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Apresentação ................................................................................................................................

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Aula 1: Bases da Teoria do Negócio Jurídico ............................................................................... 10
Introdução ........................................................................................................................... 10
Conteúdo.............................................................................................................................. 10
Constituições .................................................................................................................... 10
Constituições .................................................................................................................... 11
Código Civil de 1916........................................................................................................ 12
Justiça Social .................................................................................................................... 13
Princípio da isonomia ..................................................................................................... 14
Constituição Federal de 1988 ........................................................................................ 15
Apelação Cível .................................................................................................................. 16
Relação do consumo ...................................................................................................... 17
Recurso Especial nº 1.194.627-RS ................................................................................. 17
Qualidade intrínseca ....................................................................................................... 18
Declaração ........................................................................................................................ 20
Papel da Jurisprudência ................................................................................................. 20
Ordenamento jurídico .................................................................................................... 20
Princípio da autonomia .................................................................................................. 21
Autonomia privada .......................................................................................................... 21
Teoria da imprevisão ...................................................................................................... 22
Princípio da conservação ............................................................................................... 23
Contratos ........................................................................................................................... 23
Direito privado.................................................................................................................. 24
Informativo nº 492 do STJ ............................................................................................. 24
Recurso Especial nº 1.321.655-MG ............................................................................... 25
STJ – Superior Tribunal de Justiça............................................................................... 25
Recurso Especial nº 1.132.943-PE ................................................................................. 26
Cláusulas ........................................................................................................................... 26
Distrato .............................................................................................................................. 26
Modelo individualista-liberal ......................................................................................... 27
Conclusão ......................................................................................................................... 27
Atividade proposta .......................................................................................................... 27
Referências........................................................................................................................... 28

TÓPICOS ESPECIAIS DE OBRIGAÇÕES E CONTRATOS 1


Exercícios de fixação ......................................................................................................... 29
Notas ........................................................................................................................................... 33
Chaves de resposta ..................................................................................................................... 33
Aula 1 ..................................................................................................................................... 33
Exercícios de fixação ....................................................................................................... 33
Aula 2: Boa-Fé Objetiva ............................................................................................................... 36
Introdução ........................................................................................................................... 36
Conteúdo.............................................................................................................................. 36
Lealdade contratual ......................................................................................................... 36
Boa-fé subjetiva ............................................................................................................... 37
Ordenamento jurídico .................................................................................................... 37
Intérprete jurídico ............................................................................................................ 38
Contratos de adesão ....................................................................................................... 38
Renúncia antecipada....................................................................................................... 39
Direito de sequela ............................................................................................................ 39
Súmula ............................................................................................................................... 39
Função social do contrato ............................................................................................. 40
Conduta leal...................................................................................................................... 40
Intenção............................................................................................................................. 41
Violação positiva do contrato ....................................................................................... 41
Aplicação da violação positiva ...................................................................................... 42
Deveres anexos ................................................................................................................ 43
Contorno jurídico ............................................................................................................ 43
Funções da boa-fé objetiva ........................................................................................... 44
Boa-fé objetiva x boa-fé subjetiva ................................................................................ 45
Jurisprudencialização do direito .................................................................................. 46
Jurisprudência .................................................................................................................. 46
Transmissão das obrigações ......................................................................................... 47
Tribunais estaduais .......................................................................................................... 48
Dever de lealdade ............................................................................................................ 49
Segunda seção do STJ .................................................................................................... 49
Informativos do STJ ........................................................................................................ 50
Conduta de lealdade ....................................................................................................... 50
Contratos ........................................................................................................................... 52
Ordenamento jurídico nacional ................................................................................... 52
Desfazimento da pactuação .......................................................................................... 53

TÓPICOS ESPECIAIS DE OBRIGAÇÕES E CONTRATOS 2


Vício redibitório................................................................................................................ 53
Diploma civil ..................................................................................................................... 54
Informativo 506 do STJ .................................................................................................. 54
Garantia contratual.......................................................................................................... 54
Dever anexo de lealdade ................................................................................................ 55
Ascendente e descendente ........................................................................................... 55
Conclusão ......................................................................................................................... 56
Atividade proposta .......................................................................................................... 57
Referências........................................................................................................................... 57
Exercícios de fixação ......................................................................................................... 57
Chaves de resposta ..................................................................................................................... 62
Aula 2 ..................................................................................................................................... 62
Exercícios de fixação ....................................................................................................... 62
Aula 3: Função Social do Contrato .............................................................................................. 65
Introdução ........................................................................................................................... 65
Conteúdo.............................................................................................................................. 66
Função social do contrato ............................................................................................. 66
Direito civil-constitucional ............................................................................................. 66
Eficácia interna e externa ............................................................................................... 66
Função socioambiental do contrato ............................................................................ 70
Institutos jurídicos ........................................................................................................... 71
Código Civil brasileiro ..................................................................................................... 71
Cláusula solve et repete ................................................................................................. 72
Sistema jurídico ................................................................................................................ 73
Enriquecimento sem causa ........................................................................................... 73
Contrato de comodato ................................................................................................... 74
Obrigações indivisíveis ................................................................................................... 75
Cessão de crédito ............................................................................................................ 76
Pagamento indevido ....................................................................................................... 76
Tribunais brasileiros ........................................................................................................ 78
Tipos de contratos ........................................................................................................... 78
Denunciação da lide ....................................................................................................... 79
Dação em pagamento .................................................................................................... 80
Teoria do adimplemento substancial .......................................................................... 80
Conclusão ......................................................................................................................... 81
Atividade proposta .......................................................................................................... 81

TÓPICOS ESPECIAIS DE OBRIGAÇÕES E CONTRATOS 3


Referências........................................................................................................................... 82
Exercícios de fixação ......................................................................................................... 82
Chaves de resposta ..................................................................................................................... 87
Aula 3 ..................................................................................................................................... 87
Exercícios de fixação ....................................................................................................... 87
Aula 4: Institutos da boa-fé objetiva ........................................................................................... 89
Introdução ........................................................................................................................... 89
Conteúdo.............................................................................................................................. 90
Contextualização ............................................................................................................. 90
Abuso de direito – Conceito ......................................................................................... 90
Abuso de direito – Controle preventivo e repressivo............................................... 91
Venire contra factum proprium – Conceito .............................................................. 92
Venire contra factum proprium – Jurisprudência .................................................... 92
Obrigação de dar coisa incerta ..................................................................................... 93
Não declaração de nulidade de contrato de compra e venda ............................... 94
Promessa de doação ....................................................................................................... 96
Duty to mitigate the loss ................................................................................................ 97
A função de integração da boa-fé objetiva ................................................................ 98
Supressio e surrectio ..................................................................................................... 100
Supressio e surrectio – Código civil........................................................................... 101
Tu quoque ....................................................................................................................... 102
Atividade proposta ........................................................................................................ 103
Referências......................................................................................................................... 104
Exercícios de fixação ....................................................................................................... 104
Notas ......................................................................................................................................... 108
Chaves de resposta ................................................................................................................... 108
Aula 4 ................................................................................................................................... 108
Exercícios de fixação ..................................................................................................... 108
Aula 5: Formação dos contratos eletrônicos ............................................................................ 111
Introdução ......................................................................................................................... 111
Conteúdo............................................................................................................................ 111
Conceito de contrato .................................................................................................... 111
Características do contrato.......................................................................................... 112
Fases da formação contratual ..................................................................................... 112
Fase de negociações preliminares ou de puntuação ............................................. 113
Fase de proposta, policitação ou oblação ................................................................ 114

TÓPICOS ESPECIAIS DE OBRIGAÇÕES E CONTRATOS 4


Proposta entre ausentes e presentes ......................................................................... 115
Fase de contrato preliminar ......................................................................................... 115
Fase de contrato definitivo .......................................................................................... 117
Contextualização sobre a formação do contrato pela via eletrônica ................. 118
Aplicação do Código de Defesa do Consumidor aos contratos eletrônicos ..... 118
Formação do contrato pela via eletrônica ................................................................ 120
A visão jurisprudencial acerca dos contratos eletrônicos ..................................... 120
Atividade proposta ........................................................................................................ 123
Referências......................................................................................................................... 124
Exercícios de fixação ....................................................................................................... 124
Notas ......................................................................................................................................... 129
Chaves de resposta ................................................................................................................... 129
Aula 5................................................................................................................................... 129
Exercícios de fixação ..................................................................................................... 129
Aula 6: Revisão judicial dos contratos ....................................................................................... 131
Introdução ......................................................................................................................... 131
Conteúdo............................................................................................................................ 132
Revisão judicial dos contratos..................................................................................... 132
Quando há um conflito de interpretação de cláusulas .......................................... 133
Diante da abusividade de cláusulas contratuais ...................................................... 134
O que o juiz pode fazer diante da abusividade de cláusulas contratuais
considerando a função social do contrato? ................................................................. 134
Quando ocorre fato imprevisível ................................................................................ 135
Fato imprevisível – aplicação pelo judiciário ........................................................... 136
Onerosidade excessiva ................................................................................................. 137
Necessidade de o fato ser imprevisível ..................................................................... 137
Análise jurisprudencial.................................................................................................. 138
Inadimplemento obrigacional e inexecução voluntária do negócio jurídico ... 139
Execução forçada nas obrigações de dar coisa certa............................................. 139
Pagamento de astreintes.............................................................................................. 141
Pagamento das perdas e danos .................................................................................. 143
Cláusula penal ................................................................................................................ 144
Cláusula penal – Comodato ........................................................................................ 146
Contrato de doação ...................................................................................................... 147
Atividade proposta ........................................................................................................ 150
Referências......................................................................................................................... 150

TÓPICOS ESPECIAIS DE OBRIGAÇÕES E CONTRATOS 5


Exercícios de fixação ....................................................................................................... 150
Notas ......................................................................................................................................... 155
Chaves de resposta ................................................................................................................... 155
Aula 6 ................................................................................................................................... 155
Exercícios de fixação ..................................................................................................... 155
Aula 7: Direito contratual e Direito obrigacional ...................................................................... 159
Introdução ......................................................................................................................... 159
Conteúdo............................................................................................................................ 160
Conceito de contrato .................................................................................................... 160
Direito à moradia ........................................................................................................... 160
Direito à saúde ............................................................................................................... 164
Direito fundamental - entrega de diploma ............................................................... 165
Tutela jurisdicional ........................................................................................................ 165
Abandono afetivo .......................................................................................................... 166
Abandono afetivo - STJ ................................................................................................ 168
Atividade proposta ........................................................................................................ 169
Referências......................................................................................................................... 170
Exercícios de fixação ....................................................................................................... 170
Chaves de resposta ................................................................................................................... 175
Aula 7 ................................................................................................................................... 175
Exercícios de fixação ..................................................................................................... 175
Aula 8: Relações de consumo.................................................................................................... 178
Introdução ......................................................................................................................... 178
Conteúdo............................................................................................................................ 179
Conceito e classificação do contrato ........................................................................ 179
Contrato de adesão ....................................................................................................... 180
Artigo 54 do CDC – parágrafo 2º ............................................................................... 181
Artigo 54 do CDC – parágrafo 3º ............................................................................... 182
Artigo 54 do CDC – parágrafo 4º ............................................................................... 184
Artigo 51 do CDC ........................................................................................................... 186
Onerosidade excessiva ................................................................................................. 189
Descumprimento de cláusula contratual – plano de saúde ................................. 190
Abuso do direito – renovação de contrato .............................................................. 190
Atividade proposta ........................................................................................................ 192
Referências......................................................................................................................... 192
Exercícios de fixação ....................................................................................................... 193

TÓPICOS ESPECIAIS DE OBRIGAÇÕES E CONTRATOS 6


Chaves de resposta ................................................................................................................... 198
Aula 8 ................................................................................................................................... 198
Exercícios de fixação ..................................................................................................... 198
Conteudista ............................................................................................................................... 200

TÓPICOS ESPECIAIS DE OBRIGAÇÕES E CONTRATOS 7


É possivel afirmar que, na sociedade atual, o contrato se corporifica como o
maior negócio jurídico. Dessa maneira, a apreensão, tanto de sua base
principiológica, quanto de sua formação, torna-se um verdadeiro diferencial aos
operadores do direito.

O atual Direito Civil vem incorporando o fenômeno de constitucionalização aos


seus institutos, modificando os critérios de interpretação e aplicação do negócio
jurídico. Nesse sentido, o Código Civil de 2002 já não é mais concebido como
um diploma patrimonialista e individualista, mas sim social.

O direito civil-constitucional é materializado, por meio do exercício


jurisprudencial, a partir da aplicação dos princípios da boa-fé objetiva e da
função social do contrato aos casos concretos.

Esses princípios, atualmente, devem ser levados em consideração, diante da


revisão judicial dos contratos, da formação dos contratos pela via eletrônica e
pela via consumerista, além de determinarem a preservação do patrimônio
mínimo dos contratantes.

Sendo assim, esta disciplina tem como objetivos:

TÓPICOS ESPECIAIS DE OBRIGAÇÕES E CONTRATOS 8


1. Compreender o negócio jurídico à luz do direito civil-constitucional, por meio
da aplicação dos princípios constitucionais às relações contratuais;

2. Analisar a formação dos contratos, sua revisão judicial e a preservação do


patrimônio mínimo dos contratantes;

3. Observar a relação existente entre os contratos civis e os contratos


consumeristas;

4. Definir a aplicação jurisprudencial nas obrigações e nos contratos em geral.

TÓPICOS ESPECIAIS DE OBRIGAÇÕES E CONTRATOS 9


Introdução
É possível afirmar que, na sociedade atual, o contrato se corporifica como o
maior negócio jurídico, e, desta forma, a apreensão de sua base principio lógica
se torna um verdadeiro diferencial aos operadores do direito.

O atual Direito Civil vem incorporando o fenômeno de constitucionalização aos


seus institutos, modificando os critérios de interpretação e aplicação do negócio
jurídico. Assim, o Código Civil de 2002 já não é mais concebido como um
diploma patrimonialista e individualista, mas, sim, social.

Para tanto, a materialização dos princípios constitucionais às relações privadas,


antes submissas ao império da autonomia privada sem limites e do seu
correlato pacta sunt servanda, tornou-se uma realidade a partir do respeito aos
valores da isonomia, da dignidade da pessoa humana, da solidariedade, dentre
outros.

Objetivo:
1. Analisar o negócio jurídico à luz do direito civil-constitucional por meio da
aplicação da isonomia e da dignidade humana às relações contratuais;
2. Analisar os novos contornos jurídicos do princípio da autonomia privada e do
pacta sunt servanda nas relações contratuais.
Conteúdo
Constituições
Atualmente, o ordenamento jurídico civilista encontra-se influenciado pela
Constituição Federal, acarretando verdadeira transformação paradigmática em
sua interpretação.

Como resultado, a doutrina e a jurisprudência pátrias desenvolveram as bases e


premissas metodológicas do direito civil-constitucional, entendido, pois,

TÓPICOS ESPECIAIS DE OBRIGAÇÕES E CONTRATOS 10


como uma nova técnica hermenêutica, que busca aplicar os princípios e
direitos fundamentais às relações privadas.

É possível constatar, como seu objetivo precípuo, a unificação do direito a partir


do desiderato constitucional, consubstanciado nos valores da isonomia, da
dignidade da pessoa humana, da solidariedade, dentre outros.

Sob a égide do direito civil-constitucional, a doutrina vem transformando as


bases conceituais dos institutos que compõem a teoria do negócio jurídico,
sendo a interpretação e aplicação contratuais aquelas que mais sofreram
modificações.

Assim, a imutabilidade contratual vem comportando verdadeira intromissão


estatal, que tende a evitar o enriquecimento sem causa e a desproporção
negocial, acarretando a nulidade das cláusulas consideradas abusivas.

Constituições
Atualmente, o ordenamento jurídico civilista encontra-se influenciado pela
Constituição Federal, acarretando verdadeira transformação paradigmática em
sua interpretação.

Como resultado, a doutrina e a jurisprudência pátrias desenvolveram as bases e


premissas metodológicas do direito civil-constitucional, entendido, pois,
como uma nova técnica hermenêutica, que busca aplicar os princípios e
direitos fundamentais às relações privadas.

É possível constatar, como seu objetivo precípuo, a unificação do direito a partir


do desiderato constitucional, consubstanciado nos valores da isonomia, da
dignidade da pessoa humana, da solidariedade, dentre outros.

Sob a égide do direito civil-constitucional, a doutrina vem transformando as


bases conceituais dos institutos que compõem a teoria do negócio jurídico,

TÓPICOS ESPECIAIS DE OBRIGAÇÕES E CONTRATOS 11


sendo a interpretação e aplicação contratuais aquelas que mais sofreram
modificações.

Assim, a imutabilidade contratual vem comportando verdadeira intromissão


estatal, que tende a evitar o enriquecimento sem causa e a desproporção
negocial, acarretando a nulidade das cláusulas consideradas abusivas.

Código Civil de 1916


É importante destacar que o Código Civil de 1916 era considerado um
sistema jurídico individualista e patrimonialista, não se preocupando com
direitos sociais, nem, tampouco, com os direitos de personalidade.

A própria origem do direito civil perpassa pelos direitos de propriedade,


consagrados pela ideologia burguesa de acumulação de riquezas e
disciplinamento detalhado do dever-ser.

Dessa maneira, o direito civil moderno, inaugurado com o Código Napoleônico


de 1804, retoma a noção romana ao fenômeno jurídico, atribuindo força plena
à vontade e à impessoalidade do vínculo. Na presente perspectiva, o indivíduo é
concebido como sujeito de direito e detentor de liberdade volitiva para poder
gozar dos institutos da propriedade e do contrato.

O autor italiano De Cupis criticou tal concepção, observando a configuração de


interesses relacionados ao indivíduo, que são suscetíveis de proteção jurídica,
e, de fato, são mais merecedores de tutela que os bens econômicos.

Ao inverter a visão clássica da sociedade civil, o autor desloca a


pessoa humana para o centro do universo jurídico.

Com isso, foi constituída a unidade conceitual de situações jurídicas subjetivas


acerca dos direitos de personalidade, em um momento de total ausência do

TÓPICOS ESPECIAIS DE OBRIGAÇÕES E CONTRATOS 12


direito privado em matéria de proteção dos direitos relacionados ao indivíduo,
ainda como consequência do caráter patrimonial do ordenamento jurídico.

Justiça Social
O Código Civil de 2002, a partir de uma leitura constitucionalizada do
ordenamento jurídico, apresenta mecanismos que visam atenuar o princípio da
autonomia privada por meio da incorporação da justiça social distributiva
aos negócios jurídicos.

Dessa forma, o presente diploma foi alçado a uma posição de norma regulatória
geral das relações privadas, não excluindo a legislação específica
(microssistemas que visam a proteção da parte hipossuficiente, como o Código
de Defesa do Consumidor), nem a aplicabilidade da interpretação constitucional
às situações que disciplina.

Assim, por meio da técnica hermenêutica denominada diálogo das fontes,


busca-se a harmonização entre as diversas normas do sistema jurídico nacional.

Dentro da presente concepção social da obrigação, esta passa a ser


entendida como um processo de cooperação contínuo e efetivo entre credor e
devedor, segundo a doutrina alemã, na tentativa de mitigar a subordinação do
devedor ao credor ao redirecionar-se o olhar para o adimplemento mais
satisfatório ao credor e menos oneroso ao devedor. Importante destacar que a
responsabilidade do devedor restringe-se ao seu patrimônio, nos moldes do
Artigo 391 do CC.

A fim de ilustrar o fato de que a responsabilidade do devedor restringe-se


ao seu próprio patrimônio, cabível citar decisão prolatada no Recurso
Especial nº 1.130.742-DF, Rel. Min. Luis Felipe Salomão, julgado em
1º/10/2013.

TÓPICOS ESPECIAIS DE OBRIGAÇÕES E CONTRATOS 13


Para a Quarta Turma do STJ, não cabe prisão civil do inventariante em razão do
descumprimento do dever do espólio de prestar alimentos, uma vez que a
restrição da liberdade constitui sanção de natureza personalíssima, não
podendo recair sobre terceiro, estranho ao dever de alimentar. Como é sabido,
a prisão civil somente pode ser imposta ao devedor de alimentos, nos moldes
do Artigo 733, §1°, do CPC.

Ainda consta da decisão a possibilidade que tem o próprio herdeiro em requerer


ao juízo, durante o processamento do inventário, a antecipação de recursos
para a sua subsistência, podendo o magistrado conferir eventual adiantamento
de quinhão necessário à sua mantença, dando, assim, efetividade ao direito
material da parte pelos meios processuais cabíveis, sem que se ofenda, para
tanto, um dos direitos fundamentais do ser humano: a liberdade.

O inventariante é considerado um terceiro estranho na relação entre exequente


e executado, configurando constrangimento ilegal à possibilidade de prisão. O
referido é apenas um auxiliar do juízo, nos moldes do Artigo 139 do CC, não
podendo ser civilmente preso pelo descumprimento de seus deveres, mas, sim,
destituído por um dos motivos do Artigo 995 do CC.

Princípio da isonomia
Dentre os princípios constitucionais aplicáveis ao direito civil, destaca-se o
princípio da isonomia.

Por isonomia, entende-se que todos são iguais perante a lei, sem distinção de
qualquer natureza, conforme Artigo 5º da Constituição Federal.

Na tentativa de apreender seus parâmetros, que, uma vez violados, geram


ofensa à igualdade, Bandeira de Melo enumera: primeiro, o elemento tomado
como fator de desigualação; segundo, a correlação lógica abstrata existente
entre o fator erigido em critério de discrímen e a disparidade estabelecida no
tratamento jurídico diversificado; e, por último, a consonância desta correlação

TÓPICOS ESPECIAIS DE OBRIGAÇÕES E CONTRATOS 14


lógica com os interesses absorvidos no sistema constitucional e destarte
juridicizados.

Interessante discussão acerca da aplicação do princípio da isonomia às relações


privadas envolve a taxa de juros cobrada pelas instituições financeiras,
pois existe verdadeira disparidade estabelecida no tratamento jurídico
concebido aos bancos em relação aos particulares.

No atual cenário jurídico, vem prevalecendo o entendimento trazido pela


Súmula nº 596, de 15/12/1976, do STF: “As disposições do Decreto
22.626 de 1933 não se aplicam às taxas de juros e aos outros encargos
cobrados nas operações realizadas por instituições públicas ou privadas, que
integram o sistema financeiro nacional”.

Constituição Federal de 1988


É de se perceber que a referida súmula foi concebida antes da Constituição
Federal de 1988, o que corrobora o entendimento por sua não incidência às
relações contratuais.

A Constituição da República é clara ao elencar, dentre os seus valores


fundamentais, a isonomia, sendo oportuno questionar a razão que exclui das
limitações da Lei de Usura as instituições bancárias.

Assim, se um particular quiser emprestar um determinado valor a outro sujeito


por meio de contrato de mútuo feneratício, nos moldes do Artigo 591 do
CC, deverá respeitar a limitação imposta pelo Artigo 1º da Lei de Usura
(Decreto nº 22.626/33), mas o mesmo não se aplica aos bancos, que, desta
maneira, podem fixar a taxa de juros compensatórios que bem lhes
aprouverem. Importante esclarecer a existência de divergência jurisprudencial a
esse respeito, e a tendência majoritária pela continuidade de aplicação da
Súmula nº 596 do STF.

TÓPICOS ESPECIAIS DE OBRIGAÇÕES E CONTRATOS 15


Apelação Cível
Segundo a Apelação Cível nº 195.023.114, Rel. Darci Waccholz, 1º Grupo
Cível do TARGS, a Súmula nº 596 não pode ser aplicada segundo seus
fundamentos, pois feriu o princípio da isonomia ao reconhecer privilégio
desproporcional em favor das instituições financeiras ao estabelecer, sem uma
relevante razão, diferenças entre as pessoas, além de a referida súmula
encontrar-se desatualizada.

Porém, a aplicabilidade da Súmula nº 596 constitui entendimento majoritário na


jurisprudência brasileira, como consta do seguinte julgado do STJ:

Outra discussão que envolve a mesma matéria se relaciona ao fato de que fere
a isonomia o comportamento dos bancos, ao remunerarem, de forma
desproporcional, as atividades que realiza.

Porque, ao depositar em poupança, o sujeito é remunerado com uma taxa


baixa e, ao contratar um financiamento com o mesmo banco, o sujeito é
obrigado a desembolsar uma taxa exorbitante? A Súmula nº 297 do STJ
determina: “O Código de Defesa do Consumidor é aplicável às instituições
financeiras”.

Assim, no mesmo tribunal, apresentam-se decisões antagônicas, já que não se


estabelece um limite às atividades realizadas pelas instituições financeiras, mas
seus clientes gozam, em tese, do conjunto protetivo disciplinado pelo CDC.

AGRAVO REGIMENTAL NO AGRAVO DE INSTRUMENTO. CONTRATO


BANCÁRIO. AFASTAMENTO DA LIMITAÇÃO DOS JUROS
REMUNERATÓRIOS EM 12% AO ANO. INAPLICABILIDADE, NO CASO,
DA LEI DE USURA. INCIDÊNCIA DA LEI Nº 4.595 /64 E DA SÚMULA
596/STF. AGRAVO REGIMENTAL IMPROVIDO. 1. Nos termos da pacífica
jurisprudência desta Corte Superior de Justiça, os juros remuneratórios
cobrados pelas instituições financeiras não sofrem a limitação imposta pelo

TÓPICOS ESPECIAIS DE OBRIGAÇÕES E CONTRATOS 16


Decreto nº 22.626/33 (Lei de Usura), a teor do disposto na Súmula 596/STF,
de forma que a abusividade da pactuação dos juros remuneratórios deve ser
cabalmente demonstrada em cada caso, com a comprovação do desequilíbrio
contratual ou de lucros excessivos, sendo insuficiente o só fato de a estipulação
ultrapassar 12% ao ano ou de haver estabilidade inflacionária no período. 2.
Agravo regimental improvido. (grifos nossos).

Relação do consumo
Segundo o STJ
No que diz respeito à relação de consumo, segundo o próprio STJ, configura
hipótese de violação do Artigo 51, II e IV, do CDC, as cláusulas contratuais que
estabeleçam obrigações consideradas iníquas, abusivas, que coloquem o
consumidor em desvantagem exagerada ou sejam incompatíveis com a boa-fé
ou a equidade.

Artigo 51
Nesse contexto, cabe ressaltar o disposto no Artigo 51, §1º, III, do CDC, que
presume ser exagerada a vantagem que “se mostra excessivamente onerosa
para o consumidor, considerando-se a natureza e conteúdo do contrato, o
interesse das partes e outras circunstâncias peculiares do caso”. Como
resultado, devem ser tais cláusulas declaradas nulas de pleno direito, uma vez
que violam o ordenamento jurídico civil-constitucional.

Recurso Especial nº 1.194.627-RS


Já no Recurso Especial nº 1.194.627-RS, Rel. Min. Marco Buzzi, julgado em
1º/12/2011, a turma julgadora entendeu pela aplicação do Código de Defesa do
Consumidor à relação contratual de mútuo estabelecida pelas partes com a
instituição financeira para compra de ações da Copesul.

Nesse contexto, o que se ventilava na ação não era a redução da taxa de juros
compensatórios, mas, sim, a declaração de nulidade da cláusula de eleição de
foro contratualmente pactuada.

TÓPICOS ESPECIAIS DE OBRIGAÇÕES E CONTRATOS 17


Para o Min. Relator, o simples fato de os recorrentes, pessoas físicas, terem
utilizado o financiamento obtido junto à instituição financeira para investimento
em ações não desnatura a relação de consumo estabelecida entre as partes.

Somente se afastaria a figura do destinatário final daquele que contrai mútuo


com instituição financeira caso ele se dedicasse à atividade financeira, valendo-
se da quantia obtida para reemprestá-la, cobrando juros de terceiros.

Portanto, deve-se afastar a validade da cláusula de eleição, prevalecendo o foro


do domicílio do consumidor para processamento e julgamento da demanda em
que se discute a validade do contrato de financiamento.

Qualidade intrínseca
Dentre os princípios constitucionais aplicáveis ao direito civil, destaca-se o
Princípio da Dignidade Humana. Segundo Sarlet, dignidade da pessoa humana
pode ser entendida como:

Qualidade
A qualidade intrínseca e distintiva de cada ser humano, que o faz merecedor do
mesmo respeito e consideração por parte do Estado e da comunidade,
implicando, neste sentido, um complexo de direitos e deveres fundamentais
que assegurem a pessoa tanto contra todo e qualquer ato de cunho degradante
e desumano, como venham a lhe garantir as condições existenciais mínimas
para uma vida saudável, além de propiciar e promover sua participação ativa e
corresponsável nos destinos da própria existência e da vida em comunhão com
os demais seres humanos.

Relações privadas

TÓPICOS ESPECIAIS DE OBRIGAÇÕES E CONTRATOS 18


Aplicar a dignidade da pessoa humana às relações privadas é tarefa recorrente
no atual ordenamento jurídico por meio da jurisprudência. No Recurso
Especial nº 1.324.712-MG, Rel. Min. Luis Felipe Salomão, julgado em
24/9/2013, o STJ decidiu ser incabível a exigência de caução para atendimento
médico-hospitalar emergencial. Dessa forma, o Tribunal Superior vem
materializando o valor jurídico-constitucional da dignidade aos contratos de
prestação de serviços médicos, afastando a constituição de garantia para
tratamento emergencial, mesmo que a mencionada caução tenha sido pactuada
entre as partes ou seus familiares.

Atenção
O Superior Tribunal de Justiça, antes da vigência da Lei nº
12.653/2012, já havia se manifestado no sentido de que é dever
do estabelecimento hospitalar, sob pena de responsabilização
cível e criminal, da sociedade empresária e prepostos, prestar o
pronto atendimento. Com a superveniente vigência da Lei nº
12.653/2012, que veda a exigência de caução e de prévio
preenchimento de formulário administrativo para a prestação de
atendimento médico-hospitalar premente, a solução para o caso
é expressamente conferida por norma de caráter cogente.

Negócios jurídicos
Também constitui aplicação da dignidade humana aos negócios jurídicos, a
determinação de que o Estado, em todas as suas esferas de poder, deve
assegurar às crianças e aos adolescentes, com absoluta prioridade, o direito à
vida e à saúde, fornecendo gratuitamente o tratamento médico cuja família não
tem condições de custear. Assim, há responsabilidade solidária, estabelecida
nos Artigos 196 e 227 da Constituição Federal e Artigo 11, §2º, do ECA,
podendo o autor da ação exigir, em conjunto ou separadamente, o
cumprimento da obrigação por qualquer dos entes públicos,

TÓPICOS ESPECIAIS DE OBRIGAÇÕES E CONTRATOS 19


independentemente da regionalização e hierarquização do serviço público de
saúde.

Declaração
De outra sorte, nos Embargos de Declaração no Agravo nº 1.023.858-RJ,
Rel. Min. Jorge Mussi, julgado em 4/12/2008, o STJ afastou a interpretação
civil-constitucional ao possibilitar a penhora do único bem de família do fiador,
nos moldes do Artigo 3º, VII, da Lei nº 8.009/1990.

O Min. Relator destacou que a orientação divergente de Tribunal


estadual não tem o condão de afastar o entendimento predominante
nos Tribunais Superiores no sentido de ser penhorável o imóvel
familiar do fiador em contrato de locação.

Papel da Jurisprudência
Em conclusão, foi possível perceber o papel da jurisprudência diante da
interpretação e aplicação dos princípios constitucionais às relações contratuais,
com destaque para a isonomia e a dignidade da pessoa humana.

Assim, por meio da análise de casos concretos, foi constatada a tendência ao


dirigismo contratual por parte do Estado, mas sem esvaziar por completo a
autonomia privada, inerente aos negócios jurídicos modernos.

Ordenamento jurídico
Como analisado anteriormente, o ordenamento jurídico civilista estrutura-se no
Estado Democrático de Direito, inaugurado com a Constituição Federal de
1988, a partir de uma nova leitura acerca dos negócios jurídicos que disciplina.
A visão tradicional de que o contrato fazia lei entre as partes (pacta sunt
servanda) resta superada, permitindo-se, desta forma, uma maior intromissão
estatal na autonomia das vontades, o chamado dirigismo contratual.

TÓPICOS ESPECIAIS DE OBRIGAÇÕES E CONTRATOS 20


Tal dirigismo é a faculdade outorgada por lei ao magistrado para que este
reveja o contrato e estabeleça condições para sua execução, fazendo com que
cláusulas sejam impostas em substituição da declaração volitiva do contratante.

Porém, isso não deve levar ao esvaziamento total do princípio da autonomia


privada, mas, sim, à sua mitigação diante da aplicação da boa-fé objetiva e da
função social aos negócios jurídicos, princípios corolários de uma leitura
constitucionalizada do fenômeno privado.

Dessa maneira, a função social do contrato não tem a aptidão de afastar a


autonomia privada, tal como determinado no Enunciado 23 da I Jornada de
Direito Civil do CJF/STJ: “a função social do contrato, prevista no Artigo 421
do novo Código Civil, não elimina o princípio da autonomia contratual, mas
atenua ou reduz o alcance deste princípio quando presentes interesses
metaindividuais ou interesse individual relativo à dignidade da pessoa humana”.

Princípio da autonomia
Conceitua-se o princípio da autonomia privada como sendo um regramento
básico, de ordem particular – mas influenciado por normas de ordem pública –,
pelo qual, na formação do contrato, além da vontade das partes, entram em
cena outros fatores: psicológicos, políticos, econômicos e sociais.
Trata-se do direito indeclinável de a parte autorregulamentar os seus
interesses, decorrente da dignidade humana, mas que encontra limitações em
normas de ordem pública, particularmente nos princípios sociais contratuais.

Autonomia privada

Contratos de adesão
Com a redução da autonomia privada, o negócio jurídico paritário perdeu
espaço social em detrimento dos contratos de adesão, que passam a
constituir a regra geral.

TÓPICOS ESPECIAIS DE OBRIGAÇÕES E CONTRATOS 21


Extinção dos contratos
Apesar de tal mudança ocorrer, isto não acarreta a extinção dos contratos,
mas, sim, a mudança de sua estrutura e conceituação. O contrato muda a sua
disciplina, as suas funções e a sua própria estrutura segundo o contexto
econômico-social em que está inserido.

Padronização das transações


Assim, para uma parte da doutrina, a liberdade de contratar não mais existe,
uma vez que o contrato foi transformado em norma unilateral imposta pela
empresa que está em situação dominante, a partir de um fenômeno conhecido
como padronização das transações, decorrente de uma economia de
massa.

Teoria da imprevisão
Dirigismo contratual
É possível afirmar que, no campo intervencionista consubstanciado no dirigismo
contratual, situa-se a teoria da imprevisão, nos moldes do Artigo 478 do CC.

TÓPICOS ESPECIAIS DE OBRIGAÇÕES E CONTRATOS 22


Desequilíbrio contratual
Dessa forma, atingindo o plano de desequilíbrio contratual pela ocorrência de
fato imprevisível e/ou extraordinário, o direito deverá ser acionado e a
obrigatoriedade contratual deixada de lado.

Ordenamento jurídico
O relatado desequilíbrio possibilita a revisão ou extinção do contrato em
respeito ao ordenamento jurídico, que não mais tolera a desproporção negocial,
em que um se enriquece de forma desarrazoada em detrimento do
empobrecimento de outrem.

Princípio da conservação
Como decorrência do princípio da conservação do negócio jurídico diante da
necessidade de aplicação da teoria da imprevisão, estabelece o Enunciado
176 da III Jornada de Direito Civil do CJF/STJ: “Em atenção ao princípio
da conservação dos negócios jurídicos, o Artigo 478 do Código Civil de 2002
deverá conduzir, sempre que possível, à revisão judicial dos contratos e não à
resolução contratual”.

Contratos
No Recurso Especial nº 936741/GO, Rel. Min. Antonio Carlos Ferreira, é
possível estabelecer uma digressão entre as várias espécies de contratos
existentes no ordenamento jurídico pátrio. Anteriormente, foi afirmado que a
autonomia privada vem sofrendo atenuações como decorrência do exercício
jurisprudencial, a fim de adequar a estrutura do contrato às exigências
constitucionais.

Porém, diante de contrato de compra e venda de safra futura, não há que


se aplicar a teoria da imprevisão em decorrência da onerosidade excessiva.
Dessa maneira, contratos empresariais não devem ser tratados da mesma
forma que contratos cíveis em geral ou contratos de consumo, pois, nestes,

TÓPICOS ESPECIAIS DE OBRIGAÇÕES E CONTRATOS 23


admite-se o dirigismo contratual; naqueles, devem prevalecer os princípios da
autonomia da vontade e da força obrigatória dos negócios jurídicos.

Direito privado
Ainda é possível extrair do julgado que Direito Civil e Direito Empresarial, ainda
que ramos do Direito Privado, submetem-se a regras e princípios próprios.
Logo, o fato de o Código Civil ter submetido os contratos cíveis e empresariais
às mesmas regras gerais não significa que estes contratos sejam
essencialmente iguais. A não incidência da teoria da imprevisão, nos moldes do
Artigo 478 do CC, decorre dos seguintes argumentos:

Os contratos em discussão não são de execução continuada ou diferida, mas


contratos de compra e venda de coisa futura, a preço fixo.

Alta do preço da soja não tornou a prestação de uma das partes


excessivamente onerosa, mas apenas reduziu o lucro esperado pelo produtor
rural.

A variação cambial que alterou a cotação da soja não configurou um


acontecimento extraordinário e imprevisível, porque ambas as partes
contratantes conhecem o mercado em que atuam, pois são profissionais do
ramo e sabem que tais flutuações são possíveis.

Informativo nº 492 do STJ


Assim, de acordo com o Informativo nº 492 do STJ, nos contratos aleatórios
de compra e venda de safra futura, as variações de preço, por si só, não
motivam a resolução contratual com base na teoria da imprevisão.

Ocorre que, para a aplicação dessa teoria, é imprescindível que as


circunstâncias que envolveram a formação do contrato de execução diferida
não sejam as mesmas no momento da execução da obrigação, tornando o
contrato extremamente oneroso para uma parte em benefício da outra.

TÓPICOS ESPECIAIS DE OBRIGAÇÕES E CONTRATOS 24


E ainda que as alterações que ensejaram o referido prejuízo resultem de um
fato extraordinário e impossível de ser previsto pelas partes.

Recurso Especial nº 1.321.655-MG


De outra sorte, no Recurso Especial 1.321.655-MG, Rel. Min. Paulo de
Tarso Sanseverino, julgado em 22/10/2013, o STJ mitigou a força obrigatória
do contrato ao estabelecer como abusiva a cláusula penal de contrato de
pacote turístico que estabeleça, para a hipótese de desistência do consumidor,
a perda integral dos valores pagos antecipadamente.

Dessa maneira, não é possível falar em perda total dos valores pagos
antecipadamente por pacote turístico, sob pena de se criar uma situação que,
além de vantajosa para a empresa de turismo (fornecedora de serviços),
mostra-se excessivamente desvantajosa para o consumidor, o que implica
incidência do Artigo 413 do CC, segundo o qual a penalidade deve
obrigatoriamente (e não facultativamente) ser reduzida equitativamente pelo
juiz se o seu montante for manifestamente excessivo.

STJ – Superior Tribunal de Justiça


O STJ tem o entendimento de que, em situação semelhante (nos contratos de
promessa de compra e venda de imóvel), é cabível ao magistrado reduzir o
percentual da cláusula penal com o objetivo de evitar o enriquecimento sem
causa por qualquer uma das partes.

Além disso, no que diz respeito à relação de consumo, evidencia-se, na


hipótese, violação do Artigo 51, II e IV, do CDC, de acordo com o qual são
nulas de pleno direito as cláusulas contratuais relativas ao fornecimento de
produtos e serviços que subtraiam ao consumidor a opção de reembolso da
quantia já paga, nos casos previstos neste código.

TÓPICOS ESPECIAIS DE OBRIGAÇÕES E CONTRATOS 25


Recurso Especial nº 1.132.943-PE
No mesmo sentido do Recurso Especial nº 1.132.943-PE, Rel. Min. Luis
Felipe Salomão, julgado em 27/8/2013, que decidiu ser abusiva a cláusula de
distrato (fixada no contexto de compra e venda imobiliária mediante
pagamento em prestações) que estabeleça a possibilidade de a construtora
vendedora promover a retenção integral ou a devolução ínfima do valor das
parcelas adimplidas pelo consumidor distratante.

Cláusulas
Os Artigos 53 e 51, IV, do CDC coíbem cláusula de decaimento que determine a
retenção de valor integral ou substancial das prestações pagas, por
consubstanciar vantagem exagerada do incorporador.

Nesse contexto, o Artigo 53 dispõe que, nos “contratos de compra e venda de


móveis ou imóveis mediante pagamento em prestações, bem como nas
alienações fiduciárias em garantia, consideram-se nulas de pleno direito as
cláusulas que estabeleçam a perda total das prestações pagas em benefício do
credor que, em razão do inadimplemento, pleitear a resolução do contrato e a
retomada do produto alienado”.

Distrato
Além disso, o fato de o distrato pressupor um contrato anterior não implica
desfiguração da sua natureza contratual. Isso porque, nos moldes do Artigo
472 do CC, "o distrato faz-se pela mesma forma exigida para o contrato", o que
implica afirmar que o distrato nada mais é que um novo contrato, distinto ao
contrato primitivo.

Dessa forma, como em qualquer outro contrato, um instrumento de distrato


poderá, eventualmente, ser eivado de vícios, os quais, por sua vez, serão
passíveis de revisão em juízo, sobretudo no campo das relações de consumo.
Em outras palavras, as disposições estabelecidas em um instrumento de

TÓPICOS ESPECIAIS DE OBRIGAÇÕES E CONTRATOS 26


distrato são, como quaisquer outras disposições contratuais, passíveis de
anulação por abusividade.

Modelo individualista-liberal
Em síntese, o princípio da autonomia privada pode ser apreendido como a
possibilidade, oferecida e assegurada aos particulares, de regularem suas
relações mútuas dentro de determinados limites, por meio de negócios
jurídicos, enquanto o pacta sunt servanda é concebido como o princípio que
determina a força obrigatória dos contratos.

Importante relembrar que, no modelo individualista-liberal, típico dos códigos


oitocentistas, tais princípios eram tomados como absolutos. No entanto, na
concepção atual do direito civil-constitucional, ocorreu sua relativização com
vistas à melhor proteção da dignidade humana.

Conclusão
Conclui-se, portanto, que, ao surgirem questões práticas acerca da aplicação do
princípio da autonomia privada, da liberdade e da dignidade da pessoa
humana, deve-se privilegiar a liberdade do sujeito em detrimento dos interesses
patrimoniais inerentes ao negócio jurídico, já que prevalece o direito
existencial no sistema jurídico pátrio.

Atividade proposta
Leia sobre um case que aborda o conteúdo discutido nesta aula. Em seguida,
diante do exposto, faça a analise do acórdão e identifique se há ou não
desrespeito ao princípio da dignidade da pessoa humana, diante da
possibilidade de penhorar o único bem de família do fiador.

“TJRJ - DES. MARIO ASSIS GONCALVES - Julgamento: 09/05/2012 - TERCEIRA


CAMARA CIVEL. Embargos à execução. Fiador. Bem de família. Penhorabilidade.
Constitucionalidade reconhecida pelo STF. O inciso VII do artigo 3º, da Lei
8.009/90 afasta a impenhorabilidade do bem de família na hipótese de

TÓPICOS ESPECIAIS DE OBRIGAÇÕES E CONTRATOS 27


execução de obrigação decorrente de fiança concedida em contrato de locação.
Assim, o imóvel apontado pelo exequente, ainda que seja o único, pode ser
objeto da execução. A constitucionalidade do referido dispositivo legal foi
declarada pelo Supremo Tribunal Federal em julgamento de Recurso
Extraordinário no qual se reconheceu a existência de repercussão geral. A
matéria é, inclusive, objeto do verbete sumular nº 63 deste Tribunal. Desta
forma, legítima a penhora realizada sobre o bem de propriedade da fiadora. Por
fim cumpre destacar que a fiança é uma obrigação de garantia. Nesse tipo de
obrigação, aquilo a que se obriga o fiador é pagar a obrigação se o devedor
não o fizer. A fiança é outra relação jurídica da qual o devedor não faz parte e
que se estabelece entre o credor e o fiador, são duas relações jurídicas
distintas. Há uma relação jurídica principal que se estabelece entre credor e o
devedor e há outra relação jurídica acessória que se estabelece entre o credor e
o fiador. Da principal o fiador não é parte, assim como da acessória é o devedor
que não é parte. Desta forma, quitado o débito pelo fiador este se sub-roga nos
direitos do locador, podendo executar a dívida em virtude do direito de
regresso. Recurso ao qual se dá provimento”.

Chave de resposta: À luz do direito civil-constitucional, é cabível o


questionamento acerca da constitucionalidade do Artigo 3º, VII, da Lei nº
8.009/90, que possibilita a penhora do único bem de família do fiador.
Importante lembrar que a referida lei encontra fundamento na doutrina do
patrimônio mínimo do devedor, materializando a dignidade da pessoa humana
nas relações contratuais. É de se concluir que tal precedente acaba criando um
ambiente inseguro ao fiador e, por conseguinte, inviabiliza a assunção desta
responsabilidade.

Referências
DE CUPIS, Adriano. Os direitos da personalidade. Campinas: Romana
Jurídica, 2004. p. 121.

TÓPICOS ESPECIAIS DE OBRIGAÇÕES E CONTRATOS 28


MELLO, Celso Antonio Bandeira. Conteúdo jurídico do princípio da
igualdade. 3. ed. São Paulo: Malheiros, 1995. p. 21.
TARTUCE, Flávio. Manual de Direito Civil. 3. ed. São Paulo: Método, 2013. p.
539.

Exercícios de fixação
Questão 1
(Magistratura do Trabalho)
A liberdade de contratar, segundo preceito expresso na Lei Civil, será exercida
em razão e nos limites da função social do contrato, porque o Código Civil
vigente traz uma maior preocupação com a dignidade da pessoa humana,
quando visualiza o contrato como instrumento de integração do homem na
sociedade:
a) As duas expressões são falsas
b) A primeira é verdadeira, e a segunda é falsa
c) A primeira é falsa, e a segunda é verdadeira
d) As duas são verdadeiras, e a segunda justifica a primeira
e) As duas são verdadeiras, e a segunda não justifica a primeira

Questão 2
De acordo com os princípios que regem a relação contratual, identifique aquele
que não se aplica a presente relação.
a) Princípio da dignidade da pessoa humana
b) Princípio da função social dos contratos
c) Princípio da responsabilidade pessoal do devedor
d) Princípio da boa-fé objetiva

Questão 3
O processo de mitigação dos tradicionais critérios para solucionar o conflito
entre regras, em que se busca a harmonização entre as diversas normas do
ordenamento jurídico ao invés do afastamento de uma delas, é denominado de:
a) Crise dos contratos

TÓPICOS ESPECIAIS DE OBRIGAÇÕES E CONTRATOS 29


b) Pacta sunt servanda
c) Dirigismo contratual
d) Diálogo das fontes

Questão 4
É possível afirmar que o direito civil-constitucional pode ser considerado como:
a) Uma nova técnica de hermenêutica, em que os princípios constitucionais
deverão ser aplicados às relações privadas.
b) Uma nova técnica de hermenêutica, em que o credor deverá se
submeter ao inadimplemento voluntário do devedor.
c) Uma nova técnica de hermenêutica, em que se reafirma o Código Civil
como diploma patrimonialista e individualista.
d) Uma nova técnica de hermenêutica, em que o devedor deverá se
submeter às cláusulas determinadas pelo credor.

Questão 5
(OAB)
Semprônio realiza contrato de locação com Terêncio, de imóvel residencial
urbano. Para garantir a avença, intercede Esculápio na condição de fiador pelo
período do contrato, renunciando ao benefício de ordem. No curso da avença, o
devedor, por motivos de doença da família, deixa de quitar algumas prestações.
Após o período de dificuldades, credor e devedor ajustam a prorrogação do
contrato, não informando tal situação ao fiador. Diante do exposto, marque a
alternativa correta:
a) O fiador não será responsável, diante da prorrogação do contrato.
b) A fiança não constitui uma das espécies de garantia locatícia.
c) Qualquer modificação no contrato não precisa ser comunicada ao fiador.
d) O único bem de família do fiador poderá ser penhorado, por expressa
força de lei.

Questão 6

TÓPICOS ESPECIAIS DE OBRIGAÇÕES E CONTRATOS 30


A possibilidade, oferecida e assegurada aos particulares, de regularem suas
relações mútuas, dentro de determinados limites, por meio de negócios
jurídicos, constitui um dos princípios fundamentais da relação contratual.
Aponte, dentre as alternativas abaixo, o presente princípio:
a) Princípio da função social dos contratos
b) Princípio da autonomia da vontade
c) Princípio do pacta sunt servanda
d) Princípio da conservação do negócio jurídico

Questão 7
Quanto aos princípios que regem a relação contratual, assinale a resposta
incorreta.
a) Autonomia da vontade é a possibilidade, oferecida e assegurada aos
particulares, de regularem suas relações mútuas, dentro de
determinados limites, por meio de negócios jurídicos.
b) Função social do contrato é um princípio contratual, de ordem pública,
pelo qual o contrato deve ser necessariamente visualizado, interpretado
e estruturado de acordo com o contexto da sociedade.
c) Pelo princípio da boa-fé objetiva, os contratantes estão obrigados a
cumprir suas prestações de forma leal e proba, sob pena de cometerem
abuso de direito, o que acarreta responsabilidade civil.
d) A liberdade de contratar não será exercida em razão e nos limites da
função social do contrato.

Questão 8
(OAB)
Silvana, promitente compradora, celebrou instrumento de promessa de compra
e venda de imóvel no valor de R$ 200.000,00 (duzentos mil reais) com Ivana,
promitente vendedora, através de instrumento público. Durante a vigência do
pacto, Silvana e Ivana decidiram desfazer o negócio e celebraram novo acordo
por meio de instrumento particular, extinguindo o contrato inicial. Qual é o
instituto jurídico pertinente?

TÓPICOS ESPECIAIS DE OBRIGAÇÕES E CONTRATOS 31


a) Trata-se de distrato, que deverá seguir a mesma forma exigida por lei
para a realização do contrato.
b) Trata-se de distrato, que não precisará seguir a mesma forma exigida
por lei para a realização do contrato.
c) Trata-se de resilição unilateral do contrato.
d) Trata-se de resolução contratual.

Questão 9
José celebrou contrato de compra e venda de safra futura de soja com Antônio,
em que ficou determinado o pagamento por toda a safra de soja do segundo,
mesmo que esta não venha a existir. Quanto à classificação, é possível afirmar
que:
a) O contrato é comutativo, cabendo aplicar a teoria da imprevisão.
b) O contrato é aleatório, cabendo aplicar a teoria da imprevisão.
c) O contrato é comutativo, não cabendo aplicar a teoria da imprevisão.
d) O contrato é aleatório, não cabendo aplicar a teoria da imprevisão.

Questão 10
(Exame da OAB – 2012)
Embora sujeito às constantes mutações e às diferenças de contexto em que é
aplicado, o conceito tradicional de contrato sugere que ele represente o acordo
de vontades estabelecido com a finalidade de produzir efeitos jurídicos.
Tomando por base a teoria geral dos contratos, assinale a afirmativa correta:
a) A celebração de contrato atípico, fora do rol contido na legislação, não é
lícita, pois as partes não dispõem da liberdade de celebrar negócios não
expressamente regulamentados por lei.
b) A atipicidade contratual é possível, mas, de outro lado, há regra
específica prevendo não ser lícita a contratação que tenha por objeto a
herança de pessoa viva, seja por meio de contrato típico ou não.
c) A liberdade de contratar é limitada pela função social do contrato, e os
contratantes deverão guardar, assim na conclusão, como em sua
execução, os princípios da probidade e da boa‐fé subjetiva, princípios

TÓPICOS ESPECIAIS DE OBRIGAÇÕES E CONTRATOS 32


estes ligados ao voluntarismo e ao individualismo que informam o nosso
Código Civil.
d) Será obrigatoriamente declarado nulo o contrato de adesão que contiver
cláusulas ambíguas ou contraditórias.

Contrato de mútuo feneratício: No presente empréstimo de bens fungíveis,


permite-se a previsão de juros compensatórios entre os contratantes. Segundo
o Artigo 591 do CC: “Destinando-se o mútuo a fins econômicos, presumem-se
devidos juros, os quais, sob pena de redução, não poderão exceder a taxa a
que se refere o Artigo 406, permitida a capitalização anual”.

Juros compensatórios: Tal espécie de taxa de juros tem a finalidade de


capitalizar o valor nominal que foi emprestado. Para os contratos pactuados
entre pessoas físicas ou jurídicas que não exerçam atividade financeira, sua
base normativa será a Lei de Usura.

Aula 1
Exercícios de fixação
Questão 1 - D
Justificativa: O Código Civil de 2002, a partir de uma leitura constitucionalizada
do ordenamento jurídico, apresenta mecanismos que visam atenuar o princípio
da autonomia privada por meio da incorporação da justiça social distributiva
aos negócios jurídicos, bem como da dignidade da pessoa humana.

Questão 2 - C
Justificativa: Conforme Artigo 391 do CC: “Pelo inadimplemento das obrigações,
respondem todos os bens do devedor”.

TÓPICOS ESPECIAIS DE OBRIGAÇÕES E CONTRATOS 33


Questão 3 - D
Justificativa: Cláudia Lima Marques denomina como diálogo das fontes o
processo de mitigação dos tradicionais critérios hermenêuticos, utilizados para
se determinar qual norma deverá ser aplicada em dado caso concreto.

Questão 4 - A
Justificativa: Atualmente, o ordenamento jurídico civilista encontra-se
influenciado pela Constituição Federal, acarretando verdadeira transformação
paradigmática em sua interpretação. Como resultado, a doutrina e a
jurisprudência pátrias desenvolveram as bases e premissas metodológicas do
direito civil-constitucional, entendido, pois, como uma nova técnica
hermenêutica, que busca aplicar os princípios e direitos fundamentais às
relações privadas.

Questão 5 - D
Justificativa: Conforme Artigo 3º, VII, da Lei nº 8.009/1990.

Questão 6 - B
Justificativa: Em síntese, o princípio da autonomia privada pode ser apreendido
como a possibilidade, oferecida e assegurada aos particulares, de regularem
suas relações mútuas, dentro de determinados limites, por meio de negócios
jurídicos.

Questão 7 - D
Justificativa: Conforme Artigo 421 do CC: “A liberdade de contratar será
exercida em razão e nos limites da função social do contrato”.

Questão 8 - A
Justificativa: Conforme Artigo 472 do CC: “O distrato faz-se pela mesma forma
exigida para o contrato”.

TÓPICOS ESPECIAIS DE OBRIGAÇÕES E CONTRATOS 34


Questão 9 - D
Justificativa: Informativo nº 492 do STJ: “Nos contratos aleatórios de compra e
venda de safra futura, as variações de preço, por si só, não motivam a
resolução contratual com base na teoria da imprevisão”.

Questão 10 - B
Justificativa: Conforme Artigo 425 do CC: “É lícito às partes estipular contratos
atípicos, observadas as normas gerais fixadas neste Código”; e Artigo 426 do
CC: “Não pode ser objeto de contrato a herança de pessoa viva”.

TÓPICOS ESPECIAIS DE OBRIGAÇÕES E CONTRATOS 35


Introdução
É possível afirmar que na sociedade atual o contrato se corporifica como o
maior negócio jurídico. E, dessa forma, a apreensão de sua base principiológica
torna-se um verdadeiro diferencial aos operadores do direito.

Nesse contexto, insere-se o princípio da boa-fé objetiva, a partir da


personificação dos anseios constitucionais às relações privadas. Com isso, a
exigência de conduta pautada na lealdade dos contratantes torna-se
imprescindível e sua violação passa a constituir abuso de direito.

Diante da jurisprudencialização do ordenamento jurídico, as decisões judiciais


ganham importância fundamental para apreensão dos institutos de direito.
Diante dessa premissa, convém analisar a ocorrência ou inocorrência da boa-fé
objetiva nos casos concretos submetidos à apreciação judicial, cabendo a
seguinte pergunta: qual é o contorno jurídico que o Poder Judiciário tem
agregado ao referido princípio civil-constitucional?

Objetivo:
1. Analisar os elementos constitutivos do princípio da boa-fé objetiva: conceito,
regulamentação, requisitos para aplicação, funções, deveres anexos, abuso de
direito e violação positiva do contrato;
2. Analisar a aplicação jurisprudencial do princípio da boa-fé objetiva e
perceber sua ocorrência nas obrigações e nos contratos em geral.
Conteúdo
Lealdade contratual
A boa-fé objetiva determina que os contratantes estão obrigados a cumprir
suas prestações de forma leal e proba, sob pena de cometerem abuso de
direito (Artigo 187, CC), o que acarreta responsabilidade civil, constituindo uma
verdadeira cláusula geral, já que materializa um preceito de ordem pública.

TÓPICOS ESPECIAIS DE OBRIGAÇÕES E CONTRATOS 36


Boa-fé subjetiva
Com o intuito de diferenciar a boa-fé subjetiva da boa-fé objetiva, leciona
Gonçalves, citando Martins-Costa:

“Num primeiro plano, a boa-fé subjetiva implica a noção de entendimento


equivocado, em erro que enreda o contratante (...), sendo que a situação é
regular e essa sua ignorância escusável reside no próprio estado (subjetivo) da
ignorância (as hipóteses de casamento putativo, da aquisição da propriedade
alheia mediante usucapião), seja numa errônea aparência de certo ato
(mandato aparente, herdeiro aparente, etc).”

Ordenamento jurídico
Para doutrina italiana, a boa-fé é elemento constitutivo da fattispecie liberatória
e a sua prova cabe ao devedor.

De acordo com o Enunciado nº 548 da VI Jornada de Direito Civil do


CJF/STJ, “caracterizada a violação de dever contratual, incumbe ao devedor o
ônus de demonstrar que o fato causador do dano não lhe pode ser imputado,
conforme Artigos 389 e 475, CC”.

Tal enunciado justifica-se no fato do ordenamento jurídico ser composto por


regras, princípios e valores coerentes entre si, o que acarreta a imposição do
ônus de provar ao devedor, que não foi ele quem descumpriu a obrigação,
tanto nas hipóteses de mora e de inadimplemento, quanto nos casos de
cumprimento imperfeito.

Eventualmente, a boa-fé pode ser presumida, bastando a prova da aparência


(Teoria da Aparência) da legitimação para receber, em relação ao credor
putativo, nos moldes do Artigo 309 do CC.

TÓPICOS ESPECIAIS DE OBRIGAÇÕES E CONTRATOS 37


Intérprete jurídico
Importante destacar que se presume a boa-fé, tanto objetiva quanto subjetiva,
nos contratos consumeristas (Artigo 47 do CDC) e nos contratos de adesão
(Artigo 423 do CC).

A complementaridade entre as duas normas deve ser materializada pelo


intérprete jurídico, em respeito à técnica denominada diálogo das fontes, em
que se busca a harmonização entre as diversas fontes normativas que
compõem o ordenamento jurídico nacional.

De acordo com o Enunciado nº 27 da I Jornada de Direito Civil do


CJF/STJ: “na interpretação da cláusula geral da boa-fé objetiva, deve-se levar
em conta o sistema do CC e as conexões sistemáticas com outros estatutos
normativos e fatores metajurídicos”.

Contratos de adesão
A conduta de lealdade deverá ser observada, principalmente, nos contratos de
adesão.

Em breve conceituação, contrato de adesão é aquele em que uma parte, o


estipulante, impõe o conteúdo negocial, restando à outra parte, o aderente,
duas opções: aceitar ou não o conteúdo desse negócio (Artigos 423 e 424, CC e
54, CDC).

A consequência jurídica imposta pelo desrespeito à boa-fé objetiva em tais


contratos é a nulidade das cláusulas abusivas; dentre elas encontra-se o pacto
comissório real. Pelo Artigo 1.428, CC: “É nula a cláusula que autoriza o credor
pignoratício, anticrético ou hipotecário a ficar com o objeto da garantia, se a
dívida não for paga no vencimento”.

TÓPICOS ESPECIAIS DE OBRIGAÇÕES E CONTRATOS 38


Renúncia antecipada
Não é possível a renúncia antecipada de direitos em contratos de adesão, nos
moldes do art. 424 do Código Civil.

Atualmente, grande parte dos contratos de financiamento é de adesão,


contratos nos quais há, normalmente, constituição de direito real de garantia,
como é o caso da hipoteca.

Porém, a lei civil estabelece uma limitação ao credor, que não pode pactuar a
tomada da coisa, diante do inadimplemento obrigacional no vencimento. Para
tanto, à luz da boa-fé objetiva, necessitará de ação judicial, ou para cobrar a
dívida, ou para tomar o bem.

Direito de sequela
Hipoteca
De outra sorte, a hipoteca firmada entre a construtora e o agente financeiro
vem prejudicando o comprador do imóvel (consumidor), que acaba perdendo
seu bem.

Direto
Tal perda decorre do direito de sequela inerente ao direito real de garantia
estabelecido.

Boa-fé Objetiva
Porém, a Súmula nº 308 do STJ materializa a boa-fé objetiva, ao estabelecer:
“A hipoteca firmada entre a construtora e o agente financeiro, anterior ou
posterior à celebração da promessa de compra e venda, não tem eficácia
perante os adquirentes do imóvel”.

Súmula
Segundo Tartuce:

TÓPICOS ESPECIAIS DE OBRIGAÇÕES E CONTRATOS 39


“(...) O consumidor, diante do direito de sequela advindo da hipoteca não
deverá perder o bem. A referida súmula tende justamente a proteger o último,
restringindo os efeitos da hipoteca às partes contratantes. Isso diante da boa-
fé objetiva, uma vez que aquele que adquiriu o bem pagou pontualmente as
suas parcelas à incorporadora, ignorando toda a sistemática jurídica que rege a
incorporação imobiliária.”.

Função social do contrato


(1) (2) (3)
Além do mais, a função
A utilização da função social se deflagraria,
Há doutrina que entende social decorre da pois o negócio jurídico
ser o caso de aplicar a necessidade de proteção havido entre a
função social do do hipossuficiente da construtora e o agente
contrato, em sua eficácia relação, no caso o financeiro coíbe a
interna, à situação em consumidor, por se dinâmica natural dos
exame. tratar da parte mais pactos, ao prejudicar a
vulnerável no contrato. coletividade na obtenção
dos bens da vida.

Conduta leal
Tornou-se comum afirmar que a boa-fé objetiva, conceituada como sendo
exigência de conduta leal dos contratantes, está relacionada com os deveres
anexos, que são inerentes a qualquer negócio jurídico, não havendo a
necessidade de previsão no contrato, por se tratar de preceito de ordem
pública.

TÓPICOS ESPECIAIS DE OBRIGAÇÕES E CONTRATOS 40


Atenção
A inobservância desses deveres gera a violação positiva do
contrato com responsabilização daquele que desrespeita a boa-
fé objetiva, independentemente de culpa, pois cometeu abuso
de direito, conforme determina o Enunciado nº 24 da I
Jornada de Direito Civil do CJF/STJ: “a violação dos deveres
anexos constitui espécie de inadimplemento, independentemente
de culpa”. Há o seu reconhecimento em todas as fases do
negócio jurídico (interpretação contratual, fase pré-contratual,
fase contratual e fase pós-contratual), se tornando uma nova
modalidade de inadimplemento contratual.

Intenção
Como visto, diante da ausência de boa-fé objetiva, basta que o contratante
lesado prove a existência da violação, mas não a intenção em prejudicar do
outro contratante (como ocorre na má-fé); nos termos do Enunciado nº 363
da IV Jornada de Direito Civil do CJF/STJ, “Os princípios da probidade e
da confiança são de ordem pública, estando a parte lesada somente obrigada a
demonstrar a existência da violação”.

Violação positiva do contrato


Exemplo da aplicação da violação positiva do contrato e das outras formas de
inadimplemento possíveis no ordenamento brasileiro: João (comprador)
celebrou contrato de compra e venda com Antônio (vendedor) de um bem
imóvel.

Acompanhe esse exemplo, e aprenda!

TÓPICOS ESPECIAIS DE OBRIGAÇÕES E CONTRATOS 41


Aplicação da violação positiva
Se Antônio deixar de entregar o imóvel a João, estará absolutamente
inadimplente. Com isso, João poderá ingressar com ação de obrigação de fazer,
a fim de exigir que Antônio lhe entregue o imóvel ou arque com perdas e
danos, nos moldes do Artigo 475 do CC, já que o contrato de compra e venda é
classificado como contrato consensual, começando, pois, a produzir efeitos
jurídicos a partir de sua assinatura.

Se Antônio deveria entregar o imóvel no dia 10 do mês, mas somente o entrega


no dia 20 do mesmo mês, o vendedor encontra-se relativamente inadimplente,
cabendo a cobrança dos juros moratórios determinados contratualmente, ou,
na ausência de convenção, deveria ser observada a taxa estabelecida pelo
Artigo 406, CC c/c Artigo 161, § 1º do CTN.

Se Antônio entregou o imóvel a João e esse entregou o valor do pagamento,


para o direito civil clássico o contrato restaria extinto pelo cumprimento
obrigacional.

Porém, se Antônio, ao vender o imóvel, sabia que em poucos meses seria


construído à frente da porta do prédio em questão um viaduto com aptidão de
acarretar desvalorização considerável no bem, o vendedor faltou com a boa-fé
objetiva, pois tem o dever de informar tal situação, em respeito à conduta de
lealdade imposta aos contratantes.

Dessa forma, o comprador poderá pleitear na justiça uma reparação civil pelos
prejuízos daí advindos, em decorrência do cometimento do abuso de direito
(Artigo 187 do CC), que deflagra a mencionada violação positiva do
contrato.

De outra sorte, caso João tenha contratado com Antônio a compra do bem
mediante coação, tal negócio jurídico encontra-se eivado com um vício,
podendo o juiz declarar sua anulabilidade (Artigo 171 do CC). Nesse caso,

TÓPICOS ESPECIAIS DE OBRIGAÇÕES E CONTRATOS 42


houve a celebração do contrato sem o respeito à livre manifestação de vontade,
o que constitui um dos requisitos para sua validade, já que ocorreu a má-fé.

Deveres anexos
Juízos de valor
Como foi afirmado, não existe um rol preciso de deveres anexos, pois se vive
num sistema aberto que permite a aferição de sua ocorrência ou inocorrência
em determinado caso concreto.

Dessa forma, constitui tarefa do magistrado a observação da efetivação da


cláusula geral da boa-fé objetiva, à luz do direito civil-constitucional.

O exercício do bom senso acaba traçando um escopo jurídico à amplitude do


princípio, também para não fomentar decisões calcadas em juízos de valor
eminentemente subjetivo.

Contorno jurídico
Daí, na tentativa de lhe determinar contorno jurídico, Tartuce elenca alguns
deveres anexos que correspondem ao mínimo exigindo em relação à conduta
dos contratantes, e Gonçalves ajuda a exemplificá-los:

Cuidado em relação à outra parte contratual (não fazer do negócio jurídico um


jogo de ganhos e perdas);

Respeito e probidade (não se locupletar em virtude das fragilidades pessoais do


outro contratante, como, por exemplo, celebrar contrato desproporcional com
pessoa idosa que, apesar de ser plenamente capaz, encontra-se mais
vulnerável);

Respeito e probidade (não se locupletar em virtude das fragilidades pessoais do


outro contratante, como, por exemplo, celebrar contrato desproporcional com

TÓPICOS ESPECIAIS DE OBRIGAÇÕES E CONTRATOS 43


pessoa idosa que, apesar de ser plenamente capaz, encontra-se mais
vulnerável);

Informação ou esclarecimento (informação sobre o uso do bem alienado,


capacitações e limites);

Confiança (possibilidade de efetuar e respeitar acordos realizados no bojo do


contrato);

Lealdade (não exigir cumprimento de contrato com insuportável perda de


equivalência das prestações);

Cooperação ou colaboração (prática de atos necessários à realização plena dos


fins visados pela outra parte);

Proteção (evitar situações de perigo);

Conservação (no caso de coisa recebida para experiência).

Funções da boa-fé objetiva


Constituem funções da boa-fé objetiva: interpretação (Artigo 113 do CC);
controle (Artigo 187 do CC) e integração (Artigo 422 do CC).

Em relação à função de interpretação, a boa-fé objetiva constitui


instrumento para o aplicador do direito, que deverá observar sua ocorrência ou
inocorrência nos casos submetidos à sua análise. Constatada sua inobservância,
surge a função de controle.

A função de controle da boa-fé objetiva aparece diante de sua ausência, a


fim de conter o abuso de direito. Nos moldes do Artigo 187, CC: “Também
comete ato ilícito o titular de um direito que, ao exercê-lo, excede

TÓPICOS ESPECIAIS DE OBRIGAÇÕES E CONTRATOS 44


manifestamente os limites impostos pelo seu fim econômico ou social, pela boa-
fé ou pelos bons costumes”.

Assim, exigir cumprimento de contrato com insuportável perda de equivalência


das prestações constitui abuso de direito, pois ao credor é possível prever uma
cláusula penal (multa), mas não de forma que essa acarrete um prejuízo
demasiado ao devedor. Dessa forma, cláusulas abusivas deverão ser afastadas
em detrimento da autonomia da vontade.

A função de integração permite constatar a presença da boa-fé objetiva em


todas as fases contratuais, inclusive nas fases pré e pós-contratuais. É
entendida como uma orientação para o magistrado, de acordo com o
Enunciado nº 25 da I Jornada de Direito Civil do CJF/STJ: “O Artigo 422
do Código Civil não inviabiliza a aplicação pelo julgador do princípio da boa-fé
nas fases pré-contratual e pós-contratual”, bem como para os contratantes,
como determina o Enunciado nº 170 da III Jornada de Direito Civil do
CJF/STJ: “A boa-fé objetiva deve ser observada pelas partes na fase de
negociações preliminares e após a execução do contrato, quando tal exigência
decorrer da natureza do contrato”.

Boa-fé objetiva x boa-fé subjetiva


Conclui-se, portanto, que, enquanto a boa-fé objetiva é considerada uma regra
de conduta na visão do homem-médio, a boa-fé subjetiva relaciona-se com a
intenção do contratante, sua construção psicológica ou íntima convicção acerca
do negócio jurídico.

Diante da boa-fé objetiva, examinam-se todas as circunstâncias do caso


concreto e a partir daí indaga-se se o homem médio se comportaria do mesmo
modo que os contratantes, sendo, pois, um arquétipo ou standart, porém não
universal, e, dessa forma, não dispensa uma análise circunstancial.

TÓPICOS ESPECIAIS DE OBRIGAÇÕES E CONTRATOS 45


Tal imprecisão configura-se importante no sistema jurídico civil-constitucional
brasileiro, uma vez que o intérprete deve ter liberdade em definir a sua
dimensão e âmbito de aplicação em casa situação fática.

Jurisprudencialização do direito
Constitui fenômeno recente a jurisprudencialização do direito. Pelo referido
fenômeno, a aplicação dos institutos jurídicos pelos tribunais passa a ser leitura
imprescindível ao operador do direito, que pauta as fundamentações de suas
peças processuais no cotidiano forense.

Além disso, como mencionado anteriormente, a boa-fé objetiva materializa-se


nos casos concretos submetidos à apreciação judicial, logo, há de se perguntar:
qual é o contorno jurídico que o Poder Judiciário tem agregado ao referido
princípio civil-constitucional?

Jurisprudência
Como dito anteriormente, a boa-fé é elemento constitutivo da fattispecie
liberatória, que pode ser presumida pelo devedor, bastando a prova da
aparência de que dado credor é legítimo para receber o denominado credor
putativo.

Convém transcrever a jurisprudência do STJ, que ilustra a presente afirmação:

“DIREITO CIVIL E PROCESSUAL CIVIL. OBRIGAÇÃO DE FAZER. PEDIDO DE


OUTORGA DE ESCRITURA DEFINITIVA DE COMPRA E VENDA. DEFERIMENTO
DE OUTORGA DE ESCRITURA DE CESSÃO DE DIREITOS HEREDITÁRIOS.
JULGAMENTO EXTRA PETITA. NÃO OCORRÊNCIA. BEM TRANSACIONADO
OBJETO DE INVENTÁRIO. PAGAMENTO AO CREDOR PUTATIVO. EFICÁCIA.
SUCUMBÊNCIA RECÍPROCA. FALTA DE PREQUESTIONAMENTO. 2 - Considera-
se eficaz o pagamento realizado àquele que se apresenta com aparência
consistente de ser mandatário do credor se as circunstâncias do caso assim
indicarem. A atuação da corretora e do recorrente indicaram à recorrida,

TÓPICOS ESPECIAIS DE OBRIGAÇÕES E CONTRATOS 46


compradora do bem, que aquela tinha legitimidade para as tratativas e
fechamento do negócio de compra e venda.”

Transmissão das obrigações


O dever de lealdade, inerente à boa-fé objetiva, deve ser observado diante da
transmissão das obrigações. Constitui uma das espécies de transferência
das obrigações no ordenamento jurídico pátrio, a cessão de crédito.

A cessão é a regra no sistema jurídico brasileiro, diante da impessoalidade do


vínculo, devendo a cláusula proibitiva acompanhar o contrato originário, nos
moldes do Artigo 286 do CC.

Com isso, não se exige o consentimento do devedor, mas tal fato não pode ser
utilizado para prejudicá-lo, que deverá ser notificado da cessão realizada,
conforme Artigo 290 do CC. Institui o diploma cível, ainda que o pagamento
realizado pelo devedor de boa-fé ao cedente, sem ter sido notificado
da transferência, seja considerado válido, como dispõe o seu Artigo 292,
não configurando, dessa maneira, pagamento indevido.

Em outros sistemas de direito (Artigo 403, BGB e Artigo 1.689, Código Civil
francês) a aceitação expressa do devedor é requerida.

TÓPICOS ESPECIAIS DE OBRIGAÇÕES E CONTRATOS 47


Atenção
Quanto ao posicionamento do STJ, relevante observar a decisão
a seguir, que corrobora o disposto nos Artigos 290 e 292 do CC:
“CIVIL. RECURSO ESPECIAL. AÇÃO DECLARATÓRIA DE
INEXISTÊNCIA DE RELAÇÃO JURÍDICA CUMULADA COM
COMPENSAÇÃO POR DANOS MORAIS. CESSÃO DE CRÉDITO.
SUBSTITUIÇÃO DE PARTES. AUSÊNCIA DE NOTIFICAÇÃO. - A
cessão de crédito não vale em relação ao devedor, senão
quando a ele notificada. Precedentes desta Turma. - Agravo no
recurso especial não provido. (AgRg no REsp 1.171.617/PR, Rel.
Ministra NANCY ANDRIGHI, TERCEIRA TURMA, julgado em
22/2/2011, DJe 28/2/2011)“

Tribunais estaduais
Em outro sentido, segundo os tribunais estaduais, é dever do cessionário a
comprovação da ocorrência da cessão, a existência do débito e a notificação do
cedido, constituindo violação da boa-fé objetiva a inscrição do nome do
devedor no cadastro de inadimplentes sem as referidas comprovações,
ensejando pleito indenizatório pelos danos morais sofridos.

AGRAVO LEGAL. UTILIZAÇÃO FRAUDULENTA DE DADOS. CESSÃO DE


CRÉDITO. INSCRIÇÃO CADASTRO RESTRITIVO. DANO MORAL. 1- É dever do
cessionário a comprovação da origem, existência e regularidade do débito, bem
como a notificação da parte devedora acerca da cessão de crédito. 2- E não
comprovada a origem do débito, bem como a notificação da parte devedora
acerca da cessão, forçoso o reconhecimento da inexigibilidade do débito. 3-
Neste aspecto, a inscrição do nome do consumidor em cadastros restritivos de
crédito decorrente de débito relativo a cartão de crédito não contratado, macula
a segurança necessária à realização dos negócios, caracteriza o defeito do
serviço e enseja o dever de indenizar os prejuízos daí advindos. 4- Desta forma,

TÓPICOS ESPECIAIS DE OBRIGAÇÕES E CONTRATOS 48


a indenização por dano moral deve representar compensação razoável pelo
constrangimento experimentado, cuja intensidade, aliada a outras
circunstâncias peculiares de cada conflito de interesses, deve ser considerada
para fixação do seu valor, não podendo, todavia, traduzir-se em enriquecimento
indevido (0045656-89.2011.8.19.0001 - APELACAO DES. MILTON FERNANDES
DE SOUZA - Julgamento: 17/01/2012 - QUINTA CAMARA CIVEL).

Dever de lealdade
O dever de lealdade deve ser observado em todas as fases contratuais.

Diante do adimplemento obrigacional é fundamental observá-lo,


principalmente, quando houver divergência entre credor e devedor, quanto ao
valor devido.

Para tanto, o devedor se comportará dentro dos ditames estabelecidos pela


boa-fé objetiva, no momento em que ajuizar ação de consignação em
pagamento (quando existir contestação parcial do débito em questão), ação de
repetição de indébito (quando ocorrer pagamento indevido) ou ação de
obrigação de fazer (quando existir contestação integral do débito e o nome do
sujeito encontrar-se no cadastro de inadimplentes).

Nesse sentido, importante observar o entendimento do STJ apresentado


adiante.

Segunda seção do STJ


Conforme orientação da Segunda Seção do STJ, a inclusão do nome de
devedores em cadastro de proteção ao crédito, somente fica impedida se
implementadas, concomitantemente, às seguintes condições:

TÓPICOS ESPECIAIS DE OBRIGAÇÕES E CONTRATOS 49


Ajuizamento
O ajuizamento de ação, pelo devedor, contestando a existência parcial ou
integral do débito;

Demonstração
Efetiva demonstração de que a contestação da cobrança indevida se funda na
aparência do bom direito e em jurisprudência consolidada do STF ou do STJ;

Contestação
Que, sendo a contestação apenas parte do débito, deposite o valor referente à
parte tida por incontroversa, ou preste caução idônea, ao prudente arbítrio do
magistrado.

Informativos do STJ
Consignação em pagamento
Diante do ajuizamento de ação de consignação em pagamento,
caracaterizará boa-fé objetiva do devedor o depósito da quantia que entender
devida, sob pena, inclusive, de improcedência de seu pedido. Além disso,
consta dos atuais informativos do STJ que não basta o recolhimento dos valores
vincendos, mas também dos valores vencidos anteriores ao ajuizamento da
ação:

“DIREITO CIVIL E PROCESSUAL CIVIL. NECESSIDADE DE DEPÓSITO DOS


VALORES VENCIDOS E INCONTROVERSOS EM AÇÃO DE CONSIGNAÇÃO EM
PAGAMENTO. Em ação de consignação em pagamento, ainda que cumulada
com revisional de contrato, é inadequado o depósito tão somente das
prestações que forem vencendo no decorrer do processo, sem o recolhimento
do montante incontroverso e vencido.“

Conduta de lealdade
A conduta de lealdade também deverá ser observada na fase pré-
contratual (fase em que ocorrem os debates prévios visando à formação do

TÓPICOS ESPECIAIS DE OBRIGAÇÕES E CONTRATOS 50


contrato definitivo), segundo a jurisprudência do STJ. Porém, cumpre informar
divergência doutrinária a respeito.

Já que não está previsto no Código Civil, duas correntes surgem quanto à
responsabilização pelo descumprimento obrigacional do pré-contratante. A
majoritária, capitaneada por Maria Helena Diniz, defende não haver
responsabilidade civil contratual, uma vez que as partes não se vincularam por
meio de contrato.

Para a corrente minoritária, capitaneada por Tartuce, apesar de não ocorrer


vinculação entre as partes, há responsabilidade civil contratual em função dos
Enunciados nºs 25 e 170 das Jornadas de Direito Civil, que reconhecem a
aplicação da boa-fé em todas as fases do contrato.

Assim, quem desrespeita a boa-fé objetiva comete abuso de direito, gerando a


obrigação de indenizar. A fim de ilustrar o posicionamento do STJ, cabe
transcrever parte da decisão mencionada.

O ministro Villas Bôas Cueva, relator do recurso, considerou que a afirmação


pela BMW de sua intenção em contratar, adiantando os documentos exigidos
para a formalização do contrato definitivo, trocando correspondências,
informando a aprovação da adesão aliada ao depósito prévio, deu origem à
responsabilidade pré-negocial. Segundo a doutrina e precedentes do STJ,
incorre em responsabilidade pré-negocial a parte que cria na outra a convicção
razoável de que o contrato será assinado, mas rompe as negociações, ferindo
legítimos direitos de quem agiu com boa-fé. No Brasil, o Código Civil de 2002
prevê que os contratantes são obrigados a guardar, na conclusão do contrato e
em sua execução, os princípios da probidade e da boa-fé. No caso, o relator
entendeu que a responsabilidade pré-contratual discutida não decorre do fato
de a tratativa ter sido rompida e o contrato não ter sido concluído, mas, sim, de
uma das partes ter causado à outra, além da expectativa de que o contrato

TÓPICOS ESPECIAIS DE OBRIGAÇÕES E CONTRATOS 51


seria concluído (conduta de lealdade, inerente à boa-fé objetiva), efetivo
prejuízo material.

Contratos
A conduta de lealdade deverá ser observada, principalmente, nos contratos
de adesão. Segundo jurisprudência do STJ (Precedentes citados: AgRg no Ag
866.542-SC, Terceira Turma, DJe 11/12/2012; REsp 633.793-SC, Terceira
Turma, DJ 27/6/2005; e AgRg no REsp 997.956-SC, Quarta Turma, DJe
02/8/2012. REsp 1.300.418-SC, Rel. Min. Luis Felipe Salomão, julgado em
13/11/2013), em contrato de promessa de compra e venda de imóvel
submetido ao CDC, é abusiva a cláusula contratual que determine, no
caso de resolução, a restituição dos valores devidos somente ao
término da obra ou de forma parcelada, independentemente de qual das
partes tenha dado causa ao fim do negócio.

Ordenamento jurídico nacional


De fato, não há, no ordenamento jurídico nacional, dispositivo que imponha a
devolução imediata do que é devido pelo promitente vendedor de imóvel,
porém o CDC optou pelo sistema aberto, ao estabelecer um rol meramente
exemplificativo acerca das cláusulas consideradas abusivas, até porque
impossível seria ao legislador prever todas as práticas realizadas pelas
empresas/fornecedores em desrespeito ao consumidor.

Nesse contexto, o STJ vem entendendo serem abusivas situações fático-


jurídicas submetidas a sua apreciação, por ofensa ao Artigo 51, II e IV, do CDC.
A fim de materializar o dever de lealdade nos contratos de promessa de compra
e venda, passa a constituir prática abusiva a restituição dos valores de forma
prejudicial ao consumidor.

Como se não bastasse, o promitente vendedor poderá revender o imóvel a


terceiros, auferirindo vantagem com os valores retidos, além da própria
valorização do imóvel. Importante destacar que o Tribunal Superior

TÓPICOS ESPECIAIS DE OBRIGAÇÕES E CONTRATOS 52


reconheceu, ainda, a abusividade da mencionada cláusula no âmbito do direito
comum, com fundamentação no Artigo 122 do CC. Revela-se evidente
potestatividade na presente hipótese, o que é considerado abusivo, tanto pelo
Artigo 51, IX, do CDC, quanto pelo Artigo 122 do CC.

Desfazimento da pactuação
A questão relativa à culpa pelo desfazimento da pactuação resolve-se no
quantum indenizatório a ser ressarcido ao promitente-comprador, não pela
forma ou prazo de devolução. A presente fundamentação encontra-se disposta
no Artigo 543-C do CPC:

“Em contratos submetidos ao Código de Defesa do Consumidor, é abusiva a


cláusula contratual que determina a restituição dos valores devidos somente ao
término da obra ou de forma parcelada, na hipótese de resolução de contrato
de promessa de compra e venda de imóvel, por culpa de quaisquer
contratantes. Em tais avenças, deve ocorrer a imediata restituição das parcelas
pagas pelo promitente comprador – integralmente, em caso de culpa exclusiva
do promitente vendedor/construtor, ou parcialmente, caso tenha sido o
comprador quem deu causa ao desfazimento”.

Vício redibitório
É possível constatar a exigência dos deveres de lealdade e de informação,
diante do instituto do vício redibitório. Em breve conceituação, segundo
Maria Helena Diniz:

“Vícios redibitórios são defeitos ocultos existentes na coisa alienada, objeto de


contrato comutativo ou doação onerosa, não comum às congêneres, que a
tornam imprópria ao uso a que se destina ou lhe diminuem sensivelmente o
valor, de tal modo que o negócio não se realizaria se esses defeitos fossem
conhecidos, dando ao adquirente ação para redibir o contrato ou para obter
abatimento no preço.“.

TÓPICOS ESPECIAIS DE OBRIGAÇÕES E CONTRATOS 53


Diploma civil
O diploma civil visa atribuir responsabilização do alienante pelos defeitos
ocultos existentes na coisa, antes da tradição. Com isso, materializa a boa-fé
objetiva nas relações contratuais.

O dever de esclarecimento resta claro no disposto do Artigo 443 do CC. Assim,


para o adquirente pleitear a indenização por perdas e danos, deve-se
comprovar a ausência de boa-fé do alienante, ou seja, que esse último tinha
conhecimento do defeito. Se o alienante estiver de boa-fé, somente será
obrigado a restituir o valor recebido mais as despesas do contrato

Informativo 506 do STJ


De acordo com o Informativo 506 do STJ, nos contratos de consumo
subsiste a responsabilidade do fornecedor pelos vícios da coisa presentes antes
da tradição, mesmo que terminado o prazo de garantia convencional.

Com isso, o STJ fundamenta sua decisão na boa-fé objetiva, determinando que
o produto, ao apresentar vício fora do período de garantia contratual, não
prejudica o consumidor, que poderá reclamar pelo vício e exigir a
responsabilidade do fornecedor.

Nesse caso, o vício oculto decorre do processo de fabricação do bem, e não do


desgaste natural desse, fazendo com que a responsabilidade do fornecedor
persista e o prazo para o consumidor reclamar comece a partir da constatação
do defeito, independentemente de ter vencido o prazo da garantia
convencionada pelas partes. Colaciona-se a ementa do informativo.

Garantia contratual
Segundo o informativo 506 do STJ: “DIREITO DO CONSUMIDOR. VÍCIO
OCULTO. DEFEITO MANIFESTADO APÓS O TÉRMINO DA GARANTIA
CONTRATUAL. OBSERVÂNCIA DA VIDA ÚTIL DO PRODUTO. O fornecedor
responde por vício oculto de produto durável decorrente da própria fabricação e

TÓPICOS ESPECIAIS DE OBRIGAÇÕES E CONTRATOS 54


não do desgaste natural gerado pela fruição ordinária, desde que haja
reclamação dentro do prazo decadencial de noventa dias após evidenciado o
defeito (Artigo 26 do CDC), ainda que o vício se manifeste somente após o
término do prazo de garantia contratual, devendo ser observado como limite
temporal para o surgimento do defeito o critério de vida útil do bem”.

Dever anexo de lealdade


Ainda no que concerne aos efeitos dos contratos, é possível constatar a
exigência legal do dever anexo de lealdade, diante da evicção. Pelo Artigo
447 do CC, evicção é a perda da coisa diante de uma decisão judicial ou de um
ato administrativo que a atribui a terceiro.

Há uma garantia legal quanto à evicção nos contratos bilaterais, onerosos e


comutativos, subsistindo tal garantia ainda que a venda tenha sido realizada
por meio de hasta pública.

Importante mencionar que, no caso de haver cláusula expressa de exclusão da


garantia (cláusula de irresponsabilidade pela evicção), o alienante somente
ficará isento de toda e qualquer responsabilidade caso o evicto tenha
conhecimento do risco da evicção (Artigo 449 do CC), o que mais uma vez
demonstra a exigência da boa-fé objetiva na conduta dos contratantes.

Ascendente e descendente
No contrato de doação entre ascendente e descendente exige-se o respeito ao
dever de lealdade, não permitindo o ordenamento jurídico a utilização do
mencionado instituto jurídico, a fim de se obrar fraudes ou simulações. Nesse
sentido, faz-se importante transcrever a jurisprudência.

APELAÇÃO CÍVEL. REGISTRO DE IMÓVEIS. AÇÃO ANULATÓRIA DE ESCRITURA


PÚBLICA C/C CANCELAMENTO DE REGISTRO IMOBILIÁRIO. COMPRA E VENDA
DE BENS REALIZADA ENTRE ASCENDENTE E DESCENDENTE. SIMULAÇÃO.
OCORRÊNCIA. DOAÇÃO. ONEROSIDADE DOS NEGÓCIOS JURÍDICOS

TÓPICOS ESPECIAIS DE OBRIGAÇÕES E CONTRATOS 55


REALIZADOS NÃO DEMONSTRADA. INEFICÁCIA DOS NEGÓCIOS EM RELAÇÃO
AO HERDEIRO PRETERIDO QUE DEIXOU DE RECEBER SEU QUINHÃO PORQUE
NÃO LEVADOS OS BENS DOADOS À COLAÇÃO NO INVENTÁRIO. SENTENÇA
MANTIDA. HONORÁRIOS. MAJORAÇÃO. POSSIBILIDADE. SENTENÇA
REFORMADA NO PONTO. I. A simulação relativa, ocorrente no caso dos autos,
se dá quando se realiza aparentemente um negócio jurídico, querendo e
levando-se a efeito outro diferente. Em outras palavras, caracteriza-se quando
os contratantes concluem um negócio que é verdadeiro - doação -, mas o
ocultam sob uma forma jurídica diversa - compra e venda. No caso concreto, o
falecido, sua esposa e filhos comuns preteriram o autor - filho concebido fora
do casamento - realizando diversas doações sob a aparência de compra e
venda, com o objetivo de subtrair o direito do autor à herança de seu falecido
pai. As doações ocultas prejudicaram o herdeiro preterido, porque não levadas
à colação no processo de inventário, acarretando o desequilíbrio dos quinhões
das heranças, razão pela qual foram declaradas ineficazes, em relação ao autor,
as doações e cessões gratuitas realizadas pelo de cujus em favor dos réus.
Apelos dos réus desprovidos. À UNANIMIDADE, NEGARAM PROVIMENTO AOS
APELOS DOS RÉUS E DERAM PROVIMENTO AO APELO DO AUTOR. (Apelação
Cível Nº 70038684460, Décima Sétima Câmara Cível, Tribunal de Justiça do RS,
Relator: Liege Puricelli Pires, Julgado em 15/12/2011)

Conclusão
O contorno jurídico que o Poder Judiciário tem agregado ao princípio civil-
constitucional da boa-fé objetiva é de verdadeira limitação à autonomia privada.
Assim sendo, já não há mais espaço no ordenamento jurídico brasileiro para
condutas eminentemente patrimonialistas, destituídas de lealdade, probidade,
respeito, esclarecimento e cooperação pelos contratantes, sendo a ausência de
tais deveres a base para a responsabilização civil, por meio da aplicação da
teoria da violação positiva do contrato.

TÓPICOS ESPECIAIS DE OBRIGAÇÕES E CONTRATOS 56


Atividade proposta
Entendimento jurisprudencial (ministro Luís Felipe Salomão): “Os denominados
deveres anexos, instrumentais, secundários ou acessórios revelam-se como
uma das faces de atuação ou operatividade do princípio da boa-fé objetiva,
sendo nítido que a recorrente faltou com aqueles deveres, notadamente os: de
lealdade; de não agravar, sem razoabilidade, a situação do parceiro contratual;
e os de esclarecimento; informação e consideração para com os legítimos
interesses do parceiro contratual”.

Qual é a consequência jurídica pelo descumprimento dos deveres jurídicos


exigidos na jurisprudência colacionada?

Chave de resposta: Acarreta indenização por perdas e danos, uma vez


violado positivamente o contrato.

Referências
GONÇALVES, Carlos Roberto. Direito Civil Brasileiro. 11ª ed. São Paulo:
Saraiva, 2014.
TARTUCE, Flávio. Manual de Direito Civil. 3ª ed. São Paulo: Método, 2013.

Exercícios de fixação
Questão 1
É possível afirmar que, ao se desrespeitar os deveres anexos que compõem a
boa-fé objetiva, o contratante comete abuso de direito, gerando,
consequentemente, sua obrigação em indenizar perdas e danos do outro
contratante. Diante da presente afirmação, a doutrina mais atualizada tem
incorporado uma nova espécie de inadimplemento obrigacional ao sistema
jurídico brasileiro, denominada de:
a) Inadimplemento absoluto
b) Inadimplemento relativo
c) Violação positiva do contrato
d) Mora solvendi

TÓPICOS ESPECIAIS DE OBRIGAÇÕES E CONTRATOS 57


Questão 2
A Súmula nº 308 do STJ (“A hipoteca firmada entre a construtora e o agente
financeiro, anterior ou posterior à celebração da promessa de compra e venda,
não tem eficácia perante os adquirentes do imóvel”), além de materializar o
princípio da boa-fé objetiva, corporifica a eficácia interna do princípio da função
social do contrato. Qual dos seguintes conteúdos pode ser atribuída à
mencionada eficácia, no referido caso concreto?
a) Vedação do enriquecimento sem causa
b) Imprevisibilidade contratual
c) Conservação do negócio jurídico
d) Proteção do hipossuficiente da relação contratual

Questão 3
É nula a cláusula que autoriza o credor pignoratício, anticrético ou hipotecário a
ficar com o objeto da garantia, se a dívida não for paga no vencimento. Tal
regra expressa:
a) Pacto comissório contratual
b) Pacto comissório real
c) Cláusula abusiva nos moldes do CDC
d) Cláusula solve et repete

Questão 4
Segundo Carlos Roberto Gonçalves, a conduta em não exigir cumprimento de
contrato com insuportável perda de equivalência das prestações constitui o
seguinte dever anexo:
a) Lealdade
b) Probidade
c) Informação
d) Cooperação

Questão 5

TÓPICOS ESPECIAIS DE OBRIGAÇÕES E CONTRATOS 58


Diante do direito real de garantia constituído por meio da hipoteca, terá o
credor direito de buscar o bem com quem quer que esteja. Tal instituto jurídico
constitui o direito:
a) De adjudicação compulsória
b) De retenção
c) De resilição unilateral do contrato
d) De sequela

Questão 6
Quanto ao disciplinamento da evicção pela lei e pela doutrina, marque a
alternativa incorreta:
a) Não pode o adquirente demandar pela evicção, se sabia que a coisa era
alheia ou litigiosa, porém podem as partes, por cláusula expressa,
reforçar, diminuir ou excluir a responsabilidade pela evicção.
b) Para poder exercitar o direito que da evicção lhe resulta, o adquirente
notificará do litígio o alienante imediato, ou qualquer dos anteriores,
quando e como lhe determinarem as leis do processo, que preveem a
denunciação da lide, nos moldes do Artigo 70, I, do Código de Processo
Civil.
c) Nos contratos onerosos, o alienante responde pela evicção, subsistindo
tal garantia ainda que a aquisição se tenha realizado em hasta pública.
d) Se parcial, mas considerável, for a evicção, deverá o evicto receber a
restituição da parte do preço correspondente ao desfalque sofrido.

Questão 7
Quanto ao disciplinamento do vício redibitório pela lei e pela doutrina, analise
as alternativas abaixo e, depois, marque a alternativa incorreta:
a) Se o alienante conhecia o vício ou defeito da coisa, agindo, pois, de má-
fé, restituirá o que recebeu com perdas e danos; se o não conhecia,
agindo, pois, de boa-fé, tão somente restituirá o valor recebido mais as
despesas do contrato.

TÓPICOS ESPECIAIS DE OBRIGAÇÕES E CONTRATOS 59


b) No que diz respeito à decadência do direito de pleitear reparação em
virtude do vício, o adquirente terá os prazos do caput do Artigo 445 para
obter redibição ou abatimento de preço, desde que os vícios se revelem
nos prazos estabelecidos no parágrafo primeiro, fluindo, entretanto, a
partir do conhecimento do defeito.
c) Em vez de rejeitar a coisa, redibindo o contrato, pode o adquirente
reclamar abatimento no preço. No primeiro caso, caberá ação quanti
minoris; no segundo, ação redibitória.
d) Em relação ao vício redibitório, a responsabilidade do alienante subsiste
ainda que a coisa pereça em poder do alienatário, se perecer por vício
oculto, já existente ao tempo da tradição.

Questão 8
Conforme orientação da Segunda Seção do STJ, a inclusão do nome de
devedores em cadastro de proteção ao crédito somente fica impedida se
implementadas, concomitantemente, algumas condições. Assinale, dentre as
alternativas abaixo, aquela que não precisa ser aplicada à espécie:
a) Ajuizamento de ação, pelo devedor, contestando a existência parcial ou
integral do débito.
b) Efetiva demonstração pelo devedor de que a contestação da cobrança
indevida se funda na boa-fé objetiva e em jurisprudência consolidada do
STF ou do STJ.
c) Sendo a contestação apenas de parte do débito, deposite o devedor o
valor referente à parte tida por incontroversa, ou preste caução idônea,
ao prudente arbítrio do magistrado.
d) O devedor deverá requerer em sede liminar a retirada de seu nome do
cadastro de inadimplentes.

Questão 9
(TJAC - 2012 - CESPE – JUIZ) No que concerne a evicção, assinale a opção
correta de acordo com o Código Civil.

TÓPICOS ESPECIAIS DE OBRIGAÇÕES E CONTRATOS 60


a) A responsabilidade decorrente da evicção deriva da lei e prescinde,
portanto, de expressa previsão contratual; todavia, tal responsabilidade
restringe-se à ação petitória, não sendo possível se a causa versar sobre
posse.
b) Responde o alienante pela garantia decorrente da evicção, caso o
comprador sofra a perda do bem por desapropriação do poder público,
cujo decreto expropriatório seja expedido e publicado posteriormente à
realização do negócio.
c) Dá-se a evicção quando o adquirente perde, total ou parcialmente, a
coisa por sentença fundada em motivo jurídico anterior e o alienante tem
o dever de assistir o adquirente, em sua defesa, ante ações de terceiros,
sendo, entretanto, tal obrigação jurídica incabível caso o alienante tenha
atuado de boa-fé.
d) De acordo com o instituto da evicção, o alienante deve responder pelos
riscos da perda da coisa para o evicto, por força de decisão judicial em
que fique reconhecido que aquele não era o legítimo titular do direito
que convencionou transmitir ao evictor.
e) Sendo a evicção uma garantia legal, podem as partes, em reforço ao já
previsto em lei, estipular a devolução do preço em dobro, ou mesmo
minimizar essa garantia, pactuando uma devolução apenas parcial.

Questão 10
Em relação à cessão de crédito, assinale a alternativa incorreta:
a) O credor pode ceder o seu crédito, se a isso não se opuser a natureza da
obrigação, a lei, ou a convenção com o devedor; a cláusula proibitiva da
cessão não poderá ser oposta ao cessionário de boa-fé, se não constar
do instrumento da obrigação.
b) A cessão do crédito não tem eficácia em relação ao devedor, senão
quando a esse notificada.
c) Fica desobrigado o devedor que, antes de ter conhecimento da cessão,
paga ao credor primitivo.

TÓPICOS ESPECIAIS DE OBRIGAÇÕES E CONTRATOS 61


d) O devedor que, notificado, nada opõe à cessão que o credor faz a
terceiros dos seus direitos, não pode opor ao cessionário a
compensação, que antes da cessão teria podido opor ao cedente.

Aula 2
Exercícios de fixação
Questão 1 - C
Justificativa: A violação dos deveres anexos gera a violação positiva do contrato
com responsabilização daquele que desrespeita a boa-fé objetiva,
independentemente de culpa, pois cometeu abuso de direito, conforme
determina o Enunciado nº 24 da I Jornada de Direito Civil do CJF/STJ: “a
violação dos deveres anexos constitui espécie de inadimplemento,
independentemente de culpa”.

Questão 2 - D
Justificativa: Há doutrina que entenda ser o caso de aplicar a função social do
contrato, em sua eficácia interna, à situação em exame. A utilização da função
social decorre da necessidade de proteção do hipossuficiente da relação, no
caso o consumidor, por se tratar da parte mais vulnerável no contrato.

Questão 3 - B
Justificativa: Pacto comissório real, conforme Artigo 1.428 do CC.

Questão 4 - A
Justificativa: O dever de lealdade pode ser exemplificado como a conduta em
não exigir cumprimento de contrato com insuportável perda de equivalência das
prestações (GONÇALVES, 2014, p. 60).

TÓPICOS ESPECIAIS DE OBRIGAÇÕES E CONTRATOS 62


Questão 5 - D
Justificativa: A hipoteca firmada entre a construtora e o agente financeiro, tem
prejudicado o comprador do imóvel (consumidor), que acaba perdendo seu
bem. Tal perda decorre do direito de sequela, inerente ao direito real de
garantia estabelecido. Exemplo extraído do texto de aplicação da Súmula nº
308 do STJ.

Questão 6 - D
Justificativa: Conforme Artigo 455 do CC: “Se parcial, mas considerável, for a
evicção, poderá o evicto optar entre a rescisão do contrato e a restituição da
parte do preço correspondente ao desfalque sofrido. Se não for considerável,
caberá somente direito a indenização”.

Questão 7 - C
Justificativa: Tratam-se das ações edilícias; em vez de rejeitar a coisa, redibindo
o contrato, pode o adquirente reclamar abatimento no preço. No segundo caso,
caberá ação quanti minoris; no primeiro, ação redibitória.

Questão 8 - D
Justificativa: Conforme orientação da Segunda Seção do STJ, a inclusão do
nome de devedores em cadastro de proteção ao crédito, somente fica impedida
se implementadas, concomitantemente, as seguintes condições: 1) o
ajuizamento de ação, pelo devedor, contestando a existência parcial ou integral
do débito; 2) efetiva demonstração de que a contestação da cobrança indevida
se funda na aparência do bom direito e em jurisprudência consolidada do STF
ou do STJ; e 3) que, sendo a contestação apenas parte do débito, deposite o
valor referente à parte tida por incontroversa, ou preste caução idônea, ao
prudente arbítrio do magistrado.

Questão 9 - E
Justificativa: Conforme Artigo 448, podem as partes, por cláusula expressa,
reforçar, diminuir ou excluir a responsabilidade pela evicção.

TÓPICOS ESPECIAIS DE OBRIGAÇÕES E CONTRATOS 63


Questão 10 - D
Justificativa: Conforme Artigo 377 do CC: “O devedor que, notificado, nada
opõe à cessão que o credor faz a terceiros dos seus direitos, não pode opor ao
cessionário a compensação, que antes da cessão teria podido opor ao cedente”.

TÓPICOS ESPECIAIS DE OBRIGAÇÕES E CONTRATOS 64


Introdução
É possível afirmar que, na sociedade atual, o contrato se corporifica como o
maior negócio jurídico, e, desta forma, a apreensão de sua base principiológica
torna-se um verdadeiro diferencial aos operadores do direito.

Nesse contexto, insere-se o princípio da função social do contrato a partir da


personificação dos anseios constitucionais às relações privadas. Com isso, o
contrato deverá ser visualizado, interpretado e estruturado de acordo com o
contexto da sociedade, vedando o enriquecimento sem causa e declarando nula
a cláusula contratual, que desrespeita os princípios da Constituição Federal.

Diante da jurisprudencialização do ordenamento jurídico, as decisões judiciais


ganham importância fundamental para apreensão dos institutos de direito.
Diante dessa premissa, convém analisar a ocorrência ou inocorrência da função
social nos casos concretos submetidos à apreciação judicial, cabendo a
pergunta: qual é o contorno jurídico que o Poder Judiciário vem agregando ao
referido princípio civil-constitucional?

Objetivo:
1. Analisar os elementos constitutivos do princípio da função social do contrato:
conceito, regulamentação, requisitos para aplicação, eficácia interna e eficácia
externa;
2. Analisar a aplicação jurisprudencial do princípio da função social do contrato
e perceber sua ocorrência nas obrigações e nos contratos em geral.

TÓPICOS ESPECIAIS DE OBRIGAÇÕES E CONTRATOS 65


Conteúdo
Função social do contrato
Possível afirmar que a função social do contrato é um princípio contratual de
ordem pública, pelo qual o contrato deverá ser visualizado, interpretado e
estruturado de acordo com o contexto da sociedade, cabendo a pergunta: qual
é o contexto da atual sociedade brasileira?

Direito civil-constitucional
De acordo com o exposto anteriormente, tal contexto é baseado no direito civil-
constitucional, uma vez que os princípios constitucionais devem ser aplicados às
relações de natureza privada, diante da necessidade de concretização ética
da experiência jurídica. Na busca pela presente materialização, o princípio
da função social do contrato, a fim de afastar o enriquecimento sem
causa, determina o respeito à igualdade, justiça contratual (equilíbrio da
relação), equidade e razoabilidade.

Eficácia interna e externa


Eficácia
A eficácia interna constitui uma A eficácia externa constitui uma
orientação para os próprios orientação para os contratantes em
contratantes. relação à sociedade e para a
sociedade em relação aos
contratantes.
A eficácia externa da função
social determina que o contrato gere
efeitos perante terceiros, o que pode
ser percebido diante da tutela externa
do crédito e da função socioambiental
do contrato.

TÓPICOS ESPECIAIS DE OBRIGAÇÕES E CONTRATOS 66


Mitigação da força obrigatória do contrato: Como visto anteriormente, o pacta
sunt servanda resta diminuído no atual cenário jurídico, uma vez que a
autonomia da vontade encontra-se limitada.

É possível identificar como exemplo do presente fenômeno o disposto no Artigo


618 do CC: “Nos contratos de empreitada de edifícios ou outras construções
consideráveis, o empreiteiro de materiais e execução responderá, durante o
prazo irredutível de cinco anos, pela solidez e segurança do trabalho, assim em
razão dos materiais, como do solo”. A mencionada regra visa, claramente,
conter a autonomia privada, ao estabelecer que a responsabilidade do
empreiteiro de obras consideráveis, desde que participe com a entrega da mão
de obra e de materiais, será de cinco anos. Não cabe às partes convencionarem
prazo inferior, pois, se o fizerem, tal cláusula será considerada como “não
escrita”.

Outro exemplo a ser citado é o chamado pacto corvina, nos moldes do Artigo
426 do CC: “Não pode ser objeto de contrato a herança de pessoa viva”. O
ordenamento civilista determina, como objeto ilícito, a pactuação da herança de
pessoa viva, o que, mais uma vez, representa limitação à autonomia privada.
Dessa forma, receber a herança de um indivíduo, após a sua morte, constitui
ato legítimo, desde que herdeiro. O que a lei veda é a convenção do patrimônio
hereditário por contrato, determinando sua nulidade, por configurar hipótese de
nulidade virtual, conforme Artigo 166, VII, do CC: “É nulo o negócio jurídico
quando: a lei taxativamente o declarar nulo, ou proibir-lhe a prática, sem
cominar sanção”.

Proteção da parte mais vulnerável: Determina o Artigo 580 do CC: “Os tutores,
curadores e em geral todos os administradores de bens alheios não poderão
dar em comodato, sem autorização especial, os bens confiados à sua guarda”.
A norma visa proteger o tutelado, parte mais vulnerável da relação, uma vez
que o comodato constitui empréstimo gratuito de bens infungíveis. No mesmo
sentido, o Artigo 497 do CC estabelece que o tutor não poderá comprar os

TÓPICOS ESPECIAIS DE OBRIGAÇÕES E CONTRATOS 67


bens, que estejam sob sua tutela, o que caracteriza uma norma de conteúdo
ético, a fim de evitar que o tutor se utilize de seus privilégios para obter
vantagens patrimoniais.

Vedação da onerosidade excessiva: A teoria da imprevisão, nos moldes do


Artigo 478 do CC, é instituto utilizado para se evitar a onerosidade excessiva,
em decorrência de fatos imprevisíveis e extraordinários, que acarretam
verdadeira desproporção negocial, principalmente em contratos de execução
continuada, como no caso de contrato de financiamento imobiliário. Como
aludido nas aulas anteriores, no campo intervencionista consubstanciado no
dirigismo contratual, situa-se a teoria da imprevisão. Dessa forma, atingindo o
plano de desequilíbrio contratual pela ocorrência de fato imprevisível e/ou
extraordinário, o direito deverá ser acionado e a obrigatoriedade contratual
deixada de lado. O relatado desequilíbrio possibilita a revisão ou extinção do
contrato, em respeito ao ordenamento jurídico, que não mais tolera a
desproporção negocial, em que um se enriquece de forma desarrazoada em
detrimento do empobrecimento de outrem.

Importante lembrar que na resolução por onerosidade excessiva nos contratos


de execução continuada (obrigação de trato sucessivo), o efeito jurídico será ex
nunc, uma vez que não haverá a restituição das prestações já efetivadas, pois a
extinção não terá efeito relativamente ao passado. Tal fenômeno jurídico
ocorre, diante do enriquecimento sem causa, quando a causa jurídica, apta a
desencadear o enriquecimento, deixa de existir, nos moldes do Artigo 885 do
CC: “A restituição é devida, não só quando não tenha havido causa que
justifique o enriquecimento, mas também se esta deixou de existir”. Já diante
da resolução por inexecução voluntária em um contrato de execução única, o
efeito será ex tunc, pois se declaram extintas todas as consequências jurídicas,
desde o início do contrato.

Proteção da dignidade humana: À luz da personalização e constitucionalização


do direito civil, pode-se afirmar que a real função do contrato não é a

TÓPICOS ESPECIAIS DE OBRIGAÇÕES E CONTRATOS 68


segurança jurídica, mas, sim, atender aos interesses da pessoa humana e de
seu patrimônio mínimo. A impenhorabilidade do bem de família, de acordo com
a Lei nº 8.009/90, constitui um bom exemplo de respeito à dignidade da pessoa
humana nas relações privadas. Salvo as exceções do Artigo 3º da citada lei, o
único bem de família do devedor fica blindado em relação ao pagamento de
suas dívidas. Diante do princípio da harmonização, o legislador ponderou
interesses de igual grandeza, quais sejam, a dignidade e o direito de crédito,
esvaziando o segundo em detrimento do primeiro.

Nulidade de cláusulas abusivas: Pela aplicação da função social do contrato no


plano concreto, haverá a declaração de nulidade das cláusulas consideradas
abusivas. Em sentido contrário ao direito civil-constitucional, o STJ vem
entendendo que o julgador não pode conhecer, de ofício, a abusividade de
cláusulas em contratos bancários, conforme Súmula nº 381: “Nos contratos
bancários, é vedado ao julgador conhecer, de ofício, da abusividade das
cláusulas”. Porém, a Súmula 297 do STJ determina: “O Código de Defesa do
Consumidor é aplicável às instituições financeiras”. Assim, no mesmo tribunal,
apresentam-se decisões antagônicas, já que não se possibilita ao julgador
conhecer de ofício da abusividade de cláusulas em contratos com instituições
financeiras, mas seus clientes gozam, em tese, do conjunto protetivo
disciplinado pelo CDC.

TÓPICOS ESPECIAIS DE OBRIGAÇÕES E CONTRATOS 69


Atenção
O Enunciado 21 da I Jornada de Direito Civil do CJF/STJ
determina: “A função social do contrato, prevista no Artigo 421
do novo Código Civil, constitui cláusula geral a impor a revisão
do princípio da relatividade dos efeitos do contrato em relação a
terceiros, implicando a tutela externa do crédito”. Assim, a
proteção externa do crédito constitui orientação para que a
sociedade respeite a convenção estabelecida pelos contratantes.
É exemplo do presente instituto o Artigo 608 do CC, que assim
dispõe: “Aquele que aliciar pessoas obrigadas em contrato
escrito a prestar serviço a outrem pagará a este a importância
que ao prestador de serviço, pelo ajuste desfeito, houvesse de
caber durante dois anos”. Dessa forma, no contrato de prestação
de serviços, que pressupõe a realização de serviços
especializados sem subordinação, a sociedade não pode
interferir no pacto, sob pena de o aliciador indenizar o tomador
de serviços pelo prejuízo suportado, de maneira objetiva.

Função socioambiental do contrato


Por função socioambiental do contrato, entende-se que os contratantes
são responsáveis pelo meio ambiente, como todo e qualquer cidadão, não
podendo desrespeitá-lo, mesmo que as demais obrigações contratuais estejam
sendo satisfeitas.

Exemplificando:
No caso da locação de um terreno que esteja sendo utilizado para armazenar
material tóxico ao meio ambiente, mesmo que o locatário arque com todas as
suas obrigações locatícias, poderá o locador extinguir o presente contrato,
cobrando, inclusive, a cláusula penal determinada contratualmente.

TÓPICOS ESPECIAIS DE OBRIGAÇÕES E CONTRATOS 70


Por fim, importante mencionar as palavras de Assis. Para o autor, o contrato
cumprirá sua função social...

“... respeitando sua função econômica, que é a de promover a circulação de


riquezas, ou a manutenção das trocas econômicas, na qual o elemento ganho
ou lucro jamais poderá ser desprezado, tolhido ou ignorado, tratando-se de
uma economia de mercado”.

Institutos jurídicos
Constitui fenômeno recente a jurisprudencialização do direito.

Pelo referido fenômeno, a aplicação dos institutos jurídicos pelos tribunais


passa a ser leitura imprescindível ao operador do direito, que pauta as
fundamentações de suas peças processuais no cotidiano forense.

Além disso, a função social do contrato materializa-se nos casos concretos


submetidos à apreciação judicial; logo, há de se perguntar: qual é o contorno
jurídico que o Poder Judiciário vem agregando ao referido princípio civil-
constitucional?

Código Civil brasileiro


O Código Civil Brasileiro encontra-se repleto de exemplos em que a função
social do contrato resta evidenciada, sendo o instituto da exceção de
contrato não cumprido um deles.

Pelo Artigo 476 do CC: “Nos contratos bilaterais, nenhum dos contratantes,
antes de cumprida a sua obrigação, pode exigir o implemento da do outro”.
Assim, de acordo com a máxima de que “ninguém pode se valer da sua própria
torpeza”, o contrato, via de regra, não deve conter cláusula que possibilite a um
dos contratantes exigir o cumprimento da obrigação do outro diante do
inadimplemento da sua própria obrigação.

TÓPICOS ESPECIAIS DE OBRIGAÇÕES E CONTRATOS 71


DIREITO CIVIL. RESCISÃO CONTRATUAL. DISSÍDIO NÃO DEMONSTRADO.
EXCEÇÃO DO CONTRATO NÃO CUMPRIDO. SÚMULAS Nº 5 E Nº 7/STJ. NÃO
INCIDÊNCIA. DESCUMPRIMENTO PARCIAL E MÍNIMO DA AVENÇA.
DESPROPORCIONALIDADE. MANUTENÇÃO DO CONTRATO. PRECEDENTES. 3.
"- A exceção de contrato não cumprido somente pode ser oposta quando a lei
ou o próprio contrato não determinar a quem cabe primeiro cumprir a
obrigação. (...) A recusa da parte em cumprir sua obrigação deve guardar
proporcionalidade com a inadimplência do outro, não havendo de se cogitar da
arguição da exceção de contrato não cumprido quando o descumprimento é
parcial e mínimo" (REsp 981.750/MG, Rel. Ministra Nancy Andrighi, DJe
23/4/2010). 4. Diante do contexto de desproporcionalidade que a presente
hipótese evidencia, verifica-se que o acórdão, ao afastar a exceção do contrato
não cumprido, acabou por violar princípios norteadores da relação contratual,
quais sejam, o da proporcionalidade, da boa fé e da função social do contrato,
porque, por uma importância desproporcional ao valor do bem, garantiu aos
recorridos um benefício muito maior do que o contratado, haja vista que, o
atraso na quitação do IPTU, no montante declinado, nunca representaria
motivo suficiente ao pedido de rescisão contratual, seja pelo fato de que o
imóvel já havia sido entregue, seja pelo fato de que o valor das prestações já
quitadas supera em muito o montante atribuído ao Fisco e que, facilmente,
poderia ter sido abatido do valor devido (Recurso Especial 1220251/MA,
RECURSO ESPECIAL 2010/0186950-3, Ministro Ricardo Villas Bôas Cueva).

Cláusula solve et repete


Em alguns contratos, existe a pactuação da denominada cláusula solve et
repete.

Pela referida cláusula, um dos contratantes poderá exigir o cumprimento da


obrigação do outro, mesmo diante do inadimplemento da sua própria
obrigação. Nos contratos com empresas de energia elétrica, tal prática é
comum; assim, caso o consumidor seja cobrado a mais do que realmente deve

TÓPICOS ESPECIAIS DE OBRIGAÇÕES E CONTRATOS 72


pelo contrato, este deverá pagar a conta, sob pena de ser cortada sua energia
elétrica.

Os tribunais brasileiros, de forma majoritária, vêm entendendo pela


legitimidade da referida cláusula nesses contratos, por configurar prestação de
serviços essenciais. Diferente ocorre em contratos de consumo, que, em sua
maioria, são de adesão, sendo a cláusula solve et repete considerada abusiva,
por desrespeitar a função social do contrato e o instituto da exceção de
contrato não cumprido.

Sistema jurídico
O princípio da função social do contrato adquire importância ao sistema
jurídico, pois constitui fundamento para conter o enriquecimento sem causa.

Nas obrigações de dar coisa certa (Artigo 237 do CC), antes da tradição, a
coisa pertence ao devedor (res perit domino). Dessa forma, se o devedor
melhorar ou acrescer a coisa, poderá exigir do credor aumento no preço. Caso
o credor não deseje arcar com o aumento, poderá o devedor resolver a
obrigação, mas não será possível exigir o pagamento das perdas e danos.

A razão da norma deita origens na manutenção do sinalagma obrigacional e na


vedação do enriquecimento sem causa, o que não impede uma análise fática
das situações concretas, uma vez que o devedor poderá agir de má-fé.

Enriquecimento sem causa


Nas obrigações de restituir coisa certa (Artigo 242 do CC), também é
possível perceber a vedação ao enriquecimento sem causa em relação ao
possuidor de boa-fé (Artigo 1.219 do CC), que fará jus à indenização pelas
benfeitorias úteis e necessárias. Corroborando o que foi dito, cabe a transcrição
da jurisprudência.

TÓPICOS ESPECIAIS DE OBRIGAÇÕES E CONTRATOS 73


AÇÃO DE COBRANÇA. CONTRATO DE VENDA DE PONTO COMERCIAL.
INADIMPLÊNCIA. BENFEITORIAS NECESSÁRIAS. RETOMADA DE BENS
IMOBILIZADOS. POSSIBILIDADE. CLÁUSULA CONTRATUAL EXPRESSA.
PRINCÍPIOS DA AUTONOMIA DA VONTADE E DA FORÇA OBRIGATÓRIA DO
CONTRATO. As partes firmaram um contrato de venda de ponto comercial,
inadimplido em parte pela co-ré.

Cabível a compensação do valor gasto com benfeitorias necessárias


com o débito em discussão, de acordo com o disposto nos Artigos 242
e 1.219 do Novo Código Civil.

Em atenção aos princípios da autonomia da vontade e da força obrigatória do


contrato, considera-se plenamente válida a cláusula contratual que dispôs
acerca da retomada, pelos vendedores, dos bens imobilizados em caso de
inadimplência da compradora. APELAÇÃO PROVIDA. (Apelação Cível
70026656843, Décima Câmara Cível, Tribunal de Justiça do RS, Relator: Túlio
de Oliveira Martins, Julgado em 29/10/2009).

Contrato de comodato
No contrato de comodato, que também pressupõe uma obrigação de
restituir coisa certa, há divergência quanto à indenização pelo comodatário
acerca das benfeitorias úteis e necessárias. O Artigo 584 do CC assim dispõe:

“O comodatário não poderá jamais recobrar do comodante as despesas feitas


com o uso e gozo da coisa emprestada”.

Com isso, diante da interpretação literal do mencionado artigo, jamais deverão


ser ressarcidas pelo comodante as despesas ordinárias em relação à coisa
(IPTU, luz, água, gás).

Porém, há dúvida quanto ao ressarcimento das despesas extraordinárias,


incluindo nestas as benfeitorias. De acordo com o Tribunal de Justiça do Rio de

TÓPICOS ESPECIAIS DE OBRIGAÇÕES E CONTRATOS 74


Janeiro, de forma majoritária, e Caio Mário, as benfeitorias estão englobadas no
conceito de despesas, não ensejando indenização ou retenção, uma vez que o
comodato constitui-se como empréstimo gratuito.

Já para o Tribunal de Justiça de São Paulo, de forma majoritária, e Flávio


Tartuce, as benfeitorias não estão englobadas no conceito de despesas,
ensejando indenização e retenção nos moldes do Artigo 1.219 do CC, que trata
da indenização das benfeitorias pelo possuidor de boa-fé, a fim de evitar o
enriquecimento sem causa.

Cumpre informar que a segunda corrente está mais afinada com o direito civil-
constitucional, materializando a função social do contrato, nada impedindo, de
outra sorte, a renúncia à referida indenização contratualmente pelas partes em
decorrência da própria essência gratuita do comodato.

Obrigações indivisíveis
Nas obrigações indivisíveis, pelo Artigo 263 do CC, diante da perda da coisa
por apenas um dos devedores, apresentam-se duas correntes quanto à
responsabilização pelas perdas e danos:

Flávio Tartuce e Gustavo Tepedino


Para Flávio Tartuce e Gustavo Tepedino, só o culpado responde pelo
equivalente, mais perdas e danos, pois o “equivalente” insere-se no conceito de
danos emergentes. Porém, a melhor resposta seria a de que todos os
devedores da coisa são credores do pagamento, e o cancelamento do negócio
por culpa de um dos devedores prejudicaria os demais.

Álvaro Villaça
Para Álvaro Villaça, o culpado responde pelas perdas e danos, mas, pelo
equivalente, todos respondem. Com isso, tenta evitar o enriquecimento sem
causa. O mesmo entendimento é observado em relação à obrigação solidária
passiva (Artigo 279 do CC), em que apenas o culpado é responsável pelas

TÓPICOS ESPECIAIS DE OBRIGAÇÕES E CONTRATOS 75


perdas e danos. Nesse sentido, o Enunciado 540 da VI Jornada de Direito
Civil do CJF/STJ: “Havendo perecimento do objeto da prestação indivisível
por culpa de apenas um dos devedores, todos respondem, de maneira divisível,
pelo equivalente, e só o culpado, pelas perdas e danos”.

Cessão de crédito
Na cessão de crédito, espécie de transmissão das obrigações, de acordo com o
Artigo 295 do CC, existe a responsabilidade do cedente pela existência da
dívida nas cessões à título oneroso ou nas cessões à título gratuito se tiver
procedido de má-fé, a fim de evitar o enriquecimento sem causa.

Dessa forma, mesmo havendo cláusula contratual em sentido contrário, o


cedente fica responsável ao cessionário pela existência da dívida ao tempo da
cessão, responsabilidade esta que não se confunde com a solvência do dívida
pelo cedido, que, via de regra, o cedente não assume.

Pelo Artigo 296 do CC, a cessão é considerada pro soluto, ou seja, o cedente
não responde pelo pagamento da dívida diante do inadimplemento do cedido,
podendo haver convenção em sentido contrário, momento em que a cessão
será pro solvendo.

Pagamento indevido
Nos atos unilaterais de vontade, também é possível perceber a vedação ao
enriquecimento sem causa diante do pagamento indevido.

Segundo o Artigo 876 do CC: “Todo aquele que recebeu o que lhe não era
devido fica obrigado a restituir; obrigação que incumbe àquele que recebe
dívida condicional antes de cumprida a condição”.

Importante informar que não cabe repetição em dobro do valor pago. Será
cabível na ação de repetição de indébito (actio in rem verso) o pleito do valor
pago atualizado, acrescido de juros, custas, honorários advocatícios e despesas

TÓPICOS ESPECIAIS DE OBRIGAÇÕES E CONTRATOS 76


processuais. Se presente a má-fé, também será cabível o pagamento das
perdas e danos.

Somente haverá pagamento em dobro no pagamento indevido, nos moldes do


Artigo 940 do CC, que assim dispõe: “Aquele que demandar por dívida já paga,
no todo ou em parte, sem ressalvar as quantias recebidas ou pedir mais do que
for devido, ficará obrigado a pagar ao devedor, no primeiro caso, o dobro do
que houver cobrado e, no segundo, o equivalente do que dele exigir, salvo se
houver prescrição”.

Bem como no direito do consumidor, conforme parágrafo único do Artigo 42 do


CDC: “Na cobrança de débitos, o consumidor inadimplente não será exposto a
ridículo, nem será submetido a qualquer tipo de constrangimento ou ameaça.

Parágrafo único. O consumidor cobrado em quantia indevida tem direito


à repetição do indébito, por valor igual ao dobro do que pagou em
excesso, acrescido de correção monetária e juros legais, salvo hipótese de
engano justificável”.

Atenção
Ainda dentro dos atos unilaterais de vontade, cabível
mencionar a opção do legislador civil em constituir um instituto
jurídico próprio para coibir o enriquecimento sem causa, nos
moldes do Artigo 884: “Aquele que, sem justa causa, se
enriquecer à custa de outrem, será obrigado a restituir o
indevidamente auferido, feita a atualização dos valores
monetários”.

TÓPICOS ESPECIAIS DE OBRIGAÇÕES E CONTRATOS 77


Tribunais brasileiros
Segundo os tribunais brasileiros, constituem requisitos para a sua aplicação:

• Enriquecimento do accipiens;

• Empobrecimento do solvens;

• Relação de causalidade entre enriquecimento e empobrecimento;

• Inexistência de causa jurídica prevista por convenção entre as partes ou pela


lei, pois, no enriquecimento sem causa, falta uma causa jurídica para o
enriquecimento, enquanto o enriquecimento ilícito encontra-se fundado em um
ato ilícito;

• Inexistência de ação específica, pois, caso a lei forneça ao lesado outros


meios para a satisfação do prejuízo, não caberá a restituição por
enriquecimento sem causa, nos moldes do Artigo 886 do CC. Porém, pelo
Enunciado 36 da I Jornada de Direito Civil do CJF/STJ: “O Artigo 886 do novo
Código Civil não exclui o direito à restituição do que foi objeto de
enriquecimento sem causa nos casos em que os meios alternativos conferidos
ao lesado encontram obstáculos de fato”.

Tipos de contratos
A função social tem aplicação prática diante dos contratos comutativos, nos
quais existem vantagens e sacrifícios para ambas as partes, como, por
exemplo, no contrato de compra e venda, onde o enriquecimento sem causa
gera revisão, em decorrência do desrespeito à proporcionalidade.

Diferente ocorre nos contratos aleatórios, nos quais existe o fator risco, pois
uma das partes não sabe com exatidão sua prestação no momento da
celebração do contrato, como, por exemplo, no contrato de seguro (pela
natureza) e contrato de compra e venda de colheita futura (por determinação

TÓPICOS ESPECIAIS DE OBRIGAÇÕES E CONTRATOS 78


das partes). Nestes contratos, não se permite a revisão em decorrência da
imprevisibilidade ou pela simples onerosidade excessiva.

Na evicção, um dos efeitos dos contratos, também é possível visualizar a


necessidade de vedação do enriquecimento sem causa. O Artigo 455 do CC
dispõe: “Se parcial, mas considerável, for a evicção, poderá o evicto optar entre
a rescisão do contrato e a restituição da parte do preço correspondente ao
desfalque sofrido. Se não for considerável, caberá somente direito à
indenização”.

Pela jurisprudência, considera-se evicção parcial considerável aquela que


supera a metade do valor do bem; entretanto, deve-se levar em conta o fator
essencialidade da parte perdida em relação às finalidades sociais e econômicas
do contrato, a partir da função social do contrato. Diante disso, mesmo que a
parte perca menos do que a metade da coisa em decorrência da evicção,
poderá alegar evicção parcial considerável se provar que o contrato violou sua
finalidade.

Denunciação da lide
De outra sorte, para responsabilizar o alienante, o evicto deve, quando for
instaurado o processo judicial, chamar o alienante ao processo. Utiliza-se a
denunciação da lide, nos moldes do Artigo 70, I, do CPC, sendo medida
processual supostamente obrigatória. Porém, o STJ tem entendido que a
denunciação da lide não é obrigatória, podendo o evicto se valer de outro
instrumento processual para rever aquilo que despendeu, a fim de evitar o
enriquecimento sem causa. No mesmo sentido, o Enunciado 434 da V
Jornada de Direito Civil do CJF/STJ, que assim determina: “A ausência de
denunciação da lide ao alienante, na evicção, não impede o exercício de
pretensão reparatória por meio de via autônoma”.

TÓPICOS ESPECIAIS DE OBRIGAÇÕES E CONTRATOS 79


Dação em pagamento
A dação em pagamento pode ser conceituada como uma forma de
pagamento indireto em que há um acordo privado de vontades entre os
sujeitos da relação obrigacional, pactuando-se a substituição do objeto
obrigacional por outro, móvel ou imóvel, havendo necessidade de
consentimento expresso do credor; pelo fato de isto ser um negócio jurídico
bilateral (Artigo 356 do CC), diante da evicção, a obrigação primitiva é
restabelecida, ressalvado direito de terceiro de boa-fé (Artigo 359 do CC), o
que, mais uma vez, evidencia a necessidade legislativa em conter o
enriquecimento sem causa.

Teoria do adimplemento substancial


Decorre, também, do princípio da função social do contrato a teoria do
adimplemento substancial. Dessa forma, quando a obrigação tiver sido
quase toda cumprida, não caberá a extinção do contrato, mas apenas outros
efeitos jurídicos, visando sempre à manutenção da avença em respeito ao
princípio da conservação do negócio jurídico.

O requisito principal para a utilização da mencionada teoria é de que o


cumprimento seja relevante.

ARRENDAMENTO MERCANTIL. REINTEGRAÇÃO DE POSSE. ADIMPLEMENTO


SUBSTANCIAL. Trata-se de REsp oriundo de ação de reintegração de posse
ajuizada pela ora recorrente em desfavor do recorrido por inadimplemento de
contrato de arrendamento mercantil (leasing) para a aquisição de 135 carretas.
A Turma reiterou, entre outras questões, que, diante do substancial
adimplemento do contrato, qual seja, foram pagas 30 das 36 prestações da
avença, mostra-se desproporcional a pretendida reintegração de posse e
contraria princípios basilares do Direito Civil, como a função social do contrato e
a boa-fé objetiva. Ressaltou-se que a teoria do substancial adimplemento visa
impedir o uso desequilibrado do direito de resolução por parte do credor,
preterindo desfazimentos desnecessários em prol da preservação da avença,

TÓPICOS ESPECIAIS DE OBRIGAÇÕES E CONTRATOS 80


com vistas à realização dos aludidos princípios. Assim, tendo ocorrido um
adimplemento parcial da dívida muito próximo do resultado final, daí a
expressão “adimplemento substancial”, limita-se o direito do credor, pois a
resolução direta do contrato mostrar-se-ia um exagero, uma demasia. Dessa
forma, fica preservado o direito de crédito, limitando-se apenas a forma como
pode ser exigido pelo credor, que não pode escolher diretamente o modo mais
gravoso para o devedor, que é a resolução do contrato. Dessarte, diante do
substancial adimplemento da avença, o credor poderá valer-se de meios menos
gravosos e proporcionalmente mais adequados à persecução do crédito
remanescente, mas não a extinção do contrato. Precedentes citados: REsp
272.739-MG, DJ 2/4/2001; REsp 1.051.270-RS, DJe 5/9/2011, e AgRg no Ag
607.406-RS, DJ 29/11/2004. REsp 1.200.105-AM, Rel. Min. Paulo de Tarso
Sanseverino, julgado em 19/6/2012.

Conclusão
Logo, o STJ aplica a teoria do adimplemento substancial, que tem como
fundamento o princípio da função social do contrato para impedir que, diante
de um inadimplemento mínimo do devedor (seis parcelas em um contexto de
36), possa o credor extinguir o contrato por intermédio da resolução, sendo a
presente medida entendida como desproporcional e abusiva. Assim, o credor
terá a possibilidade de se valer de meios menos gravosos para buscar seu
crédito, como, por exemplo, uma ação de cobrança, mas não de reintegração
de posse.

Atividade proposta
A ausência normativa não poderia configurar um óbice à aplicação da teoria do
adimplemento substancial, mesmo diante da leitura do Enunciado a seguir
transcrito, por ferir o princípio da autonomia da vontade?

Enunciado 361 da IV Jornada de Direito Civil: “O adimplemento substancial


decorre dos princípios gerais contratuais, de modo a fazer preponderar a

TÓPICOS ESPECIAIS DE OBRIGAÇÕES E CONTRATOS 81


função social do contrato e o princípio da boa-fé objetiva, balizando a aplicação
do Artigo 475”.

Chave de resposta: Segundo o STJ, “(...) tendo ocorrido um adimplemento


parcial da dívida muito próximo do resultado final, daí a expressão
“adimplemento substancial”, limita-se o direito do credor, pois a resolução
direta do contrato mostrar-se-ia um exagero, uma demasia. Dessa forma, fica
preservado o direito de crédito, limitando-se apenas a forma como pode ser
exigido pelo credor, que não pode escolher diretamente o modo mais
gravoso para o devedor, que é a resolução do contrato”.

Referências
ASSIS, Araken. Comentários ao Código Civil brasileiro. v. V. Coord.
Arruda Alvim e Thereza Alvim. Rio de Janeiro: Forense, 2007. p. 85-86.

Exercícios de fixação
Questão 1
(OAB/Exame Unificado – 2010)
No que diz respeito à extinção dos contratos, assinale a opção correta:
a) Na resolução por onerosidade excessiva, não é necessária a existência de
vantagem da outra parte, bastando que a prestação de uma das partes
se torne excessivamente onerosa.
b) A resolução por inexecução voluntária do contrato produz efeitos ex tunc
se o contrato for de execução continuada.
c) Ainda que a inexecução do contrato seja involuntária, a resolução
ensejará o pagamento das perdas e danos para a parte prejudicada.
d) A eficácia da resilição unilateral de determinado contrato independe de
pronunciamento judicial e produz efeitos ex nunc.

Questão 2
(OAB/Exame Unificado – 2008)

TÓPICOS ESPECIAIS DE OBRIGAÇÕES E CONTRATOS 82


De acordo com o Código Civil, a onerosidade excessiva decorre de evento
extraordinário e imprevisível, que dificulta extremamente o adimplemento do
contrato. Nesse contexto, a onerosidade excessiva dá ensejo à:
a) Resolução do contrato por inexecução voluntária.
b) Resolução do contrato por inexecução involuntária.
c) Resolução do contrato por onerosidade excessiva.
d) Resilição do contrato por onerosidade excessiva.

Questão 3
Não constitui uma exceção à impenhorabilidade do bem de família, de acordo
com a Lei nº 8.009/90:
a) Obrigação decorrente de fiança concedida em contrato de locação.
b) Cobrança de impostos, predial ou territorial, taxas e contribuições
devidas em função do imóvel familiar.
c) Pelo titular do crédito decorrente do financiamento destinado à
construção ou à aquisição do imóvel, no limite dos créditos e acréscimos
constituídos em função do respectivo contrato.
d) Obrigação decorrente de mútuo feneratício.

Questão 4
Dentre as assertivas abaixo, marque aquela em que se materializa a tutela
externa do crédito.
a) No contrato de prestação de serviços, aquele que aliciar pessoas,
obrigadas em contrato escrito, a prestar serviço a outrem, pagará a este
a importância que ao prestador de serviço, pelo ajuste desfeito,
houvesse de caber durante dois anos.
b) No contrato de compra e venda, sob pena de nulidade, não podem ser
comprados pelos tutores, ainda que em hasta pública, os bens confiados
à sua guarda ou administração.
c) No contrato de comodato, os tutores não poderão emprestar
gratuitamente, sem autorização especial, os bens confiados à sua
guarda.

TÓPICOS ESPECIAIS DE OBRIGAÇÕES E CONTRATOS 83


d) Nos contratos de empreitada de edifícios ou outras construções
consideráveis, o empreiteiro de materiais e execução responderá,
durante o prazo irredutível de cinco anos, pela solidez e segurança do
trabalho, assim em razão dos materiais, como do solo.

Questão 5
O Enunciado 21 da I Jornada de Direito Civil do CJF/STJ determina: “A função
social do contrato, prevista no Artigo 421 do novo Código Civil, constitui
cláusula geral a impor a revisão do princípio da relatividade dos efeitos do
contrato em relação a terceiros, implicando a tutela externa do crédito”.
Aponte, dentre as assertivas abaixo, o nome do instituto jurídico evidenciado no
enunciado transcrito:
a) Eficácia interna da função social do contrato.
b) Eficácia externa da função social do contrato.
c) Pacta sunt servanda.
d) Princípio da conservação do negócio jurídico.

Questão 6
(Exame da OAB)
De acordo com o que dispõe o Código Civil a respeito dos contratos, assinale a
opção correta.
a) A onerosidade excessiva, oriunda de acontecimento extraordinário e
imprevisível, ainda que dificulte extremamente o adimplemento da
obrigação de uma das partes em contrato de execução continuada, não
enseja a revisão contratual, visto que as partes ficam vinculadas ao que
foi originariamente pactuado.
b) Considere que um indivíduo ofereça ao seu credor, com o consenso
deste, um terreno em substituição à dívida no valor de R$ 30 mil, a título
de dação em pagamento. Nessa situação, se o credor for evicto do
terreno recebido, será restabelecida a obrigação primitiva com o
devedor, ficando sem efeito a quitação dada, ressalvados os direitos de
terceiros.

TÓPICOS ESPECIAIS DE OBRIGAÇÕES E CONTRATOS 84


c) O evicto pode demandar pela evicção por meio de ação contra o
transmitente, mesmo sabendo que a coisa adquirida era alheia ou
litigiosa.
d) A resilição bilateral não se submete à forma exigida para o contrato.

Questão 7
(FGV -2011)
Nos contratos, os indivíduos devem observar os princípios da probidade e boa-
fé. A liberdade contratual será exercida nos limites da função social do contrato.
Nesse contexto, assinale a alternativa correta, de acordo com o Código Civil:
a) As partes não podem, em qualquer hipótese, reforçar, diminuir ou excluir
a responsabilidade pela evicção.
b) As cláusulas resolutivas, expressas ou tácitas, operam-se de pleno
direito.
c) Nos contratos bilaterais, nenhum dos contratantes poderá exigir, antes
de cumprida sua obrigação, o implemento da do outro.
d) Admite-se que a herança de pessoa viva possa ser objeto de contrato.
e) Nos contratos de adesão, são nulas de pleno direito as cláusulas
ambíguas ou contraditórias.

Questão 8
(OAB/Exame Unificado – 2008)
A exceção de contrato não cumprido poderá ser arguida nos:
a) Contratos sinalagmáticos
b) Contratos de mútuo
c) Negócios jurídicos unilaterais
d) Contratos de comodato

Questão 9
Nos moldes do Artigo 884: “Aquele que, sem justa causa, se enriquecer à custa
de outrem, será obrigado a restituir o indevidamente auferido, feita a
atualização dos valores monetários”. Segundo os tribunais brasileiros, não

TÓPICOS ESPECIAIS DE OBRIGAÇÕES E CONTRATOS 85


constitui requisito para a sua aplicação do instituto do enriquecimento sem
causa:
a) Enriquecimento do credor
b) Empobrecimento do devedor
c) Ilicitude do enriquecimento
d) Relação de causalidade entre enriquecimento e empobrecimento

Questão 10
Qual teoria visa impedir o uso desequilibrado do direito de resolução por parte
do credor, preterindo desfazimentos desnecessários em prol da preservação da
avença, com vistas à realização dos princípios da boa-fé objetiva, da função
social do contrato e da conservação do negócio jurídico?
a) Teoria da Imprevisão
b) Teoria do Adimplemento Substancial
c) Teoria do Inadimplemento Antecipado
d) Teoria do Cumprimento Defeituoso

TÓPICOS ESPECIAIS DE OBRIGAÇÕES E CONTRATOS 86


Aula 3
Exercícios de fixação
Questão 1 - D
Justificativa: A resilição unilateral do contrato encontra-se no Artigo 473 do CC:
“A resilição unilateral, nos casos em que a lei expressa ou implicitamente o
permita, opera mediante denúncia notificada à outra parte”. Tal forma de
extinção ocorre através de denuncia notificada a outra parte e seu efeito
jurídico é ex nunc.

Questão 2 - C
Justificativa: Conforme Artigo 478 do CC: “Nos contratos de execução
continuada ou diferida, se a prestação de uma das partes se tornar
excessivamente onerosa, com extrema vantagem para a outra, em virtude de
acontecimentos extraordinários e imprevisíveis, poderá o devedor pedir a
resolução do contrato. Os efeitos da sentença que a decretar retroagirão à data
da citação”.

Questão 3 - D
Justificativa: Conforme Artigo 3º da Lei nº 8.009/90, a única hipótese não
contemplada relaciona-se ao mútuo oneroso.

Questão 4 - A
Justificativa: Conforme Artigo 608 do CC.

Questão 5 - B
Justificativa: A eficácia externa da função social determina que o contrato gere
efeitos perante terceiros, o que pode ser percebido diante da tutela externa do
crédito e da função socioambiental do contrato.

Questão 6 - B

TÓPICOS ESPECIAIS DE OBRIGAÇÕES E CONTRATOS 87


Justificativa: De acordo com o Artigo 359 do CC: “Se o credor for evicto da
coisa recebida em pagamento, restabelecer-se-á a obrigação primitiva, ficando
sem efeito a quitação dada, ressalvados os direitos de terceiros”.

Questão 7 - C
Justificativa: Conforme Artigo 476 do CC: “Nos contratos bilaterais, nenhum dos
contratantes, antes de cumprida a sua obrigação, pode exigir o implemento da
do outro”.

Questão 8 - A
Justificativa: Sinalagmático é sinônimo de bilateral.

Questão 9 - C
Justificativa: Inexistência de causa jurídica prevista por convenção entre as
partes ou pela lei, pois, no enriquecimento sem causa, falta uma causa jurídica
para o enriquecimento, enquanto o enriquecimento ilícito encontra-se fundado
em um ato ilícito.

Questão 10 - C
Justificativa: Segundo o STJ, a teoria do substancial adimplemento visa
impedir o uso desequilibrado do direito de resolução por parte do credor,
preterindo desfazimentos desnecessários em prol da preservação da avença,
com vistas à realização dos aludidos princípios.

TÓPICOS ESPECIAIS DE OBRIGAÇÕES E CONTRATOS 88


Introdução
É possível afirmar que, na sociedade atual, o contrato se corporifica como o
maior negócio jurídico, e, desta forma, a apreensão de sua base principiológica
torna-se um verdadeiro diferencial aos operadores do direito.

Nesse contexto, insere-se o princípio da boa-fé objetiva a partir da


personificação dos anseios constitucionais às relações privadas.

Com isso, a exigência de conduta pautada na lealdade dos contratantes tornou-


se imprescindível e sua violação passou a constituir abuso de direito.

Como resultado da função de integração da boa-fé objetiva, surgem conceitos


parcelares, que concretizam a propugnada conduta de lealdade a ser seguida
pelos contratantes.

Assim, a doutrina e a jurisprudência delinearam institutos jurídicos a fim de


materializar a cláusula geral contida no Artigo 422 do Código Civil brasileiro;
dentre eles, destacam-se: o venire contra factum proprium, o duty to mitigate
the loss, a supressio, a surrectio e o tu quoque.

Esse é o tema que você verá durante esta aula.

Bons estudos!

Objetivo:
1. Analisar o contorno jurídico do venire contra factum proprium e do duty to
mitigate the loss tanto na perspectiva doutrinária quanto jurisprudencial;
2. Analisar o contorno jurídico da supressio, da surrectio e do tu quoque tanto
na perspectiva doutrinária quanto jurisprudencial.

TÓPICOS ESPECIAIS DE OBRIGAÇÕES E CONTRATOS 89


Conteúdo
Contextualização
Como visto anteriormente, à luz do fenômeno da constitucionalização do direito
civil a fim de se materializar a boa-fé objetiva, a doutrina estruturou suas três
funções:

Função de interpretação
(Artigo 113 do CC). Constituindo instrumento para o aplicador do direito.

Função de controle
(Artigo 187 do CC). Visando evitar o abuso de direito.

Função de integração
(Artigo 422 do CC).

A função de integração, além de determinar o respeito à boa-fé objetiva em


todas as fases contratuais, tem a aptidão de originar alguns institutos
jurídicos a fim de objetivar sua presença em dadas situações concretas.
Dentre eles, podem ser citados:

Nesse contexto, analisemos primeiramente o venire contra factum


proprium e o duty to mitigate the loss. Avance e confira!

Abuso de direito – Conceito


Para compreender o instituto venire contra factum proprium, é necessário
entender o que é abuso de direito. Acompanhe.

Convém transcrever o teor do Enunciado 539 da VI Jornada de Direito


Civil do CJF/STJ:

TÓPICOS ESPECIAIS DE OBRIGAÇÕES E CONTRATOS 90


“O abuso de direito é uma categoria jurídica autônoma em relação à
responsabilidade civil. Por isso, o exercício abusivo de posições jurídicas desafia
controle independentemente de dano”.

A inobservância da boa-fé objetiva gera a violação positiva do contrato com


responsabilização civil do contratante, independentemente de culpa, pois
cometeu abuso de direito, disposto no Artigo 187 do CC: “Também comete
ato ilícito o titular de um direito que, ao exercê-lo, excede manifestamente os
limites impostos pelo seu fim econômico ou social, pela boa-fé ou pelos bons
costumes”.

É possível identificar como justificativa do mencionado enunciado a vinculação


do abuso de direito a responsabilidade civil, consequência de uma opção
legislativa equívoca, que o define no capítulo relativo ao ato ilícito (Artigo 187
do CC) e o refere, especificamente, na obrigação de indenizar (Artigo 927 do
CC), o que tem subtraído algumas potencialidades da referida categoria jurídica
e comprometido a sua principal função de controle da boa-fé objetiva.

Atenção
Cumpre dizer que não resta dúvida sobre a possibilidade de a
responsabilidade civil surgir por danos decorrentes do exercício
abusivo de uma posição jurídica. Por outro lado, é possível que
qualquer abuso possa gerar dano, merecendo ser coibido com
respostas jurisdicionais eficazes.

Abuso de direito – Controle preventivo e repressivo


Decorre da boa-fé objetiva o entendimento de que o abuso de direito deva ser
utilizado para o controle preventivo e repressivo.

TÓPICOS ESPECIAIS DE OBRIGAÇÕES E CONTRATOS 91


Controle preventivo
Em demandas inibitórias, buscando a abstenção de condutas antes mesmo de
elas ocorrerem irregularmente, não para reparar, mas para prevenir a
ocorrência do dano.

Controle repressivo
Para fazer cessar um ato ou para impor um agir. Dentro do controle repressivo,
inserem-se os institutos do venire contra factum proprium, do duty to mitigate
the loss, da supressio, da surrectio e do tu quoque.

Agora que você entendeu o que é abuso de direito, vamos em frente para a
análise do instituto venire contra factum proprium.

Venire contra factum proprium – Conceito


De acordo com o venire contra factum proprium, uma pessoa não pode
exercer um direito próprio contrariando uma conduta anterior, constituindo,
pois, a proibição de comportamento contraditório.

Determina o Enunciado 362 da IV Jornada de Direito Civil do CJF/STJ:


“A vedação do comportamento contraditório (venire contra factum proprium)
funda-se na proteção da confiança, tal como se extrai dos Artigos 187 e 422 do
Código Civil”.

Vejamos a seguir o que diz a jurisprudência.

Venire contra factum proprium – Jurisprudência


A jurisprudência pátria vem materializando o mencionado instituto, a
fim de traçar o contorno jurídico da boa-fé objetiva para que seu conteúdo não
fique ao alvedrio do julgador.

TÓPICOS ESPECIAIS DE OBRIGAÇÕES E CONTRATOS 92


Assim, visa coibir o comportamento contraditório dos contratantes, por
configurar um dos deveres anexos inerente à conduta de lealdade esperada
pelo homem-médio.

Da função de integração parte-se para a função de controle, pois tal


comportamento caracteriza abuso de direito, sendo passível, pois, de reparação
civil.

Avance a tela e acompanhe algumas situações nas quais são evidenciadas o


comportamento contraditório.

Obrigação de dar coisa incerta


A obrigação de dar coisa incerta (Artigo 243 do CC) é concebida como a
obrigação de dar coisa indeterminada, sendo somente indicada pelo gênero e
pela quantidade, restando uma indicação de sua qualidade posteriormente.

A concentração é o ato pelo qual a parte, designada pela lei ou pelo contrato,
realiza a escolha, constituindo um ato jurídico unilateral, transformando a
obrigação indeterminada em obrigação determinada.

Ao pactuar tal modalidade obrigacional, o credor sabe, de antemão, que


receberá do devedor coisa cuja qualidade somente será determinada em ato
posterior, que poderá corresponder ao da entrega.

Normalmente, a escolha caberá ao devedor se não houver disposição contratual


em sentido contrário (Artigo 244 do CC). A jurisprudência evidencia a hipótese
de comportamento contraditório em obrigação de dar coisa incerta.

DES. CELIA MELIGA PESSOA - Julgamento: 28/02/2012 - DECIMA OITAVA


CÂMARA CÌVEL AGRAVO DE INSTRUMENTO. DIREITO CIVIL E PROCESSUAL
CIVIL. FUNDAMENTAÇÃO DA SENTENÇA NÃO REITERADA NO RESPECTIVO
DISPOSITIVO. CONTRATO DE CONSÓRCIO. NATUREZA DA OBRIGAÇÃO: DAR

TÓPICOS ESPECIAIS DE OBRIGAÇÕES E CONTRATOS 93


COISA INCERTA. Assertiva contida em fundamentação de sentença, mas não
reiterada no respectivo dispositivo. Carência de força normativa. Interpretação
do dispositivo. Contrato de consórcio cujo objetivo é o autofinanciamento de
bem indicado como referência para fins de rateio entre os consorciados.
Obrigação da administradora, que possui natureza de dar coisa incerta, uma
vez que o bem somente é individualizado ao final do contrato, por lance ou por
sorteio, ocasião em que pode inclusive ser complementada pelo consorciado
para aquisição de outro bem, desde que da mesma espécie. Documentos de fls.
159/163, que deixam claro que o ora agravante já tinha conhecimento quando
da contemplação no consórcio, de que o modelo antigo do caminhão havia sido
descontinuado e de que receberia o novo modelo L-1620/51. Adimplemento da
obrigação pelo réu. Claro intuito de enriquecimento sem causa do recorrente ao
pleitear o recebimento do valor do caminhão em pecúnia. Decisão que se
mantém, por seus próprios fundamentos. Recurso manifestamente
improcedente, que está em confronto com jurisprudência do STJ e desta Corte.
Art. 557, caput, do CPC. NEGATIVA DE SEGUIMENTO.

Constitui hipótese de comportamento contraditório o fato de o credor exigir o


cumprimento de obrigação em pecúnia, pois pactuou obrigação de dar coisa
incerta, cuja escolha cabia ao devedor.
Visa-se, com isso, impedir a conduta desleal do contratante, o enriquecimento
sem causa, além de preservar o sinal gama contratual por meio da
materialização do princípio da conservação do negócio jurídico.

A seguir, veja outra situação de comportamento contraditório: a não declaração


de nulidade de contrato de compra e venda.

Não declaração de nulidade de contrato de compra e venda


Outro caso emblemático de aplicação da proibição do comportamento
contraditório diz respeito à não declaração de nulidade de contrato de
compra e venda, sob a égide do Código Civil de 1916 pela ausência de
outorga uxória.

TÓPICOS ESPECIAIS DE OBRIGAÇÕES E CONTRATOS 94


De acordo com Flávio Tartuce, no presente contrato de compra e venda, o
marido celebrou o mencionado negócio sem a anuência de sua esposa, o que,
na vigência do CC de 1916, era motivo de nulidade absoluta do contrato.

Porém, a mulher informou em uma ação que concordou tacitamente com a


venda, suprindo, desta forma, o requisito imposto por lei. Ocorre que,
dezessete anos depois da celebração do pacto, esta pretendeu a declaração de
sua nulidade, sob o argumento de que a outorga constituía parte da substância
do ato.

O STJ, ao julgar a demanda, fundamentou a convalidação do negócio jurídico


com base na vedação do comportamento contraditório, inerente ao instituto do
venire contra factum proprium.

Promessa de compra e venda


PROMESSA DE COMPRA E VENDA. CONSENTIMENTO DA MULHER. ATOS
POSTERIORES. "VENIRE CONTRA FACTUM PROPRIUM". BOA-FÉ. 2. A
MULHER QUE DEIXA DE ASSINAR O CONTRATO DE PROMESSA DE COMPRA E
VENDA JUNTAMENTE COM O MARIDO, MAS DEPOIS DISSO, EM JUIZO,
EXPRESSAMENTE ADMITE A EXISTÊNCIA E VALIDADE DO CONTRATO,
FUNDAMENTO PARA A DENUNCIAÇÃO DE OUTRA LIDE, E NADA IMPUGNA
CONTRA A EXECUÇÃO DO CONTRATO DURANTE MAIS DE 17 ANOS, TEMPO
EM QUE OS PROMISSÁRIOS COMPRADORES EXERCERAM PACIFICAMENTE A
POSSE SOBRE O IMÓVEL, NÃO PODE DEPOIS SE OPOR AO PEDIDO DE
FORNECIMENTO DE ESCRITURA DEFINITIVA. DOUTRINA DOS ATOS
PRÓPRIOS (STJ, 4ª Turma, REsp 95.539-SP, REsp 1.996/0030416-5, Rel. Min.
Ruy Rosado de Aguiar, 03.09.1996).

Vamos em frente! Avance e acompanhe o último caso de venire contra factum


proprium: a promessa de doação.

TÓPICOS ESPECIAIS DE OBRIGAÇÕES E CONTRATOS 95


Promessa de doação
Ainda constituindo exemplo de venire contra factum proprium, determina o
Enunciado 549 da VI Jornada de Direito Civil do CJF/STJ:

“A promessa de doação no âmbito da transação constitui obrigação positiva e


perde o caráter de liberalidade previsto no Artigo 538 do Código Civil”.

Dispõe o Artigo 538 do CC:

“Considera-se doação o contrato em que uma pessoa, por liberalidade,


transfere do seu patrimônio bens ou vantagens para o de outra”.

Na jurisprudência, é comum a identificação de que, nos casos em que a


promessa de doação é realizada no âmbito de uma transação relacionada a
pacto de dissolução de sociedade conjugal, inexiste a possibilidade de
retratação do doador (precedentes do STJ: REsp n. 742.048/RS, relator Ministro
Sidnei Beneti, Terceira Turma, julgado em 14/4/2009, DJe de 24/4/2009; REsp
n. 853.133/SC, relator Ministro Humberto Gomes de Barros, relator para o
acórdão Ministro Ari Pargendler, Terceira Turma, julgado em 6/5/2008, DJe de
20/11/2008).

Promessa de doação
CIVIL. PROMESSA DE DOAÇÃO VINCULADA À PARTILHA. ATO DE
LIBERALIDADE NÃO CONFIGURADO. EXIGIBILIDADE DA OBRIGAÇÃO.
LEGITIMIDADE ATIVA. A promessa de doação feita aos filhos por seus
genitores como condição para a obtenção de acordo quanto à partilha de bens
havida com a separação ou divórcio não é ato de mera liberalidade e, por isso,
pode ser exigida, inclusive pelos filhos, beneficiários desse ato. Precedentes.
Recurso Especial provido (REsp 742048/RS, RECURSO ESPECIAL
2005/0060590-8, RELATOR SIDNEI BENETI).

TÓPICOS ESPECIAIS DE OBRIGAÇÕES E CONTRATOS 96


Finalizamos a análise da instituição venire contra factum proprium. Avance
a tela para entendermos a instituição duty to mitigate the loss.

Atenção
Importante esclarecer que a promessa expressa vontade dos
contratantes e, no âmbito da autonomia, não é sustentável
restringir tal possibilidade somente aos negócios bilaterais
comutativos e onerosos, sendo legítima a exigência em se
cumprir uma liberalidade que, após a chancela estatal, deixa de
apresentar tal caráter.

Duty to mitigate the loss


O que é duty to mitigate the loss?

Veja alguns posicionamentos com relação a esse instituto jurídico.

Enunciado 169 da III Jornada de Direito Civil do CJF/STJ


“O princípio da boa-fé objetiva deve levar o credor a evitar o agravamento do
próprio prejuízo”, ou seja, deve-se evitar o agravamento do prejuízo do
devedor por inércia do credor.

Informativo 439 do STJ


Ilustra o posicionamento da Corte acerca da aplicação prática do duty to
mitigate the loss, traçando o seu contorno jurídico.

Trata-se de REsp em que se discute se o promitente vendedor pode ser


penalizado pelo retardamento no ajuizamento de ação de reintegração de posse
combinada com pedido de indenização, sob o fundamento de que a demora da
retomada do bem deu-se por culpa do credor, em razão de ele não ter
observado o princípio da boa-fé objetiva. Na hipótese dos autos, o promitente
comprador deixou de efetuar o pagamento das prestações do contrato de

TÓPICOS ESPECIAIS DE OBRIGAÇÕES E CONTRATOS 97


compra e venda em 1994, abandonando, posteriormente, o imóvel em 9/2001.
Contudo, o credor só realizou a defesa de seu patrimônio em 17/10/2002, data
do ajuizamento da ação de reintegração de posse combinada com pedido de
indenização, situação que evidencia o descaso com o prejuízo sofrido. O
tribunal a quo assentou que, não obstante o direito do promitente vendedor à
indenização pelo tempo em que o imóvel ficou em estado de não fruição
(período compreendido entre a data do início do inadimplemento das
prestações contratuais até o cumprimento da medida de reintegração de
posse), a extensão da indenização deve ser mitigada (na razão de um ano de
ressarcimento), em face da inobservância do princípio da boa-fé objetiva, tendo
em vista o ajuizamento tardio da demanda competente. A Turma entendeu não
haver qualquer ilegalidade a ser reparada, visto que a recorrente descuidou-se
de seu dever de mitigar o prejuízo sofrido, pois o fato de deixar o devedor na
posse do imóvel por quase sete anos, sem que ele cumprisse seu dever
contratual (pagamento das prestações relativas ao contrato de compra e
venda), evidencia a ausência de zelo com seu patrimônio e o agravamento
significativo das perdas, uma vez que a realização mais célere dos atos de
defesa possessória diminuiria a extensão do dano. Ademais, não prospera o
argumento da recorrente de que a demanda foi proposta dentro do prazo
prescricional, porque o não exercício do direito de modo ágil fere o preceito
ético de não impor perdas desnecessárias nas relações contratuais. Portanto, a
conduta da ora recorrente, inegavelmente, violou o princípio da boa-fé objetiva,
circunstância que caracteriza inadimplemento contratual a justificar a
penalidade imposta pela Corte originária. REsp 758.518-PR, Rel. Min. Vasco
Della Giustina (Desembargador convocado do TJ-RS), julgado em 17/6/2010.

A função de integração da boa-fé objetiva


A função de integração da boa-fé objetiva, como visto anteriormente, dá
origem a determinados institutos jurídicos.

Importante lembrar que a boa-fé objetiva tem como finalidade determinar a


lealdade da conduta dos contratantes no exercício de suas prestações, sob

TÓPICOS ESPECIAIS DE OBRIGAÇÕES E CONTRATOS 98


pena de cometerem abuso de direito (Artigo 187 do CC), o que acarreta
responsabilidade civil, constituindo uma verdadeira cláusula geral, já que
materializa um preceito de ordem pública.

Segundo a jurisprudência do STJ, o referido princípio tem a função de limitar o


exercício dos direitos subjetivos.

A essa função, aplica-se a teoria do adimplemento substancial das


obrigações, também relacionada à função social do contrato, e a teoria dos
atos próprios como meio de rever a amplitude e o alcance dos deveres
contratuais, daí derivando o instituto da supressio.

Supressio
O que é supressio?

Indica a possibilidade de considerar suprimida determinada obrigação


contratual na hipótese em que o não exercício do direito correspondente, pelo
credor, gerar ao devedor a legítima expectativa de que este não exercício se
prorrogará no tempo.

Dessa maneira, haverá redução do conteúdo obrigacional pela inércia


qualificada de uma das partes em exercer direito ou faculdade ao longo da
execução do contrato, criando para a outra a sensação válida e plausível — a
ser apurada casuisticamente — de ter havido a renúncia àquela prerrogativa.

De acordo com o Informativo 478 do STJ, é possível visualizar a aplicação


do instituto da supressio em determinado caso concreto.

O recorrente firmou com a recorrida o contrato de prestação de serviços


jurídicos com a previsão de correção monetária anual. Sucede que, durante os
seis anos de validade do contrato, o recorrente não buscou reajustar os valores,
o que só foi perseguido mediante ação de cobrança após a rescisão contratual.

TÓPICOS ESPECIAIS DE OBRIGAÇÕES E CONTRATOS 99


Contudo, emerge dos autos não se tratar de simples renúncia ao direito à
correção monetária (que tem natureza disponível), pois, ao final, o recorrente,
movido por algo além da liberalidade, visou à própria manutenção do contrato.
Dessarte, o princípio da boa-fé objetiva torna inviável a pretensão de exigir
retroativamente a correção monetária dos valores que era regularmente
dispensada, pleito que, se acolhido, frustraria uma expectativa legítima
construída e mantida ao longo de toda a relação processual, daí se reconhecer
presente o instituto da supressio (REsp 1.202.514-RS, Rel. Min. Nancy Andrighi,
julgado em 21/6/2011).

Conclui-se, portanto, que a supressio significa a supressão, por meio da


renúncia tácita, de um direito ou de uma posição jurídica, pelo o seu não
exercício com o decorrer do tempo.

Da mesma sorte que o credor perde um direito pela inércia, surge, em favor do
devedor, um direito que não existia juridicamente até então, que decorre da
efetividade social, o que se denomina surrectio.

Supressio e surrectio
Colaciona-se a seguinte jurisprudência do Tribunal de Justiça de Minas Gerais,
que materializa o instituto da surrectio:

DIREITO CIVIL – LOCAÇÃO RESIDENCIAL – Situação jurídica continuada ao


arrepio do contrato. Aluguel. Cláusula de preço. Fenômeno da surrectio a
garantir seja mantido a ajuste tacitamente convencionado. A situação criada ao
arrepio de cláusula contratual livremente convencionada pela qual a locadora
aceita, por certo lapso de tempo, aluguel a preço inferior àquele expressamente
ajustado, cria, à luz do Direito Civil moderno, novo direito subjetivo, a
estabilizar a situação de fato já consolidada, em prestígio ao princípio da boa-fé
contratual (TJMG – 16ª Câm. Cível; ACi nº 1.0024.03.163299-5/001-Belo
Horizonte-MG; Rel. Des. Mauro Soares de Freitas; j. 7/3/2007).

TÓPICOS ESPECIAIS DE OBRIGAÇÕES E CONTRATOS 100


Supressio e surrectio – Código civil
O Código Civil atual, consubstanciado no direito civil constitucional, também
contempla os institutos jurídicos mencionados, no disposto do Artigo 330:

“O pagamento reiteradamente feito em outro local faz presumir renúncia do


credor relativamente ao previsto no contrato”.

Tal regra aplica-se à teoria do pagamento direito, existindo a possibilidade


de modificação do local de pagamento ajustado contratualmente pelas partes
em decorrência da renúncia tácita do credor.

Há um exemplo legal disposto no Código Civil que impede a arguição da


supressio. Trata-se do parágrafo único do Artigo 275 do CC:

“O credor tem direito a exigir e receber de um ou de alguns dos devedores,


parcial ou totalmente, a dívida comum; se o pagamento tiver sido parcial, todos
os demais devedores continuam obrigados solidariamente pelo resto. Parágrafo
único. Não importará renúncia da solidariedade a propositura de ação pelo
credor contra um ou alguns dos devedores”.

O Artigo 275 do CC instrumentaliza a opção de demanda nas obrigações


solidárias passivas, ou seja, a possibilidade do credor demandar quem ele
desejar.

TÓPICOS ESPECIAIS DE OBRIGAÇÕES E CONTRATOS 101


Atenção
Importante mencionar que tal regra cede diante da possibilidade
de o devedor demandado chamar os demais codevedores para
integrarem o processo por meio do instituto jurídico processual
denominado chamamento ao processo, conforme Artigo 77,
III, do CPC:
“É admissível o chamamento ao processo: III. De todos os
devedores solidários, quando o credor exigir de um ou de alguns
deles, parcial ou totalmente, a dívida comum”.

A título de curiosidade, caso ocorra pagamento parcial da dívida, todos os


devedores restantes, após se descontar a parte de quem pagou, continuam
responsáveis pela dívida inteira, inclusive aquele que realizou o pagamento
parcial, de acordo com o Enunciado 348 do CJF/STJ da IV Jornada de
Direito Civil.

O dispositivo do parágrafo único do Artigo 475 do CC afasta a supressio, ou


seja, a perda de um direito ou de uma posição jurídica pelo seu não exercício
no tempo. A mens legis da regra decorre do fato de que o direito material
permite ao credor escolher com quem vai demandar (opção de demanda), mas
isso não poderia constituir um óbice ao pleito creditório em relação aos demais
codevedores solidários, diante de uma incapacidade financeira daquele que foi
acionado.

Tu quoque
Pelo tu quoque, pretende-se evitar que uma pessoa que viole uma norma possa
exercer direito desta mesma norma ou possa recorrer em defesa de normas
que ela mesma violou. Assim, obsta que se faça com outrem o que não se quer
seja feito consigo mesmo.

TÓPICOS ESPECIAIS DE OBRIGAÇÕES E CONTRATOS 102


Ainda dentro dos contratos de locação, não se configura possível pactuar a
resilição bilateral e, depois, exigir a cláusula penal imposta pela inexecução
voluntária do contrato. Mais uma vez, tenta-se conter a ausência da boa-fé
objetiva, uma vez que um vício de forma não é argumento plausível a fim de se
impedir o distrato.

DIREITO CIVIL. RECURSO ESPECIAL. PACTUAÇÃO, POR ACORDO DE


VONTADES, DE DISTRATO. RECALCITRÂNCIA DA DEVEDORA EM ASSINAR O
INSTRUMENTO CONTRATUAL. ARGUIÇAO DE VÍCIO DE FORMA PELA PARTE
QUE DEU CAUSA AO VÍCIO. IMPOSSIBILIDADE. AUFERIMENTO DE VANTAGEM
IGNORANDO A EXTINÇÃO DO CONTRATO. DESCABIMENTO. 1. É incontroverso
que o imóvel não estava na posse da locatária e as partes pactuaram distrato,
tendo sido redigido o instrumento, todavia a ré locadora se recusou a assiná-lo,
não podendo suscitar depois a inobservância ao paralelismo das formas para a
extinção contratual. É que os institutos ligados à boa-fé objetiva, notadamente
a proibição do venire contra factum proprium, a supressio, a surrectio e o tu
quoque, repelem atos que atentem contra a boa-fé óbjetiva. 2. Destarte, não
pode a locadora alegar nulidade da avença (distrato), buscando manter o
contrato rompido, e ainda obstar a devolução dos valores desembolsados pela
locatária, ao argumento de que a lei exige forma para conferir validade à
avença. 3. Recurso especial não provido (REsp 1040606 / ES
RECURSO ESPECIAL 2008/0056046-1).

Atividade proposta
Analisando a jurisprudência a seguir, resta clara a tendência do julgador em
evidenciar a ocorrência do duty to mitigate the loss.

Pergunta-se: é possível identificar a violação de outros institutos


inerentes à boa-fé objetiva?

A Turma entendeu não haver qualquer ilegalidade a ser reparada, visto que a
recorrente descuidou-se de seu dever de mitigar o prejuízo sofrido, pois o fato

TÓPICOS ESPECIAIS DE OBRIGAÇÕES E CONTRATOS 103


de deixar o devedor na posse do imóvel por quase sete anos, sem que ele
cumprisse seu dever contratual (pagamento das prestações relativas ao
contrato de compra e venda), evidencia a ausência de zelo com seu patrimônio
e o agravamento significativo das perdas, uma vez que a realização mais célere
dos atos de defesa possessória diminuiria a extensão do dano.

Chave de resposta: Sim. O dever de lealdade foi violado, o que evidencia a


perda de um direito por parte do credor (supressio) e a aquisição de um direito
por parte do devedor (surrectio).

Referências
TARTUCE, Flávio. Manual de Direito Civil. 3. ed. São Paulo: Método, 2013.

Exercícios de fixação
Questão 1
(TJ/PE 2013 – FCC – Juiz Substituto)
O abuso de direito acarreta:
a) Consequências jurídicas apenas se decorrente de coação, ou de negócio
fraudulento ou simulado.
b) Somente a ineficácia dos atos praticados e considerados abusivos pelo
juiz.
c) Indenização apenas em hipóteses previstas expressamente em lei.
d) Apenas a ineficácia dos atos praticados e considerados abusivos pela
parte prejudicada, independentemente de decisão judicial.
e) Indenização a favor daquele que sofrer prejuízo em razão dele.

Questão 2
(TJPE - FCC – 2011 – JUIZ)
“Indo-se mais adiante, aventa-se a ideia de que entre o credor e o devedor é
necessária a colaboração, um ajudando o outro na execução do contrato. A
tanto, evidentemente, não se pode chegar, dada a contraposição de interesses,
mas é certo que a conduta, tanto de um como de outro, subordina-se a regras

TÓPICOS ESPECIAIS DE OBRIGAÇÕES E CONTRATOS 104


que visam a impedir dificulte uma parte a ação da outra.” (Contratos, p. 43,
26ª edição, Forense, 2008, Coordenador: Edvaldo Brito, Atualizadores: Antonio
Junqueira de Azevedo e Francisco Paulo de Crescenzo Marino). Pode-se
identificar o texto acima com o seguinte princípio aplicável ao contrato:
a) Da intangibilidade
b) Do consensualismo
c) Da força obrigatória
d) Da boa-fé
e) Da relatividade das obrigações pactuadas

Questão 3
(TRT – 4ª Região – 2012 – FCC – Juiz do Trabalho Substituto)
De acordo com o Código Civil:
a) Por expressa disposição, a configuração do abuso do direito demanda a
comprovação de culpa.
b) A regra geral é a da responsabilidade objetiva, sendo excepcional a
responsabilidade subjetiva.
c) O incapaz nunca responde pelos prejuízos que causar.
d) A ofensa à boa-fé objetiva, quando implicar danos, dá azo à obrigação
de indenizar.

Questão 4
Assinale a alternativa incorreta acerca do abuso de direito:
a) O Código Civil adota fórmula expressa para definir abuso de direito,
colocando-o na categoria de ato ilícito.
b) Ocorrerá quando o titular de um direito, ao exercê-lo, exceder os limites
manifestamente impostos pelo seu fim econômico ou social, pela boa-fé
ou pelos bons costumes.
c) O ato praticado deverá ser considerado contrário ao direito.
d) Acarreta responsabilidade do agente pelos danos causados.
e) Os atos praticados em legítima defesa ou no exercício regular de um
direito reconhecido devem ser considerados na presente categoria.

TÓPICOS ESPECIAIS DE OBRIGAÇÕES E CONTRATOS 105


Questão 5
(Pref. Teresina/PI – 2010 – FCC – Procurador Municipal)
Para o legislador civil, o abuso do direito é um ato:
a) Lícito, embora ilegal na aparência.
b) Ilícito objetivo, caracterizado pelo desvio de sua finalidade social ou
econômica ou contrário à boa-fé e aos bons costumes.
c) Ilícito, necessitado da prova de má-fé do agente para sua caracterização.
d) Ilícito abstratamente, mas que não implica dever indenizatório moral.
e) Lícito, embora possa gerar a nulidade de cláusulas contratuais em
relações consumeristas.

Questão 6
Em relação à violação dos deveres anexos do contrato, marque a opção
incorreta:
a) Surrectio é o surgimento de um direito diante de práticas, usos e
costumes.
b) No venire contra factum proprium, uma pessoa não pode exercer um
direito próprio contrariando um comportamento anterior, ou seja, é a
proibição de um determinado comportamento contraditório.
c) O duty to mitigate the loss reforça o princípio da boa-fé objetiva e o da
liberdade contratual; assim, o credor não tem nenhuma responsabilidade
em evitar o agravamento do prejuízo suportado pelo devedor.
d) Supressio é a perda de um direito pelo não exercício no tempo.

TÓPICOS ESPECIAIS DE OBRIGAÇÕES E CONTRATOS 106


Questão 7
“Não importará renúncia da solidariedade a propositura de ação pelo credor
contra um ou alguns dos devedores”. É possível afirmar que tal regra não
configura um exemplo de:
a) Supressio
b) Venire contra factum proprium
c) Tu quoque
d) Duty to mitigate the loss

Questão 8
“O pagamento reiteradamente feito em outro local faz presumir renúncia do
credor relativamente ao previsto no contrato”. É possível afirmar que tal regra
representa um exemplo de:
a) Supressio e surrectio
b) Venire contra factum proprium
c) Tu quoque
d) Duty to mitigate the loss

Questão 9
Em relação às obrigações solidárias e aos institutos que compõem a boa-fé
objetiva, analise as assertivas abaixo e, depois, marque a alternativa incorreta:
a) A renúncia à solidariedade diferencia-se da remissão, em que o devedor
fica inteiramente liberado do vínculo obrigacional, inclusive no que tange
ao rateio da quota do eventual codevedor insolvente, nos termos do
Artigo 284 do CC.
b) O credor tem direito a exigir e receber de um ou de alguns dos
devedores, parcial ou totalmente, a dívida comum, não importando
renúncia da solidariedade a propositura de ação pelo credor contra um
ou alguns dos devedores, o que impede a incidência da supressio.
c) Caso ocorra pagamento parcial da dívida, todos os devedores restantes,
após se descontar a parte de quem pagou, continuam responsáveis pela
dívida inteira, excluindo-se aquele que realizou o pagamento parcial.

TÓPICOS ESPECIAIS DE OBRIGAÇÕES E CONTRATOS 107


d) Todos os devedores respondem pelos juros da mora, ainda que a ação
tenha sido proposta somente contra um; mas o culpado responde aos
outros pela obrigação acrescida.

Questão 10
É possível afirmar que o tu quoque:
a) Pretende evitar que uma pessoa que viole uma norma possa exercer
direito desta mesma norma ou possa recorrer em defesa de normas que
ela mesma violou.
b) Significa a supressão por meio da renúncia tácita, de um direito ou de
uma posição jurídica, pelo seu não exercício com o decorrer do tempo.
c) Faz surgir em favor do devedor um direito que não existia juridicamente
até então.
d) Busca coibir o comportamento contraditório.

Ato ilícito (Artigo 186 do CC): Aquele que, por ação ou omissão voluntária,
negligência ou imprudência, violar direito e causar dano a outrem, ainda que
exclusivamente moral, comete ato ilícito.

Aula 4
Exercícios de fixação
Questão 1 - E
Justificativa: A jurisprudência pátria vem materializando o mencionado instituto,
a fim de traçar o contorno jurídico da boa-fé objetiva para que seu conteúdo
não fique ao alvedrio do julgador. Assim, visa coibir o comportamento
contraditório dos contratantes, por configurar um dos deveres anexos inerente
à conduta de lealdade esperada pelo homem-médio. Da função de integração,

TÓPICOS ESPECIAIS DE OBRIGAÇÕES E CONTRATOS 108


parte-se para a função de controle, pois tal comportamento caracteriza abuso
de direito, sendo passível de reparação civil.

Questão 2 - D
Justificativa: A boa-fé objetiva determina que os contratantes estão obrigados a
cumprir suas prestações de forma leal e proba, sob pena de cometerem abuso
de direito (Artigo 187 do CC), o que acarreta responsabilidade civil, constituindo
uma verdadeira cláusula geral, já que materializa um preceito de ordem
pública.

Questão 3 - D
Justificativa: A inobservância dos deveres anexos gera a violação positiva do
contrato com responsabilização daquele que desrespeita a boa-fé objetiva,
pois cometeu abuso de direito, tendo a obrigação de indenizar os prejuízos
causados.

Questão 4 - E
Justificativa: Conforme Artigo 188: “Não constituem atos ilícitos: I – os
praticados em legítima defesa ou no exercício regular de um direito
reconhecido”.

Questão 5 - B
Justificativa: Conforme Artigo 187 do CC: “Também comete ato ilícito o titular
de um direito que, ao exercê-lo, excede manifestamente os limites impostos
pelo seu fim econômico ou social, pela boa-fé ou pelos bons costumes”.

Questão 6 - C
Justificativa: Pelo duty to mitigate the loss, de acordo com o Enunciado 169 da
III Jornada de Direito Civil do CJF/STJ: “O princípio da boa-fé objetiva deve
levar o credor a evitar o agravamento do próprio prejuízo”, ou seja, deve-se
evitar o agravamento do prejuízo do devedor por inércia do credor.

TÓPICOS ESPECIAIS DE OBRIGAÇÕES E CONTRATOS 109


Questão 7 - A
Justificativa: A supressio significa a supressão por meio da renúncia tácita, de
um direito ou de uma posição jurídica, pelo seu não exercício com o decorrer
do tempo.

Questão 8 - A
Justificativa: O Código Civil atual, consubstanciado no direito civil constitucional,
também contempla os institutos da supressio e da surrectio, no disposto do
Artigo 330.

Questão 9 - C
Justificativa: Caso ocorra pagamento parcial da dívida, todos os devedores
restantes, após se descontar a parte de quem pagou, continuam responsáveis
pela dívida inteira, inclusive aquele que realizou o pagamento parcial, de acordo
com o Enunciado 348 do CJF/STJ da IV Jornada de Direito Civil.

Questão 10 - A
Justificativa: Pelo tu quoque, pretende-se evitar que uma pessoa que viole uma
norma possa exercer direito desta mesma norma ou possa recorrer em defesa
de normas que ela mesma violou. Assim, obsta que se faça com outrem o que
não se quer seja feito consigo mesmo.

TÓPICOS ESPECIAIS DE OBRIGAÇÕES E CONTRATOS 110


Introdução
Vamos iniciar a nossa quinta aula!

É possível afirmar que, na sociedade atual, o contrato se corporifica como o


maior negócio jurídico, e, desta forma, a apreensão de sua formação torna-se
um verdadeiro diferencial aos operadores do direito.

Nesse contexto, abordaremos sobre o contrato considerado como negócio


jurídico bilateral ou plurilateral que visa à criação, modificação ou extinção de
direitos e deveres com conteúdo patrimonial, estruturando-se a partir da
manifestação de vontade. Com a declaração objetiva, que pode ser expressa ou
tácita, o contrato passa a produzir efeitos jurídicos.

Destacam-se em sua constituição: a fase de negociações preliminares, a fase


de proposta, a fase de contrato preliminar, a fase de contrato definitivo e a
formação dos contratos pela via eletrônica.

Objetivo:
1. Analisar a formação dos contratos em geral a partir das fases: de negociação
preliminar, de proposta, de contrato preliminar e de contrato definitivo;
2. Analisar a formação dos contratos pela via eletrônica.
Conteúdo
Conceito de contrato
O contrato é considerado como negócio jurídico bilateral ou plurilateral
que visa à criação, modificação ou extinção de direitos e deveres com
conteúdo patrimonial, estruturando-se a partir da manifestação de vontade.
Com a declaração objetiva, que pode ser expressa ou tácita, o contrato passa a
produzir efeitos jurídicos.

TÓPICOS ESPECIAIS DE OBRIGAÇÕES E CONTRATOS 111


Porém, o Código Civil brasileiro não conceituou contrato, diferente do Código
Civil italiano, que assim o fez em seu Artigo 1.321, tarefa então assumida pela
doutrina.

Importante destacar que, por negócio jurídico, entende-se que o contrato é


considerado um ato jurígeno, ou seja, de interesse para direito e, assim,
passível de regulamentação. Tal regulamentação é dividida no Código Civil em
teoria geral dos contratos (Artigos 421 a 480) e contratos em espécie (Artigos
481 a 853).

Características do contrato
Atualmente, contrato comporta marcas distintas de seu correspondente
tradicional, à luz da personalização e constitucionalização do direito civil; sendo
assim, são suas características:

O contratante deve preocupar-se com a realidade social na qual está


inserido; com isto, o conceito clássico de contrato diferencia-se,
substancialmente, do conceito moderno, que leva em consideração o
atendimento dos interesses básicos da coletividade, de acordo com o
princípio da função social do contrato.

O contrato constitui a fonte principal do direito das obrigações.

O contrato encontra-se amparado por valores constitucionais, com


destaque para a dignidade da pessoa humana, a isonomia e a solidariedade.

Pelo contrato,circulação de riquezas busca-se a circulação de riquezas,


evitando a insegurança jurídica, tornando clara a manifestação de vontade e
os efeitos desejados, além de proteger terceiros.

Fases da formação contratual


Você sabe quais são as fases da formação contratual?

TÓPICOS ESPECIAIS DE OBRIGAÇÕES E CONTRATOS 112


 Fase de negociações preliminares
 Fase de proposta
 Fase de contrato preliminar
 Fase de contrato definitivo
 Formação dos contratos pela via eletrônica

Fase de negociações preliminares ou de puntuação


Na fase de puntuação, ocorrem as negociações preliminares, ou seja, os
debates prévios visando à formação do contrato definitivo, não estando
disciplinada no Código Civil brasileiro.

O inadimplemento obrigacional é uma das preocupações do legislador, que


estrutura um arsenal normativo a fim de responsabilizar àquele que descumpre
com sua prestação por culpa.

A fase de negociações preliminares ou de puntuação não se encontra


regulamentada no ordenamento civil nacional; assim, duas correntes
apresentam-se quanto à responsabilização pelo seu descumprimento.

Corrente majoritária na doutrina


A corrente majoritária na doutrina, capitaneada por Maria Helena Diniz,
defende que não há responsabilidade patrimonial em decorrência do
descumprimento das negociações preliminares, sob o argumento de que ainda
não existe contrato, não vinculando, desta forma, os sujeitos.

Corrente minoritária na doutrina


A corrente minoritária na doutrina, mas majoritária na jurisprudência,
conduzida por Flávio Tartuce, sustenta que, apesar de não haver vinculação
entre as partes, há responsabilidade civil contratual em função dos
Enunciados 25 e 170 das Jornadas de Direito Civil do CJF/STJ, que reconhecem

TÓPICOS ESPECIAIS DE OBRIGAÇÕES E CONTRATOS 113


a aplicação da boa-fé em todas as fases do contrato. Assim, quem desrespeita
a boa-fé objetiva comete abuso de direito, o que gera a obrigação de indenizar.

Fase de proposta, policitação ou oblação


Na fase de proposta, policitação ou oblação (Artigos 427 a 435 do CC), ocorre
uma declaração unilateral de vontade receptícia, ou seja, só produz efeitos ao
ser recebida pela outra parte. Diferente da fase de negociações preliminares, a
fase de proposta foi disciplinada pelo legislador civil, que determina que a
proposta vincula o proponente, gerando responsabilidade, conforme Artigo
427 do CC.

Importante mencionar que a proposta no âmbito do direito do consumidor


também vincula o proponente (Artigo 30 do CDC: “Toda informação ou
publicidade, suficientemente precisa, veiculada por qualquer forma ou meio de
comunicação com relação a produtos e serviços oferecidos ou apresentados,
obriga o fornecedor que a fizer veicular ou dela se utilizar e integra o contrato
que vier a ser celebrado”). Dentro do direito civil, porém, a propugnada
vinculação cede diante da autonomia privada, até porque o proponente não
exerce, nesta esfera, atividade empresarial, o que acaba por esvaziar a norma.

Vamos exemplificar?
Imagine que “A” deseja vender seu automóvel pelo preço de cinquenta mil
reais, anunciando-o em jornal de grande circulação. Caso “B” se interesse pelo
bem, “A” não é obrigado a vendê-lo para ele, pois a negociação decorre do
acordo de vontades.

Diferente ocorre no âmbito consumerista. Se a concessionária “X” anuncia a


venda de automóveis pelo preço de cinquenta mil reais, o consumidor
interessado poderá reivindicar a celebração do contrato, enquanto durar a
oferta e os automóveis no estoque.

TÓPICOS ESPECIAIS DE OBRIGAÇÕES E CONTRATOS 114


Em continuidade à fase de proposta, avance e entenda a proposta entre
ausentes e presentes.

Proposta entre ausentes e presentes


O Artigo 428 do CC elenca as hipóteses em que a proposta deixa de ser
obrigatória, diferenciando a proposta entre ausentes e presentes.

Presentes
Entre presentes, a proposta pode ou não estipular prazo para aceitação.

Sem prazo
A aceitação deverá ser imediata.

Com prazo
Deverá ser pronunciada no prazo concedido, sob pena de reputar-se não aceita,
ressalvados os casos de aceitação tácita (Artigo 432 do CC).

Ausentes
Entre ausentes, é necessário realizar a análise sobre o prazo.

Teoria da recepção
O Artigo 434, caput, do CC elege a teoria da expedição como a regra no direito
brasileiro. Com isso, a proposta vinculará o proponente no momento em que a
aceitação for expedida.
Teoria da expedição
Caso o proponente determine na proposta que esta somente começará a
produzir efeitos jurídicos a partir de sua recepção, a teoria será da recepção,
nos moldes do inciso II do Artigo 434 do CC, constituindo, pois, a exceção.

Fase de contrato preliminar


A fase de contrato preliminar (Artigos 462 a 466 do CC) foi regulamentada pelo
Código Civil de 2002, não sendo obrigatória, constituindo seu exemplo mais

TÓPICOS ESPECIAIS DE OBRIGAÇÕES E CONTRATOS 115


comum a promessa de compra e venda, pois, pelo Artigo 462 do CC, o contrato
preliminar, exceto quanto à forma, terá os mesmos elementos do contrato
definitivo.

Importante destacar que tal fase também gera efeitos jurídicos, vinculando as
partes quanto à obrigação de celebrar o contrato definitivo, podendo assumir
duas modalidades:

Compromisso unilateral de contrato


Quando as duas partes assinam o instrumento, apenas uma delas assume o
compromisso de celebrar o contrato definitivo, nos moldes do Artigo 466 do CC.

Compromisso bilateral de contrato


Quando as duas partes assinam o instrumento, ambas assumem o
compromisso de celebrar o contrato definitivo, nos moldes do Artigo 463 do
CC.

O que ocorre após a conclusão do contrato preliminar?


Segundo dispõe o Artigo 463 do CC, concluído o contrato preliminar, desde
que dele não conste cláusula de arrependimento, qualquer das partes terá o
direito de exigir a celebração do definitivo, assinando prazo à outra para que o
efetive. Pelo parágrafo único do mesmo artigo, o contrato preliminar deverá
ser levado ao registro competente.

De acordo com o Enunciado 30 da I Jornada de Direito Civil do CJF/STJ:

“A disposição do parágrafo único do Artigo 463 do novo Código Civil deve ser
interpretada como fator de eficácia perante terceiros”.

Assim, limita-se a abrangência do dispositivo à relação com terceiros de boa-fé,


não constituindo a ausência de registro um óbice à adjudicação compulsória do
bem...

TÓPICOS ESPECIAIS DE OBRIGAÇÕES E CONTRATOS 116


... como determina a Súmula nº 239 do STJ:

“O direito à adjudicação compulsória não se condiciona ao registro do


compromisso de compra e venda no cartório de imóveis”.

Importante registrar que o Artigo 1.417 do CC possui disposição em sentido


diverso: “Mediante promessa de compra e venda, em que se não pactuou
arrependimento, celebrada por instrumento público ou particular, e registrada
no Cartório de Registro de Imóveis, adquire o promitente comprador direito real
à aquisição do imóvel”.

Fase de contrato definitivo

É a fase em que ocorre o aperfeiçoamento contratual por meio do encontro de


vontades, gerando responsabilidade civil contratual, conforme Artigos 389 e
391 do CC.

Importante estabelecer a diferença entre responsabilidade contratual e


responsabilidade extracontratual. Acompanhe a seguir.

Não cumprindo o sujeito passivo a prestação, passa a responder pelo valor


correspondente ao objeto obrigacional, acrescido das demais perdas e danos,
mais juros compensatórios, cláusula penal (se houver), atualização monetária,
custas e honorários de advogado. Essa é a regra do Artigo 389 do CC, que
trata da responsabilidade civil contratual.

Vale dizer que dentro da concepção civil-constitucional, tratando-se de


responsabilidade civil contratual, deve-se entender que a expressão “perdas e
danos” inclui os danos materiais (danos emergentes e lucros cessantes, nos
termos dos Artigos 402 a 404 do CC), bem como danos morais (Artigo 5º,
V e X, da CF).

TÓPICOS ESPECIAIS DE OBRIGAÇÕES E CONTRATOS 117


Não se deve confundir com a responsabilidade extracontratual ou
aquiliana, cuja fundamentação encontra-se nos Artigos 186 e 927 do CC.

Contextualização sobre a formação do contrato pela via


eletrônica

Neste tópico, será evidenciada a formação do contrato pela via eletrônica


diante da atual sociedade, que vem pactuando suas negociações por meio da
internet.

O legislador brasileiro não cuidou de forma específica de sua regulamentação,


nem no Código Civil, nem no Código de Defesa do Consumidor.

Tal fato não obsta a aplicação dos diplomas mencionados de acordo com a
situação fático-jurídica, cabendo ao Poder Judiciário o preenchimento das
lacunas ante as peculiaridades do contrato eletrônico.

Convém citar a existência da Medida Provisória nº 2.200/2001, que trata


da Infraestrutura de Chaves Públicas Brasileira, disciplinando a
integridade, autenticidade e validade dos documentos públicos.

Vamos em frente! Avance e entenda a aplicação do código do consumidor


aos contratos eletrônicos.

Aplicação do Código de Defesa do Consumidor aos contratos


eletrônicos
O CDC deverá ser aplicado para disciplinar o contrato eletrônico, respeitando:

• A declaração de nulidade de cláusulas abusivas (Artigo 51 do CDC);


• A proteção do consumidor em juízo;
• A inversão do ônus da prova;

TÓPICOS ESPECIAIS DE OBRIGAÇÕES E CONTRATOS 118


• O ajuizamento da ação no foro de domicílio do consumidor;
• A vinculação da proponente em relação à oferta feita ao público;
• O direito de arrependimento;
• A responsabilidade do fornecedor;
• Os prazos prescricionais etc.

Diante de um contrato eletrônico internacional, não se deverá aplicar o


Código de Defesa do Consumidor, pois a lei a ser aplicada deverá ser aquela do
domicílio do proponente, de acordo com o Artigo 9º, §2º, da Lei de
Introdução às Normas do Direito Brasileiro:

“Para qualificar e reger as obrigações, aplicar-se-á a lei do país em que se


constituírem. §2º A obrigação resultante do contrato reputa-se constituída no
lugar em que residir o proponente”.

Nesse contexto, é importante transcrever as palavras de Gonçalves:

“Assim, malgrado o Código de Defesa do Consumidor brasileiro (Artigo 51, I),


por exemplo, considere abusiva e não admita a validade de cláusula que
reduza, por qualquer modo, os direitos do consumidor (cláusula de não
indenizar), o internauta brasileiro pode ter dado sua adesão a uma proposta de
empresa ou comerciante estrangeiro domiciliado em país cuja legislação admita
tal espécie de cláusula, especialmente quando informada com clareza aos
consumidores. E, nesse caso, não terá o aderente como evitar a limitação de
seu direito”.

Em relação ao ajuizamento de uma possível ação, deve-se aplicar o CDC à


espécie, tendo o consumidor brasileiro o direito de demandar quaisquer ações
fundadas na responsabilidade do fornecedor perante o foro de seu próprio
domicílio, mas deverá o julgador aplicar o direito material alienígena.

TÓPICOS ESPECIAIS DE OBRIGAÇÕES E CONTRATOS 119


Formação do contrato pela via eletrônica
A formação do contrato pela via eletrônica pode ocorrer por meio de proposta,
que, tal como acontece na esfera cível, pode surgir entre presentes ou
ausentes. Depende, para tanto, aferir se operou de forma instantânea ou não.

Proposta será entre presentes


Se for instantânea, ou seja, quando o intervalo entre a oferta e a aceitação
puder ser desconsiderado (ex.: chat, Messenger etc.).

Proposta será entre ausentes


Quando existir um prazo considerável entre a oferta e a aceitação (ex.: e-mail).

Diante de uma proposta entre ausentes, surge uma nova dúvida:

Aplica-se a teoria da expedição, nos moldes do Artigo 434 do CC, ou a


teoria da recepção?

O Enunciado 173 da III Jornada de Direito Civil do CJF/STJ assim determina:


“A formação dos contratos realizados entre pessoas ausentes por meio
eletrônico completa-se com a recepção da aceitação pelo proponente”.
Dessa forma, prevalece a teoria da recepção na formação dos contratos
eletrônicos.

A visão jurisprudencial acerca dos contratos eletrônicos


Doutrina
Segundo a melhor doutrina, não existe responsabilidade do estabelecimento
eletrônico onde é feito o anúncio, pois exerce a função somente de veículo,
sendo que as cautelas devem ser tomadas pelo anunciante e fornecedor de
produtos e serviços como o único responsável pelas informações veiculadas.

Jurisprudência

TÓPICOS ESPECIAIS DE OBRIGAÇÕES E CONTRATOS 120


A jurisprudência diverge em relação à responsabilidade do estabelecimento
eletrônico. Quando atua como intermediário da transação, o STJ vem
entendendo que não se pode delegar a responsabilidade exclusivamente ao
consumidor, bem como deve ser considerada abusiva a cláusula que exonera o
estabelecimento eletrônico de toda e qualquer responsabilidade, pois decorre
do risco de sua atividade empresarial.

A Turma julgou procedente recurso do consumidor que assinara contrato de


gestão de pagamento com a empresa Mercado Livre. No acordo, ficou
formalmente estipulado que a empresa intermediadora se comprometeria a
notificar a recepção dos valores ao comprador e ao vendedor do produto dentro
do prazo referido na página do site Mercado Pago. A empresa enviaria
mensagens eletrônicas comunicando a venda ou a compra de itens levados ao
leilão eletrônico. Sabedor disso, um terceiro demonstrou interesse em adquirir o
produto posto à venda e, pouco após, fazendo-se passar pela empresa
intermediadora, utilizou seu correio eletrônico para enviar e-mail ao vendedor
no qual informou falsamente que o valor referente à compra do bem já se
encontrava à disposição e que o bem já poderia ser enviado ao comprador.
Apesar de o consumidor não ter seguido rigorosamente o procedimento
sugerido no site quanto à confirmação do depósito, mediante verificação na
conta respectiva constante em página do site antes de enviar o produto, agiu
de boa-fé, certo de que o pagamento já estaria de posse do serviço de
intermediação do negócio e de que lhe seria disponibilizado assim que o
comprador acusasse o recebimento do produto vendido. Destarte, tal exigência
de confirmação da veracidade do e-mail, recebido em nome do site, não
constava do contrato de adesão. Em seu voto, a Min. Relatora ressaltou que o
objetivo da contratação do serviço de intermediação é exatamente proporcionar
segurança ao comprador e ao vendedor quanto ao recebimento da prestação
estipulada. Sob essa perspectiva, o descumprimento pelo consumidor da
aludida providência, a qual sequer consta do contrato de adesão, não é
suficiente para eximir o recorrido da responsabilidade pela segurança do
sistema por ele implementado, sob pena de transferência ilegal de um ônus

TÓPICOS ESPECIAIS DE OBRIGAÇÕES E CONTRATOS 121


próprio da atividade empresarial por ele explorada. Trata-se, portanto, de
estipulação de cláusula exoneratória ou atenuante de responsabilidade,
terminantemente vedada pelo Código de Defesa do Consumidor. Não se
justifica, pois, que procedimentos fundamentais à segurança de sistema de
mediação eletrônica de pagamentos explorados por empresa comercial sejam
atribuídos à responsabilidade exclusiva do usuário do serviço. E,
complementando o voto, a Min. Relatora arrematou que a ausência de
mecanismo de autenticação digital de mensagens consentâneo com as
exigências das modernas atividades empresariais que se desenvolvem no
ambiente virtual configura grave falha de segurança que não deve ser imputada
ou suportada pelo consumidor, mas pela empresa que assume o risco da
atividade econômica. REsp 1.107.024-DF, Rel. Min. Maria Isabel Gallotti,
julgado em 1º/12/2011.

Quando atua como mero hospedeiro de mensagens, o STJ vem entendendo


não haver sua responsabilidade em relação ao conteúdo ofensivo feito por
parte dos usuários. De outra sorte, seu dever é retirar a mensagem para não
agravar o dano do ofendido.

CIVIL E CONSUMIDOR. INTERNET. RELAÇÃO DE CONSUMO. INCIDÊNCIA DO


CDC. PROVEDOR DE CONTEÚDO. FISCALIZAÇÃO PRÉVIA DO CONTEÚDO
POSTADO NO SITE PELOS USUÁRIOS. DESNECESSIDADE. MENSAGEM DE
CUNHO OFENSIVO. DANO MORAL. RISCO INERENTE AO NEGÓCIO.
INEXISTÊNCIA. CIÊNCIA DA EXISTÊNCIA DE CONTEÚDO ILÍCITO. RETIRADA
DO AR EM 24 HORAS. DEVER. SUBMISSÃO DO LITÍGIO DIRETAMENTE AO
PODER JUDICIÁRIO. CONSEQUÊNCIAS. DISPOSITIVOS LEGAIS ANALISADOS:
ARTS. 14 DO CDC E 927 DO CC/02. 2. Recurso especial em que se discute os
limites da responsabilidade de provedor de rede social de relacionamento via
Internet pelo conteúdo das informações veiculadas no respectivo site. 3. A
exploração comercial da internet sujeita as relações de consumo daí advindas à
Lei nº 8.078/90. 4. A fiscalização prévia, pelo provedor de conteúdo, do teor
das informações postadas na web por cada usuário não é atividade intrínseca

TÓPICOS ESPECIAIS DE OBRIGAÇÕES E CONTRATOS 122


ao serviço prestado, de modo que não se pode reputar defeituoso, nos termos
do art. 14 do CDC, o site que não examina e filtra os dados e imagens nele
inseridos. 5. O dano moral decorrente de mensagens com conteúdo ofensivo
inseridas no site pelo usuário não constitui risco inerente à atividade dos
provedores de conteúdo, de modo que não se lhes aplica a responsabilidade
objetiva prevista no art. 927, parágrafo único, do CC/02. 6. Ao ser comunicado
de que determinada postagem possui conteúdo potencialmente ilícito ou
ofensivo, "deve o provedor removê-la preventivamente no prazo de 24 horas,
até que tenha tempo hábil para apreciar a veracidade das alegações do
denunciante, de modo a que, confirmando-as, exclua definitivamente o vídeo
ou, tendo-as por infundadas, restabeleça o seu livre acesso, sob pena de
responder solidariamente com o autor direto do dano em virtude da omissão
praticada. 7. Embora o provedor esteja obrigado a remover conteúdo
potencialmente ofensivo assim que tomar conhecimento do fato (mesmo que
por via extrajudicial), ao optar por submeter a controvérsia diretamente ao
Poder Judiciário, a parte induz a judicialização do litígio, sujeitando-o, a partir
daí, ao que for deliberado pela autoridade competente. A partir do momento
em que o conflito se torna judicial, deve a parte agir de acordo com as
determinações que estiverem vigentes no processo, ainda que, posteriormente,
haja decisão em sentido contrário, implicando a adoção de comportamento
diverso. Do contrário, surgiria para as partes uma situação de absoluta
insegurança jurídica, uma incerteza sobre como se conduzir na pendência de
trânsito em julgado na ação. 8. Recurso especial provido.

Atividade proposta
Segundo dispõe o Artigo 463 do CC, concluído o contrato preliminar, desde que
dele não conste cláusula de arrependimento, qualquer das partes terá o direito
de exigir a celebração do definitivo, assinando prazo à outra para que o efetive.
Pelo parágrafo único do mesmo artigo, o contrato preliminar deverá ser levado
ao registro competente. De acordo com o Enunciado 30 da I Jornada de Direito
Civil do CJF/STJ: “A disposição do parágrafo único do Artigo 463 do novo
Código Civil deve ser interpretada como fator de eficácia perante terceiros”.

TÓPICOS ESPECIAIS DE OBRIGAÇÕES E CONTRATOS 123


Assim, limita-se a abrangência do dispositivo à relação com terceiros de boa-fé,
não constituindo a ausência de registro um óbice à adjudicação compulsória do
bem, como determina a Súmula nº 239 do STJ: “O direito à adjudicação
compulsória não se condiciona ao registro do compromisso de compra e venda
no cartório de imóveis”.

Importante registrar que o Artigo 1.417 do CC possui conteúdo em sentido


diverso: “Mediante promessa de compra e venda, em que se não pactuou
arrependimento, celebrada por instrumento público ou particular, e registrada
no Cartório de Registro de Imóveis, adquire o promitente comprador direito real
à aquisição do imóvel”.

Com base no texto, foi possível perceber que o promitente-comprador possui o


direito de adjudicar o bem, independentemente de registro da promessa de
compra e venda. Pergunta-se: se o bem estiver com um terceiro de boa-fé, o
direito de adjudicar prevalece, mesmo sem registro da promessa de compra e
venda?

Chave de resposta: Não. Pelo Artigo 1.418 do CC, que explicita que “o
promitente comprador, titular de direito real, pode exigir do promitente
vendedor, ou de terceiros, a quem os direitos deste forem cedidos, a outorga
da escritura definitiva de compra e venda, conforme o disposto no instrumento
preliminar; e, se houver recusa, requerer ao juiz a adjudicação do imóvel”, e
pelo Enunciado 30 da I Jornada de Direito Civil.
Referências
GONÇALVES, Carlos Roberto. Direito Civil Brasileiro. 11. ed. São Paulo:
Saraiva, 2014. p. 86.

Exercícios de fixação
Questão 1
(OAB)

TÓPICOS ESPECIAIS DE OBRIGAÇÕES E CONTRATOS 124


Durante dez anos, empregados de uma fabricante de extrato de tomate
distribuíram, gratuitamente, sementes de tomate entre agricultores de uma
certa região. A cada ano, os empregados da fabricante procuravam os
agricultores, na época da colheita, para adquirir a safra produzida. No ano de
2009, a fabricante distribuiu as sementes, como sempre fazia, mas não
retornou para adquirir a safra. Procurada pelos agricultores, a fabricante
recusou-se a efetuar a compra. O tribunal competente entendeu que havia
responsabilidade pré-contratual da fabricante. A responsabilidade pré-contratual
é aquela que:
a) Deriva da violação à boa-fé objetiva na fase das negociações
preliminares à formação do contrato.
b) Deriva da ruptura de um pré-contrato, também chamado contrato
preliminar.
c) Surgiu, como instituto jurídico, em momento histórico anterior à
responsabilidade contratual.
d) Segue o destino da responsabilidade contratual, como o acessório segue
o principal.

Questão 2
Quanto à formação dos contratos, analise as assertivas abaixo e, depois,
marque a alternativa incorreta:
a) A oferta ao público equivale à proposta quando encerra os requisitos
essenciais ao contrato, salvo se o contrário resultar das circunstâncias ou
dos usos.
b) A aceitação da proposta fora do prazo, com adições, restrições ou
modificações, importará nova proposta.
c) A regra geral é de que os contratos entre ausentes tornem-se perfeitos
desde que a aceitação seja expedida.
d) Concluído o contrato preliminar, qualquer das partes terá o direito de
exigir a celebração do definitivo, assinando prazo à outra para que o
efetive.

TÓPICOS ESPECIAIS DE OBRIGAÇÕES E CONTRATOS 125


Questão 3
(FGV – 2012 – PC-MA – Delegado de Polícia)
A respeito da formação dos contratos, assinale a afirmativa incorreta.
a) Considera-se celebrado o contrato no lugar em que foi proposto.
b) A proposta deixa de ser obrigatória se, feita sem prazo à pessoa
presente, não foi imediatamente aceita.
c) Será considerada nova proposta a aceitação fora do prazo, com adições,
restrições ou modificações.
d) A proposta de contrato obriga o proponente se o contrário não resultar
dos termos dela, da natureza do negócio, ou das circunstâncias do caso.
e) Continua sendo obrigatória a proposta mesmo se, antes dela, ou
simultaneamente, chegar ao conhecimento da outra parte a retratação
do proponente.

Questão 4
(TJ-PR – 2012 – TJ-PR – Assessor Jurídico)
Relativamente à disciplina dos contratos no Código Civil, assinale a alternativa
correta.
a) A proposta deixa de ser obrigatória se, antes dela, ou simultaneamente,
chegar ao conhecimento da outra parte a retratação do proponente.
b) Os princípios de probidade e boa-fé têm vez apenas na conclusão do
contrato.
c) Os contratos de adesão são previstos apenas pelo Código de Defesa do
Consumidor.
d) Os contratos entre ausentes tornam-se perfeitos desde que a aceitação
seja expedida, ainda que o proponente tenha se comprometido a esperar
resposta.

Questão 5
(EJEF – 2008 – TJ-MG – Juiz)

TÓPICOS ESPECIAIS DE OBRIGAÇÕES E CONTRATOS 126


Quanto à formação dos contratos, no sistema do Código de Defesa do
Consumidor, a oferta vincula o fornecedor ou ofertante. No entanto, deixa de
ser obrigatória a proposta nas seguintes hipóteses, EXCETO:
a) Se feita sem prazo à pessoa presente, não foi imediatamente aceita.
b) Se feita sem prazo à pessoa ausente, tiver decorrido tempo suficiente
para chegar a resposta ao conhecimento do proponente.
c) Se feita à pessoa ausente, tiver sido expedida a resposta dentro do prazo
dado.
d) Se, antes dela, ou simultaneamente, chegar ao conhecimento da outra
parte a retratação do proponente.

Questão 6
Diante da formação do contrato pela via eletrônica, caso a negociação tenha
acontecido entre ausentes, segundo a doutrina, prevalecerá em relação ao
recebimento da aceitação pelo proponente:
a) A teoria da expedição
b) A teoria da recepção
c) A teoria declaratória
d) A teoria da inércia

Questão 7
(CESPE – 2013 – TRE-MS – Analista Judiciário – Área Administrativa)
Assinale a opção correta acerca dos contratos e da responsabilidade civil.
a) Conforme a teoria da cognição, o contrato entre ausentes será
considerado formado mesmo que a resposta do destinatário da proposta
não chegue ao conhecimento do proponente.
b) Diante de cláusulas ambíguas ou contraditórias em um contrato de
adesão, a interpretação deve favorecer aquele que assinou primeiro, pois
teve um tempo menor para ler e compreender o contrato.
c) Os atos praticados na etapa pré-contratual não são capazes de gerar
responsabilidade civil, que é típica daqueles atos praticados na vigência
do contrato.

TÓPICOS ESPECIAIS DE OBRIGAÇÕES E CONTRATOS 127


d) Na hipótese de envio de uma proposta por e-mail, como policitante não
se encontra na presença do oblato, a proposta feita será considerada
entre ausentes.

Questão 8
(CESPE – 2008 – STF – Analista Judiciário – Área Judiciária)
Feita a proposta entre presentes, a aceitação deve dar-se dentro do prazo
estabelecido e, não havendo prazo, deve ser imediata, visto que, do contrário,
a proposta deixa de ser obrigatória. Nesse sentido, a aceitação por parte do
destinatário da proposta formaliza o contrato, uma vez que se atinge a
convergência de vontades, elemento essencial aos contratos. Certo ou errado?
a) Certo
b) Errado

Questão 9
O contrato eletrônico internacional, pactuado no Brasil, é regido por qual
norma?
a) Código de Defesa do Consumidor
b) Norma do país do proponente
c) Norma que foi definida contratualmente
d) Norma de Infraestrutura de Chaves Públicas Brasileira

Questão 10
A proposta de contrato obriga o proponente, se o contrário não resultar dos
termos dela, da natureza do negócio, ou das circunstâncias do caso, exceto: se
feita sem prazo à pessoa presente, não foi imediatamente aceita; se feita sem
prazo à pessoa ausente, tiver decorrido tempo suficiente para chegar a
resposta ao conhecimento do proponente; se feita à pessoa ausente, não tiver
sido expedida a resposta dentro do prazo dado; se, antes dela, ou
simultaneamente, chegar ao conhecimento da outra parte a retratação do
proponente. Na hipótese da aceitação, chegar tarde ao conhecimento do

TÓPICOS ESPECIAIS DE OBRIGAÇÕES E CONTRATOS 128


proponente por circunstância imprevista, este comunicá-lo-á imediatamente ao
aceitante, sob pena de responder por perdas e danos. Certo ou errado?
a) Certo
b) Errado

Validade dos documentos públicos: A certeza jurídica da autenticidade da


assinatura digital tem levado a jurisprudência a equiparar tal assinatura àquela
que foi realizada por escrito pelo contratante.

Aula 5
Exercícios de fixação
Questão 1 - A
Justificativa: A corrente minoritária na doutrina, mas majoritária na
jurisprudência, conduzida por Flávio Tartuce, sustenta que, apesar de não
haver vinculação entre as partes, há responsabilidade civil contratual na fase de
negociações preliminares em função dos Enunciados 25 e 170 das Jornadas de
Direito Civil do CJF/STJ, que reconhecem a aplicação da boa-fé em todas as
fases do contrato.

Questão 2 - D
Justificativa: Conforme Artigo 463 do CC.

Questão 3 - E
Justificativa: Conforme Artigo 428, IV, do CC.

Questão 4 - A
Justificativa: Conforme Artigo 428, IV, do CC.

TÓPICOS ESPECIAIS DE OBRIGAÇÕES E CONTRATOS 129


Questão 5 - C
Justificativa: Conforme Artigo 428, III, do CC.

Questão 6 - B
Justificativa: O Enunciado 173 da III Jornada de Direito Civil do CJF/STJ assim
determina: “A formação dos contratos realizados entre pessoas ausentes por
meio eletrônico completa-se com a recepção da aceitação pelo proponente”.

Questão 7 - D
Justificativa: A proposta será entre ausentes quando existir um prazo
considerável entre a oferta e a aceitação (ex.: e-mail).

Questão 8 - A
Justificativa: Conforme Artigos 428 e 434, caput, do CC.

Questão 9 - B
Justificativa: De acordo com o Artigo 9º, §2º, da Lei de Introdução às Normas
do Direito Brasileiro: “Para qualificar e reger as obrigações, aplicar-se-á a lei do
país em que se constituírem. §2º A obrigação resultante do contrato reputa-se
constituída no lugar em que residir o proponente”.

Questão 10 - A
Justificativa: Conforme Artigos 427, 428 e 430, do CC.
Para os exercícios de autocorreção, não podemos ter questões discursivas. Por
favor, reformular.

TÓPICOS ESPECIAIS DE OBRIGAÇÕES E CONTRATOS 130


Introdução
É possível afirmar que, na sociedade atual, o contrato se corporifica como o
maior negócio jurídico; desta forma, a análise das premissas para sua revisão
judicial torna-se um verdadeiro diferencial aos operadores do direito.

O Direito Civil contemporâneo vem incorporando o fenômeno de


constitucionalização aos seus institutos, o que acaba por modificar os critérios
de interpretação e aplicação do negócio jurídico.

Para tanto, a materialização dos princípios constitucionais às relações privadas,


antes submissas ao império da autonomia privada sem limites e do seu
correlato pacta sunt servanda, tornou-se uma realidade a partir do respeito aos
valores da isonomia, da dignidade da pessoa humana, da solidariedade, dentre
outros, pelos tribunais brasileiros.

A revisão judicial dos contratos é o mecanismo que vem concretizando o


mencionado fenômeno em decorrência da possibilidade de intromissão estatal
nas relações privadas. Aqui, a teoria da imprevisão adquire importância vital,
delegando ao Judiciário a prerrogativa de rever ou extinguir um acordo diante
da onerosidade excessiva.

Esse é o tema que veremos nesta aula.


Bons estudos!

Objetivo:
1. Analisar o arcabouço conceitual da revisão judicial dos contratos;
2. Analisar a influência do direito civil-constitucional à revisão judicial dos
contratos a partir da análise jurisprudencial.

TÓPICOS ESPECIAIS DE OBRIGAÇÕES E CONTRATOS 131


Conteúdo
Revisão judicial dos contratos
A revisão judicial dos contratos é tema de importância fundamental em
decorrência de sua aplicabilidade prática.

Para que o Poder Judiciário possa realizá-la, existe a necessidade de amparar-


se em determinadas premissas para que sua função social não se transforme
em condutas injustas.

Diante da possibilidade de inadimplemento obrigacional, a extinção


contratual deve ser a última medida, preferindo-se, sempre, a revisão.

Tal conclusão acaba por respeitar a conservação do negócio jurídico, a


função social do contrato em sua eficácia interna e a própria
autonomia privada, pois, presume-se que os contratantes, ao celebrarem
dada pactuação, desejaram a produção de efeitos jurídicos.

O tema desdobra-se em:

Revisão judicial, quando há um conflito de interpretação de cláusulas entre os


contratantes.

Revisão judicial, diante da abusividade de cláusulas contratuais.

Revisão judicial, quando ocorre fato imprevisível que modifique


substancialmente o conjunto contratual.

Avance a tela e confira cada um desses tópicos.

TÓPICOS ESPECIAIS DE OBRIGAÇÕES E CONTRATOS 132


Quando há um conflito de interpretação de cláusulas
O que fazer?
Instaurado o conflito acerca da interpretação do contrato, paralisam-se os
efeitos do referido negócio jurídico e, consequentemente, a sua execução,
cabendo ao Poder Judiciário dirimir a controvérsia, declarando, com força
vinculativa para as partes, o sentido da palavra, frase ou cláusula controversa.

O que deve prevalecer?


Quando determinada cláusula se mostra obscura e passível de dúvida, alegando
um dos contratantes que não representa com fidelidade a vontade manifestada
na celebração do acordo, e tal alegação resta provada, deve prevalecer a
declaração em detrimento da literalidade do texto, pois, nos termos do Artigo
112 do CC:

“Nas declarações de vontade se atenderá mais à intenção nelas


consubstanciada do que ao sentido literal da linguagem”.

Que princípio considerar?

Pelo princípio da conservação do negócio jurídico, entende-se que, se


uma cláusula contratual permitir duas interpretações diferentes, prevalecerá a
que possa produzir algum efeito, pois não se deve presumir que os
contratantes tenham celebrado um contrato carecedor de qualquer
utilidade. Esse princípio informa a denominada conversão substancial do
negócio jurídico.

Exemplo
Se as partes celebraram um contrato de compra e venda de imóvel sem
atenção às formalidades exigidas por lei, pode-se considerar o negócio como
uma promessa de compra e venda, que não exige forma solene, a fim de se
aproveitar a vontade das partes, conforme Artigo 170 do CC:

TÓPICOS ESPECIAIS DE OBRIGAÇÕES E CONTRATOS 133


“Se, porém, o negócio jurídico nulo contiver os requisitos de outro, subsistirá
este quando o fim a que visavam as partes permitir supor que o teriam querido,
se houvessem previsto a nulidade”.

Importante destacar que a intenção das partes é mais importante do que a


formalidade, pois o Artigo 170 do CC deve prevalecer, de acordo com o Artigo
166, IV, do CC: “É nulo o negócio jurídico quando. IV. Não revestir a forma
prescrita em lei”.

Ainda em relação à conservação do contrato, importante transcrever o


Enunciado 22 da I Jornada de Direito Civil do CJF/STJ:

“A função social do contrato, prevista no Artigo 421 do novo Código Civil,


constitui cláusula geral que reforça o princípio de conservação do contrato,
assegurando trocas úteis e justas”.

Conclui-se, portanto, pela necessidade do julgador em preservar a pactuação


estabelecida pelas partes, a fim de se materializar, por via indireta, a própria
função social do contrato.

Diante da abusividade de cláusulas contratuais


O que o juiz pode fazer diante da abusividade de cláusulas contratuais
considerando a função social do contrato?

Segundo a melhor doutrina, ao se referir à função social do contrato, sendo


esta formada por normas de ordem pública, o juiz pode aplicar as cláusulas
gerais em qualquer ação judicial, independentemente de pedido da parte
ou do interessado, pois deve agir de ofício.

O que o juiz pode fazer diante da abusividade de cláusulas contratuais


considerando a função social do contrato?

TÓPICOS ESPECIAIS DE OBRIGAÇÕES E CONTRATOS 134


Com isso, ainda que, por exemplo, o autor da ação de revisão contratual
não haja pedido na inicial algo relativo à determinada cláusula geral, o juiz
pode, de ofício, modificar cláusula de percentual de juros, caso entenda
que deve assim agir para adequar o contrato à sua função social e igualitária.
Dessa forma, autorizado pela cláusula geral expressamente prevista na lei, o
juiz poderá ajustar o contrato e dar-lhe a sua própria noção de equilíbrio, sem
ser tachado de arbitrário ou ativista.

Atenção
Importante destacar que, apesar de, majoritariamente, não ser
cabível a revisão de contrato de execução imediata, existe
jurisprudência do STJ em sentido diverso, conforme se extrai da
Súmula 286:

“A renegociação de contrato bancário ou a confissão da dívida


não impede a possibilidade de discussão sobre eventuais
ilegalidades dos contratos anteriores”.

Logo, permite-se a revisão judicial de contratos extintos em


decorrência da abusividade.

Quando ocorre fato imprevisível


Lembra-se da teoria da improvisão?

Ela já foi conceituada em aulas anteriores. Quando ocorre um fato imprevisível


e/ou extraordinário, que acarreta uma desproporção negocial, a possibilidade
de revisão judicial do contrato decorre da aplicação dos princípios
constitucionais às relações privadas. Atualmente, tal teoria encontra-se disposta
nos Artigos 317 e 478 do Código Civil:

TÓPICOS ESPECIAIS DE OBRIGAÇÕES E CONTRATOS 135


Artigo 317
“Quando, por motivos imprevisíveis, sobrevier desproporção manifesta entre
o valor da prestação devida e o do momento de sua execução, poderá o juiz
corrigi-lo, a pedido da parte, de modo que assegure, quanto possível, o valor
real da prestação".

Artigo 478
Nos contratos de execução continuada ou diferida, se a prestação de uma das
partes se tornar excessivamente onerosa, com extrema vantagem para a outra,
em virtude de acontecimentos extraordinários e imprevisíveis, poderá o devedor
pedir a resolução do contrato”.

Fato imprevisível – aplicação pelo judiciário


Qual o parâmetro para a aplicação da teoria da imprevisão pelo judiciário?

Primeiramente, o contrato originário deve ser cumprido enquanto as


condições externas vigentes no momento da execução não forem
modificadas, em respeito à conservação do negócio jurídico.

Assim, a teoria da imprevisão somente será acionada diante de um fato


superveniente imprevisível, que acarrete uma onerosidade excessiva.

Acompanhe a aplicação da teoria da imprevisão, segundo Maria Helena


Diniz:

“O órgão judicante deverá, para lhe dar ganho de causa, apurar rigorosamente
a ocorrência dos seguintes requisitos: a) vigência de um contrato comutativo de
execução continuada; b) alteração radical das condições econômicas no
momento da execução do contrato, em confronto com as do benefício
exagerado para o outro; c) onerosidade excessiva para um dos contraentes e
benefício exagerado para o outro; d) imprevisibilidade e extraordinariedade
daquela modificação, pois é necessário que as partes, quando celebraram o

TÓPICOS ESPECIAIS DE OBRIGAÇÕES E CONTRATOS 136


contrato, não possam ter previsto esse evento anormal, isto é, que está fora do
curso habitual das coisas, pois não se poderá admitir a cláusula rebus sic
stantibus se o risco for normal ao contrato”.

Avance e veja mais detalhes sobre a onerosidade excessiva e a


necessidade do fato ser imprevisível.

Onerosidade excessiva
Como reconhecer a onerosidade excessiva?

Para que a onerosidade excessiva seja reconhecida, não há a necessidade da


prova de que um dos contratantes auferiu vantagens, bastando prova do
prejuízo e do desequilíbrio do negócio, conforme determina o Enunciado 365
da IV Jornada de Direito Civil do CJF/STJ:

“A extrema vantagem do Artigo 478 deve ser interpretada como elemento


acidental da alteração das circunstâncias, que comporta a incidência da
resolução ou revisão do negócio por onerosidade excessiva,
independentemente de sua demonstração plena”.

Necessidade de o fato ser imprevisível


Em relação à necessidade de o fato ser imprevisível, Flávio Tartuce tece forte
crítica ao comportamento dos tribunais brasileiros:

Apesar do conhecimento pacífico e da aceitação da revisão contratual por fato


superveniente, infelizmente, poucos casos vêm sendo enquadrados como
imprevisíveis por nossos Tribunais, realidade que se esperava mudar com o
advento do Código Civil de 2002. Isso porque a jurisprudência nacional
sempre considerou o fato imprevisto tendo como parâmetro o
mercado, o meio que envolve o contrato, não a parte contratante. A
partir dessa análise, em termos econômicos, na sociedade pós-moderna
globalizada, nada é imprevisto, tudo se tornou previsível. Não seriam

TÓPICOS ESPECIAIS DE OBRIGAÇÕES E CONTRATOS 137


imprevisíveis a escala inflacionária, o aumento do dólar ou o desemprego, não
sendo possível a revisão contratual motivada por tais ocorrências.

Qual a melhor solução para a aferição do fato imprevisível?

Encontra-se disposta no Enunciado 175 da III Jornada de Direito Civil do


CJF/STJ:
“A menção à imprevisibilidade e à extraordinariedade, insertas no Artigo 478 do
Código Civil, deve ser interpretada não somente em relação ao fato que gere o
desequilíbrio, mas também em relação às consequênciasque ele produz”.

Assim, a fim de se afastar maiores riscos ao meio social, deve-se conceber


como motivo imprevisível o fato superveniente e alheio à vontade dos
sujeitos. Diante da desproporção negocial, poderá ocorrer a revisão ou a
extinção do contrato, dependendo do caso em análise.

Vejamos a seguir a revisão judicial dos contratos a partir da análise


jurisprudencial.

Análise jurisprudencial
Em relação à necessidade de o fato ser imprevisível, Flávio Tartuce tece forte
crítica ao comportamento dos tribunais brasileiros:

Não há dúvidas de que a nova hermenêutica, pautada na aplicação dos


princípios constitucionais às relações privadas, influencia a revisão judicial
dos contratos.

Atualmente, o Poder Judiciário possui uma ingerência muito maior nas


negociações travadas pelos particulares, ajustando o contrato aos ditames
determinados pelo Estado Democrático de Direito.

TÓPICOS ESPECIAIS DE OBRIGAÇÕES E CONTRATOS 138


Dessa maneira, o presente tópico visa compilar algumas decisões, que
materializam a mencionada premissa diante da revisão judicial dos negócios
jurídicos.

Avance a tela e confira!

Inadimplemento obrigacional e inexecução voluntária do negócio


jurídico
Inadimplemento obrigacional

Importante esclarecer que o inadimplemento obrigacional não pode


configurar um óbice à revisão judicial do contrato, pois, muitas vezes, a mora
decorre da incapacidade econômica do devedor diante de fato imprevisível.

Assim, a ausência de inadimplemento não constitui um dos requisitos para a


aplicação da teoria da imprevisão.

Inexecução voluntária do negócio jurídico

Porém, em outros casos, ocorrerá a inexecução voluntária do negócio


jurídico por meio da conduta culposa do agente, o que acarretará a
intromissão estatal no sentido de proporcionar uma compensação financeira ao
contratante, que teve frustrada a sua vontade negocial.

Execução forçada nas obrigações de dar coisa certa


Na execução forçada nas obrigações de dar coisa certa, quando o
devedor recebia o preço e se recusava a entregar a coisa, o credor não podia
expropriá-la de seu patrimônio, resolvendo-se o litígio em perdas e danos
(Artigo 389 do CC).

Assim, a obrigação não acarretaria direito real (sobre a coisa), mas apenas
direito pessoal (sobre a conduta).

TÓPICOS ESPECIAIS DE OBRIGAÇÕES E CONTRATOS 139


Excepcionalmente, admitia-se efeito real caso a coisa continuasse na posse do
devedor, como, por exemplo:

“A” combinou de vender a “B” uma obra de arte; “B” pagou,...

...mas, depois, “A” recebeu uma oferta melhor e terminou vendendo a coisa a
“C”.

“B” não podia reivindicá-la de “C”,...

...mas caso estivesse ainda com “A”, poderia fazê-lo por meio do Poder
Judiciário.

Assim, para o direito obrigacional, o Artigo 389 do CC constitui a regra (perdas


e danos), e o Artigo 475 do CC constitui a exceção (execução forçada do
contrato).

Ainda hoje, a obrigação não gera direito real; o que o gera é a tradição para as
coisas móveis (Artigo 1.226 ao 1.267 do CC) e o registro para as coisas imóveis
(Artigo 1245 do CC).

Pelos Artigos 237 e 492 do CC, eventual perda da coisa trará prejuízo para o
dono, a depender do momento da tradição, não do pagamento da obrigação,
confirmando a regra res perit domino (a coisa perece para o dono).

Por sua vez, o registro é a inscrição da propriedade imobiliária no Cartório de


Imóveis, de modo que o dono do imóvel não é quem mora nele, quem pagou o
preço ou quem tem as chaves. O dono da coisa imóvel é aquele cujo nome está
registrado no Cartório de Imóveis (Artigo 1.245, §1º, do CC).

TÓPICOS ESPECIAIS DE OBRIGAÇÕES E CONTRATOS 140


Pagamento de astreintes
Atualmente, nas obrigações de fazer, não fazer e entregar coisa, admite-se a
execução forçada, sob pena do pagamento de astreintes, com base nos Artigos
461, §5º, e 461-A do CPC.

Quando a coisa não for entregue, o que ocorre?

Quando a coisa não for entregue, caberá busca e apreensão (se móvel) ou
imissão na posse (se imóvel), com base no §2º do Artigo 461-A do CPC.

É possível a fixação de astreintes nas obrigações pecuniárias?

A fixação de astreintes não é possível nas obrigações pecuniárias (obrigação de


dar dinheiro), por falta de previsão legal, como é possível constatar na
jurisprudência. Veja abaixo.

Ementa: APELAÇÃO CÍVEL. BRASIL TELECOM. EXECUÇÃO DE OBRIGAÇÃO DE


FAZER. MULTA ARBITRADA PARA O CASO DE DESCUMPRIMENTO DA
DETERMINAÇÃO JUDICIAL. Em se tratando de obrigação de pagar
quantia determinada, não se admite a imposição de astreintes. Não
aplicação da regra contida no Artigo 461 do CPC. Afastamento da multa
cominada. Penalidade acerca da qual sequer a apelada foi intimada
pessoalmente. Condenação decorrente da indenização referente à dobra
acionária já satisfeita, inclusive em duplicidade. Multa do Artigo 475-J, do CPC.
Incidência que resulta prejudicada em face da reconhecida ausência de título.
APELO DESPROVIDO. (Apelação Cível Nº 70030943369, Vigésima Câmara
Cível, Tribunal de Justiça do RS, Relator: José Aquino Flores de Camargo,
Julgado em 21/10/2009).

E quando do inadimplemento da obrigação de dar coisa incerta?

TÓPICOS ESPECIAIS DE OBRIGAÇÕES E CONTRATOS 141


Também não é possível a fixação de astreintes quando do inadimplemento da
obrigação de dar coisa incerta, de acordo com o §1º do Artigo 461-A do CPC.
Assim, a obrigação de dar coisa incerta ao ser individualizada transforma-se em
obrigação de dar coisa certa, havendo, a partir deste momento, interesse
jurídico para a fixação da referida multa diária.

Enunciado 160 da III Jornada de Direito Civil do CJF/STJ

Pelo Enunciado 160 da III Jornada de Direito Civil do CJF/STJ: “A obrigação de


creditar dinheiro em conta vinculada de FGTS é obrigação de dar, obrigação
pecuniária, não afetando a natureza da obrigação a circunstância de a
disponibilidade do dinheiro depender da ocorrência de uma das hipóteses
previstas no Artigo 20 da Lei nº 8036/90”. A justificativa do enunciado decorre:
a) o que se pretende é a coisa e não o ato; e, b) possibilidade de incidência de
juros legais, que somente são cabíveis na obrigação de dar dinheiro ou nela
convertida. Porém, para o STJ, tal obrigação é considerada como obrigação de
fazer do empregador, e o seu inadimplemento gera o pagamento de astreintes,
além da possibilidade de deferimento de tutela liminar (Artigo 461, §3º, do
CPC).

Quanto ao valor atingindo pela multa diária e a possibilidade de sua redução


pelo STJ, cabe a transcrição do Informativo 495 do Tribunal.

MULTA DO ART. 461, § 4º, DO CPC. OBRIGAÇÃO DE FAZER. DESCASO DO


DEVEDOR. VALOR TOTAL ATINGIDO. A discussão diz respeito ao valor atingido
pela astreinte e busca definir se a multa cominatória fixada para o caso de
descumprimento da obrigação de fazer seria exagerada a ponto de autorizar
sua redução nesta Corte. In casu sub examen, o condomínio recorrido ajuizou
reintegração na posse em que o recorrente proprietário de unidade autônoma
construiu irregularmente um deque em área comum do edifício – a qual fora
cedida sob a condição de que não fosse realizada qualquer obra. O pedido foi
julgado procedente, e o recorrente foi condenado à devolução da área, livre de

TÓPICOS ESPECIAIS DE OBRIGAÇÕES E CONTRATOS 142


qualquer construção, no prazo de noventa dias, sob pena da incidência de
multa diária no valor de R$ 1 mil. O tribunal a quo manteve a sentença
proferida e o valor atingido pela multa por descumprimento de decisão judicial
(R$ 383 mil). O recorrente sustenta que deve ser reconhecido o cumprimento
parcial da obrigação, sendo possível a revisão do valor da astreinte quando
atingido valor excessivo, de forma que deve ser reduzido aos limites da
obrigação principal, qual seja, R$ 5 mil. A Min. Relatora observou que a multa
cominatória, prevista no art. 461 do CPC, representa um dos instrumentos de
que o direito processual civil pode valer-se na busca por uma maior efetividade
do cumprimento das decisões judiciais. A multa diária por descumprimento de
decisão judicial foi inicialmente fixada em patamar adequado à sua finalidade
coercitiva e não poderia ser considerada exorbitante ou capaz de resultar no
enriquecimento sem causa da parte adversa. Ademais, o prazo estabelecido
para o desfazimento das obras se mostrava bastante razoável. Entretanto, o
recorrente, mesmo instado a desfazer as obras sob pena de multa diária fixada
na sentença, furtou-se de fazê-lo e, em momento algum, suscitou a existência
de impedimentos excepcionais ao cumprimento da obrigação. Assim, sendo a
falta de atenção do recorrente o único obstáculo ao cumprimento da
determinação judicial justifica-se a manutenção do valor atingido pelas
astreintes. REsp 1.229.335-SP, Rel. Min. Nancy Andrighi, julgado em
17/4/2012.

Pagamento das perdas e danos


Como visto anteriormente, o descumprimento culposo do contrato acarretará
no pagamento das perdas e danos.

Quanto à revisão do quantum indenizatório pelo STJ em decorrência


dessa situação, convém transcrever a jurisprudência.

ADMINISTRATIVO E PROCESSUAL CIVIL. CORTE NO FORNECIMENTO DE ÁGUA


E ESGOTO. INDENIZAÇÃO. DANOS MORAIS. IMPOSSIBILIDADE DE REVISÃO.
VALOR RAZOÁVEL. INCIDÊNCIA DA SÚMULA 7/STJ. 1. Não assiste razão à

TÓPICOS ESPECIAIS DE OBRIGAÇÕES E CONTRATOS 143


recorrente no que diz respeito à alegada inexistência de danos morais, tendo
em vista que foi com base nas provas e nos fatos constantes dos autos que o
Tribunal de origem reconheceu que a conduta da recorrente gerou danos que
devem ser reparados. Assim, para alterar a conclusão do Tribunal a quo, como
requer a recorrente, seria imprescindível adentrar a seara dos fatos, o que
esbarra na Súmula 7/STJ: "A pretensão de simples reexame de prova não
enseja recurso especial". 2. Em relação ao valor fixado a título de danos morais,
a revisão do valor fixado a título de danos morais também encontra óbice na
Súmula 07/STJ, uma vez que fora estipulado em razão das peculiaridades do
caso concreto, a exemplo, da capacidade econômica do ofensor e do ofendido,
a extensão do dano, o caráter pedagógico da indenização. 3. Não é demais
lembrar que a revisão do valor a ser indenizado somente é possível quando
exorbitante ou irrisória a importância arbitrada, em violação dos princípios da
razoabilidade e da proporcionalidade, o que não se observa in casu, uma vez
que o montante de R$ 5.000,00 (cinco mil reais) não é excessivo. 4. Agravo
regimental não provido (AgRg no AREsp 146159/SP AGRAVO REGIMENTAL NO
AGRAVO EM RECURSO ESPECIAL 2012/0031256-0 Rel. Ministro Mauro
Marques).

Cláusula penal
Pelo Informativo 484, o STJ vem entendendo ser possível a cobrança da
cláusula penal em decorrência do inadimplemento culposo do vendedor, que
não entregou tempestivamente o bem.

Aqui, mais uma vez, fica clara a revisão judicial do contrato à luz do direito civil-
constitucional a partir da materialização do princípio da isonomia às relações
privadas, mesmo em sentido contrário àquilo que foi ajustado pelos
contratantes originariamente.

Colaciona-se a transcrição do mencionado informativo.

TÓPICOS ESPECIAIS DE OBRIGAÇÕES E CONTRATOS 144


In casu, trata-se de contrato de compra e venda de imóvel, no qual o
promitente-comprador (recorrente) obrigou-se a pagar o preço e o promitente-
vendedor a entregar o apartamento no tempo aprazado. Porém, o promitente-
vendedor não entregou o bem no tempo determinado, o que levou o
promitente-comprador (recorrente) a postular o pagamento da cláusula penal
inserida no contrato de compra e venda, ainda que ela tenha sido redigida
especificamente para o caso do seu inadimplemento. Assim, cinge-se a questão
em definir se a cláusula penal dirigida apenas ao promitente-comprador pode
ser imposta ao promitente-vendedor ante o seu inadimplemento contratual. Na
hipótese, verificou-se cuidar de um contrato bilateral, em que cada um dos
contratantes é simultânea e reciprocamente credor e devedor do outro,
oneroso, pois traz vantagens para os contratantes, comutativo, ante a
equivalência de prestações. Com esses e outros fundamentos, a Turma deu
provimento ao recurso para declarar que a cláusula penal contida nos contratos
bilaterais, onerosos e comutativos deve aplicar-se para ambos os contratantes
indistintamente, ainda que redigida apenas em favor de uma das partes.
Todavia, é cediço que ela não pode ultrapassar o conteúdo econômico da
obrigação principal, cabendo ao magistrado, quando ela se tornar exorbitante,
adequar o quantum debeatur. REsp 1.119.740-RJ, Rel. Min. Massami Uyeda,
julgado em 27/9/2011.

É cediço que a cláusula penal não pode ultrapassar o conteúdo econômico da


obrigação principal, cabendo ao magistrado, quando ela se tornar exorbitante,
adequar o quantum debeatur, o que constitui, mais uma vez, a possibilidade de
revisão judicial dos negócios jurídicos (“Artigo 413 do CC: A penalidade deve
ser reduzida equitativamente pelo juiz se a obrigação principal tiver sido
cumprida em parte, ou se o montante da penalidade for manifestamente
excessivo, tendo-se em vista a natureza e a finalidade do negócio”).

TÓPICOS ESPECIAIS DE OBRIGAÇÕES E CONTRATOS 145


Cláusula penal – Comodato
Pelo Informativo 484, o STJ vem entendendo ser possível a cobrança da
cláusula penal em decorrência do inadimplemento culposo do vendedor, que
não entregou tempestivamente o bem.

No comodato, conforme Artigo 582 do CC, também cabe o pagamento de


cláusula penal (aluguel) fixada pelo comodante caso o comodatário não
entregue a coisa em momento oportuno, além da possibilidade de ajuizamento
de ação de reintegração de posse.

A jurisprudência evidencia a possibilidade da fixação de valor mais elevado por


configurar uma penalidade ao devedor da coisa.

APELAÇÃO CÍVEL. AÇÃO DE REINTEGRAÇÃO DE POSSE. COMODATO.


ESBULHO. FIXAÇÃO DE ALUGUEL. O réu ser condenado ao pagamento de
indenização em razão do esbulho, mediante o pagamento a título de aluguel
mensal desde a configuração do esbulho até a efetiva desocupação. Em relação
ao pedido de fixação do aluguel em nível compatível ao valor de mercado,
cumpre ressaltar que não foram produzidas provas efetivas e contundentes no
sentido de ilustrar o real valor de mercado para o imóvel em questão. O aluguel
possui conotação de pena e pode ser aleatoriamente arbitrado pelo comodante.
O arbitramento do aluguel pelo comodante não possui apenas caráter
indenizatório, mas também punitivo pela demora na entrega da coisa, o que
possibilita a cobrança em patamar mais elevado do que o usualmente cobrado
pela locação do imóvel. Neste sentido, aplica-se ao presente caso o art. 582, do
Código Civil. Recurso desprovido.

A seguir, você acompanha a revisão judicial de contratos em casos de contrato


de doação.

TÓPICOS ESPECIAIS DE OBRIGAÇÕES E CONTRATOS 146


O referido aluguel fixado pelo comodante, geralmente quando da notificação
para entrega do bem que está emprestado, tem caráter de penalidade, não
sendo o caso de se falar em conversão do comodato em locação.

Importante mencionar a possibilidade de interferência estatal no valor da


cláusula penal, como determina o Enunciado 180 da III Jornada de
Direito Civil do CJF/STJ: “A regra do parágrafo único do Artigo 575 do novo
CC, que autoriza a limitação pelo juiz do aluguel-pena arbitrado pelo locador,
aplica-se também ao aluguel arbitrado pelo comodante, autorizado pelo Artigo
582, 2ª parte, do novo CC”.

Contrato de doação
Contrato de doação entre ascendente para descendente

Diante da simulação no contrato de doação entre ascendente para descendente


(Artigo 544 do CC), caberá, também, a revisão judicial do contrato. Como se
sabe, a simulação acarreta a nulidade do negócio jurídico (Artigo 167 do CC),
devendo o julgador declarar a retroatividade dos efeitos jurídicos ao momento
de sua pactuação.

Apesar de constituir um caso clássico de vício do negócio jurídico, há a


necessidade de manifestação do Poder Judiciário para a referida declaração.
Cabível transcrever a jurisprudência do Tribunal de Justiça do Rio Grande do
Sul.

APELAÇÃO CÍVEL. REGISTRO DE IMÓVEIS. AÇÃO ANULATÓRIA DE ESCRITURA


PÚBLICA C/C CANCELAMENTO DE REGISTRO IMOBILIÁRIO. COMPRA E VENDA
DE BENS REALIZADA ENTRE ASCENDENTE E DESCENDENTE. SIMULAÇÃO.
OCORRÊNCIA. DOAÇÃO. ONEROSIDADE DOS NEGÓCIOS JURÍDICOS
REALIZADOS NÃO DEMONSTRADA. INEFICÁCIA DOS NEGÓCIOS EM RELAÇÃO
AO HERDEIRO PRETERIDO QUE DEIXOU DE RECEBER SEU QUINHÃO PORQUE
NÃO LEVADOS OS BENS DOADOS À COLAÇÃO NO INVENTÁRIO. SENTENÇA

TÓPICOS ESPECIAIS DE OBRIGAÇÕES E CONTRATOS 147


MANTIDA. HONORÁRIOS. MAJORAÇÃO. POSSIBILIDADE. SENTENÇA
REFORMADA NO PONTO. I. A simulação relativa, ocorrente no caso dos autos,
se dá quando se realiza aparentemente um negócio jurídico, querendo e
levando-se a efeito outro diferente. Em outras palavras, caracteriza-se quando
os contratantes concluem um negócio que é verdadeiro – doação –, mas o
ocultam sob uma forma jurídica diversa – compra e venda. No caso concreto, o
falecido, sua esposa e filhos comuns preteriram o autor – filho concebido fora
do casamento – realizando diversas doações sob a aparência de compra e
venda, com o objetivo de subtrair o direito do autor à herança de seu falecido
pai. As doações ocultas prejudicaram o herdeiro preterido, porque não levadas
à colação no processo de inventário, acarretando o desequilíbrio dos quinhões
das heranças, razão pela qual foram declaradas ineficazes, em relação ao autor,
as doações e cessões gratuitas realizadas pelo de cujus em favor dos réus.
Apelos dos réus desprovidos. À UNANIMIDADE, NEGARAM PROVIMENTO AOS
APELOS DOS RÉUS E DERAM PROVIMENTO AO APELO DO AUTOR. (Apelação
Cível Nº 70038684460, Décima Sétima Câmara Cível, Tribunal de Justiça do RS,
Relator: Liege Puricelli Pires, Julgado em 15/12/2011).

Coação no contrato de doação


Diante da coação no contrato de doação, caberá, também, a revisão judicial do
contrato. Apesar de constituir um caso clássico de vício do negócio jurídico, há
a necessidade de manifestação do Poder Judiciário para a declaração de sua
anulabilidade.

Cabível transcrever a jurisprudência do Tribunal de Justiça do Rio Grande do


Sul.

RESPONSABILIDADE CIVIL. DOAÇÃO. COAÇÃO MORAL EXERCIDA POR


DISCURSO RELIGIOSO. AMEAÇA DE MAL INJUSTO. PROMESSA DE GRAÇAS
DIVINAS. CONDIÇÃO PSIQUIÁTRICA PRÉ-EXISTENTE. COOPTAÇAO DA
VONTADE. DANO MORAL CONFIGURADO. INDENIZAÇÃO ARBITRADA. 1.
ANÁLISE DO ARTIGO 152 DO CÓDIGO CIVIL. CRITÉRIOS PARA AVALIAR A

TÓPICOS ESPECIAIS DE OBRIGAÇÕES E CONTRATOS 148


COAÇÃO. A prova dos autos revelou que a autora estava passando por grandes
dificuldades em sua vida afetiva (separação litigiosa), profissional (divisão da
empresa que construiu junto com seu ex-marido), e psicológica (foi internada
por surto maníaco, e diagnosticada com transtorno afetivo bipolar). Por conta
disso, foi buscar orientação religiosa e espiritual junto à Igreja Universal do
Reino de Deus. Apegou-se à vivência religiosa com fervor, comparecia
diariamente aos cultos e participava de forma ativa da vida da Igreja. Ou seja,
à vista dos critérios valorativos da coação, nos termos do art. 152 do Código
Civil, ficou claramente demonstrada sua vulnerabilidade psicológica e
emocional, criando um contexto de fragilidade que favoreceu a cooptação da
vontade pelo discurso religioso. 2. ANÁLISE DOS ARTIGOS 151 E 153 DO
CÓDIGO CIVIL. PROVA DA COAÇÃO MORAL. Segundo consta da prova
testemunhal e digital, a autora sofreu coação moral da Igreja que, mediante
atuação de seus prepostos, desafiava os fiéis a fazerem doações, fazia
promessa de graças divinas, e ameaçava-lhes de sofrer mal injusto caso não o
fizessem. No caso dos autos, o ato ilícito praticado pela Igreja materializou-se
no abuso de direito de obter doações, mediante coação moral. Assim agindo,
violou os direitos da dignidade da autora e lhe casou danos morais.
Compensação arbitrada em R$20.000,00 (vinte mil reais), à vista das
circunstâncias do caso concreto. 3. MULTA POR LITIGÂNCIA DE MÁ-FÉ
AFASTADA. 4. REDEFINIDA A SUCUMBÊNCIA. RECURSO DA AUTORA
CONHECIDO EM PARTE, E NESSA PARTE, PROVIDO PARCIALMENTE.
PREJUDICADO O RECURSO DA RÉ. UNÂNIME. (Apelação Cível Nº
70039957287, Nona Câmara Cível, Tribunal de Justiça do RS, Relator: Iris
Helena Medeiros Nogueira, Julgado em 26/01/2011).

Concluímos nossa aula. Avance e faça uma atividade.

TÓPICOS ESPECIAIS DE OBRIGAÇÕES E CONTRATOS 149


Atividade proposta
Vamos fazer uma atividade relacionada aos temas estudados nesta aula.

É possível ao Judiciário rever a parte comutativa existente em contratos


aleatórios, como no caso de contrato de plano de saúde, diante da onerosidade
excessiva?

Chave proposta: Os tribunais brasileiros têm entendido pela revisão de


contratos de plano de saúde, diante da onerosidade excessiva (TJSP, Agravo de
Instrumento 366.368-4/3, Órgão Julgador: 7ª Câmara de Direito Privado, Rel.
Juiz Souza Lima, Origem: Comarca de São Bernardo do Campo, j. 16.02.2005).

Referências
GONÇALVES, Carlos Roberto. Direito Civil Brasileiro. 11. ed. São Paulo:
Saraiva, 2014. p. 28.
DINIZ, Maria Helena. Código Civil comentado. 11. ed. São Paulo: Malheiros,
2006. p. 164.
TARTUCE, Flávio. Direito Civil. 6. ed. São Paulo: Método, 2011. p. 194.

Exercícios de fixação
Questão 1
Se as partes celebraram um pretenso contrato de compra e venda de imóvel
sem atenção às formalidades exigidas por lei, pode-se considerar o negócio
como uma promessa de compra e venda, que não exige forma solene, para se
aproveitar a vontade das partes. Tal possibilidade é assegurada pelo seguinte
instituto:
a) Conversão substancial do negócio jurídico
b) Pacta sunt servanda
c) Supressio
d) Diálogo das fontes

Questão 2

TÓPICOS ESPECIAIS DE OBRIGAÇÕES E CONTRATOS 150


Em relação ao instituto da conversão substancial do contrato, assinale a
alternativa incorreta:
a) O instituto da conversão traduz o princípio da conservação dos atos
negociais e acarreta nova qualificação do negócio jurídico, desde que
não haja vedação legal.
b) Para que ocorra a conversão de um negócio jurídico nulo em outro de
natureza diversa, faz-se necessário que o negócio reputado nulo
contenha os requisitos do outro negócio.
c) Para que ocorra a conversão de um negócio jurídico nulo em outro de
natureza diversa, faz-se necessário que a vontade manifestada pelas
partes faça supor que, se estas tivessem ciência da nulidade do negócio
realizado, mesmo assim, teriam querido celebrar o negócio convertido.
d) Pelo princípio da conservação do negócio jurídico, entende-se que, se
uma cláusula contratual permitir duas interpretações diferentes, não
prevalecerá a que possa produzir algum efeito, pois prevalecerá a
declaração literal manifestada no contrato.

Questão 3
De acordo com a teoria da onerosidade excessiva, também conhecida como
teoria da imprevisão, assinale a alternativa incorreta:
a) É possível a revisão contratual, desde que, em virtude de acontecimentos
extraordinários, supervenientes e imprevisíveis, fique configurado o
desequilíbrio entre as partes contratantes, com extrema vantagem para
uma das partes e onerosidade excessiva para a outra.
b) Para que seja possível requerer a revisão contratual com base na
onerosidade excessiva, o contrato deve ser de execução continuada ou
diferida.
c) Para que seja possível requerer a revisão contratual com base na
onerosidade excessiva, o contrato deve ser bilateral, oneroso e
comutativo.

TÓPICOS ESPECIAIS DE OBRIGAÇÕES E CONTRATOS 151


d) Acerca da revisão contratual por onerosidade excessiva, é suficiente que
o acontecimento tenha se manifestado apenas na esfera individual da
parte.

Questão 4
(MPGO – 2012 – PROMOTOR)
Analisando os itens abaixo, pode-se afirmar que:
I – A validade da declaração de vontade, em regra, não depende de forma
especial, mas, se o negócio jurídico for celebrado com a cláusula de não valer
sem instrumento público, este se torna substância do ato.
II – Ao termo inicial e final, aplicam-se, no que couber, as disposições relativas
à condição suspensiva e à resolutiva; logo, se for estipulado como termo final
de um negócio jurídico no dia 31/02/2013, tal estipulação será havida por
inexistente.
III – O abuso de direito enseja reparação pelo regime da responsabilidade
objetiva, sendo desnecessária a demonstração da conduta do agente (dolo ou
culpa), de sorte que são requisitos necessários para que haja o dever de
indenizar: o ato, o dano, e o nexo de causalidade entre o ato e o dano.
a) Todos são corretos
b) Apenas o I e o II são corretos
c) Apenas o II e o III são corretos
d) Todos são incorretos

Questão 5
São requisitos para aplicação da Teoria da Imprevisão, exceto:
a) O contrato deve ser de execução continuada ou diferida.
b) Quando a prestação de uma das partes se tornar excessivamente
onerosa, com extrema vantagem para a outra.
c) Os acontecimentos devem ser extraordinários e imprevisíveis.
d) O devedor poderá pedir a resolução ou a revisão do contrato.
e) A resolução não poderá ser evitada, oferecendo-se o réu a modificar
equitativamente as condições do contrato.

TÓPICOS ESPECIAIS DE OBRIGAÇÕES E CONTRATOS 152


Questão 6
(Magistratura – TJRJ)
Vanessa firmou compromisso de compra e venda de imóvel para uma
Construtora com a finalidade de incorporação de um edifício no local e, em
contraprestação, receberia 10 unidades dessa nova construção. A Construtora
demoliu o imóvel ali existente, porém, nunca construiu outro imóvel, cujas
unidades, com exclusão das destinadas à Vanessa, foram prometidas a
terceiros, por meio de contrato de compromisso de compra e venda. Em razão
disso, Vanessa pleiteou em juízo a rescisão do pacto com a Construtora, o
cancelamento do registro do contrato firmado, para que passe a ser a titular do
domínio, além de ressarcimento de danos. Em razão desses fatos, assinale a
alternativa correta:
a) A compra e venda gera direitos obrigacionais entre as partes, de modo
que o pedido de cancelamento de registro do contrato não pode ser
provido, ainda mais quando há terceiros de boa-fé.
b) Vanessa tem direito real sobre o imóvel; assim, tem direito à
integralidade do pedido, restando aos terceiros adquirentes das unidades
o pedido de ressarcimento perante a construtora.
c) Somente poderá ser atendido o pedido de ressarcimento de danos em
valor equivalente às unidades prometidas, que poderá ser convertido em
obrigação de fazer, com a determinação de construção do edifício.
d) Vanessa terá direito a ser ressarcida do valor equivalente ao imóvel que
foi demolido, além do relativo às unidades prometidas, assim como
indenização pelo dano moral suportado.

Questão 7
Atualmente, nas obrigações de fazer, não fazer e entregar coisa, admite-se a
execução forçada, sob pena do pagamento de:
a) Cláusula penal
b) Arras
c) Astreintes

TÓPICOS ESPECIAIS DE OBRIGAÇÕES E CONTRATOS 153


d) Cláusula convencional

Questão 8
A cláusula penal, como bem a conceitua Limogi França, é um pacto acessório,
cuja finalidade é garantir, em benefício do credor, por meio do estabelecimento
de uma pena, o fiel e exato cumprimento da obrigação principal. Isso posto,
analise as afirmativas abaixo:
1 – Em sendo resolvida a obrigação, sem culpa do devedor, igualmente se
resolve a cláusula penal.
2 – A cláusula penal pode referir-se apenas à inexecução completa da
obrigação.
3 – A cláusula penal pode referir-se apenas à inexecução de alguma cláusula
especial.
4 – A nulidade da obrigação principal implica na nulidade da cláusula penal.
5 – O cumprimento parcial da obrigação não comporta redução proporcional da
cláusula penal.
a) Estão corretas as 5 afirmativas
b) Estão corretas 4 afirmativas
c) Estão corretas 3 afirmativas
d) Estão corretas 2 afirmativas

Questão 9
O Enunciado 180 da III Jornada de Direito Civil determina a possibilidade, pelo
juiz, da redução do valor da(o):
a) Cláusula penal estabelecida em contratos de locação de bens móveis.
b) Aluguel-pena em contratos de comodato, diante da não entrega do bem
tempestivamente.
c) Multa estabelecida em contratos consumeristas.
d) Cláusula penal estabelecida em contratos de compra e venda de imóveis.

Questão 10
(TJDFT – 2011 – JUIZ)

TÓPICOS ESPECIAIS DE OBRIGAÇÕES E CONTRATOS 154


Disciplina a lei civil que “mediante promessa de compra e venda, em que se
não pactuou arrependimento, celebrada por instrumento público ou particular,
e registrada no Cartório de Registro de Imóveis, adquire o promitente
comprador direito real à aquisição do imóvel”. De acordo com referida previsão
legal, considere as proposições abaixo e assinale a incorreta:
a) O direito real à aquisição do imóvel, no caso de promessa de compra e
venda, sem cláusula de arrependimento, somente se adquire com o
registro.
b) O promitente comprador, titular de direito real, pode exigir do
promitente vendedor, ou de terceiros, a quem os direitos deste forem
cedidos, a outorga da escritura definitiva de compra e venda, conforme o
disposto no instrumento preliminar; e, se houver recusa, requerer ao juiz
a adjudicação do imóvel.
c) O direito à adjudicação compulsória, quando exercido em face do
promitente vendedor, não se condiciona ao registro da promessa de
compra e venda no cartório do registro imobiliário.
d) O promitente comprador, munido de promessa de compra e venda,
ainda que não registrada no cartório de imóveis, tem a faculdade de
reivindicar de terceiro o imóvel prometido à venda.

Astreintes: Multa processual aplicada para o fim de fazer cumprir


decisão judicial de obrigação de fazer ou de não fazer
(geralmente diária).

Aula 6
Exercícios de fixação
Questão 1 - A

TÓPICOS ESPECIAIS DE OBRIGAÇÕES E CONTRATOS 155


Justificativa: Pelo princípio da conservação do negócio jurídico, entende-se que,
se uma cláusula contratual permitir duas interpretações diferentes, prevalecerá
a que possa produzir algum efeito, pois não se deve presumir que os
contratantes tenham celebrado um contrato carecedor de qualquer
utilidade. Esse princípio informa a denominada conversão substancial do
negócio jurídico. Assim, por exemplo, se as partes celebraram um contrato de
compra e venda de imóvel sem atenção às formalidades exigidas por lei, pode-
se considerar o negócio como uma promessa de compra e venda, que não
exige forma solene, a fim de se aproveitar a vontade das partes, conforme
Artigo 170 do CC.

Questão 2 - D
Justificativa: Pelo princípio da conservação do negócio jurídico, entende-se que,
se uma cláusula contratual permitir duas interpretações diferentes, prevalecerá
a que possa produzir algum efeito, pois não se deve presumir que os
contratantes tenham celebrado um contrato carecedor de qualquer
utilidade. Esse princípio informa a denominada conversão substancial do
negócio jurídico. Assim, por exemplo, se as partes celebraram um contrato de
compra e venda de imóvel sem atenção às formalidades exigidas por lei, pode-
se considerar o negócio como uma promessa de compra e venda, que não
exige forma solene, a fim de se aproveitar a vontade das partes, conforme
Artigo 170 do CC.

Questão 3 - D
Justificativa: Apesar do conhecimento pacífico e da aceitação da revisão
contratual por fato superveniente, infelizmente, poucos casos vêm sendo
enquadrados como imprevisíveis por nossos Tribunais, realidade que se
esperava mudar com o advento do Código Civil de 2002. Isso porque a
jurisprudência nacional sempre considerou o fato imprevisto tendo
como parâmetro o mercado, o meio que envolve o contrato, não a
parte contratante. A partir dessa análise, em termos econômicos, na
sociedade pós-moderna globalizada, nada é imprevisto, tudo se tornou

TÓPICOS ESPECIAIS DE OBRIGAÇÕES E CONTRATOS 156


previsível. Não seriam imprevisíveis a escala inflacionária, o aumento do dólar
ou o desemprego, não sendo possível a revisão contratual motivada por tais
ocorrências (Flávio Tartuce).

Questão 4 - A
Justificativa: Conforme Artigos 107, 109, 135 e 187 do CC.

Questão 5 - E
Justificativa: Conforme Artigo 479 do CC.

Questão 6 - A
Justificativa: Diante da execução forçada nas obrigações de dar coisa certa,
quando o devedor recebia o preço e se recusava a entregar a coisa, o credor
não podia expropriá-la de seu patrimônio, resolvendo-se o litígio em perdas e
danos (Artigo 389 do CC). Assim, a obrigação não acarreta direito real (sobre a
coisa), mas apenas direito obrigacional (sobre a conduta).

Questão 7 - C
Justificativa: Atualmente, nas obrigações de fazer, não fazer e entregar coisa,
admite-se a execução forçada, sob pena do pagamento de astreintes, com base
nos Artigos 461, parágrafo 5º, e 461-A do CPC.

Questão 8 - B
Justificativa: As assertivas 1, 2, 3 e 4 estão corretas, conforme Artigo 410 do
CC.

Questão 9 - B
Justificativa: Enunciado 180 da III Jornada de Direito Civil do CJF/STJ: “A regra
do parágrafo único do Artigo 575 do novo CC, que autoriza a limitação pelo juiz
do aluguel-pena arbitrado pelo locador, aplica-se também ao aluguel arbitrado
pelo comodante, autorizado pelo Artigo 582, 2ª parte, do novo CC”.

TÓPICOS ESPECIAIS DE OBRIGAÇÕES E CONTRATOS 157


Questão 10 - D
Justificativa: Conforme Súmula 239 do STJ.

TÓPICOS ESPECIAIS DE OBRIGAÇÕES E CONTRATOS 158


Introdução
Como exposto em linhas anteriores, os direitos patrimoniais vem cedendo em
detrimento dos direitos de personalidade, fazendo com que o negócio jurídico
não possa comprometer o patrimônio mínimo do ser humano.

Dessa forma, a mitigação da autonomia privada como efeito da aplicação da


função social do contrato e da boa-fé objetiva tornou-se a regra, não podendo
o contrato invadir determinadas áreas da esfera íntima humana.

Esse é o assunto que você estudará durante esta aula.

Bons estudos!

Objetivo:
1. Analisar a tutela das relações existenciais nos contratos, a fim de se
preservar o patrimônio mínimo dos contratantes;
2. Analisar a tutela das relações existenciais no direito obrigacional.

TÓPICOS ESPECIAIS DE OBRIGAÇÕES E CONTRATOS 159


Conteúdo
Conceito de contrato
Como exposto em linhas anteriores, os direitos patrimoniais vem cedendo em
detrimento dos direitos de personalidade, fazendo com que o negócio jurídico
não possa comprometer o patrimônio mínimo do ser humano.

Nesse contexto, os direitos fundamentais sociais, dispostos


constitucionalmente, possuem eficácia imediata perante as relações entre
particulares.

A jurisprudência tem se ocupado em traçar o contorno jurídico da mencionada


aplicação, estruturando uma alteração valorativa na autonomia privada
contratual.

Na jurisprudência brasileira, o direito à saúde e o direito à moradia


constituem parâmetros valorativos para interpretação e aplicação das normas
de direito privado.

O direito à saúde é utilizado pelos tribunais brasileiros como parâmetro


interpretativo que determina a abusividade de cláusulas contratuais.

Pelo direito fundamental à habitação, é possível conferir validade aos


contratos de gaveta pactuados no Sistema Financeiro da Habitação.

Avance e acompanhe exemplos em que o direito à moradia é utilizado.

Direito à moradia
Algumas decisões determinam a eficácia imediata de um dado direito
fundamental social perante particulares. Constitui exemplo a impenhorabilidade
do bem de família do fiador em contrato de locação.

TÓPICOS ESPECIAIS DE OBRIGAÇÕES E CONTRATOS 160


De acordo com Flávio Tartuce, apesar de o STF entender pela penhorabilidade
do bem de família do fiador, existe posição minoritária que enxerga tal regra
como inconstitucional, por violar a isonomia (Artigo 5º, caput, CRFB) e a
proteção da dignidade humana (Artigo 1º, III, CRFB).

TJRJ - DES. MARIO ASSIS GONCALVES - Julgamento: 09/05/2012 - TERCEIRA


CAMARA CIVEL. Embargos à execução. Fiador. Bem de família. Penhorabilidade.
Constitucionalidade reconhecida pelo STF. O inciso VII do artigo 3º, da Lei
8.009/90 afasta a impenhorabilidade do bem de família na hipótese de
execução de obrigação decorrente de fiança concedida em contrato de locação.
Assim, o imóvel apontado pelo exequente, ainda que seja o único, pode ser
objeto da execução. A constitucionalidade do referido dispositivo legal foi
declarada pelo Supremo Tribunal Federal em julgamento de Recurso
Extraordinário no qual se reconheceu a existência de repercussão geral. A
matéria é, inclusive, objeto do verbete sumular nº. 63 deste Tribunal. Desta
forma, legítima a penhora realizada sobre o bem de propriedade da fiadora. Por
fim cumpre destacar que a fiança é uma obrigação de garantia. Nesse tipo de
obrigação, aquilo a que se obriga o fiador é pagar a obrigação se o devedor
não o fizer. A fiança é outra relação jurídica da qual o devedor não faz parte e
que se estabelece entre o credor e o fiador, são duas relações jurídicas
distintas. Há uma relação jurídica principal que se estabelece entre credor e o
devedor e há outra relação jurídica acessória que se estabelece entre o credor e
o fiador. Da principal o fiador não é parte, assim como da acessória é o devedor
que não é parte. Desta forma, quitado o débito pelo fiador este se sub-roga nos
direitos do locador, podendo executar a dívida em virtude do direito de
regresso. Recurso ao qual se dá provimento.

Para Flávio Tartuce, constituem fundamentos da mencionada corrente:

Primeiro, porque o devedor principal (locatário) não pode ter o seu bem de
família penhorado, enquanto o fiador (em regra devedor subsidiário – Artigo
827, CC) pode suportar a constrição. A lesão à isonomia reside no fato de a

TÓPICOS ESPECIAIS DE OBRIGAÇÕES E CONTRATOS 161


fiança ser um contrato acessório, que não pode trazer mais obrigações do que
o contrato principal (locação). Em reforço, haveria desrespeito à proteção
constitucional da moradia (Artigo 6º da CF/1988), uma das exteriorizações do
princípio de proteção da dignidade da pessoa humana (Artigo 1º, III, do Texto
Maior).

Vejamos mais alguns exemplos de utilização do direito fundamental à moradia


em relações contratuais.

Em trabalho doutrinário que escrevi ‘Dos Direitos Sociais na Constituição do


Brasil’, texto básico de palestra que proferi na Universidade de Carlos III, em
Madri, Espanha, no Congresso Internacional de Direito do Trabalho, sob o
patrocínio da Universidade Carlos III e da ANAMATRA, em 10.03.2003, registrei
que o direito à moradia, estabelecido no art. 6.º, CF, é um direito fundamental
de 2ª geração – direito social que veio a ser reconhecido pela EC 26, de 2000.

O bem de família – a moradia do homem e sua família – justifica a existência


de sua impenhorabilidade: Lei 8.009/90, art. 1º. Essa impenhorabilidade
decorre de constituir a moradia um direito fundamental.

Posto isso, veja-se a contradição: a Lei 8.009, de 1990, excepcionando o bem


de família do fiador, sujeitou o seu imóvel residencial, imóvel residencial próprio
do casal, ou da entidade familiar, à penhora. Não há dúvida que ressalva
trazida pela Lei 8.009, de 1990, inciso VII do art. 3º feriu de morte o princípio
isonômico, tratando desigualmente situações iguais, esquecendo-se do velho
brocardo latino: ubi eadem ratio, ibi eadem legis dispositio, ou em vernáculo:
onde existe a mesma razão fundamental, prevalece a mesma regra de Direito.
Isto quer dizer que, tendo em vista o princípio isonômico, o citado dispositivo
inciso VII do art. 3.º, acrescentado pela Lei 8.245/91, não foi recebido pela EC
26, de 2000 (STF, RE 352940/SP, rel. Min. Carlos Velloso, j. 25.04.2005).

TÓPICOS ESPECIAIS DE OBRIGAÇÕES E CONTRATOS 162


IMPENHORABILIDADE. BEM DE FAMÍLIA. BOA-FÉ. Três famílias de baixa renda
viviam juntas em uma pequena casa de madeira construída em terreno de sua
propriedade. Sucede que aceitaram permutá-lo por dois apartamentos a serem
edificados por uma empresa construtora, que deu em garantia do negócio
(formalizado em cartório) o imóvel em que morava a família do proprietário da
firma, sabidamente protegido pela Lei n. 8.099/1990. Desalojados, esperaram
em vão pela construção e, por onze anos, pelejaram em juízo, até que, às
vésperas da praça, houve a alegação de o imóvel dado em garantia ser bem de
família. Isso posto, a Turma não conheceu do especial, ao acompanhar o
entendimento do Min. Relator de que, nessa peculiar hipótese, a
impenhorabilidade do bem de família há que ser tratada com temperamentos,
cedendo frente ao princípio da boa-fé. O Min. Relator anotou, também, não se
cuidar aqui do hipossuficiente que, impensadamente, dá seu bem impenhorável
em garantia de negócio (hipótese albergada pela jurisprudência), mas sim de
parte que tinha consciência do que estava fazendo. O Min. Carlos Alberto
Menezes Direito, por sua vez, aduziu, em apertada suma, que, diante desse
específico cenário, é possível entrever a renúncia à impenhorabilidade,
renegada pelos Tribunais, mas incidente ao caso pela peculiaridade da
hipótese, e ao final, está-se, justamente, a proteger o bem de família daqueles
que foram lesados. Resp 554.622/RS, Rel. Min. Ari Pargendler, julgado em
17/11/2005.

SISTEMA FINANCEIRO HABITACIONAL E PROCESSUAL CIVIL. EXECUÇÃO


EXTRAJUDICIAL. SITUAÇÃO. ANTECIPAÇÃO DE TUTELA. IMÓVEL
HIPOTECADO. LITÍGIO ACERCA DO DÉBITO. DIREITO À MORADIA.
PROTEÇÃO. DIGNIDADE HUMANA. INTERESSE PREVALENTE. A pendência de
litígio acerca do débito de mútuo hipotecário torna controvertida a liquidez da
dívida e a mora, conferindo verossimilhança ao alegado direito à sustação da
execução extrajudicial, para proteção da moradia, indispensável à
operacionalização da garantia constitucional à dignidade da vida humana, que
se sobrepõe a direitos meramente patrimoniais. (RIO GRANDE DO SUL.

TÓPICOS ESPECIAIS DE OBRIGAÇÕES E CONTRATOS 163


Tribunal de Justiça do Rio Grande do Sul. Agravo de Instumento nº
70003299401, rel. Des. Mara Larsen Chechi, j. 28.11.2001).

Direito à saúde
Segundo Rosalice Fidalgo Pinheiro, é pertinente concordar com a incidência
direta dos direitos fundamentais sociais nas relações privadas, o que tem o
condão de delegar aos particulares a prestação de serviços básicos que
incumbem ao Estado, como, por exemplo, a saúde e a educação.
Não obstante a oposição de parcela da doutrina à eficácia direta daqueles
direitos em sua dimensão prestacional, essa oposição não vem sendo aceita
pela jurisprudência.

Com isso, o direito fundamental à saúde impõe às operadoras de plano de


saúde dar cobertura contratual aos gastos médico-hospitalares realizados por
seus usuários, como se conclui da jurisprudência.

Plano de saúde – direito fundamental à saúde

O particular que presta uma atividade econômica correlacionada com serviços


médicos e de saúde possui os mesmos deveres do Estado, ou seja, prestar
assistência média integral aos consumidores dos seus serviços, entendimento
esse que não se sustenta somente no texto constitucional ou no Código de
Defesa do Consumidor – CDC (Lei nº 8.078/90), mas, principalmente, na lei de
mercado (“quanto maior o lucro, maior também é o risco”) (MINAS GERAIS.
Tribunal de Alçada de Minas Gerais. Ap. Cív. nº 264.003-9, rel. Juíza Maria Elza,
j. 10.02.99. In: JURISPRUDÊNCIA BRASILEIRA. Cível e comércio. Planos de
Saúde, 193. Curitiba: Juruá, 2002, p. 117.)

Entra em jogo o direito fundamental à proteção do consumidor,


constitucionalmente garantido, delineando a imediata incidência dos direitos
fundamentais sociais, em sua dimensão prestacional, entre particulares. Veja
uma decisão judicial relacionada a esse assunto.

TÓPICOS ESPECIAIS DE OBRIGAÇÕES E CONTRATOS 164


Plano de saúde – direito do consumidor

“DIREITO CIVIL E DO CONSUMIDOR. PLANO DE SAÚDE. LIMITAÇÃO


TEMPORAL DE INTERNAÇÃO. CLÁUSULA ABUSIVA. CÓDIGO DE
DEFESA DO CONSUMIDOR, Artigo 51, IV. UNIFORMIZAÇÃO
INTERPRETATIVA. PREQUESTIONAMENTO IMPLÍCITO. RECURSO
CONHECIDO E PROVIDO. É abusiva, nos termos da lei (CDC, Artigo 51, IV),
a cláusula prevista em contrato de seguro-saúde que limita o tempo de
internação do segurado. Tem-se por abusiva a cláusula, no caso, notadamente
em face da impossibilidade de previsão do tempo de cura, da irrazoabilidade da
suspensão do tratamento indispensável, da vedação de restringir-se em
contrato direitos fundamentais e da regra de sobredireito, contida no Artigo 5º
da Lei de Introdução ao Código Civil, segundo a qual, na aplicação da lei, o juiz
deve atender aos fins sociais a que ela se dirige e às exigências do bem comum
(BRASIL. Superior Tribunal de Justiça. Recurso Especial nº 251.024/SP. Ministro
Relator Sálvio de Figueiredo Teixeira. Julgado em 27 de setembro de 2000).”

Direito fundamental - entrega de diploma


Outro exemplo de imediata incidência dos direitos fundamentais sociais, em sua
dimensão prestacional, entre particulares, constitui a obrigação de entregar o
diploma pelas prestadoras de serviços educacionais, mesmo que o aluno esteja
inadimplente.

Tutela jurisdicional
O inadimplemento das obrigações relacionadas aos direitos de
personalidade são passíveis de tutela jurisdicional, cabendo o
ressarcimento civil, ante o seu descumprimento.
Assim, no intuito de materializar compromissos constitucionais, a jurisprudência
possui papel destacado, seja no reconhecimento, como na tutela desses
direitos.

TÓPICOS ESPECIAIS DE OBRIGAÇÕES E CONTRATOS 165


Qual é a dívida do inadimplente?
Importante lembrar que o ressarcimento faz com que o devedor da prestação
passe a responder pelo valor correspondente ao objeto obrigacional, acrescido
das demais perdas e danos, mais juros compensatórios, cláusula penal (se
houver), atualização monetária, custas e honorários de advogado. Essa é a
regra do Artigo 389 do CC, que trata da responsabilidade civil contratual.

O que são perdas e danos?


Vale dizer que dentro da concepção civil-constitucional, tratando-se de
responsabilidade civil contratual, deve-se entender que a expressão “perdas e
danos” inclui os danos materiais (danos emergentes e lucros cessantes, nos
termos dos Artigos 402 a 404 do CC), bem como danos morais (Artigo 5º, V e
X, da CF).

O que será reparado?


Somente serão reparados os prejuízos diretos e imediatos, decorrentes do
inadimplemento, mesmo diante de conduta dolosa do devedor (Artigo 403 do
CC).

Apesar de os tribunais ainda não reconhecerem de forma unânime a existência


de cláusula geral de proteção da personalidade humana implícita
constitucionalmente e também não haver teoria acerca dos direitos de
personalidade no Brasil, alguns direitos especiais de personalidade vêm sendo
efetivados de forma satisfatória.

Abandono afetivo
Tem-se como exemplo de reconhecimento do direito da personalidade
relacionado ao direito obrigacional considerar o desrespeito ao afeto nas
relações familiares acarretar dano efetivo à pessoa humana.

Um pai que não dedica afeto ao seu filho, mesmo cumprindo compromissos de
assistência material, omite-se, ao menos, no plano de moral (para aqueles que

TÓPICOS ESPECIAIS DE OBRIGAÇÕES E CONTRATOS 166


entendem que o afeto não constitui verdadeiro valor constitucional), passível de
reparação de caráter patrimonial.

A partir dessa premissa, subsistem lacunas no ordenamento jurídico quanto a


esse aspecto.

Decorre daí a dimensão da tarefa da jurisprudência.

Atualmente, percebe-se a mudança conceitual do ato ilícito para o dano


injusto; assim, o dano será considerado injusto quando afetar aspecto
essencial da dignidade humana, mesmo não sendo antijurídico.

Caso a vítima, ponderados os interesses, permanecer não ressarcida, cumpre


aplicar o conceito de dano injusto, em respeito ao princípio basilar da
responsabilidade civil moderna, ou seja, a vítima deverá ser ressarcida.

No Recurso Especial no 1.159.242 de São Paulo, julgado em 24 de abril


de 2012, o Superior Tribunal de Justiça, na relatoria da ministra Nancy
Andrighi, entendeu que o abandono afetivo é passível de reparação,
caracterizando verdadeiro dano moralin re ipsa à vítima.

Assim, o dano moral quando se afigura inequívoco, decorrente do próprio fato,


in re ipsa, sendo de todo presumíveis a frustração e a angústia suportadas pelo
ofendido.

Relativamente à verba a ser fixada, é de se dizer que o valor deve se mostrar


razoável e proporcional ao dano sofrido pela vítima, levando-se em conta o
caráter punitivo-pedagógico da condenação sem permitir que a ela gere
enriquecimento indevido.

TÓPICOS ESPECIAIS DE OBRIGAÇÕES E CONTRATOS 167


Abandono afetivo - STJ
Em síntese, o STJ reconheceu que o valor afeto é fundamental na
relação entre pais e filhos e o abandono afetivo, decorrente da
omissão paterna ao dever de cuidar, constitui elemento suficiente
para caracterizar dano moral compensável.

Segundo o tribunal, não há restrições no ordenamento jurídico pátrio à


aplicação de regras relativas à responsabilidade civil e ao consequente dever de
indenizar no direito de família, eis que o dever de cuidado encontra respaldo na
unidade constitucional brasileira.

É importante destacar que, tanto pela concepção, quanto mediante a adoção,


os pais assumem obrigações jurídicas que ultrapassam o básico em relação aos
filhos, pois o indivíduo necessita de outros elementos imateriais, oriundos do
valor afeto.

Andrighy ressaltou que não há como se discutir o amar, que é uma faculdade,
mas sim a imposição biológica e constitucional de cuidar, que é dever jurídico,
corolário da liberdade das pessoas em gerar ou adotar filhos.

DANOS MORAIS. ABANDONO AFETIVO. DEVER DE CUIDADO. O abandono afetivo


decorrente da omissão do genitor no dever de cuidar da prole constitui
elemento suficiente para caracterizar dano moral compensável. Isso porque o
non facere que atinge um bem juridicamente tutelado, no caso, o necessário
dever de cuidado (dever de criação, educação e companhia), importa em
vulneração da imposição legal, gerando a possibilidade de pleitear
compensação por danos morais por abandono afetivo. Consignou-se que não há
restrições legais à aplicação das regras relativas à responsabilidade civil e ao
consequente dever de indenizar no Direito de Família e que o cuidado como
valor jurídico objetivo está incorporado no ordenamento pátrio não com essa
expressão, mas com locuções e termos que manifestam suas diversas
concepções, como se vê no art. 227 da CF. O descumprimento comprovado da

TÓPICOS ESPECIAIS DE OBRIGAÇÕES E CONTRATOS 168


imposição legal de cuidar da prole acarreta o reconhecimento da ocorrência de
ilicitude civil sob a forma de omissão. É que, tanto pela concepção quanto pela
adoção, os pais assumem obrigações jurídicas em relação à sua prole que
ultrapassam aquelas chamadas necessarium vitae. É consabido que, além do
básico para a sua manutenção (alimento, abrigo e saúde), o ser humano
precisa de outros elementos imateriais, igualmente necessários para a formação
adequada (educação, lazer, regras de conduta etc.). O cuidado, vislumbrado
em suas diversas manifestações psicológicas, é um fator indispensável à criação
e à formação de um adulto que tenha integridade física e psicológica, capaz de
conviver em sociedade, respeitando seus limites, buscando seus direitos,
exercendo plenamente sua cidadania. A Min. Relatora salientou que, na
hipótese, não se discute o amar – que é uma faculdade – mas sim a imposição
biológica e constitucional de cuidar, que é dever jurídico, corolário da liberdade
das pessoas de gerar ou adotar filhos. Ressaltou que os sentimentos de mágoa
e tristeza causados pela negligência paterna e o tratamento como filha de
segunda classe, que a recorrida levará ad perpetuam, é perfeitamente
apreensível e exsurgem das omissões do pai (recorrente) no exercício de seu
dever de cuidado em relação à filha e também de suas ações que privilegiaram
parte de sua prole em detrimento dela, caracterizando o dano in re ipsa e
traduzindo-se, assim, em causa eficiente à compensação. Com essas e outras
considerações, a Turma, ao prosseguir o julgamento, por maioria, deu parcial
provimento ao recurso apenas para reduzir o valor da compensação por danos
morais de R$ 415 mil para R$ 200 mil, corrigido desde a data do julgamento
realizado pelo tribunal de origem. Resp 1.159.242-SP, Rel. Min. Nancy Andrighi,
julgado em 24/4/2012.

Atividade proposta
Vamos fazer uma atividade relacionada ao tema estudado? Leia com atenção!
De acordo com Rodrigo da Cunha Pereira, a condenação por abandono afetivo
se justifica da seguinte maneira: “Não se trata, aqui, de uma imposição jurídica
de amar, mas de um imperativo judicial de criação da possibilidade da
construção do afeto, em um relacionamento em que o amor e a afetividade lhe

TÓPICOS ESPECIAIS DE OBRIGAÇÕES E CONTRATOS 169


seriam inerentes. Essa edificação torna-se apenas possível na convivência, na
proximidade, no ato de educar, nos quais é estruturada e instalada a referência
paterna. Em função da expressa negativa deste pai de proporcionar ao filho a
possibilidade da construção mútua da afetividade, violando, por esta razão,
seus direitos de personalidade, é que foi imputado ao pai o pagamento da
indenização por dano moral”. Concorde ou discorde.

Chave de resposta: Há de se concordar, pois não há como se discutir o amar,


que é uma faculdade, mas sim a imposição biológica e constitucional de cuidar,
que é dever jurídico, corolário da liberdade das pessoas em gerar ou adotar
filhos.

Referências
PINHEIRO, Rosalice Fidalgo. O “mínimo existencial” no contrato: desenhando a
autonomia contratual em face dos direitos fundamentais sociais. In: CONSELHO
NACIONAL DE PESQUISA E PÓS-GRADUAÇÃO EM DIREITO. Anais... Salvador.
TARTUCE, Flávio. A penhora do Bem de Família do fiador de locação.
Abordagem atualizada. Revista IOB de Direito Civil e Processual Civil, n.
40, abr. 2006. p. 11-15.

Exercícios de fixação
Questão 1
O devedor principal (locatário) não pode ter o seu bem de família penhorado,
enquanto o fiador (em regra devedor subsidiário – Artigo 827 do CC) pode
suportar a constrição, podendo seu bem de família ser penhorado. Assinale a
alternativa incorreta acerca do presente entendimento:
a) A Lei nº 8.009/90 permite a penhora do único bem de família do fiador
em contratos de locação, conforme Artigo 3º, VII.
b) O Artigo 3º, VII da Lei nº 8.009/90 foi declarado constitucional
incidentalmente pelo STF.
c) Caso o fiador arque com o pagamento da dívida, não terá o direito de se
sub-rogar nos direitos do credor.

TÓPICOS ESPECIAIS DE OBRIGAÇÕES E CONTRATOS 170


d) O fiador poderá renunciar ao benefício de ordem nos contratos de
locação.

Questão 2
De acordo com a corrente minoritária, a penhorabilidade do bem de família do
fiador viola a isonomia, a proteção constitucional à moradia e a dignidade da
pessoa humana. Assinale a alternativa incorreta acerca do presente
entendimento:
a) A lesão à isonomia reside no fato de a fiança ser um contrato acessório,
que não pode trazer mais obrigações do que o contrato principal
(locação).
b) Ocorre desrespeito à proteção constitucional da moradia (Artigo 6º da
CF/1988).
c) Ocorre desrespeito à proteção constitucional da moradia (Artigo 6º da
CF/1988), uma das exteriorizações do princípio de proteção da dignidade
da pessoa humana (Artigo 1º, III, do Texto Maior).
d) Ocorre desrespeito à proteção constitucional da moradia (Artigo 6º da
CF/1988), que não configura uma das exteriorizações do princípio de
proteção da dignidade da pessoa humana (Artigo 1º, III, do Texto
Maior).

Questão 3
Segundo Rosalice Fidalgo Pinheiro, é pertinente concordar com a incidência
direta dos direitos fundamentais sociais nas relações privadas, o que tem o
condão de delegar aos particulares a prestação de serviços básicos que
incumbem ao Estado, como, por exemplo, a saúde e a educação. Tal
entendimento materializa o seguinte instituto jurídico:
a) Eficácia horizontal dos direitos fundamentais
b) Eficácia vertical dos direitos fundamentais
c) Diálogo das fontes
d) Pacta sunt servanda

TÓPICOS ESPECIAIS DE OBRIGAÇÕES E CONTRATOS 171


Questão 4
É possível a paralisação da execução de débito contraído junto ao Sistema
Financeiro da Habitação fundamentada no direito à moradia, em contraposição
ao direito de crédito. Assinale a alternativa incorreta acerca do presente
entendimento:
a) A pendência de litígio acerca do débito de mútuo hipotecário torna
controvertida a liquidez da dívida e a mora.
b) A referida pendência de litígio confere verossimilhança ao direito à
sustação da execução extrajudicial.
c) A presente tutela visa proteger a moradia, indispensável à
operacionalização da garantia constitucional à dignidade da vida
humana, que se sobrepõe a direitos meramente patrimoniais.
d) A presente tutela visa proteger a moradia, indispensável à
operacionalização da garantia constitucional à dignidade da vida
humana, que ainda não se sobrepõe totalmente aos direitos meramente
patrimoniais.

Questão 5
O particular que presta uma atividade econômica correlacionada com serviços
médicos e de saúde não possui os mesmos deveres do Estado, segundo a
jurisprudência majoritária. Assinale a alternativa incorreta acerca do presente
entendimento:
a) O particular que presta uma atividade econômica correlacionada com
serviços médicos e de saúde possui os mesmos deveres do Estado, ou
seja, prestar assistência médica integral aos consumidores dos seus
serviços.
b) Tal entendimento não se sustenta somente no texto constitucional, mas,
principalmente, na lei de mercado (“quanto maior o lucro, maior também
é o risco)”.
c) Tal entendimento se sustenta somente no texto constitucional.
d) Tal entendimento se sustenta no Código de Defesa do Consumidor –
CDC (Lei nº 8.078/90).

TÓPICOS ESPECIAIS DE OBRIGAÇÕES E CONTRATOS 172


Questão 6
(IADES - 2014 - UFBA - Advogado) Considerando os conceitos de adimplemento
e inadimplemento de uma obrigação, assinale a alternativa correta:
a) Nas obrigações provenientes de ato ilícito, reputa-se o devedor em mora,
desde a citação do réu da ação de ressarcimento.
b) No tocante à cláusula penal, é correto afirmar que, quando estipulada
conjuntamente com a obrigação, ou em ato posterior, só pode referir-se
à execução completa dessa obrigação.
c) O direito do credor a perdas e danos pela imperfeição, no cumprimento
da obrigação, exclui os juros legais não estipulados no contrato.
d) O devedor pode responder pelos prejuízos resultantes de caso fortuito ou
força maior, desde que, expressamente, tenha por eles se
responsabilizado.
e) Incorre na cláusula penal, se provados dolo e prejuízo, qualquer devedor
que deixe de cumprir a obrigação ou se constitua em mora.

Questão 7
(Concurso para Juiz de Direito Substituto do Estado de Minas Gerais/2007) Uma
vez não cumprida a obrigação e constituído em mora o devedor, esse responde
por perdas e danos. As perdas e danos devidos ao credor abrangem lucros
cessantes:
a) À expectativa de lucro do credor
b) Ao prejuízo do credor potencialmente estimável
c) Ao prejuízo por efeito direto e imediato da inexecução da obrigação
d) A qualquer dano eventualmente aferível a partir da mora do devedor

Questão 8
Analise a jurisprudência abaixo e aponte a modalidade de dano moral acolhida:
“AGRAVO REGIMENTAL. AÇÃO DE INDENIZAÇÃO. DANOS MORAIS. INCLUSÃO
INDEVIDA NA SERASA. PROVA DO DANO. DESNECESSIDADE. QUANTUM
INDENIZATÓRIO. RAZOABILIDADE. SÚMULA Nº 7/STJ. I - Nas ações de

TÓPICOS ESPECIAIS DE OBRIGAÇÕES E CONTRATOS 173


indenização em decorrência da inscrição indevida nos órgãos de
proteção ao crédito, o dano moral se considera comprovado pela
simples demonstração de que houve o apontamento. II - É possível a
intervenção desta Corte para reduzir ou aumentar o valor indenizatório por
dano moral apenas nos casos em que o quantum arbitrado pelo Acórdão
recorrido se mostrar irrisório ou exorbitante, situação que não se faz presente
no caso concreto. Agravo improvido. (Superior Tribunal de Justiça STJ; AgRg-
Ag 1.101.393; Proc. 2008/0219329-7; MG; Terceira Turma; Rel. Min. Sidnei
Beneti; Julg. 17/12/2009; DJE 10/02/2010)”.
a) Dano moral simples
b) Dano moral que deve ser comprovado judicialmente
c) Dano moral não presumido
d) Dano moral in re ipsa

Questão 9
O STJ, diante da responsabilidade pelo abandono afetivo, ressaltou que não há
como se discutir o amar, que é uma faculdade, mas sim a imposição biológica e
constitucional de cuidar, que é dever jurídico. Assinale a alternativa incorreta
acerca do entendimento colacionado:
a) Tal entendimento materializa a dignidade da pessoa humana nas
relações privadas.
b) Tanto pela concepção, quanto mediante a adoção, os pais assumem
obrigações jurídicas que ultrapassam o básico em relação aos filhos.
c) O indivíduo necessita de outros elementos imateriais, oriundos do valor
afeto.
d) O presente entendimento é dever jurídico, não corolário da liberdade das
pessoas em gerar ou adotar filhos.

Questão 10
A expressão “perdas e danos” inclui:
a) Os danos emergentes e os danos morais

TÓPICOS ESPECIAIS DE OBRIGAÇÕES E CONTRATOS 174


b) Os danos materiais, compostos pelos lucros cessantes e pelos danos
emergentes, além dos danos morais
c) Os lucros cessantes e os danos emergentes
d) Os danos morais apenas

Aula 7
Exercícios de fixação
Questão 1 - C
Justificativa: Conforme Artigo 831 do CC.

Questão 2 - D
Justificativa: A lesão à isonomia reside no fato de a fiança ser um contrato
acessório, que não pode trazer mais obrigações do que o contrato principal
(locação). Em reforço, haveria desrespeito à proteção constitucional da moradia
(Artigo 6º da CF/1988), uma das exteriorizações do princípio de proteção da
dignidade da pessoa humana (Artigo 1º, III, do Texto Maior).

Questão 3 - A
Justificativa: Segundo Rosalice Fidalgo Pinheiro, é pertinente concordar com a
incidência direta dos direitos fundamentais sociais nas relações privadas, o que
tem o condão de delegar aos particulares a prestação de serviços básicos, que
incumbem ao Estado, como, por exemplo, a saúde e a educação. Não obstante
a oposição de parcela da doutrina à eficácia direta daqueles direitos em sua
dimensão prestacional, essa oposição não vem sendo aceita pela
jurisprudência.

Questão 4 - D
Justificativa: “SISTEMA FINANCEIRO HABITACIONAL E PROCESSUAL CIVIL.
EXECUÇÃO EXTRAJUDICIAL. SITUAÇÃO. ANTECIPAÇÃO DE TUTELA. IMÓVEL
HIPOTECADO. LITÍGIO ACERCA DO DÉBITO. DIREITO À MORADIA.

TÓPICOS ESPECIAIS DE OBRIGAÇÕES E CONTRATOS 175


PROTEÇÃO. DIGNIDADE HUMANA. INTERESSE PREVALENTE. A pendência de
litígio acerca do débito de mútuo hipotecário torna controvertida a liquidez da
dívida e a mora, conferindo verossimilhança ao alegado direito à sustação da
execução extrajudicial, para proteção da moradia, indispensável à
operacionalização da garantia constitucional à dignidade da vida humana, que
se sobrepõe a direitos meramente patrimoniais. (RIO GRANDE DO SUL.
Tribunal de Justiça do Rio Grande do Sul. Agravo de Instumento nº
70003299401, rel. Des. Mara Larsen Chechi, j. 28.11.2001)”.

Questão 5 - C
Justificativa: O particular que presta uma atividade econômica correlacionada
com serviços médicos e de saúde possui os mesmos deveres do Estado, ou
seja, prestar assistência médica integral aos consumidores de seus serviços,
entendimento esse que não se sustenta somente no texto constitucional ou no
Código de Defesa do Consumidor – CDC (Lei nº 8.078/90), mas,
principalmente, na lei de mercado (“quanto maior o lucro, maior também é o
risco”) (MINAS GERAIS. Tribunal de Alçada de Minas Gerais. Ap. Cív. nº
264.003-9, rel. Juíza Maria Elza, j. 10.02.99. In: JURISPRUDÊNCIA BRASILEIRA.
Cível e comércio. Planos de Saúde, 193. Curitiba: Juruá, 2002, p. 117).

Questão 6 - D
Justificativa: Conforme Artigo 393 do CC.

Questão 7 - C
Justificativa: A resposta se encontra no Artigo 403 do CC, que assim dispõe:
“Ainda que a inexecução resulte de dolo do devedor, as perdas e danos só
incluem os prejuízos efetivos e os lucros cessantes por efeito dela direto e
imediato, sem prejuízo do disposto na lei processual”.

Questão 8 - D
Justificativa: O dano moral in re ipsa é o dano moral presumido.

TÓPICOS ESPECIAIS DE OBRIGAÇÕES E CONTRATOS 176


Questão 9 - D
Justificativa: É importante destacar que, tanto pela concepção, quanto
mediante a adoção, os pais assumem obrigações jurídicas que ultrapassam o
básico em relação aos filhos, pois o indivíduo necessita de outros elementos
imateriais, oriundos do valor afeto. Andrighy ressaltou que não há como se
discutir o amar, que é uma faculdade, mas sim a imposição biológica e
constitucional de cuidar, que é dever jurídico, corolário da liberdade das
pessoas em gerar ou adotar filhos.

Questão 10 - B
Justificativa: A expressão “perdas e danos” inclui os danos materiais (danos
emergentes e lucros cessantes, nos termos dos Artigos 402 a 404 do CC), bem
como danos morais (Artigo 5º, V e X, da CF).

TÓPICOS ESPECIAIS DE OBRIGAÇÕES E CONTRATOS 177


Introdução
Contrato de consumo é aquele em que alguém, um profissional, fornece um
produto ou presta um serviço a um destinatário final, denominado consumidor,
mediante remuneração direta ou vantagens indiretas.

O Código de Defesa do Consumidor é um dos diplomas que mais representa a


constitucionalização do direito civil, como decorrência da proteção do
hipossuficiente da relação de consumo. Assim, convém analisar o contrato de
adesão consumerista, bem como a possibilidade de revisão judicial desses
contratos, a partir da declaração de nulidade das cláusulas tidas como abusivas.
Esse é o tema que veremos em nossa última aula.
Bons estudos!

Objetivo:
1. Analisar o contrato de adesão consumerista;
2. Analisar a revisão judicial dos contratos de consumo, em decorrência da
abusividade de suas cláusulas.

TÓPICOS ESPECIAIS DE OBRIGAÇÕES E CONTRATOS 178


Conteúdo
Conceito e classificação do contrato
A partir do conhecimento apropriado em todas as aulas, é possível estabelecer
um conceito para o contrato.

Assim, para a melhor doutrina, o contrato está situado na esfera dos direitos
pessoais, constituindo negócio jurídico bilateral e fonte principal do direito
obrigacional pelo qual as partes procuram regular direitos patrimoniais com
objetivos especificados pela vontade e pela composição de seus interesses.

Diante da classificação dos contratos, de maneira elementar, é possível


estabelecer diferença entre o contrato de adesão, o contrato paritário e o
contrato de consumo.

Contrato de adesão: é entendido como aquele em que uma parte, o


estipulante, impõe o conteúdo negocial, restando à outra parte, o aderente,
duas opções: aceitar ou não o conteúdo desse negócio (Artigos 423 e 424 do
CC e 54 do CDC).

Contrato paritário: decorre da livre manifestação de vontade de todos os


contratantes, que participam da confecção de suas cláusulas.

Importante observar que o contrato de consumo não se confunde com o


contrato de adesão, apesar de que na maioria das negociações consumeristas o
pacto assuma a forma de aderência do consumidor ao conjunto imposto pelo
fornecedor.

Contrato de consumo: tecnicamente, é aquele em que alguém, um


profissional, fornece um produto ou presta um serviço a um destinatário final,
denominado consumidor, mediante remuneração direta ou vantagens indiretas.

TÓPICOS ESPECIAIS DE OBRIGAÇÕES E CONTRATOS 179


De acordo com o STJ, será de adesão o contrato de consumo, quando não
houver ingerência do consumidor na pactuação de suas cláusulas:

“Contrato de adesão é aquele cujo conteúdo não pode ser substancialmente


modificado pelo consumidor (Artigo 54 do CDC), em cujo rol se inclui o contrato
de compra e venda de apartamento, salvo se, v.g., comprovada ou a
modificação da planta padrão ou a redução significativa do preço ou o
respectivo parcelamento em condições não oferecidas aos demais adquirentes
de unidades no empreendimento (STJ, Resp. 59870, DJU 07.02.2000, p. 149,
Rel. Min. Ari Pargendler, j. 16.11.1998, 3ª T.).”

Contrato de adesão
Vamos tratar da regra do contrato de adesão na esfera do direito do
consumidor, assim, convém a transcrição do Artigo 54 do CDC:

“Contrato de adesão é aquele cujas cláusulas tenham sido aprovadas


pela autoridade competente ou estabelecidas unilateralmente pelo
fornecedor de produtos ou serviços, sem que o consumidor possa
discutir ou modificar substancialmente seu conteúdo.

§ 1º A inserção de cláusula no formulário não desfigura a natureza de adesão


do contrato.

§ 2º Nos contratos de adesão admite-se cláusula resolutória, desde que a


alternativa, cabendo a escolha ao consumidor, ressalvando-se o disposto no §
2º do artigo anterior.

§ 3º Os contratos de adesão escritos serão redigidos em termos claros e com


caracteres ostensivos e legíveis, cujo tamanho da fonte não será inferior ao
corpo doze, de modo a facilitar sua compreensão pelo consumidor. (Redação
dada pela nº 11.785, de 2008).

TÓPICOS ESPECIAIS DE OBRIGAÇÕES E CONTRATOS 180


§ 4º As cláusulas que implicarem limitação de direito do consumidor deverão
ser redigidas com destaque, permitindo sua imediata e fácil compreensão.”

Analisando o parágrafo 1º do mencionado artigo, é possível a inserção de


cláusula no contrato de adesão pelo consumidor, mesmo que
posteriormente, o que não desnatura a sua classificação.

Artigo 54 do CDC – parágrafo 2º


Vamos entender o segundo parágrafo? Relembre o que ele define:

“§ 2° Nos contratos de adesão admite-se cláusula resolutória, desde que a


alternativa, cabendo a escolha ao consumidor, ressalvando-se o disposto no §
2° do artigo anterior.”

Analisando o parágrafo 2º do mencionado artigo, é possível a inserção de


cláusula resolutória, desde que haja a concordância do consumidor. Dessa
forma, se o consumidor optar pela extinção do contrato, deverá ele receber de
volta os valores pagos, atualizados monetariamente e descontadas as
vantagens auferidas com a fruição do bem, como determina o parágrafo 2º
do Artigo 53 do CDC.

Parágrafo 2º do Artigo 53 do CDC:


“Nos contratos de compra e venda de móveis ou imóveis mediante pagamento
em prestações, bem como nas alienações fiduciárias em garantia, consideram-
se nulas de pleno direito as cláusulas que estabeleçam a perda total das
prestações pagas em benefício do credor que, em razão do inadimplemento,
pleitear a resolução do contrato e a retomada do produto alienado. § 2º Nos
contratos do sistema de consórcio de produtos duráveis, a compensação ou a
restituição das parcelas quitadas, na forma deste artigo, terá descontada, além
da vantagem econômica auferida com a fruição, os prejuízos que o desistente
ou inadimplente causar ao grupo.”

TÓPICOS ESPECIAIS DE OBRIGAÇÕES E CONTRATOS 181


Se houver cláusula dispondo no sentido da perda de todas as prestações pelo
consumidor, essa deverá ser declarada nula de pleno direito.

É importante a transcrição do Informativo nº 282 do STJ, que ilustra a


necessidade de consentimento do consumidor, diante da pactuação de
cláusula resolutiva, sob pena dessa ser considerada nula. A autora, à época
com mais de oitenta anos de idade, interpôs ação declaratória de nulidade de
cláusula de plano de saúde que estipulava a rescisão unilateral por ambas as
partes. Leia o informativo.

Informativo nº 282 do STJ


“CONTRATO. PLANO. SAÚDE. RESCISÃO UNILATERAL. REEXAME. CLÁUSULA. A
autora, à época com mais de oitenta anos de idade, interpôs ação declaratória
de nulidade de cláusula de plano de saúde que estipulava a rescisão unilateral
por ambas as partes, desde que não houvesse mais interesse na avença. Assim,
a ora recorrente ré rescindiu unilateralmente o contrato após pretender o
aumento de mensalidade, o qual recusou a recorrida autora alegando a falta de
condições para suportar os encargos financeiros. O Tribunal a quo entendeu
que, conforme Artigo 54 do CDC, nos contratos de adesão, só se
admite cláusula resolutória desde que alternativa e, ao consumidor,
cabe a escolha, ressalvada a hipótese do § 2º do Artigo 53, que não se aplica
ao presente caso. Logo, a Turma não conheceu do recurso, pois, para chegar a
outro entendimento, teria que revolver as provas e examinar o contrato, o que
é vedado pelas Súmulas ns. 5 e 7 deste Superior Tribunal. Resp 242.084-SP,
Rel. Min. Aldir Passarinho Junior, julgado em 25/4/2006.”

Artigo 54 do CDC – parágrafo 3º


Analisaremos o terceiro parágrafo.

“§ 3o Os contratos de adesão escritos serão redigidos em termos claros e com


caracteres ostensivos e legíveis, cujo tamanho da fonte não será inferior ao

TÓPICOS ESPECIAIS DE OBRIGAÇÕES E CONTRATOS 182


corpo doze, de modo a facilitar sua compreensão pelo consumidor. (Redação
dada pela nº 11.785, de 2008).“

Analisando o parágrafo 3º do mencionado artigo, torna-se necessário que a


redação do contrato de adesão consumerista seja legível e clara.

O legislador estabeleceu a observância do tamanho da fonte 12 nesses


contratos, a fim de impedir que o fornecedor formule contratos com letras
minúsculas ou ilegíveis, o que dificultava o conhecimento das obrigações por
parte dos consumidores.

Atenção
É importante transcrever as palavras de Leonardo Garcia, quanto
ao diálogo normativo existente entre o Código Civil e o Código
de Defesa do Consumidor:

“A mesma ideia se encontra no Novo Código Civil, em seu artigo


423, o qual estipulou que nos contratos de adesão, quando
houver cláusulas ambíguas ou contraditórias, dever-se-á adotar
a interpretação mais favorável ao aderente.”.

Percebe-se que a aplicação do Código Civil é mais restrita, pois


somente valem para as referidas cláusulas, enquanto o CDC se
aplica em todos os contratos que envolvem os consumidores,
sejam eles de adesão ou individualmente negociados, pouco
importando se as cláusulas são ambíguas ou contraditórias,
inclusive aquelas decorrentes de publicidade, pré-contratos e
informe, em consonância aos princípios da vinculação e da
informação deficiente.

TÓPICOS ESPECIAIS DE OBRIGAÇÕES E CONTRATOS 183


Artigo 54 do CDC – parágrafo 4º
Analisemos o quarto e último parágrafo.

“§ 4° As cláusulas que implicarem limitação de direito do consumidor deverão


ser redigidas com destaque, permitindo sua imediata e fácil compreensão.”

Analisando o parágrafo 4º do mencionado artigo, vê-se que é possível limitar


direitos dos consumidores, desde que a cláusula limitadora esteja em destaque
e não constitua uma limitação considerada abusiva.

Além disso, não basta o destaque da cláusula limitativa, mas também se exige
a sua clareza semântica, uma vez ser o consumidor considerado
hipossuficiente. Havendo divergência interpretativa da cláusula, é cabível
aplicar a disposição do Artigo 47 do CDC: “As cláusulas contratuais serão
interpretadas de maneira mais favorável ao consumidor”.

TÓPICOS ESPECIAIS DE OBRIGAÇÕES E CONTRATOS 184


Atenção
É importante transcrever as palavras de Leonardo Garcia, quanto
ao diálogo normativo existente entre o Código Civil e o Código
de Defesa do Consumidor:

“A mesma ideia se encontra no Novo Código Civil, em seu artigo


423, o qual estipulou que nos contratos de adesão, quando
houver cláusulas ambíguas ou contraditórias, dever-se-á adotar
a interpretação mais favorável ao aderente”.

Percebe-se que a aplicação do Código Civil é mais restrita, pois


somente valem para as referidas cláusulas, enquanto o CDC se
aplica em todos os contratos que envolvem os consumidores,
sejam eles de adesão ou individualmente negociados, pouco
importando se as cláusulas são ambíguas ou contraditórias,
inclusive aquelas decorrentes de publicidade, pré-contratos e
informe, em consonância aos princípios da vinculação e da
informação deficiente.

O STJ possui entendimento de que a cláusula de exclusão de tratamento de


AIDS é nula, por ser abusiva – ademais, sequer foi atendido o requisito do
Artigo 54, parágrafo 4º do CDC, de ser redigida com destaque, de modo a
permitir ao segurado a sua devida compreensão:

“CIVIL E PROCESSUAL. RECURSO ESPECIAL. CONTRATO. PLANO DE SAÚDE.


AIDS. EXCLUSÃO DE COBERTURA. CLÁUSULA POTESTATIVA. PRECEDENTES.
PROVIMENTO. I. É abusiva a cláusula contratual inserta em plano de
assistência à saúde que afasta a cobertura de tratamento da síndrome
de imunodeficiência adquirida (AIDS/SIDA). II. As limitações às
empresas de prestação de serviços de planos e seguros privados de saúde em

TÓPICOS ESPECIAIS DE OBRIGAÇÕES E CONTRATOS 185


benefício do consumidor advindas com a Lei 9.656/98 se aplicam, em princípio,
aos fatos ocorridos a partir de sua vigência, embora o contrato tenha sido
celebrado anteriormente, porquanto cuida-se de ajuste de trato sucessivo.
Precedente. III. Recurso especial provido”.

Atenção
O Código de Defesa do Consumidor permite a limitação de
direitos consumeristas, desde que a cláusula esteja em destaque
e não seja considerada abusiva. É também possível limitar a
indenização do consumidor, nos moldes do Artigo 51, I, do CDC,
desde que o consumidor seja pessoa jurídica e haja uma
situação que justifique, pois nessa negociação resta diminuída a
característica de hipossuficiência de uma das partes.

De outra sorte, não é possível, em hipótese nenhuma, exonerar,


limitar ou atenuar a responsabilidade objetiva do fornecedor de
produtos e serviços, conforme Artigos 25 e 51, I, do CDC
(GARCIA).

Artigo 51 do CDC
Vamos analisar a revisão judicial dos contratos de consumo, em decorrência da
abusividade de suas cláusulas.

De acordo com o Artigo 51 do CDC, tais cláusulas são consideradas abusivas,


por desafiarem revisão judicial por meio da declaração de sua nulidade.

São nulas de pleno direito, entre outras, as cláusulas contratuais relativas ao


fornecimento de produtos e serviços que: I - impossibilitem, exonerem ou
atenuem a responsabilidade do fornecedor por vícios de qualquer natureza dos
produtos e serviços ou impliquem renúncia ou disposição de direitos. Nas
relações de consumo entre o fornecedor e o consumidor pessoa jurídica, a

TÓPICOS ESPECIAIS DE OBRIGAÇÕES E CONTRATOS 186


indenização poderá ser limitada, em situações justificáveis; II - subtraiam ao
consumidor a opção de reembolso da quantia já paga, nos casos previstos
neste código; III - transfiram responsabilidades a terceiros; IV - estabeleçam
obrigações consideradas iníquas, abusivas, que coloquem o consumidor em
desvantagem exagerada, ou sejam incompatíveis com a boa-fé ou a equidade;
V - (Vetado); VI - estabeleçam inversão do ônus da prova em prejuízo do
consumidor; VII - determinem a utilização compulsória de arbitragem; VIII -
imponham representante para concluir ou realizar outro negócio jurídico pelo
consumidor; IX - deixem ao fornecedor a opção de concluir ou não o contrato,
embora obrigando o consumidor; X - permitam ao fornecedor, direta ou
indiretamente, variação do preço de maneira unilateral; XI - autorizem o
fornecedor a cancelar o contrato unilateralmente, sem que igual direito seja
conferido ao consumidor; XII - obriguem o consumidor a ressarcir os custos de
cobrança de sua obrigação, sem que igual direito lhe seja conferido contra o
fornecedor; XIII - autorizem o fornecedor a modificar unilateralmente o
conteúdo ou a qualidade do contrato, após sua celebração; XIV - infrinjam ou
possibilitem a violação de normas ambientais; XV - estejam em desacordo com
o sistema de proteção ao consumidor; XVI - possibilitem a renúncia do direito
de indenização por benfeitorias necessárias. § 1º Presume-se exagerada, entre
outros casos, a vantagem que: I - ofende os princípios fundamentais do
sistema jurídico a que pertence; II - restringe direitos ou obrigações
fundamentais inerentes à natureza do contrato, de tal modo a ameaçar seu
objeto ou equilíbrio contratual; III - se mostra excessivamente onerosa para o
consumidor, considerando-se a natureza e conteúdo do contrato, o interesse
das partes e outras circunstâncias peculiares ao caso. § 2° A nulidade de uma
cláusula contratual abusiva não invalida o contrato, exceto quando de sua
ausência, apesar dos esforços de integração, decorrer ônus excessivo a
qualquer das partes. § 3° (Vetado). § 4° É facultado a qualquer consumidor ou
entidade que o represente requerer ao Ministério Público que ajuíze a
competente ação para ser declarada a nulidade de cláusula contratual que
contrarie o disposto neste código ou de qualquer forma não assegure o justo
equilíbrio entre direitos e obrigações das partes.

TÓPICOS ESPECIAIS DE OBRIGAÇÕES E CONTRATOS 187


Segundo Garcia, constituem características para aplicação do referido artigo:

Trata-se de rol meramente exemplificativo, podendo haver outras situações que


configurem abusividade contratual, mas que não foram dispostas pelo
legislador consumerista.

A declaração de nulidade deverá ocorrer, diante da abusividade da cláusula,


mesmo que o consumidor, parte hipossuficiente, tenha concordado
contratualmente com ela.

A sentença que declara a nulidade é constitutiva negativa, operando efeito ex


tunc, retroagindo à data da celebração do acordo.

Já que o Artigo 51 do CDC não estabelece lapso temporal para a arguição


judicial da abusividade, entende-se por sua imprescritibilidade.

A declaração de nulidade de cláusulas abusivas poderá ocorrer em contratos de


adesão (regra) ou em contratos paritários (exceção).

De acordo com o STJ, não há possibilidade de o juiz decretar de ofício a


abusividade de cláusulas contratuais, mesmo que o próprio Tribunal Superior já
tenha declarado sua abusividade em outras demandas, devendo a parte
interessada argui-la em sede judicial.

Tal fato acontece também em contratos bancários, de acordo com a Súmula nº


381 do mesmo tribunal: “Nos contratos bancários, é vedado ao julgador
conhecer, de ofício, da abusividade de cláusulas”.

Não é possível, em hipótese nenhuma, exonerar, limitar ou atenuar a


responsabilidade objetiva do fornecedor de produtos e serviços.

TÓPICOS ESPECIAIS DE OBRIGAÇÕES E CONTRATOS 188


Sob tal entendimento, a cláusula deverá ser considerada como abusiva, como
decorre do entendimento consubstanciado pela Súmula nº 130 do STJ:

“A empresa responde, perante o cliente, pela reparação de dano ou furto de


veículos em seu estacionamento”.

Onerosidade excessiva
Como já visto na aula 1, no que diz respeito à relação de consumo, segundo
o STJ, configura hipótese de violação do Artigo 51, II e IV, do CDC, as
cláusulas contratuais que estabeleçam obrigações consideradas iníquas,
abusivas, que coloquem o consumidor em desvantagem exagerada, ou sejam
incompatíveis com a boa-fé ou a equidade.

Nesse contexto, cabe ressaltar o disposto no Artigo 51, § 1º, III, do CDC,
que presume ser exagerada a vantagem que “se mostra excessivamente
onerosa para o consumidor”.

Como resultado, devem ser tais cláusulas declaradas nulas de pleno


direito, por meio da revisão judicial, que no direito do consumidor
ocorre pela simples onerosidade excessiva, não havendo necessidade
de um fato superveniente e imprevisível (Artigo 6º, V, CDC).

De acordo com Nelson Nery Jr. e Rosa Maria de Andrade Nery:

“Para que o consumidor tenha direito à revisão do contrato, basta que haja
onerosidade excessiva para ele, em decorrência de fato superveniente. Não há
necessidade de que esse fatos sejam extraordinários nem que sejam
imprevisíveis. As soluções da teoria da imprevisão, com o perfil que a ela é
dado pelo Código Civil italiano (Artigo 1.467) e pelo Código Civil brasileiro
(Artigo 478), não são suficientes para as soluções reclamadas nas relações de
consumo. Pela teoria da imprevisão, somente os fatos extraordinários e
imprevisíveis pelas partes por ocasião da formação do contrato é que

TÓPICOS ESPECIAIS DE OBRIGAÇÕES E CONTRATOS 189


autorizam, não sua revisão, mas sua resolução. A norma consumerista não
exige nem extraordinariedade, nem imprevisibilidade dos fatos supervenientes
para conferir, ao consumidor, o direito de revisão efetiva do contrato, não sua
resolução.”

Descumprimento de cláusula contratual – plano de saúde


A jurisprudência do STJ entende que o mero descumprimento de cláusula
contratual, em princípio, não gera dano moral indenizável, mas é
possível a condenação de dano moral quando há recusa infundada de cobertura
de plano de saúde.

O CDC estabelece normas de ordem pública e interesse social e, em seu Artigo


4º, consagra os princípios da boa-fé objetiva e da equidade e coíbe o abuso de
direito.

Atenção
As cláusulas restritivas do direito do consumidor devem ser
interpretadas da forma menos gravosa a ele, ou seja, mais
benéficas, visto não ser razoável que o segurado de plano de
saúde seja desamparado quando mais precise de tratamento
médico e hospitalar.

Abuso do direito – renovação de contrato


Pelo Enunciado nº 543 da VI Jornada de Direito Civil do CJF/STJ
:
“Constitui abuso do direito a modificação acentuada das condições do seguro
de vida e de saúde pela seguradora quando da renovação do contrato”.

Justifica-se, o presente entendimento, uma vez que os contratos de seguro de


vida e de saúde normalmente são pactuados por longo período de tempo.

TÓPICOS ESPECIAIS DE OBRIGAÇÕES E CONTRATOS 190


Nesses casos, verificam-se relações complexas em que, muitas vezes, os
consumidores se tornam clientes cativos de determinado fornecedor.

Como devem ser vistas tais situações?

Tais situações não podem ser vistas de maneira isolada, mas de modo
contextualizado com a nova sistemática contratual e com os novos paradigmas
principiológicos.

Por que ocorrem?

Tal ocorrência se dá em virtude do fenômeno de massificação das relações


interpessoais, com especial importância nas relações de consumo. Parte-se da
premissa de que a relação contratual deve responder a eventuais mudanças de
seu substrato fático ao longo do período contratual. É uma aplicação do
princípio da boa-fé objetiva, que prevê padrão de comportamento leal entre as
partes, como visto nas outras aulas, em detrimento da autonomia privada.

O que é exercido de maneira abusiva?

A contratação, em geral, ocorre quando o segurado é ainda jovem. A renovação


anual pode ocorrer por anos, às vezes décadas. Se, em determinado ano, de
forma abrupta e inesperada, a seguradora condicionar a renovação a uma
repactuação excessivamente onerosa para o segurado, há desrespeito ao dever
anexo de cooperação, inerente à boa-fé objetiva.

Dessa forma, o direito de renovar ou não o contrato é exercido de maneira


abusiva, em consonância com o disposto nos Artigos 187 do Código Civil e 51
do Código de Defesa do Consumidor.

Qual é o entendimento do STJ?

TÓPICOS ESPECIAIS DE OBRIGAÇÕES E CONTRATOS 191


Não se trata de impedimento ou bloqueio a reajustes, mas de definir um
padrão justo de reequilíbrio em que os reajustes devam ocorrer de maneira
suave e gradual. Aliás, esse é o entendimento do STJ (STJ, AgRg nos Edcl no
Ag n. 1.140.960/RS, relatora Ministra Nancy Andrighi, Terceira Turma,
julgamento em 23/8/11; Resp n. 1.073.595/MG, relatora Ministra Nancy
Andrighi, Segunda Seção, julgamento em 23/3/11).

Atividade proposta
CIVIL E PROCESSUAL. RECURSO ESPECIAL. CONTRATO. PLANO DE SAÚDE.
AIDS. EXCLUSÃO DE COBERTURA. CLÁUSULA POTESTATIVA. PRECEDENTES.
PROVIMENTO. I. É abusiva a cláusula contratual inserta em plano de
assistência à saúde que afasta a cobertura de tratamento da síndrome de
imunodeficiência adquirida (AIDS/SIDA).”

Analisando essa jurisprudência, é possível constatar a opção do STJ em


proteger o hipossuficiente da relação consumerista, por meio da aplicação das
normas do CDC, bem como da materialização dos princípios da boa-fé objetiva
e da função social dos contratos.
Pergunta-se: o mesmo entendimento pode ser utilizado para outras doenças,
como o câncer, por exemplo?

Chave de resposta: Sim, em decorrência da aplicação do princípio


constitucional da isonomia, mesmo em sentido contrário à autonomia privada.

Referências
GARCIA, Leonardo de Medeiros. Direito do Consumidor – Código
Comentado e Jurisprudência. 7ª ed., rev., ampl. e atual. Niterói: Impetus,
2011.
NERY JR, Nelson; NERY, Rosa Maria de Andrade. Código Civil anotado. 2ª
ed. São Paulo, 2004.

TÓPICOS ESPECIAIS DE OBRIGAÇÕES E CONTRATOS 192


Exercícios de fixação
Questão 1
(PROMOTOR – GO – 09) Analise o julgado de cunho consumerista a seguir e
marque a alternativa correta: “Civil. Seguro de assistência médico-hospitalar.
Plano de assistência integral (cobertura total), assim nominado no contrato. As
expressões ‘assistência integral’ e ‘cobertura total’ são expressões que têm
significado unívoco na compreensão comum, e não podem ser referidas num
contrato de seguro, esvaziadas do seu conteúdo próprio, sem que isso afronte
o princípio da boa-fé nos negócios.” (STJ, Resp. 264.562, Rel. Min. Ari
Pargender, j. 12/06/01, p. DJ 13/08/01).
a) O julgado está fundado na violação ao princípio da vulnerabilidade do
consumidor.
b) O julgado está fundado na violação ao princípio da informação deficiente.
c) O julgado está fundado na violação ao princípio da segurança.
d) Apoia-se o julgado na inobservância do princípio da reparação integral.

Questão 2
Para o direito do consumidor, contrato pelo qual as cláusulas tenham sido
aprovadas pela autoridade competente ou estabelecidas unilateralmente pelo
fornecedor de produtos ou serviços sem que o consumidor possa discutir ou
modificar substancialmente seu conteúdo é classificado como:
a) Contrato paritário
b) Contrato sinalagmático
c) Contrato aleatório
d) Contrato de adesão

Questão 3
Todas as assertivas a seguir evidenciam regras pertinentes à interpretação do
contrato de adesão consumerista, salvo:
a) Os contratos de adesão escritos serão redigidos em termos claros e com
caracteres ostensivos e legíveis cujo tamanho da fonte não será inferior
ao corpo doze, de modo a facilitar sua compreensão pelo consumidor.

TÓPICOS ESPECIAIS DE OBRIGAÇÕES E CONTRATOS 193


b) As cláusulas que implicarem limitação de direito do consumidor deverão
ser redigidas com destaque, permitindo sua imediata e fácil
compreensão.
c) Nos contratos de adesão admite-se cláusula resolutória, desde que
alternativa, cabendo a escolha ao credor da obrigação pecuniária.
d) A inserção de cláusula no formulário não desfigura a natureza de adesão
do contrato.

Questão 4
(TJPB – 2011 – CESPE – JUIZ) De acordo com o previsto no CDC, constitui
direito básico do consumidor:
a) A modificação de cláusulas contratuais que estabeleçam prestações
excessivamente onerosas e que acarretem extrema vantagem para uma
das partes, no caso de acontecimentos extraordinários e imprevisíveis.
b) A garantia de responsabilidade solidária no que se refere a ofensas
cometidas por mais de um autor, caso em que todos os envolvidos
deverão responder pela reparação dos danos previstos nas normas de
consumo, de acordo com sua culpabilidade.
c) A adequada, eficaz e contínua prestação dos serviços públicos em geral.
d) A facilitação da defesa dos seus direitos de consumidor, inclusive com a
inversão do ônus da prova a seu favor, no âmbito civil, quando o juiz
julgar procedente a alegação ou quando o consumidor for considerado
necessitado, de acordo com as regras ordinárias de experiência.
e) O acesso aos órgãos judiciários e administrativos com vistas à prevenção
ou reparação de danos patrimoniais e morais, individuais, coletivos ou
difusos, assegurada proteção jurídica, administrativa e técnica aos
necessitados.

Questão 5
(TJGO – FCC – 2012 – JUIZ) Marque a alternativa correta quanto ao Código de
Defesa do Consumidor:

TÓPICOS ESPECIAIS DE OBRIGAÇÕES E CONTRATOS 194


a) Estabelece normas de defesa e de proteção dos consumidores e
fornecedores de produtos e serviços, de ordem pública e de interesse
social.
b) Estabelece normas de defesa e de proteção do consumidor, de ordem
pública e de interesse social, regulamentando normas constitucionais a
respeito.
c) Prevê normas de interesse geral, dispositivas e de regulamentação
constitucional.
d) Prevê normas de defesa e de proteção ao consumidor, dispositivas e de
interesse individual, sem vinculação constitucional.
e) Estabelece normas de interesse coletivo geral, de ordem pública e
interesse social, sem vinculação com normas constitucionais.

Questão 6
(FCC – 2011 – DPE-RS – Defensor Público) Quanto ao equilíbrio dos contratos
de consumo, pode-se afirmar que:
a) Uma cláusula contratual considerada abusiva em um contrato de
consumo necessariamente o será também em um contrato civil, desde
que redigida em termos idênticos.
b) A cláusula abusiva será nula quando afetar o equilíbrio das prestações do
contrato, porém pode ser convalidada quando se trate de vício de
informação, desde que haja concordância das partes com a redução do
proveito do fornecedor.
c) A revisão dos contratos de consumo pode se dar em face da alteração de
circunstâncias, com a finalidade de proteção do consumidor, não se
exigindo que tal situação seja necessariamente desconhecida das partes.
d) Cláusula abusiva celebrada em contrato individual de consumo não pode
ter sua nulidade pronunciada em ação coletiva sem a anuência do
consumidor que é parte da contratação.
e) Não se reconhece a existência de cláusula surpresa se o consumidor leu,
no momento da contratação, os termos do instrumento contratual.

TÓPICOS ESPECIAIS DE OBRIGAÇÕES E CONTRATOS 195


Questão 7
(MPGO – 2012 – MPGO – PROMOTOR) Assinale a afirmativa correta.
a) Segundo entendimento do STJ, a inversão do ônus da prova é regra de
instrução, devendo a decisão judicial que a determina ser proferida
preferencialmente na fase do saneamento do processo.
b) A garantia legal de adequação do produto ou serviço depende de termo
expresso, no qual se explicitará o alcance da responsabilidade do
fornecedor.
c) Verificando no processo a existência de uma cláusula abusiva inserta em
um contrato bancário, o juiz deverá declarar a nulidade da cláusula, quer
a requerimento do interessado, do Ministério Público, ou mesmo ex
officio, por ser tratar de matéria de ordem pública.
d) O Ministério Público, mediante inquérito civil, pode efetuar o controle
administrativo abstrato e preventivo das cláusulas contratuais, cuja
decisão terá caráter geral.

Questão 8
Pelo Artigo 51 do CDC, são nulas de pleno direito, entre outras, as cláusulas
contratuais relativas ao fornecimento de produtos e serviços, salvo:
a) Permitam ao fornecedor, direta ou indiretamente, variação do preço de
maneira unilateral.
b) Estabeleçam inversão do ônus da prova em favor do consumidor.
c) Impossibilitem, exonerem ou atenuem a responsabilidade do fornecedor
por vícios de qualquer natureza dos produtos e serviços.
d) Impliquem renúncia ou disposição de direitos pelo consumidor.

Questão 9
(TJMS – 2012 – PUC-PR – JUIZ) Acerca do direito de proteção ao consumidor,
assinale a opção CORRETA.
a) Na execução dos contratos de consumo, o juiz pode adotar toda e
qualquer medida para que seja obtido o efeito concreto pretendido pelas
partes, em caso de não cumprimento da oferta ou do contrato pelo

TÓPICOS ESPECIAIS DE OBRIGAÇÕES E CONTRATOS 196


fornecedor, salvo quando expressamente constar no contrato cláusula
que disponha de maneira diversa.
b) Segundo o princípio da vinculação da oferta, toda informação ou
publicidade sobre preços e condições de produtos ou serviços, como a
marca do produto e as condições de pagamento, veiculada por qualquer
forma ou meio de comunicação, obriga o fornecedor que a fizer veicular
ou dela se utilizar e integra o contrato que vier a ser celebrado.
c) Nos contratos regidos pelo Código de Defesa do Consumidor, as
cláusulas contratuais desproporcionais, abusivas ou ilegais podem ser
objeto de revisão, desde que o contrato seja de adesão e cause lesão a
direitos individuais ou coletivos.
d) Em todo contrato de consumo consta, implicitamente, a cláusula de
arrependimento, segundo a qual o consumidor pode arrepender-se do
negócio e, dentro do prazo de reflexão, independentemente de qualquer
justificativa, rescindir unilateralmente o acordo celebrado.
e) O consumidor não tem direito à garantia legal.

Questão 10
(TJMS – 2012 – PUC-PR – JUIZ) Em um contrato de consumo, é considerada
abusiva a cláusula que:
a) Estabelece a remessa do nome do consumidor inadimplente para bancos
de dados ou cadastros de consumidores.
b) Impossibilite a violação de norma ambiental.
c) Estabelece a inversão do ônus da prova em desfavor do fornecedor.
d) Transfere responsabilidades a terceiros.
e) Não permite ao fornecedor, direta ou indiretamente, variação do preço
de maneira unilateral.

TÓPICOS ESPECIAIS DE OBRIGAÇÕES E CONTRATOS 197


Aula 8
Exercícios de fixação
Questão 1 - B
Justificativa: Conforme os princípios que orientam o CDC.

Questão 2
Justificativa: Conforme Artigo 54 do CDC.

Questão 3 - C
Justificativa: Conforme Artigo 54, parágrafo 2º, do CDC.

Questão 4 - E
Justificativa: Conforme Artigo 6º do CDC.

Questão 5 - B
Justificativa: Conforme Artigo 1° do CDC: “O presente código estabelece
normas de proteção e defesa do consumidor, de ordem pública e interesse
social, nos termos dos Artigos 5°, inciso XXXII, 170, inciso V, da Constituição
Federal e Artigo 48 de suas Disposições Transitórias”.

Questão 6 - C
Justificativa: Não há necessidade, no direito do consumidor, que haja fato
imprevisível e superveniente (Artigo 6º, V, CDC).

Questão 7 - A
Justificativa: Conforme entendimento majoritário do STJ, a inversão do ônus da
prova configura regra de instrução.

Questão 8 - B
Justificativa: Conforme Artigo 51, VI, do CDC.

TÓPICOS ESPECIAIS DE OBRIGAÇÕES E CONTRATOS 198


Questão 9 - B
Justificativa: Conforme Artigo 30 do CDC: “Toda informação ou publicidade,
suficientemente precisa, veiculada por qualquer forma ou meio de comunicação
com relação a produtos e serviços oferecidos ou apresentados, obriga o
fornecedor que a fizer veicular ou dela se utilizar e integra o contrato que vier a
ser celebrado”.

Questão 10 - D
Justificativa: Conforme Artigo 51 do CDC.

TÓPICOS ESPECIAIS DE OBRIGAÇÕES E CONTRATOS 199


Thiago Serrano é Mestre em Direito pela Universidade Estácio de Sá na linha
de pesquisa Direitos Fundamentais e Novos Direitos. Professor de Graduação e
Pós-Graduação em Direito Civil e Prática Jurídica da Universidade Estácio de Sá.
Professor convidado de Graduação em Direito Civil da Universidade Federal
Fluminense. Graduado em Direito pela Universidade Federal do Rio de Janeiro.
Especialista em Direito do Trabalho e Processo do Trabalho pela Escola de
Magistratura da Justiça do Trabalho do Estado do Rio de Janeiro. Advogado e
consultor jurídico especialista em direito de família e direito homoafetivo.
Examinador da Fundação Getúlio Vargas para o Exame da Ordem dos
Advogados do Brasil.

Currículo Lattes: http://lattes.cnpq.br/4260267230068806.

TÓPICOS ESPECIAIS DE OBRIGAÇÕES E CONTRATOS 200

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