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O PLANEJAMENTO DA MANUFATURA –

PRÁTICAS INDUSTRIAIS E MÉTODOS


DE OTIMIZAÇÃO

M.F. Carvalho
Fundação Centro Tecnológico Para Informática – CTI
Caixa Postal 6162 – Campinas, São Paulo, Brasil
Departamento de Projeto Mecânico,
Faculdade de Engenharia Mecânica,
Universidade Estadual de Campinas – UNICAMP

O.S. Silva Filho


C.A.O. Fernandes
Fundação Centro Tecnológico Para Informática – CTI
v.5, n.1, p. 34-59, abr. 1998 Caixa Postal 6162 – Campinas, São Paulo, Brasil

Resumo

Este trabalho apresenta uma revisão das metodologias mais utilizadas como ferramentas de apoio
ao planejamento da produção de sistemas de manufatura. Dentre elas destacam-se as práticas
industriais conhecidas como técnicas avaliativas de soluções e os métodos de otimização conhecidos
como técnicas gerativas de solução. Procura-se discutir como estas técnicas trabalham e analisar as
vantagens e desvantagens de cada uma delas. Na conclusão a otimização é apresentada como uma
ferramenta complementar para superar certas deficiências encontradas durante a aplicação das
práticas industriais, tornando-se assim essencial ao planejamento da produção.

Palavras-chave: MRP, JIT, programação matemática, planejamento da produção.

1. Introdução trados com o objetivo de atender às necessidades


de um mercado cada vez mais competitivo,

U m sistema produtivo é formado de recursos


(mão-de-obra, máquinas, computadores,
etc.) que, a partir de operações de transformação
minimizando desperdícios e custos de modo a
maximizar o lucro da corporação (JACSON &
JONES, 1987).
dos insumos básicos (ou seja, as entradas), Até os anos 70, os sistemas de manufatura
trabalham em conjunto para o desenvolvimento trabalhavam a plena carga, oferecendo um
de produtos. Estes sistemas devem ser adminis- número limitado de produtos, para uma demanda
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normalmente maior que a capacidade de po. Para exemplificar, considere-se a produção


produção. Assim a questão de planejamento era mensal planejada para um dado tipo de produto,
imediata, bastando identificar o gargalo de que é composta de duas parcelas: pedidos conhe-
produção a partir do qual se estabelecia a cidos e previsão de consumo. A primeira parcela
capacidade máxima do sistema. A partir desta é resultado dos pedidos já realizados pelos
década, devido aos avanços tecnológicos, os consumidores enquanto que a segunda é uma
sistemas começaram a evoluir para uma situação previsão de pedidos ainda não colocados, mas
em que a capacidade de produção tornou-se prováveis de ocorrerem. A importância destes
maior que o mercado e assim passou-se da componentes se inverte à medida em que se
produção em larga escala de poucos produtos afastam do tempo inicial de planejamento, como
para a produção em pequenos lotes de produtos mostrado na Figura 1. Neste sentido, observe-se
diversificados. Este fato levou o sistema que no curto prazo a demanda conhecida ocupa o
produtivo a implantar políticas para atender papel mais relevante no planejamento, enquanto
melhor o cliente e ganhar competitividade. que, no médio e longo prazo, a demanda prevista
Aos primeiros investimentos, na busca da (ou seja, não determinística) torna-se relevante
diversificação de produtos, deu-se ênfase à para decisões sobre o emprego futuro dos
tecnologia, com o aumento e a sofisticação dos recursos de produção. Esta incerteza associada à
sistemas de produção (máquinas de controle demanda mostra a importância do “tempo” no
numérico, robôs, computadores, etc.) no sentido processo de tomada de decisão.
de acompanhar a necessidade do mercado por: Conclui-se dos fatores expostos acima, que o
novos produtos, qualidade, rapidez de entrega, gerenciamento de um sistema moderno é
preços competitivos, etc. Contudo o avanço complexo devido: ao número de variáveis
tecnológico não resolveu todos os problemas da envolvidas, ao grau de incerteza associado a
produção; na verdade, pode-se dizer que esta cada informação e principalmente ao tipo de
evolução é responsável pela maior complexidade decisão a ser tomada. O problema de planeja-
do processo de gestão da produção. Quanto mais mento, formulado sob uma ótica macro, é
sofisticados os sistemas, maior atenção deve ser impossível de ser resolvido pois é de grande
dada às atividades de gestão para que os recursos dimensão e altamente estocástico. Por conse-
sejam melhor utilizados, possibilitando, assim, qüência, este problema deve ser organizado
obter o retorno do alto investimento em menor dentro de uma hierarquia de planejamento que
espaço de tempo. Nota-se, ainda, que quanto possibilite soluções locais, contudo integráveis.
mais flexíveis os sistemas de manufatura, maior Em seguida discute-se esta questão hierárquica.
é o número de possibilidades de operação a De uma maneira geral, duas atividades prin-
serem consideradas pelo gerente quando da cipais podem ser destacadas no gerenciamento
seleção da melhor solução. Em suma, quanto da produção: o planejamento e o controle da
mais complexos os sistemas mais complexo o produção. O planejamento tem como objetivo
processo de gestão. Por exemplo, em um pro- alocar, efetivamente, os recursos disponíveis às
cesso de produção serial, a determinação de um necessidades de produção dos vários produtos,
esquema adequado de operação é muito mais ajustando o custo dos recursos, a forma de
fácil de ser implementado do que em um proces- operar, a quantidade e o valor do produto final,
so contendo células flexíveis, pois a alta flexibi- dentre outros parâmetros de produção. Para
lidade e versatilidade observada neste último é considerar o grau de certeza da informação, que
responsável pela adição de vários graus de liber- faz parte do processo de tomada de decisão, e a
dade à escolha da melhor forma de operação. escala de tempo, o planejamento pode ser
Um outro fator que introduz complexidade é dividido em planejamento estratégico, planeja-
o comportamento da demanda ao longo do tem- mento tático e planejamento operacional.
36 Carvalho, Silva Filho, Fernandes – O Planejamento da Manufatura

Níveis de
Produção ordens conhecidas
ordens previstas

meses

Figura 1 – Níveis de produção baseados em demanda conhecida e prevista

O planejamento estratégico tem como objeti- O planejamento operacional, algumas vezes,


vo adquirir e desenvolver os recursos de também denominado de programação da produ-
produção, definir novos produtos, estabelecer ção, tem como meta a execução ótima das
políticas de atendimento ao cliente e gerar tarefas estabelecidas pelo planejamento tático.
planos agregados de produção baseados nas Isto corresponde a uma alocação clara de tarefas
previsões da demanda de longo prazo. As aos recursos disponíveis especificando como e
decisões tomadas neste nível influenciam toda a quando realizá-las (por exemplo, alocação de
cadeia de planejamento (ou seja, os níveis tático máquinas, operários, etc.) além da determinação
e operacional) e, para garantir a eficácia de tais dos tempos de início e fim de cada tarefa. Esta
decisões, crucial se torna o envolvimento das alocação é baseada em informação de elevado
gerências relacionadas aos diferentes departa- grau de certeza.
mentos da firma. O horizonte de planejamento é O sucesso do enfoque de planejamento hie-
de um ou mais anos com discretização mensal. rárquico está relacionado com a integração dos
Grande parte da informação disponível sobre o três módulos acima. A Figura 2 ilustra este
processo (isto é, demanda, capacidade de esquema de integração. Note que o planejamento
produção, níveis de mão-de-obra e níveis de agregado passa para o planejamento tático metas
inventário, etc.) é considerada de forma agregada e objetivos a serem cumpridos. Este último nível
e o problema é caracterizado pelo alto grau de decompõe as metas e objetivos em três dimen-
incerteza da informação em relação ao uso sões de detalhamento, a saber: dimensão de tem-
futuro dos recursos da firma. po, dimensão de espaço dos recursos e dimensão
O planejamento tático tem como finalidade de espaço de produtos (em famílias), verificando
desagregar as metas estabelecidas pelo nível então a possibilidade de atendê-las. No entanto,
estratégico em termos de tempo, recursos e caso estas metas e objetivos não possam ser
produtos e o estabelecimento de políticas ótimas cumpridas, novos limites são enviados para o
detalhadas de produção, de utilização de nível estratégico, permitindo-o gerar novas metas.
recursos de produção (máquinas, matéria-prima, Este procedimento deve garantir a robustez do
mão-de-obra, etc.). É importante acrescentar que processo de desagregação e deve ser seguido
os métodos de otimização é um dos caminhos também entre os outros níveis de decisão.
para geração de tais políticas. O horizonte de Devido, principalmente, à dinâmica de opera-
planejamento é de seis meses a um ano com ção do sistema e às incertezas do ambiente de
discretização diária ou semanal. As decisões são produção, a execução efetiva das tarefas, via de
baseadas em fontes de informação com reduzido regra, difere daquilo que foi planejado. Para a
grau de incerteza. avaliação desta diferença existe a função de
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TEMPO
Longo Prazo ESTRATÉGICO
(Agregação em tipos) Metas agregadas

Novos
Médio Prazo Limites Metas detalhadas
(Agregação em famílias) TÁTICO

Novos
Curto Prazo Limites
(Itens individuais) OPERACIONAL

Figura 2 – Hierarquia para Planejamento

controle (ou de monitoramento). Esta função dos de práticas industriais serão também
permite estabelecer uma medida de desempenho considerados. Abre-se um espaço para se discutir
em relação aos resultados esperados pelo plane- uma hierarquia que possibilite um grau de
jamento e o resultado obtido na execução. Como representação do problema, coerente com as
resultado da análise desta função é possível necessidades dos vários níveis do planejamento
realimentar os níveis hierárquicos superiores e que venha ser factível de implementar, tanto
com informações que conduzem a uma constante em termos de tempo quanto de capacidade de
revisão das metas e objetivos (ou seja, fluxo de memória, em uma estrutura computacional.
informação entre as fases de planejamento). Isto O artigo está organizado da seguinte maneira.
permite, ainda, estabelecer, se necessário, A seção seguinte introduz alguns conceitos e
decisões de controle operacional que procurem objetivos do planejamento tático e da programa-
operações mais efetivas e econômicas. Note que ção da produção. Em seguida serão estudadas as
as decisões neste nível devem ser imediatas e Práticas Industriais e as políticas de estoque que
por isto automatizadas pelo sistema. contornem as incertezas do processo produtivo,
Uma conclusão do exposto acima é que a na- da matéria-prima e da demanda. Por outro lado,
tureza multidisciplinar dos problemas de plane- o problema de planejamento da produção será
jamento e controle da produção dos sistemas de modelado como um problema de otimização de
manufatura constituem-se em uma rica fonte de fluxo em rede com uma avaliação do desempe-
pesquisa e desenvolvimento de metodologias nas nho desta modelagem. Por fim comentários
áreas de ciência do gerenciamento, pesquisa ope- comparativos entre as técnicas avaliativas e
racional e mais recentemente na área da teoria de gerativas de solução mostram a complementari-
controle ótimo (GERSHWIN et al., 1986). dade entre o enfoque por otimização e o enfoque
Neste artigo serão examinados os problemas por práticas industriais.
de planejamento em especial aqueles associados
ao níveis hierárquicos relacionados com o plane- 2. Sistema de Produção Discreta: Aspectos
jamento detalhado e com a programação da pro- Conceituais
dução. Para este tipo de problema existem alguns
enfoques de solução que utilizam a programação
matemática, entre eles estão: as técnicas de
programação linear, programação inteira, branch
D escrição: Um sistema de manufatura é
composto por itens a serem processados em
centros de produção, cada um podendo possuir
and bound, programação dinâmica e teoria de uma ou mais unidades processadoras. Estas
redes. Outros procedimentos heurísticos chama- unidades podem ser máquinas que modificam
38 Carvalho, Silva Filho, Fernandes – O Planejamento da Manufatura

Produto 1 Produto 2

M3
M3
M2 M2

M1 M1

Produto 1 Produto 3 Produto 1


(a) sistema monoproduto (b) sistema multiproduto
Figura 3 – Sistema de produção discreta

características do produto e/ou transportadoras Ponto de Pedido do Consumidor: Em cada


que modificam a localização do produto. O item manufatura, existe um ponto no processo produ-
flui pelo sistema produtivo sofrendo transforma- tivo em que o produto passa a receber tratamento
ções, sendo transportado segundo uma seqüência específico para determinado consumidor. Este
tecnológica predeterminada, fazendo parte de ponto é chamado de Ponto de Pedido do Consu-
montagens até se tornar produto final. A Figura midor (PPC). Mais especificamente, define-se PPC
3.(a) mostra um sistema com três centros de como o ponto do processo de manufatura em que
produção e um roteiro de produção. A capacida- o produto é atribuído a determinado consumidor.
de máxima de produção deste sistema é igual a Por exemplo, em sistemas que trabalhem para
menor capacidade entre as capacidades máximas estoque o PPC é o ponto de estoque de produtos
de todos os estágios de produção. Este seria um acabados. Enquanto que nos sistemas de
sistema de fácil gestão caso considerasse um produção sob encomenda o PPC usualmente é o
único produto, demanda conhecida e determinís- ponto de estoque de matéria-prima. Neste último
tica além de disponibilidade infinita de matéria- caso, pode-se ainda deslocar o PPC até aos
prima. fornecedores para que tempos com compra e
A extensão para o processamento de vários entrega de matéria-prima sejam considerados.
produtos por uma célula faz com que um mesmo O tempo total de processamento de um
recurso (por exemplo: máquina, transportador, produto pode ser composto por duas partes. Em
robô) seja requisitado por mais de um produto, uma delas o produto já está destinado a um
ou seja, os recursos de produção passam a ser determinado consumidor (posição após o PPC).
compartilhados por mais de um produto, vide Na outra o processamento dos itens que
Figura 3.(b). Agora a determinação da capacida- compõem o produto mantém características
de de produção vai depender de vários fatores comuns, independentes das que foram especifi-
entre eles: o mix (proporcionalidade) entre cadas pelo consumidor (posição anterior ao
produtos, seqüência de produção, taxa de PPC), como ilustrado na Figura 4. Este é o ponto
compartilhamento de recursos e o perfil no qual se desacopla a manufatura de itens
temporal da demanda de cada produto. Assim, o comuns, da manufatura de itens dedicados. Por
problema de planejamento evolui para a gestão exemplo, na montagem de carros a estrutura
temporal de recursos compartilhados. Para que básica pode ser a mesma para todos os modelos
esta gestão venha a ser realizada com eficácia, de um determinado carro (isto é, Modelos X, Y,
torna-se necessária a introdução de alguns Z, etc.). Contudo a partir de um certo ponto da
conceitos apresentados a seguir. linha de montagem (PPC) cada unidade
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Tempo para entrega do pedido

Tempo de processo até o Tempo de Manufatura


PPC PPC do Pedido

Figura 4 – Ponto de Pedido do Consumidor

produzida adquire características especiais de orientado a satisfação do cliente, quatro


acordo com as especificações preestabelecidas componentes devem ser considerados: cus-
para cada cliente. Deste ponto até a entrega do to/preço, qualidade, flexibilidade e desempenho
produto acabado é gasto um determinado tempo nas entregas. Prioridades e pesos devem ser
que é específico do produto dedicado. Este é alocados a cada um destes componentes.
uma parcela do tempo total de produção. Deve- Segundo GRAVES (1991), o planejamento
se ainda observar que o tempo de manufatura do da produção tem por finalidade a alocação dos
pedido pode incluir a manufatura de itens recursos disponíveis de produção ao longo do
comuns a mais de um consumidor. Contudo, o tempo para um conjunto preestabelecido de
tempo de processo até o PPC, não deve incluir objetivos. Tipicamente, o problema de alocação
nenhuma atividade dedicada. da produção envolve um conjunto de produtos,
Gargalo de Produção: Um gargalo de no qual cada produto deve passar por operações
produção ocorre quando um centro de produção que por sua vez requer máquinas e matéria-
possui uma capacidade menor que a demanda a prima. As operações requerem recursos de má-
ele alocada. Um gargalo estável é aquele que se quinas e material e devem ser realizadas segundo
mantém gargalo durante a maior parte da vida uma seqüência tecnológica determinada a priori.
do processo produtivo. Aumentar o fluxo em um A alocação de recursos é influenciada por uma
processo produtivo passa pela ampliação da série de fatores como: capacidade de máquinas,
capacidade de produção do gargalo. regra de precedência, requisitos e disponibilida-
Do exposto acima, conclui-se que para uma de de recursos, níveis de produção, prioridades,
linha serial simples pode haver um único datas e custos. Os critérios de desempenho ou a
gargalo, e assim sendo o tempo gasto para uma determinação de prioridades envolvem compro-
peça ir do gargalo ao ponto de entrega ao missos conflitantes entre níveis de produção,
consumidor é constante. É assumido um freqüências de variações da produção e grau de
“excesso” de capacidade nos estágios de atendimento às datas de entrega. Assim sendo, o
produção situados após e anteriores ao gargalo. estabelecimento de um plano de produção é
O planejamento do sistema passa a ser o essencial para a determinação de uma seqüência
planejamento do gargalo. Os dois conceitos de produção (ou rotas do processo), que leve à
acima serão explorados nas seções seguintes finalização do produto, estabelecendo as neces-
quando da análise do problema de planejamento sidades de recursos (tanto de matéria-prima
da produção pelas práticas industriais. quanto de fabricação) e determinando o tempo
de início e fim de cada operação que atendam
3. O Problema do Planejamento da Produção aos objetivos gerais do empreendimento. Para
ilustrar o problema da alocação, considere o

F inalidade: Para que uma empresa torne-se


competitiva no mercado atual, fortemente
exemplo abaixo (ROGERS, 1987). A Tabela 1
fornece os dados de rota e os tempos de
40 Carvalho, Silva Filho, Fernandes – O Planejamento da Manufatura

Tabela 1 – Dados de Produção

Tempos e Rotas
Produtos #1 #2 #3
1 1/M1 8/M2 4/M3
2 6/M2 5/M1 3/M3
3 4/M1 7/M3 9/M2

processamento para três produtos a serem Entre as técnicas avaliativas e gerativas de


processados por três máquinas. As rotas estão solução, as que mais se destacam são respecti-
mostradas na Figura 3.(b). vamente aquelas relacionadas com as práticas
A Figura 5 apresenta o diagrama de Gantt industriais e as técnicas de programação mate-
para uma possível alocação da produção para o mática, que passam a ser discutidas a seguir.
problema. Sob a suposição que todos os
produtos estão disponíveis no início do processo 4. Princípio de Operação das Práticas
e que as operações não possam ser repartidas, a Industriais
alocação proposta resulta no mínimo tempo para
processamento de todos os produtos. Observe
que a seqüência de operação foi preservada. Por
outro lado o problema acima é trivial em relação
P ara auxiliar na tomada de decisão gerencial
quanto à determinação da escala de produção
foram desenvolvidos sistemas de base de dados
aos problemas reais onde outros fatores como: para administração da compra e estoque de
datas de entrega, aleatoriedade, processamento matéria-prima, estoque em processo e capacida-
de multiprodutos com disponibilidade temporal de de produção, dentre outras atividades
diferenciada, etc., devem ser considerados. rotineiras de um processo de produção
Para ajudar na tomada da melhor decisão do (RODAMMER et al., 1988). Estas ferramentas
planejamento existem várias técnicas que podem melhoram a qualidade e a consistência da
ser classificadas em duas categorias principais solução para o planejamento da manufatura e
(GERSHWIN et al., 1986): técnicas avaliativas e algumas delas incorporam, em maior ou menor
técnicas gerativas. Uma técnica avaliativa é grau, recursos que procuram automatizar
aquela que, a partir de um conjunto de decisões, atividades de programação da produção. Os
prevê (ou avalia) qual delas leva o sistema a princípios operativos ou métodos para esta
atingir um melhor nível de desempenho. As automatização são do tipo empurra ou puxa e
técnicas gerativas, por outro lado, são aquelas estão relacionados com o conceito de Ponto de
que partem de certos critérios e restrições para Pedido do Consumidor (PPC). Outro enfoque
gerar uma única decisão para o sistema, que é adota um princípio misto (puxa-empurra) e está
entendida como a decisão ótima a ser aplicada ao relacionado aos conceitos PPC e gargalo da
sistema. Podemos citar entre as técnicas produção. Para entender a operação e aplicação
avaliativas a teoria de filas, a simulação e as destas práticas é conveniente discutir as caracte-
práticas industriais. As técnicas gerativas são rísticas de operação de cada um destes sistemas.
baseadas em métodos matemáticos de otimiza-
ção e da teoria de controle. 4.1 Princípio Operativo EMPURRA
O foco deste trabalho é discutir e apresentar
soluções a serem usadas pela gerência como Os métodos tradicionais de administração da
ferramentas de apoio ao planejamento detalhado Produção são do tipo EMPURRA. Por estes
e à programação de sistemas de manufatura. métodos as ordens de produção são colocadas no
GESTÃO & PRODUÇÃO v.5, n.1, p. 34-59, abr. 1998 41

MÁQUINA 1

MÁQUINA 2

MÁQUINA 3

4 5 6 11 14 18 23

produto 1 produto 2 produto 3

Figura 5 – Diagrama de Gantt

primeiro estágio de produção (PPC) e “empurra- Com relação às incertezas quanto a demanda
das” pelo sistema produtivo até que venham é conveniente considerar o seguinte caso:
atender o pedido do consumidor. A Figura 6 quando uma expectativa de demanda, incorpora-
ilustra este tipo de operação. Questões imediatas da ao planejamento, é interrompida ou não se
a serem analisadas por este princípio são: data realiza, um replanejamento deve ocorrer. É
em que a matéria-prima deve estar disponível justamente aí que ocorre uma das principais
para que seja respeitada a data de entrega do vantagens do sistema EMPURRA, ou seja, neste
pedido; capacidade total de produção do sistema, tipo de sistema é muito mais simples tratar as
capacidades especificadas para os recursos variações devidas a demanda; refazendo-se
individuais; requisitos de mão-de-obra para cálculos e colocando novas expectativas de
determinada política de operação e nível de produção imediatamente disponíveis a todos os
estoque em processo. O programa de produção estágios. Note que isto é possível devido ao fato
conhecido por “Manufacturing Resource de que qualquer variação (para mais ou para
Planning” (MRP-II) (FOX, 1984) é uma técnica menos) da demanda observada em relação à
avaliativa do tipo empurra e como tal avalia o demanda planejada poder ser imediatamente
comportamento do sistema para um cenário comunicada à entrada do processo.
predeterminado. Este cenário basicamente Com relação aos pontos acima, o MRP é bas-
especifica: a demanda a ser atendida, os recursos tante preciso mas apresenta algumas dificuldades
de produção necessários, as datas de compra e de em considerar, por exemplo: as perdas por
entrega, às disponibilidades de matéria-prima e defeito de fabricação; os limites de capacidade
outros detalhes vitais à realização das atividades no processamento de multiprodutos; as incerte-
de planejamento. Outros cenários podem ser zas tanto da demanda quanto do processo produ-
gerados a partir de mudanças no cenário base e, tivo. Além disso, ele não considera explicita-
iterativamente, pode-se chegar a uma solução mente a questão de custo e possui dificuldade
adequada para o planejamento. em gerar uma solução que tenha uma visão
Estes sistemas determinam, para cada produ- temporal do problema com relação a evolução da
to final e horizonte preestabelecido: demanda no horizonte de planejamento. Resu-
1. a quantidade a ser produzida; mindo, pode-se dizer que o MRP é simplesmente
2. os tempos nos quais os itens devem ser um viabilizador de cenários de produção
comprados, fabricados ou montados de forma definidos a partir dos pedidos de produção.
a atender as datas de entrega dos pedidos; e É importante acrescentar que os problemas
3. os requisitos de capacidade, tamanho de lotes relacionados às incertezas, tanto de demanda
e seqüência de operações. quanto do processo (por exemplo, quebra de uma
42 Carvalho, Silva Filho, Fernandes – O Planejamento da Manufatura

Estágio de Produção
Armazenagem
Fluxo de informação
Fluxo de material

Figura 6 – Princípio tipo EMPURRA

máquina), podem ser contornados estabelecen- colocados no último estágio de produção. Eles
do-se estoques e tempos de segurança. Os proce- necessitam de pontos de armazenagem em cada
dimentos para quantificação destes estoques e estágio de produção, embora devam trabalhar
tempos serão estabelecidos na próxima seção. com lotes tão pequenos quanto possível de modo
a garantir que o número de peças dentro do
4.2 Princípio Operativo PUXA sistema não venha a crescer.
Este princípio apresenta uma desvantagem
Neste tipo de sistema, as informações acerca quanto à velocidade de transmissão da informa-
dos pedidos dos consumidores e suas previsões ção. Considere uma súbita mudança de requisito
são processadas pelo último estágio de produção no estágio e3. Esta mudança é inicialmente
(PPC) ou pelo estoque de produtos finais. Se a transmitida para o estágio e2 e daí ao estágio e1,
demanda não puder ser atendida diretamente e assim sucessivamente, até se necessário, ao
pelo estoque disponível, quando da colocação do fornecedor de matéria-prima. Se esta mudança
pedido, este estágio irá emitir um pedido para o fosse no sentido de aumentar a produção, o
estágio imediatamente precedente, e assim procedimento acima iria levar a atraso na data de
sucessivamente até o primeiro estágio. Tem-se atendimento a demanda, dado que o WIP (i.e.,
aqui um sistema de ordens sucessivas de produ- inventário em processo) deve ser essencialmente
ção e de ordens de transporte, para repor as mínimo. Este fato exige uma sinergia, entre
partes retiradas das áreas de armazenagem. Este fornecedores, força de trabalho e manutenção, no
procedimento pode ser estendido a todos os sentido de cumprir a meta de satisfazer os
fornecedores da fábrica. A Figura 7 ilustra este pedidos dos clientes nas datas combinadas.
tipo de sistema, para um processo de produção Devido a esta característica, o sistema PUXA
serial com três estágios, onde os pontos de é adequado somente quando a taxa de produção
armazenagens de itens são observados para cada é constante, mas torna-se desastroso quando
estágio. Note-se que o fluxo de informação (ou ocorrem mudanças bruscas na demanda.
as ordens de produção) podem ser baseadas em Portanto, pode-se dizer que este sistema tem
um sistema manual conhecido por KANBAN dificuldades para adaptar-se rapidamente às
(GOLHAR et al., 1991). No sistema Kanban a variações impostas pelo mercado. As práticas
direção do fluxo de informação é sempre industriais relacionadas com a implementação do
contrária a direção do fluxo de produto. Estes conceito PUXA, juntamente com os outros
são sistemas seriais de múltiplas ordens de pro- objetivos da produção, recebem o nome de
dução que podem ser estendidas aos fornecedo- JUST-IN-TIME (JIT) (GOLHAR et al., 1991 e
res de matéria-prima e que têm os pedidos SCHONBERGER, 1984).
GESTÃO & PRODUÇÃO v.5, n.1, p. 34-59, abr. 1998 43

e1 e2 e3

Estágio de produção , ei
Armazenagem
Fluxo de informação
Fluxo de material

Figura 7 – Princípio tipo PUXA

No JIT a informação acerca do pedido do Tornar o fornecedor parceiro, de modo a obter


cliente é colocada no estoque de produtos finais credibilidade, estabilidade, redução de esto-
ou no último estágio de produção. Para se obter que e oportunidades de redução de custos.
o menor tempo de resposta ao pedido de um Estas atividades aumentam a entrega na data
cliente é necessário manter-se pontos de estoque certa e quando envolvem os fornecedores de
em cada estágio. Se a variabilidade da demanda matéria-prima dão origem ao conceito de JIT
é pequena o JIT tem grande possibilidade de estendido (LEE et al., 1995).
sucesso.
Algumas desvantagens ou observações acerca 4.3 Princípio Operativo MISTO
do princípio JIT são as mesmas do sistema puxa e
podem ser resumidas no grande tempo de trans- Nestes sistemas as ordens de produção são
missão das mudanças, já que atua com realimen- puxadas ou empurradas pelo sistema produtivo
tação discreta da informação, e na dificuldade de dependendo do estágio de produção em relação
se estabelecer o tamanho ideal dos lotes ao gargalo do sistema, veja isto ilustrado pela
interestágios, fato a ser estudado a seguir. Torna- Figura 8. Para que a peça esteja disponível o
se inadequado para os sistemas sujeitos a mu- mais cedo possível no ponto de consumo, a
danças constantes, uma vez que, é conservador melhor forma de operar os estágios pós-gargalo
quando o nível de demanda fica abaixo do plane- do sistema é pelo princípio EMPURRA. Já o
jado e inviável quando o nível de demanda fica objetivo nos estágios pré-gargalo é suprir o
muito acima do planejado. Isto pode ser expli- gargalo com partes (itens) mantendo-o ocupado
cado no fato deste princípio não ter mecanismos o maior tempo possível. Nesta situação é
para visualizar as necessidades futuras de produ- importante manter sempre um nível de estoque
ção, conseqüentemente não se preparando para de segurança no ponto de gargalo e o princípio
situações emergenciais. Assim sendo, pode-se de PUXA é o mais adequado.
antemão descartar sua aplicação a processos de Este estoque tem como objetivo a prevenção
fabricação do tipo não repetitivos. Para tentar contra o corte de atendimento à demanda por
melhorar seu desempenho algumas atividades falhas de produção nos estágios pré-gargalo.
devem ser estabelecidas, como por exemplo: Este tipo de operação permite desacoplar as duas
Aumento da comunicação entre o processo e redes, a pré-gargalo e a pós-gargalo. Esta
o cliente. distinção entre operações PUXA-EMPURRA
Maior freqüência de entrega. torna-se fácil para linhas de produção simples
Eliminação de toda incerteza quanto à com gargalo estável. Contudo para gargalos
demanda. múltiplos ou móveis o problema de identificação
44 Carvalho, Silva Filho, Fernandes – O Planejamento da Manufatura

GARGALO

Estágio de produção
Armazenagem
Fluxo de informação
Fluxo de material

Figura 8 – Princípio tipo MISTO

do ponto de acoplamento entre as duas redes ser considerado crítico (por exemplo, o tempo de
torna-se mais complexo. O software que utiliza processamento) e assim sendo deve ser operado
este procedimento é o “Optimised Production de forma diferenciada. A Figura 9 ilustra um
Technology” (OPT) (JACOBS, 1984). processo com caminho crítico.
O OPT é uma tecnologia de gestão da produ- Observe-se que pelo princípio misto, este
ção suportada por um software complexo que faz caminho é visto como possuindo uma demanda
a programação e o seqüenciamento da produção. maior que sua capacidade de produção, sendo
Este software é visto como uma caixa preta, pois mais atrativo operá-lo na forma empurra,
a metodologia que o suporta não está divulgada procurando assim maximizar sua utilização e
na literatura. Entretanto, sabe-se que ele está agilizar o processo de produção. Os outros
baseado em um conjunto de nove regras, cujo caminhos podem trabalhar com base no
objetivo é a programação de máquinas e mão-de- princípio puxa. Nos pontos de encontro entre o
obra para suprir os gargalos de produção de caminho crítico e os demais caminhos devem
forma sincronizada, de modo a reduzir inventá- haver pontos de estoque.
rio e aumentar as taxas de produção. Sob a ótica
OPT, o objetivo maior da empresa é fazer 4.4 Comentários sobre as Práticas Industriais
dinheiro. Partindo então desta premissa são
estabelecidos os princípios heurísticos e medidas Os conceitos apresentados acima foram
de desempenho que determinam a forma de formados por experiência e intuição adquiridas
programação, seqüenciamento da produção. Um pelos gerentes e operadores ao longo dos anos e
dos problemas para aplicação do OPT é a são conhecidos como práticas industriais. Estas
determinação do gargalo. Muitas vezes a práticas vêem os sistemas produtivos do ponto
dinâmica do processo de produção torna o de vista do cliente (demanda) e trabalham no
gargalo móvel, dificultando enormemente a sentido de maximizar o nível de satisfação deste,
aplicação deste enfoque. Para processos com tanto pela entrega dos produtos nas datas
gargalos móveis a aplicação do princípio combinadas quanto pela qualidade dos mesmos.
operativo misto é um pouco diferente e passa a Assim sendo, ao receber uma previsão de data de
ser apresentada a seguir. Se a estrutura do entrega de produtos aos clientes, a gerência deve
produto é complexa, pode-se utilizar a combina- imediatamente atentar para a disponibilidade de
ção dos princípios puxa-empurra para melhorar recursos e capacidade de produção para só então
o desempenho do sistema. Usualmente, neste questionar esta data. Para ter eficiência neste
caso um caminho da estrutura do produto pode questionamento, a gerência deve dispor de
GESTÃO & PRODUÇÃO v.5, n.1, p. 34-59, abr. 1998 45

caminho crítico

Estágio de produção
Armazenagem
Fluxo de informação
Fluxo de material

Figura 9 – Processo com caminho crítico

“mecanismos” para negociar novos prazos, em Além da satisfação total do cliente, atendi-
termos do objetivo principal da empresa que é o mento ao prazo de entrega, qualidade e custo,
lucro. Neste contexto, algumas dificuldades dos que significa produção dirigida por pedido, os
princípios operativos, discutidos anteriormente, sistemas de manufatura devem buscar outros
complicam este processo de negociação com o objetivos tais como a satisfação da empresa
cliente. Por exemplo, quando é adotado o (definida em termos de retorno) e satisfação dos
princípio PUXA (que caminha da demanda para empregados (definida em termos da participação
matéria-prima) a disponibilidade de matéria- nos lucros). Alguns destes objetivos podem ser
prima, via de regra, não é avaliada. Por outro “quantificados” e tratados pela otimização, como
lado, quando é adotado o princípio EMPURRA discutido na seção 6 deste trabalho.
(que caminha da matéria-prima para a demanda)
a data de entrega, via de regra, não é garantida. 5. Políticas de Estoque
Outras dificuldades gerenciais envolvendo estas
práticas industriais são: a impossibidade de
compatibilizar os recursos de capacidade em
sistemas tipo multiprodutos e o fato de conside-
A s práticas industriais utilizam a redução do
nível de estoque como estratégia para redu-
zir custos. Entretanto ao fazer isto, a abordagem
rar as incertezas sobre a demanda e o processo fica vulnerável às incertezas e variabilidade do
de produção de maneira extremamente rígida. processo produtivo. Para contornar este problema
Pode-se assim concluir que estas práticas têm é necessário considerar uma política de estoque
o plano de produção dirigido pelo cliente. Isto é, que venha amenizar as flutuações causadas pelas
a empresa recebe um pedido com uma data para incertezas como: as do sistema de produção
entrega do produto estabelecida pelo cliente que (quebra de equipamento, falta de pessoal, etc.),
não olha a capacidade ou as dificuldades do da demanda e da oferta de matéria-prima. Para
sistema produtivo. Isto coloca a questão negócio estabelecer esta política é necessário notar que
em segundo plano. Tanto o MRP quanto o JIT um sistema de produção multiestágio pode ser
pressupõem a disponibilidade de recursos de descrito como uma rede composta de estágios de
produção e matéria-prima e não questionam a produção separados por pontos de estoque.
data de entrega do pedido, típica característica Na operação de um sistema real é importante
do processo EMPURRA. Assim sendo, questões estabelecer a diferença entre uma fila e um ponto
do tipo como compatibilizar o interesse da de estoque. A fila, ou estoque intraestágio, acu-
empresa (ponto de vista da empresa) com o mula material que está esperando ou competindo
interesse do mercado consumidor (ponto de vista por recurso e o processamento começa assim que
do mercado) ficam totalmente em aberto. o recurso esteja disponível. No ponto de estoque,
46 Carvalho, Silva Filho, Fernandes – O Planejamento da Manufatura

ou estoque interestágio, o material em estoque Inicia pelo caso mais simples, o caso estágio
não é imediatamente liberado para o chão de único.
fábrica. Aqui a decisão de liberação é extrema- Caso 1 Estágio Único: Suponha que as or-
mente importante; o processamento imediato não dens sejam lote por lote. No esquema MRP II
é permitido mesmo que o recurso esteja mostrado na Tabela 2 podemos ver como a
disponível. Note-se que eles existem para reduzir previsão de demanda influencia na determinação
incertezas e flutuações da produção. das ordens de produção no caso de não se ter
As práticas industriais trabalham para dimi- estoque de segurança.
nuir o estoque intraestágio pela coordenação e Seja D(t,t+k) a demanda para o período t+k
balanceamento da produção. Contudo incertezas como previsto no início do período t e C(t) a
associadas à demanda, ao tempo de produção e soma do estoque e do WIP no início do período
até mesmo a entrega das ordens de compra criam t. Assim, por exemplo, da Tabela 2, segue que
dificuldades de gerenciamento que só podem ser C(1) = 30 +80 +60 +70. A relação, para o
contornadas pelos “estoques reguladores” dispo- período t, entre a ordem planejada P(t), o
níveis estrategicamente nos pontos de estoque. estoque C(t) e a previsão de demanda D(t,t+k) é
De acordo com o tipo da incerteza pode-se dada por:
adotar uma política diferente para a definição do l
tamanho de estoque. Exemplos são as incertezas P(t ) = ∑ D(t , t + i ) − C (t )
associadas à previsão de demanda e com o pro- i =0

cesso produtivo, exigindo da gerência a implan-


Para não resultar em ordem planejada negati-
tação de pontos de estoque reguladores. Um
va é assumido que:
outro tipo de incerteza está associado ao tempo
de produção, que gera como política de preven- l

ção, a adoção do tempo de segurança, ou seja, C (t ) ≤ ∑ D(t , t + i )


i =0
estabelece-se que o tempo de produção é um
pouco maior que o tempo esperado de produção. A presença de incertezas e a tentativa de se
Note-se que a idéia básica é evitar inesperadas evitar reprogramação da produção leva à criação
atividades de replanejamento da produção e para de estoque regulador. Isto pode ser efetuado por
tanto, adota-se a política de manter uma certa três caminhos, a saber:
quantidade de estoque nos diferentes ponto de 1. Utilização de estoque fixo de segurança, para
estoque. A eficácia destes estoques de segurança, o tempo de atraso “l”
no sentido de absorver as incertezas e as flutu- l
ações existentes no contexto do processo produ- P(t ) = ∑ D(t , t + i ) + S − C (t )
tivo, depende do tamanho do período de revisão i =0

do plano de produção. A seguir serão apresenta-


onde S denota o nível de inventário de segu-
dos procedimentos para estabelecer a quantidade
rança fixado pela gerência.
de estoque necessária para os dois casos acima,
2. Utilização de norma para o tempo “e” de
estoque de segurança e tempo de segurança.
segurança.
l+e
5.1 Estoque Interestágio em Sistemas de P(t ) = ∑ D(t , t + i ) − C (t )
Produção i =0

Esta seção considera os sistemas de produção 3. Superestimar requisitos futuros


multiestágio e a possibilidade das incertezas l
serem absorvidas por estoques entre estágios. A P(t ) = ∑ D' (t , t + i ) − C (t )
taxa de produção é assumida como conhecida. i =0
GESTÃO & PRODUÇÃO v.5, n.1, p. 34-59, abr. 1998 47

Tabela 2 – Esquema MRP para tempo de atraso de 3 unidades de tempo e


estoque de segurança de 0 unidades.

semana 1 2 3 4 5 6 7
demanda prevista 100 50 80 40 130 50 100
produção especific. 80 60 70
disponibilidade 30 10 20 10 -30 -160 -210 -310
requisito líquido 30 130 50 100
ordem planejada 30 130 50 100

A quantidade extra a ser produzida em Caso 2 Multiestágios e Outros: Para sistemas


cada caso é, respectivamente, dada pelas dois estágios, tipos convergentes, divergentes e
seguintes componentes: S, ∑i =l +1 D(t , t + i ) e
l+e
outros, expressões especiais podem ser deriva-
das. Detalhes destas expressões podem ser en-
∑ [D' (t , t + i) − D(t , t + i)]. Sendo D’ a deman-
l
i =0 contrados em WIJNGAARD & WORTMANN
da superestimada. (1985). Contudo, para sistemas com maior grau
Esta seção se restringiu ao estudo do nível de de complexidade, isto já não é possível. Abre-se
estoque de segurança para amenizar os efeitos espaço então para o emprego de outras técnicas
das incertezas. O tamanho deste estoque depende ou heurísticas que venham complementar as
do nível de variabilidade da incerteza. Podemos lacunas deixadas pelas práticas industriais. Entre
distinguir três tipos de incertezas: incertezas com estas técnicas podem ser destacadas a Teoria de
respeito ao processo, à demanda e ao tempo de Filas (PAPADOPOULOS et al., 1993) e a
processamento. Teoria de Controle Ótimo Estocástico (SILVA
Supondo conhecidas as medidas estatísticas FILHO et al., 1995).
relacionadas com os três tipos de incertezas lista-
dos acima pode-se, usando o segundo momento Incerteza com Relação ao Tempo
estatístico (ou seja, a variância) relacionado a Acima foram discutidos procedimentos para
cada tipo de incerteza, obter uma expressão o estabelecimento do nível “adequado” de
analítica para calcular o estoque de segurança S. estoque de segurança para cada item. Estes
Assim sendo, seja σ 2 (i ) a variância do erro de procedimentos resultam em manter uma certa
previsão de demanda para i períodos a frente; quantidade de estoque de segurança em cada
σ l2 a variância do tempo de atraso; e σ e2 a ponto de estoque. Um outro caminho para se
variância com respeito ao processo produtivo. estabelecer um estoque de segurança é a
Por conveniência será assumido que estas utilização de um “tempo de segurança”. Este
variâncias são independentes do período. O procedimento consiste em se adiantar a data de
estoque de segurança S, que deve cobrir todas as entrega de um pedido. A diferença de tempo
incertezas até o período l+1, é igual a: entre a need-date e a due-date é chamada de
tempo de segurança. A implementação deste

l
S =k i −0
σ 2 (i) + σ e2 + σ l2 μ 2 procedimento leva à distinção das duas datas: a
need-date e a due-date como mostrado na Figura
onde é a demanda média. O fator k pode ser 10. O pedido ao fornecedor de matéria-prima
visto como um parâmetro ponderador que deve ser colocado tomando-se em consideração a
suaviza ou incrementa S, segundo critérios de due-date a partir da qual são aplicadas as
risco estabelecidos pela gerência. tradicionais práticas industriais.
48 Carvalho, Silva Filho, Fernandes – O Planejamento da Manufatura

nível de
estoque

tempo de tempo de
segurança segurança

tempo
due- need- due- need-
date date date date

Figura 10 – Padrão de estoque de segurança gerado pelo tempo de segurança

Uma vantagem de se empregar um tempo de enfoque muito atrativo é a modelagem do


segurança em relação a um estoque de segurança sistema produtivo como um problema de fluxo
é que este procedimento não gera qualquer em rede com restrições adicionais (CARVALHO
estoque, a menos que haja uma demanda real em et al., 1994). Esta modelagem aproveita as
um futuro próximo. Enquanto que o emprego de características de fluxo de produto da rede de
estoque de segurança resulta em um aumento produção, do sistema de manufatura, para
não planejado dos níveis de inventário interme- realizar a modelagem por meio de recursos
diário (WIP). A incerteza quanto ao tempo gráficos. O grande apelo deste enfoque é que ele
advém do padrão do suprimento e do padrão da olha para o ponto de vista da empresa (retorno
demanda, ou seja, a demanda irá ocorrer, mas esperado), além de procurar resolver o problema
quando? A chegada do pedido de matéria-prima com uma visão temporal considerando assim as
irá ocorrer, mas quando? informações disponíveis para todo o horizonte
Como conclusão, as incertezas associadas ao de planejamento. Este fato permite que se
tempo deveriam ser contornadas via tempo de trabalhe no sentido de eliminar gargalos, por
segurança, enquanto que incertezas relacionadas meio de deslocamento da produção no tempo,
a quantidades deveriam ser contornadas por em alguns casos adiantando e em outros
quantidade de segurança. Contudo outro aspecto atrasando (mesmo para linhas que processem
que deve ser considerado pelas ações de multiprodutos). Permite também analisar
planejamento é a sincronização temporal da objetivos conflitantes e incluir demanda
produção em linhas concorrentes ou divergentes, probabilística, sob o ponto de vista do negócio,
sendo os pontos de concorrência ou divergência traduzidos em um único objetivo, ou seja, o
sempre um problema a mais para o planejador. lucro. A seguir são discutidos aspectos de
Esta ação permite eliminar estoque desnecessá- modelagem e da técnica de solução de proble-
rio e evitar parada do sistema de produção por mas de manufatura via otimização.
falta de produto. Como sincronizar a produção
em termos de tempo, quantidade e capacidade 6.1 Modelagem para Otimização
nestes pontos passa a ser discutido a seguir.
Tendo como objetivo fornecer as principais
6. Métodos de Otimização características da formulação do problema de
planejamento da produção a ser estudado, esta

U m outro caminho para auxiliar no apoio à


tomada de decisão gerencial de processos
de planejamento da manufatura é a utilização
seção considera o caso mais simples que se
constitui em uma linha serial multiestágio,
multiperíodo de um processo discreto de
dos métodos de otimização. Entre eles, um manufatura. A Figura 11 ilustra esta linha com
GESTÃO & PRODUÇÃO v.5, n.1, p. 34-59, abr. 1998 49

Estágio 1 Estágio 2 Estágio 3

(MP) (D)
Matéria- Demanda
-Prima

Figura 11 – Linha de produção serial

três estágios de produção na qual cada estágio a capacidade de cada grupo pode ser diferente
pode ter associado uma máquina ou um grupo de ao longo do período de planejamento.
máquinas que realizam transformações ou Segundo os custos unitários de matéria-
transportes com capacidades definidas a priori. prima, de operação, de estocagem e de atrasos na
O objetivo do planejamento é, a partir de metas entrega dos produtos e com o retorno por uni-
semanais estabelecidas por um nível hierárquico dade de demanda atendida, o planejamento deve
superior (por exemplo, decisões geradas pelo gerar um conjunto de decisões que determina:
programa mestre da produção (FOX, 1984), ou o quanto cada máquina deve produzir e em
por um sistema hierárquico de decisão que período;
(CARVALHO et al., 1996)), desmembrá-las em o quanto armazenar por estágio e em que
produções diárias, de forma a otimizar os custos, período;
atendendo ao mesmo tempo às restrições de a escala de utilização de matéria-prima por
capacidade das máquinas, de armazenagem e de período;
suprimento de matéria-prima. a escala de atendimento à demanda por
As decisões a serem tomadas para cada dia período;
podem envolver: a quantidade produzida, a a quantidade de demanda atendida com
utilização de matéria-prima, o carregamento de atraso; e
cada máquina ou grupo de máquinas, entre o retorno dentro do período de planejamento.
outras. A expansão da Figura 11 para considerar Um caminho para modelar e resolver este
um período de planejamento de cinco dias é tipo de problema, passa pela observação de que a
mostrada na Figura 12. Nesta expansão a linha de produção, para o sistema ilustrado pela
disponibilidade de cada grupo de máquinas pode Figura 12, pode ser visualizada como um
ser diferente ao longo do período de planejamen- conjunto de partes fluindo pelas máquinas e
to. Assim o grupo de máquinas 1 sofre decrés- unidades de armazenamento, sofrendo trabalho
cimo de capacidade nos intervalos de tempo 4 e (fabricação ou transporte) em cada período de
5 enquanto o grupo de máquinas 3 recebe uma tempo, até se tornarem um produto final. Se um
nova máquina a partir do período 3. Variações item deixa um estágio i, ele pode ir imediata-
semelhantes podem ocorrer com suprimento de mente ao estágio i+1 ou ser armazenado para
matéria-prima e com a demanda. De uma processamento em períodos subseqüentes. Esta
maneira geral, este problema apresenta as decisão passa pelas capacidades e custos de
seguintes características: produção e de estocagem. Esta característica
o horizonte de planejamento é discretizado sugere a aplicação de técnicas de grafos para
em períodos (hora, turno, dia); modelagem do problema de planejamento da
cada estágio de produção pode conter um ou produção, podendo ser escrita para cada estágio
mais grupos de máquinas; a seguinte equação de balanço:
são conhecidas as capacidades de produção e
de armazenagem de matéria-prima para x i -1, t + y i, t -1 = x i, t + y i, t
atendimento à demanda, dentro do horizonte
de planejamento; e
50 Carvalho, Silva Filho, Fernandes – O Planejamento da Manufatura

Grupo de Grupo de Grupo de


Máquinas 1 Máquinas 2 Máquinas 3
Mp1 D1
2 4 2

Mp2 D2
2 4 2

Mp3 D3
2 4 3

Mp4 D4
1 4 3

Mp5 D5
1 4 3

Períodos
(dias) Estágios

Figura 12 – Linha de produção com três estágios e cinco períodos.

onde xi,t representa a quantidade processada no um para representar a capacidade de processa-


estágio i, no tempo t e yi,t representa a quantida- mento e outro para representar a capacidade de
de armazenada para posterior processamento no armazenagem do sistema. De um modo geral,
estágio i e tempo t. A representação da linha de pode-se formular o problema em questão, na
montagem serial ilustrada na Figura 12, por uma forma matricial, como segue:
estrutura de grafo, está apresentada na Figura 13.
Nesta rede, os fluxos nos arcos do grafo Min f(x)
representam para cada período de tempo: a s.a Ax = b
quantidade de fornecimento de matéria-prima, a x≤X
quantidade de demanda por produto acabado, o
nível de produção das máquinas, o nível de onde f(.) é a função retorno líquido, A é a matriz
armazenagem das peças entre os períodos t e de incidência nó-arco para o horizonte de
t+1, e o nível de demanda em atraso de produtos planejamento, x o conjunto de variáveis que
acabados entre os períodos t e t-1 (CARVALHO representam os fluxos nos arcos do gráfico e b o
et al., 1992). Por outro lado, os nós do grafo conjunto de disponibilidades de matérias a serem
representam os pontos de decisão, onde são processadas ou demandas a serem atendidas. A
definidos o quanto produzir no período t e o modelagem acima, aplica-se à processos produti-
quanto armazenar para o período t+1. Neste vos seriais simples e portanto deve ser estendida
modelo o objetivo é a maximização do retorno para atender a problemas reais da indústria de
líquido, que é definido como a diferença entre o manufatura moderna, como é o caso do proble-
retorno obtido com o atendimento à demanda e ma de linhas de montagem tratado a seguir.
os custos de produção (compra de matéria-
prima, armazenagem, processamento, penalidade 6.2 Linha de Montagem
por demanda em atraso).
Este grafo possui uma estrutura muito especi- Uma linha de montagem é definida pela
al. Cada nó, com exceção dos nós relativos ao árvore do produto, ou seja, pela seqüência de
suprimento de matéria-prima e de balanço de operações que o produto e seus itens devem
demanda, correspondente a um estágio de produ- percorrer até se tornarem o produto final. O
ção. Possui pelo menos dois arcos divergentes, problema de uma linha de montagem composta
GESTÃO & PRODUÇÃO v.5, n.1, p. 34-59, abr. 1998 51

Injeção de
Semi-acabados
1,1 2,1 3,1 4,1 t=1
Arcos de
Arcos de
Matéria Prima Demanda

1,2 2,2 3,2 4,2 t=2

MP 1,3 2,3 3,3 4,3 D t=3

1,4 2,4 3,4 4,4 t=4

1,5 2,5 3,5 4,5 t=5


Demanda de
Semi-acabados

Estágio 1 Estágio 2 Estágio 3

Figura 13 – Representação por grafo do sistema produtivo

Sublinha 1

Sublinha 2 Produto
Final

Sublinha 3

Figura 14 – Representação de uma linha de montagem.

de três sublinhas é ilustrado na Figura 14. eficiência na montagem dos produtos finais. Esta
Através das sublinhas fluem os itens e os com- coordenação ou sincronização é necessária para
ponentes necessários à montagem do produto prevenir a criação de estoques supérfluos entre
final, que são acoplados em pontos determinados estágios ou que a produção pare devido a um
da linha. Nesta figura, as linhas pontilhadas fluxo não balanceado entre produtos e compo-
indicam os acoplamentos entre as sublinhas nos nentes. A Figura 15 expande a linha da
seus respectivos pontos de montagem. Figura 14 para um horizonte de três períodos de
É necessário definir o número de componen- planejamento.
tes a serem montados a cada item do produto A representação por grafo da Figura 15 é
principal (quatro pneus por carro, por exemplo). apresentada na Figura 16. Nesta figura, os arcos
Desta forma, uma das funções mais importantes em linha cheia representam as produções, os arcos
do planejamento da produção é coordenar o em tracejado as armazenagens e os arcos em
fluxo entre as sublinhas concorrentes visando pontilhado indicam os pontos de acoplamento.
52 Carvalho, Silva Filho, Fernandes – O Planejamento da Manufatura

Mp1 D1

Mp2 D2

Mp3 D3

Figura 15 – Linha de produção para três períodos.

t=1

Mp1 D1

t=2

Mp2 D2

t=3

Mp3 D3

Figura 16 – Representação por grafo do sistema produtivo.

Para se garantir o balanço de fluxo no ponto fornecer o fluxo necessário no ponto de


terminal l de uma sublinha, deve-se considerar a montagem i. O número de restrições adicionais
seguinte equação de acoplamento: será igual ao número de pontos de acoplamento
multiplicado pelo número de períodos de tempo.
q(l)x(i, t) - x(l, t) = 0, t = 1,2,..., T
onde l é o conjunto dos pontos terminais e 6.3 Linha de Montagem Multiproduto
x(l, t) representa a quantidade de peças do ponto
l no tempo t, a serem acopladas às x(i, t) peças Um ponto importante a considerar é o proces-
no ponto de montagem ou acoplamento i no samento de vários produtos pelo mesmo proces-
tempo t, a uma dada relação de acoplamento so, vide Figura 17. Estes produtos podem ter
q(l) . Esta equação garante que o fluxo do ponto árvores de produto idênticas ou diferentes, no
terminal l de cada sublinha é suficiente para entanto utilizam o mesmo conjunto de máquinas,
GESTÃO & PRODUÇÃO v.5, n.1, p. 34-59, abr. 1998 53

Produto k

t=1

Produto 2

Produto 1
t=2

t=1

t=3

t=2

t=3

Figura 17 – Sistema multiproduto multiestágio

durante a operação do sistema. Assim sendo é A representação matricial para a Figura 17,
importante garantir que, dentro do horizonte de considerando o caso multiproduto, pode ser
planejamento, o processamento de peças diferen- escrita como:
tes em uma mesma máquina não leve à violação
A1
de sua capacidade de produção. Para assegurar o
A2 0
atendimento a esta restrição deve-se estender o
. 0
problema de grafo para um problema multifluxo,
.
para isto adiciona-se mais uma restrição ao
problema: 0 .
AK
∑ x(i, t) ≤ X(j, t)
i∈I(j)
A Q1
Q2 0
.
onde X(j,t) é a capacidade máxima de produção 0
.
da máquina j e x(i,t) é a quantidade processada
0 .
da peça i no tempo t. O conjunto I(j) contém os
tipos de peças que serão processadas pela QK
E1 E2 . . . EK I
máquina j.
54 Carvalho, Silva Filho, Fernandes – O Planejamento da Manufatura

40
te m p o d e e x e c . (s )
G AM S
35
R ETR A

30

25

20

15

10

0
5 10 15 20 25 30 35 40 45 50 55 60

p ro d u to s

Figura 18 – Desempenho do GAMS x RETRA

onde A1 é a matriz incidência nó-arco do produto especial do problema. Um método que pode tirar
1, A2 é a matriz incidência nó-arco do produto 2, proveito deste tipo de estrutura é o GUB
Ak é a matriz incidência nó-arco do produto k e (“Generalized Upper Bounding”) especializado
Qk são as matrizes que definem as relações de para estruturas de rede. Este método é também
acoplamento entre as linhas concorrentes de cada conhecido como algoritmo primal para fluxo em
produto. As submatrizes Ek representam as redes com restrições adicionais. O algoritmo
restrições de capacidade mútua de processamen- empregado é o NETSIDE, código em Fortran
to. O número de restrições adicionais é igual ao para resolver problemas de fluxo em redes com
número de pontos de acoplamento multiplicado restrições adicionais, desenvolvido por
pelo número de intervalos de tempo adicionada KENNINGTON (1990) e que possui bom
ao número de máquinas que processem mais de desempenho quando o número de restrições
uma peça no mesmo intervalo de tempo. Como adicionais é menor que o número de nós do
pode-se ver acima, a matriz resultante para o grafo, caso específico do problema de planeja-
caso do planejamento da produção de uma linha mento da produção aqui formulado.
multiproduto, multiestágio e multiperíodo possui Outro enfoque é trabalhar as restrições adi-
uma estrutura muito particular que deve ser cionais de forma a converter a estrutura acima
aproveitada pela técnica de solução. Para tanto em um problema de fluxo em redes simples em
deve ser parcionada como sugerido em que algoritmos específicos muito eficientes estão
FERNANDES et al. (1995). disponíveis. Para obter uma estrutura de fluxo
em redes com função objetivo linear, dois passos
6.4 Técnica de Solução devem ser seguidos: tratamento das restrições
adicionais por técnica de penalidade quadrática
Em geral, os problemas de planejamento da suavizada e resolução do problema resultante
produção são de grande porte, devido principal- por decomposição simples e implementada no
mente à natureza temporal e à quantidade de software RETRA (CARVALHO et al., 1998). A
produtos que compartilham os mesmos recursos Figura 18 mostra o desempenho desta técnica em
de produção. Logo, requisitos como armazena- relação ao GAMS (BROOKE et al., 1992),
gem de variáveis e tempo de execução computa- software de programação linear de propósito
cional são fatores essenciais na escolha de um geral. Nesta figura é variado o número de pro-
método de solução. Para tanto, um meio de dutos e medido o tempo de execução. O GAMS
satisfazer estes requisitos é aproveitar a estrutura mostra um crescimento próximo ao exponencial
GESTÃO & PRODUÇÃO v.5, n.1, p. 34-59, abr. 1998 55

ORDENS ESTIMADAS ORDENS PLANEJADAS

DEMANDA

PLANEJAMENTO MESTRE

RETRA
PRODCON

PLANEJAMENTO PLANEJAMENTO
DE CAPACIDADES DE RECURSOS

CONTROLE DA
PRODUÇÃO

SUPERVISÃO

PROCESSO

Figura 19 – Hierarquia sugerida

como esperado, enquanto o RETRA apresenta 7. Integração Práticas Industriais e


uma vantagem crescente com o aumento do ta- Otimização
manho do problema. Esta característica é muito
importante na resolução de problemas reais.
A s práticas industriais são largamente empre-
gadas no planejamento da produção dos
sistemas de manufatura. Contudo, a cada dia
6.5 Recursos Visuais para Modelagem do
Problema cresce a necessidade de melhorá-las e supri-las
de mecanismos que considerem a questão da
A utilização de modelos de otimização do capacidade com uma visão temporal do
tipo fluxo em redes possibilita que a descrição problema para a definição das necessidades de
de um problema real, em linguagem de compu- armazenagem interestágios. Ou seja, que procure
tador, seja feita por ícones para definição da rota fazer uma alocação em um sistema capacitado,
de cada produto. Ou seja, o decisor monta a antecipando ou retardando no tempo o atendi-
árvore de produto utilizando recursos gráficos e mento a uma demanda preestabelecida,
ícones como na Figura 14. Para cada produto, baseando-se para tanto em fatores econômicos.
define as taxas de processamento por máquinas, O caminho é então a integração entre as práticas
custos, capacidades e diz o número de períodos industriais e os modelos de otimização como
que quer estudar. O sistema de interface expande sugerido na Figura 19.
esta rota ao longo do horizonte de planejamento. Este artigo sugere uma estrutura de coorde-
A modelagem gráfica torna transparente aos nação que interage por propagação de restrições
usuários as equações matemáticas que descreve- e por mecanismo de realimentação que assegura
riam o sistema físico, fator sempre relevante. o processo global de convergência. Em um
56 Carvalho, Silva Filho, Fernandes – O Planejamento da Manufatura

Prod 087 M01 Dt1 = 108.000


M15

M02 M06 M21

M19 GM3: 300.000 MG4: 300.000


M03

Dt2 = 80.000
GM1: 150.000 GM2: 100.000

M01
Prod 088 Dt1 = 40.000
M15

M02 M06 M21

M19 GM3: 600.000 GM4:200.000


M03 Dt2 = 40.000

GM1: 150.000 GM2 : 42.857


Dti demanda no tempo i

GMi Grupo de máquina i

Mi Máquina i

Figura 20 – Sistema de Produção

primeiro nível é utilizada a programação linear 8. Aplicação


(RETRA) para o problema de alocação agrega-
da. Esta agregação evita a manipulação maciça
de dados com as conseqüentes complexidades
computacionais e tem como objetivo captar os
N a Figura 20 é apresentado um sistema de
produção com quatro estágios, uma ou mais
máquinas por estágio com capacidades (GMi)
trade-offs e restrições do problema. Os itens que distintas por produto. As demandas para dois
dividem o mesmo tempo de preparação de produtos são conhecidas, não há restrição de
máquinas são agrupados em famílias e somente matéria-prima e o objetivo é gerar soluções pelo
os equipamentos importantes de cada linha são PRODCON um software do tipo MRP. O
representados, além dos pontos de montagens. PRODCON gera como primeira solução uma
O objetivo é permitir uma interação eficiente programação, Figura 21, como se os produtos
entre produtos, capacidade de produção, estoque fossem processamentos individualmente.
interperíodo e disponibilidade de matéria-prima. Quando é realizada a superposição das solu-
Em um segundo estágio, o PRODCON ções, verifica-se neste caso que a capacidade de
(PASSOS et al., 1996) detalha o plano estabele- produção é violada. Este é o caso do grupo de
cido acima e gera as ordens de produção. A máquinas GM2 no qual somente a produção de
grande vantagem da integração de duas técnicas prod087 viola a capacidade de produção.
diferentes para solução do problema de plane- Algumas atitudes corretivas devem ser tomadas.
jamento da produção, é que a solução fornecida As propostas podem ser: atender a um terço de
pelo RETRA é factível ou está muito perto de cada pedido; atender totalmente o pedido do
uma solução factível do PRODCON. Assim o produto Prod087 e o que for possível do produto
plano a ser avaliado pelo PRODCON estará Prod088; atender totalmente o produto Prod088
muito próximo da solução ótima do sistema. e o que for possível do Prod087.
GESTÃO & PRODUÇÃO v.5, n.1, p. 34-59, abr. 1998 57

saturada

108.000 108.000 108.000 108.000

Período 1 GM 1 GM2 M06 M 21

80.000 80.000 80.000 80.000

40.000 40.000 40.000 40.000

Período 2 GM1 GM 2 M 06 M21

40.000 40.000 40.000 40.000

prod087

prod088

Figura 21 – Solução PRODCON

Tabela 3 – Nível de atendimento às demandas para as propostas

Período Produto Demanda Proposta 1 Proposta 2 Proposta 3


Original Dem. Atendida Dem. Atendida Dem. Atendida
1 prod087 108.000 36.000 108.000 0
prod088 80.000 26.667 0 45.714

2 prod087 40.000 13.000 40.000 0


prod088 40.000 13.000 22.286 40.000

Tabela 4 – Solução Otimizada (RETRA)

Período Produto Demanda Original Demanda Atendida


1 prod087 108.000 108.000
prod088 80.000 03

2 prod087 40.000 40.000


prod088 40.000 22.289

9. Conclusão decisões, além da simples alocação de recursos.


Sugeriu que decisões ótimas sejam tomadas por

E ste artigo discutiu as necessidades de um


sistema de apoio à gestão da produção de
sistemas reais de manufatura que contemple
técnicas gerativas de solução, por exemplo, utili-
zado-se de modelos de otimização do tipo fluxo
em redes. Em um segundo nível, as decisões
questões de custo e dependência temporal das ótimas devem ser avaliadas e detalhadas pelo
58 Carvalho, Silva Filho, Fernandes – O Planejamento da Manufatura

PRODCON que gera as ordens de compra e de demanda, o PRODCON (que possui a estrutura
produção. Discutiu também a integração das de um MRP II) procura factibilizar de forma
duas técnicas, gerativa e avaliativa de solução, detalhada uma solução que atenda aos interesses
necessária devido a complementaridade. Ou seja, dos clientes. O grande apelo da integração destas
enquanto a otimização, para fugir do problema metodologias é olhar o sistema de produção sob
de dimensionalidade, trabalha com os produtos o ponto de vista da empresa (retorno esperado
agregados em família, otimiza custos e considera dentro do horizonte de planejamento) e do
restrições rígidas de capacidade e incerteza na cliente, privilegiado pelas técnicas avaliativas.

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MANUFACTURING PLANNING –
INDUSTRIAL PRACTICES AND OPTIMIZATION METHODS
Abstract

This paper presents a review of the most common methodologies used as tools for supporting the
production planning process of manufacturing systems. The industrial practices, known as evaluative
techniques, and the optimization methods, known as generative techniques are highlighted. The way
these techniques work is discussed, and their advantages and drawbacks are analyzed. It is concluded
that optimization is a complementary tool for overcoming certain deficiencies found during the
application of industrial practices and is essential for production planning.

Key words: MRP, JIT, mathematical programming, production planning.

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