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“HAHAHAHA”
A loja dos Laflue, Fuga do Mundo, já estava fechada, depois de ter tido um
dia não muito produtivo em questão de bugigangas e apetrechos de apresentações.
Porém, o armazém já estava cheio de materiais arcanos, que haviam sido entregues com
sucesso na manhã desse dia.
“Sempre tenho vontade de ouvir suas historias, mas você quer me fazer
dormir ou me deixar acordada?” Syl respondeu com uma expressão de dúvida.
“Ah, vai depender se você gostar ou não né. Mas vai lá, me da uma
chancezinha. Já faz muito tempo que não conto uma boa historia. O Arquimedes só as
critica e duvida de sua veracidade. Preciso de alguém que as aprecie!” Luno terminou
sua fala com peito estufado e levantando um pouco sua voz.
“Hmmm, ok tudo bem. Vou te dar essa chance. Entretenha-me, E se eu
gostar, talvez eu te permita me contar mais.”
“Ah é assim então? Você ta engraçadinha em, não cansou de fazer piada?
Agora fica deitadinha que teu pai vai te contar umas boas.”
“Faltou uma pitadinha de olhar de desdém, mas você terá bastante tempo
pra aperfeiçoar sua técnica. Afinal, você só tem 18 anos. Ta muito novinha.”
“Esse olhar é muito difícil, que tal você fazer algo pra eu sentir desdém?
Por favooor.”
“Impossível, seu pai é muito incrível para isso. Agora deixa eu começar as
minhas épicas historias!”
“Acho que vou começar com o inicio do grupo Lua Minguante, a equipe
com a qual eu viajava pelo mundo. Nós éramos seis, com cargos diversos em nossos
atos. Naquela época a magia era legal e muito usada por diversas raças, então nós
tentávamos ser diferentes e fazer de nossas apresentações algo único, com truques que
praticávamos horas, dias, semanas e até mesmo meses.”
Da palma de Luno seis figuras apareceram. Sendo elas, uma humana, dois
tieflings, dois elfos e uma halfling. Todos estavam sendo perfeitamente demonstrados
como eram na época, carecendo apenas de cores, já que Luno queria deixar sua
apresentação mais artística do que realística. Cada uma começou a fazer uma ação
diferente, indicando suas funções na Lua Minguante. A humana parecia ser uma
domadora de animais, ao lado dela aparecendo um enorme jaguar. Os tieflings eram
gêmeos, dominadores do fogo. Sua mistura de danças expressivas e seu controle das
chamas hipnotizavam as audiências. Um dos elfos era um mestre de laminas, com seu
ato principal sendo engolir suas facas e espadas. A halfling era a grande acrobata do
grupo, sendo uma das favoritas da Lua Minguante. O papel de Luno era menos corporal.
Sendo um ilusionista, ele se concentrava em dar assistência para seus companheiros e
fazer apresentações visuais para a plateia. Seu ato favorito era quando contava contos
épicos, dramas, horrores, todos representados pelas suas figuras que criava com magia.
Não era a mais emocionante, ou a mais misteriosa ou difícil apresentação, mas ela ainda
funcionava para abrir mais o coração dos espectadores e os fazerem aproveitarem o
resto do show.
Luno fazia com as palmas das mãos o nome antigo que haviam feito e com
isso uma duvida surgiu.
Olhando para sua filha com os olhos cerrados, Luno disse com um tom de
piada:
“Bom, você acertou. Nosso objetivo nesse grupo era trazer sorrisos.
Felicidade. E, além disso, dinheiro nos deixava felizes também então fazia total sentido.
Porém, ainda está faltando o ultimo membro. Seu tio, Tahlan. Eu e o irmão de sua mãe
nunca tínhamos conversado tanto. Ele era bem ocupado por seu trabalho como
ferreiro. Mas minha filha, você jamais acreditaria na habilidade que ele tinha com as
laminas. Era incrível. Nós tivemos alguns anos de apresentações antes de ele ser
convencido a entrar por Ilíada. Sua mãe era bem apaixonada pelo meu trabalho e por
causa disso queria incentivar o seu tio a entrar para o meu grupo. Ainda lembro das
risadas e dos sorrisos que ela dava quando eu apresentava um truque. Seu olhar
apaixonante, curioso e cheio de sentimento...”
“Você com certeza é especial Syl. Seu pai lhe agradece por sempre acalmar
meu coração quando necessito.”
“Bom, sei que lembrar da mamãe te deixa ansioso. Sempre estarei aqui pra
te acalmar nesses momentos papai.”
Com uma troca de sorrisos, as imagens apareceram mais uma vez nas
palmas do elfo. Dessa vez mostrando uma carroça com agora seis membros que passava
por uma densa floresta.
Luno franziu um pouco as sobrancelhas. Não era forte o sentimento que sua
expressão passava, mas quem a visse saberia a frustação que o elfo sentiu no momento.
No entanto, ao olhar a expressão de Syl, um sorriso leve apareceu em seu rosto e ele
voltou a contar sobre sua viagem.
Antes de terminar a frase, Luno notou o quão fundo em sua memorias tinha
ido e logo interrompeu seu conto. Limpando a garganta mais uma vez, prestes a
continuar a historia, Syl, franzindo as sobrancelhas, diz:
“Sim, um esquilo!”
“Papai...”
“Você não confia no seu pai!? Só acredita que eu consegui um esquilo por
umas três horas, combinado?”
“Ta bom, mas pelo menos me conta quem era a mulher que você estava
mostrando com suas ilusões.”
“A mamãe?”
Syl não teve chance de perguntar, quando novamente, nas palmas de Luno,
as figuras dos seis apareceram naquele espaço que Xorhas e seu irmão haviam criado.
“Roubados!?”
“Sim, afinal, nenhum de nós ficou de vigia depois de nossa pequena festa.
Foi um grande erro de nossa parte. Tahlan teve a ideia de rastrear os ladrões e eu
concordei. Tinhamos cerca de três a quatro horas até os outros acordarem. Peguei meu
arco e flecha, o que eu tenho pendurado na parede aqui de casa, e fui com seu tio na
direção que as pegadas estavam seguindo. Eventualmente, chegamos numa caverna e
lá fora encontramos um de nossos cavalos preso em uma rocha. Nenhum sinal do
outro.”
“E o tio Tahlan?”
“Ele foi encontrar o outro. Pelo que ele me falou ele infelizmente não
achou o cavalo, mas ele deu uma lição nos bandidos.”
“Eu não faço a menor ideia, não fiz questão de perguntar. Ele estava com
uma expressão assustadora...”
“Ai papai, você não disse que seriam historias épicas e tals tals e tals?
“Ai ai em, olha vou te contar sobre algumas regiões que eu passei que
marcaram minhas viagens tudo bem? Aí chega, eu vou pra cama.”
“Ta bom...”
“Não fica triste Syl, talvez um dia nós dois sairemos numa aventura épica e
emocionante, ai você poderá contar varias historias sobre as aventuras!”
“Seria legal eu contar historias também, e com você lá pra mostrar essas
imagens nas mãos seria melhor ainda!”
“Haha... sim... seria mesmo. Enfim, eu nunca te contei como eu conheci sua
mãe, certo? Quer saber como?”
“Siiiim!”
“Ok ok, foi em uma de minhas viagens onde eu estava sozinho. O grupo da
Lua Minguante ainda estava longe de ser formado. Um dia eu estava passeando por
uma floresta que não tinha nome. Era bem misteriosa até, não lembrava de ter visto ela
no mapa da região, então como era um lugar novo eu decidi dar uma olhada. Suas
arvores eram diferentes. Algumas folhas reagiam aos raios solares e mudavam de
cores enquanto o raio estivesse nelas. Eu peguei umas, que inclusive tenho guardadas
até hoje. Elas aparentam não envelhecerem, então coleciona-las é bem prático. Eu
fiquei surpreso com a natureza daquele local, ficava observando arbusto por arbusto,
arvore por arvore, riacho por riacho, aquela atmosfera alegre me fez pegar o meu
alaúde e tocar as musicas mais felizes que vinham em minha cabeça. E isso fez eu
esquecer que eu estava numa floresta e não tinha encontrado animais ainda. Teve uma
hora que eu tropecei em uma das raízes que haviam saltado do solo. Doeu. Mas doeu
mais quando um urso enorme pulou em cima de mim! Era muito pesado, eu não sei
como eu to vivo ainda, na verdade sei, mas eu quebrei algumas costelas infelizmente.”
“O que aconteceu com o urso? Você não matou ele né? Talvez ele estivesse
protegendo os filhotes”
“Claro que não matei ele, aquele urso era sua mãe.”
Quase caindo da cama, Syl avançou em direção a Luno com o seus olhos
parecendo estrelas.
“Ei ei, calma garota, tu quase caiu da cama. Sim, era, sua mãe era uma
druida oras, acredito que seja por isso que você tem uma ligação tão forte com animais
e a natureza. Por mais que eu não ache que você seja uma druida. Né?”
“Ah, eu acho que sim, não tenho certeza. Como eu vou descobrir?”
Depois de colocar Syl em sua cama novamente, Luno fez com suas mãos
uma imagem de uma arvore com um grande portal em seu centro.
“Bom, depois que ela notou que eu era um elfo ela ficou meio desesperada
e se sentiu obrigada a me levar para os clérigos que possuíam dentro de Aluthia. Foi
meio irresponsável, eu podia ser um espião, mas pelo que eu descobri eles eram bem
pacíficos e ainda fizeram um interrogatório com uma magia chamada Zona da
Verdade. Então eu fiquei tranquilo. Era um reino dentro do plano das fadas. Fui levado
e curado em questão de segundos. E, bom, eu me apaixonei a primeira vista. Fora da
forma de urso sua mãe era a elfa mais linda que já havia visto em toda minha vida e
aparentemente era uma dos guardiões que cuidavam dos portais. Aluthia era um ótimo
reino, tinha pessoas gentis, a rainha Aluthia era compreensiva e justa. Ela já estava em
seu milésimo ano na época e ainda continua governando até hoje.”
“Existe. Ele teve que ficar mais escondido depois da Calamidade, mas sim,
ele não caiu e eu até que sou conhecido lá. Eu fui um dos músicos principais do
casamento do filho de Aluthia.”
Assim que Luno terminou a frase, seu olhar foi direto para a marca na testa
de Syl, e antes que ela pudesse perceber, ele continuou contando a historia.
“Sim, você nasceu na floresta em volta de fadas, e por mais que seja difícil
de acreditar, você foi abençoada por uma divindade.”
“O que? Como assim? Quer dizer que eu tenho poderes ou algo assim?”
“Claro que não boba você só recebeu uma benção, essa marca na sua testa
é o sinal disso.”
Passando a mão por sua testa e olhando no espelho em seu criado mudo, Syl
fez uma expressão alegre, seu rosto corado indicava sua felicidade.
“Bom, filhinha, seu pai já está cansado, vou lá pra cima.”
“Mas antes você pode me dizer o por que de vocês terem saído de Aluthia?
E o que aconteceu com os membros da Lua Minguante depois da Calamidade???”
“Ai ai... Tudo bem, mas eu não vou mostrar imagens tudo bem?”
“Tudo bem...”
“Fomos morar na Floresta das Notas. Seu tio foi junto conosco. Afinal, ele
estava preocupado, principalmente por causa das caças da Inquisição. Moramos lá
até-“
“Papai, chega.”
Silencio tomou rapidamente o local. A única coisa que Luno fez, foi acenar
com a cabeça e se levantar de sua cadeira. Indo em direção a porta, uma voz tremula
ressoou pela sala.
Após fechar a porta, Luno respirou fundo. Entoou algumas palavras mágicas
e passou um fio de prata na parede onde o quarto de Syl estava. Uma parede azul
marinho sumiu a partir desse fio e parou no teto.
Um calafrio. Foi isso que o elfo sentiu assim que escutou a voz.
“Eu tenho que ter certeza que você está cuidando bem dela.”
“Já faz 18 anos que você a mesma desculpa Ilíada. Já é hora de parar de
me atormentar. Eu já estou cansado de fazer essa barreira anti-som”
“Precaução nunca é ruim, afinal, se você cuidar dela da mesma forma que
você cuidou de mi-“
“Cale-se.”
“Não vou calar Luno. Você com esse contato com os tieflings e os
contrabandos que você anda fazendo só estão trazendo perigo até ela.”
“Eu sei disso, você não precisa me falar como cuidar de nossa filha
Ilíada.”
“Então por que você continua fazendo isso em? Você não liga mais? Você
já esta nesse nível com ela? Se fosse pra cuidar dela dessa forma ela deveria ter vindo
comigo até-“
“CHEGA.”
“Patético.”
“...”
“Você é patético, como marido, como pai, eu nem sei como o seu grupo
reagiria ao ver você assim.”
“Pare...”
“Na verdade, é melhor que vocês tenham se separado, você poderia coloca-
los em perigo, podia até mesmo faze-los morrer.”
“Ah é verdade, foi assim que você matou o Tahlan não foi? Você
abandonou ele, nos abandonou!”
“...”
“...”
Foi o que Luno disse enquanto trocava as faixas em seu braço direito.
“Vale a pena-“
*crack*
“Eu não posso deixar o coração das pessoas se partirem assim não é?”
Olhando para o quarto da sua filha a única coisa que ele fez, foi sorrir.