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É notório sabermos o conceito do que é o direito natural. Ora, o direito natural nada
mais é do que uma filosofia que transcende ao homem, ou seja, seria o direito que está
intrínseco a natureza humana, geralmente essa ideia tenta atender aos desejos naturais do
homem abrangendo seu “senso de justiça”. Mas, me questiono, o que seria esse senso de
justiça tão defendido pelo jus naturalista? Pergunta complexa que necessita, sim, de uma
resposta complexa, e, a altura de tal questionamento. Afinal, sabemos que às concepções de
moralidade são controversas, pois, para muitas sociedades, a moral é mutável, ou seja, volátil
ao tempo, costumes e anseios sociais.
Hobbes já citava em sua obra que nossa natureza é corruptível, cruel, animalesca e
capaz de cometer às mais diversas atrocidades apenas para manter seus desejos carnais. Já
citava em seu livro “O leviatã” que vivemos “numa guerra de todos contra todos”, no qual, “o
homem é lobo do homem”. Ora, se Hobbes já dizia isto em sua obra, podemos descontruir a
ideia de que o bom selvagem defendido por Rousseau nada mais é do que um devaneio de
pura inocência, pois, bem sabemos, que de fato, nossa natureza é malévola e propicia a
cometer barbaridades.
Sabendo que nossa natureza é falha. Como podemos defender uma linha de raciocínio
que preza por este lado brutal de nossa natureza ?. Graças ao processo evolutivo nos tornamos
seres capazes de superarmos de forma racional nossos instintos obscuros e conseguimos
atingir o ápice de uma sociedade que realmente é justa, solidária e auto suficiente. Tudo isso
devido ao positivismo e racionalismo que paira em nossa sociedade. O direito natural nada
mais, é, do que, uma teoria utilitarista que não preza pela justiça, mas preza pela
sobrevivência do mais forte. Kant, fiel critico a essa teoria, nos diz que nós somos iguais por
sermos racionais, e não por sermos fortes ou fracos. Sabemos que no estado de natureza
somos seres que convivem de forma abrupta com a brutalidade. Sabendo disso, Kant se
posiciona contra o utilitarismo por acha-lo, não racional, e sim, uma justificação de nossa
natureza falha para realizarmos atrocidades.
Em seu livro “ A casa e a Rua”, Roberto da Matta explana um pouco sobre como
uma sociedade relacional, onde as leis são o ponto de partida e não o fim das ações de cada
cidadão. O autor discorre sobre a influência da relativização das leis a partir dos espaços
social onde cada indivíduo está inserido.
Tendo isso em vista, é importante ressaltar que no caso dos exploradores de caverna,
não se trata do Brasil, é claro, entretanto misturar as leis com as próprias morais e éticas da
sociedade, é permitir que o arbítrio moral prevaleça sobre as leis positivadas. Roberto da
Matta, em seu livro “ A casa e a Rua” explica aos leitores que a prevalência das morais
domesticas e provenientes da consciência de cada indivíduo podem promover a relativização
da moral, e a preponderância da ética plural de cada indivíduo sobre a lei. Um bom exemplo
disso é o “ Jeitinho brasileiro”, haja vista que para muitos indivíduos não se utilizar de
qualquer meio, mesmo sendo esse escuso e fora da lei, para alcançar seus objetivos, não é
necessariamente errado.
Desse modo, promover interpretações zetéticas e arbitrárias da lei, como fez o juiz
Foster, é um grande erro, além de ser uma grande afronta ao direito positivado. Como
afirmado anteriormente, interpretações subjetivas da lei podem criar precedentes para outras
situações e, ademais, permitir que condutas como o “jeitinho brasileiro” sejam consideradas
corretas pelo fato de serem a verdade de um determinado indivíduo.
Com isso em mente, julgar a favor dos quatro exploradores é permitir que não haja
mais parâmetros para julgamento, haja vista a sociedade pós-moderna que se vive atualmente.
Além, de dar aval a crimes que para o delinquente responsável pelo ato delituoso, não eram
considerados pelo autor do crime uma atitude erronia e fora da lei.
Além disso, Ana Lúcia Sabadell tem mais a contribuir ao assunto. Em seu livro “
Manual de Sociologia do Direito” a autora discorre da seguinte maneira.
Com isso, permitir julgamentos descolados das leis vigentes e favor da moral, seria,
em outras palavras, permitir que a desorganização causadora de guerras prevalecesse
novamente. Ademais, isso desconstruiria o sistema de freios e contrapesos promovidos por
Rousseau, quebraria, do mesmo modo, o Art. 2° da Constituição Federal de 1988, onde está
escrito:
Dentro dessa visão, é evidente que alguns juízes da Suprema corte de Newgarth, com
seus julgamentos descolados da realidade jurídica do país, buscam, quando julgam o caso sem
os devidos parâmetros legais, em outras palavras, legislar. Tendo isso em mente, é inevitável
perceber a atrocidade jurídica e o total descumprimento das normas legais ao se julgar o caso
dos exploradores de cavernas à luz de leis extrajurídicas, ou seja, as leis naturais.
Nessa perspectiva, não há margem para julgamentos à luz da moral, como promove o
juiz Foster, por exemplo. No livro “ O caso dos Exploradores de Cavernas”, juiz Foster
afirmou o seguinte:
Neste trecho, há a demonstração de que uma parte dos julgadores do caso dos
exploradores, estão, claramente, voltados para uma análise totalmente subjetiva sobre o caso,
sobre a lei e sobre a ética. Desse modo, não há imparcialidade em um julgamento amplamente
influenciado por uma doutrina fluida e relativa. Assim sendo, não há como compreender que
tipo de “moral” está em questão neste caso específico.
Um excelente exemplo de como a moral pode ser pueril, foi a Alemanha nazista da
Segunda Guerra mundial. Para todo o povo alemão, e principalmente para seu chefe de
estado, Adolf Hitler, era necessário, em sua moral eugenista, que o povo judeu fosse extinto
da população mundial em prol de uma “purificação” mundial. De acordo com o jornal El País,
em seu artigo: “Por que falamos de seis milhões de mortos no Holocausto? ”, acha-se,
atualmente, que esse funesto fato histórico tenha ceifado cerca de 6 milhões de vidas, nos
campos de concentração, guetos e fuzilamentos. O mais importante, entretanto, é o fato de a
moral seguida pela Alemanha nazista validava brutalidades e atitudes desumanas como o
holocausto.
Frédéric Bastiat, economista francês do século XIX, afirmou ao publicar seu livro “
A Lei”, em 1850 que:
Falar que os mendigos vivem em um contínuo estado de necessidade, mas nem por
isso eles matam pessoas para sobreviverem
A LINDB diz que não se pode cometer um crime e dizer que não conhecia as leis
previamente definidas em lei, pois já havia tido a vacatio legis
PRECEDENTE
Mesmo diante de tal situação que para muitos pode ser periclitante para manutenção
da vida. Os indivíduos em nenhum momento cometeram homicídio em prol de sua
sobrevivência, pelo contrário, eles esperaram que os seus companheiros e amigos falecessem
para que dessa forma a carne pudesse ser consumida. Mesmo se passando muita fome e frio.
O ato de comer a carne humana não foi algo muito agradável aos olhos dos sobreviventes. Em
contrapartida, o caso dos exploradores da caverna nos mostra uma visão mais assídua dos
exploradores em aderir a ideia de cometer um homicídio para sua sobrevivência. Se observa,
no caso em questão, um narcisismo por parte dos exploradores, que, não mediram esforços em
assassinar Roger Wetmore de forma cruel.
Mesmo os indivíduos estando numa situação mais delicada que às de Roger e seus
homens. Os passageiros não propuseram nenhuma ideia homicida para sua sobrevivência,
pelo contrário, deixaram que os passageiros morressem gradativamente para que a carne fosse
assim consumida, não ocasionando, em nenhum momento, nenhum homicídio ou tentativa do
mesmo para que o grupo sobrevivesse. Após longos 72 dias presos na neve, num frio abaixo
de 0cº, comendo carne humana e sem perspectivas de sobreviver. O socorro vem através de
um sacrifício nobre de um dos passageiros do voo 571. O mesmo saiu de seu local e decidiu ir
por conta própria em busca de ajuda, e, após 8 dias de caminhada descendo as cordilheiras o
mesmo acha um modesto fazendeiro, após uma conversa o passageiro relata sua história e a
posição dos demais passageiros dentro da cordilheira. O socorro ainda demoraria 24h para
ocorrer, mas graças ao esforço do mesmo, o resto dos jogadores é socorrido e a equipe volta
para seu local de origem.
A história causa comoção internacional e divide críticas nas mais diversas esferas da
sociedade. Afinal, é lícito cometer tal ato para manutenção da vida? Observemos que essa
discussão abrange áreas filosóficas de forma tremenda. É nítido que estamos trabalhando com
valores morais e éticos. Mas, o que diferencia estes indivíduos dos exploradores da caverna?
Nada mais é do que os fins que os mesmos utilizaram para sobreviver, a questão não se firma
no ato em si de consumir carne humano. Mas, se firma no ato de cometer homicídio para
sobreviver. É uma questão que muito se assemelha ao voo 571, mas, se distancia, ao mesmo
tempo, dos atos cometidos por ambas as partes
1- Ser cidadão é conhecer os direitos e cumprir os deveres. É válido ressaltar que todo
cidadão, o ser individual, faz parte de uma sociedade, que é geral. E, para que a
sociedade funcione e cumpra sua real função, regras de conduta precisam ser
estabelecidas. Então, esse é o papel de uma legislação: estabelecer regras de condutas
que busquem melhorar e garantir, através do poder de coercitividade, uma boa vida em
sociedade e ser um parâmetro entre o certo e o errado. Por conseguinte, não existe
nenhuma sociedade perfeita, logo, todas possuem falhas, e, por isso, em todas elas
existem uma série de condutas que são proibidas ou de caráter obrigatório.
O delito, por sua vez, é uma pequena “falha” nesse sistema chamado sociedade. E, de
acordo com Durkheim, o delito não é um fenômeno patológico, e sim, representa um
fenômeno normal dentro de um corpo social. Inclusive, Durkheim, querendo mostrar a
normalidade do delito, afirmou que até em uma sociedade de santos haveria delitos.
Para ele, além de ser algo normal, o delito em si desempenhava um papel muito
importante na sociedade, pois, através dele a coesão social permaneceria intacta. E,
isso acontece porque mediante o estabelecimento de condutas sancionadas, o cidadão
é capaz de decidir facilmente entre o certo e o errado. No entanto, apesar de serem
normais, os delitos representam uma espécie de falha na sociedade, são, sem dúvidas,
extremamente prejudiciais, logo, devem ser punidos, e, aqueles que são punidos
servem de exemplo.
Além disso, o artigo 5, inciso II da Constituição Federal diz que ninguém será
obrigado a fazer ou deixar de fazer alguma coisa senão em virtude de lei, logo, é
apenas uma reafirmação de que a lei, e somente esta, possui coercitividade. Logo, não
cabe aos cidadãos quererem obrigar outra pessoa a fazer algo que não deseja, mesmo
que tenha proposto inicialmente, como no caso dos exploradores de caverna.
Ademais, o Estado cumpriu com o seu papel e jamais pode ser acusado de negligência
ou muito menos omissão. É fato que o mesmo prestou assistência de forma imediata,
enviando várias pessoas extremamente qualificadas para resolver o problema, porém,
algumas coisas estavam fora do poder do Estado, como desmoronamentos, que
ocorrem por causas naturais, por exemplo. Mas, mesmo com vários problemas e
contratempos, mesmo com a morte de 10 homens na tentativa de salvar os
exploradores da caverna, o Estado continuou incansavelmente trabalhando para
conseguir a tão sonhada liberdade dos exploradores. Inclusive, pessoas que estavam na
operação de resgate, em nome do Estado, deram aos exploradores a previsão de 10 ou
um pouco mais de dias para o resgate. Além disso, os exploradores, via rádio,
indagaram o médico acerca da chance de sobrevivência deles, e o médico disse que era
difícil, mas em nenhum momento disse que era impossível ou os aterrorizou dizendo
que iriam morrer. Ainda assim, também o questionaram em relação ao consumo da
carne humana, perguntaram se as chances deles aumentariam se consumissem carne
humana, e o médico, relutante, disse que sim. Porém, o que está em questão nesse júri
não é o consumo de carne humana, de forma alguma. Na verdade, embora o
canibalismo seja algo complexo, o que está em pauta é o assassinato de Roger
Whetmore.
Nesse momento, nós da promotoria responderemos uma questão que vossas
excelências devem estar se perguntando: como os exploradores comeriam carne
humana e sobreviveriam sem matar ninguém?
Em primeiro lugar, de acordo com a Lei Natural de Darwin, os mais fortes possuem
mais chances de sobrevivência, e, entre 5 pessoas, claramente existem pessoas mais
fortes e pessoas mais fracas, já que todos os seres humanos são únicos e possuem
diferentes particularidades entre si. Então, pode-se afirmar com toda a certeza que a
própria natureza ampararia esses exploradores, nenhum deles precisaria se tornar um
assassino para se alimentar, isso aconteceria de forma natural, pois, é fato que um
deles morreria primeiro por causas naturais, por ser mais fraco, e assim, se realmente
necessário, os exploradores restantes poderiam, embora seja repugnante, comer a
carne humana. Logo, é inadmissível que a vida de Roger Whetmore tenha sido tirada
para que o mesmo servisse de alimento, pois, a própria seleção natural resolveria essa
problemática.
Não obstante, é válido ressaltar que o in dubio pro reo não é cabível ao caso dos
exploradores de caverna. Isso acontece porque in dubio pro reo significa “em caso de
dúvida, beneficie o réu”, porém, os fatos apresentados não deixam brechas para
dúvidas, pois são fatos concretos, logo, não há dúvida. Na verdade, o “lema” que deve
ser seguido é: cometeu um delito? Puna-se!
PRECEDENTES
VOO URUGUAIO
Por fim, faz-se necessário falar novamente sobre a questão do Estado de Necessidade,
que, de acordo com o artigo 24 é: “... quem pratica o fato para salvar de perigo atual,
que não provocou por sua vontade, nem podia de outro modo evitar, direito próprio ou
alheio, cujo sacrifício, nas circunstâncias, não era razoável exigir-se.
Outrossim, proponho uma reflexão acerca do Estado de Necessidade de fato, de uma
situação que, como diz o texto da lei, não poderia de outro modo evitar: O morador de
rua não tem onde dormir e sequer, muitas vezes, algo para comer. Eles passam o dia
vagando pelas ruas dependendo da boa vontade de alguma pessoa que se sensibilize,
definitivamente o morador de rua não escolheu essa situação, não quer estar nela, mas
está mesmo assim. No entanto, nem por esses motivos, ele pode roubar alimentos ou
dinheiro, independentemente da situação que ele se encontra, ele não pode roubar,
mesmo estando sem ter o que comer, e, isso acontece porque o Código Penal define
que roubar é crime e deve ser punido como tal. Outro exemplo que os convido a
pensar, é o caso das milhões de pessoas que passam anos definhando na fila de
transplante de órgãos, vendo a morte cada vez mais próxima. É indiscutível que elas
não estão ali porque escolheram, logo, não puderam evitar e estão em uma situação de
perigo atual constante, sob risco de morte. Mas, não é porque essas pessoas que estão
na fila de transplante precisam de um órgão para sobreviver que é justificável matar
alguém, pois, embora precisem de outro órgão para sobrevivência, matar é crime e
deve ser punido.
Nesse momento, voltemos a pensar sobre o caso dos exploradores de caverna, que
estavam todos em uma situação de perigo atual, inclusive Roger Whetmore, e que
poderiam sim evitar o ocorrido das maneiras que já foram citadas anteriormente. A lei
é geral, e, depois de oficialmente publicada, subentende-se que todos a conhecem,
então, ninguém pode deixar de cumprir uma lei alegando que não a conhece, logo, os
4 exploradores assassinaram Roger, cometeram um homicídio doloso e formação de
quadrilha, que estão dispostos nos artigos 121 e 288 do Código Penal,
respectivamente, além de violarem os artigos 104, 119 e 166 do Código Civil. Por
isso, por cometerem um crime, eles devem ser punidos. Então, a promotoria pede a
condenação do réu em 30 anos, a promotoria pede justiça, pede que as leis sejam
cumpridas e que casos como esse, não tornem a acontecer.
A PROMOTORIA ENCERRA.
REFERÊNCIAS
A CASA E A RUA
A lei
https://brasil.elpais.com/brasil/2017/09/13/internacional/1505304165_877
872.html