Você está na página 1de 662

Copyright@ 2018 Caty Coelho

Capa: Dri K.K.


Revisão: Evelyn Santana
Diagramação Digital: Karol Blatt

1º Edição
Esta é uma obra de ficção. Seu intuito é entreter as pessoas. Nomes,
personagens, lugares e acontecimentos descritos são produto da imaginação
da autora. Qualquer semelhança com nomes, datas e acontecimentos reais é
mera coincidência.
Todos os direitos reservados. São proibidos o armazenamento e/ou a
reprodução de qualquer parte desta obra, através de quaisquer meios ―
tangível ou intangível ― sem o consentimento escrito da autora.
A violação dos direitos autorais é crime estabelecido na lei nº 9.610/98 e
punido pelo artigo 184 do Código Penal.
SINOPSE
--—————————————————————————————

Andrew Simons é um playboy milionário que vive à custa de sua avó


Elizabeth — a verdadeira proprietária da Simon’s Construtora. Drew está
acostumado a mimos e uma vida de regalia, no entanto, as coisas mudam
quando sua avó ameaça deixar parte do seu patrimônio para Benjamin
Cooper. O seu maior inimigo, o cara que ele sempre quis afogar em uma
privada, o idiota que sempre colocava Drew para trás. Benjamin é jovem,
infelizmente bonito, bem-sucedido, um ótimo funcionário, é casado e
respeitado por todos os seus colegas. Drew é solteiro, mulherengo e um poço
de problemas. Como ele poderia competir contra seu inimigo?
Transformando-se em um homem melhor do que ele é claro!

Agora Drew decide mudar de vida, mas isso é uma tarefa realmente
complicada. E tudo fica pior quando ele inventa uma suposta noiva, e afirma
que está prestes a se casar. Em uma medida desesperada para encontrar uma
mulher que se encaixe na sua lista de “esposa perfeita”, Drew acaba fazendo
uma proposta para Jamie Collins. A “garota do cafezinho”, o patinho feio e
com certeza alguém longe de ser sua esposa perfeita. Mas é tudo o que ele
tem, certo? O que Drew não esperava era que o patinho feio fosse se
transformar em cisne, tornando muito difícil seguir uma regra que ele mesmo
impôs: Não se apaixonar.
SUMÁRIO
--—————————————————————————————

DEDICATÓRIA
PRÓLOGO
CAPÍTULO UM
CAPÍTULO DOIS
CAPÍTULO TRÊS
CAPÍTULO QUATRO
CAPÍTULO CINCO
CAPÍTULO SEIS
CAPÍTULO SETE
CAPÍTULO OITO
CAPÍTULO NOVE
CAPÍTULO DEZ
CAPÍTULO ONZE
CAPÍTULO DOZE
CAPÍTULO TREZE
CAPÍTULO CATORZE
CAPÍTULO QUINZE
CAPÍTULO DEZESSEIS
CAPÍTULO DEZESSETE
CAPÍTULO DEZOITO
CAPÍTULO DEZENOVE
CAPÍTULO VINTE
CAPÍTULO VINTE E UM
CAPÍTULO VINTE E DOIS
CAPÍTULO VINTE E TRÊS
CAPÍTULO VINTE E QUATRO
CAPÍTULO VINTE E CINCO
CAPÍTULO VINTE E SEIS
CAPÍTULO VINTE E SETE
CAPÍTULO VINTE E OITO
CAPÍTULO VINTE E NOVE
CAPÍTULO TRINTA
EPÍLOGO
AGRADECIMENTOS
SOBRE A AUTORA
DEDICATÓRIA
--—————————————————————————————

Bárbara, “se houver um céu”, eu espero que você esteja lá. Mas se
não houver, saiba que você estará para sempre no meu coração.
Sthefany, obrigada por me mostrar que não devo desistir dos meus
sonhos, pois eles não pertencem apenas a mim, mas a todos que me leem.
São para vocês todos os sorrisos que este livro desperta.
PRÓLOGO
--—————————————————————————————

Jamie

“Coloque seus desejos no papel e eles se tornarão realidade.”


Bufei.
Papo típico de gente rica tentando convencer gente como eu, pobre,
de que a realização de qualquer desejo é possível para pessoas de qualquer
classe desde que você “lute” por isso e não “desista”.
“Escrever suas metas ajuda a atingi-las.”
Claro que sim. Concordo com essa frase. Desde que você tenha um
sonho que custe um mísero dólar ou então uma conta bem gorduchinha no
banco. De outra forma, esqueça.
“É difícil de acreditar, mas você precisa ser positivo.”
Encarei a tela da única televisão que tínhamos em casa, onde essa
terapeuta pomposa, vestida em seu terninho caro, sorria para o entrevistador
em um desses programas de televisão de baixa audiência aos quais a gente só
assiste quando liga a tevê e, voilà, já estão passando.
“É isso mesmo, deixe o negativismo de lado. É isso que está
atrapalhando sua vida.”
Franzi o cenho.
Eu não sou negativa, sou?
Só queria que essa terapeuta que se diz especialista em analisar a vida
e os acontecimentos sob vários pontos de vista entendesse que nem tudo se
trata apenas de querer. Porque é claro que não é o negativismo que está
atrapalhando minha vida, e sim a falta de grana. E eu posso querer grana, mas
ainda assim não tê-la.
“Pare de encontrar desculpas. Você nunca vai saber se não tentar.”
Ora, agora isso está ficando pessoal.
Larguei o ferro de passar roupa e alcancei o controle da televisão
largado sobre o sofá cor amarelo-cocô-de-nenê.
Tudo bem, dona terapeuta. Diga-me, então, como é possível que eu
realize meu desejo que custa uma fortuna quando meu salário é de copeira?
Aumento o volume.
“Tudo o que você precisa fazer é dar o primeiro passo. Ou seja,
encontre o seu papel da sorte.”
Ok. Eu posso fazer isso, certo? Que mal existe em tentar?
Talvez ela esteja certa. Talvez quinhentos mil dólares pulem para fora
do papel e caiam no meu colo hoje mesmo.
Solto o controle da tevê e caminho até o aparador, onde a agenda da
Jane descansa. Arranco uma das últimas folhas. Ótimo, espero que esse seja o
meu papel da sorte.
O que fazemos agora, doutora?
“Transcrever o primeiro desejo com a fé de que ele se tornará real
fará com que você mesma acredite nisso. O segredo é acreditar.”
Suspiro. Bem, vamos lá…
Pego a caneta entre os dedos e encaro as linhas negras diante de mim.
O segredo é acreditar, Jamie. Acredite…
Solto uma gargalhada.
Como é que eu vou acreditar nisso? São quinhentos mil dólares!
“É importante que você leve isso a sério.”
Ei, calma. Estou levando a sério.
Fecho os olhos.
Inspiro.
Imagino os quinhentos mil dólares enchendo minhas mãos, escapando
pelos meus dedos, cobrindo o chão de notas gordinhas…
Acredite, Jamie. Acredite…
Escrevo a primeira linha.

1 – Comprar a casa de tijolos vermelhos no Brooklyn.

“Provavelmente quando você terminar vai perceber que foi muito


mais fácil do que imaginava.”
Abro os meus olhos. Expiro.
Uau. Ela está certa. Isso foi fácil.
Muito fácil.
“Oh, não pare agora.”
Não?
“De jeito nenhum. Você já concluiu a etapa mais difícil, continue.
Liberte sua mente. Deve ter tantos desejos que você gostaria de realizar.”
Bom, eu sempre quis me apaixonar. Viver um romance. Algo
verdadeiro, assim como meus pais tiveram. Alguém que me ame tanto quanto
eu o ame.
Não é como se um pedaço de papel pudesse me trazer o amor da
minha vida, né?
“Não hesite, não agora. O que eu disse sobre ser negativa? No seu
papel da sorte, tudo é possível. Liberte sua imaginação.”
Que mal tem em desejar o amor, não?
Não é como se eu não tivesse rabiscado as bordas dos meus cadernos
da primeira série com o nome de um menino que eu pensava que seria o
grande amor da minha vida.
Escrever nesse “papel da sorte” não é diferente. É só um desejo. Nada
de mais.
Escrevo a segunda linha.

2 – Viver um romance verdadeiro.

“Ah, viu? Você está pegando o jeito!”


Estou, é?
Pego a agenda na mão e a caneta e me aproximo da tevê, ficando o
mais perto que consigo da doutora.
“Você não quer parar agora, quer?”
Balanço a cabeça de um lado para o outro.
“Então não pare. Quando comecei essa entrevista, não coloquei um
limite para vocês. Os desejos foram feitos para se tornarem realidade.”
Posso dirigir um carro?
Quero dizer… um carro mesmo. Um carrão.
Tyler e eu somos fãs de Velozes e Furiosos e, às vezes, a gente pega
uma das tampas das panelas da Jane e finge que é o volante de um daqueles
carrões e que o nosso sofá amarelo-cocô-de-nenê é uma daquelas máquinas.
O que não fazemos pelos sobrinhos?
“Vale tudo quando se trata de desejos. Vá em frente.”
Tudo bem, você está certa.
Escrevo a terceira linha.

3 – Dirigir um carrão.
“Agora você deve estar viciada nisso, mas não se preocupe. É
importante ter muitos desejos. Ainda há espaço em branco na sua folha,
portanto, crie sua lista.”
Caramba.
Uma lista?
Essa mulher é boa nisso. Muito boa.
Mordo a tampa da caneta.
O que mais, Jamie? O que mais você deseja?
O céu é o limite.
Ah, sim.

4 – Fazer uma tatuagem.

“Alguns desejos serão mais fáceis de concretizar do que outros. Mas


não se esqueça de acreditar que todos eles são possíveis.”
Tudo é possível, Jamie.

5 – Pular de paraquedas.

“Você deve estar se sentindo ousada agora.”


Ah, você não tem ideia, doutora.

6 – Fumar maconha.

“Sabe aquele desejo de menina má, ele também deve ser colocado
aí.”
Hum, vejamos…
7 – Roubar algo.

“Deve haver desejos de infância. Não se esqueça deles.”


Você está certa, doutora. Obrigada.

8 – Gritar muito alto.

“E desejos da adolescência…”
Onde você esteve todo esse tempo, doutora?

9 – Dormir sob as estrelas.

“Alguns desejos nem mesmo são seus, mas você quer abraçá-los por
outros.”
Minha mãe…

10 – Visitar Paris.

“E alguns são seus, mas você sempre teve medo de admitir.”


Sempre…

11 – Entrar em uma festa de penetra

“Por último, lembre-se daquele desejo que permite aos outros


desejarem também.”

12 – Doar algo de valor.


“Ai, está. Você tem uma lista de desejos agora.”
Afasto a caneta e observo minha folha.
É. Ela está certa. Eu tenho uma lista de desejos.
“Agora basta ser paciente.”
Ah, eu vou ser. Prometo.
“Não perca nenhuma oportunidade.”
Não irei…
“Você sente isso?”
O quê?
“Sinta. Sinta esse cheiro no ar.”
Inspiro profundamente. Ah, sim, parece algo…
“Esse é o cheiro do sucesso em sua jornada.”
Engraçado…
Nunca pensei que o cheiro do sucesso fosse parecido com… Fogo?
Enrugo o nariz. Nossa! O sucesso deveria cheirar mal desse jeito?
NÃO!
Viro as costas, solto minha lista idiota no chão e corro em direção ao
ferro de passar roupa pegando fogo sobre a nossa pequena mesa de jantar.
Ergo o ferro e a quentura se espalha até a minha mão, obrigando-me a soltá-
lo no chão, onde pedaços de plástico derretido se espalham pelo piso. E isso
nem é o pior. Nossa mesa de jantar acaba de receber um carimbo.
Se for assim que a minha jornada começa, estou longe de querer saber
como ela termina…
CAPÍTULO UM
--—————————————————————————————

Jamie

Estou tão contente porque finalmente consegui comprar a casa de


tijolos vermelhos no Brooklyn. É a casa dos meus sonhos, é a casa em que
nasci e cresci. O lugar especial em que vivi minha infância e onde tive os
melhores e mais felizes dias da minha vida. Estou parada na calçada
observando-a, ela parece ainda maior agora. Agradeço por ter tanto
dinheiro para comprá-la. Sou realmente uma mulher de sorte, tenho tudo o
que eu quero. Sou casada com o homem mais lindo e gostoso do mundo. Ele
é incrivelmente atraente, às vezes nem acredito que ele é só meu. De repente
meu marido se aproxima e me abraça. Em seguida, me beija. Ele é tão
carinhoso, atencioso, e nossa… Ele é tão parecido com Chris Evans! Estou
olhando para ele completamente encantada e apaixonada quando percebo
que meu marido é o verdadeiro Chris Evans! Caramba, como sou sortuda!
O mundo parece tão colorido e cheio de vida. Agora tenho a casa do
Brooklyn, sou rica e casada com Chris Evans. Que, aliás, me ama de
verdade! Ouço um ronco forte de um motor e quando me viro há uma Ferrari
vermelha elegantíssima na minha garagem. Ah, sim, eu sabia, fui uma
menina muito boazinha durante o ano, finalmente o Papai Noel trouxe meus
presentes. Deus deve ter ouvido as minhas preces, estou ganhando a vida que
sempre desejei ter. Seguro firme a mão de Chris Evans e corro na direção do
meu carro novinho, louca para dirigi-lo. No entanto, quanto mais corro,
mais longe minha Ferrari parece estar.
— Volte aqui, querida! — grito, esticando minha outra mão em
direção ao meu carrão.
Estou tão perto de alcançá-lo quando de repente ele evapora, como
se tivesse sido apenas uma miragem. Não! Minha linda Ferrari… Não sei o
que aconteceu, mas não posso perder mais nada, não quero perder mais
nada. Preciso de consolo, preciso do meu marido. Só que, quando me viro,
Chris Evans se foi e no lugar dele quem segura a minha mão é o senhor
Dimitri, o síndico bigodudo do apartamento da minha irmã. Que diabos o
senhor Dimitri faz aqui? Quero questioná-lo, porém nesse momento a bela
casa de tijolos vermelhos começa a cair em ruínas bem na minha frente.
Não! Não! Não! Começo a chorar desesperadamente, porque isso não pode
estar acontecendo. Como tenho tudo em um momento e, no outro, não tenho
nada? Assim que minhas lágrimas secam, percebo que estou sozinha. Nem o
senhor Dimitri ficou.
— Jamie! — minha irmã grita, reconheço sua voz, mas não a vejo em
lugar nenhum. Estou no meio do nada, para todo lugar que olho tudo é
branco. — Jamie, acorde!
— Chris Evans! — grito, mas quando abro os olhos me deparo é com
Jane, minha irmã, sacudindo-me sobre a cama. Seu rosto se contorce em uma
careta engraçada e ela começa a rir, tendo que se curvar e segurar a barriga
quando mais gargalhadas irrompem dela.
— Sonhando acordada de novo, irmãzinha? — Jane pergunta-me
sarcástica. Ela aponta para a minha parede, onde tenho um enorme pôster do
meu ídolo. — Chris Evans está no mesmo lugar, a propósito.
— Oh, não — gemo enterrando a cabeça no meu travesseiro. Foi
apenas um sonho? Um maldito sonho! — Que horas são?
— Cedo o bastante para você pegar o metrô, tarde demais para chegar
a tempo no trabalho. — Jane se afasta e eu pulo da cama, corro até o guarda-
roupas, puxando desesperadamente as primeiras peças que vejo diante de
mim. — O que é isso?
Viro-me e vejo minha irmã agachando-se para pegar o pequeno
pedaço de papel dobrado. Ela se ergue e desfaz as dobras para ler o texto
contido ali.
— Não é nada! — exclamo e tento puxá-lo de suas mãos. Mas ela se
afasta e continua lendo.
— Jamie, o que é isso? Lista de desejos? Quantos anos você tem? —
Ela ergue os olhos para mim e depois volta para o papel, lendo em voz alta os
pedidos que escrevi. — Comprar a casa vermelha…
— Jane, me devolve isso! — exijo, mas ela me ignora e continua
falando.
— Sério, Jamie? Esquece a casa do Brooklyn, nunca vai ser nossa de
novo. — Ela me olha tristemente por um momento, porque ambas sabemos
que é realmente impossível que esse desejo seja realizado. — Vejamos o que
mais temos aqui… Meu Deus, o que é tudo isso?
— Jane, esses são os meus desejos. Meus — enfatizo.
— Roubar algo? — Os olhos dela crescem enormes. — Tá louca,
garota?
— Eu… É só… Não realmente roubar… Érr… Sempre me pareceu
uma aventura.
Jane rola os olhos e prossegue:
— Fumar maconha? Sério isso? — Jane continua lendo minha lista
incansavelmente. — Gritar muito alto. Que tipo de desejo é esse? Pular de
paraquedas. Entrar em uma festa de penetra. Você nunca fez isso?
— Não — respondo emburrada e aproveito sua distração para
arrancar o papel de suas mãos e enfiá-lo na minha gaveta.
— Você tem cada ideia, Jamie. Não é à toa que o papai sempre diz
que eu sou a realista da família e você a sonhadora. — Ela revira os olhos
outra vez e se vira para sair do meu quarto. — Fiz panquecas, se apresse.
Olho para o meu relógio e vejo que de fato estou atrasada meia hora.
Como não tenho tempo para tomar banho, retiro meu pijama e visto uma saia
preta até os joelhos e um suéter verde da coleção de leve dez pague cinco que
comprei no Walmart. Visto minha meia-calça e também meus sapatos, depois
pego minha bolsa. Lembro-me do meu Nokia Asha que aparentemente nem
para despertador serve mais e empurro-o na minha bolsa. Corro para o
banheiro, penteio meus cabelos e prendo-os em um coque firme. Escovo os
dentes, ponho meus óculos de grau e finalmente estou pronta para sair.
Na cozinha ignoro as panquecas de Jane. Elas cheiram bem, mas eu
sei que ao virá-las do outro lado vão estar pretas como carvão. Digamos que
minha irmã não nasceu para cozinhar. Tenho pena do Tyler, meu sobrinho e
filho da Jane, que está sentado na bancada enfiando o café da manhã garganta
abaixo com a ajuda de um pouco de leite.
— Bom dia, tia Jamie! — Tyler sorri para mim e eu passo por ele
revirando seus cabelos e plantando um beijo estalado em sua bochecha
gordinha.
— Bom dia, Tyler. Café da manhã gostoso? — pergunto com uma
careta.
Tyler olha para os lados e verifica que Jane não está por perto, então
balança a cabeça em um gesto negativo.
— Mamãe não sabe cozinhar como você, tia Jamie — ele sussurra.
— Tem barras de cereal no fundo do armário, são suas — sussurro de
volta, e ele sorri como se eu tivesse oferecido doces.
— Tyler, você terminou seu café? Temos que ir! — Jane surge na
cozinha pronta para o trabalho, vestida em seu uniforme de enfermeira. Pelo
menos para cuidar das pessoas ela tem algum talento. — E você, Jamie,
comeu alguma coisa?
— Ah, é, comi umas panquecas com Tyler — minto. — Já terminei,
estou indo, tenho que correr.
Beijo Tyler mais uma vez e pisco, apontando para o armário. Ele
pisca de volta. Sei que é errado o que nós fazemos, refiro-me a Tyler e eu,
que fingimos gostar da comida da minha irmã quando, na verdade, odiamos.
Até me sinto mal por enganá-la, mas a Jane simplesmente não aceita não ser
boa na cozinha. Uma vez no Natal ela insistiu em fazer o peru. Era a primeira
vez que Jane tentava cozinhar algo, e é claro que foi um fracasso. O peru se
desmanchou, além de ter ficado insosso e queimado. Todo mundo notou que
o peru estava horrível, menos a Jane. Nós até tentamos fazê-la entender que
aquilo não era mais comestível. E ela escutou? Não, é claro que não. Desde
então ela continua cozinhando como se fosse mestre, e nós apenas paramos
de tentar impedi-la.
Tirando o fracasso na cozinha, minha irmã é boa em muitas outras
coisas. Como no papel de ser a minha irmã mais velha e pegar no meu pé em
tudo. Como esposa e também como uma ótima mãe para o Tyler. Jane é
responsável e como ela mesma disse o papai a considera a realista da família.
Perdemos nossa mãe muito cedo. Eu tinha apenas dez anos e Jane, que tinha
o dobro, teve que cuidar de mim e ajudar o papai a passar por esse trauma tão
doloroso em sua vida. Nós costumávamos morar no Brooklyn, em uma casa
de tijolos vermelhos bem grande e bonita. Lembro-me de cada detalhe
daquele lugar, onde fomos tão felizes. Infelizmente, depois que mamãe se foi,
papai virou um alcoólatra, fizemos muitas dívidas e tivemos que vender a
casa. Por sorte, a Jane era noiva do Rick naquela época e, assim que ela
casou, nós viemos morar com ela nesse minúsculo apartamento no Bronx. O
papai, no entanto, escolheu voltar para o Texas e viver com a irmã dele. Ele
não era capaz de lidar com o fato de que tinha perdido a casa que foi o lar em
que viveu com a única mulher que amou.
Sempre sonhei em conseguir aquela casa de volta. Sei que faria meu
pai imensamente feliz se ele pudesse voltar a viver onde toda a história da
nossa família começou. Acho que fiquei tão obcecada com a ideia de ter a
casa de volta que vivo sonhando com ela, como aconteceu hoje. O motivo
principal de eu ter feito uma lista de desejos foi por ela. Ficamos sabendo por
acaso que a casa está à venda de novo e os proprietários estão pedindo quase
quinhentos mil dólares por ela. Não temos como pagar, aliás, quase nem
temos como pagar o aluguel de onde vivemos agora. Ainda assim, não
consigo deixar de sonhar. Papai está certo. Jane é a realista. Eu sou a
sonhadora.
Estou quase deixando o edifício com pressa para chegar ao metrô
quando ouço alguém chamar o meu nome e, enquanto me viro em direção à
voz, rezo para que não sejam elas.
Droga! São elas.
— Jamie, querida! — minha vizinha, Gertrude, grita e acena
chamando minha atenção.
— Jamiezinha, espere! — Minha também vizinha e irmã de Gertrude,
Gladys, acena com os braços no alto.
— Olá, Gertrude, Gladys — cumprimento-as com um aceno. — Estou
um pouquinho atrasada, será que podemos conversar outra hora?
— Ah, mas é rápido, querida — Gertrude diz, parando à minha frente
vestida em seu roupão rosa e pantufas da mesma cor. — É que este fim de
semana nós vamos viajar com o Felipe e precisamos de alguém para ficar
com o Bilbo.
— Jamiezinha, não queremos deixar o Bilbo no canil, ele fica com
depressão naquele lugar — Gladys explica enquanto ajeita seus óculos de
grau sobre o nariz. — Você pode ficar com ele, por favor?
— Ah, eu? Eu não sei… É que eu vou estar ocupada demais esse fim
de semana — esquivo-me.
— Mas o Bilbo é bonzinho, não vai lhe dar trabalho, por favor —
insiste Gertrude, referindo-se ao seu pinscher.
— Jamiezinha, você vai negar um favor para suas vizinhas idosas…
doentes… e precisando de um descanso?
Argh!
— Tudo bem, eu posso ficar com o Bilbo — digo.
— Ai, querida, obrigada! — Gertrude me puxa para um abraço
apertado e beija meu rosto, deixando saliva na minha bochecha.
— Ah, está tudo bem — digo, desvencilhando-me de seu aperto.
— Eu sabia que você era boazinha, Jamiezinha. — Gladys sorri e
aperta as minhas bochechas com força. — Você não estava atrasada?
Merda!
— Eu estou! Tenho que ir, tchau! — grito, já correndo pela rua em
direção ao metrô.
Tenho que revezar, às vezes correndo feito louca pelas calçadas, às
vezes andando o mais depressa que consigo. Moro a três quadras do metrô, só
que esse não é o problema. Morar no Bronx e trabalhar no centro de
Manhattan é que é, mas não posso me dar ao luxo de abandonar esse
emprego. Além disso, eu gosto da Simon’s.
Trabalho em uma grande construtora que atende apenas ao público de
alto nível. Eles são especializados na construção de edifícios residenciais e
comerciais. Todos os dias eu lido com várias pessoas importantes, sejam
clientes ou funcionários. E quer saber de uma coisa? Eu não passo de uma
pequena mosquinha comparada a eles. Pelo menos é assim que eles fazem
com que eu me sinta naquele lugar. Principalmente os meus chefes, esses,
sim, são uns babacas. É como se eu fosse uma escrava, e não uma funcionária
com direitos trabalhistas. A única coisa boa de ter um trabalho inferior ao de
uma secretária é não ter que lidar com a pressão que elas sofrem. Afinal, eu
sou a copeira, ou como eles gostam de chamar: “a garota que serve
cafezinhos”. Você pode ver o que eu sou? Secretárias pelo menos são notadas
porque elas fazem um trabalho importante. Secretárias são necessárias e por
isso elas não são insignificantes. Mas eu? Sou a mosquinha. Ninguém sabe o
meu nome ou se preocupa em saber, porque meus malditos cafés não são
indispensáveis. Eu odeio isso.
Às vezes imagino como seria se eu fosse mais do que uma
mosquinha, se eu fosse como eles, um dos grandões. Eu andaria de cabeça
erguida e as pessoas me notariam. Gostaria de ver como eles olhariam para
mim com outros olhos, enxergando minha existência. Mas é claro que isso
nunca vai acontecer, assim como os meus desejos daquela estúpida lista
nunca vão se tornar reais. Nunca serei nada além da garota que mora no
Bronx e toma café em uma mesa com carimbo de um ferro de passar roupa.
Chego ao metrô ofegante, passo meu cartão e corro para não perder o
próximo trem. Meu telefone começa a tocar no momento em que eu estou
passando pelas catracas. Lutando com o fecho, arranco o aparelho lá de
dentro e olho para a tela. É a Jane. Aperto o botão verde para atender, e em
seguida meu celular se foi. Em um momento ele estava na minha mão e no
momento seguinte o cara que passou na catraca o levou. Eu fui roubada? Oh,
merda, eu fui roubada!
— Ei, você! — Aponto para o garoto vestindo capuz e usando
mochila. Ele não está correndo, mas está andando a passos largos. —
Devolva o meu celular! Socorro! Peguem esse ladrão!
Ninguém me escuta. Ou melhor, escutam, mas preferem me ignorar.
Típico. As pessoas continuam cruzando as catracas e seguem em frente,
enquanto eu luto com a minha bolsa, tentando retornar ao outro lado. É
impossível, portanto, pulo a barra de alumínio e por pouco não caio de cara
no chão. Recomponho-me depressa e começo a correr. O garoto está apenas
alguns metros na minha frente, porém quando ele olha por cima do ombro e
me vê, começa a correr. Faço o mesmo.
— Por favor, eu preciso desse celular! Custou cinquenta dólares e já
era usado! Você consegue roubar algo melhor! — grito esperando que ele
tenha pena de mim. Ele não tem e continua correndo. Começo a ofegar e a
suar também.
O garoto some no meio da multidão e eu desacelero os meus passos.
Ótimo, que dia de sorte. Meu sonho é um sonho, não sou casada com Chris
Evans — aliás, não sou casada. Minha irmã sabe da minha lista estúpida de
desejos. Vou passar o fim de semana com um pinscher mimado, roubaram
meu velho Nokia Asha e estou atrasada para o meu trabalho. O trem! Viro-me
nos calcanhares e começo a correr novamente, não posso me atrasar mais do
que já estou. Vou ser colocada na rua se os meus chefes não tiverem seus
cafés sobre suas mesas. Tenho que pagar minha passagem novamente, passar
pelas catracas e finalmente eu consigo chegar ao trem. Até consigo um lugar
para sentar, o que é uma sorte. Posso respirar.
Estou olhando para uma mulher sentada na minha frente com um
garotinho no colo, ela está lendo para ele. Lembro-me de Jane e de que ela
me ligou, então sei que precisa de alguma coisa. Faço uma nota mental de
ligar para ela quando chegar ao trabalho. A mulher levanta os olhos do livro e
olha para mim sorrindo. Sorrio de volta, mas o sorriso dela morre e ela fica
encarando meus pés. Noto que o homem ao lado dela também está olhando,
assim como os dois rapazes em pé e até uma senhora. Abaixo a minha cabeça
e olho para os meus próprios pés. Descubro que não estou usando um dos
meus sapatos. Ótimo, apenas ótimo.
Quando foi que eu perdi um sapato?
Quando chego aos escritórios da Simon’s Construtora estou descalça,
com um sapato na minha mão e atrasada mais de duas horas. Entretanto,
ninguém parece notar, afinal, eu sou a mosquinha, lembra? Corro para o meu
armário, enfio minha bolsa lá dentro, visto meu avental e vou para a cozinha
preparar café imediatamente. Quando chego lá, encontro as duas outras
mulheres que trabalham comigo. Ambas me lançam olhares de pena.
— O que houve com os seus sapatos? — Janice pergunta-me, sendo a
primeira a notar meus pés descalços.
— Perdi.
A outra mulher, mais jovem, ri.
— Como você conseguiu perder o seu sapato? — Janice prossegue,
encarando meus pés.
— Perseguindo um ladrão que roubou meu Nokia Asha — explico,
preparando minha bancada de trabalho.
— Um ladrão roubou aquele seu celular velho e antigo? — a mais
jovem, Irene, é quem pergunta agora.
— Sim.
— Ele te fez um favor — Irene diz soltando uma gargalhada. Não
acho engraçado.
— Hoje em dia você não pode se descuidar de nada — Janice diz e
desvia os olhos para o meu rosto. — Você precisa conseguir sapatos, a Sra.
Cooper não vai te deixar trabalhar assim.
— Eu sei, eu sei. — Faço um gesto com a mão evitando esse assunto.
— Vou comprar algo no meu horário de almoço.
— A Sra. Cooper está esperando por você na sala dela, Jamie — Irene
murmura e eu levanto os meus olhos arregalados para os dela. — E ordenou
que levasse um café assim que chegasse.
Isso não é nada bom. Quando você é chamada na sala de um superior
quer dizer que algo ruim está para acontecer. É engraçado como eles nunca
me notam quando faço algo bom, contudo, quando faço algo errado é como
se já estivessem prontos para me apunhalar.
Olivia Cooper é uma das minhas superiores, ela é gerente de alguma
coisa importante com a qual eu não me importo, mas ela também adora
infernizar a vida dos empregados. Ela é a neta mais velha de Elizabeth —
proprietária da construtora — e por isso se acha no direito de mandar e
desmandar aqui dentro. As coisas estão ficando piores a cada dia, pois
Elizabeth está muito velhinha, cansada, doente e quase não pode vir até a
empresa. Enquanto isso seus netos brincam com o seu império como bem
entendem. Elizabeth é uma mulher maravilhosa que eu tive o prazer de
conhecer pessoalmente. Fico triste em pensar que, quando ela se for, a
construtora vai se tornar um lugar de víboras. Uma mais pronta do que a
outra para soltar seu veneno.
E o pior é que não resta ninguém que possa comandar a construtora
tão bem quanto ela. Seu neto — Andrew — é o cara mais babaca que eu já
conheci. É mimado, metido, arrogante, cretino, mulherengo, um péssimo
funcionário. Eu cuspo no café dele sempre que ele erra o meu nome de
propósito. Deve ser de propósito, já que eu carrego um crachá ridículo no
peito com o meu nome em letras garrafais. Eu desconfio que apesar de ele ser
todas essas coisas ruins, Elizabeth gostaria que fosse ele a assumir a direção
da empresa. Ela ama o neto, o criou como filho desde pequeno. Só que ela
vai correr um risco enorme de pôr todo o seu patrimônio a perder, se for
Andrew a pessoa a comandar tudo.
Ainda há Abigail, outra neta de Elizabeth, só que essa não quer nem
saber da construtora, apesar de estar aqui quase todos os dias. Abigail gosta
de arte, ela gerencia uma galeria e seu sonho é ser dona do lugar. Acho, sem
dúvidas, que ela é pessoa mais legal e divertida dessa família e com certeza a
melhor neta de Elizabeth. Desde que eu comecei a trabalhar na construtora,
mais ou menos há um ano, ela se tornou a minha melhor amiga. Abigail é a
única que não me trata como uma mosquinha, muito pelo contrário, ela me
faz sentir como se eu fosse importante, como se eu também fosse a sua
melhor amiga. Mas não importa qual deles assuma a presidência, ninguém
será tão bom quanto Elizabeth Simons.
— Você pode entrar, a Sra. Cooper está aguardando-a — a secretária
me avisa assim que chego à sala de Olivia.
Carrego a bandeja com dificuldades e quase não consigo abrir a porta
com as duas mãos ocupadas. A secretária nota meu sufoco, porém se vira e
continua a digitar incansavelmente no seu notebook, como se eu nem
estivesse ali. Com muito esforço, faço uma entrada um pouco barulhenta na
sala da Sra. Cooper, que está de pé atrás de sua mesa me encarando
atentamente. Eu não sei como ela consegue ser tão bonita e ao mesmo tempo
tão assustadora.
Olivia não é muito mais alta do que eu, mas ela usa sapatos de saltos
com pelo menos vinte centímetros e isso a torna um pouco intimidadora.
Assim como seus olhos castanhos, que parecem avaliar tudo com imensa
atenção. Suas sobrancelhas finas e escuras, quando arqueadas, dão a ela
apenas uma expressão: desdém. É assim que ela está me olhando agora. Os
cabelos dela são castanhos com finas luzes caramelo e a boca é fina e bonita.
Olivia é como uma modelo, toda esguia e cheia de graça e suavidade. Mas
isso é apenas o que sua aparência física é, pois por dentro Olivia tem um
coração de gelo e é a mulher mais fria que já conheci.
— Até que enfim o meu café chegou, eu pensei que você me faria ir
buscá-lo — ela resmunga.
Duvido que ela fosse buscar o próprio café…
— Desculpe, senhora, eu tive alguns problemas. Perdi o metrô, depois
fui assaltada e então eu fiquei sem sapa…
Olivia levanta a mão e silencia-me.
— Eu não quero ouvir os seus problemas, Jamie, deixe o café e saia
da minha sala.
— Sim, senhora — murmuro e mexo-me para colocar a bandeja sobre
sua mesa.
— Ah, e, Jamie, não se atrase outra vez, porque na próxima você não
terá seu emprego te esperando — Olivia diz em uma voz firme e autoritária.
— Sim, senhora. — Abaixo a minha cabeça e viro-me para deixar a
sua sala.
— Jamie — ela chama, arrastando lentamente o meu nome na sua
língua como se pronunciasse “Jamieee”.
— Senhora? — Viro-me novamente. Ela está encarando os meus pés,
droga…
— Por que você está descalça?
— Então, senhora, é que quando eu estava no metrô meu telefone
tocou e daí de repente um cara passou. Então ele pegou o meu celular, corri
atrás dele… E a senhora não quer saber, não é?
Sua sobrancelha se curva ainda mais, aprofundando sua expressão.
— Não, eu não quero saber — ela responde dura. — Encontre
sapatos, você não pode trabalhar assim. Se não conseguir, está demitida.
— Sim, senhora, de-desculpe.
— Saia — ela ordena apontando para a porta.
Passo a manhã trabalhando escondida na cozinha, já que não consegui
sapatos em lugar algum e se Olivia me visse novamente eu teria de dar adeus
ao meu emprego. E de jeito nenhum eu podia perdê-lo, ainda mais na
situação delicada em que me encontro. No meu horário de almoço eu saio em
busca de sapatos e com apenas vinte dólares na carteira consigo um par de
rasteirinhas fuleiras que pelo menos vai evitar que eu perca o emprego.
À tarde recebo ordens de limpar duas salas de escritórios vazias e
assim que termino está na hora de servir o café dos grandões. Volto para a
cozinha e preparo cada um deles. Para Olivia Cooper: Expresso, sem açúcar.
Para seu marido Benjamin Cooper: Macchiato. Para Andrew: Cappuccino.
Para Jackson: Latte. Assim que finalizo, coloco cada um deles em suas
bandejas. Levo o de Olivia primeiro, porque ela gosta de tomar seu café
pontualmente às quatro da tarde. Quando entro em sua sala, ela olha quase
que na mesma hora para os meus pés e eu sorrio internamente por estar de
rasteirinhas. Toma essa, megera! Deixo a bandeja sobre a mesa, ela não diz
nada, apenas me dispensa com um gesto de sua mão.
Em seguida levo o café para Benjamin Cooper. Ele é marido de
Olivia, os dois são casados há três anos. Acho que eles fazem um par
perfeito. Benjamin é alto, magro e tem um porte muito elegante. Cabelos e
olhos escuros e quase nunca sorri. A não ser na presença de Elizabeth
Simons, parece que seus sorrisos são guardados apenas para ela. E talvez
sejam mesmo, ele é o maior puxa-saco. Acho que ele acredita que pode de
alguma forma ser incluído no testamento ou até mesmo ser escolhido para
assumir a direção da empresa. Deixo seu café com a secretária, pois ela me
avisa que ele está em uma reunião.
Jackson sorri quando entro em sua sala. Perto dele eu fico
estranhamente constrangida, acho que é porque ele é muito bonito. Deve ter
mais 1.80 m de altura, pois é uma muralha de homem. Tem cabelos castanho-
claros e uma barba rala que o deixa muito charmoso. Seus olhos são de um
verde muito intenso, e ele tem um meio sorriso que deixa qualquer uma
sonhando acordada. Deixo seu café sobre sua mesa, ele acena dizendo que
está delicioso como sempre e eu saio de fininho, com as bochechas coradas.
Jackson é advogado, melhor amigo de Andrew, e Elizabeth o tem como se
fosse da família. O bom de ter o tipo de trabalho que eu tenho é que você
escuta de tudo, vê de tudo e ninguém nunca se importa.
Volto para a cozinha e pego o café de Andrew. Espero que hoje ele
esteja de bom humor e acerte o meu nome, ou eu com certeza vou fazer
questão de colocar um pouco da minha saliva em sua bebida. E, Deus, eu juro
que se ele continuar insistindo em me chamar de Janie vai chegar o dia em
que eu colocarei laxante em seu café. O escritório de Andrew fica no terceiro
andar, e quando estou passando pelo corredor, em direção à sua sala, vejo que
Elizabeth Simons resolveu dar o ar de sua graça e está visitando a
construtora. Ela está ocupada conversando com Benjamin, mas assim que ela
me vê sorri.
— Boa tarde, Jamie — cumprimenta-me, deixando Benjamin com um
olhar surpreso no rosto.
— Boa tarde, Sra. Simons.
— Como você está? — pergunta-me e me lança um olhar de
compreensão.
— Ótima, obrigada. A senhora também parece bem.
— Obrigada, querida.
— Com licença, Sra. Simons, preciso levar este café.
— É para o Andrew? — pergunta-me inclinando-se para ver o
conteúdo dentro da xícara sobre a minha badeja.
— Sim, senhora.
— Depois que você levar esse, poderia, por favor, fazer um para mim
e levar na sala dele? Estou indo pra lá daqui a pouco.
— Claro, pode deixar. — Sorrio e me afasto.
Sigo até a sala de Andrew, mas a mesa de sua secretária está vazia.
Quando recebi este emprego, fui muito bem alertada de que nunca devia
entrar na sala de um dos grandões sem que a secretária autorizasse antes. E o
que eu faço em uma situação dessas? Talvez eu deva deixar o café sobre a
mesa dela, mas e se esfriar? Andrew odeia tomar a bebida fria, ele me
colocaria na rua. E se eu bater em sua porta, será que ele ficaria muito bravo?
E se ele estiver em algum tipo de reunião superimportante e eu atrapalhá-lo?
Será que eu devo voltar e trazer o café em outro horário? Mas e se ele quiser
o café agora? Será que a secretária foi ao banheiro? Será que vai demorar?
Quanto tempo vou ficar parada na frente dessa porta, segurando essa bandeja
pesada, ponderando sobre o que fazer em relação ao cappuccino do babaca do
meu chefe?
Quando eu tomo a decisão de me virar e ir embora é que ouço os
sons. Por um momento eu penso que estão conversando, talvez rindo. Então
ele está aqui. Será que eu posso bater? Aproximo-me da porta, mas ainda não
consigo ouvir se ele está em reunião com alguém. Largo a bandeja na mesa
da secretária e coloco meu ouvido bem perto da porta, e é quando eu ouço
novamente. Arregalo meus olhos e levo a mão à boca, impedindo-me de rir
alto. Minhas bochechas queimam, sei que estou corando.
Oh, Drew, sim!
Mais forte, Drew, mais forte!
Ai, meu Deus, eu vou gozar, Drew. Por favor!
A voz é da nova secretária de Andrew — Tracy — e eu mal posso
acreditar que estou ouvindo meu chefe fazendo sexo dentro do escritório com
ela. Sem dúvidas essa é a situação mais embaraçosa que já vivenciei. Será
que eles têm um caso? Será que estão namorando? Impossível. Andrew é um
mulherengo, ela deve ser apenas um divertimento. Que doidos! Será que eles
não percebem o quanto é perigoso o que estão fazendo? E se alguém de
repente chegasse e os visse assim?… Putz, Elizabeth! Oh, meu Deus, ela vai
matá-lo. Não, Elizabeth vai deserdar Andrew se o pegar transando na sua sala
em horário de serviço. Ou em qualquer horário.
O que é que eu ainda estou fazendo aqui?
Vai, gostosa, empina essa bunda!
Aii, Drew, aii, eu estou quase lá, estou quase!
Porra, eu vou gozar!
Viro-me e pego a minha bandeja com as mãos tremendo, o corpo
suando e as bochechas rosadas. Tenho que cair fora daqui! Vai ser o maior
escândalo, pobre da Elizabeth, que vai acabar vendo essa cena horrorosa. Ela
não merecia isso, ela ama tanto o idiota do neto, sonha que ele vai se tornar
alguém melhor. Coitada, não sabe de nada, a inocente. Ai, meu Deus, e se ela
passar mal por presenciar essa bagunça? Andrew vai se odiar para sempre por
ser o culpado em deixar a avó passar mal. Droga! Nesse caso será que eu não
estou colaborando para isso? Quer dizer, eu poderia evitar que toda essa
desgraça acontecesse, não poderia? Eu poderia bater na porta e interrompê-
los. Poderia avisar da presença de Elizabeth. Salvaria Andrew e salvaria
Elizabeth. Não que eu me importe com Andrew, eu me importo é com o bem-
estar de Elizabeth, que não merece nada disso. Afinal, o que é que eu estou
pensando? Eu não tenho que me importar com nada do que acontece na vida
de qualquer um deles. Já tenho os meus próprios problemas para me
preocupar.
Começo a voltar para o corredor e é quando eu vejo Elizabeth.
Apenas uma senhora de setenta e seis anos, sorridente e pronta para fazer
uma visita ao neto. Uma visita que vai se tornar o pior dia de sua vida, tudo
porque eu sou uma egoísta e não quero ajudar Andrew por ele ser o idiota que
me chama de Janie. Deus, se você está vendo isso, eu estou indo fazer uma
caridade, deve contar um pouco para conseguir minha entrada aí no céu, né?
Ok. Eu posso fazer isso. Eu não posso fazer. Merda, eu não sei se
posso fazer isso.
Volto correndo para a sala de Andrew, abandono a bandeja em cima
da mesa da secretária e aproximo-me da porta, já não posso ouvir som algum.
Respiro fundo e dou duas batidinhas. Não há nenhuma resposta, então eu
bato de novo. Em seguida ouço a voz de Elizabeth e eu sei que ela está perto,
e o pior, está acompanhada de outros três funcionários. Bato novamente,
dessa vez muito mais forte, e continuo batendo.
— Quem é? — A voz de Andrew soa irritada do outro lado.
— É a Jamie, Sr. Simons. Trouxe o seu café — digo, não querendo
denunciar que sei exatamente o que ele está fazendo e com quem.
— Deixe na mesa, estou ocupado — responde-me ríspido.
Idiota! Estou salvando sua vida, seu imbecil!
— Sr. Simons, eu sei que está fazendo sexo com a sua secretária. Eu
realmente não gostaria de ter ouvido, foi sem querer. Mas eu acho que o
senhor iria gostar de saber que Elizabeth Simons está prestes a fazer uma
visita ao senhor, aqui, na sua sala — despejo rapidamente, as palavras saem
atropeladas da minha boca.
O silencio de repente inunda a sala e eu acho que acabo de perder o
meu emprego por confessar que estou ouvindo meu patrão atrás das portas.
No entanto, Andrew abre a porta nesse momento e eu perco o fôlego. Uau!
Ok. Eu sempre dei uma secadinha no meu chefe. Em todos eles, na verdade,
pois todos são atraentes. Contudo, tenho que confessar que Andrew despertou
borboletas na minha barriga desde que eu o vi pela primeira vez. Talvez não
seja só pela sua beleza, mas por ele ser um mulherengo, e eu sempre tive essa
coisa de gostar justo daquele que não se deve. Não que eu goste de Andrew,
eu só estou explicando por que ele deixa a minha boca seca e as minhas mãos
começam a suar ao mesmo tempo em que minhas pernas tremem e eu fico
completamente fora de órbita.
Andrew é bem alto, assim como o Jackson. Só que a pele dele é mais
pálida e os cabelos são de um tom de loiro escuro. Seus olhos são azuis como
o céu em um dia sem nuvens. Ele tem lábios finos e um sorriso encantador
que usa especialmente para conquistar as mulheres. Seu corpo é magro, com
músculos firmes na medida certa. Do tipo que malha para se manter saudável,
não para criar músculos exagerados. E agora eu sei também que, apesar de
ele não ter uma barriga de tanquinho, ela é bem sequinha e atraente. Do tipo
que você fica encarando e da qual não consegue desviar os olhos, igual eu
estou fazendo agora como uma perfeita idiota.
— Você disse que a minha vó está vindo pra cá? — Andrew
pergunta-me em pânico.
— S-sim, foi o que e-eu disse — gaguejo.
— Merda! — Andrew resmunga, em seguida dá um suspiro. —
Tracy, cai fora, a vovó está vindo!
Cinco segundos depois Andrew escancara a porta e a secretária deixa
a sua sala completamente vestida, mas com uma expressão de quem acaba de
ser fodida. Andrew caminha até a sua poltrona e puxa de lá sua camisa branca
toda amassada.
— Humm, eu acho que eu já vou indo — murmuro constrangida.
— Não, não — Andrew diz, vestindo a camisa. — Traga o meu café.
Faço uma careta, mas não digo nada. Volto para fora e pego a bandeja
sobre a mesa da secretária. Tracy parece completamente perfeita, retocando
apenas o batom como se o seu trabalho estivesse terrivelmente entediante. Ela
nem se importa com a minha presença, como se eu não tivesse acabado de
admitir que sei o que ela e o seu chefe estavam fazendo naquele escritório.
Volto para a sala de Andrew e coloco a bandeja sobre a sua mesa.
— Precisa de mais alguma coisa? — pergunto.
— Não. — Andrew balança a cabeça. — Na verdade, se você puder
manter… Segredo.
— Não se preocupe, senhor Simons, eu não sei de nada.
— Obrigada, Janie. — Ele nem olha nos meus olhos quando me
agradece, pronunciando o meu nome errado outra vez.
— É Jamie, senhor, meu nome é Jamie — digo entredentes.
— Foi o que eu disse — ele resmunga enquanto ajeita os botões da
camisa.
— Que imbecil — penso, e apenas quando Andrew levanta a cabeça e
olha diretamente para mim é que percebo que acabei falando alto demais.
— O que foi que você disse?
— Que o senhor tem uma marca de batom no seu pescoço, foi o que
eu disse. — E ele tem mesmo, uma marca bem grande e borrada de batom
rosa. Andrew me lança um olhar desconfiado, mas não diz nada. Ufa, foi por
pouco!
— Cadê a merda do espelho?! — Andrew reclama, procurando sobre
sua mesa e dentro das gavetas. Ele esfrega o pescoço e faz uma sujeira maior
ainda, espalhando a marca. De repente ele congela e eu também, quando
ambos ouvimos a voz de Tracy e Elizabeth do lado de fora do escritório. —
Me ajuda aqui!
— O quê? — indago confusa.
— Venha aqui, Janie, limpe essa porcaria do meu pescoço — ele
exige.
Não me movo.
— Tudo bem, Sr. Simons. Vamos fazer um acordo aqui, você pede
por favor e usa o meu nome corretamente, e eu até posso ajudá-lo —
esclareço. Não acredito que essas palavras saíram da minha boca!
Andrew arregala os olhos com a minha ousadia, porém quando ouve
novamente a voz de sua avó sua expressão muda de surpreso para
desesperado. Ele lança um olhar para o meu crachá e um leve sorriso irônico
surge em seus lábios.
— Jamie, é claro, desculpe. — Ele franze o cenho e eu fico me
perguntando se alguma vez ele já teve de pedir um favor a alguém. — Jamie,
você pode, por favor, me ajudar a retirar essa mancha do meu pescoço?
— Mas é claro que eu posso, Sr. Simons. — Sorrio sarcástica e
caminho até ele. Puxo o lenço de papel que ele tem nas mãos e uso para
esfregar sobre a sujeira que ele fez. O cheiro do perfume dele é forte e
almiscarado, simplesmente delicioso, sem querer eu inclino-me um pouco
mais para sentir essa delícia.
— Andrew! Jamie! — A voz de Elizabeth chega até mim e eu me viro
rapidamente para encará-la. Ela está no escritório, seus olhos vagam entre
mim e Andrew. — O que vocês estão fazendo?
— Eu é… Eu estava… Humm — gaguejo.
— Jamie estava limpando a minha camisa, eu virei um pouco do meu
cappuccino. — Andrew diz rapidamente, percebo que ele enfatizou o meu
nome. Sorrio por dentro.
— Limpando a camisa? — Ela arqueia levemente uma sobrancelha e
olha para a camisa amassada, mas impecável, de Andrew. Depois ela olha
para mim, próxima a Andrew e segurando o pequeno lenço sujo de rosa.
— Vó, eu não sabia que você ia passar aqui hoje, por que não me
avisou? — Andrew pergunta desviando o foco da conversa e afastando-se de
mim. — Jamie, você já pode ir.
— Sim, senhor — digo e passo por Elizabeth. — Vou buscar seu café,
senhora.
— Obrigada, Jamie — Elizabeth agradece olhando-me desconfiada.
Saio a passos largos do escritório e depois peço para Janice levar o
cappuccino de Elizabeth. Não tenho coragem de voltar para aquela sala
sabendo que de alguma forma, a partir de hoje, eu não sou mais uma
mosquinha, pelo menos não para o mulherengo Drew Simons.
CAPÍTULO DOIS
--—————————————————————————————

Andrew

Puta merda! Sou o maior sortudo do planeta!


Eu podia ter passado pela pior situação possível apenas alguns
minutos atrás, mas eu me safei desta. Por que a vovó aparece sempre nos
piores momentos? Estou até cogitando a ideia de colocar algum segurança em
sua cola. A velhinha parece ter um radar em sua cabeça, que usa
principalmente para saber quando eu estou fazendo alguma coisa que ela
considera errado. É sempre assim: Drew espancou a prima por assaltar seu
cofrinho, Elizabeth chega. Drew bateu a Mercedes novinha no SUV do
vizinho, Elizabeth chega. Drew deu um soco no babaca do frentista, Elizabeth
chega. Drew está ganhando um boquete da secretária nova, Elizabeth chega.
Érr… esse não foi um dos meus melhores momentos…
— Chupa gostosa! — exigi empurrando sua cabeça para baixo.
— Hmm, você é tão gostoso, Drew. — A mulher que eu acho que se
chama Sally suga o meu pau com avidez. Ela me leva profundo em sua
garganta e lambe todo o caminho de cima a baixo. Ela sabe chupar bem.
— Vai! Eu vou gozar, chupa mais forte! — ordeno puxando seus
cabelos e empurrando-a um pouco mais.
A mulher é a nova secretária aqui da construtora, desde que eu a vi
sabia que estaria nesse lugar agora. Sally solta um gemido baixo, e logo
depois ela me suga com força, levando-me ao meu limite, e eu gozo com um
rugido. Sally — eu acho que foi esse o nome que ela disse, mas não tenho
certeza. — continua lambendo cada gota do meu sêmen. Então nós dois
ouvimos o barulho. É um ranger suave que ambos conhecemos. O som da
porta do escritório se abrindo. Eu até tento com algum esforço tirá-la lá de
baixo, em sua posição sobre os joelhos, mas é tarde demais.
— Jesus, mas o que é isso? — vovó grita quando nos pega no flagra.
— Que barbaridade é essa, Andrew?
— Vó, eu posso explicar. — Empurro a garota para trás e puxo
minhas calças para cima.
— Explicar? — ela grita novamente completamente alterada. —
Andrew, eu pensei que você fosse um adulto e soubesse que isto é um lugar
de trabalho!
— Eu sei vó, eu sei. Escute, eu sinto muito. Não vai acontecer
novamente. — Fecho o meu zíper e aproximo-me da vovó tentando acalmá-
la.
— Mas é claro que não vai acontecer novamente, seu garoto
insolente! — A vovó levanta a big bolsa dela feita de couro de cobra e vem
para cima de mim, tentando acertar-me com golpes pesados e repetitivos.
— Ai, droga, vó, solta isso — peço e tento ficar longe dela, porque a
velhinha tem uma força e tanto.
— Eu deveria ter dado uma lição em você enquanto ainda era
pequeno! — Elizabeth exclama avançando com sua bolsa, que parece de
tijolos, e acertando o meu peito.
— Para com isso, vó!
— Você não aprende nunca, Andrew? Será que você não percebe o
quanto me machuca fazendo essas coisas? — Ela larga a bolsa de repente e
seus olhos se enchem de lágrimas. Ai, merda…
— Vó, vozinha, me desculpe, a senhora não devia ter visto isso, não
deveria ter acontecido. Sinto muito. — Aproximo-me hesitante, com medo de
que ela tente me atacar novamente. — Não vai acontecer mais, juro.
— Este é o problema, Andrew — ela murmura com a voz embargada.
— Você não muda nunca. Já me prometeu tantas vezes que não faria tantas
coisas e, no entanto, está cada vez pior. Não sei o que vai ser de você,
Andrew, se não tomar juízo. Você não é mais uma criança, e sim um adulto.
Deveria se comportar como um homem da sua idade, não como um
adolescente mimado!
— Mas, vó… — Tento abraçá-la, mas ela me afasta com um
empurrão.
— Escute aqui, Andrew, eu ainda sou dona de toda a minha fortuna e
isso também quer dizer que eu mando nesta construtora. Você é meu neto,
mas aqui dentro é meu funcionário. O que você fez é motivo suficiente para
demissão.
— O quê? — pergunto em choque. — Você vai me demitir?
Elizabeth respira fundo, junta sua bolsa do chão e ergue a cabeça
olhando diretamente para mim.
— Estou rebaixando você de cargo, Andrew — Elizabeth anuncia. —
Seu superior agora é Benjamin.
— Que porra é essa, vó? Benjamin não vai ser meu chefe!
— Olhe o linguajar, Andrew — Elizabeth repreende furiosa. — Ou
aceita Benjamin como seu superior ou está demitido. E se esta cena horrível
que eu presenciei voltar a acontecer tenha certeza de que eu não serei tão
compreensiva quanto estou sendo hoje.
— Vó, eu sei que pisei na bola, mas não faça isso comigo — peço.
— Tudo o que eu faço é para o seu bem, querido. — Elizabeth vira as
costas e caminha para fora, mas antes faz uma pausa na porta. — Eu falei
sério quando disse que não quero que isso se repita. Andrew, eu amo você,
mas não deixarei tudo aquilo que conquistei com muito trabalho nas mãos de
alguém que não dá o devido valor.
— O que isso quer dizer, vó? — pergunto engolindo em seco.
— Isso quer dizer, Andrew, que ou você vai fazer por merecer o seu
lugar aqui e seu direito ao meu patrimônio, ou eu farei o que estiver ao meu
alcance para que você não receba nada. E, querido, eu não estou fazendo
isso para o seu mal. Eu errei, Andrew, errei quando te fiz um garoto mimado,
porém, se eu posso corrigir isso, então eu vou fazer. Prometi aos seus pais
que eu te faria um homem incrível do qual eles sentiriam muito orgulho, não
vou falhar com eles, Andrew. Não vou…
— Mas, vó…
— Chega, Andrew. — Elizabeth levanta a mão silenciando-me. —
Nada mais precisa ser dito. Agora ajude essa moça a encontrar outro
trabalho e, por favor, tente não assediar a próxima secretária. É para o seu
bem, você poderia ser denunciado por essa conduta.
Eu tentei. Juro que tentei não assediar minha nova secretária por três
motivos: não perder a minha herança, não provocar a demissão de outro
funcionário da construtora e também para não decepcionar a minha avó. Mas
Tracy é muito gostosa e ela ficava me tentando com aquela boca que eu sabia
que seria perfeita em volta do meu pau. Então foi impossível conter os meus
impulsos e ninguém pode me culpar. Se colocassem uma baranga para
trabalhar no meu escritório nada disso teria acontecido, mas quase sempre
minhas secretárias são atraentes. Lutei contra a tentação por três semanas
inteiras. Mas ela sempre encontrava um jeito de chamar a minha atenção. Às
vezes com aquele decote deixando pouco para a imaginação ou então se
agachando na minha frente e expondo sua bunda aos meus olhos. Que não é
lá uma das mais bonitas que já vi, ainda assim, despertou a minha libido. Na
quarta semana já era demais, quando ela veio rebolando para a minha sala eu
não pude me conter. E é claro que ela estava mais do que disposta a ficar
sobre seus joelhos e chupar tudo o que eu pudesse dar a ela. Também foi
neste dia que a vovó resolveu aparecer inesperadamente no meu escritório.
De novo.
Jamie Collins salvou a minha vida ou, pelo menos, a minha herança.
Ela foi atrevida o bastante ao me obrigar a pedir por favor pela sua ajudinha.
Mas levei em conta sua coragem e sua bondade em me avisar da presença da
minha avó. E quando Elizabeth adentrou o meu escritório, sorri aliviado
porque desta vez ela não havia me pegado no flagra. Dispensei Jamie e
sentei-me em minha poltrona.
— Você deveria estar em casa descansando, vó — falei,
repreendendo-a.
— Deixe de besteira, Andrew — vovó resmunga. — Eu estou ótima e
preciso ficar de olho na minha construtora antes que vocês coloquem tudo a
perder.
Faço um gesto para a poltrona em frente à minha mesa e vovó se
senta, colocando a bolsa sobre seu colo.
— Você deveria confiar mais em mim.
— Se você me provasse sua confiança… Por enquanto prefiro
conferir tudo com os meus próprios olhos.
— Vó, isso tudo é pelo que aconteceu aqui no escritório? — pergunto
e prossigo. — Porque se for isso, eu estou sendo responsável.
— Ah, Andrew. — Vovó suspira. — Se fosse assim tão fácil… O
problema é que não é apenas o que aconteceu no escritório, é tudo. Você nem
percebe como olha para os nossos funcionários? Como se eles fossem algo
inferior a você. Que coisa mais feia!
— O quê? — resmungo. — De onde a senhora tirou isso?
— E não é só isso, Andrew. Você quase não se importa com os
projetos da construtora, passa seu tempo assistindo a filmes ou escutando
música dentro do escritório, em vez de trabalhar.
— Vó, você está me filmando? — Olho para as paredes lisas da
minha sala e não vejo câmeras. — Como a senhora sabe disso?
— Oh, Andrew. — Vovó comprime os lábios em uma careta. — Eu te
conheço muito bem, meu neto, e sei que você não está dando tudo de si para
melhorar.
— Eu já disse que estou tentando, estou tentando — minto.
— Não acredito em você e é por isso que resolvi tomar minhas
próprias atitudes em relação a isso — ela diz.
— Que atitudes? Do que a senhora está falando?
— Eu convoquei uma reunião hoje com seus primos e minha
advogada, pois tenho algo muito importante a dizer.
— E eu só fiquei sabendo agora? — resmungo.
— Todos ficaram sabendo agora, foi algo repentino.
— Do que se trata? — pergunto curioso.
— Você vai saber com todos os outros. Acho melhor irmos para a
sala de reunião e esperarmos Abigail lá.
— Tudo bem — digo e fico de pé. — Mas, vó, pensa bem no que
você vai fazer.
— Eu já pensei, Andrew, eu já pensei. — Vovó sorri e por incrível
que pareça eu estremeço, não é um sorriso amigável.
Quando chegamos à sala de reuniões, a vovó assume sua cadeira na
ponta da mesa. Sua advogada, Donna, está sentada ao seu lado esquerdo. Na
outra ponta da mesa, ocupando o segundo cargo mais alto da empresa, está
Benjamin. À direita dele está sua esposa e minha prima, Olivia. Está presente
também um segundo advogado da empresa, Jackson Curtis, que também é
meu melhor amigo. Além da minha outra prima, Abigail Simons, que não
ocupa cargo nenhum na construtora, mas está sempre presente para palpitar
nas decisões. As outras cadeiras são ocupadas por outras pessoas com cargos
de importância na empresa. Sento-me entre Jack e Abby, pois se tenho
aliados dentro desse lugar, são eles. Nenhum de nós tem ideia da finalidade
dessa reunião, pois a vovó permanece fazendo mistério. Finjo estar calmo, só
que estou suando de tanto nervoso. Elizabeth Simons não convoca reuniões
desse tipo a não ser que o assunto seja muito sério. E eu não sou lá a pessoa
mais apreciadora de assuntos sérios.
— O que sua avó está aprontando agora? — Jackson sussurra ao meu
lado.
— Eu não sei.
— Será que é o testamento?
— Acho que não — murmuro. — Se fosse isso ela convidaria suas
filhas também, mas estão apenas os netos.
— Então deve ser algo apenas da empresa.
— Não tenho certeza, mas deve ser.
— Será que é algo relacionado ao Benjamin?
Dou de ombros.
— Você também não serve para descobrir nada — Jack resmunga.
— É porque eu pago você para fazer isso — replico.
— Vamos começar a reunião — vovó diz e todos se calam e a
observam. — Reuni vocês porque são os meus principais herdeiros e estou
prestes a tomar uma decisão que envolve a todos.
— Benjamin não é seu herdeiro, vó — aponto.
— Cala a boca, Andrew — Olivia assobia.
— Olivia, não se intrometa, Andrew não disse nada de mais —
Abigail me defende.
— Quietos! — Elizabeth ordena. — Será que eu posso prosseguir ou
mais alguém vai me interromper?
Todos se calam.
— Como vocês sabem, não tenho mais condições de estar na direção
dessa empresa e a construtora precisa de alguém no comando — vovó
prossegue. — Eu tinha a preferência de que Andrew assumisse esse lugar em
questão.
— Rá! Eu sabia! A vovó vai me colocar na presidência! — sussurro
para Jackson.
— Drew, saca o “tinha” da frase — Jack responde e seus olhos estão
fixos na vovó. Ele está tão branco que parece ter visto um fantasma. — Eu
estou começando a pensar que não vamos gostar do rumo que esta reunião
vai tomar.
— Como assim tinha preferência em mim, vó? — pergunto elevando
a voz para ser ouvido. — Eu sou o único aqui competente o bastante para
comandar a Simons.
— Você era o único, Andrew — vovó prossegue. — Infelizmente
suas ações nos últimos meses me fizeram avaliar minha decisão. Eu preciso
de alguém responsável, inteligente, cooperativo e educado para estar diante
dos meus negócios. Addison ainda está na faculdade e cursando moda.
Abigail é apaixonada por arte e não tem interesse em assumir meus negócios.
Olivia não tem todas as qualificações necessárias para administrar essa
empresa, ao menos por enquanto. E Andrew… Bom, Andrew não se encaixa
no perfil exigido para o cargo.
— O quê? Mas que merda é essa, vó? — xingo um palavrão sob a
minha respiração acelerada. — Eu trabalho aqui desde que tinha dezoito
anos. Fiz duas faculdades para atender às exigências do cargo. Como posso
não me encaixar na porra do perfil?
— Ai, Andrew, você não poderia se fazer mais óbvio. — Olivia ri. —
Está claro por que a vovó não te quer na presidência.
— Cala a boca, Olivia — resmungo.
— Chega, Andrew! — vovó grita, alterada. — Olivia está certa, não
preciso colocar os motivos aqui, eles estão bem óbvios.
— Mas, vó, se eu não sou qualificado para administrar a construtora,
quem mais vai ser? — pergunto.
Elizabeth percorre os olhos sobre todos na mesa e fita a pessoa mais
improvável.
Porra, não!
— Benjamin tem ocupado há um mês o cargo mais alto dessa
empresa, que antes pertencia ao Andrew. Nessas últimas quatro semanas ele
fez pela Simon’s mais do que Andrew tem feito nos últimos meses. Portanto,
Benjamin, se você aceitar, gostaria de nomeá-lo o novo presidente da
construtora. — Vovó sorri docemente.
— Como assim, Benjamin? — Levantei-me batendo o punho na
mesa. — Você vai negar a presidência ao seu neto e colocar um
desconhecido no lugar?
— Benjamin é meu marido, não um desconhecido! — Olivia
exclama.
— E daí? — resmungo. — Eu sou o seu neto, vó. Fui criado por você
como um filho e trabalho aqui há tanto tempo. Você não pode tirar isso de
mim, não pode.
— Vó, eu concordo com Andrew — Abigail interrompe defendendo-
me como sempre. — Ele conhece a construtora melhor do que ninguém, não
importa o que ele faz fora destas paredes, mas aqui dentro o melhor para
comandar é o Andrew.
— Ah, pelo amor de Deus, Abigail, pare de defender o Andrew. Todo
mundo aqui sabe que ele apronta mais dentro dessas paredes do que fora
delas — Olivia replica.
— Olivia, todo mundo sabe que você e seu marido são dois
interesseiros. Vocês não estão preocupados com o bem dessa empresa mais
do que Andrew está — Abigail retruca.
— O quê? Você é louca, Abigail! — Olivia exclama, ficando de pé.
— Benjamin e eu damos tudo de nós para a construtora, somos os melhores
funcionários. Se formos interesseiros, o que você e Andrew são? Você só
quer saber da sua galeria e aparece aqui apenas quando quer dinheiro. E
Andrew é um preguiçoso!
— Chega! — vovó grita e novamente todos se calam. — Abigail, não
defenda seu primo, e, Olivia, não diga barbaridades sobre seus primos. Céus,
a cada dia vocês me desapontam mais. Deveriam ser unidos, deveriam querer
o bem um do outro. Não ficar de intrigas e brigas!
— Sinto muito, vó, mas é que não concordo com a sua decisão —
Abigail murmura.
— Bom, eu já ouvi sua opinião, Abigail. E a opinião de Andrew e
Olivia também. — Ela olha para cada um de nós respectivamente. — Quero
saber o que você acha da minha proposta, Benjamin.
Benjamin, que até então permanecia calado, encarando o espaço vazio
da mesa à sua frente, levantou os olhos para os da vovó. Ele tinha aquela
expressão contida, como se pouco importasse que ele fosse escolhido para ser
presidente de uma das melhores construtoras do país. Mas eu o conhecia bem
demais para saber que tudo aquilo era uma farsa. Benjamin estudou no
mesmo colégio que eu, foi para a mesma faculdade que eu, frequentou os
mesmos clubes que eu. Nós tínhamos uma inimizade desde sempre e um dos
principais motivos era que Benjamin sempre quis ter tudo o que eu tinha. Era
um invejoso e trapaceiro. Sabia bem como enganar as pessoas, tanto é que fez
a vovó acreditar que ele era o funcionário perfeito.
— Elizabeth, é uma honra imensa que você queira alguém como eu à
frente de seus negócios — Benjamin disse com sua voz calma e baixa. Mas o
fogo em seus olhos denunciava o quanto estava surpreso e feliz pela decisão
da vovó. — Sabe que para mim essa empresa é tudo. Amo o meu trabalho e
jamais decepcionaria você.
— Vó, sua decisão é maravilhosa, Benjamin é o melhor funcionário
desta empresa — Olivia interrompeu para elogiar o marido.
Não sabia o que minha prima tinha visto em Benjamin. Talvez fosse
beleza, dinheiro ou paixão, mas confesso que ambos combinavam muito. Ela,
uma cobra venenosa, e ele, um ladrão trapaceiro.
— Vó, você não pode estar falando sério — resmunguei chateado. —
Você sempre soube o quanto eu queria assumir seus negócios. Eu fui para a
faculdade duas vezes porque queria ser a sua melhor opção. Eu amo essa
empresa, amo o que eu faço. Você vai me tirar tudo?
— Ah, Andrew. — Vovó suspirou claramente abalada.
— Vó, conversa comigo, por favor — pedi. — Preciso que me ouça,
está fazendo tudo errado…
— Vó, acho que você deveria ouvir o Andrew — Abigail interveio
novamente, defendendo-me. Desde que eu era menino, Abigail era minha
protetora. Nunca entendi como nos dávamos tão bem, só sei que isso se
prolongou pela adolescência e agora na fase adulta. Ela é como uma irmã
para mim e tudo o que eu podia fazer por ela, fazia.
— Ah, por favor, parem com isso — Olivia resmungou, passou a mão
pelos cabelos em um gesto nervoso e prosseguiu: — A vovó já tomou a
decisão dela, parem de incomodá-la. Está feito, meu marido será o novo
presidente da Simon’s. Andrew vai ter que aprender a obedecê-lo.
Obedecê-lo? Mas nem morto…
Ignorando Olivia, vovó aproximou-se de sua advogada. Disse algo tão
baixo que apenas ela pôde ouvir. Em seguida, Donna respondeu alguma coisa
em um fio de voz. Vovó levantou os olhos e encontrou os meus. Percebi
naquele momento que eu estava tremendo, nervoso e ansioso. Mas por dentro
também estava queimando de raiva pelas ideias da vovó, furioso por ela
querer me excluir dessa forma e tudo por algumas besteiras que eu fazia.
— Andrew, você realmente tem algo importante a dizer? — vovó
questiona-me na frente de todos.
— Claro que tenho, vó — menti. Não tinha nada para dizer, mas
queria implorar para que ela não colocasse Benjamin na presidência, onde era
o meu lugar.
— Todos saiam, por favor, eu quero conversar a sós com Andrew —
Elizabeth pede.
Solto o ar que nem sabia que estava segurando.
— Mas, vó, você não tem que ouvir o Andrew! — Olivia protesta.
— Saia Olivia! — Vovó exige e ela se levanta bufando. Benjamin
olhou na minha direção e eu até pensei em fazer um gesto obsceno com o
meu dedo do meio, mas pensei melhor e achei arriscado com a vovó ali perto.
No entanto, dei o meu melhor sorriso arrogante e sei que o deixei furioso.
A advogada levantou-se, assim como Abigail e Benjamin que se
juntou a Olivia. Jackson levantou-se ao meu lado e murmurou um “boa
sorte”.
— Aonde você pensa que vai? — resmungo para Jack.
— Obedecer às ordens da sua vó.
— Claro que não. Você é meu advogado, precisa me ajudar.
— O quê? — Jack indaga. — O que você quer que eu diga?
— Sei lá, pensa em alguma coisa, tô te pagando pra ser útil.
Jack fez uma careta, mas voltou a se sentar. A sala ficou vazia com
exceção de nós três.
— Jackson, você também pode sair — vovó avisa.
Jackson se levanta.
— Jack fica vó, tudo o que dissermos ele pode ouvir — digo
Jackson senta-se.
— Tudo bem — Elizabeth cede. — Agora diga, Andrew, por que
você não concorda com a minha decisão?
— Mas é obvio, vó. Eu sou seu neto e Benjamin é só um estranho.
— Ele não é um estranho, trabalha aqui há alguns anos e é casado
com sua prima. Além de ser um ótimo funcionário.
— E eu trabalho aqui desde os dezoito, fiz duas faculdades e também
sou um ótimo funcionário — replico.
— Andrew, você já foi um bom funcionário, mas está mudando
muito. Tornando-se alguém que quase não reconheço. Eu sinto muito, mas
não tenho mais confiança em você — vovó desabafa.
— Mas, vó, você disse que eu ainda tinha uma chance — aponto. —
Quatro semanas atrás, quando me pegou no escritório com Sally, você disse
que eu teria outra chance. Agora está tirando isso de mim.
— Não, Andrew, não estou — vovó murmura. — Mas em quatro
semanas você não me deu motivos para mudar de ideia, então tive que tomar
minhas decisões.
— Quatro semanas é pouco, vó, deixe-me tentar um pouco mais,
prometo que vou mudar… — imploro.
— Andrew, Benjamin é ótimo para o cargo. Mesmo se eu deixasse
que você tivesse sua chance, seria muito difícil cumprir as exigências que
estou pedindo.
— Acha que não posso ser melhor que Benjamin? — pergunto.
— Não é questão de ser melhor, Andrew — vovó esclarece. — O fato
é que Benjamin é bem-sucedido, tem muitos amigos e contatos que são bons
para a construtora. Ele é casado há três anos e bem-visto por causa disso.
Interage bem em meio à sociedade e aos negócios. E você? Você é solteiro,
mulherengo, mimado e só arranja problemas.
— Então é isso que está impedindo Andrew de ser o presidente da
Simon’s? — Jackson bufa ao meu lado. Vovó o encara e eu também. Jack é
meu melhor amigo, me ajuda em qualquer coisa, mas não pensei que fosse se
intrometer na nossa conversa. Pedi para que ficasse apenas porque precisava
ter alguém que fosse confiável perto de mim. — Fatores… Fatores.
— O que é que tem, Jackson? — vovó pergunta. — Você tem algo a
dizer sobre isso?
— Na verdade tenho, dona Elizabeth. — Jackson pisca parecendo
controlado, porém eu o conheço bem o bastante para saber que ele está
utilizando seu lado “enrolação” de advogado. — Andrew está mudando, ele
se comprometeu a mudar de vida desde que a senhora o pegou naquela cena
constrangedora no escritório. Ele ficou muito abalado, percebeu que estava
errado e até mesmo me pediu ajuda para mudar…
— Pedi?
Senti o chute na minha canela e gemi baixinho. Filho da mãe!
— É, isso mesmo, vó, eu pedi ajuda ao Jack — menti, entrando na
onda do Jackson.
— E tem mais! — Jackson continuou com sua enrolação. — Andrew
voltou a se interessar pelos negócios da empresa e até mesmo pensou em
fazer um jantar com nossos clientes.
— Um jantar? — Elizabeth perguntou intrigada. — Verdade,
Andrew?
— Hãã… érr… pensei que seria bom para ver como andam as coisas.
— É uma boa ideia — vovó elogiou.
— Andrew também está com umas ideias novas para interagirmos
melhor com os nossos funcionários — Jackson prosseguiu. — Esses dias
estávamos comentando no escritório como seria bom construirmos um salão,
onde os funcionários pudessem passar o horário de almoço descansando, se
divertindo, descontraídos. Seria uma forma de nos aproximarmos das pessoas
que trabalham conosco, não?
— Você pensou em tudo isso, Andrew? — vovó pergunta chocada.
— Ahh… — Olho para Jackson que me lança um aceno pouco
perceptível de cabeça. — É, pensei.
— Isto é maravilhoso! — Vovó sorri e eu fico aliviado. Mais tarde
precisaria agradecer a Jackson por ser um mentiroso de primeira.
— Ah, e aproveitando que estamos falando sobre as mudanças de
Andrew… — Jackson continua, agora sorrindo confiante por estar se dando
bem com suas mentiras. — Não se preocupe mais com Andrew ser um
mulherengo, Elizabeth.
— Ah, é? Por quê? — vovó perguntou curiosa.
— É. Por quê? — pergunto semicerrando os olhos, fitando-o.
O que Jackson estava aprontando agora?
— Porque Andrew está noivo — Jack despeja.
— Eu o quê?! — exclamo dando um pulo na cadeira.
— Andrew está noivo? — Vovó encara-me desconfiada. — Como
assim, meu neto está noivo?
É, como assim eu estou noivo, Jackson?
Começo a suar, bravo. Jackson passou dos limites com suas mentiras.
Que porra, eu ia ser deserdado!
— É que foi tudo muito de repente, dona Elizabeth. — Jackson não
larga a mentira deslavada. — Ele ficou preocupado com o reboliço que seria
quando todos soubessem. Mas agora não é preciso mais esconder, não é,
Drew?
— É — afirmo com um resmungo.
— Eu não entendo. — Elizabeth balança a cabeça confusa. — Apenas
quatro semanas atrás você não tinha ninguém, e agora fico sabendo que está
noivo?
— Sabe o que é, dona Elizabeth? — Jackson interrompe. — É que
Andrew cansou de todas essas mulheres, percebeu que tinha que mudar de
vida, encontrar alguém que valesse a pena. E foi aí que ele a conheceu, a
garota que domou seu coração e que está ajudando Andrew a ser um cara
melhor.
— Quem é ela? — Elizabeth pergunta desconfiada.
— Ela? — Jackson fica branco como cera enquanto demora
pensando. — O nome dela é… Bom, nós a chamamos de Mercedes.
— Mercedes? — resmungo. Que porra é essa?
— Você vai gostar de conhecer a Mercedes, dona Elizabeth. Ela é
uma boa garota — Jackson mente.
— Pois eu quero muito mesmo conhecer a Mercedes — vovó diz
surpreendendo tanto a mim quanto a Jackson. — Você pode levá-la no fim de
semana no almoço da família. O que acha, Andrew? Assim você pode
anunciar o seu noivado para a família toda.
— Claro, vó. — Sorri forçado.
— Nossa! Você não imagina o quanto estou surpresa com tudo isso,
Andrew — vovó diz soando mais calma, com um pequeno sorriso nos lábios.
— Não achei que estivesse tentando mudar, estou orgulhosa de você por
tentar.
— Eu disse que estava tentando, vó — menti.
— É, dona Elizabeth, Andrew estava fazendo isso pela construtora,
mas também para ser motivo de orgulho para a senhora — Jackson diz. —
Por isso acho tão errado que Benjamin seja colocado na presidência logo
agora que Andrew está disposto a mudar.
— Mas se Andrew está tão disposto assim a mudar, é claro que vou
dar uma chance a ele — vovó fala. Meu coração quase sai pela boca.
— Você o quê? — murmuro.
— Vou te dar mais uma chance, Andrew. Se você me prometer que
vai cumprir com todas essas mudanças, eu não nomeio Benjamin o presidente
ainda e te dou a chance de assumir o meu lugar.
— Eu prometo, vó! — exclamo rindo e levanto-me da minha cadeira
para abraçá-la. — Ah, vozinha! Eu sabia que a senhora compreenderia,
obrigado!
— Quero ver as mudanças com os meus próprios olhos, Andrew…
— Você vai ver vó, eu juro. — Beijo sua bochecha, ela sorri.
— Bom, agora vou lá fora explicar essa nova situação para os outros.
Não se esqueça de levar a Mercedes para o almoço da família, preciso
conhecer a moça corajosa que aceitou ser sua noiva — vovó brinca.
— Pode deixar — concordo. — A senhora vai conhecer a…
Mercedes.
Vovó sorri e acena. Ela pega sua bolsa e sai da sala de reuniões
fechando a porta logo atrás. Viro-me e encaro Jackson, que está estirado na
cadeira com um sorriso presunçoso no rosto.
— Sou ou não o melhor advogado que você poderia querer? —
pergunta-me todo convencido.
— Ah, porra, você foi demais, Jack! — Dou um tapinha em suas
costas.
— Quando vi uma oportunidade para mudar o jogo ao nosso favor as
mentiras foram surgindo na minha frente — Jack conta.
— Foi brilhante. Só que você precisava mesmo ter inventado uma
noiva?
— Claro que sim — ele afirma. — A noiva foi a tacada final, não viu
a surpresa nos olhos da sua vó? Ela ficou contente com a notícia.
— Mercedes? — Fiz uma careta. — De onde tirou esse nome?
— Ei, é o nome da minha bisavó, foi a primeira coisa que me veio à
cabeça.
— Que droga — xingo. — Não vai dar certo, Jack, vovó vai sacar
quando eu não levar a falsa noiva ao almoço de família.
— E quem disse que você não vai levar sua noiva ao almoço de
família?
— Se você ainda não percebeu eu não tenho uma noiva.
— Você não tinha uma noiva… Agora você vai ter.
— Como assim? — pergunto já desconfiado.
Jackson ergue um canto de sua boca em um sorriso que implica que
ele já tem uma ideia formada. Uma ideia pior do que a outra.
— Nós vamos pagar por uma noiva.
CAPÍTULO TRÊS
--—————————————————————————————

Jamie

Na terça-feira Tyler acordou muito mal, estava com febre, dores no


estômago e vomitou algumas vezes na noite anterior. Minha irmã suspeitava
que fosse apenas uma gripe, ainda assim ela acabou vestindo-se mais cedo
para o trabalho e levou meu sobrinho junto para ser medicado corretamente.
Por trabalhar como enfermeira, ela era muito correta com tudo o que
envolvesse doenças. Enquanto eu tomava os primeiros remédios que via na
frente quando passava mal, ela precisava ouvir a opinião de um médico
especialista para confiar na prescrição dos remédios.
Eu acabei acordando bem mais cedo do que precisava, pois não
conseguiria dormir sabendo que meu sobrinho estava mal. E também Jane
disse que o levaria ao médico, mas que provavelmente Tyler teria de faltar à
escola e precisaria ficar com alguém. O problema é que não confiávamos nas
duas idosas que eram nossas vizinhas da frente e nem no adolescente rebelde
que morava na porta ao lado. Jane não podia ficar com Tyler no hospital, pois
ela nunca estava em um único lugar, ficava andando pelos corredores
atendendo as pessoas o tempo todo. Então é claro que sobrou para mim.
Eu não podia faltar o trabalho, se fizesse isso, Olivia teria um motivo
para me colocar na rua. Mas eu tinha uma cozinha grande e espaçosa onde
passava meus dias fazendo apenas cafés e vez ou outra limpava alguns
escritórios, quando estes estavam vazios também. Por isso eu sabia que
apesar de ser um risco levar meu sobrinho para o trabalho, era algo
extremamente necessário. Se ele voltasse a passar mal, estaria perto de mim
para socorrê-lo. Ele também precisaria tomar os remédios no horário certo e
comer comidas mais leves que eu poderia preparar. Então hoje Tyler ia passar
a tarde no trabalho comigo e seria um longo dia.
Pouco antes de eu sair para o trabalho, alguém bateu na porta. Eu
estava terminando de me vestir e acabei me atrapalhando toda para colocar o
meu suéter. Corri até a porta, com os meus cabelos pingando água sobre os
meus ombros, e escancarei a porta. Quem estava parado ali era o senhor
Dimitri. Um homem baixinho, bigodudo, barrigudo e com a cabeça careta.
Ele era síndico do prédio e era muito querido e simpático. No entanto quase
sempre sua presença nos causava desespero, já que ele aparecia para cobrar o
aluguel. Estávamos com três meses de atraso e ficava cada vez mais difícil
enganar o senhor Dimitri e conseguir mais tempo para arranjar dinheiro.
— Bom dia, Jamie — ele me cumprimenta com seu habitual sorriso e
estende a mão para que eu possa apertá-la.
— Bom dia, Sr. Dimitri.
— Jamie, eu não queria incomodá-la novamente, mas sua irmã não
apareceu no meu apartamento semana passada para levar o dinheiro.
— É que a Jane está muito ocupada, Sr. Dimitri. Hoje mesmo Tyler
acordou mal e ela teve que correr para levá-lo no médico.
— Eu entendo, Jamie, mas vocês estão três meses sem pagar —
apontou. — Se fosse por mim, eu daria mais tempo a vocês, mas não sou o
dono do prédio.
— Eu sei, eu sei. Mas, senhor Dimitri, é só por um tempo, estamos
com muitas coisas para pagar. Prometo que o salário deste mês vai ser para
pagar o senhor.
— Jamie, eu não posso esperar mais, mesmo que me pagasse este
mês, permaneceriam três meses de atraso e é muita coisa — senhor Dimitri
explica. — Ou vocês pagam os três aluguéis atrasados ou eu serei obrigado a
dar um aviso de despejo ainda este mês.
— O quê?! — exclamo. — Vai nos colocar na rua?
— Jamie, já disse que não sou o dono do prédio, apenas sigo ordens.
— Senhor Dimitri, onde vamos morar se formos colocados na rua? —
choramingo.
— Eu não sei, Jamie, eu sinto muito. Fale com sua irmã, façam um
empréstimo, mas paguem o aluguel.
— Nos dê dois meses, por favor, eu posso conseguir o dinheiro. Dois
meses, por favor — implorei.
— Não posso, Jamie, sinto muito. — Senhor Dimitri abaixa a cabeça
parecendo triste e desconfortável em entregar essa notícia. — Eu já vou indo,
passar bem.
E então ele foi embora, deixando-me parada no vão da porta com os
meus olhos cheios de lágrimas. Respirei fundo e tentei me conter, precisava
ficar calma e encontrar uma solução para os nossos problemas. Eu sabia que
o senhor Dimitri estava falando sério, ele nos deu muitas chances, mas agora
provavelmente estava sendo pressionado pelo dono do prédio. Só que nós
ainda não tínhamos condições de pagar os três aluguéis atrasados e se não
conseguíssemos o dinheiro seriamos colocados na rua. Eu queria chorar,
queria gritar, pois não acreditava que aquilo estava acontecendo. Nosso
mundo desabando bem na minha frente e eu não sabia o que fazer.
Eu ganhava uma mixaria no meu trabalho, quase não dava para fazer
nada. Jane era a que tinha o melhor salário entre nós e ainda assim quase não
dava para nada com tantos gastos com Tyler e também com o papai, já que
era ela que pagava os remédios que ele não tinha como pagar. Rick não
ganhava muito e depois que a empresa em que trabalha como segurança
quase faliu, seu salário foi cortado ao meio. Por este motivo estava cada vez
mais difícil lidar com nossas dívidas, sem contar que havia ainda o risco
iminente de Rick ser colocado na rua ainda esse mês. Jane rezava todas as
noites para que isso não acontecesse, mas eu não estava tão segura quanto a
isso. Na verdade, tinha até medo de imaginar como seria ter que nos virar
sem o salário do Rick, enquanto pensava no desespero que tomaria conta de
Jane ao saber do risco de sermos despejadas.
Na situação de Tyler agora doente e no papai que necessitava do
nosso apoio financeiro, tomei uma decisão. Não podia contar nada para Jane,
pois não queria preocupá-la e amedrontá-la. Não sei onde arranjaria dinheiro
para pagar os três aluguéis em menos de um mês, mas eu ia dar um jeito.
Precisava encontrar uma solução e salvar a minha família. Eu tinha que ser
útil, não apenas um peso a mais na vida deles.
Voltei para o quarto e terminei de me arrumar para o trabalho.
Quando abri a gaveta da cômoda e retirei um par de meias, um pequeno
pedaço de papel branco caiu no chão. Na hora lembrei-me da minha lista de
desejos. Capturei o papel nas mãos e franzi a sobrancelha pensando no
porquê de eu ter mantido aquilo. Era uma idiotice pensar que meus desejos
pudessem se tornar reais apenas porque eu os escrevi com caneta em um
papel. Sempre fui sonhadora demais, sempre acreditei em mágica e final
feliz. Eu tinha que parar com isso, tinha que cair na realidade que era muito
mais dura que isso. Eu precisava de dinheiro, muito dinheiro. Precisava pagar
nosso aluguel e evitar que minha família fosse para a rua. Não podia
preocupar a Jane, nem o papai. Seguir os conselhos de uma terapeuta não era
o que eu precisava agora.
Quase amacei o papel, quase desisti de todos aqueles desejos mais
secretos escritos ali. Fui tomada por uma raiva profunda, uma tristeza imensa,
um sentimento de pavor por estar vivendo daquele jeito. Planejando cada dia
da minha vida porque não tinha condições de viver me arriscando. Eu queria
mais liberdade, queria uma vida sem preocupações, queria poder sonhar e
também queria realizar desejos. Mas, em vez disso, precisava colocar o meu
salário na mesa e distribuí-lo para pagar as contas. Precisava ver diante dos
meus olhos minha irmã abrindo mão de seus próprios sonhos para cuidar das
necessidades do filho e da casa. Precisava ver meu cunhado trabalhando à
tarde, à noite e de madrugada para tentar pagar nossas dívidas, manter nossa
vida estável. Ainda precisava lidar com o fato de que papai estava vivendo no
Texas, bem longe de nós. Sofria com o alcoolismo e também com doenças do
coração. Eram tantos problemas juntos e eu ainda não queria citar os meus.
Quase rasguei a lista. No último segundo, resolvi mantê-la, dizendo a mim
mesma que eu ia lutar. Faria o que fosse possível, mas eu conseguiria realizar
pelo menos algum desses desejos.
Quando fiquei mais calma e também menos pensativa, terminei de me
arrumar, pondo os sapatos, amarrando o cabelo em um coque apertado e
colocando os meus óculos de grau. Fechei o apartamento e caminhei
tranquilamente para o metrô. Estava com a bolsa e apenas vinte dólares na
carteira, o que ultimamente era muito. Celular eu não tinha mais e, apesar de
necessitar muito de um, não podia me dar o luxo de comprá-lo, ainda mais
depois de encontrar o senhor Dimitri hoje.
Cheguei ao metrô exatamente no horário que combinei com a minha
irmã e esperei perto das catracas, porque não havia nem sinal dela. Vinte
minutos depois eu a vi caminhando na minha direção de mãos dadas com
Tyler. Meu sobrinho estava com uma aparência horrível. Geralmente não
podia me ver e saía correndo para me dar abraços e beijos. Mas hoje ele
apenas balançou a cabeça. Suas bochechas, que normalmente eram coradas,
estavam pálidas. Dava para ver que o garoto estava mesmo ruim, abatido.
— Oi, Tyler — cumprimento meu sobrinho e me abaixo em sua altura
para lhe dar um beijinho na bochecha.
— Oi, tia Jamie — murmura fracamente.
— O que houve com você, meninão? — pergunto, mas olho para
minha irmã.
Jane dá de ombros.
— É apenas uma virose. Ele vai tomar dois remédios, coloquei na
mochila dele, estão com os horários marcados — Jane diz.
— Ok. Mais alguma coisa? — pergunto.
— Não, apenas isso. Mas não dê nada de gelado para ele, nem deixe
que pegue chuva e também…
— Tá, Jane, isso eu sei — resmungo.
— Você tem certeza que vai ficar bem com ele? — Jane pergunta
lançando-me um olhar preocupado.
— Sim, vai ficar tudo bem.
— Qualquer problema me ligue — Jane insiste.
— Eu estou sem celular, esqueceu?
— Ah, é mesmo, você deveria comprar um logo.
— Claro — respondi, embora soubesse que ficaria sem comprar um
por um bom tempo, já que minha prioridade era o aluguel.
— Você está bem, Jamie? Parece estranha, está chateada com algo?
— Jane pergunta-me observando-me atentamente. Minha irmã me conhece
muito bem.
— Não, estou bem, só cansada.
— Tudo bem. Eu já vou indo, não quero me atrasar. — Jane abraça
Tyler e lhe dá um beijo. — Comporte-me, mocinho, obedeça à tia Jamie.
— Tá — Tyler balbucia.
Jane se despediu e foi embora, e Tyler e eu pegamos o metrô juntos.
Durante o trajeto ele não disse uma única palavra, estava cansado, mas eu
podia entendê-lo. Odiava ficar gripada e quando ficava não fazia nada.
Cheguei à Simon’s em um horário mais cedo do que o habitual, o que foi
muito bom, pois consegui entrar com Tyler sem que ninguém notasse. Levei-
o para a cozinha e expliquei que precisaria sair algumas vezes para entregar
os cafés e limpar os escritórios, mas que ele deveria ficar ali quietinho. Liguei
a televisão para que ele se distraísse e Tyler tirou seus carrinhos da mochila e
sentou-se calado em um canto.
Irene chegou logo depois, entrou na cozinha, pegou seu crachá e o
avental e vestiu. Depois se virou e me deu um meio sorriso, andou ao redor,
buscando os utensílios que utilizaria para servir café. Ela parou bruscamente
ao dar de cara com Tyler sentado no chão. Franziu as sobrancelhas e olhou
para mim rapidamente, um tanto assustada.
— Jamie? — indaga trêmula.
— Oi? — pergunto, fingindo que não sabia de nada, e continuo
fazendo meu trabalho.
— Hãã tem uma criança na nossa cozinha — aponta. Tive vontade de
rir, porque ela parecia desesperada.
— E qual o problema? — pergunto, ainda fazendo-me de
desentendida.
— Ai, meu Deus. — Irene vira-se rapidamente e gagueja. — V-você
tem… Um filho?
— O quê? — Rio. — Não!
— Como você nunca disse isso antes? — Irene continua. — Minha
nossa, ele tem pai?
— Não é meu filho, Irene.
— Você não precisa mais esconder esse segredo, pode confiar em
mim.
— Janice, eu tenho vinte e um e eu não engravidei com quatorze anos.
Esse é o Tyler, meu sobrinho, e vai passar o dia aqui comigo — explico.
— Seu sobrinho? — Irene olha para Tyler e ele a fita de volta
achando tudo engraçado.
— Isso mesmo, ele está doente, não podia ir para a escola.
— E você o trouxe pra cá?
— Não tinha mais ninguém para ficar com ele.
— Olivia vai te matar! — Irene exclama.
— Olivia não vai saber se você não disser nada, e Tyler vai se
comportar.
— Espero que você esteja certa. Não direi nada, mas mantenha-o
longe do meu caminho, por favor.
Ignorei a Irene e voltei ao trabalho. Janice chegou mais tarde e,
quando viu Tyler, expliquei para ela a situação. Ela prometeu me ajudar a
mantê-lo ali em segredo, principalmente longe dos olhos de Olivia. Servi café
para o meu sobrinho, porém ele comeu bem pouco e voltou a brincar. Às
oitos horas levei o primeiro expresso sem açúcar do dia para Olivia.
A secretária permitiu minha entrada e, quando passei pela porta, vi
Olivia sentada em sua mesa retocando o batom vermelho. Ela mal olhou na
minha direção enquanto eu depositava a bandeja sobre a sua mesa. Pensei em
dar um “bom dia”, mas acabei desistindo. Quando ia saindo de sua sala, ela
largou o batom sobre a mesa e indagou com desagrado:
— Jamie, ontem o café estava muito amargo para o meu gostoso, que
tipo de porcaria você está colocando na minha bebida?
Fiquei vermelha de raiva e tive de respirar bem fundo para não
respondê-la à altura. Lembrei que eu precisava daquele emprego e por isso
tinha que aturar as frescuras de Olivia. Como o café não estaria amargo, se
ela mesma faz questão de tomá-lo sem açúcar?
— Eu não coloquei nada, senhora — murmuro e na hora lembro-me
de que, apesar de já ter cuspido no café de Andrew por ser um babaca, nunca
tinha cuspido no de Olivia, que me tratava muito pior do que ele. Humm, eu
ia mudar isso rapidinho. — A senhora quer um pouco de açúcar, talvez
adoçante?
— Adoçante? — indagou furiosa. — Não quero nenhum adoçante,
quero meu café no ponto!
— Mas, senhora, é o mesmo café de sempre, expresso sem açúcar,
como a senhora sempre gostou.
— Não é o mesmo de sempre! — voltou a reclamar. — Conheço o
café que bebo, vou tomar este aqui e, se não estiver bom, quero que faça um
novo.
— Mas, senhora, os cafés foram feitos agora mesmo — explico.
— Talvez você não esteja colocando muita água, mas tenho certeza
de que o café não é o mesmo de sempre.
— É claro que é! — afirmo.
Olivia arqueia sua sobrancelha ainda mais, dando um aspecto
assustador ao seu rosto. Quando me fitou, senti que ela estava fervendo de
raiva.
— Está insinuando o que, Jamie? Que eu estou mentindo sobre o meu
café estar amargo? Que eu estou mentindo sobre o café não ser o mesmo de
sempre?
— De jeito nenhum, senhora.
— Então saia agora do meu escritório e volte para a cozinha. Faça um
café que preste! — grita, apontando para a porta.
Eu queria dizer umas poucas e boas para essa mulher. Ah, se queria!
O maldito café era o mesmo de sempre e ela nunca implicou com o gosto.
Por que isso agora? Se o café está amargo, por que ela não pode
simplesmente colocar uma gota de adoçante? Embora quisesse jogar na cara
de Olivia algumas maldições, tive que me conter. Se discutisse com ela seria
muito pior e eu precisava manter meu emprego. Peguei a bandeja intacta e
retirei-me da sala. Voltei para a cozinha já irritada e preparei um novo
expresso sem açúcar.
— Tia Jamie? — Tyler me chama. Estávamos sozinhos na cozinha, as
outras meninas estavam limpando os escritórios do andar de cima.
— Oi?
— Preciso ir ao banheiro.
— Ah, Tyler, aguente um pouquinho aí, preciso levar este café
primeiro.
— Mas estou com muita vontade, tia Jamie — murmura.
— Vou ser rápida, prometo!
Deixei a cozinha com um novo café para Olivia. Entrei em seu
escritório, depositei a bandeja sobre a sua mesa novamente. Olivia estava
lendo alguns documentos quando cheguei e, dessa vez, ela não disse nada
para mim, apenas dispensou-me com um aceno. Voltei para a cozinha, peguei
os outros cafés e fui entregar todos. Só quando retornei até a cozinha notei
que Tyler não estava em lugar nenhum. Gelei.
Fiquei paralisada em meu lugar, enquanto meus olhos
esquadrinhavam a cozinha completa. Os brinquedos dele estavam no chão, no
mesmo lugar de antes, porém Tyler havia desaparecido. Fiquei nervosa na
hora, minhas mãos começaram a suar e eu larguei a bandeja imediatamente,
antes que deixasse tudo cair no chão. Aonde ele foi? Cadê o meu sobrinho?
Lembrei-me dele desesperado pedindo para ir ao banheiro e na hora culpei-
me por dar mais atenção ao maldito café de Olivia. Saí da cozinha sabendo
que eu deveria procurá-lo nos banheiros.
Andei por cada canto, entrei nos banheiros masculinos e femininos de
cada andar. Cada vez ficava mais preocupada, porque não conseguia
encontrá-lo de jeito nenhum. Pensei que ele pudesse ter saído do prédio, mas
me dei conta de que era impossível que ele passasse pela portaria e pelos
seguranças sem ser barrado. Afinal, era um menino sozinho e pequeno.
Decidi começar a procurar nos escritórios e fiquei com mais medo ainda de
encontrá-lo dentro de um. Se Olivia o visse eu estava perdida. Justamente por
isso passei em seu escritório primeiro, mas ela estava em uma reunião com
Benjamin de portas fechadas.
Encontrei Janice enquanto seguia para o terceiro andar, e logo pedi
para que ela parasse seu trabalho e me escutasse.
— O que houve, Jamie? — perguntou-me preocupada. — Olivia
descobriu sobre Tyler?
— Não, ainda não.
— Então o que aconteceu?
— Eu o perdi, Tyler saiu da cozinha e agora não consigo encontrá-lo.
— Droga.
— Você pode ficar de olho, Janice? Se o encontrar, leve-o para a
cozinha, por favor?
— Claro, vou ajudá-la a procurá-lo.
Continuei andando por cada canto, perguntando discretamente a
alguns funcionários se haviam visto um garotinho pequeno andando por ali.
A maioria das pessoas me ignorou, no entanto, uma senhora disse ter visto
um menino parado na frente da sala de reuniões. Não esperei que ela
terminasse de falar e saí correndo naquela direção. A sala de reuniões! Se um
dos grandões pegar Tyler por lá eu com certeza serei demitida. Assim que
viro à direita no corredor meus olhos se deparam com Tyler. Só que não
exatamente como eu esperava encontrá-lo.
Ele estava rindo, rindo muito. Nem parecia um garotinho que pela
manhã estava passando mal, pois agora ele estava corado e feliz. Mas o
problema não era realmente esse. O que eu não gostei foi ver que ele estava
chutando uma bola de futebol. E com ele estavam Andrew e Jackson,
também rindo e chutando a mesma bola como se estivessem jogando uma
partida no parquinho. Só que aquilo não era o parquinho e aqueles eram os
meus chefes, junto ao meu sobrinho. Ai, merda… Para piorar eles tinham até
plateia, parecia que todos os funcionários haviam deixado seu cubículo e se
aglomeravam para ver a bagunça acontecendo.
— O que você está espiando? — uma voz feminina pergunta logo
atrás de mim. Dou um pulo, assustada demais com toda a situação. Mas de
repente fico mais calma quando vejo quem está ali.
— Que susto, Abby!
Ela riu.
— O que está acontecendo aqui? — Abigail pergunta apontando para
a cena que eu havia presenciado antes que ela chegasse. — Aquele lá é o
Drew?
— Parece que seu primo e Jackson resolveram jogar uma partida de
futebol no corredor — explico.
— Ai, ai. — Abigail revira os olhos. — Esse Drew não aprende
mesmo! Ainda ontem a vovó quase colocou Benjamin na presidência, e só
mudou de ideia porque Drew jurou que iria mudar. Agora isso?
— Abby, eu sei que ele é o seu primo, mas Andrew não vai mudar.
— Pois eu espero que ele mude, ou nós todos estamos ferrados.
Imagine só aguentar Olivia todos os dias dando ordens?
— Eu não preciso imaginar, ela é minha chefe. Lembra?
— Ah, é mesmo, às vezes eu me esqueço de que você trabalha aqui e
eu não. — Ela ri. — A propósito, como estão as coisas? Você não me contou
nada novo.
— Nesse momento eu estou correndo o risco de ser demitida. Está
vendo o garotinho lá no meio daquela bagunça? — Aponto. — É o meu
sobrinho, Tyler.
— Oh, droga…
— Sim, uma droga. Eu o trouxe escondido porque ele não tinha com
quem ficar. Agora não sei como posso tirá-lo de lá com toda aquela gente em
volta. E se Olivia ver ele eu vou ser demitida!
— Calma, Jamie. Olivia não vai demitir você, ela não tem todo esse
poder ainda. E pode deixar que eu tiro o Tyler de lá…
— O que está acontecendo aqui? — A voz elevada de Olivia chega
aos ouvidos de todos, e o tumulto cessa imediatamente. — Por que vocês
estão todos aqui no corredor quando deveriam estar trabalhando?
— Estamos nos divertindo um pouco, relaxe, Olivia — Andrew
responde, sorrindo.
— Se divertindo? — Olivia pergunta ríspida. — Isso é um local de
trabalho, não de diversão!
— Ah, sai dessa, Olivia — Andrew resmunga. — Eu só estava
tentando animar o garotinho aqui.
— Garotinho? — Olivia fixa os olhos em Tyler, e suas sobrancelhas
franzem. — Quem é esse garoto?
— O nome dele é Tyler — Jackson responde.
— Onde diabos você arranjou esse garoto, Andrew? — Olivia
prossegue irritada. — Você sabe que crianças não são bem-vindas aqui,
quanto mais criando um tumulto desses. O pai ou a mãe deste garoto tem que
ser responsabilizado por isso.
— É a minha tia que trabalha aqui — Tyler corrige. Ai, merda…
Estou ferrada! Estou ferrada!
— Quem é a sua tia? — Olivia pergunta. Adeus, emprego…
— Eu sou! — Abigail eleva a voz ao meu lado. Vejo quando ela dá
alguns passos para frente e se aproxima de Tyler, bagunçando o cabelo dele.
— Quer dizer, ele me chama de tia porque eu conheço a mãe dele. Ela não
tinha como cuidar dele, então me ofereci.
— Tinha que ser a Abigail! Só uma de suas amigas malucas para
achar que você tem competência para cuidar de outro ser humano. — Olivia
solta uma gargalhada. — Você nem trabalha aqui, não deveria estar aqui e
muito menos com esse seu sobrinho postiço.
— Olivia, deixa de ser chata, se isso te incomoda tanto por que você
não se tranca na sua sala e continua sendo a funcionária perfeita? — Abigail
rebate.
— É exatamente o que eu vou fazer. Afinal, o funcionário perfeito é
aquele que vai ficar com a presidência da Simon’s. — Olivia abre um sorriso
cínico e se vira para encarar Andrew. — Funcionários que jogam futebol
durante o horário de trabalho no escritório serão descartados.
— Você vai ver quem será descartado, Olivia, você vai ver.
— Voltem ao trabalho! — Olivia grita apontando para os funcionários
que assistiam a toda a confusão. — Agora, ou vou demiti-los!
Os funcionários assustados com a ameaça foram voltando para as suas
salas e trancando-se em seus cubículos. Andrew parecia bravo pela cena que
Olivia criou. Já Jackson permanecia quieto, mas com uma expressão bem
severa. Abigail estava séria e encarava sua prima à altura. Tyler estava
quietinho só observando tudo. E eu? Eu permanecia no mesmo lugar,
desesperada para pegar meu sobrinho e sair logo dali antes que sobrasse para
mim.
Olivia virou-se e me viu. Ela abriu a boca pronta para dizer alguma
coisa, mas de repente um grito agudo escapou de sua garganta enquanto ela
caía de bunda no chão por ter tropeçado na bola de futebol que Andrew
largou por ali. Todo mundo arregalou os olhos quando Olivia caiu com as
pernas esticadas para cima e abertas, mostrando sua calcinha branca. Ou pelo
menos o que deveria ser uma calcinha, mas estava mais para um short
tamanho GG.
— Ai, socorro! — Olivia grita, agitando as mãos no ar. — Ajudem-
me, seus emprestáveis!
Andrew, Jackson e Abigail caíram na gargalhada. Riam tanto que eu
mesma não pude me conter e acabei rindo também. Olivia ficou furiosa e
levantou-se rapidamente ajeitando seu vestido.
— Bela calcinha, Olivia — Andrew diz sarcástico. — Ou eu devo
dizer calçola?
— Arghh! — Olivia rosna, trincando os dentes. — Vocês todos vão
me pagar por isso, todos vocês!
De cabeça erguida Olivia passou por mim bufando e bateu a porta de
sua sala assim que entrou. Abigail ainda ria tanto que ficou curvada,
segurando a barriga, e Andrew tinha um sorriso bobo no rosto.
— Tyler, vem cá! — chamo meu sobrinho. Ele se vira ouvindo minha
voz e arregalou os olhos.
— Tia Jamie.
— O que você pensou que estava fazendo? Você não deveria ter
deixado a cozinha, podia ter causado um problemão para mim.
— Desculpe, tia Jamie.
— Não brigue com ele, Jamie — Abigail fala. — Tyler é apenas um
garotinho que estava se divertindo.
— Então essa é a sua tia verdadeira, garoto? — Andrew pergunta
olhando entre mim e Tyler.
— É, essa é a tia que eu falei — Tyler afirma, agitando a cabeça.
— Desculpe por isso, Sr. Simons. Prometo que não voltará a
acontecer — balbucio.
— Estamos quites agora, Jamie. — Andrew me lança um olhar e sorri
ao passar por mim. — A propósito, senhor era meu falecido vô, até meu pai
ficaria ofendido ao ser chamado assim.
— Obrigada, Andrew! — agradeço um pouco antes de ele fechar a
porta do escritório. Ele sorri.
— Bom, vou voltar ao trabalho — Jackson diz. — Foi bom conhecer
você, garoto.
— Vamos jogar de novo, Jack? — Tyler pergunta.
— Algum dia, garoto, algum dia — Jackson responde, em seguida
volta para sua sala.
— Abby, obrigada pelo que você fez — agradeço. — Se Olivia
soubesse que Tyler é meu sobrinho as coisas teriam ficado complicadas para
o meu lado.
— Enquanto eu estiver aqui Olivia não fará nada contra você, Jamie
— Abigail garante. — Ela é uma bruxa, está mais do que na hora de descer
desse altar que ela mesma criou. O problema é que isso só vai acontecer se o
Drew se esforçar para assumir a presidência.
— Acho que fui precipitada ao dizer que Andrew não é competente o
suficiente para mudar e assumir a presidência. Talvez ele só precise de
ajuda…
— Sabe que você tem razão — Abigail prossegue pensativa. — O
Andrew só é esse cara porque ele está acostumado com tudo caindo aos pés
dele. Ele precisa de ajuda para cair na real. Quem sabe com uma ajudinha ele
não possa finalmente ser o neto que minha vó tanto deseja?
— Você está com cara de quem está planejando algo.
— E eu estou! — Ela ri. — Na verdade estou indo agora mesmo falar
com ele. Se for de ajuda que o Andrew precisa para acabar com Olivia e
assumir a direção desse lugar, então eu estou nessa!
— Boa sorte com tudo isso!
Viro-me e caminho, puxando Tyler pelo corredor comigo.
— Ei! — Abigail grita.
— O quê? — grito de volta, sem me virar.
— Podemos contar com a sua ajuda também?
— O quê? Tipo ajuda para acabar com Olivia?
— Isso mesmo!
— Eu não sei…
— Ah, Jamie, você odeia ela tanto quanto nós!
— Tudo bem.
— Isso é um sim? — gritou outra vez.
— É. Isso é um sim.
— Promete?
— Prometo. — Suspiro.
— Jamie Collins, eu vou cobrar essa promessa mais cedo ou mais
tarde!
Esqueça a parte do “mais tarde”. Se ela fosse me cobrar, seria o “mais
cedo” possível. Eu só não esperava que fosse tããão cedo.
CAPÍTULO QUATRO
--—————————————————————————————

Andrew

Numa sexta-feira à noite em abril de 1995 meus pais tinham um jantar


beneficente para comparecer. Eu estava sentado no colo da mamãe em frente
à lareira e ela cantava baixinho para que eu fosse dormir. O que ela não sabia
era que eu não podia dormir ouvindo uma voz tão bonita como a dela e por
isso passava horas acordado em seu colo. Obviamente eu não me lembro
disso, mas são palavras que nossa fiel governanta dizia e minha antiga babá
confirmava.
Mamãe estava linda trajando um vestido branco de tecido macio e
leve. Seus cabelos loiros caíam soltos sobre os seus ombros em lindas
madeixas encaracoladas. Ela estava bem maquiada e muito cheirosa. Usava
no pescoço uma gargantilha de brilhantes e nas orelhas brincos que
combinavam perfeitamente. Foi um presente do papai pelo seu aniversário do
ano anterior. Bom, isso também são coisas que eu só soube quando era mais
velho. Só que nas minhas mais profundas lembranças eu posso vê-la
exatamente como ela estava naquele dia e eu também posso me lembrar de
suas palavras antes de me deixar. Mal sabendo ela que me deixaria para
sempre.
— Está na hora de ir dormir, querido — mamãe havia sussurrado. —
Amo você, Andrew, de coração e alma para todo o sempre.
Ela tinha costume de sussurrar aquelas palavras todas as noites antes
de eu ir dormir. Naquela época eu não entendia o significado delas, apenas
sabia que devia ser algo muito importante para a mamãe. Quando fiquei mais
velho, vovó me contou que mamãe disse aquelas mesmas palavras “Amo você
de coração e alma para todo o sempre” para o papai quando se casaram. Pois
mamãe acreditava que, quando se amava alguém, você amava com o coração,
mas também com sua alma. Não importava quantas vidas vivesse, sua alma
amaria eternamente aquela mesma. Por isso ela também as destinava para
mim, mamãe acreditava que mesmo estando longe um do outro, nosso amor
seria eterno. Eu a admirava por acreditar em um amor tão forte assim, pois
acho isso uma grande bobagem. O verdadeiro amor é para poucos, não é todo
mundo que vai encontrar alguém para amar da forma como meus pais se
amavam.
O fato é que aquela noite foi a última vez que escutei aquelas palavras
saindo de sua boca. Logo depois ela me colocou na cama, me cobriu, me
beijou e saiu com o papai, que também havia passado no meu quarto e dito
que me amava. Lembro-me de fechar os olhos e dormir, sonhando que
mamãe cantava baixinho para mim. Mas também me lembro como se fosse
hoje de quando naquela madrugada vovó entrou no meu quarto chorando. Ela
tentava disfarçar, mas as lágrimas caíam impiedosamente.
Acordei e sentei-me na cama, olhando sem entender o que estava
acontecendo. Ela se aproximou e me puxou para o seu colo e então mais
lágrimas vieram. Chorei junto a ela mesmo não sabendo o que havia
acontecido, só sei que fiquei assustado. Ela parecia arruinada, triste, desolada.
Abraçou-me muito forte e me segurou assim pelo que pareceram horas.
Quando me afastou, suas lágrimas estavam secas e seu rosto parecia contido.
Ela me deu um sorriso fraco e sussurrou:
— Vou cuidar de você, Andrew. Vou te proteger e vou te amar acima
de qualquer coisa. Prometi à sua mãe que farei de você um homem que lhes
dará muito orgulho, mesmo que eles não estejam aqui para vê-lo.
— Por que você está cholando, vovó? — sussurrei.
— Porque sinto saudades dos seus pais, Andrew, eu os amava muito.
— Mas eles não vão demolar.
— Eles não vão voltar, Andrew, seus pais estão no céu agora.
E eu chorei mesmo não sabendo o que aquilo significava. A simples
menção de que meus pais não voltariam fez com que as lágrimas viessem.
Quando fiquei mais velho entendi que haviam morrido. Um carro havia se
chocado contra o deles na estrada, papai morreu na hora, já mamãe foi levada
ao hospital e só morreu depois que implorou à minha vó que tomasse conta
de mim, que me criasse como se eu fosse filho dela. Vovó não a desapontou
em momento algum, pois fez exatamente o que prometeu à mamãe.
Levou-me para morar com ela, ensinou-me o que era certo e o que era
errado. Deu-me carinho, atenção e proteção. Nunca me faltou nada, pois
sempre fez as minhas vontades. Sei que em alguns momentos deixou de lado
suas duas outras filhas para atender às minhas necessidades. Fui mais do que
um neto para ela, sempre fui especial, pois era o único garoto restante da
família que tinha o seu sangue e também porque fui criado desde os quatro
anos como se também fosse filho dela.
Entendo por que vive me chamando de mimado, dizendo que fez tudo
errado durante a minha criação? Ela fez uma promessa à minha mãe. Disse
que me tornaria um homem do qual ela teria orgulho. E ela falhou. Sou
imaturo, mulherengo, rebelde, tudo o que ela não queria que eu me tornasse.
Gostaria de dizer que sinto muito, que vou mudar e que posso mudar, mas
não acredito em nada disso. Jamais quis desapontar meus pais ou minha avó e
não sinto como se ela tivesse falhado. Não quero que ela se sinta culpada,
pois a culpa não é dela. É minha. Sou o que sou, mesmo que não seja aquilo
que esperam de mim.
Agora continuo enganando-a, talvez mais do que antes. Vovó está
certa em querer passar a presidência de sua empresa para Benjamin. Ele é um
ótimo funcionário e tudo aquilo que eu não sou. Só que eu sou egoísta e
conheço um lado de Benjamin que ninguém parece conhecer. Não posso
deixar que vovó faça isso, entregue tudo o que conquistou nas mãos dele e de
Olivia. É por isso que eu preciso me tornar aquilo que minha vó mais deseja.
Preciso me tornar o homem do qual ela teria muito orgulho, assim como os
meus pais. E mesmo que isso não vá acontecer de verdade, farei isso de
mentira. Eu vou me tornar um novo Andrew, e será uma fachada para
conseguir o que eu mais quero: meu lugar por direito.
Graças a Jackson, que inventou uma porção de mentiras para vovó,
ainda tenho chances de conseguir o que eu quero. Mas as chances são
mínimas. Tudo por causa da maldita ideia de colocar uma noiva no meio
dessa história. Eu noivo? É um absurdo apenas imaginar algo assim. Vovó
me conhece muito bem, sabe que nunca namorei firme, seria impossível que
em tão pouco tempo eu encontrasse uma mulher que considerasse boa para
casar. Gosto mesmo é de ter várias mulheres à minha disposição, foder com
elas sem compromisso. Não me vejo fazendo sexo com a mesma mulher por
semanas, meses, talvez anos. É até horrível só de imaginar!
Sou um cara livre, nasci para ser desimpedido. Ainda nem comi uma
ruiva natural… Não estou pronto para embarcar nessa de casamento. E
mesmo que eu quisesse fazer o sacrifício de me casar com uma mulher só
para conseguir minha herança, não conheço nenhuma que se encaixaria nos
padrões que eu exigiria. É, o Jack ferrou com a minha chance de conquistar a
vovó.
— Drew? Drew! — Ouço a batida na porta seguida da voz de minha
prima.
— Entre, Abby.
Ela entra e fecha a porta atrás de si. Abigail é minha prima, mas
também é minha parceira. Desde pequenos nos damos bem, somos cúmplices
um do outro. Tudo o que eu preciso sei que posso contar com ela e com
certeza Abigail é a única mulher com quem eu nunca pisei na bola. Costumo
dizer que ela é o Jackson todinho, só que com uma vagina e dez vezes mais
apetite sexual.
— Tudo bem? — pergunta-me enquanto se aproxima.
— Abby, vamos direto ao assunto. O que você quer? — pergunto.
Abigail se senta na poltrona do outro lado da mesa e abre um sorriso
lento.
— Por que todo mundo acha que eu sempre quero alguma coisa? —
replica.
— Porque você sempre quer alguma coisa.
— Tudo bem, você está certo. Eu sempre quero algo, mas dessa vez
não é algo para mim — diz.
— Não? — Ergo a sobrancelha em desconfiança. — Então o que é?
— Vim para oferecer a minha ajuda.
— Ajuda? — repito. — Não me lembro de estar em alguma
enrascada. Por que eu precisaria da sua ajuda?
Abigail ri e inclina-se para frente, sustentando meu olhar.
— Drew, você não me engana, tenho certeza de que você e Jackson
disseram algo para a vovó que a fez mudar de ideia. Mas, escute-me, isso não
vai funcionar se você continuar agindo como fez agora há pouco. Brincando
de futebol no escritório? Sendo mau exemplo aos funcionários? Contrariando
regras da empresa? Seja lá o que você fez, vovó acredita que você pode
mudar e eu acredito em você também, Drew. Quero te ajudar a conseguir
isso. Ei, ainda somos cúmplices, certo? Confia em mim ou não?
Às vezes eu me pergunto se Abigail tem algum superpoder, pois ela
parece enxergar tudo aquilo que as pessoas querem esconder. Ela fareja
mentiras, principalmente quando se trata de mim. Não sei se gosto disso ou
não. Mas o fato é que ela está certa e eu odeio admitir isso, mas minha prima
tem razão. Se chegar aos ouvidos da vovó tudo o que aconteceu hoje, eu
perco minha chance. Minha única chance de conseguir o que eu quero. Só
que é tão difícil ser a porra de um engomadinho certinho como Benjamin. Eu
não sei como fazer isso, eu odeio até mesmo fingir fazer isso. Abigail mais
uma vez tem toda a razão. Talvez eu precise de ajuda, de mais aliados, de
uma… Cúmplice.
— Tudo bem, você está certa. Vovó só me deu uma chance porque
Jackson inventou umas desculpas muito boas que a fizeram mudar de ideia.
— Rá! Mas isso eu já sabia. O que eu não sei é o que exatamente
vocês dois inventaram.
— Jackson disse que estou me interessando mais pelos negócios da
empresa e até mesmo estive planejando um jantar de negócios com nossos
clientes.
— Tá certo. E o que mais? Desembucha!
— E que eu também andei tendo umas ideias para criar uma área de
lazer aqui dentro da empresa para os funcionários. Algo para entretê-los
quando não estiverem trabalhando. Vovó achou a ideia muito boa.
— Drew, para de enrolação — Abigail resmunga. — Se vovó ainda
não colocou Benjamin na presidência é porque Jackson inventou uma puta de
uma mentira muito boa.
— Ele disse que estou noivo.
— Ele disse o quê?! — Abigail engasga. — Noivo? Noivo!
Abigail cai na gargalhada bem na minha frente. Eu disse… Ninguém
vai acreditar nessa mentira, estou lascado!
— É, Abby. Noivo. Foi exatamente isso que ele disse para a vovó
que a fez mudar de ideia.
— Ai, meu Deus! — Abigail suga o ar, tentando se controlar. —
Você está falando sério, não é? Caramba, o que o Jack tem na cabeça para
inventar uma mentira tão estúpida?!
— Foi o que eu disse, mas ele falou que essa foi a tacada final que fez
a vovó mudar de ideia, e eu acho que ele está certo.
— Ai, Drew, que droga! — Abigail pragueja. — E agora? Quando a
vovó descobrir que é mentira ela não vai hesitar em colocar Benjamin na
presidência, e o pior é que ela pode até demitir você.
— Abby, você não está ajudando — gemo. — Porra, eu preciso que
uma solução caia dos céus!
— E a sua solução chegou! — Jackson adentra o escritório de repente
ostentando um sorriso triunfante.
— Não sabe bater na porta não? — Abigail resmunga.
— Eu não preciso. — Jackson dá de ombros. — Você contou pra ela
por quê?
— Porque ela é Abigail? — aponto o óbvio.
— Porque ela é Abigail — Abby imita-me com uma voz fina. — Que
diabos isso significa?
— Nada, Abby, nada.
— Significa que você é uma intrometida, nem era pra estar aqui —
Jackson resmunga.
Eu já disse que Jackson e Abigail nasceram para discordar das
opiniões um do outro? São como cão e gato desde a adolescência…
— Pois eu posso ser uma intrometida, mas sou a única disposta a
ajudar o Drew! — Abby rebata.
— A única? — Jackson ri. — Quem salvou a presidência para ele fui
eu!
— Ah, sim! Salvou tão bem… Uma noiva? Onde você estava com a
cabeça, imbecil?
— Chega! — grito, batendo sobre a mesa com o punho. — Porra,
vocês dois parem! Escutem! Eu só tenho vocês agora, os únicos que são meus
aliados. Precisamos nos juntar e pensar em algo, não ficar brigando agora,
que as coisas já foram feitas.
— Quem está brigando? — Abigail me encara. — Só estou apontando
fatos.
— Eu não estou brigando — Jackson diz. — Tenho algo importante
para dizer, que vai salvar você dessa situação.
— Ah, é? Por que você não disse logo, então? — Abigail resmunga.
Jackson fuzila minha prima com os olhos, parecendo estar lançando
adagas invisíveis na direção dela.
— Talvez porque você ficou falando toda histérica aí e não me deixou
falar.
— Pelo amor de Deus, vocês podem calar a boca um segundo? —
Encarei os dois, que me fitaram e finalmente se calaram. — Minha nossa, até
que enfim! Vamos, Jackson, diga o que você precisa dizer…
— Drew, o único jeito de conseguirmos uma noiva em tão pouco
tempo é pagando. Posso fazer um contrato extremamente confiável,
oferecemos uma boa quantia em dinheiro para um casamento falso de um ano
no máximo. Encontrei uma agência ótima, só precisamos fazer uma lista do
que procuramos nessa mulher e eles até mandam candidatas para uma
entrevista. É perfeito! Podemos colocar cláusulas de sigilo absoluto. Sua vó
nunca vai saber.
— Não vai dar certo — Abigail interrompe. — É loucura! Ninguém
paga por uma noiva, precisamos de alguém confiável, não uma qualquer que
pode colocar tudo a perder!
— Abigail está certa, não conhecemos essas mulheres, elas podem
não ser confiáveis, podem acabar desistindo, e como eu fico? — pergunto e
me levanto da poltrona, pois não consigo ficar parado. — Vovó quer
conhecer minha noiva no domingo, no almoço de família! Tenho apenas
cinco dias, e o pior, preciso que minha suposta noiva saiba sobre mim e
preciso aprender sobre ela. E se vovó fizer perguntas ao nosso respeito? O
que eu vou dizer se nem conheço direito a mulher?
— Tudo bem, você tem razão, é arriscado. Mas você tem uma ideia
melhor? — Jackson pergunta.
— Não — resmungo.
— Então é isso o que vamos fazer — Jackson prossegue. — Pegue
uma caneta e vamos montar uma lista de como deve ser sua noiva.
— Que merda… — xingo, mas puxo um pedaço de papel de cima da
mesa e uma caneta. Não acredito que vou mesmo fazer isso.
— Drew, me diz que você não está considerando isso… — Abigail
cruza os braços.
— Tem ideia melhor, Abby?
— Droga, não — ela diz. — Mas isso é muito arriscado, Drew.
— Não temos outra escolha, Abigail, então ou nos ajude com a lista
ou não interrompa mais — Jackson fala.
— Tudo bem, façam o que vocês quiserem. — Abigail dá de ombros
e descruza os braços. — Mas isso não vai dar certo e eu não vou participar de
algo que pode acabar com todas as suas chances de vez, Drew. Com licença,
estou indo.
— Abby! — chamo. Ela me ignora e caminha para fora do escritório
batendo a porta logo que sai.
— Esquece ela. — Jack acena em direção ao papel em minhas mãos.
— Vamos nos concentrar na sua noiva.
— Jack, eu não sei se posso fazer isso — digo. — Olhe só, cara, este
sou eu. Sou o Drew, eu não posso ter uma noiva, não posso ficar preso em
um casamento com uma mulher que não conheço por um ano.
— Escute, cara, você precisa fazer isso — Jackson insiste. — É um
ano de casamento em troca de uma vida inteira no poder. E, porra, você ainda
pode escolher uma noiva!
— Jackson, eu não vou comer uma única mulher por um ano inteiro
— resmungo.
— E quem falou sobre você foder só uma mulher? Se você quiser
continuar com os seus casos, cara, você pode. Só precisa manter segredo
absoluto para que ninguém descubra.
— Jackson…
— Porra, Drew, eu só estou tentando ajudar!
— Tudo bem, vamos fazer isso — concordo.
Jackson sorri e senta-se na poltrona à minha frente.
— Então vamos lá… Temos que criar a noiva perfeita, alguém que
seria exatamente o tipo de mulher com quem você aceitaria um compromisso
sério. Só que precisamos de alguém que possa conquistar a sua avó também.
Como deve ser a sua noiva, Drew?
— Gostosa — respondo.
Jackson ergue as sobrancelhas.
— Gostosa? — ele repete.
— Você disse que tem que ser a noiva perfeita, o tipo de mulher com
quem eu assumiria um compromisso. E eu estou dizendo, tem que ser
gostosa.
— Tudo bem, me dá isso aqui. — Jackson inclina-se sobre a mesa e
puxa o bloco de papel e a caneta das minhas mãos. Vejo enquanto ele rabisca
alguma coisa rapidamente. — Pronto, ela vai ser gostosa. O que mais?
— Loira com certeza.
— Loira? — Jack repete coçando a cabeça. — Drew, você não acha
que está um pouco exigente?
— Você disse que tinha que ser o tipo de mulher com quem eu
assumiria um compromisso. — Dou de ombros.
— Tá, tá. Loira. — Jack rabisca novamente no bloquinho. — O que
você acha de acrescentarmos discreta e inteligente? Será bom para o contrato,
precisamos de alguém que entenda o que queremos.
— Ok.
Jackson anota no bloquinho de novo.
— O que mais? — pergunta-me.
— Ela tem que ser elegante e de preferência bem-sucedida. Afinal, eu
não saio com qualquer uma.
— Tudo bem, estou anotando — Jackson diz. — Acrescentei educada
também, sua vó repara muito a falta disso em você.
Lanço um olhar feio em sua direção, mas ele ignora.
— Ela tem que ser sociável, Jack, odeio mulheres como Olivia.
— Tudo bem, cara, já anotei. Inclusive coloquei também que ela deve
ser alguém responsável. Eu acho que já é o suficiente, temos o perfil da sua
noiva.
— Deixa eu ver isso. — Pego o bloquinho do Jack e leio em voz alta
a lista.
— O que você acha? — Jackson pergunta-me quando termino.
Ergo os meus olhos para ele.
— Boa sorte. Eu quero ver você encontrar essa mulher.
— Eu vou conseguir, entrarei em contato com a agência hoje e pedirei
que mande algumas candidatas com esse perfil amanhã para avaliarmos.
Quanto mais rápido resolvermos isso, melhor. Não se preocupe, Drew, vai
dar tudo certo.
— Eu espero que você esteja certo.
Depois do trabalho voltei para casa com uma puta dor de cabeça.
Queria fingir que todo esse assunto de mudar de vida, de encontrar uma
noiva, de conquistar a vovó não estava me incomodando. Mas isso estava me
afetando, e muito. Entretanto, agora estava feito, e eu entrei nessa para
ganhar. As ideias do Jackson eram muito arriscadas e malucas, mas até agora
ele salvou a minha bunda mais vezes do que eu posso contar. Tenho que
confiar que ele vai conseguir, ele vai arranjar a mulher ideal para este
contrato. Vai dar tudo certo e no fim eu vou conseguir o que eu quero.
Estaciono o meu carro na garagem enorme que acomoda os meus
quatro automóveis. Desço do carro e caminho para o jardim iluminado. Vovó
vive em uma mansão estilo colonial. O lugar é enorme, com seis quartos,
sendo todos suítes. Cozinha, sala de jantar, sala de estar, sala de jogos,
escritório, biblioteca, terraço e garagem. Tem até duas piscinas no jardim,
sendo uma aquecida. Depois que meu avô morreu, vovó passou a viver na
companhia dos empregados. Apenas quando meus pais morreram ela me
trouxe para morar com ela. Vivemos nós dois sozinhos por alguns anos. Mais
tarde, minha tia Lorenna, mãe de Abigail e Addison, separou-se do marido e
se mudou para cá com as filhas, para viver conosco e também fazer
companhia para vovó. Desde então moramos nós cinco e os empregados.
Eu já pensei em sair daqui, me mudar para um lugar só meu. Acabei
desistindo, pois vovó preza muito a minha companhia, apesar de ter a tia
Lorenna. Vovó sempre fez tudo para me agradar, sempre tornou esse lugar o
mais agradável possível para mim. E, bom, esse lugar é minha casa, onde vivi
a maior parte da minha vida. Então, por enquanto, estou bem aqui, vivendo
com ela e com minhas mordomias.
Vou direto para o meu quarto e não encontro ninguém no meu
caminho. Tomo um banho bem demorado, descansando minha cabeça contra
os azulejos, pensando em todos os acontecimentos que de repente estavam
transformando a minha vida em uma loucura. Saio do chuveiro, enrolo uma
toalha na cintura e volto para o quarto. Vovó está sentada na minha cama
com um porta-retratos na mão. É uma foto antiga dos meus pais, eles estão
sorrindo um para o outro e parecendo apaixonados.
— Vó.
Ela levanta os olhos e sorri gentilmente.
— Oi, Drew — murmura. — Como você está, querido?
— Eu? Estou bem. Aconteceu alguma coisa?
— Não. — Ela balança a cabeça. — Vim chamá-lo para jantar
conosco.
— Não estou com fome, vó.
— Por favor, Andrew. Jante conosco.
— Tudo bem — concordo. — Posso colocar uma roupa pelo menos
ou você quer me ver peladão?
Ela sorri mais.
— Vá pôr uma roupa, garoto — brinca com a voz leve. — E o que
tem aí embaixo eu já vi muito.
— Vó! Como a senhora é safada! — acuso ainda me divertindo com
sua expressão.
— Ah, Andrew, deixe dessas brincadeiras! — repreende-me, mas está
rindo.
— A senhora gosta, sei que gosta.
— Espero você lá embaixo, não demore.
Vovó sai do quarto e eu me visto. Quando desço, encontro todos na
mesa. Vovó, tia Lorenna, Abigail e Adisson. Minha prima está me encarando
emburrada, tenho certeza de que é pelo que aconteceu hoje cedo. Sento-me
no meu lugar e nós jantamos todos juntos, conversando casualmente. Até que
tia Lorenna resolve tocar em um assunto muito delicado.
— Fiquei sabendo que está noivo, Andrew — ela diz. — Por que
escondeu isso de nós?
— Não escondi nada, tia. Ia contar logo, só estava esperando um
pouco porque sabia que ficariam surpresos.
— Surpresa? — ela repete. — Estou muito mais do que surpresa, não
pensei que fosse ficar noivo tão cedo.
— Pois é, tia, aconteceu.
— Estou feliz por você, Andrew, aliás, todos nós estamos. — Ela
sorri meiga, é a filha mais parecida com a vovó. Não por fora, mas por
dentro. — Finalmente está tomando jeito.
— É… Quem diria que meu priminho assumiria um compromisso
sério algum dia? — Abigail interrompe, ela tem um olhar que eu não gosto. É
o tipo de expressão que me diz que ela quer me provocar. — Sua noiva deve
ser uma mulher incrível, por que não nos conta um pouco sobre ela?
Eu vou matá-la!
— É, Andrew, conte-nos um pouco sobre ela — minha tia pede
completamente alheia à provocação de Abigail. — Como ela é? O que ela
faz? Como se conheceram?
Minha cabeça começa a latejar e eu aperto os meus punhos para me
impedir de levantar da mesa e sufocar Abigail até que ela esteja implorando
para eu soltá-la.
— Ah, tia, vocês vão conhecê-la no domingo. Ai, podem perguntar
tudo o que quiserem, eu estou com dor de cabeça, vou subir — digo. E não é
mentira, minha cabeça está fervendo.
— Mas você nem comeu a sobremesa. — Vovó aponta para o meu
prato intocado.
— Outro dia, vó. Boa noite.
Subo para o meu quarto e vou direto para a cama. Amanhã será um
grande dia, principalmente porque, se Jackson conseguir mesmo alguma
mulher que se encaixe naquela lista, então eu terei uma noiva. A cada dia que
passa as chances de isso dar certo vão caindo. Fecho os meus olhos e obrigo-
me a não pensar mais nisso. Ainda assim, passo horas acordado olhando para
o teto até cair no sono.
***
Estaciono o Tesla na minha vaga privada e depois sigo para o
elevador. Jackson me ligou meia hora atrás e disse que ele conseguiu algumas
interessadas no contrato que ele mesmo formulou para minha falsa noiva. Ele
está me esperando para começarmos uma entrevista com cada uma delas.
Fiquei sabendo que são três. Torço para que uma delas seja exatamente como
eu imagino.
Sigo pelo corredor direto para a minha sala. Minha secretária, Tracy,
sorri quando me aproximo.
— Bom dia, Drew — cumprimenta-me com um sorriso malicioso.
— Tracy, aqui é Sr. Simons — repreendo-a.
— Desculpe.
— Vá chamar o Jackson, avise que eu cheguei.
— Sim, senhor.
Entro no meu escritório e fecho a porta. Retiro o meu paletó e jogo
sobre o pequeno sofá no canto. Preparo uma dose de uísque e sento-me na
minha poltrona atrás da mesa. Três minutos depois Jackson entra no meu
escritório e fecha a porta. Ele parece calmo, tranquilo, como se todos os dias
saísse por aí caçando falsas noivas para uma armação. Eu estou nervoso,
bebo meu uísque em um gole só e afrouxo um pouco a minha gravata.
— Elas estão aqui, são ótimas. — Jackson sorri. — Vai dar tudo
certo, vamos avaliar todas e escolher uma. É simples.
— Eu estou me sentindo sufocado, Jack.
— Deixa de ser medroso — Jackson implica. — É uma noiva de
mentira, nada disso é de verdade.
— Ainda assim parece verdade, tanto é que me sinto um porco pronto
para ser abatido.
— É bom você se concentrar, Drew, ou quem vai abater você sou eu
— Jackson ameaça. — Se sua avó descobrir que mentimos, ela te coloca na
rua e você perde a herança. E ela vai me chutar junto, não estou pronto para
ser demitido.
— Tudo bem. Vamos fazer isso.
Jackson sorri e deixa a minha sala. Rapidamente ele está de volta, mas
dessa vez acompanhado. Uma mulher alta de cabelos loiros curtos e olhos
azuis está com ele. Ela está usando jeans colados e um top que marcam bem
suas curvas. Ela é gostosa exatamente como eu pedi que fosse. Levanto-me
para cumprimentá-la.
— Este é o meu chefe, Andrew Simons — Jackson diz, apresentando-
nos. — Andrew, esta é Layla.
— É um prazer conhecê-la, Layla. — Estendo a minha mão.
Ela está sorrindo e parece bem confortável. Isso faz com que eu relaxe
também.
— O prazer é todo meu, senhor Simons. — Ela solta minha mão após
apertá-la.
— Andrew, a Layla assinou um contrato de confidencialidade e por
isso podemos dizer qualquer coisa que o assunto morrerá aqui dentro do
escritório. Ela já sabe o que queremos e até leu as cláusulas do contrato —
Jackson diz.
— Você está bem com isso, Layla? Um acordo de um ano, fingindo
ser a minha noiva? — pergunto.
— Sim, senhor. — Ela acena. — Gostei muito da proposta.
— Por que você acha que eu deveria aceitá-la? — prossigo.
— Veja bem, senhor Simons, eu sou loira, gostosa e inteligente. Posso
ser discreta, educada e sociável. Tudo o que o senhor exigiu. Não tenho
problemas em ter sexo com você. É bonito, rico e parece bom de cama.
É convencida também, acrescento mentalmente, mas não digo nada.
Ela é gostosa, ela pode ser convencida. Eu sei que eu sou.
— Você entende que assinando esse contrato não vai poder se
relacionar com mais ninguém, além de mim, mas que eu estarei fodendo
outras mulheres ocasionalmente?
— Nada do que o senhor fizer é da minha conta. E estou disposta a
assinar o contrato mesmo assim.
— Você tem família? Eles não se incomodariam com isso? —
continuo.
— Não tenho família. Eu estou em Nova Iorque sozinha.
— Quantos anos você tem, Layla?
— Vinte e seis.
— Trabalha com o quê? — pergunto.
— Estou desempregada no momento, mas sou formada em medicina.
— Layla, eu vi a ficha que você preencheu para nós e estou intrigado
com algumas coisas — Jackson interrompe. Ele tem uma folha na mão,
acredito que seja a ficha da garota. — Você nasceu em Oklahoma, mudou-se
para a Califórnia com dezoito anos e viveu lá por sete anos. Depois você se
mudou para o Colorado, mas ficou apenas três meses. Em seguida mudou-se
para Nevada, onde ficou por seis meses. Depois você se mudou para
Montana, onde passou mais três meses. Em seguida você fez uma viagem e
passou seis meses na Itália. Agora está de volta em Nova Iorque. Por que
tantos lugares?
— Eu… Humm… G-Gosto de conhecer lugares — gagueja.
— Tem certeza de que é apenas isso? — pergunto desconfiado. A
garota parece ter ficado desconfortável de repente.
— Sim, senhor. Adoro viajar.
— Você está mentindo — Jackson acusa. — Sou um advogado,
Layla, sei quando alguém não está me dizendo a verdade. Para que isso possa
dar certo, você tem que ser honesta conosco. Suas viagens têm algum
significado que possa atrapalhar o nosso contrato? Porque eu não posso
deixar que você entre nessa e de uma hora para outra resolva viajar.
Porra! Jack é esperto, eu nem tinha pensado nisso. E se a garota
resolve se mandar?
— Senhor Curtis, eu prometo que minhas viagens vão estar suspensas
enquanto eu estiver com o contrato. Por favor, eu preciso muito do dinheiro.
— Ah, é? — Agora é a minha vez de questioná-la. — Por que precisa
tanto do dinheiro?
— Eu… Eu quero ajudar uma amiga com dificuldades, e… Bom, o
dinheiro vai me dar a oportunidade de viajar mais.
Olho para o Jackson que me encara de volta, depois fita a garota com
o cenho franzido.
— Está mentindo de novo, Layla — Jackson diz. — Não posso nem
escutá-la se não cooperar comigo.
— Por favor, eu só preciso da grana! Eu estou disposta a não viajar
por um ano pelo contrato! Estou disposta a não ter relações com mais
ninguém, só com meu falso noivo. E eu tenho tudo o que vocês precisam,
meu perfil se encaixa no que vocês querem. Por favor — ela implora.
— Diga-me o motivo verdadeiro das viagens e de você querer esse
dinheiro, aí quem sabe podemos aceitá-la — Jackson prossegue.
A garota abaixa a cabeça e parece ponderar sobre isso. Quando ela
levanta os olhos, eles estão cheios de lágrimas.
Urgh! É do tipo dramática.
— Olha, eu conheci um cara e me mudei com ele para a Califórnia.
Eu pensei que ele era algo, mas ele se mostrou totalmente diferente. Eu tive
que cair fora. Abandonei meu emprego e simplesmente fugi. É por isso que
viajo tanto, não posso ficar muito tempo no mesmo local ou ele pode me
encontrar. Se eu conseguir esse dinheiro que vocês estão oferecendo em troca
de um ano da minha vida eu posso correr para longe e esse cara nunca vai me
encontrar.
— Droga! — Jackson xinga. — Esse cara machucou você?
— Não — ela diz. — Mas eu tenho medo de que, se ele me achar,
resolva me machucar. Ele é só um traficante de drogas, nunca fez nada contra
mim. Só que ele não aceita que eu quero terminar.
— Ele é o quê?! — explodo. — Pelo amor de Deus Jackson, você me
trouxe a porra da namorada de um traficante?
— Eu não sabia, cara — Jackson resmunga, ele parece tão chocado
quanto eu. — Layla, você precisa ir até a polícia, só eles podem ajudar você
com o seu problema. Infelizmente não podemos arriscar esse contrato com
você. Sinto muito.
— Mas eu seria uma boa noiva falsa. — Ela chora.
Cristo! Dá-me paciência, por que eu estou querendo matar o
Jackson!
— Sinto muito, Layla, você pode sair agora — Jackson diz,
apontando a porta.
— Acompanhe ela, Jackson — ordeno. — E nós vamos ter uma
conversa séria depois.
— Desculpe, cara, eu não sabia. — Jack encolhe os ombros. — Vou
mandar a próxima entrar.
Quando Jackson deixa a minha sala com a garota ex-namorada de um
traficante, eu preparo outra dose de uísque e bebo tudo em um gole. Sabia
que não ia dar certo! Infernos, onde Jackson está com a cabeça? Imagine só,
eu apresentando para a minha avó essa mulher. E no dia seguinte recebo a
visita do maldito traficante a querendo de volta. Seria uma cena daquelas!
Pode ser loira, pode ser gostosa, mas não vai ser minha falsa noiva de
maneira alguma.
A próxima garota entra. Ela também é loira de olhos verdes e parece
ser simpática. Ela sorri muito quando me vê e logo se apresenta dizendo que
se chama Paige. Ela tem um corpão, é ainda melhor do que a primeira. Está
usando um vestido com um decote que deixa muito pouco para a minha
imaginação. Ela me agrada muito fisicamente, mas eu não quero me enganar.
A primeira também parecia boa para foder e olhe no que deu.
— Paige, você já sabe por que está aqui, mas eu preciso perguntar
mesmo assim. Está tudo bem para você fingir ser minha noiva por um ano?
— Claro que está tudo bem. Quem não quer ser noiva de um homem
como você, Andrew?
— Por que você acha que eu deveria aceitá-la?
— Bem, pelo que Jackson me disse você está procurando uma mulher
bonita, alguém para você mostrar para a sociedade e que agrade sua família.
Eu posso fazer isso. Posso ser o que você quiser, Andrew. Sou uma boa atriz,
e isso vai ajudar muito.
— Você é atriz? É sua profissão?
— Isso mesmo.
— Quantos anos você tem?
— Vinte e três.
— Bebe, fuma ou tem algum vício? — pergunto.
— Bebo socialmente, não fumo e sou viciada em… Sexo.
Demoro alguns segundos para processar o que ela acaba de me dizer.
Acho que não devo ter escutado direito, mas quando eu levanto minha cabeça
ela está olhando diretamente para mim. Ela tem um olhar que eu conheço
muito bem, é carregado de luxúria. Porra, o meu pau se contrai diante
daquela visão. Paige de repente se levanta e inclina-se para frente sobre a
mesa. Tenho uma visão perfeita dos seus seios fartos.
— Qual a próxima pergunta, Andrew? — pergunta-me com um
sorriso diabólico.
— Você tem algum problema comigo fodendo outras garotas,
enquanto você terá que ser fiel a mim durante o tempo do contrato?
— Mmmm… eu não sei, Andrew. — Ela põe a língua para fora da
boca e lambe os lábios lentamente. É extremamente erótico, eu estou me
segurando para não ir até ela. — Eu não vivo sem sexo, se você me satisfizer
eu não terei nenhum problema com isso. Mas eu sou muito exigente.
— Ah, é? — Sorrio. — Que tipo de exigências?
Paige levanta-se e caminha ao redor da minha mesa. De repente ela
está na minha frente e então montando no meu colo. Ela é ainda mais linda
vista de perto.
— Eu gosto de sexo duro, forte — ela sussurra perto do meu pescoço
e depois morde o lóbulo da minha orelha. Eu deixo que ela continue
brincando comigo, porque eu estou gostando do jogo. — Gosto de ter o
controle. Ah, Andrew, eu faria tantas coisas com você. Desde que entrei
nesse escritório e vi você, tenho imaginado coisas maravilhosas que eu
poderia fazer.
— Que tipo de coisas? — pergunto, querendo ouvi-la um pouco mais,
já que ela tem uma voz sexy.
— Primeiro eu amarraria você na minha cama, colocaria uma venda
nos seus olhos, deixaria você completamente imóvel e sem escapatória — ela
diz e eu estremeço. Não é o tipo de coisa que eu gostaria que ela fizesse
comigo, embora saiba que ficaria contente em fazer isso com ela. — Depois
eu açoitaria você, deixaria a sua pele ardendo. Você ia gritar para eu parar,
mas eu continuaria até o ponto de você sentir dor. Ai, Deus! Fico excitada só
de pensar. Eu usaria a minha vara…
— Que porra é essa?! — exclamo e levanto imediatamente,
empurrando a garota para longe. — Que merda você tem na cabeça? O
caralho que você ia chegar perto de mim com uma vara!
— Pensei que você curtisse essas coisas — ela diz emburrada. — Se
ficarmos um ano juntos eu posso fazer você se interessar pelo BDSM.
— BDSM? — repito, cuspindo a palavra. — Ah, merda, você é porra
de uma masoquista ou alguma coisa assim?
— Eu pensei que você soubesse disso.
— Não, merda, eu não sabia disso. — Caminho até a porta do meu
escritório e abro. — Olha, eu sinto muito, você tem que ir.
— O quê? Eu não passei?
— Não, você não passou.
— Bem, você é que sai perdendo — Paige responde e caminha para
fora do escritório a passos largos e decididos.
Jackson escolhe aquele momento para retornar ao meu escritório.
— Então, cara, o que você achou da Paige?
Eu avanço nele, não posso me impedir de fazer isso. Simplesmente
avanço no Jackson, ele não espera por isso e logo eu estou o esmagando
contra a parede do meu escritório.
— Seu babaca! Imbecil! — grito no rosto dele. — Você acha que isso
é uma brincadeira?!
— Drew, me solte — Jackson pede, segurando os meus pulsos.
— Primeiro a garota de um traficante e agora uma praticante de
BDSM! — explodo.
— Eu… Eu não sabia! — Jackson diz.
Solto-o e me afasto.
— Você é um idiota, Jackson, deveria ter checado todas essas coisas
antes — digo.
— Eu faria, se eu tivesse tido mais tempo — Jackson responde. —
Infelizmente tempo é o que não temos.
— Acabou, não deu certo. Vamos desistir.
— O quê? Claro que não! — Jackson fala. — Ainda há uma garota,
vamos entrevistá-la. Não é possível que todas elas não sirvam!
Eu não sei por que eu ainda escuto o Jack. Talvez agora eu aprenda a
não fazer mais isso, já que eu resolvi escutá-lo e entrevistar a última garota.
Tudo parecia muito bem no começo. Ela era loira e tão bonita quanto às
outras. Dois anos mais velha que eu, mas eu não via problema nenhum nisso.
Disse que era arquiteta e gostou muito da nossa proposta, pois com o dinheiro
poderia investir em sua carreira. Acabou elogiando nossa construtora,
dizendo que já havia visitado vários lugares onde a Simon’s havia trabalhado.
Eu gostei dela e Jackson também. Ela era simpática, sociável, bem-sucedida,
inteligente, elegante e linda. Pensei que havia encontrado a minha falsa noiva,
até que o telefone dela tocou.
“Hakuna Matata
What a wonderful phrase
Hakuna Matata!
Ain't no passing craze
It means no worries
For the rest of your days
It's our problem-free philosophy
Hakuna Matata!”
— Desculpe, posso atender? — pergunta-nos olhando entre mim e
Jackson.
— Hãã… Pode.
Que tipo de mulher coloca “Hakuna Matata” como toque de seu
telefone?
— O que você quer, Frederick?! — a garota cujo nome era Naomi
gritou ao telefone. — Eu estou ocupada! Estou naquela entrevista! Você é o
pai deles, você também tem que cuidar deles, não pode jogar tudo nas minhas
costas! Eu sei, eu sei que a Julia é hiperativa, conheço a minha filha muito
bem! Não, não eu não posso ir para a casa agora. Por que você não tira sua
bunda gorda do sofá ao menos uma vez na vida e age como um marido que
preste?
Viro-me para Jackson, ele está olhando para a garota e está chocado.
— Você disse que não era possível que nenhuma delas servisse —
aponto.
— Eu… Eu não… não sabia que ela era casada — ele gagueja.
— O que eu faço com você, Jack? Porque eu sinto que a qualquer
momento eu vou arrancar a sua cabeça.
— Desculpa, cara.
— Desculpa? Você me trouxe uma ex-namorada de traficante, uma
louca do BDSM e agora uma mulher casada com filhos hiperativos.
— Eu sei, parece mau.
— Não, Jack, não parece mau. Essa porra tá muito, muito feia.
— Pronto, eu terminei — Naomi diz empurrando o telefone de volta
na bolsa. — Desculpe por isso, mas é que meu marido está sozinho em casa
com os meus três filhos. Ele não consegue fazer nada sem mim.
Suspiro pesadamente, apertando minhas mãos em punho e fitando
Jackson.
— Sinto muito, Naomi, você não passou — Jack diz e até ele parece
triste.
— Oh. — Ela parece chateada. — Bom, obrigada pela oportunidade.
Eu já vou indo…
Naomi vai embora e eu preparo mais uma dose de uísque, dessa vez
Jackson bebe comigo. Nós nos jogamos no meu sofá e ficamos encarando o
teto. Deu tudo errado, é claro! Como algo como isso poderia dar certo? Eu
sabia! Infernos, eu sabia! Está tudo perdido. Vovó vai descobrir e eu vou
perder tudo. E o pior, vou ver Benjamin e Olivia ganharem. É a minha ruina.
— Drew, eu… — Jackson começa, mas eu levanto minha mão
impedindo-o de continuar.
— Só cala a boca, Jack, e beba comigo.
Ele acena a cabeça e me passa a garrafa inteira de uísque, em seguida
pega uma para si próprio. Nós dois viramos ao mesmo tempo.
CAPÍTULO CINCO
--—————————————————————————————

Jamie

Estava limpando a cozinha quando Abigail apareceu. Vi quando ela


caminhou até a geladeira e retirou de lá uma jarra de suco que eu havia
acabado de preparar. Pegou dois copos, virou o líquido e depois se sentou
sobre a bancada da cozinha com o seu copo em mãos. Sentei-me no chão,
saindo da minha posição de quatro, que usava para esfregar o chão, e
arranquei as luvas das minhas mãos. Suspirei e afastei uma mecha do meu
cabelo que estava sobre os olhos.
— Bom dia para você também — falei.
Ela deu de ombros e abriu um sorriso.
— Como você pode chamar isso de um bom dia quando você se
encontra no chão, de quatro, esfregando a sujeira dos outros?
Foi a minha vez de encolher os ombros.
— É o meu trabalho — respondi.
— Eu realmente não me conformo — Abigail diz. — Você é tão
jovem, inteligente, poderia conseguir um serviço muito melhor.
— Bom, eu até poderia, exceto que ninguém quer contratar uma
garota de vinte e um anos que nem ao menos está na faculdade.
— Pois então você deveria cursar alguma coisa.
— Não posso — respondo e levanto-me do chão, abandonando minha
tarefa. — Você sabe… Eu não tenho condições.
Abigail era a única amiga que eu tinha, depois da minha irmã. E por
isso ela era a única a quem eu confidenciava algumas coisas da minha vida.
Ela me conhecia muito bem, sabia tudo sobre a minha família. Inclusive sabia
que eu morava com minha irmã, meu cunhado e meu sobrinho em um
minúsculo apartamento no Bronx. E que o dinheiro que eu ganhava mal dava
para ajudá-los com as despesas. Abigail sabia que minha vida era complicada
e estava sempre disposta a me ajudar. Eu a admirava muito por isso, mas
sempre negava sua ajuda.
— Está acontecendo alguma coisa? Você precisa desabafar? —
pergunta-me parecendo disposta a me ouvir. Sentei-me em uma cadeira, e ela
veio até mim. Estendeu-me um copo de suco e encheu novamente o seu para
depois sentar ao meu lado.
Eu não queria contar nada para ninguém, mas estava ficando
sufocada. Meus problemas estavam cada vez maiores e eu não podia nem
partilhá-los com a minha irmã, pois estava mantendo os segredos dela
também. Naquele momento abaixei a cabeça e resolvi que precisava mesmo
desabafar. Abigail era a única que restava e eu sabia que ela seria uma ótima
ouvinte. Ela sempre era.
— Está ficando cada vez pior, Abigail, e eu me sinto tão perdida,
porque não sei o que fazer — desabafo. — Estou ganhando muito pouco e
mal consigo pagar algumas contas lá de casa. Rick teve seu salário cortado
pela metade e ainda corre o risco de ser demitido. E a minha irmã é que está
mantendo as pontas, só que fica complicado com o tanto de dinheiro que ela
precisa enviar para os remédios do papai. E agora estamos com três meses de
aluguel atrasados e nosso síndico foi até mim e disse que seremos despejados
se não pagarmos a dívida ainda esse mês. Eu não contei nada para a minha
irmã, como poderia? A Jane já lida com tanta coisa, eu só vou preocupá-la
mais. Queria fazer alguma coisa, queria encontrar uma solução, mas estou tão
ferrada quanto qualquer um lá em casa. Fui assaltada no início da semana e
levaram meu celular. Era um Nokia Asha! Agora nem um celular tenho mais
e nossa despensa está ficando vazia. Tenho até medo de pensar em ficarmos
sem nada para comer.
— Oh, Deus! — Abigail suspira ao meu lado. — Por que não me
contou antes? Ah, Jamie, não chore…
Nem percebi que estava chorando até que Abigail se precipitasse para
pegar os guardanapos de papel e os entregasse para mim. Assoei o nariz com
nenhuma elegância e não tive como conter as lágrimas que vieram cada vez
mais fortes. Sabia que precisava colocar tudo para fora e esse era um bom
momento.
— Eu não queria encher você com os meus problemas — solucei.
— Mas eu sou sua amiga!
Com certeza ela era. Eu não duvidava nem um pouco.
— Eu sei, eu sei, é que tudo tem acontecido tão rápido.
— Jamie, seus problemas são sérios, realmente sérios — Abigail
prossegue. — Não posso deixar que me conte algo assim e queira que eu
fique aqui parada apenas vendo tudo acontecer na frente dos meus olhos.
— O que quer dizer?
— Quero dizer que vou emprestar para você algum dinheiro. O
suficiente para que você possa pagar os aluguéis atrasados e arrumar um
pouco sua vida.
— Não! — protesto. — De jeito nenhum, Abby. Não posso aceitar.
— Jamie, você não tem escolha — Abigail diz. — Se não aceitar um
empréstimo o que vai fazer? Morar na rua com sua irmã, cunhado e
sobrinho? Passar fome? Pelo amor de Deus, eu não vou deixar isso acontecer.
— Abby, muito obrigada, realmente obrigada — agradeço fungando.
— Mas não posso aceitar seu dinheiro, não acredito que conseguiria devolver
a você…
— Então é seu! — Abigail assegura. — Estou dando a você uma
quantia em dinheiro. Pronto. Não falamos mais nesse assunto.
— Ah, Abby, eu sei que quer me ajudar, mas não posso aceitar um
empréstimo e muito menos um presente assim. Eu não me sentiria bem com
isso, infelizmente não posso aceitar o seu dinheiro. Quero conseguir isso com
minhas próprias mãos, com os meus próprios feitos, será que me entende?
— Entendo que é uma teimosa! — Abigail exclama quase
derramando suco em si mesma. — Como pensa em conseguir esse dinheiro
com teus próprios feitos? Estou disposta a ajudar, por favor.
— Não, Abby, não posso. Só de você me ouvir, me tratar tão bem, ser
minha amiga já me ajuda tanto.
— Que besteira. — Abigail revira os olhos. — Ser sua amiga não vai
impedir que coloquem você e sua família na rua. Uma amiga de verdade não
deixaria isso acontecer nunca.
— Abby, chega! — resmungo. — Vamos parar com este assunto,
sabe que não vou aceitar seu dinheiro, então não insista.
— Tudo bem, tudo bem. — Abigail levanta as mãos, rendendo-se. —
Se não vai aceitar o dinheiro, entendo. Só que não vou ficar com os braços
cruzados agora que sei da sua situação. Estou indo falar com Olivia, há
tempos que ela deveria ter aumentado seu salário.
— O quê? — Arregalo os olhos. — Falar com Olivia?
— Falar não. — Abigail sorri diabolicamente. — Vou exigir que ela
aumente seu salário.
— Meu Deus! Não, não e não! — protesto, soltando o copo sobre a
mesa.
— Isso você não pode impedir e estou indo agora mesmo.
Abigail levantou-se, virou o resto de seu suco em um único gole,
então se virou e caminhou para fora da cozinha. Desesperada, larguei o
serviço inacabado e saí atrás dela. Abigail não podia pedir um aumento de
salário a Olivia por minha causa e das minhas dívidas. Isso era um problema
meu e eu não queria que ninguém estivesse no meio disso. E sabia que Olivia
não ia aceitar essa ideia facilmente, se quisesse aumentar meu salário já teria
feito, mas não o fez. Eu sabia também que isso não podia acabar bem, e por
isso apressei-me até conseguir alcançar Abigail e segurá-la pelo pulso.
— Por favor, Abby, não faça isso — imploro.
— Jamie, eu quero ajudá-la de alguma maneira, se isso é tudo o que
eu posso fazer, então farei. Agora me solte ou vou arrastar você para a sala de
Olivia comigo.
Eu queria implorar mais uma vez para que Abigail não fizesse isso,
porém nem tive tempo. Ela voltou a andar a passos largos e logo alcançou o
escritório de Olivia. Vi quando falou brevemente com a secretária que logo
deu permissão para que ela entrasse no escritório. Eu queria morrer ali
mesmo, isso não podia estar acontecendo. Maldita hora em que fui abrir a
boca para Abigail. Justo a Abigail que quando coloca uma coisa na cabeça
não volta atrás de maneira nenhuma.
Virei as costas e voltei às pressas para a cozinha para continuar com
meu serviço. Esperava e rezava para que ou Olivia escutasse Abby e
aumentasse o meu salário. O que era muito difícil (seria mais provável que o
papa viesse de Roma pagar minhas despesas do que minha megera patroa
fizesse o que Abigail queria). Acredito que com a sorte que eu tinha ela seria
capaz até de diminuir meu salário, ao invés de aumentá-lo.
Abigail permaneceu no escritório de Olivia por quatro minutos
inteiros, o que me surpreendeu muito. Geralmente as duas não conseguiam
ficar em um único ambiente por um minuto sequer. Sempre acabam brigando
e não me surpreenderia se saíssem nos tapas. Felizmente ninguém se feriu,
mas Abigail estava soltando fumaça pela boca. E eu sabia que tinham
brigado, é claro que tinham. Olivia nunca acataria nenhum pedido de sua
prima. Ainda mais um pedido que tivesse a ver comigo.
— Ela vai me pagar! — Abigail exclama, invadindo a cozinha
bufando.
— Abby, eu disse que Olivia não ia dar atenção a você.
— Não, não. — Abigail balança a cabeça e perfura-me com seus
olhos. — Você não está entendendo. Aquela mulher é um mostro! Juro por
Deus que não pulei no pescoço dela por pouco, muito pouco!
— Abby, controle-se — pedi. Passei um copo de água que ela bebeu
inteiro rapidamente. — Esqueça isso.
— Esquecer? — ela repete. — Mas de jeito nenhum! Jamie, ela acha
que manda neste lugar… Não, não, ela não acha. Ela tem certeza! Ela age
como se fosse presidente já!
— Abby, esse é o jeito de Olivia. Também odeio, mas tenho que
suportá-la.
— Não, você não tem. Ninguém é obrigado a dizer ou fazer o que
aquela mulher quer. Ela me expulsou da sala dela alegando que não vai dar
aumento algum para você. E também que não tenho direito de interferir em
nada. Pois eu vou provar que ela está muito enganada. Olivia ainda não
manda neste lugar e, se depender de mim, nunca vai mandar. Eu vou agora
mesmo falar com Drew, ele vai me ajudar.
— O quê? Não! Meu Deus, Abigail, pare com isso! — peço. — Você
acabou de brigar com Olivia por minha causa e agora vai atrás de Andrew?
Esqueça isso, por favor.
— Então aceite meu dinheiro — ela insiste. — Não vou ver você
sendo colocada para fora de casa com toda a sua família.
— Não posso aceitar seu dinheiro, Abby, entenda isso.
— Estou indo falar com o Drew — resmunga e dá as costas para mim,
saindo novamente da cozinha.
Santa mãe de Deus! Dá-me paciência!
Novamente desisti de segui-la. Se Abigail queria insistir nisso então
que fosse, mas eu não me intrometeria. Uma hora ou outra isso acabaria
sobrando para mim e eu não tinha mais tempo para me envolver em
problemas. Também não podia aceitar seu dinheiro, mesmo sabendo que
Abigail tinha condições de pagar minhas despesas. Mas eram as minhas
despesas! Se tem uma coisa que aprendi na vida é que se queremos crescer
em alguma coisa, deve ser com nossas próprias mãos. Então Abigail tinha
que entender que para sair da situação financeira ruim em que eu me
encontrava eu precisava tomar uma decisão. Não ela, mas, sim, eu.
— Jamie? — Janice chama minha atenção, entrando na cozinha e
abandonando uma bandeja vazia sobre o balcão.
— Oi.
— A secretária de Olivia mandou um recado. Ela disse que Olivia
quer ver você imediatamente em seu escritório.
Oh, merda!
— Eu… Eu já vou — murmuro.
— Aconteceu alguma coisa? Soube que Olivia e Abigail discutiram e
que ela veio refugiar-se aqui na cozinha.
— Refugiar-se? — Rio sem humor. — Se há alguém que não teme
Olivia em nenhum aspecto, esse alguém é Abigail. Ela veio aqui apenas para
conversar.
— E onde ela está agora?
— Acho que foi ver o Sr. Simons. — Dou de ombros.
— Bom, eu vou continuar com o meu trabalho. Se precisar de algo é
só chamar. Boa sorte com Olivia.
— Obrigada, Janice.
Não era preciso ser um gênio para saber o motivo de Olivia estar
exigindo minha presença em sua sala imediatamente. Tenho certeza que o
motivo era o bendito aumento de salário que Abigail foi exigir a ela. Quando
digo que algo não vai dar certo, é porque nunca dá certo. Conheço muito bem
minha patroa para saber que ela não deixaria isso simplesmente passar.
Respiro fundo e sigo para sua sala já me preparando para os sermões que vou
ganhar.
A secretária permite minha entrada rapidamente e logo me vejo
sozinha com Olivia no escritório. Ela está sentada na sua poltrona atrás da
mesa, seus olhos estão focados em mim. Sei que está furiosa, pois seus olhos
estão semicerrados e seus lábios estão em uma linha fina, dura, impenetrável.
Ela faz um gesto para que eu me aproxime e levanta-se para me encarar em
toda a sua altura. Engulo em seco.
— A senhora mandou me chamar?
— Jamie, você tem algo a reclamar sobre o seu trabalho? — pergunta-
me firme e direta.
— Não, senhora.
— Tem certeza? — insiste.
— Sim, eu não tenho nenhuma reclamação sobre o meu trabalho.
— Então por que você disse a Abigail que está insatisfeita com o seu
salário?
— Eu não disse isso, senhora. Abigail é que queria me ajudar e
pensou que um aumento em meu salário seria bom.
— Você acha que merece um aumento de salário?
— Foi apenas um engano, senhora, eu estou bem com o meu trabalho.
— Não foi o que eu perguntei — Olivia corta-me e repete a pergunta.
— Você acha que merece um aumento de salário?
Minta! Minta! Minta! Ouço os gritos na minha cabeça implorando
que eu minta e diga que realmente não preciso de nenhum centavo a mais,
porém essa não é a verdade. Se eu não disser que preciso muito de um
aumento, onde vou conseguir dinheiro para pagar as dívidas da minha
família? Não vou aceitar o dinheiro de Abigail, então preciso ser honesta com
Olivia.
— Eu… Eu acho que seria bom ter um aumento.
Passam-se apenas alguns segundos de silêncio em que Olivia fita o
meu rosto com uma expressão dura.
— Vou dar o seu aumento — Olivia diz. Solto o fôlego que nem sabia
que estava segurando. Até que a realidade do que ela disse me atinge e eu
sorrio feito boba. Ela vai me dar um aumento? Ai, meu Deus, ela vai me dar
um aumento! — Mas eu tenho uma condição.
— Condição? — Meu sorriso morre. — Que condição?
— Jamie, você trabalha muito pouco para querer um aumento. Faz
apenas cafés e algumas vezes limpa um escritório. Tenho funcionários aqui
que fazem muito mais — Olivia diz. — Se você quer um aumento, sua carga
de trabalho vai aumentar e seu serviço também. É isso o quer?
— Trabalhar mais do que já faço?
— Céus, além de cega também é surda? — Olivia ofende-me. Tenho
vontade de avançar nela, finalmente entendo o ódio profundo que Abigail
tem por essa mulher. Que cretina!
— Não, senhora, eu entendi sua condição — respondo entredentes.
— E então? — questiona-me. — É o que você quer?
Um aumento de serviço em troca de um aumento de salário? É toda a
solução que tenho para conseguir pagar as dívidas da minha família. É a
minha única chance.
— Sim, senhora, é o que eu quero.
Olivia sorri um tipo de sorriso malvado e volta a sentar-se em sua
poltrona.
— Bom, então comece indo até a cozinha preparar um café para mim.
Um bom café, não aquele líquido sem gosto que você às vezes me traz — ela
ordena. — E depois consiga um pouco de graxa.
— Graxa? — repito. — Para que a senhora precisa de graxa?
— Eu não preciso de graxa. Mas você vai precisar… Para engraxar os
meus sapatos.
O quê? Ah, merda, eu não devo ter ouvido direito. Essa bruxa quer
que eu engraxe seus sapatos? O que ela pensa que eu sou? Uma escrava?
— Senhora, eu não vou…
— Jamie! — ela me corta. — Já tivemos nossa conversa, agora
preciso trabalhar. Ou faça o que eu digo, ou desista do seu aumento. Agora
saia da minha sala.
— Pode deixar, senhora — resmungo e me retiro.
Saio de sua sala pisando firme e bufando. Estou louca para engraxar
aquela cara deslavada dela, isso sim! Abigail tem razão, Olivia é um monstro.
Se eu não precisasse tanto desse emprego já tinha caído fora há muito tempo.
Agora preciso tanto de mais dinheiro que vou me sujeitar a essa humilhação.
Tenho vontade de gritar, de chorar, por que o mundo é tão injusto? Por que
pessoas como Olivia têm tanto poder? Por que acham que podem mandar e
desmandar em qualquer um? Ela acha que pode me pisotear, e o pior é que
não posso me defender.
Enquanto vou até a cozinha e preparo o maldito café dessa mulher,
fico pensando no futuro dessa empresa. Olivia vai acabar com tudo, ela vai
arruinar a construtora. Eu sei disso e sinto que vai acontecer em breve. Se
Elizabeth deixar seu império nas mãos dela ou de seu marido vai estar tudo
acabado. Não só para mim, como para todos os funcionários. Pela primeira
vez desejo fortemente que ela não consiga o que quer. Torço fielmente para
que Andrew tome posse de todo esse lugar. Ele até pode ser um canalha, mas
ele não é frio e sem coração como Olivia.
Termino o expresso de Olivia e levo a bandeja para sua sala. Estou
quase na porta do seu escritório quando paro abruptamente. Olho para a
bandeja, o conteúdo líquido dentro de sua xícara. Sinto uma pontinha de raiva
por tudo o que ela está fazendo comigo e com os outros. Lembro-me de suas
palavras penetrando a minha mente: “Bom, então comece indo até a cozinha
preparar um café para mim. Um bom café, não aquele líquido sem gosto que
você às vezes me traz. E depois consiga um pouco de graxa.”. Ela não
deveria me ferir com palavras, mas ainda assim ela faz. Todas as vezes que
ela diz este tipo de coisa consegue me deixar mais para baixo. Como se eu
não servisse para nada, nem mesmo para fazer cafés. Sinto raiva dela por isso
e por tantas coisas. Eu a aguento há tanto tempo, sempre quieta, sempre
obediente. Ai, como queria me voltar contra ela, esfregar na sua cara que não
preciso escutá-la, dar ouvidos a ela. Mas isso é uma mentira, eu dependo de
Olivia. No entanto, isso não quer dizer que eu não possa cuspir no seu café e
apreciar enquanto ela o bebe bem na minha frente.
Olho para um lado e depois para o outro. Os corredores estão vazios e
a secretária de Olivia está sentada em sua mesa muito concentrada. Ergo a
xícara com a minha mão livre e bebo um gole. Está delicioso, como sempre.
Tenho certeza de que ela só reclama para implicar comigo. Volto a colocar a
xícara no pires, mas agora ela carrega traços da minha saliva. Assim como eu
fiz algumas vezes com Andrew quando ele insistiu em errar o meu nome.
Sim, eu literalmente cuspi nessa xícara. Lembro-me de me sentir uma menina
travessa, vingando-me dele, sem que tivesse qualquer ideia. Agora sinto o
mesmo enquanto me encaminho para a sala de Olivia.
Deixo a bandeja sobre sua mesa e espero para assistir enquanto ela
bebe o café, assim posso rir internamente. Infelizmente Olivia me cobra a
graxa e sou obrigada a deixar sua sala e ir até a despensa. Não encontro graxa
em lugar nenhum. Mas já era de se esperar, afinal, isso aqui não é o sapateiro.
Volto para a sua sala e aviso sobre a ausência de graxa, ela coloca alguns
dólares na palma da minha mão e ordena que eu vá comprar. Ela ordena que
eu compre graxa para engraxar a porra do seu sapato! Quase grito na cara
dela, quase. Felizmente nesse momento ela bebe seu expresso bem na minha
frente e sorri. Sorrio também e pergunto:
— Está do jeito que a senhora gosta?
— Perfeito, Jamie — ela responde, bebendo mais. — Deveria fazer o
café assim sempre.
— Como desejar, senhora — respondo alargando o meu sorriso.
Se for isso o que você quer, é isso o que você vai ter!
Logo depois saio para comprar graxa, quando retorno ela me faz
engraxar seus sapatos ainda em seus pés. Isso mesmo. Eu tenho que me
sentar no chão, segurar seus pés e engraxar os sapatos assim mesmo. A
humilhação é tanta que sinto o meu rosto ficar quente de raiva, mesmo assim
prossigo fazendo meu serviço sem nenhuma reclamação. Quando termino, ela
os avalia como se estivesse procurando alguma maneira de dizer que fiz algo
errado.
— Até que não ficou tão ruim — Olivia diz. — Talvez sua vocação
seja engraxar sapatos, não fazer cafezinhos.
— Talvez esteja na hora de socar a sua cara — murmuro.
— O que foi o que você disse? — Olivia pergunta-me. Dou-me conta
de que pronunciei meus pensamentos em voz alta.
— Nada, senhora — resmungo. — Se não precisa de mais nada, vou
me retirar.
Olivia lança um olhar desconfiado na minha direção, mas parece
convencida. Graças a Deus ela não ouviu o suficiente para compreender
minhas palavras.
— Pode ir.
Saio de sala e volto para a cozinha. Minhas mãos estão pretas e
minhas roupas também. Tenho sorte de não estar usando um dos meus
melhores suéteres ou estaria chorando. Em vez disso tento pensar no lado
bom de tudo isso. Vou receber um aumento, quem sabe seja o suficiente para
fazer o senhor Dimitri nos deixar no apartamento por mais alguns meses até
que eu consiga pagar outro aluguel atrasado.
Enfio minhas mãos embaixo da torneira e tiro o máximo que posso da
sujeira preta de graxa. Infelizmente minha pele continua manchada. Espero
que ela não exija que eu faça isso todos os dias ou eu acabarei preferindo o
salário anterior.
— Jamie.
Ouço a voz de Abigail e me viro.
Ela está correndo pelo corredor e, quando me alcança, simplesmente
puxa o meu pulso e arrasta-me para fora da cozinha. Nem tenho tempo de
processar o que está acontecendo, porque ela simplesmente me carregou. A
torneira ficou ligada e minhas mãos estão pingando água. Abigail está
nervosa e eu nunca a vi assim antes. Ela olha de um lado para o outro pelos
corredores como se estivesse com medo de ser pega. Pergunto-me o que ela
fez dessa vez.
— Abby, o que houve? — pergunto.
— Shiuu, entra no elevador.
Eu nem tenho tempo de abrir a minha boca outra vez e ela já está me
empurrando para o elevador.
— Jesus, o que está acontecendo? — insisto.
— Preciso da sua ajuda.
— O quê? Por quê? O que você fez, Abby?
— Eu não fiz nada, preciso que você me ajude com Drew e Jack.
— Hã… Como assim? O que o senhor Simons e o senhor Curtis
fizeram? — pergunto confusa.
— Você já vai ver — ela responde impaciente e com uma careta
acrescenta: — Pelo amor de Deus, não os chame assim na minha frente. Eu
tenho uma visão horrorosa de dois velhos quando você os chama de senhores.
Estou pronta para perguntar novamente o que está acontecendo, mas o
elevador para. Abigail me puxa para fora e arrasta-me pelo corredor em
direção à sala de Andrew. Quando chegamos Tracy está na porta do escritório
como se fosse um soldado guardando o lugar. Abigail faz um gesto para que
ela abra a porta e é o que Tracy faz. Em seguida nós três entramos e a
secretária fecha a porta atrás dela.
Imediatamente vejo o porquê de Abigail estar tão alterada. Andrew
está deitado no pequeno sofá no canto da sala. Sua camisa está molhada com
um líquido escuro que provavelmente escorreu da garrafa vazia de uísque que
está sobre sua barriga. Sua cabeça está jogada sobre o braço do sofá em uma
posição desconfortável, mas ele está dormindo. Jackson está deitado no chão
e ele tem uma garrafa de uísque em suas mãos que não está totalmente vazia.
Eu não sei por que, mas ele está sem os seus sapatos. E apesar de seus olhos
estarem abertos, eu não acho que ele esteja presente no momento. De seus
lábios saem sons incoerentes. Ambos estão obviamente muito bêbados.
— Puta merda — murmuro.
— Entendeu agora? — Abigail encara a mim e depois aos dois
homens na sala.
— Por que eles estão bêbados? — pergunto.
— Eu não sei, nem Tracy — Abigail responde. — O que eu sei é que
se Olivia ou Benjamin aparecem por aqui os dois estão ferrados. Meu Deus, e
se vovó descobre? Céus, esses dois vão perder o emprego.
— O que você quer fazer? — pergunto. — Porque eu não tenho
certeza de como posso ajudá-la ou a eles.
— Preciso tirá-los daqui.
— Como assim, tirá-los? Você quer dizer, tirar eles do prédio?
— Exatamente — Abigail concorda. — Eu não sei por que esses
imbecis fizeram isso, mas não posso deixar que eles corram o risco de perder
o emprego. Não posso. Ainda tenho fé de que Andrew vai assumir a
presidência.
— Tudo bem — murmuro. — Mas como é que você pensa em tirá-los
daqui?
— Droga! — Abigail pragueja. — Não sei. Não posso levá-los lá para
casa, vovó vai vê-los.
— É… Por que vocês não os levam para o apartamento do senhor
Curtis? É perto daqui — Tracy sugere.
— Ah, sim, é isso. — Abigail sorri. — Vamos levá-los para o
apartamento do Jackson, sei onde fica.
— Vamos? — repito. — Como assim? Eu não posso sair agora, eu
ainda tenho trabalho a fazer.
— Jamie, aquele verme jogado no sofá também é seu chefe, tenho
certeza de que ele não vai demitir você por ajudá-lo a sair daqui nesse estado
em que ele se encontra — Abigail responde. — Além disso, a Tracy não pode
ir, ela vai nos dar cobertura. Se perguntarem por esses dois, ela vai dizer que
foram encontrar um cliente. Preciso de você.
— Eu… Eu não sei, Abby.
— Por favor, Jamie, preciso de você. Eles precisam de você —
Abigail implora.
— Merda — xingo. — Ok, eu vou ajudar.
— Ótimo. — Abigail suspira. — Eu vou dizer como vai ser isso.
Tracy, vá até a sala do Jackson e encontre as chaves do carro dele. Depois se
certifique de manter o corredor limpo, verifique onde Olivia e Benjamin
estão, eles não podem cruzar nosso caminho. Desça pelo elevador de serviço
e deixe o carro aberto e pronto para partir. Vá.
— Estou indo — Tracy responde e sai logo em seguida.
— E eu? O que você quer que eu faça? — pergunto.
— Você e eu vamos acordar o Andrew e levá-lo lá para baixo pelo
elevador de serviço. Depois voltamos para pegar o Jackson.
— Seja o que Deus quiser — suspiro. — Vamos.
Abigail e eu sentamos Andrew no sofá, em seguida ela dá tapas em
seu rosto para acordá-lo. Infelizmente Andrew abre os olhos, geme palavras
incoerentes, mas não acorda. Tentamos colocá-lo de pé, mas não dá certo e
vamos parar as duas de bunda no sofá com Andrew jogado em nossos braços.
Abigail consegue um pouco de água e acaba jogando no rosto de Andrew
enquanto grita furiosa que ele precisa acordar. A água gelada parece ter
algum efeito e ele abre os olhos, mas continua muito bêbado para prestar
atenção em nossas palavras. Novamente tentamos colocá-lo de pé, dessa vez
ele se mantém erguido, embora a maior parte de seu peso esteja sobre mim e
Abigail. Aos poucos vamos dando passos para fora do escritório. Quando
chegamos ao elevador estamos exaustas, acabamos colocando-o no chão.
Abigail e eu estamos ofegantes quando saímos do elevador e vamos em
direção à vaga de estacionamento de Jackson. Tracy já está nos esperando lá
e ela nos ajuda a manter o peso de Andrew enquanto o enfiamos no banco de
trás.
— Puta merda, nunca pensei que Drew fosse tão pesado! — Abigail
exclama passando a mão sobre a testa para se livrar do suor.
— Ainda precisamos trazer o Jackson — lembro-a.
— Merda, esses dois me devem! Devem-me muito!
— Vou ajudar vocês — Tracy diz. — Vamos.
— Humm… será que não tem problema deixá-lo aqui sozinho, nesse
estado? — pergunto, apontando para um Andrew muito desmaiado no banco
de trás.
— Sair do lugar ele não vai e ninguém vai vir bisbilhotar aqui —
Abigail diz. — Além disso, vamos ser rápidas com Jackson.
— Vamos lá então — digo.
Subimos novamente e, quando chegamos ao escritório, Jackson está
sentado no tapete. Ele olha para cima e nos encontra. Seu olhar parece
perdido, sem foco. Ele abre a boca para dizer alguma coisa e depois fecha.
Seu dedo indicador ergue e ele aponta para Abigail enquanto um canto de sua
boca torce para cima em um sorrisinho.
— Abigaiiilll, eu estouuu venddoo vocêê — Jackson diz com a voz
levemente rouca, arrastando as palavras. — Parecee tãoo real.
Abigail se aproxima, abaixa-se e dá um tapa no rosto de Jackson.
Tracy e eu olhamos chocadas.
— É porque eu sou real, imbecil!
Jackson levanta a mão e passa sobre a bochecha, no lugar exato onde
tomou um tapa. Seu cenho fica franzido, enquanto ele olha para ela.
— Adoroo mulheresss bravasss. — Ele sorri novamente. — É
muitooo sexy, Abby.
— Oh, pelo amor de Deus! — Abigail suspira. — Não posso nem ter
uma conversa civilizada com você. Vamos, levante-se, precisamos dar o fora
daqui.
— Abigaill, vocêê é sexyy demaisss. — Jackson lança um sorriso
malicioso e tenta abraçar Abigail. Tento me conter para não rir, mas é uma
cena hilária.
— Jesus, me ajudem aqui! — Abigail chama.
Tracy e eu nos aproximamos e ajudamos a retirar o Jackson de cima
de Abigail. Depois, com o maior esforço, levantamos e fazemos o mesmo
trajeto até o elevador, e então até a vaga de estacionamento. Colocamos
Jackson sentado no banco do passageiro. Tracy me passa a minha bolsa que
ela pegou escondida para que eu não precisasse retornar à cozinha e dar
explicação para os outros funcionários. A secretária promete que vai limpar o
escritório de Andrew e nos cobrir caso alguém desconfie de alguma coisa.
Depois ela passa a chave do carro para Abigail, que assume o volante. Sou
empurrada para o banco de trás, com Andrew. A cabeça dele descansa imóvel
sobre a minha coxa enquanto nós vamos embora.
— Nem acredito que conseguimos — Abigail diz.
— Nem eu — respondo ofegante.
— Obrigada, Jamie, eu não conseguiria sem você.
— Amigas são para essas coisas.
Por sorte Abigail sabe onde Jackson mora e conhece o porteiro. Nós
conseguimos colocar o carro na garagem e com a ajuda do porteiro e de um
segurança subimos para o andar dele. O apartamento de Jackson é enorme,
simplesmente incrível. Apesar de estar ajudando o segurança a carregar
Andrew, não posso impedir-me de avaliar tudo com os meus olhos. Estou
impressionada, ele deve ganhar muito, muito bem. Abigail nem se surpreende
com nada, afinal isso tudo faz parte do seu mundo. Ela está acostumada ao
luxo, eu não.
Andrew e Jackson são colocados no sofá e Abigail agradece a ajuda
do porteiro e do segurança. Logo ficamos sozinhas com eles. Jackson apagou
de vez, ele está dormindo tão pesado que está babando. É uma visão
horrorosa! E eu nem acredito que faço parte disso tudo. Estou na casa de um
homem rico, lindo e bêbado. E eu o ajudei a chegar até aqui. Assim como
ajudei Andrew a escapar de outra enrascada.
— Eu vou pegar algumas compressas frias e água para eles beberem
— Abigail diz. — Certifique-se de que eles não fiquem deitados, não quero
que vomitem.
— Ah, ok.
Abigail se retira e nesse momento a cabeça de Andrew escorrega para
baixo. Ele fica em uma posição muito desconfortável, sentado, porém com a
cabeça meio de lado. Aproximo-me e tento puxá-lo para cima, para que ele
não escorregue novamente. Quase não consigo movê-lo, é um chumbo! De
repente ele abre os olhos e me encara. Estou perdida numa imensidão de azul,
seu olhar é tão profundo, tão incrivelmente carregado e intenso que eu não
consigo desviar. Ele levanta a mão, ainda meio mole, e toca no meu rosto.
Sinto-o tão perto de mim que sua respiração está batendo contra a minha
pele, quente e com cheiro de bebida alcoólica. Andrew move a mão como se
estivesse acariciando a minha bochecha, mas seu gesto é um pouco rude e os
meus óculos de grau caem no chão. Ouço um barulho leve de vidro e
amaldiçoo. Ele acaba de quebrar os meus óculos, ótimo, apenas ótimo! Estou
prestes a largá-lo para verificar os meus óculos quando ele segura o meu
pulso, apertando firmemente. Levanto o meu olhar para o seu rosto e ele está
me encarando novamente.
— Você — Andrew sussurra.
— Hmmm, oi, senhor Simons — murmuro ficando constrangida.
— Seus olhos são… Tão bonitos.
— Obrigada, eu acho.
— Por que você está aqui? — pergunta-me grogue. — Você não pode
invadir os meus sonhos.
— O senhor não está sonhando — murmuro. — É real.
— Os seus olhos… Seus olhos são bonitos.
— Eu sei. O senhor acabou de dizer isso.
— Ninguém deveria ter esses olhos… São incríveis.
Calma, Jamie, calma. Ele está bêbado, é apenas isso, ele está bêbado.
— Senhor Simons, por que não se encosta no sofá, sim?
— Eles são castanhos ou verdes? — pergunta-me, ainda observando-
me.
— O quê?
— Seus olhos — grunhe.
— Ah, sim. Bom, eu acho que eles são os dois. Não é que eu tenha
heterocromia, nem nada disso. Pelo menos eu acho que eu não tenho, na
verdade, eu não sei. Nunca fiz nenhum exame médico para isso. Mas acho
que meus olhos são assim simplesmente porque são. Penso que são castanho-
escuros, mas com esses toques de verde ao redor. Eu sempre digo aos outros
que são castanhos. O que o senhor acha?
Levanto a cabeça para obter sua resposta, mas ele está dormindo.
Roncando pesadamente.
— E então, eles acordaram? — Abigail pergunta surgindo na sala
com as compressas.
— Andrew acordou, mas voltou a dormir.
— Será que ele está muito mal?
— Hã… Não, eu acho que vão ficar bem.
— Você está bem, Jamie? Parece um pouco vermelha demais, não vai
passar mal também, né?
— N-Não — gaguejo. — Está tudo bem.
— Cadê os seus óculos? — pergunta-me. Lembro que eles estão
caídos no chão e quebrados. Mas não quero que Abigail se preocupe ainda
mais, por isso não digo nada.
— Guardei — minto.
— Tá, então me ajuda aqui. — Ela me passa uma compressa e eu me
sento no sofá ao lado de Andrew para que eu possa cuidar dele. Enquanto
Abigail está cuidando de Jackson.
“Ninguém deveria ter esses olhos… São incríveis.”
Recordo as palavras de Andrew e enrubesço. Ninguém nunca disse
algo sobre os meus olhos. Eu gostaria que ele não estivesse bêbado, talvez
assim eu acreditasse em suas palavras. Apenas assim eu teria certeza de que
Andrew Simons acredita que eu tenho algo bonito. Eu? É… Talvez seja
melhor que ele pense que isso não passou de um sonho. A realidade é algo
com o qual eu não conseguiria lidar.
CAPÍTULO SEIS
--—————————————————————————————

Andrew

Quando abro os meus olhos, tenho consciência de tudo ao meu redor,


e embora isso devesse ser algo bom, neste momento é horrível. A claridade
incomoda os meus olhos e eu tenho que forçá-los para ficarem abertos até se
acostumarem à luz. Minha cabeça parece tão pesada e dolorida que é como se
alguém a houvesse batido contra uma parede de concreto pelo menos umas
cem vezes. E o resto do meu corpo está mole, frouxo, não consigo sentir as
minhas pernas. É uma sensação estranha, embora totalmente reconhecível
para mim. Já estou acostumado com isso e sei exatamente o que houve. Bebi.
Bebi muito.
O rosto de Abigail entra no meu campo de visão e eu tenho que
esperar que meus olhos ganhem foco até ter certeza de que eu não estou
sonhando. Quando os olhos dela encontram com os meus e ela percebe que
estou acordado, sua expressão muda. Seu rosto que estava suave e
descontraído passa a ser um misto de concentração, incredulidade e irritação.
Ela se aproxima e se abaixa até estar bem próxima de mim. Sinto sua mão
tocando a minha testa com suavidade e quase sorrio com a sua preocupação.
Então ela vira a palma para cima e estala um tapa no meu rosto.
— Seu imbecil! — Abigail grita no meu rosto. — Acorde, seu monte
de burrice! O que você pensou que estava fazendo?
Levanto a mão e toco a minha bochecha. Não foi um tapa muito forte,
mas isso não quer dizer que eu não queira enfiar a almofada embaixo da
minha cabeça na garganta dela. Com dificuldades consigo erguer-me e sentar.
Imediatamente vejo Jackson jogado no outro sofá, ele está sem sapatos e seus
membros estão jogados de qualquer maneira. O que me surpreende é que tem
uma garota sentada em uma das poltronas. Uma garota que eu conheço,
porque ela é minha funcionária. Qual é mesmo o nome dela? Jane… Não…
Janie… Não… Jamie… É isso. Seu nome é Jamie. Que diabos ela está
fazendo aqui? Afinal, que diabos Jackson, Abigail, eu e uma funcionária
estamos fazendo no apartamento de Jackson?
— Como eu cheguei até aqui? — pergunto dirigindo-me a Abigail,
que está de pé na minha frente.
— Obviamente não com ajuda das suas pernas — responde-me
ríspida.
— Caramba, Abby, chega! — resmungo.
— Chega? — ela repete aumentando o tom de voz novamente. —
Chega? É isso o que você tem a me dizer? Vá se ferrar, Andrew!
Quando Abigail me chama de Andrew é porque algo não está certo.
Para ela eu sou apenas Drew, qualquer outra coisa quer dizer que ela está
irritada, brava e furiosa.
— Abigail, contenha os xingamentos, você está me irritando. Eu não
sou nenhuma criança, porra! — xingo uma maldição. — Se é pra ficar me
insultando, vá embora, caso contrário, explique que merda está acontecendo
aqui.
Abigail recua.
— Tudo bem, eu quero mesmo conversar com você — ela diz. —
Mas primeiro vá lavar esse rosto, você está péssimo.
Arrasto minhas pernas para fora do sofá e levanto-me. Por um
momento estou meio tonto, mas rapidamente me recupero. Deixo a sala sem
mais nenhuma palavra e caminho pelo corredor em direção ao banheiro. O
apartamento de Jackson é praticamente a minha segunda casa, por isso
conheço tudo aqui tão bem quanto o meu quarto. Entro no banheiro, ligo a
torneira e lavo o meu rosto. Abigail tem razão, estou péssimo. Meu rosto está
anormalmente vermelho, meus olhos têm olheiras e parece que eu levei uma
surra. Sinto-me cansado para caramba.
Vou até a cozinha, abro a geladeira e procuro algo para beber. Pego
uma latinha de refrigerante, abro e retorno para a sala. Abigail e a garota
estão cochichando uma próxima da outra, porém, quando me veem, ficam
caladas e Abby me lança um olhar reprovador. Ela não costuma interferir nos
meus assuntos ou nos meus problemas, a menos que eu peça. Por isso é
estranho que ela esteja me tratando como um irmãozinho mais novo que fez
alguma cagada. Pergunto-me se fiz alguma merda muito grande depois de
beber e agora nem lembro mais.
— Precisamos conversar, Andrew — Abigail diz.
Estremeço, ela usou novamente o meu nome. Estranho… Muito
estranho.
— Eu já entendi, Abby.
Passo em frente ao sofá que Jackson está dormindo e enfio o dedo na
orelha dele. Jackson geme, murmura algo incoerente, mexe-se e volta a
dormir em outra posição. Bebo um gole da minha latinha e depois despejo
um pouco na boca aberta de Jackson. Ele resmunga de novo e de repente
senta-se tossindo, fungando e ofegando ao mesmo tempo. É engraçado. Solto
uma gargalhada, enquanto chuto suas pernas para o outro lado e sento-me no
sofá.
— Que… Que porra… é essa Drew? — Jackson resmunga irritado.
— Só estava tentando acordar você, Bela Adormecida.
— Palhaço, vai ter volta — ele ameaça.
— Vocês são duas crianças, é isso o que são — Abigail repreende.
Jackson dá um pulo ao meu lado e seu olhar corre diretamente até a minha
prima. Ele xinga um palavrão e ajeita-se no sofá. — Espero que as
brincadeirinhas tenham acabado, pois precisamos mesmo conversar.
— O que ela está fazendo no meu apartamento? — Jackson pergunta
e depois ele olha ao redor como se estivesse vendo o apartamento pela
primeira vez. — Pera aí, o que eu estou fazendo no meu apartamento?
Coço a cabeça.
— É o que eu estou querendo saber — digo.
— Meu Deus! — Jackson esfrega os punhos nos olhos. — O que a
garota do cafezinho está fazendo aqui?
Sorrio.
— É o que eu também estou querendo saber — digo.
— Se vocês calarem a boca eu posso explicar — Abigail diz.
Faço um gesto com a mão para que ela continue falando.
— Então fala logo — Jackson pressiona.
— Bom, eu precisava falar com você, Drew, fui até o seu escritório.
Tracy disse que você e Jackson estavam trancados lá há um tempão, rindo
alto, como se estivessem em uma festa. Então resolvi entrar por conta própria
e encontrei você e Jackson bêbados, praticamente desmaiados. Vocês têm
ideia do que fizeram? Poderia ter sido Olivia ou Benjamin. Meu Deus,
poderia ter sido a vovó! Vocês não conseguiam falar e muito menos
permanecer de pé. Se fossem vistos daquele jeito, podiam dar adeus ao
emprego de vocês. E pior, Andrew, você não teria mais nenhuma chance com
a vovó. Eu pensei que você quisesse a presidência! Pensei que você quisesse
o que é seu por direito! Pensei que finalmente colocaríamos Olivia e
Benjamin no devido lugar deles! Em vez disso, você se torna ainda mais
irresponsável!
— Não era para bebermos tanto, Abigail, aconteceu. — Jackson
encolhe os ombros.
— Vocês não entendem mesmo, não é? — De repente ela se levanta,
passa a mão no rosto e nos encara exasperada. — Isso não pode acontecer,
um deslize desses é o fim. Pensei que estivessem levando essa história a
sério. Não como uma brincadeira.
— Não é uma brincadeira, Abby — digo. — Eu quero a presidência,
eu quero o meu lugar lá, porque eu fiz por merecer.
— Não, Andrew, você não fez — Abigail corta-me. — Você acha que
porque fez duas faculdades e passa o dia sentado naquela cadeira mexendo
com alguns papéis é merecedor disso. Você não é. Mas ao contrário de você,
Benjamin é merecedor. Deus, ele pode ser um cretino, mas ele dá tudo de si
para aquela empresa. E ele pode estar fazendo isso justamente para conseguir
o que a vovó pretende dar a ele, mas pelo menos ele está fazendo algo!
— Eu não sei aonde você quer chegar com esse papo, Abigail —
prossigo. — Eu não sou Benjamin, não sou como ele e nunca vou ser.
— Não quero que você seja Benjamin — Abigail continua. — Eu
quero que seja melhor do que ele.
— Ela está certa. — Jackson suspira ao meu lado. — Eu odeio admitir
isso, mas Abigail está certa. Porra, sou seu advogado. Deveria ajudar você e
por minha causa quase colocamos tudo a perder.
— Sai dessa, Jack — digo. — Não foi sua culpa, eu mandei você
beber comigo.
— Mas só bebemos por causa da confusão que eu fiz com aquelas
mulheres — Jackson argumenta. — Eu as trouxe, a culpa é minha.
— Você só as trouxe porque queria me ajudar, você estava tentando
salvar meu emprego, minha herança — digo. — Não é culpa sua, cara.
— Será que vocês vão ficar muito tempo discutindo de quem foi a
culpa e de quem não foi? Porque eu acho que temos coisas mais importantes
para tratar — Abigail interrompe.
— Abigail está certa — digo. — Quero saber como diabos eu vim
parar aqui!
— Bem, depois que eu vi estado de vocês, não poderia simplesmente
abandoná-los daquele jeito. Posso estar sendo uma estúpida, mas ainda
acredito que você pode conseguir a presidência, Drew — Abigail prossegue.
— Então eu pedi ajuda de Tracy e Jamie para tirá-los de lá. A propósito,
vocês são tão pesados que eu acho que desloquei minha coluna. Enfim, nós
conseguimos colocá-los no carro do Jackson e os trouxemos para cá porque
era o melhor lugar. Vocês dormiram, roncaram e babaram, até finalmente
acordarem. E Jackson quase me beijou.
— Quê? — Jackson indaga. — Eu não “quase beijei você” coisa
nenhuma.
— Jamie, não é verdade que Jackson quase me beijou? — Abigail
vira-se para fitar Jamie. A garota enrubesce e balança a cabeça.
— Sim, foi verdade — responde em um fio de voz. Foram as
primeiras palavras que ela disse depois de eu ter acordado.
— Eu não estava bêbado. — Jackson esfrega as mãos no rosto. —
Estava drogado, só podia estar alucinando que era outra pessoa!
— Babaca — Abigail resmunga.
— Parem os dois — digo, encarando Jackson e depois Abigail. —
Pelo que eu entendi vocês salvaram nossa pele. Ninguém nos viu. Ninguém
soube de nada. Jackson e eu estamos a salvo e ainda temos nossos empregos,
certo?
— Certo — Abigail afirma. — Graças a mim e a Jamie.
— Sim, graças a vocês, eu já disse isso.
— Você poderia nos agradecer — Abigail diz. — Na verdade, você
deve nos agradecer, eu quero um agradecimento. Você não quer, Jamie? É
claro que ela quer.
— Não é necessário, eu só quis ajudar — Jamie murmura.
— Você não precisa ser boazinha só porque eles têm um cargo
melhor do que você naquela empresa. Deixe esses idiotas agradecerem por
salvarmos a pele deles. É o mínimo que podem fazer — Abigail replica.
— Eu sei reconhecer quando alguém me ajuda, ok? — enfrento
Abigail. — Sei que você me ajudou, Abby, obrigado por isso. Satisfeita?
— Vou ter que me contentar com isso, já que você é péssimo em
agradecimentos. — Ela sorri. — Agora a Jamie.
Olho para a garota. Ela parece tão envergonhada com toda esta
situação, não posso deixar de reparar nas suas bochechas coradas. Essa é a
segunda vez que ela salva a minha pele, estou começando a achar isso
estranho.
— Obrigado, Jamie — digo.
Ela levanta os olhos, sorri e balança a cabeça.
— Não foi nada, senhor Simons.
— Só Andrew, por favor.
— Eu não vou agradecer! — Jackson informa. — Não pedi para
ninguém me arrastar de lá até aqui, podiam ter me deixado onde eu estava.
Não vou agradecer.
— Jackson, agradeça logo — ordeno.
Jackson suspira e abaixa a cabeça.
— Obrigado, Jamie e Abigail — ele agradece, trincando os dentes.
Abby sorri vitoriosa.
— Bom, agora eu quero saber: por que diabos vocês resolveram
encher a cara durante o horário de trabalho e dentro do escritório? — Abigail
pergunta-nos.
Olho para o Jackson e ele fita-me de volta.
— E então…? — Abigail insiste.
— É um assunto particular, Abigail — Jackson responde fazendo um
gesto para Jamie.
— Desculpe-me — Jamie murmura. — Eu acho melhor eu ir.
— Não! — Abigail protesta. — Não me importa se é assunto
particular ou não. Você não vai sair, pelo amor de Deus, você salvou a bunda
deles hoje. — Abigail nos encara. — Ela salvou vocês, deveriam confiar
nela.
— Abigail, o assunto é delicado, é sobre a noiva — Jackson responde.
— Noiva? — Abigail franze o cenho. — Que noiva?
— A noiva de Drew! — ele resmunga.
— Ah! — Abigail fica surpresa. — Entendo, mas não tem problema
algum. Jamie é confiável, ela pode ouvir sobre as tramoias de vocês. Não se
preocupem, pois ela não vai correr para contar a Benjamin ou a Olivia, ela os
odeia tanto quanto nós odiamos.
— Abby! — Jamie repreende ficando vermelha.
— Tá tudo bem, Jack, eu confio na Abby e se ela confia na Jamie,
então pode falar — digo.
Jackson suspira ao meu lado.
— Deu tudo errado! — ele desabafa. — Fizemos a lista, conseguimos
candidatas, mas elas eram simplesmente malucas. Uma mais doida que a
outra, todas tinham algum defeito. Eram lindas, simplesmente maravilhosas
na aparência, mas isso não basta para o que a gente precisa. Ficamos sem
opção.
— Eu falei — Abigail aponta. — Disse que não ia dar certo, mas
vocês me escutaram? Não!
— Porra, tive que encher a cara! — conto. — Primeiro apareceu uma
ex-namorada de um traficante, depois uma praticante de BDSM e por último
a mãe de três filhos. Eu queria matar o Jack, em vez disso bebi.
— Eu avisei desde o começo que isso não daria certo, não foi? —
Abigail prossegue, a voz dura como se fosse nossa mãe passando sermão. —
O problema é que vocês acham que uma bela mulher pode resolver a situação
toda. E não é verdade. Isso é arriscado, Drew, e muito. Você está falando de
uma falsa noiva! Tem que ser alguém confiável, alguém disposta a correr
esse risco, mas também disposta a nos ajudar. E, acima de tudo, ela tem que
ser o tipo de mulher que a vovó acreditaria que conseguiu fisgar você.
Porque, convenhamos, mulheres bonitas e interesseiras você pega o tempo
todo. Não é isso o que você tem que mostrar à vovó, não é.
— Oh, Deus. — Jamie ofega ao lado de Abigail, nós três olhamos em
sua direção. Ela parece chocada.
— Ah, esqueci, não te contei a última — Abigail prossegue falando
com Jamie. — O Jackson disse para a vovó que o Drew tem uma noiva e que
ele está tentando melhorar para provar a ela que ele merece ficar com a
Simon’s. Mas isso foi tudo uma mentira. O Drew ainda é o Drew e ele não
tem uma noiva. O Jackson teve uma ideia idiota de encontrar umas
candidatas, mas, como você mesma ouviu, não deu muito certo e eles
terminaram bêbados. Eu sempre disse que essa ideia não ia dar certo, estava
na cara, né, Jamie?
Jamie balança a cabeça, ainda incrédula. Eu espero que Abigail esteja
certa sobre ela ser confiável. Porque, se ela for do tipo fofoqueira, eu vou
estar ainda mais ferrado.
— Abigail, você fica aí reclamando sobre a ideia que eu tive e que
infelizmente não deu certo — Jackson diz —, mas em nenhum momento
você tentou nos ajudar, se acha que minha ideia é ruim e que não vai dar
certo, diga algo que pode dar certo, pois se você não reparou ainda estamos
sem uma falsa noiva.
— Jack tem razão — digo. — Essa era a única ideia que tínhamos e
eu ainda não tenho uma noiva falsa. Merda, merda, merda. O que eu vou
dizer pra vovó domingo? Ela vai querer conhecer a minha noiva e eu vou ser
obrigado a dizer que menti. Ferrou, ferrou tudo!
— Bom, eu só vejo duas saídas — Abigail volta a se pronunciar. —
Ou você trata de conhecer uma garota, se apaixonar e fazer o pedido de
casamento, ou então nós procuramos por alguém que conhecemos e que
esteja tão desesperada por uma grana que não vai nem pensar em recusar.
Afinal, quanto é que você está oferecendo?
— Quinhentos mil dólares — Jackson responde.
— Uau — Jamie sussurra espantada.
— Quinhentos mil dólares? — Abigail engasga. — Onde eu assino?
Jackson ri e eu também.
— Abigail, é sério, preciso de ajuda — digo.
— Eu sei, eu estou tentando. Mas é que eu acho que você ainda não
entendeu que eu não posso tirar uma noiva do bolso.
— Queremos alguém em que confiamos, certo? — Jackson pergunta,
aceno concordando e Abigail também. — Sinto muito informar, mas eu só
conheço uma. E ela tem vinte anos a mais do que o Drew.
— Não — nego. — Definitivamente não.
— Ela não é tão má assim, é minha tia Ofélia. — Jackson dá de
ombros.
— Sem querer ofender, Jack, mas eu não quero que as pessoas
pensem que eu como a sua tia Ofélia.
— Tá, e você conhece alguém melhor? — Jackson replica.
— Eu só tenho umas garotas com quem eu saio às vezes, mas a vovó
já as conheceu e, sinceramente, eu acho que ela não aprova nenhuma delas.
— E você, Abigail? Será que você não conhece alguém em que
possamos confiar, alguém que vovó gostaria de ver com o Drew? Alguém
louca o bastante para entrar nessa com a gente? Alguém precisando de
quinhentos mil dólares? — Jackson pergunta.
Abigail para e parece ponderar o que Jack disse. Então ela balança a
cabeça negando.
— Não — responde. — A maioria das minhas amigas são casadas ou
então são seriamente perturbadas da cabeça, não acho que daria certo. Além
do mais, todas elas têm tanto dinheiro, e eu não sei de ninguém que esteja
precisando de… Ai, meu Deus!
— O quê? — Jackson inclina-se para frente e eu também.
Abigail arregala os olhos e olha diretamente para mim, em seguida ela
se vira e olha para a sua amiga. A garota do cafezinho. Então ela sorri. É um
sorriso assustador para caramba, é o tipo de sorriso que me diz que Abigail
tem uma resposta para Jackson. Sinto calafrios quando seu sorriso fica cada
vez maior.
— Eu conheço alguém — Abigail admite.
— Sério? — Jackson anima-se. — Quem?
— Jamie Collins — Abigail responde e um silêncio profundo cai
sobre a sala.
— O quê?! — Jamie praticamente grita.
A garota levanta-se de um jeito todo atrapalhado e encara Abigail
com as mãos na cintura. Eu acho que estou captando as coisas somente agora,
meu cérebro está trabalhando na informação. Provavelmente tentando provar
a mim que o que Abigail disse não pode ser verdade. Não, não pode. Mas o
meu cérebro continua tentando me convencer de que o que eu ouvi foi
exatamente o que eu escutei. Abigail acaba de sugerir que Jamie seja a minha
falsa noiva. Puta que pariu! Quando eu acho que essa merda já está feia, as
coisas pioram dez vezes mais. Abigail enlouqueceu, só pode!
— Como assim o quê? — Abigail resmunga. — Você é minha melhor
amiga, você é solteira, a vovó gosta de você, você é confiável, você odeia a
Olivia. Você quer tanto quanto eu que Drew assuma a presidência da
Simon’s. Seu emprego é péssimo e você está precisando de grana que eu sei.
Além disso, eu sei que você acha o Drew bonito.
— Ai, merda! — Jamie exclama, é a primeira vez que eu a vejo
xingar. — Cala a boca, Abby!
Sorrio, porque estou achando isso muito divertido. Jamie está ficando
vermelha novamente. Ela cora com facilidade.
— Eu apoio essa ideia — Jackson diz rindo ao meu lado.
Babaca, tá rindo da minha cara!
— É claro que você apoia — Abigail prossegue. — Minha ideia é
ótima. Olha só, vocês dois trabalham no mesmo lugar, ninguém desconfiaria
de um romance tão repentino se vocês alegassem já terem saído algumas
vezes. Na verdade, é perfeito.
— Abby, pare com isso! — Jamie resmunga. — Você está me
assustando falando desse jeito.
— Assustando por quê? — ela pergunta.
— Está bem óbvio! — Jamie argumenta. Ela está furiosa. — Sou sua
amiga e até concordei em ajudá-la. Mas isso? Não, eu não vou participar
disso. É uma loucura e nem eu nem o senhor Simons queremos isso.
— Ah, o Drew quer sim — Jack diz, sorrindo feito um imbecil.
— Não — respondo. — Não, ela está certa. Eu não quero que Jamie
seja a minha falsa noiva.
— Viu? — Jamie acena as mãos no ar. — Eu disse.
— Jamie, você fica aí. — Abigail aponta para o sofá. — Drew, vem
comigo, precisamos conversar.
Eu não tenho nem chance de responder, Abigail se levanta e
praticamente me arrasta pelo corredor. Jack segue logo atrás de nós. Abigail
entra no banheiro e nos puxa para dentro, trancando a porta logo em seguida.
— O que você pensa que está fazendo? — pergunta-me furiosa,
encurralando-me contra a parede.
— O quê?
— Jamie é a garota perfeita para o que precisamos — ela diz,
acenando com as mãos no ar. — Caramba, Drew, eu acabo de conseguir uma
solução para os seus problemas e você sai jogando fora desse jeito?
— Você só pode estar brincando — digo. — Acha mesmo que eu
aceitaria aquela garota como minha falsa noiva?
— Eu tenho cara de quem está brincando! — Abigail exclama. —
Que merda, Drew, você já viu o quão difícil é encontrar uma garota para esse
tipo de negócio. Não deu certo, mas agora pode dar.
— Abigail tem razão, Drew — Jackson interrompe. — Eu sei, cara,
deve ser complicado pra caralho estar na sua pele agora, mas eu concordo
com a sua prima. Nós dois tentamos e não deu certo. Agora temos uma
chance, talvez nossa última chance, não podemos desperdiçar.
— Porra, não — xingo. — Vocês estão querendo que eu apresente
aquela… Aquela adolescente vestida de testemunha de Jeová para a minha vó
e diga que é minha noiva?
— Eu não acredito! — Abigail altera a voz. — Você não a quer
porque ela está mal-arrumada?
— Abigail, ela não está apenas mal-arrumada. Jesus, ela é feia pra
caramba! — exclamo.
— Oh, meu Deus, Drew, eu não pensei que você fosse tão idiota! —
Abigail continua, irritada. — A Jamie não é feia, ela apenas não se cuida
muito. Mas eu sei que por baixo de todas aquelas roupas cafonas tem uma
jovem linda. E muito mais, Drew, ela tem bondade, generosidade, ela é
carinhosa, atenciosa e humilde. Ela tem o tipo de coração que você não
poderia compreender nunca, mas eu sei que a vovó viu isso nela. E nós
precisamos de beleza interior muito mais do que exterior.
— Concordo com a Abigail novamente — Jackson diz, mas ele está
rindo internamente de mim.
— Você concorda porque não é você quem terá de apresentar o
patinho feio para todo o mundo como sua noiva! — resmungo.
— Andrew, esqueça — Abigail esbraveja. — Esqueça tudo, esqueça
herança, esqueça presidência, esqueça a noiva. Porque você quer o que não
pode ter. Nem eu, nem Jackson vamos conseguir a sua noiva perfeita. Talvez
você nem deva fazer isso mesmo, talvez você não mereça. Nós estamos aqui
tentando ajudá-lo e você está fazendo pouco caso. O certo é esquecer, seguir
a sua vidinha miserável desse jeito. Porque se você estivesse disposto a
ganhar, você aceitaria qualquer coisa.
— Abby…
— Não, Drew, não diga mais nada. — Abigail ergue a mão. —
Apenas esqueça tudo, mas não diga que não tentamos ajudá-lo.
— Porra, Drew! — Jackson bate no meu ombro. — Ela tem razão,
você tem uma chance agora. Olha, eu sei que é uma merda, mas tente ver o
lado bom. A Jamie não vai ser sua noiva verdadeira, é apenas de mentirinha.
Ela pode não ser muito bonita, mas a sua vó gosta dela.
— Decida-se, Drew, porque se eu sair daqui agora não ajudo mais
você — Abigail ameaça.
Olho para Abigail, ela está me fitando intensamente com seus olhos
castanhos. O que ela diz é verdade, posso ver na sua expressão. Ela está
falando sério, se eu não me decidir, ela cai fora. E eu acho que provavelmente
o Jack fará o mesmo, porque ele tentou, ele fez o que pôde e ainda assim não
deu certo. E agora os dois acham que encontraram uma solução, uma resposta
que nós tanto precisávamos. Jamie. Eu não sei nada sobre essa garota, apenas
que ela é minha funcionária, que ela nos serve um bom café, que ela é
provavelmente a garota mais desengonçada e mal-arrumada que eu já vi na
vida. E eu sei também que eu nunca, jamais a tornaria a minha noiva.
Só que o Jackson está certo, isso é uma farsa. Minha noiva não tem
que ser alguém com quem eu me importe, ela não tem que ser a melhor em
tudo, ela não tem que ser linda. Porque tudo não passa de uma mentira. E, a
partir de amanhã, eu só terei mais quatro dias para encontrar uma mulher
disposta a fazer isso por mim. Para entrar nesse jogo para ganhar. E eu não
sei se vou conseguir essa mulher. Nós já tentamos uma vez, e não deu certo.
E eu sei que se eu não levar minha noiva para apresentar para a vovó, no
almoço de domingo, ela vai saber que eu estava mentindo. E vai ser o fim.
Eu não estou pronto para desistir agora, não depois de todas essas
mentiras, de tudo o que foi inventado. E Abigail está certa, eu não estou
dando tudo de mim para fazer este plano dar certo. E se eu não lutar, se eu
não me mostrar interessado, não vai adiantar ter a ajuda de ninguém, pois a
iniciativa tem que vir de mim. Pensando desse jeito, talvez o destino esteja ao
meu favor. Talvez eu devesse ter enchido a cara hoje para estar no
apartamento do Jackson, com Abigail e Jamie. Talvez, de alguma forma, o
destino esteja me mostrando que essa porra vai dar certo porque eu tenho
pessoas confiáveis ao meu lado. Pessoas dispostas a me ajudar, a mentir
comigo e a vencer esse jogo.
— Eu topo — falo com a voz firme, completamente certo das minhas
palavras. — Vou fazer a proposta para Jamie.
Jackson solta um assobio ao meu lado.
— Caramba, então é isso — Jack diz. — Jamie será sua falsa noiva.
— Que bom que você percebeu que eu estou certa. — Abigail sorri.
— Jamie será uma noiva excelente.
— Mas eu tenho uma condição — digo.
— Ah, eu sabia. — Abigail suspira. — O que é agora?
— Faça uma mágica, consulte um pai de santo, faça uma macumba, o
que for, mas transforme aquela garota em alguém apresentável pelo amor de
Deus. — digo.
Jackson começa a rir. Abigail me olha como se fosse me devorar
vivo.
— Escute aqui, Andrew Simons. — Abigail aponta um dedo na minha
cara. — Eu não vou apenas transformá-la em uma garota apresentável, vou
entregar a você a noiva mais linda de Nova Iorque.
— Duvido. — Jackson gargalha.
— Isso é uma merda, pedi a Cinderela e ganho o patinho feio —
resmungo.
— Drew, querido, só não se esqueça de que no final do conto o
patinho transformou-se em cisne. — Abigail dá uma piscadela para mim e
sorri de um jeito misterioso.
Não faço ideia do que ela quis dizer.
Um cisne? Continua sendo a porra de um pato!
— Bom, só temos um problema agora — Jackson interrompe. —
Precisamos que Jamie aceite a proposta.
— Vamos lá, Drew, você tem que falar com ela. — Abigail empurra-
me.
— Afinal, por que estamos tendo essa conversa no banheiro? —
Jackson pergunta e de repente eu me dou conta de como o espaço é apertado
para nós três.
Abigail começa a rir, Jackson e eu também.
Voltamos para a sala e encontramos Jamie sentada no sofá no mesmo
lugar de antes. Ela fica extremamente nervosa quando nos vê, apertando
firmemente a bolsa que está em suas mãos. Pela primeira vez desde que a
conheci eu realmente olho para ela. Não apenas um olhar de esguelha, mas
um olhar profundo para avaliá-la. E não posso acreditar que eu estou
pensando em fazer essa proposta para essa garota.
Ela é feia, baixinha e desengonçada, vive usando esses suéteres de
cores horrorosas e chamativas. Só usa saias longas cobrindo-a
completamente. E seus sapatos são medonhos, são como sapatos de
velhinhos. Já percebi que ela usa óculos, embora hoje esteja sem eles. O que
já é alguma coisa, pois aqueles óculos de fundo de garrafa a deixam olhuda.
Eu não sei exatamente qual a cor dos olhos dela, mas reparando agora vejo
que eles não são tão ruins. Ela tem olhos bem chamativos, marcantes, talvez
seja o que ela tem de melhor.
Jamie não é gostosa, o que contraria o tipo de mulher que eu gosto.
Ela também tem cabelos escuros e eu não tenho certeza se eles são lisos os
ondulados, porque ela sempre os mantém bem presos em um coque. Mas eu
gosto de loiras e já me pego reavaliando a minha ideia de fazer a proposta a
ela. Sei que é pobre porque suas roupas a denunciam, assim como o emprego
que tem. Não sei se ela é responsável, educada, inteligente ou simpática. Mas
eu tenho certeza de algumas coisas, ela não é discreta, nem elegante ou bem-
sucedida. Jamie não é nada daquilo que eu coloquei na minha lista de “esposa
perfeita”.
Mas isso não significa necessariamente algo ruim. Porque eu sei que
se ela tivesse todas aquelas qualidades eu seria instantaneamente atraído por
ela. E eu não tenho certeza de que conseguiria manter uma regra que eu
mesmo impus desde que decidi participar dessa loucura: não me apaixonar.
Agora com Jamie as coisas mudam completamente. Ela é tudo aquilo que eu
não gostaria de ter como noiva, ela nunca poderia ser minha esposa perfeita.
E por isso ela é ideal para o meu negócio. Eu nunca vou me apaixonar por
alguém como Jamie Collins.
— Vamos, Drew — Abigail me incentiva. — Não enrole!
Sinto que eu estou começando a suar frio. Não é tão fácil quanto
parece fazer essa proposta. Eu sei que tudo não passa de uma mentira, mas
ainda assim é completamente estranho perguntar a uma garota se ela quer ser
minha falsa noiva. Ainda mais esse tipo de garota.
— Jamie. — Respiro fundo. — Tenho uma proposta para você.
— U-Uma pro-proposta? — gagueja.
— Sim — afirmo.
— Que… Proposta, Sr. Simons? — pergunta-me hesitante.
É isso! É agora, Drew! Manda pra fora!
— Jamie, quero que você seja minha falsa noiva.
CAPÍTULO SETE
--—————————————————————————————

Jamie

Noiva?
Andrew Simons, meu chefe, acaba de fazer a proposta mais maluca
que eu já recebi na minha vida. Sei que eu não estou sonhando, mas ainda
assim essa é a coisa mais irreal que eu já ouvi. Acho que ele está fazendo
algum tipo de piada com a minha cara, é exatamente o tipo de brincadeira
idiota que ele faria comigo. Porque eu não consigo acreditar que o milionário
e playboy mais cobiçado da cidade tenha pedido a mim para ser sua noiva.
Eu? A mosquinha, a garota pobre que serve seus cafés? Tudo bem que esse
pedido não passa de uma farsa, afinal, como Abigail mesmo me disse,
Andrew está querendo dar um golpe na sua avó. Só que é um pouco
inacreditável que ele queira que eu seja sua noiva, mesmo que seja de
mentirinha.
— E então…? — Abigail interrompe ansiosa. — Você aceita?
Pisco uma, duas, três vezes e encaro Abigail.
— O quê? — murmuro. — Abigail, eu… Isso não pode ser sério.
— É muito sério, Jamie. — Jackson dá um passo à frente. — É como
um negócio, como se fosse um trabalho de longo prazo para o Andrew.
— Um trabalho? — Abigail repete. — Ah, cala a boca, Jackson. Não
liga para o que ele diz, não é um trabalho. Você tem que pensar nisso como
uma relação, uma relação que envolve confiança, respeito e muito, muito
dinheiro, Jamie.
— Não, eu… Eu não posso aceitar — respondo.
— Por que não? — Abigail insiste.
— Porque isso não é certo, Abby — digo. — Eu não quero enganar a
sua vó, a Elizabeth foi muito boa para mim. Não posso fazer isso com ela.
Além do mais, eu não saberia fingir um noivado. Ninguém acreditaria nisso,
sou apenas uma simples funcionária.
— Jamie, não duvide de si mesma! — Abigail prossegue. — Você viu
o que o Andrew disse? Eles fizeram entrevista com três mulheres e elas
pareciam perfeitas, no entanto, foi um desastre. Você pode ser melhor, você
pode ser tudo aquilo que minha vó espera que Andrew tenha em sua vida.
Você é a noiva perfeita.
Minha visão fica ainda mais turva e as palavras de Abigail ficam cada
vez mais distantes. Isso não pode estar acontecendo comigo, não pode.
— Abigail, não posso, me desculpe, mas eu não posso — murmuro.
— Você disse que me ajudaria! Você disse que estaria do meu lado!
Que apoiaria o Andrew mesmo ele sendo um imbecil! Você mesma me disse
que acreditava nele! — Abigail insiste balançando as mãos no ar.
— Abby — Andrew interrompe —, ela já disse não, então pare de
insistir.
— Não, eu não vou parar de insistir! — Abigail resmunga. Ela se
aproxima, senta-se no sofá e agarra as minhas mãos. — Jamie, você odeia a
Olivia, certo? Você não mentiu para mim, né?
— Eu… Eu não gosto da Olivia e não menti pra você sobre isso. Só
que não é motivo suficiente para que de um dia para o outro eu resolva ser a
falsa noiva do meu chefe!
— Você está precisando de dinheiro, sei disso. Você mesma me
contou sobre as suas dificuldades. Quando eu quis ajudar, você disse que
tinha que fazer isso com as suas próprias mãos. Que você ganharia o dinheiro
para ajudar a sua família com os seus próprios feitos, certo?
— Sim — suspiro.
— Então essa é a sua chance! — Abigail exclama. — Um ano de
acordo em troca de quinhentos mil dólares. Jamie, você pode salvar a sua
família, você pode salvar a si mesma. Pode mudar de vida e fazer tudo aquilo
o que sempre sonhou.
— Não — nego. — Sinto muito, Abby, não posso aceitar.
— Jamie, talvez tudo isso seja demais para você — Jackson diz. —
Mas é uma ótima oportunidade, você tem muito a ganhar e nada a perder.
Talvez seja melhor que você tenha um tempo para pensar, tudo bem? Você
não precisa dar a resposta agora, sei que deve estar se sentindo sob pressão.
Aguarde aqui um momento e eu vou buscar as cópias do contrato. Você pode
lê-lo em casa com calma e depois nos dar a resposta.
— Sr. Curtis, eu agradeço. Mas eu realmente não quero.
— Espere um minuto — Jackson diz e some em um corredor.
— Jamie, prometa para mim que vai ler o contrato? — Abigail pede.
— Por favor, apenas leia antes de dar uma resposta definitiva.
Suspiro.
— Eu leio, ok? Mas isso não quer dizer que minha opinião vá mudar.
— Claro, entendo. — Abigail balança a cabeça, mas a conheço bem o
bastante para saber que ela não está satisfeita.
— Eu tenho que ir agora — digo.
— Espere! Aqui está o acordo. — Jackson reaparece e entrega-me
uma pasta com vários papéis dentro. — Vou acompanhar você até a porta.
Eu não digo mais nada quando levanto, coloco minha bolsa sobre o
ombro e sigo Jackson até a porta. Esbarro minha canela em uma mesinha e
xingo um palavrão baixinho. Jackson abre a porta para mim e eu me viro para
me despedir de Abigail. Não consigo nem olhar para Andrew, quanto mais
me despedir.
— Eu preciso ir, nos falamos outra hora — digo.
— Tudo bem, eu entendo. — Abigail parece chateada. — Mas, por
favor, pense nesse acordo. Não jogue fora uma chance dessas sem pensar no
quanto você poderia fazer com esse dinheiro.
— Ok, Abby, já entendi.
— Quer que eu acompanhe você até lá embaixo? — pergunta-me.
— Não, já sei o caminho. Obrigada.
— Se cuide, Jamie, até mais!
Pego o elevador e deixo o edifício de Jackson. Minha cabeça está
explodindo com tanta coisa, tantas informações para processar. Parece que eu
estou vivendo um sonho muito louco. Caminho pelas calçadas procurando
um ponto de ônibus. E então me lembro dos meus óculos quebrados dentro
da minha bolsa. Andrew que quebrou os meus óculos! Droga, o que eu vou
fazer sem eles?
— Ei! Olha por onde anda! — uma mulher grita à minha direita, logo
depois de eu esbarrar nela.
— Desculpe, senhora!
Passo os próximos vinte minutos rodando pelas ruas tentando
encontrar uma maneira de chegar em casa. Quando eu encontro um ponto de
ônibus, peço ajuda de um senhor para entrar no ônibus certo. Ele é muito
bondoso e logo me coloca no caminho correto. Desabo exausta em um banco
e passo o trajeto todo olhando pela janela as formas borradas e distorcidas.
Quando finalmente desço no meu ponto estou com o estômago embrulhado.
Chego em casa mais cedo do que o normal. Quando fecho a porta atrás de
mim e viro-me, encontro Jane cozinhando e Tyler sentado no chão, com os
seus brinquedos.
— Jamie? — Jane parece surpresa. — Chegou em casa cedo.
— É — murmuro. — Cheguei.
— Você está bem?
— Estou cansada, é isso. Vou tomar um banho e ficarei legal.
— Ok, não demore — ela diz. — Minha sopa está quase pronta.
— Tia Jamie? — Tyler chama.
— Sim?
— Cadê os seus óculos?
— É mesmo. — Jane também repara. — Por que você está sem
óculos?
— Quebrou — digo.
— Como assim quebrou?
— Caiu no chão e quebrou. Simples assim — respondo.
— Meu Deus, Jamie, precisamos comprar outros, você não pode ficar
sem os seus óculos — Jane diz.
— Não se preocupe com isso. Vou comprar um novo amanhã —
minto.
Sigo para o meu quarto para que eu não tenha que dar mais
explicações à minha irmã. Deixo minha bolsa sobre a cama, pego roupas
limpas e vou para o banheiro. Retiro minha saia, meu suéter, meus sapatos e
as minhas meias e de repente me vejo encarando meu reflexo no espelho.
Céus, estou horrível. Estou tão branca, pareço um fantasma. Gostaria de
pegar uma cor para tentar melhorar o visual, mas acho que nem se eu
passasse uma semana no deserto do Saara conseguiria um bronzeado. Isso me
faz questionar o porquê de um homem como Andrew Simons me aceitar
como sua noiva. Tá, tá, eu sei. Falsa noiva. Mesmo sendo de mentira, não
consigo acreditar que ele me apresentaria para todo mundo, deixaria que toda
a sua família e seus amigos soubessem que nós nos amamos. Mesmo que a
gente não se ame, mesmo que esse romance seja falso. Ainda assim me sinto
de alguma forma… Lisonjeada.
Eu sei que não deveria imaginar esse tipo de coisa, ainda mais depois
de ter dito veementemente que eu não aceitaria o acordo. Todavia não
consigo parar de visualizar na minha cabeça como seria se eu o aceitasse.
Quer dizer… Primeiramente eu deixaria de ser uma mosquinha e passaria a
ser vista no mundo dos grandões. Depois eu poderia esfregar graxa na cara da
Olivia e deixar bem claro que eu não sou mais sua funcionária. Na verdade,
seríamos da mesma família. Ai, meu Deus, acho que ela enlouqueceria!
Eu também poderia acabar com todos os problemas da minha família.
Não teríamos aluguéis atrasados e nem nos preocuparíamos com os remédios
do papai. Jane e Rick não teriam que se matar de trabalhar para nos sustentar.
Uau, eu poderia realizar os meus desejos também! Poderia comprar a casa de
tijolos vermelhos e dar de presente para o papai. Ele ficaria tão feliz em ter de
volta a maior lembrança da mamãe. Eu também poderia realizar alguns outros
desejos da minha lista. Afinal de contas, são quinhentos mil dólares!
Mas sei que não posso aceitar, mesmo tendo prometido a Abigail que
eu leria o acordo, não posso aceitar. Primeiro porque entrar nesse jogo é
muito arriscado. Andrew nem ao menos quer tentar mudar, ele simplesmente
quer fingir. Eu sei que se Elizabeth soubesse disso ficaria extremamente
magoada. Elizabeth foi uma mulher incrível para mim, me ajudou no
momento em que mais precisei. Eu sei o quanto ela está mal, eu sei que a
qualquer momento ela pode deixar esse mundo. Não gostaria que ela
soubesse que fui capaz deste tipo de tramoia.
E depois eu teria que lidar com o resto da família de Andrew. Se não
suporto Olivia sendo só minha chefe, imagine ter que vê-la frequentemente.
E, Jesus, Jane me mataria! Ela nunca aceitaria isso, jamais, em hipótese
alguma. Ela pensaria que estou me sacrificando pela nossa família e não
deixaria isso acontecer de jeito nenhum. E mesmo se eu resolvesse não contar
a verdade a ela, Jane sabe que não tenho um namorado, ela sabe que não
estou vendo ninguém. Não posso de uma hora para outra dizer: Ei, Jane,
estou com o meu chefe e advinha? Estamos noivos!
Embora tenha que admitir que aceitar esse contrato salvaria a minha
vida e a da minha família também. Ele com certeza mudaria tudo, mudaria o
curso da minha vida. E é apenas um ano! Um ano passa tão rápido. E não
deve ser tão difícil bancar a noiva de Andrew. Droga, por que eu estou
procurando motivos e motivos, tentando provar a mim mesma que esse
enlace é impressionantemente maravilhoso? Tenho que parar com isso! Já
disse que não vou aceitar!
É como se houvesse uma parte de mim, uma parte endiabrada. Uma
diaba interior, deitada glamorosa sobre o meu ombro dizendo: Vamos, Jamie,
você quer aceitar esse negócio. Eu sei que você quer, também quero. Imagine
como sua vida seria perfeita, diga adeus a todos os seus problemas, basta
dizer sim! Enquanto no meu outro ombro, minha anjinha interior grita
desesperada: Não faça isso, Jamie! Você vai magoar pessoas, o dinheiro não
é tudo na vida. Dinheiro pode ser bom, mas fará você infeliz. Não aceite o
arranjo!
Quero pensar, preciso pensar! Eu! Eu, Jamie, tenho que decidir o que
fazer. E por impulso eu disse que não aceitaria esse contrato. E, agora, eu
mesma estou questionando minha escolha. Mas definitivamente continua
sendo um não. Não posso aceitar!
Tomo o meu banho e levo uma eternidade. Tudo isso porque embaixo
da água não penso em nada. Gostaria de ficar aqui para sempre, esquecer
todos os meus problemas e as possíveis soluções para eles. Mas isso aqui é
apenas um momento de relaxamento. Um momento rápido que eu tenho
poucas vezes. Talvez se eu não fizer algo logo nem esse momento terei mais.
Se formos colocados na rua, o que eu farei então? O que toda a minha família
fará?
Se não vou aceitar mesmo esse enlace, preciso fazer outra coisa logo.
Olivia pode ter me dado um aumento, mas isso não será suficiente para pagar
tudo o que devemos. Nem sei se eu ainda tenho o meu emprego. Já que tive
de sair hoje sem dar explicações nenhuma. Se Olivia sentiu minha falta, ela
com certeza vai querer saber o que aconteceu. E eu não posso dizer a
verdade, porque senão Andrew e Jackson ficarão encrencados. Eu nem
deveria me preocupar com eles. Olha só, eu tentei ajudar Andrew e ele
quebrou os meus óculos. E agora estou sem condições de obter novos. Sem
minha visão como eu vou conseguir trabalhar? Por que eu só me ferro?
Termino o banho, visto roupas limpas e volto para o meu quarto.
Retiro da minha bolsa a pasta que Jackson me entregou. Abro e retiro os
documentos. Sou tomada por uma curiosidade exorbitante. O que está escrito
aqui? Quais são as cláusulas que envolvem esse contrato? Eu tento ficar
longe, tento colocá-lo de volta no lugar. Só que infelizmente não consigo,
porque eu quero ler. Quero saber cada detalhe sobre esse acordo. E quando
finalmente decido que eu preciso ler, até porque prometi a Abigail que faria,
descubro que não consigo ler. Não sem os meus óculos.
Eu sou oficialmente a garota mais fodida do planeta, e não é o tipo de
foda boa.
Guardo os documentos dentro da minha bolsa. Encontro lá dentro
também a minha lista de desejos. Está bem amassada, mas não está rasgada.
Olho para aquelas linhas escritas com os meus rabiscos e penso no momento
em que as escrevi. Realmente acreditei naquela terapeuta em algum
momento. E agora tenho minha lista de desejos descansando perto de um
contrato que pode me oferecer quinhentos mil dólares. Só que eu disse não.
Empurro tudo dentro da minha bolsa e resolvo esquecer isso de vez.
Volto para a cozinha e encontro Jane e Tyler sentados ao redor da mesa
tomando sopa. Um olhar para o rosto do meu sobrinho e eu sei que Jane pôs
pimenta na sopa de novo. Pego um prato e me sirvo, depois me sento ao lado
do meu sobrinho e nós comemos em silêncio. Estou tão faminta que tomo a
sopa e engulo um copo inteiro de água para que eu não solte fogo pela
garganta.
— Como foi o trabalho hoje? — Jane pergunta, quebrando o silêncio
na mesa.
— O mesmo de sempre — murmuro.
— Jamie, está acontecendo alguma coisa? — Jane questiona-me,
desconfiada. — Você está tão calada ultimamente.
— Está tudo bem — minto. — De verdade, eu estou legal.
— Ok — Jane diz hesitante. — Chegaram as contas de água e luz.
Você não vai acreditar em como aumentou.
— Onde estão? — pergunto. — Quero ver.
— Em cima da mesinha da sala. — Jane aponta.
Levanto-me da mesa e vou para a sala. Encontro a pilha de cartas
sobre a mesinha e abro a de água e a de luz. Coloco o papel em diversas
posições para tentar enxergá-lo, mas os números são grandes o bastante para
que eu os veja. “Aumentou” é pouco para o que eu estou vendo. Estão nos
roubando! Como podem cobrar tão caro? Nem gastamos tanto assim.
— Meu Deus! — ofego.
Sinto lágrimas pinicando os meus olhos e um caroço imenso na minha
garganta. Mas engulo tudo, porque Jane está do meu lado e eu não posso
assustá-la.
— Está tudo bem, Jamie — Jane tenta me confortar. — Olha só, a
gente vai conseguir. Eu acho que o senhor Dimitri vai nos deixar atrasar mais
um aluguel, porque ele ainda não apareceu aqui para nos cobrar. Pelo menos
eu não o vi, e você?
— Não — minto. — Ele não veio.
— Bom, então ficaremos bem — Jane prossegue. — Rick também
não foi demitido, então conseguiremos pagar tudo. Sei que vamos conseguir.
— Jane, olha essa conta de água! — Empurro o papel no rosto dela.
— Eles devem estar cobrando a água da chuva!
Jane ri.
— Eu sei, está caro, mas vamos dar conta.
— E olhe a de luz! — Mostro a outra folha. — Estamos pagando pela
luz do sol também?
— Ai, Jamie, só você para me fazer rir nesse momento. — Jane sorri.
— Você parece realmente desesperada como se não fôssemos dar conta de
tudo isso. Como se de repente o senhor Dimitri fosse bater na nossa porta e
nos cobrar os aluguéis ou então nos colocar para fora. Você fala como se o
Rick pudesse ser demitido justo agora, quando precisamos pagar essas
contas. Olha, não vai acontecer, ok? Fique tranquila, a gente sempre
consegue.
Pobre Jane… Pobre Jane…
— Jane, se o Tyler ficar doente e precisar de remédios nós vamos ter
que vender nossos órgãos.
Jane revira os olhos.
— Pare de dizer bobagem! — ela me repreende. — Vai ficar tudo
bem.
O telefone toca nesse momento e Jane vai atendê-lo. Vejo minha irmã
sorrir enquanto conversa com a pessoa do outro lado da linha. O sorriso dela
é tão lindo. Eu poderia arrancar isso agora mesmo. Poderia dizer a ela que o
senhor Dimitri esteve aqui sim e que seremos colocados na rua, se não
tivermos dinheiro o suficiente para pagar todos os atrasados. Mas não
consigo fazer isso, não quero fazer isso. Quero manter aquele sorriso lá,
quero manter a confiança e a esperança que emanam dela. Minha irmã é tão
forte e, nesse momento, não quero quebrá-la. Então eu preciso ser forte por
ela, tenho que buscar a nossa salvação. Não quero ser apenas um peso na vida
dela.
— Jamie — Jane chama, apontando o telefone. — É o papai, quer
falar com você.
Ah, sim, é claro que é o papai. Por isso esse sorriso tão radiante. Vou
até ela e pego o telefone de suas mãos.
— Papai?
— Abelhinha, que saudades! — papai exclama alegre do outro lado.
— Também estou morrendo de saudades. Quando o senhor virá nos
visitar?
— Ah, querida, você sabe que não posso voltar aí — papai responde e
dessa vez ele parece um pouco desanimado. — Mas você pode vir até mim.
— Agora não posso, papai, estou trabalhando muito — digo. — Mas
quando eu tiver um tempo, vou visitar o senhor.
— Minha pequena abelhinha, me conte: como está a vida aí? Odeio
ficar sem notícias suas e de sua irmã. Odeio saber que minha família está aí e
eu estou aqui. Droga, me diga, abelhinha, vocês estão bem mesmo? Acho que
Jane está me enviando dinheiro demais. Ela tem uma família, precisa cuidar
de vocês, não desse velho que não tem mais utilidade.
— Não diga isso, papai — repreendo. — Você precisa do dinheiro, e
nós estamos bem.
— Como está seu trabalho? Sua chefe ainda é a tal de malévola?
— Muito pior, papai, malévola é boazinha perto de Olivia.
— Qualquer dia apareço em Nova Iorque para exorcizar essa bruxa!
Sorrio.
— Eu acho que gostaria disso.
— Ah, bom. — Ouço papai suspirar. — Eu ainda gostaria de dizer
umas poucas e boas para essa mulher que trata você desse jeito.
— Está tudo bem, papai — asseguro. — Consigo lidar com Olivia.
— E os namoradinhos?
— Que namoradinhos? — Solto uma risada.
— Acha que este velho é tolo? — ele brinca. — Minha abelhinha
linda solta nessa cidade enorme, não deve ter um dia de sossego.
— Ai, papai, não sou linda como a Jane ou como a mamãe.
— Não diga isso, Jamie — papai diz sério, usando o meu nome. — É
perfeita, tão linda quanto sua mãe. Tenho muito orgulho de ter você como
filha.
— Obrigada, papai — murmuro.
— Acho que já estou tomando muito o seu tempo. Você precisa
descansar e esse velho aqui vai parar de incomodar.
— Você nunca incomoda, papai. Eu te amo.
— Eu te amo muito, abelhinha. Venha me visitar, já faz muito tempo
que não a vejo.
— Eu vou, papai, assim que puder, eu vou.
Desligo o telefone já sentindo uma saudade imensa. Faz mais de seis
meses que não vejo o meu pai. Ele vive no Texas com a minha tia. E como
ele não gosta de vir a Nova Iorque por causa das lembranças que ele tem da
mamãe, fica ainda mais difícil vê-lo. Jane e eu não podemos estar viajando o
tempo todo. Não temos carro e nem dinheiro. Por isso ficamos vivendo aqui,
longe dele, tendo que nos falar apenas por telefone. Às vezes isso é horrível.
Meu pai é um homem muito bom. Mesmo depois que ele perdeu a
mamãe, virou alcoólatra e perdeu tudo, ainda continuou sendo um homem
bom. Ele tem um coração imenso e está sempre disposto a nos ajudar. Mesmo
quando ele não pode. Eu sei que por mim e pela Jane ele faria qualquer coisa.
Queria tanto trazê-lo para perto de mim, mas sei que isso não é possível. A
não ser que eu consiga a casa de tijolos vermelhos, o lugar onde eu nasci e
onde, anos antes, ele e mamãe iniciaram sua linda história de amor.
Minha mãe era aspirante a atriz. Papai era um policial e um dia ele foi
assistir a uma peça de teatro, em que minha mãe era a protagonista. Ele disse
que ficou fascinado desde o primeiro momento em que pôs os olhos nela. Na
mesma noite houve um incêndio que começou nos fundos do palco. Papai
nem hesitou quando correu até lá para salvá-la. Ela estava assustada,
amedrontada, mas ele a protegeu. Ele a salvou. Depois disso eles se viram
mais algumas vezes e cada vez mais ele tinha certeza de que seus sentimentos
por ela eram imensos.
Eles se casaram, compraram a casa de tijolos vermelhos e viveram lá
os melhores dias de suas vidas. Quando Jane nasceu foi a maior felicidade,
mas papai sempre insiste em dizer que tudo só ficou completo quando eu
nasci. Infelizmente, alguns anos depois, mamãe foi diagnosticada com câncer
e morreu. Eu não me lembro de como foi ruim para o papai passar por tudo
aquilo. Mas Jane se lembra. Ela diz que nos primeiros anos ele visitava seu
túmulo todos os dias e sempre levava flores. Ele jurou que nunca amaria
outra mulher. Que ele sempre seria fiel e que cumpriria com a palavra que
declarou diante do padre quando se casaram. Seria até que a morte os
separasse. E não apenas a morte dela, mas a dele também.
Ninguém pode julgar meu pai pelo que ele fez depois ou pelo que ele
se tornou. Eu não posso compreendê-lo, mas posso imaginar como deve ser
difícil perder um amor assim tão grande e verdadeiro. Acredito que poucas
pessoas amam como os meus pais se amaram.
— Jamie? — Jane balança a mão na frente do meu rosto. — Ei, volte
para a Terra!
Balanço a cabeça, deixando meus devaneios para trás.
— Estou aqui.
— Vá dormir, você está péssima.
— Você não precisa de ajuda com a louça?
— Não. Tyler e eu podemos cuidar disso.
Volto para o meu quarto, fecho a porta e me jogo na cama. À noite o
peso de tudo parece ainda maior. É como se eu estivesse aguentando o
mundo nos ombros e neste momento ele cede. Estou completamente exausta
e não é apenas fisicamente, mas emocionalmente também. Quando fecho os
meus olhos o sono vem depressa e eu logo apago.
Estou trancada em uma sala completamente branca. Apesar de não
haver nada de assustador aqui, sei que estou com medo. A sensação é muito
ruim, desesperadora. Quando as paredes começam a tremer e imagens
distorcidas ficam em foco eu ofego. O pavor se torna imenso com o que eu
estou vendo.
— Não! — grito desesperada. — Jane! Oh, meu Deus, não!
Jane está sendo colocada para fora do nosso apartamento e ela está
chorando muito. Tyler está abraçado a ela e todas as nossas coisas estão
sendo simplesmente jogadas para fora. Rick está parado com as mãos na
cabeça e o olhar fixo no chão. Ele desistiu.
Na imagem seguinte eu vejo contas e mais contas sendo jogadas
diante do meu rosto, pessoas gritam comigo e me fazem chorar porque eu
estou sendo obrigada a pagar essas contas ou vão pegar o resto de nossas
coisas como pagamento.
Então a imagem seguinte é ainda pior. Jane não tem dinheiro para os
remédios do papai. E ele está sofrendo, ele está gritando, ele está com dor.
Não posso fazer nada. Grito e imploro, mas ele está morrendo porque eu não
tenho os remédios dele.
— Papai! — choro. — Papai, não, meu Deus, papai!
Acordo chorando e tremendo e fico tão aliviada em descobrir que
tudo não passou de um pesadelo. Nada daquilo era real. Então eu ouço sons e
sento-me na cama para escutar melhor. Ouço a voz de Rick, e logo depois a
da minha irmã. Ela está chorando. Levanto-me e calço minhas pantufas. Abro
a porta do meu quarto e os sons ficam mais claros. Eles estão conversando na
sala. Aproximo-me em silêncio, porque não sei o que está acontecendo, não
sei se é apenas uma briga comum de casal ou algo mais sério.
Não faço ideia de que horas são, mas tenho certeza de que é de
madrugada. Rick não deveria estar em casa agora, ele geralmente trabalha
nesse horário. Chego ao fim do corredor e coloco apenas a minha cabeça para
fora querendo espiar. Rick está sentado no sofá e minha irmã está sentada em
seu colo. Ela está chorando baixinho, com a cabeça encostada em seu peito.
Ele diz algo para ela e eu a vejo balançar a cabeça. Aproximo-me mais um
pouco com cuidado, para que eles não me vejam. Quero saber por que ela
está chorando. Ela não deveria estar chorando, porque apenas algumas horas
mais cedo estava sorrindo.
— Vai ficar tudo bem, querida — Rick diz a ela, acalmando-a.
— Não… Não vai ficar… Nada está bem — Jane gagueja.
— Eu sei que é difícil, está tudo uma merda — Rick prossegue,
abraçando minha irmã. — Mas eu vou dar um jeito, vou procurar outro
emprego.
— Você sabe que não vai ser fácil encontrar outro emprego. Você não
podia ter sido demitido, não podia!
Oh, não! Rick foi demitido! Não!
— Calma, querida — Rick a conforta. — É meu trabalho sustentar
essa família e eu vou fazer isso.
— Ah, Rick. — Jane suspira. — Você sabe que não é assim. Não
somos apenas eu, você e Tyler. Precisamos cuidar do papai e também tem a
Jamie, que mal consegue ganhar dinheiro para si mesma.
— Calma, querida, calma — Rick sussurra.
Não escuto mais nada. Volto para o meu quarto em silêncio e me jogo
na cama. Sou um peso para a minha família. Papai também é um peso. Não
podemos nem ajudá-los. Só causamos problemas. Não consigo mais suportar,
deixo as lágrimas virem e dessa vez choro muito. Choro durante toda a
madrugada até de manhã. Porque não consigo pregar o olho, não consigo
descansar sabendo que tudo está desmoronando.
Pela manhã me arrumo para o trabalho que eu nem sei se tenho ainda
e saio antes que Jane acorde. Sei que vou desmoronar se eu a vir e não quero
isso agora. Passo o maior trabalho para chegar ao metrô e depois ao serviço.
Fazer as coisas sem meus óculos torna tudo ainda pior. Quando chego à
Simon’s noto imediatamente que tem algo errado. Os funcionários estão
cochichando. Todo mundo parece saber de algum podre que tenha
acontecido. Quase penso que é algo relacionado à bebedeira de Andrew e
Jackson, porém, quando chego à cozinha, tenho minha resposta.
— Jamie! — Irene corre até mim. Fofoqueira do jeito que é ela, tem
que me alertar sobre o que está acontecendo. — Você não vai acreditar no
que aconteceu.
— Então me diga — murmuro. Embora nesse momento eu não esteja
nem um pouco a fim de ouvir uma fofoca. Só que ainda tenho que saber se é
algo relacionado a Andrew e Jackson.
— Olivia pegou Benjamin e a secretária dele juntos no escritório! —
ela desabafa. — Meu Deus, você tinha que ver a bagunça que isso aqui ficou.
— Pera aí. — Levanto a mão. — Você acabou de me dizer que Olivia
descobriu que Benjamin a traiu com a própria secretária?
— Exatamente — ela afirma e prossegue falando: — Olivia
praticamente chutou a secretária para fora, demitiu ela na hora. Só que depois
as coisas ficaram mais esquisitas ainda.
— Por quê? O que houve?
— Olivia e Benjamin se trancaram no escritório, houve um monte de
gritos, mas no final eles estavam bem.
— O quê? Como assim estavam bem? Olivia nunca aceitaria uma
traição!
— Sim, ela aceitaria — Janice diz, entrando na cozinha com uma
bandeja na mão. — Entendo exatamente o que ela fez. Pense comigo. Você
acha que Olivia faria um escândalo pondo em risco seu emprego aqui na
Simon’s? Você acha que ela deixaria chegar aos ouvidos de Elizabeth que
seu marido traiu ela com a secretária? Você acha que Olivia pediria divórcio
sabendo que talvez Benjamin seja a única coisa que liga ela à presidência da
Simon’s? Olivia é muito inteligente, ela não ama Benjamin. Eles estão juntos
pela aparência e agora que ela chutou a secretária tudo vai voltar ao normal.
— Você está certa — digo, ponderando as coisas que Janice falou. —
Se Olivia se separasse de Benjamin e chegasse aos ouvidos de Elizabeth essa
história, então provavelmente Andrew teria mais chances de ser promovido
do que o marido da Olivia.
— Pois é — Janice concorda. — Não podemos subestimar a vadia,
ela é muito esperta.
— Olivia é pior do que eu imaginei — murmuro.
— Ah, e por falar nisso. — Janice aponta para mim. — Ela quer falar
com você, e leve um café.
— Ok, estou indo.
Preparo o expresso de Olivia e levo até a sua sala. A secretária dela
permite a minha entrada imediatamente. Vejo Olivia sentada em sua poltrona
encarando papéis brancos à sua frente. Ela está muito séria. De repente ela
levanta os olhos e me encara, vejo o frio e o vazio dentro de seus olhos
castanhos. Também percebo que ela andou chorando, mas tentou disfarçar
utilizando maquiagem. Ela pode não amar Benjamin, mas traição ainda é
traição.
— Traga o meu café até aqui — Olivia ordena.
Aproximo-me e coloco a bandeja na sua frente.
— A senhora quer falar comigo?
— Quero saber por que deixou o trabalho mais cedo ontem — ela fala
autoritária. — Todos ficaram esperando os malditos cafés e você não estava.
Jamie, como pode deixar o trabalho logo depois de pedir um aumento?
— Tive um problema para resolver, senhora — murmuro.
— Problema? — ela repete. — Eu tenho problemas! Eu sou uma
pessoa que tem problemas! Você não é nada, como você pode ter problemas?
Meu Deus do céu, não sei como eu aturo ver a sua cara todos os dias!
— Não vai voltar a acontecer, senhora, eu prometo.
Olivia solta uma gargalhada sem humor e levanta-se da sua mesa. Ela
segura a xícara de café nas mãos e depois a lança do outro lado do escritório.
Café se espalha por todo o lado, assim como pedaços quebrados da xícara. O
barulho alto me assusta e eu dou um pulo para trás. Ela enlouqueceu! Só
pode! Está maluca!
— É claro que não vai voltar a acontecer! — ela grita praticamente no
meu rosto. — Vá embora, saia daqui!
— Sim, senhora — murmuro.
Viro-me pronta para cair fora, mas Olivia segura o meu braço.
Retorno a encará-la, esperando que ela solte o meu braço antes que eu mesma
resolva enlouquecer e chutar a cara dela.
— Não vou mais olhar para a sua cara — Olivia afirma com um
sorriso completamente estranho desenhado nos lábios. — Você está demitida.
Pegue suas coisas e caia fora imediatamente.
— Não pode me demitir — sussurro.
— Eu posso tudo. — Ela alarga seu sorriso. — Posso qualquer coisa,
agora some! E não volte nunca mais!
Não estou respirando. Não estou respirando. Não estou respirando.
O ar parece ter sido tirado de mim, meu cérebro está nublado e eu não
tenho explicações para o que está acontecendo. Eu não sei como eu consigo
me virar e deixar o escritório dela para trás. Mas eu faço. Eu me retiro sem
mais nada a dizer. Olivia acabou de me demitir, ela acabou de tirar toda a
esperança que eu tinha. Sem meu emprego não resta nada e ela pensa que
acabou. Ela está enganada. Não terminou ainda. Não é assim que eu vejo o
meu fim.
Chega!
Digo a mim mesma várias vezes enquanto eu faço o caminho pelo
corredor: Chega! Eu não sei quanto tempo eu tenho, mas a vida é curta
demais para dispensar coisas boas. Pela primeira vez na vida eu tenho uma
chance e eu não vou desperdiçá-la. Não vou! Estou cega para qualquer coisa,
mas estou decidida. Vultos, borrões e tudo está distorcido. Eu nem sei mais
por que não consigo enxergar. Às vezes penso que é pela falta dos meus
óculos, mas agora também penso que pode ser o mundo desabando na minha
frente. Até que finalmente eu esbarro em algo. Não. Esbarro em alguém. Só
não caio de bunda no chão porque ele é forte o bastante para me sustentar. E,
meu Deus, esses olhos azuis são a minha única salvação.
— Jamie? — Andrew murmura apreensivo. — Está tudo bem?
— Eu aceito. — Inspiro profundamente. — Aceito ser sua falsa noiva.
CAPÍTULO OITO
--—————————————————————————————

Andrew

Parece mentira, mas eu consegui arrumar uma noiva falsa em menos


de uma semana. Ela não é exatamente aquilo que eu procurava, na verdade
está muito longe de ser o tipo de mulher a quem eu pediria em casamento.
Jamie Collins é o contrário de tudo o que eu pedi na minha lista de
exigências. Mas não posso reclamar, afinal, se não fosse ela, não seria mais
ninguém. As mulheres que Jackson trouxe para a entrevista eram
completamente erradas e eu jamais apresentaria uma delas para a minha avó.
Contudo, com a Jamie as coisas ficam mais fáceis, já que vovó gosta dela e já
a conhece. Também facilita, porque trabalhamos no mesmo local, e como
Abigail mesma já disse, podemos inventar uma história de que já
namorávamos antes de decidirmos noivar. Eu estou finalmente sorrindo para
a vida, porque pela primeira vez parece que fiz a coisa certa.
Só estou um pouco receoso com a ideia de confiar em Jamie. Sei que
Abigail confia nela completamente. Ainda assim, eu tenho medo de que ela
acabe destruindo tudo. Sei que Jamie gosta muito da vovó e não quer enganá-
la, mentir para ela. Por este motivo tenho medo de que ela se arrependa de
assinar o acordo e acabe abrindo todo o jogo. Se algum dia ela fizer isso, sei
que não perderei apenas minha herança, mas perderei a vovó também.
Jackson diz que isso não é possível, que depois que ela assinar o acordo, ela
deverá permanecer em silêncio. Eu espero que ele e Abigail estejam certos.
Jamie é estranha e eu não estou falando apenas de sua aparência. Ela é
muito quieta, reservada, tímida. Mas eu acho que isso tudo é apenas o que ela
transmite com sua aparência. Abigail nunca se tornaria amiga de alguém
assim, porque minha prima gosta de espontaneidade e de alegria. Talvez eu
só precise me aproximar dela um pouco, conhecê-la mais e quem sabe ela se
abrirá comigo também. Afinal, eu não posso ser noivo de alguém que mal
conheço, com quem mal converso e mal vejo.
Eu a encontrei vagando pelos corredores como se estivesse perdida e
sem rumo e quando ela disse que aceitava ser minha noiva foi com tanto
desejo, força e veracidade que fiquei até surpreso e um pouco espantado. Não
achei que ela fosse aceitar. No entanto, aqui está ela, bem na minha frente. E
ela está pronta para assinar esse acordo sem nenhuma hesitação. Sei que ela
ainda está nervosa, talvez até um pouco espantada por ter aceitado tudo tão
rápido. Posso ver no modo como ela brinca com o tecido de seu suéter que
ela está inquieta. Não quero que ela desista agora que já disse sim. E por isso
já chamei Jackson e pedi que Abigail viesse até o meu escritório, já que ela
também faz parte dessa loucura e é amiga de Jamie o suficiente para
encorajá-la.
— Você quer beber alguma coisa? — pergunto a ela, querendo
quebrar o silêncio que se estende entre nós.
Jamie dá um pulo em sua cadeira, como se somente agora percebesse
que estou ali. Ela me encara com seus olhos grandes e esperançosos e balança
a cabeça.
— Não, Sr. Simons, obrigada.
— Jamie, você não pode continuar me chamando de senhor. Se vamos
fingir que somos noivos, isso é algo que tem que acabar aqui.
— Oh. — Ela pisca surpresa e depois assente. — Claro, tudo bem.
— Você tem certeza de que quer fazer isso? — pergunto. — Porque
depois de assinar o contrato não vai ter volta.
— Tenho certeza, Andrew — ela diz e parece realmente segura. Fico
um pouco mais tranquilo e noto que ela usou o meu nome.
— Por que mudou de ideia tão rápido?
Ela pondera por um momento.
— Preciso do dinheiro — Jamie admite em voz baixa.
— Não tenha vergonha disso, temos o mesmo interesse — digo. —
Você precisa do dinheiro e eu preciso da presidência da construtora, o que vai
me conceder uma porrada de dinheiro. Na verdade, estamos nisso pelo
mesmo prêmio, apenas por motivos diferentes.
— Você acha que isso vai dar certo? — Jamie pergunta-me parecendo
mais interessada em tratar sobre o nosso acordo.
— Sim, eu acho — afirmo. — Claro que vamos precisar ensaiar uma
história, convencer as pessoas, mudar algumas coisas. Mas vamos conseguir.
— Eu acho que será muito difícil que eles acreditem que a garota que
serve cafezinho é a noiva do chefe — Jamie murmura.
Aproximo-me dela e apoio-me nos braços da poltrona onde ela está
sentada. Inclino-me para frente até que meus olhos estejam nivelados com o
dela. Franzo o cenho ao notar os seus olhos. Eles são enormes,
desproporcionais para o seu rosto. Lembram-me de um desenho animado ao
qual eu costumava assistir: Gato de botas. Ela tem olhos grandes como os
dele, dão a impressão de ingenuidade e fragilidade. Eles são de um tom de
castanho-escuro, embora tenham bordas esverdeadas. Por que eu nunca notei
esses olhos? São bonitos. Sinto-me estranhamente atraído por eles agora.
Como se eu pudesse ficar olhando para sempre dentro deles.
Porra, acorde! O que eu estou fazendo?
Balanço a cabeça e relembro o que estávamos falando. Minha mente
clareia novamente e eu volto para o presente. Para a garota encarando-me na
minha frente.
— Vamos fazer com que eles acreditem, Jamie. Vamos fazer com que
eles não duvidem um segundo sequer de que estamos completamente
apaixonados.
Jackson escolhe esse momento para entrar no meu escritório. Afasto-
me da garota e volto para trás da minha mesa onde ocupo meu lugar na minha
poltrona. Jackson fecha a porta e caminha até nós com um sorriso imenso no
rosto. Ele para em frente a Jamie e a cumprimenta rapidamente com um
aperto de mãos.
— Então você resolveu aceitar o acordo? — Jackson pergunta a ela.
— Sim.
— Que bom, isso é ótimo. — Jackson esfrega as mãos uma na outra e
bate palmas. Ele está eufórico. — Caramba, não acredito que isso está
acontecendo.
— Pare de enrolação, Jackson, nós não temos muito tempo — digo.
— Ah, certo, é claro — Jackson diz. — Você tem o acordo aí com
você?
— Ah, deixei na minha bolsa, está lá embaixo — Jamie responde. —
Posso ir pegá-lo.
— Não é necessário, tenho uma cópia aqui. — Jackson mostra a ela a
pasta que está segurando nas mãos. — Vamos começar, então.
Uma batida na porta nos interrompe e um segundo depois Tracy
coloca sua cabeça para dentro, avisando da presença de Abigail. Peço que ela
deixe minha prima entrar. Abigail praticamente empurra Tracy para fora do
caminho quando ela entra no escritório. Estou surpreso que ela tenha chegado
aqui tão rápido. Liguei para ela não faz nem dez minutos. Está certo que a
galeria que ela gerencia é apenas a algumas quadras daqui, mas ainda assim
parece que ela foi teletransportada para a minha sala. Como sempre.
— Ei, bom dia! — Abby nos cumprimenta com um aceno rápido. Ela
solta sua bolsa enorme sobre o meu sofá de canto e depois empurra Jackson
do caminho para sentar-se na poltrona ao lado de Jamie.
— Oi, Abby. — Jamie acena timidamente.
Eu ainda não consigo entender como as duas tornaram-se amigas.
Mulheres, sempre tão estranhas.
— Eu soube que você resolveu aceitar o acordo. — Abigail alarga o
sorriso.
Jamie acena.
— Sim, eu pensei melhor e você tem razão. Preciso do dinheiro e
aceitar essa proposta não é um sacrifício.
Abigail ri.
— Você não diria isso se conhecesse o Drew como eu conheço.
— Pare com isso, Abigail, você vai assustá-la — Jackson repreende.
— Vamos direto ao que interessa, por favor? — pergunto.
— Tudo bem — Jackson diz e estende o acordo sobre a minha mesa
para que Jamie possa vê-lo. — Você leu tudo?
— Não exatamente — Jamie murmura. — Mas eu confio na Abby,
ela pode olhar por mim.
— Você não leu o acordo? — pergunto chocado. — Como você pode
aceitar algo sem nem ao menos ter lido?
— Eu já disse que preciso do dinheiro e confio na Abby — Jamie
repete.
— Gente, calem a boca, vocês ouviram. Ela confia em mim, então,
Jackson, trate de me explicar esse acordo. Não omita nada ou eu faço você
engolir esses documentos — Abigail ameaça.
— Sempre tão sutil — Jackson diz sarcástico.
— Continue, Jack — peço.
— Bom, na verdade todo o acordo é muito simples — Jackson
prossegue. — Não estamos falando de um acordo tipo Cinquenta Tons de
Cinza ou coisa assim.
— Ai, meu Deus! — Abigail exclama. — Você leu Cinquenta Tons
de Cinza?
Jackson coça a cabeça.
— É, eu li — ele afirma. — O que é que tem?
— Uau. — Abigail assobia. — Eu só não pensei que você curtisse
essas coisas.
— Gosto de ler o que está fazendo sucesso, preciso me manter
atualizado — Jackson responde.
— Ah, Claro. — Abigail morde a ponta da unha. — Mas você
gostou?
— Pelo amor de Deus! — exclamo, interrompendo-os. — Será que
podemos deixar Cinquenta Tons de Cinza para depois e cuidar do meu
acordo?
— Ok, voltando — Jackson continua. — Como eu estava dizendo
esse acordo é muito simples. Basicamente as cláusulas mais importantes são
as que pedem sigilo absoluto por parte da Jamie. Isso quer dizer que você e
apenas você pode saber a verdade por trás do noivado.
— Não posso contar a verdade à minha família? — Jamie pergunta.
— Não — Jackson nega. — Eles terão de acreditar no mesmo que
todos os outros, que vocês realmente são noivos e pretendem casar. Você
concorda com isso?
Jamie hesita por um momento, antes de responder.
— Sim, concordo com isso — murmura.
— Bom, as outras cláusulas são as que garantem quinhentos mil
dólares em troca de um ano de acordo. Tudo bem para você? — Jackson
pergunta.
— Sim — Jamie afirma.
— Também há uma cláusula que diz que se você quebrar o acordo sai
sem nenhum dólar. E não pode de jeito nenhum contar sobre a natureza desse
contrato. De acordo?
— Sim.
— Bom, então temos a próxima cláusula, que exige que você não
tenha relacionamentos sexuais ou afetivos com outros homens durante o
tempo do acordo. Tudo bem para você?
— Tudo bem — Jamie afirma e eu solto o ar que estava segurando.
Essa cláusula é a pior do contrato, a que eu pensei que talvez ela se negasse.
— Não! — Abigail exclama levantando-se abruptamente. — Não!
Nada disso! Que cláusula é essa? Que absurdo!
— Faz parte do acordo, Abigail — Jackson explica. — Jamie não
pode ter um namorado aí fora enquanto está fingindo ser noiva do Drew.
— Não, não, isso não está certo — Abigail diz. — Ninguém pode
sobreviver a um ano sem sexo!
— Abby! — Jamie repreende. Ela está ficando vermelha, acho
divertido como ela cora com facilidade.
— Ela já aceitou, Abigail, pare com isso — digo.
— Deixe-me ver isso aqui! — Abigail arranca o contrato da mão de
Jackson e corre rapidamente os olhos sobre a folha. Seus olhos estão
arregalados quando ela termina de ler todo o parágrafo. — Andrew Simons,
você é um canalha!
— Abigail, pare de estragar tudo — peço.
— O que é isso, hein? — Abigail praticamente esfrega o acordo na
minha cara. — Ele está te enganando, Jamie. Aqui nesta maldita cláusula ele
exige que você não tenha relações sexuais com outras pessoas durante o
tempo do contrato. Mas ele? Ele pode! Como você consegue ser tão
trapaceiro, Drew?
— Eu posso ser discreto, além disso, não vou ficar um ano sem sexo
— resmungo.
— Ah, você não pode, mas Jamie tem que ficar sem? — Abigail
pergunta irônica. — Nem eu gostaria de quinhentos mil dólares se fosse para
aceitar esse tipo de cláusula.
— Abby, eu não me importo — Jamie murmura. — Sério, está tudo
bem.
Abigail vira-se para encarar Jamie. Ela pisca várias vezes e sua boca
cai aberta.
— Ai, meu Deus! — Abigail exclama. — Você é virgem?
— Não! — Jamie protesta. — Não, eu não sou virgem.
— Ai, graças a Deus! — Abigail acena dramaticamente com as mãos.
— Quase pensei que fosse, já que você está concordando com isso. Olha,
Jamie, não é porque está escrito isso no acordo que você tem que aceitar. Vai
me dizer que você ficaria contente com o seu noivo transando com outras
mulheres bem embaixo do seu nariz?
Jamie faz uma careta.
— Mas é um noivado falso, Abby — Jamie argumenta.
— Eu não acredito que eu estou ouvindo isso — Abigail continua. —
Não importa que é falso! Você não pode ficar sem sexo por um ano e permitir
que o Drew tenha a hora que ele quiser, com quem ele quiser. Isso é ridículo.
Você disse que confia em mim, certo? Estou dizendo para não aceitar essa
cláusula, porque isso é completamente patético.
— Abigail, você está tentando fazer a única mulher que conseguimos
desistir desse acordo? — pergunto. Estou começando a ficar com raiva da
intrometida da minha prima.
— Você não pode querer que ela assine isso, se nem você estaria
disposto a assiná-lo — Abigail aponta.
— Abby, só porque você não pode ficar um dia sem dar para alguém,
não significa que a Jamie seja assim — digo. — Se ela aceitou é porque ela
pode cumprir esse acordo por um ano.
— Eu não dou todos os dias! — Abigail protesta boquiaberta.
Jackson cai na gargalhada.
— Continuem, agora está ficando bom — Jackson diz. — Quem vai
querer pipoca? Isso vai ficar emocionante.
— Cala a boca — Abigail resmunga.
— Jamie, assine o acordo, por favor — peço. — Você pode confiar
em nós, porque, se não cumprimos o acordo, você tem mais armas contra nós
do que nós contra você.
— Tudo bem — Jamie assente. Ela pega a caneta sobre a mesa e
inclina-se sobre os documentos. Estou segurando a minha respiração,
finalmente isso vai acontecer. — Desculpe, não posso.
O quê?
— Como assim? — questiono.
— Abby tem razão. — Jamie olha diretamente para cima com seus
olhos brilhando de uma maneira que eu não havia notado antes. — Não vou
ser uma noiva corna.
— Isso aí, garota! — Abigail cantarola. — Seja esperta.
— Jamie, não é de verdade, não é como se eu estivesse traindo você
— explico.
— Bom, nós vamos ter que convencer a todos de que estamos
apaixonados. Você vai me apresentar para a sua família e eu vou apresentá-lo
para a minha. Vamos passar mais tempo juntos e vamos ter que fazer isso
soar verdadeiro — ela diz. — Para mim isso já é o suficiente. Se não posso
ter sexo, você não terá também.
— Puta que pariu — Jackson murmura. — Lascou!
Quero pular no pescoço de Abigail e estrangulá-la lentamente.
— Ou você aceita desta maneira ou eu recuso o contrato agora —
Jamie prossegue. Eu não sei por que, mas eu já não estou gostando muito
dessa garota. Ela está me ameaçando porque sabe que é minha única saída.
— Isso… Eu não posso aceitar isso — resmungo.
— Sempre tem uma saída — Abigail interrompe. — Vocês podem
fazer sexo entre si, que tal?
— Abby, para com isso! — Jamie repreende.
Sexo com essa pata? Abigail está enlouquecendo, isso nunca vai
acontecer.
— Drew, cara. — Jackson aproxima-se. — Eu sei que é um grande
sacrifício, mas pense que depois de um ano você pode ter a mulher que
quiser. Você vai ser milionário!
— Ok, eu aceito ficar sem sexo por um ano pelo maldito contrato —
respondo. Mas estou mentindo, é óbvio que isso não vai acontecer. Vou ser
discreto quando eu tiver que sair com as minhas garotas, Jamie nunca vai
saber disso.
— Verdade? — Abigail pergunta duvidosa.
— Estou dizendo que sim, acredite em mim — digo.
— Bom, então parece que temos tudo acertado. — Abigail sorri. —
Jackson, refaça o contrato expondo que ambas as partes devem se fiéis
durante um ano e depois Jamie assina.
— Mais uma coisa — digo. — Eu não posso ter uma noiva que serve
cafezinhos. Quero trocar a Jamie de cargo.
— Eu sempre disse que ela não merecia esse mísero serviço, então
apoio — Abigail diz.
Jamie remexe-se inquieta.
— Isso não vai ser possível — ela diz timidamente. — Olivia me
demitiu.
— Aquela bruxa o quê?! — Abigail exclama. — Eu não estou
dizendo? Isso está passando dos limites! Por que ela demitiu você?
— Eu acho que ela estava irritada pelo que aconteceu com Benjamin
— Jamie diz.
— O que aconteceu com Benjamin? — pergunto curioso.
— Hmm… vocês não sabem? — Jamie olha para nós três antes de
falar. — Benjamin traiu Olivia com a secretária e ela os pegou no flagra.
— Não! — Abigail exclama e solta uma gargalhada. — Ai, meu
Deus, meus sonhos estão se tornando realidade.
— Caramba — Jackson murmura. — Como não ficamos sabendo
disso?
— Você tem certeza, Jamie? — pergunto.
— Sim, tenho — Jamie diz. — Quando cheguei hoje, Janice e Irene
me contaram que ela entrou no escritório de Benjamin e viu ele com a
secretária. Olivia despediu a secretária na hora e todos pensaram que ela
pediria o divórcio para Benjamin, só que não foi isso o que aconteceu.
— E o que aconteceu? — Abigail pergunta.
— Eles praticamente voltaram ao que eram antes — Jamie responde.
— Janice disse que Olivia casou-se com Benjamin por aparência e que seria
um risco para ela se divorciar dele justo agora que sua avó disse que ele é
uma das pessoas possíveis a assumir a presidência.
— Que filha da mãe esperta! — xingo um palavrão. — Ela está certa,
Olivia é inteligente o bastante para fazer exatamente isso.
— Droga! — Jackson resmunga. — Se eles tivessem feito um
escândalo e finalmente se separado o cargo era seu de certeza, Drew.
— E Olivia sabia muito bem disso — Abigail diz. — Justamente por
isso ela fez pouco caso da traição.
— Quer saber? Olivia vai jogar o jogo dela com seu marido babaca —
digo. — Mas nós vamos nos concentrar no nosso jogo e vamos fazer muito
melhor. Os dias de reinado de Benjamin e Olivia estão chegando ao fim.
— O que você vai fazer? — Abigail pergunta.
— Vou mostrar que eu mando aqui tanto quanto eles. — Sorrio
quando os meus olhos encontram os de Jamie. — E que ninguém pode mexer
com a minha noiva.
— Opa, tô gostando! — Abigail bate palmas. — Qual é o próximo
passo?
— O que vai acontecer agora é o seguinte: Jamie não serve mais cafés
para ninguém dentro desta empresa. Vou colocá-la em um cargo melhor,
onde Olivia não vai poder pisoteá-la. Quero que você fique esses dois dias
afastada da empresa dando a entender que você aceitou sua demissão.
Entretanto, esse tempo de folga vai servir para que você se acostume ao seu
novo papel como minha noiva. Abigail, eu vou pagá-la para ajudar Jamie
com tudo, inclusive a renovar o guarda-roupa. Não me leve a mal, Jamie, mas
a minha mulher não pode vestir Walmart. Minha noiva merece apenas o
melhor, portanto, Abby, não hesite em usar o meu cartão, mas faça com que
Jamie esteja à altura de Olivia. Não, pera aí, faça com que Jamie fique muito
melhor do que Olivia.
— Agora eu gostei de ver! — Abigail ri.
— Senhor Simons, não acho que seja necessário gastar dinheiro para
comprar roupas para mim. E eu não pretendo ser melhor do que ninguém,
nem mesmo melhor que Olivia — Jamie diz.
— Primeiramente, gastar dinheiro com você está incluso em uma das
cláusulas. Segundo, eu quero que você seja melhor do que Olivia em todos os
aspectos. E, terceiro, me chame de Andrew — pontuo.
— Ele tem razão, Jamie, não discuta isso — Abigail interrompe. —
Vamos às compras, tudo totalmente grátis, tem coisa melhor?
Jamie suspira.
— Tudo bem — ela cede.
— Bom, então eu acho que está tudo certo agora — Jackson fala. —
Vou refazer a cláusula sobre relacionamentos e Jamie pode assinar os papéis
amanhã mesmo. Vou enviar um e-mail para você, Abigail, com todas as
questões que deve ensaiar com Jamie para que ela se acostume que é noiva de
Drew. E vocês duas podem brincar de boneca até domingo, quando
finalmente vamos encarar a realidade do que estamos fazendo.
— Domingo eu vou buscar você, Jamie — falo. — Quero que a gente
chegue junto ao almoço da vovó.
— Ok — ela sussurra.
— Bom, já que acabamos aqui eu vou roubar a Jamie agora, porque
nós duas precisamos comemorar! — Abigail exclama animada.
— Comemorar o quê? — Jamie franze o cenho.
— Muita coisa, querida! — Abigail prossegue. — Que você agora é a
noiva de um quase milionário. E que você faz parte da minha família e vamos
estar ainda mais unidas. Também podemos comemorar porque vamos utilizar
muito bem o cartão de crédito do meu priminho amanhã. Ou podemos
estourar um champanhe, porque, dentro de um ano, você vai receber
quinhentos mil dólares. Viu? Temos muita coisa para comemorar.
Jamie rola os olhos.
— Se já terminamos, eu vou indo para a minha casa — Jamie diz
levantando-se. — Ver a minha família e encontrar uma maneira não muito
maluca de contar que eu estou noiva do meu chefe. Com licença.
Jamie sai caminhando para fora do escritório e Abigail encara o lugar
vazio onde ela estava apenas alguns segundos antes.
— Pera aí! — Abigail grita pegando a bolsa e correndo atrás de
Jamie. — Você não pode passar a comemoração. Jamie?… Jamie?… Jamie!
De repente o escritório volta a ficar silencioso. Levanto-me e caminho
até a bandeja sobre a mesinha de canto. Faço duas doses de uísque e passo
um copo para Jackson, que está caído no sofá. Em silêncio nós brindamos e
eu finalmente me deixo cair na minha poltrona. Porque agora não tenho que
me preocupar com mais nada, tudo está feito. Nosso plano está em
andamento e eu sinto cada vez mais que isso vai dar certo.
— E então? — Jackson me chama. — Você estava mentindo quando
disse que aceitava a cláusula de relacionamento, né?
— O que você acha? — pergunto.
— Você estava mentindo — Jackson responde, abrindo um lento
sorriso. — Seu cara de pau.
— Você me conhece. — Pisco para ele. — Não posso ser fiel a uma
mulher, ainda mais uma que eu não vou comer.
— Tome cuidado, Drew, se você a perder, não vai haver mais
ninguém — Jack alerta.
— Vou ser cuidadoso. Agora esqueça isso.
— Quer comemorar? — Jackson pergunta-me.
Sorrio.
— Você, eu, aquelas duas loiras australianas e uma garrafa de Johnnie
Walker?
— Exatamente — Jackson afirma. — Vamos?
Viro minha dose de uísque em um gole, ponho o copo sobre a
mesinha. Levanto-me, espreguiço-me lentamente, sentindo como se eu fosse
um novo homem. E talvez seja mesmo. Sou o homem que dentro de um ano
será o herdeiro favorito de Elizabeth Simons, diretor da construtora e o novo
milionário de Nova Iorque.
— Então vamos, vamos comemorar — respondo, já prevendo uma
ótima noite.
CAPÍTULO NOVE
--—————————————————————————————

Jamie

Estou sentada ao redor da nossa mesa carimbada, encarando as


almôndegas mais feias que eu já vi na vida enquanto pondero sobre como
contar para a minha família sobre o meu noivado. O clima está bem ruim aqui
hoje. Rick perdeu o emprego e parece devastado por causa disso. Jane está
sentindo a pressão dos nossos problemas sobre os seus ombros e está
desesperada, embora tente esconder isso de mim. Eu estou agradecendo
mentalmente por não ter que dizer a ela que perdi meu emprego. Graças a
Deus Andrew prometeu que vai me colocar para trabalhar novamente, em um
cargo melhor. Ele não sabe o quanto isso é importante para mim. Andrew
nem imagina como seu acordo está salvando a minha vida e a da minha
família.
Agora o que eu tenho que fazer é contar a ela sobre o noivado e eu
nem ao menos posso dizer que é tudo falso. Isso quer dizer que minha irmã
ficará completamente surpresa e ao mesmo tempo irritada. Acho que ela
também pode ficar desconfiada, pois geralmente conto tudo a ela. Então
chegar de uma hora para outra e dizer que estou noiva do meu chefe é algo
totalmente normal de se duvidar. Eu só espero que ela não fique implicando
por causa disso, simplesmente aceite e se acostume com a ideia. Odiaria ser
pressionada por ela e acho que é exatamente como as coisas vão proceder.
Sinto como se estivesse encarando essas almôndegas queimadas como
forma de deixar o tempo passar, assim não preciso me abrir logo e contar essa
mentira toda. Infelizmente uma hora eu vou ter que dizer e quanto mais
tempo eu deixar passar será pior. Amanhã Abigail virá ao meu apartamento, e
eu vou apresentá-la para a minha família. Não posso deixar que ela chegue
aqui e dê de cara com uma Jane que não faz ideia de onde sua irmãzinha se
meteu. Preciso acostumar minha família a esta nova ideia, à ideia de que eu
estou noiva.
— Jamie? — Jane me chama. — Está tudo bem?
— Uhum — murmuro.
— Pare de brincar com a comida e me diga o que está acontecendo —
Jane exige.
Queria tanto ter coragem e dizer logo…
— Não está acontecendo nada — minto.
— Jamie Marie Collins! — Jane eleva o tom de voz. — Eu sei que
algo está acontecendo com você sim! Essa semana você está tão pensativa,
tão calada. Sem contar que parece exausta, o que eu não entendo, já que você
chegou dois dias seguidos mais cedo do serviço. Não tente esconder as coisas
de mim, conheço você muito bem. Desembucha!
Agora vai…
— Estou noiva.
Minha voz soa tão baixo que eu não tenho certeza de que todos
conseguiram me ouvir. Quando levanto a cabeça Jane está boquiaberta e Rick
está de olhos arregalados, assim como Tyler.
— Você o quê?
— Eu estou noiva — repito.
— Como assim? Que brincadeira é essa? Você nem tem namorado…
— Eu nunca falei sobre ele porque não achava que ficaríamos juntos
— minto, inventando uma história na maior rapidez que o meu cérebro
permite. — Só que eu me enganei, e agora estamos noivos.
— Meu Deus, Jamie. — Jane parece incrédula como eu sabia que
ficaria. — Como você pode esconder isso de mim? Há quanto tempo você o
conhece?
— Conheço desde que comecei a trabalhar na Simon’s, mas
começamos a nos ver apenas alguns meses atrás.
— Quem é ele?
— Andrew Simons — respondo.
Jane abre a boca para dizer algo, mas hesita. Levanta-se da mesa e
põe ambas as mãos na cintura enquanto fica me encarando. Ela está brava,
chateada e possivelmente desconfiada. Mas eu já esperava por isso.
— Está noiva do seu chefe? — Ela arqueia as sobrancelhas. — Seu
chefe…?
— Sim — afirmo.
— Jamie, você está noiva por interesse! — Jane acusa.
— O quê? Não! — protesto. — Não estou casando por interesse.
Droga! Estou noiva por interesse sim, mas minha irmã não precisa
saber disso.
— Está se casando por interesse sim! — Jane aponta. — Você não
ama esse cara!
— O quê? Amo sim! — minto.
— Não, não ama — Jane insiste. — Se você o amasse teria falado
dele para mim, nós somos irmãs! Você não teria escondido isso, você sempre
me contou tudo, absolutamente tudo!
— Jane, só porque eu resolvi contar para você só agora não significa
que estou noiva por interesse! Você me conhece, sabe que não sou assim!
— Parabéns pelo noivado, Jamie — Rick diz.
— Obrigada — murmuro.
— Jane? — Rick chama minha irmã. — Querida, por que você não
deixa de implicância e fica feliz pela sua irmã?
— Ficar feliz? — Jane vocifera. — Isso é um absurdo! Eu nem
consigo acreditar nesse noivado, não mesmo.
Jane olha para mim duramente por um longo tempo, então seus olhos
se movem para as minhas mãos.
— O quê? — resmungo.
— Você nem tem um anel. — Ela aponta para a minha mão.
— Ainda não, mas eu vou ter — digo.
Jane suspira.
— Não quero saber se você está noiva ou não, só vou acreditar vendo
com os meus próprios olhos. Quero conhecer Andrew Simons pessoalmente e
saber das verdadeiras intenções dele. Afinal, não era esse cara que você vivia
dizendo que era um cretino?
— Eu o conheci melhor e percebi que ele não é assim, Jane — minto
novamente.
— Ainda quero conhecê-lo.
— Tá, tá, eu vou trazê-lo para você o conheça — murmuro.
— Vou dormir, perdi o apetite — Jane anuncia e sai pisando firme
para o quarto.
— Jamie, não liga não, ela só está chateada por você só ter contado
sobre isso agora, você sabe como a Jane é — Rick diz. — Eu vou conversar
com ela, Tyler, ajude a sua tia a limpar a cozinha.
Rick levanta-se e vai para o quarto com Jane. Encaro Tyler do outro
lado da mesa, ele está olhando para mim com um pequeno sorriso no rosto.
— Você não está bravo comigo? — pergunto.
Ele balança a cabeça.
— Não. Eu estou feliz.
— Está feliz?
— Sim. Você vai se casar, tia Jamie, era o seu sonho, não era?
Mamãe me contou da sua lista.
— Na verdade o meu sonho era amar e ser amada de verdade Tyler.
— Mas, tia Jamie, você tem que amar seu noivo pra poder casar com
ele — Tyler prossegue. — Igual à mamãe que se casou com o papai, mesmo
ela dizendo que ele era duro de dinheiro.
Sorrio.
— Você é um garoto esperto.
— Você também é, tia Jamie, por isso eu acredito que você está se
casando por amor.
Ah, Tyler, meu pobre garoto…
— Eu lavo e você seca, ok? — digo, mudando de assunto.
— Ok — Tyler concorda.
***
Quando levanto pela manhã estou um trapo, com olheiras grandes e
redondas embaixo dos meus olhos. Tudo porque eu não consegui pregar o
olho durante a noite. Fiquei me sentindo muito mal por estar enganando a
Jane, por deixá-la pensar que não confidenciei sobre o meu noivo antes
porque não quis. E também por não contar a verdade por trás desse noivado,
que como ela mesma supôs tem tudo a ver com interesse. Ainda havia aquilo
que Tyler me disse na mesa e que me deixou horas acordada pensando. Ele é
tão pequeno e compreende tão bem as coisas. Não queria ter mentido para ele
também e deixá-lo acreditar que eu amo Andrew. Só que, mais uma vez, era
isso ou então desistir de tudo. E quem garante que eu vá viver um amor de
verdade? Não tenho muito tempo para ficar pensando nessa bobagem, não
posso viver a minha vida pensando a cada segundo se eu vou encontrar
alguém. O que eu posso fazer é me casar com Andrew e realizar boa parte
dos meus desejos. Posso deixar minha família feliz e confortável por um
longo tempo. E tudo isso é o que realmente importa. Então, se eu tenho que
mentir, eu vou mentir.
Estou sentada na mesa tomando o café da manhã. Rick ainda está
dormindo, mas Jane e Tyler estão se aprontando para sair, ela para trabalhar e
ele para estudar. Abigail vai estar aqui a qualquer momento, e eu estou um
pouco nervosa. Quando passei meu endereço para ela, já fui explicando que
moro em um lugar muito simples. Que somos pobres, não temos nenhum
luxo. Que meu apartamento é pequeno e talvez feio, mas é o meu lar. Ela, é
claro, ignorou tudo completamente. Disse que não ia reparar em nada e que
isso não importava. Eu sabia no fundo que importava, sim, que ela repararia,
sim, mas como a boa amiga que ela era provavelmente tentaria fingir que
tudo é maravilhoso.
— Você não vai trabalhar? — Jane pergunta-me quando entra na
cozinha vestida e pronta para o trabalho.
— Não, eu vou sair com Abigail, a prima de Andrew.
— E você pode fazer isso? Você sabe que não pode perder esse
emprego.
— Está tudo bem, Jane, eu não vou perder o emprego.
— Ah, claro. — Ela sorri, porém é um sorriso falso. — Você está
transando com o chefe, então está tudo bem, né?
— Jane! — repreendo. — Isso foi ridículo e maldoso.
— É a verdade. — Ela dá de ombros. — Tyler, vamos embora, não
quero me atrasar!
— Já vou, mamãe.
Jane volta para o quarto para apressar Tyler e pegar a sua bolsa.
Levanto-me e começo a retirar a mesa quando ouço as batidas na porta.
Agora? Abigail tinha que aparecer justamente agora? Merda! Só pode ser ela!
Largo tudo e passo em frente ao espelho. Estou horrorosa, ainda vestida com
o meu pijama amarelo do Ursinho Pooh. Meus cabelos estão soltos e são uma
bagunça enrolada e emaranhada sobre os meus ombros. Droga, aquilo ali é
uma remela? Caramba, estou usando pantufas verdes! Mas eu não tenho
tempo e, bom, esta sou eu, certo?
Corro até a porta, respiro fundo e abro. Abigail é um contraste
gritante parada em frente à minha porta. Ela está usando um vestido verde-
escuro justo e elegante. Saltos altos de bico fino. Uma bolsa marrom-escura
enorme está sobre o seu ombro direito. Suas orelhas, pulsos e pescoço
ostentam joias brilhantes e chamativas. Seu cabelo ruivo acobreado está solto
e impecavelmente liso. Ela abre um sorriso largo e ergue os óculos de sol
para me cumprimentar com seus olhos castanhos bonitos.
— Bom dia, pintinho amarelinho. — Ela aponta para o meu pijama.
— Bom dia, madame, acho que você errou de endereço — brinco. —
Aqui não é o Shopping Center.
— Na verdade o endereço está corretíssimo, estou aqui para salvar
seu último resquício de senso de moda. — Ela me analisa de cima a baixo. —
Parece que não existe muita coisa aí, mas eu posso ensiná-la novamente.
— Vamos, Abby, entre — digo. — Vou apresentá-la para a minha
família.
Abigail entra no meu pequeno apartamento e olha ao redor. Ela
apenas observa tudo meticulosamente, mas não faz nenhum comentário. Eu a
levo até o sofá e a convido para se sentar, depois pergunto se ela quer algo
para beber. Ela pede água. Vou até a cozinha, pego um copo de água e volto
para onde ela está sentada.
— Então a sua família acreditou no seu noivado? — Abby pergunta-
me em um sussurro sabendo que Jane está por perto.
— Minha irmã não acreditou, ela quer conhecer Andrew.
— Podemos dar um jeito nisso mais tarde. A prioridade agora é cuidar
de você.
Jane escolhe este momento para voltar para a sala com Tyler. Minha
irmã faz uma pausa quando vê Abigail. Vejo como os olhos de Jane correm
de cima a baixo sobre Abby, e sei exatamente o que está passando em sua
cabeça: Como Jamie foi se envolver com essa gente? Abigail é rica, linda,
poderosa e ela está sentada no nosso sofá de tecido cor amarelo-coco-de-
nenê. É praticamente inacreditável.
— Jane, esta é Abigail, prima de Andrew e minha amiga — digo à
minha irmã e depois me viro para Abby. — Abigail, essa é minha irmã, e o
meu sobrinho você já conhece.
— Olá, Tyler. — Abby acena para o meu sobrinho, e ele sorri
timidamente.
— Oi, Abby — Tyler murmura.
Abigail levanta-se e estende a mão delicada, com unhas longas
pintadas de vermelho para a minha irmã.
— É um prazer conhecê-la, Jane, ouvi muito sobre você — Abigail
diz à minha irmã.
Jane hesita por um momento, mas depois aperta a mão de Abby.
— O prazer é meu, desculpe-me por recebê-la desse jeito — Jane diz
acenando ao redor. — Infelizmente fiquei sabendo sobre o noivado da minha
irmã com o seu primo apenas ontem, assim como só soube da sua visita hoje
pela manhã.
— Está tudo bem. — Abby acena. — Tudo aconteceu realmente
depressa, mas tenho certeza de que vamos voltar a nos ver.
— Certo — Jane murmura. — Bom, eu tenho que ir agora. Fique à
vontade.
— Obrigada — Abby agradece.
— Vamos, Tyler — Jane chama.
— Tchau, tia Jamie, tchau, Abby. — Tyler acena para nós.
— Tchau, Tyler — Abigail e eu respondemos em uníssono.
Jane e Tyler saem, e eu levo Abigail para o meu quarto para que
possamos conversar melhor. Não quero que Rick acorde de repente e resolva
aparecer na sala de cueca para cumprimentá-la. Quando Abigail entra no meu
quarto, ela observa e mexe em tudo. Nos meus pôsteres de Chris Evans na
parede, na minha coleção de CDs e livros nas prateleiras. Eu não sei o que ela
acha de interessante nisso, mas ela se empolga e abre as gavetas da minha
cômoda. Depois o meu guarda-roupa, onde ela remexe em alguns casacos e
suéteres. Estou quase tentada a pedir que ela pare com isso, quando ela se
senta e fita-me.
— Sua irmã está brava.
— Eu sei, mas uma hora vai passar.
— Quando você e Andrew começarem a agir como um casal eu tenho
certeza de que isso vai passar.
— Você está com o acordo? — pergunto.
— Oh, é claro. — Ela mexe em sua bolsa e retira a pequena pasta com
os documentos. — Eu já li tudo e confirmei que Jackson arrumou as
cláusulas sobre o relacionamento. Quando você assinar, os dois ficam sem
sexo por um ano. Só gostaria de expressar a minha opinião e dizer que você
está sendo uma guerreira, eu não aceitaria isso nem por dois milhões.
— Você é uma ninfomaníaca.
— Não, eu não sou — nega. — Apenas curto muito sexo e tenho
muitas fantasias sexuais.
— Abby, você acha que o Andrew vai cumprir esse acordo? —
pergunto. — Quer dizer, eu sei que ele assinou e tudo mais, só que, sei lá.
Eu… Eu não sei…
— Deixe-me ver. Você acha que Andrew está mentindo? Você acha
que ele não vai cumprir com essa cláusula?
— Não. Quer dizer… — Suspiro. — É, eu acho.
— Sinto informar que você está certa. Andrew provavelmente não vai
cumprir essa parte do contrato, e é por isso que vamos ficar de olho nele.
Você não vai desistir de tudo por causa disso, né?
— Hã… Não, é claro que não.
— Bom, então assine. — Ela me passa os papéis e uma caneta.
Olho para os documentos, mas eles são apenas um monte de borrados
sem os meus óculos. Procuro onde assinar na parte de baixo do documento e
não hesito quando assino todas as folhas. Abigail sorri quando eu entrego a
pasta a ela.
— Bom, agora você é oficialmente a noiva de Andrew.
— O que fazemos agora?
— Você veste uma roupa e me encontra lá embaixo. Vamos dar uma
voltinha.
Abigail me deixa sozinha para que eu possa tomar um banho rápido e
vestir roupas limpas. Escolho minha melhor calça jeans e uma camiseta nova.
Calço tênis e amarro os meus cabelos. Estou torcendo para que ela não me
leve a um lugar chique. Pego minha bolsa e vou encontrá-la lá embaixo.
Abigail já está me esperando encostada em seu Porsche conversível
prata. A garotada da vizinha está ao redor dela, eles estão tocando e mexendo
no carro e parecem simplesmente fascinados e maravilhados. Consigo
compreendê-los, eu mesma estou de queixo caído. Um automóvel desses e
uma mulher dessas em um bairro como o nosso? Esse tipo de coisa a gente só
vê quando vai a Manhattan.
— Estou pronta — digo a ela quando me aproximo. — Não vamos a
nenhum lugar chique, né?
— Ah, não, fique tranquila. Vamos embora, entre no carro.
Faço como ela diz e assumo o lugar no banco do passageiro. Sinto-me
incrível dentro desse carro. Abigail se despede dos meninos e entra no
veículo. Logo ela está conduzindo pelas ruas com facilidade e agilidade. Ao
som de Can’t remember to forget you de Shakira e Rihanna nós curtimos o
vento ricocheteando nossos cabelos e a luz do sol refletindo em nossos rostos.
Pode ser apenas uma coisa boba, mas eu tinha a impressão de que minha vida
ia mudar completamente a partir de hoje.
O lugar aonde Abigail me leva é um Spa. O lugar é chique e luxuoso,
sinto-me completamente fora da minha zona de conforto. No entanto, Abby
não deixa que eu fique pensando muito nisso, assim que entramos ela passa
nossos nomes para a recepcionista e a mulher nos leva direto para uma sala
grande e arejada onde duas macas estão posicionadas. Ela pede que retiremos
nossas roupas e avisa que as massagistas estarão ali em poucos minutos. Eu
nunca recebi massagem de ninguém, e, apesar de estar morrendo de vergonha
de retirar minhas roupas, Abigail não me dá muita escolha. Logo eu estou
deitada de bruços com apenas uma pequena toalha branca cobrindo minha
bunda. Abigail está na maca ao lado de olhos fechados e completamente
relaxada como se estivesse acostumada a esse tipo de tratamento. Na verdade,
ela está.
As duas massagistas entram logo em seguida e começam a fazer seu
trabalho. Consigo relaxar assim que ela coloca suas mãos sobre mim, porque
é completamente divino. Ela alivia todas as minhas dores, faz com que eu
esqueça que não faço parte desse mundo. Suas mãos passeiam desde as
minhas costas para os meus braços, até as minhas pernas. Estou agradecendo
mentalmente a Abigail por ter me trazido a esse lugar. Nem percebo que
estou gemendo de contentamento até Abby rir ao meu lado. Ficamos
recebendo essa massagem poderosa por mais de uma hora e depois somos
mandadas para uma banheira grande de hidromassagem.
Abigail e eu ficamos dentro da água morna e calmante por mais uma
hora. Chego até mesmo a adormecer com a cabeça na borda, até que Abby
me acorda e avisa que ainda temos muito que fazer. Saímos de lá vestidas em
roupões brancos macios e somos conduzidas para outra sala onde Abigail
anuncia que faremos depilação.
— Depilação? — Engulo em seco. — Isso é preciso?
— Claro que é preciso. — Abigail ri. — O que foi? Você nunca fez
depilação?
— Haã… Não com cera.
— Não precisa se preocupar, não dói tanto assim como dizem — ela
explica. — O que dói um pouquinho é lá embaixo, você sabe.
— Lá embaixo? Lá embaixo onde? Na perna?
— Humm não. Um pouquinho mais em cima.
— Na virilha? — arrisco.
— Também — Abigail concorda.
— Abigail, você não está esperando que eu vá depilar a minha vagina
com cera quente, certo?
— Na verdade é exatamente isso que vai acontecer. E não me olha
com essa cara.
— Eu não vou fazer isso! — protesto.
— É claro que vai, deixa de ser medrosa.
— Eu não quero uma vagina de bebê!
Abigail ri.
— Não é uma vagina de bebê! — ela replica. — Agora seja sensata e
faça sua vagina feliz.
— Minha vagina está feliz como está.
— Jamie, provavelmente a sua vagina está morando na Amazônia
neste momento, e isso não pode deixar ela feliz.
— Cristo, vamos parar de falar da minha vagina como se ela fosse
alguém?
— Claro, está na hora. — Abigail me dá um empurrão. — Vai lá, é a
sua vez.
— Não! — protesto.
— Deixa de ser criança, Jamie!
— Você vai me pagar por isso! — grito, antes de ser empurrada para
uma sala com a depiladora.
— Você vai me agradecer mais tarde. — Ouço Abby gritar antes de a
porta ser fechada. — E a sua vagina também!
Deixe-me dizer uma coisa sobre depilação: Puta que pariu! Agora me
deixe dizer algo sobre depilação nas partes íntimas:
Putaquepariuqueporracaralhoquemerda! Sim, eu queria matar Abigail
quando deixei aquela sala com a pele completamente vermelha e uma
ardência insuportável. Mal conseguia fechar as minhas pernas e andar direito.
— Não foi tão ruim, foi? — Abigail pergunta-me quando nos
encontramos em outra sala. — Eu só ouvi você gritar uma vez.
— Não fale comigo, ainda estou brava com você.
Abigail sorri.
— Tanto faz. — Ela dá de ombros. — Eu sei que mais tarde você vai
agradecer, agora senta aí.
O que eu recebo agora é uma máscara esfoliante de mel no rosto. Em
seguida meus pés recebem pedicure, enquanto minhas mãos recebem
manicure. Duas horas mais tarde eu aprecio as francesinhas desenhadas nas
minhas unhas do pé e o vermelho nas minhas unhas das mãos. Meu rosto está
suave e brilhante. Abigail, no entanto, não está satisfeita e resolve me levar
ao cabeleireiro. Quem nos recebe é o cabeleireiro Lucius e sua assistente.
Ambos são ótimos profissionais e quando veem meu cabelo ficam
resmungando: “Meu Deus, você assassinou seu cabelo”. Ou então
“Pobrezinho do seu cabelo, parece que nunca conheceu o reparador de
pontas”. Ou ainda “Deus me livre, eu ainda não sei como você não ficou
careca amarrando o seu cabelo desse jeito”.
Por fim eles resolvem que eu preciso de uma hidratação intensiva e
um novo corte de cabelo que seja moderno e combine com o formato do meu
rosto. Eles optam por manter a cor natural, o que eu agradeço bastante. Fico
contente, pois não quero sair daqui com os cabelos pintados de outra cor.
Gosto do meu assim. A assistente de Lucius faz minha hidratação, o que leva
mais uma hora, e depois o próprio Lucius assume o lugar dela para fazer o
corte. Ele não corta muita coisa, apenas retira as pontas duplas e faz um
repicado leve nas pontas. Ele também corta a minha franja que agora não cai
mais na frente dos meus olhos. Depois ele escova meus cabelos até ficarem
completamente lisos. Então chamam Abigail para ver o resultado.
— Ai, meu Deus! — Abby exclama. — O que vocês fizeram com a
minha amiga?
— O quê? — perguntei. — Droga, cortaram demais? Tô careca em
alguma parte?
— Bobinha. — Lucius ri. — Está perfeita!
— Você está magnífica — elogia a assistente dele.
— Abigail, diz alguma coisa — imploro.
— Drew vai ter um ataque do coração. Caramba, garota, se eu fosse
homem pegava.
— Eu quero ver! — peço, rindo da cara de Abigail. Ela parece
espantada.
— Preparada? — Lucius pergunta. Aceno e ele gira a cadeira de
frente para o espelho.
O tempo parou e é apenas assim que eu consigo descrever esse
momento. Foi como se o mundo fizesse uma pausa, para que eu pudesse ver
meu reflexo no espelho. Eu nunca pensei que poderia ser tão bonita. Não,
bonita é pouco. Eu estava linda, os olhos que me encaravam eram muito mais
brilhantes e cheios de vida. A pele era mais suave e nítida e o cabelo era
luminoso. Pela primeira vez na minha vida eu não estava envergonhada de
sorrir.
Toquei o rosto com as pontas dos dedos apenas para ter certeza de que
aquilo não era uma ilusão, não era uma fantasia. Aquilo era verdade, a mulher
naquele reflexo era eu.
— O que você achou? — a assistente de Lucius pergunta. — Não
parece uma nova mulher?
— Eu… Eu não sei o que dizer… — Não deu para segurar as
lágrimas que surgiram nos meus olhos. — Obrigada, eu me sinto tão bem.
— Ai, querida, não chore! — Lucius correu para me entregar um
lencinho.
— Oh, Jamie, pare com isso, sua bobinha. — Abby me abraça. —
Quero você sorrindo, não chorando.
— É de felicidade, Abby, felicidade — murmuro.
— Mesmo assim, pare de chorar.
— Tudo bem. — Fungo e limpo as minhas lágrimas com o lenço. —
Pronto, está tudo bem.
— Bom, agora se vista — Abby diz. — Vou levar você para casa,
passamos tempo suficiente aqui.
Abigail tinha razão, quando deixamos o Spa já era tarde e eu percebi
que passamos mais de seis horas lá dentro para fazer tudo isso. E nem tinha
acabado ainda. Ela me levou para casa e disse para que eu descansasse
bastante. Avisou que no dia seguinte estaria no meu apartamento bem cedo
para dar continuidade à minha “transformação”. Nós nos despedimos, e eu já
estava ansiosa para revê-la.
Quando Rick, Jane e Tyler chegaram à noite ficaram completamente
espantados em me ver renovada e bonita, cozinhando nosso jantar. Todos me
elogiaram muito, até mesmo a minha irmã admitiu que eu estava bonita. Foi
difícil ir para a cama dormir porque eu queria ficar apenas na frente do
espelho me olhando. Mas o cansaço foi maior e eu caí em um sono profundo.
Acordei na manhã seguinte com Abigail gritando nos meus ouvidos e
abrindo as cortinas do meu quarto. Dei um pulo na cama e quando olhei para
o relógio constatei que já passavam das nove da manhã. Ninguém estava em
casa, e quando fui à cozinha beber um copo de leite encontrei uma folha de
caderno com um recado da minha irmã. Dizia que os três iam passar o fim de
semana na casa dos pais de Rick e só voltariam no domingo à noite.
Retornei ao quarto e encontrei Abigail fazendo uma loucura. Todas as
portas do meu guarda-roupa estavam abertas, assim como as gavetas da
cômoda, e ela estava jogando todas, absolutamente todas as minhas roupas,
pela janela. Os sapatos também, as meias, até as minhas calcinhas e sutiãs.
— Abigail! — grito, me lançando sobre ela.
— Ai, ai, ai! — Abby tenta se desvencilhar de mim. — Me solta!
— O que você está fazendo? Está louca? São as minhas coisas!
— Não são mais. — Ela ofega. — Estou doando suas roupas velhas e
feias.
— Não, você não pode doar as minhas coisas.
— Posso sim, são horrorosas! — ela diz, erguendo uma saia longa
laranjada e lançando-a pela janela também. — Vamos comprar tudo novo!
— Meu Deus — murmuro. — Oh, céus.
— Jamie, confie em mim — Abigail pede e lança meus tênis pela
janela.
— Eu amava aqueles tênis — digo.
— Compro cinco pares melhores para você. Ou melhor, seu noivo
compra. Afinal, a grana é do Drew.
— Ele vai matar você — suspiro.
— Não, ele me deu carta branca para gastar o quanto for necessário
para deixá-la incrível. — Abigail me olha de cima a baixo. — E até agora eu
estou fazendo um bom trabalho. Posso continuar?
— Vá em frente. — Dou de ombros. — Você já lançou todas as
minhas calcinhas pela janela mesmo.
Ouço batidas na porta e deixo Abigail terminar de fazer a limpa no
meu quarto. Vou até a porta esperando que não seja o senhor Dimitri para
reclamar dos sutiãs voadores. Quando abro percebo que é ainda pior.
Gertrude e Gladys estão paradas ali com o Bilbo no colo. De repente me dou
conta de que prometi a elas no começo da semana que ficaria com o pinscher
enquanto elas estão viajando. Merda!
— Bom dia, querida — Gertrude me cumprimenta.
— Bom dia, Jamiezinha. — Gladys acena para mim.
— Bom dia, Gertrude, Gladys. — Aceno para as duas.
— Viemos trazer o Bilbo.
— Ah, claro, eu me lembro.
— Jamiezinha, a chave do apartamento está embaixo do tapete para
quando você precisar entrar. A comida do Bilbo está no balcão da cozinha,
ele deve comer três vezes ao dia. Na geladeira tem o número do veterinário se
você precisar e também tem do pet shop, se ele precisar de um banho. Não se
esqueça de levá-lo para passear pelo menos três vezes ao dia, ou ele fica
irritado.
— Tá, claro. Pode deixar.
— Você está fazendo uma reforma? — Gertrude pergunta enfiando a
cabeça dentro do meu apartamento.
— É. Mais ou menos — murmuro.
— Jamiezinha, o Bilbo não gosta de barulho, então tente manter as
janelas fechadas, tudo bem? E quando você der agua para ele, pegue filtrada,
por favor. Ele tem dor de barriga quando é da torneira.
— Eu não vou esquecer, Gladys, vou cuidar bem do Bilbo.
— Bom, então nós vamos indo, querida. — Gertrude me dá um beijo
molhado na bochecha.
— Se cuidem, crianças. — Gladys me puxa para um abraço e beija o
cachorro e a mim, depois passa Bilbo para o meu colo.
— Sentiremos saudades, Bilbo! — as duas gritam e quando
finalmente desaparecem de vista, fecho a porta e lanço o cachorro no sofá.
Quando volto para o meu quarto não resta mais nenhuma peça de
roupa ou sapato. Abigail se livrou de tudo e quando eu olho pela janela vejo
os meninos da casa da frente correndo pelas ruas com as minhas calcinhas na
cabeça ou usando os meus sutiãs sobre as roupas. Enquanto minhas vizinhas
estão recolhendo minhas calças e meus suéteres e estão levando para si
mesmas. É como se houvesse um bazar no gramado, só que é tudo grátis.
— Vamos, ainda não acabamos. — Abigail me arrasta para fora do
quarto, lança um vestido longo florido que eu comprei e nunca usei. — Vista
isso, e vamos às compras.
Abigail me leva para tantos lugares que eu fico até tonta. Vamos para
a Quinta Avenida e para a Times Square e também para Herald Square e
Union Square. Visitamos muitos shoppings e compramos diversas roupas,
desde as mais casuais até as mais chiques e elegantes. Abigail me leva para
Upper East Side, e entra em cada boutique que ela vê pela frente. Compramos
roupas, bolsas, sapatos, perfumes, joias e qualquer outra coisa que ela ache
necessário. Apesar de eu estar com uma aparência bonita, sei que as pessoas,
principalmente os vendedores e atendentes, procuram me tratar bem apenas
porque Abigail está comigo e ela é a riqueza em pessoa. Mas se fosse outro
momento eu seria completamente ignorada. Não sei se é pelo vestido floral
que eu ainda estou usando, ou se é pelas sandálias de tiras. Tento não pensar
neles, e sim no fato de que quando eu estiver usando aquelas coisas eu serei
como Abigail.
Abigail me leva para Fifth Avenue, e eu admito a ela que nunca entrei
em nenhuma loja lá, porque as coisas são terrivelmente caras. É tipo um dos
lugares mais caros para se fazer compras! Abigail apenas sorri e acena com o
cartão que Andrew emprestou para ela. E nós começamos uma maratona
visitando: Louis Vitton, Gucci, Dolce & Gabbana, Prada, Fendi, Versace,
Bottega Veneta, Cartier e até Jimmy Choo. Eu nunca vi coisas tão lindas na
minha vida. Estou simplesmente encantada e sem fôlego!
Não faço ideia de quanto dinheiro gastamos, mas há tantas sacolas no
carro de Abigail que parece que nós fizemos compras para uma família
inteira, e não apenas para uma garota como eu. Quando eu penso que
terminou, Abigail me surpreende ainda mais me levando a uma ótica, onde
ela reservou um par de lentes para os meus olhos. Ela diz que notou que eu
estava com dificuldades para enxergar e que percebeu que eu não usava os
óculos desde que fui ao apartamento de Jackson com ela para ajudar o
Andrew. Acabo admitindo que meus óculos quebraram e que não quis contar
para não incomodá-la. Ela me dá uma bronca, mas depois me abraça.
Quando retornamos para o meu apartamento, já está tarde. Abigail me
ajuda a guardar todas as coisas que compramos e eu sou obrigada a deixar
muita coisa fora das minhas gavetas, porque nem tudo coube. Depois ela
escolhe um vestido preto e diz para eu usá-lo amanhã no almoço com sua
família. Ela também escolhe os saltos e as joias. Antes de ela ir embora, me
faz anotar o endereço de um salão de beleza que fica dentro de um hotel não
muito longe de onde eu moro. Abigail me diz para ir ao salão amanhã, pois
ela reservou um horário para que eu possa fazer meus cabelos e maquiagem.
E ela diz que vai mandar Andrew encontrar-me no restaurante do hotel.
— Estou nervosa — admito para Abigail.
— Eu sei, também estou. — Mas ela sorri. — Estou contente, gostei
tanto de fazer compras com você. Jamie, você está linda, mas já era incrível
antes de todas essas coisas.
— Obrigada por tudo, Abby.
— Não foi nada, somos da mesma família agora. — Ela pisca.
— Nos vemos amanhã então? — pergunto.
— Com certeza. Eu não perco por nada desse mundo esse almoço.
Tenho a sensação de que será um acontecimento inesquecível.
Eu não digo nada, mas tenho a mesma sensação.
CAPÍTULO DEZ
--—————————————————————————————

Andrew

Abigail me disse para encontrar Jamie no restaurante de um hotel


próximo ao Bronx. Quando eu perguntei a ela por que eu não podia
simplesmente buscá-la em casa, ela deu de ombros e respondeu que minha
noiva estava tendo um tratamento de beleza em um Spa dentro do hotel. Não
insisti muito mais, afinal, havia dado carta branca para que minha prima
fizesse qualquer coisa possível para deixar aquela garota apresentável.
Não acompanhei de perto o trabalho de Abigail para fazer isso
possível, no entanto recebi as faturas do cartão e sei cada loja onde as duas
entraram, sei exatamente o que compraram e, a julgar por todo o dinheiro
gasto, não me surpreenderia se fosse buscar Jamie folheada a ouro. Com
direito a uma coroa de diamantes maior do que a da rainha da Inglaterra na
cabeça. Abigail me garantiu que eu não me arrependeria de ter gastado toda
essa fortuna, pois ela fez um excelente trabalho.
Agora eu estou aqui, pronto para buscá-la e vê-la com os meus
próprios olhos. Não vou dizer que não estou nervoso, pois estou. Estou
suando frio desde que saí de casa. Vovó me acordou de manhã bem cedo,
toda contente porque finalmente conheceria a garota que fisgou meu coração.
Eu não posso deixar isso falhar, caminhei muito longe para entregar o jogo
agora. Preciso de Jamie.
Estaciono a Mercedes Benz em frente ao hotel e desço. Passo a chave
para o manobrista e sigo para a entrada. Não sei se está frio aqui, mas eu
estou tremendo. Deve ser o nervosismo, é difícil digerir a ideia de que eu vou
levar a garota que serve meus cafezinhos até a minha casa e vou dizer a todos
que ela é a minha noiva. Porra, Benjamin vai rir da minha cara. É a mesma
coisa que dizer: Ei, eu estou transando com essa baranga. Que absurdo! Mas
agora não posso voltar atrás, só posso rezar para que Abigail tenha
convencido aquela garota a não usar Walmart hoje.
Passo pela recepção e sigo para o restaurante. Uma mulher alta,
morena e bonita sorri para mim na entrada. É a hostess do lugar.
— Bom dia, senhor, posso ajudá-lo?
— Vou me encontrar com uma pessoa, o nome dela é Jamie Collins
— respondo.
— Ah, sim. — Ela olha para o caderninho em suas mãos e de volta
para mim. — Ela está no bar aguardando o senhor.
— Obrigado.
Sigo para o interior do restaurante e olho ao redor. O lugar está
praticamente vazio, apenas algumas poucas mesas estão ocupadas. Caminho
até o bar e vejo um casal conversando em uma extremidade. Uma mulher
loira e outra morena estão de costas para mim bebendo e rindo juntas.
Procuro do outro lado do balcão e vejo apenas as costas e o cabelo liso e
escuro de uma mulher que está conversando com o bartender. Ele se inclina
para frente para encher o copo de água dela, em seguida, diz alguma coisa
que a faz abaixar a cabeça, talvez envergonhada. Ela diz algo para ele e a
risada do bartender chega até mim. Não há mais ninguém no bar além dessas
pessoas.
Viro-me e volto para a entrada, talvez a hostess tenha se enganado e
achou que Jamie já estivesse aqui, mas obviamente não está. Espero que ela
não demore muito, não quero chegar atrasado. Não posso nem pensar que ela
possa ter desistido. Vejo a mulher que me atendeu e vou até ela, toco em seu
ombro para chamar sua atenção.
— Senhor?
— Com licença, você disse que minha noiva estava aguardando no
bar, acho que você se enganou.
A mulher franze o cenho e balança a cabeça.
— Sua noiva é Jamie Collins?
— Sim, senhorita, minha noiva, Jamie, você me disse que ela estava
no bar.
— E ela está, senhor — a mulher afirma.
— Eu acabei de voltar de lá, querida — digo.
— Eu vou levá-lo até ela, senhor, acompanhe-me.
Essa mulher acha que eu sou cego por acaso? É claro que eu notaria
se Jamie estivesse lá, mas ela não está. Que garota tapada, não deveria
trabalhar nesse lugar. Não sabe nem reconhecer as pessoas e passar as
informações corretamente. Ela me leva de volta para o bar no mesmo local
em que estive antes e faz uma pausa no caminho, apontando o dedo em
direção ao bartender, que continua conversando animadamente com a mulher
morena que está de costas para mim.
— Lá está, senhor, sua noiva — a hostess diz.
— O quê?
— Sua noiva, senhor, está sentada bem ali, no balcão.
— Ah, claro. — Olho em direção ao bar novamente e vejo apenas as
costas finas da mulher que está usando um vestido preto. Seus cabelos
também são escuros, compridos e lisos. — Obrigado.
— De nada, senhor. — A hostess se vira e caminha para longe, com
uma careta em seu rosto. Não posso culpá-la, afinal, quem não reconhece a
própria noiva?
Abigail convenceu Jamie a usar um vestido, então? Estou muito
surpreso, acho que nunca a vi vestindo outra coisa que não fosse aquelas
saias enormes e aqueles suéteres horrorosos. Aproximo-me curioso para ver
de perto seus cabelos soltos, ela sempre os deixava presos naquele coque de
tia evangélica. Eu nem sabia se eles eram lisos ou ondulados, mas agora sei
que são compridos e lisos.
Faço uma pausa quando vejo o bartender dizer algo a ela que a faz rir.
É o tipo de risada descontraída e verdadeira. É um som admirável de se ouvir.
Então Jamie Collins pode sorrir e se divertir? Isso é algo interessante. Acho
que o bartender está um pouco animado demais com a presença dela. Eu me
arrisco a pensar que ele está flertando com ela. Isso é um pouco estranho, até
absurdo. Quer dizer, o cara não é muito bonito, mas flertar com Jamie? Jesus,
ele deve estar desesperado mesmo. Quem é que flerta com uma garota como
ess…
Puta que pariu! Não… Não… Não! Que merda é essa?
Jamie Collins se vira ainda sorrindo e eu tenho uma visão do seu
rosto. Ela olha diretamente para onde eu estou, e surpresa cruza as suas
feições. No entanto, nada deve se comparar à minha cara de espanto. Estou
absolutamente paralisado comtemplando uma mulher incrivelmente linda. Ela
tem a pele clara e olhos absurdamente fascinantes. Eles são grandes, com
pestanas longas e escuras, totalmente atrativos. Suas maçãs do rosto são
rosadas e adoráveis nesse rosto angelical e feminino. A boca é pequena, e os
lábios são finos e rosados. Ela tem o tipo rosto memorável, que você não
pode esquecer mesmo se tentar. Aqueles óculos ridículos se foram e no lugar
deles permanecem apenas os olhos que eu nunca sei se são castanhos, verdes
ou uma combinação de ambos. Mas isso não importa, eles são lindos.
Caramba, ela é linda!
Ainda estou parado no meu lugar, totalmente sem reação. Eu
provavelmente devo parecer um homem que nunca viu uma mulher na vida.
Com olhos arregalados, boca aberta, eu devo estar babando. Isso é ridículo.
Como algo assim foi acontecer? Levanto as mãos e esfrego os punhos sobre
os meus olhos como se de alguma forma eu fosse enxergar a verdade. Mas
quando eu volto a colocar as mãos para baixo, ela ainda está lá, olhando para
mim e sorrindo tão encantadoramente. Não é um sonho, não estou ficando
louco. Minha noiva é uma gata!
Jamie se levanta e eu tenho uma visão inteira dela. Enquanto ela
caminha na minha direção, eu a avalio de cima a baixo novamente. Ela está
usando um vestido preto, é elegante e discreto. Vai até os seus joelhos, no
entanto, é muito justo. Sem contar que tem um decote grande o suficiente na
frente para que eu possa ver que ela tem seios. Ela não é muito alta, deve ter
em torno de 1,60 m. Mas está usando saltos altos pretos que deixam pouco
para a imaginação, ainda mais com aquelas pernas. Ela tem algumas curvas
interessantes. Droga, eu estou fodido. Acabo de descobrir que minha noiva é
gostosa.
— Andrew — Jamie me cumprimenta com um aceno e aquele sorriso
genuíno. De perto tudo fica melhor, é como se a beleza dela só crescesse.
Como eu não notei tudo isso antes? — Andrew?
Balanço a cabeça voltando para o presente.
— Jamie? — Minha voz soa seca, limpo a garganta ruidosamente. —
Oi, Jamie.
— O que você está olhando? — ela pergunta, e olha para trás como se
estivesse procurando por alguma deusa que merece minha atenção, ela só não
se dá conta de que ela é a deusa nesse momento. Ela se volta para mim e,
poxa, eu não consigo parar de olhar para ela. — Meu batom está borrado?
Droga, eu disse para não passarem muito, nunca uso maquiagem.
— O batom está bom — murmuro. Por que ela foi falar do batom?
Agora meus olhos vão para a sua boca. O batom é de um tom rosa-claro, mas
eu estou mais impressionado com os contornos daqueles lábios, eles também
devem ser muito macios. — Sua boca é linda.
Jamie ri, e seu rosto ganha um leve tom avermelhado. Como ela
consegue corar tão bem?
— Obrigada. Sr. Simons — ela agradece ruborizada.
— Só Andrew — relembro-a. — Me chame apenas de Andrew.
— Claro, desculpe — ela murmura. — É difícil de acostumar, e
também estou nervosa.
— Vai dar tudo certo, vamos ficar próximos o tempo todo e não
diremos nada que não tivermos certeza — digo a ela.
— Tudo bem. O que você acha do meu vestido? Abigail que
escolheu. Eu disse que era um pouco exagerado pra um almoço de família,
mas ela disse que ficaria bem em mim e que você ia gostar.
Ah, Abigail, hoje eu poderia beijar seus pés…
— O vestido está bom — respondo inquieto. Levo a mão até a minha
gravata e afrouxo um pouco, estou me sentindo sufocado. — Abigail está
certa, eu gosto do vestido, ficou bom em você.
— Você está pronto? Quer ir agora?
Olho sobre o ombro dela e vejo o bartender nos olhando com
curiosidade.
— O que você estava bebendo? — pergunto, embora eu saiba que era
água.
— Só uma água.
— Vamos lá. Preciso beber alguma coisa.
Jamie apenas me segue e volta a sentar-se em sua banqueta. Sento-me
ao lado dela e peço um uísque duplo. Fico encarando as minhas mãos sobre o
balcão, porque eu sei que, se desviar os olhos, eles vão voltar para ela. É
como se houvesse um ímã, eu sou atraído como um inseto para a luz. Quero
continuar olhando e olhando, porque parece inacreditável. Não faço ideia de
tudo o que Abigail fez, mas não foi apenas um ótimo trabalho, foi um
trabalho excelente. Jamie está praticamente irreconhecível. Como se eu
acabasse de receber uma nova noiva. Ainda é a voz dela, ainda é o rosto dela,
ainda é aquela garota tímida. Mas há também uma nova mulher, uma mulher
que merece toda a minha atenção.
O pior de tudo é que em nenhum momento eu acreditei que ela
pudesse mudar tanto e realmente ser uma garota linda. Quantas vezes eu
menosprezei sua aparência? Quantas vezes disse e pensei que ela era feia?
Mesmo quando Abigail me garantiu que a tornaria muito melhor, eu duvidei.
Jackson estava rindo da minha cara porque eu aceitei que ela fosse minha
noiva. O babaca vai cair para trás quando vê-la. Maldição, minha família toda
vai ser surpreendida quando eu apresentá-la. Como eu fui tão idiota?
Ela não é nada do que eu pedi, nada do que eu sonhei, nada do que eu
queria como minha noiva. Mas eu não posso pensar em ninguém melhor
neste momento. Foi a melhor coisa que eu fiz quando aceitei que ela fosse
minha falsa noiva. Jamie pode mudar, e, se ela é capaz disso, eu também sou.
Ela é a chave final para os meus planos. Com ela eu vou alcançar tudo o que
eu preciso. Obrigado, Deus, obrigado pela minha noiva gostosa…
— Sua bebida, senhor. — O bartender coloca o copo na minha frente
e se vira para Jamie. — E você, boneca, vai querer mais alguma coisa?
— Não, obrigada — Jamie responde timidamente.
O bartender pisca para ela e se vira para atender o casal do outro lado
do balcão. Caramba, ele está dando em cima dela. É tão surreal, parece que
estou do lado de outra pessoa. Merda, eu preciso me controlar. Não sou um
garoto adolescente na puberdade, sou um homem. Eu sou um homem! Um
completamente babaca por pensar que minha noiva era feia. Mas ainda assim
sou um homem e preciso voltar ao que interessa. Fiquei surpreso com a sua
mudança? Sim, completamente. Mas acabou, ela está aqui, eu estou aqui e
nós ainda temos um almoço para ir. Foco, Drew, foco!
— Ele está dando em cima de você — digo. Que merda, não era isso
que eu tinha que falar! Onde estou com a cabeça?
— Como? — Jamie murmura.
— O bartender — explico. — Ele estava dando em cima de você.
— Não — Jamie nega.
Quanta inocência…
— Sim, ele estava — afirmo.
— Não estava, não. — Ela para, bebe um gole de sua água e depois
olha para mim. Está envergonhada. — Ele estava sendo apenas gentil.
— Gentil? — Balanço a cabeça e mordo o lábio inferior. — Era mais
que gentileza, confie em mim.
— Estamos aqui pra falar do bartender? — Jamie pergunta-me. —
Porque eu pensei que tivéssemos coisas mais importantes para tratar.
— Comprei um anel para você — digo, mudando de assunto.
Ela ergue uma sobrancelha, e um pequeno sorriso surge em seus
lábios.
— Ok.
— Se perguntarem como nos conhecemos — prossigo falando —,
vamos dizer que foi quando você começou a trabalhar na Simon’s.
Começamos a sair faz três meses, mas começou a ficar sério apenas há um
mês, que foi quando eu pedi para você se casar comigo. Entendeu?
Jamie franze o cenho.
— Então eu sou uma noiva corna? — ela pergunta, refletindo.
— O quê?
— Você disse que pediu para se casar comigo apenas um mês atrás,
certo?
— Sim — afirmo.
— Mas no começo dessa semana eu peguei você com a Tracy.
— É — murmuro. — Hã… Não! Não! Jamie, ninguém sabe da Tracy,
só você.
— Ainda assim eu sou noiva corna.
— Jamie. — Suspiro impaciente. — Tracy não conta, tá legal? Você
ainda não tinha assinado o acordo.
— Então você não vai mais voltar a ver a Tracy? — Jamie questiona-
me.
— Não — minto.
— Está bem. Mais alguma coisa, noivo?
— Olha, não dá pra adivinhar o que vão nos perguntar — continuo
falando. — Por isso temos que ser cuidadosos, e tudo, absolutamente tudo o
que dissermos precisamos lembrar depois. Não podemos dizer algo e
esquecer, entende? Tente ficar próxima de mim o tempo todo. Assim, quando
perguntarem algo, vamos responder juntos. Abigail e Jackson vão estar lá
para nos dar apoio, e com a ajuda deles vai dar tudo certo.
— Onde foi o nosso primeiro encontro? — Jamie pergunta.
— Encontro? — resmungo. — Não, esquece essa droga. Ninguém vai
querer saber sobre isso.
— Ainda acho que deveríamos ter um lugar, apenas no caso de
perguntarem.
— Jamie. — Inclino-me para frente em direção a ela. — Ninguém vai
querer saber sobre isso.
— Tá legal. — Ela levanta as mãos em sinal de rendição. — Se você
diz, você é que manda.
— Vamos embora. — Viro meu uísque e bebo tudo em um gole.
Jamie se levanta e pega a sua bolsa. O bartender resolve voltar nesse
momento e se inclina sobre o balcão para passar um guardanapo para Jamie.
Reviro os meus olhos internamente.
— Me liga, boneca. — O cara dá uma piscadinha para ela e volta para
o trabalho.
Jamie se atrapalha para abrir a bolsa e colocar o guardanapo dentro.
— Eu disse que ele estava dando em cima de você — aponto.
— Vamos embora — ela diz e caminha na minha frente, tropeçando
em seus próprios saltos.
Isso vai ser interessante…
***
Quando chegamos à minha casa, já estou completamente relaxado.
Pronto para enfrentar qualquer coisa. Jamie, no entanto, está muito nervosa.
Ela não para de mexer na bolsa, ou estalar os dedos. Quero dizer a ela para
ficar calma, mas resolvo que isso não vai adiantar muito. Ela vai se
acostumar com o papel quando estiver encenando. Desço do carro e abro a
porta para ela. Ajudo-a descer enquanto observo sua boca abrir ligeiramente e
a surpresa tomar conta de sua expressão. Ela está olhando para a minha casa,
para os jardins e também para a piscina. Parece fascinada com tudo o que vê.
Imagino que ela nunca deve ter entrado em uma mansão, afinal, ela mora no
Bronx.
— O que você acha?
— É… Incrível — ela sussurra, admirada.
— Bem-vinda à nossa casa — digo.
— Quem mora aqui?
— Eu, vovó, minha tia Lorenna, Abigail e Addison — respondo. — E
alguns empregados.
— É bem grande.
— Espere até ver por dentro, vamos.
— Andrew, espere — ela pede.
— O que foi?
— Eu não sei se consigo fazer isso — ela admite.
— Você não pode me deixar na mão agora, Jamie, por favor.
Ela ri.
— O que foi? O que é engraçado?
— Você me pediu por favor.
— Ei, eu sei pedir por favor, às vezes.
— Só que desta vez ninguém obrigou você. — Ela sorri.
— Tudo bem, espertinha, vamos entrar.
— Andrew? — Jamie chama.
— O que foi agora?
— Você não acha que deveríamos entrar de mãos dadas?
— Mãos dadas? Não, isso é coisa de adolescentes.
— Isso não é coisa de adolescentes! — ela protesta. — Somos um
casal e casais andam de mãos dadas! Como você espera que a gente entre lá?
Sorrio e me aproximo. Coloco minha mão em volta da cintura dela e
dou um puxão para perto, até que ela esteja colada em mim.
— Wow… — Jamie se assusta.
— É assim que vamos entrar — sussurro próximo ao lóbulo de sua
orelha.
Seguimos em direção à entrada, a porta está aberta e eu levo Jamie
direto para a cozinha. Nossa governanta, Virgínia, está inspecionando as
cozinheiras enquanto elas preparam nosso almoço. Ela sorri quando me vê e
olha com curiosidade para Jamie. Dou apenas um aceno e levo-a para as
portas dos fundos, ainda com o meu braço ao redor de sua cintura fina. Ouço
vozes conhecidas vindo do jardim na parte de trás e respiro fundo. É agora.
— Bom dia, família — saúdo a todos.
Abigail, que está mais próxima a nós, sorri. Jackson levanta os olhos
de sua bebida e olha diretamente para Jamie, ele se engasga e cospe cerveja
para fora da boca. Estou rindo internamente de sua expressão embasbacada,
ele está tão pasmo e perplexo quanto eu fiquei. Tia Lorenna arregala os olhos
e sorri maravilhada. Addison nos lança apenas um olhar curioso. E vovó…
Vovó parece aturdida, ela se levanta e nos encara estupefata e completamente
confusa.
— Bom dia, Drew. — Abigail acena para nós. — Seja bem-vinda,
Jamie.
— Obrigada.
— Jamie? — vovó a chama. — Como assim, Jamie?
— Vó! — Abigail repreende. — Que falta de educação!
— Fique quieta, Abigail — vovó diz e se aproxima de nós. — Onde
está a Mercedes?
Mercedes? Maldição! Como eu fui me esquecer disso! Mercedes!
— Ela é a Mercedes — Jackson interrompe, aproximando-se também.
— Jackson, não estou cega — vovó vocifera. — Esta é minha
funcionária, Jamie Collins. Você me disse que a noiva de Andrew chamava-
se Mercedes, e eu me lembro muito bem disso.
Abby solta uma gargalhada, e todos se viram para ela.
— Ai, que piada! — Abigail finge secar os olhos e suspira
profundamente. — Eles disseram para a vovó que o nome dela era Mercedes?
Ai, vocês dois não prestam!
Olho para o Jackson procurando por ajuda, mas ele parece tão perdido
quanto eu. O que Abigail está fazendo?
— O que está acontecendo aqui, afinal? — vovó pergunta. — Quero
uma explicação imediatamente!
— Ah, vó, isso é uma piadinha interna — Abigail explica, inventando
outra mentira. — É que… É que… Hãã… É que o Drew atropelou a Jamie
quando eles se conheceram.
Ah, não…
— E o que isso tem a ver com o fato de que eu estava esperando pela
Mercedes, em vez da Jamie? — vovó questiona.
— É que o Drew estava dirigindo a Mercedes quando ele a atropelou,
vó — Abigail prossegue falando. — Só que não foi um atropelamento grave.
O Drew estava chegando à garagem e, bam, bateu na Jamie! Todo mundo
correu pra socorrê-la, e eles não tiveram tempo de se apresentar. O Drew nem
sabia que ela trabalhava lá na época. Quando ele foi contar para mim e para o
Jackson o que houve, ele disse: Atropelei uma garota com a Mercedes. E nós
começamos a chamá-la de Mercedes, mas depois a gente a conheceu e
mesmo sabendo que ela se chamava Jamie, continuamos a brincar chamando-
a de Mercedes. Não foi, Jackson?
— Foi — Jack assente. — Aquele atropelamento foi notícia por um
tempão. A gente ficava incomodando o Drew por ele ter conseguido atropelar
a garota praticamente na porta da garagem. Como não sabíamos o nome
verdadeiro dela, chamamos de Mercedes. Só que o apelido pegou. Jamie é a
Mercedes, dona Elizabeth.
— Por que vocês simplesmente não disseram que ela era a Jamie?
— Porque estamos acostumados a chamá-la de Mercedes, dona
Elizabeth. Talvez eu nem tenha notado quando disse isso — Jackson
responde.
— Como eu não fiquei sabendo desse atropelamento?
— Ai, vó, até parece que você não conhece o Drew. — Abigail revira
os olhos. — É óbvio que ele quis esconder da senhora, pois sabia que ficaria
preocupada e o chamaria de irresponsável.
— Eu não entendo. — Vovó balança a cabeça. — Por que você nunca
me contou que conhecia o meu neto, Jamie? Como pôde me esconder que
estavam juntos?
— Sabe o que é, vó… — Abigail começa, mas Elizabeth a interrompe
levantando a mão.
— Quero que a Jamie me responda — vovó diz.
— Desculpe, senhora Simons — Jamie sussurra. Ela limpa a garganta,
engole em seco e volta a falar. — O que eu e Andrew temos é muito recente.
Nos conhecemos desde que eu… Fui atropelada. Mas começamos a sair
apenas há três meses. Não achei que fôssemos ficar juntos, mas ele me
surpreendeu me pedindo para casar com ele. Eu não disse nada para a
senhora porque não pensei que Andrew gostasse tanto assim de mim.
Desculpe, deveríamos ter contado. Sinto muito.
Estou tão impressionado com o que Jamie falou que tenho vontade de
bater palmas. Ela é convincente pra caralho. Vovó parece acreditar nela
quando seu rosto suaviza e ela dá um passo para trás.
— Muito bem — vovó diz. — Então quer dizer que você é a noiva de
Andrew?
— Sim, sou eu.
— Confesso que fiquei surpresa — vovó continua. — Desculpe por
recebê-la desta forma, mas parece que meu neto e Jackson fizeram uma
bagunça na minha cabeça.
— O que não é uma novidade — Abigail interrompe. — Esses dois
são uns idiotas.
— Bom, mas agora está tudo bem, né? — digo. — Vovó já conhece
minha noiva, agora posso apresentá-la para o resto da família.
— Claro — vovó concorda, mas parece um pouco desconfiada ainda.
— Traga Jamie para se sentar conosco.
Levo Jamie para a mesa e a apresento formalmente para minha tia
Lorenna, que simpatiza com ela imediatamente. Abigail senta-se perto de
Jamie, e logo todas estão conversando animadamente. Vovó parece um pouco
distante, talvez ela não tenha acreditado na mentira deslavada de Abby, mas
isso não importa. Depois que ela passar a ver a mim e a Jamie juntos, ela vai
acreditar em tudo. Eu as deixo sozinhas com os seus papos de mulheres e vou
atrás de uma cerveja. Jackson me segue.
— Caramba, o que foi aquilo? — Jackson resmunga. — Quase mijei
nas calças achando que seriamos descobertos.
— Você e Abigail mentem bem pra caramba, praticamente não
vacilaram. Merecem um prêmio.
— É. Abigail foi rápida, inventou uma péssima mentira, mas que caiu
muito bem.
— Agora só precisamos continuar encenando.
— Drew, cara, eu preciso desabafar. Eu não sei o que diabos Abigail
fez com aquela garota, mas ela ficou uma gata.
Sorrio.
— Você tinha que ver a sua cara quando olhou pra ela, chegou até a
babar — comento.
— Cala a boca — Jackson resmunga. — Vai dizer que você não ficou
surpreso?
— Surpreso? — Balanço a cabeça. — Não, não. Fiquei
completamente paralisado. Eu achei que ela era feia e que não tinha salvação.
Jackson ri.
— Ah, mas isso é bom, certo? Ela é bonita, e você queria uma noiva
bonita.
— É, acho que isso é bom — respondo. Mas, no fundo, eu penso:
Será que isso não é um problema?
— Merda — Jack xinga. — Vamos voltar lá, olha só quem chegou.
Sigo o olhar de Jackson e vejo a tia Eleonor chegar acompanhada do
marido Saul. A megera de sua filha, Olivia, está agarrada ao braço de
Benjamin. Agora sim a família está completa, e a verdadeira festa vai
começar. Vovó se levanta para cumprimentá-los, e eu me aproximo de Jamie.
Ela me dá um sorriso trêmulo e estende sua mão para mim. Aperto
delicadamente e a levo ao encontro dos outros.
— Tia, tio. — Aceno para Eleonor e Saul. Depois me viro para minha
prima e seu marido. — Olivia, Benjamin, que bom que vocês chegaram.
Quero apresentar para vocês a minha noiva, apesar de acreditar que vocês já a
conhecem. Esta é Jamie Collins.
Olivia olha para mim e depois para Jamie. Ela dá um passo para trás
assustada, mas se recompõe rapidamente. Vejo quando o reconhecimento
chega lentamente para ela enquanto avalia minha noiva de cima a baixo. Ela
parece principalmente interessada no rosto de Jamie. E fica estarrecida. Uma
carranca se forma em seu rosto assombrado.
— Que brincadeira é essa? — Olivia cospe. — O que essa garota está
fazendo aqui?
— Esta garota é a minha noiva — informo novamente.
— O quê?! — Olivia exclama. — Está louco, Andrew? Essa garota
serve nossos cafés!
— Não serve mais. Jamie foi promovida.
— Ela não pode ser promovida! — Olivia altera a voz. — Eu a
demiti!
— Você o quê? — vovó interrompe. — Como assim, você a demitiu?
Quem autorizou isso?
— Não precisávamos mais dos serviços dela, vó — Olivia responde.
— Você não tem o direito de fazer isso, Olivia — vovó diz. — Eu
ainda sou a diretora da Simon’s e não permito que você a demita.
— Ninguém vai demitir minha noiva — prossigo. — Acostume-se
com a presença de Jamie, Olivia. Porque nós vamos nos casar, e ela vai fazer
parte dessa família.
— Isso é um absurdo! — Olivia exclama. — Ela é só uma
funcionária, uma garota pobre que pensa que pode brincar de noiva riquinha!
— Ela não precisa brincar, Olivia, ela é — afirmo.
— Olivia, não admito que fale desse jeito com Jamie dentro da minha
casa! — vovó esbraveja. — Quero respeito! Ou nós nos sentamos naquela
mesa e temos um almoço agradável em família, ou então eu vou pedir que
você se retire!
— Mas, vó… — Olivia começa, mas vovó a interrompe.
— Você me escutou, Olivia. Eu não vou repetir.
— Olivia, meu bem, acalme-se, vamos nos sentar — Benjamin diz à
esposa, tentando acalmá-la. Ela se vira e sai caminhando a passos firmes,
bufando. Benjamin vai atrás dela.
— Nunca pensei que fosse ver você noivo, Andrew — tia Eleonor
diz, ela tem um sorriso cínico igual ao da filha.
— Pois é, as coisas mudam, tia.
— Parabéns pelo noivado, Andrew. — Tio Saul dá um tapinha no
meu ombro. — Sua noiva é linda.
— Obrigado, tio.
— Vamos todos para a mesa, vou pedir para servirem o almoço —
vovó diz.
Voltamos todos para a mesa, puxo uma cadeira para Jamie e sento-me
ao lado dela. Olivia e Benjamin estão sentados na nossa frente, e minha prima
não esconde o ódio que está sentindo neste momento e fica encarando minha
noiva. Ela parece prestes a pular no pescoço de Jamie ou no meu. Benjamin
fica sussurrando coisas para ela, que parecem controlá-la. Ele é esperto e sabe
que eles precisam manter a compostura diante da minha vó. Olivia é mais
desequilibrada, e para ela é mais difícil de fazer isso do que para Benjamin,
que é manipulador e enganador por natureza. Percebo agora que o meu
noivado é mais do que apenas um plano para conseguir minha herança. Meu
noivado com Jamie desencadeou uma guerra. Só que eu não me importo,
estou nessa para ganhar.
— Você está diferente, Jamie — Benjamin diz, sorrindo para a minha
noiva. — Está bonita.
— Obrigada, Sr. Cooper — Jamie agradece.
Olivia parece enojada, mas não abre a boca.
— Já sabe com o que pretende trabalhar? — ele pergunta.
— Na verdade, não — Jamie responde.
— Tenho um cargo de secretária disponível, se você quiser, é seu —
ele oferece.
— Ah, obrigada — Jamie agradece. — Vou pensar.
Benjamin oferecendo um cargo para Jamie? Isso é estranho.
— Drew? — Abigail sussurra ao meu lado, cutucando-me.
— O quê?
— O anel, você tem que dar o anel para Jamie — ela diz.
— Ah, sim, o anel, é claro — murmuro.
Volto a ficar nervoso e minhas mãos tremem. Chegou a hora de
oficializar nosso noivado na frente de toda a minha família. Toco no bolso do
meu paletó e sinto a pequena caixa de veludo, dentro está o anel que era da
minha mãe. Eu deveria dar esse anel para uma mulher que eu realmente
amasse. O problema é que preciso dele agora. Levanto-me e faço um gesto,
pedindo o silêncio de todos. Olivia está novamente interessada no que eu
tenho a dizer. Vovó mais ainda.
— Tenho algo a dizer.
— O que foi, Andrew? — vovó pergunta.
— Esperei por este momento já faz algum tempo — começo a falar.
— Finalmente pude apresentar Jamie a toda a minha família e contar sobre
nosso noivado. Mas apenas agora, na frente de todos vocês, é que vou
oficializar nosso noivado, dando a ela algo que é muito importante para mim.
Olho para Jamie, ela está envergonhada e ruborizada, mesmo que isso
tudo não passe de uma encenação. Ofereço minha mão para que ela possa se
levantar. De pé na minha frente, retiro do meu bolso a caixinha e a abro de
frente para os seus olhos. Ela se surpreende com o anel e sorri. Até parece
que ela está recebendo um anel de verdade e oficializando um verdadeiro
compromisso. Ela me estende sua mão, e eu deslizo o anel pelo seu dedo.
Todos batem palmas, menos Olivia e tia Eleonor. Vovó está
sorridente e parece feliz pela primeira vez desde que chegamos. Jackson se
levanta e dá um tapa nas minhas costas, dando-me os parabéns apenas para
tornar tudo mais verdadeiro. Tudo parece que está indo muito bem, até
Abigail gritar:
— E o beijo?
Congelo no meu lugar, e Jamie arregala os olhos.
— É, e o beijo? — vovó pergunta.
— Vamos lá, crianças, não fiquem tímidos. — Tia Lorenna ri. —
Todo compromisso entre um casal se oficializa com um beijo.
— Vá em frente, Drew! — Jackson grita.
— Beija, beija, beija! — Abigail cantarola batendo palmas. Vou matá-
la!
Olho para Jamie, e ela já está olhando para mim. Vamos lá, é apenas
um beijo. Um beijo na sua falsa noiva para oficializar o seu falso noivado.
Você sabia que uma hora ou outra isso ia acontecer. Temos que manter as
aparências, e é apenas um beijo. Coloco uma das minhas mãos em sua nuca, e
a outra descansa no quadril dela. Por que o meu coração está batendo tão
rápido? É apenas mais uma garota, é apenas mais um beijo. Já fiz isso tantas
vezes, e nunca me senti assim. Como se estivesse prestes a ter um ataque
cardíaco.
Abaixo-me lentamente, ainda olhando para aqueles olhos tão lindos
que me encaram de volta com a mesma intensidade. Aproximo-me devagar.
Ela fecha os olhos lentamente, tornando a cena em câmera lenta. Fecho os
meus olhos e a beijo. Jamie tem os lábios mais incrivelmente macios que eu
já senti. São como veludo, tão suaves e tão deliciosos. Ela me beija de volta,
e se eu não estou ficando louco a sinto suspirar de prazer. No entanto, não
aprofundo o nosso beijo. Em vez disso, me afasto, completamente atordoado.
Eu não deveria gostar de beijá-la. Mas, infernos, eu gostei.
— Parabéns, meu neto, estou tão contente por você. — Vovó me
abraça forte. — Sei que não fui muito atenciosa hoje, mas fiquei realmente
surpresa em saber que Jamie é a sua noiva.
— Você gosta dela, não é, vovó? — pergunto.
— De Jamie? Ah, querido, eu não poderia pedir uma noiva melhor
para você.
— Obrigado, vó.
— E para quando é o casamento? — vovó pergunta dirigindo-se a
mim e Jamie.
— C-Ca… Casamento? — gaguejo.
— Claro, o casamento! — vovó exclama. — Ah, vamos, vocês não
enganam ninguém. Se noivaram tão rápido assim é porque Jamie está
grávida, ou então querem se casar às pressas.
— Não estou grávida! — Jamie exclama assustada.
— Então é porque querem se casar às pressas — vovó prossegue. —
Sabe, se fosse em outro momento eu não concordaria com um casamento tão
rápido. Mas se Andrew pediu para você ser a noiva dele, é porque ele gosta
de verdade de você, Jamie. A vida é tão curta, certo? Eu não sei quanto
tempo tenho de vida e até agora só tive o prazer de comparecer ao casamento
de uma neta minha. Não imagino que Abigail vá se casar tão cedo, pois essa é
avessa a casamentos. Addison ainda está na faculdade e cheia de sonhos que
não envolvem um casamento tão cedo. Mas ver o Andrew no altar, isso sim
será um sonho tornando-se real. Nem acredito que você fará isso por mim,
meu neto.
— F-Farei? — gaguejo.
— É claro que ele vai se casar logo — Jackson interrompe. — O
Drew estava louco para oficializar esse noivado, assim poderíamos começar
os preparativos para o casamento.
— Casamento? — Jamie murmura.
— É, Jamie, que maravilha! — Abigail exclama. — Você queria tanto
se casar rápido, podemos começar a planejar tudo.
— Ótimo! — Vovó sorri. — Acho que temos um casamento para
organizar.
Era só o que me faltava! Agora vou casar?
CAPÍTULO ONZE
--—————————————————————————————

Jamie

Casamento?
Eles só podem estar de brincadeira! Não foi com isso que eu
concordei, não assinei um contrato de quinhentos mil dólares para me casar.
Isso já é demais! Casamento é algo muito mais sério. São votos de
compromisso, lealdade e fidelidade para uma vida toda. Pelo menos é nisso
que eu acredito. Não posso me casar com Andrew de verdade, porque eu não
o amo. Concordei com um falso noivado porque não eu não ficaria presa a
isso. Mas um casamento é muito mais, é um voto pela eternidade. Ou pelo
menos o meu pai sempre colocou com essas palavras o que ele pensava do
significado de uma união.
— Não vou me casar — solto.
— Como assim, não vai se casar? — Elizabeth pergunta-me, fitando-
me com desconfiança.
— Claro que ela vai casar! — Jackson afirma.
— Vovó, não assuste a Jamie, ela quer se casar sim — Abigail diz. —
Mas o noivado é tão recente, e ela ainda está se acostumando a isso.
— Não — nego. — Não vou me casar.
— Por que aceitou o noivado com o meu neto, então? — Elizabeth
questiona-me.
Balanço a cabeça. Preciso clarear minhas ideias!
— Eu quero me casar — minto, voltando para o meu papel. — Só que
não agora, quem sabe daqui a um ano?
Um ano? Perfeito, até lá o contrato estará terminado.
— Em um ano posso estar morta! — Elizabeth exclama. — Se vocês
estão noivos é porque pretendem se casar, então que façam isso enquanto
ainda estou aqui para assistir meu neto. Não é, Andrew?… Andrew!
— Hã? — Andrew esfrega o rosto com as palmas das mãos. Ele está
nervoso, e eu sei que ele não planejava que isso fosse acontecer. — Vó, eu
não sei.
— Como assim, não sabe? — Elizabeth o encara. — Se você a ama
vai querer que ela se torne sua esposa. Seu pai não hesitou quando conheceu
a sua mãe. Ele soube que era ela e logo se casou. Eles ficariam orgulhosos em
saber que você encontrou alguém para viver ao seu lado. Andrew, você me
fez muito feliz hoje, não me decepcione, por favor…
— Vamos nos casar — Andrew anuncia ao meu lado. — Jamie e eu
vamos nos casar.
— Oba! — Abigail exclama. — Festa!
— Graças a Deus — Jack murmura. — Érr… Quer dizer, parabéns e
que Deus abençoe vocês.
Aproximo-me de Andrew e sussurro:
— Não posso me casar, Andrew! Não posso!
— Não estrague tudo, Jamie — Andrew sussurra de volta. — Por
favor, nós vamos conversar.
Suspiro, mas não digo mais nada. Elizabeth volta a ficar animada e se
junta a Lorenna e Eleonor para conversarem sobre os preparativos para uma
festa. Olivia está emburrada, provavelmente com um ódio mortal de mim.
Não posso dizer que isso não me deixa contente, porque estaria mentindo.
Benjamin está ao seu lado, dizendo alguma coisa à qual ela não dá
importância alguma. Seus olhos estão focados em mim, faiscando de raiva.
Quando todos estão entretidos em uma grande conversa, Andrew me
afasta discretamente da mesa e me leva para o lado de dentro da casa. Alguns
segundos depois Jackson e Abigail nos seguem. Passamos pela cozinha, sala
de jantar, sala de estar, subimos as escadas, cruzamos um corredor e Andrew
abre a porta de um quarto e me empurra lá dentro. Ele fecha a porta assim
que todos entraram.
— Não vou me casar — repito, cruzando os braços.
Andrew suspira.
— Jamie, eu preciso que faça isso por mim — ele diz. — Eu sei que
não foi o que combinamos, mas vovó vai desconfiar se eu não casar com
você logo.
— Não — nego. — Andrew, isso já está passando dos limites! Não
posso me casar com alguém que eu não amo, isso é errado de muitas
maneiras.
— Jamie, será um casamento falso também — Jackson argumenta. —
É praticamente a mesma coisa que o noivado, só que dessa vez vocês
precisam assinar uma papelada em cartório.
— Jamie, você não pode desistir agora! — Abigail exclama. — Você
está desempenhando esse papel perfeitamente. Olivia está se mordendo de
tanto ódio! Benjamin está agindo todo controlado, mas por dentro ele sabe
que Andrew é seu maior concorrente agora! E a vovó? Meu Deus, ela está
alegre demais, você não pode arruinar tudo.
— Sinto muito, ou ficamos somente com o falso noivado ou desisto
de tudo — murmuro.
— Meio milhão de dólares — Andrew diz. — Acrescento mais meio
milhão de dólares ao nosso acordo. Case-se comigo, Jamie, por favor.
— O acordo pode continuar pelo mesmo período de tempo — Jackson
prossegue. — Só um ano, e depois vocês se separam. Podem dizer que não
deu certo, e pronto. Ninguém nunca vai saber que não foi de verdade.
— Jamie, deixe de ser tola! — Abigail agarra os meus ombros. —
Você topou o noivado, o casamento é só um pouquinho a mais de sacrifício,
porém, vem acompanhando de mais meio milhão de dólares. Depois disso
você pode fazer o que quiser… Noivar de verdade e casar por amor. Não
importa, mas agora nós todos precisamos de você. Andrew, Jackson e eu
também.
— Vai, Jamie — Jackson implora. — Eu não estou a fim de ser
demitido.
— Tenho três condições! — aviso, descruzando os braços.
Andrew e Jackson juntam os punhos em um soco no ar para
comemorar.
— Isso aí, garota, você não vai se arrepender! — Abigail assegura
sorrindo.
— Primeira condição? — Andrew pergunta-me sorrindo.
— Você tem que pedir a minha mão para o meu pai — digo. — Ele
sempre sonhou em me ver casada com alguém que eu amo. Ele preza muito o
casamento e continua sendo leal à minha mãe mesmo depois de ela ter
morrido. Ele ficaria triste se eu me casasse e ele não soubesse disso. Então
quero que peça a bênção dele comigo.
— Fácil — Andrew diz. — Posso fazer isso. Qual a próxima
condição?
— Não quero me casar de véu e grinalda e nem em uma igreja.
Também não quero uma festa, apenas uma união simples em um cartório.
— O quê? — Abigail intromete-se. — Como assim você não quer se
casar com véu e grinalda? Não é assim que todas as mulheres, menos eu,
querem se casar? E por que não uma grande festa? A festa é a única parte
boa de um casamento, e você quer cortar isso?
— Abigail, o meu sonho é me casar com um homem que me ame de
verdade, em uma cerimônia com todos os nossos familiares reunidos —
explico. — Quero usar o vestido mais lindo, quero véu e grinalda. Quero
subir ao altar olhando para os olhos do meu noivo e enxergar amor de
verdade. Depois quero uma grande festa, onde eu vou ter uma dança com o
meu noivo, bolo de três camadas para cortar e também um buquê para jogar.
Eu quero muito tudo isso e eu não sei se algum dia eu vou ter a chance de
viver esse sonho. Mas não quero perder as esperanças. E é por isso que eu
vou me casar com Andrew em um cartório, ele não é o homem com quem eu
vou realizar os meus sonhos, então não quero estragar tudo por conta de um
casamento falso.
— Bom, ninguém vai estragar seus sonhos — Jackson intromete-se.
— Então, pode ser casamento no cartório mesmo.
— Mas a vovó vai querer dar uma festa! — Andrew protesta. — E ela
é muito religiosa, vai querer um casamento na igreja.
— Andrew, esta é a minha segunda condição — digo. — Ou você
aceita, ou não me caso.
— Ele aceita sim! — Abigail afirma. — Podemos lidar com a vovó.
— Qual a terceira condição? — Jackson pergunta.
— Assim como Andrew não quer decepcionar a sua família, eu
também não quero decepcionar a minha. Então quero que ele conheça minha
irmã, meu cunhado e meu sobrinho. Quero que ele seja um marido educado,
atencioso e que passe a impressão de que está apaixonado por mim. Eles
devem pensar que nosso relacionamento é verdadeiro.
— Posso fazer isso — Andrew afirma e estende-me a mão. — Temos
um acordo, então?
— Sim — concordo apertando sua mão.
— Caramba! — Jackson suspira. — Cara, você vai se casar!
— De mentirinha — Andrew acrescenta.
— Na verdade, vai ser de verdade — Jackson diz. — Só nós sabemos
do acordo, para o restante do mundo vocês estarão casados mesmo.
— Isso é um máximo! — Abigail ri. — Vamos morar juntas na
mesma casa, Jamie!
— Eu não tinha pensado nisso — Andrew murmura pensativo. — Ela
tem que morar aqui?
— Dãã. — Jackson dá um tapa na testa de Andrew. — Você quer
colocar sua esposa onde? Na casinha do cachorro?
— Não temos cachorro — Abigail aponta.
— Pior ainda. — Jackson solta uma gargalhada. — Quer colocar a
senhora Simons, sua esposa, para dormir na rua?
— Senhora Simons? — Andrew pergunta confuso.
— É, Andrew — Abigail explica como se ele fosse um tapado. —
Você e Jamie serão o senhor e a senhora Simons.
Seja o que Deus quiser…
***
Estamos todos sentados ao redor da mesa almoçando. A comida é
deliciosa e tem de tudo um pouco. Parece um banquete, nunca vi tanta
comida assim para poucas pessoas. Estou me fartando e não tenho vergonha
nenhuma disso. Olivia parece um passarinho, acho que ela sobrevive apenas
de folhas de alface e rodelas de tomate, porque foi a única comida que ela
colocou no prato. Se bem que nem isso ela realmente comeu, só deu umas
beliscadinhas. Não sei como ela consegue, se eu tivesse esse banquete todos
os dias, provavelmente me transformaria em uma obesa em poucas semanas.
Ela não disse mais nada desde que Elizabeth a repreendeu, acho que ficou
com medo de acabar dizendo algo que a faria levar uma bronca de sua própria
avó. Benjamin deve ter conseguido convencê-la a permanecer quieta. No fim
das contas, eles são inteligentes, pois sabem que se disserem algo errado vão
se dar mal.
Assim como Olivia, sua mãe, a tal Eleonor, não gostou nada da
notícia do nosso casamento. Ficou dizendo que não precisávamos ter pressa,
que tínhamos acabado de noivar, que precisávamos de tempo para nos
acostumarmos a isso. Acho que ela é como sua filha, um tipo de cobra
traiçoeira. Ela deve estar torcendo para Olivia e Benjamin conseguirem a
presidência da Simon’s. Ela tem mais a ganhar com isso do que se Andrew
herdar esse cargo. Eleonor é uma mulher bem séria, com uma pose arrogante
e toda metida. Acho que a filha herdou tudo isso dela. A mulher nem me
cumprimentou quando me conheceu e até agora não disse nenhuma palavra
dirigida diretamente a mim. Não que eu queira, por mim podem costurar sua
boca. Já basta ouvir Olivia, imagina ouvir o ser humano desprezível que a
educou dessa forma.
O marido de Eleonor, Saul, é um homem bem reservado, quieto e
calado. Ele prefere ficar em seu canto e não se intromete em nenhuma
conversa. Ele também não é exatamente simpático, mas quando tenta ser,
falha miseravelmente soltando alguma piadinha sem graça ou falando coisas
sem muito sentido. Acho que ele é tipo um pau mandado pela mulher, porque
é só Eleonor dizer algo como “Saul, corte o bife para mim” e ele vai lá e faz.
Ou então “Saul, me acompanhe até o banheiro”, e ele vai lá e faz. Ou ainda
“Saul, esfregue meus pés, estão doloridos”, ele vai lá e faz. É simplesmente
ridículo. Ela pisa nele sem dó nem piedade.
Já Lorenna é um amor de pessoa, muito querida, atenciosa e também
divertida. Percebi então que era óbvio que ela fosse a mãe de Abigail, já que
eram fisicamente muito parecidas. Com os mesmos cabelos vermelho-
acobreados e os olhos castanhos suaves. Descobri que ela foi casada cinco
vezes, o pai de Abby foi seu marido número três, enquanto o pai de Addison
foi seu marido número cinco. Agora ela está sozinha, divorciada do último
marido. Disse durante nossa conversa que não pretendia se casar mais, que já
havia sido iludida o suficiente. Só que ficou muito feliz com o anúncio do
nosso casamento e disse que Andrew e eu fazíamos um bonito casal. Apenas
concordei.
A irmã de Abigail, Addison, é uma moça calada, completamente
diferente da irmã. Ela dó dizia algo se você se dirigisse diretamente a ela. Ao
contrário da mãe e irmã, ela tem os cabelos bem escuros, quase pretos. Os
olhos também, bem escuros. Ela é simpática, embora seja tímida. A não ser
com os familiares, com quem parecia se soltar mais. Flagrei a ela e à irmã
comentando sobre o penteado horroroso de Eleanor. Andrew ouviu e se
inclinou em direção a ela para dizer alguma besteira em seu ouvido. Addison
soltou uma gargalhada e empurrou Andrew com o cotovelo. Sorri, mesmo
sem saber o que se passava entre eles.
Elizabeth estava muito feliz, extremamente alegre. Nunca a vi tão
empolgada e animada. Senti-me péssima, porque sabia que ela estava assim
pelo casamento falso com o qual concordamos. Não queria magoá-la, mas
agora já estava feito, não podia voltar atrás. Eu preciso muito do dinheiro, se
desistir de tudo posso me considerar uma sem teto junto a toda a minha
família. Isso não pode acontecer, eu tenho que ajudá-los, tenho que salvar
minha irmã, cunhado, sobrinho e também ao meu pai. Eles precisam de mim,
e eu não posso vacilar.
— Jamie. — Andrew toca o meu braço, despertando-me dos meus
devaneios. Olho para a sua mão pousada sobre a minha pele. Jamais pensei
que fôssemos ter um contato tão próximo como aquele beijo que ele me deu.
Foi estranho, diferente dos outros beijos que já ganhei, mas foi bom. Fiquei
nervosa, mas também ansiosa. Como se desejasse que ele me beijasse, mas
soubesse o quão errado era tudo aquilo. No fim das contas ele se afastou até
muito rápido, e nosso contato foi quebrado.
— Humm? — murmuro.
— Tia Lorenna está falando com você — ele explica apontando o
dedo para o fim da mesa.
Olho para Lorenna que me encara de volta, ansiosa.
— Desculpe, não ouvi — digo. — O que você perguntou?
— Perguntei sobre sua família — ela diz. — Seus pais são de Nova
Iorque? O que eles acham do noivado? Tem irmãos?
— Minha mãe morreu quando eu tinha dez anos — respondo.
— Oh, sinto muito.
— Tudo bem, faz tempo. Meu pai mudou-se para o Texas e vive em
uma fazenda com minha tia e meus dois primos. Ele ainda não sabe sobre o
nosso noivado, como eu disse, tudo aconteceu muito rápido.
— Mas vocês ainda mantêm contato? — Lorenna pergunta. — Vocês
são próximos?
— Sim, nós mantemos contato. — Sorrio. — Infelizmente não o vejo
faz alguns meses, pois não tive condições de viajar para visitá-los. Mas
somos muito próximos, sim.
— Então é melhor você contar sobre o casamento logo — ela
aconselha. — Afinal, se depender da mamãe vocês se casam essa semana.
— Vamos ligar para ele amanhã — Andrew diz. — Faço questão de
pedir a mão de Jamie para ele.
— Vai ligar para pedir a mão dela? — Lorenna faz uma careta,
horrorizada. — Andrew, querido, não se pede a mão de alguém por telefone.
Andrew solta uma gargalhada ao meu lado.
— Ah, tia, e você acha que eu vou viajar para o Texas só por isso? —
Andrew pergunta, balançando a cabeça e rindo.
— Na verdade era exatamente o que você tinha que fazer, Andrew —
Elizabeth intromete-se.
— E ele vai! — afirmo. — Ele vai sim ao Texas, pedir a minha mão
para o meu pai.
— O quê? — Andrew me encara. — Não, nada disso. Vamos ligar e
pronto.
— Andrew, querido. — Pouso minha mão sobre a perna dele por
baixo da toalha e dou um aperto. — Nós vamos para o Texas sim, você
lembra que eu disse que pediríamos a bênção dele juntos?
Andrew coloca a mão sobre a minha em sua coxa e aperta de leve,
tentando se soltar.
— Meu bem, você não disse nada sobre viajarmos para outro estado
— Andrew diz esmagando meus dedinhos. — Não tenho tempo para isso,
tenho muito trabalho.
— Andrew, é a minha condição! — sussurro.
— Não posso ir para o Texas! — ele sussurra de volta. — E tire suas
unhas da minha coxa, caramba, isso dói.
— Se não disser agora que vamos para o Texas, então digo que não
vou me casar — ameaço.
— Você não faria isso.
— Quer ver? — provoco.
— Tudo bem, vamos para o Texas — Andrew diz alto o bastante para
todo mundo ouvir.
Tiro minha mão da coxa dele e pouso sobre a mesa.
— É por isso que eu o amo. — Sorrio. — Andrew faz qualquer coisa
por mim.
— Sempre, querida, sempre. — Andrew me lança um sorriso falso
com dentes cerrados.
— Que lindos! — Lorenna exclama. — É tão lindo ver um casal
jovem apaixonado. Ah, Andrew, você tem tanta sorte, sua noiva é
encantadora. Diga-me, Jamie, como você foi se envolver com o meu
sobrinho? Não consigo imaginar Andrew com alguém como você, tão
certinha, tão romântica. Contem-me como foi o seu primeiro encontro, estou
curiosa.
— P-Primeiro… encontro? — Andrew gagueja.
— É, o que vocês fizeram? — Lorenna prossegue. — O pai de
Abigail me levou para esquiar, ele era muito aventureiro. Já o pai de Addison
me levou para velejar. Meus outros maridos me levaram ao teatro e também
para patinar, um me levou ao parque de diversões. Esse último foi horrível,
era meu primeiro marido e ficamos casados só um ano. O que vocês fizeram?
— O-o que… nós… fizemos? — Andrew gagueja novamente,
olhando para mim.
— O Andrew adora contar essa história — digo, rindo internamente
do horror em sua expressão. Bem feito! Eu disse para combinarmos algo, e
ele negou. Agora se vira! — Vai, querido, conta para a sua tia o que nós
fizemos no primeiro encontro.
— Eu… Hã… Nós… Eu a levei para jantar — Andrew diz.
Lorenna pisca.
— Só? Você a levou para jantar?
— No melhor restaurante da cidade — Andrew prossegue.
— E? — Lorenna insiste.
— E bebemos champanhe — ele completa.
Meu Deus! Andrew é terrível!
— Não foi bem assim — resolvo me intrometer para salvá-lo. — Ele
me parou um dia no trabalho e disse que estava de olho em mim há algum
tempo. Disse que amava meu café e que eu tinha uma boca linda.
Jackson contém uma gargalhada, Andrew mexe-se inquieto na
cadeira.
— Ele me perguntou se eu gostaria de jantar com ele, e eu aceitei. Foi
me buscar em casa e me levou a um ótimo restaurante, onde tivemos uma
conversa agradável. Andrew era todo elogios e não tirava os olhos de mim.
Eu o achei tão meigo, tão fofo e romântico.
— Meigo, fofo e romântico? — Abigail cai na gargalhada.
— Ei! Não foi exatamente assim! — Andrew protesta. — Eu só
estava tentando conquistá-la, ok? Eu fui muito macho! Ela ficou doidinha
quando eu disse que ia mostrar um lugarzinho especial onde poderíamos ficar
sozinhos. Aceitou de cara!
— E aonde você a levou? — Lorenna inclina-se para frente curiosa.
— Ele me levou até o topo do Empire State! — exclamo. — E era
noite, então nós ficamos lá em cima no alto vendo as estrelas. Foi incrível…
— Estrelas? Aham — Andrew concorda com o maxilar cerrado. — A
gente também deu uns pegas lá em cima, ela não resistiu ao meu charme.
— Ah, foi só um beijinho — desconverso. — Ele sempre quer
aumentar as coisas, nunca vi! A verdade é que eu sempre fui muito difícil,
sabia que seria errado termos algo no primeiro encontro. Dei só um selinho
para agradecer.
— Ah, sim, ela era tão difícil que transamos na primeira semana —
Andrew diz.
Chuto a canela dele com a maior força que consigo reunir.
— Porra, ai!
— Acho que já ouvimos o bastante! — Abigail interrompe para nos
salvar. — Não queremos saber da intimidade do casal, né? Que tal pedirmos
a sobremesa?
— Ah, tava ficando divertido! — Jackson protesta.
— Cala a boca. — Abigail lhe dá uma cotovelada.
— Nunca pensei que Andrew pudesse ser tão romântico. — Lorenna
suspira. — Ah, querido, deve ter sido um lindo encontro.
— Foi sim — afirmo.
— Eu vou pedir para trazerem a sobremesa — Elizabeth diz. —
Jamie, você me acompanha?
— Sim, senhora — respondo hesitante.
Levanto-me e sigo Elizabeth para dentro da casa. Nós vamos até a
cozinha, e ela pede as empregadas para servirem a sobremesa. Novamente é
um banquete, só que de doces. Estou louca para voltar para a mesa e
experimentar um pouco de tudo. No entanto, assim que as empregadas saem
nós permanecemos sozinhas na cozinha. Quando meus olhos encontram os de
Elizabeth um arrepio corre pela minha espinha, fico nervosa imediatamente.
Agora somos só eu e ela. Ninguém está aqui para me ajudar a mentir.
— Jamie, você já contou ao meu neto como nos conhecemos? — ela
pergunta. — Ele sabe como você conseguiu aquele emprego na Simons?
Andrew está ciente do seu passado?
— Não — respondo sinceramente. — Eu nunca disse nada a ele.
— Você está bem, Jamie? — ela prossegue. — Você está realmente
bem? Ou é só algo que você diz o tempo todo?
— Estou bem, senhora Simons, de verdade.
— Precisa contar ao meu neto mesmo assim — ela continua. —
Andrew tem o direito de saber. Você não pode esconder isso dele de qualquer
forma.
— Eu preciso de tempo — digo. — Não é algo fácil de dizer, meu
passado está enterrado e eu gostaria que permanecesse assim.
— Jamie, se o Andrew te ama de verdade, ele vai se sentir
decepcionado se você não contar. Agora que serão marido e mulher, não
devem esconder nada um do outro. Você precisa confiar nele, e ele em você.
Eu sei que aquilo ficou no passado, que agora você está bem e aquilo não te
afeta mais, porém, não é algo definitivo. E se você tiver que passar por tudo
aquilo de novo? Nunca me esquecerei de tudo o que passou. Você precisa
contar a ele, para torná-lo forte o suficiente para ser a sua base no momento
que você precisar. Se você não disser nada, pode acabar surpreendendo-o de
uma forma horrível.
— Eu não quero falar sobre isso agora, senhora Simons.
— Só estou alertando você — ela diz suavemente. — Conheço o meu
neto, Andrew parece forte, mas ele é apenas um menino assustado, isso vai
mexer com ele.
— Vou contar — minto. — Contarei quando estiver pronta.
— Tudo bem. — Ela sorri. — Estou feliz que você agora faz parte da
minha família. Acho que um anjo colocou você na minha vida. Primeiro para
me salvar, e agora para salvar o Andrew.
— Você também me salvou, senhora Simons, e eu a agradeço por
isso.
— Venha, vamos voltar para o jardim com os outros. — Ela me
estende a mão.
— Eu preciso usar o banheiro primeiro — informo. — Onde fica?
— No final do corredor, última porta à direita.
— Obrigada, com licença.
Fujo para o banheiro e me tranco lá dentro. Ligo a torneira e lavo o
meu rosto nem me importando em retirar minha maquiagem. Ofego em frente
ao espelho e depois respiro fundo várias vezes. Sinto-me sufocada. Por que
ela tinha que tocar nesse assunto? Por que ela tinha que me lembrar disso?
Faz tanto tempo! Luto todos os dias para esquecer o meu passado, que
continua me perseguindo no presente, embora ninguém saiba. Minha família
custou a parar de tocar nesse assunto, a aceitar que já passou. Por que
Elizabeth não pode fazer o mesmo? Até entendo por que ela gostaria que eu
contasse ao Andrew. Só que nosso noivado é de mentira. Não o amo, nem ele
a mim. Não somos um casal de verdade, portanto, não preciso lhe contar tudo
sobre mim. Isso inclui meu passado, que pretendo manter guardado.
Preciso me acalmar, me concentrar. Deixar de pensar nisso. Já tenho
muitos problemas e relembrar isso não é bom para mim. Seco o meu rosto e
encaro meu reflexo no espelho. Não sou forte o bastante, mas ninguém
precisa saber disso. Posso esconder minha fraqueza e é exatamente o que eu
vou fazer.
Abro a porta para retornar aos jardins e encontro Olivia no corretor.
Ela está encostada casualmente na parede, olhando para o seu reflexo no
espelho do corredor. Quando ela me vê, ergue-se em toda a sua altura e me
encara com aqueles olhos castanhos tenebrosos. Mas não tenho medo dela,
não mais. Ela sempre me encurralava e me assustava por causa de suas
ameaças ao meu emprego. Agora não preciso dela para manter minha família
viva. Não abaixarei minha cabeça diante dessa mulher nunca mais.
— Olha só quem está aqui. — Olivia se aproxima. — A golpista.
— Golpista? — repito.
— Ah, querida, vamos lá. Você pode ter enganado toda a minha
família, mas não me engana. Nem você, nem Andrew. Ele nunca se
envolveria com uma pobre coitada como você. O mais engraçado é que
Andrew só ficou noivo quando soube que Benjamin assumiria a presidência
da Simon’s. Vovó é uma tola por acreditar nessa mentira, mas eu não.
— Eu não sei do que você está falando, Olivia.
— Você sabe sim — ela prossegue. — Você é apenas um verme na
sola do meu sapato. Cedo ou tarde eu vou esmagá-la, e o seu conto de fadas
terá terminado.
— Escute aqui, Olivia, e escute muito bem, porque eu não vou repetir
— digo, dando um passo à frente e ficando cara a cara com ela. — Se você
me ameaçar novamente eu vou dar um soco tão forte na sua cara que nenhum
maquiador, por melhor que seja, vai conseguir esconder o hematoma. Estou
cansada das suas humilhações, não preciso ouvir isso e eu não vou. Não
trabalho mais para você.
— Você vai pagar muito caro por tudo isso, Jamie. Sabia que havia
uma vigarista por baixo da cara de sonsa — Olivia sibila entredentes. —
Você não faz ideia de com quem está lidando. Vou tornar a sua vida um
inferno.
— Eu sei, você é o diabo em pessoa. Mas, Olivia, você também não
faz ideia do que eu sou capaz. Então fique fora do meu caminho.
— Ora essa. — Ela ri cinicamente. — Finalmente mostrando quem
você é de verdade. Pensei que era uma tola, uma garota patética que não
tivesse cérebro.
— Nossa conversa terminou, Olivia, estou voltando para o meu noivo.
Passo por ela, esbarrando em seu ombro de propósito, e sigo em
direção à cozinha.
— Vou desmascarar vocês dois! — Olivia grita atrás de mim.
— Tente, se você for capaz! — é a última coisa que digo, antes de
retornar aos jardins.
Sei que não deveria provocar Olivia e incitá-la a nos desmascarar.
Mas essa mulher me tira do sério! Eu a aguentei por tanto tempo, estou
cansada de abaixar a cabeça. Não farei isso nunca mais. Se eu tiver que
enfrentá-la, então que seja. Tenho que alertar Andrew de que ela desconfia da
nossa farsa. Jackson e Abigail precisam saber também, precisamos estar
preparados para qualquer coisa. Olivia joga sujo e ela não vai medir esforços
para nos derrubar.
Volto para o jardim, onde todos estão comendo as sobremesas e rindo
juntos. Sigo para o meu lugar e sento-me ao lado de Andrew. Apesar de
adorar doces, perdi completamente a vontade.
— Tudo bem com você? — Andrew pergunta-me.
— Sim, estou bem — minto.
— Vovó disse algo para você lá dentro?
— Não, nada de mais — minto novamente.
— Que bom, parece que estamos indo bem.
— Olivia está desconfiada — conto a ele. — Ela me abordou no
corretor e disse que fará de tudo para nos desmascarar.
— Eu já imaginava. — Andrew suspira. — Isso é uma guerra, Jamie,
somos eu e você contra ela e Benjamin.
— Vamos vencer — afirmo.
— Eu sei, somos uma boa equipe. — Ele sorri, mas depois seu sorriso
morre. — Exceto quando você se transforma em um monstro de garras que
ataca as pessoas por baixo da mesa.
— Você pediu aquilo.
— Não pedi, não.
— Eu disse que deveríamos ter combinado um primeiro encontro —
relembro-o.
— Achei que não seria necessário.
— Você vai ter que começar a me escutar, sabe?
— Vou tentar. — Ele dá de ombros.
***
Passo a tarde toda na casa de Andrew. Mesmo depois que Eleonor,
Saul, Olivia e Benjamin vão embora, ainda permaneço. Andrew me mostra a
casa toda, onde provavelmente vou morar com ele depois que nos casarmos.
O lugar é imenso e fantástico. Não consigo nem me imaginar vivendo ali, é
surreal. Abigail me mostra o seu quarto e nos tranca lá dentro enquanto ela
me mostra suas coisas. Ela tem de tudo dentro do quarto: Obras de artes,
quadros, fotografias, roupas da época em que fazia teatro. Seu quarto é quase
do tamanho do meu apartamento todo. Tem uma grande cama de dossel que
domina o quarto, uma televisão e também uma escrivaninha com seu
notebook de última geração. Ela também tem muitas prateleiras cobertas de
livros de todos os gêneros, mas principalmente de fotografia. Em resumo, seu
quarto é a sua cara. Não imagino aquele lugar de outra forma.
Depois de bisbilhotar tudo, inclusive o quarto de Andrew. Nós
tomamos café juntos, novamente no jardim. Eu me sinto tão à vontade de
estar ao redor deles que é até estranho. Como se já fossem minha família.
Noto que com Jackson é a mesma coisa, ele se sente à vontade para circular
por qualquer lugar e fazer qualquer coisa. A diferença é que Jackson
frequenta essa casa desde pequeno, e Elizabeth o considera como um neto
também. Eu só estou aqui há algumas horas, mas sinto que será fácil viver
aqui e conviver com essas pessoas. Isso é bom, eu acho. Vai me ajudar a
desempenhar meu papel melhor ainda. Porque é claro, tudo isso não passa de
uma encenação.
Quando está tarde, finalmente me despeço de todos. Lorenna fica
triste com a minha partida, mas prometo retornar em breve. Abigail sussurra
que fiz um ótimo trabalho e que ela está orgulhosa de mim. Depois ela me
abraça. Jackson também me abraça e agradece por eu ter salvado seu
emprego. Sou obrigada a rir, ele é tão cara de pau quanto Andrew. Meu falso
noivo me acompanha até o carro e abre a porta para mim como um perfeito
cavalheiro. Depois se senta no banco do motorista e conduz o carro para fora
da propriedade.
— Você foi muito bem hoje, Jamie — Andrew elogia. — Todos
gostaram de você.
— Sua tia Eleonor não parece ter gostado muito de mim.
— Claro que não. Ela é como Olivia.
— Elas serão um problema para nós, não é?
— Provavelmente.
— Não me importo — digo.
— Eu também não — ele diz. — Apareça no escritório amanhã,
vamos escolher um cargo novo para você. Também conversar sobre essa
viagem para o Texas.
— Tudo bem — concordo. — Você acha que eu devo aceitar o cargo
que Benjamin me ofereceu?
— Eu não sei, foi bem estranha a proposta, na verdade. Vamos ver
amanhã.
— Ok.
— Você mora aqui? — Andrew pergunta-me, encostando o carro no
meio-fio.
Olho para o pequeno prédio azul, com paredes descascadas e um
jardim feio na frente. É horroroso perto da mansão onde ele vive. Mas é a
minha casa, é o lugar onde estou vivendo com a minha família. Nós
batalhamos para conseguir viver ali. Não me envergonho disso. Não nasci em
um berço de ouro como Andrew. Tudo o que eu tenho na vida é pelo o meu
esforço para conseguir. Mas não posso dizer isso a ele, porque provavelmente
não me entenderia. Será que Andrew já teve que batalhar por algo? Não, acho
que nunca.
— Sim, é aqui — afirmo.
Andrew desce do carro, dá a volta ao redor dele e abre a porta para
mim. Desço segurando a minha bolsa e de repente sinto-me constrangida. Se
ele fosse o meu noivo de verdade o que eu faria? Convidaria para entrar?
Daria um beijo de despedida? Ou simplesmente acenaria e iria embora? Sou
salva dessas perguntas quando ele prossegue caminhando e abre o portão de
ferro enferrujado. Passo à sua frente e sigo para a porta. Paramos os dois lá,
olhando um para o outro totalmente desconfortáveis, sem ter ideia do que
dizer agora. Até que ele resolve falar.
— Obrigado, Jamie — agradece-me. — Obrigado por concordar em
se casar comigo, você está salvando a minha pele.
— Novamente — acrescento. — Estou salvando sua pele novamente.
— Sim. — Ele ri. — É verdade.
— Eu tenho que entrar — digo apontando para a porta.
— Ah, claro. — Andrew desce os dois degraus e acena para mim. —
Até amanhã então.
Meu coração está batendo tão rápido, tão rápido. Meu Deus, o que
está acontecendo comigo?
— Andrew? — chamo.
— Sim? — Ele se vira novamente.
Desço os dois degraus e corro até ele. Não penso em nada quando me
ergo na ponta dos pés e planto um beijo em sua bochecha. Afasto-me
devagar.
— Obrigada por tudo — murmuro.
— Tá, claro — ele sussurra, sem reação.
Viro-me e caminho para dentro, desta vez, não paro nem olho para
trás. Meu coração bate tão forte dentro do peito que eu posso até mesmo
escutá-lo. Só quando chego ao meu apartamento e me tranco lá dentro é que
ouço o barulho do motor do carro se distanciando. Desabo no sofá e suspiro,
aliviada por tudo ter dado certo.
Tomo um susto quando ouço um barulho e de repente Bilbo pula
sobre a minha barriga. Enrola-se em uma bola e dorme ali mesmo. Ninguém
mais está em casa.
— É, amiguinho, somos somente você e eu.
CAPÍTULO DOZE
--—————————————————————————————

Andrew

Jamie aparece no meu escritório bem cedo, em seu antigo horário


normal de trabalho. Tracy é quem me avisa de sua presença, e eu peço que
libere a entrada dela. Alguns segundos depois ela abre a porta do escritório e
caminha para dentro, fechando a porta atrás de si. Imediatamente paro o que
eu estou fazendo e olho para ela apenas para ter a certeza de que eu não estou
ficando louco. Que merda é essa? Ela está com os cabelos amarrados em um
coque apertado no alto da cabeça e realmente isso não é o que me incomoda.
Mas, sim, o fato de ela estar usando uma calça preta ridiculamente larga e
uma camisa branca de seda abotoada até o pescoço. E seus sapatos? Cristo,
isso pode ser considerado sapatos? Parecem sapatilhas marrons, só que com
pequenos saltos baixos quadrados. É ridículo. Ela toda está ridícula
novamente. Até a minha avó consegue se vestir melhor.
— Oi. — Ela acena se aproximando.
— O que é isso? — pergunto, agitando a caneta na minha mão em
direção ao seu visual.
— O quê? — Ela olha para baixo conferindo sua roupa,
completamente inocente.
— O que aconteceu com a executiva sexy? — pergunto. — Por que
você voltou para o estilo freira?
— Estilo freira? — Ela dá uma risadinha. — Do que você está
falando?
— Eu estou falando dessas malditas roupas que você não deveria estar
usando — explico. — Abigail não gastou a porra da minha fortuna para que
você se vista desse jeito! Ou será que é esse tipo de roupa que
Dolce&Gabanna estão fabricando agora?
— Você não espera que eu vista aqueles vestidos elegantes o tempo
todo, né? Ou aqueles saltos exageradamente enormes e aquelas joias
brilhantes e chamativas?
— Sim, é exatamente o que eu espero que você faça. — Bufo. — Ou
você acha que eu liberei o meu cartão de crédito para você e Abigail
brincarem de Barbie só por um dia?
— Eu não posso usar aquelas coisas o tempo todo! — ela reclama. —
Odeio saltos! Não me sinto bem de vestido!
— Aprenda a gostar — replico. — Essa é a última vez que eu vou ver
você vestindo essas roupas, ok?
— Não — ela protesta. — Andrew, isso não está no acordo! Você não
pode decidir o que eu visto!
— Deixa de ser ridícula — resmungo. — Você quer ficar feia, é isso?
O que você tem contra pessoas bonitas? O que você tem contra ser bonita?
— Eu não sou bonita! — ela protesta.
— Você é — afirmo, abaixando a voz. — Eu acho você bonita.
— Você me acha bonita? — ela pergunta soando divertida.
— Acho.
— Mas só com Dolce&Gabanna, certo? Como eu estou agora você
não me acha bonita?
Olho para os seus olhos. Não, ela não está feia como eu pensava que
ela era no começo. É como se depois de vê-la usando aquele vestido, toda
poderosa e deslumbrante, eu tenha percebido o que há por baixo de todo esse
estrago que ela mesma provoca em si. Mesmo agora, quando ela está
completamente ridícula com essas roupas, eu não consigo achá-la feia.
Porque agora eu sei o que há escondido nela. Agora eu sei como ela é linda, e
mesmo que ela tente estragar essa imagem que eu tenho dela guardada na
minha mente é impossível. Está cravada, enraizada. E esses olhos, eles são
incríveis, eu nunca poderia achá-los feios. Mas o que eu estou fazendo? Eu
não deveria estar pensando sobre isso. Ela não está apresentável como
deveria estar para se passar por minha noiva. Eu tenho que mentir, porque
preciso que ela se torne mais do que isso. Preciso mostrar a Jamie o quanto
de poder ela tem com ela, quão magnífica ela pode ser. Quero que os outros
vejam isso também, quero que eles compreendam a mudança. Quero que
percebam que ela é uma nova mulher, e eu só vou conseguir isso se mentir. É
por isso que é exatamente o que eu faço.
— Você está ridícula — digo e acrescento mentalmente: Mas não está
feia. Em vez disso, digo bem alto e firme para que ela possa me ouvir. —
Trate de voltar a usar as roupas que foram compradas para você, porque eu
preciso de uma noiva realmente bonita. E você não está ajudando nem um
pouco neste momento.
Vejo um lampejo de dor e humilhação brilhar em seus olhos e quase
penso em voltar atrás e me desculpar. Mas rapidamente ela esconde suas
emoções e respira fundo.
— Você é um idiota, Andrew Simons — ela resmunga.
— Você pode me xingar, se isso significa que vai usar as roupas que
foram compradas para você — digo.
— Vou usar as malditas roupas! — Jamie sibila.
— Ótimo, parece que finalmente nos entendemos. Você quer um
café? O que você bebe?
— Não quero nada — responde-me, ainda chateada.
Pego o telefone sobre a minha mesa e ligo para Tracy, ordenando que
ela nos traga dois cappuccinos. Quando desligo, Jamie já se acomodou na
poltrona à minha frente.
— Não começamos bem hoje — digo a ela. — Vamos tentar
novamente. Bom dia, Jamie.
Ela estreita os olhos para mim como se estivesse me avaliando e
suspira derrotada.
— Bom dia, Andrew. — Sarcasmo pinga em suas palavras, estou
quase sorrindo, quase.
— Como você está? — pergunto tranquilamente encostando-me na
minha poltrona.
— Bem, e você?
— Estarei melhor quando começarmos a tratar dos nossos negócios.
— Por mim tudo bem. — Ela dá de ombros. — Por onde começamos?
Estou prestes a falar quando somos interrompidos por Tracy. Ela abre
a porta e entra com uma bandeja na mão, que deposita sobre a minha mesa.
Pego o meu cappuccino e passo a outra xícara para Jamie. Tracy pega a
bandeja e retorna para a porta, no entanto, ela faz uma pausa e olha para trás.
— Posso perguntar uma coisa para vocês dois?
— Não — respondo, ao mesmo tempo em que Jamie assente.
— Pode.
— Eu ouvi boatos de que estão noivos. — Tracy aproxima-se. — É
verdade?
Jamie lança um olhar nervoso a mim. Ela sabe que eu transo com
Tracy, ela nos pegou juntos.
— É, estamos noivos — respondo.
— Oh. — Tracy larga a bandeja sobre a minha mesa e senta-se na
poltrona ao lado de Jamie. Pergunto-me o que ela acha que está fazendo. —
Faz muito tempo que estão juntos?
— Não é da sua conta — resmungo. Mulher metida!
— Andrew — Jamie repreende-me. — Não, Tracy, faz pouco tempo.
— Ai, meu Deus! — ela exclama. — Aquele dia…? Aquele dia que
você nos viu juntos, vocês já estavam juntos, não é?
— Tracy, ninguém pode saber sobre aquele dia, você entende? Temos
que manter isso em segredo.
— Agora entendi tudo! — Tracy exclama. — Ai, meu Deus! Vocês
curtem trocas de parceiros, é isso? Ménage? Jamie, que safadinha!
— O-O quê? — Jamie gagueja.
— Só pode ser isso! — Tracy sorri. — Mas não se preocupe, eu não
vou contar a ninguém nosso segredinho sujo, prometo. Agora eu entendi por
que você não ficou brava quando nos pegou no flagra! Você gosta de dividir,
né? Ai, isso é ótimo, porque eu também gosto! Nós podemos combinar de
nos ver os três, o que acham?
— Não — Jamie diz. — Não, você entendeu tudo errado.
— Tracy, pare com isso — interrompo. — Não vamos nos encontrar
todos juntos, não há nenhuma troca de parceiros ou qualquer merda assim.
Você só tem que esquecer que Jamie nos flagrou, entende?
— Eu não vou contar, juro — ela promete. — Mas isso não quer dizer
que não vamos mais ficar juntos, certo? Quero dizer, a Jamie parece ter
aceitado bem quando nos viu juntos.
— Na verdade, vocês não vão ficar mais juntos — Jamie responde. —
Eu não vou ser uma esposa corna, Tracy, sinto muito.
— O quê? Como assim? — Tracy olha na minha direção. — Não
vamos mais transar nas segundas e quartas?
— Não, Tracy, sinto muito, acabou — respondo.
— Mas… Mas…
— Olha, Tracy, Jamie e eu vamos nos casar. Ela vai continuar
trabalhando aqui na empresa, e não será bom manter esse tipo de
relacionamento desse jeito — explico.
— Eu não sei se vou conseguir desse jeito — Tracy admite.
— Ah, querida, mas você vai ter que conseguir — Jamie diz, com
uma ferocidade que implica que ela está falando sério, quase como se
estivesse irritada. — Eu sinto muito estragar a sua transa de segunda e quarta-
feira. Mas quer saber? Eu nunca poderia ser casada com alguém que me
traísse. E Andrew precisa de mim, assim como eu preciso dele. Não é
mesmo, Andrew?
— Infelizmente — murmuro.
— Bom, de qualquer forma, tudo o que eu quero é lealdade e
fidelidade — Jamie conclui.
— Então acabou? — Tracy pergunta-me lançando um olhar triste.
— Sim, acabou — digo.
— Eu… Eu acho que vou voltar para a minha mesa — ela diz
pensativa. — Eu vou… Trabalhar.
Sem mais o que dizer, Tracy levanta-se, pega a bandeja e deixa o
escritório. Tenho pena dela, mas sei que ela vai superar. Nós nunca tivemos
nada sério, foram apenas algumas transas. Ela era boa, e ótima para
descarregar o estresse do escritório. Mas agora que vou me comprometer com
Jamie não posso fazer mais isso. Não posso correr o risco de ser pego por
Jamie, vovó ou qualquer outro funcionário enquanto estou transando com a
minha secretária. Não, infelizmente secretárias estão fora de quesito. Bem, a
não ser que não seja uma secretária que não trabalhe na construtora. Assim,
posso até rever meus planos.
— Ela não parece contente — Jamie diz. — Será que ela vai dizer
algo?
— Ela vai ficar bem — respondo. — E não, ela não vai dizer nada.
Tracy precisa do emprego e, mesmo que ela esteja chateada, sei que não é o
tipo de pessoa que prejudicaria alguém.
Jamie suspira e bebe um gole de seu cappuccino. Uma careta contorce
suas feições antes de ela afastar a xícara e colocá-la sobre a minha mesa.
— Eca. Definitivamente Tracy não sabe preparar um bom café.
Bebo um gole da minha xícara e quase cuspo sobre a minha mesa.
Uh, que droga é essa?
— Prefiro o seu — admito.
Jamie olha para a minha xícara, e dá uma risadinha. Suas bochechas
começam a ficar vermelhas.
— O que é engraçado? — pergunto.
— Ah, nada não. — Ela balança a cabeça. — É só que você
admitindo que eu faço um bom café é algo que eu gostaria de ter ouvido
antes.
— Eu nunca escondi que gosto do seu café — explico. — Eu só…
Nós não nos conhecíamos direito. Mas agora você sabe, eu gosto do seu café.
— É que eu tenho um ingrediente secreto que deixa o café muito
melhor. Até Olivia admitiu isso um dia — Jamie diz, sorrindo de uma forma
esquisita, quase como se ela estivesse falando sobre algo que eu não consigo
captar.
— Podemos voltar aos negócios? — pergunto.
— Sim, senhor — ela concorda. — Aliás, eu tenho algo para dizer a
você. Minha irmã quer que você vá jantar hoje à noite lá em casa. Olha, eu
juro que tentei explicar que você é ocupado. Mas não adianta, ela quer
conhecer você e Jane é insistente. De qualquer forma uma hora ou outra você
vai ter que enfrentá-la, então acho melhor que seja logo.
— Jantar na sua casa?
— Sim
— Tudo bem — concordo. — Assim acabamos logo com isso. Que
horas devo estar lá?
— As 19h30min está bom pra você?
— Claro.
— Ah, e, Andrew, a minha irmã pode ser quase tão pior para cozinhar
quanto Tracy para preparar um café. Estou tentando convencê-la a pedir o
jantar, mas não posso garantir nada. Como eu disse, ela é insistente. Se você
não se sentir bem tendo que enfiar a comida dela a goela a baixo, invente que
está passando mal.
Sorrio, essa garota é estranha e engraçada.
— Tudo bem, Jamie, posso lidar com isso — afirmo.
— Agora podemos falar de negócios. — Ela inclina-se para frente. —
Sobre o que você quer falar?
Abro a boca para falar quando sou interrompido novamente. A porta
do escritório abre, e Jackson enfia a cabeça para dentro, certificando-se de
que estamos ali. Ele entra e fecha a porta atrás dele. Eu deveria me sentir
incomodado que ele não bate antes de entrar. Só que eu não me sinto, porque
Jack é um metido e somos assim desde sempre. Também não peço para entrar
em seu escritório, simplesmente entro. Seu apartamento é o meu apartamento
também, porque eu circulo por lá, fazendo e mexendo onde eu quero. Somos
assim desde que eu o conheço. Nós nunca tivemos barreiras, sempre fomos
abertos e parceiros em tudo.
— Ei. — Jack acena para nós. — Tudo bem por aqui?
— Ei, Jack, você fez o que eu pedi? — pergunto.
— É por isso que eu estou aqui. — Jack pisca.
Ele se aproxima e senta-se no meu sofá de canto.
— Jamie, já que nós temos que ir para o Texas para falar com o seu
pai, o que você acha de irmos na quinta-feira?
— Quinta-feira? — ela repete. — Vamos viajar para o Texas essa
semana?
— Sim. Quanto mais rápido fizermos isso, melhor.
— Ai, meu Deus. — Ela suspira. — Eu não vejo meu pai há tanto
tempo. Estou com tanta saudade. Quinta está ótimo.
— Bom, porque a vovó vai apressar esse casamento o máximo
possível — explico.
— Já que vocês se decidiram por quinta, vou mandar Tracy comprar
as passagens — Jack diz levantando-se.
— Não! — Jamie protesta. — Não, me desculpe, não posso.
— O quê? — pergunto. — Como assim?
— Não posso ir de avião. Eu odeio aviões, tenho medo, pânico de
aviões — Jamie explica, rapidamente.
— Jamie, quando você estiver lá dentro o medo passa — digo a ela.
— Precisamos pegar esse avião, entende? Você pode vencer seu medo, certo?
— Não! Não! Não! — ela nega. — Não vou entrar em um avião.
— Você pretende ir como então? — Suspiro impaciente. — De carro?
— Sim, claro — ela concorda. — De carro está ótimo.
— Jamie, nós não vamos de carro para o Texas — digo. — É uma
viagem de mais de um dia!
— Não vou de avião, Andrew! — ela diz mais uma vez, cruzando os
braços sobre o peito e fazendo biquinho.
Merda!
— Drew, cara. Pode ser bom ir de carro, vocês vão passar mais tempo
juntos — Jackson diz. — Vão se conhecer melhor e talvez parem de agir
como dois irmãos birrentos. Que tal?
— Foda-se — resmungo. — Vamos de carro, então, mas se ela me
abrir a boca para reclamar eu vou jogá-la no deserto e deixá-la para trás.
Jamie faz uma careta para mim, mas não diz nada.
— Ah, cara, os sintomas do casamento já estão atingindo vocês. —
Jackson ri.
— Jack concentre-se no que é importante, por favor — digo. — Você
já conseguiu uma vaga para Jamie aqui na empresa?
— Ah, sim, bom temos algumas coisas — ele diz ponderando. —
Tem uma vaga de supervisão dos escritórios no segundo andar. Temos uma
vaga na recepção e, bem… Temos uma vaga de secretária para Benjamin.
Infelizmente não podemos colocá-la em nada melhor do que isso, pelo menos
não enquanto ela não estiver na universidade.
— Descarte o escritório de Benjamin — digo. — Não faço ideia de
por que ele ofereceu isso para ela, mas deve ter alguma tramoia entre ele e
Olivia. Talvez eles a queiram perto para nos avaliar, descobrir se estamos
mentindo e o que podem fazer em relação a isso. É perigoso, não podemos
arriscar.
— Você pode estar certo, Drew — Jack responde. — Mas eu ainda
acho que essa é a melhor opção para ela. Olha, ela vai trabalhar no mesmo
andar que o nosso, podemos manter contato o tempo todo. Todos os passos
que Benjamin der, Jamie saberá. Todas as visitas de Olivia na sala dele,
Jamie também saberá. Eles podem ter oferecido essa vaga para manter um
olho em nós, porém, podemos usar isso a nosso favor e manter um olho neles.
— Você está dizendo para eu aceitar esse cargo e ser uma espiã para
vocês? — Jamie pergunta, encarando Jackson.
— Não gosto dessa ideia — falo.
— Jamie, é um emprego qualquer, mas eu não vou mentir e dizer que
não seria bom para nós que você estivesse lá de olho neles — Jackson
responde.
— Por mim tudo bem — Jamie concorda.
— Sério? — Jack parece surpreso.
— Sim, preciso de um emprego.
— Ainda não acho que seja uma boa ideia — argumento.
— Ela aceitou, então é isso. — Jack sorri. — Você será a nova
secretária de Benjamin Cooper.
O telefone sobre a minha mesa toca, nos interrompendo. Contrariado
eu aperto o botão e a voz de Tracy enche a sala, anunciando a presença de
Abigail, que aguarda do lado de fora. Dou permissão para sua entrada, e um
segundo depois a porta do meu escritório abre e um furacão desgovernado
entra. Ou seria apenas a minha prima?
— Que idiotice! — Abigail exclama batendo a porta com força. —
Desde quando tenho que pedir permissão para entrar?
— Estamos tendo uma pequena reunião, Abby — digo a ela. — E
você nem trabalha aqui.
— Você está jogando isso na minha cara? — ela pergunta. — Só
porque não trabalho aqui, não posso entrar? Por que todo mundo fica falando
isso pra mim? Juro por Deus, acho que vou mudar de profissão apenas para
esfregar na cara de vocês que também posso trabalhar aqui!
— Alguém não está de bom humor hoje — Jack diz irônico.
— Você. — Abigail diz apontando um dedo para Jack. — Cala a
boca, não estou falando com você.
— Bom dia, Abby — Jamie a cumprimenta com um sorriso amigável.
— Oi, Jamie! — Abby se aproxima, dá um abraço rápido em Jamie,
depois joga a bolsa sobre a minha mesa, espalhando e revirando minhas
coisas, e planta a bunda na beirada. — Sobre o que estão falando?
— Por que ela é tão metida? — Jack pergunta, acenando na direção
de Abigail.
Dou de ombros.
— Jamie e eu vamos viajar na quinta para visitar o pai dela no Texas,
a propósito, vamos de carro porque sua amiga aqui tem pavor de avião. Você
já pode dar os parabéns a ela pelo novo emprego, como secretária de
Benjamin — informo.
— Oh, sério? — Abigail pergunta a Jamie, e ela concorda. — Boa
sorte. Eu é que nunca conseguiria trabalhar com aquele traste. Você sabe que
vai ter que lidar com Olivia muito mais do que antes, né? Tem certeza de que
está pronta para isso?
— Na verdade estou — Jamie responde confiante.
— Boa sorte em aguentar Andrew durante a viagem para o Texas —
Abby acrescenta. — Se eu fosse você levava fones de ouvido e pacotes
intermináveis de Cheetos. Era o que eu fazia quando viajávamos juntos.
— O que você quer, Abigail? — pergunto.
— O que o leva a crer que eu quero alguma coisa? — Ela sorri.
— Eu conheço você, desembucha — digo.
— Preciso de dinheiro — Abby admite.
— Quanto? — pergunto, abrindo a gaveta da minha mesa para pegar
o talão de cheque.
— Quinhentos mil dólares — ela responde e acrescenta rapidamente.
— Eu sei… Eu sei você não vai me dar isso. No entanto, eu aceito a metade
se você puder me ajudar.
— Porra, Abby! Pra que você precisa de todo esse dinheiro?
— Eu quero fazer uma exposição na galeria — ela conta. — Mas
aquela urubu que eu sou obrigada a chamar de chefe não quer investir nesse
novo artista que encontrei. Drew, sério, o cara é incrível. As obras dele são
geniais, são épicas. Em tanto tempo eu nunca vi nada igual. Mas a urubu
simplesmente ignorou esse artista, ignorou minha ideia. Eu a convenci a
deixá-lo expor as obras na galeria caso conseguíssemos algum investidor.
Preciso que você seja meu investidor, por favor.
— Abby. — Passo a mão na cabeça e suspiro. — É muito dinheiro. E
se sua chefe estiver certa e ele não tiver talento? Se você fizer essa exposição
com todo esse dinheiro e não conseguir vender as obras? Vou ficar no
prejuízo, Abigail. Pior, eu não, mas a empresa vai. Vovó ficaria furiosa se
isso acontecesse. Por que você não pede a ela? Fale com a vovó, se ela
permitir eu libero a grana.
— Drew, você sabe que a vovó não vai permitir — Abigail diz
usando sua voz manhosa. — Por favorzinho, Drew, preciso de você. Esse
cara é um talento, vou vender as obras dele e você vai ganhar mais que o
dobro do dinheiro que investir. Acredite em mim.
— Quinhentos mil dólares não, Abby, sinto muito — respondo.
— Tudo bem, me dê a metade então — ela pede, negociando. — Vou
tentar encontrar outros investidores até ter todo o dinheiro.
— Duzentos e cinquenta mil dólares, Abigail? Você sabe que ainda é
muito dinheiro para algo que pode dar errado.
— Drew, por favor, confie em mim — ela implora me olhando por
baixo dos cílios escuros. — Me dê o dinheiro.
— Tudo bem — cedo. — Eu espero que você esteja certa.
— Você não vai se arrepender! — Ela sorri alegre. — Agora vou ter
um pouco de trabalho para encontrar outro investidor, mas quando eu
conseguir tenho certeza de que vou apresentar ao mundo um novo artista.
— Posso ser o seu outro investidor, Abigail — Jackson intervém.
Largo minha caneta sobre a mesa e encaro Jackson com surpresa.
— Como? — Abigail pisca confusa.
— O quê? — pergunto.
— O que eu disse — Jackson repete. — Posso ser seu outro
investidor.
— Você quer me dar duzentos e cinquenta mil dólares? — Abby
pergunta a Jack em choque.
— Cara, você não vai querer fazer isso — digo. — Eu estou fazendo
isso porque Abby é minha prima e eu sei que se não der o dinheiro ela vai me
encher a paciência pelo o resto da vida. Mas estamos falando de Abigail, e
isso pode acabar em uma merda e eu vou perder todo o dinheiro. Você não
vai querer correr esse risco.
— Cala a boca, Drew. — Abby me lança um olhar feio. — Você é um
babaca, quando eu encher o seu bolso com um monte de dinheiro você vai
pagar com essa sua língua metida.
— Confio no instinto de Abigail para encontrar talentos — Jackson
responde. — Quero e posso investir.
— Jackson foi abduzido por extraterrestres? — Abigail ri. — Porque,
sério, o Jackson que eu conheço não me daria esse dinheiro nunca.
— Vai ficar de brincadeirinhas por muito tempo? — Jack faz uma
careta. — Posso voltar atrás se você não estiver interessada na proposta.
— Oh, não, não. — Abigail levanta as mãos em rendição. — É claro
que eu aceito, Sr. Curtis, você está fazendo um ótimo negócio.
— Passe na minha sala mais tarde para falarmos sobre isso. —
Jackson levanta-se. — Eu estou indo, se precisarem de mais alguma coisa
falem comigo.
— Valeu, Jack — agradeço.
— Vocês me dão licença, mas eu vou atrás dele — Abigail diz
erguendo-se e pegando sua bolsa. — Vai que ele volta atrás nessa ideia, né?
Não posso deixar isso acontecer!
— Tchau, Abby, boa sorte com o seu artista — Jamie diz.
— Obrigada! — Abby agradece e acrescenta: — Boa sorte para você
com a viagem.
— Então, quando é que eu começo a trabalhar? — Jamie pergunta-
me, depois que Abigail sai.
— Apenas quando retornamos da viagem. Tire os próximos dias para
se preparar para a viagem.
— Tudo bem — Jamie concorda. — Então eu vou pra casa tentar
convencer a Jane a pedir o jantar, ok?
— Ok. Vejo você às 19h30min então.
Jamie levanta-se, coloca a bolsa no ombro, dá um aceno tímido e
deixa a minha sala. Caio para trás na minha poltrona e solto o ar que estava
segurando. Caramba, quando foi que minha vida ficou de cabeça para baixo?
***
Estaciono minha Ducati Diavel em frente ao prédio azul de apenas
três andares. É um lugar horroroso, eu não sei como uma pessoa pode viver
aqui. Quando desço da moto, fico pensando se foi uma má ideia eu não ter
vindo com o meu carro. Se algum moleque tocar no meu bebê, corto os dedos
dele fora. Com pesar caminho até o portão de ferro enferrujado. Abro fazendo
um barulho extremamente alto que acorda todos os cachorros da vizinhança.
Viro-me e caminho para a porta de acesso do prédio, mas antes que eu
chegue lá alguém a abre.
Jamie sai e fica no topo das escadas me aguardando. Ela não está
usando mais aquelas roupas ridículas. Fico feliz que ela tenha acatado o meu
pedido, porque agora ela parece adorável. Merda, desde quando eu uso a
palavra “adorável” para descrever uma mulher? Parece antiquado no meu
vocabulário, mas não é. Pelo menos não quando eu tenho que descrever a
Jamie. Ela é diferente de qualquer garota que eu já tenha conhecido. Ela não é
extremamente linda como algumas modelos que eu já tive o prazer de
namorar. Mas ela tem um tipo de beleza reservada, uma beleza tímida e rara.
Gosto disso, sou atraído a ver cada vez mais. A explorar o que ela parece
querer esconder do mundo. Ela me deixa intrigado.
Agora ela veste um vestido de tecido leve floral. Ele vai até um pouco
acima dos seus joelhos. É de alcinhas, justo até a cintura e depois flui sobre
seus quadris e ao longo das suas coxas. Ela me lembra do verão vestida desse
jeito. Está calçando rasteirinhas, e o cabelo úmido está solto, caindo sobre os
seus ombros. Não está usando nenhum tipo de maquiagem, mas ela já é
bonita desse jeito. Com seus olhos de múltiplas cores que brilham
intensamente para mim.
— Ei. — Jamie acena para mim. — Você é pontual.
— Hoje eu sou. — Sorrio para ela.
— Está pronto para conhecer minha família?
— Claro — respondo e estendo um pacote para ela. — Isto é pra
você.
— Pra mim?
Ela pega o embrulho da minha mão, abre e verifica o que tem dentro.
— É um celular — murmuro.
— Oh, um celular? — ela repete olhando para a caixinha do iPhone.
— Abigail me disse que roubaram o seu — explico. — Então eu
comprei esse para você, não quero que fique sem celular.
— Você não precisava ter feito isso, Andrew — ela diz tímida. — Eu
ia comprar um.
— Agora você já tem.
Ela levanta os olhos para mim, e seu sorriso aumenta.
— Você sabia que geralmente os noivos trazem flores, certo?
Coço a cabeça.
— Desculpe, é… Da próxima vez eu vou lembrar-me disso. Flores, é
claro.
Jamie ri.
— Seu bobão! — Ela me empurra. — Não estou reclamando, o que
eu quero dizer é que geralmente se traz flores, não um iPhone de última
geração.
— Eu pensei que quanto mais caro fosse o presente, melhor — digo,
empurrando-a também. — Vocês, mulheres, são todas esquisitas, nunca
decidem o que querem.
— Ah, Andrew, você não entende nada sobre as mulheres. — Jamie
abre a porta e puxa-me para o lado de dentro. Não há um elevador, apenas
escadas. Ela me leva até lá e sobe os degraus na minha frente. — Para cada
situação se pede algo diferente. E também depende de cada mulher. Eu, por
exemplo, sou o tipo das flores. Aposto que Abigail seria a dos iPhones.
Ah, não… Abigail provavelmente é a dos Porsches.
Jamie mora no terceiro e último andar do edifício. Ela abre a primeira
porta à direita e entra me puxando logo atrás. A primeira coisa que eu noto é
como o apartamento é pequeno. Cozinha e sala são conjugadas. Os móveis
são antigos, embora tudo seja organizado e limpo. Sinto o cheiro bom de
comida no ar e noto que estou com fome. Ouço vozes abafadas que vêm do
outro cômodo enquanto Jamie me leva até a pequena sala e pergunta se eu
gostaria de sentar. Mas não tenho chances de responder porque nesse
momento uma mulher e uma criança surgem do corredor. O menino já
conheço, é Tyler, sobrinho de Jamie. A mulher provavelmente é a irmã mais
velha de Jamie. Elas têm apenas alguns traços em comum, como cor da pele,
do cabelo e dos olhos. Mas, de resto, são completamente diferentes.
— Jane, este é Andrew — Jamie diz apresentando-nos. — Andrew,
minha irmã, Jane.
— É um prazer conhecê-lo, enfim, Andrew Simons. — A mulher
estende-me a mão, e eu a aperto firmemente.
— O prazer é meu, senhora — respondo, soltando sua mão.
— Me chame apenas de Jane, ok?
— Tudo bem — concordo.
— Eu pedi comida italiana, espero que goste — Jane diz. — A Jamie
insistiu que eu não fizesse a comida, e eu realmente não fazia ideia do que
preparar.
— Italiana está ótimo, obrigado.
— E aí, Drew? — O garoto, Tyler, levanta a palma da mão para mim.
— Ei, jogador. — Bato minha mão na sua. — Como vai?
— Legal — ele responde. — Quando vamos jogar de novo?
— Podemos marcar um dia, garoto.
— Que não seja no escritório — Jamie acrescenta, Tyler ri e
concorda.
— Vamos nos sentar, eu vou colocar o jantar na mesa — Jane diz.
Jamie me leva até a mesa, sento-me e ela assume o lugar ao meu lado.
Jane começa a colocar a comida na mesa e Tyler se serve antes de todos,
mesmo que sua mãe fique gritando que é falta de educação. Um homem
aparece depois, e Jamie nos apresenta. O nome dele é Rick, e é casado com
Jane. É um cara simples e amigável. Quando todos estão à mesa, começamos
a nos servir. O jantar corre de maneira agradável. A comida é muito boa, mas
provavelmente porque é de um restaurante. Jane faz algumas perguntas
ocasionalmente, mas eu respondo tudo com calma e tranquilidade. Ela quer
saber como nos conhecemos e há quanto tempo. Ela pergunta se o nosso
relacionamento vai interferir no trabalho de Jamie e quais as minhas
intenções com ela. Quando chegamos a este tópico eu fico um pouco mais
concentrado, com medo de errar alguma coisa.
— Você não acha que é pouco tempo para já ter feito o pedido de
noivado? — Jane pergunta-me.
— Jane! — Jamie chama sua atenção. — Já falamos sobre isso.
— Quero ouvir Andrew falar — ela insiste.
— Jane, eu sei que isso é um pouco estranho, incomum — digo a ela.
— Mas aconteceu, e eu tenho certeza de que quero Jamie na minha vida.
— Vocês são jovens, talvez estejam tomando uma decisão precipitada
— ela diz.
— Jane! — Jamie protesta ao meu lado. — Você se casou cedo!
Também foi mãe cedo!
— Por isso eu não quero que aconteça o mesmo com você, apesar de
eu não me arrepender nem um pouco das minhas escolhas — Jane responde.
— Jane, eu prometo a você que eu não vou magoar a Jamie, nem
machucá-la — digo. — Se é disso que você tem medo, dou minha palavra.
— Eu vou acreditar em você, Andrew — Jane diz. — Mas só porque
eu já percebi que Jamie não vai voltar atrás.
— Nós vamos nos casar, Jane — Jamie anuncia ao meu lado.
— Casar? — Jane repete.
— Sim — afirmo. — Como eu disse, minhas intenções são
verdadeiras. Vou me casar com a Jamie em breve.
— Ai, meu Deus! — Jane exclama.
— Não pire de novo, por favor — Jamie pede ao meu lado olhando
para a irmã. — Andrew e eu vamos viajar na quinta-feira para o Texas. Ele
vai pedir a minha mão para o papai.
— Já?
— Sim — Jamie afirma. — Por favor, apenas aceite isso.
— Tem certeza de que é isso o que você quer? — Jane insiste.
— Tenho — Jamie afirma novamente.
— Se você a fizer infeliz, juro que vou atrás de você não importa
onde estiver — Jane fala fitando-me duramente. — Quero acreditar que você
pode fazê-la feliz, porque é apenas isso que minha irmãzinha merece.
— Não vou decepcioná-la, Jane — respondo.
— Então parabéns a vocês dois. — Ela finalmente sorri.
Depois do jantar, Jane nos serve a sobremesa. É um bolo de chocolate
decorado que ela comprou. Não voltamos a falar do noivado, porque todos
parecem ter compreendido que estamos levando isso a sério e que queremos
nos casar. Sinto-me um pouco estranho porque acabei de mentir mais de uma
vez para a irmã de Jamie. Prometi que nunca a magoaria nem machucaria e
que não a faria infeliz. Mas eu não deveria ter prometido isso, não sei se eu
posso cumprir. Nosso casamento nem é verdadeiro. Não sei se essas
promessas ainda valem desse jeito. Só espero que um ano passe rápido e que
esse casamento seja fácil de levar em frente.
Mais tarde despeço-me de todos e Jane me convida para retornar uma
próxima vez para provar da sua comida. Apenas concordo. Jamie me
acompanha até o lado de fora, descemos as escadas em silêncio. Caminhamos
até o portão e depois até a minha moto, que ainda está intacta no mesmo
lugar que eu deixei.
— Uau, é sua? — ela pergunta, impressionada.
— Sim — afirmo.
— É linda — elogia.
— Eu sei.
— Quantos veículos você tem?
— Três carros e uma moto — respondo.
— Que exagero. — Ela rola os olhos para mim.
Monto na Ducati, mas permaneço segurando o capacete.
— Já andou em uma dessas? — pergunto a ela.
— Em uma moto? Não, nunca.
— Talvez eu leve você para dar uma volta algum dia.
— Mmm… eu não sei. — Ela sorri. — Será que posso confiar em
você?
— Sou um ótimo motorista — garanto.
— Tem certeza? — Ela ri. — Você já me atropelou uma vez.
Sorrio.
Ela tinha que se lembrar da história da Mercedes, é claro que tinha.
— Vai ser emocionante, prometo.
— Vou pensar — ela responde e depois olha para cima e arregala os
olhos. — Não acredito, estamos sendo espionados.
Olho para cima na mesma direção que ela e vejo Jane e Tyler
espiando pela cortina.
— Eles são legais — comento.
— Sim, eles são — ela concorda. — Desculpe por isso, a Jane pode
ser um pouco bisbilhoteira às vezes.
— Eles só estão aguardando o espetáculo — respondo.
— Que espetáculo? — ela pergunta ainda olhando para cima.
Descanso uma das mãos na lateral de seu rosto e a outra uso para
puxá-la mais perto pela cintura. Jamie tropeça, e eu a seguro próximo de
mim. Ela tem cheiro de jasmim, e é delicioso. Estamos olhando um nós olhos
do outro, e eu estou irremediavelmente atraído pela cor dos olhos dela. E o
formato de sua boca pequena e rosada. Ela afasta os lábios apenas um pouco,
e eu levo isso como um convite, mesmo sem ter certeza. Beijo seus lábios
suavemente no começo, provando o gosto doce de morango da bebida que ela
bebeu. Seu cheiro entorpece meus sentidos, a pele macia e quente que eu
estou tocando me deixa consciente do que eu tenho nas mãos. Meu aperto se
intensifica, e eu aprofundo o beijo levando minha língua ao encontro da dela.
Mesmo que minha mente esteja ordenando-me a parar e me afastar, eu não
consigo.
Eu a beijo longa e profundamente, minha língua explorando cada
canto de sua boca. Obrigando-a a dar tudo de si para mim, e ela me
corresponde da mesma maneira. Suas mãos seguram os meus ombros, e ela
me aperta firmemente toda vez que eu insisto em tomar mais do que ela está
me dando. Ela geme na minha boca, e, porra, eu me sinto bem pra caralho
onde eu estou. Até que eu tomo consciência e volto à realidade. Eu não
deveria beijá-la assim, isso é profundo e intenso demais para duas pessoas
que estão fingindo. Nosso espetáculo já é mais do que o suficiente. Então eu
a afasto, e, quando ela abre os olhos, coloca a mão sobre os lábios inchados.
— Preciso ir agora — digo.
— Tá, tá, claro.
— A gente se vê na quinta.
Coloco o capacete e ligo a moto.
— Andrew, por que você fez isso?
— O quê? — Finjo-me de desentendido.
— Por que me beijou agora?
— Só queria que sua irmã visse e acreditasse no nosso noivado —
respondo.
— Ah, sim. Minha irmã, claro.
— Até, Jamie. — Dou um aceno de cabeça e parto com a minha
moto.
Fico olhando o reflexo dela pelo espelho enquanto vou me afastando.
Espero que eu esteja certo, espero que tudo isso não tenha passado de uma
encenação. Ou vou estar ferrado pra caralho…
CAPÍTULO TREZE
--—————————————————————————————

Jamie

Andrew para o carro em frente ao meu prédio às 9h da manhã de


quinta-feira. Quero matá-lo, pois na noite passada ele me ligou e ficou me
enchendo a paciência dizendo que eu deveria estar pronta às 7h, porque ele
queria sair cedo já que a nossa viagem é muito longa. Sou o tipo de pessoa
que não se incomoda em acordar cedo, já estou acostumada com essa rotina
de levantar com o sol para ir trabalhar. Então eu disse que quando ele
chegasse aqui eu estaria prontíssima com as minhas malas esperando por ele.
E olhe só, o maldito atrasou duas horas e não atendeu uma única ligação
minha. Só por isso decido esperar que ele suba aqui e carregue minha mala.
Espio pela cortina enquanto vejo-o sair do carro, fechar a porta, abrir
o portão e caminhar para o interior do prédio. Ouço seus passos apressados
subindo pela escada, e alguns segundos depois ele bate duas vezes com força
contra a minha porta. Olho para o meu reflexo no espelho, dou uma
ajeitadinha no meu cabelo. Aliso o tecido do vestido azul que estou vestindo.
Mais duas batidas na minha porta, e eu ignoro completamente. Ah, qual é?
Ele me fez esperar duas horas, eu posso deixá-lo plantado ali por mais alguns
minutos. Verifico o esmalte nas minhas unhas, e ainda está impecável. Mais
uma pancada na porta, desta vez mais forte e seguida pela voz alterada dele.
— Abre a porta, Jamie! — Andrew grita. — Eu sei, demorei. O
relógio não despertou, sinto muito!
— Mentiroso! Por que não atendeu minhas ligações?
— Tá, tá, eu desliguei o despertador e ignorei suas chamadas — ele
admite. — Estava cansado, é isso.
— Eu deveria deixar você plantado aí por duas horas, assim como eu
fiquei — digo.
— Jamie… — Andrew bate na porta novamente. — Temos que ir, é
sério. A viagem é muito longa.
Caminho até a porta e abro, deixando o caminho livre para ele passar.
Andrew entra, e eu fecho a porta atrás dele. Viro-me e logo reparo em seu
visual. É difícil ver Andrew usando outra coisa além dos ternos, afinal eu só
o via na construtora e trabalhando. Tenho que admitir que apesar de ele ficar
muito bem usando roupas sociais, ele também fica igualmente lindo usando
roupas casuais. Como a bermuda, a camiseta e os tênis que ele está usando.
Ele parece tão mais jovem do que apenas os seus vinte e seis anos. Ele
também está muito cheiroso, seu perfume impregna o ar na minha sala.
— Só estou abrindo a porta para você porque quero entrar naquele
carro o mais rápido possível e me ver livre de você logo — digo, cruzando os
braços.
Ele ri. O idiota abre um sorrisinho e depois ri de mim.
— Gosto de você brava, fica mais sexy. — Ele pisca um olho para
mim e desce os olhos pelo o meu corpo. Odeio que eu esteja usando tão
pouco pano para me cobrir, porque é como se onde os seus olhos passam eu
sentisse um leve formigamento. — Eu acho que não será possível se ver livre
de mim por um longo… Longo tempo.
— Infelizmente. — Bufo.
— Alguém está com TPM.
— Não estou com TPM! Só estou irritada que você me deixou
esperando por duas horas, sendo que o único que estava enchendo minha
paciência ontem sobre acordar cedo era você.
— Eu estou aqui, não estou? — Ele faz um gesto com a mão
apontando a si mesmo. — Acalme-se um pouco, bravinha. Temos que nos
dar bem para fazer isso funcionar.
— Bravinha? — repito.
— É, combina com você neste estado — ele explica.
— Que estado?
— De gata raivosa.
— Oh, meu Deus. — Suspiro. — Vamos embora, por favor?
O sorriso de Andrew alarga.
— Cadê as suas coisas?
— No sofá.
Ele passa por mim e caminha até o sofá, onde está a minha mala preta
de rodinhas. Pega a alça com uma das mãos e puxa, fazendo uma careta.
— Caramba, o que você está levando aqui dentro?
— As roupas que você me deu. — Dou de ombros. — E os sapatos,
um pouco de maquiagem e alguns produtos de higiene.
— Acho que você colocou uma boutique toda aqui dentro — ele
geme puxando a mala com força.
Ok. Admito que depois que ele me deixou esperando, resolvi que ele
teria que buscar a minha mala e por isso acrescentei alguns livros e CDs nas
minhas coisas. Talvez por isso esteja um pouquinho mais pesada.
— Não se esqueça da bolsa — aviso, apontando atrás dele.
Andrew me lança um olhar carrancudo.
— Você não pode pegá-la?
— Sinto muito, eu fiz as unhas. — Mostro a ele as minhas mãos, com
as unhas pintadas de azul. — Sabe, eu me lembro do meu noivo ter dito que
eu tenho que estar sempre bonita.
— Rá, você é uma espertinha — Andrew diz rangendo os dentes. —
Pensei que tinha feito a proposta para uma garota boazinha e tímida. E agora
o que eu recebo? Uma garota rebelde que gosta de provocações, é isso?
— Quem está provocando aqui? — Finjo-me de desentendida, viro-
me e caminho para fora do apartamento, deixando-o para trás. — Não se
esqueça de fechar a porta!
Ouço-o praguejar, antes de me seguir com a mala em uma das mãos e
a minha bolsa na outra, passando algum trabalho para trancar a porta. Estou
rindo internamente. Descemos as escadas, eu na frente e ele logo atrás, e
saímos do edifício. Abro o portãozinho e faço o favor de aguentá-lo aberto
para Andrew. Ele me dá um olhar irritado, e eu quase quero provocá-lo,
perguntando quem é o bravinho agora. Andrew tenta pegar as chaves do
carro, mas suas duas mãos estão ocupadas. Ele acaba largando a minha bolsa
no chão, e as minhas coisas simplesmente caem para fora dela no asfalto.
— Olhe o que você fez! — Apresso-me para ajuntar as minhas coisas.
Andrew ri.
— Deixe-me ajudá-la. — Ele se ajoelha ao meu lado.
— Eu faço isso! — Empurro suas mãos, mas ele continua pegando
minhas coisas.
— Só estou sendo um cara legal, ajudando minha noiva a pegar suas
tralhas.
— Tralha! Isso não é tralha! — resmungo.
— Olha só o que temos aqui. — Andrew segura um pacotinho com
ob. — E depois não está na TPM.
— Me dê isso! — Avanço sobre ele arrancando o pacotinho de suas
mãos. Sinto minha pele esquentar e sei que meu rosto está vermelho e corado.
— Você é um babaca.
Andrew irrompe em uma gargalhada, e por um momento eu até me
assusto. Nunca o vi rir tanto.
— Estou começando a achar que essa viagem foi uma boa ideia. —
Andrew ofega. — Vai ser divertido.
Levanto-me com a minha bolsa na mão e dou as costas para ele.
Deixando-o sozinho para pôr minha mala no bagageiro. Abro a porta do carro
e sento-me no banco do passageiro para depois colocar o cinto de segurança.
Logo depois Andrew abre a porta e acomoda-se no banco do motorista. Ele
está segurando um pequeno pedaço de papel branco, concentrado em ler o
que está escrito. Fico esperando que ele ligue o carro para irmos embora logo,
mas ele continua interessado no papelzinho. Observo sua expressão passar de
intrigado e curioso para interessado e divertido. É então que eu noto que eu
conheço aqueles desenhos de bonequinhas nas margens da folha. Merda, não
pode ser! Minha lista de desejos estava na minha bolsa, e agora está nas mãos
de Andrew. Posso morrer agora?
— Me devolve isso! — grito, esticando-me na direção dele para pegar
minha listinha, mas Andrew afasta as minhas mãos e me empurra para longe.
— Não, não — ele nega ainda lendo. — Isso é seu? Caraca, é claro
que é seu!
— É feio mexer nas coisas dos outros — aponto. — Que falta de
educação! Devolva-me isso agora, Andrew!
— Espera, deixe-me terminar de ler — ele avisa em voz alta e
prossegue: — Lista de desejos… Comprar a casa de tijolos vermelhos no
Brooklyn. Viver um romance verdadeiro…
— Andrew… — gemo. — Pare!
— Não terminei. — Ele ri e continua lendo um a um todos os meus
sonhos mais secretos.
— Pare com isso, Andrew! — exijo, ele me ignora.
— Roubar algo? — Agora mesmo ele começa a rir muito. — Jamie,
eu não sabia que você era uma garota de fazer listinha de desejos. Espera…
Entrar em uma festa de penetra?
Arranco o papel de suas mãos e enfio rapidamente na minha bolsa.
— Chega! Nem uma palavra sobre isso!
— Calma, Jamie, fique tranquila. Não vou fazer brincadeirinhas a
respeito dos seus desejos, mesmo que alguns deles sejam bem estranhos.
— Ótimo, vamos embora logo.
Ele desvia os olhos de mim e coloca os óculos escuros. Dá partida no
carro e logo está dirigindo para longe. Passamos os primeiros dez minutos em
silêncio, até que Andrew resolve falar novamente.
— Ei, acho legal que você tenha uma lista de desejos.
— Você não vai deixar isso passar, não é? — pergunto e prossigo
antes que ele diga algo. — Tudo bem, fale o que você quiser, não me
importo. Tenho uma lista de desejos, e daí? Será que você nunca pensou em
fazer algumas coisas diferentes em sua vida? Eu, sim, e as coloquei neste
papel. Essa é a única diferença dos meus desejos para os seus. Você pode
realizar os seus, os meus só posso escrevê-los aí.
— Por que você acha que eu vou implicar com isso? — ele me
pergunta. — Olha, eu já disse que não vou fazer brincadeiras a respeito da
lista. Você está certa, tenho meus próprios desejos. A diferença é que eles
não são estúpidos como os seus e não estão escritos em uma folha de papel. E
antes que você fale que eu ofendi os seus desejos chamando-os de estúpidos,
eu quero explicar que disse isso porque eles são simples. Ou pelo menos, boa
parte deles.
— Como assim? — pergunto.
— Por exemplo, você deseja fazer uma tatuagem. — Andrew faz uma
curva fechada se concentrando na estrada e depois volta a falar. — Isso você
pode fazer a qualquer momento, não há nada impedindo você. Se for mesmo
algo que você quer muito fazer, simplesmente faça.
— Eu não sei… Eu tenho medo — admito. — Tenho medo que doa,
ou que eu me arrependa.
— Ah, Jamie, tem coisas que a gente tem que simplesmente fazer,
sem medo e sem arrependimentos.
— Então você acha que eu devo fazer uma tatuagem? — pergunto.
— Se é o que você quer, acho sim. — Ele dá de ombros.
— Não é tão simples assim — murmuro.
— Claro que é — ele prossegue. — Roubar algo também é bem fácil,
mas peço que não seja nada meu. — Dou-lhe um tapa no ombro e ele se
esquiva, rindo. — Gritar alto é uma coisa que eu já faço todo dia, como é que
você ainda não fez isso? Sobre dormir sob as estrelas? Eu não entendo por
que você gostaria de dormir na rua, parece desconfortável, mas é bem fácil de
realizar.
— Vão achar que sou louca por dormir na rua!
— Aí é que está, Jamie. — Andrew lança um olhar rápido para mim.
— Você não tem que se preocupar com o que os outros vão achar. Você não
deveria ligar para a minha opinião depois que eu li sua lista. São coisas que
você quer fazer, coisas de que você gosta. Ninguém dá a mínima para isso,
mas você sim.
— Uau, estou surpresa com você, Senhor Simons — digo
sinceramente. — Nunca pensei que fosse ouvir algo tão filosófico de um cara
como você.
— Eu tenho os meus momentos. Mas não se acostume, porque são
momentos raros.
— Você poderia ser assim mais vezes — falo. — Eu gosto deste outro
Andrew.
— Não desvie o foco da conversa — Andrew diz. — Vamos voltar
para você e seus estúpidos desejos. Afinal, por que você quer fumar
maconha? Quem é que nunca fez essas coisas na vida? Você não teve
adolescência, não?
— Eu era uma boa menina, ok? Nunca fiz coisas erradas.
— E agora você não é mais uma boa menina, então? — Andrew me
lança um olhar travesso. — Deixou de fazer coisas certinhas para fazer coisas
erradas? Jamie Collins é uma garota rebelde agora?
— Não, eu não sou rebelde. Só que eu sempre fiz tudo direitinho e eu
não acho que desse jeito eu fiz coisas legais na minha vida, coisas que podem
ser lembradas. Talvez as coisas erradas valham a pena, talvez sejam algo
marcante para guardar na memória.
— Você fala de um jeito esquisito — Andrew comenta. — Você só
tem vinte e um anos, Jamie. Vai ter várias oportunidades de realizar esses
desejos.
— É. — Dou de ombros.
— Posso perguntar mais uma coisa sobre sua lista estúpida?
— Vá em frente, você vai falar de qualquer forma.
Ele ri.
— É. Eu vou — concorda. — Você colocou que deseja pular de
paraquedas. Como exatamente você pretende fazer isso se tem medo até de
pegar um avião?
Oi? Como eu nunca pensei nisso antes?
Andrew começa a rir.
— Você não sabe, não é?
— Eu não sei como não notei isso antes — admito. — Puxa, que
droga!
— Quem sabe um dia você decide perder o seu medo justamente
pulando de paraquedas?
— Talvez — concordo. Nunca!
Andrew e eu passamos as próximas seis horas de viagem
conversando. Eu me surpreendo muito por ele ser capaz de conversar
amigavelmente e não ser um cretino arrogante o tempo todo. Ele me faz rir
várias vezes. Quando eu pensei nesta viagem, nunca imaginei que a faríamos
desta forma agradável. Estou surpresa e contente pela forma como as coisas
estão acontecendo. Logo, noto que ter uma conversa com Andrew é algo que
consigo fazer com facilidade, sem problema. Sinto-me à vontade para falar
com ele sobre qualquer coisa, ou quase.
Paramos em uma lanchonete no caminho para comprar lanches e
besteiras para o resto da viagem. Nossa meta é mais seis horas na estrada até
estarmos em Nashville onde poderemos para descansar em um quarto de
hotel e prosseguir com a viagem no dia seguinte. Eu tento não me sentir mal
por saber que Andrew está dirigindo por seis horas interruptas, e assim que
terminarmos o lanche que estamos comendo ele terá de dirigir por mais seis
horas até o nosso destino. Gostaria de saber dirigir para ajudá-lo a conduzir o
carro. O Tesla é um carrão, o que faria com que automaticamente eu
realizasse um dos desejos da minha lista. Outro desejo que não tenho como
realizar, pois não sei dirigir.
Andrew devora seu hambúrguer como um leão esfomeado e depois
ataca as fritas com molho. Não sei como ele consegue manter a forma desse
jeito, deve ser a academia. Quando eu finalizo o meu hambúrguer, ele já
pediu um sundae de chocolate e café para a viagem. Nós voltamos para o
carro e caímos na estrada novamente. Desta vez, porém, Andrew resolve ligar
o som e colocar um dos seus CDs. Logo, Scream dos Avenged Savenfold
começa a tocar no último volume. Andrew se empolga a até dirige mais
rápido, dedilhando sobre o volante. Não sei como ele pode gostar de toda
essa barulheira, mas eu não digo nada. Em vez disso, deslizo o vidro e deixo
o vento ricochetear em meus cabelos enquanto curto a paisagem.
Volto a prestar atenção em Andrew, sem que ele note, quando ele
começa a cantar acompanhando a música. Tenho que admitir que ele canta
muito bem, é uma voz boa de se ouvir. Fico tão encantada com essa novidade
que eu não percebo que estou encarando-o. Mas ele deve perceber isso,
porque lança um olhar para o meu rosto e depois diminui a velocidade do
carro para me olhar novamente. Só que ele não diz nada, só continua no ritmo
e prossegue cantando. Só então eu presto atenção na letra da música, do que
ela trata e quão profunda é. Andrew canta este refrão ainda olhando para a
estrada à frente.
“Relax while you're closing your eyes to me
So warm as I'm setting you free
With your arms by your side there's no struggling
Pleasure's all mine this time.”

E na próxima estrofe ele olha para mim e, meu Deus, eu derreto.

“You know I make you wanna scream


You know I make you wanna run from me, baby
But know it's too late you've wasted all your time.”
Aposto que a temperatura dentro do carro é de uns quarenta graus. Ou
talvez seja o meu corpo febril. Não sei por que eu simplesmente não viro o
rosto e ignoro o olhar que ele está me dando. Andrew não deveria olhar para
mim assim, ainda mais enquanto está cantando maravilhosamente bem uma
música com frases tão insinuantes e significativas. Nós provavelmente vamos
nos envolver em um acidente, se ele não começar a prestar atenção na
estrada. Droga, o que eu estou falando? Nem eu estou olhando para a estrada.
Ele tem olhos azuis tão intensos que conseguem tirar o foco de qualquer outra
coisa. Somos somente eu e ele. Até que a canção termina, Andrew balança a
cabeça e volta a olhar para frente.
Que merda foi essa?
— Gostou da música? — Andrew pergunta quebrando o silêncio
constrangedor.
Por que ele não perguntou outra coisa?
— Aham. É legal.
— Legal? — ele repete parecendo ofendido. — Não é apenas legal, é
ótima.
— Não curto muito Rock — explico.
— Vou cantar outra música, então.
— Não! Quer dizer, você canta bem, mas eu prefiro ouvir outra coisa.
Na verdade, tenho medo de aonde os meus pensamentos podem me
levar se Andrew cantar outra música como aquela.
— O que você quer ouvir?
Penso no CD que tenho dentro da minha bolsa. Curto esse tipo de
música, mas aposto que Andrew não vai ficar muito feliz. Pelo menos será
uma opção para mantê-lo calado e não ficar mexendo com a minha mente
enquanto canta. Abro a bolsa, retiro o CD dele e substituo pelo meu. Andrew
aguarda ansiosamente e eu quase rio de sua expressão quando Blank Space
começa a tocar também no último volume.
— Taylor Swift? — Andrew pergunta. — É isso o que você curte?
— Não seja chato, eu gosto.
— Tudo bem. Taylor Swift então, mas depois voltamos para a música
de verdade, ok?
Ignoro sua insinuação de que o que estamos ouvindo não seja música
de verdade e viro a cabeça para o lado para continuar apreciando a paisagem.
Mais tarde Andrew troca de CD novamente e volta a ouvir rock, mas ele não
canta. Agradeço mentalmente por isso. Não sei como, mas consigo me
desligar completamente de tudo ao meu redor e pego no sono.
— Jamie?
— Mmmm.
— Jamie? — Sinto um aperto no ombro. — Jamie, acorde.
Abro os meus olhos e vejo Andrew inclinado na minha direção.
Sento-me ereta e espreguiço-me lentamente. Olho ao redor e vejo que
estamos estacionados em frente a um hotel. Finalmente chegamos a
Nashville, onde vamos passar a noite. Andrew percebe que estou acordada e
sai do carro. Vejo-o pelo retrovisor abrir o bagageiro e tirar a minha mala e
uma mochila que provavelmente é dele e entregar para um funcionário do
hotel. Depois ele dá a volta no carro, abre a minha porta e oferece-me uma
mão. Pego a minha bolsa e depois aceito sua ajuda para sair do carro.
— Reservei um quarto nesse hotel para você — Andrew diz enquanto
me leva até a entrada.
— Um quarto? — repito. — Onde você vai dormir?
— Com você, é claro.
Engulo em seco. O que ele disse?!
— Como assim? — pergunto.
— Não pude reservar dois quartos, Jamie — Andrew explica. —
Quem fez nossa reserva foi a Tracy, ela poderia desconfiar se eu pedisse
quartos separados. Além do mais, somos noivos, ficaria estranho chegar ao
hotel e me separar de você. Também temos que nos acostumar com a ideia de
dormimos perto um do outro, afinal, vamos nos casar. Você vai viver na
minha casa, e eu não acho que a vovó vai deixar você dormir na cama dela.
— Vou dormir na sua cama?
— A não ser que você prefira o sofá — ele diz. — Sim, você vai.
— Ah, talvez o sofá não seja tão ruim — pondero.
— O que foi, Jamie? — Andrew me faz parar e olha para mim
mordendo o lábio inferior. Por que ele está fazendo isso? É tão… Tão
tentador. — Está com medo de dormir ao meu lado?
— Não — nego hesitante.
— Isso é bom, porque vamos passar várias noites dormindo um com o
outro.
Por que ele não cala a boca?
— Vamos entrar, por favor? — peço.
— Claro. — Ele sorri e me acompanha.
Andrew passa na recepção e pega as chaves do nosso quarto. Vamos
para o elevador e subimos em silêncio. Ele sai na frente e indica-me a última
porta no final do corredor. Ele abre e faz um gesto para eu entrar na frente.
Fico encantada com o que eu vejo. É uma sala grande e luxuosa, com tapetes
decorados no chão e uma mobília nova e charmosa. Do lado esquerdo tem
um quarto também, com uma cama bem alta. As cores que dominam o
ambiente são o branco, o marrom e o vermelho. As cortinas, as almofadas e
as roupas de cama são todas enfeitadas e bordadas. É tudo muito lindo, nunca
estive em um quarto de hotel antes, mas aposto que esse é um dos melhores.
O funcionário do hotel deixa nossas coisas e Andrew lhe dá uma
gorjeta antes que ele se retire.
— Gostou? — Andrew pergunta-me.
— Adorei — murmuro. — É lindo.
— Eu vou tomar um banho — ele avisa. — Fique à vontade.
Ele pega sua mochila e tranca-se no banheiro. Vou até a cama e
aproveito que estou sozinha para me jogar sobre o colchão macio e suave. É
delicioso, não acredito que vou dormir aqui. Estou exausta e quero me enfiar
embaixo das cobertas logo, mas antes preciso que Andrew deixe o banheiro
livre para que eu possa tomar um banho e relaxar. Enquanto ele está lá, vou
explorando o quarto todo. Ligo a TV e abro as cortinas para ter uma vista
incrível da cidade toda iluminada lá embaixo. Abro minha mala, retiro alguns
dos meus pertences. Depois simplesmente sento-me no sofá e leio, enquanto
aguardo o banheiro ficar livre.
Andrew sai do banheiro vinte minutos depois. Ele está usando calças
jeans escuras e uma camisa branca. Está com os cabelos úmidos e muito
perfumado. Aonde ele acha que vai assim?
— Você dorme assim? — pergunto. Nossa, que estúpida! É claro que
ele não dorme assim.
Andrew ri.
— Não, eu vou dar uma volta.
— Onde?
— Ainda não somos casados, Srta. Collins.
— Só perguntei por perguntar. — Dou de ombros.
— Estamos no Tennessee, querida, o que mais tem aqui são bares
com muita música country — Andrew diz. — São garotas vestidas de
shortinhos, miniblusa e botas de cano alto. Preciso conhecer.
— Você vai procurar garotas? — pergunto boquiaberta.
— Jamie, eu sei o que você está pensando, mas eu não vou quebrar o
acordo — Andrew garante. — Só que ainda tenho o direito de olhar, sabe?
Desde que eu assinei o bendito contrato tenho batido mais punheta do que na
minha puberdade toda.
— Ai, meu Deus! — exclamo. — Que nojo, me poupe dos detalhes!
Andrew solta uma gargalhada.
— Fui sincero. — Andrew pisca para mim. — Nos vemos mais tarde.
— Nada disso! — protesto. — Vou com você!
Ele acha que sou idiota? Não vou ficar neste quarto de hotel, enquanto
ele está lá fora vendo garotas em shortinhos. Arghh!
— Jamie, você está cansada, fique no hotel — ele me aconselha.
— Nunca fui a um bar com música country, quero ir — digo.
Andrew suspira.
— Você tem cinco minutos para ficar pronta — ele me avisa.
***
Vinte minutos depois Andrew e eu estamos sentados em uma mesinha
no canto de um lotado bar com música country. Tem uma banda e os rapazes
tocam muito bem. Ele estava certo sobre as garotas com suas miniblusas e
shortinhos. Este é o último lugar em que eu gostaria de estar neste momento,
preferia a cama quentinha no hotel. Mas eu não confio em Andrew e não me
importo de estar parecendo uma verdadeira noiva ciumenta. Não vou deixar
que ele coloque chifres, mesmo que de mentira, em mim. Não mesmo!
— O que você quer beber? — Andrew grita para mim sobre o barulho
da música.
— Não sei.
— Como assim não sabe? — pergunta-me arqueando a sobrancelha.
— Droga, às vezes eu me esqueço de que você só tem vinte e um anos. Você
já ingeriu bebida alcoólica alguma vez na vida?
— Já tomei algumas taças de vinho.
— Vinho? — Ele ri. — Garota, você nunca tomou um porre?
— Quê? Não!
— Isso não é possível! — Ele fica horrorizado. — Quando se tem
vinte e um você precisa caprichar no porre!
— Eu não sei, eu nunca pensei nisso — admito.
— Sabe o que eu acho? — Ele se inclina na minha direção. — Está
faltando algo na sua lista de desejos, e é uma noite de bebedeira.
Sorrio.
— Você acha que eu tenho que encher a cara? — pergunto.
— Sim, é exatamente o que eu acho.
— O que você sugere que eu beba?
— Volto já. — Ele pisca para mim e levanta-se.
Meus olhos acompanham sua figura se afastando em direção ao bar.
Ele volta logo depois segurando uma bandeja com doses de tequila e uma
garrafa com um líquido marrom-escuro. Não faço ideia do que seja, mas
aposto que Andrew não vai sossegar enquanto não a bebermos todinha.
Nunca fiz isso na minha vida, ter uma noite de bebedeira. Mas confesso que
estou ansiosa e empolgada. Andrew está certo, eu deveria ter acrescentado
isto à minha lista. Uma pessoa normal deve viver isso alguma vez na vida, e
eu estou pronta para viver a minha noite.
— Vamos lá, Jamie, pode começar — Andrew diz passando-me um
copinho pequeno com tequila.
— Tudo bem. — Inspiro e não penso duas vezes antes de virar o
copinho na minha boca.
— Ai, meu Deus, isso tem um gosto horrível! — exclamo.
Andrew ri.
— Experiente colocar o sal na língua antes, e, depois que você beber,
chupe o limão — ele me instrui e passa-me outro copinho.
Faço como ele diz e coloco um pouco de sal na língua, para depois
virar a bebida. O líquido parece queimar minha garganta dez vezes mais, e eu
quase cuspo tudo para fora. Quase, porém, consigo engolir, pego logo o
limão e começo a chupá-lo. Andrew está olhando para mim de um jeito
divertido, como se ele estivesse tendo o seu próprio showzinho particular. Eu
o ignoro completamente e bebo um gole da bebida marrom-escuro que ele
colocou em um copo para mim. Esta não queima a minha garganta, é mais
doce e eu até que gosto. Continuo bebendo, e ele também.
Eu não faço ideia de quantos copos daquela bebidinha marrom eu
tomei, mas eu me sinto muito bem. Logo, estou na pista de dança e algumas
pessoas se aproximam de mim. Puxam-me para dançar, me arrastam de um
lado para o outro, fazem perguntas que embaralham minha cabeça e,
principalmente, oferecem-me bebidas coloridas impossíveis de recusar. Estou
flutuando, vejo as cores e elas são tão lindas. Essa música que está tocando é
muito legal, quero levá-la para casa para que eu possa escutá-la. Estou
dançando e quase fico chocada com isso porque eu não costumo dançar,
ainda mais com tanta gente ao meu redor. E isso aqui está cheio pra caramba.
As pessoas estão na minha frente, ao meu lado, atrás de mim. Estou cercada e
rindo muito alto. Sei que estou feliz, porque eu toco a minha boca e os meus
lábios estão repuxados em um sorriso imenso. Nossa, me sinto tão bem.
Onde está Andrew?
Sei que a última vez que eu o vi ele disse que iria ao banheiro e não
iria demorar. Alguém coloca um copo na minha mão, cuja bebida é rosa. Ou
será que é laranja? Não tenho certeza, as cores parecem borradas. Andrew já
deveria ter voltado, não? Ele sabe onde estou, pois eu disse que ia dançar e eu
estou dançando. Ou estou pulando? Isso aqui é tão doido, por que tudo está
girando? Queria que Andrew me visse agora, porque eu acho que eu consegui
fazer aquilo da noite de bebedeira. Eu sinto como se eu tivesse conseguido.
— Jamie?
Ah, aqui está ele!
— Andrew! — grito sobre o barulho da música. — Olhe para mim, eu
estou dançando.
— Isso não é dançar, querida. — Ele ri. — Você parece uma minhoca
descontrolada.
— O quê? — Aproximo-me dele. — O que você disse? Eu não estou
ouvindo!
— Eu estava dizendo que você já teve sua noite de bebedeira. Agora
podemos ir embora.
— Não! — protesto. — Está legal aqui, você escutou aquelas cores?
Elas são tão lindas!
Andrew solta uma gargalhada, e eu o acompanho rindo também.
Por que estamos rindo?
— Você está escutando cores?
— É — murmuro. — Vamos levá-las com a gente?
— Não, não — ele nega. — Vamos embora, você está péssima.
— Não estou, não. — Balanço a cabeça, e o mundo gira outra vez. —
Estou ótima!
— Prometo levá-la para outra noite de bebedeira, mas agora temos
que voltar — Andrew diz. — Temos que dormir e acordar cedo amanhã.
Lembra-se da viagem?
— Oh, sim, a viagem — murmuro. — Tudo bem, vamos embora.
Andrew me puxa para perto dele e me leva para longe da multidão,
das musiquinhas e cores bonitas. Nós deixamos o bar e saímos para o ar frio
da noite. Andrew me abraça, e eu aposto que é para me segurar, porque eu
não estou sentindo as minhas pernas. Elas estão formigando como se várias
formiguinhas estivessem passeando na minha pele. Eu estou com os olhos
abertos e sei disso, mas ainda assim só consigo enxergar vultos e borrões
pretos. Onde está a minha visão?
— Andrew, não estou enxergando — murmuro.
— Calma, estamos chegando ao carro. — A voz dele flua até mim.
— Andrew? — chamo.
— Estou aqui, Jamie.
— Andrew, estou sentindo um negocinho.
— Que negocinho?
— Estou sentindo o negocinho subir.
De repente estou me curvando para frente e vomitando sobre os meus
sapatos. Vômito e mais vômito desce pela minha garganta. Ouço Andrew
praguejar ao meu lado, mas ele continua me segurando firme. Meu estômago
começa a doer fortemente, e mais líquido é expelido pela minha boca.
Começo a me sentir cansada e sonolenta e faço força para que Andrew me
solte. Ele me deixa ir, mas eu não consigo dar um passo à frente antes de cair
de joelhos sobre o asfalto.
— Merda! — Andrew xinga e se ajoelha ao meu lado. Sinto seus
dedos tocando o meu rosto e afastando os meus cabelos. — Você se
machucou?
— Eu… Eu… Não sei — murmuro.
— Foi uma péssima ideia deixar você, me desculpe. Acho que
colocaram algo na sua bebida, Jamie. Mas vai passar, juro.
— Do que você está falando?
— Vou levar você para o hotel.
Andrew fica de pé, e logo depois eu o sinto perto de mim. Ele me
segura, me levanta e então eu estou no colo. Com a minha cabeça
descansando em seu peito, fecho os olhos e não sinto mais nada. O mundo
apaga de vez. Só acordo mais tarde e descubro que estou naquela cama macia
do hotel. Andrew está falando comigo, mas eu não sei o que ele diz. Sinto-o
tocando o meu rosto e depois as minhas pernas. Algo pinica no meu joelho, e
eu não sei o que é. Fecho os olhos novamente, mas não antes de escutá-lo
dizer:
— Eu espero que você não me mate amanhã, mas vou tirar a sua
calça.
O quê? Não! Por que eu não consigo falar? Cadê a minha língua?
— Boa noite, bravinha — Andrew sussurra, e a escuridão chega outra
vez.
CAPÍTULO CATORZE
--—————————————————————————————

Andrew

O plano original não saiu como eu esperava. Eu só queria curtir uma


noite tranquila em um barzinho de esquina com uma loira peituda chupando o
meu pau no banheiro. Mas a Jamie tinha que inventar de ir junto, ela tinha
que estragar os meus planos. Fui obrigada a levá-la já sabendo que o máximo
que conseguiria com ela grudada em mim era encher a cara e cobiçar as
meninas bonitas. Se eu tivesse um caso de bolas azuis, pode ter certeza que
obrigaria Jamie a lidar com o problema. Não que seja uma má ideia, ela
parece bem comestível. Ah, merda, não, de jeito nenhum. Eu não posso
comer a Jamie, ela é minha falsa noiva, e nós não podemos tonar isso ainda
mais complicado. Transar com ela complicaria tudo. Nada de complicações.
As coisas até que estavam indo bem durante a noite, eu já tinha
comprado algumas tequilas para a Jamie, e ela estava ficando animadinha aos
poucos. Mas tudo mudou quando voltei ao bar para buscar mais bebida e
encontrei aquela mulher. Só de olhar para ela meu pau ganhou vida. E era
exatamente o tipo que eu curtia. Alta, com pernas longas e torneadas. Cabelos
loiros ondulados e olhos azuis. Estava vestida para matar naquele vestidinho
curtindo e botas na altura do joelho. Já me peguei imaginando como seria ter
aquela boca em volta do meu pau. Caralho, eu precisava foder, e logo!
Tomei uma decisão, era arriscada, mas ia valer a pena. Chamei um
garçom e pedi que continuasse levando bebidas para Jamie durante o resto da
noite, que não deixasse o copo dela vazio nenhuma vez e que ficasse de olho
nela para não se meter em nenhum problema. Dei algumas notas de dólares a
ele e falei que teria mais quando eu voltasse. Depois avisei Jamie que iria ao
banheiro e, então, fui atrás da loira gostosa. Não pretendia demorar, era para
ser só uma rapidinha mesmo. A Jamie já estava animada, louca para ir para a
pista de dança. Com mais algumas bebidas, ela ficaria ocupada tempo o
suficiente para eu concluir meus planos. Sequer notaria minha ausência. Era
perfeito.
Retornei ao balcão do bar e encontrei a loira no mesmo lugar. Ela
sabia o meu interesse só pelo jeito que me olhava, e para mim isso estava
perfeito. Porque o que eu queria era uma transa rápida e descomplicada para
acabar com a minha seca. Paguei uma bebida a ela, trocamos duas palavras e
foi até mesmo a loirinha que tomou a iniciativa e me arrastou para uma
salinha no fundo do bar. Antes até lancei um olhar para onde Jamie estava
aceitando outra bebida do garçom, enquanto se balançava na pista de dança.
Depois éramos só eu e a loirinha nos pegando na salinha apertada.
A loirinha foi logo se livrando do vestido e ficando só nas roupas
íntimas. Gostei de como ela era ágil e ia direto aonde eu queria. Foi logo
desafivelando o meu cinto, descendo minha calça e cueca e segurando com
suas duas mãos o meu pau totalmente pronto para ela. Começou
masturbando-me devagar, mas quando agarrei seus cabelos com força notou
que eu estava impaciente e desceu logo a boca. Que boca! Uma delícia,
parecia o paraíso enquanto me chupava e me levava bem fundo em sua
garganta. Ela gemia, mostrando que estava gostando daquilo tanto quanto eu.
Afastei-a antes que gozasse, pois não queria terminar as coisas sem
estar dentro dela antes. Puxei-a para cima e a coloquei sentada sobre o balcão
sujo de bar. Com rapidez me livrei do sutiã e agarrei seus peitos na mão,
levando-os à boca e chupando os bicos já enrijecidos. A loirinha, de quem eu
nem sabia o nome, começou a gemer descontroladamente e eu notei que não
podia mais me segurar. Tirei uma camisinha da minha carteira, revesti meu
pau e afastei a calcinha para o lado. Estava pronto para me perder dentro dela
quando alguém bateu na porra da porta como se o mundo estivesse acabando.
Quem estava do outro lado da porta era o barman que eu tinha pagado
para ficar de olho na Jamie. Foi logo gritando bem alto que minha garota
estava causando uma confusão na pista de dança porque queria arrancar o
globo espelhado do teto e levar para casa. Primeiramente achei que o cara
estava me confundindo com alguém. Eu não tinha garota nenhuma, muito
menos uma que fosse ladra de globos espelhados. Então me toquei que ele
estava falando da Jamie, ele achava que ela era a minha garota, pois chegou
acompanhada comigo e eu tinha lhe pagado para lhe servir bebidas o resto da
noite. Quis matar a Jamie por foder com a minha foda. Ladra de globos
espelhados? Ah, droga. Pensei na hora que ela pudesse estar realizando
aquele desejo idiota de sua lista. Por mais que eu precisasse muito transar,
não podia deixar minha falsa noiva roubar globos espelhados de um bar
country em Nashville.
Deixei a loirinha para trás sem nem me despedir. Apenas puxei as
calças para cima e voltei para a pista. Encontrei a Jamie completamente
pirada, parecia que estava tendo convulsões no meio da pista, mas era apenas
a forma que ela estava dançando e pulando. Quando me aproximei ela foi
logo se agarrando em mim, gritando que podia escutar as cores e ver a
música. Seus sentidos estavam completamente alterados, e enquanto
apontava para o globo espelhado ficava gritando que o levaria para casa. Cai
na gargalhada, e ela me acompanhou rindo igual a uma hiena, sem ter noção
de nada. Tudo bem que a bebida podia deixar uma pessoa alterada, mas a
Jamie estava muito mais do que isso. Foi só então que notei que a nossa mesa
estava abarrotada de copos de bebidas. As pessoas iam e vinham, largavam
seus copos ali e Jamie estava bebendo tudo sem ter noção alguma do que
estava ingerindo. Até peguei um dos copos e cheirei, parecia ser só álcool
mesmo, mas eu não duvidava que alguns deles estivessem batizados.
Foi uma perda de tempo pagar o barman para ficar de olho na Jamie
quando, obviamente, ele só tinha colocado algumas bebidas na mesa, nem
ligando para o fato de que minha falsa noiva estava bebendo do copo de
estranhos…
Eu não deveria ter deixado a Jamie sozinha, mas tinha. A culpa de ela
ter sido drogada era minha, infelizmente.
Minha noite acabou pior do que começou. Eu não tinha conseguido o
que queria com a loirinha e ainda tive que arrastar uma Jamie muito bêbada e
um pouco drogada para fora do bar. Quando estávamos no estacionamento
ela ainda vomitou sobre os próprios sapatos e desabou no chão de joelhos,
enquanto tentava se afastar de mim. Ela estava péssima e fui me sentindo
cada vez pior por abandoná-la lá, quando ela confiou em mim para estar ao
seu lado no seu primeiro porre da vida. Levantei-a para o meu colo e a
coloquei no carro.
Voltamos para o hotel onde eu a carreguei até o quarto, ainda
completamente apagada. Deitei-a na cama e retirei seus sapatos sujos. Foi
então que notei que a calça estava suja de sangue nos joelhos e lembrei que
ela tinha caído. Cogitei deixá-la assim, e pela manhã ela mesma poderia
cuidar disso. Mas depois pensei melhor e vi que precisava limpar os
ferimentos ou ela podia ter uma infecção ou algo parecido. Sem contar que
provavelmente acordaria com uma ressaca dos infernos e sem condição de
fazer curativos.
Não tinha jeito, eu era o culpado em primeiro lugar por ela estar
daquele jeito. O mínimo que podia fazer era cuidar dos seus joelhos ralados.
Pedi em voz baixa que ela não me matasse amanhã quando acordasse sem as
calças. Torceria para que ela fosse compreensiva e levasse em conta que eu
só estava tentando ajudá-la. Desabotoei os dois botões, desci o zíper e puxei
suas calças para baixo com a cabeça voltada para o outro lado do quarto.
Não olhe, Andrew! Não olhe! Não olhe! Ah, merda…
Juro que eu tentei manter meus olhos longe, mas, porra, sou homem e
a curiosidade é maior. Olhei mesmo e esperava ver uma calcinha branca de
algodão ou com desenhos estúpidos de bichinhos. Seria a cara da Jamie,
exceto que o que ela estava usando estava bem longe disso.
Porra! Por que não calcinhas de vovó, por quê?!
Jamie Collins não deveria ser o tipo de garota que veste calcinhas
minúsculas de renda azul. Mas ela estava usando, e mais uma vez fui
completamente surpreendido. Assim como o Drew Júnior, que resolveu se
animar nas minhas calças naquele momento. Eu estava na merda, isso sim!
Como podia ter uma ereção logo agora? Justamente por causa dela? Meu pau
só podia estar caçoando com a minha cara, mais tarde teríamos que ter uma
conversa bem séria.
Terminei de retirar suas calças e fui até o banheiro procurar por um
kit de primeiros socorros. Voltei para o quarto e me concentrei apenas em
seus joelhos por mais difícil que fosse. Consegui limpá-los, aplicar um pouco
de uma pomada para machucados e depois enfaixei da melhor maneira que
consegui. Jamie estava completamente ferrada no sono, mas ainda emitia
sons incoerentes. Achei engraçado e me peguei rindo sozinho dentro do
quarto. Ela se mexeu, virou-se para o lado e depois de bruços, me dando a
maldita vista de sua bunda em uma calcinha fio dental. Ah, porra!
Levantei-me da cama, andando de um lado para o outro
completamente impaciente, e vez ou outra lançando um olhar para aquela
bunda arredondada me provocando com aquele bendito pedaço de pano azul
que não deveria ser chamado de calcinha. Meu pau estava praticamente
gritando: Foder, foder, foder. Tentei me comunicar mentalmente com ele e
dizer que era impossível. Não hoje, não agora, e não com Jamie Collins! Mas
quem disse que a cabeça de baixo queria escutar a de cima?
Parei de andar e decidi que eu precisava era apagar. Se eu dormisse
não pensaria em nada e consequentemente meu pau teria que me dar uma
trégua. Tirei a camisa, a calça, apaguei a luz e depois me joguei do outro lado
disponível da cama. Só que eu ainda estava duro e, pior, não conseguia parar
de pensar que a Jamie estava tão perto de mim usando aquele tipo de lingerie.
Virei-me para o lado e fiquei encarando a parede no escuro, eu tinha que criar
uma distração: Carneiros fofinhos, carneiros fofinhos, pense em carneirinhos
fofinhos, Andrew. Foda-se, não dá! Não dá!
Joguei as cobertas para o lado e me levantei. Andei até o banheiro,
tirei a cueca e me enfiei embaixo do chuveiro. Eu sei, estava parecendo um
moleque com tesão, mas o que eu podia fazer? Bati umazinha e, embora eu
tentasse pensar na loirinha bonita me chupando, o que vinha na minha cabeça
era um par de olhos castanho-esverdeados e imagens de uma bunda redonda e
bonita em um fio dental sexy. Eu ia para o inferno, isto era certo.
Voltei para o quarto saciado, por ora. Coloquei uma cueca boxer e
deitei no meu lado da cama. Enquanto Jamie continuava dormindo sem se
abalar com nada. Cobri-me e fechei os olhos esperando que agora o sono
viesse. E nada, já passava das quatro da manhã e eu precisava acordar cedo
para continuar nossa viagem, mas não conseguia dormir. De repente, Jamie
se moveu ao meu lado, virou-se e eu quase pensei que estava acordada, mas
não. Ela rolou para o meu lado da cama e ficou esmagada contra o meu peito.
Ouvi seu suspiro baixo de contentamento, e ela se encolheu um pouco mais,
deslizando uma perna sobre a minha e deixando uma mão aberta bem no
centro do meu peito.
Suspirei inadiavelmente.
O melhor seria afastá-la, mesmo correndo o risco de acordá-la.
Dormir na mesma cama que ela de repente se fez uma péssima ideia, e eu
estava pagando caro por aquilo. Mas ao mesmo tempo eu não tinha força de
vontade nenhuma para afastá-la. Ela estava tão confortável desse jeito e
dormindo tranquilamente. A pele nua dela em contato com a minha estava
quente, e era inacreditavelmente macia. Olhei para baixo, vendo seu rosto
relaxado descansando bem abaixo do meu braço, e desisti. Por essa noite,
esse lugar era dela. Fechei os olhos e apertei-a apenas um pouquinho,
aconchegando-a mais perto. O cheiro dela, um aroma suave de jasmim,
penetrou os meus sentidos e eu sei que finalmente consegui adormecer.
***
— ANDREW!
Hãã? Quê? Onde?
Abro os meus olhos na claridade ofuscante e vejo uma sombra
pairando sobre mim. Jamie está de pé sobre a cama, com as duas pernas
afastadas, cada uma de um lado do meu quadril. Seus braços estão cruzados
sobre o peito, e ela parece um pouquinho irritada. Ela me dá um chute no
quadril e grita o meu nome novamente. Esquece, ela está muito irritada. O
que ela não sabe é que a visão aqui de baixo é maravilhosa e que ela parece
fodidamente sexy, brava, de camiseta, calcinha e com o cabelo todo
revoltado.
— Bom dia, bravinha — murmuro grogue.
— Bravinha? — ela grita novamente. — Eu não estou bravinha, eu
estou puta! O que foi que você fez comigo?
— Eu? Nada.
— O que aconteceu ontem à noite? — ela pergunta. — Por que eu não
consigo me lembrar de nada?
— Você bebeu bastante, e eu trouxe você para casa, é isso —
respondo.
Ela semicerra os olhos.
— E por que é que eu estou usando apenas uma calcinha?
— Você preferia que eu tivesse tirado ela também? — pergunto com
um sorrisinho e pisco para ela. — Vou me lembrar disso da próxima vez.
Jamie rosna e avança sobre mim.
— Você está me escondendo alguma coisa! — Ela tenta me bater,
mas eu a puxo pelo tornozelo e ela cai de bunda na cama. — Andrew, eu vou
te matar!
— Pare com isso! — resmungo. — Você quer saber o que aconteceu?
Tudo bem, eu vou contar. Você bebeu um monte, ficou doidona e quando
estávamos voltando para casa você vomitou e caiu no asfalto ralando seu
joelho. Eu te trouxe para o hotel e tirei a sua calça porque você estava com os
joelhos ralados e precisava de um curativo. É isso!
Jamie olha para mim com o cenho franzido, e eu torço para que ela
acredite na minha história e esqueça tudo isso.
— Você está mentindo! — ela acusa.
— O quê? Não! Eu não estou mentindo, Jamie, foi o que aconteceu.
— Você acha que eu sou burra, né, Andrew? Pois você está muito
enganado! Você tem essa mania ridícula que você mesmo não percebeu
ainda. Toda vez que você mente desvia os olhos, porque sabe que o que está
fazendo é errado! E você desviou os olhos de mim!
Eu… Desvio os olhos? Que merda, como eu não sei disso?
— Eu não estou mentindo, Jamie, é sério — digo.
— Desviou os olhos de novo! — ela exclama jogando um travesseiro
na minha cabeça e tentando me bater com os punhos cerrados.
— Ai, droga, Jamie, para com isso! — Jogo-a para o lado e seguro os
seus pulsos enquanto pairo com o meu corpo sobre o dela sem machucá-la.
— Eu não desviei os olhos, não estou mentindo!
— Seu imbecil, você nem tá olhando pra mim enquanto diz isso! —
ela grita. — O que aconteceu, Andrew? Oh, meu Deus, a gente… a gente?
Sorrio.
— Se a gente transou? Não, não.
— Pelo menos você não desviou os olhos agora — ela murmura. —
Andrew, onde você estava na noite passada? Você me deixou sozinha na
pista, eu me lembro disso, foi a única coisa que eu não esqueci. Você não
estava lá.
— Claro que eu estava — minto. Olho nos olhos dela, mas não
consigo segurar por muito tempo e desvio. — Eu estava assistindo você da
mesa.
— Mentira!
— Eu estava sim! — afirmo, mentindo novamente. — Por que você
não esquece isso?
— Andrew, você me traiu? — Jamie pergunta-me seriamente.
— O quê?
— Eu perguntei se você me traiu! — ela grita no meu rosto. — Você
me deixou para transar com uma garota qualquer? Você quebrou o nosso
acordo?
— Não — sussurro.
— Será que você pode ser um homem de verdade alguma vez na
vida?! — ela exclama. — O que aconteceu ontem à noite, Andrew? Diga-me!
Olho para baixo, dentro dos seus olhos castanho-esverdeados, e noto
lágrimas se formando.
— Você está chorando? — pergunto.
— Sai de cima de mim, seu babaca!
— Eu não traí você, Jamie. Embora a minha intenção tenha sido traí-
la — confesso.
— Sai, Andrew, sai! — Ela empurra o meu peito com as duas mãos,
me afasto, deixando-a ir. — Eu quero detalhes, o que aconteceu ontem à
noite?
— Eu queria foder alguma garota aleatória, mas você inventou de ir
para o bar comigo — explico. — Quando eu cheguei lá no bar conheci uma
garota loira que estava interessada no mesmo que eu. Eu não queria que você
descobrisse o que eu estava prestes a fazer, por isso pedi a um dos garçons
que continuasse levando bebidas para você, assim ficaria ocupada dançando
na pista e aproveitando seu primeiro porre. Não cheguei a transar com a
garota, pois o barman interrompeu para avisar que você estava causando
tumulto na pista. Você queria roubar o globo espelhado deles e, logo, pensei
naquele desejo da sua lista. Deixei a garota e fui atrás de você. Encontrei
você na pista de dança, estava bêbada, mas acho que um pouco drogada
também. Acho que bebeu do copo de estranhos sem saber. Você vomitou no
estacionamento e também ralou os joelhos. Trouxe você até aqui e cuidei do
seu ferimento, por isso está sem calça.
— Você me deixou sozinha em um lugar desconhecido com pessoas
desconhecidas, apenas porque queria transar com uma desconhecida? —
Jamie pergunta em choque.
— Era pra ser rapidinho…
— Eu fui drogada porque você saiu para foder uma garota aleatória?
— Jamie dá uma risada sem humor. — Você é um cretino, Andrew, você não
merece a Simon’s. Você não merece o amor da sua família. Você não merece
a ajuda de ninguém, muito menos a minha.
Uma lágrima solitária escorre pela bochecha dela.
— Por que você está chorando? — pergunto. — Você me conhece!
Você sabia desde o começo como eu era! Você não tem o direito de achar
isso ruim!
— Você quer saber por que eu estou gastando minhas lágrimas com
você? — Ela se aproxima. — É porque eu tenho pena de você, Andrew! Eu
sabia sim, desde o começo, quem você era. Mas eu fui uma imbecil por
acreditar que você cumpriria o acordo por ser algo muito importante para
você. Eu fui uma tola porque eu queria enxergar mais em você, eu queria te
ajudar porque pensei que você fosse melhor do que isso!
Jamie funga e passa o antebraço no rosto para limpar suas lágrimas.
Eu estou me sentindo um babaca por fazê-la chorar e por decepcioná-la. Eu
faço isso com todo mundo, não importa quanto tempo demore, eu sempre
consigo decepcionar as pessoas. Eu não sei o que dizer, não sei se há algo
para dizer nesse momento. Ela acreditaria em mim se eu dissesse que me
arrependo? Observo enquanto ela caminha para o banheiro e se tranca lá
dentro. Ouço barulhos e logo depois ela surge vestida em uma calça jeans.
Vejo-a caminhar até a mala e começar a jogar suas coisas dentro sem ter o
cuidado de que elas fiquem desarrumadas.
— O que você está fazendo? — pergunto de onde estou sentado sobre
a cama.
— Estou indo embora — ela responde firme.
O quê? Não! Não! Não!
— Como assim, indo embora?
Ela começa a fechar a mala.
— Não vou conseguir, Andrew — Jamie responde. — Não posso
fazer isso sem confiança, lealdade e fidelidade. Desde o começo eu disse que
isso era algo arriscado e que eu só entraria nessa se você estivesse comigo.
Eu pensei que você estava, mas pelo visto me enganei.
— Você não pode me deixar agora.
Levanto-me às pressas e me aproximo dela.
— Não dá mais, Andrew — Jamie murmura.
Eu tento tocá-la, mas ela se afasta como se não suportasse estar
próximo de mim.
— Você assinou a merda do contrato! — relembro-a. — Você não
pode sair desta por um ano!
— Você está se esquecendo, seu idiota, que você foi o único que
acabou de quebrar esse acordo! — ela grita, avançando em mim novamente e
socando meu peito com os punhos pequenos. Eu não me mexo e deixo que
ela desconte sua raiva. — Tudo porque você não pode ficar um dia sem
foder!
— Já faz duas semanas, não um dia — digo. Jamie se vira e agarra a
mala de rodinhas. Seguro o pulso dela, fazendo-a se virar novamente. — E eu
não quebrei o contrato, Jamie, eu não transei com ninguém.
— Não importa, você ia! — ela aponta.
— Jamie, não faz isso, pelo amor Deus — peço. — Se você for
embora, vai estar tudo acabado para mim.
— Talvez seja exatamente isso que você precise, Andrew. Talvez
você precise perder, ao invés de ganhar sempre. Quem sabe dessa maneira
você aprende, né?
Ela dá um puxão e eu solto seu pulso. Ela se vira, pega a mala e
caminha em direção à porta. Assisto-a abrir a porta e passa por ela, sem nem
mesmo olhar para trás. Meu coração está batendo acelerado dentro do meu
peito e eu estou suando. Ela está fazendo isso, ela está indo embora. Estou em
choque, porque tudo pelo que lutei para conseguir, todas as mentiras que eu
contei para chegar até aqui terão sido em vão se ela for. Se ela me deixar,
acabou. Vou perder tudo, meu emprego, minha família e o amor da minha
avó. Não vou ser nada.
Pisei na bola, e muito feio. Sei que a Jamie não merecia isso, quando
eu a trouxe para esse negócio dei a minha palavra de que seria fiel. Eu posso
não ter transado com aquela garota, mas eu ia. Ela está certa, talvez eu não
mereça nada disso. Só que eu sou assim, impulsivo e egoísta. E agora, mesmo
sabendo que o melhor para Jamie é estar longe de mim e dessa encrenca, eu
ainda não consigo aceitar. Eu não quero falhar agora, quando tudo estava
indo tão bem. Isso não pode terminar assim, não assim.
Saio correndo.
Corro para fora do quarto o mais rápido que eu consigo e, quando
vejo que o elevador está ocupado, vou em direção às escadas. Desço os
degraus de dois em dois e a adrenalina toma conta do meu corpo. Não vou
deixar que ela vá, não agora. Chego ao térreo e vou para o hall. As pessoas
começam a me encarar chocadas e algumas começam a gritar comigo. Só
então noto que estou apenas de boxer preta. Não tenho tempo para me
arrepender, vejo Jamie na porta do hotel saindo. Volto a correr enquanto as
pessoas apontam para mim. Saio do hotel e desço os degraus.
— Jamie! — grito. — Jamie!
Ela olha para trás e seus olhos se arregalam.
— O que você está fazendo, Andrew?
— Você… não… pode… ir… agora — ofego, parando em frente a
ela.
— Você não pode me obrigar a ficar — ela diz.
— Você está certa. — Respiro fundo. — Você não merece apenas
metade de mim nesse acordo, você precisa do Andrew inteiro. Eu fui um
idiota por querer traí-la, por deixá-la sozinha e permitir que te drogassem.
Juro que eu me arrependo disso, e se eu pudesse voltar atrás não aconteceria.
Jamie, eu preciso de você e sei que eu não tenho o direito de te pedir isso,
mas eu vou pedir: Fique comigo, por favor. Não posso continuar se a minha
falsa noiva não estiver comigo. Prometo que eu não vou mais pisar na bola,
prometo que eu serei verdadeiro com você daqui em diante.
— Por que eu deveria acreditar em você? — ela pergunta tristemente.
— Eu tenho mais a perder do que você, Jamie — respondo. — E você
sabe disso, você sabe o quanto tudo isso é importante para mim. Não estou
mentindo, e você sabe disso porque eu estou olhando dentro dos seus olhos e
implorando para que fique comigo. Estou desviando os olhos? Não, certo?
— Senhorita, algum problema? — um segurança pergunta
aproximando-se da gente.
Jamie olha para o segurança, depois para a sua mala e então para
mim. Estou respirando rápido e pesadamente. Estou torcendo para que ela
acredite em mim e não tiro os meus olhos dos dela para que ela saiba que
estou sendo sincero.
— Senhorita? — o segurança insiste.
— É a sua única chance, Andrew — Jamie diz.
Isso! Isso! Ah, Drew, você é o cara!
— Obrigado, Jamie, obrigado!
Puxo-a para os meus braços, ela dá um gritinho assustada enquanto eu
a aperto contra o meu peito e a levanto nos meus braços, rindo, porque estou
feliz pra caralho.
— Andrew, me solta! — ela exige, e eu a solto imediatamente.
— Só porque aceito ficar não quer dizer que não continuo brava com
você.
— Tudo bem, você está certa em ficar brava comigo. Eu também
ficaria bravo comigo, sou um babaca às vezes.
— Bom saber que você reconhece isso.
Sorrio.
— Não vou decepcioná-la, Jamie, prometo.
— Eu espero que não, Andrew, porque não vai ter uma segunda
chance. — Ela corre os olhos de cima a baixo sobre o meu corpo. — E você
está só de cueca.
— Eu sei. — Solto uma gargalhada e olho em volta, as pessoas estão
nos encarando. — Elas estão curtindo o show, sou gostoso de olhar.
Jamie revira os olhos.
— Tudo bem, senhor gostoso de olhar, leva a minha mala lá para
cima, se você não se importa de andar por aí assim. — Ela faz um gesto para
a minha cueca, depois vira as costas e sai andando.
— Jamie, você que trouxe a mala aqui pra baixo! — reclamo.
— Você foi o culpado por isso. — Ela pisca e entra no hotel me
deixando parado no meio da calçada de cueca com a big mala.
***
Jamie e eu tomamos café juntos, e ela volta a falar comigo
novamente, mas eu sei que ela ainda está um pouco magoada com tudo o que
aconteceu. Tomo um banho e enquanto Jamie toma o dela vou até a farmácia
e compro aspirinas. Volto ao hotel e ela está arrumando a mala, desta vez,
com calma. Dou o remédio a ela acompanhado de um copo de água e ela me
agradece baixinho. Deixamos o hotel logo depois.
Voltamos para a estrada, pois temos mais doze horas de viagem pela
frente. Ligo o som, e Here Without You de 3 Doors Down começa a tocar.
Começo a cantarolar acompanhando a música, e Jamie fica me observando.
Assim que a música termina, ela insere outro CD. Um segundo depois a voz
de Katy Perry surge no último volume. Quase penso em trocá-lo, mas volto
atrás, porque não quero arranjar outra briga com ela. Então a viagem segue
assim, com uma playlist composta de: Katy Perry, Lady Gaga, Taylor Swift e
qualquer outra cantora pop.
Fazemos várias paradas em postos de conveniência para que Jamie
possa ir ao banheiro, para que ela compre besteiras para comer no caminho,
para que ela simplesmente possa se olhar no espelho e descansar as pernas.
Acho que ela está me provocando, me testando. Acho que ela está tentando
encontrar uma forma de fazer com que eu discorde dela, assim ela pode jogar
isso na minha cara e pular para fora imediatamente. Mas eu estou paciente e,
depois do que eu fiz, acho que mereço isso. Então se a Jamie acha que fazer
essas coisas contra mim é um bom castigo, que seja. Eu aceito qualquer coisa
para mantê-la.
Quando chegamos a Fort Worth, no Texas, já é noite. A casa de
fazenda onde o pai de Jamie mora é grande, assim como a propriedade toda.
Estaciono o carro bem em frente ao casarão iluminado. Olho para Jamie e
vejo que ela está sorrindo, completamente feliz por finalmente termos
chegado ao nosso destino. Desço do carro e ela também, sem esperar que eu
abra a porta para ela. Ouvimos barulhos vindos da casa, e eu sei que estou
prestes a conhecer mais pessoas da sua família. Inclusive seu pai.
— Andrew, se comporte — Jamie diz ao meu lado.
— Vou ser um anjo, querida.
— Estou falando sério — ela diz, encarando-me. — O meu pai tem
uma arma.
Quê?
— O quê? — pergunto. — Seu pai tem uma arma?
— Várias, na verdade.
Engulo em seco.
— Por que seu pai tem uma arma?
— Porque ele é um policial aposentado, ué — ela responde. — Ele
tem porte de arma e sabe muito bem como usar uma.
— E você só me diz isso agora?
— Não se preocupe, querido. Meu pai só usaria uma arma contra você
se ele desconfiasse do nosso noivado. Ele é bom em detectar mentirosos.
— Nossa, Jamie, você está me ajudando tanto.
Ela solta uma risadinha.
— Estou falando sério, seja um bom noivo — ela avisa. — Ou…
— Ou… Ou o quê?
— Ou eu o mando arrancar o seu pau com um tiro certeiro.
Solto uma risada, nervoso.
— Não brinque com uma coisa dessas, Jamie.
— Quem é que está brincando aqui? — Ela me encara seriamente, e
eu estremeço.
Ouvimos um estrondo e de repente uma mulher e um homem mais
velho aparecem na varanda. O sorriso de Jamie alarga, e ela corre na direção
do homem que eu acredito que seja seu pai. Dou um passo em frente e rezo
para que o meu pau saia intacto dessa visita.
CAPÍTULO QUINZE
--—————————————————————————————

Jamie

— Abelhinha!
Papai me puxa para um abraço apertado e me ergue em seus braços,
levantando-me alguns centímetros do chão. Seu cheiro infesta minhas
narinas, uma mistura de sabonete de ervas e conhaque. Quase choro de tanta
felicidade, porque faz muito tempo que eu não o vejo e estou com tanta
saudade que não cabe no peito. Nem consigo expressar em palavras como é
bom que ele esteja tão pertinho de mim. Abraço-o ainda mais forte.
— Papai, estava com tanta saudade!
— Ah, abelhinha, por que não me avisou que vinha? — Ele me afasta
e olha para mim. Está sorrindo, alegre em me ver.
— Eu queria fazer uma surpresa para o senhor.
— É uma surpresa maravilhosa, querida. — Papai toca o meu rosto e
acaricia a minha bochecha. — Estou tão feliz que esteja aqui, senti sua falta.
— Senti a sua muito mais — murmuro, apertando-o mais uma vez em
um abraço.
— Você está tão linda, abelhinha. — Papai beija o topo da minha
cabeça, e então eu me afasto. — Deixe-me olhar para você mais um pouco.
Dou um passo para trás, e ele me faz dar um giro completo para me
olhar de cima a baixo. Estou rindo porque ele parece fascinado com a minha
mudança de visual. Minha tia, Annete, se aproxima e afasta o papai,
empurrando-o com uma colher de pau. Ela dá um gritinho animado quando
me vê e me puxa para os seus braços.
— Meu Deus, menina! — tia Annete exclama. — Como está linda!
— Obrigada, tia — murmuro envergonhada.
— Ah, se eu soubesse que vinha teria preparado a torta de maçã que
você tanto gosta! — tia Annete diz. — Mas eu fiz fudge de chocolate hoje
cedo e sobraram alguns!
— Você sabe que eu amo qualquer coisa que você faz, tia —
respondo.
— Você está tão magrinha — ela repara. — Vou colocar um pouco de
massa em você antes que suma de vez!
Ouço uma risadinha atrás de nós e me viro ao mesmo tempo em que
papai e tia Annete olham na mesma direção. Andrew está parado em um
degrau da varanda, encostado no corrimão de madeira. Ele está se
controlando para não rir, mas pela expressão em seu rosto parece que está
sendo difícil. Tinha até esquecido que ele veio comigo, quando vi o papai me
esqueci de tudo ao meu redor. Inclusive do motivo que me trouxe até aqui, e
também de apresentar ao resto da minha família o meu falso noivo.
— Oh, nossa. — Tia Annete aponta com a colher de pau na direção
de Andrew. — De onde foi que saiu esse moço?
— De Nova Iorque, tia — respondo e acrescento. — Foi ele que me
trouxe até aqui para visitá-los.
— Qual o seu nome, filho? — papai pergunta a ele, e Andrew sobe os
degraus para se juntar a mim.
— Andrew Simons, senhor — Andrew responde estendendo a mão
para cumprimentar meu pai. — É bom conhecê-lo pessoalmente.
— Walter Collins. — Papai aperta a mão de Andrew e balança forte
algumas vezes. — Será que já ouvi falar de você? O nome não me é estranho.
— Papai, eu tenho algo muito importante para contar ao senhor —
digo.
— Então diga, abelhinha, estou escutando. — Papai me observa, com
atenção.
— Ah, o que é isso? — tia Annete interrompe. — Vocês acabaram de
chegar! Vamos entrar primeiro, e depois podem conversar o quanto
quiserem! Os meninos vão adorar ver você, Jamie! Senhor Simons, seja bem-
vindo à nossa humilde casa!
— Obrigado, dona Annete — Andrew agradece. — Pode me chamar
só de Andrew.
— Annete tem razão, vocês fizeram uma longa viagem — papai fala.
— Precisam comer e descansar.
— Tudo bem, papai, mas queremos falar com você essa noite —
insisto.
— Queremos?
— Sim, Andrew e eu.
— Mmmm. — Papai olha de mim para Andrew e de volta para mim.
— Tudo bem, abelhinha, mais tarde.
Tia Annete nos leva para o interior de sua casa e vai imediatamente
oferecendo um lugar para que Andrew e eu nos sentemos na sala. Ela dá um
grito alto chamando pelos meninos e depois se retira para ir até a cozinha
olhar as panelas que estão no fogo. Papai se senta em uma poltrona marrom
grande e velha bem em frente a mim e a Andrew e nos encara com
curiosidade. Fico um pouco nervosa, porque sei que a qualquer momento
vamos ter que contar a ele sobre o casamento, e não faço ideia de qual será
sua reação. Eu espero que ele tenha gostado do Andrew, apesar dos olhares
de desconfiança que ele está lançando a ele.
— Então você é o namorado dela, é isso? — papai pergunta de
repente, inteligente como sempre em captar as coisas.
Andrew tosse.
— Papai, a gente conversa sobre isso depois — murmuro.
— Só quero saber se ele é o seu namorado. — Papai dá de ombros,
despreocupado.
— Não, ele não é — respondo.
— O que ele é seu, então? — papai insiste.
— Meu chefe — conto.
— Ah, claro, sabia que o nome não me era estranho! — Papai se
inclina para frente e coloca os cotovelos sobre os joelhos. — É aquele babaca
cujo café você cospe dentro?
Ai, merda!
— Como é? — Andrew franze o cenho e se inclina na minha direção.
— Que história é essa?
— Papai! — repreendo-o.
— Pensei que você tivesse dito que o seu chefe era um idiota, com
nível alto de arrogância e muito mulherengo — papai menciona trechos de
coisas que eu disse em conversas que tivemos algumas vezes sobre o meu
emprego. — Devo estar enganado, certo? Você não andaria com este tipo de
gente.
— Pai, não é bem assim… — tento explicar. — Ele é um babaca sim,
mas ele não é tão ruim.
Andrew escancara a boca e me enfrenta com os olhos semicerrados.
— Você cospe no meu café? — pergunta-me sério. — E você disse ao
seu pai que eu sou um babaca?
— Foi só algumas vezes, Andrew, relaxe.
— O que está acontecendo aqui, afinal? — papai pergunta. — Por que
viajaram juntos? O que o seu chefe está fazendo aqui, abelhinha?
— O jantar está pronto! — tia Annete anuncia interrompendo nossa
conversa ao retornar para a sala. — Os meninos não desceram?
— Não, tia — respondo, ainda olhando para o papai.
— Egan! Duane! — Tia Annete grita tão alto que me faz saltar no
assento. — Desçam já aqui, garotos! Vocês não vão querer que eu suba aí,
nós temos visitas!
Ouço barulhos de passos pesados vindos do andar de cima, seguidos
pelas vozes alteradas dos meus primos. Logo depois os passos se aproximam,
descendo pelas escadas com rapidez. Minha tia teve dois meninos, o mais
velho é o Egan, que tem minha idade. Ele é um rapaz bom, trabalhador e que
ajuda muito a família. Seu irmão mais novo, Duane, de dezenove anos,
também é um rapaz maravilhoso. Eles são todos muito companheiros e
atenciosos, e eu sempre me dei muito bem com ambos. O pai deles, assim
como minha mãe, morreu muito cedo. Tia Annete teve que criá-los
praticamente sozinha e só passou a ter outra companhia além dos meninos
quando o papai veio morar com ela por não conseguir mais viver em Nova
Iorque.
Levanto-me do meu assento no momento em que Duane chega ao fim
da escada. Como sempre ele está usando calças jeans, uma camiseta velha
branca e um chapéu de cowboy. Todo desleixado e sem dar nenhuma
importância para isso. Mas confesso que, mesmo com o cabelo revoltado, ele
é uma gracinha. Seus olhos se arregalam quando ele me vê, e ele abre um
sorrisinho tímido.
— Jamie? — pergunta incerto. — Prima, é você?
— Oi, Duane — murmuro.
— Cê tá linda demais! — elogia-me.
— Obrigada.
Ele se aproxima e me puxa para os seus braços, enquanto eu retribuo
seu abraço. Ouço mais passos, vozes e logo meu outro primo se junta a nós.
Assim como uma terceira figura masculina que eu reconheço imediatamente.
Kurt — o rapaz mais cobiçado da cidade — e também meu velho amigo. Era
de se esperar que ele estivesse aqui na fazenda, já que ele é amigo de Egan
desde pequeno. Houve um tempo em que Kurt foi interessado por mim,
chegou a me pedir em namoro, fez juramentos de que iríamos nos casar e
viver no Texas com nossos cinco filhos. O problema é que na época eu tinha
outros problemas para resolver, nem pensava nesse tipo de vida que o Kurt
sonhava em ter comigo. Fora que ele sempre foi um pouco maluquinho, vivia
se metendo em brigas de bares, se envolvia com mais de uma garota ao
mesmo tempo, participava de qualquer rodeio que tivesse e arriscava a vida
em cima de touros sem dar nenhuma importância. Eu não sei se ele ainda faz
isso, mas uma coisa é certa, ele continua tão lindo quanto antes.
— Ei, pessoal, a Jamie veio nos visitar toda bonitona! — Duane diz,
rindo para si mesmo.
Sinto um toque na parte baixa das minhas costas e vejo que Andrew
está de pé ao meu lado. Ele se abaixa apenas um pouco para sussurrar no meu
ouvido:
— Apresente-me o resto da sua família, querida — ele diz
entredentes. — E depois vamos a algum lugar reservado, acho que temos um
assunto inacabado para resolver.
Ixii! Tô fora!
— Esses são os meus primos Egan e Duane — digo e depois aponto o
último cowboy. — E aquele é o Kurt, um amigo.
— Amigo só porque você me deu o fora — Kurt diz, lançando-me um
sorriso torto. Ele faz um gesto além de mim. — E esse cara aí, quem é?
— O que não ganhou um fora. — Andrew pisca para ele e estende a
mão, dizendo logo em seguida, em tom de deboche. — Andrew Simons, o
noivo.
— Noivo? — Egan e Duane perguntam em uníssono.
— Que noivo o quê?! — papai exclama. — De onde tirou isso,
rapaz?!
— Oh, então é por isso que esse moço de Nova Iorque tá aqui — tia
Annete diz. — Não acredito que Jamie arranjou um noivo!
— Não sabia que era isso o que você curtia. Tá namorando
playboyzinhos, é, Jamie? — Kurt pergunta-me.
— Aqui no Texas não tem escola, não? — Andrew pergunta,
encarando Kurt. — Ou você ainda não chegou à série que ensina a diferença
de namoro para noivado?
Kurt fecha as mãos em punho e dá um passo à frente. Enfio-me entre
ele e Andrew.
— O que deu em você, Andrew? — resmungo baixinho. — Fica na
sua.
— Eu acho melhor vocês todos ficarem quietos agora! — papai ruge e
aponta um dedo na minha direção. — Jamie Marie Collins, quero você no
escritório agora mesmo, e traga esse infeliz antes que o Kurt quebre o nariz
dele.
Papai deixa a sala e segue para o corredor sem olhar para trás.
Empurro Andrew e faço um gesto para que ele me siga. Droga! Não era
assim que eu queria que o papai ficasse sabendo do noivado, ou melhor, do
casamento. Andrew e sua boca grande tinham que interferir. Papai abre a
porta do escritório, acena para entrarmos e logo depois fecha a porta. Ele
assume sua antiga postura de policial durão e caminha ao redor da mesa para
sentar-se em sua poltrona.
— Sentem-se, os dois — papai ordena apontando as cadeiras.
Andrew e eu nos sentamos.
— Papai, não é bem o que você está pensando…
— Você não sabe o que eu estou pensando, Jamie — papai diz, e
como ele está usando o meu nome, em vez do apelido, eu decido não
interromper. — Então você está noiva?
— Estou — murmuro.
— Desse cara? — Ele aponta para Andrew.
— Sim — afirmo.
— E ele é seu chefe? Aquele que você achava um idiota?
— Sim — afirmo novamente.
— Há quanto tempo estão noivos?
— Oficializamos semana passada em um almoço com a família de
Andrew — explico.
— Por que não me contou, abelhinha? — papai pergunta tristemente.
— Senhor Collins, foi eu que pedi a Jamie que não contasse —
Andrew interrompe. — Eu queria conhecê-lo primeiro e vim até aqui para
pedir a mão de Jamie oficialmente ao senhor. Eu quero me casar com a sua
filha, e nós dois queremos a sua bênção.
— E se eu disser que não abençoo vocês? — papai pergunta,
encarando Andrew intensamente. — E se eu disser que não aprovo essa
união?
— Papai!
— Então nós sentiremos muito, senhor Collins — Andrew continua.
— Porque gostaríamos de ter a sua aprovação, no entanto, não importa se o
senhor for contra, ainda iremos nos casar.
— Você quer se casar com esse cara, abelhinha? — papai pergunta,
desta vez, concentrado em mim.
— Sim.
— Você sabe, Jamie, o que eu penso sobre o casamento — papai
prossegue. — Se vai se casar, tem que ter amor. Se vai se casar não há mais
volta. É eterno. Não quero filha minha divorciada, não quero filha minha
arrependida. Ou casa para sempre, ou não casa nunca.
— Eu sei, papai.
— E você. Andrew? — Papai o estuda silenciosamente. — Você sabe
que se levar a minha filha para o altar não vai ter volta, certo?
— Hãã, sim, senhor.
— Você está feliz, abelhinha? — papai pergunta.
— Estou — afirmo, embora tudo o com o que eu tenha concordado
não passe de mentiras e mais mentiras.
— Sua felicidade sempre vai ser o mais importante, minha filha —
papai murmura. — Andrew, eu ainda não me decidi se gosto de você ou não,
mas uma coisa é certa, se magoar a minha filha vai pagar muito caro por isso,
você me entende?
— S-sim, senhor — Andrew gagueja.
— Vocês têm a minha benção. — Papai sorri. — E me deem netos.
— Obrigada, papai, obrigada! — agradeço. Levanto-me do meu
assento e dou a volta na mesa para poder abraçá-lo.
— Está certo, está certo. — Papai me abraça. — Vamos jantar e
contar a novidade para os outros.
— Senhor Collins, há mais uma coisa — Andrew diz levantando-se.
— Jamie e eu queremos nos casar em breve, talvez em algumas semanas.
— Tão rápido?
— Sim, papai. Queremos nos casar logo e não será na igreja, também
não vamos fazer festa. Vai ser tudo muito simples.
— O quê? Por que isso? — papai pergunta.
— Eu quero assim, pai — murmuro.
— Você merece mais, abelhinha, você merece tudo.
— Eu concordo, senhor Collins — Andrew diz. — Por mim nos
casaríamos na igreja com uma grande festa.
— Tem certeza de que é isso o que você quer, abelhinha? — papai
insiste.
— Sim, eu tenho.
— Será do seu jeito então. — Papai acena de acordo. — Será que há
mais alguma coisa?
— Não. — Sorrio. — Podemos jantar agora.
— Ótimo!
Eu me viro, e Andrew dá uma piscadinha para mim. Sorrio em
resposta e saio do escritório. Ouço atrás de mim o papai pousar uma mão
pesada sobre o ombro de Andrew e alertá-lo:
— Escute aqui, filho, o que eu disse antes está valendo. Saiba que eu
poderia matar e enterrar um cadáver e ninguém jamais descobria.
— Entendido, senhor — Andrew sussurra.
— Faça a minha abelhinha feliz.
— Eu farei, senhor.
Então o papai seguiu em frente no corredor, e Andrew finalmente
soltou o ar que estava segurando. Não me aguentei e ri da expressão de horror
em seu rosto.
— Não vejo nada engraçado — ele diz emburrado.
— Você está branco — aponto. — Tem certeza de que está bem?
— Estou ótimo, o seu pai gosta de mim, ele pode não saber disso
ainda, mas ele gosta de mim — Andrew diz convencido e acrescenta: —
Agora vamos lá, abelhinha.
— Só o meu pai me chama assim.
Andrew ri.
— Não mais.
***
Jantamos todos juntos ao redor da mesa de madeira da tia Annete. A
comida como sempre está deliciosa, minha tia sempre cozinhou muito bem,
Jane deveria ter umas aulas com ela. Papai anunciou a todos que eu e Andrew
estamos noivos. Ele também disse que pretendíamos nos casar em breve e
que ele estava feliz por mim. Andrew se deu muito bem com a minha tia, que
não parava de chamá-lo de “moço de Nova Iorque” e ficava lhe perguntando
como era ser rico. Foi a pior pergunta que minha tia poderia ter feito a ele, já
que Andrew aproveitou o momento para falar sobre sua grande mansão, seus
ótimos carros e todas as viagens que ele já fez na vida. Fiquei feliz por ele ter
omitido as festas e as garotas. Quem também se deu bem com Andrew foi o
meu primo mais novo, Duane, que ficou fascinado quando soube que além de
ser o dono do Tesla estacionado em frente ao casarão, ele também tinha em
sua coleção uma Mercedes. Os dois ficaram um tempão conversando sobre a
potência dos motores e outras coisas que eu não tinha ideia do que
significavam.
Já o Egan não foi muito com a cara do Andrew, parecia desconfiado
sempre que olhava entre mim e ele. Mas acho que na verdade aquilo era
simplesmente preocupação, afinal o Andrew era rico, era meu chefe e não
tinha nada a ver comigo em qualquer aspecto. Acho que isso pode despertar
desconfiança em qualquer um. Egan também disse que eu estava muito
bonita, mas que ele gostava mais de mim antes. Achei engraçado meu primo
aprovar a minha feiura. Outro que também não foi muito com a cara do
Andrew foi o Kurt. Mas eu culpava Andrew totalmente, afinal, foi ele que
começou de implicância com o meu amigo. Kurt não está acostumado a me
ver com rapazes, na verdade, acho que nunca me viu próxima de qualquer
um. Acho que ele sempre acreditou que um dia eu voltaria para o Texas e
pediria para viver a vida com ele como ele propôs há alguns anos quando
éramos praticamente crianças.
Quando o jantar terminou e tia Annete trouxe a sobremesa, Kurt e
meus primos deixaram a mesa e foram para a varanda com o violão. Olhei
para Andrew e vi que ele estava entretido em uma conversa sobre caça com o
meu pai, enquanto minha tia vez ou outra se intrometia. Eu sabia que o papai
estava testando Andrew, buscando conhecê-lo e avaliá-lo para saber se ele
seria mesmo um bom noivo para mim. E eu acho que o Andrew tinha
consciência do que o meu pai estava fazendo, porque até agora ele tinha sido
muito educado e não deu um único passo em falso. Ele pode até ser um
babaca, mas de burro Andrew não tem nada.
Levantei-me sem que ninguém se desse conta e fui até a varanda.
Duane estava tocando o violão sentado sobre a mureta. Egan estava deitado
na rede, e Kurt apoiado em uma pilastra de madeira, olhando para o céu
escuro e estrelado. Encostei-me na outra pilastra em uma posição parecida
com a dele e olhei para o céu também.
— Você está muito bonita, Jamie — Kurt diz, sem tirar os olhos do
céu. — Não tive a oportunidade de dizer isso antes, mas você está incrível.
— Obrigada, Kurt — sussurro. — Você também continua lindo, a
propósito.
— O que aquele playboyzinho tem que eu não tenho, então?
Suspiro.
— Não quero falar sobre isso, Kurt.
— Se não existisse ele, eu ainda teria chances?
— Não, Kurt, não teria. — Olho para o seu perfil no escuro. — Gosto
muito da sua amizade, mas é apenas isso que é. Não vou viver no Texas,
nunca quis. Meu lugar é em Nova Iorque, e mesmo se algum dia eu pudesse
casar e ter filhos, gostaria de ter algo estável. Você não poderia me dar esse
tipo de vida e sabe disso.
— Do que é que você está falando? — Kurt franze o cenho. — Você
não está prestes a se casar com esse cara e formar uma família com uma vida
estável?
— Ah… É, claro. — Que deslize! — É que ainda não consigo
acreditar que vou me casar.
— É. Também não consigo acreditar nisso, sempre achei que viria
morar aqui perto do seu pai e que aceitaria a proposta que te fiz quando
éramos mais jovens.
— Ei. — Toco seu ombro. — Ainda somos amigos, certo?
— Só se você vier comigo ao Tucker’s essa noite. — Ele sorri. —
Vamos lá, Jamie, pelos velhos tempos. Agora pelo menos você tem idade
para beber.
O Tucker’s é um antigo bar que recebeu o nome do seu proprietário.
Quando éramos jovens costumávamos passar as noites do fim de semana lá,
jogávamos sinuca, contávamos piadas e ríamos dos bêbados. Eu nunca bebia,
mas gostava de assistir aos outros dançando. Hoje o bar é ainda mais velho,
mas continua lotado e é quase uma atração na cidade. Eu adoraria voltar lá e
relembrar esses momentos que vivemos. Só que eu já tive uma experiência
pouco agradável com bar e bebidas e não tinha certeza se gostaria de
vivenciar tudo de novo. Mesmo sabendo que Kurt não é como Andrew e
nunca me largaria sozinha e bêbada.
O que Andrew fez mexeu muito comigo. Eu quis odiá-lo quando
soube, fiquei com raiva porque apesar de saber o quão cretino ele era, nunca
pensei que fosse chegar àquele ponto. Eu sabia que mais cedo ou mais tarde
ele ia tentar me trair. Porque é o Andrew, e ele é assim. Ele não liga para mim
e não se importa com nada. Só não achei que isso fosse acontecer durante a
viagem, só não pensei que ele fosse foder com uma garota dentro do mesmo
bar onde eu estava.
Quase desisti de tudo, cheguei a pegar a minha mala e deixar o hotel.
Gastei minhas lágrimas porque acreditava que Andrew podia ser melhor que
aquilo, que ele podia, sei lá, mudar e aceitar o nosso contrato. Ser fiel e leal a
mim. Fui uma tola e por isso mesmo quis correr para longe e me esconder. Só
que no fim pensei melhor e vi que eu sairia perdendo mais do que ele.
Andrew podia inventar algumas desculpas e muitas outras mentiras e se
safaria com a sua avó. Já eu perderia o dinheiro, perderia o emprego, perderia
a casa, perderia minha família. Perderia tudo. Não era justo. Não era certo
que depois de tudo o que eu tinha inventado, de todas as mentiras que contei
à minha família, eu simplesmente desse as costas e fosse embora. Eu não amo
Andrew mesmo, então por que me preocupar que ele queria foder uma garota
aleatória? Não, eu não podia deixar o meu coração mole levar essa. Tinha
chegado o momento de pensar com a cabeça.
Foi por isso que eu dei outra chance a ele e voltei ao jogo. Ele me
prometeu que a partir de agora será verdadeiro e cumprirá o acordo. Eu
duvido muito disso, mas no fim não me importo se ele quebrar as regras de
novo. Ele quer ganhar, e eu também. No entanto, isso não quer dizer que não
vou manter um olho bem alerta quanto a ele, muito pelo contrário, a partir de
agora não confio em Andrew e estarei sempre desconfiada. Ele acha que eu
sou uma garota inocente e ingênua. Mas ele está malditamente enganado, ele
não deveria confundir o meu bom coração com burrice. Porque se eu quiser
posso mostrar a ele o meu outro lado, um lado totalmente desconhecido, mas
que vive dentro de mim. E que está cada vez mais desesperado para sair e
provar a Andrew que eu sou muito mais do que ele pensa.
— Jamie? — Kurt balança a mão em frente ao meu rosto. — Jamie,
você está aí?
— Sim, desculpe.
— Então, vai sair para beber comigo ou não?
De repente me dou conta de que talvez sair com Kurt seja a melhor
coisa a fazer neste momento. Ele é meu amigo, e eu gosto de me divertir com
ele. Kurt me faz sentir como se eu fosse uma garota bonita e desejada.
Mesmo que eu não queira nada com ele, não significa que ele não possa me
fazer feliz por uma noite. Se Andrew pode ter um pouco de diversão em uma
maldita salinha com uma desconhecida, por que eu também não posso ter o
meu tipo de diversão? Ah, sim, chegou a hora de parar de me esconder.
Sorrio travessa.
— Eu adoraria sair para beber com você.
— Ótimo. — Kurt sorri lentamente. — Você tem meia hora para ficar
pronta.
— Estarei aqui em dez minutos — aviso.
Volto para dentro, pego a minha mala, que Andrew deixou na sala, e
subo para o quarto de hóspedes. Vou para chuveiro e tomo um banho rápido.
Retorno ao quarto, abro minha mala e procuro algo para vestir. Eu enfiei um
monte de peças de roupas que Abigail comprou aqui dentro e agora não faço
ideia do que usar. Seguro um par de jeans nas mãos, mas depois desisto, pois
está muito calor essa noite. Pego uma saia longa floral na mão e quando
penso em vesti-la a imagem de Abigail vem à minha mente, dizendo as
seguintes palavras: Esta saia é linda, você poderá usá-la quando estiver na
praia. Obviamente eu não estou na praia, então acabo desistindo. O próximo
item que seguro na mão é um vestido preto justo. Descarto imediatamente, se
o papai me vir vestida nisso vai à loucura. Então os meus olhos pousam sobre
o mini short jeans que faz conjunto com um colete também jeans. É
extravagante, insinuante e lindo. Não é o tipo de coisa que eu uso. Mas,
afinal, essas malditas roupas são minhas, certo?
Penso em Andrew. Ele me disse que a maneira como eu me visto é
ridícula e que comprou essas roupas para que eu vista e seja uma noiva
apresentável. Talvez ele esteja certo, talvez eu esteja acabando com o pouco
de beleza que ainda tenho. Talvez eu deva mudar e mostrar ao mundo que eu
posso ser bonita. Não apenas essa noite, mas todos os dias.
Andrew quer uma noiva sexy? Então é exatamente isso que ele vai
ter!
Estou aplicando um pouco de maquiagem no meu rosto, quando ouço
a batida na porta. Digo para a pessoa do outro lado entrar e, logo em seguida,
Andrew está dentro do pequeno quarto comigo. Coloco o batom para baixo
sobre a penteadeira e levanto-me. Viro-me e olho para ele, sorrindo. Andrew
arregala os olhos e depois franze o cenho. Ele corre os olhos desde a minha
bota de salto alto e cano longo, pelas minhas pernas nuas, o shortinho, a
barriga de fora e a miniblusa com o colete por cima. Ele para um segundo na
minha boca pintada de vermelho e depois sobe para os meus olhos delineados
de preto.
— Uau.
— O que você achou? — pergunto. — Ah, pera aí, falta uma coisinha.
Pego o chapéu de cowgirl sobre a cama e coloco na minha cabeça.
— E agora? — Dou uma voltinha e olho para sua cara de bobo.
— Tá… Legal.
— Legal? — repito fechando a cara. — Só legal?
— Aonde é que você vai? — Andrew pergunta-me mudando de
assunto.
— Vou ao Tucker’s beber com o Kurt — respondo.
— O. — ele diz. — Fico pronto em cinco minutos.
— Por quê?
— Pra ir com você, ué.
Solto uma risada.
— Andrew, eu não vou sair com você, eu vou sair com o Kurt.
Sua expressão se fecha em uma carranca.
— Eu sou o seu noivo. Eu tenho que sair com você.
— E eu sou a sua noiva — digo. — Ainda assim isso não impediu
você de querer foder em um bar com uma garota aleatória.
— Ainda isso? — Andrew solta um gemido. — Esqueça aquilo,
Jamie, sério.
— Eu já esqueci, acredite, já esqueci.
— Espere-me aqui, vou tomar um banho — Andrew avisa.
— Não, não! — nego. — Você não entendeu, Andrew, eu não quero
que você vá.
— Como assim? — ele resmunga. — Eu tenho que ir, eu preciso
cuidar de você.
Solto uma gargalhada e uso a ponta dos meus dedos para secar as
lágrimas que se formam no canto dos meus olhos.
— Você quer cuidar de mim? — Rio novamente, e Andrew me dá um
olhar indecifrável. — Eu não acredito que estou ouvindo isso. Andrew, você
foi o único a me deixar sozinha na pista de dança de um bar em um estado
totalmente desconhecido. Você nem pensou em mim quando se mandou para
aquele banheiro. E agora você quer cuidar de mim? Quanta hipocrisia!
— Você está tentando se vingar, é isso? — Andrew pergunta-me.
— Eu, me vingar? — digo. — De jeito nenhum, eu não sou como
você, Andrew. Eu vou sair esta noite e me divertir na companhia dos meus
amigos. Não se preocupe, não vou trair você. Não que você se importe, de
qualquer forma.
— E o que eu vou fazer enquanto você está fora? — pergunta-me.
— Sei lá. — Passo por ele e abro a porta. — Por que não aproveita
para enfiar o seu pau em um tijolo e diminuir essa ereção nas suas calças?
Eu não fico para pegar a expressão de espanto no rosto de Andrew,
em vez disso, desço as escadas rapidamente comemorando em silêncio. Ah,
sim, baby, eu também sei brincar! Encontro Kurt me esperando na camionete
e assumo o lugar no banco do passageiro. Ele elogia a minha escolha de
roupas e não tenta esconder seus olhares de malícia destinados a mim.
***
O Tucker’s está lotado como eu sabia que estaria essa noite. Há uma
nova cantora se apresentando, e ela canta muito bem. A pista está uma
loucura, com todos aqueles corpos quentes e suados dançando, girando e
pulando. Sinto a energia do lugar me invadir e antes mesmo que eu possa
registrar já estou no meio da multidão. No começo apenas observo e
cumprimento todas as pessoas que eu conheço, mas depois que Kurt me traz
algumas bebidas eu começo a ficar animada e danço também.
A música pulsa nos meus ouvidos, e todo o álcool que eu estou
ingerindo faz efeito rapidamente. Eu começo a rir sem sentido e perco toda a
vergonha. Subo no palco e danço com a cantora, vou até as mesas de sinucas
e jogo algumas partidas com os caras. Encontro Tucker — o dono do bar —
atrás do balcão servindo bebidas. Ele me oferece uma por conta da casa, e eu
começo a contar a ele sobre o meu novo noivo e como eu vou me casar em
breve.
Encontro Kurt depois de um tempo, e ele me leva até a sua mesa.
Aponta-me uma garota e um cara que também estão lá. O cara espreme um
limão no pescoço da garota e depois coloca um punhado de sal sobre o ombro
dela. Assisto a ele lamber o sal, em seguida bebe a dose de tequila e arrasta a
língua em direção à garganta dela, chupando o limão que ele espremeu
apenas alguns segundos antes. Meu Deus, isso é quente. Ele simplesmente
tem a língua na boca dela logo depois, e eles estão em um verdadeiro amasso.
— Você quer? — Kurt pergunta-me próximo ao lóbulo da minha
orelha. — Você vai gostar.
— Eu… Humm… Eu não sei — gaguejo.
— Vem comigo.
Kurt me arrasta até o balcão no bar e antes que eu perceba ele me
pega em seus braços e me levanta, colocando-me sentada ali em cima. Ele vai
afastando todas as garrafas e copos de bebida até ter um espaço livre.
— Body shot na Jamie! — ele grita para as garçonetes atrás do
balcão, apontando para mim, e ganha alguns acenos em resposta.
— Eu não acho que seja uma boa ideia, Kurt.
— Não se preocupe, até eu sei que existe alguns limites que não se
devem ultrapassar com moças compromissadas, Jamie. É só uma brincadeira,
não vou fazer nada de mais.
— Tudo bem, eu acho.
— Deite-se — Kurt instrui.
— O-Ok — gaguejo.
— Garotas, ajudem aqui — Kurt chama uma das garçonetes. — Vou
pegar mais limão, Jamie. Vai ser rápido, aguente aí.
Kurt sai e me deixa sozinha, deitada sobre o balcão. Uma garçonete se
aproxima e ergue a minha blusa, expondo ainda mais a minha pele,
praticamente deixando o meu sutiã à mostra. Ela me diz para ficar quieta e
depois coloca um punhado pequeno de sal abaixo do meu umbigo em um
lugar perigosíssimo. Tucker derrama um pouco de bebida no meu umbigo, e
todo o caminho até o vale entre os meus seios. A garçonete pede para que eu
abra a boca e ela coloca uma fatia de limão entre os meus lábios. Neste
momento já há uma multidão ao nosso redor assistindo. Eu estou nervosa e
quase me movo, mas Tucker segura os meus ombros no lugar e me diz para
fechar os olhos e relaxar.
Eu já estou embriagada e faço exatamente o que ele diz. Fecho os
meus olhos e me concentro no barulho alto da música e nas conversas ao
nosso redor. Eu não me movo um centímetro sequer e conto os segundos para
ter uma língua quente e macia passeando pelo meu corpo. Isso parece algo
divertidíssimo, o tipo de aventura que eu preciso viver alguma vez na vida.
Dou um salto quando sinto uma mão pesada na lateral do meu quadril e quase
me movo. Quase. Felizmente mantenho os meus olhos fechados para não
enxergar toda a vergonha que eu devo estar passando. Não quero pensar nisso
agora, quero apenas viver o momento.
Como eu imaginava uma boca quente paira bem abaixo do meu
umbigo. A respiração quente e rápida de Kurt toca minha pele causando
arrepios que viajam até o meu couro cabeludo. Finalmente ele suga o sal com
a língua que é áspera e macia ao mesmo tempo, uma combinação de ambos.
Minha respiração acelera, e os dedinhos dos meus pés se contorcem. Sua
língua segue viagem para cima, bem no meu umbigo, e ele suga e lambe com
avidez. É como se ele estivesse sedento pelo líquido, sugando e chupando até
a última gota. Solto um gemido baixo e me amaldiçoo por me sentir tão bem
com o que eu estou fazendo.
Sua língua continua o trajeto da bebida, sugando tudo, apertando-me
firme com suas mãos fortes, até finalmente chegar ao vale entre os meus
seios. Isso é errado, eu não deveria estar fazendo isso, eu não sou assim, eu
não sou esse tipo de pessoa. Mas por que eu não consigo parar e, pior, por
que eu quero mais? E ele me dá mais, ele raspa a língua entre os meus seios e
suspira contra a minha pele. Engulo em seco, e um segundo depois sua boca
está na minha. Primeiro chupando apenas o limão, em seguida, usando os
próprios dedos para retirar a fatia da minha boca e substitui-la pelos seus
lábios.
Abro os meus olhos imediatamente e quase empurro Kurt para longe
de mim por seu atrevimento. Quase. Exceto que os olhos azuis que me fitam
por baixo de cílios longos e escuros não são de Kurt.
— Eu não sabia que eu tinha uma noiva tão safada — Andrew
sussurra com sua boca pairando a centímetros dos meus lábios. — Saiba que
você está encrencada.
Pisco uma, duas, três vezes.
— O que você está fazendo aqui? — deixo escapar.
— Estou certificando-me de que ninguém, além de mim, tenha a
boca, a língua, o corpo, ou qualquer outra coisa sobre você.
— Eu só estava me divertindo — sussurro.
— Eu também — ele diz, piscando um olho para mim. — E nós
vamos continuar essa diversão em outro lugar.
Oh, meu Deus!
CAPÍTULO DEZESSEIS
--—————————————————————————————

Andrew

Eu acho que nunca fiquei tão duro na minha vida.


Meu sangue correu todo para baixo, acumulando-se no meu pau.
Vivo, pulsando, duro como aço. Tudo começou quando eu a visualizei,
deitada sobre aquele balcão, com as lindas pernas nuas naquela bota de salto
alto, a camiseta expondo toda a barriga e parte do sutiã de renda branca. Não
parecia a mesma garota, era como se de uma hora para outra uma nova Jamie
surgisse. Muito mais decidida, muito mais sexy, extremamente gostosa. Ela
estava em uma versão rebelde de si mesma. Deixou de lado a timidez, a
vergonha e não se negou a participar do body shot. Eu queria surrar a bunda
dela por concordar com aquilo. Aceitar tão facilmente que qualquer um
colocasse a boca nela. Tinha algo de errado comigo, mas uma coisa era certa,
eu não queria outros caras ao redor dela. A Jamie é ingênua demais, inocente
demais, ela não sabe como os caras são. Também odeio que eu saiba, porque
sou um desses caras. Tenho a maldita mente pervertida e não consigo parar
de visualizá-la em várias posições com aquelas botas e o chapéu de cowgirl.
Merda! Ela me deixou duro muito antes de eu estar aqui. Mas agora é
muito pior, é caso de vida ou morte para o meu pau. Eu coloquei minha boca
nela, provei da pele dela com a minha língua. Corri boa extensão do seu
corpo, e eu ainda queria mais. Deus do céu, eu queria a minha língua e o meu
pau nos mais variados lugares do corpo dela. Não sei quando isso aconteceu,
não sei quando comecei a desejá-la tão fortemente. Mas está aqui agora, é um
sentimento que se apoderou do meu corpo e da minha mente. Só consigo
imaginar minhas mãos nela, correndo por todo o corpo nu, tocando os lugares
mais privilegiados. Quero explorá-la, conhecê-la, quero dar prazer a ela e
quero receber prazer com o corpo dela. E o pior é que o caso é particular. Não
é que eu queira foder desesperadamente. O negócio é que de todas as
mulheres dentro deste bar, os meus olhos cismam em ir em direção a ela.
Ela está surpresa de me ver aqui, provavelmente esperava que eu
fosse ficar trancado na casa dela com o meu falso sogro que esconde
cadáveres. Muito enganada, dez minutos depois que ela se foi, eu também
saí. Não fui com a cara daquele mané chamado Kurt. Quem diabos se chama
Kurt? Caipira tosco! Ela até não podia me querer lá, mas eu fui de qualquer
forma, e agora não me arrependo. Afinal, a minha noiva estava prestes a ter a
boca daquele matuto nela. Que de matuto não tem nada. Ele pensa que sou
trouxa e não percebi que tudo o que ele quer é comê-la? Pois não vai, porra.
E se a Jamie não consegue perceber isso e se proteger, farei isso por ela. É
tudo por proteção.
— Vamos embora — digo e já vou abaixando a miniblusa dela e
fechando o colete para acabar com aquela palhaçada desses bêbados
espiando.
Jamie me lança um olhar atordoado, mas acaba fechando os botões do
colete com as mãos trêmulas. Desço-a de cima do balcão e procuro ao redor
pelo chapéu que ela não está usando mais. Encontro-o em cima de uma mesa
e coloco novamente na cabeça dela. Jamie observa tudo o que eu faço em
silêncio, mas quando pego a mão dela com a intenção de ir embora ela planta
os pés no chão com força.
— Andrew, o que você acha que está fazendo?
— Levando você para fora desse lugar.
Ela cruza os braços sobre o peito.
— Não vou embora — murmura. — Estou aqui com o Kurt.
— Ah, é? — pergunto. — E cadê o Kurt?
— Foi pegar mais limões.
Sua resposta só me deixa mais irritado, afinal, são limões que ele ia
usar como desculpa para tocar nela, acariciá-la, beijá-la… Ah, porra, não
mesmo!
— Dane-se, vamos embora.
Seguro a mão dela novamente, mas Jamie se solta com um gesto
brusco.
— Eu não sei o que deu em você. Mas eu não vou embora, estou com
os meus amigos.
Solto um suspiro impaciente e vou até ela. Abaixo-me e seguro suas
pernas antes que ela sequer veja o que está acontecendo. Jogo-a sobre o meu
ombro direito e Jamie solta um grito alto. Todo mundo se vira para ver o
showzinho que estamos dando.
— Oh, meu Deus, o que você está fazendo?! — ela grita de cabeça
para baixo.
— Levando minha noiva para casa.
— Me solta! — ela grita novamente. — Socorro, me solta!
— Fica quieta.
Faço meu caminho para fora do bar, com todas aquelas pessoas nos
olhando, Jamie gritando sobre o meu ombro e batendo com os punhos
pequenos no meu quadril. Saímos para o ar quente da noite, e eu a levo para o
estacionamento. Ela não está mais gritando, porém, continua esperneando,
resmungando e tentando se livrar do meu aperto. De repente ela crava os
dentes no meu quadril e me morde com força. Solto um xingamento e sacudo
o corpo dela ainda mais. Ela tenta me morder novamente, e eu dou um tapa
forte na bunda dela.
— Andrew! — ela grita. — Você vai pagar por isso!
— Então a bravinha está de volta?
— Vá se ferrar!
— Você está muito malcriada ultimamente — digo. — Não era esse
tipo de noiva que eu queria.
— E você acha que eu te queria como noivo? — ela pergunta
zombeteira.
Localizo meu carro no estacionamento e destravo as portas. Abro a
porta de trás e coloco Jamie no chão para depois empurrá-la lá dentro,
embora ela tente escapar. Ela desliza para trás pelo banco, tentando se afastar
de mim e fugir para os bancos da frente. Mas eu entro logo em seguida, bato
a porta e fico sobre ela antes que ela tenha tempo de se mover. O espaço é
pequeno demais para nós dois, de modo que ela está completamente
espalhada sobre o banco e com as pernas abertas para me acomodar no meio.
Mantenho um braço apoiado na lateral do banco para aguentar meu peso e
não esmagá-la. Ela fica ainda mais linda embaixo de mim, é uma visão
tentadora, embora eu acredite que poderia ficar melhor se nos livrássemos de
suas roupas.
— Andrew, o que você está fazendo? — Jamie pergunta-me com a
voz vacilante.
Abaixo um pouco mais, até estar olhando dentro dos seus olhos e com
a boca pairando a centímetros da dela. O hálito dela cheira a tequila.
— Por que você faz tantas perguntas?
— Isso é ridículo. — Ela bufa. — Por que estamos aqui? Sai de cima
de mim!
— Eu vou te dizer por que estamos aqui — digo e abaixo a voz para
falar baixinho no ouvido dela. — Primeiramente, você veio com aquela
maldita cláusula de não foder ninguém por um ano, depois você resolveu
deixar de ser a freira certinha para se transformar na mulher sexy que eu nem
sabia que existia aí dentro, em seguida você me deixa com uma puta ereção
para sair com o seu amigo caipira. E você ainda quer que eu mantenha o meu
pau nas calças quando você fica por aí tirando a blusa e fazendo body shot?
— Eu não tirei a blusa! — ela protesta.
— Não fuja do assunto, abelhinha — sussurro.
Jamie engole lentamente, o movimento em sua garganta chama minha
atenção. Ela está nervosa.
— O que você está sugerindo, Andrew? — pergunta-me séria.
— Estou sugerindo mudarmos os termos do nosso acordo.
Jamie suspira.
— Não vamos mudar nada — resmunga. — Você não vai ficar
fodendo outras mulheres enquanto estiver comigo.
— Eu não quero foder outras mulheres — replico.
— Ah, não? — Ela arqueia uma sobrancelha. — E o que você quer
então?
Sorrio lentamente.
— Foder você.
Vejo o choque na expressão dela, quando seus lábios se entreabrem e
seus olhos se arregalam um pouco. Ela engole em seco novamente e se move
inquieta embaixo de mim. O que é uma péssima ideia, ou melhor, uma
excelente ideia. Porque desta forma o meu pau roça no ponto exato onde eu
gostaria de me enterrar profundamente. Ela está ciente do contato íntimo
entre as nossas partes, mesmo que ainda estejamos vestidos. Seus olhos
voltam aos meus novamente, e ela morde o lábio inconscientemente, nem se
dando conta do quão atraente ela fica fazendo esse gesto.
— Andrew… Deixe-me ir — ela pede hesitante.
— Você não quer ir. Mas eu sei exatamente o que você quer, e eu
posso te dar. Pode estar sendo a porra do tempo mais longo que eu já tive sem
sexo, e o contrato está só no começo. Só que não é ruim só pra mim, é ruim
pra você também. Nós podemos acabar com isso agora, não muda nada. O
acordo é o mesmo, só que a gente faz sexo sem complicações.
— Andrew…
— Jamie, você me quer, você quer isso tanto quanto eu. Eu prometo
que você vai gostar, posso te foder duro, rápido, lento, você escolhe… E eu
escolho na segunda vez.
— Segunda vez? — Ela ri.
— Sim, muitas vezes — concordo. — Vou precisar te comer muito
até ficar satisfeito.
— E depois que você estiver satisfeito?
— Ah, quer saber? — Balanço a cabeça. — Eu nunca estou satisfeito,
eu sempre vou querer você mais e mais. Diz que aceita o novo termo do
nosso contrato, vai, Jamie, diz.
— Eu não acho isso uma boa ideia, Andrew.
— Vou te fazer mudar de ideia — respondo como uma promessa.
Desço minha boca sobre a dela, beijando-a com força, avidez,
desesperado para tomar os seus lábios. Jamie tenta me afastar, cortar o nosso
beijo, mas eu insisto, provocando-a. Chupo seu lábio inferior e mordo
levemente. Ataco seus lábios com os meus e forço minha língua em sua boca.
Ela solta um gemido satisfeito, o que me instiga a continuar atormentando-a,
movo minha língua com a sua lentamente quase em uma dança sensual. Sinto
seu gosto em todos os lugares, seu cheiro me domina e me excita.
Afasto-me apenas um pouco, dando a ela um tempo para sugar a
respiração de volta para o pulmão, e sigo desenfreado beijando seu maxilar,
mordendo o lóbulo de sua orelha, correndo a língua na curva de seu pescoço.
Não paro aí, desço para a clavícula, onde distribuo mais beijos suaves e
molhados. Começo a desfazer os botões do colete e observo em silêncio os
olhos dela, que estão fechados, a respiração acelerada. Uma de suas mãos
apertando firmemente o couro do banco, a outra na minha camisa também
fechada em punho. Ela está bêbada, completamente embriagada, mas dessa
vez é de luxúria, de desejo carnal. Ela não me impede, e eu sei que ela quer
isso tanto quanto eu.
Termino com os botões e corro os dedos por baixo da miniblusa,
levantando-a lentamente. Jamie abre os olhos e fita-me intensamente. Ela
abre a boca, e eu acho que vai protestar e me pedir para parar. Só que eu não
posso, não agora. Por isso eu a calo com a minha boca e beijo-a novamente.
Desta vez, muito mais lento, correndo minha língua em cada canto de sua
boca, saboreando o gosto da tequila que ela bebeu. Empurro um pouco meu
quadril, girando lentamente, friccionando o tecido do meu jeans no lugar
entre suas pernas. Ela abre ainda mais a boca em um gemido silencioso que
engulo completamente.
Minhas mãos continuam agindo instintivamente, ergo a camiseta dela
o máximo que consigo sem tirá-la realmente. Desço o bojo do sutiã, expondo
ambos os seios. São pequenos, redondos e com mamilos durinhos de um tom
marrom bem clarinho. Minha boca saliva, minha fome aumenta e eu
abocanho um dos mamilos. Jamie solta um gritinho e arqueia o corpo,
empurrando os seios na minha direção. A mão que estava segurando minha
camiseta vai para os meus cabelos e me puxa com força. Como se estivesse
implorando-me silenciosamente que lhe desse mais. Estou surpreso que ela
me corresponda tão bem, que ela saiba o que eu preciso, que ela esteja
disposta a me dar. Eu via a Jamie muitas vezes como uma garota que talvez
não fosse capaz de se excitar, de se libertar. Mais uma vez estava
completamente enganado, tenho que parar de julgar tudo pelas aparências.
— Por favor — ela geme. — Ai, meu Deus, Andrew, por favor.
Circulo o mamilo com a língua e depois volto a lambê-lo e chupá-lo,
raspo os dentes sobre ele levemente. Enquanto uso a mão para apalpar o
outro seio, brinco com o mamilo também enrijecido entre os dedos. Dou
atenção a ambos, revezando de um para o outro, deixando Jamie cada vez
mais desesperada. Ela aperta as coxas contra o meu quadril em uma inútil
tentativa de parar o desejo que está correndo pelo seu corpo neste momento.
Chupo ainda mais duro e ondulo o quadril, movendo minha pélvis contra a
dela. O movimento repetidas vezes vai levando Jamie à loucura e ela começa
a gemer alto, grita o meu nome e enterra os dedos no meu cabelo, puxando
com força exigindo que eu traga seu prazer ao ápice.
— Vem pra mim, bravinha — exijo. — Goza gostoso enquanto minha
boca está nos seus peitos.
Ela solta um grito alto que enche o espaço dentro do carro. Foi
libertador para ela, mas para mim também. Observar seu rosto geralmente
suave se contrair em uma expressão de puro prazer só fez aumentar ainda
mais a minha libido. Seus olhos continuam fechados, mas seu corpo todo
relaxa. Lentamente ela solta a mão dos meus cabelos e a outra, que ainda
agarra o banco, e as deixa soltas ao lado do próprio corpo. Sua respiração
ainda é rápida, mas ela parece completamente extasiada. Jamie acaba de
gozar de uma maneira incrível, e eu só precisei usar minha boca em seus
lábios, em seus mamilos, minha ereção e a costura do meu jeans ao meu
favor. Já me pego pensando de quantas outras mil maneiras eu poderia fazê-la
gritar desse jeito, gemer daquela forma gostosa. Eu preciso de mais, muito
mais.
— Andrew — Jamie sussurra, ainda de olhos fechados. — Isso foi
tão… Tão bom. Eu nunca me senti assim.
— Contente com o seu orgasmo, abelhinha?
— Oh, Deus, eu devo ter enlouquecido.
— E então, você aceita o novo termo do nosso contrato? — pergunto.
— Isso é errado, Andrew — ela diz baixinho, mas não me olha. —
Não podemos fazer isso. Oh, meu Deus, eu não consigo pensar.
— Eu acho que você ainda está pensando demais — digo. — Talvez
um orgasmo não tenha sido suficiente para limpar a sua mente e fazê-la
aceitar nossos novos termos do contrato. Mas isso não é um problema,
porque eu ainda não desisti de você. Quero te ouvir gritar novamente. Eu já
disse que adorei ouvir você gemer? Não, pois é, e eu quero mais.
Começo a desfazer os botões do short dela e, em seguida, desço o
zíper. Jamie começa a respirar rapidamente outra vez, seus seios nus sobem e
descem com a respiração e me provocam. Quero pôr a boca neles novamente,
no entanto, acho que nesse momento minha língua precisa conhecer outros
lugares. Baixo o short pelas suas coxas e tenho um vislumbre da pequena
calcinha de renda branca. Abaixo-me entre as pernas dela e coloco um beijo
molhado no interior de cada coxa. Ela tenta fechar as pernas para bloquear o
seu desejo, mas os meus ombros a impedem.
— Andrew… — sussurra.
A voz dela está baixa, um pouco grogue, maravilhosa de se ouvir.
Coloco a mão em ambas as tiras da calcinha e desço lentamente pelas coxas
dela. Estou me matando fazendo isso, descobrindo-a lentamente. Solto um
palavrão quando a vejo completamente depilada, lisinha, pronta para mim.
Levanto os meus olhos para os dela e vejo que Jamie me observa
atentamente. As bochechas coradas, os olhos brilhando, o dente cravado no
lábio inferior. Sorrio lentamente aprovando o rubor que está tomando conta
de toda a sua pele. Meu Deus, como ela é linda.
— Isso é uma amostra de tudo o que você pode ter se aceitar os meus
termos — digo a ela e abaixo a cabeça para encarar seu sexo desnudo. —
Agora eu vou descobrir se é tão gostosa como parece.
Corro a língua entre suas dobras por toda a sua boceta. Ela está
incrivelmente molhada, com os fluidos escorrendo para mim. É uma boceta
deliciosa pra caralho, gostosa demais. Lambo-a lentamente, sugando todo o
mel da minha abelhinha. Jamie geme, e o som suave e ao mesmo tempo
agoniado chega até mim. Sorrio com a boca ainda nela e corro a língua até o
seu clitóris, provoco devagar e finalmente chupo-o com força. Ela grita e
novamente tenta fechar as coxas. Seguro seu quadril com uma das mãos para
mantê-la no lugar, e com a outra mão apalpo a bochecha de sua bunda, dando
um aperto firme para segurá-la.
— Ai, meu Deus! — Jamie geme. — Andrew, oh, nossa, não pare.
Desço com tudo novamente, comendo sua boceta com gosto, circulo o
clitóris com a língua, chupo-o firme e, em seguida, desço pelas suas dobras,
empurro a língua repetidas vezes dentro dela, seguindo um ritmo primeiro e
vendo como ela reage. Jamie agarra novamente os meus cabelos com força.
Aplico mais pressão com a língua, invadindo-a profundamente. Ela se
contorce abaixo de mim, e eu me afasto apenas para empurrar um dedo
lentamente dentro dela. Caralho, porra, é apertadinha demais, quente demais,
gostosa demais. Quero comer essa delícia até me fartar.
— Goza nos meus dedos, Jamie — ordeno.
Um movimento certo do meu dedo dentro dela e sua mente explode.
Ela grita o meu nome repetidas vezes enquanto goza deliciosamente bem nos
meus dedos. Todo o seu corpo se torna mole, e ela se deixa cair no banco
com muita leveza. Seus seios saltam com a força da sua respiração e chamam
minha atenção. Deslizo sobre ela e passo a língua sobre um mamilo sensível
e durinho, ela geme baixinho. Levanto a cabeça e finalmente encontro os seus
olhos. Ela esteve o tempo todo me assistindo, olhando tudo o que eu fazia
com ela. Foi bom, pude ver o exato momento em que ela chegou ao ápice
novamente. Desço minha boca sobre a dela e a beijo lento, devagar.
— Aceita os novos termos? — pergunto.
— Andrew — ela sussurra.
— Você está bem?
Ela solta um suspiro lento.
— O que você fez comigo?
— Fiz você gozar duas vezes e posso fazer mais — garanto. — Só
que preciso aliviar o meu pau antes, porque, puta que pariu, você acabou
comigo. Talvez eu possa te dar um orgasmo com o meu pau enterrado em
você, que tal?
— Não quero fazer isso aqui — ela murmura.
— Como assim, não quer fazer isso aqui? — insisto.
— Não quero transar com você aqui, Andrew.
— Posso comer sua boceta dentro desse carro, mas enfiar o meu pau
não?
— Não seja rude, Andrew — ela censura abrindo um sorriso
preguiçoso.
— Rude por quê?
— Você só sabe ficar dizendo comer, comer, e pau, e pau. Isso é rude.
Balanço a cabeça, achando divertido que ela esteja querendo
conversar sobre como eu sou rude e ao mesmo tempo quero esganá-la porque
o meu pau vai explodir nas minhas calças.
— E como eu deveria chamar o meu pau então? — pergunto.
Ela ri.
— Que tal pintinho? É mais bonitinho.
Semicerro os olhos, encarando.
— Você acaba de sugerir que eu chame o meu superpau, macho da
porra, comedor de bocetas, de pintinho?
Ela solta uma gargalhada e me empurra para ganhar espaço e se
sentar.
— Vamos pra casa, Andrew — ela me pede.
— Tá falando sério?
— Por favor, me leve para casa.
— Vou poder foder com você se tiver uma cama?
Ela hesita por alguns segundos e depois balança a cabeça.
— Claro.
Se o meu pau sair correndo para longe de mim, eu não posso culpá-lo.
Afinal, mais uma vez eu sou obrigado a adiar uma foda e deixá-lo sofrendo
nas minhas calças. Não posso ignorar um pedido da Jamie, muito menos
quando ela me olha desse jeito, implorando-me em silêncio com aqueles
imensos olhos castanho-esverdeados. Espero até que ela esteja
completamente vestida e pulo para o banco da frente. Saio do estacionamento
cantando pneus e acho que nunca farei aquele percurso para a casa da fazenda
tão rápido como consegui fazer. Jamie não diz nada todo o caminho, ela
simplesmente olha para fora pela janela e fica assim até que eu estaciono o
carro em frente à entrada. Finalmente ela olha para mim e parece quase
arrependida.
— Obrigada pelos orgasmos, Andrew, fazia muito tempo que eu não
me sentia tão viva — ela diz e abre a porta do carro para saltar fora. Então ela
se abaixa e olha diretamente para mim. — Vou pensar nos novos termos,
prometo. Mas agora eu preciso ficar sozinha e pensar, desculpe-me por isso.
— Jamie? — chamo, mas ela continua andando em direção à entrada.
Meu pobre pau! Desço do carro, travo as portas e vou atrás dela. — Pelo
amor de Deus, você não pode me deixar assim. Jamie?
Ela não olha para trás e finalmente entra na casa. Sigo-a, vejo
desaparecer no topo das escadas e vou até lá. Ouço uma porta bater devagar e
sei que ela está no quarto de hóspedes. Ando até lá até uma figura grande
cruzar o meu caminho e parar na minha frente.
— Sr. Collins?
— Aonde você pensa que vai, Andrew? — Walter pergunta-me sério.
— Hãã… eu vou ver a Jamie — murmuro.
— Resposta errada — ele diz. — Você pode ver a Jamie amanhã, está
na hora de dormir.
— Nós estamos indo dormir — digo.
— Que bom — Walter diz. — Sua cama já esperando por você no
meu quarto.
O quê?
— C-Como? — gaguejo.
Walter sorri.
— Você não achou que fosse dormir com a minha filha, certo? Porque
se achou está completamente enganado. Sou velho, Andrew, mas não burro.
Agora vá.
— Eu só preciso ir ao banheiro rapidi…
— Você pode aguentar até amanhã. — Walter coloca a mão sobre o
meu ombro e me empurra em direção ao seu quarto. — Vá, Andrew, agora.
— Sim, senhor.
É desse jeito que termina a minha noite. Dormindo em uma cama
improvisada no chão do quarto do meu falso sogro. Ainda assim, o pior de
tudo é a dor terrível que estou sentindo nas minhas bolas.
***
Acordo mais tarde do que o de costume e desço para tomar café na
cozinha. Encontro apenas Annete, a tia de Jamie, começando os preparativos
para o almoço. Pergunto a ela sobre Jamie e ela me diz que minha noiva saiu
de manhã cedo para cavalgar com Kurt. Meu humor não era bom, ficou ainda
pior com a notícia. Que diabos ela está fazendo com esse caipira de novo?
Ela provavelmente quer testar meus limites, só pode.
Vou até a varanda e encontro o senhor Walter sentado em uma
cadeira fumando um charuto e apreciando a paisagem do imenso pasto verde.
Ele me convida para sentar, e como não há nada para se fazer nesse lugar, eu
me sento ao lado dele. No entanto, rejeito o charuto quando ele me oferece.
Ficamos os dois em silêncio por um longo tempo até que ele resolve falar.
— Filho, eu espero sinceramente que você seja bom para a minha
Jamie. Ela não é qualquer garota. Minha abelhinha é especial, ela não merece
sofrer mais do que já sofreu. Se não for fazê-la feliz, Andrew, eu peço que a
deixe sozinha. A solidão às vezes é melhor do que a rejeição.
As palavras ficam presas na minha garganta, e eu não sei o que dizer.
Isso tudo não passa de uma mentira, não posso fazer mais promessas.
— Vou cuidar da Jamie, Sr. Collins — digo, porque isso eu posso
prometer.
— O que estão falando sobre mim? — A voz de Jamie surge na
varanda, quando ela aparece na porta.
— Só estava dando uns avisos a ele, abelhinha — ele diz.
— Papai, eu sei me cuidar, pare de encher o Andrew — ela pede.
— Está tudo bem. — Levanto-me da cadeira, aceno para Walter e
caminho até Jamie. — Quero conversar com você, a sós.
— Não aqui, Andrew — ela sussurra.
— Você sabe o que você fez comigo? Puta merda, Jamie, eu nem
dormi direito.
— Conversamos na estrada, Andrew — Jamie responde e sai, virando
as costas para mim.
Almoçamos todos juntos na cozinha, e eu agradeço mentalmente pelo
tal de Kurt não estar aqui agora, ou eu não sei se conseguiria me segurar
perto dele. Já estou de saco cheio desse imbecil. A tia da Jamie cozinha muito
bem, por isso eu provo um pouco de cada coisa que ela coloca na mesa.
Depois do almoço, eu ajudo Jamie a limpar a cozinha. Mas ela não diz
nenhuma palavra, e eu também não. Subimos os dois para arrumar nossas
coisas antes de irmos embora. Quando eu consigo um tempo para ficar a sós
com ela, Jamie se retira para tomar banho. Acho que ela está me evitando, ou
talvez evitando falar sobre o que eu fiz com ela e o que ela fez a mim.
A hora da despedida é triste para Jamie, ela abraça os primos e a tia e
chora nos braços do pai. Ela promete que vai tentar visitá-los novamente em
breve. Eu também me despeço de todos e coloco nossas malas no carro. Abro
a porta para Jamie, e ela se acomoda no banco do passageiro. Aceno para
todos que estão na varanda e entro no carro também, começando nossa longa
jornada de volta para casa. Nas primeiras horas de viagem eu resolvo não
falar nada, fico quieto porque sei o quanto Jamie está chateada por deixar sua
família para trás. Ela acaba dormindo pouco tempo depois, e eu dirijo calado
pelas primeiras horas.
Quando Jamie finalmente desperta, eu resolvo ligar o rádio. Pego um
CD aleatório e coloco. 30 Seconds To Mars enche o espaço vazio do carro
com Attack. Acelero um pouco, correndo pelas estradas praticamente vazias.
Jamie abre o vidro e deixa o vento entrar para ricochetear seus cabelos.
Começo a cantarolar baixinho com a música, e ela me observa em silêncio.
Ela sabe que eu quero conversar, mas estou esperando até que ela esteja
pronta para falar. Empolgo-me com a música e continuo cantando um pouco
mais alto. Parece que as palavras se encaixam no momento.

“I would've kept you forever


But we had to sever
It ended for both of us
Faster than a
Kill off this thinking
It's starting to sink in
I'm losing control now
Without you I can finally see…”

Olho para Jamie, e ela está me encarando. É como se ela


compreendesse o que eu estou fazendo, usando as palavras da música para
descrever um momento que estamos passando. A próxima parte é ainda
melhor, descreve como eu me sinto e o que eu estou disposto a fazer.

“Run away, Run away


I'll attack
Run away, Run away
Go chase yourself
Run away, Run away
Now I'll attack
I'll attack, I'll attack.”

Jamie engole em seco e, ainda olhando para mim, surpreende-me ao


cantar desajeitadamente o próximo refrão.

“Your promises
They look like lies
Your honesty's
Like a back that hides a knife
I promise you
I promise you
I am finally free.”

É como se ela me apunhalasse de repente, porque eu entendo o que


ela quer dizer. Jamie não confia em mim, ela não acredita que eu estou sendo
verdadeiro. Talvez ela pense que eu fiz essa proposta para usá-la novamente
ao meu favor, para o meu prazer. Ela pensa que estou mentindo, e eu não
estou. Dessa vez, não estou, eu a quero, preciso dela, é como uma
necessidade. Mas é óbvio que ela não sabe disso, e por que ela acreditaria em
mim? Fui um babaca com ela desde o começo, eu a humilhei e ridicularizei.
Eu não fiz nada para mudar isso. Só usei as palavras para garantir que isso
não voltaria a acontecer. Entretanto, como ela pode acreditar nas minhas
palavras, se tudo o que eu faço é mentir, mentir e mentir? Só há uma maneira
de contornar isso, e é ganhando a confiança dela, mas eu sei que não será
uma tarefa fácil.
— Jamie, eu não quero que você pense que eu estou querendo usar
você de alguma forma — digo. — Ontem à noite eu fiquei puto porque você
me enganou, mas ao mesmo tempo eu fiquei feliz, porque você saiu satisfeita.
Isso não é apenas por mim, estou falando sério, é por você também.
— Desculpe-me — Jamie murmura. — Eu não queria ter feito aquilo
com você, Andrew, mas não tive escolha. Eu precisava pensar, a proposta
que você me fez muda muita coisa, ao contrário do que você pensa.
— É sexo descomplicado, Jamie, não muda nada.
— Para você talvez não mude, mas pra mim, sim. Além disso, eu não
estava pronta.
— Garanto que pronta você estava. Até demais. — Dou um sorriso
malicioso a ela. — A propósito, estava uma delícia.
— Andrew — ela repreende-me rindo e abaixa a cabeça
envergonhada. — Quero acreditar em você, me dê um tempo para pensar
sobre isso.
— Tudo bem — concordo.
— Eu preciso confiar em você para entrar nisto, Andrew — Jamie
diz. — Não pode haver mentiras.
— Eu sei — sussurro.
— Você é um cara legal, Andrew, só que às vezes avacalha.
— Sei disso, desculpe-me.
— Ficar pedindo desculpas também não muda nada. Suas atitudes é
que vão provar se você é digno da minha confiança ou não.
— Eu só não sei como fazer isso, Jamie — admito. — Nunca estive
em um relacionamento sério, nunca me preocupei com ninguém além de mim
mesmo. Não me importo com os sentimentos dos outros, eu nem ao menos
sei quando estou fazendo algo errado. Ajo por impulso, sou descuidado.
Quero fazer isso dar certo, mas ao mesmo tempo, sinto que vou pisar na bola.
Não consigo mudar isso.
— Andrew, me promete uma coisa? — Jamie olha para mim, e eu
desvio os olhos da estrada para fitá-la de volta rapidamente.
— Sou péssimo com promessas, você sabe disso.
— Não é uma promessa para mim — ela diz. — É uma promessa para
você mesmo. É simples, Andrew, mas garanto que vai salvar você de cometer
algo errado quando não souber que é um erro.
— O que é? — pergunto.
— Quando você achar que vai cometer algo errado, ou mesmo
quando você tiver dúvida e não souber se o que vai fazer é o certo, em vez de
ser impulsivo, busque ajuda. Pedir ajuda não é se humilhar, Andrew. Você
tem o Jack, você tem a Abigail e você também tem a mim.
— Tudo bem — concordo. — Prometo que farei isso.
— Ótimo. — Ela sorri. — Agora coloca uma música que eu saiba
cantar.
É assim que a Taylor Swift volta para me assombrar e atormentar com
suas músicas sobre ex-namorados. Para piorar descubro que nem trocando de
música Jamie Collins sabe cantar. Continuamos a viagem por mais algumas
horas até Jamie insistir em parar para comprar besteiras em uma loja de
conveniência. Também preciso colocar gasolina, então paramos no posto.
— Vou dar uma mijada — digo, e Jamie me dá um olhar com nojo.
— Não precisa especificar o que você vai fazer no banheiro, Andrew,
estou bem sem os detalhes.
Solto uma gargalhada.
— Enche o tanque pra mim? — pergunto.
— Uhum.
Vou até o banheiro, faço minhas necessidades e volto para o posto
rapidamente. Encontro Jamie ajoelhada no chão, com duas sacolas de coisas
que ela comprou e conversando com um montinho de pelo que está
enroscado nas suas pernas. É o gato mais feio que eu já vi na vida.
Praticamente careca e magrelo.
— O que você está fazendo?
— Encontrei o pobrezinho aqui agora, estava morrendo de fome.
— Tá, vamos embora. A viagem é longa.
— Andrew, vamos levá-lo com a gente?
— Esse gato feio? Não, de jeito nenhum.
— A moça do posto disse que ele não tem dono. Ela até disse que nos
dá a casinha de transporte do cachorro dela pra gente levar o gatinho.
— Ah, que moça maravilhosa — digo irônico.
— Estou falando sério, Andrew!
— Eu também — digo e prossigo: — Jamie, a viagem é longa pra
caramba, esse gato vai morrer antes de a gente chegar lá. E depois, onde você
quer colocá-lo? Sua irmã não vai cuidar de gato nenhum, e lá em casa a gente
nunca teve animal de estimação.
— Por favor, Andrew. — Jamie me dá aquele olhar pidão que me
lembra do gato de botas. — Pense que você vai salvar um animalzinho de
morrer de fome e frio aqui fora.
Solto um suspiro pesado.
— Coloca essa coisa medonha dentro do carro — cedo aos olhos dela.
— Você é responsável por ele a partir de agora.
— Obrigada, Andrew! — Jamie agradece abraçando-me forte.

Seguimos viagem com o gato feio na casinha de transporte

que a mulher do posto deu a Jamie. Minha falsa noiva está radiante, porque

salvamos um animal de morrer de fome, e agora ele terá um lar quentinho e

feliz na minha casa. Não quero nem ver o que tia Lorenna vai dizer sobre

isso, ela não é muito fã de animais. Aquela tem medo até de uma mosca,

imagina um gato assustador desses. Até eu já estou com medo de ter

pesadelos com esse bicho. Vamos ter que fazer uma reforma geral nele e ver

se o gato fica ao menos apresentável. Sei que disse que ia tentar não julgar

tanto pelas aparências, mas qualquer um que olhar para essa versão felina de
Frankenstein vai entender o que estou falando.

Jamie e eu estamos no meio do nada, em algum lugar de longas


estradas vazias e colinas de pastos verdes. Quando, de repente, noto o painel
do meu carro e vou freando devagar. Não pode ser! Não pode ser! Porra,
estamos no meio do nada! Aqui não!
— O que foi? — Jamie pergunta ao meu lado.
— Eu não sei — digo. — No painel tá aparecendo que vamos ficar
sem gasolina. Mas você encheu o tanque, então eu não sei qual é o problema.
Vou descer e olhar.
— Andrew! — Jamie me chama alarmada. — Andrew?
— O quê?
— Não coloquei gasolina — ela admite. — Ai, meu Deus, eu não
coloquei gasolina.
— Como assim?
— Eu esqueci! — ela exclama. — Caramba, eu vi o gato e esqueci-
me da gasolina.
— Você só pode estar de brincadeira. — Solto uma risada, sem
humor. — Estamos no meio do nada, com um tanque quase vazio, não há
nenhuma cidade por perto e está anoitecendo.
— Desculpe-me — ela diz baixinho. — Sério mesmo, desculpe.
— Tudo bem. — Suspiro. — Vou tentar falar com alguém.
Pego o meu celular e desço do carro. Ando de um lado para o outro
procurando no Google uma solução para os nossos problemas. Estou quase
ligando para uma borracharia na próxima cidade, quando olho ao meu redor.
É tudo verde. Colinas, e colinas e poucas árvores. Pastos imensos. Mas o que
é mais incrível é o céu, está começando a anoitecer e as primeiras estrelas já
estão pintando no céu. Aqui é muito diferente de Nova Iorque, parece que a
lua e as estrelas estão mais próximas. É um céu de tirar o fôlego, o tipo de
cenário que você quer ficar olhando até perder os sentidos. E é olhando para
ele que uma ideia surge na minha cabeça.
Volto para o carro, abro o porta-malas e retiro um casaco pesado e
forrado da mala de Jamie e uma manta que eu tenho guardada lá dentro. Não
é grande coisa, e está cheirando a mofo, mas deve servir. Vou até a porta da
Jamie e abro. Ela olha ansiosa na minha direção, esperando por uma resposta
positiva que nos tire dali.
— Vamos, sai do carro — digo.
— O quê? Aonde a gente vai?
— Você vai ver — digo.
— Andrew?
— Chega de perguntas, apenas saia do carro.
— Ok — ela murmura confusa.
Abro a porta de trás, pego a casinha de transporte com o gato dentro e
depois tranco todas as portas. Entrego para Jamie o casaco e a manta, ela os
segura nos braços sem entender nada, mas também sem questionar. Caminho
até a cerca e a levanto, indicando a de Jamie que ela deve passar. Jamie olha
para mim como se eu fosse louco, mas ainda assim atravessa a cerca, e eu
passo logo em seguida. Começamos a caminhar pelo pasto, em direção a uma
colina alta. Andamos bastante, ficamos muito afastados do carro, mas
chegamos a um lugar privilegiado. Estamos embaixo de uma arvore alta e
temos uma visão panorâmica de todo o vale. Assim como uma linda visão do
céu.
— Andrew, o que estamos fazendo aqui?
— Você não gostou?
Ela olha ao redor e depois para mim.
— Sim, é incrivelmente lindo — ela diz gesticulando com as mãos.
— Que bom que gostou — falo, estendendo a manta no chão. —
Porque vamos passar a noite aqui.
— O- O quê? — Jamie gagueja. — Como assim, vamos passar a noite
aqui?
— Você não queria dormir sob as estrelas?
— Oh, meu… Deus. — Ela sorri dando-se conta do céu estrelado, e
depois olha para mim com os olhos brilhando com lágrimas que ela não
derrama. — É. Eu queria.
— Pode riscar esse desejo da sua lista — digo e dou tapinhas no lugar
ao meu lado. — Agora vem pra cá.
Ela se aproxima e se deita ao meu lado. Ficamos em silêncio
encarando o céu, longos minutos se passam.
— Andrew, não é perigoso ficarmos aqui? — Jamie pergunta-me. —
Será que não tem animais selvagens? E o carro, como fica?
— Pare de pensar — respondo. — Você pensa muito, apenas realize
seu desejo. Vamos ficar bem, amanhã chamo alguém para cuidar do carro.
— Obrigada, Andrew, isso é muito importante para mim.
— Eu sei. Sabe o que eu estou pensando? Estamos em um lugar
deserto, você está realizando um desejo daquela lista estúpida de desejos
estúpidos, mas já que você e eu estamos aqui, por que não realizar outro?
— Realizar outro desejo meu?
— Sim.
— Qual?
Levanto-me, pego a lanterna que eu trouxe no bolso e estico a mão
para Jamie. Ela se levanta e me segue até o topo da colina. Ficamos lá em
cima por um tempo, ouvindo o barulho de grilos e pequenos animais. Jamie
me lança um olhar de expectativa, nem se dando conta do que eu estou
prestes a fazer. Quando estávamos subindo, notei que esse lugar seria perfeito
para fazer isso, dá eco.
— Então? — Jamie pergunta. — E agora?
Encho meus pulmões de ar.
— EU TENHO O PAU MAIS GOSTOSO DO MUNDO!
Jamie olha com espanto para mim, e de repente o meu grito se alastra.
Ecos de várias vozes minhas cantam de volta minha frase. Ela cai na
gargalhada. Eu tenho que rir também, ela é linda, e talvez a única garota pela
qual eu subiria em uma colina para gritar ao mundo sobre o meu pau. Jamie
está rindo tanto que ela se curva e coloca as mãos na barriga.
— Andrew… Eu não acredito… Que você fez isso — ela diz
ofegante.
— É a sua vez — falo e acrescento. — Eu até deixo você gritar que a
sua boceta é a mais gostosa no mundo, afinal, eu provei.
— Andrew! — ela me repreende rindo e corando.
— Vai, bravinha, grita para o mundo te ouvir.
— Eu não sei se consigo fazer isso — Jamie admite.
— Consegue sim, é só gritar, todo mundo sabe gritar.
— O ANDREW É O MELHOR BABACA QUE EU JÁ CONHECI!
A voz dela se alastra, espalhando pelos quatro cantos, enquanto várias
vozes iguais cantam de volta. Jamie ri.
— EU SEI QUE VOCÊ ME ADORA! — grito de novo.
— OBRIGADA POR REALIZAR MEUS DESEJOS!
Obrigado por ser o meu desejo, penso. Rapidamente balanço a cabeça
para me livrar desse pensamento inoportuno.
Jamie se vira e me abraça sorrindo, como se eu acabasse de lhe dar
um milhão de dólares, e não apenas a oportunidade de berrar no alto de uma
colina. Ela me surpreende ao beijar a minha bochecha delicadamente.
— Obrigada por isso, Andrew, você é o melhor falso noivo que eu
poderia ter.
— Vem, vamos dormir ou o seu desejo não vai ser realizado por
completo.
Naquela noite, Jamie se enroscou em mim o máximo que pôde, assim
podíamos esquentar um ao outro. Ela ficou olhando para céu por tanto tempo
que eu acabei dormindo antes que ela fechasse os olhos. No entanto, tive a
impressão de que o sonho que eu estava tendo, onde ela beijava os meus
lábios em agradecimento, era real.
CAPÍTULO DEZESSETE
--—————————————————————————————

Jamie

Quando eu era pequena e mamãe ainda estava viva, nós


costumávamos viajar a cada dois meses para o Texas. Vivíamos em Nova
Iorque, porém, não deixávamos de voltar à terra natal do papai, assim
também matávamos a saudade da tia Annete e dos meus primos. Lembro-me
vagamente de uma noite em que mamãe e eu saímos para cavalgar. Era difícil
termos um tempo sozinhas, porque geralmente a Jane estava junto. Mas
aquele dia não. Nós fomos até o campo sobre o lombo do cavalo e fizemos
uma parada para olhar a vista tranquilamente. Deitamos uma do lado da outra
e ficamos olhando para aquele lindo céu escuro e estrelado. A lua estava
cheia e eu tinha a impressão de que se estendesse a mão poderia tocá-la. As
estrelas brilhavam intensamente e havia tantas que eu me sentia perdida, sem
saber se conseguiria olhar e memorizar cada uma…
— Mamãe, por que aqui tem tantas estrelas, e em casa não? —
perguntei.
Ela desviou os olhos do céu e sorriu quando encontrou os meus olhos.
— As estrelas estão lá também, Jamie, nós apenas não conseguimos
vê-las tão bem quanto aqui. O Texas é um dos melhores lugares no mundo
para se observar estrelas, a olho nu podemos visualizar até duas mil estrelas
no céu.
— O papai disse que quando uma pessoa boa morre, ela vira uma
estrela — falei, tocando o rosto dela. Ela tinha os olhos castanhos mais
lindos que eu já vi na vida. Era como se houvesse sua própria estrela dentro
deles, iluminando-os. — Você também vai virar uma estrela, mamãe?
Eu sabia que ela estava doente, eu tinha apenas dez anos de idade,
mas eles nunca esconderam nada de mim ou da Jane.
— O seu pai foi um pouco precipitado. — Mamãe ri e toca o meu
rosto também, acariciando minha bochecha. — Não vou virar uma estrela,
Jamie, mas estarei lá no céu junto com elas.
— Mamãe. — Minha voz sai embargada, e meus lábios começam a
tremer. — Não quero ficar sozinha, me leva junto com você.
— Você não vai estar sozinha, Jamie. — Mamãe volta seu olhar para
o céu novamente. — Eu rezo todos os dias e vou continuar pedindo a Deus
que sua vida seja muito mais longa do que a minha. Quero que você viva
muito, que conheça o mundo, que realize todos os seus sonhos. Você só deve
partir quando estiver completamente realizada na vida, quando tiver vivido
tudo o que pode.
— Você está realizada na vida? — pergunto.
Ela sorri.
— Eu tenho o seu pai, você e sua irmã. Sou a mulher mais realizada
no mundo.
— Vou sentir sua falta, mamãe — sussurro.
— Eu sei, querida, mas vou estar sempre com você. Quando você
quiser me encontrar, olhe para as estrelas. Eu te juro que estarei olhando de
volta para você.
— Vou poder conversar com você?
— Mas é claro! — ela afirma. — Conte-me tudo, pode ser uma
conversa silenciosa através dos seus pensamentos. Não vou poder respondê-
la, mas você vai sentir que eu estou lá, escutando-a.
— Obrigada, mamãe. — Inclino-me em direção a ela e planto um
beijo em sua bochecha. — Amo você.
— Te amo muito mais, abelhinha — ela diz, beijando minha bochecha
no lugar exato onde uma lágrima solitária desliza.
Alguns meses depois ela faleceu e, embora eu sempre tivesse vontade
de retornar a olhar as estrelas e partilhar uma conversa silenciosa com ela,
nunca fiz. Acho que nunca estive preparada para isso, era demais para mim.
Lembrar-me dela, saber que ela foi embora desse mundo tão cedo, tudo isso
me machucava muito. Sempre acreditei que se eu me deitasse sob as estrelas
eu sentiria a presença dela perto de mim. Sentiria seus olhos me observando
de algum lugar do imenso céu estrelado. E eu queria tanto, mas tanto senti-la
outra vez. Só que nunca tive coragem, adiei isso por tanto tempo. Até que
Andrew mudou tudo.
Para ele podia ser um desejo idiota de uma lista estúpida. Só que para
mim tinha um significado muito maior. Mesmo que Andrew pensasse que
aquilo era a maior bobeira que ele já viu na vida, ainda assim, ele realizou
meu desejo. Confesso que fiquei muito surpresa e feliz. Achei que ele estaria
zangado por estarmos no meio do nada sem gasolina e, em vez disso, ele me
carregou para o alto de uma colina e nos fez dormir em baixo de uma árvore.
Eu me senti tão grata por ele estar lá comigo, porque se ele não tivesse
tomado a iniciativa, eu nunca teria feito aquilo. Agora percebo o quanto eu
estava perdendo, porque foi a melhor noite da minha vida. Eu juro que senti
os olhos da minha mãe sobre mim e sei que enquanto eu conversava com ela,
desabafando meus medos, ela escutou cada palavra.
Agora estou olhando para Andrew enquanto ele dirige. Hoje cedo,
quando eu acordei, ele já havia conseguido ajuda com um mecânico de uma
cidade próxima. Partimos sem mais nenhum problema. Observo-o enquanto
ele segura o volante com as mãos pousadas tranquilamente e olhos
concentrados na estrada. Esse cara me confunde tanto. Desde que eu conheci
Andrew, quase um ano atrás, quando comecei a trabalhar na Simon’s, eu
tinha uma imagem dele que era a mesma que todos os outros enxergavam.
Um cara rico, arrogante, convencido, mimado, imaturo. Sim, ele é tudo isso.
Contudo, eu também sei que ele pode ser mais. Andrew diz que ele não se
importa com os sentimentos das pessoas, mas ele está enganado. Ele não
gosta de magoar a sua avó, está sempre disposto a ajudar Abigail e qualquer
coisa de que Jackson precise, Andrew está lá para ele. Então, sim, eu acredito
que ele tem um bom coração e que ele é uma boa pessoa.
Acho também que apesar de Andrew estar em uma farsa, fingindo, sei
que se ele quisesse poderia ser tudo o que sua avó espera dele, sem as
mentiras. Ele é capaz de mudar, de aprender e merece um voto de confiança
para que isso aconteça. Talvez eu esteja até enganada, talvez esta impressão
que eu tenha seja falsa. Só que o cara que realizou os meus desejos, o
Andrew que gritou comigo naquela colina, o mesmo homem que me abraçou
e dormiu comigo embaixo das estrelas sem esperar nada em troca, ele
também é o Andrew, ele também é o mesmo cara que me deixou salvar um
pequeno gatinho da morte. Então eu sei que há esperanças. Ele só precisa de
ajuda, enxergar o mundo de outra forma. Eu não sei se eu sou capaz de
provocar uma mudança em alguém, mas estou disposta a tentar. Nunca estive
tão determinada a algo como estou agora. Posso fracassar, sim, eu posso. Mas
não vou desistir sem uma tentativa antes. Vou ajudar Andrew Simons a ser
alguém que apenas está adormecido dentro dele.
— Então, quando é que você vai me contar de onde surgiu esse
apelido? — Andrew pergunta-me, desviando seus olhos rapidamente da
estrada para os meus.
— Abelhinha?
— Sim. — Ele sorri. — Esse mesmo.
— Era Halloween, e nós estávamos no Texas — conto. — Tia Annete
conseguiu duas fantasias de animais para que Jane e eu pudéssemos sair com
as outras crianças fantasiadas na rua. A Jane se vestiu de gatinha, e o que
sobrou para mim foi a de abelha.
Andrew começa a rir, e eu me viro para ele com uma cara emburrada.
— O que é?
— Nada não. — Ele balança a cabeça tentando se conter e não rir. —
Continue, por favor, sinto que é uma história interessante.
— Nos fantasiamos e passamos o dia todo na rua, visitando casa por
casa. Eu só tinha quatro anos e no final do dia pensava que fosse uma abelha
de verdade. Fizemos uma parada na fazenda do tio Frank, um senhor que é
vizinho da tia Annete até hoje. Ele criava abelhas na época. Enquanto Jane e
as outras crianças se interessaram pelos doces, eu pensei que pudesse pegar
um pouco de mel. Afinal, eu também era uma abelha.
Andrew solta uma gargalhada.
— E então?
— Você vai ficar rindo de mim? — repliquei. — Eu só tinha quatro
anos!
— Não vou rir, termine de contar.
— Levei mais de setenta picadas e fui parar no hospital. Os médicos
disseram que a fantasia me salvou, se eu estivesse sem ela teria levado muito
mais picadas — digo. — Desde esse dia o papai começou a me chamar de
abelhinha, pois ele sabia que o motivo de eu ter mexido naquela colmeia era
porque eu tinha me considerado parte da família delas.
— Eu sabia que minha noiva era estranha. Só não pensei que era tanto
a ponto de pensar que era uma abelha.
— Falsa noiva — relembro-o. — Eu era apenas uma criança, não me
chame de estranha. Você também já deve ter feito algo estúpido quando era
pequeno.
— Claro que não, eu sempre fui muito inteligente.
— Ah, tá. — Reviro os olhos. — Senhor inteligente, precisamos parar
em algum lugar para comprar água.
— Vamos estar em casa em praticamente uma hora.
— O gatinho precisa de água, Andrew — digo. — Pare em algum
lugar.
— Você está ficando muito mandona, sabe? — Andrew diz. — E essa
coisa feia pode aguentar uma hora.
— Ele precisa de água, vamos parar — insisto. — E para de chamá-lo
de coisa feia, precisamos dar um nome a ele.
— Chame-o de aberração — Andrew sugere. — Afinal, ele é o
animal mais monstruoso que eu já vi.
— Ele perdeu o pelo, Andrew, mas quando for bem alimentado e bem
tratado ficará bonito. E não vamos chamá-lo de aberração. Ele merece um
nome melhor.
— Que tal sortudo? — Andrew pergunta, e acrescenta: — Afinal, é
isso o que ele é. Um dia ele era apenas um gato com fome, com sede, sem
pelo e sem casa, jogado na beira de uma estrada. No dia seguinte ele foi
resgatado para viver em uma mansão de uma senhora milionária. É muita
sorte.
— Sortudo não é um nome. — Faço uma careta. — Não gostei, sugira
algo decente ou eu mesma darei um nome a ele.
— Pera aí. — Andrew pondera por alguns segundos. — Ah, já sei.
Você já assistiu àquele filme Como cães e gatos dois, a vingança de Kitty
Galore?
Franzo o cenho.
— Não, eu nunca assisti. E estou muito surpresa que você tenha
assistido a um filme com esse nome. É infantil, não é?
— Eu não tinha outra coisa para fazer. — Ele dá de ombros.
— O que é que tem esse filme, Andrew?
— Acho que devemos chamar este gato de Kitty Galore — Andrew
diz. — Acredite, se você tivesse assistido ao filme, concordaria comigo que
eles são idênticos.
— Eu não sei se gosto de Kitty Galore.
— Deixa de ser chata — Andrew resmunga. — É um bom nome,
vamos chamá-lo assim.
— Tudo bem, foi você quem o salvou das ruas e ele vai morar na sua
casa. Você escolhe o nome, e se é assim que você quer, ele será chamado
Kitty Galore.
Andrew fez uma parada em um supermercado logo depois e nós
compramos comida e água para alimentar o Kitty. Depois voltamos para a
estrada e não fizemos mais nenhuma parada até estarmos no Bronx. Senti
como se tivesse sido transportada de um mundo para o outro. A casa de
fazenda da tia Annete era muito diferente da minha moradia em Nova Iorque.
Mas eu tinha que admitir que, apesar de gostar muito do Texas, meu lugar era
aqui e sempre seria.
Andrew pegou a casinha com o gato e a minha mala e me
acompanhou até a porta do meu apartamento. Eu o convidei para entrar, mas
ele recusou dizendo que queria usar o tempo restante do dia para descansar da
viagem, já que amanhã ele tinha que acordar cedo para o trabalho. Acabei
concordando com ele, porque eu também estava exausta, e amanhã
recomeçava meu trabalho, embora agora não como a garota dos cafezinhos, e
sim como secretária de Benjamin Cooper.
— A gente se vê amanhã no escritório — Andrew diz.
— Obrigada, Andrew, pela viagem e todo o resto — agradeci.
— Está tudo bem, eu também me diverti.
— Tchau.
— Tchau, Jamie — Andrew despede-se beijando minha bochecha e
entregando-me a casinha com o gato. — Se precisar de qualquer coisa para o
Kitty, me avise.
— Pode deixar.
Andrew se vira e vai embora. Abro a porta do apartamento e arrasto
minha mala para o lado de dentro. Abro a casinha e libero o gato. Kitty sai de
seu esconderijo com um pouco de receio, meio assustado também. De repente
ele corre rápido como um flash e esconde-se embaixo do sofá. Vou cuidar
dele aqui até o momento em que eu tiver que me mudar para a casa de
Andrew, depois vou levá-lo comigo.
— Ei, família, cheguei!
Ouço os passos correndo pelo corredor e Tyler grita animado quando
me vê. Abro os braços e o recebo em um abraço apertado. Jane aparece logo
depois e sorri para mim.
— Como foi a viagem? — pergunta-me.
— Foi ótima!
— E o papai, como ele está?
— Bem, na verdade. Ele continua forte e saudável, nem parece que
tem todos esses problemas no coração.
— E a tia Annete, Egan e Duane?
— Todos estão muito bem, Jane.
— Que bom. — Ela sorri. — Estou com inveja de você por tê-los
visto.
— Tia Jamie, nós conhecemos sua nova casa — Tyler diz. — É uma
casona e tem piscina. Vou poder visitar você?
— Do que você está falando, Tyler? — perguntei confusa.
— Conhecemos a casa de Andrew, Jamie — minha irmã diz. —
Abigail esteve aqui e nos levou para conhecer Elizabeth pessoalmente.
— Ah, é? Que ótimo.
— Nós passamos muito tempo juntas — Jane confessa. — Eles são
ótimas pessoas, aliás. Gostei da mãe de Abigail, nos demos muito bem.
— Isso é muito bom mesmo, eu queria que você as conhecesse.
— Jamie, há um motivo pelo qual ela quis me conhecer. Elizabeth,
Lorenna e Abigail estão organizando os preparativos para o seu casamento.
No sábado.
— O-O quê? — gaguejo. — Sábado?
— Exatamente — Jamie confirma. — Elizabeth quer casá-los o mais
rápido possível. Eu não entendi por que tanta pressa. Vocês são jovens e
podem se casar quando quiserem. Mas ela pareceu muito determinada em
realizar o matrimônio no sábado. Ela já foi até o cartório e está planejando
um jantar com os mais próximos da família. Ela quis que eu estivesse
presente porque acredita que nossas famílias devem permanecer unidas.
— Meu Deus! — exclamo. — Mas isso é no final desta semana!
— Pois é. — Jane ri. — Que loucura! Tem certeza de que é isso o que
você quer, irmãzinha?
— Tenho. — Aceno para ela. — Eu só… Eu pensei em casar em
alguns meses, não em alguns dias.
— Se é realmente o que você quer, não fará diferença ser agora ou
daqui a um mês, certo?
— Eu… Eu acho que sim.
— E o papai, o que achou quando você disse que ia se casar?
— Ele aceitou melhor do que eu esperava — respondo. — Embora
tenha ameaçado Andrew mais de uma vez.
— Imaginava que algo assim aconteceria, ele fez o mesmo com o
Rick — ela conta.
— Tia Jamie? — Tyler chama. — Tia Jamie, você trouxe um gato?
Olho para Tyler e vejo que ele está sentado no chão segurando o
gatinho em seus braços.
— Sim, Andrew e eu o achamos na estrada. Vamos ficar com ele.
— Qual o nome dele? — Tyler pergunta.
— Kitty — respondo. — Kitty Galore.
Tyler ri.
— Igual aquele filme que eu vi na tevê, o gato feio se chama Kitty
Galore. — Tyler diz.
Suspiro.
— É sim, foi o Andrew que escolheu o nome.
— Você deve estar cansada — minha irmã diz. — Por que não toma
um banho, desfaz a mala e descansa um pouco? Vou preparar algo para você
comer.
— Obrigada, Jane, eu vou fazer isso. Mas dispenso a comida, comprei
muitas besteiras na estrada. Vou para o meu quarto.
Tomo um banho longo e relaxante e visto roupas limpas. Volto para o
meu quarto e encontro um prato de sopa sobre o meu criado-mudo. Provo
apenas para constatar que o gosto de pimenta continua fortíssimo e que
minha irmã ainda é uma péssima cozinheira. Abro a janela e despejo tudo na
rua. Começo a desfazer minhas malas e ajeitar minhas coisas de volta no
lugar. Quando estou mexendo na minha bolsa encontro minha lista de
desejos. Pego uma caneta dentro do meu estojo e risco uma linha reta sobre a
linha que diz: “Dormir sob as estrelas” e “Gritar muito alto”. Já são dois
desejos a menos e parece incrível que eu consegui realizá-los. Mesmo que os
outros não sejam possíveis de se realizar, estarei eternamente contente por ter
conseguido realizar dois deles.
Neste momento ouço o toque de um celular e noto a tela acesa do meu
iPhone. É a primeira vez que o ouço tocar, também é a primeira vez que
alguém me liga. Apenas minha irmã e Abigail sabem sobre este número.
Pego o aparelho na mão e vejo escrito na tela: “Noivo gostoso”. Começo a rir
já sabendo que Andrew andou mexendo na minha bolsa e no meu iPhone.
Mas não posso ficar brava, foi ele que me deu este presente em primeiro
lugar. Atendo a ligação.
— Olá, noivo gostoso — saúdo com um sorriso bobo no rosto.
— Que bom que você já aceitou que eu sou gostoso — Andrew
responde, e eu posso sentir que ele está sorrindo também.
— Já com saudades? — pergunto provocando-o.
— Muita — ele murmura. — Principalmente da sua boceta de mel.
— Andrew! — repreendo, e meu rosto esquenta.
— Relaxe, abelhinha. — Ele ri. — Não liguei para termos sexo por
telefone, embora eu ache que seria divertido. Será que você pode gozar só
com as minhas palavras?
— Por que você está me ligando, Andrew?
Ouço o suspiro profundo dele do outro lado.
— Vovó está organizando nosso casamento para sábado.
— Já sei disso — respondo.
— Já?
— Sim, minha irmã contou assim que cheguei.
— O que você acha disso? — Andrew pergunta-me.
— Acho que seremos marido e mulher de mentirinha em menos de
uma semana.
— Obrigado por concordar com isso, Jamie — agradece-me.
— Tudo bem — murmuro.
— Você vai passar no meu escritório amanhã?
— Por que eu faria isso? — pergunto.
— Pra gente dar uma rapidinha.
Sorrio.
— Boa noite, Andrew.
— Estou falando sério — ele diz.
— Boa noite, Andrew.
— A proposta vai estar de pé se você mudar de ideia — ele insiste.
— Boa noite, Andrew — repito.
— Boa noite, abelhinha.
***
Hoje é o meu primeiro dia na Simon’s Construtora como secretária.
Sabe aquela história de que eu era a mosquinha, inferior a tudo e todos, o tipo
de pessoa que não ganhava nem um primeiro olhar, quanto mais um
segundo? Pode esquecer, porque hoje, quando eu passo pelo hall, estou de
cabeça erguida. Todos, absolutamente todos, olham para mim de cima a
baixo. Aposto que a maior parte dessas pessoas não fazia ideia da minha
existência, até que o boato de casamento se espalhou pelo prédio todo. Agora
todos sabem que eu sou Jamie Collins, a futura esposa do chefe.
Escolhi um modelo de roupa bem ousado para vir trabalhar. Estou
acostumada às minhas saias longas e aos meus suéteres. Mas Andrew me fez
perceber que eu não tenho que ter medo do que as pessoas pensam, tenho que
mostrar a minha beleza ao mundo. Não quero mais esconder a garota bonita
que existe em mim. Tenho certeza de que ele ficaria orgulhoso se visse minha
escolha de vestuário. Estou usando uma saia preta que vai comportadamente
até os joelhos, mas é justa. E uma bata rosa pink. Os saltos altos que estou
calçando devem ter vinte centímetros, porque me sinto uma gigante daqui de
cima. Tenho que cuidar bem onde piso, esses saltos são perigosos. Também
arrumei o meu cabelo e fiz maquiagem.
Pego o elevador na companhia de dois outros funcionários que
sorriem para mim e me cumprimentam. Eu sei quem eles são, e eles nunca
falaram comigo antes. Em vez de ir para a cozinha, como fiz desde que
comecei a trabalhar aqui, pego um caminho diferente, seguindo até os
escritórios dos “figurões” da construtora. O escritório de Benjamin é uma das
primeiras portas assim que saio do elevador. O de Olivia fica próximo ao
dele. Já o de Andrew é no final do corredor, quase penso em ir até lá, mas
acabo desistindo. Ele pode acabar pensando que concordei com aquela ideia
da “rapidinha”.
Entro na pequena sala que dá entrada ao escritório de Benjamin. A
mesa da antiga secretária está vazia, esperando por mim. A porta do escritório
de Benjamin está aberta, e eu o vejo sentado atrás de sua mesa analisando
alguns papéis. Aproximo-me e bato delicadamente na porta que já está
escancarada. Ele levanta os olhos e me vê, surpresa cruza as suas feições e
logo se transforma em satisfação. Ele sorri, levanta-se e caminha até onde eu
estou.
— Que bom que resolveu aceitar minha proposta — Benjamin diz. —
Tenho certeza de que você será uma assistente excelente.
— Espero que sim, Sr. Cooper.
— Seu trabalho é muito simples, Srta. Collins — Benjamin
prossegue. — Atenda a todas as ligações e anote tudo. Há uma agenda
eletrônica no notebook sobre sua mesa, e eu vou ensiná-la a usar para que
você possa marcar todos os compromissos. Não transfira nenhuma ligação
sem que eu autorize antes, assim como não permita a entrada de ninguém
sem me consultar antes. Aos poucos vou explicando os detalhes, mas tenho
certeza de que uma garota inteligente como você aprende rápido.
— Sim, senhor.
— Ótimo, se você precisar de ajuda com qualquer coisa, basta me
perguntar. Bem-vinda ao seu novo cargo.
— Obrigada, Sr. Cooper.
— Sua primeira tarefa é pedir o meu café, e a parte boa é que você
sabe exatamente como eu gosto. Na verdade, eu acho que você me conhece
muito bem, e isso facilitará nosso trabalho.
— Com certeza, senhor.
— Agora só será necessário que eu aprenda mais sobre você — ele
prossegue, dando um passo à frente e invadindo o meu espaço pessoal. —
Mas eu tenho certeza de que conhecerei toda e qualquer parte de você logo.
— Eu acho que vou pedir o café — esquivo-me.
— Faça isso, Srta. Collins.
Dou as costas ao meu chefe e caminho para fora do escritório. Tenho
a impressão de que seu olhar me segue até que eu esteja fora de vista, e o pior
é que o sinto diretamente no meu traseiro. Poderia Benjamin Cooper estar
admirando a minha bunda?
***
Minha manhã corre de uma maneira inacreditável. Eu pedi o café para
Benjamin e até conversei com Janice e Irene na cozinha. Ambas queriam
saber de tudo sobre o meu relacionamento com Andrew, porém, fui bastante
vaga sobre isso. Quando retornei ao escritório, Benjamin me ensinou a
utilizar a agenda eletrônica e como inserir os compromissos. Mostrou-me a
sala de arquivos e como era organizada. Explicou basicamente tudo o que ele
poderia pedir a mim e o que faria parte do meu trabalho. E, na verdade, achei
tudo muito fácil. Era um emprego moleza e muito melhor do que ficar
esfregando o chão. Talvez a única dificuldade tenha sido permanecer perto de
Benjamin. Houve um momento, quando eu estava sentada digitando, e ele
estava atrás de mim apontando onde eu deveria mexer, e eu o senti muito
próximo, sua respiração batendo contra o meu pescoço. Tive a impressão
também de que ele estava me cheirando. Foi estranho e um pouco assustador.
O Benjamin que eu conhecia nunca me lançou um olhar, embora esse
estivesse com os olhos sobre mim o tempo todo.
Assim que meu horário de almoço começou, deixei o escritório.
Acabei almoçando sanduíche e suco na cozinha, junto a Janice e Irene. Elas
ainda insistiram em saber mais sobre meu relacionamento com o chefe.
Contei algumas poucas coisas apenas para que não ficassem me perturbando.
Elas não conseguiam acreditar que eu, justo eu, tinha fisgado Andrew
Simons. Foram logo dizendo que era porque provavelmente eu fazia sexo
muito melhor do que Tracy ou as antigas secretárias. Mal sabiam elas que
nunca tínhamos chegado a esse ponto. Bom, se dependesse de Andrew já
teríamos feito sexo dentro do carro dele no estacionamento do Tucker’s. Mas
graças a mim, continuávamos nossa farsa como o combinado desde o
começo. Sem sexo.
Quando voltei ao escritório, Benjamin já estava lá trabalhando
arduamente com as portas fechadas. Agradeci por ele finalmente ter me
ensinado tudo o que eu precisava saber, e agora eu não precisava lidar com
ele em cima de mim. Não fiz muita coisa além de atender algumas ligações,
que não eram muito importantes, e levar alguns documentos de um canto do
prédio para outro. Tirar alguns xerox, levar algumas pastas para outros
funcionários. Enfim, tudo estava correndo muito bem. Até que ela chegou, a
bruxa mais temível do prédio.
Olivia Cooper entrou na sala e correu o olhar até me encontrar atrás
da mesa. Ela não parecia surpresa, porque provavelmente já sabia que eu
tinha assumido esse cargo. Como sempre, ela ergueu a sobrancelha e me
lançou um olhar de desdém, embora um pouco de raiva cintilasse em seus
olhos castanhos. Com os saltos altos fazendo barulho no piso, ela se
aproximou. Colocou ambas as mãos, com dedos longos e unhas pintadas de
vermelho, sobre a mesa. Inclinou-se para frente e sorriu cinicamente.
— Ora, ora, o que temos aqui? — Olivia cantarolou, olhando-me de
cima a baixo o máximo que podia com a mesa entre nós. — A faxineira
achando que virou realeza. Se divertindo? Eu espero que sim, porque o seu
tempo de conto de fadas está quase acabando.
— Eu estou trabalhando, Olivia, se você não quer nada, me deixe em
paz.
— Olivia? — repetiu. — Quem te deu a liberdade de me chamar pelo
primeiro nome? Você é minha funcionária, você deve me chamar de senhora
Cooper.
— Não sou mais sua funcionária — retruco. — Mas se vai me deixar
em paz, posso chamá-la assim, senhora Cooper.
Olivia fulmina-me com os olhos.
— Eu não sei o que deu em Benjamin para colocá-la aqui — ela diz,
trincando os dentes. — Mas isso não vai durar, eu juro que não vai. Você vai
cair, e será uma queda muito feia.
— Eu acho que você já sabe exatamente o que eu penso das suas
ameaças — digo e acrescento: — Elas não me assustam mais.
— Deveriam, minha cara, deveriam — Olivia diz. — Eu mesma
tenho medo de mim quando quero muito alguma coisa e alguém está no meu
caminho.
Olivia se vira e entra no escritório de Benjamin, sem esperar por
qualquer permissão. A ameaça dela ainda paira no ar, mas eu não temo nem
um pouco. Cansei dela, cansei de viver amedrontada. Logo depois ela sai do
escritório com uma pasta na mão e, desta vez, sequer olha para mim.
Continuo fazendo o meu trabalho sem problema nenhum. Até o meu celular
começar a tocar dentro da minha bolsa. Pego-o rapidamente e vejo o nome da
minha irmã piscando na tela. É muito estranho que Jane esteja me ligando
neste horário. Deve ser algo importante, ela sempre evita me atrapalhar no
serviço. Atendo a ligação.
— Jane?
— J-Jamie. — A voz dela sai baixa e chorosa. Imediatamente fico
preocupada.
— Jane, o que houve?
— Oh, meu Deus. — Ela começa a chorar, e eu me levanto da minha
cadeira. — Jamie… Jamie eu não sei… Não sei o que fazer.
— O que está acontecendo, Jane? — insisto. — Você está me
deixando assustada, conte-me, o que houve?
— Nós… nós vamos… ser… despejadas. — Ela soluça alto.
Não! Não! Droga!
— Jane, escute, vamos ficar bem — asseguro, embora não tenha
certeza do que eu vou fazer. — Não chore, por favor, vamos ficar bem.
— Não vamos, não vamos ficar bem. Vamos ser colocadas na rua,
não temos onde ficar. O que nós vamos fazer, Jamie? Rick está sem o
emprego, e eu não posso deixar o meu filho dormir na rua!
— Confie em mim, Jane, eu vou dar um jeito — garanto. — Não
perca a cabeça agora, o Tyler não precisa saber disso. Não assuste todos
achando que não vamos ter um lugar para ficar. Eu vou conseguir o dinheiro
do aluguel e o senhor Dimitri vai ter que nos deixar ficar.
— Jamie, mesmo que você consiga o dinheiro, o senhor Dimitri me
disse que o proprietário do prédio não nos quer mais morando lá — Jane
explica. — Precisaremos de outro lugar. Mas onde? E com que dinheiro?
Meu Deus, eu não sei o que fazer!
— Jane, aguente firme, por favor — imploro e noto lágrimas correndo
pelas minhas bochechas. — Confie em mim, vou nos tirar dessa. Por favor.
— Eu… Eu confio. Confio em você, irmãzinha.
— Tudo bem, me escute. Vou desligar o telefone, e nós vamos
conversar mais tarde. Ok?
— Ok, vou esperar por você.
Desligo o telefone com o coração na mão. O que eu mais temia
aconteceu. Como eu me esqueci do senhor Dimitri e de seu aviso sobre o
despejo? Agora minha irmã está aterrorizada com a ideia de termos que sair
do nosso apartamento sem outro lugar para ficar. Sinto-me péssima porque eu
deveria ter pedido um adiantamento do salário e ter pagado pelo menos um
aluguel para conseguir a confiança do senhor Dimitri. E agora não há mais
jeito, não vamos poder ficar lá. Preciso de dinheiro, e preciso
desesperadamente. Mas como eu vou conseguir isso? Eu não posso pedir
nada a Olivia, e Benjamin se tornou meu chefe apenas hoje. A quem eu
deveria recorrer?
Percebo que estou chorando sofregamente, as lágrimas estão
escorrendo pela minha bochecha e caindo sobre o meu colo. O medo está
tomando conta de mim pela primeira vez em muito tempo. Eles são a minha
família, eu não posso deixá-los desamparados. Eu preciso de uma solução,
preciso de ajuda. Como posso conseguir dinheiro fácil e rápido com a
segurança de que não será preciso devolver imediatamente? Ai, meu Deus, eu
preciso dele. Preciso de Andrew.
Levanto-me meio trêmula e tropeço nos meus próprios saltos quando
dou a volta na mesa. Nem me incomodo de avisar a Benjamin sobre minha
saída. Estou sufocando, agonizando lentamente. Preciso me livrar disso,
preciso acabar com este medo que estou sentindo. Andrew vai poder me
ajudar, ele pode adiantar meu salário, ou talvez me adiantar uma parte do
dinheiro do nosso acordo. Isso seria muito bom. Uma solução rápida para o
meu problema e da minha família.
Saio para o corredor e caminho em direção ao escritório de Andrew.
Os funcionários começam a olhar na minha direção e cochichar. Devem estar
se perguntando por que estou praticamente correndo como se estivesse
fugindo de algo e por que estou chorando como se o mundo estivesse
acabando. Eu não me importo com eles, eu só preciso chegar até Andrew e
ele vai fazer isso passar. Eu sei que ele vai. Vejo Olivia no meu caminho, e
ela sorri largamente quando vê meu estado deplorável. Parece feliz com a
minha infelicidade mesmo que ela não saiba o motivo pelo qual estou
passando por isso.
Ela abre a boca para dizer alguma coisa, e eu estou pronta para
ignorá-la. Então, de repente, ela estende a perna exatamente no meu caminho.
Meus reflexos não são tão rápidos para capitar seus movimentos, e quando eu
penso em levantar meu pé e passar sobre a perna dela, eu acabo esbarrando
com os meus saltos altíssimos. Tropeço e vou de encontro ao chão. Caio com
tanta força que mesmo usando os braços para me proteger eu ainda bato com
o queixo no piso duro. Dor explode por toda a minha mandíbula, e eu solto
um gemido.
— Opss, cuidado — Olivia murmura logo acima de mim. — É por
isso que eu sempre digo, quem nasceu nos chinelos nunca ficará sobre os
saltos. Tenha isso em mente quando resolver usar um.
— Jamie!
A voz de Andrew me faz levantar a cabeça, e eu o vejo correndo na
minha direção. Forço minhas mãos no piso e fico de joelhos, tentando me
levantar. Andrew está ao meu lado logo em seguida, tocando os meus ombros
e depois o meu rosto. Solto outro gemido quando ele toca com um pouco de
pressão o meu queixo. Ele solta um palavrão e me ajuda a levantar e ficar de
pé. Meus olhos encontram os dele brevemente e eu vejo raiva brilhando bem
no fundo de sua íris azul.
— Andrew — murmuro.
Ele me encosta contra a parede como se achasse que eu vou cair a
qualquer momento. Então se vira e caminha até Olivia com um olhar
selvagem e o maxilar cerrado. Todas as pessoas param o que estão fazendo e
assistem à cena.
— O que você fez? — Andrew grita no rosto de Olivia e segura um
dos braços dela, chacoalhando-a. — O que você fez, Olivia?
— Não fiz nada! — ela diz ríspida. — Não tenho culpa se a sua
noivinha não sabe andar de salto alto.
— Eu não quero você perto dela, Olivia! — Andrew diz, sua voz sai
firme e dura. Ele segura o outro braço dela, mantendo-a presa sob suas
garras. — Está me ouvindo? Quero você longe!
— Você não manda em mim, Andrew — Olivia resmunga. — E solte
o meu braço, você está me machucando!
— Andrew, solte-a — peço.
— Se você machucá-la, Olivia, você vai pagar muito caro — Andrew
ameaça em voz baixa. — Eu estou falando sério, estou te avisando para ficar
longe.
— Solta o meu braço, Andrew, está doendo — Olivia exige. — Se
não soltar eu vou começar a gritar. O que acha que vai acontecer se a vovó
souber que você me feriu no escritório na frente de todos?
— Ela tem razão, Andrew, solte-a — insisto.
— Você não é minha prima — Andrew cospe. — Você é uma cobra,
Olivia, eu vou fazer você cair do seu pedestal nem que seja a última coisa que
eu faça.
— Estou esperando por isso, priminho.
Andrew solta Olivia e ela se vira e caminha de volta para o escritório.
Vejo-a esfregando os braços no lugar exato em que Andrew estava
segurando-a. Aposto que ele aplicou força o suficiente para deixar marcas.
Ele se vira e caminha até mim. Espero que ele vá dizer alguma coisa, mas ele
apenas se abaixa um pouco e passa os braços por trás das minhas pernas.
Então eu estou sendo carregada no colo na frente de todos aqueles
funcionários que ainda estão parados nos observando.
— Andrew, eu posso andar — informo.
Ele me ignora e nos leva até a sua sala. Coloca-me sentada sobre o
pequeno sofá de canto.
— Tracy, traga gelo — Andrew ordena, e a funcionária, que até agora
estava nos olhando, se retira.
— Obrigada, vou ficar bem.
— O que aconteceu? — ele pergunta. — Eu escutei um grito e
quando saí você já estava caída no chão e Olivia estava dizendo alguma coisa
para você.
— Ela pôs o pé no meu caminho, e esses saltos estúpidos me
impediram de passar por cima.
— Olivia passou dos limites, eu preciso tomar uma providência.
— Andrew, não há nada que você possa fazer contra ela neste
momento. Olivia exerce tanto poder quando você aqui dentro, e isso só vai
mudar se você se tonar o presidente da Simon’s.
— Se eu me tornar não — Andrew diz. — Eu vou me tonar. E quando
isso acontecer os dias de Olivia aqui dentro estarão terminados.
— Andrew, eu preciso falar com você — sussurro.
— O que foi? — ele pergunta sentando-se ao meu lado.
— Eu… Eu quero pedir algo.
— Jamie, para de enrolar, diz logo o que você precisa.
— Eu queria saber… Queria saber se você pode me adiantar um
pouco do dinheiro do nosso acordo. Olha, eu sei que este não é combinado.
Que o dinheiro só vem com o fim do acordo, mas eu realmente preciso. Por
favor, Andrew, eu não tenho o direito de pedir isso, mas eu estou pedindo
mesmo assim. — Começo a chorar novamente.
— Ei, ei, Jamie não chore. — Andrew toca a minha bochecha e limpa
as lágrimas que estão caindo. — O que está acontecendo? Por que você
precisa tanto do dinheiro?
— Minha família vai ser despejada — admito decidindo contar a ele a
verdade. — Não temos para onde ir, não temos onde ficar e somos obrigados
a deixar nosso apartamento. Eu só quero algum dinheiro para pagar um
aluguel em outro lugar, quando eu receber posso pagar os próximos aluguéis.
— Jamie, eu nunca deixaria você ou a sua família na rua. Vocês
gostam de morar em apartamentos ou preferem casa? Vou providenciar isso
agora mesmo.
— Obrigada, Andrew — soluço. — Obrigada, você não precisa fazer
nada. Com o dinheiro Jane e eu podemos ver um lugarzinho para ficar.
— Um lugarzinho? — Andrew repete. — Você quer dizer outra caixa
de sapato como a que vocês moram? Não, não. Vocês precisam de lugar
decente para viver, Jamie, um apartamento ou uma casa de verdade. Um
lugar espaçoso e acolhedor. E você está se esquecendo de que o seu noivo
aqui é o futuro herdeiro de uma construtora. Não vou dar nada mais nada
menos do que um apartamento ou uma casa nova e mobiliada. Você escolhe.
— Não! — protesto. — Não, Andrew, você não precisa fazer isso. Só
preciso de dinheiro para um aluguel. Quando eu receber o dinheiro do nosso
acordo eu compro a casa que eu quero.
— A casa que você quer? — Andrew pergunta. — A casa que você
quer por acaso é aquela no Brooklyn que você colocou na sua lista?
— É — murmuro. — Quer dizer, não, não! Você não pode comprar
aquela casa!
— Querida, eu posso tudo — ele diz. — Posso comprar a casa da sua
lista, você só precisa me dizer qual é. E sua família vai ter um lugar para
viver em breve.
— Andrew, não é isso o que estou pedindo!
— Mas é isso o que eu quero dar a você! — Andrew retruca. —
Agora pare de reclamar. Simplesmente aceite.
— Andrew…
— Aceite, Jamie.
— Tudo bem, mas você vai comprá-la com o dinheiro do nosso
acordo. É como um adiantamento.
— Tá, claro.
— Obrigada, Andrew — agradeço, abraçando-o apertado. — Eu sabia
que você me ajudaria, obrigada.
— Eu prometi ao seu pai que eu cuidaria de você, Jamie — Andrew
sussurra. — E essa promessa eu não vou quebrar.
— Mesmo assim, obrigada.
— Pare de chorar, eu não sei agir em torno de mulheres que choram.
Sorrio.
— Eu notei.
— Será que eu mereço um beijo?
— Mas não há ninguém aqui — falo. — Não precisamos fingir.
— Eu sei, mas eu ainda quero beijar você do mesmo jeito.
— Considere isso um agradecimento.
Inclino-me em direção a ele e fecho os olhos quando Andrew encosta
seus lábios contra os meus. Em seguida, suas mãos estão sobre mim e ele está
me colocando sobre o seu colo sem me afastar um segundo sequer. Sua
língua abre caminho e se encontra com a minha, e o que era apenas um
simples beijo se torna algo mais. Como sempre, não estamos satisfeitos,
queremos toque, queremos calor. Andrew e eu juntos somos como
combustível pegando fogo, e eu adoro isso. Beijo-o como nunca beijei
ninguém, entrego-me de uma forma que nunca me entreguei a ninguém. E eu
amo cada segundo disto. Até ouvirmos o barulho da porta se abrindo e nos
afastarmos como dois amantes pegos no flagra.
— Trouxe o gelo — Tracy diz, enfiando a cabeça pela brecha da
porta. — Estou atrapalhando alguma coisa?
Andrew e eu olhamos um para o outro com sorrisos cúmplices.
— Não está atrapalhando nada — respondemos em uníssono.
CAPÍTULO DEZOITO
--—————————————————————————————

Andrew

Comprei para Jamie a casa de tijolos vermelhos no Brooklyn. É uma


casa de dois pisos, com dois quartos, uma suíte, sala de estar, sala de jantar,
banheiro, cozinha e até área de serviço. Tem garagem para um carro e um
pequeno jardim na parte dos fundos. A residência já foi de três proprietários
diferentes desde que foi construída e o primeiro deles era o pai de Jamie, o
senhor Walter. Foi só quando eu soube disso que compreendi por que aquele
imóvel era tão importante para estar na lista de desejos de Jamie. Ela poderia
ter qualquer casa que quisesse quando recebesse o dinheiro do nosso acordo,
mas ela insistiu muito naquela. E eu só soube o porquê quando fiz essa
descoberta.
Claro que eu pedi explicações, queria saber por que aquela casa era
tão importante para ela. Jamie me confessou que foi o primeiro lar que ela
teve e foi onde os pais dela viveram juntos enquanto a mãe dela ainda era
viva. Ela disse que tinha muitas lembranças boas naquela casa e que gostaria
de recuperá-la como herança de sua família. Perguntei como elas haviam
vendido a casa se era tão importante assim, e Jamie abriu-se totalmente
comigo quando contou sobre os problemas com bebida que seu pai teve
assim que sua mãe morreu. Como ele se endividou e não conseguiu pagar as
contas e, por isso, teve que vender a casa para pagar dívidas.
A Jamie disse que seu pai se culpava muito por ter perdido aquela
casa e que um dos sonhos dela era tê-la novamente. Assim ela poderia trazer
o pai para viver em Nova Iorque, afinal, ela acredita que esse seria o único
motivo que o faria sair do Texas e viver perto dela. Jamie também queria que
sua irmã pudesse ter um lar para morar sem se preocupar com os aluguéis.
Sem ter medo de que a qualquer momento ela fosse colocada para a rua,
como estava acontecendo agora. Ela se sentia na obrigação de fazer algo
sobre isso, ficou dizendo que era um peso para a sua família, mesmo que eles
não falassem isso diretamente. E ela queria fazer algo para mudar isso, ela
desejava tirar essas preocupações dos ombros de seus familiares.
Eu a escutei em silêncio o tempo todo, enquanto ela simplesmente
desabafava. Ouvi todas as suas palavras com atenção e o tempo todo fui
obrigado a aguentar uma expressão contida no rosto. Quando algo dentro de
mim estava fervilhando. Fiquei tão incomodado com tudo o que escutei, não
conseguia imaginar a Jamie passando por tudo aquilo, tendo esses
pensamentos de que era um estorvo para sua família. Fiquei com raiva, com
ódio, fiquei magoado ao saber que no fundo Jamie só tinha aceitado se casar
comigo porque ela precisava desesperadamente do dinheiro. Não por motivos
fúteis, mas por motivos reais. Nunca conheci alguém com um amor tão
grande por sua família, a ponto de alterar o rumo da própria vida para
conseguir tornar a vida das pessoas que ela ama melhor.
Fiquei com um caroço preso na garganta e uma sensação incômoda no
peito. Respirei fundo várias vezes para tentar me livrar da imagem de uma
garotinha sendo colocada para fora da própria casa, enquanto seu pai enchia a
cara para tentar diminuir a tristeza de perder a esposa e ficar sozinho no
mundo para criar duas filhas. Pensei no quanto Jamie devia ter sofrido pela
falta de sua mãe e devido ao alcoolismo de seu pai, por falta de um lar
decente, ou talvez até por falta de comida. Fiz força para não pensar em nada,
porque tudo aquilo estava me deixando irritado e conturbado. Mas não
consegui e senti dor, uma dor estranha. Não era uma dor física, ou emocional.
Era uma mistura de ambas, e foi desencadeada pelos pensamentos de
imaginar a vida que Jamie Collins tinha antes de me conhecer.
Quando eu digo tinha, é exatamente isso que quero dizer. Agora que
eu conheço sua história de vida de uma forma mais profunda, não vou
permitir que nada disso aconteça novamente. Se depender de mim, Jamie e
sua família jamais passarão por problemas como esses de novo. Eu não só
comprei a casa para a família dela, coloquei o imóvel em seu nome e estou
dando como um presente. Não vou descontar do valor do nosso acordo de
jeito nenhum. É claro que Jamie não sabe disso, ela pensa que é apenas um
adiantamento do dinheiro. Contudo, neste momento, eu não pretendo dizer
nada. Do jeito que ela é, tentaria recusar de todas as formas. Assim como a
irmã dela está fazendo neste momento.
— Não posso aceitar! — Jane diz pela terceira vez. — Meu Deus, eu
ainda não acredito que a Jamie foi pedir ajuda a você, Andrew. Desculpe-me
por isso, mas é um problema nosso, que vamos resolver.
— Jane, escute — digo. — Eu vou me casar com a Jamie, sua família
agora também é a minha família. E eu não estou fazendo nada de mais,
apenas dando uma forcinha para vocês.
— É, Jane, o Andrew é a nossa solução mais rápida — Jamie insiste
ao meu lado. — Não temos nenhum lugar para ir, e aquela é a nossa casa.
Você sabe que nós nunca deveríamos ter saído de lá.
— Aquela casa não é mais nossa, Jamie! — Jane exclama.
— Mas ela vai ser — interrompo. — Escute, Jane. A Jamie é minha
noiva, e ela e a família estão passando por problemas, estou oferecendo uma
solução para vocês. A casa já está comprada mesmo, vocês só têm que se
mudar.
— Eu não posso, não posso aceitar. — Jane balança a cabeça.
— Jane, eu sei que deve ser difícil para você aceitar isso — digo. —
Mas pense no Tyler, ele é só uma criança e merece um lar. Se você não
aceitar a proposta que eu e Jamie estamos fazendo, então onde você vai viver
com a sua família?
— Jane, o Andrew está fazendo isso de bom coração, aceite, por favor
— Jamie implora.
— Eu… Eu vou conversar com o Rick — Jane cede. — Temos uma
semana para deixar o apartamento e até lá decido se aceito ou não.
— Tudo bem — concordo.
— Obrigada mais uma vez pela sua proposta, Andrew — Jane
agradece. — Minha irmã não deveria ter incomodado você e o feito sair do
trabalho para vir até aqui.
— Está tudo bem, Jane.
— Eu tenho que ir agora, vou fazer plantão essa noite — Jane explica.
— A gente conversa amanhã — Jamie diz e abraça a irmã. — Se
cuide.
— Vocês dois também. Até logo. — Jane acena para nós e segue para
fora da lanchonete do hospital.
Jamie suspira e segura minha mão do outro lado da mesa. Ela abre um
pequeno sorriso para mim.
— Obrigada, Andrew, de verdade — ela agradece. — Agora eu sei
que é só uma questão de tempo até Jane resolver se mudar.
— Você não tem que me agradecer.
— Tenho sim. Você não precisava ter feito nada disso, ainda assim,
você fez.
— A gente pode ir embora? — pergunto.
— Ah, sim, claro. — Ela solta a minha mão e pega a bolsa antes de se
levantar. — Você tem problemas com hospitais, né?
— O quê?
— Problema com hospitais — ela repete. — Desde que você chegou
está inquieto. Eu vi a sua cara quando olhou para todas aquelas macas e as
pessoas doentes nos consultórios.
— Eu só não gosto — admito. — Fico pensando nos meus pais
morrendo em um lugar desses e eu nem estava aqui para dizer adeus.
— Oh. — Jamie se aproxima e segura a minha mão novamente
enquanto seguimos para a saída. — Desculpe por fazer você vir até aqui. Eu
queria ter conversado com a minha irmã em outro lugar, mas ela não pode
deixar o hospital, pois tem plantão essa noite.
— Está tudo bem. Só vamos cair fora.
Jamie e eu seguimos para o estacionamento, embarcamos no Tesla e
finalmente caímos fora daquele hospital. Coloco uma música para tocar e
guio o carro pelas ruas do distrito do Bronx. Era difícil eu dirigir naquela
parte da cidade, na verdade era quase um território desconhecido para mim.
Jamie contou que ela vinha muito aqui, já que a irmã trabalhava nesse
hospital da região. Fiquei imaginando todo o percurso que ela tinha que fazer,
saindo do trabalhando em Manhattan, pegando o metrô até aqui e ainda tendo
que caminhar sozinha no escuro algumas quadras. Quase acabei dizendo a ela
que iria comprar um carro, para que ela se locomovesse pelo menos neste
tipo de situação. Só que então eu lembrei que ela não tinha carteira de
motorista. Acabei decidindo que eu teria de mudar isso em breve.
— Como foi o primeiro dia no novo trabalho? — pergunto a ela.
— Bom — Jamie murmura olhando para fora através do vidro.
— Bom? Não deve ter sido muito bom se você foi parar de cara no
chão com Olivia resmungando sobre você.
— Tirando isso, foi bom.
— E Benjamin? — insisto curioso.
— Ele foi… Normal. Se você está interessado em saber se os dois
estavam tramando algum plano maligno enquanto eu não estava lá, não, isso
não aconteceu.
— Eu não gosto de você trabalhando com Benjamin. O cara não
presta, Olivia não presta. Os dois juntos são piores ainda, então acho que
você deveria fazer outra coisa.
— Andrew, você sabe que eu não tenho estudos para trabalhar em
outra coisa. E, além disso, eu gostei do novo emprego, posso muito bem lidar
com Benjamin e Olivia. Não se esqueça de que eu estou os aguentando há
quase um ano.
— Tudo bem, mas eu quero que você saiba que se precisar de algo
você pode ir me procu…
— Para o carro, Andrew! — Jamie exclama.
— O quê?
— Pare o carro! — ela insiste apontando para frente. — Pare o carro
ali!
Olho para o ponto onde ela está apontando e vejo apenas uma fileira
de carros estacionados na beira da estrada em frente às casas. Pergunto-me se
neste meio tempo de percurso do hospital até aqui Jamie enlouqueceu e não
está batendo muito bem da cabeça. Porque não tem absolutamente nada neste
lugar. Está escuro, poucas pessoas caminham nas ruas. O único comércio
aberto é um pequeno mercadinho. E ela está querendo que eu estacione o
carro aqui? Eu faço o que ela diz e paro o carro.
— Por que você me mandou parar aqui?
Ela olha para fora da janela em direção a um conjunto de casas ali
perto e depois de volta para mim.
— Vamos a uma festa.
— Uma festa? — pergunto. — Por quê?
— Andrew, por que as pessoas vão a uma festa? — ela pergunta
irônica. — Pra se divertirem, é claro!
— Eu não sabia que você curtia ir a festas, só isso.
— Bom, na verdade eu não costumo ir — ela confessa. — Mas agora
quero.
— Tudo bem, eu conheço um lugarzinho legal no centro — digo. —
Podemos ir pra lá.
— Não! — ela protesta. — Não quero ir a uma festa no centro. Quero
entrar em uma festa aqui.
— Aqui? — Olho ao redor novamente. Franzo o cenho. — Aqui
onde?
— Lá, Andrew! — Ela aponta para fora da janela, e eu sigo o olhar
naquela direção. Vejo uma pequena multidão de pessoas reunidas em frente a
uma casa. Dá para ouvir a música tocando, embora onde estamos o som
esteja baixo. Provavelmente a festa está rolando na parte de trás da residência
ou dentro dela.
— Jamie, aquilo é uma festa particular — explico a ela. — Eu posso
te levar a um lugar muito melhor, não uma reunião de bêbados aloprados.
— Eu sei que é uma festa particular — ela diz me dando um olhar
como se eu fosse um imbecil. — E é justamente por isso que eu quero ir
àquela festa. Andrew, você mesmo me disse que eu não tenho que me
importar com a opinião das pessoas. Que se eu quiser fazer algo eu tenho que
fazer sem ficar imaginando o que os outros vão dizer. Você me ajudou a
realizar dois desejos da minha lista. E hoje eu percebi que você também
realizou um terceiro desejo. Eu sei que minha lista parece estúpida para você,
mas para mim não é. E eu nunca pensei que teria coragem de realizar nenhum
deles. Você, Andrew, me mostrou que eu estava errada, que se eu quiser eu
posso. Então eu vou fazer isso, vou entrar naquela festa.
Putz!
— Jamie, não pode ser uma festinha em outro lugar, fora do Bronx?
— Deixa de preconceituoso, Andrew! — ela repreende. — Você fala
como se eles fossem criminosos. São apenas pessoas simples como eu. E não
estou dizendo que você tem que vir junto. Na verdade, agradeço pela carona,
mas eu finalmente vou entrar de penetra em uma festa!
Jamie abre a porta, e sai do carro. Ela está toda animada com a
possibilidade de entrar em uma festa que ela não foi convidada. Eu, no
entanto, reparo que Jamie Collins não tem ideia do que ela está fazendo. Ela
pode ter até o jeito de uma pessoa mais simples, alguém criada no Bronx.
Entretanto, ela nunca vai passar despercebida neste lugar vestida daquele
jeito. Roupas de marca, bolsa de marca, sapatos altíssimos também de marca.
Eu aposto que todos os pertences dela reunidos pagam por uma casa como
aquela para onde ela está se encaminhando. Ela pode não saber, mas no
momento em que ela pisar lá dentro cada uma daquelas pessoas vai saber que
ela não se encaixa naquele lugar. E que ela não é simplesmente uma penetra,
mas uma penetra carregando uma fortuna no corpo.
Abelhinha… Abelhinha… O que eu faço com você?
Pulo para fora do carro e sigo-a.
— Jamie! — chamo.
Ela olha para trás e abre um sorrisinho.
— Mudou de ideia?
— Você não pode entrar lá vestida assim. — Aponto para suas
roupas. — Se você quer entrar em uma festa e passar despercebida então
vamos fazer isso do jeito certo.
— Vamos? Você vai comigo?
Suspiro.
— Vou aonde a minha noiva for.
A primeira coisa que eu faço é guardar a bolsa dela dentro do carro, é
chamativa demais, e ninguém leva esse tipo de uma bolsa a uma festinha.
Depois nós passamos pelas cercas de algumas residências e seguimos para os
jardins na parte de trás. Jamie fica reclamando sobre o que estamos fazendo,
mas eu não digo nada. Até que eu localizo um varal cheio de roupas e cato
uma camiseta e um short para ela. E uma camisa para mim.
— O que você está fazendo? — ela pergunta com os olhos
arregalados. — Estamos roubando essas roupas?
— Estamos pegando emprestado — digo e entrego a ela a camiseta e
o short. — Agora veste isso.
— Não! — ela protesta. — Não podemos pegar essas roupas.
— Jamie, não podemos entrar lá vestidos assim, temos que nos
misturar com aquelas pessoas. Além disso, vamos deixar nossas próprias
roupas para trás, e eu tenho certeza de que esta família não vai reclamar por
essa troca.
Jamie troca o peso de uma perna para outra e dá um olhar incerto para
as roupas em suas mãos.
— Essa camiseta deve ser três números menores do que eu visto —
ela aponta. — Vou ficar esmagada vestindo isso.
— Quer desistir, então?
— Não!
— Então veste logo.
— Onde? — Jamie pergunta olhando ao redor. Estamos a três casas
de onde está acontecendo a festa, e aqui o barulho da música é muito mais
alto.
— Aqui mesmo.
— Não vou me trocar na sua frente! — ela resmunga. — Além disso,
alguém pode me ver.
— Querida, eu sinto informar que eu já vi tudo o que você tem aí
embaixo — prossigo. — E eu aposto que ninguém vai ver você, está escuro.
Agora veste logo essas roupas.
— Não olhe! — ela rosna. — Estou começando a me arrepender
dessa ideia.
Viro de costas e começo a retirar minha camisa.
— Você pode desistir a qualquer momento.
— Não vou desistir.
Visto a camiseta que catei do varal e me viro. Jamie está usando os
shorts curtos que eu peguei, e a saia que ela estava vestindo está no chão com
a blusa rosa. Agora ela está meio presa na camiseta baby look preta. Os
braços para cima e o tecido trancado pouco acima dos seios. Ela solta um
resmungo baixo, um gemido, e em seguida rosna tentando abaixar a camiseta
sem sucesso.
— Quer uma ajudinha, amor? — pergunto rindo das tentativas dela de
se vestir.
— Argh! — Jamie rosna. — Eu sabia que não ia entrar!
— Fique quieta, eu te ajudo.
Caminho até ela e puxo a blusa para baixo. É realmente bem apertada,
e com algum esforço consigo vesti-la. Arranco a presilha prendendo os
cabelos dela e dou uma revirada neles. Ela dá um tapa na minha mão e se
afasta. Puta merda, ela está incrível! Tão gostosa quanto naquele dia no
Tucker’s. Só de pensar que eu poderia alcançá-la e beijar aquela boca
deliciosa fico doido. Infelizmente, eu tenho que me segurar, não posso agir
como um desesperado. Ela tem que confiar em mim e, além disso, ela disse
que vai pensar. Então eu não estou pronto para desistir ainda, sei que uma
hora não só aquela boca, como ela toda, vai ser minha.
— Andrew? — Jamie chama. — Andrew, vamos!
— Vamos.
Jamie segura a minha mão, e a gente vai caminhando até o local da
festa. Quanto mais nos aproximamos mais alta a música fica e podemos ver
melhor as pessoas aglomeradas. A casa é de dois pisos e antiga, assim como
todas as outras da vizinhança. Chegamos ao pequeno portão de madeira que
dá acesso ao lugar, e eu olho para Jamie antes de abri-lo. Ela olha de volta
para mim e sorri trêmula. As mãos dela estão suando, eu aposto que ela está
nervosa e com um pouco de medo também. É engraçado vê-la reagir desse
jeito só porque vai entrar em uma festinha para a qual não foi convidada. Eu
já fiz isso muitas vezes, embora nenhuma delas tenha sido no Bronx.
Abro o portãozinho, e ela entra. Sigo logo atrás, mas ela me espera e
segura a minha mão para entrarmos juntos. Tem algumas pessoas bebendo e
rindo no jardim, mas eles não dão importância para nós. Sigo pela lateral da
casa e tenho uma visão da parte de trás. Tem uma galera reunida aqui. Não
parecia ter tantas pessoas, mas agora que posso vê-los sei que há bastante
gente. Passamos outro portão e entramos no quintal.
Todo mundo está bebendo, rindo, dançando, tem gente gritando. Tem
uma piscina de plástico encostada perto da cerca, e eu vejo duas mulheres
obviamente muito bêbadas lá dentro. Um cara está distribuindo cachorro-
quente enquanto prepara hambúrgueres na churrasqueira. Vários casais estão
se pegando nos lugares mais escuros e estratégicos. De repente, um garoto
vem correndo de dentro da casa com um champanhe barato na mão, que ele
estoura e acaba molhando um monte de gente, que ri e sai correndo atrás do
moleque. Com certeza esse não é o tipo de festa ao qual eu estou acostumado
a ir.
— Caramba — Jamie murmura ao meu lado.
— Quer ir embora? — pergunto.
— Tá brincando? — Ela sorri. — Eu nunca fiz isso na vida!
— Tudo bem, vamos ficar só um pouco.
— Pega uma bebida pra mim?
— Pego — digo. — Mas fica perto de mim, me segue, tá legal?
Eu me viro e ela acena com a cabeça, confirmando. Começo a abrir
caminho no meio daquelas pessoas, à procura da bebida. Vejo que o pessoal
sai da casa com as garrafas na mão casa e sigo para lá. Se lá fora está uma
loucura, aqui está muito pior. Tem muita bebida aqui dentro, e muita gente. É
absurdo como cabem tantas pessoas neste lugar. Uma pequena sala de estar
virou pista de balada e as mulheres estão dançando como loucas. Algumas
estão na escada, fazendo strip-tease. Na cozinha tem um maluco segurando
facas na mão e lançando em um quadro com desenho de uma raposa, os
outros caras comemoram quando ele acerta o olho do animal. É doentio.
Encontro as bebidas dentro da geladeira e sobre uma mesa. Pego duas
cervejas e me viro para entregar uma a Jamie. E ela simplesmente não está
ali, ela não me seguiu.
Droga!
Cadê ela? Mulherzinha teimosa!
Largo as cervejas e começo a procurá-la. Ela não está na cozinha e
também não está na sala. Volto para o quintal pensando que talvez ela tenha
ficado lá para me esperar, mas eu também não a vejo. Começo a circular
dentro da casa, verifico os banheiros e depois subo as escadas para olhar cada
um dos quartos. A maioria está ocupada com casais e eu nem me atrevo a
abrir. Sinto vontade de matá-la! Não consigo achá-la e fui perdê-la
justamente neste lugar. Começo a perguntar sobre ela para as pessoas, mas
todo mundo está tão bêbado que não consegue me informar porcaria
nenhuma.
Meia hora mais tarde eu estou suando e desesperado, porque eu não
voltei a vê-la ainda e estou cogitando a ideia de chamar a polícia. Volto para
o lado de fora da casa e fico olhando ao redor. Tem tanta gente nesse caralho
de lugar que ela poderia estar muito bem escondida. Onde diabos Jamie se
meteu?
Sinto uma mão tocar o meu ombro e eu me viro para ver um homem
grandão, forte e com uma cara muito feia me encarando.
— Algum problema, amigo? — ele me pergunta.
— Hãã… Tô procurando a minha garota.
— Ah, sim. — Ele sorri mostrando dentes amarelados. — Uma
baixinha, morena, cabelos lisos?
— Isso mesmo — concordo. — Você sabe onde ela está?
— No porão.
Porão? Mas que porra!
— No porão? A Jamie tá no porão?
— Se for essa garota, tá sim. Fica tranquilo, cara, ela só tá
experimentando um, você sabe. Ela é doidinha, sabia?
— Onde fica o porão? — pergunto.
— Ah… Eu te levo lá.
Sigo o cara de volta para a casa, e ele me leva em direção a uma porta
na cozinha que eu não tinha reparado. Há uma abertura no chão e uma escada
que leva para baixo. A escada é estreita e apenas uma pessoa pode descer de
cada vez. Lá embaixo o espaço é pequeno e apertado, mas também há muita
gente dançando e música alta. Localizo a Jamie quase que imediatamente. Ela
está em pé dançando sobre um sofá velho, mas o que me chama atenção é o
cigarro que ela tem na boca. É maconha.
— Andrew! — Jamie grita quando me vê e acena com a mão na
minha direção. — Andrew, achei você!
— Eu acho que fui eu que achei você — digo, quando paro em frente
ao sofá. Ela está mais alta do que eu ali em cima. Ela inclina a cabeça para o
lado e sorri para mim.
— Andrew, eu estou me divertindo muito! — Ela começa a rir e
coloca o cigarro na boca outra vez.
— Jamie, vamos embora — digo e arranco o cigarro de sua boca, para
jogá-lo no chão. — Desce daí.
— Nãoooo! — ela protesta com a voz arrastada. — Não quero ir
embora, meus amigos são tão legais!
— A gente vem outro dia — minto. — Agora precisamos ir.
Ela me ignora e continua dançando. Seus pés estão descalços e eu não
faço ideia de aonde foram parar seus saltos. As pupilas dela estão dilatadas e
eu sei que ela ficou chapada enquanto eu a estava procurando. Sei que era um
desejo dela experimentar isso, mas eu ainda estou com raiva de que ela tenha
feito sozinha enquanto eu andava de um lado para o outro preocupado com
ela.
Jamie coloca as mãos em volta do meu pescoço e joga a cabeça para
trás enquanto continua dançando fora do ritmo da música. Se ela não
estivesse tão maluca, e se essa não fosse uma festa onde estamos de penetra,
eu com certeza pararia para apreciar a visão que ela está me dando. Porque
mesmo que essa garota esteja completamente sem noção, ela está sexy pra
caralho. E, infernos, Drew Junior está ganhando vida nas minhas calças
enquanto eu tento lutar para mantê-lo dormindo quando estou perto dela.
— Dança comigo, Andrew! — ela pede.
— Não, a gente vai embora. Desce daí ou eu vou carregar você.
— Ei, amigo. — O cara que me trouxe até aqui chama. — Deixe ela
curtir um pouco, afinal, vocês invadiram a minha festa para curtir, não é?
Merda!
— Sua festa?
— É, cara, essa é a minha casa, e a minha festa. — Ele pisca para
mim. — E agora que você está aqui, é melhor relaxar e curtir.
— Jamie, chega — digo e a pego pela cintura, descendo-a do sofá.
Ela protesta e tenta se afastar, mas eu agarro o braço dela. — Você já teve sua
diversão, estamos indo embora agora.
Abro caminho no meio das pessoas e arrasto uma Jamie muito
emburrada atrás de mim. Encontro as escadas e coloco-a para subir na minha
frente. Ela está muito mais lenta do que o normal e tropeça nos próprios pés.
Felizmente ela consegue chegar ao topo, e eu também. Deixamos o porão
para trás e vamos para a cozinha, onde uma faca voa perigosamente perto do
meu rosto. Localizo a saída da casa e puxo Jamie logo atrás de mim.
— Ei! — alguém grita atrás de nós, e eu vejo o dono da residência
nos seguindo. — Segurem essa mina, ela roubou minha maconha!
Jamie levanta a mão neste momento, e eu vejo um pequeno saquinho
na sua mão… com maconha dentro.
— Solta isso, Jamie! — ordeno.
— Não! — Ela solta uma gargalhada e corre na minha frente.
Puta merda!
Corro para fora da casa sem perder a Jamie de vista. Ela sai para o
quintal e corre em direção ao portão. Quando eu olho para trás vejo uns três
caras correndo na nossa direção, um deles está segurando a porra de uma
faca. Alcanço a Jamie e arranco o saquinho da mão dela para depois jogá-lo
ali mesmo no gramado. Ela solta uma gargalhada, apontando para o chão. Eu
sei que as crises de riso são apenas um dos efeitos da droga e por isso não
dou importância neste momento. Tudo o que eu faço é pegá-la no colo e levá-
la para longe dali o mais rápido que eu consigo.
Quando chegamos ao meu carro, apenas abro a porta e a enfio lá. Dou
a volta e assumo o meu lugar no banco do motorista, ligo o carro e parto para
longe. Jamie está assoprando no vidro e desenhando formas irregulares com o
dedo. Ela balança a cabeça completamente tonta, mas muito mais calma do
que antes. Respiro fundo e finalmente relaxo contra o assento. Nunca mais, e
eu digo nunca mais mesmo, vou permitir que Jamie Collins beba ou se
drogue novamente. Ela já teve seus desejos realizados e não precisa fazer isso
nunca mais. E não vai, se depender de mim. Agora percebo o quão idiota eu
fui quando a deixei sozinha naquele bar em Nashville. Sabe-se lá que diabos
podia ter acontecido naquela noite.
Dirijo até estar longe o bastante do Bronx. Paro o carro em frente a
uma Starbucks e o tranco com a Jamie ainda lá dentro. Ela está acordada e
consciente, mas eu sei que ainda vai levar alguns minutos para o efeito da
droga passar totalmente. Pego dois cafés e volto para o carro.
— Andrew, você está bravo comigo? — Jamie pergunta-me quando
eu me sento no meu lugar e passo um copo de café para ela.
— Não.
— Desculpe-me — ela murmura. — Não sei o que me deu para ir até
lá, eu realmente pensei que seria divertido.
— Eu fiquei irritado, não, na verdade eu fiquei muito furioso porque
você não ficou perto de mim e eu não conseguia te achar — digo. — E agora
você realizou dois desejos da sua lista, então você não precisa fazer isso
nunca mais. Eu não quero que você faça isso de novo.
— Realizei três, na verdade. — Ele dá um sorrisinho. — Entrei em
uma festa sem ser convidada, fumei maconha e roubei as roupas de alguém.
— É, você já é uma criminosa perigosíssima, Jamie Collins. —
Sorrio.
— Andrew, eu estou me sentindo tão cheia de coragem, e por isso eu
queria fazer algo. — Ela morde o lábio inferior e olha para mim. — Queria
que você estivesse comigo quando eu fizesse isso.
— É um boquete?
Ela me dá um tapa no braço e ri.
— Não, não é um boquete. Queria fazer uma tatuagem.
— Uma tatuagem? Você quer fazer uma tatuagem? Tipo, agora?
— É.
— Jamie, deve ser umas duas ou três da manhã.
— Mas eu estou tão corajosa, quero muito fazer uma tatuagem agora.
Eu sei que você pode conseguir um tatuador agora, você é rico, você pode
conseguir tudo.
— Eu conheço alguém, e ele é muito bom — digo. — Mas eu não sei
se é uma boa ideia você fazer uma tatuagem agora. E se você se arrepender?
— Eu não vou, prometo.
— Deixa eu ver se você ainda está chapada.
— Não estou — ela resmunga, mesmo assim eu me inclino em
direção a ela para ver suas pupilas.
— Hummm.
— Você vai me levar para fazer uma tatuagem?
Solto um suspiro.
— Eu vou ligar para o cara, tá?
— Tá! Obrigada, Andrew! Obrigada! — Ela pula animada ao meu
lado.
Eu ainda não sei por que estou fazendo todas as vontades da Jamie.
Nunca fiz nada para nenhuma mulher, e quando eu digo nada, é exatamente
isso. Nunca nem ao menos considerei pegar um café para uma garota como
eu fiz por ela. Mas é que eu tenho essa necessidade de deixá-la feliz. E Jamie
parece ficar extremamente alegre sempre que eu realizo um dos seus desejos.
É como se eu estivesse dando um mundo a ela, e eu gosto disso. Gosto de
como eu me sinto quando eu faço essas coisas para ela. E é por isso que neste
momento eu estou ligando para um amigo do Jackson, que é um ótimo
tatuador e que eu tenho certeza de que, por alguns dólares a mais, fará o
trabalho neste horário.
Quando eu ligo para Hassan, ele me atende no segundo toque.
Pergunto a ele se pode atender a mim e a Jamie neste horário, e ele concorda
imediatamente. O cara vive para o trabalho, e eu sabia que ele ia topar. Conto
para Jamie que eu consegui, e ela comemora ao meu lado. Dirijo em direção
ao Brooklyn, onde fica o estúdio de tatuagem do Hassan. Quando eu
estaciono o meu carro em frente ao estúdio, ele já está nos esperando do lado
de fora. Hassan é um cara grande, fortão, que Jackson e eu conhecemos em
uma casa noturna onde ele fazia a segurança. Ele juntou uma grana e
começou a fazer o que mais gosta: Desenhar nas pessoas.
— E aí, Drew?
— Valeu por atender a gente, cara.
— O que vocês precisam tão rápido assim?
— Essa é a minha noiva. — Aponto a Jamie. — E ela quer fazer uma
tatuagem.
Hassan ri.
— Tudo bem — ele concorda. — Vamos entrar.
— Andrew, esse cara é bom mesmo? — Jamie pergunta ao meu lado
enquanto seguimos Hassan.
— Sim, muito bom. Confie em mim, abelhinha, eu não deixaria ele
tocar na sua pele se não soubesse que ele é capaz.
— Ok.
— Você já sabe o que vai fazer? — pergunto.
— Tenho uma ideia — ela diz com um sorrisinho esquisito nos lábios.
— Pode entrar aqui, vou pegar umas coisas e volto para fazer sua
tatuagem — Hassan diz, apontando para uma sala, e em seguida sai.
— Andrew, quero entrar sozinha.
— Por quê? Você disse que me queria junto.
— Mudei de ideia. Fique aqui, por favor. Acho que estou perdendo a
coragem.
— Tá, tudo bem. Eu espero aqui fora.
— Pronta? — Hassan reaparece.
— Estou. — Jamie respira fundo, solta o ar e segue Hassan para
dentro da sala.
Eu fico vinte minutos deitado em um sofá da sala de espera do estúdio
de tatuagem do Hassan. Quando a porta da sala finalmente se abre, fico até
surpreso que tenha sido tão rápido. Jamie sai de lá sorrindo abertamente e
provavelmente está contente com o resultado de sua tatuagem. Eu não
consigo impedir os meus olhos de verificar cada lugar descoberto em seu
corpo, à procura de algum desenho ou frase. No entanto, não encontro nada.
Levanto-me e acerto o valor da tatuagem com Hassan. Espero até que
Jamie resolva me mostrar o desenho, mas ela não mostra ou diz nada. Apenas
continua sorrindo daquele jeito esquisito de sempre. Espero que ela não tenha
desenhado o Kitty Galore, porque se esse for o caso eu vou tratar de arrancar
essa tatuagem imediatamente.
— Gostou do resultado, Jamie? — Hassan pergunta.
— Adorei.
— Que bom — Hassan diz. — Quando quiser fazer outra, pode
voltar.
— Obrigada, Hassan — Jamie agradece.
— Obrigado, cara, espero que você não tenha estragado a pele da
minha noiva — digo.
— Fique tranquilo, Drew, tá tudo certo.
— Vamos, Andrew, estou cansada.
Voltamos para o carro e Jamie me pede para levá-la para casa. Como
sempre eu faço exatamente o que ela me pede, mas enquanto dirijo pergunto
a ela sobre a tatuagem.
— Você não vai me mostrar?
— E se eu disser que não?
— Acho que eu tenho o direito de ver. Você é minha noiva, é óbvio
que eu tenho que ver.
— Não sei, não — ela provoca.
— Jamie Collins, onde foi que você colocou essa tatuagem que eu não
consigo vê-la?
— Talvez a intenção tenha sido justamente essa. Ninguém pode ver, a
não ser que eu mostre.
Minha mente voa longe com as possibilidades de onde essa tatuagem
está escondida, e os pensamentos fazem com que eu me contorça no banco e
ajeite a frente das minhas calças.
— O que é? — pergunto.
— Você é muito curioso, Sr. Simons.
— Não vai dizer? — insisto.
Ela balança a cabeça negando e não diz mais nada até eu estacionar o
carro em frente ao seu prédio. Faço menção de sair do carro para acompanhá-
la, mas ela me impede. Ela abre a porta, desce e dá a volta no carro. Para em
frente à minha janela e se curva para ficar olho no olho comigo.
— Obrigada por esta noite, Andrew — agradece-me.
— Não vai me mostrar a tatuagem? — insisto novamente.
— Talvez. — Ela dá de ombros.
— O que significa talvez?
— Você vai descobrir em breve.
Ela se inclina para frente e beija minha boca rapidamente.
— O que foi isso? — pergunto.
— Um agradecimento — ela diz afastando-se do carro e seguindo
para o portãozinho.
— Fiz muitas coisas hoje, mereço um agradecimento muito maior.
— Você quer ver a tatuagem, é isso?
— Sim — concordo.
Ela leva a mão até os shorts, e os meus olhos seguem o trajeto dos
seus dedos ágeis trabalhando para desfazer os botões e descer o zíper. Eu
acho que os meus olhos estão saltando para fora do meu rosto no momento
em que ela abaixa o tecido apenas um pouco. Eu tenho um vislumbre muito
rápido da sombra de uma pequena abelhinha desenhada no osso do seu
quadril em direção à pélvis. É a porra da abelhinha mais linda que eu já vi, e
eu quero as minhas mãos e a minha boca nela. Mas Jamie puxa o tecido
rápido demais e segue em direção à entrada do prédio, rebolando aquela
bunda redonda provocativa e sorrindo perversamente, sabendo muito bem o
que ela fez comigo.
Puta que pariu! Essa mulher um dia me mata!
CAPÍTULO DEZENOVE
--—————————————————————————————

Jamie

Hoje é o grande dia.


Estou parada aqui comtemplando meu reflexo no espelho. Pareço uma
noiva de verdade com este vestido branco curto, o penteado bem elaborado e
o buquê de flores na mão. Exceto que não estou feliz como uma verdadeira
noiva deveria estar. Gosto do Andrew e gosto de como ele me faz sentir,
gosto do jeito como ele vive sua vida, apesar de ter algumas coisinhas onde
ele precisa melhorar. Mas não é nenhum sacrifício me casar com ele, e sei
que nos próximos meses que vamos passar juntos eu darei boas risadas ao seu
lado. Algumas delas serão apenas para a nossa farsa, outras serão reais como
as que ele já me proporcionou nestas últimas semanas. Mas nada disso muda
o fato de que estou me casando por interesse. E que não o amo. Meus pais
ficariam decepcionados se soubessem o que estou fazendo. Eles sempre
levaram o casamento e a união a sério.
Só que estou fazendo isso por todos, não apenas por mim. Foi este
noivado falso que me proporcionou a chance de comprar a casa de tijolos
vermelhos. E agora minha irmã, meu cunhado e meu sobrinho têm um lar
seguro para viver. O papai recusou-se a se mudar para Nova Iorque porque
não quer deixar a tia Annete sozinha, mas ele ficou emocionado e
imensamente feliz quando soube que o imóvel estava de volta nas mãos da
nossa família. Proporcionar essa felicidade a ele foi incrível, assim como ter
dinheiro para pagar por seus remédios sem que Jane precise abdicar de suas
próprias coisas. Agora não precisamos nos preocupar com contas atrasadas,
ou com a possibilidade de sermos despejados. Minha família ficará bem, eu
posso cuidar deles. Por isso que apesar deste falso noivado não ser algo muito
correto, algo de que eu me orgulhe de ter aceitado, ele ainda me fez conhecer
meu chefe mais profundamente. Justo o cara que eu achava um cretino. Bom,
eu ainda acho… Mas ele também é o cara que está tornando os desejos da
minha lista reais, e ele está fazendo isso porque quer fazer. Então eu acredito
que algumas coisas boas também vieram com esta farsa. E, no fim, não me
arrependo de estar aqui hoje. Se eu pudesse escolher, faria tudo outra vez.
— Jamie? Ei, volte para a Terra. — Jane estala os dedos na minha
frente e me tira dos meus devaneios. — Você está pronta?
— Estou — minto. Não, não estou!
Caramba, quem diria que casar de mentirinha também dá frio na
barriga?
— Você está linda — ela elogia. — Vai dar tudo certo. Eu já vou indo
porque os outros estão me esperando, vou mandar o papai entrar. Tudo bem?
— Tudo. — Respiro fundo. — Está tudo bem, tudo muito bem.
Jane me abraça, me beija e sai. Fico sozinha olhando para o espelho,
pensando em tudo o que tem acontecido comigo. Essa última semana foi de
descobertas, de experiências novas. Trabalhei todos os dias no escritório de
Benjamin, e ele continua agindo de forma estranha perto de mim. Eu acho
que ele está dando em cima de mim, mas como isso nunca aconteceu antes,
eu escolhi não mencionar nada a ninguém. Olivia apareceu todos os dias lá
para me infernizar, mas graças a Deus não causou mais nenhum acidente. Seu
ódio por mim parece crescer cada dia mais e, apesar de eu não ter nem um
pingo de medo dela, sei que estar em seu caminho é realmente perigoso.
Essa semana eu também fiz a loucura de invadir uma festa de outra
pessoa lá no Bronx e fumei maconha. Devo dizer que é algo com um cheiro
horrível e que não quero voltar a repetir a experiência. Não sei como as
pessoas conseguem se viciar nisso quando existe o chocolate, que é muito
mais delicioso e prazeroso. Ah, e eu também fiz uma tatuagem! Agi por
impulso, totalmente sem pensar. Uma onda de coragem correu pelo meu
sangue e decidi na hora que havia chegado o momento de marcar minha pele
para sempre. Contudo, quando estava na sala do tatuador, minha coragem foi
indo por água abaixo e quase cheguei a desistir. No último momento segui
em frente e fiz algo pequeno e delicado. Mas absurdamente tudo a ver
comigo!
Fiquei provocando Andrew a semana toda com a minha abelhinha
amarelinha desenhada no osso do quadril do lado direito. Ele queria olhar
mais de perto, e eu não permiti. Ele tentou subir minha saia para tocá-la, mas
eu não permiti. Ele até tentou colocar a boca sobre ela, mas eu também não
permiti. Em vez disso, fiquei mencionando a abelhinha vez ou outra apenas
para atiçá-lo. Andrew quase me trancafiou dentro do escritório na quinta-
feira. Disse que eu tinha que parar com os joguinhos e dar logo uma resposta
para ele. Depois disso parei de brincar sobre o assunto e não voltei a falar da
tatuagem. Porque, por mais que eu gostasse de provocá-lo, sabia que existia
um limite. E eu ainda não tinha decidido se eu ia deixar Andrew ultrapassar
essa linha tênue ou não.
O problema era que eu queria. Desde que Andrew me beijou a
primeira vez eu já me senti diferente, mas o que ele me proporcionou dentro
do carro dele com certeza deixou tudo pior. Ele é lindo, divertido e, caramba!
ele sabe usar aquela língua. Eu já tinha uma quedinha pequena por ele
quando servia seus cafés e agora que passo boa parte do tempo ao seu lado
essa atração parece ter crescido ainda mais. Nunca pensei que um cara como
o Andrew poderia querer algo com alguém como eu. Isso me faz pensar que
de alguma forma eu sou especial e que também mereço ter um pouco de
diversão com um homem como ele. E Deus é testemunha de que já faz um
longo tempo desde que eu fui tocada. E olhe que nem foi tão bom quanto foi
com Andrew, e por isso eu fico imaginando como seria deixá-lo ultrapassar
os limites e fazer tudo aquilo que ele vive me prometendo.
Parece tão fácil pensar que eu poderia deixá-lo entrar, tomar o que ele
quer e, no fim, a gente se afastar numa boa. Mas não é tão fácil assim. Nós
temos um contrato de um ano e não sabemos se vai realmente durar. Andrew
não é o tipo de cara fiel e também não se mostra capaz de ficar com uma
única mulher. Eu não quero me decepcionar com ele, porque no fundo gosto
de Andrew. Mas também sei que essa relação de amigos não vai dar certo
para a gente, não por muito tempo. Fico tão confusa quando penso nesse
assunto. Porque quero, e sei que não posso. Porque acho errado, mas ainda
assim desejo. Acho que a resposta final para essa situação é que tenho medo.
Tenho medo de que eu me envolva demais, tenho medo de que os
sentimentos se tornem maiores. Não posso me apaixonar pelo Andrew. Eu
melhor do que ninguém sei o quanto amar uma pessoa pode ser perigoso.
Não quero machucar o Andrew nem a mim mesma.
Ouço uma batida na porta e um segundo depois papai entra. Viro-me
enquanto ele me olha de cima a baixo, sorrindo emocionado. Eu tenho
certeza de que ele está muito alegre em saber que vai casar sua filha mais
nova. Ele sempre quis subir ao altar comigo e com a minha irmã. Conseguiu
isso com Jane e agora comigo. Também estou contente por estar
proporcionando a ele esse sonho. Não importa que seja de mentirinha, para o
meu pai é real. Talvez essa seja a única vez que ele vai me ver casando.
— Abelhinha, você está maravilhosa — papai elogia-me.
— Obrigada, papai, você também está muito elegante.
— Ah, querida, como eu queria que sua mãe estivesse aqui para ver
você assim. — Ele sorri. — Ela ficaria tão orgulhosa da moça bonita que
você se tornou.
— Eu tenho certeza de que ela pode me ver.
— Eu também. Ah, Jamie, eu estou feliz que você vai se casar e
formar sua família. Eu sempre pedi muito para que você e sua irmã fossem
felizes e encontrassem seus próprios caminhos. Eu queria ter sido um pai
melhor para você e sua irmã, eu queria ter podido estar ao lado de vocês o
tempo todo. Principalmente ao seu lado, você precisou de mim e eu fraquejei.
Eu me arrependo muito por isso.
— Papai, pare… — peço. — Por favor, não diga mais nada. Eu não
quero lembrar o passado, eu estou bem agora. Você é um pai incrível, não
importa o que aconteceu antes, nada vai mudar o meu pensamento sobre
você.
— Abelhinha, você está mesmo feliz em se casar com Andrew? Eu
não quero parecer chato, mas quero ter a certeza de que você está escolhendo
o certo. Eu te amo, Jamie, e eu acho que se você entrar em um casamento
deve ser com alguém que ame e te ame de volta. Não quero ver você
machucada no futuro.
— Papai, eu estou fazendo o que eu quero, eu prometo.
— Você sempre soube o que queria, sempre foi decidida. Não vamos
mais falar sobre isso, hoje é um dia de comemoração.
— Você ainda precisa me levar até o Andrew, papai, depois podemos
comemorar.
— Ah, claro. — Papai se aproxima e dobra o braço, fazendo um gesto
para mim. — Futura Sra. Simons, dê a honra ao seu pai de levá-la até o seu
noivo?
— Com muito prazer.
Papai me leva para fora da pequena sala que foi reservada para que eu
pudesse me arrumar e esperar até que Andrew estivesse me aguardando. Nós
estamos fazendo uma cerimônia pequena no cartório a meu pedido. Mesmo
assim, Elizabeth insistiu que Andrew não poderia me ver vestida de noiva
para não dar azar. Também mandou decorarem toda a sala do cartório com
muitas flores e velas. É claro que eu não via necessidade de fazer isso, sendo
que depois de assinar os papéis do casamento nós teríamos um jantar na
residência de Andrew para comemorar junto dos nossos parentes e amigos
mais próximos. Mas ninguém quis ir contra a vontade de Elizabeth, e por isso
aqui estou eu, sendo levada pelo meu pai até o meu falso noivo.
Vejo todas as pessoas que convidamos reunidas dentro do cartório
assim que eu chego ao limiar da porta com o meu pai. Elizabeth, Lorenna,
Abigail, Addison, Olivia, Benjamin, Eleanor e Saul estão todos reunidos.
Assim como minha tia Annete, meus primos, minha irmã, meu cunhado e
meu sobrinho. Também estão aqui algumas pessoas a quem eu ainda não fui
apresentada, mas serei em breve. Um casal e uma mulher que estão ao lado
de Jackson e que, segundo Andrew, são os pais e a irmã dele. Eu não quero
julgá-los pela capa, mas eu não vou muito com a cara deles olhando-os de
longe. Jackson parece o único que não ingeriu limão azedo.
Meu olhar segue sobre cada um deles, até Andrew. Ele está parado,
me aguardando perto do juiz de paz. Está vestindo um terno azul-escuro, com
camisa branca e gravata preta. Percebo na hora o quanto ele está nervoso,
suas mãos estão em punho ao lado de seu corpo e pequenas gotículas de suor
se formam em sua testa. Apesar de estar com uma expressão bem séria, ele
está lindo como sempre. Conforme eu me aproximo, sorrio para ele. Quero
encorajá-lo de alguma forma, quero que ele perceba que nada disso é sério e
que ele não precisa se preocupar. Ele sorri trêmulo, dá um passo à frente para
cumprimentar o meu pai e me conduzir até o seu lado.
— Você está bem? — pergunto a ele.
— Eu nunca fiquei tão nervoso na minha vida, nem no dia em que eu
perdi a virgindade com uma garota gostosa do colégio.
— Andrew! — repreendo baixinho. — Não quero saber de nada
disso!
— Você perguntou se eu estava bem, só estou respondendo — ele
cochicha.
— Você tinha que mencionar uma mulher? Por que você sempre tem
que mencionar uma mulher? É o nosso casamento!
— Foi você quem perguntou…
— Ah, Andrew, fica quieto!
— Com licença! — O juiz limpa a garganta e nos fuzila com os olhos.
— Será que vocês querem se casar agora?
— Desculpe-me — murmuro.
— Pode prosseguir, senhor Juiz — Andrew responde.
Na próxima hora o casamento se realiza sem quaisquer problemas.
Assinamos todos os papéis, assim como nossas testemunhas, que,
obviamente, são Jackson e Abigail. E por fim nos beijamos na frente dos
nossos convidados para selar nosso acordo matrimonial. Andrew e eu
estamos ambos suando e tremendo quando deixamos o cartório e seguimos
juntos no carro dele até a sua residência. Ou melhor, nossa residência, pois a
partir de agora minhas coisas também estão lá. E é onde eu vou viver pelos
próximos meses. É tão absurdo. Eu, na casa de Andrew? Eu casada com ele?
Eu sendo a nova senhora Simons? Talvez eu tenha um pouquinho de sorte
guardada em algum lugar e nem sabia.
— Até que fim acabou! — Andrew suspira ao meu lado.
— Não foi tão ruim, foi?
— Tirando a parte que eu quase mijei nas calças, foi fácil.
— Andrew! — repreendo rindo.
— Se acostume com isso, querida.
— Então estamos casados. É tão estranho, eu não sei se eu vou me
acostumar a isso.
— Você acha estranho? E eu? Cara, eu nem queria casar…
— E olhe aonde a vida te levou, Andrew Simons.
— Olhe você, casada com o chefe que você achava um cretino — ele
diz. — Ah, e eu não esqueci a parada do café não. Ainda vai ter volta.
— Só pra você não esquecer, eu ainda te acho um cretino.
— Você vai mudar de ideia muito em breve.
— Duvido!
— Vamos ver, Sra. Simons, vamos ver.
***
Andrew e eu recepcionamos nossos convidados e cumprimentamos
cada um deles separadamente. Conheci o pai de Jackson. O nome dele é
Harry, é um senhor muito elegante e podre de rico. Fiquei sabendo que ele é
dono de uma rede de hotéis e que gostaria de ter Jackson trabalhando com
ele, embora Jack não esteja nem um pouco interessado nos negócios do pai,
mesmo que seja uma fortuna. Ele é um homem muito reservado e calado, e
por isso não fiquei sabendo de muito mais. Entretanto, tive a impressão de
que ele não é muito afetuoso aos filhos. A mulher dele é a Henrietta, que,
para minha infelicidade, é muito amiga de Eleonor. Ele é chiquérrima e
esbanja fortuna em suas roupas e joias. Infelizmente não tem um pingo de
simpatia, assim como eu pensei, não fui muito com a cara dela. Por fim,
conheci a irmã mais jovem de Jack. O nome dela é Julianne, e ela até que foi
amigável, mas um pouco arrogante. Depois da passagem desses três por nós,
fiquei pensando como Jackson tinha saído tão diferente de toda a sua família.
Ele sim é pura simpatia e muito agradável. Mesmo sabendo que nosso
casamento não valia, ele fez seu papel de amigo e nos desejou felicidades.
Elizabeth chorou, nos abraçou, nos beijou. Fez questão de mostrar que
estava muito feliz por ter visto seu neto se casando comigo. Lorenna também
me desejou as boas-vindas oficiais à família e disse que estava muito
contente com o nosso casamento, que tudo tinha sido muito lindo. Abigail
também nos cumprimentou da maneira dela, dizendo que estávamos
arrasando nos nossos papéis e que todos estavam convencidos de que
estávamos apaixonados. Minha irmã também nos desejou felicidades e disse
que formávamos um lindo casal. Tyler só queria saber do dia em que eu ia
convidá-lo para tomar banho de piscina.
Por fim, Olivia e Benjamin apareceram na nossa frente. Benjamin nos
cumprimentou de maneira educada, embora Andrew tenha sido um pouco
grosso com ele. Eu não sei o que aconteceu, mas eles deviam ter tido alguma
desavença no passado. Olivia sorriu cínica e fez questão de dizer que não
acreditava no nosso casamento. E que ela continuaria à procura de uma falha
para nos desmascarar. É claro que Andrew e eu não demos importância a
suas palavras e nos fingimos de desentendidos. O que só serviu para deixar
Olivia mais furiosa. No fim, Benjamin acabou tendo que arrastá-la para longe
antes que ela fizesse um escândalo.
No final da noite estávamos todos tendo um jantar um pouco
esquisito. Minha família era mais animada, e a ideia deles de comemoração
era diferente da que a família de Andrew tinha. Foi difícil juntar todo mundo,
mas Elizabeth, Lorenna e as filhas, apesar de muito ricas, eram bastante
simpáticas e se enturmaram com os meus familiares bem mais pobres e
simplórios. Os outros permaneceram mais afastados, evitando se misturar.
Tentei não dar bola para isso e curti o máximo a noite, pois mesmo sendo
tudo de mentira, ainda era um casamento. Nós festejamos com tudo o que
tínhamos direito: comida, bebida, dança e risadas inesgotáveis. No final da
noite, tornou-se tão real que eu já estava me sentindo como uma verdadeira
noiva em sua própria festa. Quando acabou, já estava com saudades.
Despedi-me de cada convidado e, quando todos se foram, eu ainda
permaneci em pé, parada naquele hall imenso. Uma onda de satisfação
passou por mim quando decidi que uma nova vida se iniciava e estava na
hora de viver tudo aquilo que eu sempre quis, mas não tinha como realizar.
Eu não podia ter medo, pois o medo só atrasaria minha felicidade. Foi só
quando perdi o medo que consegui fazer todas as coisas que me trouxeram
até aqui. Como: assinar o acordo, casar com Andrew, fazer uma tatuagem,
roubar as roupas de alguém, etc. Gostei de tudo o que eu fiz e desejava mais.
Queria trazer essa Jamie mais vezes para o mundo real. Queria me tornar essa
mulher de uma vez por todas. E eu queria ser forte o bastante para embarcar
nesta loucura de viver um caso com o meu falso noivo. A cada momento
dessa noite quando nossos olhos se encontravam eu fiquei pensando no
quanto ele ainda podia me proporcionar de felicidade se eu permitisse. Eu só
tinha que manter o cuidado e não me apaixonar por ele.
Andrew e Jackson estão conversando na piscina, e eu aproveito que
Elizabeth e Lorenna já foram para os seus quartos e vou até a cozinha, onde
encontro Abigail e Addison comendo os restos do nosso bolo.
— Oi. — Abby sorri para mim. — Sua família já foi?
— Sim, acabaram de sair.
— Quer bolo? — Addison pergunta-me, dando outra garfada no
pedaço em seu prato.
— Não, obrigada. — Balanço a cabeça.
— O que foi? — Abby pergunta.
— Podemos conversar a sós?
— Ah, tá. — Abby enfia um pedaço de bolo na boca, acena para a
irmã e me puxa para fora da cozinha. — Tá… lengal unque tá aconteceno?
— Não está acontecendo nada… Eu só quero conversar com você
sobre uma coisa. — Troco o peso de uma perna para outra. — Abby, engole
esse bolo e vamos lá pra cima?
— U-Uhum. — Ela acena indicando as escadas e eu a sigo.
Abigail me leva até o seu quarto e fecha a porta quando entramos. Ela
usa a palma da mão para limpar as migalhas de bolo na boca e depois se joga
sobre sua imensa cama de dossel. Sento-me ao lado dela. Começo a sentir o
suor frio subindo pela minha nuca só de pensar no que eu vou falar.
— Então? — ela pergunta. — O que aconteceu? Você está tão branca,
tá passando mal?
— Não.
— Você está me deixando nervosa. Foi Olivia? Ela fez alguma coisa
com você? Se fez eu vou matá-la!
— Não é Olivia.
— Deu algo errado e eu não sei? Porque eu achei tudo muito
convincente.
— Nada deu nada errado.
— Ai, então fala logo, Jamie!
— Calma, Abby, não é algo muito fácil de dizer. Eu nem sei como
falar sobre isso, mas é que eu preciso de ajuda. E eu não tenho ninguém, você
é minha única amiga e você é tão experiente…
— Desembucha logo! — Abigail exclama.
— É sobre o Andrew — murmuro.
— Ai, merda — Abigail resmunga. — O que foi que ele fez agora?
— Ele não fez nada. Quer dizer, ele fez. Abigail, o Andrew propôs
uma mudança no nosso acordo.
— Mudança? Que mudança?
— Ele… Humm… Ele propôs que nós… Que a gente… Eu e ele…
Ah, você sabe.
Abigail deixa a cabeça pender para o lado e franze o cenho enquanto
pondera em silêncio.
— Você não está querendo dizer que o Andrew propôs sexo entre
vocês, né?
— É. Exatamente.
— Ai. Meu. Pai. Amado!
— Eu sei, eu sei. É difícil de acreditar, né?
— Que difícil o quê? Eu sabia! Eu sabia que mais cedo ou mais tarde
aquele idiota ia passar a enxergar você direito! Só não pensei que seria tão
rápido. Então quer dizer que vocês dois estão transando?
— N-Não! — gaguejo.
— Ué, por que não?
— Eu não aceitei ainda, Abby — explico. — Eu pedi um tempo ao
Andrew para que eu pudesse pensar melhor sobre isso. E agora não sei o que
fazer.
— Jamie. Ah, Jamie, querida. — Abby sorri perversamente. — É
muito simples, ou você quer dar para o Andrew ou você não quer dar para o
Andrew. O que você escolhe?
— Abigail eu tenho medo — confesso.
— Medo? Você me disse que não era virgem!
— Quê? N- Não… Não, Abby… Não é isso.
— Ufa! — Ela solta um suspiro ruidoso e agarra a minha mão. —
Então o que é? Do que você tem medo?
— Não quero me apaixonar pelo Andrew.
— Querida, só porque você faz sexo com alguém não significa que
você vá se apaixonar por essa pessoa. Eu, por exemplo, dou toda semana para
um cara diferente e eu não estou morrendo de amor por nenhum deles. Você
acha que eu também não tenho medo desse filho da puta do cupido?
Solto uma risada.
— Cupido não existe, Abby.
— Você entende o que eu quero dizer. Pense comigo, esse verme
vem, atira a flechinha e caímos de amores. Vamos lá, nos apaixonamos,
levamos pé na bunda, nos decepcionamos. A vida é assim, minha querida.
Cabe a você arrancar a bendita flecha da bunda e voltar ao mundo real.
— Certo, e o que exatamente isso significa?
— Significa que você não tem que ter medo de se apaixonar. E, se
isso acontecer, a vida te ensina a se desapaixonar. Olha, em minha opinião,
você está aqui apenas para que eu te diga vá em frente. No fundo você já
tomou a sua decisão, não é?
— Eu acho que sim — murmuro envergonhada.
— Jamie, com quantos caras você já se envolveu? Porque, sério, você
tá pior do que eu aos dezesseis anos.
— O que aconteceu com você aos dezesseis anos? — pergunto.
— Foi quando eu perdi minha virgindade, mas é uma história
horrorosa. Vamos focar em você, responde minha pergunta.
— Eu só namorei um cara, Abby. Ele foi meu primeiro namorado, o
conheci aos dezoito e ficamos apenas um ano juntos.
— Puta merda, você não dá há o quê? Dois anos?
— Érr… tipo isso.
— Jesus, deve ter paranhos na sua vagina!
— Abby, você não tá me ajudando!
— Desculpe, mas é que isso não é algo que a gente ouve todos os
dias. Agora entendo por que tanta insegurança.
— Abby, você acha que pode me ajudar? Eu não quero que o Andrew
me ache frígida. Quero saber como agir, o que fazer. Não quero cometer
erros.
— Querida, o primeiro passo é não pensar tanto. — Abigail se levanta
da cama e me dá um olhar de cima a baixo. — E o segundo passo eu vou te
ensinar agora mesmo, me espera aí.
Abigail deixa o quarto, enquanto eu permaneço sentada no meu lugar.
Nem acredito que eu consegui me abrir com ela e que vou conseguir a ajuda
que eu tanto preciso. Abigail certamente sabe o que está fazendo, e ela é a
pessoa ideal para me ajudar. Ela volta um minuto depois trazendo dois
pepinos verdes na mão.
— Pega. — Ela me estende um pepino e eu seguro na mão.
— O que é isso?
— O pau do Drew.
Jogo o pepino em cima da cama. Abigail ri.
— O que você está fazendo, Abby?
— Relaxa, vamos brincar. — Ela pega o pepino novamente e me
estende. Seguro outra vez. — Infelizmente meus vibradores são pessoais,
vamos utilizar os pepinos no lugar deles.
— O que exatamente você quer que eu faça com esse pepino? —
pergunto.
— Aí é que tá, Jamie. — Abigail segura o pepino na frente dos meus
olhos. — Use a imaginação. Você já pagou um boquete? Aposto que não! Por
que você não tenta? Você também pode encenar uma punheta. Olha, não tem
muito segredo, não. Cai de boca no pepino, querida!
Franzo o cenho enquanto observo o pepino.
— Mas é muito grosso! — protesto.
— Você já viu o pau do Drew? Não? Eu já. Confie em mim quando
eu digo que esse pepino é ideal.
— Não consigo fazer isso, Abby.
— Tudo bem. — Abigail suspira. — Vamos deixar o pepino para
depois, vou te emprestar umas lingeries minhas.
Abigail começa a ficar empolgada com a ideia de me dar algumas
dicas. Ela retira várias lingeries do seu closet que ela acha que vão servir em
mim. Cada uma é mais linda do que a outra, e juntas selecionamos algumas
para que eu leve na minha viagem de lua de mel. Ah, sim, vamos ter lua de
mel. Eu não sei exatamente para onde vamos, porque Andrew e Elizabeth
planejaram tudo juntos, mas eu estou ansiosa do mesmo jeito. Andrew e eu
estaremos sozinhos, e eu quero fazer isso dar certo.
Abigail começa a falar e não para mais. Ela diz que os homens são
muito visuais e que temos que agradar os olhos dele. Que todos os nossos
gestos, quando sensuais, chamam muita atenção, assim como nossas roupas.
Ela diz que na cama devemos nos abrir, deixar que o homem saiba o que nós
queremos. Temos que nos mostrar participativas e também podemos tomar
atitudes. Ela fala sobre a depilação e também sobre como devemos estar
sempre perfumadas. E que a arte de seduzir um homem não é difícil, pois
conseguimos isso com gestos bem simples.
Ela também me mostra uma coleção de brinquedinhos, mas eu
dispenso todos eles. Depois ela me dá uma pilha de camisinhas que ela diz
terem sabores diferentes. Ela também enfia um monte de cremes e gel na
bolsa que prepara para mim, e eu não sei para que metade de todas aquelas
coisas serve. Abigail diz que eu não tenho que ter medo de ser sensual. Que
quanto mais atitude eu tiver, melhor as coisas saem na cama. E que eu tenho
que ter confiança em Andrew para que a gente descubra junto o que cada um
gosta. Ela fala, fala, fala e eu continuo ouvindo e absorvendo tudo.
Por fim, ela decide que temos que voltar ao pepino. Eu ainda não
estou muito à vontade para enfiá-lo na boca e imaginar outra coisa. Mas
Abigail faz isso com perfeição, e eu quase peço que ela pare, porque eu
começo a imaginar a cena de uma forma bem real e me deixa traumatizada.
Ela me diz que eu não devo usar os dentes, a não ser que seja de leve, apenas
para provocar. De outra forma eu posso acabar machucando o pobre do
pepino, ou seja, aquilo lá. Depois de assistir a todas as suas técnicas com a
boca e com as mãos, ela insiste que eu tente.
— Abby, não…
— Para com isso, coloca esse pepino na boca!
— Vou morrer engasgada!
— Não tô dizendo pra você comer ele, faz isso direito!
— Argh!
Acabo colocando o maldito pepino na boca, e Abby vai me dando as
instruções. Ela faz tudo tão séria que eu quase caio na gargalhada. Mas em
vez disso trato de escutá-la, e logo estamos as duas com pepinos na boca.
Ambas sentadas sobre a cama, uma de frente para a outra, estudando todas as
técnicas. É neste momento que a porta do quarto se abre e eu vejo Andrew e
Jackson com os olhos arregalados nos olhando da porta.
— Putz! — Andrew murmura.
— Que porra é essa? — Jackson resmunga.
— O que vocês pensam que estão fazendo? — Andrew pergunta
boquiaberto.
Abigail cospe o pepino e diz:
— É uma técnica tailandesa que eu aprendi — mente. — Serve para
exercitar a garganta, é muito bom. Vocês deveriam tentar.
— Técnica tailandesa? — Jackson repete com um sorrisinho.
— Exatamente — Abigail afirma com tanta convicção que eu quase
acredito também. — Não é, Jamie?
— A-Aham — concordo.
— Essa merda tá muito estranha, Abigail — Andrew diz.
— Vocês, homens, sempre pensando besteiras… — Abigail revira os
olhos. — Por favor, o que você pensa que eu estava fazendo, então?
— Eu? — Andrew aponta para si mesmo. — Nada.
— Onde é que você aprendeu essa técnica, Abigail? — Jackson
pergunta. — Foi no redtube?
— Cala a boca, seu merdão! — Abigail lança o pepino no Jackson, e
ele tenta desviar, mas ainda acaba acertando-o na perna.
— Ficou nervosinha! — Jackson solta uma gargalhada.
— Vamos parar com isso? — Andrew diz. — Já chega, certo?
Abigail, se você já terminou sua técnica sei lá o que, eu estou levando a
Jamie para o quarto. A gente tem que acordar cedo para pegar o avião
amanhã.
— A gente já acabou, sim! — digo levantando-me da cama e pegando
a bolsa que Abigail preparou para mim. — Obrigada pelo tempo juntas,
Abby.
— Estou sempre aqui, querida, para te ensinar qualquer técnica. —
Abigail pisca para mim, e eu sorrio em compreensão.
Andrew segura o meu braço e me leva para fora do quarto de Abigail.
Jackson e ela continuam discutindo alguma coisa. Antes de nós dois
entrarmos no nosso quarto, eu ouço Jackson dizer:
— Abigail, já pensou em testar suas técnicas com o que eu tenho na
minha cueca?
Abigail bate a porta, mas não sem antes gritar:
— Vá se foder!
CAPÍTULO VINTE
--—————————————————————————————

Andrew

Acordei ao lado da minha mulher. Porra, minha mulher? Érr… Ainda


que de mentirinha, Jamie — não mais Collins — assinou os papéis e agora é
a minha senhora Simons. Eu só consigo acreditar que isso não é um sonho
porque estamos usando alianças de ouro que trocamos na noite de ontem. E
também porque ela está aqui, no meu quarto, dormindo ao meu lado, na
minha cama. Eu já trouxe outras garotas para o meu quarto, mas eu nunca
dormi com nenhuma delas (muito menos sem ter ganhado nada, nem uma
punhetinha sequer). Muito menos deixei que dividissem o closet comigo e a
minha banheira. Certamente fiz um grande avanço e estou feliz de estar
casado, pois isso significa um passo mais perto do meu objetivo.
Para a minha sorte, tudo correu bem durante o casamento. Assinamos
os papéis, e a vovó até se emocionou. Eu fiquei nervoso pra caramba,
principalmente quando vi a Jamie vestida de noiva acompanhada do pai
sendo levada até mim. Subiu um arrepio, um suor frio e eu quase pensei que
fosse desmaiar. Felizmente deu tudo certo no fim, e eu saí de lá inteiro e
casado. Recebemos as felicitações de toda a família, ou quase todos, já que
Olivia só apareceu para jogar praga. Mas isso não é uma novidade, e eu já
esperava que ela agisse como a bruxa que é. No fim, todos saíram muito
contentes com a nossa cerimônia no cartório e a recepção na casa da vovó. E
o mais importante era que todos estavam convencidos de que Jamie e eu nos
amávamos de verdade.
Olhando para ela agora, dormindo encolhida na minha cama, com o
rosto despreocupado e suave, fico me perguntando como não notei essa
garota antes. Jamie é incrível de tantas maneiras que eu não posso descrevê-la
completamente. Ela consegue encantar qualquer pessoa ao seu redor, é uma
filha dedicada, uma irmã atenciosa, uma garota amorosa. Tem um grande
coração e sempre coloca os problemas dos outros na frente dos seus. Ela é o
tipo de pessoa que recolhe gatinhos feios da rua e oferece um lar novo a eles.
Ela é tipo a porra do sonho de qualquer homem que queira construir uma
família de verdade. E é por isso que eu estou aqui me perguntando se não fiz
a maior burrada da minha vida quando a deixei entrar no meu caminho.
Porque eu tenho uma promessa a cumprir, eu não posso me envolver, mas a
porra está ficando complicada para o meu lado. E nosso contrato está valendo
há apenas algumas semanas, que merda eu vou fazer até completar um ano?
— Andrew?
Olho para baixo e vejo Jamie me observando com um olhar ainda
sonolento.
— Bom dia, dorminhoca.
— Bom dia. — Ela sorri e se espreguiça lentamente.
— Gostou da cama? — pergunto. — O colchão é confortável?
— O colchão? — ela repete e de repente suas bochechas ficam
vermelhinhas. — Ah, claro, o colchão… É ótimo.
— Se você quiser mudar alguma coisa no quarto é só me falar, eu não
sei do que garotas precisam, portanto, você precisa me alertar — digo. —
Agora, se você quiser fazer alguma mudança na casa, tem que falar com a
vovó ou a tia Lorenna, elas que resolvem essas coisas.
— O quarto está ótimo — murmura. — Tenho tudo de que preciso,
obrigada.
— O Kitty Galore ficou miando de madrugada. Vamos ter que tomar
uma providência quanto a isso, se ele não ficar quieto vou chutá-lo para fora
do quarto.
— Você não vai chutá-lo coisa nenhuma — Jamie protesta. — O
pobrezinho só não está acostumado a toda essa mudança. Primeiro vivia na
rua, depois passou uma semana no apartamento da Jane e agora está aqui na
sua casa. Dê um tempo para que ele possa se habituar.
— Tudo bem, tudo bem. — Suspiro. — Você venceu.
— Você falou com alguém para cuidar dele enquanto estamos fora?
— Jamie pergunta-me.
— Hãã… era pra ter falado?
— Ah, Andrew! — Jamie me dá um olhar de reprovação e se levanta
da cama. Ela está usando um pijama curto rosa com estampas de ursinhos.
Fica fofo nela, mas os bicos durinhos de seus mamilos estão visíveis pelo
material fino. Não consigo parar de encará-los, parece que eles estão pedindo
pela minha boca. — Andrew? Você está me escutando? Nós não temos uma
viagem a fazer?
Viagem? Do que ela está falando? Ah, sim…
— Vamos tomar café com a família, depois seguimos nosso destino.
— E onde exatamente fica o nosso destino?
— Ah, muito espertinha você, Sra. Simons. — Pulo da cama e vou
atrás de uma calça para vestir, preciso cobrir minha ereção matinal. — Nossa
lua de mel é uma surpresa.
— Se a nossa lua de mel fosse verdadeira até acharia bonitinho que
você fizesse uma surpresa. — Jamie passa por mim e se enfia no closet para
trocar de roupa. — Mas como não é, estou curiosa e quero saber para onde
vamos!
— A curiosidade matou a abelhinha. — Elevo a voz para que ela me
escute.
Ouço a risada dela abafada, e de repente ela surge na minha frente
usando um vestido verde limão curto.
— A curiosidade matou o gato, Andrew, não a abelha.
— Você está linda — elogio correndo meus olhos de cima a baixo
sobre ela. Jamie cora.
— Obrigada. — Ela sorri e se aproxima para ajeitar a gola da minha
camisa. — Assim está melhor. Ah, e não tente mudar de assunto. Para onde
vamos?
— Vamos tomar café — digo, passando por ela e indo em direção à
porta.
— Andrew! — Jamie me chama.
— O quê?
— Estamos casados, certo? Eu não acho que você deveria descer para
o café da manhã sem a sua esposa no que supostamente foi a nossa noite de
núpcias.
— Ah, merda… — gemo. — Desculpa, eu não estou acostumado com
isso ainda.
— Tudo bem. — Ela se aproxima e para na minha frente. — Eu não
esperava mesmo que o babaca mulherengo do meu chefe soubesse agir como
um homem casado.
— Você me chamou de babaca de novo? Jamie, eu acho que você está
ficando muito mal-acostumada e vou ter que tomar uma providência quanto a
isso.
— Ah, é? — ela provoca. — E o que exatamente você vai fazer,
marido?
Ela solta um grito quando eu avanço na direção dela e ergo-a com
facilidade, jogando-a sobre o meu ombro. Faço cócegas nas suas costelas, e
ela se contorce enquanto ri. Levo-a em direção à porta, abro e vou para as
escadas com ela ainda reclamando e rindo. Ouço miados atrás de nós, e Kitty
Galore passa correndo entre as minhas pernas, quase me fazendo perder o
equilíbrio. Jamie solta outro grito e se agarra no meu quadril. Desço as
escadas sacudindo-a no meu ombro.
— Para com isso! — ela exige. — Andrew, me coloca no chão!
— Fica quietinha, esposa.
— Arghh! — Jamie finca as unhas nas minhas costelas fazendo-me
silvar alto. — Seu brutamontes!
— Isso não foi legal, abelhinha. — Dou um tapa estalado na bunda
dela.
— Ai! — ela resmunga. — Doeu!
— Ah, querida, me desculpe. — Acaricio a bunda dela no lugar onde
bati.
— Tira a mão da minha bunda, seu pervertido!
— Oh, olha só! — A voz de Abigail me faz olhar para frente e dar de
cara com toda a minha família reunida na mesa para o café da manhã. — Os
pombinhos acordaram animados hoje!
— Andrew, querido — vovó diz com um sorrisinho no rosto. — Acho
melhor você soltar a Jamie agora, para que ela possa se juntar a nós no café
da manhã.
— Vou soltar você, mas só porque a vovó pediu — digo e coloco
Jamie para baixo em seus próprios pés. Ela me lança um olhar assassino e
depois se volta para a minha família com um sorriso envergonhado.
— Bom dia — Jamie saúda todos.
— Eu ia perguntar como você está, querida — tia Lorenna diz. —
Mas pela cena que já presenciei, acho que muito bem.
— Ah, sim. — Jamie cora. — Estou bem, obrigada.
— Sentem-se — vovó pede. — Vocês têm que tomar um bom café
antes da viagem.
— Vem, Jamie. — Seguro-a pela mão e levo-a até o lugar ao lado do
meu. Puxo uma cadeira, e ela se senta.
— Come uns pãezinhos, Jamie — Abigail diz passando a cesta de
pães para Jamie. — Você precisa repor as energias. Afinal, a lua de mel está
só começando.
— Por falar em lua de mel… — tia Lorenna interrompe. — Fiquei
sabendo que é uma surpresa, e que só a mamãe e você, Andrew, é que sabem
sobre o lugar. Verdade?
— É, tia — respondo. — É uma surpresa para a Jamie.
— Ah, Andrew, isso é tão romântico da sua parte. — Tia Lorenna
suspira admirada.
— Jesus! — Abigail exclama. — Jamie, me passa o segredo da sua
vagina, porque eu quero saber o que você fez com o Drew!
— Abigail, não diga essas coisas na mesa! — vovó repreende.
— Abby já disse coisas bem piores na mesa, vovó — Addison aponta,
rindo.
— Ué, falei alguma mentira? — Abigail dá de ombros.
— Será que podemos tomar um café da manhã como uma família
normal? — pergunto. Vovó concorda, e ninguém abre mais a boca.
Tomamos nosso primeiro café da manhã juntos, com mais uma
integrante na família. Jamie e Abigail ficam sussurrando o tempo todo em
que estão à mesa, e eu fico curioso para saber sobre o que estão falando.
Ultimamente as duas andam fazendo coisas estranhas, como colocar pepinos
na boca e dizer que se trata de uma técnica tailandesa. Abigail não me
engana, por isso sei que estão aprontando alguma coisa, só queria saber o que
é.
Converso com a vovó para saber se está tudo certo com o jatinho que
vamos pegar hoje e também com o apartamento em que eu e Jamie vamos
ficar durante os três primeiros dias da nossa lua de mel. Os três últimos
vamos passar em um hotel numa outra cidade. Separei dois lugares para
visitarmos em nossa viagem e tenho certeza de que Jamie vai adorar. Escolhi
especialmente para ela.
Abigail e Addison prometem para Jamie que vão cuidar de Kitty
Galore enquanto estamos viajando. E Jamie toda preocupada começa a passar
uma lista de coisas que elas devem ou não fazer para o gato. Eu não quero
estragar a felicidade de Jamie, porque ela acha que acabou de encontrar
alguém para cuidar do gato e evitar que ele morra de fome até estarmos de
volta, por isso não digo nada sobre a minha falta de confiança em Abigail
com cuidados aos animais. Abby mal sabe cuidar dela mesma, que dirá de
outro ser vivo. Acredito que Addison se sairá melhor com a tarefa.
Quando estamos quase terminando o café, a campainha toca e nossa
governanta, Virginia, vai atender. Jack entra alguns segundos depois, vestido
casualmente, com aquele sorriso malandro de sempre. Cumprimenta todas as
pessoas na mesa e acaba sentando-se para tomar café da manhã com a gente.
Eu pedi a ele que ficasse responsável por toda a minha parte no trabalho
durante esta semana que ficarei fora na lua de mel. Obviamente ele aceitou,
porque Jack é o meu amigo fodão que topa qualquer parada. E, pensando
bem, não tenho trabalhado muito ultimamente, então não é como se ele
tivesse algo de importante para fazer.
Jamie e eu deixamos a mesa e retornamos para o nosso quarto. Ela vai
tomar banho enquanto eu carrego nossas malas para o carro e levo a caminha
que Jamie comprou para o Kitty até o quarto de Abigail, onde ele vai dormir
nessa próxima semana. Desejo boa sorte ao gato feio, porque tenho a
sensação de que ele vai precisar. Ainda mais quando vejo que ele dispensa
seu cantinho com um olhar arrogante e sobe na cama de Abby. Ele faz uma
volta de 360 graus, se enrosca feito uma bola sem-pelo, fecha os olhos e
ronca suavemente dormindo sobre um vestido preto que Abigail estendeu
sobre a cama. Ah, gato, eu não queria ser você…
Volto para o quarto e encontro Jamie arrumada e pronta. Aviso a ela
que vou tomar um banho e que sairemos em vinte minutos. Ela se apressa
para arrumar algumas coisas em sua bolsa e vou para o chuveiro. Tomo um
banho rápido, visto roupas limpas, dou uma ajeitada no cabelo, passo um
perfume, pego minha jaqueta e volto para o quarto. Jamie está sentada sobre a
cama, segurando na mão um porta-retratos com uma foto minha com os meus
pais.
— Vocês formavam uma família muito bonita — ela diz, levantando
os olhos para os meus.
— Obrigado.
— Você é mais parecido com a sua mãe.
— É o que todos dizem, mas o gênio eu herdei do meu pai. A vovó
costumava dizer que ele era o tipo de cara que conseguia tudo o que queria e
fazia qualquer coisa para alcançar seus objetivos.
— É, muito parecido com você…
— A diferença é que ele não mentia para conseguir isso — respondo,
sentindo-me triste de repente.
— Tudo bem, Andrew?
— Ah, sim, tudo. — Balanço a cabeça. — Você se parece mais com
quem? Aposto que não é com o seu pai.
— Eu puxei a minha mãe. — Ela sorri. — Ela era uma mulher
maravilhosa, vivia alegre mesmo nos piores dias. E ela era tão forte, uma
lutadora…
— Assim como você.
— Não, eu acho que não. — Jamie se levanta e coloca o porta-retratos
no lugar. Depois se vira para mim. — E então, podemos ir?
— Sim, claro — concordo. — Temos que ir, não podemos nos
atrasar.
Jamie pega a bolsa e descemos juntos. Toda a família se reúne na sala,
e nós nos despedimos de cada um deles. Vovó pede para ligarmos assim que
chegarmos, para avisar se tudo está correndo bem. Tia Lorenna nos entrega
uma câmera digital profissional e diz para registrarmos todos os momentos
juntos para que ela veja depois. Abigail brinca dizendo que a última coisa que
vamos fazer é tirar fotos quando teremos uma cama à nossa disposição e
estaremos sozinhos. Ela nem imagina o quanto eu gostaria que isso fosse
verdade. Mas Jamie, apesar de ficar me provocando, continua mantendo
distância das minhas investidas. Parece que ela ainda está pensando na
proposta que fiz. E Jack, bom, ele me deseja ótimas férias. Porque ele
acredita fielmente que isso é tudo o que eu e Jamie vamos fazer enquanto
estivermos fora. Contudo, Jack nem imagina a mudança no contrato que eu
propus a Jamie. Eu ainda não tive tempo para contar ao meu amigo que eu
quero transar com a minha esposa. Mas nós teremos tempo para conversar
sobre isso outra hora…
— Tenham uma ótima viagem! — Vovó acena para nós enquanto nos
distanciamos com o carro.
***
A Jamie tem medo de altura e é por isso que ela não suporta andar de
avião. Isso fica bem claro quando chegamos à pista e ela se recusa a entrar no
jatinho. Ela implora para irmos de carro, ou mudarmos nossa viagem para
outro lugar. Mas obviamente não é isso que eu vou fazer, até porque sei que
quando estivermos no nosso destino tudo vai valer a pena. Acabo levando
Jamie arrastada para dentro da cabine e coloco-a sentada em uma das seis
poltronas confortáveis. Prendo-a no cinto, sento-me ao lado dela e seguro sua
mão trêmula. Tenho medo que ela sofra algum tipo de ataque a qualquer
momento, porque ela está tão branca que parece ter visto um fantasma, e seus
lábios estão ficando roxos.
— Jamie? — chamo.
— N-Não fala c-comigo — ela gagueja.
— As piores partes são a decolagem e a descida — informo a ela. —
Você vai ficar bem, tenta se concentrar em outa coisa.
— Não consigo!
Fico me perguntando como supostamente essa garota pretende pular
de paraquedas com todo esse medo.
— Jamie, olha pra mim — peço.
Relutante ela ergue os olhos e encara-me.
— Estou olhando.
— Você tem olhos muito bonitos, sabia? Eu sempre quis perguntar se
eles são verdes ou castanhos.
— Você já perguntou. — Ela sorri.
— Eu? Sério? Eu não me lembro. Quando?
— Você estava bêbado — responde-me.
— Ah, humm… é, eu não lembro — murmuro. — E o que você
respondeu?
— Que eles são castanhos, mas com este toque de verde ao redor.
— Boa garota — elogio. — Olhe pela janela, Jamie.
— O quê? — Ela se vira, e seus olhos se arregalam quando ela
percebe que estamos fitando o céu azul bem de perto. — Ai, meu Deus,
estamos voando! Você me distraiu! Ai, Senhor, estamos voando!
— Calma… Ei, garota, relaxe. — Seguro a mão dela de novo. — Não
é para você pirar agora, e sim para que perceba que não há nada a temer.
Estamos voando, e seguros.
— É tão linda a visão daqui — ela diz, admirando a vista.
— É sim, realmente uma linda visão — respondo, observando-a sorrir
para a janela.
Nossa viagem dura cerca de oito horas. No momento em que
aterrissamos, Jamie está dormindo, o que é ótimo, porque assim ela não
percebe a leve turbulência na descida. Ela abre os olhos assim que eu chamo
o seu nome e tem um mini ataque cardíaco pensando que está acontecendo
algum problema. Rapidamente eu explico a ela que já pousamos.
— Chegamos? — ela pergunta olhando ao redor.
— Sim. Vamos.
— Chegamos onde, exatamente? — ela insiste.
Eu não digo nada, e ela me segue. Cumprimento nosso piloto e a
aeromoça que nos guia para fora do jatinho. Jamie fica olhando para todos os
lados à procura de algo que indique onde nós estamos, é até engraçado.
— Andrew?
— O que foi? — pergunto.
— Você não vai me dizer onde nós estamos?
— É claro que eu vou.
Um carro está esperando por nós a meu pedido, e nossas malas são
colocadas no bagageiro. O motorista me passa as chaves e dou a volta para
abrir a porta do passageiro para Jamie. Ela me dá um olhar incerto, mas entra
no carro.
— Bem-vinda a Paris, mademoiselle.
Fecho a porta, mas não antes de ver a expressão de surpresa em seu
rosto. Dou a volta no carro e sento-me no banco do motorista. Jamie está
encarando o espaço à sua frente com os olhos arregalados.
— Você está brincando, né?
— De maneira alguma, madame.
— Meu Deus! — Jamie exclama. — Não pode ser! Estamos em
Paris? Paris?
— Sim, estamos — afirmo. — Temos três dias para aproveitar a
cidade, o que é pouco tempo. Mas tenho certeza de que você conseguirá
visitar a Torre Eiffel e alguns outros lugares bacanas. Depois vamos passar
mais três dias em Marselha, é outra cidade francesa maravilhosa.
— Só pode ser um sonho.
— Não, Jamie, é real.
— Por que você fez isso? — ela pergunta, virando-se para me
encarar. — Por que Paris?
— Porque é o seu desejo.
— Mas, Andrew… você… você não tinha que fazer isso por mim.
— Relaxa, Jamie, uma coisa está ligada à outra — respondo. —
Precisamos sair para a lua de mel de qualquer forma, ou a vovó desconfiaria,
assim como os demais. Segundo, a vovó tem um belo apartamento aqui. E
terceiro, estava na sua lista. Simples assim.
— Simples assim? — ela repete incrédula. — Você não sabe o quanto
eu queria estar aqui, como eu já sonhei tantas vezes em estar aqui. Eu não sei
nem o que dizer, não sei como agradecer.
— Um simples obrigada já basta.
— Merci, monsieur Simons — Jamie agradece, sorrindo de orelha a
orelha.
— De rien, madame Simons.
***
Jamie fica encantada com tudo o que vê. Parece uma criança perdida
na Disney, do tipo que quer olhar para tudo ao mesmo tempo e fica
emburrada quando não consegue. Enquanto eu dirijo para o apartamento que
vovó disponibilizou para nós, ela fica o tempo todo com a cabeça virada em
direção à janela. O tempo todo ela aponta para alguma coisa e me faz várias
perguntas. Mas em nenhum momento ela olha para mim, nem quando eu
estou respondendo-a. Ela está maravilhada com a cidade de Paris e nenhuma
outra coisa consegue chamar mais sua atenção.
Quando chegamos ao nosso destino, estaciono o carro e, antes que eu
abra a porta para ela, Jamie já está fora dele. Toda empolgada e com uma
felicidade incrível. Eu gostaria de saber por que Paris é tão importante assim
para ela, talvez mais tarde eu pergunte. Pego as nossas malas e vou em
direção às escadas. O prédio é antigo, como muitas outras construções aqui.
Ele tem quatro andares e o apartamento da vovó ocupa toda a cobertura. Não
tem elevador, o que é um saco, mas não é algo tão necessário assim.
Largo nossas malas no chão, em frente à porta, pego as chaves no
meu bolso e enfio na fechadura. Escancaro a porta e faço um gesto para que
Jamie siga na frente. Ela passa por mim e solta um sonoro suspiro quando
tem uma visão do apartamento todo. Esse lugar é bem legal mesmo, muito
espaçoso e tem uma vista incrível da janela. Vovó me trazia aqui pelo menos
uma vez por ano, geralmente nas férias escolares.
— É perfeito! — Jamie exclama.
— Imaginei que você fosse gostar. E sabe o que é melhor? Tem um
restaurante muito bom aqui na frente, podemos descer e pegar comida a hora
que quisermos.
— Esse lugar todinho é da sua avó?
— É sim, a vovó tem muitas propriedades, Jamie. Não é apenas por
ser dona da construtora, mas é que ela sempre teve essa compulsão por
comprar imóveis. Eu já perdi as contas de quantas residências são ao todo
espalhadas pelo mundo.
— Isso é… Muito legal.
— Você quer sair para jantar? — pergunto. — Sabe, naquele
restaurante que eu comentei agora?
— Seria ótimo, estou com muita fome.
— Fique à vontade para explorar o apartamento. Vou tomar um
banho, meu quarto é o último no fim do corredor. O quarto da vovó é a
segunda porta à esquerda e ainda há um terceiro quarto, que fica ao lado do
dela. Eu… Eu não sei se você vai querer o seu próprio canto.
— Meu próprio canto?
— Érr… Você sabe. Não precisamos fingir aqui, não há ninguém por
perto. Se você se sente mais à vontade tendo um quarto para você…
— Ah, entendi. Obrigada.
Deixo Jamie para trás e vou para o meu quarto com a minha mala.
Retiro um par de roupas limpas e vou para o chuveiro. Quero bater com a
minha cabeça contra os azulejos. Por que eu fui oferecer um quarto só para
ela? Porra! Eu tinha que fingir que a única cama disponível era a minha,
assim quem sabe eu possa convencê-la logo a dormir comigo. Desde quando
eu fiquei tão obcecado por uma boceta?
Saio do chuveiro e visto minhas roupas. Sigo pronto até a sala onde
encontro Jamie me esperando. Ela também tomou banho e trocou de roupa.
Está usando um vestido preto, é simples e de alcinhas. O tecido é leve como
seda e ajustado ao seu corpo. E ela não está usando a porra do sutiã. Aonde
ela pensa que vai vestida assim? E com esses saltos altos pretos cheios de
tiras? É sexy pra caralho. Ela quer me enlouquecer, só pode.
— Que roupa é essa?
— Você não gostou? — Jamie pergunta olhando para baixo e
averiguando seu próprio traje. Ela parece quase… magoada.
— É claro que eu gostei, é sexy.
— Então qual o problema em usá-lo? — ela pergunta inocentemente.
O problema, querida, é que cada filho da puta parisiense, italiano,
espanhol, americano e de qualquer outra nacionalidade vai comer você com
os olhos…
— Jamie, o restaurante ao qual a gente vai é simples, você não precisa
ir toda produzida — minto.
— Mas eu quero sair bonita, estamos em Paris! — ela diz
alegremente. — Se não tem nenhum problema com a roupa, vou assim
mesmo. Podemos ir?
— Podemos — cedo com um suspiro.
Ô, Senhor, tenha piedade do meu pau ou eu vou acabar comprando
uma boneca inflável…
Como eu já esperava, cada par de olhos masculinos estava sobre a
Jamie quando chegamos ao restaurante, e atrevo-me a dizer que alguns
femininos também. Escolhi a mesa mais escondida e afastada para nos
sentarmos. O garçom apareceu e fizemos nosso pedido, Jamie nunca tinha
comido nenhum tipo de comida francesa e por isso deixou que eu escolhesse
nosso jantar. Pedi um bom vinho para acompanhar e nós tivemos uma
conversa agradável até o nosso pedido ser servido.
— Humm… é delicioso.
— Espere até provar a sobremesa — digo. — É divino,
principalmente o Petit Gâteau.
— Eu ainda não consigo acreditar que estamos mesmo aqui.
— Você vai acreditar amanhã, quando formos visitar a Torre Eiffel.
— Nós vamos mesmo? — Ela sorri esperançosa.
— Com certeza — concordo.
— Andrew, isso é fantástico, é tão… Incrível.
— Por que Paris? — pergunto a ela.
— Como assim?
— Por que paris é tão importante para você?
— Ah, sim. Bom, houve uma vez em que mamãe contou sobre uma
viagem que ela fez até Paris. Foi antes de ela conhecer o meu pai, na época
em que tentava ser atriz. Ela me disse que Paris é o tipo de cidade
inesquecível, que fica guardada na sua memória para sempre, e que se eu
tivesse a oportunidade deveria conhecer. Eu tenho comigo uma bola de cristal
com a torre Eiffel dentro, mamãe a comprou aqui e me deu de presente antes
de morrer. Deve custar uns cinco euros, mas para mim tem um valor muito
grande. Aliás, um valor inestimável.
— Entendo agora por que é tão importante para você.
— Andrew, eu sei que você disse que só fez isso porque uma coisa
estava ligada à outra. Ainda assim, eu quero que você saiba o quanto isso
tudo é especial para mim. Eu nunca conheci ninguém como você e estou feliz
que você tenha feito a proposta de eu ser sua noiva. Estou feliz também que
eu tenha aceitado e quero dizer que, apesar das nossas desavenças, eu faria
tudo de novo.
— Deixe-me ver seu eu entendi. — Inclino-me para frente e apoio os
cotovelos sobre os meus joelhos. — Você está me dizendo que gosta de
mim?
— Não foi o que eu disse. — Ela ri.
— Mas você gosta de mim? — insisto.
— Eu… — Ela olha para baixo onde suas mãos estão entrelaçadas e
de volta para o meu rosto. — Sim, eu gosto de você.
— Eu quero muito beijar você agora, porque eu também gosto de
você, Jamie.
— Andrew, eu… — Ela olha para baixo novamente e de repente
arrasta a cadeira para trás, e se levanta. — Desculpe-me.
Eu fico parado no meu lugar, observando enquanto Jamie caminha até
o bar, senta-se em uma banqueta e pede alguma coisa ao barman. Droga, o
que eu fiz de errado? Levanto-me e caminho até lá. Paro no bar e ocupo a
banqueta ao lado da dela. O barman serve a ela uma dose de alguma bebida
que desconheço. E, em inglês, ele me pergunta se eu quero algo, mas eu
dispenso.
— Falei algo que você não gostou? — pergunto.
— Não — ela diz e vira o copo, fazendo uma careta quando engole.
— O problema não é você, sou eu.
— Sabe que na maioria das relações, quando essa frase é dita,
significa que o problema não é você, mas, sim, a outra pessoa. Então será que
você pode me dizer a verdade?
— Quero ir pra cama com você — ela admite.
Puta merda!
Escutei direito? Ela quer ir pra cama comigo?
Ó, santíssimo Senhor Jesus Cristo, prometo que frequentarei a igreja
a partir de agora…
— Isso é sério?
— Muito — ela afirma balançando a cabeça.
— Então você está me dizendo que aceita os meus termos?
— Sim — ela concorda. — Mas tenho uma condição.
Ixii, lá vem…
— Qual é?
— Nada de emoções, essa relação vai ser completamente física.
— Isso parece bom para mim.
— Pelo bem do nosso contrato, precisamos evitar complicações.
Então nada de se apaixonar, está bem?
— Me…Me… A-apaixonar? — gaguejo.
— Sim, Andrew. Eu não vou amar você, e você não vai me amar. —
Ela finalmente olha para mim. — Prometa-me isso, e eu vou para cama com
você.
Mas eu nunca vou me apaixonar, essa é fácil…
— Prometo.
— Ótimo. — Ela respira fundo. — Será que você pode me pagar
outra dose desse negócio?
— Querida, se nós vamos fazer isso eu quero que você se lembre de
cada detalhe, e não vai acontecer se você estiver bêbada.
— Andrew, eu quero muito transar com você, mas eu ainda estou
pensando no quanto isso é arriscado. Beber me traz um pouco de coragem,
então será que você pode me comprar outra dose desse negócio? Porque, se
você não fizer, eu duvido que eu vá tirar as minhas roupas para você.
— Ei, cara — chamo o garçom que se vira ao som da minha voz. —
Traz uma garrafa dessas para mim, e se você fizer isso rápido eu te dou umas
gorjetas.
***
No momento em que a porta bate atrás de nós eu tomo sua boca.
Fiquei tanto tempo imaginando quando isso aconteceria que agora parece um
maldito sonho. Ela tem o gosto da bebida doce e alcoólica que bebeu. Enfio a
minha língua em sua boca, faminto, com avidez, buscando explorar cada
canto dos seus lábios. Ela me beija com a mesma intensidade, mordicando os
meus lábios, sugando a minha língua e me puxando cada vez mais perto até
que não tenha um único espaço entre os nossos corpos.
Minhas mãos impacientes vão para as alças do seu vestido, e eu as
puxo pelos seus ombros e deslizo para baixo. Seus seios nus são a melhor
visão que eu tenho nesse momento, e mesmo que eu queira a minha boca
sobre eles acabo deixando para depois. O vestido preto cai aos pés dela, e
então é a vez de Jamie puxar a minha camisa para cima. As mãos dela
deslizam macias sobre a minha pele, tocando minha barriga e meu peitoral.
Até que a minha camisa está no chão ao lado do seu vestido.
Volto a beijá-la ao mesmo tempo em que a empurro passo por passo
até o final do corredor. Abro a porta sem nem mesmo largá-la e finalmente
estamos no quarto. Ela desfaz a braguilha da minha calça, e eu me afasto para
me livrar dela também. Tenho uma baita ereção empurrando contra a minha
cueca. Mas felizmente o meu pau está contente que dessa vez não será
abandonado. Chega de dor nas bolas também.
Eu a empurro gentilmente para trás, e ela cai sobre cama. Ela é uma
deusa, com esses cabelos espalhados sobre o lençol, esses lábios deliciosos, e
essa noite ela é toda minha. Seguro as tiras da pequena calcinha preta e
deslizo para baixo, pelas coxas e pernas dela. Não perco tempo e vou logo
subindo na cama, me jogo de boca em sua boceta. Chupo o clitóris dela com
força, Jamie geme e agarra os meus cabelos, enquanto eu continuo sugando
seu feixe de nervos.
— Ai, céus!
— Você gosta disso, querida?
— Andrew… — ela implora.
— Conte pra mim o que você quer?
— Me chupa! Ai, caramba, me chupa logo.
Sorrio e abro um pouco mais as suas pernas, acomodo-me
confortavelmente no meio delas e continuo chupando-a. Quero dar a ela todo
o prazer que pode ter, vou fazer dessa noite inesquecível. Quero-a viciada na
minha língua, em minhas mãos e no meu pau. Mantenho-a firmemente presa
à cama e enfio minha língua nela. Jamie se contorce de prazer enquanto eu
continuo provocando-a. Corro minha língua por toda a sua boceta e tomo
todos os seus fluidos. Ela está pingando para mim no momento em que eu
coloco dois dedos dentro dela e faço-a gozar, gritando o meu nome bem alto.
— Drew — Jamie ofega, seu peito sobe e desce com a respiração
acelerada.
Avanço sobre ela e lhe dou um sorriso antes de abaixar a minha
cabeça e abocanhar um dos seus mamilos. Pressiono com os dentes a carne
macia e ouço-a gemer baixinho quando aplico um pouco de pressão. As mãos
dela correm sobre as minhas costas nuas, e suas unhas cravam na minha pele
quando ela empurra os peitos em direção à minha boca, querendo mais. Parto
para o outro seio, lambo o mamilo, chupo-o na minha boca, dando o mesmo
tratamento que o anterior. Uso um cotovelo para me segurar na cama e
impedir-me de esmagá-la contra o colchão. A outra mão desce entre as suas
pernas e pressiono seu clitóris ainda sensível.
— Ai, Andrew, me faz gozar de novo, por favor.
— Você vai gritar bem alto?
— Vou, vou gritar o quanto você quiser.
— Boa garota.
Começo a fazer círculos sobre seu clitóris, pressionando no ponto
certo. As unhas dela cavam minha pele tão profundo, que eu tenho certeza de
que vão deixar marcas. Isso me deixa ainda mais excitado, a ponto de a
minha ereção doer nas minhas calças. Jamie grita quando eu mordo o lábio
dela com força e enfio um dedo profundamente nela. Começo a masturbá-la
com força e me vejo gemendo com ela. Ela goza com um grito que eu tenho
certeza de que toda a vizinhança escutou. Sua boceta está encharcada a ponto
dos seus fluidos escorrerem pelos meus dedos.
— Que gostosa, minha abelhinha… — Levo os meus dedos até a
minha boca e sugo tudo com a minha língua enquanto ela me assiste. Todo o
corpo dela está ruborizado, e seus olhos estão mais brilhantes. Simplesmente
divina.
— Drew?
— Mmmm, o que foi?
— Será que você pode me foder agora?
Sorrio lentamente.
— Você quer o meu pau?
— Quero — ela admite lambendo os lábios e encarando a ereção
visível pela minha cueca.
— Ele também quer a sua boceta, você tem me deixado louco,
abelhinha.
— Então me toma, agora.
— Vou te comer bem devagar, farei isso lento. Vou enfiar bem fundo
e escutar você gemer baixinho no meu ouvido enquanto eu meto. E depois eu
vou gozar, e com sorte você também. Mas se isso não acontecer, vamos dar
dois minutinhos para o meu rapaz aqui embaixo se recuperar, então vou
afundar em você de novo e te comer com força. O que você acha, querida?
— Eu acho que é melhor você fazer exatamente o que está me
prometendo, Sr. Simons, ou quando eu for cobrar será com juros.
— Hummm… pensando bem, juros não são tão ruim assim —
pondero. — Infelizmente eu tenho quer ter você nesse momento. Você toma
pílulas?
— Não.
— Merda, ok… — Penso por uns segundos, logo me imaginando
fodendo-a sem nada. — Escute, eu fiz meus exames faz pouco tempo. Estou
limpo, e você?
— Também.
— Confia em mim?
— Eu…
— Sei que é difícil te pedir isso…
— Eu confio, Andrew — ela sussurra.
— Eu vou te foder sem nada, mas eu vou tirar antes de gozar, tá?
— Tudo bem, confio em você.
Livro-me da minha cueca em questão de segundos e minha ereção
fica livre. Acomodo-me no meio das pernas abertas de Jamie, posiciono meu
membro rígido na entrada de sua boceta e empurro lentamente. Devagar a
cabeça do meu pau desliza para dentro do seu cantinho aveludado, macio e
quentinho. Puta que pariu, morri e fui para o céu! Não tem outra forma de
descrever o paraíso onde eu me encontro. Empurro mais um pouco, e nós
dois gememos juntos com a sensação. Ela é toda apertada ao redor do meu
eixo, mas eu me encaixo bem até demais. É como o ajuste perfeito, como se
finalmente eu encontrasse o lugar certo para acomodar meu pau.
— Andrew — Jamie geme baixinho o meu nome. — Por favor, se
move.
— Eu vou, querida, eu vou.
Dou mais um impulso até que meu pau está todinho dentro dela. A
boceta da Jamie me aperta, me segura e parece querer me manter em seu
interior escorregadio. As mãos dela agarram os meus bíceps, e suas pernas
circulam o meu quadril até que ela esteja todinha agarrada em mim. Puxo
para trás e volto a estocar contra ela. Faço devagar, lento e suave, exatamente
como eu prometi. E ela geme bem ali no meu ouvido, enquanto sua
respiração quente bate contra o meu pescoço.
Ajusto o ângulo do meu quadril e movo minha pélvis contra a dela.
Levo fundo várias vezes, tocando em todos os lugares em seu interior.
Levanto a cabeça para assisti-la. Seus lábios estão entreabertos, e seus olhos,
fechados. Apoio minha testa contra a sua, e seus olhos se abrem e fitam-me
intensamente. Aquelas pupilas esverdeadas me fascinam, e eu me vejo
completamente travado, observando-as. Ela levanta uma das mãos e toca a
palma contra a minha bochecha. Um sorriso pequeno surge em seus lábios, e
ela me beija lentamente. Nosso beijo combinando com os nossos
movimentos, e é assim que ela goza com seus gemidos sendo engolidos por
mim. Sinto minhas bolas incharem e puxo para fora no exato momento em
que eu gozo pra caralho.
Desabo ao seu lado na cama e puxo uma respiração profunda. Porra,
melhor sexo da minha vida.
— Andrew? — Jamie se vira e apoia o cotovelo sobre a cama.
— Abelhinha?
— Foi incrível. — Ela suspira.
— Foi — concordo.
— A gente pode fazer de novo? — ela pergunta, e eu me viro com os
olhos arregalados somente para ter certeza de que eu ouvi direito.
— O quê?
— A gente pode fazer de novo? — ela repete.
— A gente pode fazer a noite inteira, isso se você aguentar.
Ela torce a boca e ergue uma sobrancelha.
— Você está me dizendo que eu não sou capaz? — Jamie pergunta-
me tão séria que eu percebo que ela não levou na brincadeira. Ela se levanta e
passa uma perna sobre a minha cintura. Acomodando-se exatamente sobre o
meu pau, que começa a ganhar vida outra vez. A posição dela, sentada desse
jeito sobre mim, é maravilhosa. A visão daqui de baixo é tentadora,
provocante. — Pois eu quero ver, Sr. Simons, se o seu pau é tão incrível
como você vive dizendo. Mostre-me tudo o que ele é capaz de fazer!
— É pra já, querida…
Por que eu sinto que de repente passei do pior azarado da face da
Terra, para o cara mais sortudo do planeta?
CAPÍTULO VINTE E UM
--—————————————————————————————

Jamie

Acordo com o barulho de buzinas a distância, abro os olhos


lentamente para dar de cara com a claridade ofuscante. Uma brisa suave entra
no quarto através da porta aberta da varanda. A cortina bege balança com
leveza, e entre um balanço e outro, é possível ver os telhados de vários outros
edifícios. Não é nada parecido com Nova Iorque, aqui as construções são
mais antigas, embora sejam muito bonitas. Paris, a cidade do amor, o lugar
onde anos atrás minha mãe esteve e se encantou com toda a sua beleza. E
agora eu finalmente estou aqui, com Andrew. Parece inacreditável.
Esfrego os olhos com os punhos e sento-me sobre a cama, segurando
o lençol branco apertado contra o meu peito. Ao meu lado, Andrew está
dormindo pacificamente. O lençol cobre apenas de sua cintura para baixo, o
peito liso e imaculadamente lindo continua descoberto. Minhas mãos coçam
para tocá-lo, mas eu desisto, com medo de acordá-lo. Ainda não acredito em
tudo o que aconteceu ontem à noite, mas estou feliz que eu tenha seguido os
conselhos de Abigail e deixado de lado o meu medo. Agora, me sinto uma
idiota por não ter aceitado antes. Andrew foi maravilhoso em cada segundo
da noite, e madrugada.
Levanto-me da cama com cuidado para não acordá-lo e ajeito o lençol
ao redor do meu corpo. Vou em direção à varanda, onde o sol está brilhando
mais forte, e os barulhos rotineiros da manhã preenchem o ar. Afasto as
cortinas e vou para o lado de fora. É tão lindo daqui de cima, que o ar parece
faltar nos meus pulmões enquanto eu observo toda essa beleza. Minha mãe
estava certa, esta é uma cidade da qual você nunca consegue esquecer. Sei
que ficará guardada na minha memória para sempre.
Inclino-me sobre o parapeito, apoiando meus cotovelos ali. Fechos os
meus olhos e deixo que os sons ao meu redor me cerquem, enquanto o sol
esquenta a minha pele. Dou um pulo e arregalo os olhos quando sinto braços
fortes envolverem minha cintura. O perfume delicioso ao qual já estou
acostumada a sentir diariamente enche minhas narinas. Relaxo
instantaneamente. É uma fragrância forte e masculina, é o cheiro perfeito
para Andrew. Ele abaixa a cabeça e morde o lóbulo da minha orelha,
fazendo-me rir e saltar ao sentir cócegas. Ele ri, quando, sem sucesso, tento
afastá-lo.
— Bom dia, abelhinha. Dormiu bem?
— O pouco que você deixou, sim, consegui.
— Não reclame, foi você quem me desafiou. — Andrew descansa o
queixo sobre o meu ombro e posso senti-lo sorrindo. — Aprenda algo sobre
mim, querida, eu adoro desafios e dificilmente perco um.
— Eu percebi, e não estou reclamando. — Viro-me de frente para ele,
e Andrew continua me prendendo nos seus braços. Os olhos azuis cristalinos
dele parecem brilhar. — Inclusive estou pensando em novos desafios…
— Posso perguntar de onde surgiu essa Jamie tão fogosa?
— Ela sempre esteve aqui — murmuro aproximando meu corpo do
dele, que também está coberto por um lençol da cintura para baixo. — Mas
estava ressentida e com medo.
— Por quê? — Andrew pergunta com os lábios pairando a
centímetros dos meus.
— Porque só houve um antes de você, e porque nós temos um acordo.
Além disso, não podemos nos apaixonar. O que temos é um negócio e deve
permanecer assim.
— Somos adultos que sabem o que quer, e você sabe que eu não me
apaixono, Jamie, então não tem que temer nada. — Andrew captura o meu
lábio inferior com os dentes e morde levemente a carne, soltando logo em
seguida para lambê-lo. — Agora me confirme uma coisa, porque eu acho que
eu não ouvi direito… Só um?
— Só um — confirmo, sentindo meu rosto esquentar. — Bom, agora
dois.
— Caraca…
— O quê? — Dou um empurrão nele. — Você pensou que eu fosse o
quê? Uma Tracy?
— Não, é claro que eu não pensei. — Ele balança a cabeça divertido e
me puxa de volta para a segurança dos seus braços. — Eu sabia que você era
inexperiente desde o começo, só não pensei que eu seria o segundo.
— Mas é!
— Eu gosto disso, dois é um número bacana — Andrew diz
pensativo. — Pensando bem, isso é mentira, eu prefiro ser o primeiro em
tudo. Mas parece que eu cheguei tarde demais.
— Talvez não — admito.
— Como assim?
— É que… Ér… Humm… você foi tipo o primeiro a colocar a
boca… Você sabe…
— Fui o primeiro a chupar sua boce…
— Andrew! — repreendo.
— Cacete, com que tipo de homem você transou? Não, quer saber?
Nem me conta. Eu já sabia que eu tinha mandado muito bem, mas agora,
porra, eu sempre soube que era o melhor.
Reviro os olhos.
— Já chega, o "melhorzão". — Empurro-o e me afasto, voltando para
o quarto. — Vou tomar um banho.
— Tá.
Vou em direção ao banheiro da suíte, e Andrew me segue. Paro no
batente da porta e olho para ele.
— Por que você está me seguindo? — pergunto.
— Você sabia que foi comprovado que rapidinhas no chuveiro pela
manhã são uma ótima forma de começar o dia?
Solto uma gargalhada.
— Você inventou isso — acuso.
— É, inventei — ele admite e se aproxima. Andrew me empurra para
dentro do banheiro e fecha a porta logo atrás. — Mas não significa que não
podemos tornar isso realidade.
— E se eu não quiser?
— Você quer — ele afirma.
— Eu acho que você está sendo um metido arrogante.
— Você quer que eu peça?
— Quero. — Aceno.
— Sra. Simons, será que eu posso comer você no chuveiro? —
Andrew pergunta-me fazendo bico.
— Você foi rude.
— Jamie, querida, ontem à noite quem estava gritando para ser
chupada não era eu. Então ou você aceita que eu coma você nesse chuveiro,
ou então você também aceita, porque essa é a única opção que resta.
— Já que eu não tenho escolha… — Solto o lençol que estive
segurando e deixo que ele caia aos meus pés. Andrew corre os olhos de cima
a baixo sobre o meu corpo, e um sorrisinho sacana surge em seus lábios. Viro
as costas para ele e entro no chuveiro. Dou um olhar sobre o meu ombro
apenas para encontrá-lo no mesmo lugar. — Você vem ou não?
Ele pisca duas vezes, saindo de seu transe, e retira a boxer em dois
segundos antes de se juntar a mim. Sou abraçada por ele até que nossos
corpos estejam esmagados um no outro. Andrew me beija longa e
profundamente enquanto a água quente cai sobre nossas cabeças e desliza
pelos nossos corpos unidos. Eu o abraço e o beijo de volta e juntos
apreciamos este tempo juntos, trocamos carícias de uma forma que eu achava
impossível que um cara como Andrew pudesse fazer. É maravilhoso.
O vapor acumulando-se dentro do box em conjunto com nossos
corpos fervendo de desejo nos deixa ávidos por mais toques, por mais beijos,
por mais calor. Estamos tão envolvidos que tudo acontece de um jeito muito
natural. Eu não tenho mais medos, ou preocupações, e como confio em
Andrew não tenho mais nenhuma hesitação. Entrego-me completamente e
logo me vejo agarrando-o com unhas e dentes, implorando por mais.
— Segure firme. — Andrew instrui em voz baixa perto do meu
pescoço. Faço como ele diz e me agarro apertado a ele.
Andrew me ergue, e eu enrosco as pernas ao redor do seu quadril. Ele
me pressiona contra a parede e sua boca toma a minha outra vez. Sua língua
varre o céu da minha boca e possui cantos inexplorados em mim. Seu beijo é
exigente, e seus movimentos são leves e precisos em contraste com seus
lábios, firmes e gananciosos. Uma de suas mãos me sustenta contra a parede,
enquanto a outra percorre o meu corpo e apalpa meu peito. Com o polegar
Andrew provoca o meu mamilo, endurecendo-o sob seus dedos ágeis e seu
toque experiente. Ele quebra o nosso beijo, e sua respiração está tão acelerada
quanto a minha quando olhamos um no olho do outro.
— Por que eu demorei tanto tempo pra notar você? — Andrew
pergunta-me completamente vidrado. Eu nem tenho certeza se ele tem noção
do que está dizendo.
— Porque eu era feia demais para você, pobre e servia seus cafés?
— Não, meu Deus, eu acho que eu era um panaca.
— Humm… essa opção também serve.
Ele ri, abaixa a cabeça e descansa na curva entre meu pescoço e o
meu ombro.
— Você tem um cheiro bom — Andrew murmura, e depois sinto sua
língua contra a minha pele. — E um gosto bom também.
— Eu pensei que você quisesse uma rapidinha.
— Eu também — Andrew confessa. — Mas com você fica difícil, eu
sempre quero mais, nunca quero que acabe.
— Andrew…
— Não, calma, eu só me expressei errado… Não quis dizer que eu
não quero que isso acabe, eu só quis dizer que eu… É só o sexo, é muito bom
e não deveria acabar. Você me entende, não é?
— Andrew, eu estou escorregando…
— Você não é tão leve como parece — ele aponta.
— Tá me chamando de gorda?
— Não! Não foi o que eu quis dizer… Por que as mulheres sempre
distorcem as coisas?
— Foi o que eu entendi, você disse que eu estou pesada demais, então
estou gorda.
— Não. — Ele levanta a cabeça e olha para mim. — Não foi o que eu
disse.
— Não me deixa cair — peço.
— Não vou deixar.
— Andrew, você parou para pensar que nós consumamos nosso falso
casamento?
— Sim, e para felicidade minha e do meu pau a consumação foi
verdadeira.
— Ai, Andrew… Acho que nessa história toda a única coisa
verdadeira é a nossa lua de mel.
— Então a gente tem que aproveitar bastante os dias que temos aqui.
— Eu mal posso esperar para explorar todos os cantos de Paris —
digo.
— E eu mal posso esperar para explorar todas as superfícies de todos
os cantos desse apartamento.
— Andrew!
— O quê? Olha, eu acho que você está adorando essa parede. Vê
como ela tem uma ótima utilidade?
— Ah, sim, ela está impedindo que você me deixe cair estatelada no
chão.
— Não, a verdadeira utilidade dela é manter você segura para que eu
possa fazer outras coisas com você. Como, por exemplo, isso… — Ele abaixa
a cabeça e abocanha meu mamilo, sugando com força. Um gemido
inesperado preenche o ar só para eu perceber que ele vem de mim mesma.
Andrew aplica mais pressão entre o ponto da dor e prazer, e eu me contorço
contra ele. Mas de um jeito inexplicável vejo que estou me aproximando, não
me afastando. Ele se afasta e sorri de um modo safado para mim. — Vê?
Você aprova a utilidade dessa parede tanto quanto eu.
— Andrew, chega de brincadeiras.
— São chamadas preliminares, abelhinha.
— Pula essa droga, então, e faz alguma coisa para acabar com isso.
— Acabar com o que, abelhinha?
— Você sabe!
— Ontem à noite você não teve problemas para se abrir comigo.
— Eu… Eu preciso gozar.
— Você está vermelhinha, é fofinho.
— Andrew! — rosno.
— Ah, vê com o que eu tive que lidar quando você era a pessoa a
fazer as brincadeiras?
— Eu não acredito que você está se vingando de mim!
— Só um pouquinho. — Ele ri. — Quem sabe assim você aprende
que não deve negar nada para mim.
— Andrew Simons, eu vou te dizer uma coisa, e somente uma. Se
você não transar comigo agora, você não vai ter uma boceta pelo resto do
tempo desse contrato! — ameaço.
— Onde nós estávamos mesmo, querida? Ah, sim, bem aqui…
Ele volta a me beijar desesperadamente, me segura com as duas mãos
na minha bunda e me ergue mais um pouco até que eu esteja na altura ideal.
Sinto sua ereção pressionar meu sexo. Estou molhada e pronta para recebê-lo
desde que Andrew teve sua boca sobre mim, porque o efeito é sempre este.
Ele me deixa excitada de uma forma que eu nunca consegui antes. O sexo é
incomparável, quando estou com ele tudo é mais delicioso, mais prazeroso.
Ofego quando ele empurra todo o comprimento duro e grosso dentro
de mim até o fundo. Minha cabeça pende para trás, e um gemido escapa dos
meus lábios. Ele puxa um pouco, e meus músculos se estendem para
acomodá-lo. A fricção é deliciosa e tentadora quando ele volta a empurrar
lento dessa vez, e seus movimentos prosseguem desse jeito. Às vezes tão
lento que ambos gememos sofrendo por mais, e às vezes tão forte, rápido e
duro que o prazer e a dor se misturam.
— Oh, Drew.
— Você gosta assim, querida?
— Sim… Ai, meu Deus, bem assim — gemo.
— Quer mais duro?
— Quero!
Eu tenho certeza de que Andrew vai deixar hematomas na minha pele,
pois ele aperta minhas nádegas com as palmas de suas mãos e me prensa com
força contra a parede de azulejos do banheiro. Mas isso não importa, porque
ele começou a me foder duro. Seus grunhidos se misturam aos meus gemidos
quando ele empurra cada vez mais forte, a ponto de fazer meu corpo saltar
sobre o dele.
Ele ataca a minha boca, morde os meus lábios e suga minha língua.
Apalpa os meus peitos, brinca com meus mamilos, morde e lambe cada um
deles. Tudo isso enquanto empurra o quadril contra o meu e move sua pélvis
contra a minha. Sou fodida impiedosamente, a ponto de ter seu pau enterrado
bem fundo dentro de mim. Sou estirada e preenchida completamente, até
senti-lo em cada lugar do meu corpo.
— Vou gozar, vem comigo, abelhinha, vem comigo.
— Ah, Drew, eu preciso de mais — gemo. — Me dê mais.
Andrew leva a mão entre as minhas pernas e toca meu clitóris já
sensível. Os movimentos circulares de seus dedos provocam uma onda de
estremecimento no meu corpo. Grito até ficar rouca e gozo tão forte que
minha mente nubla por um longo momento. É um orgasmo tão forte que sinto
meus olhos rolarem e depois tudo fica tão leve que sinto que posso estar
flutuando. Andrew ainda empurra duas vezes dentro de mim até chegar à sua
libertação. Finalmente ele me coloca no chão, mas não me solta em momento
algum. Sua cabeça despenca sobre os meus seios, e ali ele descansa. Deixo
minha cabeça pender para trás e fecho os olhos, só para me dar conta de que
ele gozou dentro de mim sem proteção e que o sexo estava se mostrando uma
atividade muito viciante. Talvez Andrew não fosse o único que não quisesse
que aquilo jamais acabasse. Eu também não queria.
— Caramba! — Andrew suspira e levanta a cabeça. Ele me dá o
sorriso mais brilhante e sincero. — Eu quero fazer isso de novo…
— Eu também — murmuro. — Mas primeiro você me prometeu um
tour por Paris.
— Vou te dar um tour em qualquer lugar do mundo em troca de
outras transas como essa.
— Vamos começar por Paris, então, aonde você vai me levar
primeiro?
— Mmm… pra cama?
— Andrew! — Dou um empurrão, mas ele ri e continua me
segurando.
— Primeiro o café da manhã, abelhinha, depois me deixe te
surpreender. — Ele beija meus lábios e depois o topo da minha cabeça. —
Mas eu acho que primeiro temos que terminar esse banho, afinal, desde o
começo era por esse motivo que escolhemos o chuveiro, certo?
— Ah, sim, obviamente foi apenas por este motivo, Sr. Simons —
concordo sorrindo.
Depois que eu deixo Andrew lavar todo o meu corpo, beijar e morder
minha tatuagem de abelhinha pela qual ele parece extremamente atraído,
finalmente nós deixamos o chuveiro. Vestimos nossos roupões, e Andrew diz
que vai até a cozinha preparar nosso café da manhã enquanto eu seco meu
cabelo. Fico em dúvida se o deixo com essa tarefa ou não, afinal, ele não
parece o tipo de cara que sabe cozinhar. De qualquer forma, ele diz que sabe
exatamente o que está fazendo. Então fico no quarto para me vestir e arrumar
meu cabelo.
Quando deixo o quarto mais tarde, o resto do apartamento está
infestado com o cheiro do café da manhã, um cheiro muito bom. Sigo até a
cozinha e encontro a mesa cheia e bem elaborada. Andrew está terminando
de colocar as xícaras quando me vê parada na porta, observando-o. Ele abre
um sorrisão de moleque e faz um gesto com a mão mostrando a mesa.
— O que acha, mademoiselle?
— Está lindo e aparece apetitoso. Só é um pouco difícil de acreditar
que você fez tudo isso em tão pouco tempo.
— Querida, eu sou um mestre da culinária francesa — ele se gaba. —
Vem até aqui.
Caminho até ele, e Andrew puxa uma cadeira para mim. Sento-me e
espero que ele se acomode do outro lado da mesa.
— O que são todas essas coisas? — pergunto indicando as guloseimas
nas travessas sobre a mesa.
— Isto aqui é Croissant. — Ele aponta para uns pãezinhos e depois
para uns bolinhos em formato de concha. — E isso aqui são madeleines, uma
espécie de bolo com manteiga.
— Parece gostoso, vou provar. — Pego um bolinho na mão, ainda
quentinho, e levo até a boca. O gosto é sensacional, simplesmente
maravilhoso, parece derreter na boca. — Mmm… isso é muito bom, como é
que se faz?
— Como é que se faz? — Andrew engole em seco. — Ah, você sabe,
é de manteiga, então vai manteiga.
— E o resto? — pergunto.
— Essas receitas são todas iguais. — Andrew dá de ombros. — O
importante é que você gostou e que eu sou um ótimo cozinheiro.
— A-ham — concordo.
Nem a pau que ele fez essas coisas…
Olho ao redor da cozinha e não vejo um único talher sujo na pia.
Nunca que ele limparia tudo tão rápido. Encontro a lixeira aberta e uma pilha
de embalagens descartáveis com o emblema de uma padaria. Te peguei!
— Prova o suco, eu que fiz também — Andrew diz.
Tomo um gole do suco de limão e quase cuspo tudo. Está azedo!
Esse definitivamente foi ele quem preparou…
— Andrew, por que você insiste em pensar que eu não descubro suas
tramoias?
— Do que você está falando?
— Você não cozinhou nada! Você pediu tudo na padaria!
— O quê? Isso é calúnia!
— Da próxima vez se livra do lixo — respondo apontando a bagunça
que ele deixou exposta.
— Merda… Mas fui eu que fiz o suco!
— Eu sei, está horrível.
Andrew leva a mão ao coração e faz uma careta como se estivesse
machucado.
— Você magoou meus sentimentos, Jamie.
— Espero que isso te ensine que nunca dá certo mentir pra mim!
— Eu só queria fazer algo de bom para você — Andrew assume e
parece completamente sincero. Isso me pega de surpresa.
— Desculpe — murmuro. — É sério, sinto muito. Mas você já está
fazendo muitas coisas boas por mim, Andrew, e mesmo que você tenha
pedido tudo da padaria, ainda é muito gentil da sua parte. Obrigada.
— Só aceito suas desculpas com um beijo.
Arqueio uma sobrancelha.
— Você está se aproveitando — acuso.
— Nada disso, você feriu o cozinheiro que existe em mim.
Levanto da minha cadeira e dou a volta na mesa. Curvo-me para dar
um selinho em Andrew, mas ele me puxa para baixo e me coloca em seu colo
rapidamente. Logo suas mãos travessas estão apalpando meu corpo sob as
roupas e sua boca está atacando a minha. Afasto-o usando toda a minha força.
— Você está se aproveitando!
— Um homem usa todas as armas que tem, Sra. Simons.
Dou um tapa na mão dele e me levanto às pressas.
— Vamos ver Paris, porque eu estou sentindo que se eu não sair deste
apartamento agora, não saio nunca mais.
— Tá legal! — Andrew suspira. — Vamos ver Paris.
***
Andrew me leva primeiro para conhecer a Torre Eiffel. Eu fico
completamente encantada quando descubro que nós vamos subir até o topo
com os ingressos que Andrew comprou. Começo a tremer no momento em
que pegamos o elevador, um pouco é ansiedade e um pouco é meu medo de
altura. Agarro a mão do meu marido e não a solto em nenhum momento.
Quando nós estamos lá em cima, a vista é assustadora e ao mesmo tempo de
tirar o fôlego, de tão belíssima. Sou tomada por uma emoção tão grande ao
pensar que minha mãe esteve ali e agora eu também estou. Não consigo
conter as minhas lágrimas. Vir até Paris era um sonho tão distante que estava
rabiscado em uma simples folha de papel, e agora virou realidade.
Eu costumava balançar a bola de cristal que mamãe me deu até que os
flocos de neve ficassem flutuando ao redor da miniatura da Torre Eiffel.
Sonhava que eu estava lá dentro e que sorria para o céu e dizia à mamãe que
eu finalmente tinha conseguido. E ela sorria de volta para mim, sabendo que
eu estava correndo atrás dos meus sonhos até ser alguém realizada com a vida
que escolhi. Começo a acreditar que a razão para Andrew ter entrado na
minha vida não foi apenas um mero acaso. Estava destinado que ele tornasse
alguns dos meus desejos realidade e que me encorajasse a realizar outros.
— É como você imaginava? — Andrew pergunta ao meu lado.
— Não — murmuro. — É muito, muito melhor.
— Ei — Andrew me chama, e eu olho para ele. — Por que você está
chorando?
— Porque é tudo incrível. — Seco uma lágrima que teima em deslizar
pela minha bochecha. — Obrigada por me trazer até aqui, esse sem dúvidas
era um dos meus maiores desejos. Sem você eu nunca chegaria até aqui,
Andrew.
— Você já me agradeceu. — Andrew me puxa para ele e me abraça
apertado. — Não chora, tá legal? Você sabe que eu não gosto de lágrimas.
— Desculpe.
— Também não precisa se desculpar. Você tem feito muito por mim,
Jamie. Eu só estou encontrando formas de te agradecer. Além disso, é bem
divertido realizar os desejos de outra pessoa.
— Andrew, eu nunca vou esquecer todas as coisas que você tem feito
por mim. Prometo que sempre me lembrarei de você onde quer que eu esteja.
— Por que você está dizendo isso? — Andrew pergunta. — Olha, não
importa onde eu estiver, também não vou me esquecer de você. Acho que
nem se eu quisesse isso aconteceria. De qualquer forma, não é porque nós
temos um contrato agora que depois você tem que se afastar. A gente pode
continuar sendo amigos, não é?
— Amigos?
— Sim, depois do contrato. Claro que você vai ter o seu milhão para
gastar e provavelmente vai sair por aí fazendo um monte de coisas que
sempre quis e não pôde. Mas você não vai embora para sempre, então
podemos continuar sendo amigos. Vamos nos ver outras vezes, Jamie, certo?
— Certo — concordo balançando a cabeça.
— Meu Deus, você vai provocar uma tempestade se continuar
chorando desse jeito. — Andrew segura o meu queixo e levanta minha
cabeça até que eu esteja olhando dentro dos olhos dele. — Por favor, não
chore. Eu sei que é estranho, mas quando eu vejo pessoas chorando eu só
consigo pensar em coisas ruins. Quando meus pais se foram todos choravam,
então eu não consigo associar isso a algo bom, mesmo que saiba que existem
choros de felicidade. Você entende?
— Sim, eu entendo.
— Então me dê um de seus sorrisos, porque eles são mais bonitos que
as suas lágrimas.
Sorrio e abraço Andrew mais apertado para esconder meu rosto no
seu peito.
— Temos muitos lugares para conhecer e apenas três dias — Andrew
diz. — Então, aonde minha esposa quer ir agora?
— Me surpreenda.
***
Nos três dias que passamos em Paris, nós conhecemos a Catedral de
Notre-Dame, o Arco do Triunfo, o famoso Jardim de Luxemburgo, a Praça da
Concórdia, o incrível Panteão e até mesmo o lindíssimo Museu do Louvre.
Usamos a máquina fotográfica que Lorenna nos deu para registrar todos os
momentos. Nenhum deles foi fingimento, nem mesmo os meus sorrisos ou as
caretas e palhaçadas de Andrew. Durante aquele tempo nós curtimos a
viagem como um casal de verdade, não só no passeio como todas as noites,
quando dividíamos a mesma cama.
Cada dia era melhor do que o outro em tudo. Conheci tantos lugares
diferentes e fiquei totalmente fascinada com a cidade. Provamos as comidas
típicas de vários restaurantes e visitamos galerias de arte e cinemas. Todos os
momentos ficaram cravados na minha memória e não sairiam de lá jamais.
Eu guardaria aquela viagem para sempre. E, sem dúvidas, se eu estivesse
casada de verdade, aquela teria sido a viagem de lua de mel mais magnífica
com a qual eu poderia sonhar.
Quando nossos três dias chegaram ao fim, pegamos o jatinho (e eu
nem estava mais com tanto medo) e viajamos para Marselha, que é um lugar
tão lindo quanto Paris. Lá nós ficamos hospedados em um hotel que tinha de
tudo. Eu adorei especialmente o Spa, mas o serviço de quarto era ótimo
também. Na nossa primeira noite Andrew me disse que me levaria para
jantar. Escolhi um dos melhores vestidos e não me arrependi quando
chegamos ao local. Era um barco, nós tivemos um jantar à luz de vela
enquanto a tripulação nos servia. Foi tão romântico que nem parecia algo
planejado por Andrew. Se bem que, agora que eu estava conhecendo meu
falso marido melhor, pude perceber que ele vinha me surpreendendo muito
com as suas ações. Talvez Andrew não se considerasse um cara legal porque
nunca ninguém lhe deu a oportunidade de ser esse tipo de homem. Comigo as
coisas estavam sendo bem diferentes.
Em nosso segundo dia em Marselha, Andrew me levou para conhecer
os principais pontos turísticos. Conheci um forte, um palácio e também várias
catedrais antigas. Aqui também visitamos museus, praças e jardins. Tiramos
fotos em milhares de cantos, compramos lembranças e presentes para dar a
todos os conhecidos e no final da noite recebemos um telefonema de
Elizabeth, que queria saber como as coisas estavam. No fim, ela foi obrigada
a desligar, pois Lorenna e Abigail começaram a dar palpites pelo telefone e
ela estava ficando louca. Para mim e Andrew só nos sobrou rir de sua família
que nem imaginava o quanto estávamos nos divertindo juntos.
Andrew e eu também tivemos outros tipos de aventuras tão boas
quanto as que vivemos na rua. Mas eu gostava mais das que fazíamos juntos
em segredo. Usei todas as lingeries que Abigail me emprestou e tive
momentos muito prazerosos. Andrew era incansável e eu acho que eu era
bem ativa também. Quanto mais tempo pudéssemos estar no beijando e nos
tocando, melhor. Só que isso acabou me preocupando um pouco. Minha
intenção não era me apegar ao Andrew, e em pouco tempo eu já me via tão
viciada nele quanto ele em mim. Eu tinha que tomar cuidado, ou acabaria
descumprindo a promessa que eu mesma pedi a ele. Corria sérios riscos de
me apaixonar.
***
Acordei na manhã de sábado sentindo cócegas no quadril e não
demorou muito tempo para descobrir o porquê. Andrew já estava com a boca
na minha abelhinha, e os dedos em outros lugares. Não tive nem
oportunidade de abrir a boca para dizer qualquer coisa, pois ele me beijou e
engoliu todos os meus gemidos quando cheguei ao êxtase. Suas mãos ainda
circularam por todo o meu corpo e deram atenção a todas as partes de mim.
— Bom dia, Sra. Simons.
— Com certeza é um bom dia. — Sorrio sonolenta.
— Eu achei que você iria gostar de ser acordada pela minha boca.
— E eu gostei.
— Pronta para voltar pra casa?
— Oh, não, será que não podemos ficar aqui para sempre?
Andrew ri.
— Infelizmente não, mas eu prometo que a minha boca vai continuar
acordando você em Nova Iorque também.
Foi a minha vez de rir.
— Eu vou ficar mal-acostumada.
— Não tem problema, eu gosto muito dessa Jamie.
— Andrew. — Levantei-me segurando o lençol ao redor do meu
corpo e sentei-me na cama. — Eu quero tentar uma coisa.
— Ah, é? O que você quer tentar?
— Quero fazer algo para você.
— Vá em frente.
— Você não quer saber o que é? — pergunto.
— Não. — Andrew pisca um olho para mim. — Surpreenda-me.
Estive procurando coragem para fazer isso já há um tempinho, mas
sempre que eu achava que era a hora certa desistia e depois a voz de Abigail
ficava gritando na minha cabeça, dizendo que eu era burra por desistir. Agora
finalmente acho que é o momento ideal. Ainda olhando para Andrew, eu
solto o lençol e deixo que deslize até a minha cintura. Seus olhos vão para os
meus seios, e ele morde o lábio inferior daquele jeito bem gostoso. Sei
exatamente o que está passando por sua cabeça e sei também que quero muito
surpreendê-lo.
Inclino-me para ele e passo uma perna para o outro lado do seu
quadril, ficando montada sobre ele. Curvo-me lentamente para baixo e beijo
seus lábios de leve. Apenas um roçar para lhe dar um gostinho, depois me
afasto. Beijo seu maxilar e seu pescoço que carrega aquele perfume com
fragrância forte e masculina. Continuo descendo e beijo seu peito, a barriga e
assim por diante, para baixo. Beijo o osso do lado direito de seu quadril e
levanto os olhos apenas para pegá-lo me observando com um olhar bem
atento e cheio de luxúria.
Afasto o lençol e continuo descendo com minha boca. Beijo sua
pélvis, e finalmente chego ao seu membro. Eu nunca fiz isso antes, meu
primeiro namorado não era muito fã dessas coisas. Geralmente gozava em
dois, três minutos, sempre achei que tivesse ejaculação precoce, mas ele se
negava a ir ao médico. Durante um ano com ele acho que não experimentei
tanto sexo quanto nesta última semana com Andrew. Além disso, os dois são
muito diferentes um do outro, Andrew é muito mais receptivo neste assunto.
Faço exatamente como Abigail me instruiu, só que agora eu não estou
lidando com um pepino. E, uau! Ela tinha razão, não importa que eles não
sejam muito parecidos, mas em comparação com o tamanho e grossura ela
acertou em cheio. Andrew sabe o que está esperando por ele agora que eu já
estou com minhas mãos ao redor de seu membro, mas eu quero fazer com
que ele se lembre disso toda vez que pensar em mim.
Caio de boca sobre ele, não faço com calma, nem com atenção,
simplesmente me entrego. É como quando o picolé está derretendo e ficamos
tão desesperadas para não perder nenhuma gotinha que o levamos todo à
boca, depois sugamos e lambemos com a maior vontade até ter todo o líquido
capturado. Eu o levo o mais fundo que posso na minha garganta, e Andrew
agarra os meus cabelos e geme o meu nome. Sinto como se fosse um
incentivo ao que estou fazendo certo e o deslizo para fora, para chupar a
cabeça de seu pau.
— Porra, porra, ai, caralho!
Retiro-o da minha boca, mas continuo masturbando-o lentamente com
as mãos. Andrew estremece e deixa a cabeça pender para trás no travesseiro.
— Tá gostoso, meu bem?
— Porra, onde foi que você aprendeu a fazer um boquete desses?
— Foi com uma tal técnica tailandesa — admito.
A gargalhada de Andrew se espalha pelo quarto.
— Tinha que ser Abigail, tinha que ser. Lembre-me de comprar algo
bem caro para agradecê-la.
— Pode deixar — murmuro. — Mas eu ainda não acabei.
— Não?
— Não mesmo. Eu vou te chupar até você gozar na minha boca.
— Ai, caramba… Diz isso de novo — Andrew pede. — Porque essa é
a porra da frase que todo homem na Terra quer ouvir de uma garota.
— Não vou dizer, vou provar.
Levo-o de volta à minha boca e chupo-o todo, levando-o ao fundo da
minha garganta até lágrimas encherem os meus olhos. Estou a ponto de me
engasgar quando Andrew goza com um rugido e o líquido quente desliza pela
minha língua. Eu engulo tudo e depois o lambo todinho para me certificar de
que não deixei uma única gotinha para trás. Por fim, me acomodo novamente
sobre ele e olho para o homem completamente saciado me observando.
— Como eu me saí? — pergunto.
— Estou pensando seriamente em substituir a minha secretária por
você.
— Ah, então a minha boca é melhor que a da Tracy?
— Não, Jamie, você todinha é melhor que qualquer coisa — Andrew
diz.
— Humm, será que isso é um elogio, chefe?
— É sim, um grande elogio, querida. Agora, posso falar uma coisa?
— Sim?
— Vamos nos atrasar para o nosso voo.
— Vamos?
— Sim — Andrew afirma.
— Por quê?
— Porque eu sou obrigado a comer a minha esposa gostosa agora
mesmo.
— Nada disso, Sr. Simons. — Agarro o lençol e levanto-me da cama
rapidamente. — Não podemos nos atrasar de jeito nenhum, você sabe que a
sua vó está… Aaaah! Andrewwww!
É, parece que vamos atrasar…
CAPÍTULO VINTE E DOIS
--—————————————————————————————

Andrew

Estaciono o tesla na minha vaga reservada, desço do carro e dou a


volta para abrir a porta do passageiro. Ajudo Jamie a descer e juntos
caminhamos até o elevador. Hoje ela está usando uma saia preta até a altura
dos joelhos, é bem justa e marca todas as suas curvas. A bunda dela fica
incrível nesse tecido, e eu não tenho certeza se gosto disso ou não. Afinal,
estamos no escritório e todos aqueles vermes podem querer ficar de olho no
que é meu. Pelo menos a camisa de seda branca é de botões, e eles estão
todos fechados, impedindo uma visão maior do seu decote. Não que isso me
conforte de alguma forma, porque não muda nada. Esses saltos pretos ainda a
deixam de matar, e essa boca pintada de vermelho provoca pensamentos
muito pervertidos da minha parte.
O elevador faz sua parada no nosso andar, e Jamie segue caminhando
na minha frente. Discretamente eu dou uma secada no seu traseiro
redondinho e me arrependo por não ter feito uma parada em algum lugar
antes de vir para o trabalho. Talvez eu consiga convencê-la de a gente dar
uma rapidinha no horário do expediente. Eu espero que sim, porque vou ficar
louco se tiver que passar o dia todo na seca sonhando com o que aquela linda
boquinha é capaz de fazer. Jamie para no meio do corredor e dá um olhar
sobre o seu ombro, pegando-me no flagra.
— Você está encarando a minha bunda — ela sussurra.
— Eu sei, a visão aqui de trás é tentadora.
Ela revira os olhos e se vira para ficar de frente comigo.
— Você precisa ser mais discreto, ou todo mundo vai perceber.
— Perceber o quê? — pergunto e dou dois passos até estar
praticamente colado a ela. Minha boca paira sobre a dela quando eu volto a
falar em voz baixa. — Que eu estou louco para foder a minha esposa? Que eu
estou contando os segundos para ter você só pra mim? Que eu sou um marido
muito atraído pela minha mulher? É isso que você quer dizer que todos irão
perceber? Porque se for, é exatamente o que queremos que eles pensem, não
é?
— Andrew, nós estamos no trabalho, eu não quero misturar as coisas.
— Acredite, querida, nós não estamos misturando nada — digo. —
Caso contrário, você não estaria indo para o escritório de Benjamin agora, e
sim para o meu.
— O que há com você? A gente… A gente fez sexo antes de sair de
casa!
— Você provocou tudo isso. Foi você quem me deixou na seca por
um tempão, eu só estou tentando recuperar o sexo perdido.
— Oh, por favor! — Jamie bufa e se vira voltando a caminhar pelo
corredor em direção ao escritório do Benjamin. Paramos em frente à porta
dele. — Tenho que trabalhar agora, afinal, alguém aqui precisa trabalhar.
— Isso é uma indireta, Sra. Simons?
— Não. — Ela se aproxima e dá um beijo rápido nos meus lábios. —
Isso foi uma direta mesmo, uma bem direta, Sr. Simons.
— Só por isso eu vou trabalhar pesado hoje, você vai ver.
— Que bom, é o que todos nós queremos. A Simon’s precisa de um
líder competente, alguém que não esteja aqui só pelas aparências.
— Eu posso ser competente, mais do que qualquer um aqui dentro.
— Eu acho melhor você ir para a sua sala agora, chefe, e me provar
que isso não é apenas mais um de seus papos furados. Agora eu tenho que ir.
— Até mais tarde — digo, e Jamie se vira para abrir a porta, mas eu a
impeço segurando seu pulso. Ela dá um olhar ao redor, assustada, como se
temesse ser pega por alguém. Não há muito tempo para pensar antes que eu a
puxe para os meus braços e beije seus lábios do jeito que uma despedida
entre um casal deve ser. Quando eu me afasto, ela leva a mão aos lábios e me
olha chocada. Dou uma piscadinha e sigo caminhando para a minha sala. —
Querida, se eu provar a você minha competência, você vai ficar me devendo
um boquete.
Ouço sua risada baixa, antes que ela entre no escritório.
Quando chego à minha sala, Tracy ainda não está lá. Vou direto para
o meu escritório, retiro o paletó e o coloco pendurado no cabide. Arregaço as
mangas da minha camisa e sento-me na minha poltrona. Abro meu laptop,
digito minha senha e procuro pelos compromissos na minha agenda. Eu não
costumo fazer muito isso, geralmente passo o meu tempo no escritório
jogando Flappy Bird ou PacMan. Pode parecer que eu sou preguiçoso por
causa disso, mas a verdade é que o cargo que eu exerço aqui dentro não exige
muito esforço. Eu nunca preciso me preocupar com nada, pois meu trabalho é
feito por outras dezenas de pessoas aqui dentro. E se já tem alguém fazendo o
que eu faço, por que eu vou me cansar e me estressar com isso, não é? Tudo
bem, eu sei, não foi convincente. Sou um preguiçoso, admito.
Quando eu era mais jovem, existia uma paixão imensa dentro de mim
pelo que eu fazia. Estudei muito e me formei em dois cursos diferentes, mas
sempre com o mesmo objetivo. Obviamente não fiz administração e
contabilidade para ser veterinário. Não, desde o começo o que eu queria era
comandar a Simon’s. Meu pai trabalhou aqui antes de mim, e ele era um
ótimo funcionário. Eu aposto que se ele estivesse vivo quem assumiria a
empresa seria ele. Eu fui tão apaixonado pelos negócios imobiliários quanto
ele era. Na época em que eu ainda era um estagiário aqui dentro, costumava
comemorar cada cliente que ganhávamos, principalmente quando quem
conseguia esse cliente era eu. Quando vovó achou que eu estava preparado
para exercer um cargo mais alto, ela me transferiu. O problema foi que eu me
aproveitei por estar no comando, fiquei acomodado tendo uma sala e
privilégios que não tinha antes. Eu ganhava um bom salário, e, ainda assim,
vovó sempre bancou todo o resto. Então passei a pensar que não importava se
eu estava me matando no serviço ou não, de todo jeito eu teria tudo o que
quisesse. Eu acho que vovó está certa, eu não mereço mais a Simon’s. Talvez
um dia eu tenha merecido, mas não mais.
Eu não entendo por que faço as coisas dessa forma. Quer dizer… Eu
gostava do meu trabalho, ainda gosto, apesar de não exercê-lo como antes. E
eu também admiro todo o esforço que minha avó teve para manter esse lugar
de pé mesmo depois da morte do meu avô. Eu acho que minha avó é uma
heroína por ter conseguido o reconhecimento que obteve, e ainda acreditar
que todo o seu império pode prosseguir de pé se for colocado nas mãos
certas. Também sei que as mãos certas não são as de Benjamin, ou as de
Olivia. E estou enfiado em um falso casamento, atolado de mentiras, porque
estou tentando obter a Simon’s para mim. Mas será que sou mesmo a pessoa
adequada para esse serviço?
A Jamie tem razão, assim como a minha avó. Essa empresa precisa de
um líder competente. E se eu não trabalhar com esforço para conseguir isso,
então serei um líder por aparência. Assim como Benjamin ou Olivia seriam.
E isso não é bom. Não é bom para a Simon’s, não é bom para a minha avó,
não será bom nem para mim. Eu acho que se eu provocasse a falência da
empresa, ou de alguma forma trouxesse a queda deste império, nunca me
perdoaria. Seria pior do que qualquer merda que eu já tenha feito até agora.
Olho para a tela do meu laptop e vejo minha agenda aberta. Mas não
há um único compromisso agendado, na verdade, nunca teve. Está vazia.
Pego o telefone e disco para a secretária.
— Tracy, venha até o escritório agora — exijo.
— Tá legal, tô indo.
Alguns segundos depois Tracy abre a porta do meu escritório, entra e
fecha assim que passa para dentro. Ela caminha até mim em seus saltos altos
e senta-se com a bunda na beirada da minha mesa, bem na minha frente.
— Você precisa de mim, chefinho?
— É, eu preciso que você faça o seu trabalho direito para que assim
eu possa fazer o meu também.
— Você quer um café? — ela pergunta.
— Não.
— Você quer que eu ligue o ar?
— Não — resmungo impaciente.
— Você quer transar?
— Pelo amor de Deus! — Bato na mesa impaciente e me levanto. —
Não, Tracy, eu não quero transar. Quero que você tire sua bunda de cima da
minha mesa e me explique por que eu estou olhando para a minha agenda e
ela está vazia!
Ela se levanta assustada com o meu tom de voz alterado, inclina a
cabeça e me estuda atentamente.
— Está tudo bem com você, Drew? — Tracy pergunta-me,
preocupada.
— Estaria melhor se eu soubesse sobre a falta de compromissos na
minha agenda — respondo apontando a tela do meu laptop. — E eu já disse
que você deve me chamar de senhor Simons.
— Tudo bem, Sr. Simons. — Ela limpa a garganta ruidosamente e
volta a falar. — Você não tem compromissos na sua agenda porque nunca
teve. Eu já estou trabalhando aqui há várias semanas e você nunca teve um
único compromisso.
— O quê? Por que não?
— Obviamente porque o senhor não comparece ou cumpre qualquer
um deles. Esse caso foi levado até a sua avó, e ela ordenou que seus
compromissos fossem passados para quem realmente está interessado.
— E eu nunca soube de porra nenhuma?
— Como o senhor poderia saber se nunca se preocupou em olhar sua
agenda? — Tracy replica.
— Isso… Isso é inaceitável!
— Já que foi o senhor que tocou no assunto, devo dizer que todos nós
também achamos isso inaceitável. Todos nós estamos aqui fazendo alguma
coisa, alguns têm cargos melhores do que outros, mas todos nós trabalhamos.
Sempre achei injusto que o senhor não fizesse absolutamente nada o dia todo
e ainda recebesse um salário maior do que o nosso.
Encaro minha secretária com vontade de jogá-la pela janela.
— Nós quem, Tracy? De quem você está falando? — questiono.
— De todos com cargos inferiores — ela responde. — E digo todos
mesmo, até as faxineiras. Para a sua informação, antes de Jamie Collins ser
casada com o senhor ela também fazia parte do time da fofoca alheia. Rolava
até bolão para saber quem seria o primeiro a destruir a empresa, a dona Olivia
ou o senhor.
— Era só o que me faltava…
— Senhor Simons, isso é bem compreensível, se o senhor levar em
conta que estamos certos.
— Cala a boca, Tracy — resmungo.
— O senhor vai me demitir? — Tracy pergunta-me receosa.
— Não, eu… Eu não vou demitir você — respondo.
— Posso ir agora?
— Não, nós vamos trabalhar.
— V-vamos o-oquê? — ela gagueja.
— Você me ouviu, vamos trabalhar. Eu quero saber o que aconteceu
com os meus compromissos. Ache a pessoa responsável por eles e os
transfira para mim imediatamente. E, Tracy, eu quero todos, absolutamente
todos eles. Agende tudo, porque quando eu voltar a abrir este laptop
novamente eu quero saber o que tenho que fazer. Você me entendeu?
— Eu acho que sim.
— Então você já pode ir.
— Sim, senhor.
Tracy se vira e sai do escritório. Sento-me novamente e encaro a tela
em branco. Como posso ter tido todos os meus compromissos tirados de mim
e eu nem percebi? A que ponto eu cheguei? Quando foi que passei a ser um
malandro preguiçoso? Que droga, eu preciso mudar isso. Vovó nunca vai me
passar a presidência desse jeito. E, para falar a verdade, eu não mereço a
presidência sendo um babaca que está comendo o salário de quem realmente
está trabalhando. Eu odeio admitir isso, mas acho que sou pior do que
Benjamin. Ou eu era, porque essa fase acabou. Drew Simons está de volta
aos negócios.
Ouço uma batida na porta e logo em seguida Jack coloca a cabeça
para dentro da minha sala. Ele me vê e entra.
— E aí, cara?
— Jack, você sabia que os meus compromissos foram transferidos
para outra pessoa?
— Hãã… É, sabia.
— E você não me contou?
— Você nunca perguntou, eu achei que soubesse. — Ele dá de
ombros.
— Eu não sei… Eu acho que eu sabia, mas não queria saber.
Entende? É como se eu tivesse me acostumado aos poucos com a minha
rotina.
— Drew, digamos que você deixou de ser o cara trabalhador há muito
tempo.
— E por que você nunca me disse algo? Cara, você é meu amigo!
— Drew, não tente colocar a culpa em mim ou em qualquer outra
pessoa. Se você parou de trabalhar foi porque escolheu isso. O tempo todo
você recebeu as reclamações da diretoria, sua própria avó alertou várias vezes
sobre o que estava acontecendo. Você deu as costas para isso e se tornou o
cara que vai para o trabalho para matar tempo. Na verdade, eu sempre achei
sua avó muito bondosa por manter você na Simon’s e pagar o seu salário em
dia mesmo que você não estivesse fazendo merda nenhuma. E antes que você
ache que eu sou um falso amigo, saiba que eu avisei a você o que estava
acontecendo sim. Eu até tentei trazer o trabalho até você, mas tudo o que
você dizia era: “Jack, passa isso para a Tracy, a propósito, quando vamos
sair para pegar mulheres?”.
— Isso é uma grande porcaria… Eu não sei nem o que fazer!
— Posso perguntar o que deu em você para tocar nesse assunto?
— Jack, eu não quero acabar com a Simon’s. Quero herdá-la, quero
ser o presidente, mas não quero destruir a empresa.
— Calma lá, Drew. — Jack caminha até o canto da sala e se joga
sobre o sofá. — Você não vai destruir a Simon’s. Não se você não quiser
destruí-la. Escute, cara, você costumava ser o melhor funcionário aqui dentro.
Você era só um garoto de merda, mas as pessoas te respeitavam. Você
tomava atitudes, sabia se impor diante de todos. Eu não acho que esse cara
dos negócios tenha morrido assim de repente, na verdade eu acho que ele está
aí em algum lugar. E, pelo visto, querendo voltar à tona.
— Não sei como fazer isso, não sei o quanto eu perdi. Caramba, acho
que nem sei mais fazer o meu trabalho.
— Ah, meu caro amigo, parece que você acordou para a vida real. —
Jackson ri. — Preste atenção, comece assumindo os seus compromissos,
compareça às reuniões, traga os clientes de volta para perto de você, ganhe a
confiança dos outros funcionários. Você é o cara, o melhor que eu conheço
para fazer isso.
— Jack, eu não quero receber a Simon’s por ser o neto de Elizabeth,
eu quero receber a Simon’s por ser o melhor funcionário de Elizabeth.
— Manda a ver, então. — Jack se levanta e estende o punho no alto.
Bato com o meu punho no dele, assim como fazíamos quando éramos
pirralhos. — Ah, e como foi a viagem?
— Senta aí, Jack, a gente tem muito que conversar.
— Tá legal. — Ele se senta na cadeira em frente à minha mesa e
inclina-se para frente. — Começa a falar…
— Eu dormi com a minha esposa. Ou melhor, eu transei com a minha
esposa.
Jackson solta uma gargalhada, e eu o encaro sério. Ele para de rir e
arregala os olhos.
— Você tá brincando, né?
— Não, Jack, eu não estou.
— Putz!
— Eu sei, eu sei. Não era o combinado, não estava no contrato, mas
aconteceu.
— Eu não acredito que perdi cem dólares — Jack resmunga.
— Como é?
— Abigail apostou comigo que você ia transar com ela antes do fim
do contrato, e eu disse que isso não aconteceria — Jackson confessa. —
Aliás, obrigado, amigão, por me fazer perder cem dólares.
— Jack, às vezes eu me pergunto se preciso de inimigos tendo você
como amigo — rosno.
— Relaxa, cara, pelo menos você não vai ficar um ano na seca. E
como ela é?
— Ela quem?
— A Jamie, né, idiota? Ela parece aquelas virgens inocentes que não
fazem ideia do que é uma boa trepada.
Coitado, não sabe de nada, inocente… Nem vai saber.
— Ela não é assim — digo. — E não, eu não vou dar detalhes. Deixa
de ser pervertido, estamos falando da minha mulher.
— Você nunca teve problemas em me contar sobre as suas mulheres
antes — Jack diz.
— A Jamie é diferente.
— Drew, o que deu em você? Desde quando alguém é “diferente”?
— Eu não sei, Jack, eu não sei, tá legal? — Solto um suspiro. — Eu
me importo com ela, é só isso.
— Você se importar com alguém já é um caso preocupante.
— Você não a conhece como eu — explico. — Ela é linda, divertida e
completamente maluca. Ela também é ingênua, e a garota mais humilde e
generosa que eu já conheci. Você tinha que ver o olhar dela quando descobriu
que estávamos em Paris, foi como se eu tivesse dado o mundo a ela. Então
sim, eu me importo com essa garota.
— Drew, você está apaixonado? — Jackson pergunta-me sério.
— Eu o quê?
— A-p-a-i-x-o-n-a-d-o — Jackson soletra.
— Não — resmungo. — Não, eu não estou apaixonado. Fizemos um
acordo, lembra? Nada de me apaixonar, além disso, ela também não quer se
apaixonar.
— Você só está esquecendo um detalhe, amigo — Jackson diz. —
Contratos não impedem as pessoas de se apaixonarem e ninguém escolhe se
apaixonar ou não. Simplesmente acontece.
— Não tô apaixonado! — insisto.
— Tem certeza? Porque não é isso que está parecendo.
— Jack, o que você sabe sobre paixão? Por acaso você já se
apaixonou?
— Já — Jack admite.
Meu queixo cai com essa revelação.
— Como assim já?
— Você perguntou se eu já me apaixonei, e eu estou dizendo que sim.
— Por que você nunca me contou? Quando foi? Quem é ela?
— Estamos falando sobre você agora, e não sobre mim — Jack
desconversa.
— Eu sei que eu não estou apaixonado — repito.
— Tudo bem, cara, se você diz… Eu acho melhor eu voltar ao
trabalho, tenho a impressão de que você também quer trabalhar.
— Sim, eu quero — afirmo. Jack se levanta e acena para mim. — Ei,
Jack, espere. Preciso que você faça duas coisas por mim.
— Pode falar.
― Encontre uma boa autoescola e um instrutor para que Jamie possa
tirar a carteira de habilitação. ― peço.
— Ah, ok. — Ele balança a cabeça concordando. — E a outra coisa?
— Matricule a gente, você e eu, em um curso de paraquedismo.
— Paraquedismo? — Jack ri. — Você quer virar o Superman agora?
Porque, se for isso, eu sempre preferi o Batman. Carros são mais seguros do
que sair por aí voando, não seria nada divertido ser atingido por um raio na
cabeça.
— Só faz o que eu disse.
— Eu acho que você tem que aumentar o meu salário! — Jack grita
da porta. — Ninguém me disse que eu teria que voar quando eu aceitei
trabalhar nessa empresa.
Assim que Jack sai, Tracy entra segurando uma pasta nas mãos e
parecendo ansiosa.
— Senhor Simons, eu descobri o que você queria saber — ela diz. —
Já estou com todos os compromissos nessa pasta, vou passá-los para o
computador e depois envio direto para a sua agenda. A propósito, eu não sei
se você tem interesse em saber, mas está acontecendo uma reunião muito
importante esta manhã com nossos clientes japoneses.
— Há quanto tempo? — pergunto.
— Faz meia hora que entraram na sala de reuniões. O senhor Cooper
é quem está fazendo as apresentações.
— Eu acho que nós já ficamos bastante tempo longe das reuniões,
você não acha, Tracy?
— Acho sim, senhor.
— Pegue suas coisas — ordeno. — Vamos conhecer esses japoneses.
***
Quando Tracy e eu fazemos nossa entrada na sala de reuniões todos
nos olham de cima a baixo, surpresos. Inclusive Benjamin e Olivia, que ficam
completamente pasmos. Eu os cumprimento com um aceno e sigo até a
minha cadeira. Sento-me normalmente como se estivesse acostumado a
participar de todas as reuniões. Benjamin desvia seus olhos de mim e
prossegue com a apresentação normalmente. A intérprete continua traduzindo
o que ele está dizendo para as demais pessoas na sala. Meu olhar cruza com o
de Olivia, que está sentada na minha frente. Ela parece prestes a pular no meu
pescoço, mas duvido que faça algo diante de todos. Só então noto a garota
logo atrás dela.
Jamie está aqui, é claro que sim, já que ela é a secretária de Benjamin
agora. Sua postura é profissional enquanto ela parece anotar tudo o que
Benjamin ordena a ela. Seus olhos encontram os meus, e ela me dá um
pequeno sorriso que eu retribuo. Depois volto a prestar atenção no que
Benjamin está dizendo e não preciso ouvir muito para saber que seu projeto é
uma merda. Ele não tem nem ideia do que está dizendo, porque se soubesse
ficaria de boca fechada e esconderia a porcaria de slide que fez. Eu não sei
como esses clientes não saíram correndo ainda, eu sairia. Pego uma caneta
largada sobre a mesa e começo a anotar tudo o que eu faria diferente. Apenas
para o caso de precisarmos salvar esses clientes quando eles cuspirem na cara
de Benjamin.
A apresentação prossegue por mais meia hora, com Benjamin falando
enquanto todos parecem estar praticamente roncando sobre a mesa. O único
prestando atenção é um japonês mais velho que parece interessado no
negócio, mas que não é tão burro a ponto de aceitar o que estão oferecendo a
ele. Ele faz uma pergunta a cada três minutos. Como eu sei? Eu estou
contando o tempo para me manter ocupado, caso contrário, seria bem capaz
de assumir o lugar de Benjamin e mostrar o que é um projeto de verdade.
Mas eu não vou fazer isso, pelo menos não agora. Seria ruim para a minha
imagem interrompê-lo.
— Bom, eu acho que nós vamos fazer uma pausa agora para o almoço
— Benjamin anuncia e, sem mentira nenhuma, ouço um coro de “Graças a
Deus” vindo dos japoneses. Não, eu não falo japonês. Mas o que mais eles
poderiam ter dito, que não fosse “Graças a Deus”?
Todos se levantam e, um por um, eles vão deixando a sala. Eu
observo Jamie caminhar até Benjamin e entregar a ele uma folha com tudo o
que ela esteve escrevendo. Ele sorri para ela, aceita a folha e coloca dentro de
sua pasta. De repente ele coloca a mão no braço dela e, enquanto conversa
com ela, seus dedos deslizam para cima e para baixo, acariciando-a. Eu quase
não acredito no que eu estou vendo, até esfrego os meus olhos para ter
certeza. Mas quando eu volto a prestar atenção, noto a mão dele escorregar
para a cintura dela. Apesar de Jamie dar um passo para trás, ele não a solta.
Eu já estou de pé, com os punhos fechados ao meu lado e caminhando até
eles nesse momento. Só que Olivia chega antes de mim.
— Jamie, esse café estava horrível! — Olivia resmunga segurando a
xícara na mão. — Você quer envenenar os nossos clientes?
— Não fui eu quem fez o café, senhora — Jamie responde. — Na
verdade, já faz algum tempo que eu não faço mais os cafés.
— Mas o seu trabalho era conferir se isso está consumível! — Olivia
reclama novamente. — Além disso, está pelando, pode queimar a língua de
alguém!
— Sinto muito, mas a senhora vai ter que tratar disso com outra
pessoa — Jamie prossegue. — Agora, se me der licença, é o meu horário de
almoço.
— Sua garota petulante!
Eu praticamente corro em direção a Olivia quando percebo o que ela
vai fazer a seguir. Tudo acontece em um piscar de olhos, Jamie se livra da
mão de Benjamin segurando-a e tenta passar por Olivia. É nesse momento
que ela impulsiona a xícara para cima e o líquido marrom escuro vai em
direção a Jamie. Eu a ouço gritar quando ela se dá conta de que Olivia virou o
café em cima dela, o café que estava pelando. Jamie agarra a própria camisa,
que está colada ao corpo, e a afasta de sua pele, tentando em vão não se
queimar.
Empurro Olivia para fora do caminho com um pouco mais de força do
que o necessário. Ela se atrapalha em seus próprios saltos e grita quando
tropeça. Benjamin tenta ajudar Jamie, que está choramingando, mas eu o
empurro para trás também até chegar nela.
— Jamie?
— Oh, meu Deus, Andrew, está tão quente — ela se queixa ainda
agarrando a camisa em suas mãos. Eu me viro e olho para trás, onde
Benjamin está auxiliando Olivia.
— Caiam fora daqui! — esbravejo. — Agora!
— Sinto muito por isso, Jamie — Olivia diz cinicamente. — Fui uma
destrambelhada.
— Olivia, eu juro por Deus que se você não sair agora eu sou capaz
de fazer você engolir essa xícara — ameaço.
— Nós já estamos indo, não é, Ben?
— Para com isso, Olivia — Benjamin retruca. — Você está bem,
Jamie?
— Ela não é problema seu! — cuspo. — Agora saiam daqui!
— Vamos embora, Ben. — Olivia agarra o braço dele. — O
casalzinho quer ficar sozinho.
Assim que eles deixam a sala de reuniões, eu retiro o meu paletó.
Desfaço os botões da camisa de Jamie e ela não reclama quando a ajudo a
secar. Faço-a vestir meu paletó, que fica grande demais nela, mas que serve
para cobri-la. Levanto os meus olhos para o rosto dela e percebo as lágrimas
se formando. Eu odeio vê-la chorar, sem dúvidas é o que eu mais detesto
nela, as lágrimas. Eu queria ter sido capaz de impedir Olivia, mas não fui tão
rápido. Também queria castigá-la por isso e, se ela fosse um homem, eu com
certeza teria feito isso. Mas ela não é. É uma mulher, e eu não machuco
mulheres.
— Sinto muito por isso, querida. — Puxo-a para os meus braços, e
Jamie me abraça forte.
— Ela nunca vai me deixar em paz. — Jamie chora, e seus soluços
são abafados pela minha camisa. — Eu tento, tento, mas ela sempre encontra
uma maneira de me atingir.
— Ela quer atingir a mim, Jamie, é isso o que ela quer — digo. — Ela
machuca você para que eu interfira. Ela está esperando que eu faça algo grave
e seja demitido ou alguma coisa parecida.
— Não, Andrew, você não pode fazer nada. — Jamie funga. — Se
você fizer algo contra ela, pode perder tudo. Tudo o que estamos passando
vai ser em vão, se Olivia conseguir o que quer. Por favor, não faça nada.
— Eu estou tentando, mas a minha paciência está se esgotando,
Jamie.
— Drew, a Olivia vai ter o que ela merece quando chegar o momento
certo. — Jamie se afasta e me dá um sorriso fraco. — Eu acredito que ela vai
pagar por tudo em algum momento.
— Ah, ela vai — afirmo. — Com certeza vai.
— Eu não posso trabalhar com o seu paletó — ela diz olhando para a
própria roupa. — O que eu faço?
— Tira o resto do dia de folga.
— Não, eu quero trabalhar.
— Mulher teimosa — resmungo.
— Quero trabalhar, Andrew.
— Tudo bem, então vamos sair para comprar alguma coisa para você
vestir — digo. — Depois vamos almoçar.
— Parece bom para mim.
***
Levo Jamie até uma loja próximo dali e espero enquanto ela prova
algumas camisas até escolher uma. Ela veste a roupa nova e me entrega o
meu paletó. Depois vamos até um restaurante na esquina e almoçamos juntos.
Eu converso com ela o tempo todo, na maior parte do tempo sobre a nossa
perfeita viagem de lua de mel para Paris. Quero distraí-la do que aconteceu e
sei que falar sobre a viagem é bom. Quando tocamos nesse assunto ela
assume um sorriso glorioso no rosto. Seus olhos ainda estão um pouco
inchados por ter chorado, e isso me deixa muito irritado. Mas ela está certa,
por enquanto não há nada que eu possa fazer para me vingar. Se eu tocar um
dedo em Olivia, e vovó descobrir, pode ser o meu fim na empresa. E não há
uma forma de não me vingar dela se não for enforcando-a.
— Eu queria retornar a Paris, ou mesmo a Marselha. As coisas
estavam tão boas lá — Jamie diz.
— Eu concordo, talvez devamos pensar em uma próxima viagem pra
lá.
— Sério? — Jamie se empolga.
— Claro.
— Eu adoraria.
— Ah, tenho uma novidade pra você — digo.
— O quê?
— Pedi ao Jack para encontrar uma autoescola e um bom instrutor
para você.
— Instrutor?
— Sim.
— Por quê?
— Porque você não sabe dirigir, e eu acho que você deveria saber. Na
verdade, eu tenho certeza que você deveria saber.
— Eu não preciso tirar a carteira, eu nem tenho carro.
— Não importa. Nunca se sabe quando você vai precisar dirigir,
lembra quando fomos para o Texas? Se você soubesse poderia ter levado o
carro também.
— Pensando dessa forma, é verdade.
— Querida, eu sempre tenho razão.
Jamie revira os olhos.
— Mesmo que eu não concorde com isso, eu devo dizer que dessa vez
você fez um argumento muito bom.
— Então você vai aprender a dirigir?
— Vou sim, e obrigada por isso, Andrew. Você não precisava ter
incomodado o Jack com isso.
— Ah, não foi nada, o Jack ama o trabalho dele — comento e penso
em hoje de manhã, quando ele disse que merecia um aumento.
— Certo. Agora eu tenho que perguntar a você algo que está na minha
cabeça desde o momento em que você entrou pela porta da sala de reuniões.
— Se for sobre o boquete, está de pé.
Ela ri e joga um guardanapo na minha direção.
— Não. Eu quero saber o que deu em você para participar de uma
reunião.
— Eu disse pra você que hoje eu ia trabalhar pesado.
— Só hoje?
— Não, eu acho que não. De repente me deu vontade de voltar aos
negócios.
— Isso é muito bom. Estou surpresa, mas feliz pela sua decisão.
— Você também fazia parte do time da fofoca alheia, não é? Quanto
você ganhou no bolão “Quem destrói a Simon’s primeiro”?
— Eu não participei do bolão — ela admite.
— Sinto-me mais aliviado por isso.
— Mas eu ia, só não tinha grana pra apostar.
— Ah, é? — Arqueio a sobrancelha. — Sua abelha perigosa.
Ela sorri.
— Quem foi que te contou essas coisas?
— A Tracy — respondo. — Só pra confirmar, se você apostasse, seria
em quem?
— Obviamente na Olivia, eu não daria uma semana para ela arruinar
tudo — Jamie diz. — E eu acredito que as pessoas podem mudar. Tenho fé
em você, Andrew Simons.
— Eu espero não decepcioná-la, Sra. Simons.
— Você não vai. Ah, olhe a hora. Nós temos que ir, eu não posso
chegar atrasada, e se você quer ser um bom líder também não pode.
— Então vamos.
No caminho de volta para a Simon’s, Jamie e eu passamos em frente a
uma farmácia e uma ideia bem maluca me vem à cabeça, mas uma ideia
extremamente divertida. Eu peço para Jamie esperar do lado de fora e vou até
o farmacêutico e pago por algo que vai mudar a vida de Olivia hoje. Encontro
Jamie na calçada e voltamos a caminhar.
— O que você comprou? — ela pergunta curiosa.
— Tudo bem, eu não quero que você pire — digo. — Lembra quando
você me disse que se um dia eu fosse fazer algo, mas não tivesse certeza se
era certo, eu deveria pedir ajuda?
— Lembro — Jamie murmura. — Ai, pera aí, Andrew… Você está
com cara de quem vai aprontar.
— Preciso da sua ajuda, querida.
— O que você tá pensando em fazer?
— Quero me vingar da Olivia… Não, não é com violência e nada
arriscado que cause minha demissão. Só vamos nos divertir um pouco com
ela.
— O que é, Andrew?
— Comprei laxante e eu preciso que você coloque isso no café dela
enquanto eu a distraio.
— Você é louco! — Ela solta uma gargalhada. — Quer colocar
laxante da bebida da Olivia?
— Vamos lá, Jamie, isso é pouco comparado a tudo o que ela já fez
contra você.
— Andrew, é muito arriscado.
— Eu prometo que não vamos ser pegos. Vamos lá, querida, você
quer ou não se vingar um pouquinho de Olivia? Pense em tudo o que ela fez a
você e tantas outras pessoas dentro da construtora. É até pouco perto do que
ela realmente merece.
Jamie morde o lábio inferior, olha para o chão e de volta para mim.
— Tudo bem — ela concorda. — Vamos fazer isso.
***
Quando voltamos à sala de reunião, Benjamin já está lá organizando
seus próximos slides e Olivia está sentada em sua cadeira lixando suas unhas.
Caminho em direção a ela, dando início ao nosso plano. Olivia se levanta
para ficar cara a cara comigo.
— Escute aqui, Olivia, eu estou cansado de dar apenas avisos! —
sibilo. — Eu disse que você ia pagar se fizesse algo contra a Jamie.
— E o que você pretende fazer? — Olivia provoca.
— Você vai ver, vai ter volta! — esbravejo. Percebo Benjamin se
aproximando de nós e Jamie caminha discretamente até o outro lado da sala,
onde estão as xícaras e o café.
— Ei, Andrew, você não vai querer fazer nada contra a Olivia, se
acalme, cara — Benjamin interfere.
— Fica na sua — aviso. — Eu estou de olho nos dois, na verdade.
— Ah, que papo furado — Olivia bufa. — Andrew, por que você não
desiste dessa farsa toda que criou e deixa o Ben assumir a presidência? Todos
os seus problemas vão terminar, assim como os da Jamie.
— Nunca, eu nunca vou ceder a vocês dois. — Olho sobre o ombro
de Olivia e vejo Jamie despejando o conteúdo em uma xícara. Em seguida ela
se vira e volta discretamente para o seu lugar. Deu certo.
— É uma pena para você, porque nós vamos ganhar.
— Isso é o que veremos. — Dou as costas para Olivia e vou para o
meu lugar, em seguida a sala começa a encher novamente. Olho para Jamie, e
ela pisca para mim.
A apresentação reinicia e Benjamin volta ao falatório. Jamie começa a
servir os cafés, mas eu fico mais interessado no de Olivia. Ela bebe o
primeiro gole quase que na mesma hora em que Jamie larga a xícara na sua
frente. Eu não sei por que, mas eu já estou rindo por dentro antes mesmo de o
verdadeiro show começar. Dou um gole no meu próprio café para disfarçar o
sorriso no meu rosto. Não quero que Olivia perceba, pelo menos, não agora.
Olivia termina de beber a primeira xícara em menos de dez minutos, e
logo ordena que Jamie traga outra. E assim a reunião segue. Eu não estou
dando a mínima para as merdas que Benjamin está despejando. Eu só anoto o
que é realmente importante, ou seja, as dúvidas que o japonês velho tem. Ele
é a cabeça do negócio, pelo que eu percebi, e deve ser conquistado primeiro.
Mas é claro que Benjamin não notou isso.
Olivia começa a se contorcer na cadeira quarenta e sete minutos mais
tarde. Sim, eu estou contando. O rosto dela assume uma careta, e ela parece
tão branca quanto cera. Ela para de prestar atenção na apresentação e começa
a olhar para um ponto fixo da mesa. Sua expressão muda, e ela se mexe outra
vez. Suor se forma na sua testa, e ela começa a olhar ao redor planejando sua
fuga. De repente, ela empurra a cadeira para trás e causa um barulho
estrondoso, chamando a atenção de todos.
— Desculpe — ela murmura. — Com licença, eu preciso sair.
— Olivia, eu estou no meio da apresentação — Benjamin diz.
— Eu me lembrei de algo importante — ela insiste.
— Olivia, você está bem? O que poderia ser mais importante que a
apresentação?
— Benjamin, querido — Olivia diz entredentes. — Eu… Preciso…
Sair… Agora.
— O que está havendo? — Benjamin se aproxima dela e uma careta
se forma em sua expressão. — Meu Deus, que cheiro é esse? Tem um bicho
morto aqui dentro?
— Benjamin!
— Senhores, perdão, eu acho que deve haver algo podre aqui dentro
— Benjamin diz, e a tradutora repassa a mensagem.
Eu já estou gargalhando na minha cadeira e me contorcendo de tanto
rir.
— Problemas com o intestino, Olivia? — pergunto.
— Oh. — Olivia me lança um olhar de morte. — Então foi você!
— O que ele fez? — Benjamin pergunta.
— Oh, meu Deus — Olivia geme. — Eu preciso ir ao banheiro,
Benjamin!
— Agora?
— É, agora, seu paspalho! — ela grita assustando todos na sala.
— Senhores, a reunião está encerrada! — Benjamin anuncia e as
pessoas começam a sair rapidamente da sala de reunião infestada de maus
odores.
Levanto-me às pressas, encontro Jamie do lado de fora rindo até ter
lágrimas nos olhos. É o tipo de lágrima que não me incomoda. Ela para de rir
e praticamente pula em cima de mim. Eu a seguro enquanto ela passa as
pernas ao redor do meu quadril, sem se incomodar com outras pessoas ao
redor, quando toma a iniciativa de me beijar.
— Andrew, essa foi a melhor vingança de todos os tempos — ela diz
e me dá outro beijo casto. — Eu acho que Olivia não vai sair tão cedo do
banheiro.
— Caramba, se você for me agradecer sempre assim, eu acho que vou
provocar outros acidentes em Olivia.
Ela sorri ainda mais.
— Meu horário de trabalho acabou, se você também estiver livre, eu
estive pensando que talvez você queira ir para casa comigo.
— Eu não tenho mais nada para fazer aqui hoje.
— Sabe aquele boquete? — ela sussurra no meu ouvido. — Eu acho
que você fez por merecer.
— Tá brincando?
— Eu não brinco em serviço, amor — Jamie sussurra.
Ah, meu pai amado, obrigado! Obrigado!
CAPÍTULO VINTE E TRÊS
--—————————————————————————————

Jamie

— Jamie, antes de ir, será que você poderia levar esses documentos
até a sala de arquivos? — Benjamin pergunta-me parado na porta com a pasta
já estendida na minha direção. Coloco a bolsa sobre o meu ombro e me viro
com um sorriso no rosto.
— Claro, Sr. Cooper.
— Bem, obrigado — ele agradece e me entrega a pasta. Viro-me para
sair, mas ele segura o meu braço. — Você quer uma carona?
— Como?
— Eu estou indo para outro lugar e vou ficar próximo à mansão.
Pensei que talvez quisesse uma carona.
— Não, obrigada — agradeço.
— Não seja tímida, eu posso te dar uma carona. Assim também posso
pedir desculpas pela maneira como Olivia tratou você.
— Senhor Cooper, não precisa me pedir desculpas, meu problema é
com Olivia, não com o senhor — respondo. — E eu realmente agradeço pela
carona, mas eu vou embora com o meu marido.
— Ah, seu marido, é claro. — Ele balança a cabeça, solta o meu
braço e me lança um estranho sorriso. — Eu não sei se algum dia vou me
acostumar à ideia de que Andrew é um homem casado, ainda mais com
alguém como você.
— Alguém como eu? O que exatamente isso quer dizer?
— Sendo completamente sincero, Jamie, eu não acho que Andrew
mereça você. — Benjamin se aproxima. — Eu acho que ele não tem ideia do
que tem nas mãos, Andrew não é um cara que sabe valorizar pessoas como
você.
— Eu não sei o que está querendo dizer, Sr. Cooper. Andrew me
respeita e me faz feliz, acredito que isso seja suficiente.
— Eu acho que você sabe exatamente o que eu quero dizer. —
Benjamin dá outro passo na minha direção, e eu dou dois para trás.
— Eu tenho que ir — digo esquivando-me.
— Boa noite, Jamie — Benjamin se despede. — Até amanhã.
Corro para a sala de arquivos louca para me ver longe de Benjamin.
Devolvo a pasta à gaveta de documentos e vou em direção ao escritório de
Andrew. Vejo Tracy sentada atrás de sua mesa, com o telefone no ouvido,
conversando com outra pessoa. Paro em frente a ela e aguardo que encerre a
chamada. Quando ela termina, devolve o telefone ao gancho e sorri
abertamente para mim. É tão estranho pensar que algumas semanas atrás eu a
peguei no escritório de Andrew em um momento tão íntimo. E agora estou
casada com o cara, sorrindo para a secretária dele.
— Jamie, em que posso ajudá-la? — pergunta-me toda sorridente.
— Eu vi ver o Andrew, ele me disse para procurá-lo quando eu
terminasse o trabalho.
— Ah, então é só entrar — ela responde como se fosse óbvio. — O
Drew permite o seu acesso, da dona Abigail e do Jackson sem precisar de
permissão.
Não me passa despercebido o uso do apelido de Andrew por Tracy,
mesmo que ele já tenha dito para que ela o chame pelo sobrenome. Ok, talvez
eu tenha um pouquinho de problema com essa relação afetuosa do meu
marido com a secretária.
— Ok.
— Você quer que eu te acompanhe?
— Não, obrigada — agradeço. — Vou entrar.
Dou duas batidas de leve na porta e entro. Encontro Andrew no meio
do escritório, mexendo no que parece ser a maior e mais bonita maquete que
eu já vi. Ele larga o que quer que esteja fazendo e sorri, acenando para que eu
me aproxime.
— O que você acha? — pergunta-me ansioso, apontando para a
maquete.
— O que é isso?
— Não é óbvio? — Ele franze o cenho enquanto comtempla sua
maquete. — É um resort!
— Uau — murmuro. — Tão grande assim?
— Com certeza é um dos resorts mais completos já planejados — ele
diz orgulhoso.
— Isso é um trabalho? — pergunto.
— Não, querida — Andrew responde. — Este é o trabalho, tipo um
trabalho milionário.
— Você mal retornou as atividades e está planejando negócios
milionários?
— Na verdade, esse projeto era de outra pessoa, mas ele falhou —
Andrew explica parecendo até feliz com isso. — Então eu roubei o cliente
para mim e vou mostrar isso. Porque isso aqui, querida, é exatamente o que o
meu cliente vai querer.
— Você está tão confiante.
— É porque eu sei o quanto sou bom no que faço — Andrew diz
aproximando-se. Ele para na minha frente e pousa o polegar sobre o meu
lábio inferior. Observo-o morder o próprio lábio. — Aliás, eu sou bom em
todas as coisas que eu faço.
— Não duvido disso, Sr. Simons.
— Lembra-se da reunião de ontem?
— Lembro, nunca vou esquecer.
— Lembra-se daquele senhorzinho japonês?
— O Sr. Matsuhara?
— Exatamente.
— Sim, eu lembro. Benjamin estava muito eufórico com todo o
projeto, pelo que eu ouvi era algo muito importante. Matsuhara deve ser um
homem muito rico, e acho que é o mais importante clientes da Simon’s.
— Na verdade, o Sr. Matsuhara odiou a apresentação de Benjamin —
Andrew revela. — Ele insultou a Simon’s, disse que não temos funcionários
competentes e que procuraria outra construtora para os seus serviços.
— E por que você parece feliz com isso?
— Porque eu já sabia que isso iria acontecer — Andrew conta. —
Então, hoje pela manhã, logo depois que ele dispensou Benjamin, eu fiz uma
ligação. Consegui um almoço com o Sr. Matsuhara e o convenci a ver um
novo projeto, só que dessa vez feito por mim.
— Oh. — Sorrio. Andrew roubou o cliente de Benjamin! — Então ele
quer um resort?
— Sim, ficará localizado em Miami, perto da praia.
— A maquete está incrível — elogio. — Mas eu acho que mais
incrível é você. Andrew, você não só voltou a trabalhar, como conseguiu
manter na Simon’s um cliente que Benjamin já teria perdido. E você está tão
empolgado com esse projeto, eu não me lembro de já ter te visto trabalhando.
Estou impressionada.
— Gosto de impressionar você — ele admite e se curva para beijar
meus lábios de forma casta. — De todas as maneiras, eu adoro impressionar
você.
— Eu estou elogiando você e o seu trabalho e você está pensando em
outras coisas.
— Não, eu estou focado no trabalho — Andrew diz beijando o meu
pescoço. — Mandei organizarem um jantar.
— Ah, é? Que tipo de jantar?
— Bom, quando Jack mentiu para a vovó dizendo que eu era outro
cara, que eu estava me interessando mais pelos negócios, ele teve uma ideia
louca de dizer à vovó que eu estava planejando um jantar para todos os
nossos clientes — Andrew conta. — E eu parei para pensar sobre isso, acho
que na verdade é uma ótima ideia. Precisamos fortalecer nossa relação com
nossos clientes. Acho que um jantar seria uma boa forma de fazer isso.
— Concordo.
— Além disso, a Simon’s precisa passar a imagem de que continua
sendo uma empresa séria, competente e capaz de qualquer coisa. Mesmo sem
a vovó na diretoria. Assim quem sabe nossos clientes possam continuar
confiando no nosso trabalho.
— Eu sabia que havia um homem inteligente aí dentro, Sr. Simons.
— Você não viu nada ainda, mas terá a oportunidade de ver —
Andrew diz. — Minha esposa precisa me acompanhar nesse jantar. Preciso
que esses clientes me vejam como alguém muito melhor que Benjamin e
Olivia. Eu e você, Jamie, nós temos que convencê-los de que somos
melhores.
— Isso é fácil — digo. — Você é melhor do que Benjamin, e Olivia
não tem quaisquer chances.
— Diz isso de novo — ele pede.
— O quê?
— Que eu sou melhor que Benjamin.
— Você. É. Melhor. Que. Benjamin. — Dou um beijo nele, e Andrew
me segura pela cintura aprofundando nosso beijo.
— Gosto da sua sinceridade, poucas pessoas acreditam em mim como
você.
— Talvez essas pessoas não tenham conhecido você tão bem quanto
eu — digo. — Você sempre se manteve muito afastado e, sinceramente,
nunca tentou passar uma boa imagem. Mas eu acredito, sim, que você pode
mudar. Já está mudando.
— Posso te contar um segredo? — ele sussurra.
Balanço a cabeça confirmando.
— Pode.
— Você vai guardá-lo? — Andrew insiste.
— A sete chaves — prometo.
— Quando Jack inventou aquela mentira, eu mergulhei de cara nessa
bagunça. Eu comecei a inventar tantas coisas com um único objetivo:
conseguir a presidência da Simon’s, porque desse jeito eu conseguiria o
poder que eu vinha querendo há tanto tempo. Só que agora eu não quero mais
isso, pra mim isso não é o suficiente…
— Então o que você quer?
— Eu quero mudar, Jamie — Andrew confessa. — Eu sempre vou ser
um cara meio errado, não vou conseguir a perfeição. Mas eu quero pelo
menos ser digno do que estou pedindo. Mas isso fica só entre mim e você, tá?
— Andrew, você não precisa mudar. Eu sei que todos estão te
pedindo, até eu pedi por isso. — Olho nos olhos dele. — Mas eu descobri que
você do jeito que é já é uma pessoa digna não só da sua herança, como de
muitas outras coisas. Você é gentil, atencioso e bondoso. Precisa trabalhar
um pouquinho na honestidade, e talvez na humildade. Mas se hoje você me
perguntasse se deveria mudar, eu diria que não. Seja o homem que você já é,
mas não aquele das aparências, seja o verdadeiro Andrew. Aquele homem
que comprou uma casa para a minha família, aceitou pegar um gatinho de rua
e está realizando todos os desejos de uma pobre garota. Esse é o verdadeiro
Andrew que eu enxergo.
Ele sorri para mim.
— Meu Deus, como eu te… — Andrew pigarreia. — Como eu te
adoro.
— Eu também adoro você.
— Você já terminou o serviço? — ele muda de assunto e se afasta
para vestir o paletó.
— Sim.
— Então é melhor irmos.
— Claro.
Andrew me acompanha até o carro e nos conduz para casa. Nossa
viagem é rápida, e silenciosa. Eu não sei o que houve com ele, mas de
repente ficou calado. Quando chegamos, ele abre a porta para mim
educadamente, e seguimos juntos para a entrada da mansão. No momento em
que pisamos no hall, Abigail aparece nas escadas. Eu levo o maior susto
quando a vejo correr na nossa direção e se jogar contra o peito de Andrew,
chorando desesperada. Não tenho reação alguma, simplesmente fico parada
no meu lugar como uma estátua enquanto observo Andrew abraçá-la com o
mesmo espanto na expressão e sem entender nada. Eu nunca a vi chorar desse
jeito e aposto que pela maneira como Andrew está ele também nunca a viu
assim. Abigail não diz nada, ela apenas chora, soluça e balbucia palavras
incoerentes.
— Abby, o que está havendo? — Ele tenta afastá-la, mas ela o segura
ainda mais forte. — Precisa me dizer o que está acontecendo! Pelo amor de
Deus, Abigail, por que está chorando?
— Ela… ela… quer… morrer! — Abigail grita chorando ainda mais
forte.
Oh, meu Deus…
— Quem quer morrer? — Andrew insiste sacudindo-a. — Abigail,
quem quer morrer?
Abigail afasta a cabeça do peito de Andrew, engole em seco e olha
para mim.
— A vovó — murmura. — Ela está muito doente, Andrew, ela mentiu
para nós por muito tempo. Ela tem câncer, e ela vai morrer.
— O quê?
— A mamãe sabia o tempo todo, Andrew! — Abigail se afasta, ainda
abalada, e com lágrimas escorrendo pela bochecha. — Você acredita que já
faz quase um ano que vovó está com câncer e não está fazendo nenhum
tratamento? E a minha mãe sabia de tudo!
— Onde está a tia Lorenna? — Andrew pergunta impaciente. — Eu
quero saber o que está acontecendo aqui de verdade.
— Não há mais para saber, Andrew — Abigail diz. — Eu chamei a
tia Eleonor e Olivia, nós precisamos tomar uma providência. Juntos vamos
convencê-la a se tratar, e não podemos contar com a ajuda da mamãe. Todo
esse tempo ela sabia e não nos disse nada. Inclusive está apoiando essa ideia
ridícula da vovó de não querer se tratar!
— Abigail, onde elas estão? A vovó e tia Lorenna? — Andrew
pergunta.
— Estão lá em cima, vovó não está muito bem — Abigail conta. —
Mas está se negando a ir ao médico, ela diz que não tem nada para fazer lá.
— Vamos subir.
Acompanho Andrew e Abigail, que sobem as escadas feito dois
furacões. Andrew praticamente estoura a porta do quarto de sua avó quando
ele entra. Vejo Elizabeth deitada na cama, ela parece muito fraca, mas bem
lucida quando faz esforço para se sentar. Lorenna está ao lado dela e levanta-
se apressada quando nos vê.
— Já abriu a boca, Abigail? — Lorenna se dirige à filha em tom de
acusação.
— O que está acontecendo, tia Lorenna? — Andrew pergunta. —
Abigail me contou a versão dela muito rapidamente. O que a vovó tem?
— Andrew, não fale como se eu não estivesse aqui — Elizabeth o
repreende.
— Vó. — Andrew caminha até ela e senta-se no espaço vazio ao seu
lado na cama. — Conta pra mim, o que está acontecendo?
— Ela está cansada, Andrew — Lorenna diz. — Talvez seja melhor
conversar outra hora.
— Não — Elizabeth murmura. — Já escondemos isso bastante tempo,
minha filha, acho que chegou o momento de os meus netos saberem também.
— Eu estou ouvindo, vó, me conte — Andrew pede.
— Querido, há mais ou menos um ano eu descobri que sofro de uma
doença grave — Elizabeth começa. — Eu tive tanto medo, Andrew, você não
tem ideia do quanto. Fiquei apavorada por saber que talvez eu deixaria
minhas filhas e os meus netos sozinhos. O médico me disse que se eu
começasse o tratamento imediatamente talvez conseguisse bons resultados,
pois apesar de o meu tipo de câncer ser muito perigoso, ele ainda estava em
um estágio possível de cura. Quando cheguei em casa, só consegui chorar e
chorar. Fiquei completamente perdida, não sabia como agir. Consegui me
recompor, procurei conhecer mais sobre a doença, queria saber o que
exatamente eu tinha. Visitei hospitais e grupos de apoio, onde conheci
pessoas que foram curadas e outras que estavam sofrendo com a mesma
doença que a minha.
— Vó — Andrew murmura com a voz embargada. — Por que nunca
disse nada?
— Não acabei ainda, me escute — ela prossegue. — Eu vi gente ser
curada e vi pessoas morrerem durante o tratamento. Eu vi pessoas fortes
querendo lutar pela vida e outras que achavam que estavam prontos para
partir. Eu não conseguia decidir quem eu era no meio de tanta gente. Então eu
tentei viver fingindo que estava bem. Segui com a minha vida, tentei colocar
na minha cabeça que eu estava perfeitamente saudável, mas eu não estava.
Meses depois, sofri um desmaio, e, dessa vez, Lorenna estava comigo quando
visitamos o médico. Ela soube da verdade por ele, que ressaltou que
precisávamos começar o tratamento imediatamente, se eu quisesse ter alguma
chance de cura. — Elizabeth respira fundo e olha na direção da filha. —
Abigail, não culpe sua mãe por esconder isso de vocês, pois foi um pedido
meu. Lorenna, quando soube, ficou desesperada como vocês e quis iniciar o
tratamento imediatamente. Mas eu não quis…
— O quê? — Andrew se levanta rapidamente e eleva a voz. — Como
assim, não quis?
— Lembra quando eu disse que conheci pessoas que queriam lutar, e
outras que simplesmente aceitavam a doença? Eu descobri que eu me
encaixava nesta segunda opção. Andrew, querido, sou uma mulher velha. Eu
fui criança, fui adolescente, adulta e agora sou uma senhora. Eu me casei,
amei, tive filhos e netos. Construí um patrimônio e fui muito feliz. Fiz tudo o
que queria na minha vida, sou completamente realizada. No primeiro
momento, eu tive medo porque não queria vocês sozinhos, não queria
abandoná-los. Mas depois pensei na possibilidade de reencontrar o meu
marido e meu filho, e tudo mudou. Sinto tanta falta deles, mais do que você
poderia imaginar. Sei que quando eu for, vou vê-los novamente. E é isso o
que eu quero. Enxerguei na minha doença não um final, mas o começo de
algo novo. Você me entende, Andrew?
— Eu entendo que a senhora está completamente louca! — Andrew
grita, alterado. — Morrer para encontrar o meu avô e o meu pai? O que a
senhora tem? Isso é um absurdo!
— Não diga isso, Andrew — Elizabeth implora. — Não me chame de
louca, porque eu estou completamente lúcida. A vida é feita de escolhas, e eu
escolhi a minha. Eu não estou pedindo que você aceite, não vou mudar de
ideia. Voltei ao médico faz pouco tempo e estou em um estágio muito
avançado da doença agora.
— Estágio avançado? — Andrew repete caminhando de um lado para
o outro pelo quarto. — Que porra tudo isso significa?
— Isso significa que ela pode fazer um tratamento — Lorenna
responde.
— Então você vai se tratar! — Andrew ordena. — Eu não me importo
se você não quer, eu não vou te deixar morrer e não fazer nada para mudar
isso. A senhora não deve estar pensando direito para ter decidido algo assim.
Mas não se preocupe, eu vou fazer o que é certo.
— Você não entende, Andrew — Elizabeth replica. — No estágio
avançado significa que tudo o que eu posso fazer é um tratamento paliativo.
— E o que é isso?
— Isso é um tipo de tratamento que pode diminuir os sintomas da
doença, até que ela venha a falecer — Lorenna completa. — Eu procurei
todos os médicos possíveis, Andrew, juro que tentei fazê-la mudar de ideia.
Mas é tarde demais, a mamãe tem câncer de pâncreas. Ela pode até fazer
cirurgia, quimioterapia ou que for, mas os médicos afirmaram que não há
chances de ela conseguir.
— E eu nem quero. — Elizabeth interfere. — Não quero passar o
tempo que ainda tenho em um hospital. Quero ficar na minha casa, cercada
pela minha família, pelo tempo que ainda me resta. Lorenna aceitou isso, e eu
peço que vocês também aceitem.
— Nunca. — Andrew balança a cabeça. — Está ouvindo isso, vovó?
Nunca! Não vou aceitar essa merda de desculpa! Eu não acredito que ouvi
toda essa bobagem de querer morrer! Você deveria querer ficar ao nosso
lado! A senhora sempre foi forte, a mulher mais forte que eu já conheci, e não
vai lutar?
— Coloque uma coisa na sua cabeça, Andrew! — Elizabeth se altera
começando a chorar. — Eu quero isso!
— Eu não vou ficar aqui, sob o mesmo teto que a senhora, para vê-la
morrer — Andrew diz virando-se para sair. — Sinto pena de você por desistir
assim de si mesma, de mim e dos outros.
— Concordo com Andrew — Abigail fala, ela já está mais contida. —
Está desistindo não só de você, vovó, como da gente também.
— Vocês já ouviram o que tinham para ouvir — Lorenna diz. —
Agora saiam e deixem sua avó em paz.
— Não precisa falar duas vezez — Abigail resmunga e deixa o quarto
pisando duro. Andrew lança um último olhar para sua avó e também se retira.
Eu faço menção de ir junto quando ouço Elizabeth murmurar o meu nome.
— Jamie? — ela repete um pouco mais alto.
— Senhora?
— Pode ir, Lorenna — Elizabeth dispensa a filha. — Quero ficar a
sós com a Jamie.
— Tudo bem. — Lorenna beija a bochecha de sua mãe e se afasta. —
Depois tente descansar.
— Sente aqui, querida — Elizabeth pede, assim que Lorenna sai.
Caminho até lá e sento-me ao lado dela. — Como você está?
— Eu? — Sorrio sem quaisquer resquícios de alegria. — Estou bem,
dona Elizabeth, obrigada. Mas eu quero saber, como a senhora está?
— Aliviada — ela admite. — Escondi esse segredo por muito tempo,
estava na hora de eles ouvirem tudo.
— Eu nunca poderia imaginar que a senhora escolheria isso — digo.
— Mas posso compreendê-la, entendo seus motivos e, assim como Lorenna,
apoio sua decisão. Não que tenha algum valor, mas quero que a senhora saiba
mesmo assim.
— Seu apoio tem muito valor, minha querida. Eu queria tanto que
Andrew e Abigail entendessem também. Eu não estou desistindo deles, eu
nunca faria isso. Em nenhum momento desisti, mesmo quando o amor da
minha vida se foi eu continuei sendo firme. Mesmo depois que o meu
precioso filho se foi eu continue sendo firme. Não parei de lutar e não vou
parar nunca. Eu só queria que eles entendessem que já vivi o suficiente,
cumpri minha missão, agora quero só descansar.
— Dona Elizabeth, a minha mãe era uma lutadora. Quando ela estava
perto de partir, ela me disse que não estava com medo de morrer. E eu sabia
que ela estava falando a verdade, eu podia ver nos olhos dela que ela estava
pronta — conto. — Ela disse que se sentia preparada porque já havia feito
tudo o que podia na vida, se considerava uma mulher especial por toda a
realização que teve. Então eu entendo a senhora, quando a olho para, vejo o
mesmo brilho que minha mãe tinha. E é por isso que a apoio.
— Obrigada, querida.
— E não se preocupe com Andrew e Abigail — prossigo. — Eles a
amam muito e não querem perdê-la. Por isso não aceitam, por isso não
compreendem seus motivos. No fundo eles a estão apoiando também, porque
eles querem para a senhor, o que você quer para si mesma.
— Você é uma boa garota, Jamie. — Elizabeth sorri. — Vou
descansar em paz sabendo que o meu menino tem você. Promete para mim
que mesmo quando meu Andrew for um bronco, um teimoso como está
sendo agora, você ainda vai estar ao lado dele? Ele vai sofrer muito quando
eu for, preciso que alguém esteja lá por ele.
— Eu prometo, Elizabeth. — Engulo em seco. — Prometo que estarei
com Andrew.
— Jamie, eu tenho medo que Andrew tenha falado a verdade quando
disse que não ficaria sob o mesmo teto que eu. Eu sei que não posso te pedir
isso, mas ainda assim vou pedir. Tente fazer com que o meu neto fique, eu
quero que ele esteja perto de mim até meu último suspiro. Andrew não é
apenas um neto, é um filho para mim.
— Eu vou tentar — prometo. — Agora acho que a senhora deve
descansar.
— Eu vou.
— Boa noite — despeço-me.
Deixo o quarto de Elizabeth com um grande aperto no peito. Nunca
pensei que seria esse o fim que ela escolheria, mas, como eu disse,
compreendo e apoio sua decisão. Escuto vozes vindo do andar de baixo e vou
até a escada espiar. Eleonor, Saul, Olivia e Benjamin estão lá embaixo
conversando com Lorenna, que provavelmente está contando tudo a eles
nesse momento. Eu não quero que eles me vejam, então vou para o meu
quarto, à procura de Andrew.
Tranco-me lá assim que entro e encontro duas malas abertas sobre a
cama. As roupas de Andrew estão jogadas de qualquer forma como se ele
estivesse querendo fugir. Lembro-me da promessa que fiz a Elizabeth apenas
alguns segundos atrás e vou à procura dele. Encontro-o no banheiro, entro tão
silenciosamente que ele não me vê. Uma cortina de vapor está ao seu redor,
enquanto a água cai sobre seu corpo. A cabeça está apoiada contra a parede
de azulejos, e eu consigo sentir o quanto ele está sofrendo.
Retiro minhas próprias roupas com cuidado para que ele não me
escute. Entro devagar sob o jato de água e o abraço apertado por trás. Andrew
não emite um som e não faz nenhum movimento. Descanso a minha cabeça
contra suas costas e também não digo nada. Apenas o seguro, desse jeito bem
apertado, para que ele saiba que não está sozinho. Eu não sei quanto tempo se
passa até que ele leva as próprias mãos sobre as minhas e dá um aperto
acolhedor.
— Você vai ficar bem — murmuro.
— Não vou — Andrew protesta em voz baixa. — Sem ela, não ficarei
bem.
— Todos partem uma hora, Andrew.
— Mas ela não precisa partir agora, Jamie, ela ainda tem uma escolha.
— A escolha que restou a ela não é boa — digo. — Você a escutou,
ela não quer morrer fazendo tratamento paliativo.
— Você também está contra mim?
— Não. — Beijo as costas dele. — Eu estou com você, mas
compreendo os princípios dela.
— Não sei do que você está falando, não sou como tia Lorenna ou
você. Ela está desistindo, isso é tudo o que eu sei.
— Andrew, você por acaso tem ideia do que é ter câncer? —
questiono. — Você pode imaginar o quanto de dor e sofrimento ela já teve?
— Não. — Ele balança a cabeça. — Mas quem é você para me
perguntar isso? Você tem ideia do que é essa doença?
— Minha mãe morreu de leucemia — conto a ele. — Eu tenho sim
ideia do que é essa doença, tenho mais do que você imagina.
— Sinto muito. — Andrew se vira e olha no fundo dos meus olhos.
— Desculpe, eu não sabia.
— Está tudo bem.
— Sua mãe também desistiu?
— Bem, não exatamente. Ela fez tudo o que pôde, mas quando ficou
muito ruim, ela também recebeu a notícia do médico de que se continuasse
tentando talvez não suportasse mais. Foi quando ela resolveu parar com o
tratamento e dedicou seus últimos dias para ficar com a família.
— Você acha que eu tenho que aceitar o que ela quer?
— Se você está pedindo a minha opinião, sim, eu acho. Não
desperdice o tempo que tem fugindo para longe. Sua avó ainda está aqui,
Andrew, aproveite esse tempo que vocês estão recebendo para ficarem ainda
mais unidos. Ela te ama e quer você ao lado dela. E eu sei o quanto você a
ama e também quer estar com ela.
— Eu preciso pensar, e nesse momento eu não consigo nem fazer
isso.
— Então não pense nisso agora — peço. — Por favor, só me abrace.
E é exatamente o que ele faz, ele me abraça a noite inteirinha.
***
Duas semanas depois de Andrew ter descoberto sobre a doença de sua
avó, ele ainda continuava triste. Eu acho que nunca o vi tão derrotado, ele
trabalhou todos os dias até tarde e se entregou completamente ao serviço para
tentar ficar longe de todos os problemas que o rodeavam. Isso era bom e ao
mesmo tempo não era. Ele conseguiu que o Sr. Matsuhara aceitasse seu
projeto, o que era maravilhoso. Mas ele também estava ficando cada dia mais
quebrado. Tinha olheiras por não dormir, e seus ombros estavam encurvados.
E mesmo que eu tentasse livrá-lo disso, não conseguia.
Pelo menos ele não foi embora da mansão, acabou desistindo depois
do tanto que insisti. Ele ainda estava falando com Elizabeth, mas continuava
distante. Em um desses dias, Andrew fez a ela um pedido, que eles voltassem
ao médico para que ele pudesse ouvir tudo por outra pessoa. Elizabeth
concedeu o pedido e eles foram acompanhados de Abigail, que também tinha
essa curiosidade. Exatamente como Lorenna havia dito, o médico contou que
havia um tratamento, mas que no quadro de Elizabeth ela não teria chances
de vida. E somente assim Andrew percebeu a gravidade da situação, e apesar
de ainda não querer aceitar, pelo menos compreendeu sua avó.
Todas as noites, quando eu deitava ao lado dele, Andrew me abraçava
e me perguntava sobre a minha mãe. Ele queria saber o máximo que podia
sobre a doença. E apesar de leucemia ser um pouco diferente de câncer no
pâncreas, eu contei tudo o que podia. Ele também quis saber como foi quando
eu soube que ela iria morrer, e eu contei a ele nossa noite sob as estrelas. Aos
poucos Andrew foi percebendo que não tinha muito tempo com a avó e que
se passasse esse tempo procurando alguma solução podia ser tarde demais.
Então, em algum momento, eu acho que meus conselhos mudaram suas
opiniões.
Era sábado de manhã, eu tinha acompanhado Abigail para uma
corrida, e quando nós retornarmos para casa havia muito barulho vindo da
cozinha. Entramos às escondidas e espiamos a cena mais bonita que poderia
encontrar. Elizabeth, Lorenna e Andrew tentando cozinhar. Em um primeiro
momento, Abigail ficou pasma com a imagem diante dos seus olhos, pois ela
estava tendo ainda mais problemas do que Andrew para aceitar a condição de
Elizabeth. No entanto, quando fomos flagradas espionando, fomos
bombardeadas por muita farinha e nos juntamos à brincadeira. O almoço saiu
quase tão ruim quanto o feito por Jane. Mas o que importava era ver uma avó,
uma filha e dois netos curtindo um grande momento. E eu me sentia especial
por fazer parte daquela lembrança que ficaria guardada conosco para sempre.
E assim os dias foram passando, e eles se tornaram semanas. Andrew
voltou a ver a avó como a mulher que era antes de descobrir sobre o câncer. E
Abigail chorava todas as noites, mas o importante era que quando estava com
a sua avó, ela era apenas sorrisos. Eleonor e Olivia aceitaram bem a decisão
de Elizabeth, mas eu desconfiava muito que fosse por ela preferir assim. Na
verdade, eu podia estar sendo injusta, mas achava que a única coisa em que
elas estavam interessadas era na herança que viria com a morte de Elizabeth.
As duas não vieram visitar Elizabeth em nenhum momento. Não que alguém
se importasse com isso, a própria Elizabeth preferia a companhia que já
recebia.
Eu desconfio que os melhores dias de Elizabeth estejam sendo os de
agora. A filha e os netos passavam muito tempo com ela, fazendo todas as
suas vontades. Entretanto, cada vez mais, um medo estranho vinha se
apoderando de mim. Porque eu podia sentir que uma grande tragédia estava
prestes a acontecer. E não era o tipo de acontecimento que mexeria apenas
com a vida de Andrew, mas que também mexeria profundamente com a
minha vida. Era como se fosse um aviso de que meus segredos não ficariam
guardados por muito mais tempo. E eu odiava isso, porque meu passado era
doloroso e ele podia voltar para assombrar meu futuro.
E mudar toda a minha vida mais uma vez, só que não para melhor.
CAPÍTULO VINTE E QUATRO
--—————————————————————————————

Andrew

O tempo estava passando tão rápido, e eu só fui perceber quando


acordei nessa manhã de domingo e me deparei com o fato de que eu estava
completando vinte e sete anos. Eu não sei por que, mas eu sempre curti fazer
aniversário. Era algo tão importante quanto o Natal e a Páscoa. Enquanto
outras pessoas achavam terrível ter que lidar com a ideia de que estavam
ficando mais velhas, eu achava que essa era a melhor parte de completar mais
um ano de vida. Sem contar que quanto mais velho eu ficava, mais charmoso
eu parecia.
A única coisa que me entristecia era saber que talvez este fosse o meu
último aniversário comemorado com a vovó. Eu odiava apenas relembrar que
isso estava acontecendo, mas não podia fingir que era mentira, eu tinha que
lidar com a realidade. E nesse momento, a realidade era que eu havia
descoberto há mais ou menos um mês que minha vó vinha sofrendo com
câncer de pâncreas há um ano, e não queria se tratar. No começo foi difícil,
eu cheguei a ter raiva dela por escolher esse caminho. Mas aos poucos,
depois de muito ouvir a opinião de todos que me cercavam, compreendi o
que minha vó tanto vinha repetindo. Se ela tentasse se curar, no estágio em
que estava, provavelmente não sobreviveria. Então me restou apoiá-la e viver
todos os momentos que podia ao seu lado.
Outro fato que valia lembrar era que esse era o primeiro aniversário
que eu passava casado. Apesar de ser de mentirinha, eu já estava tão
acostumado a ter a Jamie na minha vida que passou a ser uma realidade meio
assustadora. Quando eu acordava pelas manhãs com ela deitada ao meu lado,
e quando tomávamos café da manhã com a minha família, e também quando
almoçávamos juntos no trabalho, eu não conseguia não vê-la de outra forma
que não fosse como a minha mulher. Nós tínhamos uma relação complicada,
tentávamos manter algumas coisas como apenas negócios, mas na maior
parte do tempo esquecíamos que estávamos apenas encenando um papel.
Tinha momentos em que eu já não conseguia distinguir o que era mentira e o
que era verdade.
Quando eu abri os olhos e me vi deitado na cama sozinho, levantei de
sobressalto. Foi como aqueles sonhos estranhos que a gente tem, que parecem
tão reais, que quando abrimos os olhos sofremos uma espécie de choque.
Aquela dúvida toma conta da sua cabeça, e você se pergunta: Foi só um
sonho? Era isso que eu me perguntava agora enquanto encarava meus lençóis
bagunçados e me perguntava se Jamie Collins e todas as coisas que passamos
foram apenas um sonho. Fiquei assustado e, confesso, com um pouco de
medo também. Olhei ao redor do quarto vazio, querendo encontrá-la de
algum jeito parada por perto, me observando. Mas ela não estava ali, e por
isso cada vez mais eu tinha certeza de que havia sido apenas um sonho. Até
que eu lancei um olhar para a mesinha ao lado da cabeceira e meus olhos se
fixaram em um objeto: a bola de cristal com a torre Eiffel, um presente da
mãe dela, que jamais ficaria para trás.
Senti um alívio instantâneo e voltei a respirar outra vez. Não foi um
sonho, nossos momentos foram verdadeiros, e Jamie era real. A bola de
cristal era apenas uma prova de que minha esposa de mentirinha ainda vivia
comigo e dormia naquele quarto. Ela provavelmente só acordou antes de
mim. Mais relaxado, caminhei para o banheiro e tomei um banho. Vesti
roupas limpas e saí à procura da minha abelhinha fujona. Eu tinha um dia
todo planejado, o que era uma novidade para mim, pois nunca planejei nada.
Só que dessa vez era diferente, dessa vez eu tinha uma garota na minha vida.
Desci as escadas e encontrei a casa estranhamente silenciosa. Não era
algo comum, ainda mais se Abigail estivesse acordada. Fui direto para a
cozinha e só encontrei a Virginia fatiando legumes (o que também era
estranho, porque ainda era cedo para preparar o almoço).
— Bom dia, Virginia, cadê todo mundo?
— Bom dia, Andrew. — Ela solta a faca e vira-se para mim. — Todos
já tomaram café e foram para a piscina. Eu retirei a mesa a pedido da sua avó,
mas posso preparar algo para você.
— Não, tudo bem — murmuro. — Obrigado.
Fiquei parado ali, esperando que ela fosse me dar os parabéns. A
Virginia é governanta da casa muito antes de eu nascer, e todos os anos ela
prepara um bolo magnífico de três andarem para comemorarmos meu
aniversário nas manhãs. Eu costumava acordar e encontrar todo mundo ao
redor da mesa, já com os presentes prontos para serem entregues. E, dessa
vez, nada?
— Algum problema, Andrew? — Virginia pergunta, analisando-me
de cima a baixo.
— Sabe que dia é hoje, Virginia? — pergunto, tentando instigar a
memória dela a se lembrar do meu aniversário.
— Domingo?
— É. Domingo — resmunguei decepcionado.
— Está tudo bem com você, rapaz?
— Tô bem, sim — respondi. — Vou ver minha avó.
Todo mundo tinha acordado, tomado o café da manhã e ido para a
piscina sem mim? No dia mais importante da minha vida? Minha família
estava me decepcionando…
Passei pela Virginia, abri a porta dos fundos e segui para o jardim.
Tudo continuava no mesmo silêncio esquisito para ter uma turma se
divertindo na piscina. Atravessei os arbustos da vovó e me vi diante da
piscina vazia. Cocei a cabeça e olhei para os lados, mas não havia sinal de
ninguém. Virei e foi quando dei de cara com Abigail, que esmagou um
cupcake de chocolate na minha cabeça e gritou:
— Parabéns, velhinho!
Junto a ela apareceram todas as pessoas importantes na minha vida.
Até mesmo a Virginia e a cozinheira saíram carregando um bolo de três
andares com glacê azul, igualzinho ao que ela fazia todos os anos desde que
eu era um garoto. Vovó se aproximou e me abraçou.
— Feliz aniversário, querido, não esquecemos você. — Ela dá um
tapinha na minha bochecha antes de se afastar.
— E aí, cara? — Jack para na minha frente, enfia um dedo na minha
cabeça, que sai coberto de chocolate, e em seguida ele coloca na boca. —
Chocolate, meu preferido.
— Palhaço! — Empurro-o, mas Jack volta para me dar um soco de
brincadeira, que eu vou logo revidando.
— Meninos, parem com isso! — Tia Lorenna me afasta de Jack e me
dá um abraço apertado. — Parabéns, Andrew, vinte e sete anos é uma idade
muito importante.
— Tia, você diz isso todo ano — aponto.
— É porque todas as idades são importantes, Andrew. — Ela me dá
um beijo na bochecha.
— Faz sentido o que ela disse? — pergunto ao Jack, quando tia
Lorenna se afasta.
— Não faço ideia — Jack diz. — Mas ela tem opiniões estranhas
como as da Abigail, então provavelmente não faz sentido.
— Por falar em Abigail, cadê ela? — Olho em volta e vejo minha
prima distraída roubando salgadinhos das bandejas que Virginia está
colocando sobre a mesa do jardim. — Pera aí, Jack, vou fazer minha
vingança.
Passo pela mesa e pego um cupcake. Aproximo-me de Abigail por
trás, e ela se vira nesse momento, então meu cupcake é esmagado no nariz
dela, em vez da cabeça.
— Andrew! — ela grita levando as mãos ao rosto. — Seu imbecil!
— Também te amo! — Dou um beijo em sua bochecha suja e saio às
pressas, antes que ela resolva me atacar.
Paro no meio do jardim e fico olhando para todos os lados. Virginia,
vovó e tia Lorenna estão arrumando a mesa com os doces e os salgados.
Abigail, Addison e o Jack estão roubando a comida. Jack, mais
especificamente está roubando a comida do rosto da Abigail. Só que eu ainda
estou sentindo falta de algo…
— Chocolate definitivamente não combina com o tom do seu cabelo.
Aqui está… Eu me viro e vejo Jamie sorrindo para mim.
— Bom dia, sumida. — Aproximo-me e me curvo para beijá-la. —
Senti sua falta essa manhã.
— Nós já estávamos planejando tudo desde o começo da semana,
então eu acordei cedo para ajudar. Gostou?
— Gostei — murmuro. — E eu também tenho uma surpresa para
você.
— Para mim? Mas é o seu aniversário, não o meu.
— Não importa, vamos todos nos divertir.
— Pombinhos, vamos cantar os parabéns e deixar o amor para mais
tarde, por favor.! — Abigail grita chamando nossa atenção.
— Vai lá, sua família está esperando — Jamie diz.
— Vamos lá. — Seguro a mão dela e corrijo-a. — Nossa família está
esperando.
Todos cantam parabéns para mim, me veem apagar as velas do bolo e
juntos atacamos a comida. Mais tarde, um por um, eles me trazem os
presentes (que desde pequeno são minha parte favorita). O Jack me dá uma
garrafa de vinho importada, que provavelmente eu vou beber com ele. A tia
Lorenna me dá um relógio de pulso novo, e ela tem um ótimo gosto para
escolher essas coisas. A Addison me dá um livro com o título: Manual de
como não ser um idiota. Isso faz com que todo mundo ria de mim, então eu
anoto mentalmente que no aniversário dela preciso bolar algo ainda melhor
em retorno. Fico com medo de abrir o presente da Abby, depois de já ter
levado um cupcake na cabeça, mas acabo arriscando e dentro da caixa
encontro uma coleção de CDs das minhas bandas preferidas. A maioria das
capas está autografada. É um dos presentes mais maneiros que ela já me deu.
— Pode dizer, eu sou o máximo — Abigail diz se gabando.
— Seu presente não pode ser melhor do que o meu — vovó diz. —
Tome, Andrew.
Levanto os olhos para sua mão estendida e tomo dela uma chave.
Franzo o cenho sem entender por que ela está me dando uma chave.
— Ganhei um carro? — pergunto. — Três já eram o bastante, mas se
a senhora acha que mereço mais um… Onde vamos colocá-lo? A garagem já
está cheia…
— Não é um carro, Andrew — vovó interrompe.
— E o que é então?
— Um iate — ela revela.
— Um o o-quê? — gaguejo.
— Um iate, nomeado de Elizabeth pelo seu avô — ela explica. —
Está em ótimas condições, foi reformado recentemente. Você é o meu neto
mais aventureiro, então acredito que o presente seja ideal.
— Ah, vó, sua sem graça — Abigail resmunga. — Era pro meu
presente ser o melhor.
— Dona Elizabeth, a senhora não quer ser minha avó, não? — Jack
pergunta em tom de brincadeira, e todos riem.
— Caramba, valeu, vó. — Inclino-me para dar um beijo nela. — Vou
cuidar bem do iate, prometo.
— Que bom, querido, eu não espero nada menos de você. — Ela sorri
e acaricia a minha bochecha.
— Família, obrigado pela surpresa, vocês mandaram muito bem —
digo. — Mas, se não se importam, eu planejei algumas coisas para fazer essa
manhã.
— De jeito nenhum, querido, vá comemorar do seu jeito — vovó diz.
— Jack, Abby, encontro vocês prontos em meia hora — aviso.
— Eu? — Abigail pergunta apontando para si mesma. — Por quê?
— Porque você vem com a gente — digo.
— Para onde? — ela insiste.
— Abigail, só vai colocar uma roupa que não pareça que você está
indo para a fashion week — Jack ordena. — E é melhor que seja uma calça,
se você não quiser ficar com a bunda de fora.
— Babaca — Abigail resmunga e sai batendo os pés. — Só estou
fazendo isso porque é o seu aniversário, Drew!
— Vamos lá, Jamie, você também tem que trocar esse vestido —
digo.
— Ah, tudo bem — ela concorda meio incerta. Pisco para o Jack e
levo Jamie de volta ao nosso quarto. Elas nem imaginam o que está por vir…
— O que eu visto? — Jamie pergunta quando entramos no quarto, e
eu fecho a porta logo atrás.
— Uma calça, uma blusa, um tênis — instruo.
— Ok.
Ela se enfia no closet e vou para o chuveiro. Tomo um banho para
retirar os restos de bolo e chocolate do meu cabelo e depois visto uma roupa
limpa. Saio do quarto secando o cabelo com uma toalha quando noto um
quadro sobre a cama que não estava lá antes. Aproximo-me e solto a tolha
para observar de perto. São várias fotos juntas de momentos meus com a
Jamie em vários lugares de Paris e Marselha. Em algumas fotos estamos
fazendo caretas, em outras estamos sorrindo, em algumas estamos abraçados
ou de mãos dadas, e em apenas em uma estamos nos beijando.
— Eu sei que você ganhou vários presentes maneiros hoje — Jamie
diz atrás de mim. — E não há nada que eu poderia te dar que seja mais
bacana do que um iate. Então eu espero que você não ache brega que eu
tenha criado um quadro com essas imagens. Olha, se você não quiser colocá-
lo em nenhum lugar, está tudo bem. Eu só queria que você soubesse que eu
não me esqueci de você.
— Vou colocar no meu escritório, em uma parede onde todo mundo
possa ver — digo.
— Tá brincando, né?
— Não. — Viro-me e me aproximo dela. — Quero que todo mundo
que entre lá veja.
— Então você não odiou?
— De jeito nenhum. — Coloco uma mecha do cabelo dela atrás da
orelha. — Eu gostei muito, até quero agradecer.
— Você quer?
— Sim.
— E como você pretende me agradecer? — Jamie pergunta-me.
— Assim… — Coloco uma das mãos na parte baixa de suas costas e
puxo-a para perto de mim. Jamie me olha com aqueles olhos incrivelmente
lindos, grandes e esverdeados. Minha outra mão vai para a sua nuca, e eu me
curvo para alcançar seus lábios. Dou um primeiro beijo de leve, apenas para
provocá-la. É um convite silencioso para que ela corresponda ao meu beijo.
Em seguida, beijo-a de novo, desta vez, para instigá-la, provo da sua carne
macia, mas não aprofundo. Ela solta um suspiro baixo e leva as mãos para o
meu cabelo, os dedos correndo pelos fios e puxando com um pouco mais de
força do que o necessário. E é tudo o que eu preciso para saber que ela está
pronta para mim. Dessa vez a beijo com força, com intensidade, invado sua
boca e reprimo todos os seus gemidos. É gostoso demais, assim como todos
os beijos que já roubei dela.
— Tô pronta! — Abigail grita batendo com o punho contra a nossa
porta. — E eu espero que seja muito divertido, porque eu estava planejando
passar o domingo dormindo!
— Acho melhor a gente ir — Jamie diz quando se afasta. — Também
estou curiosa.
— Você vai adorar — garanto. — Ou pelo menos é isso o que eu
espero.
— Andrew… Andrew… O que você está aprontando?
— Você vai ver, abelhinha.
***
— Long Island — Abigail lê a placa na estrada. — Por que estamos
indo para Long Island?
— Se eu contar não vai ser uma surpresa, Abby — digo.
— Eu acho muito legal da sua parte querer fazer uma surpresa para
mim, priminho, mas eu preferiria que você me levasse ao shopping —
Abigail diz.
— A surpresa não é para você. — Dou um olhar para Abby pelo
retrovisor. — É para Jamie.
— E o que eu estou fazendo aqui, então? — ela questiona.
— Vai ser mais divertido em grupo. — Dou de ombros.
— Abigail, será que você consegue ficar quieta até chegarmos ao
nosso destino? — Jack pergunta ao lado dela.
— Eu posso, se você colocar essa bunda grande do outro lado do
banco! — ela resmunga. — Daqui a pouco você vai sentar em cima de mim!
— Não se preocupe quanto a isso — Jack garante com um sorrisinho.
— Se alguém tiver que sentar, será você em cima de mim, e não ao contrário.
— Seu porco! — ela xinga.
— Estamos chegando — anuncio.
Paro o carro no estacionamento, e todos descem. Abigail continua
perguntando onde estamos, mas ninguém responde. Eu pego a mão de Jamie
e nós caminhamos ao redor da grande construção. Do outro lado tem a
entrada para o pavilhão, e no pátio a pista de voo. Olho para o rosto de Jamie,
mas ela parece estar estranhando o lugar e nem se dá conta do que estamos
prestes a fazer. Já Abigail para em frente à entrada e lê a placa com o nome
da escola de paraquedismo.
— Ai, meu Deus! — Abigail exclama. — Diz que não é o que eu
estou pensando!
— Depende do que você está pensando — digo.
— Vocês querem saltar de paraquedas? — ela pergunta
completamente pasma.
— O quê? — Jamie olha para a placa, depois para Abigail, em
seguida para mim. — Você não fez isso, não é?
— Se eu te trouxe até aqui para saltar? Sim, é exatamente isso —
afirmo.
— Não… Não… Não. — Ela balança a cabeça. — Não posso fazer
isso.
— Pode, sim, e vai — digo. — É um dos seus desejos, e mesmo que
você tenha medo, acho que está na hora de perdê-lo.
— Eu não consigo — ela murmura apavorada.
— Só porque ela quer morrer de paraquedas, não significa que eu
também queira — Abigail interrompe. — Eu estou dando meia-volta e indo
embora.
— Nada disso. — Jackson segura o braço de Abigail, impedindo-a de
ir. — Eu não perdi horas da minha vida assistindo a vídeos e dirigindo até
aqui para fazer saltos só para chegar na hora de realizar o bendito desejo e
vocês duas saírem correndo.
— Abigail, fique — peço. — Vai ser maneiro. Jack e eu estivemos
aqui no último mês e fizemos vários saltos até completar o curso. É muito
seguro.
— Tudo bem — Abigail concorda. — Só vou fazer isso porque eu sei
que se eu morrer vou levar vocês comigo.
— Jamie. — Seguro a mão dela e dou um aperto confiante. — Eu
prometo que você vai gostar e que é totalmente seguro.
— Andrew…
— Ah, não — Abigail interfere. — Se eu vou, você vai também.
— Tudo bem. — Jamie inspira profundamente, depois expira. —
Vamos saltar.
Levo Abigail e Jamie até o nosso instrutor, e ele começa o curso
básico de quinze minutos para ensinar a elas o que é mais importante.
Enquanto isso, Jack e eu começamos a vestir todo o equipamento necessário.
No último mês, estivemos aqui várias vezes na semana para concluir o curso
e fazer os saltos. Agora não só podemos saltar sozinhos, como podemos
saltar com outra pessoa. E é o que vai acontecer hoje.
Quando o instrutor — Max — termina com as explicações, é a vez de
preparar as meninas. Abigail é mais corajosa e faz tudo o que é mandado a
ela. A Jamie parece prestes a cavar um buraco no chão e fugir para o Alasca.
Eu a ajudo a vestir todo o equipamento, e tento acalmá-la, falando sobre os
saltos que fiz anteriormente. Não ajuda muito, mas é tudo o que eu posso
fazer. O medo só vai embora quando ela finalmente saltar, ou, pelo menos, é
isso o que eu espero que aconteça.
Nós vamos todos para a pista e entramos no avião. Já lá dentro, o
instrutor conecta Jamie aos meus equipamentos para saltarmos juntos. Ela na
frente, e eu atrás. O mesmo é feito com Abigail, que é colocada na frente do
Jack e presa ao equipamento dele. Fazemos a decolagem, e Jamie começa a
tremer e bater queixo, mesmo que esteja um calor infernal. Eu sei que ela está
com medo, mas eu também sei que este dia vai ser inesquecível.
— Prestem atenção — Max diz. — Vocês vão estar a mais de treze
mil pés de altura, a queda livre dura apenas um minuto, e então o paraquedas
será aberto. Não se preocupem, porque eu ensinei esses caras muito bem,
vocês podem ficar tranquilas.
— Você diz isso porque não é a pessoa amarrada aos equipamentos
desse idiota com um único paraquedas! — Abigail exclama. — Se ele tiver
uma oportunidade, vai me jogar lá de cima!
— Abigail, se você não calar a boca é exatamente o que eu vou fazer
— Jack diz. — E por que você não fez um coque, ou um rabo de cavalo? Eu
estou comendo cabelo!
— Ninguém me avisou que eu estava indo saltar para a morte! — ela
resmunga.
— Andrew, eu não vou conseguir, me tira daqui, por favor — Jamie
implora. — Eu não tô pronta.
— Você não tem que fazer nada além de curtir a vista — respondo. —
Vai dar tudo certo.
— Bom, é agora — Max anuncia. — Quem vai primeiro?
— Nós — Jack diz dando um passo à frente. Abigail agarra uma alça
pendurada no teto da aeronave.
— Nós o caramba! — ela resmunga. — Eu não votei!
— Solta isso, Abigail — Jack ordena.
Ela solta, e é nesse momento que o Jack pega impulso e joga ambos
para fora do avião.
— Euuuuu voouuuuu moooorreerrrrr! — Abigail grita, mas o som
fica distante conforme eles caem.
— É a nossa vez — sussurro para Jamie. — Pronta?
— Nã… Não — ela gagueja batendo os dentes uns nos outros. — V-
vamos… De-desistir.
— Conta até três comigo — peço, enquanto me posiciono para pular.
— Um…
— Um… — ela murmura.
— Dois… — continuo.
— D-dois…
Então eu me impulsiono para fora da aeronave e nós caímos a mais de
duzentos quilômetros por hora com o vento ricocheteando a nossa pele e o
grito da Jamie nos seguindo em uma altura extremamente alta.
— Socorrooooo! — ela berra cada vez mais alto. — Socorrooooo!
— Jamie, respire, respire — instruo.
— Eu não consigo abrir meus olhos! — ela grita. — Ai, meu Deus, eu
não consigo enxergar!
— Então abre os olhos — peço. — Você precisa ver isso.
Ela abre os olhos no momento em que eu abro o paraquedas. A força
nos puxa para o alto e depois nos mantém caindo de forma muito mais lenta e
suave. Ela finalmente para de gritar.
— Oh, meu Deus! — Jamie ofega. — Estamos voando!
— Abelhinhas devem voar, nem que seja uma vez na vida.
— Andrew, eu quero te bater por ter me jogado para fora do avião
daquele jeito. Mas eu também quero te beijar, porque você está me dando
essa visão fantástica, além de estar realizando um desejo que eu jamais teria
coragem de realizar sozinha.
— Se eu puder escolher, prefiro o beijo.
Ela ri.
— É tão lindo aqui de cima.
— Ainda com medo? — pergunto.
— Eu não sei, eu acho que não, mas estou com uma sensação
estranha.
— É porque é a primeira vez — respondo. — Também me senti
estranho, mas você está indo bem.
— Você pode segurar a minha mão? — Jamie pergunta.
— Posso.
— Olha só. — Ela aponta logo abaixo de nós. — São o Jack e a
Abby.
— Pelos menos eles não se mataram ainda.
— Eu ainda não acredito que você fez tudo isso por mim — Jamie
diz. — É o seu aniversário, deveríamos estar realizando um desejo seu.
— Acredite, nós estamos.
Realizar seus desejos é o meu desejo.
— Se prepara, estamos chegando próximo ao chão.
Fizemos um passeio de paraquedas de treze minutos até estarmos
seguros em terra. Soltei os nossos equipamentos e voltamos para o pavilhão,
onde encontramos Jack e Abby surtando um com o outro.
— Você simplesmente me chutou! — Abigail estava dizendo.
— Eu não te chutei! — Jack discorda. — Você é que não parava de se
mexer.
— Ah, e você queria que eu ficasse quieta? — Abigail replica. —
Estávamos a duzentos quilômetros por hora!
— Eu fiz o curso, devia ter confiado mais em mim — Jack resmunga.
— Eu não confio em você!
— Ei, vocês dois — chamo. — Já chega!
— Nunca mais me convide para algo com esse ser insignificante. —
Abigail aponta o dedo para Jack.
— Para de drama, Abigail — digo. — Eu sei que você gostou.
— Teria gostado mais se tivesse pulado sozinha! — Abigail diz.
— Então da próxima vez pula sozinha, sua estúpida! — Jack altera o
tom de voz. — Ah, quer saber, não importa!
Jackson se irrita, joga o equipamento no chão e sai pisando firme.
— Volta aqui! — Abigail grita correndo atrás dele. — Ninguém me
chama de estúpida!
— Nossa — Jamie murmura espantada. — O que esses dois têm?
— Eu aposto cem dólares que os dois ainda vão ter uma noite de sexo
selvagem — digo.
Jamie ri.
— Eu aposto cem dólares que eles vão ter muitas noites de sexo
selvagem. — Ela pisca para mim.
— Sabe o que eu acho? — sussurro contra o pescoço dela.
— Mmmm… o quê?
— Que nós também deveríamos ter uma noite com um sexo incrível.
— Mordo o lóbulo da orelha dela, e Jamie se encolhe com as cócegas.
— Talvez mais tarde. Bem mais tarde, porque antes nós temos outra
coisa preparada.
— O quê?
— Vai ter uma comemoração no apartamento do Jack, ele convidou
alguns amigos de vocês — Jamie explica. — Ele disse que em todos os seus
aniversários vocês costumam comemorar juntos com muita comida e bebida,
eu não quis que fosse diferente só porque eu estou na sua vida.
— Eu não teria problemas em trocar um monte de bêbados imbecis
por você.
— Eles são seus amigos — ela diz. — E você vai sim. Agora vamos
logo, quero evitar que Jack e Abby espanquem um ao outro lá fora.
— Tem razão, é melhor a gente ir.
Conseguimos evitar que Abby e Jack se ferissem gravemente, mas
tivemos que ouvi-los discutindo a viagem toda até em casa. Quando
chegamos, Abigail foi direto para o quarto emburrada, e Jack se despediu
com um aceno e foi para casa, também emburrado. Jamie e eu subimos para
tomar um banho juntos, que foi bem demorado, porque eu tive que explorar
cada pedacinho do corpo dela com as mãos, com os dedos e com a boca
também.
Todos almoçaram juntos novamente, com exceção do Jack. Jamie
contou para vovó, tia Lorenna e Addison sobre a surpresa que eu tinha
preparado. Falou toda entusiasmada de como foi a sensação de saltar de
paraquedas. Abigail acabou admitindo que também gostou bastante e que
repetiria. Mas fez questão de deixar claro que sem o Jack como instrutor.
Jamie e eu passamos a tarde juntos, um pouco na piscina, curtindo o
sol, e um pouco dentro do quarto, assistindo a filmes e comendo pipoca. Não
era nada comparado aos meus aniversários anteriores, em que eu passava o
dia todo fora com Jack. Mas eu gostei de tudo do mesmo jeito, a companhia
da minha esposa era sempre agradável.
Às oito eu terminei de me vestir para o encontro com os caras. Não
estava tão empolgado quanto nos outros anos, preferia ficar na cama com a
Jamie, mas quando falei isso a ela, Jamie insistiu que eu deveria ir em
consideração aos meus amigos e me empurrou para fora do quarto. Então eu
fui e, como esperava, meus dez amigos mais próximos, contando com o Jack,
estavam no apartamento dele quando cheguei. Colocaram uma cerveja na
minha mão e me arrastaram para frente da enorme tevê da sala, onde estava
passando um jogo de futebol. O Jack tinha colocado a mesa de jogo de botões
na sala também, então ficamos nos revezando para jogar.
Começou a ficar divertido, tinha muita comida, mas também muita
bebida. Minha mão nunca ficava vazia, assim que minha garrafa começava a
esvaziar, havia alguém para substituí-la. O jogo na televisão acabou, mas o
nosso não. Toda vez que alguém ganhava, o barulho era tanto que parecia que
um terremoto estava atingindo a cidade. Homens são competitivos de
natureza, mas com uma boa dose de álcool no sangue, a coisa só tende a ficar
pior. Do jogo de botões, fomos parar no pôquer. A gente jogava a sério,
apostávamos dinheiro de verdade e não era pouco. Eu já estava bêbado,
portanto, perdi uma atrás da outra. O Jack, por outro lado, estava
estranhamente sóbrio e ganhou várias partidas. Achei bem esquisito que ele
estivesse bebendo moderadamente, logo ele, que era a esponja do grupo,
sorvia álcool como se fosse água. Acho que ele estava se controlando para
arrancar uma grana minha no jogo, só podia ser isso. Por que outro motivo
ele não ia encher a cara justo essa noite?
Perto das três da manhã eu apaguei no sofá e só tive flashes do que
aconteceu depois. Os caras tinham ido para casa, um por um, tão bêbados
quanto eu. Se chegaram vivos? Não sei. Também notei o Jack se
movimentando pela sala, recolhendo garrafas vazias e limpando os móveis. O
Jack fazendo faxina de madrugada? Até quis perguntar o que estava
acontecendo, mas tudo ficou preto de novo e eu apaguei.
Quando voltei a abrir os olhos senti que havia algo estranho, primeiro
eu não conseguia sentir as minhas mãos e logo descobri que era porque eu
estava amarrado com elas atrás das minhas costas. Outra coisa que notei era
que mesmo com os olhos abertos eu não enxergava nada, o que só podia
significar uma coisa. Alguém tinha vendado os meus olhos e me deixado em
uma posição em que eu estava sentado.
— Jack? — murmurei com a voz grogue.
Eu ia chutar a bunda dele se estivesse avacalhando comigo.
— Alguém? — chamei.
— Estou aqui, Drew. Mas não por muito tempo. — Ouvi a voz de
Jack à distância. — Tenho que ir.
— Que porra é essa, Jack? — xinguei. — Essa merda não tem graça,
me tira daqui!
— Calma, amigo — Jack diz sério. — Você vai me agradecer mais
tarde por isso.
— Jack! — gritei. — Volta aqui, porra! Isso não tem graça, é sério…
Por que eu tô preso?
— Drew, eu e os caras preparamos uma surpresa para você — Jack
diz. — Não é a merda de uma festinha surpresa, nem um passeiozinho nas
alturas. Você precisa se soltar um pouco, tirar a Jamie da cabeça, você tá
passando tempo demais com ela.
— Do que você está falando, caramba?
— Eu já tô indo. Mas não se preocupe, eu acho que você vai se
divertir muito hoje. A Trisha vai cuidar muito bem de você, pagamos
bastante para isso.
— Jack, volta aqui! — gritei. — Cara, sério, não faz isso! Volta aqui!
Ouço a porta bater e sei que o Jack se foi. Começo a lutar com as
cordas, mas o nó está bem firme e não cede. Não sei bem o que estou
sentindo no momento, mas uma coisa era certa, a hora que eu saísse daqui ia
chutar o traseiro do Jack até a China. Ouvi barulho de passos e sentei-me
ereto, procurando prestar atenção. Senti um movimento bem próximo de mim
e um arrepio percorreu meu corpo quando ouvi uma voz melosa dizer:
— Olá, Drew.
— Quem tá aí? — exigi.
— É um prazer conhecê-lo — ela sussurra perto do meu ouvido. —
Eu sou a Trisha e vou fazer você muito feliz essa manhã.
— Ah, valeu, mas é um engano.
Ouço sua risada baixa, mais próxima ainda. Logo, sinto o sofá abaixar
ao meu lado e tento me esquivar para o canto, mas sou mantido no lugar
quando ela coloca as mãos sobre os meus ombros e senta-se no meu colo.
— Fugindo de mim? — ela pergunta e em seguida planta um beijo no
meu maxilar.
— Trisha, eu te pago o dobro do que eles pagaram pra você me soltar
— ofereço.
— Ah, não, eu não quero o seu dinheiro — ela murmura e, logo
depois, sinto seus dentes raspando o meu pescoço e o seu corpo quente ainda
mais próximo de mim. — Eu quero me divertir.
— Eu sou casado — eu me vi dizendo.
— Eu não me importo.
Sinto as mãos dela, pequenas e delicadas, deslizando pelo meu peito.
Minha camisa está aberta, e por isso eu posso sentir pele contra a minha. Seus
dedos escorregaram cada vez mais para baixo, até ela tocar o meu pau, sobre
o jeans.
— Porra, não, não faz isso — imploro. — Eu posso te denunciar,
sabia? Caralho, tira a mão do meu pau.
— Você vai gostar disso, mas primeiro nós vamos ter que deixar você
excitado, ou eu não vou conseguir nada.
— Não vai acontecer! — esbravejo.
— É claro que vai. Eu vou mostrar meus truques.
Trisha começa a rebolar sobre o meu pau, e suas unhas compridas
arranharam o meu peito nu. Sinto seu hálito fresco no meu pescoço e, logo
depois, seus dentes me mordendo e me chupando. Eu posso dizer que ela está
vestindo calcinha, porque sinto o tecido esfregando na minha calça, também
sei que ela está de sutiã, pois o tecido toca o meu peito. Tenho certeza de que
ela deve ser gostosa e experiente por causa dos movimentos. Mas nada disso
me excita, pelo contrário, estou irritado com toda essa situação. Quero essa
mulher longe de mim, e quero matar o Jack por me enfiar nessa.
— Querida, eu sinto te decepcionar, mas o meu pau não vai subir.
— Ah, não? — ela pergunta. — E por quê?
— Porque só consigo pensar em você como uma cadela no cio se
esfregando em mim — respondo sendo sincero. — Além do mais, eu tenho
uma mulher gostosa em casa que sabe exatamente como eu gosto de ser
chupado. Agora faz a porra do favor de sair de cima do meu pau e me
desamarra!
Ouço barulhos de passos se afastando e quase penso que garota vai
sair e me deixar amarrado no sofá. Mas enquanto ouço a porta se abrir e bater
outra vez, noto que Trisha não saiu do meu colo. De repente, a venda é
puxada dos meus olhos. Fico cego tentando me ajustar à claridade do
cômodo. Quando consigo enxergar sem piscar, me vejo encarando olhos
castanho-esverdeados e um sorriso com um biquinho adorável.
— Você me chamou de cadela no cio — Jamie murmura, fingindo
estar magoada.
Olho em volta e percebo que estamos sozinhos no apartamento do
Jack. E que Jamie está só de calcinha e sutiã sentada no meu colo e esteve o
tempo todo. Foi a única a me tocar e rebolar no meu pau. Saco na hora que
tudo foi bolado para acontecer dessa maneira. É claro que outra garota esteve
aqui, pois a voz era diferente, mas essa nunca tinha me tocado. Usou da voz
para me convencer de que tudo era real. O tempo todo fui enganado, pois
quem estava comigo era a minha esposa.
— Se eu não estivesse amarrado daria uma surra em você.
— É uma pena que você esteja — Jamie diz e se aproxima para
morder o meu lábio inferior. — Será que o seu pau não vai levantar mesmo
para mim?
Só de ouvi-la falar “pau” e “mim” numa mesma frase dita, Drew
Junior se agitou na minha cueca.
— Tá querendo brincar, é?
— Estou dando meu presente de aniversário para você — ela
sussurra.
— Pensei que era o quadro.
— Então você não quer esse presente?
— Você com certeza não vai sair daqui enquanto não acabar com essa
ereção nas minhas calças.
— Pobrezinho do meu marido. — Ela dá um beijinho nos meus lábios
e depois se afasta um pouco. Leva as mãos até a parte de trás das costas e
solta o fecho do sutiã. — Tudo isso foi ideia de Jack e Abigail, que acharam
que seria justo descobrir se você cumpriria o nosso acordo, mas confesso que
aceitei porque também estava curiosa para saber se meu marido se manteria
leal a mim. Você foi um menino bonzinho e fiel, por causa disso, nós vamos
continuar brincando.
— Me solta e eu vou provar o quanto sou um ótimo marido. O
melhor.
— Ah, não, essa noite quem manda sou eu.
Jamie se livra do sutiã, ficando com os peitos nus bem na minha
frente. Tento alcançá-los com a boca, mas ela pula fora do meu colo e
começa a retirar o meu cinto, depois a minha calça. É claro que eu ajudo no
processo, porque não vejo a hora de ficar nu com ela. Observo enquanto ela
tira a calcinha na minha frente e a deixa cair aos seus pés. Fico ainda mais
duro sabendo que ela está pelada na minha frente, mas que eu não posso tocá-
la, porque continuo amarrado.
Ela se ajoelha aos meus pés e, com um sorriso travesso, pega o meu
pau com as duas mãos e começa a me masturbar devagarzinho. Deixo minha
cabeça descansar contra o encosto do sofá e gemo quando sinto a língua dela
deslizar pela cabeça do meu pau. Um segundo depois ela enfia meu membro
todo na boca. Minha respiração sai entrecortada a cada vez que ela me suga e
me leva fundo dentro de sua garganta. Sinto que só preciso de um pouquinho
mais de estimulo para gozar, e então ela me solta e se afasta. É um balde de
água fria.
Abro os olhos e encaro-a, que já está me olhando daquele jeito safado.
— Que porra você pensa que está fazendo? — pergunto. — Termina
de me chupar!
— Eu já disse que quem manda hoje sou eu. E você não vai gozar na
minha boca, quero que goze dentro de mim.
— Então me solta — exijo.
— Não. — Ela balança a cabeça. — Eu também vou comandar como
vai acontecer.
Então ela sobe de volta no meu colo, segura o meu pau com firmeza e
ajusta a cabeça na entrada do seu sexo. Move-se lentamente para baixo
enquanto meu pau a enche até o talo. Fico aliviado, e ela também, porque
solta um gemido de prazer em voz alta. Acomoda-se em cima de mim até que
eu estou todo dentro dela.
— Caralho — gemo. — Jamie, é melhor você fazer isso logo, porque
eu vou gozar.
— Vai gozar só quando eu mandar — ela avisa mordendo o meu
pescoço e com certeza deixando marca.
Sinto os lábios dela sobre os meus e a beijo com firmeza. Esmago
meus lábios nos dela até sentir dor e sugo sua língua com avidez. Fico
esfomeado, quero fodê-la até que ela esteja gritando o meu nome. Mas
lembro que é ela que está no controle e que tudo o que eu posso fazer é
acompanhá-la. Então, quando ela começa a subir e descer sobre o meu pau,
me movo da melhor maneira que eu consigo para encontrá-la.
Fico louco de tesão sentindo sua boceta toda molhada empapando o
meu pau e me apertando dentro dela. Chego a morder o lábio dela até sentir
gosto de sangue, de tão alucinado que eu estou. Jamie começou a aumentar o
ritmo e cavalga duro sobre o meu pau. Ambos estamos gemendo e suando, e
eu sou o primeiro a sentir o corpo dela estremecer. Sinto que estou perto
também, mas, obediente, espero até que ela me dê a ordem:
— Goza, Andrew — geme perto do meu pescoço. — Goza dentro de
mim.
Não é preciso pedir uma segunda vez. Gozo tão forte que por um
segundo inteiro minha visão obscurece. Jamie deixa a cabeça cair no meu
ombro enquanto respira pesadamente, seu corpo está todo mole sobre o meu,
e eu sei que tudo ocorreu da maneira que ela queria desde o começo.
— Pode me soltar agora? — pergunto, enquanto me recupero do
estrago maravilhoso que minha mulher causou em mim.
— Você não vai ficar bravo pelo que aconteceu?
— Não. — Rio, mas é falso. Só que ela não sabe. — Me solta.
Ela não sai do meu colo, mas leva as mãos até as minhas costas e com
um pouco de trabalho e força consegue desfazer o nó. Livro-me das cordas e
então concentro meus olhos nela.
— Que foi? — Jamie pergunta inocentemente.
— Vou comer você de novo, só que agora vai ser do meu jeito.
— O quê?
Agarro as mãos dela e começo a passar as mesmas cordas que ela
usou para me prender ao redor dos seus pulsos. Jamie solta um gritinho e
tenta pular para fora do meu colo, mas eu a seguro apertado, até tê-la presa e
indefesa.
— Andrew!
— Gostou de brincar, né, querida?
— Gostei! — ela admite, tentando se controlar para não rir.
— Vai gostar mais agora que eu sou o cão, e você é a gata.
Dou um tapa na bunda dela e ouço-a gritar o meu nome. É só o
começo da minha vingança…
CAPÍTULO VINTE E CINCO
--—————————————————————————————

Jamie

Era sexta-feira, e nós chegamos à Simon’s uma hora mais cedo do que
de costume. Tudo porque o Andrew queria ter certeza de que o projeto do
resort estaria pronto para ser apresentado no jantar para os clientes que ele
organizou para essa noite. Eu estava tão orgulhosa dele, pois o Andrew
estava se esforçando muito e dando apenas o melhor para fazer tudo dar certo
dessa vez. E eu acreditava nele, sabia que tinha capacidade e competência e
que tudo sairia como o planejado. E eu não era a única que pensava assim.
Todo mundo estava surpreso e ao mesmo tempo feliz por cada passo que o
Andrew estava dando para tornar as coisas como eram antes, ou talvez ainda
melhores.
Acabei me despedindo dele assim que saímos do elevador, porque eu
sabia que eu se eu fosse acompanhá-lo nós faríamos tudo, menos trabalhar. E
já que eu tinha chegado mais cedo, aproveitaria para deixar todo o meu
serviço adiantado. Quem sabe assim também poderia sair mais cedo e ter
mais tempo para me arrumar com Abigail. Caminhei até a sala de Benjamin
e, quando entrei, estranhei ver a porta do escritório dele entreaberta. Sempre
ficava fechada quando ele não estava, e definitivamente Benjamin nunca
chegava adiantado. Era sempre pontual, nem um minuto a mais, nem um
minuto a menos.
Fiquei preocupada que talvez alguma das faxineiras tivesse limpado o
escritório na noite anterior e se esquecido de trancar a porta. Benjamin não
gostava do escritório aberto, ele nem gostava quando as faxineiras tinham
que limpar. Ele nunca permitia que ninguém movesse nada do lugar, nem
uma única folha de papel. E ficava irritado se isso acontecia. Eu não sabia
como ele podia descobrir quando alguém mexia em algo, mas ele sempre
sabia. Mantinha as gavetas sempre trancadas com chave, o que era estranho,
afinal, quem é que iria querer roubar projetos? Ainda que ele tivesse medo de
Andrew tentar trapaceá-lo, meu marido seria o tipo de pessoa que faria um
projeto ainda melhor, em vez de roubar um já pronto. Então, eu sempre
permanecia curiosa em relação àquelas gavetas trancadas e ao laptop com
mais senhas que a conta bancária da rainha.
Larguei a minha bolsa sobre a minha mesa e caminhei em direção à
porta do escritório com a intenção de trancá-la, para que Benjamin não
notasse que provavelmente alguém havia se esquecido de fechá-la. Só que
quando eu me aproximei escutei as vozes e parei imediatamente. Congelada
no meu lugar, reconheci as vozes familiares de Benjamin e Olivia. Uma
curiosidade exorbitante tomou conta de mim, porque nesse horário nenhum
dos dois deveria estar aqui, muito menos cochichando desse jeito. Esgueirei-
me para mais perto e, mesmo sabendo que era errado ouvir o que os outros
diziam em segredo, não pude evitar. No fim das contas, meu tempo como
mosquinha voltou, e fiquei motivada a descobrir o que estavam falando.
— … se você pensa isso é mesmo um imbecil! — Ouvi Olivia dizer.
— Fale baixo — Benjamin exigiu. — Quer que alguém nos ouça?
— Eu conferi o escritório antes de vir, e estava vazio — Olivia
responde. — E não mude de assunto, quero que você pare de dar em cima
daquela mendiga!
— Olivia, já discutimos isso e você não decide o que eu deixo ou não
de fazer.
— Escute aqui, Benjamin, você vai estragar tudo desse jeito. Eu juro
por Deus que se algo der errado porque você está se arriscando com aquela
piranha eu vou te fazer pagar muito caro.
Piranha? Pagar caro? Algo der errado? Do que eles estavam
falando?
— Afinal, o que é que você tem contra a Jamie, hein? — Benjamin
pergunta e eu quase caio contra a porta e denuncio minha posição. Quase.
Porque no último momento eu segurei o fôlego e fiquei ainda mais intrigada.
Eles estavam falando de mim?
— Eu tenho tudo contra aquela garota! Tenho nojo de gente pobre!
Fiquei com ainda mais nojo quando soube que Andrew a escolheu para esse
falso casamento. Ninguém me engana, ele devia estar desesperado mesmo
para fazer uma proposta para aquela mendiga. Guriazinha nojenta!
— Olivia, será que você não percebe o mesmo que eu?
— Tudo o que eu percebo é que você está dando em cima dela bem na
minha frente! — Olivia resmunga. — Benjamin, só porque o nosso
casamento não vale nada, não significa que você tem que sair por aí sendo
óbvio. Você já pisou na bola uma vez quando transou com aquela secretária
na sua sala, e eu tive que abafar todo o caso e levar fama de corna dentro da
minha própria empresa! E agora você quer fazer tudo de novo com aquela
mendiga? Isso eu não vou aceitar! Nunca, está me ouvindo? Pode transar com
quem você quiser, mas se fizer isso com ela, nosso acordo está acabado e eu
encontro outro homem dentro dessa empresa disposto a ir até o fim.
— Você não vai fazer isso — Benjamin fala convencido. — Sabe por
que, Olivia? Porque fui eu que desperdicei três anos da minha vida nesse
falso casamento com você. E eu sou o único com potencial para assumir a
presidência dessa empresa, então você precisa de mim para concluir o nosso
plano. Nenhum outro homem aqui dentro estará disposto a isso e, mesmo que
esteja, não seria um candidato à presidência. Agora, em relação a com quem
eu transo ou deixo de transar, também não te diz respeito. Você dorme com
os homens que quer, e eu com as mulheres que eu quero. Esse foi o nosso
acordo, lembra? Então, se eu quiser foder a esposa gostosa do Andrew, é essa
a porra que eu vou fazer, está me entendendo?
— Você vai ferrar com tudo! — Olivia acusa.
Escorrego lentamente para o chão, mortificada demais para me mexer.
Petrificada demais para piscar e talvez até mesmo para respirar. Não acredito
que estou ouvindo essa conversa. E o pior é o significado de tudo o que estão
dizendo. Benjamin e Olivia têm um acordo? Um falso casamento? Dormem
com quem querem? Eles têm um plano? Algo que envolve Benjamin como
presidente da Simon’s? Benjamin não só estava me assediando este tempo
todo como acredita que vai dormir comigo? Olivia sabe de tudo, Benjamin
sabe de tudo. E, agora, eu também sei de tudo.
— Olivia, até agora nós fizemos tudo do seu jeito — Benjamin
prossegue. — Casei com você e estamos vivendo nessa farsa por três anos. E
até agora não recebi nada do que você me prometeu! Eu tô cansando de
esperar, essa velha não vai bater as botas nunca!
— A vovó está com câncer, Benjamin, ela não vai durar muito. Cada
dia que passa ela fica pior.
— Eu espero que você esteja certa, e para a sua informação estou me
aproximando da Jamie com mais de uma intenção. Se ela topou casar com o
Andrew para que ele consiga a presidência, é porque provavelmente ele deve
ter oferecido uma fortuna para ela. Se for isso, significa que a Jamie é tão
ambiciosa quanto a gente. E acredito muito nisso, é por isso que eu quero
trazê-la para o nosso lado. Posso oferecer mais do que ele deve ter pagado a
ela. Se tivermos a Jamie, será o fim do Andrew. E sem aquele playboy
imbecil no nosso caminho, significa que eu sou o único que pode conseguir a
presidência. Quando sua avó tornar isso possível, ninguém pode nos impedir.
Vamos com o plano até o fim, teremos a maior parte das ações, vendemos
essa porcaria de construtora e cada um segue seu caminho.
— Eu não vejo a hora de isso acontecer, quero me ver livre dessa
maldita família! — Olivia cospe.
— E eu quero me ver livre de você e da maluca da sua mãe.
— Bom, querido, já que você tocou no nome da mamãe, é melhor
transferir algum dinheiro para a conta dela logo. Só essa semana ela me
chamou três vezes!
— Olivia, não posso ficar transferindo dinheiro da empresa o tempo
todo — Benjamin resmunga. — Diz pra sua mãe que só vou fazer outra
transferência quando a velha morrer.
Oh, meu Deus…
— Eu vou tentar, mas tenho medo de que ela dê com a língua nos
dentes e acabe contando tudo.
— Sua mãe não vai fazer isso — Benjamin assegura. — Ela quer o
dinheiro tanto quanto nós, e ela recebe mais se ficar quieta. Agora volte para
o seu escritório e me deixe em paz, daqui a pouco os funcionários começam a
chegar. E minha doce secretária também.
— Você é nojento — Olivia resmunga. — Espero que esteja certo em
relação a trazer a mendiga para o nosso lado, ou você vai colocar tudo a
perder.
— Sei o que estou fazendo, Olivia. Agora cai fora.
Assustada, levanto do meu lugar e vou às pressas para fora da sala na
ponta dos pés, para não denunciar minha presença. Vou em direção ao
escritório de Andrew o mais rápido que eu consigo e somente no meio do
caminho me lembro de que deixei minha maldita bolsa sobre a minha mesa.
Faço uma parada brusca e me viro, tentando decidir se devo voltar ou não.
Resolvo que o melhor é me arriscar para pegar a bolsa, do que deixá-los
pensando que sempre estive lá. Volto para o escritório de Benjamin e topo de
frente com Olivia, que está saindo. Respiro bem firme para segurar minhas
emoções, porque, nesse momento, o que eu mais quero é dizer o quanto ela é
uma mulher desprezível.
— Chegando mais cedo para o trabalho? Que funcionária exemplar!
— Olivia sorri, cínica como sempre.
— Não, eu só vim dar um passeio mesmo — digo irônica.
— Vamos ver quanto tempo seus passeios aqui dentro vão durar.
— Dá licença, Olivia, tenho muito que fazer — resmungo.
— Fique à vontade, queridinha.
Passo por ela e vou direto até a minha mesa. Graças a Deus ela não
percebeu a minha bolsa jogada aqui em cima. Coloco-a em meu ombro e
volto para o corredor, dessa vez, espio para conferir se Olivia ainda está por
perto. Como eu não a encontro, sigo para o escritório de Andrew. Tracy não
está na recepção quando chego, mas me lembro de ela ter dito que eu poderia
entrar sem ser anunciada. E esse com certeza é um caso grave demais, não
posso esperar até o jantar ou coisa assim. Dou duas batidinhas na porta por
educação e entro.
— Andrew, preciso falar com você urgente! — Fecho a porta atrás de
mim.
— O que aconteceu?
Viro e encontro Andrew sentado em sua poltrona atrás da mesa, com
uma expressão preocupada. Jackson também está aqui, e entre eles várias
pastas e papéis. Sinto-me uma idiota por interrompê-los justo hoje, que é um
dia tão importante para o meu marido e para a empresa. Mas desconfio que o
que eu tenho para dizer é muito mais importante.
—Tudo bem com você, Jamie? — Jackson pergunta.
— Olá, Jack. — Aceno para ele e me aproximo. Andrew já está de pé
aguardando minha resposta. — Eu estou bem, sente-se, Andrew, por favor.
Ele se senta ao mesmo tempo em que eu ocupo a cadeira ao lado do
Jack.
— Vocês vão discutir a relação ou algo assim? — Jack pergunta em
tom de brincadeira. — Porque, sério, eu vou me mandar daqui se for isso.
— É sobre Benjamin e Olivia — anuncio.
— Ixii — Jack resmunga. — Lá vem bomba.
— E das grandes — completo.
— Pode falar, Jamie, tudo o que diz respeito àqueles dois o Jack
também já está acostumado — Andrew diz.
— Você não vai gostar nem um pouco de ouvir o que eu tenho pra
falar — aviso. Em seguida começo a contar tudo, desde o momento em que
pisei no escritório. Conto que Benjamin disse com a própria boca que eles
estão em um casamento falso por todos esses anos, que tudo isso é para que
eles formem uma aliança e assim consigam a presidência da empresa para
mais tarde vendê-la e cada um se mandar para um canto do mundo. As
mesmas palavras grosseiras que Benjamin utilizou para se referir à dona
Elizabeth eu uso apenas para dar ênfase aos monstros que aqueles dois são.
Por fim, falo sobre a mãe de Olivia, que sabe de tudo e está metida no rolo,
acrescento também que eles já transferiram dinheiro de dentro da empresa
para ela, e pretendem fazer isso mais vezes com a intenção de manter Eleonor
de boa fechada.
Quando levanto os olhos e encaro Andrew, a expressão dele é algo
como horror e incredulidade. Jackson apenas balança a cabeça várias vezes
com os lábios comprimidos. Os dois não têm ação para mais nada, assim
como eu fiquei quando escutei. E eu ainda nem contei a eles sobre a parte em
que falaram de mim.
— Estão… Estão roubando dinheiro? — Andrew pergunta em voz
baixa.
— Não duvido de nada quando se trata daqueles dois — Jackson diz.
— Que merda! — Andrew resmunga. — O que nós vamos fazer?
— Eu não sei — Jackson responde. — Me deixa pensar um pouco,
isso é tão louco. Ainda estou processando a parte em que o casamento deles é
pura fachada.
— Para mim essa é a parte mais aceitável de tudo isso — Andrew
fala. — O casamento aconteceu tão de repente, você não lembra? Eles nunca
tinham sido vistos antes, e num dia qualquer anunciaram que se amavam.
Agora tudo faz sentido, Olivia sempre soube que nunca seria presidente. Mas
ela sabia que Benjamin tinha a chance de ser, se ele fosse alguém de
confiança. O que ela fez? Casou-se com ele, tornando-o alguém da família e
confiável aos olhos da vovó. Dessa forma os dois saem ganhando. Merda!
— É verdade, isso seria a cara dela e faz todo o sentido — Jackson
concorda.
— Eu vou avisar a vovó, ela precisa saber o que esses monstros estão
fazendo aqui dentro — Andrew diz.
— Cara, relaxa aí — Jack pede. — Você não pode simplesmente ir
até a sua avó fraca e doente e contar que a neta maravilhosa dela está
roubando a grana da empresa com o marido que ela pensa que é o funcionário
perfeito. Para começar sua avó teria um troço, ou então pensaria que você
está dizendo isso para conseguir eliminá-los da concorrência.
— A vovó nunca pensaria isso! — Andrew protesta.
— Você sabe que isso é uma hipótese que devemos considerar —
Jack insiste.
— E qual é o plano então? — Andrew pergunta.
— Olha, eu não sei, é difícil. — Jack suspira. — Eu não tenho acesso
a certos dados daqui da empresa. E a gente precisaria de uma prova de que
eles estão roubando dinheiro, ou de que planejam conseguir a presidência da
empresa para roubar. Posso até dar uma olhada e procurar por alguma coisa,
mas vai ser muito difícil, Andrew. Não se sabe há quanto tempo esses dois
estão desviando dinheiro da construtora, mas se ninguém desconfiou ainda, é
porque eles estão fazendo de forma discreta e inteligente.
— Porra, a gente tem que fazer isso logo! — Andrew esbraveja. —
Eles não podem continuar aqui dentro fazendo isso! Eu tô me segurando para
não ir até lá e quebrar a cara daquele canalha.
— Calma, cara. Você não quer fazer nenhuma besteira. Se algo der
errado, você pode ser mandado para fora da Simon’s e, aí, sim, já era.
— Eu tenho um plano — murmuro.
As duas cabeças giram na minha direção, e de repente se dão conta de
que eu ainda estou ali e de que posso ouvi-los.
— Diz, Jamie — Jack pede. — Qualquer ideia é bem-vinda.
— Eu ainda não terminei de contar tudo o que eu ouvi — digo e olho
para Andrew quando prossigo. — Quando cheguei, a primeira coisa que eu
percebi foi que ambos estavam falando sobre mim. Como sempre, Olivia
estava me xingando, só que mais do que isso, ela estava alertando Benjamin
para ficar longe de mim.
— Por quê? — Jack coça a cabeça.
— É. — Andrew inclina-se para frente e arqueia uma sobrancelha. —
Por quê?
— Desculpe, eu não contei nada para você antes porque não achava
que a intenção dele era algo como isso. Eu… Eu só achei que ele estivesse se
divertindo comigo porque agora eu sou casada com você, pensei que tudo era
para te provocar. Só isso.
— Do que você está falando, Jamie? — Andrew insiste.
— Desde que eu comecei a trabalhar para ele, Benjamin tem me
elogiado mais do que o normal. Às vezes eu o pego me observando e ele diz
coisas estranhas. Ele nunca fez nada preocupante, ou eu teria contado.
— Ele estava dando em cima de você? — adivinhou Jack.
— Sim — murmuro. E antes que Andrew abra a boca, continuo. —
Olivia disse que não o queria fazendo isso, dando em cima de mim. Ela não
acha que sou confiável, porque aceitei me casar com Andrew para ajudá-lo a
conseguir a presidência. Assim como ela fez com Benjamin.
— Ele tocou em você? — Andrew pergunta encarando-me sério.
— Drew, mantenha a calma, tá? — Jack pede.
— Ele. Tocou. Em. Você? — Andrew repete entredentes.
— Não, nunca. — Fico de pé e começo a caminhar de um lado para o
outro, nervosa. — Eu já disse que se ele tivesse feito algo eu teria contado.
Pensei que ele só quisesse se divertir me encurralando, nunca me passou pela
cabeça que ele queria transar comigo!
— Quê?! — Andrew empurra a cadeira para trás e vem na minha
direção. Ele me segura pelos ombros e me faz enfrentá-lo. — Termina de
contar exatamente o que você ouviu!
— Drew, pega leve. — Jack se levanta e coloca a mão sobre o ombro
dele. — Você sabia desde o começo que Benjamin não prestava. Era de se
imaginar que ele quisesse algo assim.
— Cala a boca, porra — Andrew resmunga. — E para de ficar
pedindo calma, ou para eu relaxar. Eu tô calmo pra caralho nesse momento!
— Tá legal. — Jack levanta as mãos e se afasta. — Só prossegue,
Jamie, e por segurança eu vou trancar a porta, assim ele não faz nenhuma
besteira.
— O que eu ouvi foi que Olivia não confia em mim, mas o Benjamin
sim. — Respiro fundo. — Ele acha que porque eu aceitei me casar com
Andrew, sou ambiciosa. Ele pensa que assim como ele e Olivia, a única coisa
em que eu estou interessada é no seu dinheiro. Então ele acredita que pode
me convencer a largar o Andrew e ficar ao lado deles. Porque sem o Andrew
no caminho, não há mais ninguém concorrendo à presidência. A ideia dele é
que oferecendo mais grana para mim, vou abandonar você.
— Filho da puta — Andrew xinga.
— Tudo bem, saquei tudo. — Jack prepara uma dose de uísque e vira
tudo em único gole. — Mas o que isso tem a ver com o seu plano?
— Eu pensei que talvez eu pudesse fazê-lo acreditar nisso, que eu sou
só uma garota ambiciosa — respondo. — Posso fazer com que ele ache que
estou interessada nele, e não no Andrew. Se ele pensar que estou com ele, vai
me contar tudo, todo o plano deles, talvez até me ofereça o dinheiro. Se
tivermos uma confissão é o fim deles.
— Não — Andrew nega, balançando a cabeça. — Que plano
estúpido, você não vai fazer isso.
— O plano é ótimo, Jamie — Jackson elogia olhando Andrew torto.
— Se você acha que pode conseguir uma confissão, não vamos precisar de
mais nada. Elizabeth vai ter uma prova.
— Isso mesmo — digo. — Posso, sei lá, gravar tudo.
— Não! — Andrew protesta me olhando irritado. — O que você não
entendeu na palavra não?
— Andrew, eu sinto muito, mas a escolha não é sua — digo. — Eu
quero fazer isso, quero ajudar você e quero impedir aqueles dois. Não vai
adiantar nada você sair daqui e quebrar a cara do Benjamin. Também não vai
adiantar nada contar à sua avó e ela não acreditar em você. Eu acho que tenho
a capacidade de conseguir isso, ou pelo menos tentar.
— Jamie, tudo o que você ouviu hoje só prova como aqueles dois são
capazes de qualquer coisa. Eu não quero você metida nesse assunto mais do
que já está, não quero que se arisque por mim — Andrew fala, aborrecido.
— Mas ninguém precisa se arriscar, cara — Jack interrompe. —
Podemos criar uma situação toda e ter tudo nas mãos para agirmos a qualquer
momento. Assim a Jamie não corre perigo.
— O que você quer dizer? — Andrew pergunta fitando o amigo.
— Jamie, você acha que pode fazer isso hoje? Digo, arrancar a
confissão de Benjamin? — Jack pergunta-me.
— Eu… Eu acho que sim — afirmo.
— Bom, porque nós podemos fazer isso essa noite — Jackson
prossegue, empolgado com a ideia. — O jantar de hoje vai acontecer no salão
do hotel. Podemos reservar dois quartos, um para que Jamie fique a sós com
Benjamin e consiga a confissão dele, e outro para que nós possamos ficar
bem próximos e agir, caso ela precise da nossa interferência. Se Benjamin
tentar ultrapassar os limites, nós entramos lá e tiramos a Jamie.
— Não gostei — Andrew resmunga. — Não vou colocá-la em um
quarto com aquele canalha filho da puta.
— Eu já disse que você não decide o que eu faço, Andrew —
interfiro. — Jackson, siga com esse plano, vamos fazer isso.
— Por que vocês dois estão achando que podem pisar nas minhas
ordens? — Andrew nos encara. — Ninguém vai fazer nada sem a minha
permissão, estão ouvindo? Que cacete!
— Se você não quiser seguir o plano desse jeito, com segurança,
então eu farei de outra forma, mas vou fazer. É necessário, Andrew. O que eu
não vou fazer é ficar assistindo àqueles dois arruinando essa construtora e
saindo daqui vitoriosos. Eu entrei nessa com você e vou dar o melhor que
posso para te ajudar a ser o presidente da Simon’s. Por favor, fica comigo
nessa.
— É, Andrew — Jack concorda. — Eu também não vou assistir você
perder tudo para aqueles dois. Se a Jamie quer fazer isso, vou ajudar ela.
Tendo ou não sua aprovação.
— Ótimo. — Andrew suspira. — Tenho um melhor amigo imbecil e
uma mulher teimosa.
— Tá com a gente ou não? — questiono impaciente.
— Estou com vocês — Andrew cede. — Mas quero estar lá de olho
em tudo, e se Benjamin tentar alguma coisa vamos invadir o quarto e acabar
com a palhaçada. E depois que tivermos a confissão eu quero ter o direito de
quebrar a cara dele.
— Por mim tudo bem. — Dou de ombros com um sorrisinho.
— Vou até levar a pipoca pra assistir — Jack brinca.
— Preciso voltar ao trabalho — aviso. — Ou Benjamin pode
desconfiar de alguma coisa, e não queremos isso.
— Você vai voltar até lá para trabalhar com ele mesmo depois de tudo
o que ouviu? — Andrew pergunta-me.
— Eu vou, e você sabe que não tenho escolha. Além disso, ele não vai
tentar nada no escritório, tem muita gente.
— Ela está certa — Jack diz. — Benjamin sempre tenta ser o mais
discreto possível. O que podemos fazer é voltar à rotina e fingir que não
sabemos de nada. Entendido, Andrew?
Jack e eu o encaramos com olhares questionadores.
— Por que estão me olhando desse jeito? — Andrew pergunta. —
Não vou quebrar a cara dele ainda, relaxem.
***
Trabalhei o dia todo na presença de Benjamin, e foi uma das coisas
mais difíceis que eu já tive que fazer. Porque no fundo eu queria gritar com
ele, esbofeteá-lo, denunciá-lo por tudo o que eu sabia que ele estava fazendo.
Mas acabei agindo como a secretária eficiente que eu sou e fingi que nada
estava acontecendo. Quando meu horário terminou, peguei minhas coisas e
saí sem me despedir. Encontrei Andrew me esperando e fomos para casa
juntos. Durante o trajeto, dentro do carro, Andrew ficou insistindo que era
uma loucura eu me arriscar daquela forma. Mas eu o ignorei, não tinha volta,
alguém precisava fazer alguma coisa.
Quando chegamos à mansão, foi difícil cumprimentar todo mundo e
continuar fingindo que estava tudo bem. Escolhemos não contar a mais
ninguém o que sabíamos, nem mesmo para Abigail. Não queríamos ter que
lidar com ela, caso resolvesse por si própria quebrar a cara de Benjamin e
Olivia. Com Andrew ainda podíamos lidar, mas Abigail tinha um gênio mais
forte que o dele. Preferimos mantê-la no escuro.
Andrew foi tomar banho e se arrumar para o jantar, ele tinha que estar
impecável para o papel que teria que desempenhar. Eu fui até o quarto de
Abigail e nós duas nos arrumamos juntas. Ela escolheu para mim um lindo e
comportado vestido vermelho justo. Encheu-me de joias, arrumou o meu
cabelo e também fez minha maquiagem. No final, eu realmente parecia com a
esposa de alguém muito importante. Para si própria ela escolheu um
vestidinho preto, que também era justo, mas não tão comportado como o
meu. Ficamos prontas em três horas.
Quando retornei ao quarto, Andrew estava parado em frente ao
espelho tentando ajeitar o lenço dentro do bolso do paletó. Ele ouviu o som
dos meus saltos e se virou. Sorrindo orgulhosa com a minha própria
aparência, dei uma rodadinha e parei na sua frente.
— Você está linda — ele elogiou, mas não parecia feliz.
— Pela cara que você está fazendo estou me sentindo uma palhaça.
Ele riu e me puxou para perto.
— Você está incrivelmente linda, está longe de ser uma palhaça. Mas
isso me preocupa, porque o que eu acho bonito Benjamin vai achar duas
vezes mais. Ele sempre quer tudo o que eu tenho, e eu não posso deixar que
ele tenha você.
— Bom, eu acho que você está se esquecendo de que eu sou uma
pessoa. Eu tenho o direito de escolher algo, e entre você e Benjamin, eu
escolho você duas vezes.
— Jamie, se ele tentar qualquer coisa, se ele encostar em um fio do
seu cabelo….
— Eu já sei, eu já sei. — Empurro-o e me afasto. — Aí eu grito e
meus dois super-heróis vão estar lá para me salvar.
— Você está levando na brincadeira — Andrew acusa, começando a
ficar irritado novamente. — Eu tô falando sério.
— Eu também estou — afirmo. Aproximo-me dele novamente para
ajeitar o lenço caindo para fora de seu bolso. — Prometo a você que seguirei
com o plano.
— Obrigado por me acompanhar essa noite — Andrew agradece. —
E também por esse plano idiota.
— Tudo bem. Agora vamos fazer isso, não podemos chegar atrasados,
é o nosso jantar.
— Senhora Simons? — Andrew me oferece o braço, e eu aceito.
— Obrigada, Sr. Simons.
Descemos as escadas juntos e encontramos toda a família esperando
por nós. Elizabeth continuava fraca, mas exigiu fazer parte do jantar. Ela
queria ver com os próprios olhos tudo o que Andrew tinha preparado,
obviamente, todos discutiram com ela, mas perderam. Lorenna e Addison
também iam, tanto para fazer companhia para Elizabeth, quanto para ver de
perto tudo o que Andrew planejou.
Abigail parou no hall, girando duas chaves no dedo.
— Vamos, vó, sou eu que vou dirigir — anunciou, sorrindo de orelha
a orelha.
— Ai, meu pai amado, nossa senhora dos trânsitos, proteja minha
vida — Lorenna brincou.
— Mãe, eu não achei engraçado — Abigail retrucou.
— Vamos em carros diferentes? — perguntei ao Andrew.
— Sim. — Ele acenou, concordando. — No nosso, só tem lugar pra
gente.
— Confio na minha neta. — Elizabeth sorriu. — Vamos, Abigail, me
mostre como os jovens dirigem hoje em dia.
— Vó, você vai adorar — Abigail garantiu. — É pura adrenalina.
Todo mundo riu.
— A chave, Abby — Andrew pediu, e ela jogou para ele uma das que
tinha na mão.
— Pombinhos, divirtam-se no passeio. — Abigail acenou. — Mas
não se atrasem.
As quatro saíram pela porta da frente e nós seguimos atrás. Abigail
deixou a propriedade cantando os pneus do Porsche. Eu só conseguia pensar
em Elizabeth e Lorenna apavoradas e rezando para que ninguém morresse na
viagem até lá.
— Tenho uma surpresa para você — Andrew disse, quando paramos
no topo da escada, fora da mansão.
— Pra mim? Andrew, eu já perdi as contas de quantas surpresas você
fez pra mim.
— É porque não é pra você contar mesmo. — Ele sorriu. — Fica aí,
volto já.
Assisti a ele caminhar até a garagem do outro lado do jardim e entrar.
Desci a escadaria para esperá-lo. Ouvi o barulho distinto de um motor e ergui
a cabeça a tempo de vê-lo manobrando um carrão, que não era nenhum
daqueles que eu já estava acostumada a ver em sua garagem, mas era
igualmente lindo. O veículo dos sonhos, prata, brilhante e poderoso. Andrew
parou com o carro bem na minha frente e me deu um sorrisão imenso de
felicidade. Na hora, tudo o que me passou pela cabeça foi que ele havia
comprado esse novo brinquedinho para si mesmo.
Andrew abriu a porta do carro, deu a volta e parou na minha frente.
Ainda sorria feito um menino grande quando balançou a chave diante dos
meus olhos. Fiquei encarando o chaveirinho de abelhinha que ele tinha
pendurado junto à chave e, de repente, dei-me conta de que estava
entendendo tudo errado. Não era um brinquedo novo de Andrew, ele já tinha
os seus e estava contente com o que tinha. Aquilo era um presente para mim.
Um desejo que ele conhecia, pois tinha lido minha lista. De repente, fez
sentido toda aquela conversa sobre encontrar um instrutor. Não tinha nada a
ver com o fato de ajudá-lo quando ele precisasse, mas de ter a certeza de que
eu estaria apta a realizar mais um dos meus sonhos. Eu tinha tirado minha
carteira só há uma semana e Andrew ficou o tempo todo me dizendo que eu
precisava de um carro, mas eu fiquei falando que não era necessário. E agora
isso…
— Diz alguma coisa — Andrew pede, olhando-me com ansiedade.
— Andrew.
— Tá, eu adoro quando você diz o meu nome. Mas eu quero saber
sobre o carro.
Isso me fez rir um pouco.
— Por que isso?
— Porque você é a mulher de um cara que tem grana, um cara que
quer dar apenas o melhor para a esposa e, definitivamente, um cara que quer
tornar o desejo dela realidade.
— Andrew, isso não está certo. Você já realizou todos os desejos
possíveis da minha lista, e quando eu coloquei sobre o carrão, não quis dizer
que queria um. Eu teria ficado satisfeita de dar uma voltinha em um dos seus.
Você não tinha que ter comprado um carro para mim. Um carrão desses!
— Tarde demais para voltar atrás. — Andrew me estende as chaves.
— É seu, e você é quem vai nos levar até o nosso jantar. Acho melhor se
apressar, porque não podemos nos atrasar.
— Eu não sei dirigir isso! — protestei.
— Que eu saiba eu paguei aulas práticas para você aprender a dirigir
qualquer carro.
— Você devia ter me dado um carro mais normal, então — aponto.
— É um Nissan 370z e esse é um carro normal, querida. — Andrew
ri. — Vamos lá, quero ver se você é boa motorista.
Ai, meu Deus, quem precisa de Chris Evans quando se tem o Drew
Simons? Mais um desejo concedido!
***
Eu estava muito feliz quando chegamos ao hotel. Tinha sido o passeio
de carro mais incrível de todos. Senti-me uma celebridade com tanta gente
me olhando quando parei o carro em frente ao hotel e entreguei as chaves ao
manobrista. Senti saudades quase na mesma hora, Andrew até riu, mas me
confortou dizendo que eu voltaria a dirigir aquela belezinha mais vezes.
Entramos no salão do hotel de braços dados e começamos a passar de mesa
em mesa, cumprimentando nossos convidados. A maioria eram clientes e
funcionários da construtora. Cumprimentei todos com um sorrisão imenso,
enquanto ia sendo apresentada por Andrew como sua esposa. Demorou, mas
nós conseguimos passar em todas as mesas.
Logo depois, Andrew foi chamado ao palco, onde se reuniu com
outros funcionários e juntos fizeram a apresentação do mais novo, importante
e milionário trabalho da construtora. O projeto do resort para o senhor
Matsuhara, que também estava na plateia, entre os convidados da noite. Uma
maquete cinco vezes maior do que a que eu tinha visto na sala de Andrew
estava em exposição no salão, para que todos pudessem ver de perto o
trabalho. No telão, em cima do palco, logo atrás de Andrew, passavam
imagens mostrando tudo o que o resort teria para oferecer aos seus hóspedes.
Ao meu lado, vi várias pessoas apontando e distribuindo elogios sobre o que
viam diante dos seus olhos. Estavam todos animados e surpresos que o
projeto tivesse partido de Andrew.
O jantar foi servido logo depois, então Andrew deixou o palco para
me acompanhar até nossa mesa, onde nos sentamos com Elizabeth, Lorenna,
Abigail, Addison e Jackson. Elizabeth estava quase aos prantos de tanta
felicidade e orgulho do neto. Lorenna e Addison não paravam de elogiar
tudo. Abigail e Jackson só reafirmaram o quanto acreditavam no potencial e
na competência de Andrew. Foi um jantar extremamente alegre e agradável.
Quando a sobremesa foi servida que a situação começou a mudar. Comecei a
ficar preocupada e senti a tensão de Andrew e Jackson, pois ambos eram os
únicos além de mim que sabiam o que mais iria acontecer essa noite. Corri os
olhos pelo salão até encontrar a mesa onde Benjamin e Olivia estavam e
comecei a me questionar mentalmente como faria para convencê-lo a subir
para o quarto comigo e arrancar uma confissão sua. Eu já carregava um
pequeno gravador comigo, preso ao meu sutiã, e só de saber que ele estava ali
já ficava apavorada.
Por fim, depois da sobremesa, Elizabeth se despediu e disse que iria
voltar para casa e descansar. Lorenna e Addison deram os parabéns para
Andrew por todo o trabalho e foram com ela. Apesar de Elizabeth insistir
para que Abigail ficasse na festa, ela preferiu levar a mãe, a irmã e a avó para
casa. Assim que elas se foram, o nome de Andrew foi anunciado no palco.
Ele se levantou, mais do que preparado para o discurso que iria fazer. Jack
deu umas palmadinhas nas costas dele, incentivando-o. Assisti a Andrew
caminhar decidido até lá em cima e dar outro show como ninguém mais seria
capaz de fazer.
Andrew fez um discurso maravilhoso como eu sabia que faria, ele até
arrancou algumas risadas do público. Quando ele desceu do palco as pessoas
começaram a requisitá-lo em suas mesas. Eu estava circulando pelo salão
com uma taça de champanhe na mão e encontrei Benjamin parado perto de
uma pilastra. Ele estava me observando, isso me fez ter um ataque de pânico
de cinco segundos. Depois, respirei devagar e decidi que o momento tinha
chegado. Dei uma olhada ao redor para localizar Andrew e vi que ele estava
com um grupo de pessoas. Mas Jackson estava exatamente na minha linha de
visão e deu um aceno pouco perceptível, como se dissesse que estava de olho
e que eu poderia ir em frente. Confiei nele.
Caminhei em direção a Benjamin com uma determinação que eu não
tinha, e meus olhos não vacilaram um segundo sequer enquanto eu o
encarava. Parei discretamente ao lado dele como se quisesse dar a ideia de
que estava me escondendo.
— O que você está achando do jantar? — perguntei utilizando uma
voz que eu acreditava ser sexy.
— Como sempre, Andrew conquistou a todos — ele resmunga mal-
humorado, olhando na direção em que o meu marido está.
— Nem todos.
Isso chama a atenção dele, e Benjamin olha para mim, correndo seus
olhos de cima a baixo sobre o meu corpo.
— Perdão, eu me esqueci de mencionar o quão linda você está essa
noite.
— Obrigada — agradeço com um sorriso falso.
— Você deve estar contente que Andrew está conseguindo chamar
tanto a atenção das pessoas. Elizabeth não esperava por essa, ela adorou o
jantar.
— É. Tanto faz — murmuro. — Eu não ligo pra isso.
— Não liga? — Benjamin dá dois passos para perto de mim. —
Pensei que você quisesse que ele se tornasse o presidente.
— Se isso fizer com que ele ganhe mais grana, é claro que eu quero.
Benjamin ri, achando tudo divertido.
— Dinheiro então, é disso que você gosta?
— Disso e de outras coisas — sussurro.
— Jamie, Jamie, por essa eu não esperava. — Benjamin morde o
lábio inferior e dá outro passo, ficando cara a cara comigo. — Pensei que
estivesse ignorando minhas investidas.
— Suas investidas? — Finjo surpresa. — Que investidas? Você nunca
ligou pra mim.
— Isso não é verdade — ele diz. — Eu sempre estive de olho em
você, uma pena que Andrew tenha chegado primeiro.
— E você é casado — aponto.
— Infelizmente.
— Não que eu me importe com isso — eu me apresso em dizer.
— Não? — Ele ergue uma sobrancelha. — Então me diz que você me
acompanharia para outro lugar agora mesmo.
— Tenho um quarto reservado nesse hotel — sussurrei. — Vou na
frente, e você me segue se estiver interessado.
Não olhei para trás, simplesmente sabia que Benjamin iria me seguir.
Era agora. Não tinha mais volta. Eu ia fazer isso.
CAPÍTULO VINTE E SEIS
--—————————————————————————————

Jamie

Paro na recepção e peço para a recepcionista a chave do meu quarto.


Enquanto ela confere meu nome, olho discretamente sobre o ombro para
tentar localizar Benjamin. Ele já está caminhando na minha direção,
completamente confiante. Estremeço com o sorriso que ele me lança e olho
além dele, à procura de Jackson ou Andrew. Nenhum dos dois está onde eu
possa ver, mas eu torço para que eles estejam me vendo. Benjamin para do
meu lado, o que é muito ousado da parte dele, considerando que ele sabe os
riscos que corremos ao sermos pegos juntos.
— Vamos para o meu quarto — ele sussurra bem perto do meu
pescoço, isso causa um monte de arrepios que atravessam o meu corpo. Não
são bons arrepios.
— Eu tenho um quarto reservado.
— E eu tenho uma suíte que é muito melhor. — Benjamin sorri
convencido. — Além disso, se ficarmos no seu quarto, Andrew pode
desconfiar, e não é isso que queremos, certo?
Merda! E agora? Se eu negar o nosso plano falha, se eu continuar o
plano muda de rumo. Ai, meu pai, que escolha difícil!
Olho mais uma vez sobre o ombro de Benjamin, mas não há sinal de
Jackson e Andrew. Penso nas duas hipóteses, a primeira: insistir para
Benjamin ir para o meu quarto e correr o risco de ele desconfiar de mim ou
mesmo negar minha proposta. Então todo o plano irá por água a baixo, e ele
saberá que estávamos tramando contra ele o tempo todo. A segunda opção:
aceitar ir para a suíte de Benjamin e dar continuidade ao plano, só que em um
local diferente. Não ia mudar nada, afinal, o gravador está preso no meu sutiã
e não no quarto onde iríamos ficar. Se Andrew e Jackson estiverem me
seguindo, como o combinado, eles vão perceber que fui forçada a mudar o
plano e aí encontrarão outro jeito de ficar por perto. Era nisso que eu ia
confiar e, portanto, seguiria a segunda opção.
— Tudo bem — concordo. — Vamos para a sua suíte.
— A chave do 218, por favor — Benjamin pede para a recepcionista
que fica momentaneamente confusa com a nossa troca de quartos, mas logo
confere os nomes e entrega para ele o cartão de acesso à suíte.
Seguimos os dois para o elevador, eu na frente e ele logo atrás. Eu
estava tão nervosa que não conseguia me impedir de ficar batendo o pé
repetidas vezes contra o chão. Tive que secar minha mão duas vezes, porque
elas estavam suando. E antes que as portas do elevador se fechassem, ainda
tentei localizar algum sinal dos meus parceiros nesse plano. Só que, mais
uma vez, ou eles estavam muito bem-escondidos, ou não estavam por perto.
Acreditei na segunda opção, até porque Andrew não me deixaria sozinha de
jeito nenhum. Não mais.
Assim que as portas se abrem, Benjamin se aproxima de mim e coloca
a mão na parte baixa das minhas costas, para me conduzir até a porta do
quarto. Ele passa o cartão magnético e escancara a porta. Olho para ela com
um pouco de receito. Andrew e Jackson possuem um cartão magnético de
acesso para a porta do meu quarto, para o caso de precisarem interceder por
mim. Mas agora, com a troca de quartos, eu não tinha certeza de que aquele
cartão iria servir. Também não pude pensar muito a respeito, pois a porta
bateu atrás de mim, assustando-me.
— Enfim estamos sozinhos — Benjamin entoou.
— Pelo visto era o que você queria.
— Você não sabe o quanto.
Ele passa por mim, e eu assisto enquanto ele retira o paletó e o coloca
sobre o recamier.
— Quer uma bebida? — pergunta-me e já se encaminha de preparar a
própria dose de uísque. Eu não quero beber, duas taças de champanhe durante
o jantar foram o suficiente para me encorajar. Mas eu também preciso enrolá-
lo de alguma forma, então aceno, concordando.
— Claro.
— Você não se preocupa que Andrew nos descubra aqui? —
Benjamin pergunta. Caminho até o recamier e me sento na ponta.
— Eu acho que ele está ocupado demais com os seus clientes para
perceber que não estou lá. E você, não se preocupa que Olivia nos pegue?
— Não. — Ele balança a cabeça com um estranho sorriso nos lábios.
— Olivia já me pegou com uma secretária uma vez, ela consegue ser bem
flexível em relação a isso.
— Sim, eu soube da secretária — comento. — Aliás, quem não
soube? E já que estamos falando neste assunto, eu quase não acreditei que
você se deixou ser flagrado daquela forma. Eu pensei que você quisesse a
presidência tanto quanto Andrew.
— E eu quero — ele afirma. — O rolo com a secretária foi um
deslize, mas eu não saí prejudicado. Ao contrário de Andrew, que quando
comeu a secretária anterior, foi pego pela própria Elizabeth.
— Você e Andrew são mais parecidos do que eu imaginava.
Benjamin ri.
— Por quê? — questiona-me interessado.
— Ambos são ambiciosos e capazes de qualquer coisa para
conseguirem a presidência. E, além disso, vocês parecem ter a mesma queda
por secretárias.
— É verdade, não posso discordar. Andrew e eu sempre queremos as
mesmas coisas, mas o importante é que eu sempre acabo conseguindo mais
do que ele.
— Então você acha mesmo que vai conseguir a presidência da
Simon’s depois do jantar incrível que o Andrew deu esta noite?
— Sim, eu vou.
— Posso saber como?
— Eu tenho um trunfo — Benjamin admite.
— Que trunfo? — pergunto curiosa.
Benjamin para na minha frente e estende-me um copo com uísque.
— Você — ele diz. — Você é meu trunfo.
— Eu? — Aceito o copo e tomo um pequeno gole para molhar minha
garganta. — Por que você acha que eu poderia ajudá-lo?
— Você poderia ficar ao meu lado, em vez do de Andrew. Eu garanto
que você teria muito mais a ganhar.
— Eu não sei. Estar ao lado do Andrew é bem vantajoso, você viu o
quanto de coisas ele tem feito por mim? Ganhei um carro hoje.
— Isso é merreca perto do que eu posso te dar, Jamie. — Benjamin
senta-se ao meu lado. — Seu casamento é mais falso do que nota de três
dólares, provavelmente Andrew te ofereceu uma quantia para ficar ao lado
dele até que ele consiga a presidência. E depois? Você pode até ganhar alguns
milhões e sair com um carro. Mas comigo, querida, você iria muito além.
— Quanto exatamente? — insisto.
— Ah, querida, eu posso te pagar três vezes mais o que ele te
ofereceu. — Benjamin toca uma mecha do meu cabelo que está caída sobre o
meu ombro e a coloca atrás da minha orelha. Em seguida seus dedos
acariciaram minha bochecha. — Além disso, você poderia ficar comigo
depois, e eu continuaria realizando todos os seus sonhos.
— Três vezes mais é muita coisa. Mesmo sendo o presidente da
Simon’s você não conseguiria todo esse dinheiro.
— Pode apostar que sim.
— Como? — persisto.
— Eu tenho meus meios, querida, isso é tudo o que você precisa
saber.
Roubando, seu ladrão! Arghh! Desgraçado, fala logo!
— Eu não sei, com Andrew tenho a garantia de que terei muito
dinheiro. Mas a sua proposta, apesar de irresistível, parece um pouco
enganosa. Eu não sou burra a ponto de acreditar que você consegue me dar
tudo o que está prometendo só porque vai se tornar o presidente da Simon’s.
Benjamin, ninguém consegue tanto dinheiro assim.
— Acredite na minha palavra, Jamie, você só precisa ficar ao meu
lado e será tratada como uma rainha.
Acreditar na sua palavra? Eu quero você confessando o ladrão,
crápula, cretino, mentiroso e bandido que é!
— Não me leve a mal, Benjamin, mas eu não posso confiar na sua
palavra. — Levanto-me, querendo me afastar dele e de seus dedos irritantes
que insistem em tocar o meu rosto e pescoço. — Isso são negócios valiosos, e
palavras não bastam.
— Posso conseguir o dinheiro, Jamie — Benjamin afirma. — Já
consegui muito dinheiro com aquela empresa, mesmo não sendo o presidente.
Quando eu for, ninguém poderá me impedir de pegar o quanto eu quiser, não
vou precisar fazer retiradas às escondidas.
— Isso ainda não me dá nenhuma garantia.
— Tudo bem. — Benjamin levanta e caminha até mim. Ele suspira e
prossegue. — Você tem razão, preciso te dar uma garantia de que vou
conseguir a grana.
— Sim?
— Quando Elizabeth deixar a herança, uma boa parte das ações vai
para mim e para Olivia — Benjamin começa. — Mesmo que Andrew e
Abigail recebam algo, eles não serão páreos para a quantidade de ações que
eu e minha esposa vamos ter juntos.
— E daí? — insisto ansiosa. Fala, cretino, fala logo! — O que isso
tem a ver com o nosso acordo?
— Olivia e eu não queremos perder o tempo que nos resta da vida
cuidando daquela construtora. Até parece, três anos lá dentro fingindo ser o
marido e funcionário perfeito já foram o suficiente. Vamos juntar nossas
partes e vender a Simon’s para a pessoa que der o maior lance. É desta forma
que vou conseguir todo o dinheiro, é dessa forma que posso cumprir com a
minha palavra.
— Olivia me odeia, Benjamin! Mesmo que vocês vendessem a
Simon’s, ela nunca concordaria em dar esse dinheiro para mim.
— Ela não te odeia, Jamie — Benjamin sussurra contra o meu
pescoço. — Ela acha que você está ao lado de Andrew e que não é confiável.
Mas eu acredito em você, e logo ela vai perceber que você é uma ótima
aliada. Olivia não vai hesitar em pagar o quanto você quiser para derrubar
Andrew de uma vez por todas.
— Então basicamente este é o plano: Você quer que eu deixe Andrew,
confesse que o nosso casamento é uma mentira para que Elizabeth descarte a
ideia de ele ser presidente. Então ela vai eleger você, e sua intenção é juntar
suas ações com as de Olivia para vender a Simon’s? E com esse dinheiro
você pode me pagar e fazer o que quiser da vida e nada pode te impedir? —
Viro-me e encaro Benjamin. — É este o plano?
— Este é o plano — Benjamin concorda e ataca minha boca logo em
seguida.
Ele tem lábios extremamente gelados e pegajosos. E utiliza de uma
força muito bruta enquanto me segura pela cintura com as mãos e insiste em
enfiar a língua na minha boca. Mentalmente retorno à nossa conversa para ter
certeza de que eu tenho tudo o que preciso para cair fora. Consegui
convencê-lo a me oferecer dinheiro para deixar Andrew, consegui provar que
Benjamin já traiu Olivia e que ela não se importa com isso, pois vive um
falso casamento. Consegui provar que Benjamin já transferiu dinheiro da
empresa. E também consegui que ele falasse do seu plano de vender a
Simon’s e ir embora com o dinheiro. No fim, ainda consegui que ele
concordasse com tudo o que disse. Eu acho que é mais do que suficiente para
que Elizabeth acredite em Andrew.
— Benjamin. — Empurro-o para trás e coloco uma das mãos em seu
peito, impedindo-o de se aproximar. Coloco o meu copo sobre a mesinha e
Benjamin faz o mesmo. Depois, ele começa a abrir os botões da própria
camisa.
— Eu sabia que você era uma garota legal, Jamie.
— O quê?
— Você vai ficar ao nosso lado, não é?
— Ah, sim, é claro — murmuro. — A proposta é irrecusável agora
que eu sei que você pode cumpri-la.
Benjamin termina de desfazer os botões da camisa e a retira, jogando
do outro lado do quarto. Em seguida ele lambe os lábios de um jeito que
talvez considere sexy, mas eu considero no mínimo repugnante. Suas mãos
vão para as suas calças, e eu fico horrorizada ao constatar o volume nelas.
Dou dois passos para trás e esbarro na mesinha, então lentamente vou
escorregando para o lado, tentando encontrar uma saída. Enquanto isso
Benjamin se livra do cinto.
— Eu fico muito feliz em saber que você está do nosso lado. Mas eu
preciso de uma prova de que você é confiável.
— Prova? — Engulo em seco. Isso não pode ser boa coisa.
Cadê o Andrew? E o Jackson? Droga, o show acabou! Já temos a
confissão!
— Isso mesmo — Benjamin concorda. — Porque seria muito, muito
ruim, se você tivesse vindo até aqui esperando arrancar uma confissão minha.
— Eu? Q-quê… isso? Eu… Eu… Não — gaguejo.
— Você parece nervosa. Não se preocupe, depois que você me der a
prova de que está do meu lado, não vamos duvidar da sua palavra.
— Você quer que eu deixe o Andrew? Eu posso fazer isso agora, se
você quiser, é uma ótima prova, não é?
— Não, não, querida. — Ele ri. — Quero outro tipo de prova.
— Benjamin…
— Você é linda, sabia? — Ele se aproxima, para na minha frente e eu
percebo que estou encurralada. — Eu tenho raiva só de pensar que Andrew
chegou a você primeiro e descobriu a mulher incrível que você é. Eu queria
desde o começo tê-la trazido para o meu lado, agora eu percebo o quanto
você é valiosa.
— Obrigada, eu acho. Tá calor aqui dentro, né? Vamos lá pra fora
tomar um ar?
— Vai ficar muito mais quente aqui, querida. — Benjamin estende a
mão e me segura pelo quadril, enquanto se aproxima e esmaga seu corpo no
meu.
Nojento!
O plano só podia ter ido por água abaixo mesmo para que o Andrew e
o Jackson não estivessem aqui nesse momento. Eu tinha a confissão e eu com
certeza não ia ficar aqui para ver Benjamin retirar a cueca. Empurrei-o para
trás, mas Benjamin era tão pesado quanto Andrew, e eu não consegui mover
um milímetro sequer. De repente, ele voltou a beijar minha boca e suas mãos
fizeram o caminho até a bainha do meu vestido. Consegui afastar minha boca
da dele e ofeguei.
— Benjamin!
— Tentando escapar, Jamie? — ele sussurra no meu ouvido.
— Não! Eu só não quero fazer isso aqui!
— Não era o que parecia quando você me convidou para o seu quarto.
— Você me entendeu errado!
— Calma, vai ficar tudo bem. Deixa-me beijar essa boca gostosa.
Benjamin volta a me beijar, e quanto mais força eu exerço para afastá-
lo, mais força ele aplica para me manter quieta. Chego a virar o rosto várias
vezes e esbofeteá-lo no peito, mas isso parece agradá-lo. Então noto a garrafa
de uísque sobre a mesinha, só a alguns centímetros de distância. Liberto uma
das minhas mãos e levo até as minhas costas, tateio sobre a madeira até que
minha mão encontra a bendita garrafa. Benjamin morde o meu lábio inferior
tão forte que lágrimas se formam nos meus olhos e o gosto de sangue atinge
minha língua. Sem pensar duas vezes, ergo a garrafa e acerto com toda a
força e raiva que estou sentindo.
Benjamin cambaleia e eu o empurro, fazendo-o tropeçar e cair no
chão. Ouço-o xingar um palavrão e vejo quando leva as próprias mãos à
cabeça. Miro em direção à porta do quarto, louca para escapar de suas garras.
Mas Benjamin agarra o meu tornozelo e me puxa, fazendo-me cair também.
Dou um impulso com a perna e acerto a ponta do meu salto com força em sua
cabeça. Ele grita de dor e me solta. Levanto-me às pressas e chego à porta.
Puxo a maçaneta, e nada. Está trancada, fico apavorada quando me dou conta
de que não sei onde ele colocou o cartão magnético.
— Socorro! — grito, batendo com os punhos contra a porta. — Estou
presa! Alguém me ajuda! Socorro!
— Segura essa vaca, Benjamin. — Ouço a familiar voz feminina atrás
de mim. Viro-me e encontro Olivia saindo do banheiro da suíte. O que ela
está fazendo aqui? Ai, meu Deus, ela sempre esteve aqui?
— Com prazer, Olivia — resmunga Benjamin, levantando-se do chão
ainda desorientado pelo golpe que infligi nele. — Você vai pagar caro por
isso, sua vagabunda!
— Andrew! — grito, socando a porta. — Jack! Tirem-me daqui!
— Cala a boca! — Benjamin cobre a minha boca e torce minhas mãos
atrás de mim, mantendo-me presa. Tento bater nele, mas ele consegue me
imobilizar. Olivia se aproxima e amarra alguma coisa em volta dos meus
pulsos. Quando ela termina, Benjamin me joga sobre a cama.
— Ninguém vai ouvir você, pode gritar o quanto quiser — Olivia diz.
— Eu estava bem preparada para isso quando reservei esse quarto.
— Eu não acredito que ela me enganou! — Benjamin esbraveja.
— Eu disse, seu paspalho, eu falei que ela não era confiável. — Oliva
cruza os braços. — Ela está com Andrew, nunca quis saber de você. Ela
ouviu nossa conversa no escritório aquele dia, eu sei disso porque a bolsa
dela estava lá, e logo depois nós nos esbarramos no corredor. Você não viu a
cara dela, Benjamin, mas eu vi. Ela estava com ódio da gente por ter
descoberto o que nós estávamos fazendo. Foi correndo contar para o Andrew
e, provavelmente, achou que podia arrancar uma confissão de você.
— E eu consegui! Vou contar tudo o que vocês estão fazendo para
Elizabeth!
— Fica quieta, sua vadia! — Benjamin puxa o meu cabelo, e dor
irradia pela minha cabeça. Eu grito quando sinto a palma de Olivia acertar em
cheio o meu rosto.
— Sua palavra não vale nada! — Olivia sibila. — Você e Andrew
querem a presidência tanto quanto eu e Benjamin queremos. A vovó sabe que
somos funcionários exemplares, que somos casados há muito tempo, que
somos dedicados àquela empresa. Além disso, eu sou a neta dela, e você é
uma mendiga desgraçada que entrou nas nossas vidas para causar problemas!
— Vocês dois vão pagar pelo que estão fazendo — choramingo.
— Ela está muito confiante, Benjamin — Olivia comenta. — Ela sabe
que a palavra dela não vale nada, até porque ela já teria corrido para a vovó
no momento em que nos escutou no escritório. Só que ela não fez isso, ela
veio até aqui fazer esse joguinho para conseguir arrancar as palavras da sua
boca. Ela deve ter gravado tudo, é por isso que ela está confiante. O que você
está escondendo, sua mendiga?
— Me deixa sair daqui! — grito. — Eu vou te denunciar! Vocês dois
vão presos! Me solta!
— Benjamin, vira ela — Olivia ordena.
— Não me toca, seu porco! — sibilo.
Benjamin segue a ordem de Olivia e me vira de forma que eu fico
deitada sobre as minhas costas.
— O que foi, Olivia? — Benjamin pergunta. — Você está com uma
expressão de que sabe de algo que eu não sei.
— Benjamin, eu acho que nós continuamos sendo enganados —
Olivia informa. — Acho que ela está nos gravando, procure o celular dela.
Não! Não! Não!
Benjamin apalpa meu corpo, mas o vestido justo não possui bolsos.
— Sem celular — ele responde.
— Ela tem algo e eu vou descobrir o que é.
— Eu não tenho nada! — exclamo. — Vocês estão loucos! Você não
vai me tocar!
Olivia coloca as mãos sobre as alças do meu vestido e dá um puxão
forte. Sinto o tecido rompendo pouco a pouco enquanto ela vai esgarçando e
revelando minha pele. Ela tem dificuldade para romper a roupa, mas
consegue tornar meu vestido um trapo cheio de rasgos e buracos. Seus olhos
miram no meu sutiã e eu sei que ela acaba de encontrar o que procura.
— Olha só isso, Benjamin, encontrei. — Olivia agarra o gravador e
mostra a ele, em seguida, joga no chão e pisoteia várias vezes com seu salto
sobre ele. — Acabou para você, nada de confissões.
Ah, não! Tanto trabalho pra nada… Não!
— Benjamin!
Andrew?
— Benjamin, abre essa porta agora ou eu juro que quando eu entrar aí
vou acabar com você. — Ouço Andrew gritar enquanto esmurra a porta. —
Eu sei que você está aí, vou arrombar essa porta, caralho!
— Andrew! — grito. — Me ajuda! Andrew!
— Fica quieta! — Olivia acerta outro tapa forte no meu rosto.
— O que fazemos agora, Olivia? — Benjamin pergunta.
— Nada — Olivia responde. — Eles não têm provas contra a gente,
vamos cair fora.
Ouço um barulho alto e forte e logo depois Andrew escancara a porta
e entra na suíte. Seus olhos vasculham todo o ambiente até repousarem em
mim, jogada na cama, com os pulsos presos nas costas e o vestido todo
rasgado. Ele não diz uma única palavra, o olhar no rosto dele diz tudo.
Andrew pousa os olhos em Olivia, mas não perde tempo em encontrar
Benjamin. Assim que coloca os olhos nele, Andrew o ataca. Ambos caem
sobre a mesa de vidro, que se espatifa em vários pedaços no chão. Eles rolam
juntos entre socos e pontapés. Jackson entra logo em seguida, ignora a cena e
corre na minha direção.
— Jackson, para eles! — peço. — Não deixa o Andrew se machucar.
— Ele precisa dar umas porradas nesse cara. Fica tranquila que se a
situação inverter eu me intrometo, mas por enquanto eu acho que o Andrew
tá mandando bem.
— Meu Deus, Jack. — Abraço-o assim que ele solta meus pulsos. —
Obrigada.
— Desculpe — ele murmura. — Sinto muito mesmo, você não devia
estar nessa situação. Eu não prestei atenção, me distraí e caguei com tudo.
— Não foi sua culpa. Eles sabiam o tempo todo, estavam
desconfiados, assim como armamos para eles, fizeram o mesmo comigo.
— Seu filho da puta! — Andrew grunhe um segundo antes de mandar
o punho contra o olho esquerdo de Benjamin. Esse é o golpe final de
Andrew, pois Benjamin apaga.
— Ai, meu Deus, você matou ele? — pergunto apavorada.
Andrew levanta o rosto e olha para mim. Ele tem um corte sobre a
sobrancelha, mas isso é tudo. Já Benjamin está com o rosto todo roxo e tem
sangue respingado em seu peito nu.
— Não, acho que está só apagado. — Jack dá um chute no abdômen
de Benjamin, que solta um gemido baixo. — É. Ainda não morreu.
— E a Olivia? — pergunto olhando ao redor. Ela não está em lugar
nenhum.
— Deve ter fugido quando viu a situação ficar feia — Jack deduz.
— Jamie, você está bem? — Andrew pergunta se aproximando. Ele se
ajoelha na minha frente e toca o meu rosto.
— Estou bem agora. Fiquei com tanto medo de que vocês não me
encontrassem, os dois falaram tantas coisas horríveis. Eles são monstros, têm
que ser presos. Mas eu perdi a gravação, perdi nossa prova.
— Eu ainda não sei como isso foi acontecer! — Jack suspira, irritado.
— Estava tudo tão certo, como deu errado?
— A Olivia sabia que eu tinha escutado a conversa dela com
Benjamin no escritório — explico. — Ela viu minha bolsa lá. Ela contou para
o Benjamin, então eles ficaram prontos, caso eu fizesse alguma coisa.
Quando eu o procurei essa noite, ele já estava esperando por isso. Eu até
consegui fazer com que ele confessasse tudo, e quando ele me pediu uma
prova de que eu estava do lado deles, tentei escapar. Mas Benjamin me
prendeu, e Olivia estava aqui. Ela desconfiou que eu tivesse gravado a
conversa, rasgou meu vestido e encontrou o gravador. Quebrou em vários
pedacinhos. Mas e vocês, como me encontraram aqui?
— O Jack deu uma de imbecil e, em vez de seguir você, foi me avisar
que o plano tinha começado — Andrew conta. — Quando subimos para o
quarto, percebemos que vocês dois não estavam lá. Então descemos e
perguntamos para a recepcionista. Ela disse que tinha visto vocês, mas que
não lembrava qual o número do quarto para onde foram. Pedimos para ela
conferir uma reserva no nome do Benjamin, mas não havia nada. Então o
Jack botou a cabeça para funcionar e pediu para ela procurar no nome da
Olivia. Foi um golpe de sorte, e nós encontramos a suíte. Sabíamos então que
eles tinham armado para nós também.
— O que vamos fazer agora? — pergunto.
— Vou contar tudo pra vovó — Andrew responde. — Não me
importo com as consequências, se ela não acreditar em mim, pelo menos eu
tentei. Não vou ficar parado aqui deixando esses bandidos saírem impunes.
— Você sabe que, contando à sua avó, se ela não acreditar em você,
sua chance de ser presidente também vai ser nula, né?
— Eu sei, Jamie, mas não há mais nada que possamos fazer —
Andrew murmura. — Eu vou confiar que a vovó vai me ouvir e vai acreditar
em mim.
— Vamos cair fora daqui? — Jack interrompe. — Porque, sério, se o
Benjamin acordar e eu ainda estiver aqui, vai ser a minha vez de socar a cara
dele.
— Vamos — concordo. — Eu não aguento mais ficar aqui.
Levanto-me e de repente o quarto todo gira ao meu redor. Sento-me
novamente e toco minha cabeça, que parece latejar. Minha visão fica
embaralhada e começa a obscurecer lentamente.
— Jamie? — Andrew me chama. — O que foi?
— Eu… Eu não sei, eu estou um pouco tonta.
— Droga — Andrew xinga. — Tudo isso foi demais para você, muita
coisa para uma noite.
— Vou ficar bem — murmuro. — Só espere um minuto.
— O que você está sentindo? — ele pergunta.
— Só estou tonta, Andrew, vou ficar bem.
— Vou levar você ao médico — Andrew diz e me coloca de pé
imediatamente.
— Não! — exclamo. — Nada de médicos!
— Jamie, você não tá legal — Jackson diz ao meu lado. — Sério
mesmo, você está pálida demais.
— Não. Vou. Ao. Médico — pontuo. — Vocês estão exagerando, é só
uma tontura.
— Não quero que nada aconteça com você — Andrew diz.
— Andrew, isso provavelmente é apenas um sinal de todo o pavor
que eu senti hoje — minto. — Não é nada de mais, sério.
— Tudo bem — Andrew cede. — Veste isso, vou te levar pra casa.
Andrew retira o paletó e me faz vesti-lo. Depois ele me abraça, e nós
três deixamos a suíte toda arruinada com Benjamin ainda apagado no chão.
***
Quando chegamos à mansão, Andrew me leva direto para o nosso
quarto. Eu retiro meu vestido arruinado e vou para o chuveiro me livrar de
toda a sujeira e repugnância dessa noite. Andrew se junta a mim e lava todo o
meu corpo, levando embora a imagem de Benjamin me tocando. Beijo-o,
querendo apagar o gosto dos lábios gélidos de Benjamin para colocar de volta
a lembrança dos lábios macios e quentes de Andrew. Ele me abraça e me
pede desculpas infinitas vezes, apesar de não ter culpa nenhuma pelo nosso
plano ter falhado.
Quando terminamos, ele me deixa sozinha para me secar e me vestir,
enquanto vai colocar um curativo no corte perto da sobrancelha. Sinto aquela
tontura retornar enquanto estou olhando o meu reflexo no espelho e me
seguro com as mãos no mármore da pia para me estabilizar. Quero acreditar
que essas tonturas têm a ver apenas com o choque de tudo o que vivi essa
noite. Mas, no fundo, bem no fundo, sei que é indício de algo pior. A bile
sobe até a minha garganta, e eu corro para a privada, onde vomito todo o
conteúdo do meu estômago. Faço tudo em silêncio porque não quero que
Andrew me veja passando mal. Não quero que ele insista que devemos ir ao
médico, ele não precisa lidar com isso agora. Temos coisas muito mais
importantes para fazer.
Termino de me arrumar e espero até conseguir ficar de pé novamente
para caminhar até o quarto. Ele está terminando com o curativo quando eu
chego.
— Tudo bem? — Andrew pergunta-me.
— Sim. — Balanço a cabeça.
— Eu não vou esperar mais tempo, quero falar com a vovó agora.
— Tem certeza, Andrew? — questiono.
— Absoluta — ele diz. — Cansei desse jogo com Olivia e Benjamin.
— Você sabe que pode estar abrindo mão de tudo, né?
— Sei — admite. — Mas você, o que você faria?
— Eu faria exatamente o que você quer fazer, a verdade é sempre o
caminho certo. Às vezes é muito difícil dizê-la, mas já que você está se
sentindo tão determinado, siga seu coração, Andrew.
— Então é isso, eu vou lá.
— Posso ir com você? — pergunto. — Eu ouvi tudo o que eles
disseram, posso ajudar você a convencer a sua avó da verdade.
— Você quer fazer isso?
— Quero, Andrew, quero estar lá com você.
Ele sorri.
Andrew pega a minha mão, e juntos nós vamos até o quarto de
Elizabeth. Eu estou tão orgulhosa dele por querer falar a verdade, mesmo
sabendo que pode perder tudo. Fico emocionada com sua decisão, com o seu
crescimento como pessoa. Tenho de me controlar para não beijá-lo, abraçá-lo
e repetir milhares de vezes o quanto ele é um homem incrível. E espero que
Elizabeth pense o mesmo que eu, quando ouvir o que o neto tem a dizer.
Andrew bate na porta, mas é Lorenna quem a abre.
— Oi, Andrew. — Ela abre um sorriso fraco.
— Eu preciso falar com a vovó — Andrew diz, gentilmente.
— Ela não pode conversar agora — Lorenna diz. — Sinto muito,
depois que voltamos do jantar, a mamãe passou mal. Abigail chamou um
médico, e ele veio vê-la. Ela não está correndo nenhum perigo agora, mas o
médico receitou que ela continuasse deitada de repouso. Também deixou uma
enfermeira para cuidar dela, caso aconteça alguma coisa.
— O quê? — Andrew murmura.
— Ela está muito fraca, Andrew — Lorenna prossegue, falando em
voz baixa, provavelmente para não perturbar o sono da mãe. — Eu sei que
você não gosta quando tocamos nesse assunto, mas a doença está cada vez
pior.
— Posso vê-la? — Andrew pergunta, engolindo em seco.
— Ela está dormindo agora, mas você pode vê-la, é claro.
Andrew entra no quarto e Lorenna me dá um breve aceno de cabeça,
antes de permitir que eu siga junto a eles. Olho para a cama, onde Elizabeth
dorme profundamente, em seu sono frágil. Uma moça vestida de enfermeira
está sentada em uma poltrona ao lado dela. Andrew olha para mim e eu para
ele, e nós dois temos uma conversa silenciosa, sem emitir palavras. Ambos
sabemos que não há nenhuma maneira de acordar Elizabeth agora e contar a
ela que sua neta está roubando sua empresa com o marido e que pretendem
vender o patrimônio que ela tanto ama. Seria o fim do repouso dela, e
também da paz de seu sono.
— É tão importante o que você tinha para contar? — Lorenna
pergunta, cruzando os braços.
— Não. — Andrew balança a cabeça. — A recuperação da vovó é
muito mais importante.
— Talvez amanhã ela esteja melhor, então vocês podem conversar.
— É. Talvez.
— Vamos para o quarto, Andrew — peço.
— Boa noite para vocês dois — Lorenna sussurra. — E parabéns pelo
jantar, Andrew. Estava maravilhoso, a mamãe adorou tudo, passou a noite
elogiando você.
— Obrigado, tia, boa noite.
Lorenna fecha a porta assim que saímos.
— Não posso contar, ela não vai aguentar — Andrew resmunga,
agoniado. — Eu não sei o que eu faço agora.
— Calma, Andrew. Você ouviu a sua tia, talvez amanhã ela esteja
melhor.
— Pouco provável, a doença só vai deixá-la mais fraca.
— Vem comigo, vamos descansar também, estamos os dois exaustos
— digo. — Amanhã tomaremos uma providência, pensaremos em algo.
— Você está certa, você deve estar acabada, e eu estou aqui
lamentando.
— Você só está com medo de tudo o que pode acontecer, e eu te
entendo. Mas não vamos deixar Olivia e Benjamin vencerem.
Andrew assente e nós voltamos para o nosso quarto. Eu vou para a
cama, e ele me segue, depois de fechar a porta.
— Você nem precisava fazer tudo isso por mim, Jamie — murmura
quando se deita ao meu lado.
— Somos mais do que parceiros de negócios. — Abraço-o e me
aconchego em seu peito. — Somos amigos.
— É. Somos amigos. — Ouço Andrew concordar, antes de eu apagar.
CAPÍTULO VINTE E SETE
--—————————————————————————————

Andrew

Não durmo a noite toda. Fico deitado na cama, encarando o teto e


pensando em que diabos eu devo fazer para resolver toda essa situação.
Seguro Jamie o tempo todo nos braços, ela dorme aninhada ao meu peito, me
segurando apertado. Sinto conforto em saber que ela está aqui comigo, que eu
tenho alguém para me apoiar. Ela foi tão corajosa em se arriscar por mim,
enfrentou Benjamin e Olivia e, mesmo humilhada, machucada, não se
arrependeu de nada. Continuou sendo forte, eu admirava isso nela.
A noite vai embora, e eu vejo os primeiros raios de sol se infiltrando
pelas cortinas. Estou cansado, exausto, irritado e completamente perdido. Sei
que a forma mais rápida de conseguir tirar Olivia e Benjamin do poder é
denunciando suas falcatruas para a minha avó. Mas ontem, quando cheguei
em casa e descobri seu estado atual de saúde, percebi que é um grande risco
envolver a vovó nisso. A saúde dela está frágil e qualquer problema pode ser
muito desgastante a ela. Não posso arriscar. Decido que eu não posso contar à
vovó o que está acontecendo, pois sei que ela não está em condições de me
ouvir e ficar bem depois. Provavelmente a notícia de que a própria neta a está
roubando seria seu fim.
Olivia sempre foi manipuladora, perversa, desde pequena. Mas já era
de se esperar, porque a tia Eleonor é igualzinha. Entretanto, nunca pensei que
pudesse chegar a esse ponto, de roubar dinheiro da empresa. De viver um
casamento de três anos, com um homem qualquer, só para conseguir pôr a
mão na grana toda. Merda! Eu sou como Olivia? Meu Deus, eu nunca,
jamais, roubaria da minha avó. Mas, afinal, também não estou vivendo um
falso casamento com a finalidade de pôr as mãos na construtora? Talvez eu
esteja sendo um hipócrita. Não! Não posso pensar assim! Posso não ser bom
o suficiente para ser presidente da Simon’s, mas não sou um ladrão. Já não se
pode dizer o mesmo de Benjamin. Por isso tenho que fazer alguma coisa, e
logo.
O problema é que nem eu, mesmo utilizando a ajuda do Jackson,
tenho meios para descobrir as fraudes que Benjamin vem cometendo. E se
ninguém descobriu nada até agora, é porque eles provavelmente encontraram
um meio muito eficiente de nos roubar sem que nossos funcionários se
dessem conta. Se eu não tenho uma confissão vinda da boca dos bandidos,
preciso encontrar outra prova muito boa para colocar esses dois atrás das
grades. E a única maneira que eu enxergo de conseguir isso é pedindo ajuda
para alguma pessoa confiável dentro da empresa, que tenha como alcançar as
informações necessárias para começar uma busca por esses esquemas ilícitos.
Quase no mesmo instante em que a ideia cruza minha cabeça, um nome pinta
na minha mente.
Donna é a única pessoa que eu conheço que pode mover céus e terras
dentro da construtora para conseguir descobrir cada podre de Olivia e
Benjamin. A mulher é funcionária da Simon’s há mais de vinte anos, foi o
braço direito da minha avó enquanto ela ainda estava no poder. Até hoje sua
lealdade com Elizabeth é algo incrível. Além de trabalharem juntas,
construíram uma grande amizade. Donna até o momento é a encarregada pelo
testamento da vovó. Se eu disser a ela o que Olivia está aprontando, talvez
ela me escute. Eu sei que ela entenderá os riscos e fará alguma coisa para me
ajudar. Ela é a minha última esperança.
— Andrew?
Baixo os olhos e encontro Jamie me observando. Sorrio
inconscientemente.
— Bom dia, abelhinha.
— Você está bem? — pergunta-me com a voz grogue do sono. —
Desculpe, é uma pergunta estúpida. É claro que você não está bem.
— Pensei em algumas coisas e acho que eu já sei o que eu vou fazer.
— O quê?
— Vou falar com a Donna, uma funcionária antiga da construtora. Ela
é advogada e geralmente a pessoa que resolve os problemas da empresa.
Vovó confia muito nela.
— Você acha que ela vai te ajudar?
— Eu não sei. — Balanço a cabeça. — Mas eu não tenho muitas
opções.
— Você está certo — ela diz. — Quer que eu vá com você?
— Não — respondo. — É melhor você ficar aqui. Além disso, eu vou
ser rápido. Temos um compromisso hoje à noite que não podemos faltar.
— Temos?
— A exposição do artista da Abigail na galeria — explico.
— Ah, é mesmo! — Jamie senta-se rapidamente na cama. — Eu tinha
me esquecido! E olhe que ela andou falando sobre isso a semana toda! Ela
está tão empolgada!
— Por mim eu ficaria em casa — digo. — Não me agrada nem um
pouco ver um monte de tinta borrada em telas. Mas eu apliquei uma grana
alta neste negócio, preciso conferir de perto o resultado. Além disso, Abigail
foi ao meu jantar, o mínimo que eu posso fazer é ir a esse evento por ela.
— Mas é óbvio! — Jamie exclama. — Eu estava pensando tanto no
seu jantar que acabei esquecendo que a exposição dela seria um dia depois.
Eu acho melhor eu me levantar, ela pode precisar da minha ajuda e…
Andrew, você acha que devemos manter a Abigail no escuro sobre esse rolo
com a Olivia e o Benjamin?
— Não, eu acho que não. Se ela descobrir mais tarde vai virar um
bicho. Só que eu também tenho receio de contar e ela resolver fazer alguma
loucura.
— Deixa que eu mesma conto.
— Fique à vontade. — Levanto as mãos em sinal de rendição. — Lide
você com a fera.
Jamie solta uma risadinha. Um som que ultimamente eu ansiava
escutar.
— Quando você vai falar com Donna? — ela me pergunta.
— Agora mesmo, vou fazer uma ligação e ver se posso passar no
apartamento dela.
— Tudo bem — Jamie murmura. — Eu vou ver como Elizabeth está.
— Vou tomar um banho e desço para tomar café com você.
Desço da cama, passo por ela e dou um beijo rápido em seus lábios
para depois seguir para o chuveiro. Tomo o banho mais rápido que um ser um
humano é capaz de tomar, depois visto roupas limpas. Pego o meu telefone,
procuro o número de Tracy entre os contatos. Ligo para a minha secretária e
peço que ela me passe o número de Donna. Tracy me liga cinco minutos
depois, repassando o número da advogada da vovó. Faço a ligação, e Donna
atende com óbvia surpresa. É claro, eu nunca ligo para ela. Pergunto se posso
passar em seu apartamento, pois tenho um assunto sério a tratar. Donna diz
que estará à minha disposição. Desligo o telefone e vou ver a vovó.
— Ela está dormindo ainda — diz a enfermeira quando entro no
quarto.
Vovó continua do mesmo jeito, deitada na cama, na mesma posição.
Aproximo-me da cama e a observo por alguns segundos. Não estou pronto
para perdê-la, minha avó é tudo para mim. Ela também é minha mãe e o meu
pai. Sempre fomos nós dois contra o resto do mundo. Não vou ser nada no
momento em que ela partir, não quero vê-la partir. Curvo-me e beijo o topo
de sua cabeça grisalha, depois saio, deixando-a descansar.
Encontro Jamie, Abigail, Addison e tia Lorenna ao redor da mesa
tomando café da manhã. Minha prima tem um telefone na orelha e não para
de latir ordens para quem quer que seja o coitado do outro lado. Eu sei que
hoje ela vai estar uma pilha de nervos. Abigail esteve esperando para fazer
essa apresentação na galeria por muito tempo, e se tudo der certo ela pode
conseguir uma grana muito alta. Ela esteve falando desde o começo do ano
que seu sonho é conseguir o dinheiro para comprar a galeria da dona atual
que está querendo colocá-la à venda. Abigail estima muito aquela galeria e
deseja se tornar a proprietária. Eu acho que ela tem muita competência para
isso, e por esse motivo investi em seu artista.
— Você está me escutando, seu idiota? — Abigail eleva a voz ao
telefone. —Não, eu disse as telas grandes nas paredes laranja! Se você
colocar as pequenas vai perder o contraste!
— Bom dia, Andrew — tia Lorenna me cumprimenta.
— Bom dia, tia.
— Você foi ver a sua avó? — ela me pergunta.
— Fui sim, mas ela ainda está dormindo.
— É bom que ela descanse o máximo possível.
— Sim! É exatamente isso o que eu quero, eu pensei que você tivesse
perdido uma orelha! Faça isso, nos vemos a noite — Abigail diz e encerra a
ligação. — O que é isso na sua sobrancelha, Drew?
— Um machucado, dãã.
— Eu sei que é um machucado, eu quero saber o que você andou
fazendo para consegui-lo. Vocês estão praticando algum tipo de luta na cama
agora?
Addison engasga com café e tosse.
— É verdade — tia Lorenna interrompe. — Eu notei o curativo, mas
esqueci de perguntar como aconteceu.
— Dei uns socos em um cara — resmungo.
— Oh, meu Deus! — Tia Lorenna ofega. — Quem? Quando? Como
isso aconteceu? Andrew, você está se metendo em encrenca de novo?
— A Jamie explica tudo pra vocês depois. — Pego um donut e enfio
inteiro na boca. — Eu… teno…que… ir… aglora.
— Vai aonde? — Abigail questiona.
— Num… te interessa — respondo mastigando.
— Eu acho bom que você esteja à minha exposição hoje à noite,
porque se você não estiver, eu não vou te dar um dólar do que eu ganhar —
Abby ameaça.
— Boa sorte, Andrew — Jamie diz.
— Obrigado. — Beijo sua bochecha e me afasto.
Antes de sair de casa ainda ouço Abigail perguntar:
— Por que ele precisa de sorte?
— É uma longa história — Jamie responde. E eu sinto pena dela por
ser a única que vai abrir a boca para contar e enfrentar Abby depois que ela
souber o que nós sabemos e escolhemos esconder dela até agora.
Meia hora mais tarde, eu estou parado em frente à porta do
apartamento de Donna, a qual ela abre, e acena para que eu entre. Donna
deve ter em torno de quarenta e poucos anos, mas ela é muito bem-
conservada. Está sempre sorridente e é muito simpática, no entanto, quando
está a serviço a mulher torna-se um verdadeiro general. E eu acho que é por
isso que a vovó gosta tanto dela.
— Andrew, eu confesso que estou muito surpresa que você tenha me
ligado — ela diz. — Por favor, sente-se.
Sento-me na poltrona que ela me indica e aceno.
— Desculpe se você tinha algum compromisso e eu atrapalhei, mas
eu preciso muito falar com você.
— Estou curiosa. — Ela sorri. — Do que se trata? É sobre seu jantar
de ontem à noite para os clientes? Saiba que eles ficaram muito satisfeitos e
adoraram o projeto do resort. Inclusive, alguns clientes que havíamos perdido
optaram por retornar a parceria com a Simon’s.
— Isso é muito bom, Donna, mas eu estou aqui para tratar de um
assunto mais sério.
— Ah. — Seu sorriso morre, e ela franze o cenho. — Você quer beber
alguma coisa?
— Na verdade não, obrigado. Eu só quero conversar.
— Tudo bem — ela murmura cautelosa e senta-se no sofá em frente a
mim. — O que o traz aqui?
— Eu descobri algumas coisas, Donna, alguns problemas, na verdade
— começo a contar. — Eu não sei o que fazer, porque não posso buscar a
ajuda da vovó nesse momento. E você é a pessoa mais próxima a ela e com
mais conhecimento sobre a construtora do que qualquer outra que eu
conheça. Eu preciso da sua ajuda.
— Você precisa da minha ajuda? — ela repete, arqueando a
sobrancelha fina. — Para que, exatamente?
— Eu desconfio que estejam roubando a Simon’s — explico. — Bom,
na verdade, eu tenho certeza de que estão transferindo dinheiro da construtora
para alguma conta particular ou coisa assim. Eu sei quem são as pessoas
envolvidas, só não posso provar. A não ser que você me ajude, aí sei que
conseguiremos as provas necessárias.
— De quem você está falando, quem são as pessoas envolvidas? —
ela questiona.
— Benjamin e Olivia — respondo. — A tia Eleonor também está
envolvida, porque ela está recebendo parte do dinheiro que está sendo
transferido.
Donna me encara por longos segundos, então desvia os olhos e se
levanta para caminhar de um lado para o outro, parecendo impaciente e
agitada.
— Andrew, essa é uma acusação bem grave.
— Eu sei, mas eu tenho certeza do que eu estou dizendo. Donna, você
precisa acreditar em mim, eles estão fazendo isso e pretendem fazer mais. Eu
sei sobre os planos deles, Benjamin quer se tornar o presidente para vender a
construtora e se mandar.
— Andrew, você deveria conversar sobre isso com a sua avó…
— Ela está morrendo! — Levanto-me alterado. — Ela não sai daquela
cama, está fraca demais!
— Por que eu deveria acreditar em você? — Donna pergunta-me. —
Alguns meses atrás sua avó me procurou para deixar claro que tinha o desejo
de colocar Benjamin na presidência, porque você vinha se comportando
como um moleque mimado. Você, Andrew! Como posso saber se você não
veio aqui me dizer todas essas coisas apenas para acusar Benjamin?
— Donna, eu sei que é difícil de acreditar, eu fiz um monte de
burradas. Mas eu estou falando sério sobre isso. Eu não me importaria de
perder tudo a que tenho direito, só que para isso eu quero ter certeza de que
Benjamin e Olivia também não receberão um dólar sequer.
— Você quer que eu saia investigando Benjamin e Olivia, então?
— Sim, você pode fazer alguma coisa, qualquer coisa — digo. —
Peça uma auditoria contábil, sei lá, mas, por favor, fica do meu lado.
— Sinto muito, não posso fazer nada sem uma ordem direta da sua
avó. Ela ainda é a proprietária da Simon’s e a única que pode permitir uma
auditoria na empresa. — Suspira. — Olha, se você estiver certo, a verdade
vai aparecer.
— O quê? — resmungo.
Mas que porra! Como a verdade vai aparecer se ninguém fizer nada?
— Andrew, se eu conheço bem a sua avó, e sim, eu a conheço, nada
passa despercebido pelos olhos dela, absolutamente nada — Donna
prossegue. — Ela pode estar cansada, doente e fraca, mas não perdeu a
inteligência e a sagacidade. Tudo o que aquela mulher faz tem um motivo,
nenhum de seus atos são por impulso, tudo é muito calculado. Eu acho que
você ainda a subestima demais, sua avó é um enigma bonito de ser
desvendado.
— Cacete! Você andou fumando erva-doce ou algo assim?! —
exclamo. — Eu não faço a mínima ideia do que você está falando. E pelo
visto eu já entendi que não vai querer me ajudar!
— Andrew, confie no que eu estou dizendo — ela continua com um
estranho sorriso no rosto. — O que tem que ser, simplesmente será.
— Eu vou embora, pra mim chega dessa conversa — resmungo.
— Até breve, Andrew. — Ouço Donna dizer, mas já estou bem longe.
Quando eu retorno para casa, descubro que Jamie saiu com Abigail
para ajudá-la com assuntos relacionados à exposição. Tia Lorenna está no
quarto com a minha avó, que continua na cama com uma enfermeira de
plantão. Virginia me oferece o almoço, mas eu recuso. Estou furioso, não
acredito que Donna não vai me ajudar. Não acredito que o mundo todo
parece estar conspirando contra mim e a favor de Benjamin e Olivia.
Somente esse pensamento me deixa extremamente exasperado.
Vou para o meu quarto e me jogo na cama. Afundo a minha cabeça no
travesseiro e encaro o teto como fiz na noite anterior. Tento pensar nas coisas
malucas que Donna me disse, mas eu não vejo qualquer sentido em suas
palavras. Parece que ela está simplesmente virando os olhos para algo errado.
Não posso deixar de pensar se ela também não está envolvida. Meu Deus,
essa hipótese me deixa ainda mais nervoso. Eu não sei quem é confiável e
quem não é. O mundo está desabando sobre a minha cabeça, e eu não estou
fazendo nada.
Perco a noção de tempo enquanto estou olhando para o vazio. Acho
que em algum momento todo o peso sobre os meus ombros se torna demais, o
cansaço vence e eu fecho os meus olhos. Acho que durmo por uma
eternidade, ou pelo menos, era isso que eu queria que acontecesse. Não
parece tão bom viver nesse mundo se eu não consigo mudar o rumo das
coisas. Eu me sinto tão leve desse jeito, como se as preocupações todas
tivessem ido embora. Até que eu sinto o mundo balançar outra vez e acordo
com algo cutucando o meu peito.
— Andrew?
É Jamie, e ela está simplesmente deslumbrante. Ela é como um anjo
imergindo da escuridão para me salvar. Quero me agarrar a ela e não soltá-la
nunca mais. A única coisa que parece ser real, pura e verdadeira na minha
vida é ela.
— Jamie — murmuro.
— Desculpe, eu não queria te acordar, mas você precisa se arrumar —
ela diz. — Você está dormindo, tipo, há umas seis horas direto.
— Droga! — resmungo e sento-me encostado na cabeceira.
— Como foi com Donna? — ela me pergunta.
— Ela não vai me ajudar, só me disse umas coisas esquisitas, eu acho
que ela não acredita em mim.
— Isso não é bom. O que vamos fazer?
— Não sei, Jamie, mas se não me restar muita escolha eu estou
pensando em algo mais grave. Não me importo mais em arriscar o meu lugar
na empresa, se eu tiver que torturar Benjamin, eu vou fazer. A única coisa
que eu não vou permitir é que eles vençam.
— Eu odeio que não tenha conseguido te ajudar — Jamie sussurra.
— Ei, não pense nisso — digo a ela. Seguro o seu queixo para ver
seus olhos e beijo seus delicados lábios rosados. — Você está do meu lado, é
isso o que importa.
— Estou com você para qualquer coisa. Então, se precisar de algo,
por favor, fale comigo.
— Tudo bem, e como foi com a Abby?
— Ela virou uma fera como você disse que ela faria. Foi muito difícil
impedi-la de ir até Olivia para espancá-la.
— Eu imaginava que seria assim.
— Eu acho que ela só não fez nada ainda porque se manteve ocupada
a tarde toda na galeria. E a exposição significa muito para que ela a abandone
agora. Mas eu tenho medo de que ela resolva ir atrás de Olivia depois.
— Ela não vai fazer isso, eu vou conversar com ela. Já sei que Olivia
é capaz de pisar em qualquer um para ir adiante, não vou deixar a Abby
correr perigo também.
— É melhor a gente ir, vamos nos atrasar.
— Abigail está aqui? — pergunto.
— Não, ela e Addison ficaram na galeria e vão se arrumar em um
salão lá perto.
— E a tia Lorenna?
— Ela não vai, disse que prefere ficar em casa com Elizabeth.
— Certo, vou só tomar um banho e nós já vamos.
— Espero você lá embaixo.
***
A galeria de arte Red&Magic’s é um espaço amplo que conta com
três grandes salas bem divididas para exposições. O lugar é moderno, cheio
de cores e bem elegante. É a cara da Abby, jovial e chamativo. Na primeira
sala que Jamie e eu circulamos juntos havia só retratos, fotografias e objetos.
O lugar estava lotado, Abigail não estava brincando quando ela disse que
seria um sucesso. Encontramos várias pessoas ricas e influentes de Nova
Iorque. Os fotógrafos brigavam para conseguir registrar todos os momentos.
Na sala seguinte estavam em exposição os quadros menores do artista
que Abigail estava promovendo. Eu nunca gostei de arte e não fazia ideia de
que as pessoas gostavam daquelas coisas horrorosas cheia de respingos de
tinta. Também não imaginava que isso dava tanto dinheiro, passou pela
minha cabeça até comprar umas telas e uns baldes de tinta. Não devia ser
muito difícil espirrar isso e transformar em uma obra. Na próxima vida, quem
sabe, eu tentaria ser artista.
Na última sala encontramos os quadros maiores, telas tão imensas que
alguns chegavam a ocupar praticamente uma parede. Também havia algumas
esculturas muito loucas, todas retorcidas. Jamie e eu fizemos uma pausa em
frente a um quadro, esse era bem diferente dos demais. Ele era escuro e tinha
alguns contornos que lembravam alguma figura, eu só não conseguia decifrar
o que era. Virei para Jamie e vi que ela estudava o quadro com bastante
atenção enquanto levava a taça de champanhe aos lábios e bebia um pequeno
gole. Era mais interessante observá-la do que o quadro do pesadelo. Para
mim uma obra de arte era alguém como ela, que eu podia decifrar e tocar.
Que eu podia enxergar beleza em seus olhos, na sua boca, na sua pele, no
contorno de seu corpo. Definitivamente eu preferia explorá-la a qualquer
outra coisa no universo.
— Então, o que você acha que é isso? — ela perguntou tirando-me
dos meus devaneios.
— O quê?
— A tela, Andrew — ela respondeu como se fosse óbvio. — O que
você vê?
— Sei lá. — Olhei de volta para o quadro. — Parece um membro da
família Adams com dor de barriga.
Jamie solta uma gargalhada ao meu lado.
— Você não tem jeito mesmo! — Ela me empurra e suga o ar antes
de perguntar. — Por que você acha isso?
— Veja bem, você está vendo esses contornos aqui. — Aponto para a
tela. — Isso é uma boca, e aqui estão os olhos, e bem aqui no meio tem este
nariz feio. É uma pessoa e está vestida de preto. Eu acho que é uma mulher,
por causa dessas sombras aqui que poderiam ser o cabelo. Aposto que é a
Mortícia, ou aquela filha dela, Wandinha.
— Deus! — Jamie ri. — Você gosta mesmo de filmes para crianças,
certo?
Dou de ombros.
— É legal.
— E por que você acha que ela está com dor de barriga?
— Não é óbvio? — digo sarcástico. — Olha só a expressão de
concentração misturada a esse franzir de cenho. E ela ainda está um pouco
curvada para frente, como se estivesse com a mão na barriga.
— Você é impagável!
— Eu não, Abigail é que vem com esses artistas malucos.
— Com licença, Sr. Simons — um fotógrafo nos interrompe. — Será
que poderíamos tirar uma foto do senhor com sua esposa?
— Só se você colocar no jornal de amanhã — digo a ele.
— Ah, bom. — O fotografo fica incerto. — Eu tenho certeza de que o
evento vai estar nos jornais amanhã, eu só não sei se esta foto será divulgada
nele. Desculpe, senhor, eu não tenho essa informação.
— Consiga que a foto seja publicada e você será recompensado.
— Andrew! — Jamie puxa o meu braço, chamando minha atenção. —
O que você está fazendo?
— Estou garantindo que você seja manchete no jornal de amanhã,
querida.
— Não! — ela nega. — Não faz isso, Andrew!
— Então… — Viro-me para o fotografo. — O que vai ser?
— O senhor e sua esposa podem ficar mais juntos, por favor?
Sorrio, sempre consigo o que eu quero.
— Só você para deixar o coitado do fotógrafo daquele jeito! — Jamie
diz depois de as nossas fotos serem tiradas e sermos deixados sozinhos de
novo.
— Coitado nada, ele vai ganhar por aquilo.
— Andrew, você tem que parar de fazer essas coisas.
— Não se você vai sorrir desse jeito — respondo.
— Argh! Você não tem jeito!
— Você já devia saber disso, querida.
— Andrew Simons! — Abigail aparece na nossa frente com um olhar
que eu não gosto nem um pouco estampado em seu rosto. Jackson está com
ela. — Eu odeio você!
— Abby…
— Nem começa! — ela exclama. — Já sei de tudo! Jamie me contou
sobre o que vocês descobriram e sobre o plano tosco que armaram.
— O plano não era tosco — Jamie protesta.
— Colocar esses dois cabeças de vento para cuidar de você fez com
que o plano fosse tosco! — ela aponta.
— Já falamos sobre isso, Abgail, não deu certo porque os dois já
sabiam de tudo — Jackson diz.
— Se vocês tivessem me contado eu teria ajudado, ou melhor, eu teria
arrancado a confissão daquela vadia. E depois eu teria socado a cara dela —
Abigail resmunga.
— Sabemos disso — Jamie diz. — E justamente por isso não
envolvemos você no plano.
— Eu ainda vou quebrar a cara da Olivia, escute o que eu estou
dizendo — Abigail ameaça. — Se vocês não tiverem um plano B, juro que
faço por mim mesma.
— Você não vai fazer nada, Abigail — prossigo. — Eu não quero que
você sequer chegue perto da Olivia, eles são perigosos. E antes que você
venha dar uma de corajosa, já vou avisando que ficarei furioso com você se
tentar algo sem me dizer.
— Ele está certo, Abigail — Jackson interfere. — Eles são capazes de
qualquer coisa. Olivia acha que o plano deles já deu certo, ela vai fazer
qualquer coisa que puder para que nada saia errado.
— Mas nós temos que fazer algo! — Abigail replica. — Meu Deus,
eles estão roubando a construtora! A vovó precisa saber disso…
— Nada de envolver a vovó — interrompo. — Ela não pode lidar
com isso agora, de qualquer maneira.
— Ah, droga, você está certo — Abigail diz. — E o que fazemos
agora?
— Agora? Nada. — Balanço a cabeça. — Não tem como fazer nada
agora, nosso próximo passo tem que ser bem pensado.
— Mas precisamos agir imediatamente…
— Abby! Drew! — Addison se aproxima com o rosto aflito e um
telefone na mão trêmula. — A mamãe está no telefone. — Ela soluça e
estende o aparelho na minha direção. — É sobre a vovó…
Pego o telefone da mão de Addison e Abigail abraça a irmã mais
nova, que no mesmo instante começa a chorar.
— Oi, tia, o que foi?
— Andrew — ela expira o meu nome como uma lufada de ar. —
Você precisa vir para cá!
— Tia, o que está acontecendo?
— Andrew… — Ela funga fortemente, e eu sei que está chorando. —
Estou no hospital.
Travo… Paraliso… E a terra para de girar em seu próprio eixo.
— O que aconteceu com a vovó?
— Vem para o hospital, Andrew, traga Abigail e Addison com você.
— Ela chora. — Venham rápido, vocês não têm muito tempo.
— Caramba, não, não, tia — imploro. — Me diz que ela tá bem, ela
vai ficar bem.
— Não, querido, não dessa vez — ela lamenta. — Ela precisa ver
vocês uma última vez.
— Que hospital?
Ela me passa o endereço e me implora para ser rápido. Desligo o
telefone e o devolvo para Addison, minhas mãos estão tremendo tanto quanto
as dela. Todos estão olhando para mim, esperando por uma resposta. Sinto
uma dor invadir o meu peito quando aviso:
— A vovó foi levada ao hospital, e parece que não vai sair de lá dessa
vez.
— Oh, meu Deus! — Abigail ofega e tropeça para trás. Jackson
agarra o braço dela, impedindo-a de cair. — Não agora! Ela não pode morrer!
— Vamos paro hospital agora, eu não quero perder tempo — digo e
só tenho tempo de puxar Jamie comigo e sair às pressas da galeria. Jackson,
Abigail e Addison nos seguem e deixamos tudo para trás.
Quem dirige para o hospital é o Jackson. Ele é a único que ainda não
está tremendo da cabeça aos pés como o resto de nós. Abigail e Addison
estão chorando copiosamente no banco de trás, abraçadas com Jamie. Eu
quero estar no hospital porque preciso ver a minha avó, mas ao mesmo tempo
eu não quero estar lá. Tenho medo por saber que essa pode ser a última vez.
Acho que nunca senti tanto medo na vida como agora.
Quando Jackson estaciona o carro, eu desço e vou em direção à porta
do hospital. Não espero por ninguém, me sinto tomado por um desejo de
apenas estar lá o mais rapidamente possível. Na recepção, pergunto pelo
quarto da minha avó, e a mulher me informa rapidamente. Pego o elevador,
praticamente corro pelo corredor, até encontrar tia Lorenna sentada em uma
poltrona da sala de espera. Ela está terrível, com o rosto inchado, e os olhos
vermelhos de tanto chorar.
— Tia.
— Andrew! — Ela se levanta com pressa, quando me vê, e me abraça
apertado.
— Tia, isso não pode acontecer. Não podemos perdê-la agora.
— Sinto muito, Andrew, sinto tanto. — Ela volta a chorar com a
cabeça enterrada no meu peito. — Ela estava sentindo tanta dor, eu nunca a vi
sofrendo daquela maneira. O médico deu alguma coisa para aliviar, mas ele
disse que ela não tem muito tempo.
— Não pode ser verdade, não pode.
— Mãe! — Abigail aparece e se joga nos braços da tia Lorenna,
ambas choram.
— Ela quer ver você, Abigail — tia Lorenna diz afastando a filha
mais velha e depois olha para a mais nova. — Você também, Addison. —
Então seus olhos pairam sobre mim. — E você, Andrew. Ela quer os netos
juntos.
— Eu não tô pronto pra isso. — Passo a mão pelos cabelos e jogo a
cabeça para trás. — Não vou conseguir, ela é tudo que me resta.
— Você precisa ser forte, Andrew — tia Lorenna diz. — Faça isso
por ela, se não conseguir fazer por você. A avó de vocês está pedindo por
último momento com os netos. Vocês não podem desperdiçar isso.
— Não vou conseguir sabendo que ela vai morrer! — Abigail
choraminga.
— Vai sim — Lorenna insiste. — Seque essas lágrimas, e entre lá
sendo a garota forte que você é. Andrew, seja o homem corajoso que sua avó
criou e entre naquele quarto como se fosse um dia qualquer. É o que ela quer
de vocês.
— Você está certa. — Respiro fundo. — Não vou abandonar a minha
avó no último segundo de vida dela por ser um fraco.
— Isso mesmo, Andrew. — Tia Lorenna acena. — Ela quer muito ter
algumas palavras com vocês.
— Vamos, Abigail, Addison. — Estico a mão para elas, e ambas
aceitam, ainda que relutantes.
Abigail insiste em secar os olhos e deixar que as lágrimas parem antes
de entrar no quarto. Ela quer ser durona, mas quando se trata da nossa família
isso se torna difícil. Eu mesmo estou com um caroço entalado na minha
garganta e sinto os meus olhos arderem, mas continuo me segurando. Digo
para mim mesmo que eu não vou chorar, eu não vou quebrar nesse momento.
Vou segurar até o último segundo.
Abro a porta do quarto e tomo o primeiro choque. Vovó parece
pequena e indefesa, deitada em seu leito. Seus olhos estão abertos, mas ela
encara o nada. Quase como se já tivesse aceitado sua morte e estivesse
esperando o momento de partir. Sua pele está muito pálida, e suas feições,
contorcidas pela dor que ela deve estar sentindo. Sinto aquela fisgada no
peito novamente, mas dou mais alguns passos até estar parado no meio do
quarto. Addison para ao meu lado, Abigail ainda permanece perto da porta,
criando coragem.
Vovó vira a cabeça lentamente, como se isso exigisse muito esforço.
E eu tenho certeza de que exige, não é fácil para ela se movimentar. As
máquinas ao seu redor apitam constantemente, mas o barulho de alguma
forma me tranquiliza. Sei que seu coração ainda está batendo, não tão firme,
nem tão forte, mas ela ainda está ali comigo. Addison passa à minha frente e
se aproxima do leito. Ela toma uma cadeira ali perto e ajeita-se próximo da
vovó. Aproximo-me também e fico de pé ao lado dela. Vovó abre um sorriso,
é pequeno, é fraco, mas toca algo dentro de mim. Ela nos ama, e eu a amo.
— Meus netos. — As palavras são curtas, mas ela ainda tem muita
dificuldade em pronunciá-las. — Meus netos maravilhosos.
— Oi, vó — murmuro.
— Andrew — sua voz é apenas um sussurro pronunciando o meu
nome.
— Estou aqui, vó.
Ela balança a mão devagar, e eu sei que é para que eu possa segurá-la.
É exatamente o que eu faço.
— Addison — ela murmura, e seus olhos se concentram na minha
prima mais nova. — Meu doce de criança, você está aqui.
— Estou, vovó. — Addison já está chorando quando acaricia o cabelo
grisalho da nossa avó.
— Onde está… Onde está Abigail?
Ao ouvir seu nome, minha prima mais velha se aproxima e fica do
outro lado da cama, perto do campo de visão da nossa avó.
— Estou aqui, vó. Sempre vou estar com a senhora.
— Ah, minha linda menina. — Ela estende a mão e Abigail a segura
também.
— Você que é linda, vó, só você — Abigail murmura, segurando as
lágrimas.
— Vocês três me orgulham tanto, todos os dias — vovó continua
falando devagar e em pausas longas. — Desculpem se eu os decepcionei…
Juro que tentei o melhor por todos.
— Vovó, você não tem que se desculpar por nada, você foi a melhor
vó do mundo — Addison chora, ao dizer as palavras.
— Addison, minha doce criança, não chore. Quero que preste atenção
no que vou lhe dizer, está bem? — Addison acena, concordando. — Você foi
minha última neta a vir ao mundo. No dia em que nasceu eu estava lá e te
peguei no colo foi uma experiência diferente de quando tomei Olivia,
Andrew e Abigail nos braços. De alguma forma, eu sabia que você seria a
última e nem por isso a menos importante. Cada um de vocês trouxe algo
para essa família, e sabe o que eu acho que você trouxe? — Addison sacode a
cabeça. — Equilíbrio. Você é o nosso mar sem ondas, a calmaria, a
tranquilidade. Você é a mais jovem, mas também a mais sensata. Você é
compreensiva e é capaz de transmitir paz só com seus olhos. Por muito
tempo, quando precisei de paz, encontrei-a nos momentos que passei ao seu
lado. Nunca se esqueça disso, está bem? Você é a harmonia desta família.
“Já você, Abigail… — Vovó aperta a mão dela sutilmente. — Você é
nosso mar com ondas, das mais fortes e turbulentas. Desde pequena, já
mostrava que era dona de uma personalidade forte e marcante. Você me
lembra tanto o seu avô… Lorenna foi a única a se parecer fisicamente com
ele, os mesmos cabelos ruivos e olhos castanhos. E aí ela fez você igualzinha.
Se você o tivesse conhecido, notaria que é uma extensão dele. Seu avô
também era um furacão, deixava marcas onde passava. Deixou marcas em
mim, assim como você. Vou partir levando-a comigo no coração. Seja
sempre essa menina-mulher que luta para conseguir o que quer, que é
corajosa e determinada. — Vovó sorri para ela. — E sempre esteja com a
família, você é uma parte muito importante dela.”
— Eu vou, vó, sempre — Abigail assente, enquanto as lágrimas
quentes deslizam por suas bochechas. — Prometo.
— Andrew. — Vovó dá um leve aperto na minha mão e suspira. —
Ah, Andrew, o que dizer de você? O maior e melhor presente que a vida me
deu. Quando eu me encontrar com os seus pais, vou contar a eles sobre o
homem que você se tornou.
— Não, vó, eu não sou nada disso. — Inspiro fundo. — Sou um
péssimo neto, fiz tudo errado. Magoei a senhora, só te decepcionei. Não
mereço isso, não mereço que pense isso de mim.
— Você pode ter feito algumas coisas, mas eu ainda vou te amar da
mesma forma.
— Vó, eu enganei a senhora, não mereço seu respeito — começo a
desabafar. — A senhora foi a melhor pessoa que eu já tive na vida. Foi minha
mãe, o meu pai e meu avô também. Eu deveria ter trazido só felicidade e
orgulho à senhora, mas eu estraguei tudo. Desculpa, vó, eu só pensei no
dinheiro. Fui ambicioso, ganancioso, fiquei cego por coisas fúteis. Estive
mentindo há tanto tempo, prometi à senhora que eu seria um homem melhor,
mas eu fui ainda pior. Não me casei por amor, me casei por interesse. Fiz isso
porque só queria saber de ganhar a minha herança, nem me importei com os
seus sentimentos quando fiz tudo isso. Não sou um homem, vó, não sou nem
um garoto, sou um lixo. Só mereço o seu desprezo, nada mais.
— Não… diz… isso Andrew — vovó sussurra.
— É a verdade, vó — continuo. — Eu deveria ter feito tudo certo, eu
não tinha por que me tornar o que me tornei. A senhora sempre me deu tudo
o que eu queria, e olhe como fui te agradecer… Sou um monstro, vó.
— Pare, Andrew…
— Só quero que a senhora saiba que eu me arrependo, sei que é tarde
para dizer isso, mas eu realmente me arrependo.
— O que você faria diferente, Andrew? — vovó pergunta-me,
olhando-me através de seus olhos marejados.
— Casaria com a Jamie por amor, trabalharia para ser o melhor
funcionário da senhora. Estaria presente em todos os momentos da sua vida
para não perder um segundo sequer. Tentaria te trazer só felicidade e
nenhuma preocupação — admito com sinceridade. — Eu passaria a enxergar
as coisas realmente importantes no mundo, porque riqueza de verdade não
está nos bens materiais, vó. Ele está nas pessoas, nos lugares, nos momentos.
Eu me dei conta tarde demais.
— Não, meu querido — vovó murmura. — Não é tarde demais, é
apenas o começo.
— Vó…
— Você a ama, não é?
— Tanto que tenho medo de contar e perdê-la — confesso.
— Você não pode perder o que já é seu. — Vovó abre um lento
sorriso. — Olhe para ela e veja como ela te olha de volta. É o amor mais
sincero que eu já tive a oportunidade de ver depois que seus pais morreram.
Não perca isso, Andrew, sua família agora se resume àquela garota. E ela
precisa de você tanto quanto você dela.
— Não é de verdade, vó, a gente começou isso como um negócio para
ambos.
— Não importa como começou, Andrew, o que importa é como pode
ser daqui para frente. Esqueça os seus erros, esqueça o passado e me prometa
agora com toda a verdade em seu coração que você será o homem de quem
eu já me orgulho?
— Prometo, vó, vou ser tudo aquilo que a senhora espera de mim.
— Acredito em você — ela sussurra. — Sempre acreditei.
— Eu te amo, vó.
— Venha aqui, Andrew… me abrace… e vocês também, minhas
meninas.
Aproximo-me de seu leito e da melhor maneira que consigo a abraço.
Assim como Abigail e Addison, que se apertam o máximo que conseguem
para um último abraço. Vovó acolhe a nós três em seus braços, mais uma vez
nos dando todo o seu amor através de um gesto tão simples.
— Eu amo vocês. — É apenas um suspiro, tão baixo que chega a ser
quase inaudível.
Olho para ela e vejo como seus olhos se fecham lentamente, como o
som de “bipe” dos aparelhos aumenta ligeiramente. Abigail grita na mesma
hora, chora e quebra-se bem na minha frente. Addison solta a vovó e se joga
nos braços da irmã, buscando outros braços que a acolham e compartilhem de
sua dor. Eu jurei aguentar até o último segundo, e o tempo acabou. Uma
lágrima desliza pela minha bochecha e outras vêm a seguir.
É esse o momento em que eu quebro para sempre.
CAPÍTULO VINTE E OITO
--—————————————————————————————

Andrew

Elizabeth Simons partiu deixando para trás saudades, valores,


reflexões e, por que não dizer, lições de vida? A prova disso é o número
incontável de pessoas que ela conquistou com o seu sorriso, que ela ensinou
com a sua bondade e que ela manteve com a sua lealdade. Eu não estou
dizendo que ela era perfeita, ninguém é. Mas ela sempre esteve em um
processo de aprendizagem e conhecimento. Ela procurava conhecer as
necessidades do outro e atendê-las. Ela buscava ser feliz e fazer o outro feliz.
A verdade é que ela levava como uma missão de vida ajudar os outros. E isso
fez dela esse tipo de pessoa amada por tantos.
Eu posso ver isso agora, em seu velório. É um dia feio, o céu está
coberto por uma massa nebulosa de escuras nuvens cinzentas. O ar está
úmido e o vento está tão gelado que ele é capaz de esfriar a sua alma. A
chuva está fina nesse momento, caindo como pequenos rabiscos do céu. O
mais engraçado é que durante toda a semana o tempo esteve agradável, e só
fechou realmente hoje. Como se o mundo estivesse lamentando a partida de
uma pessoa tão querida. É tão bom saber que apesar de o clima estar propício
para uma tarde em frente à lareira e embaixo das cobertas, muitas pessoas
deixaram de fazer isso para enfrentar o tempo feio e se juntar em um adeus
para a minha avó.
Juro que nunca vi tanta gente reunida no enterro de alguém como
agora. Toda a nossa família está aqui, mesmo aqueles que não têm o direito
de estar. Nossos amigos vieram de todos os lugares. Até mesmo os
funcionários da construtora vieram se despedir. Tem muita gente que eu não
conheço, pessoas que simplesmente passaram pela vida da minha avó.
Alguns responsáveis por instituições de que ela era membro e ajudava.
Nossos empregados estão aqui, tanto os que ainda trabalham para nós como
aqueles que por algum motivo não trabalham mais. Eu acho que cheguei a
reconhecer alguns dos nossos vizinhos, nunca tive uma palavra com eles, mas
aposto que minha avó sim.
Somos como uma pequena multidão em vestes pretas, nos protegendo
da chuva com nossos guarda-chuvas. Pisamos em poças formadas na grama e
aguentamos os relâmpagos brilhando no céu. A celebração é rápida diante de
um tempo tão instável, mas as palavras que nossos amigos dedicam a dizer
para a minha avó são o suficiente para comover qualquer um. Eu não tenho
mais lágrimas para derramar, fiquei seco por dentro. Sentirei falta dela pelo
resto dos meus dias, mas compreenderei sua partida. Tudo o que eu posso
fazer agora, é acreditar que ela está em um lugar que sempre sonhou
acompanhada das pessoas que ela ama e de quem sentia falta. Eu tenho
certeza de que onde quer que ela esteja vovó está feliz.
Eu observo quando tia Lorenna aproxima-se do caixão e joga uma
rosa branca sobre ele. Em seguida é Abigail que o faz, depois Jackson e os
demais. Sinto uma pontada de raiva quando vejo Olivia arrancar uma rosa
vermelha de um buque e jogá-la lá dentro acompanhada de Benjamin. Eles
não têm o direito de estar aqui, muito menos de se despedir da minha vó. Mas
eu não tenho nem forças para brigar e acredito que nesse momento eu não
deva fazer nada em memória da minha avó. Então eu fico calado enquanto
assisto à tia Eleonor e Saul fazerem o mesmo, e depois o resto das pessoas
por perto. Aos poucos todos vão se afastando, seguindo seus rumos para as
suas casas. Já eu, continuo parado no mesmo lugar, enraizado no chão.
Quando o lugar é apenas um cemitério praticamente vazio, eu dou
alguns passos para frente com Jamie abraçada em mim. Por mim eu ficaria
mais tempo, eu ficaria esquecido naquele lugar com os meus próprios
pensamentos. Mas eu a tenho comigo, e nosso pequeno guarda-chuva mal a
cobre. Sem contar que eu acho que ela está ficando doente e não quero
prejudicá-la caso seja uma gripe. Então simplesmente pego um punhado de
terra. Isso mesmo, eu não posso jogar flores. Minha vó teve flores a vida
toda, o que ela busca nesse momento é o descanso eterno. Jogo a primeira
camada de terra sobre sua sepultura e sei que da terra ela veio e para a terra
ela retornou. Jamie faz o mesmo, e nós somos os últimos a ir embora.
***
As próximas duas semanas passam de forma lenta e arrastada. A dor
ainda é demais para todos nós. Nossa vida se torna um pouco escura durante
esse tempo. Ninguém vai trabalhar, nós mal conversamos, mal comemos.
Nada mais nos importa, nossa casa é vazia e sem graça agora que vovó não
está mais. Não temos risos, ou café da manhã em família, porque não parece
certo fazer isso sem ela. É como se cada um tivesse sua própria rotina
solitária e dolorida para cada dia e cada noite. É isso o que eu faço, eu só
deito e durmo querendo apagar tudo o que aconteceu. Eu não vou para a
Simon’s, não ligo para o que Olivia ou Benjamin estejam fazendo, eu não me
alimento. Torno-me apenas um ser que respira, mas não vive.
Tudo isso muda em uma segunda-feira pela manhã quando tia
Lorenna bate na porta do nosso quarto. Jamie está no banheiro há quase uma
hora, e eu estou deitado na cama assistindo a Supernatural — um seriado com
o tal Jensen Ackles, que parece o gêmeo do Jack. Dou permissão para que ela
entre, e logo tia Lorenna o faz.
— Aconteceu alguma coisa, tia? — pergunto, enquanto ela caminha
até as cortinas e as puxa revelando uma manhã ensolarada.
— Isso tem que acabar, Andrew — ela diz.
— O quê?
— Isso! — Ela faz um gesto para onde eu estou deitado e ao redor do
quarto. — Sim, a minha mãe morreu, a sua avó morreu, a avó da Abby e da
Addi morreu. Todos, absolutamente todos nós, lamentamos a partida dela.
Estamos de luto há duas semanas, sofrendo sem a presença dela. Mas você
acha que é isso que ela espera de nós?
— Aonde você quer chegar, tia?
— O que eu estou querendo dizer é que não vamos mais ficar de luto
nessa casa. Se a mamãe visse como estamos ela nos chamaria de preguiçosos,
diria que estamos usando o luto dela como desculpa. E quer saber? Acho que
ela teria toda a razão. Nós, Andrew, estamos vivos. Em vez de ficarmos
fazendo papéis de zumbis, deveríamos viver a vida da melhor maneira que
podemos. Do jeitinho que a sua avó queria.
— Você quer que eu fique feliz porque a minha avó morreu?
— Oh, Andrew! — Ela suspira e senta-se ao meu lado na cama. —
Não é isso o que eu estou dizendo, menino. Você quer saber se um dia nos
acostumaremos com a perda? Eu posso afirmar que não. Nosso luto vai estar
em nossos corações para sempre, mas nós não podemos viver em luto para
sempre.
— Então você quer que a gente volte à rotina?
— Eu quero que a gente volte a ser a família que era, quero que a
gente fique tão unidos quanto éramos quando sua avó estava viva. Andrew,
vamos mostrar para a sua avó que nós somos fortes, certo?
— Não sei como ser forte agora, tia — confesso.
— Bom, vamos começar pelo café da manhã. — Ela sorri e levanta-
se. — Chame a Jamie e nos encontre lá embaixo. Se você não descer, virei te
buscar pelo cabelo igual quando era um pirralho ainda.
Tia Lorenna deixa o quarto, e eu resolvo sair de baixo das cobertas.
Talvez ela esteja certa, não vamos poder viver no luto para sempre. Temos
muita coisa para fazer ainda, e não será deitado numa cama que eu
conseguirei fazer algo. Desligo a TV e visto uma camisa limpa. Meu reflexo
no espelho não é um dos melhores, mas vai ter que servir. Vou em direção ao
banheiro e abro a porta sem me dar conta de que não bati antes. Mas, porra,
Jamie já está lá há tanto tempo que eu estou começando a desconfiar que ela
desceu pelo ralo do chuveiro. Em vez disso, fico surpreso quando a vejo
sentada no chão. Sua cabeça está curvada em direção à privada, e ela sustenta
seu peso segurando nas bordas com ambas as mãos. Eu só entendo que ela
está vomitando quando uma onda de tremor estremece todo o seu corpo e ela
expele o líquido pela boca.
— Jamie?
Apresso-me em direção a ela, e ajoelho-me ao seu lado. Afasto seus
cabelos para longe do seu rosto e acaricio suas costas enquanto uma nova
onda de ânsias passa por ela. Jamie levanta as costas das mãos e passa sobre
os lábios, depois desvia os olhos para o chão enquanto puxa a descarga.
— Sai daqui, Andrew — ela dispara ríspida, de um jeito que eu não
estava esperando.
— O quê? — Franzo o cenho. — Não, eu não vou sair.
— Eu quero me limpar, por favor, saia — Jamie resmunga.
Seguro seu queixo com uma das mãos e a obrigo a me encarar. Seu
rosto não está corado como eu esperava, caso estivesse envergonhada. Na
verdade, ela está muito pálida.
— Você está doente, não é? — pergunto. — Porra, eu sabia. Você
esteve vomitando outras vezes, e eu percebi que tem deixado de comer
muitas coisas. Eu deveria ter feito alguma coisa, e em vez disso fiquei deitado
naquela cama.
— Eu estou bem. — Ela suspira. — É só uma virose, Andrew, vai
passar.
— Não se você não for ao médico para que ele te passe alguns
remédios — digo. — Vamos descer para tomar café, e depois eu vou te levar
ao hospital.
— Eu não vou ver um médico, Andrew — Jamie responde séria.
— Qual o seu problema com médicos, caramba?
— Não gosto de médicos, assim como você não gosta de ir aos
hospitais — ela resmunga. — Além disso, com algumas ervas eu consigo
curar essa gripe.
— Ervas o caramba, isso é remédio de bruxaria. Vou te levar no
médico, e não tente me fazer mudar de ideia, porque eu não vou.
— Andrew…
— Sem discursão, Jamie.
Fico contente quando ela se levanta com a minha ajuda, e não tenta
argumentar. Sigo-a para perto da pia e assisto a ela escova os dentes e
arrumar os cabelos.
— Você vai ficar olhando tudo o que eu estou fazendo agora? —
Jamie pergunta-me.
— Sim, eu vou vigiar você. Se passar mal de novo eu quero estar
perto para ajudar.
— E se eu disser que preciso fazer xixi?
Aponto o dedo em direção ao vaso sanitário.
— Jamie, esta é privada — zombo. — Privada, esta é Jamie. Ah, pera,
vocês já se conhecem, não é?
— Babaca — ela resmunga, mas ri.
Sua mudança de humor me faz sorrir também. Tia Lorenna está mais
certa do que nunca, eu estou perdendo muita coisa vivendo sozinho com a
minha tristeza e perda.
— Eu estou falando sério, não vou sair daqui — garanto.
— Ótimo, eu não quero fazer xixi mesmo.
Ela se vira e caminha para fora do quarto com uma expressão
emburrada, ela só não deve ter percebido ainda o quanto eu amo o seu lado
bravinha.
Quando entramos na cozinha, encontramos tia Lorenna, Abigail e
Addison sentadas já tomando o café. Puxo uma cadeira para Jamie e sento-
me ao lado dela. Minha tia sorri, certamente contente que eu resolvi escutá-la.
Mas então eu lanço um olhar para a cadeira na ponta da mesa e vejo o lugar
vazio. Meu sorriso morre ao lembrar que vovó era a única que a ocupava.
Acho que a minha tia percebe o que se passa pela minha cabeça, porque ela
resolve interferir.
— Estou feliz que vocês se juntaram a nós — ela diz.
— Você também os ameaçou? — Abigail pergunta com uma pitada
de irritação em sua voz.
— Fique quieta, Abigail — tia Lorenna repreende. — Você sabe
muito bem que não pode ficar trancada naquele quarto para sempre. Sua
exposição foi um sucesso, querida, tem muito trabalho esperando por você na
galeria.
— A galeria não é mais importante que a vovó, mãe — Abigail
replica.
— Pois a sua avó não está mais aqui! — Tia Lorenna eleva o tom de
voz. — Além disso, o que foi mesmo que ela te disse antes de morrer?
— Eu… Que eu deveria continuar sendo quem eu sou, e que a família
vem em primeiro lugar — Abigail murmura com os olhos baixados para a
xícara em sua mão.
— Então, querida. — Tia Lorenna volta a sorrir. — Vamos fazer o
que ela espera de nós, tudo bem?
— Eu acho que a mamãe está certa — Addison interfere nos
surpreendendo. — A avó que eu conheci gostaria de nos ver felizes. Eu estou
triste que ela não esteja tomando café da manhã com a gente, mas sei que o
que estamos fazendo agora é exatamente o que ela queria que fizéssemos.
Família unida, sempre.
— Ok, prima, você não abre a boca. Mas quando abre, só diz
verdades — comento.
— É o que a vovó disse, eu sou o equilíbrio. — Addison pisca.
— Tudo bem — concordo. — Addison está certa, e você também, tia.
Vamos voltar a viver.
— É assim que se fala, crianças — tia Lorenna nos incentiva. — Por
que não falamos de coisas boas? Vocês nem chegaram a ver como saíram
lindos em uma capa de revista.
— Capa de revista? — Jamie engasga ao meu lado com o suco. —
Sério?
— Ah, sim. — Tia Lorenna levanta-se e caminha para fora da
cozinha. Ela retorna logo trazendo três revistas nas mãos e as coloca diante de
nós. — Vocês estavam tão isolados do mundo que não tiveram a chance de
ver. Mas eu guardei.
Pego a revista que ela me estende e vejo a minha foto e da Jamie na
capa com a legenda: “Milionário Andrew Simons e a esposa em grande
evento de arte promovido por Abigail Simons na famosa galeria
Red&Magic’s.” Além da nossa imagem abraçados, sorrindo um para o outro,
também há fotos ao redor de outros convidados importantes. Abigail também
ganhou um espaço privilegiado com uma foto sua e do artista e uma pequena
entrevista que eles concederam. Olho discretamente para Jamie e assisto aos
seus olhos brilhantes percorrerem cada linha enquanto ela lê. Um pequeno
sorriso brota em seus lábios enquanto ela encara nossa foto juntos.
— Como tiveram coragem de publicar isso? — Abigail resmunga. —
Deus, olha só o meu cabelo! Parece que um helicóptero passou a centímetros
de distância do meu couro cabeludo e o deixou todo espetado.
— Tenho que concordar com você, irmãzinha, penteado horroroso. —
Addison ri.
— Obrigada por apontar o que eu já constatei. — Abigail a fuzila com
os olhos. — Nunca mais vou naquele salão.
— Bobagem, filha, ficou linda — Lorenna diz.
— Eu também não estou vendo esse “espetado” que você diz —
Jamie comenta. — Para mim parece ótimo.
— Drew? — Abby me chama.
— Hum?
— O que você acha? — ela pergunta.
— O que eu acho sobre o quê?
— Sobre o meu penteado, é claro! — Abigail exclama. — A opinião
dos homens é mais sincera do que a das mulheres. Fiquei horrorosa, não é?
— Você vai me bater se eu disser que sim? — pergunto.
— Não.
— Parece um poodle — admito, e uma rosquinha colorida vem
voando na minha direção um segundo depois. Tento desviar, mas é tarde
demais, ela bate na minha camisa azul e escorrega para o meu colo. — Porra,
Abby, você disse que não ia fazer nada.
— Eu não disse que eu não ia fazer nada. — Ela ri. — Eu só falei que
não ia bater em você, e eu nem te toquei.
— Ah, droga, vou subir e trocar a camisa pra gente ir ao médico —
aviso a Jamie.
— Médico? — Abby questiona. — Por que vocês vão ao médico?
— Porque a Jamie está doente — respondo.
— Eu não estou doente — Jamie interrompe. — É só uma gripe, e eu
não quero ir ao médico. Será que você pode colocar isso na cabeça dele?
Porque eu não estou conseguindo.
— O que você tem? — Abigail insiste encarando Jamie.
— Nada!
— Ela está vomitando e também já teve algumas tonturas — explico.
— Além disso, olha a pele dela, nem fica mais corada.
— Então sinto muito, mas eu vou concordar com o Drew — Abby
diz. — É melhor você ir ao médico e cuidar disso.
— Tudo bem, eu vou ao médico — Jamie cede. — Mas não com o
Andrew junto, farei isso sozinha.
— Por que eu não posso ir junto? — pergunto.
— Porque eu não quero, tá legal? — Ela suspira. — Vou sozinha, ou
não vou.
— Sabe o que eu acho? — tia Lorenna interfere. — Acho que todos
vocês estão esquecendo que dia é hoje.
— Segunda — Abigail e eu respondemos em uníssono.
— E? — tia Lorenna insiste com um estranho sorriso no rosto.
— E o que, mãe? — Abigail pergunta.
— Crianças, hoje é o dia da leitura do testamento da avó de vocês —
tia Lorenna despeja.
Caramba, como eu fui esquecer?
Olho para Jamie, e ela devolve o olhar de compreensão. Se hoje é a
leitura do testamento, não há mais volta. O que estiver escrito lá é a vontade
da minha vó, e se ela fez Benjamin e Olivia os herdeiros da Simon’s, eles vão
vencer. De repente eu me sinto muito enjoado. Olho para Abigail e ela
também está me encarando, provavelmente pensando o mesmo que eu.
— Eu esqueci completamente que era hoje — Abigail diz.
— Eu não vou — digo.
— Como assim não vai? — tia Lorenna pergunta.
— Não quero ouvir a leitura do testamento, não respondo por mim se
eu vir Benjamin ganhando a presidência da construtora.
— Você acha que a vovó deixou a presidência para Benjamin? —
Addison pergunta.
— Eu não sei. — Balanço a cabeça. — Ela estava descontente
comigo, e Benjamin era tudo o que ela queria para a presidência. Se eu for até
lá, não sei o que pode acontecer.
— Pois eu vou! — Abigail exclama empurrando a cadeira para trás,
levantando-se. — E você vai também!
— Abby…
— Escute aqui, Drew, você tem que ir! — Abigail insiste. — Primeiro
porque há grandes chances de você ter sido escolhido para ser presidente, em
vez de Benjamin. E, segundo, porque se eles receberam alguma coisa eu vou
abrir a minha boca e gritar aos quatro cantos o que aqueles emprestáveis
estão fazendo! Você vai!
— Você tem que ir, Andrew, sua avó pediu a presença de todos os
netos — tia Lorenna diz. — Absolutamente todos.
— Não perca as esperanças, Andrew — Jamie murmura ao meu lado.
— É melhor você ir.
— Vamos todos! — tia Lorenna acrescenta. — E, mocinha, depois
nós vamos te levar ao médico. Concordo com Andrew e Abigail, e já que
somos uma família, todos vão te acompanhar.
— Oh, não — Jamie solta um gemido ao meu lado.
— O que vai ser? — pergunto a Jamie. — Você vai ao médico
comigo, e em troca eu vou assistir à leitura do testamento. Ou então vamos
ficar os dois aqui.
— Isso não é justo, Andrew — Jamie protesta.
— O que vai ser? — insisto, ignorando-a.
— Vamos à leitura do testamento — ela cede.
— E ao médico depois — concluo satisfeito, porque essa batalha eu
ganhei.
***
A leitura do testamento vai ocorrer na sala de reuniões da construtora,
assim como minha avó ordenou antes de partir. Quando nós chegamos ao
local no horário combinado, todos já estão lá nos aguardando. Donna — a
advogada da vovó e responsável pelo testamento — está sentada na ponta da
mesa ocupando o lugar que antes era da minha avó e que, em breve, será do
CEO escolhido no testamento. Sei que só há duas opções para esse cargo, a
escolha está limitada entre mim e Benjamin.
Não consigo esconder meu ódio por Olivia e seu noivo ladrão à
medida que caminho para dentro da sala e seus olhares me seguem. Como
sempre, ambos carregam aquela pose arrogante, como se eles fossem
superiores a qualquer um. A confiança deles provoca um medo enraizado
dentro de mim, porque eu sei que as chances de eles vencerem é grande. Mas
eu me controlo e puxo uma cadeira para Jamie ao meu lado. Tento manter
meus olhos apenas nela, assim evito desmascarar os bandidos na frente de
todos. Não que isso fosse adiantar alguma coisa, nessa altura dos
acontecimentos, se eles são herdeiros, acabou.
De um lado da mesa está tia Eleonor, seu marido Saul, Olivia,
Benjamin, tia Lorenna e Addison. Do outro lado estamos eu, Jamie e Abigail.
Até que Jackson faz uma entrada um pouco barulhenta na sala. Todos nós
viramos para assistir a ele caminhar, acenando com um sorriso para todos.
Ele puxa uma cadeira ao lado de Abby e senta-se. Quero saber que diabos ele
está fazendo aqui. Inclino-me sobre a mesa e é exatamente o que eu pergunto.
— Por que você está aqui, Jack?
Ele pisca, olha para Abigail que devolve o olhar para ele como se eles
estivessem compartilhando algo que só os dois sabem.
— Você vai saber em breve — Abigail responde.
— Você é que chamou ele? — pergunto.
— Não. — Abby balança a cabeça. — Foi a vovó.
— A vovó queria o Jack na leitura do testamento? — pergunto
confuso.
— Drew, cala a boca, você vai entender tudo logo — Abigail diz
encerrando o assunto.
— Você sabe de algo sobre isso? — pergunto para Jamie.
— Não. — Ela me dá um olhar tão confuso quanto, e sei que está
dizendo a verdade. Mas Abigail e Jackson estão escondendo alguma coisa
que claramente apenas os dois sabem.
— Já que todos estão aqui, podemos começar — Donna diz. Ela se
levanta diante de todos, se impondo, vestida em seu terno escuro habitual e
sua carranca profissional. — Como todos vocês sabem, era desejo de
Elizabeth Simons que o testamento fosse aberto e lido na segunda semana
após seu falecimento. Também é do conhecimento de vocês que eu fiquei
responsável pela leitura dele diante apenas das pessoas reunidas nesta sala.
— Sabemos disso, Donna, você pode pular a enrolação habitual —
Olivia interrompe.
— Sra. Cooper, quem conduz a leitura do testamento sou eu, não você
— Donna retruca fuzilando-a com os olhos. — Então, por favor, mantenha-se
calada enquanto eu falo.
— Fique quieta, Olivia! — tia Eleonor repreende a filha.
— Prossiga então, Donna — Olivia diz entredentes com sua cara de
poucos amigos.
— Primeiramente, eu gostaria de dizer que nunca conheci uma mulher
tão maravilhosa quanto Elizabeth Simons — Donna continua. — Trabalhar
com ela foi uma honra, ser sua amiga foi um prazer. Aos olhos do mundo,
Eliza era apenas uma senhora à beira da morte decidindo como partilhar seus
bens entre filhos e netos. Mas eu enxergava outra coisa, eu vi uma pessoa que
poucos de vocês puderam ver. Eliza era inteligente, determinada, sagaz e tudo
isso fez com que ela tomasse as decisões que vocês só vão ver hoje. Ninguém
nunca a influenciou de maneira alguma, tudo o que ela fez foi porque quis.
Vocês não têm ideia do quanto admiro aquela mulher. Aliás, não só ela,
como a sua forma de conduzir a vida e a vida das pessoas ao seu redor. E
agora, obedecendo à primeira de todas as suas ordens antes de partir, eu
gostaria de pedir que as seguintes pessoas ficassem de pé: Eleonor Simons
Meyer, Saul Meyer, Benjamin Cooper e Olivia Cooper.
Enquanto assisto aos quatro ficarem de pé, meu coração congela. Não
sou capaz de pensar, de ver, de sentir qualquer coisa. Já perdi as esperanças,
sabia que em tão pouco tempo vovó não mudaria de ideia em relação a mim.
Não posso dizer que não estou decepcionado, no entanto, sei que não tenho o
direito de achar qualquer decisão dela ruim. Afinal, a culpa é toda minha se
ela não achou que eu era competente o suficiente para assumir tal cargo. Eu
só me arrependo de ter vindo até aqui por insistência de Abigail, não quero
assistir com os meus próprios olhos à vitória desses bandidos. Seguro a
minha respiração enquanto escuto o que Donna tem a dizer.
— Vocês são parte da família de Elizabeth — Donna prossegue. —
Eleonor é a filha que Eliza criou com muito amor e carinho, sempre lhe
dando tudo para que fosse feliz. Saul é o genro que ela acolheu em sua vida e
aceitou para fazer parte dessa família. Olivia foi primeira neta que Elizabeth
teve o prazer de ver e pegar nos braços e, desde aquele momento, Eliza a
amou incondicionalmente. E você, Benjamin, de funcionário exemplar
passou a ser querido pela nossa Eliza. Durante o tempo em que eu fiquei
reunida com Elizabeth antes de fazer o testamento, sabe o que ela me disse?
Para minha filha Eleonor eu gostaria de deixar boa parte das minhas
propriedades compradas no exterior, além de uma boa quantia em dinheiro
para que ela não tenha que se preocupar pelo resto de sua vida. Para a minha
neta Olivia, eu gostaria de deixar outra parte das minhas propriedades, até
mesmo as comerciais. E não poderia negar a ela uma boa quantia em dinheiro
para que tenha a vida que sempre sonhou. E tem mais, Elizabeth ainda disse:
“eu gostaria de nomear meu melhor funcionário, Benjamin Coopper, para o
cargo de CEO da Simon’s construtora”.
Porra, não! Não! Não! Não!
— Ai, meu Deus! — Olivia exclama sorridente. — Eu sabia! Eu
sabia!
— Conseguimos, querida! — tia Eleonor grita, abraçando Olivia. —
Você estava certa o tempo todo, sua avó confiou em nós.
— Eu… Eu não sei o que dizer — Benjamin murmura atordoado com
a surpresa. — Sou o novo CEO da Simon’s?
— Sempre soube o quanto minha sogra gostava de nós. — Saul beija
Eleonor e a puxa para os seus braços.
— Minha querida vó sempre soube o que era certo. — Olivia sorri
cinicamente olhando para nós. — Viram? Eu disse que eu ia vencer!
— Por favor, silêncio! — Donna ordena. — Eu ainda não terminei de
falar, vocês poderiam, por favor, me deixar prosseguir?
— Claro, Donna — Olivia murmura. — Prossiga, por favor.
Não quero ouvir mais nada, meu Deus, eu não posso ouvir mais
nada…
— Como eu estava dizendo antes de ser interrompida… — Donna
volta a falar —, Elizabeth me disse que gostaria de deixar todas essas coisas
para vocês, mas que, entretanto, nenhum era digno sequer de uma moeda,
quanto mais de todos esses bens. Eleonor Simons Meyer e Saul Meyer, eu
tenho como provar que durante três anos vocês dois receberam dinheiro
roubado da construtora por meio de uma conta privada no exterior. Vocês
usufruíram desse dinheiro para pagar suas mordomias e viver à custa do
trabalho dos outros. E eu também tenho como provar que você, Benjamin
Cooper, e a sua esposa foram os ladrões que transferiram o dinheiro não só
para essa conta no exterior, como outra em que vocês eram os únicos
beneficiados. E posso dizer com toda a certeza neste mundo que nada do que
vocês fizeram passou despercebido por Elizabeth. Desde a primeira ação de
vocês, até a última, ela teve conhecimento. Ela deixou que vocês tirassem o
dinheiro dela, que vocês mentissem debaixo do nariz dela, que vocês
tentassem enganá-la do modo que achavam que estavam conseguindo.
Contudo, ela só fez isso porque sabia que o dia em que a queda de vocês
viesse, seria simplesmente espetacular. Como eu estou diante de cada um de
vocês, posso afirmar que Elizabeth estava certa. Eu tenho o maior prazer em
dizer que os quatro foram deserdados e, além disso, os quatro vão responder
pelos crimes que cometeram.
— Que bobagem é essa?! — Olivia grita.
— Eu não entendo! — tia Eleonor exclama. — Você está nos
acusando?
— Eu não tenho participação em nada — Benjamin diz, erguendo as
mãos. — Foram tudo elas, elas que me obrigaram.
— Cala a boca, seu paspalho! — Olivia grunhe.
— Eu também não tenho conhecimento de nada disso — Saul diz.
— Você não pode dizer essas coisas para nós! — Olivia grita para
Donna. — Você nem está lendo o testamento! Abra aquela porcaria, porque
eu sei que eu sou uma herdeira!
— Eu não posso abrir o testamento diante de vocês, essa também foi
uma ordem de Elizabeth. — Donna sorri. — Agora eu gostaria de pedir que
vocês se retirassem desta sala, e não se preocupem em tentar fugir. Quatro
oficiais aguardam vocês do lado de fora para acompanhá-los até a delegacia.
Já adianto que vocês até vão ter direito a um advogado, mas com as provas
que juntei com Elizabeth ao longo desses três anos, com certeza vocês não
deixarão a cadeia tão cedo.
— Você está brincando comigo? — Tia Eleonor começa a chorar. —
Minha mãe nunca me mandaria para a cadeia, ela me amava!
— Elizabeth não amava ladrões, Eleonor — Donna responde.
— Eu não vou para a prisão! — Olivia grita. — Quero ver essas
provas! Não vou pra prisão!
— Ah, cara Olivia, você não só vai para a cadeia como também vai
limpar muitas privadas nojentas naquele lugar — Donna prossegue. —
Espero que o tempo lá te faça refletir sobre como você foi uma bruxa todos
esses anos com os funcionários dessa empresa. Agora você vai sentir na pele
o que é ser humilhada. E não se preocupe, pois eu vou te visitar, apenas para
que eu possa assistir à sua derrota.
— Ninguém vai me prender!
Olivia se vira e sai correndo em direção à porta, desesperada para
fugir. Ela a escancara a e tenta escapar, no entanto, dois policiais que estavam
de guarda no corredor impedem sua passagem, segurando-a. Logo, eles a
empurram para o lado de dentro da sala, e outros dois policiais entram.
Ambos caminham decididos em direção a Eleonor, Saul e Benjamin. Os
policiais algemam cada um deles ali na frente de todos nós. Eu nem me movi
do lugar ainda, estou petrificado, assistindo ao que parece ser a cena de um
filme de ação bom pra cacete.
— Isso não acabou ainda! — Olivia grita esperneando. — Vocês vão
pagar!
Abigail se levanta, empurra a cadeira para trás, fazendo um barulho
alto e chamando a atenção de todos nós. Assisto à minha prima caminhar em
seus saltos até estar diante de Olivia.
— Minha querida prima, se ainda não entendeu, você perdeu —
Abigail sibila diante do rosto dela. E todos nós ofegamos quando ela levanta
a mão com o punho fechado e atinge com força o rosto de Olivia. — Isso foi
por tudo o que você fez, sua cadela.
— Oh, meu Deus! — Olivia grita quando sangue escorre do seu nariz.
— Você quebrou meu nariz!
— Ah, sério? Que pena — Abigail zomba. — Eu mirei para quebrar a
sua cara, não só o seu nariz.
— Prendam-na por agressão! — Olivia grita apontando para Abigail.
Um policial dá um passo para frente, incerto sobre o que deve fazer.
Jackson se levanta e enfia-se entre Abigail, o policial e Olivia.
— Pelo amor de Deus, foi só um tapinha de mulherzinha, senhores —
Jack diz aos policiais. — Vocês não vão querer prender Abigail por agressão,
quando os verdadeiros bandidos estão na sua frente.
— Não me defende não, Jackson! — Abigail exclama. — Me prende
mesmo, policial, me coloca na mesma cela que essa cadela para que eu possa
terminar de arrebentar a cara dela!
— Porra, Abby, assim você não facilita! — Jackson resmunga.
— Não, eu quero ficar longe dessa maluca! — Olivia berra
desesperada. — Não deixem essa mulher chegar perto de mim!
— Policiais, vocês já podem levá-los — Donna diz, acenando.
— Espera! — Eu me levanto e caminho até estar cara a cara com
Olivia e Benjamin. Abro o maior sorrisão. — Eu só queria dizer que eu
espero que vocês apodreçam no inferno.
— Você ainda vai ouvir falar de mim, Andrew — Benjamin ameaça.
— Eu te garanto.
— Mas é claro que eu vou ouvir falar de você! — Sorrio. — Todos os
dias eu vou acordar pensando: Espero que Benjamin tenha sua bunda fodida
pelo resto da vida. E você, Olivia, eu vou sonhar que você está de quatro
limpando a merda dos outros enquanto alguém grita nos seus ouvidos o quão
miserável você é.
— Eu te odeio! — Olivia cospe.
Chupem, imbecis!
— Senhores, já chega, levem todos daqui — Donna ordena e, dessa
vez, os policiais levam os quatro para fora da sala. Essa é uma das cenas que
vão ficar guardadas na minha memória para sempre.
— Quando eu fui à sua casa aquele dia, falar com você… — começo
olhando para Donna. — Você já sabia de tudo, então? Por isso me disse
aquelas coisas?
— Exatamente, Andrew — Donna diz. — Estamos acompanhando
tudo o que Olivia e Benjamin fazem dentro da empresa há três anos. Sua avó
sabia dos roubos, e eu também. Mas a pedido dela eu não podia dizer nada
antes da leitura do testamento.
— Meu Deus, a vovó me enganou esse tempo todo! — exclamo. — É
inacreditável!
— Você não tem ideia de quem era a sua avó, Andrew — Donna
prossegue. — Por favor, vamos todos nos sentar, porque eu ainda não acabei
de falar. Andrew, você se lembra de quando eu te disse que você subestimava
a sua avó?
— Lembro — murmuro. — Na hora eu não entendi, mas agora eu sei
que o que você quis dizer é que ela sempre soube os bandidos que aqueles
quatro eram.
— Não foi só por isso que eu disse que você a subestimava. — Donna
olha para Abigail, depois para Jackson e por último para mim. — Você se
lembra daquela vez quando nós fizemos uma reunião onde eu estava presente
e sua avó deixou clara a vontade dela de nomear Benjamin CEO, em vez de
você?
— Sim, eu me lembro disso. — Olho para o Jackson. — Foi naquela
reunião que eu consegui convencer a vovó a me dar uma segunda chance.
— Posso te perguntar como você a convenceu? — Donna pergunta-
me.
— Sim, eu contei pra vovó antes de ela morrer — explico. — Eu
menti para ela dizendo que eu estava me tornando um cara melhor, que eu
pretendia fazer algumas coisas para os funcionários da empresa e também
para os clientes. E por último eu disse que tinha uma noiva. Ela acreditou e
por isso me deu uma segunda chance.
— Pera aí, Andrew, volte um pouco essa história — Donna pede. —
Foi você que disse com as suas palavras essas coisas para a sua avó?
— Não. — Balanço a cabeça. — Na verdade, o Jack estava comigo
naquele dia, e foi ele quem falou essas coisas. Eu entrei na onda dele porque
sabia que era a minha única chance.
— Então foi o Jack?
— Sim — afirmo.
— E quem foi que disse que o nome de sua falsa noiva era Mercedes?
Franzo o cenho, me perguntando como diabos ela sabe disso, mas não
digo nada…
— Foi o Jack também, a vovó tinha perguntado qual era o nome da
noiva, e ele falou Mercedes porque é o nome da tia dele.
— Ah, então foi o Jack também?
— Sim — afirmo.
— Foi o Jack também que disse que vocês poderiam conseguir uma
noiva pagando por isso?
— Sim, foi — murmuro. — Como você sabe?
— Andrew, me conte: por que você rejeitou as três candidatas que
foram até o seu escritório tentar a sorte de ser sua noiva? — Donna pergunta,
me surpreendendo mais uma vez.
— Eu as rejeitei porque todas tinham defeitos, coisas que não
serviriam para uma noiva — respondo.
— Certo, agora me diga: quem foi que surgiu com a ideia de Jamie
ser a sua falsa noiva? — Donna questiona-me.
— Isso foi a Abigail — respondo. — Ela era amiga da Jamie e sabia
que ela precisava do dinheiro. Então ela só me convenceu a fazer a proposta.
— Então foi Abigail que trouxe a Jamie para a jogada de vocês?
— Sim, foi — concordo.
— Andrew, você nunca se perguntou se a sua avó já sabia da sua
farsa? — Donna prossegue.
— Não, eu sei que a vovó não sabia. Ela acreditou em mim, na
Abigail e também no Jackson quando mentimos para ela.
— E se eu te disser que o único iludido em toda essa história sempre
foi você? — Donna ergue o canto superior do lábio em um sorrisinho
discreto.
— Drew, cara, eu espero que você possa entender os meus motivos,
amigão. — Jackson se levanta e olha para mim. — Sua avó me procurou
naquela semana, e disse que estava preocupada com você e com o futuro da
construtora. Ela me pediu ajuda e estava desesperada para fazer algo que
pudesse te salvar. Eu sempre fui seu amigo, cara, eu sabia que você estava
perdendo o foco das coisas importantes. Então eu disse que eu ia ajudar a sua
avó no que ela precisasse.
— Do que você está falando? — pergunto.
— Andrew, a ideia do jantar, de ambiente de serviço melhor para os
funcionários e também da falsa noiva não foi minha — Jackson confessa. —
Sua avó foi quem bolou tudo, eu só fui uma marionete para ajudá-la.
Meu queixo cai no meu pé. Mas que merda é essa?
— Drew, você sabe que eu te amo e nunca faria nada para machucá-
lo. — Abigail também se levanta. — E foi justamente por isso que quando a
vovó me procurou com um plano louco na cabeça para ajudá-lo, eu aceitei
cooperar. Ela conhecia a Jamie há muito tempo e sabia que ela era uma boa
garota, capaz de tocar o coração de qualquer pessoa, assim como ela sabia da
péssima condição financeira dela. O Jackson contratou aquelas mulheres para
irem até o seu escritório, e todas carregavam um defeito para que você não
aceitasse nenhuma. Eram atrizes, foi tudo planejado. Você não aceitou, como
sabíamos que faria. Depois eu plantei na sua cabeça a ideia da Jamie ser sua
noiva, e o Jack obviamente concordou comigo. Por fim, conseguimos
convencer você a aceitá-la por falta de opção. E convencemos a Jamie a
aceitar a proposta jogando o trunfo de quinhentos mil dólares, já que
sabíamos que ela precisava muito do dinheiro.
— Drew, a sua avó sempre soube de tudo, Abigail e eu também —
Jack interfere. — A sua avó queria te ajudar, mas, primeiro, ela queria que
você merecesse tudo o que ia receber. A sua avó também queria ajudar a
Jamie, e ela sabia que essa jogada seria boa para os dois. No fim de tudo, o
único iludido foi realmente você.
— Por favor, Drew, não fique bravo com a gente — Abigail pede. —
Fizemos isso para o seu bem, porque queríamos que você vencesse e que
fosse digno de tudo o que recebesse. Jamie, se você está magoada comigo
porque nós te usamos para isso, me perdoe. Nossa intenção sempre foi ajudar
ambos. No fim, se vocês pararem para pensar, Elizabeth foi o cupido que os
uniu.
— Foi por isso que ela quis que a gente se casasse dentro de uma
semana, né? — Jamie pergunta ao meu lado. — Ela queria ter a certeza de
que a gente estaria preso um ao outro?
— Sim — Abby afirma. — Ela realmente acreditava que vocês
formariam um belo casal e não estava errada.
— Agora tudo faz sentido — Jamie murmura. — Eu não posso dizer
que eu estou magoada, entendo que Elizabeth só queria me ajudar, assim
como você e Jack. Claro que eu ainda estou atordoada com a notícia, mas
estou feliz em saber que nós nunca realmente chegamos a mentir e enganar
Elizabeth.
— Caraca, então a minha avó de setenta e seis anos de idade
conseguiu me trollar com a ajuda de vocês dois? — pergunto olhando entre
minha prima e meu melhor amigo.
— Sim, cara, foi isso. — Jack acena.
— Você está bravo com a gente? — Abby pergunta.
— Eu? Eu tô é muito irado com vocês! — Levanto-me da minha
cadeira e me aproximo de Abigail, que se encolhe toda. — Mas, porra, eu
amo que vocês tenham feito isso por mim.
— Aaah! — Abigail pula e se joga contra mim em um abraço de urso.
— Eu sabia que você compreenderia!
— Também ganho um abraço? — Jack pergunta balançando as
sobrancelhas.
— Seu puto, você vai ficar me devendo garrafas e garrafas de Johnnie
Walker depois de ter me enganado desse jeito!
— Amigo, vejo o lado bom das coisas — Jack diz. — E ajudei você a
ser o cara que a sua avó queria, você nunca realmente a enganou, então não
precisa ficar mal com isso. Nós trouxemos a Jamie para a sua vida, e com
isso ensinamos você a não ser tão babaca. E eu acho que ainda tem um monte
de outras coisas que ele recebe com isso, não é, Donna?
— É a minha vez. — Donna sorri e levanta um envelope branco nas
mãos. Ela utiliza a ajuda de uma pequena lâmina para deslacrar o envelope e,
em seguida, puxa algumas folhas escritas à mão de dentro. — Vocês todos já
sabem que este é o testamento original de Elizabeth. E desde que todos os
herdeiros estão presentes e provavelmente não querem me ouvir tagarelar
mais, vou direto ao assunto. Anuncio que, por ser filha legítima de Elizabeth,
Lorenna Simons recebe, por direito, metade de todos os bens de sua mãe. Isso
inclui, inclusive, 50% das ações da Simon’s Construtora. A outra metade dos
bens, que inclue propriedades, imóveis, joias, entre outras coisas, foi
partilhada igualmente para os seus três netos. Assim como os 50% restantes
das ações da Simon’s que também foi partilhado igualmente para Abigail,
Andrew e Addison. No entanto, por desejo de Elizabeth, Andrew foi
nomeado CEO da Simon’s, tendo em vista que ele é o mais apto para ocupar
um cargo com tamanha responsabilidade.
Sim! Sim! Sim!
— Sou o novo CEO! — exclamo. — Caramba, eu sou o presidente da
Simon’s!
— Parabéns, cara. — Jack dá um tapinha nas minhas costas. — Fez
por merecer.
— Vou aumentar seu salário, amigo troll — digo, devolvendo o
tapinha nas costas dele.
— Viu, priminho, agora você é um milionário que não vive à custa de
ninguém? — Abigail me abraça, e eu a abraço de volta.
— Valeu, Abby — murmuro.
Solto-a e encontro a Jamie de pé na minha frente, sorrindo pela minha
felicidade. Eu nem deixo que ela fale, simplesmente puxo-a para os meus
braços e a abraço com bastante força, só para me certificar de que eu estou
agradecendo o suficiente por tudo o que ela fez por mim. Ela ri quando eu a
levanto do chão e dá tapinhas no meu ombro para eu soltá-la.
— Eu te disse que você ia conseguir, viu?
— Eu consegui porque você disse sim à minha proposta — digo.
— Não, você conseguiu porque mostrou à sua avó que merecia tudo
isso.
— Abelhinha, você sempre esteve nessa comigo. E eu vou te
agradecer pelo resto da vida.
— Estou muito orgulhosa de você, Andrew.
— Queridos, vocês são um casal lindo, mas eu ainda preciso dizer
uma última coisinha. — Donna ri. — Abigail, a partir de hoje, você também
exerce uma função muito importante. Entre os bens que recebeu, está a
galeria de arte Red&Magic’s adquirida pela sua avó, que a concedeu como
presente por toda a sua colaboração com os planos dela. Você conseguiu, é a
proprietária de sua galeria.
— Quêêêê?! — Abigail corre até a mesa e arranca o testamento da
mão de Donna para ver com os próprios. — Jesus amado! A vovó comprou a
galeria para mim? Eu sou a dona da Red&Magic’s! Ai, vó, por que você faz
isso comigo!
— Parabéns, querida! — Lorenna abraça a filha. — Eu disse a ela o
quanto você queria a galeria, e quando ela soube que a antiga dona queria
vender, tratou de comprar.
— Mãe, eu te amo! — Abigail enche as bochechas da tia Lorenna
com beijos e depois agarra Addison pelo pescoço, para abraçá-la também.
— Acho que nós devemos comemorar — Jack diz, todo sorridente.
— Com certeza! — Abigail concorda. — Preciso fazer um brinde por
Olivia estar a caminho da prisão.
— Eu topo! — Tia Lorenna levanta a mão.
— Eu também, se eu estiver convidada. — Donna ri, erguendo a mão.
— Então, gente, vamos comemorar. — Abraço a Jamie e sigo minha
família e amigos para fora da sala de reuniões. A minha sala de reuniões, na
minha construtora. Porque agora, sim, eu sou o presidente da Simon’s
Construtora e um dos principais herdeiros da mulher mais inteligente que eu
já tive a oportunidade de conhecer na vida. Sorrio. — É tudo por minha
conta, família!
Todos gritam animados, e eu sei que esse é um dos melhores dias da
minha vida. É uma pena que eu não percebo que toda essa felicidade tem um
preço alto a se pagar. E eu só me dou conta disso na manhã seguinte…
CAPÍTULO VINTE E NOVE
--—————————————————————————————

Jamie

Eu estou deixando Andrew.


São cinco e meia da manhã quando eu me certifico de que ele está
adormecido. Provavelmente quase dopado, de tanta bebida alcoólica que
ingeriu. Mas ele mereceu toda a comemoração que teve. Eu vi em seus olhos
e no modo como ele sorria o quanto estava feliz. Ele finalmente conseguiu
tudo o que sempre quis, tanto sua parte na herança, como ser o presidente da
construtora. Mas não quero que ele pense que eu estou deixando-o por este
motivo. Sei que nosso acordo tem validade pelo período de um ano e que
indo embora agora eu provavelmente estou quebrando várias cláusulas. Sei
também que vou perder o dinheiro que Andrew me prometeu, justamente
porque não estou cumprindo o acordo de um ano. Mas quer saber? Nada
disso importa. O melhor para ele e para mim também será que eu parta de
uma vez por todas.
Uma vez eu pedi a Andrew que não se apaixonasse por mim, e ele
prometeu que não o faria. Somente por isso eu embarquei na louca viagem de
me entregar a ele. O que eu não quis enxergar foi que no momento em que eu
pedi que ele não me amasse, eu já me encontrava completamente apaixonada
por ele. Não me pergunte quando aconteceu, porque eu não saberei
responder. Acho que aos poucos ele foi tomando um lugarzinho escondido no
meu coração, e este sentimento foi crescendo e se espalhando para outras
partes até me tomar por inteiro. Eu nunca tinha me apaixonado antes e pensei
que nunca teria a oportunidade de vivenciar algo assim. Estou transbordando
felicidade por saber que eu amo Andrew. E ao mesmo tempo estou sendo
dilacerada por dentro, porque sei que vou perdê-lo. Não, não é que eu queira
perdê-lo de propósito. Por mim eu ficaria para sempre e viveria esse amor
que tive a dádiva de conseguir. Mas a vida é traiçoeira e às vezes ela não te
dá a oportunidade de escolher algo, ela simplesmente faz acontecer. E eu não
quero estar aqui, ao lado dele, quando a vida nos separar.
Levanto-me devagar da cama e vou para o closet. Pego uma única
mala e começo a encher com os meus pertences. Não preciso mais de
vestidos glamorosos ou sapatos caríssimos. Por isso pego apenas as coisas
mais simples e necessárias. Troco a minha roupa também e depois retorno ao
quarto com tudo pronto. Então me lembro de que eu devo deixar a ele uma
explicação sobre a minha partida. Também preciso encerrar as mentiras e
segredos que venho escondendo desde que nos conhecemos. Sei que Andrew
vai entender meus motivos quando souber.
Pego um caderno próximo da pilha sobre a nossa estante e também
uma caneta. Sento-me no meu lado da cama e deixo que tudo flua através de
mim direto para o papel…
“Querido Andrew,
Se você está lendo essa carta é porque provavelmente eu já fui
embora. Você deve estar se perguntando porque eu fiz isso, quais são os
meus motivos e por que eu não me despedi estando na sua frente, em vez de
me acovardar por trás de simples folhas de papel. Para que você entenda o
motivo da minha partida, sou obrigada a compartilhar com você uma
história que muitos desconhecem. Como todos os contos de fadas, vou
começar com ‘Era uma vez…’, mas não espere que no final a princesa e o
príncipe vivam felizes para sempre. Pois no meu conto ‘felizes’ existe, mas o
‘sempre’ é uma mera ilusão.
Era uma vez uma garotinha que cresceu cercada de muito amor. Ela
sempre foi uma menininha alegre e sonhadora. Também era aventureira, o
que lhe rendeu o apelido carinhoso que seu pai usava frequentemente para
se referir a ela: abelhinha. Contudo, sua vida começou a tomar um rumo
inesperado quando sua mãe adoeceu e, por fim, morreu. Para a tristeza da
garotinha, a mesma horrível doença cruzou seu caminho, fazendo com que
sua felicidade e seus sonhos fossem destruídos. Aos dez anos de idade,
apresentou o diagnóstico de LLA (Leucemia Linfoide Aguda). Iniciou um
tratamento imediatamente e, depois de seis meses de internações e remédios,
foi considerada ‘curada’.
Cinco anos depois, para a tristeza de sua família, a abelhinha passou
a apresentar novamente os sintomas da doença. Perdeu parte de sua infância
e estava prestes a perder sua adolescência também, mas, ainda assim,
escolheu lutar. Toda a noite se lembrava da mãe dizendo sob as estrelas que
rezava por ela para que, antes de partir, tivesse todos os desejos realizados.
E era nessas palavras que ela encontrava consolo e força de vontade. O pai
da garotinha, que ainda lamentava a perda da esposa, quando soube que sua
menina poderia ter o mesmo destino que a mãe, acabou se perdendo em
bebidas e jogos, procurando, dessa forma, aliviar sua dor. Ele não estava
disposto a perder outra pessoa que amava e, portanto, a família enfrentou
mais uma tragédia. Abriram mão do lar em que viviam e tiveram que se
separar, mas, desta forma, puderam pagar o tratamento da abelhinha.
Foram três anos de visitas constantes ao médico, o que tornou o
hospital o seu lar. Precisou parar os estudos por algum tempo, pois o
tratamento agressivo a deixava muito tempo presa em um leito de hospital.
Ela viu seus familiares sofrendo tanto quanto ela, a irmã que se desdobrava
para acompanhá-la nas consultas e para segurar sua mão sempre que a dor
tornava-se insuportável. O pai que havia perdido as esperanças, depois de
perder a esposa para a mesma doença e que precisava se controlar para não
chorar diante dela, imaginando que perderia a filha também. A
quimioterapia arrancou o brilho dos seus olhos e o sorriso do seu rosto,
além dos cabelos longos e escuros que achou que nunca mais fosse
recuperar.
Aos dezessete anos, recebeu uma notícia devastadora. A
quimioterapia não estava mostrando resultados e os médicos anunciaram
que somente um transplante de medula óssea poderia ajudá-la. Ela estava
cansada, exausta, não suportava mais a vida entre o hospital e seu lar. Não
suportava mais as dificuldades e o sofrimento que estava causando a todos
ao seu redor. Fechava os olhos, lembrava-se da mãe, que tinha lutado
bravamente, mas que não sobreviveu. Mas também se lembrava de como a
mãe lhe pediu para ser forte, para lutar e para não desistir da vida que ainda
a aguardava. Não podia desistir ainda e não desistiu.
Sua família não tinha doadores de medula compatíveis, portanto,
iniciou-se uma busca por um doador. O tempo foi passando e as notícias
boas não chegavam. Estavam quase perdendo as esperanças, quando a
equipe médica encontrou uma solução: transplante de células-tronco de
cordão umbilical. No mesmo ano, conseguiram um cordão que era
compatível com ela. Houve felicidade, mas também o medo. Havia chances
de as células serem rejeitadas e por isso foi feito um tratamento intensivo:
quimioterapia e radioterapia para eliminar as células doentes. Foi uma das
piores fases. Nos meses seguintes, foi preciso tomar medicações para
prevenir possível rejeição. Houve algumas, mas, com o tempo, foram
superadas.
Apesar de não mostrar mais indícios de que ainda possuía a doença,
só poderia comemorar a cura quando o transplante completasse cinco anos.
Até então, conviveria com o medo constante de voltar a ficar doente. No
entanto, conforme os anos foram passando, ela tentou não pensar a respeito
e ser positiva. Voltou a ter uma vida normal, concluiu os estudos e começou
a trabalhar para ajudar a família a se recuperar de tudo o que abriram mão
para salvá-la. Além disso, resolveu que precisava ajudar outras pessoas que
estavam passando pela mesma situação que a dela. Era importante que as
pessoas doentes acreditassem na cura. Era importante que elas não
desistissem e que lutassem também. No tempo em que passou no hospital,
conheceu médicos, enfermeiros, pacientes e voluntários que acabaram se
tornando seus amigos. Entre essas pessoas, conheceu uma senhora, uma
voluntária que frequentemente doava dinheiro ao hospital e também a
grupos de apoios para pacientes e familiares. Os recursos doados eram
utilizados para o combate ao câncer, principalmente de crianças e
adolescentes.
A senhora se chamava Elizabeth Simons, era conhecida e querida por
todos no hospital, desde a equipe médica até os funcionários. Ela visitava
leitos de crianças doentes, lhes trazia presentes, passava horas conversando
com elas. Era uma mulher que gostava de se dedicar a ajudar os outros. O
caminho delas acabou se cruzando e a garota acabou se tornando uma
grande amiga da idosa e foi assim que descobriu que Elizabeth também
estava doente. As duas compartilharam suas histórias, suas dores, seus
temores e também comemoraram o transplante bem-sucedido da garota.
Elizabeth era confiante de que um dia a abelhinha iria receber sua cura
definitiva. Até que a garota foi demitida de seu trabalho e recebeu uma
ajudinha da idosa, que lhe ofereceu um emprego. Ela aceitou e, desta forma,
apenas tornou-se ainda mais próxima daquela memorável mulher.
Por ter tido uma vida muito difícil, onde teve de abdicar dos estudos
para comparecer aos tratamentos, a garota que já se encontrava crescida
não sabia o que fazer da vida. O novo emprego era uma chance de
recomeçar. No entanto, logo se deu conta de que seus problemas ainda não
haviam acabado. O emprego não era tão perfeito quanto parecia, pois tinha
uma chefe rígida que vivia humilhando-a. O pai, que morava a quilômetros
de distância, necessitava de remédios para as doenças do coração que
apresentou ao longo dos anos. Remédios caros que ela não era capaz de
pagar sozinha, não quando tinha que ajudar a irmã e o cunhado a pagarem
os aluguéis atrasados do minúsculo apartamento em que viviam desde que
perderam a casa em que moravam.
Foi em um desses dias, onde a gente acha que o mundo está
desabando sobre nossas cabeças, que a garota resolveu criar uma lista de
desejos. Uma lista com todos os sonhos que transformaria em realidade se
tivesse coragem e condições. Alguns desejos eram bem simples, tratava-se de
coisas que ela teria feito se tivesse sido uma criança e depois uma
adolescente comum. Gritar muito alto. Dormir sob as estrelas. Roubar algo?
Ela havia gargalhado quando viu seus vizinhos adolescentes roubarem uma
torta da soleira da janela de uma de suas vizinhas e correrem cheios de
animação para devorarem a torta sob a sombra de uma árvore no final da
rua. Ela nunca poderia ter corrido com eles, estava sempre fraca demais
para isso. Fumar maconha? Seu primeiro e único namorado havia lhe
oferecido uma vez, mas ela era medrosa demais para experimentar algo que
diziam “fazer mal”. O que um cigarro poderia fazer de tão ruim que os
remédios já não tinham provocado nela em todos aqueles anos de
tratamento? Arrependeu-se de não ter experimentado, mas prometeu a si
mesma que não negaria, se houvesse outra chance.
Outros desejos vieram, então: Fazer uma tatuagem. Entrar em uma
festa de penetra. Pular de paraquedas. E já que sonhar ainda era possível,
mesmo para uma garota como ela, deixou que sua imaginação a levasse
longe. Dirigir um carrão? Ela não poderia sequer imaginar como era dirigir
um carro, afinal, não tinha condições de tirar a habilitação. Comprar a casa
de tijolos vermelhos? Ninguém nunca a culpou pela perda do imóvel, mas ela
sabia que um dos maiores motivos para que seu pai tivesse aberto mão da
casa foi para que pudessem pagar um tratamento adequado e livrá-la de sua
doença. De todos os desejos, o que ela mais desejava que se tornasse
realidade, era este. Era devolver o lar de sua família. Viver um romance
verdadeiro? Suas maiores companhias quando estava no hospital ou em casa
eram os filmes de romance, os contos de fadas com príncipes e princesas,
onde toda menina ou mulher se apaixonava verdadeiramente. Ela acreditava
no amor. Seu pai amou sua mãe incondicionalmente. Ela queria acreditar
que podia encontrar alguém que a amaria com a mesma devoção. E que ela
amaria também. E ela acabou se surpreendo ao encontrar essa pessoa.
Ele não era exatamente aquilo que estava esperando, tratava-se de
um sapo, de boca suja, arrogante, egocêntrico, mulherengo e imaturo. Sim,
eu estou falando de você. Mas não se preocupe, porque assim como nos
contos de fadas, esse sapo virou um príncipe (ou quase). O importante é que
ele tem um enorme coração, também é atencioso, generoso e bondoso. Ele
também passou por mudanças que o fizeram enxergar os seus erros e
consertá-los. Ele transformou a vida da garota para sempre, nada será igual
depois da sua passagem pelo caminho dela. Ele deu tudo o que essa pobre
garota poderia querer. Aliás, ele deu muito mais. Ele a fez acreditar que os
sonhos podem se tornar realidade.
Andrew, essa é a minha verdadeira história. Sinto muito que eu tenha
mentido para você esse tempo todo e escondido esse segredo, justo quando
lhe pedia para que não fizesse as mesmas coisas. Mas entenda que eu não
poderia dizer a você que eu tive leucemia durante anos da minha vida, pois
eu sabia que você já sofreria o bastante quando descobrisse que sua vó
estava doente. Entenda que eu não podia te contar que estou até hoje
aguardando a notícia de que meu transplante me trouxe a cura e a doença
não vai voltar. Eu não poderia te contar isso, pois nos últimos meses tenho
sentido os sintomas reaparecendo. No começo achei que era coisa da minha
cabeça, mas cada vez mais tenho certeza de que não é. Acho que estou
doente mais uma vez, Andrew. E não sei se sou capaz de passar por tudo o
que já passei de novo. Não sei.
Eu vi a dor em seus olhos quando sua avó anunciou que não iria se
tratar. Você se sentiu traído, pois não queria que ela cedesse à doença e te
deixasse. Eu estava lá e vi o seu sofrimento. Lembrei-me de como foi horrível
para o meu pai ver a minha mãe no mesmo estado. E depois de como foi ver
a mim mesma passando por tudo o que ela passou. Lembrei-me da minha
irmã dia e noite chorando ao meu lado. Eu simplesmente não quero que
você passe por algo assim novamente. Você merece ser feliz, Andrew, merece
alguém que vai estar lá ao seu lado, firme e forte sempre. Eu não sou este
alguém, pois se eu estiver doente, vai chegar um momento em que eu vou
definhar lentamente. Você não vai querer esse peso na sua vida, porque tem
muitas coisas para viver ainda. Então saiba que não te contei para te poupar
da dor. Sua avó uma vez me disse que você não passa de um menino com o
coração frágil. Ela estava certa, e não serei eu que prejudicarei seu coração.
Quero te pedir um favor, mesmo que eu saiba que não mereço. Estou
indo embora antes do término do nosso contrato. Mas como você já
conseguiu tudo aquilo que queria, eu acho que isso não vai ser um problema.
Não quero o seu dinheiro, não quero nada do nosso acordo. Apenas peço que
mantenha a casa para a minha família. O resto você já me deu, aquilo que
era mais valioso para mim você já me deu. Foi a realização dos meus
desejos, aliás, de cada um deles. Sim, Andrew, você foi o príncipe que
realizou meus sonhos. Inclusive o de viver um romance verdadeiro. Porque
apesar de eu tentar me iludir fingindo que tudo não passava de uma farsa,
cada um dos momentos que eu passei ao seu lado foram os mais verdadeiros
da minha vida. Perdoe-me por pedir a você que não se apaixonasse por mim
quando eu já me encontrava irremediavelmente apaixonada por você.
Adeus, meu querido e eterno amor.
J.
Com lágrimas nos olhos, coloco as folhas de papel sobre o
travesseiro. Além disso, pego a bola de cristal com a Torre Eiffel dentro que
mamãe me deu e ponho sobre o texto. Parece algo simples, um presente que
você pode obter por alguns dólares. Mas para mim é o bem mais valioso que
tenho. Doando ele para Andrew eu finalizo a minha lista de desejos, assim
como deixo para trás um pouquinho de mim e de tudo o que vivemos juntos
em Paris.
Olho para o seu rosto uma última vez, procurando memorizar seus
traços. Sentirei tanta falta dele que agora mesmo o simples pensamento faz o
ar faltar em meus pulmões. Curvo-me para plantar um beijo em seus lábios,
afasto-me lentamente e devagar, procurando não acordá-lo. Pego minha mala
e minha bolsa e discretamente deixo o quarto, fechando a porta logo atrás de
mim.
Caminho pelo corredor com o peito apertado, sabendo que essa foi a
última vez que vi, toquei e beijei Andrew. Faço uma pausa em frente à porta
de Abigail, onde Kitty está miando baixinho e arranhado a madeira. Abaixo-
me e faço carinho sobre suas orelhas.
— Ei, ela te abandonou aqui fora foi? — murmuro.
Kitty dá um miado ainda mais alto.
— Vou te perdoar por ser um gato traidor e ter escolhido ela, em vez
de mim.
Kitty se enrosca nas minhas pernas e solta um barulho profundo de
sua garganta.
— Você vai ser feliz aqui, Abby vai cuidar de você. Adeus, Kitty.
Levanto-me e puxo a maçaneta da porta que abre com facilidade.
Kitty se espreme na pequena fresta e corre feito um raio para cima da cama,
onde Abigail está dormindo profundamente. Fecho a porta e sigo para as
escadas. Faço meu caminho até os portões e então para fora deles sem que
ninguém me veja sair. Lá fora, ligo para um táxi. Em poucos minutos estou
indo para o Brooklyn.
***
O táxi para em frente à linda casa de tijolos vermelhos em que eu
cresci. Pago ao motorista e ele me ajuda com a minha mala. Em seguida, abro
o portão, passo pelo pequeno, mas muito bem-cuidado, jardim da frente.
Subo as escadas e toco a campainha. Sei que neste horário minha irmã
provavelmente está se arrumando para ir trabalhar. Mas em vez dela quem
abre a porta para mim é o Rick.
— Ei, veja só quem está aqui. — Ele abre um sorrisão quando me vê.
— Eu estava me perguntando quem bateria a esta hora na nossa porta.
— Desculpe — murmuro. — Eu sei que é muito cedo, mas realmente
preciso conversar com a Jane.
— Claro, entre. Ela está preparando o café.
— O que você faz de pé a essa hora? — pergunto arrastando minha
mala para o lado de dentro.
— Consegui um emprego novo — ele responde. — Não preciso mais
trabalhar de madrugada. E o meu salário é muito melhor do que o anterior.
— Nossa! Isso é ótimo!
— Muito, Jamie, sabe… No começo eu não queria aceitar a casa,
achei que era abuso demais — Rick confessa. — Mas agora percebo que foi a
nossa salvação. Como eu não preciso me preocupar com o aluguel, temos
mais dinheiro para gastar em outras coisas. Esse novo emprego também vai
me dar a oportunidade de ficar mais tempo com a Jane e o Tyler.
— Fico feliz em saber disso Rick, a Jane precisa da sua companhia. O
Tyler também necessita da presença do pai. Que bom que Andrew e eu
pudemos ajudá-los.
— Você mudou nossas vidas, garota. — Ele sorri. — Bom, você já
conhece a casa. Eu vou subir para me arrumar, a Jane tá na cozinha.
— Tenha um bom dia — murmuro.
— Você também!
Deixo minha mala em um canto perto da porta, e minha bolsa sobre o
sofá da sala. Sigo pelo corredor, que é tão familiar para mim, mesmo depois
de tanto tempo sem viver aqui. Entro na cozinha e vejo Jane ralhando com
um bule de café perto do fogão. Tyler está sentado na cadeira comendo
cereal. Ele é o primeiro a notar a minha entrada, larga a colher dentro do pote
e salta da cadeira na minha direção.
— Tia Jamie!
— Ei, meninão! — Abaixo-me para abraçá-lo.
— Jamie? — Minha irmã se vira e sorri para mim. — O que está
fazendo aqui?
— Eu tenho que conversar com você — digo, soltando Tyler e me
endireitando.
— Tia Jamie, você ainda não me levou para tomar banho de piscina
na sua mansão — Tyler se queixa.
— Tyler! — Jane o repreende. — Que falta de educação!
— Desculpe, Ty — murmuro. — Aconteceu muita coisa, e a tia
esqueceu.
— Ah. — Ele abaixa os olhos, chateado. — Mas você vai me deixar ir
um dia, né?
— Tyler! — Jane lança a ele um olhar de advertência, e o menino se
encolhe.
— Olha, Ty, prometo que um dia te levo para tomar banho em uma
piscina bem grande, mesmo que não seja a da mansão. Ok?
— Tá! — Ele sorri. — Quer cereal?
— Não. — Balanço a cabeça. — Só preciso conversar com a sua mãe.
— Tyler, leva o seu cereal para comer na sala — Jane ordena. —
Deixe a mamãe conversar sozinha com a tia Jamie.
Tyler pega o potinho e a colher e passa por mim em direção à sala.
Jane desliga a chama, pega o bule e joga sem nenhuma cerimônia dentro da
pia.
— Não nasci para cozinhar — ela observa largando o pano de prato.
— Finalmente me dei conta disso.
— Graças a Deus — murmuro.
Jane me dá um olhar que diz “engraçadinha” e puxa uma cadeira para
se sentar.
— Vou fazer um curso de culinária e depois posso me arriscar
novamente.
— Vai ser bom.
— Vamos, sente aqui. — Ela aponta a cadeira ao seu lado. — Eu
conheço você, está estranha desde que a vi no enterro de Elizabeth. Está
acontecendo alguma coisa, não é?
— Sim, está. — Sento-me ao lado dela, cruzo os braços na minha
frente e enterro minha cabeça entre elas. — Tenho muitas coisas para te
contar, mas tenho medo da sua reação.
— Sou sua irmã, sempre vou tentar ser compreensiva. — Ela passa as
mãos nas minhas costas e acaricia o meu cabelo. — Vamos, irmãzinha, fale
comigo.
— Menti pra você, estou mentindo há muito tempo — murmuro.
— Oh, vou ficar realmente chateada com o que você vai me dizer, né?
— Vai sim — concordo, minha voz sai abafada.
— Continue — ela pede.
— Estou indo embora — anuncio.
— Para onde? — Jane pergunta. — E por quê? Ah, não me diga que
você e Andrew tiveram a primeira briga de casal?
— Não é nada disso — resmungo. — Estou indo embora porque
Andrew conseguiu sua herança e o cargo de presidente da Simon’s. Ele não
precisa mais de uma falsa esposa, eu fiz o meu serviço.
— Falsa esposa? — Jane murmura ao meu lado. — Como assim?
— Casei com o Andrew porque ele precisava de uma esposa para
conseguir a herança. Ele me ofereceu um milhão de dólares — explico,
erguendo a cabeça. — Jane, estávamos quase sendo colocadas na rua,
tínhamos muitas dívidas e precisávamos do dinheiro para os remédios do
papai. Aceitei me casar com ele por isso.
— Ah, Jamie, não… — Jane se levanta e caminha de um lado para o
outro ao redor da mesa. — Sabia que havia algo errado desde o começo!
Casou-se por dinheiro?
— Precisávamos do dinheiro!
— Sacrificou-se por nós? Meu Deus, você deveria ter falado comigo.
Eu nunca deixaria Andrew te usar desta forma por causa de dinheiro.
Poderíamos ter dado um jeito, mas isso é demais, Jamie…
— Não poderíamos ter dado um jeito! — Elevo o tom de voz. —
Você sabe muito bem que estávamos ferrados! Eu fiz isso por você, pelo
Rick, pelo Tyler, pelo papai. Mas eu também fiz isso por mim! Eu precisava
do dinheiro tanto quanto vocês!
— Por quê? — Minha irmã pergunta balançando a cabeça. — Pra
que, Jamie?
— Para realizar os meus desejos — sussurro.
— Oh. — Jane faz uma pausa, se aproxima de mim outra vez. — Oh,
Jamie. Essa casa… Você queria comprá-la para nós porque ainda se culpa?
— Sei que vocês a venderam para conseguir pagar meus tratamentos.
— Nós faríamos tudo outra vez.
— Eu sei. — Assinto. — Mas eu também faria qualquer coisa para
devolvê-la para a nossa família. Foi o que eu fiz.
— Ah, irmãzinha. — Jane se curva e me abraça. — Jamie, a casa não
significaria nada se tivéssemos perdido você. Nem eu, nem o papai nos
arrependemos de nada do que fizemos por você. Você entendeu? Por favor,
me diga de uma vez por todas que você entende que nada em nossas vidas é
mais importante do que saber que você está conosco.
— Eu entendo, Jane — murmuro, abraçando-a de volta. — Eu
entendo e sempre serei grata por isso, mas também estou feliz por ter
recuperado o nosso lar. Além disso, não foi só pela casa, mas todo o resto.
Você sabe que eu fui privada de viver muitas coisas. Aceitar esse acordo
abriu as portas de um mundo que era desconhecido para mim. Jane, eu não
me arrependo de nada. Eu faria tudo outra vez, se Andrew me pedisse.
— Jamie… — Jane se afasta e me olha nos olhos. — Você se
apaixonou por ele, não é?
— Eu…
— Sim, você se apaixonou por ele. Estava na sua lista viver um amor
verdadeiro, mas você não poderia imaginar que se apaixonaria logo pelo seu
falso noivo, não é?
— Sim. — Suspiro, escolhendo novamente a verdade. — Eu amo o
Andrew.
— Ele sabe?
— Ele saberá. Deixei uma carta contando tudo a ele. Pode ter
começado como um negócio, Jane, mas eu o amo.
— Eu não entendo. — Jane inclina a cabeça, confusa. — Se você o
ama, por que está indo embora?
— O Andrew não precisa mais de mim.
— Você não tem como saber disso. Talvez ele precise de você tanto
quanto você precisa dele.
— Não, Jane, você não entende. Sou a última coisa que Andrew
precisa nesse momento…
— Do que está falando? — Jane segura minhas mãos entre as suas e
procura os meus olhos com aflição. — Há mais nessa história, não é? Conte-
me, Jamie, sou sua irmã, estou aqui para ouvi-la.
— Por favor, sente-se. — Indico a cadeira.
Jane não discute, ela puxa a cadeira e senta-se na minha frente. Volta
a segurar minhas mãos entre as suas.
— Jane, acho que estou doente — despejo de uma vez, pois não existe
um jeito mais fácil de dizer ou ouvir essas palavras.
Jane pisca como se custasse para absorver a notícia.
— O quê?
— Acho que o transplante não deu certo — explico. — Os sintomas
estão reaparecendo. Nos últimos meses tenho sentido cansaço excessivo,
tonturas, vertigens, enjoos, perda de apetite. Jane, tudo o que eu passei com a
LLA está voltando.
— Não — Jane murmura. — Não, Jamie, não é possível.
— Você sabe que é possível. A LLA não tem cura, ela só pode ser
controlada. Por muitos anos, nós conseguimos controlar a doença. Então,
quando a quimioterapia não funcionava mais, eles disseram que o transplante
nos daria uma possibilidade de cura. Uma possibilidade, Jane. Nunca me
prometeram a cura.
— Mas já faz tanto tempo…
— Quatro anos. Os médicos disseram que só poderiam nos dar a
certeza da cura dentro de cinco anos, antes disso não deveríamos comemorar,
certo? Bom, acho que não vamos precisar esperar mais um ano para descobrir
que o transplante não funcionou. Estou doente de novo. A leucemia está
vencendo, Jane.
— Isso não pode estar acontecendo. — Jane balança a cabeça. — De
novo, não. Ah, Jamie, por favor… Você pode estar enganada. Tanta coisa
aconteceu nesses últimos meses, não é? Irmãzinha, você não está doente. Não
pode estar doente. Você lutou, você venceu.
— Está tudo bem, Jane. Eu lutei para ficar aqui mais alguns anos e eu
consegui. Eu vivi o bastante para realizar meus sonhos.
— Você não vai nos deixar. Está me ouvindo? Não vou perder você
como perdi a mamãe. Nós vamos procurar o médico, vamos fazer os exames
e descobrir o que está acontecendo com você.
— Eu vou procurar um médico, mas não agora.
— Como assim, não agora? Precisamos fazer isso imediatamente.
— Não, Jane, eu cansei. Se eu estiver doente, não há nada que
possamos fazer. Você sabe muito bem disso, estava lá quando os médicos nos
disseram tudo o que poderia acontecer.
— O que você quer fazer? Desistir?
— Eu só quero ficar longe.
— Longe? — Jane repete confusa. — Por que você quer ficar longe?
— Preciso me acostumar a não ter mais o Andrew perto de mim.
— Ah. — Jane arqueja. — Ele não sabe, não é?
— Ele vai saber através da carta. E esse é o outro motivo pelo qual
estou indo embora. O Andrew perdeu a avó por causa de um câncer, e ele
sofreu muito assistindo a tudo isso. Eu não quero que ele me veja na mesma
situação.
— E se ele vier atrás de você?
— Jane, o Andrew provavelmente vai pirar quando souber que eu fui
embora, em seguida, ele vai ler a carta e compreender que ao meu lado não
há futuro. Então talvez ele fique magoado por alguns dias, mas depois ele vai
se reerguer. Vai se dedicar ao cargo que ele tanto queria e fazer por merecer a
herança que recebeu. Ele pode ter simpatizado comigo, afinal, vivemos várias
coisas juntos. Mas no fim, a patética com sentimentos profundos sou eu.
— Ainda acho que você deveria ficar e dizer tudo o que sente a ele.
Você deveria ouvir o que Andrew tem a dizer sobre todas essas coisas e
permitir que ele faça uma escolha. Porque, Jamie, talvez Andrew tenha
sentimentos profundos por você também.
— Não, não posso… Eu já fui um peso para muitas pessoas, não serei
para o Andrew também.
— Você não foi um peso para ninguém — Jane protesta, erguendo-se.
— E pare de falar como se você fosse morrer amanhã. Nós vamos ao médico,
vamos descobrir o que você tem e então vamos lutar. Vamos lutar quantas
batalhas aparecerem no nosso caminho. Jamie Marie Collins, eu não aceito
que você desista, está me ouvindo? Vou fazer o possível e o impossível por
você. — Jane leva as mãos ao rosto e começa a chorar. — Vou ficar ao seu
lado e… — Jane soluça e eu me levanto também para abraçá-la. — Você vai
ficar bem.
— Shhh, tudo bem, Jane — consolo-a, acariciando seus cabelos
enquanto ela chora no meu ombro. — Você é a melhor irmã do mundo e já
fez mais do que deveria por mim. Você tem uma família e, a partir de agora,
vai cuidar só deles, tá? Eu vou ficar bem. Vou pegar o avião dentro de
algumas horas, então preciso ir.
— Você não pode ir.
— Eu quero ficar com o papai. Sinto falta dele.
— Jamie, o médico…
— Vou procurar o médico quando voltar. Prometo.
— Você vai me ligar todos os dias?
— Sim, todos os dias.
— Se não se sentir bem, promete que vai voltar e ir ao médico
comigo?
— Prometo, Jane.
— Eu te amo, irmãzinha — Jane soluça agarrada ao meu pescoço. —
Você sabe o quanto eu a amo?
— Essa é maior certeza que eu tenho na vida. — Afasto-me,
encontrando os olhos castanhos da minha irmã brilhantes de lágrimas. — Eu
também te amo, Jane.
***
Meu voo dura pouco mais de quatro horas, e é uma tortura. Eu pensei
que depois de saltar de paraquedas com Andrew o medo de altura teria
evaporado. Mas ainda tive as mesmas sensações de antes, o frio na barriga e
o tremor no corpo. Felizmente correu tudo bem, e eu desembarquei no
aeroporto sã e salva. Encontrei um táxi, embarquei e passei o endereço da
fazenda. Abri a minha bolsa e liguei o aparelho de celular. Jane me pediu
para fazer uma chamada quando eu chegasse, apenas para dizer que estava
bem. Tenho certeza de que ela me ligaria pelo menos umas três vezes todos
os dias. Assim que a tela fica iluminada, percebo que não foi uma boa ideia
verificá-la. Tenho vinte e três chamadas não atendidas de Andrew. Além
disso, sete mensagens não lidas.
Vinte e três chamadas? Caramba…
Por curiosidade abro uma das mensagens, que diz:
Precisamos conversar, onde você está?
Em seguida abro outra:
Jamie, atende a porra do telefone!
Essa última mensagem me faz ter certeza de que ele está furioso por
eu ter abandonado o contrato. Não deveria, afinal, ele já conseguiu o que
queria, não precisa de mim. Decido que o melhor é ignorar as outras
mensagens e não retornar suas ligações. Não queria ouvir a voz dele agora,
não quando eu finalmente consegui encontrar coragem para lhe contar toda a
verdade. Não agora que ele sabe que eu estou apaixonada por ele.
— Chegamos, senhorita — o motorista avisa ao parar em frente à casa
da fazenda.
Eu o pago e desembarco com a minha mala e bolsa, sigo caminhando
em direção às escadarias da casa de fazenda. Como sempre, antes mesmo de
pisar nos degraus, papai aparece lá na porta. Surpresa cobre seu rosto, já que
não avisei que viria. Ele desce às pressas as escadas e me toma nos braços
sem nenhuma palavra. Abraço-o de volta.
— Papai!
— Abelhinha! — Papai me afasta, tira uma mecha do meu cabelo da
frente dos meus olhos e estuda o meu rosto. — Não achei que fosse vê-la tão
cedo de novo!
— Nem eu…
— Onde está o Andrew? — pergunta, olhando ao redor.
— Andrew não veio comigo, papai.
Seu olhar desce para a mala no chão, e seu rosto se contorce em
desgosto.
— Aquele babaca magoou você, abelhinha? — questionou-me em um
tom duro.
— Não. — Balanço a cabeça. — Eu preciso conversar com o senhor,
é um assunto muito sério.
— Deus, dê-me forças! — Papai suspira. Pega minha mala na mão e
segue subindo as escadas. — Da última vez que me apareceu aqui de surpresa
e disse que tinha um assunto sério para conversar, a bomba do casamento
explodiu bem na minha cara.
— Sinto muito, papai, mas eu acho que a bomba é ainda maior dessa
vez.
— Abelhinha, o que você andou aprontando?
— Se não é a menina nos visitando de novo! — tia Annete grita do
alto das escadas. — Chegou na hora certinha, tem um bolo delicioso saindo
do forno!
— Oi, tia. — Subo as escadas, pulando dois degraus de uma vez e me
jogo no abraço que ela me oferece. — Obrigada, estou com um pouco de
fome.
— Onde está o marido? — tia Annete questiona-me.
— Peguei o avião sozinha — respondo.
— Oh, entendi. — Tia Annete lança um olhar para o meu pai e de
volta para mim. — Deve estar exausta da viagem. Que tal comer algo, tomar
um banho e descansar?
— Primeiro eu preciso conversar com o papai.
— Annete, deixe esse bolo para depois, quero ouvir o que Jamie tem a
me dizer — papai diz e estremeço, pois desta vez ele usou o meu nome.
— Tudo bem então, enquanto isso vou preparar um café quentinho.
— Tia Annete sorri calorosamente e segue em direção à cozinha.
— Vamos — papai me chama, fazendo um gesto para eu seguir na
sua frente. Ele larga minha mala na sala e seguimos para o escritório. Assim
que fecha a porta, ele se senta em sua poltrona e encara-me com seu olhar
duro e questionador. — O que é tão importante, Jamie?
— É sobre o meu casamento, papai. — Respiro fundo, expiro e
prossigo. — Tudo não passou de uma farsa…
Então eu conto tudo, porque mentir para as pessoas que se ama é
doloroso e não quero mais carregar essa dor dentro de mim. Não escondo
nada em relação ao contrato que firmei com Andrew, nem mesmo que acabei
me apaixonando por ele de verdade. No entanto, quando ele me pergunta por
que eu o deixei se o amo, respondo apenas sobre a parte que Andrew
conseguiu o que queria e não precisa mais de mim. Omito minha
desconfiança a respeito de que a minha doença tenha retornado. Meu pai é
forte, mas nem tanto. O coração dele ainda é fraco e precisa de tempo para
absorver notícias tão pesadas. Decido que vou contar sobre minhas
desconfianças outro dia, assim não forço seu frágil coração com tantas
notícias ruins.
Quando termino, levanto os olhos — que estiveram o tempo todo
encarando meus dedos entrelaçados — e olho para o meu pai. Ele está com os
cotovelos apoiados na mesa e uma das mãos coçando a barba rala, enquanto
avalia meu rosto. Sua expressão não é agradável, mas ele também não parece
furioso como pensei que fosse ficar. Finalmente ele descansa suas costas
contra a poltrona, solta um suspiro audível e comprime os lábios finos.
— Veja bem, Jamie, não gostei nem um pouco de saber disso — ele
diz, sua voz está estranhamente baixa e calma. — Primeiro você me
decepciona por dizer que minha família estava a ponto de ser colocada na rua
e eu não sabia de nada. Segundo, você me chateia por ter aceitado ser casar
por dinheiro. E, terceiro, me magoa que você demorou tanto tempo para me
contar a verdade.
— Desculpe, papai, eu não queria preocupá-lo — murmuro.
— Entendo isso, Jamie. E é por isso que não estou tão bravo com
você. — Ele diz. — Agora, quanto ao Andrew, quem esse imbecil acha que
é? Ele não pode se casar com você por interesse e descartá-la como se fosse
nada.
— Pai — resmungo. — Eu que fui embora, não coloca a culpa nele.
— Mas onde ele está que não veio buscá-la ainda? — pergunta.
Solto uma risadinha.
— Pai, o Andrew não vai vir até aqui. Olha, ele vai seguir com a vida
dele e eu com a minha.
— Ah, abelhinha, você precisa aprender muito sobre a vida ainda. —
Papai se levanta e espreguiça-se lentamente, esticando os músculos. —
Principalmente sobre o amor.
— Sr. Walter, o que você está querendo me dizer?
— Nada não… — Ele se aproxima. Puxa-me para cima e com um
braço sobre os meus ombros me leva para fora, em direção à cozinha. —
Essas coisas você precisa ver para entender com o coração.
— Que coisas? — insisto.
— Prometa-me nunca mais fazer algo parecido com isso, Jamie, por
favor — papai pede, desviando o foco da conversa.
— Eu prometo.
— Então, Annete, esse café sai ou não? — papai pergunta para a
minha tia. Ela se vira com uma torta na mão e lança a ele um olhar feio.
— Vá te sentar lá, seu imprestável! — tia Annete resmunga de
brincadeira. — Onde já se viu! Não faz nada nesta cozinha, e ainda quer
mandar em mim! Mas nunca, está me ouvindo? Nesta cozinha mando eu!
Papai pisca, e eu solto uma risada. Que adorável família…
***
Duas semanas se passaram desde que eu deixei Nova Iorque. Eu
pensei que a distância pudesse de alguma forma amenizar a dor, mas estava
enganada. Parecia até pior saber que estávamos a quilômetros de distância um
do outro. E pior do que isso era saber que as ligações pararam, assim como as
mensagens. De alguma forma, Andrew simplesmente esqueceu que eu existo.
Eu sei, é exatamente o que eu queria, e eu não deveria achar isso ruim. Mas
se eu fosse sincera comigo mesma, existia uma parte dentro de mim que ficou
guardando esperanças de que ele não desistisse tão fácil.
Eu tentava não pensar muito nele, mas isso era algo muito difícil de
fazer. Tudo o que eu fazia e tudo o que eu via me lembrava de Andrew. Às
vezes eu acordava, rolava para o lado direito da cama esperando que eu
pudesse me aconchegar em seu peito e me encolher dentro dos seus braços.
Então eu abria os olhos e me deparava com o vazio e a dor voltava com
muito mais força. Ou então, durante a noite, quando eu ficava na varanda
observando o céu, lembrava-me dos desejos que Andrew me concedeu. Era
impossível que as lágrimas não viessem aos olhos e a saudade se tornasse
esmagadora.
Mesmo quando eu estava ajudando tia Annete na cozinha, jogando
cartas com o meu pai ou até mesmo escovando os cavalos com os meus
primos. Andrew continuava a perturbar meus pensamentos. Eu tinha a
curiosidade de saber o que ele estava fazendo naquele horário. Será que
trabalhando? Será que dormindo? Jantando? Ou saindo com alguma garota
linda, rica e sofisticada que pudesse vir a se tornar sua verdadeira noiva
algum dia? Esses últimos pensamentos me deixavam com ânsias, e minhas
tonturas se tornavam piores e constantes.
Chorei todos os dias e todas as noites. Eu lutava para seguir com a
minha vida, mas parecia que ela nunca mais voltaria aos eixos. Eu não
conseguia comer, tudo parecia embrulhar o meu estômago. Eu não queria sair
da cama, ficava extremamente exausta só de pensar em levantar. Aos poucos,
fui evitando até ver o sol ou as estrelas, me trancafiava no quarto e lia meus
livros. Sentia pena de mim mesma por estar vivendo naquela situação. Mas o
mundo simplesmente não tinha mais graça sem o sorriso de Andrew, sem as
suas brincadeirinhas maliciosas. Eu sentia falta até mesmo de sua boca suja
de onde saíam aqueles montes de palavrões. Meu Deus, como sentir a falta de
alguém doía.
No domingo à tarde, logo depois de tia Annete ter me trazido o
almoço no quarto, meu telefone tocou. Sem muito ânimo, alcancei o aparelho
e olhei para a tela apenas para constatar o que eu já sabia. Era Jane me
ligando. Além das pessoas na fazenda, os únicos com quem eu conversava
era Jane e meu sobrinho Tyler. Falei com eles todos os dias, mesmo quando
eu não estava com nenhuma vontade de conversar. Jane estava preocupada
com a minha saúde e implorava que eu retornasse logo a Nova Iorque para
procurarmos um médico. Já o Tyler queria saber como a fazenda estava, e às
vezes me contava sobre o que fazia na escola. Eles eram um pouquinho de
distração nesse meu mundo de solidão.
— Oi, Jane — murmurei.
— Ei, olá para você. Como está?
— Bem.
— Jesus, você está péssima, isso sim. Você acha que eu não
reconheço essa sua voz melancólica?
— Eu vou ficar bem.
— Quero a verdade, Jamie.
— Eu não tenho conseguido comer muita coisa, e as tonturas
continuam. — Suspiro. — Mas não, eu não vou voltar para Nova Iorque
ainda.
— Você é muito teimosa! Vou te buscar à força, vai ver!
— Só preciso de mais umas duas semanas.
— Sabe quem esteve aqui?
— Não, obviamente eu não sei.
Jane dá uma risadinha.
— Um milionário, estacionou sua Mercedes aqui na frente e deixou
os vizinhos todos alvoraçados. Em seguida, tocou nossa campainha e
adivinhe só? Perguntou onde minha irmãzinha estava.
Levanto-me de sobressalto e sem querer derrubo a bandeja com
comida no chão.
— Ai, merda! — resmungo.
— O que aconteceu?
— Virei algumas coisas no chão. — Endireito minha postura. —
Então Andrew esteve aí?
— Que animação é essa na sua voz? — Jane ri. — Você não consegue
ser mais óbvia, sabia?
— Jane — resmungo entredentes. — Conte-me!
— Contar o quê? Ele esteve aqui e perguntou se você estava morando
conosco.
— O que você disse? — pergunto apressada.
— Eu disse que não.
— Jane! — exclamo. — O que mais você disse?
— Bom, ele me perguntou se você tinha viajado para o Texas e eu…
Bom, eu não ia mentir, né?
— Oh.
— Ah, Jamie, não liga pra isso não… Afinal, quem em sã consciência
pegaria um voo para ir atrás da falsa noiva por quem não nutre quaisquer
sentimentos? — Jane pergunta sarcástica.
— Engraçadinha. O que mais ele disse?
— Nada. Depois ele simplesmente se virou e partiu como um raio.
— Quando foi que ele esteve aí? — pergunto.
— Você está querendo saber de mais, hein?…
— Jane!
— Ontem à noite.
— Se ele tivesse vindo já estaria aqui essa hora — murmuro.
— Talvez você esteja certa e ele não tem sentimentos por você, ou
não. Sei lá.
— Preciso desligar — aviso. — Tenho que limpar a bagunça que fiz
aqui.
— Tudo bem, Cinderela, mas me avise caso o príncipe apareça por aí.
— Tchau, Jane, simplesmente tchau!
Ouço sua risada do outro lado da linha, mas desligo.
Meu coração bate acelerado no meu peito com a simples hipótese de
que Andrew pode estar vindo atrás de mim. Isso me faz sorrir como a boba
que sou. Tento repetir a mim mesma que já se passaram duas semanas e ele
não viria atrás de mim depois de tanto tempo. Mas não consigo apagar essa
chama de esperança que se acendeu dentro de mim com essa ligação.
Com as mãos trêmulas, largo o aparelho de telefone sobre a cama e
junto a bandeja e os restos de comida do chão. Desço para a cozinha e coloco
as louças na pia e os restos da refeição no lixo. Viro-me para buscar uma
vassoura quando vejo meu pai passar pelo corredor com uma espingarda na
mão e cara de poucos amigos. Arregalo os olhos.
Que diabos meu pai vai fazer com aquela arma?
— Pai! — grito, mas ele nem me ouve.
Desisto da vassoura e corro atrás dele. Vejo-o parado na varanda,
mirando a arma em seu alvo. Meu olhar passa sobre os seus ombros para
saber a quem ele está dedicando sua pontaria depois de tantos anos sem
utilizar uma arma. Abro a minha boca para gritar, mas o som sai abafado pelo
barulho do tiro.
— Meu Deus, não! — Fecho os olhos com força.
— Puta que pariu! — Ouço Andrew praguejar a distância. Abro os
olhos e vejo-o parado como uma estátua lá embaixo, no nosso gramado, e a
centímetros de distância das escadarias.
— Se der mais um passo, não vou errar a pontaria! — papai grita.
— Pai, para com isso! — grito desesperada e saio descendo as
escadas de dois em dois para me colocar diante de Andrew. — Você pode
machucá-lo de verdade!
— Essa é a intenção! — papai resmunga. — O que está fazendo aqui,
Andrew? Já não magoou minha Jamie o suficiente?
— Pai! — Lanço um olhar de advertência a ele. — Você sabe que ele
não me fez nada!
— Mas é claro que fez! — papai esbraveja. — Você não estaria
trancada chorando naquele quarto todos os dias se esse imbecil não tivesse
magoado você! Quem começou toda esta história de falso casamento foi ele!
— Sinto muito, Sr. Walter, você tem razão — Andrew diz. — O
senhor me disse que se eu me casasse com a Jamie deveria ser porque a
amava, e não foi o que eu fiz.
— Então, merece ou não uns tiros na fuça?
— Eu só preciso de algumas palavras com a Jamie — Andrew pede.
— Não sei se confio em te deixar com a minha filha! — papai volta a
resmungar.
— Pai, para com isso! — insisto. — Por favor, eu acho que Andrew
merece uma explicação, já que ele veio até aqui.
Papai abaixa a arma e arqueia uma sobrancelha. Um pequeno sorriso
surge nos seus lábios quando ele diz:
— Eu não disse que essas coisas a gente tem que ver primeiro para
depois entender.
— O quê?
— Amor, Jamie, amor… — Papai dá de ombros, coloca a espingarda
no ombro e volta caminhando para dentro de casa, assoviando.
Enfim solto o ar que estive segurando.
— Caralho, pensei que eu ia morrer antes de ver você de novo —
Andrew diz.
Solto uma risadinha. Caralho, como eu senti falta dele…
— Desculpe por isso, você sabe como o papai é. Ele não ia machucar
você de verdade.
— Não sei não, ele me pareceu bem convincente. — Andrew se
aproxima até seus olhos estarem na altura dos meus. O azul de sua íris está
tão cristalino quanto o do céu nesta manhã. — Pelo menos ele não mirou no
meu pau, né? Seria mais trágico pra mim… E para você.
— Andrew, o que você está fazendo aqui? — pergunto, ignorando sua
insinuação de que seu órgão masculino é de alguma forma importante para
mim.
— Pera aí… Eu só preciso de um tempo, fiquei ensaiando as palavras.
— Ele respira fundo, expira, morde o lábio inferior. — Tá, olha só, desculpa.
— Desculpa pelo o quê?
— Desculpa pela demora. — Ele se mexe, inquieto. — Passei duas
semanas debatendo se eu conseguiria viver a minha vida sem você.
— E?
— E finalmente cheguei a uma conclusão.
Ele sobe outro degrau e agora fica mais alto que eu. Dou um passo
para frente e ergo-me na ponta dos pés, de forma que nossos lábios estejam a
centímetros de distância.
— Qual?
— Nessas duas semanas, eu não vivi. Existe uma grande diferença
entre viver e sobreviver. E eu só aprendi o que é viver quando conheci você.
É por isso que estou aqui. — Ele abre os braços e sorri. — Vim buscar você
para me trazer de volta à vida.
Meus olhos se enchem de lágrimas, e eu o abraço com força
quebrando todas as malditas regras de que eu não deveria tocá-lo, senti-lo ou
ficar perto novamente. Finalmente consigo pronunciar em voz alta as
palavras que tanto me amedrontavam, pois acreditava que ele não retribuiria:
— Eu amo você, Andrew.
CAPÍTULO TRINTA
--—————————————————————————————

Andrew

Quando foi que um abraço se tornou algo tão importante para mim?
Eu sou obrigado a questionar isso enquanto Jamie tem seus braços em torno
do meu pescoço. Tenho certeza de que ela está me sufocando, porque sinto
que estou ficando sem ar. O corpo dela colado no meu é uma sensação que eu
não quero esquecer nunca, o toque dela é abrasador e ao mesmo tempo
acolhedor. O cheiro dela está em todo lugar, aquela essência de jasmim na
qual eu estou terrivelmente viciado. O meu peito queima com este sentimento
descoberto recentemente. E finalmente eu tenho a chance de dizer a ela tudo
aquilo que está enrolado em um nó gigante na minha garganta.
Só depois que Jamie me deixou aquela carta é que percebi que eu
nunca tinha realmente tido o medo de perder alguém. Quando os meus pais se
foram, a minha avó estava lá para cuidar de mim. E quando minha avó se foi,
eu sabia que teria a Jamie para mim. Eu sabia que com ela ao meu lado nunca
me sentiria sozinho e abandonado. Mas então aquelas palavras rasgaram o
meu peito e me fizeram crer que a vida era uma droga e que eu não merecia
ter o amor de ninguém. Todos, absolutamente todos os que eu amava estavam
me deixando. A Jamie era a última que me restara, ela era como uma ilha no
meio do oceano em que eu caí. Ela era a minha salvação, a minha esperança.
Mas tudo morreu quando eu soube que cada segundo da sua vida sempre foi
contado. E que existia uma possibilidade de que esses segundos estivessem
chegando ao fim.
No primeiro momento eu era um misto de emoções. Senti raiva
porque ela mentiu, porque escondeu a verdade de mim todo esse tempo. Senti
ódio porque ela podia estar doente, porque podia morrer e eu ia perdê-la. Eu
não queria acreditar que aquilo estava acontecendo comigo, era azar demais
para uma única pessoa. Fiquei pensando que se existia um Deus talvez ele
estivesse tentando me fazer pagar por tudo o que eu já fiz me tirando a única
coisa que era importante para mim. Naquele momento regado de tanta
angústia e dor, meu primeiro alvo foi a bola de cristal. Lancei-a do outro lado
do quarto, quebrando-a em minúsculos pedaços de vidro que se espatifaram
no chão. Meu coração estava lá, quebrado da mesma forma.
Lutei para voltar a respirar, porque parecia que o ar da Terra havia
sido sugado. Rasguei a carta em milhares de pedaços procurando fingir que
ela nunca existiu, que nunca algo assim foi deixado para mim. Aqueles
primeiros cinco minutos depois de saber a verdade foram como uma ida ao
inferno. E quando me dei conta do que eu fiz, corri para juntar cada pedaço
de vidro no chão. Fiquei desesperado por ter destruído algo que era tão
valioso para alguém como a Jamie. Senti-me péssimo por ter estragado um
presente tão precioso. Busquei cola e passei metade da manhã sentado no
chão, tentando consertar o meu erro. E percebi que, assim como o meu
coração, não havia conserto.
Liguei para ela tantas vezes que perdi as contas, mandei infinitas
mensagens. Queria gritar com ela por ter feito com que eu me apaixonasse.
Antes dela eu tinha uma vida bacana. Saía com qualquer garota gostosa que
cruzasse o meu caminho, bebia até o esquecimento. Desfilava com os meus
carros e esbanjava a minha grana. Eu tinha a porcaria da vida que cada
homem na Terra deseja. Mas ela surgiu e estragou tudo. E eu não estou
dizendo que ela arrancou isso de mim, eu estou dizendo que ela me fez querer
arrancar isso de mim. Essa vida que eu tinha parecia divina, mas no fundo eu
sabia que não era. Faltava uma coisa… Uma coisa que só senti por ela: amor.
Foi preciso que Abigail entrasse no meu quarto e batesse na minha
cara para que eu acordasse. Eu só havia pensado nos lados negativos, não
busquei tentar encontrar uma coisa boa em toda essa situação. Mas quando
Abby me despertou daquele transe, ela me fez voltar a respirar outra vez.
Tentei me acalmar e, embora tenha sido muito difícil, eu consegui. E então
contei tudo para Abigail e para Jackson também. Ter que dizer em voz alta
tudo o que eu havia lido anteriormente fez com que a dor chegasse a ser até
maior. No entanto, só dessa forma é que eu fui perceber que estava me
precipitando.
Jamie não estava morta, só achava que estava doente. Uma pontinha
de esperança surgiu quando revisei suas palavras. Talvez ela estivesse
enganada, talvez o transplante tivesse dado certo. E mesmo se não tivesse
funcionado, deveria ter outro tratamento por aí, certo? Várias pessoas vencem
a leucemia todos os dias, por que a Jamie não venceria? Ela não era a minha
vó, e disso eu sabia, porque ela lutou todas as vezes que a doença insistiu em
ficar no seu caminho. Desde garotinha ela lutou para ficar no mundo. E se
essa força de viver estava em algum lugar dentro dela, eu tinha que buscá-la
novamente. Eu tinha que curar a minha abelhinha, porque, sem ela, eu não
conseguiria viver.
Nunca usei o meu dinheiro para fazer nada que realmente valesse a
pena, até aquele momento. O primeiro impulso que tive foi de pegar as
minhas malas para ir atrás dela, para lhe dizer que eu a amava, que estaria ao
seu lado ela querendo ou não. Só que Abigail me proibiu de fazer isso. Disse
que eu continuava muito alterado, ainda agitado demais. Ela me fez repensar
e achou que era melhor que a Jamie tivesse um tempo só para ela, enquanto
eu teria um tempo só para mim. Eu tinha que ir atrás da Jamie sabendo
exatamente o que dizer a ela. Não queria que ela pensasse que era apenas
uma garota qualquer por quem eu achava que tinha sentimentos. Eu queria
que ela soubesse com toda a certeza que era a única garota da minha vida,
que era tudo. Tudo.
Foi por isso que naquela tarde Abigail, Jackson e eu fizemos as nossas
malas. Não para ir atrás da Jamie, por enquanto não. Nós fizemos todas as
pesquisas possíveis e viajamos atrás dos melhores especialistas em oncologia
e hematologia. Eu queria ouvir de uma pessoa que entendia mais do que
qualquer um sobre o assunto. Queria saber o que era a leucemia, como agir
com uma pessoa com esse tipo de doença, qual o tratamento mais indicado e
quais os riscos diante de um, se havia realmente uma cura e quais eram as
chances de o transplante da Jamie não ter funcionado. Eu precisava saber dos
mínimos detalhes, porque faria o que tivesse que fazer para curá-la. Eu
entregaria todo o meu dinheiro se eles me garantissem que ela ia sobreviver.
Foi assim que fui parar em Washington. Conheci o doutor Davis e o
doutor Israel. Tivemos longas conversas, onde eles puderam me explicar tudo
o que eu precisava saber e tiraram todas as dúvidas possíveis. Mas ainda
disseram que para uma conclusão eles precisavam fazer exames na paciente,
ou seja, na Jamie. Isso, no entanto, não os impediu de me levar ao centro de
oncologia. Onde eu conheci todo e cada tratamento de leucemia. Para cada
caso havia um diferente, e era por isso que eles precisam conhecer o tipo de
leucemia que Jamie tinha.
Eu descobri que a doença matava mais de duzentas e sessenta mil
pessoas todos os anos e pela primeira vez eu realmente tive uma conversa
decente com Deus. Eu implorei a Ele que, se quisesse me retirar todos os
bens que havia recebido, que assim fosse. Mas que não me tirasse de jeito
nenhum a mulher que eu amava. Depois o doutor Davis me levou até o
hospital. Eu vi de perto pessoas sofrendo desse mal e entendi perfeitamente
por que Jamie não teve coragem de contar sobre suas desconfianças de que
estivesse doente de novo.
Era triste, era doloroso. Eu quase me senti um imbecil por estar
vivendo com tanta saúde quando aquelas pessoas só precisam disso.
Mulheres desanimadas e aflitas porque sua vaidade foi tirada delas. Além
disso, necessitavam ter sempre alguém por perto, cuidando, pois não
conseguiam fazer nem as coisas mais simples sozinhas. Homens que um dia
foram fortes e saudáveis se encontravam dependendo de alguém para se
locomoverem de um lugar para o outro. Tudo isso resultado de inúmeros
tratamentos, de remédios fortes usados em quimioterapias. Mas a esperança
também se encontrava lá, porque aquelas pessoas estavam lutando para viver.
E outras que eu também tive o prazer de conhecer obtiveram a tão grandiosa
cura. Eu queria que a Jamie se tornasse uma dessas pessoas.
Depois de uma semana em Washington, combinei com os dois
médicos para que viessem até Nova Iorque. Eu pagaria a fortuna que eles
quisessem para ter em qualquer hospital tudo o que precisassem para
examinar e cuidar da Jamie. E com tudo acertado, retornei para casa. Fui
tomado pelo desejo de ligar para ela, de contar sobre as novidades, de
compartilhar tudo o que ouvi. Eu ansiava ouvir a voz dela, sentir o seu toque
e ver aquele lindo sorriso se abrir para mim. Mas novamente me impedi de
fazer isso, assim como me impedi de ir atrás dela.
Dessa vez eu queria fazer tudo direito, da forma que deveria ter sido
desde o começo. A primeira coisa que eu fiz foi ir até uma joalheria. Quando
a vovó ainda era viva, ela me contou uma história sobre o meu pai. Ela disse
que ele amava a minha mãe tanto quanto ela o amava. E isso eu sempre
acreditei, ambos demonstravam muito esse amor. Quando chegou o momento
do meu pai pedi-la em casamento, ele foi até a melhor joalheria e em dez
minutos encontrou o anel perfeito para a minha mãe. Vovó disse que ele se
referiu ao anel como o “espelho dos olhos dela”. Antes eu não entendia o que
ele quis dizer com isso, mas agora eu sabia. O anel era um círculo dourado
com uma pedra valiosa, grandiosa e azulada em cima. A pedra preciosa tinha
a mesma tonalidade de azul dos meus olhos, que eram também da mesma
tonalidade dos da minha mãe. O anel se encaixava nela como se já tivesse
nascido para ser seu, assim como seus olhos azuis que nasceram com ela.
Quando noivei de mentira com a Jamie, dei o anel a ela. Achei que
era o que meu pai, minha mãe e até a vovó iriam gostar de ver. Uma herança
de família sendo passada para a próxima geração. No entanto, aquele anel não
tinha nada a ver com a Jamie. Ela não tinha os olhos azuis, e a pedra era
espalhafatosa demais para os seus dedos pequenos e delicados. Nunca
procurei ligar uma coisa à outra. Entretanto, quando entrei na joalheria aquele
dia, entendi tudo. Não precisei de dez minutos como o meu pai, dois minutos,
para ser exato, já foram o suficiente para encontrar o anel perfeito para a
mulher perfeita aos meus olhos.
Finalmente, depois de longas duas semanas longe dela, nem Abigail e
Jackson juntos conseguiram me convencer a dar mais tempo a nós dois.
Tempo se tornou algo muito essencial, fundamental e valioso na minha vida.
Então eu fiz minha mala, e minha prima e melhor amigo fizeram o mesmo.
Estavam nessa comigo e com a Jamie, e juntos mostraríamos a ela o quão
importante ela era para nossas vidas. No voo para o Texas eu me sentia como
uma criança prestes a entrar no jardim de infância. Ansioso demais, curioso
para vê-la outra vez. E definitivamente muito nervoso. Mas quando enfim
cheguei ao meu destino, soube que cada atitude que tomei foi a correta.
Abracei-a tão forte quanto ela estava me abraçando, inspirei aquele
cheiro doce que nos últimos dias eu só havia sentido através de seu
travesseiro. Senti aquela pele quente e macia contra a minha outra vez. E
voltei a olhar no fundo daqueles olhos que para mim nunca deixariam de ser
um mistério. Sejam eles castanhos ou verdes, eu os amava exatamente desse
jeito. Assim como amava cada detalhe nela do jeitinho que era. Busquei os
seus lábios afoito, audacioso e destemido, beijei-os, mordiquei-os, provei-os
de leve. Fui ao céu quando senti o seu gosto na minha língua, e tudo dentro
de mim se acendeu. Não consegui manter minhas mãos longe dela, percorri
seus braços, seus ombros, sua clavícula, desci pela lateral do seu corpo,
parando em sua cintura apenas para trazê-la mais perto de mim. E continuei a
devorar incansável aqueles macios lábios rosados.
Por mim jamais teria me afastado. Faria dela parte de mim, e nunca
teríamos de nos separar. Mas fomos forçados a voltar à realidade, e Jamie foi
a primeira a dar um passo para trás. Seus lábios agora estavam vermelhos e
inchados, e seus olhos brilhavam com lágrimas não derramadas. Eu nunca
conseguiria me acostumar com a imagem de ver aqueles olhos banhados em
lágrimas. Apenas o pensamento de isso acontecer era esmagador demais. Mas
aqui estava ela, diante de mim, frágil e à beira das lágrimas.
— Desculpe, Andrew — murmura, olhando para os próprios pés.
— Por que você está me pedindo desculpa?
— Pela carta. — Ela funga e dá outro passo para trás. — Eu não
queria ter escondido tudo isso de você, mas não sabia como dizer.
— Eu entendo, Jamie. Agora entendo mais do que você imagina.
— Como assim?
— Sei que teve medo sobre qual reação eu teria — prossigo. — E
você estava certa, se tivesse me contado quando nos conhecemos, eu sequer a
tomaria como uma possível candidata a ser minha noiva. E se houvesse me
contado depois, eu teria explodido de raiva assim como fiz com você estando
longe.
— Eu sinto muito. — Uma lágrima desliza pela sua bochecha diante
dos meus olhos. — Queria tanto ser a pessoa ideal para você, Andrew.
— Mas você é. — Dou um passo para frente, cruzando o espaço vazio
entre os nossos corpos. — Você acha que eu vim até aqui por quê? Para te
dizer que eu li a carta, tive raiva de você, mas passou? Não, Jamie, eu não
vim até aqui por isso.
— Andrew, eu sei o que você quer me dizer, mas não diga — ela pede
com seus olhos ainda cravados no chão. — Eu te amo, mas não estou pedindo
nada em troca.
— Não se trata de uma troca, Jamie.
— Andrew, se você me amasse não levaria duas semanas para
descobrir que a minha presença é indispensável — ela diz. — Se você me
amasse saberia que eu sofri tanto quanto você, estando longe durante todo
esse tempo.
— Jamie, eu tive bons motivos para ter demorado todo esse tempo,
acredite em mim, posso enumerá-los. — Seguro o queixo dela e o ergo,
fazendo seus olhos encontrarem os meus novamente. — Primeiro a
insuportável da Abigail me obrigou a controlar meu temperamento, coloque a
culpa nela por eu não ter pegado o primeiro avião depois que você partiu.
Segundo, culpe o Jack por ter tido a ideia de fazer umas pesquisas incríveis
na internet sobre a sua doença. E terceiro, culpe a mim por ter buscado
conhecer de perto tudo o que você passou e pode vir a ter que passar
novamente. Porque, Jamie, eu quis saber tudo sobre as suas necessidades, já
que pretendo estar ao seu lado daqui em diante.
— Andrew…
Ela começa a chorar, desta vez deixando as lágrimas caírem
livremente. Puxo-a para perto de mim, e ela enterra a cabeça no meu peito.
— Ah, e eu peguei o primeiro voo disponível hoje para chegar aqui.
Infelizmente demorei um pouco porque tivemos uns probleminhas.
— Que probleminhas? — ela balbucia e sua voz sai abafada pela
minha camisa.
— O carro que alugamos quebrou a uns sete quilômetros daqui —
explico. — Abigail e Jackson ficaram tentando encontrar o problema, mas eu
acho que o único resultado que eles vão conseguir é uma terceira guerra
mundial.
Jamie dá uma risadinha no meu peito, e eu suspiro aliviado.
— Como você chegou até aqui? — ela pergunta. — A pé?
— Eu? A pé, minha querida? — Aperto meus braços ao redor dela e
curvo-me para alcançar seu pescoço. — Eu roubei um cavalo.
Ela se afasta rapidamente e seca as lágrimas com o dorso da mão.
— Como assim, roubou um cavalo? — questiona-me séria.
— Roubei um cavalo — repito e aponto para trás de mim, em direção
a um lugar à distância, na cerca, onde um cavalo malhado está pastando. Dou
um sorriso torto ao ver sua expressão de espanto. — Não é branco como o de
um príncipe, mas é charmoso como eu, você não acha?
— Oh, meu Deus! — Ela ri. — Não creio que você roubou um
cavalo!
— Tive pressa de chegar até você — confesso. — Afinal, foram
longas duas semanas…
— Andrew, você não sabe onde está se metendo — Jamie diz
voltando a ficar séria. — Eu não escondi meu segredo de você por um motivo
qualquer, eu escondi porque sei que você não pode lidar com isso. Escute,
você perdeu a sua avó, e eu estou fadada a passar por algo muito parecido
com o que ela teve. Não vou levar mais sofrimento e dor a você, não vou te
prejudicar.
— Você acha que eu não poderia te amar porque você pode estar com
leucemia?
— Não, Andrew, eu não estou dizendo que você não poderia me
amar. Estou te dizendo que você não pode me amar, porque quando a doença
me atingir como já fez no passado, eu não serei a mesma Jamie que você está
vendo agora. — Ela passa as mãos nos cabelos em um gesto nervoso e solta
um suspiro pesado. — Andrew, quando eu fiquei doente, minha vida se
resumia a quimioterapias, horas perdidas em um hospital. Meu cabelo caiu,
minha pele perdeu a cor. Fiquei fraca, inútil e digna de pena. As pessoas
olhavam para mim e desejavam nunca ter que passar pela mesma situação. Eu
virei um peso a ser carregado. Se eu tiver que passar por tudo isso de novo,
não quero que esse fardo caia sobre você, porque você merece algo muito
melhor. Tudo o que está vendo agora, estes cabelos, estes olhos, estes lábios,
este corpo que você deseja… Tudo isso vai se transformar em algo
desconhecido, você não vai encontrar a Jamie que conhece quando a doença
retornar com toda a força.
— Jamie, o meu coração já ama o seu, o que você é do lado de fora é
lucro.
— Lucro? — ela resmunga.
— Ei, estou tentando ser romântico — replico. — Desculpe se
esqueci de tudo o que eu tinha para dizer.
— Andrew, eu estou falando sério. — Ela me lança um olhar
reprovador.
— Eu sei, Jamie, tive infinitas provas da seriedade dessa situação —
continuo falando rapidamente. — Você é que não entende nada! Você é o
meu melhor. Você me tornou alguém melhor. Todos os dias, quando eu
acordo, quero ser alguém melhor por você. E, Jamie, que bom que não é você
que decide como a vida é. Porque você é minha e eu estou disposto a fazer
qualquer coisa para que entenda isso. Se você tiver que estar em um hospital,
eu quero ser aquele que vai te acompanhar. Se você tiver que enfrentar a
quimioterapia, eu quero ser aquele que vai segurar a sua mão. Se os seus
cabelos caírem, sua pele perder a cor e seus olhos não brilharem, quero ser
aquele que vai te beijar e mostrar que não importa em que corpo você esteja,
eu amo o que existe dentro de você. Posso ter sentido atração pelo seu
exterior, mas eu me apaixonei primeiro pela sua bondade, humildade,
determinação, coragem e força. Isso você vai ter para sempre, nem mesmo
uma doença pode te tirar isso. Essa é a Jamie que eu amo, somente ela.
— Andrew — ela murmura com a voz embargada pelo choro. — E se
eu morrer? Eu não quero arruinar você com a minha partida.
— Se você morrer, minha alma morre com você. — Dou um passo à
frente e passo o polegar sobre sua bochecha macia para coletar uma lágrima
perdida. — Se você morrer primeiro do que eu, então eu ficarei aguardando o
dia em que a encontrarei novamente. E vai ser nesse momento que o meu
coração vai bater outra vez, quando eu voltar a te encontrar. E acredite, eu
vou te encontrar, abelhinha.
— Eu queria tanto que isso fosse possível, Andrew, eu queria muito
— Jamie admite.
— Abelhinha, uma vez a minha mãe disse que quando você ama
alguém de verdade, é um amor de coração e também de alma. Não importa
quantas vidas a pessoa vive. Seu coração sempre vai amar unicamente este.
— Ponho a mão dela sobre o meu peito e seguro firme. — Assim como sua
alma foi feita para se encaixar somente neste. — Puxo-a para perto até que
cada centímetro dela esteja ligado a mim, e nossas mãos entrelaçadas entre os
nossos corpos. — Confesso que pensava que isto não passava de uma besteira
dela. Mas então eu conheci você, e, meu Deus, foi como um soco na cara.
— O quê? — Ela respira.
— Jamie, eu te amo de coração e alma, e isso é para sempre.
— Como eu posso duvidar de algo assim? — Ela abre um terno
sorriso para mim. — Você conseguiu, Andrew Simons.
— Como?
— Você conseguiu ser romântico.
— Porra, viu? — eu me gabo. — Eu disse que era bom em tudo o que
eu fazia.
Ela solta uma risadinha e fica nas pontas dos pés para me beijar.
— Eu te amo e vou te amar em cada momento em que estivermos
juntos, Andrew — ela sussurra contra os meus lábios. — Sejam eles apenas
dias, meses ou anos.
— Pera aí. — Afasto-a de mim e tiro a pequena caixinha de veludo
preta do meu bolso. — Nós começamos isso tudo errado, e agora eu juro a
você que farei tudo certo, ou pelo menos tentarei fazer tudo certo. Foi errado
pedir que você fosse minha noiva de mentira por causa do dinheiro, só que eu
não me arrependo disso, porque foi dessa forma que você chegou até mim.
Agora, do que eu me arrependo é de ter dado o anel que está no seu dedo
como prova de um amor falso. — Ajoelho-me diante dela e seguro sua mão.
— Senhora Simons, você me daria honra de se casar comigo?
Ela arregala os olhos para a caixinha quando eu abro e revelo um
círculo de ouro branco delicado como a pele dela. Com uma pequena e
simples pedrinha verde que me lembra dos olhos dela. Um arquejo escapa
dos seus lábios.
— Outra vez?
— Sim, outra vez — concordo. — Mas desta vez você vai ter um
casamento digno de uma princesa. Eu quero que você escolha um vestido tão
lindo quanto o que você tem sonhado. Acrescente toda a porcariada de véu,
grinalda, flores e sei lá mais o que. Mas tenha a certeza de que, desta vez,
quando você entrar na igreja e olhar na direção do seu noivo, e caso você
esteja se perguntando que noivo é este, sou eu, prazer, eu vou estar olhando
para você com o sentimento espelhado em seus olhos.
— Amor — ela sussurra.
— Amor — afirmo.
— Tem certeza de que é isso o que você quer?
— Nunca tive tanta certeza de algo — digo. — Então, Jamie, o que
vai ser? Você quer ser a minha senhora Simons outra vez?
— Nunca deixei de ser. — Ela sorri. — Sim, eu aceito me casar com
você… Outra vez.
Obrigado, Senhor…
Tiro o anel da caixinha e substituo-o pelo que ela já tem no dedo.
Levanto-me e levo meus lábios à sua mão para um beijo terno.
— Eu não acredito que você se ajoelhou para mim — ela diz em meio
às lágrimas.
— Sinta-se especial, porque você é a única para quem eu faria algo
assim.
— Eu posso beijar você?
— Olha, os beijos no rosto vão custar um dólar, nos lábios uns cinco
dólares, se você quiser usar as mãos e fazer umas saliências vai custar uns
dez dólares…
— Andrew — ela me interrompe. — Se você não me beijar agora, eu
vou…
— É brincadeira, amor — corto-a rapidamente. — Pode usar e abusar
de mim, eu deixo.
Ela passa as mãos em volta do meu pescoço e raspa de leve seus
lábios nos meus, provocadora como sempre.
— É exatamente o que eu vou fazer — Jamie promete dando-me seu
lindo sorriso malicioso.
Esmago meus lábios nos seus, beijo-a como se fosse a primeira e
também a se última vez. E em silêncio prometo que todos os nossos beijos
serão exatamente como este.
— Até que enfim! — senhor Walter grita da varanda fazendo, com
que Jamie e eu nos afastemos rapidamente. — Demorou, hein, filho?!
— Pois é. — Coço a cabeça.
— Será que agora posso confiar que você vai cuidar da minha Jamie?
— ele questiona-me.
— Papai — Jamie interfere, repreendendo-o. — Ele nunca deixou de
cuidar de mim.
— Tanto faz. — Ele estala a língua. — Se magoar ela mais uma vez,
não vou errar aquele tiro. Está me entendendo?
— Sim, senhor — concordo.
— Parabéns, docinho — Annete diz para Jamie. — Vocês dois serão
muito felizes, fazem um lindo casal.
— Obrigada, tia — Jamie agradece.
O barulho de buzina a distância faz com que todos olhem em direção
à estrada de terra que leva até a fazenda. Uma SUV preta vem em alta
velocidade, disparando poeira para todos os lados. Faz uma curva perto da
cerca e quase atropela o cavalo que eu roubei. Por fim diminui a velocidade e
para em frente ao casarão. Uma porta se abre do lado esquerdo e Jackson pula
para fora, tossindo por causa da poeira. O som estridente de Rihanna explode
de dentro do carro.
— Puta que pariu! — Jackson exclama. — Nunca mais ando com essa
maluca!
A porta do motorista se abre, e Abigail desce vestida em seus shorts
curtos, blusa curta, bota de cano alto até o joelho e um chapéu de cowgirl que
ela comprou numa loja de conveniências.
— Ei! — Abby saúda a todos. — Senhor Walter, e aí? Como vão as
vaquinhas? Pastinho bonito, hein?
O pai de Jamie dá um sorriso torto e balança a cabeça.
— Bom te ver novamente, Abigail — ele diz.
— Conseguiram consertar o carro? — pergunto.
— Ah, sim, aquele imbecil finalmente serviu para algo que preste e
consertou — Abby diz rolando os olhos. — Mas e você, consertou a sua
vida?
Dou de ombros.
— É, consertei.
— Parabéns, cara — Jack diz. — E a você também, Jamie, agora é
tudo de verdade.
— Obrigada, Jack.
— Pera aí, então o que estamos todos fazendo aqui ainda? — Abigail
interrompe. — Temos um casamento para organizar!
***
Retornamos a Nova Iorque, e embora eu quisesse aproveitar todos os
momentos com a Jamie, sabia que havia coisas mais importantes a serem
feitas. Por isso no dia seguinte, quando acordamos, eu a fiz se arrumar e dei
início à minha missão de curá-la. Logo após o café da manhã — que Jamie se
negou a comer por estar enjoada — nós fomos ao hospital. Abigail e Jackson
fizeram questão de nos acompanhar, e não negamos.
Encontramos o doutor Davis e eu lhe apresentei a Jamie. Entramos no
consultório que ele estava utilizando, e Jamie começou a longa tarefa de lhe
contar tudo sobre a sua leucemia. Desde o momento de sua aparição, aos dez
anos de idade, até a sua última consulta médica, onde os médicos lhe
disseram que ela teria de aguardar cinco anos para ter certeza de que seu
transplante de células-tronco de cordão umbilical tinha realmente funcionado
e lhe trazido à cura. Tenho que dizer que foi mil vezes mais difícil ouvir de
sua boca a história, que era comovente e ao mesmo tempo inspiradora. Ela e
minha avó eram as mulheres mais fortes que eu já tinha conhecido na vida.
— Então, deixe-me ver se eu entendi — interrompe o doutor Davis.
— Você realizou o transplante há quatro anos e acha que não funcionou, pois
está apresentando os sintomas da doença mais uma vez?
— Sim — Jamie afirma.
— E os últimos exames que você fez foram há um ano? —
questionou.
— Sim, faz mais ou menos um ano que fiz os exames para ter certeza
de que não havia células doentes.
— E?
— Minhas células continuavam saudáveis, mas eu acho que algo
mudou. Eu não me sinto bem como antes, estou apresentando os mesmos
sintomas de quando estava doente. Cansaço excessivo, perda de apetite,
tonturas, vertigens e até enjoos.
— Eu gostaria que você fizesse um exame, rápido e prático, que nos
dirá como está seu estado de saúde atual — doutor Davis fala.
— Tudo bem — Jamie concorda.
— Quando vamos ter o resultado do exame? — pergunto.
— Bom, o que eu vou pedir agora é apenas um hemograma — Davis
me responde. — Ou seja, exame de sangue. Será possível ter o resultado
dentro de algumas horas. Ou, se preferir, pode retornar amanhã.
— Quero que seja o mais rápido possível — digo.
— Andrew. — Jamie me lança um olhar. — Podemos voltar amanhã?
— Certo. — Suspiro. — Retornamos amanhã, doutor, acho que hoje
já foi demais para a Jamie.
— Bom, me acompanhe, Jamie, vou pedir a enfermeira para coletar
seu sangue. — Doutor Davis se levanta e acompanha Jamie para outra sala.
Encontro-me com Jack e Abby na sala de espera. Minha prima lendo
uma revista, e Jack cantando uma enfermeira.
— Como foi? — Abigail me pergunta.
— Estão coletando o sangue dela para um hemograma — digo. —
Vamos retornar amanhã para saber o resultado.
— Só amanhã?
— Sim. A Jamie prefere assim.
— E aí, cara, o que é que deu lá? — Jack pergunta.
— Você saberia se tivesse escutado ele, em vez de estar dando em
cima daquela coitada — Abigail resmunga.
— Ela é gostosa. — Jack sorri.
Abigail revira os olhos.
— Você é um porco.
— E você é insuportável, mas a vida é assim, minha querida — Jack
retruca.
— Cristo, nem aqui vocês conseguem não discutir? — Encaro Abby e
depois Jack. — Sério, eu não sei o que deu em vocês, mas precisam resolver
isso logo.
— Não “deu” nada com a gente — Abigail diz ríspida.
— Vou buscar a Jamie — aviso. — Podem continuar a discussão,
pombinhos.
***
No dia seguinte retornamos os quatro ao hospital. Dessa vez a Jamie
parecia mais nervosa e agitada. Tentei de tudo para tranquilizá-la, mas eu
também não estava no meu melhor. Estava com medo do que o doutor Davis
poderia dizer, mesmo que na minha cabeça eu já tivesse repassado várias
situações diferentes. Era impossível não ficar assustado com algo que poderia
mudar nossas vidas para sempre. Eu torcia para que ele dissesse que a doença
não tinha voltado, ou mesmo que poderíamos curá-la, ainda que Jamie
estivesse doente mais uma vez. Eu não aceitava menos que isso de maneira
nenhuma.
— Vai dar tudo certo — Abigail diz a ela. — Estou confiante.
— Estaremos aqui esperando por vocês — Jack fala.
— Obrigada — Jamie agradece, embora sua voz seja apenas um sopro
de vento.
Doutor Davis nos cumprimenta assim que entramos no consultório e
aperta nossas mãos gentilmente. Junto a ele está uma médica, uma mulher em
torno dos quarenta anos com um sorriso agradável.
— Andrew, Jamie, essa é a doutora Sandra — Davis diz,
apresentando-nos.
— É um prazer conhecê-los. — Doutora Sandra estende a mão para
nos cumprimentar.
— Sentem-se — Davis pede, indicando-nos as poltronas.
— Então, Doutor, e o resultado? — pergunto impaciente.
— Está alvoraçado demais, Andrew — Davis observa. — Já vou falar
sobre o exame.
— É grave, doutor? — Jamie pergunta ao meu lado.
—Já vi que vocês querem ir direto ao ponto, então, em uma
linguagem que Andrew possa compreender e que não deixe dúvidas para
nenhum de vocês, o hemograma de Jamie está perfeitamente normal —
Davis conta.
— Normal? — Jamie repete.
— Normal — Davis assente.
— O que exatamente é normal? — pergunto, olhando entre Jamie e
Davis. — Normal é bom, né?
— É impossível que eu me faça mais claro, Andrew. — O doutor
Davis sorri. — Não há sinal de células doentes. Jamie, você pode continuar
acompanhando seu estado de saúde. Aliás, é muito importante que refaça os
exames mais vezes, no entanto, não acredito que precisa esperar mais um ano
para receber a notícia de que está curada.
— Oh, não, não… — Os olhos de Jamie se enchem de lágrimas,
enquanto eu fito o médico paralisado. — Você tem certeza, doutor?
Davis ri.
— Você até pode fazer um mielograma para ter certeza de que a
doença não está presente em sua medula óssea. Mas o hemograma é o
suficiente para nos dar a certeza de que suas células sanguíneas estão
normais.
— Então a Jamie está…
— Curada? — completa o médico. — Sim, Andrew, a Jamie está
curada.
— Não é possível! — Jamie arqueja. — O transplante deu certo?
— Os resultados dos transplantes com células-tronco do cordão
umbilical são muito promissores. É, atualmente, uma das melhores formas de
tratamento para a leucemia, pois tem apresentado resultados muito
satisfatórios. Muitos pacientes alcançam a cura após o transplante e com você
não foi diferente, Jamie.
— Doutor, mas isso não está certo. — Jamie balança a cabeça
incrédula. — Eu não estou bem, eu tenho ficado cada vez pior. E minhas
tonturas, e meus enjoos?
— Jamie, antes de solicitar os seus exames, encontrei-me com uma
grande amiga, a doutora Sandra. Conversei com ela a respeito do seu caso,
pois algumas coisas que me disse no consultório me deixaram com dúvidas.
Após nossa conversa, Sandra me aconselhou a requisitar um segundo exame
com a sua amostra de sangue. Portanto, tomei a liberdade de fazê-lo. Quando
recebi seu hemograma notei que ele apontou uma baixa quantidade de
hemoglobina e, às vezes, isso é sinal de outra coisa.
— Bom, é aqui que eu entro, pois se trata da minha área. Davis e eu
verificamos o resultado do seu segundo exame, o Beta-HCG, e tivemos a
confirmação de nossas suspeitas. Já sabemos por que você achou que
estivesse doente. — Doutora Sandra se concentra em Jamie. — Suas
vertigens e enjoos estão ocorrendo porque seu fluxo sanguíneo está se
adaptando ao aumento do volume de sangue no sistema circulatório.
— Meu Deus, doutora! — exclamo, encarando a médica. — Será que
a senhora pode fazer como o doutor Davis e explicar as coisas na minha
língua?
A médica sorri.
— Tontura devido a enjoo, fome, calor e também por se levantar
muito rápido é comum nestes casos — Sandra responde.
— Que casos? — Jamie pergunta fitando a médica.
— Em casos de gravidez — Sandra conclui. — Você está grávida,
Jamie.
Hã?
— Oh, Deus! — Jamie ofega.
— Não, não, não… Tem algo errado aí, doutora. — Levanto-me
apressado e passo as mãos pela cabeça, revirando meus cabelos.
— Por que estaria errado, Andrew? — a médica pergunta.
— É impossível! — Olho para Jamie e percebo que ela está chorando.
— Doutora, eu coloquei todos os meus meninos para fora.
— Andrew! — Jamie repreende-me em meios às lágrimas.
— Andrew, obviamente um dos seus “meninos” foi mais rápido do
que você — Sandra afirma com um sorriso no rosto. — Além disso, você
deveria saber que “colocar para fora” não é nem de longe um método seguro.
— Puta merda! — exclamo. — Eu não sei nem cuidar de mim, o que
eu vou fazer com um bebê?
— Filho, é nesta fase que você descobre a paternidade. — Doutor
Davis passa por mim e me dá um tapinha nas costas. — Vamos, Sandra,
vamos deixá-los sozinhos.
Os médicos deixam o consultório, e eu volto a andar de um lado para
o outro. Não sei o que eu estou sentindo. Sou o homem mais feliz do mundo
por saber que a minha Jamie está curada. Parece até um sonho, mas… Saber
que eu vou ser pai? Eu estou me borrando, não, não, estou me cagando de
medo! Não é que eu não tenha pensado em ter filhos um dia, mas agora? Eu
acho que não estou preparado para criar uma criança, eu nem sei o que é ser
um pai. E não posso errar nisso, não me perdoaria se eu errasse com o meu
próprio filho. Meu Deus, eu vou ser pai. Jamie vai ser mãe. Vamos ser pai e
mãe.
O choro da Jamie me faz voltar ao presente, àquela sala, ao espaço
confinado onde eu pareço estar sendo sufocando.
— Ei, ei… — Ajoelho-me no chão em frente à cadeira dela. — Não
chora, Jamie.
— Eu não sei… não sei o que dizer, Andrew.
— A ideia de ter bebês comigo te apavora também? — pergunto.
— O quê? — Ela olha para mim em meio às lágrimas. — Não! De
jeito nenhum! Não estou chorando pelo bebê, e sim porque estou curada.
— Lágrimas de alegria, então?
— Lágrimas de alegria — ela concorda.
— Bom. — Suspiro.
— Você não parece feliz — Jamie aponta. — Você não queria, não é?
Ter um filho te deixa assustado? Andrew, parece que você vai desmaiar.
— Jamie, se eu tivesse que escolher uma mulher no mundo inteiro
para ser mãe de um filho meu, eu não pensaria duas vezes antes de escolher
você.
— Mas? — ela insiste.
— Mas estou com medo, sim, e talvez desmaie mesmo, tô sentindo
minha visão um pouco escura — admito. — Não é como um gato sarnento
que pegamos da rua, damos comida, água e fim. É um filho.
— Andrew, eu não quero obrigar você a ser pai — Jamie murmura.
— Se você acha que não pode lidar com isso, não vou te julgar. Eu também
fui responsável por essa gravidez.
— Você acha que eu vou desistir de você ou desse bebê?
Ergo o queixo dela e dou um beijo casto em seus lábios.
— Você disse que está com medo.
— E eu estou. Mas tenho certeza de que com você ao meu lado nós
vamos passar por isso. Aliás, vamos ser os melhores pais do mundo.
Ela sorri abertamente, seus olhos se iluminam com a possibilidade
desse futuro que pinto diante dela.
— Verdade?
— Claro! — concordo. — Quem você acha que vai ensinar o garoto a
pegar mulher? Quem vai dar o primeiro porre pra ele? Vou ser um paizão.
Jamie revira os olhos.
— Andrew, você não vai tornar o meu bebê em outro sapo boca suja
— Jamie diz fingindo estar brava. — Além disso, e se for menina?
— Se for menina, vamos manter essa miniabelhinha trancafiada a sete
chaves — digo veementemente. — Assim, nenhum sapo boca suja irá se
aproveitar dela.
Jamie ri.
— Você será um ótimo pai, eu tenho certeza disso.
— Sou bom em muitas coisas, não? — Pisco para ela. — No fim das
contas, acho que concordo com você. Vou ser um ótimo pai e você vai ser
uma ótima mãe. Esse bebê não poderia ter pais melhores do que nós.
— Que nome vamos escolher? Se for menina, eu penso que seria bom
chamarmos de…
Tomo seus lábios nos meus, interrompendo-a. Levanto-a da cadeira e
coloco-a sentada sobre a mesa do consultório. Jamie tenta interromper o
beijo, mas eu apenas o aprofundo mais ainda. Enfio-me entre suas pernas,
com uma das mãos seguro delicadamente sua nuca e com a outra a trago para
mais perto. Perco-me no gosto dos seus lábios. Engulo todos os seus gemidos
baixos e todos os seus suspiros de contentamento. Drew Junior anima-se lá
embaixo, e dessa vez nem penso em impedi-lo.
— Drew — Jamie ofega.
— Silêncio, abelhinha. — Capturo seu lábio inferior entre os meus e
dou uma leve mordida, arrancando-lhe um gemido. — Vou te mostrar no que
mais eu sou bom, amor.
E eu mostro.
No consultório.
Em casa.
No trabalho.
Na rua.
Em qualquer lugar.
Eu mostro que, se Jamie estiver ao meu lado, eu serei bom em muitas
coisas.
Porque é por ela que eu quero ser esse homem.
Foi ela quem me tornou esse homem.
EPÍLOGO
--—————————————————————————————

Jamie

Ele me prometeu que quando eu entrasse na igreja, desfilasse pelo


corredor e encontrasse os seus olhos, tudo o que eu veria seria amor, e sua
promessa foi cumprida.
Casei-me com Andrew três meses depois de descobrir que eu estava
curada e também grávida. Desta vez a cerimônia foi realizada em uma igreja,
diante de um padre. Desta vez usei um longo e rodado vestido branco, com
véu e grinalda. Desta vez tive muitos convidados e uma festa grandiosa. Meu
casamento foi digno de conto de fadas, e meu sapo demonstrou todo o seu
amor por mim quando deslizou a aliança em meu dedo e beijou os meus
lábios prometendo uma vida plena e feliz.
Cumprimentei todos os meus convidados e exibi orgulhosa minha
barriga proeminente de seis meses de gestação. Descobrimos que se tratava
de um menino, o qual já chamávamos de Adam. Foi Andrew quem escolheu
o nome, embora eu tenha brigado para chamá-lo de Joseph, foi meu marido
que saiu vitorioso nessa discussão.
— Você está tão linda.
Ergo a cabeça fitando os olhos azuis mais intensos e bonitos que já vi.
— Você também está muito elegante, Sr. Simons.
— Estou pensando nas mil e uma formas que eu terei para retirar esse
vestido de você.
— Eu aposto que está. — Sorrio.
— Você está feliz?
— Não há nenhuma mulher aqui que esteja mais feliz do que eu.
— Prometo que darei a você muitos dias e noites como essa, Sra.
Simons.
Ele beija os meus lábios e se afasta para tocar minha barriga.
— E como vai Adam? — pergunta-me.
— Muito bem — digo olhando com adoração a forma com que
Andrew acaricia minha barriga. — Sabe, eu penso que Adam já reconhece
sua voz.
— É mesmo? — Andrew ergue uma sobrancelha.
— Toda vez que você está por perto, sinto que ele fica mais agitado.
— Agitado? — Andrew ri. — Certamente é o meu filho.
— Jamie! — Lorenna nos interrompe e afasta-me do meu marido. —
Você tem que jogar o buquê!
— Ah, é mesmo. — Aceno. — Tenho que ir, Andrew. Alguém além
de mim precisa casar.
— Estarei esperando bem aqui — ele diz.
Sigo Lorenna até o palco improvisado no jardim. Ela me ajuda a
subir, e em seguida avisa através do microfone para que todas as moças
solteiras se reúnam. As mulheres todas afobadas correm para perto do palco,
esperando pela sorte de serem as próximas a se casarem. Lorenna e eu
contamos juntas: um, dois, dois, dois e, finalmente, três. Enganando a todas
elas, jogo com toda a força que consigo e viro-me depressa para assistir ao
buquê passar sobre todas aquelas cabeças e atingir em cheio a única mulher
da festa que está mais preocupada com o vestido do que em arranjar um
marido.
— Que porra é essa? — Abigail resmunga capturando o buquê nas
mãos e olhando de um lado para o outro sem entender nada. — Oh, não, não,
não! Eu só estava indo pegar um champanhe! Jamie, venha até aqui e jogue
esse buquê novamente!
— De jeito nenhum. — Sorrio. — Não posso, pois você o pegou.
— Juro por Deus que se essa macumba de casamento me atingir vou
infernizar você a vida toda! — ela pragueja.
— Ué, se a flecha do cupido te atingir, arranque-a da bunda! — Pisco
para ela. — Afinal, foi você quem disse que é fácil assim.
— Engraçadinha — Abigail resmunga.
— Fique com o buquê, Abby, é sério — peço.
— Tudo bem. — Abigail suspira. — Só vou ficar porque sei que não
vou me casar. Aliás, estou indo para a cidade do pecado cometer alguns…
Pecados.
— Como assim? — pergunto.
— Eu adiei minhas férias para ajudar você com o casamento —
Abigail explica. — Mas agora você está casada, então vou aproveitar aquela
grana que consegui na exposição e tirarei umas férias.
— Isso é muito legal!
— Sim, só passei para te dar um abraço e desejar uma ótima lua de
mel — ela diz. — Você pode se despedir do Drew por mim, né?
— Posso sim.
— Venha aqui. — Ela me abraça da melhor maneira que consegue
com a minha barriga entre nós. — Olha só o Adam, já está nos atrapalhando
antes de sair da barriga.
Sorrio.
— Ei, você é a madrinha, não pode dizer uma coisa dessas sobre seu
afilhado.
— Argh! Nem me lembre disso, você sabe que eu adorei ser madrinha
do Adam, mas… Tinham que escolher logo o Jack como padrinho?
— Não implique com isso Abby, por favor.
— Sinto muito, é que eu estava esperando que fosse o Brad Pitt ou
alguém gostoso de Hollywood.
— Vai ter que se contentar com o Jack — digo.
— Quer saber? Não quero me incomodar falando sobre o Jack. Estou
indo… Las Vegas me espera, baby!
Abraço-a novamente e assisto-a sumir no meio dos convidados
balançando seu buquê na mão. Sinto um toque na minha cintura e viro-me
para encontrar-me com Andrew.
— Fugindo de mim, Sra. Simons?
— Não pretendo fugir de você nunca mais — respondo. — Eu só
estava me despedindo de Abigail, ela disse que não foi encontrar você porque
precisa pegar o voo.
— Abby vai viajar?
— Vai sim — afirmo. — Vai para Las Vegas.
Andrew cai na gargalhada.
— O que foi?
— Las Vegas? — Ele ri. — Ai, caramba…
— Andrew, o que é tão engraçado? — insisto.
— É que encontrei o Jack agora há pouco, e ele mandou um abraço
para você. Infelizmente ele teve que ir embora cedo, porque tem que pegar
um voo.
Arregalo os olhos.
— Não…
— Sim — Andrew concorda.
— Jack vai para Las Vegas?
— Vai sim — Andrew diz. — Ele disse que precisa de umas férias
antecipadas. Depois de Las Vegas, ele vai ter que enfrentar a família toda em
Honolulu.
— Nossa! — exclamo. — Abby vai ficar doida quando souber!
— Ela não precisa saber. Além disso, qual a probabilidade de que eles
se encontrem?
— Verdade.
— Não vamos nos preocupar com eles, Jamie, porque nós também
temos uma viagem para fazer.
— Paris? — Suspiro.
— Paris, mademoiselle, e qualquer outro canto do mundo que você
queira conhecer. Estou aqui para realizar todos os seus desejos.
— Mas eu já realizei todos! A não ser que eu faça uma nova lista…
— Esqueça a lista, elas obrigatoriamente fazem com que você pense
que há um limite de tempo.
— E não há?
— Não, Jamie. — Andrew fecha a distância entre nós. — Temos a
vida inteira para realizarmos todos os seus, os meus e os nossos desejos.

Fim
AGRADECIMENTOS
--—————————————————————————————

Caro leitor, faz três anos que esta obra foi escrita e finalizada, embora
eu só esteja escrevendo os agradecimentos agora. Esta última página, por
algum motivo que não sei explicar, tem me mantido durante dias e noites
com uma sensação inquietante. Talvez seja porque os agradecimentos me
fazem lembrar finais, e finais me lembram de despedidas, e despedidas me
lembram do quanto não sou boa com essas coisas. Eu não sei — e não gosto
— de dizer adeus, portanto, desta vez, vou sorrir e escrever estas linhas até o
final com a certeza de que isto não é um adeus, e sim um até logo.
Eu ainda seria uma tímida e insegura garota se não houvesse
conhecido os livros e, com eles, a escrita, e, com ela, o imenso mundo
fantástico da literatura. Então, para começar, agradeço de todo o coração a
uma jovem garota de cabelos azuis e óculos, que com seus gibis do InuYasha
e sua meiga aparência de nerd me apresentou os primeiros livros com que
tive contato. Lê, obrigada por ter sido a minha melhor amiga no momento em
que eu mais precisava de uma. Por ter me apresentado o Nyah! Fanfiction,
mas, principalmente, por simplesmente ter surgido na minha vida e por ter
me dado o melhor presente de todos: a minha autodescoberta como leitora.
Quando comecei a escrever, mantive isto em segredo de todos ao meu
redor, e, no início, era incrivelmente bom ter algo só meu. Às vezes eu me
sentia como uma super-heroína carregando um segredo. Ser escritora era a
identidade minha que precisava ser mantida longe dos olhos do mundo, mas
como acontece com a maioria dos super-heróis, minha identidade também foi
descoberta. Tiago Garcia, você é meu melhor amigo, você é meu confidente e
uma parte de mim ainda acredita que você é o irmão que eu nunca tive. Você
foi o primeiro a desvendar o meu segredo. Obrigada por todos esses anos de
sorrisos, implicâncias, brincadeiras e de conversas inesgotáveis. Por me
incentivar desde o primeiro segundo que você soube da minha paixão pela
escrita e por acreditar em mim cada dia desde então. Eu não sei o que faria
sem você, então, obrigada por existir.
Mãe e pai, eu sei o quanto foi difícil para vocês ouvirem que a filha
queria percorrer um caminho onde amor nem sempre é o suficiente. Sei que
vocês temiam pelo meu futuro quando eu disse que desejava fazer aquilo que
eu mais amo pelo resto da vida: escrever. Sei que vocês esperavam que talvez
eu escolhesse uma profissão que salvasse vidas ou ajudasse as pessoas. Eu sei
disso, e é por isso que eu sou muito grata por vocês terem aceitado que nada
me faz mais feliz do que salvar vidas e ajudar pessoas criando obras que
motivam e inspiram aqueles que as leem. Obrigada por me amarem
incondicionalmente, mesmo que eu ainda tenha escolhido minha profissão
por amor. Eu amo vocês.
Obrigada para aquela que é a minha irmã de outra mãe, amiga para
todas as horas e prima de sangue. Luiza, você é uma das poucas pessoas
capazes de permanecer ao meu lado enquanto eu passo horas e horas
contando-lhe os inícios, os meios e os finais de todas as minhas obras. Você é
uma das poucas que têm a capacidade de ouvir tudo de novo outras milhares
de vezes, porque sou extremamente detalhista e quando o assunto são meus
personagens não canso de repetir suas histórias. Obrigada por ser a melhor
ouvinte e por guardar tudo isto em segredo.
Obrigada à minha amiga, Tayonara Pereira, por ler e se apaixonar por
todas as minhas histórias. Por me ouvir, me aconselhar e apoiar os meus
sonhos. Você sabe o quanto a escrita é importante para mim e nunca deixou
de me incentivar. Obrigada por acreditar no meu talento. Eu espero que você
saiba que nenhuma distância pode nos separar.
Obrigada à minha querida amiga, Karol Blatt, por ter colocado os
olhos sobre esta obra quando ela ainda estava sendo postada em uma
plataforma. Se você não tivesse se sentido atraída por este título e depois
pelos personagens, nós nunca teríamos nos conhecido. Agradeço por você ter
entrado no meu caminho e por fazer parte desta jornada. Obrigada por amar
Outra vez casados como se ele fosse seu, e acredite, bem no fundo, ele é.
Afinal, sua sensibilidade me inspirou em cada página do final deste romance.
Obrigada à minha capista, Dri Harada, por sua paciência e carinho na
hora de realizar o seu trabalho. Você enxergou a essência dos meus
personagens e encontrou a imagem perfeita para representá-los. Obrigada à
minha revisora, Evelyn Santana, por sua disponibilidade e sua atenção desde
o nosso primeiro contato. Obrigada à Amazon pela oportunidade que é
oferecida a cada autor independente de ganhar um espaço no mundo literário.
Vocês são incríveis por isso.
A todos os meus seguidores na plataforma de leitura Wattpad, por
fazerem parte da minha vida diariamente e por acompanharem cada passo
meu nesta difícil carreira. Minhas obras se tornam sucesso graças a vocês, e
eu sou muito grata por isso. E também a todos os leitores que fazem parte do
meu grupo “Leitores da Caty” no Facebook. Vocês se tornaram minha
segunda família. É muito bom saber que eu posso contar coisas sobre a minha
vida para vocês e realmente ser ouvida/lida. Obrigada às meninas que fizeram
parte do grupo “Dremaniacas”, vocês são verdadeiramente as melhores fãs de
Drew e Jamie. E também a todas as meninas do grupo “Cat’s” por se
autointitularem minhas fãs.
Eu tenho muito orgulho de dizer que possuo um grande número de
leitores espalhado pelo Brasil e fora dele também. Gostaria que fosse possível
citar o nome de cada um de vocês, no entanto, é impossível. Portanto, cito
aqui alguns dos nomes que marcaram minha vida nos meses em que trabalhei
nesta obra: Amanda Prestes, Ana Cláudia Parreiras, Ângela Leite, Helena
Paes Landim, Hemylly Ludymyla, Juliana Ballaris, Mikaele Silva, Thabata
Montelo, Raíssa Zaneze, Ana Carolina Avino, Maxilene Alves, Mayara
Silva, Paty Cello, Yanca Diniz, Yasmin Diniz, Ellen Macedo, Iara Medolago
Carr, Duda de Nard, Kathy Cerqueira, Larissa Cerqueira, Lary Medeiros,
Larissa Maps, Caroline Alves, Drícia Isabel. E em especial, Maria Lucia, que
com seus textos imensos tem o dom de transformar complemente o meu dia.
Finalmente, obrigada a você que chegou até aqui. Pelo visto, você
ama mesmo a minha escrita. E se você a ama, saiba que eu amo você
também.
Obrigada simplesmente por ser o meu leitor.
SOBRE A AUTORA
--—————————————————————————————

Caty Coelho nasceu em Santa Catarina, tem vinte anos. É graduanda


em Letras Espanhol. Aos quinze anos tornou-se uma leitora voraz dos mais
variados gêneros, contudo, nutre um carinho especial por obras de romance.
Pouco tempo depois, tomou gosto pela escrita e adquiriu o hábito de criar
mais projetos do que jamais dará conta de escrever. Quando não está
escrevendo, ela passa seu tempo lendo, assistindo a filmes e séries ou
mimando seu yorkshire.
Outra vez casados é sua primeira comédia romântica, escrita em 2015
e publicada no mesmo ano na plataforma de leitura Wattpad, onde alcançou a
marca de dois milhões de leituras.

Redes Sociais:

Facebook:

https://www.facebook.com/autoracatycoelho/

Instagram:

https://www.instagram.com/_catycoelho_/

Wattpad:

https://www.wattpad.com/user/_Caty_

Você também pode gostar