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A SEGURIDADE SOCIAL: CONCEITO, ORIGEM E HISTORICO

1. A ORIGEM DA PROTEÇÃO SOCIAL

A preocupação com os infortúnios da vida tem sido uma constante da


humanidade. Desde tempos remotos, o homem tem se adaptado, no
sentido de reduzir os efeitos das adversidades da vida, como fome,
doença, velhice etc.
Não seria exagero rotular este comportamento de algo instintivo, já
que até os animais têm o hábito de guardar alimentos para dias mais
difíceis. O que talvez nos separe das demais espécies é o grau de
complexidade de nosso sistema protetivo.
Pode-se afirmar que a proteção social nasceu, verdadeiramente, na
família. A concepção da família já foi muito mais forte do que nos dias de
hoje e, no passado, as pessoas comumente viviam em largos aglomerados
familiares. O cuidado aos mais idosos e incapacitados era incumbência dos
mais jovens e aptos para o trabalho.
Contudo, nem todas as pessoas eram dotadas de tal proteção familiar
e, mesmo quando esta existia, era freqüentemente precária. Daí a
necessidade de auxílio externo, com natureza eminentemente voluntária
de terceiros, muito incentivada pela igreja. O estado só viria a assumir
alguma opção mais concreta no Século XVII, com a edição da famosa Lei
dos Pobres.
Não só muitos eram desprovidos do auxilio familiar, mas o próprio
avanço da sociedade humana tem privilegiado o individualismo ao
extremo, em detrimento da família, incentivando pessoas a assumirem
suas vidas com total independência, levando-as a buscar somente o bem
próprio.
Infelizmente, a desagregação familiar aviltou e ainda debilita a mais
antiga forma de proteção social. Por isso, sistemas protetivos de outra
ordem foram adotados pela sociedade, ainda que de modo não claramente
perceptível, como o voluntariado de terceiros, o qual acabou por assumir
papel fundamental na defesa da existência digna da pessoa humana.
O auxílio voluntário, desde a simples esmola até trabalhos mais
complexos em prol de pessoas carentes, tem preenchido constantemente
a lacuna da proteção familiar, sendo tão importante hoje como já fora no
passado. O atualmente chamado terceiro setor, referente ao trabalho
voluntário, é, mais do que nunca, necessário ao extremo, proporcionando
verdadeira complementação das ações do estado na área social.
Além da assistência espontânea, também a sociedade viu surgirem os
primeiros grupos de mútuo, igualmente de origem livre, sem intervenção
estatal, nos quais um conjunto de pessoas com interesse comum reunia-se,
visando à cotização de valor certo para o resguardo de todos, em caso de
algum infortúnio. Tais sociedades mutualistas foram muito difundidas,
sendo até hoje comum a sua existência. Pode-se dizer que foram um
prenúncio dos sistemas privados complementares de previdência.
Por isso a criação dos primeiros seguros marítimos é freqüentemente
citada no estudo da evolução da proteção social. Muito embora seu
escopo tenha sido muito mais voltado à proteção da carga do que das
pessoas envolvidas, além da natureza meramente contratual, era a idéia
do seguro que se aprimorava.
Já no Império Romano encontram-se indícios de seguros coletivos,
visando à garantia de seus participantes, além da preocupação com os
necessitados, como a licença estatal para a mendicância, que só era
concebida aos impossibilitados de trabalhar. Tal controle estatal não trazia,
de modo algum, intervenção direta do Estado, mas mera ação fiscalizadora
no interesse geral da sociedade. Como já dito, o início da participação
estatal apenas é visível com a criação da Poor Law, embora ainda com
delegação da ação para as paróquias da localidade, como se verá.
Com o tempo, nota-se a assunção, por parte do Estado, de alguma
parcela de responsabilidade pela assistência dos desprovidos de renda até,
finalmente, a criação de um sistema estatal secundário, coletivo e
compulsório.
Esta rede de segurança estatal tem evoluído, à medida que o próprio
conceito de Estado muda. Já se foi o tempo da prevalência de conceitos
liberais do Estado, dotado de intervenção mínima em áreas fundamentais,
como organização judiciária e segurança.
O Estado liberal tratava o governo como um mal necessário, devendo-
se, por isso, restringir-se ao mínimo necessário. As pessoas seriam livres; o
sucesso profissional e o bem-estar familiar dependeriam da dedicação e do
mérito individuais.
Contudo, devido às desigualdades existentes, os mais carentes nunca
teriam chances de atingir patamar superior de renda, sendo massacrados
pela tão propalada igualdade de direitos. Na verdade, as pessoas carecem
de igualdade de condições. Somente com tal isonomia poder-se-ia
vislumbrar uma sociedade justa, onde o progresso individual seria
realmente proveniente da dedicação e esforço do indivíduo.
Como usualmente reconhecido, o surgimento da proteção social foi
fortemente propiciado pela sociedade industrial, na qual a classe
trabalhadora era dizimada pelos acidentes do trabalho, a vulnerabilidade
da mão-de-obra infantil, o alcoolismo etc. Há uma insegurança econômica
excepcional pelo fato de a renda destes trabalhadores ser exclusivamente
obtida pelos seus salários. Ademais, a lei da oferta e da procura mostra-se,
neste estágio, perversa, haja vista a enorme afluência de pessoas da área
rural para as cidades.
Daí a importância da participação estatal, por meio de instrumentos
legais, propiciando uma correção ou, ao menos, minimização das
desigualdades sociais. Além disso, o Estado não pode aceitar a desgraça
alheia como resultado de sua falta de cuidado com o futuro – devem ser
estabelecidos, obrigatoriamente, mecanismos de segurança social.
Com a adoção de conceitos mais intervencionistas, o Estado foi trocado
pelo Estado de tamanho certo, ou seja, aquele que atenda a outras
demandas da sociedade, alem das elementares, em especial na área social,
propiciando uma igualdade de oportunidades para todos, mas sem o
gigantismo de um Estado comunista.
Esses conceitos sociais-democratas foram responsáveis pela
construção de Welfare State, ou Estado do Bem-Estar Social, que visa
justamente a atender outras demandas da sociedade, como a previdência
social.
As ações estatais modernas não se limitam ao campo previdenciário,
mas, ao contrario, também tendem a proporcionar ações em outros
segmentos, como a saúde e o atendimento a pessoas carentes. É a
seguridade social, grau máximo de proteção social.
O Brasil tem seguido esta mesma lógica, sendo que a constituição de
1988 previu um Estado do Bem-Estar Social em nosso território. Por isso, a
proteção social brasileira é, prioritariamente, obrigação do estado, o qual
impõe contribuições obrigatórias a todos os trabalhadores. Hoje, no Brasil,
entende-se por seguridade social o conjunto de ações do estado, no
sentido de atender às necessidades básicas de seu povo nas áreas de
Previdência Social, Assistência e Saúde.
Naturalmente, as ações estatais não incluíram as demais – a família
ainda tem grande relevância no auxilio recíproco de seus componentes,
além da assistência na sociedade atual, embora estas últimas sejam mais
conhecidas hoje como entidades abertas de Previdência complementar
sem fins lucrativos, como se verá.
A evolução da proteção social, desde ações mais tímidas até maiores
intervenções estatais, ficará mais evidente no estudo do histórico de
seguridade social, tanto no Brasil como no resto do mundo.
Contudo, já podemos concluir que a seguridade social, aliada às ações
de natureza voluntária da sociedade, compõe o mecanismo mais completo
na realização da proteção social, no Brasil e no mundo.
Sem embargo, não é desconhecido que o tema aqui superficialmente
desenvolvido apresenta embaraços. O adequado dimensionamento do
tamanho certo do Estado até hoje levanta discussões das mais acirradas,
não havendo consenso sobre o tema.
Sabe-se que o Estado do Bem-Estar Social surgiu muito mais como um
contraponto necessário ao crescimento do comunismo, do que
propriamente pela conscientização dos dirigentes mundiais pela
importância da proteção social. A farta oferta de benefícios foi feita,
freqüentemente, de modo irresponsável e visando unicamente a rivalizar
com o Leste Europeu.
É certo que neste embate dialético entre estruturas e finalidades do
Estado tenha havido algum exagero, de modo que países que antes tinham
ampla gama de ações sociais têm reduzido tais obras de modo
generalizado, não só pelo fim da ameaça da ditadura do proletariado, mas
também pela insuficiência generalizada de recursos, agravada pelo
envelhecimento e pelas baixas taxas de natalidade. Daí centrar-se o debate
político atual no adequado dimensionamento do Estado moderno, na sua
extensão necessária e adequada ao bem comum. Teríamos então a
formação do Estado Pós-Social.
De qualquer forma, a previdência social, em conjunto com a saúde e
assistência social, são classificados côo direitos sociais pela Constituição,
sendo usualmente enquadrados como direitos fundamentais de segunda
geração ou dimensão, devido à natureza coletiva dos mesmos, e
certamente serão mantidos em qualquer concepção a ser construída, o
que não impede, naturalmente, o dimensionamento mais restrito em
razão da escassez de recursos.

2. CONCEITO DE SEGURIDADE SOCIAL

Seguridade social foi expressão adotada pelo Constituinte de 1988, a


qual recebeu críticas, como visto, não só pela ampla gama de ações,
especialmente por pesquisadores de viés liberal, mas até de ordem
terminológica, pois o signo mais adequado da língua portuguesa seria
segurança, e não seguridade.
Entretanto, foi objetivo do constituinte originário criar um sistema
protetivo, até então inexistente em nosso país e certamente os autores de
língua espanhola tiveram sua influencia pela criação de uma rede de
proteção, capaz de atender aos anseios e necessidades de todos na área
social.
A segurança jurídica, que era freqüentemente limitada à acepção
formal, coma previsibilidade e certeza do direito, passa também a englobar
a garantia de direitos sociais mínimos. Daí a transição da segurança jurídica
típica dos Estados liberais para a segurança social, ou seguridade social,
característica do Estado Providência.
Daí a seguridade social brasileira ser definida como um conjunto
integrado de ações de iniciativa dos Poderes Públicos e da sociedade,
destinadas a assegurar os direitos à saúde, à previdência e à assistência
social (CRFB/88, art. 194, caput).
Como lembra Wladimir Novaes Martinez, é interessante observar que,
tecnicamente, não se trata de uma definição, já que a Constituição
meramente relacionou os componentes da seguridade, embora seja muito
comum a norma constitucional ser encarada como a definição da
seguridade social brasileira.
A seguridade social pode ser conceituada como a rede protetiva
formada pelo Estado e por particulares, com contribuição de todos,
incluindo parte dos beneficiários dos direitos, no sentido de estabelecer
ações para o sustento de pessoas carentes, trabalhadores em geral e seus
dependentes, providenciando a manutenção de um padrão mínimo de vida
digna.
A intervenção estatal, na composição da seguridade social, é
obrigatória, por meio de ação direta ou controle, a qual deve atender a
toda e qualquer demanda referente ao bem-estar da pessoa humana.
Na acepção de Wagner Balera, para uma completa compreensão da
seguridade social, é necessário vislumbrar-se a importância e alcance dos
valores do bem-estar e justiça sociais, os quais são, de fato, bases do
Estado brasileiro, assim como diretrizes de sua atuação. A seguridade social
é então meio para atingir-se a justiça, que é o fim da ordem social.
A justiça é o fim colimado pela ordem social, inserida na sociedade
pelo trabalho. Daí a Constituição inaugurar o Título Da Ordem Social
prevendo como objetivos o bem-estar e justiça sociais, tendo como base o
primado do trabalho (art. 193).
O bem-estar social, materializado pela legislação, traz a idéia de
cooperação. Ação concreta do ideal de solidariedade, superando-se o
individualismo clássico do estado liberal. De acordo com o art. 3º da
Constituição, o bem-estar pode ser também definido como a erradicação
da pobreza e desigualdade, mediante a cooperação entre os indivíduos.
Já a justiça social é objetivo do desenvolvimento nacional, sendo
verdadeira diretriz de atuação para nossos governantes, impondo a ação
distributiva da riqueza nacional. Requer na somente a ação do Poder
Público, mas também da sociedade, diretamente, sendo emblemática a
ação das entidades não-governamentais.
A justiça social é a equânime distribuição de benefícios sociais, baseada
no principio da seletividade e distributividade (exposto mais adiante).
Tanto a justiça social como o bem-estar social são legitimadores das
políticas publicas, sendo também diretriz axiológica para interpretação e
aplicação da normalização protetiva.
Podemos daí afirmar que a formação delineada pelo constituinte de
1988 vai além dos antigos sistemas de seguros sociais, ampliados e
aprimorados com ideais de justiça, solidariedade e isonomia, em uma ação
cooperativa nunca antes atingida pela sociedade humana. Daí haver algum
exagero nas críticas diante do Estado Social, pois, embora este apresente
sérios problemas na atualidade, o que se requer são ajustes, nunca sua
extinção. Esta seria a verdadeira concepção do Estado Pós-Social.
Cabe à sociedade e seus governantes perceberem que o Estado não
tem e nunca terá a força necessária para garantir a liberdade do querer por
si só, demandando auxílio da sociedade, inclusive por meio de organizações
não-governamentais (ONGs). É hora de superarmos o individualismo da
sociedade de consumo e atuarmos no auxilio ao próprio, tendo consciência
que o Estado nunca poderá levar esta empreitada por si só. Somente assim
poderemos garantir os objetivos constitucionais.
Por fim, cabe ressaltar a definição de seguridade social, pela
Organização Internacional do Trabalho – OIT, na Convenção 102, de 1952,
nos seguintes termos: “a proteção que a sociedade oferece aos seus
membros mediante uma série de medidas públicas contra as privações
econômicas e sociais que, de outra forma, derivam do desaparecimento ou
em forte redução de sua subsistência, como conseqüência de enfermidade,
maternidade, acidente de trabalho ou enfermidade profissional,
desemprego, invalidez, velhice e também a proteção em forma de
assistência médica e ajuda às famílias com filhos”. A aludida Convenção foi
ratificada pelo Brasil por meio do Decreto-Legislativo nº 269/08.
A convenção também traz disposições sobre o tratamento mínimo a
ser dado no caso de doenças mórbidas de qualquer origem, gravidez e
parto. Inclui, também, dispositivos sobre a concessão de auxílio-doença,
benefício de velhice e afastamento por acidente de trabalho, beneficio
familiar, auxílio-maternidade, beneficio por invalidez e beneficio de
sobreviventes, e decorrência do falecimento do segurado, entre outros.

3. A SAÚDE

A saúde é direito de todos e dever do Estado (art. 196 da CRFB/88), o


seja, independente de contribuição, qualquer pessoa tem o direito de
obter atendimento na rede pública de saúde.
Sendo assim, mesmo a pessoa que, comprovadamente, possua meios
para patrocinar seu próprio atendimento médico terá a rede pública como
opção válida. Não é lícito à Administração Pública negar atendimento
médico a esta pessoa, com base em sua riqueza pessoal.
Atualmente, a saúde tem organização totalmente distinta da
previdência social. Após a extinção do Instituto Nacional de Assistência
Médica da Previdência Social – INAMPS, as ações nesta área são agora de
responsabilidade direta do Ministério da Saúde, por meio do Sistema Único
de Saúde – SUS.
Ainda que seja comum a confusão entre a previdência e a saúde, não
há que se confundir entes componentes da seguridade social. O Instituto
Nacional do Seguro Social – INSS, responsável pela previdência social
brasileira, não tem qualquer responsabilidade com hospitais, casas de
saúde e atendimentos na área da saúde em geral.
A saúde é segmento autônomo da seguridade social, com organização
distinta. Tem o escopo mais amplo de todos os ramos protetivos, já que
não possui restrição à sua clientela protegida – qualquer pessoa tem
direito ao atendimento providenciado pelo Estado – e, ainda, não necessita
de comprovação de contribuição do beneficiário direto.
Por isso, a saúde é garantida mediante políticas sociais e econômicas,
visando à redução do risco de doença e de outros agravos, com o acesso
universal e igualitário às ações e aos serviços necessários para sua
promoção, proteção e recuperação. As condições para implantação de tais
ações da saúde, além de sua organização e seu funcionamento, são objeto
de regulamentação pela lei nº 8.080/90.
Assim, as ações e os serviços de saúde são de extrema relevância,
cabendo ao Poder Público sua execução, diretamente, ou através de
terceiros, incluindo pessoas físicas ou jurídicas de direito privado. O
emprego de particulares na proteção à saúde é freqüente, com o governo
reembolsando atendimentos destas entidades do SUS.
Grande parte da confusão, entre previdência social e saúde deve-se ao
fato destas ações, no passado, terem sido conjugadas. A própria
denominação do INAMPS, como Instituto de Assistência Médica da
Previdência Social, já explicita a questão. O fato é que, em períodos
anteriores à Constituição de 1988, a proteção à saúde não configura um
direito universal, como hoje. Deveria o trabalhador contribuir para a
manutenção do regime, e assim fazia em conjunto coma previdência social.
Nesta época, aqueles excluídos do sistema somente poderiam contar com
o atendimento médico das Santas Casas de Misericórdia.
Com a atual constituição isso muda, adotando-se a política de proteção
universal, independente de contribuição. Assim deve ser, pois a política
sanitária coerente deve amparar a todos, pois não há ambiente salubre em
uma sociedade na qual alguns não são incluídos na rede protetiva.
Destarte, hoje, não se deve mais confundir as ações de saúde com a
previdência social. É evidente que as ações de saúde e previdência social
devem ser conjugadas visando conquistar o bem-estar e a justiça social,
mas isso não implica confundir estes dois subsistemas da seguridade social.
Na saúde destaca-se também a participação da sociedade, como nos
demais segmentos da seguridade social. Aqui há o Conselho Nacional de
Saúde – CNS, criado pelo Decreto nº 5.839, de 11 de julho de 2006, sendo
órgão colegiado de caráter permanente e deliberativo, integrante da
estrutura regimental do Ministério da Saúde, composto por representantes
do governo, dos prestadores de serviço, profissionais de saúde e usuários
(art. 1º). O aludido decreto prevê as atribuições estratégicas e diretivas
deste conselho, além de sua composição, com quarenta e oito membros
titulares. Ressalta-se que a disciplina principal do SUS encontra-se na
Constituição, do art. 196 a 200.
Ações e serviços públicos de saúde integram uma rede regionalizada e
hierarquizada e constituem um sistema único, organizado de acordo com
as seguintes diretrizes: descentralização, com direção única em cada esfera
de governo; atendimento integral, com prioridade para as atividades sem
prejuízo dos serviços assistenciais; e participação da comunidade.
O Sistema Único de Saúde é financiado com recursos do orçamento da
seguridade social, da União, dos Estados, do Distrito Federal e dos
Municípios, além de outras fontes. Tal orçamento destina ao Sistema Único
de Saúde (SUS), de acordo coma receita estimada, os recursos necessários
à realização de suas finalidades, previstos em proposta elaborada pela sua
direção nacional, com a participação dos órgãos da Previdência Social e da
Assistência Social, tendo em vista as metas e prioridades estabelecidas na
Lei de Diretrizes Orçamentárias (art. 31 da Lei nº 8.080/90).
A Constituição, coma redação dada pela Emenda Constitucional nº
29/2000, determina que a União, os Estados, o Distrito Federal e os
Municípios deverão aplicar, anualmente, em ações e serviços públicos de
saúde, recursos mínimos derivados da aplicação de percentuais calculados
sobre suas arrecadações tributárias, além de parcela dos valores obtidos a
partir de repasses da União e dos Estados e dos Fundos de Participação de
Estados e Municípios. Os percentuais mínimos serão fixados em lei
complementar (art. 198, § 2º, da CRFB/88).
A lei complementar prevista será reavaliada pelo menos a cada 5 (cinco
anos), e estabelecerá os percentuais de transferência; os critérios de rateio
dos recursos da União vinculados à saúde destinados aos Estados, ao
Distrito Federal e aos Municípios, e dos Estados destinados a seus
respectivos Municípios; as normas de fiscalização, avaliação e controle das
despesas com saúde nas esferas federal, estadual, distrital e municipal e as
normas de cálculo do montante a ser aplicado pela União (art. 198, § 3º, da
CRFB/88).
Como esta lei complementar ainda não existe, a própria EC nº 29/00
inseriu o art. 77 do ADCT da Constituição, com previsão temporária até o
advento da lei complementar, dando efetividade à nova Regra. Dispõe o
citado artigo que, até o exercício financeiro d 2004, os recursos mínimos
aplicados nas ações e serviços públicos de saúde serão:
I- no caso da União, no ano 2000, o montante empenhado em ações e
serviços públicos de saúde, no exercício financeiro de 1999, acrescido
de, no mínimo, 5%; do ano 2001 ao ano 2004, o valor apurado no
ano anterior, corrigido pela variação nominal do Produto Interno
Bruto – PIB;
II- no caso dos Estados e do distrito Federal, 12% do produto da
arrecadação de impostos estaduais e dos recursos repassados pela
União e obtidos a partir do Fundo de Participação, deduzidas as
parcelas que forem transferidas aos respectivos Municípios.
III- no caso dos Municípios e do Distrito Federal, 15% do produto da
arrecadação de impostos municipais e dos recursos repassados pela
União e Estados, além dos obtidos a partir do Fundo de Participação;
Os estados, o Distrito Federal e os Municípios que apliquem
percentuais inferiores aos fixados deverão eleva-los gradualmente, até o
exercício financeiro de 2004, reduzida a diferença à razão de, pelo menos,
um quinto por ano, sendo que, a partir de 2000, a aplicação será de, pelos
menos, 7% (art. 77, § 1º, do ADCT).
A própria EC nº 29/00 dispõe que, na ausência da lei complementar,
que realmente ainda não foi elaborada, a partir do exercício financeiro de
2005, aplicar-se-á à União, aos Estados, ao Distrito Federal e aos
Municípios o disposto supra, ou seja, já se antecipando à omissão, a regra
transitória será aplicável enquanto perdurar a inércia legislativa, mesmo
após o ano de 2004.
A Constituição também evidenciou a possibilidade de assistência à
saúde pela iniciativa privada. A saúde não é exclusividade do Poder
Público, podendo as instituições privadas participar de forma
complementar do Sistema Único de Saúde, segundo diretrizes deste,
mediante contrato de direito público ou convênio, tendo preferência as
entidades filantrópicas e as sem fins lucrativos.
Todavia, é vedada a destinação de recursos públicos para auxílios ou
subvenções às instituições privadas com objetivo de lucro. Ainda que o
Estado venha a efetuar pagamentos pelos serviços prestados à população,
não poderá auxiliar empreendimentos econômicos na área da saúde com
recursos públicos (art. 199 da CRFB/88).
Embora, moralmente questionável, a Constituição não veda a
criação de empreendimentos voltados ao lucro na saúde. Apenas veda o
aporte de recursos públicos, salvo, evidentemente, a quitação de serviços
prestados ao SUS. Sem embargo, apesar de possível até a atividade
lucrativa na saúde, restou vedada a participação direta ou indireta de
empresas ou capitais estrangeiros na assistência à saúde no País, salvo
exceções previstas em lei.
A Lei nº 9.656/98 disciplina os planos privados de assistência à
saúde, com as alterações subseqüentes, em especial da Medida Provisória
nº 2.177-44/2001, que praticamente altera toda a redação original, e da
Lei nº 10.223/01, que prevê a prestação de serviço de cirurgia plástica
reconstrutiva de mama, para o tratamento de mutilação decorrente de
tratamento de câncer.
A Lei nº 8.142/90 dispõe sobre a participação da comunidade na
gestão à saúde, que é uma determinação constitucional (art. 194,
parágrafo único, VII), prevendo a criação, em cada Ente Federativo, da
Conferência de Saúde e do Conselho de Saúde.
De acordo com a Lei, a Conferência de Saúde reunir-se-á a cada
quatro anos coma representação dos vários segmentos sociais, para
avaliar a situação de saúde e propor as diretrizes para a formulação da
política de saúde nos níveis correspondentes, convocada pelo Poder
Executivo ou, extraordinariamente, por esta ou pelo Conselho de Saúde
(art. 1º, § 1º). Como já existe o órgão permanente, que é o Conselho de
Saúde, com atribuições também gerenciais, é difícil fixar uma utilidade
concreta para esta Conferência.
Já, sobre o Conselho de Saúde, prevê a Lei que possui caráter
permanente e deliberativo, órgão colegiado, composto por representantes
do governo, prestadores de serviço, profissionais de saúde e usuários,
atuantes na formulação de estratégias e no controle da execução da
política de saúde na instância correspondente, inclusive nos aspectos
econômicos e financeiros, cujas decisões serão homologadas pelo chefe
do poder legalmente constituído em cada esfera do governo (art. 1º, § 2º).
Seria o equivalente ao Conselho Nacional de Previdência Social. Tem
funcionamento constante, ao contrario da Conferência de Saúde, que é
realizada a cada quatro anos.
Interessante notar, também, que a Lei nº 8.142/90 prevê, como
requisito para recebimento de recursos do Fundo Nacional de Saúde, que
os demais Entes Federativos devam criar efetivamente o Conselho de
Saúde, além de contar com seu próprio Fundo de Saúde. Também devem
possuir planos de saúde; relatórios de gestão; contrapartida de recursos
para a saúde no respectivo orçamento; comissão de elaboração do Plano
de Carreira, Cargos e Salários (PCCS), previsto o prazo de dois anos para
sua implantação (art. 4º).
Recentemente, a EC nº 51, de 14 de fevereiro de 2006, passou a
prever que os gestores locais do sistema único de saúde poderão admitir
agentes comunitários de saúde e agentes de combate às endemias por
meio de processo seletivo público, de acordo com a natureza e
complexidade de suas atribuições e requisitos específicos para sua
atuação (art. 198, § 4º, CRFB/88). Com isso, fica assegurada na
Constituição a importante tarefa destes agentes, que atuam junto à
população, informando e incentivando a correta utilização de medicação,
trazendo ganhos preventivos importantes para o sistema de saúde. As
atividades destes agentes são regulamentadas pela Lei nº 11.350/06.
Também prevê a Constituição que a lei deve dispor sobre as
condições e os requisitos que facilitem a remoção de órgãos, tecidos e
substancias humanas para fins de transplante, pesquisa e tratamento,
bem como a coleta, processamento e transfusão de sangue e seus
derivados, sendo vedado todo tipo de comercialização (art. 199, § 4º, da
CRFB/88). O assunto é atualmente tratado pela Lei nº 10.205, de 21 de
março de 2001.
Por fim, ao Sistema Único de Saúde compete, além de outras
atribuições, nos termos da lei:
I- controlar e fiscalizar procedimentos, produtos e substâncias de
interesse para a saúde, além de participar da produção de
medicamentos, equipamentos, imunológicos, hemoderivados e
outros insumos.
II- executar as ações de vigilância sanitária e epidemiológica, bem
como as de saúde do trabalhador;
III- ordenar a formação de recursos humanos na área de saúde.
IV- participar da formulação da política e da execução das ações de
saneamento básico;
V- incrementar em sua área de atuação o desenvolvimento científico e
tecnológico;
VI- fiscalizar e inspecionar alimentos, compreendido o controle de seu
teor nutricional, bem como bebidas e águas para consumo humano;
VII- participar do controle e fiscalização da produção, transporte, guarda
e utilização de substâncias e produtos psicoativos, tóxicos e
radioativos;
VIII- colaborar na proteção do meio ambiente, nele compreendido o do
trabalho.

Também merece destaque a Portaria/MS nº 1.559, de 1º de agosto


de 2008 (DOU de 04/08/2008), que institui a Política nacional de Regulação
do Sistema Único de Saúde- SUS. A proposta do ato normativo é funcionar
como instrumento de controle e regulação das responsabilidades sanitárias
assumidas pelas esferas de governo (art. 1º). A idéia é aprimorar o acesso
às unidades de saúde, mediante ação integrada de União, Estados, DF e
Municípios.

4. ASSISTÊNCIA SOCIAL
A assistência social será prestada a quem dela necessitar (art. 203
da CRFB/88), ou seja, àquelas pessoas que não possuem condições de
manutenção própria. Assim como a saúde, independem de contribuição
direta do beneficiário. O requisito para auxilio assistencial é a necessidade
do assistido.
Neste caso, a pessoa dotada de recursos para a sua manutenção,
logicamente, não será destinatário das ações estatais na área assistencial,
não sendo possível o fornecimento de beneficio assistencial pecuniário a
esta pessoa.
Naturalmente, outras ações assistenciais, não-pecuniárias,
direcionadas a providenciar um melhor convívio do beneficiário em
sociedade, podem ser extensíveis àqueles dotados de recursos, pois neste
ponto o conceito de pessoa necessitada é mais elástico.
A assistência social é regida por lei própria (Lei nº 8.742/93), a qual
traz definição legal deste segmento da seguridade social.
A assistência social tem por objetivos a proteção à família, à
maternidade, à infância, à adolescência e à velhice; o amparo às crianças e
adolescentes carentes; a promoção da integração ao mercado de trabalho;
a habitação e a reabilitação das pessoas portadoras de deficiência e a
promoção de sua integração à vida comunitária e a garantia de 1 (um)
salário mínimo de beneficio mensal à pessoa portadora de deficiência e ao
idoso que comprovem não possuir meios de prover a própria manutenção
ou de tê-la provida por sua família (art. 2º da Lei nº 8.742/93).
O segmento assistencial da seguridade tem como propósito nuclear
preencher as lacunas deixadas pela previdência social, já que esta, como se
verá, ao é extensível a todo e qualquer indivíduo, mas somente aos que
contribuem para o sistema, além de seus dependentes.
Muitas pessoas não exercem atividades remuneradas, daí serem
desprovidas de qualquer condição de custear a proteção previdenciária. Ao
Estado, portanto, urge manter segmento assistencial direcionado a elas.
Não compete à previdência social a manutenção de pessoas carentes; por
isso, a assistência social é definida como atividade complementar ao
seguro social.
Muito embora esta seja a lógica do sistema, a assistência social tem
uma atuação muito aquém do necessário no atual contexto nacional.
Todavia, como se sabe, o incremento de benefícios pecuniários, inclusive
assistenciais, somente pode ser realizado com a previsão de seu custeio,
razão que atualmente impede a ampliação do segmento assistencial
brasileiro.
A Constituição determina quem a ação estatal na assistência social
será realizada preferencialmente com recursos do orçamento da
seguridade social, e organizadas com base na descentralização político-
administrativa, cabendo a coordenação e as normas gerais à esfera federal
e a coordenação e a execução dos respectivos programas às esferas
estadual e municipal, bem como a entidades beneficentes e de assistência
social. Também a participação da população é prevista em texto
constitucional, por meio de organizações representativas, na formulação
das políticas e no controle das ações em todos os níveis (art. 204).
A EC nº 42/2003 trouxe a faculdade aos Estados e ao Distrito
Federal de vincular a programa de apoio à inclusão e promoção social até
cinco décimos por cento (0,5%) de sua receita tributaria líquida. Neste
caso, tais recursos ficam, necessariamente, atrelados às ações sociais
previstas, sendo proibida a aplicação destes com despesas com pessoal e
encargos sociais, serviço da dívida ou qualquer outra despesa corrente não
vinculada diretamente aos investimentos ou ações sociais apoiadas.
O beneficio mensal de um salário-mínimo somente será pago ao
necessitado, que, para efeitos legais, é o idoso (maior de 65 anos) ou o
deficiente, incapazes de prover a sua manutenção, e cuja renda mensal
familiar per capita seja inferior a ¼ (um quarto) do salário mínimo (art.
203, V, da Constituição c/c art. 20, § 3º, da Lei nº 8.742/93). A assistência
deste benefício é melhor definida a seguir.
O conceito de necessitado foi considerado constitucional pelo STF
( ADIn nº 1.232-DF). Todavia, já decidiu o STJ que o limite de ¼ do salário
mínimo não é absoluto, pois deve ser considerado como um limite mínimo,
um quantum objetivamente considerado insuficiente à subsistência do
portador de deficiência e do idoso, o que não impede que o julgador faça
uso de outros fatores que tenham o condão de comprovar a condição de
miserabilidade do autor (AGRESP 523864/SP, Rel. Min. Felix Fischer).
Do fato, ainda que o legislador freqüentemente utilize-se de
parâmetros objetivos para a fixação de direitos, a restrição financeira pode
e deve ser ponderada com características do caso concreto, sob pena de
condenar-se à morte o necessitado. Ainda que a extensão de beneficio
somente possa ser feita por lei, não deve o intérprete omitir-se à realidade
social.
Dentro do atual momento pós-positivista do Direito, aliado à
reconhecida força normativa da Constituição, os princípios jurídicos
constitucionais são dotados também de eficácia positiva, alem das clássicas
eficácias interpretativa e negativa, permitindo a demanda judicial de seu
núcleo fundamental. A concessão de beneficio assistência, nestas
hipóteses, justiça-se a partir do Princípio da Dignidade da pessoa Humana,
o qual possui, como núcleo essencial, plenamente sindicável, o mínimo
existencial, isto é, o fornecimento de recursos elementares para a
sobrevivência digna do ser humano.
Infelizmente, a questão sofreu um grande revés com o
cancelamento da Súmula 11 da Turma Nacional de Uniformização dos
Juizados Especiais, que admitia a concessão do beneficio assistencial,
desde que comprovada, por outros meios, a miserabilidade do postulante
(DJU Seção 1, de 12/05/2006, p 604). Em verdade, o cancelamento era
conseqüência esperada, devido à intransigência do STF em não mitigar sua
decisão sobre a matéria, não admitindo as decisões que superam a
questão objetiva da renda per capita.
Sem embargo, em razão da contínua polêmica sobre a matéria, a
própria Corte Constitucional acena com alguma mudança em sua
compreensão, admitindo a validade dos requisitos legais de
miserabilidade, mas sem limitar este conceito somente àquelas condições.
Assim decidiu o Min. Gilmar Mendes, ao negar liminar na Reclamação nº
4374-6/PE, em razão de concessão do BCP à pessoa que não atendia aos
requisitos da LAOS. Como expôs em seu decisório, “não se declama a
inconstitucionalidade do art. 20, § 3º, da lei nº 8.742/93, mas apenas se
reconhece a possibilidade de que esse parâmetro objetivo seja conjugado,
no caso concreto, com outros fatores indicativos do estado de penúria do
cidadão. Em alguns casos, procede-se à interpretação sistemática da
legislação superveniente que estabelece critérios mais elásticos para a
concessão de outros benefícios assistenciais”.
Adicionalmente, cumpre lembrar que o Brasil, mais recentemente,
aprovou, por meio do Decreto legislativo nº 186/08, o texto da Convenção
sobre os Direitos das Pessoas com Deficiência e de seu Protocolo
Facultativo, assinados em Nova Iorque, em 30 de março de 2007. Pela
citada convenção, os Estados-partes reconhecem o direito das pessoas com
deficiência a um padrão adequado de vida para si e para suas famílias,
inclusive alimentação, vestuário e moradia adequados, bem como à
melhoria constante de suas condições de vida, e deverão tomar as
providencias necessárias para salvaguardar e promover a realização deste
direito sem discriminação baseada na deficiência (art. 28).
Interessante observar que a parametrização em salários-mínimos,
para fins de qualificação, é adotada também em outras hipóteses, como no
Decreto nº 6.135/07, o qual institui o Cadastro Único para Programas
Sociais do Governo Federal, define como família atendida aquela com
renda familiar mensal per capita de até meio salário-mínimo, ou a que
possua renda familiar mensal de até três salários-mínimos (art. 4”).
A idade de 65 anos, em substituição aos 67 anos anteriormente
previstos, foi fixada pelo Estatuto do Idoso, aprovado pela Lei nº 10.741,
de 1º de outubro de 2003. Melhor seria a lei manter a idade, mas, por
outro lado, alargar as possibilidades de obtenção do mesmo, em especial
ampliando o conceito de necessitado.
O detalhamento dos requisitos legais para a obtenção deste
benefício assistencial é previsto no próximo item. Com relação aos serviços
assistenciais, são estes definidos em lei como atividades continuadas que
visem melhoria de vida da população e cujas ações, voltadas para as
necessidades básicas, observem os objetivos, princípios e diretrizes da Lei
nº 8.742/93 (art. 23)
Com a lei nº 11.258, de 2005, foi prevista a criação, nos serviços da
Assistência Social, de programas de amparo às crianças e adolescentes em
situação de risco pessoal e social, e às pessoas que vivem em situação de
rua. Certamente não faltam pessoas nestas condições, e nos resta esperar
que o estado social, possa ampará-los. Por fim, cumpre ressaltar que o dia
07 de setembro foi instituído como o dia nacional da Assistência Social, nos
termos da Lei nº 11.162, de 05 de agosto de 2005.

4.1. Benefício Assistencial


A prestação pecuniária assistencial tradicional é conhecida como
Benefício de Prestação Continuada, instituído pela Lei nº 8.742, de 7 de
dezembro de 1993, esta conhecida como Lei Orgânica da Assistência Social-
LOAS. Regulamenta o art. 203, V, da Constituição, que prevê este beneficio.
Tecnicamente, não se trata de benefício previdenciário, embora sua
concessão e administração sejam feitas pelo próprio INSS, em razão do
princípio da eficiência administrativa.
Não é benefício previdenciário devido à sua lógica de
funcionamento: não carece de contribuição do beneficiário, bastando a
comprovação da condição de necessitado. Veio substituir a renda mensal
vitalícia, que era equivocadamente vinculada à previdência social, em razão
de seu caráter evidentemente assistencial. Ainda hoje esta prestação é
freqüentemente denominada ainda de renda mensal vitalícia ou amparo
assistencial.
A concessão é feita pelo INSS devido a preceitos práticos – se o INSS
já possui estrutura própria espalhada por todo o país, em condição de
atender à clientela assistida, não haveria necessidade da manutenção em
paralelo de outra estrutura.
Ou seja, o art. 12, I, da Lei nº 8.742/93 – LOAS dispõe que compete à
União responder pela concessão e manutenção dos benefícios de prestação
continuada, incluindo o financiamento, enquanto o art. 3º do Regulamento
do Benefício de Prestação Continuada – RBPC, aprovado pelo Decreto nº
6.214/07, delega ao INSS a responsabilidade pela operacionalização do
benefício de prestação continuada.
Em razão deste procedimento, há alguma divergência sobre a
legitimidade passiva em ações que venham a reivindicar o benefício
assistencial. O TRF da 4ª Região chegou a editar a Súmula nº 61
(posteriormente cancelada em 2004), estabelecendo que “A União e o INSS
são litisconsortes passivos necessários nas ações em que seja postulado o
benefício assistencial previsto no art. 20 da Lei nº 8.742/93, não sendo caso
de delegação de jurisdição federal”. No mesmo sentido, encontramos
precedentes no TRF da 2ª Região 9AC 2002.51.10.009765-6, Rel. Des.
Sérgio Schwaitzer) e também em contrario, o seja, identificando a
ilegitimidade da União no pólo passivo (AC nº 1998.01.00.053633-5/MA,
Relator Desembargador Federal Luciano Tolentino Amaral, DJ 4/9/2000).
O STJ tem se manifestado pela legitimidade exclusiva do INSS para
fins de obtenção do BPC. Acredito, em verdade, que a legitimidade passiva
seja exclusiva da União, pois a manutenção da assistência social é atributo
desta, cabendo ao INSS a mera execução. Esta, no entanto, é posição
francamente minoritária.
Os ramos previdenciário e assistencial da seguridade social integram
a mesma estrutura, no Ministério da Previdência Social – MPAS. No
entanto, com o advento da Lei nº 10.683, de 28 de maio de 2003, foi criado
o Ministério da Assistência Social (art. 25, II), posteriormente renomeado
para Ministério do Desenvolvimento Social e Combate à Fome, pela Lei nº
10.869, de 13 de maio de 2004, enquanto a previdência social ficou com
ministério próprio – MPS (art. 25, XVIII).
A separação é questionável, pois as ações assistenciais e
previdenciárias, ainda que inconfundíveis, completam-se, carecendo
necessariamente de orientação centralizada para a maximização de seus
efeitos, como já previra o Plano Beveridge.
O beneficio assistencial corresponde à garantia de um salário
mínimo, na forma de beneficio de prestação continuada, devido à pessoa
portadora de deficiência e ao idoso com 65 anos ou mais, que comprovem
não possuir meios de prover a própria manutenção e esta também não
possa ser provida por sua família, observando que:
I- no período de 1] de janeiro de 1996 a 31 de dezembro de 1007,
vigência da redação original do art. 38 da Lei nº 8.742, de 1993, a
idade mínima para o idoso era a de 70 (setenta) anos;
II- no período de 1º de janeiro de 1008 a 31 de dezembro de 2003, a
idade mínima para o idoso passou a ser de 67 (sessenta e sete) anos,
em razão da Lei nº 9.720/98.
III- A partir de 1º de janeiro de 2004, com o Estatuto do Idoso (art. 34 c/
art. 118, ambos da Lei nº 10.741/03), a idade passou para 65
(sessenta e cinco) anos. Apesar da Lei nº 10.741/03 fixar a idade de
60 anos como paradigma para a qualificação da pessoa idosa, o
beneficio assistencial restou limitado aos idosos necessitados com
mais de 65 anos.
A concessão do benéfico somente será feita ao brasileiro, inclusive
ao indígena, não aparado por nenhum sistema de previdência social ou ao
estrangeiro naturalizado e domiciliado no Brasil, não coberto por sistema
de previdência do país de origem.
O benefício poderá ser pago a mais de um membro da família,
desde que comprovadas todas as condições exigidas. Contudo, para o
invalido, o valor concedido a outros membros do mesmo grupo familiar
passa a integrar a renda, para efeito de cálculo per capita do novo beneficio
requerido. Já para o idoso, o beneficio concedido a qualquer membro da
família não será computado para os fins do cálculo da renda familiar (art.
34, parágrafo único, Lei nº 10.741/03). Este tratamento diferenciado foi
criado pelo estatuto do idoso, enquanto para o deficiente permanece a
regra geral da LOAS.
No entanto, esta flexibilidade da regra de renda per capita traz
alguns problemas. Por exemplo: imaginemos um casal idoso, maiores de 65
anos, sem qualquer fonte de renda, que morem sozinhos. Ambos poderão
receber o beneficio assistencial, já que, para o idoso, um benefício de
prestação continuada – BPC não será levado em consideração no cálculo da
renda per capita. Mas o que dizer da mesma situação, agora com um dos
idosos aposentado, recebendo um salário mínimo? Nesta situação, a renda
extrapolaria o mínimo fixado na LOAS!
Tal diferenciação de tratamento não se justifica. Ainda que a
extensão de direitos sociais deva ser feita com muita cautela, até mesmo
em razão do Princípio da Reserva do Possível – haja vista a escassez de
recursos financeiros – tamanha discriminação é insustentável. Acredito
que, nessas situações, sempre que um idoso for aposentado e outro não,
inexistindo outra fonte de renda do casal, e desde que a aposentadoria seja
igual ao salário mínimo, o BPC deva ser concedido para o cônjuge
necessitado. Se foi intenção do Legislador privilegiar o idoso, que se faça
isso com igualdade de tratamento. Do contrário, o idoso que contribui
durante a vida e obteve sua aposentadoria poderá situar-se em estado pior
frente àquele que nada verteu ao sistema. Ou assim se procede ou se
reconhece a impossibilidade de extensão para ambas as hipóteses, em
razão de ausência de custeio (art. 195, § 5º, CRFB/88).
Para o idoso, parte de seu beneficio assistencial pode ser utilizada
no custeio de seu sustento, quando mantido por entidades filantrópicas, ou
casa-lar, sendo então facultativa a estas a cobrança de participação do
idoso no custeio da entidade. Todavia, a cotização não poderá exceder a
70% (setenta por cento) de qualquer benefício previdenciário ou de
assistência social percebido pelo idoso (art. 35, Lei nº 10.741/03). Assim,
nada impede que a parte do benefício recebido pelo idoso seja repassado
por este à entidade que o mantém, desde que, obviamente, sejam tais
valores utilizados em seu favor.
A cessação do pagamento do benefício ocorre nas seguintes
situações:
I- superação das condições que lhe deram origem;
II- morte do beneficiário;
III- morte presumida do beneficiário, declarada em juízo;
IV- ausência declarada do beneficiário, na forma da lei civil;
V- falta de comparecimento do beneficiário portador de deficiência ao
exame medico pericial, por ocasião de revisão de beneficio;
VI- falta de apresentação pelo idoso ou pela pessoas portadora de
deficiência da declaração de composição do grupo e renda familiar
por ocasião de revisão de benefício.
O referido benefício é intransferível, não gerando direito à pensão
por morte aos herdeiros ou sucessores, extinguindo-se com a morte do
segurado. Todavia, o valor não recebido em vida pelo beneficiário será
pago aos herdeiros (art. 23 do Regulamento do Benefício de Prestação
Continuada – RBPC, aprovado pelo Decreto nº 6.214/07).
O benefício assistencial, na previsão original do RBPC, não poderia
ser acumulado com qualquer benefício da Previdência Social ou qualquer
outro regime previdenciário, salvo o da assistência médica (art. 5º do
RBPC). Pelo Decreto nº 6.564/08, dando nova redação ao art. 5º do RBPC, o
beneficiário assistencial continua não podendo ser acumulado com
qualquer outro beneficio no âmbito da Seguridade Social ou de outro
regime, salvo o da assistência médica e no caso de recebimento de pensão
especial de natureza indenizatória. As possibilidades de cumulação são
aumentadas. Até o advento do Regulamento do Benefício de Prestação
Continuada, admita-se a acumulação com a pensão especial devida aos
dependentes das vitimas da hemodiálise de caruaru/PE, prevista na Lei nº
9.422, de 24 de dezembro de 1996.
De acordo com a Lei nº 9.720/98, a renda familiar mensal, para
efeitos de obtenção do benefício assistencial, deverá ser declarada pelo
requerente ou seu representando legal (art. 20, § 8º, da LOAS). Ainda, o
benefício de prestação continuada deve ser revisto a cada dois anos para
avaliação da continuidade das condições que lhe deram origem. Caso o
beneficiário não mai se enquadre na condição de necessitado, o auxilio
deixa de ser pago.
De acordo com a LOAS, entende-se como família, para fins de
fixação da renda per capita, as mesmas pessoas classificadas como
dependentes na Lei nº 8.213/91, ou seja, cônjuge, companheiro(a), filhos
ou equiparados até 21 anos ou inválidos, pais e irmãos até 21 anos ou
inválidos. Ressalta-se que devam viver sobre o mesmo teto (art. 20, § 1º,
Lei nº 8.742/93).
Não se deve aqui aplicar o conceito mais amplo de família previsto
nas Leis nº 10.219/01 e 10.689/03, que é exposto como “a unidade nuclear,
eventualmente ampliada por outros indivíduos que com ela possuam laços
de parentesco, que forme um grupo doméstico, vivendo sob o mesmo teto
e mantendo sua economia pela contribuição de seus membros”. A LOAS
possui conceito específico para os fins de adoção de conceitos outros,
ainda que previstos em leis assistenciais diversas, é evidente tentativa de
restringir uma garantia social assegurada pela Constituição.
Ainda que o conceito de família da LOAS seja claramente falho, pois
permite que uma pessoas receba o benefício mesmo tendo família
abastada, o que deve propor a alteração legislativa competente que
propicie uma definição mais apropriada aos fins da assistência social.
Ainda prevê a LOAS que o deficiente, para a percepção do benefício,
é aquela pessoa incapacitada para a vida independente e para o trabalho
(art. 20, § 2º, Lei nº 8.742/93). Daí costuma-se afirmar que a lei requer um
conceito mais rigoroso de inválido para fins assistenciais, diferente do
utilizado para fins previdenciários – não basta a incapacidade para o
trabalho, mas também para a vida independente.
Sem embargo, a redação legal é criticável, não devendo ser
interpretada literalmente (como, aliás, quase todas as leis.), devido à
imprecisão do que seria incapacidade para a vida independente. Isso acaba
por excluir quase todas as solicitações administrativas do benefício
assistencial, pois a perícia médica em geral entende que somente
enquadrar-se-ia neste requisito a pessoa totalmente dependente de
terceiros, mesmo nas atividades mais básicas do dia a dia. Não parece ser
este o ideal da Constituição ao prever a assistência social que privilegia a
dignidade da pessoa humana.
Como já manifestou o STJ, o laudo pericial que atesta a capacidade
para a vida laboral e a capacidade para a vida independente, pelo simples
fato da pessoa não necessitar da ajuda de outros para se alimentar, fazer
sua higiene ou se vestir, não pode obstar a percepção do benefício, pois, se
esta fosse a conceituação da vida independente, o benefício de prestação
continuada só seria devido aos portadores de deficiência total, que
suprimisse a capacidade de locomoção do individuo – o que não parece ser
o intuito do legislador (REsp. nº 360.202/AL, 5º turma, Rel. Ministro Gilson
Dipp, DJU 1] de julho de 2002).
Com o Decreto nº 6.214/07, fica também claro que a realização de
atividades não remuneradas de habilitação e reabilitação, dentre outras,
não constitui motivo de suspensão ou cessação do benefício, pois é função
da assistência social, também, a inserção no mercado de trabalho ao
estimular o desenvolvimento das capacidades cognitivas, motoras e
educacionais.
Naturalmente, havendo a efetiva integração no mercado de
trabalho, por meio de atividade remunerada, o beneficio assistencial
cessará. Nãos e deve confundir assistência social com assistencialismo. A
proposta do sistema é, além de manter rendimento dignamente mínimo,
fornecer aptidão profissional para que o percipiente do benefício possa
garantir o próprio sustento. Como prevê a Constituição, a ordem social tem
como base o primado do trabalho (art. 193). Naturalmente, é possível,
também, nova concessão do benefício à pessoa que teve o BPC cessado
para assumir trabalho remunerado, caso sua situação regrida novamente.
Pelo regulamento do BPC, também foi instituído novo modelo para
avaliação da deficiência e do grau de capacidade, composta não só por
avaliação médica, mas outra social, que obedecerá aos critérios da
Classificação internacional de Funcionalidades, Incapacidade e Saúde,
substituindo o modelo tradicional. Essa avaliação, mais ampla, permite
averiguar limitações sociais no desempenho de atividades e na restrição de
participação social, que não seriam identificadas em uma pericia médica
(art. 16).
O mesmo Regulamento, com edição do Decreto nº 6.564/08, passa
a prever que, no caso de crianças e adolescentes postulantes do BPC,
menores de dezesseis anos de idade, deve ser avaliada a existência de
deficiência necessariamente em conjunto com seu impacto na limitação do
desempenho de atividade e restrição da participação social, compatível
coma idade, sendo dispensável, obviamente, proceder à avaliação da
incapacidade para o trabalho.
Não era incomum o INSS indeferir a prestação assistencial para
menores sob alegação de inexistir incapacidade para o trabalho. Em
verdade, a invalidez para o menor é muito mais gravosa, pois impede, com
freqüência, a sua formação plena, devido, especialmente, à limitada
possibilidade de internação com outras pessoas de mesma idade.
Outro problema solucionado pelo Decreto nº 6.564/08 era a
exigência de inscrição do requerente do Cadastro de Pessoa Física – CPF,
para a sua concessão, pois a praxe do INSS era exigir este documento.
Embora seja obrigatório para benefícios previdenciários, agora, a não-
inscrição no CPF, no ato do requerimento do Benefício de Prestação
Continuada, não prejudicará a análise do correspondente processo
administrativo nem a concessão do benefício. O mesmo decreto também
prevê, mas claramente, que somente o brasileiro naturalizado poderia
obter o benefício, além, naturalmente, do brasileiro nato, restando
excluído o estrangeiro.
Apesar de o benefício de prestação continuada ser o benefício
assistencial por excelência, outros existem na lei. São os benefícios
eventuais, isto é, os auxílios funeral e natalidade, que eram benefícios
previdenciários, mas agora encontram-se vinculados à assistência social.
Também são limitados às famílias, cujas rendas mensais per capita sejam
inferiores a ¼ (um quarto) do salário mínimo.
O auxílio-natalidade era benefício previdenciário concedido à
segurada gestante ou ao segurado pelo porto de sua esposa ou
companheira não-segurada, em prestação única, desde que estes
possuíssem remuneração inferior a determinação patamar. Já o auxílio-
funeral era pago ao executor dos préstimos fúnebres, em conta única,
desde que o interessado também possuísse remuneração inferior a
determinação patamar (arts. 140 e 141 da Lei nº 8.213/91, ambos
revogados pela Lei nº 9.528/97).
Dispõe a LOAS que compete aos Estados destinar recursos
financeiros aos Municípios, a título de participação no custeio do
pagamento dos auxílios natalidade e funeral,mediante critérios
estabelecidos pelos Conselhos Estaduais de Assistência Social (art. 13, I, da
Lei nº 8.742/93).
Nos artigos seguintes, a LOAS explicita que compete aos Municípios
e ao Distrito Federal destinar recursos financeiros para custeio e
pagamento dos auxílios natalidade e funeral, mediante critérios
estabelecidos pelos Conselhos Municipais de Assistência Social, e então
efetuar o pagamento destes (arts. 14 e 15 da Lei nº 8.742/93).
Também dispõe a LOAS que a concessão e o valor dos auxílios serão
regulamentados pelos Conselhos de Assistência Social dos Estados, do
Distrito Federal e dos Municípios, por meio de critérios e prazos definidos
pelo Conselho Nacional de Assistência Social (art. 22, § 1º, da Lei nº
8.742/93).
Como muitos entes Federativos sequer possuem Conselhos de
Assistência Social, os auxílios funeral e natalidade não são normalmente
pagos, trazendo evidente prejuízo aos que destes necessitam.
Obviamente, assim não deveria ser, pois a própria lei prevê que a
transferência dos beneficiários do sistema previdenciário para a assistência
social deve ser estabelecida de forma que o atendimento à população não
sofra solução de continuidade (art. 40, § 1º, da Lei nº 8.742/93, com a
redação dada pela Lei nº 9.711/98).
Estes chamados benefícios eventuais, nos termos do art. 22 da Lei nº
8.742/93, foram previstos também no Decreto nº 6.307/07, os quais
integram as garantias do Sistema Único de Assistência Social – SUAS. De
acordo com o mesmo, a concessão e o valor dos auxílios por natalidade e
por morte serão regulados pelos conselhos de Assistência Social dos
Estados, do Distrito Federal e dos Municípios, mediante critérios e prazos
definidos pelo Conselho Nacional de Assistência Social – CNAS.
De qualquer forma o Ministério Público pode e deve agir caso os
direitos dos necessitados não sejam respeitados, pois cabe a este zelar pelo
efetivo respeito aos direitos estabelecidos na LOAS (art. 31 da Lei nº
8.742/93).

4.2. Outras Ações


Além do benefício de prestação continuada, tradicionalmente
conhecido como a prestação assistencial por excelência, o governo federal
tem mantido diversas ações neste segmento, muitas vezes incorrendo em
redundâncias, com varias ações de mesma natureza em paralelo,
incrementando-se os custos dos programas e perdendo-se em efetividade.
Tais programas, com o Bolsa Escola, Bolsa Alimentação, Auxílio-Gás,
entre outros, sofriam com os conflitos de atuação, sendo evidentemente
necessária a unificação em programa único, de âmbito nacional, com
atuação precisa e técnica, deixando-se de lado as invencionices
terminológicas.
Tal procedimento foi adotado com o advento da lei nº 10.836, de 09
de janeiro de 2004, a qual unificou os procedimentos de festão e execução
das ações de transferência de renda do Governo Federal no Bolsa Família.
Foram agregados ao novo programa o Bolsa Escola, o Programa Nacional
de Acesso à Alimentação – PNAA, o Programa Nacional de Renda Mínima
vinculada à Saúde – Bolsa Alimentação, o programa Auxílio-Gás e o
Cadastramento Único do Governo Federal (art. 1º).
De acordo com alei, são benefícios financeiros do Bolsa Família: o
benefício básico, destinado a unidades familiares que se encontrem em
situação de extrema pobreza e o benefício variável, destinado a unidades
familiares que se encontrem em situação de pobreza e extrema pobreza e
que tenham e sua composição gestantes, nutrizes, crianças entre 0 (zero) e
12 (doze) anos ou adolescentes até 15 (quinze) anos (art. 2º).
O Bolsa Família consiste em pagamentos de valor certo em dinheiro
aos beneficiários, com o intuito de atender às demandas suportadas pelos
programas substituídos, em especial no que diz respeito à manutenção do
padrão alimentar da família, possibilitando a manutenção do ensino regular
da criança, que é um dos requisitos do programa, além do exame pré-natal,
ao acompanhamento nutricional, ao acompanhamento de saúde (art. 3º).
Define a lei conceitos básicos, que são a família, a nutriz e a renda
familiar mensal:
________
I- família, a unidade nuclear, eventualmente ampliada por outros
indivíduos que com ela possuam laços de parentesco ou de
afinidade, que forme um grupo doméstico, vivendo sob o
mesmo teto e que se mantém pela contribuição de seus
membros;
II- nutriz, a mãe que esteja amamentando seu filho com até 6 (seis)
meses de idade para o qual o leite materno seja o principal
alimento;
III- renda familiar mensal, a soma dos rendimentos brutos
auferidos mensalmente pela totalidade dos membros da família,
excluindo-se os rendimentos concedidos por programas oficiais
de transferência de renda.
________

Nada impede que estes benefícios sejam recebidos


cumulativamente com o benefício de prestação continuada, pois não há
vedação legal expressa. Ao revés, a lei como se vê supra, exclui da renda
familiar mensal os rendimentos concedidos por programas oficiais de
transferência de renda.
O pagamento dos benefícios previstos na Lei nº 10.836/04 será feito
preferencialmente à mulher (art. 2º, § 14). O dispositivo legal,
aparentemente contrario à isonomia constitucional entre homens e
mulheres, justifica-se plenamente pelo escopo do programa, que visa
prioritariamente o adequado desenvolvimento físico e mental da criança,
cuidando-se de sua alimentação e educação, sendo notória, na imensa
maioria dos casos a dedicação superior da mãe a sua prole.
Os valores do Bolsa Família foram reajustados pelo Decreto nº
6.491/08. Os procedimentos operacionais necessários ao ingresso no
Programa Bolsa Família é disciplinado pela Portaria MDS nº 341/2008.
Outro programa de interesse social foi criado pela Lei nº 10.835, de
08 de janeiro de 2004, que institui a renda básica da cidadania a partir de
2005. A prestação será paga a todos os brasileiros residentes no País e
estrangeiros residente há pelo menos 5 anos no Brasil, não importando sua
condição socioeconômica.
Este programa é o conhecido projeto de renda mínima, o qual visa a
garantia de um rendimento elementar a toda família. Quando efetivamente
implementado, poderá até mesmo substituir o Bolsa Família.
Naturalmente, a abrangência do programa de renda básica será alcançada
em etapas, a critério do poder executivo, priorizando-se as camadas mais
necessitadas da população.
O pagamento do benefício devera ser de igual valor para todos,
podendo ser em parcelas iguais e mensais, e suficiente para atender às
despesas mínimas de cada pessoa com alimentação, educação e saúde,
considerando para isso o grau de desenvolvimento do país e as
possibilidades orçamentárias. Como se sabe, o pagamento de tais
benefícios depende de previsões orçamentárias precisas.
Também merece menção o programa “Farmácia Popular do Brasil”
que visa à disponibilização de medicamentos em farmácias populares, por
intermédio de convênios firmados com Estados, Distrito Federal,
Municípios e hospitais filantrópicos, bem como em rede privada de
farmácias e drogarias.
A fundação Oswaldo Cruz – FIOCRUZ – é a executora das ações
inerentes à aquisição, estocagem e comercialização dos medicamentos,
podendo também firmar convênios com a União, Estados, Distrito Federal e
Municípios, sob a supervisão direta e imediata do Ministério da Saúde. O
programa consta da Lei nº 10.858, de 13 de abril de 2004, regulamentada
pelo Decreto nº 5.090, de 20 de maio de 2004.
Com o intuito de melhor gerenciar os programas assistenciais do
governo, o Decreto nº 6.135/07 institui o Cadastro Único para Programas
Sociais do Governo Federal, como instrumento de identificação, e
caracterização socioeconômica das famílias brasileiras de baixa renda, a ser
obrigatoriamente utilizado para seleção de beneficiários e integração de
programas sociais do Governo Federal voltados ao atendimento desse
público (art. 2º). No entanto, é importante observar que tal cadastro não se
aplica aos programas administrados pelo INSS (art. 2º, § 1º).

5. PREVIDÊNCIA SOCIAL
A previdência social é tradicionalmente definida como seguro sui
generis, pois é a filiação compulsória para os regimes básicos (RGPS e
RPPS), além do coletivo, contributivo e de organização estatal, amparando
seus beneficiários contra os chamados riscos sociais. Já o regime
complementar tem como características a autonomia frente aos regimes
básicos e a facultatividade de ingresso, sendo igualmente contributivo,
coletivo ou individual.
Um avanço na sistemática da assistência social foi a Poor Relief Act
(Inglaterra, 1601), o qual criou uma contribuição obrigatória, arrecadada
da sociedade pelo Estado para fins sociais. Este é considerado o primeiro
ato relativo à assistência social propriamente dita, sendo seu marco inicial.
Em 1891, tem-se a Encíclica Rerum Novarum, de Leão XIII, a qual
externava a preocupação da Igreja com a proteção social. Esta instituição
sempre teve importante participação no quadro evolutivo da seguridade
social como um todo, por meio de cobranças constantes por uma maior
participação dos Estados da população como um todo na área social.
Outras Encíclicas de importância na evolução securitária foram a
Quadragesimo Anno (1931), Divini Redemptoris (1937), Mater et Magistra
(1961), Pacem in Terris (1963), Guaudium et Spes (1965) e Laborem
Excercens (1981).
O primeiro ponto, fundamental para o estudo previdenciário,
ocorreu na Alemanha, em 1883. O Chanceler Bismarck obteve a aprovação
do parlamento para seu projeto de seguro de doença, o qual foi seguido
pelo seguro de acidentes de trabalho (1884) e pelo seguro de invalidez e
velhice (1889).
Foi a gênese da proteção garantida pelo Estado, funcionando este
como arrecadador de contribuições exigidas compulsoriamente dos
participantes do sistema securitário. Aí temos as duas grandes
características dos regimes previdenciários modernos: contributividade e
compulsoriedade de filiação.
Neste momento, tem-se o nascimento da prestação previdenciária
como direito publico subjetivo do segurado. A partir do instante em que o
Estado determina o pagamento compulsório de contribuição para o
custeio de um sistema protetivo, o segurado pode exigir, a partir da
ocorrência do evento determinante, o pagamento de seu benefício, não
sendo lícito ao Estado alegar dificuldades financeiras para elidir-se a esta
obrigação.
Em virtude da existência deste direito subjetivo é que a Lei de
Bismarck é conhecida como o marco primeiro da previdência social no
mundo. Até então, os sistemas secundários tinham natureza
exclusivamente privada, sem as garantias de um sistema estatal.
Como bem observa Manoel Póvoas, a criação do sistema
bismakiano enfrentou poucas criticas, não só pelo seu potencial
pacificador, administrando as massas revoltosas com a precária qualidade
de vida dos trabalhadores de indústria, mas especialmente pelo fato de
não existir compromisso financeiro para o Estado, pois o encargo, neste
momento, era restrito a empregadores e trabalhadores, os quais,
conjuntamente, financiam o novo sistema.
Em 1885, a Noruega aprovou a cobertura diante de acidentes de
trabalho e, também, criou um fundo especial em favor de doentes e do
auxílio-funeral. Nesta época, Ebbe Hertzberg utilizou, pela primeira vez, o
termo Estado do Bem-Estar Social (Welfare State) , em 1884.
Já a Dinamarca criou a aposentadoria em 1891. A Suécia
desenvolveu o primeiro plano de pensão nacional universal logo depois. Na
América Latina, os sistemas mais antigos foram criados na argentina, Chile
e Uruguai, no início da década de 1920. Nos Estados Unidos, o
empobrecimento causado pela grande depressão de 1920 estimulou o
presidente Franklin Roosevelt a criar o Comitê de Segurança Econômica,
que incorporou recomendações à Lei de Seguridade Social de 1935 – Social
Security Act. Quando a lei entrou em vigor, em 1940, após profunda
recessão em 1937, mais da metade dos trabalhadores era coberta.
Formou-se aí o arcabouço teórico do New Deal.
O Social Security Act, conhecido como a primeira citação feita à
seguridade social em âmbito mundial, demonstra a crescente preocupação
com os excluídos dos regimes previdenciários, defendendo a proteção de
toda a população. Apesar do nome, o Social Security Act não correspondia
à idéia atual de seguridade social, mas sim a algo próximo da previdência
social, como a conhecemos hoje, isto é, uma forma evoluída de seguro
social, a qual atende de forma mais ampla às demandas sociais da classe
trabalhadora.
A primeira Constituição a mencionar o seguro social foi a do México
(1917). A Constituição de Weimar (1919) traz vários dispositivos relativos à
previdência.
A partir do modelo bismarckiano, esta técnica protetiva espalhou-se
pelo mundo, sendo que, no período entre as duas grandes guerras, houve
uma maior abrangência da técnica, atingindo um número cada vez maior
de pessoas.
Ponto mais importante deste período da evolução securitária, é o
famoso relatório Beveridge (Inglaterra, 1942). Este documento, que dá
lugar ao plano de mesmo nome, foi responsável pela origem da Seguridade
Social, ou seja, a responsabilidade estatal não só do seguro social, mas
também de ações na área de saúde e assistência social.
O plano Beveridge foi elaborado por comissão, interministerial de
seguro social e serviços afins, nomeada em julho de 1941, com o objetivo
de trazer alternativas para os problemas da reconstrução no período pós-
guerra. O termino do trabalho deu-se em novembro de 1942.
O plano teve grande mérito por tratar-se do primeiro estudo amplo
e minucioso de todo o universo do seguro social e serviços conexos.
Acredito que esse pensamento é altamente influenciado pelo tipo
de benefício e pelo fundamento filosófico do sistema previdenciário.
Quanto mais previsível fora a prestação e quanto mais for o sistema
vinculado ao tradicional sistema de seguro social, mas evidente será a
relação jurídica única. Ao revés, quanto maior a imprevisibilidade da
prestação, e quanto maior a solidariedade do sistema, menor será a
relação entre custeio e benefício, individualmente considerada.
Por exemplo, podemos facilmente perceber a relação única
previdenciária entre custeio e benefício em uma aposentadoria por díade
dentro de um sistema bismarkiano típico, no qual o benefício tem liame
direto com as cotizações. No entanto, só com muita boa vontade e esforço
mental poderemos admitir que um benefício por incapacidade em um
sistema beveridgiano terá, em uma relação única, individualmente
considerada, o custeio e o benefício.
Isso é facilmente visto no caso brasileiro, quando um empregado,
ainda no primeiro dia de trabalho, sofre sinistro que gera a invalidez –
perceberá, pelo resto de sua vida, um benefício sem ter vertido uma única
contribuição. Onde estará o custeio? Se a resposta for desconsiderada a
análise individual e centrar-se na abordagem global, marco, o debate
perde sua função, que é exatamente o que acontece.
Como já se disse anteriormente, o importante para o sistema
previdenciário é buscar o equilíbrio financeiro atuarial, que é,
necessariamente defino no plano global, ou seja, com o dimensionamento
de um plano genérico de benefício com um sistema geral de custeio,
atendendo a toda a clientela desejada. Nada impede que algum regime
protetivo, por convicções ideológicas, demande, do ponto de vista
individual (micro), uma contribuição de cada segurado diante de cada
benefício, o que pode ser até desejável, como estimulo à autoproteção,
mas tal característica é contingente, e não necessária.
Enfim, dependendo do sistema criado, poder-se-ão encontrar
relações previdenciárias unitárias, dúplices ou mesmo mistas. Mas, como
ressaltei no inicio, trata-se de debate acadêmico de escassa utilidade
pratica, pois o que importa são as premissas concretas do sistema, dentro
de um equilíbrio atuarial global. Em verdade, o debate da relação
previdenciária dificilmente submete-se a estas visões unitárias ou
bilaterais, que muito têm a ver com os contratos de seguro tradicionais.

6. EVOLUÇÃO HISTÓRICA
O histórico da previdência social é assunto de muita relevância, pois
nos permite o entendimento de diversos institutos securitários existentes
atualmente. A evolução mostra-nos com clareza a participação cada vez
maior do Estado, proporcionando uma proteção mais eficaz da sociedade.
Além disso, o estudo do histórico previdenciário é excelente
ferramenta para evitarmos os erros do passado...
Não há consenso sobre as fases evolutivas da previdência social.
Wladimir Novaes Martinez menciona dois grandes grupos; Feijó Coimbra,
três; já Ilídio das Neves, quatro. A mais usual é a seguinte:
• fase inicial (até 1918): criação dos primeiros regimes
previdenciários, com proteção limitada a alguns tipos de
eventos, como acidentes do trabalho e invalidez;
• fase intermediária (de 1919 a 1945): expansão da previdência
pelo mundo, com a intervenção do Estado cada vez maior na
área securitária;
• fase contemporânea (a partir de 1946): aumento da clientela
atendida e dos benefícios. É o grau Maximo do Welfare State,
com a proteção de todos contra qualquer tipo de risco social.
Basicamente, o que se pretende demonstrar com essas fases é a
completude assumida pelo sistema no decorrer do tempo. No início, tem-
se a adoção de regimes previdenciários por diversos Estados, em uma
espécie de efeito dominó, em virtude do evidente beneficio para a
população. Posteriormente, os sistemas passam por mudanças, de modo a
atender demandas sociais até então excluídas da proteção social. Trata-se
do aprimoramento da técnica protetiva, fase que vivemos hoje, de modo
evidente.
Por isso, o importante é o entendimento dos principais pontos
evolutivos da proteção social, de modo a se visualizar corretamente sua
progressão, independentemente das divisões doutrinárias. A lógica da
evolução é o que importa.
Em um primeiro momento, podemos afirmar que a proteção contra
os infortúnios da vida tinha caráter eminentemente familiar, com os mais
novos auxiliando os idosos e demais incapacitados para o trabalho.
Entretanto, tal proteção, ainda que exista até hoje, é evidentemente
limitada, ainda mais nos dias atuais com uma maior degradação da
unidade familiar, conforme já mencionado.
Já em épocas remotas, a proteção adicional existente tinha caráter
privado, de fundos mutualistas, onde determinado grupo de pessoas unia-
se, voluntariamente, para a proteção mútua contra os riscos sociais.
Quanto aos necessitados, a assistência era patrocinada pela sociedade,
também em forma voluntária.
O trabalho desenvolvido por Beveridge continha alguns princípios,
sendo os principais.
1. Inovação total do trabalho, com o rompimento de conceitos
passados, a partir da experiência – o plano deveria deixar de lados
os paradigmas existentes e buscar novos horizontes para a proteção
social.
2. Amplificar a relevância do seguro social como fator de evolução
social – para o relatório, os avanços tão desejados pela sociedade
somente seriam possíveis com a melhoria do sistema
previdenciário, por ser este verdadeiro arcabouço de todo o sistema
protetivo de um Estado.
3. Cooperação entre indivíduo e Estado – as pessoas que se utilizam do
sistema protetivo são as principais interessadas em seu perfeito
funcionamento e, por isso, devem sempre participar da
administração deste e da formulação de novas estratégias sociais.
4. Novas idades para a aposentadoria – em virtude do aumento
generalizado da expectativa de vida, o Estado deveria conceder
aposentadorias com idades mais avançadas, de modo a manter a
estabilidade do sistema.
5. Plano de alcance universal – a rede protetiva formulada pelo Estado
deveria ser dotada de alcance amplíssimo, isto é, atender toda a
sociedade e protegê-la contra todo tipo de infortúnio. Daí vem a
idéia de proteção from the cradle to the grave, ou seja, do
nascimento à morte.
6. Assistência social completando as lacunas do seguro social – este
princípio vem evidenciar a evolução então adotada. A previdência
social, por si só mais evoluída que o seguro social, teria ainda mais
componentes assistenciais, de modo a atender parcelas excluídas da
sociedade, como as pessoas carentes e desempregadas.
Após a exposição de seus princípios, o relatório explicita suas
conclusões. Entre as mais importantes, pode-se citar:
1. Seguro social compulsório – todas as pessoas devem participar do
sistema protetivo, sendo garantido aos necessitados um mínimo
para sua manutenção. Ainda, todos os protegidos devem ser
tratados de modo equânime, sem requisitos diferenciados. Os
seguros sociais da área urbana e rural também deveriam integrar
um sistema único.
2. Adoção da tríplice fonte de custeio – o custeio do sistema protetivo
não deve ser incumbência única e exclusiva de uma pessoa, mas de
várias, que, no caso, são o Estado, as empresas e os trabalhadores.
3. Unificação do seguro de acidentes do trabalho com o seguro social –
embora Beveridge reconhecesse as vantagens de um sistema
privado e autônomo de seguro de acidentes, as desvantagens eram
muito superiores.
Entre elas, estão os intermináveis litígios entre empregadores e
trabalhadores, que sempre ocorrem quando o empregador ou a
seguradora, por algum motivo, deixa de arcar com o susto do benefício
acidentário.
De fato, a questão dos litígios judiciais é, de longe, a mais grave
existente. Como se sabe, é comum litigantes pactuarem acordo para pôr
fim à lide. Porém, em se tratando de benefício acidentário, um acerto de
valor global certamente deixará o segurado à mercê da própria sorte, já
que excluirá a responsabilidade futura do empregador ou da seguradora
pela previdência do benefício.
Outros litígios são extremamente complexos, como, por exemplo, a
questão das doenças do trabalho ou profissionais. Muitos desses eventos
tomam lugar após anos, senão décadas de trabalho, freqüentemente em
diversos empregadores. Caso o segurado venha a ficar invalido em virtude
desses eventos, de quem será a responsabilidade? Aceitaria o último
empregador arcar com os custos de uma doença desenvolvida ao longo de
toda uma vida profissional? Muito improvável.
Também a falta de apoio ao acidentado é evidente, já que caberia a
este proceder à solicitação de sua indenização, sem qualquer tipo de
orientação estatal. Quando unificado ao seguro social, já se conta co uma
estrutura própria para atendimento ao beneficiário.
Igualmente mencionada por Beveridge, há a insegurança do regime
privado, o qual pode falir e deixar diversos beneficiários sem seus
pagamentos, além de excluir a proteção de muitos outros.
4. Unificação do seguro e da assistência social em único ministério –
devido à similitude de ações entre seguro e assistência social, seria
evidente desperdício a manutenção de suas estruturas em paralelo
para atendimento da população. Como a assistência social visa ao
preenchimento das lacunas previdenciárias, a direção única é
fundamental para atingir-se este objetivo.
No entanto, no Brasil, a Lei nº 10.683, de 28 de maio de 2003, criou,
a partir do Ministério da Previdência e Assistência Social – MPAS, o
Ministério da Assistência Social – MAS (art. 25, II), posteriormente
renomeado para Ministério do Desenvolvimento Social e Combate à Fome,
pela MP nº 163, de 23 de janeiro de 2004, convertida na Lei nº 10.869, de
13/05/2004, o Ministério da Previdência Social – MPS, separando o braço
assistencial da seguridade, em flagrante retrocesso (art. 25, XVIII).
5. Unificação das contribuições – toda a gama de contribuições
existentes deveria ser unificada, de modo a proporcionar ao
beneficiário a solicitação de qualquer benefício. À época do
relatório, havia contribuições distintas para benefícios diversos,
tornando o custeio por demais complexo.
Esta alteração também implicaria a unificação das approved
societies, que tinham contribuições próprias, sendo algo similar aos
institutos de aposentadorias e pensões existentes no Brasil, de 1933 até
1966.
6. Separação da saúde do contexto previdenciário – a saúde, devido ao
seu espectro amplo de atendimento, deve ser colocada em
separado da previdência e assistência sociais, sob pena de
comprometimento do atendimento e gigantismo do órgão
responsável pela administração.
7. Fornecimento de auxílio para o aprendizado – este auxílio, não só de
cunho pecuniário mas também profissional, vista à preparação do
indivíduo para o ingresso no mercado. Junto a esta ajuda estatal,
deveria existir o auxílio-desemprego por tempo indefinido.
8. Revogação das isenções – todo tipo de renúncia de receita deveria
ser excluída, de modo a garantir a entrada de recursos suficientes
para a manutenção do sistema securitário.
O sistema previdenciário é necessariamente contributivo. A
exclusão de contribuições somente provoca a debilidade do regime. Se
alguma entidade, de alguma forma, realiza atividades de interesse estatal,
tais ações deveriam ser incentivadas por meio de outros tipos de
subvenção, e não da renuncia de contribuições.
9. Extensão do seguro social para todos os trabalhadores – não
somente os empregados, mas todos os trabalhadores, como os
autônomos, devem integrar o sistema.
10. Incentivo de permanência em atividade – o sistema previdenciário
pode ser dotado de regras que incentivem a permanência do
trabalhador no mercado de trabalho. Caso a pessoa deixe para
solicitar a aposentação em outro momento, seu benefício futuro
seria maior.
Beveridge questiona a suposição de que a aposentadoria precoce
iria ajudar no combate ao desemprego. Com razão, qualifica esta estratégia
como incerta, já que não há garantias de aumento de demanda por mão-
de-obra.
Em verdade, a aposentadoria precoce representa um aumento de
receita para o trabalhador – este continua trabalhando e ainda recebe um
benefício do Estado. Assim tem sido a regra até mesmo no Brasil coma
aposentadoria por tempo de contribuição. Sem duvida, a melhor opção e o
incentivo para a apoquentação tardia, sempre lembrando que não cabe à
previdência social resolver o problema do desemprego.
6.1. Reflexões da Análise Histórica – O Embate entre os Modelos Bismarkiano
e Beveridgiano de Proteção Social
A previdência social origina-se das lutas por melhores condições de
trabalho, as quais resultaram em diferentes sistemas protetivos, de acordo
com as situações de cada país envolvido. Alguns limitaram a proteção ao
necessário à sobrevivência, enquanto outros foram além, buscando
programar substituição relacionada à remuneração. Tais variações colocam
em destaque as diferentes estruturas dos sistemas de proteção.
Basicamente, todos buscavam uma previdência social como garantia, ao
menos, do mínimo vital, de modo viável financeiramente.
Percebe-se em todos os modelos a implementação das idéias
keynesianas de intervenção estatal na economia, as quais nortearam,
especialmente, o New Deal norte-americano, o Plano Beveridge e as Cartas
do Atlântico, que externaram a necessidade da aça estatal concreta como
garantidora do bem-estar social.
No modelo bismarkiano, mais primitivo, a proteção não era
universal, geralmente limitada aos trabalhadores, rigoroso financiamento
por meio de contribuições sociais dos interessados (trabalhadores e
empresas), além de restringir sua aça a determinadas necessidades sociais.
O modelo beveridgiano tem concepção mais ampla, pois visa a
universalidade de atendimento, atendendo a tudo e a todos, com
financiamento por meio de impostos, arrecadados de toda a sociedade.
Percebe-se, claramente, que a solidariedade é mais forte neste modelo.
No Pós-Guerra, surge uma tendência universalizadora do seguro
social, com base nas premissas teóricas do Plano Berevidge. As maiores
taxas de natalidade e crescimento econômico geraram a euforia protetora,
com a conseqüente universalização da clientela, sem maiores distinções em
razão das atividades econômicas, privilegiando a solidariedade. O
financiamento distancia-se da técnica de capitalização, com a repartição
simples, trazendo evidente enfraquecimento do aspecto atuarial do
sistema protetivo. No sistema beveridgiano, as prestações pagas pelo
sistema são desvinculadas da real remuneração do trabalhador, ao
contrario do sistema bismarkiano, no qual a prestação é relacionada à
cotização.
Estes são, em apertada síntese, os pressupostos históricos que
permitiram a formação teórica plena do Welfare State, que se iniciara com
Bismarck e tem íntima ligação com a previdência social. Todavia, em razão
do excessivo crescimento desordenado dos sistemas protetivos, é com
alguma perplexidade que o mundo assiste a um retorno aos modelos
bismarckianos de seguro social, haja vista seu maior comprometimento
com o equilíbrio financeiro e atuarial.
Ou seja, com a crise do Welfare State, o que se constata, em âmbito
mundial, é uma mescla dos sistemas bismarkiano e beveridgiano, com a
adoção recíproca de características até então estranhas, como a
secutirização do esquema beveridgiano, ou seja, a fixação de benefícios
calculados também em relação às contribuições individuais. Tem-se o
exemplo da Suécia, que migrou de um sistema original beveridgiano para
um modelo híbrido, adotando um segundo pilar estatal compulsório, de
repartição e relacionado às remunerações, reduzindo a importância do
primeiro pilar, que se limita desde então à garantia do mínimo existencial.
Isto é de especial importância para que se possa atender o motivo
de alguns países adotarem um sistema complementar de previdência
compulsório – são, em verdade, Estados que adotavam o esquema
beveridgiano de proteção social, mas acabaram por migrar, em parte, para
o sistema bismarkiano (que seria o 2º pilar), mantendo o 1º pilar como
valor mínimo assegurado a todos. Até mesmo o Reino Unido, berço da
concepção beveridgiano de proteção social, fez tal manutenção, sendo,
todavia, dada maior ênfase ao sistema privado de previdência
complementar.
Por isso, a análise de um sistema protetivo qualquer deve ser feita
dentro do aspecto histórico que propiciou sua criação e, também, tendo
em conta que as alterações sempre são feitas de modo extremamente
lento, em razão da grande estima destes sistemas diante dos cidadãos. Daí
inadequadas e simplórias as meras análises de gastos do sistema diante do
PIB, já que isso não leva em consideração as origens históricas dos
diferentes regimes. Não obstante, são freqüentes as análises de questão
previdenciária sobre quesitos eminentemente financeiros, em especial a
proporção do gasto previdenciário diante do produto interno bruto do país,
como se a questão econômica fosse a única envolvida.
Países com antiga tradição de seguro social, como o Brasil,
encontram, como era de se esperar, grande dificuldade em migrar para um
sistema capitalizado e individual de previdência, especialmente devido ao
encargo das gerações passadas, sendo por isso impossível aplica-se as
teorias tão conhecidas do Banco Mundial. Ademais, tal migração não
condiz com benefícios cujo evento determinante seja imprevisível, como
doenças e acidentes, os quais demandam um grau de solidariedade maior
do sistema.
Pela experiência internacional, percebe-se que reformas bem-
sucedidas em contenção de gastos se originam a partir de cópias de
modelos adotados alhures, mas sim dentro das possibilidades políticas
existentes, de acordo com o consenso formado. Este consenso pode ser
alcançado por meio de comissão de reforma, como feito nos EUA (1983),
Alemanha (1992) e Suécia (1990), entre outros – permitindo-se o debate
técnico e não meramente político da reforma. Esta é uma das questões
usualmente mal-abordadas nos debates pátrios sobre previdência social,
pois qualquer formação previdenciária duradora carece de um consenso
formado democraticamente, de modo a legitimá-lo.
Em resumo, na concepção atualmente dominante, pode-se
vislumbrar a previdência social como um seguro sui generis, pois impõe, em
regra, a filiação compulsória, além de possuir natureza coletiva e
contributiva, equilibrada do ponto de vista financeiro e atuarial,
amparando seus beneficiários conta as necessidades sociais, mediante a
repartição dos riscos dentro do grupo de segurados, em uma sistemática de
solidariedade forçada.
A previdência social, na acepção bismarkiana, tem uma evidente
correlação com a técnica do seguro, pois cabe ao interessado, em regra,
efetuar o pagamento do prêmio à asseguradora visando eventual
indenização. Evidentemente, o seguro social apresenta algumas
especialidades, como a cotização forçada e a existência de riscos previsíveis
(e.g., idade avançada) dentre as necessidades sociais cobertas.
Ao que tudo indica, o modelo bismarkiano temperado, com
amplitude de cobertura, mais fiel respeito aos preceitos atuariais ganhará o
embate mundial. Especialmente no Brasil, este parece o caminho natural,
pois nosso sistema já é, preponderantemente, bismarkiano.

7. EVOLUÇÃO HISTÓRICA
A evolução da proteção social no Brasil seguiu a mesma lógica do
plano internacional: origem privada e voluntária, formação dos primeiros
planos mutualistas e a intervenção cada vez maior do Estado.
Como exemplos mais antigos da proteção social brasileira, temos as
“santas casas” (1543), atuantes no segmento assistencial, e o montepio
para a guarda pessoal de D. João VI (1808).
Nesta mesma época, em 1795, também foi criado o Plano de
Benefícios dos Órfãos e Viúvas dos Oficiais da Marinha.
Ainda dentro do período mutualista anterior a lei alemã, é digno de
menção a criação do MONGERAL – Montepio Geral dos Servidores do
estado, em 1835.
Este movimento mutualista, que proporcionou a criação dos
montepios abertos, com ingresso franqueado a qualquer pessoa e sem fins
lucrativos, em nada se confunde com as companhias de seguro, as quais,
posteriormente, passaram também a atuar em ramo previdenciário, em
geral visando o lucro. Os mútuos, no Brasil, desde a colônia, seguiram a
tradição portuguesa das Misericórdias, sob influência de D. Leonor de
Lencastre, Rainha viúva de D. João II.
Como aponta Wagner Balera, a assistência social nasce da ajuda
mútua, inicialmente, e posteriormente com a ação do Estado. No primeiro
caso, reúne integrantes que conjugam alguma afinidade profissional,
religiosa ou mesmo geográfica, enquanto no segundo, denominamos
Socorros Mútuos pela Constituição Imperial de 1824, de acordo com a
expressão tradicional da Revolução Francesa, desenvolvem-se até o final do
século XIX.
Daí surgiram os famosos Socorros Mútuos, que se proliferam no
Brasil como o Socorro Mútuo do Marquês de Pombal, criado pelo Decreto
nº 8.504, de 29 de abril de 1882, visando, entre outras funções, a beneficiar
seus sócios, quando enfermos ou necessitados (art. 1º, § 2º), mediante o
pagamento da mensalidade fixada. Em 1875, foi criado um Socorro Mútuo
chamado Previdência (Decreto nº 5.853, de 16 de janeiro de 1875). Curioso
também o Socorro Mútuo Vasco da Gama, criado no Rio de Janeiro pelo
Decreto nº 8.361, de 31 de dezembro de 1881.
Após a criação do MONGERAL, o Decreto nº 9.912, de 26 de março
de 1888, que previa o monopólio estatal dos Correios, regulou o direito à
aposentadoria dos seus empregados, por idade ou invalidez. Na primeira
opção, deveria o empregado possuir 30 anos de efetivo serviço e idade
mínima de 60 anos (art. 195).
Em 1882, sob influência dos militares, é instituída, para os operários
do Arsenal da Marinha, a aposentadoria por idade ou invalidez, alem de
pensão por morte (Decreto nº 127, de 29 de novembro de 1892). Esse
movimento irá resultar na criação do Seguro de Acidentes de Trabalho, em
1919, como se verá.
A Constituição de 1981 foi a primeira a conter expressão
“aposentadoria”, q qual era concedida a funcionários públicos, em caso de
invalidez. Os demais trabalhadores não possuíam qualquer proteção.
Este dispositivo é bastante emblemático, pois ajuda a entender o
tratamento diferenciado dado à previdência social dos servidores e
militares. Para tais pessoas, a regra sempre foi a concessão de benefícios
custados, integralmente, pelo Estado, enquanto a previdência social dos
trabalhadores em geral, criada posteriormente, já possuía a natureza
contributiva desde sua gênese. Tal diferença, comum em diversos países
mundo afora, explica o fato de, no Brasil, ainda termos um regime
previdenciário segregado para servidores (RPPS), muito embora a
Constituição já preveja, também, sua natureza contributiva.
O Decreto-legislativo nº 3.724/19 criou o seguro de acidentes de
trabalho no Brasil. Era incumbência do empregador, o qual deveria custear
indenização para seus empregados, em caso de acidentes. Determinava o
Decreto que o acidente de trabalho obrigava o empregador a pagar uma
indenização ao operário ou à sua família. Eram excetuados apenas os casos
de força maior ou dolo da própria vitima ou de estranhos (art. 2º). A
sistemática era precária, já que não se assegurava o pagamento de
quantias mensais, mas sim um valor único de indenização, que variava de
acordo com o resultado do evento, desde incapacidade temporária até a
morte. Ainda sob a égide da Constituição de 1891 foi editada a Lei Eloy
Chaves (Decreto-legislativo nº 4.682, de 24/01/1923).

REGIME GERAL DE PREVIDÊNCIA SOCIAL

1. CONCEITO
O Regime Geral de Previdência Social – RGPS é previsto no art. 9º da
Lei nº 8.213/91 e no art. 6º do Regulamento da Previdência Social,
aprovado pelo Decreto nº 3.048/99. Compõe, junto com os regimes
próprios de previdência social dos servidores públicos e militares, e o
sistema complementar, a previdência social brasileira.
O RGPS visa a atender os beneficiários em todas as situações
previstas no art. 1º da mesma lei, a qual reza:
______
a Previdência Social, mediantes contribuição, tem por fim
assegurar aos seus beneficiários meios indispensáveis de
manutenção, por motivo de incapacidade, desemprego
involuntário, idade avançada, tempo de serviço, encargos
familiares e prisão ou morte daqueles de quem dependiam
economicamente. ______
O mesmo dispositivo legal exclui o desemprego involuntário do
amparo previdenciário. Tecnicamente, o seguro-desemprego seria uma
espécie de beneficio previdenciário, pois, como todo beneficio securitário,
visa a providenciar o sustento do segurado e de sua família, quando
atingidos pelos riscos sociais, como o desemprego (art. 201, III, CRFB/88).
Entretanto, este benefício, atualmente, não tem vinculação
previdenciária, pois excluído expressamente por lei, sendo atualmente de
incumbência do Ministério do Trabalho, o qual disponibiliza o seguro com
recursos do Fundo de Amparo ao Trabalhador – FAT, tendo este como
principal fonte de receita as contribuições para o PIS/PASEP.
O RGPS é administrado por uma autarquia federal, componente da
Administração Indireta federal, denominada Instituto Nacional do Seguro
Social, oriundo da fusão do IAPAS com o INPS, como se pôde observar no
capítulo referente ao histórico da previdência social.
Na condição de autarquia, o INSS é dotado de personalidade jurídica
de direito público, vinculada ao Ministério da Previdência Social – MPS. A
priori, o INSS tem como incumbência precípua a organização da previdência
social, ficando de fora a assistência social e a saúde.
Entretanto, por questões de ordem prática, ainda que atualmente
as ações de previdência e assistência social não estejam vinculadas ao
mesmo ministério, é comum observar-se o INSS administrando prestações
de natureza assistencial, como o benefício de prestação continuada, no
valor de um salário-mínimo.
O RGPS é o regime básico de previdência social, sendo de aplicação
compulsória a todos aqueles que exerçam algum tipo de atividade
remunerada, exceto se esta atividade já gera filiação a determinado regime
próprio de previdência.

2. BENEFICIÁRIOS DO REGIME GERAL DE PREVIDÊNCIA SOCIAL


Os beneficiários do RGPS são as pessoas naturais que fazem jus ao
recebimento de prestações previdenciárias, no caso de serem atingidas por
algum dos riscos sociais previstos em lei. As prestações previdenciárias
subdividem-se em benefícios, com conteúdo pecuniário, e os serviços, hoje
restritos a habilitação e reabilitação profissional e ao serviço social.
Ou seja, os benefícios são uma obrigação de dar do INSS, enquanto
as prestações revelam uma obrigação de fazer.
Desta forma, são beneficiários do RGPS os segurados da previdência
social (obrigatórios e facultativos) e seus dependentes.
Os segurados obrigatórios são aqueles filiados ao sistema de modo
compulsório, a partir do momento em que exerçam atividade remunerada.
Já os segurados facultativos são os que, apesar de não exercerem atividade
remunerada, desejam integrar o sistema previdenciário.

3. FILIAÇÃO E INSCRIÇÃO
3.1. Filiação
Também justifica-se a compulsoriedade do sistema como forma de
proteção aos trabalhadores mais precavidos, os quais, apesar de terem
providenciado sua proteção, serão indiretamente responsáveis pelo custeio
dos benefícios assistenciais concedidos aos demais, já que custados
mediante cobrança de toda a sociedade. O fundamento normativo é
encontrado no art. 201, caput, da Constituição.
Daí surge a relevância da filiação, que é o vínculo jurídico que se
estabelece entre o segurado e o RGPS. Decorre automaticamente a
atividade remunerada, ou seja, no momento em que uma pessoa iniciar o
exercício de alguma atividade remunerada, ipso facto, estará filiada à
previdência social (ver arts. 5º e 9º, § 12º, do RPS).
Cabe ressaltar que o inicio da atividade remunerada não coincide,
necessariamente, com o efetivo começo de trabalho, mas sim quando está
pactuada a prestação de serviços, ainda que iniciada em outro momento ou
o pagamento seja em outra data. Assim, por exemplo, para o empregado, a
conformação da contratação pelo empregador já efetiva a filiação ao RGPS.
Mesmo que o trabalhador venha a desconhecer esta situação, ou
seja contrário a ela, nada poderá ser feito. Não interessa se o trabalhador já
é aposentado ou se já exerce outra atividade que o vincule a regime
previdenciário distinto, como um servidor. É também irrelevante a
nacionalidade do trabalhador, pois se exerce atividade remunerada em
território nacional, em regra, estará filiado ao RGPS (salvo algum tipo de
Acordo Internacional que o exclua).
Ressalta-se que a atividade exercida deve ser lícita, isto é, o trabalho
em atividades ilegais, como o tráfico de drogas, evidentemente não gera
qualquer vínculo coma previdência social. Todavia, não se deve confundir
esta situação com o trabalho proibido, vedado por lei em virtude de certas
características, mas sem ilegalidade na atividade em si considerada. Por
exemplo, menores de 18 anos laborando em atividades insalubres, em
evidente desrespeito a Constituição (art. XXXIII, da CRFB/88_. Nestas
situações, ainda que a atividade seja proibida, não poderia o trabalhador
ser prejudicado pela irregularidade de seu empregador, cabendo aí a
aplicação de todas as normas previdenciárias, incluindo a filiação
automática.
Mas qual a conseqüência da filiação compulsória ao RGPS? Como
este sistema é necessariamente contributivo (art. 201, caput, CRFB/88),
aquele que está filiado ao RGPS deve, obrigatoriamente, verter
contribuições ao sistema, as quais deverão ser pagas, em regra,
mensalmente.
Cabe lembrar também que o regime de financiamento da
previdência social brasileira, de modo geral, é de repartição simples, o que
justifica a cobrança de contribuição de aposentados que retornem ao
trabalho, pois estes valores serão utilizados no pagamento de benefícios de
todo o universo de beneficiários, não somente daquele que contribuiu.
Não se está aqui a justificar a cobrança de contribuição do
aposentado, quando não exercente de qualquer atividade remunerada.
Caso a pessoa já tenha obtido a aposentação e não venha labiorar em
nenhum momento, não há razão técnica para a cobrança da contribuição,
que se traduz em verdadeiro meio indireto de reduzir o beneficio pago.
Excepcionalmente, a filiação pode ser de natureza voluntaria, o que
ocorre para o segurado facultativo, quando este vem efetuar o seu
primeiro recolhimento após a feitura de sua inscrição.
Apesar de afiliação ser vínculo jurídico, pode ser esta múltipla. Caso
o segurado venha exercer mais de uma atividade remunerada vinculante ao
RGPS, será este trabalhador filiado em relação a cada uma delas 9art. 12, §
2º, da Lei nº 8.212/91). Tal regra existe para justificar situações específicas,
como a do trabalhador que se enquadra em tipos distintos de segurado
obrigatório e, por conseguinte, faz jus a benefícios diversos ou excluídos de
uma atividade. Nestas condições, o direito ao benefício poderá existir em
razão de uma atividade, excluída a outra.
O dirigente sindical mantém, durante o exercício do mandato
eletivo, o mesmo enquadramento no Regime Geral de Previdência Social de
antes da investidura (art. 11, § 4º, da Lei nº 8.213/91). Excepcionalmente, o
trabalhador que venha exercer cargo de direção em sindicato manterá a
mesma filiação anterior. Por exemplo: um empregado que seja escolhido
por seus pares como dirigente sindical continuará sendo, para efeitos
previdenciários, segurado empregado.
Esta regra excepcional de manutenção da condição anterior à
investidura no mandato eletivo sindical vale até para o segurado especial o
qual, em regra, não pode exercer outra atividade distinta da produção
rural, sob pena de perder o enquadramento previdenciário nesta condição.
Por fim, a própria nacionalidade do trabalhador, salvo exceções
previstas em lei, não tem relevância para efeitos de filiação. Isto é, pessoa
natural que exerça atividade remunerada em território nacional é
automaticamente vinculada ao RGPS, na qualidade de segurado
obrigatório. Excepcionalmente, como se verá, a lei exclui alguns
estrangeiros da proteção previdenciária e, em outras situações, estende o
manto previdenciário a brasileiros que trabalham no exterior.
Para se ter uma idéia da amplitude da proteção previdenciária
brasileira, até o apátrida (toda pessoa que não seja considerada seu
nacional por nenhum Estado), desde que laborando em território nacional,
goza de proteção previdenciária (art. 24 da Convenção sobre o Estatuto dos
Apátridas, 1954, aprovada pelo Decreto Legislativo nº 38, de 5 de abril de
1995, e promulgada pelo Decreto nº 4.246, de 22 de maio de 2002).
Obviamente, caso um estrangeiro venha prestar serviço em
território nacional, por conta de empresa também estrangeira, recebendo
sua remuneração no exterior, não havia qualquer vinculação ao RGPS, pois
se trata de dador de serviços que não exerce atividade remunerada
vinculante ao regime geral, já que a atividade é, em verdade, equivalente à
desenvolvida no exterior, sendo que eventual materialização em território
nacional, devido a alguma contingência, não muda esta cenário. Porem, se
o estrangeiro é remunerado por empresa brasileira, há de pronto a
incidência da lei, tornando-se o mesmo segurado obrigatório do RGPS e
sendo as contribuições previstas em lei devidas ao INSS.
O Decreto nº 6.722/08 dá nova redação ao art. 20 do RPS, mas
continua a afirmar que a afiliação à previdência social decorre
automaticamente do exercício de atividade remunerada para os segurados
obrigatórios e da inscrição formalizada com o pagamento da primeira
contribuição para o segurado facultativo.
Todavia, traz uma pretensa exceção, com relação ao trabalhador
rural contratado por produtor rural pessoa física por prazo de até dois
meses dentro do período de um ano, como autorizado pela Lei nº
11.718/08. Nesta hipótese, diz o art. 20, § 2º, que a filiação decorreria,
automaticamente, de sua inclusão na GFIP, mediante identificação
especifica. Não vejo o menor amparo legal para esta ressalva, que é
flagrantemente contraditória frente ao dispositivo geral do caput.
As regras de inscrição permanecem e, caso um empresa deixe de
inscrever o segurado que lhe presta serviço, estará sujeita à multa de R$
1.329,18 por segurado não inscrito (art. 283, § 2º, RPS).
O art. 239-A do RPS prevê que o Ministério da Previdência Social
desenvolverá e manterá programa de cadastramento dos segurados
especiais, podendo para tanto firmar convenio com órgãos federais,
estaduais ou do Distrito Federal e dos municípios, bem como com
entidades de classe, em especial as respectivas confederações ou
federações. O MPS também disciplinará a forma de manutenção e de
atualização do cadastro, observada a periodicidade anual a contar do ano
seguinte ao do efetivo cadastramento dos segurados especiais.
As informações contidas no cadastro não dispensam a apresentação
de carteira de trabalho ou contrato individual de trabalho, exceto as que
forem obtidas e acolhidas pela previdência social diretamente de banco de
dados disponibilizados por órgãos do Poder Público. Da criação deste
cadastro não poderá resultar nenhum ônus para os segurados, sejam eles
filiados ou não às entidades conveniadas.

3.2. Inscrição
Já a inscrição é um ato meramente formal, pelo qual o segurado
fornece dados necessários para sua edificação à autarquia previdenciária
(art. 18 do RPS). Em feral, a filiação ocorre primeiro, sendo a inscrição
posterior. A exceção é o segurado facultativo, cuja inscrição ocorre antes
da filiação (art. 20 do RPS). Para os segurados obrigatórios, contudo, a
inscrição pressupõe a filiação. Aquela sem esta não produz qualquer efeito
perante a previdência social.
É interessante observar que, na pratica, a inscrição acaba por
assumir maio relevância que a filiação, pois esta é, em geral desconhecida
da autarquia previdenciária, enquanto a inscrição fica registrada em seus
cadastros, dando a equivocada impressão do ato formal como gerador de
direitos e deveres dos segurados.
Como regra, cabe ao Regulamento da Previdência Social disciplinar a
forma de inscrição do segurado e dos dependentes (art. 17 da Lei nº
8.213/91), cabendo ao dependente proceder a sua inscrição quando da
solicitação do benefício.
A lei prevê que o cancelamento da inscrição do cônjuge processa-se
em face d separação judicial ou divórcio sem direito a alimentos, certidão
de anulação de casamento, certidão de óbito ou sentença judicial,
transitada em julgado (art. 17, § 2º, da Lei nº 8.213/91). A redação esta
desatualizada, pois trata da matéria como se o segurado ainda fizesse a
inscrição de seus dependentes, situação que mudou com a Lei nº
10.403/02. De qualquer forma, ainda é válido o dispositivo, ao dispor que
somente a separação ou o divorcio sem alimentos exclui a condição de
dependente do ex-consorte.
Define o RPS que inscrição do segurado para os efeitos da
previdência social é o ato pelo qual o segurado é cadastrado no Regime
Geral da Previdência Social, mediante comprovação dos dados pessoais e
de outros elementos necessários e úteis à sua caracterização, na forma do
art. 18 do RPS, com redação dada pelo Decreto nº 3.265, de 29/11/99:
I- empregado e trabalhador avulso – pelo preenchimento dos
documentos que os habilitem ao exercício da atividade, formalizado
pelo contrato de trabalho, no caso de empregado, e pelo
cadastramento e registro no sindicato ou órgão gestor de mão-de-
obra, no caso de trabalhador avulso;
II- empregado doméstico – pela apresentação de documento que
comprove a existência de contrato de trabalho;
III- contribuinte individual – pela apresentação de documento que
caracterize a sua condição ou o exercício de atividade profissional,
liberal ou não;
IV- segurado especial – pela apresentação de documento que
comprove o exercício de atividade rural; e
V- facultativo – pela apresentação de documento de identidade e
declaração expressa de que não exerce atividade que o enquadre na
categoria de segurado obrigatório.
Como regra, a inscrição dos segurados empregados é feita
diretamente na empresa e no sindicato ou órgão gestor de mão-de-obra
para os segurados avulsos. Obviamente, caso aquela não seja realizada pela
empresa, poderá ser feita pelo próprio segurado, desde que comprove o
exercício da atividade, como, por exemplo, o registro na carteira de
trabalho.
Atualmente, a inscrição dos empregados e avulsos é feita quase que
simultaneamente com a inscrição no Fundo de Garantia por Tempo de
Serviço – FGTS, na qual o trabalhador recebe a numeração de seu PIS. Esta
mesma codificação é remetida à DATAPREV, responsável pela manutenção
e operação do CNIS – Cadastro Nacional de Informações Sociais, onde será
feito o registro deste trabalhador.
Estas informações são prestadas pelas empresas ano INSS por meio
da Guia de Recolhimento do FGTS e Informações à Previdência Social –
GFIP, a qual atende a demanda previdenciária por informações de todos os
segurados da previdência social, objeto de maiores considerações quando
do estudo das obrigações acessórias previdenciárias.
Todos os demais segurados da previdência social, incluindo o
facultativo, realizam sua inscrição perante o INSS, o que pode ser feito
atualmente até pela internet (www.previdenciasocial.gov.br). Embora o
RPS fale em apresentação de alguns documentos para a inscrição, estes
são, na prática, dispensados, pois a inscrição sem atividade remunerada
não gera efeitos.
Excepcionalmente, pode ser obrigação da empresa realizar a
inscrição dos contribuintes individuais que venha a contratar. Isto ocorre
quando a empresa utiliza-se de segurado não inscrito. Nesta hipótese,
caberá a esta a feitura da inscrição, até mesmo para viabilizar a declaração
deste segurado na GFIP. A mesma hipótese existe para a cooperativa de
trabalho, em razão de seus cooperados (art. 4º, Lei nº 10.666/03)
Caso a pessoa venha inscrever-se e contribuir como segurado
obrigatório, sem realizar qualquer atividade remunerada, bastará ao INSS
mudar seu enquadramento para segurado facultativo, sem maiores
prejuízos para o segurado.
Também com relação à inscrição previdenciária, dispõe o
Regulamento do imposto de Renda que as pessoas físicas inscritas como
contribuintes individuais ou requerentes de benefícios de qualquer espécie
no INSS estão obrigadas a inscrever-se no Cadastro de Pessoas Físicas –
CPF, junto à Receita Federal do Brasil (art. 33 do Decreto nº 3.000/99).
Assim como na filiação, o segurado que exercer,
concomitantemente, mais de uma atividade remunerada, sujeita ao Regime
Geral de Previdência Social, será obrigatoriamente inscrito em relação a
cada uma delas (art. 18, § 3º do RPS). Este procedimento é relevante para o
INSS, já que permite verificar, em caso de algum infortúnio, a incapacidade
para uma, algumas ou todas as atividades exercidas pelo segurado.
Sem embargo, na prática previdenciária, o INSS não fornece nova
inscrição ao segurado, determinando a continuidade de recolhimento no
número cadastral já existente. Embora este procedimento vise ao saudável
controle de inscrições concedidas, evitando-se duplicidades indevidas, a
autarquia previdenciária deveria, ao menos, proceder alteração cadastral
do segurado, de modo a evidenciar a dupla filiação.
A legislação previdenciária, de modo indevido, restringe a idade
mínima de inscrição aos 16 anos, de modo generalizado, olvidando-se do
menos aprendiz (art. 18, § 2º, do RPS).
O incremento de idade para filiação do RGPS segue ditame
constitucional, alterado pela EC nº 20/98, a qual aumentou a idade mínima
de trabalho do menor de 14 para 16 anos (art. 7º, XXXIII, da CRFB/88),
ignorando totalmente a realidade brasileira e pondo fim a diversos
programas sociais e profissionalizantes direcionados a menores carentes,
os quais ficaram abandonados à própria sorte. Realmente, imaginar que um
adolescente oriundo de família pobre do interior possa ficar excluído do
trabalho até os 16 anos é idéia somente compatível com quem vive em
mundo diverso, talvez embevecido pela fantasia do poder e cego ao dia a
dia de nosso povo.
De qualquer forma, a limitação à idade de 16 anos é indevida, por
causa do menor aprendiz, que começa seu labor aos 14 anos e tem
assegurados seus direitos trabalhistas e previdenciários (art. 65 do Estatuto
da Criança e do Adolescente – Lei nº 8.069/90). Neste caso, deve ser
enquadrado como segurado empregado. Importante também notar que
menos aprendiz, com o advento da Lei nº 11.180/05, dando nova redação
ao art. 428 da CLT, poderá permanecer nesta condição até os 24 anos, ou
mesmo sem limite de idade, se portador de deficiência.
Já para os demais segurados, inclusive o facultativo, vale a restrição:
estes somente podem filiar-se, e conseqüentemente inscrever-se no RGPS,
com 16 anos.
Questão relevante diz respeito ao menor que, em desrespeito ao
limite mínimo etário para o trabalho, exerceu atividade remunerada,
principalmente quando sob a conta de outrem. Nestas situações, o INSS
usualmente indefere a contagem do período, alegando a vedação
constitucional ao trabalho.
Acredito que tal conduta não seja adequada, pois, em matéria
trabalhista, a nulidade raramente será aplicada, já que impossível retorno
das partes ao status quo ante, haja vista o tempo, despendido pelo obreiro,
não ter mais retorno.
Em tais situações, é indiscutível a necessidade do pagamento dos
estipêndios devidos, e, mais ainda, a contagem do respectivo tempo para
efeitos previdenciários, com recolhimento das contribuições devidas, sob
pena de empreendedor que agiu ilegalmente beneficiar-se a partir de sua
própria ilicitude. Da mesma forma, já decidiu o STF(AI 529694/RS, Rel.
Gilmar Mendes, 15/02/2005).

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