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KARDEC, VIDA, OBRA E MISSÃO

Hippolyte Léon Denizard Rivail, ou simplesmente H.L.D. Rivail como assinava em seus
livros, mundialmente famoso pelo pseudônimo Allan Kardec, nasceu na cidade de Lion, França, no
dia 03 de outubro de 1804, sendo descendente de família católica. Seu pai, Jean-Baptiste Antoine
Rivail era advogado e sua mãe, Jeanne Louise Duhamel, do lar.
Com a idade de dez anos, portanto em 1814, seus pais o enviam a Iverdon, cidade suíça
situada junto ao Lago Neuchâtel, a fim de estudar no Instituto de Educação ali instalado, em 1805,
pelo educadorr Johan Heinrich Pestalozzi.
Rivail foi aluno de Pestalozzi de 1814 a aproximadamente 1822 (os registros do instituto
não são exatos). Nesse período conviveu com estudantes de diferentes nações e idades, tendo se
revelado um dos discípulos mais fervorosos do método pestalozziano. Rivail destacou-se pelo
hábito da investigação e torna-se com o tempo um sub-mestre, ou seja, colaborador ativo dos
professores e auxiliar de seus colegas de estudo.
Entre 1822 e 1823 Rivail já estava domiciliado na cidade de Paris, ostentando os diplomas
de Instituteur (mestre das escolas primárias e secundárias) e Chef d´Institution (diretor escolar). Sua
opção em não retornar à terra natal, Lion, se deu por ser Paris o centro cultural não apenas da
França, mas da Europa, onde ele teria melhores condições de trabalho.
Em 6 de dezembro de 1823 a Bibliografia da França registrava o lançamento do primeiro
livro do Professor H.L.D. Rivail: Curso Prático e Teórico de Aritmética, cujo subtítulo era "De
acordo com o método de Pestalozzi", o que atestava que ele já trabalhava para difundir em solo
francês o pensamento educacional de seu mestre Pestalozzi, o que, aliás, o fez por toda sua
existência.

Princípios pedagógicos do ensino


Denizard Rivail anunciou nessa primeira obra os princípios pedagógicos do ensino:
1. Cultivar o espírito natural de observação das crianças, dirigindo-lhes a atenção para os
objetos que as cercam.
2. Cultivar a inteligência, observando um comportamento que habilite o aluno a descobrir
por si mesmo as regras.
3. Proceder sempre do conhecido para o desconhecido, do simples para o composto.
4. Evitar toda atitude mecânica, levando o aluno a conhecer o fim e a razão de tudo o que
faz.
5. Conduzi-lo a apalpar com os dedos e com os olhos todas as verdades.
6. Só confiar à memória aquilo que já tenha sido apreendido pela inteligência.

Magnetismo, escola e casamento


Pouco depois que o jovem discípulo de Pestalozzi chegou a Paris, teve a sua curiosidade
despertada para o magnetismo animal, a partir das experiências de Mesmer e do Marquês de
Puységur, tendo dedicado seu tempo para o estudo, teórico e prático, do sonambulismo. Isso o ligou
em definitivo aos estudos científicos, que desenvolveu com prazer e que foram fundamentais anos
mais tarde para investigar os fenômenos espíritas.
No início de 1825 dirige a Escola de Primeiro Grau, primeiro estabelecimento de ensino
fundado por ele em Paris. Em 1826, juntando-se a um tio, que se fez seu sócio, ampliou o trabalho,
inaugurando um instituto técnico que funcionou até 1834, o Instituto Rivail.
Em 6 de fevereiro de 1832 foi firmado o contrato de casamento com Amélie-Gabrielle
Boudet, nascida a 23 de novembro de 1795, professora e poetisa, companheira ideal e que lutou
incessantemente com o esposo pelos ideais da Educação e do Espiritismo. Eles se conheceram nos
saraus literários dos salões parisienses, pois Amélie era poetisa e uma das poucas mulheres de seu
tempo com estudo e formação – era professora –, o que naturalmente os atraiu, consolidando o
planejamento decerto feito no mundo espiritual antes do nascimento de ambos.
Em junho de 1828 Rivail publica o Plano Proposto para a Melhoria da Educação Pública,
onde contribui para a melhora do ensino público, propondo a implantação da educação moral, dos
cursos de formação de professores e de escolas também para as mulheres. A obra mereceu destaque
e prêmio nacional, pois foi vencedora do concurso instituído pelo governo francês. Infelizmente,
apesar de vencer o concurso e receber elogios, o Plano não foi levado a efeito pelo governo.
Além de professor e diretor escolar, Rivail fazia traduções de obras do alemão para o francês
e vice-versa, e revelava-se profundo gramático, tendo em janeiro de 1831 lançado a Gramática
Francesa Clássica. Tanto essa obra como as demais posteriormente publicadas foram adotadas
pelas escolas francesas, algumas inclusive pela Universidade da Sorbonne.
Após o fechamento do Instituto Rivail, provocado pelo seu tio e sócio, que gastava dinheiro
no jogo e nas noitadas parisienses, empregou-se como contabilista em três casas comerciais e
passou a dedicar-se, juntamente com o amigo e professor Levy-Alvarès, à preparação de cursos
noturnos para alunos de ambos os sexos. Organizou e ministrou, de 1835 a 1840, em sua própria
casa, cursos gratuitos de química, física, astronomia, fisiologia, anatomia comparada, etc. Registre-
se, pela sua importância, o fato de que nunca mais Rivail cobrou um centavo para dar aula,
trabalhando gratuitamente pela educação, vivendo apenas de seus proventos como contabilista.
De 1843 a 1848, Rivail deu também cursos públicos, bissemanais, de matemática e
astronomia, visando preparar os jovens franceses para os concursos públicos realizados pelo
governo.
Frequentador do teatro, das bibliotecas e dos salões de cultura, Rivail era conhecido pela sua
inteligência, discernimento, ponderação e modéstia, tornando-se amigo, entre outros, de Victor
Hugo, Theóphile Gautier, Victorien Sardou, Marie-Pape Carpentier e outros conhecidos e ilustres
educadores, literatos e pensadores franceses.

Títulos e diplomas
O professor Rivail recebeu inúmeros títulos e diplomas de Academias, seja como
participante ativo ou como correspondente:
1. Diploma de membro da Sociedade Gramatical.
2. Diploma de membro da Sociedade para a Instrução Elementar.
3. Diploma de membro fundador da Sociedade de Previdência dos Diretores de Instituições
e Pensões de Paris.
4. Diploma da Sociedade de Educação Nacional.
5. Diploma do Instituto de Línguas.
6. Diploma da Sociedade das Ciências Naturais de França.
7. Diploma de membro da Sociedade Real de Emulação, de Agricultura, Ciências, Letras e
Artes do Departamento do Ain.
8. Diploma de membro da Sociedade Promotora da Indústria Nacional.
9. Diploma de membro titular da Sociedade Francesa de Estatística Universal.
10. Diploma de membro titular da Academia da Indústria Agrícola, Manufatureira e
Comercial.
11. Diploma de membro titular do Instituto Histórico.
12. Diploma de membro da Academia de Arras.

Livros didático-pedagógicos
Como escritor pedagógico, H.L.D. Rivail, ou professor Denizard Rivail, publicou muito,
sendo que vários de seus livros tiveram várias edições. Podemos relacionar as seguintes obras,
conforme registros da Biblioteca Nacional da França:
1. Curso Prático e Teórico de Aritmética (1824);
2. Curso Completo Teórico e Prático de Aritmética (3ª edição, 1845);
3. Escola de Primeiro Grau (1825);
4. Plano Proposto para a Melhoria da Educação Pública (1828);
5. Os Três Primeiros Livros de Telêmaco (tradução, 1830);
6. Gramática Francesa Clássica (1831);
7. Memória sobre a Instrução Pública (1831);
8. Qual o Sistema de Estudos mais em Harmonia com as Necessidades da Época? (1831);
9. Discurso Pronunciado por Ocasião da Distribuição dos Prêmios (1834);
10. Programa dos Estudos segundo o Plano de Instrução de H.L.D. Rivail (1838);
11. Manual dos Exames para os Certificados de Capacidade (1846);
12. Soluções dos Exercícios e Problemas do Tratado Completo de Aritmética (1847);
13. Projeto de Reforma referente aos Exames e aos Educandários para Mocinhas (1847);
14. Catecismo Gramatical da Língua Francesa (1848);
15. Gramática Normal dos Exames (1848);
16. Ditados Normais dos Exames (1849);
17. Ditados da Primeira e da Segunda Idade (1850);
18. Ditados da Primeira e da Segunda Idade, volume dois (1850);
19. Curso de Cálculo Mental (s/data);
20. Programa dos Cursos Usuais de Física, Química, Astronomia e Fisiologia (s/data);
21. Programa dos Estudos de Instrução Primária (s/data);
22. Tratado de Aritmética (1847).

O homem e a sociedade
No livro “Amor e Ódio”, escrito pelo espírito Charles e psicografado pela médium Yvonne
Pereira, encontramos no capítulo dois da primeira parte, interessante descrição de uma homenagem
feita ao professor Rivail por um seu ex-aluno, Georges de Franceville de Soissons, com o
comparecimento de outro ex-aluno, Gaston D’Arbeville, Marquês de Saint-Pierre. A homenagem
ocorreu em 1847, tendo por motivo o lançamento do livro Soluções Racionais de Questões de
Aritmética e de Geometria. Vejamos parte do texto:
“Realizou-se o ágape sob a melhor cordialidade, a ele comparecendo ainda outras nobres
amizades do círculo de relações dos dois amigos, dentre estas o insigne poeta Victor Hugo. (...)
Verificou-se então substancioso debate entre o professor e seus antigos alunos, durante o qual, com
aquela visão admirável que possuía, Rivail ponderou as grandes vantagens de ordem material e
financeira decorrentes da realização desse desejo de seu aluno (viagem aos Estados Unidos da
América)”.
Há registros informando que, nos salões da nobreza francesa, quando acirrada discussão
acontecia sobre determinado assunto, essa discussão era encerrada procurando-se ouvir a opinião
sensata do professor Rivail.
No livro Plano Proposto para Melhoria da Instrução Pública, encontramos o seguinte texto
sobre educação moral:
“A educação é a arte de formar os homens; isto é, a arte de fazer eclodir neles os germes da
virtude e abafar os do vício; de desenvolver sua inteligência e de lhes dar instrução própria às
suas necessidades; enfim de formar o corpo e de lhe dar força e saúde. Numa palavra, a meta da
educação consiste no desenvolvimento simultâneo das faculdades morais, físicas e intelectuais. (...)
Não se pode esperar obter um bom sistema de educação, e por conseguinte, uma boa educação
moral, se não se tiver uma massa de educadores que compreendam verdadeiramente o objetivo de
sua missão e que tenham as qualidades necessárias para cumpri-la. Em resumo, a educação é o
resultado do conjunto de hábitos adquiridos; esses hábitos são eles próprios o resultado de todas
as impressões que os provocaram, e a direção dessas impressões depende unicamente dos pais e
dos educadores”.
Sua dedicação à educação e ao trabalho contábil são encerradas no ano de 1855, quando,
aposentado, prioriza pesquisas e estudos sobre magnetismo, ampliando consideravelmente essa sua
ação ao contato com os fenômenos das mesas girantes, que vamos tratar em capítulo mais adiante,
pois preferimos didaticamente dividir a vida e obra de Denizard Rivail em antes e depois do
Espiritismo.

As mesas girantes
A partir de 1855 o professor Rivail é colocado em contato, através de amigos, com os
chamados fenômenos das mesas girantes, os quais inicialmente ele tomou como uma possibilidade
dentro dos chamados fenômenos magnéticos. Entretanto, ao assistir uma reunião onde ocorriam os
fenômenos, ele se deparou com manifestações inteligentes que estavam acima das explicações
possíveis conhecidas, o que o levou a programar uma paciente pesquisa para chegar à causa, ou
causas, dos mesmos.
As mesas girantes possuíam esse nome por se tratar de uma reunião de pessoas em torno de
uma mesa, com todos colocando as mãos sobre a mesma. Ao final de um tempo a mesa estremecia,
pulava, se erguia, passeava sozinha pela sala e, o mais extraordinário, respondia perguntas através
de um código previamente combinado: uma batida no chão significava “sim” e duas batidas
significavam “não”. Com a colocação das letras do alfabeto no chão, a mesa indicava as letras, que
copiadas formavam palavras e frases inteiras.

Publicação de O Livro dos Espíritos


Essa pesquisa durou do início de 1855 até 18 de abril de 1857, utilizando Kardec não mais
da tiptologia com as mesas girantes, e sim de médiuns psicógrafos (escreventes), quando do
lançamento de "O Livro dos Espíritos", obra fundamental do Espiritismo, ou Doutrina Espírita, já
com o uso do pseudônimo Allan Kardec
Para publicação da obra Kardec confiou os originais ao editor E. Dentú, simpatizante das
ideias espiritualistas, e que deu pessoalmente início ao trabalho tipográfico, vindo, entretanto, a
falecer antes de completá-lo. Seus filhos o sucederam na gráfica e editora e colocaram o livro em
segundo plano, pois não tinham interesse em continuar a publicar obras espiritualistas. Kardec,
ainda apenas conhecido como Prof. Denizard Rivail, teve que procurar a viúva de E. Dentú para
conseguir que, com seu aval, o trabalho editorial ficasse pronto, e assim viesse a público.
A edição, de aproximadamente três mil exemplares, esgotou em seis meses, contendo 539
perguntas e respostas. Perguntas de Allan Kardec e respostas dos Espíritos Superiores através de
doze médiuns diferentes. A segunda edição, revista e ampliada, trouxe 1.019 perguntas e dezenas de
observações e comentários do próprio codificador, como Kardec passou também a ser conhecido.

O nome Allan Kardec


O nome Allan Kardec surgiu de revelação espiritual feita pelo espírito Zéfiro, que
comunicou ter o codificador tido esse nome em existência pretérita, quando havia exercido o ofício
de sacerdote druida entre o povo celta. Assinar a obra e as demais com esse pseudônimo, teve o
objetivo de desvincular o novo trabalho do famoso pedagogo, pois ele queria que o Espiritismo
fosse aceito por si mesmo, e não pelo nome do autor da obra.

Outras publicações e trabalhos


Na sequência do trabalho de estudo e divulgação do Espiritismo, Kardec lançou no ano de
1861 a obra O Livro dos Médiuns, tratando especificamente da mediunidade, sendo que antes, em
1858, duas outras atividades de importância tinham sido efetivadas: o lançamento da Revista
Espírita, mensário doutrinário e de pesquisa, e a inauguração da Sociedade Parisiense de Estudos
Espíritas, o primeiro centro espírita organizado do mundo.
A Revista Espírita veio primeiro. A procura pelo O Livro dos Espíritos foi intensa, e a
propaganda pró e contra ocupara os jornais, teatros e rodas de conversa. A Igreja Católica investiu
pesado contra a doutrina nascente. E ele, Kardec, não dava conta de atender pessoalmente a todos
que tinham perguntas a fazer ou mereciam réplicas. Surge então um dilema: como fazer a correta
divulgação da doutrina espírita para o público? Cresce em seu espírito o sonho de fundar um jornal
ou revista, prevalecendo este último. Assim é que em janeiro de 1858 surge a Revista Espírita, ou
Jornal de Estudos Psicológicos, que fez grande sucesso, recebendo assinaturas de todo o continente
europeu e fora dele.
Em abril do mesmo ano Kardec consegue a autorização das autoridades públicas para fundar
a Sociedade Parisiense de Estudos Espíritas, conhecida como Sociedade Espírita de Paris, cujo
regulamento encontra-se publicado em O Livro dos Médiuns, para se tornar o primeiro núcleo de
feição jurídica aglutinando esforços na pesquisa, no debate e na aplicação do Espiritismo. É, sem
contestação, e como afirmamos linhas acima, o primeiro centro espírita do mundo, pois antes da
Sociedade existiam apenas grupos familiares ou de pesquisadores, grupos esses informais, embora
alguns com reuniões regulares, mas a maioria voltada apenas para o fenômeno, quando Kardec
queria que o estudo dos fenômenos fosse voltado para aplicação a todas as ciências humanas.

Viagens de divulgação
Face ao crescimento do número de adeptos do Espiritismo, tanto na França como nos demais
países europeus, Allan Kardec realiza no ano de 1862, extensa viagem pelo território francês para
uma série de palestras, o que pode ser conhecido no livro Viagem Espírita, trazendo os textos de
suas prédicas e o roteiro dessa jornada histórica. Partindo de Paris, Kardec visitou as cidades de
Provins, Troyes, Sens, Lyon, Avignon, Montpellier, Cette, Albi, Toulouse, Marmande, Bordeaux,
Angoulême, Mescher, Royan, Saint-Pierre d'Oleron, Rochefort, Marennes, Saint-Jean d'Angely,
Sainte-Gemme, Tours e Orléans, portanto, realizando um total de vinte e uma palestras.
Foi também no ano de 1862 que Allan Kardec recebeu autorização da Sociedade para a
contratação de um secretário, face à volumosa correspondência, mais de duzentas cartas por mês,
recebidas de mil centros espíritas sérios que se correspondiam regularmente com ele.
Allan Kardec também realizou outras viagens de divulgação da nova doutrina, mas não tão
extensas, nos anos de 1860, 1861, 1864 e 1867. Na viagem de 1864 ele contemplou também a
Bélgica com sua visita.

Obras espíritas
Kardec irá publicar ainda os seguintes livros:
1. O Evangelho Segundo o Espiritismo (1864) – onde comenta e publica mensagens
espirituais sobre as lições morais de Jesus.
2. O Céu e o Inferno (1866) – tratando da vida após a morte e a justiça divina, trazendo em
sua segunda parte depoimentos de espíritos de diversas categorias.
3. A Gênese (1868) – estudo bem completo da criação e evolução da Terra, a criação do
universo e também sobre os chamados milagres e predições de Jesus Cristo.
4. O Que é o Espiritismo (1859) – livro básico para os principiantes, aqueles que querem
conhecer o Espiritismo.
Até a data de sua desencarnação, 31 de março de 1869, escreve mais de cento e quarenta
volumes da "Revista Espírita", trabalho esse gigantesco numa época em que a energia elétrica não
estava instalada em todas as casas, tendo de trabalhar muitas vezes à luz de lampião noites adentro,
ainda fazendo a revisão das provas gráficas, a distribuição dos exemplares via correio ou ao
portador, num labor eficiente contando apenas com o auxílio de sua amada esposa Amélie Boudet,
do secretário da Sociedade e de mais um ou outro colaborador.
Uma curiosidade é que o encontro da causa dos fenômenos iniciais das mesas girantes, ou
seja, a existência do Espírito, foi revelado pelo próprio fenômeno, que se identificou e deu todas as
provas de ser um homem que já havia vivido na Terra e se encontrava "morto". A imortalidade da
alma com a continuidade da vida depois da morte foi a grande chave que abriu as portas para a
compreensão da vida e a organização do imenso edifício doutrinário do Espiritismo.

Perseguições e fé inabalável
Allan Kardec foi perseguido e injuriado. Seu trabalho como educador foi desprezado, e
foram muitas e amargas as decepções. Mas tudo ele venceu com fé e perseverança, muitas vezes
mantendo a obra através de seu salário como aposentado, sem nunca tirar proveito das receitas
financeiras dos livros ou da revista, pois tudo revertia a benefício da divulgação do Espiritismo.
Com o passar dos anos os grupos espíritas legalizados juridicamente começaram a se
espalhar pela França e outros países, vários jornais e revistas espíritas surgiram, e a bandeira Fora
da Caridade não há Salvação, erguida por Kardec, começou a mostrar que o Espiritismo não era
uma fábrica de loucos, e sim uma ciência e filosofia com consequências morais, portanto uma
religião no mais profundo do termo.
Digna de reprodução é a prece que ele escreve em 12 de junho de 1856, mostrando sua fé e
sua submissão aos desígnios superiores:
“Senhor! Pois que te dignaste lançar os olhos sobre mim para cumpruimento dos teus
desígnios, faça-se a tua vontade! Está nas tuas mãos a minha vida; dispõe do teu servo. Reconheço
a minha fraqueza diante de tão grande tarefa; a minha boa vontade não desfalecerá, as forças,
porém, talvez me traiam. Supre à minha deficiência; dá-me as forças físicas e morais que me forem
necessárias. Ampara-me nos momentos difíceis e, com o teu auxílio e dos teus celestes
mensageiros, tudo envidarei para corresponder aos teus desígnios”.
No dia 1º de janeiro de 1867, ou seja, dez anos e meio após ter feito e transcrito essa oração,
ele faz anotação, que pode ser lida na íntegra no livro Obras Póstumas, em que confessa ter muito
sofrido: ódio de inimigos, libelos infames publicados, instruções falseadas, traição de quem
confiava, ingratidão de amigos; mas que:
“Graças, porém, à proteção e assistência dos bons espíritos que incessantemente me deram
manifestas provas de solicitude, tenho a ventura de reconhecer que nunca senti o menor
desfalecimento ou desânimo e que prossegui, sempre com o mesmo ardor, no desempenho da minha
tarefa, sem me preocupar com a maldade de que era objeto”.

Últimos atos
Após a mudança para sede própria, a Sociedade Parisiense de Estudos Espíritas, que no
início pagava aluguel de uma sala para funcionar, preparava-se para inaugurar uma Livraria
Espírita. Era o ano de 1869, mas Allan Kardec dava sinais evidentes de desgaste físico, com
problemas coronarianos que exigiam inclusive a intervenção dos bons espíritos a seu favor, pois a
obra tinha que ser completada.
No dia 31 de março desse ano, pela manhã, Kardec, em seu pequeno apartamento, preparava
a mudança e tomava últimas providências para o despacho de livros e revistas. Um portador vinha
pegar uma encomenda, e ele, como sempre o fizera, gentilmente atendeu o rapaz e dirigiu-se à
escrivaninha para pegar o embrulho já preparado. Quando voltava para a porta da sala, sentiu forte
dor no peito e tombou. Apesar do imediato socorro recebido, não resistiu e fez seu retorno ao
mundo espiritual.
Deixou exemplos de fé, dignidade, caridade e honestidade como poucos. Uma obra
pedagógica e espírita considerável. Anos depois o movimento espírita francês lançou, em 1890, o
livro Obras Póstumas, contendo os escritos que não chegou a publicar, e então mais ainda se fez
admirar, pelo seu olhar sobre o futuro, tanto da humanidade quanto do Espiritismo, assim como pela
sua humildade diante das informações espirituais que recebia, deixando claro que não era o
responsável pela nova doutrina, mas apenas um trabalhador, pequeno, chamado por Jesus Cristo
para dar corpo aos ensinos dos Espíritos, os verdadeiros autores do Espiritismo, doutrina de
educação da alma imortal.

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