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1. INTRODUÇÃO
2. QUESTÃO PROCESSUAL
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O powerpointao qual o trabalho se refere ficou famoso nas redes sociais por apontar, ainda que da forma mais
abstrata e caricata possível, que todos os passos da Operação Lava Jato convergiam para uma única figura:
Lula.. Para entender melhorr, faz-se imprescindível a leitura da matéria elaborada pelo jornal Poder 360,
dosponível em: <<
Assim, ainda que se reconheça que as condutas investigadas possuem conexão, uma
vez que são revestidas de um mesmo “modus operandi, (a partir do qual) foram celebradas
contratações revestidas de ilicitudes em benefício de agentes públicos” (p. 31) , as quais, com
o decorrer das investigações demonstraram serem características de um “mesmo método de
governança" (p.36) em que Lula é tido como “figura central de um grupo criminoso
organizado, com ampla atuação nos diversos órgãos pelos quais se espalharam a prática de
ilicitude” (p.40), estas não se configuraram como diretamente (e exclusivamente) voltadas à
Como consequência direta dessa nulidade, o objeto dos Habeas Corpus interpostos
pela defesa do ex-presidente alegando a suspeição do ex-juiz Sérgio Moro estariam, em tese,
prejudicados, pois, se os atos decisórios foram anulados, não haveria o que se falar em
parcialidade.
https://www.poder360.com.br/lava-jato/conheca-o-powerpoint-usado-pelo-ministerio-publico-contra-lula/. >>
Acesso em 15 mar. 2021.
no litígio, ou seja, a premissa do juiz estar alheio aos interesses das partes. De mesmo modo
preceitua Gomes Filho (2013, p. 32), citado pelo Ministro Gilmar Mendes em seu voto
proferido no julgamento do HC 164.493/DF:
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Disponível em: <<
https://g1.globo.com/jornal-nacional/noticia/2021/03/08/defesa-de-lula-diz-que-decisao-de-fachin-naorepara-da
nos-causados-por-moro-e-pela-lava-jato.ghtml >>. Acesso em: 16 mar. 2021.
interrogatório e a produção de provas, enseja ainda mais a imprescindibilidade de se dar
continuidade ao julgamento da suspeição do ex-juiz Sérgio Moro pois, afinal, como seria
possível utilizar os meios probatórios elaborados sob a égide de um magistrado parcial?
Assim, o reconhecimento da incompetência absoluta do julgador acarreta na necessidade de
anulação de todos os atos do processo. (LOPES JÚNIOR, 2016, p. 317)
Além disso, como a anulação dos atos decisórios também engloba a decisão de
recebimento de denúncia, os delitos imputados à Lula podem ser atingidos pelo fenômeno da
prescrição — que consiste na perda do direito estatal de exercer a ação penal por fatos
puníveis ou de executar a pena criminal imputada contra os autores dos delitos (CIRINO
DOS SANTOS, 2007, p.677) —, pois, devido à incidência do art. 115 do Código Penal, Lula
tem seus prazos prescricionais reduzidos à metade (haja vista que tem mais de 70 anos de
idade), de modo a implicar, nos presentes casos concretos, na possibilidade de que suas
denúncias só possam ser apuradas até, no máximo, 2022.3
3. O PANORAMA POLÍTICO
Como um fato criminoso, a Operação Lava Jato pode ser entendida em seu contexto
de ocorrência, seu planejamento e premeditação, suas fases preparatórias, sua execução
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O prazo prescricional máximo dos crimes aos quais Lula está sendo imputado é de 16 anos e, segundo a
denúncia, as atividades ilícitas mais recentes praticadas pelo ex-presidente foram consumadas no ano de 2014.
Logo, devido à redução dos prazos prescricionais à metade (8 anos), a prescrição se daria, em sua mais
extensiva hipótese, no ano de 2022.
(continuada), a produção de seus resultados e consequências e, finalmente, às reações a si,
pela sociedade e pelo Estado.
Desta peça acadêmica se extrai os conceitos que seriam cruciais para o processo de
desenvolvimento da Operação Lava Jato, tais como “cruzada judiciária”, “sistema de
corrupção”, “percepção popular”, mas principalmente aqueles que ficam subjacentes na
admiração e vontade declarada de reproduzir em cenário nacional o espetaculoso inquérito
italiano. Não há, portanto, como iniciar uma análise política da autointitulada “maior
iniciativa contra a corrupção da história” sem falar antes de sua fonte inspiradora de origem,
a famosa e controversa operação mani pulite.
A noção de que o combate à corrupção deveria ser feito na forma de uma cruzada
judicial promoveu a multiplicação de irregularidades e quebras de protocolos e normas
processuais com objetivo de fazer a operação avançar o mais rápido e o mais constantemente
possível. Para além de exemplos já citados no caso analisado em outros tópicos, podem ser
destacados ainda as quebras de sigilo telefônico da presidência da república, cujas conversas
foram publicizadas pouco antes do noticiário noturno, ou as prisões espetaculosas e com
intensa cobertura midiática de dois ex-presidentes.
O que de fato acabou ocorrendo. A consequência de maior impacto da mani pulite foi
a destruição da organização política italiana e a ascensão de novos políticos que não estavam
integrados ao sistema anterior, sendo o maior exemplo o do primeiro-ministro Silvio
Berlusconi, quem acabou sendo o responsável pelo encerramento da operação italiana ao
forçar a renúncia de Di Pietro em 1996 quando este começou a investigar suas atividades.
Igualmente, a eleição de Jair Bolsonaro, quem convidou Sérgio Moro para seu ministério,
retirando-o da magistratura em Curitiba e posteriormente o fazendo renunciar do governo,
marca o início do esforço para o encerramento da Operação Lava Jato, que acaba por se
concretizar em 2020 por determinação da Procuradoria Geral da República. (CHEMIM,
2019)
A suspeição do então juiz Sérgio Moro era a questão principal nesse movimento,
estando pendente de julgamento no Supremo Tribunal Federal e, graças a forte mudança de
humor da corte, tendia-se eu seu reconhecimento e a consequente perda de todos os processos
julgados pelo magistrado no âmbito das denúncias de corrupção envolvendo a Petrobras e em
sendo o ex-presidente Lula o alvo principal perseguido pela força tarefa e o condenado pela
Lava Jato com maior influência política, grande parte da pressão pelo desfazimento dos atos
dos processos conduzidos por Sergio Moro vinham de seu caso em específico, o mais
publicizado dentre todos.
O relator da Lava Jato no STF, ministro Luiz Edson Fachin, toma então a decisão
monocrática de anular os processos do ex-presidente, garantindo inclusive a elegibilidade que
o próprio Fachin lhe negara em 2018, como então ministro do Tribunal Superior Eleitoral.
As razões que levaram o ministro a este ato, sendo aquele que anteriormente com
mais rigor referendou os procedimentos tomados pela força tarefa em Curitiba, são
naturalmente difíceis de afirmar com concretude, principalmente dado o pouco tempo desde
que este foi emitido, porém aparenta a cruzada ter se tornado em parte um ballet, em que
ministros dos tribunais superiores conduzem uns aos outros numa negociação de movimentos
afinados a fim de encontrarem ponto de equilíbrio entre responder às irregularidades
processuais e materiais da Operação Lava Jato e ainda preservar no possível os efeitos das
condenações para crimes muitas das vezes confessados.
O ministro Edson Fachin, diante da ofensiva dos ministros Gilmar Mendes e Ricardo
Lewandowski, fez o primeiro movimento de abertura no que parece ser uma dança a se
prolongar pelos próximos anos, em que a influência do condenado por Sérgio Moro será
determinante para o grau de intervenção que conseguirá obter nas cortes mais altas e o
possível desfazimento definitivo de todos os processos respondidos pelo ex-presidente Lula é
o primeiro ato de cessão, como exatamente no ballet as demais dançarinas se retiram para
que uma bailarina apenas faça seu solo, ficando ainda a questão se este será suficiente ou se
demais integrantes do espetáculo pedirão também seus momentos de estrelato, como já teve o
juiz e os demais procuradores.
4. LINHAS CONCLUSIVAS
Conclui-se, dessa forma, que, ao anular apenas os "atos decisórios praticados nas
respectivas ações penais", o Ministro Edson Fachin omite as decisões proferidas por Moro na
fase de investigação, sobretudo no que diz respeito às ordens de investigação resguardadas
pela cláusula de reserva de jurisdição.
É evidente, então, que o Ministro encontrou uma forma de manter válidas as quebras
de sigilo, interceptações e material resultante de buscas e apreensões da fase policial da
persecução penal, o que seria contraditório com a declaração de suspeição do ex-Juiz Federal
– entendível como a solução mais cabível perante os escândalos que aparecem dia e noite
envolvendo Sérgio Moro e cia.
Portanto, o que, à primeira vista, poderia ser considerado uma vitória do ex-Presidente
Lula sobre Moro pode, na realidade, ser visto como uma articulação do Supremo Tribunal
Federal para tentar preservar a Operação Lava Jato. Vale dizer, para tanto, que há
aproximadamente 07 (sete) anos, vários juristas e a própria doutrina já alertavam que a
“República de Curitiba” não era competente para julgar os fatos, por ora, suscitados.
Na verdade, a Corte Suprema coleciona decisões em que há uma clara mitigação dos
ensinamentos doutrinários de nulidade absoluta e nulidade relativa (INFORMATIVO 775).
Com base na translatio iudici e com a redistribuição dos autos ao juiz competente, os atos
instrutórios do processo envolvendo Lula poderão ser convalidados e, assim, haverá somente
a formulação de novas sentenças.
Ante tudo que fora aqui exposto, o episódio narrado encontra sua maior relevância na
declaração do Ministro Gilmar Mendes, que, ao apreciar o tema, entendeu que os inúmeros
pedidos de suspeição de Sérgio Moro perderam o objeto. Resta, por fim, a expectativa dos
próximos capítulos protagonizados pelo guardião da Lei Maior, com a certeza de que a defesa
do ex-presidente não irá aceitar facilmente a tese levantada por Gilmar Mendes.
5. REFERÊNCIAS BIBLIOGRÁFICAS:
CAPEZ, Fernando. Curso de Processo Penal / Fernando Capez. — 27. ed. — São Paulo:
Saraiva Educação, 2020.
CIRINO DOS SANTOS, Juarez. Direito Penal – parte geral. 2ª ed. Curitiba: ICPC; Lumen
Juris/ICPC, 2007;
CHEMIM, Rodrigo. Mãos Limpas e Lava Jato: a corrupção se olha no espelho. CDG
Edições e Publicações LTDA, 2019.
GOMES FILHO, Antonio Magalhães. A motivação das decisões penais. RT, 2013.
LOPES JÚNIOR, Aury. Direito processual penal. 13ª ed. São Paulo: Saraiva, 2016.
____________. Supremo pode ter retirado a competência de Sergio Moro. Conjur, 2018.
Disponível em: <<
https://www.conjur.com.br/2018-jun-16/opiniao-supremo-retirado-competencia-sergio-moro
>>. Acesso em: 16 mar. 2021.
MORO, Sérgio F. Considerações sobre a operação Mani Pulite. Revista CEJ, Brasília, n.
26, p.56-62, jul/set 2004.
ZAFFARONI, Eugênio Raul. Poder judiciário: crise, acertos e desacertos. São Paulo: