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INSTITUTO POLITÉCNICO DE VISEU

DE
ESCOLA SUPERIOR DE TECNOLOGIA
Departamento de Engenharia Civil

ENGENHARIA DE TRÁFEGO

O SISTEMA PEDONAL

António Miguel Costa Baptista


António Luís Pimentel Vasconcelos

Janeiro de 2005
1 INTRODUÇÃO

1.1 Nota introdutória

No presente texto são definidos os conceitos e os procedimentos envolvidos na


concepção dos vários elementos do Sistema Pedonal. Em alguns assuntos, o seu
conteúdo segue de muito perto o documento elaborado por SECO [1] sobre o mesmo
tema.

Nesta primeira secção de introdução abordam-se as necessidades gerais de mobilidade,


estabelecem-se os principais objectivos de concepção e gestão do sistema pedonal e
descrevem-se os seus principais elementos.

Na segunda secção apresentam-se as principais características do modo pedonal,


definindo as grandezas básicas e suas relações e ainda o conceito de nível de serviço
aplicável a peões em movimento ou parados.

A concepção dos trajectos formais, sejam passeios ou ruas pedonais, e dos


atravessamentos pedonais, é tratada, respectivamente, nas terceira e quarta secções do
texto.

1.2 Necessidades gerais de mobilidade

Qualquer deslocação engloba sempre uma componente pedonal que poderá realizar-se
no seu início, meio ou fim. As deslocações são uma consequência das necessidades
gerais de mobilidade de pessoas ou bens, as quais são geradas pelas diversas actividades
económicas, sociais e de lazer.

As deslocações pedonais, particularmente as de curta distância, representam uma parte


não desprezável do total de viagens e deverão ser asseguradas pela infra-estrutura
pedonal. Além disso, há que garantir também um espaço vital mínimo que permita a
realização de todo um outro conjunto de actividades sociais e de lazer e que não
implicam necessariamente deslocações.

1.3 Objectivos e princípios de concepção e gestão da infra-estrutura pedonal

Nas áreas urbanas, torna-se imprescindível desenvolver, implementar e gerir um sistema


infra-estrutura coerente, que englobe as necessidades gerais de mobilidade já referidas e
que, na medida do possível, permita alcançar os objectivos gerais de segurança, rapidez
e comodidade.

As intervenções devem respeitar alguns princípios metodológicos base, a saber:

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ƒ procurar a segregação máxima possível entre os sistemas viário e pedonal, o que
garante melhores condições de segurança e poderá assegurar mais rapidez e
comodidade;
ƒ assegurar uma interligação coerente da infra-estrutura pedonal com a
hierarquização viária e de cruzamentos. Como normalmente não é possível, nem
tão pouco racional, atingir uma segregação total, há que definir o nível de
prioridade relativa a atribuir, em cada caso, a cada sistema. As soluções a usar
deverão ser o mais normalizadas possível;
ƒ garantir a melhor interligação possível com outros modos de transporte e, entre
eles, prestando particular atenção à ligação aos transportes colectivos urbanos;
ƒ evitar soluções que conduzam a percursos pedonais extensos, na medida em que
a distância de percurso é um factor que condiciona a obtenção de bons níveis de
comodidade e de rapidez;
ƒ nas soluções projectadas dar particular importância às necessidades dos utentes
mais desfavorecidos (idosos, crianças e deficientes).

1.4 Principais elementos do sistema pedonal

As necessidades de mobilidade e de vivência pedonal devem ser garantidas em todo a


infra-estrutura pedonal e cujos elementos fundamentais se resumem a:

ƒ atravessamentos pedonais da rede viária urbana;


ƒ espaços reservados unicamente a peões (passeios, zonas pedonais);
ƒ zonas de interface modal (peão/transportes colectivos (TC); TC/TC;
peão/Automóvel).
Os atravessamentos da rede viária, por serem mais frequentes e por estarem na origem
de alguns problemas de segurança e de desempenho do sistema viário, devem ser
estudados com particular cuidado.

Nestes casos, importa definir os níveis de prioridade relativa, a atribuir aos sistemas
rodoviário e pedonal, em função da hierarquização viária e de cruzamentos. Convém
ainda destacar que os peões são os utentes mais vulneráveis do sistema de transportes,
pelo que a sua presença deverá constituir sempre uma preocupação de base.

Nos espaços reservados exclusivamente a peões, e em particular nos passeios, os


principais objectivos a atingir são a garantia de níveis mínimos de qualidade de
circulação e de conforto, os quais dependem principalmente dos fluxos de peões.

A qualidade de circulação é medida com base em critérios de mobilidade (velocidade de


circulação) e o conforto a partir da densidade de ocupação do espaço. Importa salientar
que estes espaços são partilhados por diversos tipos de utilizadores e com diferentes

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motivos e necessidades de deslocação (casa/trabalho, compras, lazer, convívio, etc.) e
que deverão ter-se em consideração.

Em ruas e zonas pedonais os problemas de mobilidade assumem, regra geral, um papel


secundário, passando para primeiro plano a resolução de problemas de segurança
pessoal e a adequação do espaço a outras actividades sociais e de lazer características de
um espaço urbano.

No entanto existem zonas parcialmente pedonais (ruas mistas), partilhadas por


transportes colectivos, veículos de residentes e de carga/descarga, onde a segurança
rodoviária poderá assumir uma importância significativa.

Algumas zonas de interface modal, como sejam aeroportos, gares de caminho de ferro e
estações de metro, podem assumir grande complexidade, pelo que os objectivos gerais
de segurança, rapidez e comodidade, devem ser os orientadores da estratégia de gestão
adoptada. Algumas das técnicas usadas nestes casos são comuns às usadas nos outros
espaços pedonais. Quanto às restantes não se enquadram no âmbito do presente texto.

2 CARACTERIZAÇÃO DO MODO PEDONAL

2.1 Necessidade de um espaço vital por peão

A concepção da infra-estrutura pedonal obriga ao conhecimento das características


físicas, de mobilidade e de comportamento do peão enquanto ser humano. Qualquer
peão, esteja parado ou em movimento, ocupa um espaço em cada instante. Por exemplo
trajectos com 75 cm de largura, por peão, são considerados necessários para que dois
peões de possam cruzar sem interferência mútua. Já duas pessoas que se conheçam e
que se desloquem lado a lado, e onde seja aceitável algum contacto físico ocasional,
poderão ocupar apenas 60 cm.

O corpo de um homem adulto, visto em planta (Figura 1), ocupa uma área aproximada
de 0,14 m2 (AUSTROADS, [2]). No entanto, para efeito de capacidade, considera-se
uma elipse de 0,46 m × 0,61 m equivalente a uma área de 0,21 m2.

Figura 1: Dimensões do corpo humano

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2.2 A velocidade de circulação

O peão desloca-se livremente com uma determinada velocidade, que pode oscilar entre
um mínimo de 0,74 m/s e um máximo de 2,39 m/s [2]. Esta grande variação deve-se a
um conjunto vasto de factores, uns intrínsecos ao próprio peão (idade, deficiências
físicas, sexo) e outros exteriores como sejam a hora do dia, o estado do tempo, o motivo
da viagem (casa-trabalho, lazer, etc), o tipo e características da infra-estrutura (passeio,
atravessamento viário ou zona pedonal) e a densidade pedonal (circulação livre,
condicionada ou congestionada).

Para a velocidade de circulação livre, de uma população normal, podem tomar-se como
referência os seguintes valores [1]:

V15 = 1,00 m/s = 3,6 km/h;


Vmed = 1,25 m/s = 4,5 km/h;
V85 = 1,50 m/s = 5,4 km/h.

A título de exemplo, no dimensionamento de atravessamentos pedonais regulados por


sinalização luminosa, simples ou integrados num cruzamento semaforizado, o tempo de
verde atribuído à fase do peão é calculado para uma velocidade de 1,20 m/s. Em
Portugal vigora o D.L. 123/97 de 22 de Maio que impõe que “o sinal verde para peões,
nos semáforos, deve estar aberto o tempo suficiente para permitir a travessia com
segurança, a uma velocidade de 2m/5s”.

2.3 Grandezas base e suas relações

Um movimento pedonal é caracterizado pelas seguintes grandezas base:

- velocidade de circulação, V, expressa em m/min;


- fluxo pedonal, P, quantificado em peões/m/min;
- densidade pedonal, D, expressa em peões/m2.

Nos movimentos de peões, tal como nos de veículos, também é possível relacionar as
variáveis acima referidas através da expressão (1) onde as grandezas têm o significado
referido e são expressas nas unidades base.

P=V×D (1)

Em vez da densidade, recorre-se habitualmente à noção de espaço disponível por peão e


que é o inverso da densidade. Assim o espaço, S, expresso em m2/peão, é dado por:

S=1/D (2)

Substituindo (2) em (1) obtém-se:

5
P=V/S (3)

Ou, sendo a velocidade indicada em m/s,

P = 60 × V / S (4)

Por exemplo, uma velocidade de 1,25 m/s e um espaço de 1,5 m2/peão (densidade de
0,67 peão/m2), correspondem a um fluxo de 50 peões/min/m. Na Figura 2 apresenta-se
a relação típica entre espaço (S) e fluxo pedonal (P).

Fluxo
(Peões/min/m)
100
80
60
40
20
0
0,0 0,5 1,0 1,5 2,0 2,5 3,0 3,5 4,0 4,5 5,0 5,5
Espaço (m2/peão)

Figura 2: Relação Espaço/Fluxo Pedonal (adaptado de [2])

A capacidade máxima é da ordem dos 82 a 85 peões/min/m e é atingida para uma


velocidade média de circulação condicionada da ordem dos 0,70 m/s e a um espaço de
0,5 m2/peão, ou seja uma densidade de 2,0 peão/m2. O congestionamento total,
velocidade e fluxo nulos é atingido para um espaço da ordem dos 0,25 m2/peão, o que
corresponde, grosso modo, ao espaço ocupado por um ser humano adulto.

A relação espaço/velocidade é apresentada na Figura 3. Como se pode verificar à


medida que o espaço aumenta a velocidade média de circulação também aumenta, mas a
relação não é linear.

1,50
1,25
Velocidade 1,00
(m/s) 0,75
0,50
0,25
0,00
0,0 0,5 1,0 1,5 2,0 2,5 3,0 3,5 4,0 4,5 5,0 5,5
Espaço (m2/peão)

Figura 3: Relação Espaço/Velocidade (adaptado de [2])

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2.4 Conceito de nível de serviço

De modo a caracterizar a qualidade do serviço oferecido ao peão, quer este se encontre


em circulação ou parado foi definida uma classificação por níveis de serviço.

No caso de peões em movimento, os critérios gerais de avaliação são a liberdade de


escolha da velocidade de circulação, a facilidade de ultrapassar e o grau de ocorrência
de conflitos com outros peões. Estes critérios estão directamente relacionados com os
valores das grandezas base referidas em 2.3: espaço, fluxo e velocidade média de
circulação.

Também no caso de peões parados, é possível identificar um conjunto de níveis de


conforto/qualidade de serviço que dependem principalmente do espaço disponível por
peão.

2.4.1 Níveis de serviço para peões em movimento

A definição dos níveis de serviço será sempre algo subjectiva, particularmente no que
diz respeito aos valores dos fluxos que definem as diversas fronteiras. No entanto, a sua
escolha criteriosa com base na análise das relações fundamentais referidas, permite criar
uma escala de aplicação útil na avaliação da qualidade de funcionamento da infra-
estrutura pedonal.

A escala adoptada, indicada na Tabela 1, considera os habituais seis níveis de serviço A,


B, C, D, E e F. O primeiro corresponde a uma óptima qualidade de serviço,
normalmente não justificável do ponto de vista de uma análise custo/benefício, e o F a
um funcionamento muito deficiente e também indesejável mesmo do ponto de vista da
capacidade.

Os parâmetros de referência, usados na definição das fronteiras entre níveis, foram os


níveis de capacidade, possibilidade de escolha da velocidade pretendida, possibilidade
de “atravessar” a corrente pedonal e o grau de conflito entre o movimento principal e o
secundário em direcções opostas.

O nível se serviço E caracteriza-se por velocidades baixas e variáveis, e o seu fluxo


limite corresponde à capacidade. Já o nível D é caracterizado por cerca de 2/3 da
capacidade e observam-se densidades que obrigam os peões, mesmo os mais rápidos, a
abrandar. Neste caso todos os peões que tentem atravessar a corrente pedonal entrarão
em conflito com ela. No nível de serviço C cerca de 50% dos atravessamentos estarão
em conflito.

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Tabela 1: Níveis de serviço para peões em movimento (adaptado de [1] e [2])

Restrições ao
movimento
NS (1) (2) (3) Aplicabilidade

A S > 5,6 m2/peão LL LL LL Apenas para onde se


P ≤ 16 peões/min/m pretendem elevados níveis
de conforto e sem restrições
de espaço.

B S > 3,7 – 5,6 m2/peão L L L Nível correspondente a uma


P > 16 – 23 peões/min/m situação de conforto e
desejável em condições
normais.

C S > 2,2 – 3,7 m2/peão L L R Espaços com pontas


P < 23 - 33 peões/min/m frequentes mas não muito
intensas e onde se
pretendem bons níveis de
conforto.

D S > 1,4 – 2,2 m2/peão L R R Aceitável em espaços com


P < 33 - 49 peões/min/m grande fluxos pedonais e
onde existem restrições de
espaço.

E S > 0,8 – 1,4 m2/peão R R/S S Recomendável em casos


P < 49 - 75 peões/min/m com pontas muito intensas e
com possível
congestionamento mas de
curta duração

F S ≤ 0,8 m2/peão S S S Não recomendável para


P: muito variável condições de circulação

(1) Movimento dominante; (2) Movimento não dominante; (3) Movimento de atravessamento; LL -
completamente livre; L - relativamente livre, com poucas restrições; R - com algumas restrições e
incómodas; S - Com severas restrições.

O nível de serviço B corresponde a 1/3 da capacidade e observa-se que, para valores de


densidade superiores ao seu limite máximo (1/3,7), existem peões que terão de
abrandar, começam a haver algumas dificuldades em ultrapassar e surgem alguns
conflitos no atravessamento da corrente pedonal principal.

Abaixo da densidade máxima do nível de serviço A (1/5,6) os peões praticamente não


influenciam as características dos respectivos movimentos.

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2.4.2 Níveis de serviço para peões parados

Na definição dos níveis de serviço para peões parados (Tabela 2), o parâmetro
fundamental é o espaço médio disponível por peão. Além deste considera-se a distância
média entre peões, as possibilidades de contacto entre eles e de circulação no espaço, e
ainda o nível de conforto previsível.

Tabela 2: Níveis de serviço para peões parados (adaptado de [1] e [3])

NS Espaço Dist. entre Contacto Circulação Nível de conforto


(m2/peão) peões (m) entre peões no espaço

A > 1,2 > 1,2 Nenhum Livre Muito elevado

B 0,9 – 1,2 1,0 – 1,2 Nenhum Ligeiramente Elevado


restringida

Restringida e Limite mínimo


C 0,6 – 0,9 0,9 – 1,0 Nenhum mas possível/ com razoável. Aplicável
sem grandes incómodo de por exemplo em
folgas terceiros paragens BUS

Esperas prolongadas
D 0,3 – 0,6 0,6 – 0,9 Com alguma Muito desconfortáveis.
frequência limitada Exemplo: junto a
passad. semaforiz.

Em alguns Só aceitável em
E 0,2 - 0,3 < 0,6 momentos Não possível curtos períodos. Por
para todos os exemplo em
peões elevadores.

Sempre
F < 0,2 - Permanente Não possível extremamente
desconfortável.
Potencial a gerar
pânico em
multidões.

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3 DIMENSIONAMENTO DE PASSEIOS E ZONAS PEDONAIS

3.1 Conceito de largura útil

Na concepção de qualquer espaço pedonal há que procurar adequar a área disponível às


suas diferentes utilizações, sejam elas de circulação, espera ou uma mista das duas,
como sejam a visualização de montras e as conversas em grupo.

Já foram apresentadas duas classificações, baseadas no conceito de nível de serviço, e


que permitem avaliar a adequação da infra-estrutura à densidade pedonal de peões em
movimento ou parados. Nessa análise assumiu-se que todo o espaço considerado estava
inteiramente disponível para a utilização pretendida e que possuía idêntica qualidade.

No entanto, nos passeios e em outros espaços pedonais existem, em maior ou menor


número, variados obstáculos correspondentes a vários tipos de mobiliário urbano e que
impedem, pelo menos localmente, a utilização por parte dos peões da largura total do
trajecto.

Além disso, os peões tenderão a evitar caminhar muito próximo da berma do passeio ou
das paredes dos edifícios, particularmente se nestes existirem montras onde as pessoas
param para apreciarem o que se encontra exposto.

Assim se justifica a introdução do conceito de largura útil dos passeios correspondente


ao espaço efectivamente disponível para as deslocações ou actividades. É com base
neste valor, e não no da largura bruta, que se avaliam os níveis de serviço existentes nos
diversos troços da infra-estrutura (Figura 4).

Importa referir que a existência de um obstáculo isolado, apesar de ter uma influência
localizada, por si só não afecta o funcionamento de todo um passeio ou zona pedonal.
Tal sucede se existir uma repetição periódica desse obstáculo. Como exemplos podem
indicar-se as árvores e os parquímetros.

Na Tabela 3 apresentam-se alguns valores correspondentes à dimensão e consequente


largura perdida de diversos obstáculos.

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Rua / Via Urbana

0,45
0,60

Largura
bruta
Largura
útil

0,90
0,60
0,45

Muro Fachada de edifício Montra


Figura 4: Definição da largura útil de um passeio

Tabela 3: Largura perdida em passeios (adaptado de [1] e [3])

Tipo de Obstáculo Descrição Largura Perdida (m)


Distâncias de segurança - berma do passeio 0,30 – 0,45
- muro, sebe 0,30 – 0,45
- fachada de edifício 0,60
- montra 0,90
Mobiliário Urbano - postes de iluminação 0,75 – 1,00
- postes de semaforização 0,90
- sinalização vertical 0,60
- parquímetros 0,60
- cabines telefónicas 1,20
- caixotes do lixo 0,90
- hidrantes 0,75 – 0,90
- marcos do correio 0,90 – 1,20
Vegetação - árvores 0,60 – 1,20
- pontos de vegetação/arbustos 1,50
Usos Comerciais - quiosques 1,20 – 4,00
- esplanadas de bares/cafés (2 filas de mesas) 2,10

3.2 Largura mínima dos passeios

Os valores até agora referidos conduzem a que se possa definir um conjunto de larguras
padrão mínimas para os passeios e que se indicam na Tabela 4.

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Tabela 4: Largura mínima de passeios (m)

Tipo de passeio Largura Desejável Largura Aceitável


- Passeio sem mobiliário urbano, árvores ou montras 2,00 1,50
- Passeio com fila de árvores ou montras 3,00 2,50
- Passeio com árvores e montras 4,00 3,50

Passeios com larguras inferiores a 1,5 m não são desejáveis em novas vias urbanas. No
entanto, poderá eventualmente justificar-se a utilização de valores inferiores em espaços
consolidados sujeitos a recuperação urbanística, quando se pretende defender a
segurança do peão em zonas particularmente perigosas ou ainda quando a competição
pelo espaço, entre peões e veículos estacionados, for muito forte e a fiscalização não se
mostre eficaz. Nestes casos podem adoptar-se as larguras mínimas apresentadas na
Tabela 5.

Tabela 5: Largura mínima admissível de passeios (m)

Tipo de passeio Largura mínima desejável Largura mínima aceitável


- Passeio sem obstruções 1,20 1,00
- Troço < 10 m junto a obstrução - 0,80

No caso de novas urbanizações em Portugal, a portaria 1136/2001, de 25 de Setembro,


impõe as seguintes larguras mínimas:

Tabela 6: Larguras mínimas de passeios em novas urbanizações em Portugal

Tipo de ocupação Passeios Caldeiras para


árvores (opcional)
Habitação a.c. habitação > 80% a.c. 2 × 1,60 2 × 1,00
Habitação (se a.c. habitação < 80%), comércio e serviços. 2 × 2,25 2 × 1,00
Quando exista indústria e armazéns 2 × 1,60 2 × 1,00
Nota: quando se opte pela inclusão no passeio de um espaço permeável para árvores, deve aumentar-se a
cada passeio a largura de 1,0 m

3.3 Zonas pedonais

Nas zonas pedonais e, em particular nas ruas pedonais, os conceitos descritos para os
passeios são aqui igualmente aplicáveis. No entanto, convém referir que, enquanto nos
passeios se procura garantir boa capacidade e razoável conforto, nas zonas pedonais
normalmente não se colocam problemas de capacidade e o que se pretende é acautelar a
segurança pessoal. Isto porque, a certas horas do dia, existem sempre alguns troços mais

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isolados e nos quais deve ser dada particular atenção às condições de visibilidade e
iluminação.

4 ATRAVESSAMENTOS PEDONAIS

4.1 Generalidades

Na escolha da melhor solução a implementar numa intersecção entre as redes viária e


pedonal, há sempre que conciliar as necessidades dos peões (segurança, velocidade e
conforto) com as dos veículos (capacidade e velocidade) e ainda estudar os custos
envolvidos e a integração urbanística e funcional da solução no espaço envolvente.

O tipo de solução mais indicado poderá variar desde as soluções mais simples (redução
da dimensão das entradas de um cruzamento por alteração do raio; melhoria da
visibilidade através da proibição do estacionamento reforçada pelo alargamento do
passeio em lancil; tratamento do pavimento na zona de atravessamento, etc.) até às mais
complexas e dispendiosas (semaforização dos atravessamentos ou passagens
desniveladas) passando por outras intermédias. A solução final resulta, em muitos
casos, da adopção simultânea de um conjunto de técnicas.

Torna-se, no entanto, indispensável garantir que a solução seja compreendida e aceite


pelos peões e automobilistas. Para isso é fundamental que se garantam as expectativas
naturais de ambos os intervenientes. No que respeita aos peões a imposição de um local
de atravessamento muito afastado do trajecto mais curto será de difícil aceitação,
particularmente se o perigo antecipado pelos peões não for elevado.

4.2 Parâmetros de avaliação

A decisão de criação de um atravessamento pedonal, mais ou menos formal e complexo,


será sempre tomada através da análise ponderada de um conjunto de critérios, a saber:

ƒ níveis de conflito peão/veículo;


ƒ níveis de sinistralidade actual e previsíveis após a alteração;
ƒ benefícios para os peões (conforto/conveniência);
ƒ eventuais impactes negativos para a capacidade/demora dos veículos.

As normas inglesas apresentam um critério básico de decisão baseado no conceito de


“exposição”, através da aplicação da expressão PV2, onde P é o “fluxo horário dos
peões ao longo de um troço de 100 m centrado no local em estudo” e V é o “fluxo
horário de veículos”. O valor PV2 utilizado deverá corresponder à média das quatro
horas mais críticas. A relação entre as várias alternativas possíveis pode ser feita com

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base no critério referido consultando a Figura 5 e que se resume a nível quantitativo na
Tabela 7.

1500

Fluxo Rodoviário - V (Veíc/h)

1000

3 4
500
2
3

0
0 500 1000 1500 2000 2500
Fluxo Pedonal - P (Peões/h)

Figura 5: Solução para atravessamentos pedonais com base no critério PV2

Tabela 7: Atravessamentos pedonais com base no critério PV2


2
PV P (peões/h) V (veíc./h) Solução recomendável
- > 1100 < 300 [1] - sem atravessamento formal

< 108 0 - 1100 qualquer [1] - sem atravessamento formal

> 108 50 - 1100 300 - 500 [2] - passadeira zebrada

> 2 ×108 50 - 1100 400 - 750 [4] - passadeira zebrada com separador

108 - 2 ×108 50 - 1100 > 500 [3] - passadeira semaforizada

> 108 > 1100 300 - 400 [3] - passadeira semaforizada

> 2 ×108 50 - 1100 > 750 [5] - passadeira semaforizada c/ separador

> 2 ×108 > 1100 > 400 [5] - passadeira semaforizada c/ separador

Contudo existem algumas situações onde não se pode respeitar o critério baseado em
PV2, e nas quais se justifica a introdução de um atravessamento pedonal. Tal acontece,
por exemplo, nos seguintes casos:

ƒ próximo de escolas, hospitais ou zonas comerciais com muitos peões;


ƒ zonas com níveis elevados de veículos pesados (mais de 300 veíc./h).
ƒ zonas com elevadas variações sazonais;

14
ƒ locais onde o transtorno para as comunidades seja elevado.

4.3 Soluções sem atribuição de prioridade aos peões

Podem apontar-se como soluções sem atribuição de prioridade aos peões as seguintes
intervenções:
a) Redução do raio das curvas ou introdução de curvas de raios múltiplos. Este tipo
de solução tende a reduzir as velocidades dos veículos e o tempo de exposição
dos peões ao tráfego automóvel. Há, no entanto, que verificar as necessidades de
manobra dos pesados e eventualmente proteger passeios com obstáculos que
previnam o seu galgamento intencional. Convém igualmente que se verifiquem
eventuais problemas de redução de capacidade viária, particularmente a causada
por estacionamento ilegal.

b) Alargamento do passeio com proibição de estacionar. Este tipo de actuação


tende a reduzir a existência de estacionamento ilegal por o tornar mais evidente.
Mas em alguns casos será necessário proteger o espaço com obstáculos. Esta
solução é inviável sempre que a via de estacionamento seja usada como via extra
nas horas de ponta.

c) Tratamento das superfícies de atravessamento. Em vias de acesso local ou


distribuidoras locais, de pouca importância para os veículos, poderá ser
interessante manter a cota dos passeios em todo o atravessamento pedonal
obrigando os veículos a galgar um pequeno desnível e a circularem com
velocidades reduzidas.

d) Refúgio de peões. A colocação de um refúgio no eixo de uma via permite aos


peões atravessar a rua em duas fases, concentrando-se em cada uma delas apenas
na oposição a uma corrente de tráfego. Por outro lado reduz a distância de
atravessamento com exposição aos veículos, o que simplifica e torna mais
seguro o atravessamento sem, com isso, retirar a prioridade ao tráfego viário ou
ter consequências significativas ao nível da capacidade.

4.4 Atravessamentos pedonais com atribuição de prioridade aos peões

4.4.1 Passadeiras “Zebradas”

A geometria das passadeiras deverá ser o mais uniforme possível respeitando os


princípios seguintes:

ƒ o zebrado deve ter as características indicadas na Figura 6, com a largura


mínima de 3,00 m e sempre executado paralelo ao eixo;

15
ƒ o traço de paragem deve localizar-se a 2,0 m ou a um mínimo de 1,50 m;
ƒ colocar sinalização vertical indicativa de passadeira. Se existir sinistralidade
colocar ainda sinal de perigo afastado do atravessamento;
ƒ proibir estacionamento/ultrapassagens;
ƒ se necessário, utilizar bandas sonoras/sobreelevações para reduzir velocidade;
ƒ prever refúgio central se a largura do atravessamento for superior a 10 m.

Candeeiro

0,50
0,50

0,60 2,00 4,00

Figura 6: Passadeira “Zebrada”

Este tipo de solução é relativamente barata de instalar e de manter. No entanto tende a


haver níveis elevados de desrespeito pelos condutores dos veículos, o que trás
repercussões na sinistralidade. Assim, este tipo de atravessamento é de aplicar apenas
quando se puder garantir que a velocidade dos veículos não excede os 50 km/h. Claro
está que o incumprimento agrava-se com o aumento dos níveis de tráfego motorizado.
Por outro lado, em zonas com fluxos pedonais muito elevados a pressão dos peões
poderá reduzir drasticamente a capacidade para os veículos, razão pela qual este tipo de
solução deve ser previsto apenas para vias distribuidoras locais.

4.4.2 Passadeiras reguladas por sinalização luminosa

Na Figura 7 apresentam-se os vários tipos de passadeiras reguladas por sinalização


luminosa, adiante designadas por passadeiras semaforizadas. As características
geométricas destas passadeiras são equivalentes às das passadeiras “zebradas”. Importa
no entanto referir as seguintes regras.

16
ƒ as soluções devem, tanto quanto possível, permitir um atravessamento contínuo.
O separador central, quando existe, deve funcionar fundamentalmente como
última segurança;

Passadeira Simples Passadeira alinhada com separador

Passadeira enviesada à direita Passadeira enviesada à esquerda

Figura 7: Tipos de passadeiras semaforizadas

ƒ as soluções enviesadas são assumidas como dois atravessamentos


independentes. Estas soluções são particularmente indicadas quando a via tem
mais de quinze metros de largura ou se já possui separador central. Este deve ser
dimensionado para acomodar todos os peões à espera do verde;

ƒ a utilização de guardas que encaminhem os peões pode ser justificável, sendo


imprescindível nos atravessamentos enviesados;

ƒ só se deverão usar indicadores sonoros quando tal não possa ser mal
interpretado, o que acontece quando não se sabe a que atravessamento
corresponde. Apenas não há dúvidas nos atravessamentos simples.

ƒ estas soluções podem funcionar em tempos fixos (periodicamente é dado verde


aos peões mesmo que não exista procura), mas faz todo o sentido utilizar
botoneiras para activar a fase pedonal.

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ƒ há algumas aplicações a nível experimental que recorrem a sensores (de
microondas e de pressão colocados no passeio) para tentar optimizar ainda mais
o seu funcionamento. Existem basicamente três estratégias de actuação

a) antecipar o verde dos peões se a procura for elevada;


b) estender o verde para servir peões ligeiramente atrasados;
c) anular pedido se entretanto o peão tiver atravessado no vermelho.

Sendo uma solução hierarquicamente mais evoluída do que as passadeiras “zebradas”


justifica-se a sua aplicação em vias distribuidoras principais, como forma de garantir
níveis mínimos de capacidade destas vias. Poder-se-á ainda justificar a sua utilização
onde existam níveis significativos de peões desfavorecidos (idosos, doentes com
grandes problemas de mobilidade).

Finalmente, importa referir que não deverão localizar-se próximos de cruzamentos


prioritários porque tal poderá confundir os condutores em relação ao tipo de controlo
existente no cruzamento. Em rotundas a sua aplicação muito próxima poderá ter o
mesmo efeito e ainda provocar bloqueios das mesmas por stockagem na via de
circulação. No entanto também não devem ser colocadas muito longe pois criar-se-iam
circuitos pedonais muito extensos.

4.5 Atravessamentos em cruzamentos semaforizados

Conforme a importância que for dada aos atravessamentos pedonais (segurança e


comodidade para os peões versus capacidade para o tráfego motorizado) poder-se-á ter
um conjunto de soluções:

ƒ nenhum atravessamento pedonal;


ƒ verde com oposição de viragens à esquerda e direita pelos veículos;
ƒ extensão do período de limpeza (tudo vermelho) o suficiente para dar tempo aos
peões de atravessarem depois da limpeza do cruzamento pelos veículos. Neste
caso não há semáforos para os peões;
ƒ atravessamento segregado em duas fases recorrendo habitualmente a
atravessamentos enviesados à esquerda. A existência de separador central
permite que o atravessamento de cada faixa se faça em dois tempos distintos;
ƒ atravessamento segregado em uma fase (o atravessamento de cada via poderá ser
viabilizado em fases diferentes ou todas na mesma, mas não deverá ser possível
atravessar mais do que uma de uma só vez).

Do ponto de vista da segurança dos peões as soluções segregadas no tempo são


naturalmente desejáveis, mas normalmente são penalizadoras da capacidade viária nos

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atravessamentos em uma só fase, ou da demora dos peões nos atravessamentos em duas
fases, onde muitas vezes quase que se convidamos peões a atravessar uma das faixas
com vermelho. Um compromisso interessante é a solução de extensão do tempo de
limpeza (solução c). As soluções a) e b) resultam do modo semelhante, embora na
segunda se reforce a informação sobre a prioridade dos peões.

4.6 Atravessamentos desnivelados

Os atravessamentos desnivelados são teoricamente os mais seguros, já que se eliminam


completamente os conflitos. Em muitos casos são mesmo a única solução devido à
importância funcional da via ou do cruzamento a atravessar. Mas convém relembrar que
os peões só os utilizarão se eles se revelarem de utilização agradável e cómoda, o que
normalmente apenas ocorrerá se a orografia do terreno ajudar. Assim, em condições de
terreno normal:

ƒ passagens superiores implicam normalmente o vencimento de um desnível


muito grande (6,0 m ou mais);
ƒ passagens inferiores implicam desnível inferior, da ordem dos 3,0 m, mas são
mais caras e apresentam muitas vezes problemas a nível da segurança pessoal
(usar trajectos abertos e bem iluminados). São normalmente a solução a prever
em cruzamentos complicados. Aliás uma possibilidade em rotundas consiste em
utilizar o círculo central rebaixado mas não coberto e funcionando este como
ponto de ligação entre os diferentes túneis;
ƒ passagens desniveladas onde se força os veículos a vencer o desnível, mantendo-
se o peão de nível são as ideais, mas são as mais onerosas e por vezes de
impossível execução em virtude dos problemas de concordância de traçado em
perfil longitudinal;
ƒ dever-se-á sempre tentar garantir o acesso em rampa aos deficientes motores.

4.7 A segurança dos peões

Como se sabe os índices de sinistralidade do modo pedonal, tal como no sector


rodoviário, atingem valores desmesurados no nosso País. Importa, por isso, tomar
medidas que minimizem o número de atropelamentos.

Um dado importante, além do número de acidentes mortais, é o da sua distribuição por


idades (Figura 8). Como se pode observar, o maior número de vítimas mortais são as
crianças e os idosos. Isto deve-se a dois factores principais: o primeiro têm a ver com a
sua menor mobilidade e o segundo com a motorização que, como sabemos, é mais
intensa na população activa.

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< 4 anos
4% 5-12 anos
13%
> 60 anos
33% 13-16 anos
1%
17-24 anos
14%

50-59 anos 25-29 anos


7% 9%
40-49 anos 30-39 anos
9% 10%

Figura 8: Distribuição das vítimas mortais de atropelamentos por idades

Com o objectivo de proteger os deficientes e os peões mais desfavorecidos e de


minimizar os índices de sinistralidade e a gravidade dos acidentes relativos a
atropelamentos, se possível, devem observar-se os seguintes pormenores construtivos:

ƒ rebaixar os passeios, por forma a servir os deficientes motores;

ƒ usar sinais sonoros nos semáforos para informar os invisuais;

ƒ prever a instalação de guardas para canalização dos movimentos, a colocar a


0,50 m da berma para evitar toques dos veículos;

ƒ garantir 1,2 m livres no passeio para permitir o movimento de carrinhos de bebé;

ƒ as guardas deverão permitir a visibilidade através delas, pois poderão surgir


problemas de segurança se os peões poderem usar trajectos perigosos;

ƒ iluminar os locais. A iluminação artificial permite habitualmente baixar os níveis


de sinistralidade;

ƒ aplicar material anti-derrapante em zonas onde com piso molhado se verifiquem


problemas de aderência dos veículos.

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5 REFERÊNCIAS BIBLIOGRÁFICAS:

[1] SECO, A. J. M.: “Apontamentos da Disciplina de Engenharia de Tráfego”. Curso de


Mestrado em Engenharia Urbana – Departamento de Engenharia Civil da Faculdade de
Ciências e Tecnologia da Universidade de Coimbra. Coimbra, 1995.
[2] AUSTROADS: “Guide to the Traffic Engineering Pratice”, part 13, Sydney,
Austrália, 1995.
[3] TRB: “Higwhay Capacity Manual”. Special Report 209, part IV capítulo 13 –
Pedestrians. 3.ª Edição, 1994, Washingthon, D. C., 1994.

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