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ARTIGO ARTICLE
uma abordagem etnográfica
Abstract This work has emerged from one of the Resumo O presente trabalho, elaborado a partir
core themes of research undergone in my masters’ da dissertação, aborda um dos núcleos temáticos
course at the Federal University of Minas Gerais que emergiu da pesquisa durante o curso de mes-
– School of Nursing. In order to understand group trado na Escola de Enfermagem da Universidade
learning, we used the theoretical references of Pi- Federal de Minas Gerais. Para a compreensão da
chon-Riviére. According to this author, learning aprendizagem em grupo, utilizamos como referen-
is an indicator of uttermost importance in group cial teórico Pichon-Riviére. Para esse autor, apren-
processes. Through process interactions, a learn- dizagem é um dos indicadores de fundamental
ing mechanism unfolds allowing participants to importância no processo grupal. A partir do pro-
mutually appropriate reality, share thoughts and cesso interacional, estabelece-se uma situação de
knowledge. In most statements, interviewees have aprendizagem, que permite aos integrantes apro-
highlighted that the group allows them to learn priarem-se da realidade, mutuamente, e compar-
how to deal with diabetes. The core theme, “Group tilhar pensamentos e conhecimentos. A concepção
as a space for learning and transformation”, re- dos entrevistados de que o grupo proporciona o
veals some of the meanings and understandings aprendizado no manejo do diabetes pode ser obser-
that have translated the experience lived by par- vado na maioria dos depoimentos. O núcleo temá-
ticipants. This is an ethnographical study con- tico “Grupo como espaço de aprendizagem e trans-
ducted with thirteen diabetics who participate in formação” desvela concepções e significados que
group sessions at a Basic Health Unit of the Mu- traduziram a experiência que as pessoas vivencia-
nicipality of Belo Horizonte, Minas Gerais State, ram no grupo. Trata-se de um estudo etnográfico
Brazil. Data was collected through semi-structured desenvolvido junto a treze pessoas diabéticas par-
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Gerência de Atenção à interview, participant observation and documen- ticipantes de grupo de uma Unidade Básica de Saúde
Saúde - Centro-Sul.
tal analysis. Data analysis was oriented by Bar- da Prefeitura Municipal de Belo Horizonte, Mi-
Prefeitura Municipal de
Belo Horizonte. din’s content analysis method. nas Gerais. Os dados foram coletados por meio de
Rua Tupis 149/7º andar, Key words Group, Learning, Diabetes mellitus entrevista semi-estruturada, observação partici-
Centro. 30190-062 Belo
Horizonte MG.
pante e análise documental. A análise dos dados foi
spalmeida2005@yahoo.com.br orientada pela análise de conteúdo de Bardin.
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Departamento de Palavras-chave Grupo, Aprendizagem, Diabetes
Enfermagem Básica, Escola
de Enfermagem,
mellitus
Universidade Federal de
Minas Gerais.
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Almeida SP, Soares SM
pessoas integradas entre si e no contexto no qual coletiva de grupo e as crenças e valores embuti-
as mesmas estão inseridas7. dos no espaço dessa relação, o estudo etnográfi-
A cada encontro com a realidade e com o co tornou-se, para nós, a opção que permitiu
outro, vamos aprendendo a organizar e signifi- essa compreensão.
car nossas experiências, sensações, percepções, A coleta de dados em etnografia pressupõe a
emoções e pensamentos, construindo nossos convivência do pesquisador com o grupo em es-
modelos internos a partir das nossas interações. tudo, no seu ambiente cultural, por um determi-
Desta forma, a didática proposta por Pichon- nado período de tempo, com a finalidade de
Riviére7 é definida como uma estratégia que se ampliar a escuta do mesmo, a observação e a
caracteriza por uma tarefa informativa, a partir participação em seu mundo. Neste sentido, o
da comunicação de conhecimentos, mas que não pesquisador é o principal instrumento para a
se limita a esta, ou seja, vai além disso, principal- coleta de dados, utilizando como métodos fun-
mente por desenvolver uma tarefa formativa, que damentais para a coleta dos dados a entrevista e
é a de promover modificações de atitudes através observação10.
da elaboração dos significados, sentimentos e Embora a pesquisadora que realizou o tra-
relações presentes no campo grupal. balho de campo trabalhe em uma das UBS da
A articulação dessas duas tarefas ocorre a par- Prefeitura de Belo Horizonte que desenvolve gru-
tir da construção de um instrumento (ECRO - po de diabéticos, optamos por realizar o estudo
esquema conceitual referencial) que situe o sujei- em outra unidade, com o propósito de atender à
to no campo grupal, permitindo-lhe abordá-lo, orientação metodológica da etnografia. A abor-
compreendê-lo e operar sobre ele a partir da uti- dagem etnográfica enfatiza a necessidade de es-
lização de técnicas adequadas, ou seja, a apropri- tranhamento do pesquisador ao entrar no cam-
ação instrumental da realidade para modificá-la7. po, com o objetivo de apreender aquilo que está
Neste sentido, Quiroga8 afirma que “a apren- implícito nos comportamentos, atitudes, valores
dizagem tem em cada um de nós uma historici- e crenças de determinado grupo cultural.
dade”, a partir de uma organização pessoal e so- O trabalho de campo constituiu-se das se-
cial, e que além de sermos seres sociais somos guintes etapas: aproximação com os grupos, co-
também sujeitos cognoscentes. leta de dados por meio de entrevista semiestru-
A concepção de aprendizagem definida por Pi- turada e observação participante preconizadas
chon-Riviére7 sustenta-se nessa didática, a partir por Leininger10, com elaboração concomitante
de uma leitura crítica e coerente da realidade e na de notas de campo e notas pessoais, e análise
não aceitação acrítica de normas e valores, ou seja, documental.
uma leitura que implique a capacidade de avalia- O campo de estudo foi uma Unidade Básica
ção e criatividade para a transformação do real, a de Saúde (UBS) localizada na Regional Centro-
elaboração da experiência em grupo e o contexto; Sul do município de Belo Horizonte, Minas Ge-
nisto consiste o aprender para este autor. rais. Nessa UBS estão lotadas três Equipes de
Saúde da Família (ESF). No presente estudo, os
informantes foram treze pessoas diabéticas,
Percurso metodológico moradoras da área adscrita às ESF verde e azul,
que participavam de atividade coletiva de grupo
Dentre as abordagens qualitativas, optamos pela há pelo menos três anos. A coleta de dados foi
etnografia como caminho metodológico para a realizada no período de abril a dezembro de 2005.
realização deste estudo, fundamentando-nos em A observação participante desenvolveu-se du-
seu sentido próprio que, segundo Leininger10, é rante as reuniões do grupo, sendo esclarecida, aos
um processo sistematizado de observar, detalhar, participantes do grupo, a presença da pesquidora
descrever, documentar e analisar o estilo de vida (primeira autora deste estudo) ao iniciar o traba-
ou os padrões específicos de uma cultura ou sub- lho de campo. Essas reuniões aconteciam uma vez
cultura, possibilitando ao pesquisador compre- por mês, na própria UBS, em local próprio para a
ender o modo de viver do grupo estudado den- realização desse tipo de atividade, no turno da
tro de seu ambiente natural. manhã, com duração de aproximadamente duas
Assim, tendo demonstrado, ao longo da nossa horas. As reuniões do grupo aconteciam a partir
trajetória, interesse pela compreensão que o usu- de um cronograma previamente definido e acor-
ário, como sujeito ativo do processo grupal, tem dado entre todos, com a participação de cerca de
a respeito do significado de grupo, sua procura quinze pessoas. Ao término das reuniões, as obser-
pelos meios de intervenção, qual seja, a atividade vações foram anotadas em um diário de campo,
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ença e como ela se manifestou. Nesses momen- as observações, foi possível percebermos que, nas
tos, a participação de todos contribuiu para que discussões sobre alimentação, principal tema dis-
as informações e experiências ajudassem a escla- cutido no grupo, o coordenador buscava con-
recer as dúvidas expostas pelos novos partici- textualizar as informações dentro dos hábitos
pantes do grupo. alimentares de cada um, fazendo a adequação à
Um dos entrevistados, em seu depoimento, realidade do diabético.
relatou como acontece o aprendizado, o que eles Ao se questionar sobre atividades físicas que
aprendem e a compreensão de que a manifesta- são desenvolvidas pelos integrantes do grupo, foi
ção do adoecer é individual: Aqui a gente conver- levantada a possibilidade de sua realização du-
sa, brinca, troca idéias com os colegas. Por exem- rante os afazeres domésticos e na vida cotidiana,
plo, a alimentação que é melhor pra a gente, pra inclusive com orientações de postura adequada
saúde. Como a gente se descobriu que estava diabé- ao se desenvolvê-las. Assim, foi possível obser-
tico, né? Como as pessoas se descobriram que esta- varmos que as discussões, as orientações e infor-
vam doentes. Como se manifestou a doença nelas. mações eram integradas ao contexto das expe-
Porque cada um é, cada caso é um caso. (Acácia) riências de cada um.
Essa compreensão foi possível a partir de um A partir de um diálogo em que perguntas e
diálogo contextualizado na experiência de ser di- respostas são realizadas, estabelecem-se discus-
abético entre pessoas que compartilham os mes- sões em torno de temas de interesse: Fazemos tro-
mos obstáculos, a mesma realidade, ou seja, as ca de idéias. Às vezes, assim, particular, onde nós
mesmas necessidades. Assim, os saberes são com- estávamos ali [no espaço destinado à realização
partilhados; há uma troca, que permite reflexão. do grupo]. Você sabe como que é. “Eu como isso e
A partir de uma situação dialogal, que se estabe- isso”. Outro: “Eu não como isso”. “O que eu como
lece em uma relação horizontal entre pessoas, é pra não fazer mal?” (Flor do campo). Em um dos
possível a comunicação, que para Freire14 “é o momentos do grupo, durante a discussão sobre
indispensável caminho nas questões vitais e em hábitos alimentares, um dos participantes mani-
todos os sentidos do nosso ser”. festou-se, dizendo: Cada um tem que perceber o
A oportunidade de estar aprendendo cada dia que faz bem e o que faz mal para si. (Jasmim)
mais a respeito do diabetes é compreendida como De fato, esse aprendizado acontece processual-
fonte de motivação para continuar participando mente e não de uma só vez. A cada dia, há a opor-
do grupo: A gente anima, dá mais vontade de vir tunidade de se aprender, de compreender o que
no grupo para aprender mais coisas. (Rosa) não foi possível compreender antes: Cada dia que
O aprendizado de novos hábitos acontece du- eu venho eu aprendo mais um pouquinho. (Jasmim)
rante o processo de grupo a partir das experiências Essa compreensão da aprendizagem em um
compartilhadas e dos esclarecimentos feitos pelos movimento dialético, a partir de uma leitura crí-
próprios integrantes do grupo: Ah! O grupo ali vai tica da realidade, que pressupõe movimento e
aprendendo uma com a outra, como lidar com dia- mudança, foi desvelada em um dos depoimen-
bete, com a dieta, alimentação, exercícios. (Acácia) tos: As reuniões do grupo me trouxe muito benefí-
Além dos aspectos educativos quanto ao cio porque você aprende. Você aprende e morre
manejo do diabetes, outros aspectos também sem aprender nada. O mundo evolui e aquilo que
foram abordados no contexto do grupo, como falou no passado já não vale mais nada. As coisas
os aspectos subjetivos do adoecer, os problemas mudam por isso a gente na verdade não sabe nada.
emocionais que interferem com a saúde e a do- (Flor de ipê)
ença e até mesmo com a vida: Eles ensinam a Assim, durante o acontecer grupal, ocorre um
gente como a gente vai viver. O dia a dia da gente. processo de interação em que as pessoas vão se
Que a gente não deve ficar preocupada com as coi- reconhecendo, a partir do diálogo e do intercâm-
sas, que deve ficar mais relaxada. (Orquídea) bio que, segundo Pichon-Riviére7, acontece em
A conscientização da situação real vivida e da um movimento em espiral dialética, em que cada
necessidade de adequação a uma nova realidade resposta possibilita o surgimento de outras in-
proporciona uma abertura para o aprendizado, dagações. Para Freire14, essa aprendizagem ocorre
em que o sujeito aprende a questionar o mundo na medida em que há uma conscientização da
e a si mesmo dentro do mundo, ou seja, permite, situação social, em que habilidades vão sendo
segundo Freire14, que “as pessoas se eduquem adquiridas, através de situações problematiza-
umas às outras mediatizadas pelo mundo”. doras que estimulam a discussão e o debate, e
Vale ressaltar que a aprendizagem não se li- com a utilização de um método “ativo, dialogal,
mitava à incorporação de informações. Durante crítico e criticizador”.
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pensar, apoiado em uma teoria do pensamento e mento de exercícios para a musculatura facial
conhecimento, que não são fatos individuais, mas através da realização de caretas e técnica do riso;
produtos de um contexto social, sendo corrobo- discussão de conteúdos pertinentes ao diabetes
rado por Freire14 no que diz respeito à sua con- utilizando jogos, brincadeiras e dinâmicas.
cepção de educação voltada para a autonomia As atividades lúdicas são definidas por Rabe-
do sujeito, que é um ser de relações, interacional, lo et al.6 como qualquer atividade: jogos ou brinca-
político e cultural. deiras, trabalho com massinhas, exercícios com
Outro aspecto a ser considerado quanto à os pés, jogos com música, atividades de relaxa-
aprendizagem no grupo refere-se ao ambiente em mento. Para essas autoras, essas atividades produ-
que esta ocorre e os recursos utilizados. Observa- zem um distanciamento da realidade, estimulam
mos durante as atividades do grupo, bem como a a autoexpressão dos integrantes, produzem rela-
partir das falas dos entrevistados, as referências xamento das tensões, proporcionando, ainda,
que eles fazem ao ambiente presente no grupo, entretenimento e reconhecimento de si mesmo.
que proporciona momentos de descontração. Nessa perspectiva, Torres et al.5 comentam
Os entrevistados, ao falarem sobre a vivência que os jogos e brincadeiras utilizados nas ativi-
no grupo, identificaram algumas estratégias dades de grupo propiciam um ambiente agradá-
como jogos, brincadeiras, ginásticas, alongamen- vel, que favorece a aprendizagem, facilitando a
tos, técnicas de relaxamento, dinâmicas utilizan- construção de processos internos. Além disso,
do toques e massagens realizadas no grupo. Es- esses recursos favorecem uma maior participa-
ses depoimentos revelaram a compreensão que ção e comprometimento da pessoa diabética e
eles têm desse espaço como uma oportunidade do profissional de saúde na transformação do
para se descontrair, relaxar, se divertir, ter mo- ambiente clínico e do próprio processo educati-
mentos de alegria: É muito bom! Faz ginástica. A vo realizado no grupo.
gente brinca, né. Então, é bom nesse sentido por- Observamos que essas atividades incentiva-
que a gente tem uma luta, né. Porque cada um tem vam o grupo à ação e comunicação, facilitando o
a sua luta em casa. (Acácia) processo grupal e permitindo a expansão do co-
A gente vem, a gente conversa, um ri, outro nhecimento e possibilidades de interação. Entre-
fala uma piada, outro fala outra coisa, aquilo vai tanto, Miranda et al.16 e Afonso17 recomendam
divertindo a mente da gente. (Copo de leite) que essas atividades devem respeitar e ser ade-
A reunião do grupo é uma parte importante quadas ao processo do grupo.
pra todos nós. Primeiro porque a gente distrai, con- Acreditamos que a realização de atividades
versa com um. São as horas que a gente passa ali dessa natureza no espaço do grupo tem contri-
tranquilo. A gente sai de lá tranquilo, relaxante. buído para a motivação da pessoa no que se re-
(Flor do campo) fere a sua participação no grupo, à busca do
A realização de atividades lúdicas no espaço aprendizado e à discussão das questões referen-
do grupo, como as brincadeiras, permite que se tes ao diabetes.
trabalhe algum tema específico ou, segundo au-
tores como Miranda et al.16 e Afonso17, até mes-
mo um conflito, porém essa estrutura deve per- Considerações finais
mitir uma abertura perceptiva, a expressão de sen-
timentos e idéias, permitir que o sujeito se veja em O trabalho com grupos comporta duas dimen-
situações não cristalizadas no cotidiano, e pro- sões ou potencialidades: uma terapêutica, na
mover também uma sensibilização e uma dispo- medida em que se favorecem os insights e a ela-
sição para a apreensão de novos significados. boração de questões subjetivas, interpessoais e
Durante as reuniões do grupo, observamos sociais; e outra pedagógica, uma vez que se de-
que essas atividades eram realizadas com o obje- sencadeia um processo de aprendizagem partin-
tivo de trabalhar alguns conteúdos discutidos que do de reflexões sobre a experiência e elaboração
remetiam a outras formas de incentivar o auto- do conhecimento sobre si mesmo no mundo e
cuidado, como, por exemplo, a importância da com o mundo8,17.
automassagem, principalmente dos pés e do cor- Nos grupos observados, foi possível identifi-
po, visando a promover a autoestima. Outros carmos a presença dessas duas dimensões, sen-
conteúdos trabalhados no grupo com os recur- do o aspecto pedagógico desenvolvido ao se arti-
sos dessas atividades foram: a importância de cularem as informações trazidas pelo coordena-
exercícios de alongamento, principalmente antes dor com as experiências relatadas pelos mem-
da realização de atividades físicas; desenvolvi- bros quanto ao tema em discussão. O aspecto
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Colaboradores
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