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CÂMARA DOS DEPUTADOS

Liderança da Minoria

REPRESENTAÇÃO AO MINISTÉRIO PÚBLICO FEDERAL

MARCELO RIBEIRO FREIXO, Líder da Minoria na Câmara dos


Deputados,;

ALESSANDRO MOLON, Líder da Oposição na Câmara dos


Deputados;

ELVINO JOSÉ BOHN GASS (BOHN GASS), Líder do Partido na


Câmara dos Deputados;

DANILO JORGE DE BARROS CABRAL, Líder do Partido na


Câmara dos Deputados;

WOLNEY QUEIROZ MACIEL, Líder do Partido na Câmara dos


Deputados;

TALÍRIA PETRONE SOARES, Líder do Partido na Câmara dos


Deputados;

RENILDO VASCONCELOS CALHEIROS, Líder do Partido na


Câmara dos Deputados;

JOENIA BATISTA DE CARVALHO (JOENIA WAPICHANA), Líder


do Partido na Câmara dos Deputados;

vêm, diante de Vossa Excelência, com fundamento no art. 127, caput e art. 129, II
e III, ambos da Constituição Federal, e no art. 46, III, da Lei Complementar nº
75, de 1993, ofertar a presente

REPRESENTAÇÃO

contra ato ilegal e imoral, em face do SR. ANDERSON TORRES, Ministro da


Justiça e da Segurança Pública e do SR. PAULO MAIURINO, Diretor-Geral da
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Polícia Federal, além de outros eventuais responsáveis, para instauração de


competente inquérito civil ou procedimento análogo, ante as razões de fato e
direito adiante expostas.

I. DOS FATOS

Em 14 de abril, o então superintendente da Polícia Federal no


Estado do Amazonas, o Sr. Alexandre Saraiva – à frente de inquéritos policiais
que apuram crimes ambientais graves naquele estado – encaminhou ao Supremo
Tribunal Federal, ao Ministério Público Federal e à Direção-Geral da Polícia
Federal uma notícia-crime detalhando o cometimento de crimes por parte do
Ministro do Meio Ambiente, o Sr. Ricardo Salles1.

Além do Ministro, também foram denunciados o Senador


Telmário Mota (Pros/RR) e o Presidente do Ibama, Eduardo Bim, imputando-se
os crimes previstos no Artigo 69 da Lei 9605/98 (Lei de Crimes Ambientais), Art.
321 do Código Penal (Advocacia Administrativa) e Artigo 2o, § 1o da Lei
12.850/2013 (Organização Criminosa).

As condutas teriam sido cometidas no âmbito da Operação


Handroanthus, que, capitaneada pela Superintendência Regional no Amazonas,
foi responsável pela apreensão recorde de aproximadamente 200.000 m3
(duzentos mil metros cúbicos) de madeira em toras extraídas ilegalmente por
organizações criminosas que atuam na região.

Ocorre que o atual Diretor-Geral da Polícia Federal, o Sr. Paulo


Maiurino, decidiu trocar o comando da PF no Amazonas, retirando do posto o Sr.
Alexandre Saraiva, um dia após o encaminhamento da notitia criminis
supracitada.

Em entrevista à Folha de São Paulo no último dia 04 de abril, o


ex-superintendente da Polícia Federal no Amazonas afirmou que “é a primeira

1
Disponível em: https://veja.abril.com.br/blog/jorge-pontes/policia-federal-encaminha-noticia-crime-
contra-ricardo-salles/. Acessado em: 15 de abril de 2021.
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vez que vê um ministro do Meio Ambiente se manifestar de maneira contrária a


uma ação que visa proteger a floresta amazônica”2.

O novo Diretor-Geral da Polícia Federal, segundo demonstrou a


Coluna Painel do Jornal Folha de São Paulo3, está fazendo diversas mudanças no
órgão. Em São Paulo, por exemplo, ele tirou o superintendente estava a menos de
um mês no cargo e fugiu do padrão ao escolher o substituto.

A Polícia Federal é órgão subordinado ao Ministro da Justiça e


Segurança Pública. Em outras palavras, é órgão de estado e não órgão de governo.
Caso assim não o fosse, a Polícia Federal poderia ter o risco de se tornar uma
polícia política. Ou seja, não deve ser utilizada como instrumento persecutório de
adversários ou críticos do Governo Federal.

É algo inaceitável numa democracia ocorram perseguições


política como a que se consumou em face do superintendente da Polícia Federal
do Amazonas, visto que o mesmo foi afastado do seu cargo apenas por cumprir
devidamente a sua função.

Infelizmente, não é a primeira vez que a Polícia Federal é


utilizada dessa forma pelo Governo de Jair Bolsonaro. As declarações feitas pelo
ex-Ministro da Justiça e Segurança Pública, o Sr. Sérgio Moro, acerca da tentativa
do Presidente Jair Bolsonaro de interferir politicamente na Polícia Federal com a
finalidade de proteger sua prole, resultou na instauração no Supremo Tribunal
Federal do Inquérito (INQ) nº 4831.

O também ex-Ministro da Justiça e da Segurança Pública, o Sr.


André Mendonça, foi outro que utilizou de forma demasiadamente ilegal a Polícia
Federal. Por exemplo, em 24 de julho de 2020, o Portal de Notícias UOL4
publicou matéria na qual trouxe à tona a denúncia de que o então Ministro da
Justiça e Segurança Pública estaria utilizando a Secretaria de Operações

2
Disponível em: https://www1.folha.uol.com.br/ambiente/2021/04/na-policia-federal-nao-vai-passar-
boiada-diz-chefe-da-pf-no-amazonas.shtml. Acessado em: 15 de abril de 2021.
3
Disponível em: https://www1.folha.uol.com.br/colunas/painel/2021/04/diretor-geral-da-pf-decide-
trocar-chefe-no-amazonas-que-pediu-investigacao-contra-salles.shtml. Acessado em: 15 de abril de 2021.
4
Disponível em: https://noticias.uol.com.br/colunas/rubens-valente/2020/07/24/ministerio-justica-
governo-bolsonaro-antifascistas.htm. Acessado em: 19 de março de 2021.
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Integradas (SEOPI) para monitorar policiais integrantes do movimento


antifascistas e professores universitários.

Tal fato não foi algo isolado. Em agosto de 2020, a Polícia Federal
intimou o colunista do jornal Folha de São Paulo, Hélio Schwartsman, a depor
em inquérito no qual é investigado por um artigo publicado em junho do mesmo
ano. A investigação também foi aberta a pedido do Ministro da Justiça e
Segurança Pública, com base na Lei de Segurança Nacional.

Em razão dos fatos extremamente graves e que afrontam o


ordenamento jurídico pátrio, requer-se, portanto, que medidas urgentes sejam
tomadas para coibir a Polícia Federal venha a se tornar um órgão apenas a serviço
das vontades pessoais dos membros do Governo Federal e da família do
Presidente da República, bem como responsabilizá-los penal e
administrativamente pelos atos narrados.

II. DO DIREITO

Todo aquele que ocupa um cargo público deve agir de acordo com
as competências que lhe foram atribuídas e observar os limites impostos pela
Constituição para perseguir os objetivos e finalidades inerentes a essas
competências.

Em razão da utilização da Polícia Federal como instrumento


persecutório, há uma evidente violação dos princípios constitucionais dispostos
no artigo 37 da Constituição Federal, especialmente, os princípios da legalidade,
impessoalidade e moralidade, por parte dos Representados.

Trata-se, a toda evidência, de evidente abuso do poder e desvio


de finalidade manifestado pelos fatos narrados, na medida em que acaba por
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atuar contrariamente ao interesse público, ferindo especialmente à probidade


administrativa, conceito inerente à democracia.

O princípio da impessoalidade proíbe que o ato praticado pela


Administração Pública tenha qualquer sentido de individualismo, perseguição ou
censura. Os Representados, além dos demais possíveis envolvidos no caso,
infringiram os princípios constitucionais, tendo ferido o interesse público ao não
respeitar, especialmente, os princípios da moralidade, impessoalidade e
legalidade, numa ação com notório desvio de finalidade e abuso de poder. Ou
seja, seguiram a agenda política do Presidente da República,
colocando os ditames democráticos em segundo plano, avançando
nos ataques à democracia.

O jurista Marçal Justen Filho define o princípio da


impessoalidade da seguinte maneira:

o princípio da impessoalidade implica, para a


Administração Pública, o dever de agir segundo regras
objetivas e controláveis racionalmente. Desta forma,
acentua-se a funcionalidade do agir administrativo e
concretiza-se o princípio da igualdade.

No tocante ao princípio da moralidade, temos que a ideia de


moralidade administrativa introduz um conceito de boa administração. Nesse
sentido, voto do Ministro Celso de Mello:

(...) O princípio constitucional da moralidade


administrativa, ao impor limitações ao exercício do poder
estatal, legitima o controle jurisdicional de todos os atos do
Poder Público que transgridam os valores éticos que devem
pautar o comportamento dos agentes e órgãos
governamentais. (Supremo Tribunal Federal. Mandado de
Segurança nº. 24458 – DF, Relator: Ministro Celso de
Mello. Julgamento: 18.2.2003. Diário da Justiça da União,
21.2.2003).

Conforme doutrina e jurisprudência consolidada, que tais


princípios têm força normativa e devem ser seguidos em todos os âmbitos da
administração pública. A violação de tais dispositivos configura o enquadramento
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na Lei de improbidade administrativa (Lei 8.429/1992).

A postura dos Representados pode se enquadrar na lei de


improbidade administrativa, conforme se observa:

Art. 4° Os agentes públicos de qualquer nível ou hierarquia são


obrigados a velar pela estrita observância dos princípios de
legalidade, impessoalidade, moralidade e publicidade
no trato dos assuntos que lhe são afetos.(...)

Art. 11. Constitui ato de improbidade administrativa que atenta


contra os princípios da administração pública qualquer ação ou
omissão que viole os deveres de honestidade, imparcialidade,
legalidade, e lealdade às instituições, e notadamente:

I - praticar ato visando fim proibido em lei ou regulamento ou


diverso daquele previsto, na regra de competência;

A conduta dos Representados também incidiu nos dispositivos


de advocacia administrativa e prevaricação previstos no Código Penal, por
configurar a prática de conduta absolutamente contrária àquilo que determina a
lei, uma vez que ele estaria utilizando o cargo para a defesa da agenda política do
Presidente da República. Percebe-se:

Advocacia administrativa

Art. 321 - Patrocinar, direta ou indiretamente, interesse


privado perante a administração pública, valendo-se da
qualidade de funcionário:

Pena - detenção, de um a três meses, ou multa.

Parágrafo único - Se o interesse é ilegítimo:

Pena - detenção, de três meses a um ano, além da multa.

Prevaricação

Art. 319 - Retardar ou deixar de praticar, indevidamente,


ato de ofício, ou praticá-lo contra disposição expressa de
lei, para satisfazer interesse ou sentimento pessoal:
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Pena - detenção, de três meses a um ano, e multa.

A Polícia Federal, órgão subordinada administrativamente ao


Ministério da Justiça e Segurança Pública, não pode ser utilizada como
instrumento de perseguição política.

Com a promulgação da Constituição Federal de 1988, o Brasil se


constitui como Estado Democrático de Direito. Ou seja, o estado brasileiro é
regido por regras democráticas, respeitado os direitos fundamentais. A
instituição nacionais devem respeitar o ordenamento jurídico pátrio e servir a
população.

Por tais razões de fato e de direito, requer-se ao parquet que tome


as medidas necessárias para investigar os Representados, sendo defensor fiel da
Carta Magna.

III. DOS PEDIDOS

De acordo com o artigo 127 da Constituição Federal, o Ministério


Público é função essencial à justiça, incumbindo-lhe a defesa da ordem jurídica,
do Estado Democrático de Direito e dos interesses sociais e individuais
indisponíveis.

É papel do Ministério Público investigar e representar os


interesses indisponíveis da população. Assim, requeremos o que segue:

a) O acolhimento da presente Representação por parte da Procuradoria-


Geral da República;

b) Verificadas irregularidades no cumprimento ou o descumprimento dos


ditames legais/constitucionais, que sejam tomadas as providências legais
cabíveis, inclusive com a possibilidade de anulação da nomeação do novo
Superintendente da Polícia Federal no Amazonas;
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c) Por fim, que os Representados sejam responsabilizados na forma da lei.

Nestes termos, pede o deferimento.

Brasília, 15 de abril de 2021

Deputado Federal Marcelo Freixo (PSOL/RJ)


Líder da Minoria da Câmara dos Deputados

Deputado Federal Alessandro Molon (PSB/RJ)


Líder da Oposição da Câmara dos Deputados

Deputado Federal Bohn Gass (PT/RS)


Líder da bancada do PT na Câmara dos Deputados

Deputado Federal Danilo Cabral (PSB/PE)


Líder da bancada do PSB na Câmara dos Deputados

Deputado Federal Wolney Queiroz (PDT/PE)


Líder da bancada do PDT na Câmara dos Deputados

Deputada Federal Talíria Petrone (PSOL/RJ)


Líder da bancada do PSOL na Câmara dos Deputados
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Deputado Federal Renildo Calheiros (PCdoB/PE)


Líder da bancada do PCdoB na Câmara dos Deputados

Deputado Federal Joenia Wapichana (Rede/RR)


Representante da bancada da Rede na Câmara dos Deputados

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