Você está na página 1de 5

INSTITUTO DE CIÊNCIAS DA SOCIEDADE – MACAÉ

DEPARTAMENTO DE DIREITO DE MACAÉ


CURSO DE DIREITO

SOBRE A SOLUÇÃO JUDICIAL DE CONTROVÉRSIAS NA AMÉRICA LATINA

Laís Gomes Maia

1. REFERÊNCIA DA OBRA RESENHADA

LIMA, Lucas C. Sobre a Solução Judicial de Controvérsias na América Latina. Revista de Direito
Internacional, v. 17, n. 2, p. 6-12, 2020.

2. INTRODUÇÃO

O artigo a ser resenhado, de autoria de Lucas Carlos Lima, recai sobre uma tendência
que se verifica nas relações internacionais contemporâneas: a resolução de controvérsias pela
via judicial. Nesse ponto, o autor atribui enfoque à América Latina, analisando sua postura –
pautada na solução pacífica de conflitos – quando se trata de solução judicial de conflitos.

Nesse sentido, o objetivo do artigo consiste em contextualizar as características que a


solução judicial possui na América Latina, além de discutir sobre a implementação de uma corte
permanente para resolução de conflitos latino-americanos, apontando os desafios – tanto
institucionais quanto em relação ao Direito Internacional - decorrentes de tal criação.

Por fim, a presente resenha visa, além de analisar criticamente a exposição feita por
Lucas Lima, apresentar dois litígios envolvendo países da América Latina que chegaram a Corte
de Haia.

3. COMPONENTES DE UM NOVO ÓRGÃO JURISDICONAL INTERNACIONAL

A América Latina possui como uma de suas características a tendencia à resolução de


conflitos pela via judicial. Nesse sentido, o artigo propõe uma reflexão acerca da criação de
uma Corte Latino-americana, que, por sua vez, traria consigo diversas particularidades. Dentre
estas, o autor abordou os impasses que seriam decorrentes da jurisdição, composição,
financiamento e língua de trabalho.

No que tange à jurisdição e competência, a própria ratificação dos Estados para


aceitarem a jurisdição de uma Corte recém criada, consistiria em um primeiro impasse. De
acordo com Lucas Lima, seria ilusório partir do pressuposto de que todos os Estado
concederiam – sem reservas – competência a uma Corte Regional.

No que se refere à composição de tal tribunal internacional, o autor alerta para questões
envolvendo os juízes, referindo-se não somente a quantidade, mas também como se estruturaria
o mandato e quais seriam os requisitos de formação. Tendo em vista que tais magistrados
estariam lidando com os mais variados temas concernentes ao Direito Internacional, esse último
ponto é de suma importância, pois, para assumir o cargo, o juiz deveria seguir os requisitos
impostos pelo seu próprio país ou deveria, indispensavelmente, possuir formação voltada para
o Direito Internacional? A fim de evitar conflitos políticos, o autor parece mais favorável a
segunda opção.

Já no que tange ao financiamento, Lucas Limas cita como tal questão é gerida em outras
cortes já existentes, como a Corte Internacional de Justiça, que adquire parte da sua verba da
Organização das Nações Unidas. Nesse ponto, há o questionamento sobre em qual medida é
interessante direcionar verba para uma nova corte, tendo em vista que há a possibilidade de
investir em alguma já existente, como a Corte Interamericana. Nesse sentido, utilizar a verba
para aprimorar Cortes que abordam conflitos entre Estados latino-americanos, parece mais
vantajoso do que pensar em um financiamento para uma nova instituição.

Por fim, a definição acerca da língua de trabalho consistiria em um conflito mais


profundo do que aparenta. Em um primeiro momento, considerar o espanhol e o português
como línguas oficiais da corte parece quase óbvio, porém, existem outros idiomas de suma
importância, como o guarani – língua oficial no Paraguai -, e outras línguas indígenas não
oficiais – quícha e o aimará. Nesse sentido, a escolha linguística geraria, inevitavelmente, uma
exclusão. Além disso, há o argumento sobre a possível redução no impacto da jurisprudência
latino-americana por não estar na língua oficial, tornando-se, teoricamente, “inacessível aos
grandes centros de estudo”.

Entretanto, em contraposição aos argumentos sobrepostos, é inegável que o Direito


Internacional recai sobre diversas culturas e línguas, de tal forma que tanto a tradição nacional
quanto a questão linguística interferem na percepção acerca desse ramo do direito. Nesse
sentido, o uso das línguas locais da América Latina em detrimento do uso obrigatório do inglês,
corroboraria com menor custo de traduções, além de ampliar o espaço para que especialistas
latino-americanos ocupem tal Corte, evidenciando então o “potencial deselitizante” da
implementação de línguas locais.
Em suma, no subtítulo em questão, foram abordados problemas intrínsecos à criação de
um órgão internacional, evidenciando a dificuldade que seria posta para que os Estados
adotassem tal corte, uma vez que a própria Corte Interamericana parece estar sendo eficiente
na resolução de conflitos. Dessa forma, a partir dos pontos trabalhados, o autor parte para a
análise de outros empecilhos decorrentes da criação de uma corte regional de justiça
internacional.

4. PROBLEMAS ORIUNDOS DA CRIAÇÃO DE UMA CORTE REGIONAL DE


JUSTIÇA INTERNACIONAL

Em decorrência da criação de uma Corte regional de competência geral, ao menos três


dificuldades seriam postas: conflito de competência, possíveis conflitos materiais – receio de
fragmentação – e tensão entre universalismo e regionalismo.

Em relação à competência, um possível impasse seria a “litispendência internacional”.


Esta, por sua vez, consiste em duas cortes analisando o mesmo caso e, no pior cenário, chegando
em conclusões distintas. Além disso, outro fator de risco seria a criação e interpretação de
normas internacionais diferentes por órgãos jurisdicionais distintos. Nessa última questão, um
ponto positivo posto no artigo é a “fertilização cruzada e aprimoramento de jurisprudências”,
corroborando então para o intercâmbio de ideias e evolução dos entendimentos
jurisprudenciais.

No que tange aos conflitos materiais, uma possível consequência seria a fragmentação
do Direito Internacional. Segundo Alberto Amaral Júnior, professor de Direito Internacional na
Universidade de São Paulo e autor do artigo “O “Diálogo das Fontes: Fragmentação e Coerência
no Direito Internacional Contemporâneo”, a descentralização da produção normativa,
característica desse tamo do direito, pode corroborar para uma possível fragmentação. Tendo
em vista que o D.I. recai sobre diversos Estados e busca atingir um consenso entre eles, corre-
se o risco da elaboração de normas vagas, portanto, passiveis de múltiplas interpretações.
(JÚNIOR, 2008, p. 11-31). Dessa forma, a criação de mais uma Corte internacional poderia
aprofundar tal problema, uma vez que representaria mais um ponto de descentralização
normativa.

Por último, o autor recai sobre o conflito entre universalismo e regionalismo, o que está
relacionado com o processo de fragmentação. Nesse sentido, uma Corte Regional, por ter a
vantagem de considerar as particularidades locais na aplicação do direito, poderia caminhar no
sentido da particularização das normas internacionais – ao invés da universalização de tais
normas. Contudo, essa consequência não é necessariamente negativa e um exemplo da
particularização das normas universais é a atuação da própria Corte Interamericana de Direitos
Humanos em relação as normas jus cogens ou a crimes contra a humanidade.

5. APRECIAÇÃO CRÍTICA DO RESENHISTA

Tendo em vista a clara e consistente exposição posta por Lucas Lima, a solução judicial
de controvérsias na América Latina apresenta-se como um assunto relevante e em alta na
contemporaneidade. Considerando que a postura latino-americana é pautada na solução pacífica
de litígios, atribui-se destaque tanto para os meios judiciais quanto extrajudiciais, que,
consistindo na mediação, conciliação e arbitragem, devem ser estimulados. Em suma, esses
meios corroboram para a supressão de possíveis conflitos armados. (SOARES, ?).

Contudo, considerando a existência de cortes que recaem sobre conflitos da américa


Latina, a criação de uma Corte Latino-americana para solucionar os impasses não parece ser a
opção mais viável e eficiente. Nesse sentido, ao invés da implementação de uma nova corte,
deveria ser estimulada uma reflexão acerca dos pontos positivos e negativos do sistema
existente, bem como propiciar investimento nas Cortes vigentes, tais como: Corte
Interamericana de Direitos Humanos, O Tribunal Permanente de Revisão do MERCOSUL,
Tribunal do Mar e até mesmo a Corte de Haia.

No que tange aos litígios latino-americanos que chegaram as Cortes Internacionais,


verificou-se que, em 2014, 5 processos envolvendo países latino-americanos constavam na
Corte de Haia. Dentre eles, estava presente o conflito entre Chile e Peru pelo controle de uma
parcela do litoral do Pacífico. Em tal situação, a Corte Internacional de Justiça decidiu em favor
do Peru, que reconquistou uma área perdia durante a dita Guerra do Pacífico. Dessa forma, a
CIJ pois fim a um conflito que durava cerca de 6 anos, ressaltando a possibilidade de que os
litígios sejam resolvidos de forma pacífica. (CONJUR, 2014).

Por fim, tendo em vista que nessa guerra a Bolívia perdeu sua saída para o mar, esse
país entrou, em 2013, com uma ação, também na Corte de Haia, pleiteando que o Chile
concedessemacesso ao Oceano Pacífico. Contudo, em 2018, tal corte decidiu que o Chile não
estava obrigado juridicamente a negociar tal acesso ao mar, porém, na decisão proferida, os
juízes ressaltaram a importância da boa vizinhança, recomendando que os países continuem
estabelecendo diálogo. Dessa forma, o Tribunal de Haia finalizou mais um longo conflito entre
países da América Latina, que já se estendia durante cinco anos. (CORREIO DO POVO, 2018).
6. CONCLUSÃO

Nesse prisma, por mais que existem melhorias a serem feitas nas Cortes Internacionais
existentes - com destaque à inclusão linguística e valorização de outros idiomas que não o
oficial -, conclui-se que a criação de uma Corte Latino-americana para resolução de conflitos
pode ser menos vantajosa do que o investimento e aprimoramento das Cortes Internacionais já
vigentes.

Por meio do artigo resenhado, foram expostos os principais problemas que seriam
decorrentes de tal criação, com destaque para aqueles atrelados à jurisdição, composição,
financiamento e língua de trabalho. Para além disso, atribui-se destaque a outras questões
relacionadas à criação da Corte: conflito de competência, possíveis conflitos materiais – receio
de fragmentação – e tensão entre universalismo e regionalismo.

Em suma, existem Cortes Internacionais que regulam conflitos concernentes à América


Latina, bem como foi exposto com os casos Chile e Peru e Chile e Bolívia no Tribunal de Haia.
Logo, o investimento em tais tribunais parece ser mais vantajoso e eficaz do que o
desenvolvimento de uma Corte Latino-americana para resolução de controvérsias.

REFERÊNCIAS BIBLIOGRÁFICAS

JÚNIOR, Alberto A. O “Diálogo” das Fontes: Fragmentação e Coerência no Direito Internacional


Contemporâneo. III Anuário Brasileiro de Direito Internacional, v. 2, p. 11-31, 2008. Disponível
em: < https://www.corteidh.or.cr/tablas/r27147.pdf>. Acesso em: 12 abr, 2021.

SOARES, Guido F. S. Soluções Pacíficas de Litígios na América Latina: retrospectiva 1988. Revista
da Faculdade de Direito, Universidade de São Paulo, v. 83. Disponível em: <
https://www.revistas.usp.br/rfdusp/article/view/67121>. Acesso em: 12 abr, 2021.

HAIA DÁ RAZÃO AO PERU EM DISPUTA MARÍTIMA COM O CHILE. Consultório Jurídico,


2014. Disponível em: < https://www.conjur.com.br/2014-jan-27/corte-haia-encerra-disputa-entre-
chile-peru-controle-litoral>. Acesso em: 13 abr, 2021.

CORTE DE HAIA REJEIRA AÇÃO DA BOLÍVIA CONTRA CHLE POR ACESSO AO MAR.
Correio do Povo, 2018. Disponível em: <
https://www.correiodopovo.com.br/not%C3%ADcias/mundo/corte-de-haia-rejeita-
a%C3%A7%C3%A3o-da-bol%C3%ADvia-contra-chile-por-acesso-ao-mar-1.273085>. Acesso em:
13 abr, 2021.

Você também pode gostar