O dia... Sol, ó sol! Astro rei dos espaços, Rubra tulipa imperial, Iluminai no ocaso os meus cansados braços, Com toda a vossa luz de púrpura real, Para que eles possa, Cheios de clarões dos olhos teus (São beijos que pelos meus lábios roçam), Erguer-se a Deus! Alphonsus de Guimaraens
VERSOS POLIMÉTRICOS: COM RIMA
CASTELOS N0 AR
A vida é o sonho de um sonho sonhado. FICHTE
Sonhos, noites, lagos noturnos e luares; olhos, olhares...
Quando o luar dos teus olhos aos meus olhos desce a minh'alma empalidece; todo eu fico a tremer, e tu passas sem me ver, no teu lento passo acompassado... Ao ver-te passar, eu sinto que me crescem asas, e leve de culpa e de pecado ponho-me a voar, a voar, numa volúpia nova, pelo azul dos ares, — pelo Reino dos Luares, — acima das misérias e das casas té encontrar pelo caminho um dos meus Castelos no Ar... Lá, se tu quisesses, pela primavera, íamos fazer o nosso ninho.
(Minha Sombra Azul, cor de Quimera, quando o luar dos teus olhos os meus olhos banha, na noite da minh'alma entra uma luz estranha.) 0 meu alcácer é um fantástico tesoiro, um palácio astral mitrado dum zimbório d'oiro: no parque, alabastros de ninfas e mármores de musas,
no jardim, as rosas brancas são pálidas reclusas, e as sanguíneas papoilas um bando saudável de rústicas moçoilas; dentro, numa sala imensa, em quadros murais da Renascença, vivem sonetos do Aretino e a legenda sutil de Leda e do Cisne divino. Quando o olhar dos teus olhos me veste de luar dentro da minh'alma ha um Cisne a cantar.)
Nessa câmera d'arte erótica e pagã, por uma plúmea e nupcial manhã, o meu amor espera-te. E com que desejo, com que sede te espera!
No primeiro longo, longo beijo bebe-te o hálito floral de primavera, e é como se bebesse logo.
(Quando o luar dos teus olhos os meus olhos toca, a minh'alma beija-te na boca.)
Nos meus olhos crepitam labaredas; todo eu, ardendo, quero amar-te logo; trêmulos e tímidos os dedos vão rasgando as sedas, as musselinas lívidas esparsas, penugem ventral de garças, — translúcidas e brancas, fogem pela curva clássica das ancas; como um estandarte desfraldas o cabelo: cai a noite sem luar no meu castelo, e sob o novilúnio da tua cabeleira é d'âmbar o teu corpo, Trigueira, sincero e sem pejos, todo vestido de beijos!...
(Quando o luar dos teus olhos vence todos os luares no lago da minh'alina abrem os sonhos, como nenúfares.)
Adalberto Guerra-Duval
A poesia, que tem linhas até de 16 silabas, adota um dos recursos d6 simbolismo europeu: o verso livre (detinidamente livre e não meramente heteromélrico, como o chamado verso livre "clássico", simples junção numa poesia de versos regulares de medidas diferentes). A análise rítmica dos versos mais longos de "Caslelo no Ar", a partir de 9 silabas, indica a ausência de padrões uniformes ou regulares. Guerra-Duval é assim o nosso primeiro cultor do verso-livre simbolista, e usa-o com desenvoltura bem maior do que a heterometria inicial de alguns dos próprios modernistas. Idem, p. 140
ESTÂNCIA XII (em Pastoral aos Crentes do Amor e da Morte)
E contemplei o céu, onde surgia
O dia... Sol, ó sol! Astro rei dos espaços, Rubra tulipa imperial, Iluminai no ocaso os meus cansados braços, Com toda a vossa luz de púrpura real, Para que eles possa, Cheios de clarões dos olhos teus (São beijos que pelos meus lábios roçam), Erguer-se a Deus! Alphonsus de Guimaraens
VERSOS POLIMÉTRICOS: COM RIMA
CASTELOS N0 AR
A vida é o sonho de um sonho sonhado. FICHTE
Sonhos, noites, lagos noturnos e luares; olhos, olhares...
Quando o luar dos teus olhos aos meus olhos desce a minh'alma empalidece; todo eu fico a tremer, e tu passas sem me ver, no teu lento passo acompassado... Ao ver-te passar, eu sinto que me crescem asas, e leve de culpa e de pecado ponho-me a voar, a voar, numa volúpia nova, pelo azul dos ares, — pelo Reino dos Luares, — acima das misérias e das casas té encontrar pelo caminho um dos meus Castelos no Ar... Lá, se tu quisesses, pela primavera, íamos fazer o nosso ninho.
(Minha Sombra Azul, cor de Quimera, quando o luar dos teus olhos os meus olhos banha, na noite da minh'alma entra uma luz estranha.) 0 meu alcácer é um fantástico tesoiro, um palácio astral mitrado dum zimbório d'oiro: no parque, alabastros de ninfas e mármores de musas,
no jardim, as rosas brancas são pálidas reclusas, e as sanguíneas papoilas um bando saudável de rústicas moçoilas; dentro, numa sala imensa, em quadros murais da Renascença, vivem sonetos do Aretino e a legenda sutil de Leda e do Cisne divino. Quando o olhar dos teus olhos me veste de luar dentro da minh'alma ha um Cisne a cantar.)
Nessa câmera d'arte erótica e pagã, por uma plúmea e nupcial manhã, o meu amor espera-te. E com que desejo, com que sede te espera!
No primeiro longo, longo beijo bebe-te o hálito floral de primavera, e é como se bebesse logo.
(Quando o luar dos teus olhos os meus olhos toca, a minh'alma beija-te na boca.)
Nos meus olhos crepitam labaredas; todo eu, ardendo, quero amar-te logo; trêmulos e tímidos os dedos vão rasgando as sedas, as musselinas lívidas esparsas, penugem ventral de garças, — translúcidas e brancas, fogem pela curva clássica das ancas; como um estandarte desfraldas o cabelo: cai a noite sem luar no meu castelo, e sob o novilúnio da tua cabeleira é d'âmbar o teu corpo, Trigueira, sincero e sem pejos, todo vestido de beijos!...
(Quando o luar dos teus olhos vence todos os luares no lago da minh'alina abrem os sonhos, como nenúfares.)
Adalberto Guerra-Duval
A poesia, que tem linhas até de 16 silabas, adota um dos recursos d6 simbolismo europeu: o verso livre (detinidamente livre e não meramente heteromélrico, como o chamado verso livre "clássico", simples junção numa poesia de versos regulares de medidas diferentes). A análise rítmica dos versos mais longos de "Caslelo no Ar", a partir de 9 silabas, indica a ausência de padrões uniformes ou regulares. Guerra-Duval é assim o nosso primeiro cultor do verso-livre simbolista, e usa-o com desenvoltura bem maior do que a heterometria inicial de alguns dos próprios modernistas. Idem, p. 140