O documento discute meios de resolução de conflitos de interesses, comparando a autotutela, jurisdição e meios alternativos. A autotutela é o uso da força física e geralmente beneficia o mais forte. A jurisdição é o poder do Estado de resolver conflitos baseado na lei, buscando decisões mais justas. Existem também meios alternativos como mediação e arbitragem para resolver conflitos de forma consensual.
O documento discute meios de resolução de conflitos de interesses, comparando a autotutela, jurisdição e meios alternativos. A autotutela é o uso da força física e geralmente beneficia o mais forte. A jurisdição é o poder do Estado de resolver conflitos baseado na lei, buscando decisões mais justas. Existem também meios alternativos como mediação e arbitragem para resolver conflitos de forma consensual.
O documento discute meios de resolução de conflitos de interesses, comparando a autotutela, jurisdição e meios alternativos. A autotutela é o uso da força física e geralmente beneficia o mais forte. A jurisdição é o poder do Estado de resolver conflitos baseado na lei, buscando decisões mais justas. Existem também meios alternativos como mediação e arbitragem para resolver conflitos de forma consensual.
VIDA EM SOCIEDADE – Viver em sociedade é ter a oportunidade de abrir mão de visões estritamente individuais em prol de uma vida que seja minimamente harmônica no contexto social. Ou seja, toda pessoa que vive em sociedade não pode ter uma visão exclusivamente individualista, voltada apenas para si mesma. Quem enxerga apenas a si mesmo, ignorando e invisibilizando (tornar invisível) o outro, certamente gerará conflitos. Reconhecer o outro como alguém igual no que tange ao exercício de direitos é uma forma de prevenir conflitos de interesses (alteridade = reconhecimento do outro como alguém que tem iguais condições e oportunidades de exercício de direitos. Trata-se de um modo de ver e viver não baseado apenas em concepções individualistas). Quando as pessoas pensam em si e também no outro, temos uma sociedade menos conflituosa. Normalmente os conflitos de interesses surgem quando alguém resolve impor seu modo pessoal de ver e viver ignorando o outro como alguém titular de direitos (exemplo: sujeito resolve ouvir som alto em seu apto, ignorando o direito de silêncio de seus vizinhos). Nesse sentido, a maioria dos conflitos de interesses decorre da imposição do modo individual de ser a outro ou outros sujeitos. Quando uma pessoa ignora o direito de outra pessoa, procurando impor seu modo de ser e seus interesses, teremos o surgimento de um conflito de interesses. Conclusão: os conflitos de interesses representam algo quase que inerente à vida em sociedade, uma vez que uma sociedade cujas pessoas não possuem espírito de coletividade, certamente será um espaço de maior propensão a conflitos de interesses. A tradição da sociedade brasileira não é a prevenção de conflitos, mas, sim, a retroalimentação de conflitos de interesses.
2. AUTOTUTELA – Foi o primeiro meio utilizado pelo homem na
história da humanidade como instrumento para a resolver conflitos de interesses. Autotutela = emprego da força física como meio de resolução de conflitos de interesses. Importante ressaltar que na autotutela prevalecerão os direitos daqueles sujeitos mais fortes fisicamente, que imporão sobre os mais fracos como o conflito de interesses deverá ser resolvido. Por isso, pode-se verificar que a autotutela não é um meio justo de resolução de conflitos, haja vista que os interesses dos mais fortes serão sobrepostos com relação aos mais fracos. Prevalecer a vontade do mais forte não significa dizer que é o sujeito que deve ter o direito protegido em determinado caso concreto. Às vezes o mais forte se beneficia indevidamente do mais fraco em razão, apenas, da força física. Hoje não se adota mais como regra geral a autotutela como meio de resolução de conflitos de interesses. A regra geral hoje adotada para resolver conflitos de interesses é a utilização do DIREITO E DAS LEIS aplicadas ao caso concreto, com a finalidade de verificar quem efetivamente deverá ser protegido diante de um conflito de interesses outrora existente. A legislação brasileira vigente possui resquícios do instituto da autotutela? A legítima defesa é um primeiro exemplo de resquício da autotutela no direito brasileiro (legítima defesa = utilização proporcional dos meios adequados para afastar agressão atual ou iminente. Ressalta-se que a legítima defesa é categorizada pelo direito brasileiro como uma excludente de ilicitude. O excesso de legítima defesa terá como consequência a responsabilidade jurídica do agente).
3. JURISDIÇÃO
a) Noções Gerais: O Estado, no momento em que percebeu que
a autotutela e o uso da força física na resolução de conflitos de interesses era algo que normalmente gerava injustiças, chamou para sim a responsabilidade no que tange à resolução de conflitos de interesses (a autotutela quase sempre gerava entre os particulares uma decisão injusta porque consistia na prevalência da vontade do mais forte sobre o mais fraco). Em razão disso, o Estado chamou para si a responsabilidade no que tange à resolução dos conflitos de interesses. Foi nesse contexto que surgiu a JURISDIÇÃO = poder ou atividade exercida pelo Estado que tem como finalidade resolver em nome das partes (particulares) os conflitos de interesses surgidos, ressaltando-se que o critério para resolver esses conflitos de interesses não será mais a força física, mas, sim, a aplicabilidade da norma jurídica ao caso concreto. No momento em que o Estado exerce a função jurisdicional para resolver conflitos mediante a aplicabilidade da norma jurídica ao caso concreto, tem-se maior possibilidade de se proferir uma decisão judicial justa (não prevalece mais a vontade do mais forte sobre o mais fraco, haja vista que o referencial lógico para a resolução de conflitos de interesses passou a ser a norma jurídica).
Conceito: Jurisdição é o poder dever do Estado Juiz, função ou
atividade do Estado que objetiva resolver conflitos de interesses entre particulares mediante a aplicabilidade do direito (norma jurídica) ao caso concreto, buscando uma decisão mais justa entre as partes.
A jurisdição é uma atividade típica do poder Judiciário, ou
seja, a função primordial do poder Judiciário é a resolução de conflitos de interesses mediante a aplicabilidade do direito ao caso concreto, objetivando decisões mais justas e fundamentadas. Embora a jurisdição seja uma função típica do poder Judiciário, não é considerada uma função exclusiva, haja vista que excepcionalmente o poder Legislativo exercerá a função jurisdicional no momento em que julga o pedido de impeachment contra presidente da República (o Legislativo poderá exercer atipicamente a função jurisdicional).
No momento em que o magistrado exerce a função jurisdicional
obrigatoriamente deverá fundamentar sua decisão em bases jurídicas. O magistrado tem o dever de fundamentação racional (jurídico-legal e constitucional) de todas as suas decisões, ou seja, uma decisão judicial no Estado Democrático de Direito não poderá se basear em convicções pessoais do julgador, pois se o magistrado decidir de forma valorativa, subjetiva, axiológica e metajurídica, comprometerá a segurança jurídica das decisões judiciais. O magistrado no exercício da jurisdição precisa agir com imparcialidade, ou seja, é necessário que decida de forma jurídico- constitucionalmente fundamentada e baseado em provas produzidas pelas partes no âmbito processual (permitir que um magistrado decida o caso concreto com fundamento em suas convicções pessoais, morais e religiosas constitui uma afronta aos princípios da segurança jurídica e obrigatoriedade de fundamentação das decisões judiciais).
b) Características da Jurisdição:
Imperatividade: O Estado, no âmbito jurisdicional, exerce o
poder de império no que diz respeito ao cumprimento das decisões judiciais. Toda decisão proferida pelo poder Judiciário no âmbito do exercício da função jurisdicional tem como propósito a obrigatoriedade de seu cumprimento. Ou seja, diante de uma decisão judicial, a parte tem duas alternativas possíveis: ou o cumprimento imediato ou a propositura de um recurso com efeito suspensivo para justificar provisoriamente as razões do não cumprimento. Se a parte ignora e deixa de cumprir dolosamente (intencionalmente) uma decisão judicial, poderá responder pela prática do crime de desobediência.
Substitutividade: O poder Judiciário substitui a vontade das
partes (particulares) para, em nome delas, resolver o conflito de interesses mediante a aplicabilidade da lei (norma jurídica) ao caso concreto. A substitutividade é um elemento e característica integrante da jurisdição que explica claramente a transição da autotutela para o monopólio da jurisdição. Antes, na autotutela, os próprios particulares resolviam diretamente o conflito de interesses mediante a utilização da força física. Com o advento do monopólio da jurisdição, verifica-se que o Estado passa a ter a legitimidade de, em nome das partes envolvidas no conflito de interesses, resolver em nome delas a lide (conflito de interesses qualificado por uma pretensão resistida).
Imparcialidade: No Estado Democrático de Direito a
jurisdição é uma função exercida pelo poder Judiciário e não pode ser vista como uma atividade pessoal do juiz (magistrado). O magistrado deverá ser imparcial, ou seja, deverá fundamentar racionalmente sua decisão de modo a não deixar prevalecer suas convicções pessoais, morais e religiosas como critério de fundamentação de suas decisões. Agir com imparcialidade é o mesmo que assumir o compromisso com a fundamentação racional, objetiva, jurídica, legal e constitucional da decisão (o que o jurisdicionado busca, ao levar uma pretensão para o poder Judiciário, é que seu conflito de interesses seja decidido por um juiz isento, que não deixe prevalecer suas convicções metajurídicas e axiológicas diante do caso concreto).
Obrigatoriedade de Fundamentação das Decisões
Judiciais: Trata-se de princípio constitucional explicitamente previsto no artigo 93, inciso IX da Constituição brasileira de 1988. Esse princípio constitucional estabelece expressamente que toda decisão judicial deverá de constitucionalmente e legalmente fundamentada em critérios racionais e jurídicos e, se assim não for, teremos uma decisão judicial nula de pleno direito (ou seja, se o magistrado proferir uma decisão judicial baseada em critérios metajurídicos ou axiológicos tal decisão judicial será considerada nula de pleno direito). Se uma decisão judicial atenta e viola o princípio da obrigatoriedade de fundamentação racional teremos o que se denomina de decisão judicial nula de pleno direito (o poder Judiciário poderá anular a respectiva decisão pela ofensa ao princípio aqui mencionado).
Características da Jurisdição Segundo Candido
Rangel Dinamarco:
- Atividade Criativa – Para o autor consultado a jurisdição é
vista como uma atividade pessoal do julgador e, não, uma função do Estado. Nesse sentido, entende o autor citado, que o magistrado tem liberdade no exercício da atividade de julgar, podendo criar o direito que entende mais adequado ao caso concreto. Possibilitar que o juiz crie o direito por ele considerado mais adequado ao caso concreto é conferir poderes de decidir baseado numa ampla liberdade de julgar. Essa atividade criativa do juiz reconhecida pelo autor garante a segurança jurídica ao jurisdiciona? Permitir que o juiz seja livre no ato de julgar, podendo se utilizar de critérios valorativos, metajurídicos e axiológicos como critério de decisão é o mesmo que relativizar a racionalidade crítica que deve reger as decisões judiciais. Essa criatividade do juiz no ato de decidir constitui uma forma de flexibilizar a aplicabilidade do princípio da fundamentação racional das decisões judiciais, de modo a comprometer de forma substancial a segurança jurídica (admitir a criatividade do juiz é o mesmo que reconhecer um modelo de jurisdição autocrática).
- Inevitabilidade – No momento em que uma determinada
pretensão (caso concreto) é levada ao poder Judiciário e o magistrado profere uma decisão judicial resolvendo o conflito, significa dizer que a parte, independentemente de sua anuência, submeter-se-á ao conteúdo daquilo que foi decidido (isso tem relação direta com a imperatividade como uma das características da jurisdição, ou seja, mesmo que as partes não emitam consentimento quanto ao que foi decidido pelo Judiciário, sabe-se que as mesmas terão dois caminhos possíveis: ou recorre da decisão judicial ou cumpre a decisão judicial, haja vista o poder de império do Estado-Juiz). O poder Judiciário, no exercício da jurisdição, não tem que pedir autorização para o jurisdicionado (partes) para decidir o caso concreto. No momento em que o caso concreto é levado ao poder Judiciário, no exercício da jurisdição será proferida uma decisão judicial e, as partes envolvidas no conflito, submeter- se-ão ao conteúdo decisório podendo, se quiserem, recorrer da decisão, mas, jamais, ignorar o teor da decisão haja vista o poder de império do Estado.
- Definitividade – Todas as vezes que o poder Judiciário
profere uma decisão julgando um determinado caso concreto ou homologando um acordo, verifica-se que as partes envolvidas no conflito possuem dois caminhos básicos: ou cumprirão a decisão ou recorrerão da decisão. Se as partes cumprirem a decisão e resolverem não recorrer, essa decisão tornar-se-á definitiva. Tornar-se definitiva uma decisão judicial é o mesmo que dizer que a decisão judicial transitou em julgado (transitar em julgado é dizer que a decisão judicial proferida não poderá mais ser modificada por meio de recurso, haja vista que a parte não exerceu o direito de recorrer ou quando a parte esgotou todos os meios e recursos disponíveis na legislação vigente). Se o recurso foi proposto significa dizer que há possibilidade de modificação, anulação ou reforma da decisão (os recursos evitam o transito em julgado porque esses evitam que a decisão judicial proferida se torne definitiva, haja vista a possibilidade de reforma ou modificação da decisão judicial). Não se esqueça que o recurso é instrumento processual utilizado para evitar o trânsito em julgado (é o mesmo que evitar a definitividade da decisão judicial que poderá ser mudada via recurso), haja vista que temos a possibilidade de modificação ou reforma da decisão judicial.
- Inércia – O poder Judiciário é inerte quanto ao exercício da
jurisdição, ou seja, para que o Judiciário julgue um determinado conflito de interesses é necessário que seja provocado (o conflito de interesses tem que ser levado ao Judiciário para ser julgado). A função jurisdicional somente poderá ser exercida pelo Estado Juiz quando a pretensão (conflito de interesses) das partes for levada e encaminhada ao poder Judiciário. Para que o Judiciário mantenha sua equidistância e imparcialidade nos julgamentos, é relevante que seja inerte, e que atue apenas quando provocado. Quem pode tomar a iniciativa de provocar o poder Judiciário levando até ele um determinado conflito de interesses para ser resolvido? A própria parte envolvida do conflito de interesses; o Ministério Público (promotor de Justiça) nos casos em que a lei autoriza sua atuação (o Ministério Público aciona o Judiciário para responsabilizar uma mineradora por um dano ambiental = meio ambiente é direito difuso que pertence a um número indeterminado de pessoas); a genitora de um menor quando leva a pretensão de seu filho ao poder Judiciário para pleitear alimentos ao pai.
Uma vez provocado o poder Judiciário (saiu da inércia), sabe-
se que a regra geral é que o magistrado julgará e conduzirá o processo a partir do que foi alegado e requerido pelas partes (via de regra, ao longo do processo, o juiz atuará e decidirá as questões controversas apenas quando requerido expressamente pelas partes). A postura do magistrado ao longo do processo de deferir (apreciar ou indeferir pedidos) apenas a partir do que as partes expressamente pediram (requereram) constitui um modo de garantir a isenção e a imparcialidade do julgador. A movimentação de um processo judicial é responsabilidade da parte, por meio de seu advogado, que deverá cumprir rigorosamente todos os prazos processuais (não é responsabilidade direta do magistrado movimentar o processo no que tange a realização dos pedidos considerados necessários ao andamento do feito). Excepcionalmente o magistrado poderá atuar DE OFÍCIO ou ex officio (é quando a lei expressamente excepciona algumas situações que autorizam, ao longo do processo, que o magistrado pratique determinados atos ou profira determinadas decisões mesmo sem ter sido diretamente provocado pelas partes envolvidas no conflito). São exemplos de atuação EX OFFICIO ou de ofício pelo julgador: a) o magistrado determina de oficio que o advogado do autor da ação junte no prazo legal procuração no processo, haja vista que a procuração é um dos requisitos de validade do processo judicial; b) magistrado reconhecer de oficio que determinada pretensão levada ao Judiciário prescreveu ou decaiu (decadência), haja vista que essas são matérias de ordem pública que poderão ser analisadas e apreciadas pelo julgador mesmo que não tenham sido alegadas (arguidas) pelas partes no processo; c) o magistrado poderá atuar de oficio quando verificar que uma das partes (demandante = autor da ação ou demandado = pessoa que se encontra no polo passivo da relação processual) não é titular do direito pleiteado ou alegado em juízo (ilegitimidade ativa ou passiva). Nesse caso, o julgador poderá reconhecer de oficio a ilegitimidade processual ativa ou passiva, tendo em vista que se trata de matéria de ordem pública, assim como a prescrição e a decadência. Conclusão preliminar: A atuação de oficio do julgador será possível quando atuar no sentido de garantir a regularidade e a legalidade processual e procedimental.
PRINCIPIOS REGENTES DA JURISDIÇÃO:
1- INVESTIDURA – O magistrado somente exercerá a
função jurisdicional quando efetivamente for investido nessa função pelo Estado e nos limites da lei. A formas clássicas de ingresso na magistratura é mediante concurso público de provas e títulos ou pelo quinto constitucional.
2- INDELEGABILIDADE – Uma vez investido na função
jurisdicional o magistrado não poderá delegar sua atribuição para terceiros, haja vista tratar-se de atribuição legal exclusiva.
3- ADERÊNCIA AO TERRITÓRIO – Uma vez investido no
cargo de magistrado, o julgador exercerá a jurisdição nos limites legais de atuação, ou seja, a lei delimita territorialmente o exercício da função jurisdicional por cada magistrado.
4- INDECLINABILIDADE – O magistrado investido na
função jurisdicional não poderá declinar de suas atribuições legais, ou seja, todo caso concreto que for levado ao magistrado para julgamento sabe-se que esse juiz não poderá se recusar e declinar da sua atividade jurisdicional (todo caso concreto que se encontra sob a jurisdição do julgador deverá ser por ele julgado).
5- UNIDADE DE JURISDIÇÃO – A jurisdição é una e
indivisível, ou seja, o magistrado exercerá a função jurisdicional nos limites previstos em lei. c) Jurisdição Autocrática: É aquela exercida como atividade pessoal do juiz e não como função do poder Judiciário. Não se compatibiliza com o Estado Democrático de Direito porque nessa modalidade de jurisdição o magistrado poderá se utilizar de critérios metajurídicos (fora do Direito, como é o caso de argumento morais e religiosos como critério de decisão judicial) e axiológicos (valorativos) para proferir suas decisões. Por isso, a jurisdição autocrática é considerada uma afronta aos princípios da segurança jurídica e da obrigatoriedade de fundamentação racional das decisões judiciais. Nesse sentido, pode-se concluir inicialmente que na jurisdição autocrático o julgador não tem o compromisso de fundamentar racionalmente suas decisões judiciais. Exemplo 1: o magistrado que determinou a retira da guarda da mãe pelo fato dela ser mãe de Santo (o único argumento utilizado pelo juiz para retirar a guarda do filho menor da mãe foi o fato dela pertencer à umbanda, não decidindo de forma racional se essa mulher é ou não considerada uma boa mãe). Exemplo 2: Caso Janaína – laqueadura compulsória determinada autocraticamente pelo magistrado de 1 grau de jurisdição na comarca de Mococa no Estado de São Paulo. Uma outra característica da jurisdição autocrática é que as decisões são proferidas unilateralmente pelo magistrado. Ou seja, o julgador não permite a construção participada da decisão final de mérito (não se admite que as partes envolvidas no conflito de interesses sejam coautoras da decisão ou provimento final de mérito). O juiz não compartilha com as partes envolvidas no conflito de interesses a legitimidade na construção da decisão final de mérito.
d) Jurisdição Democrática: A primeira característica da
jurisdição democrática consiste na obrigatoriedade de o magistrado fundamentar de forma racional todas as suas decisões judiciais, não podendo se utilizar de critérios metajurídicos e axiológicos para fundamentar suas decisões. Nessa modalidade de jurisdição todas as alegações e provas produzidas pelas partes deverão ser apreciadas pelo julgador no momento da decisão final de mérito, ou seja, o magistrado não poderá decidir o conflito de interesses de forma unilateral, tal como ocorre na jurisdição autocrática. Na realidade, no âmbito da jurisdição democrática o julgador deverá garantir o direito das partes poderem participar discursivamente da formação do conteúdo da decisão final de mérito.
e) Jurisdição Voluntária – Tem como característica central a
ausência de lide (LIDE = conflito de interesses qualificado por uma pretensão resistida). Ou seja, na jurisdição voluntária as partes que levam sua pretensão ao poder Judiciário objetivam apenas a homologação do acordo realizado entre elas. Na realidade, o papel do magistrado na jurisdição voluntaria é meramente homologatório (homologa e ratifica o acordo de vontade das partes). É por isso que a doutrina afirma que na jurisdição voluntaria o poder Judiciário exerce uma espécie de administração pública de interesses privados, uma vez que não temos, diante de tal situação, o exercício típico da função jurisdicional (exercício típico da jurisdição é quando o magistrado julga a lide). Exemplo de jurisdição voluntária: divórcio consensual (o casal resolve se divorciar amigavelmente. Elaboram uma petição inicial e requerem ao juiz que seja homologado o acordo realizado entre as partes. Observem que nesse caso o poder Judiciário não julgará a lide, uma vez que a pretensão resistida não existe no caso em tela).
O magistrado, de ofício (ex officio) poderá se recusar
a homologar um acordo firmado entre as partes num processo judicial de jurisdição voluntária? A vontade das partes em um acordo judicial não é absoluta e nem soberana. Sempre que houver ilegalidade no conteúdo do acordo, sempre que o acordo for lesivo ou prejudicial a uma das partes do processo e/ou fora do processo o magistrado, em decisão fundamentada, poderá se recusar a homologar o acordo firmado entre as partes. Exemplo: um casal em processo de divórcio no qual o homem acorda com a mulher de deixar todos os bens do casal para a ex-esposa visando isentar o pai de pagar pensão alimentícia ao filho menor (esse acordo não será homologado pelo juiz porque fere e viola direitos do filho menor, além de atentar contra os princípios do melhor interesse da criança e da proteção integral, expressamente previstos no Estatuto da Criança e do Adolescente).
f) Jurisdição Contenciosa – É um procedimento especial
aplicado e adotado em determinadas demandas de natureza litigiosa (procedimento = sequencia ordenada de atos processuais praticados com uma finalidade específica). Na jurisdição contenciosa o legislador criou um rito específico e particularizado para pretensões e demandas específicas, ou seja, para cada demanda litigiosa prevista no Código de Processo Civil brasileiro vigente teremos um rito ou procedimento específico. Exemplo: ação judicial de curatela é regida pelo procedimento especial de jurisdição contenciosa (nessa ação judicial o rito previsto na lei determina a realização de uma audiência de interrogatório em que o magistrado interrogará a pessoa do interditando).
gráfico-cartular ou eletrônico por meio do qual o demandante (autor da ação judicial) descreverá os fundamentos de fato e de direito alegados em desfavor do demandado.
- Pretensão: É a narração reivindicativa de direitos alegados pelo
demandante (autor da ação) na exordial (petição inicial). Quando alguém resolve bater as portas do poder Judiciário levando uma pretensão precisará documentar suas alegações de fato e de direito na petição inicial. A descrição dos fatos alegados e do direito pretendido na petição inicial (exordial) recebe o nome de pretensão. Pretensão deduzida nada mais é do que a alegação de fatos e de direitos constantes na petição inicial (= exordial = peça vestibular = peça inaugural). - Demanda: É o mesmo que pretensão resistida, ou seja, a demanda judicial surge quando a pessoa demandada contesta e apresenta defesa quanto às alegações apresentadas pelo autor da ação na exordial (Pretensão Deduzida = alegações do demandante na exordial. Pretensão Resistida = alegações do demandado na sua defesa = contestação). Na pretensão resistida a parte demandada torna controversos os pontos alegados pelo demandante em sua exordial (tornar controversos os pontos alegados pelo demandante é o mesmo que refutar tais alegações).
- Lide: Surgirá a lide quando a parte demandada resistir à
pretensão deduzida pelo autor da ação. Ou seja, a lide é um conflito de interesses qualificado por uma pretensão resistida. Se o demandado não resistir à pretensão deduzida existirá conflito de interesses mas não teremos lide. A lide surge com a pretensão resistida do demandado (com o advento da demanda), ou seja, quando a parte que se encontra no polo passivo da relação processual apresenta defesa e resiste às alegações suscitadas pelo autor da ação em sua petição inicial (exordial).
- Mérito: é a análise dos fundamentos de fato e de direito alegados
nos autos do processo. Dizer que o magistrado julgou o mérito da demanda é o mesmo que afirmar que o julgador analisou as questões de fato, as questões de direito, as provas produzidas, ou seja, decidirá a lide reconhecendo ou não o direito pretendido pelo demandante em face do demandado.
- Jurisdição: Na perspectiva da escola instrumentalista a
jurisdição é o poder do Estado juiz de dizer o direito no caso concreto, dispensando-se a participação direta dos destinatários do provimento final na construção dialógica da decisão final de mérito (nessa perspectiva a jurisdição autocrática é vista como poder pessoal do juiz de decidir o mérito da lide mediante a utilização de argumentos jurídicos e metajurídicos). Na perspectiva democrática, a jurisdição é vista como uma função do estado juiz em permitir que os destinatários do provimento final sejam coautores da decisão de mérito, relativizando-se a discricionariedade e o protagonismo judicial (na jurisdição democrática o juiz não decide de forma unilateral a lide, pois permite que os sujeitos do processo sejam coautores do provimento final).
- Processo: Na perspectiva da escola instrumentalista o processo é
instrumento para o exercício da jurisdição. Já sob a ótica democrática o processo é espaço constitucionalizado de diálogo entre as partes para que as mesmas consigam participar dialogicamente da formação do mérito processual.
- Ação: Pode ser compreendida como o direito que cada
jurisdicionado (cidadão) tem de movimentar o poder Judiciário com o condão de buscar uma decisão judicial de mérito condizente com o direito alegado e pretendido em juízo. O direito de ação encontra-se expressamente previsto no artigo 5, inciso XXXV da Constituição brasileira de 1988 (princípio da inafastabilidade do controle jurisdicional – “a lei não excluirá da apreciação do poder Judiciário lesão ou ameaça a direito”).
- Procedimento ou Rito: é uma sequência ordenada de atos
processuais praticados com uma finalidade específica, ou seja, o legislador definiu previamente na lei qual será a sequência de atos processuais praticados em cada demanda litigiosa para que o mérito da pretensão seja julgado. Na legislação brasileira temos basicamente 2 (duas) espécies de ritos: a) RITO COMUM; b) PROCEDIMENTOS ESPECIAIS.
- RITO COMUM = é aquele adotado como regra geral no processo
civil brasileiro, ou seja, se o legislador não dispuser e nem estabelecer um rito especial, sabe-se que deveremos adotar o rito comum. São etapas do rito comum: a) 1. Fase do Rito Comum = FASE POSTULATÓRIA - Distribuição da exordial: o autor da ação judicial descreve na petição inicial sua pretensão deduzida (narração de fatos e de direitos pretendidos pelo autor da ação em face do demandado). b) O magistrado recebe a petição inicial e determina a citação do demandado (citação é o ato processual no qual o magistrado comunica o demandado para que o mesmo tome ciência do que foi alegado em seu desfavor e, assim, possa exercer o direito de defesa). c) O demandado poderá apresentar contestação (defesa), momento em que poderá alegar os fatos extintivos, modificativos ou impeditivos do direito do autor (é na contestação que a parte demandada poderá desconstituir as alegações apresentadas pelo demandante = autor da ação). d) O demandante (autor da ação) terá a oportunidade de se manifestar sobre a defesa apresentada pelo demandado. Detalhe importante: o momento processual para que o demandante produza nos autos do processo provas documentais é a petição inicial (juntamente com a exordial o autor da ação deverá apresentar suas provas documentais). No mesmo sentido, o momento processual em que o demandado produzirá provas documentais é a contestação. e) Após o demandante produzir provas documentais quando da distribuição da exordial e após o demandado produzir provas documentais em sua defesa, o magistrado proferirá o DESPACHO SANEADOR (ato processual de atribuição legal exclusiva do magistrado que encerra a fase postulatória do rito comum). O despacho saneador tem as seguintes finalidades: e.1) o magistrado fixará os pontos controversos da demanda (definirá o que ainda não foi provado e que será considerado essencial para o julgamento do mérito da demanda, ou seja, ponto controvertido é o que deve ser provado e esclarecido nos autos do processo para que o juiz julgue a lide); e.2) o magistrado sanará eventuais vícios processuais na primeira etapa do procedimento comum (a primeira etapa do procedimento comum é denominada da fase postulatória = primeira etapa do rito comum onde o demandante e demandado podem produzir provas documentais que visam comprovar suas alegações nos autos do processo). Se o autor da ação constituiu advogado e não juntou procuração nos autos, o magistrado intimará o demandante para, no prazo legal, corrigir esse erro e, não fazendo, o processo será extinto sem resolução do mérito (o magistrado não julgará o objeto da lide porque o vício processual não foi sanado tempestivamente); e.3) o magistrado intimará as partes para, querendo, especificar a necessidade de produção de outras provas além das provas documentais produzidas na fase postulatória (se as partes pretenderem produzir outras provas além daqueles documentais produzidas na fase postulatória, deverão justificar sua necessidade perante o juiz, que deferirá ou não a produção das provas requeridas). f) Fase Instrutória (fase de produção de provas) = é considerada a segunda fase do rito comum. Denomina-se instrutória a fase do rito comum destinada à produção de outras provas além daquelas documentalmente produzidas na fase postulatória. Se as provas documentais da fase postulatória forem suficientes para a comprovação dos fatos alegados, teremos a desnecessidade da fase instrutória (se a fase instrutória for dispensável ocorrerá o julgamento antecipado da lide = o magistrado dispensará a fase instrutória e já passará para a fase decisória, haja vista a desnecessidade de produção de outras provas além das provas documentais produzidas na fase postulatória). Poderão ser produzidas as seguintes provas na fase instrutória: f.1) provas orais = depoimento pessoal das partes (demandante pode requerer depoimento pessoal do demandado; demandado poderá requerer depoimento pessoal do demandante); depoimento de testemunhas (testemunhas são terceiros que não integram a relação processual originária e que precisam ser imparciais); esclarecimento técnico de perito (sempre que houver a necessidade de produção de provas orais o magistrado designará AUDIÊNCIA DE INSTRÚÇÃO E JULGAMENTO); f.2) provas periciais, como é o caso da perícia médica, o exame de DNA (nas ações de reconhecimento de paternidade); f.3) juntada de documentos novos no processo (considera-se documento novo no processo aquele que não estava disponível o acessível à parte na fase postulatória); f.4) inspeção judicial = é quando o próprio juiz vai ao local dos fatos alegados no processo com a finalidade de fazer uma averiguação in loco. g) Fase Decisória = é a última etapa do rito comum. Antes de o magistrado julgar o mérito da demanda deverá oportunizar às partes interessadas o direito de apresentação de alegações finais (memoriais). Na fase decisória o magistrado poderá proferir basicamente 2 (duas) espécies de sentença: a) sentença terminativa = é aquela na qual o magistrado extingue o processo sem resolução do mérito (o juiz deixa de julgar a lide porque existe alguma questão que impossibilita o julgamento do mérito). São hipóteses que poderão acarretar a extinção do processo sem resolução do mérito: a.1) ilegitimidade processual ativa = o autor da ação não é o titular do direito pretendido (exemplo: uma mãe, propõe em seu nome, ação judicial de reconhecimento de paternidade do seu filho em desfavor do suposto pai. Esse processo será extinto sem resolução do mérito porque a ação judicial deveria ter sido proposta em nome do filho e não em nome da mãe); a.2) ilegitimidade processual passiva – um credor propõe ação de cobrança contra o homônimo do devedor (nesse caso o processo será extinto sem resolução do mérito); a.3) litispendência = ocorrerá a litispendência quando houver duas ou mais ações judiciais idênticas tramitando em juízos distintos (nesse caso ocorrerá a sentença terminativa, pois o Judiciário não poderá julgar mais de uma vez o mérito de ações judiciais idênticas); b) sentença definitiva = é aquela sentença judicial que resolve o mérito da lide ou da demanda judicial (há o julgamento do mérito = o magistrado aprecia e analisa as questões de fato e de direito que integram a pretensão deduzida). A sentença definitiva poderá ser proferida no julgamento do mérito da lide, reconhecendo-se a procedência do pedido; improcedência do pedido ou procedência parcial dos pedidos. A sentença que homologa acordo judicial das partes também é considerada uma sentença de mérito (sentença definitiva). Há as seguintes espécies de sentenças definitivas: b.1) Declaratória = é aquela que declara a existência ou inexistência de uma relação jurídica, a autenticidade ou a falsidade de um documento (exemplo: sentença que reconhece para o mundo do direito algo que já existia no mundo dos fatos = reconhecimento de paternidade); b.2) Constitutiva = é aquela que cria, modifica ou extingue direitos (trata-se de sentença que tem como finalidade modificar uma situação jurídica preexistente, exemplo: sentença de divórcio); b.3) Condenatória = é aquela que determina o cumprimento de uma obrigação de pagar quantia certa em favor do credor (são as sentenças nas quais devedores são condenados); b.4) Mandamental = é aquela que determina o cumprimento de uma obrigação de fazer ou não fazer, exemplo: sentença que determina a retirada do nome do SPC/SERASA. Normalmente essa sentença vem acompanhada de uma multa diária denominada ASTREINTES (o juiz determina um prazo para a retirada do nome do SPC/SERASA e, havendo descumprimento da ordem judicial, ensejará uma multa diária); b.5) Executiva Lato Sensu = são sentenças que objetivam o cumprimento de obrigação de entrega de coisa certa ou incerta (exemplo: sentença que determina a entrega ou devolução de veículo financiado junto a um banco, cujo consumidor está inadimplente cabendo, assim, a busca e apreensão).
- RITOS OU PROCEDIMENTOS ESPECIAIS = São
procedimentos estabelecidos na lei para regulamentar o processamento e julgamento de demandas e pretensões específicas, como é o caso do rito especial de jurisdição voluntária (não tem lide e o papel do Judiciário é apenas homologatório) e o rito especial de jurisdição contenciosa. Havendo rito especial o jurisdicionado não poderá optar pelo rito comum, que somente será adotado quando comprovadamente não houver um rito especial.