Escolar Documentos
Profissional Documentos
Cultura Documentos
UTÓPICA?
Nayara Pasqualotto
UTFPR – Pato Branco
nay_nana@hotmail.com
Danielle Pasqualotto
administradoradanipasqualotto@hotmail.com
Resumo
O presente artigo faz uma breve discussão a respeito do desenvolvimento rural sustentável, bem
como suas possibilidades de real efetivação. Para contemplação de tais questões, são abordados
no trabalho, inicialmente o histórico e o conceito de desenvolvimento sustentável, seguindo de
uma análise sobre o desenvolvimento rural sustentável. Por fim, são discutidas as reais
possibilidades de se atingir um desenvolvimento equitativo no campo, contemplando todas as
dimensões necessárias para a sustentabilidade. Desta forma, apresenta-se como alternativas reais
para o desenvolvimento rural sustentável o fortalecimento da agricultura familiar, a aposta em
novas formas de comercialização, o investimento na escala local de desenvolvimento, entre
outras.
Introdução
O debate sobre “desenvolvimento” foi colocado em evidência por dois momentos nas
últimas décadas no Brasil, sendo que o primeiro ocorreu entre os anos 1950 e 1970.
Neste período, impulsionada pelo novo padrão e estilo de vida imposto pelos países
dominantes, a expectativa pelo desenvolvimento estimulou iniciativas em diversas
partes do mundo (NAVARRO, 2001).
Devido ao grande percentual de população vivendo em áreas rurais e a relativa
participação da agricultura na economia, o desenvolvimento rural tornou-se de interesse
social e político. A concepção de desenvolvimento rural foi conduzida sob a óptica da
modernização, visto que esta época foi marcada pelas inovações tecnológicas,
científicas e de produção, comumente denominada Revolução Verde (NAVARRO,
2001).
1
O segundo momento, perpassa a década de 1990 e, de acordo com as afirmações de
Navarro (2001), ressurge com um enfoque inverso ao dos anos 1950. De acordo com o
autor, a concepção de desenvolvimento foi colocada novamente em evidencia devido às
inquietudes da sociedade em relação às impossibilidades de desenvolvimento
acarretadas pela grande crise ambiental, social e econômica do período.
Para o sociólogo Sérgio Schneider (2007), esta década representou o ressurgimento do
debate sobre desenvolvimento no Brasil ancorados no novo cenário político e
econômico que surgia. Após a estabilização da economia e a baixa nos índices de
inflação no governo de Fernando Henrique Cardozo, houve a retomada das discussões a
respeito do desenvolvimento do país.
A organização social, através do surgimento de cooperativas, associações e ONG’s
(organizações não governamentais) começam a ganhar força, reivindicando melhorias
tanto em áreas urbanas como rurais. Desta forma, pode-se afirmar que “a sociedade civil
readquiriu e ampliou a diversidade de formas de expressão de sua complexidade política
o que, sem surpresa, acaba estimulando conflitos e disputas, e às vezes revelando suas
contradições” (SCHNEIDER, 2007, p.9).
Assim como Navarro (2001), Schneider (2007) também considera a crise ambiental que
surge na década de 1960 como uma das propulsoras para o enfoque sobre o
desenvolvimento rural no período. Neste contexto, o autor aborda sobre a emersão do
discurso a respeito do desenvolvimento sustentável, onde as questões ambientais
começam a ter peso na sociedade, motivando políticas públicas e pesquisas a fim de
amenizar as consequências da crise.
Desta forma, o presente artigo busca a realização de uma análise teórica sobre as
concepções acerca do desenvolvimento rural sustentável, suas possibilidades e desafios.
Para isso, serão abordados temas referentes ao conceito de sustentabilidade e
desenvolvimento, bem como os caminhos a serem percorridos para alcança-los.
Desenvolvimento sustentável
2
Os questionamentos sobre a sustentabilidade do desenvolvimento surgem a partir da
crise ambiental, que se origina da consciência ambiental iniciada na década de 1960.
Nessa década, junto com a consciência ambiental e a busca de um desenvolvimento
mais racional, surgem movimentos de “contracultura” que buscam reduzir
drasticamente, os níveis de consumo adotando-se estilos de vida mais simples ou
naturais (EHLERS, 1999).
Esses movimentos apoiados em eventos e obras que abordam a problemática ambiental
são discussões que vêm abarcando décadas em busca de soluções viáveis, capazes de
realizar o crescimento econômico aliado à conservação ambiental e equidade social. No
entanto, são propostas que questionam uma ordem estabelecida, onde valores
econômicos transformaram-se em prioridades.
Caporal e Costabeber (2007) apresentam um resumo de estudos e conferências sobre o
processo de desenvolvimento, nos quais é abordada a problemática da
insustentabilidade do sistema convencional (Quadro 1).
3
-“La humanidad ante La alcançadas no contexto do sistema
encrucijada” mundial.
(MihanhjiloMesarovic) A busca de soluções exige
cooperação e a adoção de estratégias não
tradicionais.
1976 Terceiro trabalho do As soluções requerem uma “nova
Clube de Roma ( Jan ética global”, baseada na “cooperação”.
Tinbergen)
1980 Informe Global 2000 Diagnóstico: a vida no planeta está
(encomendado pelo ameaçada.
presidente Carter – EUA) Conclusão: o modelo de
desenvolvimento não é extensível. O
estilo de vida do “norte” não pode chegar
a todos, pois o planeta não suportaria.
1987 Informe Burtland Conceito oficial de
(Nosso Futuro Comum) da Desenvolvimento Sustentável
CMMAD (proposições ainda centradas no
crescimento econômico)
1992 Rio 92 (Conferência Carta da Terra
sobre o Meio Ambiente e Agenda 21 (Código de
Desenvolvimento) Comportamento par o século XXI)
Carta climática
- Ações para evitar os efeitos da mudança
em andamento.
- Acordos sobre Biodiversidade.
1996 Conferência da FAO e Banco Mundial: há
Alimentação (Roma) alimentos para todos. O problema é de
distribuiçãoe de capacidade de acesso aos
alimentos.
Meta: reduzir a fome de 50% dos
famintos até2025.
1997 Rio + 5 Alerta: “nada mudou”.
2002 Rio +10 (Conferência Retomada dos debates e avaliação
de Johanesburg) dos resultados da Rio 92.
Problemas gerados pela
globalização.
Fonte: Adaptado de Caporal e Costabeber (2007)
4
Leis (1996), avalia que nenhuma conferência realizada antes da “Rio 92”, teve tanta
importância nas discussões relativas ao meio ambiente. Principalmente pela
representatividade composta por chefes de Estados e de organizações não
governamental.
No entanto, o autor afirma que a década de 1990 se destacou por apresentar outras
cúpulas realizadas pela ONU, como a Viena-93 (conferência mundial sobre os direitos
humanos) e a Cairo-94 (conferência internacional sobre a população), que produziram
importantes documentos e demonstraram preocupações sobre o tema, mas, não
garantiram nenhum mecanismo efetivo de alcance global para proteger os direitos
humanos, o meio ambiente e a população mundial.
Esses eventos a nível mundial mostram o surgimento tímido de uma nova
racionalidade, mesmo que os objetivos econômicos sejam priorizados em relação aos
aspectos ambientais e sociais. Uma questão relevante é que nesse contexto surge à
noção e conceito de desenvolvimento sustentável.
A Comissão Mundial sobre o Meio Ambiente e Desenvolvimento (CMMAD) das
nações unidas, desenvolveu o conceito de desenvolvimento sustentável em 1987, o qual
definiu que o conceito de sustentabilidade envolve três condições básicas:
5
Para o autor, há a constituição de um neoliberalismo ambiental, o qual vê a
sustentabilidade aliada ao crescimento econômico, sendo que o mesmo procura
internalizar as condições ecológicas da produção, afirmando que o livre mercado é o
meio eficaz de assegurar o equilíbrio ecológico e a igualdade social. A degradação
ambiental causada pelos processos produtivos, distribuição e circulação seria revertida a
partir da tecnologia.
Essa lógica de desenvolvimento baseada na equação do crescimento, sociedade e meio
ambiente mediante a adoção de um otimismo tecnológico (excludente do ponto de vista
socioambiental) é denominado decorrente Ecotecnocrática (CAPORAL E
COSTABEBER, 2007). A qual dá base de sustentação à agricultura convencional.
Em oposição à corrente ecotecnocrática, surge quase ao mesmo tempo, a corrente que
Caporal e Costabeber (2007) denominam de corrente ecossocial, a qual é formada de
inúmeras ramificações como: o ecodesenvolvimento, os enfoques culturalistas e
ecossocialistas, economia ecológica e a teoria marxista ecológica.
Essa corrente “se caracteriza por suas reivindicações de mudanças estruturais profundas
na sociedade e de um novo pacto de solidariedade, permitindo a construção de um novo
projeto histórico e a busca de novos rumos nas estratégias de desenvolvimento”
(Caporal e Costabeber, 2007, p.84).
A partir da influência de diversas correntes, a corrente ecossocial parte da crítica do
processo de desenvolvimento liberal de exploração do meio ambiente e social, para
fornecer uma alternativa que tenha como enfoque a valorização étnica/cultural, assim
como, dos ecossistemas locais, através da adoção de tecnologias favoráveis as
condições culturais e locais para promoção de um desenvolvimento sustentável baseado
no tripé: econômico, social e ambiental.
Desta forma, parte-se do princípio de que não há desenvolvimento sustentável, baseado
apenas no crescimento econômico, onde os ecossistemas são vistos como “recursos”
naturais ilimitados, e a sociedade como “mão-de-obra” disponível para o mercado.
A efetiva construção de um desenvolvimento sustentável deve partir da
emancipação/equidade social e preservação/conservação do meio ambiente onde o
crescimento econômico esteja aliado ao bem estar social e a sustentabilidade ambiental,
mantendo sua capacidade produtiva ao longo do tempo, atendendo as necessidades das
atuais e futuras gerações.
6
Desenvolvimento Rural Sustentável
7
impulsionadora de dinâmicas socioeconômicas mais ajustadas ao imperativo
ambiental”.
Contudo, independentemente da adoção de um conceito conciso sobre desenvolvimento
rural sustentável, torna-se necessário o entendimento sobre as estratégias que
possibilitem o alcance da sustentabilidade. Para isso, serão abordadas a seguir algumas
alternativas para a real efetivação da sustentabilidade no meio rural.
8
representa um componente de forte sensibilidade social, pois essa escolhe a agricultura
familiar como o motivador dos processos de desenvolvimento rural.
Desta forma, Costabeber e Caporal (2003) evidenciam como alternativas de novas
formas de comercialização: a criação de redes de confiança entre os agricultores e
consumidores; o investimento na distribuição de alimentos através de feira-livres e
mercados locais; o incentivo ao comércio solidário, onde os agricultores recebam um
valor junto pelo produto; e o investimento no consumo institucional.
A dimensão local do desenvolvimento torna-se prioridade ao passo que as comunidades
rurais, bem como sua garantia de renda, tradições e qualidade de vida, formam a escala
de maior importância no processo para o desenvolvimento rural sustentável. Desta
forma, torna-se necessário que o processo de desenvolvimento contemple inicialmente
as comunidades locais para que depois se torne global.
Costsbeber e Caporal (2003) salientam a importância da criação de planos de
desenvolvimento rurais municipais e posteriormente regionais, os quais atendam as
reais necessidades da população presentes no espaço. Esses meios garantem além de
resultados positivos aos atores envolvidos, mas também o maior protagonismo das
famílias agricultoras.
Abordando possíveis soluções para o desenvolvimento rural, Veiga (2001) afirma que o
Brasil necessita de um arranjo institucional que auxilie as articulações intermunicipais a
elencar os principais problemas do meio rural, bem como delinear ações de
desenvolvimento. Desta forma, tem-se a necessidade de que o governo estimule
iniciativas que mais tarde possam ser financiadas a fim de obter um maior
desenvolvimento.
A diversificação das economias locais também é apontada por Veiga (2001) como um
passo importante para o desenvolvimento rural, visto que essa permite salubridade aos
trabalhadores e maior interação com o ambiente se comparada ás grandes propriedades
monocultoras. Esta estratégia garante ainda a pluriatividade do trabalho agropecuário,
fazendo com que muitos membros da família que haviam migrado para os centros
urbanos retornem com o objetivo de contribuir com as atividades.
Portanto, fica claro que muitos são os caminhos para alcançarmos o desenvolvimento
rural sustentável, e que esses devem ser pensados na perspectiva do local para o global,
pois nota-se que muitas das possibilidades encontradas por comunidades rurais de um
determinado município não se aplicam a outro.
9
Assim, ao se pensar em estratégias de desenvolvimento para o campo, deve-se
considerar as dimensões necessárias para a real sustentabilidade, não deixando
interesses meramente econômicos prevalecerem sobre as questões ambientais, sociais e
culturais, pois somente contemplando tais dimensões é que conseguiremos expandir as
possibilidades humanas e garantir a igualdade de oportunidades.
Considerações finais
10
tecnologias apropriadas às condições socioeconômicas e ambientais locais e o baixo uso
de insumos.
Assim, o desenvolvimento rural sustentável deve estar baseado em ações que visem
promover o bem estar social, a preservação ambiental e o crescimento econômico, e
para isso, é necessário uma mudança de concepção de desenvolvimento, o qual não
esteja calcado apenas nos aspectos econômicos, e que abranjam as particularidades de
cada território, diferentemente da homogeneização de técnicas e modelos econômicos
promovidos pela “agricultura moderna”.
Referências
LEFF, E.; traduzido por CAPORAL, F.R . Agroecologia e saber ambiental. Rev.
Agroecologia e desenv. Rur.Sust.Porto Alegre, v.3,n.1, p.36-50, jan/mar.2002.
12