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Manual de AB Compostagem
Manual de AB Compostagem
III
Compostagem
para a Agricultura
Biológica
L. Miguel Brito
Escola Superior Agrária de Ponte de Lima. /IPVC
Figura 2 – Pilha longa com mistura de dejectos animais e palha no início da composta-
gem (Proj. Agro 747).
2 – O PROCESSO DE COMPOSTAGEM
O processo de compostagem envolve a escolha dos materiais, a selecção do local, e a
selecção do sistema de compostagem. O processo de compostagem pode depender dos
materiais existentes e do tempo disponível para a compostagem desses materiais.
A compostagem ocorre quando existe água, oxigénio, carbono orgânico e nutrientes para
estimular o crescimento microbiano. No processo de compostagem os microrganismos
decompõem a matéria orgânica e produzem dióxido de carbono, água, calor e húmus. O
processo de compostagem mais comum na agricultura biológica é conduzido em pilhas
estáticas (ou com um volteio após 3 a 4 semanas de compostagem), por um período de 3
meses, seguido por um período de maturação de mais 3 meses.
2.1 – Biologia
Diferentes comunidades de microrganismos (incluindo bactérias, actinomicetas, leveduras
e fungos) predominam em diferentes fases da compostagem. Com temperaturas superiores
a 40°C começam a predominar os microrganismos termófilos. Com temperaturas
superiores de 55°C muitos dos microrganismos patogénicos para os humanos ou para as
plantas são destruídos. No entanto, não é conveniente deixar ultrapassar os 65 °C pois a
maioria dos microrganismos são destruídos, incluindo aqueles que são responsáveis pela
compostagem. As sementes de infestantes podem perder a viabilidade a temperaturas de
40-60°C no interior da pilha. As sementes que se localizam no exterior da pilha podem,
contudo, não perder a viabilidade por as temperaturas não atingirem aí valores necessários
para esse efeito. As infestantes podem ser impedidas de germinar no exterior da pilha
utilizando uma cobertura escura.
2.2 – Física
Temperatura
A produção de calor depende da velocidade a que a decomposição se processa ou seja da
velocidade a que os microrganismos crescem e actuam. A decomposição depende: (i) do
teor de humidade, arejamento e relação C/N da mistura dos materiais; (ii) das dimensões
e tipo de cobertura da pilha de compostagem e (iii) da temperatura exterior à pilha.
A temperatura deve alcançar os 40 a 50 °C em dois ou três dias e quanto mais depressa
o material for decomposto mais cedo a temperatura começará a descer. A compostagem
pode ser dividida em duas partes. A primeira é mais activa e caracteriza-se por uma forte
actividade microbiana e pelo aumento de temperatura dos materiais em decomposição. A
segunda parte caracteriza-se por taxas metabólicas muito mais reduzidas e é conhecida
por fase de arrefecimento e maturação, durante a qual o material se torna estável, escuro,
amorfo, com aspecto de húmus e um cheiro a terra (Witter & Lopez-Real, 1987).
A decomposição ocorre mais rapidamente na primeira parte da compostagem com
temperaturas da ordem dos 40-60°C, e pode demorar semanas ou mesmo meses,
dependendo do tamanho e da composição da pilha de compostagem. Neste período
devem ser destruídos os organismos patogénicos e as sementes de infestantes. Quando a
temperatura atingir os 65ºC é conveniente revirar a pilha para que o calor se dissipe e a
temperatura diminua. A fase mais activa da compostagem está terminada quando, após o
volteio da pilha, os valores de temperatura não aumentam significativamente, seguindo-se
um período mais longo de amadurecimento do composto.
Humidade
Um teor de humidade de 50 a 60% é considerado indicado para a compostagem. Abaixo
de 35-40% de humidade a decomposição da matéria orgânica é fortemente reduzida e
abaixo de 30% de humidade é praticamente interrompida. Uma humidade superior a 65%
retarda a decomposição, para além de se provocar maus odores em zonas de anaerobiose
localizadas no interior da pilha de compostagem.
O teste da esponja é um teste expedito para verificar se a humidade do material é
apropriada e consiste em pegar numa mão cheia de composto e apertar; não devendo
escorrer água (pode pingar algumas gotas) mas ficando humidade na mão. Idealmente a
pilha deve encontrar-se próxima da capacidade de campo.
Arejamento
O arejamento da pilha favorece a oxigenação, a secagem e o arrefecimento no seu interior.
Isto é, fornece o oxigénio para a actividade biológica, remove humidade e calor diminuindo a
temperatura da massa em compostagem. O oxigénio é necessário para os microrganismos
obterem energia resultante da oxidação do carbono orgânico resultando a libertação de
dióxido de carbono. A falta de oxigénio causa um ambiente redutor, resultando compostos
incompletamente oxidados como ácidos voláteis e metano (CH4).
O número de vezes que o material deve ser revirado depende de diversos factores
podendo ser necessário revirar uma ou duas vezes no primeiro mês e, eventualmente,
mais uma vez no segundo mês (fig. 5 a 8). Algum azoto poderá ser perdido quando se
revira a pilha de compostagem.
Figura 5 Figura 6
Figura 7 Figura 8
Figura 5 a 8 - Volteio mecânico da pilha, ao fim de 1 mês de compostagem. O material foi
introduzido no distribuidor de estrume para reconstituição da pilha (Proj. Agro 747).
Odores
O excesso de humidade, a falta de porosidade, a rápida degradação do substrato e o
tamanho excessivo da pilha, podem criar condições de anaerobiose no interior da pilha
de compostagem. Estas condições resultam na formação de compostos que provocam
odores desagradáveis quando se volatilizam. Estes odores provêm de vários compostos
orgânicos incompletamente oxidados, designadamente, ácidos gordos voláteis de baixo
peso molecular, compostos de enxofre, como o ácido sulfídrico, compostos aromáticos,
e aminas. No entanto, o amoníaco é o composto que mais frequentemente contribui,
quer em aerobiose quer em anaerobiose para os odores desagradáveis. O odor intenso e
desagradável dos resíduos orgânicos normalmente vai diminuindo durante a fase inicial da
compostagem e praticamente desaparece no final do processo de compostagem.
2.3 – Química
Carbono e azoto
Nos materiais orgânicos o azoto encontra-se principalmente na forma orgânica. O azoto
mineral existente encontra-se principalmente como azoto amoniacal durante a fase
termófila da compostagem e na forma nítrica no composto maduro. Se o azoto existir em
excesso, e os microrganismos não o utilizarem, por falta de carbono disponível, o azoto
pode acumular-se e perder-se por volatilização na forma de amoníaco ou por lixiviação
de azoto nítrico.
A relação C/N = 30 é desejável para o processo de compostagem, durante o qual, quase
todo o azoto orgânico está disponível para ser utilizado pelos microrganismos, mas o
mesmo não se verifica relativamente ao carbono de determinados materiais, por se
encontrar em formas resistentes à degradação biológica. Por exemplo, os jornais são mais
resistentes que outros papéis pois são constituídos por fibras celulósicas lenhificadas,
sendo a lenhina um composto muito resistente à decomposição. Neste tipo de materiais,
incluindo caules de milho e palha de cereais, deve ser considerada uma relação C/N mais
elevada para iniciar a compostagem. Assim, a relação C/N da mistura a compostar tem que
ser ajustada em função da disponibilidade do carbono e do azoto nos materiais.
Durante a compostagem metade ou mais de metade do volume da pilha será perdido com
a decomposição dos materiais. O carbono é perdido mais rapidamente que o azoto e,
por isso, a relação C/N diminui durante a compostagem. A relação C/N pode diminuir de
valores superiores a 30 para valores inferiores a15.
Outros nutrientes
Os outros nutrientes essenciais para o metabolismo dos microrganismos encontram-se
geralmente em quantidades suficientes relativamente ao azoto, nos materiais orgânicos
originais utilizados na compostagem. No entanto, em alguns casos poderá ser aconselhável
3 – CARACTERÍSTICAS DO COMPOSTO
3.1 – Quantidade de composto produzido
Durante a compostagem o volume da pilha reduz-se para metade ou menos de metade
Esta diminuição de peso e volume resulta num aumento da concentração de nutrientes e
reduz a necessidade em espaço para armazenamento e transporte.
Corrente (1)
Composto: Ecológico (2) Biológico (3)
Até 2009* Após 2009
Câdmio (mg/kg) 5 1,5 1 0.7
Chumbo (mg/kg) 400 150 100 25
Cobre (mg/kg) 500 200 100 45
Crómio (mg/kg) 400 150 100 70
Mercúrio (mg/kg) 5 1,5 1 0,4
Níquel (mg/kg) 200 100 50 25
Zinco (mg/kg) 1500 500 300 200
Materiais inertes antropogénicos (%) 2 1 0,5
Salmonella spp.Ausente em (g) 25 25 50
Escherichia coli (NMP/g) 1000 1000 1000
(1) Proposta de regulamentação sobre qualidade do composto para utilização na agricultura, de M. S. Gonçalves e
M. Baptista, do MADRP / INIA / LQARS, de Abri de 2001, (*) Os compostos que cumpram os requisitos correspon-
dentes ao período anterior a 2009, poderão ser utilizados depois de 2009 apenas em solos onde não se implantem
culturas destinadas à alimentação humana ou animal.
(2) Decisão da Comissão n.º 2001/688/CE de 28 de Agosto, que estabelece os critérios ecológicos para atribuição
do rótulo ecológico comunitário aos correctivos de solos e aos suportes de cultura.
(3) Regulamento (CEE) n.º 2092/91 do Conselho de 24 de Junho, que estabelece os princípios do modo de produ-
ção biológico de produtos agrícolas.
Entre as restrições à utilização das substâncias referidas no Regulamento (CEE) n.º 2092/91,
destacam-se: os estrumes não podem ser provenientes da pecuária intensiva sem terra;
os estrumes secos e os excrementos de aves de capoeira não podem ser provenientes da
pecuária sem terra; os excrementos líquidos dos animais (chorume e urina) não podem
ser provenientes da pecuária sem terra; os resíduos domésticos orgânicos têm de ser
separados na origem e com um sistema de recolha fechado e controlado pelo Estado-
membro, e só podem ser utilizados por um período de tempo limitado.
Entre os produtos de origem animal, desde que autorizados pela entidade de controlo,
podem utilizar-se as seguintes farinhas: sangue, cascos, chifres, ossos, peixe, carne, e penas.
Pode utilizar-se também farinha de bagaço de oleaginosas, casca de cacau e radículas de
malte, bem como, algas e produtos de algas desde que sejam obtidos directamente por
processos físicos, por extracção com água ou soluções aquosas, ou por fermentação.
A serradura, as aparas de madeira e os compostos de casca de árvore não podem ter
tido tratamento químico após o abate. O fosfato natural moído não pode ultrapassar um
teor de cádmio de 90 mg/kg. Vinhaça e extractos de vinhaça podem ser utilizados com
excepção das vinhaças amoniacais.
3.3. – Estado de maturação do composto
Os métodos desenvolvidos para avaliar a maturação dos compostos orgânicos baseiam-se
em ensaios físicos, químicos e/ou biológicos. Um composto estará maduro quando a sua
temperatura se mantém constante durante a movimentação do material. O pH próximo
do neutro, a capacidade de troca catiónica superior a 60 meq por 100 g de composto e
quantidades apreciáveis de nitratos são, também, indicadores de que o composto está
aceitavelmente amadurecido.
4 – UTILIZAÇÃO DO COMPOSTO
4.1 – Aplicação ao solo agrícola
As principais características a considerar para os compostos orgânicos a aplicar ao solo
(fig. 9) são os seguintes:
Na generalidade dos países União Europeia a dose máxima admissível de azoto que se
pode aplicar ao solo varia entre 170 kg/ha e 250 kg/ha por ano. Em Portugal não se
deve exceder o primeiro valor nas Zonas Vulneráveis à lixiviação de nitratos de origem
agrícola. Na Áustria, por exemplo, não pode ser ultrapassada a dose de 170 kg/ha de N
com origem em fertilizantes orgânicos, em agricultura biológica, e assume-se que 25% do
N dos compostos frescos fica disponível, após a aplicação ao solo, durante o primeiro
ano. Na Dinamarca sugere-se que a disponibilidade do N dos compostos de resíduos de
suínos ou de bovinos no segundo ano é de 10% (Danish Plant Directorate, 1997).Verdonck
(1998) referiu que a disponibilidade de N no primeiro ano baseada em aplicações de 30
t/ha seria de 10% a 15%, enquanto Amlinger, et al. (2003) referem variações entre 5% e
15% no primeiro ano e entre 3% e 8% nos anos seguintes. Contudo, em Portugal, devido
às elevadas temperaturas, em comparação com os países do norte da Europa, é provável
que estes valores sejam superiores. Por outro lado, as taxas de mineralização são muito
variáveis porque dependem da natureza dos compostos e das condições em que são
utilizados, e variam com os métodos através dos quais são estimadas.
BIBLIOGRAFIA
Amlinger, F., Gotz, B., Dreher, P., Geszti & Weissteiner, C. (2003). Nitrogen in
biowaste and yard compost: dynamics of mobilisation and availability – a review. Eur. J. Soil Biol.
39, 107-116.
Lampkin N. (1992). Organic Farming. Farming Press, UK
Lairon D, Spitz N, Termine E, Ribaud P, Lafont H & Hauton J (1984). Effect of
organic and mineral nitrogen fertilization on yield and nutritive value of butterhead lettuce. Qual.
Plant Foods Hum. Nutr. 34:97-108.
Morel J L, Colin F, Germon J G, Godin P & Juste C (1985). Methods for the evaluation
of the maturity of municipal refuse compost. In Composting of agricultural and other wastes,
J.K.R. Gasser (ed). Elsevier Applied Science, London, pp.56-72.
Witter E & Lopez-Real J M (1987). Monitoring the composting process using parameters
of compost stability. In: Compost: production, quality and use. M de Bertoldi, M.P. Ferranti,
P.L’Hermite, F.Zucconi (eds). London, pp.351-358.
Verdonck, O. (1998). Compost specifications. Acta Hort., 469:169-178.
FICHA TÉCNICA
Título: Manual de Agricultura Biológica - Terras de Bouro
Editores: Isabel Mourão, José Pedro Araújo e Miguel Brito (Escola Superior Agrária
de Ponte de Lima - ESAPL / IPVC)
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