Na sua canção "Imagine", o famoso beatle John Lenon convidava a todos a
sonharem um mundo sem céu nem inferno, de fraternidade e sem religião. Lenon estava no seu direito de propor esta visão terrena do mundo. Mas os crentes também têm o direito a apresentar uma ideia menos mágica do céu e do inferno, uma fraternidade com religião inteligente. E se um ateu não deseja um religioso fundamentalista à sua volta, um crente também não pretende conviver com um ateu fanático e intolerante. Em nome de uma ideia falsa da Fé, muitos crimes se cometeram, mas em nome de outros fanatismos, não religiosos, muita outra violência se tem gerado. O Catecismo da Igreja, mostra-nos nos números 27a 49, que o ser humano é 'capaz de Deus', porque Deus o criou com esta abertura (Sto. Agostinho: "Tu criaste-nos para Ti e o nosso coração está inquieto até que descanse em Ti..." Mais à frente, acrescenta:"Que eu, Senhor, Te busque invocando-Te e Te invoque acreditando em Ti, pois já me foste pregado. Invoca-Te, Senhor, a minha fé, a fé que Tu me deste e inspiraste pela Humanidade do Teu Filho e pelo ministério do teu pregador" (Confissões I, 1). Esta capacidade só é possível porque Deus vem primeiramente ao encontro do ser humano. É o que nos fala o Catecismo no número 50 até ao 141, onde se expõe a Revelação de Deus, apresentado esta vontade de proximidade de Deus para com a condição humana. Mas isto não exclui todo o esforço, que é necessário efetuar, para chegar a abrir este presente da fé, que é Dom de Deus. Atualmente, o pêndulo da história tende para a primazia do indivíduo. O que lhe apraz fazer nada nem ninguém o deve impedir. Mas este direito pode facilmente transformar-se em ditadura. E o ditador, normalmente, não é um coletivo, mas um indivíduo. No campo da Fé, também não se pode dar primazia ao indivíduo, mas à comunidade: foi assim que ela nasceu, é desta forma, especialmente, que ela cresce e se celebra. A fé é um ato pessoal e uma resposta livre e comprometida à proposta do Deus Revelador; por isso, dizemos: "Eu creio". É assim que o Catecismo nos apresenta, a partir do número 142. No entanto, este 'creio' pessoal é precedido por um "Nós cremos", comunitário. "Eu creio", como assinala o número 167: "... é a fé da Igreja, professada pessoalmente por cada crente". Desta forma, não é, de todo, correto afirmar: "Eu cá tenho a minha fé!" A fé não é algo que me pertence, que eu posso dispor ou manipular. Ela é herança, e se queremos ser fiéis a essa herança devemos cultivar a 'obediência da fé', como nos recorda o Catecismo, no número 144, recordando os grandes testemunhos bíblicos: de Abraão a Maria. A segunda seção do Catecismo, expõe a Profissão da Fé Cristã: clarifica o Principio Trinitário desta fé - em Deus Pai, em Jesus Cristo e no Espírito Santo. Uma coisa deve ficar clara na nossa mente: Deus revela-Se, o ser humano abre- se ou não a esta revelação, esforça-se por captar esta evidência obscura; apesar disto, o que podemos apreender de Deus é sempre uma 'centelha'. Como afirmava um teólogo alemão, Dietrich Bonhoeffer: "Um Deus que existe, não existe!", caso contrário, seria um ídolo dos homens e facilmente manipulável por eles. O que existe é a incapacidade do Homem de abarcar a grandeza infinita de Deus. Num jogo de contrários, no seu livro Teologia Mística, Dionísio Areopagita diz-nos: "Para sermos admitidos a esta Luminosa e esplendidíssima Escuridão,... Aquele que transcende toda a vista e toda a ciência, é preciso que oremos".