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Art. 927. Aquele que, por ato ilícito (arts. 186 e 187), causar dano a
outrem, fica obrigado a repará-lo.
Parágrafo único. Haverá obrigação de reparar o dano,
independentemente de culpa, nos casos especificados em lei, ou
quando a atividade normalmente desenvolvida pelo autor do dano
implicar, por sua natureza, risco para os direitos de outrem.
1
GURSKI JUNIOR, IVO. Princípio da reparação integral do dano ambiental no desastre de
Mariana/MG. Curitiba, 2016.
deve participar, com centralidade, na elaboração de ações, políticas e medidas de
reparação, para garantir a reparação integral e evitar a repetição dos danos.
Como mecanismo de garantir a participação ampla e informada dos atingidos foi
garantida a assessoria técnica às famílias. Na ocasião foi estabelecido que a execução da
assessoria se daria de acordo com projeto submetido pela AEDAS e aceito pelas
instituições de justiças e as mineradoras, no âmbito do processo nº 0010263-
16.2016.4.01.3800, sendo acordado:
CLÁUSULA 1º - OBJETO: O presente Acordo tem por objeto
estabelecer as regras mínimas acerca do compromisso assumido pela
Fundação, junto à Comissão, de custear a disponibilização de
assessoria técnica independente às pessoas, residentes no município de
Barra Longa – MG, atingidas pelo rompimento da Barragem de
Fundão, assim como estabelecer as condições para a prestação da
referida assessoria, conforme previsto no TCP.
Parágrafo único. A execução da assessoria a que se refere esta
cláusula será feita conforme o Projeto de Assessoria Técnica
Independente ("Projeto· de Assessoria Técnica Independente"),
elaborado pela AEDAS em conjunto com a Comissão e anexo a este
Acordo - Anexo c.
Tendo em vista o disposto, a AEDAS vem atuando guiada pelo seu projeto e
pela pauta dos atingidos que além de afirmar a categoria atingido, rompendo a lógica
patrimonialista e territorialista do dano, também aponta 6 eixos para reparação integral:
1) Direito à moradia digna e infraestrutura; 2) Direito ao trabalho digno, geração de
renda e desenvolvimento socioeconômico; 3) Direito a participação, poder de decisão e
acesso à informação; 4) Direito à saúde, à qualidade de vida e à convivência familiar e
comunitária; 5) Direito ao ambiente saudável; e, 6) Direito a indenização justa.
Nesse sentido, o documento que segue é produto, é fruto das reflexões e
formulações construída pelos atingidos e atingidas para a garantia de uma indenização
justa. Sobre esse ponto, resgatamos que no projeto da AEDAS foi estabelecido o
direitos dos atingidos a:
Elaboração da Matriz de Danos com foco nas indenizações: Em
consonância com o primeiro produto (Diagnóstico socioeconômico-
cultural dos atingidos), o objetivo aqui é assessorar as famílias
atingidas na validação e ajustes da Matriz de Danos, lançando mão
dos dados já levantados e revisados (até o presente momento pela
Fundação Renova), e os novos levantados no diagnóstico. Pretende-se
com este produto a contratação de empresa ou profissionais liberais
que assessorem na análise e interpretação dos resultados do
diagnóstico (...).
2
GESTA. Retrocesso na reparação das perdas e danos aos atingidos pelo rompimento da barragem
de Fundão em Mariana – MG. Ação Civil Pública n. 0400.15.004335-6; 2ª Vara da Comarca de
Mariana, MG.
(XVII - A FUNDAÇÃO fará a revisão periódica de todos os PROGRAMAS, de forma a
mensurar e buscar a efetividade das atividades de reparação e compensação,
submetendo o resultado da avaliação ao COMITÊ INTERFEDERATIVO.), pois dialoga
com a ideia de justiça e finalidade do direito, ou seja, o direito de debater direitos.
Diante desse cenário, nasce à necessidade e por consequência o direito à construção de
uma matriz de danos dos atingidos e atingidas, com ampla participação e que reflita os
danos e materialize a Reparação Integral.
Esse processo é o deslocamento da efetivação dos direitos humanos do plano da
titularidade formal de sujeitos individuais para a dimensão das práticas sociais e da
realização de concepções coletivas de comunidade, de cidade e do ser atingidos. Como
já apontado anteriormente, os atingidos e atingidos de Barra Longa, já apontaram o
tema para a Fundação Renova, na entrega da pauta formulada por eles e apresentada no
dia 02/02/2018.
A partir disso, foi estabelecida com o povo a construção de uma metodologia
para revisão, partindo de uma reunião de coordenadores, passando pelo debate nos 18
grupos de base e finalizando com uma assembleia de aprovação da metodologia. Os
debates realizados nesses espaços contaram com o aprofundamento da concepção de
reparação integral, do debate sobre o direito a debater direitos, o significado da
indenização e da matriz de danos, isso para garantir o amadurecimento dos atingidos
para construção de parâmetros e critérios para a elaboração da Matriz. Como resultado
foi encaminhado: 1) a contratação do produto da Matriz; 2) A divisão metodológica da
matriz em quatro eixos (1- Moradia e Objetos; 2- Produção Agrícola; 3- Comércio,
Trabalho e despesas; e, 4- Saúde e Dano Moral), que seguiriam um caminho para
aprovação (Grupo de Base; Reunião dos Coordenadores; Seminário; Grupos de Base e
Assembleia); 3) A definição do direito à indenização de todos (as) os (as) atingidos (as)
citados na pauta de reivindicações e que tiveram danos ocasionados pelo rompimento da
barragem de Fundão da mineradora Samarco; e, 4) O dever de reparação de todos os
prejuízos e danos causados pelo rompimento da barragem de Fundão e intervenções
decorrentes, em suma, o direito das pessoas serem reparadas guiar a construção da
Matriz, não o contrário, ou seja, a Matriz limitar o direito de reparação.
Após o encerramento da rodada de grupos de base, foi realizada assembleia de
aprovação da metodologia geral. Em seguida, abriu seleção para equipe que realizaria a
construção junto aos atingidos da revisão da Matriz da Fundação Renova, tendo como
objetivos específicos à análise da matriz de danos elaborada e proposta pela Fundação
Renova; Análise e sistematização dos danos apontados pelos atingidos e pelas atingidas,
bem como da metodologia de construção da Matriz de Danos, a partir dos documentos
da Assessoria Técnica; Elaboração e execução de estudos complementares para
conhecimento, quantificação e valoração dos danos e relações produtivas; Elaboração
de proposta de Matriz de Danos a partir das análises feitas; E, Acompanhamento da
revisão da proposta de Matriz de Danos junto aos atingidos e atingidas.
A equipe vencedora da seleção foi o Laboratório Estado, Trabalho, Território e
Natureza /ETTERN da Universidade Federal Rural do Rio de Janeiro/UFRRJ. Criada há
mais de 20 anos, a Assessoria Técnica e Educacional Meio Ambiente e Barragens –
ATEMAB está associada ao Laboratório Estado, Trabalho, Território e Natureza –
ETTERN, grupo de pesquisas nacional que reúne professores e pesquisadores de
diversas universidades públicas brasileiras e é coordenado por professores do Instituto
de Pesquisa e Planejamento Urbano e Regional da Universidade Federal do Rio de
Janeiro – IPPUR/UFRRJ. O ETTERN está cadastrado no Diretório dos Grupos de
Pesquisa do Brasil/CNPq.
Na Universidade Federal Rural do Rio de Janeiro - UFRRJ, a ATEMAB é
coordenada pela professora Flávia Braga Vieira e reúne pesquisadores graduandos e de
pós-graduação (mestrado e doutorado), os quais estiveram à frente do presente trabalho
de pesquisa e assessoria técnica. A ATEMAB assessora as populações atingidas e a suas
organizações locais, regionais e nacional nas seguintes áreas: Promoção de cursos e
produção de material didático para a educação ambiental das comunidades atingidas e
para a formação de lideranças nas áreas de desenvolvimento regional, política
energética e de recursos hídricos e minerais, legislação ambiental, direitos humanos, etc;
Consultoria técnica, através da elaboração de análises de Estudos e Relatórios de
Impacto Ambiental (EIAs/RIMAs) e da produção de estudos aplicados referentes a
política energética; recursos hídricos; meio ambiente e planejamento local/regional;
direitos econômicos, sociais e ambientais; reparações e mitigação de impactos;
Assessoria aos atingidos por barragens em negociações e debates junto a órgãos e
instâncias do Estado brasileiro, seja no âmbito da União quanto dos entes federados e
munícipios. Compreende também assessoria aos atingidos por barragens em suas
relações com bancos multilaterais e outras instituições internacionais envolvidas com a
problemática das barragens hidrelétricas e de mineração.
Após seleção e contratação, a equipe responsável veio à cidade de Barra Longa
para apresentação do produto e do plano de trabalho para a Comissão e Coordenadores,
dando inicio ao trabalho a partir do estabelecido nos objetivos listados a cima. No
sentido de acúmulo dos danos a equipe participou da primeira rodada de seminários
temáticos das categorias atingidas (donas de casa, comerciantes, pescadores,
empregadas domésticas, produtores rurais, garimpeiros, trabalhadores por conta própria,
trabalhadores rurais, aposentados, desempregados, bordadeiras, costureiras e artesã/ãos)
onde foram debatidos e sistematizados os danos, como instrumento de subsídio para a
matriz. Por fim, a equipe elaborou a proposta de Matriz de Danos a partir das análises
feitas, voltando ao território para submetê-la em Reunião da Comissão, Reunião dos
Coordenadores, em Seminário com agrupamentos de comunidade, nos, então, 22 grupos
de base e em Assembleia Geral para aceite final pelos atingidos.
Esse caminho metodológico resultou em uma proposta de matriz, com lista de
itens e preços, em anexo, que valorará os danos materiais e imateriais para o eixo
moradia e objetos, primeiro agrupamento a ser negociado. Tendo em vista o ineditismo
e excepcionalidade do caso, sua repercussão e consequências, ficou evidente a
necessidade de buscar parâmetros, medidas e soluções que dessem conta da
multiplicidade e diversidade de atingidos, interesses e bens afetados. A matriz de
valoração proposta, assim, está baseada em referenciais teóricos, jurisprudenciais e
métodos de valoração que consideram a realidade local e peculiaridades das
comunidades atingidas, bem como as experiências de casos semelhantes anteriores tanto
a nível nacional como internacional.
Com base nos princípios do poluidor-pagador e da prevenção, adotasse a teoria
do risco integral, o que significa que o agente é responsável pelos bônus e ônus da sua
atividade, devendo assumir e internalizar também os riscos e custos da sua atividade.
Em se tratando de crime ambiental de grandes consequências, incluindo enorme
diversidade de danos socioambientais, e caracterizada a substantiva grandeza econômica
da empresa, o desastre tecnológico ocasionado pelo rompimento da Barragem de
Fundão configura-se não apenas como crime ambiental, mas também se traduz em
graves violações aos direitos humanos. Um dano que afeta o direito ao meio ambiente
sadio e equilibrado, atingindo, inevitavelmente, os seres humanos, sua qualidade de
vida, modos de vida, seus direitos e garantias essenciais à dignidade da pessoa humana,
e se fere a vida humana é, portanto, também violação dos direitos humanos.
Compreender os danos causados pelo rompimento da barragem como violações
aos direitos humanos leva o foco para a vítima e sua satisfação de reparação integral e
justa dos danos por ela suportados. Com foco central na reparação da vítima e com a
perspectiva da integralidade da pessoa humana, o reconhecimento dos danos deve ser o
mais amplo possível, incluindo além dos danos materiais, danos imateriais em suas
diversas manifestações e esferas (psicológica, estética, existencial, moral, coletiva etc.).
A regra geral é da reparação total e efetiva, restitutio in integrum, com a
reabilitação dos territórios e melhoria da qualidade. Deve-se contemplar medidas que
assegurem a mitigação e a reparação do dano de forma abrangente de maneira a garantir
a recomposição e a autonomia de todas as esferas necessárias ao pleno desenvolvimento
dos indivíduos e das comunidades, além de promover e garantir a não repetição das
violações. A reparação, assim, deve incluir tanto restituição material quanto restituição
de direitos e deve incluir medidas de satisfação, garantias de não repetição, medidas de
restituição e reabilitação.
Neste sentido, a construção das categorias e valores de danos neste relatório
parte da ideia de reconhecimento da pessoa humana e seus direitos, estritamente ligado
aos aspectos materiais e imateriais que formam o indivíduo e suas formas de
sociabilidade particular e coletiva.
Como o desastre da Samarco é absolutamente inédito, foi necessário utilizar
analogias com casos semelhantes de violações de direitos humanos e ambientais. O
principal referencial pecuniário para a valoração das categorias de danos imateriais
deste relatório são as jurisprudências que tratam dos “danos aos projetos de vida” e
“danos morais”, advindas da Corte Interamericana de Direitos Humanos. Ainda não
existe um tabelamento único disposto pela Corte IDH para indenizar os danos
imateriais, nem trabalhos que sistematizem este aspecto do processo reparatório. Nosso
levantamento nas jurisprudências da Corte chegou ao montante que varia entre 40
mil e 80 mil dólares americanos em indenizações de vítimas para danos imateriais
e segundo as características concretas dos casos.
Neste sentido, a valoração das categorias e do total da Matriz buscou orbitar
entre os parâmetros da Corte IDH. Deve-se salientar que o caso em questão engloba
duas dimensões que em geral são tratadas pela Corte IDH como casos separados, a
saber: 1. crime ambiental de grandes proporções; e 2. grave violação de direitos
humanos. Desta maneira, utilizamos como parâmetro mínimo o dobro do valor mínimo
da Corte (80 mil dólares americanos) e como parâmetro máximo o dobro do valor
máximo da Corte (160 mil dólares americanos).
Para recalcular os DANOS MATERIAIS, foram revisados os preços de
mercado listados pela Renova. Para isso, foi feito um grande levantamento sobre como
os consumidores avaliam marcas e modelos que existem no mercado. Para a revisão
foram considerados o custo-benefício dos itens, a avaliação dos consumidores e a
confiabilidade das marcas (segundo sites de pesquisa de mercado que avaliam a opinião
dos consumidores e de especialistas). O entendimento aqui é de que não importa qual
era o modelo e a marca dos objetos e equipamentos que os atingidos tinham antes do
desastre, eles merecem receber agora um valor que possa pagar pelo melhor.
Além disso, equipamentos e objetos parcialmente afetados foram considerados
na totalidade de seu valor de mercado, pois se entende que, passados 4 anos do desastre,
não é mais possível repará-los. Também nestes casos, foram pesquisadas as melhores
marcas e modelos do mercado.
Estas são formas de cumprir com três dimensões da reparação integral:
restituição de direitos, bens e liberdades; satisfação das vítimas; e indenização
compensatória pelos danos materiais.
Neste trabalho entende-se que DANO IMATERIAL é mais amplo do que o que
normalmente se chama de “dano moral”. O dano imaterial é tudo o que foi causado de
sofrimento físico e psicológico aos atingidos, e compreende toda a perda de: modos de
vida; relações comunitárias e familiares; relações com o meio ambiente; cultura,
tradições, memórias, saberes, vivências; etc. Também engloba todo o sofrimento
relativo à honra e à perda de chances: ofensas, discriminação, ameaças e
constrangimentos, impedimento de planejar e realizar sonhos e projetos; etc.
No Brasil há muito poucas referências de indenizações referentes a estas perdas.
Por isso, foi usado como referencial para a indenização dos danos imateriais os
precedentes da Corte IDH. Esta forma de valorar pretende cumprir com quatro
dimensões da reparação integral: restituição de direitos, bens e liberdades;
reabilitação física, psicológica e social; satisfação das vítimas; e indenização
compensatória por danos imateriais.
Além disso, é importante destacar que, se os parâmetros máximos e mínimos do
total de danos imateriais seguem os valores arbitrados pela Corte IDH, buscou-se
também, em cada subcategoria, não extrapolar as jurisprudências nacionais para
cada um destes tipos de dano imaterial. Assim, as subcategorias referentes à saúde
física e mental não extrapolam os valores que as cortes trabalhistas brasileiras têm
arbitrado para casos de adoecimento físico e mental. Da mesma forma, quase todas as
demais subcategorias foram valoradas no intervalo entre 5 e 10 salários mínimos, que é
encontrado em quase todas as decisões do direito civil brasileiro para casos de
indenização de danos morais.
Ocorre que quatro anos se passaram e os danos se aprofundaram e geraram
novos danos, colocando a população em situação de extrema vulnerabilidade. Nesse
sentido, para entender o processo de vulnerabilização desencadeado pelo rompimento é
necessário uma breve caracterização socioeconômica de Barra Longa, segundo os dados
do último censo do IBGE (2010), o município possuía uma população de 6.143, sendo
estimado pelo órgão uma população de 5.131 pessoas em 2019, destes, apenas 31,2%
tinham relações formais de trabalho e 70,5% da população de 15 anos ou mais de idade
figurava entre os sem instrução e ensino fundamental incompleto. No entanto, por outro
lado, apenas 17,5% se enquadram na categoria de desocupação e o Índice de
Desenvolvimento Humano (IDHM) era de 0,624, sendo que deste, o fator Longevidade
apresentava índice de 0,823, seguida de Renda, com índice de 0,613, e tendo uma queda
em Educação, com índice de 0,482.
FATORES AGRAVADORES
FATORES AGRAVADORES GERAIS % DE ACRÉSCIMO
(Marcadores Sociais da Diferença)
Sexo (se mulher) 10%
Raça (se negro, indígena ou população 10%
tradicional)
Idade (se criança/adolescente ou idoso) 20%
Deficiência (se deficiente físico ou 50%
mental)
Gestante /lactante (se gestante ou lactante 10%
em qualquer momento desde o desastre)
FATOR AGRAVADOR ESPECÍFICO DO CASO
Se deslocado compulsoriamente 10
Apontamos que nesta Matriz constam danos que não foram levantados pela
Renova, mas que nos foram indicados pelos atingidos e por sua Assessoria Técnica,
notadamente os danos imateriais, mas também itens materiais.
Dentre as reflexões apresentadas nesse documento é importante acrescentar que
os rompimentos de barragens tem se tornado uma constante na vida dos brasileiros nos
últimos anos. Esse dado torna-se ainda mais preocupante tendo por base o documento
elaborado pela Comissão Internacional de Grandes Barragens (ICOLD), um registro
mundial de grandes barragens . Nele, apesar dos dados brasileiros ainda não estarem
completos, o país figura na 5º posição dos detentores de grandes barragens no mundo.
Em relação a Minas Gerais, a declaração ao final da visita ao Brasil do Grupo de
Trabalho das Nações Unidas sobre Empresas e Direitos Humanos aponta que o estado
abriga 753 barragens de rejeitos, e que 40 delas são consideradas inseguras.
Por sua vez, o grupo Política, Economia, Mineração, Ambiente e Sociedade –
PoEMAS elaborou, em relatório preliminar, uma sistematização acerca da condição das
barragens de mineração em Minas Gerais, a partir de dados oficiais disponibilizados
pela Fundação Estadual do Meio Ambiente, referentes ao ano de 2014.
O estudo aponta que entre as barragens nível 3, que não tiveram estabilidade
garantidas, estão quatro da Vale (três em Congonhas e uma em Itabirito), uma da MBR,
subsidiária da Vale (Nova Lima), uma da Namisa, pertencente à CSN (Rio Acima), e
uma da MMX Sudeste (Brumadinho). No que se refere as barragens que o auditor não
apresentou conclusão, isso se deu, porque as empresas não conseguiram apresentar
documentos que comprovassem sua estabilidade. Entre as seis, nível III, está mais uma
barragem da Namisa (Congonhas), uma da Mundo Mineração (Rio Acima) e quatro da
Minerminas (Brumadinho) (FEAM, 2014).
É possível perceber que há divergências de informações entre os dados
apresentados ao Grupo de Trabalho das Nações Unidas sobre Empresas e Direitos
Humanos e os dados oficiais analisados pelo PoEmas, nesse sentido, o próprio estudo
apresentado pelo grupo de estudo da Universidade Federal de Juiz de Fora apresenta
dúvidas sobre a efetividade da política de monitoramento: 1º) Porque como dito, os
dados oficiais não estão completos, e 2º) porque:
Essa imprecisão nos dados preocupa, uma vez que os números de desastre
crescem com mais rapidez do que as políticas para redução de vulnerabilidades e
preparação dos territórios. A tendência do crescimento de risco se relaciona ao
crescimento dos volumes de rejeitos produzidos; ao aumento da altura das barragens;
(maior probabilidade de ruptura) e ao aumento do volume do reservatório (maior
potencial de dano). Isso se evidencia em qualquer breve histórico dos rompimentos no
Brasil.
Em 1986 a barragem do grupo Itaminas rompeu-se, em Itabirito (MG), matando
sete pessoas. Em 2001 foi a barragem da mineração Rio Verde, em Nova Lima (MG),
causando a morte de cinco operários. Em 2003 houve rompimento da barragem da
Indústria Cataguases de Papel em Minas Gerais que atingiu os rios Pomba e Paraíba do
Sul, deixando 600 mil pessoas sem água. Em 2004, Alagoa Nova (PB) rompeu-se
Camará, uma barragem de água, contabilizando 5 óbitos e aproximadamente 3 mil
pessoas desabrigadas ou desalojadas. Em 2007, a barragem da mineradora Rio Pomba
Cataguases rompeu-se em Miraí, espalhando cerca de 2 milhões de m³ de rejeitos,
desalojando mais de 4 mil moradores e afetando quatro municípios. Em 2008, na cidade
de Vilhena (RO), rompeu Apertadinho, barragem de água para geração de energia,
causando danos ambientais variados (assoreamento de rios, erosão do solo, entre
outros). Em Cocal e Buriti dos Lopes (PI) no ano de 2009 foi a vez de Algodões,
Barragem de água, deixando saldo de 9 e 24 mortos e aproximadamente 2000 pessoas
desabrigadas ou desalojadas. Em 2008 uma falha no vertedouro da barragem da
Companhia Siderúrgica Nacional inundou de lama parte da cidade de Congonhas (MG),
desalojando quarenta famílias. Em 2014 três trabalhadores da Herculano Mineração
morreram em Itabirito (MG), e os rejeitos da mineração de ferro da barragem rompida
atingiram vários cursos d’água da região. Em 2014, em Laranjal do Jari (AP) a
barragem Santo Antônio deixou 04 óbitos. Em janeiro de 2019, mais uma barragem da
Vale rompeu, desta vez em Brumadinho (MG), na mina Córrego do Feijão, despejou 13
milhões de m³ de lama, causando novamente um mar de danos para várias comunidades,
causando a destruição do Rio Paraopeba, com possibilidade de contaminação do rio São
Francisco, 270 mortos e 18 desaparecidos, danos incalculáveis a fauna, a flora, mais de
24000 famílias evacuadas, destruição de modos e projetos de vida.
De acordo com o Relatório de Segurança de Barragens - RSB, elaborado pela
Agência Nacional de Águas - ANA, referente ao ano de 2017, o Brasil registra em
média quatro desastre com barragens a cada ano. Há evidências, no entanto, de que tal
estatística possa ser bem maior: a própria agência reconhece em seu relatório que há
desastres não relatados e mesmo barragens que não foram informadas ao governo
federal.
No entanto, os índices da mineração em 2018 apontaram um crescimento nos
lucros em comparação com 2017. A Vale no terceiro trimestre atingiu uma produção de
104,9 milhões de toneladas de minério de ferro, obtendo um lucro líquido de 5,75
bilhões de reais. Por sua vez, esse ano, a Vale fechou o terceiro trimestre (julho-
setembro), com um lucro de US$ 1,6 bilhões (R$ 6,5 bilhões) e um aumento de 20,2%
da extração de minério de ferro, na comparação com o trimestre anterior.
Em dezembro de 2018, o Conselho Estadual de Política Ambiental (Copam),
responsável pelo processo de concessão de Licença Prévia, a Licença de Instalação e a
Licença de Operação, aprovou a ampliação de 88% de duas minas no local e a
construção de uma estrada dentro do Parque Estadual Serra do Rola Moça, no relatório
de impacto do projeto, foi incluído os povoados de Córrego do Feijão, Tejuco, Jangada,
Casa Branca e Parque da Cachoeira, além de fazendas no entorno. Na época, o
Movimento das Águas de Casa Branca denunciou que os projetos por si só, já iriam
atingir seis mananciais, responsáveis pelo abastecimento de 40% da Região
Metropolitana de Belo Horizonte .
Após o rompimento da barragem de Fundão, no sentido de denunciar as
violações protagonizadas pelo modelo minerário nacional, produziu-se um documento
para solicitar audiência pública à Comissão Interamericana de Direitos Humanos
(CIDH). No documento buscou-se traçar, a partir de treze casos, um panorama das
afetações causadas aos direitos humanos pela atividade mineral no Brasil, fortalecendo a
caracterização de que o rompimento da barragem de Fundão, bem como os outros aqui
citados precisam ser entendidas como parte de um mesmo cenário que “se relaciona
inevitavelmente ao modelo de desenvolvimento adotado pelo país e a arquitetura legal e
institucional que se estruturou em decorrência dessa opção”.
O documento explica que as políticas minerárias adotadas no Brasil se
relacionam ao megaciclo das commodities (produtos com baixo valor agregado, ou seja,
bens que não sofrem processos de alteração). Aponta que entre 2003 e 2013 as
importações globais de minério saltaram de US$38 bilhões para US$277 bilhões (um
aumento de 630%). Segundo o relatório ainda, no caso no Brasil, a produção mineral
brasileira aumentou 550% no período entre 2001 e 2011.
Rafael Henrique Dias Manzi , explica que o bom dos commodities se relaciona
principalmente aos processos de crescimento econômico de países tradicionalmente
exportadores de matéria prima e commodities internacionais, por exemplo China e
Índia. Ocorre que a aceleração da urbanização e aumento da renda das populações
desses países, que juntas correspondem a 36,5% da população global, gerou um
aumento na demanda de commodities internacionais, o chamado “superciclo”.
A Samarco foi eleita em 2015 – prêmio referente a 2014 – pela quinta vez e
terceira consecutiva como melhor mineradora do país, pelo anuário Melhores e Maiores
da Revista Exame, como justificativa apontada para premiação, foi declarado que:
3
EXAME premia as melhores empresas de 2014. In: https://exame.abril.com.br/negocios/exame-
premia-as-melhores-empresas-de-2014/
4
SAMARCO. Relatório da Administração e Demonstrações Financeiras. 2014, p. 4. In:
https://www.samarco.com/wp-content/uploads/2016/08/2014-Relatorio-da-Administra-o-e-Demonstra-es-
Financeiras.pdf.
Segundo o relatório de sustentabilidade já citado, o preço de venda do minério
de ferro bruto havia caído em 47% em relação ao ano anterior, isso aliado a um aumento
da oferta global, combinado à desaceleração de mercados consumidores estratégicos,
conjuntura que exigiu da empresa uma política empresarial construída em cima de
quatro eixos: “alta produtividade, qualidade do produto adequada às necessidades dos
nossos clientes, baixo custo de produção e uma reputação positiva perante nossos
5
públicos de relacionamento” [grifo nosso]. De acordo com a empresa o aumento da
produção ocasionou um aumento na taxa total de acidentes registrados (com perda de
tempo + sem perda de tempo) e um óbito registado6.
Luiz Jardim Wanderley, Maíra Sertã Mansur e Raquel Giffioni Pinto7 analisando
os dados do Tribunal Regional do Trabalho de Minas Gerais e do Espirito Santo
apontaram que a empresa também passava por um processo de terceirização da mão de
obra, atingindo um total de 59% dos mais 6600 empregados. Estratégia comum em
processos de redução de custos operacionais e sustentação de níveis de lucratividade. Os
autores apontam que a Samarco registrava no TRT’s denuncias de terceirização ilícitas,
não pagamento de horas in itinere, não fiscalização das condições de trabalho pelas suas
prestadoras de serviço, dentre outros. Resultando, 554 processos no TRT 3º região
(Minas Gerais) e 1021 no TRT da 17º Região (Espírito Santo).
5
SAMARCO. Relatório Anual de Sustentabilidade. 2014. In: https://www.samarco.com/wp-
content/uploads/2016/08/2014-Relatorio-Anual-de-Sustentabilidade.pdf.
6
Ibid, p. 05.
7
WANDERLEY, Luiz Jardim; MANSUR, Maíra Sertã; PINTO, Raquel Giffioni 7. Avaliação dos
antecedentes econômicos, sociais e institucionais do rompimento da barragem de rejeito da
Samarco/Vale/BHP em Mariana (MG); In: MILANEZ, Bruno; LOSEKANN, Cristina (Orgs.). Desastre
no Vale do Rio Doce: Antecedente
8
P. 57.
A complexidade do ocorrido demonstra que o mesmo se configura desastre
sociotecnológico, o que se dá ao fato de que não se trata de um desastre natural, pois a
sua ocorrência e a sua amplitude estavam dentro da possibilidade de controle humano e
tecnológico. Destacamos que a Câmara de Atividades Minerárias (CMI) do Conselho
Estadual de Política Ambiental (Copam) aprovou nesta sexta-feira, 25 de outubro, a
Licença de Operação Corretiva (LOC) da Samarco Mineração, ato que autoriza a
empresa a retomar suas atividades no Complexo de Germano, em Mariana.
Esse cenário esboçado nos auxilia a perceber a importância de medidas
educativas e inibitórias, mediante proteção exemplar, para proteção do meio ambiente,
visando a preservação da qualidade de vida, de modo que o lucro não seja construído as
custas das vidas humanas. Portanto, pelos motivos elencados e outros elencados de
forma não exaustiva na assembleia do dia 16 de outubro de 2019, os atingidos solicitam
o pagamento de salários mínimos referentes ao lapso do rompimento da barragem até o
momento do pagamento para todos os moradores de Barra Longa e aos atingidos que
com a cidade de relacionam, na renda, trabalho, moradia e outros aspectos a serem
identificados.
Verônica perguntou ao público, quais os motivos dessa multa
para o público, foi citado: a demora, a poeira, a perda de
emprego, inflação, problema de pele, a RENOVA marcar as
reuniões e não aparecer, aumento do preço dos alimentos, o rio
poluído, saúde, falta de médicos nas comunidades, novos gastos
com saúde, falta de peixe, perda de trabalho para perda os
trabalhadores rurais, que a política da renova de cana
desempregou os cortadores de cana, o barulho da sirene, a
estrada, o corte dos cartões sem justificativa, sem dar satisfação,
não cumprem os acordos feitos em assembleia (água e luz das
pessoas deslocadas), reformas e reconstruções, maltratar as
pessoas no atendimento, no tratamento grosseiro dos atingidos
(...).
9
gesta
sofrido, sem prejuízo de outros critérios que levem em conta os danos
ocorridos à entidade familiar ou à comunidade a que pertençam,
abstendo-se de usar metodologias indenizatórias apenas por núcleo
familiar;