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Notas a propósito do processo de pesquisa

Prof. Fabio de Barros Silva


DFIME/UFSJ

1. As etapas básicas para a realização de uma pesquisa

Os diferentes tipos de pesquisa devem ser considerados mediante a definição da


natureza do assunto/tema e dos problemas a serem investigados. Isso porque a adoção dos
procedimentos metodológicos a serem seguidos justifica-se pela necessidade de responder aos
questionamentos levantados. Sendo assim, a realização de uma pesquisa deve considerar,
como indica Ruiz (Cf. 1976), a realização de algumas etapas:

Etapa I - Escolha do assunto – Na escolha do tema de sua investigação, o


pesquisador deve considerar alguns critérios: tendências e preferências pessoais – o tema
deve corresponder ao gosto pessoal; aptidão – capacidade de resolver a questão proposta;
tempo – disponibilidade de tempo para realização da pesquisa; recursos disponíveis –
possibilidades concretas de realizar a pesquisa. Outro critério importante é o que se refere à
relevância do assunto escolhido. A esse respeito, afirma Ruiz (1976, p. 59-60):

O estudante universitário imbuído de espírito científico não cede à tentação, ao


comodismo, à mediocridade de escolher assunto pela sua aparente facilidade; ao
contrário, procura assuntos cujo estudo e aprofundamento lhe possam trazer
contribuição efetiva para o próprio amadurecimento cultural, e alguma contribuição
objetiva ao esclarecer melhor um problema, ao cobrir uma lacuna, ao corrigir uma
falsa interpretação, ao esclarecer aspectos até então obscuros, ao aprimorar a
definição de um conceito ambíguo, ao promover o aprofundamento sobre tema
relevante pelo seu conteúdo e pela sua atualidade.

Etapa II – Especificação/delimitação do assunto, definição do problema – A


delimitação do tema de uma pesquisa deve ser realizada mediante leitura exploratória cujo
objetivo é conhecer o panorama geral do assunto, isto é, captar os múltiplos aspectos que o
envolvem. Por isso, como explica Ruiz (1976, p. 61), a especificação definitiva do problema
ou dos problemas de uma investigação “é fruto da própria pesquisa”. Todavia, isso não
significa que se deva iniciar uma pesquisa sem definir um alvo, um objetivo geral.
Inicialmente, é preciso delimitar o assunto. A partir daí, a delimitação, o estreitamento do
assunto, a identificação dos problemas, evoluirá no decorrer da própria prática investigativa. É

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o que afirma Köche (2003, p. 129): “[...] à medida que os seus conhecimentos vão se
ampliando em função das leituras efetuadas [...], o investigador começará a perceber o
complexo de varáveis (aspectos, elementos) que estão presentes no tema de pesquisa que
escolheu e, então, começará a decidir com quais irá trabalhar”.

Etapa III – Construção do projeto de pesquisa – Esta fase caracteriza-se pela


construção do planejamento da investigação que será realizada. Aqui, o pesquisador deverá
elaborar um projeto de pesquisa estabelecendo, entre outros pontos, o problema que será
investigado, o modo como a questão vem sendo tratada na literatura científica, a relevância
teórica e social da pesquisa, os objetivos da pesquisa, a metodologia, o cronograma de
execução e a bibliografia que já foi levantada.
O projeto de pesquisa é de fundamental importância na realização de trabalhos de
conclusão de curso (TCC), de dissertações de mestrado e teses de doutorado. Quase sempre, a
admissão em programas de pós-graduação, especialmente no mestrado e no doutorado, exige
que o candidato elabore um projeto de pesquisa que será avaliado por uma banca que,
posteriormente, arguirá seu autor. Além disso, a elaboração é exigida pelas agências
financiadoras de pesquisa (CNPq, Capes, FAPEMIG) que, considerando a qualidade do
projeto, poderá ou não fornecer bolsas de pesquisa a jovens cientistas.

2. A estrutura do projeto de pesquisa

Antes de apresentar os elementos estruturais de um projeto de pesquisa, algumas é


importante destacar algumas considerações gerais a respeito do projeto:

(i) O projeto de pesquisa, como o próprio nome já diz, não é o produto final da pesquisa.
Trata-se, pois, de um roteiro, de um planejamento prévio que poderá sofrer alterações
ao longo do processo de investigação científica.

(ii) A estrutura do projeto de pesquisa pode variar. Abaixo, procuramos expor os


elementos estruturais básicos. A introdução, por exemplo, pode ser subdividida em
três seções independentes: 1. Explicitação do objeto e dos problemas; 2. Revisão
de literatura; 3. Justificativa. Pode-se, ainda, incluir outros itens como Orçamento
– indicação dos custos financeiros para execução do projeto.

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(iii) As diferentes estruturas atendem à organização dos órgãos responsáveis pela seleção
e aprovação dos projetos. Normalmente, o processo de seleção estabelece, por meio
de editais, normas ou regulamentos, a estrutura para a apresentação e elaboração dos
projetos. Programas de pós-graduação, editais de Iniciação Científica, agências de
fomento à pesquisa (CNPq, CAPES, FAPEMIG) possuem exigências e formulários
próprios. O candidato disposto a apresentar um projeto deve estar atento à estrutura
exigida.

(iv) Outra observação importante: os editais, normas e regulamentos costumam


estabelecer o número máximo de páginas do projeto. Quando isso não acontecer, é
importante considerar que um projeto de pesquisa não deve ultrapassar 20 (vinte)
páginas.

Os elementos estruturais de um projeto de pesquisa

A) Título - O título do projeto deve retratar o tema e sua delimitação (o problema ou


problemas que serão estudados).
B) Introdução - A introdução deve fornecer uma visão geral do tema e do(s)
problema(s), ou seja, explicitar com clareza o objeto da pesquisa a ser realizada. A
apresentação do tema e dos problemas deve ser feita por meio de uma revisão de literatura
ou referencial teórico que discuta os principais conceitos, as palavras-chave da pesquisa e
o estado da questão. Algumas questões devem ser consideradas na elaboração da introdução:

(i) Qual é o objeto da pesquisa? Quais os problemas a serem investigados?


(ii) Qual a importância/relevância da pesquisa?
(iii) O que já foi estudado a respeito? Quais os conceitos principais? Quais os
principais autores e referenciais estudados?

C) Objetivos - Os objetivos devem indicar o que se pretende com o desenvolvimento


da pesquisa. Caso seja necessário, pode-se dividir os objetivos em: objetivo geral (resultado
geral que se espera alcançar com a pesquisa) e objetivos específicos (resultados específicos
que se espera obter por meio de ações particulares).

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D) Metodologia (Materiais e métodos) - Antes de tudo, é necessário ressaltar que o
delineamento metodológico, objeto deste tópico, está intrinsecamente ligado ao tipo de
pesquisa a ser realizado. O delineamento metodológico deverá explicitar o encaminhamento
da investigação destacando as técnicas e os materiais (se for o caso) que serão utilizados.
E) Plano de trabalho e cronograma - O cronograma pode ser elaborado em forma de
tabela e deve considerar o prazo máximo de entrega dos resultados finais da pesquisa.
F) Referências - As obras e artigos estudados para a elaboração do referencial teórico
devem ser listados em ordem alfabética e em conformidade com a NBR 6023 – ago. 2002 da
ABNT ou da APA.

3. Classificação das pesquisas

Existem diferentes formas de tipificar pesquisas, pois qualquer tipo de classificação


dependerá dos critérios e do enfoque utilizados. Nesse sentido, o que se pretende apresentar
aqui são classificações muito amplas e gerais que servem para introduzir a discussão. Lembre-
se, portanto, que em cada um dos tipos apresentados é possível inserir subtipos, ou seja,
detalhar ainda mais a classificação indicando características peculiares da metodologia
aplicada no estudo. Por exemplo: no âmbito do que chamamos pesquisa do tipo “teórico-
bibliográfica” pode-se inserir os estudos que resultarão na publicação de um “ensaio”, “um
artigo de revisão sistemática de literatura”, “caracterização do estado da arte”, etc. As
classificações que vamos apresentar baseiam-se em dois critérios: a pesquisa quanto a seus
objetivos gerais e quanto aos seus procedimentos técnicos gerais.

3.1 A pesquisa quanto a seus objetivos gerais

De acordo com Gil (2002, p. 41) e Andrade (Cf. 2003, p. 124), a classificação das
pesquisas levando em consideração seus objetivos gerais permitem-nos identificar três
grandes grupos de estudos, a saber, os exploratórios, os descritivos e os explicativos.

3.1.1 As pesquisas exploratórias


Os estudos que se enquadram nesse grupo têm como objetivo, como o próprio nome
denuncia, explorar determinada temática ou problema a fim de torná-lo mais explícito e,
assim, elaborar hipóteses que poderão ser testadas por outras pesquisas (Cf. GIL, 2002, p. 41;

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ANDRADE, 2003, p. 124). As pesquisas bibliográficas e os estudos de caso são os exemplos
mais comuns de pesquisa exploratória.

3.1.2 As pesquisas descritivas


Dentre as áreas do conhecimento que mais se utilizam desse tipo de estudo deve-se
destacar as Ciências Sociais (Cf. ANDRADE, 2003, p. 41; GIL, 2002, p. 42). Os estudos que
visam à caracterização de grupos, à descrição do funcionamento de instituições, à
identificação da opinião pública, ao levantamento de dados socioeconômicos e psicossociais,
etc., são exemplos de pesquisas que têm como objetivo descrever fatos e fenômenos (Cf.
ANDRADE, 2003; GIL, 2002). Quanto se atêm à descrição, tais pesquisas ganham contornos
que as aproximam dos estudos do tipo exploratório; quando procuram, além de descrever,
estabelecer relações entre fenômenos, aproximam-se das pesquisas de caráter explicativo.

3.1.3 As pesquisas explicativas


As pesquisas explicativas, embora sempre se apoiem em estudos exploratórios e
descritivos, não se limitam à exploração e à descrição de um fenômeno. Como explica Gil
(2002, p. 42),

Essas pesquisas têm como preocupação central identificar os fatores que determinam
ou que contribuem para a ocorrência dos fenômenos. Esse é o tipo de pesquisa que
mais aprofunda o conhecimento da realidade, porque explica a razão, o porquê das
coisas. Por isso mesmo, é o tipo mais complexo e delicado, já que o risco de cometer
erros aumenta consideravelmente.

Para compreender o caráter explicativo da ciência, é preciso perceber que todo


fenômeno ou ocorrência é determinado por variáveis (elementos, fatores, fatos, etc.). A tarefa
de explicar prende-se, portanto, ao estabelecimento de vínculos entre as variáveis e os
fatos/fenômenos. Vejamos alguns exemplos:

(i) Caso se pretenda, por exemplo, explicar as variáveis que concorrem para o
aumento da violência contra jovens em uma determinada região, é preciso
levantar, por meio de estudos exploratórios e descritivos, os fatores
relacionados e os índices de violência de regiões similares. A partir daí, é
possível elaborar hipóteses capazes de ser verificadas e, assim, explicar o
problema.

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(ii) Pode-se explicar, por meio de testes, os efeitos benéficos ou maléficos do
consumo de determinadas substâncias para a saúde humana, considerando a
constituição química da substância e o que se sabe de fisiologia humana.
(iii) É possível explicar ocorrências atípicas na natureza pressupondo a descrição e
a caracterização dos diversos ecossistemas já estudados.

3.2 A pesquisa quanto aos procedimentos

3.2.1 Pesquisa teórico-bibliográfica


De acordo com Gil (2002, p. 44), a pesquisa bibliográfica é desenvolvida mediante
estudo de material já elaborado e constituído, principalmente, por livros e artigos científicos.
É o que esclarece Ruiz (1976, p. 58), quando afirma:

Bibliografia é o conjunto dos livros escritos sobre determinado assunto, por autores
conhecidos e identificados ou anônimos, pertencentes a correntes de pensamento
diversas entre si, ao longo da evolução da Humanidade. E a pesquisa bibliográfica
consiste no exame desse manancial, para levantamento e análise do que já se
produziu sobre determinado assunto que assumimos como tema de pesquisa
científica.

Para Köche (1997, p. 122), a realização deste tipo de investigação exige que o
pesquisador examine o conhecimento disponível em sua área de atuação, identifique as teorias
produzidas, analise e avalie sua contribuição na compreensão ou explicação do problema
investigado. Nesse sentido, conforme Gil (2002, p. 44) e Ruiz (1976, p. 57), quase todos os
outros tipos de pesquisa exigem uma investigação desta natureza. Basta notar que os artigos
científicos de qualquer área apresentam o tópico “referencial teórico” ou “revisão de
literatura”.
Segundo Köche (1997, p. 122), as principais finalidades das pesquisas bibliográficas
são as seguintes:

 Ampliar o grau de conhecimentos em uma determinada área;


 Dominar conhecimentos em determinada área para fundamentar a interpretação de
problemas que emergem da realidade concreta;
 Descrever ou sistematizar o “estado da arte”, o “estado da questão” ou a “revisão
sistemática de literatura” referente a um tema ou problema.

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Por se tratar de um trabalho teórico, os procedimentos metodológicos da pesquisa
bibliográfica baseiam-se na leitura e fichamento/documentação. O material levantado acerca
do assunto pesquisado será submetido à análise e à apreciação, e as informações obtidas
devem ser armazenadas em “fichas”. Considerando Guerra e Castro (2002, p. 17-21), a boa
leitura deve sempre vir acompanhada de “técnicas de armazenamento. Todo apontamento, por
mais pessoal que seja, pode ser organizado em fichas e acumulado em arquivos”. Entre os
tipos de fichas mais úteis, destacam-se:

(i) Fichas de referências bibliográficas – Fichas que contêm os dados


tipográficos (nome do autor, título do texto, número da edição, local da
publicação, editora e data) dos livros e artigos que serão estudados. Estas
fichas serão utilizadas na montagem da bibliografia consultada para realizar o
trabalho.
(ii) Fichas de citação/transcrição – Fichas organizadas a partir de determinada
fonte de investigação, da qual se extraem trechos citados ou transcritos, por
localização em páginas.
(iii) Fichas-Resumo – Fichas que procurará resumir o conteúdo da fonte
documental pesquisada. O resumo deve ser realizado utilizando a “técnica da
paráfrase”, ou seja, “a reprodução do desenvolvimento do texto de uma fonte
documental, conservando-se as idéias originais”.

Passada a fase de levantamento, leitura e fichamento dos textos, o estudante deverá


construir o texto (trabalho de pesquisa acadêmico, artigo, TCC, dissertação ou tese) de sua
pesquisa. A estruturação do texto exige, antes de tudo, a elaboração de um esquema, de um
sumário provisório que indique os tópicos do trabalho. A maneira de organizar e estruturar as
informações no texto pode variar. Entretanto, é sempre bom considerar uma regra geral: as
informações devem aparecer em etapas e seguindo a disposição lógica, o encadeamento das
ideias. Esta forma de estruturar é a mais comum e obedece à lógica “do geral ao específico”.

3.2.2 Pesquisa documental


Aparentemente a pesquisa documental identifica-se à pesquisa bibliográfica.
Entretanto, afirma Gil (2002, p. 45):

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A diferença essencial entre ambas está na natureza das fontes. Enquanto a pesquisa
bibliográfica se utiliza fundamentalmente das contribuições dos diversos autores
sobre determinado assunto, a pesquisa documental vale-se de materiais que não
recebem ainda um tratamento analítico, ou que ainda podem ser reelaborados de
acordo com os objetos da pesquisa.

Entre as principais áreas que se valem da pesquisa documental estão a filosofia, a história, a
sociologia, a ciência política, a psicologia social, a economia, os estudos literários e artísticos
entre outras.
As fontes utilizadas na pesquisa documental são diversificadas e dispersas. Conforme
Gil (2002, p. 46), existem dois tipos principais:

 Documentos “de primeira mão” que não receberam tratamento analítico – Exemplos:
documentos conservados em arquivos de órgãos públicos e instituições privadas
(Associações Científicas, Igrejas, Sindicatos, Partidos Políticos, etc.) e documentos de
natureza diversificada (cartas pessoais, diários, fotografias, gravações, memorandos,
regulamentos, ofícios, boletins, etc.).
 Documentos “de segunda mão” que já foram analisados – Exemplos: relatórios de
pesquisa, relatórios de empresas, tabelas estatísticas, etc.

Ao tratar da pesquisa bibliográfica, Ruiz (1976, p. 58) oferece uma distinção capaz de
ampliar um pouco mais a discussão acima apresentada:

Fontes são os textos originais, ou textos de primeira mão sobre


determinado assunto. Esses textos, pela importância que tiveram ou que lhes
atribuíram, geraram toda uma literatura mais ou menos ampla.
Bibliografia é o conjunto das produções escritas para esclarecer as fontes,
para divulgá-las, para analisá-las, para refutá-las ou para estabelecê-las; é toda a
literatura originária de determinada fonte ou a respeito de determinado assunto.

Para Gil (2002, p. 47), dois pontos críticos devem ser considerados na avaliação das
pesquisas documentais. Em primeiro lugar, é necessário atentar para a “representatividade dos
documentos”. Para evitar o problema da representatividade, os pesquisadores “consideram um
grande número de documentos e selecionam certo número pelo critério de aleatoriedade”. Em
segundo lugar, é necessário considerar a séria questão da “subjetividade das fontes
documentais”. Nesse caso, pelo menos duas implicações devem ser consideradas: a) as fontes
documentais, por si só, não são capazes de oferecer um quadro objetivo e definitivo do
problema pesquisado; b) o próprio investigador pode estar “contaminado” com pressupostos

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de ordem teórica e moral que podem prejudicar sua interpretação. Por isso, o pesquisador que
utiliza fontes documentais precisa estar atento quanto aos limites de suas conclusões.
A realização de “pesquisas documentais” obedece às mesmas fases da pesquisa
bibliográfica: definição do assunto, levantamento bibliográfico, delimitação do problema,
elaboração do projeto, leitura e fichamento da documentação, e redação do texto. Entretanto,
ao delinear a metodologia da pesquisa, o investigador deverá estabelecer os critérios de
levantamento e seleção dos “documentos” a serem analisados. Além disso, deverá determinar
e justificar a abordagem teórica de sua análise, assim como as categorias ou os elementos que
serão analisados, isto é, responder às seguintes indagações: sob que perspectiva teórica os
documentos serão analisados? Quais elementos (as questões, as categorias) constituirão o
“objeto de investigação”? Em quais aspectos pretende-se deter a atenção? O que, realmente,
me interessa?

3.2.3 Pesquisa experimental


Considere a seguinte situação: determinado está interessado na ocorrência de
determinado fenômeno (Z). Em condições não experimentais, verifica-se que,
frequentemente, a ocorrência deste fenômeno vem acompanhada de quatro condições (A, B,
C e D). Para descobrir qual a condição essencial para que o fenômeno ocorra, o pesquisador
deve manipular e controlar todas as condições que se apresentam.
A situação apresentada serve como exemplo de um tratamento típico da chamada
pesquisa experimental. Este tipo de pesquisa caracteriza-se pela determinação de um objeto
de estudo (fenômeno, fato), seleção das variáveis (condições, fatores, elementos,
características, etc.) que seriam capazes de influenciá-lo, definição dos mecanismos de
controle, manipulação e observação dos efeitos que as variáveis produzem sobre o objeto
(GIL, 2002, p. 47).
As características assinaladas denunciam que, essencialmente, o trabalho experimental
depende de condições precisas, ou mais precisas possíveis, de controle, manipulação e
observação. Tais condições verificam-se, por exemplo, nos laboratórios. Por isso, não são
raros os manuais de metodologia científica que identificam pesquisa experimental a pesquisa
de laboratório. Ruiz (1976, p. 52), por exemplo, afirma:

A pesquisa de laboratório [...] permite que o pesquisador reitere, provoque e produza


fenômenos em condições de controle. Experimentar, ou realizar experimentos,
significa exercer positivo controle sobre as condições presumivelmente relevantes,
relativamente a determinado evento; significa reproduzir, repetir fenômenos dentro

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de um plano de modificações sistemáticas das variáveis independentes,
relativamente a determinado evento, com o objetivo de descobrir as condições
antecedentes responsáveis pelo evento subseqüente, ou efeito, ou variável
dependente assumida como objeto de pesquisa.

Gil (2002, p. 48) destaca que embora a pesquisa experimental esteja associada àquela
realizada em laboratório, ela não se desenvolve, necessariamente, a um espaço determinado.
O que define este tipo de pesquisa são as condições estipuladas para controlar, observar e
manipular as variáveis, como já foi destacado acima. Sendo assim, é possível realizar
experimentos em inúmeras áreas desde que as condições essenciais para controlar o
experimento sejam estabelecidas. Em que pese o fato de Ruiz (1976) identificar pesquisa
experimental à pesquisa laboratório - o que, na avaliação de Gil (2002), é um equívoco -, sua
definição de pesquisa experimental é bastante satisfatória. Pensando nisso, retomemos a
situação apresentada no início deste tópico.
Depois de controlar, manipular e observar as diversas condições que poderiam
determinar a ocorrência do fenômeno Z, o pesquisador chegou às seguintes conclusões:

A, B e C produzem Z.
A, B e D não produzem Z.
B, C e D produzem Z.

Considerando tais resultados, o que poderíamos concluir? Entre as variáveis analisadas


(A, B, C e D), qual é a que se revela essencial para que o fenômeno Z ocorra?

3.2.4 Pesquisa de campo


Como assinala Ruiz (1976, p. 50), “a pesquisa de campo consiste na observação dos
fatos tal como ocorrem espontaneamente, na coleta de dados e no registro de variáveis
presumivelmente relevantes para ulteriores análises”. As mesmas características são
apontadas por Marconi (apud ANDRADE, 2003, p. 127): “pesquisa de campo é aquela
utilizada com o objetivo de conseguir informações e/ou conhecimentos acerca de um
problema, para o qual se procura uma resposta, ou de uma hipótese, que se queira provar, ou
ainda, descobrir novos fenômenos ou as relações entre eles”. Sendo assim, diferentemente da
pesquisa experimental, o estudo de campo não procura isolar ou controlar variáveis, embora
permita a determinação de “fatores de inclusão” e de “fatores de exclusão” ao estipular os
dados a serem observados e analisados. A determinação destes fatores é importante, pois,

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como explica Gil (2002, p. 52-53), um dos principais objetivos do estudo de campo é o
aprofundamento de questões propostas acerca das práticas, dos comportamentos e das crenças
de uma população específica. Na avaliação de Cruz Neto (2002, p. 53), a noção de “campo de
pesquisa” indica, com clareza, este aprofundamento: ao determinar o “campo”, o pesquisador
“recorta” o “espaço”, indica a “realidade empírica a ser estudada”.
Contudo, antes de determinar o “campo” a ser investigado e o problema da pesquisa, o
pesquisador deve realizar estudos bibliográficos prévios. Para Ruiz (1976, p. 51), tais estudos
servem para verificar o estado atual do problema, ou seja, os trabalhos de pesquisa já
realizados acerca do tema; estabelecer o quadro teórico que, posteriormente, será utilizado na
análise dos dados coletados; estabelecer as variáveis e a elaboração dos questionários. Assim,
torna-se fácil demonstrar as principais fases da pesquisa de campo: Fase 1 – Pesquisa teórica;
Fase 2 – Determinar o enfoque teórico e as técnicas de que serão utilizadas na coleta de
dados; Fase 3 – Elaborar os instrumentos de coleta de dados (questionários, entrevistas,
formulários); Fase 4 – Organização dos dados coletados; Fase 5 – Análise dos dados e
conclusões.
De acordo com Ruiz (1976, p. 51-52), as técnicas de coleta de dados normalmente
utilizadas nas pesquisas de campo são as seguintes:

A – Entrevista – “Consiste no diálogo com o objetivo de colher, de determinada


fonte, de determinada pessoa ou informante, dados relevantes para a pesquisa em
andamento” (RUIZ, 1976, p. 51). As entrevistas constituem-se de perguntas abertas
respondidas pelo entrevistado diante do pesquisador. Por isso, é necessário fazer
anotações e gravar as respostas que, posteriormente, devem ser transcritas
integralmente e com absoluta fidelidade. Para conduzir a entrevista, o entrevistador
deve inicialmente elaborar um questionário semiestruturado que contém as questões
centrais referentes à pesquisa. Isso não impede que o pesquisador, durante a entrevista,
tangencie a conversa, reformule as questões e formule outras perguntas a fim de colher
o maior número de dados possíveis. Além disso, na condução das entrevistas, como
alerta Ruiz (1976, p. 51), é preciso tomar alguns cuidados. O entrevistador deve:

 Ser discreto e evitar ser importuno;


 Deixar o informante à vontade para responder;
 Manter a entrevistas dentro dos objetivos estabelecidos pela pesquisa;

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 Falar pouco – o mínimo possível – e ouvir mais – o máximo possível;
 Ser elegante e habilidoso para evitar que a entrevista seja desviada para
assuntos impertinentes;
 Registrar tudo o que for possível e necessário, e não confiar na memória.

B – Questionário – Como explica Ruiz (1976, p. 51), se “na entrevista, o informante


fala; na técnica do questionário o informante escreve ou responde por escrito a um
elenco de questões cuidadosamente elaboradas”. As perguntas, como destaca Dmitruk
(2001, p. 71), podem ser abertas. Entretanto, normalmente, o questionário é composto
por questões fechadas ou de múltipla escolha. As principais vantagens do questionário,
especialmente se ele for composto por perguntas fechadas ou de múltipla escolha,
residem na possibilidade de ampliar o número de informantes e na facilidade de
tabular e organizar os dados coletados. Alguns cuidados a serem tomados na
elaboração de questionários:

 Elaborar as respostas com objetividade, clareza e precisão.


 Articular e ordenar, adequadamente, as questões.
 Indicar, por meio de uma carta, por exemplo, a seriedade da pesquisa e a
importância da colaboração dos informantes.
 Explicar a maneira como o questionário deve ser respondido e devolvido.

C – Formulário – Segundo Ruiz (1976, p. 52), o formulário “é uma espécie de


questionário que o próprio pesquisador preenche de acordo com as respostas do
informante”. Trata-se, portanto, de instrumento composto por questões fechadas e
objetivas. Sua principal vantagem está na facilidade de aplicação – o próprio
pesquisador preenche com as respostas dos informantes.

Nos estudos de campo, a análise dos dados coletados funda-se em dois tipos de
abordagem: a quantitativa e a qualitativa. Na abordagem quantitativa os dados são tratados
de maneira estatística, isto é, são elaborados gráficos e tabelas que distribuem os resultados
obtidos que serão, posteriormente, interpretados. Tal abordagem justifica-se, especialmente,
quando se pretende dar conta de conhecer e explicar o comportamento e as crenças de uma

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população mais ampla. Vale ressaltar que a realização deste tipo de abordagem depende de
um cuidadoso delineamento metodológico e estatístico.
Na visão de Minayo (2002, p. 21-22), a abordagem qualitativa preocupa-se com tudo
aquilo que não pode ser quantificado: “ela trabalha com o universo de significados, motivos,
aspirações, crenças, valores e atitudes, o que corresponde a um espaço mais profundo das
relações, dos processos e dos fenômenos que não podem ser reduzidos à operacionalização de
variáveis”. De acordo com Gomes (2002), a abordagem qualitativa dos dados coletados pode
ser realizada, por exemplo, mediante o estabelecimento de categorias ou por meio da análise
do discurso.
No primeiro caso, o pesquisador procura organizar e classificar o discurso dos
informantes por meio de categorias estabelecidas antes do trabalho de campo, isto é, durante a
fase da pesquisa bibliográfica e da reflexão acerca dos objetivos da pesquisa. Vale destacar
que a abordagem qualitativa por meio de categorias é realizada com bastante frequência. Mas,
o que significa analisar o conteúdo de uma entrevista por meio de categorias? Eis o que
afirma Gomes (2002, p. 70):

A palavra categoria, em geral, se refere a um conceito que abrange elementos ou


aspectos com características comuns ou que se relacionam entre si. Essa palavra está
ligada à idéia de classe ou série. As categorias são empregadas para se estabelecer
classificações. Nesse sentido, trabalhar com elas significa agrupar elementos, idéias
ou expressões em torno de um conceito capaz de abranger tudo isso. Esse tipo de
procedimento, de um modo geral, pode ser utilizado em qualquer tipo de análise em
pesquisa qualitativa.

Note-se, portanto, que, depois de estabelecer as categorias, o pesquisador deverá


analisar o discurso dos informantes organizando-o e classificando-o de acordo com a
perspectiva sugerida pela categoria. Não custa acrescentar que a interpretação dos dados pode
ser realizada na medida em que as respostas obtidas nas entrevistas são analisadas.
A abordagem qualitativa fundada na análise do conteúdo possui, segundo Gomes
(2002, p. 74), duas importantes funções: A – Verificação de hipóteses e/ou questões: por
meio da análise de conteúdo, podemos encontrar respostas para as questões formuladas e
também podemos confirmar ou não as afirmações estabelecidas antes do trabalho de
investigação. B – Descoberta do que está por trás dos conteúdos manifestos: o pesquisador
deve apresentar necessária sagacidade para perceber o que está além das aparências do que
está sendo comunicado.
A análise de conteúdo pode ser utilizada em inúmeros trabalhos e pode combinar-se
com o trabalho por categorias. O mais importante é lembrar que, ao trabalhar com pesquisa
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qualitativa, o pesquisador deve estar munido de um claro referencial teórico, conhecer o
contexto em que o problema da pesquisa está inserido e, especialmente, ser capaz de perceber
significados e sentidos nas entrelinhas de um discurso, o que não significa, é claro, enxergar
elementos onde não existem.

3.2.5 Estudo de caso


Inicialmente, é preciso lembrar o “estudo de caso”, bem como a “pesquisa
participante”, vale-se dos mesmos procedimentos básicos de pesquisa que acima procuramos
destacar. De acordo com Gil (2002, p. 54), o estudo de caso “consiste no estudo profundo e
exaustivo de um ou poucos objetos, de maneira que permita seu amplo e detalhado
conhecimento [...]”. Uma das maiores desvantagens do estudo de caso, explica Gil (2002, p.
55), está na dificuldade de generalização das conclusões obtidas, já que a pesquisa, embora
aprofundada e detalhada, é realizada quase sempre em torno de um único caso.
O estudo de caso exige o uso de diferentes procedimentos metodológicos: análise de
documentos, realização de entrevistas e observação in loco. A exemplo do que ocorre com
qualquer outro tipo de pesquisa, é preciso estabelecer o referencial teórico de análise e
tratamento dos dados. O referencial oferece os subsídios para a definição do que será
analisado nos documentos escolhidos (que tipo de informação é necessária?), a elaboração dos
roteiros de entrevistas (o que será perguntado?) e dos roteiros de observação (o que será
observado?).

3.2.6 Pesquisa-ação
A pesquisa-ação consiste num “tipo de pesquisa com base empírica que é concebida e
realizada em estreita associação com uma ação ou com a resolução de um problema coletivo e
no qual os pesquisadores e participantes representativos da situação ou do problema estão
envolvidos de modo cooperativo ou participativo” (THIOLLENT, 1985 apud GIL, 2002, p.
55). Note-se que essa modalidade de pesquisa se caracteriza pelo estreito relacionamento
entre o pesquisador e a comunidade ou situação investigada. Sendo assim, o cientista não só
procura compreender a realidade estudada, mas também procura desenvolver ações de
intervenção visando à solução dos problemas que dela emergem.

3.2.7 Pesquisa participante


No que se refere ao envolvimento do pesquisador com a comunidade ou organização a
ser investigada, a pesquisa participante assemelha-se à “pesquisa-ação”. Entretanto, nesse tipo
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de investigação, não se pretende desenvolver ações de intervenção. Como explica Severino
(2007, p. 120), nessa modalidade de pesquisa, “o pesquisador, para realizar a observação dos
fenômenos, compartilha a vivência dos sujeitos pesquisados, participando, de forma
sistemática e permanente, ao longo do tempo da pesquisa, das suas atividades”. Assim,
considerando o problema ou a situação a ser estudada, o pesquisador realiza registros
descritivos minuciosos, analisa e tece considerações ao longo do processo de pesquisa. Tais
procedimentos se traduzem em dados que possibilitarão a adequada compreensão do
problema ou situação estudado.

Referências

Além dos títulos citados ao longo do texto, acrescentamos outras referências para o
aprofundamento da discussão que, de forma muito singela, procuramos apresentar. Existem,
além desses que estamos indicando, muitos outros títulos que tratam dos assuntos que
abordamos. Vale a pena consultá-los.

ANDRADE, Maria M. Introdução à metodologia do trabalho científico. 6. ed. São Paulo:


Atlas, 2003.

ASTI VERA, Armando. Metodologia da pesquisa científica. 8. ed. São Paulo: Globo, 1988.

CHIZZOTTI, Antonio. Pesquisa qualitativa em ciências humanas e sociais. Petrópolis, RJ:


Vozes, 2006.

CRUZ NETO, Otávio. O trabalho de campo como descoberta e criação. MINAYO, M. C. S.


(org.). Pesquisa social: teoria, método e criatividade. 21. ed. Petrópolis: Vozes, 2002. p. 51-
66.

DEMO, Pedro. Metodologia científica em Ciências Sociais. 3. ed. rev. ampl. São Paulo:
Atlas, 2014.

DMITRUK, Hilda Beatriz (org.). Cadernos metodológicos: diretrizes de metodologia


científica. 5. ed. Chapecó, PR: Argos, 2001.

FAZENDA, Ivani (org.). Metodologia da pesquisa educacional. 8. ed. São Paulo: Cortez
Editora, 2002.

GIL, Antônio Carlos. Como elaborar projetos de pesquisa. 4. ed. São Paulo: Atlas, 2002.

GOMES, Romeu. A análise de dados em pesquisa qualitativa. In: MINAYO, M. C. S. (org.).


Pesquisa social: teoria, método e criatividade. 21. ed. Petrópolis, RJ: Vozes, 2002. p. 67-80.
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GUERRA, Martha de Oliveira; CASTRO, Nancy Campi de. Como fazer um projeto de
pesquisa. 5. ed. Juiz de Fora, MG: EDUFJF, 2002.

KÖCHE, José Carlos. Fundamentos de metodologia científica: teoria da ciência e iniciação à


pesquisa. 21. ed. Petrópolis, RJ: Vozes, 2003.

MINAYO, M. C. S. Ciência, técnica e arte: o desafio da pesquisa social. In: MINAYO, M. C.


S. (org.). Pesquisa social: teoria, método e criatividade. 21. ed. Petrópolis, RJ: Vozes, 2002.
p. 09-29.

MOREIRA, Herivelto; CALEFFE, Luiz Gonzaga. Metodologia da pesquisa para o professor


pesquisador. 2. ed. Rio de Janeiro: Lamparina, 2008.

RUDIO, Franz Victor. Introdução ao projeto de pesquisa científica. Petrópolis, RJ: Vozes,
1978.

RUIZ, João Álvaro. Metodologia científica: guia para eficiência nos estudos. São Paulo:
Atlas, 1976.

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