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O Ensino Das Relacoes Internacionais No
O Ensino Das Relacoes Internacionais No
O Ensino Das Relacoes Internacionais No
2003
Shiguenoli Miyamoto
Universidade Estadual de Campinas
RESUMO
Em função das grandes transformações verificadas no mundo, na última década, ocorreu um rápido aumento
na quantidade de cursos de Relações Internacionais (RI) no Brasil. Atualmente, há quase sessenta
cursos em funcionamento. Percebe-se, todavia, é que nem sempre se asseguram condições adequadas
para o funcionamento desses cursos. Deficiências podem ser observadas não só no corpo docente, como
também nas bibliotecas, que muitas vezes não dispõem de acervo suficiente para atender às demandas
das disciplinas ministradas. Juntamente com esses problemas, os egressos dos cursos de RI têm
manifestado preocupações com sua inserção no mercado de trabalho, apesar de se encontrarem em
uma área em plena expansão, e terem uma formação múltipla que os torna altamente competitivos.
Neste artigo analisamos as condições sociais que criam a demanda pelo estudo das Relações
Internacionais no Brasil, bem como as exigências legais e institucionais para o bom funcionamento dos
cursos de graduação nessa área.
PALAVRAS-CHAVE: Relações Internacionais; qualidade no ensino de Relações Internacionais;
exigências legais e institucionais; inserção no mercado de trabalho.
Recebido em 10 de dezembro de 2002. Rev. Sociol. Polít., Curitiba, 20, p. 103-114, jun. 2003
Aprovado em 10 de janeiro de 2003.
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em torno delas, contemplavam quatro temas: o criou na atual administração a Secretaria Municipal
futuro do Mercosul, as perspectivas da Alca, a de Relações Internacionais, enquanto no Rio Gran-
integração física da América do Sul, e a OMC e a de do Sul, nos anos 1980, uma Secretaria Especial
regulação do comércio internacional: perspectivas de Relações Internacionais fazia já parte da estru-
pós-Seattle (ibidem). tura administrativa em âmbito estadual no governo
de Pedro Simon.
Como se pode ver pela iniciativa tomada pelo
então Presidente Fernando Henrique Cardoso, ao Apenas para complementar, poderíamos men-
convidar os 11 demais países do continente sul- cionar, ainda, a realização de eventos vários, tra-
americano para participar da primeira reunião de tando desses temas, como o recente seminário
cúpula da região, realizada nos dias 31 de agosto promovido pela PUC paulista e pelo Centro de
e 1º de setembro de 2000, o CEBRI, antes mesmo Estudos e de Cultura Contemporânea (CEDEC),
de constituir-se efetivamente, já estava exercitan- em 09 de dezembro de 2002, versando sobre
do, num primeiro momento, o papel de interlocutor integração e governos sub-nacionais, quando se
credenciado para discutir política externa com o discutiu a experiência das cidades latino-
governo brasileiro. Pela pauta proposta, podia-se americanas no contexto regional.
ver que os quatro temas objeto de discussão no
O surgimento dos cursos de Relações Inter-
encontro contemplavam o reforço da democracia,
nacionais, portanto, insere-se nesse quadro em que
o comércio, o combate ao crime organizado e a
o comércio internacional, os intercâmbios políti-
integração física do continente, tal como colocado
cos, culturais e sociais, a entrada de grandes con-
pela entidade (LAMPRÉIA, 2000, p. A-2; ROSSI,
glomerados estrangeiros, em praticamente todos
2000, p. 1-5). Contudo, em função de alguns pro-
os setores – seja adquirindo empresas nacionais,
blemas, com o passar dos anos, o CEBRI não
seja associando-se às mesmas –, passaram a
conseguiu atingir plenamente os objetivos
assumir importância crescente, causando impacto
inicialmente traçados, embora promova palestras,
tanto junto à sociedade quanto no Estado brasileiro.
encontros e realize importantes seminários. Ao
Esse fato (novos cursos e interesse pelas RI) está,
mesmo tempo, produz documentos como o re-
destarte, diretamente relacionado ao papel que o
cente Relatório sobre os Estados Unidos da Amé-
país desempenha ou exercitará com maior ou me-
rica, em agosto de 2002, que teve a colaboração
nor intensidade nos próximos anos; à sua inserção
de diversos membros da comunidade acadêmica,
em termos regionais ou mais amplos, e à própria
jornalística e empresarial (CEBRI, 2002-2003).
percepção que as pessoas passaram a ter do mun-
Além dessa instituição, não podemos esquecer do, influenciadas principalmente pelos meios de
os departamentos criados para tratar de assuntos comunicação de massa que invadiram as casas de
internacionais nas inúmeras federações e confe- todos sem pedir licença.
derações de comércio e indústria, nas secretarias
II. OS CURSOS DE RI E O PADRÃO DE QUALI-
municipais e estaduais, nas empresas estatais e
DADE
nos demais órgãos da administração federal direta
e indireta, nas universidades, nos sindicatos e nas Se, de um lado, o cenário parece promissor
associações de classes, nos partidos políticos e para o bacharel em Relações Internacionais nesse
em outras organizações não-governamentais. novo quadro, em que o mercado precisará de pro-
fissionais com uma ampla gama de conhe-
No plano federal vale lembrar a Assessoria de
cimentos, por outro lado, o surto muito rápido de
Relações Federativas (ARF) instituída em 09 de
cursos também tem levantado alguns problemas.
junho de 1997 pelo Decreto n. 2 246/97 (BRASIL,
2003). O principal objetivo da ARF, subordinada Esses obstáculos estão ligados, fundamental-
diretamente ao Gabinete do Ministro das Relações mente, ao fato de os cursos de RI serem ainda
Exteriores, é o de intermediar as relações entre o pouco conhecidos no país. Como se sabe, a pri-
Itamaraty e os governos de estados e municípios meira graduação específica sobre o assunto surgiu
brasileiros, bem como as Assembléias estaduais e em 1974 na Universidade de Brasília, locus pri-
municipais, assessorando-os em suas iniciativas vilegiado, e com apenas 20 alunos ingressantes,
externas, tratativas com governos estrangeiros, tendo com o tempo aumentado para 40. Com
organismos internacionais e organizações não- vestibulares semestrais no período diurno, esses
governamentais. O próprio município de São Paulo jovens profissionais, na condição de pioneiros,
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recomenda sua aprovação, fixando número de dades. Esses contestam muitos dos critérios utili-
vagas, turmas, turnos de funcionamento, zados pelo INEP para aferir a qualidade dos cursos,
conceituando o curso em uma gradação que pois, segundo eles, agora as instituições particulares
compreende os níveis A, B e C. Por sua vez, a foram equiparadas às públicas, apenando-as, por-
instituição que tiver uma média ponderada abaixo tanto, sem levar em conta as especificidades de
da exigida é contemplada, obviamente, com a cada uma delas (COSTA, 2002).
classificação D, tendo suas aspirações bloqueadas
III. AS DIFICULDADES ENCONTRADAS
pelo menos naquela oportunidade, havendo,
portanto, que reformular sua proposta, ou então Na maioria das instituições, as deficiências mais
simplesmente desistir. Ou utilizar, de acordo com agudas dizem respeito ao material bibliográfico e
o Artigo 3º da Portaria n. 2 297, de 8 de novembro ao corpo docente. Até mesmo universidades
de 1999, no prazo de cinco dias úteis a partir da conhecidas têm acervo limitado na área específica
entrega do relatório, o expediente de solicitar à de RI, com livros e periódicos aquém do necessá-
SESu a “revisão da avaliação em razão de erro rio inclusive para implementar os primeiros anos
material ou impropriedades no procedimento de do curso. Quando se trata de faculdades isoladas,
verificação” (BRASIL, 1999). a situação é ainda mais sofrível, visto que grande
parte delas não apresenta sequer bibliografia
Com a entrada em vigor dos recentes Manuais
adequada, referente às disciplinas conexas. Das
de avaliação de cursos, elaborados em 2002, que
avaliações dos especialistas que visitam as ins-
contaram com a colaboração de especialistas de
tituições naturalmente constam essas ressalvas,
cada área, reunidos em comissões específicas, sob
chamando-se atenção para a necessidade de se
a coordenação do INEP, alguns dos itens anteriores
implementarem medidas urgentes visando à
foram repensados e desdobrados em vários tópicos
aquisição de livros e periódicos considerados bási-
novos. Não só isso, mas uniformizaram-se também
cos, bem como a formulação de uma política de
os critérios para avaliação de todos os cursos e
atualização permanente do acervo. Como se pode
instituições do país – ressalvando-se obviamente
daí depreender, o não preenchimento deste requi-
as particularidades de cada carreira –, fazendo-se
sito implica a queda de qualidade dos cursos, im-
o mesmo para os próprios avaliadores, que passa-
possibilitando que os alunos tenham acesso a obras
ram por intenso treinamento ministrado pelo Minis-
fundamentais das Relações Internacionais, muitas
tério da Educação. No caso das Relações Inter-
delas fáceis de obter. Várias dessas obras foram
nacionais, até agora dez professores de diversas
inclusive traduzidas pela Editora da Universidade
instituições de ensino superior do país fizeram sua
de Brasília nos anos 1980, sendo que, desde o
capacitação em Brasília nos dias 27 e 28 de agosto
começo de 2002, dispõe-se uma coleção básica
de 2002. Para o curso de Relações Internacionais
de 20 textos para o público pela mesma editora,
alguns indicadores foram considerados de especial
em conjunto com o Instituto de Pesquisa em Rela-
importância 5 . Entre esses, a adequação dos
ções Internacionais do Ministério das Relações
docentes com formação específica nas disciplinas
Exteriores, e com a Imprensa Oficial do Estado
que ministram, a titulação dos professores, o
de São Paulo. O não cumprimento deste tópico
regime de trabalho – priorizando-se a dedicação
significa, ainda, que as faculdades, ao aproximar-
em tempo integral –, a existência de uma boa
se a formatura das primeiras turmas de alunos,
biblioteca e instalações satisfatórias.
poderão ter problemas quando solicitarem o reco-
Pelo fato de os manuais serem ainda recentes, nhecimento do curso, feito pelos avaliadores do
algumas controvérsias têm sido suscitadas, como INEP, se além desse quesito outros não tiverem
pode ser visto, por exemplo, no texto de Carlos sido preenchidos satisfatoriamente durante o de-
Costa que elenca não só elogios, mas principal- correr dos primeiros anos.
mente críticas de representantes de diversas facul-
Na realidade, a questão do acervo é um dos
indicadores complicados para a aferição feita pelos
especialistas de praticamente todas as áreas que
5 O manual relativo ao curso de Relações Internacionais assessoram o Ministério da Educação, tanto para
está disponível, desde o dia 09 de agosto de 2002, no seguinte efeito de autorização de funcionamento do curso
endereço eletrônico: http://www.inep.gov.br/download/ quanto para seu posterior reconhecimento.
superior/2002/condicoes_ensino/ACE-REL_INTER-
NACIONAIS.pdf. Sabendo que muitas instituições de ensino
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superior apresentam dificuldades para atender ter razão quanto à exigência de acervo numeroso
todos os requisitos exigidos, os próprios membros – com muitos exemplares de mesma obra –, nada
do Conselho Nacional de Educação procuraram justifica que grande parte das instituições faça seus
estabelecer critérios menos rigorosos para a aber- pedidos de autorização para funcionamento de
tura e funcionamento de novos cursos, afrou- cursos, ou de seu reconhecimento, sem contar
xando, por exemplo, as exigências no que se refere com um mínimo de livros considerados chaves.
à aquisição de material bibliográfico, ou mesmo Sem isso, obviamente, a qualidade do curso fica
da estrutura curricular de alguns bacharelados. seriamente comprometida, prejudicando o maior
interessado na obtenção de informações e conheci-
Pelo Parecer n. 146, de maio de 2002, o Con-
mentos, ou seja, o aluno.
selho Nacional de Educação flexibilizava os currí-
culos de diversos cursos, como os de Direito, De acordo com o novo Manual de avaliação
Administração, Ciências Contábeis, Música, Teatro do curso de Relações Internacionais (INEP, 2002),
e Economia. Por meio de liminar da Ordem dos para que o item “biblioteca” seja considerado
Advogados do Brasil, contudo, o Superior Tribunal “muito bom”, a mesma deverá funcionar pelo me-
de Justiça suspendeu, no dia 10 de setembro do nos 14 horas diárias, permanecer aberta aos sába-
mesmo ano, o parecer do Ministério da Educação. dos, apresentar possibilidade de reservas de livros
Manteve-se, assim, pelo menos temporariamente, pela internet, acesso a base de dados, ter em seu
a premissa de que o bacharelado em Direito deve acervo quantidade de livros que atendam aos pro-
ter um currículo mínimo para formação de seus gramas das disciplinas, que haja quantidade
profissionais, ao contrário do que defendia o Mi- suficiente (na proporção de um exemplar por até
nistério da Educação (CONSELHO NACIONAL dez alunos matriculados no curso para qualquer
DE EDUCAÇÃO, 2002; cf. também SOUZA, dos títulos selecionados pelo docente da disciplina)
2002, p. A-13). e que estejam atualizados, além de manter assina-
turas de pelo menos 5 jornais e 5 revistas ade-
Já segundo o Parecer CES n. 1 070/99, apro-
quados à proposta pedagógica do curso.
vado em 23 de novembro de 1999, cujo assunto
eram os critérios adotados para autorização e Se as bibliotecas têm se constituído em um
reconhecimento de cursos de Instituições de Ensi- dos elementos altamente negativos de diversas
no Superior, a Câmara de Ensino Superior do Con- instituições que oferecem os cursos de Relações
selho Nacional de Educação manifestava preocu- Internacionais, a deficiência do corpo docente
pação junto à SESu quanto às abordagens diferentes também tem sido uma constante. Esse ponto fraco,
utilizadas pelas diversas Comissões de Especialistas contudo, pode ser um pouco amenizado, justifi-
e de Verificação, consideradas extremamente hete- cado pela relativa carência ainda de professores e
rogêneas (CONSELHO NACIONAL DE EDUCA- especialistas em todo o país que possa atender a
ÇÃO, 1999). demanda tão repentina. Pelo fato de os cursos,
bem como a própria área de Relações Internacionais
De acordo com os conselheiros, era “preciso
no país, serem recentes, o número de programas
maior comedimento na exigência de múltiplos
com capacidade de formar mestres e doutores é
exemplares dos livros indicados na bibliografia”.
ainda reduzido.
Continuando, o relatório mencionava, ainda, que
“a bibliografia básica dos cursos é freqüentemente Excluindo-se os mestrados encontrados na
alterada porque deve ser atualizada constantemente Universidade de Brasília, no Instituto de Relações
e a multiplicação de textos desatualizados no Internacionais da PUC do Rio de Janeiro, e na
acervo constitui um investimento pouco produtivo. Universidade Federal do Rio Grande do Sul, as
Além do mais é preciso que a atualização e a rele- demais instituições oferecem poucas opções, além
vância das obras do acervo recebam consideração daquelas relacionadas à integração regional, não
maior que o número de livros existentes”. Assim, apresentando áreas de concentração mais solidifi-
“tanto no caso das bibliotecas como na infra-es- cadas em Relações Internacionais em seus currí-
trutura de informática o melhor é exigir a previsão culos.
de recursos permanentes para melhoria, atualização
No programa mais antigo – o da Universidade
e ampliação do acervo e dos equipamentos”
de Brasília, funcionando desde 1984 –, os pro-
(ibidem).
fissionais egressos da pós-graduação na sua maio-
Ainda que os relatores conselheiros pudessem ria já encontram trabalho, por exemplo na própria
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Capital Federal. Com os do Rio de Janeiro acontece cente é a espinha dorsal do curso.
o mesmo, sendo que muitos alunos que aí comple-
A própria Universidade de Brasília, em seus
taram seus mestrados igualmente fizeram ou estão
inícios, igualmente enfrentou problemas do gênero.
realizando seus doutorados em RI ou em Ciência
Ao contrário, porém, das demais instituições de
Política, tanto no país quanto no exterior, termi-
ensino, sua localização estratégica junto às
nando por ser absorvidos pela própria universidade
instâncias de poder facilitou a incorporação em
ou por alguma outra dos grandes centros, como
seu corpo docente de pessoal altamente qualificado
São Paulo ou Belo Horizonte.
na área de Relações Internacionais, vindo sobre-
As demais instituições que estão oferecendo a tudo do Instituto Rio Branco e dos demais depar-
graduação em RI, portanto, ao constituírem seu tamentos do Ministério das Relações Exteriores,
corpo docente têm tido dificuldades em arregi- ou de outras instâncias ligadas ao Direito Inter-
mentar recursos humanos suficientes – embora nacional e à História.
existam alguns aqui, outros acolá, e em número
Há, contudo, algumas notícias alentadoras.
mais limitado do que as outras áreas mais tradici-
Uma delas é a criação recente dos Doutorados em
onais – para ministrar inclusive as disciplinas bási-
Relações Internacionais no IRI-PUC-Rio, funcio-
cas como Teorias das Relações Internacionais, In-
nando desde agosto de 2001, com um sólido corpo
trodução às Relações Internacionais ou Organi-
docente constituído por dez professores; e o da
zações Internacionais e Política Externa Brasileira.
Universidade de Brasília, desde março de 2002,
Um elemento que se pode considerar agravante, cujo programa foi criado com professores não só
na busca de docentes qualificados em RI, é que do Departamento de Relações Internacionais mas
esses profissionais, além de pouco numerosos, também do de História. Destarte, essas duas
relutam em locomover-se para lugares mais dis- instituições situam-se na vanguarda da área de Re-
tantes dos grandes centros urbanos, pelo menos lações Internacionais no país, uma vez que a UnB
por dois motivos. Um deles é o receio de não en- tem os três níveis (graduação, mestrado e douto-
contrarem ambiente considerado satisfatório para rado), o mesmo acontecendo em breve com a
o pleno exercício de suas atividades, correndo o Pontifícia Universidade Católica do Rio de Janeiro,
risco de rapidamente ficarem desatualizados, em já que a graduação em RI também começará a ser
virtude da dificuldade de participarem com a oferecida a partir de março de 2003.
freqüência desejada de eventos relacionados à sua
A outra novidade é que a Coordenação de
área, perdendo os contatos já estabelecidos. O
Aperfeiçoamento de Pessoal de Ensino Superior
outro motivo é de ordem pecuniária, por não per-
(CAPES) concedeu recursos, em 2001, para um
ceberem vantagens suficientes que consideram
programa de incentivo à formação de recursos
importantes como contrapartida, para deixar os
humanos em Relações Internacionais, denominado
locais onde se encontram baseados, já que os
Programa San Thiago Dantas, tendo financiado
salários oferecidos não são considerados atraentes,
quatro propostas para criação e/ou reforço de pós-
preferindo manter-se no local de origem.
graduações. Duas delas já foram citadas neste
Assim, durante algum tempo, os cursos texto. A primeira foi o doutorado em RI da UnB; a
sofrerão prejuízos, com poucas possibilidades de segunda foi o mestrado da UFRS; a terceira é uma
contar em seus quadros, a curto prazo, com pro- experiência inédita, ou seja, um programa inter-
fissionais titulados tanto em Relações Interna- institucional de pós-graduação em Relações Inter-
cionais quanto oriundos da Ciência Política, So- nacionais envolvendo três grandes universidades
ciologia ou áreas conexas, com domínio de paulistas simultaneamente: a UNESP, a PUC-SP e
conhecimentos mais rigorosos sobre assuntos a Universidade Estadual de Campinas (UNICAMP).
internacionais, que possam dar conta das disci- Nesse modelo o programa será ministrado em nível
plinas específicas. de mestrado num primeiro momento (com previ-
são de início para março de 2003, na cidade de
Há necessidade, entretanto, de as IES esfor-
São Paulo), seguindo-se depois o de doutorado
çarem-se mais e investir na contratação de pro-
(provavelmente a partir de 2006); a última proposta
fessores que estão disponíveis, oferecendo política
que obteve recursos foi a da Universidade Federal
salarial satisfatória, incentivando-os a fazer parte
Fluminense que também deverá ter as Relações
de seus quadros, sem os quais jamais haverá
Internacionais como campo importante de investi-
melhoria de qualidade, uma vez que o corpo do-
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gação e docência, com o mestrado sendo ofereci- que legítima. Porém, ao invés de simplesmente
do a partir de 2003, ampliando sua atuação, um enveredar por discursos dessa natureza, ou ficar
pouco tímida até agora. infinitamente fincando pé nessas discussões, qui-
çá fosse mais produtivo trilhar por outros cami-
IV. PERSPECTIVAS DO MERCADO DE TRABA-
nhos: que os responsáveis pelos cursos, coorde-
LHO
nadores ou diretores, trabalhassem junto às suas
Apesar de a estrutura dos cursos apresentar- comunidades e empresas, procurando explicar
se como uma das questões que mais apreensão adequadamente o que é um profissional de Rela-
tem causado tanto aos alunos quanto aos espe- ções Internacionais, o que o mesmo pode fazer,
cialistas no ensino em Relações Internacionais, quais suas habilidades, suas ferramentas de tra-
outros assuntos têm, igualmente, merecido aten- balho e sua utilidade no mundo atual, em que as
ção, fundamentalmente por parte dos estudantes: mudanças processam-se com rapidez cada vez
os temas da profissionalização e do mercado de maior (SATO, 1999). Isso poderia ser feito, por
trabalho. As dúvidas levantadas abarcam desde a exemplo, obtendo-se uma listagem de empresas
própria designação do egresso do curso – sem médias e grandes de suas regiões e encaminhan-
denominação como os profissionais de outras do-lhes folhetos, material explicativo etc.
áreas, apenas identificado como “internacionalis-
Nessa direção, o Estatuto do Centro Acadêmi-
ta”, suscitando algumas discordâncias – até
co do Curso de Relações Internacionais
propostas de criação de uma reserva de mercado
(CARINTER) da Universidade do Vale do Itajaí
(ALMEIDA, 1999a, p. 13).
(UNIVALI), é esclarecedor, já que explicita em
Esta última idéia, todavia, não tem recebido seu Artigo 4º, inciso VIII, como um dos seus prin-
boa receptividade dos profissionais mais antigos cípios norteadores, “promover e divulgar o Cur-
que operam na área, até porque é complicado so de Relações Internacionais junto à sociedade”
definir com rigor qual o campo de atuação que (CARINTER, s/d, p. 1).
poderia ficar apenas aos cuidados do especialista
Talvez seja esse um dos caminhos. Ao invés
em relações internacionais, procedente desses
de tão-somente esperar pela ação dos responsáveis
cursos. Há alguns anos um deputado catarinense
pelos cursos, os próprios alunos, como interessa-
apresentou à Câmara dos Deputados projeto de
dos maiores, poderiam agir no sentido de divulgar
lei visando à regulamentação da profissão de
cada vez mais o que é e o que faz o profissional
bacharel em Relações Internacionais, estabele-
de Relações Internacionais. Como se sabe, há
cendo suas áreas de competência. Após muitas
bastante tempo os alunos têm mostrado ótima
discussões feitas pelos diversos cursos de RI, os
capacidade organizacional e se reunido em foros
estudantes decidiram na VII Reunião do Conselho
diversos, seja nos Encontros Nacionais dos
Nacional de Estudantes de Relações Internacionais
Estudantes de Relações Internacionais (ENERI),
(CONERI), realizada em Belo Horizonte, entre os
seja nos Encontros de Estudantes e Graduados
dias 7 e 9 de setembro de 2000, com a participação
em Relações Internacionais do Cone Sul,
de 12 faculdades filiadas à Federação Nacional dos
encontrando-se reunidos por meio da FENERI e
Estudantes de Relações Internacionais (FENERI),
do CONERI. Os eventos promovidos desde 1996
manifestar postura contrária à regulamentação da
em Brasília, Belo Horizonte, São Paulo,
carreira, tendo sido solicitado ao Deputado Antônio
Florianópolis, Salvador, Curitiba, ou Rio de Janeiro
Carlos Konder Reis, autor do projeto, sua retirada
são claros exemplos de que os estudantes têm
da pauta da Câmara dos Deputados. O projeto de
forjado, por conta e risco próprios, boas condições
lei, de 1999, dispunha sobre o exercício da profis-
para promover e tornar cada vez mais conhecido
são de bacharel em Relações Internacionais e auto-
o ensino das Relações Internacionais no país. Claro
rizaria a criação dos respectivos Conselho Federal
que a atuação conjunta com as direções dos cursos
e Conselhos Regionais dos profissionais de RI.
favorecerá ainda mais esse tipo de trabalho.
É claro que as preocupações com o mercado
Atividades paralelas às salas de aulas, como
de trabalho justificam-se quando um aluno termina
laboratórios, jornais e empresas júnior podem,
sua graduação, e que atinge praticamente de
certamente, dar contribuição significativa, ajudando
maneira igual a todos os formandos. Trata-se,
a impulsionar ainda mais o desenvolvimento da
inquestionavelmente, de uma apreensão mais do
área de Relações Internacionais. Na Universidade
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de Brasília, por exemplo, existia uma empresa que, espera-se, não demorarão a ser soluciona-
júnior denominada “Rel Júnior – Consultoria Inter- dos, como a deficiência do corpo docente e de
nacional” e que foi inclusive uma das organizadoras acervo bibliográfico que algumas instituições têm
do I Congresso Brasileiro de Relações Inter- apresentado.
nacionais realizado na capital federal em março de
Por outro lado, deve-se ponderar, realistica-
1998. Iniciativas semelhantes existem em diversas
mente falando, que muitas das atuais instituições
faculdades de RI do país. Na PUC de São Paulo
que não conseguirem suprir essas deficiências de
foi criado, também em 1999, o Observatório de
maneira adequada e persistirem fornecendo cursos
Relações Internacionais, responsável pela publi-
com qualidade abaixo daquela que poderia ser con-
cação do boletim Observatório Internacional, de
siderada razoável, correrão o risco de não terem,
periodicidade trimestral e elaborado pelos inte-
depois de alguns anos, alunos suficientes para
grantes do Projeto de Integração Graduação-Pós-
assegurar sua continuidade.
Graduação em Relações Internacionais (PROIN).
A abertura de muitos cursos em uma única
Esse tipo de atuação, além de interessante,
cidade também deverá acarretar o mesmo pro-
torna-se necessário porque atinge uma população
blema, já que poderá ocorrer a insuficiência de
externa mais ampla, até agora pouco voltada ou
demanda para preencher todas as vagas existentes,
informada sobre o curso ou seus problemas, tanto
o que nos anos vindouros comprometerá o pla-
da grade curricular quanto de conteúdo. Em outra
nejamento orçamentário da instituição, obrigando-
esfera, o papel desempenhado pelo RelNet (Sítio
a a tomar medidas mais drásticas.
brasileiro de referência em Relações Interna-
cionais) dispondo dados os mais variados pos- Mesmo em cidades médias onde existam um
síveis, sob a chancela do Departamento de Rela- ou dois cursos de RI, as instituições poderão en-
ções Internacionais da Universidade de Brasília, contrar dificuldades para mantê-los em funcio-
em colaboração com a Fundação Alexandre de namento após algum tempo – isso já está ocorren-
Gusmão (FUNAG), pelo Mercobol da PUC-MG e do – caso os egressos não consigam ser contra-
pela FENERI6, entre outros, tem sido de suma tados em período razoável na própria cidade ou
importância. Nesses sítios pode-se obter não só região, em um raio não muito distante. Neste último
informações sobre seminários, cursos de extensão, caso, se for pensado o deslocamento do profissio-
de pós-graduação no país e no exterior, pesquisas nal formado em cidades médias para centros
realizadas e em andamento, teses etc., mas parti- urbanos maiores, como as capitais dos estados,
cipar também de foros de debates com diversos sua formação deverá ser muito boa para compensar
professores, e ler publicações tanto do Ministério possíveis desvantagens, porque terá que competir
das Relações Exteriores quanto da própria UnB. com colegas de tradicionais universidades. Estas,
como se sabe, por uma série de fatores, têm
V. OBSERVAÇÕES FINAIS
demonstrado possibilidade de oferecer, compara-
O campo de trabalho para os “internacio- tivamente, cursos bastante sólidos, além dos
nalistas” – à falta de uma designação melhor – contatos que só grandes centros propiciam. Os
nos próximos anos deverá ser promissor, já que a próximos cinco anos serão decisivos para termos
falta de pessoas com formação sólida na área é um quadro mais definido e sabermos com maior
patente, e o momento pelo qual passamos exige precisão quais cursos sobreviverão frente a essas
crescentemente profissionais com perfil mais adversidades.
amplo. Tudo parece favorecer a participação cada
O quadro existente antes de 1995 e o posterior
vez maior, em todos os níveis, dos egressos dos
são bastante diferentes. Os cursos existentes até
bacharelados de RI.
meados dos anos 1990, como o da UnB e da
Como qualquer área que procura firmar-se, as Universidade Estácio de Sá (UNESA), apesar de
RI enfrentarão, também, durante certo tempo, já serem conhecidos, eram contudo identificados,
alguns problemas, mencionados anteriormente, pela maior parte da população, como tendo
objetivos mais específicos: a primeira voltada para
fornecer futuros quadros para o Ministério das
6 Seus endereços eletrônicos são: RelNet: http://
Relações Exteriores, e a segunda mais preocupada
www.relnet.com.br; Mercobol: http://www.pucminas.br/ com as técnicas e negociação de comércio exterior.
Mercosul, e FENERI: http://www.feneri.com.br.
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REFERÊNCIAS BIBLIOGRÁFICAS
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O ENSINO DAS RELAÇÕES INTERNACIONAIS NO BRASIL
cinada pelo Centro Brasileiro de Relações In- vista de Sociologia e Política, Curitiba, n. 12,
ternacionais (CEBRI). Política Externa, São p. 83-98, jun.
Paulo, v. II, n. 3, p. 114-135, dez.-fev.
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