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C.

G R I M A U D
Professor de Filosofia do Externato dos "Enfants-Nantais"

“M IN H A ” M IS S A
T rad u ç ão de M. M. J. M.

Segu n d a edição
POR COMISSÃO ESPECIAL DO EXMO. E
REVMO. SR. BISPO DE NITERÓI, D. JOSÉ
PEREIRA ALVES. PETRÔPOLIS. 2I-3-I944.
FR E I ATICO ETNG, O. F. M.

TODOS OS DIREITOS RE8ERVADOS


PRÓLOGO
M uitas alm as cristãs se inquietam p o r tra b a ­
lh ar tão pouco p a ra a glória de D e u s ! V êem que o
tem po passa e tem em ach ar-se tra n sp o rta d a s aos
um brais d a etern id ad e com as m ãos vazias.
E p o r isso qu ereriam te r atingido p e rfeitam en ­
te o fim p a ra o qual fo ram criadas, que é o de
louvar a D eus. M as, inpedidas pelos negócios, ou
po r m oléstias, sob recarreg ad as pela fam ília, quei­
xam -se de v er p a ssar os dias, sem g lo rific a r dev id a­
m ente a D eus.
L ançando um o lh ar pelo m undo, estas m esm as
alm as escandalizam -se p o r v er a D eus tão o fe n ­
dido, tão esq u ecid o . . . e perg u n tam com o o A ltís­
simo pode su p o rta r ta n ta s in jú ria s d a p a rte de
suas criatu ras. E êstes pensam entos pertu rb am -lh es
a fé. D esejosas de ex p a n d ir o R eino de D eus, que­
rem sab er qual meio p oderiam em p reg ar p a ra en­
d ireita r êste m undo, e d a r ao A u to r de tôdas as
coisas a gló ria a que tem direito.
O h ! que estas alm as não d e sa n im e m ! S ua pena
provém da falta de luzes: nem podem im aginar
a cópia de louvores que se elevam perp etu am en­
te desta te rra , em aparência tão in g rata, ao tro no
da D ivina M a je s ta d e ... e ain d a m enos im agi­
nam que talvez elas m esm a s podem d a r a D eus
"a h o n ra p e rfe ita e com pleta” que tão a rd e n te ­
m ente desejam , contanto que cooperem com C risto
na hom enagem in fin ita que Êle ren d e à S an tíssi­
ma T rin d ad e.
D evem unicam ente re n o v a r a o fe re n d a do C al­
vário: com, em e p o r C risto, têm elas o m eio de
atin g ir com pletam ente o fim que D eus lhes d e te r­
m inou, que é d a r-L h e um a gló ria p erfe ita sem
som bras nem desfalecim entos. E não h a v erá um a
do u trin a consoladora e cheia de pacificação, que
6 PRÓ LO G O

desvende o g ran d e m istério d a paciência de D eus


p a ra com o m undo p ecador?
Ê ste livro destina-se a p ro c u ra r a b rir às inteli­
gências cristãs, ávidas do d esejo de se rv ir a D eus,
de pro p a g a r o seu reino, e de se p re p a ra r p a ra a
eternidade, conhecim entos talvez ignorados acêrca
do Sacrifício de nossos altares.
V isa en sin ar que não é só C risto q ue deve cele­
b ra r a S. M is s a .. . m as q ue Êle u ne a si os seus
f ié i s . .. ou an tes q ue Ê le e seus fiéis form am "um
só C risto” q ue a p resen ta a D eus louvores in fin i­
t o s . . . de m aneira que cada um de nós, d eixando
de lado esta frase, m ais fam iliar do que exata:
"V ou à M issa” , a su b stitu a p o r esta o u tra : “ V ou
celebrar a m inha M issa com C risto .”

D êste conhecim ento m ais nítido de nossa p a r­


ticipação ao ato sacerdotal de N osso S enhor, re ­
sultarão p a ra nossa vida c ristã im ensas v a n ta ­
gens:
E m prim eiro lu g ar nos in teressarem os pela S.
M issa como fazem os pelas coisas que são n o ssas;
desde então pro cu rarem o s estudá-la m elhor p a ra
nela ter m aior p a rte ; terem os felicidade em assis­
tir a ela.
Depois nos sentirem os consolados. E x p erim en ­
tarem os realm ente que não som os m ais “sêres in­
úteis” desde o m om ento em q ue tiverm os cons­
ciência de ex e rc e r a m ais nobre das funções, concor­
rendo p a ra d a r a D eus um louvor p e rfeito e com ­
pleto, prelúdio daquele que L h e d arem os p o r in­
term édio de Jesu s C risto p o r tôda a eternidade.
N ossa p erfeição espiritu al desenvolver-se-á. P a ­
ra estar m ais inteiram en te unido a C risto no ato
precioso da oblação, não hesitarem os em nos con­
fo rm ar em tu d o à su a santíssim a V o ntade, em nos
PR Ó LO G O 7

p riv a r de tudo o que L h e desag rad a, em p ro cu­


ra r tudo o que L h e é agradável, a fim de reali­
zar em nós a p erfe ita u n ifo rm id ad e de pensam en­
tos e de sentim entos e n tre o S acerd o te E te rn o e
os seus hum ildes colaboradores.
Serem os cristão s intrép id o s e irre p re e n sív e is;
pois que podem tem er dos hom ens ou dos aconte­
cim entos aqueles que penetram com C risto na
intim idade de D eus, S e n h o r dos corações e so b era­
no S en h o r de tôdas as coisas?
D IV IS Ã O DA OBRA

“ M IN H A ” M IS S A com preende trê s p artes:

P R IM E IR A P A R T E
“Minha” parte no Sacerdócio de Cristo

SEGUNDA PA RTE
O ato que realizo celebrando “minha” Missa

T E R C E IR A PARTE
Meios para eu bem celebrar “minha” Missa
P R IM E IR A PARTE
“Minha” parte no Sacerdócio de Cristo

O prim eiro capítulo:


Jesus Cristo Sacerdote
lem brará as verdades fundam entais acerca do S a ­
cerdócio de N osso S en h o r Jesu s Cristo.

O segundo capítulo:
O cristão, membro de Cristo
cnsinar-nos-á como fo rm am os um a u nidade com
Jesu s Sacerdote.

O terceiro capítulo:
O membro se oferece e sacrifica com a cabeça
explicará a p a rte que o fiel tom a no ato sacerdotal
de Je su s Sacerdote.

O qu arto capítulo:
A S. Missa, sacrifício visível do Cristo místico
m o strará que as verdades, contidas nos capítulos
anteriores, são trad u zid as visivelm ente na L itu rg ia
do santo sacrifício da M issa
PRIMEIRA PARTE
C A P ÍT U L O I.
JESUS CRISTO SACERDOTE
O ÚNICO SEK CAPAZ DE OFERECER A DEUS UMA HO­
MENAGEM INFINITA E REPARADORA Ê CRISTO. HO­
MEM COMO OS PECADORES. MAS DEUS COMO SEU
PAI, E, POR ESTE TITULO DE HOMEM-DEUS, SACER­
DOTE OFICIAL DA DIVINDADE.
O decreto divino
Pelo pecado o hom em se perdera.
D eus ofen d id o pod eria te r ab andonado a h u ­
m anidade à triste so rte da condenação. E seria
m era ju stiça. M as esta solução não te ria sido tão
m isericordiosa, nem sobretu d o tão gloriosa p ara
D eus, pois a criação do hom em , a “o b ra -p rim a ” das
mão divinas, afin al teria como resultado um fias­
co.
D eus decidiu, pois, salv ar o homem .
M as de que modo?
O Altíssim o, infin itam en te bom, p oderia te r re-
habilitado a h um anidade, p erdoando-lhe sim ples­
m ente o pecado. M as êste perdão, na verdade, te ­
ria sido dem asiado fácil p a ra nós e m ui pouco h o n­
roso p ara D eus.
D eus p oderia te r exigido dos hom ens ato s de
reparação p o r m eio dos q uais seriam perdoados.
M as não tendo os atos d êste “ micróbio revoltado”
valor algum p o r si mesm os, D eus teria resolvido
conceder o perd ão sem condições.
A infin ita M ajestad e, em sua m aravilhosa sabe­
doria, decretou um a m edida sublim e de liberalidade
e de bondade, a qual lhe perm itia sa lv a r ao m es­
mo tem po o hom em , salv a g u a rd a r os direitos da
ju stiça, e o bter, além disso, um a glorificação p e r­
feita da p a rte d a criação, q ue d êste modo a tin ­
giria com pletam ente o seu fim.
12 P R IM E IR A P A R T E

D eus d ecretou que o Filho, a segunda pessoa


da Santissim a T rin d ad e, se tornasse Sacerdote, is­
to c, que o V erbo, F ilho de D eus, se abaixasse à
condição hum ana, p a ra e x ecu tar como H om em ,
represen tan te de tôda a sua raça, em h o n ra da
S antíssim a T rin d ad e, u m ato sacerdotal, pelo qual
D eus seria louvado, glorificad o e engrandecido, e
a hum anidade pag aria sua dívida e se resg ata­
ria.
Êste plano executou-se p o r d ecreto do P ai, co­
a d juvad o pelo E sp írito S anto, “e x vo lu n ta te Pa-
tris cooperante S p iritu S a n cto ”1, como o a firm a a
L iturgia.
A ssim D eus, em seus eternos desígnios, p oderá
tira r da criação a m aio r g lória possível, g raças ao
decreto pelo qual constitui a Jesu s C risto, H om em -
D eus, seu S acerdote oficial.
A noç&o de sacerdóolo
M as que c ser sacerd o te?
É ser en carregado pelo O nipotente de relacio­
n a r a c ria tu ra com o C riador, de estabelecer en tre
o hom em e D eus as relações necessárias.
S er sacerdote é ser "m ed ian eiro ” .
O sacerdote é a p onte colocada en tre o céu e a
t e rra ; é p o r isso, dizem , que Je su s S acerdote m e­
rece o nom e de P ontífice. “Foi constituído a fa ­
vor dos hom ens n as coisas que dizem respeito ao
culto d ivino.” (H e b 5, 1.)
O sacerdote é en carregado de o fe re c e r ao A ltís­
sim o as hom enagens públicas e solenes que oficial­
m ente lhe deve a sociedade h u m a n a ; esta, consti­
tuída p o r D eus, não pode sub sistir sem sacerdote.

1) Ord. da S. Missa.
CAP. I. JE S U S C R IS T O SA C E R D O T E 13

Jesus Cristo Sumo Sacerdote


U m único hom em foi escolhido p o r D eus p a ra
re a ta r plenam ente en tre seus sem elhantes e a M a­
je sta d e divina as relações in terceptadas pelo p eca­
do, rendendo à Santíssim a T rin d a d e tôda a h o n­
ra que lhe é devida.
Ê ste sacerdote incom parável é nosso S en h o r J e ­
sus Cristo.
D eus p odê-L o-ia te r escolhido e feito sacerd o­
te, ainda no caso em que a raça h u m ana tivesse
perm anecido inocente, a fim de que êste “ c h efe”
da hum anidade a fizesse ren d e r ao seu C riad or
a hom enagem p e rfeita, e estabelecesse en tre o céu
e a terra relações íntim as. N este caso, o ato sacer­
dotal de C risto teria consistido em re n d er a D eus,
da p arte dos hom ens, um a g lorificação isenta de
reparação : seu sacrifício teria sido todo de louvo­
res e de ações de g raças, e não de expiação.
M as como o hom em h avia pecado, C risto S a ­
cerdote, cu ja m issão era p ro c u ra r a m aior gló­
ria de D eus, devia, p a ra a tin g ir êsse alvo,
ap ag a r os pecados e satisfa z e r pelo mal com e­
tido: p o r isso é que D eus d ecretou em sua sabe­
d oria que o ato essencial do sacerdócio de C risto
fôsse um sacrifício cruento. E x ig iu do H om em -
D eus, p ro n to a obedecer, a m o rte cruel de cruz.
Como um só hom em foi escolhido p o r D eus p a­
ra o ferecer êste sacrifício, só há um S acerdote
principal e essencial, Jesu s Cristo, capaz como H o-
m em -D eus de ex p ia r os pecados, de' g lo rific a r a
M ajestad e divina, de o fe re c e r um a hom enagem
q ue tenha um valor infinito.
Jesus C risto, S u m o Sacerdote, é, pois, o S acer­
dote dos hom ens, o nosso S acerdote, p orque é
nosso interm ediário, indispensável en tre nós e a
Santíssim a T rin d a d e : n ão tem os e n ão podem os
te r outros.
14 P R IM E IR A P A R T E

P o r esta razão lhe dizem os no G lória: “ Só


vós sois S anto, só vós sois S enhor, só vós sois A l­
tíssim o.” 2 “ Só nÊ le h á salvação.” (A t 4, 12.)

P or que Jesus Cristo é nosso sacerdote?


P a ra ser nosso sacerdote, devia Jesu s subm eter-
se a várias condições:
1. Convinha que se torn asse m em bro da raça
hum ana, u m dos nossos, sem ó que não podia ser
nosso represen tan te. P a ra p u rific a r a hu m an id a­
de m aculada pelo pecado, D eus exigia um a re p a­
ração tal que, sem d e ix a r de ser h u m ana, fôsse
suficiente e superab u n d an te, isto é, infinita. E ra ,
pois, necessário, p a ra e x ecu tar o d ecreto divino da
restauração da g lória de D eus, q ue “o V erbo se
fize sse carne”. “ Como os filhos co m partilham da
carne e do sangue, tam bém Êle c o m p a rtilh o u . . .
devia to rn a r-se sem elhante aos seus irm ãos.” (H e b
2, 17.)
2. Convinha que fôsse d a “ra ç a ” de D eus, sem
o que não poderia o fe re c e r um a rep aração e um a
ado ra çã o ; as quais, p a ra serem su ficientes, deviam
ser infinitas.
P o r esta causa é que, p ara ex e c u ta r o decreto
da restau ração de sua glória, a M ajestad e divina
não designou um hom em em inente, nem o m ais
belo dos an jo s, m as o H om em -D eus que, sem dei­
x a r de se f hom em , fôsse ao m esmo tem po o F ilho
de Deus, segunda pessoa d a Santíssim a T rin d ad e,
igual ao P ai e ao E sp írito Santo.
Só êste S acerdote, porq u e é hom em e D eus, é
capaz de o fe re c e r a D eus um culto suficiente.
3. Convinha que recebesse do pró p rio D eus a
m issão sacerdotal e que tivesse a vocação ao sacer­
dócio; consiste a vocação essencialm ente no cha­

2) Ord. da S. Missa.
CAP. I. JE S U S C R IS T O SA C E R D O T E 15

m am ento ao fim d eterm inado pela a u to rid ad e com­


petente.
O ra, D eus cham ou N osso S en h o r ao sacerdó­
cio suprem o: Je su s C risto — diz São Pau lo —
não se g lorificou a si m esm o p a ra to rn a r-se P o n tí­
fice, m as A quele que L h e disse: “ És m eu filho,
h oje te gerei." (H e b 5, 5.) A in d a que o Filho seja
o Filho desde tôda a eternidade, estas palav ras só
lhe foram dirigidas, segundo o salm ista, no m om ento
em que assum iu a n atu re z a hum ana. F azendo-se h o­
mem, foi no m esm o instan te consagrado Sacerdote,
isto é, M ediador do gênero h um ano ju n to de D eus.
Seu P ai co n firm a-L h e esta d ignidade p o r ju r a ­
m ento: “ O S e n h o r ju ro u -o , e não se arre p e n d e rá:
T u és sacerdote p o r tôda a etern id ad e.” (S I 109, S.)
4. E ra preciso que o eleito aceitasse v o lu ntaria­
m ente esta m issão sacerdotal, p orque o sacerdote
não pode ser obrigado.
O ra, Jesu s C risto aceitou com tra n sp o rte s de jú ­
bilo a decisão e tern a de ser co n sagrado Sacerdote.
E sta subm issão do V erbo In c a rn a d o d a ta do ins­
tante em que tom ou o corpo. R evela-nos p o r estas
p a lavras que disse a seu P ai, ao e n tra r neste
m u n d o : N ã o quisestes sacrifícios n em oblações,
m as prep arastes-m e um corpo” (a fim de que se
tornasse evidentem ente a m atéria do sacrifício e
da o b la ç ã o ). . . “então ou disse: E is q ue venho, ó
Deus, fazer a V ossa v o ntade.” (H e b 10, 7.)
Quando se realizou a consagração
sacerdotal de Cristo?
A "o rd en ação ” de Jesu s C risto, se é que se L he
possa aplicar êste têrm o, efetu o u -se no instante
da incarnação. N esse m om ento sua n atu reza h u ­
m ana recebeu de sua união à n atu reza divina, pe­
la pessoa do V erbo, todos os p o deres sacerdotais.
E ssa união à n a tu reza divina d av a-L h e um a missão
determ in ad a, que consistia em ap re se n ta r a D eus,
16 P R IM E IR A P A R T E

em nom e de todo o gênero hum ano, passado, p re­


sente e fu tu ro , um a hom enagem infin itam en te p er­
feita de adoração, de louvor, de agradecim ento,
de reparação e de súplica.
N esse instante, po rtan to , Je su s C risto foi “o r­
denado sacerd o te” porq u e se to rn o u H om em -D eus.
E como êsse sacerdócio jam ais cessará, sua con­
sagração perm an ecerá etern am en te: Êle será “sa­
cerdote p o r tôda a e te rn id ad e” .
O sacrifício de Jesus sacerdote.
Jesus C risto foi orden ad o Sacerdote em vista de
um sacrifício a o fe re c e r à D ivindade em nom e dos
hom ens, p orque o sacerdócio só tem razão de ser
na oblação de um sacrifício.
Jesus C risto S um o S acerdote o ferece um sacri­
fício único, o do Calvário. Im ola-se na C ruz a seu
Pai, p a ra q ue sejam reconhecidos de m odo absolu­
to o soberano dom ínio e o infinito po d er de
Deus.
Com efeito, se a cria tu ra m ais p erfe ita que pôde
ser concebida pela S abedoria divina, foi obrigada
a se an iq u ilar an te seu A u to r, c pro v a evidente
que “ D eus só” é S en h o r absoluto, e que tudo lhe
é subm isso no céu e na te rra .
E ste aniquilam ento do H om em -D eus é, pois, um
reconhecim ento efetivo, sensível e oficial, d a su ­
prem acia divina. C onstitui um a ad oração p erfeita
de D eus, um a ação de g raças in fin ita, um a repa­
ração com pleta.
É tal o alcance do S acrifício da C ruz que, p or
si só e de um só lance, b asta p a ra atin g ir p lena­
m ente e sem restrição o fim suprem o da g lo rifi­
cação de D eus pela c riatu ra.
M as se basta, p o r si mesm o, p a ra acu m u lar ein
um só todos os tesouros de hom enagem e re p a ra ­
ção, re sta a p licar estas riquezas de g raças e de
redenção no espaço e no tem po.
CAP. I. JE S U S C R IS T O SA C E R D O T E 17

D e q ue m odo cada ser hum ano, cada fam ília,


a sociedade in teira po d erá to m a r p a rte n esta hom e­
nagem in fin ita? E m resum o, p o r que m eios se es­
p a lharão no m undo os benefícios do C alvário?
Pela renovação q u otidiana do S acrifício único,
pela M issa.
O sacrifício eucarístico de C risto nos d á a po s­
sibilidade e o direito de p a rtic ip a r do S acrifício
re d ento r do G ólgota, p erm itindo-nos nêle re p re ­
sentar, como verem os, um papel pessoal, como se
tivéssem os vivido no dia de sua consum ação, en­
tre M aria S antíssim a e S. Jo ão , aos pés da Cruz.
O Sacerdote c os sacerdotes
Jesu s C risto é, pois, o Sacerdote, o S acerdote
principal, o único Sacerdote p o r si m esm o, o m ais
com pleto e p e rfeito que jam ais existiu ou existirá,
o que o ferece o sacrifício único que D eus jam ais
tenha exigido, único capaz de satisfazer, pois os
o u tros sacrifícios apenas fo ram aceitos como fi­
gu ra s dêste.
Q ue são, pois, os sacerdotes, êsses hom ens que
celebram a S an ta M issa na sociedade cristã e
exercem as funções sa g rad as?
São p ara nós os rep resen tan tes de Je su s C risto.
O cupam o lu g ar de Jesu s C risto. São Jesu s C risto
visível e agindo en tre nós.
Com o nosso S en h o r não quis p ro lo n g ar pelo d e­
curso dos séculos sua existência te rre s tre p ara
e xercer na sociedade hu m an a suas funções sacer­
dotais de um m odo sensível, escolheu um certo n ú ­
m ero de hom ens, que assinalou com um c a rá te r es­
pecial e inextinguível e p o r meio do qual lhes con­
fere o po d er de ex ercer visivelm ente sua ação so­
b re natu ral en tre nós.
Com efeito, Jesu s C risto e seu m in istro são um
só m o ralm en te; am bos executam u m m esmo ato:
18 P R IM E IR A P A R T E

o poder de C risto d á-lhe a eficácia, e a presença


do sacerdote to rn a-o visível.
Sendo os sacerdotes instru m en to s de que se ser­
ve o S acerd o te S uprem o p a ra e x ercer en tre os
hom ens suas funções sacerdotais, é na verd ade
sublim e a sua dignidade, m aravilhosas são as
suas p rerro g ativ as, m ui v a n tajo sa c a su a missão,
p orque estão em contacto d ireto com a F o n te dc
todos os bens sobren atu rais, na qual podem h a u ­
rir graças de escol.
O Sacerdote, os sacerdotes,
os fléls e a S. Missa
Jesus C risto é o S acerdote único, estabelecido
po r D eus p a ra u n ir a te rra ao Céu, oferecendo à
eterna M ajestade, sôbre o C alvário, o sacrificio
infinito de louvor, de ad oração e de reparação.
M as Jesu s Sacerdote não quis que sua gran de
im olação fôsse p ara os cristãos, no fu tu ro , apenas
um “ fato histórico” , fadado a desap arecer pouco
a pouco da m em ória dos hom ens, im erso nas b ru ­
m as de um passado rem oto. P o r isso quis que, no
decurso dos séculos, se renovasse, ta n tas vêzes
q u antas fôsse preciso, o seu sacrifício.
E com o fito de im olar-se de novo em união com
seu povo fiel e aplicar-lhe especialm ente um a p a r­
te dos m éritos de sua Paix ão , C risto Je su s assinala
com o sêlo divino certos hom ens que o re p ro ­
duzirão sôbre o a lta r em m om entos d eterm in ad o s:
são os sacerdotes, verdadeiros com participes de seu
sacerdócio eterno. E a renovação do ato sacerdo­
tal de C risto é a S. M issa.
Eis, p o rtan to , um único sacerdote, um único
sacrifício, o ferecido pelos sacerdotes, hom ens in ti­
m am ente unidos ao S acerdote S uprem o e dotados
de seu poder.
Pelo m inistério de seus sacerdotes, C risto ren o­
va êste m esm o sacrifício em cada S. M issa, p ara
CAP. I. JE S U S C R IS T O SA C E R D O T E 19

que todos os fiéis do m undo possam dêle p a rtic i­


p a r e receber seus frutos.

A parte dos fiéis na S. Missa


V am os, pois, estu d a r esta “participação” re se r­
vada aos sim ples fiéis na oblação do sacrifício de
Jesu s Sacerdote.
V erem os que, m esm o não sendo, como os sacer­
d otes, os sacrificad o res o ficiais da san ta V ítim a,
os fiéis a o ferecem pelas m ãos do celebrante e,
p o r isso mesmo, têm um papel m uito im p o rtan te
n a oblação, a qual não se pode e fe tu a r sem seu
concurso. Ê ste papel no culto, esta p articipação dos
sim ples batizados nas funções sacerdotais de C ris­
to valeu ao povo cristão o título de “sacerdócio
real” (1 Ped 2, 9 ) , que lhe d á São Ped ro , “sa­
cerdócio santo, encarregado de o fe recer hóstias
agradáv eis a D eu s” (1 P ed 2, 5 ), com o o p ro v a­
rem os a seguir.
N ão se d everá ad m ira r o leitor se, no curso do
presente volum e, o papel adm irável dos sacerdotes
e a sua d ignidade sublim e parecem fic a r um pouco
de lado. N ão se rá p o r desprêzo, nem p o r esque­
cimento.
Sendo o o b jetivo dêste livro m o stra r aos fiéis,
p a ra sua consolação e devoção, a p a rte im ensa e
quiçá desconhecida que, em união com o celebrante,
têm no sacrifício, devem o-nos ocupar especialm en­
te dêste assunto.
O s leitores q ue desejarem conhecer m ais especial­
m ente as gran d ezas do sacerdócio, enco n trarão em
m uitas o bras sôbre a S. M issa e o sacerdote o
suplem ento de edificação q ue estão no direito de
desejar.
P R IM E IR A P A R T E

C A P ÍT U L O I I
O CRISTÃO MEMBRO DE CRISTO
SE CRISTO E O SACERDOTE SUPREMO. O CRISTÃO,
PARCELA DE CRISTO, COOPERA POR CONSEQUÊNCIA
NOS ATOS SACERDOTAIS DE CRISTO.
Cristo místico
U m único S acerdote o ferece a S. M issa, J e ­
sus Cristo.
M as que e n ten d er aqui p o r Jesu s C risto ?
A resp o sta a esta perg u n ta vai a b rir-n o s h o ri­
zonte incom ensuráveis.
C risto que o ferece a S. M issa não é, como mui
facilm ente im aginam os fiéis, C risto aniquilado e
h um ilhado como estava 110 C alvário: Jesu s C risto
não existe m ais sob esta form a, q ue já é passada
para Êle.
C risto que o ferece a S. M issa e está presen te
no a lta r é C risto atu al, glorioso, triu n fa n te no céu,
assentado à d ireita de seu Pai, e ocupado em term i­
n a r a o b ra da Redenção.
M as êste C risto a tu al não se ap resen ta só. A
Jesus C risto, C abeça e C hefe, está agregado seu
Corpo M ístico q ue é a Ig re ja , sociedade dos fiéis.
Jesus C risto e o seu C orpo M ístico form am o
“ C risto to ta l” , com o o cham a San to A gostinho,
aquele que d o rav an te o ferece a D eus, sôbre o al­
ta r, a hom enagem do Sacrifício infin ito : “O Cristo
total é cabeça e corpo: a cabeça é o F ilho de Deus,
o corpo é a Ig re ja .” 1
Que quer dizer Cristo Místico
C risto m ístico, sum o S acerdote do A ltíssim o, é,
pois, Jesu s, unido aos fiéis, com o n ossa cabeça
está un id a aos m em bros, p a ra fo rm a r um c o n ju n­
to perfeito , agindo p a ra um m esm o fim .

1) De unitate Eccleslæ contra donatlstas, n. 7.


CAP. n. O CR ISTÃO , M E M B R O D E C R IS T O 21

A S a n ta I g r e j a , a sociedade dos fiéis sob o d o­


m ínio de C risto, é o “ Corpo m ístico” de C risto;
Ê le é a cabeça dêste corpo, e os fiéis são os m em ­
b r o s .. . A Ig re ja é, pois, o “ com plem ento” de
C risto. ( E f 1, 23.)
N ão devem os im aginar que a designação “m ís­
tico” possa fa zer ac re d ita r que êste corpo seja um a
ficção. “ C risto m ístico” n ão tem n ad a de im aginá­
rio. É C risto tal com o existe atualm ente, como
C hefe inseparável de seus m em bros resgatados,
tributan d o , em u nião com êles, um a gló ria p e rfei­
ta à S antíssim a T rin d ad e.
Como é constituído
o “ Corpo Místico” de Cristo
O "C orpo M ístico” ou “ Ig re ja de C risto ” é a
sociedade dos fiéis unidos a C risto.
M as como se faz a união dos m em bros com a
Cabeça nesta “sociedade dos fiéis” ? D e um m odo
especial e incom parável que precisam os fazer com ­
pree n d e r devidam ente.
Cada sociedade une seus m em bros e n tre si e ao
chefe p o r meio de um laço. P o r exem plo, os sol­
dados estão unidos ao g eneral em uin Corpo de
exército pela concordância d as vontades e pela acei­
tação de um a rigorosa disciplina em serviço da P á ­
tria. O laço pelo qual a Ig re ja u ne seus m em bros
é dum a n atu reza tô d a div ersa e m ui su p erio r à
de todos os laços que ligam aos seus respectivos
chefes os m em bros das sociedades hum anas.
N o “C orpo M ístico” , o cristão é unido ao chefe
por um laço real de p oder e x tra o rd in ário , o graça,
princípio de vida sobren atu ral.
E sta g raça, que u ne e v ivifica e tra n sfo rm a to­
dos os m em bros, d im ana da Cabeça. Com efeito,
C risto-C abeça é cheio do E sp írito San to , que é a
alm a do C hefe e de todo o “ C orpo M ístico” . D êste
E sp írito desce p o r meio da cabeça a té aos m em-
22 P R IM E IR A P A R T E

bros um eflúvio vivificador q ue d á a vid a: "v w i-


fica n tem " .2
E sta graça exerce, em vista d a constituição de
“ C risto m istico” , um a m aravilhosa função, que é
a de tra n s fo rm a r o “ velho hom em ” ( E f 4, 2 2 ),
como o denom ina S. Paulo, isto é, o hom em decaí­
do, incapaz de a d a p tar-se atu alm en te ao C orpo
M istico, ein hom em "novo” ou so b ren atu ral que,
pelo fato de sua tran sfo rm ação , se acha “ en x e r­
tado” (R o m 6, 5) em C risto C hefe.
A metamorfose do "velho homem"
O “hom em velho” , sob a influência da graça,
so fre um a tran sfo rm ação , que, d ando-lhe o es­
tado sob ren atu ral, o assim ila ao Corpo M ístico.
Pode-se fazer co m preender esta ação apenas p or
meio de com parações.
C risto é um d iam an te m agnífico q ue irrad ia,
como um sol, a luz que L h e com unica o E sp írito
S anto: essa irrad iação é a graça.
O ra, êste d iam ante tem a p ro p ried ad e m aravi­
lhosa de d a r o brilho do d iam ante a todos os g rãos
de areia que en tram na su a irradiação, isto é, a
todos os hom ens pecadores que se subm etem à
g raça de C risto. Irra d ia n d o êles, de sua p a rte , a luz
recebida de C risto, tornam -se resplandecentes.
Se um dêsses brilhantes sai do cam po de irra ­
diação, to rna-se im ediatam ente g rã o de areia: o
hom em novo volta a ser “n a tu ra l”, hom em de
pecado, não é m ais de C risto.
O co n ju n to dos d iam antes aglom erados em to r­
no do diam ante central e no eflúvio de seus raios,
form a o Corpo M ístico, cu jo brilho se re flete todo
p ara o céu. T o d o êsse esplendor está oculto à te r­
ra sob um véu, de m an eira que a vista corp o ral não
faz d iferen ça en tre o hom em n atu ral, separado

2) Símbolo de Nicéia.
CAP. II. O CR ISTÃO , M E M BR O D E C R IS T O 23

do Corpo de C risto, e o hom em so brenaturalizado,


que só “se revelará a si m esm o" (R o m 8, 1 8), d e­
pois da queda do invólucro m ortal.
A pa rte do Corpo M ístico que está no céu sem ­
pre sc vai aCrescendo de novos eleitos, pois êstes,
agrupad o s na irradiação do cen tro Je su s Cristo,
“sol de ju stiç a ” , aum entam rapid am en te: de um
Pentecostes a ou tro , “ C risto vai crescendo” até
chegar “à p lenitude da idade de seu C orpo” M ís­
tico, “até o crescim ento p e rfe ito ” , in p lenitudi-
nem aetatis corporis C h r is ti... in v ir u m p erfec-
tum . ( E f 4, 3.)
E n tã o os tem pos serão consum ados: o núm e­
ro dos eleitos esta rá completo.

A união do membro ao seu chefe


E sta com paração auxilia a co m preender a m eta­
m orfose do m em bro sob a in fluência da g ra ç a ;
não denota, porém , ainda b astan te a união vital
que existe e n tre C risto e o fiel so b renaturalizado.
É preciso, p ara m o strar até onde vai a intim idade
da ligação q ue u ne os m em bros à Cabeça no C o r­
po M ístico, re c o rre r à im agem tão ex pressiva p e­
la qual nosso S en h o r ijiesmo se dignou iniciar-nos
n este g ran d e m istério.
N osso S en h o r disse aos seus A póstolos: “ E u
sou a videira de v e r d a d e .. . m eu P a i é o ja rd in e i­
r o . . . Perm anecei em m im e eu em v ó s . . . D o m es­
mo modo que os ram os só podem d a r fru to s com a
condição de ficarem unidos à videira, assim acon­
tecerá convosco se estiverdes unidos a mim.
“ E u sou a videira, vós sois os ra m o s; aquêle
que perm anece em mim d á m uitos fru to s, porque
sem mim nada podeis f a z e r . . . P erm anecei no meu
a m o r . . . D isse-vos tudo isto, a fim de que vos
alegrásseis e p a ra q ue a vossa alegria fôsse com ­
pleta.” ( J o 15, 1 e 55.)
P R IM E IR A P A R T E

" E u sou a v ideira, vós sois os ram os.” N osso


S enhor não podia escolher im agem mais c aracte­
rística p a ra fazer-nos com preender até que ponto
de intim idade, de união, o fiel vive unido a Êle
neste todo q ue é C risto M ístico. O s ram os e a ce­
pa que os su sten ta form am um ser vivo: o fiel e
Cristo form am um ser p a rticip an te da vida divi­
na.
Q uem susten ta as uv as? O s ram os, c e rtam en te;
m as nunca sem o concurso do tronco: o fiel p ro ­
duz fru to s de ad oração, de louvor, de reparação,
porém nunca sem C risto. “ Sem m im n ad a podeis
fazer.”
O tronco pro d u z seus fru to s p o r meio dos ra ­
mos: Je su s C risto faz g e rm in a r nos' fiéis de sua
Ig re ja , u nidos a Êle, m aravilhas de santidade. M as,
se o tronco tem necesidade d e ram os p a ra p ro ­
du z ir fru to s, pode disp en sar u m ou o u tro dêles:
tal sarm en to fica im ediatam ente p rivado da vida
da cepa: continua, contudo, ligado ainda ao tro n ­
co pela fé e pelo c a rá te r de cristão. P o d e rá re­
ceber de novo a vida pela g raça do perdão.
Im possível e x p rim ir m ais n itidam ente a união
do fiel com C risto, união vital, indispensável. O
cristão, p a ra viver, deve “ser u m ” com C risto, nes­
te gran d e organism o sob ren atu ral que é o Corpo
M ístico.
S erá fácil co m preender desde logo cm que con­
siste o “ C risto to ta l” , tronco, ram os, sarm entos,
fôlhas e fru to s. C risto possui na sua h um anidade
e em tôda a plenitude a seiva de que a D ivindade
O enriqueceu, e Êle a faz c irc u la r até às e x trem i­
dades de seus ó rgãos, isto é, até à m en o r das
alm as ligadas a Êle.
Q ue seiva é esta que o C risto, tronco divino,
vai h au rin d o na San tíssim a T rin d a d e ? É a “graça
san tific a n te ” . N osso S en h o r com para-a à seiva que
CA P. n . O CR ISTÃ O , M E M BR O D E C R IS T O 25

o E sp írito S an to p roduz, conserva e faz circu­


la r na sua Ig re ja , E sp írito q ue anim ava a C risto,
nosso C hefe, desde o in stan te de sua conceição, se­
g undo a palavra do A n jo a M aria S S .: “O E sp í­
rito Santo co b rir-te-á com som bra e conceberás.”
(L c 1,35.) E ste E sp írito de D eus, que S. P au lo cha­
m a indistintam ente o E sp írito S an to ou o E sp írito de
Jesus, faz c ircu lar em todos os m em bros do C or­
po M ístico a vida do C hefe: é pelo “E sp írito que
se expande em nossos corações a c a rid ad e” (R o m
5, 5 ), isto é, o am or que u n e e v iv ifica: “ E u
sou a videira, vós sois os r a m o s ... perm anecei no
meu am o r.”
As consequências práticas
da existência do Corpo Místico
N osso S en h o r revelou-nos pela a firm ação : " E u
sou a videira, vós sois os ram o s”, a existência do
C risto M ístico.
J á q ue existe, êste Corpo M ístico deve exercer
suas funções e devem os encontrá-lo em atividade.
É ju stam en te o que acontece. E m v árias passagens
o texto sagrad o nos assinala consequências d a
união en tre o C hefe e os m em bros.
F alan d o N osso S en h o r do juizo u niversal, p ro ­
nuncia estas p alav ras: “ T iv e fom e a destes-m e de
co m e r. . . E sta v a n u e vestistes-m e. doente e visi­
tastes-m e . . . p obre e socorrestes-m e, porque, eu
vo-lo digo, o que fizestes ao m enor dos meus, a
mim é que o fizestes.” (M t 25, 36.)
Im possível a firm a r m ais categoricam ente a fu n ­
ção do C orpo M ístico. O pobre, o doente, o fa­
m into, é m em bro de C risto, como a m inha mão é
p a rte de mim m esm o; do m esm o modo que aquê-
le que tra ta do m eu ôlho, do m eu pé ou do m eu
braço, m e tra ta a mim , tam bém o que socorre um
m em bro de C risto, socorre o p ró p rio Cristo.
26 P R IM E IR A P A R T E

Pelo con trário , aquêle q ue fizesse s o fre r um m em ­


bro de C risto, fa ria so fre r o p ró p rio C risto. É nos­
so Sen h o r quem o a firm a claram ente. Q u an d o S.
P aulo, fulm inado no cam inho de D am asco, lhe p e r­
g untou : “ S enhor, que quereis de m im ?” respondeu:
“ E u sou Je su s a quem persegues.” (A t 9, 4 .) S.
P aulo com preende logo'o sentido p ro fu n d o desta p a­
lavra: p ersegue a C risto, porque ataca seus m em ­
bros.
Seria não co m preender bem o pensam ento do
g rande A póstolo v er n esta palav ra um a sim ples
figura de linguagem em vez da ex p ressão ex a ta da
realidade. S an to A gostinho no ta que, se não fôsse­
mos seus m em bros, Je su s C risto não d iria a S au-
lo: “ P o r que m e perseg u es?” , pois Saulo não O
perseguia, m as aos seus m em bros. Jesu s Cristo
não quis dizer: a m eus santos, a m eus servos, ou
m ais h onrosam ente: a m eus irm ãos, mas a m im ,
isto é, a m eus m em bros, dos quais sou a C abeça3.
Assim , dependendo d esta Cabeça, nós os m em ­
bros “somos todos um m esm o corpo em C risto ” .
(R om 12, 5.)
São Paulo insiste sôbre
Cristo místico
N unca será dem ais insistir sôbre esta existên­
cia do C risto M ístico e da nossa união com êle.
Êste m istério é, com efeito, o fundam ento de
nossa p articipação no sacrifício do C alvário renova­
do todos os d ias no a ltar. U m cristão não poderá
celebrar “su a ” M issa com Je su s Sacerdote, se
não tiv er idéias e x atas de suas relações com Êle.
P o r esta razão é necessário conhecer sem pre
mais o que é o Corpo M ístico, con fo rm e S. P a u ­
lo insiste na im portância desta g ra n d e verdade.
“D a m esm a fo rm a, — diz êle, — que em um só
corpo tem os m uitos m em bros q ue não têm todos

3) T ra c t, in Jo 28.
CA P. II. O CR ISTÃO , M E M BR O D E C R IS T O 27

a m esm a função, assim som os u m só corpo cm C ris­


to e m em bros uns dos o u tro s.” (R o m 12, 4. 5.)
A diversidade dos órgãos, longe de d an ific a r o
corpo hum ano, dá-lhe a o rdem e a h arm o n ia ; da
mesm a form a, a v ariedade do Corpo M istico dá-
lhe a beleza: “O corpo não é um só m em bro, mas
m u ito s ... se fôsse um só m em bro, onde estaria
o corp o ?" (1 C or 12, 14. 19.) “ O corpo é um
e tem m uitos m em bros, e todos os m em bros, seja
qual f ô r o seu núm ero, form am uin só corpo:
o m esm o se dá com C risto.” (1 C or 12, 12.)
T odos êstes m em bros, u nidos e n tre si porque
participam da vida do C hefe, estão ligados uns aos
o utros e não podem disp en sar os m útuos serviços:
“Q uand o um m em bro so fre, todos tom am p arte
em sua p e n a ; q u ando um m em bro é h o nrado, to­
dos com partilham da sua aleg ria.” ( I C o r 12, 26.)
N ão se pode a firm a r m ais categoricam ente a
união dos fiéis com C risto e de C risto com os
fiéis.
O C risto “com pleto” , total, íntegro, encarregado
de o ferecer etern am en te a D eus sôbre o a lta r e
no céu a hom enagem da criação que serve de pe­
destal à sua hum anidade, é o “ C hefe e seus m em ­
b ros” , êste todo imenso que é o C risto M ístico:
“ V ós sois todos ju n to s o C orpo de C risto e indi­
vidualm ente sois seus m em bros.” (1 C o r 12, 25.)
Som os m em bros de Je su s Cristo. E s ta é a nossa
condição. N ão som os apenas seus servos ou “ m ais
honrosam ente seus irm ãos” , somos seus m em bros,
tra n sfo rm a d o s à sua imagem e unidos intim am en­
te a Êle. S eria p a ra d e se ja r que todos os fiéis
apreciassem no devido v alo r estas expressões que
encerram ex tra o rd in á ria s consequências p a ra suas
almas.
P R IM E IR A P A R T E

A cabeça de Corpo Místico


C risto é a C abeça d êste C orpo M ístico.
S. P au lo no-lo afirm a , particu larizan d o a fu n ­
ção de "c h e fe ” ex ercid a p o r Je su s C risto. “ D eus
— disse êle, — deu-o como Cabeça à Ig re ja que é
seu Corpo.” ( E f 1, 22.) O in flu x o v ital çircula
em nós, seus m em bros, p o r meio de C risto, como
po r interm édio de nossa cabeça circula o sangue
em nossos braços, nossas m ãos ou nossos pcs.
S. P au lo acrescenta: “A Ig re ja é, pois, o com­
plem ento de C risto.” ( E f 1, 23.) E la com pleta-o,
como o corpo com pleta nossa cabeça, p orque nossa
cabeça não ex erceria suas funções se não houves­
se um organism o a ela a n e x o .. .
O A póstolo term in a seu pensam ento dizendo:
“ A Ig re ja é o com plem ento d A quele que se com­
pleta inteiram en te em todos os seus m em bros”
( E f 1, 2 3 ), m ostran d o que C risto ficaria incom­
pleto, se os fiéis não estivessem associados como
m em bros vivos a êste “chefe incom parável” .
Q uan d o estam os an te o tabernáculo ou em face
do ostensório, pensem os que C risto p resen te é
a Cabeça d esta assem bléia cristã de que fazem os
p arte, e que Ele e nós, ali p resentes, não somos
sêres justap o sto s, m as um só corpo sob “esta ad ­
m irável C abeça” . “ N ão nos a fig u rem o s que C risto
esteja só na cabeça e ausente dos m em bros; não,
Êle está todo inteiro na cabeça e no corpo.” 4

Como Cristo Chefe C9tá ligado


ao seu Corpo Místico
Como está ligada esta Cabeça ao corpo? E co­
m o se operam en tre am bos as relações vitais? S.
P aulo e n tra em p a rticu larid ad es precisas p a ra m os­
tr a r que a u nião se pro d u z e n tre C risto e seu C or­

4) Aug. T ra c t, in J o 28.
CA P. n . O CR ISTÃO , M E M BR O D E C R IS T O 2»

po M ístico, de um m odo com parável em intim idade


ao que liga nossa cabeça aos nossos m em bros.
F alan d o de um visionário de C olossas, o A p ós­
tolo aponta-o abandonado às suas visões “e não
aderind o à Cabeça pela qual o Corpo inteiro, con­
servado e unido p o r meio dos n ervos e dos m ús­
culos, recebe o crescim ento, segundo a vontade de
D eus.” (C ol 2, 19.)
A prim eira condição p a ra que o Corpo receba da
C abeça a unidade, o crescim ento n orm al, todo o
influxo vital, é, pois, p ara êle aderir à Cabeça.
P o r falta de adesão a C risto, ésse visionário de­
caiu ; to rnou-se como um m em bro gang ren ad o que
será preciso desligar do tronco, se am eaçar com u­
nicar sua corrupção. D êste m odo, volvem os à a f ir ­
mação de C risto: “O sarm en to separado da cepa
será lançado ao fogo, como inútil e sêco.” (J o
15, 6.)
A adesão a Cristo, nossa Cabeça, é, pois, indis­
pensável à nossa vida sob ren atu ral. Q u ão loucos
aqueles que p retendem possuir um a v irtu d e v erd a­
deira e vital sem C risto ! Sem esta “ad esão” do
m em bro à Cabeça, isto é, sem a C arid ad e ou, p a ra
m elhor dizer, segundo a linguagem c o rren te da
piedade cristã, sem o estado de g raça, não pode
h a ver atos m eritórios, e p o rta n to não há salva­
ção.
Com preende-se que p a ra os fiéis convictos d estas
verdades não há situação m ais horrível p a ra a a l­
ma do que cair em pecado m ortal. " N a d a há, —
diz S an to A gostinho, — que o cristão tan to deva
recear como o viv er separad o do C orpo de C ris­
to. Se está separad o do Corpo de C risto, não é
mais seu m em bro, não é m ais anim ado pelo seu
E spírito . E o A póstolo diz q u e aquele que n ão
30 P R IM E IR A P A R T E

tem o E sp írito de C risto não faz m ais p a rte de


C risto.” 5
Verem os, a seguir, as im ensas consequências
que resultam d esta necessidade de a d e rir ao C or­
po M ístico de C risto pela prática d a vida espiritual,
tôda baseada nos alicerces da caridade, "derram a­
da na alm a pelo E sp írito S a n to ” . (R o m 5, 5.)
A função dos membros
no Corpo Místico
Como no corpo hum ano há m em bros v ariados
que exercem diversas funções, o m esm o se d á com
o C orpo M ístico de Cristo. “ O corpo não é um
só m em bro, m as um conju n to de m u i to s ... Se o
todo fôsse um só m em bro, onde estaria o co rp o ?”
(1 Cor 12, 27.)
N o C orpo M ístico de C risto cada m em bro possui
a im portância relativ a que lhe c pró p ria. Cada
um, com efeito, tem sua g raça, seu “carism a” co­
mo disse S. P aulo. U m é apóstolo, o u tro p ro feta,
o terceiro d o u to r; u ns são tau m atu rg o s, e ou tros
têm o encargo do govêrno.” (1 C o r 12, 28.) A ssim
o Corpo M ístico de C risto é do tad o de todos os
órgãos que lhe são necessários.
M as todos êstes m em bros, seja qual fô r o seu
papel, só poderão exercê-lo se viverem , isto é, se
forem en x ertad o s no C hefe: o ra esta ligação só
pode su b sistir plenam ente pelo estado de graça.
P o r isto é que, depois de te r enum erado os div er­
sos dons g ra tu ito s que D eus pode fa zer às al­
mas, o A póstolo acrescenta: “ M as esforçai-vos p or
obter m elhores “carism as” . . . E m ostro-vos um
cam inho ainda m ais excelente” . (1 C or 12, 31.)
Êste cam inho é o da “carid ad e” , sem a qual se­
ria inútil fa la r até a língua dos an jo s (1 C or 13, 1)

5) Aug. T ra c t. in J o 27, in m ed iu m .
CA P. II. O CR ISTÃO , M E M BR O D E C R IS T O 31

e fazer m ilagres, p orque sem ela o m em bro não


poderia mais a d e rir à C abeça e m o rreria.
Gravem os, po rtan to , em nosso espirito o conse­
lho de S. P a u lo : “A spirai à caridade. ” (1 Cor
14, 1.) Q ue a vida de união com C risto pelo esta­
do de graça, solicitam ente conservado e san tam en­
te desenvolvido, seja a aspiração de nossa al­
ma, a preocupação de nosso espírito, o gran de
ideal de nossa v id a! Q u a isq u e r que sejam nossos
dons espiritu ais e nossos ofícios n este m undo, é
som ente do g ra u de nossa carid ad e que depende nos­
so papel no C orpo M ístico de C risto, e sua im por­
tância. Sem a caridade o fiel se to rn a incapaz de
colabo rar devidam ente com o sacrifício de C risto:
pode ser assistente ou espectador do S. M issa e
pode mesmo recolher alguns fru to s, porém cessa
de celebrá-la dignam ente.
Como nos tornamos membros de Cristo
•É pelo B atism o que nos torn am o s m em bros de
C risto, ou, em fa lta dp B atism o, pela caridade que
o sup re provisoriam ente. P elo B atism o "som os
enxertad o s nêle” (R o m 6, 5) como o ram o na
videira.
Sob a influencia dêste en x erto batism al o s a r­
m ento fica unido ao tronco e viv e; ou, c ontinuan­
do a m esm a com paração do início dêste capítulo, o
hom em p ecador expõe-se, pelo Batism o, aos raios
que d a rd e ja o Sol divino, C risto, e vil g rão de
•areia que era, to m a -se fulgente como o diam ante,
refletin d o a luz que recebe.
Quem poderá p in ta r a beleza de um a alm a b ati­
zada ?
Q ue causa, porém , dá m otivo a m etam o rfo se tão
van tajo sa ? A p ró p ria m o rte de C risto, q ue foi o
preço d eterm inado para re stau ração da g lória de
D eus. A ceitando livrem ente p a g ar no C alvário a
P R IM E IR A P A R T E

dívida de reparação d evida à M ajestad e suprem a,


Cristo m ereceu to rn ar-se C hefe e Cabeça de seus
redim idos: em razão dos direitos adquiridos p or
sua m orte, C risto tem , pois, o po d er de com unicar
sua vida e sua g raça aos seus m em bros. E is por
que S. P au lo nos diz: “ Ig n o rais que todos nós,
que fom os batizados em Cristo, fom os batizados
em sua m o rte ? ” O g ra n d e A póstolo acrescenta, p a­
ra insistir nesta verdade, aludindo à im ersão, rito
p rim itivo do Batism o, verd ad eiro sepultam ento:
“ Fom os, pois, pelo B atism o sepultados com Êle,
na m orte.” (R o m 6, 3.)
O novo m em bro goza, pois, d as v antagens que
o C hefe conquistou na m orte, p ara todo o seu
Corpo M ístico.
M as quais são êstes privilégios?
Os m esm os que os da Cabeça, de cu ja so rte êste
mem bro particip a dorav an te, a não ser q ue te ­
nha a loucura de se p a rar-se de C risto pelo peca­
do m ortal: um a vida gloriosa, etern a, sem trevas,
o que S. P au lo cham a a “vida no v a” e que a lin­
guagem c ristã designa correntem ente sob o nome
de vida da graça p a ra os m em bros q ue m ilitam
neste m undo, a qual se tra n s fo rm a rá em vida de
glória à sua e n trad a no paraíso. Ê ste é o sentido
da p alav ra de S. P aulo: “ Fom os, pois, pelo B atis­
m o sepultados com Êle na m orte, a fim de que,
do mesm o m odo q ue C risto ressuscitou dos m or­
tos p ara a gló ria do eterno Pai, assim nós tam ­
bém cam inhem os nesta nova v id a ; porque, se esta­
m os en x ertad o s nÊle, pela sem elhança de sua m or­
te, da m esm a fo rm a chegarem os p o r ela à sua
ressurreição .” (R o m 6, 5.)
E sta s expressões de São P a u lo com preendem -se
perfeitam en te, desde q ue p rocurem os sab er o que
nos querem ensinar, isto é, q ue nos tornem os, sob
CA P. I I. O CR ISTÃ O , M E M BR O D E C R IS T O 33

ç> influx o de um a vida santa, m em bros de Jesu s


Cristo.
A fibra, o osso, a arté ria , o nervo, os m em bros
todos do corpo sepultam -se na m orte, q u ando o
C orpo está m orto e o C hefe cerrou os olhos.
M as, se o C hefe ressuscita, cada m em bro tam bém
ressuscita: o nervo, o osso, a a rté ria revigoram -
se. E is p o r que o B atism o nos sepulta, a nós,
órgãos do Corpo de C risto, com C risto m o rren­
do por n ó s; eis p o r que nos ressuscita com Êle:
encerrando-nos nfele, como nossas veias, nossa c a r­
ne e nossos ossos estão em nós, obrigados a p a rti­
cipar do nosso destino, sem se poderem su b tra ir!
D esde logo, com preende-se que, p o r u m a conse­
quência p e rfeitam en te lógica, tudo q ue é de C risto
é nosso. Sua m orte é nossa m orte, pois, unindo-
nos ao seu Corpo M ístico, Êle com unica-nos todos
os fruto s de sua m o rte ; sua ressu rreição é nossa
ressurreição, pois participam os atualm en te de sua
vida re ssu sc ita d a ; sua ascensão é nossa ascensão,
pois, m em bros que som os, seguirem os au to m atica­
m ente a cabeça p a ra onde ela reside, p ara o c é u ;
seu sacrifício eucarístico, renovação m ística de sua
m orte, que é a nossa, é, 'com o verem os na conti­
nuação d esta o bra, “nossa” M issa.
Estamos em Jesus Cristo
A gora nos é fácil com preender a nossa situação
de fiéis batizados e em estado de graça, em re la­
ção a Jesu s C risto.
Som os seus m em bros “en x ertad o s nÊ le” , “se­
pultados com Ê le” , como as vérteb ras, as fibras,
os nervos estão integrados nas p ro fu n d ezas de
nossa carne. A ssim unidos a Êle, participam os de
sua vida p rópria, p orque seu E sp írito circula da
Cabeça divina p a ra os m em bros que a ela ad e­
rem , como circula em m inha m ão, em m eu estô­
P R IM E IR A P A R T E

mago, em m eus pulm ões e em todos os ó rgãos enT


cerrados em m im o in flu x o vital, p roveniente de
m inha alm a.
Desde êsse m om ento, pro p riam en te falando, nós
estam os em C risto Jesus.
E sta ex p ressão volta a cada passo sob a pena
de S. P a u lo . E ste C risto Je su s de quem fala o A pós­
tolo, não é sim plesm ente Je su s Salvador, em sua
existência terre stre , m as C risto Jesu s C hefe glo­
rioso d a Ig re ja , C hefe m istico, que ab ran g e ca­
beça e m em bros, cepa e ram os, verd ad eiro templo
do E sp írito S anto que o anim a.
E m Cristo Jesu s! E is em quem vivem os! “Q uem
perm anece em m im ” , isto é, um m em bro que ad e­
re ao C hefe, “dá fru to , p o rq u e sem m im nada
podeis fa z e r.” (J o 15, 5.)
E m Cristo J e su s! isto é, im ersos 110 in terior
do Corpo M ístico, como um ó rgão, m inúsculo tal­
vez, m as vivo e o perativo, somos infin itam en te hon­
rados em p a rtic ip a r da intim idade real do R ed en­
to r e G lo rificad o r etern o da S antíssim a T rin d ad e.
Só 110 céu terem os conhecim ento da p erfeição
e da intim idade desta união dos m em bros com
seu C hefe, "em C risto Je su s” .
A união de meu coração ou de meu dedo à m i­
nha pessòa d á ap enas um a idéia d isto : com efei­
to, a ligação de m inha m ão é n atu ral, física, tem ­
porária, e realiza-se sob a dependência de um a
alm a de po d er lim itad o ; ao passo que a união do
fiel com seu C hefe, ao Corpo M ístico, é sobre­
natu ra l, divina, de um a realidade p erfe ita como
tudo que é divino, operado sob a dependência do
E sp írito c riad o r e v ivificador, destin ad a a p e rd u ­
ra r sem pre no am or, na graça, na v irtu d e e, em
breve, na felicidade i n f i n it a ...
O corpo hum ano, cabeça e m em bros, do qual S.
Paulo se serve p a ra fa zer com preender o C risto
CAP. H . O CR IST Ã O , M E M BR O D E C R IS T O 35

m ístico, é um a im agem que, longe de u ltra p a ssar


o que explica, fica m uito aquém da realidade. D aí
se pode d ed u zir o sentido p ro fu n d o contido nes­
tas palav ras que tan tas vêzes, talvez, ouvim os sem
gran d e em oção: “ Sois o corpo de C risto e indivi­
dualm ente seus m em bros.” (1 C or 12, 25.)
Conclusões práticas
A n te s de falar, no capítulo seguinte, do g ran de
ato que com pleta C risto m ístico, a celebração do
Sacrifício infinito, tirem os logo as conclusões que
n a turalm en te se deduzem d as g ran d es v erdades
que acabam de ser enunciadas.
1) R ecordem os a célebre p a lav ra de São L eão
M agno: “ Reconhece, ó cristão, tua dignidade e,
tendo-te torn ad o p articip an te da N a tu re z a divina,
evita v o lta r à baixeza de o u tro ra p o r um p roce­
dim ento degenerado. R eco rd a-te de que Cabeça
e de que Corpo és m em bro.” 1
E sta é a razão p o r que devem os re sp eitar nossa
alm a e nosso c o r p o ! . . . p o r que não devem os m an­
char nosso espírito p o r m aus pensam entos, por lei­
tu ras im o ra is ! . . . p o r que n ão devem os en tre g ar
nossos m em bros a atos culpáveis!
Q u an ta s pessoas h á que, se tivessem sem pre p re ­
sente ao espírito o pensam ento de que são m em ­
bros de C risto, fugiriam até da som bra do peca­
do, segundo o conselho de S. P au lo : “A bstende-
vos até da ap arência do m al.” (1 T ess 5, 22.)
2 ) N a d a receem os tan to como ser arran cad os
do Chefe. “O cristão nada d ev erá recear tan to co­
mo ser separado do Corpo de C risto.” 2 D á-se, en­
tão, verd ad eiram en te a m orte, porque, desde o m o­
m ento em que o m em bro é ap a rta d o de C risto, não
está m ais em com unicação com o C hefe e não re ­

1) São Leão Magno, Sermão 1. de Nat. Dni.


2) Aug. Tract. in Jo 27 p. médium.
P R IM E IR A P A R T E

cebe m ais o E sp írito S anto, que é a fonte da g ra ­


ça e da vida sobren atu ral.
Santo A gostinho explica adm iravelm ente esta
necessidade de a d e rir ao Corpo de C risto p a ra dê-
le receber a vida e o esp írito: “ Só vive da alm a
de C risto o Corpo de C ris to . . . queres tu tam bém
viver d a alm a de C risto ? Perm an ece no C orpo de
C risto.”
E m ais ad ian te o g ran d e D o u to r acrescenta: “O
m eu corpo vive acaso de tua alm a, e teu corpo da
m inha? D o mesm o m odo o Corpo de C risto só
pode viver da alm a de C r i s t o .. . A ssim , pois, ape-
ga-te ao Corpo de C risto, vive de D eus p ara
D e u s .. . eis o que é belo, o p ortuno, sa lu ta r.” 3
Se com preenderm os estas belas p alav ras de S a n ­
to A gostinho, n ão h a v e rá p a ra nós receio m aior
que o de p e rd er o contacto de Cristo. R epitam os
hum ildem ente as p alav ras que a Ig re ja nos faz
rep e tir em cada S. M issa n as orações que p rece­
dem à C om unhão: “ N ão p erm itais, S enhor, que
me eu sep are jam ais de vós.”
3) Se q uiserm os ap reciar cada dia m ais, no
devido valor, nossa qualidade de m em bros de C ris­
to, trabalhem os com tôdas as fô rças p a ra estre ita r
os laços que nos unem a êste C hefe adorável,
procuran d o nossa p erfeição pessoal, e esforcem o-
nos po r re c ru ta r-L h e novos m em bros, exercendo
o apostolado: perfeição pessoal e apostolado! N a
m edida com a qual tenderm os a êste duplo fim, es­
tim arem os nossa g ran d eza e dignidade, segundo
a p alav ra de S a n to A gostinho: “ O s fiéis conhe­
cem o C orpo de C risto, q u ando não d eixam de es-
forçar-se p a ra se r o Corpo de C risto.”4
4 ) O m ais precioso resultado do nosso conheci­
m ento do Corpo M ístico será nossa colaboração,

3) Aug. Tract, in Jo 26 p. med.


4) Aug. ibidem.
CAP. m . O M E M BR O S E O F E R E C E 37

cada dia mais p e rfeita, ao santo sacrifício d a M is­


sa. O ato essencial da religião, a hom enagem que
C risto repete ta n ta s vêzes à S antíssim a T rin d ad e,
em v irtu d e de nossa “ in corporação” a C risto, não
se pode e fe tu a r sem nós. A s páginas que vão se­
g u ir terão ju sta m e n te p o r escopo m o stra r que a S.
M issa c “nossa” M issa, porque, com Je su s S a ­
cerdote, som os na S. M issa sacrificad o res e v íti­
mas.

C A P ÍT U L O I I I
O MEMBRO SE OFERECE E SACRIFICA
COM O CHEFE
É O "CRISTO TOTAL", ISTO É, UNIDO A SEU CORPO
MÍSTICO. QUE "OFERECE" O SANTO SACRIFÍCIO.
ÊSTE MESMO CRISTO SE OFERECE TOTALMENTE. IS­
TO Ê, OFERECE-SE A SI PRÓPRIO A DEUS E OFERE­
CE JUNTAMENTE SEU CORPO MÍSTICO.
POR CONSEQUÊNCIA. O FIEL, MEMBRO DÊSTE CORPO
MÍSTICO, "OFERECE" DE SUA PARTE, COM CRISTO O
SANTO SACRIFÍCIO A DIVINA MAJESTADE, E É,
POIS, "SACERDOTE" COM CRISTO.
DE SUA PARTE. O FIE L TAMBÉM “SE OFERECE” COM
CRISTO A MESMA INFINITA TRINDADE E fi “VITI­
MA" COM ÊLE.
Quem é o sacrificador na Santa Missa?
Bem erro n eam en te im aginam alguns que Jesus
Cristo, sum o S acerdote do A ltíssim o, não apela p a­
ra o nosso concurso, a fim de ex e c u ta r a im olação
do altar.
E videntem ente, seu pró p rio Corpo e v erdadeiro
Sangue, d erram ad o no Calvário, estão p resentes
sóbre a lta r na S an ta M is sa ; m as Jesu s C risto, S u­
mo Sacerdote, não o ferece êstes dons infin ito s sem
n ó s ; e da m esm a fo rm a não p rescinde de nós, m em ­
bros de seu C orpo M ístico, p a ra p re sta r o culto
de suprem a hom enagem à Santíssim a T rin d ad e.
O ra, com o vim os no capítulo precedente, C risto
criou p a ra si, pelo Batism o, m em bros, q ue a Con­
firm ação aperfeiçoou. A lguns d estes m em bros par-
38 P R IM E IR A P A R T E

ticipam de unia m an eira m uito íntim a e oficial do


seu sacerdócio, pelo sacram ento d a O rd em , e o
E sp irito de caridade, a alm a viva e vivificad o ra
da Ig re ja , Corpo M ístico de C risto, nêles habita,
enquanto não se separam do seu C hefe pelo peca­
do grave.
Êstes m em bros, u nidos à Cabeça como o galho
ao tronco, particip am inevitavelm ente da vida dês-
te C hefe e a Êle estão unidos em tôd as as fu n ­
ções sacerdotais. A ssim , pois, no m om ento em que
C risto ex erce seu sublim e m inistério, rentJVando a
ofere n d a do Sacrificio cruento do C alvário, e apre-
sentando-o de novo à San tíssim a T rin d a d e em
um a hom enagem infinita, Êle não está nem pode
estar separado de nós, dos sacerdotes, em prim ei­
ro lugar, e, em seguida, dos fiéis.
S anto A gostinho di-lo claram ente: “ O sa c rifí­
cio dos cristãos consiste em fo rm a r um só Corpo
com Je su s C risto.” 1 Jesu s e seus m em bros, isto
é, o C risto M ístico, eis o verdad eiro sa crifica­
d or na S an ta M issa!
P o rta n to , desde o m om ento em que êste “che­
fe incom parável” u n iu a si o u tro s m em bros, não
lhe é m ais possível p re sta r, sem êles, culto à di­
vina M ajestad e, assim como não nos é possível
d esem penhar q u alq u er de nossas obrigações, dei­
xando alguns de nossos ó rgãos em casa.
Como se efetua a oblação
pelo Corpo Místico, na Santa Missa
A qui d esp erta n a tu ralm en te um a objeção no es­
pírito do le ito r:
A pós a consagração, só o Corpo e o Sangue de
C risto é que estão no a lta r, sob as espécies sa^
cram entais. O sacram ento da E u c a ristia contém o
“ C hefe” do C orpo M ístic o ; m as é evidente que não

1) Cidade de Deus, 1. 10, c. 20.


CAP. I II . O M E M BR O S E O F E R E C E 39

contém nenhum dos seus m em bros. Como é então


possível e sta r Je su s C risto p resen te na hóstia e
no cálice sem seus fiéis, e os fiéis to m arem p arte
real e eficaz na celebração d a S a n ta M issa?
A resposta a esta objeção é fácil: R ealm ente só
C risto está p resen te no a lta r ; é incontestável. M as
esta presença do chefe está ligada à ação de seus
m em bros, e isto de d uas m aneiras:
1) A oblação da S an ta M issa é feita pela Ig re ­
ja inteira, isto é, pelo C orpo M ístico unido ao seu
Chefe. A Ig re ja d eclara ex pressam ente e em v á­
rias asserções q ue esta oblação de C risto é sua
oblação: " N ó s oferecem o-V os, S enhor, êste cáli­
ce da s a lv a ç ã o .. . ” 2 “ Q ue nosso sacrifício V os se­
ja a g r a d á v e l ...” 3
Se Jesu s C risto, pois, se sacrifica sôbre o altar,
é todo o C orpo M ístico unido a Êle que O im ola e
oferece a seu Pai. A presen ça sacram en tal q u e re ­
sulta rá só p a ra o chefe, é inseparável do sa c rifí­
cio oferecido pelo C risto total.
2) C risto, o único presen te no a lta r depois da
consagração, a tu a . como “ C risto to ta l” unido a
tôda a Ig re ja , que é seu com plem ento indispensá­
vel e inseparável. P o r isso podem os dizer logo
após a elevação: “ N ós oferecem os à V ossa divina
M ajestad e o dom que de V ós re c e b e m o s.. . a pão
sagrado de v id a . . . e o cálice da salvação e ter­
na.”4 “ N ós todos, particip an tes neste a l t a r . . . que
sejam os repletos de tôda a bênção.”5
T ôda a L itu rg ia da S. M issa, como verem os a
seguir, vem co n firm a r a existência d esta ação co­
mum do C hefe e dos m em bros.

2) Ordinário da S. Missa. Oblação do cálice.


3) Ibid. Oração antes da bênção.
4) Ibid. Cànon.
5) Ibid.
P R IM E IR A P A R T E

N a v erdade, é o C risto M ístico que, p o r in ter­


m édio de seus m em bros sacerdotes, o ferece o santo
Sacrifício do C alvário, em união com todos os
seus m em bros.
Nós, simples fiéis, m em bros do Corpo M ístico
de C risto, estam os, pois, intim am ente associados ao
sacerdócio de Je su s C risto, so berano Pon tífice, já
que pelas m ãos dos sacerdotes nós m esm os o fe re ­
cemos a oblação s a n ta !
P o r isso é que S. P e d ro cham a o povo cristão
“ raça eleita, sacerdócio real” . (1 P ed 2, 9.) E ain­
da: “ Sacerdócio santo, encarregado de o ferecer
sacrifícios esp irituais, agrad áv eis a D eus." (1 Ped
2, 5.)
E is p o r que S. João, no A pocalipe, exclam a:
“ C risto fêz-nos sacerdotes de D eus, seu P a i.”
(A poc 1, 6.)
A ssim a unção sacerdotal q ue pen etra o C risto
total e o to rn a sum o sacerdote, espalha-se e des-
lisa "com o um a ro m a que desce da cabeça p ara a
barba de A a rã o ” (S I 132), espalhando-se com a bun­
dância e eficácia p o r todos os m em bros do C orpo
M ístico, co nform e são elevados às funções do cul­
to, com o tão vivam ente o explica Santo A gostinho:
“ N osso Senhor, nosso C hefe, foi ungido, e tam ­
bém seu Corpo, que som os nós.”°
Q u e doce e consoladora v e r d a d e ! E u , pobre a l­
ma cristã, tão ig n o rad a e tão fraca, estou intim a­
mente’ associada à m aio r ação que se possa realizar
neste m u n d o ! . . . eu, de m inha p arte, sou cau­
sa p a ra êsse a t o ! . . . contribuo eficaz e pessoal­
m ente p a ra a g lória da Santíssim a T rin d a d e e p a­
ra a salvação do m u n d o ! . . .

6) In Ps. 26.
CAP. III . O M E M BR O S E O F E R E C E 41

Qual a medida de nossa parte pessoal


no papel de sacrificador?
E videntem ente, os m em bros que, unidos a C ris­
to, apresentam a oblação, não possuem todos o
mesm o papel que o C hefe: Êle n a tu ralm en te ex e r­
ce a função principal e os sacerdotes têm o p o­
d e r m aravilhoso de consag rar, m as os sim ples fiéis
só cooperam com a o feren d a, n a m edida de sua
im portância no Corpo M ístico ; m as, de qualq u er
modo, cooperam os com ela.
Q u an d o um réu se lança aos pés de seu ju iz
para abrandá-lo, os joelhos do suplicante não têm
o m esm o po d er p a ra im p lo rar que suas m ãos, as
m ãos o mesm o po d er que a bôca, a bôca o m es­
mo pod er que o coração. E , no entanto, o ser in­
teiro, pés, mãos, cabeça, concorrem p a ra to rn a r
eloquente a súplica.
O m esm o se d á com o C risto M ístico g lo rifican­
do e im plorando a a u g u sta M ajestade. É "Ê le
todo” q ue oferece, isto é, Êle com todos os seus
m em bros, C risto, Cabeça e C orpo M ístico, que se
eleva p ara re n d er à S antíssim a T rin d a d e a h o­
m enagem infinita. O p oder de sua súplica recebe
algum a coisa de cada um dos m em bros que im plo­
ram com Êle. P o r m ínim a que seja a ação de al­
guns dêsses m em bros, não d eixa, todavia, de con­
c o rrer p a ra o efeito total.
A pa rte que tem os n esta hom enagem é, portait-
to, v a riá v e l; é p ro porcionada à im portância rela­
tiva que cada um de nós ocupa no C orpo M ístico,
e esta m esm a im portância depende ain d a do p a­
pel que desem penham os na S a n ta Ig re ja e da in­
tensidade de vida sobren atu ral que em nós circula.
Como na u nidade da Ig re ja , C orpo M ístico de
Cristo, as funções variam in d e fin id am en te; cada
m em bro, con fo rm e os p ró p rio s dons espiritu ais e
o g rau de carid ad e e de união com a Cabeça, coo­
42 P R IM E IR A PA RTE

pera m ais ou menos na oblação. M as todo m em ­


bro vivo de Cristo, se ja qual fô r sua ação, “ce­
lebra” com C risto.
Cada fiel pode, pois, com tôda a verd ad e di­
zer “ m inha” M issa, p orque Je su s C risto quis que
ela fôsse nossa desde o dia em que associou os
fiéis como m em bros de seu C orpo M ístico.
R eflitam os nestas m aravilhas, invisíveis aos nos­
sos olhos, porém reais, quando nos aproxim am os
do alta r, no qual oferecem os com C risto, em C ris­
to e po r C risto, o p e rfeito Sacrifício.
Se tivéssem os consciência de ser, tam bém de nos­
sa parte, sacrificadores, não teríam os sentim en­
tos d a m ais viva piedade ao assistirm os à S an ta
M issa ?
N ão teríam os d esejo de conhecer m elhor a S an­
ta M issa, seus ritos, suas orações, e tôda a sua sig­
nificação, a fim de po d er o fe re c e r digna e copio­
sam ente o nosso S acrifício?
A vítima
O s que têm p ropensão p a ra ac re d ita r que C risto
o ferece sozinho o sacrifício da S. M issa, pen­
sam logo que Êle se o ferece sozinho a seu P ai
no a ltar. É um êrro . A ssim como o Sacerdote do
sacrifício d a S. M issa é C risto M ístico, tam bém
a vítim a é C risto M ístico.
C risto, C abeça e m em bros, o fe re c e ; C risto, Ca­
beça e m em bros, se oferece. Se Êle não pode se­
p a ra r de si os m em bros p a ra oferecer, tam bém
L he é preciso conservá-los p a ra se oferecer. E is
como nós, m em bros de C risto, tem os a h o n ra im en­
sa e desconhecida p o r tan to s fiéis, de se r vítim as
com Êle no santo sacrifício d a M issa.
S. P au lo explica-nos esta verd ad e p o r um a e x ­
pressão adm irável: “ C ompleto em m inha p ró p ria
carne o que fa lta aos so frim en to s de C risto quanto
ao seu Corpo, q ue é a Ig re ja .” (C ol 1, 24.)
CAP. m . O M E M BR O S E O F E R E C E 43

E n tã o ainda fa lta a C risto algum so frim en to?


P a ra o resgate, é certo q ue não. Com o Chefe, so­
fre u tudo que podia s o fre r de dores, ainda que a
m ínim a d e n tre elas teria sido suficiente p a ra o res­
gate do m u n d o . . . M as, se a Cabeça pagou su-
perabun d an tem en te a dívida in fin ita p a ra com
a divina M ajestade, os m em bros de C risto devem
ainda so fre r, a fim de que h a ja harm o n ia en tre
os m em bros e a Cabeça. E m todo corpo bem re g u ­
lado rein a en tre os órgãos e a cabeça, e en tre os
próprio s órgãos, um a p erfe ita corresp o n d ên cia: a s­
sim deve dar-se o m esm o e n tre a C abeça do C or­
po M ístico e seus m em bros, p a ra que C risto seja
um a vítim a "com pleta” .
A Ig re ja , que c o “com plem ento” de C risto, de­
ve viver d a vida de seu C hefe e co m p artilh ar sua
sorte. P o rta n to , se a cabeça so fre u como vítim a e
cada dia repete sua oblação, a fim de perm itir-nos
a com participação, os m em bros tam bém , p a ra asse­
m elharem -se ao Chefe, devem su p o rta r, em união
com Êle, um a c erta cópia de sofrim entos, sob pe­
na de se separarem dÊle, recusando-se a co laborar
no seu Sacrifício.
N a v erdade, quem recua an te as m ortificações
indispensáveis, im postas pela p rática sincera da
fé cristã, p o r exem plo, o ra r, je ju a r, san tific a r o
dom ingo, g u a rd a r a castidade em seu estado, fu ­
g ir das ocasiões de pecado, etc., não so fre com
Cristo, separa-se dÊle, como um ram o destacado
do tronco, e cessa de celeb rar o S acrifício com o
Corpo M ístico, porque, de sua p arte, recusa ser
tam bém vítim a.
Pelo contrário, os m em bros q ue g enerosam ente
harm onizam com a Cabeça, encontram nesta união
a m aravilhosa vantagem “de com pletar em sua
própria carn e o q ue falta aos so frim en to s de C ris­
to.” N a realidade, em um corpo norm al, as d ores
44 P R IM E IR A PARTE

de um m em bro a fetam todo o organism o: “Q u a n ­


do um m em bro so fre , todos particip am de sua pe­
na.” (1 C or 12.) O C hefe so fre, pois, conosco,
não na hipótese de que so fra atualm en te nossas
dores, m as p orque “as tom a como p ró p ria s” . E is o
m otivo p o r que os sofrim en to s dos m em bros são
na verdade os de Jesu s C risto, seu C hefe, pois
Jesus vive naqueles que são dêle, e p o r isso pode-
se dizer com S. L eão, “que a p aix ão do S a lv ad o r se
prolonga até o fim dos tem pos” 7, isto é, enquanto
um a p a rte do C orpo M ístico so fre r neste m undo.
M as como pode C risto C hefe, atualm en te glorio­
so, “ to rn a r seus” os atu ais so frim en to s de seus
m em bros p ara “ com pletar sua P a ix ã o ” ?
P orq u e os so frim entos, quotidianam ente acres­
centados pela Ig re ja ao sacrifício que o C oipo
M ístico o ferece na S an ta M issa, form am p a ra a
paixão um com plem ento esperado p o r C risto
mesmo.
Com efeito, no m om ento de sua m orte na C ruz,
conhecendo o S a lv ad o r cada um de seus m em bros
fu turos, o ferecia-se com êles e o ferecia-os con­
sigo em seu pensam ento com o um a hom enagem
volutariam en te com pleta à divina M ajestad e. M as
eis que cada dia esta hom enagem prev ista e dese­
ja d a po r C risto, esta o fe ren d a p ro fé tic a de nossos
próprio s sofrim en to s e m o rtificações c ristãs se efe­
tuam realm ente: as previsões do C hefe realizam -
se no dom ínio dos fato s pelos sacrifícios atu ais de
cada um de seus m em bros. A ssim é que, p ro p ria­
m ente falando, cada um de nós, oferecendo-se com
C risto na S. M issa, "com pleta o que fa lta à sua
P a ix ã o ” .

7) D’Allioli, Com. ad Col 1, 24.


CAP. I II . O M E M B R O S E O F E R E C E 45

O Corpo Místico é, pois,


vítima do sacrifício
E sta noção da “V ítim a M ística " oferecid a no
a lta r pelo ch efe adorável está h o je m uito esqueci­
da pela piedade, que nela te ria um alim ento sólido
e inesgotável. A atenção dos fiéis, p o r não se d iri­
g ir bastante p ara estas v erdades fundam entais, dis-
trai-se com as m inudências, que são ap enas conse­
quências distantes dos g ran d es princípios teoló­
gicos.
O s p rim eiros cristãos, na escola dos P a d res da
Ig re ja , viviam , m ais do que nós, d esta g ra n d e idéia
de união ao Corpo M ístico; ouviam p re g a r sem ­
pre sôbre esta g ran d e v erdade e eram levados a ti­
ra r as consequências p ráticas dela decorrentes.
Santo A gostinho não cessava de explicar aos fiéis
a vida cm C risto. Ê ste Corpo M ístico, — diz êle,
— é a vítim a o ferecida a D eus como hom enagem
perfeita : “ Como a Ig re ja é o corpo d êste C hefe
adorável, ap ren d e dÊ le a oferecer-se a si m esm a
por meio dÊ le” 8. O C orpo de C risto se oferece, pois,
p o r m eio de sua Cabeça. A Cabeça e n cerra a p a­
lavra, o pensam ento, a v ontade, e todos os m em ­
bros ap rendem dela a se o fe re c e r com ela como
um a vítim a única, partícip e de tôdas as g randezas
do Chefe.
E m o u tro capítulo do m esm o livro, o gran de
D o u to r diz: “T ô d a a cidade resg atad a, isto é, a
Ig re ja e a sociedade dos santos (o que significa
o Corpo M ístico in te iro ) consiste no sacrifício u n i­
versal, o ferecido a D eus pelo Sum o Sacerd o te.” 9
O Corpo M ístico, pois, é o “ sacrifício u n iv er­
sal” . E s ta verd ad e perm ite-nos ag o ra com preen­
d e r a adm irável p alav ra de S. P au lo : “ Suplico-vos,
m eus irm ãos, que ofereçais a D eus vossos co r­

8) Sto. Agost. Cidade de Deus, 1. 10, c. 20.


9) Ibid, 1. 10, c. 6.
46 P R IM E IR A PA R TE

pos como um a hóstia viva, santa, ag radável a D eus.”


(R o m 12, 1.)
É esta idéia da co-oblação dos m em bros do
Corpo M ístico como vítim as com seu C hefe, que
a Ig re ja exprim e em certas orações q ue lemos na
S an ta M issa. P o r exem plo, na secreta d a M issa do
bem -aventurado G rignion de M o n fo rt: "Q u e o
bem -aventurado L u ís M aria V os faça agradável,
ó meu D eus, nossa o fe rta , já que se im olou sem­
pre como um a hóstia viva e ag rad áv el.” E s ta o u tra
não c m enos sig n ificativa: “ S enhor, que êstes m is­
térios de V ossa paix ão nos dêem o fe rv o r celeste
com o qual S. P aulo, ao oferecê-los, im olava seu
corpo, como vítim a santa, viva e agrad áv el.” 10 N ão
se pode a firm a r m ais n itidam ente a cooperação dos
mem bros que, com o vítim as, celebram o santo sacri­
fício.
Fazem os p arte d êste S acrifício in finito, o fe re­
cido diariam en te p o r nossa cabeça, m as a títu lo de
m em bros que o ferecem e q ue se oferecem , sa­
crificad o res e vítim as, p ro porcionalm ente à nossa
vida so b ren atu ral e à nossa união a Cristo. “J e ­
sus C risto, — diz S a n to A gostinho — se oferece à
Santíssim a T rin d a d e e n este o ferecim ento inclui
todos os santos com o seus m em bros, e os santos
se oferecem ju n tam en te com Je su s C risto, seu Che­
fe. E é p o r êste m istério adm irável que Jesu s C ris­
to é, em sua pessoa e em seus m em bros ao m es­
mo tem po, a V ítim a p e rfeita e o Sacerdote e te r­
no.” 11
U m cristão, ao qual é revelado êste “adm irável
segrêdo” , po d erá assistir, in d ife re n te com o um
estranho, ao san to sacrifício d a M issa?

10) Secreta de S. Paulo da Cruz.


11) Sto. Ag. Cidade de Deus, 1. 10, c. 6.
CAP. m . O MEMBRO SE OFERECE 47

Nossos sacrifícios e o Sacrifício


E sta noção que acabam os de expor, acerca da
vítim a do san to sacrifício d a M issa, deve au x iliar-
nos a co m preender um a o u tra noção, a dos nossos
sacrifícios.
Q u an ta s alm as piedosas im aginam erron eam ente
que suas m ortificações, privações, sofrim en to s, têm
v alor intrínseco, isto é, p o r si m esm os? Êstes
cristãos, pouco instruídos, pensam que D eus se sa ­
tisfaça e lhes seja reconhecido pelo que se “dig­
n am ” oferecer-L h e. Ign o ram que seus pró p rios
m éritos são m enores aos olhos de D eus do que se­
riam os de um a form iga aos nossos olhos: p o r si
mesmos seus so frim en to s n ad a valem.
P o r que meio, então, estas p enas p o derão adqui­
rir algum valor e assu m ir aos olhos de D eus ca­
rá te r de “sacrifício s” ? S om ente incorporando-se ao
Sacrifício único, ao do S a lv ad o r Jesu s. E sta s m or­
tificações só são agrad áv eis à S antíssim a T rin d a ­
de, “ se com pletam o que fa lta à P a ix ã o de C ris­
to" ; C risto c “o S an to único, o único S enhor, o
único A ltíssim o” , o único S e r que tem “direito de
apresen tação ” an te a soberana M ajestad e de Deus.
O m ínim o dos sofrim en to s de C risto tem v alor
infinito, os de ou trem n ada valem sem êle.
É necessário, pois, que nossas penas pessoais
scjain p o r nós so frid as, “ e nquanto som os m em ­
bros de C risto ” unidos à Cabeça e p o r êsse meio
cooperam os em sua g ran d e oblação. Se são incor­
poradas ao S acrifício de C risto, nossas privações
têm o d ireito de se cham arem sacrifícios, têr-
mo que indica ab ertam en te q ue tom am p a rte na
hom enagem única de louvor e de reparação, e que
o seu fim c com pletar no Corpo M ístico o que
falta à P aix ão do Salvador.
O ra, êste S acrifício de C risto renova-se para
nós na S. M issa. O C hefe adorável rep ro d u z ex-
48 P R IM E IR A PA R TE

plicitam ente sua o feren d a, q ue au m en ta d ia ria ­


m ente pelos com plem entos q ue lhe proporcionam
os sofrim en to s de seus m em bros. C oinpreende-
se facilm ente que é na S. M issa, e p o r ela, que
nossos sacrifícios podem te r p ro p riam en te o nome
e o aspecto de “ sacrifício s” . A vida c ristã com
suas pro v as evolui, m esm o sem o perceberm os, em
tôrno da S an ta M issa, tem p o r causa a S an ta M is­
sa, c é coroada de êxito pela oblação que dela faz
C risto na S a n ta M issa. E isto é lógico: o Corpo
M ístico de C risto só existe, como seu C hefe ado­
rável, p a ra p re sta r pela S. M issa a hom enagem
de glória sup rem a a Deus.
A h ! quan to s fiéis desconhecem esta im p o rtân­
cia de sua M issa, na p ró p ria existência pessoal?
Sem o conhecerem , é verdade, gozam dos fru to s do
S acrifício, porq u e estão unidos a C risto pela g ra ­
ça e pela p rática das v irtu d es que a c a rre ta mil
privações e m ortificações cada d ia : assim , c v er­
dade, hon ram o eterno Pai e oferecem -L he p o r meio
de C risto suas penas. M as q u an tas vêzes vão bu s­
car Jesu s Cristo, onde Êle é apenas representação,
num a im agem, nu m a fórm ula, num gesto piedo­
so, enquanto, negligentes, esquecem m esm o de ir
procurá-L o , onde a tu a pessoalm ente com seus m em ­
bros e p o r êles, no san to sacrifício da M issa!
Por que meio podemos aumentar
nossa participação na missa,
# como sacrificadores e vítimas?
O meio consiste em au m e n ta r nossa união com
C risto. Q u an to m ais um fiel possui o espírito de
C risto, p ra tic a suas v irtudes, se dedica aos inte-
rêsses da g lória d a San tíssim a T rin d a d e , em su­
ma, quan to m ais faz sacrifícios em união com
seu C hefe, tan to m aio r p a rte tem na oblação e m e­
lhor celebra sua M issa.
CAP. I II . O M E M BR O S E O F E R E C E 49

D e tôdas as alm as u nidas a C risto na hom ena­


gem in fin ita do Calvário, quai foi a que mais co­
laborou p a ra a o fe re n d a do seu sacrifício ? F oi,
evidentem ente, a q ue m ais so fre u com Êle, a S an-
tissim a V irgem M aria.
M aria S antíssim a tinha tais direitos, p o r sua m a­
ternidad e divina, p ara se r a C o -redentora do gê­
nero hum ano que, m esm o sem sacrifícios, teria
m erecido êsse títu lo ; N osso S enhor, que te ria podi­
do, tam bém Êle, salvar-nos sem so frim en to , quis
que M aria SS . seguisse a m esm a lei. P o r isso ex i­
giu que sua p articipação na "p rim e ira M issa so­
lene” , no G ólgota, fôsse proporcional à cópia de
am arg u ra s que su p o rta ria aos pés da Cruz.
E que am a rg u ra s ! "S om os obrigados — ex ­
clama S. B ern ard o — a pro clam ar m ais que m á r­
tir A quela cujo coração terníssim o so fre u dores
que excedem a tudo que os sentidos corp o rais j a ­
mais su p o rta ra m .” 12 E is p o r que M aria, que foi
a vítim a m ais p erfeitam en te u n id a a C risto V íti­
ma, é ao m esm o tem po A que L h e está m ais in­
tim am ente u nida na oblação de hom enagem in fi­
nita do Sum o Sacerdote.
O s g ran d es S antos, p o r su a vez, tam bém , acu­
m ulando seus sofrim en to s, unem -se tão intim a­
m ente ao C hefe adorável na o feren d a do Calvário
renovada em nossos altares, que várias vêzes D eus
im prim iu visivelm ente na carn e de alguns dêles
os sagrad o s estigm as da P aix ão , p a ra m o stra r até
que ponto eram vítim as com C risto, e com o p a rti­
cipavam em sua oblação.
O ue vasto h o rizonte se a b re d ian te de nó s! N ós
também podem os to rn ar-n o s “sa crificad o res” , im­
po rtantes re p arad o res dos d ireito s de D eus, ado­

12) S. Bernardo, "Sermo de duodecim stellis”.


50 P R IM E IR A PA R TE

radores p erfeito s d a Santíssim a T rin d ad e, cola­


boradores ativos p a ra o resgate de nossos irm ãos.
E p o r que m eio? V ivendo u nidos ao Corpo M ís­
tico de C risto pela caridade, intensificando sem pre
m ais em nós seu E sp írito pela p rática d a v irtu d e e
da perfeição cristã, aceitando alegrem ente todos
os sacrifícios exigidos p ara a realização do ideal
cristão.
D êste modo, progred in d o em união de vontades,
de sentim entos e de ideal com o S acerdote Chefe,
serem os sem pre m ais associados em seu sacerd ó­
cio na hom enagem in fin ita que Êle rende à S a n tís­
sima T rin d ad e. >
Conclusão: aqueles que são celebrantes da missa,
e aqueles que o não são
T odo fiel em estado de graça é concelebrante com
Cristo, sendo o C risto total inseparável de seus
m em bros.
M as o valo r dessa concelebração está su jei­
to a m últiplas condições que o tornam d iversam en­
te apreciável. Êsse v alo r depende, pois:
1. da intensidade da caridade que anim a o cora­
ção de cada um dos m em bros de C risto. Q u a n ­
to m ais se am a ao chefe, m ais estreitos são os
laços de união com Êle e, p o rtan to , m ais p e rfeita
é a cooperação.
2. da assistência ao santo sacrifício. É certo que
tôda a Ig re ja , e, p o r conseguinte, q u alq u er m em­
bro de C risto, p articipa, de m odo g eral, de tôdas
as M issas, m esmo daquelas às quais não assiste.
M as a p articipação pessoal é incom paravelm ente
m aior que a cooperação u n iversal, p orque a assis­
tência à S an ta M issa perm ite um a co-oblação d i­
reta, ativa, v o lu n tária e, daí, m uito m eritó ria ;
3. da intenção. Q u an to m ais determ in ad a e atu al
fô r a intenção, m ais ativa se to m a a concelebra­
ção. P o r exem plo, o fiel que segue sua M issa,
CAP. m . O M E M B R O S E O F E R E C E 51

unindo suas orações às do sacerdote, id en tifican­


do a pró p ria v o ntade com a dêle, celebra su a M issa,
mais eficazm ente que o cristão, que, m esm o em es­
tado de g raça, assiste ao santo Sacrifício, meio dis­
traído, balbuciando algum as orações vocais p a ra
passar o tem p o ;
4. do desejo de assistir ao santo sacrifício. A
ausência, desde q ue não resu lte de negligência,
mas de real im possibilidade, pode se r su p rid a pe­
lo desejo de a ssistir ao santo S acrifício. D o mesmo
modo os fiéis que am am dev eras a C risto, e cu ja
piedade não se sente sa tisfeita com a celebração
de sua única M issa de cada m anhã, e não podem
seguir du as ou três, p o derão s u p rir esta im pos­
sibilidade, u nindo-se m entalm ente a tô d as as M is­
sas que se celebram naquele dia. É este o m eio
eficaz de um a p articipação p erp étu a na g ra n d e h o ­
m enagem de C r is to .. .
A o lado dos fiéis que celebram sua M issa real
e intencionalm ente, há cristãos infelizes q ue dela
p articipam só m uito im p e rfe ita m e n te ! A h ! são os
pobres pecadores, sep arados do Corpo M ístico pe­
lo pecado m ortal.
Êstes “ rám os m o rto s” não têm m ais a g raça de
Cristo, já não recebem a s e i v a ...
E p o r esta razão será a M issa com pletam ente
inútil p a ra êles? Pelo co n trá rio ; m as é preciso
que a ela assistam como verem os m ais a d ia n te 13.
S e o S an to S acrifício não é su a M issa, ao m enos
é a gra n d e intercessão de C risto p a ra os pecadores.
A assistência à S a n ta M issa é p a ra êles o m ais
precioso p en h o r da sua reabilitação.

13) 2.* parte: cap. 3.


52 P R IM E IR A PA R TE

C A P ÍT U L O IV
A S. MISSA, OBLAÇÃO DO CRISTO MÍSTICO
AS VERDADES CONTIDAS NOS CAPÍTULOS PRECEDEN­
TES ESTAO PATENTEADAS NA PRÓPRIA LITURGIA
DO SANTO SACRIFÍCIO DA MISSA. QUE ASSIM AS
VEM CONFIRMAR SOLIDAMENTE.
A S. Missa é a cena vlsivel da oblação
T ô d a a d o u trin a exposta desde o princípio dêste
volum e tem sua aplicação concreta e sua realiza­
ção na celebração da S a n ta M issa. É no a lta r que
se renova o S acrifício do C alvário, é no a lta r que
a oblação in cruenta, mas real, se reitera p o r in ter­
m édio do C risto m ístico.
M as p a ra a S. M issa p ô r em cena a oblação m ís­
tica, deve conter em seus ritos e nas fórm ulas que
usa a ex p ressão sensível dos acontecim entos sobre­
natu rais que renova. J á que realm ente oferecem os
a hom enagem suprem a, nós os m em bros, com nosso
C hefe, Sum o Sacerdote, como poderíam os e x e r­
cer nosso papel de sacrificad o res e de vítim as, se ês-
te não se patenteasse no d ecurso da san ta oblação
do Corpo e do S angue de Je su s C risto?
É po r isso que a Ig re ja não deixou de nos assi­
n a la r em têrm os precisos nosso papel no exercício
do sacrifício do a ltar. U m a le itu ra ate n ta d as o ra ­
ções e d as cerim ônias d a S. M issa m ostrar-no-lo-
á. Às p rovas d o u trin ais enunciadas nos capítulos
precedentes, a sa n ta L itu rg ia , cu ja au to rid a d e está
acim a de q u alq u er contestação, deverá acrescen tar
um a confirm ação prática e, p o r assim dizer, p alpá­
vel.
Nosso estudo lltúrg-lco tlmltar-se-á
& demonstração desejada
N ão é possível p re te n d e r aqui um estudo com ­
pleto da litu rg ia d a S an ta M issa. L iv ro s ad m iráveis
têm sido publicados, aos quais os fiéis, desejosos
de conhecer a h istó ria da S. M issa, a significação
A MISSA, OBLAÇAO DO C R IS T O M ÍSTICO 53

de cada um a de suas orações, o m odo de acom-


panhá-la, poderão rec o rre r com vantagem .
O presente volum e tende a um fim m ais re strito :
m o stra r ao m em bro do C orpo M ístico, isto é, ao
fiel em estado de g raça, q ue a oblação de C risto
é " su a ” M issa. S om ente n as p a rte s em que ela faz
resplandecer esta v erdade será a L itu rg ia evocada
no curso d as linhas que seguem .
Q uan d o os fiéis tiverem claram ente percebido
que a M issa de C risto é “su a ” M issa, quando ti­
verem bem com preendido o valo r de sua coopera­
ção pessoal na hom enagem infinita, te rã o a v e rd a ­
d eira noção do S acrifício do a ltar, sentir-se-ão mais
vivam ente im pelidos a a p ro fu n d a r suas m aravilhas,
porque p ossuirão neste caso o verd ad eiro fio con­
d u to r p a ra seg u ir com p roveito os a u to res que
abordam o assunto.

O que nos m ostrará a liturgia da missa


A s fórm ulas e os ritos da S an ta M issa nos fa ­
rão reconhecer ao vivo q u a tro v e rd ad es:
1." que os m em bros de C risto oferecem com Ê le;
2.° que êstes m em bros se o ferecem com Ê le;
3.” que o sacerdote visível e secundário, ao a lta r,
é ao m esm o tem po um m em bro que p o r sua
vez particip a da oblação, e é nosso representante
oficial e o de C risto;
4.° que C risto invisível é o Sacerd o te Suprem o
e principal.
Os têrmos pelos quais
nos oferecemos com Cristo
A liturgia da S an ta M issa está cheia de ex p res­
sões indicando que a M issa é “n o ssa", e que ela
é nosso sacrifício. U m a delas parece resu m ir to ­
das as ou tras. O sacerdote diz, com efeito, vol­
tando-se p a ra os fiéis: “O rai, irm ãos, p a ra q ue o
54 P R IM E IR A PA R TE

m eu e vosso sacrifício seja agrad áv el a D eu s.”1


A Ig re ja não receia rep etir que "nós o ferecem os"
o sacrifício "q u e é o nosso” à Santíssim a T rin d a ­
de.
E sta v erdade fundam en tal presid e a tô d a a
oblação.
À o fe rta do cálice, o tex to é expresso do seguin­
te modo: “ N ós V os oferecem os, S enhor, êste cáli­
ce da salvação.”2 .
A L itu rg ia insiste neste “nós o ferecem os” que
o sacerdote repete em várias p arte s: “ Recebei, ó
T rin d a d e S an ta, esta oblação que nós V os o fe­
recem os. . . ” 3 “S uplicam o-V os q ue aceiteis êste S a­
crifício que nós V os o fe re c e m o s.. . ”4
N ão c esta repetição bem significativ a? N ão é
perm itido, p o rtan to , d u v id ar de nossa colaboração
com o sacerdote ao a ltar.
A lguns fiéis p oderiam , todavia, im aginar que o
sacerdote diga “ nó s” como se dissesse “ eu” , por
simples m aneira de falar, servindo-se do "p lu ral
de dignidade” que c usado, p o r exem plo, pelo P a ­
pa quando se dirige ao m undo católico, ou pelo S r.
Bispo, q u ando diz: “ N ossos Irm ã o c a r ís s im o s ...”
M as a Ig re ja , que não adm ite o equívoco e que
tem interesse de esclarecer com plena luz esta g ra n ­
de verd ad e d a cooperação de todo o Corpo M ísti­
co na oblação, tom ou suas precauções p a ra m os­
tra r que êste “ nós” ab range tôd as as alm as unidas
a C risto pela graça.
A o o fe rtó rio , no m om ento em que o sacerdote
faz a oblação do cálice, a L itu rg ia explica logo
êste “ nós V os o ferecem os” p o r meio de um gesto
que particu lariza sua significação. N a s M issas so­
lenes o diácono eleva o cálice ju n ta m e n te com o

1) "Orate Fratres.” 2) Oblação do cálice.


3) Oferecimento à SS. Trindade.
4) Comêço do cânon.
A MISSA, OBLAÇAO DO C R IS T O M ÍSTICO 55

sacerdote e com êle recita, em voz escutável p o r


ambos, a fó rm u la da oblação: “ N ós oferecem o-
V o s . . . ” E ste “ nós” está, pois, bem no plu ral: re­
presenta duas pessoas, d as quais um a, que é o d iá ­
cono, tom a p a rte na ação sa n ta em lu g a r de todos
os fiéis.
Além disso, aquele q ue h esitasse ain d a acêrca
da pluralid ad e d êste “nós” enco n traria, em alguns
outros textos da S an ta M issa, os esclarecim entos
requeridos. A n tes da elevação, m uitas palav ras li-
túrgicas provam que êste “nó s” significa o sa cer­
dote e todo o povo cristão o ferecendo o santo
S acrifício com Jesu s C risto, Sacerdote principal.
N o mem ento dos vivos, o celebrante d i z : “ L em brai-
Vos, Senhor, dos V ossos servos, pelos quais V os
oferecem os ou êles V o s o ferecem esta oblação de
nossa s u b m is s ã o ...”
Pouco depois, 110 m om ento em que estende as
m ãos sôbre o cálice q ue vai consag rar, o celebran­
te diz: “ Suplicam o-V os, pois, S enhor, q u e rece­
bais favoravelm ente esta o fe ren d a de V osso se r­
vo e de tôda a V ossa f a m í l i a .. . ” 5
N ão está assim claram ente indicado que o sa­
crifício é a obra de todo o Corpo M ístico desig­
nada aqui nestes têrm os: “ tôda a V ossa fam ília” ?
Logo após a consagração, como p a ra novam en­
te a firm a r em face do p ró p rio C risto a união de
todo o Corpo M ístico com seu “chefe incom pará­
vel” , ali p resente no a lta r, a Ig re ja faz re p e tir o
“nós” , particu larizan d o de p ropósito o sentido que
êle encerra: “ N ós, V ossos servos, e todo o povo
s a n t o .. . (isto é, todo o C orpo M í s t i c o ) ... o fe ­
recem os à V ossa divina M ajestad e o dom que re ­
cebemos de V ó s . .

5) "Hanc igitur”.
6) Cânon: "Unde et memores.”
56 P R IM E IR A P A R T E

O cânon term in a pelo P a te r n oster, nova e so­


lene afirm a ç ã o d a cooperação dos fiéis e de C risto
na oblação. Com efeito, é com ordem do próprio
D eus que ousam os dizer: " P a d re nosso.” P o r que
esta desculpa: “ousam os d izer” ? E n tã o a fó r­
m ula P a d re N osso é assim au d aciosa? Sim, D eus
tem um F ilh o único e êste Filh o som os nós unidos
a C risto ; c o “ C risto M ístico” . Som os os m em­
bros de C risto, p o rtan to , todos nós, unidos à Ca­
beça, som os o único F ilh o de D eus. N ão som os, ao
lado de C risto, o u tro s filhos inum eráveis de Deus,
m as som os m em bros do F ilho único, o único que
tem as “com placências” , e sem o qual “n ada po­
dem os fa z e r” (Jo 15, 5 ), nem m esm o re citar o P a ­
d re N osso.
Som os, pois, nós, vós e eu, hum ildes fiéis, con­
fundidos n as som bras do tem plo, m as a ten to s à
oblação, ou ainda os ausentes, que unem a sua
intenção ao santo S acrifício, som os todos nós os
sacrificad o res m ui variáveis, isto é, segundo nos­
sa condição so b ren atu ral, nossa piedade, e nossa
v ontade pessoal.
E m sum a, a sa n ta L itu rg ia nos dem o n stra com
evidência que o Sacerd o te principal da S. M issa,
que oferece pelo m in istério do celebrante, é “ C ris­
to M ístico”, Cabeça e m em bros, no ponto de cres­
cim ento em que está -no co n ju n to atual de todos
os fiéis. Celebram os, pois, com Êle, cada um se­
g undo seu papel, pequeno eni com paração do d Lie,
porém gran d e, glorioso, m aravilhoso e tran scen­
dente, em relação à nossa n a tu ra l p e q u e n e z !

As prova9 lltúrglcas que mostram que


todo o Corpo Místico
é vitim a com Cristo
D esde que é C risto M ístico que oferece, é Êle
que se oferece, pois, no a lta r como no C alvário, o
sacerdote e a v ítim a são os m esmos.
A MISSA, OBLAÇAO D O C R IS T O M ÍSTICO 57

E is por que a Ig re ja , p o r sua L itu rg ia , m os­


tra visivelm ente que estam os in tim am ente unidos
à V ítim a do a lta r e com ela som os oferecidos. E ,
com efeito, o sacerdote m istu ra um a g o ta de ág ua
com o vinho. E ssa go ta de água som os nós. O u ­
çam os sôbre êste assunto a S. C ipriano: “A ág u a
sim boliza o povo c r i s t ã o ... p o r isso é q ue nos é
proibido, ao c o n sag rar o cálice, o fe recer só o vinho,
ou só a á g u a . . . O fe re c e r o vinho consagrado serh
m isturá-lo com água, seria com o se C risto pudes­
se ser o ferecido sem n ó s; m as, quando o vinho e
a água estão m istu rad o s, só então é que se re a­
liza a totalidade do sacram ento espiritual e ce­
leste.” 7
N ós, m em bros do Corpo M ístico, som os co-ví-
tim as com nosso C hefe. É p o r isso que, logo após
a o fe ren d a do pão e do vinho m istu rad o com água,
a Ig reja faz o sacerdote, que fala sem pre em nosso
nome, recitar:
“ E m espírito de hum ildade e com o coração con­
trito, fazei, S enhor, que seja m o s aceitos por Vós,
e que assim nosso sacrifício seja ag radável aos
Vossos o l h o s .. . ” .
Se o C risto C hefe fôsse Êle só a vítim a, te ría ­
m os acaso necessidade de p ed ir q ue “sejam os
aceitos” , e que “nosso sacrifício se ja a g rad áv el?
Assim a “ cabeça incom parável” n ão se o fe re ­
ce separad a de seus m em bros, m as com todo o
Corpo M ístico. Tam bém êle, p a ra que seja “a g ra­
dável” e por isso mesm o “aceito” , deve apresen­
tar-se e “o ferecer-se” com tôda a hum ildade e con­
trição: com tôda a hum ildade, isto é, aniquilando-
se após C risto ; com tôda a contrição, isto é, eli­
m inando de si as m enores causas de desunião com
êle. D esta form a, os m em bros do Corpo M ístico se­

7) S. C ipriano, C a rta 63.


P R IM E IR A P A R T E

rão certam en te “aceitos” como vitim as, pois são


apresen tad o s com seu Chefe, o qual a g rad a sem pre
infinitam en te à divina M ajestade.
Foi êste m esm o espírito de hum ildade e de con­
trição que d itou as ad m iráveis fórm ulas litú r-
gicas que são recitadas logo após a consagração
e nas quais a Ig re ja suplica ao A ltissim o que não
atenda às fraquezas de seus m em bros, m as aos
m éritos de seu C hefe, p ara recebê-la como um a
vítim a ag radável no santo sacrifício da M issa.
E m esm o depois que- C risto acaba de descer
sôbre o a lta r, as orações sacras tom am um tom
surpreen d en te de súplica, q u ando se poderiam até
esperar, talvez, tra n sp o rte s de entusiasm o: “ D ig­
nai-vos lan çar sôbre estas oferen d as, — diz o sa­
cerdote — um o lh a r propício e favorável, e acei­
tá-las como aceitastes os presentes de V osso ser­
vo, o ju sto Abel, o sacrifício do nosso p a tria rca
A braão, e o que V os o fereceu M elquisedeque.”
A cêrca d esta passagem do cânon da S. M issa,
ouçam os um dos a u to res que m elhor soube e x p ri­
m ir o pensam ento que ela desperta:
“ Ao o fertó rio , fom os associados como m em ­
bros do C orpo M ístico de C risto à oblação da
hóstia e do c á lic e ... entram o s como um g rã o de
trigo no pão ou como u m a baga de uva no cálice:
— O ra , tudo isto form a um a única e m esm a obla­
ção — diz Bossuet.
Se N osso S enhor, em quem D eus P ai pôs tô-
das as suas com placências, tem sem pre a certeza
de ser aceito p o r Êle, não acontece o m esm o co­
nosco, que nos oferecem os com Êle. A o lado d a
hóstia im aculada h á o u tra s hóstias m enos p u r a s . . .
E eis a razão pela qual a Ig re ja suplica a D eus
que se digne in sp irar a seus filhos as m esm as
disposições que tinham os san to s P a tria rc a s .” 8

S) Le Moing.
A MISSA, OBLAÇAO DO C R IS T O M ÍSTICO 59

E sta prim eira súplica em fav o r do C orpo M ís-


tico, que se oferece como um a v ítim a evidente­
m ente im perfeita, não basta p a ra satisfa z e r à S a n ­
ta Ig re ja . A L itu rg ia reto m a o m esm o p ensam en­
to de hum ildade e de súplica com um a nova in­
sistência: “ N ós Vo-lo suplicam os, D eus onipoten­
te, fazei que esta oblação se ja levada nas m ãos do
V osso san to A n jo ao V osso a lta r sublim e, à p re ­
sença de V ossa divina M a jestad e.”
Se C risto fôsse só Êle a vítim a, sep arad a do seu
Corpo M ístico, n ecessitaria, acaso, do fa v o r de ser
tra n sp o rta d o a té D eus pelos A n j o s ? .. . Êle, o Rei
da côrte celeste, assentado ò direita, no m esmo
tro n o que o P ai ? ! . . . M as, “p a ra que esta oblação,
que encerra sim ultaneam ente o C orpo e S angue de
nosso Sen h o r e a nós m esm os e nossos votos, se­
ja m ais agradável à divina M ajestad e, conjuram os
a D eus que a faça tra n s p o rta r pelas m ãos de seu
santo A n jo até ao sublim e a lta r do céu. T em e­
mos que a nossa o fe rta seja ainda m uito im perfei­
ta, e recorrem os aos san to s A njos, a fim de que
m ais seg u ra e p ro n tam en te ela suba a té D eus.” 9
E stas súplicas da S a n ta Ig re ja devem ser p ara
nós, cada m anhã, na S a n ta M issa, um a eloquente
lição. Se a L itu rg ia insiste ta n to p a ra nos to rn a r­
m os aceitos ao A ltíssim o, do m esm o m odo nos
convida, com a m esm a insistência, a tra b a lh a r se­
gundo a m edida de nossas fôrças p a ra nos to r­
n arm os agrad áv eis a Êle.
E m tôdas as M issas, ela nos preg a a necessi­
dade de nossa santificação. Se quiserm os o ferecer,
e' oferecer-nos com nosso C hefe, tornem o-nos m em ­
bros dignos dÊIe.
O s esforços quotidianos, persev eran tes e m es­
m o heróicos q ue fizerm os, n ão serão dem asiados
p a ra to rn a r-n o s m ais apto s a p a rtic ip a r d a obla-
9) L e M oine.
P R IM E IR A P A R T E

ção. A secreta d a festa da Santíssim a T rin d a d e


exprim e adm iravelm ente esta necessidade de p e r­
feição q ue se impõe ao Corpo M ístico, a fim de
que se to rn e um a vítim a de sacrifício agradável
a D e u s : “ Santificai, S enhor, esta hóstia que V os
oferecem os, e p o r ela fazei de nó s u m d o m eter­
no à V ossa M a jesta d e."
A liturgia mostra-nos
o tríplice papel do sacerdote
A litu rg ia da S a n ta M issa nos revela o lu g ar
privilegiado que ocupa o sacerdote ao a lta r, onde
d esem penha um tríplice papel:
1.® com o representante do C hefe, ocupa o lu­
g a r de C risto, to m a n d o atual e visível o ato m iste­
rioso.
2.° com o nosso representante, a tu a em lu g a r dos
fiéis, falan d o em seu nom e e o ferecendo o sa­
crifício “d êles” , que é tam bém o “dêle” .
3.® como m em bro do Corpo M ístico, tom a sua
p a rte pessoal na oblação, segundo o g ra u de sua
caridade, de seus m éritos e de sua união com o
C hefe. Êstes três aspetos das funções do sacerdo­
te ao a lta r estão adm iravelm ente indicados na L i­
turgia.
A liturgia c o papel do sacerdote:
representante de Jesus Cristo
Ao a lta r o sacerdote é su b stitu to do próprio
C hefe, com o título de re p resen tan te oficial da ca­
beça, à qual estam os unidos.
D epois de te r o ferecido em seu pró p rio nom e e
em nom e do povo cristão, na p rim eira p a rte da
S anta M issa, o sacerdote, na oração “ H an c igi-
tu r ”, pronu n ciad a com as m ãos estendidas sôbre
o pão e o vinho, m u d a de expressão.
Êle já não existe, p o r assim d iz e r; é u m outro
Jesus Cristo.
CA P. IV . A M ISSA, OBLAÇÃO DO C R IS T O M ÍSTICO 61

A com panhem os o tex to que pronu n cia e os atos


que execyta: êle exerce as funções do Sacerdote
principal e invisível.
“ N a vcspera de sua paixão — diz o celebrante
— Jesu s C risto tom ou o p ão” . . . e êle tom a o pão,
fazendo o m esm o gesto que fêz Je su s C r i s t o .. .
"e elevando os olhos ao céu, p a ra V ós, ó D e u s .. . ”
e o sacerdote eleva os olhos, im itando a pessoa
de C r i s to ... “ benzeu êste p ão ” . . . acrescenta o
sacerdote, benzendo-o tam bém ê l e . . . “e deu-o a
seus discípulos dizendo: Ê ste é m eu corpo".
Foi C risto que falou pelos lábios do sacerdote,
C risto q ue agiu sensivelm ente p o r meio da pessoa
do sacerdote. N esse m om ento C risto e o sacerd o­
te eram apenas um : C risto falava, e o sacerdote
em prestava-lhe seus ó r g ã o s ... E o seu C orpo es­
tá presente: sim, o pró p rio C orpo de C risto.
G estos análogos, acom panhando p alav ras sem e­
lhantes, são executados tam bém pelo sacerdote,
antes da consagração do vinho. À fó rm u la: “ Êste
é o cálice de m eu San g u e” . . . Jesu s C risto m u­
dou o vinho em seu p ró p rio Sangue.
O sacerdote falou e procedeu como se fôsse
pessoalm ente Jesu s C risto ; os efeitos de sua p ala­
vra e de sua ação são os m esm os, com o se real­
m ente fôsse C risto.
P ode-se im aginar um a representação oficial de
união m ais íntim a e m ais sólida?
Foi pela v irtu d e divina que a pessoa do sacer­
dote, a qual ein si m esm o n ad a é, co ncorreu p ara
pro duzir a tran sfo rm ação d as substâncias — ou
a transubstanciação. Como pôde êste sacerdote,
que é e que perm anece um hom em im potente por
si mesm o, a tu a r acertad am en te ? Q u al a m edida ju s ­
ta de su a adm irável representação oficial?
O celebrante p roporcionou a C risto um re p re­
sentante visível que, com sua v ontade de consa­
P R IM E IR A PARTE

g ra r, m udou o pão no C orpo de C risto e o vinho


em seu Sangue.
O V erbo in carnado q u e r im o la r - s e ... m as onde
e q u a n d o ? ... como se poderá sab er q ue se im o­
l a ? . . . em que a l t a r ? . . . em que d i a ? . . . a que
h o ra ? ...
No lu g ar onde o sacerdote q u iser aí esta rá p re ­
sente e se rá sacrificado o C hefe. O sacerdote é
como o canal p o r onde passa a onipotência di­
vina.
C risto invisível atu a visivelm ente pelo m inis­
tério do sacerdote.
O h, quan to é sublim e a m issão dos sacerdotes,
que a L itu rg ia nos m ostra cada m anhã, substi­
tuindo o C risto C hefe, que então se to rn a visível
entre n ó s !
A liturgia e o papel do sacerdote:
é nosso representante oficial
Se o sacerdote ocupa no a lta r o lu g ar de C risto,
ali é tam bém nosso re p resen tan te oficial. S e o fe ­
recemos com C risto e se nos oferecem os com Êle,
não podem os todavia e x e cu tar esta oblação p o r nós
m esmos. N osso S e n h o r escolheu d e n tre nós re­
presentan tes da sociedade cristã, en carregados de
realizar em nosso nom e o Sacrifício de louvor.
A L itu rg ia faz sôbre-sair, d u ra n te todo o de­
curso da S an ta M issa, êste papel de rep resen tan te
oficial do povo cristão de q ue é revestido o sa ­
cerdote. E , de fato , desde o comêço da S. M issa
êle se apresen ta como nosso delegado. D epois de
ter pedido perd ão em nom e de todo o povo, de­
pois de te r can tad o o hino triu n fa l do “ G loria in
excelsis,” lê a o ração que se denom ina Coleta.
E sta palav ra C oleta significa “ reu n ião ” . É a s­
sim cham ada p orque o sacerdote como m inistro
oficial e re p resen tan te do C orpo M ístico, recolhe e
"re ú n e” as orações dos assistentes p a ra apresen-
CAP. IV . A M ISSA, OBLAÇÃO DO C R IS T O M ÍSTICO 63

tá-las em um a só a D eus, p o r meio de Jesu s C ris­


to. N ão é, pois, um a oração p riv ad a que faz o
celebrante ao alta r, m as um a oração pública em no­
me da Ig re ja inteira.
E sta associação íntim a e n tre os fiéis e seu re­
p resentan te ao a lta r obriga o sacerdote a fa lar
constantem ente conosco, e de nós a C risto, nosso
Chefe, e ao Pai onipotente. P o r esta razão, como
vim os no p a rá g ra fo antecedente, c que o sacerd o­
te pronuncia, em nom e de todo o povo cristão, es­
tas belas fórm ulas, por meio das quais, falando
no plural, tra d u z os sentim entos e os pedidos do
Corpo M ístico, como seu porta-voz.
A liturgia e o papel pessoal do sacerdote
Além do papel que desem penha ao a ltar, como
represen tan te de C risto de um lado, e d a Ig re ja
do outro , o sacerdote é ainda, como cada um dos
outros fiéis, um m em bro do Corpo M ístico que
oferece e que se oferece. P o r êste título, é obrig a­
do, como os ou tro s, a u n ir-se ao C hefe, com tôda
a hum ildade e contrição.
E é p o r esta causa que, desde o princípio da
S. M issa, form ula atos de tem or, de arre p e n d i­
mento, de san ta a l e g r ia ... e faz a confissão de
seus pecados, à qual os fiéis correspondem , p o r
sua vez, com a p ró p ria confissão.
A o su b ir ao a lta r, o sacerd o te pede perd ão p o r
meio de duas orações, d as quais a segunda con­
tém um a p a rticu larid ad e bem significativa: “N ó s
suplicam o-V os, S en h o r — diz o celebrante, —
que V os digneis perdoar-m<? todos os m eu s peca­
dos.”
A qui vemos Iodos os fié is im plorarem : “ N ós
su p lic a m o - V o s ...” p a ra que sejam ap agados os
pecados do sacerdote, seu rep resen tan te: “todos
os m eus pecados” . O s fiéis n ão devem te r, pois,
to do o interesse em que o seu re p resen tan te o fi­
64 P R IM E IR A PA RTE

ciai seja tão p e rfeito qu an to possível ao alta r, co­


mo m em bro p rivado de C risto? A carid ad e do sa­
cerdote não é um a condição de validade p a ra a
oblação, m as não seria um a v e rd ad eira calam ida­
de, para o povo cristão, te r com o seu rep resen­
tante oficial um “ ram o sêco” , ou m esm o um ra ­
mo debilitado e sem vigor?
E sta caridade e p erfeição in terio r do sacerdote
é julgad a tão necessária pela Ig re ja , que a L itu r­
gia obriga o celebrante a in sistir na p urificação
de sua alm a no m om ento do ofertó rio .
E nqu an to eleva a p atena e o ferece o pão que
vai ser consagrado, êle diz" “ Recebei, santo Pai,
esta im aculada h ó s t i a .. . que eu, V osso indigno
servo, V os o f e r e ç o .. . p o r m eu s inum eráveis pe­
cados, ofen sas e n e g lig e n c ia s.. . 11
E ste “eu” , êste “ m eus”, esta d em onstração da
p ersonalid ad e d êste m em bro influente do Corpo
"Místico, que é o sacerdote ao a lta r, devem recor­
dar-lhe, que, a n tes de rep re se n ta r a C risto na
oblação do santo S acrifício, an tes de o fe re c e r os
ou tro s fiéis a C risto, é preciso que se ofereça a si
próprio com o um a hóstia p u ra , e que, na su a con­
dição de sacerdote, se deve e sfo rç a r p a ra se r o p ri­
m eiro e o m ais santo na oblação.
Após o o fe rtó rio do pão, a pessoa do sacerdo­
te desaparece p a ra d a r lu g ar exclusivo ao C orpo
M ístico. O “ eu” extingue-se an te o “ nós” d u ra n ­
te todo o Sacrifício a té o m om ento d a s. Com u­
nhão, em que reaparece.
A S. C om unhão é, com efeito, o ato pessoal pelo
qual cada m em bro sela sua união com C risto: aqui
o sacerdote e C risto estão face a face em um ín­
tim o colóquio, que cada fiel, de seu lado, deve con­
sid e rar com o pró p rio .

11) Ordinário da S. Missa: Oblação da hóstia.


CAP. IV . A MISSA, OBLAÇÃO D O C R IS T O M ÍSTICO 65

O sacerdote diz: “S e n h o r Jesu s C r i s t o ... li-


vrai-m e p o r êste V osso santíssim o C orpo e S a n ­
gue de todos os m eus pecados e de todos os ou tros
males. F azei que cu m p ra sem pre os V ossos m an d a­
m entos e que jam ais m e sep are de V ós.” 12
Depois acrescenta: “Q u e êste V osso Corpo, que
eu, ain d a que indigno, recebo, não se ja p a ra m eu
juízo e condenação: m a s .. . sirva de d efesa à
m inha alm a e ao m eu c o r p o . . . ” 13
O sacerdote nos é, pois, apresen tad o pela san­
ta L itu rg ia como um m em bro do C orpo M istico,
que participa do Sacrifício com o nós, fiéis, e ob ri­
gado contudo, p o r um título especial, a um a união
p erfeita com C risto.
E sta lição de união, d ad a ao sacerdote pela
Tgreja, na S. M issa, pode cada m anhã ser pro v ei­
tosa ao sim ples f i e l; p orque nossa caridade, re­
cordem o-lo sem pre, é a m edida de nossa p a rtici­
pação, como sacrificad o res e com o vítim as do san­
to Sacrifício da nossa M issa.

A liturgia mostra-nos
que Cristo é sacerdote principal
N ossa p articipação no sacrifício e a vista do
celebrante, re p resen tan te oficial nosso e de C risto
ao alta r, devem -nos lem b rar que, sob os rito s ex ­
teriores, só um a tu a de m odo principal, só um é
essencialm ente Sacerdote, só um aplaca a S an tíssi­
m a T rin d ad e, a p resen ta-L h e louvor condigno, cu-
m ula-A de ações de g raças, e can ta-L h e do modo
que L he é devido o cântico das c riatu ras.
Êsse sacerdote é Je su s C risto.
A L itu rg ia tom a ainda aqui o encargo de com­
p e netrar-n o s dêste g ran d e p ensam ento que deve
dom inar tôda a nossa p articipação no san to Sacri­

12) 2.“ oração antes dá S. Comunhão.


13) 3.a oração antea da S. Comunhão.
66 P R IM E IR A PA R TE

fício, d u ra n te o qual n ão devem os p erd e r de vista


a Je su s C risto.
T ôdas as orações que o sacerdote p ronuncia
term inam “ por Je su s C risto, nosso S en h o r". A
Ig re ja indica-nos que só p o r Êle é que podem os e
devem os passar, p o rq u e só Ê le é o P on tifice, a
ponte que dá acesso às alm as q ue querem p res­
ta r a D eus v erd ad eira hom enagem .
E sta fó rm u la, rep etid a cem vêzes, ex pande em
todo o d eco rre r d a celebração de nossa M issa o
pensam ento do C hefe sem o qual “n ad a podem os
faz er” . (J o 15,5.)
M as em du as ocasiões a L itu rg ia insiste de
modo p a rtic u la r nas p rerro g a tiv a s do S acerdote
principal e invisível da S. M issa; no G lória e no
fim do cânon.
N o G loria, a Ig re ja , depois de te r louvado, ado­
rado, agradecido ao P ai, canta com entusiasm o seu
Chefe, Jesu s S acerdote;
“ Ó Senhor, F ilh o unigénito de D eus, Jesus
C r is to ... V ós que estais assentado à d ireita do
Pai, tende piedade de n ó s . . . p orque V ós sois o
único S anto, o único Senhor, o único A ltíssim o,
ó Jesu s C risto .”
O que, evidentem ente, equivale à fórm ula se ­
guinte: “porque V ós sois o único Sum o S acerdote
da lei nova, sendo o único da raça h u m an a q ue é
Senhor, S an to e A ltíssim o.”
Q u an ta s vêzes, talvez, tenham os cantado o G ló­
ria, sem sa b o re a r a d o u trin a nêle encerrad a, m as
ignorando-a como um teso u ro contido em um co­
fre, que nunca tivem os o p ensam ento de a b rir?
O fim do cânon não nos reco rd a m enos viv a­
m ente esta v erd ad e de C risto, Sa cerdote p rin­
cipal.
CAP. IV . A MISSA , OBLAÇÃO D O C R IS T O M ÍSTICO 67

T om ando o sacerdote a hó stia co n sagrada, e


fazendo com elas sinais da cruz, p ro n u n cia estas
palavras:
“ P o r Êle, com Êle, e nÊ le, a V ós, ó D eus, P ai
onipotente, em união com o E sp írito S anto, p e r­
tence e vos é d ad a tôda a h o n ra e gló ria.”
Jesu s C risto é, pois, o Sacerdote de dignidade
infinita, de c u ja ad oração a Santíssim a T rin d a d e
recebe a hom enagem com pleta de glória. Êle, p a ra
quem tudo foi criado, Êle que é o C hefe e o Rei
de tôdas as c ria tu ra s (C ol 16, 17 ), é o único S er
capaz de d a r a D eus a satisfação condigna, Êle
é a única voz que se eleva do m undo ao tro no
da divina M ajestad e, a única p a la v ra eloquente
q ue penetra os céus. Só Êle o ra e intercede em
nome de tudo que vive e resp ira, só Êle é o nossó
intérprete, o nosso advogado, o nosso Sacerdote.
A continuação das questões a tr a ta r neste volu­
m e nos d a rá ocasião de fa la r novam ente nesta m a­
ravilhosa e sig n ificativa passagem da litu rg ia da
S. M issa. C ontentem o-nos, p o r enquanto, de ti­
ra r a conclusão que procu ram o s: nosso sa c rifí­
cio, que oferecem os com C risto, recebe todo o v a­
lo r e fô rça do Sum o S acerd o te, e n ão de nós
mesm os q u e som os co laboradores secundários.
Q u e v e n tu ra é p a ra nós, m em bros do C orpo
M ístico, serm os cham ados a o ferecer com Ê le
esta o fe re n d a sublim e da Ig re ja , serm os asso­
ciados à su a hom enagem in fin ita, e serm os ain da
com Êle sacrificad o res e vítim as pela v irtu d e dos
seus m éritos, dos quais Ê le se digna to m a r-n o s
participantes.
SEGUNDA PA R TE

A obra que faço, celebrando “minha“ M issa.

N o capítulo p rim e iro :


O que é “minha” Missa
se explica em que consiste êste ato essencial da
religião, que celebro em cooperação com C risto.

N o capítulo segundo:
A glória de Deus
se fala em p a rtic u lar sôbre a hom enagem in fini­
ta que a San tíssim a T rin d a d e recebe p o r meio da
celebração d a “ m in h a” M issa.

N o capítulo terceiro:
Meu fruto espiritual
se enum eram as v antagens incalculáveis q ue m e
proporciona “m in h a” M issa.

N o capítulo q u a rto :
O proveito para o purgatório
se pro c u ra p ro v a r como "m in h a ” M issa c um
orvalho re frig e ra n te p a ra aquelas cham as.
SEGUNDA PARTE
C A P ÍT U L O I
O QUE É “MINHA" MISSA
JESUS CRISTO, TENDO-SE IMOLADO UMA Só VEZ. OFE­
RECE EXATAMENTE O MESMO SACRIFÍCIO QUE NO
CALVARIO. TEMOS A FELICIDADE. AO CELEBRAR A
“NOSSA” MISSA, DE ESTAR PRESENTES NO G6L-
GOTA.
“ Minha" Missa é o Calvário
A S. M issa, que cada fiel celebra com Cristo,
não é um sacrifício de n a tu re z a d iversa, rep resen­
tado no a lta r: é sem pre o m esm o S acrifício, o
da C ruz, que C risto M ístico, isto é, Je su s unido
a todos os seus m em bros, o ferece e apresen ta de
novo à S antíssim a T rin d ad e.
Vim os que há um só S um o S acerdote e um a
só V ítim a ; da m esm a fo rm a só há um S a c rifí­
cio. C om preende-se facilm ente que não pode h a ­
ver dois: o sacrifício do C alvário é com pleto, p o r­
que é in fin ito ; atin g iu de um m odo p e rfeito e
d efin itivo os q u a tro fin s pelos quais Je su s S acer­
dote o ofereceu: ad oração, ação de graças, petição
de graças e satisfação infinita.
S. P a u lo insiste n esta verd ad e fundam ental que
o sacrifício de C risto é único: “ C risto ofere-
ceu-se um a só v e z pelos pecados do m undo.”
(H e b 9, 28.)
Em o u tra p arte o A póstolo rep ete esta a firm a ­
ção: “T endo o ferecido um a única hóstia pelos pe­
cados, assentou-se p a ra sem pre à d ireita de D e u s .. .
Porque, p o r um a oblação única, .consum ou p a ra
sem pre aquêles que estão san tificad o s.” (H e b
10, 14.)
H á, pois, um único Sacrifício: o da C ruz.
70 SE G U N D A P A R T E

Mas êste sacrifício único


pode ser renovado
Se não existe sacrifício algum que e steja em
p aralelo com o da C ruz, “a oblação do C alvário”,
p o r isso m esm o deve se rv ir de apêlo a D eus, de­
ve se r-L h e repetida pelo Sacerd o te V ítim a, e ser-
L he novam ente apresen tad a, “ reap re se n ta d a ” : esta
renovação do Sacrifício da C ruz c a M issa.
D em onstrarem os a seguir a id entidade p e rfe i­
ta que existe en tre a M issa e a C ruz, m as desde
já tirem os do que foi dito um a consoladora con­
clusão: N ossa M issa é o C alvário. T om am os p a r­
te no próprio sacrifício do G ólgota. C ada m anhã
estam os, como M a ria estava, aos pés da v e rd a ­
deira Cruz, o ferecendo com ela o verd ad eiro F ilho
de D eus. T alvez tenham os invejado a so rte dos
contem porâneos de C risto, dizendo como aquêle
g ue rreiro : “ Se eu tivesse estado l á ! . . . ”
N ós lá estam os, com C risto, oferecendo-nos
e oferecendo com Êle e p o r Êle. E êste m esmo
C risto suplica-nos ainda e sem pre q ue O d e fen­
dam os c o n tra os carrascos perversos de seu C or­
po M ístico.
A Missa é a exata renovação do Calvário
N osso S e n h o r Je su s C risto ap resen ta novam en­
te em cada S. M issa a m esm a o fe ren d a e a mesma
vítim a.
A S. M issa — é preciso in sistir bem neste po n­
to — não é um a im agem do Calvário, um facsím ile,
não! N ão é um a representação como entendem os
serem representações teatrais, as quais figuram e
recordam um acontecim ento p o r meio de p erso n a­
gens fictícios q ue fazem as vêzes de pessoas au ­
sentes. N ã o ! a S. M issa é a renovação do sa c rifí­
cio do Calvário, renovação real, su bstancialm en­
te a m esm a em sua o feren d a e em seus resultados,
apresen tad o pela m esm a personagem , Je su s C risto,
CAP. I. — O Q U E £ “M IN H A ” M ISSA 71

Sum o S acerdote, que reite ra a m esm a ação, q ue


rende a m esm a hom enagem ao Altíssim o.
E stas idéias m erecem exam inadas cada um a de
per si.
Missa e Calvário:
mesmo sacerdote, mesma vitima
O sacerdote da S. M issa é ex atam en te o m es­
mo que o do C alvário: N osso S en h o r Je su s C ris­
to. “ E já que Êle está sem pre vivo p ara interce­
d e r em nosso fa v o r” (H e b 7, 2 5 ), está p ro n to ta m ­
bém a re p e tir a seu P ai a hom enagem suprem a pe­
la qual cum priu sa tisfato riam en te sua função sa ­
cerdotal. C onsente em valorizar, p a ra nós, o g ra n ­
de ato de religião que salvou o m undo, associando-
nos a si.
A vitim a do Calvário é tam bém a v ítim a da S.
M issa. Se a vítim a fôsse d e stru íd a em cada obla­
ção, seria preciso renová-la. O ra , nossa vítim a, lo­
go após a m orte, conquistou o direito à ressu rreição
em prim eiro lugar, — e à im ortalidade depois:
“ C risto ressuscitado dos m ortos não m o rre m ais.”
(R om 6, 9 .) A vítim a sobrevive, pois, in fin itam en­
te perfe ita e gloriosa, sem alteração, atra v é s de
todas as M issas celebradas: ela m antém pela sua
perpetu id ad e a identidade substancial do sa c rifí­
cio do a lta r com o do Calvário.
M as como N osso S en h o r pode ser vítim a sem
m o rre r em cada M issa?
P ode, p orque lhe bastou ace ita r u m a v e z sá a
m orte p a ra ad q u irir m érito in fin ito e d a r louvor
p e rfeito à S antíssim a T rin d ad e. D e posse dos d i­
reitos adqu irid o s p o r esta ú nica m o rte — direitos
que não podem ser aum entados, p orque são in fin i­
tos — reite ra todo o p ro d u to de adoração, de lou­
vor, de ação de graças, de satisfação, ren o v an­
do êsses ato s a D eus, com o direito de V ítim a
perpétua.
72 SE G U N D A P A R T E

O ato de Je su s C risto, Sacerdote e V itim a na


S. M issa, é idêntico ao ato de Jesu s C risto, Sa­
cerdote e V itim a na C ruz: é a oblação d a m esma
morte.
H á, pois, identidade com pleta en tre a S. M issa
e o Calvário. O s cristãos têm na verd ad e um só
Sacrifício: o sacrifício de C risto, S acerd o te e
V ítim a.
Jesus Cristo teve a intenção de representar
visivelmente na S. Missa a cena do Calvário
P a ra m o strar-n o s a té à evidência a u n idade de
sua oblação, N osso S enhor, ao in stitu ir o S a c rifí­
cio do a ltar, teve intenção de re p ro d u zir de um a
m aneira sensível aos nossos olhos o d ram a do Cal­
vário. Su a sabedoria fêz m esm o d a in stituição da
E u caristia um a cópia da cena do G ólgota, a fim
de fazer-nos concluir, p o r m eio d a sem elhança
visível, a id entidade p erfe ita q u e existe e n tre a
hom enagem da S. M issa e a da Cruz.
N ão foi ao acaso que N osso S enhor, p a ra ins­
titu ir a “ M issa” , escolheu dois elem entos: o pão
que se m u d ará em seu Corpo, e o vinho que se
tra n sfo rm a rá em' seu Sangue.
Ê ste pão e êste vinho, separad o s no a ltar, a p re­
sentam um a im agem sensível, que q u alq u er fiel,
mesmo o m ais simples, deduz da separação real
do C orpo e do Sangue, feita no Calvário. A S.
M issa foi, pois, instituída p o r N osso S en h o r sob
a form a de um a “ lição de coisas” , cu ja significa­
ção está ao alcance de todos. O sentido desta “ li­
ção de coisas” é sublinhado e fixado pelas p ala­
v ra s da consagração. N ão foi sem intenção que
Cristo consagrou separad am en te o p ão e o vinho.
T eria podido dizer sôbre am bos os elem entos, ao
mesm o tem p o : “ Isto é o m eu C orpo e S an g u e” e
op e rar num m esm o ato a m udança d as d u as subs­
tâncias.
CAP. I. — O Q U E E “ M IN H A ” M ISSA 73

M as não fêz assim . T o m ou prim eiro o pão, ben­


zeu-o e partiu -o , dizen d o : “T om ai e comei, êste
é o m eu C orpo.” (L c 22, 19.)
Depois, elevando a taça de vinho, disse: “ B e­
bei dêle todos, porq u e êste é o m eu San g u e.” (L c
22, 20.) N osso S en h o r pôs separad am en te seu C o r­
po sob as espccies de pão, seu S angue sob as do
vinho, p ara re p re se n ta r exatam en te o sacrifício
do Calvário, que coloca o San g u e à p a rte do C o r­
po, estando todavia presen te todo inteiro sob ca­
da um a das espécies.
O sacrifício da S. Missa renova
invisivelmente o sacrifício da cruz
Q ue se p assa invisivelm ente no a lta r, a trav és
dêstes sinais sensíveis do pão e do vinho, consa­
grados sep aradam ente, q ue nos apresen tam Jesu s
C risto sob o aspecto de um a m o rte violenta na S.
M issa?
C risto realm ente presen te sob as espécies sa­
cram entais, renova a seu P ai a hom enagem do
Calvário. S ua oblação é exatam en te a m esm a que
no G ólgota, p o rq u e o Sacerd o te-V ítim a d a S. M is­
sa é o m esm o da C ruz. S ua obediência, sua subm is­
são a seu P ai, continua a m esm a, e su a hom e­
nagem tam bém não so fre u alte ra ç ã o ; ap resen ta
sem pre à Santíssim a T rin d a d e a m esm a cópia
de m éritos infinitos, não susceptíveis de novos
acréscim os. G anhou tudo só p o r sua m o rte san­
guinolenta na Cruz, da qual seria inútil ren o v ar
os h o rro res, p orque nada poderiam acrescen tar
ao valor da p rim eira im olação, já então com­
pleta.
Sacerdote e V ítim a, cu ja oblação é tão p e rfe i­
tam ente significada no a ltar, Êle renova à M a­
jestad e divina a m esm a hom enagem in fin ita de
adoração, de louvor, de ação de g raças e re p a ra ­
ção; encontram os exatam en te na S. M issa tu d o
74 SE G U N D A P A R T E

o que constituía o Calvário. Podem os proclam ar


que C risto só tem um S acrifício que cada m em ­
bro do C orpo M ístico pode c h am ar “su a ” M is­
sa.
Uma nota de passagem:
a Eucaristia é sacrifício
e ao mesmo tempo sacramento
O que acabam os de dizer m o stra claram ente quais
eram as intenções de N osso Senhor, no m om en­
to em que institu iu a E u c aristia:
1.° Preo cu p ad o com os interesses de seu Pai,
seu pensam ento era in stitu ir a 5\ M issa, isto é,
p rolong ar a trav és do m undo seu ato sacerdotal,
a fim de que os m em bros fu tu ro s de seu Corpo
M ístico pudessem , po r Êle, com Êle e nÊle, de­
sem penhar o seu principal e prim o rd ial d ev er de
louvor p e rfeito à S antíssim a T rin d a d e ;
2.° Im pelido pela preocupação de realizar a
união de seus m em bros consigo m esmo, C hefe
adorável, p o r m eio do aum ento da caridade, or-
denava-lhes — "tom ai e com ei” . . . “ tom ai e be­
bei dêle todos” — que se associassem ao seu S a­
crifício, não som ente p o r um a união de sentim en­
to e de vontade, m as ain d a p o r um ato o ficial de
adesão, e de união tan to ex te rn a como intern a:
a S a n ta C om unhão.
3.° Im pelido pelo am or e sabendo, além disso,
que não seríam os a d o rad o res fiéis d a divina M a­
jestade, se não fôssem os sem pre alentados, dig-
nou-se p ro lo n g ar sua presença real m uito além
da d uração do Sacrifício e fazer-se hóspede p er­
pétuo dos nossos tabernáculos.
Vem os, pois, que a E u c a ristia é um S a cram en­
to que nos foi dado, m as que tem em vista
re nder a D eus a g lória in fin ita que procede do
S acrifício.
T a l é a ord em estabelecida p o r C risto: não a
transtorn em o s. Som os a d o rad o res p o r m eio de “no s­
CAP. I. — O Q U E É “ M IN H A ” M ISSA 75

sa” M issa, a qual só celebram os com pletam ente


quando nela com ungam os.
O fru to pessoal do S acram en to deve ser ce r­
tam ente en carado p o r nós, porq u e tem sum a im ­
po rtân c ia ; não deve, porém , fazer-n o s p e rd er de
vista a idéia de que nosso p rogresso individual te ­
rá p o r resultado final fazer-nos m em bros m ais
unidos ao C hefe, e p o r êsse m eio m ais p e rfeitos
adorado res com Ê le d a divina M ajestade.
Com preende-se daqui o ê rro em que caem cer­
tas pessoas, cegas pelo egoísm o pessoal: im agi­
nam que C risto está presen te na E u c a ristia só p a­
ra elas; rogam -L he apenas pelos p ró p rio s in teres­
ses particu lares, esquecendo os de D eus!
D aqui se vê tam bém quan to se enganam aquêles
que am am a E u caristia, m as sem a S. M i s s a ...
que pro cu ram com u n g ar fo ra da S. M issa "p a ra
não pe rd e r tem po” , que vêem na S. M issa não o
sacrifício do C alvário, autêntico, onipotente, m as
só o meio necessário p a ra se o bterem hóstias con­
sagradas . . .
A todos êstes e rro s de um a piedade mal esclare­
cida oponham os o verd ad eiro e santo conhecim en­
to do M istério do altar, S acrifício perp étu o da
C ru z ; e aproveitem os sobretudo do sacram ento
d a E u c a ristia p a ra au m e n ta r n ossa união com nos­
so C hefe a fim de associar-nos cada dia m ais p e r­
feitam ente à sua hom enagem in finita.
A liturgia frisa a identidade
entre a S. Missa e o Calvário
A s cerim ônias que a Ig re ja infalível u sa no ato,
divinam ente in stituído, da consagração, têm o es­
copo de to rn a r visível, q u an to possível fô r, a re a ­
lidade oculta, isto é, o v erd ad eiro S acrifício de
N osso S ènhor.
A L itu rg ia insiste na separação do C orpo e do
Sangue no a lta r, g rifa n d o de propósito as pala-
76 SE G U N D A PA R TE

v ra s de N osso S en ho r e sua v ontade de ter, no


sacrifício da S. M issa, o aspeto que Ê le possuía
no C alvário quando passava pela m o rte m ais a n ­
gustiosa, a “ única” que daí em d ian te e p a ra sem ­
p re teria valor.
Com efeito, nas orações do cânon que se se­
guem à consagração, lem os esta fórm u la: “ . . . a
fim de que todos que recebem os o C orpo e o S an­
gue de V osso F ilh o ” . E n q u a n to o celebrante p ro ­
nuncia estas palavras, vai fazendo com a m ão dois
sinais sig nificativos: quando diz " o Corpo” faz
um sinal da cruz sôbre a hóstia: e ao d izer “o S a n ­
gue” fá-lo sôbre o cálice. P o r êstes dois ato s es­
pecifica o sentido d as p alav ras “o Corpo de Cristo” :
é a E u caristia sob as espécies do p ã o ; e d as pa­
lavras " o Sa n g u e de C risto” : é a E u c a ristia sob a
espécie do vinho.
A Ig re ja quer, pois, de m odo especial m o stra r
pela representação ex te rio r do S acrifício do C al­
vário, em que o Corpo foi realm ente separado
do Sangue, que o sacrifício d a S. M issa é idên­
tico ao d a C ruz.
O u tra cerim ônia in stitu íd a no fim do cânon
m anifesta com nova insistência que a Ig re ja nos
quer faz e r com preender que a S. M issa e o Gól-
gota são o m esm o Sacrifício de Cristo.
O sacerdote, im ediatam ente antes do “ P a te r ” ,
pronun cia esta adm irável fó rm u la: " P o r Êle, com
Êlc e nÊ le, a V ós, ó D eus P a i onipotente, em união
com o E sp írito S anto, seja d ad a tô d a a h o n ra e
glória.” E s ta fó rm u la é acom panhada de gestos
que dão a esta fra se um sentido bem signifi­
cativo.
A ntes de p ro fe rir a fórm ula, o sacerdote eleva
com a m ão d ire ita a H ó stia acim a do Cálice, co­
mo pa ra colocar Jesu s C risto na m esm a posição
que tinha no Calvário.
CAP. I. — O Q U E Ê “ M IN H A ” M ISSA 77

N o C alvário, estava com os braços em cruz: o


sacerdote vai colocá-los da m esm a m aneira. E n ­
q u anto diz “ p o r Êle, com Ê le e nÊ le” , faz com a
H óstia, acim a do precioso Sangue, trê s cruzes, que
m ostram o Corpo crucificado acim a do Sangue. Ao
m esm o tem po essas três p alav ras pron u n ciad as re ­
sum em tôda a econom ia do C alvário onde por J e ­
sus, com Jesu s e em Jesus, se realizou tô d a a
o bra in finita.
E sta hom enagem sem lim ites dirige-se à S a n tís­
sim a T rin d a d e : ao Pai e ao E sp írito San to pelos
m éritos do Filho. P o r um novo gesto do sacerdo­
te, a Ig re ja nos faz com preender, de um a p a r­
te, que estas trê s Pessoas divinas são d istin tas da
n atu rez a hum an a que se im ola em Cristo, e p or
ou tra, que a R edenção se estende m uito além do
G ólgota sôbre todo o u niverso redim ido. E é p or
isso que, co ntinuando a m a n te r a H ó stia elevada,
o celebrante a leva um pouco p a ra fren te e fo ra
do Cálice, e faz, em cim a do a lta r, e n tre o Cáli­
ce e seu peito, um prim eiro sinal d a cruz, d izen­
d o : “n a unid ad e do E sp írito S a n to ” , m ostrando
dêsse m odo que a hom enagem de C risto na C ruz
se prolonga além do C alvário, onde é derram ado
o S angue p o r todo o m undo e sobe até às ad o­
ráveis P essoas da San tíssim a T rin d ad e.
E nfim , p a ra resu m ir esta reprodução tão viva
do d ram a do C alvário, a Ig re ja ord en a ao cele­
bran te que, continuando a m an ter a H ó stia en tre
os dedos, a sobreponha acim a do Cálice, a fim
de se v er de novo o C orpo acim a do precioso
S an g u e ; depois prescreve ao sacerdote que eleve
ao mesm o tem po o Cálice e a H ó stia acim a do al­
ta r, ao re c ita r o final d a fórm u la: “T ô d a a ho n­
ra e tôda a glória”. E m certas ig rejas o sacris­
tão toca a cam painha p a ra a ssin alar esta pequena
elevação.
78 SE G U N D A P A R T E

“T ôd a a h o n ra e tôda a g ló ria” realm ente foram


dadas à S antíssim a T rin d a d e desde o dia em que
o Corpo de C risto foi elevado sôbre a C ruz, como
acaba de ser elevado sôbre o a lta r, conform e a
palavra do p ró p rio S en h o r: “Q u an d o eu fô r ele­
vado da te rra , atra ire i tudo a m im ” (J o 12, 32.)
E sta elevação não repete, assim , ao vivo, a que
se realizou na C ruz?
O fim do cânon, em inentem ente g randioso e ao
m esmo tem po antiquíssim o, pois talvez d a te m es­
mo dos tem pos apostólicos, é a m ais significativa
expressão que podia ser d ada p a ra m o stra r que
o m esm o ato, encerran d o a m esm a hom enagem ,
se realiza sôbre o a lta r e sôbre a Cruz.

Quão preciosa é, pois, a “m inha” Missa!


M em bro de C risto posso cada m an h ã ficar, co­
mo esteve M aria, aos pés da C ruz, ju n to a Jesus
q ue se oferece em sacrifício.
Posso recom eçar cada m anhã a o fe recer à S a n ­
tíssim a T rin d a d e a m esm a hom enagem do Calvá­
rio !!
Posso cada m an h ã unir-m e intim am ente à imo­
lação de C risto, não som ente p o r um a correspon­
dência p e rfe ita de sentim entos e de afeto s, mas
pelo alto oficial da m anducação d a V ítim a, ato
q ue en cerra ao m esm o tem po um sinal e x te rio r
cie adesão e um a com unicação in te rio r d as m ais
abundan tes graças. A h ! “ m inha” M issa é um te ­
souro que en cerra todos êstes b e n s . . .
Como eu a p reciaria o celeb rar a “m in h a” M is­
sa com o sacerdote, se a conhecesse com o ela o
m e re c e !
CA P. n . A G L O R IA D E D E U S 79

C A P ÍT U L O II
A GLÓRIA DE DEUS
A SANTÍSSIMA TRINDADE RECEBE NA S. MISSA "T ô -
DA A HONRA E TODA A GLORIA”, ISTO Ê. UMA HO­
MENAGEM INFINITA. TAL. QUE A DIVINA MAJESTA­
DE NAO PODE DESEJAR DO MUNDO MAIOR ATO DE

P a ra que um a hom enagem seja in fin ita, é p re­


ciso que aquele que a p re sta seja in finito.
Pois, se aquêle que a o ferece é finito, seu ato
rle adoração tam bém o é, p orque ninguém pode d a r
o que não tem. É por isso que a hom enagem p re s­
tada por um hom em nunca será capaz de sa tisfa ­
zer plenam ente a Deus.
E n tre D eus e C risto se realizaram as condi­
ções requeridas p a ra que a hom enagem fôsse in­
finita. A quêle que a oferece é Jesu s C risto, fi­
nito como hom em , e, p o r êste título, susceptível
de hum ilhar-se an te a su p rem a M a jestad e do O n i­
potente, m as infinito, p o rq u e é o V erbo, segunda
Pessoa da T rin d a d e , q u e se associou à n a tu reza
hum ana com o fim especial de fa zer esta n a tu re ­
za hum ana p ro d u z ir atos de valor infinito.
O ato de hom enagem pelo qual C risto tem a in­
tenção de trib u ta r a D eus, do m odo m ais p e rfe ito
possível, os d everes de adoração, de ação de g ra ­
ças, de súplica e de reparação, é seu S acrifício.
O ra, êste S acrifício é único, tendo sido realizado
um a só vez: é o sacrifício do Gólgota que se re­
produz na S. M issa.
A S. M issa é, pois, de um valo r infinito. V im os
que estam os associados à S. M issa como m em ­
bros de Je su s S acerdote, de um m odo tão ín ti­
mo que a S. M issa de C risto to m a -se “nossa”
M issa.
SE G U N D A P A K T E

C ada um de nós pode assim dizer, com tôda a


verdade, que “ su a” M issa trib u ta tôdas as m anhãs
hom enagem in fin ita à Santíssim a T rin d a d e !
Q ue g ran d eza p a ra cria tu ra s tão p equenas! Q ue
co n solação ! Q ue h o n r a !
A Liturgia assegura-nos
que nossa homenagem é Infinita
A queles q ue tiverem dificu ld ad e em a c re d ita r em
tal ven tu ra enco n trarão a confirm ação d esta v e r­
dade na litu rg ia da S a n ta M issa. Seu rito, ex p re s­
são sensível d as ações ocultas que se realizam no
a ltar, nos dá bem a conhecer a infinidade da gló­
ria que a . oblação eu carística trib u ta à S antíssim a
T rindad e.
O próprio tex to do cânon nos declara ex p ressa­
m ente que o Pai onipotente, em u nidade com o
E sp írito S anto, recebe do H om em -D eus, V erbo in­
carnado, “ tôda a h o n ra e tôda a g ló ria” , isto é,
um a ho n ra to tal e um a g lória com pleta.
O ra, a h o n ra de D eus só pode se r com pleta e
total, sendo infinita. U m ser sem lim ites não se
poderia satisfa z e r p o r um a o feren d a lim itada: es­
sa hom enagem , p o r m ais extensa que fôsse, p a re ­
ceria m inúscula em relação ao fim a a ti n g i r .. .
seria tão insignificante em com paração da gló ria
devida a D eus que dela nem se d everia f a l a r . . .
M as a hom enagem , assinalada pela litu rg ia na S a n ­
ta M issa, pro d u z de m aneira total o efeito da ho n­
ra e gló ria de D eus. É, pois, evidente que a h o­
m enagem do Sacrifício do a lta r é in f in ita : de
“ m inha” M issa resu lta p ara D eus um a glória ili­
m itada.
Consequência desta verdade:
o infinito valor de “m inha” Missa
P recisam os deter-n o s p o r um m om ento an te
um a tal m arav ilh a!
E u , u m se r de nad a, estou unido a C risto como
os m em bros à Cabeça.
CAP. H . A G L Ó R IA D E D E U S 81

P o r esta Cabeça à qual estou ligado, recebo a


vida divina que circula em todo o C orpo M ístico.
Ê ste Corpo M ístico, Cabeça e m em bros, executa
um a ob ra divina, a S. M issa, a sua M issa. E sta
obra divina c in fin ita ! G lorifica a D eus sem m e­
d id a! E n esta glória tenho m inha p a rte ! E que
p a rte ! U m valo r infinito não se pode dividir, p o r­
que não é constituído de p a rte s finitas.
N ão c, pois, apenas um a parcela de louvor, m as
“ todo o louvor e tôda a h o n ra ” que rendo ao P ai
onipotente, em u nidade com o E sp írito S anto, p or
meio do m eu C hefe, o H o m e m -D e u s!
Q ue pode h av er de m ais g randioso que êste
pensam ento ?
Os quatro aspectos do louvor infinito
dado pela “minha” Missa
ftste louvor infinito, dado a D eus pela S an ta
M issa, atinge os q u a tro fins distintos, que são
“os fins do S acrifício ” :
1." A d o ra r a Deus.
2 ° A g rad ecer a D eus e re n d er-L h e ações de
graças.
3.° O ra r a D eus, cum prindo o d ev er de sú ­
plica.
4.° D a r rep aração à h o n ra de D eus e sa tisfa z er
à sua M ajestade.
P a ra bem co m preender qual a hom enagem in­
finita que D eus recebe n a S a n ta M issa que — ó
ven tu ra ! — é “m inha” M issa, é preciso ex am i­
n a r bem os q u a tro aspectos do louvor que C risto
M ístico, Cabeça e corpo, rende à divina M ajestade
por meio do seu sacrifício.
1.° Pela “minha” Missa Deus recebe um a adoração
Infinita.
A d o ra r a D eus é reconhecer sua gran d eza e
seu poder suprem o, é a firm a r sua su prem acia ab­
soluta sôbre todo ser existen te ou p ossível; é d i­
82 SE G U N D A P A R T E

zer a D eus q ue Êle é tudo, que Êle é o único ne­


cessário, que Êle é a p ró p ria perfeição.
P a ra que pudéssem os e x p rim ir ao vivo um a tal
hom enagem , D eus quis que C risto o ferecesse seu
sacrifício. Sob a lei antiga, as im olações ritu a is do
tem plo de Jeru salém apenas trib u tav am a D eus
atos de adoração m uito im perfeitos. E êsses ho-
locaustos não agrad av am ao A ltíssim o, p o rq u e não
recebia p o r meio dêles glória igual a si próp rio:
E is po r que N osso Sen h o r veio ao m undo p ara
o fe recer finalm ente o S acrifício único e sa tis fa ­
tório que constitu iria a ad oração p e rfe ita de Deus.
S. Paü lo diz-nos com efeito que, d irigindo-se C ris­
to a seu Pai, exclam ou: “ N ão quisestes nem acei­
tastes as oblações e os h o lo c a u s to s .. . então eu
disse: E is que venho, ó D eus, p a ra fazer a V os­
sa vontade.” (H e b 10, 9.)
O sacrifício de “m inha" M issa, que é o do
Calvário, é, pois, a ad oração in fin ita de D eus, p e r­
feitam ente aceitável a Êle.

Como Cristo, por seu sacrifício,


adora perfeitamente a Deus
Releva explicar com o o Sacrifício da C ruz, p e r­
p etuado em “nossa” M issa, dá a D eus esta a d o ra­
ção infinita.
P a ra a d o ra r perfeitam en te, é necessário, de um
lado, que o ad o ra d o r se ja igual aO que é ado rad o:
de o u tra fo rm a a hom enagem não seria digna
dA quele a quem é dirigida, — e p o r o u tro lado,
que seja in fe rio r À quele que é adorad o : porque,
senão, o ad o ra d o r não te ria razão algum a p a ra
hum ilhar-se. E sta s d u a s condições parecem con­
trad itó ria s, e, no entanto, p o r um a m arav ilh a da
P rovidência, C risto as realiza ao m esm o tem po:
Êle é igual a seu P ai p o r su a n a tu re z a divina e
é in ferio r a Ê le p o r sua n atu reza hum ana. Pode,
CAP. n . A G L O R IA D E D E U S 83

pois, hum ilhar-se, estando como hom em abaixo de


D eu s; e como V e rb o 'e te rn o , pode ig ualar em ho n­
ra à D ivindade.
V ejam ós agora como se realiza, de modo su­
blime, o ato de sup rem a adoração pelo S acrifício
de Cristo.
A n atu reza h u m ana de C risto é a obra-prim a
das m ãos de D eus. E la é a cria tu ra ideal, acim a da
qual a p ró p ria O n ipotência divina n ad a pode con­
ceber, pois êste homem é D eus ao m esm o tem po. O
m undo foi feito em vista desta c ria tu ra excepcio­
nal: “Tudo fo i criado por Ê le e para Ê le . . Êl e
é a Cabeça do Corpo d a Ig re ja , e é o princípio,
o P rim ogênito d e n tre os m o rto s; de m aneira que
“ocupa a prim azia em tôdas as coisas” . (Col 1,
16, 18.)
Com preende-se que esta m aravilhosa su p erio ri­
dade de C risto sôbre tôda c ria tu ra existente ou
possível L he m ereça “as com placências do P ai
celeste” . (M t 3, 17.)
N ão é evidente que esta o b ra prim a d as m ãos di­
vinas, êste C risto, S anto e Senhor, se ja digno de
tôda a v e n tu r a ? ...
N ão. U m a sentença é pron u n ciad a co n tra Êle:
é preciso que m o rra. E p o r que é preciso que m o r­
ra, Êle que é a p ró p ria vida?
P o rq u e é preciso que, pelo seu aniquilam ento,
m anifeste an te os olhos pasm ados do m undo que
criatu ra algum a, p o r m ais bela e p e rfe ita que seja,
tem o direito de sub sistir d ian te de D eus.
A hum ilhação de C risto significa, pois, que “só
D eus é D eus e q ue não pode h a v er o u tro D eus” .
(D t 3, 24.)
A m o rte de C risto é o reconhecim ento oficial,
público, solene, do soberano dom ínio de D eus sô­
bre a c ria tu ra , é a exaltação suprem a do pod er do
A ltíssim o, an te o qual deve fic a r n a som bra m es­
84 SE G U N D A P A R T E

mo a m ais p e rfe ita de suas ob ras p rim a s: a m o r­


te do H om em -D eus co nstitui o ato de p erfeita
adoração
A S. M issa, com o vim os anterio rm en te, é o re­
novação do sacrifício da C ruz, e p o r isso o ato de
suprem a subm issão de C risto an te seu P a i se m a­
n ifesta aos nossos olhos no a ltar. E n q u a n to o
H om em -D eus renova no m om ento da consagração
esta suprem a hom enagem , nós, m em bros do C o r­
po M ístico, que com Êle adoram os, estam os sem ­
p re b astan te im pressionados com a m ajestad e do
ato que fazem os em com panhia do nosso C hefe?
2.° Pela “minha” Missa, Deus recebe infinitas ações
de graças.
O sacrifício da S. M issa é ao m esm o tem po um
ato pa rfe ito de adoração e de ação de g raças. Ê ste
pensam ento de reconhecim ento é inseparável da
adoração. E , com efeito, aquele que se aniquila ante
a D ivindade é obrigado, m esm o q u ando afirm a
que E la tem tudo, a ag rad ecer-L h e tudo.
E is p o r q ue C risto, im olando-se d ian te do seu
P ai, L h e deu ações de g raças in fin ita s! T odos os
evangelistas referem que N osso S enhor, ao insti­
tu ir na ceia o S acrifício eucarístico, “ ren d ia g ra ­
ças” no m om ento em que tra n sfo rm a v a o pão
em seu C orpo e o vinho em seu Sangue. E stas
suprem as ações de g raças, repetidas com ta n ta
insistência p o r N osso S en h o r na véspera de sua d o­
lorosa Paix ão , d ão bem a conhecer que, no p en­
sam ento de C risto, seu sacrifício n a C ruz, p e r­
petuado no a ltar, era um a to de ação de g raças
para com D eus.
A Ig re ja não podia d e ix a r de re ite ra r o pen sa­
m ento do seu C hefe. C onservou cuidadosam ente,
nas pró p ria s p a lav ras d a consagração, a e x p res­
são das ações de g raças de C risto. O sacerdote diz:
“ N a véspera da P a ix ão , Jesu s C risto tom ou o
CA P. n . A G L O R IA D E D E U S 85

p ã o . . . e, levantando os olhos ao céu p a ra V ós,


ó D eus Pai onipotente, re n d eu -V o s graças, ben­
zeu o pão, partiu -o , e tc . . . ”
E m seguida, sôbre o cálice: "D o m esm o m o­
do, depois d a ceia, Jesu s tom ou e n tre a s m ã o s ...
êste precioso cálice, benzeu-o, rendeu graças ou­
tra v e z . . . "
E p o r isso não é de a d m ira r que a trad ição c ris­
tã tenh a denom inado o sacrifício da S. M issa:
E ucaristia, que q u e r d izer “ ações de g ra ç a s” . N os
prim eiro s séculos cristãos, "re n d e r g ra ç a s” equi­
valia à nossa ex p ressão atu al “celeb rar a M issa” .
A L itu rg ia, q ue vem os sem pre tão fiel em t r a ­
d u z ir as verd ad es dogm áticas, m ostra-n o s quão su­
blim e ato de ação de g raças é a “n o ssa” M issa. E
ela o faz em têrm os m agistrais e solenes.
N o m om ento do p refácio, o sacerdote convida
os assistentes a m a n ife sta r com êle, p o r meio de
C risto, a hom enagem do reconhecim ento: “Retida-
m os graças — proclam a — ao S en h o r nosso D eus.”
O s fiéis respondem : “ D evem os com tôda a ju s ­
tiça.”
O sacerdote co ntinua então com au to rid ad e:
“ Sim , é verd ad eiram en te digno e ju sto , razoável
e sa lu ta r retid er-V o s graças, em todos os tem pos
e em todos os lugares, S en h o r santíssim o e onipo­
tente, D eus eterno, por J esu s Cristo, N o sso S e ­
nhor.”
É de n o ta r o acúm ulo dos têrm os, em pregados
pela L itu rg ia : a ação de g raças é um a questão
de dignidade, de ju stiça, de equidade, de salva­
ção . . . deve ser d ad a a D eus, por tôda parte, se m ­
p re. .. O único ser que a dá de um m odo “digno,
ju sto , razoável e sa lu ta r” é Cristo, do qual se vai
ren o v ar o sacrifício.
A S. M issa é, pois, o ato p o r meio do qual, “p or
Jesu s C risto N osso S e n h o r” , isto é, a C abeça do
86 SE G U N D A P A R T E

Corpo M ístico, nós seus m em bros podem os o fe re ­


c er a D eus um a hom enagem de reconhecim ento
que se rá suficiente, p orque te rá um valo r in fi­
nito.
Que agradeço a Deus
com “m inha” Missa?
N ossas ações de g raças devem seguir um a certa
ordem : é preciso agrad ecer o que c m ais im por­
tante. A in d a neste p onto a san ta L itu rg ia nos vai
guiar.
N o versículo do “ G loria in excelsis” os fiéis
cantam um a expressão, cujo alcance talvez nem
sem pre atin jam , m as que devia ser um a revela­
ção pa ra a piedade. E is a e x p ressão : “ D am o-V os
g raças por causa de V ossa grande glória."
E is o q ue p rincipalm ente devem os a g rad ecer a
D eus: a sua g ló ria ! A g rad ecer-L h e por ser o in­
finito em tudo, infin itam en te bom, infinitam ente
perfeito , infin itam en te poderoso. É êste o mais
fo rte m otivo do nosso reconhecim ento p a ra com
Deus.
N a v erdade, uma só coisa c im portante, um a só
coisa é necessária, a grandeza e a soberania de
D eus: daí a dvém todo o bem da s criaturas.
A ntes do mais, ag radeçam os-L he p o r Ê le ser
o que é, isto é, in fin itam en te glorioso.
Ao ren d e r g raças a D eus, po r causa de sua g ran­
de glória, o m em bro de C risto h arm oniza seus
agradecim entos com os que exp rim e seu C hefe
adorável p o r meio de seu sacrifício: p orque Cristo,
que recebeu de D eus a ciência verd ad eira, não
pode te r um m otivo mais im perioso p a ra e x p ri­
m ir seu reconhecim ento à in fin ita M ajestade, que
o da sua gló ria incom ensurável, fo n te de todos os
bens que têm gozado e gozarão C risto C hefe e
seus m em bros.
CAP. II. A G L Ó R IA D E D E U S 87

Como nos eleva esta ação de g raças de C risto!


E la faz-nos su b ir m uito acim a das v istas in teres­
seiras. M u itas alm as cedem à tendência n a tu ral
de agrad ecer a D eus som ente os benefícios p artic u ­
lares que receberam . C ertam en te cum prem seu d e­
ver: devem os ser reconhecidos pelos dons que
D eus nos concede; virtu d e, ciência, saúde, pos­
ses . . . M as q u a n tas alm as se preocupam de tal
form a com o dom que se esquecem do D o a d o r!?
P o r exem plo, agradecem a D eus a cu ra de um a
doença, sem p en sa r que o dom ínio sôbre aquela m o­
léstia supõe em D eus um poder, um a bondade, um a
com paixão infinitos, de m odo que só estas já m e­
recem louvor, hom enagem e ação de g raças! E sta
“gran d e g ló ria ” , objeto de todos os sentim entos de
agradecim ento de C risto, m u ita s vezes, não ocupa
em nós o prim eiro lu g ar a que tem direito.
É verdade que, sem o saber, nossas ações de
graças, passando pela S a n ta M issa, são a p e rfe i­
çoadas pelas de Cristo, de m aneira que, sem o su­
porm os, agradecem os a D eus como devem os pela
reta intenção de fazê-lo p o r meio de nosso C hefe
e Sacerdote, Jesus. M as como seria preferív el que
aprendêssem os a h a rm o n izar “ vo lu n tariam en te”
nossas ações de graças com as de C risto, de m o­
do a se trib u ta r à Santíssim a T rin d a d e a m aior
cópia de ações de g raças, “pela sua m aio r g ló ria”
fonte de todo o b e m !
S.° “Minha" Missa apresenta a Deus pedidos que Lhe
são infinitamente agradáveis.
D eus deve ser im plorado p orque é infinito. A
criatu ra por si m esm a é só in digência; deve pe­
d ir esmola. M as a oração não é só um a necessida­
de, é um d ever q ue nos vem da obrigação de ad o­
r a r a D eus e do reconhecim ento de nossa m isé­
ria. A d o ra r é reconhecer que D eus é o S en h o r de
tudo: é, p o rtan to , necessário p e d ir-L h e tudo. E is
88 SE G U N D A P A R T E

p o r que N osso S en h o r censura aos seus A póstolos


de não p edirem coisa algum a: “a té ag o ra não pe­
distes n ad a.” (J o 16, 24.)
E é possível a m im ro g a r a D eus dignam ente?
Sim , em " m in h a” M issa, porq u e nela L h e su­
plico “por m eio de Cristo”.
Dois são os m otivos pelos q uais as súplicas que
dirigim os no santo a lta r agrad am p e rfeitam en te a
D eu s; p rim eiro, em vista da pessoa dA quele que
o r a ; e depois p o r causa dos pedidos que L h e são
feitos.
A quele que o ra é Cristo unido aos seu s m e m ­
bros. É C risto M ístico, obra-p rim a das m ãos di­
vinas, de quem sou parcela v iv a ; n este C risto, ca­
beça dos redim idos e d o rav an te dêles inseparável,
“D eus pôs tôdas as suas com placências” . (M t
3, 17.)
O s pedidos feitos p o r C risto são os m esmos' que
D eus nos o rdena: C risto, como D eus, p e n e tra os
segredos da D ivindade. Sabe com o q u e r D eus ser
im plorado p o r suas cria tu ra s e q uais as súplicas
que serão d espachadas ou rejeitad as. P o rta n to , tu ­
do que Jesu s pede ao im olar-se c certam en te “ le­
vado à S antíssim a T rin d a d e pelo A n jo san to até
ao alta r sublime, à presença da divina M ajes­
tad e ” 1.
C risto M ístico cum pre, pois, de m odo in fin ita­
m ente p erfeito , o g ra n d e d ever da o r a ç ã o ; e co­
mo sou m em bro dêste Cristo, se uno m inhas in­
tenções às suas, m eu pedido, passan d o pelos seus
lábios, tom a as p roporções de súplica onipotente
q ue será certam en te atendida p o r D eus, porque
L he é inteiram en te agradável.
E sta é um a das m arav ilh as de “m inha” M issa:
ro g a r a D eus como Êle é digno de ser rogado.

1) Cânon.
CAP. I I. A G L Ó R IA D E D E U S 8»

Que pede o Cristo Místico


n a Santa Missa?
Q uais são êstes pedidos sem pre infalivelm ente
despachados que devem os ap re se n ta r a D eus p o r
meio de C risto C hefe, em “nossa” M issa?
N osso S en h o r m esm o no-lo indicou. "D eveis
o ra r assim : — P a d re nosso q ue estais no c é u . . . ”
(M t 6, 9.)
E stas súplicas, que são sem pre aten d id as e a g ra ­
dáveis a D eus, p o r serem ap resen tad as p o r C ris­
to em seu S acrifício, são as seguintes:
— S an tificad o seja o V osso no m e;
— V enha a nós o V osso reino;
— S eja feita a V ossa vonta d e assim na te rra
como no c é u ;
— O pão nosso de cada dia nos dai h o je ;
— P erdoai as nossas dívidas, assim como nós
perdoam os aos nossos dev ed o res;
— N ão nos deixeis c air em ten tação ;
— M as livrai-nos do mal.
T a l é a série de súplicas que C risto C hefe
apresen ta e que devo ap re se n ta r com Ê le à S a n ­
tíssim a T rin d a d e no san to sacrifício da M issa.
N ão foi sem um a inspiração divina que a Ig re ja
solicitam ente intro d u ziu o P a ter no ster na L itu rg ia
da S. M issa, e no in stan te m ais solene. Se C ris­
to se dignou revelar-nos como Êle o ra, foi p a ra
que conform em os nossas intenções às suas: “D e­
veis o ra r assim .” O tex to ensinado pelo C hefe do
Corpo M ístico é m uito p ró p rio na ocasião do san­
to Sacrifício, a fim de que os fiéis façam suas sú ­
plicas com o espírito com que devem ser p ro n u n ­
ciadas.
O ra, qual o sentim ento que anim a tôda a o ra ­
ção de C risto? O sentim ento dos in teresses de
D eus. O s pedidos do P a ter têm um característico
SE G U N D A P A R T E

bem im pressionante: percebe-se q ue visam o triu n ­


fo da M ajestad e d ivina na criação do universo.
N osso Sen h o r pede com efeito ao “N o sso ” P ai
— a ê s te .P a i cujo Filh o único é d o rav an te C risto
M istico, isto é, a Cabeça unida aos seus m em bros
— a sua glória (sa n tific a d o seja o V osso no m e),
o seu reino (v en h a a nós o V osso reiiio ), a sua
vontade ( s e ja feita a V ossa v o n ta d e ). A tendidas
que sejam estas trê s súplicas, c sendo D eus p e r­
feitam ente g lorificado, aclam ado e obedecido no
m undo, que fa lta rá então ao u niverso criado?
D eus n ão é tu do? Só D eus é necessário. S endo
Êlè glorificado, tudo está em ordem e a cria tu ra
im ersa na felicidade.
Cristo, po rtan to , te ria podido lim itar a êsses os
seus pedidos. M as, p ara an im ar-nos, q u e r e x p o r
a nosso P a i as necessidades de seu Corpo M ístico
“com plem ento” ( E f 1, 2 3 ) e acabam ento do F i­
lho único, e reclam ar explicitam ente p a ra êste C o r­
po M ístico os dons que encerram os três prim ei­
ros pedidos.
E is p o r que im plora a substância quotidiana, es- .
piritual e m aterial, p ara cada um de seus m em ­
bros (o pão nosso de cada dia nos dai h o je ) , a
fim de que, com o auxilio dêstes socorros, os fiéis
possam g lo rific a r a D e u s; a caridade recíproca
en tre os m em bros dêste Corpo (com o nós p e rd o a­
m o s ) ; a persistência do s laços q ue ligam cada
m em bro ao C hefe (n ã o nos d eixeis c a i r . . . li­
vrai-nos do m a l). P enetrem o s bem o sentido d ês­
tes três últim os pedidos: se nos obtiverem o am o r
de Deus c o am o r do próxim o e a união ao nos­
so Chefe, dar-n o s-ão tam bém a posse de tôdas as
virtudes.
D êste m odo são exp o stas ao “nosso” P ai tôdas
as necessidades dos m em bros de seu F ilho, neces­
sidades, cu ja satisfação p erm itirá ao C orpo M is-
CA P. I I. A G L O R IA D B D E U S 91

tico colaborar fortem en te com a cabeça, a fim de


d a r um a glória in fin ita à Santíssim a T rin d ad e.
A ssim , pois, quando, d u ra n te “ n o ssa" M issa,
recitam os com Je su s Sacerd o te o P ater, p ro c u re ­
mos com penetrar-nos dos dois g ran d es p ensam en­
tos que preocupam a C risto d u ra n te a oração:
D eus e seu C orpo M ístico. T o d o fiel que, no espí­
rito de C risto Jesu s, a p resen ta a “ nosso” Pai tais
súplicas é certam ente atendido, e logo resu lta p a ­
ra C risto “gló ria e felicidade” 2, porq u e a divina
V ítim a realiza, nesse ato m esm o, os fins que se
propôs ao oferecer-se: g lo rific a r a D eus, g lo rifi­
car-se a si m esmo, g lo rific a r seus m embros.
A prendam os daí a fo rm u la r não som ente os pe­
didos que apresentam os em “n o ssa” M issa, m as
ainda todos os que fazem os no decurso do dia, ein
união com nosso Chefe. P ro cu rem o s ped ir segundo
a ordem estabelecida p o r C risto, isto é, em p ri­
m eiro lugar, os interesses superio res de D eus, su-
b ordinando-L he em tu d o nossas v antagens p es­
soais: c o meio infalível p a ra serm os atendidos.
Q u an ta s vêzes, talvez, terem os celebrado “ n ossa”
M issa com C risto, sem ate n d e r à form a que deviam
te r nossas súplicas! E contudo o rávam os com cer­
ta eficácia, p o rq u e o C hefe su p ria a falta de in­
tenção de um m em bro tão p reocupado de si m es­
mo, que sua o ração ficava absorvida pelos seus
p róprio s interesses particu lares. D oravante, porém ,
serem os solícitos em ro g a r a D eus com o devem os,
p o r interm édio de C risto, desapegando-nos de nós
mesmos, a fim de nos revestirm os do espírito de
Jesu s C risto.
D êsse modo gozarem os dos fru to s da prom essa
divina: “ P ro c u ra i em prim eiro lu g ar o Reino de
D eus e tudo o m ais se rá dad o p o r acréscim o.”
(M t 6, 33.) Q u e encanto e que suavidade nos

2) Hino "Pange lingua”.


SE G U N D A P A R T E

ad v irá com a abundância de todos os bens, con­


corrend o nós tam bém p ara a m issão de g lo rifi-
cadores de D eus!
4.° Por meio de “minha” Missa, a honra da Majesta­
de divina fica plenamente satisfeita e o pecado é
reparado.
O sacrifício do C alvário consum ou-se no S angue
e nos h o rro re s do suplício d a C ruz, porq u e era
preciso p a g a r o pecado. N osso S en h o r aceitou em
nosso lu g ar as hum ilhações e x trem as p a ra no-las
poupar, e assim p a g a r p o r nós a dívida que nossas
faltas nos tinham feito c o n tra ir com a divina M a­
je stade e a qual éram os incapazes de saldar. “ N o s­
sa” M issa, que é o m esm o sacrifício que o da
Cruz, nos p roporciona o mesm o resgate infinito.
N osso Senhor, ao in stitu ir a S. M issa, anteci­
pou p ara nós a rem issão dos pecados, op erad a pe­
lo sacrifício d a C ruz e do a lta r, p orque em prega­
m os as m esm as p alav ras de q ue se serviu p ara
co n sa g ra r: "Ê ste é o Cálice dè m eu sangue que
será d e rram ad o pela rem issão do s pecados.”
A Ig re ja , sem pre fiel in térp rete do pensam ento
do seu C hefe, conservou todos os têrm os da insti­
tuição divina da S. M issa, e cada m anhã faz o
sacerdote rep etir a intenção de C risto ao im olar-
se "pela rem issão dos pecados” .
A “ n o ssa” M issa encerra, pois, em si, um poder
ilim itado de perdão. P o d er infinito, p orque a V í-
tim a-Sacerd o te é in fin ita e porq u e suas re p a ra ­
ções têm um v alor divino. O que hom em algum ,
po r m ais excelso que fôsse, podia realizar, o R e­
d e ntor o realizou além de tôda m edida, conform e
a afirm ação de S. Pau lo : “ O n d e abundou o pe­
cado, su p erabundou a g raça.” (R o m 5, 20.)
A “m in h a” M issa tem , pois, o p o d er incalculá­
vel de restabelecer a h o n ra devida à S antíssim a
T rindad e, perm itin d o à c ria tu ra , d evedora indi­
CA P. I I. A G L Ó R IA D E D E U S 93

gente, de p a g ar ao seu C red o r infin itam en te ju s ­


to e exigente “até o últim o centavo” (M t 5, 2 6 ),
de m odo que a harm o n ia e a carid ad e se acham
restabelecidas e n tre o m undo culpado e a in fin ita
Santidade. Q u a n to m ais form os u nidos ao no s­
so C hefe na oblação do santo S acrifício, m ais
concorrerem os p a ra a rep aração de tôdas as in jú ­
rias, culpas e b lasfêm ias da h um anidade. P o r
nosso interm édio será v ingada a h o n ra de D eus na
m edida da nossa cooperação à S. M issa, e esta­
belecido o direito absoluto da M ajestad e divina
sôbre o m undo. Q ue alegria p a ra nós e que fo n ­
te de m éritos se assim tiverm os trab alh ad o p ara
a nossa purificação pessoal, p ara o resgate de
nossos irm ãos e p a ra a satisfação da eterna
J u s tiç a !
Conclusão dêste capítulo:
“m inha” Missa é para mim
o ato mais importante e incomparável
A s páginas q ue precedem tiveram certam en te por
efeito en tu siasm ar o coração dos cristãos fiéis.
A o lê-las n ão tiveram p o r m om entos ím petos de
dizer a si m esm os: “A h ! m as é realm ente b e l a ! . . .
Como posso eu, pobre e in significante criatu ra,
colaborar em um a o b ra d esta im p o rtâ n c ia ! . . .
Posso a d o ra r a D eus in fin ita m e n te ! . . . ren d er-L he
graças in te ira m e n te ! . . . suplicar-L he com tôda a
p e rfe iç ã o ! . . . re p a ra r, sua h o n ra p le n a m e n te ! . . . ”
É ve rd a d e : cada m em bro de C risto, ao celeb rar
o santo S acrifício com seu chefe, atinge êstes fins,
contudo infin itam en te d istan tes e fo ra do alcan­
ce de sua fraq u eza inata. Q u a n ta s m aravilhas
acum uladas: m aravilha da união dos m em bros com
a Cabeça, m arav ilh a da prolongação do S a c rifí­
cio único sô b re o a lta r, m arav ilh a d a celebração
dêste sacrifício pelo C risto M ístico, Cabeça e m em ­
bros: m aravilha da g ló ria q ue a divina M ajestade
recolhe d a oblação.
94 SE G U N D A P A R T E

A “m in h a” M issa su rg e em m inha existência


como o g ran d e ato p a ra o qual d everiam conver­
g ir todos os m eus p ensam entos e e s f o r ç o s ... N a
verdade quem celebra a " s u a ” M issa tra b a lh a
m ais p a ra a glória de D eus e p ara o bem da h u ­
m anidade que os g enerais, industriais, com erciantes
e s á b io s ... O m undo inteiro, que se agita p a ra
atin g ir fins hum anos, m ove apenas um pouco de
pó, enquanto que o cristão que o ferece “ su a” M is­
sa faz um a obra de eternidade.
C ooperando com o S acrifício do altar, o m em ­
bro de C risto preenche o fim de su a existência, p a ra
o qual foi criado, g an h a n a realidade o seu d ia so­
bren atu ra l que lhe se rá infin itam en te retribuído,
pois D eus jam ais deixou de recom pensar os obrei­
ros de sua glória.
A linguagem hu m an a não pode e x p rim ir as
grandezas incom paráveis da “m in h a” M issa. U m a
m editação p rolongada, um a re flex ão contínua so­
bre as v erd ad es contidas neste volum e e sôbre os
textos tão eloqüentes da L itu rg ia da S. M issa, e,
acim a de tudo, um a o ração ferv o ro sa em união
com Jesu s S acerdote, nosso C hefe, e ainda a Co­
m unhão com o seu Sacrifício pela recepção do
S acram ento do A ltar, p o derão pouco a pouco le-
var-nos a com preender praticam en te e a v e rific a r
“quão su av e” é a p articipação com C risto na ce­
lebração do Sacrifício único que dá a D eus g lória
infinita.
Só quando tiverm os com eçado a e n trev er a v er­
dade, é q ue ficarem os adm irados, n ão de dizer
“nossa” M issa com, em e por C risto, m as de di­
zê-la com tão pouco ferv o r, de celebrá-la tão fria ­
m ente e ainda m ais de tê-la p o r tan to tem po ne­
gligenciado. . . T erem os g ran d e p esar, pensando que
poderíam os te r dado à nossa vida um valo r sem
lim ites com a celebração q u otidiana e que o não
CAP. I II . M E U F R U T O E S P IR IT U A L 95

f iz e m o s ... que teríam os acum ulado sôbre nossa


cabeça as g raças de um D eus, infin itam en te sa ­
tisfeito p o r nós, e do qual, pelo co n trário , só m e­
recem os rep ro v a ç õ e s. . .
Contudo, ainda é tem po: tudo não está perdido.
E m nossa aflição de te r um a vida vazia e inútil,
ainda tem os o meio de enchê-la: a “nossa” M is­
sa. T an to hoje, como ontem e sem pre, com ela
rendem os a D eus um a g ló ria in fin ita ; ela está à
nossa disposição p ara que possam os, p o r seu in­
term édio, encher a m edida de D eus e a nossa.

C A P ÍT U L O I I I

MEU FRUTO ESPIRITUAL


'•MINHA" MISSA É A FONTE DE TODOS OS MEUS BENS
ESPIRITUAIS, A REMISSÃO DE MEUS PECADOS, O
AUMENTO DA GRAÇA, O DESPACHO DE MINHAS
SÚPLICAS... E, DE TODOS OS ATOS QUE POSSO FA­
ZER NESTE MUNDO PARA A MINHA SALVAÇAO, “MI­
NHA" MISSA É INCOMPARAVELMENTE O QUE ME
PROPORCIONA O MAIOR PROVEITO.
O fruto que tiro
da “m inha” Missa é finito
D o valor in fin ito da “ m in h a” M issa só posso
tira r um fru to lim itado. A ssim como do oceano que
se m e ap resen ta sem lim ites só posso tir a r u m pouco
de água, conform e o tam anho do copo, do balde ou
do recipiente que encho, tam bém da “ m in h a” M is­
sa, cu jas v antagens são in fin itas p ara D eus, só pos­
so receber g raças proporcio n ad as ao recipiente so­
bre n atu ral de m inha alm a.
Com preende-se m uito bem q ue um ente peque­
no, como sou, não pode e n c e rra r em si um a ab u n ­
dância que o inunde: e c p o r isso que, ao cele­
b ra r “ m inha” M issa, retiro dela o que posso re ­
tirar, e nada mais. São algum as gotas que bebo em
cada oblação, ou m esmo alguns goles, m as só m e
SE G U N D A P A R T E

sacio de D eus, conform e a m inha "recep tiv id a­


de”.
Eis p o r que a “m in h a” M issa, in fin ita em si
mesma, em relação a m im tem efeitos finitos.
Consequências que podem resultar para Cristo,
apesar de o meu proveito só poder ser finito
A verificação que acabam os de fazer dos lim ites
de m eu fr u to espiritual esclarece alguns dos m o­
tivos p rincipais do plano divino na instituição do
sacrifício da S. M issa.
U m lucro finito pode a u m en tar sem pre mais,
se se acrescentam o u tro s lucros. M as, p a ra assegu-
rar-n o s êsses lucros incessantes, é preciso term os
perpetu am en te novas possibilidades de a d q u irir ou­
tros: nosso capital espiritual fo rm a-se com m ui­
tos dêsses acréscim os.
N osso C hefe, d esejoso de enriq u ecer seus m em­
bros com v antagens so b ren atu rais, só podia m ulti­
plicar p a ra os mesm os as ocasiões de h a u rir em
seus m éritos. É um a d as razões que O levaram
a perp e tu a r a cena do C alvário, a renová-la, con­
vidando-nos a celeb rar com Êle a m esm a oblação
ta n ta s vêzes qu an tas quiséssem os, p a ra a u m en tar
de cada vez o nosso lucro.
T al é, em relação aos m em bros do Corpo M ísti­
co, o papel da S a n ta M issa: ela p erm ite-lhas um a
p articipação sem pre crescente aos m éritos de Jesus
Cristo. M as, p ara q ue a oblação do a lta r pudesse
realizar plenam ente essa distribuição dos m éritos
d o C hefe aos m em bros, D eus devia p ô r a celebra­
ção da S. M issa ao alcance de cada fiel. E ra p re­
ciso não u m a S. M issa em u m só tem plo, ou no
de Jeru salém ou no de Rom a, p o r exem plo, mas
m uitas S. M issas em tôda p a rte e sem pre.
Se os cursos de ág u a tivessem co rrid o d u ra n te
um certo período de tem po no p rincípio do m un­
do, seus benefícios seriam h o je um a v aga lem­
CAP. m . M E U F R U T O E S P IR IT U A L 97

brança que certam ente não d aria de beber aos vi­


ventes de tôd as as é p o c a s ... ou se um só rio
corresse sem pre, m as em um a única região, como
Suciariam a sêde os hom ens das o u tra s regiões?
O g ran d e rio dos m éritos de C risto teve sua o ri­
gem no G ólgota. P o r meio da S a n ta M issa, inunda
com suas g raças todos os séculos e todos os climas
e sacia as alm as de tôdas as nações, todos os dias
de sua vida.
V ê-se bem ag o ra p o r q ue C risto in stitu iu a S a n ­
ta M issa: p o r um lado, p a ra q ue seu S acrifício não
fô ssc esquecido dos hom ens como um aconteci­
m ento longínquo, do qual apenas teriam vaga lem ­
brança e de que não p oderiam tira r fru to tão fa ­
cilm ente; p o r o u tro lado, p a ra que fô sse m dis­
tribuídos a cada um dos m em bros de seu C orpo
M ístico, segundo as necessidades da h o ra e do
m om ento, em todos os recantos do m undo, em to­
dos os instantes do tem po, os benefícios da R e­
denção por meio da C ruz.
T or estas razões, o Sacrifício sanguinolento do
C alvário é renovado em “ m inha” M issa.
Consequências que podem resultar para mim,
apesar de o fruto espiritual
de “m inha” Missa só poder ser finito
Se da im possibilidade de nos d a r um lucro in­
finito resultou p a ra C risto a necessidade de p e r­
p e tu a r en tre nós o seu Calvário, d esta m esm a
impossibilidade redundam p a ra nós consequências
im portantes:
1.° M inha p articipação 110 Sacrifício de C risto
aum en ta a cada nova S. M issa q ue celebro.
Q u an tas forem as vêzes que oferecem os o santo
S acrifício, ta n ta s vêzes recolherem os fru to s que
vão a u m en tar nosso capital esp iritual. Isto é que
tinham com preendido os San to s q u ando m an ifes­
tavam um tão ard e n te a m o r pela “su a ” M issa.
98 SE G U N D A P A R T E

P o r exem plo, San to Isidoro, o lav rad o r, p o r suas


fugidas de m an h ã p a ra a S. M issa, inco rreu n a có­
le ra de seu am o, porém m ereceu tam bém a d ita de
s er substitu íd o pelos a n jo s no cam po, enquanto
estava na ig re ja ; S a n ta R ita, a cozinheira, ta m ­
bém foi sub stitu íd a p o r espíritos celestes, que fa ­
ziam seus hum ildes trab alh o s enquanto estava na
M issa, arre b a ta d a em ê x ta se ; S a n ta M aria M ad a­
lena P ostei, a p esar de suas g ran d es ocupações, a s­
sistia a tôdas as M issas celebradas na capela de sua
com unidade: o beato L u ís M aria G rignon de M ont-
fo rt, que cam inhou m u itas léguas a pé e a tô d a a
p ressa, a fim de chegar a um a igreja antes do
meio dia p a ra celebrar a “su a ” M issa, porq u e o
C ura d a p aróquia onde se a p resen tara pela m anhã
lhe havia in ju stam en te recusado a autorização.
2.° M inha p articipação no S acrifício de C risto
aum enta na prop o rção do aum ento de m inha in ti­
m idade com Êle pela celebração da “m in h a” M is­
sa.
N ão nos parece im possível que esta participação
de C risto possa au m e n ta r em nós em cada S. M is­
sa? Pois, se um a única S. M issa pode encher nossa
capacidade de receber, como p o d erá a S. M issa
seguinte a crescen tar algum a coisa? Q u an d o enchi
m eu copo no oceano até ficar repleto, não acres­
centarei nem m ais um a gota se o im ergir n ova­
m ente. E s ta observação seria ju sta , se nossa pos­
sibilidade de receber ficasse como a do copo, sem ­
p re a m esm a. M as, ao encher nossa alm a, a “no s­
s a ” M issa tem p o r resu ltad o au m en tar-lh e ao m es­
mo tem po a capacidade espiritual.
E na verdade, com o verem os m ais ad iante, a
celebração do santo Sacrifício aum en ta em nós
a caridade, fo rtific a n ossa virtu d e, expele nossos
pecados, em um a p alav ra, desenvolve nossa aptidão
espiritual e dêsse m odo cria em nós um a m aior “ re ­
CAP. m . M EU F R U T O E S P IR IT U A L 99

ceptividade” de D eus. Convém, pois, assistir à


S. M issa ta n tas vêzes q u a n ta s puderm os.
M as é necessário a c re scen tar à assiduidade o
m odo de assisti-la. Se é sa lu ta r o fe re c e r a "nossa”
M issa o m ais frequ en tem en te possível, não é m e­
nos urg en te oferecê-la do m elh o r m odo possível, a
fim de que ela possa desenvolver em nós m aior
capacidade so b ren atu ral: com o a S. M issa é in­
finita, não a esgotarem os jam ais, p o r m ais p ro ­
fundos que sejam os abism os a preen ch er em
nossas alm as.
3.° M inha p articipação no Sacrifício de C risto
não é dim inuída pelo núm ero daqueles que cele­
bram comigo.
E m b o ra sejam finitos os lucros que tiro da
“ m inha” M issa, êsses lucros não são repartid os
pelo núm ero de pessoas presentes que com p arti­
lham comigo dos m éritos d e la ; não dim inuem se
há g ran d e assistência em volta do a lta r, nem a u ­
m entam se a assistência fô r m ínim a. S e ja eu o úni­
co a unir-m e à "m in h a” M issa, ou centenas d e
fiéis m e rodeiem , celebrando com igo a m esm a S.
M issa, não recebo nem m ais nem menos, m as
sem pre conform e a m inha capacidade.
E , de fato, a S. M issa sendo in fin ita, é capaz
de fazer tra n sb o rd a r todos os recipientes que se
lhe apresentem a encher. E a p esar de cada um dê-
les esta r repleto, os m éritos de C risto, sendo ines­
gotáveis, não ficam dim inuídos: resta ain d a com
que in u n d a r todo o u n iv e r s o .. . Pelo co n trário , o
gran d e n úm ero dos concelebrantes é um a razão a
m ais p a ra C risto o b ter de seu P a i fru to s m ais
abundan tes p a ra cada um dêles, em v ista do fe r­
v or de um a porção tão im p o rtan te do C orpo M ís­
tico.
100 SEGUNDA PA R TE

Que se deve entender


por "meu fruto espiritual"
E levando-se a S. M issa até ao céu p a ra g lo ri­
ficar a D eus, recai em lucros vário s sôbre a te r­
ra.
Em prim eiro lugar, d á à Ig re ja u m fr u to geral,
porque p ro p riam en te tôda S. M issa é d ita “em no­
m e da I g re ja ” . D e tôdas as M issas celebradas no
m undo, resu lta um im enso bem p a ra todo o C or­
po M ístico: a fa sta dêle os flagelos, expan d e sô­
bre êle graças m ais abund an tes e aum enta o n ú ­
m ero dos m em bros com a conversão dos infiéis
e a volta dos pecadores. A Ig re ja é sobretu d o a
g ra n d e teso u reira da M issa, que é sua obra e que
ela celebra pelo m inistério do sacerdote, seu re­
p resentante.
A S. M issa p roduz ainda u m fr u to especial ou
“m inisterial” , q ue co rresponde à intenção do ce­
lebrante, o qual pode fazer dêle a aplicação que
quiser. É o p roveito obtido pela pessoa que m an­
da dizer a M issa, ou p a ra aquela p p r quem se
m anda dizê-la. D isto falarem os mais tarde.
E nfim , a S. M issa dá aos m em bros do C orpo
M ístico q ue a celebram , um fru to q ue se cham a
“pessoal”, porq u e êste fru to é um bem q ue p e r­
tence a cada um dos concelebrantes. G anham êsse
tesouro pelo fa to de sua cooperação na oferen d a.
D a m esm a fo rm a que aquêle que recebe os sa­
cram entos ad q u ire a e strita p ro p ried ad e dos efei­
tos dos m esm os, como a rem issão dos pecados, o
aum ento da g raça, a im pressão dum c a rá te r, etc.,
assim é o fru to espiritual de “m inha” M issa. É
dêste fr u to pessoal que vam os ag o ra tra ta r.
CAP. m . M EU F R U T O E S P IR IT U A L 101

Os frutos pessoais da “m inha” Missa:


1.° aumento da graça santiflcante
O prim eiro fru to que o fiel tira de “su a ” M issa
é um aum ento da g raça san tifican te, que se ch a­
m a tam bém “carid ad e” .
H á duas razões p ara êste aum ento de vida so­
b ren atu ral, a colaboração do m em bro com o Chefe,
e o ato que p ro d u z esta colaboração.
1.° M in h a colaboração com Cristo na celebração
da S. M issa com unica-m e vitalidade m aior. Com
efeito, o Corpo M ístico tem suas leis q ue são as
m esm as de q u alq u er o u tro organism o: o trab alho
dos órgãos em com um com a cabeça pro d u z a
saúde. O m em bro que se m ove, desenvolve-se, p o r­
que recebe sangue e in flu x o n ervoso em m aior
abundância. D a mesm a fo rm a o m em bro de C ris­
to M ístico que realiza com seu C hefe esta o bra m a­
ravilhosa da im olação no a lta r, particip a cada vez
m ais abund an tem en te d a seiva que d im ana da C a­
beça e que é a graça.
N otem os que êste a flu x o de vida não é o m es­
mo p ara cada m em bro que o ferece com C risto:
varia de intensidade con fo rm e a atividade do cola­
b orador. C ertos fiéis d ão ao C hefe um concurso
m ais íntim o, m ais d esinteressado, m ais sincero e
dedicado que outro s. É ju sto que o proveito, sem ­
p re generosam ente retribuído, seja p o rtan to na
p roporção do concurso de cada um . Q u e esta ob­
servação sirva aos leitores do p resen te volum e,
de lição para incitá-los a a p e rfeiço ar cada dia sua
união de inteligência, de coração e de vontade com
seu adorável Chefe.
2.° O ato que p ro d u z m inha colaboração com
Cristo é causa p o derosa de aum ento de graça p a ra
m inha alm a. N o precedente capítulo foi dem ons­
tra d o que “ m in h a” M issa d á a D eus louvor, ação
de graças, rep a ra ç ã o ; que a M a jestad e divina, ad o­
rad a p o r C risto M ístico, é plenam ente satisfeita
102 SE G U N D A P A R T E

e não pode exigir m ais de sua cria tu ra , pois recebe


dela hom enagem com pleta. Como pode acontecer
que, tendo assim p erfeitam en te glorificad o por e
em C risto a um D eus infin itam en te ju sto e bom,
eu não L h e seja ag rad áv el? O ra , se r agrad áv el a
D eus é, segundo o sentido etim ológico d a p ala­
vra, ser "gracio so ” , isto é, d otado de graça.
A o celeb rar a “ su a ” M issa, o C orpo M ístico, do
qual som os parcela viva, p articip a não som en­
te da o fe re n d a de C risto, m as tam bém de tôdas
as vantagens que da im olação resulta p a ra seu
C hefe. N o C alvário, C risto conquistou m éritos in­
calculáveis que L he d eram a im ortalidade, a gló­
ria e um reino etern o à d ire ita de seu Pai. A
o u tra parte, a que co nstitui a Ig re ja m ilitante dês-
te m undo, recebe o direito de possu ir estas m es­
m as p re rro g a tiv a s sob a form a de graça sa n tifi-
cante, que se tra n s fo rm a rá em beatitu d e gloriosa,
apenas tiv e r en trad o no p araíso, onde o C orpo
M ístico irra d ia rá resplendores com o um sol ú ni­
co, do qual C risto é o núcleo lum inoso e ilum i­
nante.
D aqui se vê que o fiel, ao celeb rar a “su a ” M is­
sa, vai acum ulando preciosíssim os tesouros. M as,
como não percebe indício algum dêsses tesouros
exteriorm ente, é tentado a c re r que saiu da igre­
ja , tão p obre como entrou.
A h ! aqui é preciso desp rezar a ilusão da carne
que só a cred ita o que vê e apalpa, e a b rir os olhos
da fé, p orque só assim reconhecerá q uão proveito­
so lhe é o ferecer “su a ” M issa.
Os frutos pessoais da “m inha” Missa:
2.° o progresso na virtude
D uas pessoas que colaboram com a rd o r e a ti­
vidade na m esm a o bra, acabam p o r a d q u irir um a
com unidade com pleta de idéias e de vontades. A ssim
é que, p o r exem plo, cônjuges cristãos chegam a
CAP. I II . M EU F R U T O E S P IR IT U A L 103

fu n d ir suas alm as em um a só, p a ra realizarem


os interesses do lar.
E sta com unidade de idéias e de d esejos, que é o
ideal dos esposús, C risto q u e r realizá-la com seu
C orpo M istico que é a Ig re ja e p o r êsse meio com
cada um de seus m em bros. E tem isto tão a pei­
to que S. P aulo pôde dizer: "M arid o s, am ai vos­
sas esposas, com o C risto am ou a I g r e j a . . . ja ­
m ais houve alguém q ue odiasse su a p ró p ria c ar­
ne, m as, pelo con trário , todos pro cu ram n u tri-la e
cercá-la de cuidados, como C risto faz «à sua I g re ­
ja, porque som os m em bros de seu Corpo, somos
de sua carne e de seus ossos. É g ran d e êste m is­
tério (d a afeição pela espôsa, sua p ró p ria c a rn e ),
mas digo em C risto e na Ig re ja .” ( E f 5, 25-33.)
C risto tem, pois, cuidados p a rticu lares com a
"carne de seu Corpo M ístico” , isto é, conosco,
seus colaboradores, m ui especialm ente no ato emi­
nente do santo S acrifício. Q u e r fazer conosco "um
só coração, um a só alm a” , identificar-n o s consigo
na m ais com pleta intim idade de pensam entos, de
desejos e de vontades. Q u e r fazer-nos b u scar o
que am a, fu g ir do que odeia, à custa m esm o dos
m aiores sacrifícios. P o r o u tra s palavras, in spira-
nos a estim a de tôdas as virtudes.
É impossível, p o r consequência, o fiel celebrar
digna, a ten ta e d evotam ente a “ su a” M issa, sem
p ro g re d ir de um m odo ráp id o e m aravilhoso ha
p erfeição cristã.
E o m esmo ato da oblação em colaboração com
Cristo, não será a ocasião de p ra tic a r n as d iversas
circunstâncias as virtu d es que C risto q u e r que
germ inem em nós?
A o feren d a eu carística põe em prova a fé . S an­
to T om ás de A quino no-lo faz n o ta r: “A vista,
104 SE G U N D A P A R T E

o gôsto, o ta to enganam -se, só podem os fiar-nos


do ouvido: creio no que disse o F ilh o de D eus.” 1
O Sacrifício do a lta r é denom inado “m istério de
fé ” . Ê ste nom e é repetido pelo sacerdote d u ra n te
a S. M issa no meio d a fó rm u la q ue m uda a subs­
tância do vinho no S angue de Cristo, d eixando
persistir as aparências. E não é ju sto que o C orpo
M ístico, ajoelhado em adoração ao seu C hefe imo­
lado no m om ento da elevação, seja recom pensa­
do pela hum ilde adesão de seu espirito com um no­
tável acréscim o de fé ?
A celebração de “ su a ” M issa é p a ra o m em bro
de C risto um exercício p e rfeito da v irtu d e da
esperança. É como a esperança de todos os bens
espirituais e tem porais necessários à salvação que
o fiel se une Jesu s S acerd o te p a ra o fe re c e r com
Ele a hom enagem in fin ita. P o r m eio da S. M issa, o
fiel sabe que possui todos êsses bens, p o rq u e os
com partilha com C risto, o qual os m antém todos em
seu p od er p ara os ir com unicando aos seus m em­
bros.
E , finalm ente, não é su p érflu o d e m o n stra r ain­
d a que a celebração de " su a ” M issa constitui p ara
o fiel, que sabe u n ir-se a C risto, u m ato perfeito
de am o r de D eus. Ê ste ato assum e proporções sem
lim ites d a p a rte de D eus c com unica-nos em tro ­
ca um acréscim o incalculável de caridade.
O ra, as v irtu d es teologais não crescem na alm a
sem a tr a ir a ela tôdas as o u tras. E assim é que, ce­
lebrando o fiel com Cristo, particip a logo de seu
h o rro r ao pecado, de seu a m o r pela ju stiça, de
seu espírito de religião, de obediência, dc m o r­
tificação, de p u r e z a ... A “ su a ” M issa faz do fiel
um m em bro são, fo rte, vivo e sem pre ativo do
Corpo M ístico, isto é, um cristão p erfeito.

1) Hino “Sacris Sollemniis”.


CAP. III . M EU F R U T O E S P IR IT U A L 105

Os frutos pessoais da “m inha” Missa:


3.° a remissão dos pecados
A “nossa” M issa perd o a nossos pecados! Q ue
alegria p ara o fiel que celebra com C risto saber
que êste Sacrifício que oferece, tem em si o po­
der de anular tôdas as fa lta s, m esm o m orta is!
De fato, a S. M issa é a C ruz. N o C alvário o
Sacerdo te S uprem o o fereceu a seu P a i um res­
gate infinito p o r todos os pecados do m undo. A S.
M issa, que foi instituída, como já vim os no p rin ­
cípio dêste capítulo, p a ra d istrib u ir em tôda p a r­
te e a todos os cristãos os efeitos da R edenção,
oferece a cada m em bro do C oqio M ístico a rem is­
são dos pecados.
E ainda C risto, “ êste divino C ordeiro que se
sobrecarregou dos pecados do m u n d o ” , tom ou a
precaução de nos asse g u ra r disso, e a san ta L i­
turgia de no-lo fazer conhecer. O sacerdote p ro ­
nuncia realm ente cada m anhã, na S a n ta M issa, as
m esm as p alav ras de C risto: " Ê ste é o cálice de
meu S a n g u e .. . q ue será d e rram ad o pela rem is­
são dos pecados."
A palav ra de C risto n ão é vã e a insistência da
Ig re ja em no-la fazer co m preender tam bém n ão
o é. O sacrifício da S. M issa tem p o r efeito p e r­
d o a r os pecados todos, sem distinção de im por­
tância, nem de m alícia. A "m in h a ” M issa concede
em prim eiro lu g a r o perd ão dos “m eu s” pecados. E
p o r isso é que todo o fiel deve d izer cada m anhã
com o celebrante 110 m om ento do o f e r tó r io : “ R e­
cebei, san to Pai, esta hóstia sem mácula que V os
o f e r e ç o ... p o r “ m eus” in um eráveis pecados, o fe n ­
sas c negligências. . . a fim de que esta oblação
seja proveitosa à m inha salvação p a ra a vida e te r­
n a .”
106 SE G U N D A P A R T E

Como a “minha" Missa


apaga meus pecados
N ão se d everá p e n sa r que a S. M issa possa
substitu ir-se ao sacram ento d a P enitência e sup ri-
mi-lo, ap agando de nossa alm a os pecados, sem
o u tra form alidade, isto é, isentando-nos da con­
fissão.
Recordem o-nos q ue o sacram ento da P e n itên­
cia, recebido ou ao m enos d esejado, é de abso­
luta necessidade p a ra a rem issão des pecados m o r­
tais. O p ecador que, p o r um ato de contrição p e r­
feita, se reconcilia fo ra do S acram ento, só re ­
cebe a graça se tem a intenção, ao m enos im plí­
cita, de ir subm eter suas faltas à sanção do san­
to tribunal. A S. M issa, ap esar de p erd o ar in fa­
livelm ente todos os pecados, não pode su b stitu ir o
sacram ento da P enitência e não f a z as suas v e­
zes.
Como obtém, então, o perdão certo de tôdas as
nossas fa lta s?
P rod u zin d o m aravilhosos efeitos: em p rim eiro
lugar apazigua a D eus e, em vista da hom ena­
gem in fin ita que lhe trib u ta, m uda sua ju s ta có­
lera em m isericó rd ia; e depois, pelo po d er de in­
tercessão do C hefe im olado, que im plora p o r seus
m em bros, a tra i sôbre o p ecador copiosas graças de
arrependim ento.
É o que afirm a o santo concílio de T re n to , q u a n ­
do diz: “ A paziguado pela oblação do santo S a c ri­
fício, o S en h o r concede a graça e o dom do a rre ­
pendim ento e p erd oa os m aiores pecados e cri­
m es.” 2
É necessário, p o rta n to , que o p ecador não re je i­
te o dom da v e rd ad eira contrição que lhe é o u to r­
gado com a assistência ao Sacrifício infin ito , mas
que, co rrespondendo a essa g raça e certo do p er­

2) Sesg. 22, c. 2.
CAP. m . M EU F R U T O E S P IR IT U A L 107

dão, vá p ro c u ra r o sacerdote, o qual, após a a b ­


solvição, lhe ap licará defin itiv am en te os fru to s de
“su a ” M issa, isto é, o p erd ão d as penas dev i­
das ao pecado m ortal, em vista das g raças de a r ­
rependim ento que lhe fo ram concedidas pela S a n ­
ta M issa.
D estas v erdades resultam grav es consequên-

1.° D evem o s conseguir dos pecadores que assis­


tam à S . M issa.
É o m elhor meio, o único m eio verd ad eiram en­
te in fa lív e l p a ra a conversão de seu coração.
M as qual a p articipação q ue lhes é possível
o bter no santo Sacrifício ?
N a verdade, um a presença p u ram en te m aterial,
consentida, p o r exemplo, só p a ra “ca u sa r p ra z e r”
ou “p ara viver em p az” seria provavelm ente de m í­
nima eficácia, pois tal assistência não constitui,
propriam en te falando, um a com participação da o fe ­
renda. A tendendo-se contudo ao infinito p oder de
in tercessão que C risto, im olando-se, possui sôbre o
coração de D eus, m esm o esta M issa poderia a tra ir
para a alm a do p ecador alguns toques so b ren atu­
rais e d e te rm in a r o comêço de um a m archa p a ra
a volta. E sta presen ça é, pois, o “ m inim um ” que
se deve p ro c u ra r p a ra o pecador. A ssim , um a es­
posa c ristã deve p ro c u ra r lev ar à S. M issa, todos
os dom ingos, o m arido que parece esta r perdendo
a fé.
O btida esta condescendência de p u ra am abilida­
de, pro cure-se tran sfo rm á -la em prática piedosa,
conseguindo-se do p ecador a assistência ao santo
S acrifício, com a intenção de cum p rir u m ato de
religião. Ê ste consentim ento, ain d a que vago e con­
fuso, é suficiente p a ra fazê-lo partícip e da obla­
ção. E sta M issa to rn a-se p a ra o pecador, já de
certo m odo, um pouco a " su a ” M issa. E m rela-
108 SE G U N D A P A R T E

ção ao Corpo M istico que a o ferece, é com o um


m em bro m o rto , m as, assim m esm o, ligado ao tro n ­
co pela fé. S e o estado do pecad o r é ain d a insu­
ficiente p a ra atra ir-lh e im ediatam ente a g raça de
um arrep en d im en to sincero, a S. M issa assim ou­
vida dispô-lo-á p a ra um dia receber êsse dom .
Se se tem a felicidade de o b ter que o pecador,
em bora separado do C orpo M ístico p o r causa de
seus pecados, tenha a vonta d e fo rm a l de partici­
par dos b enefícios da S . M issa tan to q uanto pode,
o ferecendo-a d eliberadam ente com C risto, então a
S. M issa incitará infalivelm ente a alm a culpada a
p ro cu ra r a graça da absolvição. É ao escopo d esta
“participação” sincera e eficaz, que devem ten d er os
cuidados daqueles que desejam a volta a C risto de
seus m em bros transviados.
2.° D evem os m andar celebrar M issa s pela con­
versão dos pecadores.
Se não se pode conseguir que assistam ao san­
to Sacrifício, deve-se p ro c u ra r, p o r o u tro meio,
fazê-los partícipes do pod er que tem a im olação
de C risto para p e rd o a r todos os pecados. A tin-
gir-se-á este resultado, m andando celebrar M issas
em sua intenção. V erem os, m ais adiante, q ue é re ­
servado u m fr u to especial àqueles pelos quais é
celebrado o santo S acrifício. E m percebendo êste
fru to , os m em bros em estado de m o rte ex p eri­
m entam os benefícios do p o d er de p erdão que
possuem os m éritos de C risto: e não esta rá longe
o dia em que sua obstinação há de ceder ante as
solicitações da conversão.
N ão hesitem os, pois, em m a n d a r celeb rar o san­
to Sacrifício p o r nossos pecadores. D e tôdas as
obras de m isericórdia que podem os ex e rc ita r p a ra
com êles, esta é a m elhor. P o r que, m uitas vêzes,
os m em bros do Corpo M ístico, que pedem p a ra
os seus caros a g raça da volta a D eus, esquecem
CAP. I II . M E U F R U T O E S P IR IT U A L 109

que possuem n a oblação de C risto a rem issão de to ­


dos os pecados? Sem o m itir os atos de sacrifício e de
m ortificação, as orações vocais, a p rática das v ir­
tudes em união com C risto, estas alm as seriam
m ais avisadas se, p a ra m ultip licar a eficácia de seus
esforços, m andassem o fe recer com frequência, pe­
la intenção de seus pecadores, a im olação do a l­
tar.
Os frutos pessoais da "m inha” Missa:
4.° a satisfação por minhas faltas
T odos sabem os que, depois de perdoados os pe­
cados, nos resta ainda p a g ar a s suas consequências.
Se um pai perd o a a seu filho pródigo e tudo lhe
restitui em sua casa, o filho fica assim obrigado a
tra b a lh a r p a ra ex p ia r seus erro s. D a m esm a fo r­
ma, o pecador, depois de absolvido, fica ain d a com
um a dívida p a ra com D eus. Q uem a p ag a rá ? A S.
M is s a ... Q uem p a g ará m inha dívida em p a rtic u ­
la r? A “m inha” M issa.
A C ruz apresen to u a D eus, e a S. M issa to rna
a L he ap re se n ta r todos os m éritos e satisfações do
S acerdote infinito. Êle depõe n as m ãos da divina
M ajestad e o resgate m uito m aio r que as dívidas acu­
m uladas p o r todos os pecados do m u n d o ; constitui
um a reparação p e rfe ita e total da h o n ra devida a
D eu s; re faz o que a m alícia do pecador p ro c u ra ra
destru ir, o respeito divino.
M as p a ra que a S. M issa, tesouro capaz de sal­
d a r tôdas as dívidas, salde tam bém as m inhas,
é preciso que se to rn e a “ m inha" M issa. E , com
efeito, se Jesu s C risto depositou no seio de seu
P ai o saldo superab u n d an te p a ra a m o rtizar as d í­
vidas de todos os seus m em bros, a divina M aje sta ­
de exige q ue o “ tra n sp o rte ” do cabedal com um p á :
ra nosso h a v er pessoal seja feito p o r cada um de
nós.
P a ra tir a r proveit© das satisfações de Cristo,
o pecad o r deve te r o em penho de aplicá-las a si.
110 SE G U N D A P A R T E

N a verdade seria m uito fácil p a ra o culpado a d o r­


m ecer sem inquietação, dizendo: “ N ão tenho que
m e inco m o d ar; o S alv ad o r pagou p o r m im .” Se­
ria ca ir na heresia p ro testan te, a qual preten d e que,
tendo C risto pago m ais do q ue era preciso por
todos os pecados possíveis, podem os o fe n d e r a D eus
tanto qu an to quiserm os, contanto que h a ja fé in­
abalável na infin id ade da re d e n ç ã o !
N ão, tem os de ir d escontando a dívida q ue nos
resta depois da absolvição, h a u rin d o p o r nós m es­
mos, e p o r “nossa" M issa, da abundância d as sa­
tisfações de C risto. Se celebrarm os dignam ente,
isto é, com sentim entos de união intim a e de p e r­
feita carid ad e com nosso C hefe, as penas do p u r­
g a tório serão ap agadas e ficarem os quites p e ran­
te o suprem o Juiz.
Os frutos pessoais da “m inha” Missa:
6.° a consecução dos meus pedidos
Vim os q ue C risto com su a im olação faz a D eus
súplicas ard en tes, que infalivelm ente são ouvidas.
E stas súplicas são fo rm u lad as no “ P a te r” .
Suplica p a ra a glória, o reino e a vontad e de
Deus, e em seguida, p a ra tôd as as necessidades do
Corpo M ístico: pede a su bstância espiritual e m a­
terial, a carid ad e p a ra com D eus, a carid ad e dos
m em bros e n tre si, a p ersistência de su a adesão ao
Chefe.
E já que os m em bros e a C abeça fazem um só
todo na oblação d a S. M issa, d a qual C risto M ís­
tico é ao m esm o tem po Sacerdote e V ítim a, as
súplicas feitas pelos m em bros an te o a lta r santo,
em união com seu C hefe, são aceitas pela divina
m ajestade e certam ente atendidas. E s ta certeza
do êxito de nossos pedidos não é um dos m eno­
res privilégios de "n o ssa” M issa.
A razão d êste p oder de "n o ssa ” oblação é evi­
dente. C risto p o r seu S acrifício ad q u iriu o direito
CA P. I II. M E U FR U T O E S P IR IT U A L 111

de interced er p o r aqueles que se L h e unissem como


m em bros, a fim de resgatá-los. Como C hefe, tem
o poder de ped ir p o r nós. E além disto, êste m es­
mo C risto Chefe, que intercede p o r seus m em bros, é
o próp rio D eus que ouve o pedido. S e pede é
porque está certo de o b te r; pois sabe m u ito bem
qual é a v ontade de D eus a nosso respeito.
E is p o r que todos os pedidos que um m em bro
de C risto fo rm u la em “sua" M issa, será in falivel­
m ente atendido, porque passa pela bôca de Cris­
to.
Mas como form ular nossos pedidos?
Êste é ju sta m e n te o único segredo: p a ra que os
m em bros sejam atendidos, devem fo rm u la r seus
pedidos, segundo o espírito de seu C hefe. A qui,
como em tôda p arte, a união dos m em bros com a
Cabeça é necessária: quando o fiel e C risto oram
conjuntam ente, D eus não pode resistir. Q u an d o o
pedido de C risto e o do fiel diferem , é claro que o
de C risto prevalece, p orque é sem pre conform e à
divina vontade.
A Ig re ja , na L itu rg ia, recorda-nos freq u en te­
m ente êstes g ran d es princípios da v erd a d e ira o ra­
ção do C orpo M ístico, “por, em e com C risto ” .
F az-nos dizer, p o r exem plo, na coleta do nono d o­
mingo depois de P entecostes: “ S enhor, p a ra que
nos concedais o q ue desejam os, fazei-nos p edir-V os
som ente o que é de V osso ag ra d o .”
Como, porém , poderem os saber que pedim os o
que ag rad a a D eu s? O b servando ò modo de o ra r
do nosso C hefe e im itando-O . " O ra re is assim ” ,
disse Ê l e .. . e logo nos m anda ped ir o reino, a
g lória, a vontade de D eus. P o r consequência, p ara
p a ssar pelos lábios de C risto, tôda o ração em
“nossa” M issa deve te r em vista os interêsses divi­
nos. E isto está em o rd e m : " P ro c u ra i prim eiro o
R eino de D eus.” (M t 6, 33.) A S. M issa, como
112 SE G U N D A P A R T E

vimos, tem p o r prim eiro escopo a “gló ria de D eu s”


po r meio da adoração p e rfeita, da ação de g r a ­
ças total e da satisfação com pleta. A “ m inha” M is­
sa só se to rn ará,, pois, “m eu” ato de religião p e r­
feito, se eu o o fe re c e r com m eu C hefe no desíg­
nio de co n co rrer an tes de tudo p a ra “a glória
de D eu s” .
A gló ria de D eus, a rep aração de sua honra,
a rem issão dos pecados são, d e n tre os nossos d e­
sejos, os que certam ente agradam a D eus, e os
quais, elevando-se dos m em bros à Cabeça, não dei­
xarão de se r atendidos.
M as só se pode co n co rrer p a ra êste “ reino” de
Deus pelo triu n fo de C risto M ístico, isto é, da san­
ta Ig re ja unid a a seu C hefe. E é p o r isso que,
com, em e por C risto, devem os ro g a r a D eus pe­
los m em bros de C risto de que fazem os p arte, co­
mo no-lo indica a segunda p a rte do “ P a te r ” . . .
Nosso pão espiritu al e m aterial, nossa caridade p a­
ra com D eus, nossa união com o C hefe e seus
m em bros, tais são ainda desejos que agradam a
D eus, e que n ão d eix arão de ser atendidos por
Êle.
E sfo rcem o-nos, pois, p ara “o ra r assim ", a fim
de que nossos pedidos, form ulados segundo o espí­
rito de C risto, sejam levados ao tro n o da S a n tís­
sim a T rin d a d e p o r nosso p ró p rio C hefe no de­
curso de “ nossa” M issa.
Em "m inha” Missa poderei
fazer pedidos particulares,
espirituais ou temporais?
A p a r destas intenções g erais, cada m em bro de
C risto tem as suas p ró p rias e m uito particu lares,
que tom a m uito a peito: quem não deseja tal
g ra ça espiritual p a ra si m esm o, p o r exem plo, li­
v rar-se dos escrúpulos, a coragem c o n tra cer­
tos hábitos, a aquisição de tal v irtu d e ? . . . ou ainda,
CA P. III . M E U FR U T O E S P IR IT U A L 113

outros d esejam o bom procedim ento p a ra u m jo ­


vem transviado, a conversão dos pais ou de am i­
gos, a paz p ara o l a r . . . porém , o m ais d as vêzes,
dever é confessá-lo, os fiéis se preocupam com
favores tem porais, p o r exem plo, a saúde, um a b ri­
lhante posição, um casam ento rico, o êxito em um
exam e, a prosp erid ad e nos n e g ó c io s.. .
Poderem o s fo rm u la r estes pedidos em “nossa"
M issa ? . . . ap re se n ta r C risto a D eus p o r todos êstes
fins que visam os como necessários? É evidente que
o podem os, pois é sem pre perm itido p e d ir a D eus
bens legítim os, e é h o nroso p a ra D eus que sua
criatu ra , suplicando-L he favores, reconheça sua
suprem a riqueza e sua in fin ita bondade!
E sta s súplicas serão in fa livelm en te atendidas?
Sim, se são do n úm ero daquelas “que agrad am a
D eus” . Se não o forem , obterem os então um a
outra coisa, m elhor p ara nós, p orque nenhum a
oração é desprezada p o r D eus, o qual, p o r meio
de benefícios sabiam ente repartid o s, sabe c o rri­
gir os erro s dos nossos pedidos.
M as como d a r às nossas súplicas o m aio r n ú ­
m ero de razões possíveis p a ra “a g rad arem a D eu s” ?
P rocuran d o , ao ap resentá-las, revesti-las daquele
“bom m odo” , isto é, de um verdad eiro desinterêsse,
porque a o ração egoísta não en contra jam ais o
cam inho do coração.
A “m inha” M issa é d estinada, acim a de tudo
o mais, a p rom over a g lória de D eus e o triu n fo
de C risto M ístico. E u fa ria p o rtan to um g ran de
mal se a desviasse de seu fim , p a ra tran sfo rm á -la
em sim ples instru m en to de m eus m enores desejos.
Posso o ferecer " m in h a” M issa p o r m inhas neces­
sidades pessoais: é louvável e até recom endável;
mas esta súplica deve v ir em segundo lu g ar. A ssis­
tir à S. M issa unicam ente p a ra restabelecer-se de
doença, p a ra en c o n tra r m arido, p a ra te r êxito
114 SE G U N D A P A R T E

em exam e, constitui p articipação m uito im perfei­


ta na hom enagem in fin ita, e, ao m esm o tem po, de­
n ota m uito pouca habilidade na a rte de p edir:
D eus, n a v erdade, só pode fic a r m ediocrem ente
honrado, vendo-se am ado e rogado só em vista
de interesses tão m esquinhos ao lado dos seus.
É necessário então que o m em bro do C orpo M ís­
tico, sacudindo o egoísmo, p ro cu re esquecer-se, e
que “su a ” M issa, m esm o sendo o ferecida com o
fim de ob ter um fav o r pessoal, se ja celebrada
com Cristo e pelos fin s que Cristo tem cm vista:
glória p e rfeita, rep aração total, ação de g raças in­
finita, aquisição de favores tendentes a ap e rfe i­
çoar e a to rn a r m ais agrad áv eis a D eus cada um
dos m çm bros do C orpo M ístico e nós m esmos
em particu lar. Êstes fins devem p reo cu p ar acim a
de tudo o fiel que coopera com seu C hefe no altar.
Im plorad o p o r Êle mesmo, com o m erece, e em
vista dos g ran d es interesses de Cristo, D eus, in fi­
nitam en te com pensado pela S. M issa q ue L he é
oferecida, fa rá d escer sôbre êste m em bro do F i­
lho único suas “com placências p a te rn a is” , e lhe
concederá m ais g en erosam ente o que pede.
D êste modo, o fiel te rá m uitos m otivos p a ra ser
ouvido como d eseja, e mesm o m ais ainda do que
deseja. N a v erdade, como pod eria D eus recu sar
a êste m em bro de Cristo, que L he acaba de d a r, em
união com seu C hefe, um a glória in fin ita , todos
os favores espirituais ou tem porais que deseja, e
que tão facilm ente sua O nipotência pode conce­
d er?
E é p o r isso que a divina bondade em penha-se
em cum u lar de g raças, tan to no espiritual como
no tem poral, aquêles que, esquecendo-se de si p ró ­
prios p o r D eus, celebram bem a “ su a” M issa.
O s fiéis que vivem assim desapegados de si
m esm os prom ovendo o louvor à S antíssim a T rin ­
CA P. I II. M E U FR U T O E S P IR IT U A L 115

dade, têm tan to m ais m otivos p a ra serem ouvidos


p o r ela, p orque sua solicitude pela “g ló ria de
D eus acim a de tu d o” tem p o r resu ltad o re tific a r
os desejos pessoais e to rn a r as p ró p ria s súplicas
conform es à sua v o ntade providencial. Q u an d o se
sentem im pelidos a ped ir com insistência, é p o r­
que já sabem so b ren atu ralm en te que seu pedido
não desag rad a à sum a S abedoria. E a té pode-se
m esmo fo rm u la r êste princípio: “ Q u an to m ais um a
alm a c de Deus, m ais é ilum inada sóbre a retidão
de seus pedidos.” D aí se com preende facilm ente
a certeza da concessão do pedido d a V irgem M aria
a seu F ilho, em C aná, e ain d a a de tan to s S antos
que, p o r um sim ples suspiro, obtém favores tão
assinalados.
“ Peçam os e receberem os” . É só fazer a ex ­
periência. A o ração sem pre tem êxito. M as p a ra
lá chegar, a única dificu ld ad e está em esquecer-se
su ficien tem en te para preocupar-se com D eus. É
verdad e que esta disposição só pode se r o resul­
tado dos esforços de um a m o r p e rs e v e ra n te .. .
M as quantos fiéis há que, se quisessem te r c o ra­
gem, conseguiriam com p resteza o fe re c e r " su a ”
M issa, e o ra r com devoção d e sin teressad a!? P o r
que hão de p en sar que, apenas se esqueçam de
si mesm os, D eus não m ais ate n d e rá ao que n e­
c e s s ita m ? ... "A lm as de pequena fé” (M t 14, 31.)
T ran sfo rm a m “su a ” M issa em um a argum entação,
insistindo p ara p ro v a r a D eus q ue os pró p rio s de­
sejos têm m ais im portância e que a sua glória d e­
pende d ê le s ! . . . e então só depois de te r expos­
to a D eus as p ró p rias necessidades, pelas quais
lhes é bem legítim o o ra r, é que d everiam abism ar-
se na fé p ara a d o ra r devidam ente a divina M ajes­
tade no decurso do santo Sacrifício.
A S a g rad a E sc ritu ra ensina-nos o verd ad eiro
m eio p a ra tudo alcançarm os de D eus: “ D eleita-te
116 SE G U N D A P A R T E

no S en h o r e Êle cum ulará todos os teus d esejos.”


(SI 26, 4 .) N osso S en h o r repete êste m esm o pen­
sam ento: “ P ro c u ra i — disse — o Reino de D eus e
tudo o m ais vos se rá d ado p o r acréscim o.” (M t
6, 33.)
A s p alav ras de D eus jam ais poderão enganar:
realizem os as condições que im põem e obterem os
os efeitos que prom etem . D eus p en sará em nós na
m edida em que nos p reocuparm os com Êle. É um a
regra de vida espiritual cu ja aplicação nos p e rte n ­
ce v irificar, se quiserm os, pela celebração p e rfeita
da “nossa” M issa.
O fruto pessoal do sacerdote
que celebra “sua” Missa
O fr u to pessoal do sacerdote c da m esm a na­
tureza que o dos fié is que celebram com êle. Re-
cordem o-nos que é C risto M ístico que oferece. É,
pois, Jesu s C risto unido a seus m em bros e p artic u ­
larm ente unido àqueles que concorrem p a ra a
oblação q ue se realiza naquele m om ento. É ju sto
que o sacerdote e fiéis, que na m esm a ocasião ap re ­
sentam a divina M ajestad e seu sacrifício, com­
partilhem seus efeitos.
E realm ente ofician te e assistentes gozam de
todos os benefícios de " su a ” M issa, os q uais aca­
bam os de en u m e ra r no decurso do p resente cap ítu­
lo: aum ento da graça, progresso na virtude, rem is­
são dos pecados, satisfação d as penas tem porais,
deferim en to das súplicas feitas.
M as o sacerdote percebe d êste fr u to pessoal um a
cópia m u ito superior à que é o u to rg ad a aos sim ­
ples fiéis. E sta m aior com participação dos fru tos
do santo S acrifício é de ju stiça, em vista do o fí­
cio que exerce o sacerdote n a o fe re n d a dos san­
tos M istérios.
Se o sacerdote e os fiéis são concelebrantes, só
o sacerdote é o ficiante. D e um lado é d ep u tad o pe­
lo Corpo M ístico, p a ra re p resen tá-lo ; de o u tro lado
CAP. m . M E U FR U T O E S P IR IT U A L 117

é deputado pelo p ró p rio C risto, p ara ocu p ar-L he


o lu g a r: o sacerdote é um interm ediário, o ficial­
m ente constituído e n tre C risto e seus m em bros, e
m arcado com um c a rá te r especial, do qual decor­
rem seus poderes. A m ais im p o rtan te de tô d as as
suas pre rro g a tiv a s é a de “co n sag rar", isto é, po­
d er por um ato de sua decisão livre e no m om en­
to que escolhe tra n s fo rm a r o pão no C orpo de
C risto e o vinho no seu Sangue, renovando assim
no a lta r a im olação do C alvário. D e seu lado, a
S an ta Ig re ja en carreg a o sacerdote de e x ercer es­
ta função sag rad a, segundo as necessidades e os
desejos dos m em bros que constituem a p a rte do
Corpo M ístico, à qual está unido o seu m inistério.
V ê-se bem a p a rte que tem na oblação “esta
m ão que distribui a C arne sa g ra d a ” .3 Se o sa­
cerdote tem as v antagens dos concelebrantes da
S. M issa, seu lucro deve ser m ais ab u n d an te que
o dos o u tro s fiéis, já que su as responsabilidades
e suas funções têm m ais im portância. É assim r a ­
zoável h o n ra r com um a rem uneração m ais copio­
sa aquêle cujo papel se acha em p rim eiro pla­
no.
Q uan d o se refletiu , como acabam os de fazê-lo,
sôbre o im enso fru to pessoal que os sim ples fiéis
retiram de “su a ” M issa, qual deve ser o pasm o
e o reconhecim ento dos m in istro s dos altares, pen­
sando que “ su a" M issa m ultiplica p a ra êles tão
m aravilhosos teso u ro s!
C ontudo, da m esm a form a que os sim ples fiéis,
o sacerdote só gan h a seu fru to na propo rção de seu
grau de am or e de união com o C hefe. O s sa ­
cerdotes, ap esar de tão privilegiados, podem in fe­
lizm ente in terp o r obstáculo às g enerosidades di­
vinas. Se o m em bro, como se dem o n stro u acim a,

3) São João Crisóstomo, Hom. 60, ao povo de Antio-


quia.
118 SE G U N D A P A R T E

recebe do C hefe a vida so b ren atu ral, de acôrdo com


a sua im portância no Corpo M ístico, — e é p or
isso que na S. M issa a p a rte do sacerdote é tão
abundan te — esta vida só pode a tin g ir ao m em bro se
estiver unido à C abeça. Se, porém , o sacerdote es­
tivesse desligado de C risto ou total ou parcial­
m ente, não receberia as v antagens preciosas de
" su a ” M issa, ou só teria um a pequena p arte, en­
quanto o fiel que com êle celebra ao m esm o tempo,
e com um ato de carid ad e p e rfeita, ficaria inun­
dado das g raças divinas. E m esm o assim , essa M is­
sa de um sacerdote m enos bem disposto co n tin u a­
ria a te r seu valo r intrínseco. A presentam a D eus a
hom enagem infinita, p orque todo o valo r do S a ­
crifício depende jo de Cristo. E os mesmos efeitos
de graça e de salvação se pro d u ziriam na alm a
dos fiéis.
O s concelebrantes não têm que fa zer d epender
a validade de “su a ” M issa das disposições in te­
riores do oficiante. T o davia, m ais vale p articip ar
da oblação de um S an to que da de um sacerdote
tíbio, a fim de não ficar p rivado do acréscim o su­
plem en tar de favores que pode a tra ir a interces­
são de um m in istro g ra n d e A m igo de Deus.

O lucro, daqueles por quem


é celebrada a S. Missa
P o r um ato de sua livre vontade, o sacerdote,
quando celebra, renova não som ente o Sacrifício
do C alvário, m as ainda, em v irtu d e de seus pode­
res oficiais sóbre a oblação, tem o direito de indi­
car à divina V ítim a a intenção pela qual vai reno­
var seu sacrifício. T em os, pois, nós, m em bros do
Corpo M ístico, a faculdade de ob ter do nosso
Chefe ad orável p o r meio do sacerdote, nosso re­
presen tan te, os m éritos infin ito s de sua oblação p a­
ra o fim determ inado que mencionam os.
CA P. III. M E U FR U T O E S P IR IT U A L 119

A L itu rg ia, q ue sem pre nos paten teia fielm en­


te as realidades invisíveis, apresen ta-n o s êsse p o­
d er que tem o sacerdote de d irig ir a intenção de
Cristo. P o r d uas vêzes — nos dois m em entos —
o celebrante pron u n cia os nom es das pessoas p ri­
vilegiadas pelas quais é oferecid o o santo S a c rifí­
cio. “ L em brai-V os, S enhor, de V ossos servos e
s e r v a s . . . ” (aq u i o sacerdote p á ra e recolhe-se,
a fim de dizer os seus n o m e s). F az o m esm o no
m em ento dos m ortos, depois da consagração: “ L em ­
brai-V os tam bém , S enhor, de V ossos servos e se r­
v a s . . . que nos p recederam com o sinal da fé, e
que dorm em o sono da paz.”
O s “ servos e serv as” de D eus assim designa­
dos percebem d iretam en te as vantagcfis especiais
que dim anam da intenção ex pressa pela V ítim a
divina ao im olar-se.
D êste fru to p artic u la r o sacerdote não pode ti­
ra r a m enor p arcela p a ra o u tro s: deve a trib u ir a
o fere n d a com pleta de C risto à pessoa p o r quem
celebra. T o davia, o sacerdote é livre de recom en­
d a r a D eus, sem p reju ízo da intenção especial, to ­
das as pessoas pelas quais deve ped ir p o r ju s ­
tiça, reconhecim ento e caridade: essas o u tra s te­
rão ainda da p a rte de C risto um a intenção secun­
dária, preciosa tam bém .
N otem os ainda que a aplicação da S a n ta M issa
a um a determ in ad a intenção nãt> p reju d ica de m o­
do algum aos concelebrantes: seu lucro, como dis­
sem os no capítulo passado, provém da sua coo­
p eração à oferen d a, e é p o r isso que é pessoal e
inalienável; en quanto que o fr u to especial, do qual
tratam o s aqui e de que gozam as pessoas pelas
quais a S. M issa é o ferecida, lhes p ro v irá da in­
tenção que tiv e r C risto de aplicar-lhes seus m éri­
tos na m edida que ju lg a r oportu n a.
120 SE G U N D A P A R T E

Q u e bondade do nosso C h efe! E n q u an to nós,


celebrando com Êle, retiram o s um im enso fru to
pessoal, um ente am ado, cu jo nom e designam os e
p a ra quem desejam os esta ou aquela graça, p o r
exem plo: a conversão, a saúde, a santificação, ou
a libertação do p u rg ató rio , se se tra ta de d e fu n ­
to, experim enta os efeitos da im petração in finita,
a presen tad a p o r C risto à divina M ajestade.
O fru to que re su lta desta intercessão onipoten­
te é in calcu láv el! P a ra te r um a idéia aliás m uito
fraca dêsse lucro, recordem o-nos quem é o A d ­
vogado que nos d e f e n d e ... e em q ue term os o
faz “pela ap resentação de San g u e m ais eloquen­
te que o de A b e l . . . ” (H e b 12, 24) e com que
a m or intercede p o r n ó s !
A ssim podem os ficar certos que, p a ra o b ter do
Altíssim o as graças espiritu ais ou tem porais que
são necessárias à nossa salvação e à dos o utros,
não h á no m undo meio m ais poderoso e q ue se
possa com p o rar com a oblação da S an ta M issa.

O fruto daqueles que


mandam celebrar a S. Missa
O m érito de um a o bra de carid ad e depende de
três coisas: do v alo r da obra, do esforço que exi­
ge, e, enfim , do a m o r com q ue se executa.
N ão há obra algum a de m isericórdia que ex­
ceda em valo r à dádiva de um a S. M issa. A p re­
sen ta r um copo dág u a é ato que será recom pensado;
com qu an to m aio r razão devem os en riquecer um a
alm a com os fru to s d a oblação in fin ita de C risto.
N ão h á m isericórdia que se lhe ap ro x im e! N ão
h á dom, nem riqueza que se lhe possa c o m p arar!
Se, p o rtan to , so co rrer ao próxim o em suas necessi­
dades, p ro digalizando-lhe cuidados m ateriais ou es­
pirituais, a tra i sôbre nossa g enerosidade as bên­
ção celestes, que cúm ulo de m éritos ad v irá sô-
CA P. I II. M E U FR U T O E S P IR IT U A L 121

bre nós da o feren d a da im olação de C risto a um


m em bro do Corpo M ístico!
Se o ônus que nos im pom os é o segundo elem en­
to do m érito, não é alheio à oblação do san to S a­
crifício: pois, p a ra m a n d a r celeb rar M issas, não
se deve d a r ao sacerdote um a " e sp ó rtu la” ? C er­
tas pessoas não têm dificu ld ad e de encontrá-la
em sua bôlsa, m as quan to s hum ildes m em bros de
C risto têm que econom izar, p rivando-se co ra jo ­
sam ente dessa econom ia p ara m an d ar celeb rar al­
gum as M issas! Q u an to s sacerdotes não têm ficado
p ro fund am en te edificados q u ando certos fiéis lhes
vêm en tre g a r a espórtula, a fim de celebrarem pela
intenção de seus pecadores ou de p a ren tes fale­
cidos !
E nfim , a caridade com q ue se p ratica essa obra
de m isericórdia é a terceira fo n te de lucro que se
pode tira r. A p ró p ria idéia de m an d ar celebrar
M issas não indica que se tem no íntim o d a alm a
o am or de D eus? Se êste am o r não é m uito de­
senvolvido, o san to Sacrifício, q ue vai ser o fereci­
do po r meio de nossa espórtula, não te rá p o r efeito
aum entá-lo, p e rd o a r nossos pecados e alcançar-nos
virtudes?
N ão h á obra de m isericórdia su p erio r a esta:
m an d ar celebrar M issas segundo as intenções das
pessoas que querem os socorrer. Acim a d as qu an­
tias que reservam os p ara esp ó rtu las coloquem os a
prece que p o r elas dirigim os a D eus: a g ra n d e im ­
petração de C risto na S. M issa, renovando seu Cal­
vário !
A razSo de ser das "espórtulas”
C ertas pessoas se escandalizam de v er a Ig re ja
im por aos fiéis a obrigação de d a r "e sp ó rtu la ” pa­
ra te r direito à celebração de um a M issa. Che­
gam m esm o a d iz e r: “A Ig re ja vende a M issa!”
É necessário p ro te sta r co n tra esta ex p ressão blas­
fem a e antes de tudo rebatê-la devidam ente.
122 SE G U N D A P A R T E

1 ° A espórtula não é u m pagam ento, m as um a


oferta. N ão é do espírito da Ig re ja nem do fiel
que a esp ó rtu la represen te a troca de u m valor
por outro correspondente. Po is bem sabem os que
o v alo r de algum as m oedas não se pode com p arar
com o da S. M issa. M as a Ig re ja q u e r q ue seus
sacerdotes vivam condignam ente: como com pensá-
los do bem que fazem , senão aproveitan d o o ato
principal d en tre as funções q ue exercem a fa v o r dos
cris tã o s ? !
2.° A espórtula encerra apenas um a privação leve,
o sacrifício de pequena q u an tia de dinheiro. A
Ig re ja q u e r que a oblação de um a S. M issa im ­
ponha alguina m o rtificação, pois, de o u tro modo,
os fiéis não aquilatariam — é assim a n atu reza
hum ana — bem cabalm ente da im portância 'cio
santo Sacrifício.
3.° A espórtula co nstitui u m contrato entre o
fiel e o sacerdote, de acôrdo com o qual o sacer­
dote fica obrigado, sob a pena de culpa g rave, a
celebrar a S an ta M issa segundo as intenções d e te r­
m inadas. E sta q u an tia reclam a a p ró p ria S. M issa:
obriga o sacerdote ao cum prim ento de seu com pro­
misso.
4.“ A espórtula c o único m eio que torna possí­
vel a obtenção de M issas. Com o p oderíam os obter,
sem espórtula, todo o valo r de um a S. M issa p ara
nós? T odos poderiam reclam ar tan to mil M issas co­
mo um a ; pois não lhes custariam m ais. O s sa­
cerdotes ficariam acabrunhados de pedidos que não
poderiam sa tisfazer e nem os fieis teriam direito
de exig ir: que títu lo de obrigação teriam ? N ão re­
cusariam acaso celebrar p o r estranhos, querendo
o ra r prim eiro p o r seus pais ou am igos?
Pelo con trário , o g esto de p erceber espórtulas
c apenas m anifestação ex te rio r e solene de um com­
prom isso.
CA P. i n . M E U FR U T O E S P IR IT U A L 123

A Ig re ja , p o r conseguinte, foi sábia em ad o ta r


a p rática das espó rtu las p a ra a celebração d as S.
M issas. A queles que d esejam M issas podem obtê-
la s; podem ficar certos que su a M issa será d ita ;
e dêste m odo todos os abusos serão evitados, e, de
p a rte a parte, sacerdotes e fiéis são satisfeitos.
N ão se deve dizer que as espórtulas dão azo a
que só os ricos obtenham M issas e os pobres fi­
quem p rivados delas. Pois a qu an tia exigida não é
tal que cause p reju ízo às m ais m odestas bôlsas.
É verd ad e que a g ente do povo não pode m an d ar
celebrar M issas como as pessoas ab astadas. M as
Deus vê tudo: p a ra aquêles que se im põem um a p ri­
vação m eritó ria, co ncorrendo com a espórtula, sua
sabedoria não pode com pensar a impossibilida­
de de te r m uitas M issas com o lucro de um a
só?
Se certos indigentes, ap esar do desejo, são in­
capazes de m an d ar celeb rar M issas, os m éritos de
C risto não serão acaso abund an tes para que D eus
d e rram e sôbre os m em bros pobres e abandonados
de C risto um a p a rte do tesouro inesgotável da
Ig re ja , em tro ca de sua boa v o n tad e?! E n tão,
não h á M issas sem fim im ediato, p o r exemplo,
aquelas que são oferecid as p o r alm as que já en tra ­
ram no céu, ou as q ue são o ferecidas sem se fo r­
m ular intenção p a rtic u la r? O lu cro dessas M issas
cai 110 tesouro espiritual da Ig re ja . D eus aplica-o
quando e á quem q uer, segundo os designios ad o­
ráveis da soberana Justiça.

O lucro dos que concorrem


de qualquer outro modo
p ara a celebração
A oblação do san to S acrifício apro v eita ainda a
todos aquêles que, de qu alq u er o u tro m odo, con­
correm p a ra a celebração.
124 SE G U N D A P A R T E

O coroinha, que está tão in tim am ente unido ao


ritual, percebe, é certo, a recom pensa de su a valiosa
e tão próxim a colaboração. E aqui é p a ra lasti­
m ar-se a leviandade com a qual responde m ui­
tas vêzes à S. M issa. D eve-se p ro c u ra r c h am ar a
atenção dos acólitos p ara a gran d eza do seu p a ­
pel e p a ra os fru to s que podem lucrar.
A s pessoas piedosas que contrib u íram com o
pão, o vinho, as v elas; as pessoas que bord aram os
param entos, co nfecionaram as toalhas do a lta r e o
mais, tam bém têm um a p a rte especial n a im ola­
ção de C risto. Como isto deve d a r coragem a êsses
doadores, a êsses op erário s em sua piedosa ativi­
dade !
O s en carregados da Ig re ja , aquêles que p rep a­
ram os param en to s na sacristia, aquêles que concor­
rem pa ra o asseio do san tu ário , que ad ornam os
a lta r e s .. . têm tam bém direito ao fru to das S. M is­
sa das quais aju d a m a p ro p o rcio n ar a dig n a celebra­
ção.
C ada um dêsses colaboradores, p róxim os ou a fa s­
tados, deve pen sar nas g ra ç a s q ue q uotidianam en­
te pode recolher, contanto que saiba d irig ir sua
intenção, e u n ir-se habitu alm en te a todas as S.
M issas p ara as quais o ferece seu hum ilde concur­
so.

C A P ÍT U L O IV
O PROVEITO PARA O PURGATÓRIO
DE QUALQUER MODO TEREI A "MINHA" MISSA NO
PURGATÓRIO... E ESTA MISSA ME ALIVIARA NA ME­
DIDA EM QUE EU TIVER APRECIADO A “MINHA"
MISSA NESTE MUNDO.
A “m inha” Missa,
orvalho para o purgatório
O proveito que tiro da celebração da “m in h a”
M issa não im pede de m odo algum que as alm as do
p u rgató rio tam bém recolham o seu. Recebem da
CAP. IV. O P R O V E IT O DO PU R G A T O R IO 125

oblação de C risto um alívio aos seus so frim entos,


segundo esta p alav ra da Im itação: “Q u an d o o
sacerdote celebra, contribui p a ra o descanso dos
defu n to s.” 1
Êste resultado que o p u rg ató rio tira d a celebra­
ção da “ m inha” M issa explica-se m uito sim ples­
m ente: as alm as do p u rg ató rio são, como nós, m em ­
bros do Corpo M ístico de C risto. E stã o u nidas a
seu C hefe p o r laços indissolúveis p a ra sem pre.
A renovação da hom enagem infin ita do C alvário
po r interm édio de C risto tem p o r fim, como já fi­
cou dem onstrado, to rn a r o ato suprem o de reli­
gião de Cristo acessível ao seu C orpo M ístico, e
aplicar os fru to s dêsse m esm o ato aos seus m em ­
bros. O ra , quando celebram os a “nossa” M issa
pelas alm as do p u rg ató rio , e, m elhor ainda, p or
um a tal alm a determ in ad a, p o r que razão essas
alm as não deverão te r a p a rte que lhes toca das
satisfações do R e d e n to r ? .. .
P o r isso é que o Concílio de T re n to condena
form alm en te “aquêles que d is s e r e m ... que o sa­
crifício da M issa não apro v eita de m odo algum
às alm as dos m o rto s.” 2 E é p o r isso — acres­
centa — que se oferece a S a n ta M issa, segundo a
tradição apostólica, não só p a ra alívio de tôdas as
necessidades dos vivos, m a s tam bém pelos d e fu n ­
tos, m o rto s em C risto que ainda não se p u rific a ­
ram suficientem ente.” 3
A “ m inha" M issa é, pois, p a ra em p reg ar um a
expressão fam iliar à S an ta Ig re ja , “um orv alh o”
esparso sôbre as cham as do p u rg ató rio , pois ela
abrevia o tem po q ue falta às alm as padecentes p a­
ra atingirem “a sede do re frig é rio ” ou ainda a
“etern a fre sc u ra ” .4

1) Imit. 1. 4, c. 5, n. 3. 2) Sessão 22.


3) Ibidem. 4) Missal Romano.
126 SE G U N D A P A R T E

A liturgia recorda que, em " m inha” Missa,


devo dar a parte dos defuntos
A caridade exige q ue a p a rte do Corpo M ístico,
que possui em suas m ãos a oblação do C risto,
não esqueça a o u tra p a rte dêste m esm o Corpo M ís­
tico, a qual não a pode m ais celebrar. A nós p ertence
não p riv a r a Ig re ja padecente do m aio r de seus
bens: o S acrifício que aplica os m éritos de C ris­
to.
A S an ta Ig re ja tem a p recaução de recordar-nos,
cm cada um a de “n o ssas” M issas, qual a p arte
que devem os d a r aos nossos irm ãos falecidos, a
fim de que não tenham os o perigo de esquecê-
los.
N ão m encionam os aqui a L itu rg ia da “ M issa
dos m o rto s” , tô d a repleta, é claro, de recordações
das alm as do p u rg ató rio e d as m ais eloquentes
invocações em seu favor, m as referim o -n o s aos ri­
tos im postos pela Ig re ja a tôdas as M issas que se
celebram .
À o feren d a do pão, diz o sacerdote: “ Recebei,
santo P ai, esta hóstia im aculada que V os o fe re­
ço pelos v i v o s ... e pelos m o r t o s . .. ” A Ig re ja
com pleta, m ilitante, padecente e triu n fa n te , p a r­
ticipará, pois, d a o fe re n d a ; a triu n fa n te receberá
h o nra e glória, a m ilitante, g ra ç a s de salvação, a
padecente, o refrig ério .
A pós a consagração, no m om ento em que C ris­
to C hefe está presen te no a lta r e renova a hom e­
nagem do Calvário, o celebrante p ronuncia esta
fórm ula: "L em b rai-v o s tam bém , S enhor, d e V os­
sos servos e serv as que nos p recederam com . o si­
nal d a fé e ag o ra descansam no sono d a p az.”
E n q u a n to pro n u n cia essa oração, o sacerd o te ju n ­
ta as m ãos e recolhe-se. É neste m om ento de p ro­
fundo silêncio que pro n u n cia os nom es daqueles e
daquelas que recom enda p artic u la rm e n te ; do m or­
to ou dos m ortos pelos q uais o ferece o santo
CA P. IV . O P R O V E IT O D O PU R G A T Ó R IO 127

S acrifício, os noines dos m em bros de sua fam í­


lia, de seus am igos, de seus benfeito res fa le c id o s .. .
Depois acre sc e n ta : “A êstes, Senhor, e a todos
aquêles que repousam em C risto, concedei, V o-lo
pedim os, o lu g ar do refrig ério , da luz e da paz.
Pelo m esm o -Jesu s C risto, N osso S e n h o r.”
Colocando esta intervenção em fav o r dos fiéis
d e funto s no m om ento m ais solene da S. M issa, a
U tu rg ia m ostra a p a rte im ensa que C risto, de
quem a Ig re ja é a fiel in térp rete, d á do Sacri­
fício do a lta r às alm as do pu rg ató rio . Como po­
deria d e ix a r abandonados êsses pobres m em bros
que am am seu C hefe com a m o r intenso, pois que
então ap ren d eram a conhecê-L o m elhor q ue na te rra,
porque com preenderam claram ente a espécie do la­
ço vital q ue os une a Êle!
D este m odo em tôdas as S. M issas, m esm o nas
que não são ditas especialm ente p o r elas, as alm as
dos fiéis d e fu n to s têm a sua m em ória na Ig re ­
ja e na oração de C risto. T ô d as as M issas lhes
são, pois, p roveitosas de algum a m aneira.

Terct eu "m inha” Missa


no purgatório?
D everei conten tar-m e com o fru to geral d a S an­
ta M issa, quando estiv er no p u rg a tó rio ? N ão po­
derei ob ter m ais algum a c o i s a ? ... O b te r M issas,
cujo fru to não seja aplicado em geral, mas a mim
em p a r tic u la r ? .. . M issas que, como o u tro ra na
te rra, eu possa c h am ar “m in h as” M is s a s ? ... U m a
S. M issa na qual eu colabore com C risto, m eu Che­
fe, em que eu m esm o p articipe de m odo especial
dos fru to s do S a c r if íc io ? ... P arece-m e que, se
eu pudesse celebrar a “m in h a” M issa no p u rg a­
tório, as cham as tôd as se extin g u iriam em tôrno
de m im !
E sta pretensão de te r a “m in h a” M issa no p u r­
gatório parece irrealizável. A s alm as padecentes
128 SE G U N D A P A R T E

não fazem m ais p a rte da assem bléia visivel da Ig re ­


ja, à qual, p o r o u tra p arte, não desejam , de
modo algum , ser de novo agregadas. E sta rã o , pois,
em estado de te r um a p articipação pessoal no S a­
crifício do a lta r que só a Ig re ja m ilitante pode o fe­
recer sob as espccies sensíveis do pão e do vinho?
Ser-lhes-á preciso resignar-se a ficar priv ad as dos
frutos que a oblação de C risto faz chover sôbre
aqueles q ue concorrem p a ra a sua realização?

Terei a "m inha” Missa no purgatório:


1.° se tiver o cuidado de m andar celebrá-la,
em vida, pelo repouso de minha alma
É certo que a alm a, após sua e n trad a 110 p u rg a­
tório, não pode mais o p e ra r como os o u tro s m em ­
bros de C risto na te rra , que podem só êles a p re ­
sen tar a oferen d a. É por isso que ela não pode
m ais celebrar. M as se, antes de p a rtir d êste m undo,
essa alm a quis re se rv a r várias M issas p a ra o tem ­
po que seguir a m orte, e se tom ou precauções p a­
ra êste fim , en carregando, p o r exem plo, certas
pessoas sinceras de m an d ar celeb rar em sua in­
tenção, neste caso, essa alm a, ainda que já encer­
rada no lu g ar de expiação, co ncorre realm ente à
oblação. O u tro ra economizou, mesm o à cu sta das
m ais d u ra s privações, as q u an tias n ecessárias p a­
ra co n co rrer com espórtulas suficientes, e dêsse
m odo m an ifesto u ex pressam ente a v ontade de d a r
hom enagem in fin ita à Santíssim a T rin d a d e : é em
vista dessa hom enagem , e sob sua ordem , que o
sacerdote celebra o S acrifício re d en to r e glori-
ficador.
N unca se p o d erá e n carar bastan te esta piedosa
p rá tic a: q ue os fiéis se assegurem M issas p a ra de­
pois da m orte. D êste m odo p rolongam tan to q uan­
to podem sua p articipação a tiv a na o fe re n d a do
a lta r e m an ifestam seu zêlo pela celebração de sua
CAP. IV. O P R O V E IT O DO P U R G A T Ó R IO 129

M issa, m uito além dos lim ites te rrestres. E será


possivel que D eus se não com padeça m ui especial­
m ente de ta n ta boa v ontade da p a rte destas alm as
que neste m undo se preocupam de p e rp etu ar, por
meio de Cristo, sua hom enagem à Santissim a T rin ­
d ade? N ão dem o n straram um a veneração p ro fu n ­
d a pelo Sacrifício divino, p ro cu ran d o a sseg u rar-
se um a p articipação nêle p a ra o tem po em q ue as
necessidades da expiação as p riv ariam de acer­
car-se do a lta r e de ca n ta r os louvores celes­
tes?
D aí se d epreende a g rav id ad e da falta q ue come­
teriam os herdeiros av aros ou negligentes que, não
atendendo à vontade expressa do defu n to , d eix as­
sem de em p reg ar em M issas o d inheiro que fô ra
depositado para êste fim. Ésses crim inosos p rivam
a alm a padecente do m ais precioso dos socorros
e da consolação suprem a. Se, an tes de m o rrer,
essas cria tu ra s lad ras obtiverem o perdão, fi­
car-lhes-á a p ag ar no p u rg ató rio um a pena tem ­
poral bem pesada. S eu castigo poderia bem consis­
tir em ficarem privados pela divina Ju stiç a dos
alívios que a S an ta M issa prodigaliza aos pobres
to rtu ra d o s nas cham as.
Terei a “m inha” Missa no purgatório:
2.° se outras pessoas tiverem a caridade
de m andar celebrar por mim
O fiel d e fu n to im previdente que, em vida, não
tivesse tido a precaução de se asse g u ra r algum as
M issas, pode ainda assim mesm o p a rtic ip a r pes­
soalm ente das M issas que se to rn am suas, se am i­
gos caridosos se p reocupam de m an d ar o ferecer
por Lie o santo Sacrifício.
Não é m ais a título de o feren te, m as som ente de
objeto da intenção da S . M issa, que a alm a ap ro ­
veita do sacrifício, que, de certo modo, lhe p e r­
te n c e .. . "L em brai-vos, S en h o r — diz o sacer­
ISO SEG U N D A P A R T E

dote, — daqueles pelos quais V o s o f e r e ç o ... êste


sacrifício de lo u v o r.”
C om preende-se então p o r que a Ig re ja tan to re­
com enda aos m em bros de C risto vivo, n este m un­
do, m an d ar celeb rar M issas pelos fiéis defu n to s.
C om prova que a o fe re n d a do Sacrifício in fin i­
to é a m aio r carid ad e que se possa fa zer aos
nossos caros m ortos, o m elhor meio de ex p rim ir
o reconhecim ento que lhes devemos.
E é p o r isso que a S an ta Ig re ja in stitu iu os ri­
tos m aravilhosos e as orações incom paráveis, p ró ­
prias d as M issas de d e fu n to s; convida-nos a o ra r
p or meio de orações especiais p o r nosso pai e no s­
sa mãe, nossos p aren tes e am igos, nossos b enfei­
tores, os sacerdotes e os S rs. Bispos que tiveram re ­
lação conosco, os fiéis que p ertencerem à nossa
m esm a P a r ó q u i a ... C onsidera o ofício dos m o r­
tos, cujo ponto culm inante é a M issa de defu n to s,
como a m ais fo rte ex p ressão de nossas orações: e
é por isso tam bém que nos convida, p o r meio do
Sacrificio do a lta r, a u n ir o m ais possível as al­
m as de nossos falecidos à hom enagem in fin ita ­
m ente reden to ra, que Cristo, C hefe do Corpo M ís­
tico, oferece à S antíssim a T rin d ad e.
E se eu não tiver missas
“propriamente m inhas” no purgatório?
Se o fiel que so fre no p u rg ató rio n ão teve a
precaução de m a n d a r celebrar M issas p o r si, e se
de o u tro lado ninguém na te rra pensa em m an­
dar celebrá-las, que será dêle em meio às cha­
mas vingad o ras? F ic a rá abandonado sem esperan­
ças de alívio?
N ão. Pode-se a firm a r que, m esm o assim , p er­
ceberá algum lucro dos S acrifício s celebrados em
nossos altares.
E m prim eiro lugar, tôda S. M issa encerra, co­
mo vim os, um a m em ória e p rece pelos d e fu n to s:
CA P. IV . O P R O V E IT O DO P U R G A T Ó R IO 131

a s alm as padecentes têm, pois, su a p a rte no p ro ­


veito geral da S a n ta M issa.
M as, além d êste fru to com um , certam en te te­
rão um o u tro m uito especial. H á m uitas M issas,
cu ja riqueza não determ in ad a fica à disposição de
Deus. H á m uitas M issas que não são aplicadas à
pessoa à qual se d estinavam , ou p orque a alm a a
aliviar não esteja m ais no pu rg ató rio , tendo já
voado ao p araíso, ou — a i ! — p orque nunca che­
garam a e n tra r, p o r terem caído nas “ trev as lá
fo ra ” .
E no entanto,, o m érito dessas M issas e x iste;
sua eficácia satisfa tó ria é total. E esta eficácia aca­
so se d esvanecerá sem utilização possível? N ão!
não h á que recear tal d esg ra ç a ; pois aí rege a lei
da caridade. O rico que, na te rra , tivesse assegu­
rado p a ra si g ra n d e n úm ero de M issas em p e r­
pétuo não deveria d estin a r aos pobres as satis­
fações que lhe fôssem su p é rflu a s? E , ainda m es­
mo que não ten h a pensado em ceder-lhes de sua
abundância, a Ig re ja supre seu esquecim ento, fa ­
zendo com que o su p érflu o dos ricos recaia n a tu ­
ralm ente no seio dos indigentes. T odos os m éri­
tos das oblações m últiplas, que n a te rra se o fe re ­
cem pelos d e fu n to s q ue não têm m ais necessida­
de, ficam p a ra o p roveito das “alm as ab an d o n a­
das” .
E depois, o nú m ero dessas “alm as aband o n ad as”
do p u rg ató rio não é lá tão g ra n d e como se pensa.
A delicadeza d as alm as boas d êste m undo é sem ­
pre levada a au xiliá-las. Q u a n ta s vêzes os sa­
cerdotes recebem espórtu las de M issas com esta
in tenção: “p a ra as alm as aban d o n ad as” . C ertas co­
m unidades religiosas têm m esm o como finalidade
do seu zêlo o alívio d as alm as menos s u fra g a d a s e
m ais necessitadas de re frig é rio ; a m aio r p a rte
132 SEG U N D A P A R T E

dos Pes. V igários celebram , e m uitas vêzes com


intervalos bem próxim os, na intenção "dos m o r­
tos da P a ró q u ia ” , cu ja esp ó rtu la é g a ra n tid a p o r
m eio d as coletas regulares p a ra os m ortos, ou p o r
reservas determ in ad as feitas aos recursos o rd in á­
rios.
A p ró p ria Ig re ja é solícita em p ro c u ra r aliviar
as alm as de seus m em bros so fren tes que tenham
sido abandonados pelos seus. N o dia da "C om em o­
ração dos Fiéis D e fu n to s” a Ig re ja m anda celebrar
po r todos o san to S acrifício, levando m esm o sua
solicitude a ponto de ped ir aos sacerdotes a cari-
dades de rep etir três vêzes nessa m an h ã a obla­
ção in fin ita pelo descanso dos m ortos.
G raças ao espírito de carid ad e que anim a o
Corpo M ístico de Cristo, m em bro algum pode quei­
xar-se dos o u tro s: h á sem pre m útuo auxílio na
Ig re ja . E n tre a Ig re ja da te rra e a do pu rg ató rio
as relações são' m últiplas. O s fiéis que celebram
a “su a ” M issa são cada dia advertid o s pela L i­
turgia que devem pen sar nos defu n to s. E m esmo
que não fôssem lem brados p o r ela a fazer a o ra ­
ção pelos m ortos, sua fé de concelebrantes e sua
união ao C hefe do C orpo M ístico levá-los-ia n a­
turalm en te a p en sar nos m em bros da Ig re ja p ad e­
cente.
"Minha” Missa no purgatório
é só “libertadora”
M as qual será o proveito q ue certam en te me to ­
cará 110 p u rg ató rio d as M issas q ue forem "m in h as” ,
qu er d as que eu ten h a m andado celebrar, q u er de
ou tras de cu jo fru to alguém m e to rn o u p a rtici­
p ante ?
U m a com paração fa rá co m preender com o o f ru ­
to dessas M issas é som ente “ lib ertad o r” e depen­
de, p o rta n to , d a v o ntade do m eu C ria d o r que é
D eus bondoso.
CA P. TV. O P R O V E IT O DO PU R G A T Ó R IO 133

U m soldado em atividade g an h a os galões de


honra e ao m esm o tem po um bom vencim ento que
lhe perm ite p ro v er a tôdas as necessidades. E i-lo
chegado ao pôsto de general, a custo dos próp rios
m éritos. Teve, porém , a infelicidade de co n tra ir
dívidas. N o m om ento de d e ix a r o exército, encon­
tra-se sem recursos. V endo-o seus credores
culpado, m andam julgá-lo e condenar à prisão p or
certo n úm ero de anos. Só po d erá sa ir an tes de ex ­
p ira r êsse prazo, se pag ar, “até ao últim o centavo” .
(M t 5, 26.) E videntem ente co ntinua a ser g eneral,
porque seus m éritos não os p e rd e u ; m as, p a ra
libertar-se, en trega-se às m ãos dos am igos, cu ja ge­
nerosidade, som ente, po d erá ap re ssa r sua liberda­
de, satisfazendo o credor.
T al é o m em bro do C orpo M ístico nesta te r r a ;
em atividade, m erece, p rogride, “g anha seus ga­
lões” , torn a-se m em bro unido ao C hefe, um dos
principais do Corpo M ístico.
T em contudo dívidas q ue n ão foram p agas: é
lançado na p risão do p u rg ató rio p o r tem po d e te r­
m inado pela Ju stiç a divina, tem po que só po d erá
ser abreviado p o r aquêles que quiserem p a g a r p or
êle. O ra , o "ú n ico ” que pode p a g ar é C risto ; as
o fe rend as do C orpo M ístico na S. M issa, são os
m éritos do Salvador. E ssa alm a, que não pode ga­
n h a r m ais nada, está, pois, en treg u e à g enerosidade
de Cristo.
P a ra m em bro do Corpo M ístico "em ativ id ad e” ,
concelebrante com seu C hefe no a ltar, a “ su a ” M is­
sa é m eritória; sua colaboração dá-lhe direitos a
novos fru to s na in tim idade do R ed en to r: vê-se cu­
m ulado de todos os fru to s enum erados no capí­
tulo “ F ru to s e sp irituais” . P a ra o m em bro de C ris­
to, recluso no p u rg ató rio , “su a ” M issa só é li­
bertadora: não lhe a d ia n ta rá fru to s, m as será ape­
nas um a paga dos "a tra sa d o s” , dependendo dos
134 SE G U N D A P A R T E

m éritos que C risto ap re se n ta r à S antíssim a T rin d a ­


de. Jesu s S acerd o te tem g anhos infin ito s p a ra d is­
trib u ir conosco; m as, en quanto o m em bro vivo
do Corpo M ístico pode h a u rir dêsse teso u ro p a ra
enriquecer-se, a alm a do p u rg ató rio só p ode espe­
ra r o que venha dêsse tesouro p a ra sald ar suas
dívidas.
Será todo fiel libertado
por "sua” Missa no purgatório?
E m que m edida o C hefe do Corpo M ístico salda
as dívidas dos seus m em bros padecentes q ue p a r­
ticipam d as S. M issas em nossos alta re s?
Se N osso S en h o r quisesse, um a só M issa b as­
ta ria de fato p a ra esvaziar todo o purg ató rio .
M as a p rática d a Ig re ja , baseada sôbre as m ais
graves razões teológicas, faz-nos re p etir o m aior
núm ero de vêzes possível a o fe ren d a do santo S a­
crifício pelos nossos falecidos. É que a divina V í­
tim a não distrib u i geralm ente de um a só vez os
m éritos de sua im olação pelas alm as, m as lhos
prodigaliza m ais ou m enos abundantem ente, segun­
do as vistas de sua sabedoria.
A ind a que a m edida d esta libertação p erm aneça
para nós um m istério, podem os, todavia, en tre ­
ver algum as de su as n orm as diretrizes. E sta s de
um lado esclarecerão nossa devoção p a ra com as a l­
m as do pu rg ató rio , e do o u tro nos d ita rã o os meios
que devem os to m ar desde êste m undo p a ra asse­
g u rar-n o s as v antagens de um a p ro n ta libertação
das cham as, se form os o brigados a p assa r p o r lá.
C ertos m em bros do C orpo M ístico chegam a êsse
lu g ar de suplício, abrasados de um a ard e n te ca­
ridade, h abituados como estavam a te r p a rte ativa
na “ su a ” M issa, a qual fazia dêles colaboradores
intim am ente u nidos ao C hefe na oblação da h o­
menagem in fin ita. E será possível que êstes não
recebam logo na prim eira de “ su as” M issas de
CAP. IV. O P R O V E IT O DO PU R G A T Ó R IO 135

defunto , da qual p rovavelm ente participam , não só


por terem concorrido com a espórtula, como p o r­
que é p o r êles que se celebra, um proveito capaz de
libertá-los mui rapidam ente e a té im ediatam ente de
tôda a d ívida?
C risto poderá acaso to le ra r que a d o rad o res tão
solicitos em p re sta r ao A ltíssim o a m aior glória,
fiquem esperando p o r m uito tem po o gôzo d a fe­
licidade de contem plar sem véu a Santíssim a T r in ­
d ade? Q uem sabe a té se, em sua bondade infin ita
p a ra com seus m em bros, êste C hefe incom parável
não lhes ap licará, logo à en tra d a no purg ató rio , os
lucros da sua “prim eira M issa de d e fu n to s” ,
que será talvez celebrada só no dia seguinte? O
am or não q u er delongas. S e rá tem erário pen sar
que, tendo Êle p o d er p a ra isso, não abrevie o tem ­
po do p u rg ató rio ?
“Minha” Missa neste mnndo
abrevia o tempo do purgatório
D esta consideração podem os tira r um a lição
m uito im p o rtan te p a ra nós. N ão se pode, de fato,
estabelecer como princípio: “A S a n ta M issa aliviar-
me-á, quando estiv er no purg ató rio , na m edida da
perfeição com a qual tiv er celebrado a m inha
M issa” ? Se eu tiv er sido um ad o ra d o r p e rfe ito da
Santíssim a T rin d a d e com e p o r meio de C risto,
meu C h efe; se tiv e r prestad o p o r meio dêle satis­
fações in fin itas à divina M ajestad e, não terei a tra í­
do sôbre m im in fin itas liberalidades da p a rte dA -
quele que não esquece a esm ola de um copo de
água ?
P o r isso, d a d a a hom enaguem com pleta que
trib u ta a D eus, a “ m inha” M issa é p a ra m im neste
m undo a certeza d a abreviação do p u rg ató rio . P o r
m eio dela me livro eficazm ente d aquelas cham as
vingadoras. A “m in h a” M issa obtém -m e cada m a­
nhã, em tro ca d as hom enagens de louvor e de sa ­
136 SE G U N D A P A R T E

tisfação que dou a D eus, o aum ento de m eus direi­


tos à b em -aventurança e, p o r consequência, ao p e r­
dão de m inhas d iv id a s; além disso m e dispõe a
receber, se cair naquelas cham as, o p ro n to socorro
dos “ refrig é rio s” de C risto imolado, pois lem brar-
se-á de lib ertar, no m om ento o portuno, seus cola­
boradores no santo altar.
M as todos os m em bros do Corpo M ístico não
estão assim u nidos ao C h e f e .. . M uitos deixa-
r a m - 0 o ferecer sozinho os louvores devidos a D eus
e preocuparam -se de tudo, exceto de associar-se
ao sacrifício de C risto. U n s ignoravam seu valor,
o u tros desprezavam -no. O s prim eiro s assistiam à
sua M issa p aroquial como a u m a en fad o n h a ob ri­
gação, apenas de corpo p re se n te ; os segundos se
afasta ra m quase em tôda a vida do cam inho da
Ig re ja . E todavia, no d erra d e iro m om ento, a g raça
da volta p a ra D eus, com os últim os Sacram entos,
e a intercessão da S antíssim a V irgem , a b riram as
p o rtas de salvação a essas alm as pouco fervorosas.
E i-las, assim , no p u r g a tó r io .. . N ão m erecem essas
alm as p erm anecer aí p o r certo tempo, p ara ap re n ­
der, ainda que p o r meio de au ste ra experiência pes­
soal, que não é em vão que C risto exige nossa co­
laboração no S acrifício do a lta r e que a celebração
de " no ssa” M issa é o m ais im p o rtan te dos nossos
deveres ?
S erá preciso que estas alm as ag uardem o céu no
sofrim ento, pois sua en tra d a no purg ató rio m ar­
ca pa ra elas a p rim eira estância p ara o céu, en­
quanto que, p ara as alm as que te rm in aram a lon­
ga peregrinação de vida cristã, a chegada às cha­
m as do p u rg ató rio é apenas a ú ltim a p a rad a an ­
tes do re frig é rio eterno.
CA P. IV. O P R O V E IT O D O P U R G A T Ó R IO 137

Podemos estar certos de que Deus


aplica às almas do purgatório,
tanto quanto possível,
as satisfações de “sua” Missa
Se D eus quissesse a tu a r sem ate n d e r às leis o r­
d inárias que sua sabedoria se im pôs, é evidente que
poderia salv ar qu alq u er alm a do p u rg ató rio com a
aplicação de um a só M issa. M as D eus respeita —
salvo p o r m otivos excepcionais só dÊ le conhecidos
— a ordem habitualm ente estabelecida. É p o r isso
que devem os p e n sa r que a distribuição d as satis­
fações de C risto aos seus m em bros so fred o res é
subordinada aos fins de expiação p a ra os quais
foi criado o purg ató rio .
D eterm in ar as condições da expiação e a m edida
em que é aplicado o fru to de nossas M issas, é
um cálculo reservado só a D eus. P odem os e n tre­
tanto te r duas certezas sóbre o resultado de nos­
sas oblações no p u rg ató rio :
1.° D eus é tão generoso quanto possível para com
os m em bros de Cristo. A m a decerto m ui p a rti­
cularm ente essas alm as salvas pelos m éritos do
calvário e a Êle u nidas p o r um a carid ad e que na­
da jam ais p oderá rom per. T u d o o que sua m ise­
ricórdia pode conceder a essas alm as, sem u ltra ­
p a ssar os direitos de sua ju stiç a e as necessida­
des d a expiação, lhes c concedido. C ada alm a lu­
cra, pois, de cada S. M issa, o m áxim o que pode
lucrar.
2.° S e cada alm a não recebe mais, é a si pró­
pria e não a D eus que deve atribuir as delongas
da sua libertação. N a realidade, cada m em bro pade­
cente de C risto só recebe de sua M issa de requiem
o que c capaz de possuir. N este inundo, a “ su a”
M issa, que cm si e ra de um valo r inesgotável, só
lhe proporcionava proveito lim itado, segundo sua
capacidade espiritual. N o purg ató rio , onde a S.
M issa já não tem ação direta, seus m éritos são
138 SE G U N D A P A R T E

entregues à B o ndade divina, p a ra serem d istrib uí­


d o s; po rém essa distribuição, em bora feita pela
generosidade divina, não d everá, p o r acaso, com
rara s exceções m ilagrosas, c o n fo rm ar-se ao g rau
de receptividade de cada um ?
H á naquelas cham as m em bros do C orpo M ísti­
co tão vazios de v irtu d es e, p o r o u tro lado, tão
sobrecarregados de dívidas que só podem receber
em suas m inúsculas m ãos m uito pouco, e no en­
tanto têm tan to que p a g a r! U m a g ota de orvalho
re frig e ra n te já é bastan te copiosa p a ra sua bôca,
contanto que possam bebê-la tôda. M as, p a ra com­
p letar sua satisfação, ser-lhes-ia preciso g ran d e có­
pia delas. M esm o apressan d o -a p o r M issas repe­
lidas, a h ora do livram ento d e m o ra rá m uito. F oi
de um a alm a assim que o san to cura de A rs, que
tinha visões m iraculosas do purg ató rio , dizia: “E s ­
tá salva, m as está m uito em b a i x o ... o rai m uito
por êle.” 5
Pelo contrário, o u tro s m em bros do Corpo M ís­
tico são fortes e vigorosos, porq u e souberam tira r
proveito da vida que Cristo lhes in fundia.
N o p u rg ató rio abrem m ãos am plas no m om en­
to em que C risto distribui o fru to lib ertad o r d as
S. M issas.
E poder-se-á p o r v e n tu ra d a r o caso que C ris­
to, desejoso de possuir essas alm as na g lória, he­
site em lhes d a r a m edida de satisfações que pos­
sam c o m p o rtar? E porque êstes m em bros do C orpo
M ístico estão d ecerto pouco carreg ad o s de dívi­
das, pois neste m undo pro cu rav am não te r dé­
ficit na sua vida, em breve suas contas estarão
equilibradas.
Foi assim que a piedade c ristã sem pre im a­
ginou a distribuição das satisfações de C risto no
purgató rio . C ada alm a recebe, com tô d a a ju sti-

5) Trochu, Vida do Cura de Ars.


CA P. IV. O P R O V E IT O D O PU R G A T Ó R IO 139

ça e sabedoria, de cada S. M issa que se celebra


po r ela, tudo o que D eus lhe pode dar.
T odavia, como não conhecem os os segredos da
P rovidência, pelos q uais é avaliad a a m edida da
repartição do lucro d as M issas o ferecidas pelos
defunto s, devem os repeti-las sem pre e sem d es­
canso.
O que é melhor para nós?
mandar em vida celebrar missas por nós
ou delxá-Ias para depois (la morte?
O s elem entos da resp o sta a esta q uestão acham -
se nas páginas precedentes. É bem certo que a
“nossa” M issa, celebrada p o r nós e p a ra nós no al­
ta r de Cristo, é m uito m ais preciosa do que vossa
M issa de rcquie.
1.° N este m undo colaboram os d everas no S a ­
crifício divino, o ferecendo à Santíssim a T rin d ad e,
em união com C risto, a hom enagem infinita. N o
pu rgató rio não terem os m ais esta intim idade com
a V ítim a do altar. A oblação de vossas M issas,
mesmo a das M issas p a ra as quais deixam os as
espórtulas, terá direito apenas um concurso nosso
indireto e rem oto.
2.° N este m undo a colaboração em vossa M issa
é pa ra nós um a fonte de m éritos im ensos e de g r a ­
ças abun d an tes de santificação. N o p u rg ató rio “no s­
sa” M issa de d e fu n to não nos alcan çará nenhum
novo m érito, p orque não serem os m ais capazes de
m erecer. N osso cabedal de lucros ou perd as já es­
ta rá encerrad o p ara sem pre.
3.® N este m undo p o r vossa M issa satisfazem os,
com plenos direitos, a pena devida pelos nossos
pecados, contanto que não oponham os obstáculos
a isso p o r nossas m ás disposições. Pod e-se m es­
mo dizer que a "p enitência é su av e” , pois só te ­
m os que nos ap ro v e ita r dos m éritos do nosso Chefe.
N o p u rg a tó rio nossa M issa de m o rto s não nos
aplicará m ais d iretam en te os fru to s da Paix ão,
140 SE G U N D A P A R T E

m as rem etê-los-á n as m ãos de D eus, o qual, como


acabam os de v er, no-los aplicará com tô d a a libe­
ralidade, m as segundo as necessidades d a expia­
ção e de acôrdo com sua justiça.
4." N este m undo, quando solvemos as espór­
tulas de M issas que m andam os celebrar, nos im ­
pomos um a p rivação e fazem os um ato de abne­
gação sem pre m eritório. N o p u rg ató rio , quando se
celebram nossas M issas de d e fu n to , p rivarem os
nosso herd eiro s de dinheiro, de que nos g a ra n ti­
mos o u su fru to : serão êles que farão a m o rtific a­
ção. É p o r isso que certas pessoas, aliás av aras
de M issas d u ra n te a vida, se m ostram tão interes­
sadas em m an d ar celebrá-las depois d a m orte.
5.° N este m undo estam os certos de que as 5\
M issas que m andam os celeb rar são celebradas. N o
purgató rio , p oderá acontecer que tenham os de es­
p e ra r m uito tem po até que nossos herd eiro s quei­
ram ex ecu tar nossas últim as vontades.
T ôdas estas razões nos pro v am cabalm ente que é
mais v an tajo so e mais p ru d e n te m an d ar celebrar
as “nossas” M issas em vida.
E todavia g ran d e n úm ero de fiéis mesm o pie­
dosos hesitam . M u itas vêzes são levados p o r um
%fentimento de carid ad e: p referem em p reg ar em es­
molas as espórtu las de que dispõem p a ra seus de­
funtos, abandonando-se, p a ra quando estiverem no
purgató rio , à fidelidade de seus herd eiro s e à m i­
sericórdia de D eus.
N ão deix a de ser louvável êste sentim ento, pois
a caridade ag rad a tan to ao P ai celeste, que ce rta­
m ente êstes m em bros de C risto n ad a perd erão de
sua generosidade, co ntanto que sejam m uito fe r­
vorosos na celebração quotidiana de sua M issa,
e estejam resolvidos a m an d ar celeb rar o san to
Sacrifício ta n tas vêzes q u an tas puderem , em sua
intenção, após a m orte.
TERCEIRA PARTE

M E IO S P A R A B E M C E L E B R A R
“ M IN H A ” M IS S A

P rim eiro capítulo


A preparação
A digna celebração de “m in h a” M issa supõe m i­
nha ascensão q u otidiana p ara a perfeição, sendo a
S. M issa o ponto culm inante da vida cristã.

Segundo capítulo
A assistência
A m aneira de asociar-m e com fru to à celebração
do sacerdote no altar.

T erceiro capítulo
A Comunhão
A S an ta Com unhão, p a rte in teg ran te do S acrificio,
é o canal pelo qual se expande em m inha alm a a
im ensa reserva dos m éritos de Je su s C risto.
TERCEIRA PARTE
C A P ÍT U L O I
A PREPARAÇÃO
A "MINHA” MISSA, SENDO O MAIOR ATO QUE POSSO
FAZER NESTE MUNDO. DEVE SER PREPARADA EM
TODA A MINHA V ID A ... E “MINHA” PARTICIPAÇAO
NO SACRIFÍCIO DEPENDE DO ESFORÇO QUE EMPRE­
GAR PARA ME TORNAR DIGNO DE CELEBRA-LA.

A celebração de “minha” Missa


não se Improvisa
Como o sacerdote que subisse ao santo a lta r sem
a preparação devida não o fereceria d ignam ente a
oblação, assim o m em bro do Corpo M ístico que
não se dispôs a o fe recer a oblação e a oferecer-
se com seu C hefe n ão está ap to a p a rticip ar do
santo S acrificio, com tôda a eficácia. Sacerdote,
fieis e C risto fazem , como vim os, u m único Cris­
to M ístico, que c o sa crificad o r e a vítim a. T odo
m em bro, q u e r seja g ra n d e ou pequeno, só pode­
rá colaborar, se estiv er em contacto com a Cabeça,
neste gra n d e e m aravilhoso o rganism o so b ren atu­
ral, que é “o Filh o de D eu s” in tegrado e com ­
pleto.
A “ m inha” M issa exige, pois, de m im que me
reafirm e, p o r meio de um a prep aração assídua e
perseverante, na união intim a com C risto. Se te ­
nho o desejo de concelebrar com Êle, é preciso que
esteja unido a Êle o m ais estreitam en te possível, a
título de m em bro.
E po r o u tra, m eu C hefe divino n ão m e d á o
exem plo da p rep aração ao S acrifício ? Q u e fêz d u - .
ran te os trin ta anos de vida terre stre , senão p re ­
p a rar-se p ara o S acrifício do G ólgota? “ V im , ó
meu Pai. — disse Êle — p a ra fa z e r a V ossa v o n ta­
de.” (H e b 10, 9 .) E sta v o ntade era o d ecreto de
im olação. D u ra n te sua p eregrinação n este m undo,
CA P. I. A PR E PA R A Ç A O 143

ora, je ju a , ad o ra a seu Pai, celebra a M issa sole­


ne que deve te rm in a r sua vida m ortal.
M as, com o não devia celebrá-la só, a p re p a ra ­
ção de C risto é tam bém a de seu Corpo M ístico:
por isso é que todo o evangelho no-L o ap resen ta
form and o a Ig re ja , com seus d iferen tes m em bros,
pastores e fiéis, dispondo-a p a ra a g ran d e oblação
e p a ra a g lo rificação que se seguirá, a qual fêz
en trev e r a P ed ro , T iag o e Jo ão , no T ab o r.
O Sacrifício realizado um a só vez no C alvário
e renovado sôbre o a lta r é, pois, p ara nós, m em­
bros a tu ais do C orpo M ístico sôbre a te rra , o pon­
to culm inante de nossa existência, o ato suprem o
de nossa vida cristã, p ara cu ja prep aração nosso
C hefe nos ordena tôda a solicitude. C om partici­
pes de C risto, nossa Cabeça, e vivendo dÊ le e com
Êle p a ra a glória da San tíssim a T rin d a d e , não nos
podem os ap ro x im a r do a lta r, com o convém , sem
a d a p ta r nosso espírito e nosso coração às funções
sacerdotais que devem os com p artilh ar com o Sum o
Sacerdote.
Assim , pois, é necessário, p a ra que “ m inha”
M issa seja uina p articipação digna e fru tu o sa da
oblação infinita, que me d isponha p a ra ela a ten ta
e dem oradam ente. M eu C hefe mesm o espera de
m im que eu L he seja um m em bro capaz de a tu a r:
C risto tem necessidade de se n tir o pró p rio Corpo
revigorado e em plena robustez, q u ando realiza o
ato único de oblação suprem a.
Qual deve ser a preparação
& “m inha” Missa?
P a ra bem celeb rar a "m in h a ” M issa, em p ri­
m eiro lugar, é necessário q ue m e a p ro fu n d e no
conhecim ento dos M istérios do a lta r e, p o r con­
sequência, que seja iniciado nos princípios do Sa-
serdócio e da E u ca ristia : a prep aração , pois, p ara
“ m inha” M issa deverá ser, ein prim eiro lugar,
doutrinal.
144 T E R C E IR A P A R T E

O dogm a católico tra d u z-se aos nossos olhos de


um m odo visível pela L itu rg ia : nossas cerim ônias
sacras são, p a ra em p reg ar um a ex p ressão m oder­
na, a m elhor ilustração de nossa crença. A p rep a­
ração p ara “ m inha ’’M issa d ev erá ser, po rtan to,
Utúrgica.
M as, para co m p artilh ar eficazm ente do dram a
do a lta r, devo scr m em bro solidam ente unido ao
m eu C hefe divino, m ediante a g r a ç a ; alem disso
devo estre ita r quotidianam ente m inha união com
Êle, torn an d o m inha v ontade sem elhante à dÊle
pela prática de t.ôdas as virtudes. A prep aração p a­
ra “ m in h a” M issa será ainda ascética.
Se eu tra b a lh a r em tôda a m inha vida e de to­
do o coração p a ra esta tríplice p reparação, serei
cada dia m enos indigno de o fe re c e r com m eu C hefe
a hom enagem de gló ria suprem a à S antíssim a T rin ­
dade.
1.° A preparação doutrinal
para "minha" Missa
“ N inguém deseja o que não conhece.” P o r isso,
a p rim eira necessidade q ue se im põe ao fiel, p a ­
ra ap reciar devidam ente “su a ” M issa, é p ro c u rar
conhecer o seu valor. A i ! — todavia é preciso
confessar — m uitos cristãos ignoram as verdades
concernentes aos M istérios do a ltar. M uitos têm
apenas dêste Sacrifício “que é o seu”1 vagas n o­
ções apren d id as, rem iniscências ap agadas do ca­
tecism o de p rim eira Com unhão. C om preende-se a s­
sim a indiferença que certos católicos m anifestam
pela “su á” M issa de dom ingo, as censuras que fa ­
zem à Ig re ja p o r obrigá-los a a ssistir a ela, e a
facilidade com que se dispensam sem g ra n d e re ­
m orsos.
É preciso, p o rtan to , sab er o q ue é a S. M issa.
Seu estudo é o m ais im p o rtan te e o m ais fru tu o -

1) “Orate frates”.
CA P. I. A P R E PA R A Ç A O 145

so de todos q ue tem os a faz e r n este m undo, p o r­


que a S. M issa nos o briga a e stu d a r os m istérios
principais de nossa fé : Santíssim a T rin d a d e , I n ­
carnação, R edenção, G raça, Salvação.

A leitura, primeiro melo para assegurar


a preparação doutrinal de ‘‘minha*’ Missa
U m m em bro de C risto, desejoso de conhecer sua
M issa, p ro c u ra em prim eiro lu g ar livros capazes
de instruí-lo.
O s sacerdotes e os fiéis in stru íd o s ach arão um a
fonte inesgotável de conhecim entos sôbre a d o u ­
trin a de C risto M ístico e de seu S acrifício na lei­
tu ra dos P a d re s da Ig re ja , especialm ente S. Jo ão
C risóstom o e San to A gostinho, que p reg aram elo­
quentem ente em tôdas as ocasiões, e de acôrdo
com o E vangelho e as S ag rad as E sc ritu ra s, sô­
bre nossa incorporação a C risto pela o b ra da glo­
rificação de D eus e de nosso resgate pessoal.
Santo T om ás de A quino, c u jo p ensam ento é o
re flexo do ensino dos S an to s P ad res, recolhe em
um a m agnífica o b ra os dados esparsos nos tr a ta ­
dos dos dou to res que o p recederam , e form ou o
mais com pleto corpo de d o u trin a que se possa con­
ceber sôbre a vida cristã pela adesão ao C orpo
M ístico de C risto. D ir-se-ia que S an to T om ás de
A quino é inacessível à piedade dos sim ples fiéis.
O êxito enorm e e inesperado q ue tiveram as t r a ­
duções de suas ob ras parecem p ro v a r o c o n trá­
rio.
D entre os a u to res franceses que m elhor escre­
veram sôbre nossa união m ística com C risto, e nos­
sa colaboração aos seus M istérios, devem os c ita r S.
João E udes, de m odo especial na su a obra A
Vida e o Reino dc Jesu s nas A lm a s Cristãs.
A escola francesa de espiritu alid ad e do sécu­
lo X V I I foi fiel à trad ição d o u trin al da Ig re ja.
O s Bérulle, os O llier, os C ondren, os T hom assin,
146 T E R C E IR A P A R T E

souberam d ed u zir d as v erdades reveladas p o r N o s­


so S en h o r e desenvolvidas p o r S. P aulo, as m ag­
níficas conclusões que en cerram acêrca da nossa
participação no sacerdócio do H om em -D eus.
Q uais as causas a que devem os a trib u ir a espé­
cie de eclipse que, d u ra n te o século X IX , so fre u a
d o utrin a da incorporação do- fiel ao C orpo M ís­
tico e, ao m esm o tem po, o desprezo ap a re n te des­
sas gran d es v erd ad es? O jansenism o, logo ao p rin ­
cípio, depois o m aterialism o do século X V I I I , e,
afinal, a an a rq u ia o riginada pela to rm en ta revo­
lucionária, parecem explicar êste abandono. É com
tristeza que devem os reconhecer êste fato : a pie­
dade c ristã não pro cu ro u no ú ltim o século, como
em o u tra s épocas, o seu alim ento na união, como
m em bro, ao “ C hefe incom parável.”
Ainda h o je a g ra n d e m assa dos fiéis não cogi­
ta desta adm irável d o u trin a e poucas alm as nela
acham o alim ento p a ra sua vida espiritual. E sta
apatia reclam ava u m a reação, a qual, graças a D eus,
já começa a p roduzir-se. São p rincipalm ente os
trabalh o s da O rdem dos B eneditinos e ou tro s, as­
sim como o Clero Secu lar que já tan to têm con­
corrido p a ra cham ar a atenção d as alm as p a ra esta
d outrin a, da qual nunca se deveriam te r d istraí­
do. É bom n o tar, — e é êste um triu n fo p a ra a
sabedoria insp irad a d a Ig re ja , que não descuida os
m enores atos do culto devido a D eus — q ue foi
p o r m eio d a L itu rg ia q ue se renovou a espiritu alid a­
de, após o período de esquecim ento, levada nova­
m ente à concepção do nosso papel de m em bros
do C orpo M ístico.
N a m esm a época em que apareceram estudos
m agistrais sôbre S. P aulo, ilu stres p ro fesso res s u r­
giram n as cátedras. U m a plêiade de teólogos gu ia­
dos p o r m estres eru d ito s estu d a ra m a d o u trin a do
CA P. I. A P R E PA R A Ç A O 147

Corpo M ístico, g o d e-se dizer que h o je essa d o u­


trin a fo rm a a elite da piedade católica.
M as como esta “ substân cia” tão suave e tão n u ­
trien te d escerá a té às alm as sim ples?

A pregação, segundo melo de assegurar


a preparação doutrinal da “m inha” Missa
O s prop ag ad o res d as idéias teológicas en tre os
fiéis são os p regadores. “A fé e n tra pelo ouvi­
d o . . . ” (R o m 10, 17) e com o se fa ria isto sem
p re g ado res? T al é a a firm ação de S. P au lo . É ne­
cessário, pois, que, segundo o conselho do mesm o
Apóstolo, os p a sto res de alm as e todos os P ad res,
encarregados de esp alh ar a d o u trin a, retom em an ­
te as m ultidões a linguagem q ue usavam os P a ­
dres da Ig re ja . O u tro ra , em tô rn o de seus púlpi­
tos, seus ensinam entos sem pre os m esm os e p ro ­
fundos chegavam a p e n e tra r as alm as de convic­
ções sólidas sóbre “a vida cristã, adesão ao Corpo
M ístico” . T odos sabiam q ue cada alm a era “m em ­
bro de C risto” ; referiam tôdas as p rá ticas da re ­
ligião a esta v e rd ad e fun d am en tal da “ colabora­
ção com a Cabeça” e consideravam esta com p arti­
cipação ao eterno P o n tífice como o m óvel de to ­
da a santificação.
Seria p a ra d e se ja r que o ensino catequístico, ho-
m ilético e o rató rio , m inistrad o em nossos d ias aos
fiéis, tivesse de novo como base êste tem a fu n d a ­
m ental. Q u e alim ento p a ra a piedade en co n trariam
nêle os fiéis, se conhecessem as m arav ilh as de sua
incorporação a C risto M ístico! C om preenderiam
que, pelo Batism o, são e n x e rtad o s e ligados ao
C h e fe ; que, pelo c a rá te r batism al, en tram em ver­
dadeira p articipação no Sacerdócio de C risto ; que
po r êsse meio ficam "sem elhantes ao Filh o de
D eus” , como sacerdotes de D eu s2 ; q u e os carac-

2) S u m a Teol., m , p. 63, a. 3.
148 T E R C E IR A P A R T E

teres indeléveis d a C o nfirm ação e da O rd em são


apenas o com plem ento do B atism o e produzem
um a incorporação m ais íntim a ao P o n tífice su p re­
m o; que, como m em bros de C risto, o S acrifício
dêste, sua m orte, su a ressu rreição , sua ascensão,
seu reino, su a g raça são bens e pro p ried ad es dêles,
e que os m éritos de C risto são tam bém se u s; que,
p o r êste fato da p ró p ria incorporação a C risto S a­
cerdote, os cristãos são “a R aça eleita, o S acer­
dócio real” (1 P ed 2, 9 ) , com direito de o fe re c e r a
D eus p o r meio de “su a ” M issa o culto autêntico,
oficial e p ú blico; que, em um a p alavra, “se o C or­
po de C risto foi ungido da unção sacerdotal, seu
Corpo M ístico, que som os nós, tam bém o fo i”3.
O aud itó rio , m aravilhado com esta pregação cheia
de do u trin a , ap re n d e ria assim a d e te sta r pratica­
m ente o pecado, porq u e sen tiria os efeitos im edia­
tos dêle e poderia v e rificar, com efeito, que o pe­
cado venial p reju d ica ou m esm o p aralisa o m em ­
bro do Corpo M ístico e que o pecado g ra v e o
aniquila tran sfo rm an d o -o em um ó rgão que não
atua, ain d a que esteja, todavia, ligado ao Corpo,
pela fé que lhe resta. E ainda esta m esm a d o u trin a
recordaria aos fiéis q ue são capazes de recu p erar,
por meio da absolvição, o "e n x ê rto ” inalterável e
re v ig o ra d o ! . . . Q u an to s p ensam entos m arav ilh o­
sos! Q u e assu n to inesgotável p a ra a lim en tar um a
piedade que se to rn o u concreta e fácil, pois p ro ­
cura atin g ir um fim determ in ad o : to rn a r cada dia
m ais unido, m ais robusto, m ais n u trid o um m em ­
bro dêste C hefe, que é C risto. P o r esta certeza
de p erten cer ao C orpo M ístico de C risto, como o
C ristão deve sen tir-se p erto de D e u s ! Je su s C ris­
to não é m ais personagem d istan te de nós e m ajes­
tosa, que o ad o ra d o r tím ido e cheio de tem o r a p e r­
cebe oculto sob as espécies e u c a r ís tic a s ... N ão é

3) S. Agos. in P s. 26.
CA P. I. A P R E PA R A Ç Ã O 149

tam bém , como certos espíritos gostam de a fig u ra r-


se, “prisio n eiro ” algem ado p o r nós no cárcere do
tab e rn á c u lo . . . Ê le é, ali, m ais q ue A m ig o . . . é
m ais que um I r m ã o .. . é o “ C hefe incom parável”
de quem som os o braço, a m ão, os ó rgãos, vivendo
d a m esm a seiva, pen etrad o d a m esm a alm a que é o
E sp írito Santo.
E quão sublim es são as funções que realiza êste
C orpo M ístico, “q ue som os nós m esm o s!” Como
seria fácil aos o rad o res sacros pro m o v er o cul­
to verd ad eiro de D eus, ensinando aos fiéis que não
podendo C risto C hefe se p arar-se de seus m em bros,
como nós não nos podem os se p a ra r dos nossos,
oferece conosco o S acrifício do a lta r, que se to r­
n a a nossa M is s a ! O presen te compêndio vem p ro ­
curando tira r d esta verd ad e um pouco do suco que
ela c o n té m ... Porq u e, como fru to de nossa M is­
sa que é nossa im olação com C risto, h a v e rá nossa
ressurreição com Êle, nossa ascensão, nosso reino
à d ireita do etern o Pai, pois os m em bros de q u al­
qu e r organism o com partilham em q u alq u er lu g ar
e sem pre da so rte da Cabeça.
P ergu n tam o s, às vêzes, p o r que d eixam os a d o r­
m ecer verd ad es como estas, em vez de “p regá-
las oportuna e inoportu n a m en te” (2 T im 4, 2 .),
como o pede S. P aulo.
O bjeta-se, às vêzes, com o desculpa pelo silên­
cio, a dificuldade que se te ria p a ra fa z e r com preen­
d er aos fiéis esta d o u rtin a. Poucos ouvintes, é cer­
to, são capazes de entendê-las da p rim eira vez. E é
por isso que os cristãos, que atu alm en te ouvem fa ­
la r tão pouco sôbre estas idéias tão belas e an im a­
doras, m anifestam adm iração, quando, p o r acaso,
um p reg ad o r lhas expõe. N ão estando h abituados
a essa linguagem , desconfiam dela, e p o r vêzes,
como de um a novidade q ue n ão precisam os lev ar
150 T E R C E IR A P A R T E

em conta. A sem ente, que aliás e ra excelente, caiu


em um te rre n o m al p reparado.
M as se, desde a prim eira p a la v ra do catecism o,
que com eça geralm en te pela d efinição do "cristão
m em bro de C risto ” a té à últim a, que c m uitas vê-
zes “a vida ete rn a ” , isto é, o reino do C hefe, p a r­
tilhado pelos m em bros, se tem p ro cu rad o ensinar
às crianças suas relações com a C ab eça; se h a b itu a­
ram -nas a v iver na adesão a C risto e a conser­
var-se em p erp étu a união com Ê le; se de sua p a r­
te o sacerdote continua no p úlpito o ensino cate-
quístico, visando sem pre o dogm a católico, sob o
mesmo ponto de vista de nossa incorporação, pe­
lo Batism o, a C risto, com a qual co m partilham os as
funções sacerdotais a té celebrar com Êle, p o r in­
term édio do m in istério dos sacerdotes, a “nossa”
M issa, então os fiéis com preenderão bem depressa
sua vida so b ren atu ral, am arão m ais o seu divino
Sacerdote, e com eçarão a te r um a piedade que até
então desconheciam , p a ra p re p a ra r-se p a ra a sua
oblação.
2.» A preparação lltúrglca
de “m inha” Missa
O hom em é feito assim : só com preende p erfe ita
e praticam ente o que vê. É um dos c a ra cterísti­
cos d a divindade d a Ig re ja te r trad u zid o as v e rd a­
des ocultas em linguagem com preensível: a L itu r­
gia é a represen tação viva d as m ais a ltas d o u tri­
nas, as quais, p o r si m esm as, p arece q ue deveriam
escapar inteiram en te ao dom ínio dos sentidos.
P a ra com pletar o conhecim ento e a m a r os M is­
térios do a ltar, tem os que a c rescen tar ao estudo da
d o u trin a o d a L itu rg ia . A s cerim ônias d a S. M issa,
sua h istó ria, su a significação co m pletarão e de­
te rm inarão p e rfeitam en te as noções teológicas.
M as não se pode conhecer em um só dia todos
os rito s d a Ig re ja . P a ra serem com preendidos e
saboreados, devem se r acom panhados p o r m uito
CAP. X. A P R E P A R A Ç Ã O 151

tempo. A prep aração litúrgica de “m in h a” M issa


deverá ser m uito p e rsev eran te p a ra que eu possa
conhecer os m enores gestos, im postos ao P ad re,
assim como su a origem a qual, m uitas vêzes, ex ­
plica o que sig n ificam ; d ev erá tam bém se r bas­
tante ap ro fu n d a d a p a ra que eu possa p e n e tra r o
sentido das p a lav ras que o celebrante p ronuncia,
palavras repletas de suavidade, d e unção e de v er­
dade!
Ê ste estudo liturgico de m inha M issa requer, p a ­
ra ser fru tu o so , guias ex perim entados. H á alguns
anos ap areceram o bras p e rfeitam en te a d ap tad as às
necessidades da piedade do povo e capazes de p ro ­
p o rcion ar a todos os assisten tes luzes a b u n d an­
tes sôbre as cerim ônias do a lta r, aliás tão pouco
com preendidas dos fiéis. S ão dignas de menção
tam bém certas revistas litúrgicas, cujo fim é es­
p a lh a r p o r tôda p a rte as noções indispensáveis aos
cristãos que q uerem interessar-se pelo serviço do
alta r. N u nca será dem ais recom endar ao m em ­
bro de C risto, desejoso de celeb rar a sua M issa,
que leia êsses livros e essas revistas, que lhe
a b rirão novos h orizontes sôbre a p articipação no
S acrifício.
P a ra os fiéis pouco instru íd o s ou dem asiado a b ­
sortos n as d ificuldades m ateriais, q ue não dão a
si próp rio s o ensejo de e stu d a r os dados litú r-
gicos, a pregação e os curso s orais devem su p rir a
impossibilidade du m a in stru ção pessoal. P o r que
não se instituem , p o r exem plo, em nossas escolas
católicas, em nossas congregações de filhas de
M aria, em nossos círculos de estudos m asculinos
e fem ininos, em nossas ligas e c o n fra ria s, aulas
de L itu rg ia ? S eria um dos m eios mais p ráticos
p a ra en sin ar aos sim ples fiéis a “c e leb rar” d ig ­
nam ente a sua M issa e inspirar-lh es um a tra tiv o
so b renatu ral pelos sublim es m istérios d o a ltar.
152 T E R C E IR A P A R T E

S.* A preparação ascética


para “m inha” Missa
D e tôd as as preparaçõ es p a ra a celebração do
santo S acrifício, a m ais im p o rtan te é a do coração
e da vontade. P a r a o fe recer sua M issa, o m em bro
deve e sta r unido ao C hefe tão p e rfe ita e solida­
m ente qu an to possível, pelos laços da v irtu d e e do
am or. O g ra u da cooperação que o fiel d á ao P o n ­
tífice suprem o, n a o fe re n d a d a hom enagem in fi­
nita, m ede-se pela im portância dêsse mesm o fiel no
C orpo de C risto M ístico. Concebe-se desde então
que tô d a a vida não é dem asiada p a ra re a lizar a
obra de desenvolvim ento do m em bro, que somos, e
para a sseg u rar a êsse m em bro um g ra u su p erio r de
vitalidade e de atividade no organism o so b ren atu­
ral que é C risto com pleto e total, em v ista do ato
suprem o de religião a o fe recer à S antíssim a T rin ­
dade.
A prep aração p a ra o santo S acrifício torna-se,
pois, p a ra o fiel que com preendeu o que é a sua
M issa, o fim único da existência. E na verdade,
êste cristão sabe que foi criado unicam ente p a ra
servir a D eus, louvá-L o e ad o rá-L o . O ra , a ado­
ração e o louvor são prestad o s à divina M a je sta­
de só p o r meio de C risto M ístico, e o lu g ar onde
êste C risto M ístico o ferece sua hom enagem é sem ­
pre o a lta r. O cristão com preende então q ue todo
o seu esforço deve te n d e r p a ra o crescim ento neste
Corpo M ístico, a fim de colaborar nos atos de re­
ligião que trib u ta com seu C hefe, so bretudo no ato
de su a M issa.
E sta concepção v erd ad eira da ‘‘vida em C risto”
tra n sp o rta -n o s p a ra longe d as estreitezas de cer­
tas espiritualidades com tendências “so b ren atu ral­
m ente egoístas", q ue fazem p ro c u ra r a v irtu d e por
ela mesm a, pelas v antagens q ue nos traz neste m u n­
do e no ou tro , sem p en sar que acim a de tu d o está
CA P. I. A P R E PA R A Ç Ã O 153

a glória e o ato de adoração a D eu s! O m em bro


de C risto deve te r o u tra s preocupações. In co rp o­
ra r-se mais in tim am ente a C risto M ístico, p a ra
ser m ais “ laborioso” no serviço da d ivina M ajes­
tade n a oblação do a lta r, é o ideal da perfeição
cristã. Sabe que, p ro cu ran d o ard en tem en te o R ei­
no de D eus p o r sua união com o C hefe, todos os
o u tro s bens esp iritu ais e tem porais lhe ad v irão com
um a p ro fu são inaudita.
A v irtu d e não é p a ra a alm a c ristã um luxo e
um orn ato , de q ue se possa o rg u lh ar, é um bem
de prim eira necessidade, sem o qual não pode h a ­
v e r união possível a C risto M ístico ; pelo m esm o
m otivo, n ão h a hom enagem a D eus, e, p o rtan to , não
há S. M issa.
Preparem o s nossa M issa cad a dia m elhor e com
mais solicitude. O esforço d a vida in teira não
é dem asiado longo. E stejam o s certos: m o rre re ­
mos sem te r alcançado celeb rar a “n o ssa” M issa
tão p erfeitam en te qu an to o teríam os ideado.

A preparação ascética
da “m inha” Missa consiste
em form ar em mim a vitima do sacrifício
O fiel, na prep aração ascética p a ra sua M issa,
deve p en sar q ue será tan to m ais unido à Cabeça,
como sacrificad o r, quan to m ais se e sfo rç a r p or
to rn ar-se vítim a com ela. C elebrarem os tan to m e­
lhor a nossa M issa, q uanto m ais nosso estado de
“vítim as” nos u n ir a C risto V ítim a ; serem os tan to
m ais co-oferentes da hom enagem in fin ita q uanto
m ais form os “co-oblatos” . É o que São P a u lo q ue­
ria dizer, quando escrevia aos rom anos: “ R ogo-
vos pois, irm ãos, pela m isericórdia de D eus, que
apresen teis os vossos corpos como um a hóstia vi­
va, santa, ag radável a D eus, como vosso culto r a ­
cional.” (R o m 12, 1.)
154 T E R C E IR A P A R T E

A prep aração espiritu al p a ra nossa M issa consis­


tirá, pois, em sacrificar-n o s com Cristo, isto é, em
p ro cu ra r e a m a r os so frim en to s da vida cristã, os
quais m erecerão p a ra nós o nom e de sa crifícios na
medida em que fizerem de nós co-vítim as de C ris­
to no seu santo S a crifício.
Q uais são, porém , êstes sofrim en to s q ue farão
de nós um “m em bro-vítim a” com o C hefe e tra n s­
form arão cada um de nós n esta "h ó stia viva, sa n ­
ta c agradável a D eu s” , como pede S. P au lo ?

A nossa formação de co-vitima do sacrifício:


1.° pela aceitação das penas necessárias
à conservação do estado de graça
A p rim eira preocupação do fiel, q ue q u e r ce­
le b rar a “su a ” M issa, deve se r a de perm anecer
m em bro de Cristo, isto é, de perm anecer unido
ao C hefe divino pelos laços da caridade. M as não
é sem pre fácil m a n te r êsses laços bem unidos. Sem
extrao rd in á ria vigilância e solicitude sem pre em
atividade, se a fro u x a ria m bem facilm ente! O con­
ju n to de esforços q ue fazem os cristãos p a ra p er­
m anecer em sólida união com o C hefe pela con­
servação do estado de g raça, constitui nêles o
prim eiro estado de vítim a, indispensável p a ra
tornarem -se concelebrantes d a M issa de C risto.
N ão se pode d izer que esta p rim eira form ação
em nós da V ítim a do S acrifício não seja m uito
m e ritó ria ! Q uem ignora qu an to custa à p obre n a­
tu reza decaída o m anter-se em estado de G raça?
E m esm o as obrigações gerais da vida c ristã são
um a fon te de p rivações re ite ra d a s: o ra r com reg u­
laridade, p re fe rir a M issa do dom ingo a q u alquer
prazer, a jo elh ar-se an te um sacerdote no co nfes­
sionário, se r fiel à abstinência e je ju a r nos dias
determ inados pela Ig re ja , m o stra r-se c a tó lic o ...
eis ta n ta s ocasiões de “sacrifício s” q u e p rep aram
p a ra o “ S acrifício ” .
CA P. I. A P R E PA R A Ç Ã O 155

M as, além d estes preceitos da vida cristã, com um


a todos, qu an tas o u tra s m o rtificações são im pos­
tas pela observância dos diversos d everes do p ró ­
prio estado! O s esposos sabem qual a coragem e a
confiança na P rovidência que lhes é precisa p a ra
nunca o fenderem a D eus no cum prim ento de seus
deveres conjugais. O s jo v en s que p rezam a sua
pureza têm q ue fu g ir dos teatro s, dos rom ances,
dos cam aradas, têm que co n trap o r às solicitudes
viciosas um a resistência p erseverante. Q u an d o um
rapaz, p o r exem plo, ou um a moça passam o ci­
mo dos anos te rrív eis sem ja m a is se “d esligarem ”
de C risto, p o r um pecado m ortal, êstes tenros
m em bros do C orpo M ístico não apresentam já
unia prep aração seria p a ra o estado de co-vítim a
que lhes p erm ite o fe re c e r com o Sacerdote a d o rá­
vel do alta r?
U m a moça que atrav essa o m undo atu al, perm a­
necendo sim plesm ente “ virgem c ristã ” , não será
acaso a adm iração daqueles que a c o n h e c e m ? ...
É decente no v estuário, m odesta nos o lhares, re­
servada no porte, foge dos bailes onde p oderia
b rilhar, não faz o stentação da p ró p ria m ocidade
c beleza, m as, pelo co n trário , apresen ta-se p ru ­
dentem ente piedosa, tra b a lh a d o ra em casa, p ro n ­
ta a em pregar-se nos m ais penosos trab alh o s d o­
m ésticos, caridosa, d edicada aos pobres e aos
d o e n tes. . . Q u al se rá a opinião da sociedade so­
bre esta jo v em ? U n s adm iram -na, o u tro s censu­
ra m -n a . . . m as de q u e ? . . . D e sac rific a r seus m e­
lhores anos. E todavia foi apenas m uito p ru d en­
te. E sta sim ples v o ntade de ficar fielm ente unida
a C risto pelo cum prim ento dos deveres o rd in á ­
rios é, pois, a causa de "sacrifício s” q ue deixam
o m undo adm irado.
D êste modo, não será verd ad e d izer que a sim ­
ples aceitação leal e g enerosa da vida c ristã se-
156 T E R C E IR A P A R T E

ja p o r si m esm a já um a p rep aração à oblação da


nossa M issa? Q u a lq u e r m em bro de C risto que se
apresen te no a lta r de sua M issa, em estado de graça,
certam en te so freu penas e aceitou priv açõ es; em
um a p alav ra, é de algum m odo "u m a h ó stia viva
e agradável a D eu s” , capaz de oferecer-se com
C risto C hefe, e p o r isto m esm o de o fe re c e r a obla­
ção com Êle.
A nossa formação de co-vítlma do sacrifício:
2.° pela aceitação des cruzes
Q uan d o , porém , N osso S e n h o r q u e r d a r aos seus
m em bros um a im portância m aio r n a oblação, a p e r­
feiçoa-lhes o estado de co-vítim a, enviando-lhes
sofrim en to s suplem entares. N osso S en h o r m esmo
nos ad v e rte que está disposto a nos associar de m o­
do m ais íntim o ao seu sacrifício p o r m eio das pe­
nas e dos sofrim entos. E é p o r isso q ue nos con­
vida a aceitar de boa v o ntade as provações: “ Se
alguém quiser v ir após m im . . . q ue tom e sua cruz
de cada dia e m e siga.” (L c 9, 23.)
A trad ição cristã com preendeu o pensam ento do
M estre. D esignou pelo nom e de “cruzes" as trib u ­
lações da vida, do m om ento q ue são aceitas pe­
los m em bros de C risto como vindas d a m ão de
D eus. M as, assim com o nossos sofrim en to s só m e­
recem o nom e de sacrifícios à m edida q ue coope­
ram em fazer de nós co-vítim as do Sacrifício úni­
co, tam bém as provações não são d ignas de se­
rem cham adas "c ru z e s” senão quando as rece­
bemos com a intenção de nos identificarm os m ais
intim am ente à renovação do Sacrifício do Gólgota,
que é a nossa M issa.
O m em bro de C risto M ístico, desejoso de cele­
b ra r quotidianam ente a sua M issa, com preende qual
meio poderoso seja, p a ra esta colaboração com
Cristo, a aceitação livre e “ so rrid e n te ” d as penas,
doenças, reveses, separações e o u tra s d o r e s . . . O
CA P. I. A PR E PA R A Ç Ã O 157

m em bro de C risto fa ria m uito m al em tem er estas


te rríveis visitas: são as enviadas de D eus. E fa ria
ainda p io r em m u rm u ra r c o n tra e la s: en cerram
em si a sem elhança m ais a p ro x im ad a possível com
a V ítim a -S a c e rd o te ; tam bém lhe prodigalizam o
m ais precioso dos tesouros: porque, de envolta
aos m éritos de Cristo, nossos pobres sofrim en tos
revestem -se de um valo r incalculável, como no o fe r­
tório a go ta de água lançada no cálice se dissolve
no vinho e se tra n sfo rm a no S angue do Salvador.
A ssim a nossa M issa, p re p a ra d a p o r meio do
so frim en to cristão, será verd ad eiram en te um a co­
operação com C risto que se o ferece a seu Pai.

A nossa formação de co-vítima do sacrifício:


3.° pelas mortificações que nos impomos
C ertas alm as san tas acham que o C hefe divino
não form a nelas com b a stan te presteza a sua im a­
gem.
A rden tem en te sequiosas de se to rn arem , sem pre
m ais, vítim as do santo S acrifício, im põe-se, além
das cruzes providenciais, o u tro s so frim en to s v o­
luntário s. L êein-sc na vida dos San to s p artic u la ri­
dades aterro riz a n te s sôbre as penitências que se
im punham , m ais ad m iráveis que im itáveis. O santo
cu ra de A rs, p o r exem plo, que p o r m uitos anos
ouvia confissões doze a dezoito horas cada dia, d o r­
m indo apenas no m áxim o du as h o ras cada noite,
com endo ao meio d ia m ui p arcam ente, sem jam ais
sentar-se à m esa, flagelando-se até c o rre r o sa n ­
gue, e usando cilícios que lhe p en etrav am as c a r­
nes. . A
O bom cura de A rs era verd ad eiram en te vítim a!
M as, tam bém , que ótim o co operador com C risto
em sua M is s a ! E r a v erdade sabida em A rs e basea­
d a nos fatos, que êle percebia de m odo m aravilho-

4) V ida do S a n to p o r T ro ch u .
158 T E R C E IR A P A R T E

so a presença de C risto na sag rad a H ó s tia . . .


sua atitu d e no a lta r era de um a eloquência visível:
bastava a vista do P a d re V ian n ey celebrando os
santos M istérios p a ra co n v erter os pecadores e in­
flam ar de am o r as alm as piedosas.
A ssim , pois, se os S an to s fo ram em sua M issa
m em bros que colaboravam excepcionalm ente com
o Chefe, foi devido tão som ente à sua prep aração
ao estado de vítim a, a qual lhes era p a rticu larm en­
te cara. M as nós, sim ples fiéis, que aliás somos
tam bém desejosos de celeb rar p e rfeitam en te a
nossa M issa, podem os acaso aco m p an h ar os S a n ­
tos nestas vias e x tra o rd in á ria s da p enitência?
O bom cura de A rs responderá a esta p e rg u n­
ta com seu fino e sua retidão de juízo. E m um a
ocasião, no comêço d a Q uaresm a, a fiel C a tarina
Lassagne lhe pediu p erm issão p a ra je ju a r. O P a ­
d re V ianney recusou-lhe. “ M as V. R evm a. je ju a
tôda a Q u a re sm a ” , replicou ela. O san to sacerdote
respondeu-lhe: “ É v e rd a d e ; m as p a ra m im o je ­
ju m não m e im pede de ex ercer o m eu ofício, e a
senhora não p oderia d esem penhar o seu.”
N osso S en h o r só exige de nós, pois; com o pe­
nitência voluntária, ten d o em v ista a nossa M issa,
os atos “que não nos im pedem de e x ercer nosso
ofício” , isto é, de c u m p rir p e rfeitam en te os deve­
res de nosso estado. S eria, pois, um a rd o r m al en­
tendido o de certas alm as piedosas que negligen­
ciassem , p o r exem plo, a saúde, dom precioso p a ra
a vida da fam ília, a fim de se entreg arem à p rá ti­
ca de privações ex tra o rd in á ria s. N ão h á no m un­
do coisa que exija ta n ta prudência com o o uso das
“penitências suplem entares” . E jam ais se po d erá
recom endar bastan te aos m em bros de C risto que,
se quiserem ev itar os perigos d a tem erid ad e e não
ra ro do orgulho, n ad a em preendam dêste gênero
CA P. I. A P R E PA R A Ç A O 159

de m ortificações, an tes de te r recebido a perm is­


são de um d ire to r esclarecido.
R esta ainda no entanto, p a ra as alm as d esejosas
de se to rn arem “ hóstias vivas e agrad áv eis a D eu s” ,
um cam po vasto de privações volu n tárias, as quais,
sem p re ju d ic a r a saúde, nem as obrigações do
p róprio estado, podem realizar-se m esm o sem a
licença do co nfessor. P o r exem plo, q u ando êstes
m em bros de C risto tiverem sacrificado as palav ras
inúteis, as conversações frívolas, os olh ares dis­
traídos na ig reja, o luxo n a alim entação, a im ora­
lidade no v e stu á rio ; q u ando d epositarem na m ão
dos pobres ou na caixa d as o b ras pias esm olas tão
abundan tes q u an to lhes perm ite a p ró p ria condição
so c ia l; q u ando souberem p riv a r-se de algum a coi­
sa p ara p re sta r serviço ao próxim o, consolando-o,
anim and o -o ; q u ando tiv erem exercido o aposto­
lado segundo suas aptidões e as circuntâncias pes­
soais, p o r m eio do ensino do catecism o às crian­
ças, ou da p ro p ag an d a d a boa Im p re n s a . . . terão
p raticad o g ran d e núm ero de m o rtificações suple­
m entares, escolhidas livrem ente, e, sem sair das
sendas bem experim entadas, terão delineado em
si mesm os a “h ó stia ” . Ê stes cristãos poderão cele­
b ra r tôd as as m anhãs d ignam ente a “su a ” M issa
p a ra a qual se terão p re p a ra d o tão persev eran te
q uão cuidadosam ente em todos os m om entos de
sua vida.
160 T E R C E IR A P A R T E

C A P ÍT U L O S E G U N D O
A ASSISTÊNCIA
NOSSA ASSISTÊNCIA A S. MISSA DEVE SER UMA CELE­
BRAÇÃO... POR CONSEGUINTE, DEVEMOS PARTICI­
PAR ATIVAMENTE DA OFERENDA, ASSOCIANDO-NOS
A LITU R GIA ... ESTA COMPARTICIPAÇÃO A LITURGIA
REALIZA-SE PERFEITAMENTE QUANDO ACOMPANHA­
MOS AS MISSAS SOLENES.
Nossa presença deve
ser um a celebração
O p resen te trab alh o tem p o r fim d em o n strar
que o Sacrifício do a lta r é a “n o ssa” M issa p orque
c C risto M ístico, Cabeça e C orpo, do qual somos
um m em bro vivo, q ue oferece e se oferece.
O conhecim ento desta g ran d e verd ad e deve ex e r­
cer sua in fluência sôbre nosso m odo de assistir à
S. M issa. A Ig re ja n ão exige de nós que leve­
mos ap enas um a presença co rporal, passiva e in­
diferen te, m as deseja de nós um a colaboração com
C risto q ue se im ola; q u e r um a celebração.
T odos os fieis, reunidos em a nave do templo
em volta do celebrante, form am “ um só coração
e um a só alm a” . C risto, C hefe de tôda a Ig re ja,
é sacrificad o em cada S. M issa, como Cabeça de
todo o C orpo M ístico, e vem oferecer-se sôbre o
alta r, m ui especialm ente com e pelos seus m em­
bros, reunidos naquela ocasião em volta dÊ le. Com
êsses é que m ui p a rticu larm en te trib u ta à S a n tís­
sim a T rin d a d e a hom enagem in fin ita, o ferece o lou­
vor perfeito , a ação de g raças superab u n d an te, a
satisfação su p re m a ; com êsses é que pede o R eino
de D eus e as g raças espirituais e tem porais q ue lhes
são necessárias. E sta M issa é especialm ente o ato
com um da p a rte do Corpo M ístico reunido na
Ig re ja , a re su lta n te dos esforços dêstes m em bros
com seu Chefe.
D aqui se deduz quão longe do bom senso e da
verdade estão certos fiéis que vêm à S. M issa sem
CA P. n . A A SS IS T Ê N C IA 161

piedade e sem gôsto. E stã o n este caso, p o r exem ­


plo, aqueles q ue d eclaram abertam en te que vão às
M issas de d e fu n to s ou de casam entos, só p a ra sa­
tisfaz er às p ra x e s sociais. V ão p a ra a ig re ja o
m ais ta rd e possível e saem o mais c e d o . . . e êsse
cu rto lapso de tem po em pregam em o lh a r p a ra o
povo, em p en sar nos negócios, em im pacientar-se,
etc. N em um a palav ra de preces v o c a is .. . essa m e­
ra presença à S. M issa não tem valo r algum : não é
colaboração.
Felizm ente essa a titu d e é apenas a de um pe­
queno n úm ero de católicos. A queles que se e sfo r­
çam po r não fa lta r à S. M issa de dom ingo têm m ais
convicções. Se vão à Ig re ja p ara cum p rir u m dever,
sua intenção é reta e já e n cerra um a vontade, ain­
da que inconsciente, de cooperação com Cristo.
P rovavelm ente êsses fiéis fo rm u larão algum as o ra ­
ções, e desse m odo já te rã o d em onstrado b a stan­
te adesão ao Corpo M ístico, p a ra te r p a rte na obla­
ção: e é por isso que a S a n ta Ig re ja considera que
cum prem o preceito.
M as que m aravilhosos fru to s poderiam tira r ês­
ses católicos pouco in struídos, se tivessem sôbre
a assistência da S. M issa noções ao m enos ele­
m en ta re s! N ão seriam m ais vistos rec ita r d u ra n ­
te a S. M issa quaisq u er orações vocais, d esfiando,
talvez distraid am en te, as contas do rosário, ou len­
do as ladainhas, no m om ento em que o dram a do
Calvário, que se rep resen ta no a ltar, reclam a tôda
a sua atenção.
O s cristãos que rezando ap enas de “bôca ou de
coração” , seja qual fô r o objeto de sua oração, já
se unem aos m inistros e já tom am p a rte na o fe ­
re n d a ; m as com o sua p articipação seria m aior, sua
ação m ais fecunda, sua piedade m ais p ro fu n d a , se
possuissem o espírito do C hefe, im olando-se, se­
g undo suas intenções, e ratifican d o , com um a ade-
162 T E R C E IR A P A R T E

são v o lu n tária e re iterad a, cada um a d as fases da


oferend a.
O melhor melo de celebrar:
a assistência lltúrglca
Q ual a m elhor m an eira de o fiel celebrar a
“sua” M issa? E v identem ente, u nindo-se passo a
passo à L iturgia.
A L itu rg ia venerável da S. M issa é im posta ao
sacerdote que o ferece o santo S acrifício. A Ig re ­
ja considera, pois, que não há o u tro meio m ais a u ­
têntico e oficial de celebração do que êste. A s ex­
pressões do rito, escrupulosam ente d eterm inadas,
traduzem m istérios ocultos, exprim em sentim entos
próprio s de acôrdo com a realidade, m anifestam
como convém a união da Cabeça com os m em bros
na oblação. E não é êste um motivo suficiente
para que os fiéis procurem ap ro v eitar-se da assis­
tência Iitúrgica, se querem celeb rar do m elhor m o­
do possivel a “su a ” M issa?
É evidente que o sim ples fiel não é obrigado,
como o sacerdote, à celebração " a u tên tica e oficial”
d a S. M issa. N ão tem o papel de re p resen tan te vi­
sível do C hefe, p o r um lado, e do Corpo M ístico,
po r ou tro . E é p o r isso que a Ig re ja não exige
do sim ples fiel que siga o tex to pró p rio da L itu r­
gia, p a ra c u m p rir o preceito da assistência à M is­
sa de preceito.
M as a alm a, q ue com prendeu o que é a “su a ”
M issa, não a te n d erá só à obrigação, p a ra obter
o m elhor resu ltad o : liv rem en te escolherá o m étodo
m elhor e o m ais eficaz p a ra u n ir-se ao S a c rifí­
cio.
H ou v e um tem po em que o fiel podia descul­
p a r-se de não acom p an h ar o te x to pró p rio d a S.
M issa, pela dificu ld ad e de se obter, então, um
m issal. H á um a dezena de anos a trá s, a m aior
p a rte dos m anuais de M issas, intitulados “Iitúr-
gicos” , en tretin h am apenas o fiel, oferecendo-lhe
CA P. I I. A A SS IS T Ê N C IA 163

p a ra acom p an h ar a S. M issa m étodos q ue possjuiam


som ente mui ligeiros contactos com as p alav ras do
sacerdote. D aí bem se pode a d m itir que o fiel, ape­
sar de assistente devoto, n ão pudesse te r a trativ o
p o r essas considerações piedosas, as quais não
lhe davam a v e rd ad eira significação d as fórm ulas
e dos gestos usados no a lta r. E é p o r isso q ue o
aborrecim ento de um a L itu rg ia incom preensível
invadiu o coração do povo cristão, e com ra ra s ex­
ceções quase m ais ninguém sabia acom panhar de­
v idam ente a “su a ” M issa.
H ouv e depois um esforço ex tra o rd in á rio em prol
d a L itu rg ia, de m aneira que h o je pode-se colocar
nas m ãos dos fiéis m issais v e rd ad eiram en te li-
túrgicos. A lguns, p e rfeitam en te com pletos, são d es­
tinados aos m em bros de C risto q ue assistem à
M issa q u o tid ian a1, ou tro s, m enos com pletos, são
apenas suficientes p a ra a assistência litúrgica à
S. M issa dos dom ingos e d as festas principais.
O s au to res d êstes pequenos m issais não pro cu­
raram som ente a p re se n ta r te x to s oficiais: quise­
ram g u ia r os fiéis p o r m eio de indicações n ítidas
e instru tiv as. T o d av ia não é nestes livros, que
procuram aliás n ad a om itir, que se deveria ir bu s­
ca r um a explicação literal e explícita do tex to o fi­
cial. E sta po d erá ser e n co n trad a em certas o bras
dedicadas de um m odo especial a êste objetivo, e
todo cristão, que deseja celeb rar d ignam ente a
“su a ” M issa, deve possuí-las ao lado do m issal quo­
tidiano.
A ssim instruído, p o d erá o fiel a ssistir devida­
m ente à “su a ” M issa. C om preendendo bem os
gestos ritu ais, acom panhá-los-á com interesse, e,
pouco a pouco, p o r m eio dêles, ap ro fu n d a r-se -á
no conhecim ento e nos M istérios do a ltar.

1) Recomendamos o Missal dos Fiéis, por Matos


Soares.
164 T E R C E IR A P A R T E

^ As vantagens da assistência lltúrglca


O s fiéis que se dedicarem a celebrar liturgica-
m ente a “su a ” M issa não ta rd a rã o a descobrir os
preciosos fru to s q ue irão recolhendo d êste m é­
todo.
1.° O santo altar fica rá m ais pró xim o d os assis­
tentes. A té nossos dias o sacerd o te era um a p er­
sonagem m isteriosa, um tan to p arecida com M oi­
sés em colóquio com D eus no cim o da m ontanha.
Suas p alav ras, seus atos ficavam envoltos no m is­
tério. A g o ra, porém , a celebração oficial não tem
mais segredos. O fiel eleva-se até ao sacerdote p a ra
cooperar com tôdas as suas ações. O diálogo que
se estabelece en tre êle e o sacerdote, ao pé do altar,
a confissão dos pecados, o intercâm bio d as p e rg u n­
tas e d as respostas de espaço a espaço, d ão à assis­
tência a im pressão de que o fiel é “concelebran-
te ”, pois a sua voz, p o r meio do acólito, é ouvi­
da na cerim ônia oficial.
O fiel que se decide a seg u ir liturgicam ente a
S. M issa, não ta rd a a v e rific a r que ocupa na ce­
lebração d a m esm a um lu g a r im p o rta n te : esta re ­
velação faz-lhe co m preender que não som ente a s­
siste à S. M issa, m as que celebra a “su a ” M issa
com o auxílio do m in istério do sacerdote.
2.° O s a ssistentes instru em -se no s m istérios da
fé . A Ig re ja in tro d u ziu propositad am en te n a L i­
turgia dos santos M istérios leitu ras do m ais alto in­
teresse. A s epístolas e os evangelhos apresentam
à piedade dos fiéis um a d o u trin a inspirada pelo
E sp írito do pró p rio Deus. São intercalados p or
intróitos, grad u ais, tracto s e o fe rtó rio s, inspirados
nas m ais belas passagens da E sc ritu ra . Ê stes tr e ­
chos escolhidos em nossos L iv ro s S an to s ap resen­
tam um a incom parável riqueza e um a inesgotável
v ariedade de pensam entos, porq u e a Ig re ja pro cu­
rou ap ro p riá-lo s ao “ciclo litú rg ico ” . O cristão pie­
CA P. I I. A A SS IS T Ê N C IA 165

doso p e rco rre realm ente, no d e c o rre r do ano, todo


o dogm a c ristã o : contem pla cada um dos m istérios
da nossa sa n ta fé, a vida de C risto, sua m orte, seu
reino, seus ensinam entos, as g ra n d es v erd ad es d a
salvação. O ra alegre com as festas de júbilo, o ra
triste com as solenidades q ue recordam a dor, a
L itu rg ia ex u lta ou chora, inspirando àqueles que a
com preendem os sentim entos que, em cada época
da vida cristã, anim am os verd ad eiro s a d o rad o res
de Deus.
O s cristão s q ue aceitarem seguir com atenção e
piedade a L itu rg ia de " su a ” M issa, torn ar-se-ão
pouco a pouco bem instru íd o s e esclarecidos. A l­
guns objetam , e é verdade, q ue a m aio r p a rte dos
textos sagrados ultrap assam a sua com preensão e
que não atingem seu alcance. C ertos a u to res re ­
solveram , porém , esta d ificuldade, d ando às epís­
tolas e aos evangelhos de cada dia com entários ao
alcance de todos. Com livros bem redigidos, o
m em bro de C risto, co ntanto que saiba ler com os
olhos do am or, a tin g irá facilm ente o delicioso âm a­
go de v erdade oculto nos tex to s de seu m issal
quotidiano.
3.“ O s concelcbrantes aprendem a orar. Além
dos tex to s sagrados, e x traíd o s do A ntigo o u do N o ­
vo T estam ento, o m issal contém as m ais belas fó r­
m ulas de orações que existem no m undo. O con­
ju n to d as orações — coletas, secretas e poscom ú-
nios — constitui a m ais preciosa coleção de súpli­
cas que se possa im aginar. E sta s orações, inspi­
radas na m ais alta d o u trin a, são expressas em
um a linguagem adm irável, cu ja harm o n ia, preci­
são e elegância causam adm iração aos literatos.
E já que todos os dogm as são rem em orados
d u ra n te o ciclo litúrgico, tam bém tódas as g raças
espiritu ais e tem porais são p edidas no m esmo. P r o ­
nunciando cada m anhã com o sacerdote as o ra ­
106 T E R C E IR A P A R T E

ções do dia, o fiel não d e ix a rá de m encionar ne­


nhum a de suas necessidades: o ra p e d irá a D eus a
fé, a esperança, a carid ad e e tôdas as v ir tu d e s ; o ra
p e d irá a saúde, a p rosperidade, a salvação nos pe­
rigos; o u tra s vêzes im p etrará o descanso eterno
de seus m ortos, ou reclam ará a sua p ró p ria sal­
vação e o prêm io do p a r a ís o .. . E com o lhe será
doce im p lo rar a s s im ! . . . P a ra solicitar todos es­
tes dons, possui a linguagem da Ig re ja , cheia de
encanto, de fe rv o r e hu m ild ad e; n esta q uotidia­
n a oração te rá a v erd ad eira a titu d e de quem obri­
ga a D eus a o lh ar a “baixeza de seus serv o s” .
4.° O s concclebrantes com penetram -se bem de sen
papel de sacrificadores e de vítim as. P ro n u n c ia n ­
do ao m esm o tem po que o sacerdote as orações
do ofe rtó rio e do cânon, e acom panhando a te n ta ­
m ente os gestos simbólicos do o ficiante, os fiéis
desem penham de m an eira explícita e p o sitiva seu
papel de m em bros do C orpo M ístico, e cooperado-
res de C risto Cabeça. Ju n ta m e n te com o sacerdo­
te dizem “ nós o ferecem os” . . . “nosso sacrifício ” . ..
e tôdas estas afirm açõ es no plu ral, pelas quais, co­
mo vim os acim a, com participam os intim am ente da
ação do Sacrifício.
E assim , com preendendo a S. M issa, o fiel sabe­
rá qual é o seu papel: m em bro do Corpo M ístico,
colaborando com seu C hefe, oferecendo à S a n tís­
sim a T rin d a d e com Êle, nÊle, e p o r Êle, a hom e­
nagem in fin ita. A S. M issa não é m ais, como pen­
sava o u tro ra , antes de te r apren d id o a u n ir-se a
ela liturgicam ente, o privilégio só do oficiante,
mas é sua coisa p ró p ria, “su a ” M issa. E dêste
modo, com fe rv o r a celebra!
A assistência lltúrgica
às missas solenes
Se são tais as v antagens d a “assistência litú r-
gica” às M issas rezadas, que o fiel piedoso acom ­
panha p articu larm en te, que benefícios n ão são
CA P. I I. A A SS IS T Ê N C IA 167

prodigalizadas n as M isas solenes, n as quais o


m em bro de C risto é cham ado a to m ar p a r t f ex ­
teriorm ente, respondendo p o r si m esm o ao sacer­
dote e cantando com o povo os tex to s sa g ra d o s . . .
P a ra acom panhar a M issa solene o piedoso a s­
sistente não tem , p o r assim dizer, o u tro trabalho,
que deix ar-se lev ar aonde a L itu rg ia o conduz.
B asta-lhe entreg ar-se de olhos e ouvidos, isto é,
u nir-se aos cânticos que ouve e acom panhar as ce­
rim ônias que se passam a n te seus o lh o s; assim co­
la b o rará ativa e fru tu o sam en te com a oblação.
O In tro ito com o "G loria P a tri” c um p ensa­
m ento do céu que se eleva a té à S antissim a T rin ­
dade. L ogo após se dizem os “K y rie ” , trê s em louvor
ao P a d re , três ao V erbo, trê s ao E sp írito S anto:
três brados de hum ilde adoração, de p esar, de sú ­
plica que comovem tôda a assem bléia. N ão será
éste cântico, c u ja m elodia g reg o rian a se a d ap ta tão
m aravilhosam ente à letra, pró p rio a inspirar-nos
os mesm os sentim entos que o sacerdote exprim e,
batendo no peito quando começa a S. M issa nos
degraus do a lta r?
O oficiante, sem seguida, incensa o a lta r. O fe re ­
çamos com êle o incenso, à crUz em prim eiro lu­
gar. Ê ste incenso re p re se n ta nossa hom enagem a
Cristo, nossa adoração, nossa alegria de serm os
dÊle. S audam os nosso C hefe e em balsam am o-L o
com p e r f u m e s .. . E m seguida, incensam os com o
sacerdote o a lta r, fig u ra a in d a de C risto, “p ed ra
a n g u la r .. . ” (1 P ed 2, 7 .), pois som os dÊ le, a Ê le
nos dedicam os o m ais p erfeitam en te possível, nós,
seus m em bros concelebrantes.
U nid o s ao sacerdote q ue can ta as orações, su­
plicam os a D eus — e com eloquência — “p o r
Cristo, N osso S e n h o r” . O subdiácono lê em a lta
voz a epístola: e ouvim os aten tam en te as lições
que nos d á: são a p ro p riad as p a ra a h o ra presen te
168 T E R C E IR A P A R T E

e serão preciosas p a ra nos g u ia r na vida cristã.


P o r V ieio do g rad u al, do tra c to ou do aleluia, can­
tam os nosso am or, nossa aflição, nosso arre p e n ­
dim ento ou nossa alegria.
Ao evangelho ouvim os de pé a p alav ra de D eus:
Jesus C risto ai está o ficialm ente represen tad o pe­
lo diácono. A cercam o-nos dÊ le como o u tro ra as
m ultidões na m ontanha. E na v erdade essas p ala­
vras autên ticas são as m esm as que ouviam os fe­
lizes habitan tes d a P alestin a, ag ru p ad o s em re­
do r do M estre. O h ! pudéssem os bem com preen­
der que nesse m om ento não é som ente o tex to evan­
gélico que ouvim os, m as é um a v e rd ad eira cena
da vida de C risto que se repro d u z no m eio de nós,
eni nossa ig re ja p a ro q u ia l!
O ofician te en to a o Credo. U nin d o nossas vozes
às dêste cântico tão conhecido, proclam am os em voz
alta e inteligível a a firm ação v ib ran te e resolu­
ta de nossa fé no Pai C riador, no Filho, nossa Ca­
beça, no E sp irito S a n to v ivificador, na S an ta Ig re ­
ja, Corpo M ístico de C risto. U m fiel q ue sabe
s aborear o seu Credo encontra nêle de antem ão
as alegrias da b em -aventurança.
D e que doçura inebriam a alm a os cânticos tão
simples quão m agníficos da M issa solene! N as
M issas rezadas as palav ras deslizam como água
rápida e m u rm u re ja n te de regato, rebrilhando em
palhetas fu g itiv a s; nas M issas solenes, os textos
cantados avançam com a m a jestad e de rio cau da­
loso que re fle te n as águas a luz deslu m b ran te do
sol e o céu inteiro.
A o o fertó rio , o diácono sobe ao a lta r ; aí re ­
p re senta o povo: som os nós que, com êle, subim os
os mesm os d egraus. D erram a o vinho no cálice, e
tam bém o fazem os; o subdiácono acrescenta alg u­
m as gotas de água. E sta água rep resen ta todos
CA P. n . A A SS IS T Ê N C IA 169

nós que nos unim os a C risto p a ra se r o fereci­


dos. •
O sacerdote incensa as oblatas, o cru cifix o , o
alta r, que representam C risto. In censando ju n ta ­
m ente com o sacerdote, assem elham o-nos àqueles
que perfu m am as p ró p rias cabeças, porq u e q ue­
rem em belezar e h o n ra r a p a rte m ais im p o rtan te
de si mesmos. Como o u tro ra a M adalena, d e rra m a ­
mos sôbre C risto tudo que tem os de m ais delica­
d o . . . E m seguida o incenso é o ferecido ao o fi­
ciante, ao Clero, aos assistentes: o p e rfu m e desce
da Cabeça p a ra todo o Corpo M ístico, p aten tean­
do assim a união dos m em bros com seu C hefe
adorável.
Começa então o p refácio. Com tfm tom de voz
solene e g rave que acentua, p o r assim dizer, o sen­
tido de cada palav ra, dialogam os com o sacerdo­
te : “ L evantai os corações ao a lto !’’ . . . E respon­
dem os: "A ssim os tem os p a ra o S en h o r.” “ D e­
mos graças ao Sen h o r nosso D eus” , continua o
oficiante. R espondem os: “ É verd ad eiram en te dig­
no e ju sto .” P o r que êste colóquio e n tre o sacerdo­
te e os fiéis? S an to A gostinho responde-nos: p or
estas respostas a firm am o s pública e o ficialm ente
que nossos corações estão levantados p a ra o alto,
p a ra o a ltar, p a ra colab o rar com a consagração que
vem logo após. E r a necessário que, neste m om ento
solene, se requeresse nossa adesão c nosso con­
sentim ento na celebração do S acrifício, sendo nós
cooperadores de C risto que vai im olar-se.
P o r aí se vê com q ue po d er a L itu rg ia da S.
M issa cantad a nos faz sub ir “até ao a lta r do S e­
n h o r” , e com q ue m ajestad e nos faz d esem penhar
nosso papel de concelebrantes.
E é p o r isso que, depois de te r louvado e a d o ra ­
do a S antíssim a T rin d a d e com o tríplice “Sanc-
tu s,” devem os recolher-nos: é chegado o m om en­
170 T E R C E IR A P A R T E

to de u n ir intim am ente a n ossa vontad e à do sa-


cerdíJle q ue p ronuncia a fó rm u la da co nsagra­
ç ã o . . . Êle p r o n u n c ia - a ... E is C risto que aco rre
ao apêlo do sacerdote, intercesso r do seu C orpo
M ístico! N osso C hefe está no meio de n ó s ! .. .
P ro strem o -n o s em a d o r a ç ã o ... Q u e sejam dados
“ louvores e bênçãos” ao C hefe, p resente em nosso
a l t a r . . . 2 Q u e “ p o r Êle, nÊle, e com Êle, tôda
a honra, tôda a gló ria subam ao P ai onipotente
em unid ad e com o E sp írito S a n to !3 O s instantes
que vão da elevação ao " P a te r ” d everiam p e rd u ­
ra r sem pre!
O sacerdote eleva novam ente a voz. R espon­
dem os-lhe p o r um “A m en,” que deve ser um a a f ir ­
m ação de nossa união com C risto e de nossa fc.
E m seguida o celebrante começa a o ração ensinada
pelo nosso C hefe: P adre nosso que estais no c é u . ..
E sta o ração do S en h o r é repetid a em nossos a lta­
res pelo pró p rio C risto, porque, não o duvidem os,
sob os véus eucarísticos Je su s está todo inteiro
entregu e à “sua" M issa, e pro n u n cia conosco sua
oração sublim e. R espondem os p o r esta súplica fi­
nal: “L ivrai-n o s do m al” , isto é, do pecado, do de­
m ônio, de tudo que p oderia, sep arando-nos do Che­
fe, nossa Cabeça a d o rad a, ser causa de nossa fatal
ruína: tal é o b rad o de nossos corações!
É o m om ento d a S. Com unhão. O fiel q ue vive
da L itu rg ia sente-se verd ad eiram en te unido a C ris­
to. J á com unga de coração e de sentim entos com
Ê l e . . . e vai co m ungar sacram en talm en te: é o m o­
m ento de p a rticip ar da m anducação da V ítim a . . .
eis que já se encam inha p ara a sag ra d a m e s a ...
ou, se perm anece em seu lugar, p orque já recebeu
o Corpo de C risto na M issa d a m anhã, o fiel pro-

2) Hino ‘‘Pange língua”.


3) Cânon.
CA P. I I. A A SS IS T Ê N C IA 171

cura recebê-L o espiritu alm en te em seu coração, p o r


um ato de a m o r e de ard e n te desejo. •
E logo após entoam os o cântico de ação de g ra ­
ças p o r m eio da an tífo n a cham ada com únio. Como
é co n so la d o r! . . . E p o r ú ltim o pedim os a graça de
em pregar, segundo as vistas de D eus, os bene­
fícios recebidos: é êste o objeto das últim as o ra ­
ções.
“ Ide-v o s! A cabou-se a M issa” . — “D em os g ra ­
ças a D e u s!” respondem os alegrem ente. E , logo
após, inclinando a cabeça, recebem os da S an tíssi­
m a T rin d a d e a bênção do P ad re, do Filh o e do
E sp írito S a n to ! Som os abençoados, e como não
o seríam os, nós, concelebrantes de C risto ?
...F ic a m o s adm irad o s de certos fiéis p re fe ri­
rem a M issa rezad a à M issa c a n ta d a . . . E ainda
quando ouvim os certos cristãos a firm a re m con­
vencidos: “ P re firo as M issas b r e v e s ... as M is­
sas solenes são interm ináveis", só tem os que las­
tim á-los ! Êsses ain d a n ad a com preenderam da “su a ”
M issa, do seu papel de m em bros de C risto, da
hom enagem q ue o Corpo M ístico, unido a seu
Chefe, rende à Santíssim a T rin d ad e. Êsses ne­
cessitam ain d a de ser educados d o u trin al e li-
tu rg ic a m e n te .. . Q u e as alm as já in stru íd as não
hesitem em ex p a n d ir suas luzes nas m entes desses
cristãos infelizm ente ainda im ersos na som bra.

Que pensar dos cânticos


populares durante a S. Missa?
E m certos lugares, p o r ocasião das solenidades,
costum a-se c an tar, d u ra n te as M issas rezadas,
cânticos em língua v u lg ar ou m otetes em latim.
P rocede-se assim p a ra “a tr a ir ” os assistentes, to r­
nando-lhes a S. M issa “m ais ag rad áv el” . A lém dis­
so acom panham -se os cânticos e os solos com m úsi­
172 T E R C E IR A PA R TE

ca a rtística, a fim de m ais a tr a ir o povo aos


atos A .
Q ue devem os p en sa r dêsses diversos u so s? E m
prim eiro lu g ar devem os la stim a r q ue a educação
litúrgica dos fiéis n ão e steja suficientem ente des­
envolvida p a ra fazer-lhes p re fe rir sem pre a M issa
cantada a essas o u tra s M issas, n as q uais o reco­
lhim ento é sem pre m e n o r .. . M as, já que o povo
cristão aprecia e conta com êsses cânticos, não se
pode cond en ar um uso que a Ig re ja au to riza. E
m esmo devem os c o n fessar que êsses cânticos em lin­
guagem po p u lar podem alim en tar a oração de m ui­
tas alm as pouco litúrgicas, q ue não saberiam co­
mo dirig ir-se a D eus se não lhas fizessem bal­
buciar.
T odavia, devem os ap o n tar d u as condições acer­
ca do uso dos cânticos:
1.° É preciso escolhê-los com cuidado. H á cân­
ticos cheios de d o u trin a e de ensinam entos sôbre a
S. M issa, a presença real, a redenção, a incarnação,
cuja letra eleva aqueles que os entoam ao pensa­
m ento dos M istérios que se com em oram no altar.
Esses são os cânticos que se deve m a n d a r cantar.
Os San to s com puseram m uitos d esta form a. O s
do bem -aven tu ran d o P a d re de M o n tfo rt to rn aram -
se célebres: as populações d a B retan h a e da V en-
déia devem em g ra n d e p a rte às suas poesias ad ­
m iráveis a g raça de conservarem tão p u ra e fir­
me a d o u trin a da E u caristia.
M as, a p ar dessas “preces c a n tad as” , que não
prejudicam a celebração, há composições insípidas,
grosseiras e ôcas q ue a m oda introduziu e que não-
são p ró p rias p a ra in sp irar aos fiéis sentim entos de
união com C risto que se im ola. D eve-se om itir
êsses textos, que mais preju d icam a p iedade que a
auxiliam .
CA P. II. A A SS IS T Ê N C IA 173

E sta ú ltim a razão fa rá ap re c ia r no seu ju sto va­


lor as audições m usicais d u ra n te a S. M issa.*Ê stes
concertos, que se dizem litúrgicos, a traem à ig re­
ja um a m u ltidão num ero sa q ue enche generosa­
m ente a b an d eja do peditório. M as acaso estam os
certos que essa m úsica religiosa favoreça a assis­
tência à S an ta M issa e a cooperação dos fiéis ao
Sacrifício de C risto ? M uitos m em bros do C orpo
M ístico p resentes em a nave da igreja não estarão
m ais preocupados com o ó rgão do que com o a lta r?
N ão estarão m ais atentos aos canto res que ao ce­
le brante? A lguns am antes da a rte opinam que
nunca se o ra tão bem com o em balados nas ondas
dessas h a rm o n ias; será isto verd ad e p rovavelm en­
te p a ra êles, m as os d esta espécie não serão m í­
nim a exceção? N o entan to os fiéis, em geral, não
têm p e sar de d e ix ar sua atenção d esviar-se da
im olação de C risto: ao m enos terão essa desculpa,
aliás valiosa, que “a a rte é um louvor a D eu s” ?
Q u an to essas M issas acom panhadas de cân ti­
cos ex tra-litú rg ico s estão longe da v erd ad eira M is­
sa solene c a n ta d a ! Só esta ú ltim a possui o segrê-
do d a v erd ad eira celebração, porque, em vez de
su b o rd in a r a piedade à a rte , coloca a a rte m usi­
cal ao serviço respeitoso e incessante da L itu r­
gia.
2.° ê preciso saber in terrom pê-los nos m om entos
solenes. Se os cânticos bem escolhidos, tolerados
du ra n te as M issas rezadas, são pró p rio s a fazer
o ra r e re fletir, é necessário, contudo, d e ix a r às
alm as um intervalo p a ra v o ltar aos seus pensam en­
tos e m editá-los. H á d u ra n te a S. M issa m om en­
tos nos quais convém o silêncio. D o p refácio ao
“ P a te r” , só a cam painha da elevação deve soar. N o
instante em q ue o céu e a te rra se unem , coisa al­
gum a deve p e rtu rb a r o recolhim ento.
174 T E R C E IR A P A R T E

Com o h a b itu ar, p o r exem plo, as crianças a ado­


ra r Voluntária e p ro fu n d am en te a C risto se, ju s ­
tam ente 110 m om ento em que o sacerdote se incli­
n a sôbre o a lta r p a ra co n sag rar, são o brigadas a
rep e tir todos, em côro, as estro fe s e os estribi­
lhos?
As explicações p ara a assistência
à “m inha” Missa
Em alguns países, o Clero tem o costum e, para
fazer co m preender os santos M istérios aos fiéis,
de exp licar aos assistentes em ocasiões favoráveis,
p or exem plo d u ra n te os retiro s e as m issões, a L i­
tu rg ia do sacrifício da S. M issa, à m edida que ela
se desenvolve an te seus olhos. E m m u itas dioce­
ses os exercícios d e catecism os p rep a ra tó rio s p a ra
as Com unhões solenes requerem um a S. M issa às
q uintas-feiras, d estin ad a a p ro p o rcio n ar às cria n ­
ç as a educação eu carística prática.
E n qu an to o sacerdote celebra, o u tro sacerdote, do
p úlpito ou da b alau strad a, ensina às crianças e
aos adultos a aco m p an h ar e a co m preender cada um
dos gestos litúrgicos. P ro c u ra tam bém associar
as crianças às orações q ue o celebrante recita,
fazendo-as p ro n u n c ia r com êle o C onfiteor, o K y-
rie, o G lória, o C r e d o .. . D e vez em q u ando a ex ­
plicação é interro m p id a p o r algum cântico bem es­
colhido, q ue ex p rim a p e rfeitam en te os sentim en­
tos que devem encher seus corações.
É fácil d ep reen d er o resu ltad o que pode a d vir
desta “assistência explicada” . É u m a lição de coisas,
dem onstração concreta, acom panhada pelo exem ­
plo e pela oração. T em a vantagem de g ra v a r no
espírito e n a m em ória d as crianças q ue se p re ­
p aram p a ra a p rim eira C om unhão as cerim ô­
nias do santo S acrifício e seus ensinam entos. D o
em prego dêste m étodo vem p rovavelm ente o apê-
go que, em certos lugares, os cristãos conservam
à “su a ” M issa e ao sacerdote.
CA P. II. A A SS IS T Ê N C IA 176

H á sacerdotes que se to m a ra m m estres neste


gênero de explicação da S a n ta M issa. Sabeifl d a r
às suas explicações clareza, sobriedade, sim plici­
dade, variedade, piedade. T a n to as criancinhas co­
mo os adultos, q ue acorrem a estas M issas, acom ­
panhad as em com um , m anifestam , pela atenção e
p ra z e r q ue m ostram , um interesse especial. P o r
que não im prim ir e esp alh ar os m elhores dêsses
m étodos? C ontribuiriam p ara in sp irar a o u tros
apóstolos a idéia de apro v eitarem dêles p o r sua
vez.
Quando devo celebrar
a "m inha” Missa?
É evidente que aos dom ingos e em tôdas as
festas de preceito. É êste o dev er m ínim o a que
todo fiel está obrigado. Q uem sabe o q ue é a
“su a ” M issa, o que vale, qual o papel que reali­
za no m undo, qual o p roveito que D eus e nós de­
la tiram os, deve reconhecer que a Ig re ja exige
m uito pouco, o brigando-nos a a ssistir ao san to S a ­
crifício e a ex e c u ta r o ato suprem o de religião
só um a v e z por sem ana, aos dom ingos.
Êstes mesmos fiéis concluirão que, se querem
“p a g ar am o r com a m o r” , devem te r p o r re g ra ce­
le brar a “su a ” M issa o m ais frequ en tem en te pos­
sível.
Como se deve en ten d er esta expressão: "o m ais
frequentem ente possível” ?
O m em bro de C risto, desejoso de realizar seu
papel no C orpo M ístico, co m preenderá que tôdas
as vêzes que u m d ever de estado ou u m im p e­
dim ento razoável n ão o im peça de ir à ig reja, seu
lugar é cada m an h ã ju n to ao santo altar.
U m d ever de estado é, p o r exem plo, o cuida­
do que um a m ãe de fam ília deve d a r a seus fi­
lh o s; é a obrigação que tem o operário de sair
m uito cedo p ara seu tra b a lh o ; é a necessidade de
velar um doente.
176 T E R C E IR A P A R T E

U m im pedim ento razoável é a fadiga, a dis-


tâncift, a in tem périe d as estaçõ es; m as não será
im pedim ento a preguiça, a vo n tad e de d o rm ir, a
in d o lê n c ia .. .
Cada fiel exam ine, pois, o que lhe é perm iti­
do, segundo as circunstâncias. U n s dirão que p a ra
êles a assistência m ais freq u en te possível é a de
cada do m ingo; p a ra outro s, porém , a de cada dia.
Como não som os nós, m as a Pro v id ên cia ^divina
que determ ina nosso papel e nossa situação neste
m undo, co rresponderem os aos planos divinos assis­
tindo à S. M issa com a frequência que D eus nos
concede, contanto que sejam os leais e que com ­
pensem os nossas ausências m atinais à ig reja, com
um sincero p e sar de serm os obrigados, in v o lu n taria­
m ente, a p riv ar-n o s dela.
P o r esta razão a m ãe de fam ília, obrigada a
ficar em casa p a ra ate n d e r a m uitos filhos, não
será m enos favorecida sobrenatu ralm en te, contan­
to que tenha um fe rv o r igual, do que a jovem ,
sem encargos nem cuidados, que freq u en ta tòdas
as m anhãs a S a n ta M issa. A segunda deve m ulti­
plicar seus louvores a D eus, substituindo a p ri­
m eira. . . É neste caso que deve h av er so lid arieda­
de e com unhão e n tre as alm as. D eus d ar-n o s-á a
cada um seu quin h ão com pleto de g raças, em tro ca
das M issas que tiverm os a possibilidade de cele­
brar.
Cada um de nós deve p e n e tra r bem esta verdade,
na qual é preciso insistir se m p re ; a ausência des­
culpável à ig reja não ju stific a , da p a rte dos m em­
bros de C risto p rivados p o r ou tro s deveres, um
esquecim ento com pleto de “su a ” M issa. Se qui­
serem a p ro v e ita r de um m odo p e rfeito d a assis­
tência d a S. M issa de dom ingo, necessitam u nir
cada dia sua intenção à S a n ta M issa, e realizar a
“su a ” celebração ao menos com o desejo. Ê ste
CAP. I II . A COMUNHÃO 177

pensam ento deve ser expresso todos os dias na


oração d a m anhã. É p a ra la stim a r que não* § eja.
bem ex presso nos form u lário s de orações já ex is­
tentes. Ê ste desejo de “su a ” M issa associaria,
de modo volu n tário e preciso, cada um dos m em ­
bros do corpo M ístico à oblação do C hefe divi­
no, e fa ria com que p articipassem m ais d ire ta ­
m ente dos fru to s do S acrifício.
P rocu rem , p o rtan to , as alm as piedosas e unidas
a C risto, im possibilitadas de ir à ig reja, celebrar
espiritualm ente tôdas as m anhãs em união com o
sacerdo te de sua P aró q u ia, e em geral com todos
os sacerdotes q ue celebrarem M issas d u ra n te todo
o dia em todo o m undo.
T enh am ainda o cuidado de ensinar às c rian ­
ças desde pequeninas a se u nirem ao santo S a­
crifício, a fim de que desponte nelas esta pieda­
de essencial a todo m em bro de C risto: a estim a
e o am o r à S an ta M issa.

C A P ÍT U L O III

A COMUNHÃO
A COMUNHÃO DEPENDE DE TAL MODO DO SACRIFÍCIO
DA MISSA QUE DELA NAO SE PODE SEPA RA R... POR
CONSEQUÊNCIA, O MEMBRO DE CRISTO DEVE COMUN­
GAR SACRAMENTALMENTE EM “SUA” MISSA O MAIS
FREQUENTEMENTE POSSÍVEL. AO MENOS E SPIR I­
TUALMENTE.
A S. Comunhão faz parte
Integrante do sacrifício
N ão ra ro os fiéis têm o hábito de co n sid erar a
S. M issa e a S. Com unhão com o dois ato s intei­
ram ente separados. A M issa p a ra m u ita gen te não
é, como se disse acim a, senão “o meio de se obte­
rem hóstias con sag rad as” . D e o u tro lado os cris­
tãos se têm acostum ado de tal fo rm a a contem plar
o benefício m aravilhoso e tão com ovedor da “p re ­
178 T E R C E IR A P A R T E

sença re a l” , separad o do sacrifício da M issa, que


m u itfs alm as se to m aram de u m a devoção tão
vivã ao divino tabernáculo q ue o fuscou a seus
olhos, quase com pletam ente, a devoção à S a n ta
M issa.
Cada um dos m istérios, na piedade cristã, deve
te r seu lugar, segundo a o rdem e a im portância
do m e s m o ... A S. Com unhão, m istério de am or
infinito de Cristo, está não som ente ligada ao S a­
crifício, m as depende dêle, a êle deve seu v alo r e
sua existência, e não se pode dêle separar.
Q ue é a sag rad a Com unhão? A recepção de um
dos sacram entos p o r m eio do qual se com unica a
nós o benefício do G ólgota, isto é, a “ nossa”
M issa.
O S acrifício do C alvário apresen to u a D eus os
m éritos infin ito s de Jesu s C risto. P ela sua im ola­
ção sanguinolenta, o S alv ad o r depositou nos cu­
mes das “m on tan h as e tern as” (S I 75, 5) o in­
sondável reserv ató rio de g raças e de perdões. Como
poderem os nêle h a u rir, nós, fraco s m o rtais que
h abitam os nesta te r r a tão a fa sta d a dos céus?
A plicando à nossa bôea os canais que descem dessa
“ m ontanha do S e n h o r”, e que nos trazem “a água
que jo r r a a té à vida ete rn a ” ( J o 4, 14) com in fi­
n ita abundância, podem os saciar-nos à vontade,
líste canais são os sete S acram entos. T o d o s ju n ­
tos, porém , não têm valo r senão pelo S acrifício
de C risto, sem o qual seriam vazios. T êm apenas
o fim de com unicar-nos os fru to s.
O ra, en tre êstes sete S acram entos, todos intim a­
m ente ligados ao G ólgota, a E u c a ristia tem , em
relação ao Sacrifício de C risto, um lu g a r que se
pode ch am ar “sem igual” . A E u c a ristia é de todos
os sacram entos o m ais ligado à oblação, pois que
se origina do p ró p rio ato de im olação de C risto.
É possível ter em vista a C om unhão, isto é, a re­
CAP. m . A COMUNHÃO 179

cepção do S acram ento eucarístico, sem co n sid erar


ao m esm o tem po a su p rem a o fe rta , n a qual Ê le
tra n sfo rm a o p ão em seu C orpo e o vinho em seu
Sangue ?
U m m em bro de C risto não pode, pois, sep a rar
do pensam ento e do coração a C om unhão d a “ su a ”
M issa. A C om unhão é, p a ra êle, an tes de tudo,
a m ais ín tim a p articipação do Sacrifício de C risto.
E sta m anducação tem p o r efeito im ediato e direto
u n ir a alm a do com ungante à do Salv ad o r, p e r­
m itindo d êste m odo ao pequeno m em bro de C ris­
to iden tificar-se in tim am ente aos atos de a d o ra­
ção e de hom enagem do Sum o Sacerd o te e re ­
ceber um a inundação dos m éritos da C ruz.

A liturgia mostra-nos a mútua dependência


da comunhão e do sacrifício
A Ig re ja , que n ão e rra jam ais em suas in te rp re­
tações d as verd ad es ocultas, revela-nos p o r meio
d a sua L itu rg ia o laço que u ne a Com unhão ao
sacrifício da M issa.
1.° N ã o pode haver presença eucarística sem
que o sacrifício da S . M issa seja celebrado. R eal­
m ente, é im possível h a v e r E u c a ristia sem ren o­
var-se o sacrifício da M issa. N ão h á o u tro meio
de se o b ter a C om unhão. E não é êste o sinal da
vontade de D eus q ue fiquem unidas q u an to pos­
sível su a presença perm an en te na E u c a ristia e sua
im olação na S. M issa?
E is p o r que a santa L itu rg ia une estreitam en te
a presença real e a C om unhão à celebração d a S an­
ta M issa, e nos recorda que o “T om ai e com ei” é
“ realizado cada ypz em m em ória da P a ix ã o de
C risto” .
2.° Tam b ém não pode ha ver sacrifício com ple­
to da M issa sem C om unhão. S e C risto n ão pôde
dar-se em alim ento a seus m em bros fo ra de seu
Sacrifício, tam bém não quis que êste sacrifício
180 T E R C E IR A P A R T E

se pudesse ex e c u ta r sem que Êle se to rn asse nos­


so alim ento. O sacerd o te que celebra é obrigado
a com ungar, sem o q ue não d iria M issa; o fiel,
que cum pre o preceito dom inical, n ão deve sa ir da
igreja sem te r assistido à C om unhão do sacerdo­
te, porque falta ria à “ su a ” M issa.
P o r que a Ig r e ja procede assim ? P o rq u e o
sacerdote, sendo o re p resen tan te o ficial de C risto
no a lta r em prim eiro lugar, e do povo logo após,
deve p ro v a r p o r um a t a ex te rio r e público a união
de C risto com seus m em bros, e dos m em bros com
a Cabeça, n a o fe re n d a do san to S acrificio. Ê ste
ato oficial e v isível d a união dos m em bros com a
Cabeça é a m anducação da V itim a divina que faz
o oficiante. N ão teríam os razão, se víssem os na
C om unhão do sacerd o te apenas um a p rá tic a des­
tinada a satisfa z e r a piedade pessoal do celebran­
te. S eria não com preender o alcance d a p a rte que
tom am os em “nossa” M issa. O sacerdote com un­
ga em nosso nom e, como pouco an tes con sag ra­
va em nosso nom e. É o nosso delegado, o nosso
m andatário no a lta r, d u ra n te todo o tem po da obla­
ção. T odos os seus gestos interessam aos assisten­
tes: só em segundo lu g ar é q ue seus atos se d es­
tinam a alim en tar seu pró p rio ferv o r. A sua Co­
m unhão supõe que-, pela união de nossa v ontade
com a sua, nós tam bém nos unim os oficial e ex te ­
riorm en te ao C orpo e ao San g u e de Je su s C risto :
eis o que significa a nossa p resença ob rig ató ria à
C om unhão do sacerd o te e a atitu d e respeitosa e
recolhida q ue devem os ter n este m om ento solene.

Deveríamos comungar sacramentalmente


tôdas as vêzes que celebramos “nossa” Missa
A s considerações que acabam os de e x p o r levam-
nos a um a conclusão lógica: os m em bros do C or­
po M ístico, presentes à S a n ta M issa, não deveriam
d e ix a r só ao sacerdote o encargo de uni-los ao
CA P. I II . A COMUNHÃO 181

C hefe pela m anducação da san ta V ítim a, m asfc já


que lhes é “o rd en ad o ” com ungar, devem se r so­
lícitos em fazê-lo logo após o celebrante.
O encargo de consagrar p ertence exclusivam en­
te ao oficiante, o rdenado pela Ig re ja p a ra êste
fim. O s leigos, ain d a que p articipem do sacerd ó­
cio de C risto, em vista do seu “e n x erto batism al” ,
não tem , e n tretan to , p oder p a ra m u d a r no Corpo
do Sum o S acerdote a hóstia que está no a ltar,
nem tra n su b sta n c ia r o vinho contido no Cálice.
E is po r que, no m om ento em que o sacerdote se
inclina p a ra p ro n u n c ia r a fó rm u la onipotente, os
fiéis têm apenas a p a rte da “colaboração d as von­
tades” no ato da o fe re n d a da V ítim a in fin ita a
Deus. M as, chegado o m om ento da Com unhão,
a p a rte do m em bro do Corpo M ístico é diferen te.
N esta p a rte da S. M issa pode agir por si m esm o,
e com o m esm o d ireito que o sa c e rd o te ; pode exe­
c u ta r um ato e x terio r, visível, oficial, de adesão
a C risto, aproxim ando-se da sa g rad a m esa. A ssim
particip a da divina V ítim a, que, ó felicidade! é o
Corpo real de C risto com su a A lm a e sua D ivin­
dade, tão vivo e tão p e rfeito como o sacerdote
O recebeu na sua p ró p ria Com unhão. Q ual o m o­
tivo, pois, que pode im pedir os m em bros de Cristo
de se disporem a com ungar tôdas as vêzes que,
vindo à Ig re ja , têm a g raça de ouv ir a S an ta
M issa?
Fican d o em seus lugares, com o fazem certos
fiéis, com preju ízo próprio, m ostram -se su rd o s aos
apelos instan tes de seu C hefe que os cham a com
instância: " E u vos d arei a m inha C arne a com er
e meu S angue a b e b e r .. . A quêle que não com er
a m inha C arne não te rá em si a vida.” ( J o 6, 54.)
“ T om ai e c o m e i.. . bebei dêle todos.” (M t 26, 27.)
Cristo talvez jam ais tenha dad o avisos m ais in­
sistentes do que os que se referem à m anducação
182 T E R C E IR A P A R T E

de seu C orpo: reclam ava p a ra seus m em bros fu ­


tu ro s união a m ais com pleta possível ao ato do
Sacrifício que ia ren o v ar cada dia cm nossos a lta­
res.
P o r isso o m em bro de C risto, q ue bem com preen­
de a “su a” M issa e que a Ê le se q u e r u n ir devida­
m ente, deve te r su a alm a em estado de com ungar,
tòdas as vêzes que o ferece o S acrifício com o sa­
cerdote. O fiel p resen te an te o a lta r não será, pois,
em tôd a a fôrça da expressão, co-oblato e concele-
bran te senão q u ando particip a de “su a ” M issa em
tôda a extensão q ue C risto lhe perm ite, ou m elhor,
o convida a p artic ip a r dela. Só neste caso te rá
h aurido de “su a ” M issa todo o resultado que po­
de tira r, tan to p a ra a gló ria de D eus, qu an to p a ra
seu bem pessoal e p a ra o alívio d as alm as do p u r­
gatório.
Além disso, êste estado de alma, exigido p a ra
com er a C arne d a V ítim a im olada, não se rá tam ­
bém um a condição indispensável não som ente p ara
com ungar, como p a ra co operar devidam ente com a
o ferend a de um fiel que nesse m om ento estives­
se indigno de receber a C risto com o sacerd o te? P o ­
de-se, pois, enu n ciar esta v erd ad e: “Só se pode u n ir
perfeitam en te à S. M issa o fiel que se ache n as
disposições de p o d er com u n g ar” . O m em bro a fa s­
tado da sa g rad a mesa, devido às suas faltas, é
m em bro m orto. M as, se êste m orto fizer reviver,
po r meio da C onfissão sacram ental, o “en x e rto ”
que o liga ao C hefe p a ra que re ad q u ira o p o d e r de
ofere ce r com Êle, então n a d a lhe im pedirá, vol­
tando a to m ar p a rte no S acrifício, de tra n sp o r o
cam inho que o se p ara da sag rad a M esa.
P o r q ue se te rá perd id o em nossos tem pos a
noção do laço íntim o q ue une a S a n ta M issa à
Com unhão? Q u an to s fiéis vêm a ssistir ao santo
S acrifício, não só sem p e n sa r em com ungar, m as
CA P. I II . A COMUNHÃO 183

até sem exam in ar-se se estão so b ren atu ralm en te ap ­


tos a fazê-lo. Com o está longe de nossas p iá tic as
atu ais o espírito que anim ava os fiéis da p rim iti­
va Ig re ja !
N esses tem pos de fé p ro fu n d a todos os assisten­
tes se aproxim avam d a sa g rad a m esa: até as
criancinhas recém -batizadas recebiam a E u c a ristia!
S. Ju stin o escreve: "O s m in istro s que cham am os
diáconos distribuem a todos os assisten tes o pão, o
vinho e a água consagrados, e os levam aos a u ­
sentes.” 1 O s doentes, os presos, os m á rtires não
eram esquecidos. A ssim a com unidade cristã, isto
é, todo o Corpo M ístico oferecia e se oferecia d e­
liberadam ente com seu C hefe e evidenciava, p or
meio d a sua solicitude em alim en tar-se da V ítim a
do S acrifício, o a rd o r com que se unia a ela na
oblação.
Devemos comungar ao menos espiritualmente
tôdas as vêzes que celebramos “nossa” Missa
M as êstes belos tem pos p assaram , e até que
m elhor com preensão d esta d o u trin a p en etre a m as­
sa dos fiéis, m uitos m em bros de C risto, mesmo
os mais dignos de se apro x im arem do a lta r pela
pureza de sua consciência, ficarão em seus luga­
res no m om ento da Com unhão.
N ão pensem os fiéis, e n tretan to , que, ou p or
não se ju lg arem dispostos, ou porq u e ainda não
se decidiram a alim entar-se da C arne sagrada, essa
abstenção da C om unhão sacram ental os dispensa
de tôda colaboração na C om unhão do sacerdote.
D a m esm a fo rm a que na elevação, os concele-
brantes deviam , em espírito, c o n sag rar o pão e
o vinho, unidos à v o ntade do oficiante, e ap re­
sen tar a D eus a V ítim a in fin ita ju n ta m e n te consi­
go e com os o u tro s m em bros do C orpo M ístico.
A ssim na C om unhão os m em bros de C risto devem

1) 1.» Apol. C rist., 65.


184 T E R C E IR A P A R T E

de algum a form a com u n g ar com C risto. Sem esta


m andiicação da V ítim a, a “su a ” M issa fic a rá in­
com pleta. E com a S. Com unhão, su a p articipação
com C risto no seu Sacrifício pode ser considerada
um a v erd ad eira celebração.
E sta união na S. C om unhão realiza-se pelo fiel
desde o m om ento que tenha a intenção geral de
unir-se a tôdas as p a rte s da S. M issa: pelo m es­
m o ato se u ne ao sacerdote que com unga, como se
tinha unido ao sacerd o te oferecendo a oblação e
consagrando-a. E sta intenção, ao m enos im plícita,
de unir-se à C om unhão é o m ínim o requerido pelo
Chefe, dos concelebrantes que em “su a" M issa se
não aproxim am do sacram ento d a E ucaristia.
A m aio r p a rte dos fiéis, q ue observam o p re­
ceito dom inical sem p ro c u ra r frequ en tem en te ali­
m entar-se do Pão celeste, não devem esquecer-se
que, sem esta união à C om unhão oficial do sacer­
dote, n ão satisfazem às exigências da celebração
do divino S acrifício. P o r esta razão, o fiel que sai
da igreja antes da C om unhão do sacerdote fa lta
ao preceito. P o r esta razão, tam bém , aquele que
deixasse de se u n ir, ao m enos p o r um a intenção
geral piedosa, aos ato s do celebrante, dos quais
a S. C om unhão é um dos p rincipais, êsse tam bém
não ouviria M issa.
T odavia, se é suficien te êste m ínim o d a C om u­
nhão espirtual, os fiéis devem p ro c u ra r ir m uito
além, p roduzindo atos explícitos e vo lu n tário s de
desejo da recepção sacram ental. Isto lhes d a rá
um m eio de su p rir, tan to q u an to possível, a falta
da m anducação da C arn e sagrada.
O s m em bros de C risto d everiam aperfeiço ar-se
tan to m ais n este exercício da C om unhão espiritual,
quanto , em m uitos casos, a té as pessoas m ais bem
intencionadas n ão podem realm ente ap ro x im ar-se
da sa n ta m esa em cada M issa que celebram
CAP. i n . A COMUNHAO 185

com Cristo. P o r exem plo, o cristão piedoso que,


tendo no dom ingo com ungado n um a prim eira» M is­
sa que assistiu pela m anhã, volta à o u tra M issa
com a intenção de u n ir-se à celebração solene, não
te rá de contentar-se com a C om unhão espiritu al?
Do mesmo m odo, as alm as cheias de zêlo q ue assis­
tem sem pre que podem as d uas, trê s e m ais M is­
sas . . . só com ungam sacram entalm ente em u m a . . .
m as é-lhes necessário, se q uerem p a rtic ip a r p e rfe i­
tam ente das diversas oblações, com ungar espiri­
tualm en te em cada um a delas. Q u an to s doentes,
m ães de fam ília, pessoas q ue m oram longe da
igreja, achando-se na impossibilidade m aterial de
se apro x im arem da sag rad a m esa todos os d om in­
gos, só com a sua C om unhão espiritual é que têm
a possibilidade de asse g u ra r sua plena p articipação
110 S acrifício, sem a recepção do S acram ento.
P a ra êsses, é evidente que um a união intencio­
nada e ferv o ro sa à C om unhão oficial do sacerdote
lhes assegura a colaboração na o feren d a do Gól-
gota, renovada no altar.
O s m em bros de C risto devem , pois, ser m uito
solícitos em sua C om unhão espiritual, e não se
co n tentar de fazê-la com um a intenção geral b as­
tante vaga “de a ssistir à M issa” ; devem p rep a­
rar-se com cuidado, u nindo-se v erd ad eiram en te p o r
seus sentim entos de adesão à C arne e ao Sangue
divinos, para realizarem um a fervorosa celebração
de “ su a ” M issa.
T odavia, p o r m aio r que seja a perfeição de sua
Com unhão espiritual, devem os fiéis co m preender
que ela está bem longe de te r p a ra su as alm as o
valor da união sacram ental, oficial e e x te rio r, ao
Sacrifício que celebram , fo n te m aravilhosa dos
mais suaves fru to s in teriores. P o r isso, deveriam ,
sem pre que um im pedim ento m aterial n ão se lhes
oponha, alim entar-se, em união com o sacerdote
186 T E R C E IR A P A R T E

que os rep resen ta no a lta r, da C arne viva e glo-


riosa»do F ilh o de D eus.
Posso comungar fora
da “m inha” Missa?
O sacram ento da E u c a ristia está de tal m odo uni­
do ao divino S acrifício, que bem pode nos v ir a
dúvida de q ue o fiel dem o n stre um a fa lta de sen­
so dou trin al e litúrgico, q u ando com unga fo ra de
“su a” M issa.
A esta questão só se pode responder com a a f ir ­
m ativa. E p a ra isso é óbvio estabelecer o princí­
pio seguinte: “U m fiel não deve, jam ais, se não
tiver um a razão su ficien te para fazê-lo , se p arar
m aterialm ente a sua C om unhão de sua M issa. Se
fô r obrigado a receber a " su a ” C im unhão fo ra de
“su a ” M issa, não deve, contudo, se p a ra r esp iritu al­
mente um a da o u tra .”
1.° U m fie l, que não tem razão su ficien te, nu n­
ca deve separar m aterialm ente a “su a " C om u­
nhão de “sua” M issa. A v eracidade desta a sser­
ção deduz-se de tudo que foi d ito no p resen te vo­
lume. A S. C om unhão é um ato que faz p a rte da
celebração de “ nossa” M issa. “ A C om unhão não
é sobretudo um ato de intim idade m ais ou m enos
afetuoso com N osso S e n h o r ... é o meio p o r ex­
celência de p articipação do S acrifício .” E p o r que
pro c urar-se então, sem h aver sérias razões, sep a rar
o que C risto tão intim am ente u n iu ?
É po rta n to incom preensível a a titu d e de certos
fiéis que se ap ressam a com ungar antes da S. M is­
sa, m esm o tendo de assisti-la até ao f i m . . . ou a
daqueles que, deix an d o o sacerdote te rm in a r a ce­
lebração, só se apresentam à sag rad a m esa depois
das orações ao pé do a l t a r . . . E sta s anom alias
caprichosas são, aliás, m uito frequentes. O s p re­
te xtos alegados p a ra legitim ar um tal procedim en­
to não têm o m en o r v a lo r: algum as pessoas dizem
que rezam m elhor d u ra n te a M issa q u ando em
CAP. n i . A COMUNHÃO 187

lôda ela fazem a ação de g ra ç a s ; ou que acom pa­


nham m elhor a “su a ” M issa quando não são«“dis-
tra íd a s” no meio pela C o m u n h ão !! T ô d as estas
expressões d em onstram um a ignorância p ro fu n d a
d a do u trin a do S acrificio e do sentido d as orações
litúrgicas que nos revelam nossa colaboração com
o C hefe adorável.
É preciso, então, que todos os fiéis tom em um a
resolução enérgica: a de com ungar, tô d as as ve­
zes que não tiverem um im pedim ento sério, logo
após o o ficiante, no m om ento determ in ad o pela
santa L itu rg ia.
2.° P o r um a rasão ponderosa u m m em bro de
Cristo pode separar m aterialm ente a “sua’’ C om u­
nhão de “sua” M issa. H á m uitos casos de ordem
geral ou de interesse p a rtic u la r que obrigam o
fiel a sep a ra r m aterialm ente a “su a “ Com unhão
de “su a ” ' M issa. P o r exem plo, p ara não esten d er
d em asiadam ente a S. M issa de dom ingo, o Pe.
V igário decide que a C om unhão só se ja d is tri­
buída um a vez, ao te rm in a r a M is s a .. . ou, às ve­
zes, as M issas são ditas em a ltares onde não se
conserva o S antíssim o S acram ento. O u tra s vêzes
o com ungante tem h o ra m arcad a: vê-se obrigado
a sa ir antes de te rm in a r a S. M issa. H á pessoas
que, m orando afa sta d o s do cen tro e chegando ta r ­
de à igreja, pedem p ara co m ungar um pouco a n ­
tes da S. M issa principal, p o r não poderem su p o r­
ta r um je ju m p ro lo n g a d o .. . o u tra s não tiveram
tem po de ir ao co n fessionário antes da prim eira
M issa, e irão com ungar depois que o P a d re volte
a lhes a t e n d e r ... E os doentes, presos em casa,
p oderão com ungar na M issa?
A Ig re ja com preendeu tão bem tôd as estas ra ­
zões que instituiu um rito p ró p rio com orações p a­
ra adm in istra r a sa n ta E u c a ristia fo ra da M is s a .. .
E aind a não p roíbe distribuí-la, m esm o em h o ra
188 T E R C E IR A P A R T E

bem a fa sta d a d a M issa, especialm ente aos doen­


tes, • não ra ra s vêzes a co rajosos fiéis que p erm a­
neceram em je ju m a té depois do m eio-dia para
saciar sua fom e sob ren atu ral.
M as se a Ig re ja , com o boa e te m a mãe, deu a
seus filhos tan ta facilidade p a ra receber a E u c a ­
ristia, p o r o u tro lado encarece com tal insistência
a união da C om unhão com o S acrifício, q ue se­
ria um certo desprezo de seus desejos o q u erer
sep a rar m aterialm ente um do o utro, sem hav er
para isso razões legítim as. O s fiéis devem recor-
dar-se que a perm issão de com ungar fo ra da S.
M issa é apenas tolerância, e n ão estím ulo. N ão
se devem , pois, a p ro v e ita r desta concessão, senão
quando se acharem em v e rd ad eira im possibilida­
de de fa zer de o u tro m odo.
3.° A in d a assim o fie l, que recebe a C om unhão
fo ra da S . M issa, não pode separar espiritualm en­
te um a da outra. T o d av ia, o m em bro de C risto
que p o r m otivos su ficientes se ap ro v eita d as am ­
plas au torizações dad as pela Ig re ja , p a ra com un­
g a r fo ra d a M issa, deve fazê-lo com o espirito de
N osso S enhor. Je su s C risto u niu intim am ente a
S anta C om unhão e os benefícios de sua presença
real à oblação de seu Sacrifício: seus m em bros
não devem pro ced er co n tra o espírito de seu
Chefe, considerando-os separados. O fiel, mesmo
quando com unga fora da S. M issa, deve u nir-se
intim am ente com o pensam ento e com o coração a
C risto q ue se oferece no a lta r e ap resen ta a seu
P ai a hom enagem infinita. E , ainda m ais, deve
estar intim am ente convencido de q ue todos os
bens que lhe advêm da m anducação d a C arne sa ­
grada, são nêle p roduzidos tão som ente pelo S acri­
fício da C ruz, renovado na S. M issa, cujo s m éri­
tos são aplicados à sua alm a pelo precioso canal do
san to S acram ento.
CAP. m . A COMUNHÃO 189

Ê stes pensam entos, baseados no verd ad eiro co­


nhecim ento d a oblação eu carística, terão u m » d u ­
pla influência na alm a do com ungante: en g ran d e­
cerão a seus olhos a m ajestad e do sacram ento da
E u caristia, e o a tra irã o invencivelm ente p a ra o Sa-
crificio do altar.
O Sacram en to divino terá, realm ente, p a ra o
fiel piedoso, p ro porções que um a piedade m enos
esclarecida não pode v e r: êste C risto que vem a êle
é seu Chefe, do qual é m em bro e 'd e cu ja imolação
p articip a como sa c rificad o r e como vítim a, e com
o qual o ferece ao A ltíssim o hom enagens que são
in fin itas! líste C hefe adorável, revestido da m is­
são de “louvor à S antíssim a T rin d a d e ” , digna-se
e n tra r em contacto corporal com seu pequeno m em ­
bro, p ara lhe p ro v a r até que ponto de intim idade
chega a sua u n iã o ! Q u e novas luzes p a ra a piedade
que sabe elevar-se a estas a l t u r a s !
C om preendidas estas verdades pelo m em bro de
C risto, já lhe se rá penoso se p a ra r a C om unhão do
Sacrifício. C om ungar fo ra da S. M issa p arecer-lhe-
á como que um a dim inuição de seu fru to espiri­
tual. N ão há m ais necessidade de convidá-lo a es­
colher o m om ento litúrgico p a ra se a p ro x im a r da
sagrada mesa. J á se convenceu que o plano lógi­
co da C om unhão é a S. M issa. T o rn a -se desde
então um fervoroso concelebrante, isto é, leva sua
colaboração com C risto, que se imola, a té à co-
m anducaçâo litú rg ica da sob eran a V ítim a.

Açâo de graças litúrgica


Se a C om unhão é um a to o ficial e litúrgico, co­
locado m uito acim a d a satisfação de a m o r p riv a ­
do e pessoal, a ação de g raças que a segue, deve
revestir-se do m esm o c a rá te r: e x p rim irá em p ri­
m eiro lu g a r o agradecim ento o ficial da Ig reja , p ro ­
vando a C risto a su a g ratid ão . T e rm in a d a esta
190 T E R C E IR A P A R T E

hom enagem pública, a ação de graças p o d erá to r­


n a r - « ato d e in tim idade pessoal do m em bro com
seu C hefe, e prolo n g ar-se em deliciosa intim idade.
A ação de graças oficial é a p a rte da M issa que
vai da C om unhão às ú ltim as orações. C om preen­
de as m aravilhosas fórm ulas d a a n tífo n a cham a­
d a com únio e d as orações cham adas poscom únio.
C ontinua com o " I te m issa e st” ao qual devem os
responder de todo o coração com um “D em os g ra ­
ças a D eu s” . A bênção do P a d re , do F ilh o e do
E sp írito San to desce logo em seguida sôbre nós.
E n fim a ação de g raças te rm in a com a le itu ra do
sublim e comêço do evangelho de S. João, o qual
nos faz contem plar com um relance de águia to­
dos os m istérios de C risto que a “nossa” M issa
renovou.
Se a Ig re ja escolheu estas orações p a ra consti­
tu ir a ação de g ra ç a s oficial e pública que impõe
ao celebrante, é que ju lg a essas fórm u las e essas
atitudes as m elhores para a g rad ecer a C risto e
à Santíssim a T rin d a d e pelo dom inefável q u e aca­
ba de nos ser o u torgado. E sendo assim , p o r que
se vêem os fiéis, que aliás acom panharam ate n ­
tam ente tôda a L itu rg ia de " su a ” M issa, sa ir da
igreja apenas acabaram de com ungar? O s te x ­
tos sagrados, que lhes pareciam tão p ró p rio s p a ra
orientá-los na sua celebração, torn ar-se-ão im pro­
fícuos apenas C risto pen etra em seu co ração? E ,
110 entanto, o sacerdote, q ue p o r estado é o modê-
lo do povo, não se esconde a um canto do sa n tu á­
rio com as m ãos no rosto p a ra agrad ecer. Pelo
contrário, ca n ta ! Q u e razão tem os p a ra n ão fazer
como êle? V oltando ao nosso lugar, orem os com
C risto como C risto pede que se ore. S e a d istri­
buição d a E u c a ristia aos assistentes é longa, en­
tão façam os u m piedoso colóquio com N osso Se­
n h o r em in tim id ad e; m as, apenas recom ece a fu n ­
CA P. I II . A COMUNHÃO 191

ção santa, continuem os logo nossa celebração, a


qual devem os acab ar como principiam os, í o m o
sacerdote ofician te e a Ig re ja inteira.
A gindo assim , o m em bro de C risto experim en­
ta rá os m aiores benefícios. C om eçará p o r p a rtici­
p a r das últim as orações e d as últim as ações de
graças de “su a ” M issa; depois p ro c u ra rá nas fó r­
m ulas que p ro n u n c ia r com o sacerdote pensam en­
tos e a feto s que alim entem sua piedade e reconhe­
cim ento; fa rá pedidos que serão certam ente ate n ­
didos; receberá da m esm a m ão do sacerdote que
lhe acaba de d a r o Corpo de C risto, a bênção oni­
potente da S antíssim a T r in d a d e ; d a rá enfim um
vôo com S. Jo ã o às a ltu ra s celestiais. D êste m odo
o piedoso com ungante fa rá um a verdadeira ação
de graças, evitando as repetições, as distrações, o
enfado que q u ase sem pre vêm p e rtu rb a r um a ação.
de graças pessoal, rotin eira, revolvendo-se sem pre
no mesm o círculo de idéias jam ais renovado.
T e rm in ad a esta ação de graças oficial, e saindo
o sacerdote p a ra a sacristia, o piedoso fiel conti­
n u a rá seus ag radecim entos a C risto p o r sua ação
de graças pessoal. E n tã o po d erá e n treg ar-se a tô-
da efusão de seu coração, p o r todo tem po que
quiser, com um fru to tan to m aio r q u an to m ais
seus pensam entos se tiverem alim entado de só­
lida piedade com o recurso d a L itu rg ia.

A S. Comunhão é
“nossa” ressurreição
O contacto da C arne sa g rad a do S alv ad o r com
nossa carne, pela S a n ta Com unhão, tem um resu l­
tado p articu lar, do qual nos fala N osso Sen h or
quando diz: "A quêle q ue com e a m inha C arne e
bebe o m eu Sangue, ressuscitá-lo-ei no ú ltim o d ia.”
(J o 6, 44.)
Sabem os q ue estam os "en x e rta d o s” em C risto,
que com partilham os, como m em bros seus, a sor-
192 T E R C E IR A P A R T E

te de nosso Chefe. S u a vida é nossa vida, pois


que dele c o rre .para nós, suas p re rro g a tiv a s são as
.nossas, su a ressurreição, sua ascensão, seu reino,
são nossos.
O ra, su a ressu rreição foi um a ressurreição de
sua Carne: nossa ressu rreição te rá o m esm o a s­
pecto. N osso corpo deverá, pois, ressu scitar p a ra
revestir-se d a g lória do C orpo de Cristo. Q uando,
entretan to , logo depois da nossa m orte, nós, seus
m em bros, form o-nos re u n ir ao nosso C hefe no céu,
p a ra lá subirem os sem os nossos corpos. N ossa vi­
da de felicidade com eçará sem nossa carne m ortal.
M as éste estado n ão podia d u ra r sem pre. P o r isso,
elegendo-nos C risto p o r seus m em bros, associa não
som ente nossa alm a à sua A lm a sag rad a, m as ta m ­
bém nosso corpo à su a C arne: é a Com unhão
•sacram ental. A união do Corpo de C risto com o
nosso, p o r meio d as espécies sacram entais, é o si­
nal e xterio r, oficial e certo, de que nosso corpo é
partícipe do C hefe, como nossa alm a. P o r éste
título, o Salv ad o r é obrigado a ressu scitar nosso
Corpo, a no-lo restitu ir, e a ap re se n ta r a D eus
um C orpo M ístico form ad o de m em bros, e x a ta­
m ente como o C hefe divino, de Corpo e A lm a.
E is po r que disse: "A quele q ue com er a m inha
C arne, ressuscitá-lo-ei no últim o dia.”
P o r que, q u ando se com unga, não se pensa m ais
neste insigne fa v o r? Pelo fato de m inha carn e ser
cham ada a to car a C arn e de C risto, ela é, p o r isso
m esmo, co n sagrada p a ra a im ortalid ad e! Q u e fe­
licidade e que g ló r ia !
M as, então, pode-se bem p e rg u n ta r: com que
direito ressu scitarão aqueles que n unca com un­
garam ?
O s que n unca com ungaram , afa sta ra m -se do
Corpo de C risto, ou p o r desprezo ou p o r im pos­
sibilidade. O s prim eiros condenar-se-ão e sua car­
T E R C E IR A PA R TE 193

ne servir-lh es-á sem pre de torm en to : m elhor te ria


sido p a ra êles que nunca tivessem despertadí) do
túm ulo.
A queles, porém , que n ão com ungaram sem p ró ­
p ria culpa, ou p orque não conheceram a Com u­
nhão ou p orque não p u d eram recebê-la em sua
cu rta existência, p a rticip arão da ressu rreição de
C risto, p orque seu estado de união a C risto como
m em bros e n x ertad o s nÊ le lhes d á o direito à C o­
m unhão corporal e sacram ental, direito êste que
não pu deram exercer, m as que possuem sem pre e
que lhes concede os favores que dêle dim anam .
A ssim , em vista do direito d a m anducação da
C arne divina e do contacto desta C arn e de C risto
com o nosso C orpo de cristão, êste corpo fica m a r­
cado com um sinal de vid a: re ssu scitará glorioso.
C om preendem os ag o ra m elhor do que nunca co­
mo C risto é nosso em tudo que existe. T odos os
seus privilégios são os nossos, su a p ró p ria C arne,
p o r assim dizer, é nossa carne, pois a nossa c a r­
ne m ortal, sa n tificad a ao contacto d a C arne de
Cristo, encerra em si o direito à p articipação de
tôdas as g lórias que tiv er no céu o m aravilhoso
Corpo do C hefe dos ressuscitados.
ín d i c e

Prólogo

Capitulo I. Jesus Cristo Saoerdote ...................................... 11


O decreto divino, 11. - A noção do sacerdócio, 12. - Jesus
Cristo, Sumo Sacerdote 13. - Por que Jesus Cristo é nosso
Sacerdote, 14. - Quando se realizou a consagração sacerdo­
tal de Cristo?, 15. - O Sacrifício de Jesus, Sacerdote 16. -
O Sacerdote e os sacerdotes. 17. - O Sacerdote, os sncerdotes,
os fiéis e a S. Missa, 18. - A parte dos fiéis no S. Missa,
19.
Capitulo II. O cristão, membro de Cristo.................... 20
Cristo Mistico. 20. - Que quer dizer Cristo Mistlco, 20. -
Como é constituído o Corpo Mistlco de Cristo, 21 - A
metamorfose do "velho homem”, 22. - A união do membro
ao seu Chefe, 23. - As consequências práticas da existên­
cia do Corpo Mistico, 25. - São Paulo insiste sóbre Cristo
Mistlco, 26. - A Cabeça do Corpo Mistlco, 28. - ComoCristo
Chefe está ligado ao seu Corpo Mistico, 28. - A função dos
membros no Corpo Mistico, 30. - Como nos tornamos mem­
bros de Cristo, 31. - Estamos em Jesus Cristo, 33. - Con­
clusões práticas. 34.
Capitulo III. O membro se oferece e sacrlíloa com o
Chefe ..................................................................................... 37
Quem é o sacrificador na Santa Missa?, 37. - Como se
efetua a oblação pelo Corpo Mistico, na Santa Missa, 38. -
Qual a medida de nossa parte pessoal no papel de sacri­
ficador?. 41. - A Vitima, 42. - O Corpo Mistlco é, pois,
"Vitima do sacrifício", 45. - Nossos sacrifícios e o Sacri­
fício, 47. - Por que melo podemos aumentar nossa par-
clpaçáo à S. Missa, como sacrificadores e vitimas?, 48. -
Conclusão: aquêles que são concelebrantcs da S. Missa,
e aquêles que o não são, 50.
Capitulo IV. A S. Missa, oblação de Cristo M istico .... 52
A S. Missa é a cena vlsivel da oblação, 62. - Nosso estudo
lltúrgico limitar-se-á á demonstração desejada, 62. - O que
nos m ostrará a liturgia da S. Missa, 63. - Os têrmos pelos
quais nos oferecemos com Cristo, 53. - As provas lltúr-
gicas que mostram que todo o Corpo Mistico é vitima
com Cristo, 56. - A Liturgia mostra-nos o tríplice papel
do sacerdote, 60. - A L iturgia e o papel do sacerdote
como representante de Jesus Cristo, 60. - A Liturgia
„ _ ------- ------ J ite, como nosso representante ofi-
o papel pessoal do sacerdote, 65. -
que Cristo é o Sacerdote prln-
IN D IC E 185

Capitulo I. O que 4 “Minha" Mlaaa.............................. 69


"Minha” Missa é o Calvário, 69. - Mas êste Sacrifício único
pode ser renovado, 70. - A S. Missa é a exata renovaçáo
do Calvário, 70. - Missa e Calvário: mesmo Sacerdote,
mesma Vitima, 71. - Jesus Cristo teve intenção de repre­
sentar visivelmente na S. Missa a cena do Calvário. 72. -
O sacrifício da S. Missa renova invisivelmente o Sacrifí­
cio da Cruz, 73. - Uma nota de passagem: a Eucaristia
é sacrifício e ao mesmo tempo sacramento, 74. - A L i­
turgia frisa a Identidade entre a S. Missa e o Calvá­
rio. 75. - Quão preciosa é, pois, a "minha” Missa!, 78.
Capitulo II. A glória de D eus........................................ 79
"Minha” Missa dá a Deus uma glória de valor infinito,
79. - A L iturgia assegura-nos que nossa homenagem é
infinita, 80. - Consequência desta verdade: o infinito va­
lor de “Minha” Missa, 80. - Os quatro aspetos do louvor
infinito dado pela "minha" Missa, 81. - Como Cristo, por
seu sacrifício, adora perfeitamente a Deus, 82. - Que
agradego a Deus com “minha” Missa?, 86. - Que pede
Cristo Mistico na Santa Missa?, 87. - Conclusão deste
capitulo: “Minha" Missa é para mim o ato mais impor­
tante e incompnrável, 93.
Capitulo III. Meu fruto espiritual.................................. 95
O fruto que tiro de “Minha” Missa é finito, 95. - Con­
sequências que podem resultar para Cristo, apesar de
meu proveito só poder ser finito, 96. - Consequências que
podem resultar para mim, apesar de o fruto espiritual de
"minha" Missa só poder ser finito, 97. - Que se deve enten­
der por "meu fruto espiritual”, 100. - Os frutos pessoais da
"minha” Missa: 1° Aumento da graca santlficante, 1Q1. -
2» O progresso na virtude, 102. - 3° A remissão dos pecados,
105. - Como “minha” Missa apaga meus pecados, 106. -
4» A satisfação por minhas faltas, 109. - 5« A consecu-
Cão dos meus pedidos, 110. - Mas como formular nossos pedi­
dos?, 111. - Em “minha” Missa poderei fazer pedidos par­
ticulares, espirituais ou temporais?, 112. - O fruto pessoal
do sacerdote que celebra "sua” Missa, 116. - O lucro daque­
les por quem d celebrada a S.Missa, 118.-O
les que mandam celebrar a S. Missa, 120. - A razão de ser
das "espórtulas”, 121. - O lucro dos que concorrem de qual­
quer outro modo para a celebração, 123.
Capitulo IV. O proveito do purgatório............................ 124
A “minha” Missa, orvalho para opurgatório, 124. - A
Liturgia recorda que, em “minha” Missa, devo dar a parte
dos defuntos, 126. - Terei eu “minha” Missa no purgatório?,
127. - Terei “minha” Missa no purgatório: 1» se tiver o cui­
dado de mandar celebrá-la, em vida, pelo repouso de minha
alma, 128. 2.» se outras pessoas tiverem a caridade de man­
dar celebrar por mim, 129. - E se não tiver Missas “pro­
priamente minhas" no purgatório?, 130. - "Minha" missa no
purgatório é só "libertadora”, 132. - Será todo fiel libertado
por "sua" Missa no purgatório, 134. - “Minha" Missa neste
mundo abrevia o tempo do purgatório., 135. - Podemos
196 ÍN D IC E

estar certos de que Deus aplica às almas do purgatório,


tantoa quanto possível, as satisfações de "sua” Missa. 137. -
O que é melhor Dara nós: Mandar em vida celebrar Missas por
nós ou deixá-ltS para depois- da nossa morte?, 139. '
III PARTE: MEIOS PARA BEM CELEBRAR
"MINHA" MISSA
Capitulo I. A preparação...................................................... 142
A celebração de "Minha" Missa não se improvisa. 142. -
Qual deve ser a preparação à “minha” M issa?.. 143. - 1°
A preparação doutrinal para “minha" Missa, 144. - A lei­
tura, prim eiro melo para assegurar a preparação doutrinal
de “minha" Missa, 145. - A pregação, segundo melo de asse­
gurar a preparação doutrinal da "minha” Missa, 147. - 2®
A preparação litúrglca da “minha” Missa, 150. - 3« A pre­
paração ascética para "minha" Missa, 152. - • A preparação
ascética da “minha" Missa consiste em formar em mim a vi­
tima do Sacrifício. 153. - A nossa formação de co-vltima do
Sacrificio: 1° pela aceitação das penas necessárias á conser­
vação do estado de graça. 154. - 2® pela- aceitação das cruzes,
156. - 3° pelas mortificações que nos impomos?, 157.
Capítulo II. A assistência........................ 160
Nossa presença deve ser uma celebração,' 160. - O melhor
melo de celebrar: a assistência litúrglca. 162. - As vantagens
da assistência lltúrgica, 164. - A assistência litúrglca às
Missas solenes. 166. - Que pensar dos cânticos populares du­
rante a S. Missa, 171. - As explicações para a assistência
à- "minha" Missa, 174. - Quando devo celebrar a “minha"
Missa, 175.
Capitulo -III. A Comunhão...................................................... 177
A S. Comunhão faz parte Integrante do Sacrificio, 177. -
A L iturgia m ostra-nos-a mútua dependência da Comunhão e
do Sacrificio, 179. - Deveríamos comungar secramentalmente
tódas as vêzes que celebramos "nossa" Missa, 180. - De­
vemos comungar ao menos espiritualmente tódas .as vêzes
que celebramos “nossa" Missa, 183. - Posso comungar fora
da "minha” Missa?, 168. - Ação de graças litúrglca, 189.
- A S. Comunhão é "nossa" ressurreição, 191.

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