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Precursores do Nacionalismo Musical Brasileiro

Nas últimas décadas do século XIX surgiu uma nova corrente estética que ganhou
rapidamente o agrado do grande público europeu como alternativa válida para os
exageros da ópera italiana. Essa nova tendência se chamou Nacionalismo Musical,
isto é, música escrita com teor de nacionalismo, seja direto ou indireto.

O sucesso (desse tipo de composição) foi considerável pelo aspecto exótico que tal
atitude estética representava. Essa tendência continuou pelo século XX com bastante
sucesso até a Segunda Guerra Mundial.

No Brasil essa valorização das riquezas folclóricas nacionais encontrou resistência


por parte de uma sociedade ainda demasiadamente dependente dos gostos europeus.
Como a parte mais rica do nosso populário nacional vinha dos escravos, o público
musical das sociedades de concertos olhava com certo desprezo tudo o que pudesse
vir do povo. No fim do século XIX, existia uma nítida subvalorização da contribuição
cultural das camadas mais baixas da sociedade. Ainda em 1920 era preciso disfarçar
os sambas sob o título de “tangos” para que pudessem ser aceitos. A Semana de Arte
Moderna teve efeito preponderante em 1922 para o reconhecimento dos méritos da
música de caráter nacional, que acabou sendo aceita como arte moderna. Essa música
baseada no folclore já vinha obtendo aplausos na Europa havia, talvez, uns cinquenta
anos, mas a distância e os preconceitos pós-coloniais atrasaram sua consagração entre
nós.

Por volta de 1870, começam a surgir as primeiras composições impressas dessa nova
tendência, porém, é importante lembrar que anteriormente, mesmo a música colonial,
alguns tipos de música já podiam ser consideradas “nacionais”, como os Lundus e as
Modinhas, compostas por José Maurício, Elias Alvares Lobo, Francisco Manuel da
Silva etc.
Compositores
Brasilio Itiberê

Brasílio Itiberê da Cunha nasceu em Paranaguá, em 8 de setembro de 1846


em uma família musical: se destacaram pai, tio, irmãos, sobrinho. A escolha de seu
nome já reflete duplamente a “postura nacionalista” de que fala Sérgio CABRAL
(1997, p. 39): “Assim, surgiram os Brasílio Itiberê, os Índios do Brasil, os Suassuna e
os sobrenomes indígenas...”. Se o pai derivou seu primeiro nome do país, o próprio
Brasílio teria sugerido a adição do nome indígena Itiberê, rio afluente do Paranaguá
(MARIZ, 1994, p. 116). Estudou violino, mas foi ao piano, cujas primeiras lições lhe
ministrou a irmã Maria Lourença (CASTAGNA, 2008, p. 10), que Brasílio Itiberê se
tornou conhecido como virtuoso e compositor. Aos 20 anos, ingressou na Faculdade
de Direito de São Paulo onde teve, como colegas, futuros ilustres e influentes
personalidades como Rui Barbosa, Rodrigues Alves, Afonso Pena e Castro Alves.
Estímulos para a busca de um nacionalismo, em todos os sentidos, não faltaram no
ambiente acadêmico, como “...o desejo que temos de ver nacionalizada também a
Música no Brasil... A nossa natureza esplêndida, a nossa educação política, os
costumes e as inclinações do nosso povo devem necessariamente inspirar nossos
artistas...”, de que falava o ativista Vicente Xavier de Toledo em 1867 (RESENDE,
1954, p. 221).
Embora ainda estivesse se dedicando à finalização de seu Curso de Direito,
não estava alheio à crescente efervescência do pianismo que a sociedade paulista
experimentava na segunda metade do século XIX. Paulo CASTAGNA (2008, p. 9)
lembra da possível influência de pianistas virtuosos de consolidadas carreiras
internacionais que se apresentaram no Brasil, como Sigismond Thalberg (1812-1871)
em 1855 e o norte-americano Louis Moreau Gottschalk (1828-1869), que aqui
residiu. No ano de 1869, tanto a Casa Levy quanto a loja de música paulista Madame
Fertin anunciavam o recebimento de novas obras para piano para seu ávido público e,
entre essas, a fantasia característica A Sertaneja de Brasílio Itiberê.
Já Bacharel em Direito, viajou para o Rio de Janeiro, onde procurou divulgar
sua obra. Em um de seus concertos, realizado na Quinta da Boa Vista, contou com a
presença do Imperador D. Pedro II quem, encantado com o artista e dentro de uma
prática do que se tornaria comum na corte brasileira, ofereceu-lhe um custeio para
completar seus estudos na Europa. Esta ajuda, entretanto, devido à formação
acadêmica de Brasílio Itiberê, ao contrário daquela da maioria dos músicos
brasileiros, acabou se traduzindo em um cargo oficial no corpo diplomático, a convite
da Princesa Isabel em 1870 (CASTAGNA, 2008, p. 10). Na sua trajetória política,
morou em diversos países da Europa e América do Sul: Prússia, Itália, Bélgica,
Bolívia, Peru, Paraguai e Portugal. No Paraguai, teve destacada atuação no processo
de reestabelecimento da paz após a guerra contra a Tríplice Aliança (Brasil,
Argentina e Uruguai).
Mas foi nos períodos de residência nos países europeus que pode continuar
seus estudos musicais e se aproximar de reconhecidos compositores e instrumentistas.
Sua posição como adido cultural brasileiro facilitou seu trânsito no meio musical,
sendo que o período em Roma, entre 1873 e 1882, foi dos mais intensos. Em um
evento, na mesma noite, reuniu três dos mais renomados pianistas: Giovanni
Sgambati, Franz Liszt e Anton Rubinstein, o último para o qual teria escrito
um Estudo de Concerto (ACADEMIA BRASILEIRA DE MÚSICA, 2008). Relatos
espúrios contam da troca de gentilezas entre Brasílio Itiberê e Liszt que teriam lido,
cada um, uma obra do outro: nosso compositor teria tocado as Soirées à Venise de
Liszt, e este, aSertaneja. Há ainda a história de que Liszt teria ouvido o pianista
brasileiro estudando no seu quarto de hotel na Via del Corsouma de suas difíceis
obras e, por isso, bate-lhe à porta. Da amizade entre os dois, restou um bilhete em que
Liszt agradece e retribui “uma magnífica remessa” que NEVES (1996, p. 45) cogita
ter sido A Sertaneja:

“Querido Senhor, Mil agradecimentos por sua magnífica remessa. Como uma pobre
[retribuição] eu vos ofereço minha Messe pour Orgue (ou Harmonium) sans Chant; e
como outra, uma bagatelle recentemente publicada e já esquecida. Afetuosamente,
F. Liszt. Quarta-feira.”
Brasílio Itiberê deixou cerca de 60 obras, a maioria das quais pouco
conhecidas e, muitas, ainda desaparecidas. 30 estão guardadas na Biblioteca Casa da
Memória da Fundação Cultural de Curitiba (algumas poucas podem também ser
encontradas na Biblioteca Nacional no Rio de janeiro). No catálogo que preparou,
Mercedes Reis Pequeno (NEVES, 1996, p. 101109) descreve 21 peças para piano
solo com número de Opus (o que sugere a existência de pelo menos outras 20
desaparecidas de um total de 41); 11 peças para piano solo sem número
de Opus (onde faltam mais 2 mencionadas em jornais); 3 arranjos para violino e
piano; 5 obras vocais (3 religiosas, uma de Natal e outra profana) para
instrumentações diversas com piano e cordas. Embora entre as obras do compositor
predominem os títulos convencionais do repertório erudito de salão do século XIX,
algumas merecem um estudo cuidadoso para se verificar até onde se estende seu viés
nacionalista além de A Sertaneja: Danse americaine, Ballade des tropiques, A
Serrana, Súplica do escravo. Outras obras: Noites Orientais para piano solo em três
partes: Noturno, Dahabieh e Jardim dos Trópicos composta durante uma excursão
que fez ao Egito. Noites em Veneza (Barcarola, Noturno e Romance); Caprichos à
Mazurca; Tarantella; Rapsódias Brasileiras; Poema de Amor; Estudo de Concerto.
Brasílio Itiberê faleceu em 11 de agosto de 1913 em Berlim, pouco antes de
sua transferência como diplomata para os Estados Unidos (MARCONDES, 1998, p.
225). Entretanto, havia deixado claro para a família seu desejo de retornar ao país
natal. Duas semanas depois, seu corpo embalsamado chegou a Paranaguá e seguiu no
dia seguinte para Curitiba, onde foi sepultado. Mais tarde, como o governo do Paraná
não ergueu um prometido monumento ao compositor, sua família decidiu levar suas
cinzas para o túmulo da esposa no Cemitério São João Batista no Rio de Janeiro
(NEVES, 1996, p. 50).
Alexandre Levy

Nasceu em 10 de novembro de 1864. Aos 12 anos já compunha e dava concertos de


piano. Devido ao seu grande talento, viajou aos 23 anos a Europa para ser
aperfeiçoar. Seu pai, Henrique Luís Levy, era clarinetista e fundador da Casa Levy,
uma importante e tradicional loja de música na cidade de São Paulo.

Muito ativo no meio musical paulista, fundou o Clube Haydn e depois o Clube
Mendelssohn. Participou dos 35 concertos que esta sociedade organizou, atuou como
pianista e regente. Dentre as obras que compôs, destaca-se as Variações Sobre um
Tema Brasileiro, primeira composição orquestral baseada em tema folclórico
nacional (Vem cá, Bitu) embora esta obra siga as tendências do romantismo,
oscilando entre Schumann e Mendelssohn.
Suas composições são altamente originais e às vezes construídas em formas
populares brasileiras (o caso do Tango Brasileiro) ou usam temas folclóricos
brasileiros como matéria prima, o que o torna um precursor do nacionalismo musical
brasileiro.

Em 1887 foi a Paris, onde estudou com Emile Durand e participou de um concerto
em homenagem a D. Pedro II. Outra importante obra é o Tango Brasileiro, para piano
solo, além da Suíte Brasileira para orquestra composta em 1890.

Nos seus últimos anos de vida compôs uma Sinfonia em Mi, o poema sinfônico
Comala, além de uma interessante série de piano intitulada Schumannianas.

Levy faleceu em 17 de janeiro de1892.


Alberto Nepomuceno

Nasceu em Fortaleza no dia 06 de julho de 1864. Em 1884, transferiu-se para o Rio


de Janeiro onde atuou como pianista no Clube Beethoven e na Sociedade e Concertos
Clássicos. Estudou por sete anos na Europa, primeiro em Roma e depois em Berlim e
Paris. Assumiu a classe de órgão no Instituto Nacional de Música. Presidiu a
Sociedade de Concertos Populares, que divulgou muita música moderna para a época
e , em 1879, ofereceu concerto de suas obras no qual apresentou a Série Brasileira,
escrita em Berlim em 1891, aos 27 anos de idade.

Nepomuceno se fez notar em diversos gêneros musicais. Sinfônico-Orquestral (Série


Brasileira, a abertura O Garatuja, Sinfonia em Sol Menor), operístico (Abul e
Artemis), música de câmara (Trio em fá sustenido maior), Coral (As Uyaras) e
especialmente, no Lied, sua mais importante contribuição para a música brasileira.
Quanto a Sinfonia em Sol Menor, Edino Krieger afirma: “Não seria exagero incluir a
Sinfonia em Sol Menor, de Nepomuceno, entre as obras primas do sinfonismo
romântico. É uma obra de admirável feitura artesanal, dotadas de elementos de
grande beleza temática, desde o privilegiado tema inicial, impregnado daquela tensão
brahmnsiana feita de respirações ondulantes, até o enérgico final, onde se advinham
prenúncios de batuque no motivo pontuado característico, tão aparentado,
ritmicamente, ao do Balaio, utilizado por Alexandre Levy em sua Suíte”.

Nepomuceno sempre se preocupou com a valorização da cultura brasileira. Entoava


canções do norte e colecionava versos populares – estava destinado a convencer o
público e a crítica brasileiros das qualidades da língua e do populário do nosso país.
Não desconhecia a dificuldade da aceitação do Lied em português, da canção
brasileira. Sem forças para lutar no começo e influenciado por Grieg e Schumann,
compôs parte de suas 87 canções um pouco à maneira desses músicos, sobre textos
estrangeiros e sem acento nacionalista. Ao ascender à direção do Instituto Nacional
de Música em 1902, sucedendo a Miguez, sentiu-se forte para tentar uma campanha
vigorosa pelo canto em português e a partir dessa época compôs quase que
exclusivamente em língua nacional.
Como diretor do Instituto Nacional de Música fez realizar concertos sinfônicos
durante a Exposição Nacional de 1908. Ocasião em que foi apresentado vasto
repertório de música moderna, sobretudo francesa e russa. Fez várias viagens à
Europa e sua ópera Abul foi apresentada em Roma e em Buenos Aires. Richard
Strauss quando veio ao Brasil, em 1920, escolheu o Garatuja para dirigir em vários
concertos.
Luiz Heitor define bem o compositor cearense: “Artista de transição entre o espírito
do século XIX na música brasileira, que era de servidão à Europa, e o século XX, que
era o de libertação”. Nepomuceno faleceu no Rio de Janeiro em em 16 de outubro
1920, aos 56 anos de idade.

Ernesto Nazareth
Compositor, professor e pianista, considerado um dos maiores expoentes da música
brasileira, Ernesto Nazareth é autor de uma obra que, situada num lugar de difícil
definição entre a música erudita e a popular, tem importância fundamental para a
cultura brasileira dos séculos XIX e XX.

Ernesto Júlio de Nazareth nasceu em 20 de março de 1863, no Rio de Janeiro. Era o


segundo dos quatro filhos de Vasco Lourenço da Silva Nazareth, despachante
aduaneiro, e Carolina Augusta da Cunha Nazareth, dona de casa e pianista amadora.

Com cerca de três anos, o menino Ernesto começou a demonstrar interesse pelas
peças de compositores como Chopin, Beethoven e Arthur Napoleão, que sua mãe
executava ao piano, e passou a ter com ela as primeiras noções do instrumento,
aprendendo também a solfejar.

Quando tinha dez anos, ao cair de uma árvore, sofreu uma forte concussão na cabeça
e teve hemorragia nos ouvidos, principalmente no direito. As sequelas desse acidente
perduraram por toda a sua vida, levando-o, na velhice, à quase completa surdez. Aos
14 anos, fez sua primeira composição: a polca-lundu Você bem sabe, dedicada ao pai.
Com 16 anos, participou do que seria sua primeira apresentação pública, num recital
no salão do Clube Mozart.

Aos 20, já era conhecido no Rio de Janeiro como compositor, intérprete e professor
de piano. Em 1886, casou-se com Theodora Amália Leal de Meirelles, 11 anos mais
velha. Ambos ficariam juntos até a morte dela, em 1929. O casal teve quatro filhos.

Em 1893, Nazareth publicou o primeiro tango brasileiro: Brejeiro, uma das


composições mais executadas de todos os tempos na música brasileira. O primeiro
concerto de suas obras aconteceu em 1898, no Salão Nobre da Intendência da Guerra,
por iniciativa do Clube São Cristóvão.
As gravações em disco no Brasil tiveram início em 1902, com o primeiro registro
fonográfico de uma música de Nazareth, feito para a Casa Edison do Rio de
Janeiro:Está chumbado, pela Banda do Corpo de Bombeiros, com regência de
Anacleto de Medeiros.
O tango Brejeiro foi lançado em disco em 1905 pela Odeon, sob o título Sertanejo
enamorado, com letra de Catulo da Paixão Cearense e interpretação de Mário
Pinheiro. Também em 1905, foram editados os tangos Escovado e Ferramenta, sendo
que, na partitura deste último, logo abaixo do nome do autor, apareceu pela primeira
vez o epíteto “Rei do tango”.
Em 1910, costumava se apresentar na sala de espera do cinema Odeon. Muita gente
comparecia apenas para ouvi-lo tocar. Odeon acabou sendo o nome de um de seus
tangos mais famosos.

Nazareth completou 50 anos em 1913, quando deixou de tocar no cinema. Onze de


suas composições foram editadas neste ano, entre elas Ameno
Resedá (polca), Atrevido(tango), Batuque (tango
característico), Confidências (valsa), Eponina (valsa), Fon-
fon!(tango), Reboliço (tango) e Tenebroso (tango). Sua polca Apanhei-te,
cavaquinho!…, editada em 1914, obteve sucesso imediato, e suas
peças Brejeiro e Dengoso, publicadas nos Estados Unidos, receberam no país
gravações de diversos artistas. Dois anos depois, Apanhei-te, cavaquinho!… foi
registrada em disco para a Casa Edison pelo grupo O Passos no Choro e pela
Orquestra Odeon.

Visitou São Paulo no início de 1926, apresentando-se no Theatro Municipal (onde


Mário de Andrade proferiu uma palestra a seu respeito) e no Conservatório
Dramático e Musical. Passou ainda por Campinas, Sorocaba e Tatuí. No Rio de
Janeiro, sua obra foi tema de conferência proferida pelo musicólogo Andrade Muricy.
Nazareth retornou ao Rio somente em março de 1927, com um piano Sanzin
(presente do público paulista, hoje pertencente ao acervo do Museu da Imagem e do
Som do RJ) e novas composições: os tangos Cruzeiro, Cubanos e Paraíso e a
valsa Faceira. Em 1928 e 1929, suas músicas foram gravadas pelos dois maiores
cantores populares da época: A voz do amor (adaptação da polca Cuyubinha, com
letra de Marina Stella Quirino dos Santos), Favorito e Primorosa, por Francisco
Alves, e Êxtase (letra de Frederico Mariath), por Vicente Celestino.

No início de 1929, participou de um festival organizado no Instituto Nacional de


Música, onde se apresentaram vários artistas amadores e principiantes, entre eles a
jovem Carmen Miranda, com apenas 19 anos. Em 5 de maio, faleceu sua esposa
Theodora Amália, aos 77 anos, fato que o deixou bastante abalado.

Sua última composição, a valsa Resignação, foi terminada em maio de 1930. Em


setembro, gravou ao piano quatro de suas músicas para a Odeon: Apanhei-te,
cavaquinho!…, Escovado,Nenê e Turuna, sendo que apenas as duas primeiras foram
lançadas em disco. Fez, em março de 1931, duas audições na Rádio Sociedade, com
enorme sucesso. Em maio, a Rádio Mayrink Veiga produziu um programa especial
sobre ele, com uma hora de duração e com participação do próprio homenageado, que
executou 13 obras de sua autoria.

Em janeiro de 1932, em companhia das filhas, partiu de navio para o Rio Grande do
Sul, levando sua última partitura editada: o tango brasileiro Gaúcho, em homenagem
ao povo rio-grandense. Fez recitais em Porto Alegre, em Rosário do Sul e em Santana
do Livramento (onde fez, no dia 26 de fevereiro, sua derradeira apresentação,
debruçado ao piano, pois seu problema auditivo quase não o deixava mais escutar o
que tocava). No dia 29, chegaram a Montevidéu, capital do Uruguai. Durante um
passeio pela cidade, sofreu uma séria crise nervosa. Teve ligeira melhora ao voltar
para o Rio, mas, em julho, com a surdez em estado avançado, foi diagnosticado como
portador de sífilis e internado no Pavilhão Guinle do Hospício Pedro II, na Praia
Vermelha, de onde saiu em janeiro de 1933.
Dois meses depois, a dias de completar 70 anos, deu entrada na Colônia Juliano
Moreira, em Jacarepaguá. Numa das visitas que Eulina fez ao pai, ouviu dele:
“Descobri um caminho para Laranjeiras. Basta que eu siga por ali, que eu chego lá
em casa!…”. No ano seguinte, fugiu da colônia.

Ernesto Nazareth morreu entre os dias 1 e 4 de fevereiro de 1934. Seu corpo foi
encontrado no dia 4, domingo de Carnaval, nas águas de uma represa pertencente à
floresta situada nos fundos do manicômio.
Francisco Braga

Antônio Francisco Braga nasceu no Rio de Janeiro em 1868. Órfão de pai, a partir de
1876 foi aluno interno do Asilo dos Meninos Desvalidos, onde iniciou seus estudos
musicais na clarineta e integrou a banda de música do educandário. Em 1883, Braga
ingressou no Imperial Conservatório de Música. Ao terminar o curso foi nomeado,
em 1887, professor do Asilo onde estudara.

Um grande impulso na sua carreira resultou da sua participação no Concurso para a


escolha do que deveria ser o novo Hino Nacional Brasileiro, em 1890. O segundo
lugar no concurso, que premiou o compositor Leopoldo Miguez, lhe valeu uma bolsa
de estudos na Europa, onde se tornou aluno de Jules Massenet no Conservatório de
Paris. De seu período de estudos na Europa são algumas de suas principais obras
orquestrais, destacando-se os poemas sinfônicos "Paysage" e "Cauchemar",
compostos entre 1892 e 1895.
Em Dresden e Bayreuth, na Alemanha, Francisco Braga travou contato com a música
de Richard Wagner. Sob a influência do mestre alemão, iniciou a composição de sua
ópera "Jupira" cuja história se passa no interior de Minas Gerais e trata do trágico
amor da índia Jupyra por Carlito. Uma história de caráter nacional envolta em uma
linguagem nitidamente wagneriana.
De volta ao Brasil, em 1902, foi nomeado professor de fuga, contraponto e
composição do Instituto Nacional de Música, instituição de ensino musical que
sucedeu ao Conservatório e, atualmente, é a Escola de Música da UFRJ. No instituto,
se tornou um disputado docente, tendo sido mestre de muitos compositores da
primeira geração de nacionalistas, com destaque para Lorenzo Fernandez. Ele próprio
desenvolveu em algumas obras essa temática como nas Variações sobre um Tema
Brasileiro e no Trio para violino, violoncelo e piano, onde utiliza no terceiro
movimento um lundu. A obra é de 1937, período de plena maturidade do compositor.
Além de compositor, Braga foi um dos mais atuantes regentes de seu tempo, tendo
sido maestro titular de três orquestras no Rio de Janeiro: a do Instituto Nacional de
Música, a da Sociedade de Concertos Sinfônicos e a do Theatro Municipal.
Fundador do Sindicato dos Músicos, foi acolhido Patrono da Cadeira de número 32
da Academia Brasileira de Música. Em 1938, aposentou-se como professor do
Instituto Nacional de Música.
Francisco Braga buscou para as suas primeiras canções a obra de poetas românticos
como Victor Hugo (1802-1885) e Machado de Assis (1839-1908). Ao compor em
francês, Braga familiarizou-se com a formulação da mélodie, um tipo específico de
chanson, na qual a elaboração musical é regida pela sonoridade própria da língua
francesa. Na obra de Francisco Braga encontram-se composições no âmbito da
música de câmera, sinfônica e solo. Muito destaque tem sido dado à sua produção
sinfônica e operística; entretanto, destaca-se também uma significativa contribuição
ao gênero da canção brasileira para canto e piano, com 36 obras, onde pode ser
percebida grande diversidade. Além das canções chamadas romances, Braga utilizou
de referências advindas da modinha, do lundu e do fandango, onde podemos perceber
sua constante preocupação com aspectos relativos à efetiva utilização do vernáculo
também nessas manifestações musicais tipicamente populares. O seu refinamento no
trato musical do idioma acabou por levar a uma frutífera associação com a poesia de
Olavo Bilac (1865-1918), a qual revela semelhante apuro quando trata da sonoridade
das palavras.
Dentre suas obras podemos ainda destacar: Variações sobre um Tema Brasileiro, para
orquestra; o Trio em Sol Menor; o Tango Caprichoso para violino e piano; a Toada
para cello e orquestra; Episódio Sinfônico.
Francisco Braga faleceu no Rio de Janeiro em 14 de março 1945.

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