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Revcrian 41
Revcrian 41
Prêmio Professores
do Brasil
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expediente
Presidente da República
Luis Inácio Lula da Silva
Ministro da Educação
Fernando Haddad
Secretário Executivo
Jose Henrique Paim Fernandes
Consultora Editorial
Vitória Líbia Barreto de Faria
Jornalista Responsável
Adriana Maricato - MTB 024546/SP
Editor
Alex Criado
Reportagem
Adriana Maricato de Souza, Adriano Guerra e Edit Silva
Direção de Arte
Projects Brasil Multimídia
Projeto Gráfico
Projects Brasil Multimídia
Criação e Diagramação
Projects Brasil Multimídia
Fotografias
André Dusek e João Castilho
Revisão
Projects Brasil Multimídia
Foto da Capa:
Jardim de Infância 21 de abril, Brasília-DF
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sumário
3 18
2
sumário
Carta ao Professor
3 Entrevista
8 Caleidoscópio
18 Matéria de Capa
27 Artigo
30 Relato
33 Reportagem
35 Resenhas
37 Notas
39 Diálogo
41 Arte
carta ao professor
2 revista criança
entrevista
Imagens quebradas
Adriano Guerra | Belo Horizonte/MG
Existe um choque entre a preparados para isso, assim É hora de preparar os profes-
realidade da escola e o que como um pediatra tem que sores para lidar com essa in-
as crianças vêem fora dos estar preparado para corpos fância real.
seus muros? desnutridos, baleados, vítimas O que significa “culturas
de violência sexual. infantis”?
Estamos inseridos num
mundo onde as imagens ro- Eu tenho medo de haver ain- O ser humano não nasce
mânticas da infância já se da uma visão romantizada da pronto, ele é construído num
destruíram. Outro dia me fa- infância. As imagens românti- processo longo que acom-
laram sobre um pai que esta- cas da infância se quebraram. panha a vida toda. A partir
va muito preocupado porque Foto: João Castilho
revista criança 3
entrevista
de determinantes biológicos Antes das diversidades re- Não, não dá. Entre outros
e das concepções culturais gionais, nós temos a dos su- aspectos, são muito diferen-
vão criando-se as diversas jeitos humanos. Passamos tes as vivências de uma crian-
temporalidades e cada tempo por tempos diversos da vida, ça de classe média em rela-
tem suas especificidades. A então temos que respeitar ção a uma criança que mora
infância é uma delas, como é a infância em suas especifi- na favela. Se vamos falar dos
a adolescência, a juventude, a cidades. Temos que ter um processos de humanização,
vida adulta e como é a velhice. currículo para a formação da de construir-se como huma-
São tempos em que o ser hu- adolescência, dentro dessa nos, eles são muito diferentes.
mano está em um dado mo- especificidade do que é ser Hoje, temos crianças que não
mento da construção da sua adolescente. Os Parâmetros passam sequer por processos
mente, das suas faculdades Curriculares Nacionais (PCNs) de humanização.
superiores, assim como de prevêem isso, de certa forma.
A infância popular hoje está
seus valores e de sua ética.
vivendo um dos seus momen-
Estas temporalidades variam “As imagens
tos mais dramáticos. No mo-
de acordo com cada povo e românticas da infância mento em que você encontra
cultura. Num ambiente rural, a
se quebraram. É crianças na rua, em risco social,
infância, provavelmente, será
hora de preparar os ameaçadas pela droga, amea-
mais curta.
çadas pela violência, crianças
professores para lidar
As condições sociais e de 9 e 10 anos exploradas se-
culturais determinam a pró-
com a infância real.” xualmente, então precisamos
pria duração da infância e ter um projeto específico de
As diversidades de classe
desses outros tempos? educação para elas.
são muito mais fortes: se até
Sim, determinam a duração, agora falamos em infância, Diante disso, eu não posso
as maneiras de viver esses quando vemos as diversidades ter o mesmo processo de Edu-
tempos e o imaginário que se de classe, vamos ter que falar cação Infantil, nem o mesmo
tem sobre eles. Desde o livro em “infâncias”. Porque uma currículo de Educação Infantil.
clássico de Philippe Aries na coisa é ser criança em uma Temos que tomar consciência
década de 19601, chamou-se favela, com o pai desemprega- de que as políticas universa-
a atenção para o fato de que a do, com uma mãe que tem que listas não dão conta das vi-
infância não é sempre a mes- sair de casa cedo para poder vências tão desiguais da
ma, ela passa por temporali- trazer comida para a casa, ser infância.
dades diferentes e, historica- uma criança de seis anos que
Como trabalhar
mente, ela se constrói como cuida do irmãozinho de dois.
as diversidades?
um tempo diferenciado. Uma Essas infâncias são muito di-
coisa é a infância nos tempos versas das infâncias de classe Estávamos falando da di-
mais primitivos e outra a in- média, das infâncias da elite. versidade das infâncias por
fância na Idade Medieval. Nesse sentido, temos que ter classes. A mesma coisa é por
um projeto de Educação Infan- gêneros: é muito diferente um
Como as diretrizes nacio-
til para cada infância. menino, que cedo o pai diz
nais podem atender à di-
“vai pra rua e tem que trazer
versidade cultural e ser, ao Dá para atender às deman- comida e alguns trocados e
mesmo tempo, orientação das da infância popular da você, menina, fica cuidando
segura para a formulação de mesma forma que se atende de seus irmãozinhos”. Uma
propostas pedagógicas? crianças da classe média? criança, uma pré-adolescen-
1
História social da criança e da família. LTC Editora.
4 revista criança
entrevista
te, normalmente, já tem que irmãzinha e a irmãzinha chega de uma criança em cada tem-
sair para trabalhar fora, para aqui duas horas depois”. Na po. Depois, teríamos que saber
cuidar dos filhos dos outros, hora de sair, a mesma coisa. coisas específicas para traba-
para trazer um dinheiro para Você pode ser rígido com a lhar os valores da infância.
a casa. E o menino sai e en- classe média, porque eu pego
No entanto, os cursos hoje
tra nas drogas. São condições um carro, vou lá e busco meu nos preparam muito para co-
diferentes para cada gênero, filho, mas na escolinha da fa- nhecer os conteúdos, para
assim como, é um problema vela não, porque a própria mãe transmitir as matérias. A esco-
muito sério, por raça. Tem que
não sabe que horas chega o
haver políticas específicas.
ônibus. Por isso, as propostas
“Se hoje as camadas
O senhor defende as po- educativas para as infâncias
líticas afirmativas também populares têm que ser muito
populares e sua
dentro da infância? mais sensíveis. infância vivem
realidades tão
Sim, quanto mais há reali- Que tipo de formação o
dades negativas, mais temos professor da Educação In- negativas, elas
que ter políticas afirmativas. fantil precisa ter para incor- têm que ter ações
Se hoje as camadas popula- porar este modelo? afirmativas.”
res e sua infância vivem reali-
dades tão negativas, elas têm Temos que acabar com a la trabalha muito as habilida-
que ter ações afirmativas. Ou- formação generalista. Tem des – de leitura, de escrita –
tro dia, estava em uma escoli- que ser básica para todo edu- mas muito pouco os valores.
nha ao lado de uma favela, e cador e depois para as especi-
a diretora me colocou algumas ficidades dos tempos da vida. Ainda hoje se pensa que
questões que são muito dife- O educador de infância teria a infância é um período de
rentes daquelas de um jardim preparação para alguma coi-
que conhecer muito a história
de infância. Ela disse: “eu não sa que ainda está por vir...
social da infância, a psicologia
posso insistir que as crianças da infância, isso é de uma ri- Aí entramos na questão de
queza! Deveríamos conhecer como entender a infância. O
a diversidade de formas da in- que torna a infância um tem-
fância, sobretudo em um país po específico? Ela é um tem-
como o nosso, de tantas de- po de não fala, um tempo de
não ter o domínio da razão,
sigualdades. Os futuros
do verbo, da lógica do pen-
profissionais devem
samento racional. A infân-
conhecer como
cia se define pelo negativo,
vivem as crian- essa sempre foi a tendência.
ças, como se so- A infância era uma espécie
cializam, que valores de fase mais próxima entre o
aprendem, que cuidados pre- bicho e o ser humano: tempo
cisam, que proteção têm. dos instintos, do choro, do
não controle, dos caprichos.
Depois, tem que entender
muito mais sobre o desenvol- Ela é vista como um tempo
cheguem na hora certa, por- vimento humano. Teríamos que não tem identidade, que
que há dias em que a mãe sai que estudar como se processa não se define por si mesmo, se
muito cedo, deixa por conta da o desenvolvimento no cérebro define em relação à vida adul-
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entrevista
ta, tida como o tempo nobre Como o senhor situa o res, sua ética, sua mente, sua
da vida humana. A vida adul- brincar na Educação Infantil auto-estima, sua capacidade
ta é o tempo do raciocínio, da e no ensino fundamental? motora, sua corporalidade. A
fala, das grandes decisões, da infância é um grande tempo
Antigamente, nos referíamos
para se desenvolver tudo isso.
“ O ideal seria entender à Educação Infantil a até, no
Mas, como? Seria o modelo
máximo, 6 anos. Para a escola,
que a infância penetra a infância é muito curta. Uma
escolar? Eu acho que não. O
modelo escolar está muito fo-
no ensino fundamental. das coisas que temos que
cado em apenas algumas ha-
Ela vai até os 9 anos, fazer hoje é alongar o tempo
bilidades.
de infância. O ideal seria en-
no mínimo.”
tender que a infância penetra Qual a mudança que preci-
gestão do mundo, da gestão na educação fundamental. Ela sa ocorrer?
da cidade e, nesse sentido, vai até os 9 anos, no mínimo.
Na família, por exemplo, para Precisamos pensar o que
todos os tempos anteriores à
nós, 8 anos é criança, 9 anos é ser criança, o que signifi-
vida adulta são considerados
é criança. ca essa fase, esse tempo da
tempos preparatórios.
vida, e nos perguntarmos:
Mas eu não considero que a O que isso traria em termos como desenvolver sua mente,
de mudança para a escola? que ainda é de criança, seus
infância seja uma preparação
para a cidadania. A infância é valores, seu relacionamento,
Isso muda radicalmente a
sua sociabilidade, seu corpo?
um tempo de cidadania. Não escola. Se você tivesse uma
Vamos desenvolver isso atra-
se preparam crianças e ado- política de educação em que
vés do brinquedo, da habilida-
lescentes para um dia serem a infância fosse de 0 a 9 anos,
de de mexer, trabalhar o sen-
sujeitos de direitos, eles já são nós não estragaríamos essa
sorial, a dimensão corpórea, a
sujeitos de direitos, esta é uma fase com os pré-escolares e dimensão de sua identidade
mudança recente. escolares de 1a à 4a série. Se como menino, como menina.
partíssemos dos tempos da
Essa concepção já está vida, de suas especificidades, Isso tem sido feito de for-
incorporada à legislação poderíamos dividir esse longo ma intuitiva...
brasileira, às diretrizes das tempo da infância em três ou-
políticas de educação? É intuitivo, mas há proje-
tros períodos: de 0 a 3 anos,
tos de Educação Infantil que
um período da primeira infân- fazem isso de uma maneira
Está incorporada no Estatuto
cia; de 3 a 6, um período da muito consciente, existem
da Criança e do Adolescen-
segunda infância; de 6 a 9, a professores que se preparam
te (ECA) por exemplo. O ECA
terceira infância. para isso. A minha definição é
tem 15 anos e não diz apenas
preparemos a infância para um O que isso mudaria no que tenhamos uma proposta
dia ter seus direitos, ele diz currículo? de educação para a infância
que respeite seu tempo e tra-
que os direitos da infância e
Mudaria a concepção da balhe a totalidade de desen-
do adolescente devem ser vivi-
educação. Primeiro, teríamos volvimento nesse tempo, até
dos agora. O ECA nos diz que que entender que educar é os 9 anos, invadindo o ensino
a criança tem direito a comer, permitir que o indivíduo se de- fundamental. Eu diria que, no
a brincar, à moradia, à educa- senvolva como ser humano. Brasil, a educação na primei-
ção. O maior direito que uma Desenvolva todas suas poten- ra e na segunda infância ainda
criança tem é ser criança. cialidades, identidades, valo- têm uma concepção totalizan-
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entrevista
te. O currículo seria um proje- um projeto que dê conta dis- a 1a série. E a pré-adolescên-
to, uma proposta de educação so, preparar profissionais, ter cia, que era 9, 10 e 11 anos,
que abrangesse essa totalida- projetos arquitetônicos ade- ainda estava bem próxima da
de. Não de uma maneira intui- quados e, depois, esse projeto infância. Na realidade, nós ti-
tiva, “espontaneísta”, que é o ir invadindo, contaminando, ramos os de 11 anos, que an-
que geralmente se faz. de baixo para cima, o antigo tes estavam na educação de
“pré”, até contaminar a 1a à 4a 5a a 8a série e passamos para
Como ver a ânsia de alfa- série, ao menos, que é o que baixo. Em vez de invadir de
betização nesse tempo da chamamos de ciclo da infân- cima para baixo, é o contrário:
infância? cia no ensino fundamental. é respeitar a infância como
Claro que temos que alfabe- infância e a pré-adolescên-
Como o senhor vê essa cia como pré-adolescência. E
tizar, mas fazendo da própria discussão sobre a inclusão
alfabetização um processo em nunca fazendo com que a pré-
da criança de seis anos no adolescência fosse invadida
que possamos desenvolver a ensino fundamental?
plenitude da capacidade da pela adolescência e nem inva-
criança. O que não podemos Já incluímos a criança de 6 disse a infância, que no Brasil
é dizer que primeiro deve-se anos no primeiro ciclo quando é de 0 a 6 anos. Agora, se for
aprender a ler para, depois, implantamos a Escola Plural colocar os de 6 anos no en-
aprender o resto. Claro que (Projeto Político-Pedagógico da sino fundamental, com todas
é diferente a abordagem de Rede Municipal de Ensino de as características de séries,
6 a 9 anos, como é diferente Belo Horizonte), em 1994. O ci- de ensinar a ler e a escrever,
de 3 a 6, ou de 0 a 3. Mas, a clo da infância no ensino fun- de matar a infância, eles vão
partir dessas especificidades, damental era até os 8 anos; 9, sofrer. Isto pode ser um de-
é preciso ter um projeto de 10 e 11, o ciclo de pré-adoles- sastre. Se for para escolarizar
Educação Infantil mais amplo, cência; e 12, 13 e 14 o ciclo da a infância, eu sou contra. Se
que englobe todo o tempo da adolescência. Mas veja, o que for para respeitar a infância,
infância. nós fizemos foi acabar com as sou a favor.
séries. Então, você não estava
Isso representa também incluindo a criança de 6 anos
uma mudança radical na es- na 1a série. Nós a inserimos no
cola. ciclo da infância.
Seria uma mudança radical O senhor estava aumen-
no modelo de escola. Sobre- tando a infância?
tudo, teríamos que começar
por fortalecer a educação nos Sim, estávamos fazendo
primeiros anos da infância, ter com que a infância invadisse
revista criança 7
CALEIDOSCÓPIO
“...Mal Alecrim segurou a maria-mole, percebeu como era incrivelmente macia. E cheirosa.
Levou-a para seu cantinho na biblioteca, sentou-se em cima dela, pulou, e aprovou.
– Agora, tenho um ótimo travesseiro.
Na manhã seguinte, acordou com a cabeça cheia de açúcar e coco ralado.
– Que maravilha! – deslumbrou-se. – Vai me dar pensamentos doces. – Deu uma lambida na
ponta dos cabelos. – Hummm! E é uma delícia também. Nunca tive um travesseiro tão bom.”
Rosa Amanda Strausz
Alecrim, Ed. Objetiva, 2003
* Doutora em educação pela PUC-Rio. Professora Adjunta da Universidade Federal do Estado do Rio de
Janeiro/UNIRIO. Realiza pesquisa na área de avaliação escolar, políticas educacionais em avaliação e orga-
nização da escolaridade em ciclos. Participou da elaboração da proposta de avaliação do PROINFANTIL.
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caleidoscópio
gico do conhecimento e que acerca da função social da es- o olhar observador, a promo-
aprendam que vão à escola cola seja colocada novamente, ção das crianças e de suas
para ter prazer, para aprender entre nós educadores, a fim de aprendizagens, a valorização
sem que para isso precisem reafirmarmos os valores para das experiências culturais das
receber um prêmio. os quais ela foi criada. A partir crianças, o desenvolvimen-
daí, então, podemos começar to da autonomia, a inclusão,
Para se discutir mudanças
a discutir todos os elementos o diálogo, a preservação da
no que tange à avaliação, an-
do currículo/proposta peda- auto-estima favorável ao cres-
tes de se propor métodos e
gógica, inclusive a avaliação. cimento, o comprometimento
alterações práticas, é preciso
da escola e do professor com
pensar no papel social que Os princípios
o social, o caráter formativo da
tem a escola, a pré-escola e
Ora, se pensar sobre avalia- avaliação, a auto-avaliação, a
a creche, bem como a pro-
ção implica repensar o papel participação, a construção da
fissão de professor. Ninguém
social da escola e da profis- responsabilidade com o cole-
dirá que a função da escola é
são de ser professor, estamos tivo.
selecionar, classificar, excluir.
falando, portanto, de alguns
Ninguém ousaria, entenden- Uma mudança na escola,
princípios que devem nortear
do a educação escolar como em direção a práticas mais
a avaliação. Eles não devem
um bem universal, dizer que democráticas de avaliação e,
ser diferentes daqueles que
a escola deveria ficar apenas portanto, não classificatórias
orientam as práticas e as nos-
com os melhores. Parece que ou segregadoras, não passa
sas crenças acerca do papel
temos claro qual é nosso pa- inicialmente, por mudanças
da escola e da instituição de
pel e a função social da insti- de métodos ou didáticas mais
Educação Infantil na vida das
tuição a qual nos vinculamos contemporâneos. Uma mu-
crianças, de suas famílias e da
profissionalmente. No entan- dança profunda implica em
sociedade.
to, concordando com Sacristán uma reflexão acerca dos prin-
(2001) é necessário desvelar o Gostaria de destacar alguns cípios que regem nossa ação
óbvio para resignificar o papel princípios que, a meu ver, de- pedagógica e que nos darão
da escola e do ensino públi- veriam ser norteadores de a base para a construção de
co como um bem universal. É uma avaliação na instituição nosso projeto pedagógico e
fundamental que a discussão de Educação Infantil. São eles: para os processos de avalia-
ção que estiverem aí inseri-
dos. A clareza e a retidão de
princípios poderão nortear
uma prática coerente e própria
de uma escola ou instituição
democrática, compromissada
com o crescimento e a valo-
rização das crianças, profes-
sores, educadores e funcioná-
rios.
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caleidoscópio
Referências Bibliográficas
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caleidoscópio
Para abrir nosso diálogo, Acompanhar o desenvol- história deve ser considerada,
vale discutir o sentido de ava- vimento da criança ajuda o as conquistas valorizadas, as
liar na educação. A avaliação professor a rever e aprimorar descobertas apreciadas. Para
estará presente o tempo todo seu trabalho. Neste sentido Hoffmann, a avaliação é uma
em nossa prática educativa, avaliar a criança nos leva tam- forma de conhecer/investigar
inclusive nos momentos de bém a avaliar nossa própria o movimento das crianças e,
inserção de novas crianças e ação pedagógica e também a a partir desta investigação,
instituição na qual estamos in- pensar formas de intervenção
ao longo de nossos planeja-
seridos. Afinal, avaliar é o mo- que possam favorecer o
mentos. A cada decisão que
vimento de pensar tudo que desenvolvimento e a ampliação
tomamos, a cada escolha que
envolve nossa prática e bus- dos conhecimentos da criança.
fazemos - desde uma ativida-
car caminhos de torná-la cada Avaliar é comprometer-se com
de que planejamos, até a for- vez mais coerente e mais con-
ma com que lidamos com as a criança, seu sucesso e suas
textualizada. conquistas.
crianças - estamos avaliando.
A avaliação é, portanto, um A professora Jussara
Por isso, é fundamental es-
ato que sugere movimento, Hoffmann – muito conhecida
tudarmos mais sobre o desen-
reflexão e transformação. por suas pesquisas sobre o
volvimento infantil. Muitas ve-
tema da avaliação educacional
zes as crianças com as quais
É importante ressaltar que a – afirma que: “A avaliação
trabalhamos nos surpreendem
avaliação não é um instrumen- deve ser entendida como
com respostas inusitadas que
to para medir o quanto a crian- uma prática investigativa e
nos mostram o quanto elas
ça aprendeu nem tampouco é não sentenciva, mediadora e
pensam sobre o mundo à sua
uma forma de julgar, reprovar não constatativa. Não são os
julgamentos que justificam volta, bem como as ligações
ou aprovar uma criança. A ava-
a avaliação, as afirmações entre os diversos conheci-
liação, que de fato contribui mentos que vão construindo
para o crescimento da criança inquestionáveis sobre o que a
criança é ou não é capaz de na relação com os elementos
e para o trabalho do professor, da cultura, com seus parceiros
fazer.” (2000: 15). Portanto,
precisa ser mediadora e aco- e com o ambiente. A escuta
não devemos avaliar as
lhedora. É ela que possibilitará do ponto de vista da criança
crianças para classificá-las,
o acompanhamento da crian- é, portanto, fundamental! Ela
julgando o que sabem ou não
ça em todos os momentos sabem fazer, padronizando nos revela muito, por um lado,
vividos na Educação Infantil, comportamentos, constatando sobre quem é aquela criança,
contribuindo com seu avanço apenas as suas “capacidades”, quais são as suas vivências e
na ampliação do conhecimen- quantificando seus saberes experiências e, por outro, so-
to de si e do mundo. e apontando seus erros. Sua bre a lógica infantil.
Diretora pedagógica da Casa Monte Alegre Educação Infantil (RJ), professora do curso de Especialização
*
12 revista criança
caleidoscópio
As falas de nossas crianças excelentes instrumentos para outro momento, buscar fontes
nos fornecem preciosas pistas que eles conheçam mais so- de consulta para alimentar o
sobre suas hipóteses, suas bre seu filho e sobre o trabalho trabalho. O professor não pre-
idéias próprias e, partindo do que estamos desenvolvendo, cisa ter todas as respostas!
Ele é na verdade um pesqui-
que elas pensam, podemos mas isso não quer dizer que
sador que vai buscando dia-
desafiar o avanço de seus co- escrevemos para mostrar “o a-dia ampliar também seus
nhecimentos com atividades quanto fizemos” nem para in- recursos e conhecimentos,
interessantes e instigantes. Tal dicar “o que a criança sabe ou junto com suas crianças. O
qual “detetives”, precisamos não sabe”. professor é alguém que ques-
olhar, escutar, observar com tiona, que organiza o grupo
atenção o que nossas crian- Registrar por escrito nossas em torno das necessidades
ças demonstram, o que lhes experiências e as observa- e curiosidades que surgem.
chama a atenção. Isto nos for- ções sobre as crianças permi- Mais experiente, vai sugerindo
te que possamos refletir sobre caminhos, desdobramentos,
nece elementos não só para
nossa prática, revendo nos- desenvolvimentos a partir das
compreender mais sobre cada
sos atos, organizando idéias idéias e sugestões infantis.
uma delas, mas também para
que possamos planejar nosso e experiências, mapeando as Enfim, avaliar é abrir uma ja-
trabalho. Se soubermos os dúvidas, relacionando o que nela para compreender mais
interesses, curiosidades, dú- vivemos com as teorias. Cecília profundamente nossas crian-
Warschauer, professora e edu- ças e a nós mesmos. Assim
vidas, dificuldades de nossas
cadora, acredita que o registro é teremos recursos para apri-
crianças, podemos pensar em
uma forma de retratar a histó- morar a educação e fazê-la
propostas que vão ao encon- mais e mais uma experiência
tro delas. ria vivida, de deixar marcas. É
rica e significativa para crian-
um instrumento que favorece ças e professores.
Um aspecto significativo da a reflexão (1993: 61) e o apri-
prática avaliativa é o registro moramento do professor.
(escrito, fotográfico, ou outro).
Registrar o vivido pela criança A reflexão é o repensar a
Referências Bibliográficas:
permite que acompanhemos ação pedagógica num tempo
ESTEBAN, Maria Teresa (org.).
suas conquistas e avanços. posterior a ela. Neste momen-
Avaliação: uma prática em bus-
É importante termos em vista to, o professor se distancia ca de novos sentidos. Rio de Ja-
do imediatamente vivido, po- neiro: Editora DP& A, 2000.
que não podemos nos base-
ar apenas na nossa memória, dendo, com essa distância, HOFFMANN, Jussara. Avaliação
na pré-escola: um olhar reflexi-
porque ela é muitas vezes fa- olhar para seus atos de uma
vo sobre a criança. Porto Alegre:
lha. Se não registramos nos- outra forma. É por meio deste Editora Mediação, 2000.
sas experiências corremos o repensar que vamos revendo FREIRE, Madalena. A Paixão de
risco de esquecer detalhes os caminhos trilhados, plane- conhecer o mundo. Rio de Janei-
jando os próximos passos e ro: Paz e Terra, 1983.
preciosos do vivido!
articulando os objetivos mais OSTETTO. Luciana Esmeralda.
A escrita, registro mais co- gerais da Educação Infantil e a Deixando Marcas... A prática do
mumente utilizado na escola, registro no cotidiano da educa-
realidade concreta de nossas ção infantil. Florianópolis: Editora
é um excelente recurso para Cidade Futura, 2001.
crianças.
ampliar à reflexão. Não de-
WARSCHAUER, Cecília. A roda
vemos escrever para “prestar Se surgem curiosidades so- e o registro, uma parceria entre
contas” aos pais ou à institui- bre algum assunto por parte professor, alunos e conhecimen-
to. Rio de Janeiro: Editora Paz e
ção. É claro que, para os pais, das crianças, se registramos Terra, 1993.
os relatórios das crianças são suas perguntas, podemos, em
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matéria de capa
Prêmio Profess
Edit Silva | Brasília-DF
18 revista criança
matéria de capa
ores do Brasil
Foto: André Duzek
suas experiências por meio de
uma publicação.
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matéria de capa
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matéria de capa
Foto: André Duzek
revista criança 21
matéria de capa
• Em Campo Grande (MS), • O interesse por música, ses. Na ânsia de buscar mais
alunos de Mara Aparecida manifestado pelas crianças prazer para as atividades, as
Manzoli Caldeira, do Centro de do Centro de Educação Infan- professoras Lucinéia Soprani
Recreação e Educação Infan- til Bem-te-vi, de Florianópolis Camargo, Mary Tavares dos
til Parque dos Poderes, pes- (SC), resultou no trabalho Santos e Tatiane Souza da Sil-
quisaram a história da cidade “É música no ar...”. A profes- va observaram o interesse do
onde moram. Inspirada nos sora Cristiane Lopes estimu- grupo pela água. Com o obje-
versos “ama com fé e orgulho lou as crianças de 3 a 4 anos, tivo de aguçar o conhecimen-
a terra em que nasceste”, do a levarem seus CDs à escola, to, as crianças foram levadas
poema Pátria, de Olavo Bilac, de maneira a apresentar reper- a locais onde havia água,
a professora passou a anali- tórios diversos para os alunos. como o aquário da escola.
sar, em classe, o registro de “Isso fez com que valorizásse- Observaram também a chuva
nascimento de cada uma das mos as cantigas de roda, am- e manusearam recipientes que
crianças. “Filosofamos sobre pliando o acervo musical de- pudessem ser cheios e esva-
isso e priorizei temas como las, a dança, contrapondo-se ziados. “Além disso, o projeto
matemática, história, portu- à erotização da infância”, lem- proporcionou a exploração de
guês, artes e estudamos a his- bra a professora, referindo-se livros com obras de Claude
tória de Campo Grande, para às musicas mais divulgadas Monet, que tem a água como
saber como eram os meios de pela mídia. A partir daí, a tur- presença constante”, diz Luci-
transporte e o comércio da ci- ma visitou escolas de música, néia. Segundo ela, o aprendi-
dade”, relata Mara. escolas de dança, museus, lo- zado ficou visível no interesse
jas de instrumentos musicais, pelas imagens apresentadas e
Depois da pesquisa, o grupo
assistiu a ensaios de bandas no comportamento das crian-
fez passeios pela Cidade para
e orquestras, conheceu as ças que passaram a sentir pra-
observar traços do passado
biografias de compositores zer em tomar banho. O proje-
e do presente. As crianças
eruditos como Brahms e Hei- to também contribuiu para o
também conheceram a histó-
tor Villa-Lobos. Construiu ins- desenvolvimento das crian-
ria de José Antonio Pereira,
trumentos com sucata e con- ças ampliando o vocabulário
fundador da Capital, e fizeram
feccionou um criativo painel
a releitura da tela “O Boi” de
com temas como ‘boi da cara
Humberto Espíndola, que re-
preta’ e ‘fui no tororó’, além de
trata a economia da região,
fantoches para estimular
baseada na criação de gado
a brincadeira e a re-
e atividades agrícolas. Tam-
presentação.
bém entrevistaram famílias
de artistas locais, como a do • O Centro Muni-
poeta Manoel de Barros. Para cipal de Educação
a professora, essa prática ser- Infantil Zélia Vianna
viu para mostrar que “é pos- de Aguiar, em Vi-
sível trabalhar cultura e artes tória (ES), foi o es-
com as crianças, verdadeiros paço principal para
potenciais humanos. A esco- desenvolver ativida-
la não é depósito de criança des com 25 bebês,
e todos os dias fazemos dela cujas idades varia-
um local para a criança viver”. vam de 6 a 17 me-
22 revista criança
matéria de capa
Foto: André Duzek
dos pequenos. “Subestima- acostumar e já se identifica- lenar pião foi a receita mágica
mos a capacidade de nossas vam nele. Usei roda de leitura, da professora Cláudia Beatriz
crianças, mas elas foram ca- com o objetivo de envolver a Souza de Jesus, de Salvador
pazes de compreender tudo”, comunidade e os pais”, expli- (BA). “Prática leitora através
atesta orgulhosa a professora cou Patrícia. Após cinco me- do brinquedo: 1, 2, 3 “lereuei”
Lucinéia. ses de oficinas de interação, a do pião ao “bey blade”. Ela re-
professora colheu fotografias lata que o grupo de crianças,
• Em Cabedelo (PB), crian- de 5 anos, na Escola Munici-
ças de 1 a 3 anos participaram com as mães e as crianças
pal de Nova Esperança Pro-
de uma experiência inédita começaram a reconhecer fa-
fessor Arx Tourinho, na perife-
com a professora Patrícia da miliares e coleguinhas. Foram,
ria da capital, levava imitações
Silva Dutra, na Creche Santa então, orientadas a produzir a
de “bey blade”, pião moderno
Catarina. “O projeto ‘Cons- própria carteira de identida-
originário de um desenho ani-
truindo identidades’ começou de, com fotos e digitais. Ainda
mado. “A partir daí, fizemos
com a experiência de colocar na sala de atividades, fizeram uma viagem no tempo porque
um espelho em sala de aula, maquiagem e fantoches. essa criança não conhecia o
e quando as crianças se de- O corpo e a brincadeira brinquedo tradicional. Mas
ram conta de seus reflexos foi com o que ela via na televi-
uma alegria. Elas beijavam e • Ensinar matemática, lin- são, foi capaz de fazer o pró-
agarravam o espelho e com guagem e as demais áreas do prio brinquedo, com a mesma
o tempo começaram a se conhecimento por meio do mi- dinâmica, que é rodar sobre o
revista criança 23
matéria de capa
eixo”. Essa atividade possibili- começou estudando o próprio de Jesus. Como prometido, o
tou o trabalho com textos, co- terreno da escola. Não encon- visitante foi à escola em forma
nhecer números e a verdadeira trou ali a resposta. A pesquisa de livro: “O Joelho Juvenal” de
história do pião, que surgiu na prosseguiu com a observação Ziraldo, que relata o sofrimen-
Babilônia, há cinco mil anos. dos hábitos caseiros das crian- to do joelho quando o corpo
Foram realizadas oficinas e ças. Descobriu que boa parte não dá conta de se sustentar.
todos aprenderam a tradicio- delas, quando estava em casa, A novidade serviu para que a
nal cantiga “Roda Pião”. ficava sentada vendo televisão. professora trabalhasse com as
Decidiu, então, que era hora de crianças sobre o corpo em mo-
• Por que a mesma criança trabalhar a expressão corporal vimento, ajudando todos a se
cai várias vezes e no mesmo e o movimento para estimular a descobrirem. Ela mostrou ima-
dia? O grande número de pe- coordenação motora daqueles gens do corpo humano, fizeram
quenos acidentes envolvendo meninos e meninas. teatro de fantoche e aprende-
os alunos de 4 a 6 anos fez ram como abotoar a roupa e
com que a professora Maria • A primeira medida foi anun-
amarrar o próprio calçado. Para
de Jesus Gomes Almeida, da ciar que “no dia seguinte, a es-
que as crianças pudessem co-
Escola Municipal Nilza Aires cola receberia a visita de Juve-
nhecer o próprio corpo, todos
Pires, de Catalão (GO), desse nal, o que causou alvoroço entre
desenharam a mão num pa-
início ao projeto “Descobrindo- as crianças e cada uma criava
pel e riscaram as articulações.
se e movimentando-se”. Ela o próprio Juvenal”, conta Maria
Também houve momentos em
que a comunidade foi à escola
O
e os pais pularam corda e brin-
Primeiro Seminário caram com bambolê. Houve
ainda duas caminhadas. “Isso
Professores do melhorou consideravelmente o
desempenho das crianças”, re-
Brasil contou com lembra a professora.
24 revista criança
matéria de capa
revista criança 25
professor faz literatura
*Regina Célia Melo e Rachel Dumont são professoras do Jardim de Infância da 114 Sul,
em Brasília. O material faz parte do Projeto “Livrinho na mão”.
26 revista criança
artigo
O conceito de currículo não 1- A criança um sujeito so- pectiva ampla, supondo que é
corresponde a uma condição cial e histórico que se cons- possível mudar à força o real,
universal, natural, como algo titui na interação com outros com decretos, projetos, refe-
sempre igual, homogêneo e sujeitos da cultura; renciais ou parâmetros sem
de significado óbvio. Ele é so- mudar as condições” (Kramer,
2- As instituições de Edu-
cial e historicamente construí- 2001, p.129).
cação Infantil como espaço
do, tendo sido crivado por di-
de cuidado e educação das No contexto mais amplo, o
ferentes concepções teóricas
crianças de 0 a 6 anos que Ministério da Educação (MEC)
ao longo da história. Faz-se
possibilite a integração entre e o Conselho Nacional de
necessário, portanto, analisar
os diferentes aspectos do de- Educação (CNE) vêm produ-
as condições e os contextos
senvolvimento humano; zindo e publicando documen-
como o currículo para Educa-
tos que estabelecem diretrizes
ção Infantil está sendo gesta- 3- As crianças enquanto
e orientações para elaboração
do em nossa sociedade. Nessa sujeito de direitos;
do currículo da Educação In-
direção, Campos indica que:
4- Os princípios éticos, po- fantil. Neste processo, desta-
“Um dos aspectos que so- líticos e estéticos na elabora- ca-se a instituição pelo CNE,
bressaem no debate atual, ção da proposta pedagógica; em dezembro de 1998, das
com significativas repercus- Diretrizes Curriculares Nacio-
sões sobre as decisões de 5- A identidade dos profis- nais, que são mandatórias.
política educacional que são sionais, das famílias e de cada Este documento expressa a
tomadas, seja de forma des- unidade educacional; preocupação com a qualida-
centralizada nos municípios, de do trabalho a ser desen-
6- A intencionalidade das
seja na instância estadual e volvido neste nível de ensino.
ações educativas;
federal, diz respeito às diver- Na mesma direção, o Parecer
gentes concepções sobre o É possível afirmar, portanto, 04/2000 da Câmara de Edu-
modelo pedagógico que deve que a construção e gestão de cação Básica do CNE, apro-
ser adotado nas creches e propostas curriculares para a vado em 16/02/2000, define
pré-escolas, agora definidas Educação Infantil estão inseri- diretrizes operacionais para a
como constituindo a primeira das num processo social am- Educação Infantil.
etapa da educação básica” plo e multifacetado. Kramer Por outro lado, aponta-se
(Campos, 2002, p.XV). destaca que: “na realidade também a publicação e dis-
Para ampliar o debate acerca brasileira, (...) o debate em tor- tribuição do documento “Re-
do tema em questão, é impor- no do currículo tem mordido ferencial Curricular Nacional
tante levar em conta diversos as pontas do problema, mas para Educação Infantil vol.1,
aspectos que compõem uma não o miolo: ou se refere à es- 2, 3/ RCNEI”. Segundo este
prática educativa de qualida- cola; ou se vincula à dimensão documento, as creches e pré-
de. Entre outras questões, é macro, aborda modelos, de- escolas são espaços de inser-
preciso considerar: senhos e políticas numa pers- ção das crianças nas relações
revista criança 27
artigo
éticas e morais que permeiam Muitos estudos que discu- “Essas práticas
a sociedade. O documento tem propostas pedagógicas
necessitam levar
ressalta, também, que o tra- e currículo desvelaram uma
balho educativo deve criar realidade infinita e ímpar, na em conta o contexto
condições para as crianças qual o processo educativo só social e cultural em
conhecerem, descobrirem e pode ser observado de uma
que as crianças e
ressignificarem experiências, forma multifacetada. Segundo
sentimentos, valores, idéias, Sacristán (1998) a realidade suas famílias estão
costumes e papéis sociais, do currículo não se mostra em inseridas.”
por meio do aprender, do fa- suas modelagens documen-
zer e das múltiplas formas de tais, ou seja, nos projetos pe-
dagógicos, mas na interação sociais não são exclusivamente
expressão.
de todos os contextos educa- um processo psicológico, mas
Este documento tem sofrido tivos que compõem essas prá- social, cultural e histórico. Acre-
diversas críticas de educado- ticas. Essa polissemia permite ditamos, portanto que os direi-
res, pesquisadores e profis- inferir a necessidade de um tos fundamentais das crianças
sionais da área . Para muitos, modelo pedagógico alicerça- devem ser a base de toda e
ele traz de forma implícita uma do em práticas cotidianas que qualquer proposta educacional
concepção de educação com- respeitem as necessidades de para as crianças pequenas.
pensatória e escolarizante, desenvolvimento da criança.
É importante destacar que
além de considerar a criança
Assim, destacamos que as estas questões estão contem-
numa perspectiva universal,
sem levar em conta particula- meninas e os meninos de- pladas no documento “Crité-
ridades regionais ou sociais, vem ser vistos na dimensão rios para um Atendimento que
por exemplo. de “sujeitos–históricos”, ou Respeite os Direitos Funda-
como indica Ostetto (2004) mentais das Crianças”, elabo-
Tendo em vista a diversida- “é preciso assimilar que não rado por Maria Malta Campos
de de “modelos de enquadra- existe criança universal: são e Fúlvia Rosemberg e publica-
mento curricular” presentes na grupos diversos de meninos e do pelo MEC/COEDI em 1995.
realidade educacional, os ter- meninas, de idades variadas, O documento traz as bases e
mos ‘propostas pedagógicas’, procedentes desta ou daquela os princípios para uma política
‘currículo’, ‘projeto político pe- região, pertencentes a este ou nacional de Educação Infantil.
dagógico’, ‘regimento escolar’, àquele grupo familiar”.
‘diretrizes pedagógicas’, ora Na verdade, esses critérios
Nesse sentido, os profissio- de atendimento, passaram a
tem o mesmo significado, ora
nais que atuam em institui- orientar e nortear o trabalho
se diferenciam. Nessa direção
ções com meninas e meninos desenvolvido em alguns con-
Kramer destaca que:
de 0 a 6 anos necessitam de- textos educativos. Assim, em
(...) currículo é palavra polis- senvolver práticas educati- muitas instituições é possível
sêmica, carregada de sentidos vas que considerem todas as identificar práticas concretas
construídos em tempos e es- dimensões e competências que buscam oferecer um es-
paços distintos. Sua evolução humanas potencializadas nas paço estimulante e seguro,
não obedece a uma ordem crianças. Ou seja, essas práti- permitindo que as crianças
cronológica, mas se deve às cas necessitam levar em con- manifestem seu potencial fí-
contradições de um momento ta o contexto social e cultural sico, afetivo, intelectual e cul-
histórico, assumindo, portan- em que as crianças e suas fa- tural, bem como a aprendiza-
to, vários significados ao mes- mílias estão inseridas. Segun- gem de sua autonomia e de
mo tempo (p.136). do Kuhlmann Jr., as relações sua socialização.
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artigo
REFERÊNCIAS BIBLIOGRÁFICAS
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relato
30 revista criança
relato
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relato
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reportagem
revista criança 33
reportagem
ções podem ser conseguidas dentro da creche ou escola professores leitores. Isto trará
na Associação de Leitura do e garantir livros de literatura ganhos para os profissionais e
Brasil”. Os acervos para os infantil adequados às turmas para as crianças. E muito pra-
professores devem ser di- de Educação Infantil, deixan- zer também. Fazem parte da
versificados, com leitura in- do o material disponível para Rede Nacional de Formação
formativa - jornais, revistas, ser pego, folheado, trocado, Continuada: Universidade
periódicos, textos científicos acompanhado, cuidado. “Não de Brasília (UnB), Universi-
sobre educação e também li- é para o livro ficar apenas dade Estadual de Campinas
teratura. “O professor precisa como enfeite bonito na es- (Unicamp), Universidade
conhecer o universo simbó- tante da escola, a criança tem Estadual de Ponta Grossa
lico da Literatura Brasileira e que pegá-lo”. (UEPG), Universidade Fede-
Universal”, diz ela. ral de Minas Gerais (UFMG) e
Secretarias estaduais e mu-
Universidade Federal de Per-
Mas Rosana Becker adverte nicipais de educação e ins-
nambuco (UFPE). Mais infor-
que a professora não pode es- tituições de ensino superior
mações no telefone (0 xx 61
tar sozinha neste trabalho de podem procurar os centros da
2104-8672) e no site www.
leitura. Ela precisa do apoio Rede/MEC na área de Alfabe-
mec.gov.br.
da direção. A diretora deve tização e Linguagem para criar
garantir um espaço de leitura programas de formação de
34 revista criança
resenha
Ao consultarmos o dicioná- Ao falar de sua própria in- tas da infância do autor e que
rio, encontramos como uma fância, Manoel de Barros se confunde com a infância
das acepções da palavra in- desperta nos leitores pe- de cada leitor.
fância “meninice”. E ao falar- quenos sorrisos, franzidos
mos da palavra infância, mui- nas testas, olhares curiosos Um autor que desde crian-
tas imagens, gostos, cheiros e uma vontade de ir adiante ça sabia o que queria: “frase-
e toques parecem estar vi- em cada pequena história ar” e “escovar as palavras”.
vos na nossa memória, bem lembrada ou inventada. E você, o que deseja da vida
como na de nossos pais e no tempo de ser criança?
avós... Estas histórias podem ser
lidas em conjunto ou mesmo
Nesta publicação depara- separadas, vêm muito bem
mo-nos com uma caixa, uma guardadas, como as delícias
caixa de segredos, uma cai- e memórias de uma in-
xa de brinquedos, uma caixa fância devem estar
de memórias, uma caixa de dentro de cada
pessoas e personagens, uma um de nós.
caixa de imaginação, uma
caixa de muitas coisas... Os livrinhos
são entrelaça-
Manoel de Barros é um au- dos cuidadosa-
tor que escreve sobre e para a mente com laços
infância, e, também para adul- de fita e com lindas
tos. Como na infância, o autor ilustrações feitas por
nos recebe na primeira página sua filha Martha – que
do livro dizendo: “tudo que parecem traçadas por
não invento é falso”, pois na criança – uma caixinha que
infância o que é mais verda- encanta crianças e adultos.
deiro é a imaginação que se
transforma em faz de conta, A caixa é um convite para
que se transforma em brinca- conhecermos os objetos, bi-
deira, que se transforma em *Karina Rizek Lopes é Coordenadora
chos e pessoas que foram e
Geral de Educação Infantil da Secretaria
coisa séria! são personagens protagonis- de Educação Básica do MEC.
revista criança 35
resenha
Pé com Pé
Compositor/Intérprete: Sandra Peres e Paulo Tatit
Ilustrações: Giba Gomes
Pesquisa: Paulo Dias
Gravadora: Selo Palavra Cantada
Vitória Faria*
O álbum está organizado em co infantil. Este último parece O álbum como um todo se
dois CDs que exploram o uni- pertencer à mesma linhagem constitui em uma verdadeira
verso rítmico brasileiro e suas do Álbum Canções do Bra- aula de música para crianças e
origens africanas. O primeiro, sil, de 2001. Naquele traba- adultos, vez que, além dos dois
“Pé com Pé”, apresenta can- lho foram gravadas canções CDs, traz um encarte com le-
ções cheias de humor, aven- com crianças de 26 estados tras das canções, explicações
tura e poesia. Com diferentes brasileiros, que retratavam sobre os instrumentos utiliza-
ritmos e fazendo uso de uma a diversidade das tradições dos, origem e história dos rit-
linguagem lúdico-poética, pe- musicais de cada local visi- mos escolhidos, partituras das
netra na cultura infantil, tra- músicas apresentadas, além
tado. Tudo acompanhado por
zendo à tona seus brinquedos dos maravilhosos desenhos
registros feitos em um diário
e brincadeiras, seus hábitos e ilustrativos de Giba Gomes.
de viagem que acompanhava
maneiras de ver o mundo. a coletânea. A coletânea é uma grata
O segundo CD, “Pé na Co- contribuição aos professores
Agora, tendo como base a
zinha” é um convite à dança, de creche e pré-escola no de-
pesquisa feita pelo etno-mu-
à exploração de movimentos senvolvimento de atividades
sicólogo Paulo Dias, os dois relacionadas à história da mú-
e ao conhecimento de uma
músicos trazem a cultura ne- sica brasileira, bem como de
multiplicidade de ritmos re-
gra enraizada em alguns es- apreciação, vivência e produ-
tirados de diferentes instru-
tados brasileiros com ritmos ção musical. Neste sentido,
mentos musicais. Com grande
que vão do reggae ao maraca- possibilita às crianças diver-
ênfase na percussão, as mes-
tu, passando pela umbigada e sas formas de exploração do
mas canções são reapresen-
danças originárias da capoeira conteúdo do álbum por meio
tadas em trilha sonora, tendo
e dos quilombos, bem como o de diferentes linguagens: cor-
apenas bases instrumentais.
boi matraca, o partido alto e o poral, musical, poética, lúdica,
Eis o resultado de um cuida- moçambique. Contracenan- plástica, oral e escrita, além de
doso e sério trabalho da du- do com as sonoridades afri- fornecer conhecimentos sobre
pla Sandra Peres e Paulo Tatit, canas, trazem a música pop, as nossas raízes culturais.
que, em outros momentos, já de origem norte-americana e
nos presenteou com outras inglesa e os caboclinhos da *Vitória Faria é consultora editorial da
obras voltadas para o públi- tradição indígena. Revista Criança.
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notas
revista criança 37
notas
Divulgação de experiências
premiadas
Cerca de 20 mil exemplares da publicação
Prêmio Qualidade na Educação Infantil 2004
foram distribuídas às secretarias de educa-
ção de todo o país. A publicação relata as
24 experiências premiadas naquele ano, de
forma a torná-las conhecidas e estimular a
38 revista criança
diálogo
Natalice,
revista criança 39
diálogo
É com grande emoção que escrevo por- Moro em uma comunidade no Rio de
que acabei de ler “Oh Bagdá!”, poema do Janeiro, Vila do João, local em que
professor Daniel Faria. É lindo! Gostaria de constantemente a violência aterroriza meu
parabenizá-lo e dizer que também gosto de coração. Fui educadora infantil no Bairro
poesia. Acredito que só o poema é capaz de da Maré por muitos anos.Exatamente hoje,
por luz na alma humana quando esta está na num momento de tristeza, pois não pude
escuridão, porque a poesia é a linguagem de ir a faculdade devido ao tiroteio da noite,
Deus. chegou a Revista Criança...
... Eu preciso que vocês saibam que
Adenir Vendrame materiais como este são essenciais para
Juruena (MT) nossa reflexão constante, pois relatam
experiências fascinantes e possíveis, além
dos artigos e entrevistas importantíssimas.
Adenir,
É um material maravilhoso! Estou feliz
Os poetas são os responsáveis pelo reencan- por ter a oportunidade de receber esse
tamento do mundo e, os defensores do meio presente, num dia como esse.
ambiente, os preservadores da continuidade
da vida em nosso planeta. Que bom saber que
Sara da Conceição Alves
existem pessoas como você trabalhando com
Vila do João – Bom Sucesso (RJ)
as crianças na Educação Infantil.
Sara,
40 revista criança
arte