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Se a Luz
estava fora de alcance, o que haveria de ser do seu espírito se morresse ali? Será
que a Luz não o receberia? Estaria a essência dele condenada a uma eternidade
de perambulação pelo vazio?
Levou uma vida honrada. Ainda assim... seria isso alguma espécie de punição?
Nobambo rolou para a direita e respirou fundo, tentando ignorar a dor nas costelas
e na perna. Sem poder recorrer à Luz, ele não tinha como se curar, então teria
que conviver com a dor por ora. Ao menos a sensibilidade do lado esquerdo do
corpo voltou. E... ele podia ouvir os ruídos abafados causados pelos seus
movimentos, o que significava que a audição também estava normal.
Com a pouca força que lhe restava, Nobambo agarrou o cabo e empurrou-o em
direção à abertura. Alguns destroços dos entalhes cederam, revelando um vão
estreito criado pelos gigantescos blocos de pedra que caíram.
A julgar pelo volume do gemido entre os escombros, agora mais alto, Nobambo
supôs que se tratava de um ogro tentando desesperadamente se soltar. O
guerreiro ficou de costas e arrastou-se sobre os cotovelos até o ar noturno,
enquanto o ogro fazia outro esforço para se soltar. Agora, Nobambo conseguia ver
todo o monte de entulho. O ogro urrou enfurecido mais uma vez, e toda a pilha
cedeu por completo, projetando uma nuvem de poeira em todas as direções e
interrompendo abruptamente o grito.
Nobambo se virou e viu algo que jamais esqueceria, não importa o quanto
tentasse, daquele dia em diante.
Todo Bairro Inferior, iluminado pela lua e por tochas, havia se tornado um depósito
de cadáveres de draeneis. E, apesar de a chuva ter parado, as montanhas de
corpos ainda estavam molhadas de vômito, sangue e toda espécie de detritos.
Mais uma vez, seus ouvidos foram atacados pelos gritos de uma fêmea,
acompanhados por provocações e escárnio. Os orcs estavam celebrando,
deleitando-se com a vitória. Ao olhar para cima, localizou a origem do ruído: bem
acima, projetando-se sobre os Picos da barreira, os draeneis ergueram o Terraço
dos Aldor. E lá estavam os orcs, torturando uma pobre draenaia.
“Tenho de detê-los.”
A gritaria cessou. Nobambo olhou para cima e viu silhuetas à luz da lua que
carregaram uma figura imóvel até a beira do mirante e a balançaram, atirando a
massa sem vida às profundezas. O corpo aterrissou com um baque surdo não
muito longe de onde Nobambo estava, paralisado.
Outro grito veio de cima, a voz de outra fêmea. A raiva ferveu dentro do guerreiro.
Raiva, frustração e um desejo incontrolável de vingança.
Algo dentro dele o impelia a sair de lá o mais rápido possível, a se esconder com
os demais, a viver... para, um dia, cumprir um propósito maior.
Mas, no fundo, Nobambo sabia que a batalha havia terminado. Se, de fato, algum
destino maior o aguardava, ele tinha que ir embora de imediato. Não conseguiria
nada além de uma morte sem significado, se tentasse chegar ao topo. Gritos
angustiados tornaram a dominar o ar da noite. Nobambo olhou para uma parte da
muralha externa que estava parcialmente destruída. Era um obstáculo perigoso,
mas não insuperável – e que não estava sendo vigiado.
Era uma oportunidade. Uma chance de viver e, algum dia, fazer a diferença mais
uma vez.
Aquele longo gemido soou novamente mas, dessa vez, foi interrompido
misericordiosamente. Então, o som das vozes de orcs, do outro lado da muralha
interna, chegou a ele. Elas soavam como se estivessem vasculhando em meio
aos cadáveres, em busca de algo ou alguém. O tempo havia acabado.
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– Espero que seja verdade, velho amigo. Eu, simplesmente... Não me sinto o
mesmo. Algo mudou dentro de mim.
– Não digas bobagem. Estás cansado e confuso, e após tudo por que passou,
nem podemos culpar-te por sentir-te assim. Descansa um pouco.
Mas isso seria verdade mesmo? Ele não tinha certeza. Nos últimos tempos,
Nobambo tinha cada vez mais dificuldade em pensar direito. Os pensamentos
eram turvos, desconexos. O draenei suspirou profundamente e se levantou do
cobertor estendido sobre o chão de pedra, gemendo por causa das juntas
doloridas.
Nobambo saiu entre a névoa do pântano e abriu caminho por entre o solo alagado
e repleto de juncos. O Pântano Zíngaro era um território inóspito mas, por ora,
seria seu lar.
Aquele pantanal sempre fora evitado pelos orcs, e com razão. Toda a região
estava coberta por uma camada rasa de água salobra. Grande parte da flora e da
fauna era venenosa se não preparadas adequadamente. Muitas criaturas do
pântano comeriam qualquer coisa que não as devorasse primeiro.
Enquanto avançava por entre cogumelos gigantes, altos como torres, o
sobrevivente ouviu gritos: um tumulto se formara perto do acampamento.
Nobambo correu para ver o que estava acontecendo. Três draeneis espancados,
dois machos e uma fêmea, estavam sendo acudidos por membros do
acampamento, logo após a guarda do perímetro. Outro, inconsciente, estava
sendo carregado por eles.
– Sobreviventes de Shattrath.
– Onde estamos? O que aconteceu? Não estou sentindo... Alguma coisa está...
Estes acrescentou:
Estes prosseguiu:
– Não posso falar por Akama, mas Estes e eu éramos simples artesãos, sem
familiaridade com qualquer tipo de arma. Foi por isso que nos mandaram para as
cavernas, para sermos a última linha de defesa.
Estações se passaram.
Velen, o profeta líder dos draeneis, visitara os sobreviventes havia dois dias... ou
seriam quatro? Ultimamente, Nobambo estava tendo dificuldade em lembrar de
algumas coisas. Velen viera de um dos acampamentos vizinhos. A localização
exata dele era um segredo guardado a sete chaves, dado o risco de alguém ser
sequestrado e torturado. Ninguém poderia revelar informações que não
conhecesse. De qualquer forma, Velen falara com eles sobre o futuro que os
aguardava, sobre a importância de permanecerem discretos por muito tempo,
possivelmente por anos, para observar e aguardar o que aconteceria com os orcs.
De acordo com Velen, os orcs haviam dado início à construção de algo que
parecia tomar todo o tempo e todos os recursos deles. O projeto tinha,
aparentemente, desviado a atenção dos monstros esverdeados da caça aos
draeneis, ao menos por ora. O que estavam construindo, não muito longe da
principal cidadela órquica nas terras calcinadas, parecia ser algum tipo de portal.
Velen parecia saber muito mais do que havia contado, mas ele era, afinal de
contas um profeta, um vidente. Nobambo pensou que o nobre sábio devia saber
muitas coisas, coisas que ele e outros simplesmente não entendiam por faltar-lhes
a sabedoria necessária.
Mais tarde, Nobambo assistia a Korin entrar na água com uma lança de pesca
quando reparou que algo nela parecia diferente. Ele tinha a impressão de que o
físico dela havia mudado nas últimas semanas. Os antebraços estavam
ligeiramente maiores; o rosto dela parecia sem energia; e a postura dela havia se
deteriorado. Por mais improvável que isso soasse, a cauda parecia ter encolhido.