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A LEI
André Sant’Anna
nada, porque ela, aquela vaca, não vai estar mais sentindo nada,
nem dor, nem medo, nem nada, nada, nada, nada, nada, nada,
nada... nada. Aí ela morde mesmo, na maior), outro no sovaco,
outro no nariz. Você já enfiou o seu pau na narina de uma
mulher? Eu já, porque eu sou da polícia. Então, a gente fica
horas e mais horas fodendo a puta, batendo na puta, rindo da
cara da puta, enfiando coisas no cu e na buceta da puta. A gente,
polícia, é burro, mas tem imaginação. Você já enfiou um livro
no cu de alguém. Eu já, que eu sou da polícia e enfiei uma lista
telefônica no cu de uma putinha, uma vez. Era menina ainda,
uma dessas Paraíba, menor de idade, dessas que chegam aqui
no Rio com motorista de caminhão, dessas que não têm carteira
de identidade, certidão de nascimento, pai, mãe, infância e,
depois de passar pela mão da gente, não têm nem mais cu, só
um buracão cheio de sangue e cocô e umas gosmas amarelas,
uns negócios meio nojentos que saem de dentro do intestino. O
segredo é ir alargando o intestino da criança aos poucos. A
gente, que é da polícia, primeiro enfia um pau, pau mesmo,
depois, o cano de revólver, depois, um cabo de vassoura, depois
uma peixeira, depois, rasga, aí vai enfiando o que tiver à mão –
e esse acento grave não é coisa de polícia – aí tem uma hora que
cabe qualquer negócio, qualquer troço. Mas a gente, que é da
polícia, que trabalha com essas porra de lei, tem que tomar
cuidado na hora de fazer essas porra, se a gente faz essas porra
na pessoa errada, aí fodeu. Por exemplo, criança, que nem essas
putinha aí que eu falei. Na maior parte das vezes, dá para ver
só pelo jeitão. A gente logo vê que a criança é sozinha, que
ninguém vai notar a falta dela etc. Mas, às vezes – crase em “ás
vezes” também é difícil de polícia, burros, eu, usar – a criança
tem alguém que protege, e não protege ela, que passa sempre
pelo sinal onde ela, a criança, vende chicletes, essas porra. Aí, a
gente, os policiais, pega essa criança, enfia um monte de coisa
no cu dela, arrebenta ela, quer dizer, a arrebenta, e, depois, a
joga num desses matos por aí, põe fogo no corpo, joga as cinzas
no rio, essas porra toda. Aí, essa pessoa que gosta daquela,
Ficção Brasileira Contemporânea