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Qual o seu limite?

(adoecimento mental do estudante de medicina)


Alex Fabrício de Oliveira
Psiquiatra, Ms em filosofia
Departamento de Medicina e Enfermagem - UFV
Ser médico pode ser uma
aventura incrível!
Mas a medicina é um
empreendimento perigoso...
Plano da apresentação
1. Por quê falar de transtornos mentais na
faculdade de medicina;
2. Diagnóstico da saúde mental do estudante de
medicina;
3. Fatores do adoecimento mental: a
“contribuição” da universidade;
4. Ações de enfrentamento coletivas e individuais;
Por que falar sobre?
Por que falar sobre?
Por que falar sobre?
Por que falar sobre?
Por que falar sobre?

• Há evidências de que os problemas de saúde mental do


médico têm impacto negativo nos cuidados clínicos:
• Redução da empatia do médico;
• Aumento das taxas de erro médico;
• Piora da qualidade de cuidado por baixo profissionalismo;
• Redução da satisfação dos pacientes.
(SLAVIN et al., 2014; PANAGIOTI et al., 2018)
Plano da apresentação
1. Por quê falar de transtornos mentais na
faculdade de medicina;
2. Diagnóstico da saúde mental do estudante de
medicina;
3. Fatores do adoecimento mental: a
“contribuição” da universidade;
4. Ações de enfrentamento coletivas e individuais;
Diagnóstico situacional
Diagnóstico situacional
Diagnóstico situacional

Saúde mental do estudante de medicina:


• 27,5% de prevalência de sintomas depressivos (contra 10% da
população geral) e 11% de ideação suicida (ROTENSTEIN et. al.,
2016);
• 82% de prevalência de sintomas ansiosos (clínico e subclínico)
(estudo de qualidade de vida e saúde mental do estudante de
medicina Projeto VERAS – FMUSP);
• 44% de prevalência de Transtorno Mental Comum (sintomas
ansiedade+depressão+somatização leves);
Diagnóstico situacional

Saúde mental de estudantes de saúde:


• Estudantes de medicina, enfermagem e farmácia:
• 13% ideação suicida e 94% de desesperança (sem diferença
entre os cursos)
• maior severidade da escala de desesperança entre os
estudantes médicos;
• maiores scores de sintomas depressivos no internato
médico e entre as mulheres; (ALEXANDRINO-SILVA, 2009)
Diagnóstico situacional

Saúde mental de estudantes de saúde:


• Estudantes de medicina, psicologia e biologia:
• Escores de ansiedade iguais entre os cursos se corrigido a
relação homem/mulher;
• Redução da ansiedade foi estatisticamente significativa após
mudanças curriculares; (ZUARDI, 2008)
Como era antes de entrar?
Como será depois de sair?

Saúde mental do profissional de medicina:


• 28% apresentam T. depressivo ou de ansiedade,
comparando com os 18% de outros profissionais ou os 30%
nos desempregados (TILLETT, 2003);
• Altas taxas de divórcio e uso de drogas psicoativas;
• Suicídio:
• taxa de suicídio de 28 a 40 /100.000 contra 12.3/ 100.000 na
população geral) (AMERICAN PSYCHIATRIC ASSOCIATION (APA)
2018. Abstract 1-227, presented May 5, 2018.)
• Suicídio foi a 2ª causa de morte de médicos abaixo dos 40 anos
num estudo brasileiro (CREMESP, 2012);
Como será depois de sair?
• É provável que o modelo de processo de trabalho adotado na
vida acadêmica se perpetue (como todo hábito)
Plano da apresentação
1. Por quê falar de transtornos mentais na
faculdade de medicina;
2. Diagnóstico da saúde mental do estudante de
medicina;
3. Fatores do adoecimento mental: a
“contribuição” da universidade;
4. Ações de enfrentamento coletivas e individuais;
Fatores de adoecimento
Fatores de adoecimento
• Fatores mais associados à prevalência de TM:
FACUNDES, V.L.D., LUDERMIR, A.B. Transtornos mentais comuns
em estudantes da área de saúde. Rev Bras Psiquiatr.
2005;27(3):194-200
• Prevalência correlaciona-se à carga horária, percepção de
sobrecarga, estratégia centrada no professor, ocorrência
de “situações especiais” na infância e a ser aluno de
medicina
(prevalência de TMC)

(FACUNDES, 2005)
Fatores de adoecimento
Adoecimento mental em princípio é algo multifatorial:
1. Perfil do ingressante;
2. Características inerentes à prática médica;
3. Fatores relativos à estrutura pedagógica e curricular do
curso;
Fatores de adoecimento
1. Perfil do ingressante:
• Ideação suicida prévia é um preditor robusto de novas tentativas
(MORTIER - J Clin Psychiatry. 2017 July; 78(7) );
• Eventos traumáticos e necessidade de tratamento na infância e
adolescência aumenta o risco - OR: 2.2 (FACUNDES, 2005);
• Características psicológicas do ingressante: perfeccionismo, alta
competitividade, identificação com “papel messiânico”, está
acostumado a um estilo de estudo passivo e com menos
desafios...
• Importância do rastreamento na entrada do estudante;
Fatores de adoecimento
2. Características inerentes à prática profissional:
• Eventos mais estressantes na avaliação dos internos (Nogueira-
Martins, 2005):
• recusa de tratamentos;
• morte;
• situações impactantes (amputação, estupro);
• causas institucionais;
• A maioria avaliou não ter sido preparado para isso na graduação
• Fadiga empática: tendência a sofrer com o sofrimento alheio
Fatores de adoecimento
3. Fatores relativos ao curso:
• carga horária,
• didática: percepção de não aplicabilidade do que estuda,
método de transmissão passiva ;
• desamparo ante ao poder do professor;
• cultura da naturalização do sofrimento (“no pain, no gain”);
• pouco treinamento em habilidades psicossociais e
humanidades;
• Intervenções na estrutura mostram impacto na
prevalência de depressão;
Fatores de adoecimento
Fatores relativos ao curso:
Carga horária mínima dos cursos de graduação (bacharelados, modalidade presencial)
Curso Carga horária Conclusão
Biblioteconomia, Ciências Sociais, Filosofia, História, 3 ou 4
2.400
Letras, Museologia, Teatro, Turismo anos
3,5 ou 4
Cinema e Audiovisual, Comunicação Social 2.700
anos
Administração, Ciências Contábeis Ciências
Econômicas, Computação e Informática, Jornalismo, 3.000 4 anos
Serviço Social
Biomedicina, Ciências Biológicas, Fonoaudiologia,
3200 4 anos
Nutrição, Pedagogia
Agronomia, Arquitetura e Urbanismo, Engenharias,
3.600 5 anos
Zootecnia, Direito
Enfermagem, Farmácia, Fisioterapia, Medicina
4.000 5 anos
Veterinária, Odontologia, Psicologia
Medicina 7.200 6 anos
• Insalubridade psíquica pelo modelo
demanda-controle de Karasek:
Plano da apresentação
1. Por quê falar de transtornos mentais na
faculdade de medicina;
2. Diagnóstico da saúde mental do estudante de
medicina;
3. Fatores do adoecimento mental: a
“contribuição” da universidade;
4. Ações de enfrentamento coletivas e individuais;
Ações de enfrentamento

• Modificações curriculares: uma


educação para o sec. XXI;
• Programas de promoção ativa de
bem estar: psicologia positiva;
• Oferta de serviços de saúde mental
para aluno;
• Ações de iniciativa pessoal;
Só os estudantes de medicina
são negligenciados?

"Almoço no topo de um arranha-céu, 1932”


Impacto das estruturas curriculares
Elementos curriculares de impacto
“Os alunos identificaram o curso de Anatomia Humana como o mais
exigente e desafiador no currículo pré-clínico e como uma importante
fonte de estresse. Assim, fizemos duas mudanças no curso: (1) o
diretor da Escola de Medicina instruiu os coordenadores do curso a
produzir exames que atingissem um maior escore médio, para ser
consistente com outros cursos no currículo pré-clínico e para que
menos estudantes se sentissem em risco de falhar.” (SLAVIN et all,
2014, p.575)
Elementos curriculares de impacto
“Reduzimos as horas de contato nos dois primeiros anos do currículo
em aproximadamente 10% e tentamos reduzir os detalhes
desnecessários no currículo do curso pré-clínico, ajudando os
coordenadores de disciplina da faculdade a fazerem as melhores
escolhas possíveis em relação a que conteúdo incluir durante a
realização de sessões de desenvolvimento curso-específicas da
faculdade. Nós instituímos essa redução nas horas de contato para
permitir aos alunos mais tempo para participar das novas
comunidades de aprendizagem e eletivas longitudinais.”(SLAVIN et all,
2014, p.575)
Ciência do bem estar
Ciência do bem estar
• Resilience Conferences:
• “Como construir resiliência através de
relacionamentos professor-aluno e cultura
escolar”
• “O papel dos pontos fortes pessoais para
desenvolver competências sociais e emocionais
em aprendizes de todas as idades"
• “Criando comunidade e promovendo a resiliência
com o apoio dos colegas”
• “Intervenções educativas positivas do jardim de
infância ao pós-secundário”
Ciência do bem estar
Ciência do bem estar
Serviços de atendimento
em saúde mental
• Serviços de acolhimento e tratamento em saúde mental;
• Estratégias variadas: redução do estigma, contratação de
profissionais não docentes para os atendimentos
individuais, ações em grupo integradas às disciplinas;
• Momento atual: desmonte econômico de programas
antigos e bem estruturados, limitação de pessoal e poucos
estudos científicos mostrando eficácia;
• Alcance limitado (não é preventiva)
Serviços de atendimento
em saúde mental
• Problemas quanto à procura pelos serviços:
• Pressão assistencial;
• Pressão institucional de uma “função pericial” (determinar se
“alunos problemáticos” estariam aptos a continuar o curso);
• Preconceito dos alunos em relação à doença psiquiátrica ou às
dificuldades psicológicas. Os mais necessitados são os que
menos procuram;
• Indisciplina por parte dos alunos quanto aos horários
agendados, com faltas e atrasos frequentes;
Ações de iniciativa pessoal
Ações de iniciativa pessoal

"O homem depressivo [da atualidade] é aquele


animal laborans que explora a si mesmo [...] sem
qualquer coação externa.... Ela [a depressão]
irrompe no momento em que o sujeito de
desempenho não pode mais poder. A lamúria do
indivíduo depressivo de que nada é possível só se
torna possível numa sociedade que crê que nada é
impossível. [...] O sujeito de desempenho encontra-
se em guerra consigo mesmo; o depressivo é o
inválido dessa guerra internalizada."
(BYUING-CHUL, 2015 p. 28-9)
Fatores de adoecimento
2. Características inerentes à prática profissional:
• Eventos mais estressantes na avaliação dos internos (Nogueira-
Martins, 2005):
• recusa de tratamentos;
• morte;
• situações impactantes (amputação, estupro);
• causas institucionais;
• A maioria avaliou não ter sido preparado para isso na graduação
• Fadiga empática: tendência a sofrer com o sofrimento alheio

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