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SUBSTITUIÇÃO TRIBUTÁRIA DO ICMS

Marcio Cândido de Mendonça1

RESUMO

A aplicação da substituição tributária está sendo usada amplamente pelos estados, seja
para evitar a sonegação, seja para facilitar o mecanismo de fiscalização, tornando-o mais
eficaz, pois concentra forças em poucos contribuintes. Sua aplicação tem trazido, no
entanto, polêmicas e injustiças tributárias para inúmeros segmentos, além de aumentar o
custo do produto e o preço final da mercadoria para o consumidor final. Cada Estado define
sua forma de aplicar a substituição tributária deixando o contribuinte diante de legislações
anômalas.
Palavras-chave:ICMS.Substituição Tributária.Restaurantes.Inaplicabilidade

ABSTRACT

The application of tax substitution is being widely used by states, either to avoid evasion or to
facilitate the enforcement mechanism, making it more effective, since it concentrates forces
on few taxpayers. Its application has brought, however, controversies and tributary injustices
to numerous segments, in addition to increasing the cost of the product and the final price of
the merchandise to the final consumer. Each State defines its form of applying the tax
substitution leaving the taxpayer before anomalous legislations.
Keywords:ICMS. Tax Replacement.Restaurants.Inapplicability

Sumário

Introdução; 1 A polêmica da substituição tributária do ICMS; 2 Substituição Tributária nos


Estados; 3 Impossibilidade da aplicação da Substituição Tributária; Conclusão; Referências
bibliográficas

1
Advogado, especializando em Direito Tributário pela Puc Campinas, militante na área tributária, com
experiência em consultoria tributária em multinacionais voltadas para serviços, atacado e varejo no segmento
alimentício.
Introdução

A aplicação da substituição tributária está sendo usada amplamente pelos estados,


seja para evitar a sonegação, seja para facilitar o mecanismo de fiscalização, tornando-o
mais eficaz, pois concentra forças em poucos contribuintes.
Hoje a lista de produtos que se aplica a sistemática da substituição tributária é ampla
e só tem aumentado.
Desde o inicio a substituição tributária foi tratada com polêmica. A Constituição
Federal não previa a cobrança de tributos pela simples presunção, o que fora emendado
através da EC 3/93. Doutrinadores defendem a inconstitucionalidade desta sistemática, mas
a jurisprudência já pacificou sua aplicabilidade.
Sua aplicação encarece o produto, prejudica o principio da capacidade contributiva
ao onerar outro contribuinte, submetendo o pagamento do tributo no inicio da cadeia.
Não bastassem incontrovertidas as posições, veremos um cenário não uniforme na
aplicação desta sistemática, pois quem devia impor limites e regras no âmbito nacional,
uniformizando a matéria, a delegou ao legislador estadual, criando-as mais mirabolantes
substituições tributárias de forma anômalas e incoerentes.
A delegação de competência efetuada pela Lei Complementar 87/96 aos entes
federativos para legislar sobre a matéria da substituição tributária é inconstitucional.
Ao ampliarem sua utilização na grande maioria dos produtos, os estados não se
preocuparam em analisar cada contribuinte e operação, pois há segmentos que
simplesmente não há como aplicar a sistemática, pelo fato do produto não ser revendido,
mas sim aplicado como insumo – como ocorre com os restaurantes comerciais.
Veremos adiante a polêmica e a posição da doutrina a respeito e como estados têm
tratado esta sistemática.

1 A polêmica da substituição tributária do ICMS

A substituição tributária do ICMS sempre foi tratada com muita polêmica. Muito se
discute sobre a inconstitucionalidade deste regime, mesmo após posição do STF
estabelecendo sua constitucionalidade, o que para muitos não passou de mera decisão
política. A substituição tributária pura, que ocorre, por exemplo, na retenção do imposto de
renda sobre os salários pagos pelos empregadores, é legítima e não se vê discussão sobre
a sua legalidade, estando pacificada sua aplicabilidade e a sua legalidade.

1
Doutrinadores defendem a inconstitucionalidade da substituição tributária quando,
deturpando-a, passa a exigir a exação antes da ocorrência do fato gerador – a subsunção
do fato a norma. Incluindo sujeito passivo alheio à operação. Não tratamos aqui da mera
antecipação, da qual o sujeito passivo poderá utilizar como crédito no pagamento da exação
principal no momento da apuração, mas sim o recolhimento definitivo mediante a presunção
de base de cálculo e da ocorrência de um fato, que passa aqui a ser presumido.
Analisando a nossa Constituição Federal2 a aplicação da presunção na sistemática
da Substituição Tributária estaria autorizado pelo artigo 150, § 7º.
Em julgamento de ADI 1851-AL3 de 08.5.2002, onde a Confederação Nacional do
Comércio requer a Declaração de Inconstitucionalidade de cláusula prevista em um
Convênio celebrado por vários estados brasileiros. Nesta cláusula há proibição sobre a
restituição ou pagamento de ICMS complementar quando a operação se realizar por valor
menor ou maior.
Ao mesmo tempo que a decisão garante a constitucionalidade da referida cláusula,
também a extinção da técnica da não cumulatividade, pelo fato de ocorrer a apuração e o
pagamento do ICMS em fase única, passando o tributo de plurifásico e não cumulativo, para
monofásico e cumulativo. Esta posição, contudo, quanto a cumulatividade, deve ser
analisada de forma mais profunda.
Não havendo incidência do ICMS nas fases seguintes, o adquirente de mercadorias
não utilizará de créditos, pois estes não são permitidos, haja vista, que a venda do produto
não sofrerá, nas fases seguintes, nova tributação.
A posição de Hugo de Brito Machado não é particular, temos autores como Roque
Antonio Carrazza e Marco Aurélio Grecco que defendem a inconstitucionalidade da
Substituição Tributária.
Roque Antonio Carrazza considera a Emenda Constitucional 3/934 (que adicionou o
§ 7º ao Artigo 150 de nossa Carta Magna) inconstitucional, pois fere preceitos de nossa
Constituição Federal no quesito de segurança jurídica e a impossibilidade de se tributar fato
gerador futuro, ouçamo-lo:

“Ora, a Constituição veda a tributação baseada em fatos de provável


ocorrência. Para que o mecanismo da substituição venha
adequadamente utilizado é preciso que se estribe em fatos

2
BRASIL. Constituição Federal de Brasil de 5 de out. de 1988. CONSTITUIÇÃO DA REPÚBLICA
FEDERATIVA DO BRASIL DE 1988. Brasília, DF. out 1988.
3
BRASIL. Supremo Tribunal Federal. Ação Direta de Inconstitucionalidade nº 1851-4 Alagoas.
Requerente: Confederação Nacional do Comércio - CNC. Requerido: Governador do Estado de
Alagoas. Relator: Ministro Ilmar Galvão. Brasília, 8 de maio de 2002. p. 149-172, mai 2002.
4
BRASIL. Constituição (1988). Emenda Constitucional 3, de 17 de março de 1993. Altera os arts.
40, 42, 102, 103, 155, 156, 160, 167 da Constituição Federal. Brasília, DF. mar 1993.

2
concretamente ocorridos; nunca em fatos futuros de ocorrência
incerta. Esta é uma barreira constitucional inafastável, pois integra
um conjunto de direitos e garantias que a Lei Maior confere ao
contribuinte.”5

Marco Aurélio Greco6 em sua obra Substituição Tributária traz um rol com criticas e
objeções sobre esta infamada sistemática tributária, afirma a que a substituição é uma
ampliação de competência tributária; até considerar a inconstitucionalidade da EC 3//93.
Até aqui notamos critica feroz sobre a substituição tributária. Através da EC 3/93 se
tentou contornar os obstáculos jurídicos sobre a substituição, principalmente sobre a
cobrança de tributos sobre fato futuro. Foi por ela acrescentado o parágrafo 7º ao artigo 150
de nossa Carta Magna: “A lei poderá atribuir a sujeito passivo de obrigação tributária a
condição de responsável pelo pagamento de imposto ou contribuição, cujo fato gerador
deva ocorrer posteriormente, assegurada a imediata e preferencial restituição da quantia
paga, caso não se realize o fato gerador presumido.”
Não bastasse uma discussão em relação ao modelo constitucional da Substituição
Tributária, veremos outras anomalias geradas pelos estados, uma vez que a Lei
Complementar 87/96 atribui, indevidamente, ao legislador ordinário a liberdade para tratar
de regras gerais da substituição tributária.
Entendemos como anomalia do sistema tributário quando a LC 87/96 “transfere” ao
legislador ordinário a responsabilidade para disciplinar sobre algumas matérias. É um tema
polêmico, pois tem efeito contrário a uniformidade da matéria, com a liberdade
inconstitucional concedida pela LC 87/96 aos legisladores ordinários.
Ao delegar a matéria, exclusiva de Lei Complementar, para legisladores ordinários,
não vemos como se estabelecer uma uniformização da matéria, uma vez que tais
legisladores poderão criar as mais absurdas formas de substituição tributária.
Não sendo o bastante a Emenda Constitucional 3/93 discrepar de cláusulas pétreas,
ignorando segurança jurídica, a própria LC 87/96 que trata do ICMS não se harmoniza com
o a Constituição Federal quando em grande parte de seus artigos que trata da substituição
tributária, delega ao legislador ordinário competência para disciplinar o assunto.
Esta incoerência tributária prejudica os contribuintes que se vê em cada Estado com
uma situação diferente. Em alguns estados se cobra o ICMS de forma antecipada e
definitiva; em outros há a cobrança da exação, mas permite-se o crédito; em outro algumas
mercadorias têm a sistemática e outras não. Enfim, nossa Carta Magna determina uma

5
CARRAZA, Roque Antonio. ICMS. 9ª ed. São Paulo: Malheiros Editores; 2002. p.231
6
GRECO, Marco Aurélio. SUBSTITUIÇÃO TRIBUTÁRIA. 2ª ed. São Paulo: Malheiros Editores. 2001,
p.39
3
uniformidade na aplicação, mas uma Lei Complementar outorga ao legislador ordinário a
competência para tratar de um assunto de cunho exclusivo de Lei Complementar.
Esta incongruência só reforça a insegurança jurídica no que tange a substituição
tributária estadual pelos vários atropelos legais que podemos vislumbrar com apenas uma
pequena análise, desde nossa Constituição até as leis estaduais mais extravagantes que
veremos adiante.
Nossa Carta Magna traz diretriz ao legislador infraconstitucional sobre como deve
legislar sobre determinada matéria, não tendo liberdade para moldar determinado assunto à
sua vontade.
Conforme prevê a Constituição Federal, caberá a Lei Complementar instituir regras
gerais de forma a uniformizar a aplicação do ICMS pelos estados. A Lei Complementar
responsável pela diretriz do ICMS é a Lei Complementar 87/96 e nela se tem previsão da
substituição tributária do ICMS em seus artigos 6º e seguinte.
Roque Antonio Carraza7 afirma que para a existência da substituição tributária se faz
necessário vinculo do sujeito passivo com o fato gerador. Não se pode exigir tributo de
sujeito que não participou do fato gerador.
Há outros requisitos previstos na legislação. O primeiro requisito será o que a lei
definir como fato gerador, independente de vontade, bastando que o fato esteja lá previsto.
Ocorrendo no mundo fenomênico e estando previsto em lei nascerá a obrigação tributária,
seja principal ou acessória. O que vemos aqui é a subsunção do fato a norma.
Outro requisito são os sujeitos ativo e o passivo, sendo ativo o ente tributante,
competente para exigir a exação. O sujeito passivo será o contribuinte que a lei do Estado
ou do Distrito Federal definir. A Lei Complementar 87/96, artigo 121, inciso I, define
contribuinte “... quando tenha relação pessoal e direta com a situação que constitua o
respectivo fato gerador;”
Em todas as legislações estaduais se deve obedecer a estas regras, da mesma sorte
se faz necessário obedecer regras para a responsabilidade tributária, como substituto. A
imprescindível é a necessidade de vínculo do substituto ao fato concreto.

2 Substituição Tributária nos Estados

Analisando o arquétipo da substituição tributária do ICMS percebemos um arcabouço


das mais mirabolantes incoerências criadas pelos Estados, através de uma atribuição
indevida dada pela Lei Complementar 87/968 ao legislador ordinário estadual.

7
CARRAZA, Roque Antonio. ICMS. 9ª ed. São Paulo: Malheiros Editores. 2002. p.229.
8
BRASIL. Lei Complementar 87 de 13 de set. de 1996. Dispõe sobre o imposto dos Estados e do
Distrito Federal sobre operações relativas à circulação de mercadorias e sobre prestações de
4
Hugo de Brito Machado9 ao se referir aos limites constitucionais do ICMS assevera
que o fato gerador é o descrito na legislação estadual e no Distrito Federal, mas esta não
pode ultrapassar os limites previstos em nossa Carta Magna, bem como em Lei
Complementar.
Com esta afirmativa se entende que ao instituir a cobrança do ICMS pela sistemática
da Substituição Tributária o legislador estadual pouco se move para seguir os ditames de
nossa Carta Magna, pelo contrário, os Contribuintes se veem compelidos a seguir regras
diferentes em cada Estado, sempre no sentido de aumentar a arrecadação, sem, contudo
olhar para o Contribuinte.
Mesmo com tantas críticas percebemos a utilização da substituição tributária na
grande maioria dos estados, aplicando estes na maioria dos produtos. Muitos negócios se
veem do dia para a noite, já que não estamos diante de uma instituição ou majoração de
tributos, obrigados a apurar, reter e recolher aos cofres estaduais o valor retido das etapas
vindouras a título de ICMS por Substituição Tributária.
Para as etapas seguintes se vê uma majoração absurda no preço dos produtos, pois
passa a fazer parte do preço do produto o valor de um tributo que ainda se quer tem fato
gerador imponível, onerando uma pessoa estranha. Roque Antonio Carrazza nos ensina
que:
“...ao eleger o sujeito passivo da obrigação tributária o legislador
deve obedecer a uma regra básica: só poderá onerar quem
participou da ocorrência do fato típico. Não pode fazer recair a carga
tributária sobre pessoa estranha ao fato gravado pela incidência
fiscal. Noutro giro verbal, ninguém pode ser compelido pela lei a
pagar tributo sem que tenha participado, de algum modo, da
realização do fato imponível.”10

Um produto com o seu ciclo normal de tributação, seguindo os ditames de nossa


Carta Magna para o ICMS, com a característica plurifásica e a não-cumulatividade, sofrerá
apenas a incidência do ICMS, do percentual sobre o seu valor adicionado, aplicado pelo
adquirente no momento da revenda do mesmo produto.
Paulo Rocha11 defende que na tributação normal – plurifásica, estamos diante de
uma distribuição equitativa da capacidade contributiva do Contribuinte e, ao incluir-se na
Sistemática da Substituição Tributária, acaba-se por prejudicar este princípio, pois se
concentra o pagamento do tributo dentro para uma fase e um Contribuinte.

serviços de transporte interestadual e intermunicipal e de comunicação, e dá outras


providências. (LEI KANDIR). Brasília, DF, set 1986.
9
MACHADO, Hugo de Brito. CURSO DE DIREITO TRIBUTÁRIO. 32ª ed. São Paulo: Malheiros
Editores. 2011, p.371)
10
CARRAZA, Roque Antonio. ICMS. 9ª ed. São Paulo: Malheiros Editores. 2002. p.229.
11
ROCHA, Paulo Victor Viera da. SUBSTITUIÇÃO TRIBUTÁRIA E PROPORCIONALIDADE: Entre
capacidade contributiva e praticabilidade. São Paulo: Quartier Latin do Brasil. 2012. p.160-183.
5
De forma mais didática, pegamos um caso prático: Atacadista em São Paulo adquiri
mercadoria de uma indústria localizada em outro Estado para revenda. O preço de aquisição
é R$ 100,00 com alíquota de ICMS de 12%, perfazendo um valor do ICMS, presente em
nota fiscal, de R$ 12,00. .como mão de obra e lucro, o faz pelo valor de R$ 250,00. A
alíquota nesta operação será a interna do Estado, que aqui consideramos como 18%. O
valor e alíquota serão destacados em Nota Fiscal, sendo o valor do ICMS destacado de R$
45,00. O adquirente da mercadoria vendida pelo atacadista, um varejista, pode se creditar
do valor do ICMS destacado em nota.
O atacadista irá recolher aos cofres públicos o resultado da subtração do ICMS da
compra R$ 12,00 do valor do ICMS da venda R$ 45,00, perfazendo o valor de R$ 33,00.
Neste exemplo há ICMS apenas no acréscimo de valor entre o preço de aquisição pelo
atacadista e o valor de venda.
Se submetermos este produto à sistemática da substituição tributária e se tratando
de uma compra de outro Estado (Operação Interestadual) o mesmo contribuinte (atacadista)
terá que recolher os mesmos R$ 33,00 e mais outro valor com o titulo de ICMS Retido por
Substituição Tributária. Este segundo valor será determinado pelo Estado ao estipular uma
margem de valor agregado (MVA) do produto. Está margem dependerá de estudo realizado
pelo Estado para determinar uma base de cálculo do ICMS com fato futuro, mais próxima da
realidade.
Imaginemos que no exemplo prático o MVA seja de 70%. A base é o valor total das
mercadorias, com outros acréscimos, não considerados aqui; multiplica-se pelo MVA e
soma o resultado a base. Aplica a alíquota interna do ICMS sobre esta nova base. Do valor
encontrado subtrai o valor do ICMS da operação normal de venda do atacadista, o valor de
R$ 45,00 do exemplo anterior. O resultado aqui é um valor adicional no preço de R$ 31,50
que deve ser recolhido pelo atacadista, mas cobrando em nota do varejista. Este novo valor
de ICMS tem como base uma estimativa, previsão; um fato presumido.
O atacadista passa a ser o responsável tributário de uma operação de venda ao
consumidor final, que ainda não se sabe se ocorrerá, mas deve recolher este tributo para o
Estado.
O adquirente da mercadoria ainda terá um acréscimo em seus custos do mesmo
valor pago a titulo de ICMS por substituição tributária. Aqui, como já comentado, se pode
questionar e se verifica a transgressão do principio da capacidade contributiva, pois a outro
contribuinte o Estado dá a obrigatoriedade de pagamento de um tributo que deveria ocorrer
em inúmeras fases e contribuintes, ou seja, ser pago dentro de toda a cadeia econômica do
produto.

6
O produto que passa a ser tributado pela sistemática em comento, não será mais
tributado nas próximas cadeias, pois já foi tributado antecipadamente pelo substituto que
efetuou a retenção e recolheu aos cofres públicos, ou a quem a lei assim dispuser como
responsável tributário. Por não ser mais tributado, o adquirente, não poderá usufruir do
crédito, pois na sua revenda não haverá incidência do ICMS no mesmo produto.
E quando, contudo, não se efetua a revenda deste produto? Não se realiza o fato
presumido? Veremos pela já comentada delegação da Lei Complementar ao legislador
ordinário, inúmeras arbitrariedades.

3 Impossibilidade da aplicação da Substituição Tributária

Não bastasse a legislação infraconstitucional ignorar os ditames constitucionais,


muitos contribuintes, dos mais variados segmentos, são compelidos a recolher o tributo
como responsável tributário, mesmo não realizando o fato presumido.
A realização do fato presumido é uma condicional para a cobrança antecipado do
ICMS na modalidade comentada. Se não se realiza o fato presumido não se pode exigir a
cobrança antecipada e definitiva, esta afirmativa se verifica no comando presente na Lei
Complementar 87/96, em seu artigo 10º, neste deve ser imediata a devolução do tributo
pago se o fato presumido não se realizar12.
Existem segmentos específicos que a tributação pela sistemática da substituição
tributária não pode ser aplicada, pelo simples fato presumido não ocorrer. É o exemplo de
um restaurante comercial no Estado do Amazonas. Ao adquirir a Carne para aplicação como
insumo na fabricação de refeições tem a obrigatoriedade de pagar o ICMS por substituição
tributária, mas não venderá a Carne, mas sim outro produto. Produto este tributado pelo
ICMS.
A Carne ou qualquer produto alimentício com incidência da substituição tributária não
será revendido, se considerar o segmento de Restaurantes Comerciais. Será sim aplicado
como insumo para a fabricação de um novo produto, não podendo assim participar da
sistemática da substituição tributária.
A análise de aplicação ou não da sistemática da substituição tributária contudo, não
é pacífica e tampouco automática pelos estados, muito pelo contrário, se trava discussões
judiciais para que a exação não ocorra.

12
BRASIL. Lei Complementar 87 de 13 de set. de 1996. Dispõe sobre o imposto dos Estados e do
Distrito Federal sobre operações relativas à circulação de mercadorias e sobre prestações de
serviços de transporte interestadual e intermunicipal e de comunicação, e dá outras
providências. (LEI KANDIR). Brasília, DF, set 1986.

7
Nosso entendimento é de que mercadoria adquirida para ser consumida em
processo produtivo não pode ser submetida à sistemática da substituição tributária, por
questões óbvias – a não realização do fato presumido. A mercadoria não será revendida,
pelo contrário, desaparecerá para o comércio.
Alguns estados já têm previsão expressa da não aplicação da substituição ou sua
aplicação com restituição do valor pago. É o caso do Estado de São Paulo. Em Decreto13 se
estabeleceu a utilização de um crédito presumido sobre o volume de compras de
mercadorias submetidas à substituição tributária.
Outros estados, mediante regimes tributários específicos e a pedido do contribuinte,
permitem a utilização do valor pago como substituição tributária ou a não incidência quando
da aquisição de mercadoria. O Estado de Pernambuco, por exemplo, mediante Portaria SF
147/0814 permite o aproveitamento do ICMS por substituição tributária, efetivamente pago,
como crédito em sua escrita fiscal, de forma não há aplicação da sistemática em comento
quando adquirida por contribuinte que utilize a mercadoria como insumo.
A grande maioria dos estados, contudo, exige a exação sem se atentar a legalidade,
mesmo que o produto não seja objeto de nova operação de venda, como o Estado do
Amazonas que exige o ICMS na entrada de Carne, mesmo que aplicada como insumo.
Assim o Contribuinte não vê alternativa a não ser buscar tutela judicial para resguardar seus
direitos.

Conclusão

A aplicação da substituição tributária, se observada às regras estabelecidas, em


especial a uniformização, favorece ao Fisco um controle de arrecadação concentrado em
poucos contribuintes. Aumenta arrecadação ao evitar a sonegação do ICMS nas etapas
finais da cadeia econômica do produto. Sua aplicação, no entanto, fere princípios
constitucionais, como a capacidade contributiva e o princípio da não cumulatividade.
Sua polêmica não é apenas em relação aos princípios com mudança de tributo
plurifásico para monofásico, mas de prever um valor de tributo com base em uma
presunção, podendo ou não ocorrer. Exige-se tributo de um fato que não ocorreu. A
delegação de regras permitindo aos estados legislarem de forma que lhes convém, não
havendo uniformidade da matéria no âmbito federal, também se inclui na polêmica.
Ao percorrer a sistemática da substituição tributária nos estados nos deparamos com
inúmeras situações anômalas, na sua maioria prejudicial ao contribuinte.

13
SÃO PAULO (Estado). Decreto 57.404 de 06 de out de 2011. Introduz alteração no Decreto
51.597, de 23 de fevereiro de 2007, que institui regime especial de tributação para contribuintes
que tenham como atividade o fornecimento de alimentação ou a preparação de refeições
coletivas. São Paulo, SP. Out 2011.
14
PERNAMBUCO. Portaria SF 147/08. Antecipação Tributária. Recife, PE. Ago 2008
8
A aplicação ainda da substituição tributária deve ser criteriosa observando todos os
contribuintes que a sistemática ira influenciar, prevendo exceções e possibilidades de
créditos, como fizera o Estado de São Paulo, para não onerar o contribuinte com mais
tributos.

REFERÊNCIA BIBLIOGRAFIA

BRASIL. Constituição Federal de Brasil de 5 de out. de 1988. CONSTITUIÇÃO DA


REPÚBLICA FEDERATIVA DO BRASIL DE 1988. Brasília, DF. out 1988. Disponível em:
<http://www.planalto.gov.br/ccivil_03/constituicao/constituicaocompilado.htm>

BRASIL. Lei Complementar 87 de 13 de set. de 1996. Dispõe sobre o imposto dos


Estados e do Distrito Federal sobre operações relativas à circulação de mercadorias e
sobre prestações de serviços de transporte interestadual e intermunicipal e de
comunicação, e dá outras providências. (LEI KANDIR). Brasília, DF, set 1986. Disponível
em: <http://www.planalto.gov.br/ccivil_03/leis/LCP/Lcp87.htm>

BRASIL. Supremo Tribunal Federal. Ação Direta de Inconstitucionalidade nº 1851-4


Alagoas. Requerente: Confederação Nacional do Comércio - CNC. Requerido: Governador
do Estado de Alagoas. Relator: Ministro Ilmar Galvão. Brasília, 8 de maio de 2002. p. 149-
172, mai 2002. Disponível em: < http://redir.stf.jus.br/paginadorpub/paginador.jsp?docTP=A
C&docID=266781>

CARRAZZA, Roque Antonio. ICMS. 9ª ed. São Paulo: Malheiros Editores. 2002.

GRECO, Marco Aurélio. SUBSTITUIÇÃO TRIBUTÁRIA. 2ª ed. São Paulo: Malheiros


Editores. 2001.

MACHADO, Hugo de Brito. CURSO DE DIREITO TRIBUTÁRIO. 32ª ed. São Paulo:
Malheiros Editores. 2011.

PERNAMBUCO. Portaria SF 147/08. Antecipação Tributária. Recife, PE. Ago 2008.


Disponível em: <https://www.sefaz.pe.gov.br/Legislacao/Tributaria/Documents/Legislacao/Po
rtarias/2008/Port147_2008.htm>

ROCHA, Paulo Victor Vieira da. SUBSTITUIÇÃO TRIBUTÁRIA E PROPORCIONALIDADE:


entre capacidade contributiva e praticabilidade. São Paulo: Quartier Latin. 2012.

SÃO PAULO (Estado). Decreto 57.404 de 06 de out de 2011. Introduz alteração no


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preparação de refeições coletivas. São Paulo, SP. Out 2011. Disponível em:
<http://info.fazenda.sp.gov.br/NXT/gateway.dll?f=templates&fn=default.htm&vid=sefaz_tribut
aria:vtribut>

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