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FÍ MAT

251

Q

252 Capítulo 25................28


Módulo 55 .............. 33
Módulo 56 ..............36
253
a
O

Capítulo 26................40
es
Módulo 57 ..............44
BI

gu

Capítulo 27................48
Módulo 58 ..............54
Módulo 59 ..............58
rtu

Módulo 60 .............. 62
Po
a
gu
Lín

IS
H
GE
O
L
FI

O
C
SO

LP
S
RE
1. Antecedentes
do Realismo português 30
2. Contexto 31
3. Traços de estilo 31
4. Organizador gráfico 32
Módulo 55 – Realismo: contexto 33
Módulo 56 – Realismo: traços de estilo 36

• Localizar, em textos literários do Rea-


lismo/Naturalismo, marcas discursivas
e ideológicas desse estilo de época e
seus efeitos de sentido.
• Compreender valores, ideologias e
propostas estéticas representadas em
obras literárias realistas/naturalistas.

THE BRIDGEMAN ART LIBRARY / KEYSTONE BRASIL


Gustave Courbet,
Os quebradores
de pedra, 1849.

Realismo 25
29

“O Realismo é a anatomia do caráter. É a crítica do ho-


mem. É a arte que nos pinta a nossos próprios olhos –
para condenar o que houver de mau na nossa sociedade.”
Eça de Queirós
1. Antecedentes do Antero, líder do grupo difamado por Castilho, respondeu à
25

altura, em um texto intitulado “Bom senso e bom gosto”. Leia


Realismo português um fragmento.
252

A publicação do romance Madame Bovary, de Gustave


Flaubert, em 1857, foi um marco da nova tendência artística [...] combatem-se os hereges da escola de Coim-
que se iniciava, enquanto o Romantismo perdia força em ra- bra por causa do negro crime de sua dignidade, do
zão das ideias filosóficas e científicas que surgiam à época. O atrevimento de sua retidão moral, do atentado de
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livro foi considerado um escândalo por apresentar uma perso- sua probidade literária, da impudência e miséria de
nagem adúltera do meio burguês. serem independentes e pensarem por suas cabeças.
Um evento específico marcou o fim do Romantismo e o E combatem-se por faltarem às virtudes de respeito
início do Realismo em Portugal: a Questão Coimbrã. Mesmo se humilde às vaidades omnipotentes, de submissão
ela não tivesse acontecido, o Romantismo daria lugar, natu- estúpida, de baixeza e pequenez moral e intelectual.
ralmente, à nova escola. No entanto, os episódios ocorridos
em Coimbra explicitaram o choque entre as duas formas de Ao se referir a Castilho nesse mesmo texto, Antero de
pensar e de escrever – a romântica e a realista. Quental, com 25 anos na época, afirmou:
A Questão Coimbrã é o nome que se deu à desavença
estabelecida entre António Feliciano de Castilho, defensor do Levanto-me quando os cabelos brancos de V.
Romantismo, e os estudantes da Universidade de Coimbra Ex.ª passam diante de mim. Mas o travesso cére-
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que haviam se juntado na Sociedade do Raio, uma associação bro que está debaixo e as garridas e pequeninas
fundada por Antero de Quental, em 1861, com o intuito de le- coisas que saem dele confesso não merecerem
var ao sisudo meio acadêmico a aventura e a insubordinação. nem admiração, nem respeito, nem ainda esti-
O conflito começou quando, ao escrever uma carta sobre obra ma. A futilidade num velho desgosta-me tanto
de Pinheiro Chagas, em 1865, Castilho teceu grandes críticas como a gravidade numa criança. V. Ex.ª precisa
aos jovens de Coimbra, acusando-os de exibicionismo e fal- menos cinquenta anos de idade, ou então mais
ta de bom senso, citando, entre outros, os nomes de Teófilo cinquenta de reflexão.
Braga, autor da obra poética Visão dos tempos, e Antero de SAULO MICHELIN / PEARSON BRASIL

Quental, autor de Odes modernas. Leia um trecho da carta.

[...] muito há que eu me pergunto a mim donde


proviria esta enfermidade que hoje grassa por tantos
espíritos, de que até alguns dos mais robustos adoe-
cem, que faz com que a literatura e em particular
a poesia ande marasmada, com fastio de morte à
verdade e à simplicidade, com o olhar desvairado e
visionário, com os passos incertos, com as cores da
30

saúde trocadas em carmins postiços. [...]


Deixando de parte, por agora, Braga e Quen-
tal, de que, pelas alturas em que voam, confesso,
humilde e envergonhado, que muito pouco en-
xergo nem atino para onde vão, nem avento o
que será deles afinal [...].
Antero de Quental
SAULO MICHELIN / PEARSON BRASIL

Antero de Quental foi um dos maiores sonetistas da língua


portuguesa e um marco do Realismo na poesia. Seu contempo-
râneo, o poeta Cesário Verde, também escreveu sob influência
das ideias de seu tempo, afastando-se do Romantismo.
REPRODUÇÃO

A geração de 1870, vitoriosa na Questão Coimbrã, teve como


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representantes destacados (a partir da esquerda) Eça de Queirós,


Oliveira Martins, Antero de Quental, Ramalho Ortigão e Guerra Junqueiro.
António Feliciano de Castilho
2. Contexto O Romantismo e o Realismo são escolas literárias do sé-

25
Durante a segunda metade do século XIX, o continente euro- culo XIX. Enquanto o Romantismo teve lugar no início do sécu-
peu viu a burguesia se consolidando, assim como presenciou o lo, o Realismo apareceu em sua segunda metade. Apesar dis-

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fortalecimento do capitalismo e o avanço industrial e científico. so, são momentos com características radicalmente opostas:
Marcaram esse período o positivismo de Auguste Comte o Romantismo é marcado pela valorização da subjetividade,
(o verdadeiro conhecimento é aquele que advém de compro- dos sentimentos, da fantasia e da imaginação, afastando-se
vação científica), o determinismo de Hippolyte Taine (o com- do condicionamento das regras clássicas; já o Realismo é

Língua Portuguesa
portamento do homem é determinado pelo meio em que se baseado no racional, na objetividade, procurando retratar a
insere, pela raça e pelos fatos históricos) e o evolucionismo sociedade de maneira impassível, com o intuito de criticá-la.
de Charles Darwin (a seleção natural relaciona-se diretamen-
te com a sobrevivência das espécies). Mas a busca de uma visão racional do mundo,
no encalço da “verdade”, impessoal e universal,
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implicava um conceito específico de realidade: à


pergunta – que é real – respondiam: o que está
fora de nós como objeto, e pode ser captado pe-
los sentidos [...]. Para realizar [o que queriam],
abandonaram as preocupações teológicas e me-
tafísicas por considerá-las subjetivas, egocêntri-

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cas, e aderiram à ciência, forma de conhecimen-
to objetivo da realidade efetuado com o apoio
das faculdades racionais. O dado positivo, como
ensinava Comte, substitui afora o idealismo ro-
mântico: só interessa o que pode ser observado,
documentado, analisado, experimentado [...].
A obra literária passou a ser considerada
utensílio, arma de combate, de reforma e ação
social.
MOISÉS, Massaud. A literatura portuguesa. São Paulo: Cultrix, 2008.

Charles Darwin APRENDER SEMPRE 2

A ciência está atrelada ao pensamento da época. Por isso 01.


ela também tem papel fundamental na produção literária. Observe a imagem.

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3. Traços de estilo
REPRODUÇÃO
THE BRIDGEMAN ART LIBRARY / KEYSTONE BRASIL

George Clausen, Busto de uma camponesa, 1882.

Como a mulher é retratada?

Resolução
A mulher é retratada sem idealizações: com rugas, ros-
to sofrido, mãos fortes e roupas rústicas. O pintor registra
uma trabalhadora rural de maneira bem próxima da realida-
de, como em uma fotografia; faz, nas artes plásticas, o que
os escritores realistas fazem na literatura.
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Hubert von Kerkomer, Em greve, 1891.


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252

Conheça a obra de Gustave Courbet, um dos pioneiros do Realismo na pintura. Sobre esta tela, Enterro em Ornans, que
retratava o funeral de seu tio-avô, o artista declarou que significava também a morte do Romantismo.
Língua Portuguesa

MUSÉE D'ORSAY, PARIS


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4. Organizador gráfico
THE BRIDGEMAN ART LIBRARY / KEYSTONE BRASIL, TRAVELER1116 / ISTOCKPHOTO.COM, THE BRIDGEMAN ART LIBRARY / KEYSTONE BRASIL, REPRODUÇÃO

Pensamentos científicos:
positivismo,
evolucionismo e determinismo
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Questões
Retrato fiel sociais
à realidade
Olhar científico
e objetivo

Apenas
Tema Tópico Subtópico Subtópico destaque texto Características
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Módulo 55

25
Realismo: contexto

252
Exercícios de Aplicação

Língua Portuguesa
01. UCS-RS 03.
Sobre o Realismo, considere as afirmações e assinale a Associe as colunas.
alternativa correta. 1. Castilho
I. Em oposição ao Romantismo, cujo idealismo favorecia 2. Comte
o romance histórico, as obras realistas pretenderam 3. Darwin
relatar com objetividade seu próprio momento histó- 4. Quental
rico. 5. Taine
II. Entre os novos ideais defendidos pelos autores realis- ( ) Defensor do Realismo.
tas, encontravam-se ideais antirromânticos, antirreli- ( ) Defensor do Romantismo.
giosos e antiburgueses. ( ) Teoria do ambientalismo determinante: o ser huma-

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III. A poesia realista teve representantes tão notáveis no como produto do meio.
quanto a prosa, que acabou sendo suplantada apenas ( ) Teoria positivista: todos os fenômenos sujeitos às
pela força do Romantismo. leis naturais.
a. Somente I está correta. ( ) Teoria da origem das espécies e sua evolução bio-
b. Somente I e II estão corretas. lógica.
c. Somente I e III estão corretas.
Resolução
d. Somente II e III estão corretas.
e. I, II e III estão corretas. 4–1–5–2–3
Habilidade
Resolução Compreender valores, ideologias e propostas estéticas
A poesia realista não tem o mesmo destaque que conse- representadas em obras literárias realistas/naturalistas.
gue a prosa do período.
Alternativa correta: B

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02. UFV-MG (adaptado)
Sobre o movimento realista, assinale a alternativa correta.
a. O Realismo teve sua origem na França e foi uma reno-
vação apenas no campo literário.
b. O homem como indivíduo é o centro das preocupa-
ções do autor realista.
c. O ponto mais alto da prosa de ficção, no Realismo bra-
sileiro, encontra-se na obra de Álvares de Azevedo.
d. O escritor realista deve estudar os indivíduos, inter-
rogá-los, analisar o meio e transcrever suas observa-
ções.
e. A prosa de ficção, no Realismo, não é uma obra de ata-
que à mentalidade burguesa, à ordem social clerical e
monárquica.
Resolução
O Realismo é marcado pelo olhar “científico” do autor so-
bre os homens e a realidade que os cerca.
Alternativa correta: D
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Exercícios Extras
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04. UFS-SE (adaptado) 05. Uergs-RS (adaptado)


Assinale a alternativa que confirma a tese defendida pelo Considere as afirmações e assinale a alternativa correta.
autor realista: “O homem é produto do meio”. I. Para o filósofo Comte, o verdadeiro conhecimento só
a. O romance de análise procura estudar as causas do pode ser obtido a partir de fenômenos observáveis.
Língua Portuguesa

comportamento humano. II. Para o historiador Taine, o ser humano é, em última


b. Limita-se ao máximo, no romance realista, a interven- instância, um animal que tem seu destino determina-
ção do autor na narrativa. do pelo meio social e pela hereditariedade.
c. Raça, clima e temperamento são fatores naturais que III. Para o naturalista Darwin, o homem também é um pro-
influenciam na conduta do homem. duto da evolução das espécies.
d. Desnudam-se, na obra realista, as mazelas da vida pú- a. Somente I está correta.
blica e os contrastes da vida íntima. b. Somente I e II estão corretas.
e. No Realismo, os processos expressivos tornam-se mais c. Somente I e III estão corretas.
simples, concisos, ajustando-se à análise e à reflexão. d. Somente II e III estão corretas.
e. I, II e III estão corretas.
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Seu espaço
Sobre o módulo
Leia com os alunos os trechos de António Feliciano de Castilho e de Antero de Quental, transcritos no início da parte teórica
do capítulo 25. Mostre a eles que, além de a discussão reproduzir o embate entre o Romantismo, que estava acabando, e o Rea-
lismo, que nascia, evidencia o conflito entre representantes de gerações diferentes.

Exercícios Propostos

Da teoria, leia os tópicos 1 e 2. d. Visão do amor unicamente sob o aspecto da sexuali-


Exercícios de tarefa reforço aprofundamento dade, como mera satisfação de instintos animais.
e. Aspectos descritivos e minuciosos, sempre que possí-
vel, baseados na observação da realidade e do subje-
06. PUC-SP tivismo e sentimentalismo do autor.
Estabeleça pelo menos três distinções entre o romance
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realista e o romance romântico. 09. FEI-SP (adaptado)


Leia o fragmento de texto de Alfredo Bosi e responda à questão.
07. UFES (adaptado)
Assinale a alternativa incorreta. Desnudam-se as mazelas da vida pública e os
a. O Realismo português alcançou destaque na prosa, não contrastes da vida íntima; e buscam-se para am-
havendo qualquer representante da poesia realista. bas causas naturais (raça, clima, temperamento)
b. A Questão Coimbrã foi o marco inicial do movimento ou culturais (meio e educação), que lhes reduzem
realista português. de muito a área de liberdade. O escritor tomará a
c. Antero de Quental foi o grande defensor do movimento sério suas personagens e se sentirá no dever de
realista em Portugal. descobrir-lhes a verdade, no sentido positivista de
d. António Feliciano de Castilho opunha-se aos realistas dissecar os móveis do seu comportamento.
e defendia o Romantismo.
e. A Universidade de Coimbra foi o berço das ideias rea- O texto refere-se ao Realismo e às ideias que lhe deram
listas portuguesas. sustentação. O trecho que não evidencia essa argumentação é:
a. “Desnudam-se as mazelas da vida pública...”
08. Cefet-PR b. “... buscam-se... causas naturais...”
Assinale a alternativa que melhor caracteriza o Realismo. c. “O escritor tomará a sério suas personagens...”
a. Preocupação em justificar, à luz da razão, as reações d. “... se sentirá no dever de descobrir-lhes a verdade...”
das personagens, seus procedimentos e os proble- e. “... no sentido positivista...”
mas sentimentais e metafísicos apresentados.
b. Apresentação do homem como um ser dominado pe- No Brasil, o marco do início do Realismo é considerado a publi-
los instintos, pelas taras, pela carga hereditária, em cação do romance Memórias póstumas de Brás Cubas, de Machado
detrimento da razão. de Assis. Leia um fragmento da obra e responda às questões 10 e 11.
c. Preocupação em retratar a realidade como ela é, sem
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transformá-la. O autor, ao relatar, baseia-se na docu- Algum tempo hesitei se devia abrir estas memó-
mentação e na observação da realidade. rias pelo princípio ou pelo fim, isto é, se poria em
primeiro lugar o meu nascimento ou a minha morte. III. Para o escritor realista, o que importa é o que está fora

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Suposto o uso vulgar seja começar pelo nascimento, de nós, o objeto captado pelos sentidos.
duas considerações me levaram a adotar diferente IV. O Realismo é uma obra de ataque à mentalidade bur-

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método: a primeira é que eu não sou propriamente guesa, à ordem social, clerical e monárquica.
um autor defunto, mas um defunto autor, para quem a. Somente I e IV estão corretas.
a campa foi outro berço; a segunda é que o escrito b. Somente IV está correta.
ficaria assim mais galante e mais novo. [...] c. Somente II, III e IV estão corretas.

Língua Portuguesa
Dito isto, expirei às duas horas da tarde de d. I, II, III e IV estão corretas.
uma sexta-feira do mês de agosto de 1869, na
minha bela chácara de Catumbi. Tinha uns ses- 14. UFPE (adaptado)
senta e quatro anos, rijos e prósperos, era soltei- Sobre o Realismo, considere as afirmações e assinale V
ro, possuía cerca de trezentos contos e fui acom- para verdadeiro e F para falso.
panhado ao cemitério por onze amigos. Onze ( ) O regionalismo, iniciado com O sertanejo, de José de
amigos! [...] foi assim que me encaminhei para Alencar, é a obra típica do Realismo no Brasil.
o undiscovered country de Hamlet, sem as ânsias ( ) Por razões de dependência cultural, o Realismo, no
nem as dúvidas do moço príncipe, mas pausado Brasil, apresenta muitas das características do Rea-
e trôpego como quem se retira tarde do espe- lismo francês.
táculo. Tarde e aborrecido. Viram-me ir umas ( ) Uma das correntes de pensamento que servem

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nove ou dez pessoas, entre elas três senhoras como base ao Realismo é o positivismo de Comte.
[...] Tenham paciência! daqui a pouco lhes direi ( ) O positivismo exerce enorme influência sobre a es-
quem era a terceira senhora. Contentem-se de tética realista, refletida, entre outras coisas, no racio-
saber que essa anônima, ainda que não parenta, nalismo científico de algumas obras.
padeceu mais do que as parentas. É verdade, pa- ( ) No Realismo, reduz-se a natureza a simples cenário,
deceu mais. Não digo que se carpisse, não digo sem função na narrativa. Assim, a natureza não con-
que se deixasse rolar pelo chão, convulsa. Nem diciona nem influencia o comportamento dos perso-
o meu óbito era coisa altamente dramática... Um nagens.
solteirão que expira aos sessenta e quatro anos,
não parece que reúna em si todos os elementos 15. UPE/SSA (adaptado)
de uma tragédia. Sobre o Realismo, considere as afirmações e assinale V
para verdadeiro e F para falso.
10. Ufal/Copeve (adaptado) ( ) Um dos princípios da estética realista é a busca pela
Faça um comentário sobre aspectos do texto que o dife- interação entre realidade e fantasia. Isso implica
renciam das obras românticas e o inserem entre as realistas. uma tentativa de produzir textos literários identifica-
dos com o sentimentalismo romântico.
11. Ufal/Copeve ( ) Não há expressiva diferença entre a estética românti-

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“[...] eu não sou propriamente um autor de- ca e a realista, já que, em ambas, a linguagem, por ser
funto, mas um defunto autor”. de natureza literária, encontra-se sempre figurada.

Explique a diferença de sentido provocada pela mudança 16. Vunesp


de posição dos termos nos segmentos destacados. Leia o fragmento do texto que fez parte da conferência,
ocorrida no Cassino Lisbonense, que marcou o início do Rea-
12. PUC-PR (adaptado) lismo em Portugal e faça o que se pede.
Sobre o Realismo, assinale a alternativa incorreta.
a. O Realismo surgiu na Europa, como reação ao Arcadismo. [...] é uma base filosófica para todas as concep-
b. O Realismo tem suas bases no pensamento de Taine e ções do espírito – uma lei, uma carta de guia, um
Comte, entre outros. roteiro do pensamento humano, na eterna região
c. O Realismo surgiu como consequência do cientificis- artística do belo, do bom e do justo. É a negação
mo do século XIX. da arte pela arte, é a proscrição do conven-
d. Gustave Flaubert foi um dos precursores do Realismo, cional, do enfático e do piegas. É a abolição
com o romance Madame Bovary. da retórica considerada como arte de promover
e. Antero de Quental foi um dos mais importantes defen- a comoção usando da inchação do período, da
sores do movimento realista em Portugal. epilepsia da palavra, da congestão dos tropos. É a
análise com o fito na verdade absoluta. É a anato-
13. FEI-SP mia do caráter. É a crítica do homem.
Considere as afirmações e assinale a alternativa correta.
I. O Realismo teve sua origem na França e foi uma reno- a. Qual é o nome do fato literário no qual está inserida a
vação apenas no campo literário. conferência?
II. O escritor realista deve estudar o exterior dos indiví- b. Forneça o nome dos dois principais oponentes nesse
duos, interrogá-los, analisar o meio e depois trans- episódio artístico literário.
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crever suas observações, procurando ser, rigorosa- c. Por conhecer esse fato, você é capaz de interpretar o
mente, impessoal. trecho destacado no texto? Faça-o.
Módulo 56
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Realismo: traços de estilo


252

Exercícios de Aplicação
Língua Portuguesa

Leia os textos e responda às questões 01 e 02. 02. Sistema COC


A linguagem de ambos os textos permite a identifica-
Texto I ção de dois traços, um do Romantismo e um do Realismo,
Eu deixo a vida como deixa o tédio bastante distintivos entre si. Sucintamente, descreva essa
Do deserto, o poento caminheiro diferença.
Como as horas de um longo pesadelo
Resolução
Que se desfaz ao dobre de um sineiro
Álvares de Azevedo No primeiro texto, a linguagem torna-o emocional e sub-
jetivo, com uso de metáfora e comparação. A linguagem do
Texto II segundo texto é objetiva, racional, com uso mínimo de figuras
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Este último capítulo é todo de negativas. Não de linguagem.


alcancei a celebridade do emplasto, não fui mi-
nistro, não fui califa, não conheci o casamento.
Verdade é que, ao lado dessas faltas, coube-me
a boa fortuna de não comprar o pão com o suor
do meu rosto. Mais; não padeci a morte de Dona
Plácida, nem a semidemência do Quincas Borba.
Somadas umas coisas e outras, qualquer pessoa
imaginará que não houve míngua nem sobra, e
conseguintemente que saí quite com a vida. E 03. UFTM-MG
imaginará mal; porque ao chegar a este outro Assinale a alternativa em que se encontram característi-
lado do mistério, achei-me com um pequeno sal- cas da prosa do Realismo.
do, que é a derradeira negativa deste capítulo de a. Objetivismo; subordinação dos sentimentos a inte-
negativas: Não tive filhos, não transmiti a nenhu- resses sociais; críticas às instituições decadentes da
ma criatura o legado da nossa miséria. sociedade burguesa.
Machado de Assis b. Idealização do herói; amor visto como redenção; opo-
sição a valores sociais.
36

01. Sistema COC c. Casamento visto como arranjo de conveniência; des-


Considerando a comparação entre os estilos romântico e crição objetiva; idealização da mulher.
realista, indique a diferença entre a atitude do eu lírico do pri- d. Linguagem metafórica; protagonista tratado como an-
meiro texto e a do narrador do segundo texto diante da morte. ti-herói; sentimentalismo.
e. Espírito de aventura; narrativa lenta; impasse amoro-
Resolução
so solucionado pelo final feliz.
O eu lírico do primeiro texto considera a vida como abso-
lutamente ruim, um pesadelo, um tédio, enquanto o narrador Resolução
do segundo texto conclui que a vida merece ao menos uma A alternativa A é a única que apresenta aspectos do Rea-
análise, um balanço, por meio do qual identificou algum “lucro”. lismo.
Alternativa correta: A
Habilidade
Compreender valores, ideologias e propostas estéticas
representadas em obras literárias realistas/naturalistas.
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Exercícios Extras

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04. Sistema COC do à selva intensa dos romances cavalheirescos,

252
Assinale a alternativa correta sobre o Realismo. despertado um momento da legenda morta para
a. É uma fase de transição, em que várias tendências uma entrevista de espectros e recordações. Um
opostas coexistem. jato de luz elétrica, derivado de foco invisível, fe-
b. Inicia-se durante a Idade Média, em meio ao feudalis- ria a inscrição dourada ATHENÆUM em arco

Língua Portuguesa
mo. sobre as janelas centrais, no alto do prédio. A
c. Apresenta exaltação da fantasia e da imaginação. uma delas, à sacada, Aristarco mostrava-se. Na
d. Tem como traço a observação do mundo objetivo e expressão olímpica do semblante transpirava a
exato. beatitude de um gozo superior. Gozava a sensa-
e. Valoriza a musicalidade, ou seja, o ritmo e a sonoridade. ção prévia, no banho luminoso da imortalidade a
que se julgava consagrado. Devia ser assim: – luz
Leia o trecho do romance O Ateneu, de Raul Pompéia, e benigna e fria, sobre bustos eternos, o ambiente
responda às questões 05 e 06. glorioso do Panteão. A contemplação da posteri-
dade embaixo [...]
Na ocasião em que me ia embora, estavam
acendendo luzes variadas de Bengala diante da 05. Sistema COC

Linguagens, Códigos e suas Tecnologias


casa. O Ateneu, quarenta janelas, resplendentes É possível perceber a riqueza de detalhes na descrição
do gás interior, dava-se ares de encantamento impressionista-expressionista do cenário, bem como a ati-
com a iluminação de fora. Erigia-se na escu- tude ironicamente crítica que o narrador faz sobre o perso-
ridão da noite, como imensa muralha de coral nagem Aristarco. Com base nisso, informe o nome do estilo
flamante, como um cenário animado de safira de época em que melhor se enquadra o romance de que se
com horripilações errantes de sombra, como um extraiu o fragmento.
castelo fantasma batido de luar verde empresta-

Seu espaço

Sobre o módulo Na web


Mostre aos alunos como o intuito de retratar fielmente a Para mais informações sobre o Realismo na pintura,
realidade não aparece apenas na literatura, podendo ser veri- acesse:
ficado também em obras como a apresentada no final da teo-
ria do capítulo 25. Incentive os alunos a falarem sobre a forma <http://www.itaucultural.org.br/aplicEx-

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como a mulher foi pintada nessa obra. ternas/enciclopedia_ic/index.cfm?fuseac-
tion=termos_texto&cd_verbete=3639>.
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Exercícios Propostos
25

Da teoria, leia o tópico 3. d. Operam uma crítica das leituras romanescas, que con-
252

sideram fantasiosas em relação à vida real.


Exercícios de tarefa reforço aprofundamento
e. Têm como objetivos principais criticar as mazelas da
sociedade e propor soluções para erradicá-las.
06. Sistema COC
Língua Portuguesa

Qual é o tema predominante na narrativa em questão? 10. Vunesp


Leia o fragmento de texto de Eça de Queirós e responda
07. UPE/SSA (adaptado) à questão.
Sobre o Realismo, considere as afirmações e assinale a
alternativa correta. Amaro abriu a vidraça. Ao fim da rua um can-
I. Na prosa realista, diferentemente da estética lite- deeiro esmorecia. A noite estava muito negra.
rária que a antecedeu, algumas das características E havia sobre a cidade um silêncio côncavo, de
mais evidentes são o desejo e a necessidade do abóbada.
autor de buscar e encontrar, na linguagem verbal, Depois das cornetas, um rufar lento de tam-
representação fiel à realidade em sua concretude bores afastou-se para o lado do quartel; por bai-
mais exata. xo da janela um soldado, que se demorara nal-
Linguagens, Códigos e suas Tecnologias

II. Memórias de um sargento de milícias é um romance guma viela do castelo, passou correndo; e das
considerado de transição entre a estética romântica e paredes da Misericórdia saía constantemente o
a estética realista, todavia as características da esté- agudo piar das corujas.
tica realista, no desenvolvimento da história, em sua — É triste isto – disse Amaro.
totalidade, são predominantes. Mas o São Joaneira gritou de cima:
III. O Realismo emerge no Brasil sob o seguinte lema: “A — Pode subir, senhor cônego! Está o caldo
linguagem romântica consegue retratar a realidade da na mesa!
vida tal qual a vida é”. Isso implica dizer que o Realis- — Ora vá, vá, que você deve estar a cair de
mo precisa se aproximar da estética romântica, visan- fome, Amaro! – disse o cônego, erguendo-se
do alcançar seus objetivos literários. muito pesado.
a. Somente I está correta. E detendo um momento o pároco pela manga
b. Somente II está correta. do casaco:
c. Somente III está correta. — Vai você ver o que é um caldo de galinha
d. Somente I e II estão corretas. feito cá pela senhora! Da gente se babar!...
e. Somente II e III estão corretas. No meio da sala de jantar, forrada de papel
escuro, a claridade da mesa alegrava, com a sua
08. UMC-SP (adaptado) toalha muito branca, a louça, os copos reluzin-
38

Sobre o Realismo, considere as afirmações e assinale a do à luz forte dum candeeiro de abajur verde.
alternativa correta. Da terrina subia o vapor cheiroso do caldo, e na
I. As linhas diretrizes da escola literária realista fazem larga travessa a galinha gorda, afogada num ar-
notar que o subjetivismo, o nacionalismo ufanista e o roz úmido e branco, rodeada de nacos de bom
sentimentalismo são questões pouco relevantes. paio, tinha uma aparência suculenta, de prato
II. No Realismo, há predomínio da vida concreta e exte- morgado. No armário envidraçado, um pouco
rior sobre a vida interior e abstrata. na sombra, viam-se cores claras de porcelana, a
III. O melhor da produção realista está na poesia. um canto, ao pé da janela, estava um piano, co-
a. Somente I está correta. berto com uma colcha de cetim desbotado. Na
b. Somente II está correta. cozinha frigia-se; e sentindo o cheiro fresco que
c. Somente I e II estão corretas. vinha dum tabuleiro de roupa lavada, o pároco
d. Somente II e III estão corretas. esfregou as mãos, regalado.
e. I, II e III estão corretas.
Sabendo que Eça de Queirós foi o introdutor do Realis-
09. mo em Portugal, explique por que se pode considerar o texto
Sobre os romances realistas, assinale a alternativa transcrito como pertencente a um romance realista.
incorreta.
a. Apoiam-se nos ideais românticos, adaptando-os aos 11.
conceitos positivistas e às descobertas científicas. O Realismo foi um movimento de:
b. Procuram demonstrar a hipocrisia da sociedade a. volta ao passado.
burguesa. b. exacerbação ultrarromântica.
c. Opõem-se às idealizações românticas e observam de c. maior preocupação com a objetividade.
modo crítico a sociedade. d. irracionalismo.
e. moralismo.
EMI-15-10
12. UFTM-MG (adaptado) 13.

25
Leia o fragmento de “O sentimento dum ocidental”, de Ce- Sobre o Realismo, considere as afirmações e assinale a
sário Verde, e responda à questão. alternativa correta.

252
I. Busca o perene humano no drama da existência.
Vazam-se os arsenais e as oficinas; II. Defende a documentação de fatos e a impessoalidade
Reluz, viscoso, o rio, apressam-se as obreiras; do autor perante a obra.
E num cardume negro, hercúleas, galhofeiras, III. Consiste na estética literária restritamente brasileira;

Língua Portuguesa
Correndo com firmeza, assomam as varinas. seu criador é Machado de Assis.
a. Somente II e III estão corretas.
Vêm sacudindo as ancas opulentas! b. Somente III está correta.
Seus troncos varonis recordam-me pilastras; c. I, II e III estão corretas.
E algumas, à cabeça, embalam nas canastras d. Somente I e II estão corretas.
Os filhos que depois naufragam nas tormentas. e. Somente I e III estão corretas.

Descalças! Nas descargas de carvão, 14.


Desde a manhã à noite, a bordo das fragatas; O Realismo, como escola literária, é caracterizado:
E apinham-se num bairro onde miam gatos, a. pelo exagero da imaginação.
E o peixe podre gera os focos de infecção! b. pelo culto às formas clássicas.

Linguagens, Códigos e suas Tecnologias


c. pela preocupação com o exótico.
Vocabulário d. pelo subjetivismo.
Vazam-se – esvaziam-se. e. pelo objetivismo.
Varinas – vendedoras de peixe.
15.
Os traços estilísticos dos versos permitem afirmar que se Qual dessas características não pertence ao Realismo?
trata de texto do: a. Preocupação crítica.
a. Realismo, marcado por linguagem descritiva e temáti- b. Visão materialista da realidade.
ca do cotidiano. c. Ênfase nos problemas morais e sociais.
b. Romantismo, marcado por linguagem narrativa vaga e d. Valorização da Igreja.
temática exótica. e. Determinismo na atuação das personagens.
c. Arcadismo, marcado por reflexões sobre a arte e temá-
tica erudita. 16.
d. Classicismo, marcado pelo uso recorrente de figuras Assinale a única alternativa incorreta.
da mitologia grega ou romana. a. O Realismo não tem nenhuma ligação com o Roman-
e. Barroco, marcado por linguagem figurada e temática tismo.
mística e religiosa. b. A atenção ao detalhe é característica do Realismo.

39
c. Pode-se dizer que alguns autores românticos já pos-
suem certas características realistas.
d. O cientificismo do século XIX forneceu a base da visão
do mundo adotada, de um modo geral, pelo Realismo.
e. O Realismo apresenta análise social.
ENSINO MÉDIO – TEORIA
Autora: Cristiane Rodrigues de Souza
EMI-15-10
1. Poesia do Realismo português 42
2. Antero de Quental 42
3. Guerra Junqueiro 43
4. Organizador gráfico 43
Módulo 57 – Antero de Quental
e Guerra Junqueiro 44

• Perceber a presença dos diferentes


elementos que estruturam o texto nar-
rativo literário de Quental e de Guerra
Junqueiro: personagens, marcadores
de tempo e de localização, sequência
lógica dos fatos narrados, modos de
narrar (1ª e 3ª pessoa); adjetivação
na caracterização de personagens,
cenários e objetos.
• Relacionar características discursivas
e ideológicas de obras realistas em
versos ao contexto histórico de sua
produção, circulação e recepção.
• A partir da leitura de textos literários
consagrados do Realismo e de infor-
mações sobre concepções artísticas,
compreender relações entre eles e
seu contexto histórico, social, político
ou cultural, inferindo as escolhas dos
temas, gêneros discursivos e recursos
expressivos.

OPACHEVSKY IRINA / SHUTTERSTOCK


Universidade de Coimbra

Antero de Quental e Guerra Junqueiro


26
41

“Razão, irmã do Amor e da Justiça,


Mais uma vez escuta a minha prece,
É a voz dum coração que te apetece,
Duma alma livre, só a ti submissa.”
Antero de Quental
1. Poesia do Realismo português No meu sonho desfilam as visões,
26

Em Portugal, durante o Realismo, há produção poética de Espectros dos meus próprios pensamentos,
grande qualidade. Como um bando levado pelos ventos,
252

Nessa época, destacam-se Antero de Quental, protago- Arrebatado em vastos turbilhões...


nista da Questão Coimbrã, e Guerra Junqueiro.
A poesia da época, além da produção abertamente realis- Numa espiral, de estranhas contorções,
ta, apresenta diferentes facetas, como a poesia metafísica de E donde saem gritos e lamentos,
Língua Portuguesa

Antero de Quental. Vejo-os passar, em grupos nevoentos,


Distingo-lhes, a espaços, as feições...

2. Antero de Quental Fantasmas de mim mesmo e da minha alma,


A obra de Antero de Quental reflete o drama íntimo do es- Que me fitais com formidável calma,
critor, dividido entre duas formas de se posicionar no mundo. Levados na onda turva do escarcéu,
Por um lado, filia-se, racionalmente, ao espírito combativo da
época, preocupado em revolucionar a sociedade. Por outro, Quem sois vós, meus irmãos e meus algozes?
traz consigo a educação tradicionalista, com forte religiosi- Quem sois, visões misérrimas e atrozes?
dade, que o leva à reflexão metafísica. Sua obra, portanto, Ai de mim! ai de mim! e quem sou eu?!...
divide-se em três vertentes: aquela que se relaciona às expe-
Linguagens, Códigos e suas Tecnologias

riências da juventude, em que coexistem várias tendências; a Antero de Quental também escreveu prosa, considerada
poesia engajada, em tom revolucionário; a poesia metafísica, polêmica e filosófica por seus estudiosos.
ou seja, poemas formulados como resposta às perguntas que
a consciência humana costuma fazer, como “O que sou?” e
“Para onde vou?”. APRENDER SEMPRE 3

Leia o poema “Mais luz!”, de Antero de Quental, e res-


ponda à questão.

Amem a noite os magros crapulosos,


REPRODUÇÃO

E os que sonham com virgens impossíveis,


E os que se inclinam, mudos e impassíveis,
À borda dos abismos silenciosos...

Tu, lua, com teus raios vaporosos,


Cobre-os, tapa-os e torna-os insensíveis,
Tanto aos vícios cruéis e inextinguíveis,
42

Como aos longos cuidados dolorosos!

Eu amarei a santa madrugada,


E o meio-dia, em vida refervendo,
E a tarde rumorosa e repousada.

Viva e trabalhe em plena luz: depois,


Antero de Quental Seja-me dado ainda ver, morrendo,
O claro sol, amigo dos heróis!
Privilegiado, com a mente voltada para a reali-
zação de grandes obras, Antero viveu sempre tor- 01.
turado pelo afã de conciliar opostas ideias, não raro No poema, há oposição entre os que amam a noite
nascidas em clima febril, e a ação que lhes desse (duas primeiras estrofes) e o eu lírico, que ama o dia (duas
razão de existência. Apesar dos gigantescos esfor- últimas estrofes). Tendo em vista o contexto em que o poe-
ços, o resultado foi nulo, porquanto era essencial- ma foi produzido, a que movimentos literários esses posi-
mente vocacionado para a contemplação ou para a cionamentos podem ser relacionados?
especulação filosófica, e não para o combate ativo:
ao mesmo tempo que revelava alto pendor para o Resolução
jogo sedentário das ideias, era inepto na tentativa Aqueles que amam a noite, porque sonham com mu-
de as pôr em prática. Além disso, alimentava ideias lheres idealizadas e inatingíveis, remetem ao Romantismo.
demasiado utópicas e visionárias, e muito acima O eu lírico, o qual prefere a luz, o sol, ou seja, a racionalida-
das possibilidades duma só vida. de, que é clara e objetiva, está de acordo com o Realismo.
MOISÉS, Massaud. A literatura portuguesa. São Paulo: Cultrix, 2008.
EMI-15-10

Leia o poema “No turbilhão”, em que o eu lírico reflete so-


bre quem ele é e sobre seus próprios pensamentos.
3. Guerra Junqueiro

26
Abílio Manuel Guerra Junqueiro (1850-1923) teve pro- Depois, começa a defender o cientificismo, com o qual
dução significativa em poesia, com a publicação de vários li- não consegue ser totalmente coerente, por causa de sua for-

252
vros de poemas, como A morte de D. João (1874), Os simples mação religiosa, além de seu temperamento emotivo.
(1892) e Pátria (1896). Ao lado de Antero de Quental e de no- Na terceira fase de sua carreira, o poeta atinge qualidade
mes como Gomes Leal e Cesário Verde, foi adepto da poesia poética, ao deixar de lado as preocupações realistas.
realista. Em prosa, pouco publicou.

Língua Portuguesa
A partir de 1890, o poeta alcança repelir os
asfixiantes compromissos estético-científicos,
desfazer as contradições íntimas, e criar obra
REPRODUÇÃO

dirigida noutro sentido, se não antagônico, com-


plementar ao da fase anterior. Elabora então o
melhor da sua poesia [...], das obras mais rele-
vantes dos fins do século XIX: Os simples (1892).
Como o título sugere, o poeta faz o elogio das
criaturas que vivem num mundo contrário ao
das personagens da poesia realista: os simples,
os humildes, os camponeses, os contemplativos,

Linguagens, Códigos e suas Tecnologias


os sonhadores e os puros.
MOISÉS, Massaud. A literatura portuguesa. São Paulo: Cultrix, 2008.

Conheça o filme Anthero – o palácio da ventura, produ-


ção portuguesa de 2009, dirigida por José Medeiros. Am-
bientado em diversas localidades de Portugal, o filme se
baseia na vida e na obra do poeta Antero de Quental, mos-
Guerra Junqueiro trando seus ideais e seus tormentos, com a participação
de personagens representativos de outros grandes nomes
Massaud Moisés lembra que Guerra Junqueiro, quando da literatura da época, como Eça de Queirós e Teófilo Braga.
começa a escrever, ainda rapaz, não tem contato com os postu-
lados do Realismo. Por isso, em sua primeira fase, liga-se ao Ro-
mantismo, com versos de tom declamatório e melodramático.

43
4. Organizador gráfico
OPACHEVSKY IRINA / SHUTTERSTOCK, REPRODUÇÃO, REPRODUÇÃO

Poesia do Realismo português

Antero de Quental Guerra Junqueiro


EMI-15-10

Apenas
Tema Tópico Subtópico Subtópico destaque texto Características
Módulo 57
26

Antero de Quental e Guerra Junqueiro


252

Exercícios de Aplicação
Língua Portuguesa

Leia os textos e responda às questões 01 e 02. 01. Vunesp


Os dois textos identificam-se por expressar, sob pontos
Tem gente que continua achando que a vida é de vista distintos, a decepção e o pessimismo do homem com
uma piada. Ainda bem que tem gente que pensa relação à vida e ao mundo. Diferenciam-se, todavia, na atitude
que a vida é uma piada. Pior é a gente que pensa final ante essa decepção. Explique essa diferença de atitude.
que o homem é o rei da criação. Rei da criação,
Resolução
eu, hein? Um assassino nato, usufruidor da misé-
ria geral – se você come, alguém está deixando Conforme o primeiro texto, a vida humana é vã e, sobretu-
de comer, a comida não dá para todos, não –, do, prejudicial ao planeta. Já de acordo com o segundo texto,
de que é que ele se ri? De que se ri a hiena? Se a vida, por mais conturbada que seja, é o caminho para co-
Linguagens, Códigos e suas Tecnologias

não for atropelado ficará no desemprego, se não nhecer o amor, por isso é válida.
ficar desempregado vai pegar um enfisema, será
abandonado pela mulher que ama – mas ama,
hein? –, arrebentado pelos filhos – pelos pais, se
for filho –, mordido de cobra ou ficará impotente.
E, se escapar de tudo ficará velho, senil, babando
num asilo. Piada, é? Pode ser que haja vida inte-
ligente em outro planeta, neste, positivamente,
não. O homem é o câncer da Terra. Estou me
repetindo? Pois é: corrompe a natureza, fura tú-
neis, empesta o ar, emporcalha as águas, apodre-
ce tudo onde pisa. Fique tranquilo, amigo: o de-
saparecimento do ser humano não fará a mínima
diferença à economia do cosmos.
Millôr Fernandes, Atriz.

Disse ao meu coração: Olha por quantos 02. Vunesp


44

Caminhos vãos andamos! Considera O soneto Solemnia verba desenvolve-se como um diálo-
Agora, desta altura fria e austera, go entre duas personagens: o eu poemático e seu coração. O
Os ermos que regaram nossos prantos... que simboliza, no poema, o coração?
Resolução
Pó e cinzas, onde houve flor e encantos!
E noite, onde foi luz de primavera! O coração representa resistência – “[...] feito valente” –
Olha a teus pés o mundo e desespera diante das desilusões. O penar possibilita ao coração tornar-se
Semeador de sombras e quebrantos! crente de que vale a pena viver, sobretudo pelo amor. Para o
eu lírico desiludido (duas primeiras estrofes), o coração deixa
Porém o coração, feito valente uma mensagem de esperança: “Viver não foi em vão [...]”.
Na escola da tortura repetida,
E no uso do penar tornado crente,

Respondeu: Desta altura vejo o Amor!


Viver não foi em vão, se é isto a vida,
Nem foi demais o desengano e a dor.
Antero de Quental, Solemnia verba.
EMI-15-10
03. Fuvest-SP Resolução

26
Guerra Junqueiro pode ser enquadrado no movimento Guerra Junqueiro escreveu poemas de eloquência engajada.
estético realista porque: Alternativa correta: B

252
a. se voltou para a análise das camadas profundas do Habilidade
inconsciente. A partir da leitura de textos literários consagrados do Rea-
b. escreveu poemas de combate social. lismo e de informações sobre concepções artísticas, com-
c. desenvolveu, em seus romances, a crítica social. preender relações entre eles e seu contexto histórico, social,

Língua Portuguesa
d. buscou revitalizar a musicalidade do verso. político ou cultural, inferindo as escolhas dos temas, gêneros
e. procurou as raízes históricas da nação. discursivos e recursos expressivos.

Linguagens, Códigos e suas Tecnologias


Exercícios Extras

04. Vunesp Leia o texto e responda às questões 05 e 06.

45
Lá! Mas onde é lá? – Espera,
Coração indomado! O Céu, que anseia No ano de 1865, em Portugal, inicia-se uma
A alma fiel, o Céu, o Céu da Ideia, grande polêmica. De um lado, António Feliciano
Em vão o buscas nessa imensa esfera! de Castilho (1800-1875); de outro, Antero Tar-
quínio de Quental (1842-1891). Em posfácio ao
O espaço é mudo: a imensidade austera livro Poema da mocidade, de Pinheiro Chagas,
Debalde noite e dia se incendeia… Castilho refere-se com pouco caso e algum de-
Em nenhum astro, em nenhum sol, se alteia boche aos jovens poetas que, em Coimbra, de-
A rosa ideal da eterna Primavera! fendiam ideias novas. Antero, um dos mencio-
nados por Castilho, faz logo publicar uma carta
O Paraíso e o templo da Verdade, em resposta ao velho mestre, na qual retribui as
Ó mundos, astros, sóis, constelações! ironias, ao mesmo tempo que faz ataque cerra-
Nenhum de vós o tem na imensidade… do e contundente a Castilho. Em pouco tempo,
cada um ganha adeptos e com isso se produz
A Ideia, o sumo Bem, o Verbo, e a Essência, uma das mais ricas polêmicas da história da lite-
Só se revela aos homens e às nações ratura portuguesa. Tal episódio ficou conhecido
No céu incorruptível da Consciência! como a Questão Coimbrã e também pelo título
recebido pela publicação de Antero: “Bom senso
O soneto é de autoria de um dos mais importantes inter- e bom gosto”.
venientes na Questão Coimbrã, que é:
a. António Feliciano de Castilho. 05. Vunesp
b. Camilo Castelo Branco. O que representam António Feliciano de Castilho e Antero
c. Guerra Junqueiro. de Quental nessa polêmica?
d. Antero de Quental.
EMI-15-10

e. Eça de Queirós.
Seu espaço
26

Sobre o módulo Na web


252

Leia, em sala de aula, os dois poemas apresentados na


O site <http://www.uc.pt/ruas/> traz informa-
teoria deste capítulo. “No turbilhão” apresenta traços que
ções sobre a Universidade de Coimbra, em que
permitem relacioná-lo à produção metafísica de Quental, já
estudou Antero de Quental.
Língua Portuguesa

que se aproxima de questionamentos sobre a existência do


homem. “Mais luz!” faz parte da produção literária de Antero
segundo a estética realista. Ressalte aos alunos que o Sol é
comumente associado à razão e à clareza, enquanto a noite
lembra intuição e subjetividade.
Linguagens, Códigos e suas Tecnologias
46

Exercícios Propostos

Da teoria, leia os tópicos 1, 2 e 3. Conheci a Beleza que não morre


E fiquei triste. Como quem da serra
Exercícios de tarefa reforço aprofundamento Mais alta que haja, olhando aos pés a terra
E o mar, vê tudo, a maior nau ou torre,
06. Vunesp Minguar, fundir-se, sob a luz que jorre:
O que marca a Questão Coimbrã na história da literatura Assim eu vi o Mundo e o que ele encerra
portuguesa? Perder a cor, bem como a nuvem que erra
Ao pôr do sol e sobre o mar discorre.
07. ENC-SP (adaptado)
Leia o soneto "Tormento do ideal", de Antero de Quental, e Pedindo a forma, em vão, a ideia pura,
responda à questão. Tropeço em sombras na matéria dura,
E encontro a imperfeição de quanto existe.

Recebi o batismo dos poetas,


E, assentado entre as formas incompletas,
EMI-15-10

Para sempre fiquei pálido e triste.


Sobre o verso “Recebi o batismo dos poetas,”, considere d. caracterizou-se por uma longa carreira poética, marca-

26
as afirmações e assinale a alternativa correta. da por seus poemas declamatórios e melodramáticos.
I. Evidente postura religiosa assumida pelo eu lírico, e. assumiu o Realismo desde seus primeiros trabalhos

252
que lhe permite ver a beleza como autêntica alegria poéticos, durante a Questão Coimbrã.
de Deus.
II. Convicção de que o eu lírico é fadado a contemplar a 11.
beleza, o que tem como consequência a sensação de O poeta Guerra Junqueiro não assumiu completamente o

Língua Portuguesa
imperfeição do mundo e o sentimento de melancolia. cientificismo em razão de:
III. Ideia de que a contemplação da beleza depende ex- a. seu ideal romântico.
clusivamente da vontade e da razão do eu lírico, con- b. sua formação religiosa.
forme ditavam os princípios do realismo oitocentista. c. seu apego às pessoas mais simples.
a. Somente III está correta. d. sua obstinação quanto ao ideal poético.
b. Somente II está correta. e. sua resistência às propostas de sua geração.
c. I, II e III estão corretas.
d. Somente I e II estão corretas. 12.
e. Somente II e III estão corretas. A obra Os simples, de Guerra Junqueiro, trata:
a. dos ideais realistas levados ao extremo.
08. Vunesp (adaptado) b. dos estudantes envolvidos na Questão Coimbrã.

Linguagens, Códigos e suas Tecnologias


A carta a Castilho, intitulada “Bom senso e bom gosto”, c. dos poemas orientados por temas primitivistas.
que defendia os jovens escritores realistas e a poesia nova d. das pessoas humildes, dos camponeses e sonhadores.
em Portugal, na segunda metade do século XIX, foi escrita por: e. dos realistas, que se opunham à complexidade dos
a. Alexandre Herculano. ideias românticos.
b. Camilo Castelo Branco.
c. Antero de Quental. 13. UFPE (adaptado)
d. Almeida Garrett. Leia o texto e assinale a alternativa que completa a lacuna.
e. Guerra Junqueiro. É nos Sonetos que encontramos o melhor conjunto da
obra poética amadurecida de ___________________. O poeta via na sé-
09. UNIFESP rie completa dos sonetos, muitos deles desentranhados de
Eça de Queirós fez parte da geração que lutou ferrenha- outras coleções já publicadas, uma série de marcos de sua
mente contra a ordem social lisboeta, passional e romântica, autobiografia espiritual.
liderada, politicamente, pela monarquia, pela burguesia e pelo a. Ramalho Ortigão
clero. Além dele, foram figuras importantes dessa geração: b. Oliveira Martins
a. Camilo Castelo Branco, António Feliciano de Castilho e c. Antero de Quental
Oliveira Martins. d. António Feliciano de Castilho
b. Antero de Quental, Oliveira Martins e Teófilo Braga. e. Almeida Garrett

47
c. Júlio Dinis, Alexandre Herculano e Antero de Quental.
d. António Feliciano de Castilho, Camilo Castelo Branco e 14. Sistema COC
Teófilo Braga. Guerra Junqueiro teve forte influência romântica antes
e. Alexandre Herculano, Oliveira Martins e Júlio Dinis. de aderir ao Realismo. O que isso causou em sua obra?

10. 15. Sistema COC


O poeta Guerra Junqueiro: Que aspecto da periodização em estéticas literárias é re-
a. na primeira fase de sua poesia, ligou-se ao Romantismo. velado pelo exemplo de Guerra Junqueiro?
b. foi romântico até o final da vida, opondo-se às novas
ideias dos realistas. 16. Sistema COC
c. na terceira fase de sua poesia, assumiu a proposta Como se divide a produção poética de Antero de Quental?
realista com convicção.
EMI-15-10
1. Prosa do Realismo português 50
2. Organizador gráfico 53
Módulo 58 – Eça de Queirós I 54
Módulo 59 – Eça de Queirós II 58
Módulo 60 – Eça de Queirós III 62

• Perceber a presença dos diferentes


elementos que estruturam o texto
narrativo literário de Eça de Queirós:
personagens, marcadores de tempo e
de localização, sequência lógica dos
fatos narrados, modos de narrar (1ª e 3ª
pessoa); adjetivação na caracterização
de personagens, cenários e objetos.
• Relacionar características discursivas e
ideológicas de obras realistas em prosa
ao contexto histórico de sua produção,
circulação e recepção.
• A partir da leitura de textos literários
consagrados de Eça de Queirós e de
informações sobre concepções artísti-
cas, compreender relações entre eles e
seu contexto histórico, social, político
ou cultural, inferindo as escolhas dos
temas, gêneros discursivos e recursos
expressivos.

ZYANKARLO / SHUTTERSTOCK
Eça de Queirós, um
dos mais importantes
escritores portugueses.

Eça de Queirós 27
49

“Foi à sala, sentou-se ao piano, tocou ao acaso bocados da Lúcia,


da Sonâmbula, o Fado; e parando, os dedos pousados de leve sobre o
teclado, pôs-se a pensar que Basílio devia vir no dia seguinte; vestiria o
roupão novo de foulard cor de castanho! Recomeçou o Fado, mas os olhos
cerravam-se-lhe.”
Eça de Queirós, O primo Basílio.
1. Prosa do Realismo português A obra de Eça de Queirós pode ser dividida em três fases.
27

Os autores de contos e de romances da década de 1870, Na primeira fase, o autor ainda estava influenciado pelo
em Portugal, refletiam as condições sociais, analisando-as e Romantismo, principalmente pela obra do francês Victor
252

criticando-as. Eram também alvo de suas críticas o clero e a Hugo. Escreveu O mistério da estrada de Sintra (semelhante a
aristocracia, que eles responsabilizavam pela manutenção um romance policial), As farpas e Prosas bárbaras.
de uma sociedade hipócrita e cheia de vícios.
Eram colocados sobre análise, por exemplo, o casamento A primeira fase da carreira queirosiana come-
Língua Portuguesa

e o adultério. Assim como a obra realista francesa Madame ça com artigos e crônicas publicados entre 1866
Bovary, de Gustave Flaubert, Primo Basílio, do português Eça e 1867, na Gazeta de Portugal, postumamente
de Queirós, mostra a mulher levada ao adultério, sujeita aos coligidos no volume Prosas bárbaras, e termina
desejos carnais e instintos. em 1875, com a publicação de O crime do padre
Eça de Queirós, ao lado de Teófilo Braga e de Ramalho Or- Amaro. Fase de indecisão, preparação e procura,
tigão, foi importante representante da época. dum escritor ainda jovem e romântico, à mercê
duma heterogênea influência, especialmente de
origem francesa [...]
REPRODUÇÃO

MOISÉS, Massaud. A literatura portuguesa. São Paulo: Cultrix, 2008.

A segunda fase teve início em 1875 e foi até 1888. Na


Linguagens, Códigos e suas Tecnologias

produção dessa época, os traços do Realismo já são bem


marcantes.

Aderindo às teorias do Realismo [...] a partir


de 1871, Eça [...] passa a escrever [...] obras de
combate às instituições vigentes (monarquia,
Igreja, burguesia) [...]. Tais romances compro-
missam-se com o ideário da geração de 1870,
e valem como flagrante, embora deformado, re-
trato da sociedade portuguesa, sua contemporâ-
nea, erguido em linguagem original, plástica, já
impregnadas daquelas qualidades características
do seu estilo: naturalidade, fluência, vigor narra-
tivo, precisão, oralidade, repúdio às soluções re-
tóricas exageradas. Junte-se-lhes o pendor inato
para certo lirismo melancólico e para a sátira e a
ironia, utilizadas estas com sutileza e graça, facil-
50

Eça de Queirós mente transformadas em riso, que brota do ridí-


culo daquelas criaturas escolhidas pelo escritor
No Cassino Lisbonense, local em que se reuniam os jo- como exemplos típicos duma sociedade hipócri-
vens realistas para fazer conferências, o escritor proferiu, ta, destituída de princípios morais [...]
ainda moço, “A literatura nova” ou “O Realismo como nova ex- MOISÉS, Massaud. A literatura portuguesa. São Paulo: Cultrix, 2008.
pressão da arte”, em que critica o Romantismo e defende os
postulados realistas. Leia um trecho desse texto. Dessa fase, fazem parte, entre outros, os romances O cri-
me do padre Amaro, Os Maias e O primo Basílio.
O Realismo é [...] a negação da arte pela arte; Em O crime do padre Amaro, um jovem padre, Amaro Viei-
é a proscrição do convencional, do enfático e ra, protegido pelo cônego Dias, é transferido para uma comu-
do piegas. É a abolição da retórica considerada nidade de pessoas simples, onde conhece Amélia, uma bela
como arte de promover a comoção usando a in- jovem, que já é noiva. Ao se encontrarem em uma fazenda,
chação do período, da epilepsia da palavra, da Amaro se aproxima de Amélia, que se assusta com essa pri-
congestão dos tropos. É a análise com o fito na meira investida. Depois, o pároco a aconselha a romper seu
verdade absoluta. Por outro lado, o Realismo é noivado, alegando que João Eduardo, seu noivo, não é um
uma reação contra o Romantismo: o Romantis- rapaz digno. Com isso, João Eduardo fica mal visto, perde o
mo era a apoteose do sentimento; o Realismo é emprego e agride o padre com um soco. Em outra ocasião, na
a anatomia do caráter. É a crítica do homem. É a casa do padre Amaro, Amélia é seduzida e tem seu primeiro
arte que nos pinta a nossos próprios olhos – para encontro íntimo com ele. A criada do padre aconselha que
nos conhecermos, para que saibamos se somos eles se encontrem na casa de um sineiro, porque seria mais
verdadeiros ou falsos, para condenar o que hou- seguro. Para o sineiro, Amaro conta que Amélia está estudan-
ver de mau na nossa sociedade. do para se tornar freira e que ele a está orientando para essa
QUEIRÓS, Eça de. In: SARAIVA, Antonio José; LOPES, Oscar. História missão sagrada. Amélia engravida, e o cônego Dias, mestre e
da literatura portuguesa. Porto: Porto Editora, 1982. protetor de Amaro, o aconselha a casá-la com João Eduardo,
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para evitar escândalos. Mas João não está mais em Portugal.


Como último recurso, Amélia é encaminhada à casa de dona
Josefa, uma senhora doente que vive no interior. O médico Com o tempo, Basílio vai se desinteressando de Luísa, e ela

27
que cuida de dona Josefa descobre a gravidez de Amélia. cai doente. Nesse período, Jorge encontra uma das cartas
Após o nascimento do filho, a jovem morre, apesar da assis- comprometedoras e pede explicações à esposa. Luísa sofre

252
tência do médico. Amaro deixa o filho com uma ama que tem um choque com o fato de ter sido descoberta e, alguns dias
fama de matar as crianças que lhe são entregues, mas exige depois, morre.
que ela cuide do recém-nascido até que seja encontrada ou- Na terceira fase, que vai de 1888 até a morte de Eça de Quei-
tra pessoa a quem o encaminhar. Mesmo assim, quando volta rós, o escritor renunciou ao pessimismo das análises da socieda-

Língua Portuguesa
a procurá-la, o bebê já está morto. O padre Amaro então es- de que tinha feito na fase anterior, optando pelo otimismo e pela
creve ao cônego contando o que ocorreu, e é transferido para esperança. São dessa época A ilustre casa de Ramires, A corres-
Lisboa, onde continua sua carreira religiosa, assumindo uma pondência de Fradique Mendes e A cidade e as serras.
nova paróquia. A cidade e as serras foi o último romance escrito por Eça
Em Os Maias, a alta sociedade de Lisboa é analisada. O de Queirós, publicado em 1901, um ano depois de sua morte. A
romance gira em torno do caso de incesto que só é revelado história mostra a exaltação inicial da vida na cidade por Jacinto.
no final da história. No entanto, o lugar em que vive, Paris, aos poucos, revela-lhe
Da mesma fase, o romance O primo Basílio trata de um sua futilidade. Saindo de lá, em retorno a Portugal, Jacinto per-
casal burguês, Jorge, funcionário publico, engenheiro de mi- cebe o valor da vida no campo. Leia um trecho em que Eça de
nas, e Luísa, que vive em boas condições financeiras, sem Queirós revela o espaço idílico da parte rural de Portugal.
nenhum problema aparente. Durante a ausência de Jorge,

Linguagens, Códigos e suas Tecnologias


que viaja a trabalho, Luísa recebe a visita de um antigo na- Em fila começamos a subir para a serra. A
morado, seu primo Basílio, que conta a ela fatos de sua vida tarde adoçava o seu esplendor de estio. Uma
fascinante em Paris. Aos poucos, Basílio a seduz, aproveitan- aragem trazia, como ofertados, perfumes das
do-se da tendência sonhadora de Luísa, que espera viver com flores silvestres. As ramagens moviam, com um
ele um grande amor. Eles se tornam amantes e passam a se aceno de doce acolhimento, as suas folhas vivas
encontrar em locais clandestinos. Juliana, a empregada de e reluzentes. Toda a passarinhada cantava, num
Luísa, de posse de algumas cartas trocadas entre Basílio e alvoroço de alegria e de louvor. As águas cor-
sua patroa, passa a chantageá-la, exigindo grande soma em rentes, saltantes, luzidias, despediam um brilho
dinheiro para manter o segredo. Sebastião, um amigo de Luí- mais vivo, numa pressa mais animada. Vidraças
sa, mesmo indignado ao saber do adultério que ela lhe con- distantes de casas amáveis flamejavam com um
fessa, aceita ajudá-la e ameaça Juliana com a prisão se as fulgor de ouro. A serra toda se ofertava, na sua
cartas não forem devolvidas. Juliana, percebendo que perdeu beleza eterna e verdadeira [...].
sua oportunidade de enriquecer, tem uma síncope e morre. QUEIRÓS, Eça de. A cidade e as serras. Belo Horizonte: Vila Rica, 1994.

APRENDER SEMPRE 4

51
Para responder às questões 01 e 02, leia um trecho de O primo Basílio, de Eça de Queirós, em que Luísa conversa com seu
primo, na primeira visita que ele lhe faz, após a viagem do marido dela.

Luísa voltava entre os dedos o seu medalhão de ouro, preso ao pescoço por uma fita de veludo preto.
— E estiveste então um ano em Paris?
— Um ano divino. Tinha um apartamento lindíssimo, que pertencera a Lord Flamouth, rue Saint
Florentin; tinha três cavalos...
E recostando-se muito, com as mãos nos bolsos:
— Enfim, fazer este vale de lágrimas o mais confortável possível!... Dize cá, tens algum retrato nesse
medalhão?
— O retrato de meu marido.
— Ah! Deixa ver!
Luísa abriu o medalhão. Ele debruçou-se; tinha o rosto quase sobre o peito dela. Luísa sentia o aroma
fino que vinha de seus cabelos.
— Muito bem, muito bem! – fez Basílio.
Ficaram calados.
— Que calor que está! – disse Luísa. — Abafa-se, hein!
Levantou-se, foi abrir um pouco uma vidraça. O sol deixara a varanda. Uma aragem suave encheu as
pregas grossas das bambinelas.
— É o calor do Brasil – disse ele. — Sabes que estás mais crescida?
Luísa estava de pé. O olhar de Basílio corria-lhe as linhas do corpo; e com a voz muito íntima, os
cotovelos sobre os joelhos, o rosto erguido para ela:
— Mas, francamente, dize cá, pensaste que eu te viria ver?
— Ora essa! Realmente, se não viesses zangava-me. És o meu único parente... O que tenho pena é
que meu marido não esteja...
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— Eu – acudiu Basílio – foi justamente por ele não estar...
27

Luísa fez-se escarlate. Basílio emendou logo, um pouco corado também:


— Quero dizer... talvez ele saiba que houve entre nós...
252

Ela interrompeu:
— Tolices! Éramos duas crianças. Onde isso vai!
— Eu tinha vinte e sete anos – observou ele, curvando-se.
Ficaram calados, um pouco embaraçados. Basílio cofiava o bigode, olhando vagamente em redor.
— Estás muito bem instalada aqui – disse.
Língua Portuguesa

Não estava mal... A casa era pequena, mas muito cômoda. Pertencia-lhes.
— Ah! Estás perfeitamente! Quem é esta senhora, com uma luneta de ouro?
E indicava o retrato por cima do sofá.
— A mãe de meu marido.
— Ah! Vive ainda?
— Morreu.
— É o que uma sogra pode fazer de mais amável...
Bocejou ligeiramente, fitou um momento os seus sapatos muito aguçados e, com um movimento
brusco, ergueu-se, tomou o chapéu.
— Já? Onde estás?
— No Hotel Central.
Linguagens, Códigos e suas Tecnologias

— E até quando?
— Até quando quiseres.
— Não disseste que vinhas amanhã com o rosário?
Ele tomou-lhe a mão, curvou-se:
— Já se não pode dar um beijo na mão de uma velha prima?
— Por que não?
Pousou-lhe um beijo na mão, muito longo, com uma pressão doce.
— Adeus! – disse.
E à porta com o reposteiro meio erguido, voltando-se:
— Sabes que eu, ao subir as escadas, vinha a perguntar a mim mesmo como se vai isto passar?
— Isto quê? Vermo-nos outra vez? Mas, perfeitamente. Que imaginaste tu?
Ele hesitou, sorriu:
— Imaginei que não eras tão boa rapariga. Adeus. Amanhã, hein?
No fundo da escada acendeu o charuto, devagar.
— Que bonita que ela está! – pensou.
E arremessando o fósforo, com força:
— E eu, pedaço de asno, que estava quase decidido a não a vir ver! Está de apetite! Está muito me-
52

lhor! E sozinha em casa; aborrecidinha talvez!... [...]


Luísa, quando o sentiu embaixo fechar a porta da rua, entrou no quarto, atirou o chapéu para a
causeuse, e foi-se logo ver ao espelho. Que felicidade estar vestida! Se ele a tivesse apanhado em roupão,
ou malpenteada!... Achou-se muito afogueada, cobriu-se de pó de arroz. Foi à janela, olhou um momento a
rua, o sol que batia ainda nas casas fronteiras. Sentia-se cansada. Aquelas horas Leopoldina estava a jantar
já, decerto... Pensou em escrever a Jorge “para matar o tempo”, mas veio-lhe uma preguiça; estava tanto
calor! Depois não tinha que lhe dizer! Começou então a despir-se devagar diante do espelho, olhando-se
muito, gostando de se ver branca, acariciando a finura da pele, com bocejos lânguidos de um cansaço feliz.
Havia sete anos que não via o primo Basílio! Estava mais trigueiro, mais queimado; mas ia-lhe bem!

Vocabulário
Causeuse – pequeno sofá de dois lugares.
Reposteiro – cortinado que se sobrepõe à porta.

01.
Ao receber o primo, Luísa tem entre os dedos o medalhão que contém a foto do marido. Qual o intuito de Basílio ao pedir
para ver a foto?
Resolução
Apesar de o medalhão conter a foto do marido de Luísa, o que poderia reforçar a Basílio o fato de ela ser casada e fazê-lo
se afastar dela, ele usa a desculpa de querer ver a fotografia e aproxima-se da prima.
02.
Após a proximidade do primo, Luísa resolve abrir as janelas, alegando calor. O que o calor significa nesse contexto?
Resolução
O calor de Luísa representa seus sentimentos com relação ao primo.
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252
DIVULGAÇÃO

Língua Portuguesa
Conheça o filme Madame Bovary, produção francesa de 1991, dirigida por
Claude Chabrol. O filme baseia-se no romance homônimo, de Gustave Flaubert,
considerado o marco inicial do Realismo na Europa.

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2. Organizador gráfico
ZYANKARLO / SHUTTERSTOCK

Prosa do Realismo português

53
Eça de Queirós

Primeira fase Terceira fase

Prosas bárbaras A cidade e as serras

Segunda fase

O primo Basílio

Apenas
Tema Tópico Subtópico Subtópico destaque texto Características
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Módulo 58
27

Eça de Queirós I
252

Exercícios de Aplicação
Língua Portuguesa

01. Unicentro-SP [...] o Realismo é uma reação contra o Ro-


A única passagem que não encontra apoio em A cidade e mantismo: o Romantismo era a apoteose do sen-
as serras, de Eça de Queirós, é: timento; o Realismo é a anatomia do caráter. É a
a. Em A cidade e as serras, José Fernandes, de rica famí- crítica do homem. É a arte que nos pinta a nos-
lia proveniente de Guiães, região serrana de Portugal, sos próprios olhos – para condenar o que houver
narra a história de Jacinto de Tormes, seu amigo tam- de mau na nossa sociedade.
bém fidalgo, nascido e criado em Paris. Eça de Queirós
b. A cidade e as serras explora uma grave tese socioló-
gica: o fato de preferirmos viver e proliferar pacifica- Em qual parte do primeiro fragmento se pode perceber
mente nas aldeias a naufragar no estéril tumulto das que o narrador critica os traços românticos de Luísa?
Linguagens, Códigos e suas Tecnologias

cidades. a. “... Luísa vestia-se para ir à casa de Leopoldina.”


c. Para Jacinto, Portugal está associado à infelicidade, b. “Se Jorge soubesse não havia de gostar, não!”
enquanto Paris se associa à felicidade; ao longo do c. “Mas estava tão farta de estar só!”
romance, contudo, essa opinião se modifica. d. “Aborrecia-se tanto!”
d. No romance, dois ambientes distintos são enfocados e. “O que pensava em tolices então!”
ao longo das duas partes em que o livro pode ser divi-
Resolução
dido: a civilização e a natureza.
e. Já avançado em idade, Jacinto se aborrece com as Nessa frase, o narrador critica a propensão ao sentimen-
serras e tenciona reviver as orgias parisienses, mas talismo e ao tédio de Luísa. Essa característica a faz pensar
faltam-lhe, agora, saúde e riqueza. em “tolices”.
Alternativa correta: E
Resolução
A obra A cidade e as serras relata as transformações na 03.
maneira de o protagonista Jacinto encarar o mundo. Inicial- Sobre o romance O primo Basílio, de Eça de Queirós, assi-
mente, ele se encontra inserido na modernidade, vivendo nale a alternativa correta.
em Paris, entusiasta das novidades tecnológicas. Depois de a. É uma obra realista que retoma os ideais românticos
uma crise de “fartura”, muito deprimido, reencontra o prazer para contar da vida conjugal de Jorge e Luísa.
54

de viver nas serras de Tormes, segundo a vida simples que b. Apresenta como tema central o adultério cometido pe-
anteriormente criticava. Essa nova fase conscientiza o prota- los personagens Juliana e Basílio.
gonista dos problemas sociais, levando-o a procurar conciliar c. Critica a pequena burguesia do fim do século XIX em
os avanços tecnológicos e o modo de vida local. Lisboa.
Alternativa correta: E d. Critica a Igreja e sua influência sobre a personagem
Luísa, que se aliena da vida real.
e. Critica a maneira como o verdadeiro amor é reprimido
02. Sistema COC pela falsa moral da sociedade.
Leia os fragmentos de textos e responda à questão.
Resolução
Havia doze dias que Jorge tinha partido e, A obra ironiza os ideais românticos; o adultério se dá
apesar do calor e da poeira, Luísa vestia-se para entre Luísa e Basílio; Luísa não se mostra como religiosa, e
ir à casa de Leopoldina. Se Jorge soubesse não a Igreja não aparece como entidade relevante no desenvolvi-
havia de gostar, não! Mas estava tão farta de es- mento das ações dos personagens; o caso entre Luísa e Ba-
tar só! Aborrecia-se tanto! De manhã ainda tinha sílio não é um caso de amor, mas de sedução e realização de
os arranjos, a costura, a toilette, algum romance... desejos reprimidos.
Mas de tarde! Alternativa correta: C
À hora em que Jorge costumava voltar do Habilidade
ministério, a solidão parecia alargar-se em torno Perceber a presença dos diferentes elementos que es-
dela. Fazia-lhe tanta falta o seu toque de campa- truturam o texto narrativo literário de Eça de Queirós: perso-
inha, os seus passos no corredor!... nagens, marcadores de tempo e de localização, sequência
Ao crepúsculo, ao ver cair o dia, entristecia-se lógica dos fatos narrados, modos de narrar (1ª e 3ª pessoa);
sem razão, caía numa vaga sentimentalidade: [...] adjetivação na caracterização de personagens, cenários e ob-
O que pensava em tolices então! jetos.
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Eça de Queirós, O primo Basílio.


Exercícios Extras

27
04. a. apresenta um narrador que se recorda de uma viagem

252
Sobre o romance O primo Basílio, de Eça de Queirós, assi- feita há algum tempo ao Oriente Médio, à Terra Santa,
nale a alternativa correta. de onde deveria trazer uma relíquia para uma tia ve-
a. Jorge é um personagem romântico; Luísa é realista e lha, beata e rica.
dominadora. b. caracteriza uma narrativa em que se analisam os me-

Língua Portuguesa
b. Jorge, ao perceber que está sendo traído, vinga-se de canismos do casamento e o comportamento da pe-
Basílio. quena burguesia da cidade de Lisboa.
c. Luísa, mulher romântica, deixa-se seduzir por Basílio, c. apresenta uma personagem que detesta inicialmente
acreditando que viverá com ele um grande amor. a vida do campo, aderindo ao desenvolvimento tec-
d. Basílio conhece Luísa por meio de Jorge, que o apre- nológico da cidade, mas que ao final regressa à vida
senta à esposa sem imaginar que essa convivência se campesina e a transforma com a aplicação de seus
tornaria uma paixão incontida. conhecimentos técnicos e científicos.
e. Luísa começa a trair o marido por se sentir entediada d. revela uma narrativa cujo enredo envolve a vida de-
e, numa dessas aventuras, conhece Basílio, seu gran- vota da província e o celibato clerical e caracteriza a
de amor. situação de decadência e alienação de Leiria, toman-
do-a como espelho da marginalização de todo o país

Linguagens, Códigos e suas Tecnologias


05. PUC-SP em relação ao contexto europeu.
O romance A cidade e as serras, de Eça de Queirós, publi- e. se desenvolve em duas linhas de ação: uma marcada
cado em 1901, é o desenvolvimento de um conto chamado por amores incestuosos; outra voltada para a análise
“Civilização”. Do romance, pode-se afirmar que: da vida da alta burguesia lisboeta.

Seu espaço
Sobre o módulo Estante
Incentive os alunos a lerem textos de Eça de Queirós. Ini- MARCATTI. A relíquia. São Paulo: Conrad, 2007.
cialmente, uma maneira interessante de eles estabelecerem Trata-se de uma adaptação para história em quadrinhos
contato com a obra do autor é ler adaptações para história em da obra A relíquia, de Eça de Queirós.
quadrinhos.

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Exercícios Propostos
27

Da teoria, leia o tópico 1. 09. Sistema COC


252

Exercícios de tarefa reforço aprofundamento Assinale a alternativa que se relaciona ao texto.


a. O romance realista adota ponto de vista crítico com re-
lação ao comportamento das classes sociais.
06. b. No fim do século XIX, a ficção opõe-se aos princípios
Língua Portuguesa

Sobre o romance O primo Basílio, de Eça de Queirós, assi- cientificistas, revalorizando os valores espiritualistas.
nale a alternativa incorreta. c. O escritor realista caracteriza-se pela linguagem vul-
a. A obra não romantiza a paixão entre Jorge e Luísa; ao gar com que critica a hipocrisia romântica.
contrário, ironiza a hipocrisia que é típica dos meios d. Para o autor realista, a decadência dos valores da so-
burgueses da época. ciedade burguesa deveria ser combatida com exem-
b. O Romantismo é criticado na personagem Luísa, cheia plos de conduta moral e religiosa.
de futilidades e devaneios. e. O Realismo denuncia a degradação da aristocracia, tra-
c. Luísa se sente seduzida por Basílio, que a encanta tando da sociedade estabelecida, sem a necessidade
contando histórias e vivências de Paris. de descrever traços psicológicos das personagens.
d. Luísa é influenciada por ideias românticas, e sua inge-
nuidade facilita o objetivo de Basílio, que é seduzi-la. 10. Poli-SP
Linguagens, Códigos e suas Tecnologias

e. Juliana, a empregada, sente ciúmes de Luísa e tenta Leia o trecho do romance O primo Basílio, de Eça de Quei-
impedir seu relacionamento com Basílio. rós, que descreve a personagem Juliana, e responda à questão.

07. A necessidade de se constranger trouxe-lhe o


hábito de odiar: odiou sobretudo as patroas, com
A personagem da criada Juliana, do romance O primo Basílio: um ódio irracional e pueril. Tivera-as ricas, com
a. representa a classe trabalhadora submissa, que se palacetes, e pobres, mulheres de empregados, ve-
contenta com sua condição. lhas e raparigas, coléricas e pacientes; – odiava-as
b. é uma pessoa ressentida, que vê na chantagem uma a todas, sem diferença. É patroa e basta! pela mais
oportunidade de enriquecer. simples palavra, pelo ato mais trivial! Se as via
c. é uma mulher vingativa, que tenta prejudicar seu pa- sentadas: — Anda, refestela-te, que a moura tra-
trão, Jorge. balha! Se as via sair: — Vai-te, a negra cá fica no
d. é uma heroína romântica, batalhadora e incansável. buraco! Cada riso delas era uma ofensa à sua tris-
e. é uma jovem ignorante, usada por Luísa para escon- teza doentia; cada vestido novo uma afronta ao
der seu adultério. seu velho vestido de merino tingido. Detestava-as
na alegria dos filhos e nas propriedades da casa.
Leia o fragmento de texto de Eça de Queirós e responda Rogava-lhes pragas. Se os amos tinham um dia de
às questões 08 e 09. contrariedade, ou via as caras tristes, cantarolava
56

todo o dia em voz de falsete a “Carta Adorada!”


A Marquesa de Alegros ficara viúva aos quarenta Com relação ao texto, assinale a alternativa incorreta.
e três anos e passava a maior parte do ano retirada na a. Juliana trabalha na casa de Luísa e Jorge, e esse trecho
sua quinta de Carcavelos. Era uma pessoa passiva, de retrata como se sente injustiçada por sua condição social.
bondade indolente, com capela em casa, um respeito b. No trecho “A necessidade de se constranger trouxe-lhe
devoto pelos padres de S. Luís, sempre preocupada o hábito de odiar ...”, podemos observar o pensamento
dos interesses da igreja. As suas duas filhas, educadas determinista, uma vez que a condição social de Julia-
no receio do céu e nas preocupações da moda, eram na a obriga a servir aos outros e, em consequência,
beatas e faziam o chic falando com igual fervor da hu- passa a odiar os patrões.
mildade cristã e do último figurino de Bruxelas. Um c. Em “... cada vestido novo uma afronta ao seu velho
jornalista de então dissera delas: — Pensam todos os vestido de merino tingido.”, notamos o olhar do narra-
dias na toilette com que hão de entrar no paraíso. dor, que, por meio desse jogo de oposições, chama a
atenção para a injustiça social.
08. Sistema COC d. No trecho “É patroa e basta!”, poderíamos imaginar que
Sobre o texto, é correto afirmar que: a voz de Juliana se mistura ao discurso do narrador.
a. o narrador enaltece o comportamento recatado e a re- e. Em “... cantarolava todo o dia em voz de falsete a ‘Carta
ligiosidade das filhas da Marquesa. Adorada!”’, o nome da música foi escolhido aleatoria-
b. o jornalista apoia, com admiração, o esmero e a ele- mente e não apresenta relação com o destino da per-
gância com que se vestem as moças da burguesia. sonagem.
c. o narrador assume ponto de vista imparcial com re-
lação ao comportamento das moças, mas condena, 11.
implicitamente, o jornalista. O romance O crime do padre Amaro, de Eça de Queirós,
d. o narrador e o jornalista assumem pontos de vista se- trata de:
melhantes com relação ao modo de ser das moças. a. um amor proibido entre um padre e uma mulher casada.
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e. a fala do jornalista pressupõe um total desinteresse da b. uma relação erótica entre um padre e uma jovem in-
mídia pela vida de pessoas da classe rica da sociedade. teriorana.
c. um crime de pedofilia que escandaliza a alta hierar- Leia o fragmento do romance O primo Basílio, de Eça de

27
quia da Igreja. Queirós, referente à personagem Luísa, e responda às ques-
d. um assassinato encoberto pela Igreja do século XIX, tões de 14 a 16.

252
envolvendo a classe burguesa.
Lia muitos romances; tinha uma assinatura, na
e. um caso de corrupção envolvendo a Igreja e a burgue-
Baixa, ao mês. Em solteira, aos dezoito anos, entu-
sia portuguesa do século XIX.
siasmara-se por Walter Scott e pela Escócia; deseja-
ra então viver num daqueles castelos escoceses, que

Língua Portuguesa
12.
têm sobre as ogivas os brasões do clã, mobilados
A personagem Amélia, do romance O crime do padre Ama-
com arcas góticas e troféus de armas, forrados de
ro, de Eça de Queirós:
largas tapeçarias, onde estão bordadas legendas he-
a. vive um amor proibido, pelo fato de ser uma mulher
roicas, que o vento do lago agita e faz viver; e amara
casada.
Ervandalo, Morton e Ivanhoé, ternos e graves, ten-
b. deixa o convento para se unir ao jovem padre por
do sobre o gorro a pena de águia, presa ao lado pelo
quem se apaixona.
cardo de Escócia de esmeraldas e diamantes. [...]
c. é uma mulher atraente, que seduz o jovem padre em Ia encontrar Basílio no Paraíso pela primeira
início de carreira. vez. E estava muito nervosa: não pudera domi-
d. é seduzida pelo padre de sua paróquia, que se encon- nar, desde pela manhã, um medo indefinido que
tra com ela clandestinamente.

Linguagens, Códigos e suas Tecnologias


lhe fizera pôr um véu muito espesso, e bater o
e. encontra-se secretamente com o padre de sua paró- coração ao encontrar Sebastião. Mas ao mesmo
quia, com o apoio da mãe, que a protege. tempo uma curiosidade intensa, múltipla, impe-
lia-a, com um estremecimentozinho de prazer.
13. UEL-PR Ia, enfim, ter ela própria aquela aventura que lera
Leia o fragmento de texto de Eça de Queirós e responda tantas vezes nos romances amorosos! Era uma for-
à questão. ma nova do amor que ia experimentar, sensações
excepcionais! Havia tudo – a casinha misteriosa, o
Então, passeando excitado pelo quarto, levava segredo ilegítimo, todas as palpitações do perigo!
as suas acusações mais longe, contra o Celibato e a
Igreja: por que proibia ela aos seus sacerdotes, ho- 14. FGV
mens vivendo entre homens, a satisfação mais na- Estão conjugados no mesmo tempo, mas se referem a di-
tural, que até têm os animais? Quem imagina que, ferentes períodos da vida de Luísa, os verbos destacados em:
desde que um velho bispo diz “serás casto” a um a. “Lia muitos romances...” e “... tinha uma assinatura...”.
homem novo e forte, o seu sangue vai subitamente b. “... entusiasmara-se por Walter Scott...” e “... desejara
esfriar-se? E que uma palavra latina – accedo – dita então viver...”.
a tremer pelo seminarista assustado será o bastan- c. “... que têm sobre as ogivas...” e “...onde estão bordadas...”.
te para conter para sempre a rebelião formidável d. “... Ia encontrar Basílio...” e “...que ia experimentar...”.

57
do corpo? E quem inventou isso? Um concílio e. “... que lhe fizera pôr...” e “...que lera tantas vezes...”.
de bispos decrépitos, vindos do fundo dos seus
claustros, da paz das suas escolas, mirrados como 15. FGV
pergaminhos, inúteis como eunucos! Que sabiam Das características da escola literária a que pertence
eles da Natureza e das suas tentações? Que vies- esse romance, a mais perceptível no fragmento é a apresen-
sem ali duas, três horas para o pé da Ameliazinha, tada na alternativa:
e veriam, sob a sua capa de santidade, começar a a. O homem está submetido às mesmas leis universais
revoltar-se-lhes o desejo! Tudo se ilude e se evita, que os demais seres vivos.
menos o amor! E se ele é fatal, por que impediram b. Assim como o cientista, o ficcionista pretende provar
então que o padre o sinta, o realize com pureza e com sua obra uma teoria.
com dignidade? É melhor talvez que o vá procurar c. As massas emergiram ao plano histórico, buscando a
pelas vielas obscenas! Porque a carne é fraca! posse dos progressos materiais e políticos.
d. O sentimentalismo e a imaginação podem ser fatores
Este trecho é o pensamento do padre Amaro Vieira, prota- condicionantes das atitudes humanas.
gonista do romance O crime do padre Amaro. É correto afirmar e. A arte pode ser um instrumento para a reforma das
que, no texto, o escritor registra: condições sociais.
a. a burguesia degenerada a conduzir a formação dos
padres católicos. 16.
b. a noção comum de que o pecado da carne é o único De acordo com o fragmento, Luísa pode ser vista como
aceitável entre os religiosos. uma personagem:
c. a percepção científica de que homens e animais são dife- a. vulnerável a fantasias românticas.
rentes porque aqueles são educados pela moral religiosa. b. bem adaptada à rotina da vida conjugal.
d. o traço determinista do positivismo de Auguste Comte, c. influenciável pelo modismo da sociedade burguesa.
admitindo a motivação sexual como algo comum a todos. d. inquieta e nostálgica, leitora de romances antigos.
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e. a promiscuidade das vielas obscenas como o pecado e. promíscua e dominadora, com forte influência sobre
a afligir os padres jovens. o marido.
Módulo 59
27

Eça de Queirós II
252

Exercícios de Aplicação
Língua Portuguesa

Leia o fragmento da carta do poeta Antero de Quental ao 03. PUC-SP (adaptado)


escritor Eça de Queirós, sobre seu romance O crime do padre Indique a alternativa que não condiz com o romance
Amaro, e responda às questões 01 e 02. O primo Basílio, de Eça de Queirós.
a. É uma obra realista que retoma os ideais românticos
A longanimidade, a indiferença inteligente para contar da vida conjugal de Jorge e Luísa.
com que V. descreve aquela pobre gente e os b. Apresenta como tema central o adultério, nas perso-
seus casos encantou-me. Com efeito, aquela nagens de Luísa e Basílio.
gente não merece ódio nem desprezo. Aquilo, c. Mostra-se como uma lente de aumento sobre a inti-
no fundo, é uma pobre gente, uma boa gente, midade das famílias e revela criticamente a pequena
vítimas da confusão moral do meio de que nas- burguesia do fim do século XIX em Lisboa.
Linguagens, Códigos e suas Tecnologias

ceram, fazendo o mal inocentemente, em parte d. Ataca instituições sociais como a família, a Igreja, a es-
porque não entendem mais nem melhor, em par- cola e o Estado, sempre com a preocupação de fazer
te porque os arrasta a paixão, o instinto, como um vasto inquérito da sociedade portuguesa e morali-
pobres seres espontâneos, sem a menor trans- zar os costumes da época.
cendência. e. Caracteriza-se por ironia fina e humor na composição
das personagens.
Vocabulário
Longanimidade – generosidade, paciência.
Resolução
01. Unicamp-SP Eça de Queirós não realiza crítica à escola em sua obra
Em qual ato reside o “crime” do padre Amaro? O primo Basílio.
Alternativa correta: D
Resolução Habilidade
O “crime” do padre Amaro reside na entrega do filho bas- Relacionar características discursivas e ideológicas de
tardo, que teve com Amélia, para uma ama de leite. A quebra obras realistas em prosa ao contexto histórico de sua produ-
dos votos, o cinismo e o assassinato são uma série de trans- ção, circulação e recepção.
gressões feitas pelo padre.
58

02.
Explique se a carta de Antero de Quental critica o romance
de Eça de Queirós ou se compactua com ele.
Resolução
A carta elogia a maneira como Eça de Queirós apresenta
as personagens do povo mais simples, que, segundo Quental,
não podem ser responsabilizadas por suas ações, visto que
são produto da confusão moral de seu meio.
EMI-15-10
Exercícios Extras

27
04. UEL-PR deliciosa em ser assim levada rapidamente para o

252
Sobre a forma encontrada por Eça de Queirós, no roman- seu amante, e mesmo olhava com certo desdém
ce O primo Basílio, para criticar a sociedade burguesa de Lis- os que passavam, no movimento da vida trivial
boa, é correto afirmar: – enquanto ela ia para uma hora tão romanesca
a. A crítica encontra-se espalhada por todo o romance, da vida amorosa! Todavia à maneira que se apro-

Língua Portuguesa
presente nos comentários do narrador e na forma de ximava vinha-lhe uma timidez, uma contração de
pensar e agir das personagens. acanhamento, como um plebeu que tem de su-
b. A crítica está presente nas reflexões realistas da per- bir, entre alabardeiros solenes, a escadaria de um
sonagem Luísa sobre seu casamento e sua posição palácio. Imaginava Basílio esperando-a estendido
na sociedade. num divã de seda; e quase receava que a sua sim-
c. Juliana é a personagem responsável pela crítica do plicidade burguesa, pouco experiente, não achas-
escritor à sociedade, ao revelar para Jorge que sua se palavras bastante finas ou carícias bastante
mulher o trai. exaltadas. Ele devia ter conhecido mulheres tão
d. A crítica aparece nos debates dos grupos políticos de belas, tão ricas, tão educadas no amor! Desejava
Lisboa que frequentam as igrejas protestantes. chegar num cupê seu, com rendas de centos de
e. Basílio é a personagem que representa a crítica aos mil réis, e ditos tão espirituosos como um livro...

Linguagens, Códigos e suas Tecnologias


valores burgueses, visto que se posiciona a favor da A carruagem parou ao pé de uma casa amare-
liberdade amorosa dos casais. lada, com uma portinha pequena. Logo à entrada
um cheiro mole e salobre enojou-a. A escada, de
Leia o fragmento da obra O primo Basílio, de Eça de Quei- degraus gastos, subia ingrememente, apertada
rós, e responda às questões de 05 a 08. entre paredes onde a cal caía, e a umidade fize-
ra nódoas. No patamar da sobreloja, uma janela
Ia encontrar Basílio no Paraíso pela primeira com um gradeadozinho de arame, parda do pó
vez. E estava muito nervosa: não pudera dominar, acumulado, coberta de teias de aranha, coava a
desde pela manhã, um medo indefinido que lhe luz suja do saguão. E, por trás de uma portinha,
fizera pôr um véu muito espesso, e bater o cora- ao lado, sentia-se o ranger de um berço, o chorar
ção ao encontrar Sebastião. Mas ao mesmo tempo doloroso de uma criança.
uma curiosidade intensa, múltipla, impelia-a, com Mas Basílio desceu logo, com o charuto na
um estremecimentozinho de prazer. Ia, enfim, ter boca, dizendo baixo:
ela própria aquela aventura que lera tantas vezes — Tão tarde! Sobe! Pensei que não vinhas. O
nos romances amorosos! Era uma forma nova do que foi?
amor que ia experimentar, sensações excepcionais! A escada era tão esguia que não podiam subir
Havia tudo – a casinha misteriosa, o segredo ilegíti- juntos. E Basílio, caminhando adiante, de esguelha:

59
mo, todas as palpitações do perigo! Porque o apa- — Estou aqui desde a uma hora, filha! Imagi-
rato impressionava-a mais que o sentimento; e a nei que te tinhas esquecido da rua...
casa em si interessava-a, atraía-a mais que Basílio! Empurrou uma cancela, fê-la entrar num quarto
Como seria? Era para os lados de Arroios, adiante pequeno, forrado de papel às listras azuis e brancas.
do Largo de Santa Bárbara; lembrava-se vagamen- Luísa viu logo, ao fundo, uma cama de ferro
te que havia ali uma correnteza de casas velhas... com uma colcha amarelada, feita de remendos
Desejaria antes que fosse numa quinta, com arvo- juntos de chitas diferentes; e os lençóis grossos,
redos murmurosos e relvas fofas; passeariam as de um branco encardido e mal lavado, estavam
mãos enlaçadas, num silêncio poético; e depois impudicamente entreabertos...
o som da água que cai nas bacias de pedra daria Fez-se escarlate, sentou-se, calada, embaraça-
um ritmo lânguido aos sonhos amorosos... Mas da. E os seus olhos, muito abertos, iam-se fixan-
era num terceiro andar – quem sabe como seria do – nos riscos ignóbeis da cabeça dos fósforos,
dentro? Lembrava-lhe um romance de Paulo Féval ao pé da cama; na esteira esfiada, comida, com
em que o herói, poeta e duque, forra de cetins e uma nódoa de tinta entornada; nas bambinelas da
tapeçarias o interior de uma choça; encontra ali a janela, de uma fazenda vermelha, onde se viam
sua amante; os que passam, vendo aquele casebre passagens; numa litografia, onde uma figura, co-
arruinado, dão um pensamento compassivo à mi- berta de uma túnica azul flutuante, espalhava flo-
séria que decerto o habita – enquanto dentro, mui- res voando... Sobretudo uma larga fotografia, por
to secretamente, as flores se esfolham nos vasos cima do velho canapé de palhinha, fascinava-a:
de Sèvres e os pés nus pisam gobelins veneráveis! era um indivíduo atarracado, de aspecto hílare e
Conhecia o gosto de Basílio – e o Paraíso decerto alvar, com a barba em colar, o feitio de um piloto
era como no romance de Paulo Féval. ao domingo; sentado, de calças brancas, com as
Mas no Largo de Camões reparou que o sujei- pernas muito afastadas, pousava uma das mãos
to de pêra comprida, o do Passeio, a vinha seguin- sobre um joelho, e a outra, muito estendida, as-
EMI-15-10

do, com uma obstinação de galo; tomou logo um sentava sobre uma coluna truncada; e, por baixo
cupê. E ao descer o Chiado, sentia uma sensação do caixilho, como sobre a pedra de um túmulo,
pendia de um prego de cabeça amarela uma co- criança doente que tinha crostas grossas de cha-
27

roa de perpétuas! gas na sua cabecinha cor de melão.


— Foi o que se pôde arranjar – disse-lhe Ba- Luísa mordia os beiços; sentia-se entristecer.
252

sílio. — E foi um acaso; é muito retirado, é muito Então nós de dedos bateram discretamente à
discreto... Não é muito luxuoso... porta. Ela assustou-se, desceu rapidamente o véu.
— Não – fez ela, baixo. Levantou-se, foi à Basílio foi abrir. Uma voz adocicada, cheia de ss
janela, ergueu uma ponta da cortininha de cas- melífluos, ciciou baixo. Luísa ouviu vagamente:
Língua Portuguesa

sa fixada à vidraça; defronte eram casas pobres; — Sossegadinhos, suas chavezinhas...


um sapateiro grisalho batia a sola a uma porta; à
entrada de uma lojita balouçava-se um ramo de 05. Sistema COC
carqueja ao pé de um maço de cigarros penden- Que sensações Luísa experimentava antes de chegar ao
tes de um barbante; e, a uma janela, uma rapariga Paraíso?
esguedelhada embalava tristemente no colo uma

Seu espaço
Sobre o módulo Cinemateca
Linguagens, Códigos e suas Tecnologias

Leia com os alunos um trecho de O primo Basílio. Indique aos alunos o filme O primo Basílio, produção na-
Conte-lhes que, quando Juliana, que trabalha na casa de Luí- cional de 2007, dirigida por Daniel Filho.
sa, descobre sua traição, começa a chantageá-la e exige que
a patroa cumpra os afazeres domésticos em seu lugar.

Exercícios Propostos

Da teoria, leia o tópico 1. 10.


Exercícios de tarefa reforço aprofundamento Em O crime do padre Amaro, de Eça de Queirós, como é
solucionado o problema do filho recém-nascido do padre, já
que Amélia morre em consequência do parto?
06. Sistema COC
O que levou Luísa a “pôr um véu muito espesso”? 11. Vunesp
Leia o fragmento do romance O primo Basílio, de Eça de
07. Sistema COC Queirós, e responda à questão.
A obra de que foi extraído o fragmento trata da aparência
versus a essência, temática comum nas obras realistas. So- Bom Deus, Luísa começava a estar menos co-
60

bre o local do encontro de Luísa e Basílio, ocorre uma oposi- movida ao pé do seu amante, do que ao pé do seu
ção entre o devaneio da personagem e a realidade. Explique marido! Um beijo de Jorge perturbava-a mais, e
essa oposição. viviam juntos havia três anos! Nunca se secara ao
pé de Jorge, nunca! E secava-se positivamente ao
08. Sistema COC pé de Basílio! Basílio, no fim, o que se tornara para
Comente o trecho “[...] e a casa em si interessava-a, atraía- ela? Era como um marido pouco amado, que ia
-a mais que Basílio!”. amar fora de casa! Mas então valia a pena?
Onde estava o defeito? No amor mesmo tal-
09. Uniban-SP (adaptado) vez! Porque, enfim, ela e Basílio estavam nas
Por meio dos personagens de O primo Basílio, Eça de condições melhores para obterem uma felicidade
Queirós, sendo fiel às teses realistas, critica a sociedade de excepcional: eram novos, cercava-os o mistério,
seu tempo. Assinale a alternativa em que a caracterização do excitava-os a dificuldade... Por que era então que
personagem não ganha dimensão de crítica social. quase bocejavam? É que o amor é essencialmen-
a. Luísa é o protótipo da mulher burguesa que, por alimen- te perecível, e na hora em que nasce começa a
tar sonhos, frustra-se com a vida conjugal entediante. morrer. Só os começos são bons. Há então um
b. Jorge, funcionário público, orienta-se por princípios delírio, um entusiasmo, um bocadinho do céu.
conservadores e preocupa-se com a preservação das Mas depois!... Seria pois necessário estar sempre
aparências. a começar, para poder sempre sentir? E, pela lógi-
c. Juliana é uma pessoa ressentida por sua condição so- ca tortuosa dos amores ilegítimos, o seu primeiro
cial e vê nas circunstâncias que se formam uma chan- amante fazia-a vagamente pensar no segundo!
ce de ganhar dinheiro.
d. Basílio é um homem sedutor, que se aproveita da vulne- O amor é visto, predominantemente, como um sentimento:
rabilidade de Luísa para conduzi-la a encontros eróticos. a. eterno, pois Luísa não deixa de amar seu marido, Jor-
e. Tanto Jorge quanto Basílio sabem lidar com as opor- ge, apesar da distância que os separa.
EMI-15-10

tunidades de conquistar mulheres, que eles cativam b. passageiro e frágil, pois, para Luísa, só os começos
pelo poder do discurso bem articulado. são bons.
c. intenso, pois Luísa se mostra profundamente dividida 15. Fuvest-SP

27
entre o amor de Basílio e Jorge. Leia o fragmento de A ilustre casa de Ramires, de Eça de
d. terno e carinhoso, como se pode notar na boa lem- Queirós, e responda à questão.

252
brança que Luísa tem do beijo de Jorge.
e. sofrido, pois Luísa e Jorge sofrem por se amarem de- As duas manas Lousadas! Secas, escuras e gár-
mais e por não poderem ficar juntos. rulas como cigarras, desde longos anos, em Oli-
veira, eram elas as esquadrinhadoras de todas as

Língua Portuguesa
12. PUC-SP (adaptado) vidas, as espalhadoras de todas as maledicências,
A obra O primo Basílio, escrita por Eça de Queirós em as tecedeiras de todas as intrigas. E, na desditosa
1878, é considerada uma das mais representativas do ro- cidade, não existia nódoa, pecha, bule rachado,
mance realista português. Assinale a alternativa que não con- coração dorido, algibeira arrasada, janela entrea-
firma o conteúdo desse romance. berta, poeira a um canto, vulto a uma esquina,
a. Esse romance de tese apresenta os mecanismos do bolo encomendado nas Matildes, que seus olhi-
casamento e analisa o comportamento da pequena nhos furantes de azeviche sujo não descortinas-
burguesia de Lisboa. sem e que sua solta língua, entre os dentes ralos,
b. Luísa, personagem central do romance, é caracteriza- não comentasse com malícia estridente.
da como uma mulher romântica, sonhadora e frágil,
comportamento que a predispõe ao adultério. No texto, o emprego de artigos definidos e a omissão de

Linguagens, Códigos e suas Tecnologias


c. O narrador do romance aproxima-se bastante do mo- artigos indefinidos têm como efeito, respectivamente:
delo proposto pela literatura realista, que se caracteri- a. atribuir às personagens traços negativos de caráter;
za pela objetividade e pelo senso da minúcia. apontar Oliveira como cidade onde tudo acontece.
d. Juliana, a empregada, é solidária a Luísa e a ajuda a escon- b. acentuar a exclusividade do comportamento típico
der o caso extraconjugal que a patroa tem com o primo. das personagens; marcar a generalidade das situa-
e. Basílio, personagem que dá título ao romance, não se ções que são objeto de seus comentários.
compromete nem se envolve emocionalmente; ape- c. definir a conduta das duas irmãs como criticável; colo-
nas busca na aventura amorosa uma maneira agradá- cá-las como responsáveis pela maioria dos aconteci-
vel de ocupar o tempo. mentos na cidade.
d. particularizar a maneira de ser das manas Lousadas; si-
13. UFPI tuá-las numa cidade onde são famosas pela maledicência.
Um traço estético presente em O primo Basílio, de Eça de e. associar as ações das duas irmãs; enfatizar seu livre
Queirós, é: acesso a qualquer ambiente na cidade.
a. linguagem fortemente descritiva.
b. linguagem contida, sem detalhes. 16. UFMA
c. emprego de recursos gráficos. Eça de Queirós, em O primo Basílio, sustenta como uma de
d. linguagem introspectiva. suas teses a crítica ao movimento romântico, como na descri-

61
e. linguagem cinematográfica. ção de um dos personagens, o literato Ernesto Ledesma:

14. UFPR Pequenino, linfático, os seus membros franzi-


nos, ainda quase tenros, davam-lhe um aspecto
Eça de Queirós afirmava:
débil de colegial; o buço, delgado, empastado em
O Realismo é a anatomia do caráter. É a crítica cera-moustache arrebitava-se aos cantos em pontas
do homem. É a arte que nos pinta a nossos pró- afiadas como agulhas; e na cara chupada, os olhos re-
prios olhos – para nos conhecermos, para que sai- polhudos amorteciam-se com um quebrado langoroso.
bamos se somos verdadeiros ou falsos, para con-
Nessa descrição, a crítica ao Romantismo evidencia-se
denar o que houver de mau na nossa sociedade.
com o emprego de:
Para realizar essa proposta literária, quais os recursos a. atributos que elevam a condição moral de Ernesto Le-
utilizados no discurso realista? desma, como “membros quase tenros”, “buço delga-
Considere esta relação e assinale a alternativa correta. do” e “aspecto de colegial”.
I. Preocupação revolucionária, atitude crítica e de combate b. adjetivos depreciativos como “linfático”, “pequenino”
II. Imaginação criadora e “débil”, além da imagem conotativa representada
III. Personagens frutos de observação; tipos concretos e vivos pelo “buço que se arrebitava aos cantos em pontas
IV. Linguagem natural, sem rebuscamentos afiadas como agulhas”.
V. Preocupação com mensagem que revela concepção c. verbos no pretérito imperfeito, como “davam-lhe”, “ar-
materialista do homem rebitava-se” e “amorteciam-se”, sugerindo a continui-
VI. Senso de mistério dade da ação que começou no passado.
VII. Retorno ao passado d. elipses verbais, com o intuito de tornar o texto mais
VIII. Determinismo biológico ou social enxuto e preciso, satisfazendo, assim, uma das carac-
a. I, II, III, V, VII e VIII d. III, IV, V, VI e VIII terísticas do Realismo: a objetividade.
b. I, III, IV, V e VIII e. II, III, IV, V e VII e. metáforas e comparações inusitadas, como “olhos
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c. II, III, IV, V e VIII repolhudos” e “pontas afiadas como agulhas”, na ten-
tativa de enaltecer o caráter do personagem escritor.
Módulo 60
27

Eça de Queirós III


252

Exercícios de Aplicação
Língua Portuguesa

01. Mackenzie-SP 03. Mackenzie-SP


Assinale a alternativa correta. Em texto sobre O primo Basílio, de Eça de Queirós, Macha-
a. A prosa realista, com intuito moralizador, desmascara do de Assis afirma: “[...] o tom carregado das tintas, que nos
o casamento por interesse, tão comum no século XIX, assusta, para ele é simplesmente o tom próprio.”. Assinala
para defender uma relação amorosa autêntica, segun- que o escritor português já provocara a admiração dos leito-
do princípios filosóficos do platonismo. res com O crime do padre Amaro e acrescenta: “Pois que havia
b. A prosa romântica analisa mais profundamente a na- de fazer a maioria, senão admirar a fidelidade de um autor que
tureza humana, evitando a apresentação de caracte- não esquece nada e não oculta nada? Porque a nova poética
res padronizados em termos de paixões, virtudes e é isto, e só chegará à perfeição no dia em que nos disser o
defeitos. número exato dos fios de que se compõe um lenço de cam-
Linguagens, Códigos e suas Tecnologias

c. A prosa realista põe em cena personagens tipificados braia ou um esfregão de cozinha.”.


que, metamorfoseados em heróis valorosos, corres- Deve-se compreender as palavras destacadas como:
pondem à expressão da consciência e de valores co- a. elogio, sem ironia, a uma prática inovadora que mere-
letivos. ceria ser adotada pelos autores realistas brasileiros.
d. A prosa realista, apoiando-se em teorias cientificistas b. recusa do Realismo entendido como reprodução foto-
do século XIX, empreende a análise de instituições gráfica, que não distingue a relevância dos detalhes
burguesas, como o casamento, por exemplo, denun- que mereceriam ser enfocados.
ciando as bases frágeis dessa união. c. crítica à velha poética, que, mais sutil, mais sugeria do
e. A prosa romântica recria o passado histórico com o in- que explicitava, negando-se a descrições detalhadas.
tuito de ironizar os mitos nacionais. d. negação dos procedimentos típicos dos escritores
românticos, que, evitando a observação da realidade,
Resolução
em nada podiam contribuir para a formação da cons-
As obras realistas apresentam crítica social, que busca ciência da nacionalidade.
desnudar as mazelas da burguesia e do clero. O adultério e a e. elogio ao público pelo reconhecimento do valor do es-
união por interesse são denunciados. critor português, fiel à descrição e à avaliação da so-
Alternativa correta: D ciedade burguesa que retrata em suas obras.
62

Resolução
O comentário de Machado demonstra que ele não aceita-
02. UFRGS-RS va a maneira como Eça de Queirós usava as descrições, em
Considere o enunciado e as três possibilidades para com- qualquer situação.
pletá-lo e assinale a alternativa correta. Alternativa correta: B
Em A cidade e as serras, de Eça de Queirós, percebe-se Habilidade
uma: Relacionar características discursivas e ideológicas de
I. visão irônica da modernidade e do progresso median- obras realistas em prosa ao contexto histórico de sua produ-
te descrições de inventos reais e fictícios; ção, circulação e recepção.
II. consciência dos conflitos que a vida moderna traz aos
indivíduos que vivem nas grandes cidades;
III. mudança progressiva quanto ao modo de valorizar a
vida junto à natureza, percebendo seus benefícios.
a. Somente I está correta.
b. Somente II está correta.
c. Somente III está correta.
d. Somente I e II estão corretas.
e. I, II e III estão corretas.
Resolução
Todas as afirmações correspondem ao que apresenta o
romance A cidade e as serras.
Alternativa correta: E
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Exercícios Extras

27
04. UFV-MG d. O Realismo foi marcado por forte espírito crítico e as-

252
Leia o fragmento de texto de Eça de Queirós e responda sumiu atitude mais combativa diante dos problemas
à questão. sociais contemporâneos.
e. O sentido de observação e análise vigente no Realis-
O Romantismo era a apoteose do sentimento; mo exigiu do escritor postura racional e crítica diante

Língua Portuguesa
o Realismo é a anatomia do caráter. É a crítica do das contradições do homem como ser social.
homem. É a arte que nos pinta a nossos próprios
olhos – para nos conhecermos, para que saiba- 05. UFRS
mos se somos verdadeiros ou falsos, para conde- Sobre a obra de Eça de Queirós, considere as afirmações
nar o que houve de mau na nossa sociedade. e assinale a alternativa correta.
I. O crime do padre Amaro é um romance com que o au-
Assinale a alternativa que não está em conformidade tor pretende defender uma tese.
com as definições do romancista português. II. A ironia é um recurso literário frequentemente usado
a. As preocupações psicológicas da prosa de ficção realista pelo autor para exercer a crítica social.
levaram o romancista a uma conscientização do próprio III. O romance A cidade e as serras valoriza Portugal.
eu e à manifestação de sua mais profunda interioridade.

Linguagens, Códigos e suas Tecnologias


b. Em oposição à idealização romântica, o escritor realis- a. Somente I está correta.
ta procurou descobrir a verdade de seus personagens, b. Somente I e II estão corretas.
dissecando-lhes o comportamento. c. Somente I e III estão corretas.
c. O autor realista retratou com fidelidade a psicologia d. Somente II e III estão corretas.
dos personagens, demonstrando interesse maior pe- e. I, II e III estão corretas.
las fraquezas humanas e pelos dramas existenciais.

Seu espaço
Sobre o módulo
Reforce para os alunos a importância da obra de Eça de Queirós e o posicionamento do autor como uma voz crítica da socie-
dade portuguesa de sua época. Indique a leitura dos romances da segunda fase de sua obra, como O primo Basílio e O crime do
padre Amaro, que são retratos contundentes da hipocrisia presente nas instituições consagradas pela burguesia.

63
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Exercícios Propostos
27

Da teoria, leia o tópico 1. se, naquela ociosidade de Oliveira — nem superio-


252

Exercícios de tarefa reforço aprofundamento ridade do marido, nem encanto dum filho no seu
berço. Só a amparavam o orgulho, certo respeito
religioso pelo nome de Ramires, o medo da peque-
06. na terra espreitada e mexeriqueira.
Língua Portuguesa

São obras representativas do Romantismo e do Realismo


português, respectivamente: Vocabulário
a. Amor de perdição e Frei Luís de Sousa. Assomado – destacado.
b. Os Maias e Viagens na minha terra. Bacoco – ingênuo.
c. Eurico, o presbítero e O crime do padre Amaro. Bigodeira – pessoa com bigode farto.
d. O primo Basílio e Amor de salvação. Bulha – ruído, gritaria.
e. A cidade e as serras e A ilustre casa de Ramires. Quinta – propriedade rural.
Guedelha – cabeleira.
07. UFBA (adaptado)
Leia o fragmento do romance A ilustre casa de Ramires, Considere a afirmação:
de Eça de Queirós, e responda à questão. Gracinha Ramires tinha uma determinação que a protegia
Linguagens, Códigos e suas Tecnologias

de qualquer investida do ex-amado.


Barrolo beliscava a pele do pescoço, cons-
trangido ante aqueles rancores ruidosos que Com base no fragmento do romance, analise se a afirma-
desmanchavam o seu sossego. Já, por imposição ção é correta e justifique sua resposta com algum trecho do
de Gonçalo, rompera desconsoladamente com o texto.
Cavaleiro. E agora antevia sempre uma bulha,
um escândalo que o indisporia com os amigos Leia o fragmento do romance O crime do padre Amaro, de
do Cavaleiro, lhe vedaria o Clube e as doçuras Eça de Queirós, e responda às questões 08 e 09.
da Arcada, lhe tornaria Oliveira mais enfadonha
que a sua quinta da Ribeirinha ou da Murtosa, O cônego Dias era muito conhecido em Lei-
solidões detestadas. Não se conteve, arriscou o ria. Ultimamente engordara, o ventre saliente
costumado reparo: enchia-lhe a batina; e a sua cabecinha grisalha,
— Ó Gonçalinho, olha que também todo esse as olheiras papudas, o beiço espesso faziam lem-
espalhafato só por causa da política... brar velhas anedotas de frades lascivos e glutões.
Gonçalo quase quebrou o jarro, na fúria com
que o pousou sobre o mármore do lavatório: 08. UFTM-MG
— Política! Aí vens tu com a política! Por política Considere as afirmações e assinale a alternativa correta.
64

não se atira água suja aos governadores civis. Que Ao apresentar cônego Dias, o narrador o faz de forma irô-
ele não é político, é só malandro! Além disso... nica e sarcástica:
Mas terminou por encolher os ombros, emu- I. pelo uso sistemático de adjetivos que, pelo contexto,
decer, diante do pobre bacoco de bochechas assumem conotação pejorativa;
pasmadas, que, naquelas rondas do Cavaleiro II. pela caracterização psicológica do personagem;
pelos Cunhais, só notava o “lindo cavalo” ou “o III. pelo uso da palavra beiço (para designar lábio).
caminho mais curto para as Lousadas!”... a. Somente II está correta.
— Bem! – resumiu. — Agora larga, que me b. Somente III está correta.
quero vestir... Do bigodeira me encarrego eu. c. Somente I e II estão corretas.
— Então, até logo... Mas, se ele passar, nada d. Somente I e III estão corretas.
de asneiras, hein? e. Somente II e III estão corretas.
— Só justiça, aos baldes!
E bateu com a porta nas costas resignadas do 09. UFTM-MG
bom Barrolo que, pelo corredor, suspirando, lamen- No fragmento, há importantes características da literatu-
tava o assomado gênio do Gonçalinho, às cóleras ra de Eça de Queirós:
desproporcionadas em que o lançava “a política”. a. idealismo, linguagem coloquial e tom sarcástico.
Enquanto se ensaboava com veemência, de- b. psicologismo, linguagem prolixa e tom retórico.
pois se vestia numa pressa irada, Gonçalo ruminou c. criticismo, linguagem concisa e tom reflexivo.
aquele intolerável escândalo. Fatalmente, apenas d. elitismo, linguagem rebuscada e tom aristocrático.
se apeava em Oliveira, encontrava o homem da e. anticlericalismo, linguagem mordaz e tom descritivo.
grande guedelha, caracolando por sob as janelas
do palacete [...] E o que o desolava era perceber no Leia o fragmento do romance O primo Basílio, de Eça de
coração de Gracinha, pobre coração meigo e sem Queirós, e responda às questões 10 e 11.
fortaleza, uma teimosa raiz de ternura pelo Cava-
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leiro, bem enterrada, ainda vivaz, fácil de reflorir... Luísa, ao voltar para casa, veio a refletir na-
E nenhum outro sentimento forte que a defendes- quela cena. Não – pensava –, já não era a pri-
meira vez que ele mostrava um desprendimento Luísa ergueu-se bruscamente; encarou-o,

27
muito seco por ela, pela sua reputação, pela sua teve um movimento desdenhoso dos lábios.
saúde! Queria-a ali todos os dias, egoistamente. — Tu estás doida, Luísa?

252
Que as más-línguas falassem; que as soalheiras — Estou farta. Faço todos os sacrifícios por
a matassem, que lhe importava? E para quê?... ti; venho aqui todos os dias; comprometo-me, e
Porque enfim, saltava aos olhos, ele amava-a me- para quê? Para te ver muito indiferente, muito
nos... As suas palavras, os seus beijos arrefeciam secado...

Língua Portuguesa
cada dia, mais e mais!... Já não tinha aqueles ar- — Mas meu amor...
rebatamentos do desejo em que a envolvia toda Ela teve um sorriso de escárnio.
numa carícia palpitante, nem aquela abundância — Meu amor! Oh! São ridículos esses fingi-
de sensação que o fazia cair de joelhos com as mentos!
mãos trêmulas como as de um velho!... Já se não Basílio impacientou-se.
arremessava para ela, mal ela aparecia à porta, — Já isso cá me faltava, essa cena! – excla-
como sobre uma presa estremecida!... Já não mou impetuosamente. E cruzando os braços
havia aquelas conversas pueris, cheias de risos, diante dela: — Mas que queres tu? Queres que
divagadas e tontas, em que se abandonavam, te ame como no teatro, em São Carlos? Todas
se esqueciam, depois da hora ardente e física, sois assim! Quando um pobre diabo ama natu-
quando ela ficava numa lassitude doce, com o ralmente, como todo o mundo, com o seu co-

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sangue fresco, a cabeça deitada sobre os braços ração, mas não tem gestos de tenor, aqui del rei
nus! Agora, trocado o último beijo, acendia o que é frio, que se aborrece, é ingrato... Mas que
charuto, como num restaurante ao fim do jantar! queres tu? Queres que me atire de joelhos, que
E ia logo a um espelho pequeno que havia sobre declame, que revire os olhos, que faça juras, ou-
o lavatório dar uma penteadela no cabelo com tras tolices?
um pentezinho de algibeira. (O que ela odiava — São tolices que tu fazias...
era o pentezinho!) Às vezes até olhava o reló- — Ao princípio! – respondeu ele brutalmente.
gio!... E, enquanto ela se arranjava não vinha, — Já nos conhecemos muito para isso, minha
como nos primeiros tempos, ajudá-la, pôr-lhe o rica.
colarinho, picar-se nos seus alfinetes, rir em vol- E havia apenas cinco semanas!
ta dela, despedir-se com beijos apressados da — Adeus! – disse Luísa.
nudez dos seus ombros antes que o vestido se
apertasse. Ia rufar nos vidros – ou sentado, com Vocabulário
um ar macambúzio, bamboleava a perna! Algibeira – bolso.
E depois positivamente não a respeitava, não Macambúzio – triste.
a considerava... Tratava-a por cima do ombro, Secante – entediante.
como uma burguesinha, pouco educada e estrei- Soalheiras – maledicentes, fofoqueiras.

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ta, que apenas conhece o seu bairro. E um modo
de passear, fumando, com a cabeça alta, falando 10. Ibmec-SP (adaptado)
no “espírito de madame de tal”, nas “toaletes da Assinale V para verdadeiro e F para falso.
condessa de tal”! Como se ela fosse estúpida, e ( ) Luísa demonstra estar decepcionada com as atitu-
os seus vestidos fossem trapos! Ah, era secante! des frias e grosseiras de Basílio, por isso revela sua
E parecia, Deus me perdoe, parecia que lhe fa- intenção de pôr fim à relação extraconjugal.
zia uma honra, uma grande honra em a possuir... ( ) Em “...venho aqui todos os dias; comprometo-me, e
Imediatamente lembrava-lhe Jorge, Jorge que a para quê?”, Luísa emprega uma pergunta retórica
amava com tanto respeito! Jorge, para quem ela para deixar claro que esperava do amante um com-
era decerto a mais linda, a mais elegante, a mais portamento mais romântico.
inteligente, a mais cativante!... E já pensava um ( ) Habilidoso, Basílio conhece as fraquezas da amante
pouco que sacrificara a sua tranquilidade tão fe- e, teatralmente, joga-se ao chão de joelhos, fazendo-
liz a um amor bem incerto! -lhe juras de amor, embora julgue que tal atitude seja
Enfim, um dia que o viu mais distraído, mais uma tolice.
frio, explicou-se abertamente com ele. Direita, ( ) Em “Meu amor! Oh! São ridículos esses fingimen-
sentada no canapé de palhinha, falou com bom tos!”, Luísa explicita que está consciente da indife-
senso, devagar, com um ar digno e preparado: rença do amante, apesar de ele negar isso.
Que percebia bem que ele se aborrecia; que o ( ) Na passagem “Trazias isso decorado!”, Basílio de-
seu grande amor tinha passado; que era portan- monstra perceber que a fala de Luísa é artificial e
to humilhante para ela verem-se nessas condi- ironiza a solenidade do desabafo.
ções, e que julgava mais digno acabarem...
Basílio olhava-a, surpreendido da sua soleni- 11.
dade; sentia um estudo, uma afetação naquelas Assinale a alternativa que comprova, com a citação do
frases; disse muito tranquilamente, sorrindo: fragmento, a desilusão de Luísa quanto a seu relacionamento
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— Trazias isso decorado! com Basílio.


a. “As suas palavras, os seus beijos arrefeciam cada los; então Tomás Alencar, que [...] passava ele
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dia...” próprio uma existência medonha de adultérios,


b. “Já não tinha aqueles arrebatamentos do desejo...” lubricidade, orgias [...] – de ora em diante auste-
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c. “... como num restaurante ao fim do jantar!” ro, incorruptível, [...] passou a vigiar atentamen-
d. “Às vezes até olhava o relógio!” te o jornal, o livro, o teatro.
e. “... percebia bem que ele se aborrecia...”
Vocabulário
Língua Portuguesa

12. FGV De chofre – de repente.


Leia o fragmento do romance O primo Basílio, de Eça de Escangalhar – destruir.
Queirós, e responda à questão. Lubricidade – sensualidade exagerada.

Jorge envolvia-a em delicadezas de amante, 13. Enade (adaptado)


ajoelhava-se aos seus pés, era muito dengueiro. Quem relata é o narrador em terceira pessoa que se apro-
E sempre de bom humor, com muita graça; mas, veita, dentre outros recursos, do discurso indireto livre. É cor-
nas coisas da sua profissão ou do seu brio, tinha reto afirmar que, nesse relato, o uso da ironia:
severidades exageradas, e punha então nas pa- a. permite que o narrador, aderindo aos sentimentos de
lavras, nos modos uma solenidade carrancuda. Tomás Alencar, critique a estética realista, traduzindo
Uma amiga dela romanesca, que via em tudo dra- a visão de Eça de Queirós.
Linguagens, Códigos e suas Tecnologias

mas, tinha-lhe dito: é homem para te dar uma pu- b. produz uma inversão: o narrador, caracterizando o
nhalada. Ela, que não conhecia ainda o tempera- Realismo sob a perspectiva de Tomás Alencar, deixa
mento plácido de Jorge, acreditou, e isso mesmo transparecer as convicções do realista Eça de Queirós
criou uma exaltação no seu amor por ele. sobre o Romantismo.
c. cria um discurso de natureza metalinguística: o tema
Vocabulário é a arte de Tomás Alencar, que, embora romântico, pro-
Brio – honra. cura compor segundo o estilo das obras de Zola.
Dengueiro – delicado, carinhoso. d. propicia que sejam citadas, pela voz da personagem,
Romanesca – influenciada por romances. as razões do juízo desfavorável de Eça de Queirós
acerca das propostas da geração de 1870.
No fragmento, Luísa reconhece certas características de e. cria referências (tédio no casamento, maridos como
Jorge que se confirmam no curso do romance, exceto uma: figuras bestiais, amantes apolíneos) que aproximam
a. a extrema violência. Tomás Alencar do autor de Madame Bovary, o que jus-
b. a delicadeza no trato. tifica sua aversão ao Realismo.
c. o bom humor.
d. o rigor profissional. 14. Sistema COC
e. o temperamento tranquilo. Como o narrador imagina que Tomás Alencar entende o
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naturalismo?
Leia o fragmento do romance Os Maias, de Eça de Quei-
rós, e responda às questões de 13 a 15. 15. Enade
O crítico José Guilherme Merquior, ao analisar a questão
Pobre Alencar! O naturalismo; [...] essas ru- da literatura na modernidade, afirma: “[...] a partir de Flaubert
des análises, apoderando-se da Igreja, da reale- e Baudelaire, instala-se nas letras o senso da ‘vacuidade do
za, da burocracia, da finança, de todas as coisas ideal’; emerge a tradição moderna como literatura crítica.”. O
santas, dissecando-as brutalmente e mostran- ideal esvaziado de conteúdo, assinalado pelo crítico, no texto
do-lhes a lesão, [...] apanhando em flagrante de Eça de Queirós:
[...] a palpitação mesma da vida; tudo isso [...], a. constitui a busca do “paladino da moral”.
caindo assim de chofre e escangalhando a cate- b. é considerado causa da ação de celebrar missa duran-
dral romântica, sob a qual tantos anos ele tive- te tantos anos.
ra altar e celebrara missa, tinha desnorteado o c. pode ser associado à escangalhada catedral românti-
pobre Alencar [...]. O naturalismo, com as suas ca.
aluviões de obscenidade, ameaçava corromper d. está tomado como sinônimo de “palpitação mesma da
o pudor social? Pois bem. vida”.
Ele, Alencar, seria o paladino da moral [...]; e. é tido como consequência da “propaganda do amor
então o romancista de Elvira, que, em novela e ilegítimo”.
drama, fizera a propaganda do amor ilegítimo,
representando os deveres conjugais como mon- 16. Sistema COC
tanhas de tédio, dando a todos os maridos for- Considerando o texto da questão anterior, como pode ser
mas gordurosas e bestiais, e a todos os amantes entendida a expressão “vacuidade do ideal”?
a beleza, o esplendor e o gênio dos antigos Apo-
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