A discussão descreve a especificidade sócio- histórica do amor romântico e a aceitação do amor como a base legítima do casamento. A ideia de que um bom relacionamento é aquele entre iguais, baseado na comunicação emocional ou intimidade, talvez seja predominante no discurso Ocidental, mas está longe de ser universal. O capítulo apresenta os conceitos básicos pelos quais os cientistas sociais discutem formas de família, parentesco e casamento, introduzindo as categorias padronizadas de família nuclear, família ampliada, monogamia, poligamia, poliginia e poliandria. Embora as formas de família não sejam estáticas, tendemos a ter uma visão fixa e idealizada da família, que combina o que ela é com o que deveria ser, com base em alguma comparação com a era dourada do passado. Uma visão histórica, usando o trabalho de Lawrence Stone, considera as mudanças na constituição das famílias europeias, das formas pré-modernas à dominância contemporânea do individualismo afetivo.
Os padrões familiares têm mudado ao redor do
mundo, com uma erosão da influência de grupos de parentesco e tendências gerais para o individualismo, a liberdade sexual e os direitos da criança. Nas sociedades Ocidentais, o casamento é contraído com base na monogamia serial, sendo identificado como a base da família. Ele se caracteriza por uma herança patrilinear (ao contrário da matrilinear) e pela residência neolocal da unidade nuclear com conexões com um grupo mais amplo de parentes. Therborn identifica cinco tipos familiares principais no século XX, estruturados pelos três elementos principais: • dominância masculina; • casamento/não casamento no controle do comportamento sexual; • medidas de controle de natalidade para regular a fertilidade. A desigualdade na família é persistente e moldada por desequilíbrios generificados no trabalho doméstico, no cuidado e no trabalho emocional. A violência íntima é causada muito mais por homens sobre mulheres e crianças, onde grande parte do abuso infantil sexualizado também é incesto. No âmbito global, a violência doméstica contra a mulher parece estar aumentando. As taxas de divórcio estão crescendo, à medida que as mulheres se tornam menos dependentes economicamente dos homens, o estigma social ligado ao divórcio evapora e o desejo por um relacionamento emocionalmente gratificante se torna uma aspiração amparada pela sociedade. Entre as décadas de 1930 a 1970, o tema do pai ausente se tornou proeminente, pois os pais estavam ocupados no papel de provedores e, muitas vezes, também, em papéis militares. Atualmente, a preocupação política e moral gira em torno de pais que, como resultado da separação, têm contato infrequente com seus filhos. O autor norte-americano David Blakenhorn promove uma nova versão do conservadorismo moral, argumentando que a erosão do papel social do pai tem efeitos sociais profundos para pais e filhos: os filhos sem pai se perdem porque não têm uma figura de autoridade, e os pais se perdem porque, pela falta de um canal para suas energias sexuais e agressivas, se voltam para a criminalidade e a violência. Atualmente, mais de 40% dos casamentos envolvem pelo menos uma pessoa que já foi casada. Acredita-se que as famílias reconstituídas sejam oportunidades excelentes para novos padrões de relacionamentos parentais e familiares. Alguns autores hoje falam de famílias binucleares para descrever essas novas formas de famílias; está claro que, mesmo que os casamentos sejam rompidos pelo divórcio, as famílias como um todo não são. Um estudo sobre pais separados e divorciados, realizado por Carol Smart e Bren Neale, mostra relacionamentos fluidos entre os pais e entre pais e filhos. Esses pais negociam novos relacionamentos com os filhos e adotam uma moralidade de cuidado, tomando decisões com base em seu melhor juízo sobre o que é melhor a fazer para a criança em cada momento. Uma alternativa ao casamento é a coabitação. Esse padrão é tão difundido que talvez seja melhor pensar nos relacionamentos heterossexuais em termos da formação e separação de casais, ao invés de enfatizar a significância do casamento formal. Os casais jovens, sejam unidos em matrimônio ou coabitação, enfatizam que o seu vínculo é um compromisso assumido livremente, ao passo que a geração dos seus pais enfatizava a significância de obrigações e deveres. Três perspectivas teóricas são consideradas em relação à família: o funcionalismo, o feminismo e aquelas abordagens associadas aos teóricos do risco e da sociedade pós-tradicional, preocupados em localizar a análise da família dentro de uma análise mais ampla de mudanças globalizantes e modernizantes. O funcionalismo de Parsons e Bales trabalha com as funções de socialização primária e estabilização da personalidade e a divisão instrumental/afetiva do trabalho entre o casal. A abordagem é avaliada como um produto do seu tempo e também como normativa com relação a um ideal da “classe média branca”. As abordagens feministas ao problema sem nome são bem recebidas, como um corretivo para as idealizações anteriores da família. Os três temas principais identificados na análise feminista são: a divisão doméstica do trabalho com base no modelo do homem como provedor; a violência doméstica e abuso sexual; e atividades de cuidado e trabalho emocional. As relações de poder desiguais (risco) dentro da família significam que alguns membros se beneficiam mais do que outros com esses arranjos e que uma fonte de conforto e amor para alguns pode ser um lugar de exploração para outros. Giddens fundamenta-se em seu próprio trabalho, bem como no de Ulrich Beck e Elisabeth Beck‐Gernsheim e Zygmunt, para um estudo sobre a família e a intimidade.
Esse estudo localiza os novos padrões de família
e relacionamento (divórcio, monopaternidade, famílias reconstituídas, famílias homossexuais, coabitação) no contexto da modernização globalizante. Giddens argumenta que o ideal dominante se torna o relacionamento puro – aquele em que os parceiros permanecem por tanto tempo porque as necessidades de cada um são satisfeitas em um grau suficiente. Isso se caracteriza pela sexualidade plástica, a sexualidade separada da reprodução e do casamento; pela reflexividade social, o ato autoconsciente de escolher com quem se quer estar; e o amor confluente, o amor que (ao contrário da ideia de amor romântico) aceita ser contingente e possivelmente temporário. Ulrich Beck e Elisabeth Beck‐Gernsheim enfatizam que a maior escolha e variedade nos relacionamentos podem ser consideradas questão de hábito e que todos os elementos de um relacionamento estão constantemente abertos para negociação. O amor, segundo argumentam, passou a ocupar um lugar bastante central nas sociedades modernas, pois é o antídoto percebido para a natureza impessoal, abstrata e tão inconstante do resto da vida moderna. Mesmo com o crescimento da indústria do aconselhamento, grupos de auto- ajuda e outros que regulam as vidas pessoais, o amor é considerado uma expressão autêntica do self e uma nova fonte de fé. A noção do amor líquido de Zygmunt Bauman enfatiza as tensões inerentes à individualização, à medida que as pessoas alternam-se entre o desejo de liberdade pessoal e a necessidade de segurança.
Carol Smart discorda das teorias contemporâneas
argumentando que a vida pessoal é um conceito mais realista para explicar como as pessoas mantêm suas conexões com outras pessoas, por meio de memórias compartilhadas e tradições que geram significados. EXEMPLO DE AULA
A busca por intimidade
• Objetivo: Colocar os padrões contemporâneos
de vida pessoal no contexto da mudança social e cultural. Resultado: Ao final da aula, os alunos:
• 1. Citar três fontes de aconselhamento sobre
relações pessoais na sociedade Ocidental contemporânea. • 2. Entender que as mudanças nas formas institucionais de vida pessoal estão relacionadas com mudanças sociais mais amplas. • 3. Analisar a letra de uma canção como uma representação contemporânea de relacionamentos íntimos. QUESTÕES PARA REFLEXÃO & DISCUSSÃO
• Todas as formas de família são aceitáveis
socialmente da mesma forma na Grã-Bretanha moderna?
• Que vantagens emocionais, sociais e
econômicas a poliginia ou a poliandria poderiam oferecer a mulheres e homens em uma sociedade moderna? • De que modo as taxas crescentes de divórcio indicam que a relação de matrimônio se tornou mais, e não menos, importante?
• O comportamento violento é um problema
relacionado com a personalidade individual ou parte da estrutura da sociedade? Pode ser ambos?
• Que medidas sociais podem ser adotadas para
reduzir os níveis de violência dentro das famílias? • O que é mais importante: proteger a privacidade ou proteger as pessoas da violência?
• Quando as pessoas falam da volta aos valores
familiares, o que querem realmente dizer?
• O amor romântico é uma base segura para um
relacionamento duradouro? • Os casamentos arranjados oferecem uma base para a formação de um relacionamento emocionalmente íntimo?
• É possível ter intimidade por escrito?
• À luz da diversidade contemporânea, qual é a
utilidade de se falar sobre ‘a família’ no singular? • De que modo os aspectos abusivos da vida em família podem ser melhorados com mudanças nas posições de homens e mulheres na sociedade mais ampla?