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Pouco mais se poderia falar quanto a isto. Deste algo que vem ao
autor, que surge, que percebemos como fulgor, apenas duas
notas talvez se distingam como padrões. Primeiro, que, fora a
luminosidade, não se pode prever muito: é possível que este algo
chegue como som, como palavra, como ideia. Quem saberá?
Anuncia-se, ouvimos, e então nada mais faz senão esperar que
tateemos. “Há algo aí” – e vamos, às apalpadelas. Depois, que
não é paciente, que oferece poucas oportunidades: ou o
aceitamos e nos demoramos nele ali, ou muito provavelmente se
perderá. Exige muito esforço nosso conservar seu brilho,
recuperar o frescor e a imediatez do encontro, e ao fim é muito
maior o número de nossas perdas do que daquelas que
aproveitamos: o texto que nasce, ou que ao menos se estrutura,
muito tempo depois da manifestação desse quid passa, ao autor,
a sensação da sobrevivência.
Ora, jaz aí, parece-nos, a resposta àquele “Por que isso pode dizer
respeito a outrem?”. A luminosa experiência do autor não é mais
que um lado da experiência artística; também por parte de quem
lê, de quem contempla, há a experiência luminosa que abre o
indivíduo a algo que lhe é claramente maior. Surge de fato a
ironia: a materialidade da letra, para o leitor, não figura mais
como obstáculo, mas torna-se precisamente a ponte que o
aproximará da experiência original de quem escreve. Apenas
aproximará, naturalmente, pois também aqui as bagagens, os
“elementos pessoais” acumulados pelo leitor ao longo de toda a
sua vida, fazem desta uma experiência pessoal e intransferível. A
experiência da escrita e a experiência da leitura se refletem e
correspondem tanto quanto o negativo e o positivo de um filme.
Ambas as partes contribuirão com seus traços e especificidades,
prejudicarão ou farão jus à experiência que é ponto de partida
para o autor e, para o leitor, local de chegada.