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DISCIPLINA DE FUNDAÇÕES

FUNDAÇÕES SUPERFICIAIS

DIMENSIONAMENTO GEOTÉCNICO

PROF. EDUARDO AZAMBUJA 1


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1. CONCEITOS GERAIS DE FUNDAÇÕES SUPERFICIAIS

1.1. Definição

De maneira geral, o termo fundação refere-se ao ato ou efeito de alicerçar,


fundar, lançar bases, fazer sustentação (Ferreira, 1987). Remete, portanto, a
qualquer tipo de base que sirva de sustentação a uma estrutura, ação ou
empreendimento.

No que se refere à Engenharia Civil, o termo é usado para designar “a parte de


uma estrutura que transmite ao terreno subjacente seu próprio peso, o peso da
superestrutura e qualquer outra força que atue sobre ela”. Em uma edificação, a
fundação é, portanto, o elemento que faz a ligação entre a estrutura e o solo e a
sustenta, transmitindo a este, de forma segura, não somente o peso da edificação,
mas também o de todos os elementos a ela agregados.

Uma fundação corretamente projetada tem como função suportar todas as


cargas que atuam sobre ela e distribuí-las de maneira satisfatória sobre as
superfícies que fazem contato com o solo sobre o qual se apóia. Para que cumpra
sua função de maneira eficaz, essa distribuição não deve produzir tensões
excessivas ou não homogêneas no solo a qualquer profundidade sob a fundação.
Considera-se excessiva qualquer tensão que possa provocar uma ruptura na massa
de solo em que a fundação se apóia, bem como inclinações e recalques apreciáveis
do conjunto estrutural. Também considera-se excessiva aquela tensão que produz
recalques desiguais na estrutura, de sorte que esta venha a apresentar fissuras ou
avarias.

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Torna-se evidente a importância do adequado emprego das fundações, uma


vez que nenhuma estrutura pode subsistir sem uma base apropriada. O emprego de
fundações inadequadas pode causar danos devido a rupturas no solo,
escorregamentos de terraplenos, fissuras e avarias na edificação e, por fim, em
casos extremos, até mesmo desabamentos de toda a edificação. Assim, as
fundações – como qualquer outra parte da estrutura – devem ser projetadas e
executadas para garantir, sob a ação dos carregamentos, as condições mínimas de
segurança, funcionalidade e durabilidade necessárias à obra ao longo de sua vida
útil.

Com relação à segurança, uma fundação deve atender aos coeficientes de


segurança contra rupturas, fixados por normas técnicas, tanto no que diz respeito à
resistência dos elementos estruturais que a compõem, quanto às do solo que lhe dá
suporte. Quanto à funcionalidade, deve garantir deslocamentos compatíveis com o
tipo e finalidade a que se destina a estrutura. Os recalques devem ser estimados, na
fase do projeto, num trabalho conjunto entre as equipes que calculam a estrutura e a
fundação. A esse respeito, Alonso (1998) assim se manifesta:

As reações, para o cálculo das fundações, fornecidas pela primeira equipe


[que calcula a estrutura] são usadas como ações pela segunda [a que
calcula as fundações], que deverá, também, estimar os recalques
correspondentes. Se os valores desses recalques não estiverem dentro da
ordem de grandeza daqueles inicialmente fixados pela equipe de cálculo da
estrutura, deverá ser feita uma reavaliação das cargas, impondo-se estes
novos recalques. O confronto e ajuste entre esses valores (recalques
prefixados pela equipe de estrutura para o cálculo das cargas e recalques
calculados pela equipe de fundações a partir dessas cargas) é o que se
denomina interação solo-estrutura.

Modernamente, com a popularização das ferramentas computacionais para o


projeto de estruturas, há facilidade de se considerar a relação carga-deslocamento
das fundações na análise das solicitações nas estruturas. Esse tipo de projeto onde
os vínculos externos da estrutura são tomados como deformáveis é uma forma mais
racional de projeto, mas implica na necessidade de se dispor de uma equipe
multidisciplinar já no início do projeto estrutural, fazendo-se desaparecer a figura do
“projetista de estruturas” e do “projetista de fundações”.

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No que se refere à durabilidade, uma fundação deve apresentar vida útil no


mínimo igual à da estrutura. Torna-se necessário, no que se refere a esse aspecto,
um estudo minucioso das variações de resistência dos materiais constituintes da
fundação, do solo e das cargas atuantes ao longo do tempo.

À medida que as condições de segurança, funcionalidade e durabilidade são


atendidas, ter-se-á o bom desempenho de uma fundação, o que estará intimamente
ligado ao controle e garantia de qualidade imposto pelas equipes envolvidas com o
projeto e execução de uma estrutura.

1.2. Tipos de Fundações

De acordo com Velloso e Lopes (2004), existem, basicamente, dois tipos de


fundações: as fundações rasas ou superficiais e as fundações profundas. Tem-se o
primeiro tipo quando o mecanismo de ruptura prolonga-se até a superfície do
terreno, conforme mostra a figura 1(a).

Ocorrem fundações profundas quando o mecanismo de ruptura não atinge a


superfície, como mostra a figura 1(b). Admitindo o embutimento da fundação no
terreno como a distância “D” e a menor dimensão da fundação como “B”, a ABNT
NBR 6122:2010 Projeto e execução de fundações postula que uma fundação
poderá ser considerada profunda quando:

D  2B e D  3m

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Figura 1: Conceituação de fundação superficial e profunda (Velloso e Lopes, 2010).

Fundação superficial (rasa ou direta) é o elemento de fundação em que a carga


é transmitida ao terreno pelas tensões distribuídas sob a base da fundação, e a
profundidade de assentamento em relação ao terreno adjacente à fundação é
inferior a duas vezes a menor dimensão da fundação.

Com relação às fundações superficiais sua classificação se dá conforme sua


forma e característica morfológica e de distribuição de tensões. Reproduzindo a
classificação proposta pela NBR 6122, tem-se:

- sapata – elemento de fundação superficial, de concreto armado,


dimensionado de modo que as tensões de tração nele resultantes sejam
resistidas pelo emprego de armadura especialmente disposta para este fim;

- bloco – elemento de fundação superficial de concreto simples (tronco-


cônico ou piramidal), dimensionado de modo que as tensões de tração nele
resultantes sejam resistida pelo concreto, sem necessidade de armadura;

- radier – elemento de fundação superficial que abrange parte ou todos os


pilares de uma estrutura, distribuindo os carregamentos;

- sapatas associadas – sapata comum a mais de um pilar;

- sapata corrida (contínua ou viga de fundação) – sapata sujeita à ação de


uma carga distribuída linearmente ou de pilares ao longo de um mesmo
alinhamento;

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- viga alavanca ou equilíbrio – elemento estrutural que recebe as cargas de


um ou dois pilares (ou pontos de carga) e é dimensionado de modo a
transmiti-las centradas às fundações. Da utilização de viga de equilíbrio
resultam cargas nas fundações diferentes das cargas dos pilares nelas
atuantes;

- grelha – conjunto de vigas de fundação que se cruzam na interseção com


os pilares;

As figuras 2a a 2e apresentam uma seqüência de ilustrações da tipologia de


fundações superficiais.

Figura 2(a) – Fundações em blocos de concreto simples e sapatas.

A
A

A
Planta A
Planta
Pilar Viga de Rigidez
Pilar Viga de Rigidez

Vista Lateral Corte A-A


Vista lateral Corte A-A

Figura 2(b) – Fundações em sapatas associadas em condição simétrica e


em condição de divisa.

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VIGA DE RIGIDEZ A PILAR


A
Planta

A
Vista lateral Corte A-A Planta Corte A-A
Figura 2(c) – Viga de fundação e sapata corrida.

Figura 2(d) – Sapatas associadas por viga de equilíbrio.

Figura 2(e) – Grelhas e radiers.

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De acordo com Velloso e Lopes (2004), as sapatas e os blocos são os


elementos de fundações superficiais mais simples, bem como os mais econômicos,
desde que seja possível sua adoção.

Para cargas reduzidas ou para apoio em rocha, os blocos são mais


econômicos que as sapatas, pois o consumo de concreto é pequeno e não há
necessidade de armação. Entretanto, não há restrições de seu emprego também
para cargas elevadas, desde que bem calculada sua capacidade de carga.

De fato, na maioria das construções de pequeno porte, as fundações mais


comuns são as sapatas contínuas e as sapatas isoladas. A Figura 3 exibe uma
ilustração da construção de sapata contínua em edificações residenciais de
alvenaria portante e a Figura 4 apresenta uma ilustração de construção de um
pequeno edifício comercial sobre pilotis.

Figura 3 – Seqüência construtiva de uma sapata contínua para uma


edificação residencial em alvenaria portante. Observa-se que no
procedimento construtivo não foram empregadas formas laterais
para a concretagem.

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Figura 4 – Seqüência construtiva de uma sapata isolada.

De todas as fundações superficiais, as menos freqüentes são as placas ou


radiers. Isto decorre de duas razões: uma técnica e outra econômica.

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A razão técnica é que os radiers são, em geral flexíveis e, por isso, mais
complexo de serem dimensionados do que sapatas. A razão econômica surge na
necessidade de aumentar a espessura do radier para torná-lo rígido, o que implica
em custos maiores. A figura 5 ilustra os diferentes tipos de radiers empregados em
construções de edifícios, ressaltando as estratégias para aumentar a rigidez da peça
nos locais de concentração de cargas.

Figura 5 – Tipos comuns de radiers: (a) placa lisa sem nervuras; (b) placa
cogumelo com espessamento apenas sob os pilares; (c) placa
nervurada; (d) placa com capitéis; (e) radier tipo caixão (fonte: Bowles,
1998).
Recentemente, passou-se a adotar radiers flexíveis para fundações de casas
populares. A escolha desse tipo de fundação é fundamentada em razões
econômicas, pois as fundações profundas em solos de várzea podem ser muito
profundas e desproporcionais ao valor desejado para uma moradia destinada à
população de baixa renda. A figura 6 exibe as fases construtivas desses radiers,
salientando-se que se trata de uma placa com nervuras sob as paredes. Observe
que o revestimento do terreno sob o radier é constituído por um plástico filme e não
por concreto magro. Está é apenas uma opção construtiva, não tendo justificativa
técnica.

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Figura 6 – Detalhes da construção de radiers flexíveis na Vila dos


Papeleiros – Porto Alegre.

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2. CAPACIDADE DE CARGA DE FUNDAÇÕES SUPERFICIAIS

Inicialmente, deve-se definir capacidade de carga como a tensão limite que


uma fundação impõe à superfície em que se assenta, a partir da qual a estrutura não
mais se comporta adequadamente. Tal limite, conforme Cintra et al (2003), pode
estar associado a duas condições: limite último (condição de colapso ou ruptura do
terreno) e limite de serviço (condição de deformação inaceitável e que compromete
a funcionalidade da estrutura).

Ainda conforme o autor supracitado, a previsão de capacidade de carga,


quanto ao limite último, é obtida em função da forma de ruptura do terreno, que
condiciona o comportamento “carga x recalque” e é dependente do confinamento
(profundidade da fundação) e da rigidez do solo.

Há diversos métodos para a estimativa de tensões admissíveis e ou resistente


de projeto em uma estrutura. De acordo com a NBR 6122 Projeto e execução de
fundações, a tensão admissível pode ser estimada segundo métodos teóricos e
semiempíricos. A norma considera a estimativa de capacidade de carga a partir de
uma prova de carga (ensaio de placa) como um método específico. Conforme será
discutido posteriormente, esse método poderia ser considerado como uma
formulação semiempírica.

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2.1. Conceito de Segurança

Conforme já foi discutido anteriormente, as fundações devem ser verificadas


segundo dois procedimentos: pelo estado limite último e pelo estado limite de
serviço.

O estado limite último é uma verificação de tensões, ou seja, de avaliação da


capacidade do solo oferecer reação às solicitações transmitidas da estrutura pela
fundação.

Já o estado limite de serviço é uma verificação de deformações, ou seja, de


avaliação dos recalques que uma fundação pode exibir sem implicar em prejuízo
funcional à estrutura.

O regime de trabalho de uma fundação deve, portanto, estar convenientemente


afastado desses limites. Esse “convenientemente” enseja a garantia de
funcionamento frente às variabilidades das ações e às variabilidades das
propriedades do solo.

Dentro desse contexto é que são possíveis diferentes abordagens da


segurança das fundações. Em linhas gerais, é possível adotar conceitos
deterministas, semiprobabilistas e probabilistas de segurança para o limite último, os
quais serão brevemente discutidos a seguir.

2.1.1. Verificação do estado-limite último (ELU) na compressão

a) Métodos deterministas

Os métodos deterministas partem do princípio que as variâncias das ações e


das propriedades dos solos são constantes. Toda esta variabilidade é confundida
apenas na determinação da tensão admissível.

A verificação da estabilidade é assim realizada:

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 ult
 d  f  Fk   adm   d
FS

Ou seja: para a determinação das tensões de contato solo-fundação, utiliza-se


as ações características (sem fatores de ponderação ou de combinação de ações) e
para a determinação da tensão admissível, utiliza-se um fator de segurança global.
A Figura 07 ilustra a situação prevista pelo método determinista.

Figura 07 - Filosofia dos métodos deterministas para a verificação da


estabilidade das fundações.

O fator de segurança global pode ser definido de acordo com o preconizado


pela NBR-6122 em sua Tabela 01.

b) Métodos semiprobabilistas

Os métodos semiprobabilistas são largamente empregados em cálculos de


estruturas correntes como as de aço, madeira e concreto. A filosofia básica é
introduzir fatores de ponderação nas ações e nas resistências, cada qual procurando
contemplar a variabilidade intrínseca de cada parâmetro e a sua significância na
estabilidade da fundação.

Na verificação do estado limite último tem-se:

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 ult
 d  f  f ; Fk   adm   d
m

Ou seja: para a determinação das tensões de contato solo-fundação, utiliza-se


as ações de cálculo previstas pela ABNT NBR 8681:2003 Ações e segurança nas
estruturas (aplicados os fatores de ponderação e de combinação de ações) e para a
determinação da tensão admissível, aplica-se um coeficiente de minoração (m) à
tensão de ruptura, ou, resistência última. A Figura 08 ilustra a filosofia do método.

m

Figura 08 - Filosofia dos métodos semiprobabilistas para a verificação da


estabilidade das fundações.

Os valores do coeficiente de minoração são indicados pela Tabela 01 da NBR


6122, apresentada a seguir.

Tabela 01 – Fundações superficiais - Fatores de segurança e coeficientes de minoração para


solicitações de compressão - NBR 6122.
Métodos para determinação da Coeficiente de minoração da
Fator de segurança global
resistência última resistência última

Valores propostos no próprio Valores propostos no próprio


Semiempíricos a
processo e no mínimo 2,15 processo e no mínimo 3,00
Analíticos b 2,15 3,00
Semiempíricos a ou analíticos b
acrescidos de duas ou mais provas
de carga, necessariamente 1,4 2,0
executadas na fase de projeto,
conforme item 7.3.1 da NBR 6122
a
Atendendo ao domínio de validade para o terreno local
b
Sem aplicação de coeficientes de minoração aos parâmetros de resistência do terreno.

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c) Métodos probabilistas

Os métodos probabilistas são aqueles que substituem o conceito de fatores de


segurança e fatores de ponderação e passam a trabalhar com o conceito da
probabilidade de ruína.

Embora com evidentes vantagens sobre os métodos deterministas e


semiprobabilistas, os métodos probabilistas esbarram na dificuldade de se avaliar as
variâncias dos parâmetros envolvidos na análise.

A Figura 09 ilustra a situação analisada pelo método probabilista.

Figura 09 - Filosofia dos métodos semi-probabilistas para a verificação da estabilidade


das fundações: a área hachurada corresponde à probabilidade de ruína.

2.1.2. Verificação do estado-limite último (ELU) na tração e para


deslizamento

A verificação do estado limite último na tração e para o deslizamento é


realizada apenas por métodos semiprobabilísticos utilizando-se fatores de
segurança parciais, sendo adotados os seguintes fatores de segurança:

a) Carregamento dado em termos de valores característicos

Devem ser adotados fatores de segurança parciais de minoração de


resistência:

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- Para a parcela de peso – mp = 1,2;

- Para a parcela de resistência do solo – m = 1,4.

Esta parcela de resistente deve ser comparada com o esforço característico


atuante majorado pelo fator f = 1,4.

W  
 f  Tk   

  mp  m 

b) Carregamento dado em termos de valores de projeto

Devem ser adotados somente os fatores de segurança parciais de minoração


de resistência indicados acima.

W  
Td   
 
 mp  m 

2.1.3. Verificação do estado-limite último (ELU) para flutuação

A verificação do estado limite último para flutuação é realizada apenas pelo


método determinístico, considerando-se todas as combinações mais desfavoráveis
(por exemplo, a elevação do lençol freático), tanto nos esforços atuantes quanto nos
resistentes, devendo ser observado um fator de segurança global mínimo de 1,1.

2.1.4. Segurança quanto ao estado limite de serviço (ELS)

Para a verificação de uma fundação quanto ao estado limite de serviço,


existem duas estratégias possíveis: a avaliação de recalques máximos e a avaliação
de recalques admissíveis.

Os recalques máximos (,max) são geralmente estipulados como uma condição


máxima de deslocamentos previstos no projeto da superestrutura. Por essa razão, é

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necessário resguardar uma margem de segurança com respeito a esta situação. O


fator de segurança tipicamente adotados nessa verificação é 1,5.

  ,max
 adm 
FS

Os recalques máximos admitidos em fundações já foram estudados por


diversos autores. A tabela 02 salienta alguns desses valores propostos.

Tabela 02 – Recalques totais limites para sapatas e radiers sugeridos por


diferentes autores.
 (mm)
Autores
Sapatas Radiers
Terzaghi e Peck, 1967 25 50
Skempton e MacDonald, 1956 65 90
Cernica,1995 38 51
Teng, 1984 26 52
Teixeira e Godoy, 1998 65 90
Burland e outros, 1977 65 100
Bowles, 1977 38 64

Convém destacar que uma série de outros autores reporta-se às limitações de


distorção nas estruturas, em função do tipo de dano tolerado. O gráfico que aparece
na Figura 10 sintetiza esses limites de distorção.

A distorção (ij) entre dois pontos “i” e “j” de uma estrutura é freqüentemente
expressa como:

 j  i
ij 
Lij

Onde: j é o recalque total em um ponto “j”;

i é o recalque total em um ponto “i”;

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Lij é a distância entre os pontos “i” e “j”.

Figura 10 - Distorções em estruturas e danos associados segundo Bjerrum


(appud Velloso e Lopes, 2004)

Já os recalques admissíveis são normalmente definidos por prescrições ou


pelo projeto se houver uma condição limite de funcionalidade (inclinações máximas
de pistas de trilhos de equipamentos, por exemplo). Nesses casos, não se costuma
utilizar um fator de segurança específico.

 adm    ,adm

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2.2. Formulações Racionais de Previsão da Capacidade de Carga

As formulações racionais, de acordo com Teixeira e Godoy (1996), consistem


na aplicação de uma fórmula de capacidade de carga para a estimativa da tensão de
ruptura do solo de apoio, σult, portanto uma verificação no Estado Limite Último.

O que é comum em todos os métodos racionais é a criação de uma estrutura


analítica simplificada que tenta reproduzir o fenômeno de colapso da massa de solo
sob a fundação. A partir da determinação da tensão última, aplica-se um dos
conceitos de segurança já discutidos anteriormente para determinar a “tensão
admissível”.

De acordo com os autores supra citados, existe uma imprecisão inerente às


fórmulas de capacidade de carga. Além disso, essa metodologia esbarra em
dificuldades de ordem prática na avaliação da resistência ao cisalhamento dos solos
envolvidos. As correlações desses parâmetros a partir de ensaios de campo
ensejam imprecisões intrínsecas e nem sempre é possível realizar ensaios de
laboratório em amostras indeformadas com representatividade suficiente para a
condução de projetos.

Os métodos racionais são também denominados de métodos teóricos,


conforme destaca Velloso e Lopes (2004), pois são estruturados a partir de um
modelo analítico de comportamento mecânico do conjunto solo-fundação. Esse
modelo é representado, esquematicamente na Figura 11 que destaca que nas
massas semi-infinitas como é o caso de solos, a mobilização de cargas
concentradas implica em um complexo movimento de massas.

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Figura 11 - Modelo analítico de capacidade de carga: a reação que o solo pode oferecer a uma
solicitação é resultado de um mecanismo de rotação de massas que mobiliza tensões de
cisalhamento nas interfaces.

2.2.1. Formulação Teórica de Terzaghi

A formulação de Terzaghi (Terzaghi e Peck, 1948) consiste na aplicação


pioneira para a mecânica dos solos das teorias de punção em massas semi-infinitas.
Essas teorias surgiram inicialmente na mecânica aplicada à punção de metais e foi
derivada para materiais friccionais como é o caso dos solos.

A versão apresentada neste trabalho é a proposta por Cernica (1995), que


apresenta algumas simplificações particularmente interessantes na determinação
dos fatores de capacidade de carga.

A tensão última da sapata pode ser avaliada pela seguinte expressão

1
 ult  S c  c  N c  qo  N q   S     B  N
2

Cada uma das três parcelas da formulação racional de capacidade de carga foi
deduzida a partir do comportamento de materiais fictícios. Por exemplo, a primeira
parcela foi deduzida para um solo sem atrito, puramente coesivo e sem embutimento
(=0; qo=0); a segunda parcela foi deduzida para um solo sem coesão e sem peso e
a terceira parta um solo sem coesão e sem embutimento. Um solo real é uma
mescla das três situações e, desse raciocínio, surgiu a expressão acima.

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Os parâmetros Sc e S são denominados fatores de forma e os valores são


indicados na Tabela 03.

Tabela 03 - Fatores de forma para a formulação de Terzaghi.


Tipo de sapata Sc S
Contínua (L>10B) 1,0 1,0
Quadradas (L=B) 1,3 0,8
Circulares 1,3 0,6

Os fatores Nc, Nq e N são denominados de fatores de capacidade de carga e


são assim definidos:

 3  
a2     tan 
Nq  onde ae  4 2
 
2 cos 2  45  
 2

Nc 
1
tan 

 Nq 1  para   0  , adota  se N c  5,70

N 
1  k p
 tan   

 1

onde k p   3  tan 2  45 
  33 
2  cos 2    2 
 

Na formulação, a sobrecarga qo significa a pressão vertical efetiva acima do


nível da fundação e pode ser considerada como:

qo    D

A Figura 12 que mostra o arranjo dimensional de uma sapata. Cabe destacar


que a formulação original de Terzaghi não prevê a capacidade de carga de
fundações retangulares (L>B). Alguns autores, erroneamente, utilizam os fatores de
forma das sapatas quadradas para sapatas retangulares.

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Figura 12 - Arranjo básico de uma fundação superficial, conforme a


formulação de Terzaghi.

A formulação de Terzaghi é válida para solos que mobilizam sua máxima


resistência ao cisalhamento ao longo de todas as superfícies de ruptura do modelo
indicado na figura 11. É importante destacar que esse fenômeno envolve a
participação do empuxo passivo que só é integralmente mobilizado com grandes
deformações. Por isso a formulação é válida para solos compactos ou densos que
possuem um pico de resistência ao cisalhamento bem destacado, conforme ilustra a
Figura 13. Para essas situações, Terzaghi denominou de “ruptura geral”.

Figura 13 – Ruptura geral onde a resistência ao cisalhamento é


integralmente mobilizada em todas as superfícies envolvidas.

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Para solos com resistência muito baixa (areias fofas e argilas moles), a ruptura
se dá de forma dúctil, ou seja, com expressivas deformações plásticas. O resultado
prático dessa plasticidade é que existem deformações muito grandes nas massas o
que implica que o valor máximo da resistência ao cisalhamento não pode ser
mobilizado ao longo de todas as superfícies de ruptura.

Essa forma de ruptura foi denominada por Terzaghi como “ruptura localizada”,
pois o mecanismo de ruína não se propaga até a superfície do terreno. A figura 14
mostra a comparação entre o comportamento carga –recalque das fundações
segundo as diferentes formas de ruptura. Nos casos de rupturas localizadas,
Terzaghi sugere que a formulação seja mantida, porém adotando-se parâmetros de
resistência ao cisalhamento modificados (cmod e mod):

2 2 
c mod   c  mod  arctan   tan  
3 3 

Figura 14 – Diferentes formas de ruptura de uma fundação superficial


segundo Vèsic (apud Velloso e Lopes, 2004): (a) ruptura
generalizada; (b) ruptura localizada; (c) ruptura por punção.

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Na prática, os solos com NSPT inferior a 4 desenvolvem ruptura por punção e os


solos com NSPT entre 4 e 10 desenvolvem ruptura localizada. Nos solos que
apresentam ruptura por punção, a princípio, devem ser evitadas as fundações
superficiais. Caso elas sejam imperiosas, então estudos mais detalhados devem ser
desenvolvidos a respeito da capacidade de suporte.

Para o caso de sapatas com carga vertical excêntrica, admite-se que a


distribuição das tensões é uniforme, a partir do princípio da superposição dos efeitos
para materiais perfeitamente elásticos, conforme indicado na Figura 15.

Figura 15 – Distribuição das tensões no solo admitida pela formulação de Terzaghi para solicitações
normais excêntricas.

Com isto, têm-se as máximas e mínimas tensões em uma sapata de base


retangular definidas pela seguinte expressão:

N k  6  eL 6  eB 
 min
max
 1   
BL L B 

No caso de uma fundação de base circular, as tensões máximas e mínimas


seriam dadas por:

N k  4  er 
 min
max
 1  
  R2  R 

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Os limites de aplicabilidade da expressão são também as condições de


estabilidade para a sapata:

4  min   max
 max   adm  min  0   adm
3 2

Interpretam-se essas limitações da seguinte forma: a base deve ser totalmente


comprimida, uma vez que o solo não pode desenvolver tensões de tração; a tensão
máxima pode superar ligeiramente a tensão admissível, uma vez que a plastificação
(não admitida pelo método mas provável na condição real do solo) proporciona uma
redistribuição de tensões na base que lhe é favorável.

2.2.2. Formulação Teórica de Meyerhof

Outro autor que trouxe importantes contribuições ao tema capacidade de carga


foi Meyerhof (1956). Segundo Cintra et al (2003) o método considera que a
superfície de ruptura se prolonga na camada superficial do terreno e que, portanto,
há a contribuição não só da sobrecarga, mas também da resistência ao
cisalhamento do solo nessa camada, conforme ilustra a figura 16.

Figura 16 – Capacidade de carga segundo o modelo proposto por Meyerhof: a resistência ao


cisalhamento é considerada até a superfície do terreno, como indicado no destaque.

A contribuição de Meyerhof está na simplificação dos fatores de capacidade de


carga e na introdução de fatores de forma, profundidade e inclinação de cargas. A

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partir dessa formulação, passou-se a contar com uma previsão mais adequada para
a capacidade de carga de sapatas retangulares.

A formulação de Meyerhof é semelhante à formulação de Terzaghi e expressa


como:

 ult  sc  d c  ic   c  N c  s q  d q  iq   qo  N q   
1
 s  d   i    B   N 
2

Os fatores de capacidade de carga foram modificados ligeiramente em relação


aos previstos por Terzaghi e são assim expressos:

Nc 
1
tan 

 Nq 1  para   0 , adota  se N c  5,1

   
N q  e  tan   k p onde k p  tan 2  45  
 2

 
N  N q  1  tan 1,4 

Os fatores de forma, profundidade e de inclinação de carga podem ser obtidos


a partir das expressões apresentadas na Tabela 04.

Tabela 04 - Fatores de forma, profundidade e inclinação de carga para a


formulação de Meyerhof.

Fatores de
Condição de Fatores de
Fatores de Forma Inclinação de
carregamento profundidade
Carga

B' D  
2
s c  1  0,2  k p  d c  1  0, 2  k p  
L' B' i c  1  
 90 
2
s q  1  0,1  k p 
B'
d q  1  0,1 k p 
D   
Drenada (>0°) i q  1  
L' B'  90 
2
B' D  
s  1  0,1 k p  d   1  0,1 k p  i   1  
L' B'  

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sc = 1 dc = 1 ic = 1
Não drenada (=0°) sq = 1 dq = 1 iq = 1
s = 1 d = 1 i = 1

O ângulo  que aparece na determinação dos fatores de inclinação significa o


ângulo do carregamento incidente na base da fundação em relação ao eixo vertical e
pode ser estimado por:

Hk
  arctan 
Nk

A figura 17 indica a posição da carga inclinada considerada na formulação de


Meyerhof.
Não é possív el exibir esta imagem no momento.

Figura 17 - Posição de um carregamento inclinado na base da fundação


superficial segundo Meyerhof.

Para o caso de carga vertical excêntrica, Meyerhof (1956) propõe que as


dimensões reais da base da sapata (B. L) sejam substituídas, nos cálculos de
capacidade de carga, por valores reduzidos (B’, L’) dados pelas expressões:

B’ = B – 2eB L’ = L – 2eL

em que eB e eL são as excentricidades da carga nas direções dos lados B e L da


sapata, conforme a figura 18, a seguir. Essa simplificação sugere uma plastificação
perfeita do solo e considera uma área efetiva de apoio (B’ x L’) cujo centro de
gravidade coincide com o ponto de aplicação da carga. Nesses casos, a estabilidade
da sapata no estado limite último seria adequada quando:

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Nk
    adm
B  L

Figura 18 – Proposta de área reduzida para sapata submetida a


carregamento excêntrico postulada por Meyerhof.
Meyerhof recomenda que a excentricidade máxima aceitável para uma
fundação de base retangular seja correspondente a um terço do lado
correspondente, ou seja:

L B
eL  e eB 
3 3

Para o caso de sapatas com área circular de raio R, tem-se:

Nk  er 
   arccos   [radianos]
2   R 2 R

Para cálculo dos fatores de forma e de profundidade, pode ser admitido que:

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2    R  e r  2   R 2
B  R  L 
R  sen B

O autor recomenda ainda que a tensão de contato admissível seja determinada


pela seguinte expressão, para qualquer forma de sapata:

 ult
 adm   Re
FS

onde Re é um fator de redução em função da excentricidade que pode ser


assim determinado:

2e r
Re  1 
B para solos coesivos

er
Re  1 
B para solos granulares

A excentricidade “er” é a soma vetorial das excentricidades segundo os eixos


principais de inércia, ou seja:

er  e B 2  e L 2

2.2.3. Formulação de Brinch-Hansen

A formulação de Brinch-Hansen (1970) é também conhecida como formulação


geral de capacidade de carga, pois incorpora uma série de fatores de correção,
entre eles o de inclinação de carga e o de inclinação de terreno, portanto
contemplando uma gama de situações de relevo que são comuns em terrenos
declivosos.

A expressão é assim apresentada:

 ult  s c  d c  ic  bc  g c   c  N c  s q  d q  i q  bq  g q  q o  N q 


1
2
 
 s  d   i  b  g     B   N 

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Os fatores de capacidade de carga são idênticos aos de Meyerhof, exceto por


uma ligeira modificação em N:

Nc 
1
tan 

 Nq 1  para   0 , adota  se N c  5,1

   
N q  e  tan   k p onde k p  tan 2  45  
 2

 
N   1,5  N q  1  tan 

Os fatores de forma e de profundidade são apresentados na Tabela 05:

Tabela 05 - Fatores de forma e profundidade para a formulação de Brinch-


Hansen.
Condição de
Fatores de Forma Fatores de profundidade
carregamento

B N q 1 dq
sc  1  d c d q 
L N c N c  tan 
B
d q  1  2 tan   1  sen 2 
D
Drenada (>0°) sq 1 tan  (*)
L B
B
s  1  0,4  d  1
L
B N q B
sc  1  d c  1  0,4 
L N c L
Não drenada
(=0°) sq = 1 dq = 1
B
s  1  0,4  d = 1
L
(*) Quando D>B, adota-se D=B. Observe que não são empregados B’ e L’ nos fatores de
profundidade.

Os fatores de inclinação de carga propostos por Brinch-Hansen são


ligeiramente diferentes daqueles formulados por Meyerhof. Hansen introduz
coeficientes de forma (mB e mL) que se associam à natureza do carregamento
através do coeficiente “m”.

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B L
2 2
mB  L mL  B
B L
1 1
L B

m  m L  cos 2  n  m B  sen 2 n

onde: n é o ângulo entre a resultante da carga e o eixo da fundação,


segundo a direção L

Hansen entende que a parcela de coesão mobilizada efetivamente na base da


fundação (que ele denomina de Ac) atua restringindo o efeito da influência da
componente horizontal do carregamento (Hk).

Assim, têm-se:

Ac  B 'L'cb

onde B’ e L’ são as dimensões reduzidas conforme definido por Meyerhof e cb


é a coesão de interface entre a fundação e o solo.

Para a condição drenada de carregamento (>0°), tem-se:

m
 
 Hk 
iq  1  
 N  Ac 
 tan  
k

m 1
 
 Hk 
i  1  
 N  Ac 
 tan  
k

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1  iq
ic  i q 
N c  tan 

Para a condição não drenada (=0°), tem-se:

m Hk
ic  1 
Ac    2 

iq  i  1

Os fatores “g” e “d” são, respectivamente, destinados a contemplar os efeitos


de inclinação do terreno e os de inclinação da base da fundação.

Considerando que  é o ângulo médio do terreno em relação com um plano


horizontal, têm-se, para a condição drenada:

g q  g   1  tan  2

1 gq
gc  gq 
N c  tan 

Já para a condição não drenada, os fatores gq e g permanecem inalterados,


mas o fator gc é expreeso como:

2
gc  1  com  em radianos
 2

As expressões dos fatores de inclinação do terreno são válidas para as


seguintes condições:

 < 45°



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Hansen também recomenda que nos casos de terrenos inclinados, o fator de


capacidade de carga N seja alterado pata:

N   2  sen

Os fatores de inclinação de fundação são semelhantes aos fatores de


inclinação do terreno. Para a condição drenada de carregamento eles podem ser
assim expressos:

bq  b  1  tan  2

1  bq
bc  bq 
N c  tan 

onde:  é o ângulo da base da fundação em relação ao plano horizontal.

Já para a condição não drenada, os fatores bq e b permanecem inalterados,


mas o fator bc é expreeso como:

2
bc  1  com  em radianos
 2

2.2.4. Formulação de Vèsic

Vèsic (1975) avaliou com mais detalhe o comportamento carga-deformação


das fundações, discutindo a forma como a ruptura desenvolve-se na massa de solo
em função da forma da fundação e da rigidez do solo.

No que compete à capacidade de carga, o autor sugere as expressões


propostas por Meyerhof e Brinch-Hansen, sugerindo alterações em N e nos demais
fatores, incorporando ainda os fatores de compressibilidade (cc; cq e c).

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 ult  s c  d c  ic  bc  g c  c c   c  N c  s q  d q  iq  bq  g q  c q  q o  N q 


1
2
 
 s  d   i  b  g   c    B   N   r

Nc 
1
tan 

 Nq 1  para   0  , adota  se N c  5,14

   
N q  e  tan   k p onde k p  tan 2  45  
 2


N   2  N q  1  tan 

Os fatores de forma são apresentados na Tabela 06.

Tabela 06 - Fatores de forma para a formulação de Vèsic.


Tipo de sapata sc sq s
Contínua (L>10B) 1,0 1,0 1,0

Nq
Quadradas ou Circulares sc  1  sq  1 tan  s  0,6
Nc

B N q B B
sq  1   tan 
Retangulares sc  1   L s  1  0,4 
L N c L

Os fatores de profundidade são apresentados na Tabela 07, mas o autor


aconselha sua utilização apenas na interpretação de provas de carga ou situações
muito especiais em que as escavações para a construção das sapatas tenham sido
muito localizadas.

Na condição normal de obra, espera-se uma escavação e reaterros


generalizados com o solo acima da sapata em condição muito distinta do solo
original. Assim, os fatores de profundidade poderiam ser admitidos, por
conservadorismo, iguais a 1.

Tabela 07 - Fatores de profundidade para a formulação de Vèsic.

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Para D/B  1 Para 2,5  D/B >1

B D
d c  1  0,4  d c  1  0,4  arctan  
L B
D
d q  1  2 tan   1  sen 2  d q  1  2 tan   1  sen 2  arctan  
D
B B
d  1 d  1
(*) os valores de arctan(D/B) são expressos em radianos.

Os fatores de inclinação de carga propostos por Vèsic são idênticos aos de


Brinch-Hansen. Os fatores “g” e “b”, destinados a contemplar os efeitos de inclinação
do terreno e os de inclinação da base da fundação, são semelhantes aos propostos
por Brinch-Hansen:

Considerando que  é o ângulo médio do terreno em relação com um plano


horizontal, têm-se:

g q  g   1  tan  2

2
gc  1  com  em radianos
 2

As expressões dos fatores de inclinação do terreno não fazem distinção entre


condição drenada e não drenada, mas a limitação dos fatores segue a orientação:


0   
2

Os fatores de inclinação de fundação são semelhantes aos fatores de


inclinação do terreno e são assim expressos

2
  
bq  b  1  
 tan  

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2
bc  1 
 2

onde:  é o ângulo da base da fundação em relação ao plano horizontal,


expresso em radianos.

A maior colaboração de Vèsic está na determinação dos fatores de


compressibilidade do solo. São parâmetros relacionados com o índice de rigidez que
é definido como a relação entre o módulo de cisalhamento e a resistência ao
cisalhamento de um solo, tomando-se como referência as tensões efetivas B/2
abaixo da fundação.

G E
Ir   para condição drenada
c    tan  21     c    tan  

G E E
Ir   
Su 21     Su 3  Su para condição não drenada

 B
Onde:    D  
 2

Os fatores de compressibilidade podem então ser expressos por:

B'
cc  0,32  0,12  0,60  log I r
L'

cq  c  e

 B'    3,07 sen   log2 I r  


onde:    0,6  4,4   tan     
 L'    1  sen 

O autor sugere que esses fatores só sejam considerados quando o solo


apresentar um valor de índice de rigidez abaixo do índice de rigidez crítico. Na
verdade essa verificação é dispensada, desde que se limite os fatores de
compressibilidade a um valor máximo de 1.

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Por fim, Vèsic salienta que, para fundações de grandes áreas mas de
pequenas profundidades, a terceira parcela da formulação tende a superestimar a
capacidade de carga, razão pela qual foi introduzido o fator de redução r. Esse fator
pode ser expresso por:

B
r  1  0,25 log   1
2

2.2.5. Formulação de Skempton

Skempton (1951) desenvolveu uma formulação de capacidade de carga


especificamente para o caso de solos argilosos sob condição não drenada.

Apoiando-se na Formulação original de Terzaghi, a expressão toma a seguinte


forma:

 B
 ult  1  0,2    S u  N c  qo
 L

O fator de capacidade de carga depende da relação entre o embutimento e a


menor dimensão da sapata (D/B). Originalmente, os valores de Nc são obtidos por
ábacos apresentados pelo autor. Com margem aceitável de imprecisão, esses
valores podem ser estimados pela seguinte relação:

D  D
N c  0,74  ln   0,22   6,25  válido para  2,5
B  B

2.3. Métodos Semiempíricos

Métodos semiempíricos, na concepção de Teixeira e Godoy (1998), são


aqueles em que as propriedades dos solos seriam estimadas com base em
correlações, para, em seguida, serem aplicadas fórmulas teóricas, adaptadas ou
não. Na maioria dos casos, a estimativa de parâmetros (resistência e
compressibilidade) é feita com base na resistência à penetração medida em

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sondagem, N (STP), ou na resistência de ponta do ensaio de penetração estática do


cone, qc.

O problema dos métodos semiempíricos reside na dificuldade de se obter


parâmetros de resistência ao cisalhamento de solos que conciliam atrito e coesão
significativos, como é o caso dos solos tropicais. Geralmente as correlações entre os
ensaios de campo e os parâmetros de resistência ao cisalhamento são mais
eficientes para solos puramente friccionais (solos arenosos com coesão
negligenciável) ou solos puramente coesivos (argilas plásticas em condição não
drenada).

Tanto os resultados do ensaio de cone como os resultados do ensaio SPT


devem ser interpretados em função da tensão de confinamento. Entretanto, para
fundações superficiais, as tensões de confinamento em projetos correntes de
edificações é muito baixa (inferior a 50kPa), o que simplifica a interpretação.

Na prática brasileira, o ensaio SPT é o mais empregado e, por isso, as


correlações mais empregadas para fundações superficiais são apresentadas a
seguir, considerando os ensaios SPT brasileiro.

Os ensaios de penetração com cone estático são pouco empregados para o


projeto de fundações superficiais, mas as correlações com o CPT também serão
apresentadas.

Em ambos casos, existem correlações para solos puramente friccionais


(areias) e puramente coesivos (argilas em condição não drenada). A maioria dos
solos fica em uma situação intermediária, exigindo que o usuário enquadre em um
ou outro caso a sua situação de projeto.

Para solos arenosos:

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 Para SPT (Teixeira e Godoy, 1996)   15  20 N

(Decourt, 1996)   18,8  6,55 ln N 

qc
 Para CPT1   15 
40

Para solos argilosos

 Para SPT (Teixeira e Godoy, 1996) Su  10N kPa

qc
 Para CPT2 Su 
25

Para estimar o peso específico do solo, Cintra et al (2003) sugerem a utilização


das tabelas 08 e 09 a seguir.

Tabela 08 - Estimativa de pesos específicos a partir do ensaio SPT para


solos argilosos (Cintra et al, 2003).
NSPT Consistência Peso específico (kN/m3)
2 Muito mole 13
3-5 Mole 15
6-10 Média 17
11-19 Rija 19
20 Dura 21
Tabela 09 - Estimativa de pesos específicos a partir do ensaio SPT para
solos arenosos (Cintra et al, 2003).
Peso Específico (kN/m3)
NSPT Compacidade
Seco Úmido Saturado
<5 Fofa 16 17 19
5-8 Pouco 16 18 19

1
Para pequenas tensões de confinamento em areias, pode-se admitir que a resistência de ponta do
cone seja da ordem de 800N [kPa].
2
Para pequenas tensões de confinamento em solos argilosos, pode-se admitir que a resistência de
ponta do cone seja da ordem de 250N [kPa].

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Compacta
Medianamente
9-18 17 19 20
Compacta
19-40 Compacta 18 20 21
Muito
>40 18 20 21
Compacta

Velloso e Lopes (2004) esclarece que, no caso de fundações diretas, é


preferível estimar σadm diretamente de N ou de qc, sem a necessidade de intercalar-
se uma correlação entre esses índices e as propriedades dos solos. Tais
estratégias, conhecidas como formulações empíricas, tendem a reduzir o efeito da
propagação de erros de estimativa de parâmetros na determinação da capacidade
de carga.

2.3.1. Formulações semiempíricas baseadas no SPT

A estimativa de capacidade de carga a partir do ensaio SPT é o método mais


usado na prática. As primeiras recomendações a esse respeito surgiram com a
publicação pioneira de Terzaghi e Peck (1948), sendo depois adaptadas por outros
autores para se ajustar às condições existentes nas diferentes localidades ou
regiões em que atuavam.

A seguir, são discutidas algumas das formulações empíricas mais empregadas


na prática de fundações superficiais no Brasil, sempre restritas ao ensaio SPT. As
formulações baseadas no CPT não foram discutidas neste trabalho, em função da
sua pouca aplicabilidade em fundações superficiais de edificações de pequeno
porte.

a) Formulação de Teixeira

Existem duas expressões clássicas para a determinação da tensão admissível,


ambas propostas por Teixeira (1996). Em ambas, a tensão admissível é diretamente
calculada a partir dos ensaios de campo, considerando um fator de segurança global
igual a 3.

PROF. EDUARDO AZAMBUJA 41


DISCIPLINA DE FUNDAÇÕES

A primeira formulação é destinada a solos coesivos em condição não drenada.


A origem da expressão está na formulação racional da capacidade de carga
proposta por Skempton, adotando-se a resistência não drenada estimada a partir do
SPT. É conveniente destacar que Teixeira utiliza um fator de capacidade de carga
para condição mínima de embutimento. Então, a expressão fica:

 adm  20 N  qo com 5  N  20

A segunda formulação refere-se a solos granulares com coesão negligenciável.


O autor utiliza a correlação entre o SPT e o ângulo de atrito interno, uma estimativa
de peso específico de 18kN/m3 e uma sapata quadrada com 1,5 metro de
embutimento para chegar à seguinte expressão, empregando a formulação de
Terzaghi:

 adm  50  10 1  0,4 B N kPa  adm  500 kPa

Em ambos os casos, o autor sugere que o número de golpes N do SPT a ser


adotado nas formulações deva ser a média dos valores obtidos entre D
(profundidade de assentamento) e D+1,5B.

Talvez pela facilidade do emprego da primeira fórmula, esta tenha se


consagrado como uma expressão geral para qualquer tipo de solo, o que consiste
em um erro de avaliação.

b) Formulação de Mello

Mello (1975) relata o uso de outra correlação na prática profissional que não
distingue o tipo de solo:


 adm  100 N  1  kPa 4  N  16

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c) Formulação de Meyerhof

A formulação de Meyerhof (1957) é fundamentada em correlações entre o SPT


e o ensaio de placa da norma inglesa (placa quadrada de 1 pé de lado).

Independentemente do tipo de solo, excluindo-se as argilas plásticas que


podem sofrer adensamento, a formulação proposta por Meyerhof é a seguinte:

 adm  14,4  N  kd kPa para B<1,22 m

2
 B  0,305 
 adm  9,6  N     kd kPa para B>1,22 m
 B 

Convém destacar que a formulação original proposta por Meyerhof é


apresentada para o ensaio SPT inglês que possui energia de cravação cerca de
20% inferior ao ensaio brasileiro. A formulação aqui apresentada foi, portanto,
corrigida para a energia do ensaio brasileiro.

O valor de kd consiste no ajuste do fator de profundidade dos ensaios para a


situação da fundação analisada e é admitido como:

D
kd  1   1,33
3 B

Convém destacar que para Meyerhof, o valor de N deve ser tomado como a
média do número de golpes entre as profundidades D e (D+B).

Posteriormente, Meyerhof (1965) propôs uma nova versão de sua formulação,


considerando uma limitação quanto ao limite de serviço, portanto um critério
suplementar ao primeiro:

3
 adm   N   adm kPa  para B<1,22 m
5

PROF. EDUARDO AZAMBUJA 43


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2
 B  0,305 
 adm
2
  N   adm    kPa para B>1,22 m
5  B 

Onde: adm é o recalque admissível para a fundação em mm e B é dado em


metros.

Convém destacar que as formulações originais propostas por Meyerhof são


apresentadas para o ensaio SPT inglês que possui energia de cravação cerca de
20% inferior ao ensaio brasileiro. As formulações aqui apresentadas foram, portanto,
corrigidas para a energia do ensaio brasileiro.

d) Formulação de Bowles

Bowles (1977) propõe, baseado em suas experiências pessoais, o ajuste da


formulação de Meyerhof. Entretanto o autor não esclarece a origem dessa proposta.
De qualquer forma, a expressão fica:

 adm  20  N  kd kPa para B<1,22 m

2
 B  0,305 
 adm  12,5  N     kd kPa para B>1,22 m
 B 

O valor de kd é o mesmo preconizado por Meyerhof.

2.3.2. Formulações baseadas no ensaio CPT

Existem poucas expressões que correlacionem diretamente a tensão


admissível com os resultados da tensão de ponta verificada no cone estático (CPT).
As mais empregadas são as de Meyerhof, Robertson, Teixeira e Godoy.

a) Meyerhof

A formulação de Meyerhof (1957), é fundamentada em ensaios de cone


holandês e em ensaios com o cone de Begemann.
PROF. EDUARDO AZAMBUJA 44
DISCIPLINA DE FUNDAÇÕES

B  D
 adm  qc   1   B em metros
36,6  B

O valor de qc é obtido pela média das tensões de ponta do ensaio de cone


entre as profundidades D e (D+B).

b) Robertson

A formulação de Robertson (apud Lunne et all, 1997) é dedicada apenas a


solos granulares e a tensão admissível restrita a sapatas quadradas ou circulares.

K
 adm  qc 
3

O valor de K é estimado pela Tabela 11 e o valor de qc é obtido com a mesma


sugestão de Meyerhof, ou seja, como a média dos valores entre D e (D+B).

Tabela 11 – Valores do fator K para a formulação de Robertson.


Areias densas Areias médias
D/B
quadrada circular quadrada circular
0,5 0,30 0,30 0,30 0,30
1 0,26 0,24 0,22 0,20
2 0,24 0,22 0,20 0,18
4 0,26 0,22 0,18 0,16

Com razoável aproximação, a proposta de Robertson pode ser resumida na


seguinte expressão:

qc 4 B
 adm  
12 D

c) Teixeira e Godoy

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DISCIPLINA DE FUNDAÇÕES

Segundo os Teixeira e Godoy (1996), a prática brasileira tem sido de adotar as


seguintes formulações para os ensaios de cone:

qc
 adm  para argilas
10

qc
 adm  para areias
15

Os autores ainda destacam que as expressões são válidas para qc superior a


1,5 MPa e a tensão admissível não pode ser superior a 4 MPa.

O valor de qc é tomado como a média das resistências de ponta entre as


profundidades D e D+1,5B.

2.3.3. Condições especiais a respeito da profundidade de influência das


formulações empíricas

Apesar dos autores apresentarem divergências quanto à profundidade de


influência da fundação com respeito à capacidade de carga, deve-se ter em mente
que o emprego de valores entre D e D+1,5B pode conduzir a práticas pouco
conservadoras se a resistência do solo é crescente. Atualmente há uma tendência
de se padronizar, indiferentemente da formulação, uma profundidade de D+B como
a mais recomendável.

Todavia, alguns autores salientam que o valor médio do número de golpes


deva ser tratado com mais conservadorismo quando se utiliza uma formulação
empírica. Para evitar que recalques excessivos ocorram, sugere-se que o valor de N
ou qc calculados pela média no espaço sugerido entre D e D+B seja limitado ao
número de golpes observado na profundidade D.

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DISCIPLINA DE FUNDAÇÕES

2.3.4. Correlações com o ensaio DCP

O emprego do ensaio de cone dinâmico para previsão da capacidade de carga


ainda é incipiente, embora o aparato tenha uma facilidade executiva que o torna
promissor.

Em estudos experimentais conduzidos por Fraga (2005), foram sugeridas as


seguintes correlações, para as quais deve se tomar o menor dos valores obtidos:

10.500 5.000
 adm  1, 4
 adm 
PR PR1,14

As expressões são válidas para PR menor do que 40mm/golpe, limitando-se a


tensão admissível em 400kPa.

2.3.5. Correlações com o CBR

Em situações em que as fundações superficiais são apoiadas em aterros de


compactação controlada sistematicamente, há a possibilidade de estimar os
parâmetros de resistência a partir do índice de suporte (CBR). As expressões aqui
apresentadas ainda carecem de comprovação experimental, devendo ser
empregadas com cautela.

Para a resistência não drenada:

Su  12,6  CBR0,7

Para o ângulo de atrito interno:

  15  4,1 7,54logCBR

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DISCIPLINA DE FUNDAÇÕES

2.4. Rigidez relativa e distribuição de tensões

A teoria de capacidade de carga postulada pelos autores está estreitamente


atrelada à hipótese de que as tensões de contato entre a fundação e o terreno são
uniformemente distribuídas. Esta hipótese é plausível para uma condição de estado
limite último, onde a plastificação do solo nas proximidades da fundação é provável
se a fundação for suficientemente rígida.

Historicamente, têm se considerado que uma fundação superficial é rígida


quando ela possui características geométricas favoráveis para que o comportamento
da fundação sob carga exiba flexão negligenciável, ou seja, que a transferência da
solicitação do pilar se dê basicamente por bielas comprimidas. Assim, uma sapata é
considerada rígida quando atender a seguinte condição:

Onde as medidas são as indicadas na Figura 19.

A expressão considera que a distribuição das tensões depende unicamente da


rigidez da sapata, o que não é exatamente verdadeiro. Na verdade, a rigidez de uma
fundação também é dependente da resposta que o solo é capaz de oferecer às
deformações induzidas pela fundação. Denomina-se esta interação solo-estrutura de
“rigidez relativa”.

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Figura 19 – Legenda de dimensões para uma sapata isolada.

Para ilustrar, a figura 20 mostra um mesmo radier com as mesmas cargas de


três pilares e as distribuições de tensões de contato oferecidas por três solos
diferentes. No primeiro caso (a), o radier está assente sobre argila sedimentar mole,
com um NSPT menor do que 4. Nessas condições, as tensões são distribuídas
uniformemente e o radier pode ser considerado rígido. No caso seguinte (b), o
mesmo radier está assente sobre uma argila medianamente rija, com NSPT entre 10
e 15 e a hipótese de distribuição de tensões é discutível. Nesse caso, o radier é
considerado flexível. Por fim, no caso (c), o radier está assente sobre alteração de
argilito onde a argila é dura com NSPT acima de 30. Nessa situação, o radier perde
a finalidade pois sequer distribui adequadamente as tensões.

(a) (b)

(c)
Figura 20 – Distribuição das tensões de contato em radiers de mesma
geometria e carga, porém em solos com rigidez diferente.

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DISCIPLINA DE FUNDAÇÕES

Existem várias propostas para caracterizar a rigidez relativa solo-estrutura,


entre as quais destacam-se aquelas fundamentadas na teoria de vigas flexíveis
apoiadas em meio elástico (Hetèniy, 1947). Essas teorias envolvem o emprego do
módulo de reação vertical do solo (Kv), parâmetro que pode ser definido como a
relação entre a tensão de contato e o recalque de uma placa apoiada no terreno.


Kv 

Conforme será discutido posteriormente, o módulo de reação vertical é


dependente da forma da sapata, da sua dimensão e do tipo de solo envolvido. Para
estudos de vigas apoiadas em terreno elástico, costuma-se empregar o coeficiente
de reação vertical (K’v) que se assemelha com a constante de mola de Winkler:

K v  K v  B

A relação entre o coeficiente de reação vertical e o módulo de elasticidade do


solo pode ser estimada pela expressão proposta por Vèsic:

Es Es  B 4 Es
K v  0,65   12 
1  2 Ec  I c 
B  1  2 
Estabelecido o conceito do módulo de deformação é possível definir parâmetro
de rigidez :

K v
4
4  Ec  I c

Onde Ec é o módulo de elasticidade do material da fundação;

Ic é o momento de inércia da seção transversal da fundação em uma


dada direção.

Uma peça pode ser considerada rígida se atender a seguinte condição:

 1,75 sapatas isoladas


  le  
1,90 sapatas associadas

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Onde le é a semi-largura da sapata isolada na direção considerada ou a


distância entre pilares em uma sapata associada.

Para radiers a formulação é ligeiramente diferente, utilizando-se o conceito do


raio de influência Ri.

Ec  t 3
Ri  4

12  K v  1   c 2 
onde t é a espessura de uma placa lisa ou a espessura teórica de uma placa
lisa de mesma rigidez do radier. Quando o raio de influência é maior do que a
distância entre pilares, o radier é considerado rígido.

A maior dificuldade nessas análises de rigidez reside na determinação do


coeficiente de reação vertical (K’v) ou no módulo de reação vertical (Kv). Conforme
poderá ser observado posteriormente, existem ensaios específicos para determinar
esse parâmetro (ensaio de placa), assim como é possível determiná-lo a partir do
módulo de elasticidade. Quando avaliado pelo ensaio de placa, os resultados são
dependentes do formato e da dimensão da placa. Por isso, é comum expressar os
resultados em termos de Kv1 que significa o módulo de reação vertical para uma
placa de 1 pé de largura.

O valo do módulo de reação vertical pode ser estimado por valores típicos,
conforme indicado na Tabela 12.

Tabela 12 – Valores do típicos para o módulo de deformação vertical (Kv1)


adaptado de Bowles (1996).
Tipo de solo Kv1 (kN/m3)
Areia fofa 4,8 a 16
Areia medianamente compacta 9,6 a 80
Areia compacta 64 a 128
Areia argilosa medianamente compacta 32 a 80
Areia siltosa medianamente compacta 24 a 48
Argila mole (Su<40kPa) 12 a 24
Argila média (40kPa<Su<150kPa) 24 a 48
Argila dura (Su>150kPa) >48

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Embora as correlações com ensaios de campo sejam frágeis e apresentem


grande dispersão, as seguintes formulações podem ser empregadas para estimativa
de rigidez relativa das fundações:

Para o SPT K v1  22  ln( N )  14 [ MPa / m] para solos transportados

0,6  N 1, 4
K v1  [ MPa / m] para solos residuais
B2

Para o CBR K v1  20,7  ln(CBR )  6,3 [ MPa / m]

Para o DCP K v1  129  56 logPR  [ MPa / m] PR em mm / golpe

Para adaptar o valor de Kv1 para qualquer dimensão de fundação, o ACI


sugere, apenas para fins de avaliação de rigidez relativa, que se considere:

0, 6
 0,3 
K v  K v1    com B em metros
 B 

Quando se trabalha com radiers, a correção do Kv1 deve ser realizada com o
menor valor entre B (largura do radier) ou Bef:

Bef 64  E c  t 3
2
 4
 
3  1   c 2  K v1

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3. RECALQUES EM FUNDAÇÕES SUPERFICIAIS

O cálculo dos recalques em uma fundação constitui-se em tarefa mais


complexa do que a determinação da capacidade de carga. Isto decorre,
principalmente devido à heterogeneidade dos solos, mas também devido à não
linearidade de seu comportamento tensão-deformação. O módulo de deformação
elástica não só varia com o estado de deformações, mas também com o estado de
tensões.

Mesmo com essas dificuldades de enquadrar os solos como materiais


“elásticos”, a maioria das formulações para a previsão de recalques é ainda
fundamentada na teoria da elasticidade.

Os recalques totais em fundações superficiais podem ser estimados pela soma


de três componentes:

  i c  s

onde: i é o recalque imediato ou “elástico;

c é o recalque por consolidação primária;

s é o recalque por consolidação secundária.

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3.1. Recalques imediatos

Assim como na previsão de capacidade de carga de fundações superficiais,


existem três estratégias para a previsão de recalques: através de formulações
racionais, através de formulações semi-empíricas e através de formulações
empíricas.

Embora existam inúmeras propostas de diferentes autores, neste trabalho


serão apresentadas apenas as mais utilizadas na prática corrente de projetos de
engenharia.

3.1.1. Formulação racional de Janbu

Janbu (apud Simons e Menzies, 1981) utilizou-se das equações gerais da


mecânica do contínuo para, analiticamente, resolver os casos mais freqüentes de
fundações superficiais.

As formulações originais de Janbu prevêem expressões para argilas não


drenadas e areias. A expressão a seguir é generalizada para qualquer tipo de solo.

  B 1  2
i   0 1
E 0,75

Onde:  é a tensão média de contato solo-fundação

 é o coeficiente de Poisson do solo;

E é o módulo de deformação elástica para os níveis de tensão do


problema;

0 e 1 são os fatores de forma que podem ser estimados dos ábacos


constantes na Figura 21

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Figura 21 – Ábacos dos fatores de forma da formulação de Janbu (apud


Simons e Menzies, 1981).

3.1.2. Estimativa dos parâmetros do solo a partir do SPT e CPT

Para avaliar a magnitude dos recalques é necessário estimar o módulo de


deformação elástica e o coeficiente de Poisson. Para tanto, é necessário realizar
ensaios com condição controlada de tensões e deformações, o que só é possível
nos ensaios de laboratório em amostras indeformadas (ensaios triaixiais, por
exemplo).

Na prática, pela dificuldade de se realizar campanhas de ensaios de laboratório


com quantidade e abrangência que permitam a utilização de formulações racionais,

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esses parâmetros acabam sendo estimados a partir de ensaios de campo, o que


resulta em um método semi-empírico de previsão de recalques.

Neste trabalho, serão apresentadas correlações entre o módulo de elasticidade


e os ensaios SPT e CPT, uma vez que esses ensaios são mais populares e, na
prática de engenharia, os únicos a serem utilizados em projetos correntes de
fundações.

A correlação mais empregada para previsão de recalques é a sugerida por


Teixeira e Godoy (1996)

E s    qc a partir do ensaio CPT

E s K N a partir do ensaio SPT

Os valores de , K e do coeficiente de Poisson () podem ser estimados pela


Tabela 13 a seguir.

Tabela 13 – Fatores de correlação para determinação do módulo de


deformação e coeficiente de Poisson (Teixeira e Godoy, 1996 com
modificações retiradas de Cintra et al, 2003).
Solo  K (kPa) 
Areia com pedregulhos 3 1.100 0,40
Areia 3 900 0,20
Areia siltosa 3,5 700 0,30
Areia argilosa 3,5 550 0,30
Silte arenoso 4,5 450 0,30
Silte 5 350 0,40
Argila arenosa 6 300 0,30
Silte argiloso 6 250 0,50
Argila siltosa (escura) 7 200 0,50
Argila (vermelha) 7 250 0,30

Outra expressão muito empregada para a avaliação do módulo de deformação


elástica é proposta por Sandroni (1991). A correlação de Sandroni está
fundamentada em uma série de provas de cargas em solos residuais:

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E s  0,6  N 1,4 [ MPa]

3.1.3. Método semiempírico de Schmertmann

Schmertmann et al (1978) utiliza um procedimento que considera a


possibilidade de variação do módulo em profundidade, entre outros fatores. Segundo
o método, o recalque pode ser estimado por:

n  Iz 
i  C1  C2    q      z 
i 1  Es 

O coeficiente C1 introduz o efeito do embutimento da sapata e é expresso por:

 q 
C1  1  0,5     0,5
   q 

O coeficiente C2 introduz o efeito de tempo (ou de parcelas viscosas do


recalque) e pode ser expresso por:

t
C2  1  0,2 log
0,1

Onde t é o tempo de análise (geralmente tomado como a vida útil da obra)


expresso em anos.

O parâmetro Iz é denominado de fator de influência da camada e pode ser


calculado da forma descrita a seguir.

Para sapatas quadradas:

z B
I z  0,1  2  ( I z max  0,1)  para z
B 2

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2  z B
Iz  I z max   2   para  z  2B
3  B 2

B
zmax 
2

Para sapatas contínuas:

z
I z  0,2  ( I z max  0,2)  para zB
B

1  z
Iz  I z max   4   para B  z  4B
3  B

zmax  B

Em ambos casos, o valor de Iz Max pode ser estimado por:

 q
I z max  0,5  0,1 
z

onde: q é a tensão geostática efetiva no nível da sapata (q=D)

 é a tensão de contato da sapata

z,max é a tensão geostática efetiva na profundidade em que


ocorre o Iz,max.

É conveniente destacar que o método de Schmertmann é calibrado a partir de


suas correlações entre o módulo de deformação e os resultados do ensaio de cone.
Assim, as expressões de Schmertmann devem ser adotadas na sua formulação, em
detrimento de outras correlações:

E  2,5  qc para sapatas isoladas

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E  3,5  qc para sapatas contínuas

Segundo Teixeira e Godoy (1996), o método vêm sendo empregado também


para a avaliação de recalques a partir do ensaio SPT. Para tanto, utilizam-se as
correlações entre qc e N já consagradas na literatura.

3.1.4. Método empírico de Schutze e Sheriff

O método de Schultze e Sheriff (1973) foi fundamentado em resultados do


ensaio SPT e é aplicável a solos arenosos. Na prática brasileira o seu método tem
sido extrapolado para solos argilosos e siltosos residuais, mas sem comprovação de
eficácia.

A expressão dos recalques foi desenvolvida para ensaio SPT europeu. A


expressão a seguir foi adaptada para o ensaio brasileiro.

 F
i 
1,2  N 0,87  1  0,4  D 
 B

onde i é o recalque em centímetros;

 é a tensão média de contato solo-fundação em kgf/cm2;

F é o fator de recalque conforme Tabela 14, em cm3/kgf

Tabela 14 – Fatores de recalque para a formulação de Schultze e Sheriff


(1973)
L/B
B (m)
1 2 5 10
1 3,7 4,3 5,5 6,1
2 5 6 7,2 8
5 8 10 11 12
10 11 15 17 19
O valor de N no ensaio SPT é tomado como a média do número de golpes
entre a profundidade D e D+2B.

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3.2. Recalques por adensamento primário

Os recalques por adensamento primário podem ser estimados a partir das


teorias clássicas de adensamento. No caso de argilas normalmente adensadas ou
fracamente pré-adensadas (OCR1,2), a teoria do recalque unidimensional
formulada por Terzaghi é válida para calcular a magnitude dos recalques embora
não seja válida para calcular a velocidade com que eles ocorrem.

Os recalques podem ser estimados por:

n    v 0,i   v,i 
 Cr ,i  log OCRi   Cc,i  log 
Hi
c   
 OCR    
i 1 1  e0,i   i v 0,i  

Onde:

Hi são as espessuras das camadas compressíveis;

e0,i são os índices de vazios iniciais de cada camada;

OCR,i são as razões de pré-adensamento médias de cada camada;

Cc,i são os índices de compressão de cada camada;

Cr,i são os índices de recompressão de cada camada;

’v0,i é a tensão geostática efetiva no centro de cada camada compressível.

v,i é o acréscimo de tensão devido à presença da fundação, calculada no


centro de cada camada compressível.

Existem diversas expressões para a determinação das pressões verticais em


função da profundidade, entre as quais as mais conhecidas são as de Boussinesq,
Newmark e Love (Teixeira e Godoy, 1998). Entretanto, para a avaliação dos
recalques por adensamento, é aceitável aproximar as fundações não contínuas de
uma fundação circular equivalente e adotar a expressão de Love:

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 
 
 
 1 
 v, z    1  2 
  R  
2 3
 1     
   z   
 

onde: z é a profundidade onde se deseja determinar a pressão;

BL
R é o raio equivalente da fundação R

Para as sapatas contínuas, a solução simplificada da distribuição 2:1 é uma


alternativa razoável para o problema. Assim, a tensão em uma profundidade
genérica qualquer é dada por:

B
 v, z   
Bz

Para solos fortemente pré-adensados, os recalques devem ser corrigidos para


uma situação de tridimensionalidade do estado de tensões, não sendo aplicáveis
diretamente os resultados obtidos pela teoria do adensamento unidimensional. Uma
das formas mais simples de fazer essa correção é a utilização de um fator de
tridimensionalidade (ver figura 22), conforme proposto por Leonards (1976).

c( corrigido)    c

As dimensões B e H significam, respectivamente a menor dimensão da sapata


e a espessura de solo mole. Uma expressão aproximada para o fator de
tridimensionalidade pode ser dada por:

 B 
  1   0,11  0,06  ln   lnOCR 
 H 

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Figura 22 – Fator de tridimensionalidade segundo Leonards (1976).

3.3. Recalques por adensamento secundário

Os recalques por adensamento secundário são menos significativos e ocorrem


em tempos muito longos. Mesmo assim, pode-se estimar essa parcela com a
expressão a seguir:

n
ts
 s   C,i  H i  log
i 1 ti

Onde: C,i são os índices de compressão secundários de cada camada;

ts é o tempo da vida útil da obra;

ti é o tempo em que se encerra o recalque primário (se não for


disponível o ensaio de adensamento, pode se admitir ti como
aquele correspondente a uma dissipação de 98% do excesso de
poro-pressão).

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4. PROVA DE CARGA DIRETA NO TERRENO DE FUNDAÇÃO

4.1. Considerações preliminares

O ensaio de prova de carga direta no terreno de fundação é também conhecido


como “ensaio de placa”.

O ensaio de placa consiste em uma prova de carga em modelo reduzido (ou


não) de uma sapata. É o único método experimental que permite determinar a carga
de ruptura e também o comportamento tensão-recalque do sistema solo-fundação.

A origem do ensaio é muito antiga (anterior aos conceitos clássicos da


mecânica dos solos), mas o primeiro ensaio a ser normatizado foi o da Cidade de
Boston, onde as placas são quadradas com lado de 1 pé (305mm). No Brasil, os
ensaios foram normatizados com placas circulares de 800mm de diâmetro, conforme
descreve a NBR-6489.

Segundo Alonso (2000), o ensaio de placa é de rápida execução e de baixo


custo, mas estranhamente o seu emprego na prática corrente de obras de
engenharia é muito raro. O seu emprego tem se pautado em estudos acadêmicos,
quando se deseja testar correlações entre outros ensaios de campo e as
propriedades do terreno.

A NBR-6489 sugere ainda que o ensaio seja realizado em solos homogêneos.


No caso de solos estratificados ou heterogêneos em que o módulo de deformação

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elástica varia significativamente com a profundidade, sugere-se a realização do


ensaio com diferentes diâmetros (600mm, 800mm e 1.200mm).

4.2. Procedimentos de ensaio

Para a realização do ensaio, requer-se um sistema de aplicação de carga


(cilindro hidráulico acoplada a uma bomba de acionamento manual), e de um
sistema de reação (cargueira ou viga ancorada).

O sistema de aplicação de carga deve ter sua capacidade compatível com o


intervalo de carga que se deseja impor à placa. Recomenda-se que o equipamento
disponha de pelo menos dois cilindros com capacidade de levante distintos: 300 kN
e 600 kN. O curso do cilindro hidráulico não pode ser inferior a 50mm,
recomendando-se um curso de 75mm para evitar paralisação do ensaio por
esgotamento do sistema de carregamento.

O registro da carga imposta à placa pode ser realizado a través de transdutores


como uma célula de carga ou através do registro da pressão no sistema hidráulico
do cilindro. Neste último caso, o sistema deve ser previamente calibrado para que se
possa determinar a perda de carga por atrito no cilindro.

Os registros de recalques na placa deve ser realizado em pelo menos 3 pontos,


de forma que se determinem as eventuais rotações. Os deslocamentos podem ser
medidos com defletômetros mecânicos ou com transdutores de deslocamento como
os LVDT’s, por exemplo. A resolução dos defletômetros deve ser de pelo menos
0,01mm e o curso mínimo de 35mm.

Independente de qual seja o sistema de medição de recalques, os instrumentos


devem utilizar um sistema de referência independente do sistema de aplicação de
carga na placa. Recomenda-se o emprego de uma régua rígida e longa com apoios
afastados do local de aplicação de carga em pelo menos 1,5Bp (onde Bp é o
diâmetro da placa).

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O sistema de reação pode ser estruturado de várias formas, desde que


obedecidos os seguintes preceitos:

 O sistema de reação deve ser suficientemente rígido para não consumir


curso do cilindro hidráulico desnecessariamente;

 O sistema de reação deve ter céu centróide alinhado com o eixo da


placa e este com o eixo do cilindro de forma a evitar instabilidade do
dispositivo ou excentricidades na placa;

 Se o sistema de reação utilizar-se de apoios no terreno ou ancoragens


em profundidade, estes não podem interferir no bulbo de tensões da
placa.

Os sistemas mais empregados para a reação são: as cargueiras fixas, as vigas


ancoradas com tirantes e as vigas ancoradas com placas de reação. As Figuras 23 a
25 exibem desenhos ilustrativos desses sistemas.

A NBR-6489 destaca que, para evitar a interferência entre o bulbo de pressões


da placa com as massas solicitadas por apoios da cargueira ou ancoragens, devem
ser tomados os seguintes cuidados:

 O espaço entre o eixo da placa e o eixo dos apoios e ancoragens deve


ser superior a 1,5Bp;

 No caso de ancoragens com placas, estas devem estar a uma


profundidade superior a 2,5Bp abaixo da cota de apoio da placa.

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DISCIPLINA DE FUNDAÇÕES

Figura 23 - Arranjo do ensaio de placa com sistema de reação com viga com placas de ancoragem
tipo helicóide (modificado a partir de Alonso, 2000).

Figura 24 - Arranjo do ensaio de placa com sistema de reação com cargueira fixa (modificado de
Alonso, 1989).

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Figura 25 - Arranjo do ensaio de placa com sistema de reação com viga com tirantes (modificado de
Alonso 1989).

É importante que se destaque que o sistema com ancoragens helicoidais é o


mais prático e, portanto, mais econômico. Todavia, a baixa capacidade de reação
desse sistema limita a sua utilização a solos com tensão admissível até 200 kPa.
Para solos mais resistentes torna-se necessário o emprego de cargueiras ou de
tirantes. Já um solo com resistência admissível de 300 kPa exigiria uma cargueira de
cerca de 40 toneladas de massa, o que nem sempre se constitui em uma tarefa de
fácil gerenciamento. Por essa razão, o sistema com ancoragens injetadas (tirantes)
é mais freqüentemente empregado quando o ensaio é realizado em solos mais
duros.

No Brasil, de acordo com Quaresma et al (1996), é usual a utilização de placas


circulares de ferro fundido ou aço com 800 mm de diâmetro para a determinação da
capacidade de carga, conforme a prescrição da norma. No entanto, algumas vezes
são usadas placas quadradas ou circulares com 30 cm de lado ou diâmetro, em
discordância com as prescrições normativas. Mais recentemente, surgiu a idéia de
se executarem provas de carga em placas de pequeno diâmetro (5”, ou seja, 12,7
cm) no interior de tubos de revestimento de 6”, mas esses procedimentos ainda
estão no âmbito acadêmico.

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DISCIPLINA DE FUNDAÇÕES

Segundo as prescrições da NBR-6489/84, a placa deve ser instalada na


mesma cota de assentamento das fundações e, preferencialmente, com o mesmo
embutimento no terreno. Para tanto, é necessário que se realize uma abertura de
um poço com o diâmetro da placa (ver Figura 26). Assim, a folga entre a placa e as
paredes do poço devem ser mínimas. Na prática, esse procedimento não é
respeitado e os poços são amplos para permitir o registro de deslocamentos e a
montagem adequada do sistema de reação. Com embutimento menor ou menos
efetivo, os resultados dos ensaios são conservadores.

Figura 26 - Embutimento do ensaio de placa: o terceiro desenho corresponde à prescrição da NBR-


6489, (segundo Velloso e Lopes , 2004).

No ensaio, são aplicados estágios de carga ao mesmo tempo que são


observados os recalques. São aplicados estágios de carga equivalentes a 10% ou
20% da carga de ruptura prevista para a placa. Nesses estágios devem ser
aplicados incrementos de carga sempre iguais, medindo-se os recalques (ou
deslocamentos) da placa em relação a um sistema de referência independente e os
tempos transcorridos entre as leituras. Os tempos de registro são sempre o dobro do
tempo anterior, por exemplo, 0’; 1’; 2’; 4’; 8’; 16’, 32’; 1h; 2h, e assim por diante.

Um estágio de carga subseqüente só pode ser aplicado após a estabilização


dos recalques do estágio anterior. Consideram-se recalques estabilizados quando o
incremento de recalque verificado entre duas leituras de tempo tenha sido inferior a
5% do incremento de recalque verificado no intervalo de tempo anterior.

O ensaio é paralisado quando não se observa mais a estabilização, ou seja,


quando a velocidade dos recalques não se reduz, o que caracteriza uma ruptura.

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DISCIPLINA DE FUNDAÇÕES

Também é possível a paralisação quando o ensaio de placa atinge o dobro da


tensão de trabalho prevista para a fundação da obra. A NBR-6489/84 prevê ainda a
paralisação do ensaio quando o recalque for superior a 25mm, o que é considerado
um dos critérios de ruptura.

A Figura 27 exibe a forma de organização do ensaio. A curva descrita em linha


cheia constitui

Figura 27 - Diagrama típico do ensaio de placa (modificado de Alonso, 1989).

Figura 28 - Outras formas de carregamento para o ensaio de placa (modificado de Velloso e Lopes,
2004).

A norma brasileira não se refere a outras formas de carregamento, nem mesmo


à possibilidade de ensaios com carregamento lento ou acelerado, como prevê a
NBR-6122 quando se reporta às provas de carga em fundações profundas. Velloso
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DISCIPLINA DE FUNDAÇÕES

e Lopes (2004), contudo, salienta que o ensaio pode ser realizado com deformação
controlada (Figura 28a) com incrementos controlados de carga sem a estabilização
(Figura 28b) e carregamento cíclico com diferentes padrões de ciclagem (Figura
28c).

O ensaio com carregamento cíclico é empregado em ancoragens, por exemplo.


Seus defensores argumentam que as cargas variáveis nas estruturas são sempre
cíclicas e a fundação pode acumular recalques plásticos ao mesmo tempo que
compactam o solo abaixo de si. A Figura 29 ilustra esse efeito.

Figura 29 - Comparação entre os diagramas de carregamento no ensaio de placa: (a) incremental


com estabilização dos deslocamentos e (b) carregamento cíclico (modificado de Velloso e Lopes,
2004).

Nas recomendações da norma brasileira existem ainda sugestões sobre a


forma de realizar o descarregamento. Nessas prescrições, os estágios de
descarregamento devem ser os mesmos do carregamento, aguardando-se a
estabilização de cada estágio.

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DISCIPLINA DE FUNDAÇÕES

4.3. Interpretação do ensaio de placa

O bulbo de tensões mobilizado pela placa é diferente do que o bulbo de


tensões mobilizado por uma sapata em condição de serviço. Isto porque a maioria
das fundações tende a dimensões maiores do que a do ensaio de placa (este com
área 0,5m2).

Admite-se que a região de influência das deformações geradas pela placa sob
tensão seja da ordem de 2Bp em profundidade e 1,5Bp em largura, volume que
corresponde à isóbara de 10% da tensão aplicada pela placa.

No caso de solos estratificados, especialmente quando ocorrer uma camada de


solo de baixa resistência em profundidade (ver Figura 30), a extrapolação dos
ensaios de placa para o comportamento de uma fundação deve ser realizada com
cautela.

Figura 30 - Cuidados na extrapolação dos ensaios de placa: diferenças de bulbos de pressão


(extraído de Velloso e Lopes, 2004).

Em solos onde o módulo de elasticidade varia com a profundidade, os


resultados também não podem ser extrapolados diretamente. Apenas nos casos
onde o módulo de elasticidade varia pouco com a profundidade ou quando as

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DISCIPLINA DE FUNDAÇÕES

fundações possuem a mesma área da placa é que o ensaio possui relação direta
com as estruturas em verdadeira grandeza.

Tais dificuldades de comparação entre o ensaio e uma fundação real


resultaram nas prescrições da norma brasileira, que exige placas relativamente
grandes (800mm quando as placas americana e inglesa possuem 300mm).

De qualquer sorte, sempre que uma fundação possuir área diferente da área da
placa, há a necessidade de se corrigir os resultados de recalques e os critérios de
ruptura. Essas correções são diferentes para solos argilosos e para solos arenosos,
pois as argilas pré-adensadas tendem a apresentar módulo constante, enquanto que
as argilas normalmente adensadas e as areias tendem a apresentar módulo
linearmente crescente com a profundidade.

4.3.1. Correção de recalques em argilas pré-adensadas

Admitindo o módulo de elasticidade e o coeficiente de Poisson constantes para


uma profundidade cerca de 2B abaixo da sapata, pode-se dizer que o recalque na
fundação pode ser estimado por:

1  2
i    B   I
Es

onde: I é o coeficiente de forma para a placa circular.

Pode-se dizer que a paca, nessas condições, deverá apresentar o mesmo


coeficiente de forma e as mesmas propriedades mecânicas da fundação, de sorte
que:

1  2
 Bf   I
f Es

p 1  2
  Bp   I
Es

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DISCIPLINA DE FUNDAÇÕES

Para a mesma tensão, temos:

f Bf

p Bp

A Figura 31 mostra os diagramas do ensaio de placa e o comportamento


tensão-recalque de uma fundação circular de diâmetro superior ao diâmetro do
ensaio de placa, ambos na mesmo solo argiloso pré-adensado.

Figura 31 - Diagrama tensão-recalque típico em solo argiloso pré-adensado (modificado de Cintra et


al, 2003).

É óbvio que essa relação linear entre recalque e diâmetro da placa não é válida
para a relação entre placa e fundação que tenham formas diferentes. No caso da
extrapolação de um recalque de uma placa circular para uma fundação com
geometria retangular, teríamos:

f B f  I , f

p B p  0,79

Onde: I,f é o índice de forma da fundação retangular.

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O índice de forma de uma placa rígida retangular, com pequena margem de


erro, se aproxima da seguinte expressão:

L
I  , f  0,6  ln   0,9
B

Substituindo esta expressão na expressão anterior, teria-se:

f Bf  L 
  0,76  ln   1,14 
p Bp  B 

Segundo Cintra et al (2003), é razoável admitir que uma sapata retangular


possa ser expressa com um diâmetro de mesma área. Dessa forma, seria mantida a
linearidade entre recalques e diâmetros.

4.3.2. Correção de recalques em areias

Existe um certo consenso que o módulo de elasticidade nas areias varia com a
profundidade. Essa variação pode ser linear em areias fofas e não linear em areias
compactas e cimentadas.

Essa variação do módulo de deformação com a profundidade é que torna mais


complexa a extrapolação dos recalques observados nos ensaios de placa para a
previsão de comportamento de sapatas em verdadeira grandeza.

Admitindo-se que o módulo varia linearmente com a profundidade, poderia-se


expressar:

E s  E0  k  z

Admitindo que o módulo B abaixo da fundação seja o representativo do


comportamento médio do recalque, temos:

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E s  E0  k  B

Desta forma, a relação entre recalques de uma fundação e da placa (ambas


circulares) poderia ser expressa como:

1  2 k
 Bf   I 1  Bp
f E0  k  B f Bf E0
  
p 1  2 Bp
1
k
Bf
  Bp   I
E0  k  B p E0

Como existe uma natural dificuldade de se obter informações sobre a forma


como varia o módulo de deformação, Terzaghi e Peck (1948). A partir de uma
avaliação puramente empírica de provas de carga em solos arenosos, propuseram a
seguinte expressão:

2
f  2B f 
   onde Bf é expresso em metros.
p  B f  0,3 
 

Evidentemente que a formulação de Terzaghi e Peck é baseada nos resultados


de placas quadradas de 0,3 metro de lado. Logo, o seu emprego para extrapolação
do ensaio brasileiro constitui-se em um erro grave que infelizmente é cometido na
maioria dos casos.

Sowers (1972) extrapolou a formulação de Terzaghi e Peck para qualquer


placa quadrada de lado Bp, transformando a expressão original em:

f 
 B f  B p  0,3  2
   com Bp e Bf expressos em metros
p  
 B p  B f  0,3 

Para o caso particular da placa adotada pela norma brasileira que é circular
com diâmetro de 80cm, a sapata quadrada equivalente teria um lado de
aproximadamente 70cm. Assim, a equação de Sowers poderia ser reescrita como:

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2
f  Bf 
  
p  
 0,7  B f  0,3 

De fato, essa expressão é a que deveria estar sendo utilizada na interpretação


dos ensaios brasileiros, mas deve-se ter em mente que ela é válida para uma
condição particular de módulo variando com a profundidade prevista por Terzaghi e
Peck.

Segundo Bjerrum e Eggestad (apud Cintra et al, 2003), a formulação de


Terzaghi e Peck não é aceitável para a maior parte dos solos granulares. A figura 32
mostra a síntese dos estudos experimentais realizado pelos autores, destacando
que, na maioria dos casos estudados, os recalques foram maiores do que os
previstos pela formulação de Terzaghi e Peck.

Segundo vários autores, entre os quais destacam-se Velloso e Lopes (2004) e


Alonso (2000) consideram que as expressões de correção em geral, mas sobretudo
para solos granulares, devem ser substituídas por um ensaio com três placas,
conforme será destacado adiante.

Velloso e Lopes (2004) destacam ainda que, se no local da obra for disponível
um ensaio de campo de boa resolução como o CPT, é possível estimar uma
variação para o módulo de deformação elástica com a profundidade e realizar uma
previsão de recalques através do modelo de Burmister (1947), conforme é discutido
adiante.

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DISCIPLINA DE FUNDAÇÕES

Figura 32 - Diagrama tensão-recalque típico em solo argiloso pré-adensado.

4.3.3. Correção de recalques em argilas normalmente adensadas

Em argilas normalmente adensadas é aceitável a previsão de recalques a partir


de uma idéia de variação linear do módulo de elasticidade com a profundidade. A
formulação de Terzaghi e Peck não é adequada para este caso, de forma que a
utilização de ensaios com três placas ou modelos como o de Burmister (1947)
devem ser empregados para a extrapolação dos resultados.

Argilas normalmente adensadas são, via de regra, solos moles onde as


fundações superficiais assumem a forma radiers. Estas fundações costumam
mobilizar bulbos de pressão em profundidades expressivas em face das suas
dimensões avantajadas, especialmente se a placa de fundação for do tipo rígida.
Assim, o ensaio de placa pouco colabora com a previsão de comportamento da
fundação, embora possa ser útil para a determinação de algumas propriedades dos

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DISCIPLINA DE FUNDAÇÕES

solos mais superficiais, como o módulo de elasticidade ou a resistência não drenada


logo abaixo do radier, por exemplo.

4.3.4. Correção de recalques a partir do ensaio com três placas

Existem algumas propostas para a interpretação do ensaio de placas


realizados com três diâmetros diferentes, entre as quais destacam-se as propostas
de Housel (1929) e Burmister (1947). As duas propostas são restritas a solos com
módulo de elasticidade que variam linearmente com a profundidade.

a) Modelo de Housel (1929)

O ensaio de três placas é interpretado em termos de tensões para um mesmo


recalque, em geral definido como um recalque admissível, conforme é ilustrado na
Figura 33 (a). No caso da proposta de Housel, na falta de recomendações de projeto
específicas, toma-se 10mm como recalque admissível.

Com os resultados de tensões admissíveis para diferentes placas, é possível


plotar um gráfico em termos de tensões e o inverso da superfície específica,
conforme indica a Figura 33 (b). O inverso da superfície específica é a relação entre
o perímetro (P) e a área (A) da placa que, no caso da placa circular é tomado como
(4/Bp).

A extrapolação da tensão admissível (que corresponde ao recalque admissível


adotado para a interpretação do ensaio) pode ser expressa por:

P
 adm  n  m
A

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Figura 33 - Modelo básico de Burmister (1947) para a interpretação do ensaio de três placas.

b) Modelo de Burmister (1947)

O autor entende que nos solos com módulo linearmente crescente com a
profundidade, deve ser tomado como módulo representativo (denominado de Eequiv)
aquele situado em uma profundidade Bp abaixo da placa, conforme indica a Figura
34 (a).

Os resultados são plotados em termos de “y” que, entre outras coisas,


representa a razão entre a tensão e o recalque:

y

4
  
 1  2 

Com o gráfico plotado, conforme indicado na Figura 34 (b), determina-se os


valores do módulo de reação inicial (K) e o módulo de deformação inicial (E0). Com
isso, a equação de previsão do recalque de uma fundação circular de diâmetro
genérico Bf pode ser escrita como:

 f  Bf 
1   2


E0  K  B f 4

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Figura 34 - Modelo de Burmister (1947) para a interpretação do ensaio de três placas.

4.3.5. Influência da velocidade do carregamento

Outro limite importante dos ensaios de placa reside na velocidade do ensaio.


Especialmente nos materiais coesivos e porosos, os recalques estimados pelo
ensaio tendem a ser menores do que aqueles que ocorrem em fundações
submetidas a um carregamento de longa duração ao longo de sua vida útil. A
diferença entre os recalques previstos de curto prazo e os de longo prazo podem ser
muito significativos, mesmo em materiais que não são adensáveis, conforme
demonstra a Figura 35.

.
Figura 35 - Comparação entre as curvas de ensaio de placa com curta duração e de longa duração.

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4.4. Critérios para determinação da tensão admissível

O critério para a determinação da capacidade de carga pela norma brasileira


consiste em determinar o menor dos seguintes valores:

a) Critérios fundamentados no estado limite último

r
 adm  onde  r  tensão de ruptura
2


 adm  25
onde  25  tensão correspond ente a 25mm de recalque
2

b) Critérios fundamentados no estado limite de serviço

 adm   10 onde  10  tensão correspondente a 10mm de recalque

a
 adm  onde  a  tensão correspondente ao recalque máximo aceitável
1,5

O diagrama apresentado na Figura 36 ilustra os resultados de um ensaio de


placa conforme a norma brasileira, destacando a interpretação dos seus resultados.

Figura 36 - Diagrama típico de um ensaio de placa (extraído de Teixeira e Godoy, 1998).

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4.5. Coeficiente de reação vertical e módulo de deformação

Conforme já discutido anteriormente, o ensaio com uma única placa permite


avaliar o módulo de elasticidade equivalente, ou seja, o módulo de deformação
elástica do solo que justifica o recalque observado para aquelas condições
específicas de carregamento.

O valor do módulo de elasticidade obtido dessa forma não pretende identificar


um parâmetro para qualquer outra condição de carregamento. Sabidamente o
módulo de deformação é muito sensível à dimensão da placa, sua forma e,
sobretudo, ao nível de deformação.

De qualquer sorte, admitindo-se o módulo relativamente uniforme na área de


influência da placa, pode-se estimá-lo pela seguinte expressão:

1  2
E s  0,79    B p 
p

Segundo Cintra et al (2003) admitindo-se um valor médio do coeficiente


Poisson de 0,35 (valor médio para todos os tipos de solo), o módulo de deformação
elástica pode ser obtido pelo ensaio de placa da norma brasileira por uma expressão
simplificada:


E s  0,55 
p

Muitos autores preferem o emprego de um parâmetro afim ao módulo de


deformação elástica que é denominado de módulo de reação vertical, também
conhecido como módulo de placa (Kp) que é a relação entre tensão e recalque
observado no ensaio:


Kp 
p

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A relação entre o módulo de deformação elástica e o módulo de reação vertical


na placa é, portanto, dado por:

 
E s  0,79  1   2  B p  K p ou E s  0,55  K p

A idéia de que o módulo de reação vertical seja constante é assumida, muitas


vezes, para facilitar a interpretação dos problemas de estruturas apoiadas no solo,
associando o solo a um sistema de molas com rigidez constante. Esse modelo é
denominado de Modelo de Winkler. Entretanto é importante que se compreende que
a distribuição de pressões no solo não corresponde ao Modelo de Winkler pois na
verdade constitui-se em uma complexa transferência de tensões de um apoio em
área discreta (fundação) em uma massa semi-infinita (solo). Figura 37 apresenta a
comparação entre os dois modelos, conforme destacado por Velloso e Lopes (2004).

Figura 37 – Diferenças entre as distribuições de tensões em apoios elásticos do modelo de Winkler e


massas semi-infinitas (modificado de Velloso e Lopes, 2004).

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4.6. Considerações sobre a aplicabilidade do ensaio de placa

Conforme já discutido neste capítulo, os resultados dos ensaios de placa são


fortemente dependentes do diâmetro da placa. É evidente que ensaios de placa com
grandes dimensões, isto é, próximas às dimensões da sapata, tornam-se mais
representativos do comportamento tensão-deformação. Por esta razão que a norma
brasileira optou pela padronização de placas com 800mm de diâmetro, diferente das
placas inglesa e americana que trabalham com diâmetro de 300mm.

É importante se destacar que a morosidade desse ensaio e o custo do sistema


de reação desestimulam seu emprego corrente. Apenas para ilustrar a complexidade
de um sistema de reação para placas de grande dimensão, apresentam-se
fotografias de um ensaio em uma sapata de 1,80m x 1,80m na Figura 38.

Nesse sentido, apesar de contrários à NBR-6489, os ensaios de placa de


pequeno diâmetro (p=300mm) poderiam ocupar um espaço importante na
avaliação de capacidade de carga das fundações superficiais, especialmente para
estruturas mais modestas.

Os ensaios com placas pequenas são tão populares fora do Brasil, que existem
conjuntos disponíveis para a comercialização, conforme aparece na Figura 39.

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Figura 38 - Arranjo do sistema de reação para uma prova de carga em uma sapata.

Figura 39 - Arranjo do cilindro hidráulico e sistemas de medição de deslocamentos e carga para uma
placa comercial de 300 mm de diâmetro.

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