilizando-se de uma estética
No total, foram realizadas 15 Ações Urbanas Co- matizada, tal qual a do renomado grafiteiro Kobra,
Mural criado pelo artista Gersion de Castro no bairro Residencial Vitória, 2016
munitárias (AUC) em São Sebastião, que propor- representou, nos muros de uma escola, a figura do Fonte: Acervo Equipe de Assistência Técnica CODHAB
cionaram a harmônica inserção dos arquitetos seu filho brincando pelas ruas, quadro que suaviza
da CODHAB/DF em cada uma das comunidades, a rudeza da região. Em outra ocasião, na entrada
Mural criado pelo artista Nivaldo Nunes no bairro Vila do Boa, 2017
tendo se mostrado uma ponte, tal qual um inter- da cidade - local privilegiado -, o artista criou dois Fonte: Acervo Equipe de Assistência Técnica CODHAB
câmbio, para a salutar troca de experiências, o que murais: um representando os antigos oleiros e
resultou em um atendimento mais efetivo à popula- olarias da cidade - base de construção da capital
ção. Em todas as Ações buscava-se o nivelamento federal, e outro que simbolizava o Congresso Na-
qualitativo, de modo que todas as comunidades cional - fruto do trabalho dos candangos, muitos
deveriam receber, isonomicamente, benfeitorias deles moradores e fundadores da antiga Agrovila
tais quais: (I) pintura de fachadas, (II) plantio de de São Sebastião.
árvores, (III) confecção de mobiliário urbano e
execução de painéis - merecendo, este último, No Residencial Vitória, grande parte das AUC´s
especial consideração, haja vista que introduzem estabeleceram a Praça Central como foco, assim
um conceito de galeria ao ar livre, impactando e como ruas que para ela convergiam, de manei-
transformando a comunidade. ra a potencializar o processo de transformação
desses espaços públicos. Ao realizar inúmeras
Sobre os painéis, ainda cabe pontuar: diferente do oficinas na região, a equipe técnica buscava a
ocorria em outras comunidades, onde eles eram junção e a partilha de experiências, que resultava
criados, ou pelo arquiteto responsável pelo Posto, na edificação de um conhecimento mútuo, do qual
ou por artistas convidados - sem vínculo com a resultavam materiais artísticos nos quais registra-
região -, a arquiteta Sandra Marinho propôs algo va-se as diferentes perspectivas dos moradores
novo: que artistas locais, personagens da própria sobre o território.
comunidade, expusessem, nos painéis, a sua arte.
Além disso, atividades como a confecção de ma- (IV) quiosque, (V) espaços de encontro para os
quetes, árvore dos desejos - uso de post-it com moradores, (VI) estacionamento para os comércios
palavras que representavam os desejos individuais próximos e (VI) paisagismo adequado ao ambiente
de cada morador, criando um varal dos sonhos -, urbano e ao clima do DF.
crianças que desenhavam os seus sonhos para
a Praça. Assim, contando com o apoio das crianças do
bairro, principalmente os filhos do morador “Mi-
Em junho de 2016, um mês após a instalação neiro”, e depois de inúmeras reuniões individuais
do Posto de Assistência Técnica (PAT) no Bairro com os moradores - para delinear o escopo das
Residencial Vitória, realizou-se no local, mais pre- possibilidades de intervenção -, durante o mês de
cisamente em frente ao Posto, a primeira Ação setembro de 2016, ocorreu a Ação na Rua nº 04.
Urbana Comunitária (AUC), tendo como objetivo a As propostas de atividades desta AUC foram as
524 525
publicidade da Assistência Técnica (ATHIS), bem seguintes: (I) reboco e pintura, (II) painel artístico,
Oficina com maquete e árvore dos desejos durante AUC de mobilização, 2016
Fonte: Acervo Equipe de Assistência Técnica CODHAB como a recuperação do único parque infantil exis- (III) jardineiras com cano de PVC e (IV) numeração
tente na região. A segunda AUC foi realizada na das casas - tendo em vista que o endereçamento
rua nº 04 do Bairro Residencial Vitória, abarcando ou placa de identificação ali existentes se conso-
os seguintes propósitos: realizar a mobilização lidam por conta própria.
de um grande número moradores - eram mais
de 40 casas -, e dar uma solução para a falta de Ao finalizar a Ação Urbana, registrou-se um re-
espaço destinado aos jardins, haja vista que a rua sultado estimulante, porque, além das diversas
era estreita. intervenções ali efetuadas, o nível de engajamen-
to com a população local atingiu um patamar
As AUC’s - cuja maioria fora realizada na praça -, promissor - sem contar, é claro, com a generosa
buscavam garantir a manutenção/conservação participação de coletivos e grupos ligados à ha-
desse espaço coletivo, possibilitando o desen- bitação -, especialmente com as crianças, que,
volvimento de um projeto de urbanismo que con- de tão participativas, ganharam um eixo “Monitor
templasse os seguintes itens: (I) quadra esportiva, Mirim do Meu Bairro”.
(II) ponto de encontro comunitário, (III) parquinho,
Crianças ajudando a divulgar o programa Ações Urbanas Comunitárias no bairro Residencial Vitória, 2016
Fonte: Acervo Equipe de Assistência Técnica CODHAB
Rua transformada no bairro Residencial Vitória durante AUCs #19 e #20, 2016
Fonte: Acervo Equipe de Assistência Técnica CODHAB
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O Subprograma Melhorias Habitacionais iniciou-se, de fato, em fins de 2018, A sra Helena, idosa com limitações de movimento, morava com a filha em
quando a CODHAB/DF, mediante licitação, contratou empresas de arqui- uma pequena casa de telhado muito baixo que causava excesso de calor.
tetura - dispondo de equipe multidisciplinar, de arquitetos, engenheiros e Cômodos mal divididos e sem adaptação às suas limitações faziam com que
assistentes sociais - para o (I) atendimento à população, bem com para a ela passasse a maior parte do tempo em um único local da residência. Com
(II) elaboração de projetos arquitetônicos destinados às famílias carentes. a promessa de recebimento de doação de material, sua filha buscou a equipe
Inicialmente, o Programa estabeleceu o seguinte propósito: o combate ao do Posto para desenvolvimento do projeto de intervenção. Após meses de
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déficit habitacional qualitativo, de forma a garantir, tanto o direito à moradia, entrega do estudo preliminar verificou-se que as doações de materiais não
como à dignidade da pessoa humana, para os indivíduos/famílias que care- foram concretizadas e que o projeto desenvolvido para a residência havia
ciam da intervenção pública. sido guardado na gaveta à espera de uma nova oportunidade.
Num primeiro momento, pretendeu-se ofertar projetos e execução de re- Diante das experiências vividas, viabilizar a execução das obras de reformas
formas residenciais na cidade de São Sebastião, mais especificamente no de habitação de interesse social, seja por meio de fundo perdido do Estado
Bairro Residencial Vitória, contudo, ao longo dos anos de 2016 à 2018, não foi ou linha de financiamento a juros baixo, é de suma importância para apontar
possível concretizar o intento - a não ser por algumas intervenções pontuais um caminho para o morador.
para alguns moradores que, possuindo recursos financeiros, tiveram seus
projetos desenvolvidos pela equipe técnica disponibilizada para a comunidade. Porém, destaca-se que, mesmo que tardio, em novembro de 2018 foi celebra-
do pela Codhab|DF contrato com empresa com equipe multidisciplinar para
Nesse sentido, podemos destacar o caso do senhor João, cadeirante, que desenvolvimento de projetos de reformas de até 80 unidades habitacionais
reivindicava um lar mais acessível e que lhe permitisse mais autonomia, o que apresentassem problemas de insegurança e insalubridade. Entende-se
que seria possível a partir de um projeto com proposta de acessibilidade que assim, que o simples fato de deixar um instrumento administrativo com
lhe permitisse autonomia e liberdade.E foi assim, que a prestação do serviço tamanho impacto social é de fato um avanço na política da habitação e
de Assistência Técnica Pública e Gratuita o atendeu na este morador. garantia ao direito à moradia.
Também ressaltamos a senhora Jaqueline, esteio de uma família com três Assim, com estimativa de intervenção de até 4.000 m² em Habitação de
filhos, nutria no seu peito um anseio por melhores condições de habitabilidade Interesse Social (HIS) - o equivalente a, aproximadamente, 80 famílias -, o
em sua residência - o mofo, por exemplo, causava problemas respiratórios Projeto foi apresentado à comunidade e às lideranças locais, que, cientes
nos seus filhos -, de modo a que se permitisse que todos os componentes das projeções, auxiliaram no mapeamento das famílias potenciais, seguindo
familiares pudessem ser adequadamente abrigados no lar. Assim, coube ao o seguinte critério: (I) que estivessem dentro da poligonal urbana; (II) que
Posto de Assitência Técnica o desenvolvimento de projeto inicial para que estivessem em situação de vulnerabilidade social - e residissem em casas
a mesma pudesse ter um direcionamento nas intervenções prioritárias e precárias, insalubres, com riscos estruturais ou outras patologias; e (III)
urgentes que seriam executadas pela própria moradora. cujo rendimento familiar não ultrapassasse 03 (três) salários mínimos, em
conformidade com a Lei Federal nº 11.888/2008.
PRINCIPAIS DESAFIOS
E PERSPECTIVAS PARA O FUTURO
A regularização fundiária do bairro Residencial Vitória Assim como o Distrito Federal, São Sebastião é muito
é sem dúvida algo muito importante que deverá ter nova. Mesmo que consolidada, ainda é muito precária,
andamento nos próximos quatro anos. Apenas um embora possua grande potencial para o desenvolvimen- Referências
dos seis projetos de regularização foi aprovado até este to econômico, social e ambiental. Tal evolução é hoje
momento, com isso, foi permitida a escrituração, doação emperrada pela burocracia e pela lentidão dos governos, ARAUJO, Mara de Fátima dos Santos. São Sebastião-DF: do sonho à cidade real.
de lotes e implantação completa da infraestrutura. Os que não respondem à necessidade de regularizar e 2009. 140 f. Dissertação (Mestrado em Arquitetura e Urbanismo) - Universidade
demais projetos de urbanismo devem ser aprovados organizar o desenvolvimento da cidade no mesmo de Brasília, Brasília, 2009.
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com urgência a fim de garantir segurança jurídica aos ritmo que o crescimento das ocupações irregulares.
moradores e comerciantes da cidade para construírem e COMPANHIA de Planejamento do Distrito Federal. Pesquisa Distrital por Amostra
empreenderem, além de permitir a negociação e venda No Brasil, a contratação de serviços de arquitetura e de Domicílios: São Sebastião. Distrito Federal, 2016. Disponível em:
dos lotes já ocupados há décadas, movimentando a engenharia como uma solução para evitar os problemas <https://goo.gl/LSJaoL>. Acesso em outubro de 2018.
economia da cidade. decorrentes da falta de planejamento e da construção
desassistidos é algo distante da população de uma MEMÓRIAS OLEIRAS. São Sebastião tijolo por tijolo. Disponível em:
Seja por meio da conscientização e orientação dos mo- forma geral. Assim, o Estado disponibilizar a Assistência <http://memoriasoleiras.com.br/historia/>. Acesso em novembro de 2018.
radores acerca da inseguridade de ocupar irregularmen- Técnica Pública e Gratuita dentro de um território que
te e habitar áreas de risco, seja por meio da fiscalização possui estoque de moradias provenientes da autocons- IAB. Manual para a Implantação da Assistência Técnica Pública e Gratuita a
e do monitoramento eficiente, é importante controlar trução com a oferta de melhorias é respeitar a história Famílias de Baixa Renda para Projeto e Construção de Habitação de Interesse
o crescimento da cidade e evitar novas ocupações e esforço de cada morador que com esforço próprio Social. Disponível em: . Acesso em: Agosto de 2018.
irregulares. Também são fatores a serem observados ergueu da maneira que pode o seu espaço de morar.
durante o processo de regularização a emissão de
licenças e alvarás por parte da Administração Regional Assim, a atuação do Estado deve ser ordenada no
e a morosidade dos demais órgãos quando denunciada sentido de concretizar as políticas públicas, e apesar
uma nova invasão ou solicitada uma desobstrução. dos grandes avanços obtidos pelo Governo de Brasília
Tais práticas não protegem as poucas áreas públicas durante os anos de 2015|2018 em relação a implemen-
remanescentes, tão necessárias à cidade. tação da Assistência Técnica em HIS, conclui-se que
ainda têm-se um caminho muito longo a ser percorrido
O monitoramento sobre a ocupação que cresce dia a e desenhado para que a mudança na forma de fazer
dia nas áreas rurais da cidade, deverá ser a principal a cidade afete as futuros usuários dos mesmos. A
batalha das próximas gestões tendo em vista que mi- oferta desta política de ATHIS precisa obrigatoriamente
lhares de famílias já estão construindo de forma célere avançar no próximos anos de forma a tornar-se uma
suas habitações em áreas ambientalmente sensíveis, política de estado que permita a construção efetiva
impactando na alteração da vegetação, do solo, recur- de Estado Democrático de Direito, demonstrando que
sos hídricos, tornando-se inclusive risco à saúde e à existe respeito ao território já consolidado.
integridade física e mental da população ali residente,
como é o caso do aglomerado Morro da Cruz que já
ocupa uma área aproximada de 200 hectares e possui
Resultado da AUC #20, 2016
uma estimativa de mais de 20.000 pessoas. Fonte: Acervo Equipe de Assistência Técnica CODHAB
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atores e
estratégias
1
2
A ARQUITETURA PÚBLICA E SEUS ATORES
ASSISTÊNCIA TÉCNICA COMO EXTENSÃO da construção
popular
3 O PONTO DE VISTA DAS ENGENHARIAS
4 MOBILIZAÇÃO NA COMUNIDADE E INTERDISCIPLINARIDADE
A ARQUITETURA PÚBLICA
E SEUS ATORES
Quando escolhemos estudar arquitetura somos A sociedade tem dificuldades em reconhecer o “os resultados mostraram que 54% do universo Embora não tenha sido investigada a participação
sempre muito jovens, e o que conhecemos da arquiteto como um profissional que pode atuar em estudado tinha feito reformas ou construções e, dos arquitetos nos serviços de responsabilidade
profissão está relacionado ao glamour por meio suas necessidades cotidianas e se sente pouco destes, menos de 15% utilizaram os serviços de da gestão pública, provavelmente teríamos índices
do qual é reconhecida pela sociedade e por parte encorajada a contratar serviços dessa natureza. um arquiteto no projeto ou no acompanhamento semelhantes ou até mais preocupantes. Poucas
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significativa dos possíveis clientes. A arquitetura Tal constatação foi reforçada pela pesquisa que 1
da obra”. A mesma pesquisa apontou também que são as prefeituras que abrem concursos para a
que chama atenção é aquela das capas de revistas o Conselho de Arquitetura e Urbanismo (CAU) “70% afirmaram que contratariam os serviços de contratação de arquitetos e, em nível estadual ou
e premiações nacionais e internacionais, em que realizou em 2015 em parceria com o Instituto um arquiteto e urbanista, mas a parcela dos que federal, também são raras as possibilidades que
são mostrados os projetos dos stararchitects e de Datafolha, a qual teve como foco o universo em que já contrataram tais serviços era de 7%”. Esses se apresentam para a ampliação desse quadro
seus pupilos. Consolidou-se ao longo de décadas se insere a população economicamente ativa do números confirmam a “distância existente entre a de profissionais.
desse glamour uma ideia pouco satisfatória sobre a país. Conforme apontei na publicação Arquitetura profissão e o processo de produção das cidades”.
profissão, infelizmente relacionada a projetos para em retrospectiva: 10 bienais de São Paulo2,
os mais ricos ou para as pretensões megalômanas
de governos. 1 Conselho de Arquitetura e Urbanismo e Datafolha, 2015.
O maior diagnóstico sobre arquitetura e urbanismo já feito no
Brasil. Disponível em: <https://goo.gl/CZHD3e>.
Como resultado, temos poucos profissionais credenciados para trabalhar na Essa situação pouco favorável à profissão e aos milhares de profissionais
gestão pública, e os poucos que se enveredam por esse caminho são sempre que se formam a cada ano vem se transformando, mesmo que aos poucos,
vistos com desconfiança pela categoria, considerados como membros da graças a experiências de um reduzido número de colegas no serviço públi-
base da pirâmide social da profissão. Essa desconfiança muitas vezes se co. Várias experiências ilustram a importância da presença de arquitetos e
estabelece em relação a suas reais intenções ao escolher a gestão pública arquitetas na condução de políticas públicas, cabendo citar alguns poucos
como área de atuação. O pior de todos os momentos se dá quando o téc- e bons exemplos.
nico trabalha para um governo que não representa aquele pelo qual alguns
profissionais nutrem amores infinitos. Aí, então, ele será considerado como O que seria do Rio de Janeiro sem a presença de Carmen Portinho e Affonso
alguém à direita de todos os espectros ideológicos e, mesmo que realize Reidy na condução do Departamento de Habitação, berço do mais represen-
um bom trabalho, nunca será reconhecido e, na maior parte das vezes, será tativo projeto de habitação social do país: o conjunto Pedregulho? Décadas
criticado ou analisado com desconfiança. depois, a Secretaria de Habitação coordenou o Programa Favela-Bairro, um
exemplo seguido por cidades brasileiras e estrangeiras, mostrando que era
Existem ainda os arquitetos públicos que se veem frente aos profissionais possível tirar do mapa da desigualdade os bairros mais pobres e irregulares
da crítica, já que temos formado em nossas faculdades de arquitetura um da cidade maravilhosa. Cabe ainda lembrar as práticas inovadoras implanta-
grande número de estudantes que, amparados pela visão limitada de seus das na cidade de São Paulo entre os anos de 2005 e 2012, quando dezenas
orientadores, dedicam-se apenas à pesquisa, sem se aventurarem no campo de favelas foram urbanizadas com projetos de qualidade conduzidos por
da vida prática. Esse grupo profissional dirige grande parte de suas pesquisas escritórios de arquitetura. Em todas essas experiências reforça-se a relação
à análise das poucas boas práticas públicas que existem. Como consequ- entre a arquitetura e a construção de cidades mais inclusivas.
ência, para cada programa executado com todas as dificuldades existentes
na máquina pública, o que se observa é que aparecem nove ou dez estudos Recentemente, partiu do Distrito Federal outra experiência inovadora, condu-
criticando o tal trabalho. zida por um conjunto de profissionais entusiasmados e prontos para mudar
a realidade e o cotidiano dos bairros precários da capital federal.
AS NOVAS FORMAS DE FAZER ARQUITETURA
PÚBLICA E O EXEMPLO QUE VEM DE BRASÍLIA
Há tempos, nós, os poucos profissionais da cidade crescimento populacional que viria a ocorrer a Assim como ocorre nas maiores cidades brasileiras, em Brasília a expansão
e da gestão pública, temos alertado para a neces- partir da construção e implantação da nova capital urbana das últimas décadas – não prevista em nenhum plano diretor original
sidade de mudança das formas tradicionais de se federal. À semelhança do que vem ocorrendo em e muito menos no Plano Piloto – vem empurrando as famílias para a irre-
praticar a arquitetura. Algumas experiências, como todas as grandes e médias cidades brasileiras, o gularidade, para bairros implantados sem a observação das normas e dos
as acima lembradas, vêm demonstrando, através crescimento populacional ultrapassou previsões, padrões de uma legislação urbana desatualizada. Essa legislação foi cons-
de práticas inovadoras, que é possível, sim, mudar e os bairros periféricos se expandiram à margem truída sob a influência dos códigos da era modernista e não mais responde
e revolucionar o modo de ser da gestão pública a de toda e qualquer legislação urbana – incluídos às necessidades da população urbana crescente, a qual não tem condições
partir da participação dos arquitetos. É com muita os idolatrados planos diretores e suas legislações de acessar os sistemas financeiros existentes para a aquisição da moradia.
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alegria que acompanhamos as boas práticas que complementares, como a lei de uso e ocupação
foram implantadas no Distrito Federal entre 2015 e do solo e o código de obras. “Aprimora-se o formal como se não existisse a presença do informal”, confor-
2018, na gestão da Secretaria de Estado de Gestão me escreveu o arquiteto Luiz Fernando Janot em artigo para o jornal O Globo
do Território e Habitação (Segeth, atual Seduh) e No Distrito Federal, apenas em uma das regiões (6.5.2018. O Globo). Evidenciam-se, assim, as preocupações dos governos
da Companhia de Desenvolvimento Habitacional administrativas – a maior delas, Ceilândia – vivem municipais em regular a cidade formal, sem reconhecer o crescimento da
do Distrito Federal (Codhab/DF). cerca de 500 mil moradores. Essa população é cidade informal.
quase duas vezes maior que a do Plano Piloto e
Em 2015, Rodrigo Rollemberg assumiu o Governo maior que a de algumas capitais brasileiras, como Quanto ao exemplo que nos chega de Brasília, vemos uma inversão dessa
do Distrito Federal e, reconhecendo a competência Vitória ou Florianópolis. Os números continuam prioridade. A política habitacional é desenvolvida e implantada para aqueles
dos colegas da direção do IAB local, convidou o expressivos quando analisamos projeções do IBGE que, sem outra opção que não a de comprar um terreno não legalizado,
então presidente do Instituto, Thiago Teixeira de mostrando que bairros novos como o Pôr do Sol construíram suas moradias com esforços que tomam parte de seu salário
Andrade, para assumir a Secretaria. Thiago, de e o Sol Nascente apresentaram taxas de cresci- e anos de vida. Inverte-se, então, a lógica tradicional da gestão pública e, em
imediato, chamou seu colega Gilson Paranhos para mento de até 9%. Brasília, aprimora-se o informal.
coordenar os trabalhos da Codhab. Em apenas qua-
tro anos, uma revolução foi colocada em prática e
mudando a forma de atuar da gestão pública local,
materializando uma política habitacional que visa
atender a população mais carente e destituída das
benesses da vida urbana encontradas nos limites
territoriais estabelecidos pelo Plano Piloto.
Envolvendo profissionais de vários campos de atuação e atraindo a parti- É importante lembrar que a Companhia foi pioneira na aplicação da Lei Federal
cipação de estudantes, rapidamente se conformou o plano da gestão para nº 11.888/08, que trata da assistência técnica para famílias moradoras dos
implementar programas habitacionais dirigidos às necessidades maiores dos bairros mais pobres, assistência essa materializada por meio de dez postos
bairros carentes do Distrito federal. Sob o guarda-chuva do programa Habita que foram implantados nas regiões mais carentes do DF. Lá, os jovens arqui-
Brasília, foram planejadas e implantadas ações de regularização urbanística tetos e urbanistas desenvolveram projetos de infraestrutura e de melhorias
e fundiária, produzidas novas unidades, e havia ainda um amplo programa de de espaços públicos, além de melhorias habitacionais, sempre envolvendo
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assistência técnica – o que implica um esforço enorme para a mobilização de forma ativa as famílias que ali vivem. As equipes de assistência técnica
das comunidades envolvidas. se aproximaram dos moradores e buscaram reverter o desconhecimento e/
ou a reserva inicial sobre o trabalho do arquiteto, demonstrados na pesquisa
O Habita Brasília visava promover a construção de novas unidades habi- do CAU.
tacionais, regularizar juridicamente a situação dos milhares de moradores
dos bairros implantados em desconformidade com a legislação urbanística Parte das ações desenvolvidas pela equipe à frente da condução da política
excludente e combater a grilagem de áreas vazias. Esse último objetivo teve habitacional no DF, essas iniciativas ilustram um mundo de possibilidades
como enfoque o combate a um dos maiores problemas enfrentados no Dis- em que a presença dos arquitetos é fundamental para melhorar as condições
trito Federal. Também merece elogios a forma de contratação de projetos de vida dos moradores de bairros esquecidos há décadas, devido a formas
para os novos conjuntos habitacionais e equipamentos públicos que serão de atuar na cidade que ignoram a realidade urbana brasileira. Os arquitetos
implantados nos bairros, com a realização de dezenas de concursos públicos e arquitetas do DF não buscaram a notoriedade das premiações nacionais
que atraíram a participação de equipes de todo o país. e internacionais; buscam, tão somente, transformar a cidade considerada a
Meca do urbanismo modernista.
Dessa forma, os colegas gestores não só promoveram uma forma democrática
e inclusiva de contratar projetos – que resultou em um amplo conjunto de Graças à mudança que realizaram em tão pouco tempo e tão entusiastica-
boas soluções arquitetônicas e urbanísticas –, como também reforçaram, mente, com toda certeza já se transformaram em referência importante na
através de seu trabalho exemplar, a importância de arquitetos estarem à construção do ideário do urbanismo do século XXI. Esse urbanismo acredita
frente de órgãos públicos. Em apenas quatro anos de gestão, os concursos que a atuação pública deve privilegiar todos e, em especial, os mais pobres,
públicos promovidos resultaram em projetos para cerca de 12 mil novas que vivem em bairros historicamente fora do radar das políticas urbanas.
unidades habitacionais, inclusive no âmbito de financiamentos do Minha
Casa Minha Vida. Isso demonstra que seria possível que o programa federal A nova Brasília, construída pelos quase três milhões de moradores que ali
tivesse investido na qualidade dos projetos, ao contrário do que temos visto vivem à revelia da legislação formal, entra no radar das políticas públicas e
na maioria das intervenções que se multiplicaram pelo país afora. não só nos servem como exemplo de experiência revolucionária em curso,
mas também nos traz um sopro de otimismo em relação à nossa capacidade
de mudar as cidades a partir de referências do século XXI.
ASSISTÊNCIA TÉCNICA
COMO EXTENSÃO
A ASSISTÊNCIA TÉCNICA EM ARQUITETURA E URBANISMO
NOS PROJETOS DE EXTENSÃO DA FAU/UNB EM DOIS MOMENTOS:
NO NÍVEL DE FORMAÇÃO DOS ESTUDANTES NO EMAU/CASAS
E NO NÍVEL DE PROFISSIONALIZAÇÃO NA DIPLOMAÇÃO
COM A METODOLOGIA PARTICIPATIVA
DO PROCESSO DE PROJETO DO GRUPO PERIFÉRICO
INTRODUÇÃO
Estudantes em oficina prática dos processos de projeto englobados pelo urbanismo participativo ou tático
Fonte: Liza Andrade (editadas)
A forma como ocorre a participação depende tanto das metodologias de
trabalho aplicadas como também do envolvimento do técnico e da forma
como são conduzidas. Os atores envolvidos são pessoas da comunidade,
ETAPAS E PROCESSOS DA METODOLOGIA
crianças, jovens, mães, trabalhadores e até mesmo técnicos de governo.
A escolha da área se dá por meio de demandas pré-estabelecidas ou em
regiões onde integrantes do grupo Periférico já trabalharam ou onde os
Consiste na análise do contexto espacial por meio das dimensões morfo- estudantes conhecem bem. Procura-se dar continuidade a ações e projetos
lógicas e dos princípios de sustentabilidade, simultaneamente a análise em territórios já trabalhados para fortalecer vínculos e aumentar a chance de
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dos dados socioeconômicos, culturais e dos atores que podem participar produzir intervenções concretas. A aproximação ocorre por meio de visitas e
do processo. Nessa fase também se analisa a dimensão política. em que entrevistas ou apresentação de intenções com chamadas para encontros ou
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situação fundiária se encontra a ocupação urbana, conflitos, dinâmicas e café comunitário em algum equipamento público como escolas ou espaços
atores envolvidos. Trata-se do diagnóstico participativo, parceria do pes- públicos. A partir daí, inicia-se o processo de conhecimento da comunidade e
quisador com a comunidade. Para análise do contexto físico, a partir do de agentes potenciais para o desenvolvimento do trabalho. Em alguns casos
entendimento das expectativas sociais associadas às características do em que a comunidade é organizada, onde já ocorre uma autogestão, é mais
lugar, à forma urbana, considera-se as dimensões morfológicas do processo fácil de avançar com propostas de táticas urbanas, entendidas como ações
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ANÁLISE DO de urbanização desenvolvida pelo grupo DIMPU para um bom desempenho interativas no espaço para estimular a conexão entre as pessoas o lugar
CONTEXTO FÍSICO quanto aos aspectos funcionais, bioclimáticos, econômicos, sociológicos, como, arte urbana, grafites, ruas de lazer, caminhadas com a comunidade,
E SOCIAL COM de identidade e orientabilidade, afetivos, simbólicos e estéticos, bem como OFICINAS E concurso fotográfico, ou construção de mobiliário urbano. Nessa fase é im-
ENVOLVIMENTO DA éticos e ecológicos. Aprimorou-se o método de sistematização de informações PRÁTICAS DE portante o arquiteto urbanista ter em mente que pode contribuir para agenciar
POPULAÇÃO LOCAL por meio das dimensões da sustentabilidade, metodologia desenvolvida por PARTICIPAÇÃO PARA atores e processos existentes. O objetivo é funcionar como dispositivo para
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DE ACORDO COM Andrade e Lemos (2015) “Qualidade de projeto urbanístico: sustentabilidade ELABORAÇÃO DE promover uma autogestão e agregar mais pessoas no desenvolvimento dos
AS DIMENSÕES DA e qualidade da forma urbana”, que segue os princípios norteadores inerentes CÓDIGOS TÉCNICOS planos e projetos.
SUSTENTABILIDADE à cada uma das quatro dimensões da sustentabilidade urbana (ambiental,
NA FORMA DE UM social, econômica, cultural e afetiva) de uma maneira mais inclusiva e mostra
DIAGNÓSTICO como o conceito pode ser abordado em cada esfera urbana, no que tange
PARTICIPATIVO aos princípios, critérios e indicadores. A partir da sistematização dos padrões, são apresentados cenários no formato
de propostas alternativas a partir dos padrões espaciais e de acontecimen-
tos nas quatro dimensões da sustentabilidade. Utiliza-se quando possível PROPOSTAS
Para uma melhor adequação sociotécnica AST, a etapa seguinte consiste a dinâmica do café mundial. Apresenta-se um repertório fotográfico com ALTERNATIVAS E
na elaboração de soluções na forma de códigos ou padrões que podem ser ilustrações de soluções em lugares semelhantes ou apontadas pela comu- ELABORAÇÃO DE
elaborados a partir dos problemas relatados pela comunidade, soluções nidade possíveis soluções e desenho à mão livre. CENÁRIOS
apontadas pelas pessoas no processo participativo e pela análise do contexto
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local. Um padrão pode ser entendido como uma solução recorrente para Apresentação do produto intermediário à comunidade antes de ser finalizado
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resolver um problema de arquitetura e urbanismo ou técnico ou até mesmo no formato de caderno/relatório. Esta é a etapa de conclusão do trabalho
social. Essa capacidade em se comunicar gerada pelos padrões possibilita um desenvolvido por um estudante de TFG ou da equipe do projeto de extensão
conhecimento aplicável em desenho. Nesse caso, a linguagem dos padrões com bolsistas vinculados aos Editais do Decanato de Extensão da UnB ou
fica vinculada às atividades humanas, à cultura e à tradição (ALEXANDER dos residentes, da parceria da Nucleação da Residência AU+E da UFBA.
et al, 1977). Cada solução proposta em cada padrão é escrita no formato Nesse caderno se encontram informações com uma linguagem mais aces-
de instrução, contendo um caráter abstrato. Os padrões de acontecimentos sível à população como: histórico do lugar; análise da legislação vigente e
estão diretamente ligados a seu espaço que nos mostram o que é a estrutura ELABORAÇÃO das diretrizes dos planos do território; análise do contexto físico e social
de uma cidade ou edifício. A partir daí, cabe a cada um interpretar da melhor A TRANSFORMAÇÃO E ENTREGA DE (preexistências) segundo as dimensões da sustentabilidade, o levantamento
forma, adaptando suas preferências às condições e ao local do projeto. Os DE CÓDIGOS CADERNO TÉCNICO de padrões identitários, espaciais e de acontecimentos; mapas mentais ou
padrões são sistematizados no formato de cartas de baralhos para que os TÉCNICOS ILUSTRADO afetivos desenho dos padrões; o processo participativo, os atores envolvidos,
membros da comunidade possam inseri-los na imagem aérea do local de EM PADRÕES COM ESTUDO fotos e desenhos, cenários no formato de soluções alternativas, estudo preli-
acordo com temas no processo participativo, como por exemplo, na dinâmica ESPACIAIS E DE PRELIMINAR minar e direcionamentos futuros ou possíveis termos de referências no caso
do café mundial. ACONTECIMENTOS CONTENDO TODO O de estudantes da pós-graduação para concorrência em editais de fomentos.
PROCESSO
Referências
ANDRADE, Liza Maria Souza de. Conexões dos padrões espaciais dos
ecossistemas urbanos: a construção de um método com enfoque
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transdisciplinar para o processo de desenho urbano sensível à água no
nível da comunidade e da paisagem. Tese de doutoramento. UnB, FAU, 2014.
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O primeiro contato com as habitações de interesse social é sempre uma As escolhas feitas pelos moradores parecem para- A foto a seguir mostra uma imensa rachadura
experiência impactante. Geralmente, as residências apresentam diversas doxais, visto que muitos possuem bens de consu- no banheiro de uma casa, ameaçando a vida dos
patologias em níveis alarmantes, esgoto exposto, partes da edificação não mo com um custo elevado, como televisões com que ali habitam. A composição familiar, na época,
finalizadas, entre outros fatores. Evidentemente, o fato de os moradores não alta tecnologia e aparelhos de celular, enquanto contava com a mãe, chefe de família, e com cinco
entenderem a real gravidade das condições nas quais estão submetidos é submetem suas famílias ao perigo, frente às graves crianças, de 17, 10, seis e gêmeas de três anos
intrigante; porém, associar as condições precárias das casas aos possíveis patologias presentes nas casas. Portanto, não são de idade. A abertura é tão evidente que se pode
problemas de saúde que enfrentam e aos riscos que correm não é algo claro apenas as questões econômicas que levam os enxergar o outro lado da residência, e a rachadura
como pode parecer – o que testifica a real necessidade da assistência técnica moradores a essa situação, mas também a falta era utilizada pelos moradores para guardar objetos
em engenharia e arquitetura. de entendimento dos riscos de se morar em locais de higiene, como escova e pasta de dente. Nesse
insalubres e com problemas estruturais associa- caso específico, a moradora procurou o Posto de
Não é rara a existência de moradores com problemas respiratórios e alergias da ao desconhecimento de acesso aos serviços Assistência Técnica, onde modificações estruturais
dormindo em cômodos sem ventilação e sem iluminação natural, cujas paredes técnicos de engenharia e arquitetura. foram propostas para sua casa. Porém, alguns
apresentam infiltrações e mofos. A infiltração causada por percolação da água, dias mais tarde, por questões pessoais, ela pediu
que chega às fundações por meio de capilaridade, alcança a alvenaria e deixa desligamento do programa.
as paredes úmidas, ocasionando mofo e bolor. Para contornar tal problema,
bastaria a simples impermeabilização dos elementos de fundação que estão
em contato com o solo; entretanto, essa técnica não é usual, uma vez que a
grande maioria das casas da localidade é feita por meio da autoconstrução,
e há pouco conhecimento difundido sobre prevenção de umidade. A técnica
de impermeabilização, em especial, apresenta baixo custo em relação aos
potenciais problemas que sua ausência pode gerar, tendo em vista a saúde
dos residentes e o fato de a recuperação das paredes infiltradas ser dispen-
diosa. Além dos citados acima, são recorrentes problemas estruturais, casas
rebaixadas, instalações elétricas e hidrossanitárias precárias.
familiar máxima para que a família participe do classificação que mais se aproxima das obras
programa e seja abrangida pela Lei da Assistên- de melhorias habitacionais é a de construção de
cia Técnica é de três salários mínimos. Então, as edifícios, o que não reflete as características gerais
soluções propostas devem contar com técnicas, de obra e cria uma inconsistência orçamentária.
materiais e soluções construtivas baratas e alter- Aspectos referentes à legislação orçamentária
nativas, que garantam a viabilidade de execução. por vezes inviabilizam e dificultam a execução de
obra, pois não há referências voltadas a pequenas
A Codhab, por meio de empresas parceiras, exe- obras, nas quais pequenos itens orçamentários
cutou parte do projeto entregue aos moradores, têm grande peso, afetando a sustentabilidade das
limitando-se a um teto de R$13.500. O engenheiro empresas participantes. Além de não considerar
orçamentista tem papel crucial na implementação metodologias da autoconstrução que implicam em
das melhorias, uma vez que ele assume função soluções orçamentárias de ajuste desse embrião
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de projetista ao estabelecer quais prioridades são de residência sem respaldo legal para orçamento.
mais emergenciais e o que vai realmente ser exe- Toda a formação do engenheiro civil é voltada para
cutado na obra, evidenciando a importância dessa as classes econômicas que têm maior poder aqui-
Típicas fissuras encontradas
nas moradias, 2017 especialidade. sitivo e têm acesso para contratar o profissional.
Fonte: Equipe ARQBSB Isso se reflete na maneira como os projetos são
O Decreto 7.983/13 e a Lei nº 13.303/16 exigem elaborados. As matérias de projetos raramente
Ao responsável técnico cabe a responsabilidade Explicar ao usuário, de forma técnica e se fazendo que os orçamentos de obras públicas sejam ba- impõem limites orçamentários durante a aprendiza-
social de olhar, conversar com a família e esclare- entender, que aplicar o recurso disponibilizado pelo seados prioritariamente no Sistema Nacional de gem acadêmica, não se aprende a projetar obras de
cer o risco que ela eventualmente corre, além de governo para a casa dele em elementos estruturais, Pesquisa de Custos e Índices da Construção Civil baixo custo. Logo, soluções construtivas voltadas
explicar como ter acesso ao projeto e à construção que não são visíveis, em vez de em revestimento (SINAPI), que determina custos unitários dos prin- às parcelas da população em vulnerabilidade eco-
das melhorias mitigaria a possibilidade de ruína da cerâmico – como muitas vezes solicitado por ele cipais serviços a serem executados em obras, e nômica raramente são conhecidas e estudadas.
estrutura. Durante o processo, fica evidente que a –, é um desafio que não pode ser subvalorizado. como as reformas realizadas pela equipe eram
assistência não é dada somente por intermédio financiadas pelo Estado, deveriam seguir essa De maneira coerente, o curso de Engenharia Civil
de projetos ou melhorias habitacionais, o trabalho Do ponto de vista técnico, os principais problemas formatação. Tais custos são vinculados a certas é englobado na grande área de Exatas; entretanto,
de conscientização e conversa com os moradores presentes nas casas são: cômodos não ventilados produtividades, entretanto, percebe-se que essas a humanidade é necessária para entender os pro-
também faz efetivamente parte do processo. e não iluminados; ausência de cômodos suficien- não foram obtidas em obras de interesse social blemas dos moradores. São seres humanos que
tes para os moradores; infiltrações; patologias ou de reformas habitacionais. Isso significa uma executam, habitam e utilizam os projetos de cons-
Alinhar a expectativa dos moradores às suas reais estruturais como rachaduras e trincas; instalações grande divergência para as empresas executoras, trução de engenharia. O tato durante as conversas
necessidades foi fator determinante. Além da solu- elétricas e hidrossanitárias ruins; casas abaixo do uma vez que as perdas são usualmente subesti- e a escolha das prioridades a serem executadas
ção técnica apresentada, as expectativas do usuário nível da rua, que enfrentam alagamentos; carência madas e a produtividade da equipe técnica é sub- são habilidades essenciais para o cumprimento
devem ser levadas em conta, conduzindo a uma de acessibilidade para pessoas com deficiência; e dimensionada. Infelizmente, ainda não há tabelas do papel social do engenheiro civil. O desafio da
aprovação do programa que fortalece a própria lei. falta de revestimentos e forro. e índices que reflitam as características intrínsecas engenharia vai muito além das questões técnicas
A situação de um morador que se sinta violado em às construções de interesse social. e, muitas vezes, o curso de graduação não dialoga
seus direitos devido a uma execução de projeto que Entregar soluções de engenharia para tais proble- sobre a sensibilidade social necessária ao proces-
não lhe agrada tem grande potencial de impactar a mas não é tarefa muito difícil, já que basta aplicar O valor de benefícios e despesas indiretas (BDI), so. É de suma importância que o profissional de
imagem do programa. o conhecimento aprendido na universidade e de- parcela do orçamento que indica o lucro e as engenharia tenha esse perfil, pois o nosso cliente
senvolver os projetos necessários, adequando despesas indiretas de obra, é baseado no Acór- é a sociedade que precisa de moradia com digni-
As conversas com os moradores são pontos de igual as casas de acordo com as normas vigentes. No dão 2.622/13 do Tribunal de Contas da União, dade e qualidade.
importância para a assistência técnica bem sucedi- entanto, muitas vezes tais soluções são completa- em que as alíquotas são determinadas de acordo
da quanto à elaboração de projetos de melhorias. mente inviáveis pelo viés econômico, pois a renda com o tipo de obra. Das opções disponíveis, a
MOBILIZAÇÃO NA COMUNIDADE
E INTERDISCIPLINARIDADE
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Ao desenvolver o trabalho de assistência técnica por meio da metodologia de
imersão é necessário ponderar a totalidade das necessidades das pessoas que
vivem em Áreas de Regularização de Interesse Social, principalmente, consi-
derando os fatores econômicos, sociais, culturais, ambientais e habitacionais.
Trabalhar para solucionar problemas de arquitetura e urbanismo é apenas
uma parte do desafio da política de habitação, pois diante de condições de
pobreza, falta de infraestrutura, baixos salários, ausência de serviços públicos, É essencial que a Assistência Técnica como política habitacional, tenha como
insalubridade, péssimas condições de habitação e desorganização comunitária ponto de partida a sensibilização e a necessidade de despersonalização de
são necessárias estratégias complementares que não resuma a política de figuras específicas com experiências em mobilização social, reconhecendo
habitação a construção de projetos urbanos e habitações em si, nos obrigan- os equipamentos públicos e as potencialidades comunitárias. Potencializar
do a ir um pouco além, a partir de uma agenda construída coletivamente que trabalhos já existentes na comunidade como artistas, coletivos, outros proje-
tenha como objetivo um trabalho PROGRAMÁTICO E CONTINUADO de ações tos sociais (associações de moradores, prefeituras comunitárias) e conectar
de cunho social e político. população é a forma que foi tomada pela equipe da gestão da CODHAB entre
2015 e 2018.
As marcas expressas pelo conjunto de desigualdades sociais das localidades de
atuação, não podem ser observadas de forma isolada. O papel dos profissionais Assim, aplicação de metodologias de MOBILIZAÇÃO SOCIAL na execução
técnicos lotados nos postos de assistência técnica, arquitetos, engenheiros e diária da Política de Habitação de Interesse Social tem o objetivo de esta-
assistentes sociais, é romper seu lugar comum de atuação e buscar expandir belecer um caminho que vise pactuar uma relação orgânica entre o poder
sua percepção para além das demandas de habitação e urbanismo. Mesmo público (Estado) e a população beneficiária na organização dos serviços
que esse seja o principal foco. Porém, isso não se realiza de forma automática, como um instrumento programático e continuado. Atreladas a uma meto-
principalmente considerando a formação profissional de cada um e os perfis dologia de imersão em áreas prioritárias de regularização de interesse social,
profissionais diferenciados em cada categoria. Assim, a identificação e análise a MOBILIZAÇÃO SOCIAL, tendo a sensibilização e a comunicação como
de aspectos sociais e econômicos, mapeamento de potencialidades, estudos fundamentais para sua efetiva realização, é um instrumento estratégico
sociais, formação de lideranças e diálogo comunitário deve ser pactuado, por para a construção de vínculos entre beneficiários, profissionais, gestores,
meio do desenvolvimento de metodologias internas, legitimadas institucional- políticas públicas e movimentos organizados em suas diversas modalidades
mente, de MOBILIZAÇÃO SOCIAL E TRABALHO EM REDE. na política de habitação.
A escolha para instalação de um novo Posto de Assistência Técnica levava A materialidade do trabalho por meio do espaço físico que é integrado à
em consideração, principalmente, locais de maior vulnerabilidade social e malha urbana da cidade, com funcionários de diversos campos profissionais
econômica e deficit habitacional qualitativo. As áreas de atuação da equipe que estejam disponíveis para o diálogo é essencial. Não somente como
têm como campo amostral as Áreas de Regularização de Interesse Social atendimento a cadastros ou políticas institucionais, mas a relação direta
(ARIS) definidas pelo Plano Diretor de Ordenamento Territorial do Distrito com técnicos que são responsáveis pela tomada de decisão ou por fazer o
Federal (PDOT-DF). Contextos políticos influenciam a decisão tendo em vista balanço entre as demandas sociais e as limitações políticas e econômicas
a necessidade de apoio e parceiros para atuação no local pretendido. Outro da gestão governamental.
fator importante é a mobilização comunitária já existente, quanto maior a
possibilidade de mobilização, mais célere se torna o processo de entrada na Buscando ampliar o entendimento de Assistência Técnica, para além de
comunidade e início dos trabalhos. Em vários casos, os postos começaram uma pauta corporativa dos profissionais que atuam implementando a Lei
a funcionar em imóveis cedidos por moradores locais. Federal nº 11.888/2008, deve ser empenhada uma luta coletiva, entendida
sempre como uma pauta de cidadania e direto para toda a sociedade, cujo
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Foi fundamental integrar intervenções para o fortalecimento cotidiano da norte seja o direito à moradia da população de baixa renda, ultrapassando o
Companhia nessas localidades, buscando conciliar agenda da comunidade trabalho técnico arquitetônico, firmando dessa maneira, uma ampla agenda
com a instituição, além dos demais serviços que atuam em rede. “Rede” é o de direito à cidade.
emprego do termo que define sistemas institucionais de gestão e de prestação
de serviços sociais que correspondem a um determinado direito social ou
uma determinada região/território. A administração Regional da localidade,
junto ao processo de identificação de um CRAS (Centro de Referência de As-
sistência Social), CREAS (Centro de Referência Especializado em Assistência
Social), CENTRO POP (Centro Especializado de Referência para População
em Situação de Rua), CAPS (Centro de Atenção Psicossocial), Unidade Básica
de Saúde, ESCOLA, ASSOCIAÇÃO, ONG, LÍDERES, MOVIMENTOS SOCIAIS,
SERVIÇOS PRIVADOS, COBERTURA POLICIAL para o compartilhamento de
informações, socialização de problemas, soluções coletivas, fortalecimento
de vínculo, torna-se elementos de extrema potência na busca por melhorias
e formas criativas de soluções para problemas/ dificuldades.
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SAFÁRI URBANO?
– DA IMPORTÂNCIA DE CONHECER AS CIDADES
DA IMPORTÂNCIA DA IMERSÃO EM TODAS AS SUAS MARGENS E DO CUIDADO
E DE OCUPAR ESPAÇOS DE DECISÃO NECESSÁRIO DURANTE ESSE PROCESSO
Para o desenvolvimento de qualidade de uma cidade, é vital o contato de É recorrente que a academia e profissionais muitas vezes bem intenciona-
arquitetos e urbanistas com a realidade daqueles que nela habitam. Do dos, seja na iniciativa privada, seja na pública, tratem os territórios rejeitados
mesmo modo, a presença desses profissionais é fundamental em espaços pelo sistema dominante como objeto de estudo, local para ser observado,
de tomada de decisão nas instituições de gestão das cidades, como conse- escrutinado e analisado, de onde se tira o conhecimento e se transforma em
lhos, fóruns, reuniões comunitárias, associações, entre outros. Foi por meio textos e artigos que não retornam nada para aqueles que compartilharam
de um órgão público de desenvolvimento habitacional que se fez possível a seus saberes ou que foram observados. Além disso, há as visitas ao território
implementação da Lei de Assistência Técnica em arquitetura e urbanismo no que se limitam ao olhar, quando não há espaço para o diálogo com a popu-
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Distrito Federal e, junto dela, a prática imersiva de arquitetos e urbanistas em lação, e tudo acontece da janela para fora, como um safári. É de extrema
Postos de Assistência Técnica. Esse foi um ponto crucial para uma produção importância que em uma sociedade desigual como a brasileira, pessoas
menos mecanizada, mais sensível e com real capacidade de entender e gerar que tiveram acesso à educação e que desejam entender e trabalhar com os
mudanças na realidade dos beneficiados. É a partir dessa aproximação, entre processos cotidianos de construção das cidades informais fiquem atentos
o profissional e quem sente de forma abrupta a violência da desigualdade, ao seu lugar de fala como parte que tende a reforçar a opressão dessas
que surge a possibilidade de mais acertos e melhores resultados. injustiças sociais. Compreender que o conhecimento formal não é superior
aos saberes da vida e que somente com colaboração e troca entre os dois
lados é que se pode construir algo transformador.
MEDIAÇÃO DE
CONFLITOS TERRITORIAIS
A atuação dos técnicos junto à comunidade fun- a rede, para não haver mais ligações irregulares.
ciona como interlocutora dos interesses dos mo- O pedido foi enviado diversas vezes. Depois de
radores e de outros agentes públicos ou privados. quase um ano sem nada ter sido resolvido, Bra-
Dentro de uma estrutura governamental e social sília enfrentava uma grave crise hídrica e todas
que funciona na base do crachá, haver um técnico as ligações irregulares da cidade estavam sendo
que vivencie o cotidiano do território e que pode fechadas. Entre elas, as da região, cujos moradores
atuar e intermediar a partir do entendimento dos já haviam pedido à concessionária que fizesse a
atores daquele espaço é estratégico para balan- ligação regular. Naquele dia, a empresa apareceu
cear forças que muitas vezes não representam com carros de polícia militar e civil, mídia e uma
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realmente aquela população. Houve uma situação máquina para cortar os “gatos”. Uma moradora
na comunidade do Porto Rico que deixou claro a avisou o posto do que estava acontecendo, e a
importância dessa mediação. Devido a mudanças arquiteta responsável chegou ao local com uma
na legislação ambiental, uma área da comunidade cópia do ofício, alertando que a concessionária já
com cerca de 150 casas não precisava mais ser havia sido informada diversas vezes sobre o caso.
reassentada, e para melhorar as condições de vida Só então, diante da exposição da falta de eficiência
daqueles habitantes, as concessionárias de água da empresa, que as redes de água foram ligadas
e energia foram informadas que poderiam ligar devidamente nas semanas seguintes.
SANTA LUZIA
– A ESCALA DO PROBLEMA
Há uma carência de espaços públicos para reunião que representam um convite a entrada àqueles
e convivência comunitária nas regiões periféricas que estão ali por perto. Muitas dessas igrejas
do Brasil em geral. Esses espaços de reunião aca- possuem centro educativo que complementa a
bam sendo ocupados pelas igrejas evangélicas e educação formal das crianças no período contrário
católicas que detêm áreas grandes o suficiente ao das aulas, enquanto os pais estão no trabalho.
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para reunir muitas pessoas para dialogar com o Esses são os espaços para famílias interagirem,
Estado. A relação espacial dos templos católicos usualmente. Os outros espaços são os salões de
e evangélicos como espaço urbano demonstra o beleza e bares, que na sociedade machista da
que na maioria das vezes é refletido no crescimento qual fazemos parte são dominadas pelos públicos
vertiginoso do número de fiéis evangélicos nas de determinado gênero, sendo o primeiro predo-
periferias do Brasil. Enquanto as igrejas católicas se minantemente feminino e o segundo masculino.
configuram no centro de um terreno cercado e só Faltam espaços democráticos, públicos, laicos para
abre as portas normalmente aos finais de semana todas as idades e gêneros para que as pessoas se
ou em horários de missa, as igrejas evangélicas reconheçam como comunidade em um território. PENSAR O ESPAÇO URBANO PARA PESSOAS
ocupam espaços comerciais mais ligadas às ruas – A AVENIDA DAS PALMEIRAS
Uma das experiências mais significativas que tive- rua reta. Sensibilizado da importância daquele
mos a oportunidade de desenvolver foi o caso da espaço para o cotidiano das pessoas, um novo
Avenida das Palmeiras, no Sol Nascente. Durante o projeto, mais adequado aos desejos da comuni-
processo de transformação das antigas chácaras dade, foi elaborado pela equipe do Posto de As-
em lotes urbanos, a comunidade preservou uma sistência Técnica, de forma a garantir um espaço
aleia de palmeiras imperiais que marcava a entrada que privilegiasse o verde e as pessoas, em vez de
de uma das sedes rurais que ali existiam. Em uma prever um local voltado ao transporte motorizado,
comunidade sem endereçamento e carente de como é usual. A pintura das fachadas e dos murais
vegetação de grande porte e de elementos focais artísticos e a execução do paisagismo e da arbo-
que auxiliem a apreensão do espaço urbano, as rização foram feitas por meio de mutirões, o que
palmeiras funcionavam como uma importante permitiu uma rápida apropriação do espaço pelos
referência de localização. Quando as obras de moradores da localidade. O novo espaço virou um
pavimentação foram iniciadas, a equipe identificou símbolo do processo de regularização fundiária
que pelo projeto urbanístico de 2008, as palmeiras promovida por técnicos imersos na comunidade e
seriam removidas, e o largo “corrigido”, ficando a com participação popular nas decisões de projeto.
PARÂMETROS URBANOS IRREAIS
DESCONEXÃO URBANA
O conceito pedagogia urbana deriva da junção das dade sobre as dinâmicas de construção da cidade.
teorias de dois autores mundialmente importantes: É trocar informações a respeito de como funcio-
Paulo Freire e David Harvey. Freire, educador brasi- nam as cidades e como elas são construídas; é
leiro nascido em Recife, versa sobre os diferentes perceber como somos todos frutos e agentes da
saberes: o técnico e o de vivência. Suas teorias produção colaborativa e participativa. A cidade é
foram amplamente aplicadas para alfabetização uma construção coletiva. Uma rua só é uma rua
das populações rurais. Harvey, geógrafo britânico, porque várias pessoas construíram suas casas
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discorre sobre direito à cidade no século XXI, reto- ali; apenas uma casa não seria suficiente para o
mando os conceitos de Lefebvre, trazendo luz às entendimento de cidade, e as pessoas precisam
disputas de classe no ambiente urbano sob as for- tomar consciência de seu poder nesse processo,
ças do capitalismo financeiro. Atuar em pedagogia principalmente sobre a situação de segregação
urbana é um trabalho contínuo de conscientização socioespacial, reflexo de uma sociedade desigual
dos cidadãos acerca de seu poder e responsabili- como a brasileira, que em Brasília é tão profunda.
PARTICIPAÇÃO POPULAR
– NOS PROJETOS, NAS AÇÕES, NAS DECISÕES
MUTIRÃO
Um dos eixos de atuação da equipe da companhia dentro da assistência O espaço de intervenção de uma Ação Urbana se torna obra aberta na medida
técnica é o programa Melhorias Habitacionais, que proporciona aos con- em que a participação no processo de planejamento e execução do mutirão
templados, com recursos limitados e valor fixo, a reforma de suas casas. é instrumento de engajamento e apropriação do espaço. Diversas comuni-
Esse valor é estabelecido para que o maior número de pessoas possa ser dades, a partir da transformação inicial proposta pelo programa, adotaram o
atendido pelo programa, porém nem sempre é possível executar todo o regime colaborativo de manutenção do espaço público como lugar de trocas
projeto proposto com o valor disponibilizado, executando-se o que é mais sociais e convivência comunitária. Essas comunidades se organizaram e
urgente. Ao fim da atuação da equipe, não é incomum que os moradores continuaram a intervir no ambiente e a zelar por ele depois dos mutirões.
deem continuidade às obras iniciadas pelo Estado com recursos próprios, uma Muitas delas já eram, na verdade, protagonistas de seus próprios processos
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vez que se sentem mais motivados a investir em sua residência e completar comunitários de vida cultural, sendo reconhecidas e potencializadas dentro
o projeto da equipe técnica. do desenvolvimento do processo de uma Ação Urbana com participação de
Estado, do setor privado e da sociedade civil.
PAINEIS ARTÍSTICOS
A PERSISTÊNCIA DO MEIO-FIO
Mesmo que a maior parte da população das pe- veículos automotores. Estreitos corredores com DIVULGAÇÃO
riferias brasileiras priorize meios de transporte a presença de postes de iluminação e de uma – ESTRATÉGIAS DE COMUNICAÇÃO:
ativos para seus deslocamentos cotidianos, como infinidade de outros elementos que não favore- WHATSAPP, CARTAZES, LAMBE-LAMBES
andar a pé e de bicicleta, ainda há resistências cem a acessibilidade inclusiva e agradável forçam
culturais no país em aceitar a forte demanda por os pedestres a arriscadamente e indignamente Uma das ferramentas de metodologia desenvolvidas pela equipe foi criar
mais e melhores infraestruturas para tais modais. transitar pela via dos carros. A insistência na per- formas de comunicação e diálogo com a comunidade, utilizando não só
A qualidade dos projetos urbanísticos produzidos manência do meio-fio, mesmo em vias planejadas meios digitais, como físicos. Foram produzidos e colados cartazes em es-
hoje no Brasil ainda é defasada, frente à corrente para serem compartilhadas, é símbolo do processo paços diversos, convidando a população para reuniões e mutirões de dis-
técnica que luta por cidades mais inclusivas que e pensamento carrocrata, que não permite que cussão sobre projetos, o que ajudou a criar uma conexão. Os convites para
privilegiem o pedestre, tanto nos maiores centros carros, bicicletas e pedestres transitem na mesma participar dos mutirões também funcionavam como uma demarcação da
urbanos quanto nas periferias em constante urba- via em velocidades compatíveis com a segurança característica pública do vazio urbano, com dizeres de efeito como: “aqui vai
nização. A ausência de modelos ou referências de necessária. O meio-fio é o elemento que, ao ser virar praça, mutirão no último final de semana do mês”. Os cartazes visavam
melhores situações para o pedestre nas grandes colocado formando duas linhas paralelas, define a combater a grilagem de terras e a ocupação irregular dos locais, afirmando
cidades tem influência sobre a falta de conscien- o plano em que começa o domínio total do carro que eram espaços públicos e coletivos. Além dos cartazes, existiam folders
tização e, consequentemente, sobre a tomada de e no qual pedestres, ciclistas e qualquer forma de para serem colocados na caixa de correio de cada casa, a fim de atingir mais
decisão dentro da lógica rodoviarista usual para vida não são bem-vindos. Pensar regularização de diretamente a população. Esse material impresso também tinha versão digital
os projetos de regularização urbanística dos novos favelas com foco nas pessoas passa por extinguir a ser disseminada via WhatsApp, pois as comunidades têm grupos muito
assentamentos urbanos de interesse social. Dentro o meio-fio como definidor da zona de conforto bem estabelecidos nesta mídia social para troca de informações. Essa foi
do processo de aprovação e execução das obras do automóvel. Acabar com degraus e desníveis uma plataforma eficaz, enquanto em outras redes digitais não era possível
de infraestrutura, o leito carroçável tem prioridade. é uma forma de romper os limites impostos aos alcançar a população. Todos os materiais foram pensados com uma lingua-
As calçadas são sempre os espaços restantes da pedestres e ciclistas e tornar as ruas espaços de gem contemporânea, para chamarem atenção e se destacarem dos avisos
via, o que sobrou do amplo espaço destinado aos fato democráticos. comuns nas comunidades.
POÇOS DE VENTILAÇÃO
E ILUMINAÇÃO
A maioria das casas que sofreram intervenção e iluminação natural para alguns cômodos que
pelo programa Melhorias Habitacionais precisava não apresentam possibilidades de instalação de
de mais ventilação e/ou iluminação em seus cô- aberturas e janelas convencionais. Ainda que seja
modos. A construção dessas habitações tem ca- importante solução para a melhora da qualidade
racterísticas que permitem associá-las a bunkers, de vida e saúde da habitação, a resistência dos
sem nenhuma ou com poucas aberturas e acessos moradores em construir uma possível entrada
fora a entrada principal. Isso pode derivar de três para estranhos no teto de suas casas era grande.
situações: falta de planejamento na construção; A saída, então, foi instalar grades e portões no alto
economia ao construir as casas, aproveitando-se das aberturas, para impedir garantir o sentimento
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as paredes dos vizinhos; e receio da violência urba- de segurança das pessoas e para que elas não
na. Os poços de ventilação são áreas desprovidas fechassem novamente os espaços para ventilação
de cobertura e que, por isso, possibilitam ventilação de suas casas.
DA LÓGICA RODOVIARISTA
SOBRE O ESPAÇO PÚBLICO
Quando a construção ainda está precária, revestir áreas molhadas ou fazer Muitos problemas domésticos podem ser resolvidos com o uso de soluções
instalações hidráulicas adequadas parece luxo. São recorrentes residências alternativas, quando não se tem a possibilidade de acessar mecanismos
cujos principais problemas de insalubridade se davam pela falta de pelo formais. Por meio das vivências e saberes comunitários, faz-se possível
menos um desses dois fatores, comprometendo de maneira significativa a contornar as adversidades comuns nessas localidades. Nas comunidades
salubridade da construção, o que reflete na saúde e na qualidade de vida dos em que estivemos presentes, foi fácil perceber como os saberes são trans-
moradores. Na prática de assistência técnica, essas áreas devem receber portados da escala doméstica e individual à escala urbana e coletiva. Essa
uma atenção especial quando, com um investimento baixo, pode ser feita atitude representa a resiliência das comunidades, a capacidade de adaptação
uma grande diferença. a novos contextos e a postura de não dependência de outros métodos ou
agentes para atuarem na resolução de problemas. A qualidade do serviço
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e a estética não são fatores esquecidos, as prioridades é que divergem das
dos métodos formais.
INFRAESTRUTURA
LIXO
Há quem diga que o lixo é um erro de design. a fabricação dos produtos ou sobre a destinação
O Lixão da Estrutural, que se localizava a 17 qui- deles quando são considerados sem uso. O que
lômetros do Plano Piloto, deu origem à Cidade se tornou normal para a vida urbana é o conceito
Estrutural. Inicialmente, a ocupação foi feita pelas de lixo, e não o de reaproveitamento e reciclagem.
pessoas que faziam da montanha de lixo seu sus- Nas localidades que receberam a equipe da assis-
tento, em seguida, grileiros parcelaram o restante tência técnica, essa realidade não é diferente. Os PAPA-LIXO
do terreno para pessoas de baixa renda, até se for- vazios urbanos que sobram das ocupações dos
mar um assentamento informal grande o suficiente lotes – onde deveriam estar áreas verdes, áreas Buscando por um melhor serviço de atendimento à limpeza urbana em áreas
para ser regularizado. O contato diário com os resí- de lazer com mobiliário urbano e equipamentos de difícil acesso pelos caminhões convencionais de coleta do lixo, foram
duos urbanos banalizou a relação dos moradores públicos –, acabam virando pontos de acúmulo de instalados enormes contêineres semi-enterrados, em pontos estratégicos
com a sujeira. A ausência de serviço público de lixo. Os lixões urbanos são pontos de transmissão de algumas regiões com problemas críticos de resíduos urbanos. Um ponto
coleta urbana – inicialmente em toda a Estrutural, de doenças e propagação de insetos e animais, único e fixo de coleta facilita e potencializa o trajeto do caminhão ao percorrer
e hoje apenas em alguns pontos, como na área de transformando o problema em questão de saúde rotas simples e mais acessíveis. O Papa Lixo, como é conhecido o contêiner,
Santa Luzia – leva os moradores a acumularem pública. Combater a cultura de uso de espaços tem 3,5 metros de profundidade e necessita de um caminhão específico que
seus resíduos em todo e qualquer local aberto e públicos para jogar resíduos urbanos foi um dos possa erguê-lo e despejar os resíduos na caçamba, por meio da abertura no
disponível. De maneira geral, falta-nos, na contem- pontos de trabalho de nossa equipe técnica nas fundo. Além de melhorar a rota dos veículos, o sistema contribui para evitar
poraneidade, o entendimento sobre a origem e o periferias de Brasília. o acúmulo de lixo em espaços abertos, o que reduz o mau cheiro e a pre-
destino dos materiais; não há conhecimento sobre sença de animais transmissores de doenças nas ruas – situação bastante
corriqueira nas áreas periféricas de cidades brasileiras.
ESCOLAS-PRISÕES VIOLÊNCIA
– A FALTA DE RELAÇÃO COM A RUA
No entendimento mais comum do termo: Uma forma diferente de encarar o termo:
Na construção das escolas no Brasil, principalmente as públicas, existe um É habitual que se imagine um cenário violento e Mais explícita que a violência urbana do cotidiano
padrão de desenho que há muito tempo segue a lógica de um ordenamento hostil quando se fala das comunidades em que das desiguais cidades brasileiras, e mais grave, é
espacial que limita e prende os estudantes em caixas isoladas e espaços a equipe trabalhou e nas quais os colaboradores a violência do Estado, raramente mencionada. Um
sucateados, com uma arquitetura semelhante à dos presídios. Que padrão técnicos imergiram. Muitos desses comentários Estado que ignora as necessidades básicas de
comportamental pode ser gerado nessas escolas-prisão? O que se perde partem dos índices de violência coletados por infraestrutura para a salubridade dessa população,
na formação dos estudantes enclausurados nesses espaços? Para uma pesquisas oficiais, e outros, do histórico dessas que é truculenta com processos de remoção e de
educação mais humana, de melhor qualidade e mais afetiva, nossas escolas localidades. Porém, a vivência nesses lugares não vigilância, que fecha os olhos para as necessidades
precisam ser pensadas como espaços públicos que estabelecem relação foi hostil, pelo contrário. O fortalecimento dos laços de equipamentos públicos e transporte para que
com o seu contexto, criando um senso de comunidade não somente entre e a presença diária da companhia fizeram com que, as pessoas tenham o mínimo de condição para
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os estudantes, mas também com os outros habitantes da cidade. Em muitas nos quatro anos de atuação, não houvesse ocor- batalhar por uma vida melhor. Há violação do Esta-
localidades, as escolas são os únicos espaços que permitem a reunião da rência grave, ainda que o grau de exposição fosse do em prover o que é sua obrigação, pois o direito
comunidade para eventos. São potenciais espaços coletivos que acabam alto. A leitura externa do cenário não corresponde à cidade e à moradia são direitos constitucionais,
negados, já que poderiam ser catalisadores de um sentimento colaborativo. à realidade vivenciada. não são favores. O esquecimento dessas famílias
nas políticas públicas é a violência institucional,
mais uma das violências com que elas convivem
cotidianamente.
ENDEREÇAMENTO
COMUNITÁRIO
CAMPO DE FUTEBOL
E AUSÊNCIA DE OUTRAS DEMANDAS
– REFLEXO DE CONFLITOS DE GÊNERO
ESPAÇOS CULTURAIS
AMBULANTES
Lindos, carinhosos e soltos: este é o retrato da algum morador, vemos com bons olhos o papel A presença de animais domésticos é muito comum, inclusive daqueles que
maioria da cachorrada nas ruas dos assentamen- desempenhado por esses “amigos”: ajudar a tornar desempenham alguma função de auxílio na renda familiar, como cavalos,
tos informais. É notável a quantidade de cães nas a infância de muita criança mais feliz, aliviando as porcos e galinhas, em um ambiente muitas vezes extremamente urbanizado.
ruas, e eles não são necessariamente abandona- agruras de problemas familiares ou oriundos do co- Há uma lógica para garantir a presença de animais de grande porte, como
dos, a maioria tem dono e casa. Essa situação tidiano de onde moram. Muitos cães acompanham os cavalos puxadores de carroças. Existem estábulos coletivos de aluguel
não fica clara à primeira vista. A falta de quintais as crianças à escola ou os seus donos aos pontos em quase todas as áreas de interesse social, assim como há muitos ani-
em muitas casas, além da própria cultura de criá- de ônibus. Há casos de cachorros de catadores mais abandonados, principalmente os idosos ou doentes, que deixam de
-los soltos, definem esse padrão de como ter um em Santa Luzia acompanharem os donos até o desempenhar função produtiva e se tornam um fardo. Esse problema deve
cão de estimação nessas comunidades. De modo aterro, espaço de trabalho, e retornarem juntos. ser solucionado com auxílio dos órgãos públicos, principalmente para ga-
geral, uma das diferenças no trato aos bichinhos Eles também são os companheiros de pessoas rantir o bem-estar e os direitos desses animais. Nossa equipe de arquitetos
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entre diferentes classes sociais está no grau de sozinhas e solitárias É comum presenciar idosos já projetou um estábulo para um cavalo que era um ser fundamental para a
humanização dado a eles, devido às diferentes sozinhos que acalentam a vida com seus cãezinhos renda da família, a qual vivia da coleta de resíduos recicláveis.
prioridades das famílias, especialmente as grandes para amenizar as dores de toda uma situação que
e em situação de pobreza. Mesmo assim, não falta a velhice e falta de recursos podem trazer. Também
afeto e cuidado. E como é recíproco. Apesar de havia membros da equipe de assistência técnica
que pela falta de alguns cuidados esses animais que resgatavam ninhadas de cães na comunidade
possam eventualmente causar dano à saúde de para levá-los à adoção.
SENSIBILIZAÇÃO SOBRE O ESPAÇO
– MENINOS
A natureza do espaço público é concebida, his- uma vez que já estão acostumados a isso. Nesse
toricamente, para o masculino: normalmente as sentido, é importante aproveitar esses momentos
cidades são projetadas, executadas e ocupadas de construção coletiva do espaço para incentivar
por homens. Por não terem seus corpos confron- outras narrativas de ocupação da cidade. Perceber
tados cotidianamente com o receio de ocupar a e evitar a segregação por gênero nas brincadeiras,
cidade, dentro da lógica dos papéis de gênero democratizar os espaços de decisão em casa e
estabelecidos socialmente, os homens circulam na comunidade e envolver os meninos na respon-
com maior autonomia, tornando frágil ou inexis- sabilidade do cuidado sobre o espaço coletivo e
tente a reflexão sobre como o espaço pode ser em atividades artísticas são meios de enfrentar a
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mais seguro e inclusivo para todas as pessoas. masculinidade tóxica tão violentamente ensinada
No que toca às crianças e à cidade, as ruas e os aos homens desde a infância. É uma tarefa polí-
vazios são frequentemente ocupados por meni- tica buscar que os meninos tornem-se homens
nos jogando bola, restando às meninas espaços sensíveis e entendam a necessidade de espaços
menores ou nenhum. Nas Ações Urbanas Comu- públicos coletivos, para que atuem de forma efetiva
nitárias, os meninos são os primeiros a chegar, na luta por uma cidade segura e acolhedora para
apropriando-se do espaço com mais naturalidade, todas e todos de maneira democrática.
EMPODERAMENTO FEMININO
– MENINAS
MONITOR MIRIM
CIDADE DE MUROS
– A ARIDEZ NO ESPAÇO URBANO
Nas paisagens urbanas, são raros os casos de bairros que possuem áreas A ocupação por pessoas nos espaços públicos é primordial para o fun-
verdes generosas, parques e espaços de uso coletivo bem arborizados. Vi- cionamento eficiente da cidade. Somente criando condições para que os
ver em um bairro com essas características é um privilégio de poucos. Nos moradores possam se apropriar das áreas livres é que teremos lugares com
assentamentos informais, a principal necessidade é haver terra para todo mais qualidade e segurança. Contudo, a lógica da construção das cidades
mundo, geralmente parcelada por grileiros que pouco se importam com a muitas vezes deixa a desejar no âmbito da produção de espaços públicos.
arborização. A lógica é a do lucro, da densidade, da impermeabilização e do Nos assentamentos informais, há poucos vazios urbanos, que normalmente
carro. “Da casa para fora não é problema meu”, mas é problema de todos são subutilizados e tratados como locais residuais. Abandonados, tornam-se
que sofrem com as consequências de cidades quentes, sem sombra, hostil inseguros, sendo utilizados até mesmo para descarte irregular de resíduos
para a caminhada e que alagam no período das chuvas. Para cidades com dos mais diversos tipos. Ao mesmo tempo, existe também a carência de
temperaturas mais agradáveis, é preciso pensar novas formas de se promover áreas verdes e espaços de encontro e convivência. Somente tendo as pes-
arborização, principalmente em locais com pouco espaço para áreas públicas. soas como ponto central dessa perspectiva faz-se possível a transformação
dessas áreas tratadas como terrenos baldios. A mudança se torna praticável
por meio da inserção de verde e de equipamentos para que esses vazios
deem lugar a espaços de permanência onde as pessoas queiram estar. Os
vazios são fundamentais para garantir áreas arborizadas no processo de
urbanização desses locais.
VEGETAÇÃO COMO É POSSÍVEL
– JARDINEIRAS DE PVC
AGROFLORESTA
HORTA MEDICINAL
Em 2004, uma moradora de São Sebastião foi contaminada pelo hantavírus. É ilusão pensar que, ao falarmos em comunidade engajada, estaremos nos
A situação gerou comoção e mobilizou os moradores a limpar o terreno vazio referindo a um grupo coeso e continuamente participativo. O engajamento
próximo a suas casas. Com a área limpa, surgem as preocupações com a é normalmente motivado e liderado por uma pessoa chave ou por pessoas
ocupação irregular e a grilagem. Visando a impedir essas atividades e ofertar que conseguem perceber o potencial de um grupo em uma determinada
ao bairro mais oportunidades de vivência, nasceu a Horta Girassol. Ainda situação, aliando o contexto de trabalho à sua capacidade de visão estra-
que seja também uma ocupação de caráter irregular, a iniciativa nasceu do tégica e liderança. É assim com Hosana, moradora da área do Morro Azul,
interesse coletivo e público e já conquistou a possibilidade de ter o terreno em São Sebastião. Ela foi uma personagem importante para a conquista do
como propriedade da horta. Após anos de atividades, o grupo se organizou território e para a fixação da comunidade, e hoje é a principal responsável pela
formalmente, transformando-se em ponto de apoio para diversas outras manutenção da Horta Girassol. Hosana tem papel relevante de mobilização e
atividades do bairro e da região. Além dos conhecimentos ambientais e articulação, aglutinando movimentos e grupos de setores diferentes, visando
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alimentícios, a comunidade pôde aprender sobre mobilização, cooperação ao trabalho em conjunto e à melhora da comunidade.
e ressignificação do uso de espaços urbanos.
ROGÉRIO ‘BARBA’
Barba é uma liderança que viveu grande parte da vida na rua e conseguiu
sair dela. Decidiu então auxiliar outras pessoas em situação de rua a saírem
desse estado de extrema precariedade. Pessoas cujo percurso de vida era
semelhante ao dele. Em certa ocasião, viu o presidente da Codhab com a
equipe em um evento cultural no Setor Comercial Sul e foi conversar sobre
um direito que hoje essa população possui. Havia descoberto a existência de
um percentual obrigatório de lotes em programas habitacionais que deveria
ser destinado à população de extrema vulnerabilidade. Ciente disso, foi exigir
o cumprimento dessa norma pelos programas da companhia. A partir desse
encontro casual, surgiu a discussão sobre formas de incluir pessoas em situ-
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ação de rua, que ocupavam há anos o espaço público como moradia e não
conseguiam acessar os programas sociais devido à extrema vulnerabilidade,
por não terem documentos ou por não residirem oficialmente em um local.
Barba auxiliou a formatar as políticas públicas para agregar essa população
a que o Estado tem dificuldade de acessar sozinho. Assim, tornou-se uma
figura de extrema importância para os processos da companhia.
EDMILSON ‘MINEIRO’
Nascida no Rio Grande do Norte, Dona Chica chegou ao Distrito Federal aos
dez anos com toda a família. Atraídos pela promessa de melhor qualidade
de vida na nova capital, eles se instalaram na Cidade Livre, hoje conhecida
como Núcleo Bandeirante. Junto a eles, tantos outros sonhadores e trabalha-
dores esperançosos de uma vida com dignidade e felicidade. Nos anos 70, já
casada, dona Chica chegou à região da comunidade do Pôr do Sol, após ser
realocada do Setor de Chácaras P Sul. Desde então, luta pela permanência
e regularização da comunidade. É integrante da Prefeitura Comunitária do
Pôr do Sol, organização criada por ela em 2000. Em 2015, ao descobrir que
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pontos de atendimento da Codhab seriam instalados nas áreas de regulari-
zação do DF, solicitou a presença de uma unidade em sua região. Acreditou
tanto no trabalho técnico que estava prestes a ser realizado que ofereceu a
sede da prefeitura para que o Posto pudesse funcionar ali. Durante mais de
dois anos, a equipe técnica esteve presente nessa sala, com o aluguel sob
responsabilidade da comunidade.
Objetivando potencializar o resultado e construir intervenções mais sólidas e Ser voluntário é praticar empatia, é colocar-se no jovens estudantes de arquitetura que buscam por
duradouras, durante as semanas de preparação que antecediam uma Ação lugar do outro e ver o problema com os olhos dele. É experiência pessoal no trabalho social, ganhavam
Urbana Comunitária, a equipe de obras era responsável por todo o esforço também, além de se conscientizar sobre as proble- também experiência profissional no que se refe-
físico e de construção para transformar as áreas de intervenção. Eram co- máticas, inquietar-se frente à realidade. É instinto re à realização de trabalho conceituado em um
laboradores sem ponto fixo de trabalho que realizam suas funções na rua resolutivo de ir contra as injustiças e enfrentá-las. urbanismo de caráter emergente e colaborativo.
e debaixo do sol. Nossos super-heróis têm conhecimento de construção O aprendizado vem da convivência com o diferente, Alguns voluntários exerceram papel importante
civil, marcenaria, serralheria e muita sensibilidade para entender o contexto do respeito ao próximo e da crença nas práticas nos processos dos quais participaram e tiveram
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da vida. Realizavam desde atividades de grande esforço físico – transporte colaborativas como ferramentas de construção de a oportunidade de integrar oficialmente a equipe
de materiais, montagem de tendas, carregamento de caminhões –, até o uma sociedade mais inclusiva e justa. Motivados profissional da assistência técnica. Convênios es-
sensível trabalho com cores, interação e mobilização. As especialidades e os pelos valores de participação e solidariedade, os pecíficos para arquitetos foram estabelecidos com
conhecimentos individuais ampliam as potencialidades de atuação da equipe. voluntários disponibilizam tempo e conhecimen- instituições parceiras, como o Conselho Interna-
to para melhorar a qualidade de vida de muitas cional de Arquitetos de Língua Portuguesa (CIALP)
comunidades. A maior parte do voluntariado da e a Association Internationale des Etudiants en
assistência técnica participou do programa Ações Sciences Economiques et Commerciales (AIESEC).
Urbanas Comunitárias. De maneira geral, eram
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Sempre presentes nas comunidades, são figuras de boa recepção e de fácil Uma das características do Posto foi a flexibilidade do horário de trabalho,
engajamento. Oferecem água e café, dão informações, vendem marmitas, que foge do padrão do serviço público ao variar conforme a necessidade da
doam mudas e ainda oferecem suas casas como pontos de apoio à equipe comunidade. As reuniões comunitárias aconteciam após o horário comercial,
de obras. De maneira geral, podem representar fortaleza e resistência na luta de forma a abranger mais moradores, que não precisavam faltar ao trabalho
pela fixação no território, já que, geralmente, foram as primeiras a chegar ao para participar. Essa liberdade de ajustar os horários de trabalho e os dias de
local. São, ainda, pontos de referência para endereços e importantes fontes atuação possibilitou maior diálogo com a comunidade e facilitou o acesso
da memória local. Durante as Ações Urbanas, divertiam-se e trabalhavam aos serviços do Estado. O Posto adotou esse precedente ao fazer a reflexão
em prol da comunidade, fazendo esforço físico sem se deixarem dominar de que uma companhia de habitação que trabalha em áreas periféricas deve
por barreiras corporais. O processo de participação nos faz perceber como estar ali para auxiliar os moradores e não para criar dificuldades para eles.
a cidade é deficitária para o usufruto dos idosos. Poder ouvir essas mulheres
é importante para garantir uma transformação que assegure acessibilidade
e direito à cidade a todas as gerações.
7
entrevistas
e depoimentos
1 UM PAPO COM GILSON PARANHOS
2 CONVERSA COM DONA CHICA
UM PAPO COM
GILSON PARANHOS
Uma das experiências pessoais mais importantes que eu tive foi quando
cheguei em casa – sou de uma família de seis irmãos, na mesma casa mo-
rávamos dez –, e a empregada estava chorando. Quando perguntei o que
tinha acontecido, ela me falou que tinha tirado uma nota muito baixa em uma
prova. “Mas por que você tirou nota baixa?”, e ela respondeu “porque é muito
difícil, eu não consigo entender”. Ela trabalhava o dia todo e estudava à noite,
então falei “vou estudar junto com você”, e começamos. No segundo dia ela
chamou duas amigas, depois mais três, mas a cozinha da minha casa era
muito pequena, e não cabia.
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Memória do Arquiteto de Brasília: Apresentação do trabalho do arquiteto Milton Ramos (da esquerda para a
Gilson Paranhos em ateliê na FAU/UNB, década de 1970 direita: Yara Lúcia, Aleixo Furtado, Milton Ramos, Sérgio Parada, Manoel Balbino e Gilson Paranhos), 1996
Fonte: Acervo Gilson Paranhos (editada) Fonte: Acervo IAB/DF (editada)
Muito cedo fui trabalhar com uma pessoa mara- o contrato adiante e fui para lá. Aprendi muito em É verdade que fica o meu nome, o que eu acho natural, mas é importante
vilhosa, que era o Milton Ramos. Um técnico de termos de obra, de tomar decisões rápidas. Com dizer que ele é realizado por uma equipe enorme, e é consequência de uma
capacidade enorme e politicamente muito radical. o Lelé, aprendi muito. Com ele era do dia pra noite, experiência na qual diversas pessoas estão incluídas.
Pra você ter uma ideia, ele desenvolveu e detalhou o e a gente começava a obra, porque tinha que ficar
Itamaraty e o Teatro Nacional. Depois que trabalhei pronta logo. Aprendi a fazer a diferença no setor
com ele, fui trabalhar com o Lelé. público e, quando você faz algo novo, é normal
quebrar a cara, mas a gente quebrava a cara jun-
Tive um aprendizado enorme com os dois, pessoas tos. As portas eram fechadas e começávamos do
fantásticas que tinham na veia os mesmos grandes zero novamente.
objetivos, mas eram totalmente diferentes. Milton
Ramos brigou com o Oscar Niemeyer e não aten- Depois, continuei trabalhando no meu próprio
dia as ligações dele. Eu atendia os telefonemas escritório e procurando coisas novas para fazer.
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do Oscar no escritório do Milton e dizia que ele O governador Rollemberg nos chamou – eu, Thia-
tinha saído. Era muito engraçado, e pra mim uma go1 e Luiz Otávio2 – para participar do governo,
coisa louca, porque o Oscar era um líder mundial, graças a um trabalho politizado feito dentro do
e o Milton simplesmente não atendia (risos). Eu IAB. Nenhum de nós tinha relação alguma com
vi essas pessoas trabalharem de maneira muito o governador, então acreditamos que o trabalho
séria, com decisões políticas radicais, e os meus que vem sendo feito na Codhab é fruto de uma Prototipagem dos arcos
no canteiro de obras do
valores batiam muito com suas maneiras de pen- atividade séria anterior. Eu tenho hoje uma equipe Palácio do Itamaraty
sar e decidir. maravilhosa, que aos poucos foi sendo formada sob a coordenação de
Milton Ramos, 1962
e tem feito esse trabalho incrível.
Fonte: Acervo Milton Ramos
O Milton me chamou pra fazer a obra do Aeroporto (editada)
de Confins quando eu estava saindo da universi- Existem algumas comprovações do respaldo que
dade e não tinha o CREA ainda. “Milton, mas eu esse trabalho tem: dos 27 estados, fomos convi-
não tenho capacidade pra fazer uma obra desse dados a mais de 20 para mostrar o que fizemos.
tamanho, você sabe, eu só fiz os clubes da aero- Para mim, isso demonstra que estamos fazendo
náutica, casas, obras de pequeno porte.” O Milton algo que atende às necessidades das cidades
só me falou assim: “eu sei o que eu estou fazendo, brasileiras. Fomos convidados pra Bienal do Chile,
porra”. Ele era muito radical. Eu pensei comigo recebemos dois prêmios da Associação Brasilei-
mesmo “bom, vou pra Confins”, e te confesso que, ra de Cohabs (ABC), e vamos ter uma conversa
duas semanas depois que estava lá, cheguei no com a UN-Habitat, ligada à ONU e à UNESCO; um
trabalho e tinha duas passagens, para minha na- pessoal da central, lá na África, juntamente com
morada e eu irmos pra Europa ver um forro. Eu falei o pessoal do Rio de Janeiro, querendo falar com
para pessoa “não, muito obrigado, já decidimos a Codhab. Isso mostra que estamos fazendo um
qual forro vai ser usado em Confins, não preciso trabalho sério, e a gente não tem dúvidas sobre a
ir para Europa”. Então entendi que o Milton queria importância dele.
que uma pessoa séria estivesse lá.
Gilson Paranhos
Mais tarde, eu estava com um contrato com a 1 Thiago Andrade, Secretário da Secretaria de Estado de (à esquerda) e Henrique
Universidade de Brasília, fazendo os prédios dos Gestão do Território e Habitação (Segeth) e ex-presidente do Melman no Aeroporto
IAB/DF. de Confins/MG, 1984
professores. O Lelé me liga e fala “Gilson, vem
2 Luiz Otávio Rodrigues, Secretário-Adjunto da Segeth e Fonte: Acervo Milton Ramos
para cá”. Era um trabalho na Bahia, então passei ex-presidente do IAB/DF. (editada)
Luiz Sarmento
Ainda sobre as suas práticas profissionais, quais delas te firmaram como
profissional de arquitetura e urbanismo e quais delas te levaram a estabele-
cer uma relação com o direito à cidade e a arquitetura de interesse social?
638 639
Gilson Paranhos
Eu morei em Belo Horizonte um tempo para fazer o Aeroporto de Confins.
Trabalhei nesse aeroporto desde o primeiro risco, desde o estudo preliminar,
quando o Milton disse “talvez a gente faça um aeroporto, mas peço reservas
por enquanto”. Ninguém sabia se íamos fazer ou não, nem nós mesmos, mas
ele fez um croqui que eu tenho até hoje.
Logo que eu voltei, o Lelé estava fazendo uma pesquisa sobre argamassa
armada em Abadiânia. Fui até lá e comecei a fazer parte da equipe dele na
fábrica de argamassa. Essas relações profissionais fizeram a diferença, e
também o meu amadurecimento no IAB.
Eu não admitia aquilo, então fui ao CREA ver quais direitos eu tinha. Descobri
Experiências em pré-fabricação na construção de habitação de interesse social:
que não tinha direito nenhum, o direito que eu tinha era simplesmente de matéria do Correio Braziliense, 1987
tirar meu nome do projeto. Eu não entendia muito de conselho, fui pesquisar Fonte: Acervo Gilson Paranhos (editada)
e rapidamente vi que o CREA não tinha nada a ver com a nossa realidade.
Nossos objetivos eram outros, por isso precisávamos de um conselho pró-
prio, então comecei a batalhar por isso. Na época, eu realmente ia para o
Congresso todo dia. As coisas acontecem e acontecem rapidamente, não
dá tempo, a gente tem que ir para dentro do Congresso e da Câmara brigar
pela nossa profissão.
Bom, a partir daí tem toda uma história maravilhosa: conseguimos ter nosso
conselho próprio, com pessoas fantásticas do Brasil todo. Quem fez isso fo-
ram os arquitetos do Brasil. Fomos nós, arquitetos. Pagávamos telefonemas,
pagávamos as coisas do nosso bolso, e todo mundo falava “como é que vocês
vão brigar com um conselho milionário?”. Nós brigamos e conseguimos em
função da nossa luta, tenho certeza disso.
Gilson Paranhos
Olha, algumas coisas nos ajudam muito, a gente e ganhar como funcionário público. Eu acho que
tem que ter isso claro. Eu acho que o fato de a gente seria justo você cobrar pela tabela do IAB”. O Oscar
morar em Brasília traz uma liberdade. O fato de se responde dizendo que seria correto cobrar pela
construir Brasília faz com que nós não tenhamos tabela do IAB se ele não fosse funcionário público,
vocação pra mediocridade, é uma verdade dita mas ele era. Oscar era funcionário da Novacap. O
por Lúcio Costa. Aterro do Flamengo também foram funcionários
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públicos que fizeram. O funcionário público tem
O segundo fator é que o nosso trabalho não te- que ter esse nível, tem que brilhar, então eu acho
ria a importância e a visibilidade que ele tem no que a gente tem uma responsabilidade maior.
Brasil hoje se não fosse o CAU – especialmente
a Comunicação do CAU. A contratação do Júlio1 Com relação ao ensino, tenho uma visão particu-
foi de extrema importância, um profissional que lar que pode ser que esteja equivocada: o ensi-
sabe o que é arquitetura e urbanismo, entendeu no reproduz aquilo que é realizado. Não dá para
rapidamente o que é habitação de interesse social um professor que não fez empolgar os alunos a
e colocou isso pro Brasil todo. Foi muito importante fazerem alguma coisa. A gente faz aquilo que a
e deu total apoio ao nosso trabalho. gente acredita. Hoje nós temos as universidades
trabalhando com a gente, eu amo isso, acho que
Outra questão é que eu trabalhei paro poder público é fantástico. Os nossos profissionais, se tem uma
junto com o Lelé, atrás dele, como um discípulo. palestra na UnB, eles vão; outra em uma universi-
O Lelé tinha uma velocidade e uma capacidade dade na Bahia, em Pernambuco, no sul, no Chile,
de atuar no setor público, que eu aprendi. Era um eles estão lá. É fruto de um trabalho real, então eu
profissional de qualidade que, quando ia fazer uma acredito que as universidades em breve estarão
rampa, colocava as pessoas em cadeiras de rodas com um volume de matérias de habitação de inte-
para subir e testar a inclinação. Ele não ficava fo- resse social, resultado do trabalho que a gente está
cado apenas na norma, na 9050, ele testava. Era fazendo e que, ainda bem, começa a se expandir.
Presidência do IAB/DF: matéria do Correio Braziliense, 2000
Fonte: Acervo Gilson Paranhos (editada) diferente a práxis desses caras, Milton Ramos, Existem muitos outros trabalhos sendo feitos no
Lelé, Oscar Niemeyer, era uma coisa fantástica. Brasil, e eu acho que isso é fantástico.
O Oscar era funcionário público, quem fez Brasília Acredito que a universidade não deve se apequenar
foram funcionários públicos. O Juscelino [Kubits- e se contentar em compartilhar conhecimento, isso
chek] escreve para ele “Oscar, acho que não é digno a internet faz! As universidades precisam produzir
você fazer uma cidade maravilhosa, a capital, com conhecimento. Lelé produziu conhecimento, Solano
repercussão mundial como está sendo Brasília, Benitez produziu conhecimento. A universidade
Luiz Sarmento brasileira precisa retomar o experimentalismo e a
A Codhab/DF é pioneira na implementação da Lei Federal nº 11.888/2008, busca por produzir conhecimento, retomar o que foi
1 Júlio Moreno, chefe da Assessoria de Comunicação
a Lei de Assistência Técnica. Como você conseguiu colocar em prática? Integrada do CAU. a Universidade de Brasília em seus primeiros anos.
Luiz Sarmento Luiz Sarmento
Uma das primeiras decisões que você tomou ao assumir a gestão da Codhab Você acha que a ida para a ponta é algo que deve ser seguido por outros
foi a de colocar técnicos da companhia dentro dos maiores e mais complexos órgãos ou é específico da arquitetura? Como você vê essa questão enquanto
assentamentos informais de baixa renda do DF. Qual é a meta, a motivação gestor público?
e as consequências disso?
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Gilson Paranhos Gilson Paranhos
Muito cedo eu percebi que a nossa profissão tem muito de técnica, mas tam- A pergunta principal é a seguinte: quem é nosso cliente? Nossos clientes
bém tem muito de sensibilidade, de interação e de relação com o cliente. Não são as pessoas mais necessitadas, de baixa renda. O meu sonho é que a
dá para o médico simplesmente fazer a receita sem sentir o cliente, eles têm sede da Codhab seja uma salinha pequenininha. Nós não temos que ficar
que ter contato pessoal, senão a receita não vai atender. Não dá para você na sede, temos que estar onde o nosso cliente está, e o nosso cliente está
fazer nem o lavabo de uma casa se você não conhecer a pessoa, a família. na ponta, na periferia. A média e a alta renda, os empreiteiros resolvem os
Essa interação é essencial numa obra de edificação. problemas de habitação delas, nós temos que resolver questões de habitação
de interesse social.
Na obra pública urbana é a mesma coisa: se você não sentir a comunidade,
se você não souber o que acontece naquela comunidade, a sua resposta Os nossos Postos de Assistência Técnica têm que ter a melhor qualidade
vai ser mentirosa e não vai atender às necessidades daquela população. A possível, e a inserção na ponta é essencial para evitar essas normas absurdas
intuição do arquiteto é que faz dele um arquiteto, ela é diferente, é essencial. que nós temos, não só em Brasília, mas no Brasil todo. Só vamos conseguir
Dez mil recebem o diploma, mas cinco mil são arquitetos: esses cinco mil fazer uma norma digna se a gente estiver lá na ponta, senão a gente vai es-
utilizam a intuição. crever besteira. Os profissionais da melhor qualidade têm que ir pra pronta
mesmo, eu acho que é lá que um arquiteto tem que estar.
Quando nós chegamos ao Posto de Assistência Técnica de Brazlândia, nós
damos uma resposta totalmente diferente da que nós damos no Sol Nascente, O órgão que faz concursos públicos de projeto na França fica em duas sali-
que é diferente da resposta que nós damos pra Vila Cauhy, que é diferente nhas pequenininhas, e fez mais de dois mil concursos. Não é o tamanho da
pra Fercal, pra Santa Maria, para o Porto Rico. As áreas são diferentes, as empresa que importa, não é quantidade de pessoas que faz a diferença, e
populações são diferentes, as respostas urbanas têm que ser diferentes. sim a qualidade do corpo técnico. A Codhab tem hoje um corpo técnico de
Logo que eu entrei na Codhab fui à Codeplan (Companhia de Planejamento qualidade. E é essencial que essas pessoas qualificadas estejam na ponta
do DF) buscar informações sobre as populações mais carentes de Brasília. junto aos mais necessitados, para poder atender às necessidades deles.
O poder público tem que atender os mais necessitados, e é em função disso
que a gente está nas pontas.
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Gilson Paranhos
O pessoal comenta que foi uma revolução, uma dois locais que eram muito distantes dos mais
guerra inicial. Hoje eu sei o que me deu forças para necessitados, e isso não fazia sentido. Disseram “é
isso. Eu tinha 16 anos de idade quando conheci, muito perigoso, as pessoas vão ser assaltadas”, e
por meio da literatura, Dom Hélder Câmara. Eu eu falei “já fiz um teste lá no Itapoã e fui assaltado
peguei carona e fui para o Recife, porque queria duas vezes. Podemos ser assaltados, mas não
conversar com ele. Entrando no palácio, pude ver vamos morrer. Logo que a comunidade souber que
que ele tinha transformado aquele espaço num estamos junto com ela esses assaltos acabam”.
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local de assistência social de seriedade ímpar. Foi uma loucura no começo, e eu tinha medo, mas
não podíamos abrir mão de ocupar aquele espaço.
Na época, havia uma dualidade total entre Esta-
dos Unidos e Rússia, e eu perguntei pra ele: “Dom Enfim escolhemos o local. O diretor administra-
Hélder, o senhor é comunista? O senhor é da Igreja tivo alugou a loja e me perguntou “como é que
Católica? O senhor é um bispo da Igreja Católica nós vamos pagar isso?”. As questões jurídicas
e um comunista?”. E ele falou “meu filho, você tão não nos permitiam alugar um local lá, então eu
Gilson Paranhos (de costas) em visita a Dom Elder Câmara - Recife/PE, 1976
novo com um pensamento tão antigo”. Ele era um disse “vamos fazer uma vaquinha, a gente paga Fonte: Acervo Gilson Paranhos (editada)
cara fantástico! Foi lá dentro e pegou dois envelo- do bolso”. Nós montamos o nosso Posto e, dois
pes com convites para dar palestras nos Estados dias depois, eu recebi um telefonema da AGEFIS:
Unidos e na Rússia, e falou “não estou preocupado “você está montando um Posto numa área ilegal”.
se eu sou comunista ou se eu sou capitalista, eu Onde estávamos era uma ZEIS (Zona Especial
tenho que atender os mais necessitados, esse é de Interesse Social), passível de regularização. O
meu objetivo”. Eu amei aquilo. Dom Hélder me pessoal lá não me conhecia, então eu falei “olha, Luiz Sarmento
ensinou a quebrar barreiras; Lelé, Milton e IAB, se você me vir trabalhando em uma área legal, eu O Clóvis Ilgenfritz, que formulou na década de 70 o que é assistência técnica,
também. estarei no lugar errado. O médico tem que ir aonde disse que vai seguir a metodologia da Codhab e abrir um posto de assistência
tem doente; onde as pessoas estão saudáveis técnica na periferia de Porto Alegre. Isso é algo muito importante. A criação
Quando eu cheguei à Codhab, sabia que ia ser não precisa de médico. O Estado tem que estar de escritórios dentro da comunidade não necessariamente tem a ver com
difícil, mas eu já tinha aprendido muito cedo o que especialmente nas áreas ilegais, os arquitetos assistência técnica, isso foi algo que você trouxe. Até onde sabemos você
é o risco. Estudando na universidade, eu pensava têm que estar nas áreas ilegais, porque são eles chegou à Codhab com essa decisão tomada. De onde surgiu essa história
que o risco era no papel, o risco de se fazer um que as legalizam”. de ter um escritório técnico nesses locais?
projeto que nasce ali e, se você fizer mal feito, ele
realmente nasce ruim e acabou-se, você nunca Foi uma luta, e eu agradeço muito aos que acre-
mais consegue consertar. O risco de se fazer um ditaram em mim. Muita coisa eu tinha que trazer, Gilson Paranhos
projeto de arquitetura é o risco da sua vida den- eu tinha que convencer meus pares e, às vezes, Pra mim, o maior problema das universidades brasileiras para tratar arqui-
tro da profissão. No começo, as pessoas não me era difícil, porque algumas pessoas não estavam tetura e urbanismo é a distância da prática. Percebi isso muito cedo. Eu fui
conheciam, então o baque foi maior. entendendo aquilo. Muitos deles não entendiam fazer um trabalho de conforto ambiental na biblioteca da Universidade de
nada do que eu estava falando, e hoje dão valor a Brasília, na época eu trabalhava com o Milton Ramos. Eu falava que ele tinha
Eu pedi que fosse escolhido um local no Sol Nas- isso e estão com a gente na luta. que dar aula lá, e ele, muito radical, dizia “esses caras não entendem nada
cente pra gente começar o nosso Posto. Sugeriram de arquitetura”. Caramba, para mim a UnB era fantástica, era tudo de bom!
Quando fui fazer o Aeroporto de Confins, cheguei lá
e tinha um escritório pronto, fantástico, na Savassi,
pertinho da minha casa, totalmente confortável,
com ar condicionado. Na época, eu falei “negativo,
o escritório tem que ser dentro da obra”. A obra
era longe pra caramba. Liguei pro Milton, ele era
meu chefe, e falei “Milton, nosso escritório está
na Savassi, não tem a menor condição! Escritório
tem que ser dentro da obra!”. Ele respondeu “está
entendendo por que eu te mandei ir? Você sabe
como é o negócio”. O escritório foi transferido para
dentro da obra, e as pessoas falavam “mas lá tem
650 651
muita poeira, as pranchas vão ficar sujas de terra”,
e eu falava que era isso mesmo, obra é assim. Lá
tinha acontecido a mesma coisa: essa distância
da obra é uma loucura.
No início, eu não entendia bem por que ele dizia isso. Então, fazendo esse Se ela não estivesse lá, se as pessoas não esti-
trabalho na biblioteca, fui até o CEPLAN (Centro de Planejamento). Quando vessem lá, todo o pessoal que está na ponta, já
peguei os desenhos, todos eram do Milton Ramos. Quando eu bati o olho pensou? Tem que estar, senão não acompanha
no desenho – naquela época a gente desenhava à mão – eu pensei “isso é a execução da obra. Se você não estiver dentro
coisa do Milton”. Conferi o carimbo: Milton Ramos. Cheguei no escritório e da obra, a cidade não vai acontecer. O arquiteto
falei “Milton, que negócio é esse? Você fez a biblioteca?”. Eu não sabia. Ele distante da obra faz com que as nossas cidades
falou “sim, a moçada tinha que botar o negócio em pé, mas tinha uma briga sejam péssimas como são hoje.
de autoria, e eu não estou preocupado com autoria”.
Gilson Paranhos
Nós, velhos de cabelos brancos, temos dificuldade em perceber que o mundo
é da molecada nova, não é nosso. Ela é que deve traçar os caminhos. Eu
Gilson Paranhos acredito nisso de verdade e vou te mostrar por quê. Essa molecada dá ou-
654 655
A assistência técnica, o concurso público e alguns público de projeto. É isso que nós temos que fazer. tros caminhos e parâmetros para a gente conduzir o nosso processo, nosso
outros assuntos que nós discutimos não se trans- Eu tenho consciência de que nós estamos fazendo caminho profissional. Então trazê-la pra dentro das entidades é essencial.
formaram em algo maior porque nós não acredita- o melhor e o mais barato pra sociedade. Temos Quando você traz essa garotada, você já vai ver algumas coisas claramente.
mos totalmente neles. Se os concursos públicos ainda que disseminar essa ideia dentro de todas Eu aprendo com meus filhos, aprendo com a equipe jovem. Não vai dar para
não acontecem, os principais responsáveis são as entidades de arquitetura e engenharia, porque entender que você faça qualquer coisa que não esteja dentro do celular. Eu
os arquitetos, somos nós. Se nós acreditássemos as pessoas precisam entender o que é isso. É percebo isso porque tenho uma relação com os jovens.
que essa é a única maneira de fazer uma contra- lógico que temos sim que fazer concursos com
tação – e quando eu falo “única” fico pensando melhor qualidade, com valores baixos e de inte- Uma das primeiras perguntas que eu fiz dentro da Codhab sobre as escri-
que é muito radical, mas eu não encontrei outras resse coletivo. Acho que essa é uma briga que turas foi “como é que vocês se comunicam com essas 150 mil pessoas?”.
maneiras ainda. Os nossos concursos precisam temos pela frente. Responderam “a gente manda carta registrada”. Ninguém se comunica mais
melhorar a qualidade? Claro que sim, eu também por meio de carta, então trabalhamos dois anos no aplicativo. Não vamos
acho. Mas se nós acreditássemos de verdade no A outra briga essencial é mostrar que as normas conseguir brigar contra as normas burras se a molecada não estiver com a
concurso público, não admitiríamos fazer uma de arquitetura e urbanismo têm que atender às gente, porque ela vai sentir rapidamente a necessidade de mudar. Isso inclui,
contratação pelo menor preço. necessidades dos que estão na ponta. Hoje eu por exemplo, perceber que não tem sentido que ninguém aprove o seu projeto.
não tenho dúvida de que nossas normas urbanas, Ou eu sou profissional ou eu não sou. Um médico não aprova a cirurgia de
As pessoas perguntam “você acha que o arquiteto além de outras normais e leis, fazem com que os outro médico, um advogado não aprova a petição de outro advogado, um
muda o país?”. Sim, eu acho. Se a gente contaminar pobres estejam nas periferias das nossas cidades. professor não fica com outro na sala de aula para saber se ele está dando
metade dos 160 mil arquitetos, nós mudamos a É muito simples: por causa delas, nossas cidades aula corretamente ou não. Então um arquiteto não pode ter um projeto sendo
realidade desse país. O IAB fez muitos concursos, são espraiadas. Você faz uma cidade espraiada aprovado por outro arquiteto, é uma interferência absurda!
é verdade, eu participei de muito concurso feito e depois quer resolver o problema da mobilidade,
pelo Instituto que foi uma porcaria. Não tem pro- mas não vai resolver nunca, porque a cidade está As nossas cidades serão melhores na hora em que os arquitetos estiverem
blema, não tem problema errar, mas nós temos espraiada. Você tenta resolver o problema da saúde sabendo qual é a responsabilidade deles. A Asa Sul é muito melhor do que
que acreditar de verdade. e não resolve nunca, porque tem que fazer 200 a Asa Norte – o código de obras da Asa Sul tinha duas páginas e o da Asa
hospitais. O problema da educação é a mesma norte era um livro. Eu não tenho dúvida de que a presença da juventude faz
Eu confesso que uma das satisfações que eu tive, coisa, tem que construir 200 escolas. A gente fica com que a gente consiga oxigenar as ideias e fazer coisas melhores. Nós
depois de estar há três anos à frente da Codhab, foi correndo atrás do prejuízo, sendo que o equívoco velhos não sabemos dar a resposta rápida que a molecada dá. Não adianta
irmos até o Tribunal de Contas do Distrito Federal está em quando o arquiteto não desenhou e não eu desenhar hoje uma cidade com estacionamento para 10 mil carros, se
defender o concurso público. Todos os conselhei- mostrou pra sociedade o que é uma cidade es- daqui a dez anos não tem carro nas cidades. A garotada sabe disso, os ve-
ros sentados e a gente defendendo o concurso praiada, o que é uma densidade equivocada. Nós lhos não. Os velhos não sabem e ficam fazendo cidades de rodovias, ficam
temos obrigação de mostrar isso à sociedade. gastando dinheiro com isso.
Algumas coisas dá para a gente peitar. Desde que eu cheguei na Codhab, Manuella Coelho
eu brigo feio por causa de algumas normas. Onde você faz um prédio de Pensando em diversidade, acessibilidade e direito à cidade, como você percebe
habitação de interesse social você é obrigado a fazer duas garagens, ou uma que o arquiteto pode promover isso dentro do programa habitacional?
garagem que seja. Olha o preço de um apartamento: é o mesmo preço de
uma garagem, ela fica no subsolo, é cara. Não tem sentido essa exigência. Gilson Paranhos
Existem muitas normas e leis que não atendem à realidade das periferias, Nós velhos temos uma dificuldade, e aí eu queria É essencial que a gente abra a cabeça pra isso: o
das pontas. fazer uma confissão: eu só percebi que não tinha número de arquitetos no governo é baixíssimo. A
negros na Codhab depois de muito tempo que eu SHIS (Sociedade de Habitação de Interesse Social)
estava aqui dentro. Hoje eu acho uma vergonha tinha profissionais que foram nossos professores e
nós termos o número de negros que nós temos no tinham muita qualidade. Nós precisamos remontar
Luiz Sarmento poder público em Brasília. No Brasil, pior ainda. Nós nossas equipes técnicas e engajar outras pesso-
Brasília foi planejada e construída em pouquíssimo tempo, demonstrando velhos só percebemos essas questões quando a as. Hoje temos o apoio de arquitetos de Brasília
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que nem sempre a velocidade é inimiga da qualidade. É claro que existe uma gente se depara com os questionamentos feitos que trabalham como voluntários e são pessoas
crítica totalmente contemporânea ao que é o Plano Piloto, mas é inegável a pelos jovens. Os mais novos se tocaram que isso que têm responsabilidade com a profissão, com
qualidade arquitetônica. Como um Estado planejador pode acompanhar a é muito sério. as quais a gente conversa. Arquitetos de Brasília
velocidade do crescimento da terceira maior metrópole do país? estão trabalhando como voluntários para ajudar
a melhorar a qualidade dos nossos projetos de
Gilson Paranhos habitação de interesse social. Então é possível,
Eu era moleque ainda, devia ter uns 19 anos quando Ter equipes técnicas nos órgãos do governo é é uma questão de ir atrás. Se internamente não
o Darcy Ribeiro veio a Brasília voltando do exílio. essencial, mas essas equipes têm que ser com- viabilizarmos esses direitos, como projetar esses
Ele foi dar um curso no CCBB e, em alguma dis- pletas. Eu sei que acontece devagar, agora é que direitos para a cidade?
cussão política, alguém perguntou pra ele “Darcy, conseguimos e estamos começando a colocar
você criticou todo o sistema, então quem você os assistentes sociais, os engenheiros e toda a
acha que deveria ser o Ministro da Educação?”, e equipe que precisa estar dentro dos nossos Postos
ele falou “Darcy Ribeiro”. Avançados.
É necessário ter técnicos atuando no governo. Ouvi durante a vida toda para não trabalhar no
Veja, nós estudamos cidades há 30 anos. Você poder público, relutei muito para aceitar e me ques-
tem que botar a pessoa que estuda cidade nesse tionei bastante. Fechei a empresa que abri quando
meio e não precisa ser eu, de maneira nenhuma, me formei, com todo mundo me falando pra não
mas tem que colocar técnicos de qualidade no fechar. Ou você vem para dentro do poder público
poder público. de cabeça ou é melhor não vir. Com um pé aqui e
outro lá fora você não vai fazer nada, tem que ter
Eu discuto que o projeto é um só. A gente vive coragem de vir para fazer a diferença. Nós preci-
defendendo que o concurso público tem que ser samos de pessoas que acreditem na melhora do
feito com todos os nossos colegas, arquitetura é serviço público e que tenham qualidade técnica.
só o início da conversa. Não dá para você contratar
só o Caetano Veloso agora, e depois você faz uma
licitação para contratar o baterista dele, depois o
engenheiro de som. Não dá pra você contratar o
projeto de arquitetura e depois licitar o projeto de
Apresentação da experiência da CODHAB na Universidade de Brasília, 2016
cálculo estrutural e instalações. É muito sério. Fonte: Acervo Equipe de Assistência Técnica CODHAB
assistentes sociais, advogados. A cidade é feita de pessoas e as profissões
de todas têm que estar inseridas, mas não podemos ficar esperando que
essas discussões caminhem a ponto de resolver os problemas, porque nós
já vimos que elas não resolvem. Mesmo nas cidades latinas os arquitetos
são mais respeitados que no Brasil e isso tem consequências nos espaços
concretamente.
Luiz Sarmento
Retomando a questão urbana, quando a gente compara as cidades brasi- Eu falo nas nossas entidades que temos que celebrar o que já foi feito, temos
leiras com várias cidades latinas, por exemplo, a gente vê como as cidades que ver o trabalho de Clóvis Ilgenfritz, Fábio Penteado, Paulo Mendes da Rocha
brasileiras costumam ser muito deficientes em relação à qualidade. O que e dos que fizeram as nossas entidades. Acho essencial que em cada Posto
você acha que falta na cultura de projeto e obra no Brasil, que deixa a gente a gente tenha uma homenagem a um arquiteto desses, porque é imprescin-
tão atrás em relação aos nossos vizinhos? dível celebrar e aprender com o passado. Não é ficar com as luzes viradas
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pro passado – temos que olhar pra frente –, mas aprender com o passado.
Gilson Paranhos
Eu digo sempre que a baixa autoestima do arquiteto brasileiro é uma coisa
estúpida. Eu acho isso, e todo mundo fala “você é muito folgado, você acha que
o arquiteto vai resolver o problema do país?”. Acho sim. No momento em que
a gente perceber que temos uma baixa autoestima absurda, vamos começar
a modificar as nossas entidades. Os gestores brasileiros têm que saber que
nós fazemos a diferença, e existem alguns exemplos que podemos usar.
O arquiteto faz a diferença. Nós temos Brasília, que nos mostrou isso. Mos-
tramos para o mundo arquitetos como Oscar Niemeyer e Lúcio Costa. O
prédio da ONU nos Estados Unidos foram eles que fizeram. Nós mostramos
o que é arquitetura lá atrás. Jaime Lerner, que agora sai como o segundo
maior urbanista do mundo, mostrou como se faz a diferença lá em Curitiba,
e nós não utilizamos esses como exemplos concretos pros nossos gestores.
Franca, no interior de São Paulo, teve um prefeito arquiteto que fez a diferença
e ninguém sabe. Não temos uma bibliografia no Brasil mostrando onde um
arquiteto fez a diferença. Nós não sabemos, não damos muito valor a isso.
Trabalhou com o arquiteto Lelé nos projetos dos Hospitais Sarah e em projetos
de moradia popular, na Bahia. Com o arquiteto Milton Ramos, trabalhou no
desenvolvimento de vários projetos para a Aeronáutica, como o Aeroporto
de Confins.É autor de 185 projetos, entre eles o Terminal III do aeroporto de
Guarulhos, em São Paulo, de 1998/99; o Condomínio Residencial classificado
como primeiro colocado na Bienal de Brasília, de 1998; a Capela do Seminário
Nossa Senhora de Fátima, classificada em 2º lugar na Bienal de Brasília, de
2003; o Mercado de Sobral, classificado em 2º lugar no Concurso Nacional de
Sobral – CE; e o Hospital de Oncologia de Natal – RN.
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Francisca Ambrósio do Nascimento, Dona Chica, mente, os cargos de faxineira, fiscal de caixa e te-
nasceu em 1948 em Lajes/RN. Em 58, mudou-se soureira na Sociedade de Abastecimento de Brasília
com a família para Brasília, pois o pai muito ouvia - SAB. Posteriormente, foi presidenta da Associação
falar da cidade e, assim como vários trabalhado- de Produtores Rurais do P Sul até 2000, ano em
res, apaixonou-se pela nova capital, lugar em que que fundou a Prefeitura Comunitária do Pôr do Sol.
imaginou um destino promissor para sua família. [falando sobre a cadela]
Após morar na Segunda Avenida do Núcleo Ban- Em 2015, Dona Chica conheceu o trabalho de as-
deirante/DF, a família se mudou para o acampa- sistência técnica pública e gratuita em arquitetura Dona Chica
mento do Departamento de Água e Esgoto de Bra- e urbanismo realizado pela Codhab por meio do Não está dando de mamar mais, está com 50 dias hoje, já está desmamando.
sília (DAE). Dona Chica passou a juventude nesse Posto de Assistência Técnica, localizado na vizinha
acampamento, que ficava localizado entre o atual comunidade do Sol Nascente Trecho I. Ao perceber Manuella Coelho
Núcleo Bandeirante e o Setor de Mansões Park Way. a importância e as possibilidades do trabalho que É, ela já está bem grandinha mesmo, né? E tu vai ficar com as duas?
começava a ser desenvolvido, solicitou um Posto
Casou-se em 1969 e, em 1971, mudou-se para o para sua comunidade, no Pôr do Sol. Dona Chica
Acampamento Metropolitano, atual Vila Cauhy/ Vou, meu netinho de quatro anos não quer que eu dê de jeito nenhum, só vive
DF, quando o marido foi exercer a função de ad- Dona Chica é uma das maiores entusiastas e in- com ela no colo. Agora não está pegando porque está dormindo.
ministrador. Ainda naquele ano, mudou-se para a centivadoras da assistência técnica em engenharia,
QNL, em Taguatinga/DF, onde recebeu sua casa arquitetura e urbanismo em Brasília e luta pela con- Manuella Coelho
de um programa de habitação de interesse social solidação e ampliação do programa no DF. Estamos em um momento de pensar em finalização do trabalho que realizamos
da Sociedade de Habitação de Interesse Social, a até agora e gostaríamos de registrar o que foi feito.
antiga SHIS e atual Codhab.
Dona Chica
Em 1972, comprou uma chácara na região em que Ah, minha filha, nem fala uma coisa dessas! Porque eu fico pensando, eu
mais tarde se localizaria o P Sul (Ceilândia/DF). Em No final de 2018, Dona Chica recebeu a equipe vou ter que começar tudo de novo e eu não estou aguentando mais. Eu já
1978, quando da construção do setor P Sul, famílias da Diretoria de Assistência Técnica da CODHAB estou com 70 anos.
residentes no chamado Setor de Chácaras do P para uma entrevista sobre o trabalho desenvolvido
Sul, inclusive a de dona Chica, foram transferidas no Pôr do Sol e sobre a vivência próxima com os Manuella Coelho
para a região onde hoje se localiza a comunidade arquitetos e urbanistas da companhia. É muito difícil mesmo, mas é no sentido também de registrar para dar
do Pôr do Sol. continuidade de alguma maneira, entendeu? Obrigada outra vez por receber
a gente aqui.
Foi servidora pública até 1989, exercendo, gradual-
Dona Chica
Estou aqui para isso mesmo, eu é que tenho que agradecer. É uma parceria Eu estou com meu coração partido por causa do O Pôr do Sol está perto de ser regularizado, eu
e foi outra vida que eu conheci, porque, imagina, a gente nunca teve essas meu Fred 1, porque ele me ajudou a me politizar. acredito nisso. Começam as nossas obras, e eu
coisas aqui. Nunca. Cheguei aqui em 58, com oito anos, esse tempo todo Me politizar na maneira de ser, sabe? Para tratar as já pedi para o governador que faça um documen-
acompanhando as coisas do governo. Naquele tempo, só tinha o prefeito, situações com mais leveza, porque eu não respeita- to, uma lei, para que, se ele sair, nunca acabe a
não era governador. Não tinha deputado distrital, mas a gente tinha que correr va. Quando eu ia pedir uma coisa num determinado função de vocês dentro da Codhab. Por exemplo,
atrás das coisas, e eu aprendi a correr e a brigar pelo que eu devo e tenho órgão do governo, eu não ia pedir, eu ia exigir, e para que o Sol Nascente, o Pôr do Sol, que eu co-
vontade de ter. E com vocês foi a realização dos meus sonhos, porque aqui hoje não. Hoje eu conquisto pra depois pedir e não nheço a fundo, nunca fiquem sem um escritório
no Pôr do Sol a gente sofreu demais e sofre até hoje. No começo, a gente recebo um “não”, eu nunca mais recebi um “não” de assistência técnica, porque sempre vai ter um
não dormia, não tinha casa e passava o dia todinho brigando com a equipe na minha cara. Sempre tem uma maneira da gente problema. Como é uma área pública, sempre vai
do governo para não derrubar nossas casas. Mas era luta, não era agraciado resolver o problema, e resolvemos. E eu devo muito ter alguém tentando invadir e o escritório da Co-
com nada, era só com luta mesmo [emociona-se]. isso ao Fred. Mas, como diz a história, as pessoas dhab, inibe, não deixa, entendeu? E eu peço a ele,
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têm que voar, procurar as coisas melhores, né, e já pedi pessoalmente, e peço de novo e agradeço
Conseguimos reverter a situação e o Pôr do Sol está aí, em pé, depois de ele está bem, graças a Deus. a todos vocês pelo carinho, pela dedicação, pelo
muita briga, muita luta, conseguimos. Falta de governos anteriores ter feito trabalho lindo que vocês fazem, sem distinção de
o que esse fez agora, porque se eles tivessem feito assistência técnica da cor, raça, sexo. Eu aprendi a viver isso e agradeço
Codhab em 2000, não tinha esse monte de casa construída e esse tanto de demais, e eu espero que vocês continuem, para
áreas ocupadas. Todo mundo teria sua casa, mas legalmente, sem precisar fazer do Pôr do Sol, do Sol Nascente, o que vocês
invadir, comprar de grileiros. Porque vocês trouxeram isso: dignidade. E eu imaginam e eu também. Eu imagino meu Pôr do
sou muito grata, muito mesmo. Antigamente, o arquiteto era praticamente Sol lindo e peço a Deus que vocês continuem fa-
um deus, você não chegava perto do arquiteto, só os ricos que chegavam, zendo esse trabalho. Quando eu não estiver mais
e eu tinha uma imagem muito diferente de vocês. Para mim, era um campo aqui, eu pelo menos deixei alguma coisa, algum
que eu nunca ia chegar perto, mas Deus faz as coisas certas e ele colocou legado. Obrigada.
vocês nas nossas vidas, e eu agradeço muito.
Aquele trabalho que foi feito lá embaixo com os
muros, que já está tudo sujo por causa da chuva,
mas deu dignidade a muita gente, muitas pessoas.
“Dona Chica, que coisa linda, nós nunca tivemos
isso aqui.” A gente tinha um buraco, com lama até
a canela. Hoje não, a gente já tem um asfaltozinho
para pisar. A gente já tem nossa energia regulari-
zada, nossa água regularizada, nosso lixo não está
mais jogado no meio da rua. Quem nos ensinou a
correr atrás disso? A Codhab, com o programa de
vocês. Quando a gente subia aqui no meu corredor,
só o que tinha era saquinho de lixo. Acabou.
Evolução da ocupação do Pôr do Sol - Ceilândia/DF, 1995 Evolução da ocupação do Pôr do Sol - Ceilândia/DF, 1997
Fonte: Geoportal - SEGETH/DF Fonte: Geoportal - SEGETH/DF
Evolução da ocupação do Pôr do Sol - Ceilândia/DF, 2009 Evolução da ocupação do Pôr do Sol - Ceilândia/DF, 2015
Fonte: Geoportal - SEGETH/DF Fonte: Geoportal - SEGETH/DF
Ariel Aleixo
Como líder comunitária, a senhora acha que os moradores têm feito algo
para preservar essas coisas que foram feitas?
Dona Chica
Têm, têm. Não são todos, porque sempre tem uns que é contra, mas a maior
parte tem um respeito muito grande pelo trabalho de vocês, muito grande
mesmo, e diz que a melhor coisa que aconteceu foi o Posto da Codhab aqui
dentro.
Manuella Coelho
A mobilização depois do Posto foi diferente, você acha?
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Dona Chica
Muito diferente, o nível é outro. Antigamente, nós brigávamos de pau, de bom-
ba, sabe? Mas hoje em dia não, a gente conversa. Tem uns que não aceitam,
porque estão procurando o interesse deles lá, e cada um tem seu interesse.
Não vou entrar nesse mérito, mas as pessoas que têm cabeça elogiam, é
uma coisa que ninguém nunca teve, então é uma novidade que nos traz be-
nefício, entendeu? Eu acho que não tem por que não aceitar de bom grado.
Pelo menos onde eu converso, as pessoas vêm e me falam e elogiam muito.
E estamos aí, minha filha, vamos ver o que Deus traz pra nós no futuro, né?
Eu tenho fé em Deus que o Posto da Codhab não sai mais de dentro do Pôr
do Sol. Eu acredito e, se depender de mim pra lutar, eu estou aqui.
Manuella Coelho
Eu acho que a importância da proximidade com a comunidade é muito essa,
desse entendimento das coisas e de exigir que esse processo continue. Para
a próxima gestão, se houver uma ruptura, que a força da comunidade também
seja positiva nesse sentido, de pedir para continuar.
Dona Chica
Com certeza, e a gente está aí para lutar mesmo, a gente faz o que puder
fazer para continuar. E agora vai receber aquele contêiner, né? Vai botar o
escritório no contêiner, vai ficar mais perto. Quero que o Gilson1 continue onde
ele está, porque é um ser humano muito bom, muito sensível, uma pessoa
fabulosa que eu aprendi a gostar e a respeitar.
Visita da Equipe de Assistência Técnica à casa de dona Chica, 2017 Visita ao Novo Posto Avançado da Codhab no Pôr do Sol - Ceilândia/DF, 2018
Fonte: Acervo Equipe de Assistência Técnica CODHAB Fonte: Acervo Equipe de Assistência Técnica CODHAB
Caio Fiuza
A Manu (Manuella Coelho) estava comentando que você foi uma figura importante para a própria
instalação do Posto aqui, e acho que seria legal você comentar um pouco.
Dona Chica
Foi assim por acaso. Eu sempre vou à feira do produtor comprar verdura, aí, eu der fazer a medição. Aí eles vieram: “Dona Chica, a senhora pode vir aqui?”.
passando aqui por dentro, eu vi escrito lá “Assistência Técnica da Codhab”. Lá Fui. Cheguei lá, o homem disse que ninguém entrava e não sei o quê, aí eu
dentro tinha uma moça e um rapaz, aí eu perguntei “o que é que é isso aqui”? conversei com ele. Disse: “Seu Raimundo, aqui é do governo, o governo vai
E eles me explicaram que era um Posto de Assistência Técnica para poder tomar conta dessa área. O senhor já se beneficiou esses anos todos com isso
ajudar na regularização do setor. Aí eu falei “como é que eu faço pra levar um aqui, mas agora vai ser moradia e eles têm uma autorização do governo pra
pra mim?”, aí ela respondeu “a senhora é quem?”, eu falei “sou a Dona Chica, fazer isso”. Aí o rapaz me mostrou a autorização e eu fiquei com o coração
prefeita do Pôr do Sol”, e ela disse “sente-se aqui, que eu vou ensinar como deste tamanhozinho, porque ele ficou muito triste, ele já é um senhorzinho de
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é que a senhora faz”. Aí eu sentei e ela me ensinou a fazer o ofício pedindo idade. “Mas eu pensei que o governo ia me dar isso aqui porque eu cuidei”, e
o Posto para cá. Eu fiz. Nem fui para feira mais, voltei para casa, fiz o ofício, eu falei “não tem como, meu filho, aqui vai passar uma pista” e ele entendeu.
fui lá na Codhab, protocolei e, três dias depois, o Gilson estava aqui no meu Aí os meninos mediram lá tudo e saímos e fomos embora.
sofá. Aí perguntou se eu queria mesmo e eu disse “quero”, aí ele disse “então
vamos procurar o local para colocar”.
Aí explicou como que o escritório da Codhab teria que ser mantido pela comu-
nidade, e eu tinha uma salinha. A sala que a Codhab usava era da prefeitura,
onde eu atendia o pessoal. Eu pagava o aluguel de lá, pagava não, né, pago
até hoje. Aí eu falei “vou botar a prefeitura pra dentro da minha casa e vou
botar a Codhab lá”, e está aí. Graças a Deus não demorou 15 dias e estava
todo mundo aí. Pra mim, foi o melhor presente que eu já ganhei. E assumo
o aluguel – o aluguel, a água e a luz da Codhab quem paga sou eu. Agora
eu vou ficar sem pagar, porque vai ganhar o contêiner, aí eu vou pra lá com
a prefeitura.
Enquanto eu sou prefeita, vamos trabalhar pelo meu Pôr do Sol, viu? Não foi
fácil [risos]. A vida ensina à gente que querer é poder, e é mesmo. Tudo que
você sonha você pode ter, é só lutar, é só lutar por isso. Eu tenho experiência
de vida aqui dentro da minha casa, e eu não pude dar estudo para eles, fizeram
só o básico mesmo. Em 2000, Deus me abençoou e eu paguei a faculdade
de todos os três. Hoje eu tenho um economista, uma professora de geografia
e uma repórter. Formados, Graças a Deus. E todos eles têm seu lugarzinho
de morar, não pagam aluguel, moram no que é deles, e eu me sinto uma
pessoa abençoada. Com 70 anos, fiz dia 15 de fevereiro, e estou aqui na luta.
Ontem mesmo eu fui lá naquela área que vai ser o lançamento do concurso1,
eu fui lá porque um daqueles moradores de cima, que cercou, que plantou
um pezinho de manga, de abacate, não queria deixar o rapaz entrar pra po-
Dona Chica
O programa do muro é excelente. Era pintura de muro, mas não foi pintura
de muro, foi fazer um muro. Ninguém tinha seu muro. Tinha o tijolo puro e a
Codhab fez tudo, rebocou de cima em baixo e pintou de cima em baixo. Então,
isso é gratificante, é dignidade que você está dando para as pessoas, porque
lá tem algumas pessoas, na 501, que é quase igual à 94, pobres. Não tinha
condições de fazer o reboco, e a Codhab fez com a ajuda da comunidade,
mas muito pouco. Eu fiquei com vergonha, fiquei com vergonha porque eles
não ajudam, muitos não ajudaram. As casas sendo rebocadas e os donos de
braços cruzados. Cheguei a conversar com eles, e eles: “olha, Dona Chica, é
o costume também, né, nós nunca tivemos isso” e “olha, Dona Chica, isso é
obrigação do governo”. Eu disse “rebocar sua casa, meu irmão? A casa é sua,
você que tem que rebocar”, e eles “mas a gente pensou que era o governo
querendo agradar a gente”, e eu disse “eles estão agradando mesmo, mas
se você ajudar acaba mais depressa”. Muitos foram ajudar.
Eles começaram a praça lá embaixo, né? A praça do mirante, e não deu pra
fazer, porque, quando estava nos finalmentes, o IBAMA [Instituto Brasileiro
do Meio Ambiente e dos Recursos Naturais Renováveis] disse que não podia
pavimentar o chão. Era uma praça com parquinho de criança, aquelas coisas
todas, lindo. Esses meninos carregavam meio-fio, as meninas, o Fred com
aquela gordura toda, o sol de rachar mamona. Carregavam meio-fio, e os
donos das casas tudo na janela, olhando. Agora eu lhe pergunto: é porque
são ruins, preguiçosos? Não. É porque nunca tivemos isso, ninguém nunca
tirou nem um papel do chão a não ser os lixeiros, entendeu? Aí a gente vai
conversar com eles e eles dizem: “mas, dona Chica, a gente achou que era
Mutirões para a construção da Praça do Mirante, parte do programa
obrigação deles”. Falei “não, gente, estão fazendo para vocês, para nós”. Aí
Ações Urbanas Comunitárias da Codhab, Pôr do Sol - Ceilândia/DF, 2017
Fonte: Acervo Equipe de Assistência Técnica CODHAB no final até as crianças começaram a ajudar.
Foram ajudar. Aí a praça não pôde sair, porque o IBAMA disse que não podia.
Lá nesse local tinha nove casas com moradores. Em 2008, a erosão abriu
as casas, abriu mesmo, literalmente, dividiu sala e cozinha com aquele
buracão. O governador da época deu casa para essas pessoas na 929 da
Samambaia, e esse chão, essa terra, ficou lá. O governo mandou caminhões
de terra e fechou lá o buraco, mas condenou, ninguém podia fazer nada ali.
Pelo estudo da Saint Germain, dava para fazer qualquer coisa ali, uma horta
comunitária, uma praça, um troço que não usasse muito cimento, aí nós
pensamos nessa praça. Aí depois o IBAMA não deixou, e nós ficamos todo
mundo assim, tristes, porque ficamos sem a praça. Já estava quase tudo
pronto, até as plantinhas a gente já tinha plantado, não era? As plantinhas,
as florzinhas, os arbustos foram plantados, agora só tem mato lá, mas pelo
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menos ainda está cercada.
Manuella Coelho
Hoje o pessoal voltou a jogar lixo lá?
Dona Chica
Não, o mato está deste tamanho e eu não estou limpando exatamente por
Mutirões do programa Ações Urbanas Comunitárias da Codhab, Pôr do Sol - Ceilândia/DF, 2017
isso, porque, se eu limpar, eles vão jogar lixo. Aí eles vieram aqui: “dona Chica, Fonte: Acervo Equipe de Assistência Técnica CODHAB
tem que aparar aquele mato”. Aí eu aparei para o pessoal, mas arrancar do
jeito que a gente arrancava não, que eles vão jogar lixo de novo. E está cercado
ainda, o arame ainda está lá, e é bom que arame inibe alguém de invadir, né?
Porque, do jeito que lá está bonito, pra chegar um e fazer uma casa lá é fácil.
Manuella Coelho
Ariel Aleixo E o pessoal usa mesmo o Papa Lixo? Porque lá na Avenida das Palmeiras
E os moradores continuam a jogar o lixo no chão? eu lembro que colocou, mas ainda teve muita resistência.
Manuella Coelho
Vocês têm reuniões fixas? Como é que funciona?
Dona Chica
Periodicamente. Nós temos uma vez por mês, mas fui no Correios e falei “minha filha, eu sou do Pôr
não com a comunidade, com a liderança, porque aí do Sol”. “O que é Pôr do Sol?”. “Pôr do Sol é uma
tudo que a gente faz durante o mês a gente passa invasão”. “Quantos moradores tem lá?”. Na época,
pra liderança, e a liderança passa para sua quadra. tinha uns 1.500, mais ou menos. Ela falou assim: “a
Em cada quadra nós temos um líder. Aí esse líder senhora vai fazer um mapa, um memorial descritivo Manuella Coelho
vai para reunião da prefeitura junto com a diretoria, e trazer aqui para mim”. E eu falei “sim, senhora”. Aí Dona Chica, a senhora tinha que ter alguém para escrever um livro dessas
a gente passa tudo que foi feito e eles passam para fiquei dois anos. Ela mandou uma caixa de correio, histórias, de registro da cidade, de como aconteceu tudo, com as pessoas
comunidade deles. É organizado. Eu fiz o Pôr do um armário. Meu portão não era fechado ainda, que ajudaram. É tão legal, tão importante fazer...
Sol, meu filho, então tem que ser [risos]. então eu botava na entrada o armário e colocava
as cartas lá dentro, e o pessoal vinha pegar. Mas, Caio Fiuza
Eu fiquei de 2000 até 2005 pegando caixas deste nossa, eu não tinha sossego, o pessoal vinha pegar Fazer um filme também.
tamanho assim no correio, aí um dia eu amanheci era domingo, era feriado, era de noite, era de dia,
com a pá virada e eu disse: “não vou pegar de vinha um monte de gente procurando carta. Dona Chica
ninguém mais não, eu vou botar correio aqui”. Aí Minha filha pode fazer, a repórter, né?
8
a construção do
1 A CONSTRUÇÃO DO ARCABOUÇO LEGAL arcabouço legal e
as perspectivas
E AS PERSPECTIVAS PARA O FUTURO
2 PROGRAMA DE ASSISTÊNCIA TÉCNICA AO PROJETO E
CONSTRUÇÃO DE MORADIA ECONÔMICA - ATME (1999)
para o futuro
3 PROGRAMA DE ASSISTÊNCIA TÉCNICA À
MORADIA ECONÔMICA - ATME (2002)
4 LEI NACIONAL DE ASSISTÊNCIA TÉCNICA PÚBLICA
E GRATUITA EM ARQUITETURA E URBANISMO (2008)
A CONSTRUÇÃO DO ARCABOUÇO LEGAL
E AS PERSPECTIVAS PARA O FUTURO
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A história de luta dos arquitetos e urbanistas brasileiros por cidades mais jus- Com a retomada da democracia e com a formulação da Constituinte, as dis-
tas possui um percurso extenso. Desde os debates sobre a Reforma Urbana, cussões sobre as cidades brasileiras foram retomadas e incluídas no Título VII
no Hotel Quitandinha, organizados pelo Instituto de Arquitetos do Brasil em o Capítulo II da Política Urbana. Durante os anos 1990, o poder federal estava
1964, até a aprovação da Lei de Assistência Técnica em 2008, foram quase 50 mais voltado a estabilizar a macroeconomia, esquecendo-se dos espaços
anos de lutas por leis que dessem respaldo a práticas que visam a fomentar urbanos que continuavam cada vez mais problemáticos e que poderiam se
o direito à cidade e à moradia. Esses debates atravessaram diferentes fases configurar como plataformas de soluções econômicas importantes. Por-
da história política brasileira, tendo sofrido retrocesso principalmente durante tanto, coube aos movimentos sociais, entidades de classe e instituições de
o período da Ditadura Militar. Entretanto, de geração em geração, conseguiu ensino possibilitar as práticas voltadas à promoção do direito à cidade em
evoluir de maneira a galgar para o Brasil posição de destaque e de referência escala municipal, com a participação mais próxima da comunidade, e sem
internacional quanto ao aspecto de vanguarda da legislação urbanística. E grandes investimentos. Foi nesse período também que os Planos Diretores
mesmo sendo tímidas as ações de implementação da Lei frente ao enorme municipais, de alguma forma, tentaram criar meios para aplicar a Função
deficit habitacional qualitativo brasileiro, nós, arquitetos e urbanistas, temos Social da Propriedade, conceito definido já na Constituição.
de agir para colocá-la em prática da melhor forma possível.
A moradia no Brasil passou a ser um direito social básico do cidadão brasileiro
O entendimento da função social da propriedade urbana foi reforçado pelos em 2000, por meio de uma Emenda Constitucional ao Artigo 6º. Somente em
debates da Reforma Agrária e Reforma Urbana. Assim como os enormes 2001 o Capítulo da Política Urbana da Constituição foi regulamentado pela Lei
latifúndios improdutivos, que não permitem que as pessoas mais pobres Federal nº 10.257/2001, conhecida como Estatuto da Cidade, que levou para
tenham acesso à terra e nela possam produzir, nas cidades também há o âmbito nacional os debates e práticas de instrumentos de regulação das
grandes terrenos vazios ou subutilizados que poderiam servir para a mora- cidades brasileiras, como forma de dar suporte metodológico para a gestão
dia, enquanto muitos não têm onde morar. Nesse início da década de 1960, dos municípios. Poucos anos depois, em 2003, houve outro momento de
muito se avançou no entendimento do conceito e da necessidade de coibir grande esperança para os estudiosos e ativistas pelas cidades brasileiras, que
os abusos dos grandes proprietários de imóveis. Essas ricas e amplas dis- já abrigavam mais de 80% da população segundo o IBGE (2010): foi criado o
cussões sobre a Reforma Urbana foram interrompidos pela Ditadura Militar Ministério das Cidades que tinha como objetivo dar suporte aos municípios
que, durante 20 anos, silenciou quaisquer perspectivas de inclusão social, ao na gestão de seus territórios de maneira a colocar em prática o Estatuto,
mesmo tempo em que as cidades cresciam vertiginosamente, e os problemas voltando principalmente à práxis do direito à cidade e à moradia. Entretanto,
levantados nos debates se agravavam assustadoramente, o que ocorreu até já em 2005, o Ministério foi barganhado em negociações partidárias, e suas
o fim dos anos 1980. funções foram perdendo as forças até sua total extinção em 2019.
A Lei Federal nº 11.888/08 assegura o direito à assistência técnica pública Além disso, é uma forma de contrapor nossa O que gera uma sensação de passividade por parte
e gratuita para pessoas de baixa renda. A legislação “abrange todos os formação profissional excessivamente elitista e dos oprimidos e a total alienação da realidade
trabalhos de projeto, acompanhamento e execução da obra a cargo dos distanciada da realidade dos territórios, que tem socioeconômica do nosso país por parte dos opres-
profissionais das áreas de arquitetura, urbanismo e engenharia necessários se imposto inclusive nas instituições de ensino sores, estes, inclusive, não raramente se sentem
para a edificação, reforma, ampliação ou regularização fundiária da habita- que estão localizadas na periferia. Citemos Paulo muito incomodados quando vivenciam espaços
ção”. No entanto, apenas dez anos após sua aprovação, surgiram iniciativas Freire: “Quando a educação não é libertadora, o urbanos de outras capitais brasileiras.
experimentais de maior escala. Ela é fundamental para reforçar as lutas pelo sonho do oprimido é se tornar opressor”. Os estu-
direito à cidade e à moradia digna que têm sido travadas em nosso País, e dantes precisam se reconhecer como catalisadores Os espaços das periferias de Brasília também
precisa ser abraçada pelos arquitetos-urbanistas para que se desenvolvam da transformação em suas localidades, uma vez são um reflexo da lógica automobilística e se-
novas experiências para atualizar a prática à luz dos novos desafios e da que podem unir seu conhecimento técnico aos gregacionista, em que mesmo com muitos dos
realidade atual da sociedade e de suas cidades, desenvolvendo projetos em seus saberes de vivência da realidade onde estão moradores utilizando-se de transporte público,
comunidades com participação popular e processos democráticos. A imersão inseridos. bicicletas ou fazendo seus trajetos à pé, não há
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de arquitetos e urbanistas na cidade, por exemplo, cria uma sem-dimensão questionamento quanto a falta de espaço para esse
de possibilidades em busca de espaços urbanos menos injustos. O território de Brasília, nesse aspecto de conexão tipo de mobilidade mais inclusiva e ecológica. A
com a realidade, é peculiar pois possui um es- morfologia das periferias é uma continuação da
Ao reconectar os profissionais, estudantes e pesquisadores aos problemas e praiamento e uma segregação socioespacial com lógica rodoviarista do Plano Piloto, e que foi pio-
potencialidades de seus territórios, a implementação da Lei Federal nº 11.888 distâncias e vazios urbanos mais extensos que o rada nas Regiões Administrativas projetadas pelo
pode ter um enorme impacto positivo no campo da arquitetura e do urbanismo. que se costuma observar nas demais metrópoles governo local. Nos assentamentos informais de
brasileiras. Isso dificulta não só a locomoção por Brasília, é comum existir barracos cuja estrutura
parte das populações de periferia, como também o é extremamente precária, mas dentro do mínimo
próprio encontro das diferenças. Se para Lefebvre, lote a família guarda seu principal bem: o carro.
em seu clássico O Direito à Cidade, de 1968, “A
vida urbana pressupõe encontros, confrontos das Se a questão das grandes distâncias e da preca-
diferenças, conhecimentos e reconhecimentos recí- riedade da infraestrutura urbana para a mobilidade
procos (inclusive no confronto ideológico e político) ativa ou por meio de transporte público foram os
dos modos de viver, dos ‘padrões’ de coexistência primeiros desafios encontrados para a implemen-
na Cidade”, o território de Brasília apresenta-se tação do programa de assistência técnica no DF,
como um dificultador desse entendimento de vida muitos outros se seguiram. Desde a dificuldade de
urbana, onde é mais complicado o confrontamento o governo adquirir, alugar ou construir um escritório
dessas classes, ‘padrões’ e modos de viver. em locais ainda não regularizados, a ausência de
internet, rede de abastecimento de água, esgoto e energia regulares, passando política continue, possibilitado que mais pessoas tenham acesso a espaços
pela desconfiança inicial dos moradores com esses novos e inesperados de vida mais justos e qualificados no DF. Temos a obrigação de, juntos aos
agentes atuando em suas comunidades, a questão da (in)segurança públi- moradores dessas áreas de baixa renda, continuar lutando para que não haja
ca e do enfrentamento aos estigmas relacionados à periferia da metrópole retrocesso e sim avanço nas políticas implementadas.
brasiliense e chegando a desafios mais técnicos, como a dificuldade de aten-
dimento das diversas demandas por uma equipe de profissionais bastante Sabemos que há uma tradição bastante arcaica no Brasil de desfazer o que
enxuta e a ausência de previsão orçamentária. Houve ainda a necessidade foi feito por gestões anteriores, em uma atitude personalista e patrimonialista
de se desenvolver novas metodologias e rotinas processuais para atender de gestão pública. Temos que resistir a essa prática para que a Assistência
essas localidades, além de sensibilizar e os colegas da “repartição” e dos Técnica se torne uma política de Estado, não de governo, passageira.
demais órgãos do governo, que nunca haviam lidado com esses desafios,
sobre a importância da atuação imersa no território e em contato direto com Tivemos o privilégio de implementar a lei de 2008 em nossa Unidade da
as populações afetadas pela política de habitação do DF. Federação e, cientes de oportunidade tão única, desde o início tivemos
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consciência da responsabilidade das nossas ações. Esse empenho de cada
Quatro anos é pouco tempo para se consolidar uma política dessa enverga- um e cada uma que participou dessa empreitada, permitiu que erigíssemos
dura com atividade em tantos pontos simultâneos do território. Se o foco do metodologias que possam ser usufruídas, copiadas, sampleadas e ampliadas
primeiro ano foi organizar a Companhia para que as ideias da nova gestão em várias cidades e governos do país.
tivessem solo fértil para florescer, apenas os dois anos seguintes foram de
produção plena, já que no quarto e último houve o período eleitoral com A Assistência Técnica, depois de décadas de lutas pelo reconhecimento de
todos os problemas e amarras jurídico-burocráticas-financeiras impostas à sua importância na garantia de direitos e sua capacidade de transformação
administração pública. social e espacial, hoje se configura como uma prática de política pública
que resulta em um serviço social de difícil retrocesso. Como sintetizou com
Um dos principais acertos do programa foi a implementação dos Postos de bastante felicidade nossas colegas de Santa Catarina: a assistência técnica
Assistência Técnica e essa escolha de colocar os servidores da Companhia pública e gratuita em arquitetura e urbanismo é um direito e muitas possibili-
em contato direto com as localidades e seus moradores. A experiência foi dades. Várias são as iniciativas que surgiram, principalmente fruto de ações
bastante exitosa e gerou resultados como maior celeridade na execução das individuais de arquitetos, urbanistas e engenheiros, de modelos de negócio e
obras de urbanização vinculadas à regularização fundiária; pronta identifi- empresas de ATHIS desde 2014. Naturalmente que o Conselho de Arquitetura
cação de erros de procedimentos e de projetos ainda em etapas iniciais; e o e Urbanismo teve papel fundamental nesse processo, ao publicizar e, por
envolvimento ativo dos moradores no processo. Este ponto, aliás, poderia ter isso, conectar essas iniciativas.
sido melhor explorado pela gestão: com maior contato entre a Companhia e
as comunidades, seus territórios, problemas e potencialidades. Além disso, Com um deficit habitacional qualitativo na casa de dezena de milhões, com
o desenvolvimento dos projetos urbanísticos de regularização poderiam ter enorme parte da população vivendo em favelas, um país como o Brasil
sido transferidos totalmente para os postos, desenvolvendo-se uma estrutura tem apenas um caminho para lidar com esses territórios que é consolidar
potente de pensar, planejar e fazer regularização e (re)urbanização in loco, e qualificá-los, já que, felizmente, por razões sociais, históricas, simbólicas,
contaminados pelo território, com o povo, para o povo. urbanísticas, geográficas, lógicas e humanas; a remoção dessas comuni-
dades não deve ser uma possibilidade. Para isso, a Assistência Técnica e
No entanto, é difícil vislumbrar a curto prazo um novo momento político a proximidade dos técnicos com as comunidades são o caminho natural.
propício, como foi esse dos últimos quatro anos, em que nos foi permitido
botar em prática, com liberdade, essas ideias de arquitetura e urbanismo Nesses quatro anos, a equipe que esteve à frente do programa de Assistência
social. Porém, o fato de já haver resultados concretos, equipes treinadas, Técnica da CODHAB teve a oportunidade de contribuir um pouco para o de-
metodologias desenvolvidas e estrutura de trabalho instalada, possibilita senvolvimento da função social da arquitetura e do urbanismo nesse período
que o trabalho seja facilmente continuado se houver interesse dos novos após a sanção da Lei Federal nº 11.888, somando esforços a outras iniciativas
gestores. Enquanto sociedade civil, temos que pressionar para que essa públicas ou privadas na atualização, experimentação, análise e formulação
de políticas voltadas ao habitar de interesse social. urbanistas e agentes públicos do Estado, temos A cidade é uma construção coletiva, tanto na sua materialidade quanto no
Os editais de licitação de melhorias habitacionais, de estar próximos de nossos clientes, de nosso seu capital simbólico, fruto do trabalho de todos os seus habitantes, que
que inexistiam em 2015, com as especificações público-alvo, daquelas e daqueles que precisam de tornaram aquele espaço um lugar com vida urbana. Esse valor não deve
de como contratar projetos, orçamentos, obras, nossos serviços. Almejamos que um dia o trabalho ser capitalizado e auferido por poucos, pois o prejuízo é compartilhado por
fiscalização e serviços de assistente social para dos arquitetos e urbanistas esteja à disposição da todos. A função social da cidade deve ser uma luta permanente para além
melhorias habitacionais de pessoas de baixa renda, comunidade assim como o serviço de médicos e do que foi alcançado pelos movimentos sociais por meio da legislação, com
já representa um avanço. O desenvolvimento de enfermeiros estão nas proximidades, de forma práticas continuadas, principalmente, aquelas voltadas ao trabalho comu-
metodologias de inicialização de um programa gratuita. Médicos, assistentes sociais, professores, nitário, para as obras de urbanização e regularização fundiária em assenta-
de ATUAIS em uma comunidade, assim como defensores públicos, engenheiros, estão nesses es- mentos informais, e melhorias habitacionais para moradias em condições
ferramentas para a permanente mobilização dos paços há anos e a nossa presença ainda é bastante precárias que gerem riscos aos seus moradores. Assim como durante a
agentes envolvidos, principalmente os moradores tímida. Nós podemos fazer a diferença nos terri- ditadura o sentimento de justiça social resistiu, hoje precisamos enfrentar o
atendidos, como o projeto Ações Urbanas Co- tórios periféricos de nossas cidades, contribuindo autoritarismo, o fundamentalismo e a desinformação para permanecer com
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munitárias apresenta uma forma possível de se com temas que só nossa formação generalista é nossos direitos, porque eles não são favores ou benevolências do Estado,
iniciar um trabalho para promover regularização capaz de considerar. são formas de amortecer as desigualdades existentes e garantir o mínimo
fundiária e a melhoria dos espaços de vida de de justiça social e espacial.
seus habitantes. É urgente criarmos uma rede nacional de profis-
sionais que atuam em (prol) Assistência Técnica Cabe a nós, como cidadãos, como arquitetos e urbanistas, trabalharmos
A escolha de gestão de colocar os planejadores em Urbanismo e Arquitetura de Interesse Social, de para que nossa legislação não retroaja, particularmente porque ela enfrenta
mergulhados em seu objeto de planejamento e forma a pressionar governos para que esse direito o principal problema das cidades brasileira que é a disputa pela terra urba-
em diálogo com as pessoas afetadas por suas conquistado avance e se consolide enquanto um nizada. Em momentos de autoritarismo e sucessivas tentativas de retroagir
escolhas, talvez seja o mais simples mas o mais serviço de Estado, público, gratuito e de qualidade quanto às legislações progressistas de nosso país, devemos reagir. Urge a
eficaz exemplo desse trabalho que deve ser se- para as populações de baixa renda, assim como é formação de uma rede de pessoas que lutam e trabalham pela Assistência
guido. Como nos ensinou João Filgueiras Lima, preciso intensificar e reconhecer essa prática de Técnica para fortalecer as iniciativas e, principalmente, possibilitar a troca
Milton Ramos e Lina Bo Bardi, é no canteiro onde arquitetura e urbanismo social como uma forma de de experiências e informações relativas a essa prática urgente e emergente.
as coisas acontecem: os problemas mais desa- planejamento urbano e regional focado na imersão
fiadores a serem enfrentados, as questões mais no território e na proximidade com a população,
urgentes e que demandam soluções rápidas e que deve ter participação ativa e facilitada nos
as inovações acontecem. Enquanto arquitetos e processos sobre seu território.
Referências
690 O PRESIDENTE DA CÂMARA MUNICIPAL DE PORTO ALEGRE O Congresso Nacional decreta: DOS BENEFICIÁRIOS 691
Faço saber, no uso das atribuições que me obriga o parágrafo
7º, do art. 77, da Lei Orgânica, que a Câmara Municipal manteve Art. 1° Art. 4°
eu promulgo a seguinte Lei Complementar: Fica instituído o Programa de Assistência Técnica à Moradia Entende-se como beneficiário para qualificação de cada moradia
Econômica - ATME que dispõe sobre assistência técnica gratuita do Programa ATME, toda a família ou grupo, com até três pessoas,
Art. 1º Art. 6º ao projeto e construção de moradias a pessoas de baixa renda, com renda total mensal total até cinco salários mínimos, ou com
Fica instituído o Programa de Assistência Técnica ao Projeto e Para qualificação ao Programa, entende-se como beneficiário toda nos termos como a seguir se dispõe. mais de três pessoas com renda per capita mensal não superior
Construção de Moradia Econômica (ATME) a pessoas de baixa a família, com até três pessoas, com renda familiar mensal até a um e meio salário mínimo.
renda, nos termos do art. 233 da lei Orgânica do Município de cinco salários mínimos, ou família com mais de três pessoas com Parágrafo único. A assistência técnica será oferecida de forma
Porto Alefre. uma renda “per capita” mensal não superior a 1,5 salário mínimo. gratuita individualmente ou em grupos organizados, tais como Art. 5°
Art. 7º mutirões e cooperativas. O beneficiário final do Programa ATME deverá ser proprietário,
Parágrafo único. A assistência técnica será oferecida indivi- O Programa atenderá às solicitações para fins residenciais. promitente comprador ou cessionário de direito de uso, na forma
dualmente ou em grupos organizados, tais como mutirões e Art. 2° da Lei, relativamente ao terreno sobre o qual pretenda construir.
cooperativas. Art. 8º O Programa de Assistência Técnica à Moradia Econômica –
O gerenciamento do Programa terá a participação de entidades ATME tem por objetivo: Parágrafo único. As cooperativas habitacionais podem usufruir
Art 2º comunitárias e entidades profissionais da área tecnológica. do Programa – ATME devendo atender, por seus cooperativados,
O Programa de Assistência ao Projeto e Construção de Moradia I - possibilitar assessoria técnica na área da moradia a pessoas à condição socioeconômica prevista no art. 4° desta Lei.
Econômica tem por objetivo: Art. 9º ou grupos organizados, carentes de recursos financeiros;
Os beneficiários do Programa poderão receber isenções de DOS DIREITOS DOS BENEFICIÁRIOS
I - possibilitar assessoria técnica na área de moradia a pessoas taxas administrativas municipais relativas à regularização ou II - otimizar e qualificar o uso e aproveitamento racional do espaço
ou grupos organizados, carentes de recursos financeiros. aprovação de sua moradia. edificado e seu entorno, dos recursos humanos, técnico-cons- Art. 6°
trutivos e econômicos necessários à moradia e à qualidade de O Programa atenderá às solicitações para fins residenciais.
II - otimizar o aproveitamento racional do espaço, de recursos Art. 10 vida dos beneficiários;
humanos e de materiais construtivos necessários à moradia. Esta Lei Complementar entra em vigor na data de sua publicação. § 1° Cada beneficiário terá direito a apenas um atendimento do
III - garantir a formalização legal do processo construtivo junto Programa – ATME.
Art. 3º Art. 11 às Prefeituras Municipais e outros orgãos do poder público;
O Município poderá celebrar convênios com cooperativas pro- Revogam-se as disposições em contrário. § 2° Os beneficiários serão atendidos por demanda e na ordem
fissionais e sindicatos das categorias profissionais habilitadas IV - assegurar e prevenir a não ocupação de áreas de risco e de cronológica de
legalmente para prestar assistência técnica a projetos e cons- interesse ou proteção ambiental; inscrição solicitada e aprovada pelas Prefeituras Municipais.
truções, visando à credenciação dos técnicos.
V - propiciar e qualificar a ocupação do sítio urbano em conso- § 3° Será permitida a existência de atividade econômica, aliada
Art. 4º nância com a Legislação Urbana Ambiental - PLANOS Diretores, à residência, sempre que a atividade seja explorada pelo próprio
O Município poderá celebrar convênios com organismos não Código de Obras ou assemelhados, assim como diminuir a inci- beneficiário, permitida pela legislação municipal, e na proporção
governamentais, entidades profissionais, bem como com os dência de obras irregulares. máxima de área construída, de até cinquenta por cento relativa
governos Estadual e Federal para fins de viabilizar isenções e à área da residência.
recursos financeiros ao Programa. DOS AGENTES PROMOTORES
DOS AGENTES GESTORES
Art. 5º Art. 3°
O beneficiário final do Programa deverá ser proprietário, promi- Os agentes promotores do programa ATME serão: Art.7º
tente comprador ou cessionário de direito de uso, na forma da A gestão do Programa – ATME, será feita pelas Prefeituras Munici-
Lei, relativamente ao terreno sobre o qual pretenda construir. I - o Governo Federal, através da Caixa Econômica Federal e/ou pais em convênio com as entidades representativas da categoria
outro agente financeiro por aquele designado; profissional dos arquitetos urbanistas.
Parágrafo único. As cooperativas deverão atender, por seus Gabinete da Presidência
cooperativados, à condição sócio-econômica prevista no art. da Câmara Municpal de Porto Alegre, 23 de II - os Governos Estaduais e Municipais; Art. 8º
6º desta lei. As Prefeituras Municipais que aderirem ao Programa ATME
abril de 1999 III - Entidades representativas da categoria profissional da ar- receberão os recursos, a fundo perdido, do Governo Federal.
quitetura e urbanismo.
Parágrafo único. Outras fontes de recursos de origem dos Es-
NEREU D’AVILA tados, Municípios, entidades públicas ou privadas, organismos
financiadores bilaterais, assim como de fundos filantrópicos,
Adeli Sell poderão aportar ao Programa ATME.
Art. 9º
O controle e fiscalização técnico-financeira do Programa ATME Parágrafo único. O profissional encarregado da prestação dos b) na hipótese de não se haver concluído a obra, por interrupção Urge, portanto, que junto com os planos governamentais para
ficarão a cargo dos agentes gestores e entidades representativas serviços técnicos deverá estar preparado para orientar processos da construção, a qualquer título, serão apresentados o caderno saúde (hoje representados num projeto que vem estruturando
dos profissionais arquitetos urbanistas e engenheiros. não tradicionais de construção, tais como a efetuada através de de obra, com a anotação formal da suspensão da assistência com razoável sucesso pelo Sistema Único de Saúde), para o sa-
mutirões e formas solidárias assemelhadas. técnica, e a baixa parcial da ART; junto ao CREA regional; neamento, para a educação, e outros, se estabeleça um processo
DO AGENTE TÉCNICO PROFISSIONAL de atendimento à moradia, à adequação urbana e ambiental.
DOS HONORÁRIOS PROFISSIONAIS c) na hipótese, quer de obra acabada, quer de construção inter-
Art. 10 rompida, deverá o profissional apresentar relatório sintético sobre Neste ano de 2001, quando a sociedade conquistou junto ao
Os serviços de arquitetura constantes do projeto e construção Art. 16 os serviços prestados, nos termos de formulário constante do Congresso Nacional o Estatuto das Cidades, que regulamenta
do Programa ATME serão prestados por profissionais arquitetos O valor da remuneração será fixo por projeto e obra assumidos, Manual de Atendimento ao beneficiário final, o qual fica sujeito artigos da Constituição de 88, mais razões existem pelos pos-
urbanistas, que individualmente considerados terão a denomi- definido pela entidade representativa profissional. a exame e aprovação pela Comissão Especial constituída pela tulados de seus conteúdos para buscarmos soluções do tipo
nação de Agente Técnico Profissional. Entidade Representativa. PROGRAMA ATME, entre outras.
Parágrafo único. O pagamento dos honorários profissionais far-
§ 1° Os Agentes Técnicos Profissionais deverão estar habilitados -se-á em duas etapas, sendo a primeira, na conclusão e aprovação Art. 24 Significa a criação de Agentes Técnico-Profissionais à disposição
peIo Conselho Regional de Engenharia, Arquitetura e Agronomia do projeto junto aos órgãos públicos e a segunda, na conclusão Habilitar-se-á o profissional ao pagamento de seu trabalho com das populações carentes para minorar os problemas existentes.
– CREA, de cada Estado ou Região, ou órgão com as mesmas da construção. o conjunto de documentos referido no artigo anterior. Assim o Programa ATME se propõe a uma espécie de SUS da
funções, que venha a ser criado em substituição a esses. Arquitetura e do Urbanismo.
Art. 17 Art. 25
§ 2º Além dos arquitetos urbanistas, poderão participar como Havendo interrupção da construção, devidamente formalizada, Esta lei entra em vigor na data de sua publicação. A outra razão que objetiva o presente projeto de lei, é evitar que
Agentes Técnicos Profissionais outros técnicos graduados a e desde que o projeto já tenha sido integralmente elaborado, o beneficiário final percorra desde o início da construção de sua
nível de terceiro grau, desde que com a mesma habilitação pro- caberá ao profissional receber a metade da remuneração prevista, JUSTlFlCAÇÃO moradia, aquele processo burocrático onde, cada momento ou
fissional, de conformidade com a Lei nº 5.194, que regula as ficando o recebimento da outra parte vinculada à conclusão da etapa dele junto ao poder executivo municipal, necessita,
profissões em questão. obra, se houver continuidade da prestação de assistência técnica O objetivo do projeto de lei que estamos ingressando nesta não raras vezes, dispender estipêndios, de que não é possuidor.
Casa e neste final de Precisa primeiramente apresentar a “planta”, que na maior parte
692 DO TIPO DE CONSTRUÇÃO DAS FONTES DE RECURSOS legislatura, é o de possibilitar assessoria técnica, na área da mora- das vezes, é confeccionada por atravessadores num processo 693
dia e remanejamento urbano, a peswoas ou grupos organizados, exploratório totalmente condenável, para a sua elaboração.
Art. 11 Art.18 carentes de recursos financeiros, otimizando o aproveitamento De um lado, as Prefeituras exigem projeto e documentos para a
A construção da moradia neste Projeto, deverá ser enquadrável O Governo Federal destinará recursos a fundo perdido no Or- racional do espaço, de recursos humanos e de materiais cons- aprovação da construção, por outro o especulador e/ou atraves-
como de tipo econômico. çamento Geral da União - OGU, e em recursos provenientes de trutivos necessários à moradia. sador, criando “facilidades” mas extorquindo os parcos recursos
Fundos Federais intencionados no desenvolvimento social, como da pessoa (beneficiário) e entre os profissionais habilitados sem
Parágrafo único. Não serão feitas restrições ao emprego de o Fundo de Assistência Social – FAZ, o Fundo de Garantia por O beneficiário deste Programa, que irá receber assistência técnica condições de atendimento.
materiais não convencionais, garantindo-se a segurança e ha- Tempo de Serviço – FGTS, o Fundo de Amparo ao Trabalhador graciosamente, deverá ter nível de renda familiar inferior a 5 (cinco)
bitabilidade. – FAT, o Plano de Integração Nacional PIS/PASEP ou outros. salários mínimos, e ser proprietário, promitente comprador ou Necessário é pois, que se estabeleça uma prestação de serviços
cessionário de direito de uso, na forma da Lei, relativamente ao gratuitos de Assistência Técnica ao Projeto e Construção da
DO CREDENCIAMENTO DOS AGENTES TÉCNICO-PROFISSIO- DISPOSIÇÕES GERAIS terreno sobre o qual pretende construir. Moradia Econômica, que o atendimento aos beneficiários finais,
NAIS seja dado pelos próprios profissionais legalmente habilitados e
Art. 19 A moradia econômica será definida tão só pela relação entre as credenciados junto a suas entidades laborais, ou pelas coope-
Art. 12 O Programa ATME elaborará um Manual de Atendimento ao be- necessidades e a disponibilidade econômica do beneficiário, rativas profissionais, especificamente constituídas para atender
O credenciamento dos Agentes Técnicos Profissionais para parti- neficiário final, que servirá como seu instrumento de orientação, vale dizer, a partir de sua condição pessoal e familiar. Assim às finalidades deste programa.
cipar do Programa ATME dar-se-á junto à entidade representativa dos profissionais e dos órgãos fiscalizatórios, quanto aos serviços haverá moradia econômica, para os efeitos deste Programa
dos profissionais de arquitetura e urbanismo. prestados, independente da existência do Caderno de Obras. (ATME), sempre que houver uma pessoa física caracterizada Assim como existe o SUS, que se preocupa em preservar ou
como beneficiário final, e que necessite de assistência técnica restaurar a saúde da população, assim a ATME, estaria motivada
§ 1º Caracterizam-se como entidades representativas das ca- Parágrafo único. O Manual de Atendimento conterá o compro- gratuita ou financiada, para o projeto e construção de prédio com no proporcionar a construção da moradia dessa população e de
tegorias profissionais os Sindicatos de Arquitetos, o Instituto misso firmado entre o Beneficiário final e o Agente Técnico- destinação para moradia. adaptá-la e definir o seu entorno.
dos Arquitetos do Brasil - IAB, em cada unidade estadual da -Profissional.
Federação, ou Departamento respectivamente, e que doravante Entre as diversas razões para a proposição deste projeto de Lei, Os recursos da ATME serão assegurados fundamentalmente
passam a ser denominados para os termos desta lei, de entidades Art. 20 além das conhecidas desde a época pioneira de sua criação e pelo Governo Federal, podendo ter aportes financeiros de outros
representativas. O Programa ATME poderá atender às solicitações dos entornos agravadas pelos resultados perversos dos problemas poIíticos, órgãos e entidades conforme consta do projeto em questão.
dessas moradias, considerada a necessidade de urbanização ou econômicos atuais, que segregam as populações, criando um
§ 2º Para fins de cadastramento e operacionalidade, o Programa reurbanização em casas de viIas ou favelas onde aconteceu a crescente quadro de exclusão social, de desemprego, de habi- Finalizo esta justificativa, por dever de ofício, agradecendo à
ATME deverá ser gerido por uma Comissão Especial composta regularização fundiária. tação, saneamento básico, assistência à saúde, à educação, categoria profissional a que pertenço, dos Arquitetos, e aos
de profissionais representantes de cada entidade representativa entre outros aspectos; estamos enfatizando duas razões que, signatários do Programa Pioneiro do ATME editado pela primeira
acordada dentre elas e centralizado por uma delas. Art. 21 por si só, justificam nossa preocupação e nossa proposição: o vez pelo Sindicato dos Arquitetos do Rio Grande do Sul, com o
Os beneficiários do Programa poderão receber isenções de taxas Programa ATME. auxílio do CREA/RS, em 1976, representados pelos arquitetos
§ 3º Havendo o interesse de outros profissionais habilitados administrativas relativas à regularização ou aprovação de sua Carlos Maximiliano Fayet, Newton Burmeister e Cláudio Caraccia
nos termos do art.10, § 2º, estes deverão ser inscritos por seus moradia, dependendo A primeira refere-se aos altos índices de urbanização havidos e Paulo Henrique Soares e dos Advogados Manuel André da
órgãos profissionais na entidade representativa responsável, da respectiva legislação municipal. nas últimas décadas, propiciados pela expulsão das pessoas Rocha e Maria Madalena Borges Borges, assim como das cola-
conforme prescreve o § 1º do art.12 do campo. Este fenômeno irreversível das concentrações urba- borações recebidas do IAB/DN, através de sua Direção Nacional
Art. 22 nas, não é um privilégio de nosso país, mas tem características pelo seu Presidente, Arquiteto Haroldo Pinheiro, do apoio da
Art. 13 Por infrações cometidas às finalidades ou modo operativo des- mundiais, só que no Brasil com maior intensidade. Hoje, mais de FNA - Federação Nacional dos Arquitetos pelo seu presidente,
Deverão as Entidades Representativas, periodicamente em prazo te Programa estabelecer-se-ão penalidades que irão desde a 80% da população brasileira se localiza nas cidades, em especial, arquiteto Eduardo Bimbi e da Consultoria Atuação pelo senhor
trimestral, informar às Prefeituras Municipais, através de listagens advertência e a multa pecuniária até a suspensão temporária nas regiões metropolitanas, na maioria em precárias condições Helmut Leonardo Volkmann e do meu Gabinete pelo Advogado
circunstanciadas, os profissionais credenciados, bem como a ou o cancelamento definitivo do credenciamento ou registro. de emprego, habitação, transporte, segurança etc. Davi Ulisses C. Simões Pires. O Projeto de Lei-Programa ATME,
confirmação de credenciamentos anteriores, bem como enumerar passa neste momento a ser não só do interesse dos seus pro-
a perda dessas condições por decurso de prazo, indeferimento Parágrafo único. A aplicação dessas penalidades, pelos órgãos Esse quadro, no que se refere à ocupação do espaço é, na maior ponentes, mas da população brasileira e dos seus representan-
de renovação ou aplicação de penalidades. gestores, não eximem o faltoso de responder civilmente por parte das vezes, caótico. As populações carentes, discriminadas tes, os Deputados e Senadores arquitetos urbanistas, mas da
eventuais danos causados a tercéiros, no caso os beneficiários pelo sistema dominante, vêem-se totalmente desprotegidas de população brasileira e dos seus representantes, os Deputados
Art. 14 finais, nem de responsabilidade criminal porventura ocorrente. serviços, destacando-se no caso, a falta de habitação e/ou a e Senadores da República.
A responsabilidade técnica e o período de vinculação do profis- sua localização em áreas de risco, em locais inconvenientes
sional à obra deverão ser observados nos termos da Lei Federal Art. 23 para vida digna.
nº 5194, reguladora do exercício das profissões de engenheiro, A documentação probatória da prestação dos serviços deverá
arquiteto, engenheiro agrônomo, geógrafo, geólogo e técnico ser representada:
de nível médio. CLOVIS ILGENFRITZ DA SILVA
a) em obra pronta e acabada pelo “habite-se” municipal, acom-
Art.15 panhado da baixa da anotação da responsabilidade técnica Deputado Federal (PT-RS)
A assistência prestada deverá ser integral, abrangendo o projeto (ART) junto ao Conselho Regional de Engenharia, Arquitetura e
da edificação com todos os seus componentes e a assistência Agronomia (CREA) regional;
técnica à construção, até sua conclusão.
LEI NACIONAL DE
ASSISTÊNCIA TÉCNICA PÚBLICA E
GRATUITA EM ARQUITETURA E URBANISMO
Lei Federal 11.888/08*
Lei Federal 11.888 de 24 de dezembro de 2008
Autoria de Zezéu Ribeiro
Assegura às famílias de baixa renda assistência técnica pública e gratuita para o projeto e a
construção de habitação de interesse social e altera a Lei no 11.124, de 16 de junho de 2005.
694 O PRESIDENTE DA REPÚBLICA Art. 3º § 1º Na seleção e contratação dos profissionais na forma do Art. 7º 695
Faço saber que o Congresso Nacional decreta e eu sanciono A garantia do direito previsto no art. 2o desta Lei deve ser efe- inciso IV do caput deste artigo, deve ser garantida a participação O art. 11 da Lei no 11.124, de 16 de junho de 2005, que dispõe
a seguinte Lei: tivada mediante o apoio financeiro da União aos Estados, ao das entidades profissionais de arquitetos e engenheiros, mediante sobre o Sistema Nacional de Habitação de Interesse Social -
Distrito Federal e aos Municípios para a execução de serviços convênio ou termo de parceria com o ente público responsável. SNHIS, cria o Fundo Nacional de Habitação de Interesse Social
Art. 1º permanentes e gratuitos de assistência técnica nas áreas de - FNHIS e institui o Conselho Gestor do FNHIS, passa a vigorar
Esta Lei assegura o direito das famílias de baixa renda à assis- arquitetura, urbanismo e engenharia. § 2º Em qualquer das modalidades de atuação previstas no acrescido do seguinte § 3o:
tência técnica pública e gratuita para o projeto e a construção de caput deste artigo deve ser assegurada a devida anotação de
habitação de interesse social, como parte integrante do direito § 1º A assistência técnica pode ser oferecida diretamente às responsabilidade técnica. “Art. 11. [...]
social à moradia previsto no art. 6o da Constituição Federal, e famílias ou a cooperativas, associações de moradores ou outros § 3º Na forma definida pelo Conselho Gestor, será assegurado
consoante o especificado na alínea r do inciso V do caput do art. grupos organizados que as representem. Art. 5º que os programas de habitação de interesse social beneficiados
4o da Lei no 10.257, de 10 de julho de 2001, que regulamenta Com o objetivo de capacitar os profissionais e a comunidade com recursos do FNHIS envolvam a assistência técnica gratuita
os arts. 182 e 183 da Constituição Federal, estabelece diretrizes § 2º Os serviços de assistência técnica devem priorizar as usuária para a prestação dos serviços de assistência técnica nas áreas de arquitetura, urbanismo e engenharia, respeitadas as
gerais da política urbana e dá outras providências. iniciativas a serem implantadas: previstos por esta Lei, podem ser firmados convênios ou termos disponibilidades orçamentárias e financeiras do FNHIS fixadas
de parceria entre o ente público responsável e as entidades pro- em cada exercício financeiro para a finalidade a que se refere
Art. 2º I - sob regime de mutirão; motoras de programas de capacitação profissional, residência este parágrafo.” (NR)
As famílias com renda mensal de até 3 (três) salários mínimos, ou extensão universitária nas áreas de arquitetura, urbanismo
residentes em áreas urbanas ou rurais, têm o direito à assistên- II - em zonas habitacionais declaradas por lei como de interesse ou engenharia. Art. 8º
cia técnica pública e gratuita para o projeto e a construção de social. Esta Lei entra em vigor após decorridos 180 (cento e oitenta)
habitação de interesse social para sua própria moradia. Parágrafo único. Os convênios ou termos de parceria previstos dias de sua publicação.
§ 3º As ações da União, dos Estados, do Distrito Federal e dos no caput deste artigo devem prever a busca de inovação tecno-
§ 1º O direito à assistência técnica previsto no caput deste artigo Municípios para o atendimento do disposto no caput deste artigo lógica, a formulação de metodologias de caráter participativo e
abrange todos os trabalhos de projeto, acompanhamento e exe- devem ser planejadas e implementadas de forma coordenada e a democratização do conhecimento.
cução da obra a cargo dos profissionais das áreas de arquitetura, sistêmica, a fim de evitar sobreposições e otimizar resultados.
urbanismo e engenharia necessários para a edificação, reforma, Art. 6º
ampliação ou regularização fundiária da habitação. § 4º A seleção dos beneficiários finais dos serviços de assistência Os serviços de assistência técnica previstos por esta Lei devem
técnica e o atendimento direto a eles devem ocorrer por meio ser custeados por recursos de fundos federais direcionados à
§ 2º Além de assegurar o direito à moradia, a assistência técnica de sistemas de atendimento implantados por órgãos colegiados habitação de interesse social, por recursos públicos orçamen-
de que trata este artigo objetiva: municipais com composição paritária entre representantes do tários ou por recursos privados.
poder público e da sociedade civil.
I - otimizar e qualificar o uso e o aproveitamento racional do
espaço edificado e de seu entorno, bem como dos recursos Art. 4º
humanos, técnicos e econômicos empregados no projeto e na Os serviços de assistência técnica objeto de convênio ou termo
construção da habitação; de parceria com União, Estado, Distrito Federal ou Município
devem ser prestados por profissionais das áreas de arquitetura,
II - formalizar o processo de edificação, reforma ou ampliação urbanismo e engenharia que atuem como:
da habitação perante o poder público municipal e outros órgãos
públicos; I - servidores públicos da União, dos Estados, do Distrito Federal
ou dos Municípios;
III - evitar a ocupação de áreas de risco e de interesse ambiental; Brasília, 24 de dezembro de 2008
II - integrantes de equipes de organizações não-governamentais
IV - propiciar e qualificar a ocupação do sítio urbano em conso- sem fins lucrativos; 187º da Independência e 120º da República
nância com a legislação urbanística e ambiental.
III - profissionais inscritos em programas de residência acadêmi-
ca em arquitetura, urbanismo ou engenharia ou em programas LUIZ INÁCIO LULA DA SILVA
de extensão universitária, por meio de escritórios-modelos ou
escritórios públicos com atuação na área; Guido Mantega
IV - profissionais autônomos ou integrantes de equipes de Paulo Bernardo Silva
pessoas jurídicas, previamente credenciados, selecionados e Patrus Ananias
contratados pela União, Estado, Distrito Federal ou Município.
Márcio Fortes de Almeida
PALAVRA Para além de sua reconhecida atuação, é preciso destacar a importância da
DOS ARQUITETOS equipe da CODHAB/DF entre os anos de 2015 e 2018 no tocante à sensibili-
dade de compreensão do espaço urbano no processo de implantação da Lei
Federal nº 11.888/2008. A equipe liderada por Gilson Paranhos assimilou a
Depoimentos de profissionais sobre a experiência Lei de Assistência Técnica extrapolando os limites comumente vinculados
em Assistência Técnica ocorrida na CODHAB-DF entre 2015 e 2018 à arquitetura e à engenharia. De maneira responsável e integrada, pautou a
cidade como objeto de exercício profissional, mirando como alvo o combate
às desigualdades sociais. Esse olhar - com visão além do alcance e que ora
se lança em ações pontuais em unidades habitacionais e ora se expande
na escala macro - costura e se interconecta, devolvendo à população não
só estatísticas de trabalhos realizados, mas também dignidade e cidadania.
Para mim, falar dessa equipe é traduzir em gestos o que se defende no papel
O trabalho que foi desenvolvido no Distrito Federal pela equipe da CODHAB, sobre o direito à cidade.
sob a batuta do arquiteto e urbanista Gilson Paranhos, nos últimos quatro
anos (2015-2018) possui qualidade excepcional e rapidamente se transformou – PEDRO ROSSI é arquiteto e urbanista, presidente do Instituto de Arquitetos
em referência no Brasil e no exterior. do Brasil Departamento da Paraíba (IAB/PB) durante o triênio 2017-2019.
Doutor em Teoria e História da Arquitetura pela Escuela Técnica Superior
A equipe conseguiu, nesse curto intervalo, implementar a mais relevante de Arquitectura de Barcelona (ETSAB), Coordenador do Projeto Br Cidades.
experiência brasileira na implantação de uma política de Assistência Técnica
pública e gratuita em habitação de interesse social. Apesar de a Assistência
Técnica ser garantida há dez anos pela Lei Federal nº 11.888/2008, poucas O trabalho realizado pela equipe da Codhab entre 2015 e 2018 com Assistência
são as iniciativas no Brasil para sua efetiva aplicação. Técnica em Arquitetura e Urbanismo é certamente uma das propostas mais
inovadoras em termos de administração pública e desenvolvimento urbano.
As ações da equipe melhoraram as condições de vida de centenas de famílias Ao capilarizar sua atuação nos territórios periféricos, conseguiu criar num
no Distrito Federal, como pude conferir pessoalmente em visita realizada curto espaço de tempo respostas mais sensíveis à multiplicidade de neces-
nas localidades. O reconhecimento dessas ações pode ser medido pela sidades habitacionais do Distrito Federal -- mas que são partilhadas pelas
imensa quantidade de palestras que Gilson realizou em todo o Brasil e no grandes cidades brasileiras. Suas ações combinam capacidade técnica no
exterior – inclusive no último Congresso Mundial de Arquitetos na Coréia enfrentamento das precariedades urbanas com um espírito de experimenta-
do Sul, em 2017 – e no interesse que diversos países em desenvolvimento, ção institucional e arquitetônica. Isso se verifica já nos modos de instalar os
especialmente da África Lusófona, têm tido em conhecer essa experiência, escritórios de acordo com as possibilidades de cada local, mas sobretudo
inclusive enviando estagiários para a Companhia. em encontrar saídas mais eficientes para a regularização fundiária e para as
melhorias habitacionais, além de projetos corajosos para a construção de
Além disso, não podemos esquecer as ações de regularização fundiária da unidades novas. Não menos importantes são as Ações Urbanas Comunitárias
Companhia, que entregou mais de 60 mil títulos, nem os 15 concursos pú- nas quais se aposta, por meio dos mutirões, no protagonismo e envolvimento
blicos de projeto de arquitetura e urbanismo promovidos pelo órgão desde o da sociedade com os espaços públicos.
início desta gestão, em 2015. Esse número é especialmente significativo se
considerarmos que, em todo no Brasil, em 2014, foram realizados apenas 16 – PAOLO COLOSSO estudou Arquitetura na École Nationale Supérieure
concursos públicos de projeto, e que em 2013 foram apenas oito concursos. d´Architecture de Grenoble (2004-2005), graduou-se em Arquitetura e
Urbanismo pela Pontifícia Universidade Católica de Campinas (2006). Mestre e
– NIVALDO ANDRADE é presidente Nacional do Instituto de Arquitetos do Brasil Doutor, trabalha com questões de produção social do espaço, Direito à Cidade,
(IAB) durante o triênio 2017-2019, Doutor em Arquitetura e Urbanismo e Professor Teoria e História da Arquitetura e Urbanismo e Estética Contemporânea,
da Faculdade de Arquitetura da Universidade Federal da Bahia (UFBA). Coordenador do Projeto Br Cidades.
AGRADECIMENTOS
Esta publicação foi elaborada de forma voluntária pelos membros que com- Da mesma forma, agradecemos ao Thiago de Andrade, que à frente da Secre-
põem sua organização e pelos autores, para que pudéssemos registrar e taria de Gestão do Território e Habitação (SEGETH) foi entusiasta de primeira
compartilhar um pouco das experiências que tivemos enquanto profissionais hora das iniciativas empenhadas pelas equipes que estavam nos fronts da
que estiveram comprometidos com a implementação de um programa de luta pelo direito à cidade e à arquitetura, assim como a equipe da Secretaria
Assistência Técnica Pública e Gratuita em Arquitetura, Urbanismo e Enge- que nos deu apoio em nosso trabalho nos Postos de Assistência Técnica.
nharia, o primeiro do DF após a Lei Federal nº 11.888/2008 entrar em vigor.
Como profissionais que ao longo de quatro anos trabalhamos em campo Ao Conselho de Arquitetura e Urbanismo do Distrito Federal (CAU/DF), por
em uma prática emergente, construindo processos e metodologias novos, disponibilizar o edital que fomentou a impressão desta publicação e nos fez
enfrentamos os desafios inerentes às práticas da arquitetura e do urbanismo colocar no papel uma ideia que a muito tempo estava em nossas mentes e
mais inclusivos e ainda pouco explorados em nosso campo profissional. corações inquietos.
Gostaríamos que as vivências, muito pessoais, nas quais pudemos aprender
enquanto fazíamos, não se perdessem com o fim desse ciclo. Enquanto Ao Instituto de Arquitetos do Brasil departamento do Distrito Federal (IAB/
organizadores, agradecemos a contribuição de todas e todos que fizeram DF), que acreditou na importância desta publicação e nos permitiu a parceria
esta publicação possível. para concorrer ao edital de fomento e poder finalmente registrar parte de
nossas experiências.
Em nome do arquiteto e urbanista Gilson Paranhos, agradecemos à toda
a equipe de funcionários, colaboradores, diretores e conselheiros da Com- Ao artista e comunicador social Chico Monteiro, pela paciência em revisar
panhia de Desenvolvimento Habitacional do Distrito Federal (CODHAB/DF), tantas páginas em pouquíssimo tempo e, por fim, não menos importante,
que acreditaram no potencial da Assistência Técnica e que deram o suporte agradecemos em nome da Dona Chica às comunidades que estiveram ao
necessário para que essas experiências e serviços fossem possíveis. Se nosso lado, no dia-a-dia, na luta. Vocês são o combustível que alimentam as
tentássemos citar cada um dos nomes, correríamos o risco de incorrer práticas daqueles que acreditam que as cidades são para todos e somente
em alguma injustiça e, por isso, em nome do presidente durante a gestão em parceria, unindo os saberes às técnicas, é que conseguimos transformar
2015/2018, expressamos nossa gratidão a aqueles que trabalharam de ma- o mundo profunda e definitivamente.
neira colaborativa, desenvolvendo a visão de que o trabalho de uma empresa
governamental deve ser feito junto à população.
Este livro foi impresso com fundos oriundos do Edital de Patrocínio do
Conselho de Arquitetura e Urbanismo do Distrito Federal (CAU/DF)
(Chamada Pública nº 1/2019 - Processo CAU/DF nº 885240/2019)
e produzido com recursos dos organizadores e do Instituto de Arquitetos
do Brasil — Departamento do Distrito Federal, que edita esta publicação.