Você está na página 1de 3

BEM-VINDO AO INFERNO

DO DESENVOLVIMENTO
Introdução do livro Tales from development hell, de David Hughes

"Tentar fazer um filme em Hollywood é como tentar


grelhar um bife tendo uma sucessão de pessoas en-
trando na sala e baforando nele."

- Douglas Adams

A produtora Jane Hamsher, cujos créditos incluem Assassinos por


natureza e Do inferno, descreveu o desenvolvimento da seguinte
maneira: “O escritor transforma um roteiro. Os produtores e exe-
cutivos do estúdio lêem, dão ao roteirista suas notas de desenvol-
vimento, e ele volta e reescreve o melhor que pode, tentando fazer
todos felizes. Se voltar e for ótimo, o estúdio e os produtores vão
tentar colocar um diretor e estrelas (se ainda não o fizeram), e com
sorte o filme será feito.”

Isso é desenvolvimento, em teoria. Na prática, é mais assim:

1. O escritor apresenta um roteiro tão inefavelmente perfeito que


os produtores prefeririam furar os olhos com uma caneta que usar
ela para alterar alguma coisa.
2. O produtor ou executivo do estúdio, muito ocupado / entediado
/ analfabeto para ler o roteiro por si mesmo, pede “cobertura do
roteiro” - conselhos sobre o potencial do roteiro de um leitor pro-
fissional de roteiro. Se isso não levar imediatamente ao lixo de ro-
teiros e ao escritor ser demitido e substituído - por um modelo
mais jovem, mais gostoso e mais barato (um 'novato'), ou um mais
velho, mais experiente e mais caro (um 'veterano ') - o escritor re-
ceberá' notas '. “Todo mundo dá notas aos escritores”, diz o rotei-
rista Richard Friedenberg (Tudo por amor, Nada é para sempre),
“[até] o lixeiro. E as notas sempre entram em conflito.”

3. Se suficientemente encorajado a fazê-lo, o produtor / executivo


pode então realmente ler o roteiro. “Isso é perfeito”, pode ser que
ele (ou, uma vez em mil, ela) diga. “Quem podemos conseguir
para reescrevê-lo?” Então, para justificar seu próprio crédito na
tela / salário exorbitante / cargo / vaga no estacionamento, eles vão
jogar suas próprias ideias na mistura ou, mais comumente, tirar
ideias. “Em Hollywood, as ideias são um anátema”, diz o rotei-
rista e produtor Gary Goldman (Instinto selvagem, O vingador do
futuro, Minority Report), “e quanto maior o orçamento, mais proi-
bidas elas são”. O escritor então se apressa para reescrever sua
magnum opus, fazendo o possível para incorporar todas as notas
diferentes e conflitantes, e reenvia o roteiro para aprovação.

As etapas 1 a 4 agora são repetidas continuamente, com o script


evoluindo continuamente - e, em casos raros, melhorando - até
que finalmente alguém decida que é bom o suficiente (embora
provavelmente não tão bom quanto o primeiro tratamento) para
virar um filme ... Este último tratamento do roteiro é enviado a
atores e diretores, na esperança de atrair um com influência
suficiente para realmente fazê-lo. Diretores interessados - que po-
dem estar vinculados a até uma dúzia de projetos por vez, na es-
perança de que um estúdio eventualmente dê a um deles um 'sinal
verde' - quase certamente vão querer uma reescrita, para incorpo-
rar cenas de vinte minutos, cenários elaborados, milhares de ex-
tras, locais impossíveis, etc., qualquer um dos quais pode adicio-
nar alguns zeros ao orçamento que o produtor tem em mente. Os
atores interessados quase certamente vão querer uma reescrita,
para tornar suas cenas maiores, seus personagens mais heroicos,
sua jornada mais árdua, seu diálogo maior, bem, você sabe, me-
lhor - mesmo (ou especialmente) se isso significar roubar as me-
lhores falas de outros personagens. Em outras palavras, como
disse um roteirista veterano, “ajustar um tratamento para melhor
se adequar a uma estrela que manifestou interesse, apenas para
ter essa estrela abandonando o projeto”. Como os desejos do es-
túdio, produtores, diretor e atores costumam ser mutuamente ex-
cludentes, todos culparão o escritor, que será demitido e substitu-
ído por um novo escritor... levando todo o processo de volta ao
estágio 1.

Isso é o inferno do desenvolvimento.

Você também pode gostar