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Faculdade de Medicina da UFMG

Departamento de Anatomia Patoló gica e Medicina Legal - APM

MEDICINA LEGAL
PROF. LUCIANA GAZZOLA
2020.2

TEMA 3
TANATOLOGIA FORENSE
MORTE ENCEFÁLICA E TRANSPLANTES

Tanatologia forense 🡪 parte da Medicina Legal que estuda a morte, os fenô menos
cadavéricos e a legislaçã o pertinente.

Necropsia x perinecroscopia

Tipos de morte:

1) Morte “natural”- por antecedentes patoló gicos


2) Morte suspeita
3) Morte violenta - por causas externas

Obs.: 1. E a morte por omissã o de socorro?

2. E a morte em cirurgias eletivas?

3. E a morte sob custó dia?


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Necropsia clínica

Exemplos: morte sem uma devida explicaçã o durante uma cirurgia; enfermidades raras;
pacientes que se submeteram a protocolos de pesquisas clínicas; mortes perinatais e
infantis precoces; sem diagnó stico clínico confiá vel.

Há obrigatoriedade normativa?

Perícia de sobrevivência

Premoriência e comoriência (art. 8º, CC)

“Art. 8o Se dois ou mais indivíduos falecerem na mesma ocasiã o, nã o se podendo


averiguar se algum dos comorientes precedeu aos outros, presumir-se-ã o
simultaneamente mortos.”

1) Morte sú bita/instantâ nea

2) Morte mediata

3) Morte agô nica ou tardia

Perícia do tempo de sobrevivência

“Docimá sias da agonia”

1) Docimá sias hepá ticas

2) Docimá sias suprarrenais


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Diagnóstico da realidade da morte

Morte – quando ela ocorre?

⮚ A morte é um processo, uma sucessã o de eventos, e nã o um momento!


⮚ A necessidade legal e científica de se fixar um marco...
⮚ A evoluçã o do conhecimento científico até a adoçã o do critério da morte
encefá lica.

Morte encefálica

✔ É a perda definitiva e irreversível das funçõ es encefá licas e das cerebrais


relacionadas à existência consciente.
✔ É a condiçã o final, irreversível, definitiva de cessaçã o das atividades do tronco
encefá lico.
✔ É a lesã o final do encéfalo, isquêmica, anó xica ou metabó lica.
✔ Morte encefá lica x coma
✔ Dificuldade: como diferenciá -la das situaçõ es em que ainda é possível alguma
recuperaçã o neuroló gica...

Morte encefálica – critérios diagnósticos

I - Descartar causas reversíveis de coma capazes de mimetizar ME:


Hipotermia, Choque, Intoxicaçã o por drogas, Distú rbios metabó licos
Obs.: causa desconhecida – iniciar protocolo???

II - Exame Clínico e Teste da Apneia


Exame Clínico: pesquisa de reflexos (pupilar, corneano, tosse, etc), estímulo doloroso
(face)
Teste da apneia (ú ltimo teste): existe movimento ventilató rio espontâ neo?

III - Exames Complementares


EEG, angiografia (padrã o ouro), doppler
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Critérios clínicos:

- Ausência de resposta ao comando verbal ou visual.


- Flacidez, ausência de movimentos voluntá rios; arreflexia de extremidades (cuidado!
Reflexos medulares nã o excluem ME).
- Ausência de movimentos involuntá rios, restriçã o ou hesitaçã o pelo paciente aos
estímulos.
- Pupilas arreativas ao estímulo luminoso (fixas).
- Ausência de reflexo ó culo-cefá lico (olhos fixos ao se virar a cabeça);
- Ausência de reflexo corneano (nã o pisca ao ser estimulado).
- Ausência de respiraçã o espontâ nea (estímulo para respirar com [55mmHG] de CO2 no
sangue).

Atenção!!!
Mudanças na legislaçã o e na Resoluçã o do CFM em 2017.

Resolução CFM 2.173/2017

Art. 1º. Os procedimentos para determinaçã o de morte encefá lica (ME) devem ser
iniciados em todos os pacientes que apresentem coma nã o perceptivo, ausência de
reatividade supraespinhal e apneia persistente, e que atendam a TODOS os seguintes
pré-requisitos:
a) Lesã o encefá lica de causa conhecida, irreversível e capaz de causar ME;
b) Ausência de fatores tratá veis que possam confundir o diagnó stico de ME;
c) Tratamento e observaçã o em hospital pelo mínimo de 6 horas (se encefalopatia
hipó xico-isquêmica, mínimo de 24 horas);
d) Temperatura superior a 35 oC, saturaçã o de O2 acima de 94% e PAS maior ou igual a
100 mmHG para adultos (crianças – tabela).

Art. 2º. É obrigató ria a realizaçã o mínima dos seguintes procedimentos para
determinaçã o da ME:
a) Dois exames clínicos que confirmem coma nã o perceptivo e ausência de funçã o do
tronco encefá lico;
b) Teste de apneia que confirme ausência de movimentos respirató rios apó s
estimulaçã o má xima dos centros respirató rios;
c) Exame complementar que comprove ausência de atividade encefá lica.

Obs.: 2 exames clínicos (2 médicos diferentes), 1 teste de apneia, 1 exame complementar


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Resolução CFM 2.173/2017


(Art. 3º: duas avaliações clínicas e intervalo de tempo)

IDADE INTERVALO (em horas)


7 dias a 2 meses
2 meses a 2 anos
Maior de 2 anos

Atençã o à s mudanças: até 2017, era necessá rio aguardar o intervalo de 6 horas para os
dois exames clínicos e complementares, em todos os pacientes acima de 2 anos de idade,
inclusive adultos!

Art. 4º. O teste de apneia deverá ser realizado uma ú nica vez por um dos médicos
responsá veis pelo exame clínico e deverá comprovar ausência de movimentos
respirató rios na presença de hipercapnia (PaCO2 > 55mmHg).

Art. 5º. O exame complementar deve comprovar de forma inequívoca uma das seguintes
condiçõ es:
a) ausência de perfusã o sanguínea encefá lica ou (angiografia, doppler, cintilografia...)
b) ausência de atividade metabó lica encefá lica ou, (PET, extração cerebral de O2)
c) ausência de atividade elétrica encefá lica.

- Necessidade de preenchimento do Termo de Declaraçã o de Morte Encefá lica e do


prontuá rio do paciente (art. 7º);
- Esclarecimento dos familiares (art. 8º) e direito de que eles indiquem um médico
de sua confiança, desde que eventual demora nã o inviabilize o procedimento
diagnó stico;
- Hora da morte na declaraçã o de ó bito: momento da conclusã o do ú ltimo
procedimento para determinaçã o da ME (art. 9º);
- Direçã o técnica do hospital vai indicar os médicos especificamente capacitados
para o procedimento, que nã o podem participar de equipes de remoçã o e
transplante (art. 10).

Obs.: Constatada a ME em nã o doador, pode-se suspender os procedimentos de suporte


terapêutico???

Resolução CFM 1826/2007

Art. 1º É legal e ética a suspensã o dos procedimentos de suportes terapêuticos quando


determinada a morte encefá lica em nã o-doador de ó rgã os, tecidos e partes do corpo
humano para fins de transplante, nos termos do disposto na Resoluçã o CFM nº 1.480, de
21 de agosto de 1997, na forma da Lei nº 9.434, de 4 de fevereiro de 1997.
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§ 1º O cumprimento da decisã o mencionada no caput deve ser precedida de


comunicaçã o e esclarecimento sobre a morte encefá lica aos familiares do paciente ou
seu representante legal, fundamentada e registrada no prontuá rio.
§ 2º Cabe ao médico assistente ou seu substituto o cumprimento do caput deste
artigo e seu pará grafo 1º.
Art. 2º A data e hora registradas na Declaraçã o de Ó bito serã o as mesmas da
determinaçã o de morte encefá lica.

Lei dos transplantes – Lei 9434/1997

Art. 1º A disposiçã o gratuita de tecidos, ó rgã os e partes do corpo humano, em vida ou


post mortem, para fins de transplante e tratamento, é permitida na forma desta Lei.
Pará grafo ú nico. Para os efeitos desta Lei, nã o estã o compreendidos entre os tecidos a
que se refere este artigo o sangue, o esperma e o ó vulo.

Consentimento:

⮚ Em 1997: consentimento presumido forte – salvo manifestaçã o expressa em


contrá rio, a doaçã o era presumida. Se a pessoa nã o quisesse ser doadora, a
expressã o “nã o doador de ó rgã os e tecidos” deveria estar gravada na CI e na CNH.

⮚ Em 2001: revoga-se a doaçã o presumida:

Art. 4º - A retirada de tecidos, ó rgã os e partes do corpo de pessoas falecidas para


transplantes ou outra finalidade terapêutica, dependerá da autorizaçã o do cô njuge ou
parente, maior de idade, obedecida a linha sucessó ria, reta ou colateral, até o segundo
grau inclusive, firmada em documento subscrito por duas testemunhas presentes à
verificaçã o da morte. (redação dada pela Lei 10.211 de 2001)

Doação – consentimento

Post mortem

⮚ Consentimento informado: cô njuge (e companheiro) ou familiar até 2º grau e


duas testemunhas
- se juridicamente incapaz: ambos pais se vivos ou os responsá veis legais
- pessoas nã o identificadas: nã o podem ser doadoras
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⮚ As manifestaçõ es de vontade relativas à retirada post mortem de tecidos, ó rgã os


e partes, constantes da Carteira de Identidade Civil e da Carteira Nacional de
Habilitaçã o, perderam sua validade a partir de 01 de março de 2001.

Obs.: o parentesco jurídico

Doação – consentimento

Doador vivo

⮚ Pessoa juridicamente capaz pode dispor gratuitamente de T/O/PCH para fins


terapêuticos:
- em cô njuges ou parentes consanguíneos até o 4º grau, inclusive, ou
- em qualquer outra pessoa, mediante autorizaçã o judicial (exceto para medula
ó ssea).

⮚ Menores de idade, mesmo com consentimento dos pais, nã o podem ser doadores
em vida (exceçã o: medula ó ssea: consentimento e autorizaçã o judicial).

⮚ O caso das gestantes: MO e risco à sua saú de ou do feto

⮚ Só é permitida a doaçã o de ó rgã os duplos ou de partes de O/T/PCH cuja retirada


nã o cause ao doador comprometimento de suas funçõ es.
⮚ A retirada só será permitida se corresponder a uma necessidade terapêutica
comprovadamente indispensá vel e inadiá vel do receptor.
⮚ A doaçã o poderá ser revogada pelo doador a qualquer momento, antes de
iniciado o procedimento.
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Obs.: Decreto 9.175 de 2017 dispensou a presença de um neurologista para realizaçã o


do protocolo de diagnó stico de morte encefá lica: requisito passa a ser “médicos
especificamente capacitados”.

Decreto 9.175/2017
E Resolução CFM 2.173 de 2017

O que é ser um “médico especificamente capacitado” para a realizaçã o do protocolo de


diagnó stico de ME ????
Mínimo de um ano de experiência no atendimento de pacientes em coma +
🡪 que tenha acompanhado ou realizado pelo menos 10 determinaçõ es de ME ou
🡪 que tenha realizado curso de capacitaçã o para determinaçã o de ME, nos moldes
do anexo da Resoluçã o.

Diagnóstico de morte encefálica

⮚ Os familiares serã o obrigatoriamente informados do início do procedimento para


a verificaçã o da morte encefá lica.
⮚ É admitida a presença de médico de confiança da família no ato de comprovaçã o
e atestaçã o da morte encefá lica.
⮚ Todos os estabelecimentos de saú de devem comunicar a Central Estadual de
Transplante, em cará ter de urgência, o diagnó stico de morte encefá lica.
⮚ Se nã o dispuser de condiçõ es para a comprovaçã o de morte encefá lica ou para a
remoçã o de O/T/PCH, a Central acionará profissionais habilitados para
efetuarem ambos os procedimentos.
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Alocação

⮚ As Centrais de Captaçã o e Distribuiçã o de Ó rgã os indicarã o a destinaçã o dos


ó rgã os observando a ordem dos receptores inscritos com compatibilidade para
recebê-los.

⮚ A ordem de inscriçã o pode deixar de ser observada:

- (in)compatibilidade;
- distâ ncia e condiçõ es de transporte;
- tempo de deslocamento do receptor;
- urgência.
- transplante inter vivos

⮚ Nã o se admite a inscriçã o de receptores em mais de uma Central.

Obs.: E o sigilo???

✔ Decreto 9.175, de 18 de outubro de 2017


Art. 52. Na hipó tese de doaçã o post mortem, será resguardada a identidade dos doadores
em relaçã o aos seus receptores e dos receptores em relaçã o à família dos doadores.

Perspectivas a serem definidas...

⮚ Condiçõ es de exclusã o de potenciais doadores devido a riscos de transmissã o de


infecçã o ou neoplasia.
⮚ Maior controle judicial nos transplantes com doador vivo nã o parente.
⮚ Realizaçã o de necropsias em bloco cirú rgico.

⮚ Pesquisa com células-tronco ?


⮚ Transplante de espermatogô nias ?
⮚ Cultivo e criopreservaçã o de células ?

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