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Tradução de Macro I
Tradução de Macro I
1 Introdução
Uma preocupação central da macroeconomia neoclássica é a relação entre teoria e
fatos. Essa preocupação remonta ao início do século, quando uma crítica comum à
economia neoclássica era a falta de contrapartidas empíricas para as previsões teóricas.
A partir desses anos, o uso de métodos quantitativos para avaliar economias reais e os
resultados de modelos teóricos se desenvolveram de maneira incrível. A maioria desses
desenvolvimentos ocorreu no campo econométrico, pelo menos até o advento da
macroeconomia neoclássica e seus modelos de ciclo de negócios real (RBC).
O uso de modelos de equilíbrio calibrado para reproduzir as propriedades de
duração e amplitude das economias reais está presente na economia há muito tempo; 1
no entanto, as técnicas modernas de uso de modelos de equilíbrio geral dinâmico para
simular características-chave das economias reais começaram com Kydland e Prescott
(1982). Neste artigo seminal, eles calibram uma versão modificada do modelo de
crescimento de equilíbrio básico para replicar propriedades básicas da economia
americana. O ponto é que a inclusão de tempo de construção geraria um modelo onde a
persistência da saída corresponder à persistência da produção americana. Ao usar esse
tipo de procedimento para testar modelos, eles estavam iniciando uma nova abordagem
para explicar os fatos nas economias reais.
No âmago da nova abordagem estava a ideia de que os modelos teóricos
calibrados deveriam ser capazes de replicar fatos importantes das economias reais.
Nesse sentido, qualquer modelo consistente com o comportamento ótimo de firmas e
indivíduos pode ser testado através da abordagem RBC, não há razão alguma para evitar
hipóteses estranhas à macroeconomia neoclássica, desde que a hipótese seja consistente
com uma dinâmica geral modelo de equilíbrio (DGE).
Nessa perspectiva, o nome “ciclo de negócios real” pode não ser o mais adequado
para descrever a nova metodologia, pois alguns autores da área estão calibrando e
simulando modelos com propriedades nominais interessantes: recentemente, até mesmo
artigos que apresentam rigidez nominal foram incorporados à RBC análise (ver, por
exemplo Chari, Kehoe & McGrattan, 2000). O apenas a restrição prática sobre a
incorporação de novas hipóteses nos modelos DGE calibrados é computacional. Além
disso, a nova hipótese também deve ajudar a explicar os fenômenos cíclicos.
O princípio de que os modelos teóricos devem ter alguma contrapartida empírica
pode ser ilustrado nesta passagem de Ragnar Frisch, mencionado por Kydland e
Prescott (1991): “a teoria, na formulação de noções quantitativas abstratas, deve ser
inspirada em maior medida pela técnica de observação . E novos estudos estatísticos e
outros estudos factuais devem ser o elemento de saúde da perturbação que
constantemente ameaça e inquieta o teórico e o impede de descansar em algum conjunto
herdado e obsoleto de suposições. (Ragnar Frisch, em sua declaração editorial
introduzindo o primeiro número da Econometrica, 1933) ”.
Frisch também destaca que no conjunto de técnicas quantitativas aplicadas à
análise econômica está a teoria dos ciclos econômicos. Nesse sentido, os modelos
modernos herdaram a apreensão de Frisch sobre as bases empíricas para justificar
construções teóricas. Em modelos de ciclos é natural que o foco principal esteja
relacionado às propriedades cíclicas de uma dada economia. Claro, se alguém quer lidar
com ciclos, deve ter uma definição de ciclos. Para fornecer tal definição Stock e Watson
(1999), e também Diebold e Rudebusch (1999), citaram Burns e Mitchell (1946: 3):
“Um ciclo consiste em expansões que ocorrem aproximadamente ao mesmo tempo em
muitas atividades econômicas, seguidas por recessões gerais semelhantes, contrações e
reavivamentos que se fundem na fase de expansão do próximo ciclo; esta sequência de
mudanças é recorrente, mas não periódica; na duração os ciclos de negócios variam de
mais de um ano a dez ou doze anos; não são divisíveis em ciclos mais curtos de caráter
semelhante com amplitudes próximas das suas ”.
Stock e Watson (1999) enfatizam que as duas principais questões empíricas são
como identificar os ciclos de negócios históricos e como quantificar o comovimento de
uma série de tempo específica com o ciclo de negócios agregado.
Seguindo a tradição da RBC, este artigo pretende fornecer um conjunto de fatos
empíricos para caracterizar as propriedades dos ciclos no Brasil. Tal conjunto pode ser
útil para pesquisas que utilizam modelos de RBC para explicar a economia brasileira.
Nesse sentido, o artigo fornece a calibração do modelo básico de RBC e do modelo de
trabalho indivisível. Essa calibração é consistente com os fatos deste artigo e segue os
procedimentos propostos por Cooley e Prescott (1995). Além disso, simulações dos
modelos calibrados são fornecidas e os resultados são comparados com os fatos
brasileiros.
A seção 2 descreve um conjunto de dados compatível com a análise do ciclo de
negócios. A seção 3 mostra os segundos momentos do ciclo brasileiro. A seção 4
apresenta uma versão calibrada do modelo básico de RBC, enquanto a seção 5 estende o
modelo a fim de incorporar a hipótese do trabalho indivisível. A seção 6 discute as
propriedades cíclicas geradas pelos modelos simulados e as compara com as
propriedades cíclicas da economia brasileira. Por fim, a seção 7 apresenta algumas
conclusões e sugestões para pesquisas futuras.
2. Conjunto de dados
2.1 Produto nacional bruto
A série do produto nacional bruto foi obtida a partir das tabelas de contabilidade
nacional. De 1947 a 1986 foi calculado pelo Instituto Brasileiro de Economia (IBRE /
FGV), órgão da Fundação Getulio Vargas do Rio de Janeiro (FGV). Em 1986, o
governo decidiu calcular por conta própria as tabelas contábeis nacionais por meio do
Instituto Brasileiro de Geografia e Estatística (IBGE), que é um instituto oficial.
Embora essas mudanças impliquem algumas modificações nas metodologias para
contabilizar o PIB, não foram tão relevantes a ponto de prejudicar a série completa.
Alguns dos problemas mais relevantes decorrentes deles serão discutidos nesta seção.
Usamos o PIB em vez do produto interno bruto (PIB) mais tradicional para criar
um conjunto de dados compatível com a pesquisa do ciclo de negócios real. Como a
maioria dos modelos de RBC lida com economias fechadas, o PNB é mais apropriado
do que o PIB. A Figura 1 mostra as duas séries de 1947 a 1998.
Como se pode ver, as duas séries estão intimamente relacionadas. Somente na
década de 1980 eles começaram a mostrar alguma diferença perceptível. Além disso, a
série do PIB encontra-se acima da série do PIB, e isso se deve ao fato de o Brasil ser
remetente líquido de rendas para o exterior. A maior parte dessa renda vai como
pagamento de juros da dívida externa.
2.2 Consumo
A série original de consumo final provém das tabelas contábeis nacionais e é
composta pelo consumo das famílias e pelo consumo do governo. Embora o consumo
do governo possa ser usado como aparece nas tabelas contábeis nacionais, o consumo
da família deve ser ajustado a fim de corresponder à série consistente com a análise dos
ciclos de negócios.
Dois problemas na série de consumo das famílias merecem atenção especial. O
primeiro está relacionado à inclusão de variações nos estoques, que são contabilizados
como consumo desde 1986. O segundo problema é que as tabelas das contas nacionais
não fornecem uma série específica para o consumo de bens não duráveis. Embora seja
verdade que outros problemas estão relacionados a esta série, esses dois foram
selecionados porque são particularmente relevantes para a análise do ciclo de negócios.
A Figura 2 mostra o consumo total, o consumo das famílias e o consumo do
governo de 1947 a 1998. Essas séries foram extraídas diretamente dos dados das contas
nacionais, portanto, apresentam todos os problemas descritos acima. Ao longo desta
seção vamos separar as séries do problema de estoque e depois tentaremos identificar o
consumo de não duráveis.
Se o problema da variação dos estoques não foi tão difícil e de menor importância,
a questão de como identificar o consumo de bens não duráveis na série de consumo total
é muito mais difícil. Na verdade, de 1947 a 1969 não se pode nem tentar resolver esse
problema, já que não existe uma série regular de matrizes de insumo-produto.
As tentativas de reunir as mais esparsas informações sobre esses anos e de usar
alguma técnica de interpolação estão fadadas ao fracasso em decorrência das mudanças
estruturais pelas quais a economia brasileira foi submetida nesse período. É quase
consenso que aqueles foram os anos da industrialização brasileira. É amplamente sabido
que o Brasil era um país predominantemente agrícola na década de 1940 e agora é um
país fortemente industrializado. Claro, essas mudanças tiveram um grande impacto na
composição do consumo.
No período de 1970 a 1989, a situação melhora lentamente. Primeiro, além da
crescente industrialização na década de 1970, é sem dúvida justo supor que houve
menos mudanças na composição do consumo nesses anos. As mudanças envolvidas em
um longo período de crescimento são muito menos dramáticas do que as associadas à
transição de uma economia rural para uma urbana. Os dados da matriz insumo-produto
para os anos 1970 a 1980 mostram que a participação no consumo de bens não duráveis
passou de 0,62 para 0,61. Este fato claramente apóia a suposição de estabilidade.
A outra coisa boa é que há uma matriz de insumo-produto publicada3 para os anos
1970, 1975, 1980, 1985 e 1990. Com essas matrizes, pode-se calcular a parcela do
consumo de bens duráveis sobre o consumo total de cada ano. Levando em
consideração a estabilidade dessas participações, é possível usar a interpolação para
fornecer um valor nos anos sem matriz. Para fazer isso, o seguinte método foi usado:
a) encontre a parcela durável em cada ano com uma matriz de insumo-produto;
b) utilizar uma interpolação linear para preencher as séries nos anos sem dados;
c) criar um choque com média zero e os mesmos desvios-padrão da série real;
d) calcular uma nova participação, somando o interpolado ao choque, ou seja,
ação = interpolada + choque;
e) multiplique a participação pelo consumo total;
f) encontrar o consumo de bens não duráveis como um resíduo, ou seja, não
duráveis = total de bens duráveis.
Esse procedimento foi capaz de gerar uma série de consumos não duráveis de
1970 a 1990; a partir deste último ano, foi possível utilizar a matriz anual insumo-
produto para obter o consumo de bens não duráveis. A Figura 3 mostra o consumo das
séries de bens não duráveis.
Consumo do governo
Esta série vem diretamente das tabelas de contas nacionais. Representa o consumo
geral do governo de 1947 a 1998 no Brasil. Como nas outras séries, foi deflacionado
pelo deflator implícito do PIB. A Figura 4 mostra a série.
O consumo do governo inclui bens duráveis e não duráveis. Isso é um problema
porque não podemos separar o consumo em duráveis e não duráveis. Não podemos
aplicar a mesma metodologia do consumo das famílias ao consumo do governo porque
a contabilidade nacional não dá suporte para separar o consumo de bens duráveis do de
não duráveis. Este problema era um pouco menor consequência devido ao fato de que a
maior parte do consumo do governo veio de serviços.
2.3 Investimento e capital
A série de investimentos vem diretamente das tabelas das contas nacionais. A
única correção foi somar a movimentação dos estoques de 1986 a 1998. O procedimento
para obtenção do valor da movimentação dos estoques foi descrito na seção 2.2.1.
Também foi criada uma série de investimentos ampliada para dar conta do consumo de
bens duráveis. A Figura 5 mostra a série completa de investimentos e o investimento
mais o consumo de bens duráveis de 1970 em diante.
Capital stock
Para criar uma série de estoque de capital pode-se usar a série expandida de
investimento e a fórmula recursiva Kt + 1 = (1 − δ) Kt + It, onde K é o estoque de
capital, δ é a taxa de depreciação e I é o investimento. Por mais simples que essa
abordagem possa parecer, ela não é direta quando se tenta usá-la. Em primeiro lugar,
não há valores iniciais para o estoque de capital, nem o IBRE / FGV nem o IBGE
fornecem uma estimativa oficial. Consequentemente, sem uma série de consumo de
bens de consumo não duráveis, o investimento ficará subestimado, com implicações
para a calibração da taxa de desconto. Finalmente, não existe uma boa estimativa do
valor de δ, nem mesmo uma faixa comum de valores.
Como o trabalho sobre o consumo conseguiu criar uma série de consumos de bens
de consumo não duráveis apenas para o período entre 1970 e 1998, a série de capitais
abrangerá apenas esses anos. A falta de uma boa estimativa do estoque de capital inicial
e da taxa de depreciação induziu a escolha de um método iterativo para encontrar as
séries de capital. Embora este método não tenha suporte econométrico, acaba sendo tão
arbitrário quanto qualquer método que dependa de um valor inicial ou de um parâmetro
de taxa de depreciação, com a vantagem de ser totalmente compatível com a técnica de
calibração. A série de capitais foi calculada de acordo com a seguinte metodologia:
a) no estado estacionário, a taxa de depreciação é definida por δ = IK + 1 - (1 + n) (1 +
x), onde n é a taxa de crescimento da população ex é a média da taxa de crescimento do
PIB per capita;
b) fornecida uma estimativa inicial para I K, n e x são calculados a partir da série do
PIB e da população;
c) com estes valores δ é calculado de acordo com a expressão acima;
d) a partir da regra Kt + 1 = (1 − δ) Kt + It, os valores de Kt + 1 são calculados; este
procedimento é seguido para o cálculo de toda a série de capitais; 8
e) então os valores médios de It Kt são encontrados; se eles corresponderem à
estimativa em (b) até um critério anterior, o algoritmo é interrompido; caso contrário, o
novo valor é usado como uma estimativa e um retorno é feito para (c).
Para refinar o procedimento, a série foi dividida em três períodos, o primeiro
cobre os anos entre 1970 e 1980, o segundo vai até a década de 1980 e o terceiro vai de
1990 a 1998. A razão para fazer essa partição é que a taxa de depreciação pode estar
mudando com o tempo. A Figura 6 mostra a série de capital resultante para o Brasil:
Como se pode ver, a série é responsável pelo rápido crescimento na década de
1970, o chamado milagre econômico brasileiro, e pela grande recessão da década de
1980, a “década perdida”, após a crise da dívida externa em 1982.
2.4 O mercado de trabalho
Nesta subseção, documentamos os fatos relevantes sobre o mercado de trabalho
agregado. Tomamos várias medidas de horas trabalhadas e produtividade em alguns
períodos de amostra. Os dados sobre o mercado de trabalho são separados em duas
partes: uma para o tempo que as famílias despendem nas atividades do mercado e outra
para as horas trabalhadas. Como nas outras séries, faltam dados.
Tempo nas atividades de mercado
Os dados sobre o tempo dado pelas famílias às atividades de mercado foram
calculados a partir do tipo de pesquisa de duas famílias. Extraímos esses dados do censo
decenal brasileiro e da Pnad (Pesquisa Nacional por Amostra de Domicílios), ambas do
IBGE. A cobertura de dados é de 1970 a 1996, com pontos ausentes em 1974, 1975,
1991 e 1994.
Para a análise desses dados utilizou-se a metodologia proposta por McGrattan e
Rogerson (1998). O problema com esses dados é que: há uma entrada para cada faixa de
horas trabalhadas pelas famílias. Na prática, os campos e categorias desses registros são
os seguintes:
• E39 = empregado até 39 horas semanais;
• E40-48 = empregado 40-48 horas semanais;
• E49 = empregado 49 ou mais horas semanais;
• E = total de Informantes por pesquisa;
• A = força de trabalho;
• N = população total;
• H = (30E39 + 44E40-48 + 54E49) (A / E), onde H é horas;
• H / A = horas por trabalhador;
• H / N = horas per capita.
Para construir a série agregada, calculamos somas ponderadas. Para cada classe
agregada, o peso para a população de cada grupo particular é a fração da população total
que o grupo representa. Por exemplo, na primeira aula de horas, menos de 39,
encontramos o peso adequado olhando para o conjunto irregular de horas trabalhadas
nas pesquisas.
O principal fato para este conjunto de dados é que o número de horas semanais de
trabalho de mercado per capita mudou muito pouco ao longo do período, ou seja,
tem sido aproximadamente constante desde 1970. Da média do total de horas por
trabalhador, descobrimos que as famílias gastam 1/3 de seu tempo em atividades de
mercado e 2/3 do seu tempo em atividades não mercantis.
Horas trabalhadas, emprego e produtividade
A série de horas trabalhadas provém de duas bases de dados diferentes. Uma é a
Pesquisa Industrial Mensal - Dados Gerais (PIM-DG), a outra é da Federação das
Indústrias do Estado de São Paulo (Fiesp). O PIM-DG é um levantamento industrial
mensal feito pelo IBGE que cobre o território nacional, enquanto a Fiesp cobre apenas a
atividade industrial de São Paulo. Por outro lado, enquanto o PIM-DG cobre apenas o
período de 1985 a 1998, a Fiesp fornece dados de 1975 a 1998.
Os dados de emprego também vieram das bases de dados do PIM e da Fiesp.
Relatamos esses dados para o mesmo período de horas trabalhadas. Finalmente,
produtividade, de fato, é a produtividade do trabalho. A produtividade do trabalho é
definida como o produto (PIB) por horas trabalhadas para as duas séries, PIM-DG e
Fiesp.
3. Ciclos
Uma propriedade comum das séries econômicas é que elas exibem ciclos. Pelo
menos essa é a suposição por trás da análise RBC. Nesta seção, descreveremos as
principais características dos ciclos no Brasil. Para atingir nossos objetivos, vamos
filtrar as séries de frequências muito altas ou muito baixas para serem classificadas
como parte do ciclo de negócios.
Iniciamos nosso estudo usando um filtro proposto por Hodrick e Prescott (1997),
o chamado filtro HP. Entre as razões para usar este filtro está o fato de ser o filtro
padrão em uso na literatura de ciclo de negócios real (Cooley & Prescott, 1995), e que,
sendo amplamente utilizado, há muitas pesquisas lidando com as vantagens e problemas
de usar esse filtro. Além disso, possui uma fácil implementação computacional, com
códigos fornecidos para uma ampla gama de softwares.
Embora seja a ferramenta mais popular para separar ciclos, tendências e
movimentos irregulares presentes na série, o filtro HP tem sido alvo de algumas críticas.
Uma variedade de problemas foi detectada, sugerindo que o filtro pode não ser capaz de
funcionar bem (Baxter & King, 1999). Os problemas potenciais com o filtro HP são
mais evidentes quando se tenta filtrar dados anuais.12 Como esse é o tipo de dados com
os quais estamos lidando neste artigo, optamos por fornecer evidências com outro filtro,
além do HP. Este foi o filtro passa-banda proposto por Baxter e King (1999).
3.1 A abordagem do filtro HP
O HP é o filtro padrão na literatura RBC. Muitos estudos no campo utiliza este
filtro como ferramenta para separar os ciclos de outros movimentos presentes em uma
série econômica. Nesta seção, apresentaremos as principais propriedades dos ciclos HP,
definidas como o ciclo obtido através do procedimento de Hodrick e Prescott.
Como não fomos capazes de criar um conjunto completo de séries totalmente
consistente com a teoria do ciclo de negócios real para todo o período, de 1947 a 1998,
a seção será dividida em duas subseções. O primeiro apresentará as propriedades
cíclicas de toda a amostra, enquanto o segundo se concentrará no período de 1970 a
1998. Para ambas as amostras, vamos definir o parâmetro de suavização do filtro HP
como 100.
Ciclos de 1947 a 1998
Como consequência de políticas industriais com participação ativa do governo, o
Brasil, um país rural em 1947, tornou-se um país fortemente industrializado em 1998. É
claro que esta presença do Estado forte mostra seus efeitos no ciclo brasileiro. Em
particular, pode-se observar as altas correlações entre os gastos do governo e o PIB. A
Figura 7 mostra o ciclo do PNB.
Como se pode concluir na figura 7, o PIB brasileiro mostra claramente os ciclos.
Além disso, há um padrão um tanto claro que começa na década de 1960 e se estende
até a década de 1990. O ciclo é caracterizado por altos picos em intervalos de 10 anos.
Cada pico é seguido por depressões, em um padrão claramente recursivo. Os picos mais
recentes podem estar associados à política de expansão durante o governo do presidente
Kubtischek nos anos 1950, o milagre econômico brasileiro no início dos anos 1970, o
Plano Cruzado no meio década de 1980 e o Plano Real na década de 1990. A crise da
dívida externa em 1982 e o default da dívida interna em 1990 estão relacionados a duas
das maiores depressões brasileiras, bem como ao ajuste econômico implementado pelo
governo militar em 1967, que também produziu uma depressão. As estatísticas básicas
do ciclo brasileiro são descritas na tabela 1. Para qualquer série de dados, primeiro
pegamos os logaritmos e depois usamos o filtro HP para remover a tendência.
TABELA1
Uma característica de particular interesse no ciclo brasileiro é a alta volatilidade
da série. A razão de 1,06 entre o desvio padrão do consumo e o PIB é maior do que se
esperaria da teoria da renda permanente. De particular interesse é a alta correlação entre
o consumo do governo e o PIB. É um sinal da grande participação do Estado na
economia brasileira.
A Figura 8 mostra o consumo das famílias nos ciclos do PIB. É evidente que o
consumo é fortemente pró-cíclico. A volatilidade um tanto grande do ciclo de consumo
pode ser explicada pela inclusão dos duráveis no consumo e, principalmente, por uma
existência bem documentada de restrições de liquidez no Brasil (Reis et alii, 1998; Issler
& Rocha, 1999).
Um fato particularmente curioso é o comportamento do consumo do governo ao
longo do ciclo. A já grande correlação contemporânea com o PIB é superada pela
correlação do PIB e o próximo período de consumo do governo. Essa constatação
corrobora a tese de que o governo brasileiro consumirá sempre que tiver oportunidade e
cortará despesas apenas quando pressionado por quedas no faturamento total.
O investimento tem uma volatilidade maior do que o PIB (figura 10). Também é
fortemente pró-cíclico. O investimento em capital fixo é menos volátil do que o
investimento total. Isso sugere que as mudanças nos estoques são mais voláteis do que o
investimento.
Ciclos de 1970 a 1998
Como não fomos capazes de construir as séries de consumo de bens não duráveis
para todo o período de 1947 a 1970, a seção anterior deixou de ser totalmente
compatível com a análise de RBC. A solução é criar novos modelos compatíveis com os
dados disponíveis para o Brasil ou trabalhar com uma amostra menor, mas totalmente
compatível.
A primeira forma parece ser um bom desafio para os economistas brasileiros.
Afinal, os dados seriam compatíveis com um modelo de três setores onde um setor
produz bens não duráveis, o outro bens de consumo duráveis e o terceiro bens de
capital. No entanto, caso não se queira descartar todos os modelos anteriores, o que
parece uma escolha razoável, apresentamos as propriedades do ciclo de um conjunto de
séries totalmente compatível com os modelos RBC atuais. Mais adiante neste artigo,
vamos verificar se alguns modelos básicos têm um bom desempenho na reprodução
desses fatos.
A Tabela 2 mostra os fatos das variáveis-chave para o período entre 1970 e 1998.
Observe que, além da volatilidade ainda maior, os fatos são muito semelhantes aos
exibidos na tabela 1.
TABELA 2
O consumo pessoal apresenta uma correlação cruzada contemporânea com o PIB
de 0,8250 e um desvio padrão de 5,21. Isso mostra que o desvio padrão do consumo
corresponde a cerca de 95% do desvio padrão do PIB.
A Tabela 2 também mostra que o desvio padrão do consumo de bens não duráveis
e serviços é de 5,17%, enquanto o desvio padrão do consumo de bens duráveis é de
11,23%; o consumo de bens duráveis é muito mais volátil do que o PIB e o consumo
pessoal total. O consumo de não duráveis e de serviços tem correlação cruzada de
0,7739 com o PIB e o consumo de duráveis tem 0,5601.
Esses fatos parecem apoiar a teoria de que o consumidor brasileiro está restrito a
financiar seu consumo ao longo do ciclo de negócios. Em particular, a alta volatilidade
do consumo de bens não duráveis, próxima à volatilidade do PIB, é um sinal nessa
direção.
A Figura 11 mostra que o consumo no Brasil apresenta uma volatilidade próxima
à do PIB. Se aceitarmos a hipótese de restrição de liquidez, esse fenômeno não
surpreende, uma vez que o indivíduo não pode obter empréstimos para financiar seu
consumo. A teoria da renda permanente, portanto, fracassará e os indivíduos se
comportarão de maneira keynesiana.
Agora, voltamos nossa atenção para a série temporal de horas trabalhadas. Tabela
3 contém um resumo das estatísticas dos dados anuais brasileiros. Novamente estamos
trabalhando com dados do PIM-DG e da Fiesp. As variáveis para ambas as pesquisas
são horas trabalhadas (h), produtividade (w) e emprego (n).
Para cada variável j, reportamos as seguintes estatísticas: o desvio padrão
percentual, o desvio padrão em relação ao produto σj / σy e a correlação com o produto
corr (j, y). Também relatamos o desvio padrão relativo das horas para aquele da
produtividade σh / σw, e a correlação entre horas e produtividade corr (h, w).
TABELA 3
A Tabela 3 exibe os fatos do ciclo de negócios padrão. Todas as variáveis são
positivamente correlacionadas com a produção. As horas trabalhadas são ligeiramente
mais variáveis do que a saída nos dados PIM e 44% mais variáveis do que a saída nos
dados Fiesp. Também pudemos verificar esse fato nas figuras 13 e 14. A variância das
horas é superior ao PIB. As Figuras 15 e 16 mostram, respectivamente, que o nível de
emprego oscila um pouco abaixo da saída dos dados do PIM e 11% acima da saída dos
dados da Fiesp.
Analisando as estatísticas básicas de emprego, notamos uma grande semelhança
entre as horas trabalhadas e o emprego. A variabilidade de horas para emprego, σh / σn,
é 1,03 (PIM) e 1,44 (Fiesp) e a correlação entre horas e emprego é 0,9835 para dados
PIM e 0,9427 para dados Fiesp (figuras 15 e 16).
Essa evidência mostra que o fluxo de emprego é importante para explicar o
comportamento do mercado de trabalho agregado. A variação do total de horas
trabalhadas deve-se às variações do número de pessoas ocupadas (margem extensa) e às
variações das horas médias trabalhadas (margem intensiva). As estatísticas de emprego
e horas trabalhadas lançam alguma luz sobre a importância da extensa margem para
explicar as oscilações no total de horas. Nessa direção está o trabalho de Pereira (1998),
que mostra que a variância se deve muito mais ao emprego do que à média de horas
trabalhadas. Ele mostra que a variação da média de horas trabalhadas é de 14% e 67%
do emprego.
Outro recurso importante a ser observado é que as horas flutuam mais do que a
produtividade, um pouco mais nos dados do PIM e 39% mais nos dados da Fiesp. A
correlação entre horas e produtividade, corr (h, w), é negativa. Para dados PIM, a
correlação é -0,50 e para Fiesp é -0,71. Isso fica claro nas figuras 17 e 18, que mostram
gráficos de dispersão de produtividade versus horas trabalhadas para dados PIM e Fiesp.
3.2 A abordagem do filtro passa-banda
TABELA 4
As principais propriedades cíclicas dos dados brasileiros não se alteram de
maneira sensível em relação aos fatos apresentados na tabela 2. O desvio padrão do
consumo de não duráveis ainda é muito elevado. Na tabela 2, essa volatilidade
representou 94% da volatilidade do PIB. A Tabela 4 mostra uma taxa de 98%. Quanto
aos gastos do governo, eles ainda estão altamente correlacionados com o PIB, enquanto
a correlação entre o PIB contemporâneo e o consumo futuro do governo é ainda maior
do que na tabela 2.
Uma diferença um tanto curiosa entre os fatos da tabela 2 e os da tabela 4 reside
na série de consumo de bens duráveis. A correlação entre essa série e o PIB cai para
quase metade da mesma correlação apresentada na tabela 2. De fato, esse fenômeno é
observado em todas as correlações entre essas duas séries. Por outro lado, todos os
sinais permanecem os mesmos da tabela 2, sendo a única correlação negativa a que
existe entre o PIB e o nível das exportações futuras.
Essas correspondências entre os fatos nas tabelas 2 e 4 não são uma surpresa. Isso
deve ser esperado a partir da análise de Baxter e King (1999) e da breve nota sobre o
assunto em Cooley e Prescott (1995).
TABELA 5
4. O modelo de crescimento padrão
onde trabalho (Ht) e capital (Kt) são os insumos para produzir o produto (yt); zt é
um choque estocástico que segue a lei específica do movimento
onde 0 <ρ <1, é distribuído normalmente, com média zero e desvio padrão σ.
A empresa escolhe otimamente capital e trabalho de modo que os produtos
marginais sejam iguais ao preço por unidade de insumo:
As variáveis de estado para as famílias são zt, kt e Kt, e as variáveis agregadas são
zt, Kt. O problema ideal para as famílias pode então ser escrito como
Para medir a produtividade total dos fatores (Zt), usamos os conjuntos de dados
PIM e Fiesp para horas trabalhadas.
A série Zt pode então ser regredida em uma tendência de tempo e o residual é
identificado como choque de tecnologia (zt). O resíduo calculado é altamente
persistente, e a autocorrelação é bastante consistente com um processo tecnológico que
é um AR (1). Portanto, definimos esse processo no seguinte modelo:
6. Resultados da Simulação
7. Conclusões
Este artigo resumiu os fatos dos ciclos econômicos no Brasil. Para cumprir este
objetivo, tivemos que construir um conjunto de dados consistente com a classe de
modelos em análise. O principal desafio era fazer uma série de estoque de capital e
consumo de bens duráveis, e o quesito horas trabalhadas e produtividade também se
tornou um desafio, pois estávamos tentando gerar séries para todo o país e não só para o
estado de São Paulo. Em um futuro próximo, alguns dos problemas que encontramos
em nosso trabalho deverão ser resolvidos em decorrência do novo esquema de
constituição das contas nacionais, em uso pelo IBGE desde 1990.
Usamos dois filtros para gerar os fatos do ciclo de negócios: o tradicional filtro
Hodrick-Prescott e um filtro passa-banda proposto por Baxter e King (1999). Os fatos
associados aos dois filtros foram muito semelhantes, resultado encontrado por outros
autores que tentaram comparar as duas abordagens para filtrar os dados.
Finalmente, tentamos comparar os fatos reais com as previsões da teoria
econômica. Usamos dois modelos muito populares para gerar fatos a partir de
economias reais. As conclusões foram que ambos os modelos não conseguem explicar a
alta volatilidade do consumo, horas e produtividade quando comparada com a
volatilidade do PIB. Os modelos também não explicam a baixa correlação entre
produtividade e PIB.
Já existem muitos novos modelos tentando adicionar novos recursos ao os que
usamos neste artigo. O desafio que se coloca aos economistas brasileiros é identificar
quais modificações devem ser feitas no modelo básico de RBC para criar um modelo de
equilíbrio geral dinâmico capaz de gerar melhores correspondências do que as
apresentadas neste artigo. Acreditamos que extensões para incluir restrições de crédito,
gastos do governo, configuração de pequena economia aberta e algumas características
nominais podem estar entre as que criariam um modelo capaz de reproduzir os
resultados para a economia brasileira.