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Miriam Alves

Salve América!

Ah!
Esta América Ladina
Ainda nos roubam o fígado, os filhos
Nos roubam a sorte
A morte
O sono

Ah!
Esta América Ladina
As três caravelas pintaram destinos
Santa Maria, nada teve a ver comigo
Pinta, roubou-me o colorido natural
de ser eu mesma
Nina, enfiou-me pela goela
mamadeira de sangue, sal e urina
Até hoje me Nina em seus podres berços de miséria

Fumaça

Estou a toque de máquina


corro, louca, voo, suo
a fumaça sou eu

Estou a toque de nada


vivo, ando
como a comida envenenada
e o comido sou eu

estou a toque de selva


os ferros torcidos, sacudidos
dentro de uma marmita
e a marmita sou eu

Nego, mas vivo dizendo


Sim
a tudo que me dói na cabeça
e o doido sou eu

Paro, mas estou sempre correndo


doem as pernas, os pés
e este corpo é o meu
Amanhã me encontra acordada
como a noite deixou
e o insone sou eu

Indago, mas não estou escutando


a pergunta anda solta
e ninguém explicou
que a resposta sou eu

Mahin Amanhã

Ouve-se nos cantos a conspiração


vozes baixas sussurram frases precisas
escorre nos becos a lâmina das adagas
Multidão tropeça nas pedras
Revolta
há revoada de pássaros
sussurro, sussurro:
“é amanhã, é amanhã.
Mahin falou, é amanha”
A cidade toda se prepara
Malês
bantus
geges
nagôs
vestes coloridas resguardam esperanças
aguardam a luta
Arma-se a grande derrubada branca
a luta é tramada na língua dos Orixás
é aminhã, aminhã”
sussuram
Malês
bantus
geges
nagôs
“é aminhã, Luiza Mahin falô”

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