1 Autoeficácia é um constructo central na teoria social cognitiva, entendida por Bandura (1997) como
a crença do indivíduo em sua capacidade em organizar e executar cursos de ação requeridos para
realização de uma tarefa específica tem papel mediador entre habilidades do indivíduo, desempenho
anterior e o comportamento prospectivo. Para informações adicionais em português recomendamos
a leitura de Azzi, & Polydoro (2006) e Pajares & Olaz (2008).
Autorregulação da aprendizagem:
modelos de investigação e de intervenção
Pesquisas sobre processos autorregulatórios a partir da perspectiva da
teoria social cognitiva têm sido conduzidas em diferentes direções de articula-
ção conceitual, como: estabelecimento de objetivos, percepções de autoeficácia,
autoinstruções, autorreforçamento (Zimmerman, 1989). Nos últimos tempos,
nota-se um intenso avanço no desenvolvimento do conhecimento internacional
a respeito da autorregulação no domínio acadêmico, em termos da teoria, da
pesquisa ou da aplicação educacional (SCHUNK e ZIMMERMAN, 1998). A
aprendizagem autorregulada é tema que tem gerado muitas investigações cujos
resultados têm demonstrado que processos essenciais, tais como formulação de
metas, autossupervisão, uso de estratégias, autoavaliação e autorreações desempe-
nham um papel importante no êxito acadêmico dos estudantes (ZIMMERMAN,
KITSANTAS, CAMPILLO, 2005). Tais resultados orientam o desenvolvimento
de intervenção no contexto educativo em diferentes níveis de escolaridade, como
será visto a seguir.
Conforme Zimmerman, Bandura e Martinez-Pons (1992, p. 664), os
aprendizes autorregulados não são diferenciados somente por sua orientação
pró-ativa e performance, mas também por suas capacidades automotivadoras.
Schunk e Ertmer (2000) destacam da literatura os seguintes processos envolvidos
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na autorregulação da aprendizagem: estabelecer objetivos, atender regras, usar
estratégias cognitivas apropriadas, organizar o ambiente de trabalho, usar os
recursos de forma eficaz, monitorar o próprio desempenho, gerenciar o tempo
disponível, buscar ajuda se necessário, manter crenças de autoeficácia positivas,
perceber o valor do aprendizado, identificar os fatores que influenciam a aprendi-
zagem, antecipar os resultados das ações e experimentar satisfação com o próprio
esforço. Ainda, diante da descrição do processo autorregulatório da aprendizagem
por meio dos diferentes modelos, denota-se que o estudante autorregulado em
sua aprendizagem é aquele que, como sintetizado por Montalvo e Torres (2004),
aprendeu a planejar, controlar e avaliar seus processos cognitivos, motivacionais,
afetivos, comportamentais e contextuais; possui autoconhecimento sobre o pró-
prio modo de aprender, suas possibilidades e limitações. Com tal conhecimento,
o estudante controla e regula o próprio processo de aprendizagem em direção
aos objetivos e metas.
Zimmermann (1986, 2008) nos ajuda na identificação da trajetória de
investigação sobre o tema quando relata um encontro ocorrido em simpósio
da American Educational Research Association (AERA), em 1986, em que se
propôs uma definição inclusiva de autorregulação da aprendizagem como o grau
em que os alunos são metacognitiva, motivacional e comportamentalmente
participantes ativos no seu próprio processo de aprendizagem. Entendidos como
critérios de definição, estas três categorias devem estar presentes nas discussões de
aprendizagem autorregulada do aluno em seu processo de realização acadêmica.
O autor aponta que, a partir deste acordo conceitual, foi possível agrupar sob
uma mesma rubrica as pesquisas sobre estratégias de aprendizagem, monitora-
mento metacognitivo, percepção de autoconceito, estratégias motivacionais e
autocontrole desenvolvidas por investigadores “como Monique Boekaerts, Lyn
Corno, Steve Graham, Karen Harris, Mary McCaslin, Barbara MsCombs, Judith
Meece, Richard Newman, Scott Paris, Paul Pintrich, Dale Schunk, dentre outros”
(ZIMMERMAN, 2008, p. 167).
Para Montalvo e Torres (2004), a publicação do livro Self-regulated
Learning and Academic Achievement: theory, research, and practice (ZIMMERMAN
& SCHUNK, 1989) é um marco importante no desenvolvimento de inves-
tigações sobre a autorregulação da aprendizagem. Outras obras seguiram
como: Self-regulation of learning and performance (SCHUNK & ZIMMERMAN,
1994), Self-regulated learning: from teaching to self-reflective practice (SCHUNK &
ZIMMERMAN, 1998), Handbook of self-regulation (BOEKAERTS, PINTRICH &
Áreas de auto-regulação
Considerações finais
Reservamos para este item algumas considerações importantes, considera-
ções estas que abordam diferentes aspectos, mas a todas deve ser dada a devida
atenção quando trabalhadas sob o referencial da teoria social cognitiva.
Um primeiro aspecto que vale a pena destacar refere-se ao aporte teórico.
É importante notar que qualquer que tenha sido a direção assumida nos modelos
aqui apresentados, a coesão teórica revelou-se importante para solidificar estraté-
gias de investigação, cuidado já apontado e discutido em Azzi e Polydoro (2006).
Este lembrete é necessário dado que o tema da autorregulação da aprendiza-
gem é atrativo a muitas pessoas do campo educacional. No entanto, o cuidado
em não adentrá-lo de forma superficial é um risco que precisa ser evitado. A
fundamentação teórica exaustiva que sustenta determinadas práticas no campo
aplicado da intervenção no desenvolvimento da aprendizagem autorregulada de
base sociocognitiva deve contemplar permanentemente a relação teoria-prática,
ainda que se esteja ‘atuando’ no campo de um dos lados da díade.
Quanto ao desenvolvimento de investigações, optamos por indicar as
direções propostas por Zeidner, Boekaerts e Pintrich (2000). Os autores apre-
sentam uma agenda com 12 pontos para os pesquisadores do século XXI. Os
primeiros pontos assinalados tratam da formulação de definições mais claras e
precisas em relação ao próprio processo de autorregulação da aprendizagem e dos
principais processos envolvidos, especificando seus atributos relevantes de forma
a permitir a discriminação entre constructos. Outra frente de pesquisa refere-se
à elaboração/validação de modelos mais completos, especificando o tamanho do
efeito das variáveis envolvidas. Quanto ao delineamento dos estudos, sugerem
o refinamento das medidas de avaliação, inclusive os instrumentos e métodos
qualitativos, além da opção por desenhos longitudinais e causais. Outro ponto
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importante a ser investido, conforme os autores, refere-se à análise do papel do
contexto de aprendizagem sobre a cognição e motivação acadêmica, acrescido do
estudo da influência do desenvolvimento e do papel das diferenças individuais e
culturais no processo de autorregulação da aprendizagem. Por fim, ressalta-se a
necessidade de estudo sobre a intervenção, já que a promoção da autorregulação
caracteriza-se como a maior razão para a busca de compreensão deste processo.
Aqui também cabe uma nota sobre os estudos nacionais, em que não se observa
o estudo sistemático de intervenções desta natureza.
Ao voltar nossa atenção para o aspecto mais próximo do cotidiano das
escolas vale contar que Cleary (2006) comenta que a despeito da existência
de estudos explicitando a relação entre uso de estratégias de autorregulação
na aprendizagem e realização acadêmica este é um tema pouco abordado nos
espaços escolares. Vai além mencionando que professores reconhecem sua impor-
tância, mas relatam não ter obtido este tipo de informação em seus cursos de
formação. Embora fale o autor da realidade norte-americana a situação parece
não ser muito diferente no Brasil. É pela crença de que os estudos e achados
da teoria sociocognitiva muito tem a contribuir com as práticas escolares que
iniciamos várias ações promotoras do encontro dos pressupostos teóricos com o
cotidiano escolar. Particularmente, nossos grupos de pesquisa estão empenhados
na realização de estudos sobre autoeficácia, autorregulação da aprendizagem e
processos envolvidos, incluindo avaliação e intervenção.
Esperamos ter contribuído com informações relevantes para que se pensem
os desafios envolvidos no processo educacional de promoção de engajamento
efetivo dos estudantes em seus processos de aprendizagem. Mas é necessário
destacar que estas informações, modelos e pesquisas não podem ser aplicados
sem que se atente para as diferenças, necessidades e especificidade da realidade
brasileira. É com este cuidado que estudos brasileiros precisam ser desenvolvidos.
Resumo
O objetivo deste artigo é apresentar e discutir a aprendizagem autorre-
gulada como tema de investigação e na prática educativa. Tomando-se como
referência a contextualização da teoria social cognitiva e do constructo de autor-
regulação nela integrante, este artigo apresenta o desenvolvimento desta área
Abstract
The objective of this article is to present and discuss self-regulated learning as a theme to
be investigated as well as an educational practice. Referring to cognitive social theory and to the
self-regulation construct embedded in it, this article portrays the development of this research field,
models of self-regulated learning of Barry Zimmerman, Paul R. Pintrich and Pedro Sales Rosário,
educational intervention proposals and considerations on future investigations.
Keywords: self-regulated learning; social-cognitive theory; self-regulation; Learning
strategies.
Resumen
El objetivo de este trabajo es presentar y discutir el aprendizaje autorregulado como un tema de
investigación y en la práctica educativa. Tomando como referencia el contexto de la teoría cognitiva social
y la construcción de la autorregulación, este artículo presenta el desarrollo de esta área de investigación;
modelos de aprendizaje autorregulado de Barry Zimmerman, Paul R. Pintrich y Pedro Sales do Rosário;
propuestas de intervenciones en el contexto educativo; y consideraciones sobre futuras investigaciones.
Palabras clave: aprendizaje autorregulado; psicología social cognitiva; autorregulación;
estrategias de aprendizaje.
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