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INTERFACES ENTRE DIREITO E ARTE: ESTUDO SOBRE FEMINISMO A

PARTIR DO TEATRO ÉPICO DE BERTOLT BRECHT

Kelly Helena Santos Caldas

Universidade Federal de Sergipe – kellycaldas.contato@gmail.com

Resumo: Neste trabalho pretende-se, a partir de três obras épicas do encenador e dramaturgo alemão Bertolt
Brecht, examinar e discutir o papel social e político ocupado pelas suas protagonistas femininas. As peças
objeto deste estudo são: Santa Joana dos Matadouros (1929 -1931), Mãe Coragem e seus Filhos (1938 –
1939) e A alma boa de Setsuan (1939 – 1942). Essas literaturas dramáticas serão analisadas com o fito de
observar em uma perspectiva de gênero, quais narrativas são desempenhadas, respectivamente, por Joana
Dark, Mãe Coragem e Chen Te. Antes de adentrar nas histórias dessas mulheres e na problematização delas
decorrentes, faz-se necessário compreender o modelo épico do teatro brechitiano, caracterizado pelo
didatismo, estranheza e distanciamento entre palco e plateia. Após esta etapa importante do trabalho,
aprofundar-se-ão as questões de gênero presentes nas três obras épicas acima mencionadas. Deseja-se, para
tanto, averiguar a existência ou não de traços sexistas, de binarismo ou cegueira de gênero nessas histórias e
a partir das possíveis desigualdades constatadas, refletir sobre feminismo e luta pelos direitos das mulheres.
A relevância deste estudo se insere na contribuição sensibilizadora da literatura teatral para a potencialização
da discursão sobre desigualdade de gênero e feminismo, sendo este analisado em uma perspectiva cultural e
da diferença, já com relação à ciência jurídica serão apresentados aportes concernentes à proteção jurídica da
mulher. O método de pesquisa empregado é o hipotético-dedutivo e objetivo exploratório, sendo a
abordagem qualitativa e dialética. Tal metodologia parte de uma revisão bibliográfica e da análise das três
peças teatrais mencionadas.
Palavras-chave: teatro épico, protagonismo feminino, direitos da mulher, feminismo, garantismo.

Introdução: Diante das obras teatrais e numa perspectiva do constitucionalismo


teorias de Bertold Brecht (1898 a 1956), garantista contemporâneo.
através de ferramentas como didatismo, A estética e a obra de Brecht, decorrente
distanciamento e estranheza observa-se que, de seus estudos marxistas e sociológicos, não
em sua vasta obra, objetiva-se fomentar o se identifica com a premissa dramática do
olhar crítico e político da plateia frente às Teatro Aristotélico, porque o objetivo do
barbaridades, injustiças e desumanidades Teatro Épico não é a catarse do público e sim
perpetradas entre os seres humanos. a sua capacidade de, ao se distanciar da cena,
É nesse cenário que se evidencia a enxergar as determinantes sociais que
urgente conexão interdisciplinar entre o interferem nas relações inter-humanas.
Teatro Épico Brechtiano e o Direito, sendo (ROSENFELD, 1968).
este concebido para além do normativismo,

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No teatro clássico e hegemônico, reina a jurídico e subjetividade do caso concreto e o
fantasia e a construção simbólica das teatro épico apresenta à plateia uma
aparências: desconstrução da realidade utópica, a partir de
uma crítica substancial às engrenagens sociais
A plateia é atraída para a trama ou enredo e determinantes).
levada a identificar-se com os personagens;
os meios para conseguir isso falsificam a
imagem da realidade; e a plateia está por
demais contente e hipnotizada para descobrir “O garantismo jurídico objetiva a tutela de
que tudo é falso. Por mais brilhantes que todos os direitos fundamentais, direitos
sejam a encenação e representação de uma liberais e direitos sociais, estes têm
peça, o seu efeito (se não o seu objetivo) é importância central, pois possibilitam a
colocarmos em um estado mental passivo e quantificação da concretização da
sem capacidade crítica. (WILLETT, 1967, p. Constituição e representam os alicerces da
213) existência do Estado Democrático de
Direito.” (GIL, 2006, p. 41)
A arte teatral como espaço de catarse, de A plateia é atraída para a trama ou enredo
deleite e contemplação passiva reproduz uma e levada a identificar-se com os personagens;
ideologia burguesa, entorpecente e ilusória, os meios para conseguir isso falsificam a
incapaz de uma ideia rebelde emancipatória e imagem da realidade; e a plateia está por
a arte teatral como espaço de estranheza e demais contente e hipnotizada para descobrir
distanciamento reproduz uma ideologia contra que tudo é falso. Por mais brilhantes que
hegemônica, que parte do capitalismo e da sejam a encenação e representação de uma
exclusão política e social das classes para peça, o seu efeito (se não o seu objetivo) é
libertar e transformar os sujeitos. colocarmos em um estado mental passivo e
De modo ainda inicial, pode-se propor sem capacidade crítica. (WILLETT, 1967, p.
uma relação intrínseca entre positivismo 213)
jurídico e teatro dramático (o positivismo O próprio Brecht, na obra Estudos sobre
prescreve a mera subsunção do fato a norma, teatro, apresenta de forma esquemática as
teoria do silogismo jurídico, não cabendo ao diferenças entre a forma dramática de teatro e
juiz uma interpretação racional diante caso a forma épica de teatro. Enquanto a forma
concreto e o teatro dramática, por meio das dramática caracteriza-se pela “atuação,
fórmulas de unidade de tempo, lugar e ação, envolvimento e mergulha nas emoções”, a
produz uma linearidade passiva da plateia, forma épica caracteriza-se pela “narração,
fechada em si mesma), bem como entre o observação e desperta uma tomada de
garantismo jurídico e o teatro épico (o decisões/ações”. Enquanto o espectador se
garantismo jurídico ressalta a diferença entre identifica na forma dramática, o mesmo
normatividade e realidade, entre formalismo

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estuda e analisa na forma épica. Para a forma dramática “o ser humano é imutável e um ser
fixo, os olhos são lançados na meta final, uma consiste em obscurecer a forma, em aumentar
cena faz a outra, há linearidade e a dificuldade e a duração da percepção. O ato
desenvolvimento”, já para a forma épica “o de percepção em arte é um fim em si e deve
ser humano é mutável, os olhos são lançados ser prolongado; a arte é o meio de sentir o
no percurso, cada cena é vista por si mesma, devir do objeto, aquilo que já se „tornou‟ não
ao invés de linearidade há curvas e elipses”, interessa à arte. (CHKLÓVSKII, 1971, p. 82)
além disso na forma dramática “o pensamento Por meio das protagonistas femininas
determina o ser”, enquanto que na forma “Joana Dark”, “Mãe Coragem” e “Chen Te” e
épica “o ser social determina o pensamento”. das representações culturais que estas
(BRECHT, 2005, p. 31) mulheres representam, pretende-se
Os fatores ambientais, sociais e históricos problematizar os lugares de fala e ação
para além dos conflitos interpessoais ainda ocupados pelas mulheres. De uma perspectiva
não haviam sido vivenciados no teatro, coube interdisciplinar entre direito e arte,
a Brecht o desafio de trazer de forma didática especificamente entre direito e teatro, busca-
essas narrativas à obra teatral e, se criar pontos de diálogo entre as narrativas
consequentemente, ao palco. jurídicas e artísticas que investigam, direta ou
Para Brecht, o teatro era um palco indiretamente, a expressão cultural do
científico capaz de elucidar a plateia sobre a patriarcado e a inferioridade e vulnerabilidade
sociedade e a necessidade de transformá-la. feminina.
Capaz de, concomitantemente, ativar o Neste contexto, a justificativa deste
público e nele fazer nascer uma ação trabalho se mostra relevante pela necessidade
transformadora. Dar fim à ilusão e ao impacto urgente de criar pontos de conexão do direito
inerte e mágico do teatro, abrindo espaço para com outras linguagens sociais, advindas de
o pensar crítico dos sujeitos enquanto seres outros campos do saber. A existência formal
sociais estruturalmente desiguais. da norma não é capaz de garantir-lhe eficácia
(ROSENFELD, 1968). jurídica e social (efetividade), é preciso
A finalidade da arte é dar uma sensação adentrar nos fenômenos culturais para tanto e
do objeto como visão e não como o teatro épico é um ótimo espelho social.
reconhecimento; o processo da arte é o Existem diversas vertentes teórico-
processo de singularização ostranenie – políticas do feminismo, sendo o feminismo
(estranhamento) dos objetos e o processo que cultural aquele que mais dialoga com a

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dramaturgia brechtiana, na medida em que os virtualidades criativas e transformadoras”.
(ROSENFELD, 1968, p. 138-139)
personagens estão inseridos em contextos
Nesta perspectiva, a literatura épica
socioculturais determinantes para a negação
mostra-se capaz de abrir caminhos de reflexão
e/ou resistência do sujeito feminino.
sobre as teorias feministas e os direitos da
Para o feminismo cultural é necessário a
mulher. Dentre os conteúdos abordados por
construção de uma contracultura feminina,
Brecht estão as vicissitudes do convívio
pautada em uma educação libertária,
social, bem como as tensões sociais entre os
antirracista e não sexista. Por meio de
detentores do poder e a realidade cruel dos
processos de formação de consciência, os
subalternos, entre o discurso de dominação e
símbolos e representações da ideologia
o discurso de emancipação, entre as virtudes
patriarcal dão lugar a construção do feminino
humanas e as seduções do capital, entre a
pela ótica da diferença. (CISNE, 2018, p. 5)
tirania da guerra e a eliminação cruel dos
Para a filósofa e escritora Simone de
marginalizados, entre o discurso de paz e a
Beauvoir sexo e gênero são diferentes,
concretização de perseguições e
enquanto sexo é uma decorrência biológica, o
desigualdades e, de maior importância para
gênero é algo construído pela sociedade.
este trabalho, entre a coisificação da mulher e
“Nenhum destino biológico, psíquico,
o patriarcado.
econômico define a forma que a fêmea
Desta forma, a hipótese levantada é que o
humana assume no seio da sociedade; é o
Teatro Épico de Bertold Brecht possui
conjunto da civilização que elabora esse
ferramentas estéticas e dramatúrgicas capazes
produto intermediário entre o macho e o
de fomentar o diálogo com o Direito e,
castrado que qualificam o feminino”.
especificamente, com o garantismo jurídico
(BEAUVOIR, 1980, p. 99)
de tutela dos direitos fundamentais e humanos
Diante do distanciamento e da estranheza
da mulher.
do tempo histórico ou do espaço geográfico
O objetivo geral deste trabalho é
atrelado ao uso da narração ao invés do
investigar, a partir das protagonistas
diálogo, o dramaturgo Bertold Brecht induz a
femininas das peças brechtianas, o papel
plateia a desenvolver o “olhar épico da
ocupado pela mulher nas suas relações sociais
distância”:
e as possíveis tensões sexistas e patriarcais e,

“[...] para que nós mesmos e a nossa por meio desta interface entre Direito e
situação se tornem objetos do nosso juízo
crítico e para que, desta forma, possamos
Literatura, estudar, por meio do
reencontrar e reentrar na posse das nossas constitucionalismo garantista contemporâneo,

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os direitos da mulher. Dentre os objetivos Segundo Gil (2008), normalmente as
específicos, estão: a) Fazer um levantamento pesquisas sociais possuem uma abrangência
dos aportes teóricos e estéticos das peças muito grande no seu universo de elementos,
épicas brechtianas; b) Analisar as tensões dessa forma é impossível considerá-los em
subjetivas e sociais enfrentadas pelas sua totalidade.
personagens femininas: Joana Dark, Mãe Diante da complexidade das
Coragem e Chen Te; e c) Construir diálogos personagens brechtianas objetiva-se
entre Direito e Literatura, por meio do estudo relacionar o teatro épico e o garantismo
crítico do garantismo jurídico dos direitos jurídico com a perspectiva de enxergar os
fundamentais e humanos da mulher. diversos ângulos de tutela dos direitos
fundamentais e humanos da mulher. Não
Metodologia: Quanto ao método de menos importante, será utilizada a pesquisa
pesquisa, o presente estudo utiliza o método bibliográfica que subsidiará todo referencial
hipotético-dedutivo e objetivo exploratório. produzido.
Optou-se por um raciocínio hipotético-
Resultado e discussões: O papel de garantia
dedutivo, que na concepção de Gustin e Dias
do Direito, preocupado com o resgate da
explicando o pensamento de Karl Popper:
dimensão democrática do Estado de Direito
[o raciocínio hipotético-dedutivo] Constitucional, tornou-se hoje possível pela
apresentado por meio das seguintes
características: a) existem expectativas ou específica complexidade de sua estrutura
conhecimento prévio; b) surge o problema
de conflitos com as expectativas ou teorias formal, a qual é marcada por uma dupla
já existentes; c) propõem-se soluções a partir
de conjecturas (dedução de consequências
artificialidade de garantias: (i) pelo
na forma de proposições passíveis de teste); positivismo jurídico da norma e (ii) pela sua
d) teste de “falseamento” (tentativa de
refutação pela observação e experimentação sujeição ao Direito. Assim, a produção
ou por outros procedimentos). (GUSTIN;
DIAS, 2006, p. 24) jurídica é disciplinada por normas, já não
apenas formais, mais também substanciais.
Nesta pesquisa pretende-se utilizar a
(FERRAJOLI, 1997).
abordagem qualitativa, através do método
É preciso observar que a norma nunca
dialético, que penetra o mundo dos
está isolada e sozinha, ao contrário, está
fenômenos tendo em vista sua ação recíproca,
diretamente ligada a outras normas, formando
da contradição inerente ao fenômeno e da
com estas um sistema normativo. Neste
mudança dialética que ocorre na natureza e na
percurso, observa-se que o Direito só existe
sociedade (MARCONI; LAKATOS, 2011).

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onde haja um complexo de normas formando (1618 – 1648). Mãe Coragem (Anna Fierling)
um ordenamento jurídico. (BOBBIO, 1989) tem dois filhos (Queijinho e Elif) e uma filha
O Teatro Épico Brechtiano é uma poética muda (Kattrin). Seu modo de subsistência é o
que coloca as forças sociais acima da comércio de mantimentos escassos que vende
liberdade dos personagens (BOAL, 1991), em uma carroça, ao exército em guerra. A
bem como se utiliza da narração e da medida que passam os anos, Mãe Coragem
descrição para, didática e criticamente, gerar a perde os seus filhos homens, ambos
interpretação, a compreensão e o próprio recrutados para trabalhar em batalhas bélicas.
julgamento do espectador acerca da realidade Resta-lhe sua única filha mulher, pela qual,
que o rodeia (DESGRANGES, 2003). Mãe Coragem tem pouco apreço. Não
A partir da leitura inicial das obras enxergando outro modo de vida possível, Mãe
teatrais aqui propostas, tendo em vista que Coragem segue resignada acompanhando os
esta pesquisa ainda está em seu momento soldados, nos frontes de guerra. A peça
embrionário, observa traços silenciadores da termina, com a protagonista sozinha em sua
cultura patriarcal e sexista. carroça, o seu único bem que restou.
Na peça A Santa Joana dos Matadouros Já na peça A Alma Boa de Setsuan (1939
(1929 -1931), que tem como cenário um – 1942) a história se passa na cidade chinesa
rigoroso inverno em Chicago, Estados “Setsuan”, onde três deuses disfarçados
Unidos, diante de um momento de crise procuram um abrigo de uma boa alma.
econômica dos frigoríficos e de especulação Somente a prostituta Chen Te aceita hospedá-
financeira entre empresários rivais, Joana los. Em agradecimento, os deuses a
Dark, tenente do grupo Boinas Pretas, oferece presenteiam com dinheiro suficiente para que
amparo religioso e de subsistência aos ela abra uma tabacaria e mude de vida.
desempregados. Ao receber uma tentativa de Ao saberem de sua nova condição de vida,
corrupção e a efetiva negatória da sua líder, a uma família inteira de „amigos‟
mesma é expulsa do grupo Boinas Pretas. desempregados invadem o seu comércio.
Agredida por soldados, aos 25 anos de idade, Aproveitadores, os membros da família se
Joana falece vítima de „pneumonia‟, usufruem da boa vontade de Chen Te, a qual
tornando-se mártir ao defender a palavra de se disfarça de um homem, seu primo, para
Deus e sendo canonizada como santa. conseguir impor limites e dizer não.
A peça Mãe Coragem e seus Filhos (1938 Seguem abaixo, alguns trechos das obras
– 1939) se passa na Guerra dos Trinta Anos épicas aqui analisadas. A primeira citação,

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extraída da obra A Santa Joana dos Mãe Coragem – [...] Meu filho é inteligente
e corajoso. O outrozinho é tapado mais
Matadouros, revela o momento em que Joana honesto. Minha filha não é coisa nenhuma;
mas não fala, e isso tem algum valor. [...]
é silenciada pelos membros do grupo Boinas Mãe Coragem – Kattrin: não me vá arranjar
Pretas, que a desejam transformar em santa e coisa com soldados! O amor é um poder
celestial, eu só estou avisando. Mesmo com
mártir, ao invés de dar ouvidas às denúncias homem que não veste farda, não é nenhum
melado que se lamba: ele pode dizer que
sociais que Joana declara em seu leito de gostaria de beijar o chão onde você põe os
pés...Depois você vira escrava dele! Dê-se
morte: por muito feliz por ser muda, não pode falar
demais [...] ser muda é uma dádiva do céu.
(BRECHT, 1990, p. 189-198, grifo nosso)
Joana – Os de baixo estão presos embaixo.
Para que os de cima permaneçam em cima, Por meio deste resumo breve das três
E a baixeza destes é sem limites, E ainda que
eles melhorassem, não melhorava. Nada, peças e destas citações, inicialmente
porque é sem paralelo. O sistema que
organizaram: Exploração e desordem, bestial
selecionadas, de alguns momentos das obras é
e, portanto incompreensível. Os Boinas possível perceber que o teatro épico de
Pretas a Joana – Seja santa! Cale a boca!
(BRECHT, 1990, p. 123, grifo nosso). Bertold Brecht mostra-se um terreno fértil
Em A Alma boa de Setsuan, transcreve-se para a reflexão sobre gênero e apagamento da
aqui o momento em que Chen Te transforma- mulher nos espaços de poder.
se em seu falso primo, Chun Ta, com o Não foi difícil retirar Joana Dark do
objetivo de ser respeitada por aqueles que comando, como foi difícil para Chen Te dizer
abusam de sua boa vontade: não aos seus “amigos”, resolvendo vestir-se
de homem para adquirir poder e respeito
Chui Ta apagando o lampião – Os primeiros frente aos outros sujeitos. Com relação a Mãe
fregueses devem estar chegando. Arrumem-
se depressa, por favor, para eu poder abrir a Coragem é interessante refletir sobre a cultura
minha loja! Velho – Sua loja? Pensei que
fosse da nossa amiga Chen Te! [...] Chui Ta do machismo mesmo entre as mulheres, já
– Ela não pôde vir. Mandou dizer que, de que aprenderam a olhar para o mundo pelas
agora em diante, visto eu estar aqui, não vai
poder fazer mais nada por vocês.” lentes masculinas, sendo a figura da mulher
(BRECHT, p. 82, grifo nosso)
compreendida na perspectiva da servidão e da
Na obra Mãe Coragem e seus filhos, em
propriedade.
razão de sua filha ser uma mulher muda, a
São considerações ainda iniciais de uma
mesma a trata como imprestável, em uma
pesquisa em sua fase inicial, mas já evidencia
relação explícita de inferiorização frente aos
a contribuição dialógica que a obra brechtiana
outros dois filhos homens:
pode representar para os direitos da mulher.

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Conclusões: A opressão das mulheres e a Referências:
dominação masculina ainda se mostra uma
desigualdade latente nos dias de hoje. BEAUVOIR, Simone. O Segundo sexo –
Algumas pautas foram conquistadas apesar fatos e mitos; tradução de Sérgio Milliet. 4
da forte resistência, como por exemplo, o ed. São Paulo: Difusão Européia do Livro,
direito ao voto, mas ainda não é incomum 1980.
ver-se um número significativo de homens
em postos de liderança e prestigio frente BOAL, AUGUSTO. Teatro do Oprimido
aos espaços profissionais femininos com e Outras Poéticas Políticas. Rio de
menor remuneração, ainda que ocupando a Janeiro: Civilização Brasileira, 1991.
mesma função.
Apesar da existência de normas BOBBIO, Noberto. Teoria do
nacionais e internacionais de proteção da ordenamento jurídico. São Paulo: Editora
mulher, ainda é cotidiano casos de Universidade de Brasília, 1989.
violência domestica, violência sexual e
feminicídio. A luta pelo reconhecimento e BRECHT, Bertold. Estudos sobre teatro.
afirmação feminina ainda se mostra latente Rio de Janeiro: Nova Fronteira, 2005.
na contemporaneidade. E porque não
utilizar o teatro épico, forte mecanismo ______________. Teatro Dialético:
artístico de denúncia das violações e ensaios. Rio de Janeiro: Civilização
tiranias, para refletir sobre desigualdade de Brasileira, 1967.
gênero e feminismo cultural?
Por meio do distanciamento, da ______________. A Santa Joana dos
estranheza e do didatismo, característico Matadouros. In: ____________. Teatro
do teatro épico brechtiano, pode-se ver por Completo em 12 volumes. Vol. 4. Rio de
uma lente privilegiada, os embates sociais Janeiro: Paz e Terra, 1990.
que o patriarcado impõe às mulheres em
suas relações socioculturais. ______________. Mãe Coragem e seus
Ao analisar-se a trajetória de Joana filhos. In: ____________. Teatro
Dark, Mãe Coragem e Chen Te pode-se Completo em 12 volumes. Vol. 6. Rio de
extrair as desfigurações feitas à dignidade Janeiro: Paz e Terra, 1990.
feminina, seja de forma explícita ou
silenciada.
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______________. A alma boa de Santa Catarina. Florianópolis, 2006.
SetSuan. In: ____________. Teatro
Completo em 12 volumes. Vol. 7. Rio de GUSTIN, Miracy Barbosa de Sousa;
Janeiro: Paz e Terra, 1990. DIAS, Maria Tereza Fonseca.
(Re)pensando a pesquisa jurídica: teoria
CISNE, Mila. Feminismo e Marxismo: e prática / Miracy Barbosa de Sousa Gustin
aportes teóricos-políticos para os e Maria Tereza Fonseca Dias. 2ª Ed. Belo
enfrentamentos das desigualdades Horizonte: Del Rey, 2006.
sociais. São Paulo, 2018. Disponível em:
http://www.scielo.br/scielo.php?script=sci LAKATOS, Eva Maria; MARCONI,
_arttext&pid=S010166282018000200211 Marina de Andrade. Metodologia
&lng=pt&tlng=pt. Acesso em: 01 de Científica. 6ª Ed. São Paulo: Atlas, 2011.
setembro de 2018.
ROSENFELD, Anatol. O Teatro Épico.
DESGRANGES, Flávio. A Pedagogia do São Paulo: Perspectiva, 1985.
Espectador. Hucitec: São Paulo, 2003.
SANTOS, Amanda Lemos Gonçalves dos.
FERRAJOLI, Luigi. O Direito como Brecht e a experiência do Cinema: Texto
sistema de garantias. In: OLIVEIRA e Montagem. Dissertação (Mestrado em
JÚNIOR, José Alcebíades de. (org.). O Cinema e Narrativas Sociais) – Pós-
Novo em Direito e Política. Porto Alegre: graduação interdisciplinar em Cinema,
Livraria do Advogado, 1997. Universidade Federal de Sergipe. Aracaju,
2018.
GIL, Antonio Carlos. Métodos e técnicas
de pesquisa social. 6ª. Ed. São Paulo: SANTOS, Amanda Lemos Gonçalves dos.
Atlas, 2008. Brecht e a experiência do Cinema: Texto
e Montagem. Dissertação (Mestrado em
GIL, Lise Anne de Borba Franzoni. O Cinema e Narrativas Sociais) – Pós-
garantismo jurídico de Luigi Ferrajoli e graduação interdisciplinar em Cinema,
a teoria da argumentação jurídica de Universidade Federal de Sergipe. Aracaju,
Robert Alexy: uma aproximação teórica. 2018.
Dissertação (Mestrado em Direito) –
Universidade Federal de
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TODOROV, Tzvetan. CHKLOVSKI in
Arte como processo. Teoria da Literatura
I: Textos
formalistas russo. Lisboa, Portugal:
Edições, 1999.

WILLETT, J. O Teatro de Brecht.


Tradução de Álvaro Cabral. Rio de
Janeiro: Zahar, 1967.

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