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Tema 3

Municipalismo e Poder Local Opção 2

Tema 3 ( opção 2)

Tomando como referência o Capítulo III das lições da UC Municipalismo e Poder Local, procure
delinear a evolução dos municípios e do poder local decorrente da vigência do Estado Novo entre
1930 e 1974, que culminou com queda do marcelismo enquanto continuidade do regime fundado
por Oliveira Salazar.

“(…) Sei muito bem o que quero e para onde vou, mas não se me exija que
chegue ao fim em poucos meses. No mais que o País estude, represente,
reclame, discuta, mas que obedeça quando se chegar à altura de mandar .”
Salazar, discurso na tomada de posse como Ministro das Finanças, de 27
de Abril de 1928.

A primeira República não teve uma vida fácil com mais de 40 governos nomeados em cerca
de 16 anos. Em 28 de Maio de 1926 deu-se em Braga um golpe militar que foi chefiado pelo
General Gomes da Costa. O Golpe Militar de 1926 foi o culminar de uma situação política
insustentável vivida pela Primeira República desde a sua instauração em Outubro de 1910. O
fracasso desta primeira experiência republicana deveu-se não só às lutas entre os diversos partidos
políticos, mas também pela corrupção, pela instabilidade política e pela crise económica após a
desastrosa participação de Portugal na Primeira Grande Guerra.
Foi então instaurada em Portugal uma ditadura militar entre 1926 e 1933, a qual suspendeu
várias liberdades, nomeadamente as eleições para o Parlamento, os governos passaram a ser
escolhidos pelos militares, o direito à greve e às manifestações, a imprensa passou a ser controlada
pela censura e a oposição ao governo passou a ser proibida.
Em 1928 o Presidente Óscar Carmona convida António de Oliveira Salazar para Ministro das
Finanças, com o objectivo de resolver a grave crise económica que o país atravessava e é assim
que começa a ascensão do ditador:
 1928: Nomeação de Salazar para Ministro das Finanças;
 1932: Nomeação de Salazar para Presidente do Conselho;
 1933: Aprovação em plebiscito de uma nova Constituição (que legitimaria o Estado Novo);
 1936: Salazar assumiu as pastas da Defesa e da Guerra e dos Negócios Estrangeiros.
Outros factos e datas são relevantes para a ascensão do regime ditatorial/fascista, tais
como o aparecimento:

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 da União Nacional (foi durante o governo de Domingos Oliveira, em 1930, que, por decreto do
Conselho de Ministros se instituiu o partido único do regime, a União, mas só em 1932 é que,
por decreto, se publicaram os estatutos da organização,
 a publicação do estatuto do Trabalho Nacional em 1933, com 52 artigos, dividindo a sua
temática por quatro títulos: I - Os indivíduos, a Nação e o Estado na ordem económica e
social; II - A propriedade, o capital e o trabalho ; III - A organização corporativa; IV -
Magistratura do trabalho
 as eleições para a Assembleia Nacional em 1934 (com partido único), por sufrágio directo dos
cidadãos maiores de 21 anos ou emancipados, os analfabetos só podiam votar se pagassem
impostos não inferiores a 100$00 e as mulheres eram admitidas a votar se possuidoras de
curso especial, secundário ou superior,
 e as eleições para a Presidência da República em 1935, Óscar Carmona, reeleito sem
opositor, obrigado a aceitar a concentração de todas as pastas-chave em Salazar.
A ditadura, com Salazar à cabeça, ia-se instalando obedecendo à ideia de uma sociedade
com valores tradicionais que se traduziam no modelo tão apregoado; Deus – modelo cristão, Pátria
– modelo nacionalista e Família – modelo corporativista.
A definição mais usual de corporativismo é “uma forma de organização antidemocrática e
anticomunista que, agrupando patrões e operários pretendia esbater os conflitos sociais.” De facto a
proposta de corporativismo é “interessante” ao pretender eliminar a luta entre classes, propondo
uma estreita colaboração entre elas, mas a existência e a fomentação de classes dominantes e
dominadas eliminava qualquer hipótese desta forma de construção da sociedade.
O que são as corporações? São organizações/associações que representam famílias e organismos
que se agrupavam de acordo com os seus interesses. (asilos, instituições de caridade, agremiações
artísticas e literárias, Casas do povo, Grémios e Sindicatos Nacionais, entre outras). O
«corporativismo português» cedo mostrou o que era e ao que vinha: um dispositivo de consolidação
do regime autoritário, um recurso de dominação e arbitragem de interesses.
A partir da Constituição de 1933, com o fim da ditadura militar, os ideais do Estado Novo
iniciam o seu caminho até à implantação de uma outra ditadura, agora mais feroz, com objectivos
bem delineados e influenciados pela política internacional, nomeadamente de Itália e Espanha.
São adoptadas várias medidas que farão de Portugal um país amordaçado; a abolição dos
partidos políticos e aprovação da União Nacional como “partido único”, a suspensão dos direitos dos
cidadãos, o aumento da repressão, a limitação do poder legislativo da Assembleia Nacional, que
passou a ser desempenhado pelo Presidente do Conselho (Salazar) a instituição da censura (não

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só à diversidade de opiniões mas, também, à própria história de Portugal que foi reescrita de forma
a que os heróis nacionais fossem “bem” seleccionados, assim como as figuras negras da história de
Portugal, de modo a dar a conhecer ao aluno “os bons e os maus exemplos, as atitudes nobres e as
que constituíram traição à Pátria, despertando nas crianças e nos jovens o sentido de devoção para
com esta, e o de repulsa para com os que, em dado momento da história, contribuíram para o seu
declínio”), a abolição dos sindicatos livres, substituídos por sindicatos nacionais (corporações), são
apenas algumas das medidas para que o poder instituído não fosse colocado em causa por
algumas mentes “pensantes” que se evidenciam no combate à ditadura como por exemplo;
Fernando de Abranches Ferrão, António Sérgio, João Martins Pereira, Abel Salazar, Manuel
Valadares, Soeiro Pereira Gomes e tantos outros que durante a sua vida optaram por uma postura
antifascista.
A regulação da economia foi outra das preocupações centrais do Estado Novo. O
condicionamento da capacidade de iniciativa e a livre concorrência, Portugal pode ser caracterizado
como uma ‘velha quinta de família’. Os princípios de nacionalismo e autarcia, que temem as crises
do capitalismo e as pressões e dependências externas, governam a economia. A indústria (sector
secundário) é um sector menor ocupado apenas por trinta por cento da população activa face aos
cinquenta por cento do sector primário, em muito devido à Lei de Condicionamento Industrial
publicada em 1931. Investiu-se especialmente nos cereais, de que o trigo é exemplo, que
satisfariam a mais básicas necessidades alimentares dos portugueses. Com uma agricultura
desmecanizada para um aumento significativo da área de cultivo, a produtividade não acompanhou
as necessidades da população levando às importações. A fome e a miséria atinge o país e o êxodo
rural é a consequência, quer para o litoral quer para outros países europeus.
É urgente o desenvolvimento da indústria. Portugal assina o pacto fundador da OECE em
1948. em 1953 surge o primeiro de quatro planos de fomento. O I Plano de Fomento, que vigorou
desde 1953 a 1958, teve como principal objectivo criar infra-estruturas (energia, transportes e
comunicações). O II Plano de Fomento surge logo a seguir, em 1959 e estendeu-se até 1964. Este
já reconhece a presença das infra-estruturas e dedica-se ao investimento na indústria
transformadora de base (siderurgia, refinação de petróleos, adubos, químicos e celulose)
Em 1960 Portugal adere à Associação Europeia de Comércio Livre ou European Free Trade
Association (EFTA), passa também a fazer parte dos membros do Banco Internacional de
Reconstrução e Desenvolvimento (BIRD), do Fundo Monetário Internacional (FMI) e do Acordo
Geral de Tarifas e Comércio ou General Agreement on Tariffs and Trade (GATT). A adesão de
Portugal a estas instituições representa apenas uma coisa: maior integração de Portugal na

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economia europeia e mundial. Depois da substituição de António de Oliveira Salazar por Marcelo
Caetano em 1968, inicia-se o último dos Planos de Fomento, o III Plano de Fomento. Este é o Plano
que demonstra o pico da agressividade capitalista de todo o Estado Novo. Isto visto através da
captação de capitais estrangeiros, da liberalização da concorrência e do mercado.
Contudo, Portugal ainda se situava economicamente atrás do resto dos países europeus. A
única coisa que não mudou foi o regime que permaneceu activo até ao golpe de 25 de Abril de
1974.

O poder local em Portugal que herdou a sua organização do liberalismo com a reforma de
1835, na I República, por razões várias, acabou por não ver cumpridas as promessas
descentralizadoras. No Congresso Nacional Municipalista, realizado em 1922, foram lembradas as
principais ideias da proposta descentralizadora colocando a instituição municipal na origem da
nacionalidade, da consolidação da pátria, do enfraquecimento das classes privilegiadas, da
supremacia do poder civil, das liberdades públicas e do desenvolvimento da riqueza local.
A situação agrava-se com o Golpe militar de 1926 que suspende todas as disposições
administrativas vigentes. Foram dissolvidos os corpos administrativos, sobrando os governadores
civis que ficaram responsáveis pelo envio de nomes de cidadãos, ao poder central, a integrarem as
futuras comissões administrativas (1926-1937) das câmaras municipais. O governador civil passa a
ter um papel preponderante na implantação da ideologia do Estado Novo em todo o território.
A Constituição de 1933, como era de prever, também contemplou algumas directivas para
as autarquias locais. Em termos de divisão administrativa, a Constituição de 1933 organiza o
território em treze províncias (Minho, Trás-os-Montes, Alto Douro, Beira Alta, Beira Transmontana,
Beira Litoral, Beira Baixa, Ribatejo, Estremadura, Alto Alentejo, Baixo Alentejo, Algarve). Em 1936
duas províncias unem-se a outras duas (Trás-os-Montes/Alto Douro e Beira Transmontana/Beira
Alta), passando para onze. Em 1959 a Constituição em vigor desde 1933 é alterada, são extintas as
províncias, que dão lugar aos governos civis. Esta situação conduz à reformulação do Código
Administrativo em que o distrito passa a ser uma entidade autárquica supramunicipal, que agrega os
municípios do seu território.
O Código Administrativo de 1936-1940 veio dividir o território nacional em quatro níveis de
circunscrições administrativas: a freguesia, o concelho/município, o distrito e a província (eliminada
em 1959).

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A unidade política mais pequena era a freguesia. As freguesias variavam de tamanho e


podiam compreender um certo número de lugares, aldeias e vilas. Uma cidade abrangia diversas
freguesias. Cada freguesia tinha um órgão de administração local — a junta de freguesia
(Presidente, Secretário, e Tesoureiro e dois vogais) - eleito pelos “chefes de família” e o regedor
indicado pelo poder central. As funções do regedor incluíam a recolha de dados para o censo da
população, o policiamento da freguesia, a recolha de estatísticas sobre a agricultura e a indústria,
afixação de decretos governamentais, notificação de mancebos para o serviço militar, comunicação
ao presidente da câmara de irregularidades na administração da freguesia ou na actuação da junta.
De acordo com a lei, cada freguesia rural deveria ter uma casa do povo, na qual se deveriam filiar
tanto os proprietários como os trabalhadores.
Um certo número de freguesias contíguas constituía um concelho, dirigido pelo presidente
da câmara, nomeado pelo governo central, e por um conselho municipal (a câmara municipal). Os
trezentos e tal concelhos ficavam incluídos em dezasseis distritos, cada um deles dirigido por um
governador, escolhido pelo ministro do Interior, em que cada distrito é composto por conselho de
distrito (composto pelos procuradores dos concelhos da circunscrição distrital) e junta distrital (o
corpo administrativo do distrito e compõe-se de presidente e vice-presidente e de três vogais, eleitos
pelo conselho do distrito na sua reunião de constituição).
A reforma do Código Administrativo (1936-1940) elaborado por Marcelo Caetano foi uma
das grandes reformas que tiveram lugar neste período. Esta reforma utilizava uma classificação dos
concelhos em classes e ordens. Em relação às classes os concelhos podiam ser urbanos ou rurais
(existindo, em cada classe, subdivisões designadas 1ª, 2ª e 3ª ordem, dependendo do número de
habitantes). Nos concelhos urbanos a maioria da população encontrava-se num centro residencial,
nos concelhos rurais a população encontrava-se dispersa pelo povoamento.
Os órgãos da administração municipal eram divididos em comuns e especiais. Os comuns
eram o Conselho Municipal; formado pelos representantes das juntas de freguesia, das ordens
profissionais, dos sindicatos, dos grémios e misericórdias, com funções de moderação e de eleição
dos vereadores, a Câmara Municipal, com função deliberativa, constituída pelos vereadores eleitos
e pelo Presidente indigitado pelo Governo, com funções executivas. Os órgãos especiais eram as
juntas de turismo, as comissões especiais de turismo, as comissões municipais de assistência e os
órgãos municipais consultivos (ex: em arte, arqueologia, etc.)
A figura do Governador Civil manteve-se e para ocupar este cargo tinha de ser um “cidadão
português no gozo dos seus direitos civis e políticos, diplomado com um curso superior, funcionário
civil com a categoria igual ou superior a chefe de repartição….antigo vereador ou vogal da junta de

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província durante pelo menos quatro anos” (Art.347º). Para além de outros benefícios pessoais e
profissionais tinha como funções representar o governo, representar a autoridade policial, controlar
a actuação dos presidentes de câmara do distrito, nomeados pelo Ministro do Interior, por sua
recomendação.
O presidente de Câmara assumia um papel dependente da política imposta pelo Governo.
De tal forma que os executivos municipais (Presidente e Vereadores, com um mandato de seis anos
alterado para oito anos, em 1940, pela dificuldade em encontrar pessoas disponíveis para o
exercício dos cargos) estavam limitados ao exercício de controlo, fiscalizando o cumprimento de
normas definidas centralmente.
Os presidentes de Câmara e regedores de freguesias nomeados pelo poder central, sujeitos
a apertada tutela administrativa, dispunham de receitas que provinham de um subsídio municipal e
de uma parte do imposto profissional. As fontes de receita local incluíam a renda das propriedades
da freguesia, os impostos sobre a utilização das propriedades da freguesia, renda de feiras, receitas
do cemitério e multas locais próprias (Código Administrativo, artigo 777.°). O Código de 1940 (em
vigor até 1974) era o diploma que regulava esta matéria, quartando a autonomia financeira dos
municípios.
A “primavera” marcelista manteve as autarquias na dependência, tanto no plano político
como no financeiro, do orçamento de Estado que afectava verbas claramente insuficientes para as
necessidades locais fazendo sobressair a inutilidade, por incapacidade e incompetência, destes
órgãos desconcentrados da Administração do Estado, contribuindo para o descrédito das
instituições.

Em suma: os presidentes de câmara eram nomeados pelo Governo; os governadores civis


representavam o governo no distrito e perante as autarquias locais, controlando os corpos
administrativos. As Câmaras Municipais dependiam da centralidade do Estado Novo, no domínio
político (nomeação do presidente e vice-presidente e a possibilidade de dissolução apoiada na
acção interventora e inspectiva dos Ministérios das Finanças e do Interior) e no domínio financeiro,
com a obrigatoriedade de aprovação pela administração central de determinadas deliberações
municipais.

Esta estrutura organizativa do poder local mantém-se até à Revolução do 25 de Abril de


1974. Com a transição de um regime ditatorial para um regime democrático ocorreram profundas

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alterações políticas que se irão repercutir em toda a organização do poder local, conferindo-lhe uma
ímpar autonomia.

GOMES, João Carlos Alberto da Costa, “O município através da história”, Eloy do Amaral(coord),
Congresso Nacional Municipalista de 1922, Lisboa. Off.Gráf.d’O Rebate, 1923
Otero, Paulo (1990). «A concepção unitarista do Estado na Constituição de 1933», in Revista
da Faculdade de Direito da Universidade de Lisboa , vol. XXXI,
RAMOS, Rui (1986) “O Estado Novo perante os poderes periféricos” Análise Social, vol. XXII, nº 90
Rosas, Fernando (1994). O Estado Novo (1926-1974). Lisboa, Círculo de Leitores.
Código Administrativo de 1940 e Reforma de 1959

ROSAS,Fernando, Análise Social, vol. XXIX (128), 1994 (4.°), 871-887 “Estado Novo e
desenvolvimento económico (anos 30 e 40): uma industrialização sem reforma agrária”
http://analisesocial.ics.ul.pt/documentos/1223377862S2yDZ6ad3Zv90JB8.pdf
História e Ideologia no Estado Novo – A Revisão Integralista do Passado Nacional Márcia Grilo
https://sapientia.ualg.pt/bitstream/10400.1/7448/1/08_Promontoria9_MGrilo.pdf.pdf
Licenciada em Património Cultural pela Universidade do Algarve
https://digitalis-dsp.uc.pt/bitstream/10316.2/41656/1/Estado_Novo_Republica_Corporativa.pdf
Torgal, Luís Reis (2006). «Estado Novo: “República Corporativa”», in Revista de História das Ideias,

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