Você está na página 1de 16

INTENSIVO I

Marcelo Novelino
Direito Constitucional
Aula 2

ROTEIRO DE AULA

Tema: Poder Constituinte

Poder Constituinte

O Poder Constituinte é dividido em algumas espécies:

1) Poder Constituinte Originário;


2) Poder Constituinte Decorrente; e
3) Poder Constituinte Derivado.
3.1) Reformador;
3.2) Revisor.

Cada um deles será trabalhado detalhadamente a seguir:

1. Poder Constituinte Originário: responsável pela elaboração de uma nova constituição dentro do Estado

O Poder Constituinte Originário é encarregado de elaborar a Constituição do Estado. Pode ser a primeira constituição
ou uma nova constituição, ou seja, toda a vez que uma nova constituição surge dentro de um Estado já existente, ela
terá sido elaborada pelo Poder Constituinte Originário.

1.1. Natureza

✓ O Poder Constituinte é um poder de fato ou de direito? É um poder jurídico ou é um poder político?

1
www.g7juridico.com.br
Os poderes constituídos (Legislativo, Executivo e Judiciário) retiram sua força do texto constitucional. Assim, todos esses
poderes são jurídicos, pois retiram sua força de uma norma jurídica.

Se o Poder Constituinte Originário é o responsável pela elaboração de uma nova constituição, significa que ele está
acima dela e, portanto, não retira sua força da Constituição Federal.

Poder Constituinte Originário

Constituição Federal

Leis

Decretos

Se o Poder Constituinte Originário está acima da Constituição, é possível questionar de onde esse poder retira sua força.
Existem duas respostas diferentes para essa pergunta:

1º) Dentro de uma visão jusnaturalista (ou seja, de que existe um Direito Natural acima do direito positivo).
O direito natural é aquele inato ao homem, com princípios eternos, universais e imutáveis.
De acordo com a visão jusnaturalista, o direito positivo deve observar os imperativos do direito natural. Logo, o Poder
Constituinte Originário, embora não esteja subordinado ao direito positivo, está subordinado aos imperativos do direito
natural.
De acordo com esta concepção, o Poder Constituinte Originário seria um poder jurídico ou um poder de direito. Isto
porque este poder estaria limitado pelo Direito Natural.

2º) Já para a concepção positivista, não há nenhum outro direito além daquele posto pelo Estado. Assim, tratar-se-ia de
um poder político ou um poder de fato. Se não há direito acima do direito positivo, o Poder Constituinte Originário tem
natureza política, e não jurídica.

2
www.g7juridico.com.br
Em uma prova objetiva, o aluno deve marcar a concepção positivista. Este é o entendimento predominante dentro da
doutrina brasileira.

1.2. Características essenciais (MP/MS 2013) (DPC/MA 2018)

Aqui também há uma concepção jusnaturalista e uma concepção positivista. Dependendo da concepção adotada, as
características serão diferentes.

1º) Concepção jusnaturalista (Abade Sieyès - principal teórico do Poder Constituinte)

a) Incondicionado juridicamente: o Poder Constituinte Originário é incondicionado juridicamente pelo direito


positivo, mas é condicionado pelo direito natural.

b) Permanente: não se esgota com o seu exercício. Ou seja, não acaba com a elaboração de uma constituição. Ele
permanece existente, mesmo depois de realizar a sua obra, em estado latente.

c) Inalienável: a titularidade deste poder é intransferível. O titular do Poder Constituinte, para o Abade Sieyès, era
a nação. Atualmente, entende-se que o titular do Poder Constituinte é o povo, que é um conceito mais amplo.
Na visão do Abade Sieyès, a nação nunca perde a titularidade, que é inalienável. O Poder Constituinte pode até
ser usurpado, mas seu titular continua sendo o povo ou a nação.

2º) Concepção positivista (Georges Burdeau):

a) Inicial: Ele é o responsável pela elaboração da constituição e, portanto, não há nenhum outro poder antes ou
acima dele, já que os demais poderes retirarão a sua força da constituição.

b) Autônomo: cabe ao Poder Constituinte Originário escolher a ideia de direito que irá prevalecer dentro do
Estado (exemplo: estado unitário, federativo, presidencialismo, parlamentarismo etc.).

c) Incondicionado: segundo os positivistas, não há nenhum outro direito além do direito positivo, assim, não está
sujeito a nenhuma condição: nem condição formal, nem condição material. Cabe apenas a ele decidir que
conteúdo será consagrado na constituição e qual a formalidade a ser observada para a elaboração destas
normas.

Observação: no caso da CF/1988, houve uma convocação por meio da EC 26/1985 e uma constituinte para elaborar a
constituição. A citada emenda constitucional trouxe uma formalidade a ser observada. Veja a redação da EC 26/1985:

3
www.g7juridico.com.br
EC 26/85 – “Convoca Assembléia Nacional Constituinte e dá outras providências.
[...]
Art. 1º Os Membros da Câmara dos Deputados e do Senado Federal reunir-se-ão, unicameralmente, em Assembléia
Nacional Constituinte, livre e soberana, no dia 1º de fevereiro de 1987, na sede do Congresso Nacional.
Art. 2º. O Presidente do Supremo Tribunal Federal instalará a Assembléia Nacional Constituinte e dirigirá a sessão de
eleição do seu Presidente.
Art. 3º. A Constituição será promulgada depois da aprovação de seu texto, em dois turnos de discussão e votação, pela
maioria absoluta dos Membros da Assembléia Nacional Constituinte.”

Considerações importantes:
✓ Segundo José Afonso da Silva, não houve uma Assembleia Nacional Constituinte para a elaboração da CF/1988,
mas um Congresso Constituinte.
✓ Quando se fala em Poder Constituinte Originário, pode-se falar em poder inicial, autônomo e incondicionado ou
pode-se falar em poder soberano, independente e primário.
✓ Assembleia Nacional Constituinte é um conjunto de pessoas eleitas para o fim específico de elaborar uma
constituição. No caso da CF/1988, houve uma convocação específica para a formação da Assembleia Nacional
Constituinte. O professor destaca, entretanto, que nem todos os constituintes foram eleitos exclusivamente para
esse fim, pois alguns senadores já estavam cumprindo mandato no momento da instauração da Assembleia.
Diante disso, muitos autores, na época, questionaram se o Poder Constituinte da CF/1988 era, de fato, originário.
Prevaleceu o entendimento de que se tratava de Poder Constituinte Originário e democrático. Além disso, o
professor destaca que não se tratou de Poder Constituinte condicionado, pois a Assembleia Nacional Constituinte
não estava obrigada a seguir as formalidades da EC 26/1985.
✓ Na visão positivista, o Poder Constituinte Originário não precisa respeitar sequer os princípios éticos e valores
enraizados na sociedade, pois não há qualquer tipo de limitação para o Poder Constituinte Originário. Se,
entretanto, for adotada uma visão não positivista do direito, existem limites materiais ou extrajurídicos que
devem ser observados.

1.3. Limites materiais (ou extrajurídicos)


Tem ganhado força, no Brasil, uma visão não positivista em relação aos limites materiais que o Poder Constituinte
Originário possui.

Robert Alexy, por exemplo, intitula-se não positivista e defende que o direito extremamente injusto não pode ser
considerado direito (fórmula de RadBruch).

✓ Obs.: Não positivista é aquele que admite algo além do direito positivo. Visão não positivista é mais ampla do

4
www.g7juridico.com.br
que a visão jusnaturalista.

Limites materiais (ou extrajurídicos) que devem ser observados pelo Poder Constituinte Originário:

1º) Imperativos do Direito Natural: Para os jusnaturalistas, acima do direito positivo, há um conjunto de normas eternas,
universais e imutáveis, que formam o direito natural. Este direito natural limita o direito positivo e, por consequência, o
Poder Constituinte Originário.

2º) Valores éticos, sociais e políticos: os valores acolhidos por uma comunidade limitam o Poder Constituinte Originário.
Se ele tem como titular o povo, ele não pode consagrar na constituição valores incompatíveis com aqueles
predominantes na sociedade, mas sim que correspondam aos valores éticos, sociais e políticos.

3º) Direitos fundamentais já consolidados: a doutrina entende que os direitos fundamentais conquistados por uma
sociedade ao longo do tempo não podem ser objeto de retrocesso.

A proibição (vedação) do retrocesso atua em dois sentidos (efeito cliquet):


a) Seria uma limitação ao Poder Constituinte Originário, não podendo ser desprezada quando da elaboração de uma
nova Constituição.
Neste primeiro sentido, os direitos fundamentais conquistados pela sociedade e sobre os quais haja um consenso
profundo não podem ser objeto de um retrocesso. Uma nova constituição não pode retroceder naqueles direitos
fundamentais que a sociedade já conquistou.
Fábio Konder Comparato traz o exemplo da pena de morte, pois, no Brasil, uma nova constituição não poderia, segundo
ele, prever a pena de morte, já que isso seria um retrocesso social.
Na Convenção Americana sobre Direitos Humanos há dispositivo que consagra a vedação do retrocesso, exatamente
com relação à pena de morte. É o chamado “efeito cliquet”, termo originário do alpinismo, que significa, neste contexto,
o impedimento de retrocesso.

b) Limitação aos poderes públicos em relação ao grau de concretização alcançado pelos direitos sociais.
Aqui, há a vedação de retrocesso social. Segundo essa visão, os direitos sociais não podem ser objeto de retrocesso.

4º) Normas de Direito Internacional: cada vez mais o Poder Constituinte Originário tem a característica da ilimitabilidade
relativizada.
A flexibilização do caráter ilimitado do Poder Constituinte decorreu de dois aspectos: globalização e crescente
preocupação com a proteção de direitos humanos.
Assim, atualmente, o Poder Constituinte deve observar, também, as normas de direito internacional, principalmente as
que se referem aos direitos humanos.

5
www.g7juridico.com.br
1.4. Legitimidade do Poder Constituinte Originário: como ele está acima da Constituição, não se fala em
constitucionalidade ou inconstitucionalidade desse poder. Quando se analisa o Poder Constituinte Originário, deve-se
avaliar se ele é legítimo ou não.

A legitimidade pode ser analisada por dois prismas:

a) Subjetiva: titularidade e exercício deste poder. A titularidade, dentro de uma concepção democrática, pertence ao
povo ou à nação. O exercício deste poder (efetiva elaboração da constituição) nem sempre corresponde à titularidade.
Quando a constituição é elaborada por representantes do povo, eleitos para esse fim específico, a constituição é
considerada democrática.
Se a titularidade não corresponde ao exercício, o Poder Constituinte é ilegítimo no aspecto subjetivo. Exemplo: um
determinado grupo de pessoas toma o poder e faz nova constituição. Ela será ilegítima.

b) Objetiva: está relacionado ao conteúdo da constituição. Sob o aspecto objetivo, o Poder Constituinte Originário deve
consagrar um conteúdo normativo em conformidade com a ideia de justiça e com os valores radicados na comunidade
em um determinado momento histórico. É necessário que haja correspondência entre o que foi consagrado na
constituição e os valores daquela comunidade.

2. Poder Constituinte Decorrente:


Só existente em federações. É um poder jurídico responsável por elaborar as constituições dos estados-membros,
podendo ser inicial ou secundário.

2.1. Natureza
Discute-se na doutrina se o Poder Constituinte Decorrente seria realmente constituinte ou constituído. Há três
posicionamentos:

I) Constituinte: Anna Cândida da Cunha Ferraz entende que o Poder Constituinte Decorrente é um poder
verdadeiramente constituinte, uma vez que é o responsável pela criação da constituição do estado-membro.

II) Derivado: Celso Bastos defende que se trataria de poder derivado, e não constituinte propriamente dito. Esta
posição foi cobrada na prova do MP/SC de 2016. É o poder de modificar a Constituição Federal e, também, o poder de
elaborar constituições estaduais.

III) Dupla: Raul Machado Horta entende que o Poder Constituinte Decorrente teria uma dupla natureza: seria um
poder constituinte em relação à constituição do Estado-membro, mas seria constituído em relação à Constituição
Federal.

6
www.g7juridico.com.br
2.2. Fundamento constitucional:

Na CF/1988, há dois dispositivos que preveem a existência do Poder Constituinte Decorrente:

CF, art. 25. “ Os Estados organizam-se e regem-se pelas Constituições e leis que adotarem, observados os princípios desta
Constituição.”

ADCT, art. 11, caput. “Cada Assembléia Legislativa, com poderes constituintes, elaborará a Constituição do Estado, no
prazo de um ano, contado da promulgação da Constituição Federal, obedecidos os princípios desta.”

✓ As constituições estaduais devem ser simétricas em relação à Constituição Federal.

O princípio da simetria é extraído destes dois dispositivos citados. Quando dizem “observados os princípios desta
Constituição”, dizem que a Constituição Estadual deve ser simétrica à Constituição Federal. Isto é, deve seguir o modelo
da Constituição Federal. Como decorrência do princípio da simetria, há normas de observância obrigatória pelos Estados
– normas que o Estado obrigatoriamente deve observar.

Há normas, entretanto, que se dirigem à União e, mesmo assim, o modelo estabelecido deve ser seguido pelos estados-
membros (observância obrigatória). Exemplo: processo legislativo (art. 59 e seguintes da CF).

Outro exemplo se refere aos requisitos para a criação de uma CPI (art. 58, §3º, CF1). Ao fazer a leitura do dispositivo, é
possível perceber que só há menção da CPI em âmbito federal. Entretanto, segundo a jurisprudência do STF, os requisitos
para a criação da CPI (requerimento de um terço dos membros, apuração de fato determinado e prazo certo de duração)
são de observância obrigatória para os estados.

Por fim, pode-se citar como exemplo expresso o art. 74 da CF2, o qual determina que as normas de organização e
funcionamento do TCU devem ser reproduzidos pelos tribunais de contas dos estados.

1
CF, art. 58, §3º: “As comissões parlamentares de inquérito, que terão poderes de investigação próprios das autoridades
judiciais, além de outros previstos nos regimentos das respectivas Casas, serão criadas pela Câmara dos Deputados e pelo
Senado Federal, em conjunto ou separadamente, mediante requerimento de um terço de seus membros, para a apuração
de fato determinado e por prazo certo, sendo suas conclusões, se for o caso, encaminhadas ao Ministério Público, para
que promova a responsabilidade civil ou criminal dos infratores.”
2
CF, art. 74: “Os Poderes Legislativo, Executivo e Judiciário manterão, de forma integrada, sistema de controle interno
com a finalidade de:

7
www.g7juridico.com.br
2.3. Características do Poder Constituinte Decorrente

O Poder Constituinte Decorrente não tem as mesmas características do Poder Constituinte Originário.
O Poder Constituinte Decorrente retira o seu fundamento do texto constitucional. Assim, trata-se de um poder jurídico,
pois está limitado pela Constituição Federal.

a) Secundário: o Poder Constituinte Decorrente é secundário, pois surge a partir de outro poder, que é o originário.

b) Limitado: encontra limites na Constituição Federal.

c) Condicionado: deve observar determinadas condições impostas pela Constituição da República.

Questão: Existe Poder Constituinte Decorrente no Distrito Federal e Municípios? (AGU 2006)
O entendimento majoritário na doutrina é no sentido de que no Distrito Federal existe um Poder Constituinte
Decorrente. Isto porque, embora se chame Lei Orgânica, ela tem a natureza de uma Constituição Estadual tanto quanto
de Lei Orgânica – o Distrito Federal detém competências estaduais e municipais. (Entendimento de Marcelo Novelino,
Dirley da Cunha Júnior, Bernardo Gonçalves).

No caso dos Municípios, prevalece o entendimento no sentido de que não há Poder Constituinte Decorrente. Dirley da
Cunha Júnior e Pedro Lenza adotam esse entendimento.

✓ Na opinião do professor Novelino, a natureza da lei orgânica do município é a mesma natureza da constituição
estadual. Entretanto, esse não o posicionamento dominante.

3. Poder Constituinte Derivado

I - avaliar o cumprimento das metas previstas no plano plurianual, a execução dos programas de governo e dos
orçamentos da União;
II - comprovar a legalidade e avaliar os resultados, quanto à eficácia e eficiência, da gestão orçamentária, financeira e
patrimonial nos órgãos e entidades da administração federal, bem como da aplicação de recursos públicos por entidades
de direito privado;
III - exercer o controle das operações de crédito, avais e garantias, bem como dos direitos e haveres da União;
IV - apoiar o controle externo no exercício de sua missão institucional.
§ 1º Os responsáveis pelo controle interno, ao tomarem conhecimento de qualquer irregularidade ou ilegalidade, dela
darão ciência ao Tribunal de Contas da União, sob pena de responsabilidade solidária.
§ 2º Qualquer cidadão, partido político, associação ou sindicato é parte legítima para, na forma da lei, denunciar
irregularidades ou ilegalidades perante o Tribunal de Contas da União.”

8
www.g7juridico.com.br
3.1. Espécies

A Constituição da República prevê duas espécies de poder derivado:

1º) Poder Reformador (CRFB/88, art. 603): responsável pela reforma da Constituição. A reforma pode ser definida como
a via ordinária de alteração da constituição.

2º) Poder Revisor (ADCT, art. 3): este poder é responsável pela revisão constitucional. A revisão é uma via extraordinária
de alteração da constituição.

ADCT, art. 3º: “A revisão constitucional será realizada após cinco anos, contados da promulgação da Constituição, pelo
voto da maioria absoluta dos membros do Congresso Nacional, em sessão unicameral.”

O art. 3º, ADCT, trouxe duas limitações para este poder: (I) uma limitação temporal de 5 anos; e (II) uma limitação formal,
relativa ao procedimento a ser adotado.

3
CRFB/1988, art. 60: “A Constituição poderá ser emendada mediante proposta:
I - de um terço, no mínimo, dos membros da Câmara dos Deputados ou do Senado Federal;
II - do Presidente da República;
III - de mais da metade das Assembléias Legislativas das unidades da Federação, manifestando-se, cada uma delas, pela
maioria relativa de seus membros.
§ 1º A Constituição não poderá ser emendada na vigência de intervenção federal, de estado de defesa ou de estado de
sítio.
§ 2º A proposta será discutida e votada em cada Casa do Congresso Nacional, em dois turnos, considerando-se aprovada
se obtiver, em ambos, três quintos dos votos dos respectivos membros.
§ 3º A emenda à Constituição será promulgada pelas Mesas da Câmara dos Deputados e do Senado Federal, com o
respectivo número de ordem.
§ 4º Não será objeto de deliberação a proposta de emenda tendente a abolir:
I - a forma federativa de Estado;
II - o voto direto, secreto, universal e periódico;
III - a separação dos Poderes;
IV - os direitos e garantias individuais.
§ 5º A matéria constante de proposta de emenda rejeitada ou havida por prejudicada não pode ser objeto de nova
proposta na mesma sessão legislativa.”

9
www.g7juridico.com.br
Obs.: o único local em que a Constituição Federal de 1988 dispôs sobre sessão unicameral foi no art. 3º, ADCT. Em todos
os demais momentos, versa-se sobre sessão bicameral, ou seja, o cômputo dos votos dos membros do Congresso
Nacional é feito separadamente (Câmara dos Deputados e Senado Federal). Mesmo quando há sessão conjunta, os votos
são computados separadamente.

✓ Segundo a doutrina, o objetivo da limitação temporal de 5 anos foi permitir que se fizesse uma mudança mais
ampla e profunda na Constituição Federal caso o eleitorado optasse por modificar a forma de governo e o
sistema de governo, pois o art. 2º da ADCT4 trazia a previsão de plebiscito a ser realizado em 07/09/1993. Caso
o eleitorado quisesse alterar a forma ou o sistema de governo, a revisão constitucional viabilizaria todas as
mudanças que seriam necessárias.
✓ É possível uma nova revisão constitucional no Brasil? Não, pois o art. 3º da ADCT é norma de eficácia exaurida.
✓ Poderia uma EC acrescentar um novo dispositivo da ADCT prevendo outra revisão? Parte da doutrina entende
que não, pois seria uma maneira de burlar a Constituição Federal, pois o Poder Constituinte Originário previu
um procedimento mais complexo para alterar o texto constitucional.
O professor defende que, desde que haja uma justificativa fática realmente importante, no entendimento dele,
seria possível estabelecer uma nova revisão. Entretanto, esse tema é bastante polêmico e não é possível utilizar
a revisão como maneira de fraudar o procedimento de alteração da CF/1988.

STF, ADI 981 MC: “Após 5 de outubro de 1993, cabia ao Congresso Nacional deliberar no sentido da oportunidade ou
necessidade de proceder à aludida revisão constitucional, a ser feita uma só vez.”

STF, ADI 1.722 MC: “Ao Poder Legislativo, Federal ou Estadual, não está aberta a via da introdução, no cenário jurídico,
do instituto da revisão constitucional”.

3.2. Limitações

As limitações podem ser de quatro espécies, segundo a doutrina:

3.2.1. Temporais:
A limitação temporal proíbe a alteração da constituição durante um determinado período de tempo. Isso ocorre para

4
ADCT, art. 2º: “No dia 7 de setembro de 1993 o eleitorado definirá, através de plebiscito, a forma (república ou
monarquia constitucional) e o sistema de governo (parlamentarismo ou presidencialismo) que devem vigorar no
País. (Vide emenda Constitucional nº 2, de 1992)
§ 1º Será assegurada gratuidade na livre divulgação dessas formas e sistemas, através dos meios de comunicação de
massa cessionários de serviço público.
§ 2º O Tribunal Superior Eleitoral, promulgada a Constituição, expedirá as normas regulamentadoras deste artigo.”

10
www.g7juridico.com.br
possibilitar a sedimentação do texto constitucional.
No Brasil, a Constituição Imperial de 1824 trouxe uma limitação temporal de 4 anos.

CIB/1824, art. 174: “Se passados quatro anos, depois de jurada a Constituição do Brasil, se conhecer, que algum dos
seus artigos merece reforma, se fará a proposição por escrito, a qual deve ter origem na Câmara dos Deputados, e ser
apoiada pela terça parte deles.”

A Constituição Federal de 1988 não trouxe limitação temporal para o Poder Reformador. Agora, como visto
anteriormente, houve uma limitação temporal para o Poder Revisor (art. 3º, ADCT).

3.2.2. Circunstanciais:
As limitações circunstanciais são aquelas que proíbem a alteração da constituição durante a vigência de situações
excepcionais, nas quais a livre manifestação do Poder Constituinte possa estar ameaçada.
Estas circunstâncias são tão graves que podem colocar em risco a livre manifestação do Poder Reformador.
As três circunstâncias previstas na Constituição são (art. 60, § 1º5): Estado de Defesa, Estado de Sítio e Intervenção
Federal. É uma forma de preservar a livre manifestação do Poder Reformador.

Prevalece na doutrina que as limitações previstas se aplicam ao Poder Revisor.

3.2.3. Formais ou procedimentais (processuais):

São aquelas que impõem formalidades a serem observadas quando da alteração da Constituição.

São também chamadas de limitações implícitas, pois, se elas impõem formalidades a serem observadas, implicitamente,
estão proibindo outras formalidades.

As limitações formais do Poder Reformador estão previstas no art. 60, caput, §§ 2o, 3º e 5o6.

5
CRFB/1988, art. 60, §1º: “A Constituição não poderá ser emendada na vigência de intervenção federal, de estado de
defesa ou de estado de sítio.”
6
CF/1988, art. 60, caput, §§2º, 3º e 5º: “A Constituição poderá ser emendada mediante proposta:
I - de um terço, no mínimo, dos membros da Câmara dos Deputados ou do Senado Federal;
II - do Presidente da República;
III - de mais da metade das Assembléias Legislativas das unidades da Federação, manifestando-se, cada uma delas, pela
maioria relativa de seus membros.
(...)
§ 2º A proposta será discutida e votada em cada Casa do Congresso Nacional, em dois turnos, considerando-se aprovada
se obtiver, em ambos, três quintos dos votos dos respectivos membros.

11
www.g7juridico.com.br
a) Limitações formais subjetivas: relacionadas aos sujeitos competentes para alterar a constituição. Esta iniciativa
está prevista no art. 60, caput, I, II e III:

“Art. 60. A Constituição poderá ser emendada mediante proposta:

I - de um terço, no mínimo, dos membros da Câmara dos Deputados ou do Senado Federal;”

Ao contrário do que acontece com o projeto de lei, que pode ser apresentado por um Deputado ou um Senador, as
propostas de emenda exigem, no mínimo, um terço – ou dos membros da Câmara ou dos Senadores.

“II - do Presidente da República;”

O Presidente da República é o único legitimado que pode propor lei e emenda.

A iniciativa para propor emenda é a única participação que o Presidente da República pode ter no processo legislativo
de elaboração de Emenda Constitucional.

“III - de mais da metade das Assembléias Legislativas das unidades da Federação, manifestando-se, cada uma
delas, pela maioria relativa de seus membros.”

As Assembleias Legislativas, se quiserem apresentar proposta de Emenda, devem se reunir em, no mínimo, quatorze,
devendo obter a maioria relativa dos votos dos presentes na sessão (maioria relativa).

Atenção: a Constituição Federal não traz previsão expressa de iniciativa popular para a PEC. Diante disso, há dois
posicionamentos na doutrina sobre a possibilidade ou não de que uma PEC seja de iniciativa popular:
1º) Ingo Sarlet e José Afonso da Silva sustentam que é possível, por meio de uma interpretação sistemática da CF, haver
iniciativa popular de emenda. Por analogia, aplicar-se-ia o art. 61, §2º, CF.
2º) Gilmar Mendes e Marcelo Novelino defendem que, por razões de interpretação histórica, a iniciativa popular não é
possível, já que o Poder Constituinte Originário optou por não acrescentar essa possibilidade ao texto constitucional.

§ 3º A emenda à Constituição será promulgada pelas Mesas da Câmara dos Deputados e do Senado Federal, com o
respectivo número de ordem.
(...)
§ 5º A matéria constante de proposta de emenda rejeitada ou havida por prejudicada não pode ser objeto de nova
proposta na mesma sessão legislativa.”

12
www.g7juridico.com.br
Além disso, a norma que prevê a iniciativa para PEC é excepcional e, portanto, deve ser interpretada restritivamente.

b) Limitações formais objetivas: o art. 60, §2º da CF prevê que “A proposta será discutida e votada em cada Casa
do Congresso Nacional, em dois turnos, considerando-se aprovada se obtiver, em ambos, três quintos dos votos
dos respectivos membros.”

b.1) Limitação relativa ao quórum: é necessário ter atenção ao quórum (3/5 dos votos = 60% - É possível fazer a relação:
art.60 = 60% dos votos) e para o fato de que são dois turnos de votação em cada Casa do Congresso Nacional.
Não há previsão para lapso temporal entre esses dois turnos, mas o Regimento Interno do Senado prevê, no mínimo, 5
dias úteis.

STF – ADI 4.357/DF: “1. A aprovação das emendas à Constituição não recebeu da Carta de 1988 tratamento específico
quanto ao intervalo temporal mínimo entre os dois turnos de votação (CF, art. 62, §2º), de sorte que inexiste parâmetro
objetivo que oriente o exame judicial do grau de solidez da vontade política de reformar a Lei Maior (...) A interferência
judicial no âmago do processo político, verdadeiro locus da atuação típica dos agentes do Poder Legislativo, tem de
gozar de lastro forte e categórico no que prevê o texto da Constituição Federal. Inexistência de ofensa formal à
Constituição brasileira.”

b.2) A segunda limitação está no § 3º do art. 60, CF: “a emenda à Constituição será promulgada pelas Mesas da Câmara
dos Deputados e do Senado Federal, com o respectivo número de ordem”.
Esta promulgação é feita conjuntamente por duas Mesas: a Mesa da Câmara dos Deputados e a Mesa do Senado Federal.
Não há sanção ou veto de proposta de emenda.

b.3) A terceira limitação está no § 5º do art. 60, CF: “a matéria constante da proposta de emenda rejeitada ou havida
por prejudicada não pode ser objeto de nova proposta na mesma sessão legislativa”.

Obs.: o STF decidiu uma questão interessante referente ao substitutivo, o qual é uma emenda mais ampla que,
praticamente, substitui a proposta de emenda originária.
Imagine, por exemplo, que o Presidente da República apresenta uma PEC e, ao chegar na Câmara dos Deputados, estes
apresentam um substitutivo a esta PEC. Posteriormente, o substitutivo é rejeitado. Em relação a essa situação, o STF
entende que a rejeição do substitutivo não impede que a proposta originária seja votada na mesma sessão legislativa.

MS 22.503/DF: “1. Não ocorre contrariedade ao §5º do art. 60 da Constituição na medida em que o Presidente da
Câmara dos Deputados, autoridade coatora, aplica dispositivo regimental adequado e declara prejudicada a proposição
que tiver substitutivo aprovado, e não rejeitado, ressalvados os destaques (art. 163, V). 2. É de ver-se, pois, que tendo a
Câmara dos Deputados apenas rejeitado o substitutivo, e não o projeto que veio por mensagem do Poder Executivo,
não se cuida de aplicar a norma do art. 60, § 5º, da Constituição. Por isso mesmo, afastada a rejeição do substitutivo,

13
www.g7juridico.com.br
nada impede que se prossiga na votação do projeto originário. O que não pode ser votado na mesma sessão legislativa
é a emenda rejeitada ou havida por prejudicada, e não o substitutivo que é uma subespécie do projeto originariamente
proposto.”

Atenção: sessão legislativa não se confunde com períodos legislativos, os quais são semestrais. A sessão legislativa
também não se confunde com a legislatura, que é o período de mandato de 4 anos (art. 44, §único, CF7).

3.2.4.Materiais

As limitações materiais são aquelas que proíbem modificações violadoras do núcleo essencial de certos institutos e
princípios. As cláusulas pétreas não impedem a alteração da constituição em si, mas apenas a violação desses núcleos
essenciais.

✓ Constitucionalismo x democracia

É importante destacar que essa limitação material faz surgir um conflito entre o constitucionalismo e a democracia.
A ideia do Constitucionalismo é limitar o poder para proteger direitos fundamentais. Já a democracia é o governo do povo,
ou seja, a maioria impõe a sua vontade. Ao criar cláusulas pétreas, surge uma tensão, pois, há, de um lado a imposição
de certas normas para proteger direitos; de outro, há o enfraquecimento da vontade da população naquele momento.

I- Dificuldades:
1ª) de caráter temporal: “Governo dos mortos sobre os vivos” (Thomas Jefferson): questiona-se por que a vontade de
gerações passadas deve prevalecer sobre a vontade da geração atual;

2ª) de caráter semântico: existem alguns dispositivos na constituição que são vagos, abstratos e imprecisos. Assim,
quando os juízes fazem a interpretação de preceitos vagos, a vontade deles, em tese, poderia estar prevalecendo em
relação à vontade do parlamento.
Exemplos: individualização da pena e princípio da presunção de inocência (houve quatro alterações de entendimento
do STF ao longo dos anos).

II- Teorias de justificação

Na teoria política contemporânea, existem algumas tentativas de justificar a legitimidade das restrições impostas pelas

7
CRFB, art. 44, §único:” Art. 44. O Poder Legislativo é exercido pelo Congresso Nacional, que se compõe da Câmara dos
Deputados e do Senado Federal.
Parágrafo único. Cada legislatura terá a duração de quatro anos.”

14
www.g7juridico.com.br
cláusulas pétreas:
a) Teoria do pré-comprometimento (Jon Elster)
b) Teoria da democracia dualista (Bruce Ackerman)

• Teoria do pré-comprometimento

A Teoria do pré-comprometimento parte da ideia de que as constituições democráticas são mecanismos de


autovinculação da sociedade, ou seja, são mecanismos de pré-comprometimento. São adotados para que a sociedade
possa se proteger de suas próprias paixões e fraquezas. A vontade momentânea deve ser deixada de lado para que o
propósito maior não seja esquecido.

“...mas muito mais frequente é os homens serem distraídos de seus principais interesses, mais importantes, mas mais
longínquos, pela sedução de tentações presentes, embora muitas vezes totalmente insignificantes. Esta grande fraqueza
é incurável na natureza humana.” (David Hume).

É curioso que, posteriormente, Jon Elster adotou uma visão negativa acerca das cláusulas pétreas.

• Teoria da democracia dualista

Essa teoria tem esse nome, pois Bruce Ackerman faz uma distinção entre política ordinária e a política extraordinária.
a) Política ordinária: deliberações dos órgãos de representação popular, ou seja, é a atuação cotidiana do
Congresso Nacional (leis).
b) Política extraordinária: decisões tomadas pelo povo em momentos de grande mobilização cívica. Neste caso,
essa política poderia impor certos limites à política ordinária.

✓ “Peter drunk – Peter sober”: essa é uma outra analogia feita por Stephen Holmes. A ideia é a seguinte: Pedro
vai a uma festa e, antes de sair de casa, fala para o amigo que, se ele estivesse bêbado, o amigo não deveria
entregar a chave do carro a ele. Pedro vai à festa, fica bêbado e muda de ideia. Então, pede que o amigo lhe
entregue a chave do carro. O amigo se recusa a entregá-la. Diante disso, pergunta-se: por que a primeira vontade
de Pedro deve prevalecer sobre a segunda? Porque, no primeiro momento, ele estava sóbrio; no segundo,
embriagado.
Do mesmo modo, muitas vezes, a sociedade toma certas decisões embriagada. Por esse motivo, é necessário
que algumas metas sejam resguardadas.

III- Finalidades

15
www.g7juridico.com.br
As cláusulas pétreas possuem três finalidades básicas::
a) Preservar a identidade material da Constituição: toda Constituição tem uma identidade de conteúdo. Para
evitar que a Constituição se desfigure, alguns dispositivos que conferem a ela a identidade material não podem
ser alterados – pelo menos em seu núcleo essencial. É para isto que existem cláusulas pétreas.

b) Proteger institutos e valores essenciais para a sociedade: a Constituição consagra institutos e valores essenciais
para uma sociedade – por exemplo, direito à vida, direito ao voto etc.

C) Assegurar a continuidade do processo democrático: nesse sentido, as cláusulas pétreas servem para impedir
que uma maioria que esteja no poder utilize mecanismos para se manter no poder. Quem está no poder tem a
tendência de modificar as regras do jogo para nele se manter. Para evitar isto, a Constituição consagra cláusulas
pétreas.

16
www.g7juridico.com.br

Você também pode gostar