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Entrevista com o CM Jorge Ferreira

1- Você conquistou o título 18 anos depois. Por quê um jogador do seu nível ficou tanto
tempo sem ele e qual a diferença entre 2001 e 2019?
Defendi o título em 2002 e acabei ficando com o vice campeonato. Após a final de
2002, decidi abandonar as finais, porque não aceitava jogar finais sem premiação em
dinheiro. Não eram poucos os gastos para participar das finais! Tinha a taxa CBX,
inscrição da semifinal e final. Naquela época, eu vivia de xadrez e cada centavo que
ganhava era importante para mim. Também decidi ficar focado na minha vida pessoal.
Nasci numa família humilde, não podia brincar de jogar xadrez.
A diferença entre os dois títulos é a maturidade alcançada aos 43 anos.
2- Como foi a sua preparação para a competição? Você estudou seus adversários que
considerava mais fortes? Quem?
Honestamente, não fiz nenhuma grande preparação para final. Passei meu tempo
apenas tentando melhorar minha capacidade de cálculo. Sabia que os meus
adversários, diretos, usariam o repertório de sempre. Então, senti que preparar seria
perda de tempo.
3- Como avalia o nível da competição?
O nível da competição foi bom, mas teria sido melhor com a participação dos MFs
Paulo Jatobá e Diogo Duarte.
4- Em algum momento se sentiu inseguro e quando foi?
Entrei no torneio com “sangue no olho”. Cheguei na cidade de Feira de Santana com
vontade de vencer e foi o que procurei demonstrar nos meus jogos. A partida decisiva
com Zallio afetou um pouco, pois tive a vitória nas mãos e deixei escapar. Esta situação
me fez lembrar da nossa partida no zonal, realizado alguns meses antes da final. Venci
o zonal, mas deixei Zallio escapar numa posição completamente perdida com peça a
menos. Não tive segurança para jogar no apuro e acabei cedendo o empate. Quando a
partida da final terminou empatada fiquei um pouco abalado, mas um amigo chegou
perto de mim e falou “você vai ganhar no desempate, você foi mais jogador que todos
aqui este ano” finalizou dando um tapa nas minhas costas. Não posso negar, suas
palavras me deram motivação para jogar as duas partidas de xadrez rápido que
decidiriam o título. Enquanto esperava o início do match, eu ficava mentalizando as
palavras do treinador da Fiona Mutesi do filme “A rainha de Katwe”. Ele disse para ela
num torneio “o seu lugar é aqui” achei essa sentença muito forte quando assisti o
filme. Acabei entrando com tudo para jogar o desempate e felizmente venci.

5- Qual foi a sua melhor partida e por quê?


Minha melhor partida foi jogada contra o meu amigo Luís Ulbrich. Ele decidiu
empregar a defesa francesa e acabei escolhendo o sistema do avanço como resposta.
Fui feliz no jogo, pois Luís decidiu jogar uma variante que eu já tinha boa experiência
jogando contra.
6- Como se sente tendo conquistado o título Baiano nas três modalidades? Qual dessas
se considera mais competitivo?
Na verdade, o baiano clássico só contou com minha participação por causa das finais
de rápido e blitz que venci. Vi a possibilidade de conseguir a tríplice coroa e fazer
história no xadrez baiano. O único título baiano que não tinha conquistado era o de
xadrez rápido, mas ele veio em 2019. Nunca carreguei comigo o desejo de ser
inúmeras vezes campeão baiano absoluto, basta observar que não joguei finais
durante mais de 10 anos. Você pode ganhar 10 vezes e o título permanecerá sendo o
mesmo.
Quanto à modalidade que sou mais competitivo, inicialmente, eu sou a única pessoa
que pode responder esta pergunta! Não tenho a menor dúvida que é o xadrez
pensado onde expresso mais a minha força. Meus melhores resultados sempre
ocorreram nesse ritmo e não foram poucos dentro e fora do estado.
7- Qual seria o melhor modelo de competição para a disputa da final do baiano?
Acho o sistema schuring o mais justo, pois todos os jogadores devem enfrentar uns aos
outros.
8- Como é atualmente sua rotina de estudos?
Não estudo mais horas e horas de xadrez, porque não tenho tempo e paciência para
isso! Estou mais focado em análise de partidas e trabalho com cálculo. O tempo de
estudo varia e vai depender do tempo livre em média 40 minutos ou 1 hora.
9- Quais os livros que você mais gosta e indica para aqueles que querem progredir?
Todos os livros de xadrez nos oferecerão conhecimento, mas sempre temos aqueles
que consideramos importantes para o nosso desenvolvimento. Gosto do “Tratado
General del Ajedrez” volume 3 Roberto Grau, “Piense como um Grande maestro”
Alexander Kotov, “Chess Structures” Mauricio Flores, “The Shereshevsky Method”
Shereshvsky.
10- Qual o melhor enxadristas de todos os tempos na sua opinião e por quê?
Serei breve! Bobby Fischer é o maior de todos os tempos. Sozinho acabou com o
domínio soviético no xadrez.
11- Qual a sua partida inesquecível?
Não tenho uma partida para pontuar como inesquecível, mas acho que recentemente
joguei uma partida interessante contra o MI argentino Leandro Perdomo. Jogamos no
Floripa open 2019 e a partida terminou empatada numa posição perdida para o MI. A
partida foi interessante por causa da minha preparação o lance Ca4!? Peguei o mestre
de surpresa e conquistei vantagem desde o início da abertura.
12- Qual é a sua lista dos 10 maiores jogadores da Bahia de todos os tempos?
Não quero criar polêmica, mas os jogadores que vi apresentar um xadrez de muita
qualidade no nosso xadrez são: Pinto Paiva, Francisco Marotta, Paulo Jatobá, Daniel
Góes, Bolívar Gonzalez, Carlos Paterson, Júlio Ramos, Manoel Paes, Adriano Barata e
Diogo Duarte.
Sei que muitos dirão que faltou este ou aquele jogador, pois jogadores mais jovens
não viram muitos dos jogadores da minha lista em ação. Muitos dirão já joguei com
este ou aquele e venci, mas não quer dizer nada. Observem que o único sem título de
campeão baiano é o Diogo Duarte. Título que ele conquistará mais cedo ou mais tarde.
Claro que outros nomes surgiram a exemplo de Pedro Ferreira, Luciano Zallio, Vitor
Mauricio e Rêmulo Aguiar. Todos fortes e talentosos, mas os nomes que estão na lista
jogaram e alguns ainda jogam num nível de xadrez que me impressiona.
13- Como foi disputar o tie- break contra Zallio, qual era seu nível de confiança?
Como foi dito no início da entrevista, eu entrei com tudo para jogar o desempate
contra Zallio. Não passava pela minha cabeça sair de Feira de Santana com o vice
campeonato. Fui para lá para ser campeão, era a única coisa que passava pela minha
cabeça durante todo o torneio. 2019 foi um ano onde venci todos os torneios
importantes e alguns eventos com menos expressão e venci convincentemente. A
conquista da final clássica foi uma mistura entre mérito e raça.
Fiquei surpreso quando Zallio decidiu jogar com as brancas uma abertura que permitiu
a igualdade rapidamente. Quando tive a chance de jogar com as brancas, joguei com
energia e muita vontade de vencer. Ao ver meu peão alcançar a casa b7 percebi que o
título estava nas minhas mãos. Felizmente, o título ficou com quem teve os melhores
resultados em 2019.
14- Você teve uma reação bastante explosiva quando saiu vitorioso da partida decisiva.
Por que essa carga de emoção? O que passou por sua cabeça?
Tentaram transformar este momento de explosão em polêmica. Eu cheguei confiante
para jogar a final e alcancei uma posição vitoriosa contra Zallio, após um apuro de
tempo que me deixou com segundos, vi o título indo embora. Precisei me recompor e
ouvir palavras de amigos para voltar a ficar confiante. Fiquei impressionado com o
número de pessoas torcendo por mim. Até um dos árbitros veio até a mim, apertou
minha mão e falou “vai dar você, tô torcendo por você” Estava contendo a ansiedade
problema que sempre me acompanhou desde a infância. Quando veio a vitória, a
emoção foi muito grande! Era a conquista da tríplice coroa! Estava entrando para
história do xadrez baiano. Tinha vencido um desafio que procurei impor ao Jorge
jogador de xadrez. Não posso negar que cheguei em Feira de Santana mentalizando “O
favorito sou eu”, mas claro que respeitei todos os meus adversários como de costume.
O título terminou nas mãos de quem deveria ficar com ele naquele momento.
15- Quais seus planos futuros com o xadrez?
Criar um canal para ministrar aulas e dividir o pouco que sei sobre xadrez.

16- Gostaria de fazer algum agradecimento?


Primeiramente, agradeço a Deus pelos resultados obtidos no xadrez e na vida pessoal
em 2019. Também agradeço aos amigos, Luís Ulbrich, Carlos Bruno, Tiago Seixas e
Alexandre Palomino pelos momentos de muitas resenhas e alegria. Agradeço o apoio
psicológico também oferecido por eles.

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