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UNIVERSIDADE POLITÉCNICA
A POLITÉCNICA
CURSO DE CIÊNCIAS JURÍDICAS

2º Ano. 3º Semestre Professor: Dr. Aboobacar Changa

Ano Lectivo - 2019

LIÇÕES DE DIREITO FISCAL E ADUANEIRO

RESUMO

FICHA N.º 4
IV - TEORIA GERAL DO IMPOSTO

1. CONCEITO DE IMPOSTO

Como referimos anteriormente, o centro fundamental do Direito Fiscal assenta no


conjunto de normas de direito tributário material que estabelecem e regulam os
impostos.

De um modo geral a doutrina define o Imposto como sendo uma


“Prestação pecuniária, coativa, definitiva, sem contrapartida e sem
carácter de sanção, exigida pelo Estado, como vista a satisfação de fins
públicos”

Tendo por base este conceito, três elementos caracterizadores e distintos se destacam:
o elemento objectivo, o elemento subjectivo e o elemento teleológico.

1.1. Elemento objectivo:

Neste elemento verifica-se de forma objectiva que o Imposto é uma prestação,


definitiva, unilateral, estabelecida pela lei, que não constitui sanção de um acto
ilícito.

Ainda neste campo a prestação é o acto exigível a todo o Sujeito Passivo do


imposto a favor do Sujeito Activo que é o Estado. Assim,

 O carácter definitivo do imposto pretende referir que a prestação feita pelo


sujeito passivo do imposto não dá qualquer direito a um reembolso, uma
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substituição ou indemnização, salvo se o valor por aquele prestado se mostrar
superior em relação ao que devia ter sido efectivamente cobrado.

 A prestação unilateral é assim entendida, porque não corresponde a qualquer


contraprestação, ou seja, o sujeito passivo, contribuinte, não recebe a
contrapartida imediata por ter pago o imposto.

 Prestação estabelecida pela lei, no sentido de que só a lei é que pode


estabelecer o imposto e a forma de sua prestação. De referir que a lei fiscal é a
fonte do imposto, por isso, fonte da obrigação fiscal.

1.2. Elemento subjectivo do imposto

Deve-se entender que a prestação é realizada a favor do Estado, na posição de


Sujeito Activo do imposto, credor do mesmo.

1.3. Elemento teleológico

Deve-se entender o fim para que existe o imposto. De notar que o imposto é uma
forma de os contribuintes (sujeitos passivos) fazerem entrar dinheiro nos cofres do
Estado, com a finalidade de Este prosseguir determinados fins que podem ser
imediatos. Por esta razão, o fim para que existe o imposto deve condizer com os
objectivos da sociedade. Deste modo, pode-se afirmar que o fim do imposto está
em função das suas finalidades e objectivos, logo Receita Pública para a satisfação
das necessidades colectivas.

1.4. Outros aspectos a considerar na definição do imposto:

a) Prestação pecuniária – Aquela que é susceptível da avaliação em dinheiro. De


notar que o pagamento do imposto assume hoje e quase sempre a forma
monetária. Nem sempre isso aconteceu já que era vulgar, no feudalismo, o
pagamento de impostos em géneros (prestação em espécie) ou actividades.

Em Moçambique, por exemplo, esta possibilidade de prestação em géneros,


vigorou no extinto Imposto sobre o Rendimento de Trabalho – Secção “B”.

b) Prestação coativa Entende-se que a obrigação do imposto surge unicamente


por força da lei, não derivando de qualquer contrato ou convenção entre o
Estado e os particulares. Pode-se argumentar que esta é uma característa que
decorre de todo o direito e que, no Direito Fiscal, depende da vontade dos
particulares colocarem-se ou não na situação geradora da obrigação ao
pagamento. A verdade, porém, é que todo o conteúdo da obrigação fiscal é
moldado pela lei.

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É a razão pela qual se distinguem os impostos dos empréstimos.

c) A prestação do imposto não tem contrapartida, é unilateral e como já vimos,


o imposto não comporta nenhuma contraprestação directa por parte do Estado.
É nisto que distingue o Imposto da Taxa, que sendo também uma receita
coactiva e definitiva, tem uma contrapartida específica numa actividade do
Estado, especialmente dirigida ao respectivo obrigado, ainda que não solicitada
por este ou não vantajosa para ela. São cobradas taxas pela prestação de
serviços de determinadas autorizações (licenças de uso e porte de arma,
portagens, taxas de utilização de parques e estacionamento, etc.).A
unilateralidade permite distinguir o Imposto dos chamados tributos especiais,
em que o contribuinte aufere uma particular vantagem, Contribuição de
Melhorias por exemplo, prevista na Lei das Finanças e Património das
Autarquias.

d) O imposto não tem carácter de sanção, não se destina a punir actos ilícitos, o
que o distingue das multas.

e) O imposto é exigido pelo Estado ou outros entes públicos. Com esta


característica, pretende-se acentuar que hoje em dia não só o Estado pode ser
sujeito activo de obrigações fiscais como outros entes públicos, quer sejam de
âmbito territorial restrito (órgãos locais) ou ainda mais vasto (orgão central).

2. Distinção entre Imposto e Figuras Afins

Outras figuras em que há de certa forma uma distinção como o Imposto, pode-
se elencar as seguintes:
 Taxa,
 Empréstimos,
 Requisição Administrativa,
 Multa, e
 Tributos Especiais.

No entanto, mais difícil é distinguir os Impostos das Taxas, já que nem sempre é
fácil ou pacífico, detectar a existência ou não da contraprestação por parte do
Sujeito Activo da obrigação fiscal.

2.1. IMPOSTOS E TAXAS

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O Imposto é unilateral não havendo por isso reciprocidade nem contraprestação
e a Taxa em Direito Fiscal pretende corresponder à prestação da
actividade
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pública, a utilização do domínio e a remoção de um limite jurídico, e por
isso estas realidades e a Taxa que lhes corresponde encontram-se entre si
ligados por um eixo sinalagmático, em termos de uma se apresentar como
contraprestação da outra.

Temos também a Taxa como expressão aritmética, normalmente percentual,


que, aplicada ao valor ou ao volume do objecto da incidência do imposto,
dá a expressão monetária do imposto, direito do Estado à cobrança. Esta
Taxa quando multiplicada à matéria colectável dá-nos o valor do imposto ou
colecta.

2.2. Os Empréstimos já foram referidos, aquando do estudo das Receitas


Públicas.

2.3. REQUISIÇÃO ADMINISTRATIVA

 Por Requisição Administrativa entende-se o acto pelo qual, em


casos excepcionais, expressamente previstos na lei, um órgão da
Administração exige dos particulares, mediante justa indemnização,
a prestação de determinados serviços, a cessão de coisas móveis
ou a utilização temporária de certos bens, para concorrer a
necessidades urgentes.
Assim, o Imposto é forma normal de obtenção de meios para satisfazer
necessidades públicas, enquanto a Requisição Administrativa destina
a fazer face à determinadas necessidades concretas e individualizadas
de natureza excepcional e urgente.

 Por sua vez, o Imposto tem carácter de prestação unilateral e definitiva e


a Requisição Administrativa permite o pagamento ao requisitado, do
preço correspondente ao valor dos bens ou de uma indemnização pelos
prejuízos sofridos.

 O Imposto consiste na prestação pecuniária e a Requisição se traduz


numa prestação de serviços, na cedência de certas coisas ou da
utilização temporária de determinados bens.

 Também se pode definir a Requisição Administrativa, segundo Marcelo


Alonso como um “instrumento de intervenção estatal mediante o qual,
em situação de perigo público iminente, o Estado utiliza bens móveis,
imóveis ou serviços particulares com indeminização ulterior se houver
danos”.

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1.4 A MULTA já foi tratada, assim como os empréstimos, aquando da


abordagem sobre as Receitas Públicas.

2.5. IMPOSTOS E CONTRIBUIÇÕES ESPECIAIS

 As prestações especiais são aquelas prestações pecuniárias exigidas


pelo Estado e pagas pelo contribuinte em virtude de uma vantagem
particular e concreta que retira do funcionamento de determinado serviço
público ou da maior despesa que a sua actividade provoca. Importa ter
presente que na classificação dos tributos a Lei Geral Tributária, Lei n.º
2/2006, de 22 de Março, no n.º 4 do artigo 3 define as Contribuições
especiais, que podem ser nacionais ou autárquicas, como prestações
efectuadas como contrapartida de benefício ou aumento do valor dos
bens do sujeito passivo, que resultem de obras públicas ou da criação ou
ampliação de serviços públicos, ou devidas em razão do especial
desgaste de bens públicos ocasionados pelo exercício de uma actividade,
desde que previstas na lei.

 A Contribuição de Melhorias estabelecida na Lei 1/2008, de 16 de


Janeiro, Lei da Finanças e Património das Autarquias é uma Contribuição
Especial.

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LIÇÕES DE DIREITO FISCAL E ADUANEIRO

RESUMO

FICHA N.º 5

V- RELAÇÃO JURÍDICA FISCAL

A Relação Jurídica fiscal é toda a situação ou relação da vida social disciplinada pelo
Direito Fiscal e, como tal, susceptível de produzir consequências jurídicas

1. OBRIGAÇÃO FISCAL E RELAÇÃO JURÍDICA FISCAL

A relação jurídica fiscal é na sua essência uma relação juridica como outra qualquer,
formada por sujeitos (activo e passivo), ligados por um objecto que é a (prestação) que
decorre de uma situação prevista na lei ou contrato.

Na relação jurídica fiscal a obrigação fiscal tem características especiais, decorrendo


da verificação de um facto previsto na lei fiscal, o facto gerador, que faz nascer essa
obrigação.

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Por sua vez a obrigação fiscal consiste numa prestação pecuniária, um dever de
pagar o imposto, contraposto ao direito subjectivo do Estado de exigir, como credor da
obrigação, ou seja, por um lado, temos um direito de crédito do Estado e por outro,
uma obrigação do contribuinte, devedor do imposto.

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Esta noção simples não abarca todo o conjunto das relações contratuais que se
desenvolvem entre os sujeitos da obrigação do imposto, pois, surgem ao lado da
realção obrigacional, vínculos de diferente natureza (deveres acessórios, direitos
potestativos, sujeições, ónus, etc.), todos eles ao serviço da realização do fim
obrigacional. Assim surge a noção de relação jurídico-fiscal, que abrange, além da
obrigação fiscal singular, todas estas obrigações e ou deveres acessórios do sujeito
passivo do imposto. (por exemplo, a obrigação de apresentar a declaração fiscal de
início de actividade, de escrituração, de emitir facturas de conformidade com a lei, etc.).

1.1 DEVERES TRIBUTÁRIOS ACESSÓRIOS

No que concerne aos deveres tributários acessórios destinados a possibilitar ou a


garantir a percepção da dívida tributária, a par do dever principal, o de pagar impostos,
estes, agrupam-se quanto à sua finalidade imediata, quanto aos sujeitos passivos e
quanto ao objecto.

a) Quanto à sua finalidade, as obrigações fiscais acessórias referem-se a:

- Deveres tendentes a determinação do contribuinte;


- Deveres tendentes a assegurar a cobrança do imposto ou a liquidação da
dívida tributária; e
- Deveres destinados à fiscalização de outros deveres fiscais acessórios.

b) Quanto aos sujeitos passivos, as obrigações acessórias podem recair:

- Sobre o próprio contribuinte – as obrigações de declaração do imposto; e


- Sobre terceiros, particulares ou entidades públicas. É o caso dos deveres
públicos de colaboração.

c) Quanto ao objecto, as obrigações acessórias pode ser:

− de “facere”; e/ou – (neste caso a pessoa jurídica deve realizar por


exemplo pagar o imposto ou o registo nos livros de contabilidade)
- de “nom facere”.- (neste caso a pessoa jurídica deve …….)

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1.2. OBRIGAÇÃO JURÍDICO - FISCAL ou JURÍDICA FISCAL e OBRIGAÇÕES CIVIS

Apesar da referência de que a relação juridica fiscal é como uma outra relação juridica,
no que concerne a sua distinção com as obrigações civis, a fiscal quanto à sua
estrutura fundamental não difere da obrigação civil, mas, quanto ao seu regime
jurídico, surgem caracteres de diferenciação que importa realçar:

a) A obrigação civil é moldada pelas partes, depende da vontade das partes - por sua
vez a obrigação fiscal é uma obrigação “ex. lege”, depende da lei.

b) Na obrigação civil o sujeito activo pode dispor do seu crédito, pode renunciar a ele
- ao contrário da obrigação fiscal que é indisponível e é irrenunciável.

c) A Administração Tributária goza da presunção de legalidade própria dos actos


administrativos, goza do privilégio de executoriedade ou privilégio de execução
prévia: quer isto dizer, que o crédito do Estado pode ser desde logo coercivamente
exigido ao devedor, sem necessidade de decisão judicial que o confirme.

d) Outro elemento caracterizador da obrigação fiscal é o regime específico das


suas garantias, que vai ser objecto de análise no âmbito dos elementos da relação
jurídica fiscal.

1.3. MOMENTO DA CONSTITUIÇÃO DA OBRIGAÇÃO DO IMPOSTO

Como já referimos a obrigação fiscal deriva da lei, isto não significa, obviamente, que a
obrigação nasce no momento da entrada em vigor da lei. Neste sentido, vamos analisar
duas doutrinas que podem ser a base dos sistemas fiscais (tratando-se de impostos
directos):

a) Doutrina da eficácia constitutiva da liquidação - Segundo a qual a obrigação


nasce com a liquidação, ou seja, a obrigação do imposto distingue-se da sua
dívida e surge quando se verificam os pressupostos de facto do tributo pois, a
dívida do imposto nasce com a liquidação e só ao efectuar-se a sua notificação ao
sujeito passivo é que se constitui para o Estado, o crédito e o débito para o
contribuinte.

b) Doutrina da eficácia declarativa da liquidação - segundo a qual a obrigação do


imposto nasce no momento da ocorrência do facto gerador. Nesta doutrina e

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segundo Pessoa Jorge, Curso de Direito Fiscal, pag. 172. “A partir da liquidação e
do momento em que o contribuinte é notificado do resultado desta, a obrigação
torna-se líquida e exigível. Mas não nasce apenas nessa altura, já nascera com a
concretização da hipótese legal”.

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Devemos perfilhar a doutrina da eficácia declarativa da liquidação, porque esta
permite a defesa do princípio da não retroactividade em direito fiscal. Quer a
determinação do sujeito passivo quer a da matéria colectável devem reporta-se ao
momento em que se realiza a situação ou facto que as leis fiscais prevêem, isto é, o
facto gerador do imposto.
Segundo Dr. Brás Teixeira, a lei aplicável aos elementos essencias da obrigação é a lei
em vigor na altura da ocorrência do pressuposto do facto e não a que vigora na altura
da liquidação.

2. ELEMENTOS DA RELAÇÃO JURÍDICA FISCAL

A relação jurídica fiscal tem com elementos:


 Os sujeitos,
 O objecto,
 o facto jurídico, e
 a garantia.

2.1. SUJEITOS TRIBUTÁRIOS (Activo e Passivo)

a) Sujeito Activo

De acordo com a Lei Geral Tributária - LGT, sujeito activo “(…) é a entidade de direito
público, titular do direito de exigir o cumprimento das obrigações tributárias, quer
directamente, quer através de representante.”) - artigo - 13. Nesta definição o Estado é
definido como o credor e titular do direito de exigir a prestação tributária, assim com
outros entes públicos.

O sujeito activo não é a entidade que cria o imposto, não é também a entidade que
realiza as operações de lançamento e cobrança do imposto, mas aquela pessoa de
direito público em benefício da qual é estabelecido o imposto e que tem o poder de
exigir ou pretender o seu pagamento, portanto, o Estado.

b) Sujeito passivo

Sujeito passivo, ou devedor do imposto, é a pessoa a quem pode ser exigido o


cumprimento da prestação tributária, definido no artigo 14 da LGT, ou seja, é a pessoa
obrigada, por lei, ao cumprimento da obrigação tributária (principal e acessórias)

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Por vezes, “ab initio”, a lei obriga ao pagamento do imposto pessoas diferentes
daquelas em relação as quais se verificam os pressupostos da tributação. Portanto,
torna-se importante distinguir entre sujeitos passivos originários e sujeitos passivos não
originários.

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Importa referir que há casos em que o devedor do imposto é um sujeito passivo por
débito alheio cuja lei impõe-lhe a obrigação de entregar o imposto distinguindo-o do
próprio contribuinte, ou seja, do sujeito passivo por débito próprio - aquele que suporta
de facto o encargo patrimonial: é a figura da substituição fiscal.

Temos também a sucessão fiscal que surge nos casos em que nascida a obrigação
do imposto, vêm outras pessoas a ocupar o lugar do sujeito passivo, assim como para
reforçar a garantia de cumprimento das obrigações fiscais que é o caso da
responsabilidade fiscal.

A substituição fiscal, com vem definida na Lei de Bases do Sistema Tributário e na


LGT, artigos 11 e 20, respectivamente e, de uma forma geral, efectiva-se via retenção
na fonte e resulta no processo determinado por lei que faz recair a obrigação de
entrega do imposto não sobre os titulares dos rendimentos, mas sobre as entidades
que pagam esses rendimentos. A mesma pode ser total quando o substituto tem sobre
si a obrigação da entrega do imposto e outros deveres acessórios e é parcial quando
ao substituto impendem apenas alguns dos deveres acessórios.

O substituto tem o direito e por vezes o dever de exigir ao contribuinte (substituído) a


importância do imposto ou de lhe descontar tal importância nos rendimentos que lhe
paga. Goza de um direito de regresso sobre o substituído.

Quando o imposto não é pago pelo substituto, a este será instaurado a execução fiscal,
havendo responsabilidade subsidiária do substituído.

A figura da substituição fiscal não deve ser confundida com o fenómeno da


repercussão, cujo encargo do imposto transfere-se do contribuinte legal para o
contribuinte de facto, por um mecanismo meramente económico, como é o caso do
IVA.

Quanto à sucessão fiscal por morte do sujeito passivo da obrigação tributária, os


herdeiros são responsáveis pelas dívidas fiscais, nos termos da lei civil.

A responsabilidade dos herdeiros vai apenas até ao valor dos bens herdados, nos
termos do artigo 2071.º do Código Civil. É o princípio da limitação da dívida às forças
da herança e não havendo herdeiros, mas apenas legatários, a solução é a prevista na
lei civil: os legatários serão obrigados ao pagamento dos impostos na proporção dos
legados (artigo 2277.º do Código Civil); existindo herdeiros e legatários, estes só
respondem na insuficiência dos bens recebidos por aqueles.

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A responsabilidade fiscal é para reforçar a garantia do cumprimento da obrigação
fiscal, como é o caso da responsabilidade dos administradores, gerentes e membros do
conselho fiscal das sociedades (previsto na Lei de Bases do Sistema Tributário e nos
Códigos de Impostos) e, ainda, a responsabilidade dos testamenteiros e cabeças-de-
casal (prevista no Código do Imposto sobres as Sucessões e Doações), etc.

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Nas relações entre os responsáveis e o devedor do imposto, o responsável goza do
benefício da execução, isto é, os seus bens só responderão depois de excutidos os
bens do originário devedor.

2.2, Sujeição a imposto de Entidades Públicas e aos Entes de Facto

a) O Estado e outras pessoas colectivas públicas

Por vezes a pessoa colectiva de direito público, sendo sujeito activo do imposto
preenche os requisitos para ser sujeito passivo do mesmo imposto, tal entidade não
pode considerar-se sujeito passivo da obrigação fiscal, dado que a coincidência entre o
titular activo e o titular passivo do imposto faz extinguir a obrigação fiscal por
confusão, figura que vamos abordar mais adiante.

No entanto, na legislação fiscal estabelecem-se isenções a favor do Estado, o que


pressupõe a existência de capacidade tributária. Contudo, parece antes tratar-se,
nestes casos, de normas negativas de incidência e não de verdadeiras isenções.
Situação que não se verifica, no caso dos impostos eindirectos, Imposto sobre o Valor
Acrescentado, por exemplo.

b) Entes de facto

O problema põe-se principalmente em relação às sociedades irregulares, pois estas


são sociedades comerciais ou civis sob forma comercial, constituidas sem obediência a
determinados requisitos legais, nomeadamente a falta de escritura pública. Assim, por
exemplo, as sociedades devem se constituir de conformidade com as disposições do
Código Comercial, aprovado pelo Decreto-Lei nº 2/2005, de 27 de Dezembro (artigos
90 a 92 do Código Comercial). Por sua vez, tais sociedades não possuem
personalidade jurídica, “as sociedades comerciais adquirem personalidade jurídica
a partir da data do respectivo acto constitutivo - artigo 86 do Código Comercial”
isto poderá significar que as mesmas não dispõe também de personalidade tributária?

A resposta é não, na medida em que a capacidade tributária é mais ampla do que a de


capacidade jurídica, tudo se passando para efeitos fiscais como se os entes de facto
estivessem personalizados. “A personalidade tributária não é uma construção de mero
alcance teórico é um instrumento de conveniência prática que serve os fins da
administração tributária, ao individualizar o contribuinte, no duplo aspecto de incidência

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material e serve os interesses do próprio ente de facto – contribuinte - permitindo-lhe,
como uma só pessoa, intervir no processo administrativo de liquidação dos impostos e,
depois, reclamar ou impugnar juridicamente, se necessário”.

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Há, portanto, que reconhecer capacidade tributária passiva a todos os entes com uma
autonomia económica. Assim, dispõe o Código do IRPC, aprovado pela Lei nº 34/2007
de 31 de Dezembro, moçambicano na alínea b) do seu artigo 2, que considera sujeitos
passivos de IRPC “as entidades desprovidas de personalidade jurídica (…)”.

2.3. Objecto

O segundo elemento da relação jurídico-fiscal é o objecto que é a prestação a que o


devedor do imposto está adstrito para com o sujeito activo.

A prestação é uma regra precedida de uma actividade para a sua concretização que é
o lançamento e é determinada pela aplicação de uma taxa à matéria colectável, que é
a liquidação.

2.4. Facto Jurídico ou Facto Gerador do Imposto

O terceiro elemento é o facto jurídico da relação tributária, isto é, a ocorrência de


elementos (obtenção de rendimentos ou aquisição de bens) que, hipoteticamente
previstos na lei como criadores de relações jurídico - fiscais, fazem nascer a obrigação
do imposto. A obrigação fiscal constitui-se, portanto, no momento da verificação de tais
factos ou situações e não no momento da liquidação do imposto. Melhor dizendo,
Facto Gerador é a situação, descrita em lei, suficiente e necessária para o nascimento
da obrigação tributária, situação que deve ocorrer para permitir incidência da norma
tributária.

2.5. Garantia

O quarto e último elemento da relação jurídico tributária, a garantia das obrigações


representa o conjunto de sistemas legais de protecção do sujeito activo com vista ao
cumprimento pelo sujeito passivo.

A garantia geral das obrigações fiscais como também a das obrigações civis é o
património do devedor, que é a garantia geral que a lei concede ao credor. Por outro
lado, existem também garantias especiais que podem consistir na afectação do
património de outras pessoas responsabilizadas pelo cumprimento da obrigação
(garantias pessoais), sendo a responsabilidade fiscal, a principal ou na afectação de
determinada espécie de bens (garantias reais), como por exemplo:

(a) Previlégio Creditório é a faculdade que a lei, em atenção à causa do


crédito concede a certos credores, independentemente do registo, de

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serem pagos com preferência a outros. Melhor dizendo, ainda, é a
faculdade que a lei concede a certos credores, independentemente do
registo, de serem pagos com preferência a outros.

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 Privilégios mobiliários, sendo gerais abrangem o valor de todos os
bens móveis existentes no património do devedor à data da penhora
ou de acto equivalente e são especiais, quando compreendem só o
valor de determinados bens móveis; e

 Privilégios imobiliários são sempre especiais.

O Estado e as autarquias locais têm privilégio imobiliário geral para a garantia dos
créditos por impostos directos e indirectos inscritos para a cobrança no ano corrente,
na data da penhora e nos respectivos orçamentos, bem como nos dois anos anteriores.
Exclui-se deste privilégio a sisa e o imposto sobre as sucessões e doações e outros
que gozam de privilégio especial.

(ii) Hipoteca é a garantia que confere ao credor o direito de ser pago pelo
valor de certas coisas imóveis pertencentes ao devedor. A hipoteca, para
produzir efeitos, tem de ser registada.

2.6. Prestação de caução

Esta garantia facultativa com ela se pretende a assegurar o cumprimento da obrigação


fiscal, através do depósito em dinheiro, títulos da dívida pública ou outros títulos com
cotação na Bolsa de Valores, pedras ou metais preciosos ou fiança bancária.

Com a prestação da caução pode-se suspender a execução fiscal, ou atribuição de


efeitos suspensivos aos recursos em execução ou impugnação judical.

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RESUMO

FICHA N.º 6

VI- 3. PROCESSO ADMINISTRATIVO PARA O CUMPRIMENTO DA OBRIGAÇÃO


DO IMPOSTO

3.1. FASES DA VIDA DO IMPOSTO

O imposto nasce quando surge uma norma legal que confere ao Estado a posição de
credor do imposto e ao cidadão a situação de devedor do mesmo.

O primeiro aspecto a ter em conta é a noção de de INCIDÊNCIA que é a definição


geral e abstrata feita pela lei, dos actos ou situações sujeitas a imposto e das
pessoas sobre as quais recai o dever de o prestar.

Como se pode constatar nesta definição há que considerar dois aspectos na incidência:
o que é que está sujeito a imposto (incidência real ou material, ou objectiva) e quem
está sujeito a imposto (incidência pessoal ou subjectiva) e para a sua concretização
temos três fases do imposto que são:
 o lançamento em que se identifica-se o sujeito passivo do imposto e se fixa a
matéria colectável,
 a liquidação, que consiste no cálculo da colecta, aplicando a matéria colectável
à taxa do imposto, e

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 a cobrança , que é o conjunto de operações destinadas à arrecadação do
imposto.

Estas fases não aparecem em todos os impostos – ao lançamento administrativo não


estão sujeitos os chamados impostos de auto-lançamento e auto-liquidação (por
exemplo o IVA).

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3.1.1. Lançamento

a) A determinação do contribuinte pode fazer-se de várias formas:

- Por declaração do contribuinte, como acontece em quase todos os impostos.


- Por declaração de terceiros, que em regra cumula com a do contribuinte.
- Por simples actividade do Fisco.
- Por indicação de certos serviços públicos.

b) A fixação da matéria colectável poderá ser feita fundamentalmente pelos seguintes


processos:

- com base em declaração do contribinte e de terceiros


- feita pela própria Admnistração Tributária.

No caso da fixação da matéria colectável pela Admistração, de acordo com os Códigos


do IRPS e IRPC, aprovados pelas Leis nºs 33 e 34, ambas de 31 de Dezembro de
2007 , a matéria colectável pode ser determinada por um regime simplificado ou nos
casos em que se usam os métodos indirectos (métodos indiciários)

- feita pelo contribuinte e sujeita a correcção pela Administração.


- fixada por mera actividade da Admnistração.
- fixada por acordo entre as partes, de que não há exemplo no nosso País

3.1.2 Liquidação

A competência da liquidação é por regra feita, nos impostos directos pela


Administração Fiscal, e nos impostos indirectos pelo contribuinte.

A liquidação está sujeita a caducidade que é de cinco anos. Este prazo não é o da
prescrição. Daí que, tendo havido liquidação, não se encontre necessariamente
prescrito o direito à cobrança dos impostos, cujo prazo é de dez anos ( Lei Geral
Tributária).

A liquidação é, em princípio um acto estável e definitivo. Contudo, dentro do prazo de


caducidade pode ser alterada por efeito da sua revisão ou impugnação judicial, como
em outros casos expressamente previsto na lei.

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3.1.2.1 Liquidação Adicional

Este tipo de liquidação é efectuada quando na primeira liquidação se tiverem cometido


erros de facto ou de direito ou tenha havido quaisquer omissões, de que haja resultado
prejuízo para o Estado ou outro sujeito activo. A liquidação adicional consiste em se
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efectuar uma nova liquidação da importância em dívida, que acrescerá ou se adionará
à primeira. Havendo retardamento na liquidação por facto imputável ao contribuinte, à
contribuição devida acrescerão juros compensatórios.

3.1.2.2. Anulação da liquidação

Será feita oficiosamente quando, por motivos imputáveis aos serviços, tenha sido
liquidado imposto superior ao devido, ou em virtude de decisão judicial que o confirme.

Anulada a liquidação, processar-se-á o respectivo título de anulação, que pode ser


pago a dinheiro ou compensado em posteriores dívidas do imposto.

3.1.2.3. Reforma de liquidação


Nos casos em que se realiza uma nova liquidação, pelo facto de a anterior não estar de
acordo com as condições de facto a que se refere.

3.1.3. Cobrança
Determinado o montante do imposto a pagar é necessário proceder à arrecadação do
imposto. Neste processo podemos efectuar a cobrança extraindo o conhecimento de
cobrança que é debitado ao Recebedor de Fazenda, que por sua vez fica com a
obrigação de cobrar – a chamada cobrança virtual.

Noutros casos, o contribuinte solicita o documento de cobrança, junto da respectiva


área fiscal e o apresenta no acto do pagamento ao Recebedor de Fazenda, estamos
na presença da cobrança eventual.

Na cobrança virtual há um rol nominativo de contribuintes e o imposto é determinado


previamente, sendo a forma normal de cobrança dos impostos periódicos, enquanto
que, na cobrança eventual não se pode prever antecipadamente o valor a pagar.

3.1.3.1. Extinção da obrigação tributária

a) Cumprimento

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Esta é principal forma do pagamento do imposto pelo sujeito passivo que permite a
extinção da obrigação do mesmo.

No pagamento voluntário, que contrapõe-se ao pagamento coercivo, distinguem-se


duas fases:
 Pagamento à Boca do Cofre, e
 Pagamento com juros de mora (antes do relaxe).

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O pagamento à boca de cofre é efectuado durante um certo prazo de vencimento,
fixado para cada imposto (em regra, um mês).

Pagamento com juros de mora é o realizado após este período e durante os prazos
que precedem o relaxe. (em Moçambique nos impostos de cobrança virtual é de 60
dias)

O imposto poderá ser pago a pronto, em prestações e em anuidades.

O imposto a pronto é o pagamento integral do imposto.

O pagamento a prestações, tem a sua previsão na LGT, no seu artigo 148. O não
pagamento de uma prestação implica o vencimento imediato de toda a divida.

O pagamento em prestações é ainda permitido no âmbito do processo executivo. Neste


caso, poderá o executado, feita a penhora dos seus bens, requerer ao juíz o
pagamento do débito em prestações semestrais em número não superior a dez,
suspendendo-se a execução.

O pagamento em prestações e por anuidades está previsto no Código da Sisa,


relativamente à aquisição do usufruto. Se o usufruto for vitalício, ou temporário, por
vinte ou mais anos, divide-se a importância do imposto em vinte unidades; se fôr
temporário por menos de vinte anos, dividir-se-á em tantas anuidades quantos os anos
porque o usufruto, caducarão as anuidades vincendas; o não pagamento de alguma
anuidade, diversamete do que sucede no caso das prestações, não implica o
vencimento das restantes anuidades.

b) Outras formas de extinção da obrigação tributária

 Dação em cumprimento: Forma de extinção que consiste na prestação com o


acordo das duas partes de coisa diversa da que constitui o objecto da obrigação
esta prestação exonera o devedor da sua obrigação. Em lugar da prestação
pecuniária devida, a lei admite que se entregue outra coisa de valor idêntico.

 Prescrição – forma de extinção de um direito pelo seu não exercício por um


dado lapso de tempo fixado na lei e variável de caso para caso.

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O prazo de prescrição das dívidas tributárias conta-se do início do ano seguinte
àquele em que tiver ocorrido o facto tributário. Na legislação moçambicana, como já
nos referimos, o prazo de prescrição é de 10 anos, salvo o disposto em lei especial
(artigo 48 da LGT).

A reclamação, a impugnação, o recurso e a execução interropem a prescrição.

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 Compensação: No caso de anulação da liquidação é precessado o título de
anulação.

O contribuinte, nos casos em que tenha outra obrigação do mesmo imposto, poderá
compensá-la com o crédito representado no título. A obrigação, neste caso, extinguir-
se-á “por encontro com título de anulação”. Vidé as Técnicas de Reembolso na Lei
de Bases do Sistema Tributária –Art.º 33 - Lei n° 15/2002, de 26 de Junho.

 Confusão: Verifica-se, quando o sujeito activo é simultaneamente sujeito


passivo do imposto (por exemplo, quando a herança é deferida ao Estado, por
falta de todos os parentes sucessíveis.

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