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FREQUÊNCIA DE DIREITO PENAL I – 4º Ano

4 de Dezembro de 2007

Coordenação e Regência: Professora Doutora Maria Fernanda Palma


Colaboração: Mestres Helena Morão e Inês Ferreira Leite e Lic. João Matos Viana

1 - Em 1997, Ana decidiu, ao engravidar, não tomar os medicamentos que


evitariam que viesse a abortar, o que, devido a complicações de saúde, aconteceria com
elevada probabilidade. Ana abortou na décima semana de gravidez.
Suponha que Ana veio a ser acusada por crime de aborto, previsto no artigo 140.º,
n.º 3, do Código Penal. Pode Ana invocar em sua defesa que tal interpretação da norma
viola princípios de Direito Penal?
Fundamente, evidenciando quais os princípios que estariam em causa e como
decidiria o problema.

2 - Suponha que Ana era condenada por crime de aborto (artigo 140.º, n.º 3, do
Código Penal) e que recorria da decisão, entrando em vigor, na pendência do recurso, a
lei que descriminaliza a interrupção voluntária da gravidez nas primeiras 10 semanas, se
realizada em estabelecimento de saúde legalmente autorizado (actual artigo 142.º do
Código Penal). Poderá Ana invocar a aplicação da nova lei? Equacione o problema,
contemplando todas as possibilidades interpretativas da lei.

3 - Suponha que o tribunal admitiu que a nova lei se aplicava à conduta de Ana,
mas que o Tribunal Constitucional a veio declarar inconstitucional em fiscalização
abstracta de constitucionalidade. Como deveria ser decidido, a essa luz, o caso?

4 - Suponha que, em 2006, uma nova lei aumentava os prazos de prescrição do


procedimento criminal aplicáveis ao caso de 10 para 15 anos e que entretanto já teriam
decorrido os dez anos anteriormente previstos. Poderia aplicar-se ao caso a nova lei?
Responda fundamentadamente.

Duração: 60 minutos
Cotações: 1 – 5 valores; 2 – 5 valores; 3 – 5 valores; 4 – 3 valores; 2 valores de ponderação
global.
GRELHA DE CORRECÇÃO

1
Proposta de distribuição dos 5 valores:

a) Identificação de um problema de interpretação do art. 140.º n.º 3 do CP – 0,75;


b) Referência à impossibilidade de equiparação entre “fazer abortar” e impedir um
aborto espontâneo – 1;
c) Análise dos limites de interpretação em direito penal e da proibição de analogia
– 1;
d) Ponderação do princípio da legalidade (lege stricta e lege sripta) – 1;
e) Ponderação do princípio da culpa – 0,75;
f) Conclusão pela impossibilidade de aplicação do art. 140.º n.º 3 – 0,5.

Tópicos

A descrição do artigo 140.º, n.º 3 do Código Penal é suficientemente


determinada: na parte que agora interessa, incrimina-se o comportamento da mulher que
«por facto próprio ou alheio, se fizer abortar». Saber se o comportamento de Ana
instancia esta disposição é questão que depende da interpretação daquele preceito, e a
que não pode decerto responder-se a partir do modelo tradicional (e metodologicamente
ingénuo) da «subsunção» dos «factos» ao «direito»: no processo de interpretação da lei
(penal, ou outra) não se opera com conteúdos semânticos predeterminados aos quais os
«factos» possam, ou não, ser reconduzidos. Isto não significa, porém, que não seja
possível traçar a fronteira da significação textual para lá da qual os resultados
interpretativos já não podem considerar-se secundum legem — e para lá da qual,
portanto, haverá analogia proibida (art. 1.º, n.º 3 do C.P.). É aliás nesse nível de
significação que os textos das leis penais pretendem motivar os comportamentos
daqueles a quem se dirigem.
A questão colocada pode ser abordada de dois pontos de vista, que se não excluem.
Em primeiro lugar, pode questionar-se se uma reconstrução adequada do interesse
normativo de tutela do “bem jurídico” que a incriminação do artigo 140.º visa proteger
(a vida intra-uterina) permitiria que se considerassem aí abrangidas condutas que (como
a de Ana) não provocam a interrupção da gravidez, mas apenas a não impedem,
deixando que venha a ocorrer por força de outras causas que não podem ser
consideradas acções ou factos do agente. Na discussão deste ponto, e tomando em conta
também razões político-criminais de necessidade punitiva (que se derivam do art. 18.º,
n.º 2, da Constituição, e intervêm também como factores de interpretação da lei penal),
pode defender-se a restrição interpretativa do âmbito da incriminação de aborto apenas
aos comportamentos activos que dêem causa à interrupção da gravidez.
Em segundo lugar, pode notar-se que o argumento exposto no parágrafo anterior é
independente do cabimento dos factos descritos na descrição contida no artigo 140.º:
por outras palavras, a restrição interpretativa sugerida é compatível com o entendimento
de que o comportamento de Ana realiza — no plano pré-interpretativo em que se pode
ponderar a «correspondência« dos factos aos textos — aquela descrição. Mas mesmo
neste plano seria possível obter o mesmo resultado: tomando em consideração apenas a
descrição do artigo 140.º, o que é pressuposto da questão, 1 pode observar-se que a
matéria de facto descrita não tem cabimento na esfera de significação comum, nem
1
Não se pondera nesta resposta, por exemplo, a extensão da tipicidade que, para os crimes de resultado,
resulta do disposto no artigo 10.º, n.º 1 (segunda parte) e n.º 2.
talvez sequer na esfera de significação possível, do verbo “fazer” e da referência a
“facto próprio ou alheio” — que sugerem com suficiente clareza a incriminação de uma
acção positiva de causação da interrupção da gravidez. Assim, e porque aquela esfera
comum de significação traça um limite aos resultados possíveis da interpretação
permitida da lei penal, também deste ponto de vista se chegaria a um resultado de não
punibilidade de Ana pelos factos descritos. E a interpretação contrária, que conduziu a
que Ana fosse acusada da prática de aborto, opõe-se assim ao princípio constitucional
de legalidade (art. 29.º, n.º 1, da Constituição; e artigo 1.º, n.º 1 e n.º 3 do Código
Penal), na sua dimensão de exigência lex stricta, que proscreve estes casos de analogia
proibida; mas também, e correspondentemente, na dimensão de exigência lex scripta,
que requer que a delimitação dos factos puníveis seja dada em texto de lei, e não
deixada opções de quem a aplique. Atenta também contra o princípio constitucional de
culpa, que se deriva da protecção da dignidade da pessoa e da garantia de liberdade
(arts. 1.º e 27.º da Constituição), e que na doutrina por vezes se aponta como
fundamento «interno» do princípio de legalidade criminal: esse princípio impede a
punição de quem, como Ana, precisamente por adoptar um comportamento não
claramente previsto como crime à data da sua prática, não poderia ter formado, com
base na redacção do artigo 140.º, n.º 3, qualquer consciência da respectiva ilicitude.

2
Proposta de distribuição dos 5 valores:

a) Identificação de um problema de descriminalização – 0,5;


b) Aplicabilidade, em abstracto, da nova lei a Ana, por força do art. 2.º n.º 2 do CP
– 0,75;
c) Análise dos fundamentos da aplicação retroactiva da lei penal mais favorável –
0,75;
d) Avaliação dos elementos especializadores introduzidos pela nova face aos
princípios da culpa e proibição de valoração retroactiva – 1,5;
e) Referência à sempre possível aplicação analógica da lei penal posterior mais
favorável a Ana – 0,75;
f) Conclusão pela extinção da responsabilidade de Ana– 0,75.

Tópicos:

Ana é condenada, ao abrigo de uma lei (L1) que, no entendimento sustentado


pelo Tribunal de julgamento (e sem prejuízo das conclusões anteriormente sustentadas a
propósito do problema interpretativo), tipifica o seu comportamento como crime (artigo
140.º, n.º 3, do CP).
Entretanto, entra em vigor uma nova Lei (L2) que delimita o comportamento
típico previsto na lei anterior, descriminalizando a interrupção voluntária da gravidez,
nas primeiras 10 semanas, se realizada em estabelecimento de saúde legalmente
autorizado.
Neste caso, a delimitação típica (ou por outras palavras, a exclusão de
punibilidade de certos factos anteriormente integrados na descrição típica da L1) traduz-
se na introdução de um novo elemento constitutivo no tipo legal de aborto, a saber, para
além das exigências relativas à idade do feto, a exigência de que a interrupção da
gravidez não seja realizada em estabelecimento de saúde legalmente autorizado.
Por um lado, verifica-se que o novo elemento constitutivo do tipo legal de
aborto, contido na nova lei que delimita a tipificação do mesmo (descriminalizando
certos comportamentos), não pode ser retroactivamente valorado. E o mesmo é dizer
que o julgador não pode recorrer a factos que ocorreram em momento anterior à entrada
em vigor da L2 para preencher esse mesmo elemento constitutivo, pois tratar-se-ia de
retroacção in pejus, violadora dos artigos 1.º, n.º 1, e 2.º, n.º 1, do CP e 29.º, n.º 1, da
Constituição. Por exemplo, para condenar, o julgador não pode ter em consideração que
o alegado aborto foi realizado fora de estabelecimento de saúde legalmente autorizado.
Aliás, a valoração típica de tal circunstância implicaria que se desse relevância ao facto
de o aborto ter sido praticado fora de estabelecimento de saúde legalmente autorizado
quando, no momento em que o mesmo foi praticado, era legalmente impossível (pelo
menos nas circunstâncias do facto concreto) interromper a gravidez naquele tipo de
estabelecimento.
Por outro lado, após a entrada em vigor de L2, o juízo de necessidade punitiva
associado ao crime de aborto foi alterado pelo legislador penal. Nessa medida, e por
referência ao facto sub judice, o novo juízo de necessidade punitiva (constante da nova
lei) determina que a punição do agente já não se basta com o «fazer abortar» (previsto
em L1). Passa a ser necessário também que, ressalvadas as exigências referentes à idade
do feto, tal «fazer abortar» seja realizado em determinadas circunstâncias, em particular,
que seja realizado fora de estabelecimento de saúde legalmente autorizado. Contudo,
conforme anteriormente referido, esta (nova) condição não pode ser
preenchida/valorada retroactivamente.
Assim, neste caso, não estamos perante uma sucessão de lei penal em sentido
estrito, com a consequente aplicação do artigo 2.º, n.º 4, do CP, em caso de lei penal
posterior concretamente (e unitariamente) mais favorável ao arguido. Estamos antes
perante uma situação de descriminalização, prevista no artigo 2.º, n.º 2, do CP.
O agente não poderá ser punido ao abrigo de L2 (e aqui consideramos L2 como
constituindo o tipo penal de aborto delimitado – em termos de maior
compreensibilidade – pelas novas circunstâncias introduzidas pelo artigo 142.º, n.º 1,
alínea e), do CP), uma vez que os novos elementos que delimitam (negativamente) o
tipo não podem ser retroactivamente valorados. O agente não poderá ser punido ao
abrigo de L1 porque o juízo de necessidade punitiva associado ao mesmo já se encontra
desactualizado, não sendo suficiente e bastante, para punir o agente, a mera constatação
do «fazer abortar».
Note-se que, a propósito da concepção do Prof. Taipa de Carvalho, o erro sobre
o elemento «estabelecimento de saúde legalmente autorizado» implicaria a exclusão do
dolo, o que implica a sua natureza de especialização.
Acresce por fim que, sendo L2 uma norma permissiva, seria aceitável conceber
uma aplicação analógica dessa mesma norma ao facto de Ana, na medida em que
determinasse a desresponsabilização ou desagravamento da sua responsabilidade
(analogia favorável ao agente). Assim, chegaríamos à mesma solução de não punição do
agente através da aplicação analógica do artigo 142.º, n.º 1, alínea e), do CP.
Esta linha de resposta pode ser suportada pelo entendimento do novo artigo
142.º, n.º 1, alínea e), do CP, não tanto como uma norma delimitadora do tipo legal de
aborto, introduzindo novos elementos constitutivos ao mesmo (conforme referido
anteriormente), mas antes, e acima de tudo, como uma norma que traduz o afloramento
de critérios gerais de solução (e harmonização e concordância prática) de conflitos entre
bens jurídicos, como seja, a vida intra-uterina e o livre desenvolvimento da
personalidade da mulher2.
Para além disso, esta linha de resposta pode ser igualmente suportada pela
circunstância de tal norma permissiva ser inspirada por um princípio geral de liberdade,
2
Nesse sentido, Acórdão do Tribunal Constitucional n.º 617/2006.
neste caso, liberdade de procriação e constituição de família da mulher, o que parece
excluir a sua eventual excepcionalidade (excepcionalidade que existe, por exemplo, nas
autorizações legais de natureza processual, para a intromissão das autoridades policiais
na reserva de privacidade dos cidadãos).
Tudo visto, Ana não seria punida, uma vez que o seu facto mereceria ser
permitido segundo o mesmo princípio geral de liberdade (e segundo a mesma solução
de concordância prática entre bens jurídicos em confronto) que fundamento o novo
artigo 142.º, n.º 1, alínea e), do CP, o qual seria analogicamente aplicável àquele mesmo
facto.

3
Proposta de distribuição dos 5 valores:

a) Identificação do problema de relevância da lei penal inconstitucional de


conteúdo mais favorável ao agente – 0,5;
b) Enunciação sumária de teses que defendem a aplicação retroactiva da lei penal
inconstitucional de conteúdo mais favorável ao arguido e seus fundamentos – 1;
c) Enunciação sumária de teses que rejeitam a aplicação retroactiva da lei penal
inconstitucional de conteúdo mais favorável ao arguido e seus fundamentos – 1;
d) Opção fundamentada por uma das teses anteriormente enunciadas– 1;
e) Determinação das consequências diferenciadas de cada uma das teses defendidas
no caso concreto – 1,5.

Tópicos:

O problema que agora se coloca é o da determinação da relevância da lei penal


inconstitucional de conteúdo mais favorável no caso sub judice.
De acordo com uma das perspectivas possíveis acerca deste problema, Ana deverá
ser absolvida, por aplicação retroactiva da lei penal inconstitucional concretamente mais
favorável. Efectivamente, segundo este enquadramento da questão, a repristinação da lei
antiga de conteúdo menos favorável, que decorre da eficácia ex tunc da declaração de
inconstitucionalidade com força obrigatória geral, encontra como limite o princípio da
retroactividade penal in melius (artigo 29.º, n.º 4, da Constituição), por força dos
princípios constitucionais da confiança, da segurança jurídica e da irrectroactividade
penal in pejus (artigos 2.º, 18.º e 29.º, n.ºs 1 e 4 da Constituição). De outra forma, a
repristinação da lei anterior envolveria um efeito substancialmente análogo ao da
retroactividade da lei penal incriminadora, frustrando as legítimas expectativas dos
destinatários das normas penais quanto à descriminalização de comportamentos.
De acordo com uma orientação distinta, Ana deverá ser condenada à luz da lei
penal antiga em vigor no momento da prática do facto. Segundo esta perspectiva, a lei
penal inconstitucional é nula, não tendo realmente “entrado em vigor” nem revogado
validamente a lei anterior (art. 3.º, n.º 3, da Constituição), e não pode ser aplicada (art.
204.º da Constituição), uma vez que a determinação da lei válida é algo que antecede,
lógica e valorativamente, a colocação do problema da sucessão de regimes jurídicos no
tempo. Por outro lado, sendo o facto praticado por Ana anterior à aparência de vigência
desta norma inconstitucional que, como tal, não pode ter orientado o seu
comportamento, não deve sequer ser invocada qualquer expectativa legítima a tutelar de
acordo com o regime da falta de consciência da ilicitude, que conduziria a uma exclusão
da culpa por erro não censurável induzido pelo próprio legislador (artigo 17.º, n.º 1, do
Código Penal).
Esta última posição tem a seu favor a circunstância de conduzir a uma conciliação
óptima dos valores constitucionais envolvidos, salvaguardando simultaneamente a
sujeição dos tribunais à Constituição, o princípio da separação de poderes e as
expectativas realmente merecedoras de tutela dos destinatários das normas penais.
Uma proposta intermédia de resolução deste problema, defendida nas aulas
plenárias pela regente, adopta o critério da aplicação da lei penal inconstitucional mais
favorável aos casos em que o agente actua na vigência da lei inconstitucional ou na
eminência da sua entrada em vigor (por exemplo, após o resultado de um referendo),
com fundamento no princípio da autovinculação do poder punitivo do Estado ao Direito
que cria (artigo 2.º da Constituição). Embora esta posição se distinga, nas
consequências, daquela que rejeita a aplicação da lei penal inconstitucional, uma vez
que prescinde da demonstração dos pressupostos de um problema de culpa para tutelar
as expectativas dos destinatários da normas penais, no caso concreto de Ana a resposta
seria coincidente, uma vez que o momento da prática do facto se verifica anos antes da
realização do referendo.
Ressalve-se, todavia, que, na hipótese de o tribunal vir a proferir uma decisão
absolutória e de esta transitar em julgado, se verificaria uma consolidação dos efeitos do
caso julgado inconstitucional, por força da 1ª parte do n.º 3 do artigo 282.º da
Constituição.

Proposta de distribuição dos 3 valores:

a) Identificação de um problema de sucessão de leis penais em face da natureza da


norma – 0.75;
b) Análise dos pressupostos da sucessão de leis e conclusão pela aplicação do art.
2.º n.º 1 CP – 0.75;
c) Referência à proibição de aplicação retroactiva da lei penal mais gravosa, art.
29.º n.º 1 da CRP e arts. 1.º n.º 1 e 2.º n.º 1 do CP – 1;
d) Conclusão: extinção da responsabilidade penal de Ana – 0.5.

Tópicos:

As normas relativas à prescrição do crime encontram-se no Código Penal, nos


arts. 118.º e seguintes. Por conseguinte, à sucessão de leis prescricionais no tempo
deverão aplicar-se os arts. 1.º a 3.º do mesmo código.
Por alguma jurisprudência, foi colocada em causa a natureza penal das normas
prescricionais por, de um ponto de vista funcional, estas revestirem natureza processual,
uma vez que a prescrição do crime releva como pressuposto processual, obstando ao
conhecimento do mesmo.
Contudo, e independentemente da natureza que seja atribuída a este tipo de
normas, tem já sido aceite, de um modo geral, que às mesmas se deverá aplicar o regime
previsto no Código Penal, tendo em conta os seus efeitos na efectivação da
responsabilidade penal do arguido.
Na verdade, encontrando-se as normas prescricionais no Código Penal, o
afastamento do regime constante dos arts. 1.º a 3.º só seria possível caso se concluísse
pela natureza exclusivamente processual das normas em questão. Tal conclusão não
parece válida, uma vez que as mesmas exprimem um juízo de desnecessidade de
censura penal – em virtude do distanciamento entre a conduta e a eventual aplicação de
uma pena, ficando fragilizadas as finalidades desta – representando, ainda, uma garantia
fundamental dos cidadãos no âmbito do princípio da segurança jurídica.
Assumindo as normas prescricionais natureza, pelo menos mista – senão
essencialmente substantiva – deve ficar claro que à sucessão de leis deste tipo se aplica
o regime previsto no Código Penal.
Cumpre então determinar se estamos perante um problema de sucessão de leis,
atendendo aos seguintes pressupostos:
a) Possibilidade de subsunção do facto concreto à lei antiga e à lei nova:
uma vez que a lei que a norma incriminadora não foi alterada, este
pressuposto verifica-se;
b) Manutenção da situação jurídica a regular: este pressuposto não estaria
verificado, caso o prazo prescricional já houvesse decorrido, na sua
totalidade, antes da entrada em vigor da lei nova, pois estaria já extinta
a responsabilidade penal de Ana; uma vez que o prazo estava ainda em
curso aquando da entrada em vigor da lei nova, importa continuar a
nossa análise;
c) Alteração dos termos da responsabilidade penal, sem que ocorra uma
extinção da mesma – de facto, da aplicação da lei nova não decorre
uma imediata extinção da responsabilidade penal de Ana.

Tratando-se, portanto, de um problema de sucessão de leis e afigurando-se a lei


nova como uma lei posterior mais gravosa, impõe-se a aplicação dos arts. 1.º 1 e 2.º n.º
1 do Código Penal. Em virtude da proibição de aplicação retroactiva da lei penal mais
gravosa, art. 29.º n.º 1 da CRP, conclui-se pela aplicação a Ana de uma prazo
prescricional de 10 anos.
Ora, uma vez decorrido este prazo, no ano de 2007, a responsabilidade penal de
Ana encontrava-se, já, extinta.

Observações finais
A classificação das frequências têm em atenção a coerência das respostas, a
relevância dos argumentos utilizados e a capacidade de o aluno adoptar posição acerca
dos problemas suscitados como se os tivesse de decidir.

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