Você está na página 1de 11

O povo de Cristo — Imitadores de Cristo

Sermão nº 21
Ministrado na manhã de domingo, 29 de abril de 1855
Pelo Rev. C. H. Spurgeon
Em Exeter Hall, Strand, Londres, Inglaterra

Então eles, vendo a ousadia de Pedro e João, e informados de que eram homens sem
letras e indoutos, maravilharam-se e reconheceram que eles haviam estado com Jesus. —
Atos 4:13, ACF

Vejam! Que mudança a graça divina provoca numa pessoa, e em quão pouco tempo! Esse
mesmo Pedro, que pouco antes seguia seu Mestre à distância e, com juramentos e
maldições, negava conhecê-lO, agora está lado a lado com o amado João, declarando
ousadamente que não há salvação em nenhum outro nome senão no de Cristo, e pregando
a ressurreição dos mortos por meio do agonizante sacrifício do Senhor. Os escribas e
fariseus logo descobrem a razão de sua intrepidez. Acertadamente eles supõem que não é
devido aos estudos ou talentos de Pedro e João, pois nem um nem outro tinha instrução;
eles tinham sido treinados como pescadores; sua educação era o conhecimento do mar —
no ofício de pescadores, nada mais que isso; sua ousadia, portanto, não podia vir da
autossuficiência do conhecimento, mas do Espírito do Deus vivo. Sua coragem também não
vinha de sua posição, pois posição pessoal confere às pessoas certa dignidade, fazendo-as
falar com suposta autoridade, mesmo que elas não tenham talento ou genialidade; mas
estes homens eram, como diz o texto original, idiotai, homens simples, sem cargo oficial,
homens sem patente ou posição. Quando veem a ousadia de Pedro e João, e percebem
que eles são iletrados e incultos, as autoridades do povo e os escribas ficam maravilhados,
chegando acertadamente à conclusão da origem do seu poder — eles tinham estado com
Jesus. Suas conversas com o Príncipe de luz e glória, sustentadas, como também deviam
saber, pela influência do Espírito Santo, sem a qual até mesmo esse importante exemplo
santo teria sido em vão, tornaram-nos ousados pela causa do seu Mestre. Ah, queridos
irmãos, como seria bom se essa condenação, irrompida dos lábios dos inimigos, pudesse
também ser forçada pelo nosso próprio exemplo. Se vivêssemos como Pedro e João; se
nossas vidas fossem “epístolas vivas de Deus, conhecidas e lidas por todos os homens” (2
Coríntios 3:2); se, sempre que fôssemos vistos, as pessoas soubessem que estivemos com
Jesus, seria uma ótima coisa para este mundo, e uma bênção para nós. É sobre isso que
quero lhes falar nesta manhã; e, pela graça que me for concedida por Deus, vou me
esforçar para estimular suas lembranças e exortá-los a imitar Jesus Cristo, nosso modelo
celestial, para que as pessoas percebam que vocês são discípulos do Santo Filho de Deus.

Portanto, em primeiro lugar vou falar sobre o que o cristão deve ser; depois, quando
é que ele deve ser assim; a seguir, por que ele deve ser assim e, por último, como ele pode
ser assim.

1. Com a ajuda de Deus, então, primeiramente vamos falar sobre o QUE O CRENTE
DEVE SER. O cristão deve ter uma incrível semelhança com Jesus Cristo. Lemos sobre
aquilo que Cristo fez, tudo escrito com beleza e eloquência, e ficamos admirados com o
talento das pessoas que escreveram tão bem Sua história; mas a melhor parte da história
de Cristo é a Sua biografia viva, escrita nas palavras e atitudes do Seu povo. Se nós,
queridos irmãos, fôssemos o que professamos ser; se o Espírito do Senhor estivesse no
coração de todos os Seus filhos, como desejamos; e se, ao invés de termos tantos crentes
professos por mera formalidade, todos fôssemos possuidores daquela graça vital, vou lhes
dizer não só o que deveríamos ser, mas o que seríamos: seríamos retratos de Cristo, sim,
com tal semelhança com Ele que o mundo não teria como nos resistir por uma hora sequer,
dizendo: “Bem, parece que há alguma semelhança”, mas, quando nos visse, exclamaria:
“Ele esteve com Jesus, foi ensinado por Ele, e é como Ele; ele sabe exatamente quem é o
Santo de Nazaré; e age como Ele no seu dia a dia”.

Para discorrer sobre este ponto será necessário pressupor que, quando afirmamos
que as pessoas devem ser tal e tal coisa, estamos nos referindo ao povo de Deus. Não
queremos falar de forma legalista. Não estamos debaixo da lei e sim da graça. Os cristãos
creem que devem guardar todos os preceitos de Deus não porque a lei os obrigue a isso,
mas porque são constrangidos pelo evangelho; eles acreditam que, tendo sido redimidos
pelo sangue divino, tendo sido comprados por Jesus Cristo, eles têm mais razões para
guardar Seus mandamentos do que se estivessem sob a lei; eles se consideram milhares
de vezes mais devedores a Deus do que se estivessem sob a dispensação mosaica. Não
pela força, não pela obrigação, não pelo medo do chicote ou pela escravidão da lei, mas
pelo amor puro e desinteressado e pela gratidão a Deus eles se dispõem a servi-lO,
procurando ser realmente israelitas em quem não há dolo. Falo isso para ninguém pensar
que estou pregando as obras como meio de salvação; jamais cederei nesse ponto; sempre
vou sustentar que — pela graça somos salvos, não por nós mesmos. No entanto, devo
igualmente testificar que, onde está a graça de Deus, ela produzirá boas obras. Sempre vou
exortá-los a isso, ao passo que a prática de boas obras geralmente é esperada entre
cristãos. Além disso, quando digo que um crente deve ter uma semelhança notável com
Jesus, não creio que ele vá exibir perfeitamente todas as características de nosso Senhor e
Salvador. Entretanto, meus irmãos, apesar da perfeição estar fora do nosso alcance, isso
não deve diminuir o ardor do nosso anseio por ela. O artista, quando pinta, sabe muito bem
que não será capaz de superar Apelles (NT: renomado pintor da Grécia antiga), mas isso
não o desanima. Ele usa o pincel com todo empenho, a fim de poder, de alguma forma, se
assemelhar ao grande mestre. Da mesma forma o escultor, mesmo sabendo que nunca
será como Praxíteles (NT: o mais renomado escultor grego do século IV aC), irá esculpir o
mármore procurando deixá-lo o mais parecido possível com o modelo. O cristão,
igualmente, não obstante saber que nunca estará à altura da completa excelência e
perceba que, na terra, nunca será a imagem exata de Cristo, ainda a tem diante de si e
mede suas próprias deficiências pela distância entre si mesmo e Jesus. Ele o fará
esquecendo-se de tudo o que ficou para trás (Fp 3.12), avançando e gritando: Excelsior!
(NT: palavra latina que significa mais alto, mais elevado, supremo) Subindo e desejando
cada vez mais ser conformado à imagem de Cristo Jesus.

Assim sendo, em primeiro lugar, o cristão deve ser como Cristo em sua ousadia.
Esta é uma virtude que hoje chamamos de atrevimento, mas a graça é igualmente valiosa
seja qual for o nome dado a ela. Suponho que, se os escribas tivessem dado uma definição
para Pedro e João, eles os chamariam de atrevidos.

Jesus Cristo e seus discípulos foram notáveis por sua coragem. “Então eles, vendo
a ousadia de Pedro e João, reconheceram que eles haviam estado com Jesus”. Jesus
Cristo nunca bajulou os ricos; Ele nunca se dobrou diante dos nobres e poderosos; Ele
sempre ficou de cabeça erguida, um homem diante dos homens — o profeta do povo;
falando ousada e livremente o que pensava. Você não se admira daquele feito poderoso de
Jesus, quando Ele foi à cidade onde tinha vivido e sido criado? Sabendo que um profeta
não tinha honra na sua própria terra, ao receber o volume sagrado (Seu ministério mal tinha
começado), sem tremor Ele o desenrolou, e qual texto escolheu para ler? A maioria das
pessoas, indo à sua própria terra, teria escolhido um assunto mais palatável, a fim de
ganhar fama. No entanto, qual foi a doutrina pregada por Jesus naquela manhã? A mesma
que em nossa época é desprezada e odiada — a doutrina da eleição. Ele abriu as
Escrituras e começou a ler: “Na verdade vos digo que muitas viúvas havia em Israel no
tempo de Elias, quando o céu se fechou por três anos e seis meses, reinando grande fome
em toda a terra; e a nenhuma delas foi Elias enviado, senão a uma viúva de Sarepta de
Sidom. Havia também muitos leprosos em Israel nos dias do profeta Eliseu, e nenhum deles
foi purificado, senão Naamã, o siro” (Lucas 4:25-27). E, então, Ele começou a lhes dizer
como Deus salva a quem Lhe agrada e redime a quem quer. Ah! Eles rangeram os dentes,
expulsaram-nO da cidade e O levaram ao cimo do monte para O lançarem de lá (Lucas
8.28-29). Você não fica maravilhado com a Sua intrepidez? Ele viu os dentes deles
rangendo; sabia que seus corações ardiam de hostilidade, enquanto suas bocas destilavam
vingança e malícia; mas ainda assim ficou como o anjo que fecha a boca de leões; Ele não
os temeu; fielmente proclamou o que sabia ser a verdade de Deus e continuou lendo, a
despeito de todos eles. Seus discursos eram assim. Se visse um escriba ou fariseu na
congregação, Ele não escondia o jogo, apontava o dedo e dizia: “Ai de vós, escribas e
fariseus, hipócritas” (Mateus 23:29), e quando um doutor da lei Lhe disse: “Mestre, dizendo
estas coisas, também nos ofendes a nós outros! (Lucas 11:45), Ele replicou: “Ai de vós
também, intérpretes da Lei! Porque sobrecarregais os homens com fardos superiores às
suas forças, mas vós mesmos nem com um dedo os tocais” (Lucas 11:46). O que Ele dizia
era a mais pura verdade; Ele não conhecia o temor do homem; Ele não tremia diante de
ninguém; Ele Se destacava como o escolhido de Deus, ungido acima de Seus pares, sem
se importar com a opinião das pessoas. Meus amigos, sejam como Cristo. Não sigam essas
religiões da moda, religiões exibidas apenas nas salas de visita dos crentes, que só
florescem em ambiente de estufa, e só podem ser percebidas em boa companhia. Não, se
vocês são servos de Deus, sejam como Jesus Cristo, ousados pelo seu Mestre; nunca se
envergonhem da sua própria religião; sua profissão de fé nunca os envergonhará; cuidem
também para nunca envergonhá-la. Seu amor por Cristo nunca será uma desonra para
vocês; pode ser que traga algum menosprezo passageiro por parte de seus amigos, ou
alguma difamação por parte dos inimigos; mas continuem firmes e logo se esquecerão das
calúnias. Resistam e estarão entre os glorificados, honrados até mesmo por aqueles que os
desprezaram, quando Jesus vier para ser glorificado pelos anjos e admirado por aqueles
que O amam. Sejam como Jesus, valentes pelo seu Deus, a fim de que quando as outras
pessoas virem sua ousadia, digam: “ele esteve com Jesus”.

No entanto, um único traço não nos dará o retrato de uma pessoa; da mesma forma,
somente a ousadia nunca o fará semelhante a Cristo. Algumas pessoas são muito nobres,
mas levam sua coragem ao extremo, por isso, são caricaturas de Cristo, não retratos dEle.
Precisamos unir nossa ousadia com a beleza do espírito de Jesus. Que a coragem seja o
bronze e o amor, o ouro. Que os dois sejam misturados a fim de produzir o rico metal
coríntio, próprio para a fabricação do belo portão do templo. Que o seu amor e a sua
coragem andem de mãos dadas. Quem é ousado pode, de fato, realizar maravilhas. John
Knox fez muita coisa, mas se tivesse tido um pouquinho de amor, talvez tivesse feito muito
mais. Lutero foi um conquistador — paz às suas cinzas e honra ao seu nome! Apesar de o
vermos de longe, pense que, se às vezes ele tivesse usado um pouco de brandura — se,
embora fosse fortiter in re, também tivesse sido suaviter in modo (NT: firme na ação, mas
suave na maneira), e falado com um pouco mais de gentileza, poderia ter feito um bem
ainda maior. Portanto, irmãos, mesmo sendo ousados, também devemos imitar o amor de
Jesus. Uma criança se achega a Ele e Ele a toma nos braços: “Deixai os pequeninos, não
os embaraceis de vir a mim” (Mateus 19:14). Uma viúva acaba de perder o único filho, Ele
se compadece diante do esquife e, com uma palavra, restaura a vida ao morto (Lc 7.12-15).
Ele vê um paralítico, um leproso ou um homem confinado à sua cama; Ele fala, eles se
levantam e são curados. Ele viveu para os outros, não para Si mesmo. Seus constantes
labores foram sem qualquer motivação, exceto o bem daqueles que viviam no mundo. E,
acima de tudo, vocês conhecem o grande sacrifício que Ele fez, quando consentiu em dar a
própria vida pelo homem — quando no madeiro, tremendo em agonia, lutando com um
sofrimento extremo, Ele Se submeteu à morte pelo nosso bem, para que pudéssemos ser
salvos. Eis em Cristo o amor consolidado! Ele foi um poderoso pilar de benevolência. Assim
como Deus é amor, Cristo também é amor. Ó cristãos, sejam também cheios de amor. Que
seu amor e sua caridade sejam dispensados a todas as pessoas. Não digam: “aquecei-vos
e fartai-vos” (Tg 2.16), mas “repartam com sete e ainda com oito” (Eclesiastes 11:2). Se não
é possível imitá-lO e destrancar as portas da prisão — se não é possível suportar a dor e o
sofrimento, cada um, dentro da sua esfera de atuação, fale palavras bondosas e aja com
gentileza; faça Cristo reviver na bondade da sua vida. Se há uma coisa elogiável no cristão
é a virtude da amabilidade; é amar o povo de Deus, a igreja, as pessoas do mundo, a todos.
No entanto, há muitos cristãos amargos em nossas igrejas, os quais têm dentro de si tanto
vinagre e fel misturados que mal conseguem falar uma palavra amável: eles acham que é
impossível defender sua religião sem altercações apaixonadas; não conseguem falar em
nome de seu desonrado Mestre sem ficar com raiva de seus oponentes; e, se alguma coisa
está errada, seja em casa, na igreja ou em qualquer outro lugar, eles acham que é seu
dever fechar a cara e desafiar quem quer que seja. Eles são como icebergs isolados,
ninguém quer chegar perto deles. Eles flutuam no mar do esquecimento até que,
finalmente, derretem e somem. Embora sejam boas almas, ficaremos satisfeitos se só as
encontrarmos no céu; ficamos bem felizes em nos livrar delas aqui na terra. Elas são tão
indigestas que, para nós, seria melhor passar a eternidade com elas no céu a ficar cinco
minutos em sua companhia na terra. Portanto, não sejam assim meus irmãos. Imitem a
Cristo na força do seu amor; falem com gentileza, ajam com gentileza e façam tudo com
gentileza, para que todos possam dizer de vocês: “Eles estiveram com Jesus”.

Outra característica excelente na vida de Cristo foi sua profunda e sincera


humildade; nisto também devemos imitá-lO. Embora não devamos nos retrair ou nos curvar
(longe disso, pois somos pessoas livres, libertos pela verdade, e andamos neste mundo
iguais a todos, sem sermos inferiores a ninguém), ainda assim devemos nos esforçar para
sermos como Cristo, sempre humildes. Ó cristão orgulhoso (pois mesmo sendo um
paradoxo, creio que deva haver alguns, pois eu não seria tão intransigente a ponto de dizer
que não há), se és realmente cristão, digo-te para levares em consideração as atitudes do
Teu Mestre, conversando com as crianças, sujeitando a majestade da Sua divindade para
falar à humanidade, tabernaculando com os camponeses da Galileia, e então — ó
profundidade da condescendência incomparável — lavando os pés dos discípulos e
secando-os com a toalha após a ceia. Este é o teu Mestre, a quem professas adorar; este é
o teu Senhor, a quem adoras. Mas alguns de vós, que vos considerais cristãos, sequer
falais com quem não se veste da mesma forma, ou que não ganha a mesma quantia anual.
É bem verdade que na Inglaterra um soberano (NT: moeda equivalente a 20 xelins) nunca
falará com um xelim, e um xelim nunca notará um seis pence, e um seis pence zombará de
uma moedinha de um pêni. No entanto, não deve ser assim com os cristãos. Devemos
esquecer a classe social, a condição e a posição quando estamos na igreja de Cristo.
Lembra-te, cristão, de como foi o teu Mestre — um homem dos pobres. Ele viveu com eles,
e comeu com eles. E vós andareis de nariz empinado, empertigados, olhando com
insuportável desprezo para os miseráveis vermezinhos? Quem sois vós? Os mais
desprezíveis de todos, pois vossos adornos e artifícios vos deixam orgulhosos. Almas
lamentáveis e desprezíveis que sois! Como pareceis pequenos aos olhos de Deus! Cristo
foi humilde, Ele Se humilhou para poder servir aos outros. Ele não teve orgulho; Ele foi um
homem humilde, um amigo de publicanos e pecadores, que viveu e andou com eles.
Portanto, cristão, sê como teu Mestre — alguém que pode se humilhar; sim, sê tu aquele
que não pensa em se humilhar, mas considera os outros superiores a si mesmo (Fp 2.3),
que considera uma honra sentar-se ao lado dos pobres do povo de Cristo, e diz: “Se meu
nome for escrito na parte mais obscura do livro da vida, isso é suficiente para mim, tão
indigno sou de ser por Ele notado”! Seja como Cristo em Sua humildade.

E assim, eu poderia continuar, queridos irmãos, falando de várias outras


características de Cristo Jesus; mas como vocês podem se lembrar delas tão bem quanto
eu, não vou falar mais. É muito fácil se sentar e descrever Jesus Cristo, pois Ele está
delineado em Sua Palavra. Creio que me faltaria tempo para lhes dar uma imagem
completa dEle; mas, deixem-me dizer o seguinte: imitem-nO em Sua santidade. Ele era
zeloso pelo Seu Senhor? Sejam vocês também. Andem por aí fazendo o bem. Não percam
tempo. Ele é precioso demais. Jesus negava a Si mesmo, jamais buscando Seu próprio
interesse? Façam o mesmo. Ele era piedoso? Sejam fervorosos em suas orações. Ele Se
submetia à vontade do Pai? Da mesma forma, submetam-se a Ele. Ele era paciente?
Aprendam a ser tolerantes. E acima de tudo, como a característica mais sublime de Jesus,
tentem perdoar seus inimigos como Ele perdoou; e que as magníficas palavras do Mestre:
“Pai, perdoa-lhes, porque não sabem o que fazem” (Lucas 23:34), ressoem sempre em
seus ouvidos. Quando estiverem prestes a se vingar, quando a raiva aflorar, puxem as
rédeas imediatamente e cuidem para não perder o controle. Lembrem-se, raiva é
insanidade temporária. Perdoem como esperam ser perdoados. Amontoem brasas vivas
sobre a cabeça de seu inimigo sendo bondosos para com ele (Rm 12.20). Pagar o mal com
o bem, lembrem-se, é ser semelhante a Cristo. Sejam semelhantes, então. Portanto, de
todas as formas, e por todos os meios, vivam de tal maneira que seus inimigos possam
dizer: “Ele esteve com Jesus”.

2. Agora, QUANDO É QUE OS CRISTÃOS DEVEM SER ASSIM? Digo isso porque
existe uma ideia no mundo de que as pessoas devem ser muito religiosas no domingo, mas
não importa o que serão na segunda-feira. Quantos pregadores são religiosos no domingo,
mas totalmente ímpios durante o resto da semana! Quantos há que vão à casa de Deus
com semblante solene, cantam junto com os outros e fingem orar, mesmo sem sentir nada,
mas que estão “em fel de amargura e laço de iniquidade”! (Atos 8:23). Isso se aplica a
algumas pessoas aqui presentes. Quando, então, um cristão deve ser como Jesus Cristo?
Será que há um momento em que ele pode tirar seu uniforme — quando o guerreiro pode
tirar sua armadura — e ser como as outras pessoas? Não mesmo! Que em todo o tempo e
em todos os lugares, o cristão seja aquilo que professa ser! Lembro-me de ter conversado
há algum tempo com uma pessoa que disse: “Não gosto das visitas que vêm à minha casa
e começam a falar sobre religião; acho que devemos ser religiosos somente nos domingos,
quando vamos à casa de Deus, mas não na sala de estar de casa”. Eu lhe disse que
haveria muito trabalho para os estofadores se só houvesse religião na casa de Deus.
“Como assim?”, ele perguntou. “Ora”, respondi, “deveríamos ter camas adequadas em
todos os locais de culto, pois certamente precisamos da religião para morrer e,
consequentemente, todos gostariam de morrer lá”. Sim, no final todos nós precisamos das
consolações de Deus, mas, como podemos esperar gozá-las se não obedecermos os
preceitos da religião durante a vida? Irmãos, deixem-me dizer: sejam como Cristo em todos
os momentos. Imitem-nO em público. A maioria de nós vive em algum tipo de comunidade;
muito são chamados a trabalhar diante de seus semelhantes todos os dias. Somos
observados; nossas palavras são ouvidas, nossa vida é examinada — esmiuçada. O
mundo, com seus olhos de águia, não deixa passar nada, observa tudo o que fazemos, e
somos alvo de críticas acirradas. Vivamos a vida de Cristo em público. Cuidemos para que
nosso Mestre seja visto, não nós mesmos — a fim de podermos dizer: “já não sou eu quem
vive, mas Cristo vive em mim” (Gálatas 2:20). Cuidem para levar isso para a igreja também,
vocês que já são membros. Sejam como Cristo na igreja. Quantos aqui não são como
Diótrefes, buscando preeminência? (3Jo 1.9). Quantos não estão tentando ter notoriedade e
poder sobre seus irmãos ao invés de se lembrar que a regra fundamental em nossas igrejas
é que todos são iguais — iguais como irmãos, iguais para serem recebidos como tais.
Portanto, tenham também o espírito de Cristo em suas igrejas, onde quer que estejam. Que
seus irmãos digam de vocês: “Ele esteve com Jesus”.

E, o mais importante, cuidem para que haja cristianismo em suas casas. Uma casa
religiosa é a melhor prova da verdadeira piedade. Não é a igreja, é a minha casa — não é o
meu ministro, é o meu companheiro no lar — que podem melhor avaliar quem sou — é o
empregado, o filho, a esposa, o amigo, que podem falar sobre o meu verdadeiro caráter.
Uma boa pessoa tornará sua casa melhor. Certa vez Rowland Hill (NT: 1744-1833, popular
pregador britânico) disse que ele não acreditava que uma pessoa pudesse ser um
verdadeiro cristão se seu cônjuge, seus filhos, seus empregados, e até mesmo seu gato e
seu cachorro, não fossem exemplares. Isso é ser crente. Se a sua casa não é a melhor por
causa do seu cristianismo — se as outras pessoas não puderem dizer: “Esta é uma casa
melhor que as outras”, não se engane — você não tem nada da graça de Deus. Que o seu
empregado, ao deixar o emprego, não diga: “Bem, a religiosidade dessa família é meio
esquisita; ninguém orava pela manhã, eu começava o dia com meu trabalho enfadonho,
ninguém orava à noite e, aos domingos, eu tinha que ficar em casa. Uma vez a cada quinze
dias, às vezes eu podia sair à tarde, quando não havia para onde ir e ouvir um sermão
sobre o evangelho. Meu senhor e minha senhora iam, é claro, a um lugar onde ouviam o
bendito evangelho de Deus — isso era muito importante para eles; quanto a mim, porém,
tinha de ficar com as sobras de algum pároco sobrecarregado depois do almoço”. Com
certeza, quem é cristão não age assim. Não! Pratique sua piedade em sua família. Que
todos digam que você vive sua religião na prática. Que isso fique claro na sua casa e no
mundo inteiro. Cuide de seu caráter lá, pois quem somos em casa é quem realmente
somos. Nossa vida longe de casa, com frequência, é uma parte emprestada, a parte de um
ator em uma grande cena; em casa, no entanto, o encanto é removido e as pessoas são o
que são. Cuide de seus deveres domésticos.

Outra vez, irmãos, antes que eu deixe este ponto, imitem Jesus em secreto. Quando
ninguém mais estiver vendo, somente Deus, quando as trevas o encobrirem, quando
estiverem longe da observação dos mortais, sejam como Jesus Cristo. Lembre-se do fervor
de Jesus, da Sua devoção secreta, quando, depois de pregar o dia inteiro, Ele Se esgueirou
nas sombras da noite para suplicar a ajuda de Deus. Lembre-se de como Sua vida toda foi
constantemente sustentada pela doce influência do Espírito Santo, derivada da oração.
Cuidem da sua vida secreta, a fim de que, quando ela for lida naquele último grande dia,
vocês não fiquem envergonhados. Sua vida íntima está escrita no livro de Deus, o qual um
dia será aberto diante de vocês. Se a vida inteira de algumas pessoas fosse conhecida, de
forma alguma seria vida; seria morte. Sim, mesmo de alguns cristãos verdadeiros é possível
dizer que quase não há vida. Uma existência empurrada com a barriga — uma rápida
oração diária — um suspiro, o suficiente para manter sua alma viva, nada mais. Ó, irmãos,
lutem para ser como Jesus Cristo. Queremos mais orações secretas neste momento. Tive
muito medo durante toda esta semana. Não sei se é verdade ou não, mas quando sinto
algo assim gosto de compartilhar com os irmãos da minha própria congregação. Estremeço
só de pensar que, estando longe do nosso próprio lugar (NT: a capela da New Park Street
estava passando por reformas e a congregação estava temporariamente se reunindo no
Exeter Hall, um salão de festas alugado), vocês deixem de orar com tanto fervor quanto
antes. Lembro-me de seus gemidos e de suas súplicas fervorosas — de como lotavam a
casa de oração e suplicavam a ajuda de Deus para o Seu servo. Neste momento não
podemos nos reunir daquela forma, mas vocês ainda oram em particular? Será que me
esqueceram? Deixaram de clamar a Deus? Oh! Meus amigos, eu lhes suplico com todas as
minhas forças. Lembrem-se de quem eu sou, e o que eu sou — apenas uma criança, com
pouca educação, pouco conhecimento, habilidade ou talento, e aqui sou chamado, semana
após semana, para pregar a tanta gente. Amados, ainda orais por mim? Será que Deus não
Se agrada de ouvir as vossas orações um milhão de vezes? Cessareis agora, quando um
poderoso avivamento está ocorrendo em tantas igrejas? Parareis justamente agora com
vossas petições? Não! Não! Ide para vossas casas e dobrai os joelhos, suplicai a Deus para
que ainda possais levantar as mãos como Moisés no cimo do outeiro, a fim de que Josué, lá
embaixo, pudesse lutar contra os amalequitas e vencer (Ex 17.10-13). Esta é a hora da
vitória, vamos perdê-la? Esta é a maré alta que nos fará flutuar sobre os recifes; agora,
vamos remar, vamos orar com fervor, clamando ao Espírito de Deus que encha as velas da
nossa embarcação! Vós que amais a Deus, de todos os lugares e de todas as
denominações, lutai por vossos ministros; orai por eles; por que Deus não derramaria o Seu
Espírito mesmo agora? Qual a razão pela qual nos seriam negadas épocas iguais à do
Pentecoste? Por que não nos prostramos como uma poderosa multidão diante dEle, neste
mesmo instante, e rogamos, por amor do Seu Filho, que Ele reavive Sua igreja decadente?
E, então, todos veriam que somos verdadeiramente discípulos de Jesus Cristo.

3. E, agora, em terceiro lugar, POR QUE OS CRISTÃOS DEVEM IMITAR A


CRISTO? A resposta é fácil e natural: em primeiro lugar, os cristãos devem ser como Cristo
pelo seu próprio bem. Pelo bem da sua honestidade e da sua reputação, que não sejam
considerados mentirosos diante de Deus e dos homens. Pela sua própria saúde, se
quiserem ser protegidos do pecado e impedidos de se desviar, que imitem o Senhor Jesus.
Pela sua própria felicidade, se quiserem beber vinho bem clarificado (Isaías 25.6); se
quiserem gozar da santa e doce comunhão com Jesus; se quiserem ficar acima dos
cuidados e tribulações deste mundo, que imitem Jesus Cristo. Ó, caros irmãos, não existe
nada tão proveitoso, que lhes dê tanta prosperidade, tanta ajuda, que os faça caminhar tão
depressa para o céu, mantenha suas cabeças erguidas e seus olhos radiantes de glória,
como a semelhança com Jesus Cristo. É quando, pelo poder do Espírito Santo, vocês são
capazes de andar com Jesus nas Suas próprias pegadas, trilhando nos Seus caminhos, são
mais felizes e mais reconhecidos como filhos de Deus. Pelo seu próprio bem, irmãos, eu
lhes digo: sejam como Cristo.

A seguir, por amor à sua religião, empenhem-se em imitar Jesus. Ah! Pobre religião,
tens sido fortemente atacada por cruéis inimigos, mas nem a metade do que tens sido ferida
por próprios teus amigos. Ninguém te fere tanto, ó cristianismo, quanto aqueles que
professam ser teus seguidores. Quem é que fere a bela mão da piedade? É o professo que
não vive à altura da sua profissão de fé; aquele que sob pretexto entra no aprisco, nada
mais sendo do que lobo em pele de cordeiro. Tais pessoas, senhores, prejudicam o
evangelho mais que quaisquer outras. Mais que o infiel escarnecedor, mais que o crítico
mordaz, elas prejudicam a nossa causa, a qual professam amar, mas suas ações
desmentem o seu amor. Cristão, amas esta causa? O nome do amado Redentor é precioso
para ti? Queres ver os reinos do mundo se tornarem os reinos de nosso Senhor e Seu
Cristo? Desejas ver o soberbo humilhado e o poderoso abatido? Anseias pela alma do
pecador perdido e queres ganhá-la e salvá-la do fogo eterno? Desejas impedir que ela caia
nas regiões dos condenados ao inferno? É teu desejo que Cristo veja a luta da sua alma e
fique muito satisfeito? Será que teu coração anseia pela alma imortal de teus
companheiros? Desejas vê-los perdoados? Sê, então, coerente com a tua religião. Anda na
presença do Senhor, na terra dos viventes (Salmos 116:9). Comporta-te como um eleito de
Deus. Lembra-te de como as pessoas devem ser em santo procedimento e piedade (2
Pedro 3:11). Esta é a melhor forma de converter o mundo; sim, tal conduta faria mais até
mesmo que os trabalhos missionários, por mais excelentes que sejam. Que todos vejam
que a nossa conduta é superior à dos demais; só então poderão acreditar que há alguma
coisa em nossa religião. Contudo, se nos veem de modo totalmente contrário àquilo que
declaramos, o que irão dizer? “Esses crentes não são melhores que os outros! Por que
deveríamos andar no meio deles”? E eles estarão totalmente certos. Isso é apenas bom
senso. Ah! Meus amigos, se amais a religião, por amor a ela, sede coerentes e andai no
amor de Deus. Segui a Cristo Jesus.

E então, colocando da forma mais enfática possível, deixem-me dizer: por amor a
Cristo, esforcem-se para ser como Ele. Ah! Se eu pudesse trazer o agonizante Senhor
Jesus aqui e deixá-lO falar com vocês! Minha própria língua está presa nesta manhã, mas
eu faria Seu sangue, Suas cicatrizes e Suas feridas falarem. Pobres bocas emudecidas,
peço a cada uma delas que fale em Seu nome. Jesus estaria aqui nesta manhã e lhes
mostraria Suas mãos! “Meus amigos”, Ele diria, “olhai para mim! Estas mãos foram
cravadas por vós. E vede o meu lado, ele foi aberto como fonte da vossa salvação. Vede
meus pés; ali entraram os cravos cruéis. Cada um destes ossos foi deslocado por amor de
vós. Estes olhos jorraram torrentes de lágrimas. Esta cabeça foi coroada de espinhos. Este
rosto foi esbofeteado; este cabelo, puxado; meu corpo se tornou fonte de dor e agonia.
Estremeço pendurado no sol ardente, e tudo isso por vós, meu povo. Não Me amareis
agora? Rogo que sejais como eu. Porventura existe pecado em mim? Não. Credes que sou
mais justo que milhares de justos e tenho mais amor que milhares de amores? Acaso vos
tenho prejudicado? Pelo contrário, não fiz tudo pela vossa salvação? Não estou agora
mesmo assentado ao lado do trono de Meu Pai intercedendo por vós? Se me amas, cristão,
ouve esta palavra; que as doces sílabas ecoem para sempre em teus ouvidos, como o som
ressonante de sinos prateados — “se Me amas, se Me amas, guarda os Meus
mandamentos”. Ó, cristão, que esse “se” fique contigo nesta manhã. “Se me amas”.
Glorioso Redentor! É mesmo um “se”? Precioso Cordeiro crucificado, pode haver um “se”?
O quê? Quando vejo Teu sangue derramado, é um “se”? Sim, choro ao dizer que é um “se”.
Muitas vezes, meus pensamentos o tornam um “se”, e minhas palavras, com frequência,
querem dizer “se”. Mas, ainda assim, creio que minha alma sente que não é um “se”

Nem aos meus olhos a luz é tão querida


Nem a amizade tão doce.

“Sim, eu Te amo, sei que Te amo. Senhor, Tu sabes todas as coisas, Tu sabes que eu Te
amo”, pode dizer o cristão. “Bem, então”, diz Jesus, olhando para baixo com afetuosa
aprovação, “já que tu me amas, guarda os meus mandamentos”. Ó amado, existe razão
mais forte que esta? É o argumento do amor e da afeição. Sê como Cristo, uma vez que a
gratidão requer obediência; assim o mundo saberá que estiveste com Jesus.

4. Ah! Então choras, e percebo que sentes a força da piedade, e alguns estão se
perguntando: “COMO POSSO IMITÁ-LO?” Assim, é minha tarefa, antes que saiam daqui,
dizer-lhes como podem ser transformados à imagem de Cristo.

Por isso, em primeiro lugar, queridos amigos, em resposta à sua pergunta,


deixem-me lhes dizer que vocês devem conhecer Cristo como seu Redentor antes de
segui-lO como seu Exemplo. Muito se fala sobre o exemplo de Jesus, e é difícil encontrar
alguém que não acredite que nosso Senhor tenha sido um homem santo e extraordinário,
que deve ser admirado. No entanto, por melhor que tenha sido Seu exemplo, seria
impossível imitá-lo se Ele também não tivesse sido nosso sacrifício. Sabeis que Seu sangue
foi derramado por vós? Podeis juntar-vos comigo nestes versos?

Ó, doces maravilhas daquela cruz,


Onde Deus, o Salvador, amou e morreu
Sua nobreza meu espírito seduz
Pelo precioso sangue que Ele verteu.

Nesse caso, vocês estão no caminho certo para imitar a Cristo. Mas não procurem imitá-lo
enquanto não forem banhados na fonte do sangue vertido de Suas veias. E isso não pode
ser feito por vocês mesmos; suas paixões são fortes e corrompidas demais, e vocês estarão
construindo sem alicerce, sem estrutura, o que fará a construção ser tão instável quanto um
sonho. Vocês não podem modelar sua vida de acordo com o molde de Cristo enquanto não
possuírem o Seu espírito, enquanto não forem revestidos da Sua justiça. “Bem”, dizem
alguns, “já chegamos até aí, o que fazemos agora? Conhecemos nosso interesse por Ele,
mas temos consciência das nossas múltiplas deficiências”. Por isso, agora quero lhes pedir
que estudem o caráter de Cristo. A Bíblia tem se tornado quase obsoleta, mesmo entre os
cristãos. Existem tantas revistas, periódicos e publicações efêmeras, que corremos o risco
de deixar o exame das Escrituras. Cristão, queres conhecer teu Mestre? Olha para Ele. Há
um poder tremendo no caráter de Cristo, pois quanto mais você o estuda, mais se conforma
a Ele. Vejo meu reflexo no vidro, vou embora e me esqueço de como eu era. Olho para
Cristo e me torno semelhante a Ele. Portanto, olhem para Ele, estudem-nO nos evangelhos,
examinem cuidadosamente o Seu caráter. Mas aí vocês dizem, “já fizemos tudo isso, mas
não progredimos muito”. Por isso, em seguida, corrijam sua pobre cópia todos os dias. À
noite, tentem relembrar todas as suas ações durante as vinte e quatro horas do dia,
examinando-as escrupulosamente. Quando recebo as provas de qualquer um dos meus
textos, tenho de anotar as correções à margem. Eu poderia ler cada um deles mais de
cinquenta vezes, mas, se não anotasse as correções, quando fossem impressos, eles
sairiam com os mesmos erros. Vocês devem fazer a mesma coisa; se, à noite, encontrarem
alguma falha, façam uma anotação à margem, para que saibam onde está o problema e, na
manhã seguinte, possam corrigi-lo. Façam isso todos os dias, observando continuamente
suas falhas, uma a uma, para que cada vez mais consigam evitá-las. Uma máxima dos
antigos filósofos dizia que, três vezes ao dia, deveríamos repassar nossas ações. Portanto,
vamos fazê-lo; não nos esqueçamos disso; examinemos a nós mesmos todas as noites e
vejamos onde temos falhado, para que possamos reformar a nossa vida.

Por último, o melhor conselho que posso lhes dar é que busquem mais do Espírito
de Deus, pois esta é a maneira de se tornarem parecidos com Cristo. São vãs todas as
tentativas de sermos como Ele se não buscarmos o Seu Espírito. Peguem um pedaço de
ferro frio e, se puderem, tentem entortá-lo. Que esforço inútil! Coloquem-no na bigorna,
peguem um martelo de ferreiro e batam com toda a força, sem parar, e também não
conseguirão nada. Agitem-no, virem-no, usem tudo o que estiver à mão, e ainda assim não
conseguirão dar a ele a forma que desejam. No entanto, coloquem-no no fogo, deixem que
amoleça e fique maleável, depois coloquem-no na bigorna, e cada martelada terá um efeito
poderoso para fazerem a forma que quiserem. Do mesmo modo, peguem seu coração, frio
e duro por natureza, e coloquem-no na fornalha; ali ele será amolecido, e depois poderá ser
transformado como cera e moldado à imagem de Jesus Cristo.

Ah, irmãos, o que mais posso dizer para reforçar nosso texto senão que, se sois
como Cristo na terra, sereis como Ele no céu? Se pelo poder do Espírito vos tornardes
seguidores de Jesus, vós entrareis na glória. Pois, no portão do céu está assentado um anjo
que não admite ninguém que não tenha as mesmas características de nosso adorável
Senhor. Eis que chega um homem com uma coroa na cabeça. “Pois não?” — diz o anjo —
“Você tem uma coroa, é verdade, mas aqui elas não são meios de acesso”. Outro se
aproxima, de manto e trajes acadêmicos. “Pois não?” — diz o anjo — “Ser culto e educado
é uma coisa boa, mas togas e erudição não são as marcas que o admitirão aqui”. Outro dá
um passo à frente, bem vestido, belo e atraente. “Pois não?” — diz o anjo — “Beleza pode
ser agradável na terra, mas aqui não tem importância”. E, então, surge mais um,
prenunciado pela fama e aclamado pela humanidade, mas o anjo diz: “Você está muito
bem, mas não tem o direito de entrar aqui”. Em seguida, aparece um outro — talvez tenha
sido pobre, sem instrução — mas o anjo, ao olhar para ele, sorri e diz: — “É Cristo outra
vez; eis uma segunda edição de Cristo. Entra, entra. Terás a glória eterna. Tu és como
Cristo; no céu te assentarás, pois tu és como Ele”. Ser como Cristo é entrar no céu; mas ser
diferente dEle é descer ao inferno. No final, os semelhantes serão reunidos, joio com joio,
trigo com trigo. Se pecastes com Adão e morrestes, estareis com os espiritualmente mortos
para sempre, a menos que ressusciteis em Cristo para uma nova vida; então, viveremos
com Ele por toda a eternidade. Trigo com trigo, joio com joio. “Não vos enganeis: de Deus
não se zomba; pois aquilo que o homem semear, isso também ceifará” (Gálatas 6.7). Vão
para casa com este único pensamento, meus irmãos, para que possam provar a si mesmos
por Cristo. Se vocês são como Cristo, são de Cristo e estarão com Cristo. Se forem
diferentes dEle, não terão parte na grande herança. Que o meu pobre discurso os ajude a
limpar o chão e exibir a palha; sim, que ele possa levar muitos de vocês a buscarem ser
participantes da herança dos santos na luz (Cl 1.12), para o louvor da Sua graça. A Ele seja
toda a honra! Amém.
Tradução e revisão: Mariza Regina de Souza

Você também pode gostar