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N.Chalo. 335.

4 M355t
Autor: Marx. Karl. 1818-1883
Título: Teorias da mais--valia : tooria

lllJll~llf1111~1111111
13852934 A&. 68368
V.2 BEAC
TEORIAS DA MAIS-VALIA -
HISTóRIA CRITICA
DO PENSAMENTO ECONôMICO

TeoTias da mais-valia, a parte maior e


mais,desenvolvida do manuscrito econô-
mico elaborado por Marx de 1861 a
1863, é antes de tudo uma história criti-
ca do pensamento econômico. Nessa
obra, entretanto, as pesquisas hlst6rico-
críticas se alíam à elaboração teórica,
envolvendo questões que são hoje objeto
do mais aceso debate.
Em Teorias da mais-valia, a visão crí-
tica de Marx se liga particularmente a
sua concepção acerca das categorias e
relações econômicas, bem distinta da vi-
gente na economia clássica. Para Marx,
as relações econômicas fazem parte de
um complexo processo evolutivo, social,
mas essa evolução pode culminar em
transmutação revolucionária. Marx viu
que, para explicar as relações econômi-
cas, era mister ir além do domínio ec<>-
nômico, e por isso elaborou uma teoria
da história.
A economia clássica, ao considerar as
.categorias e relações econômicas dados
universais, imutáveis, tinha implicita-
mente como pressuposto uma estrutura
social petrificada. ·
As concepções de Marx induziram-no·
sem dúvida a empregar métodos de aná-
lise muito mais amplos e penetrantes
que os da economia clássica. a fim de
ultrapassar o campo estrito por ela
Ocupado, de estudar as transformações
das estruturas sociais e descobrir as leis
que regem sua dinâmica.
Apesar dos progressos realizados pela
moderna economia acadêmica em vários·
domínios, como na investigação dos ci-
clos, nos modelos de crescimento a lon-
go prazo e no relacionamento com as-
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- l;t>t'•• .. ...._.

Teorias da mais-valia
Volume II
to
KARL MARX

Teorias da tnais-valia
História Crítica do Pensamento
Econômico

(livro 4 de O CAPITAL)

Volume II

Tradução de
REGINALDO SANT' MINA
Do 01igilial em alemão:
THEORIEN UBER DEN MEHRWERT
(VIERTER BAND DES ..KAPIT ALS")
ZWBITER IBIL
Ai:hte< l>ís achtt<1hnles Kapitel
NEW,26.2

Dictz Vetlll!J, Bérlim, 1974

ClP-Bcasil. Catalogaçâo·na-Publi~
Câmarà Biaslleir:a do Livro, SP
...

Marx, Karl.1818-1883.
Teorias da mais-valia : história crítica do
; v.1-2 pensamento econômico : livro 4 de O capital I
! Karl Mao:; tradução de Regina!do Sant'Anna. -
São Paulo : DIFEL, 1980·

1. Mais-valia l. Título. II. Título: História


crítica do pensamento econômico.

17. CDD·335.411' ;
; 83-0253 18. CÓD-335.412 1··

l"ndices-para catálogo sistemático:


l. Mais·va!ia: Eronomia marxista 335.411 (17.)
335.412 (18.)

1983
14 13<l> 5~~ 3L.{

Sede:
Av. Vieira de Carvalho, 40
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SUMARIO

TEORIAS DA MAIS. VALIA


HISTÓRIA CRITICA DO PENSAMENTO EÇONÔMICO

Volume II

VUI.RODBERTIJS. DIGRESSÃO. NOVA TEORIA DA RENDA


FUNDIÁRIA 449
1. Mais-valia suplementar na agricultura. DesenvoMmento agrí·
cola mais lento que o industrial nas condições do capitalismo. 449
2. A taxa de lucro e a taxa de mais-valia. O va1or da matéria·pri·
ma agrícola como elemento do capital constante na agricultura 455
3. Valor e preço médio na agricultura. Renda absoluta. 459
a) Nivelamento da taxa de lucro na indústria 459
b) Formulação do problema da renda fundiária. . 464
e) A prop_riedade privada da terra, condição necessária para a
existência da renda absoluta. Na agricultura a mais-valia de-
compõe-se em lucro e renda fundiária 4 71
4. Tese de Rodbertus: O valor da matéria-prima não entra nos
custos de produção agdcola. . . . 4 78
5. Suposições erradas da teoria da renda de Rodbertus. . . 488
6. Rodbertus não compreende a relação entre preço médio eva·
lar na indústria e na agricultura. A lei do preço médio 496
7. Falsa a concepção de Rodbertus sobre os fatores que deterrni·
narn a taxa de lucro e a taxa da renda fundiária. . 503
a) Primeira tese de Rodbertus . 504
b) Segunda tese de Rodbertus . 507
e) Terceira tese de Rodbertus 517
8. -O verdadeiro cerne da lei deformada por Rodbertus. • 523
9. Renda diferencial e renda absoluta em sua relação recíproca. O
caráter histórico da renda fundiária. Métodos de pesquisa de
Smith e Ricardo 525
1O. Taxa de renda e taxa de lucro. Relação entre a produtividade
da agricultura e a da indústria nos diferentes estágios do desen-
volvimento histórico 537

IX. OBSERVAÇÕES SOBRE A HISTÓRIA DA DESCOBERTA DA CHAMA-


DA LEI RICARDIANA. OBSERVAÇÕES COMPLEMENTARES SOBRE
RODBER11JS (DIGRESSÃO). 545

1. Anderson descobre a ~enda diferencial. Malthus o plagia e lhe


deforma as ídéias no interesse dos donos das terras. . 545
2. Desenvolvimento das forças produtivas, princípio fundàmental
de Ricardo na avaliação dos fenômenos econômicos. Malthus
defende os elementos mais reacionários das classes dominantes.
Darwin na realidade refuta a teoria malthusiana da população 549
3. Roscher falsifica a história das idéias sobre renda fundiária.
Exemplos da imparcialidade cientifica de Ricardo. A renda
fundiária na produção agrícola e na industrial. Efeito duplo da
concorrência. 553
4. Erro e confusão de Rodbertus no tocante à relação entre va19r
e mais-valia quando encarecem os produtos 558
5. Ricardo nega a renda absoluta em virtude de seus erros na,teo-
ria do valor. . . . . ·. 560
6. Tese de Ricardo sobre a ascensão constante dos preços dos_ ce-
reais, preços médios do trigo nos anos de 1641a1859 564
7. Hopkins: A diferença entre renda absoluta e renda diferencial,
e entre trabalho produtivo e improdutivo; renda .fundiária
oriunda da propriedade fundiária . / 561
8, Custos de desbravamento. Períodos de ascensão e períodos de
queda dos preços do trigo (1641-1859) 571
9. Anderson contra Malthus. Tese de Anderson: produtividade
agrícola crescente e sua influência na renda diferencial . . . 574
1 o. Inconsistência da crítica rodbertiana ã teoria da renda de ru.
cardo. Rodbertus não compreende as peculiaridades da agri-
cultura capitalista . . 580

X. TEORIA DE RICARDO E DE A. SMITII SOBRE PREÇO DE CUSTO.


(REFUTAÇÃO). 593
·.. ··~), A. TEORIA DE RICARDO SOBRE PREÇO DE CUSTO 593
1. Derrocada da teoria fisiocrâtica e desenvolvimento posterior
das idéias sobre renda fundiária 593
2. Determinação do valor pelo trabalho segundo Ricardo. Jus-
tificação histórica e carências de seu método de pesquisa. 596
3. Ricardo· e a questão do valor ''absoluto" e "relativo". Sua
incompreensão das formas do valor. 602
4. Como Ricardo vê lucro, taxa de lucro, preços médios etc 605
a) Ricardo confUnde capital constante e fixo, capital va-
riável e circulante. Erra ao explicar a variação dos valores
relativos. 605
b) Ricardo confunde preços de custo com valor: contradi·
ções em sua teoria do valor ociundas dessa confuS'oa. Não
compreende o processo de nivelamento da taxa de lucro
nem a transformação dos valores em preços de custo 621
5. Preços médjos ou preços de custo e preços de mercado. 634
a) Observações preliminares: valor individual e valor de
mercado; valor de mercado e preço de mercado. 634
b) Ricardo confunde o processo de fprmação do valor de
mercado com o de formação dos preços de custo. -637
e) As duas deftniçães ricardianas de "preço natural". Varia·
ções nos preços de custo regidas pelas variações na pro-
dutividade do trabalho. . 642
B. TEORIA DE SMITH SOBRE O PREÇO DE CUSTO 647
1. Suposíçães errôneas de Smith na teoria dos preços de custo.
Incoerência ricardiana de adotar a idéia smíthiana de identi-
ficar valor com preço de custo . 647
2. Teoria ,de Smith sobre a "taxa natural" do salário, do lucro
e da renda (rent) . . 652

XI. TEORIA DA RENDA DE RICARDO 667

1. Condições históricas para a formação da teoria de renda de


Anderson e Ricardo. 667
2. A explicação errônea de Ricardo sobre os preços de custo re·
percute em sua teoria da renda. . . 671
3. Deficiência da defutlção ricardiana de renda. . 675

Xíl. QUADROS E COMENTARIOS REFERENTES À RENDA DIFEREN·


CIAL. 681

1: Variações no montante e na taxa de renda 681


2. Combinações diferentes da renda diferencial e da absoluta.
Quadros A, B, C, D, E 684
3. Análise dos quadros 701
a) Quadro A. A relação entre valor individual e valor de
mercado 701
b) Nexo da teoria da renda de Ricardo com a concepção da
produtividade cadente da agricultura. Relação das varia-
ções da taxa de renda absoluta com as variações da taxa
de lucro . 703
c) Observações sobre a influência da variação do valor dos
meios de subsistência e das matérias-primas (e do valor
da maquinaria) sobre a composição orgânica do capital. 706
d) Variações da renda (rent) global dependentes da variação
do valor de mercado. 718
XIII. TEORIA RICARDIANA DA RENDA (CONCLUSÃO) 737

1. Ricardo pressupõe a inexistência da propriedade da terra.


Transição para novas terras: A localização e a fertilidade . 737
2. A renda diferencial, segundo Ricardo, nã'o pode influenciar
o preço do trigo. A renda absoluta, causa da elevação dos
preços dos produtos agrícolas 742
3. Concepção do "preço natural" do produto agrícola segundo
Smith e Ricardo 746
4. Os melhoramentos na agricultura e sua influência na renda
fundiária, segundo Ricardo . . 749
5. Crítica de Ricardo à teoria smithiana da renda ~ a certas
opiniões de Malthus . 761

XIV. TEORIA DA RENDA DE ADAM SMITH . 773

1. Contradições na formulação do problema. 773


2. Tese ·de Smith relativa ao caráter específico da procura de
produtos agrícolas. Influência fisiocrática na teoria Smíthia·
na da renda 785
3. Explicação de Smith sobre a relação entre oferta e procura
segundo as diferentes espécies de produtos da terra. Suas
conclusões no tocante à teoria da renda . 789
4. Análise smithiana das variações dos preços dos produtos da
terra. 797
5. Idéias de Smith sobre o movimento da renda (Rent) e sua
avaliação dos interesses das diferentes classes sociais. 802
XV. TEORIA DA MAIS-V ALIA DE RICARDO 805
A. LUCRO E RENDA SEGUNDO RICARDO
1. Ricardo confunde as leis da mais-valia com as leis do lucro 805
2. Casos diversos de variação da taxa de lucro. 811
3. Variações opostas no valor do capital constante e do ca-
pital variável e sua influência na taxa de lucro . 813
4. Em sua teoria do lucro, Ricardo-confunde preço de cus-
to com valor. 816
5 _ Relação entre a taxa geral de lucro e a taxa da renda ah-
soluta. Influência da baixa do salário sobre os preços de
custo. 818
B. A MAIS-VALIA SEGUNDO RICARDO
1. Quantidade de trabalho e valor do trabalho 827
-2. Valor da força de trabalho. Valor do trabalho. 832
3. Mais-valia . 836
4. Mais-valia relativa. Salário relativo. 848
XVI. TEORIA RICARDIANA DO LUCRO 857
1. Casos particulares em que Ricardo distingue mais-valia de
lucro. 857
2. Formação da taxa geral de lucro (lucro médio) (ou "general
rate of profits") (lucro usual). 863
a) A taxa média de lucro dada, ponto de partida da teoria
Ricardiana do lucro . 863
b) Errônea concepção de Ricardo acerca da influência do
comércio colonial e do comércio exterior em geral sobre
a taxa de lucro 866
3 . Lei da queda da taxa de lucro 868
a) Pressupostos falsos da concepção Ricardiana da taxa de-
crescente de lucro 868
b) A idéia Ricardiana da absorção progressiva da taxa de lu-
cro pela renda crescente da terra .. 870
c) Conversão de parte do lucro e de parte do capital em
renda da terra. A magnitude da renda da terra varia con-
forme a quantidade do trabalho empregado na agricultu.
~- U6
d) Comprovação histórica da elevação da taxa de lucro com
alta simultânea dos preços dos produtos agrícolas. Poosi·
bilidade de acrescer a produtividade do trabalho na agri-
cultura 894
e) A queda da taxa de lucro segundv ki..:<irdo e sua teoria
da renda 896
XVII. TEORIA RICARDIANA DA ACVMULAÇÃO. SUA CRfTICA DE·
SENVOLVlMENTO DAS CRISES EM DECORRÊNCIA' DA FORMA
FUNDAMENTAL DO CAPITAL. 907

I. Erro de Srrúth e Ricardo, de não levar em conta o capital


constante. Reprodução das diferentes partes desse capital. 907
2. Valor do capital constante e valor do produto. 910
3. Condições necessárias para a acumulação de capital. Amorti-
zação do capital fixo e seu papel no processo de acumula·
ção.. . . . 913
4. Dependência recíproca dos ramos de produção no processo
de acumulação. Conversão imediata de parte da mai.s,.valia
em capital constante na agricultura e na indústria:de cons-
trução de máquinas . . . . 917
5. Conversão da mais-valia capitalizada em capital constante e
variável .. •. .. .. 925
6. Problema das crises (observações preliminares) .. Destruição
de capital pelas crises . / 92&
7. O absurdo de negar a superprodução de mercadorias e ao
mesmo tempo reconhecer a pletora de capital. 932
8. Ricardo nega a superprodução geral. A possibilidade da cri·
se decorre das contradições internas da mercadoria e do
dinheiro. . . . 93 5
9. A errada concepção Ricardiana da relação entre produção e
consumo nas condições do capitalismo 941
10. A crise, uma possibilidade que se toma realidade. A crise.
revelação de todas as contradíções da economia burguesa 943
11. Das formas da crise 949
12. Contradições entre produção e consumo nas condíções do
capitalismo. A superprodução dos artigos principais de con-
sumo converte-se na superproduçã'o geral 952
13. Atraso do mercado em relação à produção crescente. Con-
cepção Ricardiana da procura ilimitada e do emprego ilimi-
tado do capital . 958
14. A contradição entre o desenvolvimento irresistível das for-
ças produtivas e a limitação do consumo redunda em super-
produção. O caráter apologético da teoria da impossibili-
dade da superprodução geral 962
15. Idéias de Ricardo sobre os diferentes tipos de acumulação
de capital e sobre as conseqüências econômicas da acumu-
lação.. 969

xvm. RICARDO: TEMAS DIVERSOS E CONCLUSÃO (JOHN BARTON) . 981

A. RENDA BRUTA E RENDA LfQUIDA . 981


B. MAQUINARIA: INFLu:ENCIA DAS MÁQUINAS NA SI-
TUAÇÃO DA CLASSE TRABALHADORA, SEGUNDO
RICARDO E BARTON 985
_l. As idéias de Ricardo. . . . . 985
a) A expulsão de trabalhadores de suas atividades pelas
máquinas segundo Ricardo .• , 985
b) Ricardo: Influência dos aperfeiçoamentos da produ-
ção sobre o valor das mercadorias. Conc.epção errônea
do fundo de trabalho disponível para trabalhadores
despedidos. . . . . 987
e) Probidade de Ricardo ao rever suas idéias sobre o em·
prego das máquinas. Mantém suposições errôneas na
nova foi:mulação do problema . . . 989
d) Conseqüências da introdução das máquinas para a
classe trabalhadora, segundo Ricardo. 998
2. Idéias de Barton . . 1010
a) O decréscimo relativo da procura de trabalho no pro·
cesso de acumulação do capital, segundo Barton. Sua
concepção unilateral do efeito da composição orgâni-
ca do capital nesse processo. I Ol O
b) O movimento dos salários e o crescimento .da popu-
lação segundo Barton. 1014
ADITAMENTOS

1. Formulação irúcia1 da tese sobre a concordância constante


entre a oferta e a procura na agricultura. Rodbertus e os
economistas práticos do século XVIII . 1021
2. Nathaniel Forster e a hostilidade entre os donos das terras
e os empresários 1023
3. Ponto de vista de Hopkins sobre a relação entre renda fun-
diária e lucro 1024
4. Melhoramentos na agricultura segundo Carey, Malthus e Ja.
mes Deacon Hume. 1024
5. O crescimento da produtividade do trabalho agrícola, se·
gundo Hodgskin e Anderson 1025
6. Diminuição da taxa de lucro 1026

ADENDOS

Tabela de pesos, medidas e moedas. 1029


fudice onomástico . 1030
fudice analítico. 1033
Capítulo VIII
Rodbertus. Digressão. Nova teoria
da renda fundiária 1

1. Mais-valia suplementar na agricultura.


Desenvolvimento agrícola mais lento que o
industrial nas condições do capitalismo

Rodbertus. Dritter Brief an von Kirchmann von Rodbertus.


Widerlegung der Ricardosch.en Lehre von der Gnmdrente und
Begri.indung einer neuen Rententheorie, Berlim, 1851.

De início, uma observação: :fJXando-se o salário necessário em l O ho-


ras. a coisa fica muito mais fácil de explicar. Se o trabalho de 10 horas em

1. Ao empreender a redação do manuscrito de Teoriar da Mair-Valia, já percebia


Maxx: que uma das principais falhas da teoria da renda de Ricardo consistia na negação
da renda absoluta (ver correspondência de Marx em MEW, Band 30, pp. 263-268, 274-
275 e 626-628). Rodbertus tentara antes desenvolver essa idéia em sua Terceira Carta a
von KÍ/'chma1111 (Drltter Brief an 11011 Kirchmann). Esta a razão fundamental por que
Marx, nesta "Digressão", faz uma análise crítica exaustiva dessa tentativa de Rodbertus,
antes de entrar no elCame pormenorizado da teoria ricardiana da renda.
No Suplemento organizado pelo tradutor ver-se-'á como se apresentou o proble-
ma de localização da matéria deste capítulo na elaboração do manuscrito.

449
média capacita o jornaleiro agrícola (por conseguinte a soma em dinheiro=
IO horas) a ê"ómprar todos os meios de subsistência necessários, produtos
agrícolas e industriais etc., essa quantidade é o. salário médio para o uabalho
simpJes2 Trata-se aí portanto do que lhe tem de caber, do valor de seu pro-
duto diário. Primeiro, esse valor existe na forma da mercadoria que produz,
isto é, em determinada quantidade deltsa. mercadoria, e com essa quantida·
de - depois de deduziÍ'' o que ele mesmo consome (se o faz) - pode obter
para si os meios de subsistência necessários. Assim, na avaliação da renda
que lhe é necessária entram manufatura, agricultura etc., e não apenas o
valor de uso .que ele mesmo produz. Mas isso está implícito no conceito de
mercadoria. Produz mercadoria, não mero produto. Sobre isso portanto nã'o
é mister gastar palavras.

Rodbertus investiga primeiro a situação num país onde não estão se-
paxadas a propriedade da terra e a do capital, e chega à importante con-
clusão de que a renda fundiária (considerada por ele a mai$-valia toda) é
simplesmente igual ao trabalho não pago ou à quantidade de produtos em
que esse trabalho se configura.

De início, importa observar que Rodbertus só concebe aumento da


mais-valia relativa, isto é, aumento oriundo da produtividade ~rescente do
trabalho e não o aumento da mais-valia derivado do prolongamento da jor-
nada de trabalho. Sem dúvida, toda mais-valia absoluta é relativa num sen-
tido. O trabalho tem de ser produtivo bastante para que o trabalhador não
precíse empregar seu tempo todo para sustentar a própria vida. Mas daí em
diante começa a diferença. Ademais, se na origem o trabalho é pouco pro-
dutivo, as necessidades são extremamente simples (caso dos escravos), e os
próprios senhores não vivem muito melhor que os servos. A produtividade
relativa do trabalho necessária para surgir um sugador de lucro, um para-
sita, é muito pequena. Elevada taxa de lucro onde o trabalho é muito im·
produtivo, onde não se emprega maquinaria, divisão do trabalho etc., só
ocorre nestas condições: ou (caso da fudia) porque as necessidades do tra-
balhador são absolutamente reduzidas, além de ser ele mesmo ainda com-
primido abaixo dessas· diminutas necessidades, e também porque a baixa
produtividade do trabalho se identifica com a pequena proporção de capi-
tal fixo para a porção do capital despendida em salário, isto é, a proporção

2. Ver O Capital, DrFEL,livro 1. vcl. 1, pp. 45, 46, SI, 193, 214, 222 e 223.

450
da parte do capital desembolsada em trabalho é grande para o capital to-
do~ ou enfün porque se prolonga em excesso a jornada de trabalho, Este
último é o caso dos países (como a Áustria etc.) onde já existe o modo
de produção capitalista e que têm de concorrer com países muito maís de-
senvolvidos. O salário aí pode ser pequeno tanto porque as necessidades do
trabalhador são menos desenvolvídas, como porque os produtos agrícolas
são maís baratos ou - o que para o capitalista é a mesma coisa - têm me-
nor valor monetário. Por isso, é pequena a quantidade do produto, de 10
horas por exemplo, destinada ao trabalhador, como remuneração necessá·
·ria. Mas, se ele trabalha 17 horas em vez de 12, pode-se lucrar esse acrésci-
mo. De modo nenhum se deve imaginar que - por cair num dado país o
valor relativo do trabalho ao acrescer a produtividade do trabalho - o sa-
lário nos diferentes países se alteia na razão inversa da produtividade do
trabalho. Sucede justamente o contrário. Quanto mais produtivo um país
em relação a outro no mercado mundial, mais elevados são nele os salários,
comparados com os de outro~ países. Na Inglaterra não só o salário nomi·
nal mas o real é mais alto que no Continente. O trabalhador come mais car-
ne, satisfaz mais necessidades. Isso, entretanto, não -se aplica ao trabalhador
agríoob mas apenas ao trabalhador industrial. Mas o salário na Inglaterra
não é mais alto em relação à produtividade dos trabalhadores ingleses.
A renda fundiária em geral - isto é, a moderna forma da proprieda·
de da terra -, a mera existência. dela, já seria possível, abstraindo-se da va·
riação dessa renda em virtude da fertilidade dos solos, porque o salário mé-
dio do trabalhador agrícola é inferior ao do trabalhador industrial. Uma vez
que, desde o início e sobretudo por tradiç!o {quando o veJho arrendatário
vira capitalista, antes de os capitalistas virarem arrendatários), o capitalista
cede parte do lucro ao senhor das terras~ e ressarce-se comprimindo o salá-
rio abaixo do nível. Com o êxodo dos b:abalhadores rurais, os salários te·
riam de subir e subiram. Todavia, mal se toma perceptível essa pressão, in·
troduz-se maquinaria etc., e de novo população supérflua (relativa) se pro-
duz no campo (ver a Inglaterra). A mais-valia pode ser acrescida pela mera
compressão do salário abaixo do nível tradicional, embora não se prolon·
gue a jornada, nem se desenvolva a produtividade do trabalho. Ê o que de
fato sucede em toda parte onde a produção agr:ícola se realiza por méto-
dos capitalistas. Onde não se consegue isso com a máquina, a terra se trans-
forma em pasto de carneiros. Aí já haveria portanto a possibüidade da ren-
da fundiária, porque de fato o salário do trabalhador agrícola nio é igual ao
salário médio. Essa possibilidade da renda ÍWidiária seria de todo indepen·
dente do'preço dos produtos, igual ao valor deles.

451
Ricardo conhece também o segundo acréscimo de renda, por corres-
ponder ela a mais produto ao mesmo preço, mas não calcula esse acréscimo,
pois mede a renda por quarter e não por acre. Ele não diria que a renda fun-
diária subiu (e desse modo a renda fundiária pode subir com queda de pre-
ço) por ser 20 quarters X 2 xelins mais que 10 X 2 ou 10 qua.rters X3 xelins.
Aliás, como quer que se explique a'própria renda fundiária, remanesce
a diferença significativa entre a agricultura e a indústria: nesta, excesso de
mais-valia, valor excedente, é gerado por produção mais barata; naquela,
por produção mais cara. Se é 2 xelins o preço médio de uma libra de fio, e
posso produzí-la por 1 xelim, para conquistar mercado tenho de vendê-lo
por 1 1/2 xelins, ou pelo menos abaixo de 2 xelins. E isso é absolutamente
necessário, pois a produção mais barata pressupõe produção em maior es-
cala. Abanoto portanto o mercado relativamente à situação anterior. Te-
nho de vender mais que antes. Uma libra custa l xelim apenas, mas só se
forem produzidas cerca de 1O 000 libras em vez das 8 000 anteriores, O me·
nor custo decorre apenas de o capit.al fixo .se repartir por l O 000 libras. Se
vendesse 8 000 libras somente, o desgaste das máquinas aumentaria de
I/S = 20%, actescendo o preço de cada libra. Assim, vendo abaixo de 2
xelins para poder vender 10 000 libras. Com isso ainda obtenho um lucro
extr_aordinário de 6 pence, ou seja, de 50% sobre o valor de.meu produto,
de 1 xelim, que já inclui o lucro normal. De qualquer modo forço por esse
meio a baixa do preço de mercado, e o resultado é o consumidor conse-
guir mais barato o produto. Mas, se fosse na agricultura, venderia por 2
xelins, porque se tivesse suficiente terra fértil não se cultivaria· a menos f ér-
til. Naturalmente se aumentasse a área fértil ou a fertil~dade da área pobre
de modo que eu pudesse satisfazer a procura, acabaria esse jogo. Ricardo
não nega esse fato; ao contrârío, dá-lhe ênfase.
Por conseguinte, admitindo-se que a fertilidade variante do solo não
explica a própria renda fundiária, mas apenas as diferenças nesse tipo de
renda, remanesce esta lei: enquanto na indústria o lucro extraordinário de-
corre, em média, do barateamento do produto, na ·agricultura a magnitude
relativa da renda provêm não só do encarecimento relativo (elevação do
preço do produto da tena fértil acima do valor), mas também da venda do
produto barato pelo custo do mais caro. Mas isso, conforme já mostrei
(Proudhonf, é mera lei da concorrência, o que não provém da "terra" e
sim da própria "produção capitalista".

3. Ver Misbia da Fik>&ofia de Marx, cap. Il, §IV, "A propriedade ou a1enda da
terra".

452
Adernais, Ricardo estaria certo noutro ponto, só que, à maneira dos
economistas, converte um fenômeno histórico numa lei eterna. Esse fenô-
meno histórico é o desenvolvimento relativamente mais rãpido da manufa.
tura (o genuíno setor industrial bur.guês) em contraste com a agricultura.
Esta se tomou mais produtiva, mas não na mesma proporção da indústria.
Quando a produtividade decuplicou na indústria, talvez tenha dobrado na
agricultura. Esta se tomou improdutiva rélawamente, embora positivamen.
te mais produtiva. Isso evidencia apenas a extrema singularidade do desen-
volvimento da produção burguesa e as contradições que lhe ,sio inerentes,
mas não invalida a proposição de se tomar a agricultura relativamente mais
improdutiva, isto é, de o valor do produto agrícola subir em relação ao do
produto industrial e em conseqüência elevar-se a renda fundiária. A circuns-
tância de o trabalho agrícola no nível de desenvolvi,mento da produção ca·
pitalísta se ter tomado relativamente mais improdutivo que o trabalho in-
dustrial significa apenas que a produtividade da agricultura não se desenvol-
veu com a mesma velocidade e na mesma proporção.
Seja de 1 1 a relação entre a indústria A e a B. Na origem, a agricul-
tura é mais produtiva porque nela atua, além de forças naturais, uma máqui·
na organizada pela natureza; de imediato, o trabalhador individual opera
com uma máquina. Por isso, na Antigüidade e na Idade Média, os produtos
agrícolas eram relativamente muito mais buatos· que os industriais, o que
já se infere (ver Mule) da razão entre os dois tipos de produtos no salário
médio.
Ao mesmo tempo admitamos que 1° : 1° indique a produtividade de
ambas as indústrias. Então se na indústria A ela se torna 1Oº, isto é, decupli-
ca, e na B apenas triplica, passando a 3", a razão entre ambas as indústrias
que era antes de 1 : l ·é agora de 10 : 3, ou seja, de 1 : 3/10. Relativamente,
a produtividade da indústria B diminuiu de 7 /10, embora triplicasse em ter-
mos absolutos. Para a renda fundiária mais alta, isso significa que ela - em
relação à indústria ~ teria subido por ter o pior terreno redução de 7/10
na fertilidade.
Agora não se segue daí, como pensa Ricardo, que a taxa de lucro caiu
por ter o salário subido em virtude do encarecimento relativo dos produtos
agrícolas, pois o salário médio é determinado não pelo valor relativo, mas
pelo valor absoluto dos produtos que nele entram. Mas, sem dúvida, daí re.
sulta que a taxa de luci:o (a bem dizer, a taxa de mais-valia) não subiu na
mesma proporção da produtividade da indústria manufatureira, fato decor-
rente de a agricultura (não a terra) ser relativamente menos produtiva. E is-
to é absolutamente certo. Em face do progresso da indústria parece pequena

453
a redução do tempo de trabalho necessário. ~o que transparece na circuns-
tância de países como a Rússia etc. baterem a Inglaterra no domínio dos
produtos agrícolas. Nesse caso, não pesa nada na balança o valor menoi do
dinheiro em países mais ricos (isto é, os baixos custos de produção relativos
do dinheiro para países mais ricos). E que se pergunta precisamente: por
que esse valor menor não influi nos produtos industriais, ao concorrerem
esses países com países mais pobres, e sim em seus produtos agrícolas.
(Aliás, isso não prova que países pobres produzem mais barato, que seu tra·
balho agrícola é mais produtivo. Mesmo nos Estados Unidos, conforme de-
monstram recentes infonnações estatísticas, aumentou, a um dado preço, o
volume de trigo. não por ter havido acréscimo de produção por acre, mas
porque mais acres foram cultivados. Não se pode dizer que a terra é mais
produtiva no país onde há imensa extensão territorial e grandes áreas culti-
vadas superficialmente e que proporcionam, com o mesmo trabalho, quanti·
dade absoluta de· produto maior que a obtida em áreas bem menores no pais
mais. adiantado).
A progressão p111a terras menos produtivas não demonstra necessaria-
mente q_ue a agricultura se tomou menos produtiva. Ao revés, pode demons·
trar que se tomou mais produtiva, que - além de o solo improdutivo ser cul-
tivado porque os preços do produto agrícola súbiram o bastante para repor
o emprego de capítal - em sentido oposto, os meios de pi:odução se desen-
volveram tanto que o solo improdutivo se tomou "prqdutivo" e capaz de
pagar o lucro normal e ainda a renda fundiária. O solo, fértil para dado ní-
vel de desenvolvimento da força produtiva, é estéril para nível_ inferior.
Na agricultura, o prolongamento absoluto da jornada de trabalho,
isto é, o acréscimo da mais-valia absoluta, sô ê possível em escala diminuta.
Na agricultura não se pode trabalhar com iluminação' a gás etc. Sem dúvida,
o trabalho pode começar cedo no verão e na primavera. Mas isto se contra-
balança com os dias mais curtos do inverno, quando no final de contas só
se pode realizar quantidade relativamente pequena de trabalho. Sob este as·
pecto, a mais-valia absoluta é portanto maior na indústria, desde que a jor-
nada normal de trabalho não seja regulada mediante coerção legal. O pro·
duto permanece longo período no processo de produção sem nele se aplicar
trabalho, e esta é segunda causa do montante menor .da mais-valia gerada
na agricultura. Com exceção de alg1,ms ramos da agricultura, como pecuária,
criação de carneiros etc., nos quais a população é de todo expulsa da terra,
o número de pessoas empregadas em relação ao capital constante aplicado -
mesmo na mais avançada agricultura em grande escala - é sempre bem
maior q_ue na .indústria, pelo menos nos :ramos industriais dominantes. Em
virtude desse aspecto, embora o montante de mais-valia pelos motivos antes

454
mencionados seja relativamente menor do que o seria com o emprego da
mesma quantidade de pessoas na indústria - circunstância por sua vez
em parte compensada pela queda do salário abaixo do nível médio -, a
taxa de lucro pode ser maior que na indústria. Mas, na agricultura, sejam
quais forem as causas (só jndicamos aquelas acima) que elevam a taxa
de lucro (elevação não temporária e sim média, comparada com o nível
da indústria), a mera existência dos donos das terras implicaria que esse
lucro extraordinário - em vez de entrar no nivelamento da taxa geral
de lucro - se consolidaria e caberia ao proprietário da terra.

2. A taxa de lucro e a taxa de mais-valia. O


valor da matéria-prima agrícola como
elemento do capital constante na
agricultura

Vejamos de modo geral a questão a responder, relacionada com


Rodbertus:

A forma geral do capital adiantado é:

capital constante capital variável


maquinaria - matérias-primas força de trabalho

Meíos de trabalho e objeto de trabalho são, de modo geral, os dois


elementos do capital constante. O objeto de trabalho não precisa ser mer·
cadoria, produto do trabalho. Por iss.o pode não existir como elemento
do capital, embora exista sempre como elemento do processo de traba-

455
lho. A matéria-prima4 do agricultor é a t~rra, a do mineiro é a mina, a
do pescador, a água, e a do caçador, a própria floresta. Na forma de ple-
nitude máxima do capital, porém, aqueles 3 elementos do processo 'de
trabalho existem também como 3 elementos do capital, isto é, todos .os
3 são mercadoria,s, valores de Uso que têm um valor de troca e são produ-
to do trabalho. Nesse caso, todos os 3 elementos entram também no pro-
cesso de formar valor, embora a maquinaria não participe dele com a am·
plitude em que enua no processo de trabalho, mas somente na medida
em que esse processo a consome.
Temos agora a questâ'o: a inexistência de um desses elementos po-
de elevar, no ramo industrial onde se verifica, a taxa de lucro (não a ta-
xa de mais-valia?) De modo geral encontra-se a resposta na própria fór-
mula:

Taxa de lucro é igual à relação entre a mais-valia e a totalidade do


capital adiantado.

Ao longo de toda esta investigação supõe-se que permanece imutá-


vel a taxa de mais-valia, isto é, a repartição do valor do produto entre ca-
pitalista e trabalhador.
A taxa de mais-valia = m/v; a taxa de lucro = m/ç + v. Uma vez da-
da a taxa de mais-valia m', v é dado, e presume-se que m/v é magnitude
constante. Assim a grandeza de m/c + v só pode variar, se e+ v se alterar
e uma vez que v é dado, só pode ela crescer ou decrescér pór decrescer ou
crescer e. E aumentará ou diminuirá rn/c + v não na pJoporção de e : v, mas
na de e para a soma de e + v. Se e = O, m/c + v = m/v. Nesse caso, a taxa
de lucro = taxa de mais-valia, e aí temos sua maior expiessão possível,
pois nenhuma forma de cálculo pode alterar a iµagnitude de m e v. Se
v = 100, em= 50, será m/v = 50/100 = 1/2 = 50%. Se fosse adicionado
capital constante de 100, teríamos a taxa de lucro 50/100 + 100 = 50/200 =
= 1/4 = 25%. A taxa de lucro se teria reduzido à metade. Com a adição.

4. Por matéria-prima (Rohmaterial) entende Marx aí, excepcionalmente, um ob-


jeto de trabalho p1opo1cionado pela natureza, sem te:i: experimentado modificação al-
guma do trabalho humano. Mas, foxa essa exceção, mantêm ele ao' longo do manuscrito
a mesma conceituação de matéria-prima que apresenta em O Capital; "a mat~·prima,
ísto é, um objeto já filtrado pelo trabalho, um produto do pióprio trabalho" (tivro 1,
vol. 1, DIFEL, p. 206); "o objeto de trabalho só é matéria-prima depois de ter experi-
mentado modificação efetuada pelo ~aba.lho" {ib., 203).

456
de 150c a lOOv, teríamos a taxa de lucro 50/150 + 100 = 50/250 = 1/5 =
= 20%. No primeiro caso, a totalidade do capital= v, igual ao capital va-
riável, e por isso a taxa de lucro = taxa de mais-valia. No segundo, a totali-
dade do capital = 2 X v, daí ser a taxa de lucro igual à metade da taxa de
mais-valia. No terceiro caso, a totalidade do capital = 2 1/2 X l 00 =
= 2 1/2 X v = 5/2 X v; v é apenas 2/5 da totalidade do capital. A mais-valia
é igual a 1/2 de v; 1/2 de 100, por conseguinte 1/2 apenas de 2/5 da tota-
lidade do capital = 2/10 da totalidade do capital. 250/10= 25, e 2/10 de
=
250 50. Mas 2/10 = 20%.
Desde logo se verifica portanto: se não varia v nem m/v, não impor·
ta como se constitui a grandeza de e. -Se c tem determinada grandeza, 100
por exemplo, tanto faz que se decomponha em .?O unidades de matéria-
prima e 50 de maquinaria ou em 10 de matéria-prima e 90 de maquinaria
ou em O de matéria-prima e 100 de maquinaria ou vice-versa, pois é a rela-
çlfo m/c + v que determina a taxa de lucro; não interessa aí o valor relativo
de cada um dos elementos de produção oompanentes de e. Por exemplo,
na produção de carvão pode-se considerar a matéria-prlma (deduzido o
próprio carvão que por sua vez serve de matéria auxiliar) igual a zero e
admitir que o capital constante todo consiste em maquinaria (incluídas
construções e instrumentos de trabalho). Em contrapartida, no caso de um
alfaiate, pode-se considerar a maquinaria igual a zero (particularmente quan-
do grandes alfaiates ainda não utilizam máquinas de costura; além disso, co-
mo hoje ocorre às vezes em Londres, fazem economia de instalação, empre-
gando pessoas que trabalham em casa. E algo novo onde a segunda divisão
do trabalho reaparece na forma da primeira5 ), e o capital constante pode
reduzir-se todo ~ matéria-prima. Se o dono da mina de can'li'o emprega
1 000 em maquinaria e 1 000 em trabalho assalariado, e o alfaiate 1 000
em matéria-prima e l 000 em trabalho assalariado, a taxa de lucro nos dois
casos é a mesma para igual taxa de mais-valia. -Admitamos seja a mais.va-
lia = 20%; então, a taxa de lucro seria de 10% nos dois casos, isto é,
200/2 000 = 2/2.0 = 1/10 O 10%. Assim, a razão entre os componentes
de c, matéria·prima e maquinaria, só em dois casos pode exercer influência na

5. No caderno IV do manuscrito de 186M863 (pp. 149 e segs.), Marx chama de


primeira di1>isii'o do trabalho a que se estabelece na sociedade entre os produtores de
mercadorias, independentes uns dos outros, e de segunda diJIÚÍiD do trabalho a que se
organiu numa manufatura (ver O Capital, DIFEL, livro 1, vol. 1, pp. 402411).

457
taxa de lucro: 1) quando mudança nessa razão modificar a grandeza absoluta
de c; 2) quando a razão entre os componentes de c alterar a magnitude de
v. Isso terá de resultar em modificações orgânicas na própria produção, e
nã'.o na mera relação idêntica: se determinada parte de e tem de correspon-
der a fração menor do todo, a outra terá de corresponder a fração maior.
No balanço feito por um arrendatário inglês, salários = 1 690 libras,
adubos = 686, sementes = 150, cereais para o gado =
l 00. Para "matéria-
prlma" portanto 936 li'bras, mais de metade dos salários. (Ver F. W. Newman
LecturesonPol Ec., Londres, 1851,p.166.)
"Em Flandres" (parte belga} "importam-se da Holanda esterco e feno"
(paza a cultura de linho etc.; em compensação, exportam-se fibra e se-
mente de linho etc.). "O lixo das cidade$ holandesas tomou-se por jsso
objeto de comércio e se vende à Bélgica a preços altos. Ce.rca de 20 milhas
de Antuérpia, pelo Escalda acima, podemos ver recipientes para o este.roo
que é transportado da Holanda. O comércio se p.rocessa por intermédio
de uma sociedade de capitalistas e pelos barcos holandeses" etc. (B!!nficld)6

Sim, até o estrume, os estercos comuns se tomaram mercadoria, e


atualmente também farinha de osso, guano, potassa etc. A circunstância de
os elementos da produção serem avaliados em dinheiro não decorre apen_as
da mutação formal da produção. Com finalidades produtivas adicionam-se
novos elementos ao solo e deste se vendem os refugos. A diferença aí entre o
modo capitalista de produção e o anterior não é meramente formal. O pró-
prio comércio de sementes aumentou de importância na·:medida em que se
reconhecia o significado da mudança das sementes. Seria por conseguinte ri-
dículo dizer da verdadeira agricultura que nela não entra ''m,atéria-prima"
alguma, isto é, matéria-prima na qualidade de merc:adorfa, seja por ela mes-
ma reproduzida ou comprada como mercadoria, adquil}da fora. Também se-
ria ridículo diur que, para o construtor de máquinas, a máquina que ele
mesmo utiliza não entra no respectívo capital como elemento que tem valor.
Um camponês alemão que todo ano produz os próprios elementos de
produção - sementes, adubo etc. - e que junto com a famflia consome par-
te da colheita, só desembolsa dinheiro (para a produção mesma) na compra
de a1guns instrumentos agrícolas e em salário. Admitamos que o valor de to-
dos os seus dispêndios seja 100, a metade a ser paga em dinheiro. Metade do
produto consome ele na própria forma física (e isso constitui custos de pro-
dução), e metade vende e recebe, digamos, 100. Sua renda (income) bruta
portanto é de 100, e se ele a relaciona com o capital de 50, achará 100% de

6. Banfield, The OTK'11fi:J:R-tiOrz of iruiustry, 2!1 ~ .. Londres, 1848, pp. 40 e 42.

458
lucro. Se deduzir de 50 1 /3 para renda fundiária e l /3 para ímpostos (ao to-
do 33 1/3), restam-lhe 16 2/3, isto é, 33 1/3% de 50. Mas na realidade só
obteve 16 2/3% do dispêndio de 100. O carnpones simplesmente calculou
errado e logrou a si mesmo. Erros dessa espécie não sucedem com um arren-
datário capitalista.
Mathieu de Dombasle, em Annales agricoles etc., Paris, 1828, 4!l
edição, diz que no contrato de parceria agrícola, ria província de Berry,
por exemplo,
'•o proprietário das tenas fornece o solo, as construções e de ordinário
todos os animais ou parte deles e os instrumentos necessários à explorà-
ção; o colono, por sua parte, entxa com o trabalho e nada mais ou quase
nada; os produtos da terra se repartem meio a meio" (p. 301). «os meei-
ros f:iío em regra pessoas me.rgulhadas na miséria" (302). "Quando o meei-
ro com uma despesa de 1 000 francos aumenta o produto bruto paxa
l 500" (portanto, ganho bruto de 500), "teci ele de dar a metade ao pro-
prietário, retendo 750, e assim perde 250 do que desembolsou" (p. 304).
"No antigo sistema agrícola, as des.pesas ou os custos de produção eram
quase por completo tirados dos produtos do próprio cultivo, para o.con-
sumo dos animais, do lavrador e de sua familia; quase não se despendia
dinheiro. S6 essa circunstância poderia justificar a c.rença de que o pro-
prieté.rio e o colono poderiam repartir entre si o produto inteiro da co-
lheita que não fosse coruumido na produção; mas esse processo é aplicá-
vel apena$ a essa espécie de agricultura,· isto é, a agricultum miaeráve~·
porque, quando $e quer melhorar o n(vel de~sa agricultura, verifiCJJ·Sf!. que
só é possível por meio de adiantamentos, sendo mister deduzi-los do pro-
duto bruto, para aplicá-los na produção do ano seguinte. Por isso, toda 1e·
partição do produto bruto entre o proprietário e o colono constitui obstá-
culo intransponível a toda melho1ia" (l.c., p. 307).

3. Valor e preço médio na agricultura. Renda


absoluta
a) Nivelamento da taxa de lucra na indústria
Rodbertus parece imaginar que a competição estabelece lucro normal
ou lucro médío ou taxa geral de lucro, reduzindo as mercadorias a seus ver.
dadeiros valores, isto é, regula suas relações de produção de maneira que as

7. Marx emprega aí preeo mé:dio no sentido de "preço de produção", isto é, cus·


to de produção (e + v) mais lucro médio. O termo "preço médio" indica tratar-se aí
"do preço médio de mercado durante um período longo ou do centro em torno do
qual gravita o pr~ de mercado" (ver neste volume, cap. Xlll, 3).

459
quantidades correlatas de tempo de trabalho, encerradas nas diferentes
mercadorias, se configuram em dinheiro ou no que for a medida do valor.
Sem dúvida, isso acontece não por ser o preço de uma mercadoria. em algum
momento dado, igual ou tec de ser igual a seu valor. Segundo Rodbertus,
a coisa se passa assim: por exemplo, o preço da mercadoria A ultrapassa o
valor, isto é, por algum tempo se fixa nesse nível ou mesmo continua a
subir. O lucro de A supera por isso o lucro médio, pois o capitalista aí se
apropria niío só do respectivo tempo de trabaJho "não pago", mas também
de parte do tempo de trabalho não pago que outros capitafütas "produzi-
ram". Isto tem de se revelar na queda de lucro num ou noutro ramo de pro-
dução, desde que não se altere o preço em dinheiro das outras mercadorias.
A mercadoria A, se entrar no consumo dos trabalhadores como meio de sub-
sistência comum, fará cair a taxa de lucro em todos os demais ramos; se en-
trar no capital constante como componente, fará descer a taxa de lucro nos
ramos de produção onde constitui elemento desse capital.
O último caso possível: a mercadoria não entra como componente em
capital constante algum, nem constitui meio de subsistência necessdrio dos
trabalhadores (pois aquelas mercadorias que o trabalhador pode ou não
comprar a seu arbítrio, consome-as como consumidor proptjament~ e não
como trabalhador), mas é artigo de conswno, objeto de con.Sumo individual
em suma. Se a mercadoria, como artigo de consumo, entra no consumo do
próprio capitalista individual, a elevação de seu preço de rnan.eira alguma
atingirá o montante ou a taxa de mais-valia. Mas o capitàlista; se quer man-
ter seu padrão anterior de consumo, aumentará a parte~do lucro (mais-valia)
por ele aplicada em consumo individual, em relação à que emprega em re-
produção industrial. Esta cairá portanto. Assim, num dado período (deter-
minado também pela reprodução), o montante de lucro cairá em B, C etc.,
em virtude da alta dos preyos ou da elevação do lucro de A acima da taxa
média. Se a mercadoria A só entrar no consumo de capitalistas não indus-
triais, consumirão estes, em face da situação anterior, mais da mercadoria A
que da B, C etc. Diminuirá a procura das mercadorias B, C etc.; seu preço cai-
rá e nesse caso a elevação do preço ou a alta do lucro de A acima da taxa
média terá provocado queda do lucro de B, C etc, abaixo da taxa média,
por ter deprimido os preços em dinheiro de B, C (em contraste com os ca-
sos anteriores onde os preços em dinheiro de B, C etc. não se alteraram).
Capitais de B, C etc., onde a taxa de lucro caiu abaixo do nível médio, mi-

460
grarão da própria esfera de produção para a esfera de produção de A; mas
este seria o caso sobretudo com parte do novo capital que de contínuo apa-
rece no mercado e por certo busca particularmente a esfera de A, mais lu·
crativa. Em conseqüên1,,'ia, o preço da mercadoria A cairá após algum tempo
abaixo do valor e continuará a cair por prazo maior ou menor até que se res-
tabeleça o movimento oposto. Nas esferas B, C etc. ocorre o fenômeno con·
trãrio, em parte por causa da oferta reduzida dos artigos B, C etc., decorren-
te do capital emigrado, isto é, das mutações orgâniéas sobrevindas nessas
próprias esferas, e em parte pelas alterações verificadas em A e que atuam
sobre B, C etc., no sentido oposto.
Note-se de passagem; é possível que, no movimento ora descrito, os
preços em dinheiro de B, C etc. (suposto constante o valor do dinheiro) nun-
ca maís alcancem o nível anterior, embora os preços em dinheiro de B, C
etc. subam acima do valor das mercadorias B, C etc., e em conseqüência
também a taxa de lucro de B, C etc. se eleve acima da taxa geral de lrn:ro.
Melhoramentos, invenções, economia maior dos meios de produção etc. não
se empregam nos tempos em que os preços ascendem acima do nível médio,
mas naqueles em que declinam abaixo desse nível, isto é, o lucro cai abaiXo
da taxa -usual. Durante o período da queda de preços de B, C etc., o valor
real deles_ pode portanto cair, ou decrescer o mínimo do-tempo de trabalho
necessário pata produzir essas mercadorias. Nesse caso, a mercadoria s6 pode
voltar a atingir o antigo preço em dinheiro, se o acréscimo do preço sobre o
valor for igual à margem, à diferença entre o preço que expressa o valor no-
vo e o preço que exprimia o valor antigo, mais alto. Aí o preço da mercado-
ria teria a1terado o valor, atuando sobre a oferta, sobre os custos de produção.
Resultado do movimento acima: se tomamos a média das ascensões
e declínios de preço da._mercadoria em relação ao valor ou o período de ni-
velação das altas e baixias - períodos que de contínuo se repetem-, o pre-
ço médio é igual ao valor; assim, o lucro médio de um determinado ramo é
também igual à taxa geral de lucro; é que, embora nesse ramo com a alta
ou baixa dos preyos - ou com o acréscimo ou decréscimo dos custos de pro-
duyão e invariável o preço - o lucro tivesse subido ou caído em relação à
taXa antiga, a mercadoria foi vendida pelo valor na média do período. Por
isso, o lucro obtidó é igual à taxa geral de lucro. Essa é a concepção de A.
Smith e mais ainda de Ricardo, pois este se aferra mais ao conceito real do
valor. Rodbertus recebe-a deles. Essa concepção entretanto é falsa.
Qual o efeito da concorrência entre os capitais? O preço médio das
mercadorias durante um dos períodos de nivelamento é tal que os preços em
cada ramo dão aos produtores de mercadorias a mesma taxa de lucro, diga·

461
mos, 10%. Que mais significa isso? Que o preço de to da mercadoria está 1/1 O
acima dos custos de produção que o capitalista despendeu, gastou para pro-
duzi.la. Dito de modo geral, isso quer dizer apenas que capitais de igual mag..
nítude produzem lucros iguais; que o preço de toda mercadoria é um déci-
mo mais alto que o preço do capital nela desembolsado, consumido ou re.
presentado. Mas é absolutamente falso afirmar que capitais nos diferentes
ramos de produção produzem a mesma mais-valia na razão de sua magnitude
(aí abstraímos por completo da possibilidade de um capitalista estabel~er
jornada de trabalho mais longa que a de outro, e igualamos a jornada absolu-
ta para todos os ramos. A intensidade do trabalho etc. compensa em parte
as diferenças nas jornadas absolutas de uma série de dias, e em parte essas di-
ferenças representam apenas excesso arbitrário de lucros, exceções etc.),
mesmo quando supomos igual em todos os ramos a jornada de trabalho
absoluta, isto é, supomos dada a taxa de mais-valia.
Admitido esse pressuposto, o montante de mais-valia que capitais de
igual magnitude produzem varia, primeiro, de acordo com a proporção dos
componentes orgânicos, a saber, o capital variável e o constante; segUndo;
de acordo com o tempo de circulação, determinado pela razã'o·entre capítal
fixo e circulante e ainda pelos períodos de reprodução diversos das diferentes
espécies de capital fixo, e terceiro, de acordo com a duração do verdadeiro
período de produção, distinto da duração do próprio tempo de trabalho 8 , o
que introduz diferenças substanciais na relaçã'o entre período de produção
e período de circulaçã"o. (A primeira relação mencionada, a i;azão entre ca-
pital constante e variável, pode-originar-se de causas bem diversas; pode, por
exemplo, ser puramente formal e as.sim a matéria-prima transformada num
ramo é mais cara que a transfonnada no outro, ou resultar da produtividade
diversa do trabalho etc.)
Assim, se as mercadorias fossem vendidas por seus valores ou se os pre-
ços mêdios das mercadorías fossem iguais a seus valores, a taxa de lucro teria
de variar muito de um ramo para outro; num caso seria 50 e noutros, 40, 30,
20, 10 etc. Tomando-se, por exemplo, o volume total das mercadorias do
ramo A durante um ano, será seu valor = capital nelas adiantado + trabalho

8. Período de produção abrange, além do tempo de trabalho, o tempo em que o


objeto de trabalho está sujeito à influência de processos naturais. Marx analisa os dois
conceitos - período (tempo) de produ~ e período (rempo) de ttabalho em O Capi-
tal, DIFEL, livro 2, vol. 3, cap. Xlll, "O tempo de produção"', pp. 252-262. Sobre a
diferença entte tempo de produção e tempo de trabalho na agricultura, ver Grun-
drisse der Kritik der politischen Okonomie, Berlim, J 953, pp. 560-562.

462
não pago nelas contido. O mesmo nos ramos B, C. Mas, uma vez que A,
B e C contêm quantidades diferentes de trabalho não pago, digamos, A
tem mais do que 8, B mais que C, as mercadorias de A forneceriam, por
exemplo, 3 M (= mais·valia) aos produtores, as de B, 2 Me as de C, M. E
uma vez que a taxa de lucro é determinada pela razão entre a mais.valia
e o capital adiantado, e uma vez que este, segundo o pressuposto, é igual
para A, B, C etc., as díferentes taxas de lucro, se designamos por C o capi·
tal adiantado, seriam 3 M/C para A, 2 M/C para B, M/C para C. A concor-
rência entre os capitais só pode portanto igualar as taxas de lucro, se aí, por
exemplo, fixá-las em 2 M/C, 2 M/C, 2 M/C nos ramos A, B, C. A venderia
sua mercadoria um M abaixo, e C um M acima de seu valor. O preço médio
de A seria menor e o de C maior que o valor das-respectivas mercadorias.

Como demonstra o caso de B, na realidade pode oconer que preÇQ


médio e valor de uma mercadoria coincidam. Isso acontece quando a rnais-
valia produzida no próprio ramo B é igual ao lucro médio, isto é, as diferen-
tes partes do capital nesse ramo mantêm entre si a mesma proporção obser-
vada quando consideramos a totalidade dos capitais, o capital da classe capi·
talista, como uma grandeza em relação à qual se c.alcula a mais-valia global,
não importa qual seja, do capital total, a esfera que a gerou. Nesse capital
global compensam-se os períodos de circulação etc.; considera-se, por exem-
plo, que esse capital todo circulou durante um ano etc. Então cada cota des-
se capital total, na proporção de sua magnitude, participaria de fato na mais-
valia global e retiraria o quinhão correspondente. E uma vez que todo capi·
tal indMdual deve ser considerado cotista desse capital global, seria certo
afirmar, primeiro, q_ue a taxa de lucro dele é a mesma obtida .por cada um
dos demais cotistas, pois capitais de igual magnitude dão lucros iguais, e
segundo - conseqüência automática do antecedente -, que o montante do
lucro depende da grandeza do capital, do número das cotas desse capital
global pertencentes ao capitalista. A concorrência entre os capitais atua no
sentido de tomar todo capital fração do capital global e, em concordância,
no sentido de regular sua participayã°o na mais·valia e por isso também no lu-
·cro. E a concorrência o consegue mais ou menos por meio dos nivelamentos
que realiza (não investigaremos aqui as causas por que em certos ramos tro·
peça em obstâculos especiais). Sem rebuços, isso significa apenas que os ca·
pitaljstas se empenham (esse empenho é a concorrência) em repartir entre si
a quantidade de trabalho não pago que extraem da classe trabalhadora-· ou
os produtos dessa quantidade de trabalho - não na proporção em que um

463
capital partiailar produz diretamente trabalho excedente; mas, primeiro, na
proporção em que esse capital particular constitui porção alíquota do capi-
tal global e, segundo, em que o capital global mesmo produz trabalho exce-
dente. Como irmãos e inimigos, os capitalistas repartem entre si o saque do
trabàlho alheio de que se apropriam, de modo que em média um obtém tan-
to trabalho não pago quanto o outro 9
A concorrência efetiva esse nivelamento regulando os preços médios.
Esses próprios preços médios se colocam acima ou abaixo do valor, de modo
que uma mercadotja não obtenha taxa de lucro maior que a de outra. F, por-
tanto en::ado dizer que a concorr~ncia entre os capitais produz taxa de lucro
geral por igualar os preços das mercadorias a seus valores. Gera-a, ao contrá-
rio, porque transfonna os valores das mercadorias em preços médios, e nes-
tes parte da. mais-valia se transfere de uma mercadoria para outra etc. O va•
lor de uma mercadoria = quantidade de trabaJho nela ~ntida, pago e não
pago. O preço médio de uma mercadoria =quantidade de trabalho pago ne-
la eru:errado (materializado ou vivo) + cota média de trabalho não pago. Es-
ta não depende da circunstância de estar ou não de todo contida na própria
mercadoria ou de se encel'rar mais ou menos dela no valor da mercadoria.

b) Formulação do problema da renda fundi.ária

E possível que certos ramos de produção - este assunto não constitui


objeto deste livro e será investigado depois - trabalhem effi: circunstâncias
que se opõem à redução dos valores a preços médios no sentidQ adma e que
não permitem essa vitória à concorrência. Se esse fosse o caro
por exemplo
com a renda (rent) agrícola ou das minas (há ·rendas que só podem ser expli-
cadas por monopólio, por exemplo, a renda de água ná Lombardia e em par-
tes da Ásia, o aluguel de casa no que é renda fundiária), seguir-se-ia que, en-
quanto o p~duto de todos os capitais industriais se move mediante altas e
baixas para o preço médio, o da agricultura é igual ao valor, que estaria aci-
ma do preço médio. Haverá aí barreiras que possibilitem a esse setor de pro-

9. MtllX expõe esse C()!Dp<>Itamento dúplice doo capitalistas, CQ!IlO irmãos e co-
mo adversários no livro 3 de O Capital.. Ao tratar do nivelamento das taxas de Incro,
destaca ele que "todo c.apitalista individual, como o conjunto dos capitalistas de todo
ramo particulaI de produção, participa da exploração da totalidade da classe trabalha·
dcu:a, e do grau dessa exploração". E escreve: "Temos aí matematicamente demonstra·
do a razão por que os capítallsta&, embora simulem fraternidade no seu logro recípro-
co, constituem verdadeira irmandade maçônica ao se defrontarem com o conjunto da
classe ttabalhado,i:a." {Ver O Capital, DIFEL, livro 3, vol. 4, pp. 222 e 223).

464
dução retirar da mais-valia nele produzida. corno sua propriedade,quantida-
de maior do que a que é permitida pelas leis da concorrência, do que a que
se pode obter na proporção da cota do capital empregado nesse setor?
Se càpitais industriais produzem 10 ou 20 ou 30 por cento mais valor
exc.edente 10 que capitais industriais de igual magnitude em outras esferas de
produção, não temporariamente, mas de acordo com a natureza de seus ra-
mos confrontados com os demais, e se, diga.mos, forem capazes de ·reter,
contra a concorréncia, esse excesso de mais-valia e de-impedir que ele entre
na contabilidade ( distribuiçãb) geral que determina a taxa geral de lucro,
nesse caso poder-se-ia distinguir nos ramos daqueles capitais 2 beneficiários,
um que receberia a taxa geral de lucro e outro que receberia apenas o acrés-.
cimo inerente a esses ramos. Todo capitalista poderia pagar, transferir a esse
prlvilegíado tal acréscimo, a fim de aplicar aí seu capital, e reservaria para si
mesmo a taxa geral de lucro como qualquer outro capitalista e na dependên-
cia das mesmas possibilidades. Se esse for o caso na agricultura etc., a de-
composição da mais-valia em kt.cro e renda fundiárVJ não indicaria absoluta-
mente que o trabalho aí é de per si "mais produtivo" (de mais-valia) que na
manufatura, e não seria mister portanto atdbuir à terra poderes mágicos, o
que aliás é ridículo por natureza, pois, se valor= trabalho, não -pode haver
mais-valia = terra (embora mais-valia possa decor.rer da fertilidade natural
do solo, mas daí de maneira nenhuma poderia resultar preço mai!f alto para
os produtos da terra. Muito pelo contrário). Nem seria necessário ter pro-
curado na teoria de Rícardo o refúgio que por natureza estabelece uma liga-
Ção repulsiva com o lixo maltbusiano, tem conseqüências repugnantes e,
mais especialmente, embora não se oponha no domínio teórico à minha con.
cepçtro da mais-valia relativa, tira-lhe grande parte do significado prático.

A idéia de Ricardo é esta: a renda fundiária (por exemplo, na agrtcul·


tura) só pode ser um excedente sobre a taxa geral de lucro onde - como ele
supõe - se explora a agricultura em bases capitalistas, há a.nendatdrio. Tan·
to faz que se iguale ou não de fato a essa renda - no sentido econômico
burguês - o que o dono da terra recebe. Pode ser me.ra dedução do salário
(ver Irlanda) ou consistir parcialmente em compressão do lucro do arrenda-
tário abaixo do nível médio de lucro. Em absoluto. não importa qual dessas
possibilidades ocorra. No sistema burguês, a renda fundiária só constitui for-
ma especial, característica de mais-valia, quando é excesso sobre o lucro
(geral).

JO. Valor ex~ente. = mais-v~

465
M_as como é isso possível? A mercadoria trigo, como as demais, é ven-
dida por seu valor, isto é, troca-se por outras mercadorias na proporção do
tempo de trabalho nela contido. (Este é o primeiro pressuposto errôneo, ar-
tifício que já torna o problema mais difícil. Só por exceção as mercadorias
se trocam por seus valores. Seus preços médios são determinados de outra
maneira. (Ver acima.) O arrendatário que cultiva trigo obtém o mesmo lu-
cro dos demais capitalistas. Isso prova que ele, como todos os outros, se·
apropria do tempo de trabalho não pago de seus trabalhadores.. E a renda
fundiária, então, donde provém? Tem de representar tempo de trabalho.
Por que o trabalho excedente na agricultura se repartiria entre lucro e renda
fundiária, quando na indústria corresponde apenas a lucro? E como é isso
possível, se o lucro na agricultura = lucro em qualquer outro ramo de produ-
ção? (As idéias deficientes de Ricardo sobre lucro e a mistura direta que ele faz
de lucro com mais-valia acarretam aí efeitos prejudiciais. Tornam-lhe o pro-
blema mais difícil.)
Ricardo resoJve a dificuldade, supondo-a em princfpw inexistente (e
esta é na realidade a unica maneira de resolver uma dificuldade, na base de
princípios. Mas aí só cabem dois métodos. Ou se mostra que a contradição
com o princípio é aparéncia, aparência que procede do desenvolvimento da
própria coisa. Ou o pesquisador, como o faz. Ricardo, ao negar a díficulda·
de num ponto, daí parte para poder explicar sua existência noutro ponto).
Ricardo supõe um ponto onde o capital do arre!'ldatário, como o de
qualquer outra pessoa, sô paga lucro (configura-se esse capital em aplicação
que não paga renda fundiária ou arrendamento especial, ou em aplicação na
parte do solo de um arrendamento na qual não se paga renda, em suma,
qualquer capital investido na cultura da terra e que não pague renda). Este
é mesmo o ponto de partida e pode ser expresso assim: na origem, o capital
do arrendatário só paga lucro (embora essa forma pseudo-histórica seja irre-
levante e seja comum a todos os economistas burgueses em "outras leis");
não paga nenhuma renda fundiária. Não se distingue de qualquer outro capi~
tal industrial. A renda fundiária só aparece por subir a procura de cereais,
e então, em contraste com outros ramos industriais, é mister recorrer a solo
"menos" produtivo. Com o encarecimento dos meios de subsistência, o
arrendatário sofre (o-hipotético arrendatário primitivo) como qualquer ou-
tro capitalista, ao ter de pagar mais a seus trabalhadores. Mas ganha com a
alta do preço de sua mercadoria acima do valor, primeiro, ao experimenta-
rem outras mercadorias, componentes de seu capital constante, queda no
valor relativo, e assim as compra mais barato; segundo, ao possuir seu valor
excedente na mercadoria mais cara. O lucro desse arrendatário portanto so-

466
be acima da taxa média de lucro, que todavía caiu. Por isso, outro capita·
lista vai para terreno pior, o II, que, com essa taxa menor de lucro,pode for-
necer produto ao preço de I ou talvez algo mais barato. Seja como for, agora
temos de novo em II a situação normal, com a mais-valia reduzida apenas a
lucro; mas temos a renda fundiária explicada para I, pela existência de um
duplo preço de produção, o preço de produção de II, ao mesmo tempo pre-
ço de mercado de 1. Um ganho suplementar temporário, tal como ocorre
com a mercadoria de fábrica, produzida em condições mais favoráveis. Do
trigo, o preço que, além do lucro, contém renda fundiária consiste apenas
em trabalho materializado, é igual ao valor, mas não o nele mesmo encerra-
do e sim o de II. Dois preços de mercado são impossíveis.
(Enquanto Ricardo introduz o arrendatário II por ter caldo a taxa de
lucro, Stirling o faz por ter caído e não por ter subido o salário em conse·
qüência dos preços do trigo. Essa redução do salário permite a II cultivar
uma área n. li, com a antiga taxa de lucro, embora a terra seja menos fér-
til11 Uma vez estabelecida~ a existência da renda fundiária, o restante
vem com facilidade. Sem dúvida continua certa a idéia da diferença entre as
rendas ftmdiário.s segundo a fertilidade diversa etc. Isto não acarreta a neces·
sidade de se cultivarem terras cada vez menos férteis.
Temos aí a teoria de Ricardo. O preço elevado do trigo proporciona a
1 lucro suplementar e a II nem sequer taxa de lucro igual à anterior e sim
menor; por isso, é claro que o produto II contém mais valor que o produto
1, é produto de mais tempo de trabalho, nele se encerra maior quantidade de
trabalho, ou seja, é mister empregar mais tempo de trabalho para se obter o
mesmo produto, digamos, 1 quarter de trigo. E a elevação da renda fundiária
estará na razão dessa_ crescente improdutividade da terra ou do crescimento
da quàntidade de trabalho que tem de ser empregada para produzir, por
exemplo, 1 quarter de trigo. Ricardo por certo nao falaria de "elevação" da
renda se aumentasse apenas o número de quarters com que se paga a renda,
mas somente se o preço da mesma unidade, de um quarter, subisse, digamos,.
de 30 para 60 xelins. Todavia esquece às vezes que a magnitude absoluta do.
rendo. pode crescer com baixa taxa de renda, do memto modo que o mo1Z>-
tante absoluto de lucro pode aumentar com taxa decrescente de lucro.
Outros procuram contornar a dificuldade (Carey, por exemplo) ncgan·
do diretamente a dificuldade de outra mane.ira. A renda fundiária é mero ju·

11. Stirling, The philosophy of trude; or, outlines of a theory of profits and
prices, Edimburgo, 1846. pp. 209-210.

467
ro para o capital antes incorporado à terrall. Assim, também uma forma de
lucro apenas. Nega-~ aí portanto que exista a renda fundiária, realmente
eliminada pela eipücação.
Outros. como Buchann~, consideram-na mera decorrência de monopô-
lio13. Ver tunbémHópkins14 . A renda fundiária para eles é meia robrecarga
sobre o valor.
Para Opdyke 15 , um ianque típico, a propriedade fwidiária ou renda
·fundiária vem a ser "o reflexo legalizado do valor do capital". (Em analogia
com a idéia de Opdike de ser a propriedade "o reflexo legalizado do valor
do capital" o .. capital é o reflexo legalizado do 'trabalho alheio'~)
Em Ricardo, as duas suposições errôneas díf1cultam a pesquisa. Não
foi Ricardo quem criou a teoria da renda. Antes dele, West e Malthus pu-
seram-na em letra de fonna. Mas a fonte original é Ander:ron. Todavia, o que
distingue Ricardo é a conexão que estabelece enue a renda e sua teoria do
valor (embora nlfo' falte de todo em West .a conexão real). Malthus. confor-
me demonstra sua polêmica posterior com Ricardo sobre a renda, não com·
preendera a teoria andersoniana por ele mesmo adotada.) Se partinnos do
princípio correto de ser o valor das mercadorias determinado pelo tempo de
trabalho necessário para produzi-las (e o valor em geral é apenas tempo de
trabalho social materializado), inferiremos que o preço médio das mercado-
rias é determina~o pelo tempo de trabalho necessário pa~ produzi-las. Tal
conclusão seria certa se ficasse demonstrado que preço médio= valor. Ora,
evidencia-se que, justamente porque o valor da mercàdoria é determinado
pelo tempo de trtlbaDw. o preço médio das mercadorias,(exçetuado o caso
úníco da taxa de. lucro por assim dizer individual num ramo particular de
produção, isto é, o lucro determinado pela mais·v~ia nesse próprio ramo
onde essa taxa de lucro individual é igual à taxa de lucro médía da totalida·
de do capital) nu~ 1XJde ser igual ao valor delas, embora essa determina·
ção do preço médio só decorra do valor baseado na determinação pelo tem-
po de trabalho.
Daí inferimos de inído que até mercadorias cujo preço médio (se
abstraímos do valor do capital constante) se reduza apenas a salário e lucro,
enquadrados a?- taxa normal, isto é, salário e lucro. médios, podem ser ven-
didas acima ou abaixo do valor. Por isso, se a circunstância de a mais-valia

12. Ver, neste ".Olume, p. 160 e em O Capital, DlFEL, livro 3, vols. 5 e 6, pp.
680-701e705-717.
13. Ver neste volume pp. 595 e 819.
14. Ver, neste volume, pp. 567-571.
15. Opdyke,A.. tre4tise on polltical economy, Nova Iorqu~ 1851, p. 60.

468
somente se expressar na rubrica de lucro normal não demonstra que a mer-
cadoria se vende pelo valor, também a circunstância de a mercadoria, além
de lucro, proporcionar renda fundiária não prova que a mercadoria se ven-
de acima de seu valor imanente. Se a taxa média de lucro ou taxa geral de
lucro do capital realizada por uma mercadoria pode estar abaixo de sua prô·
pria taxa de lucro determinada por sua mais-valia real, fica evídente que, se
mercadorias de um ramo particular de produção, afora essa taxa média de
lucro, ainda rendem outro montante de maís-valia com denominação espe-
cial, rugamos, renda fundiária, o lucro + a renda funcliária, a soma de lucro
e renda fundiária não é necessariamente maior do que a mai~valla contida
na própria mercadoria, Uma vez que o lucro pode ser menor que a mais-valia
imanente da mercadoria ou que a quantidade de trabalho não pago nela con-
tida, lucro + renda fundiária não .constituem necessariamente montante
maior que a mais-valia imanente da mercadoria.

Resta por certo a explicar por que isso ocorre num ramo particular de
produção, em contraste com os demais ramos. O problema porém já estaria
bastante simplificado. Essa mercadoria se distingue das outras por isto: nu·
ma secção das outras mercadorias, o preço méclio está acima do valor ima-
nente, mas só para elevar a respectiva taxa de lucro ao nível da taxa geral
de lucro; noutra secção dessas outras mercadorias, o preço médio está.abai·
:«> do valor imanente delas, mas só até o ponto necessário para reduzir a
respectiva taxa de lucro à taxa geral de lucro; e por fim, na terceira secção
delas, o preço médio é igual ao valor imanente, mas só porque elas propor-
cionam a taxa geral de lucro quando vendidas pelo valor imarumte. Difere
de todas as mercadorias desses três casos aquela que proporciona renda fun-
diária. Sejam quais forem as circunstâncias, o preço a que é vendida é tal
que ·dá mais que o lucro' médio - determinado pela taxa geral de lucro do
capital.
O que se quer saber agora é: qual ou quantos dos 3 casos podem su-
ceder? A mais-valia todo. contida na mercadoria se realiza no preço? Se se
dá isso, exclui-se o caso 3, isto é, as mercadorias cuja mais-valia toda se rea·
liza em seu preço médio, pois só proporcionam o lucro normal. Esse caso
portanto não interessa. Nem o caso 1, na condição considerada, com a mais-
valia realizada no preço da mercadoria acima de sua mais-valia imanente.
Pois aí supõe-se que "a mais-valia contida na mercadoria se realiza" no pre-
ço. Esse caso tem portanto analogia com o caso 2, onde a mais-valia .ímanen·
te das mercadorias é maior que a mais-valia realizada no respectivo preço
médio. Como sucede com as mercadorias precedentes, o lucro constitui for-
ma dessa mais-valia, que mediante decréscimo se iguala à taxa geral de lucro:

469
aí o lucro do capital aplicado. Todavia,. naquelas mercadorias excepcionais,
realiza-se ainda, ao contrário do que se dá em 2, a sobra, acinw. dessy lucró,
da mais-valia imanente da mercadoria, mas cabe a outro proprietário que
não o do capital, a sab.er, ao dono da terra, do fator natural, mina etc.
Ou se o preço for elev.ado a tal nível que dá mais que a taxa média de
lucro? Este é, por exemplo, o caso dos verdadeiros preços de monopólio.
Essa hipótese - estendida a todo ramo de produção onde se podem aplicar
livremente capítal e traballio e cuja produção, no tocante ao volume do ca-
pital aplicado, está sujeita às leis gerais - seria uma petição de princípio e
ainda contradiria diretamente os fundamentos da ciência econômica e da
produção capíta1ista, e desta é aquela apenas a expressão teórica. É que tal
hipótese supõe justamente o que se deve explicar, isto é, que num_ ramo
particular de produção o preço da mercadoria tem de proporcionar mais que
a taxa gera:l de lucro, mais que o lucro médio, e pa:ra esse fim a mercadoria
tem de ser vendida acima de seu valor. Supõe-se portanto que os produtos
agrícolas escapam às leís gerais do valor da mercadoria e da pwdução capi-
talista. E sem dúvida supõe-se isso porque a presença particular da renda
fundiária junto ao lucro gera à primeira. vista essa aparência. Daí esse absurdo
Assim resta apenas a Wpótese de existirem nessa esfera particular de
~rodução circunstâncias esPeciais, ínfluências que levam as mercadorias a
realizar nos preços a mais-valia global nelas imanent.e, ein vez de, como no
caso 2, só realizarem nos preços tanto de sua m~s-vàlia quanto rende a taxa
geral de lucro e de fazerem os preços médios caír abai.x,o da respectiva mais·
valia, a ponto de só darem a taxa geral de lucro, ou seja, de o lucro médio
delas não ser maior que o vigente em to$s as demais esteras de produção
do capital.
Com isso, o problema já fica bem mais simples. Não se trata mais de
explicar como é que o preço de uma mercadoria, além de lucro, proporcio-
na renda fundiária, parecendo portanto violar a lei geral dos valores, e me-
diante elevação desse preço acima da mai3-valia imanente rende mais que a
taxa geral de lucros para um capital de dad~ magnitude. Trata-se antes de
saber como é que essa mercadoria, no nivelamento das mercadorias aos pl"e'-
ços médios, não tem de ceder às outras mercadorias tanto de seu vakJr ima-
nente que só proporcione o lucro médio, e da própria mais-valia realiza ain·
da wna porção que constitui um excedente sobre o lucro médio; desse mo-
do é possível a um· arrendatário que emprega capital nessa esfera de produ·
ção vender a mercadoria a preços que lhe dêem o lucro normal e ao mesmo
tempo o capacitem a pagar a terceiro, ao dono da terra, o excesso de mais-
valia realizado acima desse lucro.

470
Nessa forma, a. simples formulação do problema já traz implícita a
própria solução.

e) A prop1-kdade privada da terra, candifão


necessá.ria para a existência da renda absoluta;.
Na agricultura a mais-valia decompõe~se em lucro
e renda fundiária

A propriedade privada de certas pessoas sobre a terra, minas, ãgua, etc.


muito simplesmente as capacita a desviar, ínterceptar e capturar o o:cesso
de mais~valia que ultrapassa o lucro (lucro médio, taxa de lucro detennínada
pela taxa geral de lucro) e se contém nas mercadorias dessa esfera particular
de produção, dessa$ apliéaçõcs particulares de capital, e a impedir que esse
excesso entre no proces.ro geral por que se forma a taxa geral de lucro. Em
todo negócio industrial colhe-se mesmo parte dessa mai~valia, pois por toda
a parte corresponde à superfície utilizada (pelo edifício da fábrica, da ofici-
na etc.) uma renda fundiária, uma vez que onde a terra é disponível de graça
não se constroem fábricas, excetuadas as regiões mais ou menos populosas
e bem dotadas de transportes.
Se as mercadorias obtidas no pior terreno cultivado fossem de catego-
ria 3, com preço médio= seu valor, isto é, mercadorias que realizam no pre·
ço a totalidade da mais-valia imanente porque só assim dão o lucro normal,
não pagaria esse terreno renda fundiâria alguma e a propriedade da terra aí
seria apenas nominal. Se aí for pago um arrendiunento, isso. prova apenas
que ·pequenos capitalistas, como em parte sucede na Inglaterra (ver New-
man)16, se conte-ntam em obter lucro abaixo do lucro médio. E isto se dá
sempre que a taxa de renda é maior que a diferença entre a maís-valia ima-
nente da mercadoria e o lucro médio. Há terras cujo cultivo no máximo dá
para pagar o salário, pois, embora o trabalhador nelas trabalhe o dia inteiro
para si mesmo, seu tempo de trabalho ultrapassa o tempo de trabalho social·
mente necessário. E tão improdutivo - em face da produtividade dominante
nesse ramo de trabalho - que o homem, embora trabalhe para si 12 horas,
mal produz o que o trabalhador obtém em 8 horas em condições de produ·

16. Francis William Newman, Lectures on political economy, Londres, 1851.


À p. 155 diz Newman: " ... observando-se a maio.ria desses arrendatários que não são
indigentes e que por certo têm de· ser classificados de capitalistas, temos de conelu.ir
que o amOI à vida no campo leva-os (de ordináiio) a se contenta.Iem com ganho menor
que o que se poderia esperaz do mesmo ct1pital em outros ramos de atividade."

471
ção mais favoráveis. Está na mesma sitUação do tecedor a mão que concorre
com o tear mecânico. Sem dÚVida, o produto des.se tecelão artesima+ = 12
horas de trabalho, mas só se iguala a 8 ou menos horas de trabalho socíal-
mente necessário, e seu produto por isso tem apenas o valor de 8 horas de
trabalho necessário. Se nesse caso o lavrador paga arrendamento, este é mera
dedução de seu salário necessário e não representa maiHalia, menos ainda
excesso sobre o lucro médio.
Admitamos primeiro que, num pais como os Estados Unidos, seja ain·
da tã'o pequeno o número de agricultores concorrentes, e a apropriação da
terra seja ainda tão reduzida a mera formaJidade, que todo mundo encontre
espaço para empregar seu capital na terra sem permissão de proprietários ou
arrendatários que a tenham até então cultivado. Nessas circunstâncias, é pos-
sível por Jongo período -· excetuadas as tenas cuja situação em regiões po-
pulosas lhes proporciona monopólio - que a mais-valia produzida pelo ar-
rendatário acima do lucro médio não se realize no preço de seu produto,
mas tenha ele de reparti-la com os irmãos capitalistas, como a mais-valia de
todas as mercadorias, a qual, quando realizada no preço, lhes confere um lu-
cro excedente, eleva a respectiva taxa de lucro acima da geral Nesse caso
subiria a taxa geral de lucro porque o trigo etc., como outras mercadorias
manufaturadas, seria vendido abaixo do valor. Essa vendl! abaixo do valor
não constituiria exceção, mas antes evitaria que o trigo configurasse uma
exceção em fac.e de outras mercadorias da mesma categoria.
Segundo, suponhamos um país onde só exista uma. qualidade de ter·
ra, mas tal que, se a mais-valia toda da mercadoria se realízar no preço, esta
só dê ao capital o lucro normal. Nesse caso não se_pagaria renda fundiária.
A ausência dessa renda em nada ínfluiria a taxa geral de lucro, não a elevaria
nem a rebaixaria, nem seria influenciada pela circunstância de outros produ-
tos não agrícolas se encontrarem nessa categoria. Essas mercadorias se en-
contram nessa categoria justamente porque seu valor imanente é igual ao lu-
cro médio, não podem portanto alterar o nível desse lucro, ao contrário com
ele se confonnam e nele nã'o têm a menor influência, embora ele as influencie.
Terceiro, admitamos, para o país, uma espécie de solo tão pobre que o
capital nele empregado seja tão improdutivo que seu produto pertença à
espécie de mercadoria cuja mais-valia fica abaixo do lucro médio. Aí a maís-
vaJia só poderia naturalmente subir (uma vez que o salário se elevaria por
toda a parte em virtude da improdutividade da agricultura) onde se pudesse
prolongar a jomada absoluta, e onde ainda a matéria-prima como ferro etc.
não fosse produto da lavoura, ou como algodão, seda etc. constituísse artigo
de ímportaçã"o e produto de um solo mais fértil. Nesse caso, o preço da mer- ·

472
cadoria agrícola incluiria mais-valia mais alta que a imanente, a fim de pro·
porcionar o lucro nonnal. Por isso, cairia a taxa de lucro, embora não exís-
tisse renda fundiária. Ou admitamos. no caso 2, que o solo é muito improdu-
tivo. EntãO a mais-valia desse produto agrícola, por sua igualdade com o lu-
cro ,médio, mostraria que este é muito baixo, pois das 12 horas de trabaJho
na agricultura talvez 11 sejam necessárias para produzir apenas o salário, sen·
do a mais-valia igual apenas a 1 hora ou menos.
Esses diversos casos ilustram o seguinte:
No primeiro caso, a amêncla ou falta de renda fundiária está ligada ou
coexiste com taxa de lucro elevada., em relação a outros países onde a renda
fundiária se desenvolveu.
No segundo caso, a ausência ou falta da renda fundiária em nada in·
fluencia a taxa dflucro.
No terceiro, comparando-se com outros países onde existe renda fun-
diária, está ligada a uma taxa geral de lucro, ba"fxa, relativamente mais baixa,
indicando-a.
Infere-se daí que a formação de uma renda fundiária particular nada
tem a ver em si com a produtividade do trabalho agri'cola, uma vez que sua
falta ou ausência pode estar associada com taxa de lucro crescente, constan·
te ou decrescente.
A questão aqui não é: por que na agricultura etc. se captura o excesso
de mais-valia sobre o lucro médio? Ao revés, caberia perguntar: por que te-
ria de suceder aí o oposto? Mais-valia nada mais é que trabalho não pago; o
lucro médio ou o lucro norma] é apenas a quantidade de trabalho não pago
que se espera realize cada capital de magnitude dada; quando se diz que o
lucro médio é de 10%, isto significa que a um capital de 100 correspondem
10 de trabalho não pago; ou 100 de trabalho materializado tem comando so-
bre trabalho níio pago equivalente a 1/10 de seu montante. Excesso de mais·
valia sobre o lucro médio significa portanto que numa mercadoria (em seu
preçO ou na parte deste que consiste em mais-valia) se encerra quantidade
de trabalho não pago maior do que a quantidade de trabalho não pago que
constitui o lucro médio, que por isso no preço médio das mercadoriasfonna
o excedente de seu preço sobre o preço dos custos de produção. Em cada
mercadoria isolada, os custos de produção representam o capital adiantado,
e o excedente sobre esses custos de produção, o trabalho níio pago que o ca-
pital adiantado comanda; por isso, a proporção desse excedente no preço
sobre o preço dos custos de produção representa a taxa com que capital de
magnitude dada - aplicado no processo de produção de mercadorias - co-
manda trabalho não pago, e não importa que o trabalho não pago contido

473
na mercadoria do ramo particular de produção seja ou-não igual a essa taxa.
Que é então que força o capitalista' individual a vender, por exemplo,
a mercadoria a um preço médio? (Esse preço médio se estabelece, "lhe é
imposto, de modo nenhum decorre de seu livre arbítrio; ele preferiria vender
a mercadoria acima do valor que só lhe dá o lucro médío e lhe pennite reali-
zar menos trabalho não pago que o que está de fato consumido em sua pró-
pria mercadoria.) A coerção dos outros capitalistas exercida por meío da
conconêncía. Todo capital da mesma magrútude poderia penetrar também
no ramo de produção A, onde a razão do trabalho não pago para o capital
adiantado, digarnoo, de 100 libras é maior que nos ramos B, C etc., cujos
produtos, com seu valor de uso, satisfazem uma necessí9ade social assim co-
mo as mercadorias da esfera de produção de A.
Quando há ramos de produção onde certas condições de produção
tais como terras aráveis, jazidas de carvão, minas de ferro, quedas-d'água
etc. - sem as quais não se pode exercer o processo de produção nem produ-
zir a mercadoria do ramo - encontram-se em mãos diversas das dos proprie-
tários ou possuidores do trabalho materializado, das dos capitalistas, dirâ
ent.ão essa outra espécie de proprietárim; das condições de produção:
Se te ceder o uso dessa condiçãO de produção, obterás teu lucro mé-
dio, apropriar·te-ás da quantidade normal de trabalho não pago. Mas tua
produção te dá um excesso de mais-valia, de trabalho não págo acima da ta-
xa de lucro. Não lanças esse excesso numa conta con:ium, segundo nonna
entre vós capitalistas, e dele me aproprio: pertence.me. A transação te con-
vém, pois teu capita1 te dá nessa esfera de produção tanto quanto em quaJ.
quer outra, e além disso esse ramo de produção é muito sólido. Teu capital
aí te dá os 10% em trabalho não pago os quais constituem o lucro médio,
e mais 20% adicionais em trabalho não pago. Pagar-me-ás estes e, para o fa.
zeres, acrescentarás ao preço da mercadoría 20% em trabalho não pago e
não ajustarás contas disso com os outros capitalistas. Como tua proprieda-
de de uma condição de trabalho - capital, trabalho materializado - te ca-
pacita a te apropriares de determinada quantidade de trabalho não pago dos
trabalhadores, minha propriedade da outra condição de produção, a terra
etc., habilita-me a retirar de ti e de toda a classe capitalista a parte de traba._
lho nãb pago que ultrapassa o lucro médio. Vossa lei estabelece que, em
condições normais, capitais iguais se apropriam de quantidades iguais de
trabalho não pago, e vós capitalistas podeis impor isso uns aos outros por
meio da concorrência. Bem, aplico a lei a tí mesmo. Não te apropriarás do·
trabalho não pago dos teus trabalhadores em quantidade maior que aquela
de que poderias, com o mesmo capital, apropr:iar*te em qualquer outro ra-
mo de produção. Mas a lei nada tem a ver com o excesso de trabalho não

474
pago que "produzíste" acima da cota normal. Quem me impedirá de me
apropriar desse "excesso"? Por que deveria; como sói acontecer entre vós,
lançá-lo, para se repartir pela classe eapitalista, no fundo comum do capital,
a fim de cada wn tirar dele uma parte alíquota correspondente ã cota que
tem na totalidade do capital? Não sou capitalista. A condição de produção
cujo uso te cedo não é trabalho materiaJizado mas um produto da natureza.
Podes fabricar terra, água, minas ou hulheiras? De modo nenhum. Para mim
não existe o meio de coerção que se pode aplicar contra ti, para te fazer vo-
mitar parte do trabalho excedente que tu mesmo capturaste. Dá-me, portan-
to, o que é meu. A única coisa que teus irmãos capitalistas podem fazer é
competir contigo e não comigo. Se me pagares menos lucro suplementar que
a diferença entre o tempo excedente que obtiveste e a cota de trabalho
excedente que te cabe de acordo com a lei do capítaf, teus irmãos capitalis-
tas acudirão e por meio da concorrência te constrangerão a pagar-me leal-
mente a importâncüi inteira que te posso extorquir.
Importaria expor agora: (1) a transição da propriedade feudal para ou-
tra forma, a renda fundiária comercial, regulada pela produção capitalista
ou, de outro ângulo, a conversão dessa propriedade feudal da terra em pro-
priedade camponesa livre; (2) como a renda fundiária surge em países como
os Estados Unidos, onde na origem não houve propriedade das terras e pelo
menos formalmente, desde o início, predomina o modo de produção bur-
guês; (3) as fonnas asiáticas de propriedade fundiária que amda existem. Mas
esses problemas não são pertinentes aqui.
Segundo aquela teoria, portanto, a propriedade privada de objetos da
natureza como terra, água, minas etc., a propriedade dessas condições de
produçio, dessa condição natural da produção, não é uma fonte donde flw
valor, pois valor é apenas trabalho materializado; nem é a fonte donde jorra
mais-valia suplementar, isto é, excesso de trabalho não pago sobre o trabalho
não pago encenado no lucro. Mas essa propriedade é uma fonte de rendi-
mento (revenue). Bum título, um meio que capacita o proprietário da con-
diçlfo de produção, no ramo onde o objeto de sua propriedade faz o papel
de condição de produção, a apropriar-se da parte do trabalho não pago ex-
torquido pelo capitalista, a qual, do contrário, seria lançada na conta co-
mum do capital como excesso sobre o lucro nonnaJ. A propriedade é um
meio de impedir esse processo ocorrente nas demais esferas de produção, e
de reter, nessa esfera particular de produção, a mais-valia nela produzida,
para ser dividida entre o capitalista e o proprietário da terra. Assim, a pro-
priedade da terra, como o capital, se constitui num direito a trabalho não
pago, gratuito. No capital, o trabalho materializado do trabalhador aparece

475
dominando este, e de modo semelhante, na propriedade da terra, a circuns-
tância de esta capacitar o titular a tomar do capitalista parte do trabalho não
pago dá·lhe o aspecto de fonte de valor. ·
lsso explica a moderna renda fundiária, sua existência. A variação da
magnitude da renda fundiária, para igual capital empregado, só pode decor-
rer da diferença da fertilidade da tem. A mesma variação, para igual f erti-
lidade, sô se pode explicar pela difetença na magnitude do capital emprega-
do. No primeiro caso, a renda fundiária cresce, por subir sua taxa em rela·
ção ao capital desembolsado (e também em relação à área da terra). Cresce,
no segundo, por aumentar seu montante, com taxa igual ou até com taxa
diversa (se a segunda dose de capital não tíVer a mesma produtividade).
Com essa teoria não é necessário que o pior solo pague ou não renda.
Demais, não é absolutamente necessário que a fertfüdade da agricultura de-
cline, embora a diferença na produtividade, quando não removida com arti-
fícios (o que é possível), seja maior do que em ramos industriais de produ-
ção análogos. Quando se fala de maior ou menor fertilidade, tem·se em
mira o mesmo produto. Como os vários produtos se comportam entre sí
é outra questão.

A renda fundiária calculfida sobre o próprio solo é a global (rental),


o montante de renda. Pode subir, sem crescer a taxa de renda. Se não varia
o valor do dinheiro, pode subir o valor relativo dos produtos agrícolas, não
por se tomar a agricultura menos produtiva, mas porque; embora ela aumente
a produtividade, não a aumenta no mesmo ritmo da ind(lstri~. Por sua vez,
elevação dos preços em dinheiro dos produtos agrícolas, invariável o valor
do dinheiro, só é possfvel quando o seu valor mesmo sobe, isto é, a agricul-
tura se torna menos produtiva (quando a causa não e pressão momentânea
da procura sobre a oferta, como sucede com as demais mercadorias).
Na indústria têxtil algodoeira, o preço d.a matéria-prima tem caído
constantemente com o desenvolvimento da própria indústria, e o mesmo va-
le para o ferro, para o carvão etc. O crescimento da renda fundiária aí foi
po~vel não por ter subido sua taxa, mas por se ter aplicado mais capital.
Opina Ricardo: as forças naturais como o ar, a luz, a eletricidade, o
vapor e a água são gratuitas; a terra não, por ser limitada. Já por isso, a
agricultura é menos produtiva que outras indústrias. Se a terra fosse comum,
sem dono, disponível em qualquer quantidade como os outros elementos
e forças naturais, a produção seria muito mais abundante.
Antes de mais nada, se a terra estiVesse à livre disposição de todo mun·
do de maneira imediata, faltaria um elemento primordial para se formar o
capital Uma condição de produção da maior essencialidade e - excluído o

476
homem e seu próprio trabalho - a única condição original de produção
não poderia ser alienada nem ser objeto de apropriação e assim não po-
deria contrapor-se ao trabalhador como propriedade alheia e fazer dele
trabalhador assalariado. A produtividade do trabalho no sentido ricardia-
no,isto é, capitalista, a "produção" de trabalho alheio não pago seria por
conseguinte impossível. Com isso. a produção capitalista em geral teria
um fim.
Quanto às forças naturais referidas por Ricardo, podem elas sem
dó.vida ser em parte obtidas de graça e nada custam ao capítaJista. O car-
vão lhe acarreta um custo, mas o vapor nada lhe custa se tem grátis a água.
Vejamos o caso do vapor. Sempre ex.istiram os atributos do vapor. Sua
utilidade industrial é uma nova descoberta científica de que o capitalis·
ta se apropriou. Por causa dela subiu a produtividade do trabalho e, com
essa produtividade, a mais-valia relativa. Isto é, a quantidade de traba-
lho não pago de que o capitalista numa jornada se apropria cresceu por
meio do vapor. A diferença entre a força produtíva·do vapor e a da ter-
ra residt:? apenas em que uma rende trabalho não pago ao capitalista e a
outra ao dono da terra, e este o toma não do operário, mas do capitalis-
ta. Daí o entusiasmo do capitalista pela "inexistência da propriedade"
desse elemento.
O certo aí se reduz a isto: suposto o modo de produção capitalis-
ta, o capitalista nfío é só funcionário imprescindível da produção, mas
o fundonário predominante. O dono da terra, ao revés, é de todo supér·
fluo no _modo capitalista de produção. Este modo de produção precisa
apenas que a terrà não seja propriedade comum, se oponha à classe tra-
balhadora como condição de produção que niio pertence a essa ciaJse,
e se atinge por completo esse objetivo quando a terra se torna propríe.
dade do Estado, isto é, o Estado percebe a renda fundiária. O dono da
terra, funcionário tão essencial da produção no mundo antigo e no me-
dieval, é na era industrial inútíl, excrescência. O burguês radical (cobiçan-
do também a supre~[o de todos os outros tributos) avança no plano teó-
rico para negar a propriedade privada da terra, que desejaria tornar proprie-
dade comum da classe burguesa, do capital, na forma de propriedade do Es-
tado. Na prática, entretanto, falta coragem, poís o ataque a uma forma de
propriedade - uma forma de propriedade privada das condições de tra-
balho - seria muito perigoso para a outra forma. Ademais, o próprio bur-
guês tornou-se dono de terras.

477
4. Tese de Rodbertus: o valor da matéria-prima
não entra nos custos de produção agrícola A

E agora Rodbertus.
Segundo ele, nenhuma matéria-prima entra na contabilidade agrícola.,
porque o camponês alemão, assim nos assegura, não computa para si mesmo
como despesa sementes, forragens etc., não registra esses custos de produ-
ção, erra nas contas portanto. Na Inglaterra, onde o agricultor há mais de
150 anQs faz as contas certo, não deveria por isso existir renda fundiária.
Assim, a conclusão como a formula Rodbertus não seria a de que o anen-
datário paga renda fundiária por ser sua taxa de lucro superíor à da manufa.
tura, mas a de que a paga porque, em virtude de um cálculo errado, está &a·
tisfeito com taxa de lucro mais baixa. Sua idéia seria mal recebida por Dr.
Quesnay, filho que era de um arrendatário e bem familiarizado com o sis-
tema francês de arrendamento. Quesnay contabiliza entre os "adiantamen-
tos" a "matéria·prima" de que precisa o arrendatário, coroo um dos itens
do adiantamento anual de 1 bilhão, embora o arrendatário a reproduza fi-
sícamente.
Se há um setor da manufatura onde quase não aparece capital fixo ou
maquinaria, há outro onde não existe matéria-prima, mas apenas instrumen-
tos de produção - a indústria toda de transporte, indústria que produz mu-
dança de lugar com vagões, ferrovias, navios etc. Dão tais ramos industriais,
além de lucro, renda fundiária? Como se distingue esse ram_o industrial da
míneração, por exemplo? Em ambos só aparecem maquiharia e matéria auxi-
liar, isto é; carvão para navios a vapor, locomotivas e minas, forragens para
animais etc. Por que a taxa de lucro numa forma de.atividade deve ser cal-
culada de maneira diversa da de outra? Sejam os adiantamentos em produtos
feitos pelo camponês à produção = 1/5 do capital todo que ele adiantou,
onde se incluem 4/ 5 dos adiantamentos para as compras de maquinaria e pa·
ra salários, e atinja todo esse dispêndio 150 quarters. Se ele fizer um lucro
de 10%, teremos 15 quarters. O produto bruto será portanto de 165 quar-
ters. Se ele deduzir l / 5, isto é, 30 quarters, e calcular os 1S quarters sobre
120, terá feito um lucro de 12 l /2%.
Alternativamente poderíamos dizer também: o valor do produto ou o
produto= 165 quarters (= 330 libras). Ele computa seus adiantamentos em
120 quarters (= 240 libras), e 10% dão 12 quarters (= 24 libras). Mas o pro-
duto bruto= 165 quarters, e o montante a deduzir dele= 132 quarters,
com o que restam 33. Mas destes saem fisicamente 30 quarters. Sobra por-
tanto o lucro extra de 3 quarters (= 6 libras). O lucro global= 15 quarters

478
(= 30 libras), em vez de 12 (= 24 libras). Ele pode portanto pagar 3 quarters
ou 6 libras de renda e imaginar ter obtido lucro de 10% corno qualquer ou-
tro capit.alista. Mas esses 10% só existem na ímagínação. Na realidade adian-
tou não 120 quarte rs, mas 150, e deste montante l 0% são 15 quarters ou 30
libras. Na verdade recebeu a menos 3 quarters, 1/4 dos 12 quarters que obte-
ve ou 1/5 do lucro global que deveria ter recebido por não ter contabilizado
como adiantamento 1jS dos adiantamentos. Por isso, logo que aprendesse a
calcular à maneira capitalista, deixaria de pagar renda fundiária que seria
apenas a diferença entre sua taxa de lucro e a taxa nonnal.
Noutras palavras, o produto do trabalho não pago inserido nos 165
= =
quarters 15 quarters 30 libras = 30 semanas de trabaJho. Essas 30 sema-
nas de trabaJho ou 15 quarters ou 30 libras, confrontadas com a totalidade
dos adiantamentos de 150 quarters, representariam ·ápenas 10%, confronta-
das somente com 120 quarters, constituiriam mais: l 0% de 120 quarters são
12 quarters, e t 5 quarters não são 10% de 120 quarters, mas 12 1/2%. Dito
de outro modo: o camponês, uma vez que não teria contabilizado como ca-
pitalista parte dos adiantamentos que realmente fez, relacionaria como par-
te menor de seus adiantamentos o trabaJho excedente por ele acumulado, o
qual por isso corresponderia a taxa de lucro maior que a dos outros ramos
industriais e poderia proporcionar uma renda fundiária decorrente apenas
de um erro de cálculo. A brincadeira acabaria se o camponês soubesse que,
para avaliar seu adiantamento em dinheiro e considerá-lo por ísso mercado·
ria, não é absolutamente necessário transformá-lo antes em dinheiro efetivo,
tê-lo vendida.
Sem esse erro de conta {que uma porção de camponeses alemães po-
de cometer, mas não um arrendatário capitalista), a renda fundiária rodber-
tiana seria impossível. Só é possível onde a matéria-prima entra nos custos
de produção, mas não onde não entra. Só é possível onde a matéria-prima
entra, sem ser computada. Mas é impossível onde ela não entra, embora
Rodbertus pretenda derivar a renda fundiária não de um erro de co~ta e
sím da ausência de um item reál dos adiantamentos,
Tomemos a mineração ou a pesca. Aí não entra matéria-prima, exce-
tuada a matéria auxiliar, que podemos omitir, pois emprego de máquína
supõe sempre ao mesmo tempo (com raras exceções) consumo de matérias
auxiliares - os meios de subsistência das máquinas. Seja 10% a taxa geral de
lucro. Despendem-se 100 libras em maquinaria e salários. Por que o lucro
sobre l 00 deveria ultrapassar 1O em virtude de não se terem investido as l 00
libras em matéria-prima, maquinaria e salário, ou em matéria-prima e salã·.
rio? Se deve ocorrer alguma diferença, só pode ela provir de que nos dwer-

479
sos casos difere realmente a relação entre o-. valor do capital constante e o
do capital variável. Essa relação, ao variar, faz variar a mais-valia, meSJl.lO
supondo-5e constante a taxa de mais-valia. E a relação entre quantidades di·
ferentes de mais-valia e capitais de igual magnitude terá naturalmente de
dar lucros desiguais. Aliás, a taxa geral de lucro significa meramente que se
nivelam essas desigualdades e que se abstrai dos componentes orgânicos do
capital e se redistribui a mais-valia, de modo que capitais de magnitude igual
dão lucros iguais.
Que o montante de mais-valia dependa da magnitude do capital apli·
cado - conforme as leis gerais da mais-valia - não é válido para capitais em
diferentes ramos de produçio, mas para diferentes capitais no mesmo ramo,
onde se supõem as mesmas proporções dos componentes orgâniros do capital.
Se digo, por exemplo: o montante de lucro corresponde, naFração, à grande-
za do capital aplicado (o que não é de todo correto, exceto acrescentando:
considerada constante a produtiVidade), na realidade afirmo apenas que,
dada a taxa de exploração dos fiandeiros, a soma da exploração depende do
número dos fiandeiros explorados. Ao revés, se digo que o montante de lu-
cro em diferentes esferas de produção depende da magnitude dos capitaís·
aplicados, isso significa que é li;. mesma a taxa de lucro de todo capital de_
dada grandeza. isto é, o montante de lucro só pode mudar com a magnítu-
de desse capital; em outras palavras, que a taxa de lucro_ não depende da re-
lação orgânica dos componentes de um capital num. ranio de produção par-
ticular; que ela é de todo independente da grandeza. da mais-~valia realizada
nos ramos de produção particulares.
A mineração deve ser de antemão incluída na indústria e não na agri-
cultura. Por quê? Porque nenhum produto dela se emprega fisicamente na
própria produção, não entra no capital constante da mineração tal como saí
da mina (o mesmo se dá na pesca, caça; aí, em grau bem maior, os gastos
se concentram em instrumentos de trabalho e salários ou no próprio traba-
lho).. Em outras palavras, porque todo elemento de produção da mina -
mesmo quando sua matéria-prima dela se obtém - primeiro muda a forma
e se toma mercadoria, tem de ser comprado, e assim volta à mina como ele-
mento de produção. O carvão é a única exceção. Mas· só aparece no papel de
meio de produção num estádio de desenvolvimento em que o explorador da
mina tem forrnaçao capitalista, mantém contabilidade de partidas dobradas,
em que deve a si mesni.o seus adiantamentos, é devedor da sua própria caixa,
e sua caixa é dele mesmo devedora. Assim, justamente aí, onde na realidade
matéria-prima alguma entra nos gastos, tem de prevalecer, de saída, a conta-
bilidade capitalista. impossibilitando a ilusão do camponês.

480
Tomemos agora a própria manufatura e examinemos o setor em que
todos os elementos do processo de trabalho são também elementos do pro-
cesso de criar valor, isto é, todos os elemento!!! da produção constituem gas·
tos de elaboração da nova mercadoria, valores de uso que têm valor, merc.a-
dorio.s. Aí o fabricante que produz o primeiro semimanufaturado d.ífere
essencialmente do segundo e de todos os posteriores da seqüência. A maté·
ria·prima desses é mercadoria, mas já de segunda potência, isto é, mercado-
ria que já recebeu forma diferente da forma natural da primeira, o produto
bruto, já ultrapassou uma segunda fase do processo de produção. Na fiação,
por exemplo: a matéria-prima é algodão, produto bruto que já é mercado·
ria. A matéria-prima da tecelagem porém é fio, produto da fiação; a da es-
tamparia ou da tinturaria é o tecido, produto da tecelagem; e todos esses
produtos que reaparecem em fase ulterior do processo como matéria-prima
são ao mesmo tempo mercadorias.
Está claro que ora voltamos à questão que já nos ocupou duas vezes:
uma vez a propósito de John Stuart Mill 17 , e outra, no exame geral da rela-
ção entre capital constante e renda (revenue) 18 • O ressurgimento constante
da questão evidencia que ainda persiste uma dificuldade. A rigor a matéria
pertence ao capítulo Ili sobre lucro 19 • Mas convém tratá-la aqui.
[Vimos portanto ao exemplo:
4 000 libras-peso de algodão = 100 libras; 4 000 libras-peso de fio =
200 libras;4 000 jardas de tecido= 400 libras.
Segundo esse pressuposto, 1 libra-peso de algodão = 6 pence, 1 libra-
peso de fio = 1 xelim, 1 jarda de tecido = 2 xelíns.
Se a taxa de lucro for de 10%, temos:
(A) algodão, L(lavrador), l;em lOOllbras, o dispêndio é de 90 10/11,
e o lucro= 9 1/11;
(B) fio, F (fiação), Il; em 200 libras, o dispêndio é de 181 9/1 l, e o
lucro= 18 2/11;
(C) tecido, T (tecelagem), ID; em 400 libras, o díspêndioéde363 7/11.
e o lucro= 36 4/11.
Nessa hipótese nã'o importa que os 90 10/11 de A já incluam ou não
um lucro. Não o incluem quando constituem capital constante que se repõe
a si mesmo. Para B também tanto faz que se contenha ou não lucro nas 100
libras, o valor do produto de A, e o mesmo vale para Cem relação a B,
17. Ver vol. 3 desta tradução, cap. XX, 7., b).
18. Vervol 1 desta ttadução, pp. 119-122, 200-202 e 213·232.
19. Marx chama aí de "capítulo lll" a terceira parte de sua pesquisa sobre "O
capital em- geral'\ parte que se transfoonou depois no livro 3 de O Capital

481
.i:..
00
N

A situação de L Oavtador de algodão) ou I, de F (fiação} ou de II e a de T (tecelagem) ou 1U apresenta-se assim;

1) Dispêndio = 90 10/11 Lucro = 9 1/11 Soma = 100


li) Dispêndio = 100 (1) + 81 9/11 Lucro = 18 2/11 Soma= 200
UI) Dispêndio = 200 (ll) + 163 7/11 Lucro = 36 4/11 Soma= 400

Total = 700
Lucro =9 1/11+18 2/11+36 4/11=63 7/11

Capital adiantado em todas as três secções: 90 10/11+181 9/11+363 7/11 = 636 4/11

Excesso de 700 sobre 636 4/11=E63 7/11: 6364/11=10:100.

Continuando a analisar e5sa droga, temos:

l) Dispêndio = 90 10/11 Lucro = 9 1/11 Soma = 100


ll) Dispêndio = 100 (1) + 81 9/11 ·Lu.cro ::::; 10 +8 2/ 11 Soma= 200

lll} Dispêndio :::: 200 (li) + 163 7/11 Lucro = 10 + 16 4/11 Soma= 400
l não restitui lucro de ninguém, pois se supõe que seu capital constan-
te de 90 10/11 não encerra lucro, configurando mero capital constante. No
díspêndio de II entra o produto inteiro de 1 como capital constante. A par-
te = 100 do capital constante repõe 9 l / 11, o lucro de 1. O produto inteiro
de II = 200 entra no dispêndio de UI; por isso, este repõe lucro de 18 2/11.
Apesar disso, o lucro de 1 não é em nada maior que o de II e III. pois o ca-
pital que I tem de repor é menor na mesma proporção, e o lucro constitui
relação com a magnitude do capital, não importa qual Seja a composição dele.
Admitamos agora que III sozinho produza tudo. A coisa IJ<lTece mu-
dar, pois os dispêndios se apresentam assim:
90 10/11 para produzir algodão, 181 9/11 para produzir fio e 363 7 /11
para produzir o t,ecido. Comprou todos os 3 ramos de produção e por isso
tem de empregar sempre dada ql1antidade de capital constante em todos
esses 3 ramos. Somando tudo, temos 90 10/11+1819/11+363 7/11 =
6364/11. Desse montante 10% dão 63 7/11, como acima, só que uma úni-
ca pessoa embolsa tudo, quando antes os 63 7 /11 se repartiam por 1, Il e Ill.
Como surgiu há pouco a falsa aparência'!
Antes, parém, outra observação.
Se tirarmos dos 400 o lucro da tecelagem, 36 4/11. teremos
400 - 36 4/11 = 363 7/11, o dispêndio dela. Nesse dispêndio pagam·se 200
por fio. Nesses 200, 18 2/11 constituem o lucro da fiação. Se deduzirmos
esses 18 2/11 do dispêndio de 363 7 /11, ficaremos com 345 5/11. Nos 200
que a fiação reembolsa ainda se encerram 9 1/11, o lucro do lavrador de
algodão. Se os retirannos dos 345 5/11, teremos 336 4/11. Se subtrairmos
esses 336 4/11 dos 400 - o valor total do tecido -, veremos que nele se
contém lucro de 63 7/fl.
Mas lucro de 63 7/1 I sobre 3364/11 corresponde a 18 34/37%.
Pouco antes, esses 63 7/11 foram calculados sobre 636 4/11, o que
representava lucro de 10%. O excesso do valor global de 700 sobre 636 4/11
era assim de 63 7 /11.
O lucro sobre 100 do mesmo capital atingiria 18 34/37% pelo novo
cálculo, enquanto pelo anterior seria de 10% apenas.
Como se explica isso?
Admitamos que 1, li e III sejam o mesmo capitalista que todavia não
aplica os 3 capitais ao mesmo tempo em lavoura de algodão, em fiação e em
tec.elagem. Ao contrário, ao tenninar a lavoura começa a fiar o algodão, e
feito o fio encerra essa atividade para iniciar a terelagem.

483
Os cálculos se apresentariam da seguinte maneira:
Despende ele 90 10/11 libras na lavoura de algodão. Desta obt~
4 000 libras-peso de algodão. Para fiá-lo tem -de despender 81 9/ 11 libras
em maquinaria, matéria auxiliar e salários. Com isso fabrica 4 000 libras-
peso de fio. Por fim faz com o fio 4 000 jardas de tecido, o que lhe custa
dispêndio adicional de 163 7/11 libras. Somados todos os dispêndios, oca-
pital que adiantou;;:; 90 10/11 + 81 9/11 -t- 1637ít1 libras, isto é, 336 4/11
libras. Destas, 1 Oo/o seriam 33 7 /11, pois 336 4fl l : 33 7 /11 = t 00 : 1O. Mas
336 4i11 + 33 7{11 = 370 libras. Venderia portanto as 4 000 jardas não
por 400 libras, mas por 370, 30 libras mais barato, isto é, 7 1/2% mais ba-
rato que antes. Se o valor fo~e realmente de 400, poderia vender com o
lucro normal de 10% e ainda pagar uma renda (rent) de 30 libras, pois a ta-
xa de lucro seria não de 33 7/11, mas de 63 7/11 sobre adiantamentos de
336 4/11, ou seja, 18 34/37%, como acabamos de ver. E esta parece ser na
realidade a maneira como Rodbertus faz seu cálculo da renda fundiária.]
Em que consiste a ilusão? Antes de mais nada é evidente que fiação
e tecelagem, ao se fundirem, teriam segundo Rodbertus de proporcionar
renda fundiária, como a fiação e a agricultura ao se combinarem ou a agri-
cultura numa exploração indepeqdente.
Revelam-se aí dois problemas díferentes,
Primeiro, computamos as 63 7/11 libras sobre um capital de 336 4/11
libras apenas, quando temos de calculá-las sobre 3 capitais no valor global
de 636 4/ 11 libras.
Segundo, no último capital, o de III, atribuímo~lhe o dispêndio de
336 4/11 em vez de 363 7/11.
Examinemos separados esses dois pontos.
Primeiro. Se Ili, II e I sã'o uma só pessoa e fia o produto todo da co·
lheita de algodifo, não emprega ela parte alguma dessa colheita para repor
o capítal agrícola. Em vez de empregar uma parte do capital na lavoura de
algodão - nos dispêndios do cultivo de algodão, sementes, salários, maqui-
naria - e outra parte na fiação, investe fração do capital na lavoura d.e algo-
dão, depois essa fração + segunda na fiação, e em seguida a soma das 2 pri-
meiras frações ora consistentes em fio + a terceira fração, em tecelagem.
Agora que o tecido, as 4 000 jardas estio prontas, como vai repor seus ele-
mentos? Enquanto tecia, não fiava nem tinha matéria-prima para fiar, e
enquanto fiava, não cultivava algodão. Seus elementos de produção não são
portanto substitufveis.. Para facilitar, digamos: bem, o gajo vende as 4 000
jardas e então "corr..pra" fio e os elementos do algodão, com parte das 4 000
libras. Aonde nos lev:a isso? A admitir que de fato 3 capitais estão ao mesmo

484
tempo empregados e comprometidos, adiantados à produção. O fio tem de
existir para ser comprado, e é necessário que exista o algodão para ser adqui·
rido, e a fün de existirem ambos e assim poderem repor o fio tecido e o ai·
godão transfonnado em fio, é mister, empregar, junto com o capital compro·
metido em tecelagem, capitais que ao mesmo tempo se convertam em algo-
dão e fio, enquanto o fio se transforma em tecido.
Os 3 capitais têm de existir ao mesmo tempo. e assim tanto faz que
III unifique os.3 ramos de produção ou que os 3 produtores os dividam. Não
pode Ili explorar fiação e Javoura de algodão com o mesmo capital com que
explorou tecelagem, se quer produzir na mesma escala. Cada um desses ca·
pital.s está comprometido, e a reposição recíproca deles nada tem a ver com
o problema em exame. Os capitais de reposição são o capital constante que
tem de ser emprega~o e tem de operar ao mesmo tempo em cada um dos 3
ramos. Se as 400 libras encerram lucro de 63 7/11 é apena$ por tennor;
admitido que III, além do próprio lucro de 36 4/11, embolsa o lucro que
tem de pagar a II e a I, e que, segundo supomos, se realiza em sua merca40-
ria. O lucro todo não saiu das 363 7/1 J libras de III, mas o lavrador o tirou
de sua parcela de 90 10/ll libras, e a fiação de suas 181 9/l 1. Sem fica
com o lucro todo, tampouco o obteve das 363 7/I1 libras que investiu na
tecelagem, mas desse capital e dos 2 outros que empregou na fiação e na Ja.
voura de algodão.
Segundo: O que nos levou a atribuir a m dispêndio de 336 4/11, em
vez de 363 7/11, foi o seguinte:
Calculamos em 90 10/11 e não em 100 seu dispêndio em lavoura de
algodão. Mas ele precisa do produto inteiro que não é 90 10/11, mas 100.
E aí está o lucro de 9 1/1 L Ou empregaria capit.a.1 de 90 10/11 sem '/uero.
A lavoura de algodão não lhe daria lucro. Reporia somente o dispêndio de
90 10/11. Do mesmo modo, a fiação não proporcionaria lucro, e o produ-
to todo só reporia o dispêndio.
Nesse caso seu dispêndio se reduz na realidade a 90 10/11 + 81 9/Ü +
+ 163 7/11 = 336 4/11. Este seria o capital que adiantou. Desse montante
'10% seriam 33 7 /11 líbras. E o valor do produto = 370. O valor não passa-
ria disso, pois supôs-se não ter havido Jucro em 1 e II. Nessas condições te·
ria sido muito melhor para III não intervir em 1 e ll, e pennanecer no velho
método de produção. E que, em vez dos 63 7 /I l que 1, II e III tinham antes
para sugar, III agora tem apenas 33 7/11 libras, quando anteriormente, com
a particípação dos confrades, tinha 36 4/11 libras. Seria de fato um homem
de negócios incompetente. Em U teria economizado a despesa de 9 1/11 li-
bras apena_s por não ter obtido lucro em 1, e em III teria economizado a des-

485
pesa de 18 2/ 11 por não ter conseguido lucro em II. As 90 10/11 libras na
lavoura algodoeira e as 81 9/11+9010/11 na fiação teriam chegado ape~
para a própria reposição. Só o terceiro capital, empxegado na tecelagem, de
90 10/11 + Sl 9/11 + 163 7 /11 teria proporcionado lucro de 10%. Isto sig·
nificaria portanto que 100 libras na tecelagem dão 10 de lucro, e nada na
fiação e na lavoura algodoeira. Isto seria muito agradável para IU, desde que
outras pessoas e nã"o ele fJZessem o papel de I e II, mas de maneira nenhuma
se ele, para se apropriar dessa. economia de pequenos lucro~ unificasse em
suas honradas mã'os os 3 ramos de negócios. A economia de desembolso pa-
ra lucro (ou a.parte do capital constante de um, a qual é lucro de outros)
seria portanto devida a que na verdade não se conteriam lucros em I e 11,
e estes não teriam realizado trabalho excedente, mas teriam considerado a
si mesmos meros trabalhadores assalariados, só teriam reposto seus custos.
de produç6o, isto é, dispêndio em capital constante e salários. Nesses casos
portanto - a não ser que I e II quisessem trabalhar para III, e na conta d~
te entra.ria o lucro - ter-se-ia enfim trabalhado menos, e para III não impor·
taria que o trabalho que tem de pagar tivesse sido despendido apenas em sa-
lário ou em salário e lucro. Para ele nada se altera, desde que compre e pa-
gue o produto, a mercadoria.
Não tem importância alguma que o capital constan,:te seja reposto
em produto, no todo ou em parte, isto é, pelos produtores dá mercádoría
para a qual serve de capital constante. Antes de mais' nada, todo capital
constante tem no fim de ser reposto em produto, máquina por máquina,
matéria-prima por matéria-prima, matéria auxiliar por matéria auxiliar.
O capital constante também pode entrar na agricultura como. mercadoria,
isto é, ser obtido diretamente por meio de compra e'"venda. O capital cons-
tante, tratando-se de matérias orgânicas que entram na reprodução, tem na·
turalmente de ser reposto por produtos do mesmo ramo. Mas não é mister
que o substituam os produtores desse ramo individualmente considerados.
Quanto mais se desenvolve a agricultura, tanto mais todos os seus elemen-
tos nela entram como mercadoria, nâ'o só fonnal mas realmente; isto é, vêm
de fora, são produtos de outros produtores: sementes, adubos, gado, subs·
tâncias animais etc. Na indústria, por exemplo; o vaiv~m contínuo do ferro
na fábrica de máquinas e o da máquina nas minas de ferro são tão constan-
tes quanto o do trigo, do celeiro para a terra e da terra paia o celeiro do ar·
rendatário. Na agricultura estão os produtos que se repõem diretamente•.
Feno não pode substituir máquinas. Mas feno, no valor da máquina, repõe
a máquina para um e o feno para outro. desde que o valor da própria má-
quina seja reposto por ferro.

486
Não se concebe que diferença faria na taxa de lucro se o lavrador, por
exemplo, no cálculo das 90 10/11 libras que despende no produto de 100,
gastasse 20 em semestres etc., 20 em maquimuia etc. e 50 10/11 em salários.
E sobre o total que ele quer lucro de 10%. As 20 libras do produto, as quais
equipara às sementes, não incluem lucro. Não obstante, são nem mais nem
menos 20 libras como as 20 libras de maquinaria, onde se contém eventual
lucro de 10%, embora possa ser formal apenas. As 20 libras de maquinaria,
como as 20 de sementes, podem não encerrar lucro algum. Ê. o que se dá
quando aquelas 20 libras são mero substituto dos componentes do capital
constante do construtor de máquinas, componentes que ele retira, por exem·
plo, da agricultura.
O erro de afirmar que a totalidade da maquinaria entra na agricul·
tura como capital constante equivále ao de dizer que entra na manufatura
a totalidade da matéria-prima. Parte bem grande desta fica detida na agri-
cultura, é mera reprodução do capital constante. Outra parte, constituin-
do meios de subsistência, entra diretamente na renda (rev~) e parcial·
mente não passa por "processo de fabricação", como frutas, peixes, ga-
do etc. Por conseguinte, não seria correto lançar na conta da indústria
a totalidade da matéria-prima "fabricada" pela agricultura. Nos ramos
da manufatura onde a matéria-prima utilizada constitui adiantamento
junto com salários e maquinaria. o capital adiantado tem por certo de
ser maior que naqueles ramos da agricultura que fornecem a matéria-pri-
ma assim empregada. Poder-se-ia supor que, se os ramos considerados da
manufatura tivessem. ta,xa própria de lucro, t'.!1 taxa seria menor que na
agricultura, em virtude da circunstância de se empregar menos trabalho,
e assim, dada taxa igual de mais-valia, capital constante maior a capital
variável menor dão necessariamente menor taxa de lucro. Mas isso se apli-
ca também a determinados ramos da manufatura em relação a outros e a
determinados ramos da agricultura (no sentido económico) em relação
a outros. E é mais difícil de ocorrer na agricultura propriamente dita, pois,
embora forneça ela matéria-prima à indústria, nas próprias despesas con-
sidera matéria-prima, maquinaria e salários como itens diferentes sem que
a indústria de modo algum lhe pague essa matéria-prima - a parte do ca-
pital constante a qual a agricultura repõe por si mesma e não por meio de
troca com a indústria.

487
5. Suposições erradas da teoria da renda de
Rodbertus

Resumamos as suposições de Rodbertus.


Primeiro, imagina a situação em que o proprietário da terra (que sus-
.tenta a si mesmo) é ao mesmo tempo o capitalista e senhor de escravos. De-
pois surge uma dissociação. A parte "do produto do trabalho" tirada do
.trabalhador - a qual é uma renda (rent) natural - divide-se então "em ren-
da fundiária e ganho de capítal" (pp. 81, 82). (Hopkins - ver cademo20 -
explica -isso de maneira ainda mais simples e brutal.) Ródbertus então faz
"produto bruto" e _:'produto de fabricaçlo" (p. 89) repartir-se entre pro-
•prietãrio da terra e capitalista - petíção de princípio. Um capitalista fabrica
produtos brutos e·o outro produtos de fabricação. O dono da terra nada fa.
brica, nem é "dono dos produtos brutos". Este é o produto da mente de um
"fazendeiro" alemão, como o é Rodbertus. A produção capitalista na lngl.a·
terra começou ao mesmo tempo na manufatura e na agricultura.
Como surge uma "taxa de ganho de capital" (taxa de lucro), explica
Rodbertus simplesmente pela circunstância de sé obter com o dinheiro uma_
"medida" do ganho, para exprimir "a relação entre o ganho e o capital"
(p. 94), o que "estabelece um padrão de medida para cómparar os ganhos
de capital" (p. 94). Não desconfia que essa uniformidade do lucro contra-
diz a igualdade da renda com trabalho não pago em todo rarrio de produção,
e que por isso valores têm de divergir de preços mé~ios das, mercadorias.
Essa taxa de lucro torna-se também a norma na agricultura, pois "o rendi-
mento patrimonial só pode ser calculado sobre o capital" (p. 95), e de lon-
ge ·~a parte maior do capital nacional se emprega" (p. 95) na fabricação. Ne-
nhuma palavra sobre a. circunstância de a produção capítalísta xevolucionar
a agricultura tanto formal quanto materialmente, e rebaixar o proprietário
da teria a mero recipiendãrio, destituído do p_apel de funcionário da pro-
dução. Segundo Rodbertus
"na fabricação ainda se inclui no capital como material o valor da rotalf.
dade dos produtos dia agricultura, enquanto na pn;>duçio primária isso
não pode ocorrer'' (p. 95).

20 ..Trata-se do caderno XII dos extrat.os de Marx relati"os à economia política.


Na capa do caderno esere"eu Marx "Londres, julho de 1851 ". O .Auto.1" tem em mira
o trecho·de Hopkins citado neste "ºlume p, 1021. ·

488
A passagem está toda errada..
Rodbertus pergunta então se, além do lucro industrial, do lucro do ca·
pital, "sobra um segmento de renda para o produto bruto" e "quais os mo-
'.tivos" dessa sobra (p. 96).
E supõe

"que o produto bruto, como o da fabricação, se troca pelo custo em tra-


balho, e que o valor do pioduto bruto apen~, igualii a custo em traba-
lho" (p. 96).

Ricardo concorda sem dúvida com o que diz Rodbertus. Mas está erra-
do, pelo menos à ptimeira vista, uma vez que as mercadorias não se trocam
pelos valores, mas pelos preços médios deles díferentes, e esse fato decorre
de o valor das mercadorías ser determinado pelo "tempo de trabalho", des-
·sa lei de aparência contraditória. Se o produto bruto, além do lucro médio,
contém uma renda fundiária dele diversa, isto só será possível se o produto
bruto não se vender ao preço médio, e ter-se-á de explicar porque. Mas veja-
mos como procede Rodbertus.

"Admiti que a renda" (rent) (a mais-valia, o tempo de trabalho não pago)


"se reparte na proparçãa do valor da produto bruto e da ptoduto de fa-
bricaç6o, e que esse valor é detennínado pelo custo em trabalho" (tempo
de trabalho) (pp. 96, 97).

De inicio cabe exaffiinar a primeira suposição. Em outras palavras, ele


quer dizer que os valores excedentei21 encerrados nas mercadorias guardam
entre sí as mesmas proporções existentes entre os valores, ou que o trabalho
não pago contido n~ mercadorias mantém a mesma proporcionalidade com
as quantidades de trabalho que elas em geral contem. Se as quantidades de
trabalho contidas nas mercadorias A e B guardam a relação de 3 : l, o traba-
lho não pago delas ou os valores excedentes guardam a mesma relação 3 : 1.
Nada pode ser mais errado. Dado o tempo de trabalho necessário, 10 horas.
por exemplo, pode uma mercadoria ser o produto de 30 trabalhadores, e a
outra. de 10. Se os 30 operários só trabalharem 12 horas, a mais-valia por
eles gerada será de 60 horas= 5 jornadas (5 X 12), e se os 10 trabalharem
16 horas por dia, a ma.ís-valia por eles criada será também de 60 horas. Por
isso, o valor da mercadoria A será de 30 X 12 .:::: 120 X 3 = 360 = 30 jorna-
das de trabalho (12 horas= 1 jornada), e o valor da. mercadoria B = 160 hó-

2l. Valcues excedentes= mais-valias.

489
ras de trabalho = 13 l /3 jornadas. As mais-valias encerradas nas mercadorias
estão na razão de 60 : 60 = 1 l. São iguais, embora os valores guardem a
razão de 3: 1 1/3.
A razão entie as ma~-valias das mercadorias não é a mesma existente
entre os valores delas, sobretudo quando são diferentes as mais-valias abso-
lutas, o prolongamento do tempo de t1abalho além do trabalho necessário,
isto é, as taxas de ~valia.
Segundo, se as taxas de mais-valia forem as mesmas, as mais-valias,
omitindo-se outras circunstâncias relacionadas com a circulação e com o
processo de reprodução, não dependem das quantidades relativas de traba-
lho encenadas em duas mercadorias, mas da relação entre a.parte do capital
despendida em salários e a despendida em capital constante, matérias-primas:
e maquinaria, e essa relação pode variar muito em mercadorias de valores
iguais, sejam essas mercadorias "produtos da agricultura" ou "produtos de-
fabricaçio", o que nada tem a ver com o problema, pelo menos à primeira
vista.
E portanto absolutamente errada a primeira suposição de Rodbertus
de que, se os valores das mercadorias são determinados por tempo de trabll-
lho, resulta que as quantidades de trabalho não pago encenadas nas diferen-.
tes mercadorias - ou suas mais-valias - esttío na razão direta dos valores.
Por conseguinte também é falso que

"a renda (rent) se 1eparte na 1azão do valor do p1óduto bruto e do p1odu-


to de fabricação'\ se "esse valor é dete.tminado pelo cus.to em trabalho"
(pp. 96, 97). .
"Aí está por certo implícito que a mag!ÚtUde dessas porções de renda
(rcnt) não é detenninada pela magnitude do capital,sobre que se calcula o
ganho, mas pelo trabalho direto, seja agrícola ou de fab1icação +o traba-
lho a acrescentar em virtude do desgaste dos instrumentos e das máqui-
nas" (p, 97).

Novo erro. A magnitude da mais-valia (e a mais-valia aqui é a renda


(rentJ, pois se considera renda o termo geral, distinto de lucro e renda fun-
diária) só depende do trabalho dú:eto e não do desgàste do capital fixo, nem
do valor da matéria-prima, nem de parte alguma do capital constante.
Esse desgaste determina sem dúvida a proporção em que o capital fi.
xo tem de ser reproduzido. (A pxodução deste depende ao mesmo tempo
da formação de novo capital, da acumulação de capital.) Mas o trabalho ex·
cedente realizado na produç[o do capital fixo não influi na esfera de produ-
ção em que esse capital fixo entra como tal, o que também vale, por exem-
plo, para o trabalho excedente que en.tra na produção de matéria-ptima. An-

490-
tes, em todos os setores, agricultura, fabricação de máqtúnas e manufatura,
por igual vigora que a mais·valia só é determinada pela massa de trabalho
empregada, uma vez dada a taxa de mais-valia, e pela taxa de mais.valia,
uma vez dada a massa de trabalho empregada. Rodbertus procura "promo-
ver o ingresso" do desgaste para expulsar a "matéria~prima".

Entretanto, Rodbertus pensa que "do capital o segmento consistente


no valor material" nunca pode influenciar a ~gnitude da renda {rent};
pois, "por exemplo, o custo em trabalho da lã no nível de produto bruto
não pode contribuir para detenninax o custo em trabalho do produto par·
tícular, o fio ou o tecido" (p. 97). ·

O tempo de trabalho requerido para fiar e tecer depende tanto ou an·


tes tão pouco do tempo de trabalho - do valor - da máquina, quanto do
tempo de trabalho que custa a matéria~prima. Ambas, máquina e matéria·
prima entram no processo de trabalho; nenhuma delas, no processo de criar
maiHalía.

Entretanto, o valor do produto primário ou o valor material figUra como


dispêndio de capr"tal no montante de capital sobre que o dono tem de cal·
cular como g'allbo, a porção de renda que cabe ao produto de fabricação .
.Mas erre segmento do Cllpftal falta no capital agrícola. A agricultura não
precisa de material que seja produto de produção antecedente, mas tem
a primazia de iniciar a produção, e nela a parte do patrimônío análoga ao
material seda a própria terra, que se supõe gratuita" (pp. 97, 98).

Esta é a idéia do camponês alemão. Na agricultura (dela ainda niio se


exclui a pecuária; excluem-se mineração, caça, pesca) sementes, forragens,
gado, adubôs minerais etc. constituem o material para fabricação, e esse
material é produto do trabalho. Esses "dispêndios" aumentam à medi-
da que se desenvolve a agricultura industrial Toda produção - desde
que não se trate de mera captura ou apropriação - é reprodução e por ísso
requer "material que seja produto de produção precedente". Na produ-
ção tudo o que é resultado é também precondição. E a agricultura, quan·
to mais se desenvolve em grande escala, tanto mais compra produtos "de
produção precedente" e vende os próprios. Essas despesas entram na agri-
cultura na forma de mercadória - convertidas em mercadorià pôr serem
computadas em dinheiro - logo que o agricultor se torná de todo de.pen·
dente da venda de seu produto e se tenham fJXado 'os preços dos diver-
sos produtos agrícolas (como feno, por exemplo), pois a divisão das esferas
de produção se instala também na agricultura. Teria de haver algo estranho
na mente do camponês que computasse como "receita" o quarter de trigo

491
q_ue vende e não computasse como ''despesa" o quarter empregado na se-
meadura. Aliás, seria bom Rodbertus "iniciar" àlgures a "produção", por
exemplo, de linho ou seda, sem "produto de produção precedente". Isso é
puro disparate.
E em conseqüência também o são as demais conclusões de Rodbertus:

"Por conseguinte, são de fato comuns à agricultura e à fabricação os dois


segmentos do capital que influenciam a magnitude das porções da renda
(Terit). Mas não o segmento que não tem essa influência - sobre ele m
tretanto, também se calcula na qualidade de ganho, a renda (rent) deter-
mi~a por aqueles dois segmentos do capital - e só se eneontra no capi-
tal de fabricação. Se, de acordo com a suposição, o valor do produto bru·
to, como o do produto fabricado, depende do custo em trabalho, e uma
vez que a renda se reparte na proporção desse valor pelos donos do pro-
duto bruto e do pzoduto fabzicado, se por isso as porçõet dá renda obti·
das na produção primária e na fabricação são proporcionais ds quantida·
des de trabalho que o respectivo produto custou, ao rev~s. os capitais em·
pregados na agricultura e na índllstria peloa quah as porções da renda co·
mo ganho se repartem - na fabricação por completo, na agrieultura de
acordo com a taxa de ganho estabelecida na primeira - não se mantêm na
mesma proporção como aquelas quantidades de habalho e as porções da
renda por elas "determinadas. Ou melhor, dada igual magnitude das por·
çôe;r da renda pertinentei à matét'ia·prima e II{) produto fabricadQ, o capi-
tal de fabricação ultrapassa, pelo inteiro valor material que contém, o ca-
pital agríeola; uma vez que esse valo1 matezial aumenta o capital.de fabri-
cação !!Obre que se calcula a porção de renda obtida como ganho, manião
esse mesmo ganho, e portanto ainda serve para rebaixar .a taxa de ganho
do capital em vigor também na agricultura, tem necessaÍíamente de so-
brar, da p01ção de renda obtida na agricultura, parte que ~o é absorvida
pelo cálculo do ganho segundo essa taxa" (pp. 98, 99).

Primeira suposição falsa: Os produtos industriais e os agrícolas, se se


trocam pelos respectivos valores (isto é, na proporção do tempo de trabalho
requerido para a produção), proporcionam aos donos quantidades iguais de
mais-vali.a ou de trabalho n:ío pago. As mais-valías não são proporcionaís aos
valores.
Fal&i a segunda suposição: Uma vez que Rodbertus já dá por existente
a taxa de lucro. (o que chama de taxa de ganho do capital), é falsa a suposi-
ção de as mercadorias se trocarem na proporção dos valores. Uma suposição
exclui a outra. Os valores das mercadorias já têm de estar transformados em
preços médios ou estar no fluxo constante dessa transformação, para existir
wna taxa (geral) de lucro. Igualam-se nessa taxa geral as taxas de lucro parti-
culares que se fonnam em toda esfera de produç!ro pela razão entre mais-va-
lia e capital adi4ntado. E por que não na agricultura? Esta é a questão. Mas
Rodbertus nem sequer a formula com acerto, pois supõe primeiro que existe

492
uma taxa geral de lucro e segundo que niio se nivelam as taxas de lucro parti-
ctllares (e em conseqüência também suas diferenças) e assim as mercadoáas
se trocam por seus valores.
Falsa a terceira suposição: O valor dtJ matéria-prima níio entra na agri-
cultu1tl. Nela os adiantamentos de sementes etc. são, pelo contrário, compo-
nentes do capital constante e como tais são computados pelo agricultor. A
agricultura se toma mero ramo industrial - a produção capitalista se instala
no campo -, a agricultura passa a produzir para o mercado, passa a produ-
zir mercadorias, artigos para venda e não para o próprio consumo, e na mes-
ma medida em que isso ocorre computa ela suas despesas e considera cada
item delas mercadoria, compre-o de si mesma (isto é, dtJ produçãn) ou de
terceiros. Na mesma extensão dos produtos, os elementos dtJ produção natu·
ralmente também ~ tomam mercadorias, visto que esses elementos são eles
mesmos produtos. Uma vez que trigo, ferro, gado, sementes de toda espécie
etc: são vendidos como mercadoria - e na verdade o essencial é essa venda
e não a subsistência por meio deles - entram eles na produção como merca-
dorio,s, e o agricultor teria de ser verdadeiro mentecapto se fosse incapaz de
utilizàr o dinheiro como moeda de conta. TodaVia, isto é antes de tudo o as-
pecto fonnal do cálculo. Mas, no mesmo ritmo desenvolve-se este processo:
o agricultor compra suas despeYlls, sementes, gado, adubos, substâncias mi·
nerais etc., enquanto vende suas receitas, e desse modo aqueles adiantamen-
tos constituem para o agricultor individual também adiantamentos no senti-
do formal de serem mercadorias compradíl.s. (Para ele são sempre mercado-
rias componentes de seu capital constante. E na qualidade de produtor con-
sidera-as vendidas a si mesmo, ao restituí-las fisicamente à produção.) E é o
que sucede à medida que a agricultura se desenvolve e o produto final se
obtém cada vez mais -pelos métodos vígentes na índústria e de acordo com o
modo de produção capitalista.
E falso portanto que, do capital, entre na indústria uma parte que
niio entraria na agricultura.
Assim, se de acordo com a suposição errada de Rodbertus as porções
de renda (isto é, as cotas-partes de mais-".alia) correspondentes ao produto
agrícola e ao produto fabricado são dadas, são proporcionais aos valores
do produto agrícola e do fabricado; noutras palavras, se produtos agríco-
las e produtos industriais de valores iguais proporcionam aos respectivos
donos mais-valia da mesma grandeza, isto é,'contêm quantidades iguais de
trabalho não pago, não surge desproporção alguma por entrar na indústria
uma parte do capital (relativa à matéria-prima) a qual não entraria na agrí·
cultura, de. modo que, por exemplo, a mesma mais-valia na indústria seria

493
reduzida em relação a um capital acrescido por aquele componente. E que
esse mesmo item do capital entra na agricultura. Só resta a pergunta, se na.
mesma proporçáb. Mas ai recaímos em mems dife1enças quantitativas, en-
quanto Rodbertus tem em·miJ:a uma diferença "qualitativa". Aquelas dz'fe-
renças quantitativas aparecem nós diversos ramos de produção industriais.
Nivelam-se na taxa geral de lucro. E por que não se nivelam entre a indústria
e a agricultura (se tais diferenças existem)? Uma vez que Rodbertus faz a
agricultura participar da taxa geral de lucro, por que não a faz participar de
sua formação? Mas naturalmente não daria para tanto o seu latim.
Falsa a quarta suposição: Rodbertus faz suposição errada e arbitrária,
ao incluir o desgaste da maquinaria etc., essa parte do capital constante, no
capital variável, isto é, na parte do capital criadora de mais-valia e que espe-
cialmente determina a taxa de mais-valia, e ao excluir a matéria-prima do ca-
pital agrícola. Comete esse erro de conta para chegar ao resultado que de
início desejava atingir.
Falsa a quinta suposição: Se Rodbertus quer distinguir entre agricultu-
ra e indústria, então do capital o elemento consistente em maquinaria, ins-
trumentos, capital fixo, pertence por inteiro à indústria. Esse elemento do
capital, ao fazer parte de um capit.àl, entra sempre no capital constante e em
nada pode aumentar a mais-valià. Além disso, como produto da indústria re-
sulta de determinada esfera de produção. Seu preço, ou à; porção de valor
que forma na totalidade do capital da sociedade, representa .portanto ao
mesmo tempo determinada quantidade de mais-valia (como é o.caso da ma-
téria-prima). Entra então no produto agrícola, mas procede da mdústria. Se
Rbdbertus considera a matéria-prima na indústila parte ,do capital vinda de
fora, terá de computar na agricultura máquinas, instrumentos, recipientes,
construções etc. como a parte do capital oriunda de fora. E assim terá de
dizer que na indústria só entram salário e matéria-prima (pois o capital fixo,
não sendo matéria-prima, é produto da indústria, próprio dela), e na agricul-
tura, ao contrário, só entram salário e maquinaria etc., capital ftxo, pois a
matéria-prima, desde que não se incorpore em instrumentos etc., é produto·
·da agricultura. Importaria então examinar como ficaria a conta com a ausên-
cia daquele "item" na indústria.

Sexta suposição: E veniade que na mineração, pesca, caça, corte de


madeira (no caso de floresta natural) etc., em suma na indrí.stria extrativa
(produção extrativa de matéria-prima que não é reproduzida fisicamente)
não entra matéria-prima, excetuadas as matérias auxiliares. Isto não se aplica
à ~icultura.

494
Mas não menos verdadeiro é que o me9m0 sucede a segmento bem
grande da indústrúl, a indústria de transporte. Nela as despesas consistem
wmente em maquinaria, matérias auxiliares e salário.
Por fün, é certo que noutros ramos da indústria, dentro de certa rela-
tividade, só entram matéria-prima e salário, excluídos maquínaria, capital
fixo etc., como na alfaiataria etc.
Em todos esses casos, a magnitude do lucro, isto é, a razão entre a
mais-valia e o capital adiantado, não dependeria de consistir o capital adian-
tado - depois de se deduzir o capital variável ou a parte do capital aplicada
em salário - em maquinaria ou matéria-prima ou em ambos, mas da grande-
za do capital em relação à parte do capital adiantado despendida em salário.
Nas diferentes esferas de produção existiriam assim (fora as modificações
provocadas pela circulação), diversas taxas de lucro, cujo nivelamento cons-
titui precisamente a taxa geral de lucro.
O que Rodbertus vislumbra é a diferença entre a mais-valia e suas for.
mas especiais, sobretudo o lucro. Mas erra o alvo por começar tratando de
interpretar um fenômeno particular (a renda fundiária) e não de descobrir
a lei geral.
Dá--se reprodução em todos os ramos de produção; só na agricultura
porém sincronizam-se essa reprodução industrial e a reprodução natural.
Isso não ocorre na irulústrúl extrativa. E por isso que nesta o produto não se
torna, na forma natural, elemento da próprta reprodução (exceto na forma
de matéria auxiliar).
O que distingue a agricultura, pecuária etc. das outras indústrias niio é
primeiro a circunstância de um produto tornar-se meio de produção, pois
isso ocorre com todos os produtos industriaís que não possuem a forma defi-
nitiva de meios de subSistência individuais, e mesmo nesta qualidade eles se
tornam meios de produção do produtor que reproduz a sí mesmo ou man-
tém sua força de trabalho, consumindo-os; nem segundo a circunstância de
entrarem na produção como mercadoria, isto é, como componentes do ca-
pital; entram na produção como dela saem; dela provêm como mercadoria
e nela entram como mercadoria; a mercadoria é a precondição e ao mesmo
tempo o resultado da produção capitalista; terceiro, resta asmm apenas o fa-
to de entrarem no processo de pmdução, do qual são os produtos, como
seus próprios meios de produção. Isso também sucede com a maquinaria.
Máquina constrói máquina. Carvão serve para tirar o carvão da mína, para
transportar carvão etc. Isso aparece na agricultura como processo natutal
que o homem dirige, embora o gere "até certo ponto"; nas outras indústrias
aparece como efeito direto da indústria.

495
Mas, se Rodbertus pensa por isso não poderem os produtos agr(colas
entrar na reprodução como "mercadoria", em virtude da forma peculiar em
que nela entram como «valores de uso" (tecnologicamente), está ele por
completo errado e baseia-se; está claro, na reminiscência dos tempos em que
a agricultura ainda não era negócio, e só a sobra de seu produto acima do
consumo do produtor se tornava mercadoria, e esses produtos, uma vez que
entrassem na produção, não configuravam mercadorias. Esta é uma incom-
preensão fundamenta1 a respeito da aplicação do modo capitalista de produ-
ção na indústria. Para esse, todo produto que tem valor - e por isso é em si
mer'cadoria - é também mercadoria no domínio das contas.

6. Rodbertus não compreende a relação entre


preço médio e valor na indústria e na
agricultura. A lei do preço médio •

Na indústria de mineração, por exemplo, seja de 500 libras o capital


constante consistente apenas em maquinaria, e também de 500 libras o ca-
pital empregado em salários. Então, se a mais-valia é de 40% = 200 libras, o
lucro será de 20%. Assim:

Capital constante Capital variável Mais.-val~


Maquinaria
500 500 ,,
200

Nos ramos manufatureiros (ou também nos agrícolas) onde entra ma-
téria-prima, se for gasto o mesmo capital variável cujo emprego (isto é, a
ocupação de número determinado de trabalhadores) exija maquinaria etc.
no montante de 500 libras, é mister na realidade agregar terceiro elerp.ento,
o valor da matéria-prima, no mesmo montante de SOO libras, digamos. Nes·
se caso temos:

Capital constante Capifl11 variável' Mais-valia


Maquinári.a Matéria-prima
soo + 500 = l 000 ''' soo 200
: i

E-sses 200 teiiam de ser então calculados sobre 1 500, o que só daria
13 1/3%. Esse exemplo continuaria válido se o do primeiro caso fosse a

4'96
fudústria de transporte. Em compensação no segundo, a taxa de lucro
ficaria a mesma se à maquinaria correspondessem 100 e à matéria-prima 400.
Rodbertus imagina portanto que, para o dispêndio de 100 em salá-
rio + 100 em maquinaria na agricultura, temos na indústria o dispêndio de
100 para maquinaria, 100 para salário e X para matéria-prima. O esquema
seria este:

1. Agricultura

Capital constante Capital varidvel Mais va!Ui Taxa de lucro


Maquinaria
100 100 50 50/200 = 1/4

II. Indústria

Capital constante Capital variável Mais-valia Taxa de lucro


Matéria-prima Maquinaria 50
X 100 100 50 200+ X

de qualquer modo, portanto, menor que 1/4. Daí a renda fundiária de 1.


Primeiro, essa diferença entre agricultura e manufatura é imaginária,
inexistente; portanto, sem influência alguma nessa forma de renda fundiá-
ria que detennina todas as demaís.
Segundo, Rodbertus poderia encontrar essa diferença entre as taxas
de lucro em dois ramos particulares quaisquer da indústria, diferença que
depende da relação- entre a magnitude do capital constante e a do variável,
relação que por sua vez' ainda pode ser ou não deternrinada pelo acréscimo
de matéria-prima. Nos ramos industriais onde, além de maquinaria, entra ma-
téria-prima, o valor desta, isto é, a magnitude relativa que tem na-totalidade
do capital, é sem dúvida muito importante, conforme já mostreí 22 • Isto nada
tem a ver com a renda fundiária. ·

"Só quando o valor da matéria-prima cai abaixo do custo em trabalhei é


possível que também na agricultura o segmento inteiro da renda relativo à
mat;Ma-prima seja abwrvido pelo ganho calculado sobre !J ctzpital, pois

22. Ver no vot 3 desta traduçi__o, cap. XX, 7, e):

497
ent.ão é possível que tal segmento seja tão zedu.zido que, por issó, ·entre
ele e o capital agrícola, embora falte aí o valor da matéria~prima, se pxo·
duza proporção igual à verificada entre o segmento da renda 1elativo ao
pxoduto fabricado e o capital de fabricação, apesar de neste se contei
valo1 da matéria-prima; só nessas circunstâncias, portanto, é possível
que também na agricultuill nio reste renda fundiária alguma além do
ganho de capital. Enquanto, na prática pelo menos, a gravitação de acor-
do com a lei de ser o valor igual ao custo em trabalho constitui a iegra,
a tenda fundiária CQnstituí também a 1egra, e nao couesponde ao esta-
do original das coisas, como quer Ricardo, mas a ~ anomalia, a de
não sobrar renda fundiária e havei apenas ganho de capital (p. 100).

Continuemos. E a mesma ilustração, para ficarmos no exemplo ante·


rior; fazemos a matéria-prima = 100 libras, para ter algo tangível (vide qua-
dro p.499).
Aí a taxa de lucro na agricultura seria a mesma da indústria, nada so-
braria então para a renda fundiária, por se vender o produto agrícola abaixo
do valor em 16 2/3 libras. Mesmo que o exemplo, falso para a agricultuTa,
fosse para ela considerado correto, a circunstância de o valor da matéria-pri-
ma cair "abaixo do custo em trabalho" só corresponderia à lei dos·preços
mêàiós. -Cabe antes explicar por que excepcionalmente atê certo pontq não
·se dá isso na agricultura e por que aí a mais-valia global (ou pelo menos mais
que nos outros ramos industriais um excesso sobre a taxa de lucro médio)
fica no preço do produto em vez de entrar na formação da taxa .geral de lu·
cro. Vê-se aí que Rodbertus não sabe o que é taxa. (geral) de .lucro é preço
médío.
Para elucidar essa lei, o que importa muito mais que Rodbertus, apre-
sentaremos 5 exemplos. Suporemos ser sempre a mesma a taxa de mais-valia.
Não é absolutamente necessário comparar mercadorias de valor igupl;
basta compará-las pelo valor respectivo. Para simplificar, confrontaremos
mercadorias produzidas por capital de igual magnitude (vide qu~dro p. 499).
Temos nas categorias I, II, III, IV e V (cinco esferas diferentes de pro·
dução) mercadorias cujos valores são 1 100, 1 200, 1 300, 1 150 e 1 250.
Estes seriam os preÇos em dinheiro pox que eJas se trocariam se fossem tro-
cadas pelos valores. Em todos os casos o capital adiantado tem a mesma
magnitude = 1 000 libras. Se essas mercadorias fossem vendidas pelos valo-
res, a taxa de lucro seria em 1 de 10%, em II o dobro, 20%, em III 30% em
.IV 15%, em V 25%. Se somarmos essas taxas particulares de lucro, teremos
10% + 20% + 30% + 15% + 25%, isto é, 100%.

498
1. Agricultura

Capital oonstan'* Capital variável Mais-11atia Valor Preço Luci:o


Maquinariá
100 100 50 lSO 233 1/3 33 1/3=16 2/3%

U.IndlÍstria

Capital coutante Capitltl 11ariável Mau-valia Valor Preço Lua:o


Matérla·prima Ilbquinaria
100 100 50 350 350 so =16 2/3%

...
'
i Capi(llll Capital 1
:' conseante 'IUiável:
. M . alia Tau de TllXll de Valor do
a.IS-V • fMis.yalia Lucro lucro Produto
Maqui· Matéiia· Salário
naria prima
~·· - '

J 100 700 200 100 50% 100 10% 1 100


n soo 100 400 200 50% 200 20% 1 200
III 50 350 600 300 50% 300 30% 1 300
inexis-
IV 700 '' tente 300 150 50% 150 15% l 150
i
V inex. 500 500 250 50% 250 25% 1 250

1 ..... i i i

Se considerarmos a totalidade do capital adiantado em todas as S esfe·


ras de produção, uma porção (1) dá 10%, outra (II) 20% etc. A média cor·
respondente ao capital todo é igual à média das 5 porções, isto é,

499
100 (soma das taxas de lucro)
5 (número das várias taxas de lucro)
o que dá 20%.
Na realidade verificarr1os que-os 5 000 de capital adiantado nas 5 esfe.
ras dão lucro de 100 + 200 + 300 + 150 + 250 = 1 000. Assim 1 000 sobre
5 000 = 1/5 = 20%. Do mesmo modo, se calculamos o val.or do produto to-
tal, temos 6 000, e o que ultrapassa os 5 000 de capital adiantado é igual a
1 000, a 20%do capital adiantado, ou seja, 1/6 ou 16 2/3% do produto todo.
(Novo cálculo aí). Mas, a fim de que cada um dos capitais adiantados I, II,
III etc. - ou, o que dá no mesmo, capitais de iguo,l magn.itude ou capitais
na proporção apenas de sua magnitude, isto é, na mera proporção em que
representam cotas .do capital adiantado gwbal, participem na mais-valia cor-
respondente à totalidade do capital, só pode cada um deles obter lucro de
20%, e esses 20%.têm de caber a cada um. Para possibilitar isso, os produ-
tos de diferentes esferas têm de ser vend.Jdos ora acima, ora mais ou menos
abaixo do valor. Ou a totalidade da mais-valia tem de se distribuir por eles
não na proporção em que é gerada nas esferas particulares de produçao, mas
na proporção da magnitude dos capitais adiantados. Todos têm de vender
seu prod:uto por l 200 libras, de modo que o excesso do valor do produto
acíma do capital a_diantado seja 1/5 =. 20%.
Com esse rat~io temos (ver quadro na pág. 501 ):
Observamos que só num caso (II) o preço médio = valor da mercado-
ria, pois por casualidade a mais-valia aí é igual ao lucro médio:normal de
200. Nos demais casos quantidade maior ou menoz de mais-vália é tirada
de uma esfera e dada a outra etc.
Se Rodbertus tem alguma coisa a provar é a razão por que na agri-
cultura isso nlio pode ocorrer e por que nela a mercadoria deve ser vendi-
da pelo valor e não pelo preço médio.
A concorrêncfa faz que os lucros se igualem, isto é, que os valores
das mercadorias se reduzam a preços médios. O capitalista individual, con-
forme diz Malthus, espera igual lucro de cada porção de seu capital13 , o que,
noutras palavras significa, apenas que considera - e assim lhe parece - cada
porção do capital (pOf1dO de lado sua função orghnica) fonte autônoma de

23. Ver O Capital, DIFEL, livro 3, vol. 4, p. 39, e voL 4 desta uadução, cap. XIX,
seção_9.

500
lucro. Do mesmo módo cada capitalista, em ~ce da classe dos capitalistas,
vê em seu capital fonte de lucro da mesma magnitude do proveniente de
qualquer outro capital de grandeza igual; isto é, todo capital numa esferá
particular de produção é considerado parte do capital todo adiantado para a
totalidade da produção, e exige participação mi mais-valia global, no total
do trabalho não pago ou dos produtos -do trabalho - na proporção de sua
magnitude, de sua cota - na proporção da parte alíquota que representa
da totalídade do capital. Essa aparência convence o capitalista - para quem
tudo aparece. invertido na concorrência -- e ainda alguns de seus mais devo-
tados fariseus e escribas a que o capital é uma fonte de renda, indepen-
dente do trabalho, pois na realidade o lucro do capital em cada esfera par·
ticular de produção não é de modo algum determinado apenas pela quanti-
dade de trabalho não pago que o próprio capital "produz" e lança no fundo
global dos lucros, donde os capitalistas individuais retiram porções propor-
cionais a sua participação na totalidade do capital.
Evidenciam-se assim os disparates de Rodbertus. De passagem obser-
var ainda que em alguns ramos da agricultura, como na pecuária autônoma,
o capital variável, isto é, aplicado em salário,- é muito reduzido, comparado
com a parte constante do capital.
"Por natureza, o arrendamento pago é sempre renda fum;[ídrla" (p. 113).
Errado. O arrendamento é sempre pago ao dono da terra; eis tudo.
Mas se é, como ororre muitas vezes na prática, em parle ou no todo dedu-
ção do lucro normal ou dedução do salário normal (a mais-valia real, lu-
cro + renda, nunca se deduz do salário, mas daquela parte do produto do
trabalhador a qual resta desse produto após a retirada ,do salário), não é,
sob o aspeeto econômico, renda fundiária, o que na prátiea logo se demons-
tra quando as condições da eoncorrência estabelecem o salário nonnal e o
lucro normal.
Para haver os preços médios a que a eoncorrência procura eonverter
os valores dás mercadorias, ocorre assim - excetuado II no quadro aeima -
éonstante acréscimo de valor do produto de uma esfera de produção e de-
créscimo de valor do produto de outra, a fim de se estabelecer a taxa geral
de lucro. Para as mercadorias da esfera particular de produção onde a rela-
ção do capital variável com o total do capital adiantado (suposta dada e
igual a taxa de trabalho excedente) eorresponde à relação média pertinente
ao capital soeial, o valor é igual ao ?reço médio, e não há acréscimo nem de-
créscimo de- valor. :Mas, se em derermínadas esferas de produção, em virtude
o
de eírcunstâncias especiais que não cabe expor aqui, valor das mereadorlas,
~mbora acima do preço médio, em caráter não transitório e em média não

502
sofre decréscimo, essa captura da mais-yalia inteira numa esfera particular
de produção - apesar de sustentar o valor da mercadoria acima do preço
médio e em conseqüência proporcionar taxa de lucro superior à média - de-
ve ser co~idera4a um prívilégío dessa esfera de'produção. Cabe aqui tratar
como pecÍdiariilo.de, exceção e explicar nãO a circunstância de seu preço
médio ficar abaixo do valor - fenômeno de ordem geral e condição neces-
sária do nivelamento - e sim a razão por que são vendidas justamente pelo
valor acima do peço médio, em contraste com as outras mercadorias.
O preço médio de uma mercadoria é igual a seu custo de produção
(o capital nela adiantado, seja em salário, matéria-prima, maquinaria e o que
mais for)+ lucro médío. Por conseguinte, se o lucro médío, como no caso
acima, for de 20% = 1/5, o preço médio de toda mercadoria= C (o capital
adiantado)+ L/C (a taxa média de lucro). Se C + L/C for igual ao valor des-
sa mercadoria, isto é, a mais-valia produzida nessa esfera de produção for
igual a L, o valor da mercadoria será igual a seu preço médio. Se C + L1C for
menor que o valor da mercadoria, isto é, a mais-valia gerada nesse ramo for
maior que L, o va1or da mercadoria será rebaixado a seu preço médio e par-
te de sua mais-valia acrescerá o valor de outras mercadorias. Por fim, se
C + L/C for maior que o valor da mercadoria, e portanto .M < L, o valor da
mercadoria é alteado a seu preço médio e é-Jhe acrescida mais-valia gerada
em outras esferas de produção.
Finalmente, se ·houver mercadorias que se vendem pelo valor, embora
seu valor > C + L/C, ou eujo valor não é rebaixado a ponto de nivelar-se ao
preço médio nonnal C + L/C, devem atuar circunstâncias que assegurem a
essas mercadorias uma posição excepcional. Nesse caso o lucro realizado
nessas esferas de produção está acima da taxa geral. Se o capitalista aí obtém
a taxa geral de lucro, o senhor da terra pode receber o 1uero excedente na
forma de renda fundiária.

7. Falsa a concepção de Rodbertus sobre os


fatores que determinam a taxa de lucro e
a taxa da renda fundiária

O que chamo de taxa de lucro e taxa de juro ou taxa da renda fundíá-


ria é para Rodbertus

"m'vel do ganho do capital e dos juros" (p. 113 ).


"Resulm da proporção deles com o capital... Em toda.!; as nações civiliza-

503
das aceita-se um capital de 100 eomo unidade, a medida padrão do nível
a calcul.a1. Assim, quanto maior a proporção do ganho ou do lucro eom o
e.apitai de 100, em outras pala"<'ras, quanto 'maior a percentagem' que um·
capital rende, tanto maiores serio gànho e juros" (pp. 113, 114 ).
"O nível da renda fundiária e do arrettdamento depende da proporção de-
les com determinadi álea~· (p. 114).

Infeliz idéia. Antes de mais nada, a taxa da renda fundiária deve ser
calculada sobre o capital, portanto como o excedente do preço de uma mer-
cadoria acima do preço dos custos de produção e da parte do preço constitu-
tiva do lucro. Rodbertus calcula por acre ou jeira, o que suprime o nexo cau-
sal, e prende-se à forma aparente da coisa, por lhe explicar éla certos fenô·
menos. A renda fundiária que um acre proporciona é o que se paga de arren·
<lamento (rental); o montante absoluto de renda. Poderá crescer se a taxa de
renda ficar a mesma ou até se baixar.
"O nfvel do valor da terra resulta da capitalização da renda fundiária de
determinado terreno. Quanto maior o montante de capital obtido pela ca-
pi talizaçã'o da 1enda fundiw de um terreno de dada área, tanto mais alto
é o valor do solo" (p. 114).

O emprego aí da palavra "nível" é disparate. Pois expressa relação


com quê'! E óbvio que a capitaliza.Ção com taxa de juro de 10% dá mais do
que com 20%; mas aí há a unidade de medida 100. A inteira expressão "ní-
vel do valor da terra" enuncia mera generalidade como nível alto ou baixo
dos preços das mercadorias em geral.
Rodbertus passa então a investigar:

"Que ê que derennina o n (vel do ganho do capital .e da renda fundióría?


(p. 115).

a) Primeira tese de Rodbertus

De início estuda: que determina o "nfvel da renda (rent) em geral",


isto é, que é que regula a taxa da mniNalia?

"[) Em dado valo.t do produto ou no p[oduto de dada quantidade de tra-


balho ou, o que também resulta no mesmo, em dado produto nacional, o
nível da renda (rent) em geral est.á na razão inversa do nível do salárto e
na direta do nível da ptodutividade do trabalho. Quanto mais baixo o sa-
lário, mais alta a [enda (rent); quanto mais alta a produtividade do traba-
lho em geral, tanto mais baixo o salário e tanto mais alta a renda" (pp.
115, 116).

504
"O nível" da renda {rent} - a taJCa da mais-valia -, diz Rodbe1tus, depen·
de da "magnitude dessa parte que sobra para a .renda (rent)" (p. 117),
isto é, depois de se deduzir o salário do produto total, e aC "pode-se omi-
tir aquela porção do produto destinada a repor capita!"••. (p. 117 ).

Boa idéia (refiro.me à ídéia de "omitir" a parte constante do capital


nesse exame da mais-valia).
Segue modo de ver algo estranho:

"Quando os salários caem, isto é, passam a constítuir cota menor do valor


total do produto, o capital todo sobre que cabe calcular como ganho a
outra parte da renda (isto é, o lucro industrial) torna-se menor. Mas, só a
proporção entre o valor que se torna ganho de capital ou renda fundiária,
e o capital ou área da terra sobre que deve ser calculado esse valor é que
determina o 11tvel de ambos. Se o.. salário portanto deixa sobrar valor
maior para a renda {rent), haverá maior valor na qualidade de ganho e
renda fundiária para calcular sobre o capital ainda reduzido e sobre igual
área de terra. A proporção de ambos daíresultante toma-se maior, e
assim os dois juntos ou a renda em geral se elevam... Supõe-se aí que o va-
lor do produto nlro se altera ... Por se tornar menor o salário que o traba-
lho curta, não se toma menor o trabalho que o prôduto custa" (pp. 117,
118).

O final está bom. Mas é falso que, se diminuir o capital variável, o apli·
cado em salário, tem de decrescer o capital constante; em outras palavras,
não é verdade que a taxa de lucro (excluímos por eompleto a referência ína-
dequada à área de terra etc.) tenha de subir porque se eleva a taxa de mais·
valia. O salário cai, por exemplo, porque o traballio se torna mais produtivo,
e em todos os casos esse acréscimo de produtividade se expressa na eircuns-
tância de o mesmo trabalhador transformar no mesmo tempo quantidade
maior de matéria-priína~por conseguinte, essa parte do capital constante
cresce e também a maquinaria e seu valor. A taxa de lucro pode assim cair
com a reduçã'o do salário. A taxa de lucro depende da magnitude àa mais-
valia, roàgnitude que é determinada não só pela taxa de maiHalia, mas
também pelo nómero dos trabalhadores empregados.
Rodbertus define com acerto o salário necessário, igualando.o

"ao mmrt®te doa meioa de subsistência necessárior, isto é, a uma qwmti-


dade real dada de produtos, bottante estdvel, num país e num peiíodo de-
terminados" {p. 118).
1

Rodbertus expõe as proposições sustentadas por Ricardo sobre a rela·


ção inversa entre salário e lucro e a determinação dela pela produtividade do
trabalho, de maneira ao extremo complicada, confusa, emaranhada e lerda.

505
Em parte a confusão surge porque ele simploriamente toma por medida não
o tempo de trabalho, mas quantidades de produto e faz distinções disparata-.
das entre "nfvel do valor do produto" e "magnitude do valor do produto·:
Esse moço entende por "nfvel do valor do produto" a mera relação
que o produto tem com o tempo de trabalho. Se o mesmo tempo de trabalho
fornece grande quantidade de produto, é baixo o valor do pr9duto, isto é, o
valor de cada porção do produto; caso contrário, o contrário. Se uma jorna-
da de trabalho fornecer 100 libras-peso e mais tarde 200 libras-peso, no se-
gundo caso o valor do fio será a metade do observado no primeiro. No pri-
meiro caso, o valor da libra-peso de fio é de 1/100 da jornada de trabalho;
no segundo, de 1/200. Uma vez que o trabalhador obtém a mesma quantida-
de de produto, seja seu valor alto ou baixo, isto é, contenha essa quantida-
de mais ou menos trabalho, é inversa a razão entre salário e lucro, e o sa1á-
rio retira mais ou menos do produto global conforme a produtívidade do
trabalho. :B o que ele expressa nas seguintes complicadas proposições:

" ... o salário, como subsistência necessária, se é dada quantidade real de


produto, deve ter valor alto quando o valor do produto é alto, e valor bai·
xo quando o valor do produto é baixo; urna vez que se supõe constante o
valor do produto a repartir, quando o valor do ptoduto é alto, o salário
deve absorver grande parte desse valor, e quando baixo, pequena parte dt1-
le, e em conseqüência deve sobrar finalmente para a renda uma cota g:ran-:
de ou pequena do valor do produto. Mas, se vigc a reg:ra,de ser o valor do'
produto igual à quantidade de trabalho que o produto.custou, o que maisi
uma vez determína o n(vel do valor do produto ,é a mera produtividade
do trabalho ou a xeJação entre a quantidade do produto e .a quantidade de·
trabalho emp1egada. pata produzi-lo ... Se a mesma quantidade.de tiabalho
gera produto maior, em ouuas palavras. se aumenta ·a produtividade, a
mesma quantidade de produto conterá menos trabàlho; e ao xevés, se a
mesma quantidade de ti:abalho gera produto menor, em outtas palavras,
se cai a produtividade, a mesma quantidade de pfoduto encerrará mais
trabalho. Ora, a quantidade de tral>a/ho determina o valor do produto, e
o valor relativo de dada quantidade de produto, o nível do valor do pro-
duto"... Por conseguínte, "a tenda em geral..." tem de "ser tanto mais ai·
ta quanto mais alta for a produtividade do trabalho em geral" (pp. 119,
120).

Mas isso só é certo quando o produto, para cuja produção se empreg;i


o trabalhador, pertence à espécie que entra em seu consumo como meio de
subsistência, de acordo com a tradição ou a necessidade. Se isso não se dá,
a produtividade desse trabalho não tem influência no nível relativo do salá-
rio e do lucro, nem na magnitude da mais-valia em geral. A mesma cota de
valor do produto global caberá ao trabalhador como salário, cresça ou decres-
ça o número de produtos ou a quantidade de produto em que essa cota se
expressa. Neste caso, nenhuma mudança na produtividade do trabalho alte-
ra a repartição do valor do produto.

506
b) Segunda tese de Rodbertus

"II. Dado o nível da renda (rent} em geral num dado valor de produto, o
nível da tenda fundiária e o do ganho do capital estão na tazão inversa
um do outto e também na razão inversa da produtívidade do traba-
lho de produção prímária e do trabalho de fabricação respectivamen-
te. Quanto maior ou menor a renda fundiária, tanto menor ou maior
o ganho do capital e vice-versa; quanto maior _ou menor a produtivi-
dade do trabalho de produção primária ou do trabalho de fabricação,
tanto menor ou mairu: a renda fundiária ou o ganho do capital, e po1tan-
to, alternativamente, tanto maior ou menor o ganho do capital ou a ren-
da fundíária" (l .c., p. 116).

Primeiro (na tese I) tivemos a lei ricardiana: salário e lucro estão em


relação inversa.
Agora a segunda lei ricardiana arrumada de outra maneira, ou melhor,
"embrulhada": lucro e renda estão em relação inversa.
Está bem claro que, se dada mais-valia se divíde entre capitalista e do.
no da terra, a parte de um é tanto maior quanto menor a do outro e vice-
versa. Mas Rodbertus ainda acrescenta algo dele mesmo, a examinar em
pormenores.
Rodbertus, antes de mais nada, consídera como nova descoberta que
a mais-valia em geral ("o valor do produto do trabalho a distribuir corno
renda em geral"), a mais-valia toda surrupiada pelos capitalistas "consiste
no valor da matéria-prima +o valor do produto fabricado" (p. 120).
Primeiro insiste Rodbertus em sua "descoberta" da ausência do "va-
lor da matéria·prima" na agricultura. Desta vez, na torrente de palavras que
·segue:

"Da renda o segmento que cabe ao produto fabricado e determina a ta·


Ka de ganho do capital corresponde, como ganho, ao capital empregado
para produzil de fato esse produto e ainda ao valor total da matéria-prl·
ma, 11akir materiíll que participa do fundo de-empresa do fabricante; e$$e
valor mateiial, porém, nffo existe para o segmento da renda relativo à ma·
téría-p1ima e com que se calcula o ganho do capital empregada na produ-
çaõ primdria de acordo com a taxa de lucro estabelecida na fabricação"
(sim, taxa de lucro estabelecida), "ficando o que resta para renda fundíá·
ria" (p. 121 ).

Isso é que não, repetimos.


Admitamos - o que Rodbertus não demonstrou nem pode demons-
trar com seu método - existir renda fcmdiúrio., isto é, caber detenninada
parte da mais·valia do produto primário ao dono da terra.

507
Admitamos ainda: "o nível da renda" (a taxa de mais-valia) é em geral
dado por deteffilinado valor do produto" (p. 121). O que significa, por.
exemplo: em mercadoria de 100 líbias seja a metade igual a trabalho não
pago, constituindo o fundo- donde se pagam todas as rubricas da mais-va1ía,
renda (rent), lucro etc. Está então bem claro que um participante desse
fundo de 50 libras tanto mais dele percebe quanto menos pe1cebe o outro e
více·versa, ou que lucro e renda fundiária estão em relação inversa. Trata-se
agora de saber o que determina a partilha entre os dois .
. Em todo caso continua certo que a renda (revenue) do empresário
(seja ele agricultor ou fabricante) é igual à mais-valia que ele extrai da venda
de seu produto industrial (e que subtraiu dos trabalhadores de sua esfera de
prndução), e que a renda fundiária (quando não deriva diretamente do
produto fabricado, como no caso da quedà-d'dgua vendida ao industrial e no
da construção de casas etc., pois casas por certo não são produto prlmúrio)
provém do lucro excedente (da mais-valia, a parte que não entra na taxa ge-
ral de lucro) inserido no produto primário e transferido pelo anendatário ao
dono da terra.
E certo que, quando o valor do produto primário sobe ou desce nos
ramos industriais que empregam matéria-prima, a taxa de lucro subirá ou
cairá na razão inversa do valor da matéria-prima. Se dobra o vajor do algo-
dão, dados o salário e a taxa de mais-valia, cairá a taxa de lucro, segundo
mostrei antes em exemplo. 24 O mesmo se aplica à agricultui-a. Se a colheita
for má e o objetivo for manter. a escala de produção (supomos ág~ra que as
mercadorias se vendem pelo valor), porção maior do pro.duto total ou de
seu valor terá de ser devolvida à terra, e após a dedução do salário, suposto
invariável, quantidade menor do produto constituirá a mais-valia do arren-
datário e haverá po1tanto quantidade menor de valor a distribuir entre ele
e o dono da terra. Embora a unidade de produto tenha mais valor que antes,
será menor tanto o volume de produto, quanto a porção de valor remanes·
cente. A coisa muda quando o produto, em virtude da procura, sobe acima
de.seu valor, e tanto que quantidade menor dele tempreço maior que gran-
de quantidade antes. Todavia, isso está contra a suposição de os produtos
serem vendidos pelo valor.
Ao revés, admitamos que dobre a colheita de algodão e que dela a par-
te que se restitui diretamente à terra, por exemplo, adubo e sementes, custa
menos que antes. Nesse caso, do valor a parte que perrnanece par~ o produ-

24. Ver volume 3 desta tradução, cap. XX, 7., e).

508
tor de algodão, após a deduçâ'o do salário, será maior que antes. A taxa de
lucro aí subirá como na indústria têxtil algodoeira. Sem a menor sombra
de dúvida, agora numa jarda de tecido a parte do valor a qual constitui a
matéria-prima será menor que antes, e a que forma o valor industrial maior
que antes. Suponha que a jarda de tecido custe 2 xelins, quando o valor do
algodão nele contido= 1 xelim. Se o algodão cair de l xelim para 6 pence
(o que, na lúpótese de o valor ser igual ao preço, só é possível por ter a cul-
tura ficado ma.is produtiva), ao valor da jarda de tecido será igual a 18 pen-
ce. Reduziu-se de 1/4 = 25%. Mas o lavrador de algodão, se vendia 100 li·
bras-peso a l xelim cada, deve agora vender 200 a 6 pence cada. O valor an·
tes era de 100 xelins; agora, também 100 xelins. Embora o algodão consti·
tuísse antes fração maior do valor do produto - e ao mesmo tempo caísse
a taxa de mais-valía na própria cultwa algodoeira -, o lavrador de algodão
recebeu pelos 100 xelins de algodão, com a libra-peso a 1 xelim, 50 jardas
de tecido apenas; recebe agora por seus lOO'xelins, com a libra-peso a 6 pen-
ce, 66 2/3 jardas.
Suposto que as mercadorias se vendam por seus valores é falso que, a
.renda (rwenue) dos produtores que participam na produção do produto de-
penda necessariamente dos componentes de valor constituídos por seus
produtos no val.or total do produto.
Admitamos que o valor do produto total de todas as mercadorias in·
dustriais, inclusive maquinaria, consista em 300 libras, num ramo, em 900,
noutro, e em 1800, num terceiro.
Se for ve1dade que a proporção em que se reparte o valor do produto
total entre o valor da matéria-prima e o valor do produto industrial determi-
na a proporção em q\je a mais-valia - a renda (rent), segundo Rodbertus
se divide em lucro e renda fundiária, terá isso de ser verdade também para
diferentes produtos de diferentes esferas de produção onde matéria·prima
e produto industrial participam em proporções diversas.
Do valor de 900 libras correspondam 300 a produto industrial e 600
a matéria-prima, e seja 1 libra = 1 jornada de trabalho. Admitida ainda a
·taxa de mais-valia, por exemplo, de 2 horas para 10, e jornada nonnal de
trabalho de 12 horns, conter-se-ão nas 300 líbias (produto industrial) 300
jornadas, e o dobro, 2 x 300, 600, nas 600 libras (matéria-prima). Num pro·
duto, a mais-valia soma 600 horas; no outro, 1 200 horas. Isso quer dizer
apenas que, dada a taxa de mais-valia, a magnitude dela depende do número
dos trabalhadores, ou do número dos trabalhadores, simultaneamente ocupa-
dos. Ademais, uma vez que se supôs (não se provou) que da mais-valia que
entra no valor do produto, parte cabe ao dono da tena como renda fundiá-

509
ria, seguir-se-á daí que, na realidade a magnitude da rendafuruiiária cresce na
mesma proporção do valor do produto agrícola com o do "produto fabricado".
No exemplo acima, o produto agrícola está para o ,produto industrial
na razão de 2 1 = 600 : 300. Admitamos a razão de 300 : 600. Uma vez
que a renda fundiária depende da mais-valia inserida no produto agrícola;
ê claro que se esta no primeiro caso atinge 1 200 horas e, no segundo, 600
apenas, a renda fundiária - se constitui porção detenninada dessa rnais-
valia - tem de ser, no primeiro caso, maior que no segundo. Ou, quanto
maior a [X>rçlio de valor do produto agrícola no valor do produto total, tan·
to maior a parte que lhe cabe na mais-vai-ia do produto global, pois em cada
fração do valor do produto se insere determinada porção de mais-valia; e
quanto maior a participação do produto agrícola na mais-valia do produto
global, tanto maior a renda fundiária, uma vez que determinada proporção
da mais-valia do produto agrícola se insere na renda fundiária.
A renda fundiária, na hipótese de ser 1/10 da mais-valia do produto
agrícola, será 120 horas se o valor do produto agrícola for 600 libras, dedu-
zidas das 900, e 60 horas se esse valor for 300 libras. A TTIJlgnitude da renda
fundiária, por isso, variará com a magnitude do valor d.o produto agrícola, e
em conseqüência também com a magnitude relativa do valor do produto agrí-
cola comparado com o produto industrial. Mas o ''nível" da renda fundiária
e o do lucro - suas taxas - nada em absoluto terão a ver <XJ'!' isso. No pri·
meiro caso, o valor do produto = 900 libras, das quais 300 = produto indus-
trial e 600""' produto agrícola. Daí 600 horas de mais-valia para o produto
industrial e l 200 para o produto l!grícola. Ao todo, 1 800- horas. Destas,
120 correspondem a renda fundiária, e 1 680 a lucro. No segundo caso, ova-
lor do produto = 900; 600 para a índüstria e 300 para a ágricultura. Mais-
valia, portanto, 1 200 horas para a indústria e 600 para a agricultura. Ao to-
do, l 800. Saem daí 60 para renda fundiária e 1 200 para o lucro da indús-
tria + 540 para o da agricultura, o que soma l 740. No segundo caso, o pro·
'duto industrial é o dobro do agrícola (segundo o valor); no primeiro, o con-
trário. No segundo caso, a renda fundiária = 60; no primeiro, 120. Cresceu
na mera proporção do valor do produto agrícola. Quando este aumentava,
ela crescia. Se consideramos a mais-valia global = 1 800, a renda fundiária
será 1/1 S no primeiro caso, e 1/30 no segundo.
Aí se aumenta, com a grandeza da porção de valor pertinente ao pro-
duto agrícola, a TTIJlgnitude da renda fundiária e se, com a magnitude des-
ta, a respectiva participação proporcional no valor gwbal - e em consequên-
cia a taxa em que a mais-valia pertence â renda fundiária sobe em relação à
taxa em que pertence ao lucro - é apenas porque Rodbertus supõe que a

510
renda fundiária participa em proporçiio determinada da mais-valia do pro-
duto agrícola. e, o que tem na realidade de suceder, dada ou presruposta
essa circunstân.cia. Mas ela mesma não decorre dos disparates arrumados
por Rodbertus sobre o "valor da matéria-prima" e que mencionei acima
no intcio da página 47625
O nlvel da renda fundiária cresce mas não em proporção com a mais-
valia no produto em que ela participa, pois agora como dantes essa propor-
çã'o é 1/10; a magnitude da renda fundiária cresce porque esse produto cres-
ce, e porque sua magnitude cresce, sem ter subido seu "nível", cresce seu
"nível'' comparado com a quantidade do lucro ou a cota do lucro no valor
desse produto global. Da maís-vaJia a parte transformada.em renda é maior
naturalmente porque se pressupôs que parte maior do valor do produto total
proporciona renda (rent), se tomou conversível em renda (rent) parte maior
da mais-valia. A coisa nada tem a ver com o "valor da matéria-prima". Mas
é absurdo afirmar que

''renda maior" configure ao mesmo tempo renda "de nível mais alto",
"porque a área ou número de acres em que é calculada não variou e em
conseqüência maior soma de valor conesponde a cada acre" (p. 122).

Desse modo, mensura-se o "nível"da renda por ..medida" que exclui


as dificuldades do próprio problema.
Se nos limitarmos a reformular o exemplo. acima, pois não sabemos
ainda o que é renda (rent), e atribuirmos ao produto agrícola a mesma taxo.
de lucro do produto industrial, acrescentando-lhe apenas 1/10 para renda, o
que é a bem dizer necessário, pois se supõe a mesma taxa de lucro, a coisa
assumirá outro aspecto.e ficará mais clara.

Ptoduto Produto
industriei agrícola

600 libras 300 libras 1 200 horas de mais-valia para indústda, 600 para agri-
cultura e 60 para renda (rent). Ao todo 1 860, das
quais 1 800 para lucro.
11 300 libras 600 libras 600 horas de mais-valia para indústria, l 200 para agri-·
cultura e 120 para renda. Ao todo 1 920, das quais
1 800 para lucro.

25. Ver, neste volume,p. 507.

511
A renda fundiária do caso I é duas vezes ª'do caso II, porque aumen-
tou, em relação ao produto industrial, o produto agrícola, a parte que ela
suga do valor do produto. O montante de lucro nos dois casos é o mesmo,
l 800. No primeiro caso, a renda fundiária é 1/31; no segundo, 1/16 da
mais-valia global.
Se Rodbertus quer que seja ônus exclusivo da indústria "o valor da
matéria-prima", deve ele antes de mais nada sobrecarregar apenas a agricul·
nua com a parte do capital constante formada por maquinaria etc. Essa par·
te do capital entra na agricultura como produto fornecido pela indústria -
como "produto de fabricação" que constitui meio de produção da "maté·
ria-prima".
No tocante à indústria - e uma vez que se trata aí de contas entre
duas firmas - já se lhe debita na rubrica de "matéria-prima" ou "valor do
material", a parte do valor das máquinas constituídas por "matéria-prima".
Não se pode então computar isso duas vezes. Das máquinas, a outra parte do
valor utilizada na indústria consiste em "trabalho de fábricação" adicionado
(pretérito e present~ ), e este se reduz a salário e lucro (trabalho pago e traba-
lho nao pago). Assim, a parte do capital aí adiantada (fora a contida na ma·
téria-prima das máquinas) consiste sqmente em salário. Daí acrescer a mag-
nitude do capital adiantado e ainda o montante de mais-valia a ser calculado
sobre esse capital adiantado, isto é, o lucro.
[O erro usual nesses cálculos consiste por exemplo em,que o desgaste
da maquinaria ou dos instrumentos, encerrado na própria máqui.il.a, em seu
valor - embora em última análise redutível a trabalho, sej~ trabalho inseri~
do na matéria-prima, seja trabalho que transformou a matéria-prima em má-
quina etc. - esse trabalho pretérito nunca ma.is entra no luéro nem no salá-
rio, mas só atua ainda como condição produzida de produção (no sentido
de que não muda o tempo de trabalho necessário para a reprodução) que figura
no processo de criar mais-valia apenas como valor do capital constante, seja
qual for seu valor de uso no processo de trabalho. Isso é muito importante
e já analisei na pesquisa sobre a troca entre capital constante e renda (reve-
nue)26. Contudo, é mister, além disso, desenvolver ainda o assunto na secção
sobre acumulação de capital.]
Quanto à agricultura, isto é, a mera produção de produtos primários
ou a chamada produção primária - no ajuste das contas entre as firmas de
"produção primária'' e de ·rabricarifu" - a parte do valor do capital a qual
nela participa e representa máquinas, instrumentos etc., essa parte do capital

26. Ver, no vol. 1 desta tradução, pp. 224·232.

512
constante, só pode ser considerada uma rubrica que entra no capital da agri-
cultura sem lhe aumentar a mais--wilin. Se o trabalho agrícola adquire maior
produtividade em virtude do emprego de maquinaria etc., a produtividade
cresce tanto menos quanto mais aumenta o preço dessa maquinaria etc. :f o
valor de uso da maquinaria e não seu wilor que acresce a produtividade do
trabalho agrícola ou de qualquer trabalho. Aliás, poder-se-ia dizer também
que a produtividade do trabalho industrial é determinada, antes de tudo, pe-
la existência da matéria-prima e por suas propriedades. Mas por sua vez é o
valor de uso da matéria-prima - não seu valor - que é condição da produ·
çã'o industrial O valor é antes uma desvantagem. Mutatis mutandis aplica-
se portanto à maquinaria etc., o que Rodbertus diz do "valor da matéda-
prima" referindo-se a capital industrial:

"Por exemplo, o custo em t.rabaJho do a r a d o ou do d e s e a r o ç a-


d o r como máquinas" (ou o custo em trabalho do canal de drenagem
ou da construção de estábulos) "não pode contribuir para detenninar o
custo em trabalho do produto particula.T, seja t r i g o ou a 1 g o d ã o".
"Entretanto o valor da m á q u i na ou o v a l o r - m a q u i n a l figu-
ra no montante de eapital sobl:c que o dono tem de calcular como ganho·
a porção de renda que cabe à matéria-prima (ver Rodbertus, p. 97)27

Noutras palavras: do valor a parte que no trigo e no algodão represen·


ta o valor do desgaste do arado ou do descaroçador não resulta do trabalho
·de arar ou do de descaroçar a fibra de algodão, mas do trabalho que fabricou
o arado e o descaroçador. Esse componente do valor entra no produto da
agricultura sem nela ser produzido. Passa por suas mãos apenas, pois ela s6
o repõe com os arados e descaroçadores que compra no construtor de má-
quinas.
As máquinas, instrumentos, construções e outros produtos industriais
empregados na agricultura consistem em dois componentes: 1) as matérias-
prirnas desses produtos industriais; 2) o trabalho adicionado às matértas·pri·
mas. Essas matérias-primas são o produto da agricultura, mas desse produto
parte que nunca entra em salário ou lucro. Mesmo que não existisse capita-
lista, ainda assim o agricultor não poderia lançar a seu favor como salário es-
sa parte de seu produto. De fato teria de dá·la grátis ao construtor de má-
.quinas para este fazer dela uma máquina; além disso, teria de pagar o traba-
lho adicionado a essa matéria-prima (= salário+ lucro). Isso ocorre na reali-
dade. O construtor de máquinas compra a matéria-prima, mas o agrlcultor,

27. Marx parodia aí frases de Rodbertus <,,itadas neste volume, pp. 490 e 491. As
palavras introduzidas por Marx estão impressu em letras espaçada!l.

513
ao comprar a máquina, tem de recomprar a inatéria·prima. E portanto co-
mo se não a tivesse mesmo vendido, mas emprestado ao construtor de má-
quinas para este lhe dar a forma de máquina. Assim, do valor da maquinaria
aplicada na agricultura, a parte que se reduz a matéria-prima, embora produ-
to do trabalho agrícola e fração de seu valor, pertence à produção e não ao
produtor e por isso figura nos custos dele como as sementes. Ao revés, a ou-
tra parte que configura o trabalho de fabricação da maquinaria é "produto
fabricado" que entra na agricultura no papel de meio de produção, domes·
mo modo que a matéria-prima entra na indústria como meio de produção.
Por conseguinte, se é certo que a firma "produção primária" fornece
à firma "indllstria"' o ''valor da matéria-prima", item que entra no capital
do fabricante, não é menos certo que a firma "indústria" fornece à firma
"produção primária" o valor das máquinas, o qual entra por inteiro (incluf-
da a parte c.onsistente em ~téria-prima) no capital do agricultor, sem que
esse componente do valor proporcione ao agricultor maís-valia alguma. Essa
é a razã:o por que, na alta agricultura2"', como a chamam os ingleses, a taxa
de lucro se revela menor que na agricultura rudimentar, embora a taxa de
mais-valia seja maior.
Isso ao mesmo tempo propiç.ia a Rodbertus contundente prova de
que, para a natureza de um adiantamento de capital, tanto faz que a parte
do valor do produto despendida em capital constante tenha reposição físi-
ca direta e seja meramente contabilizada como mercadoria, como valor mo·
netário, ou que realmente se tenha alienado e passado pelo processo de- com-
pra e venda. Se o produtor de matérias-primas, por exemplo, desse' grátis ao
construtor de máquinas o ferro, cobre, madeira etc., contidos na máquina
que utíliza, de modo que o construtor ao vender-lhe a máquina, lhe debitas-
se o traballio adicionado e o desgaste da própria maquinaria, tal máquina
custaria ao produtor primário tanto quanto lhe custa atualmente, e a mesma
parte componente do valor figuraria em sua produção como capital constan-
te, como adiantamento. Também tanto faz que um agricultor venda a co-
lheita e com a parte de seu valor representadorn de sementes (matêria-prima),
compre sementes - talvez para efetuar mudança conveniente no tipo de se-
mente e evitar degeneração por cultivo, dentro da mesma espécie -, ou que
.tíre diretamente de seu produto esse componente de valor e o restitua à terra.
Mas Rodbertus para justificar seus cálculos desvirtua a natureza da
parte do capital constante constituída por maquinaria.

28. Na agricultura desenYolvida.

514
Segundo aspecto a examinar no tocante à tese li de Rodbertus: ele
fala dos produtos industriais e agrícolas em que consiste a renda (revenue),
o que difere muito dos produtos industriais e agrícolas em que consiste a
totalidade do produflJ anual. Admitamos seja certo, para essa totalidade, di-
zer que - após se descontar, do capital agrícola, a parte toda consistente em
maquinaria etc., e do produto agrícola, a parte restituída diretamente à pro-
dução agrícola - a proporção em que a mais-valia se reparte entre o arrenda-
tário e o industrial, e portanto a proporção em que a recebida pelo arrenda-
tâJio s.e reparte entre este e o dono da terra, tem de ser determinada pela par-
ticipação que indústria e agricultura têm no valor global dos produtos; ainda
assim, é muito discutível que isso seja certo quando s.e fala dos p1odutos
que constituem o fundo comum da renda (rwenue). A renda (revenue) (ex-
cluída aí a parte que se reconverte em novo capital) consiste em produtos
que entram no consumo individual, e agora trata-se de saber quanto os capi·
talistas, arrendatários e donos de terra retiram desse fundo. São essas cotas-
partes determinadas pela participação que indústria e produção pri.má;ia têm
no valor dos produtos que constituem renda (re11e1me)? Ou pelas partes (de
trabalho agrícola e de trabalho industrial) que formam o valor do produto
total que cónfigura renda?
A massa.desses produtos em que consiste a renda exclui, segundo mos-
trei antes 29 , todos os produtos que entJam na produção como instrumento
de trabalho (maquinaria), matéria auxiliar, semimanufaturado e matéria-
prima de semimanufaturado e constituem parte do produto anual do traba·
llio. Exclui não só o capital constante da produção primária, mas também
o capital oonstante do construtor de máquinas e o capital constante todo
dos arrendatários e dos capitalistas, o qual entra no processo de trabalho,
mas não no processo de· criar valor. Ademais, exclui não só capital constan-
te, ma.-. também a parte daqueles produtos não consumíveís que configuram
a renda (revernle) de seus produtores e entram no capital dos produtores dos
produtos consumíveis como renda (rwenue) para repor o capital constan-
te desgastado.
A massa. de produtos em que se gasta a renda (revenue) e que de fato
configura, da riqueza, a parte que forma a renda segundo o valor de uso e o
valor de troca, essa massa de produtos, conforme demonstrei antes, só pode
ser considerada consistente em trabalho de novo adicicmado (durante o
ano), e por isso só se converte em renda (revenue), isto é, salário e lucro
(que por sua vez se reparte em lucro, renda (rent}, impostos etc.), sem par·

29. Ver volume 1 desta tradução, pp. 224·232.

515
tícula alguma dela conter valor da maté1ia-prtma que entra na produção,
nem valor do desgaste de mãquinas nesta ocorrido. numa palavra, valor al·
gum dos meios de trabalho. Consideremos essa renda (revenue) (pondo de
lado as formas dela derivadas, pois só mostram que o dono da renda trans-
fere a outro sua parte alíquota dos referidos produtos, por serviços etc. ou
por débito etc.) e admitamos que o salário constitua 1 /3 dela, o lucro l /3 e
a renda fundiária 1/3, e seja o valor do produto= 90 libras. Assim, cada um
retira da massa produtos no montante de 30 libras.
Uma vez que a massa de produtos que fonna a renda configura apenas
trabalho de novo adicionado (adicionado durante o ano), parece muito sim-
ples que se a massa de produtos encerra 2/3 de trabalho agrícola para 1 /3
de trabalho industrial, o valor se repartirá entre industriais e agricultores
nessa proporção. Caberá aos industriais 1/3 do valor, aos agricultores 2/3,
e a magnitude proporcional de maís-valla realizada na indústria e na agricul-
tura (suposta a mesma a taxa de mais-valia em ambas) corresponderá às par·
ticipações que indústria e agricultura têm no valor do produto global; e a
renda fundiária por sua vez crescerá em proporção ao montante do lucro
do arrendatário, pois o suga como parasita. Isso entretanto é falso. E que
do valor parte constituída por tr~balho agrícola forma renda (revenue)
daqueles fabricantes de capital fixo etc. que repõem o desgaste deste capi-
tal na agricultura. A razão entre trabalho agrícola e trabalho industrial nos
componentes do valor dos produtos que configuram a renda (revenue) não
indica portanto a proporção em que se reparte o valor dessa lllassa de pro-
dutos ou essa massa de produtos entre industriais e agricultores, ném a pr<>-
porção em que indústria e agricultura participam na produção global .
.Rodbertus prossegue:

"Mas afo.da é só a produtividade do trabalho - da produção primária ou


da fabricação - que determina o nível relativo do valor do produto pri-
mário ou do produto fabricado ou as participações de ambos no valor do
produto global. O valor do produto primário se.rá tanto mais alto quanto
mais baixa a produtividade do trabalho na produção primária, e vice-ver-
sa. Uma vez que valor alto do produto primário origina renda fundiária
alta e baixo ganho de capital, e valor alto do produto fabricado, ganho
alto de capital. e renda fundiária babta, se for o dado ci n.íYel da renda em
geral, o nível da. renda fundiária e o do ganho de capital têm de estar em
relação inversa um com o outro e ainda com a produtividade dos respec-
tivos uabalhoo, o da produção primária e o trabalho da fabricação'
(p. 123).

Quando se compara a produtividade de dois ramos diferente$ de pro-


dução, só se pode fazê-lo em termos relativos. Vale dizer, parte-se de um

516
ponto arbitrário em que, por exemplo, os valores de cânhamo e de tecido
de linho, isto é, as quantidades correlativas do tempo de trabalho neles con-
tido estão na razão de 1 : 3 Se essa razão se altera, é correto dizer que a pro-
dutividade desses diferentes trabalhos se alterou. _Mas é falso dizer que a
produção de ouro é "menos produtiva"' que a de ferro, por ser de 3 o tem-
po de trabalho exigido para a produção de uma onça de ouro e também de
3 o requerido para a de uma tonelada de ferro.
A relação de valor entre duas mercadorias mostra que uma custa mais
tempo de trabalho que a outra; por isso, não se pode dizer que uma é "mais
produtiva" que a outra. Isso só seria correto se o trabalho nos dois lados
se aplicasse para produzir os mesmos valores de uso.
Não se pode em absoluto dizer que a indústria é 3 vezes mais produ-
tiva que a agricultura, por estar o valor do produto primário para o do in-
dustrial na razão de 3:1. Só quando a razão muda, se toma, digamos, 4:1 ou
3 :2 ou 2:1 etc., poder-se-á dizer que variou a produtividade relativa nos dois.
ramós. Isto é, ao crescer ou decrescer ~queta razão.

e) Terceira tese de Rodbertus

III. "O nfvel do gtinho do C(lpital é determinado apenas pelo nível do l'll·
lor do produto em geral e pelo do valor do produto primário e do p.ro-
duto fabricado em particular, ou pela relação entre a produtividade do
trabalho em geral e a do trabalho da produção primária e da fabricação
em particular. O nível da renda fundiária, além disso, depende da magni·
tude do valor do produto ou da quantidade de /r(lb(IJhO ou de forç(I pro-
duti11(1 que, com ckda reJ(lçâo de produtividade, se aplica na produção"
(pp. 116, 117).

Em outras palavras: a taxa de lucro depende somente da taxa de mais-


valia, e esta é determinada apenas pe1a ptodutividade do trabalho; mas, dada
a produtividade do trabalho, a taxa da renda fundiária depende também da
de trabalho aplicada (do n6mero de trabalhadores).
1111IS$0.
Nessa afirmação as inexatidões são quase tantas quanto as palavras.
Primeiro, a taxa de lucro não é de modo algum determinada apenas pe-
la taxa de mais-valia. Logo voltaremos a isso. Mas, antes de tudo é falso que
a taxa de mair;-valia só dependa da produtividade do trabalho. Dada a pro-
dutividade do trabalho, a taxa de mais-valia varia de acordo com a duração
do tempo de trabalho excedente. Assim, a taxa de mais-valia depende não só
da produtividade do trabalho, mas também da quantidade de trabalho apli·
cado, pois a quantidade de trabalho não pago pode crescer (com produtivi-
dade constante), sem aumentar a quantidade de trabalho pago, ou seja, a

517
parte do capital desembolsada em salário. Não p9de existir mais-valia, abso-
luta ou relativa (e Rodbertus, seguindo Ricardo~ só conhece a últíma), se o
trabalho não é pelo menos tão produtivo que sobre para o trabalhador tem-
po de trabalho excedente acima do necessário para a própria reprodução.
Mas, nessa hipótese, daào um mínimo de produtividade, a taxa de mais-valia
varia com o tempo de trabalho excedente.
Primeiro, é portanto falw que a taxa de lucro seja determinada apenas
pela produtividade do trabalho explorado pelo capital, porque assim o seja
a taxa de mais-valia ou o "nível do ganho do capital". Segundo: supomos
dada a taxa de mais--valia, que, para dada produtividade do trabalho, varia
com a duração da jornada e, para dada jornada normal, com a produtividade
do trabalho. A própria mais-wilia variará então de acordo com o número de
trabalhadores dos quais se extrai em cada jornada detenninada quantidade
de mais-valia; ou de acordo com a magnitude do capital variável, o desem-
bolsado em salário. A taxa de lucro porém depende da proporção entre essa
mats-valüt e o capital variável+ o capital constante. A magnitude da mais-
valia, dada a taxa de mais-valia, depende por certo da magnitude do capital
variável, mas o nível do lucro, a taxa de lucro, depende da proporção entre
essa mais-valia e a totalidade do capital adiantado. Aí a taxa de lucro: será
determinada portanto pelo preço da 'matéria-prima (no ramo industrial on-
de há matéria-prima) e pelo valor da maquinaria de rendimen.to definido.
Por isso está substancialmente errado o que diz Rodberfus:

"Na mesma proporção em que em virtude do aumento do. ·valor do pro-


duto acresce a soma·do ganho do capital, também se.eleva ·em conse-
qüêneia a soma do valOJ do capital 11-0bre a qual calculaÍ o ganho, e aquele
acréscimo do ganho do capital em nada altera a razão até então existente
entre ganho e eapital" (p. 125). '

Isso só é verdadeiro se se trata da tautologia: para dada taxa de lucro


(muito diferente de taxa de mais-valia e da própria mais-valia) não importa a
magnitude do capital aplicado, justamente porque se supõe constante a taxa
de lucro. Mas, ao revés, a taxa de lucro pode crescer, embora seja constante
a produtividade do trabalho, ou pode cair, embora cresça a produtividade do
trabalho e cresça mesmo em todas as esferas.
E de novo a tola observação sobre a renda fundiária, cujo mero acrés-
cimo aumenta sua taxa, por ser calculada em todo país na base de "número
ínvariável de acres" (p. 126). Se cresce o montante de lucro (dada a taxa de
lucro), aumenta a massa de capital donde vem; mas se cresce a renda fundiá-
ria, só um fator varia (segundo Rodbertus). a própria renda, enquanto sua
medida, "o número de acres", pennanece. sempre invariável

518
"Po1 isso, a renda fundiária pode subir por um fator vigente no desenvol-
vimento econômico nacional da sociedade em toda parte, o acréscimo do
trabalho empregado na produção, ou seja, a população crescente, sem te1
conseqüência na ascensão do va101 do produto primário, pois a retirada
de renda fundiária de quantidade maior de produto primário já tem ne-
cessariamente aquele efeito" (p. 127).

A página 128 faz Rodbertus esta esdrúxula descoberta: mesmo quan-


do a renda fundiária desapareça por completo, por cair o valor da matéria-
prima abaixo do normal, é impossível

"que ganho de capital possa jamais atingir 100%" (isto é, se a mercadoria


for vendida pelo valor). e "por mais alto que seja tem sempre de importar
em consideravelmente menos" (p. 128).

E porquê?

"t gue" (o ganho do capital) "resulta apenas da 1epartiçio proporcional


do valor do produto. Só pode portanto ser um.a fração dessa unidade"
(:pp. 127, 128).

Isso, senhor Rodbertus, depende totalmente de sua maneira de calcular.


Ad.Qlitamos seja o capital constante de 100 libras, o salário adiantado,
50, e o produto do trabalho ultrapasse de 150 as 50 libras de salário. Tere-
mos então:

r~~~~::::u.·-te_,.....Ca_p_i_tal_vana_·_'ve-1,_~:;·~::~ia -~alot Custos de produção Lucro %

i 100 50 150 300 150 150 100

Para ocorrer esse caso basta o operáóo trabalhar 3/4 da jornada para o
patrão, supondo-se portanto que l /4 dessa jornada lhe seja $uficiente para a
própria reprodução. Sem dúvida, se Rodbertus, em face do valor total do
produto= 300, não o considera pelo que ele excede os custos de produção,
mas diz que esse produto é para dividir entre capitalista e trabalhador, a co-
ta do capitalista só pode importar em fração desse produto, mesmo quando
alcance 999/1000. A maneira de calcular, porém, é incorreta ou pelo menos
inútil em quase todos os aspectos. Quem desembolsa 150 e obtém 300 não
costuma dizer que lucra 50%, calculando os 150 sobre 300 e não sobre 150.
Admitamos, no exemplo acima, trabalhe o operário 12 horas, 3 para
si e 9 para o capitalista. Passe ele agora a trabalhar 15, isto é, 3 para si e 12
para o capitalista. De acordo com a relação de produção antes vigente, o

519
capital constante terá de acrescer em 25 (na realidade menos, pois o dispên-
dio em maquinaria não cresceria na mesma proporção da quantidade de tra-
balho). Assim:

Capital c~w Mais-valia Valor Custos de Lucro : %


constante varilivel produção :
125 50 200 375 175 200 114 2/7

Volta Rodbertus então ao crescimento da "renda fundiária ao infini-


to", primeiro porque concebe o mero acréscimo de seu montante como alta
e assim também fala de sua alta quando a mesma taxa de renda fundiária se
paga sobre montante maior de produto. E depois porque toma "um acre"
por base de cálculo. Duas coisas que entre &i nada têm em comum.
Tratar com máxima brevidade os pontos que seguem, pois nada têm
a ver com o objeto de minha pesquisa.
O "valor do solo" é a "'renda fundiária capitalizada': Por isso, esse
valor, sua expressão monetária, depende do nível da taxa de juros prevale-
cente. Capitalizado a 4%, teria de ser multiplicado por 25 (uma vez que
4% = 1/25 de 100); a 5%, por 20 (pois 5% = 1/20 de 100). Haveria aí di-
ferença de 20% no valor do solo {p,. 131). Por causa mesmo da queda do
valor do dinheiro subiria nominalmente a renda fundiária e em conseqúên-
cia o valor do solo, enquanto o capital em sua expressijo monetária nãÓ so-
be na mesma cadência observada no tocante à expressão maior (em dinhei-
ro) do juro ou do lucro. Entretanto, a renda fundiária elevada em dinheiro
tem de ser repartida "pelo número inalterado de acres de _terra" '(p. 132).
Rodbertus resume como segue sua sabedoria; lígada à Europa:

1) " ... nas nações européias a produtividade do trabalho em geral - do


trabalho na produção primázia e na fabricação - elevou-se ... , em con-
seqüência diminuiu a cota do produto nacional empregada em salário e
aumentou a que sobra para renda {rentj, ... assim, a renda em geral SU·
biu" (pp. 138, 139).
2) " ... 'a produtividade da fa.brícaçã"o acre~ceu em proporção mczíor que
a da ptodução primária ... e eis por que hoje, em quantidade igual deva-
lor do produto nacional, a renda (rent) que cabe ao produto prímário é
maior do que a que cabe ao produto fabricado;por isso, apesar da eleva-
ção da renda em geral, só a renda fundiária subíu, o ganho do capítal, ao
revés, caiu" (p. 139).

Rodbertus aí, tal como Ricardo, explica uma pela outra, a ascensão
da renda fundiária e a queda da taxa de lucro; a queda de .uma é igual à
ascensão da outra, e a elevação da renda fundiária se explica pela improdu-

520
tividade relativa da agricultura. De maneira até bem explícita diz Ricardo
algures 30 que não se trata de improdutividade absoluta mas "relativa". Ti-
vesse ele porém dito o contrário, sería incoerente com o princípio que de-
fende; o autor original do ponto de vista ricardi.ano, Anderson, sustenta ex-
plicita.mente a capacidade absoluta de melhoramento.de todo solo.
Se a "mais-valia" em geral subiu (lucro e renda fundiária), é possível
que a taxa da renda fundiária total tenha caído em relação ao capital cons-
tante, e ainda ela terá caído por se ter elevado a produtividade. Embora te-
nha aumentado o número dos trabalhadores empregados e a taxa por que
são explorados, o capital desembolsado em salário em geral, apesar de acres-
cido em termos absolutos, terá caído relatlvamente, pois o capital como
adiantamento, produto do passado que é posto em movimento pelos traba·
lhadores e entra na produção como antecedente necessário, constitui parte
sempre crescente da totalidade do capital. Terá por isso caído a taxa conjun-
ta lucro +renda fundiária, embora a soma de ambos tenha crescido (a mag-
nitude absóluta) e ainda a taxa de exploração do trabalho. Rodbertus não
pode ver isso, pois para ele o capital constante é uma invenção industrial e
dela nada sabe a agricultura.
Quanto ã magnitude relativa do lucro e da renda fundiária: da cir·
cunstância de a agricultura ser relativamente menos produtiva que a indús-
tria não resulta que a taxa de lucro caia em tennos absolutos. Se, por exem-
plo, a razão entre lucro e renda fundiária era de 2 : 3 e agora de 1 : 3, constí·
tuía ele antes 2/3 da renda fundiária e agora l /3, ou seja, formava antes 2/5
da mais-valia global e agora somente 1/4, correspondia antes a 8/20 e agora
somente a 5/20; teria portanto ;decrescido de 3/20 ou 15%.
Suponha que o valor da Jibra-peso de algodão era 2 xelins. Cai para l
xelim. l 00 trabalhadores que antes fiavam 100 libras-peso num dia, fiam
agora300.
As despesas para 300 libras-peso eram antes de 600 xelins; agora são
apenas de 300 xelins; admita ainda que a maquinaria nos dois casos seja
1 /10 = 60 xelins. Finalmente, as 300 libras·peso custavam antes 300 xelins
em dispêndio com 300 trabalhadores, mas agora somente 100 xelins com
l 00 trabalhadores. Uma vez que a produtividade dos trabalhadores aumen·
tou, e aqui temos de supor que são pagos com o próprio produto, admita-
mos a mais-valia anterior = 20% do salário, e a atual = 40.
Assim, as 300 libras-peso custam: no caso I, 600 de matéria-prima, 60
de maquinaria, 300 de salário, 60 de mais-valia, ao todo 1 020 xelins; no

30. Ver nC$te volume p. 767.

521
caso II, 300 de matéria-prima, 60 de maquinaria" 100 de salário, 40 de mais-
valia, ao todo 500 xelins.
No primeiro caso, custos de produção, lucro e taxa de lucro, respecti-
vamente, 960, 60 e 6 1/4%; no segundo caso, respectivamente, 460, 40 e
8 16/23%.
Admitindo-se que a renda fundiária seja 1/3 de libra-peso, no primeíro
caso será ela igual a 200 xelins = 1O libras, e .no segundo caso igual a 100
xelins = 5 libras. A renda caiu aí porque a matéria-prima barateou de 50%.
Mas o produto total barateou de mais de 50%. O trabalho adicionado indus-
trial em 1 está para o valor da matéria-prima na razão de 360 : 600 = 6: 10 =
1:1 2/3; em II, na de 140:300 = 1:21/7. O trabalho industrial tomou-se re-
lativamente mais produtivo que o agrícola; entretanto, no primeiro caso a
taxa de lucro é menor e a renda fundiária maior que no segundo. Nos dois
casos, a renda fundiária representa 1/3 da matéria-prima.
Admitamos que em II dobre a massa de matéria-prima; haveria assim
fiação de 600 libras-peso e a situação seria:
II. 600 libras-peso = 600 xelins de matéria-prima, maquinaria 120 xe-
lins, salário 200, mais-valia 80. Ao todo, custos de produção 92Q xelins, lu-
cro 80, taxa de lucro 8 16/23%.
A taxa de lucro subiu comparada com a de I. A renda fll1ldiária.seria
a mesma de 1. As 600 libras-peso só custariam 1 000, quando antes teriam
custado 2 040.
Do preço relativo alto do produto agrícola não décorre que ele dê
renda fundiária mais alta. Mas, uma vez admitido que renda fundiária é
percentagem que se fixa em toda fração de valor do produto agrícola -
como o faz Rodbertus, pois é tola sua pretensa demonstração - resulta-
rá por certo que a renda sobe com a elevação crescente do preço do pro-
duto agrícola.

em conseqüência da população acrescida também teve acréscimo


extraordinário o valor da totalidade do produto nacional... por isso ho-
je no país obtém-se mais salário, mais ganho, mais renda fundiária ... além
disso, essa obtenção maior da renda fundiária elevou-a quando não se
pôde observar efeito semelhante com a obtenção maior de salário e ga·
nho" {p. 139).

522
8. O verdadeiro cerne da lei deformada
por Rodbenus

Se pusennos de lado todos os disparates de Rodbertus (para não falar


daquelas concepções fragmentárias sobre as quais nos detivemos acima,
por exemplo, que a taxa de mais-valia ("nfvel da renda"} só pode subir
quando o trabalho se toma mais produtivo, omissão portanto da mais-
valia absoluta etc.), a saber: o disparate de que na agricultura propriamen-
te dita (a capitalista) não entra nos adiantamentos o "valor da matéria-prima;
O segundo disparate: Rodbertus não considera a maquinaria etc., a
segunda parte do capital constante da agricultura e da indústria, como "par-
te componente do valor" a qual, como o "valor da matéria-prima'', não
provém do trabalho da esfera de produção onde serve de maquinaria e em
conseqüência entra na soma sobre que se calcula o ganho obtido em toda
esfera de produção, embora o valor da maquinaria a esse ganho nada acres-
cente e o "valor" da matéria-prima tampouco, apesar de ambos serem meios
de produção e como tais ingressarem no processo de trabalho;
O terceiro disparate: não debita à agricultura o "valor" inteiro da
"maquinaria" etc. que nela entra como adiantamento e desse valor não
considera como débito da agricultura à indústria a parte que não é maté-
ria-prima e para cujo pagamento a agricultura tem de fornecer grátis à in·
dústria parte da matéria-prima, parte portanto que não figura entre os de-
sembolsos da indústria como um todo;
O quarto disparate: acredita que em todos os ramos industriais entra
o "valor da matéria-prima", além da maquinaria e das matérias auxiliares,
o que não se dá em toda a indústria de transportes nem na indústria ex-
trativa;
o quinto disparate: não vê que em muitos ramos industriais, além
do capital variável, entra "matéria-prima" '(e isso quanto mais forneçam
eles produtos acabados para consumo), mas o outro componente do capi·
tal constante quase falta por completo ou é mínimo, incomparavehnente
menor que na indústria em grande escala e na agricultura.
O sexto disparate: confunde os preços médios das mercadorias com
seus valores.
Despojando-se Rodbertus de tudo isso que o leva a explicar a renda
fundiária com o erro de cálculo do agricultor e a cometer seu próprio erro
de conta, de modo que a renda fundiária teria de desaparecer desde que o

523
arrendatário calculasse de fato as despesas que faz, o cerne que perdura é
apenas a seguinte asserção:
Se as matéria8'-prirnas são vendidas pelo respectivo valor, esse valor
está acima dos preços médias das outras mercadorias, ou seja, acima do
próprio preço médio, vale dizer, é maior que os custos de produção + o
lucro médio, deixando assim lucro excedente que forma a renda fundiária.
Isso significa também que, em relação ao capital constante, o capital variá·
vel (suposta invariável a taxa de mais-valia) é maior na produção primária
que na média das esferas de produção que pertencem à indústria (o que
não impede que em parte dos ramos da indústria seja maior que na agri·
cultura). Ou de maneira mais geral: a agricultura pertence ao gênero dos
ramos industriais cujo capital variável, em relação ao constante, é maior
que na média dos ramos industriais. Sua mai~-valia calculada sobre os cus-
tos de produção tem por isso de ser mais alta que na média dos ramos in-
4ustríais. Vale dizer, sua taxa particular de Lucro está acima da taxa média
de lucro ou da taxa geral de lucro. O que significa também: a taxa particular
de lucro em cada ramo de produção - invariável a taxa de mais-valia e dada
a própria mais-valia - depende da relação, em cada ramo, entre capital va-
riável e capital constante.
Aí a lei geral por mim desenvo1Vida 31 estaria expressa apenas para um
ramo particular da indústria.
Bm conseqüência:
l) E núster demonstrar que a agricultura pertence aos ramos particula-
res de produção em que os valores das mercadorias estão acima dos preços
médios e cujo lucro portanto, quando esses ramos dele se apropriam e não
cedem para o nivelamento da taxa geral de lucro, está acima óo lucro médio,
isto é, proporciona, além deste, um lucro excedente. Esse ponto parece in-
dubitáveÍ para a média da agricultura, por nela predominar relativamente o
trabalho manual e ser próprio do modo de produção burguês desenvolver a
indústria mais rápido que a agricultura. Alíás isso é uma diferença histón·ca,
suscetível de desaparecer. Isso ao mesmo tempo deriva de cair no conjunto
o valor dos meios de produção fornecidos pela indústria à agricultura, en-
_quanto no conjunto sobe o valor da matéria-prima fornecida pelá agricul-
tura à ind6stria, motivo por que o capital constante em grande parte da in-
dústria tem valor relativo maior que na agricultura. Parece que isso nã'o se
estende, de ordinário, à indústria extrativa.

31. Ver, neste vol..,pp. 498-504.

524
2) Não cabe dizer corno faz Rodbertus: o produto agrícola, se se ven-
de em média, de acordo com a lei geral, pelo valor, tem de fornecer -um lu-
cro excedente, aliás renda fundiária. Como se essa venda pelo valor da mer-
cadoria acima do preço médio fosse a lei geral da produção capitalista. Ao
revés, importa demonstrar porque na produção prímária - por exceção e em
constraste com o gênero dos produtos industriais cujo valor também está
acima do preço médio - os valores não se rebaixam aos preços médios e por
isso fornecem lucro excedente, ou seja, renda fundiária: Isto se explica sim-
plesmente pela propriedade da terra. O nivelamento só ocorre entre capitais,
pois só capital tem poder sobre capital para executar as leis imanentes doca-
pital. Até aí têm razão os que derivam a renda fundiária do monopólio: do
mesmo modo que só o monopólio do capital capacita o capitalísta a extor·
quir trabalho excedente do trabalhador, o monopólio da propriedade fun-
diária éapacita o dono da terra a extorquir do capitalista a parte de trabalho
excedente que constituiria lucro suplement(11' permanente. Os que derivam
a renda fundiária do monopólio erram ao acreditar que o monopólio capa·
cite o dono da terra a impelír o preço da mercadoria acima do valor. Ao re-
vés, o monopólio consiste em manter o valor da mercadoria acima do preçá
médio; em-vender a mercadoria não acima do valor mas pelo valor.
Assím modificada, a coisa fica certa. Explica a existencia da renda
fundiária, enquanto Ricardo só explica a existência das rendas fundiárias
dz'ferendais e na realidade deixa a propriedade da terra sem efeito econ6mi-
co. Além disso, elimina a superestrutura aliás apenas arbitrária no próprio
sistema de Ricardo, desnecessária para sua exposição, e consistente em que
a indústria agricola se torna progressivamente menos produtiva; permite,
ao contrário, que se torne mais produtiva. Só que, na base burguesa, é rela.-
tivamente menos produtiva ou mais lenta que a indústria para desenvolver
as forças produtivas. Ric~rdo acerta ao derivar sua ''mais-valia excedente"
não de maior e sim de menor produtividade.

9. Renda diferencial e renda absoluta em sua


relação recíproca. O caráter histórico da
renda fundiária. Métodos de pesquisa de
Smith e Ricardo

A diferença nas rendas fundütrias decorre, para igual investimentó de


capital em áreas da mesma magnitude, da diferença na fertilidade natural,

525
em particular e antes de tudo para os produtos que fornecem o pão, o ali-
mento principal; para solos de área. e fertilidade iguais, provém de investi-
mento desigual de capita! A primeira diferença natural gera diferença no
montante e ainda no nível Oú taxa da renda fundiária, em confronto com o
capital despendido; a segunda, diferença industrial, apenas gera renda fun-
diária maior, proporcional à magnitude do capital adiantado. Pode ocorrer
também diferença de resultado· por sucessivos investimentos de capital no
mesmo solo. A existência dos diferentes lucros suplementares ou das dife-
rentes rendas fundidrias em terras de fertilidade diversa não distingue a agri-
cultura da indústria. O que a distingue é a fixação desses lucros suplemen-
tares, por repousarem numa base natural (que por certo 110de ser mais ou
menos nivelada), enquanto os lucros suplementares na indústria - dado
igual lucro médio - só emergem para desaptJTecer e só surgem porque se
empregam máquinas e combinações de trabalho mais produtivas. Na indús-
tria é sempre o capital que chega por último, o mais produtivo, o que pro-
picia um lucro suplementar rebaixando os preços médios. Na agricultura
esse lucro suplementar pode e com freqüência. tem de resultar não do acrés-
cimo absoluto mas do relativo da fertilidade das melhores áreas, por se cul-
tivar terra menos produtiva. Na in~ústria a produtividade relativa maior,
o lucro suplementar evanescente tem de provir sempre do acréscimo abso-
luto da rentabilidade, da produtividade do novo capital aplicado, em con-
fronto com o antigo. Na indústria nenhum capital pode propiciar lucro su-
plementar (estamos excluindo alta momentânea da procura) em·vittude da
entrada recente no ramo industrial de capitais menos produtivos.

Também na agricultura (o que Ricardo admite) te:i:reno mais produ-


tívo - terreno por natu1eza mais fecundo ou que com os novos avanços
da tecnologia se toma mais fértil que o terreno antigo nas velhas condições
- pode entt:ar mais tarde na sequência dos utilizados, excluir di1 exploraçibJ
parte da velha terra (como sucedeu com a indústria míneiia e os produtos
coloniais), ou lançá-la noutra espécie de agricultura que fornece outro
produto.

A circunstância de se flXllrem mais ou menos as diferenças das rendas


fundiárias (lucros suplementares) distingue a agricultura da indústria. Mas
o fato de a média das condições de produção determinar o preço de merca-
do - e assim elevai: o preço de produtos, que está abaixo da mêdia, acima
do preço e mesmo do valor deles não decorre absolutamente da ter-
ra, mas da concorr~ncia, da produÇiío tXJpitalista; não é portanto lei da na-
tureza mas social.

526
Segundo essa teoria não é necessário. que o pior terreno pague renda
fundiária nem que não pague. E também possível que, onde não se obtém
renda fundiária mas apenas o lucro nonnal ou nem mesmo este, se pague
arrendamento, o proprietário emboJse uma renda iundiária embora nenhu-
ma exista economicamente.
Primeiro. Só se paga renda fundiária (lucro supT.ementar) pelo terrenD
melhor (mais fértil). A renda fundiária "como tal" não existe aí. Nesses casos,
o lucro suplementar - como o lucro suplementar da indústria - rarament.c
aparece fixo na configuração de renda fundiária (como no Oeste dos Estados
Unidos da América do Norte).
Esse é o caso onde relativamente grande quantidade de terra disponí-
vel nãó é objeto de propriedade privada e ainda a fertilidade natural tem
magnitude tal que, apesar do pequeno desenvolvimento da produçã'o capita-
lista, isto é, da gránde proporção do capital variável com o constante, os
valores dos produtos agrícolas são iguais (freqüentes vezes inferiores) aos
preços médios. Se os valores forem mais altos, a concorrência os rebaixará
a esse nível. E absurdo contestar essa ausência da renda fundiária, como faz
por exemplo Rodbertus, dizendo que o Estado cobra um dólar mais ou
menos por acre, um preço pequeno, quase nominal. Se1ia equivalente a ale-
gar que o Estado cobra um "imposto de indústria e profissões" sobre a
atividade de todo ramo industrial. 32 Nesse caso existe alei de Ricardo. A
renda fundiária existe - embora não em estado sólido mas fluido como o
lucro suplementar na indústria - só para teuas relativamente mais férteis,
O solo que nenhuma renda fundiária paga, deixa de pagá-la não por falta
de fertilidade, mas antes em JJirtude de rua fertilidade. Às melhores espécies
pagam potque possuem mais que a fertilidade média, em virtude de sua
fertilidade relativamente mais alta.
Por motivos op0stos, em países onde existe propriedade o mesmo
caso seria possível, a saber, que a terra cultivada por último não pague
renda fundiária. Seja o valor do trigo, por exemplo, tão baixo (e essa bai-
xa nada teria a ver com a circunstância de se pagar renda fundiária) que,
em virtude da fertilidade relativamente diminuta do solo cultivado por
último, apenas se iguale ao [JTeço médio: assim, se aí se aplica a mesma
quantidade de trabalho empregada no solo que dá renda, o número de
quorters, por exemplo, seria tão pequeno (para o capital desembolsado)
que, com o valor médio dos cereais panificáveis, só se obteria, digamos,
o preço médio do trigo.

32. yer, neste vol., p. 586.

527
Admitamos. por exemplo, que o último solo que dá renda (e o solo
que dá a menor renda representa a renda pura; os outros, renda diferen-
cial) produza com um investimento de 100 libras um produto de 120 libras
ou 360 quarteis de trigo, o quarter por lí3 de libra. Nesse caso 3 quar-
ters = 1 libra, Seja 1 libra= 1 semána de trabalho. 100 libras= 100 sema-
nas de trabalho e 120 libras = 120 semanas de trabalho. 1 quarter = 1 /3
de semana= 2 dias, e desses 2 dias ou 24 horas (se a jornada normal de traba·
lho = 12 horas) 1/5 ou 4 4/5 horas sejam trabalho não pago= mais-valia
contida no quarter. l quarter = 1/3 libra= 6 213 xelins ou 6 6/9.
Se o quarter se vende pelo valor e o lucro médio= 10%, o preço mê·
dio dos 360 quarters = 110 libras ou o preço médio do quarter = 6 1J9
xelins. O valor estaria 10 libras acima do preço médio. E uma vez que o
lucro médio = 10%, seria a renda fundiária = metade da mais-valia = 1O
libras ou S/9 de xelím por 1 quarter. Tipos melhores de terra que, para o
mesmo dispêndio de 120 semanas de trabalho (das quais só 100 corres-
pondem a trabalho pago, seja materializado ou vivo), fornecessem mais
quartets, dariam, ao preço de 6 6J9 xelins por quarter, uma renda maior.
Mas a pior terra cultivada daria uma renda de 1O libras para l 00 de capi·
tal ou de 5/9 de xelim para o quarter de trigo.
Admitamos se cultive novo solo que só dê 330 quarters C9m. 120
semanas de trabalho. Se o valor de 3 quarters = l libra, o de '330 quar-
ters ;: 11 O libras. Mas agora o quarter = 2 dias e 2 2/ 11 horas. quando an-
tes era igual a 2 dias. Antes 1 quarter = 6 6/9 xelins ou 1 quarter = 6 xe-
lins e 8 pence; agora, uma vez que 1 libra= 6 dias, 1 quarter. = _7 xelins,
3 pence e l 1/11 farthing. O quarter agora terá de ser vendido mais caro
de 7 pence e l l /11 farthing, para ser vendido pelo vafor,,ao qual também
proporcionaria a renda de 5/9 de xelim por quarter. O valor do trigo produ-
zido no melhor solo está então abaixo do valor do obtido no pior solo~ se
esse solo pior vende ao preço do quarter do solo que é imediatamente
.melhor ou fornecedor de renda, estará vendendo abaixo do seu valor, mas
a seu preço médio, isto é, ao preço em que tem o lucro norma) de 10%. Pode
portanto ser cultivado e propiciar ao capitalista o lucro médio nonnal.
Em dois casos, o pior solo daria então, além de lucro, renda.
Primeiro: o valor do quarter de trigo ultrapassaria 6 6/9 xelins (seu
preço poderia ultrapassar 6 619 xelins, isto é, seu valor, em virtude da pro-
cura, mas aqui não investigamos esse ponto; os 6 6/9 xelins, o preço do
quarter, davam uma renda de 10 libras ao pior solo antes cultivado e eram
o valor do trigo cultivado nesse solo que proporcionava uma renda não
diferencial), isto é, o pior solo antes cultivado e todos os outros seriam re-

528
!ativamente menos férteis, para darem a mesma renda, de modo que seu va.
lor estivesse mais acima de seu preço médio e do preço médio das outras
mercadorias. A circunstância, portanto, de o novo terreno da pior qualida-
de nâ'o proporcionar renda alguma, não decorre de sua baixa fertilidade e
sim da fertilidade relativa dos outros solos. O pior solo cultivado que dá ren-
da r~presenta, ante o novo tipo de solo com o novo investimento de capi·
tal, a rendll em geral, a renda não diferencial. E o que eleva aí a renda não
é a fertilidade desse solo que dá renda.
Admitamos existam três classes acima do último solo que fornece
renda. A classe II (acima de I, o último solo que dá' renda) proporciona ren-
da 1i5 maior, porque o solo é 1í 5 mais fértil que o da classe 1; a classe III,
por sua vez, renda 1/5 maior, por ser 1/5 mais fértil que a II, e a~im a clas-
se IV, por ser 1/5 mais fértil que a III. A renda em libras, uma vez que é
de 10.na classe I, é de 10 + 1/5 =
12 na clas'se II, de
12 + 1/5 = 14 2/5 na
III,e 142/5+ 1/5= 177/25nalV. 33
· Se a fertilidade de IV fosse menor, seria maior a renda de III a 1 in-
clusive e também maior absolutamente a de IV (mas a proporção seria a
mesma?). Podemos encarar a questão de duas m_aneíras. Se I for mais fértil,
a renda de li, III e IV será proporcionalmente menor. Mas 1 está para II,

33. Nesse parágrafo começa Marx a pesquisar como a roma das tendas (a renda
absoluta e a renda düerencial) depende da fertilidade tehtiva da tena, partindo da
hipótese preliminar de ser a soma das rendas diretamente proporeíomtl à fertilidade
do solo (se uma classe de solo é um quinto mais fértil que outra, a respectiva soma
das rendas será um quinto maior que a renda que se obtém da classe do solo menos
fértil). Prosseguindo na pesquisa, Mai:x abandona essa hipótese e formula de manei-
ra mais precisa a dependência que a soma das rendas tem da fertilidade telatil'll do solo.
Se, de acordo com as explicações a seguiJ de Marx, fizermos a soma elas ren-
das de cada uma das classes de solo - H, lll e IV -, considerando o número de quar-
ters obtido em cada uma delas e vendido por todas as chsses a pieço de l /3 de libra
por quartcr, teremos para a classe li 34 libnu, pata a Ili 62 4/5 e para IV 97 9/25.
O cálculo é feito da seguinte maneira: a classe li, uma vez que é 1/5 mais fértil que
a l, fornece 360 + 72, isto é, 432 quarten, vendidos por 432/3 libras, ou seja, 144
libras. Dessas 144 oorrespondem 110 libras ao custo de produção + lucro médio; pa·
ra a soma das rendas (absoluta ç diferencial) ficam 34 libras. Calcula-se do mesmo
modo para as classes Ili e IV.
Marx aplica à soma da$ rendas no cap. XII ("Quadros e comentários xeferentes
à renda diferencíal") o método preciso de calcular, que todavia já aparece neste
capítulo. Assim, à p. 98 retoma Marx à soma das rendas da classe IV, 17 7 /25, apre-
sentada à p. 92, e refere-se à renda diferencial dessa classe, 7 7/25, ao mesmo tempo
indicando o caminho certo de calcuJar a renda diferencial, a saber, 207 9/25 - 120 =
""' 87 9/25 libras. Se adicionarmos aí as 10 libras da renda absoluta, teremos a soma
das rendas ela classe IV, 97 9/25 libras, o que fica em plena ooncordíincia com as con-
clusões posteriores de Marx.

529
II está para III e IIl para IV, como o novo tipo adicionado de solo que não
dá renda está para 1. O novo tipo de solo não fornece renda porque o valor
do trigo de 1 não está acima do preço médio do novo solo. Estaria acima
se I fosse menos fértil. O novo solo então também daria renda. Mas o mes·
mo sucede com 1. Se II for mais fértil, I não dará renda ou dará renda me-
nor, e do mesmo modo II está para llI e lil está para lV. Por fim, o inver-
so portanto: a fertilidade absoluta de IV determina a renda de III. Se IV
for maís fértil, Ill, II e l darão renda menor ou nenhuma. A renda que 1
dá, a renda não diferenciada, é determinada portanto pela fertilidade de
IV, como a circunstância de o novo solo n:!o dar renda é determinada pela
fertilidade de 1. Aí vige portanto a lei de Storch, a saber: a renda do terre-
no mais fértil determin&. a renda do último solo a dar renda em geral e por
conseguinte também a diferença entre o solo que dá renda não diferencia-
da e o que não dá nenhuma. 34
Por conseguinte, o fato de a quinta classe aí, o novo solo cultivado
I' (em contraste com T), não dar renda é devido não à própria carência de
fertilU:ktde, mas à carência em relação a I, isto é, à fertilidade relativa de 1
em confronto com l'.
Segundo: o valor referente aos tipos de solo 1, li, III e IV que dão
renda, a saber, 6 xelins e 8 pence por quarter (para maior verossimilhança
pode-se dizer bushel em vez de quarter), é igual ao preço médio .de I' e está
abaixo do próprio valor deste. Mas são possíveis muitos estádios interme-
4iârios. Se r, para um investimento de 100 libras, proporcionasse uma quan·
tidade qualquer entre seu rendimento real de 330 bushels e o de l~ de 360,
ou seja, 333, 340, 350 at.é 360 · x, o valor do quarter = 6 xelins e 8 pence
estaria acima do preço médio de I' (por bushel), e esse últ;tno solo cultiva-
do daria uma renda. Que proporcione enfim o lucro médio é devido à ca-
rência relativa de fertilidade de l e portanto de 1 a IV. Que náo porporcio-
ne renda é devido à fertilidade relativa de I e à própria carência de fertili-
dade. O último terreno cultivado I' poderia dar uma renda, se o valor do

34. Em seu Cours d'ér:onomie politique; vol. 2, pp. 78 e 79, São Petersburgo,
1815, escreve Stoich: "A renda das classes de terra mais férteís determina o nível
da renda de todas as outras espécies de terra que conconem com a terra mai.s fértil
Enquanto os produtos das classes de temi mais férteis puderem satisfazer a procura,
as tenas menos férteis que fazem concouência à tena mais fértil nlo podem ser cul-
tivadas ou, pelo menos, não podem proporcionar 1enda. Mas, logo que a procura co-
meça a ultrapassar a quantidade de produto que as elasses de terra mais férteis Podem
fornecer, aumenta o preço do produto e toma.-se possível cultivar as classes de terra
menos férteis e delas obter renda." Marx também fala dessa idéia de· Storch em O Ca-
pital (ver DlFEL, livro 3. vol. 4, pp. 207 e 208, e vol. 6, p. 754).

530
quarter estivesse acima de 6 xelins e 8 pence, isto é, se l, II, III e IV fossem
menos férteis, pois então o valor do trigo seria maior. Mas poderia também
proporcionar uma renda, dado o valor de 6 xelins e 8 pence para o bushel,
isto é, se fosse a mesma a fertilidade de I, II, III e IV. desde que ele mesmo
fosse mais fértil, fornecesse mais de 330 bushels, e por conseguinte o valor
de 6 xelins e 8 pence por quarter estivesse acima de seu preço médio, em
outras palavras, seu preço médio agora estivesse abaixo de 6 xelins e 8 pen-
ce, ou seja, abaixo do valor do trigo cultivado em I, 11,Jll e IV. Se o valor
está acima do preço médio, há um lucro suplementar acima do lucro médio,
e daí a possibilidade de renda.
Vemos então: confrontando-se diferentes ramos de produção - indús-
tria e agricultura por exemplo - a existência de valor acíma do preço mé-
dio indica maior carência de produtividade do ramo de produção que for-
nece o lucro suplementar, o excesso de valor sobre o preço médio. Nomes-
mo ramo, entretanto, indica produtivídade maior do capital em contraste
com outros capitais no mesmo ramo. No exemplo acima, I fornece renda
fundiária porque na agricultura é maior que na indústria a razão entre oca·
pítal variável e o constante, isto é, mais trabalho novo tem de ser adiciona-
do ao materializado, e porque, em virtude da propriedade da terra, esse ex·
cesso de valor sobre o preço médio não é nivelado pela concorrência dos
capitais. Mas l ainda proporciona renda fundiária porque o valor de 6 xelins
e 8 pence por bushel não está abaixo de seu preço médio, pois não é tão
estéril a ponto de seu próprlo valor ultrapassar 6 xelins e 8 pence por bushel,
e não é seu próprio valor que determina seu pre.ço e sim o valor do trigo
cultivado em li, llI e IV ou, de um ângulo estrito, em II. Depende de sua
própria produtividade a circunstância de esse preço de mercado ser então
apenas igual a· seu próprio preço médio ou estar acima dele e a de seu valor
estar acima de seu preço médio.
Por isso, Rodbertus também erra ao sustentar que todo capital que
proporciona lucro médio na agricultura tem de dar renda fundiária. Essa
conclusão falsa decorre de sua premissa errada. Ele raciocina asaim: o capi-
tal na agricultura, por exemplo, rende 1O libras. Mas as 1O libras aí ~- por
não entrar no caso matéria.-prima, ao revés do que sucede na indústria - se·
calculam sobre soma menor. Representam portanto mais de 10%. Todavía,
o busílis é este: náo é a ausência da matéria-prima (a matéria-prima, ao con-
trário, entra na verdadeira agricultura; nlfo importaria que não entrasse se
aumentasse a proporção da maquinaria etc.) que eleva o valor dos produtos
agrícolas acima do preço médio (seu próprio preço médio e o das outras
mercadorias) e sim uma proporção maior do capítal variável com o cons·

531
tante, comparada não com a de ramos industriais particulares mas com a
média da índústria. A magnitude dessa diferença geral determina o montan-
te e a existência da renda fundiária de 1, da renda fundiária absoluta, não
diferencial e por isso a men.or. O preço do trigo em I', do novo solo cultiva-
do que não dá renda fundiária, não é determinado pelo wlor de seu próprio
produto e sim pelo valor de 1, e portanto pelo preço médio de mercado do
trigo fornecido por I, II, III e IV
O privilégio do produto agrícola (em virtude da propriedade da terra)
de se vender não pelo preço médio, mas pelo valor quando esse valor está
acima do preço médio, não víge absoluta e reciproca.mente para os produ-
tos cultivados em diferentes tipos de solo, para os produtos produzidos por
diferentes valores dentro da mesma esfera de produção. Confrontados com
os produtos industriais têm a faculdade exclusiva de ser vendidos pelos res-
pectivos valores. Confrontados com os outros produtos da mesma esfera
são detenninados pelo preço de mercado, e depende da fertilidade de 1 que
o valor - nele igual ao preço médio de mercado - seja bastante alto bu
baixo, isto é, a fertilidade de 1 seja bastante alta ou baixa para 1', ao ser
vendido por esse valor, participar pouco, muito ou em nada mesmo da di-
ferença geral entre o valor e o preço médio do trigo. Mas Rodbertus - uma
vez que de maneira nenhuma distingue valores de preços médios e conside-
ra lei geral de todas as mercadorias e nã'o privilégio dos produtos ·agrícolas
a circunstância de serem vendidas por seus valores - tem sem dúvida de
acreditar que também o produto do pior solo tem de ser vendido por seu
valor individual. Mas esse privilégio desaparece para esse produto naconcor-
rência com produtos do mesmo gênero.
Então é po~ível que o preço médio de r esteja acima do valor de 1,
6 xelins e 8 pence por bushel. Pode-se admitir que (embora isto n5o seja de
todo correto) a procura tem de subir para haver cultivo do solo I'. Por isso,
o preço do trigo de 1 tem de elevar-se acima de seu valor, acima de 6 xelins
e 8 pence, e de maneira persistente. Nesse caso será cultivado o solo I'. Se
ao preço de 6 xelins e 8 pence pode obter o lucro médio, embora seu valor
esteja acima de 6 xelins e 8 pence, e satisfazer a procura, o preço se reduzi-
rá a 6 xelins e 8 pence, pois agora a procura de novo corresponderá à oferta,
e assim I - e também 11, III e IV - tem de ser de novo vendido a 6 xelins.
:e 8 pence; o mesmo se estende portanto a I'. Entretanto, se o preço mMio
de I' importar em 7 xelins e 8 pence, de modo que só a esse preço (muito abai-
xo de seu valor individual) proporcione o lucro normal, terá o valor do
bushel, se não houver outro modo de satisfazer a procura, de se fixarem 7 xe-
lins e 8 pence, e o preço da procura de 1 subirá acima de seu valor. O de II,

532
III e IV já está acima de seu valor indivídual, e subirá mais ainda. Mas, se
fosse prevista a importação de trigo, que de maneira nenhuma permitiria
tal configuração, 1' podería contudo ser cultivado se houvesse pequenos
arrendatários que se contentassem com menos que o lucro médio, Isso ocor-
re constantemente na agrícultura e na indústria. E também nesse caso, quan-
r
do fornece o lucro médio, pode-se pagar renda fundiária que seria apenas
uma dedução do lucro do arrendatário. Se isso também não for exeqüível,
pode o dono da terra arrendá-la a lavradores que se empenhem sobretudo,
como ocorre com o tecellfo manual, em obter o salário e lhe pagar o exce-
dente, grande ou pequeno, na forma de renda. Esse excedente poderia ser
mesmo, como no caso do tecelão manual, mera dedução náo do produto
do trabalho e sim da remuneração do trabalho. Em todos esses casos pode.
ria ser paga renda- fundiária. Num caso, seria dedução do lucro do capita-
lista. No outro, o dono da terra apropriar-se-ia do trabalho excedente do
trabalhador, do qual o capitalista, aliás, se apropria. E no último caso, es-
taria sugando o salário do trabalhador como os capitalistas o fazem fre-
qüentes vezes. Mas produção capitalista em grande escala só é possível
onde o último solo cultivado dá pelo menos o lucro médio, isto é, se o va-
lor de 1 proporciona a I' pelo menos o preço médio.
Vê-se como a distinção entre wz/or e preço médio resolve o problema
de maneira surpreendente e mostra que Ricardo e seus opositores rem ra-
zão. 35
1, o solo que dá renda fundiária absoluta, se fosse o único cultivado,
venderia o bushel de trigo pelo valor, por 6 xelins e 8 pence ou 6 6/9 xelins
e não o rebaixaria ao preço médio de 6 1/9 ou 6 xelins e l 1/3 pence. Se
crescesse a procura, se toda terra do país fosse do mesmo tipo e decuplicas-
se a terra cultivada,·e-uma vez que l dá 10 libras de renda por 100, a renda
aumentaria para 100 libras, embora só existisse um único tipo de terra. Mas
não awnentaria a taxa ou o nível da renda com relação ao capital adianta-
do nem com relação ao solo cultivado. Seriam cultivados 10 vezes mais
acres e adiantado capital 10 vezes maior. Haveria portanto mero acréscimo
do total, da massa da renda, não do seu nível. A taxa de lucro não declina-
ria, pois o valor e preço dos produtos agrícolas não se alterariam. Um capi-
tal 1O vezes maior pode naturalmente dar urna renda 1O vezes maior que a
de um capita] l O vezes menor. Entretanto, se for aplicado capital l O vezes

35. Diz Marx que, na questão do valor de mercado dos produtos agrícolas, Ricardo
e Storch enam e acertam ao mesmo tempo e que ambos omitiram o caso intermédio
(ver O Capiral, DJFEL, livro 3, vol. 4, pp. 207 e 208, nota 30),
maior na mesma área com o mesmo resultado, a taxa de renda, em confron-
to com o capital desembolsado, será a mesma; terá subido em relaçã'o à área,
mas em nada alterará a taxa de lucro.
Admitamos agora se torne o cultivo de 1 mais produtivo não por se
ter modificado a terra.e sim por se ter desembolsado mais capital constan-
te e menos capital variável, mais capítal em maquinaria, cavalos, adubos mi-
nerais etc. e menos em salário; então, o valor do trigo se aproximará de seu
preço médio e do preço médio dos produtos da indústria por se ter reduzi-
do a proporção excessiva de capital variável com o constante. Nesse caso
cairá a renda, e a .taxa de lucro ficará invariável. Se ocorresse tal mudança
no modo de produção, igualando-se com a média da indústria a proporção
entre capital variável e constante, desaparecería o excesso do valor sobre o
preço médio do trigo e portanto a renda {rent), o lucro suplementar. 1 não
pagaria mais renda, e a propriedade da terra se teria tomaçlo nominal (des-
de que ao modo de produção alterado não se juntasse porventura incorpo-
ração adicional de capital ao solo, e assim o proprietário, ao ténnino do
arrendamento, extraísse juro de um capital que nãô adiantou, meio prin-
cipal de enriquecimento do dono da terra e em tomo do qual gira a contro·
vérsía sobre o direito do arrendatário na Irlanda). Se, fora I, exístirem II,
Ili e IV, e em todos estes se tiver aplicado esse modo de produção, darão
eles contudo renda em virtude da fertilidade natural maior.que a de Í e na
medida em que são mais férteis. Nesse caso 1 teria cessado de dar renda fun.
diária, e em correspondência as rendas de II, III e IV teriam :Caído, pois o
nível geral da produtividade na agricultura se teria igualado ao da indústria.
A renda de II, Ili e IV corresponderia à lei ricardiana; seria simplesmente
igual ao lucro suplementar -~ e só como tal existiria - ·<le solo mais fértil
em confronto com solo menos fértil, em analogia com os lucros suplemen·
tares da indústrta, só que a estes falta a base natural para se fixarem.
A lei ricardiana também reinaria mesmo quando não existisse pro-
priedade fu1Ulidria. Abolida a propriedade da terra e mantida a produção
capitalista. remanesceria esse lucro suplementar emergente da diferença de
fertilidade. Se o Estado se apropriasse da terra e prosseguisse a produção
capitalista, a renda de ll, -Ili e IV seria paga ao Estado, a própria Rind~ con-
tinuaria a existir. Se a terra se tomasse propriedade do povo, desapareceria
em geral a base da produção capitalista, o fundamento sobre que se apóia
a autonomia, em face do trabalhador, das condições de trabalho.
Uma questão, a esclarecer mais tarde, relativa à renda fundiária: co-
mo pode ascender o valor e o volume da renda fundiária com agrfoultura
ma.is intensiva, embora decline a taxa dessa renda eqi relação ao capital

S34
adiantado? E claro que isso só é possível porque aumenta o montante do
capital adiantado. Se a renda é 1/5 e se toma 1/10, 20 X 1/5 = 4 e
50 X 1/10 = 5. Esse é o único efeito. Se a agricultura intensiva adquiris·
se as mesmas condições em média prevalecentes na indústria, em vez de
apenas se aproximar delas, desapareceria a renda do terreno menos fértil
e reduzir-se-ia, para o terreno mais fértil, a mera diferença de solo. Deixa-
ria de existir a renda abroluta.
Admitamos agora que, por aumentar a procura; se passe do cultivo
do terreno l para o II. 1 paga a renda absoluta, II pagaria renda diferencial,
mas o preço do trigo (valor para I, valor suplementar para II) ficaria o mes-
mo. A taxa de lucro também não seria alterada. E assim por diante até se
chegar ao solo IV. Por conseguinte, também sobe o nfvel, a taxa da renda
se o câlculo abrange o capital despendido em 1, II,Ilie.IV. Mas a taxamédia-de
lucro de II, III e IV permaneceria a mesma de 1, igual à da indústria, à taxa
geral de lucro. Subindo-se portanto para terras mais férteis, podem crescer
o montante e a taxa de renda, embora não varie a taxa de lucro e perma-
neça constante o preço do trigo. A fecundidade crescente do capital em
U, III e IV, e não a decrescente em 1, teria causado- a alta na taxa e no
montante da renda. A produtividade crescente, ao contrário do que neces-
sariamente sucede na indústria, não aumentaria o lucro nem reduziria o
preço da mercadoria e o salário.
Mas, se ocorrer o processo oposto, indo de IV para III, II e 1, o preço
subirá até 6 xelins e 8 pence, ao qual ainda haverá em 1 renda de 10 libras
para cada 100. Assim, o trigo em IV, para cada 100 libras, dá renda de
17 7 /25, mas destas 7 7/25 são excesso de seu preço sobre o valor de 1.
O solo 1 proporcionou por 100 libras (com renda de 10 libras e o bmhel
no vtµor de 6 xelins e. Jl pence) 360 bushels. O II, 432 bushels; o III, 518
bushels, e o IV, 622 2/25 bushels. Com o bushel ao preço de 6 xelins e
8 pence, IV deu uma renda suplementar de 7 7 /25 para cada 100. IV vende
3 bushels por l libra ou 622 2/25 por 207 9/25 libras. Mas o valor é apenas
de 120 libras, como em I; o excedente é apenas o excesso do preço sobre
o valor. IV venderia o quarter ou melhor o bushel pelo valor se o vendesse
por 3 xelins e 1O 8/27 pence, e por esse preço obteria de 100 libras 1O de
renda. Com o movimento de IV para Ili, de III para II e de II para I sobe
o preço (e com ele-a renda/do bushel até afinal atingir 6 xelins e 8 pence
~m 11 onde o preço proporciona a mesma renda que antes fornecia em IV.
Com a ascensão do preço cairá a taxa de lucro, em parte por subir o valor
dos meios de s.ubsistêncta e das matérias-primas. O movimento de IV para
Iii poderia ooo.rrer desta maneira: em virtude da procura, cí"preço de IV

535
sobe acima do valor, fornecendo, além da renda, renda suplementar. Por
isso cultiva-se Ill, que a esse preço e suposto o lucro médio usual não deve
proporcionar renda. Se com a alta do preço de IV não tiver caído a taxa de
lucro mas o salário, III proporcionará o lucro médio. O salário, porém, de·
ve elevar-se ao nível nonnal em virtude da oferta de III; cairá então a taxa
de lucro em 1ll etc.
Cai portanto a taxa de lucro nesse movimento declinante confonne
os pressupostos estabelecidos: IlI não pode dar renda ao preço de IV, e l i
só pode ser cultivado com a. taxa de lucro antiga por causa da queda mo-
mentânea do nível do salário.
Nessas condições pode vigorar a lei de Ricardo. Mas não necessaria-
mente, nem mesmo em sua concepção. Só pode vigorar em determinadas
conjunturas. Na realidade os mo'<imentos sãü contraditórios.
Isto encerra, na essência, a teoria da renda (rent).
Para Rodbertus a renda fundiária deriva da natureza eterna, pelo me·
nos da produção capitalista, em virtude de sua idéia do "valor da matéria·
prima". Para nós resulta de uma diferença histón"ctz nos componentes orgâ-
nicos do capital, a qual pode em parte eliminar-se e mesmo desaparecer por
completo com o desenvolvimento da agricultura. Sem dúvida, desde que se
origine apenas da variação da fertilídade natural do solo, a difere~ça rema-
nesce, mesmo que tenha desaparecido a renda absoluta. Mas -::" omitindo-se
de todo a possível igualação das diferenças naturais - essa renda 4iferenci.al
se liga à regulação do preço de mercado e por isso desaparece_ com o preço
e com a produção capitalista. Só restaria o fato de o trabalJw Social cultivar
solos de fertilidade diverS11, e então, apesar da quantidade- diferente de tra-
balho aplicado, pode este se tornar mais produtivo em ,todos os tipos de
terrenos. Mas a quantidade maior de trabalho que o terreno pior despende
não teria de redundar em pagamento de má.is trabalho para o terreno me-
lhor, como no sistema burguês. Ao contrário, o trabalho poupado em IV
seria utilizado para melhorar III, o poupado em III para melhorar II, e por
fim o de II para melhorar I; assim, o capital todo devorado pelos donos das
terras serviria para igualar o trabalho da terra e para· reduzir o trabalho em
geral aplicado na agricultura.
(Como vimos 36 , A. Smith primeiro concebe com acerto o valor e are-
lação entre lucro, salário etc., componentes desse valor, mas depois, ao
revés, considera como antecedentes necessários os preços do salário, do
lucro, da renda fundiári~ e procura defmi-los como elementos aut_ônomos,

36. Ver, no vol 1 desta tradução, pp. 47-64 e 73· 76.

536
para com eles compor o preço da mercadoria.. Nessa reviravolta procura
de início apreender a coisa em seu nexo causal e depois, na forma inversa,
como ela aparece na concorrência. Comporta-se ingenuamente com ambas
as idéias que nele se entrecruzam, sem perceber a contradição. Rícardo,
ao contrário, de maneira consciente abstrai da forma, da aparência da com-
.petição, para apreender as leis como tais. Cabe criticá-lo, por um lado, por
não avançar nem ser conseqüente bastante na abstração, e assim, por exem-
plo, ao interpretar o valor da mercadoria, logo se deixa íníluenciar por con-
siderações relativas. a condições concretas de toda espécie; p.or outro lado,
por conceber a forma fenomenal, de maneira imediata e direta, como pro-
va ou representação das leis gerais, sem explicd-la. No primeiro caso, sua
abstração é por demais incompleta, e no segundo é abstração formal, falsa
em si mesma.)

lü. Taxa de renda e taxa de lucro. Relação


entre a produtividade da agricultura e a da
indústria nos diferentes estágios do
desenvolvimento histórico

E agora um b.reve retorno ao que resta de Rodbertus.

"O aumento de salárío, de ganho de capital ou de renda fundiária, orfün-


do do acrescimo do valor do produto nacional, nãô pode elevar o salário
nem o ganho do capital da nação, pois o salário maíor se reparte por um.
maior número de trabalhadores, e o maior ganlto de eapital corresponde a
capital acrescido na mesma proporção; a renda fundiária, entretanto, tem
de $Ubir, pois cabe sempre às terras, invariáveis na extensão. Assim pode
ela explicar bastante a grande elevação do valor dtZ te"o, o qual nada mais é
que renda fundiária capitalizada segundo a taxa de juro usual, e dispensa
o argumento da improdutividade crescente do trabalho agrícola, impro-
dutividade que contradiz frontalmente a idéia da perfectibilidade da so-
ciedade humana e todos os fatos agrícolas e estatísticos" (pp. 160, 161).

De início importa observar que nenhures procura Rícardo explicar a


"grande el.evaçiio do valor da terra". Isso não é problema para ele. Ricardo
diz ademàis, e faz mesmo uma observação precisa (ver Rícardo mais adian-

537
te), que - dada a taxa de renda fundiária - a re,nda fundiária pode acrescer
sem se alterar o valor dos cereais ou do produto agrícola37 • Esse aumento
também não é problema para ele. O acréscimo do montante de renda, quan-
do a taxa permanece a mesma, não lhe é problema. O problema para ele é
a elevação da taxa de renda, isfo é, a relação entre a renda e o capital agrí-
cola adiantado, e por isso também o acréscimo do valor e não do volu-
me do produto agrícola, mas do valor, por exemplo, de um quarter de
trigo, da mesma quantidade de produto agrfcola, com o que aumenta
o excesso desse valor sobre o preço médio e em conseqüência o exces-
so da renda sobre a taxa de lucro. Rodbertus elimina aí o problema
ricardiano (para não falarmos de seu errôneo "valor da matéria-prl-
ma").
Sem dúvida pode a taxa de renda subir em relação ao capital adian·
tado, isto é, o valor relativo do produto agrícola em confronto com o pro-
duto industrial, embora a agricultura se tome cada vez maia produtiva. E
isso pode ocorrer por dois motivos:
Primeiro: tomemos o exempl.o acima, a passagem de 1para11, III e
IV, isto é para terras cada vez mais férteis (mas sem que a oferta a~cional
seja bastante para lançar 1 fora.de .cultivo ou se reduu a diferença entre
valor e preço médio a ponto de IV, 111 e II pagarem rendas proporcional-
mente mais baixas e I nenhuma). Se em 1 a renda for 10, em JI 20, em III
30 e em IV 40, e forem investidas 100 libras em todos os tipos ,de terras,
a renda em 1 será 1/10 ou 10% do capital adiantado, em II 2/10 Õu 20%, em
III 3/10 ou 30%, e em IV 4/10 ou 40%. Ao todo 100 libras para 400 de ca·
pital adiantado, o que à taxa média de renda dá 100/4 = 25%. Consideran-
do-se o capital todo empregado na agricultura, a renda importa agora em
25%. Se fosse ampliado apenas o cultivo do solo I, a renda importaria em
40/400, 10% corno dantes, e não teria tido os 15% adicionaís. Mas, neste
caso (se 330 bushels correspondem a dispêndio de 100 libras em I) seriam
produzidos somente 1 320 bushels ao preço de 6 xelins e 8 pence; no outro
caso são produzidos 1 518 bushels ao mesmo preço. Nos dois casos adian-
ta-se o mesmo capital.
Mas ai a elevação do m'vel da renda é apenas aparente. 38 E que, se
cakularmos o dispêndio do capital em relação ao· produto, em 1 são neces-

37. Ver neste volume pp. 746 e 747.


38. A elevação do nível da tenda só é aparente no sentido de se fundamentu
ela num "falso valor social". Marx trata dessa questão no livro 3 de O Capital, Ed.
DIFEL, vol. 6, pp. 757 e 758.

538
sárias 100 libras para se produzirem 330 bushels, e 400 para se produzirem
1 320 bushels. Agora, porém, são necessárias apenas l 00 + 90 + 8J + 70,
isto é, 340 libras, para se produzirem 1 320 bllShels.. Em II 90 libras produ·
zem tanto quanto 100 em I, em III 80 tanto quanto 90 em II, em IV 70
tanto quanto 80 em III. Em II, UI e IV elevou.se a taxa de renda fundiária
em confronto com a de I.
Se considerarmos a sociedade inteira, para produzir o mesmo produ-
to seria aplicado capital de 340 em vez de 400, isto é, 85% do anterior.
Os l 320 bushels apenas se repartem de maneira diversa da do pri·
melro caso. Para 90 de capital, o arrendatário tem de ceder o mesmo que
antes para 100; para 80, o mesmo ciue antes para 90, e para 70, o mesmo
que antes para 80. Mas os dispêndios de capital de 90, 80 e 70 lhe dão o
mesmo produto que o dispêndio anterior de 100. Cede mais não por ter de
empregar capital maior para fomecer o mesmo produto, mas por empre-
gar menos capital, não por se ter tomado o capital menos produtivo e sim
mais produtivo; entretanto, continua a vender ao preço de 1, corno se pre·
cisasse ainda do mesmo capital para produzir a mesma quantidade de p_ro.
duto.
Segundo. Além desse aumento da taxa de renda - o qual coincide
com a elevação desigual do lucro suplementar em ramos isolados da indús-
tria, embora aí não se fixe - só há para taxa de renda wna segunda possi-
bilidade de subir, embora invariável o valor do produto, isto é, o trabalho
nã'o se toma menos produtivo. Isso ocorre quando a produtividade da agri-
cultura permanece a mesma e sobe a da indlistria, e essa elevação se expres-
se na queda da taxa de lucro. Isto é, quando se reduza a proporção do ca-
pital variável com ..o constante. Ou também quando a produtividade sobe
na agricultura, mas não em proporção igual à observada na indústria e sim
menor. Se a produtividade na agricultura aumenta na razão de 1 : 2, e na in-
dústria na razão de 1 : 4, relativamente é o mesmo que tivesse ela continua·
do igual a 1 na agricultura e dobrado na indústria. Nesse caso, o capital
variável em relação ao constante decresceria na indústria duas vezes mais
rápido que na agricultura.
Nos dois casos cairia a taxa de lucro na indústria e, por ter caído, su-
biria a taxa da renda fundiária. Nos demais casos, a taxa de lucro não sofre
queda absoluta (ao contrário, permanece comtante) mas relativa, confron-
tada com a renda fundiária, não por ela mesma cair, mas por subir a renda
fundiária, a taxa da renda fundiária em relação ao capital adiantado.
Ricardo não distingue entre esses casos. Excetuados eles (ísto é, quan-
do varia a proporção geral entre capital constante e capital variável em vir·

539
tude da produtividade acrescida da indústria, e da( aumentar o excesso do
valor sobre o preço médio na agricultura, ou quando a taxa de lucro, embo·
ra constante, experimenta q~da relativa por causa das rendas diferenciais
do capital aplicado em terra& mais férteis), a taxa de renda fundiária só po-
de subir quando a taxa de lucro declina sem tornar-se a indústria mais
produtiva. Mas isso só é possível se o salãrio subir ou a matéria-prima au-
mentar çle valor em virtude da menor produtividade da agricultura. Então,
a queda da taxa de lucro e a elevação da taxa da renda fundiária resultam
da mesma causa - a produtividade decrescente da agricultura, do capital
empregado na agricultura. É o que pensa Ricardo. Inalterado o va1or do di-
nheiro, isso tem de se revelar na alta dos preços das matérias-primas. Se a
alta é relativa, como acima, mudança nenhuma no preço do dinheiro pode
elevar de maneira absoluta os preços em dinheiro dos produtos agrícolas
em confronto com os industriais. Se o dinheiro cair em 50%, l quarter de
trigo que vali a 3 libras passa a valer 6, e uma libra-peso de fio que valia
l xelim sobe para 2. As variações no dinheiro nunca podem portanto ex-
plicar a aJta absoluta dos preços em dinheiro dos produtos agrícolas, ~­
parados com os industriais.
Em geraJ pode-se supor que 110 modo de produção rudinientar, pré-
capitalista, a agricultura é mais produtiva que a indústria, pois a ·natureza
na função de máquina e organismo coopera com aquela, enquanto na in-
dústria as forças naturais ainda são quase por completo substituídas pela
força humana (o que se dá na indústria artesanal etc.); na wancia tempes-
tuosa da produção capitalista, a produtMdade da indústria se &senvolve.
rapidamente, confrontada com a agrícola, embora esse desenvolvimento.
pressuponha já ter ocorrido na agricultura variação importante entre capi-
tal constante e capital variável, isto é, o êxodo de grande número de seres
humanos. Mais tarde a produtividade avança em ambas, embora em ritmo
desigual. Mas, ao atingir a indústria certa altitude, a desproporção tem de
decrescer, isto é, a produtividade da agricultura deve ter acréscimo relativo
mais rápido que a industrial. Isso requer: (1) substituição do agricultor
preguiçoso pelo homem de negócios, o arrendatário capitalista, transforma-
ção do lavrador em mero assalariado, agricultura em grande escala, com
capitais concentrados portanto; (2) sobretudo a verdadeira base cientifi-
ca da indústria moderna, a mecânica, que no século XVlll atingira certo
nível de acabamento. Só no século XIX, em particular nas últimas déca·
das, desenvolvem-se as ciências que formam de maneira direta, em grau
mais alto, as bases específicas da agricultura como da indústria: a química,
a geologia e a fisiologia.

540
É disparate falar da maior ou menor produtividade de dois ramos
industriais comparando apenas o valor das respectivas mercadorias. Se em
1800 a libra-peso de algodão = 2 xelins e a do fio ""' 4, e em 1830 o valor
do algodão se fixar em 2 xelins ou 18 pence, e o do fio em 3 xelins ou 1
xelim e 8 pence, pode-se comparar a proporção em que cresceu a produ-
tividade nos dois ramos. Mas. sõ porque se toma por ponto de partida o
nível de 1 800. Ao revés, por ser a libra-peso de algocj.ão = 2 xelins e a do
fio""' 3, isto é, o trabalho que produz o algodão o dobro do novo trabalho
adicionado, o de fiar, é tolice dizer que este é duas vezes mais produtivo
que aquele. Tolice tamanha como a de dizer que, por ser o custo de fazer
a tela menor que o da obra do pintor sobre ela, este trabalho é menos pro-
dutivo que aquele.
O correto, embora abranja o sentido capitalista de produtivo - pro-
dutivo de mais-valia ~ consideradas ao mesmo tempo as quantidades rela-
tivas do produto-, é apenas o seguinte:
Se, em média, de acordo com as condições de· produção, são neces-
sárias 500 libras em matéria-prima, maquinaria etc. (dados os respectivos
valores), _para empregar 100 trabalhadores por 100 libras na índústria têX·
til algodoeira, e necessárias 150 libras em matéria-prima e maquinaria pa·
ra empregar l 00 trabalhadores por l 00 libra! na cultura do trígo, então o
capital variável em I representa l /6 do capital total de 600 libras, e l / 5 do
capital constante; em II o capital variável representa 2/5 do capital total
de 250 libras e 2/3 do capital constante. Assim cada 100 libras despendi-
das em I só pode conter 16 2/3 libras de capital variável e tem de conter
83 1/3 de capital constante; em II, entretanto, 40 libras de capital variável
e 60 de capital constante. Bm 1 o capital variável constitui 1/6 ou 16 2/3%
e em 11 40%, Vê-se corno são deploráveis as atuais histórias de preços. E só
podem ser deploráveis até que a teoria lhes mostre o que têm de pesquisar.
Dada a taxa de mais·vaÍia, 20% por exemplo, a niais-valia em I = 3 l /3 libras
(lucro portanto de 3 l /3%). Em II, entretanto, 8 libras (lucro portanto de
8%). O trabalho em 1 não seria tão produtivo quanto em II por s-er mais
produtivo (isto é, não seria tão produtivo de mais-valia por ser mais pro-
dutivo de produto). E claro, diga-se de passagem, que na indústria têxtil
algodoeira, por exemplo, a razão de 1 :1 /6 só é possível quando por ven-
tura se despende capital constante (isso depende das máquínas etc.) no
montante de l O 000 libras, por conseguínte salários no montante de 2 000,
isto é, um capital global de l 2 000. Se fossem despendidas apenas 6 000
libras das quais 1 000 em salários, a maquinaria seria menos produtiva etc.
Com 100 ·essa indústria não teria possibilidade alguma de funcionar. Entre-

541
tanto. é possível que, despendidas 23 000 libras, ocorra acréscimo na efi-
ciência da maquinaria, outras economias etc., de modo tal que as 19 166 2}3
libras talvez não correspondam por inteiro a capital constante, mas que
mais matéria-prima e a mesma quantidade de trabalho exijam menos ma-
quinaria etc. (em valor), nela economizando-se, digamos, 1 000 libras, En-
tão cresce por sua vez a proporção do capital variável com o constante,
mas só por ter crescido o capital absoluto. Isso é um freio à queda da taxa
de lucro. Dois capitais de 12 000 produzirão a mesma quantidade de mer-
cadoria que um de 23 000, mas primeiro as mercadorias serão mais caras,
pois custam mais 1 000 libras de dispêndio, e segundo a taxa de lucro será
menor, pois no capital de 23 000 libras o capital variável> 1/6 do capital
total, maior portanto que na soma dos dois de 12 000.
(Com o progresso da indústria, a maquinaria se torna mais eficaz
e mais barata, e em conseqüência decresce essa parte do capital constante
na agricultura se nela se empregar a mem'la quo.ntidaà.e anterior de maqui-
naria, mas essa quantidade avança mais rápido que o declínio de preço da
maquinaria, pois esse fator aínda está pouco desenvolvido na agricultura.
Ademais, com ·a produtividade da agricultura cai o preço da matéria-prima -
ver algodão -, e desse modo a matéria.prima como componente do proces-
so de fonnar valor não aumenta na mesma proporção em que açresce como
componente do processo de trabalho.) ··

Já Petty dizia que os donos das terras de seu tempo temiam ~s benfei-
torias na agricultura, pois causariam queda do preço dos .produtos agríco-
las e da renda fundiária (quanto ao nível); do mesmo modo, o aumento de
terras e cultivo de terras até então não utili2.adas = ácréscimo do solo.
(Na Holanda pode-se perceber esse acréscimo de terra (propriedade fun-
diária) de maneira ainda mais direta.) Diz ele:

"Os donos das terras resmungam contra a drenagem de pântanos, o apro-


veitamento de florestas, o ce1camento de tems comuns, a seméadura
de esparzeta e tzevo, por serem os meios pua rebaixar os P?eços dos ali-
mentos" (p. 230, Po/. Arith., Londres, 1699).
("A renda fren.tl de toda a Inglatena, Gales e das tenas baixas da Esc6·
eia é de cerca de 9 milhões de libras po1 ano.") (l.c.., p. 231.)

Petty combate aqueJe modo de ver, e D'Avenant prossegue revelando


como o n(vel da renda (rent) pode decrescer e não obstante aumentar o
montante ou o total da renda. Diz ele:

542
"As rendas podem cair em certos lugares e condados, e entretanto terem
melhoria constante as terras da nação" (ele quer dizer o valor das ter·
ns), "por exempfo,.quando desmoitam partes, usurpam e cercam flores-
tas e tenas comuns, drenam pântanos e beneficiam muitas áreas" {do
país) "por meio da indústria e da adubação. Então tem de se depreciar
por certo a terra que foi antes beneficiada por completo e onde não mais
cabe melboria ulterior. Asrim decai a receita em renda fundiária dos par-
ticulares, mas ao mesmo tempo aumenta a renda geral do reino em vir-
tude dessas melhorfas" (pp. 26, 27). "De 1666 a 1668 caíram as rendas.
(renttJ particulares, mas a ascensão na totalidade da renda geral do reino
foi de maior proporção que nos anos anteriores, porque a.~ melhorias da
temi entre aqueles dois limites do tempo foram maírues·e mais general\-.
zadas que em qualquer época a[lterior" (p. 28, D'Avenant,DiscourSe$ on
the l'ublick Revenuet etc.~ Pa.rt Il, Londres, 1698).

Ai ve-se também que os ingleses entendem sempre por nível de renda


(rem) a renda em relação ao capital e nunca em relação à 'totalidade da ter-
ra do reino (ou o acre em geral, como Rodbertus).

543
Capítulo IX
Observações sobre a história da
descoberta da chamada Lei
Ricardiana. Observações complementares
sobre Rodbertus (digressão)

1. Anderson descobre a renda diferencial.


Malthus o plagia e lhe deforma as idéias no
interesse dõs donos das terras.

Anderson era experiente arrendatário. Sua primeira obra, onde se ven-


.tiia de passagem a natureza da renda, apareceu em 177739 , tempo em que
Sir James Steuart aínda era o economista dominante para parte do público,
mas em que a atenção geral se dirigia para a Riqueza dlU Nações (Wealth of
Nations), aparecida um ano antes. Em contrapartida não podia despertar
interesse a obra do agricultor escocês, escrita por causa de uma controvér-

39. Anderson, An inquiry fnto the nature of the com laws, with a vzew to the
new corn bill proposed for Scotland, Edimburgo, 1777.

545
sia de caráter prático e imediato, sem o propósito de tratar da renda (rent),
e que explicava a natureza dela apenas como tema incidental. Nessa obra
tratou Anderson da renda em caráter acidental e não premeditado. Sua teo-
ria sobre ela reaparece, também de passagem, em um ou dois de seus ensaios
da coletânea que ele mesmo publicou em 3 volumes sob o título: Essays.
Relating to Agriculture anà ro.ral Affairs, 3 vol., Edimburgo, 1775-1796.
O mesmo se dá na obra Recreations in Agrirulture, Natural History, Arts
etc., Londres {consultá-la no British Museum40 ), publicada de 1799 a 1802;
obras todas destinadas diretamente a arrendatários e agricultores. A coisa
mudaria de figura se Anderson tivesse pressentido a importância do acha-
do e o singularizasse para o público no título "Inquiry into the nature of
rent", ou possuído em grau mínimo, para explorar o comércio das próprias
idéias, o talento que o conterrâneo MacCulloch tinha para explorar o comér-
.cio com as idéias alheias e com tanto sucesso. As reproduções de sua teoria
em 1815 apareceram de imediato como se fossem pesquisas teóricas dele
independentes sobre a natureza da renda, o que já denotam os títulos das
obras de West e Malthus:
Malthus: Inquiry into the Nature and Progress of Rent West: Essay
on the Application of Capital to Land.
Além disso, Malthus utilizou à teoria andersoniana da renda para dar
pela primeira vez fundamento tanto econônúco-nacional quanto real· (his-
tórico-natural) à sua teoria da população, e a progressão geométrica e
aritmética, tolice que tomou de empréstimo a autores precedentes, cons-
tituía hipótese meramente ilusória. Mr. Malthus "tirou partido" imediato
da ocasião. Ricardo até fez daquela doutrina da renda, confÓrme ele mesmo
diz no prefácio 41 , um dos elos mais importantes do sistema global da eco-
nomia política ·e ]he deu - omitindo-se por inteiro o lado prático - um al-
cance teórico inteíramente novo.
Ricardo, pelo visto, não conhecia Anderson, pois no prefácio de sua
Economia política considera West e Malthus os descobridores. West, pela
maneira original como expõe a lei, podia não conhecer Anderson. como
Tooke desconhecia Steuart. A coisa muda com Malthus. Um cotejo cuida-
doso de sua obra evidencia que conhece e utiliza Anderson. Era em subs-
tância plagiário por ofício. Basta confrontar a primeira edição de sua obra

40. British Mun:um - o museu nacional britânico, em Londres, fundado em


1753. Sua parte mais i.mportant:e é a tn"bliotec:a, uma das maioxes do mundo, e o.nde
Marx realizava pesquisas.
41. "Prefácio" à primeira edição ela obra de Ricardo On the principies of political
economy, and taX11tkm, publicada em dois volumes, em Londres, 1776.

546
sobre população com a anterior do reverendo Townsend 42 por mim cita-
da, para se ter a certeza de que ele, em vez de utilizá-lo à maneira de um
produtor independente, o copía e parafraseia como plagiador servil, embo-
ra nenhures o mencione e lhe oculte a existência.
E característica a maneira como Malthus se serviu de Anderson.
Anderson defendera prêmios de exportação para cereais e tributos sobre
a importação de cereais, não na base do interesse dos donos das terras,
mas por acreditar que esse tipo de legislação "moderasse o preço médio
dos cereais" e assegurass~ desenvolvimento equilibrado das· forças produ-
tivas da agrícultura. Malthus aceitou essa aplicação prática formulada por
Andersen, porque - membro autêntico da Igreja Oficial da lnglaterra -
era sicofanta profissional da aristocracia fundiãria, cujas rendas, sinecuras,
dissipação, desunia.nidade etc. justificava no plano econômico. Malthus só
representa os interesses da burguesia industrial até o ponto em que se iden-
tificam .com os da propriedade fundiária, da aristocracia, isto é, se opõem
à massa do povo, ao proletariado ;mas, quando divergem os interesses daquelas
duas esferas e assumem posições antagônicas, coloca-se ele do lado da aris-
tocracia_ contra a burguesia. Daí sua defesa dos "trabalhadores improdu~
vos", do superconsumo etc.
Anderson, ao revés, explicara a diferença entre solo que paga e o que
não paga renda ou entre terras que pagam rendas de magnitudes desiguais,
por meio da baixa fertilidade relativa da terra que não dá renda ou fornece
renda mencr, em confronto com a terra que dá renda ou renda maior. Mas
dissera de maneira terminante que esses graus de fertilidade relativa em
di/erentes tipos de terra, em conseqüência também a ball:a fertilidade rela-
tiva dos piores tipo_s de solo, comparados com os melhores, nada têm a ver
com a produtividade absoluta da agricultura. Ao contrário, acentuara que
a produtividade absoluta de todos os tipos de solo pode ser sempre aumen-
tada e tende a crescer com o progresso da população; além disso fora mais
adiante e afirmara que as desigualdades na fertilidade dos diferentes tipos
de solo podem ser niveladas de maneira progressiva. Diz que o atual estádio
de desenvolvimento da agricultura na Inglaterra não proporciona uma
idéia do desenvolvimento agrícola posstvel. Por isso dissera que num país
os preços dos cereais podem ser altos e a renda baixa, e noutro, os preços

42. Obra de Joseph Townsend,A diatertation on the poor laws... , citada po1 Marx
no m~uscrito de 1861-1863, caderno m, cap. ''Mais-valia absoluta" (pp. 112 e 113).
Marx repro.;tuz as três citações aí apresentadas em O CtJpital, F..d. DiFEL, livro 1, vol. 2,
p. 750.

547
dos cereais; baixos, e a renda, alta; e isso decorre de seu princípio, pois nos
dois países o que determina o nível e a existência das rendas é a diferença
entre os terrenos mais férteis e os menos férteis e, em nenhum deles, é a
fertilidade absoluta; em cada um, são apenas as gradações na fertilidade dos
típos existentes de terras, e em nenhum é a fertilidade média desses tipos
de terras. Conclui daí que fertilidade absoluta da agricultura nada tem a ver
com a renda. Por isso declarou-se mais tarde, conforme veremos mais adian·
te4~, decidido advers·ário da teoria malthusiana da população, sem pressen-
tir que sua própria teoria da renda ia servir de fundamento a essa monstruo-
sidade. Para Anderson, a alta dos preços dos cereaís na Inglaterra de 1750-
1801 • em confro"nto com 1700-17 50, não era devida ao cultivo de tipos de
tena .cada vez menos férteis, mas à influência da legislação sobre a agricul·
tura.nesses doís períodos.
Que fez então Malthus?
Justificou sua teoria da população com a teoria de Anderson e não
com a sua quimera (também plagiada) da progressão geométrica e arítmé·
tica, a "frase" que manteve. Conservou de Anderson a aplicação prática
da teoria naquilo que era de interesse dos donos das terras - e esse fato por
si só demonstra que, da conexão, dessa teoria com o sistema da economia
burguesa, entendia tão pouco quanto o próprio Anderson; torcia-a contrn.
o proletariado, sem se deter nas provas em contrário aprésentadas pelo
descobridor da teoria. DeiXou para Rieardo o avanço teórico e prático que
se podia fazer a partir dessa teoria - teórico, por detemúnar 9 valor da
mercadoria etc. e penetrar na natureza da propriedade fundiária; prático,
por negar a necessidade da propriedade privada da terra na base da produ-
fiío burguesa e, de maneira circunstanciada, por se op6r a todas as medi·
das governamentais como as leis sobre cereais, as quais fortaletjam a pro·
páedade fundiária. A única utilização prática que Malthus extraiu foi uma
defesa da proteçiío aduaneira que os donos das terras exigiram em 1815:
serviço de sicofanta para a aristocracia e nova j~tificação da miséria dos
produtores de riqueza, nova apologia dos exploradores do trabalho. Por
este aspecto, serviço de sicofanta para os capitalistas industriais.
Baixeza congênita de caráter é o que nele se vê, baixeza que só se
pode permitir um padre' que identifica na miséria humana o castigo pelo
pecado original e sobretudo precisa de "um vale terreal de lágrimas", mas
ao mesmo tempo, em vista da eõngrua que recebe e com a ajuda do dogma

43. Ver, neste volume, pp. 574 e segs.

548
da predestinação, acha vantajoso em extremo "dulcificar" a pennanêncía
das elas.ses dominantes nesse mundo de prantos. Essa baixeza se revela
também no domínio científico. Primeiro, em sua atividade cínica de pla-
giador habitual. Segundo, nos resultados que mfere de premissas científi-
cas, prisioneiros e não libertos das reverências.

2. Desenvolvimento das forças produtivas,


princípio fundamental de Ricardo na
avaJ iação dos fenômenos econômicos.
Malthus defende os elementos mais
reacionários das classes dominantes.
Darwin na realidade refuta a teoria
malthusiana da população.

Cqm razão para seu tempo, Ricardo considera o modo capitalista de


produção o mais vantajoso para a produção em geral, o mais vantajoso pa-
ra a geração de riqueza. Quer a produfifo pela produção, e está certo. Que-
rer sustentar, como o fizeram os adversários sentimentais de Ricardo, que a
produção como -tal não é o objetivo, é esquecer que a produção pela pro-
dução significa apenas desenvolvimento das forças produtivas humanas,
ou seja; desenvolvimento da riqueza da natureza humana (',(}mo fim em si.
Opor a essa finalidade o bem do indivíduo. é afirmar que o desenvolvimen-
to da espécie tem _sie ser detido para assegurar o bem do indívíduo, e que
assim não se deve, por exemplo, conduzir uma guerra onde, seja como
for, alguns indivíduos pereçam (Sismondi só tem razão contra os econo-
mistas que dissimulam ou negam essa contradição). AMm da inutilidade
de tais meditações edificantes, deixa-se de compreender que esse desen-
volvimento das aptidões da espécie humana, embora se faça de Início às
custas da maioria dos indivíduos e de clas:res inteiras, por fim rompe esse
antagonismo e coincide com o desenvolvimento do indivíduo isolado;
que assim o desenvolvimento mais alto da índividwlidade só se conquista
por meio de um processo histórico em que os indivíduos são sacrificados,
pois as vantagens da espécie no reino humano, animal ou vegetal só se
impõem às custas das vantagens dos indivíduos, em virtude de essas van-
tagens da espécie coincidirem com as vantagens de indivi"duos especiais,
as quais ao mesmo tempo constituem a força desses privilegiados.

549
Assim a dureza de Ricardo constituía probidade cientifica e se im-
punha cienlificamente de seu ponto de vist~. Por isso, para ele tanto f:12
que o desenvolvimento ulterior das forças produtivas liquide proprieda-
de .da terra ou trabalha.4ores. Esse progresso, mesmo que desvalorize o
capital da burguesia industrial, é-llte por igual benvindo. Se o desenvolvi-
mento da força produtiva desvaloriza de metade o capital fixo existente,
que importa, diz Ricardo. Duplicou a produtividade do trabalho huma-
no. Há portanto probidade denttfica. Se no todo a concepção de Ricar-
do se ajusta ao interesse da burguesia industrial, isto se dá somente par-
que e até o ponto em que esse interesse coincide com o interesse da pro-
dução ou do desenvolvimento produtivo do trabalho humano. Quando
se opõe a e~te interesse, a impiedade de Ricardo contra a burguesia é a
mesma das outras ocasiões em que ele é contra o proletariado e a aristo-
cracia.

Mas Malthus! Esse miserável extrai das premissas cientificamente


dadas (que sempre furta) apenas aquelas conclusões que são "agradáveis"
(de proveito) para a aristocracia, mas contrárias à burguesia, e agradáveis
para ambas, mas contrárias ao proletariado. Por isso, nã"o quer a produçlio
pela produção, mas só até o ponto em que ela mantém ou infla o instituí-
do, convém ao interesse das classes dominantes.
Já seu primeiro trabalho, um dos mais espantoso.s exemplos literá-
rios do sucesso do plágio às custas das obras originais, tinha "no plano eco-
nômico" o objetivo prático de demonstrar, no interesse do regime inglês
instituído e da aristocracia fundiária, que eram utópicas as tendências de
perfectibilidade da Revolução Francesa e dé seus ad_eptos na lnglate"ª·
lsto é, tratava-se de um panfleto laudatório das condições vi.gentes, con-
trário ao desenvolvimento histórico e que, além disso, justificava a guerra
contra a França revolucionária.
Seus escritos de 181 S sobre tarifas aduaneiras e renda fundiária ha·
viam de confirmar em parte a apologia anterior da miséria dos produtores,
de defender em particular a reacionária propriedade da terra contra oca-
pital "esclarecido'', "Hberal" e "progressista", e de justificar muito espe-
ciabnente um retrocesso proposital da legislação inglesa no interesse da
aristocracia contra a burguesia industrial.44 Por fim seus "princípios de eco-

44. Alusão à lei dos cereaís de 1815, lei que proibia. a entrada de trigo na Inglater-
ra enquanto o preço do trigo se mantivesse abaí:xo de 80 xelins por quarter.

550
.nomia política" contra Ricardo tinham, na essência, o objetívo de reduzir
as exigêncías absolutas do "capital industrial" e das leis sob as quais se de-
st!Dvolve sua produtividade, aos "limites vantajosos" e "desejáveis" para os
interesses existentes da aristocracia fundiária, da ..Igreja Oficial" (a que
Malthus pertence), dos pensionistas do governo e consumidores de tribu-
tos. Chamo de ''vil" um homem que procura acomodar a ciência a um
ponto de vista que dela mesma não procede (por mais errônea que seja),
mas de interesse de fora, a ela es'franhos e extTíruecos.
Ricardo não é vil quando equipara os proletários à maquinaria ou à
besta de carga ou à mercadoria, porque (de seu ponto de vista) incentiva
a produção serem eles apenas maquinaria ou besta de carga ou porque
na realidade são meras mercadorias n:i. produção burguesa. Isso é estóioo,
objetivo, científico. Ricardo, desde que atue sem pecar contra sua ciên-
cia, é sempre filantropo, como o era naprdtiaJ.
O reverendo Malthus, ao revés, por amor à produção rebaixa ostra-
balhadores a besta de carga, até os condena à morte pela fome e ao celi-
bato. Mas quando essas mesmas exigências da produção reduzem a renda
do dono da terra ou atingem o "dízímo" da Igreja Oficial ou os interesses
do "consumidor de impostos" ou sacrificam o segmento da burguesia in-
dustrial interessado na paralisia do progresso, ao segmento que represen-
ta o progresso da produção - quando portanto se trata de um interesse
qualquer da aristocracia contra a burguesia ou da burguesia conservadora
e estagnada contra a progressista - em todos esses casos "o reverendo"
Malthus não sacrifica o interesse particular à produção, mas procura no que
dele depende, sacrificar as exigências da produção ao interesse particular
das classes dominantes existentes ou de frações delas. E para esse fim for-
mula conclusões científicas falsas. Esta é sua vilania científica, seu pecado
contra a ciência, para não mencionarmos seu plagiarismo cíníco e habi-
tual. As conclusões científicas de Malthus são "cheias de reverências" pa-
ra as classes dominantes em geral e para os elementos reacionários dessas
classes em particular; isto é, ele falsif'zca a ciência em favor desses interes-
ses. São por ísso brutais com respeito às classes subjugadas. E Malthus não
é só brutal. Ostenta brutalidade, nela se compraz e exagera as conclusões
desde que se dirijam contra os miseráveís, mesmo dlém da medida que, de
seu ponto de vista, se justificaria cientificamente.
Ricardo por exemplo (ver acima), quando sua teoria o convence de
que a ascensão do salário acima do mínimo não aumenta o valor das mer·
cadorias, com toda a franqueza o diz. Malthus quer manter baixo o salário
para que o burguês lucre.

551
O ódio da classe trabalhadora inglesa contra Malthus - o reverendo
charlatão. corno duramente o chama Cobbett (na verdade, o maior escritor
político da Inglaterra neste século; faltava-lhe porém aquela formação do
professor de Leipzig45 , e era adversário direto do "estilo.erudito") - justi-
fica-se assim por completo; e o povo aí pressentia com instinto certeiro
que não defrontava homem de ciéncia algum, mas um advogado compra-
do por seus inimigos, sicofanta cínico das classes dominantes.
O inventor de uma idéía pode exagerá-la de boa-fé; o plagiário que a
exagera sempre faz "um negócio" com esse exagero.
A obra de Malthus On Populatlon - a primeira edição - uma vez
que não contém palavra científica nova, deve ser considerada apenas impor-
tuno sermão de capuchinho, uma versão, no estilo de Abraham a Santa Clara46
das exposições de Townsend, Steuart, Wallace, Herbert etc. Uma vez que
na realidade pretende impor-se apenas pela forma popular, com razão se
volta contra ela o ódio popular.
O único mérito de Malthus, em face dos míseráveis mestres de har-
monia da economia burguesa, é justamente o destaque acentuado das de-
sarmonias, nenhuma delas descoberta por ele, mas as quais em todo caso
apreende, adorna e dl\'ulga com cínica e satisfeita beatice.
Charles Danvin, On the Origfn of spedes by means o/natural selection,
or the preservation of favoured races in the sttuggle for life (5th thousand),
Londres, 1860, diz na introdução:

"No próximo capítulo tratar-se-á da luta pel!i existénçitÍ entre os seres


vivos do mundo todo, decorrêncía inevitável da alta progressão geomé·
trica em que aumentam. Esta é a doutrina deMalthus âplicada a todo
o ieino animal e vegetal."

Em seu excelente trabalho, Darwin não viu que derrubou a teoria


de Malthus, ao descobrir a progressão ••geométrica" no reino animal e ve-
getal. A teoria de Malthus baseia-se em contrapor a progressão geométrica
humana de Wallace à quimérica progressão "aritmética" dos animais e plan-
tas. Na obra de Darwin, por exemplo a propósito da extinção de espécies,
está pormen.orizada (abstraímos de seu princípio fundamenal) a refutação
da história natural à teoria malthusiana. A teoria de Malthus, no que depen-
de da teoria de Andersen, está refutada pelo próprio Anderson.

45. Marx alude aí a Roscher, Profesro1 da Universidade de Leípzíg.


46. Pseudônimo de Hans Ulrich Megerle, pregador e escritor austríaco .que, para
divulgar o catolicismo, procuravii redigir seus se:rmões num ·estilo pseudopopula.r.

552
3. Roscher falsifica a história das idéias sobre
renda fundiária. Exemplos de
imparcialidade científica de Ricardo. A
renda fundiária na produção agrícola e na
industrial. Efeito duplo da concorrência.

A primeira obra de Andersen, onde ele expõe incidentalmente a teoria


da renda, era trabalho polêmico prático, não sobre renda, mas sobre prote-
cionismo. Apareceu em 1777, e o título já diz, primeiro, que visa um obje-
tivo prático e, segundo, que se refere a um ato legislativo iminente em que
industriais e donos das terras tinham ínteresses opostos: An Enquiry into
the Nature of the Com Laws, with a view to the new Q:>m Bill proposed
for Scotland, Edimburgo, 1777.
A lei de 1773 (na Inglaterra; sobre o assunto consultar catálogo de
MacCUJloch) deveria ser introduzida (assim parece) na Escócia em 1777
(ver no Museu).

"A lei de 177 3 ", diz Anderson, "tinha por intenção confessa rebaixar o.
preço dos cereais para nossos indust.riaís, inc~ntívando a importação do
exterior com o fim de proporcionar a nosso povo preço mais baixo"
(p. 50, A calm Invertigation of the circum1tances that have led to the
present SCflrcity ofgrain in Britam, Londres, 1810).

A obra de A:nderson era assim polêmica em favor dos interesses dos


agricultores (proteção) (e inclusive dos donos das terras) e contra os interes-
ses dos industriais: E ele confessa que a publicou como obra alinhada nes-
sa posição. A teoria da renda aparece aí de permeio, e nos escritos poste-
riores, .que de contínuo se referem mais ou menos àquele conflito de inte-
resses, só reaparece de passagem uma ou duas vezes, nunca aliada à preten-
são de um interesse científico e nem sequer chega a ser objeto autônomo
da exposição de Andersen. Depois dis~o pode-se fonnular um juízo com
respeito à justeza das seguintes observações de WtlhelmTucídidesRoscher47 ,
que pelo visto não conhece as obras de Anderson:

47. Ironizando Roscher, Marx chama-o de Wilhelrn Tucídides Roscher, porque


este se proclamaca o Tucídides da economia política no prefácio da primeira edição
de sua obra Grundlagen der Nationalõkonomie. Marx mostra neste capítulo e em
outras passagens como Roscher deforma a história das condições econômicas e a da
teoria ecçmômica.

553
"!! notável como uma doutxina qué em 1777 quase ficou despercebida,
em 1815 e nos anos seguintes foi por igual defendida e combatida com o
maior interesse pnrque ela tocava à contradição tão bruscamente for.·
mada enue o juro do capital-dinheiro e o da propriedade fundiária"
(pp. 297, 298, Die Grundlagen der Nationalokonomie, 3;t edição, 185 8).

Nesse trecho as falsidades são tantas quanto as palavras. Primeiro, An·


derson nã'o apresentava sua idéia como "doutrina", como o faziam West,
Malthus e Ricardo. Segundo, não ficou quase, mas de todo despercebida.
Tf;!'éeiro, de início apareceu de passagem numa obra que tinha por único
propósito tratar da contradição - contradição que teve considerável desen·
volvimento em 1777 - entre industriais e donos da terra, e tocava a essa
luta prática de interesses, mas "n!o tocava" â teoria geral. da econonúa na-
cional. Quarto, em 181 S Malthus, um dos reprodutores dessa teoria, lecio-
nara-a para justificar as leis sobre cereais, como Ande.cson o fizera. A mesma
doutrina foí utilizada pelo descobridor e por Malthus em favor da proprie-
dade da terra, e por Ricardo contra ela. No máximo poder-se-ia portanto
dizer que, entre os que a sustentavam, wis defendürm o interesse da pro·
priedade fundiária. e outros combatiam o mesmo m'teresse, mas não se po-
deria dizer que em 1815 essa teoria foi combatida pelos defensores da pro-
priedade fundiária (pois Malthus ai defendia antes de Ricardo), nem que foi
defendida pelos adversários da propriedade da terra (pois Rjcardo não ti-
nha de "defender" essa teoria contra Malthus, pois ele me$mo o considera
um dos descobridores e seu próprio precursor. Só tinha de combater a
aplicação malthusiana dela). Quinto: A contradição em que "toca1' Wilhelm
Tucídides Roscher, entre "os capitalistas fmanceiros" e c:1i "donos das ter·
ras ", não tinha até então absolutamente nada a ver com a, teoria andersonia-
na da renda, nem com sua reprodução, defesa e contestação. Por "classe
dos capitalistas financeiros" {''moníed class"), como Wilhelm Tucídides po-
dia verificar em Íohn Stuart Mill {Essays on some unsettled questions o/
Political Economy, pp. 109, 110, Londres, 1844), entendem os ingleses:
(1) os prestamistas; (2) serem esses prestarrústas pessoas que em geral vi-
vem de juros ou prestamistas de profissão como banqueiros, corretores
financeiros etc. Todas essas pessoas se enquadram, co_nforme observa Mill,
na .. classe dos capitalistas financeiros", opondo-se à "classe produtora"
ou pelo menos dela se destacando (Mill entende por classe produtora os
"capitalistas industriais" além dos trabalhadores). Assim Wilhelm Tucídí·
des teria de ver que o interesse da '"classe produtora", e portanto dos fa.
bricantes, dos capitalistas industriais, e o interesse da classe dos capitalis-
tas financeiros são duas coisas bem diversas e que essas classes diferem en-

554
tre si. E mais, Wilhelm Tucídides deveria ver que uma luta entre os capi-
talistas industriais e os donos das terras não era absolutamente wna luta
entre os "capitalistas financeiros" e "os donos das terras". Se Wilhelm
Tucídides conhecesse a lústória da legislaçãó sobre cereais de 1815 e a lu-
ta em torno dela, já saberia de Cobbett que os traficantes dos burgos (os
donos das terras) e os traficantes de empréstimos (capitalistas fmanceiros)
marchavam juntos contra os capitalistas industriais. Mas Cobbett é "cru"
Wilhelm Tucídides deveria ainda saber da história de 1815 a 1847 que, na
luta em torno das leis sobre cereais, a classe financeira na maior parte, e
mesmo a classe mercantil em parte (Liverpool, por exemplo), encontrava·
se entre os aliados dos donos das terras contra a classe industrial.
(Roscher poderia ter no máximo estranhado que a mesmll "doutri·
na"-seivisse em 1777 para defender e em 1815 para combater «os donos
das terras" e só então causasse estrépito. 48
Se pretendesse esclarecer com esses pormenores todas as grosseiras
falsificações desse jaez cometidas por Wilhelm Tucídides em suas notas
histórico-literárias, teria de escrever uma obra t!o volumos3: quanto suas
Grondlagen, e tal obra na realidade "não valeria o papel em que fosse es·
crita": Mas o dano que a ignorância erudita de um W-tlhelm Tucídides pode
causar em pesquísadores de outras ciências vê-se em A. Bastian, que, em sua
obra, Der Mensch in der Geschichte, 1860, vol. 1, p. 374, nota, cita a fr.ase
acima de Wilhelm Tucídides como comprovante de uma proposição "psi-
cológica" De passagem, não se pode dízer de Bastian: "a obra superava a
matéria" 49 Ao contrário, a "obra" aí está aquém do próprio material.
Além disso, por meio das poucas ciências que "conheço", notei que Bastian,
·conhecedor de "todas" as ciências, fia-se com muita freqüência em autori·
dades do nível dê Wilhelm Tucídides, o que é inevitável sobretudo num "sá-
bio enciclopédlco".
Espero não ser acusado de tratar com desamor Wilhelm Tucídides.
Com que desamor esse pedante trata a própria ciência! Em todo caso, para
-falar de suas "inverdades totais" tenho o mesmo direito que ele quando
ousa falar, de maneira arrogante e depreciativa, das "meias verdades" de
Ricardo. Demais, Wilhelm Tucídides não tem "probidade" na seleção de

48. Marx tem aí em Vista a obra de Edward West, ESS/ly on the applicatíón of
capital to Jand. •• , anonimamente publicada em Londres, 1815, e a olua de David Ri-
cardo An ewy on the in,fluence of a low price of com on the profit of stock, publi-
cada em Londres no·mesmo ano.
49. Citação de Ovídio: "materiam superabat opus".

555
seus estudos .. Quem não é "respeitável", não existe nem historicamente
para ele; Rodbertus, por exemplo, não existe para ele como o teórico da
renda fundiária, porque é "comunista". E maís: é inexato quando trata de
"autores respeitáveis". Bailey, por exemplo, marca mesmo urna época para
MacCulloch. Para Wilhelm Tucíd~des, não existe. Para incentivar e popula-
rizar a ci~ncia da economia política na Alemanha, pessoas como Rodbertus
t.eriam de fundar um jornal que ficasse aberto a todos os pesquisadores (que
não fossem pedantes, presunçosos e vulgarizadores) e que tivesse por obje-
tivo principal pôr em evidência a ignorância dos eruditos tanto nessa ciên-
cia quanto em sua história.
Em Anderson não se encontrava pesquisa alguma sobre a relação de
sua teoria da renda com o sistema da economia política, o que não é de sur-
preender considerando-se que seu primeiro livro apareceu um ano depois
de WeaJth of Nations, no momento portanto em que o "sistema da econo-
mia política" mal acabava de se consolidar, pois também o sistema de
Steuart só aparec~ra poucos anos antes. Mas, o ma.teria! de que Anderson
dispunha no campo especial que obsel'llava era sem dúvida mais extenso que
o de Ricardo. Ricardo em sua teoria monetária, reprodução da teoria de
Hume, só atentou para os acontecimentos de 1797 a 1809, e do mesmo
modo na teoria da renda, reprodução da teoria de Anderson, só levou em
conta os fenômenos econômicos da alta dos preços dos cereais de 1800
a 1815.

Caracterizam Ricardo as frases importantes e contundentes que se-


guem:

·•Acho muito lamentável que comideraçõe$ em fatJOr de qualquer classe


em particular levem a restringir o acréscimo da riqueza e da produção do
país." (p, 49, Ricardo, An Essay on the lnftuence óf a Jow Price of Corn
on the Profits of Stock etc., Londres, 1815, 211 ed.) -

Com a importação livre de cereais "a terra é abandonada" (l .c., p.


46). A propriedade fundi.ária é portanto sacrificada ao desenvolvimento da
produção.
Mas, a propósito da iinportação livre de cereais:

"~ indiscutível que se perderia algum capital; mas a posse ou a conserva.


ção do capital é o meio ou o fun? Sem dúvida, o meio. O que desejamos
é abundância de mercadorias" (riqueza em geral) "e se for demonstrável
que podemos, com o sacrif(cío de parte de nosso capital, aumentar a pro-
dução antJJJl daquelas coisas que contribuem pua nossa satisfação e nos-

556
sa felicidade, não deveremos nos queixar da perda de parte de nosso ca·
pita/" (p. 60, On Proteclíon toAgriculture, 4,a ed., Londres, 1822).

Ricardo chama de ''nosso capital" o capital que pertence não anós ou a


ele, mas o que os capitalistas investem na terra. Mas nós quer dizer o perfil
transversal da nação. O acréscimo de "nossa., riqueza é o acréscimo da ri·
queza socfal, um fim em si, nã'o importa quais sejam os participantes dessa
riqueza.

"Pua um indivíduo com capital de 20 000 libras e Incro anual de 2 DOO,


tanto faz que seu capital empregue cem ou mil trabalhadores, que as mer·
cadorias produzidas se vend3.m por 10 000 ou 20 000 libras, desde que o
lucro em todos os casos nào caia abaixo de 2 000 líbras. Não é semelhan-
te o interesse real da nação? Desde que seja a mesma sua rend3. real líqui-
da, as rendas fundiárias e os lucros; não tem a· menor importância que a
nação consista em 10 ou 12 milhões de habitantes" (p. 416, Principies of
Political Ecmwmy. 39- ed.).

Sacrifica-se ai o "proletariado" à riqueza. Desde que não influa na


existência da riqueza, a esta n«o importa a existência dele. Mera massa -
massa de seres hwnanos - nada vale. Esses 3 exemplos ilustram a imparcia-
lidade científica de Ricardo.
[A !?"fl (natureza) etc., elemento em que se investe o capital empre·
gado na agricultura. Por isso, a renda fundiária aí é igual ao excesso do 11a-
lor sobre o preço médio do produto de trabalho criado nesse elemento. Ao
revés, se um elemento (ou matéria) da natureza, de propriedade individual,
entra em outra produção cuja base {física) ele não forma, pode a renda
fundiária, quando ocorre apenas em virtude do emprego desse elemento,
não consistir no excesso do valer desse produto sobre o preço médio, mas
no excesso dos preços rnédios gerais desse produto sobre o próprio preço
médio. Por exemplo, uma queda-d'água pode substituir uma máquina a
vapor de um industrial e poupar-lhe consumo de carvão. Com essa queda-
d'água venderá sempre o fio, por exemplo, acima de seu preço médio e fa.
rá um lucro suplementar. Esse lucro suplementar cabe ao proprietário da
terra na qualidade de renda, se ele é o dono da queda-d'água. Hopkins em
seu livro sobre "renda fundiária" observa que as quedas-d'água em Lan-
cashlre pagam renda e, conforme o grau da força natural da quecia·d'água,
renda diferencial. 50 A renda ai é apenas o excesso do preço médio de mer-
cado do produto sobre seu preço médio individual.)

50. Hopkins, Economical enquiries relati11e to the laws which regulate rent,
profit, wages, and lhe value of money, Londres, 1822, pp. 37 e 38. Adiante, p. 155,
apresenta Marx a passagem correspondente do referido livro.

557
(Na conconinda cabe distinguir dois· movimentos de nivelação. Os
capitais dentro da mesma esfera de produção nivelam os preços das merc.a-
dorlas produzidas dentro dessa· esfera ao mesmo preço de mercado, qual-
quer que seja a razão entre o valor dessas mercadorias e esse preço. O pre-
ço médio de mercado teria de ser igual ao valor damercadoria, se não houvesse
o nivelamento entre as diferentes esferas de produtos. Entre essas diferentes
esferas, a concorrência iguala os valores aos preços médios, desde que a in-
teração dos capitais não seja obstruída, perturbada por terceiro elemento
- a propriedade fundiária etc.)

4. Erro e confusão de Rodbertus no tocante à


relação entre valor e mais-valia quando
encarecem os produtos.

Rodbertus erra por completo ao sustentar que uma mercadoria por


ser mais cara que outra, realizando assim mais tempo de tr<!balho, tem de
conter - para igual taXll de mais-valia ou igwil exploração'dos trabalhado-
·res nas diferentes e!iferas - mais tempo de trabalho 71iio pago, tempo de
trabalho excedente. Se o mesmo trabalho em solo pouco fértil 4á r quarter,
em solo fértil, 3 (sem variar com bom ou mau tempo); se o mesmo trabalho
em terreno aurífero dá 1 onça de ouro e no menos aurífero ou no esgota-
do, apenas l /3 de onça, e se o mesmo tempo de ttabálho que produz 1 li-
bra-peso de lã fia 3 libras-peso de lã, então, em princípio, são de igual mag-
.nitude os valores de 1 quarter e de 3 quarters, de 1 onça e de 1/3 de onça,
de l libra-peso de lã e de 3 libras-peso de fio de lã (menos o \'alar da lã
nele contida). Encerram quantidade igual de tempo de trabalho e portan-
to, de acordo com a suposição, quantidade igual de tempo de trabalho ex-
cedente. Sem dúvida, a quantidade de trabalho excedente contida em 1
quarter é maior, mas em compensação temos apenas 1 quarter, enquanto
no segundo caso temos 3 quarters ou 1 libra-peso de lã, e no terceiro, 3
libras-peso de fio (menos o valor do material). E portanto a mesma a quan-
tidadé de trabalho excedente. E é também a mesma a magnitude propor-
cional de mai.f.valia, comparando-se uma a uma as mercadorias. No quar-
ter ou na libra-peso de lã, segundo a suposição, contém-se tanto trabalho
quanto' nos 3 quarters ou nas 3 libras-peso de fio. Por isso o capital despen-

558
elido em trabalho aumenta tanto quanto a mais-valia. Na libra-peso de lã
se contém 3 vezes a quantidade de trabalho de l libra-peso de fio. A mais.
valia, se é 3 vezes maior, refere-se a um capital 3 vezes maior despendido
em salário. A proporção permanece portanto a mesma.
Rodbertus aí erra por completo em seu cálculo, ou seja, ao comparar
o capital despendido em sa."14rio com a quantidade maior ou menor de mer-
cadorias em que se realiza esse salário. Essa conta porém é de todo errada
se, como ele supõe, é dado o salário ou a taxa de .mais-valia.. A mesma
quantidade de trabalho, por exemplo, 12 horas, pode configurar-se em x ou
3x de mercadoria. Num caso, lx de mercadoría contém tanto trabalho
e trabalho excedente quanto 3x, no outro; mas em nenhum caso se des-
pendeu mais de uma jornada de trabalho e em nenhum caso a taxa de mais-
valia é, digamos, mais de 1/5. No primeiro caso 1/5 de x está para x, como,
no segundo, 1/5 de 3 x, para 3 x, e se chamamos cada um dos 3 x, x', x",
x"', haverá em x', x", x"', em cada um de per si, 4/5 de trabalho pago e 1/5
de trabalho não pago. Em contrapartida é absolutamente certo que, para
se produzir nas condições improdutivas a mesma quantidade de mercado-
ria obtida nas mais produtivas, ter-se-á na mercadoria mais trabalho e em
conseqüência também mais trabalho excedente. Mas então despende-se
também capital proporcionalmente maior. Para se produzir 3x, será mister
despender·em salário 3 vezes mais capital que para se produzir lx.
Ora, é certo que a indústria não pode transformar mais matéria-prima
que a fornecida pela agricultura, digamos, não pode fiar maís libras-peso de
lã que as produzidas. Assim, se a produtividade. da fiação de lã triplica, é
mister, se as condições de produção de lã não mudaram, o triplo do tempo
antes aplicado, o triplo do capital para o trabalho de produção de lã, en-
quanto na fiação seria necessário apenas o mesmo tempo de trabalho para
fiar essa lã triplicada. Mas a taxa de mais-valia permaneceria a mesma. O
mesmo trabalho de fiação teria o mesmo valor que antes e conteria o mes-
mo valor excedente. O trabalho que produz lã teria valor excedente 3 ve-
zes maior, mas por isso ter-se-ia triplícmlo também o trabalho nela conti-
do ou o capital adiantado em salário. O valor excedente 3 vezes maior seria
portanto calculado sobre capital 3 vezes maior. Não haveria portanto razão
para se dizer que a taxa de mais-valia na fração seria mais baixa que na pro-
dução de lã. Poder-se-ia dizer apenas que o capital despendido em salário numa
é 3 vezes maior que na outra (uma vez que se supõe ai que as modificações
na fiação e na produção de lã não derivam de variaçio no capital constante).
Agora cabe distinguir. O mesmo trabalho+ capital constante dá me-
nos produto em sazão desfavorável que em sazão favorável, em terra me-

559
nos produtiva que em terra mais produtiva e em minas pobres que em mi·
nas ricas. No primeiro caso, o produto é portanto mais caro, encerra mais
trabalho e mais trabalho excedente para a mesma quantidade de produtos;·
mas. no segundo, a quantidade desses produtos ê maior. E mais: isso não
atinge a relação entre trabalho pago e não pago em cada produto individual
de ambas as categorias, pois o produtoindívidual, se encerra menos traba-
lho não pago, contêm, dentro da suposição, menos trabalho pago na mesma
proporção. E que aí não se supôs mudança alguma nas proporções dos oom-
ponentes orgânicos do capítal - o capital variável e o capital constante.
Admitiu-se. que a mesma soma de capital variável e de constante, em condi-
ções diferentes, fornece quantidades diferentes, maiores ou menores, de
produto.
Rodbertus af parece confundir-se sempre e inferir do mero encare·
cimento do produto, como se fosse o óbvio, mais-valia maior. Isso, no to·
cante à taxa, já está errado em face do que se supõe; mas, no tocante à so-
ma, só está certo se num caso se adianta mais capital que no outro, isto é,
se do produto mais caro se produz tanto quanto antes do produto mais ba·
rato ou se a multiplicação do produto mais barato {caso acima da fiação),
supõe multiplicação correspondente do mais caro.

5. Ricardo nega a renda absoluta em vinude


de seus erros ·na teoria do valor.

Ricardo esquece com freqüência, apesar de o saber, que a renda po·


de subir e em conseqüência o valor do solo, embora a taxa da renda não
varie ou até decresça, e que portanto também se eleva a produtividade
da agricultura. Em todo caso, Anderson o sabe e já o sabiam Petty e
D'Avenant. Não é esta a questão.
Ricardo omite a questão da renda absoluta, que nega por força da
teoria, pois parte do falso pressuposto de que, se ·o valor das mercadorias
é detennínado pelo tempo de trabalho, os preços médios das mercadoriaJJ
têm de igwilm seus valores (daí tirar a errada conclusão prática de a con-
corrência dos terrenos férteis lançar fora de cultivo os menos férteis, mes-
mo que estes antes dessem renda). Se os valores fossem idênticos aos pre-
ços médios das mercadorias, seria impossível a renda fundiária absoluta,
isto é, tanto a renda fundiária do pior terreno cultivado quanto a do terre-
no primitivamente cultivado. Que é preço médio da mercadoria? O capital

560
todo despendido na sua produção (constante + variável) + tempo de traba-
lho contido no lucro médio, por exemplo, 10%. Assim, se um capital pro-
duzisse, com a participação de um elemento, valor mai.or que o -preço me-
dio justamente por se ttatar de um elemento particular da natureza, a ter-
ra, por exemplo, o valor dessa mercadoria estaria acima de seu valor e esse
valor suplementar se oporia à idéia de ser o valor igual a determinada quan-
tidade de tempo de trabalho. Um elemento natural, algo heterogêneo em
relação ao tempo de trabalho social, criaria valor. E o que não pode ser.
Por isso, a aplicação do capital no terreno puro e simples não deve dar
renda. O pior terreno é o terreno puro e simples. Se o melhor terreno dá
renda, isso apenas demonstra que a diferença entre o trabalho individual-
mente necessário e o trabalho socialmente necessário se fixa na agrícultura
por ter esta uma_ base natural, enquanto na indfistria está sempre desapa-
recendo.
Não se permite a existência da renda fundiária absoluta, mas apenas
a da renda [undúiria diferencial. Pois admitir a renda fundiária absoluta
significaria admitir que a mesma quantidade de trabalho (materializado,
despendido em capital constante e comprado com salário) cria valores
diferent(!s, de acordo com o elemento em que o trabalho se despende ou
com o material que ele transforma. Mas, se se admite essa diversidade no
valor, embora em cada um dos ramos de produção o mesmo tempo de tra-
baJho se materialize no produto, supõe-se que o tempo de trabalho não de-
termina o valor e sim algo heterogêneo. Essa diferença das magnitude& de
valor anularia o conceito de valor, isto é, que sua substância é tempo de
trabaJho social, que suas diferenças portanto só podem ser quantitativas
e essas diférenças quantitativas siio apenas iguais às diferenças nas quanti-
dades do tempo de trabalho social empregado.
A sustentação de;- valor - não só a determinação da magnitude do va·
lor pela variação da magnitude do tempo de trabaJho, mas também da subs-
tância do valor pelo trabalho social - supõe assim a negação da renda fun-
diária absoluta. E a negação da renda fundiária absoluta pode expressar-se
de dois modos.
Primeiro. O_pior terreno niio ttmi a faculdade de dar renda. Nos me-
lhores tipos de terrenos, a renda se explica pelo preço de mercado que é
o mesmo tanto para os produtos de tipos mais favoráveis de terrenos quan-
to para os de tipos menos favoráveis. Mas o pior terreno é o terreno pUl'O e
simples. Em si não é diferenciado. Distingue-se do emprego do capital indus-
trial apenas por ser esfera particular de emprego do-capital. Se desse renda,
decorreri_a ela de a mesma quantidade de trabalho. quando aplicada em df..

561
ferentes esferas de produção, se representar em diferentes valores, vale di-
zer, a própria quantidade de trabalho não determina o valor, e não se igua-
lariam entre si produtos onde se encerram quantidades iguais de trabalho ..
Segundo. Ou também não deve dar renda o terreno primitivamente
cultivado. Então, que é o terreno primitivamente cultivado? O terreno prí·
mitivamente cultivado não é terreno melhor nem pior. :B terra pura e sim-
ples. Não se diferencia, Na orígem, o emprego de capital na agricultura só
pode diferençar-se do da indústria pelas esferas onde esses capitais se apli-
cam. Mas, uma vez que quantidades iguais de trabalho se configuram em
valores iguais, em absoluto não há razão alguma por que o capital aplica-
do em terra, além de lucro, ainda dê renda, a não ser que a mesma quanti-
dade de tr!!balho empregada nessa esfera produza valor maior, de modo que
o excesso desse valor sobre o valor produzido na manufatura proporcione
lucro suplementar = renda. Mas isso significaria dizer que a terra de per si
cria valor, e assim eliminar o próprio conceito de valor.
A terra primitivamente cultivada só terá portanto o poder de dar ren-
da na origem se se lançar por terra toda a teoria do valor. Com isso liga-se
então com muita facilidade (embora não necessariamente, segundo mos·
tra Anderson) a idéia de os homens terem escolhido na origem para o cul-
tivo não o pior mas o melhor terreno. E assim o terreno que na origem
não dá renda alguma, mais tarde a proporciona em virtude da, coer~o pa-
ra a busca de tipos pi.ores de terrenos, e desse modo na descida para o aver-
no, para terra cada vez pior, no avanço da civilização e. da 'população, tem
de subir a renda na terra mais fértil cultivada na origem e, em progressão,
na seguinte, enquanto o pior terreno, que representa 'sempre a"terra pura
e simples - a esfera particular de emprego do capital - nunca proporciona
renda. Tudo isso tem maior ou menor coerênciá lógica. -
Entretanto, sabe-se que não são idênticos preços médios e valores,
que o preço médio de uma mercadoria pode ser igual ao valor, maior ou
menor, e assim desaparece a questão, o próprio problema e com ele tam.
bém as hipóteses para resolvê-lo. Fica apenas a pergunta: por que na agri-
cultura o valor da mercadoria ou em todo o caso o preço não está acima
do valor, mas acima de seu preço médio? Esta pergunta, porém, nada mais
tem em comum com o fundamento da teoria, com a determinação do va-
lor de per si. -
Ricardo sabe sem dúvida que se modificam os "valores relativos"
das mercadorias segundo a proporção mferente entre capital fixo e capi·
tal despendido em salário, aplicados em sua produção {aí nã.o há nenhuma
contradição; capital fJXo e capital circulante se opõem, e capital circulante

562
abrange tanto o salário quanto matérias-primas e matérias auxiliares. Por
exemplo, na indústria mineira e na de pesca existiria entre capital desem-
bolsado em salário e capital fixo despendido uma relação corno a encontra-
da, na alfaiataria, entre capital despendido em salário e o despendido em
matéria-prima). Mas sabe também que esses valores relativos se nivelam pe-
la concorrência. Só deixa mesmo aparecer a diferença, a f.tm de surgir a
mesma taxa média de lucro nessas diferentes aplicações de capital. Isto é,
esses valores relatii10s de que fala são os meros preços médios.. Nem lhe
ocorre a idéia de valor e preço médio serem coisas diferentes. Ocorre-lhe
apenas a ídentidade deles. Mas, uma vez que essa identidade não existe
com a proporção diversa dos componentes orgânicos do capital, admite-a
como fato inexplicado produzido pela concorrência. Não chega por isso
à pergunta: por que os valores dos produtos agrícolas não se nivelam em
preços médios? Ao contrário, admite que o fazem e desse ponto de vista
apresenta o problema.
Não se pode compreender porque tipos como Wilhelm Tucídides
se entusiasmam com a teoria rícardiana da renda fundiária. Pelo seu pris-
ma depreciativo, as "meias verdades" de Ricardo perdem todo valor.
Para Ricardo, o problema só existe porque o valor é determinado
pelo tempo de trabalho. Para aqueles tipos não é o caso. Segundo Roscher,
a nature~a como tal tem valor. Ver mais adiante. 51 Isto é, ele não sabe
absolutamente o que é valor. Que o impede, portanto, de fazer o valor
da terra, na origem, entrar nos custos de produção e formar a renda, e de
supor o valor da terra, isto é, a renda, para explicar a renda?
O termo "custos de produção" nada significa para esses tipos. E o
que vemos em Say. O valor da mercadoria é determinado pelos custos de
produção, por capital, terra, trabalho. Mas estes são determinados pela
oferta e procura. Isto é, não ocorre determinação alguma. Uma vez que
a terra realiza "serviços produtivos" por que não deveria o preço desses
"serviços" ser determinado pela oferta e procura como os serviços que
trabalho ou capital realizam'? E uma vez que os "serviços da terra" estâ'o
na posse de certos vendedores, por que esse artigo não deveria ter um

51. Mux não retoma mais adiante ao exame das idéias de Rosche.r. Entretanto,
empreende Mane uma análise pormenorizada das idéias análogas e vulgues de Mc-
Culloch fw:temenk influenciadas, como as de Rosche1, pela concepção apologética
doll "serviços produtivos" (ver vol. 3 desta tradução, .cap. XX, seçào 4 ). Marx fala tam-
bém sobre Say (ib., b ). Trata ainda das ídéias de Roscher e Say em O Capital (ver Ed.
DIFEL, livro l, vol. 1, pp. 231 e 232, e livro 3, vol. 6, pp. 949 e 965).

563
preço de mercado e existir portanto a ren~ da terra como elemento do
preço?
Vê-se como falta razão a Wilhelm Tucídides para amofinar-se com
a teoria ricardiana, despendendo tanta benevolência.

6. Tese de Ricardo sobre a ascensão constante


dos preços dos cereais, preços médios do
trigo nos anos de 1641 a 1859.

Mas, se abstraímos da renda fundiária absoluta, fica para Ricardo


este problema:
A população cresce e com ela a procura de produtos agrícolas. Daí
subirem os preços desses produtos, como sucede na indústria em casos
dessa natureza. Mas, na indústria, essa alta de preços cessa logo que a pro-
cura tenha atuado e gerado oferta acrescida de mercadorias. O valor do pro-
duto cai então ao velho nível ou abaixo dele. Na agricultura, po~ém, esse
produto adicional não é lançado no mercado ao mesmo preço nem a pre·
ço inferior. Custa mais e causa ascensão constante dos preços de mercado
e em conseqüência alta da renda. Como explicar isso a não ser pela circuns··
tância de se recorrer a tipos de terra cada vez menos férteis, de se exigir
cada vez maís trabalho para a obtençã'o do mesmo produto, de se tornar
a agricultura cada vez menos produtiva? Por que. exduída a influência
da depreciayão monetária os produtos agrícolas na Inglaterra, de 1 797 a
1815, subiram com o rápido desenvolvimento da população'! Voltaram a
baixar depois e com isso nada se demonstra. O fato de ter sido cortada a
oferta de mercados estrangeiros não estabelece nenhuma conclusão. Pelo
contrário: apenas gerou as condições adequadas para que se evidenciasse
a lei da renda fundiária em sua pureza. Pois justamente o desligamento
do exterior forçou o país a recorrer a terras cada vez menos férteis. A ex.
plicaç:ão não pode provir do acréscimo absoluto da renda, pois não só o
·montante, mas a taxa da renda subiu. O preço do quarter de trigo etc. su-
'biu, o que nã'o se pode explicar pela depreciação monetária, pois esta ex-
plicaria bem por que, com o grande desenvolvimento da produtividade
na indústria, os preços dos produtos industriais caíram, isto é, subiram
relativamente os preços dos produtos agrícolas. Não explicaria por que,
além dessa ascensão relativa, os preços absolutos dos produtos agrícolas

564
tiveram elevação contínua. Nem se pode explicar íssc;> como oonseqüênda
da queda da taxa de lucro. Essa queda nunca explicaria mudança nos pre-
ços, mas apenas mudança na distribuição do valor ou do preço entre dono
da terra, industrial e trabalhador.

·No tocante à depreciação admitamos que 1 libra agora = 2 libras


anteriores. Um quarter de trigo que antes era 2 libras, agora é 4. Se o pro-
duto industrial caiu a 1/ l O, valfa antes 20 xelins e agora 2 xelins. Mas esses
2 xelins são agora iguais a 4 xelins. A depreciação por certo poderia ter al·
go a ver com isso e também as más colhe~tas.

Mas, se abstraímos de tudo isso, podemos admitir que para o estado


anterior da agricultura (de trigo) se cultivou terra de fertilidade escassa.
A mesma terra mais tarde ê fértil, caindo as rendas diferenciais quanto à
taxa, como demonstram os preços do trigo, o melhor barômetro.

Os preços mais aJtos em 1800 e 1801, e em 1811 e 1812; os pri·


meíros são os anos de más colheitas, e os últimos, os de maior deprecia·
ção monetária. 1817 e 1 81 8 são também anos de depceciação monetária.
Mas, se extraímos todos esses anos, resta na verdade (a examinar mais
adiante) o preço médio. (Ver página 566). ·

Quando se comparam os preços do trigo etc. em diferentes períodos,


importa ao mesmo tempo confrontar os volumes produzidos a tanto por
quarter, pois é justamente assim que se revela até onde a produção adicio-
nal de cereais influencia o preço.

Durante o período (9 anos) de 1641·1649,omaiorpreçomédioanualé


de 75 xelins e 6 pence em 1645, ano da revolução, depois 71 xelins e 1
pence em 1649, 65 xelins e S pence em 1647, e o menor, 42 xelins e 8
pence em 1646.

O próprio West diz:

"Num estádio avançado da agrtcultu:ra pode-se obter produto, em ten:a


de segunda ou terceira qualidade. a custo tio baixo quanto em terra de
primeira qualidade no velho sistema" (Sir Edw. West, Price of Corn and
Wages of Labour, Londres, 1826, p. 98).

565
1
PREÇOS MEOIOS 00 TRIGO
..----------··-----···-----------
PieÇó m{n;mo

1641-1649 ISc'J xelíM e 5 U3 pence 7S xelin. e 6 pence (Ui4S) 42 xelins e 8 pence (1!>46)
16:50-1659 4Sxelins e 8 9110 penoc 6heliru e 1 peru:e{l6SO) 23 xolíru o l penté (16S O
166().1669 44 l!eliru e 9 P"""" li5 xellru e 9 pence (1662} 32 xelins e Opence {ló66 e 1667)
1671>-16111 44 nlü\s e 8 9/10 pena> 61 ~linse Openc:e (1674) 3:.l xeliN e O pene<> (1676)
Vi3().1689 3S xellns e 1 8/10 pence 41 xelíru e S pene<> {1681) 22xelins e 4 pen"" (1687)
SO_x_e_lins_e_4_/1_0__p_om_c:e____!!.l<elinsto l peooe (1695)
1690-169,_9__ 30.xeliru. 2 pence u._6_91_c..)_ _...
Tolllalldo-1C o periOdo 16SD-1699, o preço médio (anual) nesses SO anos é ile 44 xelins e 2 1/5 pencv.
li
Pl<>Ç(> múilllO no decênio Preço minimo no deaônio

l 70!H 709 15 xelim 1/10 pêJI.! 69 xelins e 9 pence (1709} 2!5 xelins e 4 pene<> (l 707)
1710.1119 43 xolins 6 1/10 pence 69 xelim o 4 pence (1710) 31 xelinse 1 pêni (1719)
1720-1129 37 xelins e 3 7!10 pence 48 xelins e S pen"' (1728) 30 xelins e 10 pence (1723)
• 1730-1739 31 xewe S S/lOpence 58 xelins• 21"'nce(l735} 23 xelins e 8 pence (17'2)
l.Y40-1749 Jl Mlins e 7 9/lO pence ....~xelilu e~. pênl (1740) 22 xelins e 1 pênl (1743 e 1744)
ProÇJ> 111êdio (uwal) dllllll\W Sil anos, de 1700 a 1749, 3S xelins e 9 29/SO pence.
Ili
PieÇó mfoimo no d.ocêllio

36 xelins e 45/101"'"'"'
17SfH 759 S3 xelins e 4 pente (1757) 28 xelins e 10 pence (17SOJ
40 ""lins • 4 9/10 pence
1760-1769 S3 XJOlins o 9 peni:e (1768) 26 xelins e 9 pence (1761)
4S xelins e 3 2/10 pencv
l 77CH 179 S2 xelim e 8 penoc (1174) 33 xelins e 8 pence (1719)
~ xelilue9 2/l01"'noe
1 !?80..1789 52 xelins e 8 pence (1783) 35 xeliru e 8 pen"' (1780)
~79..~~~"<:':i"' e 6 5/10 pence_ _ _7.8 xelins~ 7 pen"' (l 796..;.)_ _4_3_x_elins_·
_•_O.:..pê_N_·-'-(1_7_92_)_ __....
Méd"1 """'1h11>s :SO orrin, de 115011 1799: 45xeffn.re1J1/:SO perrce.
IV
---···
~ mi.lloa anllW
~~=
l'n!ÇO midi<> anml
mâxímos 110 dec*nio
1800-1809 84 ~tllim e 8 S/10 pence U9 xeliru • 6 pen"" (1801) 58 xelins e 10 pence {1803)
llh:eliru e 10 pcn<e (1800)
)810-1819 9 l xelinu 4 8/10 pew:o 126 xelins e 6 peru:e (1812.) 65 xelim e 7 pence {1815)
109 xelim e 9 pence (1813} 74 xeliM • 4 penc:e (1814)
106 xdin• ~ s pence (1810) 74 xclin•e 6 ~ce{1819)
18l0-l829 58 X4lill$ e 9 7/lO pen<e 68 xelim e 6 pence (182$) 44 xelins e 7 pence (1822)
1830-183'9 56 xelins• SSJlOpence 66 i.eliiu e 4 pence (l 831) 39 xeJ.in;," 4 pa>oe (1835)
1840-1849 55 >:elins e 114/10 pence 69 MlinH S pcn.ee (l 84 7) 44 xelim e 6 pence (1849)
18.50-lS.S9 Slxelinse 4 7/JO pence 74 xelÍIQ e 9 pellQl (185.5) 40ulim e4 pence (l8SO)

Mêdia anual durante 50 anos, de 1800 a 1849: 69 xelins e 6 9/50 pence.


MMiaanual durante 60rmos, de 1800a1859: 66 xelins e 914/15 pence.
Temos assim as médias anuais:
1641-1649 60 xelins e 5 2/3 pence 1750-1799 45 xelins e 3 13/50 pence
1650·1699 44 xelins e 2 1/5 pence 1800-1849 69 xelins e 6 9/50 pence
1700-1749 35 xelins e 9 29/SO pence 1850·1859 53 xelins e 4 7/10 pence

566
7. Hopkins: a diferença entre renda absoluta e
renda diferencial, e entre tra~,lho
produtivo e improdutivo; renda fundiária
oriunda da propriedade fundiária.

Hopkins apreende com acerto a diferença entre renda absoluta e ren-


da diferencial:

"O princípio da concorrência toma impossíveis 2 taxas de lucro no


mesmo .País; ora, isso determina as rendas reloti11t1s, mas não a média
geral da renda" (Th. Hopkins, On Rent of Land, and its Influence on
Sub#Uence and Population, p. 30, Londres, 1828).

Hopkins estabelece entre trabalho produtivo e improdutivo ou, co-


mo diz, entre trabalho primário e secundário, a seguinte díferença:

"Se todos os trabalhadores fossem empregados para o mesmo fim ou


para o mesmo objetivo, como o lapida.dor de diamantes ou o cantor de
ópera, em pouoo tempo não haveria n'queza para mantê-los, porque
então nado dJI riqueza produzida te tomwia capital. Se parte conside-
rável assim se empiegasse, os salários seriam baixos, pois só fração rela·
tivamente pequena do que se produz seria empregada oomo capital:
mas, se apenas alguns dos trabalhadore~ fossem assim empregados e na·
turalmente quase todos fossem lavradores, sapateiros, tecelões etc.,
produzir-se-ia então muito capital, e os salários poderiam ser proporcio-
nalmente mais altos" (l.e., pp. 84, 85). "Devem ser colocados juntos
com o lapi.dador de diamantes e o cantor todos os que trabalham para
os donos das tenas ou para os rentiers e 1ecebem como salário parte da
renda (income) deles; de fato, todos cujo trabalho se limita apenas à
produção das coisas que os donos da terra e os rentieu fruem, e todos
os que recebem pelo trabalho parte da renda (rent} do dono da tena
ou da tenda {íncame} do .renüei. Todos eles são trabalhadores produti·
•·os, mas todos os seus trabalhos têm por objetivo converter noutra for-
ma a riqueza existente representada por renda fundiária e por renda$
anuais, a q_ual nessa outia forma satisfará melhor o dono da terra e o
rentier, e por isso sio eles produtores secunddrios. Todos O$ outros tra-
balhadores são produtru:es primdrws" (l .c., p. 85 ).

Diamante e canto, ambos trabalho realizado, podem, como todas


as mercadorias, ser transformados em dinheiro e como dinheiro, em capi-

567
tal. Mas nessa transformação do dinheiro em capítal há duas coisas adis-
tinguir. Todas as mercadorias podem converter-se em dinheiro e, como
dinheiro, em capital, porque nessa forma de dinheiro extinguem~se o valor
de uso delas e a forma natural particular deste. São elas traballÍ.o materia-
lizado na forma social em que este é permutável por todo trabalho real,
conversível em toda forma de trabalho real. Entretanto, a possibilidade de
as mercadorias - produto do trabalho - reverterem, tais como são, a ele-
mentos do capital produtivo depende de a natureza de seus valores de uso
lhes permitir voltarem ao processo de produção, seja como eondições obje-
tivas de trabalho (instrumentos e material), seja eoroo condição subjetiva
(meios de subsistência dos trabalhadores) (isto é, elementos do capital
constante ou do variável).

"Na Irlanda, segundo estimativa mo4e:rada e de acordo com o censo


de 1821, o produto líquido total que vai para os donos da tena, o go·
vemo e os titulares do dízímo monta a 20 3f4 milhões de libras, en-
quanto os salários todos apenas a 14 114 000 libras" (Hopkins, l.c.,
p. 94).
"Os laVtadores" na Itália "pagam em geral de renda ao dono da terra
1/2 e até mais de 1[2 do produto, e têm habilidade razoável na agricul-
tura e suprimento escasso de capital fixo. A parte maior da população
consiste em p1odutores secundários e donos de tena, e .em geral os pro·
dutores primários são uma classe pobre e degradada"' (pp. 1()1, 102).
"O mesmo se dá na França de Luiz XIV, XV e XVI. Segundo Young,
140 905 304 libras em renda {rent), dízimos e impostos. Ao mesmo
tempo, lavoura miserável. A população da França, na época, 26 363 074.
Se houvesse 6 milhões de famílias de t!abalhadores, o que é exagero, ca-
da farn11ia teria de fornecer por ano, direta ou í.tidii:etamente. cerca de
23 libtas, em média, de riqueza liquida ao dono da teaa, à Igi:eja e ao
Estado." De acordo com os dados de Young é levada em conta uma
série de outros elementos, cabe a cada fanu'lía de trabalhador "por ano,
42 libr.IS e 1O xelins, e daí 23 fibras soo para pagar a terceil:os, e 19 li-
bras e 10 xelins füam para o próprio sustento" (1.c., pp. 102-104).

A potJUlação depende do capital.

"O erro de Malthus e seus adeptos· consiste· na hipótese de que a uma


redução da populaçâo trabalhadora não se seguiria redução correspon-
.dente do capital" (Le., p. 118). "Malthus esquece que a procuta de tra·
balhad9res é llinit;ada pelos meios exf:rten tes para pagar salários e" que
"esses meios não surgem espontâneos, mas sempre são gerados antes
pelo trabalho" (l.c., p. 122}.

568
Esta é a concepção correta da acumula{i'o do capítol Mas os meios po-
dem acrescer, isto é, a quantidade de produto excedente ou de trabalho exce-
dente, sem aumentar proporcionalmente o volume de trabalho.

"Singular essa forte inclinação de taxai: de vantajoso pai:a a classe tra-


balhadora· 1iqueza excedente, por lhe proporcionai: possibilidade de
trabalho. Por certo, isso não ocorre por ser ela excedente e assim rer
esse poder, mas por ser riqueza criada por· trabalho. Mas, ao mesmo
tempo, conside1a-se quantidade adicional de trabalho prejudicial às
classes trabalhadoras, embora esse trabalho produza 3 vezes o que eon-
some" (l.c., P- 126).
"Se com o uso de máquinas melhores, o produto primário todo pudes-
se elevar-se de 200 a 250 ou 300, enquanto renda Jfquida e lucro se limi-
tassem a 140, é claro que ficariam como fundo de salários dos produ-
tores primirlos 110 ou 160 em vez de 60" (l.c., p. 128).
"A sJtuação dos ttabalhado1es piora ou porque sua produtividade é pre-
judicada ou porque lhes tomam o que produziram" (1.c., p. 129).
"Não, diz Malthus, 'o peso de teu fardo nada tem a ver com tua misé-
ria; a origem exclusiva está na circunstância de gente demais carregd-
lo'" (Lc., p. 134).
"No princípio geial de os custos de produção detennina.rem o valor de
troca de todas as mereadorias não se incluem as matérias-primas; mas o
direito que seus proprietários sobrepõem ao produto faz a renda {rent)
entrar no. valor" (p. 11, Th. Hopkins, Economical Enquires relative to
the Laws which regulate Rent, Profit, Wages, and the Value of.Money,
Londres, 1822).
"Renda frent) ou preço pelo uso surge natlllalmente da propriedade ou
de se estabelecer um direito de propriedade" (l.c., p. 13).
"Pode dar renda (rent) tudo que possua as seguintes propriedades: pú-
meiro, deve ter certa raridade; segundo, tem de possuir força para aju-
dar o trabalho na grande obra da produção" (l.c., p. 14). Não se deve
naturalmente considerar o caso "em que o solo em relação ao trabalho
e ao capital a aplicar nele"· (abundância ou escassêi de terra são por
certo relativas, referem-se à quantidade disponível de tmbalho e de ca-
pital) "existe em tal magnitude que não poderia, por não ser raro, pro-
porcionar umarenda frent)" (l.c., p. 21).
"Em alguns. países, o senhor das teaas pode exto1quir 50%, em outros
nem 10%. Nas regiões fecundas do Leste pode o homem viver com 1/3
do produto do trabalho que aplicou na terra; mas, em terras da Suíça
e da Noruega, a coleta de 10% poderia despovoar a tara .. , Não vemos
balizas naturais para a renda fundiirla que pode ser coletada, a não ser
o limite da capacidade dos pagantes" e, "onde existirem terras piores,
a concorrênCÍll entre eams terras e as melhores" (pp. 3 3, 34).
"Na Inglaterra há muita te-rra comum euja feztilidade natural se iguala
àquela que possuía, antes de terem sido lavradas, grande parte das ter-
ras ora cultívad/Ja; todavia, os custos de cultiro dessa terra comum são
tão grandes que ela não pode proporciotlal" ao dínheiro nefa aplicado o
juro usual e não deíxa de sobra nenhuma rendo para a fertilidade na tu-·
rol do solo; e isso apesar de todas as vantagens do emprego ímediato de
trabalho, apoiado por capital que se aplica tecnicamente e provido de
produtos industriais baratos; além. disso, boas estradas nas redondezas

569
etc.•.• Os donos atuais de tem1s podem ser considérados os proprietários
de todo o uaba1ho acumulado l{Ue, ao longo dos séculos, vem sendo des-
pendido para colocar o solo no presente estado de produtividade" (1.c.,
p. 35).

Esta é uma circunstância muito importante para a renda fundiária,


sobretudo quando a população tem um crescimento rápido considerável,
como de 1780 a 181.5, em virtude dos progressos da indústria, e por isso
grande parte das terras até então incultas foi de súbito incorporada ao cul-
tivo. A nova terra cultivada pode ser tão fértil, até mais fértil do que era a
antiga antes de nesta se acumular o cultivo de séculos. Mas o que se requer
da nova terra --,. para não se vender o produto a -preço mais caro - é que
sua fertilidade seja igual primeiro â fertilidade natural da terra cultivada e
segundo à fertilidade desta, artificialmente produzida pelo cultivo, mas ora
tomada fertilidade natural. A terra de novo cultivada teria portanto de ser
muito mais fértil que a antiga antes de ser lavrada.
Mas, dir·se-á:
A fertilidade da terra cultivada decorre primeiro de sua fertilidade
natural. Depende portanto da qualidade natural da nova terra cultívada a
alternativa de ela possuir ou não essa fertilidade procedente da natureza
e a esta devida. Em ambos os casos, essa qualidade nada custa. A outra par·
te da fertilidade da terra cultivada é produto artificial, de'lido ao cultivo,
ao emprego de capital. Mas essa parte da produtividade exigiu custos de
produção que são pagos com o juro do capital fixo incorporado à terra.
Essa parte da renda fundiária é apenas juro do capital fixo agregado à ter-
ra. Por isso entra nos custos de produção do produto da antiga terra culti-
vada. Assim, é mister empregar apenas o mesmo capital no novo terreno
cultivado) e este também receberá essa segunda parte da fertilidade; como
no primeiro, os juros do capital empregado para gerar essa fertilidade en·
tram no preço do produto. Por que não poderia então ser cultivada nova
tena - sem ser muito mais fértil - sem preço ascendente do produto?
Se a fertilidade natural é a mesma, a diferença é fonnada apenas pelo in·
vestimento de capital; e o juro desse capital entra nos custos de produção
de ambos os casos, na mesma medida.
Esse raciocínio, porém, é falso. Porção dos custos dó desbravamen·
to etc. não pode mais ser paga, uma vez que a fertilidade por ele produzí-
da, como Ricardo já observa, em parte se insere na qualidade natural da
terra (estão no caso os custos de arrotear, drenar, canalizar, nivelar, mo-
dificar a química da terra com processos químicos continuados etc.). O
novo terreno cultivado teria portanto de ser bastante fértil - com vistas

570
à possibilidade de o produto ser vendido pelo mesmo preço daquele do
último terreno cultivado - para que esse preço lhe cubra a porção dos
custos de desbravamento, a qual entra nos próprios custos de produção,
mas cessou de integrar os custos da terra antes cultivada, pois neste caso
já se incorporou à fertilidade natural do solo.

"Um curso d'água de localiiação favruável prop.orciona o exemplo de


uma renda que &e paga por um dom da natureza, objeto de pwprleda·
de da espécie mais exclusiva possível. Isso é bem visível nos distritos
manufatureiros onde rendas consideráveis são pagas por pequenos cur-
sos d'âgua, sobretudo se a queda é acentuada. Sendo a força obtida des-
ses cursos igual à que geram possantes máquinas a vapor, utilizá-los,
apesar do pag:unento de uma renda alta, é tão vantajoso quanto despen-
der grandes soma~ para instalar e operar máquinas a vapor. Demais, há
cursos d'água maiores e menores. A proximidade de um centro manu-
fattueíro é outra vantagem que gera renda mais alta. Nos condadoi de
York e Lancaster, a diferença entre· as rendas dos menores e as dos maio-
res cursos é provavelmente maior que a verificada enue a renda dos SO
acres menos férteis e a dos 50 acres mais férteis, cultivados em conjun-
to" (Hopkins, l.c,, pp. 37, 38).

8. Custos de desbravamento. Períooos de


ascensão e períodos de queda dos preços do
trigo (1641-1859).

Comparemos os preços médios acíma52 e subtraiamos, primeiro, o


que é devido à depreciação monetária (1809 a 1813) e, segundo, o que é
devido a colheitas especiàlmente ruins como as de 1800 e 1801, para con-
siderar um elemento importante: a quantidade de nova terra cultivada.
num dado momento ou durante um dado período. Alta do preço nas
terr~s cultivadas indica então crescimento da fJOpu/açlio e por isso exce-
dente de preço sobre os custos; além disso, o mesmo acréscimo da pro-
cura provoca o cultivo de novo solo. Se a quantidade deste tem grande
acréscimo relativo, o preço ascendente e o preço mais alto que em perío-
do anterior comprovam apenas que grande parte dos custos de desbrava-
mento entra na quantidade adicional de alimentos produzidos, Se o pre-
ço não tivesse subido, não teria ocorrido essa produção adicional. A que-.

52. Vér, neste vQJume, pp. 564·566.

571
da de preço, efeito dela, só pode revelar-se depois, uma vez que no pre-
ço dos alimentos recém-produz.idos entra um elemento - dos custos de
produçio ou do preço - o qual se extinguiu há muito tempo nos inves-
timentos mais antigos de capital na terra ou nas porções mais antigas do
solo cultivado. A diferença seria até maior se, em conseqüência da produ-
tívidade acrescida do trabalho, o custo de aproveitar o solo para cultivo
não tivesse caído consideravelmente em relação aos custos de arroteamen-
to de períodos anteriores, passados.
A tarefa de pôr novo solo, de fertilidade maior, igual ou menor que
a da terra antiga, em estado que o capacite para nele se aplicar capital e
trabalho (e esse estado é dado pelo nível geral de adaptação à cultura pre-
dominante na ter.ta existente em cultivo) - nas mesmas condições em que
se empregam capital e trabalho na área média de solo cultivado -, essa
adaptação tem de ser paga pelos custos de converter terta inculta em cul-
tivada. Essa diferença de custo tem de ser coberta pela nova terra cultiva-
da. Se não entra no preço de seu produto, só há dois casos possíveis em
que se pode obter esse resultado, Ou o produto da nova terra cultivada não
é vendido por seu valor real: seu preço está abaixo do valor, como de fato
sucede com a maior parte das terras que não dã'o renda, pois o preço não
é formado por seu próprio valor, mas pelo valor do produto oriundo de
terras mais férteis. Ou a nova terra cultivada tem de ser tllo ftrtil que se o
produto for vendido pelo valor imanente, próprio, de acordo com a quan-
tidade de trabalho nele realizada, será vendido a preço menor que o preço
do produto obtido no solo antes cultivado. ·
Se a diferença entre seu valor inerente e o preço de. mercado estabe-
lecido pelo valor da terra cultivada é tal que se eleva digamos a 5% e se,
ademais, o juro que entra nos custos de produção em virtude do capital
empregado para pôr o solo no nível de capacidade produtiva comum ãs
ten:as 3J1tigas fosse também de 5%, então o novo solo cultivado forneceria
produto capaz de pagar ao preço anterior de mercado os salários, lucros
e rendas usuais. Se o juro do capital empregado fosse de 4% apenas, en-
quanto o grau de fertilidade ultrapassasse a dos solos antigos em 4%, o
preço de mercado, depois de deduzi.do o juro de 4% pelo capital emprega-
do para tomar ..cultivável" o novo solo, deixaria um excedente, ou o pro-
duto poderia vender-se a preço menor que o preço de mercado estabeleci·
do pelo valor do solo menos. fecundo. Em conseqüência, rendas em gerál
baixariam junto com o preço de mercado do produto.
Renda absoluta é o excedente do valor sobre o preço médio do pro-
duto primário. Renda diferencial é o excedente do preço de mercado do
produto fornecido por solos favorecidos sobre o valor desse mesmo produto.

572
Por isso, se o preço do produto primário sobe ou permanece cons-
tante em períodos onde parte relativamente grande dos meios de alimen·
tação adicionais requeridos pelo acréscimo de população é produzi.da em
terra que passou do estado de incultura para o de cultura, essa constância
ou elevação de preços não prova que a fertilidade da terra decresceu, mas
apenas que não cresceu a ponto de contrabalançar o novo elemento dos
custos de produção - formado pelo juro do capital.aplicado com o obje-
tivo de colocar a terra inculta no nível das condições de produção comuns
em que os solos antigos são cultivados conforme dado estágio de desen-
volvimento.

Mesmo o preço constante ou ascendente - quando varia a quanti-


dade relativa da nova terra cultivada em diferentes períodos - não de-
monstra portanto que esta é menos fértil ou fornece met10$ produto, mas
somente que no valor de seus produtos entra um elemento de custo que
se extinguiu nos terrenos cultos mais velhos, e que esse novo elemento per-
dura, embora tenham diminuído nas novas condições de produção os cus-
tos do desbravamento, comparados com os. que eram necessários para o so-
lo antigo passar do estado angina!, natural de fertilidade para o estado atual.
Convém por .isso verificar nos diferentes períodos a proporção relativa dos
cercamentos das terras comuns. 53
De resto, os quadros acima nos mostram (pp. 507, 508): 54
Considerando-se os decênios, o período de 1641-1649 tem nível mais
alto que qualquer decênio até 1860, excetuadas as décadas de 1800..1809
e 1810-1819.
Considerando-se os perfodos de 50 anos, o de 1650.1699 tem nível
mlJi$ alto que o de 1700-1749, e o de 1750-1799, mais alto que o de 1700..
1749, e mais baixo que o de 1800.1849(ou1859).
Há queda regular dos preços no período de 1810-1859, enquanto no
período de 1750-1799, apesar do preço médio mais baixo nesses 50 anos,
o movimento é ascencional com regularidade semelhante ao descencional
de 1810-1859.
Na realidade, em relação ao período de 1641-1649 sucede em con-
junto queda contínua dos preços médios decenais, e nos dois últimos de.

53. Marx fala sobre os cercamentoo {enclosures) das terras comuns na Inglaterra
em O Capital (ver DIFEL, livro l, vol 2, pp. 840 a 84 7).
54. Ver pp. 564 e segs. neste volume.

573
cênios da primeira metade do século XVIII essa descensão se acentua ao
máximo, atinge (o ponto mais baixo).
Do meado do século XVIII em diante, o movimento é ascencional,
tem por ponto de partida um pr(lço (36 xelins e 4 5/10 pence, em 1750-
1759) mais baixo que o preço médio dos 50 anos da segunda metade do
século XVII e quase no nível do preço médio - superando-o por pouco -
dos 50 anos do período 1700-1749(35 xelins e 929/50pence),aprimeira
metade do século XVIII. Esse movimento ascencional continua progressi-
vamente nos dois decênios 1800-1809 e 1810-1819. Neste atinge o ponto
culminante. A partir daí volta a ocorrer com regularidade o movimento des-
cendente. Se consideramos a média c!o período ascendente que vai de 1750
a 1819, o preço médio (pouco acima de 57 xelins por quarter) iguala o pon-
to de partida do período declinante a partir de 1820 (isto é, para o decênio
1820-1829, pouco acima de 58 xelins); do mesmo modo, o ponto de par-
tida da segunda metade do século XVIII iguala o preço médio da primei-
ra metade.
Com um simples exemplo aritmético vê-se como clrcwistâncias espe-
ciais, más colheitas, depreciação monetária etc. podem influir n;i média.
Por exemplo: 30 + 20 + 5 + 5 + 5 = 65. Média= 13, embora os três úl-
timos números sejam sempre 5. Todavia, 12 + 11 + 10 ·+ 9 + 8::, 50, mé-
dia = l O, embora, se cancelarmos os excepcionais 30 e 20 i:ia primeira sé-
rie, a média de quaisquer 3 anos da segunda seja maior.
Se deduzirmos os custos diferenciais decorrentes do capital sucessi-
vamente empregado para arrotear a terra, o qual durante- certo período
constítui item dos custos, os preços de 1820-1859 serão talvez mais baixos
que todos os adteriores. E o que de certo modo parecem-·vislumbrar aque-
les gajos que explícam a renda (rent) pelo juro do capital fixo incorporado
à terra.

9. Anderson contra Malthus. Tese de Anderson:


Produtividade agrícola crescente e sua
influência na renda diferencial.

Diz Anderson (em A calm Investigation of the circumstances that


have led to the present scarcity ojgrain in Britain, L:m dres, 1801):

574
"De 1700 a 1750, queda constante dos preços, por quarter de trigo, de
2 libras, 18 xelins e 1 pêni pllla 1 libra, 12 xelins e 6 pence; de 1750 a
!SOO, ascensã'o constante, de 1 libra, 12 xelins e 6 pence para 5 libras
e 10 xelins'' (p. 11).
Não tinha ele diante de si o fenômeno excltisivo de uma escala ascen-
dente de preços dos cereais, mas ao contrário o fenômeno duplo, um século
inteiro que na primeira metade revela declínio constante e na segunda, as-
censão constante dos preços dos cereais. Observa de maneira terminante:

"Na primeira metade do século XV111 a população cresceu tanto quanto


na segunda .. (1.c., p. 12).

~ decidido adversário da teoria da população 55 e sustenta expressa-


mente que a terra tem capacidade perene e ascendente de meJhorar.

"A terra pode tonw:-se cada vez melhor por meio de agentes químicos e
de culfü'o" (l.c., p. 3Bli6).
"Num sistema racional de administração, a produtividade da tena pode
crescer todo ano durante um período para o qual não se pode índicar
limites, com a possibilidade final de chegar a um nível que hoje não es-
tamos talvez em condíç1Jes de imaginar.. (pp. 35, 36).
"Pode-se dizer com certeza que a população atual, em relação à que esta
ilha pode sustentar, é r.ão insignificante que está muito longe de mere-
cer consideração séria" (p. 37).
"Quando a população aumenta, tem de crescer com ela o produto do
país, se não se permitir a uma influência moral qualquer perturbar a
eco1tomia da naturera "(p. 41 }.
A "teoria da população" é "o preconceito mais perigoso" (p. 54 ).
A "produtividade da agricultura", procma ele demonstrar no plano his·
tórico, s.obe eom população crescente e baixa com população decres-
cente (pp. 55·, 56, 60, 61 e segs.).

Para se conceber corretamente a renda (rent}, o primacial é sem dú-


vida que ela não deriva da terra, mas do produto da agricultura, isto é, do
trabalho, do preço do produto do trabalho, do trigo, por exemplo. Provém
do valor do produto agrícola, do trabalho aplicado na terra e não da terra,
e Anderson com acerto acentua isso.

55. Alu5iio à teoria malthusíana da população.


56. James Anderson cita aí o livro do italiano Camillo Tarello de Lonato, Ricar-
do d'Agrfcoltura, segundo a primeira edição publicada em Mântua, na versão francesa
editada pi;l.a Société Economique de Ilema. Houve várias edições dessa obra, de 1567
a 1816.

575
"Não é a .tenda da terra que detennfua o preço de seu pxoduto, mas é
esse pxeço que determina a renda fundiária., embora o preço desse pro-
duto seja com freqüência muito alto nos países onde é muito baixa a·
renda fundiária."

(A renda portanto nada tem a ver com a produtividade absoluta da


agricultura.)

"Isto parece ser um paradoxo que merece explicação. Em todo país há


diferentes espécies de terra, com diferença considerável de fertilidade
entre elas. Agora suporemos que se ordenam em classes diversas que d.,_
s.igruuemos com as letras A, B, C, D, E, F etc. A classe A abrange osso-
los de maior fertilidade, e as outras letcas reptC$elliam as classes de so-
los com fertilidade que deClesce à medida que eles se afastam da pri·
meka. Ora, como os custos do cultivo da terra menos fértü lfifo tão gran.
des ou maiores que os da mais féTh.1, Kegue-se daí necessariamente que
se quantidade igual de grão, não importa a origem, se pode vender ®
me~o preço, o lucro procedente do cultivo do solo mais fértil tem de
ser muito maior que o de outros solos"

(isto é, o excedente do preço sobre as despesas ou sobre o preço do capi-


tal adiantado)

"e uma vez que este" (o lucro) "decresce à medida que s~ reduz a fei:ti-
lidade, chega-se por fim necessariamente ao ponto em que o diçpêndio
do culti110 de vária$ das classes inferiores de terra se iguala ao valor do
produto todo" (pp. 45-48).

A última terra não paga renda. (Citaçã'o apud MacCulloch, The Lite·
rature of [JOlit econ., Londres, 1845. MacCulloch tira de An Enquire into
the Nature of the CVm Laws, ou de Recreations ln Agriculture. Natural
History. Arts etc., Londres, 1799-1802? Verificar no Museu. 5")
O que Anderson chama aí de "valor do produto todo é, sem dúvida,
nada mais que sua concepção de preço de mercado a que se vende o pro-
duto, provenha este de solo bom ou ruim. Para as espécies mais férteis de
terra, esse "preço" (valor) deixa excedente maior ou menor sobre os custos.
Isto não se aplica ao último produto. Neste, o preço médio - o preço for-
mado pelos custos de produçâ'o + o lucro médio· - coincide com preço o
de mercado do produto, e por isso não dá lucro extr:a, o único elemento
que pode constituir a renda. Para Anderson, rend_a (rent) é igual ao excesso

57. Alusão à Biblioteca do Museu Britânico (British Museum).

576
do preço de mercado sobre o preço nWlio do produto. (A teoria do valor
aínda não chega a inquietar Anderson). Assim, se em virtude de especial
carência de fertilidade do solo o preço médio do produto dessa terra coín-
cide com o preço de mercadt:> do produto, aquele excesso desaparece, isto
é, nã'o há fundo para formar renda. Anderson não diz que o último t<'lrreno
cultivado 11IÍO pode dar renda. Diz apenas que, se "se chega a esse ponto",
os custos (custos de produção + lucro médio) serão tão grandes que farão
desaparecer a diferença entre o preço de mercado e o preço médio do pro-
duto, desaparecendo também a renda, e assim tem de ser se se desce cada
vez mais na escala. Pressuposto para essa formação de renda, diz expressa-
mente Anderson, é detenninado preço de mercatkJ igual para quantidades
iguais de produtos obtidos em condições de produção mais favorãveís ou
rneril?S favoráveís. ·O lucro suplementar ou sobra do lucro nas melhores es-
pécies de terra sobre o lucro das píores, diz ele, tem de ocorrer necessaria-
mente, ·~e igual quantidade de grão, não importa a origem, pode ser vendida·
pelo mesmo preço". E justo é, se se supõe preço de mercado geral.
Como poderia parecer pela passagem acima, Anderson de maneira
nenhuma admíte, ao contrário da impressão que poderia dar a passagem
acima, que os diferentes graus de fertilidade são mero produto natural.
Ao revés,

"a diversidade infinita dos solos" decorre em parte da possibilidade de


esses "solos, cm relação ao estado original, se terem transformado muito
em virtude dos tipos de cultura a que foram submetidos antes, dos adu-
bos" etc. (p. 5, An Inquiry fnto de Causes etc., Edimburgo, 177 9).

Por um lado, o-p~ogresso da produtividade do trabalho universal 58


toma mais fácil arrotear a terra; por outro, o cultivo aumenta as diferenças
entre os solos, pois o terreno A, cultivado, e o B, inculto, podem ter tido
a mesma fertilidade original, se tirarmos da fertilidade de A a porção que
hoje lhe é natural, mas antes lhe foí dada artificialmente. O próprio culti-
vo aumenta portanto a diversidade de fertilidade natura! entre os solos cul-
tivados e os incultos.
Anderson é bem claro ao dizer que o terreno cujo produto tem pre-
ço médio e preço de mercado coincidentes não pode pagar renda:

58. Sobre trabalho universal ou intelectual ver O Capital, DIFEL, H\ll'o 3, vot. 4,
pp. 92 e 116.

577
"Onde há dois campos cujo produto se enquadra mais ou menos no
exposto acima, isto é, um dá 12 bus.heis que cobrem os curtos, e o ou-
tro 20, sem exigirem dispêndio imediato para a respecti11t1 melhoria.,
o attendatário pagaria pelo segundo campo digamos, mais de 6 busl1e!s
de renda, mas nenhuma pelo primeiro. Se 12 bushels chegam aperuu
para os custos do cultivo, nenhuma espécie de .cenda se pode obter da
tel'ill cultivada qué só dá 12 bushels" (pp. 107 a 109, v-01. IIl, EtSllys
reltztín.g to agriculture and rural affairs, Edimbutgo ·.Londres, l 77S a
1796).

E logo prossegue:

"Contudo, não é de se esperaz que o arrendatário, se o produto maior foi


de imediato produzido pelo emp1ego do próprio capital e de esforço di-
ligente, possa pagar como renda maú ou menos a mesma proporção do
produto; mas depois que a terra por certo tempo tiver ]icadD em estado
penmmente de fertilidade nesse ní11el, prontificar-se-á. ele a pagai uma
renda da proporção mencionada, emboia a terra deva origmarlamente
es81l fertilidade à própria diligência dele" (1.c., pp. 109, 110).

Assim, seja o produto por acre da terra melhor cultivada, digamos, 20


bushels; destes, segundo o pressuposto, 12 bu,shels pagam os custos (capital
adiantado + lucro médio). O produto pode Pagar então 8 bushelS' de renda.
Admitamos o bushel = 5 xelins, então 8 bushels ou 1 quarter =40 xelins ou
2 libras, e 20 bushels = 5 libras (2 l /2 quarters). Dessas 5 libras, são custos
12 bushels ou 60 xelins = 3 libras. o produto paga então renda = 2 libras
ou 8 bushels. Se a taxa de lucro é de 10%, dos custos de 3 libras, 54 6/11
xelins são dispêndio e 5 5/11 xelins, o lucro (54 6/11 : 55/11=100: 10).
Admitamos tenha o arrendatário então de f~r melhoramentos de toda
espécie em terra inculta, tão fértil quanto era rw. origem a ·que dá 20 bushels,
com o fim de pô-la. em condições de cultivo apropriadas ao nível geral da
:agricultura. Custe-lhe isso, além do dispêndio de 54 6/11 xelins ou, se in-
·cluímos o lucro nos custos, além dos 60 xelins, despesa adicional de 36 4/1 l;
10% destes são 3 7/11, e só em 10 anos, depois de ter feito vendas de 20
bushels sempre a 5 xelins o bushel, só depois de ter reproduzido seu capital,
poderá o arrendatário pagar renda. A partir daí a fertilidade do solo artifi.
cial.mente produzida será considerada original e caberá ao dono da teua.
O novo soJo cultivado, embora tão fértil quanto o era na origem o me-
lhor solo cultivado, tem então produto onde coincidem preço de mercado
e preço médio, por nele entrar um item de custo extinto no melhor solo
onde até certo ponto coincidem a fertilidade gerada por artifício e a natu·
ral. Mas, no novo solo cultivado, o segmento da fertilidade gerado artificial-
mente, mediante emprego de capital, ainda é de todo diverso da fertilidade

578
natural do solo. O novo solo cultivado, embora dotado da mesma fertilidade
natural do melhor solo cultivado, nenhuma renda portanto poderia pagar:
Contudo, após 1O anos, poderia pagar renda e tanta como a melhor espécie
de solo cultivado antes. Anderson compreende por conseguinte ambos os
fenômenos:
(] ) a renda diferencial dos donos das terras em parte resulta da ferti-
Ii dade que o arrendatário dá ao solo mediante artifício~
(2) essa fertilidade artificial configura-se após certo lapso de tempo na
própria produtividade original do solo, desde que o próprio solo se tenha
transformado e o processo por que se opera a transformação se tenha extin-
guido, não seja mais visível.
Se hoje construo uma fiação por 100 000 libras, disponho de fábrica
mais eficiente que meu predecessor que a montou 10 ·anos antes. Nã:o pago
a diferença entre a produtividade atual de fabricação de máquinas, de cons.
trução em geral etc. e a vigente 10 anos atrás; ao contrário. Ela me coloca
na posição de pagar menos por uma fábrica de eficiência i,gual ou o memw
por uma fábrica de eficiência maior. A coisa é out~a na agricultura. Adi-
ferença entre as fertilidades originais é amplificada por aquele segmento
da chamada fertilidade natural da terra, o qual, na realidade, foi antespro-
duzido por .seres humanos, mas ora incorporou-se ao solo e não mais se po-
de distinguir de sua fertilidade original. A fim de o solo inculto da mesma
.produtividade original atingir essa fertilidade ekvada. não são necessários,
em virtude do desenvolvimento da força produtiva do trabalho universal~
os mesmos custos antes requeridos para converter a fertilidade primitiva
do solo cultivado na fertilidade que ora se aparenta original, mas ainda se
exigem certos custos para se chegar a esse nível. O preço médio do produ-
to novo está assim mais.alto que o do produto do terreno antigo, e a diferença
entre preço de mercado e preço médio é assim menor e pode desaparecer
por completo. Mas, admitamos que no caso acima o novo solo cultivado
.seja tão fértil que após o custo adicional de 40 xelins (lucro inclusive) for·
neça 28 bushels em vez de 20. O arrendatário então poderia pagar de renda
8 bushels ou 2 libras. Mas por quê? Porque o novo solo cultivado dá mais
-8 bushels que o antigo, de modo que, apesar do preço médio maior e igual
p(eÇO de mercado, proporciona o mesmo montante em excedente relativo
a preço. Essa produtividade, se não lhe tivesse custado despesa extra, seria
o dobro da do solo antigo. Com a despesa atinge ela a mesma magnitude.

•Ver nota 58, p. 577.

579
10. Inconsistência· da crítica rodbertiana
à teoria da renda de Ricardo: Rodbertus
não compreende as peculiaridades da
agricultura capitalista.

Voltemos agora a Rodbertus de maneira terminante e final.

"Explica" (a teoria da renda rodbutian.a) .•. todos os.fenômenos de sa·


lá.rio e de renda etc. por uma divisão do produto do trabalho, a qual
necessariamente se efetua quando são dadas duas condições prévias,
produtividade bastante do trabalho e propriedade da terra e do capi-
tal. Explica que só a produtividade bastante do trabalho estabelece a
possibilidade eccmômica de tal divisão, pois essa produtividade dá ao
valor do produto cQnteúdo real tão grande que outras pessoas, que não
trabalham, também podem viver dele. E explica que só a propriedade
da tena e a do capital constituem a realidade jurídica de tal divisão,
pois ooage os trabalhadores a repartirem seu produto com os donos da
terra e do capital que não trabalham, e em proporção tal que justamen·
te os trabalhadores só recebem dele a quantidade que lhes possibilite
viver" {Rodbertus, l.c., pp~ 156, 157).

A. Smith apresenta a coisa segundo duas ótkas. Divisiiô do produto


do trabalho, fato que considera dado e na realidade trata· da p1Utici[XJÇiio
no llf1lor de uso, E a mesma concepção de Rodbertus. Ela se encontra tam-
bém em Ricardo, e a esse cabe reprovação maior, pois não se detém apenas
nessa formulação geral, mas se esforça com seriedade por determinar o va-
lor pelo tempo de trabalho. Mutatis mutandis, essa concepção adapta-se
mais ou menos a todos os modos de produção onde os trabalhadores e
os donos das condições objetivas de trabalho constituem classes diferentes.
A segunda ótica de Smith, ao contrário, é característica do modo de
produção capitalista. e por isso a única fórmula frutuosa no campo teóáco.
É aí que Smith concebe lucro e renda oriundos do trabalho. excedente
que o trabalhador adiciona ao objeto de trabalho, além da parte do traba-
lho por meio da qual só reproduz o próprio salário. Este é o único ponto
de vista correto onde a produção se baseia apen~ no valor de
troca. Com-
preende o processo de desenvolvimento, enquanto na prime.ira concepção
se supõe constante o tempo de trabalho.
Em Ricardo a unilateralidade decorre de pretender ele em geral de-
monstrar que as diferentes categorias e relações econômicas não contra-
dizem a teoria do valor, .ao invés de desenvolvMas em conjunto com as

580
contradições aparentes a partir dessa base ou de expor o desenvolvimento
dessa própria base.

"Sabeis59 que todos os economistas, já a partir de A. Smith, decompõem


o valor do produto em $11/drio, re1Jda fumlidria e ganho do capital, e que
por C-Ol1lleguinte não é nova a idéia de basear a-renda" (income) "das
diversas classes e em particular as partes da renda" (rent) "numa repar-
tição do prQdu.ro." (Por certo que não[) "Só que os economistas logo
se extraviam. Todos - até sem excetuar a escola ri.cardiana - cometem
a.ntes de 1111Zis nada o erro de não oonsídera.r o produto todo, os bens
obtidos, a totalidade do produto f!flcional como a unidade em que txa-
balhadores, donos das terras e capitalistas participam, e ao contrário
consideram a secção do produto primário um setor particular em que
três entes participam, e a secção do produto industrial um setor parti-
cular em que apenas dois entes participam. Assim, esses sistemas já con-
sideram o mero pmduto primário e o rne.ro produto industrial, cada um
de per si, como bem especial que é Ienda" (p. 162).

Ante.s de tudo, A. Smith na realidade levou a se extraviarem todos


os econonústas posteriores, inclusive Ricardo e Rodbertus, por ter decom·
posto "em salário, renda fundiária e ganho do capital o valor inteiro do
produto" (p. 162) e assim omítído o capital constante, que constitui par-
te do valor. A falta dessa discriminação impossibilitava por completo qual-
quer desdobramento científico, como evidenciam minhas exposíções60 •
A esse respeito. os fisíocratas foram mais longe. Seus "adiantamentos ori-
ginais e anuais" se destacam. como parte do valor do produto anual ou do
próprio produto anual, parte que não se reconverte em salário, lucro ou
renda nem para a nação nem para o indivíduo. Segundo os fisiocratas, a
matéria-prima dos agricultores repõe os adiantamentos da classe estéril (mas
a transformação dessa matéria-prima em máquina cabe à classe estéril),
enquanto os agrícultôres. repõem parte de seus adiantamentos (sementes,
animais reprodutores, gado de engorda, adubos etc.) com seu próprio pro-
duto e parte (maquinaria etc.) com o que recebem da classe estéril em tro-
ca da matéria-prima.
O segundo erro de Rodbertus é identificar a repartição do valor com
a repartição do produto. O "bem que é renda" nada tem a ver diretamente
com essa repartição do valor. Como Rodbertus, os economistas sabem
muito bem que as partes do valor, que, por exemplo, cabem aos fabricantes de
fio e se configuram em quantidades determinadas de ouro, se realizam em

59. Alusão a Von Kirl'!hmann.


60. Ver vol l desta tradução, pp. 76-131.

581
produtos de toda espécie, agrícolas ou manufaturados. ~ o que se supõe,
pois os fabricantes produzem mercadorias e não bens para o próprio con-
sumo imediato. Uma vez que o valor a ser repartido, isto é, a parte do valor·
a qual forma renda (revenue) é produzida em cada esfera particular da pro-
dução de mane.ixa independente d.as demais - embora cada esfera pressu-
ponha as demais em virtude d~ divisão do traballio - Rodbertus regride
e gera confusão quando, ao invés de examinar puramente a produção do
valor, logo de início embruJha essa questão ao perguntar que porção no
produto nacional disponível essas partes componentes do valor asseguram
a seus possuidores. Para ele, repartição do valor do produto toma-se de
imediato repartiçi'i?> de valores de uso. Ao impingir essa confusão aos ou-
tros economístas, toma ele necessária sua emenda de considerar em bloco
os produtos industriais e as matérias-primas - modo de ver sem interesse
para a produção do valor e portanto falso se tem por objetivo explicá-la.
Só o capitalista e o trabalhador fJ3Slllariodo participam do valor do
produto industrial, no que esse valor se reduz a renda (revenue} e desde
que o fabricante não pague renda fundiária, seja pelo terreno das edifica-
ções, seja por quedas-d'água etc. Do valor: do produto agrícola em regra
participam três: Rodbertus também admite isso. A maneira como explica
o fenômeno em nada altera esse fa,to. Mas os outros economistas, Ricardo
em particular, ao partirem da repartição entre dois, capitalistas- e assaJa-
,riado, só introduzindo depois, como excrescência especial, o'dono da ter-
ra coletor de renda, estão em concordância total com o ponto de vísta da
produção capitalista. A produção capitalista baseia-se na contraposição
entre dois fatores, o traballio materializado e o trabalho .vivo. O 'capitalis-
ta e o trabalhador assalariado são os únicos funcionários e fatores da pro-
dução cujas relações e antinomia provêm da natureza dó modo capitalis-
ta de produção.
Só em segunda instância vêm as circunstâncias em que o capitalista
por sua vez tem de repartir porção do trabalho excedente ou valor exce- ,...,
dente de que se apoderou, com terceíros que não traballiam. Nessa pioà.u-
çio também se positiva que, excetuada a parte do valor do produto.a qual
paga salário e descontada a parte do valor a qual se iguala a eapital constan-
te, a mais-valia inteira se transfere diretamente da3 mãos do tralmlhador
pll1U as do capitalista. Este, em face do trabalhador, é o dono imediato da
mais-valia toda, não importa como a reparta mais tarde com o presta.mista,
os donos das terras etc. A produção, segundo observa James Mill61 , poderá

61. J. Mil1. Elementi of poUtic(ll economy. Londres. 1821, p. 198.

582
por isso continuar sem estorvo se o dono das tenas coletor de renda desa-
parecer e for substituído pelo Estado. O proprietário particular da terra
não é agente necessário da produção capitalista, embora esta eJdja que a
terra pertença a alguém, desde que não seja o trabalhador e sim, digamos,
o Estado. Essa redução das classes participantes diretas da produção - e
portanto dos participantes imediatos do valor produzido e, ainda, dos
produtos em que esse valor se realiza - aos capitalistas e aos t:rabalha.dores
tusu.'lariados, excluídos os donos das terras {que só depois aí penetram em
virtude de relações de propriedade sobre forças naturais, relações que não
emergem do modo capitalista de produção, mas The são legadas), funda-
menta-se na natureza do modo capitalista de produção, diferente do feu-
dal e do da Antiguidade, e longe de ser um erro de Ricardo etc., torna-se
a expressão teórica adequada do modo capitalista de produção, mostra
sua diferença específica. Rodbertus ainda encarna demais wn "fazendei-
ro" prussiano da vellia cepa para entender isso. Também a coisa s6 se tor-
na compreensível e por si mesma se impõe quando o capitalista se apode-
ra da agricultura e por toda a parte, como ocorre em geraJ na Inglaterra,
torna-se o dirigente na agricultura conforme o é na indústria, e o proprie-
tário da terra é excluído de toda participação direta no processo de pro-
dução. O que Rodbertus portanto considera aí "desvio" é a senda correta
que não identifica, pois está prisioneiro de idéias originárias do modo pré-
capitalista de produção.

"Também Ricardo não reparte o produto acabado entre os interessado&,


m!ú, como os demais economistas, supõe cada um - o produto agríco--
la e o produto industrial - um produto bolado a repartir".

Não o produto, Herr Rodbertus, mas o valor do produto é o correto.


Vosso produto "acabado" e sua repartição nada t~m a ver absolutamente
com essa repartição do valor.

"Ricardo considem dada a propriedade do capital e antes mesmo da pro-


priedade fundiária... Assim, não começa com as razões mas com a reali-
dade da repartição do produto, e sua teoria toda limita..se às c.ausas que
detenninam e modificam as proporções dessa repartição... Para ele, a
repartição original é a mera rcpa:rtição do produto em mlárlo e ganho
de capital e na origem i também a única" (1.c., p. 167).

Eis aí outra coisa que não entendeis, Herr Rodbertus. Do ponto de


vista da produção capitalista, a propriedad.e do capital se revela de fato a
primeira por ser a espécie de propriedade sobre que se baseia a produção

583
capitalista onde é fator e exerce função, o que nã'o vale pará a propriedade
fundiária, Esta se patenteia derivada porque na realidade a moderna pro-
priedade fundiária é a feudal transformada pela ação do capital, por conse-
guinte a forma moderna deriwl, resulta da produção capitalista. A coisa tal
como é e aparece na sociedade moderna, consídei"a·a Ricardo hlstoricamen-'
te original (enquanto vós, ao invés de vos aterdes à forma moderna, nã'o po-
deis vos libertar das reminiscências de fazendeiro), uma quimera que do·
mina os economistas burgueses com relação a todas as leis econômicas bur-
guesas, que para eles configuram "leis naturais" e em conseqüência ''ponto
de partida" histórico.
Mas a circunstância de Ricardo admitir que se reparta o inteiro produ-
to "acabado", quando não se trata do valor do produto e sim do próprio,
produto, é o que Rod~rtus podia ver logo no prbneiro paiágrafo do prefá-
cio de Ricardo :

"Os produtos da terra - tudo o que se obtém de sua superfície pela apjj,.
cação combinada de trabalho. maqui.narla e eapital - se repartem por
três cJmes da socíe&tde, a saber, os proprietários do solo, os proprietá-
rios do equipamento ou do capital necessârio para cultivá-lo, e os traba·
lliadores que o cultivam com sua atividade" (Ricat"do,Princ. of Pol. Ec.,
Prefácio, 3!' ed., Londres, 1821).

E logo prossegue :

"Mas nos div~sos níveis de desenvolvimento da sociedade são bem diver·


sas as proporções do produto total da terra, as,quais sob. o títuJo de ren·
da, lucra e salário cabem a cada uma dessu classes" (Lc.).

Trata-se aí da repartição do "produto total", nã'o do produto indu.


trial ou do produto primário. Mas essas participações no "produto total",
suposto dado ,o "produto total", são detenninadas apenas pelas cotas que
cada um dos participantes, dentro de cada esfera de produção, tem no "va-
lor" do respectivo produto. Esse ''valor" é conversível e pode exprimir-se
em certa parte alíquota do "produto total". Ricardo só erra aí, como A.
Smith, ao esquerer que o "produto total., não se reduz a renda fundiária,
lucro e salário, mas que parte dele caberá a uma ou mais dessas três classes
na forma de capital.

••poder-se-ia pretender af'umar que na origem a lei do nivelamento dos


ganhos do capital teria de deprimir t.anto os preços d0$ ptodutos primá·
rios que a renda fundiária teria de desapuecer para ressurgir depois em
virtude da alta de preços, .oriunda da diferença entre rendimentos de

584
terras mais férteis e menos férteis, e que hoje, do mesmo modo, as van-
tagens de conseguir renda fundiária junto com o ganho normal do capi-
tal incitariam capitalisr.is a aplicarem capítal para anotear e melhoru
as terras por tanto tempo llté qu.e os preços, por força do resultante abar-
rotamento do mercado, baixassem o ba&tante para fazerem desapuecec
a obtenção de renda nos menos vantajoSÓS empregos de capital. Noutras
paltlvrtn, seria. isso afirmar que a lei do nívelamento dos ganhoa do capi-
tal elimina, no tocante ao produto primdrit>, a outra lei 1egundo a qual
o Wllor dos produtos se govema pelo custo do tra1Mlho, quando o pró-
prio Ricrudo, no primeiro capítulo de sua obra, utiliza a.que!a para pro-
vares~" (l.c., p. 174).

De fato, Herr Rodbertus. A lei do "nivelamento dos ganhos do capi·


tal" nã'o derroga a lei de o "valor" se governar pelo "custo do trabalho".
Mas anula o pressuposto de Ricardo, de ser o preço médio dos produtos
iguaJ a seu '"valor". E, além disso, o "produto primário" não tem o valor
reduzido ao preço médio; ao contrário. O ..produto primário" se distin-
gue - em virtude da propriedade da terra - pelo privilégio de seu valor
não se reduzir ao preço médio. Se esse valor de fato cair - o que é possí-
vel apesar de vosso "valor do material" - ao nível do preço médio das mer-
cadorias, desaparecerá a renda fundiária.. Os tipos de solo que hoje possi-
vebnente. não pagam renda fundiária, não o pagam porque para eles o pre·
ço de merca.dQ dos produtos primários é igual ao respectivo preço médio
e porque - por força da concorrência dos tipos de solo mais férteis -
perdem o privilégio de vender seu produto pelo "valor" deste.

''.Antes de haver qualquer cultura llgffrola podem existiI é:ipítalistas que


peiceii.n lucro e de aoordo com a lei do nivelamento deste empreguem
seus capitais'!" (Que tolice!) " .•• Se hoje se empreende. de países cM.·
liiados, uma expedição pata novo país de terras Incultas, na qual os
participantes mais ricos estão providos de suprimentos e ferramentas
(instrumentos) de uma agricultura já amadurecida - de capital, e os
mais pobres os acompanham na esperança de gll.llhar a serviço deles um
salário alto, admito que então os capitalistas oonsiderado como ganho
pr-Oprio o que lhes sobra depois do salário dos trabalhadores, pois levam
consigo coisas e idéias da terra natal, há muito tempo nela existentes"
(pp.174, 175).

Eis aí, Herr Rodbertus. A concepção toda de Ricardo só vai bem


com o pressuposto de ser dominante o modo capitalista de produção.
À própria questão não importa corno ele expriroa esse pressuposto e se
comete uma inversão da seqüência histórica. O pressuposto tem de ser
estabelecido, e portanto não cabe o que fazeis, introduzindo economia
camponesa que não entende a contabilidade capitalista e por isso não oon·

585
sidera sementes etc. como capital adiantado. E um "contra-senso" não de
Ricardo, mas de Rodbertus, se este admite haver capitalistas e trabalhado-
res "antes do cultivo da terra" (1.c., p. 176).

"Na concepçào ricudiana, o cultivo do solo só deve começar ... quando


na sociedade tenha súrgido capital e se conheça e pague ganho de capi-
tal" (p. 178).

Que disparatel Só quando o capitalista intervém como arrendatário


entre o lavrador e o proprietário da terra - seja o antigo vassalo que por
tretas chegou a arrendatário capitalista, seja o industrial que emprega
seu capital na agricuJtura em vez de na manufatura - só entâ'o começa,
é claro que não a "cultura do solo", mas a cultura "capitalista,. do solo,
a quaJ pela forma e conteúdo difere muito das formas anteriores de cul·
tivo.

"Em todo país, a maior parte da ten:a já é objeto de propriedade mui-


to antes de ser cultivada; sobretudo bem antes de se estabelecer na in-
dústria uma taxa de lucro do capital" (p. 179).

Para compreender a concepção de Ricardo, Rodbertus teria de ser


inglês, em vez de um fv..endeiro pomeran.iano, e de entender, da história
do cercamento das terras comuns e das terras incultas. Rodbertus cita a
América. O Estado lá vende as terras

"em lotes só aos agricultores, a preço por certo reduzido, mas que em
todo caso já tem de representar tenda fundiária" (pp. 179, 180).

De maneira nenhuma. Esse preço não constitui renda fundiária, co-


mo tampouco, por exemplo, um imposto geral de indústria e profissões
constituiria renda (rent) industrial, nem imposto absolutamente nenhum
constitui "renda" {rent).

"Mas. a causa da elevação em b" (acréscimo da população ou acréscl·


mo da quantidade de trabalho aplic:ado), "asseguro, dá vantagem à ren-
da fundi:íria sobre o ganho do capital. Esse ganho nunca pode elevar-
se por ocorrer no país mai'or ganho de c:api1al em virtude do acréscimo
do produto nacional, com pl'Oliutívidade inalterada, mas força produti·
va acrescida (população aumentada), pois esse ganho maior incide sem·
pre sobre capital acrescido .na mesma proporção. e a taxa de ganho con-
tinua pottanto a mesma" (pp. 184, 185).

586
Isso é fa1so. A quantidade de trabalho excedente não pago acresce,
por exemplo, se o operário trabalha 3, 4, 5 horas de tempo de trabalho
excedente, em vez de 2. Com a massa desse trabalho excedente não pago
não aumenta o montante do capital adiantado, antes de mais nada porque
essa sobra ulterior de trabalho excedente não é paga, não causa portanto
dispêndio de capital; segundo porque o dispêndio de capital fixo não au-
menta na mesma proporção quanto acresce aí sua utilização. Não se em-
prega maior quantidade de fusos. Estes, seja como for. se desgastam mais
rapidamente, mas não na mesma proporção em que são mais utilizados.
Assim, inalterada a produtividade, cresce então o lucro não só porque
terá aumentado a mais-valia, mas também a taxa da mais-valia. Na agri-
cultura, isso não é viável em virtude das condições naturais. Ademais, a
produtividade varia facilmente com o aumento do capítal despendido.
Omitindo-se divisao de trabalho e maquinaria, embora o capital adianta-
do seja grande em termos absolutos, em virtude da economia das condi-
ções. de produção fica menor relativamente esse adiantamento. A taxa de
lucro poderá portanto crescer, mesmo quando a mais-valia (e não só sua
taxa) permaneça a mesma.
R~bertus comete erro evidente e se revela típico fazendeiro pome-
rano, ao dizer:

"ê possível que no cu.rso desses 30 ano~" (de 1800 a 1830) "tenham
surgido mais propriedades po.r meio de loteamento ou de desbrava-
mento, e a renda fundiária. acrescida se t(lpalte assim po1 mait proprie-
dades, mas em 183() ela Tilio se repaTda por mais acres que em 1800;
o total de acres dos terrenos desmembrados ou novos cultivados estava
antes compreendido nas propriedades mais antigas, e portanto a renda
fundiária menor de 1800 se repartiu também por eles e contribuiu na-
quela época' para detemünar o nível da renda fundiária ínglesa em ge-
ral, como OCOJ'feu com atenda fundiária. malot de 1830" (p. 186).

Caro pomerano! Por que sempre essa transferência depreciante de


tua situação prussiana para a Inglaterra? Os ingleses não fazem contas
deste tipo: se, como foi o caso (verificar isso). se privatiza.mm 3-4 milhões
de acres de 1800 a 1830, a renda desses 4 milhões de acres se repartiu
tanto em 1830 quanto em 1800. Ao contrário, eram terras incultas ou
comuns que não davam renda alguma e a ninguém pertenciam.
Rodbertus, como Carey (mas de outra maneira), tenta mostrar a
Ricardo que o solo (mais fértil) não é normalmente o primeiro cultivado,
em virtude de razões físicas e de outra natureza, mas isso nada tem a

587
ver com Ricardo. O solo "mais fértil" é sempre "o mais fértil" nas con·
dições dadas de produção.
Grande parte das objeções feitas por Rodbertus a Ricardo decorre
de aquele identificar de maneira ingênua as condições de produção "po-
meranas" às "inglesas". Ricardo supõe produção capitalista, a que corres-
ponde, onde ela se efetiva como na Inglaterra, a separação entre o arren·
datário capitalista e o dono dá terra. Rodbertus estabelece condições que
em si mesmas são estranhas ao modo capitalista de produção, ãs quais
este se sobrepõe. O que Rodbertus diz, por exemplo, sobre a situação
dos centros econômicos em complexos econômicos ajusta-se como uma
luva à Pomerânia mas não à Inglaterra, onde o modo capitalista de pro-
dução desde o último terço do século XVI, cada vez mais poderoso, assi-
milou a si todas as condições e mandou para o inferno, em diferentes
períodos e progressivamente, os antecedentes históricos, a,ldeias, constru-
ções e seres humanos, a fim de obter a aplicação "mais produtiva" do
capital.
Rodbertus também erra, ao falar sobre a "aplicação do capital".

"Ricardo limita a renda fundiária ao que se paga ao dono da terra pelas


forças originais, naturais e indesrrut(veis da terra. Com isso deseja que
se deduza da renda fundi.árfa tudo o que se te>ria de creditar ao capital
em solos já cultivados. Está claro, porém, que nunca se deve, à custa
do rendimento de uma área de terra, atribuir ao capi.tal· mais do que
os juro1 p/eno11 usuais no pa(S, Pois, do contrário, teria Ricardo de admi-
tir no desenvolvimento econômico de um país duas taxas düerentes
de ganho, a agrícola, que daria resultado maior que a taxa ~dustrial,
e esta; hipótese, entretanto, que destruiria seu próprio sistema, basea·
do no nivelamento da t~a de ganho" (pp. 215, 216). ·'

De novo a imaginação do fazendeiro pomerano que toma capital


de empréstimo para melhorar suas terras, e só quer pagar ao prestamista,
po1 força de razões teóricas e práticas, apenas os juros "usuais no país".
Todavia, na Inglaterra a coisa é diferente. E o arrendatário, o arrendatá-
rio capitalista, que despende capital para melhorar a terra. Desse capi-
tal, como do que desembolsa diretamente na produção, exige não os ju-
ros usuais do país, mas o lucro usual. Nã'o empresta capital ao dono da
terra, para este pagar os "juros usuais". Ele mesmo talvez tome empres-
tado capital ou empregue o próprio capital excedente, a fim de que esse
lhe propo1cione o lucro industrial "usual no país", pelo menos o dobro
dos juros usuais.
De resto Ricardo sabe o que Anderson já sabia e ademais diz expres-
samente que a força produtiva do solo gerada pelo capital coincide mais

588
tarde com a "natural'', isto é, faz a renda acrescer. Rodbertus nada sabe
a esse respeito e assim fica a dizer disparates.
Já apresentei definição cabal e correta da moderna propriedade fun.
diária;
..A renda (rent), no sentido de Ricardo, é a propriedade fundiária
em sua configuração burguesa: isto é, a propriedade feudal que se subme-
teu às condições da produção burguesa" (p. 156, Misére de kz PhiL, Paris,
1847).
Também está correta a observação que já fiz:
"Ricardo, que supõe a produção burguesa necessária para determi-
nar a renda (rent), aplica não obstante a concepção de renda fwidiárla
à propriedade da terra de todos os tempos e de todos os países. Este é o
erro de todos os economistas que vêem nas relações de produção burgue-
sa categorias eternas" (l.c., p. J60).
Era também correta a obseIVação que fiz de os "capitais.terras"
poderem aumentar como todos os outros capitais:
"Os capitais-terras podem ser aumentados como os demais meios
de produção. Nada se acrescenta à matéria, para usarmos a linguagem de
ProudhoQ, mas aumentam-se as terras que servem de meios de produção.
Basta aplicar nas áreas de terra já transformadas em meios de produção
investimentos adicionais de capital, para aumentar o· capital-terra, sem
nada acres.centar à matéria-terra, isto é, à extensão do solo,. (1.c., p. 165).
Continua correta a distinção que então acentuei entre indústria e
agricultura:
"Primeiro, não se pode aumentar à vontade, como na indústria ma-
nufatureira, os instrumentos de produção de ;gual produtividaile, isto é,
as terras de igual fertilidade. Então, à medida que cresce a população,
passa-se a cultivar terra ·de qualidade inferior ou a investir na mesma área
capital novo, menos produtivo em relação ao empregado no início" (1.c.,
.p. 157).
Diz Rodbertus:
"Mas tenho de chamar atenção para outra circunstância. que, por cer-
to de maneira bem mais paulatina e ainda bem mais geral, converte má-
quinas agrícolas piores em melhores&. li: o que faz o cultivo continuo
de uma área, simplesmente de acordo com método racional, sem o me-
nor emprego extraordínário de capital" (p, 222).

62. Por máquínas agrícolas entende aí Ro.dbertus as diferentes classes de sol.o se-
:undo a fe1tilidade. Rodbettu.s tomou de empréstimo a Malthus essa equiparação das
·lasses de sol.o a máquinas.

589
Anderson já o dizia. O cultivo melhora o solç.
Prossegue Rodbertus:

"Deveis p.rovar que a população trabalhadora ocupada na agricultura,


no curso do tempo, teria ..crescido em proporção maior que a produ-
ção de meios de subsiirtência ou pelo menos que o resto da população
de um país. S6 daí se poderia inferir de maneira irrefutáv~ que, com o
ac1éscimo da produção agrícola, também se teria de empregar nela ca·
da vez mais trabalho. Mas é aí que a estatística vos contradiz" (p. 274).
"Sim, descobri.reis que predomina, bastante generalizada, a .regra de
ser tanto menor a proporção de seres humanos ocupados na agricultu-
ra quanto mai~ densa fm a população de um país... O me&mo fenôme-
M se revela no acréscimo da população do mesmo país: a parte que
não se emprega na agricultura crescerá quase por toda parte em pro-
porção maior" (p. 275).

Mas, seja porque mais terra arável se transforma em pastagem de ga-


do e de ovelha, seja porque com a escala maior da produçãÓ - da agricul-
tura moderna - o trabalho se toma mais produtivo. Mas também. circuns-
tância de todo omitida por Rodbertus, porque grande segmento da popu-
lação não agrícola coopera na agricultura, fornece capital constante - cres-
cente com o progresso da agricultufll - como adubos minerais, sementes
estrangeiras, maquinaria de toda espécie.
Segundo Rodbertus (l .c., p. 78),

"hoje" (na Pomerânia) "o agricultor não vê como capital a forragem


dos animais de tiro, produzida na própria fazenda.''
"Capital em si ou no sentido econômico nacional é. produto a seguir
utilizado na p.rodução... Mas, no tocante a um ganho particulat: que
deve dar ou na concepção do empresário hodiemo,.·tem de ~revelar
'dirpindio ', pa.ra ser capital" (p. 77).

Só que essa idéia de "dispêndio" não exige tenha ele sido compra·
do como mercadoria. Se parte do produto, em vez de ser vendida como
mercadoria, volta à produção, nela entra como mercadoria. E é avaliada
antes em "dinheiro", o que se faz tanto mais precisamente quando todos
esses "dispêndios" são mercadorias que ao mesmo tempo estão presen~
tes no mercado: gado, forragem, adubos, grlios para semeadura, toda es-
pécie de semente. Mas na Pomerânia, segundo parece, não são considera-
dos "dispêndios".

"O lllllor dos resultados partieulares desses trabalhos diferentes" (ma-


nufatura e produção primária} "ainda não é a prôp:ria renda (income}
que cabe ao proprietário desses resultados, mas tão-só a medida da

590
con\.ersão dele em dinheiro. Essa própria renda (im:ome) particular é
parte da renda social que apenas se gei:a pela ação combinada do traba-
lho da agricultura e da indústria, e cujas ptITtes portanto também só
são geradas por essa ação combinada" (p. 36).

Que posso extrail daí? A realização desse valor só pode ser a reali-
zação em valor de uso. Não é disso que se trata. Além disso, no salário
necessário já entra a quantidade de valor - de produtos agrícolas e indus-
triais - que se configura nos meios necessários à manutenção do traba-
lhador.
Basta.

591
Capítulo X
Teoria de Ricardo e de A. Smith sobre
preço de custo. (Refutação)63

A) Teoria de Ricardo sobre o


preço de custo

1. Derrocada da teoria fisiocrática e


desenvolvimento posterior das idéias sobre
renda fundiária.

A doutrina füiocrática ruiu com a tese de Anderson (em parte conti-


da também na obra de A. Smíth): "Não é a renda fundiária que determi-
na o preço do produto da terra, mas é o preço desse produto que deter·

63. Como já vimos (vol. 1 desta tradução, p. 75. nota 29). Marx utiliza o tenno
"preço de custo" em diferentes sentidos: (1) no de custo de produção para o capitali&-
ta (e+ v); (2) no de "custo imanente de produção" da mercadoria (e+ v+ m), o qual
coincide com o valoi, e (3) no de prego de produção lc + v +lucro médio). Neste vo-
lume Marx emprega "preço de custo" no sentido (3), o de preço de produção ou preço

S93
mina a renda fundiária". 64 Assim, o preço do produto agrícola passou a
ser a fonte da renda (rent), ao invés de esse próprio produto ou a terra.
Com isso desmoronou a tese de a renda ser o rebento da produtividade
excepcional da agricultura, a qual por sua vez decorreria da fertilidade
específica da terra. Pois, se a mesma quantidade de traballw exercida num
elemento especialmente produtivo era por isso de produtividade excepcio·
nal, daí só poderia resultar que esse trabalho se configurasse em massa
relativamente grande de produtos e por isso fosse relativamente baixo o
preço do produto individual, e não o oposto, isto é, que o preço do pro-
duto desse trabalho fosse mais alto que o dos outros produtos em que se
realizasse a mesma quantidade de trabalho, e por isso tal preço, desta-
cando-se do dos demais produtos, proporcionasse ainda uma renda além
de lucro e salário. (A. Smith, ao tratar da renda (rent). retrocede em par-
te à concepção ftsiocrática, depois de a ter antes refutado ou pelo menos
contestado com seu conceito inicial da renda (rent) como parte do tra-
balho excedente.)
Buchanan resume esse desmoronamento da concepção fisiocrãtíca
nestas palavras:

"A idéia de a agricultura gerar um produto e em conseqüência uma


renda (rent), porque natureza e diligência humana operam juntas no
processo de cultivo, é mera fantasia. A renda não provêm do produ-
to, mas do preço a que ~e vende o produto; e não se consegue esse pre-
ço porque a natureza protege a produção, mas por ser o preço que aju11-
ta o consumo il oferta. ,.65 ,

médio. No volume 3, Marx utiliza o termo "preço de custo" no sentido (1) (custo de
produção para o capitalista) e no (3) (preço de produção); e no volume 1, no sentido
(2) (custo imanente de produção da mercadoria).
Essa variação no emprego do termo "preço de ~sto" decorre, segundo observa
Marx, dos diferentes sentidos que tem a pa.là111a "CU5to" em economia, a saber: (1)
montante adiantado pelo capitalista; (2) preço do capita! adiantado ma.is lucro médio;
(3) custo real (llllanente) da própria mercadoria.
Além desses três sentidos encontrados nos economistas. clássicos, existe o de
Say: preço de custo é o que se paga pelos serviços produtivos do trabalho, do capital
e da terra. Marx rejeita essa concepção vulgar (ver neste volume pp, 562-564, 645,
6-«í e 905.
64. Ver pp. S75 e 576 neste volume.
65. Adam Smith, An inquiry into the nature and cau11e$ofthe wealth of1111túms.
Wíth notes and an additional volumen, by David Bucha111l!l, vol ll, Edimburgo, 1814,
p. 55. Marx cita Buchanan apud Ricatdo, On the principies ofpolitical economy, and
taxation, 3ít ed., Londres, 1821, p. 66, nota.

594
Refutada essa idéia dos fisiocratas - mas que se justifica plenamente
em seu sentido mais profundo, porque eles consideram a renda (rent) co-
mo o único excedente, e os capitalistas junto com os trabalhadores, como
os assalariados dos donos das terras -, só eram;possíveis os seguintes pon-
tos de vista:
(I) A proposição de a renda (rent) derivar do preço de mono-pálio
dos produtos agrícolas 66 , e o preço de monopó1io, da circunstância de o
proprietário fundiário deter o monopólio da terra. Nessa proposição, o
preço do produto agrícola está sempre acima de seu valor. Ocorre acrés-
cimo de preço, e o moTIDpólio da propriedade fundiária transgride a lei
dos valores das mercadorias.
A renda provém do preço de monopólio dos produtos agrícolas,
porque a oferta está sempre a"bai;xo do nível da procura ou a procura sem-
pre acbtuz do nível da oferta. Mas por que então a oferta nto atinge o
nível da procura? Por que uma oferta adicional não nivela essa relação
e assím, de acordo com essa teoria, extingue toda a renda? Para explicar
essa questão, Malthus recorre à ficção de os produtos agrícolas criarem
para si mesmos consumidores diretos (o que veremos depois, ao tratar
de sua ~ndência com Ricardo) e, ademais, à teoria andersoniana de a
agricultura tomar-se menos produtiva porque a oferta adicional custa mais
trabalho. Por isso, esse modo de ver, até o ponto em que não se baseia
em mera ficção, coincide com a teoria ricardiana. Também aí o preço
está acima do valor, é acrescído de um suplemento.
(II) A teoria ri.cardiana: Não há renda fundiária absoluta, mas apenas
renda diferencial. Também aí o preço dos produtos agrícolas que propor-
cionam renda está acima de seu valor individual, e desde que renda exista,
existe ela por meio P.o excesso do preço dos produtos agrfcolo.s sobre seu
valor. Só que aí ess.e excesso do preço sobre o valor não contradiz a teoria
geral do valor (embora pennaneça o fato), porque dentro de cada ramo
de produção o valor das respectivas mercadorias não se determina pelo
valor individual da mercadoria, mas. pelo valor que ela tem nas condiçôes
gerais do ramo. Aí também o preço dos produtos que dão renda é preço
de monopólio, monopólio como o ocorrente em todos os ramos da indús-
tria, mas que na agócultura se fixa e por isso torna a forma de renda, di-
versa do lucro suplementar. Ainda aí há o exeesso da procura sobre a ofer-
ta ou, o que dâ no mesmo, a circunstância de não se poder satisfazer a
procura adicional com urna oferta adicional aos preços que eram os da ofer·

66. Vu neste volume p. 468.

595
ta original, antes de os preços crescerem em virtude do excesso da procura
sobre a ofertá. Ainda aí a renda (renda diferencial) surge por causa do
excesso do preço sobre o valor - por causa da ascensão dos preços acima
do valor no melhor solo, o que dá origem à oferta adicional.
(III) A renda (rent) é·apeno.s o juro do capital embutúln na terra 67
Esse ponto de vista tem em comum com Ricardo a negação da renda fun-
diória absoluta. Tem de admitir a renda diferencial, quando áreas em que
se empregam a mesma quantidade de capital proporcionam rendas de mag-
nitude diferente. Por isso, na realidade dá na mesma que a teoria de Ri-
cardo: certos solos não dão renda e onde se obtém renda verdadeira, esta
é renda diferencíal. Só não pode absolutamente explicar a renda da terra
em que não se investe capital, a de quedas-d'água, minas etc. De fato, nã'o
passou de uma tentativa, dentro da concepção capitalista, de salvar a ren-
da contra Ricardo, sob o nome de jWYJ.
(IV) Por fim: Ricardo admite que no solo que não dá renda, o pre-
ço é igual ao valor do produto, por nivelar-se ao preço médio, isto é, adian-
tamento + lucro médio. Erra assim ao supor que o valor da mercadoria
é igual ao preço médio da mercadoria. Se cai essa suposição falsa, torna-
s~ possível a renda absoluta, porque o valor dos produtos agrícolas, co-
mo o de todo um vasto elenco de; outras mercadorias, está acima do res-
pectivo preço médio, mas em virtude da propriedade fundi.ária não se ni-
vela ao preço médio como sucede com essas outras mercadorias. Essa idéia
portanto admite, em harmonia com a teoria do monppóiio, que a pro-
priedade fundiária como tal tem algo a ver com a renda; aceita a renda
diferencial, de acordo com Ricardo, e por fim dá por ce.rto que' a renda
absoluta não transgride a lei do valor.

2. Determinação do valor pelo trabalho


segundo Ricardo. Justificação histórica e
carências de seu método de pesquisa.

Ricardo parte da determinação dos valores relativos· (ou valores de


troca) das mercadorias pela "quantidade de trabalho·: ( Podemos por
fim examinar os sentídos díversos em que Ricardo usa o termo valor. De-

67 Ver ne.rt~ volume pp. 467, 468, 569-571 e 574.

596
corre daí a crítica de. Bailey e também as deficiências de Ricardo. E dei-
xa de pesquisar o caráter desse "tiabaJho". Se duas mercadorias são equi-
valentes - ou equivalentes em determino.da proporção ou, o que dá no
mesmo, divergem na magnitude segundo a quantidade de "trabalho" que
encerram - está claro que são, na qualidade de valores de troca, iguais
pela substância. Sua substância é trabalho. São por ísso "valor". Sua magni-
tude varia conforme contenham mais ou menos dessa substância. Ricar-
do não examina a forma - a propriedade específica do trabalho de gerar
valor de troca ou de representar-se em valores de troca - , o caráter desse
trabalho. Daí não apreender a conexão entre esse tra!Jalho e o dinheiro,
ou a circunstância de ele ter de configurar-se em dinheiro. Por isso não
concebe de maneira alguma o nexo entre a determinação do valor de tro-
ca da mercadoria pelo tempo de trabalho e a necessidade do desenvolvi-
mento que leva as mercadorias a formarem o dinheiro. Daí sua falsa teoria
monetária. Na sua obra, desde o início só se trata da magnitude do valor,
isto é, da circunstância de as magnitudes de valor das mercadorias serem
proporcionais às quantidades de trabalho requeridas para produzi-las. Daí
parte Ricardo. E claro ao qualificar A. Smith de seu predecessor (cap. 1,
secção n:
O método de Ricardo consiste no seguinte: parte da determinação
da magnitude do valor da mercadoria pelo tempo de trabalho e investiga
se as demais condições e categorias econômicas contradizem essa deter-
minação ou até onde a modificam. À primeira vista percebe-se a legítimi·
dade histórica dessa maneira de proceder, sua necessidade científica na
história da economia, mas ao mesmo tempo sua insuficiência científica.
A insuficiência se revela no modo de apresentação (meramente formal)
e, ademais, leva a resultados errôneos, porque omite os necessários elos
intermediários e procura de imediato provar a congruência entre as cate-
gorias econômicas.
Historicamente era legítimo e necessário esse método de pesquisa.
Com A. Smith, a economia política ,atingira certa plenitude, ficara por
assim dizer delimitado o domínio que ela abrange, e assim pôde Say, de
maneira superficial e sistemática, sintetizá-la num compêndio. Entre Smith
e Ricardo só ocorreram investigações de permenores, relativas a trabalho
produtivo e improdutivo, moeda, teoria da população, propriedade da
terra e tributos. O próprio Smith move-se com grande ingenuidade em
contradição contínua. Ora investiga as conexões causais das categorias
econômicas ou a estrutura oculta do sistema econômico burguês. Ora
junta a essa pesquisa as conexões tais como se exteriorizam na aparência

597
dos fenômenos da concorrenc1a, se manifestàm portanto ao observador
não científico e, do mesmo modo, ao que na prática está preso e interes- ·
sado no processo da produção burguesa. Desses dois ângulos, um penetra
no nexo causal, na fisiologia por- assim dizer do sistema burguês; o outro
apenas descreve, cataloga e relata, ajustimdo a definições esquematizantes,
o que se revela externamente no processo vital, tal como se mostra e apa-
rece: ambos, na obra de Smith, alêm de correrem num paralelismo ingê-
nuo, se misturam e se contradi1..em de contínuo._Isso nele se justifica (exce-
tuadas algumas pesquisas especializadas como a do dinheiro), pois na rea-
lidade sua tarefa era dupla. Numa, procura penetrar na fisiologia interna
da sociedade burguesa e, na outra, empreende várias tentativas: descrever,
pela primeira vez, as fonnas vitais aparentes, externas dessa sociedade e
apresentar suas conexões como aparecem exterionnente; achar ainda, pa·
ra esses fenômenos, nomenclatura e as correspondentes idéias abstratas,
e assim pela primeira vez reproduzi-los na linguagem e no processo inte-
lectual. Uma tarefa interessa-o tanto quanto a outra, e uma vez que ambas
marcham independentes uma da outra, daí resultam modos de apresenta-
ção absolutamente contraditórios: um expressa os nexos causais com maior
ou menor acerto, e o outro, com a mesma legitimidade e sem qualquer
relação interna, configura, sem a menor coerência com o pQníeiro .modo
de ver, as conexões aparentes. Os sucessores de A. SrnJ,tli, quando não
representam contra ele a reação de modos de ver mais velhos e arcaicos,
podem prosseguir tranqüilos em suas pesquisas e observações d~,ponneno­
res é considerar sempre A Smith o ponto de partida, apóiem-se na parte
esotérica ou exotérica de sua obra ou, o que quase se111pre sucede, bara-
lhem as duas. Mas, por fim, Ricardo entra em cena e dá o brado no campo
da ciência: Basta! O flmdamento, o ponto de partida da fisiologia do siste·
ma burguês - para compreender seus nexos orgânicos internos e processo
vital - é a determinação do vak>r pelo tempo de trabalho. Daí parte Ri-
cardo e leva então a ciência a abandonar a rotina vigente, a verificar até
que ponto as demais categorias por ela desenvolvidas e descritas - rela-
ções de produção e de circulação -, fonnas daquele fundamento, corres-
pondem ao ponto de partida, ou o contradizem; até que ponto a ciência
que espelha e reproduz simplesmente as fonnas aparentes do processo,
e assim esses próprios fenômenos, correspondem ao fundamento sobre
que repousam os nexos internos, a fisiologia verdadeira da sociedade bur-
guesa, ou que constitui seu ponto de partida; e em geral como se com·
porta essa contradição entre o movimento aparente e o real do sistema.
Este é portanto o grande significado histórico de Ricardo para a ciên-

598
eia, e o fútil Say, por lhe ter Ricardo tirado os estribos dos pés, extravasa
seu despeito na frase: "com o pretexto de expandi-la" (a ciência), "lança-
ram·na no vácuo". 6 s Entrosa-se com esse mérito científico de Ricardo a
circunstância de ele descobrir e expressar a contradição econômica entre
as classes - segundo patenteiam os nexos causais; em conseqüência, a eco·
nomia apreende e revela as raízes da luta hlstórica e do processo de de-
senvolvimento. Ouey (ver depois a passagem) denuncia-o por isso como
pai do comunismo.

"O sístema de Rica.rdo é de discórdias ... tende a produzir hostilidade


entre classes e nações ... Sua ob1&. é o verdadeiro manual do demagogo
que procura poder por meio do agrarianísmo, da guerra e da pilhagem"
(H. C Carey, The Paçt, the. Present, and the Future, Filadélfia, 1848,
pp. 74, 75).

Infere-se assim a legitimação científica e o grande valor lústórico do


método de pesquisa ricardiano; contudo, são evidentes as carências cientí-
ficas de seu sistema, as quais serão pormenorizadas no que segue ma.is adiante.
Daí a arquitetônica de sua obra - &íngular ao extremo e necessaria·
mente revirada. A obra toda (terceira edição) consiste em 32 capítulos.
Dela, 14 çapítulos tratam de impostos e por ísso contêm apenas aplicação
dos princípios teóricos. 69 O capítulo XX "Valor e Riqueza, suas Proprieda-
des Distintivas" não passa de pesquisa sobre a diferença entre valor de uso
e valor de troca, isto é, de um complemento do capítulo 1 "Do Valor".
O capítulo XXIV ••Doutrina de A. Smith Relativa à Renda da Terra", co-
mo o capítulo XVIII "Do Valor Relativo do Ouro, Cereais e Trabalho etc."
e o capítulo XXXII "Opiniões de Malthus sobre Renda (rent)" são meros
complementos e em· parte defesa da teoria da renda fundiária de Ricardo,
isto é, mero apêndice dos capítulos II e III, que tratam da renda. O capí-
tulo XXX "Da Influência da Procura e Oferta nos Preços" é mero suple-
mento do capítulo IV "Do Preço Natural e de Mercado" Outro suple-
mento desse capítulo é o XIX "Das Mudanças .Súbitas no Intercâmbio
Comercial". O capítulo XXXI "Da Maquinaria" é mero apêndice dos ca-

68. Say, Traíté d'économie poUtique, 5!\ ed., vol 1, Paris, 1826, pp. LXXXllI
e LXXXIV (ou 6!1 ed., Paris, 1841, p. 41).
69. Marx adiciona aos 12 capítulos (Vlll·XV111 e XXIX) que tratam de impostos
em sentido estrito, o cap. XXII ("Pi:êmtos à exportação e proibições de importação")
e o cap. xxm ("Prêmios à pl'Odução.,), que também dizem respeito a questões de tri-
butação. pois prêmios desse gênero saem de fundo fonnado par vári~ tributos pagos
pela população.
pítulos V e VI "Do Salário" e do "Lucro". O capítulo VII "Do Comércio
Exterior" e o XV "Do Comércio Colqnial" são mera aplicação - como os
capítulos sobre impostos - dos princípios antes estabelecidos. O capítulo
XXI '"Efeitos da Acumulação- sobre Lucros e Juros" é um apêndice dos
capítulos sobre a renda fundiária, lucros e salário. O capítulo XXVI "Da
Renda Bruta e Líquida" é um apêndice dos capítulos sobre salário, lu-
cros e renda. Por fim o capítulo XXVII "Da Moeda e dos Bancos" está
de todo isolado .dentro da obra e simplesmente amplia e em parte modí·
fica as idéias sobre dinheiro formuladas nos anteriores escritos ricardianos.
A teoria de Ricardo está portanto toda contida nos 6 primeiros
capítulos da obra. Quando falo de suas falhas arquitetôrúcás, trata-se des-
sa parte. A outra parte consiste em aplicaç5es, esclarecimentos e aditamen-
tos (excetuada a secção sobre moeda) que por sua natureza se baralham
e nada exigem da arquitetôriica. Mas a arquitetôrúca falha da parte teóri-
ca (os .primeiros 6 capítulos) não ê acidental e sim result.ante do método
de pesquisa do próprio Ricardo e dos ?bjetivos determinados que impusera
a sua investigação. Revela as deficiências do próprio método de pesqUisa.
O capítulo Itrata "Do Valor". Subdivide-se em 7 secções. Na primei-
ra secção Ricardo investiga adequadamente se o salário contradiz a deter-
minação dos valores das mercadorias pelo tempo de traba1ho··nelas con-
tido. Na terceira secção demonstra que a entrada do que chamo capital
constante no valor da mercadoria não contradiz a deterniinação do valor
e que a alta ou a queda do salário também não influi nos valore~ <las mer·
cadorlas. Na quarta secção investiga até onde a aplicação de maquinaria
e de outro capital ftxo e durável, desde que varie, nos diferentes ramos de
produção, sua proporção no capital total, altera a detirminação dos valo-
res de troca pelo tempo de trabalho. Na quinta secção investiga até onde
alta ou queda dos salários modifica a determinação dos valores pelo tem·-
po de trabalho, quando se empregam em diferentes ramos de produção
capitais de duração desigual e de tempo de rotação diferente. No capítu-
lo primeiro nota-se portanto que se supõe existirem mercadorias - e nada
mais é mister supor quando se observa o valor em si - e ainda salário, ca-
pital, lucro, mesmo taxa geral de lucro, como veremos, as diferentes formas
do capital segundo emergem do processo de circulação, e também a dife-
rença entre «preço natural e de mercado". Este desempenha papel deci-
sivo nos capítulos seguintes, II e UI: "Da Renda (rent}" e "Da Renda
das Minas". De acordo com o rumo de seu método de pesquisa, o capí-
tulo segundo "Da Renda" - o terceiro "Da Renda das Minas" apenas o
complementa - por sua vez começa acertadamente -com a questão: a pro-

600
príedade fundiária e a renda fundiária contradizem a determinação dos
valores das mercadorias pelo fempo de trabalho?

"Falta considerar", assim inicia o segundo capítulo "Da Renda", "se


a conversão da tena em propriedade e a criação conseqüente da 1en-
da causarão alguma variação no valot relativo das mercadorias, indepen-
dentemente da quantidade de trabalho necessário para produzi-las"
(p. 53,Princ. of Pol. Ec., 3~ ed., Londres, 1821).

Para efetuar essa pesquisa, introduz de passagem a relação entre "pre-


ço de mercado" e "preço real'' (expressão monetária do valor), e ainda su-
põe a plenitude da produção capitalista e a concepção cabal que formula
sobre a relação entre salário e lucro. O capítulo IV "Do Preço Natural e
do Preço de Mercado", o V "Do Salário" e o VI "Dos Lucros". além de
pressupostos, estão de todo revelados nos dois primeiros capítulos "Do
Valor" e "Da Renda", e no capítulo III como apêndice do II. Nos 3 capí-
tulos posteriores, neste ou naquele trecho onde se encontra algo novo no
domtnio teórico. Ricardo preenche lacunas, elabora definições mais precí·
sas que .na maior parte já tinham de figurar propáamente nos capítulos
1 e II.
Toda a obra de Ricardo está portanto contida nos dois primeiros ca-
pítulos. Aí confronta ele com seu princípio da determinação do valor,
as relações de produção burguesa desenvolvidas e portanto as categorias
desenvolvidas da economia política e examina até onde elas díretamente
concordam com esse princípio ou o que se passa com os desvios aparentes
que elas introduzem na relação de valor das mercadorias. Esses capítulos
contêm toda a sua ,crítica da economia política até então vigente, a cate;
górica ruptura com a contradição contínua de A. Smith entre o modo de
ver esotérico e o exotérico, e proporcionam, por meio dessa crítica, resul-
tados que são de todo novos e ao mesmo tempo surpreendentes. Daí serem
teoricamente fascinantes esses dois primeiros capítulos, pois fazem de ma-
neira compacta e concisa a crítica do velho que se dispersa e se extravia
na proliXidade, e apresentam o sistema burguês da economia subordinado
em sua totalidade a uma lei fundamental, extraindo a quinta-essência
dos desvios e da variedade dos fenômenos. Mas esse fascínio teórico desses
dois capítulos - em virtude da originalidade, unidade da visão fundamen.
tal, simplícidade, concentração, profundidade, inovação e abrangência
que ostentam - inevit.avelmente se perde na seqo.ência da obra. Aí tam-
bém ficamos às vezes encant.ados com a originalidade de certas idéias. Mas
o conjunto nos cansa e entedia. Na continuação, a obra deixa de oferecer

601
novos desenvolvimentos. Quando e~ prosseguiinento não consiste na apli·
cação monótona e fonn~ dos mesmos princípios a elementos heterogê·
neos e estranhos, ou na defesa polêmica desses ptincípíos, limita-se a·repe-
tir ou reelaborar matérias; no máximo, encontram-se às vezes, nas últimas
secções, conclusões admiráveis.
Na crítica de Ricardo temos de distinguir o que el.e mesmo não díS:.
tinguiu. Primeiro, a teoria, que naturalmente nele se encontra, da ~
valia, embora ele não defina a mais-valia destacando-a de suas formas par-
ticulares, lucro, renda, juro. Segundo, sua teoria do lucro. Começaremos
com esta teoria, embora não pertença ela a este capítulo e sím ao apêndice
histórico do capz'tulo III ':

3. Ricardo e a questão do valor "absoluto'' e


"relativo". Sua incompreensão das formas
do valor.

Antes, ainda algumas observações sobre a maneira como Ricardo


confunde as definições de valor. A polêmica de Bailey contra ele baseia-
se nísso. Mas para nós também é importante.
De inicio, Ricardo chama o valor de "valor de troca" e com Smith
define-o: "o poder de comprar outros bens" (p. 1, Principies}. Este é ova-
lor de troca tal como apurece imediatamente. E- então passa ele à verdadei-
ra definição do valor:

"O que deteimina o valor relativo, atual ou pretérito, das mercâ.dorias é


sua quantidade proporcional que o trabalho produz" (1.c., p. 9).

"Valor relativo" significa ai apenas o valor de troca determinado pelo


tempo de trabalho. Mas valor re'fativo pode ter também outro sentido, a
saber, quando exprime o valor de troca de uma mercadoria no valor de uso
de outra, por exemplo, o valor de troca de açúcar no valor de uso de café.

"Duas mercadorias variam em valor relo.tivo, e desejamos saber em qual


.
delas ocorreu de fato a variQçõo" (p .. 9).

* Ver nota 19, p. 482.

602
Que varl<lÇão? Maís tarde Ricarcio chama esse ''valor relativo" de "va-
lor comparativo" (pp. 448 e segs.). Queremos saber: em que mercadoria
se deu a variação? Isto é, a variação do "valor", que acima se chamou de
valor relaúvo. Por exemplo, 1 libra-peso de açúcar = 2 de café. Mais tar-
de, l libra-peso de açúcar= 4 de café. Quanto à "variação", o que deseja·
mos saber é se se alterou o "tempo de trabalhe necessário" para o açúcar
ou para o café, se o açúcar custa 2 vezes mais tempo d,e trabalho que antes
ou o cate 2 vezes menos tempo de trabalho que antes, e qual dessas "va-
riações" no tempo de trabalho necessário para a respectiva produç,ão pro·
vocou essa variação na relação de troca. Esse valor "relativo ou compara-
tivo" de açúcar e café -- a proporção em que se trocam - difere portanto
do valor relativo no primeiro sentido. No primeiro sentido, o valor relati-
vo do açúcar é detemlinado pela quantidade de açücar que se pode produ-
zir num determinado tempo de trabalho. No segundo case, o valor relati-
vo do açúcar e do café expressa a razão em que se trocam um pelo outro,
e as mudanças nessa razão podem resultar de variação do "valor relativo"
no primeiro sentido, do café ou do açúcar. A razão em que se trocam po(je
pennaneçer a mesma, embora seus "valores relativos" tenham variado no
primeiro sentido. Pode 1 libra-peso de açúcar continuar igual a 2 de café,
embora o tempo de trabalho para produzir o açúcar e o café tenha dobra-
do ou diminuído de metade. Variações no 11alor comparativo, isto é, quan-
do o valor de troca do açúcar se expressa em café e vice-versa, só se reve·
larão quando suas variações no valor relativo no primeiro sentido, isto é,
nos valores determinados pela quantidade de trabalho, se efetuaram de ma-
neüa desigual, tendo ocorrido assim mudanças comparativas. Mudanças
absolutas - se elas. não alteiam a razão original, se são de igual magnitude
e na mesma direção - não causam variação nos valores comparatívos, nem
nos preços em dinheiro dessas mercadorias, uma vez que o valor do dinhei-
ro, no caso de mudar, muda para ambas por igual. Por conseguinte, expres-
sem-se os valores de duas mercadorias de maneira recíproca nos respectivos
"Va1ores de uso ou em seu preço monetário, representem-se os dois valores
no valor de uso de terceira mercadoria, esses valores rekltivos ou compara-
tivos ou ·preços são os mesmos, e é mister distinguir as mudanças neles ocor·
rentes, dos Yalores re"/ativos no primeiro sentido, isto é, no de expressarem
apenas variação no tempo de trabalho requerido para a próprio. produção e
assim realizado nelos mesmas. Esse valor relativo se patenteia portanto
"valor absoluto", em confronto com os valores relativos no segundo sen·
tido, o da representação real do valor de troca de uma mercadoria no va-
lor de uso de outra ou em dinheiro. Por isso, ocorre a Ricardo o termo

603
"valor absoluto", para expressar ó "valor relativo" no primeiro sentido.
Se, no exemplo acima, l libra-peso de açúcar continua a custar ames·.
ma quantidade de trabalho anterior, não variou seu ..valor relativo" no
primeiro sentido. Mas, se o café custa duas vezes menos trabalho, terá va-
riado o valor do açúcar expresso em café, porque variou o "valor relatívo"
do café no primeiro sentido. Os valores relativos de açúcar 'e café se reve-
lam diferentes de seus ''valores absolutos", e essa diferença se patenteia
porque o valor comparativo do açúcar, por exemplei, não variou em con-
fronto com mercadorias cujos valores absolutos pennaneceram os mesmos.

"A pesquisa para a qual p.rocuro dirigiz a atenção do leitor refe1e-se ao


efeito .das variações no 110lor relativo das. mercadorÍlls e não no valor
absoluto" (p. i5).

Ricardo, às vezes, também chama esse valor "absoluto" de "valor


real" ou de valor apenas (p. 16, por exemplo).
Ver toda a argumentação polêmica de Bailey contra Ricardo em;
A Criticai Dissertation on the Nature, MellSlll'es, and Ozuses of Value;
chiefty in reference to the wri'tingg of Mr. Ricardo and his followers. By
the Author of Essays on the Formation and Publication of Opinions,
Londres, 1825. (Dele ver também: A Letter to a Pol. Economist;occasioned
-by an arlicle in the Westminster Review etc., Londres, 1826). Parte da
argumentaçllo polêmica gira em tomo das diferentes instâilcias da concei-
tuação do valor, as quais Ricardo não justifica, nele se revelam ~penas de
fato e se misturam, e onde Bailey s6 acha "contradições" .AÍém disso,
Bailey é contra o ''valor absoluto" ou ''valor real,, diverso do valor com-
parativo (ou valor relativo no segundo sentido). '

No primeiro trabalho citado diz Bailey: "Em vez de considerai: o val.01


urna relação entre duas coisas", (Ricardo e seus adeptos) "vêem-no como
resultado positivo pi:oduzído por determinada quantidade de trabalho''
(1.c., p. 30).
Consideram "o valor algo imanente e absoluto" .(l.c., p. 8).

Essa crítica final decorre da exposição carente de Ricardo, pois não


pesquisa o valor segundo a forma - a fonna determinada que o trabalho
assume como substância do valor -, mas tão-só as magnitudes de valor,
as quantidades desse trabalho abstrato, geral e, nessa forma, social, as quais
geram as diferenças nas grandezas de valor das mercadorias. Do contrário,
Bailey teáa visto que a relatividade do conceito de valor de maneira nenhu·
ma se anula, porque todas as mercadorias, enquanto ·valores de troca, são

604
meras expressões rei.ativas do tempo de trabalho social, e a relatividade
delas não cons.iste apenas na razão em que se trocam uma pela outra, mas
também na relação que todas elas guardam com esse trabalho social, sua
substância.
Muito pelo contrário, como veremos, cabe criticar Ricardo por esque-
cer muitas vezes esse "valor real" ou "absoluto" e só se deter "nos valores
relativos" ou "comparativos".
Vejamos:

4. Como Ricardo vê lucro, taxa de lucro, preços


médios etc.
a) Ricardo confunde capital constante e fixo, capital
variável e circulante. Erra ao explicar a variação
dos valores relativos.

Na secção III do capítulo primeiro explica Ricardo que a proposição


de ser o valor da mercadoria determinado pelo tempo de trabalho tanto se
estende ao trabalho que se aplicou de imediato à mercadoria no último
processo de trabalho, quanto ao tempo de trabalho contido na matéria.
prima e nos meios de trabalho necessários à produção da mercadoria. Abran-
ge portanto o tempo de trabalho contido no novo trabalho adicionado,
adquirido mediante pagamento de salário, e ainda o tempo de trabalho
contido no segmento da mercadoria o qual chamo de capital constante.
A falha já se apresenta no cabeçalho da secção IIl do capítulo 1. E.i-lo:

"Influí sobre o valor das me1cadorlaJ1, além do trabalho de ímcdiato


nelas empregado, o trabalho aplicado em instrumentos, ferramentas e
edifícios que apóiam o trabalho diretamente despendido" (p_ 16).

Omite-se aí a matéria-prima; todavia, o trabalho nela empregado di·


fere tanto do "trabalho aplicado de imediato em mercadorias" quanto
o despendído nos meios de trabalho, "instrumentos, ferramentas e edifí-
cios". Mas Ricardo tem já em mente a secção seguinte. Na seeção III pre·
sume que os meios de trabalho aplicados entram, com iguais frações com·
ponentes do valor, na produção das diferentes mercadorias. Na secção
seguinte investiga a diferença que surge em conseqüência das diferentes
proporções em que o capital fixo entra nas mercadorias. Assim, Ricardo

605
na:o chega à idéia do capital constante, do qual parte consiste em capital
fixo, parte - matéria-prima e matérias auxiliares - em capital circulante,
do mesmo modo que o capital cz'rculante abrange tanto o capital variável,
quanto matéria-prima etc. e todo_s os meios de subsistência que entram
no consumo em geraPo (e nã"o só no consumo dos trabalhadores).
A proporção em que capital constante entra numa mercadoria não
influencia os valores das mercadorias, as quantidades relativas de trabalho
contidas nas mercadorias, mas influi diretamente sobre as diferentes quan-
tidades de mais-valia. ou 'trabalhn excedente encerradas nas mercadorias
que contêm quantidade igual de tempo de trabalho. Por isso a diferença
nessa proporção gera preços médios que divergem dos valores.
No tocante à secção IV e V do capítulo I cabe, de início, observar
que Ricardo, em vez de investigar a diferença na proporção em que capi-
tal constante e capital variável constituem partes componentes do mesmo
montante do capital em ramos diversos de produção (essa diferença é da
maior importância e influencia a produção imedia.ta da mais-valia}, ocupa-
se exclusivamente com as díferentes formas do capital e com as propor-
ções diversas em que o mesmo capital toma essas várias formas, ocupa·
se com diferenças de forma oriundos do processo de circulação do capital:
capital fixo e circulante, capital mais ou menos fixo (ou seja, capital fixo
de duração diversa) e velocidade desigual de circulação ou riUm.ero dife-
rente de rotações do capital. E a maneira como Ricardo conduz a pesqui-
sa é esta: supõe taxa geral de lucro ou lucro médw de igual magnitude pa-
ra diferentes aplicações de capital de grandeza igual ou para- ramos de
produção diversos onde se investem capitais de montante igual, ou, o que
dá no mesmo, lucro na proporção da grandeza dos capitais empregados
nos diferentes ramos de produção. Em vez de pressupor essa taxa geral de
lucro, Ricardo deveria antes ter pesquisado até onde sua existência corres-
ponde efetivamente à deternúnação dos valores pelo tempo de trabalho,
e teria descoberto que, ao ínvés de lhe corresponder, a contradiz à primei-
ra vista, e assim teria primeiro de elucidar sua existência por meio de uma
série de elos intermediários, elucidaçã'o muito diversa da subsunção pura

70. Por "meios de subsiirtênda que entram no consumo em geral" entende Marx
aí: (1) os meios de subsistência que entram no consumo dos trabalhadores e (2) as ma-
térias auxiliares {material acessório ou substâncias auxiliarei1) que são consumidas pelas
máquinas (como carvão, lubrlficantes etc.) no processo de produção. Sobre (2) ver
O Capital, Ed. DIFEL, livro 1, vol. 1, pp. 206, 228, 234, 248; livro 2, vol. 3, pp. 144,
166, 167, 171, 176, 206, 211, 245;livro 3, vol.4,pp. 93, 114, 118, 119, 131.

606
e simples à lei do valor. Com isso teria atingido compreensão de todo di-
versa da natureza do lucro e não o teria identificado de imediato à mais-valia_
Depois de ter feito aquela suposiçifo, Ricardo propõe a si mesmo a
questão: como atuará ,a alta ou a queda do salário sobre os "valores relati-
vos", ao variar a proporção do capital fixo e circulante empregados? Ou
meÍhor, ônugina encaminhar assim a questão, Na verdade trata-a de ma·
neira bem diversa, a saber: pergunta que efeito a alta ou queda de salário,
nos capítais cujo período de circulação difere e qué encerram proporções
diferentes das diversas formas de capital, terá .sobre os lucros que lhes
correspondam? Então acha naturalmente que, segundo seja maíor ou menor
o capital fixo etc., a alta ou queda dos salários tem de influir de modo muito
diferente nos capitais, conforme parte maior ou menor deles consista em capi-
tal variável, isto é, em capital diretamente empregado em salário. Por isso,
para nivelar de novo os lucros nos diferentes ramos de produção, aliás,
restabelecer a taxa geral de lucro, os preços das mercadorias têm de ser
regulados de maneíra diferente, em contraposição a seus valores. Daí con-
chJ.ír ele depois: essas diferenças influenciam os "valores relativos" ao su-
birem ou .caírem os salários. Deveria ter dito o contrário. Essas diferen-
ças, embora em nada alterem os valores em sí, geram, por sua influência
variável ~obre os lucros nos diferentes ramos de produção preços médios
que divergem dos próprios valores ou, digamos, preços de custo que não
são determinados díretamente pelos valores das mercadorias, mas pelo
capital adiantado para produzi-las acrescido do lucro médio. Deveria por-
tanto ter dito: divergem esses preços de custo médios e os valores das mer-
cadorias. Em vez disso, conclui que são idênticos e parte desse pressupos-
to errado para examinar a renda fundiária.
Ricardo erra 'também ao achar que só por meio dos 3 casos que in-
vestiga chega às "variações" dos "valores relativos", independentemente
do tempo de trabalho contido nas mercadorias; de fato, portanto, à dife-
rença entre os preços de custo e os valores das mercadorias. Já supu,sera
essa diferença ao admitir taxa geral de lucro; presumira portanto que, ape-
sar das diferentes relações entre os componentes orgânicos dos capitais,
estes dão lucro proporcionado a sua magnitude, enquanto a mais-valia que
fornecem é por completo determinada pela quantidade de tempo- de traba-
lho não pago que absorvem, e isso, para dado salário, depende totalmente
do montante da parte do capital despendida em salário e não da magnitu-
de absoluta do capital.
O que de fato investiga é: supostos preços de custo diferentes dos
valores das mercadorias - e a admissão de taxa geral de lucro pressupõe

607
tal diferença -. como esses preços de custo (que, para variar, se chamam
de ''valores relativos") se modificam recíproca e proporcionalmente pala
alta ou queda do salário, quando diferem as proporções entre os compo-
nentes orgânicos do capital? Se Ricardo tivesse examinado mais a fundo
a matéria, teria visto que a mera existência de urna taxa geral de lucro -
com as diversidades nos componentes orgârúcos do capitàl as. quais de íni~
cio se configuram, dentro do processo imediato de produção, na diferença
entre capital variável e capital constante, e depois se ampliam palas dife-
renças oriundas do proce~o de circulação - tem por conseqüência: pre-
ços de cu.tio diferentes dos valores - mesmo supondo-se salfirio constan-
te -, uma diferença portanto que em nada depende da alta ou queda do
salário, e nova determinação fonnal. Teria também visto que, para a teoria
global, a compreensão dessa diferença é incomparavelmente mais impor-
tante e mais decisiva que sua observação sobre a variação nos preços de
custo das mercadorias, causada por alta ou queda do salário. O resultado
com que se satisfaz - e essa satisfação corresponde por inteiro à natureza
de sua pesquisa - é este: uma vez admitidas e levadas em conta as varia-
ções nos preços de custo (ou ''valores relativos", como diz ele) das merca-
dorias - desde que, no caso de d~versidade na composição orgânica dos
capitais empregados em diferentes ramos, se realizem ao ocorrere.m altera-
ções de salário, alta ou queda - a lei continua a vigorar, e is.so não contra-
diz a lei de os ''valores relativos" das mercadorias serem determinados por
tempo de trabalho, pois todas as outras variações que não sejam meramen-
te temporárias nos preços de custo das mercadorias só se podem explicar
por modificação no tempo de trabalho necessário .para produzi-las.
Em contrapartida, devemos considerar que Ricardo conquista gran-
de mérito ao associar as diferenças entre capital fixo e círcu1ante com o
tempo de rotação diverso do capital, e ao derivar todas essas diferenças do
tempo de circulação diferente, na realidade, portanto, do tempo de circula.-
ção ou de reprodução do capital.
Primeiro que tudo observaremos essas próprias díferenças conforme
sua exposição inicial na secção IV ( cap. 0 e depois examinaremos o modo
como as vê influir ou causar variações nos "valores relativos".

1. "Em cada estádio de desenvolvimento da sociedade, as fenamentas,


instrumentos, edifícios e máquinas empregados nos diferentes ramos po-
dem ter gnzu.s diversos de durabilidade. e requerer quantidades diferentes
de traballw para sua produção" (1.c., p. 25).

608
No tocante às "quantidades diferentes de trabalho para sua pro-
dução", pode incluir-se aí a idéia de que os menos duráveis exígem, tan·
to para reparo quanto para reproduçã'o, mais trabalho (trabalho imedia-
to e repetido), e isso parece ser o único ponto de vista de Ricardo; ou in·
cluir-se também a idéia de que maquinaria etc. do mesmo grau de durabf..
lidade pode ser mais ou menos .cara, produto de mais ou menos trabalho.
Este último aspecto, muito importante para a relação entre capital cons-
tànte e variável, nada tem a ver com o exame de Ricardo que nenhures o
considera de maneira autônoma.

2. "Podem variar também as proporções em que se combinam o capital


destinado a sustentar o trabalho" (o capital variável), "e o capital des-
pendido cm ferramentas, maquinaria e edífíci.os" (capital :fixo). Temos
portanto "diferença no grau de duraMldade do capital ju;o e aquela varia-
ção nas proporções em que se podem combinar ambos os tipos de ca-
pital" (p. 25).

Logo se vê por que não lhe interessa a parte do capital constante


configurada em matéria-prima. Ela mesma é parte do capital circulante.
A elevação do salário não gera acréscimo de disp~ndio para a parte do capí-
tal representada em maquinaria e que não se precisa substituir, mas rema-
nesce; essa elevação, contudo, aumenta .a despesa na parte consistente em
matéria-prima, pois esta tem de ser suprida de contínuo e assim de repro-
duzir-se também de contínuo.
"Os alimentos e vestuário consumidos pelo trabalhador, os edifícios onde
ele trabalha, os instmmentos que ajudam seu trabalho, tudo isso são coi-
sas de natureza perec(vel. Todavia difere muito o tempo de duração des-
ses vários capitais... O capital é ctassificado como circulante ou fixo, de-
penden4o de ser perecível com npidez, tendo de se rep1odm:ir com fre-
qüência, ou de ser de comum'> lento" (p. 26).

Por conseguinte, a diferença en.tre capital fixo e circulante se reduz


aí à diferença no tempo de reprodução (o qual coincide com o tempo de
circulação).

3. "Cabe a.inda observar que o capital circulante pode ci!cular, ou refluir


a quem o empree:ou, em prazos muito desigum. O trigo comprado"por
um an:endatário para semear é um capital fixo em comparação com o tri-
go que o padeiro adquire para transformar em pão. Um deixa--0 na terra
e só obtém resultado depois de um a.no; o outro pode convertê-lo em fa..
rinha e vendê-lo aor. fregueses como J)âo, e dentro de uma semana dispor

* Rodbertus verá aí que se "compra" semente na Inglaten:a. (Nota de Marx.)

609
de novo de seu capital para renovar a o~eração ou iniciar qualquer ou-
tra" (pp. 26, 27).

Donde provém essa diferença nos prazos de circulação dos diversos


capitais circulantes? Da círcUn.stâm~ia de o mesmo capital, num caso, demo-
rar na eefera de produção propriamente dita mais tempo do que dura o
processo de trabalho. É o que se dá com o vinho depositado· na adega para
amadurecer, com certos processos químicos dos curtumes, com tinturas etc.

"Dois :ramos podem assím empre8$f: a mesma quantidade de capital, mas


este pode dividir-se de manei.ra bem diversa no tocante à porção fixa e à
circulante" (p. 27).
4. "Dois empresário~ podem ainda emp.cegar montante ígual de capital
fixo e de capital circulante, e ser entretanto muito desigual a duração
dos respectivos capitais fixos" (e portanto o tempo de reprodução).
"Um tern, digamos, máquinas a vapor no valor de 10 000 lib1as, e o ou-
tto, nmos de igual ~or" (pp. 27, 28).
"Duração diversa dos capitais•.. ou, o que dá no mesmo, ... o tempo que
tem de decorrer até que se possa levar ao mercado um lote de mercado-
rias" (p. 30).
~. "Quase não é necessário djzer que mercadorias, em euía produção se
aplicou a mesma q1111.ntidade de trabalho, terão valores de troca diferen-
tes se não forem levadas ao mercado no mesmo tempo" (p. 34 ):

1. Diferença portanto na proporção de capital fixo com· circulante.


2. Diferença na rotação do capital circulante em virtude da interrupção do
processo de trabalho enquanto prossegue o processo de produção. 3. Dife-
rença na durabilidade do capital fixo. 4. Diferença na proporç.[ó em que
uma mercadoria demora em geral no processo de trabalho (sem interromper
o tempo de trabalho e sem diferença entre tempo de produção e tempo de
trabalho".), antes de poder entrar-no processo de circulação propriamente
dito. Ricardo descreve este caso assim:

"Suponha-se que eu empregue vinte pessoas num ano com um desem-


bolso de 1 000 libras para produzu uma mercadoria. No fim do ano em·
prego de novo \'Ínte pessoas por outro ano com o desembolso adicional
de 1 000 libras, para acabar ou melhorar a mesma mercadoria. Decorri-
dos dois anos levo a mercadoria ao mercado. Se o ·lucro for de 10%, te-
nho de vendê-la por 2 310 líbias, pois num ano empreguei l 000 e, no
outro, 2 100 de capital. Empregue outra pessoa. exatamente a mesma
quantidade de ttabalho, mas emp1egando-a toda no pdmeiro ano. Ocupa
quarenta homens com desembolso de 2 000 e no fim do ano vende o

* Ver nota 8, p. 462.

610
produto com 10% de lucro, isto é, por 2 200 lib:ras. Há aí portanto duas
mercadorias ex.atamente com a mesma quantidade de trab:alho: uma é
vendida por 2 310 libras, e a outra, por 2 200" (p. 34).

Mas como entã'o uma diferença dessa natureza - seja na duração do


capital fixo ou no tempo de rotação do capital fixo, seja nas proporções em
que se podem combinar as duas espécies de capital, seja, por fim, no tempo
de chegarem ao mercado mercadorias nas quais se aplica a mesma quantida-
de de trabalho - faz variar os vatores relativos dessas mercadorias? E que,
diz de início Ricardo,

"egsa diferença e a variedade das proporções etc. introduzem outra


causa - além da maior ou menor quantidade de trabalbo necessária para
produzir mercadaria.s - das variações no valor relativo delas: esta caum
é a alta ou a queda nó valor do trabalho" (pp. 25, 26 ).

E como se demonstra isso?

"Urna elevação de salirío não pode deixar de influir de maneira desi-


gual em mercadorias produzidas em condições tão diferentes" (p. 27),

Clígam.os, ao se empregarem capitais de igual magnitude em diferentes ra-


mos, um capital consiste sobretudo em capital fixo e só fração ínfima dele
em capital "empregado no sustento de trabalho .. , enquanto o outro capital
apresenta justamente a proporção oposta. Antes de mais nada é disparate
falar da influência sobre as mercadorias. Ele quer dizer seus valores. Mas
até onde essas condições os influenciam? Em nada absolutamente. Nos
dois casos, o que se influencia é o lucro. Admitida igualdade de salário e
de taxa de mais-valia e para taxa de mais-valia de 20%, quem, por exemplo,
só despende l/S do capital variável, só pode produzir mais-valia de 4 para
um capital de 100; ao revés, quem despende 4/5 em capital variável, pro-
duzirá mais-vai.ia de 16. Então, o capital despendido em salário no primei-
ro· caso é igual a 100/5 = 20, e l/~ de 20 ou 20% = 4. E no segundo caso,
o capital despenctído em salário é igual a 4/5 X 100 = 80. E 1/5 de 80 ou
20% = 16. No primeiro caso, o lucro será igual a 4, e no segundo, igual
a 16, O lucro médio para ambos será 16 + 4/2 ou 20/2;;;;: 10%. Este é pro-
priamente o caso de que fala Ricardo. Assim, com a venda aos preços de
custo - o que Ricardo pressupõe - cada um venderá sua mercadoria por
11 U. Admitamos suba o salário, digamos, de 20% do montante anterior.
Antes um homem custava 1 libra; agora, 1 libra e 4 xelins, ou seja, 24 xe·

611
líns. O primeiro tem de gastar, como dantes, 80 libras em capital constan-
te (uma vez que Ricardo aí omite a matéria-prima, podemos fazer o mesmo)
e com os 20 traba1hadores, fora as 20 libras, mais 80 xelins, ou seja, 4 libras.
Seu capital agora portanto é de 104 libras. E das 110 libras restar-lhe-ão
apenas 6 libras de lucro, uma vez que os trabalhadores passaram a produ-
zir mais-valia menor. Sobre 104 libras, 6 representam 5 I 0/13%. Ao revés,
o segundo empresário, que emprega 80 trabalhadores, terá de pagar mais
320 xelins, isto é, 16 libras. Terá portanto de desembolsar 116 libras. As-
sim, se for vender a 110 libras, terá perda em vez de lucro. Mas esse.caso
só ocorre porque o lucro médio já alterou a relação entre o trabalho por
ele despendido e a mais-valia que ele mesmo obteve.
Por isso, em vez de investigar o fenômeno decisivo - as variações
necessárias a ocorrer para que o primeiro, que despende em salário 80 das
100 libras, não faça lucro 4 vezes maior que o outro que só desembolsa
em salário 20 das 100 libras -, pesquísa Ricardo o problema acessório, a
saber, como é que, depoís de nivelada essa grande diferença, isto é, dada a
taxa de lucro, toda alteração na taxa de lucro em virtude da alta dos salá-
rios, por exemplo, influi no que emprega muitos trabalhadores com as
100 libras, muito mais do que no que emprega poucos traba1hadores com
as IOO libras, e assim, para igual taxa de lucro. os prc;1ços das mercadorias
de um têm de subir e Os do outro, de descer, para continúár a mesma a
taxa de lucro ou os preços de custo.

A primeira ilustração que Ricardo apresenta nada ~m absoluto tem


a ver com "qualquer alta no valor do h'abalho", embora ele proclamasse
no começo que deve provir dessa causa· a variação toda nos "valores rela-
tivos". Segue a ilustração:

"Admitamos que de duas pessoas cada uma emprega 100 homens duran·
~e um ano na construção de duas máquinas, e que outra empregue o mes-
mo número na cultura de trigo: no fim do ano, cada uma das máquinas
terá o mesmo valo:r do trigo, pois cada um foi produzJ.do por quantidade
igual de trabalho. Admitamos que um dos proprietários de uma das máqui-
nas a empregue no ano seguinte, com a ajuda de cem homens, para produzir
pano, e o dono da outra máquina utilize também a sua para fabricar,
com a ajuda de cem homens, artigos de algodão, enquanto o arrendatá-
rio prossegue empregando como dantes cem homens para cultivar trigo.
Durante o segundo ano, todos empregam a mesma quantidade de traba.
lho"

(isto é, despendem o mesmo capital em salário, mas de modo nenhum


empregam a mesma quantiaade de trabalhO );

612
"todavia, as mercadorias e máquina juntas do fabricante de panos serão,
como acontece com o fabricante de artigos de algodiío, o resultado do
trabalho de duzentos homens, empregados por um ano; ou melhor, do
trablllho de cem homens du1ante dois anos; enquanto o trigo será produ-
:r.ido pelo trabalho de cem homens durante um ano. Em conseqüência,
se o trigo tiver o valor de 500 libras, a máquina e o pano juntos devem
ter o valor de 1 000 libras, e a máquina e os artigos de algodão devem
ter tambAm o dobro do valor do trfgo. Mas terão mais do dobro do va-
lor do trigo, pois o lucro, no primeiro ano, do capital do fabricante de
pano e do fabricante de artigos de algodão se acrescentou a !JeUs capitais,
enquanto o do arrendatário foi despendido e fruído. O valor das merca-
doria' depende poxtanto da duração diversa do re1pectivo cupítal, ou, o
que dá no mesmo, do tempo que tem de deco"er até que se possa levar
um conjunto delas ao mercado, mas sem guardar proporção exata com a
quantidade de trabalho nelas aplicado. A Ia.tão não serâ de dois para um,
mas algo maior para compemar o prazo maior que tem de deco"er até
que se possa Iançll' no mercado as mercadori4s de maior Vtllor. Admita·
mos sejam pagas a cada trabalhador 50 libras por ano, ou se empregue
capital de S 000 libras e os luaos sejam de 10%; então, o valor de cada
uma das duas máquinas, como o do trigo, será, no fim do ano, de 5 500
libras. No segundo ano, cada um dos fal)ricantes e arrendat.áxios emprega-
rá de novo 5 000 hõras para sustentar os trabalhadores e assim cada um
venderá mais uma vez mercadorias por 5 500 libJ:as. Todavia, os fabri-
cantes, a fün de se equipararem ao agricultor, têm de receber - para igual
capital de 5 000 libras empregadas em trabalho - 5 500 e mais uma
soma de 550 libras como lucro sobre as 5 500 Jibras que investiram em
máqu1"'nas, e por isro suas mercadorias" (pois na verdade admitiu-se como
decorrência de necessidade e lei a me3ma taxa. de lucro anual de 10%)
"se 11endem por 6 050 libras."

(Assim, em virtude do preço médio, da taxa geral de lucro pressuposta


por Ricardo, surgem preços médios ou preços de custo diferentes dos valores
das mercadorias).

"Temos aí capitalista$ que empregam exatamente a menrw quantidade


anUlll de trabalho para produzu as respectívas mercadorias; contudo, essas
mercadoria!/ produzidas, em virtude das quantidades diferentes de capital
fixo ou de trabalho acumulado, aplicadas por cada um deles, diferem em
seus valores."

(Não em virtude disso, mas em virtude de esses dois pulhas terem a


idéia fixa de que ambos têm de extrair o mesmo butim do "apoio que deram
ao trabalho"; ou de que, não importa os valores das respectivas mercadorias,
essas mercadorias têm de ser vendidas a preços médios que a cada um deles
dão a mesma taxa de lucro.)

"O pano e os artigos de algodão têm o mesmo valor por serem produ:r.i-
dos por iguais quantidades de trabalho e iguais quantidades de capital

613
fixo; mas o trigo não tem o mesmo valar" (na verdade, preço de custo}
"de.~sas mercadorias, porque, na tocante ao capital fu:o, foi produzida
noutras condições" (pp. 29-31). ·

Essa explicação por demais desajeitada de m.atéria de extrema simpli-


cidade toma-se tão complicada para não se dizer apenas: um.a vez que capi·
tais de igual magnitude, não importa a proporção de suas partes componen-
tes ou seu tempo de circulação, dão lucros de mÍlgnitwie igual - o que é
impossível se as mercadorias forem vendidas por seus vak>res etc. - existem
preços de custo das mercadorias diversos dess~ valores. Isso, na verdade,
está implícito na idéia de uma taxa geral de lucro.
Passemos em revista o complicado problema e reduzamo.lo a suas
verdadeiras dimensões, bem pouco "complicadas'~ Com esse propósito CO·
mecemos pelo fim e de antemão observemos, visando ao mesmo tempo
compreensão mais dara, que Ricardo "supõe" que a matéria-prima nada
custa ao arrendatârio e ao fabricante de algodão; além disso, que o arren-
datário não despende capital em instrumentos de trabalho, e que por fim
parte alguma do capital fixo despendido pelo pulha do fabricante entra no
respectivo produto como desgaste. Todos esses pressupostos são na verda-
de absurdos, mas, em si mesmos, em nada prejudicam a demonstração.
Com todos esses pressupostos, o exemplo de Rícardo_, se começamos
pelo fim, é este: o arrendatário despende 5 000 libras e.m salário; o biltre
da indústria algodoeira S 000 hbras em salárío e S soo em maquinaria.
Assim, o primeiro desembolsa S OUO hbras e o segundo lO SOO; assim, o
segundo, cerca do dobro do primeiro. Para ambos obterem lucro de 10%,
é mister que o arrendatário venda sua mercadoria po! S SOO e o fabrican-
te a sua por 6 USO libras (uma vez que se admitiu que nenhuma fração das
S SOU de maquinaria constitui, como desgaste, componente do valor do·
produto). Não se pode absolutamente conceber o que Rícardo quis eluci-
dar com isso, exceto que os preços de custo da mercadoria, ao serem deter-
minados pelo valor dos adiantamentos contidos na mercadoria + a mesma
taxa anual de lucro, diferem dôs valores das mercadorias, e que essa dífe--
rença decorre de se venderem as mercadorias a preços tais que proporcio-
nam a mesma taxa de- lucro ao capital adiantado; em suma, que essa dífe-
rença entre preços de custo e valores se identifica com taxa geral de lui:To.
Mesmo a diferença entre capital fixo e capital circulante, a qual ele intro-
duz aí, é mero subterfúgio. Pois, se por exemplo as S SOO libras de capital
fixo empregadas a mais pelo industrial do ramo algodoeiro consistíssem em
matérias-primas, e o arrendatário não precisasse de sementes etc., o resulta-
do em nada se alteraria. Nem o exemplo mostra, como disse Ricardo, que

614
"essas mercadorias produzidas" (pelo fabricante do ramo algodoeiro e
pelo arrendatário), "em virtude das quantidades diferentes de capital
fixo ou de trabalho acumulado, aplicadas por cada um deles, diferem
em seus valores" (p. 31).

É que, segundo pressupõe, o fabricante emprega em capital fixo 5 500


libras, e o arrendatário, O; um emprega-o e o outro não. De maneira alguma,
portanto, empregam-no "em quantidades diferentes", e do mesmo modo
não se pode dizer que consomem carne ··em quantidades diferentes" uma
pessoa que come e outra que não come carne. Ao revés, é ~rto que eles
aplicam "em quantidades diferentes" "trabalho acumulado" (termo contra-
bandeado por meio de um "ou"), isto é, trabalho materializado, a saber,
um na magnitude de 10 500 libras, e o outro na de 5 000, Mas, emprego
de "quantldades diferentes de trabalho acumulado" sígnifica apenas desem-
botso de "quantidades diferentes de capital" nos respectivos ramos, que
o montante do lucro é proporcional à magnitude diversa dos capítaís que
aplicam, por se admitir a mesma taxa de lucro, e que por fim essa diferen-
ça no montante de lucro, montante proporcional à magnitude dos capitais,
se expressa, se configura nos preços de custo vigentes das mercadorias.
Mas donde provém a fallia na demonstração de Ricardo?

''Temos aí dois capitalistas que empregam exatamente a mesma quan·


tidade de tra"l>alho pot ano para produzir suas merc;tdoria.s, que entre-
tanto divergem em seus valores" (pp. 30, 31).

Isso quer dizer que não empregam a mesma quantidade de traba·


lho - imediato e acumulado, tomados em conjunto -, mas aplicam ames-
ma quantidade de capital variável desembolsado em salários, a mesma
quantídade de trabalho vivo. E uma vez que, só de acordo com a lei das
mercadorias, se troca dinheiro por trabalho acumulado, isto é, mercado·
rias existentes na forma de máquinas etc., e uma vez que a mais-valia tem
origem apenas na apropriação sem pagamento de parte do trabalho vivo
aplicado, está claro que (uma vez que, segundo o pressuposto, nenhuma
parte da maquinaria entra como desgaste na mercadoria) ambos só podem
obter o mesmo htcro se lucro e mais-valia forem idênticos. O industrial do
algodão terá de vender sua mercadoria por 5 500 libras, como o arrendatá·
rio, embora tenha desembolsado capital mais de duas vezes maior. E mes-
mo que a maquinaria toda entrasse na mercadoria, só poderia vender esta
pot 11 000 libras, vaJe dizer, obteria lucro de menos de 5%, enquanto o
arrendatário obtém 10'%. Mas, com esses lucros desiguais, o arrendatário e

615
o industrial teriam vendido as mercadorias por seus valores, admitindo-se
que os 10% obtidos pelo arrendatário representam trabalho real não pago,
embutido em sua mercadoria. Se venderem suas mercadorias com igual
lucro, será necessária uma das duas ocorrências: ou o industrial a seu arbí-
trio acrescenta 5% a suas mercadorias, e então as mercadorias do industrial
e do arrendatário tomadas em conjunto são vendidas acima de seu valor;
ou a mais-valia real que o arrendatário consegue i:\ digamos, de 15%, e am-
bos adÍcíonam a sua mercadoria a média de 10%. Neste caso, embora· o
preço de custo de cada mercadoria esteja acima ou abaixo do correspon-
dente valor, o total das mercadorias é vendido por seu valor e o próprio
nivelamento dos lucros é determinado pela soma de mais-valia nelas conti-
da. A passagem acima de Ricardo, se for corrigida com acerto, revelará a
verdade: a relação entre capital variável e constante, invariável a magnitu-
de do capital despendído, tem de produzir mercadorias com valores de di-
ferente magnitude e, em conseqüência, lucro diferente; o nivelamento
desses lucros, por isso, tem de gerar preços de custo diferentes dos valores
das mercadorias.

"Temos aí capitalistas que empregam exatamente a mesma quantidade.


anual de trabalho" (imediato, \ivo) "para produzir suas mercadorias;
contudo, essas mercadorias produzidas, em virtude das quantidades di-
ferentes de capital fixo ou de trabalho acumulado aplicadas por' cada um
deles, difezem em valor" (isto é, têm preços de custo diferentes de seus
valoies) (pp. 30, 31).

Esse vislumbre de Ricardo, entretanto, não se converte numa idéia


clara. Elucida apenas a ambigüidade e a falácia patei:ite da demonstração,
que até aí nada tem a ver com "quantidades diferentes de capital fixo apli·
cadas".
Retrocedamos mais na análise. No primeiro ano, o industrial cons-
trói uma máquina com 100 homens, e entrementes o arrendatário produz
trigo também com 100 homens. No segundo ano, o industrial utiliza a má-
quina e faz fio de algodão, e para isso emprega de novo 100 homens. O
arrendatário, entretanto, empreg~ de novo 100 homens na cultura de tri-
go. Suponha, diz Ricardo, seja o valor do trigo anualmente de 500 libras.
Admitamos, o trabalho não pago seja aí 25% do pago, isto é, de 100 libras
para 400. Nessas condições, a máquina no fün do ano valeria também 500
libras, das quais 400 = trabalho pago, e 100 - valor do trabalho não pago.
Admitamos que no fim do segundo ano a máquina inteira se tenha desgas-
tado e incorporado no Valor do fio. E o que Ricardo na realidade supõe ao·

616
compan:r tanto o valor dos artigos de algodão quanto o "valor dos artigos
de algodão e da máquina" com "o valor do trigo".
Bem. O valor do fio de algodão, no fun do segundo ano, tem então
de ser igual a l 000 libras, repartindo-se em 500, valor da máquina, e 500,
valor do novo trabalho adicionado. O valor do trigo, entretanto, é de 500,
e se reparte em 400, o valor do salário, e 100, o trabalho não pago. Até aí,
nada neste caso rontradiz a lei dos valores. O industrial do algodão obtém
lucro de 25%, em igualdade com o empresário do trigo; mas a mercadoria do
primeiro = 1 000, e a do segundo= SOO, porque a do primeiro encena o
trabalho de 200 homens, e a do segundo, cada ano, o de 100 homens ape·
nas~ além disso, as 100 libras de lucro (mais-valia) que o industrial do algo-
dlo obteve com a máquina no primeiro ano - ao incorporar nela, sem pa·
gar, 1/5 do tempo de trabalho dos obreiros que a construíram.:__ só se con-
vertem em dinheiro para ele no segundo ano, pois só entíío, no valor do fio
de algodão, realiza ao mesmo tempo o valor da máquina. Mas chegamos
àgora ao busílis. O industrial do algodão vende o fio por mais de 1 000 li-
bras, isto é, por valor maior que sua mercadoria contém, enquanto o arren-
datárip vende o trigo por SOO, isto é, pelo valor, de acordo com o pressu-
posto. Se só houvesse essas duas pessoas para o intercâmbio, o industrial
para adquirir o tdgo do arrendatário, e o arrendatário, o fio do índustríal,
o resultado seria como se o arrendatário vendesse a mercadoria abaL'(O do
valor e obtivesse lucro ínferior a 25%, e o industrial vendesse o fio adma
do valor. Não precisamos dos dois capitalistas (o fabricante de tecido e o
fabricante de fio), pois os dois figurantes introduzidos por Ricardo são aí
demais: modifiquemos sua proposição para que entre em cena apenas o
fabricante de fio. Para a demonstração, é de todo inútil até aqui tal du-
plicação. Assim:

"Terão" (os fios de algodão) "mais do dobro do tl(!/or do trigo, pois o


lucro, no primeiro ano, do capital ... do industrial do algodão se acrcs--
centou a seu capital, enquanto o do arrendatário foi dei>pendido e fruído."

(A última frase, um eufemismo burguês, nã'o tem no caso o menor


sentido teórico. Considerações morais nada têm a ver com o assunto.)

"O valor das mercadorias depende portanto da duração diversa áo res.


pectivo capital, ou, o que dá no mesmo, do tempo que tem de decorrer
atê que te possa levar um conjunto detas ao mercado, mas sem guardar
proporção exata com a quantidade de trabalho nalas aplicado. A razão
não será de dois para um, mas algo maior para compentar o prazo maior
que tem de decorrer até que se possa lançar ao mercado as. mercadorias
de maior valor" (p. 30).

617
Se o industrial vender a mercadoria por seu valor, véndê-la-á por l 000
libras, o dobro do preço do trigo, por encerrar ela o dobro de trabalho: 500
libras de trabalho acumulado na maquinaria (das quais não pagou 100 libras)
e 500 de trabalho em fio de algodão, das quais também não paga 100. Mas
ele calcula assim: no primeiro ano desembolso400 libras e, mediante explo-
ração dos trabalhadores, construo com elas uma máquina que vale 500 li-
bras. Fiz portanto um lucro de 25%. No segundo ano desembolso 900 libras,
a saber, 500 nessa máquina, e 400 de novo em trabalho. Para obter de novo
25%, tenho de vender o fio por 1 l 25, isto é, 125 libras acima de seu valor.
Pois essas 125 libras não representam trabalho contido no fio de algodão,
nem acumulado no primeiro ano, nem adicionado no segundo. A totalida-
de de trabalho nele encerrada é apenas de l 000 libras. Ademais, admitamos
que as trocas se processam entre os dois, ou seja, metade dos capitalistas
se encontram na situação do industrial do algodão e metade na situação
do arrendatário. Donde a primeira metade obterã o pagamento das 125
libras? De que fundo? Só pode obtê·lo da segunda metade, é óbvio. Ma9
então fka evidente que essa segunda metade não consegue lucro de 25%.
A primeira metade fraudaria a segunda sob o pretexto de uma taxa ge-
ral de lucro, quando na realidade, a taxa de lucro do industrial· estaria em
25% e a do arrendatáóo, abaixo de 25%. As coisas têm portantQ de ocorrer
de outra maneira.
Para uma demonstração mais precisa e mais clara, admitamos que o
arrendatário empregue no segundo ano 900 libras. Obtém assim no. primei-
ro ano, com a taxa de 25%, lucro de 100 libras sobre as 400 que desembol-
sa, e no segundo 225, ao todo 325. Ao revés, o industriàl, no primeiro ano,
consegue 25% sobre as 400 libras, mas, no segundo, apenas 100 sobre 900,
isto é, só 111/9% (pois as 500 em maquinaria nã:o proporcionam mais-valia,
e sim as 400 em salário). Ou adnútamos desembolse o arrendatário de novo
400: assim consegue 25% no primeiro ano e a mesma taxa no segundo; no
conjunto, 25% ou 200 libras sobre um dispêndio de 800 em dois anos.
Em contrapartida, o industrial, 25% no primeiro ano, e 11 1/9 no segun-
=
do; em dois anos, 200 libras sobre desembolso de 1 300 15 5/13%. Com o
nivelamento, tanto o industrial quanto o anendatárío teriam de obter
20 5/26%71 , ou seja, o lucro médio. Isso daria à mercadoria do arrendatá-
rio menos de 500 libras, e à mercadoria do industrial mais de l 000.
71. O lucto médio só atingiria 20 5/26% se fossem iguais os capitais empregados
pelo industxíal e pelo arrendatário. Mas, se considerarmos a diferença de magnitude
dos capitais empregados - 800 libras para o anendatário e l 300 para o industrial (ao
todo, 2 100) - e o lucro global de ambos (400 libras}, teremos: lucro médio ::::
= 400 X 100::::: 19 1/21%/2 100.

618
Em todo caso, o industrial aí desembolsa no primeiro ano 400 libras,
no segundo, 900, enquanto o arrendatário, de cada vez, apenas 400. Se o
industrial, em vez de fiar o algod.ro, construísse uma casa (fosse constru-
tor), a casa inacabada, no fim do primeiro ano, representaria 500 libras, e ele
teria de despender mais 400 libras cm trabalho para conclui-la. O arrenda-
tário, cujo capital completou a rotação durante o ano, pode ainda capita-
lizar em trabalho parte das 100 libras de lucro, 50/por exemplo, o que o
industrial, na suposição feita, não pode. Para ser a mesma, .nos dois casos,
a taxa de lucro, a mercadoria de um deve ser vendida acima e a do outro,
abaixo do correspondente valor. Ê o que se dá, uma vez que a concorrên-
cia opera no sentido de nivelar os valores aos preços de custo.
Mas Ricardo erra ao dizer que aí se produz nos valores relativos
varíação que "depende da duração diversa dos "capitais" ou "do tem-
po que tem de decorrer até que se possa levar um conjunto delas ao
mercado". Ao revés, é a adoção da taxa geral de lu.cro que, apesar dos va-
lores diferentes condícionados pelo processo de circulação, produz preços
de custo iguais, diferentes dos valores determinados apenas pelo tempo
de trabalho.
A demonstração de Ricardo se faz em dois exemplos. Não chega a
entrar no segundo exemplo a duração do capital nem a qualidade de tixo
em que o capital se apresenta. Só se trata de capitaís de magnitude díver-
sa, com o desembolso do mesmo montante em salário, com o desembolso
do mesmo capítal variável, e onde os lucros devem ser .os mesmos, embo·
ra as mais-valias e os valores tenham de divergir.
A duração do capital também não aparece no primeiro exemplo.
Trata-se de proce.sso de trabalho mais longo - permanência mais longa da
mercadoria na esfera de produção, até ficar pronta e poder entrar na cir-
culação. Nele emprega o industrial, no segundo ano, capital maior que o
arrendatário, embora aplique nos dois anos o mesmo capital variável. Mas
o arrendatário, em virtude de sua mercadoria demorar menos no proces·
so de trabalho, de se converter mais cedo em dinheiro, poderá. empregar
capital variável maior no segundo ano. Além disso, a parte do lucro desti-
nada a consumo como renda {revenue) é consumível para o arrendatário
no fim do primeiro ano, e para o industrial só no fim do segundo. O indus-
trial portanto tem de gastar capital extra para stiStentar-se, tem de adian-
tá-lo a si mesmo. Aliás, a possibilidade de haver compensação no caso II
e nivelamento dos lucros depende por inteiro da medida em que os capi-
tais que. efetuam a rotação anual possam ter os lucros reinvestidos, isto é,

619
da verdadeira magnitude dos lucros produzidos. Nada há a nivelar onde na-
da e:xíste. Os capitais também aí não produzem valores e, em conseqüên-
cia, ma.is-valia e lucro na proporção de sua grandeza. Para haver essa pro·
porção, têm de existir preços de custo diferentes dos valores.
Ricardo apresenta uma terceira demonstração que exatamente coin-
cide com o exemplo da primeira e nada de novo expressa.

"Admitamos: emprego vinte homens durante o ano com dispêndio de


1 000 libxati para produzir uma mercadoria. No fim do ano emprego de
novo linte pess.oas por mais um ano com outJ:o dispêndio de 1 000 libras,
para aprontar e aperfeiçoar a mesma mercadoria. Após -decon:erem dois
anos levo a mercadoria. ao mercado. Para o lucro ser de 1'0%, é mister que
minha mercadoria seja vendida por 2 310 libras, uma vez que desembol-
sei por um ano J 000 libras de capital e por mais um ano 2 100 de capi-
tal. Outra pessoa emprega a mesma quantidade de trabalho, mas toda de
uma vez no primeíro ano. Emprega 40 homens com dispêndio de 2 000 li·
brali, e a venda se dá no fim do primeiro ano com lucro de 10%, l~o ê,
por 2 200 libras. Temos assim duas mercadorias onde se apficou exata-
mente a mesma quantidade de trabalho, e uma se vende por 2 310 libras
e outra por 2 200.
Esse caso parece diferir do anterior, mas, na realidade, é o mesmo" (pp.
34, 35).

~ o mesmo caso "na realidade'' e também "na aparência"; a .única


restrição é chamar-se a mercadoria num caso de ''máquina?' é- no outro de
"mercadoria" apenas. No primeiro exemplo, o industrial desembolsou no
primeiro ano 400 libras e no segundo 900 (desta vez, no primeiro a.no,· l 000
e, no segundo, 2 IOO), e o arrendatário, no primeiro ano, 400 e no segwido
400. Desta vez, a segunda pessoa desembolsa, n-C> primeiro ano, 2 000 e, no
segundo, nada. Aí está a diferença toda. Mas a moral da-fábula consiste em
que, nos dois casos, um deles despende no segundo ano o produto· total do
primeiro (inclusive rnais--valia), acrescido de uma soma adicional.
A deficiência desses exemplos mostra que Ricardo luta contra uma
dificuldade que para ele mesmo não se toma clara e que ele muito menos
supera. A deficiência consiste nisto: o primeiro exemplo da pr1meira de-
monstração destina-se a introduzir a duração do capital; não faz nada dis-
so; o próprio Ricardo tomou impo11Sível esse objetivo, porque não faz en-
trar na mercadoria, como desgaste, parte do capital fixo, isto é, omite jus-
tamente o elemento onde se patenteia o modo peculiar de circulação do ca·
pital fixo. Demonstra apenas que, em virtude da duração maior do processo
de trabalho, se emprega capital maior do que onde o processo de trabalho
é mrus curto. O terceiro exemplo destina-se a esclarecer algo diferente disso,
quando na realidade esclarece a mesma coisa. Mas, o segundo exemplo da

620
primeira demonstração tinha por fim mostrar que diferenças emergem em
virtude de proporções diferentes de capítal ftxo. Em vez disso, mostra ape·
nas a diferença entre dois capitais de magnitude desigual, embora ambos
apliquem em salário a mesma dose de capital. E por cima o industrial que
opera" sem algodão e fio, e o arrendatário, sem sementes e instrumentos.
A total inconsistência, o absurdo mesmo dessa demonstração decorre ne-
cessariamente da obscuridade que lhe é intrínseca.

b) Ricardo confunde prefOS de custo com valor:


contradições em sua teoria do valor oriundas
dessa confusão. Não compreende o processo de
nivelamento da taxa de lucro nem a
transformação dos valores em pri!fos de custo.

Por fim expressa ele a c..-onclusão a tirar de todas essas demonstrações:

"A dífeumça de valor decoue nos dois casos do lucro acumulado em ca-
pital e por isso é uma compensação /u~ta" (como se houvesse aí uma
questão de íustiça) "pelo tempo em que se reteve o lucro" (p. 35).

Isso significa apenas que em determinado tempo de circulaçá-0, um


ano por exemplo, um capital tem de proporcionar 10%, qualquer que se-
ja o tempo próprio de circulação e sem depender em nada das mais-valias
diferentes que nos diferentes ramos, se abstraímos do processo de circula-
ção, capitais de igual magnitude têm de produzir de acordo com a propor-
ção entre seus componéntes orgânicos.
As conclusões que Ricardo tinha de tirar eram estas:
Primeiro: Capitais de igual magnitude produzem mercado1ias de va-
lores desiguais e por isso proporcionam mais-valias ou meros desiguais; é
que o valor é determinado pelo tempo de trabalho e a quantidade de tem-
po de trabalho a qual um capíta1 realiza depende não de sua grandeza ab-
soluta e sim da grandeza do capital variável, do capital desembolsado em sa-
lário. Segundo: Mesmo supondo-se que capitais de igual magnitude produ-
zam miares iguais (embora a desigualdade na esfera de produção coinci-
da em regra com a da esfera de circulação), difere, de acordo com seu pro-
cesso de circulação, o tempo em que podem apropriar-se de quantidades
iguaís de trabalho niilJ pago e convertê-las em dinheiro. Isto gera portanto
uma segunda diferença nos valores, nas mais-valias e lucros que capitais

621
de igual rntlQlitude têm de render em diferentes ramos num determinado
espaço de tempo.
Por conseguinte, para os lucros serem iguais como percentagem so-
bre o capital durante um ano, por exemplo, de modo que capitais de igual
magnitude em periodos iguais dêem lucros iguais, os preços têm de diferir dos
valores das mercadorias. Esses preços de custo de todas as mercadorias,
tomados em conjunto, atingem soma igual ao valor delas. Do mesmo mo-
do, a totalidade do lucro será igual à totalidade da mais-valia que esses
capitais em conjunto proporcionam durante um ano, por exemplo. O lu-
cro médio, e em conseqüência também os preços de custo, ficaria no do-
mínio da pura imaginação e da inconsistência, se não tomássemos por
base a definição do valor. O nivelamento das mais-valias nos diferentes
ramos em nada muda a magnitude absoluta da totalidade da mais-valia,
mas altera sua repartição pelos diferentes ramos. Já a determinação dessa
própria mais-valia tem por única origem a detemúnação do valor pelo
tempo de trabalho. Sem este, o preço médio é preço médio de nada, mera
fantasia. E então poderia ser 1 000% ou l 0%.
Todas as demonstrações de Ricardo servem-lhe apenas para contra·
bandear a suposição de uma taxa geral de lucro, E isso ocorre no capítu-
lo I "On value''. quando era de esperar que só tratasse de salários no capí-
tulo V e de lucro no VI. Como da simples determinação dÓ "valor" das
mercadorias' provêm a mais-valia, o lucro e mesmo uma taxa geral de lucro,
é questão que fica obscura em Ricardo. A única coisa que· de fato prova
nas demonstrações acima é que os preços das mercadorias, no que são de-
tenninados pela taxa geral de lucro, divergem por completo dos valores
das mercadorias. Encontra essa divergência, ao admitié como lei a taxa de
lucro. Embora incriminado de abstrato demais, vemos que lhe seria adequa·
da a censura oposta: carência do poder de abstrair, incapacidade, ao tratar
dos valores das mercadorias, de esquecer os lucros, fato com que se con-
fronta, oriundo da concorrêncía.
Ricardo admite - ao invés de derivar a diferença entre os preços de
custo e os valores da própria determinação do valor - que influências
independentes do tempo de trabalho determinam os próprios "valores"
(aí estaria em posição de apreender a idéia do "valor absoluto" ou "real"
ou "valor" puro e simples) e derrogam por vezes sua lei; por isso, seus
adversários, como Malthus, aí se apoiaram para atacar toda a sua teoria
dos valores. Com razão observa Malthus que as diferenças entre os compo-
nentes orgânicos do capital e os períodos de rotação dos capitais em ra-
mos diversos se desenvolvem e~ simetria com o progresso da produção,

622
-e assim chegar-se-ia ao modo de ver smíthiano de que a determinação do
valor pelo tempo de trabalho não se ajusta mais aos tempos "civilizados''.
(Ver também Torrens.) Ademais, os discípulos de Ricardo, para adequar
esses fenômenos ao prútcípio fundamental (ver James Mill e o mísero Pe-
ter McCulloch ) 72 , recorreram aos mais indigentes embustes escolástícos.
Sem se deter no resultado deoorrente de suas próprias demonstra-
ções - a saber, que, sem se levar em conta a alta ou a queda do salário,
supondo-se constante o salário, os preços de custo das mercadorias têm
de diferir de seus valores, se são detenninados pela mesma percentagem
de lucro - Ricardo, naquela secção, trata da influência que.a ascensão ou
queda do salário exerce sobre os prews de custo aos quais já estão nivela-
dos os valores.
O malabarismo em si mesmo é de extrema simplicidade.
O arrendatário desembolsa 5 000 libras a l 0%; sua mercadoria= 5 500.
Se o lucro diminui de l %, indo de 10% para 9%, por ter subido o salário,
por ter a elevação do salário provocado essa redução, o arrendatário vende
a mercadoria; como dantes (uma vez que se admitiu que desembolsou o
capital todo em salário), por 5 500. Mas dessas 5 500 não lhe pertencem
mais 500 e sim 454 14/109 apenas. O capital do industrial. consiste em
5 500 lib~a.S de maquinaria e S 000 de trabalho. As últimas 5 000 configu-
ram-se, como dantes, em 5 500, só que agora em vez de 5 000 desembolsa
5 045 95/109, e entlfo obtém apenas lucro de 454 14/109, como o arren-
datário. Aliás, não pode mais computar 10% ou 550 sobre o capita1 fixo
de 5 500, mas somente 9% ou 495. Assim venderá sua mercadoria por
5 995 libras, em vez de por 6 050, e assim, em virtude da elevação do sa-
lário, o preço em dinheiro da mercadoria do arrendatário pennaneceu o
mesmo, e portanto ·subiu o valor da mercadoria do arrendatário em com-
paração com o da mercadoria do industrial. Todo o malabarismo se reduz
a que, se o industrial vender a mercadoria pelo mesmo valor de antes, con·
seguirá lucro maior que o médio, porque só a parte do capital desembolsa-
da em salário é diretamente atingida pela alta do salário. Nessa demonstra-
ção já se pressupõem preços de custo regulados por lucro médio de 10%
e diferentes dos valores das mercadorias. O problema é saber como atua
sobre esses preços de custo a elevação ou a queda do lucro, segundo varie
a proporção entre capital fixo e capital circulante. Essa demonstração
(em Rícardo, pp. 31, 32) nada tem a ver com o problema essencial, a trans-

72. Sobre as idéias de Malthus, Ton:ens, James Mm e McCulloch \lé.r os capítulos


correspondentes no volume 4 desta tradução.

623
formação dos valores em preços de custo. E interessante porque Ricardo
aí mostra na verdade que alta de salário, dada a igualdade na composição.
dbs capitais, só provocaria - contra a idéia vulgar - baixa do lucfo sem
influir nos valores das mercadorias, e dada a desigualdade na composíçã'.o
deles, queda no preço de algumas-mercadorias, ao invés de elevar o preço
de todas as mercadorias, como crê a concepção vulgar. Temos aí queda dos
preços das mercadorias em virtude da queda na taxa de lucro ou, o que dá
no mesmo. elevação do salário. No caso do industrial, grande parte do
preço de custo da mercadoria é determinada pelo lucro médio que ele
computa sobre o capital fixo. Assim, caia ou suba essa taxa de lucro, em
virtude de ascensão ou queda do salário, baixará ou elevar-se-á, em corres-
pondência, o preço dessas mercadorias (de acordo com a parte do preço
oriunda do lucro computado sobre o capital fixo). O mesmo vale para
"capitais circulantes que refluem em períodos mais extensos e vice-versa"
(MacCultoch, p. 300). Se os capitalistas que empn:gam menos capítal va-
riável continuassem debitando no preço da mercadoria o capital fixo na
base da mesma taxa de lucro, sua taxa de lucro subiria, e na mesma propor-
ção em que empregam mais capital fixo em confronto com aqueles cujo
capital tem parte maior de capital variável. A concorrência nivelaria isso.
"Ricafdo", diz Peter Mac, "foi o prírneiro que investigou es efeitos das
flutuações do salário sobre o valor das mercadorÍ11$, quando os capitais
empregados para produzi-las não têm a mesma duração" (pp. 298, 299).
"Rieardo mostrou que é impossível uma alta de salário elevar o preço
de todas as mereadorias, e ainda que em muitos casos ascensão.dos salif.
rim conduz necessariamente a queda dos preços e quedá dos salários
a ascentão dos preços"· (p. 299, MacCuUoch, The-Princíples of Political
Economy, Edimburgo, 1825}- · •
Ricardo demonstra seu ponto de vista, primeiro, ao pressupor preços
de custo regulados por taxa geral de luêl'O.
Segundo: "O valnr do trabalho não pode subir sem cair o lucro" (p. 31).
Assim, no capítulo 1 ''On Value" já pressupõe as leis que nos capítu·
los V e VI "On Wa~s" e "Profits" devem ser inferidas do capítulo "On Vaw
lue''. Aliás, Ricardo erra por completo ao concluir que, uma vez que "ova-
lor do trabalho nã"o pode subir sem cair o lucro", o lucro não pode subir
sem cair o valor do trabalho, A primeíra lei refere-se à mais-valia. Mas, uma
vez que lucro = proporção de mais-valia com a totalidade do capital adian-
tado, o lucro pode subír, dado o mesmo valor do trabalho, se cair o valor
do capital constante. Ricardo em suma confunde mais-valia e lucro. Daí
leis falsas sobre o lucro e a taxa de lucro.
Conclusão geral da última demonstração:

624
-.. O g1au da alteração no valor relativo das mercadoria.~, causada pm alta
ou baixa de tr&balho" (ou, o que dá no mesmo, por alta ou queda da
taxa de lucro), "depende da proporção de capital fixo na totalidade do
éapital aplicado. Todas as mercadorias que se produzem com máquinas
de grande valor ou em edifícios de g1ande valor, ou que requerem tempo
considerável para chegar ao mercado, terão decréscimo de valor relativo,
enquanto te1ão acréscimo de valor relativo todas as que são produzidas
príncipalmente pelo trabalho ou são logo levadas ao mercado" (p. 32).

Ricardo volta ao único tema que na pesquisa propriamente o preo-


cupa. Nos preços de custo das mercadorias, essas variações ·resultantes da
ascensão ou queda do salário nã'o são significativas quando comparadas
com as variações - nos mesmos preços de custo - resultantes das modifl•
cações nos valores das mercadorias, na quantidade de trabalho empregado
para produzi-las (Ricardo está longe de expressar essa verdade nesses ter·
mos apropriados). Por jsso, pode-se de modo geral "abstrair" daquelas va-
riações, e em consonância a lei dos valores contínua válida também prati-
camente. (Ele deveria ter acrescentado que os próprios preços de custo fi-
cam inexpJicáveís sem os valores determinados pelo tempo de trabalho.)
Este o rumo a seguir de sua pesquisa. Na realidade é evidente que, apesar
da transformação dos valores das mercadorías em preços de custo, de ex.is·
tência pressuposta, uma variação nesses preços - desde que não decorra
de queda ou ascensão permanentes., de alteração permanente na taxa de
lucro, alteração que só pode se estabelecer no decurso de muitos anos -
tem por origem possível, única e exclusiva uma variação nos valores das
mercadorias, no tempo de trabalho necessário para produzi-las. (Importa
distinguir esses preços de custo dos preços de meràldo; são os preços de
mercado médios das mercadorias nos diferentes ramos. Preço de mercado
já traz implícito em- si ~ma média até o ponto em que mercadorias do mes-
mo ramo são determinadas pelos preços das mercadorias obtidas nas condi-
ções medianas, médias de produção. E não nas condições piores, corno
admite Ricardo no caso da renda (rent), pois a procura média depende de
determinado preço, o que se dá mesmo com o trigo. Certa dose da oferta
não se venderá acima desse preço. Do contrário, a procura cairia. Os que
não produzirem dentro das condições médias, mas abaixo delas, têm por
isso de vender muitas vezes sua mercadoria abaixo do valor, e ainda abaixo
do preço de custo.)

"Todavia eonvém que o leitor observe que essa causa da va.ríação das
mercado das" (isto á, variação dos preços de custo ou, como lhe parece.
no& valores relativos das mercadorias) ''tem efeitos relativamente muito
redu'làdos ... Atua de maneira diferente a outra eausa da variação do va.

625
lor das mercadorias, isto é, o acréscimo ou decréscimo da quantidade de
trabalho necessário para produ:r.Has... Alteração de eerta magnitude na
taxa permanente de lucro é o efeito de causas que só atuam no decurso
de anos; ao revés, oeorrem diariamente modificacões na quantidade de
trabalho necessári() fÍ,ara produzir mercador.ias. Toda melhora nas máqui·
na.s, instnimentos, rias edificações e na obtençã~ de matérias-primas eco-
nomiza trabalho e possibilita-nos produzir, com mais facilidade, a merca-
doria a que se aplica a melhoria, e em conseqilência altera-se-lhe o 1111lor.
Ao apreciar as causas do valor das mercadorias seria enado omitir por
completo o efeito causado por alta ou baixa do trabalho, mas seria por
igUal incorreto atribuir-lhe importiincia demasiada" (pp. 32, 33).

Por isso, não trata mais do assunto.


Toda essa secção IV do capítulo I "On Value" está tão confusa que
Ricardo, embora anuncie no começo o propósito de examinar a influência
das variações causadas nos valores por alta ou bai:Jca de saldrio, em virtude
da composição diferente do capital, na realidade só de vez. em quando se
envolvê em demonstrações sobre o tema. Em contrapartída, enche de fato
a parte principal da secção IV com demonstrações que comprovam.que,sem
dependência alguma da alta ou baixa do salário - com salário que ele mes-
mo admite constante - a adoção da. taxa geral de lucro tem de gerar preços
de custo diversos dos valores das mercadorias e, ademais, sem dependerem
mesmo da diferença na razão entre e.apitai fixo e circulante. ~-isso ele tam-
bém esquece no final da secção.
Anuncia a pesquisa da secção IV com as palavras:

"Essa diferença na duração do eapltal fixo e a variedade das proporções


em que podem ser combinadas ambas as formas do capital introduz
outra causa - além da maior ou menor quantidade de trabalho necessá-
rio para produzir mercadorias - das variações no valor relativo das mer-
cadorias, a saber, a alta ou baixa do valor do trabalhon (pp. 25, 26).

De fato evidencia, de início, com suas demonstrações que só a taxa


geral de lucro capacita a combinação diversa das espécies de capital (a sa-
ber, variável e constante etc.) a diferençar os preços dos valores das mer·
cadorias, e que essa taxa portanto, e não o valor do trabalho suposto cons-
tante, é a causa daquelas variações. Então - só em segunda instância - su-
põe preços de custo já diferenciados dos valores em virtude da taxa geral
de lucro e pesquisa como sobre eles atuam variayões no valor do trabalho.
Não ínvestiga a questão primordial, essencial; t:lsquece-a por completo e
encena a secção como a iniciou:

626
"Ficou demonstrado nesta secção que, sem se alterar a quantidade de
trabalho, a alta do valor do trabalho causa apenas queda nos valores
de troca das mercadorias em cuja produção se emprega capital fixo;
quanto maior a quantidade de capital. fixo, tanto maíor ser.i a queda"
(p. 35).

E na secção V que segue (capítulo I) continua no mesmo rumo, isto


é, perquire apenas como os preços de custo das mercadorias podem variar
por força de Yariação no valor do trabalho ou salário, quando não difere
a proporção de capital fixo com variável em dois capitais de magnitude
igual, aplicados em dois ramos diversos, mas há "duração desigual do ca.
pi tal fixo", ou seja, "velocidade desigual com que os capitaís refluem pa-
ra os investidores". Ai não aparece maís a intuíção certa, encontrada na
secção IV, sobre a diferença entre preços de custo e valores em virtude da
taxa geral de "lut:ra. Agora trata.se apenas de urna questão secundúrio., da
variação nos próprios preços de custo. Por isso, essa secção, na realidade,
quase não apresenta interesse teórico se omitimos as referências ocasio.
naís às diversídades de forma dos capitais oriundas do processo de cir-
culação.

"Um capital fixo, quanto menos dura, mais se aproxima da natureza


do capital circulante. Consome-se e o valor se reproduz em prazo mais
curto para conservar o capital do fabricante" (p. 36).

Assim, reduz a menor duração e a diferença entre capital fixo e cir-


culante em geral à diferença no tempo de reproduçiio. Esta é po~ certo de-
terminação de ímportância decisiva. Mas não é a única. O capital fixo en-
tra inteiro no processo de trabalho, mas, no processo de formar valor, de
maneira apenas sucesSíva e parcelada. Esta é outra distinção básica na for-
ma de circulação. E maís: o capital fixo entra necessariamente no proces.
so de circulação apenas na qualidade de Yalor de troca, enquanto seu valor
de uso se gasta no processo de trabalho e dele nunca sai. Eis aí outra dís--
tinção importante na fonna de circulação. Ambas as distinções na forma
de circulação concernem também ao tempo de circulação; mas não são
idênticas aos graus de duração nem às diferenças no tempo de circulação.
Capital menos durável exige de contínuo mais trabalho
"para manter a efieíêncía original; mas o trabalho assim empregado
pode se considerar despendido efetivamente na mercadoria produzida,
que tem de conter valor eorrespondente a 1:sse trabalho" (pp. 36, 37}.
"Se o desgaste da máquina for grande, se a quantidade de trabalho ne-
cessário para mantê-lo eficiente for de einqüenta homens por ano, te·
reí de pedir preço adicional por minhas mercadorias, igual ao que será

627
obtido por qualquer outro fabricante que empregue cir::qüenta homens
p:ua produzir outras mercado.rias e que não empregue maquinaria algu-
ma. Todavta, alta do salário não atingirá por ígUal mercadorias produ-
zidas com maquinaria consumida a curto prazo e mercadotias produzi..
das com maquinaria consumida a longo prazo. Numa hipótese, transfe-
fir-re-4 de contfnúo grande quantidade de trab/Jlho prva a 11um:adoria",

(mas a idéia fixa da taxa geral de lucro leva-o a não ver que, assim, também
se transfere de contínuo, para a mercadoria, grande quantidade relativa
de trabalho excedente),

"e na outra, quantidade muito reduzida."

(Daí, quantídade muito reduzida de trabalho excedente; daí muito


menos valor excedente, se as mercadorias se trocam segundo seus valores.)

"Por isso, toda alta de salário ou, o que dá no mesmo, toda queda de
lucro díminuirá o valor relativo daquelas n::iercadorias que forem pro-
duzidas com capital durável, e allIÍ'lentará em correspondêneia o valor
relativo das que siio produzidas por capital mais perecível: Queda de sa-
lário terá efeito diametralmente oposto" (pp. 37, 38).

Noutras palavras: o industrial que emprega capital d~ menor duração


aplica relativamente menos capital fixo e mais -capital. despertdido em sa-
lário que aquele que emprega capital de major duração. Este caso coinci-
de portanto com o anterior, referente ao modo como a variação de salário
atua sobre os capitais, sendo que um emprega, em termos relativos, propor-
cionais, mais capital fixo que o outro.· Aí nada de novo.
Tratar do que Riciirdo diz ainda sobre maquinaria nas pp. 38-40
quando chegarmos ao capítulo XXXI "On Machinery "73 •
I! curioso como Ricardo no fim esboça quase literalmente a idéia
correta, para deixá-la escapar e, após o esboço citado a seguir, de novo
regride à idéia que o domina, concernente ao efeito da variação do valor
do trabalho sobre preços de custo, e com essa consideração acessória encer-
ra em definitivo a pesquisa.
Eis o esboço:

73. Ver pp. 989-990, neste volume.

628
"Vê-5e portanto que nas faseg anteriores de desenvolvimento da socie-
dade, antes de se usa.r muita maquinaria ou capital durável, as merca-
dorias produzidas por capitais iguais têm aproximadamente valor igual,
e só SQbem ou caem em relação umas com as outras, em v.i!tude de mais
ou menos trabalho requerido pata produ?.i·las,"

(a fràse final ruim; nem se refere ao valor, mas às mercadorias, o que ator.
na incompreensível, a não ser que diga respeito a preços; pois afimlar
que os valores caem na proporção do tempo de trabalho é dizer que va-
lores caem ou sobem quando caem ou sobem);

"mas, após se introduzirem esses instrumentos custosos e duráveis, as


mercadorias produ~idas com o emprego de capitais iguais são de valor
muito desigual. Embora continuem sujeitas a subir ou e-ili em relação
umas com as outras, conforme quantidade máior ou menor de trabalho
se tome necessária para produzi-las, subordinam-se a outra variação,
todavia menor, oriunda da alta ou baixa de salário e de lucro. Uma vez
que a.~ mercadorias vendidas por S 000 libras podem ser p1oduto de ca-
pital de montante igual a outro com que se produzíram mercadorias
vendidas por 10 000 libras, serão os mesmos os lucros obtidos com a
produção delas. Mas esses lucros seriam desiguais se os preços das mer-
cadorias não variassem com alta ou queda da t= de lucro" (pp. 40, 41 ).

Na realidade diz aí Ricardo:


Capitais de igual magnitude produzem mercadorias de valores igUais
quando é a mesma a proporção de suas partes orgânicas, quando despen-
dem porções de magnitude igual em salário e em condições de trabalho.
Nas respectivas mercadorias incorporam-se entã'o as mesmas quantidades
de trabalho, isto é, valores iguais (excetuada a diferença que surgiria por
meio do processo d~ circulação). Em contrapartida, capitais de magnitude
igUal produzem mercadorias de valor muito desigUal quando diferem na
çomposição orgânica, ou seja, quando divergem bastante na razão entre a
parte existente cm capital fixo e a parte desembolsada em salário. Primei-
ro, só fração do capital fixo entra na mercadoria como componente do
valor, e por isso já se tomam muito díferentes as magnitudes de valor segundo
se empregou na produção da mercadoria muito ou pouco capital fixo. Segun-
do, a parte desembolsada em salário calculada em termos percentuais
sobre montante igual de capital - é muito menor; em conseqüência, é
menor a totalidade do trabalho adicionado, incorporada na mercadoria,
e (dada a duração ígual da jornada de trabalho) o trabalho ex{'edente,
que constitui a mais·va1ía. Por isso, para que esses capítais de magnitude
igual cujas mercadorias têm valores desiguais em que se et1Ce1Tam maís-
valias deslguals e por conseguinte lucros desiguais - forneçam lucros íguais

629
por causá da magnitude igual, os preços das mercadorias (desde que de-
tenninados pela tax.a geral de lucro sobre dado desembolso) têm de diyer-
gir muito dos vawres das mercadorias. Não se segue daí 4ue os valores
mudaram de natureza,· mas que os preços diferem dos vawres. Surpreen-
de que Ricardó não tenha chegado a essa conclusão tanto mais que eJe vê
que mesmo os preços de custo, determinados pela taxa de lucro, variam -
supondo-se que variação na taxa de lucro (ou taxa de salário) tem de mo-
dificar esses preços de custo, para a taxa de lucro ficar a mesma nos dife-
rentes ramos. Assim, a formação da taxa geral de lucro teria de alterar
os valores desiguais sobretudo porque essa taxa geral de lucro nada mais
é que nivelamento das diferentes taxas de mais-valia nas diferentes mer-
cadorias produzidas por capitais iguais.
Ricardo, depoís de ter em todo caso constatado de fato a diferen-
ça entre custo e valor, preços de custo e valores das mercadorias, embora
não a tenha desenvolvido e compreendido, finaliza com a frase:

"Malthus parece pensar que faz paJ"te de minha doutrina a igualdade


entre custos e ll(J[Or de uma coisa. Faz parte, se ele entende por custos
'custos de produção' abrangendo lucro" (p. 46, nota). (Isto é, desem-
bolso +lucro determinado pela taxa geral de lucro.)

Com essa confusão errônea, contestada por ele mesmo, entre preços
de custo e valores, passa a examinar a renda (rent}.
No tocante à influência das variações do valor do. trabalho sobre o
preço de custo do ouro, diz Ricardo na secção VI do capítulo Í:

"Não se pode considerar o ouro me1cadoria ·produzida com a prop'oF


ção dos dois tipos de capital, mais próxima da média empregada na pro-
dução da maior parte da~ me1cadorias? Não pode e5sa proporção ficar
aproximadamente eqíiídlstante dos dois extremos - um onde se utiliza
pouco capital fixo e outro onde se emprega pouco trabalho - e assim
configwar o justo meio termo entte eles?" (l.c., p. 44).

Pelo contrário, o que Ricardo diz se aplica às mercadorias em cuja


composição as diferentes partes orgânicas entram na proporção média e
cujo tempo de circulação e de reprodução é o médio. Para elas coincidem
preço de custo e valor, pois nelas, mas s6 nelas, o lucro médio coincide
com a mais-valia real.
Embora as secções IV e V do capítulo I se revelem carentes no exa-
me da lnfluéncia das variações do valor do trabalho sobre os "valores rela-
tivos'\ coisa acessória (teoricamente) comparada com a transformação dos

630
valores em preços de custo pela taxa média de lucro, daí tira Ricardo im-
portante conclusão e derruba um dos principais erros que se transmitiam
desde A. Smíth, a saber, que alta do salário, em vez de fazer cair o lucro,
eleva os preços das mercadorias. Isso já está implícito no mero conceito
de valores e de maneira alguma se altera por sua conversão em preços de
custo, uma vez que essa metamorfose só atinge propriamente a repartição
da mais-valia que a totalidaile do capital obtém, pelos diferentes ramos
ou pelos diferentes capitais nas diferentes esferas de ,produção, Mas o im-
portante é ter Ricardo acentuado aquele ponto e demonstrado o oposto.
Daí dizer com razão na secção VI, capítulo 1:

"Antes de mudar de assunto, parece adequado observM que Adam Smitl1


e todos os autores que o têm seguido, pelo que sei, afümaram sem
exceção que alta do preço do uabalho tinha por eonseqüêncía eleva-
ção unifotme do preço de todas as mercadorias."

(Isso corresponde à segunda defmição de A. Smith sobre valor: ova-


lor é igual à quantidade de trabalho que uma mercadoria pode comprar.)

"Espero ter conseguido mosuar não haver fundamento para tal opinião,
e que, ao se elevarem os salários, só subirão aquelas mercadorias em que
se aplicou menos eapital fixo que na meti/adoro onde ae exprer;&a o pre-
=
ço" (aí l'alor relativo eKpxessão do valor em dinheiro), "e ainda que
aquelas onde se aplicou mais terão por certo queda de preço, Ao revés,
se os salários caírem, s6 baixario aquelas mercadorias em que se aplica
proporção de capital fixo menor que a empregada na mediadora em
que se estima o preço, enquanto todas aquelas em que se aplica propor-
ção maior terão de fato ascensão de preço" (p. 45).

Isso parece errado no tocante aos preços do dinheiro. O ouro, quando


acresce ou decresce em valor - nã'o importa a causa -, varia de maneíra
uniforme em relaç[o a todas as mercadorias que nele se avaliam. Ao confi..
gurar assim mediador relativamente inalterado apesar de sua variabilidade,
não se concebe como nele uma combinação relativa, seja qual for, entre
capital fixo e circulante, em confronto com as mercadorias, possa engen·
dra:r uma díferença. Mas aí temos o pressuposto errado de Ricardo, de ser
o dínheiro, ao servil' de meio de circulaç[o, mercadoria que se troca por
mercadorias. As mercadorias se avaliam nele antes de circularem por seu
intermédio. Admitamos que o mediador, em vez de o ouro, seja o trigo.
Se, por exemplo, em virtude de alta do salário, o preço de produção do
trigo - mercadoria onde, em relação à média, entra mais capital variável
que constante - subir relativamente, todas as mercadorias serão avaliadas

631
em trigo de maior ''valor relativo" As mercadorias onde entrar mais capítal
fixo expressar-se-ão em quantidade de trigo menor que a anterior, nãq por
seu preço específico ter caído em relação ao trigo, mas por ter caido em.
ger;il. Mercadoria que tenha entre trabalho vivo e trabalho acumulado a
mesma proporção que o trigo, expressará sua ascensão de preço configu-
rando-se em mais trigo que outra cujo preço tenha caído em confronto
com o trigo. Se as mesmas causas que fazem subir o preço do trigo elevam,
por exemp1o, o preço do vestuário, este por certo não se expressa em quan-
tidade de trigo maior que a anterior, mas aquelas mercadorias cujo preço
caiu em relação ao trigo, por exemplo, tecidos, expressam-se em quanti-
dade menor. Tecidos e vestuário revelarão em trigo, o mediador, a difo·
rença entre seus preços.
Mas o que Ricardo pensa é algo diferente. Quer dizer: trigo, em vir-
.tude da alta de salário, terá subido em relação a tecido, mas não em rela-
ção a vestuário. Assim, este trocar-se-á por trigo do preço anterior, e teci-
do por trigo de preço elevado. Em si mesma é absurda ao extremo a supo-
sição de variações no preço do salário na Inglaterra, por exemplo, alterarem
os preços de custo do ouro na Califórn.ía., onde o salário não subiu. O ni-
velamento dos valores pelo tempo de trabalho não existe dessa forma ime-
diata entre diferentes países: e muito menos ainda o nivelamento dos
preços de custo por uma taxa geral de lucro. Co~deremos o próprio
trigo, produto nacional. Suba o preço do trigo de 40 xelins para 50, isto
é, de 25%. Se o vestuário subir de 25%, vale, como daµtes, J quarter de
trigo. Se o tecido cafr de 25%, a mesma quantidade ,de tecido que antes
valia l quarter de trigo, só vale agora 6 bJJSheis. E essa expressão em tri-
go representa exatamente a proporção entre os preços de tecído e vestuá-
rio, por serem ambos mensurados pela mesma medida, l quarter de trigo.
Aliás, aquele ponto de vista é absurdo por outro motivo. O preço
da mercadoria que serve de medida de valores, e portanto de dinheiro,
nlo existe de maneira alguma, pois, do contrário, além da mercadoria
que serve de dinheiro, terei de possuir outra mercadoria que sirva de di-
nheiro - dupla medida dos valores. O valor relativo do dinheiro configura-
se nos preços inumeráveis de todas as mercadorias, pois, em cada um des-
ses preços onde o valor de troca da mercadoria se expressa em dinheiro,
o valor de troca do dinheiro se expressa no valor de uso da mercadoria.
Por isso, não se pode falar de alta ou baixa do preço do dinheiro. Posso
direr: o preço do dinheiro em trigo ou em vestuário não se alterou; seu·
preço em tecido subiu ou, o que dá no mesmo. caiu o preço em dinheiro
do tecido. Mas não posso dizer que o preço do dinheiro subiu ou caiu.

632
Mas Ricardo, na realidade, acha, por exemplo, que o preço do dinheiro
em tecido subiu ou caiu o preço do tecido em dinheiro, por ter o valor
relativo do dinheiro subido em confronto com o tecido, enquanto man-
teve o mesmo valor em confronto com vestuário ou trigo. Ambos são
assim mensurados por medida desigual.
A secção VI "On an invariable measure of value" trata da "medida
dos valores", mas nada contém de ímportante. Não se concebe a conexão
entre valor, sua medida imanente pelo tempo de trabalho, e a necessida-
de de uma medida externa dos valores das mercadorias, nem mesmo se
propõe o problema dessa conexão.
Logo o intróito mostra a maneira superficiaJ de tratar do assunto:

"Quando varia o valor 1elativo das mercadorias. é desejável ter meios


de averiguar quais as que acrescem e quais as que decrescem de valor
real, o que só se pode conseguir comparando uma a uma com uma me-
dida padrão invariável que convém estar livre de todas as flutuações a
que estão expostas a~ demais me1cadorias" (pp. 41, 42). Mas "não há
mercadoria que n«o e$teja exposta a semelhantes variações. .. , isto é,
não há mercadoria que não esteja sujeita a exigir, para ser produzida,
quantidade variável de trabalho" (p. 42). ·

Mas se houvesse tal mercadoria, a influência. da alta ou queda de sa-


lário, as combinações diferentes de caP.ital toco e círcul.ante, os graus de
duração do capital fixo e o tempo que ela leva, para poder chegar ao mer·
cado etc. irupedi-la·iam

"de ser medida perfeita do valor com que pudé$$Cmos averiguar exa-
tamente as variações de todas as outras coisas" (p. 43). "Seria medida
perfeita do valoi para todas as coisas produzida$ piecisamente nas mes.
mas condições, mas nao paca as demais" (Lc.).

Isto ê, se variassem os preços de tais "coisas", poderíamos dizer (se


o valor do dinheiro não aumentasse ou diminuísse) que a variação provém
de alta ou baixa "em seus valores", do tempo de trabalho necessário para
produzi-las. Quanto às demais coisas, não poderia.mos saber se as "varia-
ções" em seus preços em dinheiro resultam das outras cauMS etc. Voltar
mais adiante a esse assunto ainda cru (ao rever mais tarde a teoría do di-
nheiro).
Ozpi'tulo l, secção VIL Além da importante doutrina sobre salários
"relativos", lucros e rendas (rents), à qual volveremos mais tarde, essa
secção contém apenas esta teoria: ao cair ou subir o valor do dinheiro,
alta ou queda couespondentes no salário etc. em nada altera as relações

633
mas somente a expressão monetária delas. Se a mesma mercadoria duplica
sua expressão em libras, o mesmo se darâ com a parte dela que se decom~
põe em lucm, salário ou renda. Mas não varia a relação entre os três nem
os valores reais que representam. O mesmo é válido quando o lucro dupli-
ca em libras, e 100 libras se expressam então em 200; assim não se altera a
relação enue lucro e capital, a taxa de lucro. As mudanças da expressão
monetária atingem ao mesmo tempo lucro e capital, e idem lucro, salários,
renda. Para esta, ademais, isso é válido quando o cálculo se faz sobre o capi-
tal adiantado na agricultura etc., e não sobre o acre. Em suma, nesses ca-
sos. a variação não se dá nas mercadorias etc.

"Afta de salários oriunda dessa causa será, sem dúvida, sempre acompa-
nhada de alta no preço das mercadorias; mas então verificar-se-á que tra·
balho e todas as mercadorias não variaram entre si e que a variação se
limitou ao dinheiro" (p. 4 7 ).

5. Preços médios ou preços de custo e preços de


mercado.
aj Observações preliminares: valor individual e
valor de mercado; valor de mercado e prf!fo·de
mercado.

Para desenvolver a teoria da renda diferencial sqstenta Ricardo no ca-


pítulo II "On Rent" a seguinte tese:

"O valor de troca de todas as mercadorills, sejam elas produtos da indús-


tria. da mine.ração ou da terra, não é regulado pela menor quantidade de
trabalho que bastará para produzi-Ja.s em circunstâncias muito favoráveis
desfrutadas apenas pelos que têm facilidades peculiares de produção; é
sempre reguladu pela quantidade de trabalho que tem de ser empregada
para produzi-las por aqueles que não dispõem de tais facilidades; por
aqueles que continuam a produzi-las nas condições mais desfavoráveis;
quer dizer, nas condições mais desfalforáveis, necess4rias para que se leve
a cabo a produção que atinja a quantidade requerida do produto" (pp.
60, 61).

A última frase não ê de todo correta. A "quantidade requerida do


produto" não é grandeza fixa. Correto seria dizer: certa quantidade do pro-
duto requerida dentro de certos limites de preço. Se este ultrapassa esses

634
limites, a ''quantidade requerida" cai com a procura.
A tese acima, de modo geral, pode ser expressa assim: o valor da mer-
cadoria - que é produto de uma esfera particular de produção - é determi·
nado pelo ·trabalho necessário para produzir o volume global, a totalidade
das mercadorias correspondentes a essa esfera de produção, e nlfo pelo
tempo especial de trabalho requerido por cada capitalista individual ou em-
pregador dentro dessa esfera de produção. As condições gerais de ·produ-
ção e a produtividade geral do trabalho nessa esfera ~special de produção,
por exemplo, indústria têxtil algodoeira, são as condições médias de pro·
dução e a produtividade média nessa esfera, a indústria têxtil algodoeira.
A quantidade de trabalho pela qual se determina, por exemplo, o valor de
uma jarda de pano de algodão não é a quantidade de trabalho nela contida
e empregada pelo i'ndustrial, mas a quantidade média com que todos os fa.
bricantes da indústria têxtil algodoeira produzem úma jarda de pano. E as
condições particulares em que os capitalistas individuais produzem na ín·
dústr.ía têxtil algodoeira dividem-se em 3 classes. Uns produze~ em condi-
ções medianas, isto é, as condições de produção individuais em que produ-
zem coincidem com as condições gerais de produção do ramo. As condições
médias 1!50 suas condições reais. A produtividade de seu trabalho situa-se
no nível médio. O valor individual de suas mercadorias coincide com o va·
lor geral dessas mercadorias. Quando, por exemplo, vendem a jarda de teci-
do por 2 xelins - o valor médio - vendem pelo valor que as jardas produ-
zidas materializam. Outra classe produz em (:9ndições melhores que as mé-
dias: o va1or individual de suas mercadorias está abaixo do valor geral de-
las. Se vendê-las por esse valor geral, vendê-las-á acima. de seu valor indivi-
dual. Por fim, a terceira classe produz abaixo das condições médias de pro·
dução.
A "quantidade requerida de mercadoria" dessa esfera particular de
produção não é grandeza fixa. Se o valor das mercadorias ultrapassa certos
limites do valor médio, cai a "quantidade requerida do produto" ou essa
quantidade s6 é procurada a dado preço - ou pelo menos dentro de deter-
minados limites de preço. Também é possível que a ultima classe tenha de
vender suas mercadorias abaixo do valor individual, como a classe melhor
situada vende sempre acima do valor individual. Qual das classes tem efei·
to decisivo sobre o valor médio dependerá sobretudo da razão numérica
ou da magnitude proporcional entre ela5 74 A classe do meio determiná-

74. "Razão numérica ou magnitude p1op01cional" entre as classes de emp.resátios


significa a·quantidade .relativa de p.rodutos que cada urna delas traz para o mercado.

635
lo-á quando tiver amplo domínio quantitativo. Quando, em termos quan·
titativos, essa classe é débil, e a classe que traba1ha abatxo das condiçõ.es
médias é forte e predomina, estabelece esta o preço geral do produto desse
ramo, embora nem de longe se pretenda dizer, e seja até muito improvável,
que o capitalista individual situado na última classe, na posição mais desfa-
vorável, tenha papel decisivo (ver Corbert 75 ) •
.Mas ponhamos de lado essa questão. O resultado geral é: o valor ge-
ral dos produtos dessa classe é o memw de todos, não importa a razão exis-
tente entre ele e o valor individual de cada mercadoria em separado. Esse
valor comum é o valor de mercado dessas mercadorias, o valor com que
aparecem no mercado. Expresso em dinheiro, esse valor de mercado é o
preço de mercado, como em geral valor expresso em dinheiro é preço.
O verdadeiro preço de mercado está ora acima ora abaixo desse valor de
mercado e só por acaso com ele coincide. Mas as variações se compensam
no decorrer de certo período, e pode-se dizer que a média dos preços
reais de mercado é o preço de mercado que representa o valor de meren-
do. O preço real de mercado - num dado momento coincida ou não em
grandeza, quantitativamente, com esse valor de mercado - em todo o caso
tem com ele em comum a deteuninação qualitativa: todas as· mercadorias
do mesmo ramo de produção disponíveis no mercado (desde_que, é claro,
sejam da mesma qualidade) têm o mesmo preço ou de fato representam o
valor gerar das mercadorias desse ramo.
Por isso, a tese acima que Ricardo apresenta com v:ístas à teoria da
renda {rent}, na exposição dos discípulos, passou a significar 'que não po-
dem existir no mesmo mercado, ao mesmo t~mpo, dois preços de mercado
diferentes, ou que, ao mesmo tempo, os produtos da mesma espécie dispo-
níveis no mercado têm o mesmo preço ou - uma vez. que aqui podemos
abstrair das eventualidades do preço - o mesmo vak>r de mercado.
Assim, a concorrencia dos capitalistas entre si ou dos compradores
da mercadoria com eles e entre si ocasiona aí que o valor de cada mer-
cadoria em separado num ramo particular de produção é determinado pe.
la soma global do tempo de trabalho soei.ai, exigida pela massa global das
mercadorias de:me ramo particular da produção social, e não pelos valores
individuais das mercadorias separadas- ou pelo tempo de trabalho que a
mercadoria individual custou ao produtor e vendedor particulares_

75, Corbert, An inquily tnto the causes 1111d modes of the wealth of individuais,
Londres, 1841. Nesse livro (pp. 42-44) afirma Corbert que na indústria os preços sã_o re-
gulados pelas mercadorias que se produzem nas melhores condições. Na sua opiníão
constituem elas a maior parte das me.rcadotías de determinada classe.

636
Daí resulta naturalmente que, em quaisquer circunstâncias, os ca-
pitalistas da primeira classe, cujas condições de produção são mais favo-
ráveis que as médias, conseguem lucro suplem~ntar, ou seja, seu lucro está.
acima da taxa geral de lucro desse ramo. Não é portanto pelo nivelamento
dos, lucros dentro de um ramo particular de produção que a concorrência
estabelece o valor de mercado ou preço de mercado. (Essa distinção entre
valor e preço não importa para essa pesquisa, pois continuam as diferen-
ças nas condições de produção do mesmo ramo - e daí as diversas taxas
de lucro para os capitalistas indivíduais - qualquer que sefa a relação en-
tre preço de mercado e valor de mercado.) Ao revés, a concorrência aí ni-
vela os diferentes valores individuais ao mesmo valor de mercado, igual,
indistinto, ao permitir as diferenças no domínio dos lucros individuais,
dos lucros dos capitalistas individuais e seus desvios da taxa média de lu-
cro do ramo. Cria-as até, ao estabelecer o mesmo valor de mercado para
mercadorias produzidas em condições de produção desiguais, por conse.
guinte com. produtividade desigual de trabalho, representando assim quan-
tidades de tempo de trabalho indMduaís desiguais. "A mercadoria produzi-
da em çondíções mais favoráveis contém menos tempo de trabalho que a
produzída em condições mais desfavoráveis, mas se vende ao mesmo preço,
tem o mesmo valor, como se encerrasse o mesmo tempo de trabalho,.o que
não contém.

b) Ricardo confunde o processo de formafão do


valot' de mercado com o de .formação dos preços
de ettsto .

.Ricardo serve-se de duàs proposições para formular a teoria da renda,


as quais expressam efeitos da concorrência não só diferent~s mas opostas.
Segundo a prlmeíra, os produtos do mesmo ramo se vendem a um s6 <: aa
mesmo valor de mercado, e a concorrência portanto impõe taxas diferentes
de lucro, desvios da taxa geral de lucro. De acordo com a segunda, a taxa de
lucro tem de ser a mesma para cada aplicação de capital, ou seja, a ooncor-
rência gera taxa geral de lucro. A primeira lei se aplica aos diferentes capi-
tais autônomos empregados no mesmo ramo de produção. A segunda se
aplica aos capitais, desde que investidos em diferentes ramos de produção.
Com a primeira atuação, a concorrência gera o valor de mercado, isto é,
o mesmo'vawr para mercadorias do mesmo ramo de produção, embora esse

637
valor üUntico tenha de produzir lucros diferentes; gera portanto o mesmo
valor não obstante taxas diferentes de lucro ou, antes, por meio delas. Copi
a segunda atuação (esta, aliás, se concretiza de outra maneira; é a CQncorrên-
cla dos capitalistas nos diferentes ramos, a qual lança o capital de um ra-
mo para outro, enquanto a outra concorrência, desde que não se conside-
rem os compradores, ocorre entre os capitais do mesmo ramo), a concor·
rência gera o preço de custo, isto é, a mesma taxa de lucro nos diferentes
ramos de produção, embora essa taxa idéntiea _de lucro contradiga a desi-
gualdade dos valores, e assim só se possa impor por meio de preços que se
distinguem dos valores.
Uma vez que Ricardo se serve das duas proposições em sua teoria da
renda - igual valor ou preço com taxa desigual de luao,e taxa igual de lu-
cro com valores desiguais - é estranho que não tenha atinado com essa du-
plicidade e que mesmo no capítulo onde se propõe tratar do preço de mer·
cado, capítulo IV "On Natural and Market Price': de maneira nenhuma se
ocupe com o preço de mercado ou val.or de mercado, embora na passagem
citada acima torne-O por fundamento para explicar a renda diferencial, os
lucros suplementares que se cristalizam em rendas (rents). Ao contrário,
aí só trata da redução dos preço~ nos diferentes ramos de produção apre-
ços de custo ou 'Pfeços médios, isto é, das relações entre os valores de mer·
cado dos diferentes ramos de produção, e não da formação do valor de
mercado em cada ramo, e sem essa formação de modo nenhum existem
valores de mercado.
Os vai.ores de mercado de cada ramo particular, em conseqüência os
preços de mercado de cada ramo particular (se o preço de mercado corres-
ponde ao "preço natural", isto é, representa simplesmente o valor em di-
nheiro) proporcionaríam taxas de lucro muito diferentes, pois capitais
de magnitude igual nos diferentes ramos (omitidas por completo as dife-
renças resultantes de seus diferentes processos de circulação) empregam
capital constante e capital variável em proporções muito desiguais e assim
fornecem montantes muito desiguais de mais-valia e, em conseqüência, de
lucro. Assim, o nivelamento dos diversos valores de mercado, de modo
que se estabeleça a mesma taxa de lucro nos diferentes ramos e que capi-
'tal de magnitude igual proporcione lucros médios iguaís, só é possível por
se converterem os mi.ores de mercado em preços de mercado diferentes
dos valores reais."'

'" g possível que a taxa de maiM'lllía não se nivele em todos os ramos de produ-
ção (por exemplo. em virtude da duração desigual da jomada de trabalho). Isso não é
neces!l4rlo porque as próprias mais-valias se nivelam (Mane).

638
O que a coocorrência efetua no mesmo ramo de produção e a de-
terminação do valor da mercadoria nesse ramo por meio do tempo mé·
dio de trabalho nele requerido, isto é, o estabelecimento do valor de mer·
cado. O que a concorrência efetua entre os diferentes ramos de produção
é a geração da mesma taxa geral de lucro nos diversos ramos, nivelando
os diferentes valores de mercado a preços de mercado que representam os
preços de custo divergentes dos valores de mercado reais. Nesse caso, por·
tanto, a concorrência de modo nenhum tende a assimilar os preços aos va-
lores das mercadorias, mas, ao contrário, a ·reduzir esses valores a preços
de custo diferentes deles, a desvanecer as diferenças que existem entre os
valores e os preços de custo.
:S só este óltimo movimento que Ricardo observa no capítulo IV e,
coisa estranha, considera-o conversão dos preços das mercadorias - pela
concorrência - aos valores, conversão do preço de mercado (preço diver·
so do valor) ao preço natural (o valor expresso em dinheiro). Essa tolice
decorre porém do erro já cometido no capítulo 1 "On Value", de identi·
ficar preço de custo com valor, o que por sua vez originou-se de ele ~ on-
de tinh~ de tratar tão-só do "valor", isto é, tinha diante de si a "merca-
doria" apenas arremessar-se à taxa geral de lucro e a todas as condições
oriundas das relações capitalistas de produção mais desenvolvidas.
Por isso, é também de todo superficial o método que Ricardo segue
no capítulo IV. Parte Ricardo das "variações acidentais e temporárias de
preço" (p. 80) das mercadorias, em virtude das relações variáveis entre
procura e oferta.

"Com a. a.lta ou baixa do preço, os lucros ou subirão acima do nfvel


geral ou serão comprimidos abaixo de-le, e- o capital ou é rncentivado
a entrar no emprego particulnr onde ocoueu a variação, ou incitado a
dele sair" (p. 80).

Aí já se supõe a taxa geral de lucro pelos diferentes ramos, pelos


"empregos particulares". Mas devia Ricardo antes observar como se esta·
be]ece o ni'vel geral de preço no mesmo emprego e o nível geral de biao
pelos diferentes empregos. Teria entio visto que a última operação pres-
supõe movimentos em todas as direções, ou repartição, deternúnada pela
concorrência, da totalidade do capiflll social pelos diferentes ramos de
emprego. Uma vez pressuposto que, nos diferentes ramos, os valores de
mercado ou os preços médios de mercado se reduzem aos preços de cus-
to com a mesma taxa de lucro (mas isto só ocorre nos ramos onde a pro-
piiedade ·fundiária nio interfere; onde interfere, pode a concorrência den-

639
tro do mesmo ramo converter os preços no valor e o valor no preço de
mercado, mas não pode rebaixar este a preço de custo), desvios, com maior
constância, do preço de mercado em torno do preço de custo,_des.loca-
mentos para cima ou para baixo deste em ramos particulares causam no·
vas migrações e nova distribuição do capital social. A primeira migração
sucede para estabelecer preços de custo diferentes dos vai.ores, a segunda,
para nivelar os preços reais de mercado aos preços de custo, quando aque-
les sobem acíma ou caem abaixo destes. A primeira é conversão dos valo-
res em preços de custo. A segunda é rotação dos preços de mercado reais
e eventuais nos diferentes ramos em tomo do preço de custo, que aparece
como o preço natural, embora seja diferente do valor e resultado exclu·
sivo de ação social. E este movimento mais superficial que Ricardo exa-
mina e em certas ocasiões, sem perceber, confunde com o outro. E sem
dúvida "o mesmo princípío" que dá origem a ambos, a saber, que

"toda pessoa livre para empregar seu capital onde quiser procura:rá,
é claro, o investimento mais vantajoso; ficará por certo descontente com
um lucro de. 10% se, ao deslocar seu capital, pode obter lucro de 15'%,.
Esse afã incessante de t_odos os pri>prietdrios de capital para deixar um
negócio menos lucrative por outro mo.is vantajoso gera forte tendência
para nivelllr a taxa dos lucros de todos, ou a estabelecei_ os lucros em
tais proporções que possam, na estimativa dos partid_pa.ntes, compensar
qualquer vantagem que um tenha ou pareça te1 so~re o outro" (p. 81).

Essa tendência atua no sentido de distribuir a massa tocia do tempo


de trabalho social pel.os diferentes ramos de produção de acordo com a
necessidade social. Por isso, os valores dos diferentes ramos se eonvertem
em preços de custo; ademais, nívelam-se pelos preços 'de custo as variações
dos preços reais nos ramos particulares.
Tudo isso já está ém A. Smith. O próprio Ricardo diz:

"Nenhum autor mostrou de maneira mais satisfatóda e hábil que Doutor


Smith a tendência do capital de de~ocar·se de empregos onde o preço
das mercadorias obtidas não compensa as despesas totais de produri-las
e levá-las 110 mercado, inclusive e lucro normal" (o preço de custo, por·
tanto) (p. 34 2, nota). -

O mérito de Ricardo - sua falha decorre em geral da aushicia de espí-


rito critico em relação a A. Smith, nesse domínio - consiste em ter deter-
minado, de maneira maís precisa, essa núgração- do capital de uma esfera
para outra, ou melhor, o modo como ela opera. Mas isso apenas porque em

640
seu tempo o sistema de crédíto estava mais desenvolvido que no tempo de
Smith. Diz Ricardo:

"É talvez muito difícil aoompanhar os pass.os por meio dos quais se efe-
tuo essa mudança; é pxovável que um industrial não mude totalmente o
emprego de teu capital, mas apenas reduza a quantidade de capital de
que dispôe nettt emprego. Em todo$ os países riC-OS há certo número de
pessoas que formam a chamada cünse financeira"'; essas pe"°as não se
empenham em indúsrría algum;1, mas vivem do juro do dinheiro empre-
gado no desoonto de letras ou em empréstimo$ à parte. mafi; ativa da c<r
murudade. Também os banqueiros aplicam do mesmo modo grandes
montantes de capital. O capital assim empregado forma capital circulan··
te de grande magnitude, e num país todos os ramos o requerem em
maior ou menor proporção. Talvez não haja industrial, por mais rico,
que limite seu negócio ao montante pennítido por seus fundos apenas:
tem sempre certa porção desse capital tlutuante em acréscimo ou decrés-
cimo de acordo com o desenvolvimento da procw:a por suas mercadorias.
Quando aumenta a procura de artigos de seda e diminui a de tecidos
de algodão, o fabricante destes não de8loc.a. seu capital para a indústria
de seda, mas demite alguns de seus trabalhadores, suspende a procura
de empréstimos junto a banqueiros e a prestaroistas. O caso do indus-
trial da seda é o reverso: toma mait emprútado e assim capital se trans-
fere de um ramo para outro, sem a necesddade de um fabricante inter-
romper sua ocupação u:rual. Quando observamos os mercados de uma
grande cidade e vemos oomo se suprem regulafmente de mercadorias
nacionais e e.strnngeíras, nas quantidades· requeridas, em todas as cir-
cunstánci1u da prooora que varia em virtude de preferências caprichosas
ou po1 causa de mudança no número de habitantes, sem muitas vezes
produzír os efeitos de excesso de uma oferta por demais abundante ou
elevação extrema de p1eço, por não corresponder a oferta à procura,
temos de coniesslll' que o princ(pio que reparte o capital por cada ramo
na exato. quantidade requerida é mais atuante do que em geral se admi-
te" (pp. 81, 82).

O crédito portanto - meio pelo qual o capital da classe capitalista toda


é posto à disposição de cada ramo não na proporção do capital de pro·
priedade dos capitalistas de determinado ramo, mas na das necessidades
de prod~o, enquanto na concorrência os capitais individuais se revelam
autônomos entre si - é tanto o resultado quanto condição da produção
capitalista, o que nos dá uma clara transição da concorrência entre os ca-
pitais para o capital como crédito.

* Roscher poderia ter visto aí mais uma vez o que os ingleses entendem por
"'clasre financeira" (mcnkd cla$s). A( a "classe finanreira" é o antipoda da "parte ín-
dustrlosa aa comunidade" (Marx).

641
e) As duas definições ricardianas de "preço natural".
Variações nos preços de custo regidas pelas
variações na produtividade do trabalho.

No intróito do capítulo IV diz Ricardo que entende por preço na-


tural o valor das mercadorias, isto é, o preço determinado por seu tempo
de trabalho relativo, e por preço de mercado os desvios acidentais e tem-
pôrários desse preço natural igual ao valor. Ao longo de todo o resto do
capítulo, e de ijlaneita bem explícita, entende por preço natural algo por
completo diferente, a saber, o preço de custo, diverso do" valor. Assim, ao
invés de mostrar como a concorrência transforma os valores em preços
de custo, isto é, gera desvios permanentes dos valores, expõe, de acordo
com A. Smith, como a concorrência reduz os preços de mercado em di-
ferentes ramos a preços de custo.
Lê-se no início do capítulo IV:

"Se fa~emo$ do trabalho o fundamento do valru das mercadorias, e da


quantid!Jde comparotiita_de rrabfllho necessátio para produz.i-la.$ a regra
que determina 3!! quantidades respectívas de ben~ que se trocarão umas
pelas outras, não cabe de modo !Ú,gllm supor que contestamos os dewios
acidentais e tempordrios do preço real ou de mercado .-das mercadorias
em relação àquele preço oríginal e natural" (p. 80).

Aí portanto preço natural significa valor e preço de mercado nada


mais é que o desvio do preço efetivo em relação ao valor.
Ao revés:

"Admítixemos toda$ as mercadorias a seu preço natural e, ·em conse-


qüência, que os lucros do capital em todos os investimentos tenham a
mesma taxa ou só se distingam pelo que, na estimativa das partes, cor-
responde a uma vantagem real ou subjetiva que possuem ou lhes fal·
ta" (li. 83).

Aí preço natural é igual a preço de custo, isto é, preço em que é a


mesma a proporção do lucro com os adiantamentos inseridos na merca-
doria, embora valores iguais de mercadorias fornecidas por capitais em
diferentes ramos contenham mais-valias muito desiguais e lucros portanto
desiguais. O preço. para dar o mesmo lucro, tem por isso de diferir do
valor da mercadoria. Além disso, capitais de grandeza igual fornecem mer-
ca.dorias com magnitudes de valor bem diver81Js, conforme entre na merca-

642
doria porção maior ou menor de capital ftxo. Mais sobre o assunto quando
tratarmos da circulação dos capitais.
Por isso, Ricardo entende por nivelamento decorrente da competi·
ção apenas a rotação dos preços reais ou preços de mercado reais em tor-
no dos preços de custo ou do preço natural diferente do valor, o nivela-
mento do preço de mercado em diferentes ramos a preços de custo gerais,
ou seja. justamente a preços que divergem dos valores reais nos diferentes
ramos:
"O desejo particular de todo capitallsu, de deslocar seus recursos de um
emprego menos hlcrativo para outro mais lucrativo, impede o preço de
mercado das mercadorias de continuar por certo tempo muito acima ou
muito abaixo de seu preço Tliltural. e essa competição que estabelece
paddade entre os WJfores de troca das mercadorias" (também entre os
diferentes valores reais), "de modo que, após serem pagos os salários
pelo trabalho necessiírio pata produzi-las e · todas as demais despesas
requeridas pata pôr o capital empregado no estado original de eiiciên-
cia, o 111Jlor remanescente ou excedente seja em cada ramo proporcional
ao valor do capital aplicado" (p. 84 ). ··

E o que realmente sucede. A concorrência ajusta os preços nos dife-


rentes ramos de modo que '(} valor remanescente ou excedente", o lucro,
se harmonize com o valor do capital empregado, mas não com o valor
·real da mercadoria, nem com a sobra de valor contida na mercadoria após
se deduzirem as despesas. Para se efetivar esse ajustamento, o preço de uma
mercadoria tem de ser elevado acima e o de outro comprimido abaixo
dos respectivos valores reais. Não é em tomo do valor mas em torno do
preço de custo das mercadorias - isto é, as despesas nel.às contidas + a ta-
xa geral de lucro - que a concorrência faz os preços de mercado girar nos
diferentes ramos.
Prossegue Rícardo:

"No capítulo VI da "Wealth óf Nations" é excelente o tratamento dado


a tudo o que se 1elacíona com essa questão" (p. 84).

De fato, Rícardo aí se extravia por se apegar sem espírito crítico à


tradição smithiana.
Ricardo, corno sempre, encerra o capítulo dizendo que nas investi·
gações seguintes "omitirá por completo" (p. 85) os des\ios acidentais que
os preços de mercado têm do preço de custo, mas esquece que de maneira
nenhuma considerou, em relação aos valores reais das mercadorias" os des-
vios constantes dos preços de mercado no que correspondam aos preços
de custo,.e que sÍlbstituiu o valor pelo preço de custo. -

643
Capítulo XXX "On the influence of demand and supply on prices~:
Rícardo aí sustenta que o preço pennanente é determinado pelo pre-
ço de·custo e não por oferta e procura: assim, o preço permanente só é
determinado pelo vrilor das mercadorias até o ponto em que esse valor
determina o preço de custo. Suposto que os preços das mercadoóas se
ajustem de modo que todos dêem 10% de lucro, toda mudança constante
neles será determinada por mudança nos valores delas, no tempo de tra-
balho requerido para prodilzi-las. Como esse valor continua a determinar
a taxa geral de. lucro, suas mudanças prosseguem determinando as varia·
ções nos preços de cµsto, embora não se anule por isso a diferença entre
esses preços de custo e os valores. O que se anula é o que na diferença entre·
valor e preço real ultrapasse a diferença entre preços de custo e valores·
causada pela taxa geral deilucro. Ao mudarem os valores das mercadorias,
seus preços de custo se alteram. Forma-se "novo preço natural" (p. 460).
Por exemplo, o trabalhador pode produzir 20 chapéus no mesmo tempo
em que antes ptoduzia 10 e o salário constituía l /2 do dispêndio com o
chapéu; então, cai à metade o dispêndio,. o custo de produção dos 20
chapéus no tocante a salário. E que agora para a produção de 20 chapéus
se paga o mesmo salário anterior para a produção de l O. Cada chapéu por-
tanto nada mais encerra que 1/2 das despesas de salário. Se o fabricante
de chapéu continuar vendendo o chapéu pelo mesmo preço, vendê-lo-á
acima do preço de custo. Se o lucro era de 10%, será agora (admitindo-
se que o dispêndio para fabricar determinada quantidade de' chapéus se
repartisse antes .em 50 para matérias-primas· etc., e 50 para salário) de
46 2/3%. O dispêndio agora se divide em 50 para m·atérias-primas etc. e
25 para salário. Se a mercadoria for vendida pelo preço antigo, teremos
lucro = 35í75 ou 46 2/3%. Em virtude da queda do valor, o novo preço
natural, portanto, cairá até o ponto em que o preço só dê 10% de lucro.
Á queda no valor ou no tempo de trabalho necessário para produzir a
mercadoria revela-se na circunstância de se despender - para se conseguir
a mesma quantidade de mercadorias - menos tempo de trabalho, em con-
seqüência menos tempo de trabalho pago, menor stilârio, e enfim de cair
a despesa, o salário que e pago (pelo montante; isso não pressupõe queda
na taxa de salário) em relação à produção de cada mercadoria isoladamen-
te considerada. E o que se dá se a mudança no valor sucedeu na própria
fabricação ·do chapéu. Se a mudança ocorresse no material ou nos instru-
mentos de trabalho, também nesses ramos ela se expressaria em decrés-·
cimo de dispêndio de salário para se produz.ir certa quantidade de produ-

644
to, mas para o fabricante de chapéu configurar-se-ia em custo menor do
respectivo capital constante. Os preços de custo ou "preços naturais"
(que nada têm a ver com a "natureza") podem ter duas baixas em virtude
de mudança - queda, no caso - nD valor das mercadorias:
A primeira porque decresce o salário que se despende ao produzir.
se dada quantidade de mercadorias, por ter caído a totalidade do volume
absoluto de trabalho aplicado nessa quantidade, trabalho pago e trabalho
não pago;
A segunda quando, por força da produtividade acrescida ou decres-
cida do trabalho (os dois casos podem ocorrer: um quando o capital variá-
vel diminui em relação ao constante, o outro quando o salário sobe em vir-
tude do encarecimento dos meios de subsistência), muda a proporção
da mais-valia com o valor da mercadoria ou com o valor do trabalho nela
contido, sobe ou desce portanto a taxa de lucro, reparte-se de maneira
diferente o montante de trabalho.
Neste último caso, os preços de produção ou os preços de custo só
poderão variar se atuarem sobre eles variações no valor do trabalho. No
primeíro caso, permanece o mesmo o valor do trabalho. Mas no último
caso, não· se alteram os valores das mercadorias e sim apenas a repartição
entre trabalho necessário e trabalho excedente, Contudo, haveria então
mudança na produtividade, portanto no valor das mercadorias isáladamen·
te consideradas. O mesmo capital, num caso, produzirá mais, no outro,
menos mercadorias que antes. A massa de mercadorias em que se configu-
rar terá o mesmo valor, mas a mercadoria individua~ valor diferente. O va·
lor do salário não determina o valor das mercadorias, mas o valor das mer-
cadorias (que entram no consumo do trabalhador) determina o valor do
salário.
Os preços de rosto das mercadorias nos diferentes ramos, urna vez
dados, sobem ou descem uns em relação aos outros, ao variarem os valo-
res das mercadorias. Se ·sobe a produtividade do trabalho. dímínuí o tem-
po de trabalho requerido para a produção de determinada mercadoria, cai
portanto seu valor, e tanto faz que essa mudança de produtividade ocorra
no trabalho empregado por último ou no capital constante, o preço de
custo dessa mercadoria terá de experimentar queda correspondente. A
quantidade absoluta de trabalho nela aplicado diminui portanto a quan-
tidade de trabalho pago nela contido, o montante de salário nela despen·
dido, embora não varie a taxa de salário. A mercadoria, se for vendida ao
preço de custo anterior, dará lucro mais alto que a taxa geral de lucro, pois
antes esse _lucro era igual a l 0% sobre dispêndio maior. Será agora portan-

645
to mais de 10% sobre o dispêndio diminuído. Ao revés, quando a produ-
tividade do trabalho decresce, sobem os valores reais das mercadorias.
Dada a taxa de lucro - ou, o que dá no mesmo, dados os preços de custo· -
a alta ou baixa rel,tivas deles depende da alta ou baixa, da variação dos
valores reais das mercadorias. Em virtude dessa variação, novos preços
de custo ou, como disse R.íca.rdo em concordância com Snúth, "preços
naturais novos" substituem os antigos.
No capítulo XXX, citado por 6ltimo, Ricardo ainda identifica no-
minalmente o preço natural, isto é, o preço de custo, com o valor natural,
ou seja, com o valor determinado pelo tempo de trabalho.

"O preço" (das mercadorias monopoliza.das) "não tem conexão com seu
valor Mtural.Mas os preços das men::adorias expostos à conC(ITTência....
dependem em última in~t.ância... do respectivo... custo de produção"
(p. 465).

Aí portanto preços de custo ou preços naturais diretamente identifi-


cados com "valor natural", isto é, com o "valor':
Essa confusão explica porque mais tarde uma série de gajos depois"
de Ricardo, como o próprio Say, podia adotar "o custo de produção" co-
mo regulador último dos preços, sem ter a noção mais ínfima. da detemú-
nação do valor pelo tempo de trabalho, e ainda se opunha a esta idéia en-
quanto sustentava aquela.
Todo esse equívoco de Ricardo e a conseqüente configuração inexa-
ta da renda fundiária etc., como as leis errôneas sobre a taxa. de lucro etc.,.
decorrem de não distinguir ele entre mais-valia e lucro, no seu procedi-
mento com as de)mições das formas, em geral rudimentar e conceitual-
~ente vazio como o dos demais econonústas. A seguir ver-se-á como se
deixou envolver por Smith.

Ao já dito cabe acrescentar que Ricardo só conhece uma diferença


entre valor e preço rt.atu1'til: este é a expressão monetária do valor, isto é,
pode mudar em Virtude da variação do valor dos metais preciosos, sem mu-
dar o valor. Mas essa mudança atinge apenas o apreçamento, a expressão
do valor em dinheiro. Diz ele por exemplo:

"Só pode ser regulado" (o comércio exterior) "mediante alteração do


preço natural e não do JIQ/or natural a ,que se podem produzir as merca-
dorias naqueles países, e aquela alteração .se efetua por se modificai: a
distribuição dos metais preciosos" (1.c:., p. 409).

646
B) Teoria de Smith sobre o
preço de custo

L Suposições errôneas de Smith na teoria dos


preços de custo. Incoerência ricardiana de
adotar a idéia smithiana de identificar
valor com preço de custo.

De início observar que ainda segundo Srrúth,

''há sempre algumas mercadorias cujo preço se decompõe em duas partes


apenas, a saber, os salários e os lucros do capital" (Recherches rur la
nature et les causes de la richesse des nationt, Paris, 1802, l.J, v. l, cap.
VI, p. 103).

Essa discordância da concepção de Ricardo pode ser portanto igno-


rada agora.
Smith primeiro expõe que o valor de troca se reduz ã quantidade de
trabalho, que o valor contido no valor de troca, após a dedução das maté-
rias-primas etc., se decompõe na parte do trabalho paga ao trabalhador e na
parte que não lhe é paga, e esta se divide em lucro e renda (rent) (o lucro
por sua vez pode repartir-se em lucro e juro). logo a seguir, muda brusca-
mente de rumo e, ao invés de decompor o valor de troca em salário, lucro
e renda, faz desses os fatores constitutivos do valor de troca, considera-os
valores de troca autônomos componentes do valor de troca do produto,
forma o valor d.e troca da mercadoria com os valores - determinados de
maneira autônoma e independente em relação a ele - do salário, do lucro
e da renda (rent). Estes, em 'Vez de terem por fonte o valor. tomam-se a
fonte do valor.

"Salário, lucro e renda (rent) sio as três fontes originais de toda renda
(revenue) e também de todo valor de troca (1.1, v.l, cap. Vl, p. l 05).

647
Depois de ter revelado a conexão íntima, de novo o domina de súbi·
to a visão fenomênica, a conexão das coisas tal como ap11Tece na concon'ên-
da. e nesta tudo se configura sempre ao revés, de cabeça para baixo.
E então a partir dessa vi.são invertida que Smith ex.põe a diferença
entre "'preço natural das mercadorias" e seu ''preço de mercado". Ricardo
herda·lhe essa distinção, mas esquece que o "preço natural" de A. Smith,
segundo as premissas deste, é apenas o preço de custo resultante da concor-
rência, e que, para o próprio Smith, esse preço de custo só se identifica
ao ''valor" da mercadoria quando ele olvida sua concepção mais profunda
e se aferra à errônea, oriunda do aspecto superficial, a de que o valor de
troca das mercadorias se forma juntando os valores do salá.Iio, lucro e ren·
da (rent) determinados de maneira independente. Ricardo, enquanto com-
bate essa concepção de modo geral, aceita a confusão nela fundada, ou se-
ja, identifica Valor de troca a preço de custo ou preço natural de A. Smith.
Essa confusão se justifica para Smith, pois toda a sua pesquisa sobre o
preço natural parte de sua segunda concepção errônea do valor. Mas, para
Ricardo não há justificação alguma, pois nenhures aceita ele essa idéia falsa
de Smith, e abertamente a combate por incoerente. Mas Smith consegue
envolvê-lo de novo por meio do preço natura!
o
Depois de ter con.struído valor da mercadoria com os valores do sa-
ltirio, lucro e renda (rent) determinados de maneira separada e independen-
te da mercadoria, Smith se pergunta então como são ·!leterminados esses
valores elementares. E aí parte dos fenômenos tal como a~arecem na con-
coerência.
Capítulo Vil, livro 1, "Des prix nature.l des moichandises, et de leur
prix de marché ". Diz ele aí:

"Em toda sociedade ou região há uma taxa normal ou média· de salário .•.
de lllcro ... e .de renda {rentj" (l.c., v. 1, p. 11 O). Essa "taxa média pode-
se chamar de taxa 11atural de salário, de lucro e de renda, no tempo e
no espaço nos qull.is essa taxa de ordinário domina" (pp. llO, 111).
"Se o preço de uma mercadoria basta para pag-.u renda (rent}, salário
e lucro, segundo taxas na"turàis, vende·se a mercadoria pelo preço natu·
ral" (p. 111). ·

Esse preço natural é então o preço de custo da mercadoria. e o preço


de custo coincide com o mlor da mercadoria, uma vez que se pressupõe
que o valor desta é formado pelos valores do s.alário, do lucro e da renda
{rent).

648
"A mercadoria é vendida exatamente pelo que vale" (a mercadoria€ en·
tio vendida pelo valor) "'ou pelo que cu1ta de fato àquele que a leva
ao mercado" (pelo valor ou pelo preço de custo para a pessoa que a
leva ao mercado); "pois, embora na linguagem comum o que se chama
de custo de pr-odução da mercadoria '1Jfo inclU11 o lucro de quem a re-
vende, todavia, esse personagem se a cede por preço que não lhe dtl o
lucro usual na região, perde, é ~taro, no negócio, uma vez que com apli-
cação diferente de $eJJ capital poderia atingir aquele lucro" (p. 11 l ),

Temos aí a história toda da origem do preço natural e por cima em


linguagem e lógica de todo apropriadas, uma vez que o valor da mercado-
ria é integrado pelos preços do salário, lucro e renda (rent), mas o verda-
deiro valor destes por sua vez se constitui ao se enquadrarem nas taxas na-
turais; assim, é claro que o valor da mercadoria é idêntico ao preço de custo,
e este ao preço Tliltw'al da mercadoria. Pressupõe-se dada a taxa de Jucro e
também a de salário. Silo dados para a formação do preço de custo. Ante·
cedem-no. As taxas também se revelam dadas para o capitalista individual.
O como, as causas e as razões não o interessam. Smith aí adota o prisma
do capitalista individual, do agente da produção capitalista, quem estabe-
lece o preço de custo da mercadoria. Tanto para salário etc., tanto para
taxa geral de lucro. Logo: é desse modo que o capitalista v~ a operação por
meio da qual se estabelece o preço de custo da mercadoria, ou o valor da
mercadoria, como a coisa lhe aparece depois, pois ele sabe também que o
preço de mercado está ora acima ora abaixo desse preço de custo que, por
isso, representa para ele o preço ideal da mercadoria, o preço absoluto em
contraste com as oscilações de preço, em suma, o valor, desde que dispo-
nha enfim de tempo para refletir sobre matérias dessa natureza. E Smith,
ao transpor-se para o mundo da concorrência, de imediato arrazoa e de-
sarrazoa com a lógica peculiar do capitalista, prisioneiro dessa esfera. Argu.
menta: por custos entende-se, na linguagem usual, não o lucro que o vende-
dor consegue (e que tem de constituir sobra acima do dispêndio). Por que
então computar o lucro no preço de custo? A. Smith, como o capitalista
meditabundo diante dessa pergunta, assim responde:
Lucro em gerai tem de entrar no preço de custo, porque eu seria
tapeado se no preço de custo entrasse lucro de 9% apenas e nio de 1076
Essa ingenuidade com que Smith expressa as convicções do agente
da produção capitalista e apresenta as coisas de maneira franca e abran-
gente como esse agente as vê, as pensa, como essas coisas o determinam

76. Supõe-se aí que é de J 0% a taxa de lucro média.


na prática e, sem dúvida, se passam na aparenCJa, enquanto faz revela-
ções e~porádicas sobre as conexões mais profundas, dá a seu livro pode.-
roso encanto.
Vê-se aí também por que Smith - apesar dos grandes escrúpulos
nesse ponto - reduz o valor total da mercadoria a ren~a (rent), lucro e
salário, e omite o capital constante, embora sem dúvida o admita para todo
capitalista "em separado". E que, do contrário, dir-se-ia: o valor da mer-
cadoria consiste em salário, lucro, renda e na fração do valor da mercado-
ria a qual não consiste em salário, lucro e renda. Seria portanto necessá-
rio determinar o valor sem dependência do salário, lucro e renda (rent).
Se, além do dispêndio no salário médio etc., o preço da mercado-
ria proporciona o lucro médio e - caso a renda (rent) nele entre - a ren-
da média, é a mercadoria vendida pelo preço natural ou preç,o de custo,
e esse preço de custo é igual a seu va"lor, porque seu valor nada mais é que
a adição dos valores naturais do salârlo, lucro e renda.
Depois de se ter imergido na concorrência e pressuposto dada a ta-
xa de lucro etc., Smith, aliás, dá uma idéia correta do preço mtural ou
preço de custo, distinguindo esse preço de custo do preço de mercado.

"O pTeço natu:ml ou o JJ(Jfor global de renda, trabalho e. lucro, que é


mister pagar para levá-la" (a mercadoria) "ao mercado" (Lc., p. 112).

Esse preço de custo da mercadoria difere do preço real ou preço de


mercado da mercadoria (p. 112). Este depende da procura e oferta. ·
Os custos de p1'0dução ou o preço de custo da mercadoria são justa-
mente "o valor total da renda (rent), salário e'lucro, o_.qual tem de ser pa-
go para levá-la ao mercado". Se a procura corresponde à oferta, o preço
de mercado é igual ao preço natural.

"Quando a quantidade levada ao mercado é exatamente o bastante pa-


Ia suprir a procura efetiva e não mais que isso, o pTeço de mercado coin-
cide por completo... oom o pTeço natuTal" (v. [, 1.c., p. 116). "Po1 isso,
o preço natuml constitui por assim dizer o .p,eço centTal em torno do
qual gravitam de contínuo os preços das mercadorias. Diferentes circuns·
tâncias acidentais podem às vezes mantê-los bastante acima e às vezes
comprimi-los mesmo um tanto abaixo desse preço" (v. I, l.c., p. 116).

Daí conclui Smith que em geral:

"11 indústria toda empregada por ano para abastecer o mercado com qual-
quer mercadoria" corresponde às necessidades da sociedade ou à "pro-
cura efetiva" (p. 117).

650
O que Ricardo conc.ebe como repartição do capital geral pelos dife-.
rentes ramos ainda aparec.e aí na forma mais ingênua da indústria nec.essá•
ria para produzir "uma mercadoria particular". O nivelamento dos preços
em preços de mercado entre os vendedores da mesma mercadoria e o nive-
'/amento dos preços de mercado das diferentes mercadorias em preços de
custo ainda se baralham em confusão total,
Por mero acidente Snúth aí alude à influência que a variação nos
valores reais das mercadorias tem sobre os preços .naturais ou preços de
custo.
Assim, na agricultura,
"a mesma quantidade de trabalho produz em diferentes anos quantida-
des bem diversas de mercadorias, enquanto em outros ramos gera sem-
pre quantidade igual ou quase. O mesmo número de trabalhadores na la-
\'Oura produzirá em diferentes anos quantidades multo diversas de e-0reais,
vinho, azeite, lúpulo ete. Todavia, o mesmo número de fiandeiros e. te-'.
celões produzirá todo ano a mesma quantidade ou quase a mesma de te-
cido de linho e de algodão ... Nas outras espécies de iRdústria" (não agrí-
colas) "onde o produto de quantidades iguais de trabalho permiinei:e sem-
pre igual ou qúase" (ísto é, desde que nã'o mudem as condições de produ-
ção) "pode a produção adequar-se de maneira mais exata à procura. efe-
tiva" (pp. 117, 118).

Smith vê então que simples variação na produtividade de "quantidades


iguais de trabalho", portanto nos verdadeiros valores das mercadorias, muda
os preços de custo. Mas retoma à superficialidade, ao reduzír esse reparo à
relação entre oferta e procura,. De acordo com seus próprios argumentos, a
idéia como ele a apresenta é falsa. Pois, se na agricultura "quantidades iguais
de trabalho", em virtude das estações etc., fornecem quantidades diferentes
de produtos, mostrou. ele mesmo como na indústria etc., em virtude da
maquinaria, divisão do trabalho etc., "quantidades iguais de trabalho"
fomec.em volumes bem diversos de produto. Não é portanto essa dife-
rença que separa a agricultura dos outros ramos da índústria. E a circuns-
tância de a índ{tstria empregar "a força produtíva em grau predetenninado",
e a agricultura depender de eventualidades naturais. Mas o resultado conti-
nua a ser que o valor das mercadorias ou a quantidade de trabalho a despen.
der necessariamente em dada mercadoria, conforme a produtividade do
trabalho, faz variar os preços de custo.
Na passagem seguinte A. Smith também já mostra cotno a migração de
capitais de um ramo para outro estabelece o preço de custo nos diferentes
ratnos de produção. Todavia, não é tão claro aí quanto Ricardo. Pois, se o
preço da mercadoria caí alxlixo do preço r14tura/, .é porque, de acordo com

651
sua argumentação, um dos elementos desse preço caiu abaixo da taxa
natural. Assim, não é porque os capitais apenas se retiraram ou migraram,
mas porque trabalho, capital ou terra se deslocaram de um ramo para outro.
Nesse ponto sua idéia é mais consistente que a de Ricardo, mas errada.

"Qualquer que seja a parti' desse preço" (natural) "paga abaixo da taxa
natural, aqueles cujos interesses foram prejudícados logo sentirão a per-
da e de imediato retiftll'ão terra ou trabalho ou capital da produção des-
sa mercadoria em quantidade tal que o volume dela levado ao mercado
em breve bastará apenas para suprir a procura efe'tiva. Seu preço de mer-
cado, por isso, subirá rapidamente ao preço natural. Isso ocorrerá pelo
menos onde houver liberdade perfeita" (l.c., p. 125).

Essa, a diferença fundamental entre a concepção de Smith e a de Ri-


cardo a respeito do nivelamento no preço natural. A de Smith repousa na
suposição falsa de os 3 elementos determinarem de maneira autônoma o
valor da mercadoria, enquanto a de Ricardo assenta na suposição correta
de ser a taxa média de lucro (dado o salário) que sozinha estabelece os pre-
ços de custo.

2. Teoria de Smith sobre a "taxa natural" do


salário, do lucro e da renda (rent).

"O preço natural varia com a taxa natural de seus componentes, o salá·
río, o lucro e a renda" (1.c .• p. 12·7).

Nos capítulos VIII, IX, X e XI do livro 1 procura Smith determinar


a ta.xa natural dessas "partes constitutivas", salário, renda e lucro, e as va-
riações dessas taxas.
Capftulo VIH: "Dos salários do trabalho".
No intróito do capítulo sobre salário, Smith, abandonando o pris-
ma da concorrência, mostra antes de mais nada a verdadeira natureza da
mais-valia e que lucro e renda são meras formas do valor excedente 77 •
Estabelece a base para determinar a taxa natural do salário, a saber,
o valor da própria força de trabalho, o salário necessário.

77. Nesta tradução, valor excedente =mais-valia.

652
"Um homem ·tem sempre de vívet de seu uabalho, e o salárío tem de
bastar pelo menos para $11Stentá·lo. Na maioria dos casos, o salário tem
até de ser algo maior, do contl:ârio não seria possível aos trabalhadores
constituir familia, e a classe desses trabalhadores não poderia durar além
de uma geração" (Lc., p. 136).

A exposição volta aí a esvaziar-se de sentido, porque ele não se per-


gunta como é determinado o valor dos meios de subsistência necessários,
isto é, da mercadoria em geral. Smith aí, uma vez que se desviou de sua
concepção principal, tinha de dizer: o preço do salário é determínado pe-
lo preço dos meios de subsistência, e este pelo preço do salário. Tendo
suposto antes que o valor do salário está fixado, descreve de maneíra exa-
ta suas oscilações como se revelam na concorrência e as circunstâncias que
provocam essas variações. Isso pertence à parte exotérica de sua obra e não
nos interessa aqui.
[Trata ele em particular do acréscimo, da acumulaçiío do capital,
mas não diz o que a determina, uma vez que essa acumulação só pode ser
rápida quando a taxa de salário é relativamente baixa e a produtividade
do trabalho, alta (nesse caso, elevação do salário resulta sempre de ante·
rior baix~ permanente), ou quando a taxa de acumulação é baua, mas
alta a produtividade do trabalho. No primeiro caso, de acordo com seu
ponto de vista, teria ele de inferir a taxa de salário da taxa de lucro,
isto é, da taxa de salário; no segundo caso, do montante bruto do lucro,
o que porém tomaria a exigir investigações sobre o valor da mercadoria.]
Pretende ele explicar o valor da mercadoria pelo valor do trabalho
como elemento constitutivo. E em contrapartida explica o nível do salá-
rio pela circunstâncía- d.e:

"os salários... não variarem com o preço dos víveres" (p. 149) e de "os
salários, de um lugar para outro, se alterarem mais que o preço dos ví-
veres" (1.c., p. 150).

Na realidade, o capítulo nada encerra de pertinente além da defini-


ção do mtnimo de salário, aliás, do valor da força de trabalho. Por instinto
Smith volve a sua concepção mais profunda para logo abandoná-la, e dessa
maneira mesmo aquela defmição se anula. Pois como determinar o valor dos
meios de subsistência necessários e, portanto, das mercadorias em geral?
Em parte pelo preço natural do trabalho. E como determiná-lo? Pelo valor
das coisas necessárias à vida ou das mercadorias em geral. Um lastimável
beco sem saída. De resto, o capítulo nada contém sobre a questão, o preço

653
natural do trabalho, mas encerra apenas pesquisas sobre a alta dos salários
acima do nível da taxa natural, isto é, na proporção da veloéidade da acumu-
lação do capital, da acumulação progressiva do capital. Investiga então à1J
diversas condições sociais onde isso ocorre e por fim contraria a detenni-
nação do valor da mercadoria pelo salário e a do salário pelo valor das coi-
sas necessárias à vida, ao mostrar que esse não parece ser o caso da Ingla-
terra. De permeio aparece um retalho da teoria malthusiana da população,
pois o salário é determinado pelas coisas necessárias para se manter a vida
e também para se reproduzir a população.
Assim, depois de procurar mostrar que o salário subiu no século
XVIII, em especial na Inglaterra, pergunta se se deve considerar esse fato
''vantajoso ou desvantajoso para a sociedade" (l.c., p. 159). Retorna então
de. passagem a sua concepção mais profunda onde lucro e renda (rent) são
meras frações do produto do trabalhador. Os trabalhadores, diz ele

"constituem de longe a grande maioria da sociedade. Mas nunca se pode


considerar desvantajoso para o todo o que melhora as condições da
maior parte. Por certo, nenhuma sociedade pode ser considerada prós~
pera e feliz se a grande maioria dos membros é pobre e miserável. Ade-
mais, a simples eqüidade exige que aqueles que alimentam, vestem e
alojam todo o corpo da nação tenham no produto do próprio trabalho
participação bastante para se alimentar, vestir e alojar em nível pelo
menos tokrável" (pp. 159, 160}. · ·

Nessa altura chega à teoria da população.

"A pobreza, embora sem dúvida desencoraje, nem sempre impede o ca-
samento. Parece mesmo favorecer a procriação ... A esterilidade, tão fre-
qüente nas mulheres da alta sociedade, é muito rara nas das camadas infe-
riores ... Mas, embora a pobreza não evite a procriação, é por extremo des-
favorável à criação dos filhos. A planta nasce tenra; mas logo murcha e
morre em terra tão fria e clima tão severo ... Toda espécie animal se mul-
tiplica naturalmente na proporção dos meios de subsistência, e nenhuma
pode jamais se multiplicar além desse limite ... Mas numa sociedade civi-
lizada é só nas camadas inferiores do povo que a carência de meios de
subsistência. pode estabelecer limitações à continuidade da propagação
da· espécie humana ... A procura de trabalhadores, como a de qualquer
outra mercadoria, regula necessariamente a produção deles: quandQ esta
anda por demais lenta, acelera-a e, quancto. está por demitis rápida,
freia-a ... " (l.c., pp. 160-163 passim).

No tocante à conexão entre o mínimo de salário e as diferentes con-


dições sociais diz ele :

654
"Os salários pagos a jornaleiros e criados de toda espécie têm de ser tais
que os ponham, uns e outros, em condição de manter a rerpectiva classe,
de acordo com o que exija a procura crescente, decrescente ou estacioná-
ria da sociedade" (da sociedade! isto é, do capital)· (1.c., p. 164).

Mostra então que o escravo é "mais caro" que o trabalhador, porque


este cuida do próprio "desgaste·: enquanto o daquele está "sob administra-
ção de um .senhor negligente ou de feitor desatento" {l.c., p. 164). O tra-
balhador livre "economiza" o fundo para reparar o "desgaste", enquan-
to, no caso do escravo, esse fundo é administrado com desperdício e des-
leixo.

"O fundo destinado a repor ou reparar, se assim cabe dizer, o desgate


do escravo, é de ordinário administrado por um senhor negligente ou fei-
tor desatento. O que tem a mesma finalidade com respeito ao homem
livre, é este mesmo quem gere. Na administração do primeiro inserem-
se naturalmente as desordens que em geral prevalecem na economia do
rico; na do segundo imperam sem dúvida a frugalidade estrita e o cuida-
do parcimonioso do pobre" (1.c., p. 164).

A determinação do mínimo de salário ou do preço natural do trabalho


caracterizà-se pela circunstância de ser ele mais baixo para o assalariado li-
vre que para o escravo. Essa idéia aparece em Smith.

"O trabalho feito por homens livres no fim sai mais barato que o reali-
zado por escravos... 'Por isso, a remuneração liberal do trabalho tanto é
o efeito do aumento da riqueza crescente, quanto a causa do aumento
da população. Queixar-se disso é lamentar-se da causa e efeito necessá-
rios da maior prosperidade pública" (1.c., p. 165).

Smith defende ainda salário alto,

que "incentiva a procriação" e além disso "aumenta a diligência da plebe.


O salário é o estímulo da diligência que, como toda qualidade humana,
melhora na proporção do incentivo que recebe. Um sustento abundan-
te acresce a força física do trabalhador. E a esperança confortável de me-
lhorar sua condição... anima-o a empregar ao máximo essa força. Assim,·
os trabalhadores sempre se revelam mais ativos, diligentes e expeditos,
onde os salários são altos do que onde são baixos" (1.e., p. 166).

Mas, salário alto incita õ trabalhador ao esforço excessivo e à 4estrui-


ção prematura de sua força de trabalho.

655
"'Os trabalhadores, quando obtêm pagamento liberal por peça, são
muito propensos a se esforçar demais e a anuinar a saúde e a consti·
tuição física em poueos anos'"' (pp. 166, 16n "Os empresários, se ou-
vissem sempre os ditames da 1azão e da humanidade, teriam r;:om mais
freqüência de moderar que de incitar os esforços de muitos de seus tra-
balhadores" (p. 16 8).

Combate ademais a idéia de que "algo melhor que o sustento comum


tome certos trabalhadores ociosos" (1.c., p. 169).
Investiga então se é verdade que o trabalhador é mais preguiçoso nas,
fases de abundância que nas de carência, e qual em geral a relação entre'
salário e preço dos meios de subsistência. Aí a incoerência retoma.

''O preço em dinheiro do trabalho é necessariamente regulado· por dois


fatores: a procura de trabalho e o preço das coisas correspondentes às
necessidades e comodidades da vida ... O preço em dinhcixo do trabalho
é determinado pelo que é necessário para se comprar essa quantidade"
(de coisas correspondentes ãs necessidades e comodidades da vida)
(l .c., p. 175).

A seguit investiga porque - em virtude da procura do trabalho - o


salário pode subir nos anos de abundância e cair nos de escassez (pp. 1 76
e seguintes).
Nos bons e maus anos, as causas de alta e de baixa se;cômpensam.

"A escassez de um ano de carestia, ao diminuir a procura de trabalho,


tende a baixar-lhe o preço, enquanto tende a elevá.lo, o preço alto dos
meíos de subsistência. Ao revés, a ab~tança de um ano de barateza, ao
a.crescer a procura de trabalho, tende a elevar-lhe o preço, enquanto o
preço baixo dos meios de subsistência tende a ·baixá-lo. Nas variações
normais dos preços dos meios de subsistência, essas duas causas opostas
parecem contrabalançar-se. e·provável que aí esteja em parte a razão
por que os salários, seja onde for, são mais estáveis e constantes que o
preço dos meios de subsistência" (p. 177).

Por fim, depois de todo esse ziguezague, de novo contrapõe ao salá-


rio coroo fonte de v-.tlor das mercadorias, sua concepção prinútiva, mais
profunda, de ser o valor das mercadorias determinado pela quantidade de
trabalho; e se o trabalhador, nos bons anos ou com o incremento do capi-
tal, recebe mais mercadorias, também produz muito mais mercadorias, ou
seja, a mercadoria individualizada contém menor, quantidade de trabalho.
Pode portanto receber quantidade maior de mercadoria com menor valor
e assim, esta· é a conclusão ímplfoíta, pode o lucro aumentar apesar de sa-
lário absoluto ascendente.

656
"O acréscimo do salário aumenta necessariamente o preço de muitas
mercadorias ao acrescer aquela parte do preço a qual rereduz a salário,
e com isso leva a decréscimo do consumo delas no país e no exterior.
Todavia, a mesma causa que eleva o salário, a saber, o ac1éscirno do ca-
pital, tende a aumentar as aptidões produtivas do 4aballio e capacita
quantidade menor dele a produzir quantidade maior de pmduto." Isso
decorre da divisão do trabalho, do emprego de maquinaria, de inven-
ções etc... "Há por isso inuitas mercadorias que, em conseqüência dessas
melhorias, se produzem com muito menos trabalho, que antes, e assim
o preço elemdo do trabalho é mais do que compensado pela redução
de sua quantidade" (pp. 177, 17 8).

O trabalho é melhor pago, mas há menos trabalho contido na mer-


cadoria individualízada e portanto menos a pagar. Assim, Smith permite
que sua teoria correta - a de ser o valor da mercadoria detenninado peta
quantidade de trabalho nela contida - anule ou ·antes paralise, contraba-
lance sua idéia errada de o salário, como elemento constitutivo do valor,
detenninar o valor da mercadoria.
Capftulo IX: Dos lucros do capital.

Ca~e aí portanto elucidar a taxa natural do segundo elemento que


determína e constitui o preço natural ou o valor das mercadorias. Exa-
minar, mais adiante, o que diz Smíth sobre a causa da queda da taxa de
luí:T'O (pp, 179, 189, 190, 193, 196, 197etc.)18
Smith aí envolve-se em dificuldades. Diz que determínar a "taxa
média" do salário já equivale a encontrar a "tax:r usual do salário" (p. 179),
a taxa realmente dada do salário. "Mas, mesmo isso é dif(cil de obter no
tocante aos lucros do capital" (p. 179). Posta de lado a boa ou má sorte
do empresário, "ess~ lucro é influenciado por toda variação de preço das
mercadorias" (p. 180),-· quando o propósito é justamente detenninar o
preço natural dessas mercadorías pela taxa natural do lucro, um dos ele-
mentos constitutivos do "valor". Isto já é difícil num 6nico ramo para
um capitalista apenas.

"Averiguar a taxa média de lucro de todos os diferentes ramos em ati-


vidade num gnmdereino tem de ser muito mais difícil" (p. 180).

Mas pode-se formar uma idéia dos "lucros médios do capital" "a
partir do juro do dinheiro":

78. Ver neste volume pp, 868-869, 902 e 903.

657
"PÓde..se estabelecer a max1ma: onde é possível obter muito com a
aplicaçaõ do dinheiro, muito se dará em
regra po1 seu uso, e onde pou-
co se pode obter com essa aplicação, de ordinário pouco se dara por
ele" (pp. 180, 181).

Smith não diz que a taxa de juro determina a taxa de lucro. Diz ex-
pressamente o contrário. Mas, para taxa de juro em diferentes épocas há
registros que faltam para taxa de lucro. As taxas de juro são portanto
indicadores pelos quais se pode estimar o nível aproxímado da taxa de
lucro. Mas a tarefa não era comparar o nível de taxas de lucro diferentes,
dadas, e sim determinar o nível natural da taxa de lucro. Smith desvia-
se para urna pesquisa acessória sobre o nível da taxa de juro em diferen·
tes épocas, o que não interessa ao problema que se propôs tratar. Exami-
na, grosso modo, diferentes épocas na lnglateua, compara-as com dados
da Escócia, França, Holanda e descobre que - excetuadas as colônias
americanas -

"é raro alguma vez se combinarem S11l4rios altos e taxas altal de lucro.
exceto nas circunstâncias ~eculiares das novas colônill!!" (p. 187).

Smith aí já procura de maneira aproximada, com~ Ricardo, e até


certo ponto melhor, explicar os lucros altos:

"Colônias novas devem sempre tet, por algum tempo, maior carência
de capital em relação à extensão do território e ser mais despovoadas
em relação ao montante do capital, quando compà.radas com a maioria
dos outros países. Têm maís terra que capital pa:ra cultivá-las. Por isso,
o que dispõem 9l:J se aplica ao cultil'O da te"a maú flrtil e melhor si-
tuada nas proximidades da costa e ao longo das margens dos rios nave-
gáveis. Essa terra também é comprada, com freqüência, a preço abaixo
mesmo do valor de seu ptoduto natural." (De fato, nada custam por-
tanto.) "Capital empregado na compra e melhoria dessas terras tem de
dru: lue;ro muito grande e, e(ll conseqüência, permitir o pagamento de
juro muito alto. A acumulação rápida de capital numa empresa tão
lucrativa capacita o plantadOJ: a aumentu os braços com 1apídez maior
que os que pode encontrar numa colônia nova.· Os.que pode encontrru:
são por im temunerados de maneira muito liberal. A medida que a co-
lónÍil se dese11VQ/ve, reduzem-se gradativamente 011 lucros do capim/.
Quando estiverem por completo ocupadas as terras mais férteis e melhor
situadas, menor lucro se pode obter pelo cultivo das que são inferiores
em fertilidade e localização, e menos juro se pode conceder ao capital
assim aplicado. Por isso na maioria de noS$3$ colônias ... houve no de·
curso do século atual redução considerável na taxa de lucro" (pp. 187-
189).

658
Ai está, embora com argumentação dife1ente, uma das bases da ex-
plicação ricardiana sobre a queda do lucro. Em suma, Smith aí explica
tudo pela concorrência entre os capitais: com o acréscimo destes, o lucro
cai; com o decréscimo, sobe; em conseqül!ncia; o salário sobe ou desce,
inversamente.

"A diminuição dos capitais da socie4ade ou dos fundos destinados a


sustentar a indústria, ao baixar os salários, elevll os lucros do capital e
em conseqüência o juro do dinheiro. Ao caírem os salários, os proprie-
tários do capital restante na sociedade podem levw: suas mercadorias
ao mercado a custo menor que o anterior; e urna vez que agora menos
capital se emprega para supril o mercado, podem vendê-las mais caro"
(pp. 191, 192).

Fala Smith então sobre a taxa mais alta possível e a mais baixa pos-
sível.

"A taxa mais alta" é a que "do preço da maior parte das mercadorias
absorve tudo o que deveria cabeJ à renda da terra, e deixa apenas o bas-
tante para pagar o trabalho de p1epa.rá-las e levá-las ao mercado, de acor-
do com a taxa mais baixa a que, s~ja onde for, se possa pagu o t1aba-
lho, isto é, no nível da nma subsistência do trabalhador" (pp. 197, 198).
"A mais ball:a taxa usual de lucro tem sempre de ser algo mais que o
suficiente para compensar as perdas eventuais a que se expõe todo em-
prego de capital. Esse excedente apenas é que representa lucro puro ou
líquido" (p. 196).

O próprio Smíth qualifica de fato o que diz sobre a "taxa natural


de lucro":

"Os comerciantes na Grã-Bretanha consideram o juro em dobro lucro


bom, moderado, justo. Por esses tenÍl.os nada mais entendo que lucro
comum e usual" (p. 198).

E na verdade Smith não chama esse "lucro comum e usual" de mode-


rado nem de justo, mas dá-lhe o nome de "taxa natural de lucro". Todavia,
não nos diz absolutamente o que esse lucro é ou como é detennínado, em-
bora o propósito seja determinar, por meio dessa "taxa natural de lucro",
o "preço natural" da mercadoria.

"Nos países que estão avançando rapidamente para a .riqueza, a baixa


taxa de lucro pode compensar os altos Sahí.rios no preço de muitas mer-
cadori~ e capacitá-los a venderem-nas tão barato quanto os vizinhos me-
nos florescentes, cujos salários são talvez ínferi01es" (p. 199).

659
Lucro baíxo e salário alto não estão àí em oposição recíproca, mas
a mesma causa - o incremento rápído ou acumulação de capital - gera
ambos. Os dois entram no preço, constituem-no. Por isso, se um é alto, e
o outro baixo, o preço permanece o mesmo etc.
Smith aí considera o lucro mera sobrecarga, pois diz no fim do ca-
pítulo:

"Na realidade lucros altos tendem a elevar o preço do produto muito


mais que saláJios altos" (p. 199). Por exemplo, se os $alários de todos
os trabalhadores ocupados na indústria de linho subirem de 2 pence
por dia, isto elevará o preço da "peça de linho'' apenas de tantas vezes
2 pence, ·quantos forem os trabalhadores empregados "multiplicados
pelos dias de trabalho nela aplicados. Do preço da mcrcadoria, essa par·
te que se reduz a sl!lirio sobe, através de todos os diferentes estádios
da indústria, somente na razão aritmética dessa alta do salário. Mas, se
os lucros de todos os diversos empregadores desses trabalhadores subi-
rem de 5%, a parte do preço da me1cadoria a qual.se reduz a lucro ele-
va-se, através de todos os diferentes estádios da indústria, na raiifo geo·
métrica dessa alta de lucro... A alta de Wrío atua na elevação do pre-
ço das mercadorias do mesmo modo que o juro simples na acumulação
da dívida. A alta do lucro opera ~mo o j~ro composto" (pp._200, 201).

No fim desse capítulo, Smith nos diz de quem obteve a noção comple-
ta de ser o preço da mercadoria - ou seu valor - formado ·pelos valores do
salário e do lucro: dos amigos do comércio 79 , os crentes praticantes da con-
corrência.

"Nossos comerciantes e patrões manufatureiros queixam-se muito dos


efeiios nocivos dos salários altos no sentido de elevar os preços, reduzin·
do a venda de suas mercadorias no país e no exterior. Nada dizem no
tocante aos efeitos p.rejudiciais dos lucros altos. Silenciam a respeito dos
efeitos perniciosos dos ganhos próprios. Só se queixam dos alheios"
(p. 201).

CapítukJ X: "Dos salários e dos lucros nos diversos empregos do


trabalho e do capital':
O capítulo envolve-se com o pormenor, isto é, trata da concorrência e
é muito bom oo gênero. Totalmente exotérico.
[Trabalho produtivo e improdutivo:

79. Expressão de Fourier (amis du commerce):

660
'~A loteria do advogado está muito longe de ter eqüidade perfeita. E, co-
mo muitas outras profissões liberais e honrosas, é sem dúvida mal re-
compensada do ponto de vista do ganho pecuniário" (t. l, l.I, cap. X,
pp. 216, 217).

De maneira semelhante diz dos soldados:

"O soldo está abaixo do salário do trabalhador comum, embora suas fa.
digas no serviço diário sejam muito maiores" (t. I, U, cap. X, p. 223).

Dos marinheiros da força naval;

"A habilidade e a presteza dos marinheiros são muito superiores às de


QUa.$e to.dos OS OUUOS artífices, e s_ua. vida é nm desemolar permanente
de privações e perigos... Seu salário não é maior que o dos trabalhadores
oomuns, o qual regula a taxa de salário dos marinheiros" (t. 1, 1.1, cap.
X, p. 224}.

Irônico:

"Seria sem dúvida imperti.Jlente comparar um coadjutor eclesiástico ou


capelão com um assalariado de qualquer ofício comum. Todavia., pode-
·se considerar com razão que possuem o mesmo caráter o pagamento de
um coadjutor ou capelão e a remuneração de um assalariado" (t. I, 1.l,
cap. X, p. 271).

Qualifica expressamente de mal pagos os "homens de letras", em


virtude de seu número excessivo, e lembra que, antes de se inventar a im-
prensa, "estudante e mendigo" eram a mesma coisa, o que parece estender
em certo sentido aos ho~ens de letras.]
O capítulo está cheio de observ-.içlies argutas e comentários impor-
tantes.
"Na mesma 50ciedade ou região, as taxas médías e ordinárias de lucro
nos diferentes ramos de aplicação do capital estarão muito mais próxi·
mas do mesmo nível que os salários das diferentes espécies de trabalho"
(1.c., p. 228).
"A expansão do mercado, ao dar emprego a capitais maiores., ~duz o lu·
cro visfliel; mas, ao requerer suprimentos de maior distância, eleva o pre-
ço de custo. A redução de um parece contrabalançar mais ou me.nos a
elevação do outro, na maioria dos casos" (o que se dá em artigos como
pão, carne etc.) (Lc., p. 232).
"Nas pequenas cidades e aldeias, em vutude da /imitação do macado, o
comérdo nem sempre pode expandir-se à medida que se expande o ca·
pital. Por isso, nesses lugares, a taxa de lucro de determinada pessoa po-
de ser muito alta, mas a s.oma ou montante global do lucro e, em con-

661
seqüência, a acumulação anual nunca podem set muito grandes. Ao re-
vés, nas gi.1mdes cidades, o comércio pode crescei à medida que se ex-
pande o capital, e o credito de um homem parcimonioso e bem sucedi·
do aumentar muito mais rapidamente que seu capital. Seu comércio se
expande na razãO do .montante dos dois" (l .c., p. 2n).

No tocante aos fiilsos dad'ls estatísticos sobre salários, digamos nos


séculos XVI e XVII etc., com razão observa Smith que os salários aí eram
apenas, por exemplo, salártos de lavradores que, quando não ocupados
em volta de suas cabanas ou a serviço dos senhores (que lhes davam casa,
"uma pequena horta, erva fonageira bastante para uma vaca e talvez um
ou dois acres de terra arável ruim" e um salário muito escasso)

"punham seu tempo supérfluo à disposição de qualquer pe!l8oa por re-


munei:ação muito pequena e trabalbavall) por salários menores que os
outros trabalhadores" (p. 241).
"Todavia, a remuneração didritl ou :remaNJt parece ter síoo considerada
o salário global poi muitos escritores, que no passado coletaram os pie·
ços do trabalho e os dos meios de subsistência e aos quais aprouve apre-
sentá-los em níveís espantosamente baixos" (p. 242).

Faz com acerto uma observação geral:

"Esse nível de igualdade no total das vantagens e de~antagens dos dife·


rentes empregos de trabalho e de capital s6 pode haver nos que são a úní-
ca ou principal ocupação daqueles que os exercitam" {p. 240).

Aliás, Steuart já desenvolve ísso muito -bem80 , em particular no to-


cante aos salários agrícolas, logo que o tempo se toma precioso.
No tocante à acumulação do Ctlpital nas cidades durante a Idade Mé-
dia observa Smith com raião, nesse capítulo, que é devida sobretudo à ex-
ploração do campo (pelo comércio e pelos ofícios). (Ainda havia os usurá-
rios e mesmo os grandes financistas; em suma, os comerciantes do dinheiro.)

"Em conseqüência desse; regulamentos, cada grupo (dentro das cida-


des corporativas} era obrigado a comprar, dentro da cidade, as meica-
dorias que requeria de outro algo mais caro do que, de outro modo,
poderia obtê-las. Mas, em recompensa, podia vender as próprias merca-
dorias no mesmo nível de carestia. Dessa maneira, até aí tudo dava no

80. Sir Jamc~ Stcuart, An inquiry into the princíples of politú:al economy, Du-
blín, 1770, voL 1, p. l 71. Ver Marx. Grundrisse der Kritik der politischen Okanomil:.
Berlim. 1953. p. 742.

662
mesmo,. como se diz. No comércio entre os diferentes grupos dentro
da cidade, nenhum deles perdia com esses regulamentos. Mas todos
eles eram grandes ganhadores nos negócios que faziam com o campo.
E nesses negócios consiste o comércio todo que sustenta e enriquece
toda cidade. Toda cidade retira do campo a subsistência inteira e to-
dos os materiais pua pxodução urbana. Paga por essas coisas de duas
maneiras p:ríncipais: primeiro, retorno ao campo de parte das maté-
riat-primas, beneficiadas e manufaturadas, quando o preço delas actes·
ce doa SDlários dos tTabalhadorea e dos lucros dQS me1tre1 ou emprega-
dcwes imediatos; segundo. ren.tessa para o campo de parte dos produtos
primários e manufaturados que a cidade recebeu de oul:Ias regiões ou
de lugares mais dístantes da mesma regíão, com que, de maneira seme-
lhante, o preço original dessas mercadorias acresce dos salários dos
transportadores ou marinheiros e dos lucros dos comerciantes que em-
pregam e1se11 trabalhadores. O que rende o primeiro dos dois ramos
de atividade é o ganho que a cidade obtém com suas manufaturas. O que
rende o . segundo representa o ganho do comércío íntemo e externo. Os
salários dos trabalhadores e os luctos dos diversos empregadores formam
a soma global que os dois ramos ganham. Po1 isso, todas as regulamen-
tações que conl:Iibuam para elevar os soJdl'ios e lucros acimo do ntvel
que de ordinário preJ11Jleceria, capacitam a cidade a comprar com quan-
tidade menor de trabalho o produto de quantidade maior de trabalho
do campo."

[Smith aí retoma portanto à determinação correta do valor (1.c.,


t.I, LI, cap. X, p. 259), a determinação do valor pela quantidade de traba-
lho. Citar isso como exemplo ao tratar de suas idéias sobre mais-valia. Os
preços das mercadorias que a cidade e o campo intercambiam, se represen·
tarem quantidades iguais de trabalho, serão iguais aos correspondentes valo-
res. Lucro e salário dos dois lados do intercâmbio não podem determinar
esses valores, mas a divisão desses valores determina lucro e salário. Por is-
so, Smith acha também que a cidade, ao trocar quantidade menor de tra-
balho por quantidadê maior de trabalho do campo, consegue, em relação
a este, lucro excedente e salário excedente. Isso não ocorreria, se ela não
vendesse ao campo mercadoria acima do valor. Nesse caso "preços e salá-
rios" não se elevariam "acima do nível que de ordinário prevaleceria': Pre-
ço e salário portanto, se forem o que naturalmente devem ser, não detenní-
narão o valor da mercadoria, mas serão por ele determinados. Lucro e salá-
rio entã'o só podem surgir da repartição do valor dado da mercadoria, o qual
os antecede; esse valor não pode ser obtido nem resultar de lucros e salários
que o pressupõem.]

"Lucros e salários proporcionam aos comerciantes e axtesãos vantagem


$Obre os donos das terras, sobre os arrendatários e os trabalhadores agrí·
colas, e destroem a igUaldade natural que, não fora isso, existiria no co-
.mércio que se processa entre a cidade e o campo. A totalidade do produ-

663
to anual do trabalho da $Clc/edade se reparte todo ano entre esses dois
setores da população. Por meio dessas regulamentações" (urbanas), "os
habitantes da cidade retiram dele mais do que lhes caberia normalmente,
e a população do campo, menos. O preço que a cidade realmente paga
pelos alimentos e matérias-primas importados por ano é a quantidade
anual que expoi:ta, das manufaturas e de outras mercadorias. Quanto mais
catO Pendê-la, tanto mais barato pagará pelo que importar. A ativídade
urbana toma-se mais vantajosa, e a do campo, menos" (pp. 258-260).

Assim, de acordo com a própria exposição de Smith, se as mercado-


rias urbanas e as rurais fossem vendidas na proporção da quantidade de tra-
balho que cada úma encerra em face da outra, seriam vendidas por seus
valores, e o lucro e o salário de ambos os lados não poderiam portanto de-
terminar esses valores, mas seriam detenninados por eles. O nivelamento
dos lucros - diferentes em virtude da composição orgânica diversa dos capí·
tais - é matéria que não cabe aqui, pois iguala os lucros, em vez de neles
introduzir diferença.

"Os habítantes da cidade, uma vez que estão juntar num lugar .1'6, podem
associar-se com facilidade. Em conseqüência, as atividades mais insigni-
ficantes em cidades organizaram-se em corporações, neste_ ou naquele
local" (p. 261}. "Os habitantes do campo, dispersos em lugares distan-
tes, não podem associar-se com facilidade. Nunca se organizaram em cor-
porações, e entre eles nunca se impôs o espúito corporativo. Nunca se
consídcrou necessário um tempo de apiendizado cori\ o fim de preparar
alguém para a agricultw:a, a atividade principal do campc" (p. 262}.

Nessa altura, Smith fala das desvantagens da ..divisão do trabalho"


O camponês emprega no trabalho maís inteligencia que o trabalhador ma·
nufatureiro subordinado à divisão do trabalho.

"A condução de tarefas que se modificam com toda variação do tempo e


muitas outras eventualidades, requer maior discemímento e perspicácia
que a oonduçâo de tarefas que sempie são as mesmas ou quase as mes·
mas" (p. 263).

A divisão do trabalho desenvolve a produtividade social ou a produti-


vidade do trabalho social, mas às custas da capacidade produti11a geral do
trabalhador. B por i~o aquela ascensão da produtividade social o confron-
ta como produtividade elevada niio de seu trabalho e sim da potência que
o domina, o capital. Se o trabalhador urbano é ma.is desenvolvido que o
rural, deve-se isso apenas à circunstância de seu modo de trabalho permi-
tir-lhe viver em sociedade, enquanto o do outro o faz viver em contato di·
reto com a natureza.

664
"A superioridade que a atividade manufatureira das cidades tem por
toda parte na Europa sobre a ativídade dos ca.rnpos, não decorre por
inteiro das corporações e de suas leis. Apóia-se em muitos outtos regu-
iamentos. Visam o mesmo propósito os altol: direitos sobre os produtos
da manufatura estrangeira e sobre todas as mercadorias importadas por
comerciantes estiangelros" (p. 265). Esses "regulamentos assegu1am-
nas" (as cidades) "contra a conconência de estrangeiros" (l.c.).

Ternos aí uma intervenção que não é mais da burguesia urbana e sim


da burguesía que - configurada em corpo da nação ou em terceiro estado
das cortes do Império ou em Câmara dos Comuns - já legísla em escala
nacional. O que é específico da burguesia urbana, dirigido contra o cam-
po, são os impostos e direitos lançados sobre os produtos às portas da ci-
dade, os írnpostos indiretos em geral que se originaram nas cidades (ver
H\illmann), enquanto os diretos têm origem no campo. Poderia parecer.
que os impostos sobre os produtos fossem, por exemplo, um tributo que a
cidade impusesse indiretamente a si mesma. O camponês tem de adiantá-lo,
mas consegue reembolsá-lo no preço do produto. Contudo, isso não ocor-
r~ na Idade Médía. A procura dos seus produtos, até onde o camponês os
transformava em mercadoria e dinheiro, fica na cidade limitada em regra
compulsorfamente à área dentro do domínio urbano, de modo que não
tinha ele o poder de elevar o preço desses produtos pelo montante total
da tributação urbana.

"Na Grã-Bretanha, a superioridade da atividade econômica urbana so-


bre a rural parece ter sido muito maior no passado que no presente. Os
salários do trabalho ru1al se aproximam daqueles do trabalho manufa-
tureiro, e os lucros do capital empregado na agricultura se aproximam
dos do -capital comercial e manufatureiro, e, pelo que se diz, bem mais
do que o fizeram no século 11J1terior" (XVll) "ou no começo do atual"
(XVIII). "Essa alteração pode ser considerada necessária, emboza con-
seqüência bem tardia do fomento extiao1dinálio à atividade econômica.
n11S cidades. Com o tempo, o capital nclas acumulado toma-se tão gran-
de que não pode sei: emprega.do com o antigo lucro naquele ramo que
lhe era p16prio. Esse 1amo tem limites como qualquer outra; e o acrés-
cimo de capital, ao acrescer a concorrência, tem de reduzir o lucro.
A baixa do lucro na cidade empurra o capital para o campo onde ele, ao
ctlar nova proCUia de trabalho agrícola, força a subida d0$ saláJ:ios oor-
respondentes. Espraia-se então, por assim dizer, pela. !!Uperftcie da terra
e, ao ser -empregado na agricultura, é em parte recuperado pelo campo,
a cujas custas, na origem, acumulou-se em grande escala nas cidades"
(pp. 266, 267).

665
No capftulo XI, livro I procura então Smith determinar a taxa natural
da renda (rent), o terceiro elemento constitutivo do valor da mercadoria ..
Trataremos dessa matéria mais tarde, e antes retornaremos a Ricardo.
De acordo com o ci.ue precedeu ficou evidente; A. Smith identifica o
preço natural ou preço de custo da mercadoria com o valor dela, depois de
abandonar a concepção correta de val.or e de a substituir pela ci.ue emana
e provém irresistível das aparências da competição. O que aparece na con-
corrência regulando os preços de merc:ado não é o val.or, é o preço de custo,
na qualidade por assim dizer de preço imanente, valor das mercadorias. Mas
esse próprio preço de custo nela aparece configurado pela taxa média dad<!-
do salário, do lucro e da renda (rent). Por isso, procura Smith estabelecer
essa taxa de maneira autônoma, sem depender do valor da mercadoría, ou
melhor, como se fo~e fator do preço natural. Ricardo, cujo interesse prin-
cipal era refutar essa aberração smithiana, aceita-lhe o result.ado necessário -
a identidade dos vak>res com os preços de custo -, embora impossível para
ele no plano lógico.

666
Capítulo XI
Teoria da renda de Ricardo

1. Condições históricas para a formação da


teoria de renda de Anderson e Ricardo.

Já tratamos dQ principal a propósito de Rodbertus. Agora, ainda algu-


mas coisas a respigar.
Para começar, algumas observações de ordem histórica:
Ricardo tinha em vista, antes de tudo, o período de 1 770-181 S, com
que até certo ponto conviveu e no qual os preços do trigo subiram de manei-
ra constante. Anderson tinha em mira o século XVIII e escreveu nos fins
dele. Os preços caíram até o meio desse século e subiram do meio para o
fim. Por isso, a lei descoberta por Anderson não tem relação alguma com
produtividade decrescente da agricultura ou encarecimento nonnal (para
Anderson, inatural) do produto. Para Ricardo existe essa relação. Anderson
acreditava que a revogação das leis sobre cereais (naquele tempo prêmios
de exportação) causara a ascensão dos preços na segunda metade do século
XVIII. Ricardo sabia que a introdução das leis sobre cereais (1815) vísava
impedir e até certo ponto tinha de impedir a queda dos preços. Para ele im·

667
portava acentuar que a 1ei da renda fundíária entregue a si mesma - dentro
de determinado território - tinha de motivar recurso a terras menos férteis,
portanto, encarecimento dos produtos agrícolas, crescimento da re[lda às
custas da indústria e da massa da população. E aí Ricardo tinha razão prá-
tica e historicamente. Anderson, ao contrário, sustentava que as leis dos
cereais (também defende o imposto de importação) têm de incentivar o
desenvo1vimento regular da agrícultura dentro de determina.do território,
que é mister garantia para e~e desenvolvimento regular e que assim essé
desenvolvimento progressivo por si mesmo, em virtude da lei que descobriu
da re-nda fundíária, tem de gerar acréscimo da produtividade da agricultura
e, por isso, queda dos preços médios do prnduto agrícola.
Mas ambos partem da concepção que soa tão estranha na Europa Con-
tinental: (1) não existe propriedade fundiária que impeça o investimento
desejado do capital em terra; (2) vai-se das melhores para as piores terras
(para Ricardo, isso ê absoluto, excetuadas as interrupções decorrentes da
atuação em contrário da ciência e da indústria; para Anderson, relativo, o
pior terreno transforma-se por sua vez em melhor; (3) existe sempre capi-
t~, massa bastante de capital, para se aplicar na agricultura.
No tocante a (l) e (2) deve parecer muito estranho aos europeus do,·
Continente que no país onde jmaginam que a propriedade feudal.. se mante·
ve de maneira mais obstinada, partam os economistas, e tanfo Anderson.
quanto Ricardo, da idéia de não existir proprieda~e fundiária. E isso tem.
expliçação:
primeiro: a peculiaridade da "lei inglesa de cercamento das·terras co-
muns", a qual não tem analogia alguma com ~ distríbuiÇão das terras co-
muns no Continente;
segwulo: nenhures no mundo, a produção capitalista, desde Henri-
que VII, amoldou tão brutalmente as relações tradicionais da agricultura,
adaptou e subordinou as condições desta a suas exigências. Nesse domínio,
a Inglaterra é o país mais revolucionário do mundo. Foram implacavelmen-
te liquidadas todas as condições historicamente transmitidas que contrarias-.
sem os requisitos da produção capitalista no país ou nfo lhes correspondes-
sem - a saber, a situação das comunidades rurais, as próptj.as comunidades
rurais, os locais habitados pela população agrícola, essa própria população,
os centros originais das culturas, as próprías culturas. Para os alemães, por
exemplo, as condições econômicas se apresentam determinadas por cir-
cunstâncias tradicionais referentes a limites territoriais, locais dos centros
econômicos, aglomerados fixos de população. Para os ingleses, o capital
criou progressivamente as condições históricas da agricultura, a partir do

668
fim do século XV. "Esvaziar as terras" ("deuring of e:~tates"), ex.pressão
técnica usual no Reino Unido, 1:1ão se encontra em nenhum país da Europa
Continental. Mas que significa esse "esvaziar as terras."? Que não há a me-
nor consideração pela população estabelecida, que é enxotada; pelas aldeias
existentes, que são arrazadas; por edifícios rurais, que são demolidos; por
espé-eíe alguma de agricultura, que é transformada de um golpe, converten-
do-se, por exemplo, lavoui:a em pastagem. E que, assim, não se aceita ne-
nhuma das condições econômicas como são tradicionalmente; todas são
historicamente produzidas de modo que tenham de servir ao emprego
mais rentável do capital. Até aí mio existe portanto propriedade fundiá-
ria, que deixa com o capital - o arrendatário - a iniciativa de administrá-
la, urna vez que só lhe importa o rendimento em dinheiro. Um proprietá-
rio de terras pomerano; com a mente condicionada· pelos limites ancestrais
de suas terras, com os centros econômicos e conselhos agrícolas etc., pode,
por isso, assombrar-se ao ve1 a concepção "não-histórica" sustentada por
Ricardo a respeito do desenvolvimento das condições agrícolas. Com isso
mostra apenas que sua ingenuidade confunde as condições pomeranas
com as jnglesas. Mas não se pode dizer que Ricardo, que parte das condi·
ções inglesa.">, seja tão limitado quanto o fazendeiro pomerano que racio·
cina dentx.o das condições pomeranas. As condições inglesas são as únicas
onde a moderna propriedade fundiária, isto é, a propriedade das terras mo-
dificada pela produção capitalista, teve desenvolvimento adeqúado. Aí a
concepção inglesa é a clássica para o modo de produção moderno, capi-
talista. A concepção pomerana, ao contrário, julga as relações desenvolvi-
das segundo forma historicamente inferior, ainda inadequada.
E mais: a maioria dos censores continentais de Ricardo partem mes-
mo de condições em· que o modo capistalista de produção, de maneira ade-
quada ou inadequada, ainda não existe. E como se um mestre de uma
corporação medieval quisesse aplicar em sua economia corporativa, com
casca e tudo, as leis de Smith, que pressupõem a livre concorrência.
O pressuposto da marcha dos melhores para os piores solos - de
caxáter relativo, conforme o nível eventual de desenvolvimento da produ-
tividade do trabalho, como quer Anderson, e não absoluto como quer
Ricardo - só podia surgir num país como a Inglaterra onde o capítal, num
território relativamente pequeno, já tinha operado de maneira tão impla-
cável e procurado há séculos adequar, sem compaixão, a suas necessida-
des, todas as condições tradícíonais da agricultura. Só podia surgir portan·
to onde a produção capitalista na agricultura não é de origem recente e
nem luta contra nenhuma tradição antiga, como sucede na Europa Con-
tinental.

669
A visão que os ingleses adquiriram das colônias foi outro fator. Já
vimos que 81 já se encontra na obra de Smith - com referência direta às
colônias - a base de toda a concepção ricardiana. Nessas colônias - e em.
especial nas que só produziam artigos para o comércio como fumo, algo-
dão, açúcar etc. e não os produtos comuns para alimentação - onde os
colonos, de antemão, não procuravam subsistência, mas estabeleciam um
negócio, o que decidia, dada a localizaç.ãi> geogrdfica, era a fertilidade da
terra, e dada a fertilidade, a localização geográfica. Não procediam como
os germanos que se estabeleceram na Alemanha para nela construir o lar,
mas como pessoas que, detenninadas pelos motivos da produção burgue·
sa, queriam produzir mercadorias por critérios determinados, antes de
mais nada, não pelo produto e sim pela venda do produto: A circunstân-
cia de Ricardo e outros escritores ingleses transferirem esses critérios - pro-
cedentes de homens que já eram eles mesmos o produto do modo de pro-
dução capitalista - das colônias para o palco da história mundial e c.onsi-
derarem o modo capitalista de produção condição prévia da agricultura
em geral, como o era para aqueles colonos, explica-se pelo fato de reen-
contrarem nessas colôrúas e de maneíra mais evidente, sem luta contra
refações tradicionais e em toda pµreza portanto, o mesmo domínio da
produção capitalista na agricultura, domínio que salta aos olho~ por toda
parte no próprio país. Por isso, é bem compreensível que um ãlemão, pro-
fessor ou fazendeiro - pertencente a um país que se distingue dos outros
pela falta absoluta de colônias - ache ••errada,. tal concepção ..
Por fim, o pressuposto do fluxo contínuo do cap~tal de -um ramo
para outro. esse pressuposto fundamental de Ricardo, significa nada mais
que o pressuposto do domínio da produção capitalista desenvolvida. Onde
esta ainda não se estabeleceu, não existe esse pressuposto. Um fazendeiro
pomerano achará, por exemplo, estranho que Ricardo nunca tenha suspei-
tado, nem qualquer escritor inglês, da pOSSibilidade de faltar capital na agri·
cultura. Os ingleses queixam-se, por certo, da carência de terra em relação
ao capital, mas nunca da carência de capital em relação à terra. Apoiados
na primeira circunstância procuram Wakefield, Chalmers etc. explicar
a queda da taxa de lucro. À segunda nenhum escritor inglês faz referência;
Corbet observa, como fato evidente por si mesmo, que sempre sobra capi-
tal em todos os ramos. Ao revés, se pens<trmos rtas condiÇêíes alemãs, nas
dificuldades dos fazendeiros para arranjar dinheiro emprestado - pois em
regra é o próprio dono e não uma classe capitalista de todo independente

81. Ver, neste volume, p, 658 e 659.

670
dele, quem cultiva a terra, toma-se compreensível, por exemplo, o espanto
de Rodbertus sobre "a ficção ricardiana de que o suprimento de capital é
regulado pelo desejo de investi-lo" (p. 211). Os ingleses sentem a falta de
"campo de ação", oportunidade de investir a reserva existente de capital.
Mas, na Inglaterra, "desejo de encontrar capital" para "investir" não existe
para a única classe que tem capital para empregar - a classe capitalista.
Esses "desejos de capital" são pomeranos.
O que os autores ingleses objetavam a Rícardo não era que não exis·
tisse capital na quantidade desejada para investimentos particulares e sim
que o refluxo do capital da agricultura encontrasse obstáculos técnicos
específicos etc.
Assim, a censura crítico-continental a Ricardo é de espécie que só
mostra o nível inferior das condições de produção donde partem aqueles
sábios.

2. A explicação errônea. de Ricardo sobre os


preços de custa repercute em sua teoria da
renda.
Direto ao assunto,
De início, para ver o problema em si, temos de abandonar por com-
pleto a renda diferencial, a única existente para Ricardo. Por renda diferen-
cial entendo a diferença de magnitude da renda - a renda maior ou menor,
decorrente da fertilidade diversa dos tipos de terra. (Dada igual fertilidade,
a renda díferencial só pode originar-se da magnitude diversa do capital
aplicado. Tal caso não.existe para nosso problema, não o atinge.) Essa ren-
da diferencial corresponde apenas aos lucros suplementfl1'es que - dado o
preço de mercaâ-0, ou melhor, o valor de mercado de cada ramo industrial,
fiação de algodão, por exemplo - são obtidos pelo capitalista cujas con-
dições· de produção são melhores que as condíções médias do ramo, pois o
valor da mercadoria de cada ramo de produção não é determiJ3ado pela
quantidade de trabalho que custa a mercadoria individual, mas pela que
custa aquela mercadoria produzida nas condições médias do ramo. Aí
manufatura e agricultura se distinguem pela circunstância de os lucros su-
plementares, na primeira, irem para o bolso do próprio capitalista e, na
segunda, para o do dono das terras; ainda diferem porque, na primeira,
são fluidos, não adquirem consístência, ora obtidos por este ora por aque-
le capitalista e sempre voltam a desaparecer, enquanto, na segunda, se
fixam em 'virtude da base natural que subsiste (pelo menos por um perío-
do prolongado) na variedade dos solos.

671
Por isso; abstrair dessa renda diferencial, mas observar que ela tanto é
possível com o movimento dos melhores para os piores solos, como com o
movímento dos piores para os melhores. A única suposição que se fa:. nos
dois casos é a de a nova terra cultivada ser necessária, mas apenas suficien·
te para satisfazer a procura adicional. Se a nova terra de melhor qualidade
for mais que suficiente para essa procwa adicional, parte ou totalidade
da terra inferior, conforme o volume da procura adicional, será posta fo-
ra de cultivo, pelo menos do cultivo do produto que constitui a base da
renda (rent) agrícola, caso do trigo na Inglaterra e do arroz na fodia. A ren-
da diferencial não pressupõe .portanto piora progressiva da agricultura, mas
pode originar-se t<ttnbêm de melhora progressiva. Mesmo onde pressupõe
o declínio para tipos piores de terra, pode esse declfnio, primeiro, resultar
de melhora das forças produtivas, quando só a produtividade mais alta pos-
sibilita o cultivo do solo inferior ao preço que a procura permite. Segun-
do, o solo inferior pode ser melhorado; contudo, as diferenças permane·
cem, embora fiquem mais próximas do nivelamento, e assJm o resultado é
apenas o decréscimo relativo, comparativo da produtividade, enquanto
acresce a produtividade absoluta. Este é, aliás, o pressuposto de Anderson,
o primitivo autor da lei ricardiana.
Ademais, passando à .segunda instância, só temos de considerar aqui
a renda agrícola em sentido estrito, isto é, a renda da terra que fornece os
principais alimentos vegetais. Já Smith explicara que essa nmda determina
as rendas da terra que fornece outros produtos como gado etc., as quais
portanto já são derivadas, determinadas pela lei da renda e nífo ,detenní-
nantes dela. Assim, consideradas em si, não proporcionam material para
se apreender a lei da renda nas condições puras- e ori~ais. Nada têm de
primordial.
Estabelecidos esses antecedentes, o problema se reduz à pergunta:
existe renda absoluta? Isto é, renda oriunda de se empregar o capital na
agricultura, em vez de na manufatura, e que é por completo independente
da renda diferencial ou dos lucros suplementares fornecidos pelo capital
aplicado em melhor terra?
E claro que Rkardo naturalmente diz não a essa pergunta, pois par·
tiu do falso pressuposto .de valores e preços médios das- mercadorias serem
idênticos. Se essa suposição fosse verdadeira, teríamos a tautologia: o pre·
ço dos produtos agrícolas está acima do preço de custo - se o preço cons-
tante dos produtos agrícolas ainda fornece, além do lucro médio, renda
extra, uma sobra permanente acima desse lucro médio -, pois esse preço
de custo é igual a adiantamentos acrescidos do lucro médio e de nada mais.

672
Os preços dos produtos agrícolas, por estarem al'ima dos preços de custo,
dariam necessariamente lucro suplementar, estariam acima do valor. Resta~
ria somente aceitar que são sempre vendidos acima do valor, o que é o
mesmo que supor que todos os demais produtos se vendem abaixo do va-
lor, ou que o valor em geral é algo por completo diferente do que necessa-
riamente se concebe na teoria. A mesma ql.lllntidade de trabalho (imediato
e acumulado) - levadas em conta todas as compensações que se dão entre
os diversos capitais em \'Írtude de diferenças emergentes do processo de
circulação - produziria na agricultura valor maior que na· manufatura.
O valor da mercadoria não seria portanto detennínado pela quantidade
de trabalho nela contida. Assim, o fWldamento todo da economia se dis-
solveria. Daí a conclusão lógica de Ricardo: não há renda absoluta. Só a
renda diferencial é-possível; isto ê, o valor do produto agrícola obtido no
pior solo é igual a seu preço de custo, que é igual ao valor, como é o caso
de qualquer outra mercadoria. O capital investido no pior solo é capital
que só se distingue do empregado na manufatura pelo tipo de aplicação,
como espécie particular de investimento_ Aí transparece portanto a valida-
de universal da lei dos valores. A renda difer.encial - e esta é a renda em me·
lhor solo -única e exclusiva - nada mais é que o lucro suplementar que,
em virtude de um Vf!:lor idêntico de mercado em cada ramo de produção,
proporcionam os capitais operantes em condições melhores que as médias.
Esse lucro suplementar só se fixa na agricultura graças à base natural dela
e, além disso, por ser o dono da terra o representante dessa base natural,
para ele flui e não para o capitalista.
O raciocínio todo se desmorona com o pressuposto de Ricardo, de
ser preço de custo igual a valor. Esgota-se o interesse teórico que o força
a negar a renda fund~rla ,absoluta. Se o valor das mercadorias se distingue
do preço de custo, repartem-se elas necessariamente em 3 categorias: nu-
ma, o preço de custo é igual ao valor, noutra, o valor está abaixo do preço
de custo, e na terceira, o valor está acima do preço de custo. O ünico pro-
blema ainda pendente de solução seria: por que, em contraste com as ou-
tras mercadorias cujo valor também está acima do preço de custo, o valor
dos produtos agrícolas não é rebaixado ao preço de custo pela concorrên·
cia dos capitais? A pergunta já traz implícita a resposta. Porque, segundo
o pressuposto, isto s6 ocone até o ponto em que a concorrência entre os
capitais pode realizar esse nivelameQto, o que por sua vez só pode suceder
até o ponto em que todas as condições de produção ou são criaturas do
próprio capítal ou, do mesmo modo que estas. estão primariamente à d.is·
posição del~. Isto não se dá no caso da terra porque existe a pro~riedade

673
fundiária e o modo de produção capitalista inicia seu curso com o pressu-
posto da propriedade fundiária que dele não deriva, mas existia antes. Por
isso, a mera existência da propriedade da terra responde ã pergunta. Tudo'
o que o capital pode fazer. é sujeitar a agricultura às condições da produ-
ção capitalista. Mas não pode privar a propriedade furuiitiria de apreender
a parte do produto agrícola, da qual só .poderia apropriar-se, não por meio
de ação direta, mas depois de estabelecida a não existência da propriedade
funiliária. Pressuposta essa prc;>priedade, tem o capital, ao contrário, de dei-
xar para o dono da terra o excesso do valor sobre o preço de custo. Essa.
própria diferença, porém, decorre apenas de diversidade na combinação
dos componentes orgânicos do capital. Todas as mercadorias cujo valor,
conforme essa composição orgânica, está acima do preço de custo, mostram
por isso que são relativamente mais improdutivas que aquelas cujo valor
é igual ao preço de custo, e ainda mais que aquelas cujo valor está abaixo
do preço de custo, pois exigem quantidade maior de trabalho imediato
em relação ao trabalhe pretérito contido-em capital constante, mais traba·
lho para pôr em atividade detemúnado capital. Essa diferença é histórica.
e pode portanto desaparecer. A mesma argumentação que mostra a possi-
bilidade de existir a renda fundiária absoluta, demonstra que esta é real,
existe na qualidade de mero fato histórico, próprio de certo estádio de de-
senvolvimento da agricultura, e pode desaparecer em estádio superior.
Para Ricardo, a renda diferencial é devida ao decréscimo absoluto
da produtividade da agricultura, o qual ela absolutamente não pressupõe,
nem Anderson estabeleceu essa condição prévia. Ricard.o; em êontrapar-
tida, nega a renda fundiária absoluta porque presume a composição orgd-
r.ica do capital da indústria igual à da agricultura, e assim nega a existên-
cia apenas histórica do desenvolvimento inferior da produtivldade do tra-
balho na agricultura, comparado com o da manufatura. Incide por isso
em duplo erro histórico: de um lado, nivela absolutamente a produtivi-
dade do trabalho agrícola à do trabalho industrial, nega mera diferença
histórica no nível dado de desenvolvimento de lUQ.bos; do outro, admite
decréscimo absoluto na produtividade agrícola e toma-0 a lei da agricul-
tura. Com a primeira idéia pretende igualar ao valor o preço de custo no
pior terreno, e com a outra, explicar as diferenças entre os preços de custo
e o valor dos produtos das terras melhores. O erro todo provém da confu-
são de preço de custo com VDlcr.

Assim, desembaraçamo-nos da teoria ricardiana. Seus outros aspectos


foram examinados quando tratamos de Rodbertus,

674
3. Deficiência da definição ri01rdiana de
renda.

Já mencionei82 que Ricardo abre o capítulo dizendo que ímporta exa-


minar "se a apropiação da terra e a conseqüente criação de renda" (On the
principies.... Londres, 1821, p. 53) contradizem a determinação do valor
pelo tempo de trabalho. E mais adianre afirma:

"Adam Smith... não pode estar certo ao supor que a regra original que
regula a valor de troca dat mercadoriat, isto é, a quantidade relativa de
trabalho que as produz, pode ser de algum modo alterada: peút apropria-
ção da temi e pelo pagamento de renda" (p. 67).

É mérito teórico de Ricardo essa conexão direta e consciente que sua


teoria da renda tem com a determinação do valor. Quanto ao mais, esse ca-
pftu'/() li "On Rent" é por certo inferior à exposição de West. Nota-se aí
muita coisa duvidosa, petições de princípio e falta de isenção no tratamen-
to do problema.
A verdadeira renda agrícola, que Ricardo com razã"o trata como a
renda no sentido próprio, é o que se paga pela permissão de empregar ca-
pital, realizar produção capitalista no elemento terra. A terra aí é o elemen-
to de produção. A coisa muda quando se trata da renda de edificações, que-
das-d 'água etc. As forças da natureza pagas nesses casos desempenham na
produção o papel de condição, seja de força produtiva ou condição sine
qua non, mas não são o elemento próprio desse ramo determinado de pro-
dução. Ademais, nas rendas de minas, exploração de carvã'o etc., a terra é
o reservatório dos valores de uso a serem arrancados de suas entranhas.
Neste caso paga-se pela terra, não por ser o elemento em que se tenciona
produzir, como na agricultura, neru por entrar ela na produção, na quaJi.
dade de urna das condições de produção como a queda-d'água ou o local
de produção, e sim por ser o reservatório dos valores de uso dos quais a
indústria visa apoderar-se.
Não é boa a derulição de Ricardo:

"A renda é a porção do produto da tena, a qual é paga ao senhorio pelo


UfO dasforçaf originais e indestrut(veiB do solo .. (p. 53).

82. Ver, neste volume, pp. 600 e 601.

675
Primeiro, o solo nã'o tem "forças indestrutíveis'.'' (Fazer nota sobre o
assunto no fim deste capítulo.) Segundo, o solo nã'.o tem forças "originais"
até onde não é nada original e sim o produto de um processo histórico-
na tur.tl. Mas abstraiamos disso. Aqui entendemos por forças "originais" do
solo as que este possui, sem depender da ação da indústria humana, embo-
ra as forças a ele dadas pela indústria humana se tomem forças originais
inteiramente dele como as que lhe deu o processo natural. Quanto ao mais,
pennanece correto dizer que se paga a renda pelo "uso" de coisas naturais,
e tanto faz que se trate daquelas "forças originais" do solo ou da força
da queda-d'água ou da área para construir ou dos tesouros a serem utili-
zados, contidos na água ou nas entranhas da terra.
Em contraposição à renda agricola propriamente, fala A. Smith (diz
Ricardo) da renda paga por madeira de florestas virgens, da renda de mi-
nas e de pedreiras. .E um tanto estranha a maneira como Ricardo se desem-
baraça disso.
Com~a afirmando que não se deve confundir com a renda da terra
o juro e lucro do capital, a saber, do
•'

"capital empregado .na melhoria da qualidade do solo e na construção


de edificações necessárw paía p1otege1 e armazenar os produtos" (p. 54).

Daí vai logo para os exemplos acima de A. Sinith. Quanto às flores-


tas virgens:

"Mas não é evidente que &,pessoa que pagou o que" (Smith) "chama de
xe.nda, o fez considerando a mercadoria valiosa que e.ntão havia no solo,
e na 1ealidade se reembolsa com lucro, ao vender a madeira?

O mesmo diz das pedreiras e minas de carvão.

"A compensação em favor da mina ou da pedreira é paga pelo valor do


ca:mio ou das pedias que delas podem ser retirados, e não tem relação
com as forças origíMis e indestrutíveis do solo. Esta é uma distinção
de grande importância num.a pesquisa concernente a renda (rent) e lu·
cro, pois observou..,çe que as leis que determinam- a evoluçâ-0 da renda
dife.rem muito das que determinam a evolução do lucro, e que é raro
atuarem ela$ na mesma dileção" (pp. 54, 55).

Que lógica extravagante. Importa distinguir entre renda que é paga ao


dono da terra para uso das forças originais e indestn.J.tfveis do solo e o juro e
lucro que lhe são pagos pelo capital que investiu em melhorias da terra etc.
A "compensação" paga ao proprietário de florestas naturais pelo direito de

676
retirar madeira ou ao proprietário das pedreiras ou das minas de carvão pelo
direito de retirar pedras e carvão, não é renda (rent). pois nã'o é paga pelo
"uso das forças originais e indestrutíveis do solo". Muito bem. Mas Ricar~
do raciocina como se "essa compensação" fosse o mesmo que o lucro e o
juro pagos por aplicação de capital para melhorar a terra. Está errado. Terá
o dono da floresta empregado capital para ela dar madejra, ou o proprie-
tário das pedreiras e minas investido para elas conterem pedras e carvão?
Donde vem pois a compensação de Ricardo? De nenhum modo é lucro ou
juro do capital, como Ricardo quer insinuar. E portanto "rendp." e nada
mais, embora não seja renda segundo a define Ricardo. Isto apenas mostra
que sua definição de renda exclui formas em que se paga "compensação"
por meras coisas naturais em que não se realiza nenhum trabalho humano,
e se paga ao proprietário dessas coisas naturais só porque é "proprietário"',
proprietário de terra, consista essa terra em solo, floresta, águas piscosas,
quedas~'água, local para construção etc. Mas, diz Ricardo. a pessoa que
paga pelo direito de cortar madeira na floresta faz isso "considerando a
mercadoria valfosa que então havUz no so'/o, e na realidade se reembolsa com
lucro, ao vender a madeira". Basta. Se Ricardo chama aí de "mercadoria
valiosa" a madeira que "há no solo" e faz parte da floresta virgem, essa ma-
deira é valor de uso virtual. E esse valor está expresso aí na palavra "valío-
so ". Mas não é "mercadoria''. Pois para isso teria de ser também valor de
·troca, isto é, materializar certa quantidade de trabalho nela despendida.
Só se torna mercadoria por ser destacada da floresta, cortada, removida,
transportada, convertida de tronco em madeira. Ou se toma mercadoria
apenas por ter sido vendida? Então, a terra arável toma-se mercadoria pelo
mero ato de venda?
Teríamos portanto de dizer: renda é o preço pago ao dono de forças
naturais ou de meros produtos da natureza pelo direito de usar aquelas
forças ou de apropriar-se (pelo trabalho) daqueles produtos. Esta é na ver·
dade a forma em que toda renda (rent) ap<ll'ece na origem. Mas o que fica
então é justamente a questão a resolver: como têm preço coisas que não
têm 11a'/or e como compatibilizar isso com a teoria geral dos va'/ores. Nada
tem a ver com a questão real a pergunta: com que objetivo se paga "com-
pensação" pelo direito de tirar madeira da terra onde ela está? A pergunta
pertinente é: com que fundo se paga? Diz Ricardo, "com a venda da ma-
deira". Isto é, com o preço da madeira. E precisamente esse preço era tal
que, d!z Ricardo, a pessoa "na realidade se reembolsa oom lucro". Sabemos
agora onde estamos. Em todo caso, o preço da madeira tem de ser igual
à soma em dinheiro que represente a quantidade de trabalho necessária pa-

677
ra cortá-la, deslocá-la, transportá-la, levá-la aq mercado. Ê entã'o o lucro
com que a pessoa se "reembolsa", acréscimo sobre esse valor, o valor de
troca outorgado à madeira justamente pelo trabalho nela despendido? Ri·
cardo, se afirmasse isso, incidiria na concepção mais grosseira, bem infe-
rior à própria doutrina. Não. Supondo-se seja o herói de sua história um
capitalista, o lucro é a parte que não pagou do trabalho por ele empregado
pata produz.ir a madeira, e ele teria, digamos, o mesmo lucro se tivesse
Posto em movimento a mesma massa de trabalho em fiação de algodão.
(Se nosso herói não é capitalista, é o lucro igual àquela quantidade de
seu trabalho a qual excede seu salário e teria constituído o lucro do capi-
talista se um capitalista o tivesse empregado; mas agora constitui seu pró-
prio lucro porque ele reúne na mesma figura as qualidades de assalariado
e de capitalista.) Mas o madeireiro - aí surge a expressão vil - "na realida-
de se reembolsa com lucro,; Isso dá à transação toda aspecto muito vul-
gar e corresponde à maneira crua como esse capitalista que extrai madeira
pode entender a fonte de seu lucro. Primeiro, paga ao dono da floresta
pelo valor de uso da madeira, que entretanto não tem ''valor" (valor de
troca) e, enquanto "está no solo", não tem valor de uso algum. Paga-lhe,
digamos, 5 libras por tonelada. E então vende ao público a mesma madei-
ra (se abstraímos dos outros curtos) por 6 libras e assim reembolsa as 5 li-
bras com lucro de 20%. "Na realidade se reembolsa com luc_ro". Se o do..
no da floresta só tives.se "compensação" de 2 libras ( 40 :Xelins), o madei-
reiro teria vendido a tonelada por 2 libras e 8 xelins 'e não por 6 libras.
Uma vez que sempre acrescenta a mesma taxa de lucro, o preço da ma-
deira subira ou descerá por subir ou descer a renda. Está entraria no pre-
ço como elemento constitutivo, mas não seria resultado do preço. A cir-
cunstância de se pagar "renda" - compensação - ao proprietário da terra,
pelo uso das "forças" da terra ou pelo uso de seus "produtos naturais",
em nada altera a relação econômica, em nada altera o pagamento que se
faz por "coisa natural" (força ou produto da terra) onde não se aplicou
antes trabalho humano. E assim Ricardo, na segunda página de seu capí-
tulo "On Rent", lançaria por terra sua teoria inteira para escapar de uma
dificuldade. Parece que aí A. Smith foi muito mais perspicaz.
Ricardo procede do mesmo modo com as pedreiras e as minas de
carvão.

"A compensação em favor das rniruls e pedxeítas é paga pelo valor do


canrã"o ou das pedras que delas podem set tetilados, e não tem relação
com as forças originais e indestrutíveis do solo" (pp. 54, 55).

678
Não! Todavia, conexão muito significativa com os "produtos ori-
ginais e destrutíveis do solo". A expressão "valor" aí é tão vil quanto a
anterior "reembolsa-se com 1ucro ".
Ricardo nunca emprega a palavra wilor no sentido de utilidade, ser-
ventia ou «valor de uso". Quererá então díz.er que a "compensação" é pa-
ga ao proprietário das pedreiras e minas de carvão pelo "valor" que têm
as pedras e o caivão antes de serem retirados da pedreira e da mina - no
estado original? Assim. e]imina toda a sua teoria do valor. Ou valor aí síg-
nifica, corno deve, o valor de uso possível e em conseqüência o valor de
troca prospectivo do carvão e das pedras? Então apenas se quer dizer que
se paga ao proprietário renda (rent) pela permissão de utilizar a "compo-
sição original do solo" para a produção de carvão e pedras. E é de todo
incompreensível que não se chame isso de renda como no caso da pennis-
são dada para utilizar as "forças" da terra na produÇão de trigo. Do con-
trário. reincidimos na eli.mínação, analisada no caso da madeira, de toda
a teoria da renda. De acordo com a teoria correta, o problema não apre-
senta dificuldade alguma. O trabalho - ou capital - empregado na "pro-
dução" (nã'o reprodução) de madeira, carvão, pedras (sem dúvida, esse tra•
balho não .cria esses produtos naturais e sim os separa de seu nexo elemen-
tar com a terra e os produz na qualidade de madeira, carvão ou pedras uti-
lizáveis) pertence de certo aos ramos de produção onde a parte do capital
empregada em salário é maior que a empregada em capital constante, o tra-
balho imediato é maior que o ..pretérito" cujo resultado serve de meio
de produção. Por isso, se a mercadoria aí for vendida pelo valor, esse valor
estará acima do preço de custo, isto é, do desgaste dos instrumentos de tra·
balho, do salário e do lucro médio. A sobra pode assim, a título de renda
(rent), ser paga ao donl'.) da floresta, da pedreira ou da mina de carvão.
Mas, por que essas manobras grosseiras de Ricardo. o emprego erra-
do de valor etc.? Por que se agarra ele à explicação de ser a renda pagamen-
to pelo uso das "forças originais e indestrutíveis da terra"? A resposta tal-
vez surja mais tarde. Em todo caso quer ele distinguir a renda agrícola pro-
priamente, especificá-la e ao mesmo tempo já abrir caminho para a renda
diferencial, afirmando que só se pode pagar essa força elementar na medi-
da em que ela se desenvolve em diferentes graus.

679
Capítulo XII
Quadros e Comentários
Referentes à Renda Diferencial

1. Variações no montante e na taxa de renda.

Em acréscimo ao que já vimos, admitamos a descoberta de minas


e de pedreiras com maior produtividade, de modo que fomeçam elas, com
a mesma quantidade de. trabalho, mais produto que as antigas e produto
táo grande que satisfaça por completo a procura. Cairia então o preço -
por cair o valor - do·carvão, das pedras e da madeira, e por isso as velhas
minas de carvão e pedreíras teriam de fechar; não dariam lucro nem salá·
rio nem renda. Não obstante, ~ novas da.riam renda como antes as anti-
gas, embora menor (quanto à taxa). E que todo aumento da produtivida-
de do trabalho diminui o capítal empregado em salário em refação ao ca-
pital constante, empregado aí em instnunentos. :E i~o correto? Também
é correto nes:i;e caso em que a mudança na produtMdade do trabalho
não decorre de mudança no próprio método de produção e sim da abun-
dância natural da mina de carvão ou da pedreira ou da localização delas:?
Só podemos diz.er aí que a mesma quantidade de capital fornece mais
toneladas de carvão ou de pedras e por isso cada tonelada contém menos

681
trabalho; a tonelagem total, entretanto, encerra a mesma quantidade de
trabalho ou até mais se as novas minas e pedreiras, além da procura supri·
da pelas velhas, satisfaiem procura adicional, aliás, procura adicional maior
do que a diferença entre a abundância das velhas e a das novas minas e pe-
dreíras. Mas a composiçiib orgânica do capital aplicada não se alteraria
por isso. Seria verdadeiro dizer que o preço de uma tonelada, de uma to-
nelada isolada, conteria renda menor, mas só porque ela encerra menos
trabalho e em conseqüência menos salário e menos lucro. Isso, contudo,
não influenciaria a re/a.çiío entre a taxa da renda e o lucro. Podemos por-
tanto dizer apenas:
Se não variar' a procura, se a quantidade de carvão e de pedras a pro-
duzir for a mesma anterior, aplicar-se-á então, nas novas minas e pedreí-
ras mais ricas, menos capital que antes nas antigas, para a produção do
mesmo volume de mercadorias. O valor global delas cairá portanto e em
conseqüência também o montante global de renda (rent), de lucro, de
salário e de capital constante aplicado. Mas as relações entre renda e lu-
cro mudam tão pouco quanto as relações entre lucro e salário ou entre
lucro e capital despendido, porque não se deu variação orgânica no capi·
tal empregado. Só mudou a magnitude do capital aplicado e não a com-
posição, nem o método de produção portanto.
Se há procura adiciotfl11 a satisfazer, mas procura adicional-igual à
diferença entre a abundâncía das novas e a das velhas minas e pedreiras;
aplicar-se-á capital dtJ memw. grandeza anterior. Cairá o valor da tonelada
isolada. Mas o total de toneladas tem o mesmo valor de antes. Conside-
rando-se uma tonelada de per sí, diminlli, junto com o valor nela conti-
do, a magnitude das partes do valor correspondentes a lucro e renda. Mas,
uma vez que não variou a magnitude do capital nem se álterou com isso
o valor global do respectivo produto e tampouco sucedeu mudança orgâ-
nica na sua composição, permanece o mesmo o montrmte absoluto de
renda e lucro.
Se a procrua adicional é tão grande que não a satisfaz a diferença de
abundância entre as novas e as velhas minas e pedreiras, setâ .mister por-
tanto empregar capital adicional nas novas .minas. Nessa hipótese - caso
não se altere, ao crescer a totalidade do capital empregado, a repartição
do trabalho, o emprego da maquinaria, nem portanto a composição orgâ-
nica do capital - aumenta o montante de renda e lucro por ter aumenta-
do o valor do produto global, o valor da totalidade das toneladas, embora
o valor da tonelada isolada tenha caído e por conseguinte a parte do valor
dela a qual se reduz a renda e lucro.

684
Em todos esses casos não ae altera a taxa de renda, por não haver
mudança na compoaição orgdnica do capital aplicado (não importa a V4"'
riaçíio de magnitude). Em contrapartida, se a alteração decorrer desse tipo
de mudança, de decréscimo do capital desembolsado em salário em con-
fronto com o despendido em maquinaria etc., de modo portanto a se alte-
rar o próprio método de produção, cairá a taxa de renda, porque terá di·
minufdo a diferença entre o preço de custo e o valor da mercadoria. Essa
taxa não diminui nos três casos observados acima. E que, se neles cai o
valor, também cai por igual o preço de custo de cada mer~doria isolada,
pois nesta se aplicou menos trabalho, menos trabalho pago e não pago.

Por isso, quando a produtividade maior do trabalho - ou o valor


menor de determinada quantidade das mercadorias produzidas tem
origem exclusiva em mudança da produtividade dos elementos naturais,
na diferença do grau natural de fertilidade dos solos, minas, pedreiras, etc.,
o montante da renda pode cair porque, nas condições modificadas, empre-
ga-se quantidade menor de capital; pode permanecer constante com uma
procura ·adicional; pode crescer se a procura adicional é maior que a dife-
rença de fertilidade entre os fatores naturais utilizados antes e os emprega-
dos agora. Mas a taxa de renda só poderá crescer se houver mudança na
composição orgânica do capital empregado.

Não é portanto necessário o decréscimo do montante da renda quan·


do se abandona a t!)rra, a pedreira, a mina etc., de pior qualidade. A taxa
de renda pode mesmo não cair jamais se esse abandono é mera conseqüên-
cia de menor fertilidade natural

Nesse caso, o montante da renda pode cair, conforme a situação da·


da da procura, isto é, dependendo de diminuir, não variar ou crescer a
magnitude do capital aplicado. Essa idéia correta confunde-a Ricardo com
a idéia basicamente errada, de a taxa de renda ter de cair, o que é impossí-
vel com o pressuposto estabelecido, pois se adnútiu que não se alterou a
.composição orgânica do capital, e assim mudança alguma influenciou a
relaçOO entre val.or e preço de custo, a única relação que determina a taxa
de renda.

683
2. Combinações diferentes da renda
diferencial e da absoluta. Quadrt:>s A, B, C,
D, E.

Como se comportam nesse caso as rendas diferenciais?


Admitamos estejam sendo exploradas 3 classes de minas de carvão,
1, II e III. 1 dá renda absoluta, I1 o dobro dessa renda, e III o dobro da
renda de II ou o quádruplo da de 1. Nesse caso, I dá a renda absoluta R,
II dá a renda 2R e III 4R Estabelece-se então a n? IV, maís produtíva que
1, II e III e tão grande que nela se pode empregar capital de montante
igual ao de 1. Neste caso - invariável a procura anterior - emprega-se em
IV capital igual ao anterior de 1. Com isso fecha-se 1. E parte do capital
empregado em II tem de ser retirada; III e IV bastarão para repor 1 e parte
de II, mas não para suprir a procura toda sem II continuar operando. Para
facilitar o raciocínio vamos supor que IV seja capaz, empregando capí-
tal igual ao investido antes em I, de produzir a oferta inteira de 1 e a me·
tade da de II. Se se aplicar portanto em II 1/2 do capital anterior, em III
o anterior e em IV 'o novo, suprir-se-á o mercado inteiro.
Quais foram então as mudança.S que se deram ou como as mudanças
efetuadas influenciam a renda global, as rendas de I, II, Ili e IV?
A renda absoluta oriunda de IV, em montante e taxa, ~rá absoluta-
mente igual à que antes pro'.'inha de I; de fato, a renda absoluta, em m_on-
tante e taxa, terá sido a mesma anterior de 1, II e III, desde que se admita
se empreguem nessas díferentes elas.ses o mesmo montante de capital o
valor do produto de IV será a rigor idêntico ao do capital,.antes emprega-
do em I, por ser o produto de capital da mesma magnitude e de capital
da mesma composição orgtinica. Por isso, a diferença entre valor e preço
de custo tem de ser a mesma; em conseqüência, será a mesma a taxa de
renda. Alêm disso, o montante da renda tem de ser o mesmo porque, para
dada taxa de renda, se terão empregado capitais de magnitude igual. Mas,
uma vez que o valor do can'ão não é determinado pelo valor do carvão
oriundo de IV, dará este uma renda suplementar ou uma sobra acima de
sua renda absoluta; uma renda proveniente não de diferença entre preço
de custo e valor, mas da diferença entre o valor de mercado e o valor in·
dividual do produto de IV.
Quando dizemos que a renda absoluta ou a diferença entre o valor
e o preço de custo é a mesma em 1, II, III e. IV - pressupomos que não
varia a grandeza do capital neles aplicado, nem portanto a J!lagnitude da

684
renda para dada taxa -, o sentido é o seguinte: o valor (individual) do car-
vão de l é mais alto que o de II, e o de II mais alto que o de III, pois numa
tonelada de carvão de l 8e contém mais traball:to que numa de II, e numa
de II mais que numa de III. Mas, uma vez que a composição orgânica do
capitã! é a mesma em todos os 3 casos, aquela diferença não influencia a
renda individual absoluta que I, II e III proporcionam. E que, se é maior
o valor da tonelada de 1, também o é o preço de custo; e esse valor s6 é
maior na proporção em que se aplica em I, para produzir uma tonelada,
capital - com a mesma composição orgânica - maior que:em II, e em
II maior que em III. Por isso, a diferença entre seus valores é a rigor igual
à diferença entre os preços de custo, entre os capitais relativos despendi·
dos para produzir urna tonelada de carvão em I, II e Ili. A diferença entre
as magnitudes de valor nas três classes não influencfa portanto a difere11-
ça entre valor e preço de custo nas dive,rsas classes. Se o valor é maior, é
o preço de custo mailJr na mesma proporçiío, pois o valor só é maior na
proporção em que se aplica mais capital ou trabalho. Por isso, não varia a
relação entre ·v-.tlor e preço de custo, e a renda absoluta é portanto a mesma.

Prosseguindo vejamos agora o que sucede com a renda diferencia.l.


Primeiro, na produção toda de carvão de II, III e IV emprega-se ago-
ra menos capital. E que o capital de IV é tão grande quanto o anterior
de 1. Ademais, retira-se a metade do capita] empregado em II. Por isso,
o montante de renda em II se reduz, seja como for, â metade. O emprego
de capital só se alterou em II, pois em IV se aplica tanto capital quanto
antes em 1. Tínhamos suposto que em I, II e III foram investidos capitais
de igual magnitude, digamos, 100 em cada, ao todo 300; assim empregam.
se agora 250 apenas erri II, III e IV, isto é, 1/6 do capital foi retirado da
produção de carvão.
Mas, além disso, caiu o valor de mercado do carvão. Vimos que I
proporciona R, II 2R e III 3R. Admitamos que o produto de 100 em
I = 120, dos quais R = 10 e lucro = 10; então, o valor de mercado de II
é 130 (10 de lucro e 20 de renda), o de III 150 (10 de lucro e 40 de ren-
da). Seja o produto de I .= 60 toneladas (a tonelada= 2 libras); então, o
de II = 65, o de III :=. 75 e a produção total = 60 + 65 + 75 = 200 tone-
ladas. Uma v~z que 100 em IV produz tanto quanto o produto inteiro de
1 e a metade do de II, temos 60 + 32 1/2 toneladas= 92 1/2 que, de acor"
do com o valor de mercado anterior teriam custado 185 libras e teriam por
isso fornecido renda de 75 libras, porque o lucro= 10; assim, 7 l/2 R, por
ser a renda absoluta = 1Olibras.

685
O mesmo número anterior de toneladas, ,200, continua a ser produ-
zido por II, III e IV, pois 32 1/2 + 75 + 92 1/2 = 200.
Mas que sucede agora com o valor de mercado e as rendas diferen-
ciais? Para responder à questã~>, temos de ver a quanto importa a renda
absoluta individual de II. Admitimos que a diferença absoluta entre preço
de custo e valor nessa esfera de produção é de 1O libras, renda que a pior
mina proporcionou, embora isso não seja necessário, exceto quando 1
com seu valor determinava absolutamente o valor de mercado. Se isso
ocorrer na realidade, a renda de 1 (se o carvão de 1 se vender por seu va-
lor) representará em geral a sobra do valor acima do próprio preço de cus-
to e do preço de custo geral das mercadorias nessa esfera de produção.
II vende portanto seus produtos pelo valor, ao vender o total de tonela-
das por 120 libras (as 65 toneladas), e portanto cada tonelada por 1 11/13
libra. A circunstância de, em vez disso, tê-la vendido por 2 libras originou-
se apenas da sobra do valor de mercado - determinado por 1 - acima de
seu valor individual, e não da sobra de seu valor, mas da de seu valor de
mercado sobre seu preço de custo.
Além disso, conforme pressupomos, II só vende 32 1/2 toneladas,
em vez das 65, empregando na mina capital de 50 apenas, em vez de 100.
Assim II vende agora 32 1/2 toneladas por 60 libras, e 1,0 libras são
20% de 50. Das 60 libras, 5 são lucro e 5 renda.
Para II temos portanto: valor do produto, da tonelada= 1 11/13 li-
bra; número de toneladas = 32 1/2; valor global do produto= ?O libras;
renda = 5 libras. A renda caiu de 20 para 5. Só teria caído para,10 se ainda
fosse aplicado o mesmo montante anterior de ·capital. A taxa, portanto,
só diminuiu de metade. Ist9 é, reduziu-se de toda a diferença entre o valor
de mercado - determinado por 1 - e o valor do produto de 11, excedente
que se adicionava à diferença que existia entre esse valor e o corresponden-
te preço de custo. A renda diferencial de II era 10; agora, essa renda é 10,
igual à renda absoluta. Em II, portanto, ao reduzir-se o valor de mercado.
ao valor (do carvão de II), desaparece a renda diferencial, em conseqüência,
a taxa de renda acrescida, duplicada por essa renda diferencial. A renda
diminuiu assim de 20 p;i.ra 10; mas, com essa dada taxa de renda, a seguir
decresce de 10 para 5, por ter caído à metade o capital aplicado em 11.
Uma vez que o valor de mercado - 1 11/13 libra a tonelada - é de-
terminado agora por II, o valor de mercado das 75 toneladas produzidas
por III será então de 138 6/13, das quais 28 6/13 libras de renda. A renda
antes era de 40 libras. Caiu portanto de 11 7/13 libras. Sua diferença da
renda absoluta importava em 30. Agora importa apenas em 18 6/13 (pois

686
18 6/13 + 10 = 28 6/13). Antes era 4R. Agora é apenas 2R + 8 6/13 li-
bras. Uma vez que não variou a magnitude do capital empregado em 111,
esse caso tem origem exclusiva na queda da taxa de renda diferencial, isto
é, na redução da sobra do valor de mercado de III sobre seu valor indivi-
dual. Antes, o montante todo da renda em III era igual ao excesso do va-
lor de mercado maior sobre o preço de produção, mas agora é apenas igual
ao excesso do valor de mercado mais baixo sobre o preço de custo 83 ; a
diferença vai-se aproximando portanto da renda absolúta de III. Com 100
de capital, III produz 75 toneladas com valor de 120 libras; 1 tonelada,
portanto, igual a 1 3/5 libra. Entretanto, III vendia antes pelo preço de mer-
cado de 2 libras, isto é, 2/5 de libra mais caro por tonelada. Para 75 tonela-
das, temos 2/5 X 75 = 30 libras, e isto era na realidade a renda diferencial
da renda em III; pois esta renda era 40 (10 de renda-absoluta e 30 de renda
diferencial). Agora III vende a tonelada pelo novo valor de mercado, por
1 11 /13 libra apenas. Quanto acima de seu valor individual? 3/5 = 39/65
e 11/13 = 55/65. Vende assim a tonelada 16/65 acima desse valor 64 • Assim
consegue, em 75 toneladas, 18 6/13 libras e essa quantia é a rigor a renda
diferencial, que portanto é sempre igual ao número de toneladas multipli-
cado pelcr que o valor de mercado excede o valor individual da tonelada.
·Falta ainda calcular como se dá a queda de 11 7/13 na renda. O excesso
do valor de mercado sobre o valor de III reduziu-se de 2/5 de libra por to-
nelada (quando esta se vendia por 2 libras) para 16/65 por tonelada
(a 1 11/13 libra), isto é, de 2/5 = 26/65 para 16/65, decrescendo de 10/65.
Isto dá, para 75 toneladas, 750/65 = 150/13 = 11 7/13, a rigor o montan-
te da queda ocorrida na renda de III.
As 92 1/2 toneladas de IV, a 1 11/13 por tonelada, custam 170 10/13
libras. A renda aí é de· 60.10/13 e a renda diferencial= 50 10/13.
Se as 92 1/2 toneladas fossem vendidas por seu valor, 120 libras, 1 to-
nelada custaria 1 11/37 libra. Em vez disso, vende-se a tonelada por 1 11/13.
Mas 11/13 = 407 /481 e 11 /37 = 143/481. O valor de mercado de IV exce-
de seu valor, de 264/481. Isto a rigor dá, para 92 1/2 toneladas, 50 10/13
libras, a renda diferencial de IV.
Cotejemos agora os dois casos sob os títulos de A e B.

83. A proposição de o montante todo da renda (a soma da renda absoluta e da di-


ferencial) ser igual ao excesso do valor de mercado sobre o preço de custo desenvolve-a
Marx mais adiante (ver, neste cap., pp. 722 e 723).
84. Marx obtém 16/65 subtraindo 1 3/5 libra, o valor individual da tonelada de
carvão, de 1 11/13 libra, o novo valor de mercado.

687
A

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100 10 6.l t ttfB 130 10
100 10 75 l l/.S uo 30
lOO lO 200 400 40

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•b~1uta potLo~l3da in.d~vldr..tal diíurencial
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IV IOO 10 9:2 lfl l llfll 1 11/ll 1101om SOl011'
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O v~to~! •~ U>Oteindadil.$ c:liu di.::400 para 369 3fl3.

Ambos os quadros motivam considerações muito importantes.


De inícío vemos que o montante da renda absoluta sobe ou desce na
proporção do capital aplicado na agricultura85 , das somas de capital empre-
gadas em I, II e III. A taxa dessa renda absoluto. - uma vez que é por com-
pleto independente da diferença entre os diversos tipos de solo e decorre,
ao contrário, da diferença entre valor e preço de custo, diferença essa por
sua vez determinada ·pela composição orgâniC11 do capital agrícola, pelo
método de produção e não pela terra - em nada depende da magnitude
dos capitais aplicados. Em II B, o montante da renda àbsoluta cai de 1O
para 5 porque o capital caiu de 100 para 50; retirou..se a metade do·capital.
Antes de fazer outras considerações em ~orno dos dois quadros,
passemos ã elaboração de outros. Em B vimos o valor .de mercado cair
para 1 11/13 libra por tonelada. Mas com esse valor adnútamos não tenha
1 A de desaparecer por completo do mercado, nem II B seja forçado a em·
pregar apenas metade do capital anterior. Em 1 a renda é 1O libras, tiradas
do valor global da mercadoria, de 120, ou 1/12 do valor global, e isto se
estende também ao valor da tonelada individual, de 2 libras. Mas 2/12 de
libra= 1/6 de libra ou 3 1/3 xelins (3 1/3 xelins X 60 = 10 libras). O pre-
ço de custo da tonelada de 1 é portanto 2 libras - 3 1/3 xelins = 1 libra e
16 2/3 xelins. O novo valor de mercado é l 11/13 libra ou 1librae16 12/13
xelins. Mas 16 2/3 xelins = 16 xelins e 8 pence ou 16 26/39 xelins. Em

BS. Os exemplos dàdos não concernem à agrlcultuxa e sim à e.Xplonção de minas


de carvão de produti'Vidade diversa. Mas todas as referências feitas a essa exploração po-
dem ser aplicadas à agricultura em solos de fettilidade diferente.

68$
contrapartida. 1612/13 xelins= 16 36/39, isto é, a mais, 10/39dexelim.
Esta seria a renda por tonelada para o novo valor de mercado e daria, para
60 toneladas, uma renda global de 15 5/13 xelins. A renda não chega por-
tanto a 1% do capital de 100. Para 1 A não dar rerida, o valor de mercado
terá. de cair a seu preço de custo, por conseguinte a 1 libra e 16 2/3 xelins
ou 1 5/6 libra (ou 1 10/12 libra). Nesse caso terá desaparecidQ a renda de
1 A. Mas a mina 1 A poderá ser explorada com o lucro anterior de 10%.
Só deixaria de haver essa possibilidade se sobreviesse queda do valor de
mercado abaixo do preço de custo de l 5/6 libra.
No tocante a II B, supôs·se no quadro B a retirada de metade do ca-
pital. Mas, o valor de mercado de 1 11 / l 3 libra, uma vez que proporciona
uma renda de 10%, proporciona-a tanto para 100 q~to para 50. Por isso,
se .se admitiu a rétirada de metade do capital foi apenas porque, nas cir-
cunstâncias, II B ainda fornece a renda absoluta de 10%. Pois, se II B ti-
ve;'!:e. continuado a produzir 65 toneladas, em vez de 32 1/2, o mercado
ficaria abarrotado e o valor de mercado de IV, que domina o mercado,
cairia tanto que o capital empregado em II B teria de ser reduzido para
dar a renda absoluta. Contudo, é claro que o capital todo de 100 com ren-
da (rent) de 9% dá montante maior que o capital de 50 que proporcione
renda de 10%. Assim, se de acordo com a situação do mercado só é mister
cal'.'ital de 50 em II para satisfazer a procura, a renda terá de se reduzir a
5 libras. Mas na realidade cairá mais se se admite que as 32 l /2 toneladas
excedentes não podem mais ser vendidas de maneira constante, isto é, se-
riam lançadas fora do mercado. O valor de mercado cairá tanto que não
só desaparece'rá a renda de II B, mas também o lucro será atingido. Ocor-
rerá então retirada de capital para diminuir a oferta até chegar ao exato
montante de 50, e Ó valor de mercado se fixará então em 1 11/13 libra,
quando voltará a dar a renda absoluta de II B, mas só para a metade do
capital nele aplicado antes. Também nesse caso, a ação provi~ de IV e III,
que dominam o mercado.
Mas não se disse que o mercado, se absorve 200 toneladas a 1 11/13
libra por tonelada, não absorve 32 1/2 toneladas adicionais se o valor de
mercado cair, se portanto a pressão das 32 1/2 toneladas suplementares
sobre o mercado rebaixa o valor de mt;rcado de 232 1/2 toneladas. O pre-
ço de custo em II B é l 9/13 libra ou 1 libra e 13 11/13 xelins. Mas ova·
lorde mercado é 111/13Iibraou llibrae 1612/13xelins.Seovalordemerca-
do cair a ponto de 1 A não dar mais renda, cair ao preço de custo de 1 A,
a 1 libra e 16 2/3 xelins ou l 5/6 libra ou 1 10/12, a procura já terá de
crescer bastante, para II B empregar seu capital todo; pois a mina I A p~

689
deria continuar. a ser explorada uma vez que dá o lucro normal. O merca·
do teria de absorver adicionalmente 921/2 toneladrurem vez de 32 1/2,
de adquirir 292 1/2 toneladas em vez de 200, quase a metade a mais, por·
tanto. Acréscimo de magnitude bem considerável. Para ser moderado o
acréscimo a ocorrer, o valor de ·mercado terá de cair tanto que I A será
expulso do me~cado. Isto é, o preço de mercado terá de cair abaixo do
preço de custo de IA, portanto abaixo de. l 10/12 libra, digamos, a l 9/12
libra ou 1 libra e 15 xelins. Continuaria a estar significativamente acima do
preço de custo de II B.
Em face d.essas considerações., acrescentaremos aos quadros A e B
mais três quadros, C, D e E. Em C admitiremos que a procura cresce, que
todas as classes de A e B podem prosseguir produzindo, mas ao vaiar de
mercado de B, quando 1 A ainda dá renda. Em D admitiremos que a pro-
cura ainda basta para 1 A dar o lucro normal, mas sem dar renda. Em E
suporemos que o preço cai a ponto de excluir 1 A do mercado, e que essa
queda ao mesmo tempo leva à absorção das 32 1 /2 toneladas excedentes
de II B.
Ê possível o que se admitiu em A e B. ~ possível que 1 A, ao redu-
zir-se a renda de 1O libras para quase 16 xelins apenas, retire a terra dessa
exploração e a arrende a outro ramo de produção onde obtenha renda fun-
diária mais alta. Mas nesse caso, II B seria forçado a retirar 1/2 de·seu ca·
pital pelo processo antes descrito, se o mercado nã:o se dilatasse com a in·
tradução do novo valor de mercado. ·

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690
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m lllO 10 D/4 11/IS 75 131 J/4 +Hl/4
lV 100 10 1 3/4 11/37 921/2 1617/8 <417/8
i Tolril 300 2~ )/4 231 l/l 406 7/8 -f))l/i

Vamos agora reunir os quadros A, B, C, D e E, mas da maneita como


deveriam ter sido elaborados desde o início. Capital, valor global, produto
global, valm de mercado por tonektda, valDr individual, valor diferem::ia/86,
preço de custo, renda absoluta, renda absoluta em tone'latlas. renda dife-
rendal, rendo. diferencilll em toneladas, renda glDbal Em cada quadro fi.
guram os totais de todas as classes.
Comentários sobre os quadros (p. 574 do manuscrito).

86. Por wilor diferencial entende Marx a diferença entre valor de mercado e va-
lor individual (ver pp. 699 e 7 00 nes.te volume). Marx determina o valor diferencial por
unidade do produto, e calcula arenda dife1encíal pelo total pi:oduzido na classe considera-
da. Quando o valo1 de mercado da unidade produzida é maior que o respectivo valor indi·
vidual, a diferença constituí gxandeza positiva; quando esse valor de mercado é menor,
constitui essa diferença magnitude negativa. Daí o uso dos sinais + e • na coluna valor
diferencial dos quadros A a E, apresentados na p. 692 deste volume.
Nos quadros C, D e E da p. 692 põe Marx os sinais+ e - antes dos números que
expressam a renda diferencial em libras. No quadro C, por exemplo, na coluna "renda
diferencial" temos a grandeza negativa"· 9 3/13 libras". lsso quer dizei: que, nesse ca-
so, a produtividade do solo da classe I é tio baixa que, ao dado valor de mercado, além
de não se obter nele renda diferencial, a pxópria renda absoluta cai muito abaixo da
magnitude normal. No caso IC, a tenda absoluta Importa apenas em 10/ 13 de libra, esti
abaixo da magnitude normal (que, no exemplo dado, é de 10 libras) por 9 3/13 libras.
Nos quadros A a E da p. 692 deste vol., Marx expressa o mesmo fenôme-
no da renda diferencial negativa por meio do valor diferencial negativo e nesse caso
coloca na coluna "'renda diferencial" simplesmente O (zero), que então indica a fal-
ta da renda diferencial positiva (a renda diferencial negativa reVel.a-se na redução
couespondente da renda absoluta, apresentada na coluna "renda absoluta"). A
transferência. das grandezas negativas para i coluna "valor díferencíal" elimina o incon•
veniente que surgia no quadro C da p. 690, quando se tinha de adíciolll!l' as rendas di-
ferenciais das diversas clao;.ses: na soma só entravam as rendas diferenciais precedidas do
&.inal +, enquanto se considerava nula a grmdeza negativa"· 9 3/13 Ubras", para se evi·
tar computação dobrada. Por isso, com o fim de calcular as rerufas diferenciais negati-
vas, introduziu Marx nos quadros maís amplos da p. 692 o título "valor diferencial
por tonelada", que também abrange os valares diferenciais negativos.

691
(CONVENÇÕES UTILIZADAS PELO TRADUTOR NA APRESENTAÇÃO

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l llll3L= IL 1612/1) X
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m 100 1S 1386/13 111/13L"'1t1612/B X I3/SL=1L11X + 16/óS L *+ Ú2/l3 X
1V 100 921/'l 170 10/13. 111/H L =! L 16 l1Jl3 X 111/37 L =1 L Sls/3? X ~264/4&1L"'•1()410f4Sl X
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IV 100 ~2 l/2 lO?íl2 1 ${6 L-1 Llõ2/3X 111/37 L ~ l LS 3S/37 X -+ 119/:lll L =• 10 80/111 X
To1al 400 292 1/2 ~36 1/4 Sl6 1/4
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u 10~ 65 lll 3/4 1 l/4L=.IL15X ·l l2/13X


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IV 100 921/l 1611/8 1 3/4L=lL15 X +9 2/~7 X
"(btll 300 l32 lil 406 118
DOS QUADROS ABAIXO: L = LIBRA!S); X= XELl!Nl !NS))

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1313/24 n •12 90/13
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17/15 L=I LH/3X u~m

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l 9.'U !.=! L 13 lI/l3 X 9!/6 o 5 o s 1/6 5
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l9 1/6 ó7 l/12 15 10/11 36 H/22 96 1/4 Sl 112

Í 9;13 L ~1 L \3 LJ/13X 1314 a 2 117 o 3 3/4 '1/7


l 7jl5 L " 1 L ~ j/J X 10 LJ l/4 SS(I on 21 l/4 12 u:
1 7il? L = 1 L Vi~/37 X w 41 7i8 5 5i1 23 13/14 51 718 29 9;'14

23 J/4 53118 13417 305/J.4 76 7/8 4; J3fl4


Admitimos que se despende càpital de 100 (capital constante e capi·
tal variável) e que o trabalho por ele movimentado proporciona trabalho
excedente (trabalho nã'o pago) igual a 1/5 da totalidade do capital adian:
tado ou mais-valia igual a 100/5. Assim, se o capital adiantado = 100 li-
bras, o valor do produto global terá de ser 120 libras. Ademais, suposto
. o lucro médio = l 0% o preço de custo do produto total é de 11 O libras,
no exemplo acima do carvão. As 100 libras de capital se transformam, com
a taxa dada de mais-valia ou de trabalho excedente, num valor de 120 li-
bras, ocorra a exploração em minas abundantes ou escassas; numa palavra:
produnvidade diferente do trabalho resulte a diferença de condições na·
turais diversas do trabalho ou condições sociais diferentes ou de condiçôes
tecnológicas diversas - em nada altera a circunstância de o valor das merca-
dorias ser igual à quantidade de trabalho nelas materializada.
Por isso, dizer que o valor do produto gerado pelo capital de 100 é de
120 significa apenas que está contido no produto o tempo de trabalho ma-
terializado no capital de 100 + 1/6 de tempo de trabalho que ·não é pago,
mas de que o capitalista se aprnpria. O valor global do produto é de 120 li·
br<ll!, e tanto faz que o capital de 100 produza numa classe de mina 60 to·
neladas, e noutra 65 ou 7 5 ou 92 1/2. Mas está claro que o valor da unida-
de considerada, seja ela expressa por tonelada como no caso, por quarter,
jarda etc., düere mui.to conforme a produtivídade. Para fi~ar em nosso
quadro (e isto se estende a qualquer outro volume de mercadoria gerado
pela produção capitalista), o valor de 1 tonelada = 2 libras, quando () pro-
duto total do capital = 60 toneladas, isto é, 60 toneladas valem. 120 libras
ou configuram tempo de trabalho igual ao que se materializa em 120 libras.
Se o produto total = 65 toneladas, o valor da· toneladµ-isolada = 1 libra
e 16 12/13 xelins ou 1 11/13 libra; se é igual a 75 toneladas, o valor da
tonelada isolada = 1 9/15 libra = 1 libra e 12 xelins; se por fim atinge
92 1/2 toneladas, o valor da tonelada é 1 11/37 libra ou 1 libra e 5 35/37
xelins, A massa total das mercadorias ou toneladas produzidas pelo capi-
tal de 100 tem sempre o mesmo valor = 120 libras, pois ·representa sempre
a mesma quantidade total de trabalho, contida em 120 libras, e justamen-
te por isso o valor da tonelada individual varia segundo esse valor se confi-
gure em 60, 65, 75 ou 92 1/2 toneladas, ísto é, de acordo com a variação
da produtividade do trabalho. Essa diferença na produtividade do traba-
lho faz que a mesma quantidade de trabalho ora se configure em menor
ora em maior volume global de mercadorias, em conseqüência a unidade
considerada dessa massa global ora contém mais ora menos da quantidade
absoluta de trabalho despendida, isto é, ora tem mais ora tem menos valor.

694
Esse valor das toneladas como unidades, o qual varia conforme o capital
de 100 libras se aplique em mina.~ abundantes ou escassas, de acordo, por-
tanto, com a produtividade diferente do trabalho, é o que figura no qua-
dro como o valor individual da tonelada de cada mina.
Por isso, nada mais falso que a idéia de que, ao cair o valor da mer-
cadoria isoladamente considerada, com a produtividade ascendente do
trabalho, sobe o val.or global do produto gerado por um capital determi-
nado, digamos, de 100, em virtude do volume acrescido de mercadorias
no qual se configura. O valor da mercadoria isoladamente considerada 'Cai
apenas por se representar o valor global - o total de trabalho despendi-
do - em quantidade maior de valores de uso, de produtos, por incidir
assim sobre a unidade produzida parte alíquota menor do valor global ou
do trabalho gasto, aliás, por só incidir sobre essa _unidade na medida da
quantidade menor ..de trabalho que ela absorve ou da quota menor que lhe
cabe do valor global.
Na origem víamos na mercadoria isoladamente considerada r~sulta­
do e produto direto de determinada quantidade de trabalho. Agora quan-
do a mercadoria se apresenta como produto da produção capitalista, há
esta mudança de forma: o volwne produzido de valores de uso representa
quantidade de tempo de trabalho = quantidade de tempo de trabalho
contida no" capital (constante e variável) consumido para produzi-los+ tem-
po de trabalho não pago de que se apropria o capitalista. Se o tempo de
trabalho contido no capital expresso em dinheiro = l 00 libras, se essas
100 libras de capital incluem 40 libras de capital desembolsado em salá-
rios e se o tempo de trabalho excedente monta a 50% do capital variável,
isto é, se a taxa de mais-valia é de 50%, então o valor da massa global de
mercadorias produzidas pelo capital de 100 é igual a 120 libras. Para as
mercadorias circularem, seu valor de troca, como vimos na primeira par-
te desta obra 87 , tem de se transformar antes em preço, isto é, de se expres-
sar em dinheiro. Assim, o capitalista, antes de lançar as mercadorias no
mercado, tem de calcular o preço da unidade, desde que o produto glo-
bal não seja uma coisa única, indivisível, como por exemplo uma casa
onde se configura o capital todo, mercadoria única cujo preço, segundo
o pressuposto, seria então igual a l 20 libras, o valor global expresso em
dinheiro. Aqui, preço = expressão monetária do valor.
De acordo com a variação da produtividade do trabalho, o valor
global de 120 libras se repartirá por mais ou menos produtos, e em con·

87. Marx, Zur Kritlk der Polirischen Oekonomie, MEW, Band 13, p. 51.

69.5
cordância o valor da unidade - na proporção - será igual a maior ou me-
nor fração alíquota de 120 libras. A operação é muito simples. Se o pro·.
duto global = 60 toneladas de carvão por exemplo, 60 toneladas = 120
libras e 1 tonelada = 120/60 libras = 2 libras; se o produto = 65 tonela-
das, o valor da tonelada = 120/65 libras = l ll/13 libra ou 1 libra e
16 12/13 xelins(= 1 libra, 16 xelins e 11 l /13 pence); para o produto= 75
toneladas, o valor da tonelada= 120/75 = 1 libra e 12 xelins; para o pro-
duto = 92 1/2 toneladas, o valor da tónel~da = 1 l 1/37 libra = l libra e
5 35/37 xelins. O valor (preço) de cada unidade de mercadoria é portan-
to igual ao valor global d.o produto dividido pelo número total ci.osprodu-
tos, mensurados de acordo com as medidas - a tonelada mesmo, o quar·
ter, a jarda etc. - apropriadas a eles como valores de uso.
Assim, se o preço da unidade é igual ao valor global do volume de
mercadorias produzidas por capital de 100, dividido pelo 11úmero total das
mercadorias, o valor global= preço da unidade x número total das unida-
des, ou é igual ao preço de determinada medida dessa unidade x número glo·
bal da massa de mercadorias, mensurada por essa medida. E mais; o valor
global consiste no valor do capital adiantado na produção + mais-valia;
no tempo de trabalho contido no ;capital adiantado + tempo de trabalho
excedente ou não pago de que se apropria o capital. Cada parte alíquota
da massa de mercadorias contém mais-valia na mesma proporção em que
encerra valor. As 120 libras se distribuem por 60, 65, 75 ou 92 1/2 tone·
ladas, e da mesma maneira se repartem por elas as 20 libras dé mais-valia.
Se o número de toneladas = 60, o valor de cada tonelada = 120{60 = 2 li·
bras ou 40 xelins, I /6 desses 40 xelins ou de 2 libras é· a quota de mais-
valia - 6 2/3 xelins - a qual cabe a cada tonelada; a proporção de mais-
valia na tonelada que custa 2 libras é a mesma nas 60 que ·custam 120 li-
bras. A proporção da mais-valia com o valor no preço de cada unidade de
mercadoria é a mesma que se observa quando se trata do valor global da
massa de mercadorias. No caso acima, a mais-valia global em cada tonela-
da= 20/60 = 2/6 ou 1/3 de 20 = 1/6 de 40 como vimos. A mais-valia de
uma tonelada x 60 é por isso igual à mais-valia global que o capital produ-
ziu. Se do valor a parte que cabe à unidade - a parte alíquota do valor
global - é menor em virtude do número maior de pródufos, isto é, em
virtude da maior produtividade do trabalho, também será menor a parte
de mais-valia que 'toca a essa unidade, a parte alíquota - que nela se inse-
re - da mals-valia global. Mas isso não influencia a proporção da mais-va·
lia, do valor novo criado com o valor adiantado e apenas reproduzido. Vi-

696
moss!! entretanto que a produtíVidade do trabalho, embora não altere o
valor global do produto, pode acrescer a mais-valia quando o produto entra no
consumo do trabalhador, e portanto se reduz o salú:rio normal ou, o que
dá no mesmo, o valor da força de trabalho, em virtude da queda do pre-
ço das mercadorias singularmente consideradas ou, o que é o mesmo, de
dada quantidade de mercadorias. A produtividade maior do trabalho, ao
criar a mais.valia relativa, não acresce o valor global do produto, mas sim
a parte desse valor global configuradora de mais-valia, isto é, de trabalho
não pago. Assim, 'se com maior produtividade do trabalho cabe à unidade
de produto parte menor do valor por ter aumentado a massa global das
mercadorias onde o valor se configura, e em conseqüência caí o preço da
unidade, sobe= contudo, nas condições mencionadas acima, a fração des-
se preço a qual representa mais-valia, terá crescido· portanto a proporção
da mais-valia com o valor reproduzido (na realidade importa referir-se ainda
ao capital variável, pois aqui não se trata ainda de lucro). Mas isso apenas
ocorre porque no valor global do produto aumentou a mais-valia em con-
seqüência da produtividade acrescida do trabalho. A mesma causa, a pr~
dutividade acrescida do trabalho, que faz a mesma quantidade de trabalho
expressai-se em maior volume de produtos, baixa por isso o valor da parte
alíquota desse volume ou o preço da unidade, reduz o valor da força de
trabalho e, em conseqüência, acresce o trabalho excedente ou trabalho
não pago contido no valor do produto global e portanto no preço da mer·
cadoria singularmente considerada. Por isso, embora o preço da unidade
de mercadoria caia, embora diminua a quantidade globalde trabalhe nela
contida e por conseguinte o valor dela, cresce, desse valor, a proporção da
parte consistente em mais-valia; ou seja, o total menor da quantidade de
trabalho inserida em ·cada unidade de mercadoria contém quantidade de
trabalhe nlío pago mawr que o anterior, quando o trabalho era mais im-
produtivo, em conseqüência era maior o preço da unidade e maior a quan-
tidade global de trabalho nela encerrado. Nesse caso, 1 tonelada, embora
encerre menos trabalho e seja mais barata por isso, contém mais trabalho
excedente e por isso dá quantidade maior de mais-valia.
Uma vez que na concorrência tudo aparece numa configuração falsa,
invertida, imagina o capitalista individual (1) que baixa o lucro sobre a uni·
d.ade de mercadoria ao reduzir-lhe o preço, mas que obtém lucro maior em
virtude do volume maior (aí ainda gera confusão o montante maior de lu-

SS. Ver voL l desta tradução, pp. 193·199.

697
cro proveniente do acréscimo do capital aplicado, mesmo com taxa mais
baixa de lucro); (2) que estabelece o preço da unidade de mercadoria e de-
te:rmina por multiplicação o valor global do produto, quando o processo
original ê a divisão, e a multiplicação só é correta em segunda instância,
que pressupõe aquela divisão. O economista vulgar apenas traduz em lin-
guagem mais teórica na aparência as estranhas noções dos capitalistas pri·
sioneiros da concorrência e procura forjar a justeza dessas noções.
Voltemos aos quadros.

O valor global do produto ou volume de mercadorias gerado por ca·


pital de 100 = 120 libras; o volume de mercadorias pode ser grande ou pe-
queno conforme varie o grau de produtividade do trabalho. O preço de cus-
to desse produto global, nã.'o importa a magnitude, é de 110 Übras, se, de
acordo com o suposto, o lucro médio = 10%. O que sobra do valor do pro-
duto global, não importa o volume, é 10 libras= 1/12 do valor global ou
1/10 do capital adiantado. Essa sobra do valor acima do preço de custo do
produto global, essas 1O libras, constitui a renda. Em nada depende, está
claro, da produtividade variável do trabalho, oriunda dos graus díferentes
da fertilidade natural das minas, dos tipos de terra, em suma, do elemento
natural em que se empregou o capital de 100, pois esses diferentes graus
na produtividade do trabalho aplicado, originários ·dos diferentes graus
de fertilidade do agente natural, não impedem o produto_ global de pro-
porcionar valor de 120 libras, preço de custo de 11 O libras e, em canse-.
qüência , sobra do valor sobre o preço de custo= 10 libras'. Tudo o que
a concorréncia entre os capitais pode conseguir é que seja de 110' Iibras o
pre.ço de custo das mercadorias que Ul'n capitalista gera com 100 libras na
produção de carvão, nesse ramo particular de produção. Mas não pode
fa:re.lo vender o produto por 11 O libras, embora valha 120 libras - coação
que se exerce nas demais indústrias. I! que de permeio surge o dono da
terra e se apodera das 10 libras. Por isso, chamo essa renda de renda abso-
luta. Daí ser sempre a mesma nos quadros, ni!o importa a mudança que su-
ceda na fertilidade das minas de carvão e por conseguinte na produtivida-
de do trabalho. Mas ela não se expressa no me:nno 'número de toneladas
em virtude dos diferentes graus de fertilidade das minas e portanto de pro-
dutivi dade do trabalho. Pois, confomie varie a produtividade do trabalho,
a quantidade de trabalho contida em 1O libras configura-se em mais ou em
menos valores de uso, em mais ou menos toneladas. Na análise posterior
dos quadros veremos se essa rendo. ab11<>luta é sempre paga no todo ou em
parte, ao variar o grau de fertilidade.

698
Mas, além disso, há no mercado disponibilidades de carvão proceden-
tes de minas com produtividade diversa, designadas - a começar pelo grau
mais baixo de produtividade - por I, II, III e IV. Assim, por exemplo, com
um capital de 100, a classe I produz 60 toneladas, a II 65 etc. Capitais de
igual magnitude, 100 libras, com a mesma composição orgânica, no mes-
mo ramo de produç!o, têm produtividade desigual por divergir o grau de
produtividade do trabalho de acordo com o grau de fertilidade da mina,
do tipo de terra, em suma, do agente natural. Mas a concorrência estabe-
lece val.or de mercado para esses produtos que divergem no val.or irulivi-
dua~. Esse próprio valor de mercado nunca pode ser maior que o valor in-
dividual do produto da classe menos fértil. Se fosse maior, apenas mostra-
ria que o preço de mercado está acima do valor de mercado. Mas o valor
de mercado tem de representar valor real. Ora; é possível que, se consíde-
ramos os produtos das classes particulares, esteja seu valnr acima ou abai-
xo do valor de mercado. Se estiver admtJ do valor de mercado, a diferença
entre' ,este e seu preço de custo será menor que a diferença entre seu valor-
individual e esse preço de custo. Mas, uma vez que a renda absoluta é igual
à diferença entre seu valor individual e seu preço de custo, o valor de merca-
do, nesse caso, não pode proporcionar a tais produtos a renda absoluta in-
teira. E se for reduzido ao preço de custo deles, não lhes proporcionará
renda alguma. Não poderão eles pagar renda, pois a renda (ren.t) é apenas a
diferença entre valor e pfeço de custo, mas para eles individualmente essa
diferença terá desaparecido por ter caído o valor de mercado. Nesse caso, é
negativa a diferença entre seu valor individual e o valor de mercado. Isto é,
o valor de mercado diverge, por magnitude negativa, do valor individual
deles. Chamo de val.or àiferencfal a diferença entre valor de mercado e va-
lor individual em geral. Çoloquei sinal menos (·) diante do valor diferencial
das mercadorias que se encontram na situação referida.
Em contrapartida, se o valnr individual dos produtos de uma classe
de mina (classe de terra) está abaixo do valor de mercado, o val.or de merca-
do estará então acima desse valor individual. O valor, ou valor de mercado,
vigente nesse ramo de produção dará portanto sobra acima do valor indivi-
dual deles. Se o valor de mercado da tonelada, por exemplo, for 2 libras,
o valor diferencial da tonelada, com valor individual = 1 libra e 12 xelins,
será de 8 xelins. E uma vez que o capital de 100 libras produz 75 toneladas
na classe onde o valor individual da tonelada = 1 libra e 12 xelins, o valor
diferencial global, para essas 75 toneladas, é de 8 xelins e 75 = 30 libras.
Para o produto todo dessa classe, essa sobra do valor de mercado acima
do valor ,individual desse produto, a qual decorre da fertilidade relativa

699
maior da terra ou da mina, constitui a renda diferencial, uma vez que para
o capital o preço de custo permanece o mesmo. Essa renda diferencial é
maior ou menor, segundo a maior ou menor sobra do valor de mercado
sobre o valor tnih'viduat sobra que por sua vez é maior ou menor de- acor-
do com a fertilidade relatir>a maior ou menor da classe de mina ou de solo
à qual pertence o produto, comparada com a classe menos fértil cujo pro-
duto determina o valor de mercado.
Por fim cabe ainda observar que diverge o preço de custo individual
dos produtos das diferentes classes. Por exemplo, para a classe onde o
capital de 100 libras fornece 75 toneladas com valor global = 120 libras
e preço de custo = 110 libras, o preço de custo da mercadoria individual
será de 1 libra e 9 1/3 xelins; e se o valor de mercado for igual ao valor
individual nessa classe, isto é, a 1 libra e 12 xelins, as 75 toneladas vendi-
das por 120 libras darão renda de 10 libras, enquanto 110 libras represen-
tarão seu preço de custo.
Mas o preço de custo individual de cada tonelada varia naturalmen-
te de acordo com o número de toneladas em que se configura o capital
de 100 ou de acordo com o valor individual do produto particular das di·
ferentes classes. Por exemplo, se o capital de ·100 produz 60 toneladas, o
valor da tonelada será igual a 2 libras e seu preço de custo= 1 libra 16 2/3
xelins; 55 toneladas serão iguais a 110 libras ou ao preço de custo do -pro-
duto global. Em contrapartida, se o capital de 100 produz-_ 75 toneladas,
o valor da tonelada = 1 libra e 12 xelins, e seu preço cte· custo = 1 libra e
9 1/3 xelins, e do produto global 68 3/4 tonelada$ custariam l_lO libras
ou reporiam o preço de custo. Nas diferentes classes, o preÇo de custo in·
dividual, isto é, o preço de custo de uma unidade, de cadfZ tonelada, varia
na mesma proporção do va'/or individual.
Em todos os 5 quadros evidencia-se que a renda absoluta é sempre
igual à sobra do valor da mercadoria acima do próprio preço de custo;
em contrapartida, a renda diferencial = sobra do valor de mercado acima
do valor individual da mercadoria, e a renda total, se existe a diferencial
(além da renda absoluta) = sobra do valor de mercado acima do valor
individual + sobra do valor individual acima do preço de custo = sobra
do valor de mercado acima_ do preço de custo individual.
Uma vez que o objetivo aqui é expor a lei geral da renda para ilustrar
minha teoria sobre valores e preços de custo, e como só examinarei em
pormenor a renda fundiária quando trataI especificamente da proprieda·
de fundiária, afastei todas as circunstâncias que complicam a questão: a
saber, influêndtz da. localização das minas ou tipos de solo; grau variável

700
de produtividade das doses de capital aplicadas na mesma mina ou no
mesmo tipo de solo; relação entre as rendas obtidas de variedades dife-
rentes do mesmo ramo 4e produção, digamos, por diferentes atividades
agrícolas; relaçlfo entre as rendas obtidas de ramos de produção diferentes,
mas intermutáveis como, por exemplo, quando se retira terra da agricul-
tura para a construção de imóveis etc. Nada disw cabe aqui.

3. Análise dos Quadros

Detenhamo-nos no exame dos quadros. Mostram como a lei geral


explica grande variedade de combinações, enquanto Ricardo, por não
ter CPIJlpreendido a lei geral da renda, só entendeu a natureza da renda
diferencial de maneira unilateral, e por isso' pretendeu reduzir, por meio
de abstração forçada, a grande diversidade dos fenômenos a um caso úni-
co. Os quadros não têm por fim mostrar a totalidade das combinações,
mas apenas· as mais importantes, sobretudo para nosso objetivo específico.

a) Quadro A. A relação entre valor individual e valor


de mercado.

No quadro A, o valor de mercado da tonelada de carvão é deteoni-


nado pelo valor individual da tonelada na classe I que tem a mina menos
fértil, portanto, a menor produtividade do trabalho, em conseqüência, a
massa mais reduzida de produtos fomecida pelo emprego do capital de
100 libras e, por isso, a unidade com o preço mais alto (o preço determi-
nado pelo valor dela).
Supõe-se que o mercado absorve 200 toneladas, nem mais nem menos.
O valor de mercado não pode estar acima do valor da tonelada em 1,
da mercadoria obtida nas condições mais desfavoráveis de produção. A cir-
cunstância de II e III venderem a tonelada acima do valor individual decor-
re de as respectivas condições de produção serem mais favoráveis que as

701
das demais mércadorias produzidas no mesmo ramo, e assim não se ínfrin·
ge a lei do valor. Em contrapartida, o valor de mercado só poderá estar
acima do valor da tonelada em I se o produto de 1 for vendido acima de
seu valor, sem consideração alguma pelo valor de mercado. Diferença entre
valor de mercado e valor ocorre em geral não porque se vendem produtos
absolutamente acima de seu valor, mas só porque o valor que tem o pro-
duto de um ramo inteiro pode divergir do valor do produto individual, isto
é, porque o tempo de trabalho necessário para fornecer o produto global -
no caso 200 toneladas - pode diferir do tempo de trabalho que produz
parte das toneladas, aqui as de II e III, numa palavra, porque o produto
global fornecido resultou de trabalhos com diferentes graus de produti-
vidade. A diferença entre valor de mercado e valor individual de um pro-
duto só pode por isso relacionar-se com os diferentes graus de produtivi-
dade com que detenninada quantídade de trabalho gera porções diferentes
do produto global. Nunca pode relacionar-se com a circunstância de o valor
ser determinado de maneira independente da quantidade de trabalho apli-
cada em geral nesse ramo. O valor de mercado da tonelada só poderá estar
acima de 2 libras se 1, postas de lado suas relações com II e III, em geral
·vender seu produto acima do valor, dele. Nesse caso, em virtude da situa-
ção do mercado, do nível da oferta e da procura, o preço de mercado es-
tará acima do valor de mercado. Mas, o valor de mercado de-que estamos
tratando -- ao qual aqui se pressupõe igual o preço de mercado - não pode
estar acima de si mesmo.
O valor de mercado aqui é igual ao valor de I, que aliás fornece 3/10
de todo o produto disponível no mercado, pois II e III só fornecem o sufi.
ciente para se chegar à satisfação da procura global, para.suprir a procura
adicional que não é atendida por 1. II e III não têm portanto motivo para
vender abaixo de 2 libras, uma vez que o produto todo pode ser vendido
a 2 libras. Não podem vender acima de 2 libras porque 1 vende a tonelada
por 2 libras.
Esta: lei pela qual o valor de mercado não pode ser gerado acima do
valor individual do produto obtido nas piores condições de produção e
que fornece parte da oferta necessária, desfigura-a Rícardo sustentando
que o valor de mercado nunca pode cair abaixD do valor daquele produto
e portanto tem sempre de ser por ele deternúnado. Veremos adiante o
erro dessa aiirmaçfo.
Em I, por coincidirem valor de mercado e valor individual da tonela-
da, a renda obtida, a sobra absoluta do valor sobre o preço de custo, repre-
senta a renda absoluta = 10 libras. II fornece uma: renda diferencial de 1O

702
libras e III uma de 30 libras porque o valor de mercado determinado por I
proporciona a II uma sobra de 1O libras e a III de 30 libras sobre o respec-
ti\'o valor individual e, em conseqüência, acima da renda absoluta de 10 li-
bras,que representa o excesso do valor individual sobre o preço de custo.
Por isso, II fornece renda global de 20 e III de 40, pois o valor de mercado
configura excesso de 20 e de 40 acima do preço de custo deles.
Supomos que se marcha de 1, a mina menos fértil, para II, mais fér-
til, e desta para III, mais fértil ainda. Sem dúvida II e III são mais férteis
que I, mas só satisfazem 7/10 da procura total e por isso podem, como
acabamos de expor, vender seu produto por 2 libras, embora o valor dele
seja respectivamente de 1 libra e 16 12/13 xelins e 1 libra e 12 xelins ape-
nas. Quando se fornece a quantidade requerida para satisfazer a procura e
ocorre gradação na produtividade. do trabalho que satisfaz às diferentes
porções dessa procura - conforme a transição se opere num ou noutro sen·
tido -, é claro que, nos dois casos, o valor de mercado das classes mais fér-
teis sobe acima de seu valor individual; num caso, porque acham o valor
de mercado determinado pela classe menos fértil e a oferta adicional que
suprem não basta para alterar o valor de mercado determinado pela classe
I; no outro, porque o valor de mercado que originahnente determinavam,
que era estabelecido pela classe III ou II, passa a ser determinado pela clas-
se 1, que proporciona a oferta adicional exigida pelo mercado, e s6 pode
proporcioná·la por valor mais· alto - que ora deternúna o valor de mercado.

b) Nexo da teoria da renda de Ricardo com a


concepção da produtividade cadente da
agricultura. Relaçao das varit1fões da taxa de
renda absoluta com as variações da taxa de lucro.

Na situação considerada, por exemplo, diria Ricardo: o ponto de par·


tida é a classe III. E a oferta adicional, de início, é fornecida por II. Por
fim, a última oferta adicional - que o mercado exige por I, e como 1
só pode fornecer a oferta adicional de 60 toneladas por 120 libras, por 2
libras a tonelada, e essa oferta.é necessária, sobe então para 2 libras ova-
lor de mercado da tonelada, o qual na origem era 1 libra e 12 xelins e mais
tarde 1 libra e 16 12/13 xelins. Mas, ao revés, é por igual certo que, se o
ponto de partida é l que satisfazia a procura de 60 toneladas por 2 libras
e se depois II supre a oferta adicional vendida ao valor de mercado de 2

703
libras, embora o valor individual d.e seu produto seja apenas de l libra e
16 12/13 xelins, então só pode continuar o suprimento necessário de 125
toneladas se 1 fornecer as 60 toneladas pelo valor de 2 libras. Do mesmo
modo, se é necessária nova oferta adicional de 75 toneladas, mas III só
fornece 75 toneladas, provê apenas a procura adicional, 1 terá de conti-
nuar suprindo as 60 toneladas por 2 libras. Se I tivesse provido a procura
toda de 200 toneladas, teriam sido elas vendidas por 400 libras. E assim
são vendidas agora porque II e IIl não vendem pelo preço a que podem
satisfazer a procura adicional de 140 toneladas e sim pelo preço a que 1,
que somente ·supre 3/10 do produto, poderá satisfazê-la. O volume do pro-
duto requerido = 200 toneladas é vendído então a 2 libras a ·tonelada por-
que 3/10 dele sô podem ser fornecidos pelo valor de 2 libras a tonelada,
e tanto faz que o suprimento das porções adicionais da procura apareça
na seqüência ID, Il e 1 ou na I, II e III.
Diz Ricardo: se IIl e II sã'o os pontos de partida, seu valor de mer-
cado tem de subir para o valor de 1 (preço de custo para ele) por serem os
3/10, que 1 fornece, necessários à procura e estar em jogo portanto o volu·
me requerido de produtos e não o valor índívidual de porções particula·
res. Mas é correto também afirmar que, se o ponto de partida é 1, e II e
Ili apenas fornecem a procura adiciooal, os 3/10 de 1 continuam .por igual
necessários; se este determinou o valor de mercado na seqüência descen·
dente, pelas mesmas razões determina-0 na seqüência ascendente. O qua-
dro A portanto mostra-nos o erro da concepção rícardiana de a renda di-
ferencial supor a transição das minas e terras mais férteis para .a8 menos
férteis, a produtividade decrescente do trabalhQ. Ela .também é de todo
compatível com a seqüência inversa e portanto com a pródutividade cres-
cente do trabalho. A efetivação de uma ou de outra seqüência nada tem a
ver com a natureza e a existência da renda diferencial: é um problema
histórico. Na realidade, as seqüências ascendentes e descendentes se cru·
zam, e a procura adicional é suprida por transição para tipo de terra, mi-
na, fator natural, ora mais fértil ora menos fértil. Sempre se supõe ai que
a oferta suprida pelo agente natural de classe nova e diferente - seja mais
fértil ou menos - apenas iguala a procura adicional e assim não altera a
relação entre procura e oferta; só causará, portanto, mudança no prôprio
valor de mercado no ponto em que a oferta só possa ser suprida não a
custos mais baratos e sim a custos mais caros.
Assim, o quadro A logo patenteia a falsidade daquela fundamental
suposição ricardiana, que, segundo mostra Anderson, nlfo era necessária
mesmo no caso de uma concepção errônea da rendll absoluta.

704
Se a transição se faz na seqüência descendente, de III para II e de
II para 1, com emprego de fatores naturais cuja fertilidade decresce gra·
dualmente, é III, onde se aplica capital de 100, quem primeiro vende suas
mercadorias pelo valor delas, por 120 libras. Isso dá l libra e 12 xelins por
tonelada, uma vez que III produz 75 toneladas. Se for necessária oferta
adicional de 65 toneladas, II, que investe capital de 100, também vende
seu produto por 120. Isso dá 1 libra e 16 12/13 xelins por tonelada. Se
por fim for necessária oferta adicional de 60 toneladas, que só 1 pode
fornecer, venderá este seu produto também pelo respectivo valor de 120
libras, o que dá 2 libras por tonelada. Com esse processo, III darã renda
diferencial de 18 6/13 libras logo que II chegue ao mercado, quando antes
só proporcionava a renda absoluta de l O libras. II dará renda diferencial
de 10 libras assim que 1 entre no jogo, e a renda diferencial de III subirá
para 30 libras.
Ricardo, ao descer de m para I, não acha mais renda em I por ter
partido em III da idéia de não existir renda absoluta.
Sem dú'Vida há diferença entre a seqüência ascendente e a descenden-
te. Quando se vai de I para III, de modo que Il e III apenas suprem a ofer-
ta adicional, o valor de mercado permanece igual ao valor individual de
1 = 2 libras. E quando o lucro médio, conforme se pressupõe aquí, é de
10%, pode.se admitir que em seu cômputo terá entrado o preço do carvão
(ou o preço do trigo; é sempre possível substituir 1 quarter de trigo etc.
por l tonelada de carvão), uma vez que carvão tanto entra no consumo
dos trabalhadores na qualidade de meio de subsistência, quanto no capi·
tal constante na função de importante matéria auxiliar. Por isso, pode-se
admitir ainda que a taxa de mais-valia teria sido mais alta, portanto maior
a própria mais-valia e também mais de 10% a taxa de lucro, se 1 tivesse si·
do mais produtivo ou o valor da tonelada se fixado abaixo de 2 libras. E o
que sucederá se III for o ponto de partida. O valor de mercado da tonela-
da de carvão será então de 1 libra e 12 xelins; sobe, quando entra II, para
1 libra e 16 12/ 13 xelins e, por fim, para 2 libras, aÕ entrar I. Pode-se por-
tanto admitir que - supostas constantes e inalteradas todas as demais cir·
constâncias, duração do trabalho excedente, outras condições de produ-
ção etc. - a taxa de lucro era mais alta (e também a taxa de ma.is-valia por·
que mais barato um elemento do salário; já em 'Virtude da taxa mais alta
de mais-valia, mais elevada a massa de mais-valia e em conseqüência tam-
bém a taxa de lucro; mas, além disso - com a mais-valia assim modifica-
da - a taxa de lucro fica mais elevada por ser menor um elemento de cus-
to do capital constante) quando se explorava apenas III, diminuí ao entrar

705
em cena II e por fim cai nível mais baixo, 10%, com I. Caberá então su·
por que, por exemplo (não importam os dados), a taxa de lucro era de 12%
quando apenas se eiplorava IH; caí para 11 % quando II entra em cena, e
em deturitivo para 10% quando I aparece. Nesse caso, a renda absoluta de
III teria sido de 8 libras porque o preço de custo = 112 libras; teria ido
para 9 libras após a entrada de II em cena, porque então o preço de cus-
to = 111 libras. e por fim se teria elevado a 1O libras por causa da queda
do preço de custo para 11 O libras. Por isso, variaria a taxii da própria ren-
da absoluta e na razão inversa da variação da taxa de lucro. Haveria cresci·
mento progressivo da taxa de renda por ocorrer declínio progressivo da ta·
xa de lucro. Esta teria caído em virtude da produtividade decrescente do
trabalho nas minas, na agricultura etc. e do correspondente encarecimen-
to dos meios de subsistência e das matérias auxiliares.

e) Observações sobre a influência da variação do


valar dos meios tk suhsistência e das matérias-
primas (e do va/Dr da maquitiaria) sobre a
composição orgânica do capital.

No caso considerado, a taxa de renda subiu por ter caído a taxa de lu-
cro. Caiu esta por ter mudado a constituição orgânica do capital? Se a cons-
tituição média do capital era 80c + 20v, ficou ela invariável? Supõe-se que
não varia a jomada normal de trabalho. Do contrário, a influência do enca-
recimento dos meios de subsistência pode ser neutralizada,.Há aí duas coi-
sas a distinguir. Primeiro, encarecimento dos meios de subsistência, em con·
seqüência redução do trabalho excedente e do valor excedente. Segundo,
encarecimento do capital constante por se elevar, como no caso do carvão,
o va1or da matéria auxiliar, ou de outro elemento do capital constante, a
semente no caso do trigo, ou ainda por poder subir, em virtude do encare-
cimento do trigo, o preço do produto broto (matéria-prima). Por fim, se o
produto for ferro, cobre etc., subirá a matéria-prima de certos ramos indus-
triais e a matéria-prima da maquinaria (inclusive recipientes) de todos os
ramos de produção.
Supõe-se que não houve, sob um aspecto, mudança alguma na cons-
tituição orgânica do capital; isto é, não houve mudança no método de pro·
dução a qual aumentasse ou diminuísse a quantidade a aplicar de trabalho
vivo em relação à massa do capital constante empregado. Continua a ser

706
requerido o mesmo número de trabalhadores (não mudam os linútes da
jornada normal de trabalho) para transformar a mesma massa de matéria-
prima com a mesma massa de maquinaria etc., ou pra movimentar a mesma
maSs:a de maquinaria, instrumentos etc., onde não há. matéria-prima. Mas,
além desse aspecto a consíderar na composição orgânica do capital, há
ainda outro, a saber, a variação no valor dos elementos do capital, embora
e.orno valores de. uso continuem e1es a ser empregados nas mesmas porções.
Aí cabe distinguir:
Primeiro: a variação do valor influencia por igual ambos os elemen-
tos - o constante e o variável. Isso nunca deverá ocorrer na prática. Alta
de certos produtos agrícolas, como trigo etc., encarece o salário (necessá-
rio) e a matéria-prima (a semente, por exemplo). Alta do caJVão encarece
o salário e a matéría auxiliar da maioria das indústrias. Todavia, no primei-
ro caso, a alta de salário sucede em todos os ramos industriais, e a de ma-
téria-primas só se dá em algumas. Para o carvão, a proporção em que en-
tra no salário é menor que aquela em que entra na produção. Para a tota-
lidade do capital portanto, não é de se esperar que a variação no valqr do
algodão e no do trigo influenciem por igual ambos os elementos do capi-
tal. Mas·admitamos que isso ocorra.
Seja igual a 120 o valor do produto do capital 80c + 20v. Para a to·
talidade do capita~ o valor e o preço de custo do produto coincidem. E
que a diferença se nivela para essa totalidade. A elevação do valor de um
artigo como carvão, que, segundo o pressuposto, entra em proporção si·
métrica nos dois componentes do capital, gera, para os dois elementos,
elevação, dígamos, de 1/10 no custo. Assim, com 80c só se poderá com-
prar quantidade aproximada à que se obtinha antes com 70c, e com 20v
sõ se poderá pagat a quantidade aproximada de trabalhadores que antes
se conseguia com 18v. Ou, para prosseguir a produção na mesma escala
anterior, será mister desembolsar agora cerca de 90c e 22v. O valor do
produto continua a ser 120, mas o respectivo dispêndio = 112 (90 de ca-
pital constante e 22 de variável). Assim, o lucro = 8, o que corresponde
a 1/14 = 71/7% de 112. Por ísso, o valor do produto para o capital de-
sembolsado de l 00 será agora de 107 1/7.
Em que proporção entram agora e e v no novo capítal? Antes a ra-
zão v e = 20 80 = l 4, agora é 22 : 90 = 11 : 45. 1/4 = 45/180;
11/45 = 44/180. Isto é, o capital variável decresceu de l /180 em relação
ao constante. Para continuar vâlída a hipótese de a alta do carvão etc. ter
o mesmo efeito proporcional sobre ambas as partes do capital, temos de
adnútir 88c + 22v- Para o valor do produto = 120, deduzimos o dispên.

707
dio de 8S + 22 ;;::: 110, e fica o lucro de 10. 22 : 88 = 20 : 80. Entre e e v
terá permanecido a mesma proporçiio do capital anterior. Continua a ra-
=
zão v : e= 1 : 4. Mas, o lucro de 10/110 = l/l l 9 1/11%. Por isso, se o
objetivo é manter a produçiio na mesma escala, é mister investir capital
de 110 onde antes se empregava 100, e o va1or do produto continua a ser
de 12089 • Mas, para um capital de l 00, a composição seria 80c + 20v, com
produto no valor de 109 1/11.
Segundo: se, no caso acima, ficasse inalterado o valor de 80c e ape-.-
nas variasse o de v, a razlio anterlçir 20 : 80 ou 1O : 40 seria agora 22 80
ou 11 : 40. Se ocorresse essa variação, o capital ascenderia a 80c + 22v
e o valor do produto a 120; portanto, desembolso de 102 e lucro de 18,
isto é, de 17 33/51%. Mas 22 18 = 21 29/51 .17 33/51. Se é mister
desembolsar em salário capital de 22y para movimentar capital constante
no valor de 80, precisa-se então de 21 29/51 para movimentar capital cons-
tante no valor de 78 22/5L De acordo com essa proporção, do capital
de 100 apenas 78 22/51 podem corresponder a dispêndio com maquinaria
e matéria·prima; 21 29/51 terão de ir para salário, quando antes eram 80
para matéria-prima etc., e apenas 20 para salário. Valor atual do produ-
to = 117 33/51. E a composíção do capital: 78 22/Slc + 21 29/Slv. Mas
são 21 29/51 + 17 33/51 = 39 lJ/5!. Na composição anterior, o total
do trabalho adicionado = 40; agora é 39 11/51 ou menos 40/Sl não por
se ter alterado o valor do capital constante e sim por haver .menos capital
constante para transformar, e assim pode o capital de- 100 m.ovimentar
trabalho em quantidade pouco menor que antes, ~mbora, tràbajho pago
m•~-
Se, por isso, variação num elemento de ctisto - aqui encarecimen-
-
to, elevação do valor - altera apenas o salário (necessário), ocorrerá o se-
guinte: primeiro, cai a taxa de mais-valia; segwi.do, para um dado capital,

89. No exemplo referido por Marx, o produto cuja produção depende da proprie-
dade fundiária entra, em proporção invariável, nos dois componentes do capital adian-
tado. Marx admite que, apesar do encarecimento do capital constante (88c em vez de
80c, em virtude do preço maior da matéria·prima) e da alta do sal.á:do (22v em vez de
20v, em virtude do preço mais alto dos meios de subsistência dos trabalhadores), o va-
lor do produto total contínua a ser 120 como dantes. Só pôde ocorrer ísso porque a
mais-valia de que se apropriou o capitalista caiu de 20 para 10. Tal redução da mais--
valia tem origem no acréscimo da renda diferencial em 10 unidades nos solos mais
produtivos, relacionado eom a entrada em exploração de solos menos produtivos. Esse
acréscimo da renda diferencial se realiza por meio do acréscimo do valor do capital
constante em 8 unidades e do valor 4o capital variável em 2 unidades.
Ver caso semelhante neste volume pp. 890·893.

708
pode-se empregar menos capital constante, menos matéria-prima e maquinaria.
O montante absoluto dessa parte do capital reduz-se em relação ao variável e,
não se alterando as demais condições, tem sempre de provocar alta na taxa de
lucro (se o valor do capital constante não varia). Seu volume diminui, embora
seu valor continue o mesmo. Mas a taxa de maiS>valia decai e a própria
mal$-valia decresce, uma vez que, ao cair a taxa, não cresce o número dos
trabalhadores empregados. A taxa de mais-valia - de trabalho exceden·
te - cai mais que a proporção do capital variável com o constante. S mis-
ter portanto continuar a empregar o mesnw número anterior de trabalha-
dores, isto é, a mesma quantidade absoluta de trabalho para movimentar·
a mesma massa de capital constante. Só que essa quantidade absoluta de
trabalho encerra mais trabalho necessário e menos trabalho excedente. S m.is--
ter portanto pagar mais caro pela mesma quantidade de trabalho. Do mesnw
capital - 100 por exemplo - pode-se investir menos em capital constante,
uma vez que se tem de desembolsar mais em capital variável para movi-
mentar capital constante menor. A queda da taxa de mais-valia neste caso
não está ligada a acréscimo na quantidade absoluta de trabalho que deter~
minado capital aplica ou a actéscimo do número dos trabalhadores que em·
prega. A~im, a própria mais-valia aqui não pode elevar-se, embora caia a
taxa de mais-valia.
Se a composição orgânica do capital, portanto, permanece a mesma
no tocante ao aspecto material dos componentes como valores de uso,
isto é, se a mudança dessa composição não deoorre de mudança no méto-
do de produção no ramo onde se emprega o capital, mas apenas de eleva·
ção no valor da força de trabalho e, em conseqüência, de alta do salário
necessário, o que é igual a decréscimo do tempo de trabalho excedente
ou da taxa de m~valia, decréscimn impossível de ser neutralizado no
todo ou em parte por acréscimo do número de trabalhadores empregados
por capital de dada magnitude - 100 por exemplo -, então, a queda da
taxa de lucro tem origem pura e simples na queda da própria mais-valia..
Se não se altera o método de produção nem a razão entre as quantidades
de· trabalho imediato e de trabalho acumulado, então a mudança na com-
posição orgânica do capital provém dessa mesma causa, tem odgem apenas
na circunstância de se ter modificado o valor (o valor proporcional) das
quantidades empregadas. O mesmo capital emprega, sem mudar a propor-
ção, quantidade menor de trabalho ime.diato e quantidade menor de capi-
tal constante, mas paga mais caro por essa quantidade menor de trabalho.
Só pode por isso empregar menos capital constante porque a menor quan·
tidade de trabalho, que movimenta esse capital constante, absorve parte
maior do capital todo. Para movimentar 78 de capital constante, tem de

709
despénder, .por exemplo, 22 de capital variável, quando antes 20v basta-
vam p~ pôr em marcha 80c.
E o que se dá quando o encarecimento do produto sujeito à proprie-
dade fundiâria influencia apenas o salário. Ocorrerá o resultado oposto
ao baratear esse produto.
Mas tratemos do caso que supusemos acima. O encarecimento do
produto agrícola atinge em pro(JOTfÕO 'igual capital constante e capital
variável. De acordo com o pressuposto, também não ocorre aqui mudan-
ça na Cl)mposição orgânic.a do capital. Primeiro, nenhuma mudança no
método de produção. A mesma quantidade absoluta de trabalho imedia·
to continua a movimentar a mesma quantídade de trabalho acumulado.
A razão entre as quantidades não se altera. Segundo, não varia a propor-
ção do vakJr do trabalho acumulado com o do trabalho imediato. Se sobe
ou desce o valor de um, o mesmo se dá com o outro e.m proporção igual a
sua magnitude relativa, que portanto permanece inalterada. Mas, antes
80c + 20v- valor do produto = 120. Agora 88c + 2;, valor do produ·
to = 120. lsso dá 1O para 11 O, ou seja, 9 l /11 %, isto é, valor de 109 1/11
para soe+ 20v. .,
Tínhamos antes:

Capital Qipital Mais-valia Taxa de lucro Taxade 1


constante variável mais-valia 1
80 20 20 20% l00%
~-·---·-------------

Agora temos:

Dpital . --;;;.,ital ··-. Mais-valia Taxa de lucto Taxa de


[ constante variável mais-valia
80 20 91/11 9 1/11% 45 5/11%
·--·--·-------------------~

Aí 80c representa menos matéria-prima etc., e 20v• na mesma pro-


porção, menos trabalho absoluto. Ficou maís cara a matéria·prima etc.; a
quantidade de matéria-prima etc. comprada por 80 ficou por isso menor
e portanto exige. uma vez que não mudou o métodc de pr'odução, menos
trabalho imedíato. Mas essa quantidade menor de trabalho imediato custa
tanto quanto antes a quantidade maior de trabalho imediato e encareceu
por"igual, ficando portanto reduzida na mesma proporção da matéria-pri·
ma etc. Assim, se a mais-valia não variasse, a taxa
de lucro decresceria na
proporção em que encarecesse a matéria-prima etc., mudasse a felação entre

710
o valor do capital variável e o do capital constante. A taxa de mais-valia,
porém, não pennaneceu a mesma; ao contrário, variou na mesma propor·
ção em que cresceu o valor do capital variãvel
Vejamos outro exemplo.
O valor da libra-peso de algodão subiu de 1 xelim para 2. Antes po-
diam ser compradas 1 600 libras-peso com 80 libras (façamos aqui a má-
quina etc. =
O). Agora, com 80 libras só podem ser compradas 800 libras-
peso. Antes, para fiar 1 600 libras-peso eram necessárias 20 horas de salá-
rio que correspondiam, digamos, a 20 trabalhadores: Para fiar 800 libras-
peso bastam 10, uma vez que o método de produção não mudou. Os 10
trabalhadores custavam antes 1O libras, custam agora 20, do mesmo modo
que as 800 libras-peso custavam antes 40 libras e ora custam 80. Admita-
mos que o lucro anterior era de 20%. Aí supomos:

"fuada. ~ntcJ

1·3tltUnas:=.t 60(Jltbtu-pc.s1:1d~ l.!Jlibm•~ú uabllhad4Jr' 20 ).ibru 100~


"'W""" llOOllbn>r<»doll<>
tl.g~lo
llWlíl:mi=&oO:lil;lr&S-~~de 20.U'tnt$•JO lnba1kukf't$ l()libru ~!)$, 10~ •m&h"b~4~ffo
.,JfOdtio
----··--·-·-····---··--··--------

A mais-valia que 20 trabalhadores criam é igual a 20, e assim a que


1O geram-é igual a 10 hõras; mas, agora, para produzir estas continua a ser
necessário pagar 20 libras, quando, segundo a proporção anterior, só 10
eram pagas. O valor do produto, a libra-peso de fio, tem de subir aqui, se-
ja como for, porque contém mais trabalho, trabalho acumulado (do algo-
dão que nela entra) e trabalho imediato.
Se subisse apenas o algodão e não variasse o salário, 1O trabalhado-
res apenas, como dantes, fiariam 800 libras-peso de algodão. Mas esses 10
trabalhadores só custariam 1O libras. Assim, a mais-valia de 10 correspon-
deria como dantes a 100%. Para fiar as 800 libras-peso são necessários 10
traballiadores com dispêndio de capital de 1O. Assim, dispêndio total do
capital: 90. Agora, conforme o pressuposto, teremos sempre 1 trabalhador
para cada 80 horas-peso de algodão. Daí, para 800 libras-peso, 1O, e para
1 600, 20. Quantas libras-peso poderá füu agora o capital total de 100?
Poder-se-á comprar 88 8/9 libras de algodão e despender 111/9 libras em
salário.
As proporções seriam: (vide tabela)

711
Nesse caso, nã:o se dá variação de valor no capital vuriáve~ mantém-
se portanto a mesma taxa de mais-valia, e daí;
Em 1 o capital variável está para o constante na razão de 20 ;80 = 1 :4.
Em III, a razão é 11 1/9 : 88 8/9 = 1 : 8, isto é, o capital variável reduziu·
se relativamente de metade por ter duplicado o valor do capital constante.
O mesmo m'.tmero de trabalhadores fia a mesma massa de algodão, mas ago-
ra, com 100 libras, só 11 l /9 trabalhadores podem ser empregados, enquan-
to as libras restantes - 88 8/9 - só compram 888 8/9 Ubras·peso, em vez
de 1 600 como em 1. A taxa de mais-valia nã'o se alterou. Mas, em virtude
da mudança no valor do capital constante, não é mais possível empregar
o mesmo número de trabalhadores para um capital de 100; variou a pro-
porção do capital variável com o constante. Daí reduzir-se o montante da
mais-valia e em conseqfiência o lucro, pois se computa essa mais-valia so-
bre o mesmo dispêndio anterior de capital. No primeiro caso, o capital va·
riável era 1}4 do constante (20 : 80) e 1/5 do capital todo("" 20). Agora é
apenas 1/8 do capital constante (111/9 88 8/9) e 1/9 (111/9) de 100,
do capital todo. Mas 100% de 100/5 ou 20 é 20, e 100% de 100/9 ou
111/9 é somente 11 1/9. Não se alterando aí o salário ou valor do capi·
tal variável, cai sua grandeza absoluta por ter subido o valor do capital
constante. Por isso, decresce a percentagem do capital variáyel, em conse-
qfiência a própria mais-valia, sua grandeza absoluta e pottanto a taxa de
lucro.
Mudança no valor do capital constante - i'fW.lterados valor do capi-
tal variável e método de produção, proporções iguais portanto das quan-
tidades empregadas de trabalho, matéria-prima e maquinaria - gera na
composição do capital a mesma variação que haveria se o valor do capital
constante nã'o variasse e se aplicasse, do capital de valor inalterado, masrJa
maior (portanto, também maior soma de valor) em relação ao capital des-
pendido em salário. A conseqüência necessária é queda do lucro. (Ao con-
trário, quando cai o valor do capital constante.)
Ao revés, mudança no va'/or do capital variável (aqui elevação) au-
menta a proporção do capital variável com o constante. em conseqüência,
a percentagem do capital variável sobre o capita! todo ou -a cota propor-
cional que nele possui. Contudo, aqui a taxa de lucro cai em vez de subir.
Pois o método de produção não mudou. Continua-se a aplicar a mesma
massa de trabalho vivo para transfonnar em produto a mesma massa de
matérias-primas, maquinaria etc. Agora, como no caso anterj_or, com o mes-
mo capital de 100 só se pode movimentar volume global menor de trabalho

712
imediato e de trabalho acumulado; mas a quantidade menor de trabalho
custa mais. O salário necessário subiu. Fração maior dessa quantidade me-
nor de trabalho corresponde a trabalho necessário, e, em conseqüência,
fração menor constitui trabalho excedente. A taxa de mais-valia cai enquan-
to ao mesmo tempo diminui o número dos trabalhadores ou a quantidade
total de trabalho comandada pelo mesmo capital. O capital variável aumen-
tou em relação ao capital constante e por isso em relação ao capital todo,
embora a quantidade de trabalho tenha diminuído em relação à massa do
capital constante. Assim, cai a mais-valia e com ela a taxa de lucro. Antes
a taxa de lucro caiu porque, inalterada a taxa de maú-valia, o capital variá-
vel diminuiu em relação ao constante e por conseguinte em relação ao ca-
pital todo, ou a mais-valia decresceu porque, inalterada a taxa. se reduzira
o número de trabalhadores, minguara seu multiplicador. Desta vez cai a
taxa de lucro porque o capital variável sobe em relação ao constante e por-
tanto em relação ao capital todo; essa alta do capital variável é acompanha-
da de queda da quantidade de trabalho aplicado (trabalho empregado pelo
mesmo capital); ou a mais-valia cai por sua taxa decrer;cente estar ligada a
número decrescente de trabalhadores empregados. O trabalho pago aumen·
tou em relação ao capital constante, mas diminuiu a quantidade total de
trabalho.
Essas variações do valor sempre atuam portanto sobre a própria
mais-valia, cujo montante absoluto decresce em ambos os casos porque
diminui um dos dois ou os dois fatores que a determinam; ora decresce
por diminuir o número de trabalhadores, inalterada a taxa de mais-valia, ora
decresce por diminuirem a taxa e o número de trabalhadores empregados
para 100 de capital.
Chegamos por fün ao caso IT: aí a mudança do valor de um produ-
to agrícola tem proporcionalmente efeito igual sobre as duas partes do ca-
pital e, em conseqüência, essa mudança de valor não é acompanhada por
mudança na composição orgânica do capital.
A libra-peso de fio nesse caso (ver p. 58490 ) sobe de l xelim e 6
pence para 2 xelins e 9 pence por ser produto de tempo de trabalho maior
que o anterior. Cont.ém sem dúvida a mesma quantidade anterior de tra-
balho imediato (embora mais trabalho pago e menos não pago), porém
mais trabalho acumulado. A mudança do valor do algodão de 1 para 2 xe-
lins insere no valor do fio 2 xelins em vez de 1.

90. Ver pp. 711 e 712 neste volume.

713
O exemplo II da p. 584, entretanto, não está conetamente apresen-
tado. Tínhamos:

O trabalho de 20 obreiros se expressa em 40 libras. Delas, a metade


é trabalho não pago. 20 de mais-"Valia portanto. De acordo com essa rela-
ção, 10 trabalhadores produúrão 20 libras e, delas, 10 são salário e 10
mais.valia.
Por isso, o valor da força de trabalho, se subir na mesma proporção
que o .da matéria-prima, isto é, se for duplicado, será de 20 libras para 10
trabalhadores como antes era de 20 para 20 trabalhadores. Nesse caso
não restará trabalho excedente. e
que o valor que os 10 trabalhadores
fornecem em dinheiro é de 20 libras se o que os 20 fornecem em dinhei-
ro é de 40. Isto é impossível. Com essa ocorrência teria desaparecido a ba-
se da produção burguesa.
Mas, uma vez que se supõe (de proporção) igual a variação de valor
do capital constante e- do variâ"Vel, temos de apresent3l' o caso de maneira
1

diferente. Assim, admitamos suba de 1/3 o valor do algod,ão; 80 libras


compram agora 1 200 libras.peso de algodão, contra as l '.600 anteriores.
Antes 1 libra = 20 libras-peso ou 1 libra-peso = 1/20 de libra = 1 xelim.
Agora 1 libra= 15 libras-peso ou 1 libra~peso = 1/15 de librà =A 1/3 xe·
lim ou 1 xelim e 4 pence. Antes. um trabalhador custava l llbra, agora
l 1/3 libra = l libra e 6 2/3 xelins ou l libra, 6 xelins, e 8 pence, o que
dá 20 libras (15 libras + 15/3 libras) para 15 trabalhadores. Uma vez que
20 homens produzem valor de 40 libras, 1S homens produzirão valor de
30. Desse valor, agora 20 são salário deles e 10 são mais-valia ou trabalho
não pago.
Temos portanto:

. --- lirfUitmU~-----~'ftriiw:J ·-ibl$.\111b Tua4e 'Tua~ ~(Q tl~~~


1 ~tOl.14 lucro de f'.c, i
J\' Qo 15t-w ~ l lOO 1ihl.u-ftjll') dê 20 M'llra' ~ 15 1~~! ló :ibrM 50~ J<l"- l 200 'Ub.r»pew 4k r'll'> ) xo'lltn e 10 ;-trti:I:' ~
~~-----··--· ·-··---------··--·____]

714
No preço de 1 xelim e l O pence, 1 xelim e 4 pence para algodão e
6 pence para trabalho.
O produto encarece porque o algodão ficou mais caro de 1/3. Mas
o produto não ficou mais caro de 1/3. Antes era em 1 18 pence; se portan-
to tivesse encarecido de I/3, seria agora 18 + 6 pence= 24 pence, mas ago.
ra é 22 pence apenas. Antes inseriam-se em 1 600 libras-peso de fio 40 li-
bras de trabalho, portanto 1 libra-peso corresponde a 1/40 de libra ou
20/40 xelins ou 1 /2 xelim = 6 pence de trabalho. Agora l 200 libras-peso
de fio eneerram 30 libras de trabalho e, em conseqüência, 1líbra-peso=1/40
de libra = 1/2 xelim ou 6 pence. Embora o trabalho tenha encarecido na
mesma proporção que a matéria-prima, permaneceu a mesma a quantida·
de de trabalho imediato que se insere em 1 libra-peso de fio, conquanto
seja maior o trabalho pago e menor o não pago.- Essa mudança do valor
do salário em nada altera o valor da libra-peso de fio, do produto. Conti-
nua a inserir-se aí, como dantes, 6 pence para trabalho, quando para algo-
dão figuram agora 1 xelim e 4 penee em vez de 1 xelim de antes. E assim,
quàndo a mercadoria se vende por seu valbi, a mudança de valor do salá-
rio não pode em suma fazer variar o preço do produto. Mas antes, dos 6
pence, 3 eram salário e 3 mais-valia. Agora, dos 6 pence, 4 são salário e 2
mais-valia. Na realidade, 3 pence de salário por libra-peso de fio dão, para
1 600 libras-peso, 3 x l 600 = 20 libras. E 4 pence por libra·peso dão, pa-
ra l 200 libras-peso, 4 x 1 200 = 20 libras. E 3 pence para 15 pence (1 xe-
lím de algodão + 3 pence de salário) correspondem, no primeiro caso, a
lucro de 1/5 ::: 20%. Em contrapartida, 2 pence para 20 (16 pence de al·
godão + 4 pence de salário) correspondem a 1/10 ou 10%.
Se no exemplo acima o preço de algodão não tivesse variado, tería-
mos chegado ao seguinte: 1 trabalhador fia &O líbras-peso de algodão, uma
vez que o método de produção é o mesmo em todos os exemplos, e a líbra-
peso equivale de novo a 1 xelim.
Decomposição atual do capital:

i C.pAltoNWtlti -·--~~

-, 1~ l(J ...... ~ 1445113 ~......., ~ l/3 lilm (l!l """""*-


doü,godio cf.c~)

715
Essa co~ta é impossível, pois, se 1 trabalhador fia 80 libras-peso, 20
fiam 1 600 e não 1 466 2/3, dado o pressupoSto de não variar o mêtodo
de produção, Isto em nada se pode alterar por se modificar o pagamento
do trabalhador. O exemplo tem de ser formulado de outra maneira.

.-··----··-------
\ Clrtbl~k .....,
'l'md• "1'14<110 .. "!>O ..."".... 1
l
i .. !lo

li 7!1.:)J1;.l=l
1-..••~ótQ_ _ _ _ _ _d_
.....
_
íDD~M 1$H~:ua_ l!_J/é_
f1~!1al?u~
_ _ij_bm
ll lil SO!»
_ _ __
l2 lil% ' soo hbr.p.. . . . . .
t;,
1 M\illtC&pl'ntt: !

Desses 6 pence, 4 são salário e 2 lucro. 2/16 1/8 = 12 l /2%. =


Finalmente, se o valor do capital variável fosse o anterior, 1 trabalha-
dor = 1 libra, e variasse o valor do capital constante de modo que 1 libra-
peso de algodão custasse· 1 xelim e 4 pence ou 16 pence em vez de 1 xelim,
teríamos:

lUS44Jl9t.itlr-..sçJl6~J/1911W;u. UlSJ!9líbm-•l$iS/19 UU/19 100. UUf19'6!16Jl/1P'libl'U'peS(I Sx~~lOptn...-:


JIC'lbdc~u tntrdl.adeiRJ Ubntt

o lucro= 3 pence, que a rigor são 15 15/19% de 19 pence.


Cotejemos agora os 4 casos, a começar por 1 onde ainda.não ocorreu
variação de valor.

r--·-
a~hlt.(6n,1Anlt Cii~W'll»titti MaU-_,lJ T......_.4., TtMÜ ........ , f'I~ dl IJbn.·~IO
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O preço do produto varia em lll e IV porque variou o valor do capital


constante. Em contrapartida, variação do valor do capital variá.vel não acar-
reta variação alguma do preço porque a quantidade absoluta de trabalho
imediato não se alterou e apenas se reparte de maneira diferente em traba-
lho necessário e trabalho excedente.
O que sucede ent.ão no caso IV onde a mudança de valor se efetua
no capital constante e no variável na mesma proporção, e ambos acrescem
de 1/3?

716
Quando apenas subiu o salárío (II), o lucro diminuiu de 20% para
12 1/2%, isto é, de 7 1/2%. Quando só o capital constante subiu (III), re-
duziu-se o lucro de 20% para 15 15/19%, portanto de 4 4/19%. Uma vez
que ambos sobem na mesma proporção (IV), o lucro decresce de 20% pa-
ra 1Q%, isto é, de 10%. Mas, por que a redução do lucro não chega a
7 1/2 + 4 4/19 por cento ou a 11 27/38, a soma das diferenças de II e Im
Ê mister achar a razão dessas 1 27/38 libras; de acordo com elas, o lucro
(IV) deveria ter caido a 8 11/38% e não a 10%. O montante de lucro é
determinado pelo montante da mais-valia, e esta, dada a taxa de trabalho
excedente, pelo nómero dos trabalhadores. Em 1, não se paga metade do
trabalho dos 20 trabalhadores. Em 11, só não se paga 1/3 do trabalho to-
tal, isto é, há queda da taxa de mais-valia; além disso, empregam-se menos
1 1/4 trabalhadores, decréscimo portanto do número de trabalhadores
ou do trabalho total. Em III, a taxa de mais-valia é de novo a mesma de 1,
não se paga metade da jornada de trabalho, mas, em virtude da alta do ca-
pital constante, o número dos trabalhadores cai de 20 para 15 15/19, ou
seja, decréscimo de 4 4/19. Em IV, o número de trabalhadores decresce
de 5 {depois de a taxa de mais-valia ter caído tanto quanto em II, isto é,
a 1/3 da jornada de trabalho), ou seja, de 20 para 15. Em cotejo com I,
o número de trabalhadores de IV diminuí de 5; em cotejo com II, de 3 3 /4,
e em cotejo com lll, de 15/19; não decresce, em cotejo com I, de 1 1/4 +
4 4/19, isto é, de 5 35/76. Se assim fora, o número de trabalhadores em-
pregados em IV= 14 41/76.
Daí resulta que variações do valor das mercadorias que entram no ca-
pital constante ou variável - inalterado o método de produção ou a com-
posição j(sica do capital (isto é, dada a mesma relação entre o trabalho
imediato e o acumulàdo . aplicados) - não modificam a composição orgâ-
nica do capital quando têm o mel)1'YI() efeito proporcional sobre o capital
variável e o constante como em IV (onde a alta do algodão, por exemplo,
ocorre na mesma proporção da do trigo consunúdo pelos trabalhadores).
Aí a taxa de lucro cai (ao subir o valor do capital constante e do variável)
primeiro por decrescer â taxa de mais-valia em virtude da elevação do salá-
rio e, segundo, por minguar o número de trabalhadores.
A variação do valor - quando sucede apenas no capital constante ou
apenas no capital variável - tem o efeito de uma variação na composição
orgânica do capital e faz variar o valor relativo das partes componentes do
capital, embora o método de produção continue o mesmo. O capital variâ·
vel, se é o úníco atingido, sobe em relação ao constante e ao capital todo,
mas cai a t!l.){a de maís·valia e também o número dos trabalhadores emprega·

717
dos. Por ísso, também se aplica menos capital constante (11), que mantém
valor inalterado,
Se a variação do valor só atinge o capital constante, o capital variável
decresce em refação ao constante e ao capital todo. Embora a taxa de mais-
valia não varie, o montante dé mais·valia decresce.por diminuir o número
dos trabalhadores ocupados (Ill).
Finalmente, é possível que a variação do valor se dê nos dois, capital
constante e capital variável, mas em proporção desigual. Cabe apenas en-
quadrar esse caso entre os anteriores. Por exemplo, admitamos que o capi-
tal constante e o variável foram atingidos de maneira que o valor do primei-
ro subiu de 10"~, e o do segundo de 5%. Verificar-se-á então o caso IV, des-
de que ambos se elevem de 5 por cento, um de 5 t 5 e o outro de 5. Mas,
se o capital constante se mover para novo adicional de 5%, teremos o
caso III.
Acima supusemos apenas alta do valor. No caso de queda, o efeito
oposto. Por exemplo, de IV para I observar-se-ia a queda que na mesma
proporção se efetiva em ambos os componentes. Seria mister modificar
II e III para se observar o efeito da queda pura e simples de um compo-
nente.
* * *
No tocante à influência da variação do valor sobre a'composíção or-
gânica do capital, acrescentar ainda: para capitais em diferentes ramos de
produção -·porém de composição física igual - o valor maior ~a maquina-
ria ou material empregados pode gerar diferença. Por exernpló, se as indús-
trias de algodão, seda, linho e lã tivessem a rigor a mesma composição fí.
sica, a mera diferença no custo do material empregado~ criaria essa variação.

d) VarUifões de renda (rent)· global dependentes da


varUifão do valor de merc.ado.

Voltemos ao quadro A. Inferiu-se9 l que a suposição de o lucro de 10%


ter surgido mediante decréscimo (a taxa de lucro mais alta no ponto de par-
tida, em III, em II mais baixa que em III, porém ainda mais alta que em 1

91. Ver pp. 704-?06.

718
o:nde é 10%) pode ser corretà, a saber, se ocorreu na realidade a seqüência
descendente~ mas que essa suposição não é decorrência necessária da gra-
dação das rendas, da mera existência das rendas diferenciais, e que, com
seqüência ascendente, essa gradação das rendas pressupõe, ao contrário, a
continuidade de taxa de lucro inalterada.
Quadro B. Aí, conforme já se analisou acima92 , a concorrência de I1I
e IV força o explorador de II a retirar metade de seu capítal. Na seqüência
descendente parecerá, ao contrário, que se requer oferta adicional de 32 l /2
toneladas e, em conseqüência, é mister investir em II apenas capital de 50.
Mas vejamos o aspecto mais interessante do quadro: antes, emprega-
vam-se 300 libras e agora somente 250, 1/6 menos portanto. Assim elevou-
se a produtividade do trabalho, caiu o valor da unidade de mercadoria. Do
mesmo modo o valor global das mercadorias caiu de 400 para 369 3/13 li-
bras. Em comparação com A, baixou o valor de mercado da tonelada de 2
libras para 1 libra e 16 12/13 xelins, ao ser o novo valor de mercado deter-
rninado pelo valor individual de II, em vez de o ser pelo anterior mais alto
de 1. Apesar de todas essas circunstâncias - decréscimo do capital aplicado,
decréscimo do valor global do produto sem se alterar o volume da produção,
queda nq valor de mercado, exploração de classes mais férteis - a renda
(rent} de B, comparada com a de A, teve acréscimo absoluto de 24 3/13 li·
bras (94 3/13 contra 70). Se observarmos até onde as distintas classes con-
tribuem para o aumento da renda global, veremos que na classe II não se
alterou a renda absoluta no tocante à taxa, pois 5 libras sobre 50 = 10%;
mas seu montante se reduziu à metade, de 10 para 5, pois o emprego de
capítal em II B decresceu de metade, de 100 para 50. Em vez de acrescer
a renda global (rental}, a classe II B a fez decrescer de 5 libras. Além disso,
desapareceu por completo a renda diferencial de II B porque agora o valor
de mercado é igual ao valor individual de II; daí advém decréscimo de 10
libras, a segunda perda. Assim, ao todo, o decréscimo da renda da classe II
é de 15 libras.
Em Ili, o montante da renda absoluta é o mesmo; mas. em virtude
da baixa do valor de mercado, caiu-lhe o valor diferencial e, em conseqüên·
eia, a renda diferencial. Esta atingia 30 libras. Agora monta apenas a 18 6/13.
Perda de 11 7 /13. Para II e III juntos, a renda caiu portanto de 26 7 /13. Fal-
ta portanto prestar contas de um acréscimo não de 24 3/13, como parece à
primeira vista, e sim de 50 10/13. Mas, fora isso, para B, em comparação

92. Ver pp. 684 e segs. neste volume.

719
com A, d~sapareceu, com a classe I, a renda absoluta de I A. Em conse-
qüência, há mais perda de 1O libras. Assim cabe prestar contas do total
das somas, de 60 10/13 libras. Mas esta é a renda global da nova cWse
IV de B. O acréscimo da renda global de B só pode ser explicado' pela ren-
da de IV B. A renda absoluta de lV B, como a de todas as demais classes,
é igual a 1O libras. Mas a renda diferencial de SO 10/13 decorre da circuns-
tância de o valor diferencial de IV importar em 10 470/481 xelins por tone-
lada, a serem multiplicados por 92 1/2, o número das toneladas. A fertilida-
de de II e a de III não variaram; a classe r,nenos fértil foi de todo afastada,
e não obstante sobe a renda global porque só a renda diferencial de IV,
em virtude da grande fertilidade relativa é maior do que era a renda dife-
rencial toda de A. A renda diferencial não depende da fecundidade abso-
luta das classes cultivadas, pois I /2 II, III, IV B são mais férteis que 1, II,
III A, e contudo a renda diferencial de 1/2 II, Ili, IV B é maior que a ante-
rior de I, ll, III A porque a maior parte do produto fornecido - 92 l /2
toneladas - é obtido de uma classe com valor diferencial maior que o atin-
gido, afinal de contas, em I, II, III A. Dado o valor diferencial para uma
classe, o montante absoluto de sua renda diferencial depende naturalmen-
te do volume de seu produto. Mas esse volume já foi levado em conta no
cálculo e na formação do valor diferencial. Por produzir IV com l 00 libras
92 1/2 toneladas, nem mais nem menos, seu valor diferencial ·em B, onde
o valor de mercado é de I libra e 16 12/13 xelins por tonelada, monta a
10 xelins etc. por tonelada. .
A renda global {tentai} em A atinge 70 para capital de.300. isto é,
23 1/3%. Em contrapartida em B, pondo-se de lado os 3/Ú, 94 sobre
250 = 37 3/5%,
Quadro C. Admite-se aí que, depois de a classé IV ter entrado em
cena e a II ter determinado o valor de mercado, a procura, em vez de ficar
inalterada como no quadro B, acresce com a baixa de preço, de modo que
o me1-cado absorve o volume inteiro de 92 l /2 toneladas, adicionado por
IV. A 2 libras por tonelada eram adquiridas apenas 200 toneladas~ a 1 11/13
libra a procura cresce para 292 1/2 toneladas.Berrado supor que, a 1 11/13 li-
bra por tonelada, mantenha o mercado necessariamente o limite que tinha
a 2 libras por tonelada. Pelo contrârio, o mercado se expande até certo
ponto com a queda de preço, mesmo no caso de um meio de subsistência
geral como o trigo.
Este é, por ora, o único ponto que desejamos destacar no quadro e.
Quadro D. Admite-se aí que o mercado só absorve as 292 1/2 tone·
ladas quando o valor de mercado cai para l 5/6 libra, o preço de custo
da tonelada para a classe 1, que portanto não dá renda e sim o lucro usual

720
de 10% apenas. Este é o caso que, para Ricardo, é o normal e por isso é
mister examiná-lo detidamente.
Como nos quadros acima, de início supomos aqui a seqüência ascen-
dente; depois, observaremos o mesmo processo na seqüência decrescente.
Se II, III e IV só fornecessem oferta adicional de 140, isto é, oferta
adiêional que o mercado absorve a 2 libras por tonelada, 1 continuada a
determinar o valor de mercado.
Mas isso não ocorre. Há no mercado uma sobrá de 92 1/2 toneladas
produzidas pela classe IV. Se isso for mesmo superprodução que exceda
em absoluto as necessidades do mercado, 1 por inteiro será jogado fora de-
le e II terá de retirar metade de seu capital como faz em B. II detemtinará o
valor de mercado como em B. Mas admite-se que, se for maior a queda
do valor de mercado, o mercado pode absorver as ,92 l /2 toneladas. Como
se efetuará então o processo? IV, III e 1/2 li têm o domínio absoluto do
mercado, isto é, lançarão l fora do mercado se este só puder absorver200 to-
neladas.
Mas comecemos pelos fatos. Há no mercado 292 l/2 toneladas, quan-
do antes só havia 200. II venderá por seu valor individual, a 1 11/13 libra,
para abrir caminho e do mercado expulsar I cujo valor individual = 2 li-
bras. M3!0,. ·uma vez que, para esse valor de mercado, não há lugar para
292 1/2 toneladas, IV e III pressionam sobre II até o preço de mercado
cair a 1 5/6 libra, e a esse preço as classes IV, III, li e 1 encontram coloca-
ção para seu produto no mercado que absorve a totalidade do produto
a esse preço de mercado. Com essa queda de preço, oferta e procura se ni-
veiaro. Logo que a oferta adicional ultrapassa os limites do mercado - de
acordo com o velho valor de mercado - cada classe se empenha natural-
mente para pôr no mercado seu produto todo, com exclusão do produto
o
das demais classes. E que só pode ocorrer mediante reduç!o de preço,
isto é, redução até o ponto em que toá.os os produtos se coloquem. Se essa
reduyão de preço for tão grande que as classes 1, II etc. tenham de vender
a°fJaixo do custo de produção 93 , terão elas naturalmente de retirar seu capital
da produção. Mas, se se verifica que a redução não tem de ir tão longe pa-
ra adequar o produto ao mercado, pode o capital total prosseguir atuando
nessa esfera de produção com esse novo valor de mercado.

93. Aí e noutras passagens mais adiante emprega Marx o termo cu~tó de produ-
ção no ~ntido de custo de produção acrescido do lucro médio. Ver O Capital, DIFEL,
livro 3, vol. 6, pp. 748, 771, 772, 847, &50 e 851.

721
Contudo, ainda é evidente que, nessas circunstâncias, não são os pio-
res solos, l e II, que determinam o valor de mercado, e sim os melhores,
III e IV, e por isso a renda dos melhores tipos de solo determina a dos
piores, como viu Storch com acerto no tocante a esse caso.*
IV vende ao preço com que pode impor a colocação total de seu
produto no mercado e anula a reação das outras classes. Esse preço é 1 5/6
libras. Se vender por mais, contrair-se-ão os limites do mercado e recome-
ça o processo da exclusão reciproca.
1 só determina o valor de mercado na hipótese de a oferta adicional
de II etc. igualar apenas a ofert.a adicional que o mercado absorve nos li-
mites do valor de mercado de 1. Se for maior, I fica em passívidade total
e em virtude do espaço que ocupa provoca apenas a reação de Il, III e IV
até que o preço se contraia a tal ponto que o mercado tenha amplitude
suficiente para o produto todo. Vê-se então que, a esse valor de mercado
determinado de fato por IV, IV mesmo, além da renda absolut.a, propor-
ciona renda diferencial de 49 7/12 libras, e III, além da renda absoluta, ren-
da diferencial de 17 1/2 libras; II, em contrapartida, não proporciona renda
diferencial mas apenas parte da renda absoluta, 9 1 /6 hõras em vez de 10.
sem atingir portanto o total da renda absoluta. Por quê? O novo valor de
mercado de 1 5/6 libra está por çerto acima de seu preço de custo, porém
abaixo de seu valor individual. Se fosse igual a seu valor individual, daria
a renda absoluta de 10 libras, a diferença entre o valor individual e o pre-
ço de custo. Mas, uma vez que está abaixo dele - a renda real que II propor-
ciona é a diferença entre o valor de mercado e o preço de custo, e essa di-
ferença é menor que a existente entre seu valor individ.ual e seu preço de
custo - , U só proporciona parte da renda absoluta, 9 l /6 libras em vez de 1O.
(Renda real= diferença entre valor de mercado e preço de custo.)
Renda absoluta = diferença entre valor individual e preço de custo.
Renda diferencial = diferença entre valor de mercado e valor indivi-
dual.
Renda real ou global = renda absoluta + renda diferencial, ou seja,
é igual a excesso do valor de mercado sobre valor individual + exce.sso do
valor individual sobre preço de custo, ou é igual à diferença entre valor
de mercado e preço de custo.
Se o valor de mercado for igual ao valor individual, a renda diferen-
cial =O, e a renda global= diferença entre valor individual e preço de custo.

• Ver p. 530, nota 34.

722
Se o valor de mercado é maior do que o valor individual, a renda di-
ferencial é igual ao excesso do valor de mercado sobre o valor individual.
mas a renda global é igual a essa renda diferencial acrescida da renda abso-
luta.
Se o valor de mercado é menor do que o valor individual, porém maior
que o preço de custo, a renda diferencial é magnitude negativa e, por isso,
a renda global = renda absoluta + essa renda diferencial negativa, o exce-
dente do valor índividual sobre o valor de mercado.
Se o valor de mercado for ígual ao preço de custo, a renda afinal de
contas é igual a zero.
Para apresentar o assunto em forma de equações chamaremos a renda
absoluta de RA, a renda diferencial de RD, a renda global de RG, o valor
de mercado de VM, o valor individual de VI e o preço de custo de PC. Te-
mos então as seguintes equações:
l.RA=VI-PC=+y
2, RD = VM - VI = x
3. RG = RA+ RD= VM - VI+ VI ·PC= y+x=VM-PC
Se VM >VI, VM ·VI= + x. Daí: RD positiva e RG = y + x.
E VM. - PC = y + x. Ou VM - y • x =PC ou VM = y + x +PC.
Se VM < VI, então V:M - VI =.x. Daí, RD negativa e RG = y - x.
B VM ·PC = y • x. Ou VM + x = VI. Ou VM + x _. y =PC.
Ou VM = y - x +PC.
Se VM = VI, então RD = O, x = O porque VM - VI = O. Portanto,
RG = RA + RD = RA + O = VM • VI + VI ·PC = O+ VI - PC = VI ·PC =
=VM-PC ""'VM-FC =+ y.
Se VM =PC, ~G ou VM - PC= O.
Nas circunstãncia.S admitidas, l não paga renda. Por quê? Porque a
renda absoluta é .igual à diferença entre o valor individual e o preço de cus-
to. Mas a renda diferencia! é igual à diferença entre o valor de mercado e o
valor individual. E agora o valor de mercado é igual ao preço de custo de 1.
O valor individual = 2 libras por tonelada, o valor de mercado = 1 5/6 li-
bras. Assim, a renda diferencial de 1 = 1 5 /6 · 2 = · 1/6 de libra. Mas a ren-
da absoluta= 2 libras - 1 5/6 libra, isto é, a diferença entre o valor indivi-
dual e o preço de custo = + l /6. Por conseguinte, a renda real de t, por ser
igual à renda absoluta (1/6 de libra) mais a renda diferencial(· 1/6 de libra),
é igual a+ 1/6 • 1/6=O.1 não paga portanto a renda diferencial nem a ren·
da absoluta e sim o preço de custo apenas. O valor de seu produto = 2 li-
bras; vende-o por l 5/6 libra, isto é, 1/12 abaixo do valor, ou seja, 8 1/3%-

723
abaixo desse valor. 1 não pode vendê-lo por mais, pois não é ele quem de-
termina o mercado e sim IV, III e II contra ele. Só lhe cabe oferecer uma
oferta adicional ao preço de 1 5/6 libra.
1 não paga renda porque o valor de mercado é igual a seu preço de
custo.
Este fato porém decorre do seguinte:
Primeiro, a menor fertilidade relativa de L O que 1 tem para forne-
cer são 60 toneladas adicionais a 1 5/6 libra. Admita-se que 1, em vez de
60 toneladas por 100, forneça 64 por 100, 1 tonelada menos que a classe
II. Assim, bastaria o emprego de 93 3/4 libras de capital para 1 fornecer
60 toneladas. O valor individual da tonelada de 1 seria então 1 7/8 libra
ou 1 libra e 17 1/2 xelins, e seu preço de custo, 1 libra e 14 3/8 xelins~
E uma vez que o valor de mercado= 1 5/6 libra:::: 1 libra e 16 2/3 xelins,
a diferença entre preço de custo e valor de mercado = 2 7 /24 xelins. E is-
to formaria, para 60 toneladas, uma renda de 6 libras e 17 1/2 xelins.
Assim, se todas as circunstâncias não variassem e I fosse 1/15 mais
produtivo do que é (pois 60/15 = 4), pagaria ele ainda parte da renda
absoluta, pois existiria diferença entre o valor de mercado e seu preço
de custo, embora menor que a diferença entre seu valor individual e seu
preço de custo. Então o pior terreno ainda daria renda se fosse mais f ér~
til do que é. Se I fosse em absoluto mais fértil do que é,JI; III ;e lV se-
riam, comparados com ele, relativamente menos fúteii Seria menor a
díferença entre o valer individual destes e o daquele. A circ.unstância de I
não dar renda decorre tanto de rn!o ser mais fértil em absoluto quanto de
II, UI e IV não serem relativamente menos férteis.
Mas, segwulo: dada a fertilidade de l, ·60 tonel.a.das para 100 libras.
Se II, III e IV, e em especial IV, novo concorrente que entra no merca-
do, ficarem menos .férteis em relação a I e ainda e.m absoluto, poderá I dar
uma renda, embora esta consista apenas em fração da renda absoluta. Pois
o mercado, uma vez que adquire 292 1/2 toneladas a 1 5/6 libra, absor·
verá número menor de toneladas, digamos, 280 a valor de mercado maior
que 1 5/6 libra. Mas todo valor de mercado superior a 1 5/6 libra, isto é,
aos custos de produção de I, dá renda = valor .de mercado - preço de cus-
to de I,
Pode-se dizer também que é por causa da fertilidade de IV que I não
dá renda, pois, enquanto os concorrentes no mercado eram apenas II e III,
dava ele renda: e continuaria a dá-la, embora menor, apesar do apareci-
mento de IV, apesar da oferta adicional, se IV com o dispêndio de 100
libras de capital produzisse 80 toneladas em vez de 92 1/2.

724
Terceiro: admitimos que a renda absoluta para dispêndio de capital
de 100 libras fosse de l O libras = 10% sobre o capital ou 1/11 do preço
de custo, e que por isso o valor do produto de 100 libras de capital na
agricultura = 120 libras onde 1O libras são lucro.
E não se imagine que, se dizemos terem sido gastas 100 libras de
capital na agricultura e se uma jornada de trabalho = l libra, foram então
empregadas 100 jornadas. Em geral, se um capital de 100 libras = 100
jornadas, o novo valor resultante nunca é igual a 100 jornadas, não impor-
ta o ramo de produção onde se despenda esse capital. Seja 1-libra de ou-
ro = 1 jornada de 12 horas, e esta seja a jornada normal; então, a primei-
ra pergunta a fazer é: a que taxa se explora o trabalho? Isto é, quantas
horas das 12 o obreiro trabalha para sí, para reproduzir o salário (o equi-
valente), e quantas· grátis para o capital? Isto é, qual é a quantidade de
tempo de trabalho que o capitalista vende sem a ter pago e que constitui
a fonte da mais-valia, do acréscimo do capital? Se a taxa é 50%, o obrei-
ro trabalha 8 horas para si e 4 grátis para o capitalista. O produto = 12
horas = 1 libra (urna vez que 12 horas de tempo de trabalho contêm, se-
gundo o pressuposto, l líbra de ouro). Dessas 12 horas= 1libra,8 repõem
o salário para o capitalista, 4 formam sua mais.valia. Para um salário de
13 1/3, a qia.Ís-valia ê igual a 6 2/3 xelins, ou para um desembolso de ca·
pital de 1 libra, 10 xelins, e de l 00 libras, 50. Então, o valor da mercado-
ria produzida com as l 00 libras de capital seria de 150 libras. O lucro do
capitalista consiste, de resto, na venda do trabalho nã'o pago inserido no
produto. O lucro normal provém da venda desse elemento não pago.
A segunda pergunta é: qual é a composição orgânica do capital?
A parte do valor do capital constituída por maquinaria etc. e matéria·
prima simplesmente 'se .reproduz no produto, reaparece e não varia.
O capitalista tem de pagar essa parte do capital pelo valor que ela tem.
Ela entra no produto como valor preestabelecido, dado. Só o tra-
balho que o capitalista emprega, entra por inteiro no valor do pro-
duto e o capitalista o compra por inteiro, embora só pague fração dele.
Admitida a taxa mencionada de exploração do traba1ho, a quantidade da
mais-valia para capita1 de magnitude igual dependerá portanto de sua com-
posição orgânica. Se o capital a é 80c + 2Dy, o valor do produto = 110,
e o lucro = 10 (embora não se paguem aí 50% do trabalho). Se o capital
b = 40c + 60v, o valor do produto = 120, e o lucro= 20, embora tam·
bém não se paguem aí 50% do trabalho. Se o capital e= 60c + 40V' o valor
do produto = 120, e o lucro = 20%, embora se eleve a 50% a percentagem
de trabalho não pago. Assim, temos para os 3 capitais = 300, lucro to-

725
tal = 1O + 30 + 20 = 60. Isso dá média, na base de 100, de 20%. E cada
um dos capitais faz essa média, se vende a mercadoria que produzi!-! por
120 libras. Assim, o capital a, SOc + 20v, vende o produto 10 libras acima
do valor, o capital b, 40c + 60v, 10 libras abaixo, e o capital e 60c + 40V'
pelo valor. Em conjunto, as mercadorias se vendem pelo valor: 120 + 120 +
+ 120 = 360. Na realidade, o valor de a+ b +e== 110+ 130 + 120 = 360
libras. Mas os preços das distintas categorías estão ora acima, ora abatxo,
ora no nível do valor, a fim de cada uma delas proporcjonar lucro de 20%.
Os valores assim modificados das mercadorias são os preços de custo de-
las, os centros de gravitação constante que a concorrência estabelece para
os preços de mercado.
Para as 100 libras agora aplicadas na agricultura admitamos que, se
a composição é 60c + 40v (v aí talvez ainda esteja subestimado demais),
o valor do produto = 120. Isso, porém, estaria igual ao preço de custo da
indústria. Por isso, no caso acima suporemos que o preço médio, para
produto de capital de 100, seja 110 libras. Dizemos então que, se o pro-
duto agrícola é vendido por seu valor, estará este 10 libras adma do pre-
ço de custo do produto, Dá então uma renda de 10%, e consíderaremos
que o normal na produção capitalista é o produto agrícola, em contraste
com os demais, vender-se, eni virtude da propriedade fundiária, não pelo
preço àe custo e sim pelo valor. A composição da totalidade do capital
é 80c + 20v se o lucro médio é 10%. Admitimos que: a do capital agríco-
la = 60c + 40v, ou que, em sua composição, se desembolsa .proporção
maior em salário - trabalho imediato - que no montante -global do ca-
pital despendido nos demais ramos industriais. Isso indica desenvolvimen-
to rei.ativo inferior da produtividade do tràbalho naquele setor. Sem dúvi-
da, em alguns ramiJs agrícolas, na pecuária por exemplo, a composição
pode ser 90f; + 10.,., isto é, a razã'o- v : e menor que na totalidade do capí·
tal industrial. Mas não é esse ramo que determina a renda e sim a agrícul·
tura no sentido estrito e precisamente aquele segmento que produz o
principal meio de subsistência, o trigo etc. A renda nos outros ramos não
é determinada pela composição do capital neles aplicado, mas pela com-
pos.íção do capital empregado na produção do meio de subsistência prin·
cipaJ. A mera existência da produção capitalista pressupõe que a alimen-
tação vegetal em vez da animal seja o elemento de maior peso dos meios
de subsístência. A inter-relação das rendas dos diferentes ramos é questão
secundária que aqui não nos interessa nem é objeto de exame.
Assím, para a renda absoluta ser igual a 10%, pressupõe-se que a
composição média geral do capital não agrícola seja ígua1 a 80c + 2f\ e
a do capital agrícola= 60c + 40v·

726
Pergunta-se agora se teria influencia no caso da classe I que não
paga renda, admitido em D, a circunstância de o capital agrícola se com-
por de outra maneira, por exemplo, 50 + !{lv ou 70c + 30v. Na primeira
hipótese, o valor do produto seria iguaf a 125 libras, na segunda, 115. Na
primeira hipótese, a diferença oriunda da composição diversa do capital
não agrícola seria igual a 15 libras e, na segunda, 5. Isto é, a diferença
entre o valor do produto agrícola e o preço de custo seria, na primeira
hipótese, 50% superior à da suposição acima, e na segúnda hipótese, 50%
inferior.
Concretizada a primeira hipótese, o valor do produto de 100 libras
seria igual a 125 libras, e assim no quadro A o valor da tonelada de 1 seria
igual a 2 1i12 libras. E este seria o valor de mercado de A, uma vez que l
o determina aí. Em contrapartida, o preço de custo de I A continuaria a
ser de 1 5/6 libra. Uma vez que, segundo Sé pressupôs, as 292 1/2 tonela·
das_ só poderiam ser vendidas a 1 5/6 libra, não proviria alteração daquele
fato nem da composição do capital agrícola de 70c + 30v, ou seja, da cir-
cunstânda de a diferença entre o valor do produto agrícola e o preço de
custo ser apenas 5 libras, metade do que se admitiu. Suposto constante o
preço de custo e portanto a composição orgânica média do capital não
agrícola = 80c + 20v a do capital agrícola, superior ou inferior, n:ro faria
diferença para esse casb (I D), embora trouxesse alteração considerável
para o quadro A, implicando diferença de 50% na renda absoluta.
Mas, ao revés, admitamos: a composição do capital agrícola continua
a ser 60c + 40v e a do capital não agrícola varia. Em vez de 80c + 20v pas-
sa a ser 70c + 30 v ou 90c + lOv. Na primeira hipótese, o lucro = 1S libras
ou 50% além da suposição anterior; na segunda, seria ígual a 5 ou 50% abai-
xo. Na primeira, a renda,_absoluta = 5 libras. Mais uma vez, i~o nã'o alte-
raria o caso l D. No segundo caso, a renda absoluta = 15, o que também
não modificaria o caso I D. Nada disso portanto altera esse caso, embora
tudo isso seja importante para os quadros A, B, C e E, isto é, para a deter-
minação absoluta da renda absoluta e diferencial, sempre que a nova clas-
se - seja a seqüência ascendente ou decrescente - só forneça a procura
adicional necessária ao antigo valor de mercado.
Surge agora a seguinte pergunta;
Esse caso D pode ocorrer na prática? E antes disso: é o caso normal,
como supõe Ricardo? Só pode ser o caso nonnal numa de duas situações
alternativas:
Ou se o capital agrícola fosse 80c + 20v, ·com a mesma composição
média do capital nlfo agrícola, de modo que o val.or do produto agrícola

727
fosse igual ao preço de custo do produto hão agrícola. Isso por enquanto.
é um erro estatístico. A suposição da produtividade relativamente in~erior
da agricultura em todo caso é mais objetiva que o postulado ricardiano
de decréscimo absoluto progressivo de sua produtividade. ·
No capítulo I "On Value" admite Ricardo que em minas de ouro
e prata vigora a composição média do capital (se bem que fale aí apenas
de capital fixo e capital circulante; mas é o que vamos "corrigir"). Com
esse pressuposto, essas minas só poderão dar renda diferencial e nunca
renda. absoluta. O próprio pressuposto fundamenta-se por sua vez noutro,
o de que a oferta adicional fornecida pelas minas mais ricas é sempre maior
que a oferta adicional exigida ao velho preço de mercado. Mas é de todo
inconcebível o motivo por que o oposto não poderá por igual suceder.
A mera existência da renda diferencial já mostra que é possível oferta adi-
cional sell) se alterar o valor de mercado dado. Pois N ou Ili ou II não
forneceriam rendas diferenciais se não vendessem pelo valor de mercado
de I - não importa como seja determinado -, isto é, por preço de merca-
do determinado sem deperuitncía da grandeza absoluta da oferta deles.
Ou na outra situação: o caso D terá de ser sempre o nonnal se as
condições nele supostas forem sempre as normais; isto é, se I pela con-
corrência de IV, III e I, em especial de IV, for sempre forçado a vender
seu produto abaixo do valor - deduzido o montante :da renda absolu-
ta -, pelo preço de custo. A mera existência da renda diferencial em IV,
III'e II demonstra que eles vendem por valor de mercado superior a seu
valor individual. Se Ricardo adnlite que isso não pode ocorrer com 1 é ape-
nas porque pressupõe a ímpossibilidade da renda absoluta, e isto porque
supõe a identidade entre valor e preço de custo.
Tomemos o caso C onde as 292 l/2 toneladas se escoam ao valor
de mercado de 1 libra e 16 12/13 xelins. Como Ricardo, partamos de IV.
Enquanto só forem necessárias 92 1/2 toneladas, N vende a tonelada por
1 libra e 5 35/37 xelins, portanto mercadoria produzida com 100 libras
de capital por seu valor de 120 libras, o que proporciona a renda absolu-
ta de 10 libras. Por .que precisa IV vender sua mercadoria abaixo do valor
e ao preço de custo dela? Enquanto estiver sozinho, Ili, II e 1 não lhe
podem fazer concorrência. O mero preço de custo de III está acima do va-
lor que pennite a IV renda de 1O libras, e mais acima ainda o preço de
custo de II e o de I. Estes e III não poderiam portanto concorrer mesmo
vendendo essas toneladas pelo preço de custo puro e simples.
Admitamos que exista uma classe única - o melhor ou o pior tipo
de solo, IV óu I, III ou II, o que em nada altera a teoria - comn dádiva

728
elementar, isto é, como dádiva elementar em relação à quantidade do ca-
pital dado e do trabalho, a qual está em geral disponível e pode ser absor-
vida por esse ramo de produção, de modo que essa classe n!o estabeleça
portanto limites e seja um campo de ação ilimitado para a massa existen-
te de capital e de trabalho; admitamos por isro que não exista renda di-
ferencial porque os solos cultivados não diferem na fertilidade natural,
não havendo portanto renda díferencial (mesmo evanescente); admitamos
ainda que não exista propriedade da temz; então, é evidente que não há
renda absoluta e portanto nenhuma renda em geral (uma vez pressuposta
a inexistência de renda díferencial). Isto é tautologia, pois a existência
da renda fundiária absoluta, além de pressupor a propriedade da terra, é
a propriedade fundiária pressuposta, isto ê, a propriedade fundiária con-
dicionada e modificada pela ação da produção capitalista. Essa tautologia
em nada resolve o problema, uma vez que explicamos a formação da ren-
da fundiária absoluta justamente pela resisttncia que a propriedade da ter-
ra na agricultura opõe ao nivelamento capitalista dos valores das merca-
dorias a preços médios. Se supriminnos essa ação da propriedade da ter-
ra - essa resistência, a resistência específica contra a qual se choca a con-
corrênciã d.os capitais nesse campo de atividade - suprimiremos sem dú-
vida a condição prévia para a existência da renda fundiária. Aliás•.. a supo-
sição se contradiz: de um lado, produção capitalista desenvolvida (como
vê muito bem Wakefield em sua teoria colonial~); do outro, a não exis-
tência da propriedade da terra. Donde poderão vir nesse caso os trabalha·
dores assalariados?
Algo aproximado ocorre em colônias, mesmo quando existe pro-
priedade da terra legalmente, no sentido de ser a terra dada grátis pelo go-
verno como de iníê:io aconteceu na colonização tnglesa, e mesmo quando
o governo institui na realidade a propriedade fundiária, ao vender a terra,
embora a preço msignificante, como nos Estados. Unidos, a l dólar mais
ou menos por acre.
Há aí duas coisas a distinguir:
Primeil'o: trata-se de verdadeiras colônías como nos Estados Unidos,
Austrália etc. Aí a massa dos colonos agricultores, embora traga da terra
natal montante maior ou menor de capital, não constitui classe capitalis-
ta, nem sua produção é a capitalista. São mais ou menos camponeses que
trabalham autonomamente, para os quais o fundamental, antes de tudo,

94. Sobre a teoria da rolonização de Wakefield ver O Capital, DlFEL, livro 1,


voJ. 2, pp.-883 a 894.

729
é prodU?ir o préJprio sustento, os meios <J,e subsistência, e cujo produto
principal portanto não se torna mercadoria e não se destina ao comér~io.
Vendem, trocam o que de seus produtos excede o próprio consumo por
manufaturas importadas etc. A outra parte dos colonos, menor, estabele-
cida ·em zonas marítimas ou â margem dos rios navegáveis forma cidades
comerciais. Ainda não se pode falar af de produção capitalista. Mesmo que
esta se desenvolva gradualmente, de modo a se tornarem decisivos para o
agricultor - que é trabalhador autônomo e dono da terra - a venda de
seus produtos e o ganho que obtém com essa venda. ainda assim a pri-
meira forma de colonização se efetiva e prossegue enquanto a terra exfa·
tir em abundância elementar em face do capital e do trabalho e na práti·
ca permanecer portanto campo ilimitado de ação; por isso, a produção
nwica será regulada de acordo com as necessidades do mercado, a dado
valor de mercado. Tudo o que os colonos da primeira espécie produzem
acima do consumo direto, lançam no mercado e vendem a qualquer pre-
ço que lhes dê mais que o saláóo. São e permanecem por muito tempo
concorrentes dos arrendatários que produzem ma.is ou menos segwido
o modo capitalista, e por isso mantêm sempre o preço de mercado do
produto agrícola abaixo do respectivo valor, O arrendatário que assim
cultiva terreno da pior espécie 'ficará muito satisfeito se obtiver o lucro
médio na venda de sua empresa agrícola, quando recupera' o capital em·
pregado, o que não se dá em grande número de casos. Competem aí por-
tanto duas circunstâncias essenciais: primeiro, a produção capitalista ainda
não predonúna na agricultura; segundo, embora legal, a propriedade da
terra tem existência real apenas esporádica e no sentido estrito há apenas
posse da terra. Ou a propriedade da terra, embora exista legalmente, ain-
da é incapaz, em face da abundância elementar do solo em relação a tra-
balho e capital, de oferecer resistência ao capital, de transfonnar a agri-
cultura num campo de ação que opõe ao emprego de capital resistência
especlÍlca em contraste com a indústria não agrícola.
Na segunda espécie de colônias - as grandes fazendas (plantations)
- destinadas desde o início ã especulação comercial e com a produção
voltada para o mercado mundial, verifica-se produção capitalista, embora
fomtalmente apenas, uma vez que a escravatura negra exclui o assalaria-
do livre, portanto o fundamento da produção capitalista. Mas são os ca·
pitalistas que fazem o tráfico negreiro. O modo de produção que intro-
duzem não provém da escravatura, mas nela se enxerta. Nesse caso, capi·
talista e proprietário da terra são a mesma pessoa. E a existência da terra
como elemento abundante em relação ao capital e ao trabalho não opõe

730
ao emprego de capital e, por conseguinte, à concorrência entre os capi-
tais, resistência alguma. Não se desenvolve aí nenhuma classe de agricul-
tores que se distinga dos donos das terras. Enquanto durar essa situação,
nada impede que o preço de custo regule o valor de mercado.
Todas essas precondíções nada têm a ver com aquelas em que exis-
te renda fundiária absoluta: isto é, produção capitalista desenvolvida, de
um lado; do outro, propriedade fundiária que, além de existir legalmen-
te, ainda resiste ao capital, defende contra ele o campo de atuação e só
lhe cede caminho sob certas condições.
Nessas circunstâncias, mesmo quando só se cultiva IV, ou lII ou II
ou 1, exjstlrá renda fundiária absoluta. O capital só pode conquistar no-
vo espaço na classe única existente pagando a renda fundiária, isto é, ven-
dendo o produto· agrícola pelo respectivo valor. Também só nessas circuns·
tâncias pode-se falar de comparação e diferença entre o capital empregado
na agricultura (isto é, num elemento natura1 como tal da produção primá·
ria) e o empregado na indústria não agrícola.
A questão agora é esta:
Se 1 é o ponto de partida, é claro que II, III e IV geram apenas a ofer-
ta adicional permitida pelo velho valor de mercado, venderão pelo valor
de mercado detenninado por 1 e, por isso, fornecerão, além da renda abso·
luta, renda diferencial na razão da fertilidade relativa. Ao revés, se o pon-
to de partida é IV, algumas objeções parecem possíveis.
:E que vimos que II obtém a renda absoluta se vende o produto pelo
respectivo valor, l 11/13 libra ou 1libra16 12/13 xelins.
No quadro D, o preço de custo de III, da classe seguinte na ordem
decrescente, está maís alto que o valor de IV que dá renda de 1O libras.
Aí não pode haver· problema de concorrência ou de guerra de preços,
mesmo quando III venda ao preço de custo. Mas se IV não satisfaz mais
a procura e o mercado exige quantidade superior a 92 l /2 toneladas, subi·
rá seu preço. Nesse caso já terá de subir de 3 43/111 xelins por tonelada,
para 111 poder concorrer mesmo a seu preço de custo. Pergunta-se: nessa
situação concorrerá UI? Reformulemos o caso. A procura não precisa ter
acréscimo de 75 toneladas para o preço de IV subir para 1 libra e 12 xe-
lins, o valor individual de UI, pelo menos no caso de produto agrícola do-
minante, quando insuficiência da oferta causa alta de preço bem maior
que a correspondente à queda aritmética da oferta. Mas, se IV tiver subi·
do para 1 libra e I2 xelins, III proporcionará a esse valor de mercado, igual
a seu valor individual, renda absoluta, e IV, renda diferencial. Desde que
se verifique uma procura adicional, III pode vender a seu valor indívidua1

731
pois então óomina o vaiar de mercado e em absoluto nã"o haveria motivo
:<ara que o proprietário da ten-a renunciasse à renda.
Mas admitamos suba o preço de mercado de IV apenas a 1 libra e
9 1/3 xelins, o preço de cus/o d.e UI. Ou para tomar o caso mais contun-
dente: seja o preço de custo .de III somente 1 libra e 5 xelins, isto é, a ri-
gor 1 8/37 xelins mais aJto que o preço de custo de IV. Tem de ser mais
àlto por ter fertilidade inferior à de IV. Agora, pode III entrar no empreen-
dimento e concorrer com IV que vende acima do preço de custo de III,
a saber, a 1 libra e 5 3$/37 xelins? Ou sucede procura adicional ou não.
No primeiro caso, IV terá o preço de mercado acima de seu valor, acima
de l líbra e 5 35/37 xelins. E III então, não importam -as circunstâncias,
venderá acima de seu preço de custo, ainda que não chegue ao montante
global de sua renda absoluta.
Ou não há procura adicional. Aí são possíveis dois casos. Só pode
entrar em cena a concorrência de III se o arrendatário de III for seu pró-
prio senhorio e se a propriedade da terra não opuser a ele como capitalis-
ta obstáculo algum, resistência alguma, pois ele a tem sob seu domínio,
não na qualidade de capitalista e sim na de proprietário. Sua concorrên·
eia forçará IV a vender abaixo do preço até então vigente de 1 libra e
5 35/37 xelins e mesmo abaixo •do preço de 1 libra e 5 xelins. Com isso,
III será posto fora de campo. E IV poderá sempre expuJsar · III. Bastará
reduzjr o preço aos próprios custos de produção inferiores aos de III. Mas,
se o mercado se expandir em virtude da rebaixa de preço provocada por
III, que sucederá? Ou o mercado se expande de modo que'IV·pode conti-
nuar colocando suas 92 1/2 ton~ladas apesar das 75 novas toneladas adi·
cionadas, ou não vai a tanto, de modo que sóbra parte do produto de IV
e IlI. Nesse caso, IV manterá redução de preço, uma vez que domina o
mercado, até que o capital em III se reduza ao montante adequado, isto
é, nele só se empregue a quantidade de capital a rigor suficiente para per-
mitir a absorção do produto todo de IV. Mas a 1 libra e 5 xelins poder-
se-á vender a totalidade do produto, e uma vez que III vende parte do pro-
duto a esse preço, IV não poderá vender acima dele. Este porém seria o
único caso possível, superprodução momentânea que não deriva de uma
procura adicional e que leva a uma expansão do mercado; E este caso só
é possível quando capitalista e proprietário da terra são idênticos em III -
isto é, de novo se admite que a propriedade fundiária não existe como
poder em oposição ao capital, por ser o próprio capitalista proprietário
da terra e sacrificar o proprietário da terra ao capitalista. Mas, se a pro-
priedade fundiária como tal se contrapõe ao capital em III, não haverá

732
motivo para que o proprietário da tena ceda seus acres à agricultura sem
obter Ultlll renda, para que os ceda, portanto, antes de o preço de IV ter
subido pelo menos acima do preço de custo de UI. Sempre que a alta
seja diminuta, III deixará de ser campo de ação do capital em todo pais
de produção capitalista, exceto se não tiver outra forma de obter renda.
Mas nunca será cultivado antes de dar uma renda, de o preço de IV ficar
acima do preço de custo de III, portanto, antes de IV dar uma renda di-
ferencial além de sua renda anterior. Com o crescimento posterior da
procura, o preço de III subirá até seu valor, uma vez que o preço de cus-
to de II está acima do valor individual de III. II será cultivado logo que o
preço de III ultrapasse 1 libra e 13 11/13 xelins, dê portanto a li uma
renda qualquer.
Mas em D supõe-se que I niio dá renda. E isto só porque se admítiu
que I era terra já cultivada, sendo forçado, pela mudança no valor de· mer·
cado oriunda da entrada de IV, a vender abaixo de seu valor, a seu preço
de custo, Só continuará a ser assim explorado se o proprietário mesmo
for o arrendatário, isto é, se nesse caso lndividw.zl a propriedade da ter·
ra desaparece em face do capital, ou quando o arrendatário for um pe-
queno capitalista que se contenta com menos de 10%, ou um trabalha-
dor que quer apenas conseguir o salário ou algo mais e paga seu trabalho
excedente, 10 ou 9 ou menos de 10 libras, ao dono da terra e não ao ca·
pitalista. Nos dois últimos casos paga-se de fato arrendamento, mas sem
haver a figurn econômica da renda, a matéria que nos interessa aqui. Num
caso, o arrendatário é mero trabalhador; no outro, um ser híbrido entre
traballiador e capitalista.
Nada mais absurdo que sustentar não poder o dono da terra retirtn
seus acres do mercado com a mesma facilidade com que o capitalista re-
tira seu capital de um ramo de produção. O que melhor evidencia esse
absurdo é a quantidade de terra fértil que não é cultivada nos países mats
desenvolvidos da Europa como a Inglaterra, é a terra que se transfere da
agricultura para a construção de vias férreas ou de moradias ou se reserva
para esse fim, ou que o dono dela destina a clubes de atiradores ou a ca-
ça como nas terras altas da Escócia etc. O que melhor evidencia o absur-
do é a luta vã dos trabalhadores íngleses para se apossarem dos terrenos
baldios.
Note-se: em todos os casos em que a renda absoluta cai abaixo de
seu montante - o que se dá em II D porque aí o valor de mercado está
abaixo do valor individual da classe, ou em II B onde parte do capital,
em virtude da concorrência do melhor solo, tem de ser retirada do pior,
ou em I D onde a renda desaparece de todo temos por pressuposto:

733
(l) onde ela desaparece de todo, o dono da terra e o capitalista
constituem a mesma pessoa, e assim aí se desfaz, em caráter individµal
e excepcional, a resistência da propriedade fundiária contra o ~pital e a
limitação do campo de ·ação deste por aquela. A condição prévia da pro-
priedade fundiária desaparece como nas colônias, só que de maneira in-
dividualizada;
(2) a concorrência das melhores terras gera superprodução - tam-
bém a das piores (na seqüência decrescente) - e força a expansão do mer-
cado, cria procura adicional por meio de redução violenta do preço. Mas
este é a rigor o caso que Ricardo não pressupõe, pois raciocina sempre na
base do postulado de só ser provida a procura adicional necessária;
(3) II e I - em B, C, D - nã'o pagam nenhuma renda absoluta ou
não pagam o montante global dela porque são forçados. pela concorrên-
cia das melhores terras a vender seu produto abaixo do, valor dele. Ricardo,
ao contrario, supõe que eles vendem seu produto pelo respectivo valor e
que o pior solo sempre determína o valor de mercado, quando no caso I
D que ele considera o normal ocorre justamente o oposto. Ademais, seu
raciocínio pressupõe a seqüência decrescente da produção.
Admitamos que a composição média do capital não agrícola= 80c +
+ 20v, taxa de mais-valia = 50% e a composição do capital agrícola =
= 90c + l Ov, isto é, superior à do capital industrial, o que· é historicamen-
te falso para a produção capitalista; então, não have·rá renda fundiária
absob.Jta; se a composição do capital agrícoia = soe + 2Qv• ~ que até ho-
je não ocorreu, não haverá renda absoluta; se inferior, <por exemplo,
60c + 40v, haverá renda furuliária absoluta. ·.
De acordo com a posíção das diferentes classeS em sua relação com
o mercado, isto é, a proporção em que esta ou aquela classe domina ;
mercado, e pressuposta a teoria, podem surgir:
A. A última classe paga renda absoluta. Determina o valor de mer*
cado porque todas as classes a esse valor de mercado só fornecem a ofer-
ta necessária.
B. A última classe determina o valor de mercado; paga renda abso-
luta, a taxa inteira desta, mas não a totalidade do montante anterior, por-
que a concorrência de l!I e IV a força a retirar da produção parte do ca-
pital.
C. A oferta excedente que as classes I. II, III e IV proporcionam ao
antigo valor de mercado força a baixa deste, mas esta - regulada pelas
classes superiores - expande o mercado. I só paga parte da renda absolu-
ta e U apenas a renda absoluta.

734
D. O mesmo domfuio do valor de mercado pelas melhores classes
ou domínio das piores classes por oferta excedente destrói por completo
a renda de 1 e red.uz a de II abaixo de seu montante absoluto; por fim, em:
E. Mediante queda do valor de mercado abaixo do preço de custo
de 1, as melhores classes o expulsam do mercado. Então II regula o valor
de mercado porque, a esse novo valor de mercado, todas as 3 classes só
proporcionam a oferta nece$árla.
Voltemos a Ricardo.

Está claro que, ao se falar da composição do capital agrícola, nela


não se inclui o valor ou o preço da terra. Este nada mais é que renda fun-
diária capitalizada.
j
Capítulo XIII
Teoria Ricardiana da renda (conclusão)

1. Rfrardo pressupõe a inexistência da propriedade da


terra. Transição para novas terras: A localização e a
fertilidade
Vo1tem:is aRiaudo, arp. ll "OnRent":
Começa pela "teoria colonial" já conhecída de Smith. 95 Aqui bas-
ta fazer uma apresentação sumária de sua concatenação lógica.

''Não haverá renda na primeira colonização de um país onde há abun-


dância de terras ricas e férteis, das quais, para sustentar a população
existente, ro diminuta proporção é miner cultivar ou pode ser de fato
cultivada com o capital disponível pela população; e não haverá renda
porque ninguém pagará pelo uso da temi quando há qUllntidade abun-
dante de que ninguém se apropriou ainda e por isso" (porque ningu~m
dela se apropriou, o que Rícatdo depois esquece por completo) "está
â disposição de quem quer que se decida a cultivá-la" (p. 55).

(Aí portanto a inexistência da propriedade da terra é condição pré·


via. Essa descrição de processo, embora seja mais ou menos acertada pa·
ra as colônias dos povos modernos, não é válida para a produçã\l capitil-

95. Ver neste volume pp. 658 e 670.

737
lista desenvolvida, e é por igual errado considerá-la o caminho histórico
na velha Europa.)

"De acordo com os princípios gerais da oferta e procura, nenh14ma


renda pode ser paga por terra assim abundante, pela razão já exposta:
nada se paga pelo uso do ar e_ da água ou de quaisquer dons da nawre-
za existentes em quantidade inexaurível... Nada $e cobla pelo uso des·
ses recursos naturais por serem inexauríveis e estarem à disposição de
qualquer um ... Se todas as terras possuíssem as mesmas qualidades, se
fossem de quantidade ilimitada e de qualídade igual, nada se poderia
exigir por seu uso" (porque não poderiam ser convertidas em proprie-
dade. privada), "excetuadas as que tivessem vantagens peculiares de
localização" (e estivessem ii disposição de um proprietário, devia ele
acrescentar). "Nio ~ ilimitada a quantidade nem igual a qualída.de das
terras, e cultivam-se, ao acrescer a população, terras de qualidade in-
ferior ou de localização menos favorável: é só por essas .razões que se
paga renda pelo seu u:so. ·Quando no curso do desenvolvimento da so-
ciedade se cultiva ten:a de segunda classe em fertilidade, logo surge
renda no. de primeira, e em montante dependente da diferença de qua-
lidade entre as duas classes" (pp. S6, 57).

Detenhamo-nos aí. Vejamos a consistência lógica:


Se há terra rica e fértil, in~ulta, em quantidade praticamente ilimi-
tada para a população e capital existentes - o que Ricardo su.põe ao se
estabelecer a "primeira colonização de um pa(s '' (teoria colonial de
Smith} -, se ademais "ninguém se apropriou ainda" da "quantidade abun-
dante" dísponível, e por isso, uma vez que "ninguém dela se apropriou
ainda", "está à disposição de quem quer que se decida.ª cultivá-la", nada
se pagará sem dúvida pelo uso da terra, nenhuma renda. Se a terra fosse
um elemento ilimitado, não só em relação ao capital e à população, mas
de fato (como o ar e a água), se existisse em "quantidade ilimitada", a
circunstàncía de uns se apropriarem dela não excluiria a possíbllidade de
outros fazerem o mesmo. Não poderia existir propriedade privada do so-
lo (nem "pública" ou estatal). Nesse caso - se todas as terras fossem da
mesma qualidade, nenhuma renda fundiária poderia ser paga. No mâxi-
mo, ao possuidor de terras que "tivessem vantagens peculiares de loCS:•
lização"
Assim, nas condições pressupostas por Ricardo - a saber, que "nin-:
guém se apropriou da terra" e por isso a terra inculta está "à disposição
de quem quer que se decida a cultivá-Ia" - só existe a possibilidade- dÍ{
se pagar renda porque "não é ilimitada a quantidade nem igual a qualida-
de das terras", isto é, porque há diferentes tipos de terra e terra do rnes·
mo tipo é "limitada". Diremos que, de acordo com o que pressupõe Ri-

738
cardo, só se pode pagar renda diferencial. Ricardo, contudo, em vez de
se cingir a isso, de imediato concluí - sem levar em conta sua suposição
da inexistência da propriedade fundiária - que nunca se paga renda abso-
luta pelo uso da tena, mas apenas renda diferencial,,
Tudo, portanto, se reduz a isto: se existe em excesso terra inculta
em face do capital, este se move na agricultura da mesmo. maneíra como
em qualquer outro ramo industrial, Então não exisj:e propriedade da tf!f'·
ra, nem renda. No máxímo, quando uma área é mais fértil que a outra,
podem existir lucros suplementares como na indústria. Nesse caso, fixar-
se-ão como renda diferencial em virtude da base natural que têm nos di-
ferentes graus de fertilidade do solo.
Ao revês, se a terra ê (1) limitada e (2) objeto de propriedade, o ca-
pital encontra á propriedade da terra ·como condição prévia, e é o q_ue
sucede onde se desenvolve a produção capitali.Sta; onde o capital não en-
contra essa precondição existente na velha Europa, ele mesmo a cria co-
mo nos Estados Unidos, e desse modo a terra não é a priori um campo
elementar de ação do capital. Daí a renda absoluta, além da renda dife-
rencial. E as transições de uma classe de terra para outra, sejam as ascen-
dentes,- I, II, III, IV, ou descendentes, IV, III, li e I, se processam de ma-
neira diferente da suposição de Ricardo. l! que o emprego de capital en·
contra resistência da propriedade fundiária tanto em 1 quanto em II, III
e IV e o mesmo se dá quando se passa de IV para III etc. Não basta, quan-
do se transita de IV para III, que o preço de IV esteja suficientemente
alto para se poder aplicar o capital em III com lucro médio. E mister que
esteja tão alto que se possa pagar renda em ll1. Se a transição se faz de I
para II etc., já está evidente que o preço que pagava renda a 1 paga a II
não só essa rendâ, ·porém mais ainda renda diferencial. Ao supor a ine-
xistência da propriedade da terra, Ricardo, sem dúvida, não eliminou a
lei estabeleci.da pela existência e com a existência da propriedade da terra_
Logo depois de mostrar como pode surgir renda diferencial com
sua suposição, prossegue Ricardo;

"Quando se cultiva terra de terceira qualidade, de imediato surge ren-


da na de segunda e se regula, como dantes, pela diferença entre as res·
pectivas forças produtivas. Ao mesmo tempo, a renda da terra de prí·
rneíra qualidade acre~cerâ, pol$ tem de estar sempre acima da Jenda
da de segunda em virtude da diferença no produto que se obtém para
a mesma quantidade de traball!o e capital A cada passo que se der no
desenvolvimento da população e que forçar um país a recorrer a ter-
ras de pior qualidade"

739
(com isso de modo nenhum se diz que cada passo no desenvolvimento da
popu1ação forçará um paz's a reco"er a terra de pior qualidade),

"para poder aumentar a oferta de alímentos, elevar-se-á a renda em


todas as terras maü férteis" (p. S7).

Isso aí está certo.


Ricardo exemplifica. Excluídas observações a fazer depois, o exem-
plo supõe a seqüência descendente. Mas apenas supõe. O que Ricardo in-
sinua ao dizer:

"Na primeira <:olonização de um país onde há abundânda de terras ri-


case férteis ... de que ninguém ainda se apropriou" (p. 55).

Mas o caso seria o mesmo se houvesse, em relação aos colonos, "abun-


dância de terras pobres e estéreis de que ninguém ainda se apropriou". O
que se supõe para não se pagar renda não é a riqueza ou fertilidade das ter·
ras e sim a circunstância de serem elas ilimitadas, de não serem objeto de
apropriação e serem de qualidade igual, qualquer que seja essa qualidade
r>o tocante ao grau de fertílidaqe. Por isso, o próprio Ricardo formula a
seguir sua suposição:

"Se toda:i; ac terras tivessem atributos iguais, _se fossem ilimita®s em


quantidade e iguais em qualidade, nada se poderia cobrar par seu uso"
(p. 56).

Não diz nem pode dizer "se fossem ricas e fért~.is", pois essa condi-
ção nada teria absolutamente a ver com a lei. Se as tenas, em vez de ri·
cas e férteis, fossem pobres e estéreis, cada colono teria de cultivar pro-
porção maior da totalidade das terras, e assim chegariam elas mais depres-
sa, com o crescimento da população, ao ponto onde o excesso prático de
terra deixaria de ser efetivamente ilimitado em relação à população e ao
capital.
Não há aí a menor dúvida de que os colonos não escolherão as ter-
ras menos férteis e sim as mais férteis, isto é, as terras mais férteis para
os meios de cultivo a seu dispor. Mas este não é o único limite à sua es-
colha. Para eles, o que é decisivo, primeiro, é a situação, a localização nas
regiões marítimas, nas margens dos grandes rios etc. Não importa a ferti·
lidade do oeste americano etc. Os colonos se estabelecem naturalmente
em Nova Inglaterra, Pensilvânia, Carolina do Norte, Virgínía etc., em su-

740
ma, na costa oriental do Atlântico. Se escolhem a terra mais fértil, só es·
colhem a terra maf.s fértl1 nessas áreas. Isso não os impediu de cultivarem
depois terras mais férteis no Oeste, logo que o crescimento da população,
a formação de capital, o desenvolvimento das eomunicações e a constru·
ção de cidades lhes tomaram acessíveis as terras mais férteis nessa região
num distante. Não procuram a região mais fértil, mas a melhor situada
e dentro dela naturalmente - iguais as demais condições de situação - a
terra mais fértil. Mas isso por certo não prova que passam das terras mais
férteis para as menos férteis, e sim que, na mesma região, suposta igual.
dade de situação, a terra mais fértil é cultivada antes da menos fértil.
Mas Ricardo, depois de substituir, com acerto, "abundância de ter·
ras ricas e férteis" por "terras de propriedades iguais, quantidade ilímita·
da e qualidade igual", formula o exemplo e daí retrocede pulando para
a primeira suposição que é falsa.

"CUltiva-se primeiro a terra mai:r fértil e melhor situada" (Lc., p. 80).

Sente o que há de frágil e errôneo na afirmação e por isso acresceli·


ta às palavras "terra mais fértil" a nova condição: "e melhor situada", o
que faltou_ no começo. "A terra mais fértil nos limites da situação mais
favorável" teria de ser o sentido evidente, e não se pode chegar ao dispa·
rate de sustentar que as áreas do país as quais estão por ventura melhor
situadas para os recém-chegados, para os manter em contat0 com a rnãe-
pátria, com os velhos amigos da terra natal e com o mundo exterior, são
"as áreas mais férteis" em relação ao conjunto das terras que os colonos
ainda não exploraram ou que para eles são inexploráveis.
Assim, dissimula-s~ por completo a introdução do postulado da se-
qüência descendente da transição das zonas mais férteis para as menos
férteis. Pode-se dizer apenas que, na primeira região onde há cultivo em
virtude da situação mais favorável, nih se paga renda até que nessa região
se passe das terras mais férteis para as menos férteis. Contudo, se se pas·
sa para uma região mais fértil que a primeira, a segunda, confonne o pres-
suposto, estará pí.or situada. Por isso, é possível que as maiores desvanta-
gens da situação excedam as vantagens da maior fertilidade, e nesse caso
as terras da região I continuarão a pagar renda. Mas, uma vez que a situa-
ção é circunstância historicamente mutável com o desenvolvimento eco·
nôroico e de contínuo tem de melhorar com o estabelecimento das comu-
nicações, fonnação de novas cidades etc., crescimento da população, é
claro que o produto obtido na região Il vai sendo levado ao mercado a

741
preço que faz declinar de novo a renda 9.a região 1 (para o mesmo produ-
to), e que a II com o tempo se revela no mercado o solo mais fértil à me-
dida que desaparece a desvantagem da situação. ·
E portanto evidente;
que, na condição prévia que o próprio Ricardo expressa, de ma-
neira correta e geral, para surgir a renda diferencial - "todas as terras...
com os mesmos atributos. .. ilimitadas em quantidade ... iguais em quali-
dade" -, não se inclui a circunstância da transição de terras mais férteis
para menos férteis;
que essa transição também não corresponde aos fatos da histó·
ria da colonização dos Estados Unidos, a qual ele tinha e:m vista como
Smith, e daí se justificarem nesse ponto as objeções de Carey;
que o próprio Ricardo transtorna de novo o problema ao acres-
centar o fator "situação": ..cultiva-se primeiro a terra mais fértil e me-
lhor situada':·
que Ricardo demonstra seu pressuposto arbitrário com um exem-
plo onde se pressupõe a proposição a demonstrar, a saber, a transição das
melhores terras para terras cada vez piores;
que por fim (com vistas, por certo, à explicação da tendência a
cair da taxa geral de lucro) e'stabelece ele esse pressuposto por não poder
encontrar outras explicações para a renda díferencit1!. embora esta em na-
da dependesse da circunstância de a seqüência ser I, II, III, IV ou IV, Ill,
ll, I.

2. A renda diferencial, segundo Ricardo, não pode


influenciar o preço do trigo. A renda absoluta, causa
da elevação dos preços dos produtos agrícoJas.

No exemplo admitem-se 3 tipos de terra, 1, 2 e 3, os quais com igual


emprego de capital fornecem produto líquido de 100, 90 e 80 quarteIS de
trigo, respectivamente. O tipo 1 é o primeiro a ser cultivado "num país
novo onde há abundância de tena fértil em relação· à populaçãô e onde
por isso basta cultivar o tipo l" (p. 57). Nesse caso, o "produto líquido
todo" pertence ao agricultor e "constituirá os lucros do capital que adian-
ta"' (p. 57). Também aí repugna (não estamos falando das grandes fazen-
das de colonização - p/antotions} considerar de imediato esse "produto
h'.quido" lucro do capital, apesar de não se ter pressuposto aí produção

742
capitalista. Mas talvez o colono chegado da '\relha pátria" veja a coisa
assim. Se a população cresce a ponto de se ter de cultivar o tipo 2, o 1 da·
rá uma renda de 1O quarters. Supõe-se aí naturalmente que "ninguém se
apropriou" das áreas do tipo 2 e 3 e que elas continuam na prática "ili·
mitadas" em relação à população e capital. Do contrário, as coisas pode·
riam as.sumir outro curso. De acordo com aquela suposição, portanto, o
tipo 1 dará uma renda de 10 quarters:

"Pois ou tem de haver duas taxas de lucro para capital agrícola, ou


rêm de ser deduzidos do pwduto obtido no tipo 1, pw:a outro objetí-
vo qualquer, dez quarters ou o valor de dez quarters. Tanto faz que
o dono da terra ou qualquer outra pessoa eultive o tipo 1, esses dez
quarters sempre representam renda; é que o agricultor do tipo 2 obte·
rá com seu capital o mesmo resultado seja cultivado o tipo 1 e pagan·
do 10 quatters de renda, séja eontinuando a cultivar o tipo 2, sem pa-
gar renda" (p. 5 8).

De fato haveria duas taxas de lucro para o capital agrícola, isto é, o


tipo l fomeceria lucro suplement111 (que nesse caso pode fixar-se em ren-
da) de l O quarters. Mas o próprio Ricardo, duas páginas depois, diz que
para capital da mesma espécie no mesmo ramo de produção. para capital
agrícola portanto, não são apenas possíveis, mas inevitáveis, duas ou mui-
tas taxas diferentes de lucro:

"A terra mais fértil e melhor situada é cultivada p1imeiro, e o valo:r de


troca do produto é determinado da mesma maneira que o valor de tro-
ca de todas as demais mercadorias, isto é, pela quantidade total de
trabalho nece.ssária em diferentes fonnas, do começo ao fim, para pro-
duzí·lo e levá-lo ao mercado. Quando se cultiva terra de qualidade inferior,
eleva-se o ·valor de troca do produto agrícola, uma vez que maís tra-
balho se requer pa:ra p1oduzi-lo. O valor de troca de todas as mercadorias,
oriundas da produção industrial, da mineração ou da agricultura, não é
detetminado pela menor quantidade de trabttlho adequada para produzi·
las em condições muito favoráveis, fruídas apenas por aqueles que dis-
põem de facilidades peculiares de produção; mas pela quantidade maior
de trabalho nece.-..wriamenre empregada 1111 produção pot aqueles que não
dispõem dessa;s facilidades, por aqueles que continuam a produzi-las nas
condições mais deifovorá,,eís; isto é, nas condições mais desfavoráveis cm
que a quantidade de produto requerida" (ao velho preço) "torna neces·
sário que prossiga a produção" (pp. 60, 61).

Em cada indústria portícular, portanto, há duas ou muitas taxas de


lucro, isto é, desvios da taxa geral de lucro.
Não cabe ínvestigar aqui o exemplo noutro aspecto (pp. 58, 59) em
que trata do efeito de doses diferentes de capital-sobre a mesma área de
tena. Vejamos somente as 2 proposições:

743
(1) "Renda (rent) é sempre a diferença no produto obtido pelo empre-
go de duas quantidades iguais de capital e de trabalho" (p. 59).

Quer dizer, só há a renda diferencial (de acordo com o pressuposto


de não existir propriedade fun,diãria). E que

(2) "não pode haver duas taxas de lucro" (p. 59). "Jl; certo que se obte-
tá na melhor terra o mesmo produto com o mesmo trabalho anterior,
mas seu valor subíni em vitÇude dos resultados reduzidos que obtêm
aqueles que empregam tlabalho e capital novos em teua menos fértil.
Por isso, as vantagens das terras férteis sobre as inferiores, embora em
nenhum caso se percam, mas :e transfiram do agricultor ou do consumi·
dor para o dono da teua, todavia - uma vez que é mister mais txabalho
nas terras inferiores, e só e&SIJB terras nos podem prover com a ofertlJ
adiclonal de produtos agrícolas -, o valor relativo desses produtos per-
manecerá acima do nível anteriot e se trocará por mais chapéus, rou-
pas, sapatos etc. em cuja produção não se exige aquela quantidade adi-
cional de trabalho" (pp. 62, 63).
"A tazão para o acréscimo do valor relativo dos produtos agrícolas é
o emprego de mais trabalha para produzir a última porção obtida, e
níio a circunstância de ae pagar remio ao proprietârio da terra. O vakJr
do trigo é determinado pela quantidade de trabalho aplicada para pro-
duzi-lo em terra daquela qualidade - ou com a porção. do capital - a
qual não dá renda. O· preço do trigo é alto não porque se paga renda,
mas paga.se renda porque o preço do trigo é alto. Com acerto já se ob-
servou que nenhuma redução ocorreria no preço dq. trigo, se os donos
das terrai:. renuncíassem à totalidade da renda. Tal medida apenas pos-
sibilitaria a alguns agricultores viverem como fidalgos, ma§ não dimi-
nuiria a quantidade de trabalho necessária pua se. obterem produtos
agrícolas na terra cultivada menos produtiva" (p. 63)."

Minha exposição anterior toma desnecessário .díscorrer sobre a falsi-


dade da proposição: «o valor do trigo é detenninado pela quantidade de
trabalho aplicada para produzi-lo em terra daquela qualidade, ... a qual
não dá renda". Mostreí que a circunstância de Q últi.lllo tipo de terra pa·
gar ou não renda, pagar a renda absoluta inteira ou parte dela, ou ainda
pagar renda diferencial além da absoluta (se a seqüência for ascendente)
depe~o..parte do sentido da·seqüéncia, se é ascendente ou descendente,
e seja como 'for depende da relação entre a composição do capital agríco-
la e a do capital não agrícola, e que, suposta a renda absoluta em vírtude
dessa diferença de composição, os casos acima dependem da conjuntura
de mercado. Mas o caso ricardiarto em particular só pode ocorrer em duas
circunstâncias (embora ainda haja a possibilidade de se pagar arrendamen-
to e não renda): ou quando não existe, em lei ou de fato, propriedade fun-
diária, ou quando a melhor terra fornece oferta adicional que só se pode
colocar no mercado se cair o valor de mercado.

744
Mas, além disso, no trecho acima citado há várias asserções erradas
ou unilaterais. Outras causas, além da mencionada, podem aumentar o va-
lor comparativo - aqui no sentido apenas de valor de mercado - do pro-
duto agrícola: primeiro, se até então se vendia esse produto abaixo do va-
lor, talvez abaixo do preço de custo, o que sempre ocorre em certo está-
dio da sociedade no qual a produção do produto agrícola ainda se desti·
na na maior parte à subsístência do agricultor (o que também se dava na
Idade Média, quando se assegurava ao produto urbano preço de monopó-
lio); segundo, quando o produto agrícola ainda não se vende pelo valor,
em contraste com as demais mercadorias, que se vendem ao preço de custo.
Por fnn, é correto dizer que pa,ra o preço do trigo nada se altera se
o dono da terra renuncia à renda diferencial e o agricultor a embolsa. Isto
não se estende à renda absoluta. -E errado dizer que a propriedade fundiá-
ria não eleva o preço do produto agrícola. Ao revés, isso se dã porque a
intervenção da proprieda& privada faz o produto agrícola ser vendido
pelo valor que excede o preço de custo. Suposto, como acima, o capítal
médio não agrícola = 80c + 20v, a mais-valia = 50%, a t~a de lucro seria
igual a 10 e o valor do produto a 110. Em contrapartida, o capital agríco-
la = 60c + 40v, valor = 120. O produto agrícola se vende a esse valor. Se
a propriedade da terra não existe de direito nem de fato, em virtude da
abundância relativa de terra como nas colônias, vender-se-ia o produto
por 115. E que o lucro global do primeiro capital e do segundo (de 200)
= 30, e assim o lucro médio = 15. O produto não agrícola seria vendido
por 115 e não por 11 O; o produto agrícola, a 115 e não por 120. Por con-
seguinte, o valor relativo do produto agrícola cairia de 1/12 em confron-
to com o produto não agrícola; mas, para ambos os capitais - ou para a
totalidade do capital - o agrícola e o industrial, o lucro médio subiria
de 50%, de 10 para 15.
Diz Ricardo de sua própria concepção de renda:

"Considero a tenda sempre conseqüência de um monopólio pardal


que na realidade nunca determina o preço"

(assim, nunca exerce a função de monopólio e nunca portanto é a renda


conseqüência do monopólio, Para Ricardo só poderia ser conseqüência
do monopólio a circunstância de o dono das melhores terras embolsar
a renda, em vez de o fazer o arrendatário),

"mas antes resuita do preço. Se os donos das ten-as renunciassem a ro-


da renda, penso que as me1cadorias produzidas na terra não ficariam

745
mais baratas, porque há sempte uma parte dessas mercadorias a qual
nenhuma rendo paga ou pode pagai', pois o produto excedente só dá
para pagar o lucro do capital" (Rica.rdo,Princ., 1.c., pp. 332, 333).

Aqui produto excedente é o que ultrapassa o produto absorvido


pelo salário. Desde que se preestabeleça a suposição de certa terra nunc.a
pagar renda, a aftnnação de Ricardo só estâ certa se essa terra ou antes seu
produto determinar o valor de mercado. Em contrapartida, se seu produ-
to não paga renda por ser o valor de mercado regulado por terra mais fér-
til, esse fato nada prova.
Na realidade, se "os donos das terras renunciassem" ã. renda diferen-
cfal, os arrendatários seriam beneficiados. Ao revés, a renúncia à renda
absoluta baixaria o preço dos produtos agrícolas e elevaria o dos produ-
tos industriais até o ponto em que subisse o lucro médio por esse processo.

* * *
"A elevação da renda é 11empre o resultado da riqueza crescente do país
e da dificuldade de proverdealimentosapopulaçãoacrescida" (pp. 65, 66}.

Errada essa proposição.

"A riqueza aesc.e mais rápida naqueles países onde a terra disponível
é mais fértil e a importação menos limítada, onde a produção sem acrés~
cimo proporcional da quantidade de trabalho pode .ser multiplicada
por meio de melhoramentos da exploração agrícola e o~e por .itso é
lento o progresso da renda" (pp. 66, 67).

O montante absoluto da renda pode subir também quando a taxa


da renda não varia, e apenas o capital aplicado na agricultuni awnenta
com o crescimento da população; pode subir, quando em l não se paga
renda e em II só se paga parte da renda absoluta, mas a renda diferencial,
em virtude da fertilidade relativa, muito se eleva etc. (ver os quadros) 96

3. Concepção do "preço naruralt• do produto agrícola


segundo Smith e Ricardo.
"Se preço mais alto do trigo fosse efeito e não causa da renda (rent),
1endas altas ou baíxas te.riam influência pro~orcional no preço, e a ren-

96. Ver pp. 692 e 693.

746
da seria parte componente do preço. Mas o trigo produzido com a maior
quantidade de trabalho é o regulador do preço do trigo, e a renda de ma-
neü:a nenhuma entra nem pode entear nele como componente... .Maté-
ria-prima entra na composição da maioria das mercadorias, mas o valor
da matéria-prima é determinado, como o do trigo, pela produtMdade
da última porção de capital empregada na terra e que não dá renda. Por
i&so, a renda não é parte componente do preço das mercadorias" (p. 67).

Há aí muita confusão por se misturar ''preço natural" ( pois é desse


preço que se trata aqui) e valor. Ricardo adota essa confusão criada por
Smith. Neste, ela é relativamente adequada porque e até onde Smith aban·
dona sua própria definição correta de valor. Nem a renda nem o lucro
nem o salário constituem parte componente do valor da mercadoria. Ao
contrário. Dado o valor de uma mercadoria, as diferentes partes em que
esse valor se póde dividir pertencem à categoria de trabalho acumulado
(capital constante) ou à de salário, lucro ou renda (rent}. Em contraparti-
da, no tocante ao preço natural ou preço de custo pode Smith falar de
suas partes componentes como condições preestabelecidas. Transfere es-
sa caracterização para o valor da mercadoria só por confundir preço na-
tural e valor.
Pondo-se de lado o preço da matéria-príma e da rnaquínaria (em
suma, do capital constante) - o dado externo que aparece ao capitalista
em todo ramo particular de produção e entra determinado na produção-,
tem ele, ao fixar o preço da mercadoria, duas coiSas a fazer: acrescentar
o preço do salário, e este lhe aparece também dado (dentro de certos li-
nlites). No tocante ao preço natural da mercadoria não se trata do preço
de mercado, mas do preço médio de mercado durante um período longo
ou do centro em tomo do qual gravita o preço de mercado. Ai, portan-
to, o preço do sa'/ário é em geral dado pelo valor da força de trabalho.
Mas a taxa de lucro - a taxa natural de lucro - ê dada pelo vakJr da to-
talidade das mercadorias ger.ulas pela totalidade dos capitais empregados
na indústria não agrícola. :eque aí o excedente desse valor sobre o valor
do capital constante está contido na mercadoria, acrescido do valor do
salário. A mais-valia global criada por aquela totalidade do capital fonna
o montante absoluto do lucro. A proporção desse montante absoluto
plllll com o capital global adiantado detennina a taxa geral de lucro. Por
isso, também essa taxa geral de lucro se revela dado externo tanto para
o capitalista individual quanto para o capital em cada esfera particular
de produção. Ao preço dos adiantamentos em matéria-prima etc., encer-
rados na mercadorta, e ao preço natural do saJário tem ele portanto de
adicionar o lucro geral, digamos, 10%, para assim, segundo necessaria-

747
mente lhe parece, formar o preço natural da mercadoria, adicionando
partes componentes ou reunindo-as. A circunstância ,de ser pago o pre-
ço natural, ou mais ou menos, depende do nível eventual do preço de
mercado. Em contraste com o valor, no preço de custo só entram salário
e lucro; a renda (rent) só entra quando já .incorporada ao preço dos adian-
tamentos de matéria-prima, de maquinaria etc, Por isso, não entra como
renda para o capitalista, para quem, de modo geral, o preço da matéria·
prima, da maquinaria, em suma, do capital constante aparece corno to·
tal preestabelecido.
A renda (rent) não entra no preço de custo como parte componen-
te. Se o produto agrícola em circunstâncias especiais se vende ao preço
de custo, nenhuma renda existe. No plano econômico, então, a proprie-
dade da terra não existe para o capital, isto é, quando o produto da es·
pécie de terra que vende ao preço de custo regula o valor de mercado do
produto do mesmo ramo. (E bem diferente o comportamento de 1 no
quadro D97 .)
A alternativa é a existência de renda (absoluta). Nesse caso, o pro·
duto agrícola se vende acima do preço de custo. Vende-se pelo valor, que,
está acima do preço de custo, Ma.s a renda entra no valor de mercado do
produto ou, antes, constitui parte desse valor. Para o arrendatário, contu-
do, ela representa um dado, como o lucro, para o industri!ll: :E: determi·
nada pelo que o valor do produto agrícola ultrapassa o ;preço de custo.
Mas o arrendatário calcula no mesmo estilo do capitalista: primeiro, os
adiantamentos; segundo, o salário; terceiro, o lucro médio, ~ por fim a
renda, que também lhe parece dada. Isso é pata ele o ·preço natural do
trigo, por exemplo. A circunstância de esse preço lhe Jer pago depende,
de novo, do estado eventual do mercado.
Se se mantém objetivamente a distinção entre preço de custo e va-
lor, a renda nunca pode entrar no preço de custo como elemento consti-
tutivo, e em contraste com o valor da mercadoria só se pode falar de ele·
mentos constitutivos quando se trata de preço de custo. (A renda dife-
rencial, como o lucro suplementar, nunca entra no preço de custo porque
sempre ou é ·excedente do preço de custo do mercado 98 acima do preço
de custo individual, ou excesso do valor de mercado sobre o valor individual.)

97. No capítulo precedente (p, 722) mostrou Marx que a classe l no quadro D
"fica em passividade total». Não é [quem detennína o mercado "e sim IV, lll e II con.·
tra ele" (p. 724 ).
98. Por preço de custo do mercarlo entende Marx. o preço de custo geral que re-
gula os preÇO$ de mercado das mercadorias num determinado ramo de produção (ver
p, 558).

748
Na substância está Ricardo certo ao afirmar contra Smith que a ren-
da nunca entra no preço de custo. Mas reincide em erro porque o demons·
tra não distinguindo preço de custo de valor e sim• os identificando, como
faz Smith, poís renda (rent), lucro e salário não são elementos comtituti-
-vos do valor, embora o valor possa decompor-se em salário, lucro e renda,
e com a mesma legitimidade para todas essas 3 partes, quando todas as 3
existem. Raciocina Ricardo: a renda não é elemento constitutivo do preço
natural do produto agrícola, porque o preço do produtó do pior solo= pre·
ço de custo desse produto = valor desse produto, o qual determina ova-
lor de mercado do produto agrícola. A renda portanto não constitui par-
te do valor por não constituir parte do preço natural e ser este igual ao va-
lor. Mas justamente isso está errado. O preço do produto obtido no pior
solo é igual ao preço de custo, ou porque o produto-se vende abaixo do va-
lor - e não porque, como diz Ricardo, se vende pelo valor -, ou porque
o -produto agrícola pertence ao tipo, à elas.se de mercadorias que por ex-
ceção têm valor e preço de custo idintiros. E o que se dá quando a mais·
valia conseguida numa esfera particular de produção para dado capital, di-
gamos 100, por acaso reproduz a média da mais-valia correspondente à
parte alíquota de igual montante {100) da totalidade do capital. Vê-se aí,
portanto, a confusão de Ricardo.
Quanto a Smith: desde que identifica preço de custo com valor,
tem ele razão de dizer - partindo desse falso pressuposto - que renda
(rent) como lucro e salário são "elementos constitutivos do preço natu·
ral" Revela, antes, incoerência ao reafirmar depois, no decurso do traba-
lho, que a renda não entra no preço natural da mesma maneira que salá-
rio e lucro. Incorre nessa incoerência porque a observação e a análise cor-
reta o levam de novo a _reconhecer que existe diferença entre determina-
ção do preço natural do produto não agrícola e a do valo.r de mercado
do produto agrícola. Pormenores sobre o assunto, quando tratarmos da
teoria da renda de Smith.

4. Os melhoramentos na agriculrnra e sua influência


na renda fundiária, segundo Ricardo.
"Vimos que a renda sobe com cada porção de capital adicional que se
torna neeessária aplicar em terra com rendimento menor."

(Mas nem toda porção de capital adicíonal dá resultado menos pro·


dutivo.)

749
"Dos mesmos princípios infere-se que, na sociedade, quaiSque1 circuns·
tâncias que tornem desnecessário aplicar na terra o mesmo montante
de capítal e que por isso tomam mais produtiva a última parte, fazem
cair a renda" (p. 6 8).

Isto é, cair a renda absoluta e não necessariamente a renda diferen-


cial (ver quadro B).
Aquelas circunstâncias podem ser "redução do capital de um pais",
seguida por decréscimo da população. Mas também desenvolvimento
maior das forças produtivas do trabalho agrícola..

"Todavia, os mesmos efeitos podem produzir-se quando acrescem rique·


za e população de um país, mas esse acréscimo é acompanhado por me-
lhotamento.s na agricultura tão consideráveis que por ígual resultam
em dírninuír a necessidade de cultivar terra pior ou a de empregar o
mesmo montante de capital para cultivar as iireas mais férteis" (pp. 68,
69).

(Admira esquecer aí Ricardo os melhoramentos que terão por efeito


elevar' a qualidade de terras mais pobres e convertê-las em ricas, aspecto
realçado por Anderson.)
Erro grave a proposição dé Ricardo:

"lnvariâvel a população, não pode haver procura:de quantidade adicio-


nal de cereais" (p. 69).

Sem considerar que, ao cair o preço dos cereais-, surgirá procura adi·
cional de outros produtos agrícolas, legumes, carne etc., e que se pode
fazer aguardente etc. de cereais, Ricardo aí pressÚpõe que a população
ínteira costuma consumir tanto cereal quanto quer. Errado.

({"O acréscimo enorme de nosso consumo em 1848, 1849 e 1850 mos-


tra que antes estávamos subnutridos e que os preços e1am mantidos al-
tos pela carência da oferta" {p. 158, F. W. Newman, Lectures 011 Pol. Ec.,
Londres, 1851 ).

O mesmo Newman diz:

"O iugamento de Ricardo", de que renda não pode elevar ,preço, ''re-
pousa na suposição de que o poder de exigjr renda em nenhum caso da
vida real pode dimÍfWv a oferta. Mas por que não? Há áreas bem exten·
sas que $erlam de imediato eultivlldas se para isso não se pudesse exi-
gir renda, mas que medimrte artifício se conservam incultas, seja porque

750
os donos das terras puderam arrendá-Ias com vantagem para caça, seja
porque preferem eles o ermo romântico a uma pequena rernia nomi-
nal, a única coísa que receberiam por permitír o cultivo delas" (p. 159).)]

Errado, sobretudo, dizer que, se o proprietário retira a terra da pro·


dução de cereais, não poderá obter renda convertendo-a em pastagem ou
terrenos de edificação ou, como em alguns condados das terras altas da Es-
cócia, em bosques artificiais para fins de caça.
Ricardo distingue duas espécies de melhoramentos na agricultura. A
primeira compreende

"os que aumentam os poderes produtivos da tena. .. como rotação mais


adequada das colheitas ou melhor escolha de adubo. Esses melhoramen-
tos nos ·possibilitam diretamente obter o mesmo produto em menor área
de terra" (p. 70).

Nesse caso. segundo Ricardo, a renda tem de caú.

"Admitindo-se, por exemplo, que as porções sucessivas do capital pro-


duzam 100, 90, 80, 70, enquanto eu empreglll' essas quatro porções,
minha renda será 60, ou igual à diferença enue

70 e 100 =30}
70 e 90 = 20 enquanto o produto será
[100
:g
70e80=10 70
- -
60 340

A tenda ficatd a mesma, enquanto essas porções de capital forem empre-


gadas, embora o produto de cada uma delas tenha acJésclmo igual."

(Se tivesse acréscimo desigual, a renda poderia subir apesar do acrés-


cimo de fertilidade.)

"Caso o produto suba de 100, 90, SO, 70 para 125, 115,105, 95, are.n-
da· montará sempre a 60 ou será ígual à diferença entre

95 e l'.25 =
95 e 115 =
30}
20 enquanto o produto se elevará para
125
[ 115
105
95e105 =10
60
l 95
440

Mas, com esse aumento da ptodução sem acré1cimc dlI procura, não há
motivo pa1a se aplicar tanto capital na terra; parte dele é retirada, e a

751
última po1ção do capital produzirá 105 em vez de'95, e a reruía cairá
para 30 ou será igual à difernnça entre. /
=
l
105 e 125 20 \ enquanto o produto continuará a conesponder: l25
105 e 115 =:_.!.Q_
à neeessidade da população, pois se.rã_
de 345 quarten
;!
115
~
30 - 345
(pp. 71, 72).
Omitida a circunstância de a procura, ao cair o preço, poder subir sem
a população crescer (o próprio Ricardo admite que ela subiu de 5 quarters),
sustenta ele a transição oonstante para solos de fertilidade decrescente,
pois a população cresce todo ano, isto é; a parte que consome trigo, pão,
e essa parte cresce mais rápido que a população toda, porque o pão oons·
tituí para a maior parte o alimento principal. Não é portanto necessdria
a hipótese de a pro.eura não aumentar eom a produtividade do capital e
de cair em conseqüência a renda.. E esta pode subir, quando é desigual a
influência do melhoramento no grau de fertilidade.
Aliás, é certo que (quadros B e E) o acréscimo da fertilidade - inal-
terável a procura - pode pôr fora do mercado o pior terreno e ainda for-
çar que se retire da produção de trigo parte do capital investido em solo
de melhor qualidade (quadro B). Nesse caso cai a renda em trigo se é igual
o acréscimo de produto nos díferentes tipos de terra.
Ricardo passa então à segunda espécie de melhoramentos agrícolas.

"Mas há melltoramentos que reduzem o valor relativo do produto sem


diminuir a renda em trigo, embora baixe a renda em dinheiro da terra.
Esses melhoramentos não aCiescem os poderes produtivos da terra,
mas nos possibilitam obter o produto com menos trabalho. Visam a
formação do captral empregado na terra de preferêncía ao cultivo ime-
diato dela. Entre eles figuram aperfeiçoamento~ dos imtrumentos agrí·
colas, como arados e debulhadoras, emprego econômico dos cavalos
na agricultura, melhor conhecimento de veterinária. Emprega-se na ter-
ra menos capital, o que equivale a menot trabalho; mas, para se obter
o mesmo produto, não se pode cultivar menos terra. Que melhoramen-
tos dessa espécie influam sobre a renda em trigo depende de a diferença
entre os produtos obtidos pelas diferentes porções de capítal aumentar,
ficar inalterada ou díminuir."

[Ricardo devia deter-se nesse aspecto ao tratar daferlilidade na-rural


das terras. Que a transição entre elas reduza, mantenha inalterada ou acres-
ça a renda diferencial, depende de a diferença entre os produtos dos capi-
tais aplicados nessas diferentes terras mais férteis aumente, fique estacioná-
ria ou diminua.]

"Se se empregam na terra quatro porções de capital, 50, 60, 70, 80, ca-
da um.a das quais dá o mesmo resultado e qualquer mellioramento na

752
formação desse capital me possibilite retú:ar .S de cada uma, e desse mo·
do atinjam elas 45, 55, 65 e 75, nenhuma alteraçãQ se dará na renda em
trigo. Mas, se os rnelhonunentos forem tais que me capacitem a fazer a
poupança toda na porção do capital empregada da maneira menos pro-
dutiva, cairá de únedíato a renda em .trigo, uma vez que se reduz a di·
ferença entre a porção mais produtiva e a menos produtiva do capital;
e é essa diferença que forma a renda" (pp. 73, 74).

Isso está certo para a renda diferencial, a única existente para Ri-
cardo.
Mas Ricardo nem de leve toca na verdadeira questão. Para resolvê·
la não importa que decresça o valor de cada unidade, de cada quarter;
nem que a mesma quantidade de terra, a quantidade anterior dos mesmos
tipos de terra, tenha de ser cultivada, e sim que, em virtude do bamtea-
mento do capital constante - que custa menos -trabalho de acordo eom
o pressuposto - diminua, aumente ou mantenha inalterada a quantidade
de trabalho imediato empregado na agricultura. Em suma, o que importa
é a ocorrência ou não de mudança orgânica no capital.
Tomemos nosso exemplo do quadro A (p. 574, caderno XI) 99 e
substituamos as toneladas por quarters de trigo.
Aqui supõe-se a composição do capital não agrícola = 80c + 20v, a
do agrícola = 60c + 40v, e nos dois a mais-valia = 50%. No capital agrí-
cola, portanto, a renda ou o excedente do valor sobre o preço de custo=
10 libras. Teremos então:
(Convenções utílizadas pelo tradutor no quadro a seguir: L = libra(s);
X:::: xeli(m) (ns)]

Qasse Capital Quarters Valor Valor de Valor individual por


de global mercado quarter
trigo por
quarter
L L L L
I 100 60 120 2 2 L -=40 X
Il 100 65 130 2 111/13 L=l Le 1612/13X
llI 100 75 150 2 1 3/5 L = l I. e 12 X
Total 300 200 400

9~. Ve.r pp. 692 e 693.

753
Renda Renda Renda Renda
Valor diferencia1 Pr~ de custo abso· düe- absolu- dife-·
por quarter por quarter luta rencial fa rencial
[. L L L quar- quar-
ters ters
1 o =
l 5/6 L l L e 16 2/3 X 10 o 5 o
11 2/13 L=3 1/13 X 19/13 L =l Le 13 11/13 X 10 10 5 5
IIl 2/5 L=S X 1 7 /15 L =.1 L e 9 1/3 X 10 30 5 15
30 40 15 20

Renda Renda
global global
L quarters
I 10 5
11 20 10
UI 40 20
70 35

Para examinar o problema com toda limpidez, é mister supor que,


em todas as 3 classes, o barateamento do capital constânte (100) infllli
por igual na magnitude do azpital aplicado em l, ll e !O, pois ·a influência
desigual atinge apenas a renda diferencial, nada tem a ver com a matéria.
Admitamos, portanto, que o custo da mesma massa de capitàl que antes
era de 100 libras, seja agora, em virtude de melhoramentos, somente de
90, diminuindo de 1/10 ou 10%. Pergunta-se então: como os melhora-
mentos repercutirão na composição do capital agrícola?
Se 100 = 60c + 40v e invariável a proporção do capital aplicado em
salário com o capital constante, então 90 = S4c + 36v, e neste caso o va-
lor dos 60 quarters na terra 1 será igual a l 08 libras. Mas, se o barateamen-
to for tal que o mesmo capital constante que antes custava 60, custa ago-
ra apenas 54 e o v (ou o capital despendido em salário) 32 2/5 somente
em vez de 36 (reduza-se também de 1/10), nesse caso, em vez de 100, o
dispêndio será de 86 2/5. A composição desse capital será 54c + 32 2/Sv.
Na base de 100, a composição seria 62 1/2c + 37 1/2y. Naquelas condi-
ções, o valor dos 60 quarters em I seria de 102 3/5 libras. Por fün, admi·
tamos que, embora decresça o valor do capital constante, o capital des·
pendido em salário permaneça absolutamente o mesmo, aumente portan-

754
to em relação ao capital constante; então, o capital despendido de 90 =
50c t 40v, e na base de 100, a compôsição = 55 5/9c + 44 4/9v.
Vejamos agora como nesses 3 casos se comportam a renda em trl·
go e a renda em dinheiro. No caso B não varia a relação entre e e v, em·
hora o valor de ambos diminua. Em C reduz-se o valor de e, mas em pro-
porção maior que o de v. Em D diminui o valor de e, mas não o de v.
Primeiro, retomemos o quadro que serve de pontode partida e fi·
gura na página anterior: comparemo-lo com os novós quadros B, C e D,
que ilustram os casos referidos acima sobre as variações no valor dos com-
ponentes orgânicos do capital agrícola.

Vemos nos quadros páginas 756 e 757.


Na origem, em A, a relação é 60c + 40v; em cada classe, o capital
aplicado = 100. A renda em dinheiro = 70 libras; em trigo = 35 quarters.
Em B barateia o capital constante, de modo que em cada classe só
se empregam 90 libras, mas na mesma proporção barateia o capital va-
riável, de maneira que a razão entre ambos não varia. Aí cai a renda em
dinheiro, a renda em trigo não varia; a renda absoluta100 é a mesma. A
renda em dinheiro decresce por diminuir o capital aplicado. A renda em
trigo fica a mesma porque, inalterada a razão anterior, menos dinheiro
corresponde a mais trigo.
Em e barateia o capital constante; V reduz-se mais, de modo que
há alta relativa do capital constante. A renda absoluta cai. Diminw a ren-
da em trigo e a renda em dinheiro. A renda em dinheiro porque o capi-
tal em geral teve redução sígnificativa, e a renda em trigo, por ter decres-
cido a renda absoluta; enquanto as diferenças entre as diversas classes
continuaram as mesmas, e assim todas caem por igual.
Em D dá-se caso diametralmente oposto. Só cai o capital constan-
te; o capital variável continua o mesmo. Esta em a su[XJsição de RíCIJl'do.
Nesse caso, a queda absoluta da renda em dinheiro, em virtude da redu-
ção do capital, é mínima, de 1/3 de libra apenas, embora tenha alta signi-
ficativa em relação ao capital despendido. Em contrapartida, a renda em
trigo tem crescimento absoluto. Por quê? Porque a renda absoluta subiu
de 10% para 12 2/9%, porque v aumentou em relação a c.

100. Por ...renda absoluta" entende Marx aí a taxa da renda absoluta.

755
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abM- ab~o- dife· 3hs.). diCe· global iiobal
lllla luta rencial luta rendai L qu>tlers
% L L quarter> !jllar·
tet$

-·----··
A) 60c-+ 40v 10 30 40 iS 20 70 3S

B) 5qc:.,. 36v (60ç + 40c) 10 27 36 JS 20 63 35

C} S4e +32"2!5v(62 l/2(; + 37 l/2v) 83/4 22 17/25 341/5 13 5/19 20 56 22/25 33 5f19

D) soe+ 40v (55 5f9c + 44 419,,) 12 2/9 33 36 2/3 l& 20 69 2/3 38

Rkardo prossegue:

"Tudo que diminui a desigualdade entre os produtos obtidos de pot-


ções sucessivas de capital, empregadas na mesma terra ou em nova, ten·
de a baixai a renda; e tudo que acresce e$St1 desigualdade produz neces-
sariamente efeito oposto, tendendo a aumentá-la" {p. 74).

A desigualdade pode acrescer ao se retirar capital é ao decrescer a


esterilidade, ou mesmo ao se pôr fora do mercado a terra menos fértil.
[Proprietário da terra e capitalista. Ao tratar de quém é' a responsa-
bilidade (voluntária ou compulsória) de socorrer os trabaJhadores na mi-
séria (em virtude da falta de algodão e da guerra civil nos Estados Unidos),
nos distritos da indústria têxtll algodoeira de Lancashire, o Moming Stlll',
em editorial de 1S de julho de 1862, diz:

"Essa& pessoas têm legítimo díreíto à subsistência em face da riqueza


que na maior parte criaram com sua atividade... Dizem que àqueles que
obtiyera.m fortunas com a indústria têxtil algodoeira cabe em parti-
cular acorrer com generosa ajuda. I1 o que se dá sem dúvida.•• Assim o
fizeram os comerciantes e industriais do r(llllo... Mas constituem eles
a única classe que fez dinheiro com a indústria têxtil algodoeira? Por
certo que não. Os donos da$ terras de Lancashire a North Cheshire ti-
veram enorme participação na riqueza assim produzida. E a vantagem
pecullar desses proprietários foi a de participar nessa riqueza sem mo-
ver uma palha ou dar uma idéia para a indústria que a criou... O dono
da fiação contribuiu com capital, experiência e vigilância incansável
para criar essa grande indústria que ·c:unbahlia. sob golpes tão duros;
o fiandeiro deu sua destreza, seu Jempo e seu trabalho físico; mas, que

758
de.iam os proprietário& de terras de Lancashire'1 Nada, absoluta e lite-
ralmente nada; entret.anto, extJ:aíram dela ganhos mais substancia.is
que qualquer uma das outras classes... Por certo, o acréscimo das ren-
das anuais desses grandes proprietários, oriundas dessa única causa. é
imenso, e é provável que essas rendas tenbam nada menos que triplicado."

O capitalista é o explorador imediato do trabalhador, não só usurpa·


dor direto, mas também o criador direto do t:raballw excedente. ~ias, uma
vez que isto só pode ocorrer (para o capítalista industrial) por meio do
processo de produção e dentro dele, o capitalista em pessoa é o funcío·
nárío dessa produção, seu diretor. Em contraste, o dono da terra possui
na propriedade da terra (para a renda absoluta) e na diferença natural en-
tre os tipos de solos (renda diferencial) um título que o capacita a embol-
sar parte desse trabalho excedente ou desse valor excedente, 101 sem con-
tribuir em coisa alguma para dirigi-los e crtá-los. O capitalista o considera,
nos casos de conflito, mera excrescência, aberração sibarita, planta parasi·
ta da produção capitalista, o percevejo que se agarra à sua pele.)
Co.pftulo HI "On the Rent of Mines':
Ai- reitera:

·•essa renda" (das minas) "como a renda das terras é o efoíto e nunca.
a causa do valor alto de seus produtos" (p. 76).

No tocante à renda absoluta, não é ela efeito nem causa do "valor


alto", mas efeíto do excesso do valor sobre o preço de custo. A circunstân·
eia de esse excesso ser pago no caso dos produtos das minas e da terra, e
assim formar-se a i:enda absoluta, não é efeito desse exces:iv, pois ele exis-
te para um setor ínfeiro de ramos industriais sem entrar no preço dos
produtos desses ramos industriais particulares, mas é o efeito da proprie-
dade da terra.
No tocante à renda diferencial pode-se dizer que ela é efeito do
"valor alto': desde que se entenda por ''valor alto" o excesso do valor
de mercado do produto sobre seu valor real ou individual, o que se dá
com as terras ou minas de maior fertilidade relativa.
Ricardo entende por "valor de troca", que regula o produto das
terras ou minas mais pobres, apenas o preço de custo, e por preço de eus-
to nada mais que o capital adiantado + o lucro usual, e erra ao identifi·

101.-Nesta tradução, valor ell:cedente =mais-valia.

759
car esse preço de custo com o valor real. E o que também se pode ver no
seguinte tre<:ho:

"O metal extraído da mina explorada mais pobre tem de possuir valor
de troca que pelo menos baste não: só para prover todos que nela tra-
balham e levam o Pioduto ao mexcado, com as roupas, alimentos e
outros meios de subsistencià por eles consumidos, mas também para
proporcionar o lucro geral, usual a quem adiantou o capital necessá-
rio para o empreendimento. A remunexação do capital da mina mais
pobre, que não prnpie.ia 1enda, detenninru:á a renda de todas as outras
minas mais rieas. Admite-se que aquela mina dá o lucto usual do ca.pi·
tal Tudo o que as outras minas proporcionam acimlÍ. disso é renda
que terá de se.r pagaª'" p1oprietários" (pp. 76, 77).

Em linguagem franca temos aí portanto; renda = excess0 do pre-


ço {preço e valor de troca são aí a mesma reisa) do produto agrícola so-
bre seu preço de custo, isto é, sobre o valor do capital + lucro usual (mé-
dio) do capital. Assim, se o valor do produto agrícola é maior que seu pre-
ço de custo, pode ele pagar renda sem se levar em conta a diversidade do
solo, pode a terra mais pobre e a mina mais. pobre pagar a mesma renda
absoluta que a rica. Se seu valor não for maior que seu preço de custo,
a renda só poderá proceder do excesso do valor de mercado sobre o valor
real do produto decorrente de solos relativamente mais férteis etc.

"Se quantidades iguau de trabalho e quantidades iguai$ de capital fixo


puderem obter sempre quantidades iguais de ouro dá mina que !lão dá
renda ... a quantidade" (de ouro) "aumentará tom a procura, mas seu
valor ficará inalterável''·(p. 79).

O que se aplica a ouro e minas estende-se a cereais e terra. Assim se


os mesmos tipos de terras continuam a ser explorados e a dar o mesmo
produto para igual dispêndio de traballio, o valor de uma libra de ouro
ou de um quarter de trigo permanecerá o mesmo, embora a quantidade
deles aumente com a procura. Aumentara por isso a renda deles (o mOJl·
tante, não a taxa de renda) sem haver mudanças no preço do produto.
Mais capital será aplicado, embora com produtividade sempre uniforme.
Esta uma das grandes causas do acréscimo do montante absoluto da ren-
da, omitindo-se qualquer aumento no preço do produto e, por isso, sem
mudança proporcional alguma nas rendas pagas por produtos de solos e
minas diversos.

760
5. Critica de Ricardo à teQria Smithiana da renda e a
certas opiniões de Malthus.

Capitulo XXIV "Doctrine of A. Smith conceming the rent of land."


Esse capitulo é muito importante para se fixar a diferença entre Ri-
cardo e A. Smith. Transferimos o estudo mais a fundo da matéria (no to-
cante a Smith) para quando examinarmos a teoria smithiana em parti-
cular, depois da de Ricardo.
Ricardo começa citando, de A. Smith, uma passagem onde este de-
termina com acerto quando o preço do produto agrícola dá renda e quan-
do não dá. Mas Smith achava que vários componentes do produto da ter-
ra, como alimentos, têm sempre de proporcionar renda.
Nessa altura faz Ricardo a observação seguinte, importante para ele.

"Acredito que até agora em todo país, do mais primitivo ao mais civi-
lizado, há terra de tal qualidade que não pode fornecer produto cujo
valor se/a mais que suficiente para repor o correspondente capital apli-
cado e proporcionar o lucm ordinário e usual nesse país. :!! notório
que isso ocorre na América; contudo, ninguém afuma que os princí-
pios que lá determinam a renda dif!.llem dos vi.gentes na Europa" (pp.
389, 390).

Na verdade, a diferença existe e é· considerável. Onde não existe


propriedade da terra - de fato ou de direito - não pode existir renda
fundiária absoluta. Esta, e não a renda diferencial, é a expressão perti-
nente da proprieda~e da terra. Dizer que, onde exista ou não a proprie-
dade da terra, os mesmos princípios regulam a renda fundiária, é susten-
tar que a figura econômica da propriedade da terra não depende de exis-
tir ou não a propriedade da terra.
Além disso, que signífica "ruí. terra de tal qualidade que não pode
fornecer produto cujo valor seja mais que suficiente para repor o capital ...
e proporcionar o lucro ordinário"? Produza a mesma quantidade de traba-
lho, num caso, 4 quarters e no outro, 2 quarters, o valor do produto não
é maior no primeiro, embora o valor de cada quarter isolado seja no se-
gundo duas vezes maior que no primeiro. Por isso, a circunstância de dar
ou não renda não dependeria absolutamente da magnitude desse "valor"
do produto, considerada em si mesma. Este produto só pode dar renda
quando seu valor é maior que seu preço de custo, regulado pelo preço de
custo de. todos os outros produtos ou, em outras palavras, pela cota de

761
trabalho não pago da qual em mêdia se ;ipodera um capital de 100 em
cada ramo. Mas a circunstância de seu valor ser mais alto que seu pr~ço
de custo não depende em nada da grandeza absoluta desse valor e sim
da composição do capital aplicado, confrontada com a composição mé-
dia do capital empregado na indústria não agrícola.

"Se fosse verdade que a Inglaterra avançou tanto na agricultura que


hoje não existem terras remanescentes que não dêem renda, seria por
igual verdade que antes tinha de haver te.nas desse gênero. A existên-
cia ou não dessas terras em nada altera a questão em pauta, pois., se
na Grã-Bretanha ex\ste qualquer eapítal aplicado em terra e que se re-
põe acrescido apenas do lucro ordinátio, tanto faz que se invista ele
em terra nova ou velha. Um empresário agrícola, se artendar terra por
7 ou 14 anos, pode pretender empregar nela capital de 10 000 libras,
se sabe que, ao preço vigente dos cereais e matérias-primas, pode re.-
cuperar a porção de capital que é obrigado a despender, pagar a ren-
da e obt(lr a taxa geral de lucro. Não aplicará 11 000 libras, a não ser
que as últimas l 000 libras possam ser empregadas de maneira tão pro-
dutiva que lhe proporcionem o lucro ordinário do capital. Ao calcular
se convém ou niio empregá-ku, considera apeMS se o preço dos pr()-
dutos agrfco/a& basta para repor as despesas e dar lucro, pois sabe que
não terá de pagor renda odiciorral. Mesmo ao terminar o p:rnzo de ar-
rendamento, a renda a pagar não será aumentada, porque ele, caso o
proprietlÍ.rio exija renda pelo emprego dessas 1 000 libras adicionais,
retirará esse capital, pois ao aplleá-las só obtém, de acordo eom a su-
posição, o lucro usual e ordinário que pode oonsegilu com qualquer
aplicação de capital. Por isso, não pode então ir àté o ponto de pagar
renda, a não sex que suba o preço dos produtos agr(co/as, ou, o ·que
dá no mesmo, caía a taxa u.swzl e geral de lucro" (pp. 390, 3,91).

Ricardo admite aí que o pior solo também pode dar tenda. E co-
mo explica isso? Segunda dose de capital, aplicada n~ pior solo para criar
oferta adicional, toma-se necessária em conseqüência de procura ·adicio-
nal e só consegue o preço de custo se subir o preço dos cereais. Assim,
a primeira dose daria então um excedente sobre esse preço de custo, isto
é, renda. Por isso, de fato, antes de se aplicar a segunda dose, a primei-
ra dose dá renda no pior solo porque o valor M mercado fica acima do
preço de custo. A única questão, portanto, é saber se o valor de merca-
do, além disso, tem de estar acima do valor do produto do pior solo, ou
antes se seu valor não está acima de seu preço de custo, e apenas a alta
do preço o capacitou a ser vendido por seu valor.
Ademais; por que o preço deve chegar ao nível do preço de cus·
to = adiantamentos + lucro médio? Por causa da concorrência entre os
capitais nos diferentes ramos, da transferência· do capital de um ramo
para outro. Isto é, em virtude da ação do capital sobre o capital. Mas,

762
por que meio o capital coagirá a propriedade fundiária a fazer o valor
do produto recuar para o preço de custo do produto? Retirada de capi·
tal da agricultura não pode ter esse efeito se não for acompanhada de
queda da procura dos produtos agrícolas. Daria o resultado oposto, fa.
zendo o preço de mercado do produto agrícola ultrapassar o respectivo
valor. Também a transferência de novo capital para a terra não pode ter
aquele efeito. Pois a concorrência dos capita.is entre si é o que capacita
o dono da terra a exigir do capitalista individual que se contente com
"um lucro médio" e lhe pague o excesso do valor sobre o preço que dá
esse lucro.
Mas poder-se-ia perguntar: se a propriedade fundiária dá esse poder
que faz o produto se vender acima. do preço de custo, pelo valor, por que
nãq dá também o poder para ser ele vendido acima do valor, portanto,
a preço arbitrário de monopólio? Numa pequena ilha onde não houvesse
comércio externo de trigo, este produto alimentar poderia sem dúvida
ser vendido, como qualquer outro produto, ao preço de monopólio, isto
é, a preço limitado apenas pelo estado da ·procura, ou seja, da procura
solvi'vel, e essa procura solvível varia muito de importância e amplitude
conformé o nível de preço do produto oferecido.
Excluída essa ~xceção - impossível nos países europeus; mesmo
na Inglaterra há o artiffcio de retirar da agrícultura, do mercado em su-
ma, grande parte da terra fértíl, para aumentar o valor da outra parte -,
a propriedade fundiária só pode influenciar e anular a ação dos capitais,
a concorrência entre eles, no nível em que essa concorrêncía modifica
a determinação dos valores das mercadorias. A conversão dos valores em
preços de custo é apenas conseqüêncía e resultado do desenvolvimento
da produção capitâlista, Na origem, as mercadorias (em média) se ven-
dem pelos valores. A propriedade fWldiária impede aquele desvio dos
valores na agricultura.
Quando um agricultor arrenda terra por 7 ou 14 anos, diz Ricardo,
calcula que, para um capital investido de l O 000, por exemplo, o valor
do t:rigo (valor médio de mercado) lhe permitirá repor adiantamentos
acrescidos de lucro e da renda convencionada. Por ísso, enquanto "ar·
renda" a terra, o que vem primeiro para ele, o primordial, é que o valor
médio de mercado seja igual ao valor do produto; lucro e renda são me-
ras porções a que se reduz esse valor, mas que não o criam. O preço dado
de mercado é para o capitalista o que o valor pressuposto do produto é
para a teoria e para a coerência interna da produção. E agora a conclu-
são que :Ricardo tira daí. Se o arrendatário acrescenta l 000 libras, o que

763
procura é ·apenas o 1ucm usual que elas proporcionarão ao preço dado de
'"".e-reado. Por isso, Ricardo parece pensar que o fator determinante é o pre-
ço de custo, e o iuero entra nesse preço de custo como elemento regula-
dor, mas não a renda.
Primeiro, o lucro também não entra aí como elemento constítuti·
vo. De acordo com o pressuposto, o arrendatário considera primordial
o preço de mercado e calcula se as 1 000 libras lhe proporcionarão o lu·
cro usual com esse preço dado de mercado. Esse lucro portanto não é a
c:ausa e sim efeito desse preço. Mas Ricardo pensa também que o empre-
go das próprias 1 000 libras é determinado pela circunstância de o preço
dar ou não lucro. O lucro, portanto, determina o emprego das 1 000 li·
bras, o preço de produção.
E mais: o capitalista, se achar que as l 000 libras não dão o lucro
usual, não as investirá. Não ocorrerá a produção adicional de alimentos.
Se esta for necessária para a procura adícional, a procura terá de elevar o
preço, isto é, o preço de mercado até que ele proporcione esse lucro. Por
isso, o lucro - em contraste com a renda - entra como elemento cons·
titutivo não porque gera o valor do produto e sim porque o próprio pro-
duto não é gerado se seu preço não sobe para pagar, além dos adianta-
mentos, a taxa usual de lucro. Mas não é mister nesse caso .que suba a
ponto de pagar renda. Daí existir diferença essencial entre ·renda e lucro,
e em certo sentido pode-se dizer que o lucro é um elemento constitutivo
do preço, enquanto a renda não o é, (Sem dúvida, isso também está im-
plícíto no pensamento de A. Smith.)
Nesse caso, a idéia está certa.
Mas por quê?
Porque nesse caso a propriedade fundiária não pode como tal con-
trapor-se ao capital, isto é, não ocorre a combinação em que se forma
renda,. renda absoluta, de acordo com o pressuposto. O trigo adicional
produzido com .a segunda dose, no montante de 1 000 libras - invariá·
vel o vabr de mercado, isto é, para uma procura adicional que só ocorre
na suposição de o preço permanecer o mesmo - tem de ser vendido abai·
xo de seu valor, ao preço de custo. Esse produto adicional das 1 000 li-
bras encontra-se portanto nas mesmas circunstâncias dó caso em que se
cultivasse terra pior, que nilo detennina o valor de mercado e só pode
fornecer a oferta adicional se o fizer pelo valor de mercado antes vigente,
ou seja, por preço que se detennina sem depender dessa produção nova.
Nessas condições, depende por completo da fertilidade relativa dessa ter-
ra adícional, a circunstância de ela dar ou não renda, justamente porque

764
níio detennina o valor de mercado. O mesmo se aplica às 1 000 libras adi·
cionais na terra anterior. E precisamente por isso Ricardo conclui ao re-
vés que o solo adicional ou a dose adicional de capital determina o valor
de mercado, poís o preço do correspondente produto não dá renda e sim
lucro apenas, não cobre o valor e sim o preço de custo somente, para da-
do valor de mercado, detenninado sem depender deles. Temos aí urna
contradíção em termos.
Mas, o produto af se gera sem dar renda. Por certo, Na terra que
o fazendeiro tIFTendou, a propriedade fundiária não existe para ele, para
o capitalista, como elemento autônomo que opõe resistência durante o
período em que ele é de fato o proprietário da terra pelo contrato de
arrendamento. Então, o capital se move nesse elemento sem defrontar
resistências, e ao capital basta o preço de custo. Mesmo após expirado
o arrendamento, o arrendatário naturalmente calculará a renda pelo in-
vestimento de capital na terra para obter produto que se venda pelo vabr,
isto é, dê renda, Aplicação de capital que, para dado valor de mercado,
não dê excesso sobre o preço de custo, se põe fora de cogitação, e tam-
bém o pagamento de renda ou a obrigação de pagá-la, no caso de terra
cuja fertilidade relativa faz que o preço de mercado pague apenas o pre-
ço de custo de seu produto.
Na prática, as coisas nem sempre se comportam segundo a vísão
rícardiana. O arrendatário, se possui capital disponível ou o adquire nos
primeiros anos de um arrendamento de 14 anos, não exigirá então o lu-
ao usual, a não ser quando tenha obtido por empréstimo o capital adi·
cional. Pois, que fará com o capital disponível? Arrendar mais terras?
Para a produção agrícola, emprego mais intensivo de capital é muito mais
vantajoso que o cÚltivo mais extensivo da terra com capital maior. E se
não há terra arrendável na vizinhança imediata da arrendada, o arrenda-
tário com 2 fazendas terá em sua superintendência ruptura maior que um
capitalista que dirija 6 fábricas na ind'Clstria. Ou deixará o dinheiro c.om
o banco, a juros, em títulos públicos, em ações ferroviárias etc.? Então
renuncia de saída a pelo menos metade ou 1/3 do lucro usual. Pode por-
tanto empregá-lo como capital adicional na terra que já cultiva, mesmo
abaixo da taxa de lucro, digamos a 10%, quando seu lucro é de 12%, e
assim ganha 100%, quando a taxa de juro é de 5%. Para ele aínda conti-
nua a ser especulação mais vantajosa empregar as 1 000 libras adicionais
na terra que já cultiva.
Por isso, Ricardo incide em erro total ao identificar esse emprego
de capital adicional à aplicação de capital adicional em novas terras. No

765
primeiro caso não é mister que o produto dê o lucro usual, mesmo na
produção capitalista. Basta que dê, acima da taxa usual de juro, algo mais
que vallia as preocupações e o risco do arrendatário, para preferir o em·
prego industrial ao financeiro do capital disponível.
Mas Ricardo incorre em completo absurdo, conforme se mostrou,
ao concluir daquela observação:

"Se o espírito abnngente de Smith se tivesse dirigido para esge fato,


não teria ele afirmado que a renda· constitui um dos camponentes do
preço dos produtos agr(colas. pois o preÇô é por t~da pa.rte determi-
nado pelo ganho obtido com essa última parte do capital, pata a qual
não há pagamento algum de renda" (p. 391).

Sua explicação demonstra just11.mente o oposto: o emprego na terra


dessa última porção de capital foi determinado por preço de mercado
que não depende dessa aplicação e que existe antes de ter ela ocorrido;
por isso, não proporciona renda e sim lucro apenas. Afumar que o lucro
é o único regulador da produção capitalista está absolutamente certo. E
portanto certo que não existiria renda absoluta se a pr9dução fosse regu-
lada uniéamente pelo capital. Essa renda surge onde as condições da pro-
dução conferem ao proprietário da terra o poder de estab\:lecer .limites
à regulação exclusiva da produção pelo capital. ,
Segundo: Ricardo (pp. 391 e seguintes) censura A. Smith por de-
senvolver, com base nas minas de carvão, o princípio correto. da renda;
diz mesmo:

"Ele explica de maneira admirável e perspicaz o princípio global da


renda, mas cada palavra é por lgual aplicável às terras e às minas. Não
obstante afirma que 'a coisa muda quando se trata de propriedade de
terras para cultivo etc.!" (p. 392).

A. Smith sente que, em certas circunstâncias, o dono da terra tem


poder para opor resistência efetiva ao capital, para fazer valer a proprie-
dade da terra e assim exigir renda absoluta, e que, noutras, não tem esse
poder; mas que é em particular a produção de alimentos que estabelece
a lei da renda, enquanto, em outros empregos do capital na terra, a renda
agrícola determina. a renda.

"A propor_yâo tánto do produto quanto da renda deJas", ll>'l (diz. A.


Smith) "corresponde à respectiva fertilidade absoluta e nãõ à relativa"
(p. 392}.
-----
102. Isto é, das tenas.

766
Em sua réplica, Ricardo aproxima-se o mais possível do princípio
da renda. Diz:

;<Mas admitamos que niio há te"a (/ue niio dé renda; então, o montan-
te da renda no pior solo regular-se-d pelo excesso do valor do produto
acima do dispêndio e do lucro ordifltirio do capital. O mesmo princí·
pio regerá a renda da terra de qualidade algo melhor ou de situação mais
favorável, e por isso a renda dessa tena excederá a renda da que lhe é
inferior, em virtude das maiores vantagens que· possui. O mesmo se po-
de dli:er da terra que ascende ao terceiro degrau de qualidade, e assim
por diante até à melhor de todas. Por isso, afirmar que a produrfvidade
relativa da terra é o que dete.tmina a parte do produto a ser paga a tí-
tulo de renda da terra é tão certo quanto sustentar que a produtivida-
de relativa das minas é o que determina a parte do produto a ser paga
a título de renda das minas" (pp. 392, 393 ).

Ricardo expressa aí o verdadeiro rrincípio da renda. Quando a pior


terra paga renda, quando portanto se paga renda sem depender das díferen-
ças de fertilidade nas terras a renda absoluta -, essa renda tem de ser igual
ao "excesso do valor do produto acima do díspêndío e do lucro ordin~io
do capítal", ou seja, é igual ao excesso do valor sobre o preço de custo
do proiluto. Ricardo supõe que esse excesso não pode existir porque, er·
rando contra seu prôprio princípio, aceita o dogma smithiano de ser o va·
lor igual ao preço de custo do produto.
Aliás, reincide no erro.
A renda diferencial seria sem dúvida detenninada pela "fertílidade
relativa". A renda absoluta nada teria a ver com a "fertilidade natural".
Mas Smith teria por certo razão ao sustentar a possibilidade de a ren.
da efetiva paga pelo pior solo depender da fertilidade absoluta dos outros
solos e da fertilidade _relativa do pior solo ou da fertilidade absoluta do
pior solo e da relativa das outras classes de solo.
E que o montante efetivo de renda pago pelo pior solo depende,
não como quer Ricardo, do excesso do valor do respectivo produto so-
bre o preço desse produto, mas do excesso do valor de mercado sobre es·
se preço de custo. Mas aí estão coisas bem diferentes. Se é esse produto
que determina o preço de mercado, então o valor de mercado é igual a
seu valor real, e assim o excesso de seu valor de mercado sobre seu preço
de custo é igual ao excesso de seu próprio valor indivídual, real, sobre
seu preço de custo. Mas a coisa muda se o preço de mercado não depen·
de dele e é determinado pelos outros típos de terras. Ricardo pressupõe
a seqüência descendente. Admite que o pior solo se cultiva por último
e só é ~ltivado (segundo a suposição feita) quando a procura adicional

767
tiver exigido oferta adicional pelo valor do produto oriundo do pior solo,
cultivado por último. Nesse caso, o valor do pior solo regula o valor d~
mercado. Na seqüência ascendente, isso ocorre somente (mesmo de acor·
do com ele) quando a oferta adicional dos melhores tipos de terra é igual
apenas à procura adicional ao antes vigente valor de mercado. Se a ofer-
ta adicional é maior, admite sempre Ricardo que a terra antiga tem de ser
exclufda do cultivo, embora sô decorra daí que dará renda menor que a
anterior (ou mesmo nenhuma). O mesmo se dá na seqüência descenden-
te. Se a oferta adicional é tal que só possa ser absorvida ao velho valor de
mercado, a circunstância de a terra de pior qualidade dar ou não renda
e - se a dá - o nível desta dependem da magnitude em que esse valor
de mercado ultrapassa o preço de custo do produto da nova terra.de pior
qualidade. Nos dois casos, a fertilidade absoluta - e não a relativa - de-
termina essa renda. Da fertilidade absoluta da nova terra depende atê on-
de o valor de mercado do produto dos melhores. solos está acima do pró-
prio valor real, índívidual.
A. Smith distingue aí com acerto terra e minas, porque no tocante
a estas pressupõe nunca haver a transição .para tipos piores, mas sempre
para melhores, e que sempre fornecem mais que a oferta adícional neces-
sária. A renda do pior solo depende então de sua fertilidade absoluta..

"Depois de A. Smith ter declarado que há minas· que só podem ser


operadas pelos proprietários, uma vez que só proporcionam o -suficien-
te para cobrir os custos de ope1ação junt.o com o lúcro1 ordinário do
capital empregado, era de e11peraT admitisse ele serem essas minas par-
ticulares que determil'fl1in o preço dos .produtos de todas as min4s. Se
as velhas minas não bastam pa:ra suprir a quantidade de carvão requeri·
da, subirá o preço do carviio e pros1SCguirá subindo até que o proprietá-
rio de uma mina nova e inferio1 ache que pode obter o lucro usual
do capital, explorando a mina. .. Percebe-se então que é sempre a mi-
1U1 menos rica que detennina o preço do ClfflJâo. A. Smith, entretanto,
é de outra opinião. Observa que 'a mina maís .rica também determina
o preço do carvão de todas as outras minas da vizínhança. Tanto o pro-
prietário quanto o empresário desoobrem que um pode obter renda
maior e o outro, luc.ro maior, vendendo um tanto mais barato que os
ví.zinhos. Estes são logo foxçados a vender (}.() memto preço, embora
não possam .sustentá-lo e esse preço sempre diminua, e às vezes lhes
tome de todo renda e lucro. Abandonam-se pra: completo algumas mi-
nas, outras. não podem dar renda e por isso s6 podem ser exploradas
pelo dono'. Caso retroceda. a procwa de carvão ou caso aumente a
quantídade' COlil o emptego de novos métodos, cairá o preço e se aban-
donarão algumas minas. Mas, seja como for, o preço tem de bostar pa-
ra pagllT os dispêndios e lucro da mina erpk>rada sem ônus de renda.
Por isso, é a mina menos pmdutiva que determina o preço. De fato, é
o que afuma o próprio Smith noutra passagem, ao dizer: 'O preço mais

768
baixo a que se pode comprar carvão a longo prazo, como sucede com
todas as ouuas mercadorias, é o preço a rigor suficiente pnra repor,
acrnscido do lucro, o capital que tem de ser empregado para levá·lo ao
mercado. Em geral, tem de estar em torno daquele preço, o preço do
carvão da mina de que o proprietário não pode obter renda, mas que
ele mesmo tem de explorar ou largar de todo"' (pp. 393 a 395).

A. Smith erra ao generalizar uma conjuntura especial em que a mi-


na mais rica (ou o solo) oomina o mercado. Mas, uma vez que se admita
o caso, seu raciocíruo está (no conjunto) certo e o de Ricardo, errado.
Smith pressupõe que em virtude do nível da procura e da riqueza relati·
va superior, a melhor mina só pode impor a colocação no mercado, de
tudo o que produz, se vender maís barato que os competidores, se seu
produto ficar abajxo do antigo valor de rnercaoo. Por isso, também cai
o preço para as piores minas. O preço de mercado baixa. Essa queda em
todo caso reduz a renda nas minas de pior classe e pode fazê-Ia desapare-
cer por completo. Pois a renda é igual ao excesso do valor de mercado
sobre o preço de custo do produto, seja esse valor de mercado igual ou
não ao vaJor individual do produto de c.erta classe de solo ou de minas.
Isso só pode diminuir o lucro - o que Smith não repara - se se tomar
necessário retirar capitaJ e reduzir a escaJa de produção. Se o preço de
mercado, regulado como está nas circunstâncias dadas pelo produto das
melhores minas, caí tão baixo que não dá sobra acima do preço de custo
do produto da pior mina, então só o dono pode explorá-la. Nenhum ca·
pitalista lhe pagará renda a esse preço de mercado. Nesse caso, a proprie-
dade da terra não dará ao respectivo titular poder sobre o capital, mas
extingue para ele a resistência que os demais capitalistas encontram pa-
ra aplicar capital na_ terra. Para ele não existe a propriedade fundiária, por·
que ele mesmo é o dono da terra. Pode assim destinar sua terra para mi-
neração ou para qualquer outro ramo de atividade, isto é, empregá-la,
quando o preço de mercado do produto - o qual não preestabeleça, mas
já encontra determinado - lhe dá o lucro médio, coincide com seu preço
de custo.
E Ricardo conclui que Smith se contradiz! Da particularidade de o
antigo preço de mercado determinar até onde novas minas podem ser
abertas pelos próprios donos, isto é, podem ser exploradas em circuns·
tâncias. em que a propriedade fundiária desaparece porque, ao antigo pre-
ço de mercado, asseguram elas ao empresário o preço de custo, infere ele
que esse preço de custo determina o preço de mercado. Mas recorre à
sua seqüência descendente e só admite a exploração das minas menos
ricas, na -hipótese de o preço de mercado do produto ultrapassar o valor

769
do produto das minas de melhor qualidade, quando - para as piores mi-
nas, exploradas pelos próprios donos - só é necessário que esteja acima
do preço de custo ou mesmo que o pague. Aliás, supõe que "_se aumen-
tar a quantidade" (de carvão) "com novos processos, cairá o preço e al-
gumas minas serão abandonadas"; esta ocorrência, porém, depende da
magnitude da queda do preço e do nível da procura. Se com essa queda
de preço o mercado puder absorver o produto todo, as núnas ruins con-
tinuarão a dar renda se a queda do preço de mercado não extinguir um
excesso do valor de mercado sobre o preço de custo das núnas mais po-
bres, e estas serão exploradas pelos proprietários se o valor de mercado
apenas ~brir esse preço de cus.to, igualá-lo. Mas, nos dois casos, é absur-
do dizer que o preço de custo da pior mina regula o preço de mercado.
Sem dúvida, o preço de custo da pior mina regula a proporção do preço
de seu produto com o preço regulador do mercado, e por isso decide o
problema de ser ou não viável explorá-la. A circunstância de ser exeqüí-
vel, a dado preço de mercado, explorar solo ou minas de determinado
grau de fertilidade nada tem a ver evidentemente com a ocorrência - nem
lhe é idêntica - de o preço de custo dessas minas regular o preço de mer·
cado. Se uma oferta adicional for necessária ou exeqüível a valor de merw
cado acrescido, a pior terra regulará o valor de mercado, m,as então dará
também renda absoluta. Esse é a rigor o contrário do caso suposto por Smith.
Terceiro: Ricardo censura Smith por acreditar (pp. 395 e segs.) que
barateamento dos produtos agrícolas, por exemplo, substítuiÇão de trigo
por batatas, o que faria baixar o salário e decrescer o custo'de produção,
redundaria em participação maior e quantidade maior para o dono da
terra. Ricardo, ao revés:

"nada dessa po1ção adicional se destinará a renda, mas toda ela irá fa-
talmente pai:a lucro... Enquanto se cultivarem terras da mesma quali·
dade e não se alterem sua fertilidade e vantagens relativas, a renda re-
presentará sempre a mesma proporção do produto bruto" (p. 396}.

O erro af é total. Da renda cairá a participação e portanto, re"/ativa-


mente, a quantidade .. A conversão das batatas em meio de subsistência
principal depreciaria o valor da forç-a de trabalho, reduziria o tempo de
trabalho necessário, aumentaria o tempo de trabalho excedente e, em
conseqüência, a taxa de mais-valia; por isso, invariáveis as demais circuns·
tâncias, alteraria a composição do capital, reduziria, segundo o valor, o ca-
pital variável em face do constante, embora permanecesse a mesma a quan-
tidade aplicada de trabalho vivo. Subiria assim a taxa de lucro. Nesse ca-

770
so, queda da renda absoluta e, proporcionalmente, da renda diferencial.
(Ver p. 61 O, quadro C). 163 O fator considerado teria efeito igual sobre o
capital agrícola e o não agrícola. Subiria a taxa geral de lucro e por ísso
caíria a renda.
Capítulo XXVIIL "On the comparative value of gold, com, anà
l/Jbour, in rich anà poor countries. "

"O erro que percorre toda a obra de Smith estí em supor ele que o va·
tordo trigo é eonstante, e que, embora o valai de todas as outras coisas
possa eleVaI·se, o do trigo nunca pode subir. Segundo ele, o trigo tem
sempre o mesmo valor, pois alimenta sempre o mesmo número de pes-
soas. Do mesmo modo poder·se":ia dizer que tecido tem sempre o mesmo
valor, porque sempre se faz com ele o mesmo número de casacos. Que
relação pode ter o V'.ilor com o poder de alimentaI e de vci.1ír1" (pp. 449,
450).
" ..• Dr. Smith.•. sustentou com talento a doutrina - o preço natural
das mercadorias determina em última instância o preço de mercado de·
las" (p. 451).
"... O ouro, expiesso em trigo, pode teI valor bem diferente em dois
países. Esfoicei·me por mostrar que esse valor costuma ser baixo em
países ricos, e alto em países pobres. A. Smith tem outra opinião: pen-
sa que, expiesso em trigo, o valor do ouro atinge o máximo em países
ricos" (p. 454 ).
.
Capftuli'J XXXII. 'Ur. Malthus's Opinions on Rent."

"Renda é criação de valor ... mas não criação de ríqueza" 104 (p. 485}.
"Ao falar da alta de trigo, é evidente que Malthus não tem em vista o
preço por quarter ou bushel, mas antes o ex.cesso do preÇ-O a que se ven-
de o produto total, o excesso acima do custo de produção, sempre
incluídos lucro. e salário no termo 'custo de produção': 150 quarters
de trigo a 3 libras e 1O xelins por quartcr darão ao dono da terra renda
maior que 100 quarters a 4 libras, desde que o cu~to de produção seja
o mesmo nos dois casos'' (p. 481). "Qualquer que seja a qualidade da
terra, renda alta tem de depender do p1eço alto do produto. Mas, da-

103. Ver neste volume as pp. 756 e 757.


104. Ricardo cJ.assifiea a renda fundiária de "crillçfio de valor" no sentido de dar
aos p!Oprietários das terra~ a possíbilidade de dispor do acréscimo de valor do produ·
to social, acréscimo que, segundo ele, Iesulta da dificuldade crescente para prnduzír
qualquer porção de cereais. No capítulo X.XX.li de sua obia critica o ponto de vista
de Malthus, de seI a renda fundiá:ria "ganho evidente e nova criação de riqueza" e
su~tenta a tese de que a renda fundíá.ria nada acrescentá. à 1íqucza da sociedade e tão·
s6 "transfere uma parte do ;-alor dos cereais e das n'ictcadoiias, de seus primcíros
donos para os proprietários das tenas., (ver Ricardo, On lhe Principies... , Londres
1821, pp. 484 e 485}. Vet neste volume p. 982.

771
do o preço alto, a renda tem de ser. alta em proporção com a abundân·
eia e não com a escassez" (p. 492).
"Uma vez que a rerula resulta do alto pr~o do trigo, a perda de renda
é conseqüência de preço baixo. O trigo estrangeiro nunca,. entra em
competição com aquele trigo nacional que dá renda. A influência da
queda de preço sobre o proprietário da teIIa é i.uevit.ivel, indo a ponto
de absorver toda a sua renda; o preço, se cau ainda ma.is, nem mesmo
propo1cionará o lucro ordinário do capital. O capital abandonará en-
tão a tena, em busca de outro emprego, e o tJigo que nela era anterior-
mente cultivado passa em seguida, e nào antes, a ser ímportado. Em
deoonência da perda de 1enda. haverá perda de valor, de valor expres·
so em dinheiro, mas oooireiá acréscimo de riqueza. Aumentará o vo-
lume global dos produtos agrícolas e dQS outros produtos. Em virtude
da maior facilidade de serem produzjdos, embota .cresçam em quanti-
dade, decrescetão em valor" (p. 519).
Capítulo XIV
Teoria da renda de Adam Smith

1. e ontradições na formulação do problema.


Não. trataremos aqui da interessante exposição de Smith, relativa
à maneira como o principal meio de subsistência vegetal domina todas
as demais rendas agrícolas no sentido estrito (pecuária, extração de ma-
deiras, culturas para o mercado), em virtude da conversibilidade recípro-
ca desses ramos de produção. Disso está excluído para ele o arroz onde
seja o principal meio de subsistência vegetal, porque os arrozais não são
conversíveis em campos de pasto, de trigo etc. e vice-versa.
Com acerto Smith deline a renda: "preço pago pelo uso da terra"
('"Recherch.es sur la nature et les causes de la rlchesse des natíons .•. ", Pa-
ris, 1802, t.1, p. 299). Terra aí significa toda força natural como tal, e
por isso inclui água etc.
Contrastando com a idéia singular de Rodbertus, 105 logo no come-
ço Snúth enumera os itens do capital agrícola:

"O capital que i-rovê as semente.~" (matéria-prima), "paga o trabalho,


compra e mantém as bestas e outJ:o5 instrumentos de cultura" (1.c.).

105. Referência à tese de Rodbertus, de que o valor da matéria-prima não entra


nos custos .de produção dos produtos agrícoll!s. Ver neste volume pp. 4 78486.

773
Que é então esse preço pago pelo uso da terra?

"O que do produto ou de seu preço ultrapassa essa cota" {que paga o
capital adiantado, "acrescido dos lucros ordinários"), "o donó da tena
proeura retirar para si mesmo como renda de sua terra."
"Essa parte pode ser considerada renda fundiária natural" (p. 300).

Smith recusa-se a confundir a renda com o juro do capital empre·


gado na terra.

"O proprietário exige renda mesmo quando sua terra não tem melho-
ria alguma" (pp. 300, 301),

e mesmo a outra forma de renda, 10 6 acrescenta Smith, tem a peculiarida-


de de o juro correspondente ao capital de melhoria ser o juro de um capi-
tal que o arrendatário empregou e não o proprietário.

"Exige" (o proprietário) "às vezes renda pelo que não pode absoluta-
mente ser objeto de melhoria pelo esforço humano" (p. 301).

Smith acentua muito que' é a propriedade, o proprietário, que na


qualidade de proprietário "exige a renda". Mera resultante 'da proprieda-
de, a renda ê preço de monopólio, o que está absolutamente certo, pois
só a intervenção da propriedade faz o produto pagar mais que o preço de
custo e ser vendido pelo valor.

"A renda fundiária, considerada preço pago p«lo uso da terra, é por
natureza preço de monopólio" (p. 302).

E na realidade preço que o monopólio da terra consegue extorquír


e por isso, como preço de monopólio, se distingue do preço dos produ-
tos industriais.
O preço de custo do ponto de vista do capital - e o capital domina
a produção - requer apenas que o produto, além dos adiantamentos, pa-
gue o lucro médio. N~sse caso pode-se ''levar oo mercado" o produto da
terra ou qualquer outro.

"Se o preço ultrapassa esse nível, a parte excedente destinar-se-á sem


dúvida à renda da tena. Se não o ultrapassar, a mercadoria, emboraposm

106. Isto é, a renda da 1ena com melhoria.

774
ser levada ao mercado, não tem condições de ~ renda à propriedade
fundiária. A possibilidade de haver ou não aquela alta de preço depen-
de da procura" (t.I, pp. 302, 303).

A questão é esta: por que a maneira como a renda entra no preço


difere daquela do salário e do lucro? De início, Smith acertara ao resolver
o valor em salário, lucro e renda (onútído o cápital constante). Mas, logo
se desvia para o rumo oposto ao identificar valor com preço natural (pre·
ço médio detenninado pela concorrência ou preço 'de custo das mercado-
rias) e ao formar este agregando salário, lucro e renda.

"Essas três partes parecem constituir de imediat:o ou em última ínstân·


eia o preço em sua totalidade" (t.l, 1.1, cap, Vl, p. 1°01).
"Mas, nas sociedades mais adiantadas, há sempre algumas mercadorias
cujo preço se reduz apenas a duas portes, 1XTl.ário do trabalho e lucro do
capital, e um número ainda menor cu/o preço conrirte todo em miá·
rio. Do preço do pescado marítimo, por exemplo, parte paga o tuba·
lho do pescador e parte o lucro do capital empregado na pesca. ~ mui-
to raro a renda entrar nesse preço ... Em certos lugares da Escócia há
pobres que têm por negócio colher ao longo da oosta aquelas pequenas
pedras mosqueadas, conhecidas pelo nome de feíxos da Erc6cia. O pre-
ço que o lapidador lhes paga consiste apenas no saldrio, uma vez que
nesse preço não entro renda fundúiTia nem lucro, Mas, o preço todo
de uma mercadoria tem de reduzÍI·se, no final de oonta.~. a uma ou a
outra dessus tres partes ou a todas e!,o,s" (ti, 1.1, c:ap. VI, pp. 103, 104).

Nessas passagens baralham-se a redução do valor a salário etc. e a


constituição do preço pelo salário etc. (sobretudo nesse capitulo VI que
trata "dos partes constitutiWJs dcJ preço das mercadorias''). (O capítulo
VII é o primeiro a tratar do preço natural e do preço de mercado.)
No livro l, caps. 1, li e III tratam da "divisão do trabalho", cap. IV.
da moeda. Nesses capítulos e nos seguintes defme-se, de passagem, o va-
lor. Cap. V trata do preço rea.l e do preço nominal das mercadorias, da
conversão do valor em preço; cap. Vl, das partes constitutiVas do preço
das mercadorias; cap. VJJ, do preço natural e preço de mercado; cap. VUJ,
do salário; cap. IX, do lucro dos capitais; cap.X, dos saldrios e lucros nos
diversos empregos do -trabalho e dos capitais; por fim, cap. XI, da remia,
da terra.
Depois d.isso desejamos antes de mais nada destacar: de acordo rom
as passagens que acabamos de citar, o preço de certas mercadorias consiste
apenas em salário. o de outras, em salário e lucro, e o de terceiro grupo de-
las, em salário, lucro e renda. Por isso
"o preço todo de uma mercadoria tem de redum-se•., a uma ou a outra
deua$ três partes ou 11 todaf elas."

775
Não .haveria, pois, razão para dizer que a maneira de a renda entrar
no preço dístingue-a do lucro e do salário, massim que, sob esse aspecto,
renda e lucro diferem do salário, uma vez que este sempre entra no preço
e aqueles nem sempre. [)()_nde provém então a diferença?
Ademais, Smith tinha de investigar se era possível que as poucas
mercadorias onde só entra salário fossem vendidas pelo valor, ou se aque-
les pobres que colhem os seixos da Escócia não são antes assalariados dos
lapidadores, que fues pagam pela mercadoria apenas o salário normal; pe-
la jornada de trabalho inteira que lhes pertence na aparência, apenas a
mesma remuneração que o trabalhador recebe nos outros ramos de ativi-
dade, onde parte da jornada forma o lucro de que não ele e sim o capita·
lista se apropria. Smith ou teria de afirmar isso ou de sustentar que, nes-
se caso, aparece apenas o lucro que se confunde com o sa1ário. Ele mesmo diz:

"Quando essas três espécies de renda {re11en.ue} pertencem a pessoas


diferentes, é fácil dístingui-las; mas, quando pertencem à mesma pes-
soa, confundem-se, às vezes, umas com as outras, pelo menos na lin-
guagem comum" (t.[, 1.1, cap. VI, p.106).

Contudo, apresenta a coisa asslln.:


Se um trabalhador independente (corno aqueles pobres.da Escócia)
emprega mero trabalho (sem utilizar capital), em suma, seu trabalho e ele-
mentos naturais, o preço reduz-se apenas a. salário. Se ·:aplica. um peque-
no capital, a mesma. pessoa obtém salário e lucro. Por flm,
se emprega
trabalho, seu capital e terra de sua propriedade, reúne em.
si mesmo as
qualidades de proprietário, de arrendatário e de. trabalhador.
Todo o absurdo smithiano se revela das passagens fmais do capítu-
lo VI, livro 1:

"Num pais civilizado são poucas as mercadorias cujo yq/Qr de troca tem
origem exclusiva no mldrio" (trabalho aí identificado com salário).
"Uma vez que a renda (rent) e o lucro contribuem muito para o valor
de troca da gxande maioria das mercadorias, o produto anual do tra·
balho desse país" (aí igualam-se mercadorias e produto do trabalho,
embora o valor todo desse p.rod\lto não proceda apenas do trabalho)
"bastará sempre para comprar ou comand(ZT' quantidade de trabalho
bem maior que a empregada para produzir, preparar e levar e~$e pro•
duto ao mercado" (1.c., pp. 108, 109).

O produto do trabalho não é igual ao valor desse produto ..Ao contrá-


rio (é compreensível), esse valor é acrescido de lucro e de renda. Por isso,
o produto do trabalho pode comandar, comprar mais trabalho, isto é, pa-

776
gar valor em trabalho maior que o trabalho nele contido. A proposíção
seria correta reformulada assim:

Smith diz: Para $e1' coerente, deveria dizer:


"Num país civilizado são poucas as "Uma vez que num país civilizado
mercadorias cujo valor de troca tem são poucas as mercadorias cujo in-
origem exclusiva no saldrlo. Uma teiro valor de.. troca se resolve em
vez que a renda (rent) e o lucro con- :taltirio apenas, e uma vez que, para
tribuem muito para o valor de troca a grande maioria delas. vasta porção
da grande maioria das mercadorias, o desse valor de troca se reduz a renda
produto anual do trabalho desse país e lucro, o produto anual do traba-
bastará sempre para comprar ou co- lho desse país bastará sempre para
mandar quantidade de trabalho bem comprar e comandar quantidade de
maior que a empregada para produ- trabalho bem maior que a que teve
zir, preparar e levar esse produto ao de ser paga" (e por isso empregada)
mercado." "para produzir, aprontar e levar es-
se produto ao mercado."

(Smith retorna aí a sua segunda concepção do valor, e deste diz no


mesmo capítulo:

"É mister observar 1:1ue o valor real de todas as diferentes partes consti-
tutivas do preço se mede pela quantidade de trabalho que cada uma
del4s pode comptar ou co1tt11ndar. Trabalho" (nesse sentído) "não só
mede a parte do preço a qual se reduz a trabalho" (devia dizer: a salá-
rio), "mas também aquela que se reduz a renda e lucro" (t.l, LI, cap.
VI, p. 100).

(No capítulo VI ainda domina a redução do valor a salário, lucro e


renda. E só no cap. VII, referente ao preço natural e preço de mercado,
que a idéia da formação do preço por esses elementos constitutivos ganha
a ·primazia.)
Assim, o valor de troca da produto anual do trabalho consiste em
salário do trabalho aplicado para gerar o produto, e ainda em lucro e ren-
da {rent). Mas aquele trabalho é comandado ou comprado exclusivamente
com a parte do vaJor .a qual se reduz a salário. E portanto possível pÕr ·em
movimento quantidade muito maior de trabalho, se do lucro e da renda
se aplica parte para comandar ou comprar trabalho, sendo ela assim con-
vertida em salário. Em conseqüência, isso vem a dar nisto: o valor de tro-
ca do produto anual do trabalho se reduz a trabalho pago (salário) e a

777
trabalho não pago (lucro e renda). Convertendo-se em salário um segmen-
to da parte do valor, a parte que se reduz a trabalho não pago, pode:se
comprar quantidade de trabalho muito maior que a que se compraria se
se reservasse para adquirir de novo trabalho apenas a parte desse- valor re-
lativa a salário.]
Voltemos atrás.

"Um manufator independente, que possui capital bastante para oom-


p.rar material e para se manter até que possa levar seu produto ao mer-
cado, embolsará diretamente tanto o !ia"lbrio de um oficial que trabalha
para um patrão, q_uanto o lucro que o patrão consegue ao vender os
produtos pelo oficial. Entretanto, tudo o que ganhou se chllma em ge..
1al de lucro e tambêm nesse caso salátío se confunde oom luQ;O. Um
jardineiro que cultive terra de sua propriedade com as próprias mãos
reúne em si mesmo as três diferentes qwzh'dades de demo da terra, de
amndatdrio e de trabalhador. Seu produto lhe dá por isso a renda do
primeiro, o lucro do segundo e o salário do terceiro. Mas, de 01dinário,
o conjunto é considerado fruto de seu trabalho. Nesse caso mistur:un·
se renda e lucro com salário" (t.l, U, cap. Vll, p. 108).

O que há mesmo aí é confusão. Não é o oonjunto "o fruto de seu tra-


balho"? E, ao revés, não se tr~spõem para o jardineiro as condições da
produção capitalista -- onde, com o divórcio entre o trabalho e suas con-
dições objetivas, o trabalhador, o capitalista e o proprietário também se
confrontam como protagonistas diferentes - quando se
considera que o
fruto de seu trabalho, ou melhor, o valor de seu produto se fragmenta
em salário, para pagar o trabalho, em lucro, para recompensar o capital
aplicado, e em renda, a cota que cabe à terra ou antes ao proprietário
da terra? Dentro da produção capitalista, ao se tratar das condições de
trabalho naqueles casos em que esses elementos "na realidade" não estão
separados, está absolutamente certo supô-los dissociados e assim ver nes-
se jardineiro, numa única pessoa, seu próprio jornaleiro e seu próprio se-
nhorio. Mas nessa altura já se introduz na obra de Smith a idéia vulgar de
o salário provir do trabalho, e o lucro e a renda - independentes do tra-
balho do operário -, do capital e da terra, fontes autônomas da riqueza
mesma e não fontes que se apropriam do trabalho alheío. Desse modo
extravagante, baralham-se em Smith as visões mais profundas com as idéias
mais absurdas, tais como as formadas de maneira abstrata pelo conheci-
mento vulgar, a partir dos fenômenos da concorrência.
Depois de ter reduzi.do o valor a salário, lucro e renda, faz o valor,
ao contrário, compor.t;e de salário, lucro e renda, determinados sem de-
penderem do valor. Após ter assim esquecido a origem do lucro e da ren-
da (rent), por ele descrita com acerto, pode dizer:

778
"Salário, lucro e renda (ren t) são as três fontes originais de toda .renda
(revenue) como de todo valor de troca" (t.1, l.l, cap. VI, p. lOS),

De acordo com sua própda exposição, deveria ter dito:


"0 valor de uma mercadoria provém exclusivamente do trabalho
(da quantidade de trabalho) contido nessa mercadoria. Esse valor se re-
duz a salário, lucro e renda. Salário, Jucro e renda são as formas originais
em que o trabalhador, o capitalista e o proprietário participam do valor
criado pelo trabalho do primeiro. Nesse sentido são as três fontes origi-
nais de toda renda (revenue}, embora nenhuma dessas fontes assim cha-
madas entre na formação do valor.,.
Pelas passagens citadas vê·se como Smith, no cap. VI referente às
"partes constitutivas do preço das mercadorias': chega à posição de re-
duzir o preço a salário, quando só trabalho (imediato) entra na produção;
a salário e lucro, quando, em vez do trabalhador independente, o que há
é um jornaleiro empregado por um capitalista (por capital, portanto)~ a
salário, lucro e renda (rent), quando a "terra", além de capital e traba-
lho, entra na produção. Mas supõe ele aí que houve apropriação da ter-
ra e que portanto, ao lado co trabalhador e do capitalista, aparece em
cena o proprietário (embora observe ser possível que os três protagonis-
tas ou doís deles se encarnem numa só pessoa).
No cap. VII referente a preço rtlltutal e preço de mercado, a renda
(quando a terra entra na produção) é considerada parte constitutiva do
preço natural da mesmíssima maneira que salário e lucro. E o que demons-
tram as seguintes passagens:
(1.1, azp. VII)

"Quando o· preço de qualquer mercadoria não é mais nem menos do


que o bastante para pagar, de acordo com as taxas naturais, a renda
da temi, o .wldrio do trabalho e o lucro do capital empregado para pro-
duzir. aprontai e levar o produto ao mercado, vende-se a mercadoria
pelo que se pode cblllnar de preço natural. A mercadoria é vendida
por seu valor exato" (!, p. 111). (Também se enuncia aí que o preço
natwal é ídêntico ao valor da mercadoria.)
"O prefo de mercado de cada mercadoria particula1 é determinado
pela proporção da quantidade de fato disponível no mercado, com a
procura dos que estão dispostos a pagar o preço 1111tural da mercado-
ria ou o valor total de renda, trabalho e lucro, que e mister pagar para
levá-la ate ld" (l, p. 112).
"Quando a quantidade oferecida de qualquer mercadoria está aquém
da procura efetiva, todos aqueles que estão dispostos a paglll'. o valor
global da renda, salário e lucro que é mister pagar para levá-la ao mer-
cado, não podem ser supridos com a quantidade que precisam. O pre·

779
·ço de mercado subirá mais ou menos. acima do preço natural, segundo
a magnitude da escanez ou a ríqueu e a prodigalidade imoderada dos
compradores tomem mais ou menos intensa a avidez da conconência"
(1, p. 113).
"A quantidade levada ao mercado, caso exceda a procura efetiva, não
pode ser toda vendida àqueles que estio dispostos a pagar o valor total
da rerula, salário e lucro, que têm de ser pagos para se levar a mercado-
ria ao mercado... O preço de mercado cai mais ou menos abaixo do
preço natural, conforme a magnitude do excesso da oferta aguce mais
ou menos a conron:ência entre os vendedores, ou a estes importe mais
ou menos se livrarem logo da mercadoria" (1, p. 114).
.. Quando a quantídade levada ao mercado basta exatamente para pro-
ver a procura efetiva, haverá coincidência perfeita entre o preço de mer·
cado... e o preço 1111tur11T... A concon:ência entre os diferent« comer·
ciantes obriga-os todos a aceitarem esse preço, mas não os obriga a acel·
tarem menos" (1, pp. 114, 115).

Para Smith, o dono deixa. a terra sem emprego ou f:!a1'13fere-a da pro-


duçiio de uma merc:adoria (digamos trigo) para a de outra (pastagem, por
exempJo), se, em conseqüência da situação do mercado, sua renda cai abai-
xo da taxa natural ou excede-a.

"Se durante certo tempo a quantídade de mercadoria" (levada ao mer-


cado) "ultrapassa. a procura efetiva, alguns componentes do preço têm
de ser pagos abaixo da taxa natural. Se é esse o caso da !'enda, o interes-
se dos proprietários das terras os motivará logo a retfrtir desse emprego
parte delas" (1, p. 115). ·
"Ao revês, se durante certo tempo a quantidade levada.ao mercado es-
tá aquém da procura efetiva, alguns componentes do preço têm de ul·
tcapassaI a taxa natural. Se esie é o caro da renda, .é evidente que o in-
teresse de todos os outros donos de ten:as os instigará a proverem com
maior quantidade delas a produção dessa mercadoria" (1, p. 116).
"As flutuações ocasionais e temp0rárias do preço de mercado de qual-
quer mercado.ria recaem principalmente sobre as partes do preço as
quais se reduzem a salário e lucro. Influem menos na parte que se re-
duz a renda" (1, pp. 118, 119).
"O preço de monopólio é em todo caso o mais alto que se pode obter.
Em contrapartida, o preço natural ou o da livre-concorrência é o mais
baixo que se pode a.çeitar, por certo não em todas as ocasiões, mas no
decurso de um prazo longo" (1, p. 124). '
"O preço de mercado de qualquer mercadoria particular pode por mui·
to tempo ficar acima, mas raramente ahaíxo, do preço natural. Seja qual
for a parte dele paga abaixo da respectill4 taxa natural, as pessoas preju-
dicadas em seu interesse logo sentem o prejuízo e de imediato retiram
da produção dessa mercadoria uma porção de terra ou de trabalho ou
de capital, de JTUtg.ni.tude tal que o volwne levado ao me1cado sem de-
mora baste apenas para cobrir a procura efetiva. Por isso, seu preço de
mercado logo se elevará ao preço natu11.1I. Pelo menos é o que se dará
onde houver completa liberdade" (l, p. 125). ·

780
Depois dessa exposiç!io no cap. Vll, fica difícil de entender como
Smith, ao tratar da renda da terra, no cap. XI, 1.1, pode justificar a propo-
sição de a renda nem sempre entrar no preço quando a terra que entra na
produção tem proprietário; como pode distingujr a maneira como a renda
entra no preço daquela como nele entram o lucro e o salário, depois de,
nos capítulos VI e vn, ter convertido a renda em parte constitutiva do
preço natural, de maneira absolutamente igual como o fez com salário e
lucro. Retomemos agora ao cap. XI (1 J). .
Vimos que nele se determina a renda como o excedente que fica do
preço do produto depois de serem pagos os adiantamentos do capitalista
(arrendatário)+ o lucro médio.
Nesse capítulo XI, Smith muda diametralmente de posição. A ren-
c!a não entra mais no preça naturaL Ou melhor, A. Smith recorre a um
preço órdinário que em regra difere do preço natural, embora tivéssemos
lido no capítulo vn que o preço ordinário nunca pode ficar por muito
tempo abaixo do pxeço natural, nem pode prosseguir pagando por muíto
tempo uma parte componente do preço natural abaixo da respectiva ta-
xa natural, nem pode prosseguir por muito tempo no nível de pagar uma
parte componente do preço natural abaixo da respectiva taxa natural e
menos ainda no de a não pagar de todo, como se afirma agora no tocan-
te à renda. Smith tampouco nos diz se o produto, quando paga renda,
se vende abaixo do valor, ou se, quando a paga, se vende acima.
Antes, o preço natural da mercadoria era:

'(:) valor total de renda, lucro e salá.do, que é mitter pagar PIUtJ levâ·kt
ao mercado" (1, p. 112)

Agora lemos:

"Só podem ser levadas usualmente ao mercado aquelas partes do pro-


duto da terra, das quais o preço ordindn'o basta para repor, acrescido
do juro ordinário, o capital que é mister empregar a fim de as levar pa.
ftl lá" (pp. 302, 303),

O preço ordinário, portanto, nã'o é o preço natural, e não é necessá-


rio pagar o preço natural para levar essas mercadorias ao mercado.
Antes lemos que, se o preço ordinórw (naquela ocasião, o preço de
mercado) não é suficiente para pagar a renda (rent) inteira ("o valor to-
tal de renda" etc.), retirar-se-á terra até o ponto em que o preço de merca-
do suba ao nível do preço natural e paguearenda toda. Agora, ao contrário:

781
"Se o preço ordinário ultrapassa o nivel" (de repor o capital acrescido
do lucro 01dinário), "a parte excedente entra naturalmente na renda.
Se uão o ultxapassa, a mercadoria, embora possa ser levada ao mercado;
não tem condições de dar renda ao dono da tena. Depende da proeura,
ir ou não o preço· além desse nível" (1.r, cap. XI, pp. 302, 303).

De parte constitutiva do preço natural, a renda de súbito se conver-


te em excedente do preço suficiente cuja existência ou inexistência depen-
de do nível da procura. O preço suficiente, porém, é o preço necessário
para a mercadoria vir ao mercado e portanto para ser produzida, sendo as-
sim o preço de produçãn da mercadoria. E que o preço necessário à oferta
da mercadoria, para que esta chegue a existir e apareça no mercado na
qualidade de mercadoria, é sem dúvída o preço de produção ou preço de
custo. Esta é a condição sine qua non de sua existência. Por sua vez, a pro-
cura de alguns produtos da terra tem sempre de chegar a nível em que seu
preço ordinário pague um excedente sobre o preço de produção, uma ren-
da portanto. A procura de outros pode chegar ou não a esse nível.

"Há algumas panes do produto da terra para as quais a procura tem


sempre de cheg<rr a nível que proporcione preço maior que o suficien-
te para levá-las ao mercado, e há outras pa.ta as quais a procura pode
chegar ou não a esse nível que redunda nesse preço maior. As primei-
ras sempre têm de daI renda aos donos da terra. As·últímas às vezes
podem e às. vezes não podem dar, confonne as dtferentes circunstân-
cias" (Lc., 1, p. 303).

Em vez do preço natural temos agora o preÇQ mficiente. O preço


ordinário por sua vez difere desse preç,o sujr.ciente.. O preço ordinário,
quando inclui a renda, está acima do preço suficiente. f-lhe ígual quando
a exclui. E mesmo característica do preço suficiente excluir a renda. O pre-
ço ordinário está abab:o do preço suficiente quando, depois de repor o
capital, não paga o lucro médio. O preç,o suficiente é na realidade portan·
to o preç,o de produçãn ou o preço de custo, conceituado por Ricardo
segundo o que extraiu de Smith, e como de fato se configura do ponto
de vista da produção capitalista, isto é, o preço que paga o lucro ordiná·
rio, além dos adíantamentos do capitalista; o preço médio, tal como o
gera a concorrência entre os capitalistas nos diferentes empregos de capi-
tal. O que induz Smith a contrapor o preço suficiente a seu preço natural
é essa abstração oriunda da concorrência, embora ele, na exposição sobre
o preço natural, assevere, ao contrário, que só é suficiente a longo prazo
o preço ordinário que paga as partes constitutivas do preço natural - ren-
da, lucro e salário. Uma vez que o capitalista dirige a produção de mer-

782
cadorias, o preço suficiente é o que basta para a produção do ponto de
vista do capital, e esse preço suficiente para o capital não inclui renda,
mas, ao contrário, a exclui.
Aliás, esse preço suficiente não basta para alguns produtos da ter-
ra. Para estes, o preço ordinário tem de se elevàr a nível bastante para
proporcionar um excesso sobre o pi:eço suficiente, uma renda para o pro·
prietário da terra. Isso, para outros, depende das circunstâncias. Smith
não se perturba com a contradição de o preço suficiente não ser suficien-
te, de o preço que basta para a colocação do produto no mercado não
bastar para colocá-lo no mercado.
E verdade que - sem dar sequer uma ligeíra olhada retrospectiva
nos capítulos V, VI e VII - reconhece que com o preço suficiente des-
trói toda a sua teoria do preço natural (o que não considera contradição,
mas algo novo que descobre de súbito).

"Por isso cabe observar" (é nesta fonna ingênua ao extremo que Smith
passa de uma afumação para ouúa que se lhe opõe) ..que /1 renda entra
1U1 comporlçlfa do preço da mercadoria, de maneira diferente do $/JM·
rio e do lucro. Salários e lucros altos ou baixos são a causa de preço al-
to ou baixo; rendas altas ou baixas são o efeito do preço. A nece&s:ida.
de de pagar lllkirios e lucros altos ou bai:J:oll para prover o mercado
com detenninada mercadoria constitui a ru.zaõ por que seu preço é
alto ou baixo. Mas seu preço - por ser alto ou baixo, muito mais, pou-
co mai!J ou não mai$ que o w.fidente para pagar eue!J ml.órios e lucros -
ptoporcionará renda alta, baixa ou não dará mesmo nenhuma renda"
(pp. 303, 304).

Antes de mais nada, a conclusão. O preço suficiente portanto, o pre-


ço de custo que só paga salário e lucro, exclui a renda (rent). O produto,
se paga muito mais que o preço suficiente, pagará renda alta. Se paga pou·
co mais, pagará renda baixa, se a rigor paga apenas o preç.o suf'u:iente, não
pagará renda. O preço real do produto não pagará renda se coincíde com
o preço suficiente. que paga lucro e salário. A renda é sempre um exce-
dente sobre o preço suficiente. O preço suficiente, por natureza, exclui
a renda. Essa é a teoria de Ricardo, Este aceita a idéia do preço wf'u:iente,
do preço de custo de A. Smith; evita a inconseqüência smithiana de distin·
gui-lo do preço natural e desenvolve a idéia de maneira coerente. Smith,
depois de ter cometido todas aquelas incoerências, ainda é incongruente
a ponto de estabelecer para alguns produtos da terra um preço mais ako
que o preço suficiente. Mas essa própria incongruência é por sua vez re-
sultado de uma "observaç[o" mais acertada. "

783
No começo, o trecho ~obre o assuntçi surpreende deveras pela inge-
nuidade. No capítulo VII explica Smith que renda, lucro e salário entram
por igual na romposiçfio do preço natural; transvertera antes a reduÇiio
do valor a renda, lucro e salário em romposiçfio do valor pelo preço natu-
ral da renda, lucro e salário. Agora diz que a renda entra na "composição
do preço das mercadorias", de maneira diferente da do lucro e salário.
E em que difere a maneira de a renda entrar nessa composição? Em não
entrar nela absolutamente. E só agora chega.mos à verdadeira explicação
do preço suficiente. O preço das mercadorias é caro ou barato, alto ou
baixo porque salário e lucro - as respectivas taxas naturais - são altos ou
baixos. A mercadoria não é levada ao mercado, não é produzida se não
forem pagos aqueles lucros e salários, altos ou baixos. Formam o preço
de produção, o preço de custo da mercadoria; são na realidade, portanto,
os elementos constitutivos do valor ou preço dela.. Em contrapartida, a
renda não entra no preço de custo, no preço de produção. ~ão é elemen·
to constitutivo do valor de troca da mercadoria. Só é paga quando o pre-
ço ordindrio da mercadoria está acima do preço suficiente. Lucro e salá-
rio, na qualidade de elementos constitutivos do preço, são causas do pre-
ço; a renda, ao contrário, é efeito, conseqüêndo. dele. Não é, como lu-
cro e saJário, elemento que entrà na sua composição. E a isso chama Smith
de entrar nessa composição de maneira diferente daquela __ do lucro e salá-
rio. E parece não ter a mais leve percepção de ter arruinado sua doutrina
do preço natural. Pois, o que era o preço natural? O centro em tomo do
qual gravita o preço de mercado: o preço si.eficiente, alfabço do qual o
produto não ~de cair, para ser levado ao metcado, produzido, durante
muito tempo.
A renda agora é o excedente sobre o preço natural e antes era ele-
mento constitutivo do preço nDtural; agora, efeito e, antes, causa do preço.
Smith, porém, não se contradiz ao afirmar que para certos produ-
tos da terra as circunstâncias do mercado sempre são tais que o preço or·
dinário tem de estar acima do preço suficiente, noutras palavras, a pro-
priedade da terra tem o poder de forçar o preço a subir além do nível que
bastaria para o capitalista, se a ele não se opusesse uma força contrária.
Assim, no capítulo XI, depois de ter posto abaixo os capítulos V,
VI e VII, prossegue tranqüilo dizendo que terá por tarefa examinar: (1) os
produtos da terra que sempre dão renda; (2) os produtos da terra que às
vezes dão e às vezes não dão renda; por fim (3) as variações que, nos di-
ferentes períodos de desenvolvimento da sociedade, sucedem no valor re·
lativo desses dois tipos de produtos, confrontad<:>s entre si, ou confronta-
dos com as mercadorias manufaturadas.

784
2. Tese de Smith relativa ao caníter específico da
procura de produtos agrícolas. Influência fisiocrática
na teoria Smithiana da renda.

"Seção Primeira. Dos produtos da turra que sempre dão renda. "
Começa com a teoria da população. Os alimentos sempre criam
a própria procura. Se acrescem também acrescem os seres humanos, os
conswnidores dos alimentos. A oferta dessas mercadorias produz portan-
to sua procura.

"Uma ~vez que 03 seres humanot, como todos os outros animais, aumen·
tam na proporção dog meloa de subzistência, há sempre procura maior
ou menor de alimentos. Estes podem sempre comp1ar quantidade maior
ou menor de trabalho, e sempre se encontra alguém disposto a fazer
alguma ooisa pua obtê·lo$" (1.1, cap. XI; l, p. 305).
"Mas a terra produz" (por quên "quase em toda situação quantidade
de alímentor maior que a suficiente para sustentl1!' o total de trabalho
necessário paza levá-los ao mercado, e da maneira mais liberal para esse
sustento. O excedente também é sempre mais que bastante para repor,
com luero, o capital que empregou esse trabalho. Sempre remanesce,
por isso, alguma coisa para dar renda ao proprietâ.rio da terra" (l.c., I,
pp. 305, 306).

Isso aí não passa de música fisiocrática e não demonstra nem expli-


ca por que o "preço" dessa mercadoria particular paga um excedente aci-
ma do "preço suficiente". isto é, renda.
Smith passa logp a falar de pastagens cultivadas e sem cultivo, como
exemplo. Segue então a proposição sobre renda diferencial:

"A rerufa da terra varia com a fertilidade, seja qual for a magnitude do
produto, e ainda com a locaJfaação, seja qual for a fertilidade" (l, p. 306).

Aí renda e lucro se revelam mero excedente do produto, depois de


deduzida deste a parte que na forma natuml alimenta o "trabalhailor. (Visão
fisiocrática genuína que na realidade se apóia na circunstância de se viver
em condiÇóes de país agrícola, quase exclusivamente de produtos da agri-
cultwa, e de a própria indústria, a manufatura, aparecer como trabalho
rural acessório que uti1iz.a o produto local da natureza.)

785
"Por isso, tem de sustentar-se à custa dele 107 quantidade maior de tra-
balho, e tem de ser reduzido o excedente de que se tira o lucro do ª"en-
datário e a renda do dono da te"a" (p. 307).

Por isso, também a cultura de trigo deveria dar lucro maior que pas-
tagem.

"Um trigal de fertilidade moderada produz quantidade de alimentos pa-


ra o ser humano muito maior que a melhor pastagem da mesma extensão."

(Aí não se trata portanto de preço, mas da quantidade absoluta, em


forma natural, de alimentos para o ser humano.)

"Embora a triticultura requeira muito mais trabalho, todavia o exceden-


te que sobra depois de ela repor as sementes e manter todo esse trabalho
é também muito maior."

(Embora o trigo custe mais trabalho, o excedente de alimentos que


um trigal deixa depois do pagamento do trabalho é mais considerável
que o de uma pastagem de criação de gado. E vale mais, não por custar
o trigo mais trabalho e sim por se conter no excedente de trigo mais ali-
mento.)

"Por isso, suposto que uma libra de carne nunca valesse mais que urna
libra de pão, esse excede,nte maior" (porque área iguaí de terra produz
mais trigo que carne) "possuiria por toda-parte valor maiór" (porque se
admitiu que uma libra de pão, em valor, é igual a· uma.libra de carne, e
que da mesma área de terra sobram mais libras d~ pão que libras de car-
ne, após se alimentarem os trabalhadores) "e éonstituiria fundo maior
tanto para o lucro do arrendatário quanto para a rendà do dono da
terra" (pp. 308, 309).

Smith, depois de substituir o preço natural pelo preço suficiente e


de igualar a renda a excedente sobre o preço suficiente, esquece que se
trata em suma de preço, e deriva a renda da razão entre a quantidade de
alimentos que a agricultura fornece e a quantidade de alimentos que o la-
vrador precisa de consumir.
Fora do âmbito dessa interpretação fisiocrática, supõe na realidade
que o preço do produto agrícola que fornece o alimento principal paga,
além do lucro, renda. A partir dessa base continua a investigar. Com o de-

107, Isto é, do produto da terra situada a distância maior do mercado.

786
senvolvimento da agricultura, as pastagens naturais se tomam insuficien-
tes para a criação de gado relacionada com a procura de carne. Para esse
fim é mister empregar terra cultivada. O preço da carne tem portanto
de subir até o ponto em que pague o trabalho empregado na pecuária e ainda

"a renda que o dono da te"a e o lucro que o ª"endatdriD poderiam


ter obtido se a tivessem empregado na lavoura. O gado criado nas char-
necas mais incultas, quando levado ao mercado, vende-se na razão do
peso e da qualidade, pelo mesmo preço que o gado criado na terra com
o melhor cultivo. Os donos dessas charnecas tiram vantagem disso e
aumentam a respectiva renda fundiária na razão dos preços do gado."

(Aí, com acerto, vê a orígem da renda diferencial no excedente


do valor de mercado sobre o valor individual. Mas, nesse caso, o valor
de mercado sobe não por se passar de terra inelhór para pior e sim de
menos fértil para mais fértil.)

"Assim, na melhoria progressiva das terras, a renda e o lucro da pas-


tagem inculta são determinados, em certa medida, pela renda e pelo
lucro da terra cultivada, e esses por rua vez pela renda e pelo lucro do
trigo" (l, pp. 310, 311 ).
"Onde não há ... vantagem local, a renda e o lucro do trigo ou do que
for o usual alimento vegetal do povo têm de determinar na terra, ade-
quada a essa produção, a renda e o lucro da pastagem" (p. 315).
"A utilização da cultura de gramíneas, de nabos, cenouras, couves e
de outros expedientes a que se tem recorrido para alimentar com área
igual de te"ª mais gado do que é possz'vel com gramínea natural, de-
verá, como é de esperar, ter reduzido um pouco a superioridade que
o preço da carne, num país desenvolvido, possui naturalmente em con-
fronto com o preço do pão" (l.c.). "E esse é o resultado que parece
ter ocorrido" etc. (l.c.).

Smith, depois de ter assim analisado a relação entre renda (rent) da


pecuária e renda da lavoura prossegue:

"Em todos os grandes países emprega-se a maior parte das terras culti-
vadas, para produzir alimentos destinados aos homens ou aos animais.
A renda e o lucro daí decorrentes determinam a renda e o lucro de to-
das as demais terras cultivadas. Se um produto particular dá menos ren-
da e lucro, a área logo será convertida em terra de trigo e de pastagem.
Mas, se proporciona mais, logo se transfere para esse produto certa por-
ção das terras de trigo e de pastagem" (1, p. 318).

Fala de vinhas, pomares, hortas etc.


"Por isso, a renda e lucro daqueles produtos que exigem ou maior dis·
pêndio inicial com melhoramentos da terra para esta lhes ficar adequa-

787
·da, ou maiox djspêndio anual de cultivo emboxa sejam muitas vezes
bem superiores aos do trigo e da pastagem - são Illl .realidade determi-
iwios pela renda e lucro daquelas atividades agrícolas corriqueiras, quan-
do compensam apenas esses dispêndios extraordinários" {I, pp. 3.23, 324).

A seguir fala do açúcar nas colônias e do fumo.

"E assim que a renda da terra cultivada que produi alimentos para seres
humanos determina a renda da maio1 parte das ouhas tenas cultivadas"
(1, p. 331). "Na Europa, o trigo é o produto principal que serve de ime-
diato para a alimentação humana. ·Por isso, excetuadas cizcunstâncías
especiais, a renda das tenas de trigo regula, na Europa, a de todas as
demais terras cultivadas" {l.c., pp. 331, 332).

Retoma então à teoria fisíoc1ática, ajustando-a à p1oposição: o ali-


mento gera seu próprio consumidor. Se a cultura do trigo for substituída
por outra que forneça quantidade maio1 de alimentos, com o mesmo culti-
vo nas terras mais comuns,

"terá de ser muito maior a renda do dono da te.na, ou a quantidade


excedente de alimentos que lhe sobrará depois de pago o uabalho é
reposto, com acréscimo ,'do lucro ordinário, o capital do arrendatário.
Não importa qual seja a taxa geral de remune1ação do trabalho nesse
país; esse excedente maior poderá sempre sustentar qµan'tidade maior
de trabalho, e assim capacitar o dono da terra a cqmprá-la ou coman-
dá-la" (1, p. 332).

Como exemplo cita o caso do arroz.

"Em Carolina. .. os plantadores {planters), como em ouuas colônias bri-


tânicas, são em regra arrendatários e proprietdrios ao mesmo tempo,
e a renda, por isso, confund!t·tt com o lucro... " (1, p. 333). ·

As terras de plantação de arroz, porém, não são

"adequadas para trigo, pastagens ou vinhas, nem para qualquex outro


produto vegetal de grande utilidade para o ser humano, e as terras que
são apropriadas a essas culturas são inadequadas para arroz" (l, p. 334).
"Po.r isso, mesmo nos países riZícultores, a renda das terras de arrozais
não determina a rerufa das outras terras cultivadas que não podem ser
transferidas para aquele produto" (1, p. 334).

Segundo exemp'/o, as batatas (acima, oposição e crítica de Rkar-


do).108 Se as batatas se tomarem o alimento primordial, substituindo o trigo
108. Ver neste volume p. 770.

788
'17 mesmo qllllntidade de urra cultii>ado sufftentará muito nwis iereG
humanos. E uma vez que os trabalhadore.~ em regra se alimentarão com
batatas, haverá excedente maior, depois de ter sido reposto o capital
inteito e sustentado o trabalho todo empregado no cultivo. Ao pro·
prietáóo da terra pertencerá a maior parte desse excedente. A popu-
la~ crescerá, e as rendas elevar-se-ão considezavelmente acima do
nivel atual" (I, p. 335).

Com mils alguns ~as sobre o pão de trigo, de a~ e sobre


as batatas encena a primeira seção do capítulo XI.
Como vemos, essa primeira seção que trata daquele produto agrí·
cola que sempl'e paga renda resume-se a isto: presumida a renda do prin·
cipal alimento vegetal, expõe Snúth como essa renda regula a renda da
pecuária, das vinhas, hortas etc. Nada diz sobre a própria natureza da ren·
da, exceto a proposição geral de a fertilidade e a situação, uma vez pres-
suposta a existência da renda, determinarem seu nível. Mas isso toca ape-
nas a diferenças nas rendas, a diferenças de magnitude das rendas. Então,
por que esse produto sempre paga renda? Por que seu preço ordinário é
sempre mais alto que seu preço suficiente? Smith aí abstrai do preço e
recai na füiocracia. Aí, porém, perpassa a idéia de que a procura é sem-
pre tão grande porque ·o produto mesmo geia os solicitantes, seus pró·
prios consumidores. Ainda com esse pressuposto não se pode rompreen·
der por que deveria a procura ultrapassar a oferta e em conseqüência com·
pelir o preço a superar o preço suficiente. Aí surge dissimulada a reminis-
cência do -preço natural que abrange ao mesmo tempo renda, lucro e sa-
lário, e que é pago quando oferta e procura coincidem.

"Se a quantidade levada ao mercado basta apenas pata provei a pro-


cura efetiva, o preço de mercado concorda exatamente ... com o preço
natural" (I, p. 114).

Contudo, é significativo que naquela seção Smith nenhures fale


nisso. Chegou mesmo a dizer no começo do capítulo XI que renda não
entra no preço como elemento constitutivo. A contradição era por de·
mais contundente.

3. Explicação de Smith sobre a relação entre oferta e


procura segundo as diferentes espécies de produtos
da terra. Suas conclusões no tocante à teoria da renda.

"Segunda secção. Do produto que às vezes dá e às vezes não dá


renda."
86 neS8a seção trata propriamente da natureza geral da renda.

789
"Alimentos para o ser humano parecem ser os únicos pxodutos da ter-
til que propoxcionam certa renda ao dono da terra, sempxe e necessa-
riamente." (Não mostrou a razão do "sempre" e "necessariamente".)
"Outi:as espécíes de produtos podem às vezes dar e às vezes não dar
renda, conforme as diferentes circunstâncias" (l .c. 1, p. 337).
"Vestudrio e habitação eonstítuem, depois de nutrição, as duas neces-
sidades principais dos seres humanos" (Lc. p. 338). A terra "no rude
estado origínal" provê materiais de vestuário e habitação a mímero
de pessoas maior "do q11e o q11e ela pode a!imentar". Em virtude da
"111perab11ndância desses materiais" em relação ao número de pessoas
que a terra pode alimentar, em relação portanto à população, esses
materiais "custam" pouco ou nada. Grande parte desses "materiais"
ju desusada e inútil, "e o preço dos materiais que se utilizam consi-
deraose equivalente apenas ao trabalho e dispêndio para adequá-los iJ
utilização" Esse preço, poxém, "nenhuma renda" p.roporciona "ao
dono da terra". Em contraste, no estádio da terra cultivada, o núme-
ro de pessoas que "ela pode alimentar", isto é, a população, é maior
que a quantidade daqueles materiais que ela supre, pelo menos "da
maneira como as pessoas os exigem e estão dispostas a pagá-los". Sur-
ge relativa escassez desses bens, "a qual neeessariamente aumenta o va-
lor deles" "Há com freqüência procura maior do que a quantidade
que pode ser obtida." Paga-se por eles mais do que "o dispêndio de
levá-los ao mercado. Po1 isso, seu preço pode sempre dar certo rendo
ao dono da terra" (1, pp. 338, 339).

Ex.plica-se aí a renda pelo excesso da procura sobre a oferta que po-


de ser provida ao preço suficiente.

Os materiais primitivos do vestuário eram as peles .e couros "de ani·


mais de maíor porte" Entre os povos caçadores e pastóres, que têm
a carne po1 alimento principnl, "cada um, ao prover-se de alimentos,
provê-se dos materiais de vestwirio em qwntidflde maior que a que
pode 11.tíli'Zat" Sem comércio externo, a maiorparte seria jogada foia
por inútil. A procUia decorrente do comércio externo eleva o preço
desse excesso de materiais "acima do CIJsto da remessa. Esse preço,
por isso, dá certa renda ao proprietário da tena ... " A lã inglesa, graças
ao mercado de Flandres, ac1e.~centou "algo à renda da terra que a pro-
duziu" (1, pp. 339, 340).

O comércio externo aí eleva o preço de ·um subproduto agrícola


a tal ponto que a terra donde provém pode dar alguma renda.

"Os materilli& de habitação nem sempre podem ser transportados a


distância tão grande quanto os de vestuâ.tio e não se tomam objeto
de comércio exterior com tanta facilidade. Quando são supe1abundan-
tes no país que os produz, com freqüência ocorre que, mesmo no esta·
do presente do comércio mundial, não têm valor para o dono diJ terra."
Assim, uma pedreira pode du renda nas proximidades de Londres e
não dá-la em muitos lugares da Escócia e de Gales. O mesmo se estende

790
à madeira. "Num país populoso e bem cultivado" proporcionaiá renda,
mas apodrecerá no chão "em muitas partes da América do Norte". O
proprietário ficará feli:i se pude1 livrar-se dela. "Quando o material de
habitação é tão abundante, a parte utilizada vale apenas o trabalho e o
dispêndio para adequá-la ao uso. Nenhuma renda proporciona ao pro·
prietário, que em geral deixa que a leve qualquer um que se dê ao tra·
ba.1ho de pedi-la. A procura das nações mais ricas, todavia, permite-lhe
às vezes obter daí uma renda"((, pp. 340, 34 l).
Os países povoam-se não na razão do "núme10 de habitantes que a 1es·
pectiva produção pode vestir e a que pode proporcionai teto, e sim na
do número que ela pode alimentar. Provi.da a alimentação, é fácil achar
o vestuádo e a habitação necessários. Mas, embora estes estejam dispo-
níveis, pode muitas vezes ser difícil eneontra.1 alimentos. Em algumas
regiões do Império Biitâníco, um dia de tJabalho de um homem pode
construir o que se chama uma casa." Entre os povos selvagens e bárba-
ros basta 1/l00 do trabalho anual para obterem o que necessitam em
vestuário e habitação. Precisam mu.lw vezes dos outros 99/100 do tra·
balho anual para se p1overem dos alimentos necessários. "Mas quando,
em virtude do melhoramento e do cultivo do solo, o tr11ba/lto de u.mn
fam11ia pode produ.:ir alimento para duas, bastará o trabalho de meta-
de da sociedade pau. alimenta.t todos." A outra metade poderá então
satisfazei as outras necessidades e fanta.~ías dos se1es humanos. Os prin-
cipais objetos dessas necessidades e fantasias são o vestudrio, a habita·
ção, o mobilidrio da casa e o que se chama de fausto ou luxo. A neces·
sidade de alimentos é limitada. As demais necessidades, ilimitadas. Os
donos do excesso de alimentos "estão sempre dispostos a trocar o ex-
cesso". "Os pobres, pua obter alimentos", ocupam-se em dar satisfa·
ção a essas "fantasias" dos Iicos, e nisso, ainda por cima, e-0ncorrem
entre si. O número dos trabalhadores aumenta· com a quantidade dos
alimentos, portanto na razio do progresso da agricultura. Seu "negócio"
permite "a mais extrema subdivisão do trabalho"; a quantidade de ma·
téáas-primas que transformam acresce por isso de maneira ainda mui-
to mais rápida que seu núme10. "Surge daf procura de toda espécie de
material que a invenção humana pode empregiir, com vistas à utilidade
ou à bele~a, em ronstrnções, vestuário, mobiliário, decoração; e também
a procura dos fôsseis e minerais contidos nas entranhas da te1ra, dos
metais preciosos e das pedras preciosas."
"O alimento é, portanto, a fonte original da renda, mas, se outro pro·
duto da terra passa a dar renda, essa adição do valor decone do acrés.ci·
mo da capacidade do trabalho para produzir alimentos por meio d3. me-
lhoria e do cultivo do solo" (1, pp. 342, 345).

O que Smith apresenta aí é a verdadeira base natural da fisiocracia


nesta proposição: toda criação de mais-valia (inclusíve renda) fundamenta·
se na produtividade relativa da agricultura. A primeira forma real de maís-
valia é o excedente do produto agrícola (alimentos), e a primeira fonna
real de trabalho excedente é bastar um ser humano para produzir o sufi-
cie.nte para dois. Quanto ao mais, isso nada tem a ver com o desenvoM-
mento dessa forma específica de mais-valia, a renda frent), que pressupõe
a produção capitalista.

791
ProsSegue Smith:

As outras partes do pxodulo da tena (fora alimentos) que dão renda mais
tarde, nem seq1pre a dão. A procura delas, mesmo nos países de maior
desenvolvimento agrícola, nem sempre é suficíente "para estabelecer
preço f!lperior (lo b(lsflmte para pagar o trabalho e repor, acrescido do
lucro 11Cf'nta1, o capital que tem de ser empregado para lellá·lat ao mer·
cado. Se a procura se comportará ou 11ão assim depende de diferentes
cfrcun1tàncw". (1, p. 345).

Aí de novo, portanto: a renda decorre de a procura ser maior que a


oferta ao preço suficiente, que não abrange renda, mas apenas salário e
lucro. Que significa isso se não que a oferta ao preço suficiente é tão gran·
de que a propriedade não pode opor resistência ao nivelamento dos capi·
tais ou ao trabalho? Que a propríedade, portanto, apesar de exístir no do·
mínio legal, não existe de fato, não pode na prática- atuar como tal? Smith
erra ao não ver que a propriedade, ao realizar venda pelo valor, realiza-a
acima do preço suficiente. Supera Ricardo ao ver que se impor ou não a
propriedade no plano econômico depende das circunstâncias. Por isso,
acompanhar passo a passo essa parte de sua exposição. Começa pelas mí-
nas de carvão, passa para a extração de madeira, para voltar às minas de
carvão etc. Façamo-lo começar pela extração de madeira.

O preço da madeira varia com o nível da agrlcultll!ll, pela mesma ra·


zão que o preço do gado. Na míancia da agricultu.ra. p~omínava a
floresta, verdadeiro empeço para o proprietário, que a .cedia com pra-
zer a qualquer pessoa para extraÍI madeira. Com o progresso da agri·
cultura desbrava-se a floresta em parte pela expansão da lavoura e em
parte pelo e1escimento dos rebanhos que comem- e roem as raízes e as
árvores nascentes. "Esses rebanhos, embora não aumentem na mesma
proporção do trigo, que resulta inteiramente da indústria humtl11a, mui·
tiplicam·se sob os cuidados e proteção do homem."
A escassez de madeira assim criada eleva seu preço. Por isso, pode dar
renda tão alta que lavouras (ou terra arável) $e convertem em flo1es·
tas. Assim é na Grã·Bretanha. A renda da extração de madeira nunca
pode ultrap~ar durante muito tempo a renda do trigo ou das pasta-
gens. mas pode alcançar esse nível (I, pp. 347-349).

Na realidade, portanto. a renda da extração de madeira é por nature-


za idêntica à renda das pastagens. Entra nesta categoria, embora madeira
não sírva de alimento. A categoria econômica não se regula pelo valor de
uso do produto, mas pela circunstância de haver ou não a conversibilida-
de em terra arável e vice-versa.

792
Minas de ctlfViio. Riqueza ou pobreza das minas em geral, observa
Smith com acerto, depende de se poder extrair de díferentes minas, com
a mesma quantidade de trabalho, quantidade maior ou menor de mineral.
A pobre:za pode anular a situação favomel, de modo que as minas pobres
nem mesmo podem ser exploradas. Em contrapartida, a situação desfavo.
rtivel pode anular a riqueza, de modo que as minas ricas não são explorá-
veis apesar de sua fertilidade. f: o que se dá sobretudo quando não há boas
estradas nem navegação (I, pp. 346, 347).
Há minas cujo produto basta apenas para cobrir o preço suficiente.
Por isso pagam o lucro do empresário, mas nenhuma renda fundiária. O
proprietário em pessoa tem de explorá-la. Ganha assim "o lucro ordiná-
rio do capital que emprega". Há muitas minas de carvão desse tipo na Es-
cócia. Não poderiam ser exploradas de outro modo.

"O proprietário a ninguém petmi.te explolá.-las sem pagar renda, mas


ninguém tem meios de pagar renda alguma."

Com acerto Smith determina aí quando não se paga renda onde


existe a propriedade da terra. ~ quando proprietário e empresário se jun·
tam numa só pessoa. Já nos dissera antes que ísso ocorre nas colônias.
Um arrendatário aí não pode cultivar terra, pois esta não pode pagar ren-
da. Mas o proprietário pode cultivá-la com lucro, embora ela não lhe pa.
gue renda. Eo que sucede, por exemplo. nas colônias do Oeste americano, por-
que novas terras podem sempre ser objeto de apropriação. A terra como
tal não é fator de resistência e ai a competição entre os proprietários la-
vradores é de fato concorrência entre trabalhadores ou capitalistas. No
caso suposto das minas de ca.IVão ou das minas em geral, as condições
são diferentes. As mi~as menos ricas ou pior situadas, o valor de merca-
do - determinado pelas minas que provêem a oferta a esse valor - ou
proporciona renda menor ou nenhuma, mas cobre o preço de custo. Aque-
13$ minas então só podem ser exploradas por pessoas para as quais não
existe a resistência da propriedade, a exclusão que esta impõe, porque
capitalista e proprietário se encarnam num só indivíduo; é o que sucede
unicamente quando a -propriedade deixa de ser elemento autônomo, opos-
to ao capital. A situação se distingue da das colônias porque nestas o pro-
prietário não pode impedir a exploração de novas terras. Naquela situa·
ção, pode. Só a si mesmo dá a permissão de explorar a mina. Isso não o
capacita a obter renda e sim a empregar com lucro na mina seu capital,
com exclusividade.

793
O que Smith disse sobre a determinação da renda pela mina mais
rica, já comentei a propósito de Ricardo e sua polêmica. 109 Destacar aqui·
apenas a proposição:

"O preço mais baixo" (antes, o preço suficiente) "a que o carvão pode
ser vendido por muito tempo é, roma o de todas as demais mercadorias,
o preço que apenos basta para repor, acrescfdo do lucro ordinário, o Cf!·
pifai que tem de ser empregado para levá-liJa ao mercado" (I;p. 350).

Vê-se o preço suf'tdente substituir o preço natural. Ricardo, com


acerto, considera-os idênticos.
Smith afü:ma:

que a renda das minas de carvão é muito menor que a dos produtos
agrícolas: nestes 1/3, e naquelas, 1/5 é renda muito· alta e 1/lo,uo a
renda usual. As minas metalíferas não dependem tanto da situação,
uma vez que seus produtos são mais fáceis de transportar e o mercado
mundial lhes está mais aberto. O valor delas por isso depende mais da
riqueza em metal que da situação, quando sucede o contrário com as
minas de carvão. Concouem entre ~os produtos das minas metalíferas
mais distantes (uma1 das outras). "Por isso, o preço dos metais comuns,
e ainda mais dos metais precíosos, nas minos mais n"cas da terra, tem
nei:essai:iamente de mflulr mais ou menos no preço oco.gente em to-
das as demais minas" (l, pp. 351, 352).
"O preço de todo metal em cada mina, sendo detertninado em certa
medida pelo preço na mina mais rica de fato explorada no mundo, $Ó
pode ultrapa~sar muito pouco, para a rnaioría das minas; as _custos de
exploração e raramente pode proporcionar renda muito altà. Por esse
motivo, a renda parece constituir, na maioria das minas, pequena parte
do preço dos metais comuns e parte ainda menor do preço dos metais
preciosos. Nos dois aisos, trabalho e lucro constitúem a maior parte"
(1, pp. 353, 354).

Smith analisa aí com acerto o caso do quadro C111


A propósíto dos metais preciosos repete Smith a explicação do preço
suficiente, que põe no lugar do preço natural ao tratar da renda. Não tem
necessidade disso ao falar sobre a indústria não agríéola, pois coincidem o
preço suficiente e o preço natural segundo sua definição inicial, a saber, o
preço que paga os adiantamentos do capítal +o lucro médio,

109. Ver neste volume pp. 766-770.


11 O. Trata-se de fraqões do produto bruto.
111. Ver pp. 756 e 757.

794
"O preço mais baixo a que os metais preciosos podem ser vendidos por
muito tempo ... é regulado pelos mesmos prindpíos que estabelecem o
e
preço normal mais bahco de todas as outras mercadorias. detennina-
do pelo capital que em regra é mister emp1egar, pelo alimento, roupa e
alojamento que é mister consumir pau· levá-los da mina ao mercado.
Tem pelo menos de repor esse capital acrescido do lucro ordinário"
(I, p. 359).

Com referência ãs pedras preciosas observa:

"A procura de pedras preciosas decorre inteiramente ·da bele-la que


possuem. Sua única utilidade é a de ornamentar. O mérito da beleza
é bastante exalçado pela escassez ou pela dificuldade ou dispêndio de
as extrai! da mina. Por isso, ná lllllioria dos ca.'lOS, lucro e saláxío com-
põem quase todo o alto preço. A renda tem neste participação muito
pequena ou, oom freqüência, nenhuma. Sô ·as minas mais ricas pro-
porcionam renda digna de nota" (l, p. 361).

Aí só pode haver renda diferencial.

"Uma vez que o preço, tanto dos metais nobres quanto das pedras pre·
dosas, é detenninado no mundo inteiro pelo respectivo preço na mi·
na mais produtiva, a renda que uma mina pode dar ao proprietário é
proporcional não a sua riqueza absoluta e sim à chamada riq\1eza rela-
tiva ou à ~11perioridade dela em relação às outras minas da mesma es-
pécie. Se forem descobertas novas minas tão superiores às de Potosi
quanto estas eram superiores às da Europa, o valor da pra.ta pode ser
degradado a ponto de não compensar mesmo a exploração das minas
de Potosi" (1, p. 362).

Os produtos das minas de metais preciosos menos produtivas não


proporcionam rendà, porque a mina mais produtiva sempre determina o
valor de mercado e sempre se abrem novas minas mais ricas, numa seqüên-
cia em ascensão constante. São portanto vendidas abaixo do valor, apenas
pelo preço de custo.

"A abundância. tem de aviltar um produto cujo valor decorre sobretudo


da escassez.'' (1, p. 363).

O raciocínio de Smith reincide então em erro relativo.

"A coisa é diferente em propriedade na superfície da terra. O valor de


seu produto e da renda correspondem a sua fe1tilldade absoluta e não
à relarfra. O solo que p1oduz certa quantidade de alimentos, vestuário
e alojamento pode sempre alimentar, vestir e abrigac eerto número de
pessoas; a proporção do dono da terra, qualquer que seja" (o p1oblema

795
é }ustamente saber se ele participa ou não do produto e em que pro-
porção), "da.r-Ihe-á sempre comando correspondente do trabalho da-
quelas pessoas e das mereadodas que esse trabalho lhe pode suprir"
(l, pp. 363, 364).
"O valor das terras .p.ouoo férteis não se reduz com a vmnhança das
mais férteis. Ao contrário, acre$ce com ela. O grande número de pessoas
sustentadas pelas terras fecundas proporciona, a muitot produtos da
terra pouco fértil, mercado que esta nunca teria encontrado nas peswas
que pode sustentar com a própria prnduçlo."

(Mas só quando não produz o mesmo produto das terras férteis da


vizinhança; só quando o produto das terras pouco férteis não conco"e
com o das terras mais férteís. Neste caso Smith tem razão, e isso é im-
portante sem dúvida para a maneira oomo o total da renda das diferentes
espécies de produtos naturais pode aumentar em conseqüência da fertiJ.i.
dade das terras que fornecem alimentos.)

"Tudo o que aumenta a fertilidade do oolo para produzir alimentos


não só ae1esce o valor da terra onde se aplica a melhoria" (pode redu-
zir esse valor e mesmo destruí-lo), "mas contribui por igual para aumen-
tar o valor de muitas outias tertas, ao se criar novai procurai para seus
produtos" ou, ante:J, ao se .criar também a procura de novos produtos
(l, p. 364).

Em tudo isso, o que Smith não explica é a renda absoluta, cuja exis-
tência admite para terra que produz alimentos. Com razão obs~rva não ser
mister que ela exista para outras terras, para minas, por exeµiplo, pois sua
disponibilidade relativa é sempre tão ilirrutada (eill face da procura) que a
propriedade aí não pode opor resistência ao capital, nã0 tem existência
econômica, embora tenha a legal.
(Ver p. 641 m sobre a renda de imóveis.)

Ver p. 632. 113 Sobre renda de imóveis diz A. Smith:

"Do aluguel todo de uma ca~a, a parte que ultrapassl11' esse lucro ra·
z.oável" (do construtor) "pertence naturalmente à renda fundiária e es·
ta, quando o dono d.a tena e o dono da casa são duas pessoas díferen·
tes, é totalmente paga ao primeiro, na maioria dos casos. Em casas de

112. Página do manuscrito.


113. Página do manusc1ito.

796
campo, a certa distância de alguma g.rande cidade e onde há bastante
disponibilidade de terra, essa renda fundiária tem significação ínfima
ou não é mais do que a que proporcionaria o solo que a casa ocupa se
fosse empreg11do na agticultuta (l,V, cap. li).

Para a renda fundiária referente a casas, o fator decisivo da renda di-


ferencial é a situação, como a fertilidade (e a situação) o é para a renda
agrícola.
A. Smith se enfileira com os fisiocratas na predileção pela agricultura
e pelo dono da terra e ainda na concepção de que ambos são objetos espe·
cialmente apropriados para tributação. Diz:

"Ambas, a renda fundiária considerada e a renda ordinária da terra são


uma espécie de renda (revenue) que o proprietário em muitos casos
frui sem o menor esforço ou cuidado. Mesmo que dele se tome parte
dessa renda {revenue} para pagar as despesa.s do Estado, não se desesti-
mula por isso gênero algum de atívíd;ide. O produto anual da terra e
do trabalho da :sociedade, a rlquez;i 1eal e a renda (revenue} da grande
massa do povo podem ser os mesmos antes e depois dessa tdbutação.
Aquela renda fundiária e a renda ordinária da terra são por isso talvez
as espécies de renda frevtmue) iue podem suportar melho1 uma tr.ibu-
tação específica" (1. v. cap. 11 ). 4

Ricardo opõe a isso (p. 230) reparos de filisteu. 115

4. Análise Smithiana das variações dos preços dos


produtos da terra.

"Seção terceira. Das vanaç.oes na proIXJrçâo entre os respectivos


valores da espécie de produto que sempre dá renda e da espécie que dá
renda às vezes" etc. (1.V, vol. II, cap. XI).

"Num país de tena fértil por naturez.a mas totalmente inculta na maior
parte gado, aves, caça de toda espécie etc. só compl'Qráo ou comanda-
rão quontidade dimínuto de trabalho, pois podem ser
obtidos com
quantidade diminuta" (Il, p. 25).

114. As duas últimas citações de Smith .nesta seção ti.rou-<ts Mwc não da tradução
francesa de Garnier, mas das pp. 227, 229 e 230 da obra de RícanJohinciplesofpo·
litÍca! ecoPWmy, 311 ed., Londres, 1821.
115. Mm refere-se aí a reparos feitos por Ricardo na p. 230 de sua obra Principies
of political economy, Jíl ed., Londres, 1821.

797
A maneira singular como Smith baralha a· medida cio valor pela quan-
tidade de trabalho, com o preço do trabalho ou com a quantidade de tra-
balho que uma mercadoria pode comandar, patenteia-se na passagem aci·
ma e sobretudo na seguinte que nos mostra como ele chegou a promover
ocasionalmente o trigo a medida do valor.

"Em todo estado da sociedade, em todo nível do desenvolvimento, o


trigo é produto da indústria humana_ Mas, o produto médio de toda
espécie de atividade sempre- se ajusta, com mai01 ou menor exatidão,
ao consumo médío; a oferta média, à procura média. Ademais, em ca·
da estádio particular do desen110lvimento, a produção de quantidades
iguais de trigo no mesmo solo e no mesmo clima exigirá em média quan~
tidades de trabalho quase iguais ou, o que dá no mesmo, o preço ·ae
quantidades quase iguai$, pois a a.<.eensão continua das forças 'produtt-
vas do trabalho, num estado adiantado de cultivo, é mais ou menos
compensada pelo acréscimo continuo do preço do galÍJ;>, inru-umento
principal dà agricultura. Por todas essas razões podemos estar eertos
que, em qualquei estado da sociedade, em qualquer nível do desenvol·
vímento, quantidade1 iguais de trígo configurarão quantidades íguais
de trabalho de maneira mais preci.~a - ou lhes serão equivalentes - do
que quantidades iguais de qualquer outra espécie de produto prímário.
Por conseguinte, nos diferentes níveis da riqueza e do desenvolvimen·
to, o trigo é medida do valor mais exata que qualquer outra mercado-
ria ou oonjunto de mercadorias. Ademais, trigo, ou o que quer que
seja o alimento vegetal comum e preferido do povo, cori&titui em to-
do país civilizado a porte principal do sustento do trabalhador... O
preço em dinheiro do txabalho, por isso. depende muito mais do pre·
ço médio do trigo - o sustento do trabalhador - que _do da carne ou
de qualque1 outra espécie de pwduto primário. Por isso,_,o' valor real
do ouro e da prata, a quantidade 1eal de trabalho qué eles-podem com-
prar ou comandar depende muito mal~ da quantidade de trigo que po-
dem oomprar ou comandar, que da quantidade dé carne ou de qual-
quer outra espécíe de produto primário" (11, Pp. 26-28).

Ao comparar o valor do ouro e o da prata, Smith volta a expor sua


idéia do preço suficiente e observa de maneira explícita que este exclui
a renda:

"Pode-se dizer que uma mercadoria é CQ/'Q ou barata conforme seja alto
ou baixo o preço abwluto normal, e também c0nfonne esse preço es-
teja mais ou menos acima do preço mais baixo a que é possível levá·la
ao mercado durante um prazo prolongado. Esse preço mais baixo é o
que só basta para repor, acrescido de lucro moderado, o capital que é mis-
ter empregar para levar a mercadoria até lá. E o-pieço que nada propor·
clona ao proprietário da terra; a renda não é parte componente desse
preço, por completo reduzido a salário e lucro~· (li, p. 8l).
"O preço dos diamantes e de outras pedras preciosas, talvez ainda maís
que o próprio preço do ouro, aproxima-se do preço mais baixo a que é
po5Sível levá-los ao mercado" (lI, p. 83).

798
Há (vol. li, p. 89) 3 classes de produtos primários. A primeira, cujo
acréscimo é quase ou por completo independente da indústria humana; a
segwula, que pode aumentar em função da procura; a terceira, sobre cujo
acréscimo a indústria "exerce efeito apenas limitado qu incerto" .
.Primeira dasse: peixes, pássaros raros, diferentes espécies de caça,
aves selvagens, em particular as de arribação etc, A procura deles aumenta
muito com a riqueza e o luxo.

"Uma vez que a quantidade dessas mercadorias permanece a mesma ou


quase, enquanto acresce de contínuo a competição para comprá-las, seu
preço pode atingir qualquer grau de extravagância" (li, p. 91),
Segunda classe: "Consiste nas plantas e anímaís úteis que a natureza
produ:i:-nos países sem cultivo agrícola, com tanta abundância que têm
valor reduzido ou nulo e com o avanço da agricultura são por esta força.-
das a ceder lugar a produtos ma.is lucrativos. Durante longo período de
melhoramentos contínuos há redução eanstante da quantidade daquelas
plantas e animais, mas ao mesmo tempo cresce de contínuo ~11a procura.
Seu valor real, a quantidade efetiva de trabalho que podem comprar ou
comandar, tem portanto ascensão gradual até atingir por fim nível Ião
alto que os toma tão lucrativos como qualquei outro produto que a
indústria humana possa obter na terra mais fértil e melhor cultivada.
Atingido esse nível, não é fácil continuar a ascensão. Se isso oconer, mais
terra e mais trabalho serão de imediato empregados para aumentar a
quantidade deles" (U, pp. 94, 95). E o caso, por exemplo, do gado.
"De todos os diferentes artigos que compõem essa segunda espécie de
produtos primários, o gado é talvez o prímeiro a alcançar preço naque-
le nível, no decurso do desenvolvimento" (U, pp. 96, 97). "Assim como
o gado figura entre os primeiros artigos que pioporcionam esse preço"
(isto é, o p1eço pelo qual vale a pena cultivar o solo para alimentá-lo),
"a caça grossa está entre os últimos. O preço da carne dessa caça - por
mais alto que pareça - está longe de bastil! para cobrir os custos de
um parqtie de__ veados. :e o que sabem muito bem todos os que têm al·
guma experiêneia de alimentar esses animais selvagens" (Il, p. 104).
"Em toda fazenda, os resíduos dos celeíros e estábulos sustentam de·
tenninado número de aves. Estas, alimentadas com o que de outro mo-
do se perderia, constituem simples meio de se aproveitar tudo. E como
quase nada custam ao arrendatário, pode este vendê-las muito barato.
"Enquanto essa oferta é suficiente, as aves são tão baratas quanto a car-
ne de vaca. Com a riqueza aumenta a procura, e em conseqüência o pre-
ço da~ aves se eleva acima do preço da carne de vaca, até que "se torna
rentável cultivar a terra para alimentá-las". :t'. o que se dá na França etc.
(II, pp. 105, 106).
Sutnos, corno aves, "mantidos de início para se aproveitat tudo". Vi·
vem de restos. O preço por fim sobe até se tfll: de cultivar adrede teua
para alimentá-los (II, pp. 108, 109).
Leite, indústria leiteira (II, pp. 110 e seguintes) (manteiga, queijo, ibi-
dem).

799
Segundo Smith, a ascensão progressiva do preço desses produtos pri·
mários apenas demonstra que se tornam gradualmente produtos da indús"
tria humana, quando antes não passavam de produtos naturais. A transfor-
mação mesma de produtos naturais em produtos da indústria humana re-
sulta do desenvolvimento da agricultura, que subtrai cada vez mais o espa-
ço dos produtos espontâneos da natureza. Ademais, nas condições de pro·
dução menos desenvolvidas, grande parte desses produtos se tem vendido
abaixo do valor. Esses artigos se vendem por seu valor (daí a alta de preços)
logo que de produto acessório se convertem em produto autônomo de um
ramo qualquer da agricultura.

"É claro que as terras de um país nunca serão por inteiro cultivadas
e melhoradas enquanto o preço de todos os produtos - que a indústria
humana é compelida a obter nelas - não tiver subido a ponto de pagar
os custos de melhoramento e cultivo completos. Para se chegar a isso,
é mister que o preço de cada produto particular baste, primeiro, para
pagar a renda de boa terra de trigo, pois é ela que determina a renda
da maior parte da restante terra cultivada, e, segundo, para pagar o tra·
balho e despesas do arrendatário, como são em regra indenizados em
boa terra de trigo, ou seja, para repor, acrescido do lucro ordinário, o
capital por ele empregado. Essa alta do preço de cada produto parti·
cular tem sem dúvida de' preceder o melhoramento e o cultivo da ter-
ra destinada a produzi-lo... Essas diferentes espécies de, produtos pri·
mários valem quantidades maiores que as anteriores, tanto de prata co-
mo de trabalho e de meios de subsistência. Uma vez que levd-las ao mer-
cado custa quantidade maior de trabalho e de meios de subsistência,
ao chegarem ld, representam quantidade maior ou lhe são equivalen·
tes" (11, pp. 113-115).

Vê-se de novo aí que Smith só pode utilizar o valor - determinado


pela quantidade de trabalho que pode comprar -, confundindo-o com
o valor determinado pela quantidade de trabalho exigida para produzir
as mercadorias.
Terceira classe: refere-se aos produtos primários
"para cujo acréscimo a eficácia da indústria· humana ou é limitada ou
ineerta" (II, p. 115).

Lã e peles são limitadas pela quantidade de gado graúdo e miúdo que


se cria. Mas esses subprodutos já contam com grande mercado, o que ainda
não existe para o próprio gado. A carne de vaca se limita quase sempre ao
mercado interno. A lã e as peles cruas, mesmo nos começos desordenados,
já dispõem em regra de mercados estrangeiros. São fáceis de transportar
e constituem matéria-prima para muitos artigos manufaturados. Já podem

800
assim contar com mercado em países mais desenvolvidos no domínio indus-
trial, embora a indústria nativa ainda não precise delas.

"Em países de agricultura atrasada e por isso de população escassa, o


preço da lã e das peles representa sempre, em relação ao do animal to-
do, proporção muito maior que nos países onde, em virtude de desen-
volvimento e população em nível mais avançado, domina procura maior
de carne." O mesmo se aplica ao "sebo". Com o crescimento da indús-
tria e da população, a alta do preço do gado incide mais sobre o corpo
do que sobre a lã e pele. f. que, com o crescimento da indústria e da
população de um país, se expande o mercado de carne, enquanto o de
subprodutos já se estendia antes além das fronteiras. Mas, com o desen-
volvimento da indústria indígena, haverá alguma alta no preço da lã
(II, pp. 115-119).
Peixes (II, pp. 129, l'.30). Se a procura de peixe sobe, a oferta corres-
pondente exigirá mais trabalho. "O peixe em regra terá de ser captura-
do a distância maior, terão de ser empregados barcos maiores e utiliza-
da maquinaria mais dispendiosa de toda espécie." "Será em regra im-
possível suprir o mercado ampliado sem empregar quantidade de tra-
balho" maior que a "que antes bastava para abastecê-lo''. "Em conse-
qüência, o preço real dessa mercadoria sobe naturalmente ao prosse-
gUír o desenvolvimento" (II, p. 130).

Assim, Smith detennina aí o preço real pela quantidade de trabalho


necessária para produzir a mercadoria.
No decurso da civilização, segundo Smith, o preço real do alimento
vegetal (trigo etc.) tem de cair.

"A expansão dos melhoramentos e do cultivo da terra, urna vez que


necessariamente eleva mais ou menos, em relação ao preço do trigo,
os preços de toda espécie de alimento animal, rebaixa necessariamen-
te, creio, ·o preço de todo alimento vegetaL Eleva o preço dos alimen-
tos de origem animal, porque grande p:µte das terras que os produzem,
tomada apta para o cultivo do trigo, tem de proporcionar ao senhorio e
ao arrendatário a renda e o lucro das terras de trigo. Rebaixa o preço
do alimento vegetal porque aumenta sua abundância ao acrescer a fer·
ti/idade da terra. Os melhoramentos da agricultura ainda introduzem
muitas espécies de alimento vegetal que, exigindo menos terra e não
mais trabalho que trigo, chegam ao mercado muito mais baratas. f. o
caso da batata e do milho... Além disso, muitos alimentos vegetais no
estádio primitivo da agricultura estão confinados a hortas e são culti-
vados apenas com enxada; no estádio desenvolvido incorporam-se à
agricultura geral e são cultivados com o emprego de arado, eomo é o
caso de nabos, cenouras, couve etc." (11, pp. 145, 146) (1.I, cap. XI).

Smith vê que os preços das mercadorias manufaturadas caíram em


geral onde quer que

801
"o pleço real das matérias-primas nio subiu de todo ou não teve ascen-
são extrema" (l.c,, II, p. 149).
Em contrapartida, afirma que o preço real do trabalho, isto é, o sa-
lário, tem subido com o progresso da produção. Por isso, também segun-
do ele, os preços das mercadorias· não sobem necessariamente por subir o
salário ou o preço do trabalho, embora o salário seja "parte constitutiva
do preço natural" e mesmo do "preço suficiente" ou "do preço mais bai-
xo a que as mercadorias podem ser levadas ao mercado". E como explica
ele isso? Pela queda do lucro? Não. Ou da renda? Tampouco. (Embora
admita a queda :ia taxa geral de lucro com o avanço da civilização.) Diz:
"Em vnude de melhores máquínas, de maior destteza e de divisão e
distric· .ição do trabalho maís adequadas - tudo isso efeitos naturais
do progresso -:- torna-se muito menor a quantidade de trabalho neces-
sária paxa produzir qualquer peça porticuku. Embora o preço real do
trabalho experimente ascensão conside.rável por força das condíções
florescentes da sociedade, a grande redução da quantidade de trabalho
mais do que compen11aiá em ge1a1 a maio1 alta possível desse preço"
OI, p. 148).
Assim, o valor das rnercadoáas diminui por cair a quantidade de
trabalho necessária para produzi-Ias, e diminuí apesar de subir o preço re.al
do trabalho. Se ai se entende por preço real do trabalho o valor do traba·
lho, o lucro terá de cair se o preço da mercadoria baixar por lhe diminuir
o valor. Em contrapartida, se por tal se entender a soma dos meios de sub-
s.ístência recebidos pelo trabalhador, está certa a proposição.. de Smith,
mesmo quando o lucro sobe. .
Até onde Smith faz uso da deimição correta de valor, toda vez que
analisa realmente os fatos, evidencia-se ainda no tmal do capítulo, quando
pesquisa a razão por que oo panos de lã eram mais caros no século XVI etc.

"Custava quantidade maior de trabalho leitor 11 mercadoria ao mercado.


Era mister por isso que, chegando Já, comprasse elá quantidade maiox
de trabalho, ou se trocllSSe pelo oonespondente preço" (II, p. 156).

O erro aí somente na palavra preço.

·s. Idéias de Smith sobre o movimento da renda (Rent)


e s~a. avaliação dos interesses das diferentes classes
sociais.
Conclusão do capitula. A. Smith encerra o capítulo observando que:

"toda melhoria das c.ondições da sot.'iedade tende direta ou induetamen·


te a aumentar a renda fundíái:la real" (Il, pp. 157, 158). "A expansão
dos melhoramentos e do cultivo do sólo leva a acréscimo dileto da renda.
A cota do dono da terra no produto acresce necessariamente com o au-

802
mento deste" (II, p. 158). A alta "do preço real de detenninados produ·
tos primários, a qual de início resulta de se terem arnpliado os melhora-
mentos e o cultivo do solo e mais tatde é a causa que ainda os amplia
mais", por exemplo, a alta do preço do gado, primeiro eleva o valor
real da cota do dono da terra, e ainda a proporção dessa cota, poís
"obter-te esse produto, após se ter elevado o,preço real, não exige mais
trabalho que antes. Por isso, menor quantídade dele basta para repor
o capital que emprega etse trabalho, acrescido do lucro U$Ual. Em oon-
seq Liéncia, proporção maiox tem de pextencer ao proprletá.río" (li, pp.
158, 159).

Esta é a rigor a maneira como Ricardo explica a alta da proporção da


renda ao subir o preço para o trigo nas terras mais férteis. Só que essa alta
não decorre de melhoramentos; daí chegar Ricardo a conclusão oposta à
de Smith.
Além disso, diz Smith que ao proprietário aproveita todo desenvol-
vimento da produtívidade do trabalho na manufatura.

"Tudo o que redu:i: o preço real destes 116 eleva o preço daqueles 117 "
(ll, p. 159). Ademais, com todo acréscimo da riqueza real da sociedade
aumenta a população; com a população expande-se a procura dos pro-
dutos agrícolas, em conseqüência, o capital empregado na agricultura,
"e a renda acresce com o produto" (l.c.). Ao revés, atuam no sentido
de diminuir a renda e, por conseguinte, de redu:z:.ír a riqueza dos donos
das terras todas as círcunstâncías opostas que impedem o desenvolvi·
mento da riqueza geral (Lc., p. 160).

Daí concluir Smith que o interesse dos donos das terras (proprietários)
está sempre em harmonia com o "ínteresse geral da sociedade". Estende is-
so aos trabalhadores (II, pp. I 61, 162). Mas não falta a Smith a honestidade
para fazer esta distinção:

"A classe dos proprietáxios pode talvez ganhar mais com a prosperidade
da sociedade que a dos ttabalhadores; mas não há classe que sofra tão
cruelmente com o declínio da sociedade como a trabiilltadôta" (1.c.,
p. 162).

Em contrapartida, os interesses dos capitalistas (manufatores e comer·


ciantes) não são idênticos ao

"interesse geral da sociedade" (l.c., p. 163). "O interesse dos que transa·
cionam em qualquer ramo comercial ou manufatureíro, em certos aspec-
tos, sempre difere do interesse público e lhe é mesmo oposto" (U, pp.

116. lsto é, dos produtos manufaturados.


117. Isto é, dos produtos agrícolas.

803
164, 165). " ... uma classe cujo interesse nunca é a rigor o mesmo da co-
munidade. Em geral tem eJa em mira lograr e até oprimir o públiro, lo-
gro e opressão que tem exercido cm muitas ocasiões" (li, p. 165).118

118. Segue no manuscrito seção em que Man analisa o que Ricardo díz da pró-
pria concepção de renda. Es~a seção, separ.ida por um traçe do tc:tto precedente,
eomplement11. os capítulos em que Marx estuda a teoria da renda de Ricardo. Pelo
conteúdo pei:tence ao capítulo XIII, onde foi incluída (ver neste volume pp. 745 e 746).
Logo depois dela vem entre parênteses um complemento da análise da teoria
J'icardiana dos preyos de custo, análise apresentada no capítulo X. O complemento
figura por isso no mesmo capítulo (ver neste volume p. 646).

804
Capítulo XV
Teoria da mais-valia de Ricardo

A. Lucro e renda segundo Ricardo

1. Ricardo confunde as leis da mais·valia com as


leis do lucro.
Nenhures considera Ricardo a mais-valia à parte e em separado de suas
formas particulares - lucro (juro) e renda. Por isso, as observações que fez
referentes à composição orgânica do capital, a qual é de importância tão
decisiva, limitam-se às diferenças na composição orgânica legadas por A.
Smith (a tem dízer, pelos fisiocratas): as oriundas do processo de circula-
ção. Nenhures menciona ou distingue as diferenças de composição orgâ-
nica dentro do processo real de produção. Daí sua confusão de valor com
preço de custo, a falsa teoria da renda, as falsas leis sobre as causas da as-
censão e queda da taxa de lucro etc.
Lucro e mais-valia só são idênticos quando o capital adiantado é idên-
tico ao capital diretamente despendido em salário. (Aí não se leva em con-
ta a renda, uma vez que o capitalista, de início, se apropria da mais-valia
inteíra, e não importa que porções dela tenha de transferir a consórcios.
Aliás, o próprio Ricardo considera a renda parte destacada, saída do lucrn.)
Em suas observações sobre lucro e salário Ricardo abstrai da parte cons·
tante do capital, a qual não se aplica em salário. Trata o problema como
se o capital todo se empregasse diretamente em salário. Até aí trata por·
tanto da nu1is-valin e não do lucro, e assim pode-se falar de sua teoria da

805
mais-valia. Mas, em contrapartida, acredita falar do lucro como tal, e sem-
pre se insinuam na realidade pontos de vista oriundos do pressuposto do
lucro e não da mais-valia. Onde apresenta com acerto as leis da mais-valia;
erra ao expressâ-Jas de imediato como leis do lucro. Ademais, procura es-
tabelecer, como leis da mais-valia, as leis do lucro de imediato, sem os elos
intermediários.
Quando tratamos de sua teoria da mais-valia, estamos falando por-
tanto de sua teoria do lucro nos casos em que ele confunde este com a
mais-valia, isto é, só considera o lucro em relação ao capital variável, à par·
te do capital empregada em salârio. Ocupar-nos-emos depois do que ele
diz do lucro como elemento dístinto da mais-valia.
A circunstância de a mais-valia só poder ser tratada em relação ao
capital variável, o capital diretamente empregado em salário, insere-se tan-
to na natureza da questão ~ e sem se conhecer a mais-valia é impossível
teoria do lucro - que Ricardo trata o capital todo como capital variável
e abstrai do capital constante, embora este apareça em certas ocasiões na
forma dé adiantamentos.
Ricardo (cap. XXVI, On Grossand Net Revenue) fala de:

"1amos onde os lucros são proporcionais ao Cllpital e não à quantidade


de trabalho empregada" {On the principies.•. , 3!l ed., p. 418).

Que significa toda a sua teoria do lucro médio (em :que repousa sua
teoria da renda), se não que os lucros "são proporcionais ao capital e não
à quantidade de trabalhb empregada" Se fossem "pro~rcionais à quanti-
dade de traqalho apJicada", capitais iguais dariam lucros muito desiguais,
porque o lucro seria igual à mais-valia produzida no próprio ramo, e essa
depende não da magnitude do capital em geral e sim da grandeza do capi-
tal variável, igual à quantidade de trabalho empregada. Que sentido tem
ª
então atribuir a um emprego partieular de capital, .. ramos especiais, em
caráter de exceção, a propriedade de os lucros serem neles proporcionais
ao montante de capital e não à quantidade de trabalho empregada? Dada
a taxa de mais-valia, o montante de mais-valia de determinado capital sem-
pre tem de depender não da magnitude absoluta do capital e sim da quan-
tidade de trabalho empregado. Em contrapartida, dada a taxa média de
lucro, o montante de lucro tem de depender sempre- do montante do ca-
pital empregado e não da quantidade de trabalho aplicado. Ricardo fala
expressamente de atividades cómo o
"transporte marítimo, comércio ultramarino e os ramos que exigem
maquinaria dispendiosa" (l.c., p. 418).

806
Isto é, fala de ramos que empregam relativamente muito capital
constante e pouco capital variável. Ao mesmo tempo são ramos onde o
nwntante global de capital adiantado é grande em relação aos demais, ou
que só podem ser explorados por grandes capitais, Dada a taxa de lucro,
o montante de lucro depende precisamente da magnitude dos capitais
adiantados. Mas isso absolutamente não distingue os ramos onde se aplicam
vultosos capitais e muito capital constante (andam sempre juntos), dos
ramos onde se empregam pequenos capitais, e é mera _aplicação do prlncí·
pio - capitais iguais dão lucros iguais; assim, capital maior dá mais lucro
que capital menor. Isso nada tem a ver com a "quantidade de trabalho
empregada". Mas a circunstância de a taxa de lucro em geral ser grande
ou pequena depende na verdade da quantidade total de trabalho emprega-
do pelo capital da classe capitalista toda e da quantidade proporcional de
trabalho não pago empregado; e por fim da proporção entre o capital em-
pregado em trabalho e o capital apenas reproduzido como condição da
produção.
Rícardo se opõe ao ponto de vista smithiano, de taxa de lucro mais
alta do comércio exterior, de

'"os grandes lucros obtídos às vezes por certos comerciantes no inter·


câmbio externo elevarem a taxa geral de lucro no país" (1.C., cap. Vil,
On Foreiéz frade, p. 132).

Diz:

"afinnam que a igualdade dos lucros será estabelecida pela alta ge.ral
~doslucros; sou de opinião que os lucros do ramo favorecido baixarão
com rapidez ao nível geral" (pp. 132, 133).

Mais tarde veremos até onde está certa sua idéia de lucros excepcio-
nais (que não decorram da elevação do preço de mercado acima do valor),
apesw do nivelamento, 11ão elevarem a taxa geral de lucro, e também até
onde é válida sua idéia de o comércio exterior e a expansão do mercado
não poderem elevar a taxa de lucro. u 9 Mas, admitido o acerto dessas
idéias, sobre.tudo a "igualdade dos lucros", como pode ele distinguir ra,
mos "onde os lucros são proporcionais ao e.apitar: de outros onde são
"proporcionais à quantidade de trabalho empregado"?
No Cap. XXVI, ''On Gross and Net Revenue", diz Ricardo:

119. Ver neste volume pp. 866-868 e 905.

807
"Admito que, em virtude da natureza da renda, dado capital empre-
gado na agricultura, em qualquer terreno exceto o cultivado por últi·
mo, põe em movimento quantidade maior de trabalho que capital igual
aplicado em manufatura ou Comércio" (l.c., p. 419).

A frase inteira é disparate. Primeiro, no último terreno cultivado


emprega-se, segundo Ricardo, quantidade maior de trabalho que em to-
das as demais terras. Daí provém, segundo ele, a renda nas demais terras.
Como pode então dado capital em qualquer terra exceto a última culti-
vada pôr em movimento mais trabalho do que na manufatura ou comér-
cio? A circunstância de o produto das melhores terras ter valor de mer-
cadi:J superior ao valor individual, determínado pela quantidade de trabalho
empregada pelo capital qué os cultiva, não é por certo idêntica à circunstân·
eia de esse capital "põr em movimento quantidade maior de trabalho que
capital igual empregado em manufatura ou comércio". Mas Ricardo teria
sem dú\'ida acertado se tivesse dito que, se abstraímos das diferenças na
fertilidade das terras, a renda em geral decorre de o capital da agricultu-
ra pôr em movimento, em relação à parte constante do capital, quantida·
de maior de trabalho que o capital médio na indústria não agrícola.
Ricardo não considera que, se é dada a mais-valia, há fatores que
podem elevar ou rebaixar a taxa de lucro e em geral nela influir. Uma vez
que ídentifica a mais-valia com o lucro, quer demonstrar, por coerência,
que alta e queda da taxa de lucro são determinadas apenas por circunstân-
cias que fazem a taxa de mais-valia subir ou cair. Além. disso, não leva
em conta que - fora as circunstâncias que, para dado montante de· mais-
valia, influem na taxa de lucro, mas não no montante de lucro, - a taxa
de lucro depende do montante de mais-valia e nunca da taxa de mais-val"ia.
Dada a taxa de mais-valia, de trabalho ex.cedente, o montante de mais-
vaJia depende da composição orgânica do capital, isto é, do número de
trabalhadores empregados por um capital de valor dado, de 100 libras por
exemplo. Dada a composição orgânica do capital, depende da taxa de
mais-valia, E detecmlnado assim por ambos os fatores: o número de tra-
balhadores ao mesmo tempo empregados e a taxa de trabalho exceden-
te. Se acresce o capital, qualquer que seja a composição orgânica, desde
que invariável apesar do acréscimo, acresce também o montante de mais-
valia. Mas isso em nada modifica a circunstância de esse montante per-
manecer o mesmo para um capital de valor dado, 100 por exemplo. Se
aí é 10, será 100 para 1 000 libras, e por isso não se altera a proporção.

808
Riairdo:

"Não pode haver no mesmo ramo de produção duas ttlxas de lucro, e


por isso, quando difere a proporção do valor do produto com o capi-
tal, é a renda que seri diferente e não· o lucro" (cap. XII, "l..tJnd Tax·:
pp. 212, 213).

lsso vale apenas para a taxa normal de lucro "no mesmo ramo de
produção". Do contrário, estaria em contradição direta com a citação an·
terior 120 :

"O valor de troca de todas as mercadorias, sejam elas produtos da in-


dústria, da mineraçiío ou da tem, nio é regulado pela menor quantida-
de de trabalho que bastará para pioduzi·las em circunstâncias muito
favoráveis desfrutadas apenas pelos que têm facllidades peculiares de
produção; é sempre regulado pela quantidide de trabalho que tem de
ser empregada para produzi-las por aqueles que não dispõem de tais
facilidades; por aqueles que continuam a produzi-las nas condíções mais
desfavoráveis; que:r dízer, nas condições mais deifal!Ordveis necessários
para que se le11e a cabo a produçfio que atín/a a quantidade requerida
dó produto" (cap. ll "On Rent", pp. 60, 61 ).

No capítulo Xll, "Land Tax", Ricardo diz de passagem contra Say


(o que evidencia que os ingleses têm sempre uma percepção aguda dos
matizes econômicos, constantemente negligenciados pelos europeus do
continente):

"Say supõe que 'um p:roprietário de tena por meio de sua a:rriduitJa.
de, parcimôrria e habilidade aumenta sua renda anual de 5 000 francos'.
Mas um pxoprietário de teua não tem possibilidade de empregar sua
ass.W.uidade, parcimônia e habilidade na tena, a menos que a cultive.
E então melhoia a tena na qualidade de capitalista e arrendatário e
não na de proprietário. Não é concebível que possa aumentar o pro-
duto de sua cultura por meio de habilidade peculiar" (a "habilidade"
aí cai mais ou menos no vazio), "sem antes aumentar o capital nela
aplicado" (l.c.., p. 209).

No capitulo XIIL "Taxes on Gold", importante para a teoria mone-


tária de Ricardo, apresenta ele alguns acréscimos ou outras definições re·
ferentes a preço de mercado e preço natural. Reduzem-se a que o tempo
para ambos efetivarem o nivelamento depende de o ramo particular de
produção permitir rápido ou lento acréscimo ou de<:réscimo da oferta,

120. Ver neste volume pp. 635, 743 e 744.

809
o que é o mesmo que entrada do capital no ramo em questão ou salda
dele, em ritmo rápido ou lento. Muitos (Sismóncli etc.) criticaram Ricar-
do a propôs.ito de suas observações, por não levar em conta as dillculda·
des para retirar o capital, encontradas pelo arrendatário que emprega· mui-
to capital fixo etc. (E o que demonstra exaustivamente a história da Ingla-
terra de 1815 a 1830.) Essa crítica, embora correta, de modo algum atin-
ge a teorta, deixando-a intacta por inteiro, pois aí se trata apenas da maior
ou menor velocidade em que se efetiva a lei econômica. Mas, a coisa mu-
da radicalmente no tocante à crítica inversa, referente à aplicação de no-
vo capital a novos solos. Ricardo admite que ela pode ocorrer sem inter-
ven~o do dono da terra e que o capital aí opera nu.m domínio onde se
movimenta sem chocar-se com resistêncfas. O erro aí é fundamental. Para
demonstrar tal pressuposto e que assim ocorre onde se tem desenvolvido
a produção capitalista e a propriedade fundiária, supõe sempre Ricardo
casos em que a propriedade fundiária não existe de fato ou na lei e em
que a produção capitalista ainda não se desenvolvel1, pelo menos no pró-
prio campo.
As passagens a que aludimos acima são as seguintes:

"Em todos os casos sucederá,. po1 fim, em conseqüência de tributa·


ção ou de dificuldades de p1oduçio, alta no preço das mercadorias;
mas, a dul'açfio do intervalo que decorre até coincidirem pieço de mer-
cado e preço natural tem de depender da nature.za da mecadoria e
da facflídaik com que se pode reduzir em quantidade. Se nao se pu·
der diminuir a. quantidade da mucadoria tributada, se, ,pór exemplo,
o capital do arrendatário ou do chapeleiro não puder ser. transferido
para outros 1amos, não 1epercutirá a circunstância de· seus luCios serem
comprimidos abaixo do nível geral em virtude de txibutação. Jatrulis
conseguirão elevar o preço de mexcado do t:rígo -·ou de chapéus ao
p.ceço natural acrescido, a não ser que aumente a procura por roas mer-
cadorias. Seu$ avisos de que deixarão as 1espectivas empresas e deslo-
carão os capita.is para ramos mais favorecidos seriam considerados amea-
ças vazias, irrealizáveis, e por isso o preço não se poderia elevar por meio
de produção diminuída. Contudo, mercadorias de todas l i espécies po-
dem ser reduzidas em qualltidade,e capital pode ser removido de ranu:Js
que são menos lut'l'ativos para os l/Ue são ma(s, mas com velocidades
difere11tes. O preço de determinada mexcadoria - após a tributação
ou outro meio ter agravado a dificuldade de p1oduzi-la - subirá com
mais rapidez na. proporção que sua oferta puder ser reduzida com maís
facilidade, sem inconveniente para o p1odutor" (pp. 214, 215).
["A conco1dâncía do preço de mercado com o natuml de todas as mer-
cadorias depende sempre da facilidade com que a oferta pode ser au-
mentada ou diminuída. No caso do ow:o, das construções, do trabalho
e de muitas outras coisas, esse efeito, em certas circunstâncias, não se
pode produzir com rapidez. Mas o caso é diferente com as mercadorias

810
que se consomem e se 1eproduzem todo ano, como chapéus, sapatos,
trigo, tecidos; podem ser reduzidas, se necessário, e não é longa a de-
morn de a oferta se contrair em proporção ao encai:go ac1escido de
produzi-los" (1.c., pp. 220, 221 ).

2. Casos diversos de variação da taxa de lucro.


No mesmo capítulo XIII, '"faxes on Gold", diz Ricardo:

"Renda não é criação e sim mera transferência de riqueza" (1.c., p. 221).

E lucro criação de riqueza ou, ao contrário, traneferêncilJ. do exc.e-


dente de trabalho das mãos do trabalhador para as do capitalista? Também
o salário, na realidade, não é criaçío de riqueza: Mas não é transferência.
E do produto do trabalho a parte de que se apropriam os que- o pro~uzi­
ram. No mesmo capítulo diz Ricardo:

"Um imposto sobre produtos primór{os da superfície da ten:a recai ...


sobre o conwmidor e de maneira alguma tocará na renda, a não ser que,
por diminuir o fundo de sustento do trabalho, baixe o salário, reduza
a população e faça decrescer a procura de trigo" (p. 221).

Não nos interessa aqui saber se Ricardo tem razão ao dizer que "o
imposto sobre produto primário da superfície da terra" não recai sobre o
proprietário ou o arrendatário e sim sobre o consumidor. Mas assevero
que, se ele tem razão, esse imposto pode elevar a renda, embora Ricardo
acredite que tal imposto não a influencie, salvo se, por encarecer os meios
de subsistência etc., diminua o capital etc., a população e a procura de tii-
go. Ricardo irnagí.ria · que encarecimento do produto primário só atinge
a taxa de lucro se passa a encarecer os meios de subsisUnda do trabalha-
dor. E então está certo que encarecimento do produto pri~o só nessa
condição pode influenciar a taxa de mais-valia e por isso a mais-valia, em
conseqühlcia também a taxa de lucro. Mas, supondo-se dada a mais-valia,
encarecímento do ••produto primário da superfície da terra" acresceria o
valor do capital constante em relação ao variável, aumentaria a proporção
do capital constante com o variável e reduziria por is&O a taxa de lucro: ele-
varia portanto a renda. Ricardo parte da idéia de alta ou baixa do produto
primário não influenciar o lucro, contanto que não influencie o salário,
pois, segundo raciocina (excetuada passagem a que voltaremos mais tar-
de),121 a taxa não varia, suba ou caia o valor do capital adiantado. Se
121. Ver neste volume pp. 861-863.

811
acresce em valor o capital adiantado, por deco~rência acresce em valor
o produto, e do produto a parte que constitui o produto excedente, isto
é, lucro; ao revés, se cai o valor do capital adiantado. Isso está certo ape·
nas quando, em virtude do encarecimento da matéria-prima ou de impos-
tos etc., o valor do capital variável e- o do constante variam na mesma. pro·
porção. Nesse caso a taxa não varia, por não ter ocorrido mudança na
composição orgânica do capital. E mesmo então temos de supor - o que
se dá em mudanças efêmeras - que, suba ou caia o preço do produto
prm'.mrio, o salário não varia (ou seja, não varia, suba ou desça, para valor
dado, invariável, seu valor de uso).
Existem as posslbilidades seguintes:
Primeiro, as duas distinções principais:
A. Em virtude de mudança no método de f-"Oduçiio altera-se a pro-
porção entre a massa do capital constante e a do capital variável que são
empregados. Aí não se altera a taxa de mais-valia, suposto ínvariável o sa-
lário (segundo o valor, isto é, segwido o tempo de trabalho que represen-
ta). A mais-valia, porém, se altera quando varia o número dos trabalha-
dores empregados pelo mesmo capital, isto é, quando o capital variável
se modifica. Se o capita! constante decresce relativamente por mudar o
método de produção, cresce a mais-vàlia, em conseqüência, a taxa de Ju-
cro. E vice-versa.
Aqui estamos sempre supondo que fica o mesmo o valqr pro tanto,
para 100, por exemplo, de capital constante e variável.
Nesse caso não é possível que a mudança no método de produção
influencie por igual o capital constante e o variável; assím, ·por exemplo,
que capital constante e capital variável - sem variação no valor - tenham
de acrescer ou decrescer por igual. :e que a queda ou a ascensão tem aí
de depender sempre da variação na produtividade do trabalho. E a dife-
rença - e não a ínfluência igual - que efetua mudança no método de
produção; o que, suposta a composição orgânica do capital, nada tem a
ver com a circunstância de se ter de aplicar montante grande ou peque-
no de capital.
B. Inalterável o método de produção. Mudança na. proporção do
capital constante com o variável, invariáveis as respectivas massas relati-
vas (de modo a continuar cada um deles constituindo a mesma parte alí-'
quota do capital total), ocorrida em virtude da variação do valo:r das mer·
cadorias que entram no capital constante ou no varíáveL
Ocorrências aí possíveis:
1. O valor do capital constante contínua o mesmo, o do capital va-
variável sobe ou desce. Isso influenciará sempre a mais-valia e em conse-
qüência a taxa de lucro.
812
2. O valor do capital variável permanece o mesmo, o do capital cons-
tante sobe ou desce. Então a taxa: de lucro cairá com a subida e subirá
com a descida do capital constante.
3. Se ambos caem ao mesmo tempo, mas em proporção diversa, um
sempre terá subido ou caído em relação ao outro.
4. O valor do capital constante e o do capital variável são influen.
ciados por igual, isto é, ambos sobem ou ambos caem. Se ambos sobem,
a taxa de lucro cai, não por subir o capital constante e sim por subir o va.
riável, e assim a mais-valia cai (apenas por subir o valor do variável sobe,
apesar de pôr em r.;ovímento o mesmo número anterior de trabalhadores
ou menos talvez). Se ambos caírem, subirá a taxa de lucro, não por cair
o capital constante e sim por cair o capital variável (em valor) e crescer
em conseqüência a mais-valia.
e.Mudança no método de produção e no valor dos elementos que
compõem o capital constante e o capital variável. Uma mudança aí pode
anular a outra, quando, por exemplo, a massa do capital constante aumen-
ta, enquanto seu valor diminui ou fica o mesmo (isto é, diminuí pro tanto,
para 100), ou quando sua massa diminui, mas seu valor sobe na mesma
proporção ou fica o mesmo (ísto é, sobe [JrO tanto). Não ocorreria então
mudança alguma na composição orgânica. A taxa de lucro ficaria inalte·
rada. Excetuado o capital agrícola, nunca pode suceder que a massa do
capital constante diminua em relação ao variável, enquanto seu valor aumenta.
A anulação considerada é impossível para capital variável ( enquan-
to o salário real permanecer inalterado).
Excetuado esse úníco caso, só é possível portanto que valor e mas-
sa do capital constante simultaneamente diminuam ou aumentem em re.
lação ao capital variável, que seu valor por isso tenha acréscimo ou de-
créscimo absoluto em confronto com o capital variável. Caso esse já exa-
minado. O acréscimo ou decréscimo simultâneo deles, em proporção dí·
ferente, sempre se reduz, segundo o pressuposto, a aumento ou redução
do valor do capital constante em relação ao do capital variável.
Isso abrange ainda o outro caso, pois, se aumenta a massa do capi·
tal constante, a do capital variá11el diminuí relativamente, e ..ice-versa. O
mesmo se estende ao valor.

3. Variações opostas no valor do capital constante e do


capital variável e sua influência na taxa de lucro.
Quanto ao caso C, 640, 122 cabe ainda observar:
O salário poderia subir, o capital constante diminuir de valor e não
de massa. Se houvesse correspondência entre a ascensão e a queda dos
122. Página do manuscrito.

813
dois lados, a taxa de lucro podería ficar inalt~rada. Por exemplo, se o ca·
pital constante for 60 libras, o salário 40 e a taxa de mais-valia 50%, o
produto será 120. A taxa de lucro será 20%. Se o capital constante, sem·
se alterar sua massa, caísse. a 40, o salário se elevasse a 60 e a mais-valia
caísse de 50% para 33 1/3%, o produto seria 120 e a taxa de lucro, 20.
Isso é falso.
De acordo com o pressuposto, o valor global da quantidade de tra-
balho aplicada = 60 libras. Se o salário portanto subisse para 60, a mais-
valia e em conseqüência a taxa de lucro seriam nulas. Se não subisse tan·
to, causaria sempre, em cada ascensão, decréscimo da mais-valia. Se se
elevasse a 50, a rilais-valia seria 10 libras; se fosse 45, a mais-valia seria 15
etc. Em todas as circunstâncias, portanto, a mais-valia e a taxa de lucro
cairiam em igual medida. E que se mede aqui pelo capital total inaltera-
do. Invariável a magnitude do capital (do capital total), a taxa de lucro
tem de subir e cair não com a taxa de mais-valia, mas com o montante
absoluto da mais-valia. Se, no exemplo acima, a fibra de linho caísse tan-
to que 40 libras pudessem comprar quantidade igual à que fiava o mes-
mo número de trabalhadores, teríamos:

'' ('.apitai ('.apitai Maís-valia V::dm: do Capital Taxa de


'
constante variável produto adiantado lucro

1
40 so 10
................
100 90 111/9%
·······················

A taxa de lucro teria caído abaixo de 20%.


Mas admitamos:

Capital Capital Valo1 do Capital Taxa de


constante variável Mais·valía produto adiantado lucro
30 50 10 90 80 12 1/2%

E mais:

Capital '' Capital


' Mais·valla
r Valoi-do l Capital 1 Taxa de
constante variável 1
produto adiantado lucro
!
20 50 10 80 70 14 2/7%
1 1 i

814
Segundo e suposto, a queda do valor do capital constante neutrali·
za sempre, mas só em parte, a alta do valor do capital variável. De acordo
com o suposto, ounca poderá anulá-la de todo, pois para a taxa de lucro
ser 20, 10 teria de ser I/S do capital total adiantado. Mas é o que só pode
ocorrer, para o capital variável = 50, se o capital constante =O. Em con-
trapartida admitamos que o capital variável se eleve apenas a 45; nesse
caso, a mais.-valia é 15. Suponhamos caia o capital constante a 30; nesse
caso temos:

1
Capital Capítal M.ais-valia 1 Va1otdo Capital 1 Taxa de
i
1
constante variável 1
1
1
1
1
produto adiantado lucro
1
1
30 45 1
1
1
15 1
90 75 1
20%

Assim anularam-se aí por completo os dois movimentos.


Admitamos ainda:

Capital Capital Valor do Capital Taxa de


M.aís-valia
constante variável produto adiantado
1 lucro
20 45 15 80 65 23 1/13%
...

Neste caso p0,:t:anto poderá, mesmo com redução da mais-valia, subir


a taxa de lucro, em virtude da queda desproporcionalmente maior do va-
lor do capital constante. Com o mesmo capital de IOO poderao ser em.
pregados mais trabalhadores apesar do salário acrescido e da queda da
taxa de mais-valia. Não obstante a queda dessa taxa, acrescerá a própria
mais-valia e em conseqüência o lucro, por ter cresddo o número de tra-
balliadores. Para dispêndio de capital de 100, a relação acima de 20c com
45v nos dá com efeito as seguintes proporções:

Capital Capital Mais-valia Valor do Capital i Taxa de


constante 1r'llrilÍvel produto adiantado lucro

30 10/13 69 3/13 13 ljl3 123 1/13 100 231/13%


1

815
Toma-se muito importante aí a relação entre a taxa de mais-valia
e o número de trabalhadores. Ricardo nunca atenta para isso.

• * *
Sem dúvida, o que se coilsídera aqui variação na composição orgâni·
ca de um capital pode estender-se por igual à díferença de composi{iio
orgânica de capitais dirJersos, de capitais aplicados em ramos diferentes.
Primeiro:· em vez de variação na composição orgânica de wn capi-
tal, diferença na composição orgânica de mpitais diversos.
Segundo; alteração da composição orgânica por lJt1rilJ1' o valor dos
dois segmentos de' um capital é por igual diferença no wzlof das matérias-
.e
primas maquinaria aplicadas por capitais diversos. Isso não se estende
ao capital variável, pois supõe-se salário igual nos diferentes ramos. Adi-
vergência no valor de diferentes jornadas de trabalho em diferentes ra-
mos nada tem a ver com o problema. Se o trabalho de um ourives é mais
caro que o de um trabalhador comum, também o trabalho excedente da-
quele é mais caro que o deste, na mesma proporção.

4. Em sua teoria do lucro, Ricardo confunde preço de


custO com valor.

No capítulo XV "Taxes on Profits" diz Ricardo:

«Impostos sobre as mercadoxias chamadas em geral de artigos de luxo


só atingem aqueles que as utilizam ... Mas impostos sobre gêneros de
primeira necessidade, muitas vezes, oneram os éonsumidotes desses
bens: não na proporção da quantidade que eles consumam e sim em
p.coporção bem maior." Por exemplo, imposto sobre t.cigo. Esse im-
po~to "altera a taxa de lucto do capital. O que quer que aumente o
salário reduz a taxa de lucto; por isso, todo imposto sobte mercado-
ria consumida pelo trabalk\dor tende a rebaixar a taxa de lucro" (p. 231).

Impostos sobre consumidores são ao mesmo tempo impostos sobre


produtores, desde que o bem tributado entre no consumo individual e ain-
da no consumo industrial ou só neste. Mas isso nao é válido apenas para
gêneros de primeira necessidade, consumidos pelos trabalhadores. Esten-
de-se a todos os materíais índustrlalmente consumidos pelo capitalista.
Todo imposto dessa ordem diminui a taxa de lucro, por elevar o valor do
capital constante em relação ao variável. Por exemplo, um imposto ínci-

816
dente sobre fibra de linho ou sobre lã. A fibra do linho sobe de preço.
A empresa de fiação por isso não mai~ pode adquirir a mesma quantida-
de de fibra com capital de 100. Uma vez que não mudou o método de
produção, precisa do mesmo número de trabalhadores para fiar a mesma
quantidade de fibra. Mas a fibra tem mais valor que antes, relativamente
ao capital despendido em salário. Assim cai a taxa de lucro. Nessas con-
dições de nada lhe serve a alta do preço do fio de linho. Em nada lhe im-
porta o nível absoluto desse preço. A única coisa que importa é o exces-
so do preço sobre o preço dos adiantamentos. Se quiser aumentar o pre-
ço do produto global para ajustá-lo ao preço da fibra e para que a mes-
ma quantidade de fibra dê o mesmo lucro anterior, a procura, que já de-
cresce em virtude da alta da matéria~prima do fio, decrescerá ainda mais
em virtude da alta artificial decorrente da elevação do lucro. Embora da-
da em média a taxa de lucro, esse aumento não é possível em semelhan-
tes casos.123
No capítulo XV 'Taxes on Profits" diz Ricardo:

"Examinamos antes os efeitos da divisão do capital em fixo e circulan·


te, ou melhor em capital durdvel e pereciPel, sobre os preços das mer-
cadorias. Mostramos que dois fabricantes podem empregar exatamen·
te o mesmo montante de capital e dele extrair o mesmo montante de
lucro, mas que venderão suas me.rcadorlas po1 somas de dinheiro bem
diferentes, segundo a rapidez ou lentidão com que s.ão consumidos e
reproduzidos os capitais que empregam. Um pode vender seus bens por
4 000 libras, o outxo por 10 000 libras, e ambos podem empregar 10 000
libras e obter 20% de lucro, ou 2 000 libras. O capital de um pode con-
sisti!: em 2 000 libras de capital circulante, a ser reproduzido, e 8 000
libras de capítal fixo, empregado em edifícios e maquinaria; o capital
do outro pode oompor-se de 8 000 libras de capital circulante e 2 000
libras apenas de capital fixo - maquinaria e edifícios. Se cada um de·
les tiver ·a .imda (income) tributada em 10% ou 200 libras, um terá de
elevar o preÇo total de seus bens de 10 000 libras pata 10 200, para o
negócio lhe dar a taxa geral de hicro; o outro será também forçado a
elevar o preço total de seus bens, de 4 000 .libras para 4 200. Ante~ do
imposto, os bens vendidos por um dos fabricantes valiam 2 1/2 vezes
mais que os bens do outro; depois do imposto valerão 2,42 vezes mais.
Uma classe de bens te.rá $Ubido dois por cento, e a outra, cinco por cen-
to. Em conseqüência, um imposto de renda, embora continue inalterado
o valor do dinheiro, alterará preços e valor relativos das mercadorias"
(pp. 234, 235).

123. No manuJcrito segue urna seção (pp. 642 e 643J que trata das variações, em
sentidos opostos, dos valores do capital constante e do variável, matéria que perten·
ce à ~eção 3 deste capítulo, onde está incluída (ver pp. 813;a.S16 deste volume).

817
O erro está neste último "e" - preços e valor. Essa variação de preços
provaria apenas que, tal como sucede com a diferença da divisão do capi-
tal em fixo e circulante, para se estabelecer a taxa geral de lucro é míster
que os preços ou preços de custo determínados e regulados por tal variação
sejam bem diferentes dos vai.ores das mercadorias. E nenhures em Ricardo
se encontra esse aspecto da questão, o maís importante. No mesmo capí-
tulo diz ele:

"Se num pais não houver tributação e cair o valor do dinheiro, sua abun-
dância em todo mercado (aí a idéia rídícula de a queda no valor do di·
nheko ter por companhia necessá.ria sua abundância em todo merca-
do) gerará efeitos semelhantes. Se a carne subir de 20%, também subi·
1á de 203 pão, cerveja, calçados, trabalho, toda mercadoria enfim; é
necessárío que assim seja para se assegurar a cada ramo a mesma taxa
de luC,ro. Mas isso deixa de ser verdade quando alguma dessas mercado-
rias é tributada; se, então, subirem todas na proporção ,da queda do va·
lor do dinheiro, ocorrerão lucros desiguais. Para as mercadorias tribu·
tadas, os lucros serão elevados acima do nivel geral, e capital ~ deslo·
cará de um emprego para outro até se restaul'fJJ' um equilibrio de lucros,
o que só pode suceder depois de se alterarem ospreçosrelati.-os" (p, 237}.

E desse modo se estabelece pot fim o nivelamento dos lucros, por se


alterarem os vai.ores relativos, os valores reais das mercadorias e se ajusta-
rem uns aos outros de maneira a haver equivalência entre ela.s não segundo
o valor real e sim de acordo com o lucro médio que elas têm de proporcionar.

5. Relação entre a taxa geral de lucro e a taxa da renda


absoluta Influência da baixa do salário·Sübre os
preços de custo.
No capítulo XVII "Taxes on other Commodities than raw produce"
díz Ricardo:

:·Buchanan acha que trigo e produtos primários têm preço de monopó·


lio pox darem renda. Supõe que todas as mercadórias que. dão renda têm
necessariamente preço de monopólio, e daí infere que todos os .Impos-
tos sobre produtos primários recairão sobre o dono da rerula e não so·
breco consumidor.
'Uma ~\.ez que o preço do trigo', díz ele, 'que sempre dá renda, de mo-
do aliUm se influencia pelas despesas para produzi-lo, têm estas de ser
pagas pela/fenda; e por isso, quando se elevam ou caem, a conseqüên·

818
eia não é subir ou cair o preço, mas aexescer ou decrescer a renda. Sob
esse ponto de vista todos os impostos sobre empregados agrícolas, cava-
los ou implementas a,grfoolas são na cealídade íropostos sobre a terra.
O ô11us reC3i sobre o arrendatário enquanto vigora o arrendamento, e
sobre o senhorio quando é mister renovar o arrendamento. De igual
modo todos os implementos da exploração, os quais poupam despesas
ao arrendatário como debulhadoras e colheit~iras, e o que quer
que lhe dê mais fácil acesso ao mereado, como boas estradas, canais
e pontes -, embora reduzam o custo original do trigo, não diminuem
seu preço de mercado. Por isso pertence ao senhorio, como parte de
sua renda, o que quer que se poupa com esses melhoramentos.'
"Desde que aceitemos a base", diz Ricardo, ·"sobre a qual Buchanan
constrói sua argumentação, a saber, que o preço do .trigo sempre dá
renda, é claro que resultam evidentes todas as conclusões por ele sus·
tentadas" (pp. 292, 293}.

De maneira_ alguma está ísso claro. A base sobre que Buchanan cons-
trói _sua argumentação não é a circunstância de todo trigo dar renda, mas
a de ser vendido a preço de monopólio todo trigo que dá renda, e a de o
preço de monopólio ser - no sentido definido por A. Smith e esposado
po1 Ricardo - "o preço mais alto a que os consumidores estão prontos
para comprar a mercadoria". 124
E.aí que está o erro. Trigo que dá renda (abstraindo-se da renda di-
ferencíal) não se vende a preço de monopólio no sentido de Buchanan:
só se vende a preço de monopólio enquanto se vende acima do preço de
custo e pelo valor. Seu preço é determinado pela quantidade de trabalho
nele realizado e não pelas despesas para produzi-lo, e a renda é o excesso
do valor sobre o preço de custo, e assim detenninada por este; quanto maior
a renda, tanto menor o preço de custo em relação ao valor, e quanto me-
nor a renda, tanto maior o preço de custo em relação ao valor. Todos os
melhoramentos requzem o valor do trigo por diminuírem a quantídade
de trabalho necessárÍa -para produzi-lo. Que reduzam ou não a renda de·
pende de circunstâncias diversas. Se o trigo fica mais barato e por isso bai-
xa o salário, eleva-se a taxa de mais-valia. Além disso, cairiam as despe-
sas do arrendatário em sementes, alimentação do gado etc. Assim elevar·
se-ia a taxa de lucro em todos os outros ramos do sej!)t não agríoola e em
conseqüência também na agricultura. Nos ramos não agrícolas não se alte-
rariam as magnitudes relativas de trabalho imediato e acumulado; o nú-
mero de trabalhadores ficaria o mesmo (em relação ao capital constante),

124. Ricardo dá essa definição de preço de monopólio no capítulo XVll de sua obra
On lhe principies of political ecotwmy, and taxatúm, 3!1 ed .. Londres, 1821, pp. 289 e
290. Acima cita Marx definição análoga de preço de monopólio, dada por Adam
Smith (p. 775 deste volume).

8)9
mas cairia o valor do capital variável e subiria portanto a mais-valia e daí
a taxa de lucro. Ambas, em conseqüência, subiriam também no setor agri-
cola. Nessas condições, a renda cai por subir a taxa de lucro. O trigo fica
mais barato, mas seu preço de custo aumenta. Por isso diminui a diferen-
ça entre seu valor e seu preço de custo.
Segundo nosso pressuposto, a composição do capital não agrícola
médio era 80c + 20y, a taxa de mais-valia= 50%, daí, a mais-valia= 10 e
a taxa de lucro = 10%. Por conseguinte, o valor do produto do capital
médio de 100 = 110.

Admitamos decresça o salário de 1/4, por baixarem os preços do tri-


go; o mesmo número de trabalhadores que se ocupava com um capital
constante de 80 libras, isto é, com a massa anterior de matéria-prima e
de maquinaria, só custará 15 libras. E o mesmo volume de mercadorias
terá o valor de 80c + l 5v + 15, uma vez que a quantidade de trabalho
realizada = 30 libras, de acordo com o pressuposto. Assim, como dantes,
o valor do mesmo volume de mercadorias é igual a 11 O. Mas o valor do
capital despendido só importará em 95, e 15 sobre 95 = 15 15/19%. Con-
tudo, se se despender o montante anterior de capital, isto é, IQO, a rela-
ção será 84 4/19 + 15 15/l 9; o lucro = 15 15/19 e o valor do _produto =
11 5 15/19. Mas, segundo o pressuposto, o capital agrícola = 60c + ~v
e seu valor=· 120; a renda= 10, enquanto o preço de custo= 110. En-
tão, ela seria apenas4 4/19, pois 115 15/19 + 4 4/19 = 120libras.

Vemos aí que o capital médio de 100 libras produZiu mercadorias


ao preço de custo de 11 S 15/19, em vez das anteriores 11 O libras. Teria
subido por ísso o preço médio da mercadoria? O valor dela não se altera-
ria, uma vez que exige a mesma quantidade de trabalho para converter
em produto a mesma quantidade de matéria-prima e de maquinaria. Mas,
o mesmo capital de l 00 põe em movimento mais trabalho e agora conver-
te em produto 84 4/19 de capital constante em vez das anteriores 80 li-
bras. Contudo, da mesma quantidade de trabalho provirá mais trabalho
não pago. Daí acréscimo do lucro e do valor global do volume de mer-
cadorias produzidas por 100 libras. O valor unitário da mercadoria não
variou, mas produz-se mais mercadoria pelo mesmo valor com capital
de 100. Mas, como se comporta o preço de custo nos diversos ramos?

820
Admitamos que o capital não agrícola seja formado pelos seguin-
tes capitais:

······
Produto Valor Diferença entre preço
Suposição para serem de custo e valox
as mercadori11s vendidas
pelo mesmó preço
de custo
--··· '
(1) 80c+ 20v 110 110 o
(2) 60c + 40v 110 120 -10
:(3) 85c + lSv 110 107 1/2 + 21/2
!C4) 95c + Sv 110 1021/2 + 71/2

Assim, o capital médio = 80c + 20v.


Para (2), a diferença= - 10, para (3) e (4) somados=+ 10. Para o
=
capital todo de 400 = O - 10 + 10 O. Se o produto do capita) de 400
se vende por 440, vendem-se então por seu valor as mercadorias que esSe
capital produz. Isso corresponde a lucro de l 0%. Mas em (2) as mercado·
rias se vendem a 10 libras abaixo do valor, em '(3), 2 l /2 libras acima, e em
(4), 7 l /2. acima. Só em (1) se vendem por seu valor, quando vendidas pe-
lo preço de custo = 100 de capital + 1O de lucro.
Mas quaJ seria o comportamento, se o saJário decrescesse de I /4?
Para o capital (1), em vez de 80c+ 20y, teríamos844/19 0 + 1515/19v,
lucro IS 15/19,valordoproduto 11515/19.
Paru o capital (2), despende-se apenas 30 em salário, pois l /4 de
40 = 10 e 40 - 10 -= 30. O produto = 60c + 30y e a mais-valia= 30 (pois
o valor do traba.Tho apliéado = 60 libras). A mais-valia representa 33 1 i3%
do capitel de 90. Para l 00 1 a relação é 66 2/3c + 33 1 /3v e o valor= 133 l /3.
Taxa de lucro= 33 1/3.
Para o capital (3), somente 11 1/4 em salário, pois 1/4 de 15 = 3 3/4
e 1 S - 3 3/4 = 11 J /4. O produto será 85c + 11 li4v e a mais-valia, 11 1/4
(valor do trabalho empregado = 22 1/2). A mais-valia sobre um capital de
96 1/4 representa 11 53/77%. Para 100, a relação é 88 24/77c + 11 53/77v.
Taxa de lucro = 11 53/77, e produto= 111 53/77.
Ptua o capital (4), despende-se em salário apenas 3 3/4, pois 1 /4 de
5 ê 1 1/4, e 5 - 1 1/4 = 3 3/4. O produto é 95c = 3 3/4v, e a mais-valia=
3 3/4 (pois o valor do trabalho global = 7 1/2). Para um capital de 98 3/4
representa ela 3 63/97%. Para 100, a relação: 96 16/79c + 3 63/79v. Taxa
de lucro= 3 63/79. Valor= 103 63/79.

821
Teremos- portanto:

.--------
.Taxa de 1 .. Produto Valor Diferença
IU:CJO Suposição entre preço de
l
1
1
: para serem
i !lS mercado-
rias vendidas·
custo e valm

! 1
pelo mesmo
preço de
custo
(1) 84 4/l9c + 15 15/19v 15 15/19 i 116 11515/19 +4/19
(2) 66 2/3c + 33 l/3v 33 1/3 1 116 133 1/3 - 17 1/3 1
(3) 88 24/77 e+ 11 53/77v 11 53/77 116 111 53/77 + 4 24/77
(4) 96J~/79,, + 3 63/79v 3 63/79 116 103 63/79 + 1216/79
Total 400 64 (quantia arredÓndada)

Temos aí 16%. Com maior aproximação, algo mais que 16 l/7%. 1?.5
O cálculo é aproximado, pois despreza-se, não se leva em conta fração do lu·
cro médio, e assim a diferença negativa de (2) aparece um pouco aumenta-
da e a positiva de (1), (3) e (4), um pouco diminuída. Mas vê-se que fora
disso anular-se-iam as diferenças positivas e negativas, e que crescerá de
maneira significativa a venda de (2) abaixo de seu valor, e a: de (3) e so-
bretudo de (4) acima de seu valor. Por certo, o acréscimo· ou decréscimo
não .seriam tão grandes para o produto individual, como pod~ parecer
aqui, uma vez que em todas as 4 categorias se aplica mais trabalho e em
conseqüência se converte mais capital constante (matéria-prima e maquina-
ria) em produto, e desse modo o acréscimo ou decréscímo se repartirem
por quantidade maior de mercadorias. Contudo, permaneceriam ainda
significativos.
E assim evidencíou·se que a baixa do salário teria causado alta dos
preços de custo de (1), (3), (4), bastante considerável em (4). E a mesma
lei que Ricardo desenvolveu ao tratar da diferença ~ntre capital fixo e ca-
pital circulante, mas sem ter de maneíra alguma provado ou podido pro-
var que isso é compatível com a lei do valor e que o valor. dos produtos
não varia para a totalidade do capital. 126
125. No manuscrito: mais exatamente 16 libras e 12 1/2 xelins, mas arredondam-
se algumas frações, o que provoca desvio abaixo de 2 pence.
126. Mau: alude ai às seções IV e V do capítulo primeiro do livro de Ricardo On
the principie:; of political economy, and taxation, nas quaís Ricardo investiga se alta
ou baixa do .salário influencia os "valores rela.tives das mercadorias" produzidas por
capitais de composição orgânica difetente. Marx faz uma análise pormenorizada de
ambas as seções neste volume, pp. 607 e seguintes.

822
O cálculo e o nivelamento se tornam muíto maís complicados se le-
vannos ainda em conta as diferenças na composição orgânica do capital,
oriundas do processo de circulação. Pois em nosso cálculo admitimos
que todo o capital constante adiantado entra no produto, isto é, só con-
tém o desgaste de capital fixo durante um ano, digamos (uma vez que te-
mos de calcular o lucro por ano). Do contrário, os valores, das massas de
produtos comportar-se-iam de maneira bem diversa, enquanto aqui só
mudam com o capital varíável. Ademais, com taxa invariável de mais-valia
mas com período de circulação variável, haverá diferenças maiores na
magnitude da mais-val'ia produzido. em relação ao capital adiantado. Omi-
tidas diferenças do capital variável, os montantes de mais.valia estarão em
proporção com os montantes dos diferentes valores criados pelos mesmos
capitais. A taxa de lucro será bem mais baixa quando parte relativamente
grande do capital constante consistir em capital fixo, e bem mais alta,
quando parte relativamente grande do capital consistir em capital circulan-
te. Atingirá a altura máxima quando o capital variável for grande em rela-
ção ao constante e a parte fixa deste for ao mesmo tempo relativamente
pequena. Se fosse igual, para os diferentes capitais, a relação, no capital
constante, entre a parte fixa e a circulante, o fator decisivo seria apenas
a diferença entre capital variável e constante. Se não se alterasse a relação
entre capital variável e constante, o fator decisivo seria apenas a diferença
entre capital fixo e circulante, ou seja, a diferença dentro do próprio ca-
pital constante.
Conforme vimo_s, a taxa de Jucro do arrendatário de qualquer mo-
do subirá se, em virtude da baixa do trigo, aumentar a taxa geral de lucro
do capital não agrícola. A questão é saber se aquela taxa de lucro subirá
diretamente, o que parece depender da natureza dos melhoramentos. Se
estes forem de natureza a reduzir consideravelmente, em relação ao capi·
tal aplicado em maquinaria etc., o capital despendido em salário, a taxa
de lucro do arrendatário não terá de subir de maneíra direta. Se forem
de natureza que o arrendatário necessite de 1/4 a menos de trabalhado-
res, terá ele de despender apenas 30 em salário, em vez das 40 libras ante·
riores. O capital portanto será 60c + 30v ou, na base de 100 horas,
66 2/3c + 33 I/3v. E uma vez que trabalho adquirido por 40 dá 20 de
mais-valia, o obtido por 30 dará 15. O adquirido por 33 1/3 dará 16 2/3.
Assim, a composição orgâníca do capital aproximar-se-á da do capital

823
não agrícola. 'E cairá mesmo abaixo desta, no caso acima, se houver de·
créscimo simultâneo de 1/4 no salário. 111 Neste caso eliminar-se-á a ren-
da (a renda absoluta).
Após o trecho acima referente a Buchanan, prossegue Ricardo:

"Espero ter esclarecido bastante que, até um país ser de todo cultiva·
do e no mais alto grau, haverá sempre, do capital aplicado no solo, par-
te que não dará renda, e" (!) "que essa parte do capital é a que deter-
mina o preço do trigo e seu resultado se dívlde, como na indústria, em
lucro e salário. Sendo o preço do trigo que não dá renda determinado
por seus custos de produção, não podem esses custos ser pagos por
renda. Por isso, a conseqüência de crescerem esses custos é um preço
mais alto e não uma renda mais baixa" (1.c., p. 293). -

127. Marx toma como exemplo uma das direções em que pode ocorrer o pio·
cesso de aproximação entre a composição 01gâníca do capital agi:ícola e a do capi-
tal industrial. Serve-lhe de ponto de partida:
60c + 4-0v para o capital agrícola e
SOc + 20v para o capital não·agrícola.
Mai:x admite que, em virtude da, alta da produtividade do trabalho agrícola,
diminui de 1/4 o númezo de trabalhadores na agricultuta. Muda portanto a compo-
síção orgânica do capital agrícola: o produto que requeria antes o dispêndio de um
capital de 100 unidades (60c + 40v), exige o desembolso de 90 unidades (60c + 30y),
o que, .transposto para 100 unidades, resulta cm 66 2/3c + 33 l/3v.· Assim. a compo-
sição orgânica do capital agrícola aproxima-se da do capital industrial.
Marx supõe ainda que, além de se reduzir o número dos trabalhadores agríco-
~. baixa de l /4 o salário em virtude de baratear o trigo. Nest!l · caso:é necessário
admitir que na indústria o salário também cai na mesma proporção. Mas a queda
do salário tem de repercutir maís no capital agrícola, que te!T\. composiç.ão orgâni-
ca inferior, do que no capital não-agrícola. Isso levaria a que diminuísse de novo a
diferença entre a composição orgânica do capital agrícola e a do capital industrial.
Se o salário diminuir de 1/4, o capital agrícola de 66 2/3c + 33 1/3v conver-
ter-se-á num capital de 66 2/3c + 2Sv, o que dá, par.i. lOOunidades, 72 8/llc + 27 3/llv.
C-om a mesma diminuiç.ão do salázio, o capita! não-agrícola de 8-0c + 20v trans-
fonnar-se-á num capital de 80c + lSv, o que, transposto para 100 unidades, dá
844/19c+15 15/19v.
Com outro decréscimo do número dos trabalhadores agrícolas e com outra
queda do salário, a composição orgânica do capital agrfoola aproximar-se-á ainda
mais da do capital não-agrícola.
a
No estudo desse caso hipotético formulado para explicar influência que o
aumento da produtividade do trabalho na agricultllf3 tem na composição orgânica
do capital agdcola, abstrai Marx do aumento simultâneo, na maioria dos casos ainda
mais rápido, da produtividade do trabalho na indústria, aumento que se expressa em
nova elevação da composição orgânica do capita! industrial em relação à do capital
agrícola. Sobre a 1elação entre a oomposição orgânica do capital industrial e a do
capital agrícola \'er neste volume pp. 453, 454, 524, 539, 540 e 674.

824
Uma vez que a renda absoluta é igual ao excesso do valor do pro-
duto agrícola sobre o preço de produção, 128 é claro que tudo o que di·
minui a quantidade global do trabalho requerido para produzir trigo etc.
dinúnui a renda, por reduzir o valor, isto é, o excesso do valor sobre o
preço de produção. Enquanto o preço de produção consiste em despesas
pagas, sua queda é idêntica ã queda do valor e com ela coincide. Entre-
tanto, enquanto o preço de produção (ou as despesas) é igual ao capital
adiantado acrescido do lucro médio, ocorre justamente o oposto. O va-
lor de mercado do produto cai, mas deste a parte igual ao preço de pro-
dução sobe se a taxa geral de lucro sobe em virtude da queda do valor
de mercado do trigo. A renda portanto cai, por subirem as despesas nes-
se sentido em que Ricardo em geral as vê, ao falar de custo de produção.
Melhoramentos na agricultura, que geram acréscimo no capital constante
em relação ao variável, farão cair ponderavelmente a renda, mesmo se
a quantidade total de trabalho tiver queda reduzida ou tão redui.ida que
não chegue mesmo a influir no salário (diretamente na mais-valia). Se,
em virtude desses melhoramentos, o capital 60c + 40y se converter em
66 2/3 0 + 33 l/3v (por exemplo, por causa do salário ascendente, resul-
tante de· emigração, guerra, descoberta de novos mercados, prosperída·
de da ind(1stria não agrícola, ou por causa da coneorrência de trigo estran-
geiro, poderá o arrendatário se ver forçado a se emepenhar em aplicar
mais capital constante e menos capital variável; as mesmas circunstâncias
podem continuar atuando depois desses melhoramentos e assim não cair
o salário apesar deles), o valor do produto agrícola baixará de 120 para
116 2/3, isto é, diminuirá de 3 1/3. A taxa de lucro continuará a ser 10%.
A renda cairá de 10 para 6 2/3, e essa queda terá ocorrido sem haver qual.
quer redução em salário.
A renda absoluta pode subir, por cair a taxa geral de lucro, em vir·
tude de novos progressos na indústria. A taxa de lucro pode cair, porque
sobe a renda em virtude de aumentar o valor do produto agrícola e, em
conseqüência, a diferença entre seu valor e seu preço de custo. (Ao mes-
mo tempo, a taxa de lucro baixa por subir o salário.)
A renda absoluta pode cair, por cair o valor do produto agrícola
e subir a taxa geral de lucro. Pode cair, por cair o valor do produto agrí·
cola em virtude de se transformar a composição orgânica do capital. sem
que se eleve a taxa de lucro. Pode desaparecer por completo, desde que
o valor do produto agrícola seja igual ao -preço de custo, isto é, o capital
agrícola tenha a mesma composição que o capital médío não agrícola.
128. Preço de produção= e+ v +lucro médio.

825
A proposição de Ricardo só seria correta assim expressa: se o valor
do produto agrícola for igual a seu preço de custo, não existirá renda ab-
soluta. Mas ele está errado porque diz: não há renda absoluta porque va-
lor e preço de custo são em substância idênticos, tanto na indústria quan-
to na agricultura". Ao revés, a agricultura pertenceria a um tipo excepcio·
nal de indústria, se nela valor e preço de custo fossem idênticos.
Ricardo, ao admitir que não existe mesmo terra que não pague ren-
da, acha que é muito importante apoiar-se na circunstância de existirem
pelo menos doses de capital, empregadas na terra e que não pagam renda.
Para a teoria um fato é tão irrelevante quanto o outro. A verdadeira ques-
tão é esta: os produtos dessas terras ou desses capitais determinam o va-
lor de mercado? Ou antes não terão esses produtos de ser vendidos abaixo
de seu valor, porque essa oferta adicional só é vendável por esse valor de
mercado - determinado sem sua interferência - e não acima dele? A coi-
sa é simples para doses de capital, porque então para o arrendatário não
existe propriedade do. teTTa no tocante às doses adicionais, e ele como
capitalista tem apenas em mira o preço de custo e, se dispõe do capital
adicional, continuará empregando capital mesmo. abaixo do lucro médio
mais vantajosamente do que se o emprestasse, isto é, obtivesse meros ju·
ros e não lucro. Quanto às terras que não pagam renda, constituem elas
componentes de conjuntos fundiários que pagam renda, . dcis quais não
se podem separar e com os quais são arrendadas, embora 'não seja possí-
vel arrendá-las isoladas, de per si, a nenhum arrendatário capital~sta {mas
por certo a um pequeno lavrador ou a um pequeno capitalista). Nesses
pedaços de terra volta a desaparecer o confronto entre a _propriedade fun-
diária e o arrendatário. Ou então o proprietário mes.rrío. tem de cultivá·
los. Eles não possibilitam a um arrendatário pagar renda, e o senhorio
não os arrenda de graça, a não ser que por exceção queira por esse meio
arrotear sua terra sem custos.
As condições mudariam num país onde a composição do capítal
agrícola fosse igual à composição médía do capit:µ não agrícola, o que
pressupõe elevado desenvolvimento da agricultura ou baixo desenvolvi·
mento da indústria. Neste caso, o valor do produto agrícola = seu preço
de custo. Então, só se poderia pagar renda diferencial. As terras que não
pudessem proporcionar renda diferencial e .0 pudessem dar renda agrí-

• Ricardo conscientemente identifica valor e custo de produção na seguinte


passagem: "Malthus parece acreditar que faz parte de minlta doutrina a idéia de serem
a mesma coisa custo e WJlor de um produto. Está ce.rto se entende por custo 'custo
de produção' abra11gendo lucro" (l.c., p. 46).

826
cola, não poderiam pagar renda. Pois, se o arrendatário vender o produ-
to agrícola por seu valor, esse produto só cobrirá o preço de custo. O
arrendatário portanto não pagará renda. O proprietárto terá então de cul·
tivá-la ou de arrecadar parte do lucro ou mesmo do salário de seu rendei-
ro, a título de arrendamento. Que suceda isso num país não impede nou·
tro a ocorrência oposta. Mas, onde a indústria - e portanto a produção
capitalista - tem escasso desenvolvimento, não existem arrendatários
capitalistas, que pressupõem a produção capitalista no país. Ai entram
em consideração condições por completo diferentes daquelas da organi-
zação econômica em que a propriedade da terra só tem existência econô-
mica na figura da renda fundiária.
No mesmo capitulo XVII diz Ricardo:
"Produ~o primário não tem preço de monopólio, porque o preço de
mercado da cevada e do trigo é determinado pelo respectivo custo de
produçáo como o dos panos de algodão e de linho. A única diferença
consiste em que, na agricultura, é uma porção do capital empregado
que determina o preço dos cereais, isto é, a porção que ruto paga renda,
enquanto na produção de mercadoriin manufaturadas se emprega com
igual resultado cada porção do capital; não ha~endo porção que dê ren-
®· ca® uma determina por igual o preço" (l.c., pp. 290, 291).

Essa afirmação de se empregar toda porção de capital com o mesmo


resultado e de nenhuma pagar renda (que no caso significa lucro suple·
mentar), além de estar errada, é contestada pelo próprio Ricardo, como
Vimos antes. 129
Passamos agora a expor a teoria da mais-valia de Ricardo.

B. A mais-yalia segundo Ricardo

1. Quantidade de trabalho e valor do trabalho.


Ricardo inicia o capitulo 1 ''On Value" com o cabeçalho da seção [,
a saber:

"O valor de uma mercadoria, ou a quantidade de outra mercadoria pe·


la qual ela se trocará, depende da qul1lltidade relativa de trabalho neces·
síria para produzi-la e não da maior ou menor compensação que se pa·
ga poI esse trabalho".

129_ Ver nente volume pp. 743, 744 e 809.

827
No estiló que prevalece ao longo de sua pesquisa, Ricardo começa aí
seu livro dizendo que a dete.tminação do valor das mercadorias pelo tem-
po de trabalho não é incompatível com o salário ou com a recompensa
diferente desse tempo ou dessa quantidade de trabalho. De saída volta-se
contra a confusão que A. Smith faz .entre a <feterminação do valor das mer-
cadorias pela quantidade proporcional de trabalho requerida para produzi·
la e o valor do trabalho (ou a recompensa do trabalho).
É claro que a quantidade proporcional de trabalho contida em duas
mercadorias A e B em nada se altera com a circunstância de os trabalhado-
res que produzíram A e B terem recebido muito ou pouco do produto de
seu trabalho. O valor de A e B é determinado pela quantidade de trabalho
que sua produção custa. e não pelos custos do traballw para os donos de
A e B. Quantidade de trabalho e valor de trabalho são duas coisas diferen·
tes.. A quantidade de trabalho respectivamente contida em A e B nada tem
a ver com a magnitude de trabalho contida em A e B,paga pelos donos de A e B
ou por eles mesmos executada. A e B se trocam não na razão do trabalho
pago neles contido, mas na razão da totalidade, neles encerrada, de traba-
lho pago e não pago.

"A. Smith que definiu com tanto rigor a fonte original do va.)or de tro·
ca e que por coerência estava obrigado a afirmar que tpdas as coisas
têm valor maior ou menor segundo a quantidade maior ou menor de
trabalho empregada pata produzi·las, é quem erige ôuuo padrão de
medida do valo.r e fala de terem coisas valor maior ou menor segundo
se trocarem por mais ou menos daquela medida rn:mnaL. como se se
tratasse de duas expressõet equivalentes e como se alguém, por ter do·
brado a eficácia de seu tiabalho e por isso pudesse p.roduzír o dobro
da quantidade de uma mercadoria, recebesse necessuiamente em tro·
ca duas vezes a quantidade anteríor" (isto é, em troca de seu trabalho).
"Se isso fosse realmente verdade, 1e a recompensa do trabalhador sem·
pre correspondesse ao que ele produz, serfam iguais a quantidade de
trabalho aplicada numa mercadoria e a quantidade de t7abalho que se
pode comprar com e!llXI mercadoria, e uma ou outra quantidade pode-
ria medir precisamente as variações dos ·outros bens: mas não são iguais"
(1.c., p. S).

Nenhures afümou Smith que "se tratasse de duas expressões equiva-


lentes". Diz ao contrário: por não ser mais o salário do trabalhador, na pro·
dução capitalista, igual a seu produto, e por serem assim duas coisas dife-
rentes, a quantídade de trabalho que uma mercadoria custa e a quantida·
de de mercadoria que o trabaUtador pode comprar com esse trabalho, jus-
tamente por isso a quantidade relativa de trabalho contida nas mercado-
rias deixa de determinar o valor delas; este, ao contrário, é determinado

828
pelo valor do trabalho, pela quantidade de trabalho que posso comprar,
comandar com volume definido de mercadorias. Por essa razão, o valor
do trabalho se torna a medida dos valores, em vez de a quantidade relati-
va de trabalho. Ricardo, com acerto, retruca a A. Smith que a quantidade
relativa de trabalho contida em duas mercadorias, de modo algum se alte-
ra com a porção dela que caberá ao próprio trabalhador, com a forma de
recompensar esse trabalho, e que portanto, se a quantido.de relativa de tra-
balho era a medida dos valores das mercadorias antes de aparecer o salá-
rio (remuneração distinta do valor do próprio produto), não há razão
alguma por que não continue a ser essa medida depois de aparecer o sa-
lário. Com razão argumenta que A. Smith pode utilizar ambas as expres-
sões, colocadas no tempo em que são equivalentes, mas que isso não é
justificativa para· empregar a expressão falsa em lugar da correta, quan-
do deixam de ser equivalentes. Mas com isso Ricardo de modo algum
resolveu o problema que é a causa intrinseca da contradição de A. Smith.
Valor de trabalho e quantidade de trabalho continuam a ser "expressões
equivalentes", desde que se trate de trabalho materializado. Deixam de
ser equivalentes quando se trocam trabalho materializado e· trabalho vivo.
Dúas mercadorias se trocam na razão do trabalho nelas materiali-
zado. Trocam-se entre si quantidades iguais de trabalho materializado.
Seu estalão é o tempo de trabalho, e justamente por isso sã:o "de valor
maior ou menor, segundo se trocarem por mais ou menos daquele esta-
lão". Se a mercadoria A contém uma jornada de trabalho. trocar-se-á por
qualquer quantidade de mercadoria que encerre também uma jornada
de trabalho, e tem "valor maior ou menor" de confonnidade com a quan-
tídade maior ou menor de trabalho materializado em outras mercadorias
pela qual se troca, pois essa relação de troca exprime a quantidade rela-
tiva de trabalho nelas mesmas contida, é-lhe idêntica.
Mas, atualmente, o salário é mercadoria. E mesmo a base em que
se dá a produção dos produtos como mercadorias. Não vigora, para ela,
a lei dos valores. Esta, portanto, de maneira nenhuma domina a produ-
ção capitalista. Há aí uma contradição. Este é o primeiro problema de A.
Smith. O segundo, que mais tarde encontraremos desenvolvido em Mal-
thus: a utilização de urna mercadoria (como capital) não é proporcional
ao trabalho que ela contém, mas ao trabalho alheio que comanda, ao do-
mínio que dá sobre trabalho alheio em quantidade maior que a do traba-
lho nela mesma encerrado. Este é de fato segundo motivo disfarçado para
a afirmação: ao iniciar-se a produção capitalista, o valor das mercadorias
é determjnado não pelo trabalho que elas encerram e sim pelo trabalho
vivo que comandam, isto é, pelo valor do trabalho.

829
Ricardo retruca simplesmente que a coisa é assim na prod~o ca-
pitalista. Além de não resolver o problema, nem sequer o nota na obra
de A. Smith. De acordo com toda a ordenação de sua pesquisa, basta~lhe
provar que o valor variável do trabalho - em suma o salário - não elimi-
na a determinação do valor das mercadorias, distintas do próprio traba-
lho, pela quantidade relativa de trabalho nelas contida. "Não r4o iguais",
a saber, "a quantidade de trabalho aplicada numa mercadoria e a quan-
tidade de trabalho que essa mercadoria pode comprar". Contenta-se em
constatar esse fato. Mas, como se distingue a mercadoria trabalho das ou-
tras mercadorias? Uma é trabalho vivo, as demais, trabalho materializado.
Por conseguinte, apenas duas formas diferentes de trabalho. Por que uma
lei vige para uma e não para as demais, quando a diferença é apenas de
forma? Ricardo não responde, nem sequer propõe o problema.
De nada serve dizer ele:

"Não é o valor do trabalho •.. variável, sendo não só influenciado, oo-


mo as demais coisas" {quer dizer, mercadorias), "pela relação entre a
oferta e a procura, a qual se altera sempre com toda mudança na estni·
tura da sociedade, mas também pelo preço oscilante dos alimentos e
de outros bens necessários crri que se gasta o salário?" (p. 7).

A circunstância de o preço do trabalho, como o de outrlis mercado-


rias, variar com a oferta e a procura nada prova no tocante ao val.or do
trabalho, segundo o próprio Ricardo, e do mesmo modo essa variação
dos preços com a oferta e a procura nada prova no tocante ao ·valor das
outras mercadorias. Mas a circunstância de o "salário", agora outra ex-
pressão para valor do trabalho, ser influenciado pelo preço "variável de
alimentos e de outros bens necessários em que se gasta o salário" tam-
pouco mostra por que razão o valor do trabalho é (ou parece ser) deter-
minado de maneira diferente do valor das outras mercadorias. E que estas
também são influenciadas pelo preço variável das demais mercadorias que
entram em sua produção e pelas quais se trocam E o dispêndio de salá-
rio em alimentos e outros bens necessários, por certo, significa apenas a
troca do valor do trabalho por alimentos e coisas necessárias. A questão
é justamente esta: por que o trabalho e as mercadorias por que ele se per-
muta não se trocam segundo a lei do valor, conforme as quantidades re-
lativas de trabalho?
A questão assim colocada é de per si insolúvel, pressupondo-se a lei
dos valores, e insolú.vel porque se contrapõe o trabalho como tal à mer-
cadoria. determinada quantidade de trabalho imediato como tal a deter-
minada quantidade de trabalho materializado.

830
Essa debilidade da exposição de Ricardo contribuiu, como se verá
mais tarde, para que sua escola se dissolvesse e se elaborassem hipóteses
absurdas.
Com razão diz Wakefield:

"Se considerarmos o trabalho e o capital, produto do trabalho, como


mercadorias, e ~e os ra1ores dessas duas mercadorias fo.rem regulados
por iguais quantidades de trabalho, dada quántidade de trabalho se
trocará, seja como for, por essa quantidade de capital que foi produ·
zida pela mesma quantidade de trabalho, trabalho prei~rito se trocará
sempre pela mesma quantidade de trabalho presente. Mas, o valor do
trabalho em relação a outras mercadorias, pelo menos enquanto o sa·
láJ:io constitua porção do produto, é determinado não por quantidades
iguais de trabalho, mas pela proporção entte oferta e prncura" (E. G.
Wakefleld, nota à p. 230, vol. I de sua edi~o de A. Smith, Wealth of
Nariona, Londres, 1836).

Este é um dos temas prediletos de Bailey, a examinar mais tarde.


Ver também Say que muito se alegra por se considerarem oferta e procura,
sem mais nem menos, fatores decisivos.

* * *
Nesta subdivisão 1, observar ainda: capítulo 1, seção 3 traz, a seguin-
te epígrafe:

"Influencia o valor das me.readerias não só o trabalho nelas de imedia·


to empregado mas também o trabalho que se aplicou em maquinaria,
ferramentas e edifícios, que ajudam o trabalho de imediato despendi-
do" (David Ricardo, On the principle5... , Londres 1821, p. 16).

Por conseguinte, o valor de uma mercadoria é determinado, por igual,


pela quantidade de trabalho materializado (pretérito) requerida para pro·
duzi-la e pela quantidade de trabalho vivo (presente) necessário a sua pro·
dução. Noutras palavras: quantidades de trabalho de maneira nenhuma
são influenciadas pela diferença formal de ser o trabalho materializado ou
vivo, pretérito ou presente (imediato). Se essa diferença não importa à
determinação do valor das mercadorias, por que razão se toma de impor-
tância tão decisiva quando o trabalho passado (capital) se troca por tra-
balho vivo? Por que deve a diferença aí anular a leí do valor, uma vez que
de per si, como se revela na mercadoria, não importa à determinação do
valor? Ricardo não responde a essa pergunta, nem mesmo a suscita.

831
2. Valor da força de trabalho. Valor do trabalho.

Para detemúnar a mais-valia, Ricardo, como os flsiocratas, A. Smith


etc., tem de definir, antes de mais nada, o valor da força de trabalho ou,
conforme diz em concordância com A. Smith e seus predecessores, o valor
do trabalho.
Como se define valor ou preço natural do trabalho? Segundo Ricar·
do, o preço natural é apenas a expressão monetária do valor.

"O trabalho tem preço natlllal e preço de me1cado, como todas as de-
mais coisas que' se compram e se vendem e que podem aumentar ou di-
minuir em quantidade" {isto é, como todas as outras mercadorias).
"O preço natural do trabalho é o preço necessário para capacitar os
trabalhadores em geral a subsistir e perpetuar sua raça, sem acréscimo
ou deçiéscimo" (ou melhor, com a taxa de crescimento requerjda pe-
lo progresso médio da produção). "O poder do trabalhador de sustentar
a si e à família que seja necessária para manter o número de trabalha·
dores... depende do preço do& alimento11. do:r ben:r es.rencioí.s e do ccm-
forw material, requeridos para a manutenção do trabalhador e de SUil
famtlia. Com a alta elo pre9o dos alimentos e bens essencíais sobre o
preço natural do trabalho; ao cair aquele preço, decrescerá o preço na-
tural do trabalho" {p. 86).
"Não se eleve supor que o preço natural do trabalho, mes·mo expresso
em alimentos e bens essenciaís, seja absolutamente fixo e constante.
Varia com o tempo no mesmo país e muda muito materialmente de
um país para outro. Depende fundamentalmente dos hábitos. e costu-
mes elo povo" (p. 91).

O valor diJ trabalho portanto é determinado pelos··meios de subsis-


tência tradícionalm.ente necessários, em dada sociedade, para os trabalha·
dores se manterem e se reproduzírem.
Mas por quê? Por que lei é o valor diJ 'trabalho assim determinado?
Na realidade, Ricardo só tem esta resposta: a lei da oferta e da procura
reduz o preço médio do trabalho aos meios de subsistência necessários
(física ou socialmente necessários em dada sociedade) para o sustento do
trabalhador. Aí, envolvendo um fundamento do sistema inteiro, deter-
mina o valor pela oferta e procura, como observa Say com alegria diabó-
lica (ver a tradução de Constâncio).
Ricardo devia ter falado de força de trabalho e não de trabalho mas,
se o tivesse feito, o capital se teria configurado nas condições objetivas
de trabalho, que se opõem ao trabalhador como potência independente.
E o capital se teria revelado relação social determinada. Segundo Ricardo,
o capital só se distingue de "trabalho imediato" como "trabalho acumu-

832
lado". E é algo meramente material, simples elemento do processo de tra-
balho; a partir daí jamais se poderá desenvolver a relação entre trabalha-
dor e capital, salário e lucro.

"Capital é aquela parte da riqueza de um país a qual se emprega na


produção e consiste em alimentos, roupa.$, instrumentos, matétias-pri·
mas. maquinaria etc., coisas necessárias para se efetivax o trabalho"
(p. 89). "Menor capital é o mesmo que menos trabalho" (p. 73). "Tra-
balho e capital, isto é, trabalho acumulado" (l.c.; p. 499).

Esse salto de Ricardo muito bem o apreende Bailey:

"Ricardo, bastante engenhoso, evita uma díficuldade que à primeira


vista ameaça contrapor-se a sua teoria, a saber, que o valor depende
da quantidade de trabalho aplicada na produção. Se nos atemos com
rigídez a esse princípio, resulta que o valor do trabalho depende da
quantidade de trabalho empregada para produzir o trabalho - absur-
do evidente. Por isso, Ricardo, com um desvio inteligente, faz o valor
do trabalho depender da quantidade de trabalho rei;iuerida para pro.
duzir o s:Uárío, ou, segundo suas próprias palavras, aflr.ma que o volor
do trabalho deve ser avaliado pela quantidade de trabalho exigida pa-
ra produzir o salário, o qual para ele é a quantidade de trabalho ne·
ce-ssária para produzir o dinheiro ou as mercadorias que se d!o ao tra-
balJJador. l?, o me$!Tlo que dizer que o valor do pano deve ser estíma-
do não pela quantidade de trabalho empregada para produzi-lo, mas
pela quantidade de trabalho empregada para produzir a prata po1 que
se troca o pano." (A Criticai Díssertation on the Nature, Measures, anà
Causes of Value etc., Londres, 1825, pp. 50, 51).

Essa objeção está literalmente correta. Ricardo distingue entre salá-


e
rio nominal real.. Salário nominal é o salário expresso em dinheiro, o sa-
lário monetário.

Saldrio nominal é "o número de libxas pagas por ano ao trabalhador",


e raldrio real é "o m1mero de jornadas n~ssái:ias para se obterem es-
sas libras" {Ricardo, Lc., p. 152).

Uma vez que salário ::::: meios de subsistência do trabalhador, e o va-


lor desse salário (o salário real) == valor desses meios de subsistência, é evi·
dente que o valor dos meios de subsistência é também igual ao salário real,
isto é, ao trabalho que eles podem comandar. Adnútamos que os meios
de subsistência do trabalhador consistam apenas em trigo, e que por mês
precisa ele de 1 quarter de trigo. Assim, o valor desse salário mensal é
igual ao. valor de l quarter de trigo; se subir ou descer o valor do quarter

833
de trigo, subirá ou cairá o valor do trabalho mensal. Mas, o valor do quar·
ter de trigo, não importa quanto suba ou desça (quanto de trabalho se
contenha no quarter de trigo), é sempre igual ao valor de um mês de tra-
balho.
E aí temos a razão oculta. por que A. Smith diz que, ao intervir o
capítal e em conseqüência o trabalho assalariado, o que regula o valor
do produto não é a quantidade de trabalho nele aplicado e sim a quan-
tidade de trabalho que o produto pode comandar. Varia - do trigo e de
outros meios de subsistência - o valor determinado pelo tempo de tra-
balho; mas, enquanto se pagar o preço natural do trabalho, a quantida-
de de trabalho que o quarter de trigo comanda fica invariável. Tem por-
tanto valor relativo pemtdnente, ao se COmptll'0.1' rom o trigo. Eis por que,
também para Smith, valor do trabalho e valor do trigo (no sentido de
alimentos. Ver D. Hume) 130 são medidas-padrão do \llllor, dado que cer·
ta quantidade de trigo, enquanto se pagar o preço natural do trabalho,
comanda certa quantidade de trabalho, qualquer que seja a quantidade
dele empregada num quarter de trigo. A mesma quantidade de trabalho
comanda sempre o mesmo valor de uso, ou antes, o mesmo valor de uso
comanda sempre a mesma quantidad!! de trabalho.
O próprio Ricardo detennina por esse meio o valor do trabalho, o
preço natural deste. Diz Ricardo: o quarter de trigo tem valores diversos,
embora comande sempre a mesma quantidade de trabalho :ou por ela se-
ja comandado. Sim, diz A. Smith: por mais que, do quarter de trigo, va-
rie o valor detenninado pelo tempo de trabalho, o trabalhador, para com-
prá-lo, tem sempre de pagar com a mesma quantidade de trabalho (de sa-
crifício). Assim, o valor do trigo varia, mas não o valor·do trabalho, pois
l mês de trabalho = 1 quarter de trigo. Também o valor do trigo só va-
ria quando consideramos o trabalho exigido para produzi-lo. Ao revés,
se observarmos a quantídade de trabalho por que se troca e que põe em
mm.imento, seu valor não varia. E justamente por isso a quantidade de
trabalho por que se troca 1 quarter de trigo é o estalilo dó valor. Mas os
valores das outras mercadorias estão com o trabalho na mesma relação
em que estão com o trigo. Dada quantidade de trigo comanda dada quan·
tidade de trabalho. Dada quantidade de qualquer outra mercadoria co-

130. Marx ref~ aí ao folheto de Hume, Thoughts on the com law1:..., Londres,
1815, p. 59. Hume, ao analisal' nesse folheto a tese de Adam Smith - "o preço do
trabalho é determinado pelo preço do trigo"-, explica que, quando Smíth "fala de
trigo, é mbter entender que fala de alimentos, pois o valor de todos os produtos
agrícolas ... possui tendência natural a nivelar-se".

834
manda certa quantidade de trígo. Por conseguinte, qualquer outra mer·
cadoria - ou antes o valor de qualqllt)r outra mercadoria se expressa pe·
la quantidade de trabalho que comanda, uma vez que se expressa pela
quantidade de trigo que comanda. e este, pela quantidade de trabalho
que comanda.
Mas como é detenninado o valor das outras mercadorias em rela·
ção ao trigo (meios de subsistência)? Pela quantidade de trabalho que co-
mandam. E como se determina a quantidade de trabalho que comandam?
Pela quantidade de trigo que o trabalho comanda. Dá-se aí a queda irre-
missível de Smith no círculo vicioso. (Embora, diga-se de passagem, nun-
ca empregue e~a medida de valor em análises objetivas.) Além disso con-
funde aí, o que Ricardo também faz muitas vezes, o trabalho, a medida
imanente do valor, com a medida externa, o dinh_eiro, o que pressupõe
já estar determinado o valor; entretanto, como diz ele e Ricardo, o tra-
balho é "o fundamento do valor das mercadorias'', enquanto "a quan-
tidade relativa de trabalho necessária para produzi-las" é "a regra que
determina as quantidades correspondentes de bens que serão dadas em
troca umas pelas outras" (Ricardo, l .c., p. 80).
A.. Smith erra ao extrair da circunstância de se poder trocar deter-
minada quantidade de trabalho por determinada quantídade de valores
de uso, a conclusão de que esta determinada quantidade de trabalho é a
medída do valor, sempre tem o mesmo valor, enquanto a mesma quanti-
dade de valor de uso pode configurar valores de troca diversos. Mas Ri-
cardo erra duas vezes, primeiro por não entender o problema que gera
o erro de Smith, e segundo porque, omitindo de todo a lei dos valores
das mercadorias e refugiando-se na lei da oferta e da procura, determina
ele mesmo o valor do trabalho, não pela quantidade de trabalho aplica-
da para produzu a força de trabalho e sim pela aplicada para produzir
o salário que cabe ao trabalhador. Assim, diz na realidade: o valor do tra·
balho é determinado pelo valor do dinheiro que por ele se paga. E este
valor, que é que o determina? Que determina o montante de dinheiro
que se paga? A quantidade de valores de uso que comanda quantidade
definida de trabalho ou é por ela comandada. Ao dizer isso, Ricardo in-
cide literahnente na incoerência que reprova em A. Smith.
Essa posição ao mesmo tempo o impede, conforme vimos, de apreen-
der a diferença específica entre mercadoria e capital, entre a troca de
mercadoria por mercadoria e a troca de capital por mercadoria - em con-
cordância com a lei da troca de mercadorias.
No exemplo acima, 1 quarter de trigo = 1 mês de trabalho, diga-
mos, 30 jornadas. (Jornada de 12 horas.) Neste caso, o valor de 1 quarter

835
de trigo é inferior a 30 jornadas. Se 1 quarter de trigo fosse o produto
de 30 jornadas, o valor do trabalho seria igual a seu produto. Então, mais-
valia nenhuma e portanto nenhum lucro. Nenhum capital. Por isso, na
realidade, o valor de 1 quartel' de trigo é sempre inferior a 30 jornadas,
se l quarter de trigo representa o salário de 30 jornadas. A mais-valia de-
pende de quanto inferior seja. Por exemplo, 1 quarter de trigo = 25 jor-
nadas. Então, a mais-valia = 5 jornadas o:=: 1/6 do trabalho total. Se 1 quar-
ter (8 bushels) = 25 jornadas, 30 jornadas serão iguais a l quarter l 3/5
bushels. Assim, o valor das 30 jornadas (isto é, o salário) é sempre me-
nor que o valor do produto que contém 30 jornadas. O valor do trigo
não é portanto determinado pelo trabalho que o trigo comanda, que se
troca, e sim pelo trabalho que nele se contém. Em contrapartida, o va-
lor das 30 jornadas, seja qual for, é sempre determinado por 1 quaiter
de trigo.

3. Mais~valia.
Excetuada a confusão entre trabalho e força de trabalho, Ricardo
define com acerto o salário médio ou o valor do trabalho. E· que, diz,
esse valor é detemúnado, não 'pelo dinheiro, nem pelos meio.s ·de subsis-
tência que o trabalhador recebe, e sim pelo tempo de trabalho que custa
produzi-los; pela quantidade de trabalho materializado nos meíos de sub-
sistência do trabalhador. E o que chama de salário real. (Ver in?is tarde.)
Ali.ás, essa definição é uma inferência necessária de sua teoria. Uma
vez que o valor do trabalho é detenninado pelo valor dos meios de rub·
sistênda necessários em que se gasta aquele valor, e o valor desses meios,
como o de todas as outras mercadorias, é determinado pela quantidade
de trabalho neles aplicada, é conseqüência natural que o valor do traba-
lho = valor dos meios de subsistência necessários = quantidade de tra-
balho empregada nesses meios.
Essa fórmula não basta, por mais correta que seja (se abstraímos
da oposição direta entre trabalho e capital). O trabalhador individual, pa-
ra repor seu salário, por certo não produz diretamente 9s produtos de
que vive, mas produz mercadorias no valor de seus meios de subsistên-
cia ou produz o valor de seus meios de subsistência, ou antes, reproduz
esse valor, se consideramos a continuidade desse processo (pode produ-
zir produtos que não têm participação alguma em seu consumo e, mes-
mo quando produz gêneros de primeira necessidade, só o faz, em virtude
da divisão do trabalho, no tocante a um elemento isolado, por exemplo,

836
trigo, e só lhe dá uma forma, digamos, a de grão e não a de farinha). Isso
significa portanto que, ao examinarmos seu consumo diário médio, o
tempo de trabalho que se contém nos seus meios de subsistência de ca·
da dia constitui fração de sua jornada. Trabalha parte do dia para repro.
duzir o valor de seus meios de subsistência; a mercadoria produzida nessa
parte da jornada tem o mesmo valor ou tempo de trabalho da mesma
magnitude de seus meios de subsistência cotidianos. Depende do valor
desses meios de subsistência (isto é, da produtividade social do trabalho
e não da produtividade do ramo particular onde trabalha), o tamanho
que terá o segmento de sua jornada destinado a reproduzir ou produzir
o valor, ou seja, o equivalente de seus meios de subsistência.
Ricardo pressupõe naturalmente que o tempo de trabalho conti-
do nos meios de subsistência cotidianos é igual ao tempo de trabalho diá·
tio que o trabalhador tem de trabalhar para reproduzir o valor desses meios.
Mas intJoduz uma dificuldade e oblitera a compreensão clara dessa refa-
ção, por nã"o mostrar de imediato o destino de uma fração da jornada do
trabalhador, o de reproduzir o vaJor de sua força de trabalho. Daí surge
dupla confusão. Não se esclarece a origem da mais-valia, e assim os suces·
sores de. Ricardo o censuram por não ter apreendido nem explicado a na-
tureza da mais-valia. Esta é uma das razões das tentativas escolásticas de-
les para as explicar. Mas, uma vez que desse modo não se apreende com
clareza a origem e a natureza da mais-valia, considera-se o trabalho exce-
dente + o trabalho necessárío, em suma, a jornada global de trabalho co-
mo grandeza fixa, perdem-se de vista as diferenças na magnitude da mais-
valia, não se toma conhecimento da produtividade do capital, da extra-
ção coercitiva do trabalho excedente, formado pelo trabalho excedente"'
absoluto e ainda pelo impulso endógeno do capital de reduzir o tempo
de trabalho necessário; assim, não se esclarece a razão histórica do capi-
tal. A. Smith, em contrapartida, já ap1esentara a fórmula correta. Tão
importante quanto reduzir o valor a trabaJho era reduzir a mais-valia a
trabalho excedente, e de maneira explícita.
Ricardo parte da realidade presente da produção capitalista. O va-
<
lor do trabalho valór do produto que ele gera. O valor do produto > va-
lor do trabalho que o produz, ou seja, o valor do salário. O excedente do
valor do produto sobre o valor do salário é igual â mais-valia. (Ricardo
erra ao dizer lucro, mas então, como se observou antes, identifica lucro
com mais-valia e é desta que de fato fala.) Para ele, de fato, o valor do
produto > valor do salário. Como esse fato surge, permanece obscuro.
A jornada inteira é maior que o segmento dela requerido para produz.ir

837
o salário. Não se evidencia o porquê. Por isso, erra-se ao se pressupor fi·
xa a magnitude da 'jornada total, e daí deoorrem de imediato conseqüen-
cias falsas. Assim, o acréscimo ou decréscimo da mais.valia só se pode·
explicar pela produtividade crescente ou decrescente do trabalho social
que produz os meios de subsistência. Isto é, só se apreende a mais-valia
relativa.
E claro que, se o trabalhador utilizasse a jornada toda para produ-
zir os próprios meios de subsistência (ísto é, mercadoria igual ao valor
dos próprios meios de subsistência), não poderia haver mais-valia, nem
produção capitalista portanto, nem salário. Para exfatir este, a produtí·
vidade do trabalho social tem de estar desenvolvida bastante para haver
excedente da jornada total sobre o tempo de trabalho necessário à repro-
dução do salário, ou seja, trabaU1.0 excedente, seja qual for sua magnitu-
de. Mas, ainda é claro que tanto a produtividade pode diferir muito para
dado tempo de trabalho (magnitude da jornada), quanto· o tempo de tra-
balho, a magrritude da jornada, para dada produtividade. Ademais, é evi-
dente que, se a existência de trabalho excedente supõe certo desenvolvi-
mento da produtividade do trabalho, a mera possibilidade desse traba-
lho excedente (isto é, a existência daquele mínimo necessááo .de produ-
tívidade do trabalho) ainda não gera sua efetivídoiJe. Para isso, é mister
que o trabalhador seja antes coagi.do a trabalhar além do tempo necessá·
rio, e essa coação exerce-a o capital. E o que falta em Riça.ido e, em con-
seqüência, ignora ele toda a luta pela determinação da jornada normal.
Em nível inferior de desenvolvimento da produtividade. social do
trabalho, quando o trabalho excedente é relativamente exígÚo, a classe
dos que vivem do trabalho alheio será em geral dim~uta em relação ao
número dos trabalhadores. Pode ter crescimento bem considerável (pro-
porcional) à medida que se desenvolve a produtividade, isto é; a mais-
valia relativa.
Admitiu-se ainda que o valor do trabalho varia muito em diferentes
épocas no mesmo país e na mesma época em diferentes países. As zonas
temperadas. porém, são a pátria da produção capitalista. A produtividade
social do trabalho pode estar muito pouco desenvolvida, o que entretan-
to podem compensar, justamente na produção dos meios de subsistência,
a fertilidade dos agentes naturais (como a da terra) e a frugalidade dos
habitantes (em virtude do clima etc.) - duas coisas que sucedem, por
exemplo, na Índia. Em condições rudimentare·s pode o mínimo de salá-
rio (quantitativamente, em valores de uso) ser muito pequeno, ·em virtu-
de de necessidades sociais ainda não desenvolvidas, e contudo custar mui-

838
fo trabalho. Mas. se o trabalho necessário para produzir esse mínimo for
de magnitude mediana, a mais-valia produz.ida, embora se eleve muito
em relação ao salário (tempo de trabalho necessário) e seja alta portanto
a taxa de mais-valia, é tão pobre (considerando-se essa proporção), expres-
sa em valores de uso, quanto o próprio salário.
Seja o tempo de trabalho necessário = 10 horas, o trabalho exce-
dente = 2, a jornada total = 12. Se o tempo de trabalho necessário for
12 horas, o trabalho excedente 2 2/5 e a jornada total 14 2/5, os valores
produzidos diferirão muito: 12 horas, no primeiro caso, e 14 2/5, no se.
gundo. E semelhante o que sucede com as magnitudes-absolutas das mais-
valias. Num caso temos 2 horas, no outro 2 2/5. Não obstante, a taxa de
mais-valia ou de trabalho excedente setá a mesma, pois 2 ·~ 10 = 2 2/5 : 12.
O capital variáve! despendido, no segundo caso, se ê maior, também o é
a mais-valia ou trabalho excedente de que se apropria. Se nesse caso o
trabalho excedente, em vez de aumentar de 2/5 de hora, acrescer de 5/5,
atingindo assim 3 horas e a joroada total 15 horas, subiria a taxa de mo.is-
valia, apesar do acréscimo havido no tempo de trabalho necessário ou no
mínimo de salário, pois 2 10 = l/5, e 3 J2 = 1/4. Poderia haver as
duas oc_orrências, se, em vírtude do encarecimento do trigo etc., o míni·
mo de salârío tivesse crescido ,de 10 para 12 horas. Por conseguinte, mes·
mo então poderia a taxa de mais-valia não variar ou aumentar o montan-
te e a taxa de mais-valia.
Admitamos continue o salário necessário a ser 10, o trabalho exce-
dente 2 e não se alterem as demais condições (aqui está portanto fora de
consideração decréscimo nos custos de pr0dução do capital constante).
Trabalhe o operário entao 2 2/5 horas a mais, apropde-se de 2, ficando
2/5 de trabalho excedente. Nesse caso, salário e mais-valia crescerão na
mesma proporção, mas o primeiro representará mais que o salário neces-
sário ou o tempo de trabalho necessário.
Quando tomamos dada magnitude e a dividimos em duas partes,
é claro que uma parte só pode aumentar se a outra diminuir e vice-versa.
Mas isso de maneíra alguma é verdade para magnitudes crescentes (elâs·
ticas). E ajornada de trabalho tem essa magnitude crescente, enquanto
não se tenha conquistado uma jornada normal de trabalho. Nas magnitu-
des dessa natureza, ambas as partes podem crescer na mesma proporção
ou não. O acréscimo de uma não é regulado pelo decréscimo da outra
e 'ice-versa. Também este é o úníco caso em que salário e mais-valia po·
dem crescer juntos e ainda é possível que, no tocante ao valor de troca,
cresçam na -me:una proporção. E por si mesmo evidente que possam cres-

839
cer em valor de uso; este pode aumentar, embora decresça o valor do tra·
balho, por exemplo. De 1797 a 1815, quando o preço do trigo e o salá-
rio nominal tiveram a1ta considerável na Inglaterra, acresceu muito o nú·
mero de horas de trabalho por dia nas indústrias principais, que ·estavam
então em fase de ímplaciivel desenvolvimento, e acredito que essa circuns·
tância deteve a queda da taxa de lucro (por ter detido a da taxa de mais.
valia). Mas, num caso assim, sejam quais forem as circunstâncias, prolon·
ga-se a jornada normal de trabalho e reduz-se em correspondência a du·
ração normal da vida do trabalhador e por conseguinte a duração nonnal
da força de trabalho. E o que se dá quando esse prolongamento da jorna·
da é permanente. Se é apenas temporário, para compensiµ- encarecimento
temporário do salário, pode ter por conseqúêncía apenas {não se conside·
rando crianças e mulheres) impedir a queda da taxa de lucro nos negócios
cuja natureza possibilita prolongar-se o tempo de trabalho (essa possibili·
dade é mínima na agricultura).
Ricardo omitiu isso por completo, pois não investigou a origem da
mais-valia nem a mais-valia absoluta, e daí considerar a jornada de traba·
lho magnitude dada. No caso em exame está portanto errada sua lei, a de
que mais-valia e salário (lucro e salário, na sua expressão incorreta) só po·
dem crescer ou decrescer em proporção inversa, no tocante ao valor de
troca. Admitamos dois casos: num, o trabalho necessário não. se altera nem
o trabalho excedente. Isto é, 10 horas+ 2 horas;jornada-_de-trabalho = 12;
mais-valia= 2. Taxa de mais-valia= 1/5.
No outro, o tempo de trabalho necessário é invariáve1, e. o trabalho
excedente aumenta de 2 horas para 4. Portanto, 10 + 4 = jornada de tra·
balho de 14 horas; mais-valia = 4 horas. Taxa de mais-valia "" 4 10 =
4/10 = 2/5.
Nos dois casos não varia o tempo de trabalho necessário;· mas num
a mais-valia é duas vezes maior que no outro, e a jornada de trabalho do
segundo caso é 1/6 maior que a do primeiro. Além disso, os valores pro·
duzidos, correspondentes às quantidades de trabalho, serão bem diversos,
embora não varie o salário; no primeiro caso, o .valor será 12 horas, no
segundo 12 + 12/6 = 14. E portanto errado diz.er que, suposto o mesmo
saldrio (segundo o valor, o tempo de trabalho necessário), a mais-valia
contida em 2 mercadorias está na mesma proporção com as quantidades
de trabalho nelas inseridas. Isso só é verdade quando a jornada normal
de trabalho não varia.
Admitainos ainda que, em virtude da ascensão da produtividade do
trabalho, diminua o salário necessário (embora não varie o que este adqui-

840
re em valores de uso) de 10 para 9 horas e também diminuia de 2 para
1 4/5 (ou 9/5) o tempo de trabalho exc.edente. Teremos então 10 : 9 =
2 1 4/5. O tempo de trabalho excedente cairá portanto na mesma pro-
porção do necessário. A taxa de mais-valia é a mesma nos dois casos, pois
2 = 10/5 e 1 4/5 ;;;;: 9/5; l 4/5 : 9 = 2 10. De acordo com o pressuposto,
não variará a quantidade de valores de uso que poderá ser comprada com
a mais-valia. (Contudo, isso só se aplicaria aos valores de uso que são meios
de subsistência necessários.) A jornada de trabalho cairá de 12 para 10 4/5.
O montante dos valores produzidos no segundo caso será menor que no
primeiro. E apesar dessas quantidades desiguais de trabalho, a taxa de
mais-valia será a mesma nos dois casos.
Na mais-valia distinguúnos: mais-valia e taxa de mais-valia. Consi·
derando-se uma jornada de trabalho, a mais-valia é igual ao número abso-
luto de horas de trabalho que ela representa, 2, 3 etc. A taxa é igual à
proporção desse número de horas com o das que constituem o trabalho
necessário. Aquela distinção já é relevante porque indica a duração mutá-
vel da jornada. Se a mais-valia = 2, a taxa é 1 / 5, se o tempo de trabalho
necessário= 10 horas, e 1/6, se o tempo de trabalho necessário= 12. Num
caso, a jomada de trabalho= 12 horas; no outro, é igual a 14. No prúnei-
ro caso, a taxa de mais-valia é maior, e apesar disso o operário trabalha
menor numero de horas por dia. No segundo, a taxa de mais-valia é me-
nor, o valor da força de trabalho maior, e ao mesmo tempo o operário
trabalha durante o dia número maior de horas. Vemos aí que, para mais-
valia invariável, mas com jornada de duração desigual, a taxa de mais-
'Valia pode variar. No caso anterior, 10 : 2 e 9 l 4/5, vimos que, para ta-
xa invariável de mais-valia (mas jornada desigual), a própria mais-valia
pode ser bem diferente (num caso 2, no outro 1 4/5).
Mostrei antes (càp. 2) que, dados a duração da jornada de trabalho,
o tempo de trabalho necessário e portanto a taxa de mais-valia, o mon-
tante de mais-valia depende do número de trabalhadores ao mesmo tem-
po empregados pelo mesmo capital. 131 Era uma afirmação tautológica.
Pois, se 1 jornada me dá 2 horas excedentes, 12 jornadas me darão 24
horas excedentes ou 2 jornadas excedentes. Contudo, a afirmação se tor·
na muito únportante para se determinar o lucro, igual à proporção da
mais-valia com o capital adiantado e por conseguinte dependente da mag-
nitude absoluta da mais-valia. Isso se toma importante porque capitais de

131. Marx menciona aí o capítulo que começa na página 95b do caderno UI do


manuscrito de 1861-1863, com o título "2. Mais-valia absoluta". A matéria referida
por Marx. encontra-se na seção "Jornadas simultâneas", pp. 102-104 do manuscrito.

841
grandeza igual mas compostçao orgamca diferente empregam númem
desigual de trabalhadores, têm portant.o de produzir mais-valia desigual.
e em conseqüência gerar lucro desígual Com taxa decrescente· de mais-valia
pode o lucro subir e com ·taxa ascendente cair ou permanecer o mesmo,
quando a alta ou queda na taxa de mais-valia é compensada por m'oví-
mento oposto no número dos trabalhadores empregados. Desde logo ve-
mos aí ser grave erro identificar as leis da alta e queda da mais-valia às
leis da alta e queda do lucro. Se consideramos apenas a simples lei da mais-
valia, parece tautologia dizer que, para dada taxa de mais-valia (e dada
jornada), o montante absoluto da mais-valia depende da. magnitude do
capital empregado. Pois o acréscimo desse montante de capital se iden-
tifica com o acréscimo do número dos trabalhadores ao mesmo tempo
empregados, segundo o suposto, ou ambos são apenas expressões do mes-
mo fato. Mas quando consideramos o lucro nos casos em que o montan-
te do capital aplicado e o número dos trabalhadores empregados diferem
muito para capitais de igual magnitude, apreende-se a importância da lei.
Ricardo parte de mercadorias de valor dado, ísto é, de mercadorias
que representam dada quantidade de trabalho. E mais-valia absoluta e
mais-valia relativa, com esse pontp de partida, parecem coincidir sempre.
(Em todo caso, isso explica a wlilateralidade de seu modo de proceder
e harmoniza-se com todo o seu método de pesquisa: partir do va!Or das
mercadorias detemrlnado pelo tempo de trabalho nelas :contido e então
investigar até onde salário, lucro etc. exercem influência at) Essa apa·
rência contudo engana, uma •.;ez que então se trata nãp da -mercadori!I
e sim da produção capitalista, das mercadorias como produtos do capital.
Empregue um capital detenninada quantidade/de trabalhadores,
digamos 20, e seja o salário = 20 libras. Para simplificar, reduza-se a ze-
ro, isto é, seja excluído, o capital fixo. Admitamos que esses 20 trabalha·
dores transformem 80 libras (esterlinas) de algodão em fio, trabalhan·
do l 2 horas por dia. Se a libra-peso de algodão custa 1 xelim, 20 libras-
peso = 1 libra, e 80 libras = l 600 libras-peso. Se 20 trabalhadores fiam
1 600 libras-peso em 12 ~oras, fiarão em 1 hora 1 600/12 libras-peso =
133 1/3 libras-peso. Por conseguinte, se o tempo de trabalho necessá·
rio = 1O horas, o tempo de trabalho excedente = 2 horas e correspon-
de a 266 2i3 libras-peso de fio. O valor das 1 600 libras-peso de fio se-
rá 104 libras. Pois, se 10 horas de trabalho = 20 libras, 1 hora de tra-
balho = 2 libras, 2 horas = 4 libras; portanto, l2 = 24 libras (80 libras
relativas à matéría-prima + 24 libras= 104 libras).

842
Mas, se os operanos trabalharem 4 horas de trabalho excedente,
o correspondente produto = 8 libras (quer dizer; a mais-valia que produ-
zem; o produto deles será de fato igual a 28 libras132 ). O produto glo·
bal = I 21 1/3 libras 133 • E essas 121 1 /3 libras corresponderão a l 866 2/3
libras-peso de fio. Uma vez que não variaram as condições de produção,
1 libra-peso de fio continuará com o mesmo valor; conterá a mesma quan-
tidade anterior de tempo de trabalho. Segundo o pressuposto, também fi-
cará invariável o salário necessário (seu valor, o tempo de trabalho nele
contido).
As 1 866 2/3 libras-peso, sejam produzidas nas condições do pri-
meiro caso ou nas do segundo, isto é, com 2 ou 4 horas de trabalho ex-
cedente, terão, nos dois casos, o mesmo valor. Vejamos: 13 1/3 libras cor-
respondem às 266 2/3 libras-peso adicionais de algodão fiadas. Com mais
80 libras relativas às 1 600 libras-peso de algodão·, teremos 93 1/3 libras,
e 4 horas de trabalho adicionais dos 20 homens equivalem a 8 libras, nos
dois casos. No global correspondem ao trabalho 28 libras, e assim chegare-
mos a 121 1/3 libras. Em ambos os casos, o salário é o mesmo, e a h'bra-
peso de fio custa l 3{1 O xelim. Uma vez que o valor da libra-peso de algo-
dão é l xelim, ficará, nos dois casos, para o trabalho de novo adí.cionado
em 1 libra-peso de fio, 3/10 de xelim= 3 3/5 pence (ou 18/5).
Entretanto, a relação entre valor e mais-valia em cada libra de fio
muda muito nas circunstâncias estabelecidas. No primeiro caso, uma vez
que o trabalho necessário = 20 libras, o trabalho excedente = 4 libras, ou
seja, 2 horas para este e 1O horas para aquele, o trabalho excedente está
para o necessárío na razão 2 : 10 = 2/10 = 1/5 (do mesmo modo, 4 li-
bras 20 libras = 4/20 = 1 /5). Nos 3 3/5 pence da libra-peso de fio en-
cerra-se 1/5 de trabalho não pago = 18/25 de pêni ou 72/25 = 2 22/25
farthings. No segundo, em contrapartida, o trabalho necessário = 20 li-
bras (10 horas de trabalho), o trabalho excedente = 8 libras (4 horas de
trabalho). O trabalho excedente está para o necessário na raz.ão 8 : 20 =

132. Marx fala aí do novo valor criado pelos 20 trabalhadores: geram em l nora
de ttabalho valor de 2 libras e numa jornada de 14 horas valor de 28 libras. O pro-
duto dos 20 trabalhadores compõe-se de 10 horas de trabalho necessário, equíva·
lentes a 20 libras, e de 4 horas de traballto excedente, ou seja, 8 libra!>.
133. O valor do produto global contém o valor transferido ao produto (e) e o no-
vo valor cliado (v + m). Uma vez que Marx aí absttaí do capital f"ixo, o valor transfe.·
rido consíste no valor da matéria-prima. No exemplo em exame, o valor da matéria·
prima = 93 1/3 libras (em 1 hora serão fiadas 133 113 libras-peso de algodão, em 14
horas 1866 2}3 libras-peso; 1 libra-peso de algodão C\lsta l xelim). Adícionadas ao
novo valor criado (28 libras), temos 121 1}3 libras.

843
8/20 = 4/10 '= 2/5. Assim, nos 3 3/5 pence da libra-peso de fio inserem·
se 2/5 de trabalho totahnente grâfü ou 5 19/25 farthings ou l pêni e
l 19/25 farthings. A mais-valia na libra-peso de fio, embora tenha esta
o mesmo valor nos dois casos e se pague em ambos o mesmo salário, é
num caso o dobro da do outro. A relação entre valor do trabalho e mais-
valia em cada mercadoria individual, considerada parte alíquota do pro-
duto, tem naturalmente de ser a mesma do produto todo.
No primeiro caso, se o capital adiantado fosse 93 1/3 libras para al-
godão, quanto seria para salário? Aí o salário para 1 600 libras-peso= 20
libras, e portanto para as 266 2/3 libras-peso adicionais = 3 1/3 libras.
Desse modo, temos 23 l /3 libras. O dispêndio global = capital 93 l /3 li-
bras + 23 1/3 libras-= ll6 2/3 libras. O produto= 121 1/3 libras. [Ades-
pesa adicional em capital variável de 3 1/3 libras só dará 13 1/3 xelins
(= 2/3 de libra) de mais-valia. 20 libras: 4 libras = 3 1/3 libras 2/3 de
libra.)
No outro caso, porém, o dispêndio de capital só importará em
92 1/3 + 20 libras = 113 l/3 libras, e às 4 libras de mais-valia se acrescen-
tarão 4 libras. Produz.se num caso a mesma quantidade de fio obtida no
outro, e ambas têm o mesmo valor, isto é, confi.guram o mesmo total
de trabalho posto em movimento por capitais de magnitude desigual,
embora o salário não varie; em contrapartida, as jornadas de trabalho
são de magnitude desigual e por isso diferem as quantidades de trabaJho
não pago. Considerada cada libra-peso de fio singularmente, difere o sa-
lário por ela pago ou o trabalho pago nela contido. O mesmo_ salário se
reparte então por maior quantidade de mercadorias, não pot ser o tra-
balho num caso mais produtivo que no outro, e sim pgr ser a massa glo-
bal de trabalho excedente não pago posta em movimento num caso maior
que a· do outro. Por isso, com a mesma quantidade de trabalho pago pro-
duzem-se, num caso, mais libras-peso de fio que no outro, embora nos
dois casos se produzam as mesmas quantidades de fio, que representam
as mesmas quantidades de trabalho total (pago e não pago). Se, ao con-
trário, tiver aumentado a produtividade do trabaJho no segundo, cairá de
quàlquer modo o valor da libra-peso de fio (seja qual for a relação entre
a mais-valia e o capital variável).
Em tal caso, portanto, seria errado dizer que - por ser dado o va!.or
da libra-peso de fio = 1 xelim e 3 3 /5 pence, e também o valor do traba-
lho adicionado = 3 3/5 pence, e por se1 f'rxo, segundo o pressuposto, o
salário, isto é, o te:mpo de trabalho necessário - a mais-valia seria a mes-
ma e que 2 capitais, invariáveis as demais condições, teriam produzido
o fio com igual lucro. Isso estaria certo se se tratasse de 1 libra-peso, mas
af se trata de um capital que produziu 1 866 2/3 libras-peso de fio. Para
saber de quanto é seu lucro (na verdade, a mais-valia) numa libra-peso,
temos de saber qual a duração da jornada de trabalho ou a quantidade
de trabalho não pago (para dada produtividade) ·que o capítal põe em
movimento. Mas não se pode perceber isso na mercadoria singularmen-
te considerada.
A~im, Ricardo oogita apenas do que tenho eh.amado de mais-valia
relativa. Seu ponto de partida, como parece ter sido o de Smith e seus
predecessores, é este: é dada a magnitude da jornada de traballu:J. (No
máximo, Smith menciona diferenças na duração da jornada de trabalho
em ramos de trabalho diversos, as quais se anulam ou oompensam pela
intensidade relativa maior do trabalho, pela dificul4ade, repugnância des-
te etc.) A partir daquele pressuposto, Ricardo explica a mais-valia relati-
.v.a de maneira em geral exata. Antes de apresentar os pontos principais
dessa teoria, ainda algumas citações que elucidem a concepção de Ricardo.

"0 trabalho de um milhão de homens nas manufaturas produzirá sem-


pre o mesmo valor, mas nem sempre a mesma riqueza" (I.c., p. 320).

Isto é, o produto de seu trabalho cotidiano será sempre o produto


de um milllão de jornadas, conterá o mesmo tempo de trabalho, o que é
errado ou só é certo quando for estabelecida em geral a mesma jornada
normal de trabalho, consideradas as diferentes dificuldades etc. nos dis·
tintos ramos de trabalho.
Entretanto, ainda assim a proposição é falsa, na forma geral em que
está expressa. Admitamos que a jornada normal de trabalho seja de 12 ho-
ras. Seja de 50 libras' o produto anua] em dinheiro de um homem, e inva·
riável o valor do dinheiro. Nesse caso, o produto de l milhão de homens
será sempre de 50 milhões de libras por ano. Se o trabalho necessário é de
6 horas, o capital despendido nesse_ milhão de homens será de 25 milhões
de libras por ano. A mais-valia é também de 25 mílhões de libras. O pro·
duto será sempre de 50 milhões, recebam os trabalhadores 25 ou 30 ou 40
milhões. Só no primeiro caso será a mais-valia de 25 milhões; no segWldo,
será de 20 milhões, e no terceiro, de 10 milhões. Se o capital adiantado
consistisse apenas em capital variável, isto é, somente no capital despen-
dido no salário desse milhão de homens, Ricardo teria razão. Só tem ra-
zão, portanto, no único caso em que a totalidade do capital se iguale ao
capital variável; precondição que aparece em todas as observações de Ri-

845
cardo e de Smith, sobre o capital da sociedade toda, e que na produção
capitalista, não se verifica em nenhum ramo industrial particular e muito
menos ainda na produção da sociedade como um todo.
D() capital const(IJlte .a parte que entra no processo de trabalho, sem
entrar no processo de formar valor, não ingressa no produto (valor do pro-
duto;, e por isso não nos interessa agora que tratamos do valor do produ·
to anual, por mais importante que seja levar em conta aquela parte doca-
pital constante para a determinação da taxa geral de lucro. Mas a coisa
muda no tocante à porção de capital constante que entra no produto
anual. Vimos que segmento dessa porção do capital constante, ou o que
se reve1a capital constante numa esfera de produção, se patenteia produ·
to imediato do trabalho noutra esfera, durante o mesmo período de pro·
dução de um ano, e que ?Or isso grande parte do capital despendido por
ano, a qual aparece na figura de capital constante, do ângulo do capitalis
ta individual ou do ramo particular de produção, reduz-se a capital varió.-
vel do ponto de vista da sociedade ou da classe capitalista. Esse segmento
está portanto incluído nos SO milhões, na porção dos 50 milhões que cons-
titui o capital variável ou se despende em salário.
Mas o caso é outro com a parte do capital_ constante absorvida para
repor o capítal constante consum'ido na indústria e na agricultura, com a
parte absorvída do capitaJ constante empregado nos ramos_ de prndução
que produzem capital constante, matérià-prima em sua·; piimeira forma,
capital fürn e matérias auxiliares. O valor dessa parte reaparece, reproduz-
se no produto. A proporção em que entra no valor do produto todo de-
pende por completo de sua magnitude efetiva (suposta irivaríável a produ-
tívidade do trabalho; mas, por mais que varie a produtividade, terá aquele
valor magnitude definida). (Em média, descontadas algumas exceções na
agricultura, o volume dos produtos, isto é, a riqueza produzida por l mi·
lhão de homens, a qual Ricardo distingue do i'lfllor, também dependerá
sem dúvida da grandeza desse capital que antecede à produção.) Essa par-
te do valor do produto não existiria sem o novo trabalho anual do mi·
lhão de homens. Em contrapartida, o trabalho do milhão de homens não
daria o mesmo volume de produtos sem esse capital constante cuja exis-
tência não depende da produção anual deles. Esse capital entra no proces-
so de trabalho como condição de produção, mas nem uma hora a mais
se trabalha para se reproduzir seu valor, Por isso, como valor não resulta
do trabalho anual, embora tal valor não se tívesse reproduzido sem esse
trabalho anual. Se a parte do capital constante a qual entra no produto
for 25 milhões, o valor do produto do milhão de homens será 75 milhões,

846
se for 10, esse valor será apenas 60 milhões etc. E uma vez que no curso
do desenvolvimento capitalista aumenta a proporção do capital constante
com o variável, o valor do produto anual do milhão de homens tenderá
a crescer de contínuo na razão do crescimento do trabalho pretérito, fator
que participa da produção anual deles. Já se infere ·aí que Ricardo não po-
dia compreender a essência da acumulação nem a natureza do lucro.
Ao crescer a proporção do capital constante com o variável, cres-
ce também a produtividade do trabalho, as forças produtivas engendra·
das com que opera o trabalho social. Em virtude dessa produtividade cres-
cente do trabalho, por certo se desvaloriza de contínuo parte do capital
constante existente, ao não se regular o valor dele pelo tempo de traba·
lho que originalmente custava e sim pelo tempo de trabalho com que se
pode reproduzir,-tempo esse que diminui de maneira progressiva com a
produtividade crescente do trabalho. Por isso, embora seu valor não cres-
ça na razão de seu volume, não obstante cresce, porque o vo]ume cresce
com mais rapidez do que decresce o valor. Mais tarde, porém, voltare-
mos às idéias de Ricardo sobre a acumulação.
Está claro·aí que, uma vez dada a jornada de trabalho, o valor do
produto· do trabalho anual do milhão de homens variará muito com ava-
riação do volume do capital constante que entra no produto, e que esse
valor, apesar da produtividaàe crescente do trabalho, será maior onde o
capital constante constítui grande parte da totalidade do capital, do que
nas condições sociais onde representa parte relativamente pequena dessa
totalidade. Com o progresso na produtividade do trabalho social, acom-
panhado que é pelo crescimento do capital constante, parte cada vez maior,
relatívarnente, do produto anual do trabalho caberá portanto ao capital
como tal, e por conseqüência o capital na forma de propriedade {renda
à parte) aumentará de contínuo, e a parte do valor a qual cada trabalha·
dor e mesmo a classe trabalhadora criam cairá cada vez mais em relação
ao produto de seu trabalho pretérito que os enfrenta como capital. As·
sim, crescem de maneira inípterrupta a alienação e a oposição entre a for-
ça d.e trabalho e as condições objetivas de trabalho, independentizadas
na forma de capital. (Não estamos considerando o capítal variâvel, a parte
do produto do trabalho anual necessárí.a para que se reproduza a classe
trabalhadora; mas até esses meios de subsistência é capital que a enfrenta.)
Ricardo expressa a idéia de ser a jornada de trabalho .quantidade
dai/a, limitada, fixa. ainda de outras maneicas, por exemplo:

(a remuneração do trabalho e o lucro do capital) "em conjunto têm


sempre o mesmo Jllllor" (1.c., p. 499, cap. XX:XII, "Mr. Malthus opi-
nions on r<:nt"),

847
noutras palavras, isso quer dizer apenas: o tempo de trabalho (diário), cujo
prnduto se re-{JIIfte entre remuneração do trabalho e lucro do capital, é
sempre o mesmo, é constante. ·

"Salâiios e lucro em oonjunto terão o mesmo ~Yllor" (l.c., p. 481, nota).

Aqui é ocioso repetir que, nessas passagens, se leia sempre mais-valia


onde está lucro.

"Salátio e lucro considerados em conjunto possuirão. sempre o mesmo


valor" (pp. 490, 491).
"Os salários têm de ser estimados pelo WJlot real, isto é, pela quantidade
de trabalho e capital que foram empregados para produzf.. /os. e não pelo
WJlor nominal em casacos, chapéus, dinheiro ou trigo" (l.c., cap. l "On
Value", p. 50).

O vaJor dos meios de subsistência que o trabalhador recebe (compra


com o salário), trigo, roupas etc., é detenninado pelo tempo de traba·
lho total exigido para produzi-los, pela quantidade de trabalho imediato
e pela quantidade de trabalho materializado, necessárias para produzi·
los. Mas Ricardo enreda o probléma por não lhe dar a expressão coneta,
por não dizer: "o valor real do salário, isto é, aquele segmento da jornada,
requerido para reproduz.ir o valor dos próprios meios de subsistência dos
trabalhadores, o equivalente a esses meios de subsistência, o qual lhes ê
pago ou se troca por seu trabalho" O salário r~al tem de se,r,determina-
do pelo tempo médio que o trabalhador tem de trabalhar por dia, para
produzir ou reproduzir o próprio salário.

"O trabalhador só recebe preço realmente alto por seu traballlo quarufo
seu salário compra o produto de grande qual).tidade de trabalho" (1.c.,
p. 322).

4. Mais-valia relativa. Salário relativo.

Esta é de fato a única fonna de mais-valia que Ricardo analisa sob o


nome de lucro. Seu modo de ver:
A quantidade de trabalho exigida para produzir a mercadoria e nela
contida detennina seu valor, que portanto é um dado, uma grandeza defi·
nida. Essa magnitude se reparte entre trabalhador e capitalista. (Ricardo,
como Smith, não considera aí o capital constante.) E cla.10 que a porção

848
de um só pode crescer ou decrescer na proporção que decresce ou acres·
ce a porção do outro. Uma vez que o valor das mercadorias é devido ao
trabaJho dos trabalhadores, é esse próprio trabalho que, sejam quais fo.
rem as círcunstâncias, constitui a precondição; mas o trabalho é impossí-
vel sem que o traballi.ador viva e se mantenha, receba portanto o salário
necessário (mínimo de salário, salário == valor da força de trabalho), Por
isso, salário e mais-valia - essas duas categorias em que se reparte .o valor
da mercadoria ou o próprio produto - estão entre si em proporção inver-
sa, e o primacial, o detemúnante, é o movímeoto dos salários. A ascensão
ou queda d.estes causa o movimento oposto do lado do lucro (mais-valia).
O salário não sobe ou desce por cair ou se elevar o lucro (mais-valia), e
sim, ao contrário, a mais·valia (lucro) cai ou se eleva por subir ou descer
o salário. O produto excedente (conviria dizer a maiHalia) que resta de-
pois de a classe trabalhadora ter recebido o que lhe cabe de sua própria
produção anual, constitui a substância de que vive a classe capitalista.
Dado que o valor das mercadorias se detennina pela quantidade de
trabalho nelas contido, e que salário e mais-valia (lucro) são apenas pur-
tes, propo1ções em que duas classes de produtores dividem entre si ova-
Io1 da mercadoria, é claro que ascensão ou queda do saláiio, embora de-
termine a taxa da mais-valia (lucro), não influencia o valor da mercado-
ria ou o preço (como expressão monetária desse valor). A proporção em
que um todo se divide entre dois associados não torna o próprio todo
maior nem menor. "E'. portanto errado pressupor que aJcensão dos saltirios
eleva o& preços das mercadorias;. apenas faz o lucro (mais-valia) decrescer.
Mesmo as exceções que Ricardo apresenta, nas quais alta dos salários fa+
ria cair os valores de troca de algumas mercadorias e subir os de outras,
são errôneas quando se trata de valores, e verdadeiras somente para pre-
fXIJ de custo.
Uma vez que a taxa de mais-valia (lucro) é determinada pelo nível
relativo dos salários, como é este detemúnado? Concorrência à parte, pe·
lo preço dos meios de subsistência necessários. Este por sua vez depende
da produtividade do trabalho, a qual acresce com a fertílidade. da terra
(Ricardo supõe produção capitalista). Todo "melhorament<:1" reduz o
preço das mercadorias, dos meios de subsistência. O saláiio ~u o valor
do trabalho sobe e desce portanto em proporção inversa ao desenvolvi
mento da produtividade do trabalho, desde que este produza meios de
subsistência que entrem no consumo médio da classe trabalhadora. A ta-
xa de mais-valia (lucro) cai ou sobe portanto na proporção direta do
desenvolvimento da produtividade do ti:abaiho, pois esse desenvolvimen-
to reduz ou aumenta o salário.

849
A taxa de lucro (mais.valia) não pode cair sem subir o salário, e
não pode subir sem este cair.
O valor do salário tem de ser calculado não de acordo com a quan;
tidade dos meios de subsistência que o trabalhador recebe, e sim pela
quantidade de trabalho que custam esses meios de subsistência (de fato,
pela proporção da jornada de trabalho da qual ele mesmo se apropria),
segundo a participação relativa que o trabalhador tem no produto glo-
bal, ou antes, no valor global desse produto. E possível que, estimado
em valores de uso (quantidade de mercadoria ou dinheiro), o salário su·
ba (com a produtividade crescente), mas caia segundo o valor, e vice-versa.
Um dos grandes méritos de Ricardo é ter exanúnado, fixado como cate-
goria, o salário relativo ou proporcional. Até então, o salário sempre fora
considerado algo simples, e o trabalhador, em conseqüência, um animal.
Mas agora passa a ser visto em sua conexão social. A posição recíproca
das classes depende mais dos salários relativos que do montante absoluto
dos salários.
Apoiar agora as proposições acima em citações de Ricardo.

"O valor do veado, produto da jornada de trabalho do caçador, cones-


ponde exatamente ao valor dos peilces, produto da jorriada de trabalho
do pescador. A relação de valor entre o pescado e a caça ê por intei-
ro determinada pela quantidade de Ullbalho realizada em 'cada um,qwzl-
quer que seja a quantidade produzida ou o nível al~o ou baixo dos sa-
1.ârfDs e do lucro. Se._. o pescador... empreg;i. 10 pessoas cujo trabalho
custa 100 horas por ano e que 11um dia obtêm oom seu, trabalho 20 sal-
mões; se... o caçador... também emprega 10 .homens cujo trabalho custa
100 ú'bras por ano e que num dia lhe trazem 10 veados, ..:. o preço natu-
ml de um veado será dois salmões, não·importa que seja grande ou pe-
quena a cota do produto global destinada às pessôas que o produzem.
A cota por ventura paga como salório é da maior importância para a ques-
tã'o do lucro; é mister que fique de imediato ela.to que os lucros são altos
ou baixos eicatamente na proporção em que os salários são baíxos ou
altos. M.as isso não pode inflllenciar no mínimo o valor relativo do pes-
cado e dã caça, pois o salário nas duas ocupações estará ao mesmo tempo
alto ou baixo" (cap. l "On Va(ue", pp. 20, 21).

Vemos que Ricardo deriva do trabalho dos homens empregados o


valor inteiro da mercadoria. O que se reparte entre eles -e . o capital é seu
próprio trabalho ou o produto deste ou o valor desse produto.

"Nenhuma alteração dos salários pode provocar qualquer alteração no


valor relativo dessas mercadorias; pois, admitamos subam eles, não será
exigida qwzntidade mawr de trabalho em nenhuma dessas ocupações,
mas o trabaTho será pago a preço mais alto•.• Podem os salários subir

850
de vinte por cenio e os lucros em conseqüência cair em proporção maior
ou menor, sem causar a menor alteração no valor relativo dessas mer-
cadorias" (l.c., p. 23).
"O wzwr do trabalho não pode subir sem redução do lucro. Quando o
trigo é para ser dividido entre o arrendatário e o uaba.lhador, ficará tan-
to menos para aquele, quanto maior for a cota deste. Também ao se re-
partir pano e artigos de algodão entre o trabalhadoJ e seu empresário,
para este ficará tanto menos quanto tnllior fora cota daquele" (Lc.,p. 31).
"A. Smith e, pelo que sei, todo~ os autores que o seguem, sem exceção,
afinnararn que alta do preço do trabalho tem por conseqüência unifor-
me elevação do preço de todas as mercadorias,,· Espero ter conseguido
mostrar que essa opllúão nio tem fundamento algum" (l.c.• p. 45).
"Alta dos salários, decorrente de melhor remuneração ·do trabalhador
ou da dificuldade de se obterem os bens necessários em que se despen-
dem os salários, não gera, salvo em alguns casos, elevação de preços,
embora concorra muito para a queda do lucro." A coisa é difere-nte
quando a alta do salário provém de "variação no valor do dinheiro".
"Num caso" (isto é, o por último referido) "não se 4estina prop<»çaõ
mJJ.ior do 11aba1ho anual do pais para o sustento dos 'traoofhadores, en·
quanto, no outro, porção maior tem esse destino" (1.c., p. 48).
"O preço natural do trabalho subirá ao elevar-se o preço dos alimentos
e dos meios de subsistência., e baixará, ao cair esse preço" (1.c., p. 86).
"O produto excedente que remanesce, depois da satlsfaçào das neces·
sidades da população existente, tem de estar, por força, na razão da
fQc11idllde de produção, isto é, do número menor de pes$0a5 emprega-
das na produção" {p. 93).
"Nem o arrendatário que cultiva aquela terra que detetJDina o preço,
nem o fabricante que produz mercadorias, renuncia porção do produ-
to em favor da renda. O valor global de suas mercadorias se divide em
duas partes apenas: uma constitui o lucro do capital.. e a outra, a remu-
neração do trabalho,, (l .c., p. 107).
"Admitamos que o preço da seda, do veludo, do mobiliário e de outras
mercadorias que o trabalhador não precisa, suba em conseqüência de
nelas se despender mais tmbalho: não será isso desfavorável ao lucro'!
Por certo que não, pois somente a alta do salário pode prejudicar o lu·
cro; seda e veludo não são consumidos pelo trabalhador e por isso não
podem elevar os salários" {l .c., p. 118).
"Se o trabalho de dez homens obtém, em ten:a de certa qualidade, 1 SO
quarters de trigo, e seu valor for 4 libras por quarter ou 710 libras ... "
{p. 110) " ... em todos os casos tem de se repartir a mesma soma de 710 li·
bras entre sal.ária e lucro ... Suba ou desça o salário ou o lucro, é dessa
soma de 720 que ambos têm de sair. Por um lado, o lucro nunca pode
ascender ao nível de absorver dessas 720 libras porção tão grande que
não reste o suficiente para prover os trabelhadores com os bens de abso·
luta necessidade; por outro lado, os satários nunca podem subir a pon-
to de não deixar porção alguma daquela soma para lucro" (l.c., p. 113).
"Os lucros dependem de Slllários altos ou baixos;. os salmos, do preço
dos bens necessários ao trabalhador, e o preço 'desses bens, do preço
dos alimentos principalmente, uma vez que todos os demais artigos
podem ser acrescidos quase sem limites" (l.c., p. 119).
"Embora se produza valor maior" (ao piorar a tem), ·proporção maior
do que resta desse 1111/or, depois de paga a renda, é consumida pelos pro-

851
dutores" (ele identifica aí ttabalhadores a produtores), "e isso e só
isso - determina o lucro" (l .c., p. J 27}.
"A característica essencial de um melho/'llmento é reduzir a quantida-
de de· irabalho antes neces.~a para produzir urna mercadoria. Mas esse
decréscimo não pode ocorrer sem queda de seu preço ou Jltllor relati·
w" (l.c., p. 70).
"Diminua-se o custo de produção de chapéus, e seu preço acabará baí·
xando a seu novo preço natural, embora a procwa tenha dobrado, tri·
plicado ou quadruplicado. Diminua-se o custo de subsistência dos trll·
balhadores, reduzindo-se o preço natwal dos alimentos e vestuário
que mantêm a vida, e os salários acabarão caindo, mesmo que a pro-
cura de trabalhadores tenha subido muito" (l .c., p. 460).
"Quanto maior- a proporção que vni para salário, tanto menor a que
irá para lucro, e vice-versa" (Lc., p. 500).
"Um dos objetivos dessa obra foi mostrar que, a.cada decréscimo do
valor real dos bens necessârios ao trabalhador, caem os salários e· sobe
o lucro do capital, ou seja, que, para dado wzlor a.nua!, se paga porção
menor à classe trabalhadora e porçio maior àqueles cujos fundos em-
pregam essa classe."

(l! s6 nessa frase. hoje corriqueira, que ruca.rdo expressa a natureza


do capital, sem contudo entrevê-la. Capital não é trabalho acumulado
empregado ~Ia classe trabalhadora, ~los próprios trabalhadores, e sim
"fundo", •'trabalho acumulado'', "que emprega· a essa classe", emprega
trabalho presente, imediato.)

"S~jam 1 000 libras o valor das mercadorias produzidas em determi-


nada manufatwa, a ser repartido entre o patrão e seus trabalhadores"
(aí de ·novo expressa a natureza do capital; o capitalista é o patrão, os
operârlos são seus trabalhadores) "na proporção· de . 800 libras pua
os trabalhadores e 200 paJ:a o patrão. Se o valor dessas mercadorias
cair para 900 libras é em saláxios se economizarem 100 libras em vir-
tude da baixa dos bens necessários, em nada se p1ejudicarâ a .tenda
Hquida do empresmo" (pp. 511, 512).
"Os calçados e o vestuário do trabalhador terão provavebnente baíxa
de 75%, se for possível, em virtude de melhoramentos da maquinaria,
produzi·los oom um quarto do trabalho até agora necessário para sua
produção. Mas está longe de ser verdade que o trabalhador, por isso,
esteja sempre capacitado para consumir quatro casacos ou quatro pa-
res de .sapato:;, em vez de um. O provâ.vel é que seu salário, em virtu-
de dos efeitoi da concotrêneia. e do estimulo ao acréscimo da popula-
ção, se ajustará em pouco tempo ao noro llllior dos bens neceS$/Úios
em que era despendido. Se essas melhorias se. estenderem a todos os
objetos de consumo do trabalhador, é possível que o enconuemos, de-
pois de poucos anos, de posse de pequena adição apenas, se de alguma,
de .suas f.ruições, embora o valor de t.toca daquelas mercadorias tenha
deci:escído muito em 1elação a qualquer outra mercadoria, e elas sejam
o produto de quantidade de trabalho bem menor" (l.c., p. 8).
"Quando os salários sobem, é sempre às custas do lucro, e quando caem,
o luci:o sempre sobe" (Lc., p. 491, nota).

852
••Esforcei-me por mos:trai:, em toda a extensão desta obra, que a taxa
de lucro só pode ctescer com queda de salário, e que só pode haver
redução permanente de salário em C{)n:>eq_üência de baixa dos bens
necessârios em que ele se despende. Por conseguinte, se, por se expan-
dir o comArcéo e~rerior ou se aperfeiçoar a maquinaria, os alimentos
e os bens necessários ao 1rabalhador podem ser levados ao mercado a
preço ieduzido, os lucros subirão. Se, em vez de cultivar nossos pró·
prios cereais ou de produzir as roupas e outros bens necessários do tra·
balhador, descobrirmos novo mercado onde nos possamos suprir des-
sas mercadorias a preço mais barato, os salários caúão e o lucro subi-
rá; mas, se as mercadorias obtidas a preço mais baxato, com a expansão
do comércio exreríor ou com o aperfeiÇCJamento da maquinaria, forem
de consumo exclusivo dos ricos, nenhuma alteração haverá na taxa
de lucro. Embora vinho, veludo, seda e outras mercador.ias díspendio·
sas baixem de :SO por cento, a taxa de salário não se alterará, e a taxa
de lucro, em conseqüência, fica.tá invariável.,
"Assim, o comércio exterior, embora seja -muito vantajoso para um
país - uma vez que aumenta o volume e a variedade dos objetos em
que se pode aplicar a renda, e proporcione estímulo para poupar" (e
por que não incentivos para gastar?) "e para acumular capítal, em vir-
tude da abundância e da barateza das mercadorias -, não prnpende a
eltr1o1u o lucro do capital, a não ser que as mercadorias importadas se.
iam daquelar em que se despendem os saldríos.
"As observações que fiz no tocante ao comércío exterior são também
aplicáveis ao comércio interno. A taxa de lucro nunca acresce"

(acabara de dizer o contrário; naturalmente quer dizer nunca, exceto quan·


do o valor do trabalho decresce em virtude dos aperfeiçoamentos referidos)

"em conseqüência de melhor divisão do trabalho, de invenção de tnJi.


quimts, de constTUção de estradas e camiís ou de quaisquer outros meios
que reduzam trabalho na produção ou transporte de mercadorias, São
fatores que influenciam o preço e sempre trazem grandes vantagens pa-
ra os cóiisumidoru, pois lhes possibilitam conseguir, com o mesmo
ttabalho, quantidade maior das mercadorias, como resultado do em-
prego do melhoramento. Mas não têm influência de espécie alguma
no lucro. Em contrapartida, toda redução de salário aumenta o lucro,
mas não influi no preço das mercadorias. Temos num caso vantagem
para todas as classes, pois todas elas se constituem de consumidores;"

(mas qual a vantagem para a classe trabalhadora, uma vez que Ricardo
pressupõe que essas mercadorias, se entram no consumo do assalariado,
reduzem o salário, e se não o reduzem ao baratearem, também não entram
nesse consumo?);

"e, no outto, vantagem apenas para os produtores; estes ganham mais,


porém continua tudo com o mesmo preço."

853
(Mais uma vez, como é isso possível, dado que Ricardo pressupõe
que o decréscimo salarial, que aumenta o lucro, ocorre justamente. por
ter caído o preço dos bens necessários ao trabalhador, e portanto de mo-
do nenhum "continua tudo com o mesmo preço".)

"No primeiro caso, os consumidores ganham o mesmo que antes, mas


todas as coisai; em que despendem seus ganhos" (novo erro; deveria
dize1 todas as coisas menos os meios de subsistência necessários) "de·
crescem em valor de trocaº (pp. l37, l38).

Vemos que é muito falha a redação dessa passagem. Mas, excluído


esse aspecto formal, as afirmações só são válidas se. em lugar de taxa de
lucro, se ler "taxa, de mais-valia", o que se aplica a toda essa investigação
sobre a maís-valia relativa. Mesmo nos ramos dos artigos de luxo, aqueles
aperfeiçoamentos podem elevar a taxa geral de lucro, uma vez que a ta-
xa de lucro desses ramos, como a de qualquer outro, participa do nivela-
mento de todas as taxas particulares de lucro em torno da taxa média
de lucro. Nesses casos, se, em virtude das influências referidas, o valor
do capital constante cai em relação ao variável, ou diminui o tempo de
circulação (isto é, muda o prqcesso de circulação), eleva-se a taxa de lu-
cro. Além disso, é unilateral sua maneira de ver o comércio exterior. O
essencial para a produção capitalista é a transformação' ~do produto em
mercadoria, o que se liga fundamentalmente à e:icpartsão do mercado, à
criação do mercado mundial, ao comércio exterior portanto. Com as ex-
clusões apontadas, Ricardo acerta ao afirmar 'que todos os' melhoramen-
tos, sejam os decorrentes da divisão do trabalho, do aperfeiçoamento das
máquinas, dos meios de transporte, ou oriundos do comércio exterior,
em suma; todos os meios que reduzem o tempo de trabalho necessário
na produção ou no transporte de mercadorias, aumentam a mais-valia
(portanto, o lucro), enriquecendo assim a classe capitalista, porque e até
o ponto em que esses "mellioramentos" diminuem o valor do trabalho.
Nesta seção ainda temos, por fim, de citar algumas passagens onde
Ricardo examina a natureza do salário relativo.

"Se tenho de contratar um trabalhador por uma semana e lhe pago


oito xelins em vez de dez, sem ter \lariado o valor do dinheiro, é pro·
vável que o trabalhador com os oito xelins possa obter mais alimen·
tos e bens de consumo necessários do que antes obtinha com dez; mas
isso não decorre de alta no valor teal do m14rio, como afinnava Smith
e mais recentemente Malthus, e sim de baixa no valor dos bens em que
se despende o salário, coisas bem distintas. Contudo, por chamar isso

854
de queda no valor real do salário, di2:em-me que emprego um modo
de expressão novo e inusitado, incompatível com os venladeiros prin-
cípios da ciência" ( l.c., pp. 11, 12).
"Podemos avaliar com acerto a taxa de lucro, 1enda e salário, níio pela
quantidade absoluta de produtos, recebida por cada classe, e sim pela
quantidade de trabalho necessáJ:ia pata p1oduzir aquela quantidade.
O prnduto global pode dobrai: com melhoramentos na maquinaría e na
agricultura; mas, se salário, 1enda (rent) e lucro também dob1a1em, os
três manterão entre si a mesma proporção anterwr e de nenhum deles
se pode dl2er que variou relativamente. Todavia, se o salário não tiver
participação plena nesse acréscimo; se, em vez de dobrar, aumentar
apenas de metade ... creio sei: correto dizer que o salário caiu, o o lucro
subiu. Pois, se tivéssemos um padrão invariável para medir o 1>111Dr dessa
produção, ve1famos que coube à classe trabalhadora menos ... e à classe
capitalista mais valo.r que antes" (Lc., p. 49).
"Não é míster que se dê a menor queda feal, pois o novo salário lhe po-
de proporcionar maior quantidade de mercadorias baratas que o ante-
rior" {l.c., p. 51).

Quincey acentua o contraste entre algumas das proposições desenvol-


vidas por Ricardo e as dos outros economistas.

"Quando se perguntava" aos economístas anteriores a Ricardo "o que


determina o valoT, a 1esposta era que esse valor era determinado princi-
palmente pelo salário. Quando então se perguntava que é que determi-
na o salário, a resposta aludia a que o salário tem de se guilu: pelo valor
das mercadorias em que se despende, e na realidade significava que o
salário era determinado pelo valo1 das mercadoiias" ("Dialogues of
Three TempJai:s on Pol. Econ., chiefly ín relation to the prínciples of
Mr. Ricardo'', in London Magazine, voL IX, 1824, p. 560).

Nos mesmos Dialogue1; lê-se, no tocante à lei da medida do valor pe-


la quantidade de traballw e pelo va"lor do uabalho:

"Tão distantes estão as duas fórmulas de ser apenas duas expressões


diferentes d.a mesma lei, que a melhor maneira de expressar negativa-
mente a lei de Ricardo (isto é, o valor de A está para o valor de B, Có·
mo as quantidades de trabalho que os produziram) seria dizer que o
valor de A niio está para o de B como os valorer do trabalho que os
produziu" (p. 348).

(Se a composição orgânica do capital for a mesma em A e B pode-


se na realidade díz.er que a razão que há entre os dois é a mesma que exis-
te entre os valores do trabalho que os produZiu. Pois em ambos a razão
entre o trabalho acumulado de um e o do outro é a mesma que se encon-
tra para o trabalho imediato. Mas as quantidades de trabalho pago esta-
rão em ambos na mesma proporção das quantidades totais de trabalho

855
imediata neles aplicado. Admitamos seja a composição 80c + 20v e a ta-
xa de" mais-valia = 50%. Se um capítal = SOO e o outro = 300, num caso.
o produto será 5 50 e no outro 330. Um produto estará para o outro a8sim
como S X 20 = 100 (saJário)está para 3 X 20 = 60, ou seja, 100 : 60 =
10 : 6 = 5 : 3. E 550 : 330 "" 55 : 33 ou seja, 55/11 : 33/11 = S : 3, pois
S X 11 = 55 e 3 X 11 "" 33. Mesmo assim, só se saberá a proporção de
um com o outro e não seus verdadeiros valores, uma vez que valores mui-
to diferentes correspondem à razão 5 : 3.)

"Se o preço é de 10 xelins, salário e lucro, tomados em conjunto, não


podem excede.r 10 xelins. Mas, ao revés, não são salário e lucro juntos
que determinam o preço? Não, esta ia velha doutrina superada." (Th.
de Quincey, The Logic of Polit. Eam, Edimburgo e Londres, 1844,
p, 204).
"A nova economia mostcou que todo preço é governado pela quanti·
dade proporcional do trabalho produtor, e po.r ela apenas. O preço,
uma vez fixado, jpso facto determina o fundo donde o saldrio e o lu-
cro retiram as respectivas cotas" (Lc., p. 204). "Qualquer mudança
capaz de perturbar a 1elação existente entre salário e lucro tem de pro·
vir do salário" (1.c., p. 2fü ).
Ricardo tnovou a teoria da renda fundiária, ao questionai se essa ren-
da de fato anula a lei do valor real (l.c., p. 158).

856
Capítulo XVI
Teoria Ricardiana do lucro

1. Casos panículares em que Ricardo distingue mais-


valia de lucro.
Já se mostrou em pormenor que as leis da mais-valia - ou antes da
taxa de mais-valia - (uma vez dada a jomada de trabalho) oão coincidem
com as leis do lucro nem lhes são aplicáveis de maneira tão imediata e sim·
ples como o faz Ricardo; que ele comete o erro de identificar mais-valia
a lucro, mas que ambos só são idênticos quando o capital todo consiste
em capital variável ou se despende de imediato em capital variável; e ain-
da que, por isso, o que Ricardo trata sob o nome de ..lucro" é em última
análise apenas mais-valia. Só naquele caso o produto global se reduz mera-
mente a salário e mais-valia. E evidente que Ricardo compartilha da idéia
smithiana de o valor g'/obal do produto anual se decompor em rendas
{revenues). Daí também confundir valor e preço de custo.
Aqui é ocioso repetir que a taxa de lucro não é de imediato regula.
da pelas mesmas leis da taxa de mais-valia.
Primeiro, vimos que a taxa de lucro pode subir ou descer em virtu-
de da queda ou ascensão da renda frent), sem depender de qualquer mu·
dança no valor do trabalho.
Segundo: montante absoluto do lucro = montante absoJuto da mais-
valia. Este é determinado pela taxa de mais-valia e pelo número dos tra-
balhadores empregados. Por isso, o mesmo montante de lucro é possível

857
com taxá decrescente de mais-valia e número ascendente de trabalhado-
res, e vice-versa etc. .
Terceiro: dada a taxa de mais-valia, a taxa de lucro depende da com-
posição orgânica do capital.
Quarto: dada a mais-valia (com o que se supõe dada, na base de 100,
a composição orgânica do capital), -a taxa de lucro depende do valor rela-
tivo das diferentes partes do capítal que podem ser influenciadas de ma-
neira diversa, seja pela economia de energia etc. no emprego dos meios
de produção, seja por variações de valor que podem atingir uma parte
do capital sem atíngir as outras.
Por fim teriam de ser consideradas as diferenças na composição
do capital oriundas do proçesso de circulação.
Algumas reflexões ocorrentes ao próprio Ricardo eram de molde
a levá-lo a distinguir entre mais-valia e lucro, Por não ter feito essa dis-
tinção, parece ele por vezes esposar - como já referido na análise do ca-
pítulo 1 (On Value) - a idéia vulgar de ser o lucro mero acréscimo sobre
o valor da mercadoria, como sucede ao falar da detenninação do lucro
do capital onde predomina o capital fixo etc. 134 Daí provêm muitos dis-
parates dos sucessores. A idéia· vulgar tem de se introduzir, se a proposi-
ção (correta, na prática) de éapitais de igual magnitude f()rnecerem, em
média, lucros iguuis, ou de o lucro depender da magnitude do capital em-
pregado, não se relaciona, por meio de uma série de elos intermediários,
com as leis gerais do valor etc., em suma, se se consideram idênticos lu-
cro e mais-valia, o que só é verdade para a totalidade dos·capitais. Por
isso também faltavam a Ricardo as condições para definir taxa geral de lucro.
Ricardo percebe que a taxa de lucro níW é ínfluencíada por aque·
las variações do valor das mercadorias as quais repercutem por igual em
todas as partes do capital, como, por exemplo, variação no valor do di-
nheíro. Deveria portanto ter concluído que é influenciada pelas variações
(do valor das mercadorias) que niio repercutem por igual em todas as par-
tes do capital; que variações da taxa de lucro são possíveis sem se alte-
rar o valor do trabalho e mesmo em sentido oposto às variações no va-
lor do trabalho. E acima de tudo não deveria ter esquecido que aí me-
de o produto excedente ou, o que é o mesmo para ele~ o valor exceden-
te ou, o que também é o mesmo, o trabalho excedente, visto pelo prisma
do lucro, não em relação ao capital variável, mas em relação a todo o ca-
pital adiantado.

134. Ver neste volume p. 613.

858
No tocante à varirlfão do valor do dinheiro diz:

"A mudança do valor do dinheiro, por maior que seja, em nada alte-
ra a taxa de lucro; pois, admitindo-se que as mercadorias do fabrican-
te subam de 1 000 libras para i 000, ou 100%, sua taxa de lucro será
a mesma, se também ,obcm de 100% o capital - em que as variações
do dinheiro têm o mesmo efeito que no valor dos produtos -, a ma.-
quinaria, os edifícios e os estoques ... Se, com capital de dado valor,
pode, economizando trabalho, duplicar a quantidade de produto cujo
preço cai à metade do ante1ior, esm quantidade manterá a mesma pro-
porção anterior com o capital que a gerou, e em consequência a taxa
de lucro continuará a mesma. Se, ao mesmo tempo que dobra a quan-
tídade do produto com o emprego do mesmo capital, o valor do di-
nheiro por um acidente qualquer baixa de metade, o produto sei:á ven-
dido pelo dobro do valor anterior em dinheiro; mas o capital empre-
gado para produzi-lo terá também o dobro- do valor anterior em di·
nheiro; e por isso, também nesse caso, o valor do produto manterá a
mesma proporçáo de antes com o valor do capital" (l.c., pp. 51, 52).

Ricardo está certo aí se entende por produto o produto excedente;


pois a taxa de lucro =P!?;duto {valor) excedente. Assím, se o produto ex·
capital
cedente = 10, e o capital = 100, a taxa de lucro = 10/100 = 1/10 = 10%.
Se ele quer dizer o produto total, não está exata a maneira de se expdmir.
E evidente que por proporção do valor do produto com o valor do capi-
tal quer dizer àpenas o excesso do valor da mercadoria acima do valor
do capital adiantado. Seja como for, vê-se que ai não identifica o lucro
à mais-valia, nem a taxa de lucro à taxa de mais-valia que é igual a
valor excedente ou a valor excedente
valor do trabalho capital variável
Diz Ricardo (capítulo X.XXII):

"Mas supôMe que as matérias-primas de que se fazem as mercadorias


caíram de pxeço e por esse motivo baixarão as mercadorias. l! verdade
que baixarão; a baíxa, porém, não será acompanhada po1 decréscimo
na renda (income} monetária do produtor. Se ele vender sua mercado-
ria por menos dinheiro, será apenas por ter caído de valor um dos ma-
teriais de que é feita. Se quem fabrica o tecído o vende por 900 libras,
em vez de 1 000, sua renda não Mirá menor, c:aso a li de que se faz o
tecido se tenha depreciado de 100 libras" (l.c., p. 518).

(O aspecto particular de que Ricardo trata aí, o efeito num caso prá·
tico, nã'o nos interessa agora. Por certo, deprecíação súbita de lã terá reper-
cussão (prejudicial) na renda monetária dos fabricantes de tecido que dis--

859
ponham em depósito de um grande estoque de panos prontos e acabados,
feitos de lã, quando esta era mais cara, e que têm de ser vendidos depois
que ela se depreciou.)
Se, como aí supõe Ricardo, os fabricantes de panos empregarem
a mesma quantidade anterior de trabalho (poderão empregar quantidade
muito maior, pois parte do capital antes despendido apenas em matéria-
príma ficou disponível e pode ser agora aplicada em matéria-prima + tra·
balho), é claro que sua "renda monetária", em termos absolutos, "não
será menor", mas a taxa de lua-o será maior que a anterior; pois a mesma
soma anterio.f que representava, digamos, 10%, montando portanto a
100 libras, terá de ser confrontada com 900 libras e não com 1 000. No
primeiro caso, a taxa de lucro era 10% e, no segundo, 1/9 = 11 1/4%. Uma
vez que Ricardo supõe até que os produtos primários de que se fazem
as mercadorias em geral baixarão, subirá a taxa geral de lucro e não ape-
nas a taxa de lucro num ramo particular. Estranha que Ricardo não tenha
percebido isso, pois percebe o caso oposto. Assim, no capítulo VI "On.
Proftts" trata do caso em que, em virtude de encarecerem os gêneros de
primeira necessidade, por se cultivar terra de pior qualidade e em conse-
qüência eleV'ar-se a renda diferencial, p1ímeit0 sobe o salário e depois to-
das as matérias-primas da superfície da terra. (Suposição absolutamente
desnecessária. Pode haver muito bem baixa do algodão, da seda e até da Iã
e linho, embora aumente o preço do trigo.)
Diz que a mais-valia (chama-a de lucro) do arrendatário cairá por-
que o V'alor do produto dos 10 homens que emprega.continua a ser 720
libras, e desse fundo de 720 tem ele de retirar mais para salário. Prosse-
gue Ricardo:

"Mas a taxa de lucro cairá ainda mais, uma vez que o capital do arren-
datário ... em grande parte consiste cm produtos agdcolas como cereais,
feno, trigo e cevada antes de debulhados, cavalos e vacas, e todos eles
subiram de preço em tlccou:ência da elelltlção geral do preço dos pro-
dutos. Seu lucro absoluto cairá de 480 libras pai:a 445 libras e 15 xe-
lins. Todavia, se o capital, em virtude da' causa a que acabo de me re-
ferir, elevaNe de 3 000 libras paxa 3 200, a taxa de lucro ficará abaixo
de 14%, quando o trigo esteja a 5 libras, 2 xelins e 10 pence. Um fa.
bricante, se tiver também empregado 3 000 libras em seu negócio, terá
de elevar o capital, em virtude da alta do salário, para poder prosseguir
no mesmo empreendimento. Se vendia antes suas mercadorias por 720
libras, continuará a vendê-las pelo mesmo preço; mas o salário, que an-
tes era de 240 libras, subírâ quando o uigo estiver a 5 libras, 2 xelins
e 10 pence, para 274 libras e 5 xelins. No primeiro caso, recebe a sobra
de 480 libras como lucro sobre o capitá:I de 3 000 libras. No segundo,
obtém, com capital maior, lucro de 445 libras e 15 xelins, que assim
coincide com a taxa de lucro alterada do arrenda.tário"(l.c., pp.116,117).

860
Ricardo, portanto, distingue aí entre lucro absoluto (igual a mais-
valia) e taxa de lucro, e ainda mostra que a taxa de lucro, em virtude da
variação do valor do capital adiantado, decresce mais que o lucro absolu-
to (mais-valia), em decorrência da alta do valor do trabalho. A taxa de
lucro aí também terá de cair se o valor do trabalho ruio variar, porque
se terá de medir o mesmo lucro absoluto por capital maior. O caso opos-
to de ascensão da taxa de lucro (diverso da alta da mais-valia ou do lu·
cro absoluto) ocorrerá assim no primeiro exemplo que dele extraímos,
quando cai o valor das matérias-primas. 2 por isso evidente que alta e
queda da taxa de lucro decorrem de outras circunstâncias além da ele·
vação e baixa do lucro absoluto e elevação e baixa de sua taxa, calcula·
da de acordo com o capital despendido em salário.
Na última passagem citada prossegue Ricardo:

"Artigos de joalhecia, de fen:o, de prata e de cobce não subiTão, por·


que neles não entra produto primário obtido com o cultivo do solo"
(Lc., p. 117}.

Os preço!> dessas mercadorias não subirão, mas a taxa de lucro desses


ramos ultrapassará a dos outros. 2 que, nestes últimos, mais-valia menor
(em virtude da alta do salário) corresponde a capital adiantado que cres-
ceu por dois motivos: primeiro, por ter subido o dispêndio com salário
e, segundo, por ter acrescido o dispêndio com matéria~prim.a. No segun-
do caso 135 há mais-valia menor para capital adiantado que só ter.â crescí·
do na parte variável em virtude da alta do salário.
Nessas passagens, o próprio Ricardo derrui toda a sua teoria do
lucro, fundada no erro de identificar a taxa de mais-valia à de lucro.

"Em todos os casos, os lucros agrícolas como os industriais são rebai-


xados por alta dos preços dos produtos primários, se a acompanha ele·
vação de salií.rio'· (l.c., pp. 113, J 14 ).

Do que diz o próprio Ricardo, porém, infere-se que a taxa de lucro


caua em virtude de elevação daquela parte do capital adiantado, constituí-
da de produtos primários, mesmo quando não a acompanha a alta de salário.

"Admitamos suba o preço da seda, veludo, mobiliário e de uma série


de outras mercadodas de que o trabalhador não precisa, por se des-
pender nelas maior quantidade de trabalho: não influencimti isso o fu.

135. lsto ~.o dos artigos dejoo..llleria, de fen:o, de prata e de cobre.

861
cro? Por certo que não, pois só elevação do salário pode preyudfcar o
lucro. O trabalhador não consome seda e veludo, que por isso não ;:io-
dem elevar o salário" (1.c., p. 118).

Sem dúvida, a taxa de "lucro cairá naqueles ramos particulares, em·


bora o valor do trabalho - o salário - pennaneça o mesmo. Terá enca-
recido a matéria-prima dos fabricantes de seda, de piano, mobiliário etc.,
e por isso cairá a proporção da mesma mais-valia para o capital despendi·
do e, em deoocrência, a taxa de lucro., E a taxa gelrll de lucro consíste
na média das taxas particulares de lucro de todos os ramos de negócio.
Ou aqueles fabricantes, para continuarem a obter o lucro médio, eleva·
rJo o preço de suas mercadorias. Essa alta nornínal de preços díretamen-
te não prejudica a taxa de lucro e sim a repartição do lucro.
Ricardo volta mais uma vei ao caso exposto acima em que a mais-
valia (lucro absoluto) cai, por subír o preço dos meios de subsistência
essenciais (e em conseqüência a renda da terra).

"De novo tenho de observar que a taxa de luc.ro cairá com rapidez
maior que a por mim c.alculada, pois, se o valor do produto é o que
estabeleci nas circunstâncias supostas, o valor do capital do arrenda-
tário terd grande ascensão, uma vez que esse capital tem de consistir
em muitas mercadorias que llUbitam de preço. Ant~s,de o trigo poder
subir de 4 libras para 12, é provável que dobre o valor de troca desse
capital, que valerá 6 000 libras em vez de 3 ooo: Se o lucro portanto
era 180 libras ou 6% sobre o capital original, a taxa de lucro agora não
a
será na realidade superior a 3%, pois 6 000 libras 3% 1:endem 180, e
nessas condições noro arrendatário só poderá· estabelecer-se na agri-
cultura, com 6 000 libras no bolso. Muitos ramos tí.rarão mais ou me-
nos vantagens da mesma fonte. O fabricante .de cerveja, o destilador,
o fabricante de tecidos ou de linho terão o decréscimo de lucro em
parte compenwdo pela alta no valor do reqiectivo estoque de matérias-
primas e produtos acabados; todavia, o fabricante de ferragens, de jóias
e de muitas outras mercadorias estarão sujeitos, como aqueles cujo
capital por completo consiste em dinheiro, à queda global da taxa de
lucro, sem qualquer compensação" (1.c., pp. 123, 124).

Aí é só o essencial que Ricardo não conscientiza, a saber, que derrui


sua idéia de identificar lucro a mais-valia e que admite a possibilidade
de a taxa de lucro ser influenciada por variação no valor do capital cons-
tante, sem depender do valor do trabalho. Ademais, seu exemplo só é
correto em parte. A compensação que o arrendatário, o fabricante de
tecidos etc. obteriam com a alta do preço do estoque existente de mer-
cadorias e que está no mercado cessaria naturalmente assim que vendes·
sem essas mercadorias. A elevação do valor do capital também não seria

862
mais compensadora para eles, assim que o capital estivesse consumido e
tivesse de ser reproduzido. Todos então ficariam na situação do novo
arrendatário, referida peJo próprio Ricardo, o qual teda de adiantar ca·
pítal de 6 000 b"bras para conseguir lucro de 3%. Em contrapartida, o
joaTueiro, o fabricante de ferragens, o prestamista etc., embora no come-
ço não tivessem compensação pela perda, realizariam taxa de lucro supe·
rior a 3%, pois só lhes teria aumentado o valor do capital despendido em
salário e não o do capital constante.
Aí o importante aínda nessa compensação, mencionada por Ricar-
do, do lucro decrescente pela alta do valor do capital é que para o capi-
talista - e em geral no tocante à repartição do produto do trabalho anual -
se trata não só da repartição do produto entre os diferentes participan·
tes da renda (revenue), mas também da -divisã'o ·desse produto entre ca-
pital e renda,

2. Formação da taxa geral de lucro (lucro médio)


(ou (lgeneral rate of profits'') (lucro usual).

a) A taxa média de lucro dada, ponto de partida da


teoria Ricardiana do lucro.
Aí falta por completo a Ricardo clareza teórica.

"Já observei que o preço de mercado de uma mercadoria pode exce·


der seu preço natural ou nece$Slirio, poiK é possível que seja produzi-
da em volume menor que o exigído pela nova procura. Isso todaví.a
não passa de efeito tempordrio. O alto lucro do capital empregado
para produzir essa mercadoria atrai.tá sem dúvida capital para esse ra-
mo; e logo que se supram os fundos necessários e ocorra o acréscimo
adequado do volume da mercadoria, o preço caird, e o lucro do ramo
se ajustard ao nfvel geral. Queda na taxa geral de lucro não é de modo
nenhum incornpntível com alta parcial do lucro em determinados ra-
mos, Por meio da desigualdade dos lucros, o capital se desloca de uma
aplicação para outra, Enquanto o lucro geral está caindo e se estabili-
zando aos poucos num nível inferior, em virtude da alta do salário e
da diflculdade cada vez maior de suprimento da população crescente
com meios de subsistência essenciais, o lucro do arrendatário pode fi-
car acima do nível anterior por período de curta duração. Determina-
do ramo do comércio exterior ou colonial pode por certo tempo ter
grande estímulo" (l.c._, pp. 118, 119}.
"importa lembuu que pxeços varíam sempre no mercado e, em pri-
meiro lugar, por causa da relação existente entre a oferta e a procura.
Embora $e possa forn«cer pmo a 40 xelins po1 jarda e obter o lucro

863
usual, p<>de esse artigo chegar a 60 eu 80 xelins em virtude de mudan-
ça gernl na moda ... Os fabricantes de pano terão por algum temp<> lu-
cros extraordinários, mas capital afluirá sem dúvida a esse ramo, até
a oferta e a procura ficarem num nível razoável, e então o, preço do
pano voltará à 40 xelins, o preço natural ou necessário. Do mesmo
modo pode o trigo, a cada procura acrescida, subir tanto que pi:opor-
cione a-0 an:endatário mais que o lucro geral. Se houver terra fértil em
abundância, o preço do trigo voltará à posição anterior, depois de se
ter empregado para produzi-lo a quantidade neeessária de capital, e o
lucro será o mesmo de antes. Mas, se não houver terra fértil bastante,
se, para se produzir essa quantidade adicional, for exigida quantidade
de capital e trabalho superior à usual, o preço do trigo não regredirá
ao nível anterior. Subirá seu preço natural, e o arrendatário, em vez
de continuar obtendo lucros maiores, ver-se-á constrangido a se satis-
fazer com a taxa reduzida, conseqüência inevitável da alta de salários,
produzida' pela alta dos meios de subsistência essenciais" (l.c., pp. 119,
120)..

Dada a jornada de trabalho (ou se nas jornadas de trabalho de di-


versos ramos só ocorrem diferenças tais que são compensadas pelas par-
ticularidades de trabalho de natureza distinta), será dada a taxa geral de
mais-valil, isto é, de trabalho excedente. uma vez que o salário em média
é o mesmo. E'. o que Ricardo tem em mente. E confunde essa taxa geral
de mais-valia com a taxa geral de lucro. Mostrei que, para a mesma taxa
1

geral de mais-valia, as taxas de lucro terão de ser mui~o- diferentes em


díversos ramos, se as mercadorias forem vendidas pelôs respectivos valo-
res. A taxa geral de lucro surge ao se medir a mais-valia. total produz.ida
pela totalidade do capital da sociedade (da classe dos 'capitalistas); ·por
isso, cada capital de cada ramo particular configura' cota de um capital
total da mesma composição orgânica, seja no tocante a capital constan-
te e variável, seja com referência a capital fixo e circulante. Como tal CO·
ta retira, na razão da magnitude, dividendos da mais-valia produzi.da pela
totalidade do capital, a mais-valia assim repartida, a porção de mais-valia
que cabe a cada cots de capital de dada grandeza, digamos de 100, du-
rante dado período, 1 ano por exemplo, constitui o lucro médio ou a ta-
xa geral de lucro e como tal entra nos custos de produção de todo ramo.
Se a porção para 100 é 15, o lucro usual será 15% e o preço de custo 115.
Este pode ser menor se, por exemplo, só parte do capital adiantado en-
trar corno desgaste no processo de formação do valor. Mas é sempre igual
ao capital consumido adicionado de 15, que constituem o lucro médio
do capital adiantado. Se, num caso, 100 se incorporam ao produto e, no
outro, apenas 50, o preço de custo será, num caso, 100 + 15 = 115 e, no
outro, 50 + 15 "" 65; ambos os capitais, nessas condições, terão vendido
suas mercadorias pelo mesmo preço de custo, isto é, a preço que aos dois

864
proporciona a mesma taxa de lucro. E claro que a taxa geral de lucro,
para se configurar, realizar e estabelecer, exige que os valores se conver-
tam em preços de custo que deles diferem. Ricardo, ao revés, supõe a
identidade de valores e preços de custo. pois confunde taxa de lucro e
taxa de mais-valia. Não tem, por isso, a maís remota idéia da mudança
geral que se dá nos preços das mercadorias, resultante da implantação
de uma taxa geral de lucro, antes de haver a possibilidade de se tratar
dessa taxa. Considera essa taxa de lucro uma precÔndição que, por pre·
existir, faz parte mesmo de sua determinação do valor. (Ver capítulo 1
"On Value'~) Depois de pressupor a taxa geral de lucro, só considera as
modificações excepcionais nos preços, exigidas para que se mantenha
e perdure essa taxa gero.L De nenhum modo percebe que tem de haver
antes conversão dos valores em preços de custo para que se crie a taxa
geral de lucro, e que portanto, ao partir de uma taxa geral de lucro, não
está mais operando de imediato com os valores das mercadorias.
Ademais, no trecho acima, há apenas a idéia smitlúana, e mesmo
assim de maneira uru1ateral, pois no fundo Ricardo se apega a sua taxa
geral de mais·valia. Para ele, a taxa de lucro só ultrapassa o nfvel em ra-
mos paiticµlarizados porque o preço de mercado ultrapassa o preço na·
tural em .virtude das relações entre a oferta e a procura. da subprodução
ou superprodução de determinados ramos. A concorrência, oferta de no·
vo capital a um ramo ou retirada de capital antigo de outro ramo, nivela
então preço de mercado e preço natural e reduz o lucro desse ramo parti-
cular ao nível geral. Aí supõe-se oonnante e dado o nível real do lucro,
e a questão é apenas a de o reduzir a esse nível em ramos particulares
onde ele, em virtude da oferta e da procura, se elevou acima ou caiu abai·
xo desse nível. Além disso, Ricardo sempre supõe que estão acima de
seu valor as mercadorias cujos preços proporcíonam mais que o lucro
médio, e abaixo, aquelas cujos preços proporcionam menos que esse Ju.
cro. Se por força da concorrência seu valor de mercado se ajusta a seu
valor, o nível se estabelece.
Esse próprio nível, segundo Ricardo, só pode subir ou descer quan-
do cai ou sobe (por período relativamente longo) o salário, isto é, varia
a taxa da mais-valia relativa, o que se dá sem se alterarem os preços. (Em-
bora o próprio Rícardo adnúta aí importantes variações dos preços, em
diferentes ramos, de acordo com a respectiva composição do capital em
fixo e circulante.)
Mas, mesmo quando se constitui uma ,taxa geral de lucro e em con·
seqüência preços de custo, a taxa de lucro em determinados ramos pode

865
subir, por ser mais longa aí a jornada de trabalho e elevar-se a taxa de
mais-valia absoluta. A intervenção do Estado demonstra que a concor.rên-
cia entre os trabalhadores não pode aplaná-la. Nesses determinados ramos
subírá a taxa de lucro sem que o preço de mercado ultrapasse o preço
natural. Contudo, a concorrência entre os capitais pode, com o tempo,
conseguir e conseguirá que esse lucro suplementar em tais ramos não cai-
ba de todo aos capitalistas. Estes terão de cotar suas mercadorias abaixo
dos "preços naturais", ou os dos outros ramos terão de elevar um pouco
seus preços (seja como for, se não os elevarem de fato, por poder a que-
da do valor dessas mercadorias se opor a essa elevação; não os rebaixarão
tanto quanto o exige o desenvolvimento da produtividade do trabalho
nos próprios ramos). Subirá o nível geral e alterar-se-ão os preços de custo.
E mais: se surgir um novo ramo onde se empregue muito trabalho
vivo em relação ao acumulado e onde por conseguinte a composição do
capital está muito abaíxo da composição média, que determina o lucro
médio, é possível que as relações entre a oferta e a procura nesse novo
ramo lhe pennitam vender a produção acima de seu preço de custo, a
preço que mais se aproxime de seu valor real. A concorrência aí só pode
exercer ação rúveladora, altera~do o ntvel geral, porque o capital, no con·
junto, realiza .• põe em movimento quantidade maior de trabalJw exceden-
te não pago. No primeiro caso, as relações entre a oferta·e a procura não
fazem que a mercadoria, conforme acha Ricardo, se venda acima de seu
valor, mas apenas que se venda acima de seu preço de custo, aproximan-
do-se do valor. O nívelamento não pode portanto fazer quê' ela volte ao
velho nível, e sim que MVO nfvel se estabeleça..

b) Errônea concepção de Ricardo acerca da


influência do comércio colonial e do comércio
exterior em geral sobre a taxa de lucro.

O que foi dito também se aplica, por exemplo, ao comércio colo-


nial onde, em virtude da escravatura e da fertilidade da natureza, ou aín-
da por não se ter desenvolvido de fato ou de direito a propriedade fun-
diária, o valor do trabalho é mais baixo do que nos velhos países. Os ca-
pitais, se forem transferíveis à vontade da metrópole para essa nova ati-
vidade, rebaixarão o lucro suplementar específico dela, mas elevarão o
nível geral do lucro (corno obsen:a A. Smith com todo o acerto).

866
Ricardo sempre remove essa idéia com a frase: nos velhos ramos
de atividade, a quantidade de trabalho aplicada ficou sem dúvida a mes·
ma, o que também se deu com o salário. Mas, a taxa geral de lucro é de-
terminada pela proporção do trabalho não pago com o pago e com o ca-
pital adiantado não neste ou naquele ramo, e sim em todos os ramos pa-
ra onde o capital pode ser transferido livremente. Essa proporção pode
pennanecer a mesma em 9i10 dos ramos; se se alterar em 1/10, a taxa
de lucro terá de mudar nos l 0/1 O. Sempre que aumente a massa de tra-
balho não pago, posta em movimento por capital de grandeza dada, a
concorrência só pode fazer que capitais de magnitude igual obtenham
dividendos iguais, particípações iguaís_ nesse trabalho excedente acresci·
do, e não que, apesar do trabalho excedente acrescido em relação à to-
talidade do capital adiantado, o dividendo de cada capital individual fi-
que o mesmo ou se reduza à velha participação no trabalho ex.cedente.
Ricardo, se admite essa idéia, não tem razão alguma para contestar este
modo de ver smithiano: apenas a concorrência crescente entre os capi·
tais oriunda de rua acumulação rebaixa a taxa de lucro. Pois ele mesmo
supõe aí que a mera concorrência reduz a taxa de lucro, embora aumen-
te a taxa de mais-valia. Isso por certo se liga a sua segunda suposição fal-
sa de nun,ca poder subir ou descer a taxa de lucro (excluídas a baixa ou
alta do salário), exceto em conseqüência de desvios temporários que o
preço de mercado tem do preço natwal. E que é preço natural? E o pre-
ço igual ao dispêndio de capítal acrescido do lucro médio. Isso portanto
vem a dar de novo no pressuposto de que o lucro médio só pode cair ou
subir da mesma maneira que a mais-valia relativa.
Por isso, Ricardo erra, ao se opor a Smith, dizendo:

''Na minha opinião, nenhuma mudança de um comércio estrangeiro


piua outro ou do comércio interno para o externo pode alte.rlll" a taxa
de lucro" {l.c., p. 413).

Ainda está errado, ao achar que a taxa de lucro não influi nos pre·
ços de custo, por não influir nos valores.
Ricardo se engana ao acredítar que, em conseqüência de um comér-
cio exterior favorecido, o nível geral do lucro tem sempre de ser recon-
duzido ao velho nível mediante redução e não mediante alta do nível geral.

"Sustentam que a igualdade dos lucros se realizará pela alta geral dos lu-
cros, e sou de opinião que os lucros do ramo favorecido depressa des-
cerão ao nível geral" (1.c., pp. 132, 133).

867
Em virtude de sua concepção de todo errada da taxa de lucro, Ricar~
do se engana por completo ao tratar da influência do comércio estnµ1gei-
ro, nos casos em que esse comércio não rebaixa diretamente os preços
dos alimentos dos traba.lhadores. Não vê a importância enorme que tem
para a Inglaterra, por exemplo, obter matérias·primas mais baratas desti·
nadas à indústria, e que nesse caso, corno já mostre:í 136 , embora os preços
caiam, a taxa de lucro sobe, enquanto no caso oposto a taxa de lucro po·
de cair com preçvs ascendentes, mesmo quando, nos dois casos, o salá·
rio continue o mesmo.

"por isso, nfio é em conseqüência da expansão do mercado que a taxa


de lu~o se eleva" (1.c., p. 136).

A taxa de lucro não depende do preço da mercadoria em separado,


e sim da magnitude do trabalho excedente que se pode realizar com dado
capital, Ademais, Ricardo também desconhece a importância do merca-
do porque não compreende a natureza do dinheiro.

* * "'
{No tocante ao dito a~ima observar ainda: Ricardo. comete todos
esses equívocos porque quer impor identídade que supõe entre taxa de
mais-valia e taxa de lucro, por meio de abstrações torçadas. Daí a con-
clusão vulgar de as verdades teóricas serem abstraçõ~s ·que contrariam
as condições reais, ao invés de se ver que Ricardf:? não,aVa.nça bastante
no caminho da abstração correta e se de_sviar portanto para a abstração
falsa. 137 ).

3. Lei da queda da taxa de lucro


a) Pressupostos falsos da concepção Ricardiana da
taxa decrescente de lucro.
Este é um dos pontos mais importantes do sistema ricardiano.
A taxa de lucro tende a cair. Por quê? Diz- A. Smíth: por causa da
acumulação crescente e da concorrência crescente (dos capitais) que a

136. Ver volume 3, cap. XX, seção 7, subseção e).


J 37. Marx aí tem em vista certos críticos de Ríca.tdo como Say que, por exemplo,
na int1odução à quinta edição de seu TraiU d'~conomie politique... , Paris, l 826, cen-
sura Ricardo "por argumentar na base dos princípios abstJ:atos que generaliza de·
mais", e chegar as.sim a coMeqUências que não se ajustam à realidade (ver edição
acima, p. LXXXI, ou sexta e-dição, P<Uis, 1841, pp. 40, 41).

868
acompanha. Rícardo retruca: a concorrência pode nivelar os lucros (vimos
acima que aí lhe falta coerência) nos diferentes ramos; mas não pode re-
baixar a taxa geral de lucro. Isso só seria possível se, em virtude da acumu-
lação do capital, os capitais aumentassem com rapidez bem maior que a
população, de modo que a procura de traballto fosse de maneira constante
maior que a oferta e por isso o saláriO sempre aumentasse, nominal, real e
segundo o valor de uso - em valor e em valor de uso. E o que nã'o se dá. Ri-
cardo não é um otimista que acredite em ficçães desse gênero.
Uma vez que para ele sã'o idêntícas taxa de lucro e taxa de mais-valia -
trata-se da mais-valia relativa, poís supõe invariável a jornada de trabalho -,
só se pode explicar queda permanente do lucro ou a tendência a cair do lu-
cro pelos mesmos mntivos que causam queda permanente ou tendência
a cair da taxa da mais-valía, isto é, do segmento da jornada no qual o tra-
balhador trabalha não para si mas para o capitalista. Quais são essas cau-
sas? Supondo-se dada a jornada de trabalho, o segmento dela no qual o
trabalhador trabalha grátis para o capitalista só pode cair, diminuir, se au-
mentar o segmento em que trabalha para si. E isso só é possível (suposto
que se pague o valor do trabalho), se acresce o valor dos meios de subsis-
têncía essenciais, dos meios de subsistência em que despende seu salário.
Mas, em virtude do desenvolvimento da produtividade do trabalho, de-
cresce constantemente o valor das mercadorias manufaturadas. A coisa
portanto só se pode explicar pela circunstância de aumentar sempre o va·
lor do componente principal dos meios de subsistência - os alimentos.
E isso decorre de agricultura se tornar cada vez menos produtiva. O mes-
mo pressuposto que, segundo a exposição de Rícardo, explica a existên·
eia e o crescimento da renda da terra. A queda contínua do lucro liga-se
portanto à ascensão contmua da taxa da renda da terra. Já mostrei que
é falsa a concepção ricàrdiana da renda da terra. Assim, desfaz-se um dos
fundamentos de sua explicação da queda da taxa de lucro. Mas, além dis.
so, ela repousa sobre o falso pressuposto de serem idênticas a taxa de
mais-valia e a taxa de lucro, de serem portanto idênticas queda da taxa
de lucro e queda da taxa de mais-valia, o que só seria explicável à manei·
ra ricardiana. Isso liquida sua teoria. A taxa de lucro cai - embora a taxa
de mais-valia fique a mesma ou suba -, porque, com o desenvolvimento
da produtividade do trabalho, o capital variável decresce em relação ao
capital constante. Cai, portanto, não por se tornar o trabalho menos pro-
dutivo, e sim por se tomar mais produtivo. Não por ser o traballto me--
nos explorado, e sim por ser mais explorado, seja porque se dilata a jor·
nada excedente absoluta, ou porque, logo que o Estado o impeça, acres-

869
ce a jornada excedente relativa, pois à produção capitalista se identifica
com o valor relativo decrescente do trabalho.
A teoria de Ricardo repousa sobre duas suposições falsas:
(l) o pressuposto errado de a existência e crescimento da renda da
terra terem como condição necessária a fertilidade decrescente da agri-
cultura;
(2) o pressuposto errado de a taxa de lucro ser igual à taxa de mais·
valia relativa e só poder subir ou cair na razão inversa do salário, ao cair
ou subir este.
Compilarei agora as proposições com que Ricardo explica o mo-
do de ver que acaba de ser apresentado.

b) A idéia Ricardiana da absorção progressiva da


taxa de lucro pela renda crescente da terra.
Antes, ainda algumas observações sobre a maneira .como Ricardo,
uma vez pressuposto seu conceito de renda da terra, imagina absorção
progressiva da taxa de lucro pela renda.
Utilizaremos os quadros à p. 574138 -, com as modificações necessárias.
Supõe-se naqueles quadreis que o capital aplicado = 60ç + 40y, a mais-
valia = 50%, e assim o valor do produto = 120 libras, qua1quer que seja
a produtividade do trabalho. Desse valor, 10 libras cor~espondem a 20 ho-
mens (por trabalho semanal, por exemplo, ou melhor, cortsiderando-se a
taxa de lucro, por trabalho anual, o que aí em nada alte.ca a· questão).
De acordo com o quadro A, o terreno I determina <í · valÔr de mercado,
produz 60 toneladas, e por isso 60 toneladas = 120 libras e 1 tonelada =
120/60 horas = 2 libras. O saJário, 40 libras, é portanto igual a 20 tone-
ladas ou quarters de trigo. Isto corresponde portanto ao salário necessá·
rio para o número de trabalhadores empregados pelo capital de 100. Se
for necessário desur para espécie inferior de terra que exija capital de
110 para produzir 48 toneladas (60 libras em capital constante e os 20
trabalhadores que põem em movimento, isto é, 60 libras de capital cons-
tante e 50 libras de capital variável), a mais-valia nesse caso será de 10 li-
bras e o preço da tonelada, 2 1/2 libras. Se foaitos para tipo ainda pior
de terra onde 120 libras "" 40 toneladas, o preço da tonelada será
120/40 = 3 horas. Desaparece então a mais-valia toda no terreno pior.
O que os 20 homens produzem vale sempre 60 b"bfas (3 ~oras = 1 jorna-

138. Página do manuscrito (ver neste volume pp. 692 e 693).

870
da de trabalho de certa magnitude). Se o salário aumenta portanto de 40
para 60, desaparece a mais-valia toda. Sempre se admitiu que 1 quarter é
o salário necessário para um homem.
Admitamos que nesses dois casos só se empregue capital de 100.
Ou, o que dá no mesmo, consideremos o capital em termos percentuais,
qualquer que seja o capital despendido. Isto ê, em vez de considerar que
o capital despendido é 110, 120, sem que variem (). número de trabalha-
dores e o capital constante, calcularemos, para a mesma composição or-
gânica (não segundo valor, e sim segundo a quantidade de trabalho em-
pregado e o volume do capital constante), quanto capital constante e
quantos trabalhadores po'de empregar um capital de 100 (para se man·
ter a comparação com as outras classes na base de 100). Está 110 para
60 assím como 100 54 6/11, e 110 50 assím como 100: 45 5/11. Se
20 homens movimentam 60 de capital constante quantos movímenta·
rão 54 6/11?
fêinoS- então: é de 60 libras o valor obtido com o número de tra-
balhadores empregados (digamos 20). Cabem a esses trabalhadores 20
quarters .ou toneladas = 40 libras, se a tonelada ou o quarter for igual a
2 libras. Se o valor da tonelada sobe para 3 libras, desaparece a mais-valia.
Se sobe para 2 1{2, desaparece da mais-valia a metade que configurava
a renda absoluta.
No prímeiro caso, para capital despendido de 120 libras (60c + 60v),
o produto = 120 libras = 40 toneladas, isto é, 40 X 3. No segundo, para
capital despendido de ,110 (60c + 50v), o produto= 120 = 48 toneladas?
isto é, 48 X 2 1/2.
No primeiro caso, para capital despendido de 100 (50c + 50v), o
produto = 100 libras = 33 1/3 toneladas, isto é, 3 X 33 1/3 = 100. E
mais; uma vez que só a terra piorou e não houve mutação no capital, a
quantidade de trabalho que movimentará o capital constante de 50 será,
em termos relativos, equivalente à que movimentou antes o de 60. Assim,
se 20 homens movimentaram este (os quais receberam 40 libras, sendo
2 libras o valor de _1 tonelada), é aquele movimentado por 16 2/3 homens
que recebem 50 libras, desde que o valor da tonelada tenha subido para
3 libras. Como dantes, 1 homem recebe agora 1 tonelada ou 1 quarter =

871
3 libras,_ pois 16 2/3 X 3 = 50, Se o valor criado por 16 2/3 homens é
igual a 50, o criado por 20 homens será 60. Mantém-se portanto o pr~su­
posto de a jornada de trabalho de 20 homens ser igual a 60 libras.
Examinemos o segwido caso. Com 100 libras de capital despen-
dido, o produto será 109 1/11 libras, isto é, 43 7/11 toneladas (2 1/2 X
43 7/11 = 109 l /11). Capital constante = 546/11 e o variável= 45 5/11.
As 45 5/11 libras representam quantos homens? 18 2/11 homens. E se o
valor da jornada de trabalho de 20 homens= 60 libras, a de 18 2/11 ho-
mens = 54 6/11 libras e em conseqüência o valor do produto= 109 1/11
libras.
Vê-se que, nos dois casos, o mesmo capital movimenta menos ho·
mens, que entretanto custam mais. Seu trabalho dura o mesmo tempo,
mas o tempo excedente é menor ou não existe, pois, com o mesmo tra-
balho produzem menos produto (e esse produto consiste em seus meios
de subsistência), e assim aumentou o tempo de trabalho, embora conti-
nue a mesma a jornada de traballio, pois é maior o tempo de trabalho
que empregam para produzir 1 tpnelada ou 1 quarter.
Ricardo, em seus cálculos, supõe sempre que o capital tem de mo-
vimentar mais traballw e por isso é mister empregar câpital maior, isto é,
120, 11 O, em vez das 100 libcas anteriores. Isso só é con:eto, _dado o obje-
tivo de se produzir a mem:a quantidade, ou seja, 6U toneládas nos casos
acima; mas no caso 1 produzem-se 40 toneladas eç>m dispêndio de 120
libras, e no caso li, 48 toneladas com díspêndio de 110. Em.conseqüên-
cia, com dispêndio de 100 produzem-se 33 1/3 toneladas no primeiro
caso, e 43 7 /11 no segundo. Ricardo se desloca, portanto, do enfoque
acertado: este não consiste em que mais trabalhadores tenham de ser em-
pregados para produzir o mesmo produto, e sim em que da.da quantida-
de de trabalhadores gera produto menor, do qual fração maior constitui
o salá.r.io.
Agora apresentaremos em conjunto dois quadros, primeiro, o. qua-
dro A da p. 574 139 e novo quadro decouente dos dados vistos.mais acima.

139. Página do manuscrito (ver neste volume pp. 692 e 693).

872
Convenções utiliiadas ~o tradutor na ª&resentação dos quadros:
L = libra(s), t =tone ada(s)
VT VM VI VD PC RA RD RA
Classe Capital Tone- Valor Valor de Valorindi- Valordi· Preço de Renda Renda Renda
!adas total mercado vidusl por ferencial c11Sto por abso- dife- abso-
por tone- tonelada por tone- tonelada luta rencial luta
fada !ada

L L. L L L L L L t

t 100 60 120 2 2 o 1 5/6 10 o s


1l 100 65 130 2 l 11/13 2/13 1 9/13 10 10 s
lll 100 75 150 2 1 3/5 2/5 1 7/15 10 30 5

300 200 400 30 40 15

RD
Clasi;o Rendadi- Renda Renda Composi- Taxa de Número de Salário SahúiG Taxa de
ferenclal total total çiodo mais-valia trabalha· ··lucro
capital dores

L t % L t %

1 o 10 5 60c + 40v 50 20 40 20 10
11 5 20 10 60c + 40v 50 20 40 20 10
I1l 15 40 20 60c +40v 50 20 40 20 10
00
~
20 70 35
Se esse Quadro for organizado ao revés, de acordo com a seqüência
descendente de Ricardo, começando então por 111, e se ao mesmo tem·
po se supuser que não pague renda o terreno mais fértil, cultivado primei-
ro, teremos, no início, o capital de 100 em IlI, produzindo o valor de
120 libras, das quais 60 correspondem a capital constante e 60 a novo tra-
balho adicíonado. Segundo Ricardo, cabe ainda supor que a taxa de lu-
cro ultrapasse a indícada em A, uma vez que os 20 homens, eom a bai·
xa da tonelada de carvão (do quarter de trigo), obtinham 20 toneladas = 40
libras, quando a tonelada era igual a 2 libras. Mas eomo ela agora é igual
a 1 9/15 libra ou 1 libra e 12 xelins, os 20 homens só obtêm 32 libras
(equivalentes a 20 toneladas). O capital adiantadó para o mesmo núme-
ro de trabalhadores importará em 600 + 32y = 92 libras, cujo valor será
igual a 120 libras, wna vez que o valor do trabalho executado pelos 20
homens continuará a ser de 60 libras. De acordo com essa proporção, um
capital de 100 terá de produzir valor de 130 10/23, pois 92 120 = 100 :
130 10/23 (ou 23 : 30 = 100 130 10/23). E mais; esse capital de 100
terá a composição: 65 S/23c t 34 18/23v. Assim, o capital será 65 5/23c +
34 18/23v; valor do produto = 130 10/23. O número de trabalhadores
será 21 17/23. A taxa de mais-valia será 87 1/2%.

vr VM VI VD

Cl.... C•phal TotU!WI"" VahnloW V11do.rde-J111.eK::a.do V>lor índMd>W V:alo1 dilertruoial


por wMl'ld:I por IOll•,bda , Pot tontb.d•

l J, L L

Ili 100 21 121:u DO 1om 1 3/S 1 3/S o

L&11cro T1:s.21 de lucrt)

l l

)011),123 )(J 10/23 81 lll ll 17{23

Expresso em toneladas, o salário= 21 17/23, e o lucro= 19 1/46.

874
Mantendo a suposição ricardiana, admitamos agora que, em vírtu·
de da população crescente, o preço de mercado suba tanto que tenha de
ser cultivada a classe II, onde o valor da tonelada= 1 11 /3 libra.
Ao contrário do que supõe Ricardo, então é impossível que os
21 17/23 trabalhadores continuem a produ:i.ir o mesmo valor, a saber,
65 5/23 libras {salário e mais-valia juntos). Pois o número de trabalhadores
que III pode empregar, explorar portanto, decresce de acordo com sua
própria suposição e em conseqüência também o total da mais-valia.
Não varia, contudo, a eomposição do capitaLagríe-0la. Para movi·
mentar 60c são sempre necessários 20 trabalhadores (dada a jomada de
trabalho), não importa como sejam pagos.
Uma vez que esses 20 trabalhadores recebem 20 toneladas e a to·
nelada = 1 11/13 libra, os 20 trabalhadores eustam 20 (1 + ll/13) li·
bras::::: 201ibras+ 16 12/13 libras= 3612/13 libras.
Assim, o valor que esses 20 trabalhadores produzem é igual a 60,
qualquer que seja a produtividade de seu trabalho; por conseguinte, o
capital adiantado = 96 12/13, o valor= 120, e o lucro= 23 l/13 libras.
Em conseqüência, o lucro do capital de 100 será 23 17/21 libras e a composi·
ção do ·capital 61 19/21ç_+ 38 2/2lv. Empregani.se 20 40/63 trabalhadores.
O valor total = 123 17 /21. e, uma vez que o valor individual da tone-
Jada na classe III é de 1 3 /5 libra, quantas toneladas tem o produto? 77 8/21
toneladas. A taxa de mais-valia é 62 l /2%.
Mas I1I vende agora a tonelada por 1 11/13 libra. Isso redunda num
valor õiferéncíal por tonelada de 4 12/13 xelins ou 16/95 b'bra, o que para
77 8/21 toneladas representa 77 8/21 X 16/65 = 19 l /21 Jibras.
Em vez de vender o produto por 123 17/.21, III o vende por
12317/21 + l/~1=1426/7 libras. As 191/21 libras constituem a renda.
Para III teremos:

Convenções utilizadas pelo tradutor na apresentação dos quadros que seguem:


L = libra(s), X= xeli(m)(ns), t = tonelada(s)
VTft VTM VM VI
(1w;t ('lpital Tonelad..
....
\',dor•ot•l Vaktr &oul
de: '"euado
v.1o. de-
merado.por
'ºa.alld.;).
'\'alo1 individual
por lon:ladíl

l L L l l
---~---··-,,

IDO 11 s;i1 lil 17/21 1426n 1 11/13 ll/:l

VD
V•ior dlhfen·
dai ,...1on..
lida
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L ···-
11.md•cm T•udc

...---------
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"'
Compcaçio
do<11pff1I
T•>ade
nta4J·~

...
Número dC!
trth6lh'4.urc&

+ 16)~ 1.~ !91/21 10 20/63 u 17/11 61 19/21". 6l tl2 20 40163


.. +412/ll X + l~ 2/lly

Em toneladas, o salário= 20 40/6'.3, e o lucro= 12 113/126.

875
Se-passannos para a classe 11, nera- J!ãO haverá renda. Valor de mer-
cado e valor individual serão iguais. Em toneladas, II produz 67 4/63.
Para li teremos, portanto:

vr VM VI

Classe Capital Tonelada$ Valor Valor de Valor individual


torai mercado po.r por tone_lada
tonefada

L L L L

li 100 67 4/63 123 l 7/21 1 [ l/13. 1 11/13

VD

Valor diferencial Renda Tau de lutro Composição do Taxa de Nlunero dos


por tonelada capital mais..vafü1 trabalhadores

L L

o o 23 l 7{21 6119/2lc +38 2/2lv 62 !/:? 2040/63

Em toneladas, salário= 20 40/63, e lucro== 12 113/126.

8'76
VTR VTM VM VI VD

~
Classe Capital Toneladas Valor to· Valor to- Valor de Valor lndi· Valor dife,encial
tal real tal de
me1cado
mercado
por
vidual por
tonelada
por tonelada ~
tonelada
ffe"
:::i
o
ril
L L L L L L §p.
o
o
m 100 77 8/21 123 17/21 142 6/7 1 11/13 1 3/5 + 16/65 L :=+ 4 12/13 X ~
123 17/21 123 17/21 o o
11 100 67 4/63 1 11/13 1 11/13 :::i
p.
(1)
(li

a
íJ
,.,
,.,o..
Composição do
capital
Número de
lraballta.dores
Taxa de
mais-valia
Taxa de
lucro
Salátio Lucro Renda Renda
-
i;i
(1)

...
( 1)

~
% % t t L t °8
ia
~
J"
r+
61 19/21 0 + 38 2/2lv 10 20/63
.,,~
20 40/63 62 l/2 23 17 /21 20 40/63 1,2 113/126 19 l/'J.1
00
-...l
--.1 61 19/21c + 38 2/2lv 20 40/63 621/2 23 17/21 20 40/63 12 113/126 o o
Pasáemos agora ao terceiro caso e admitamos com Ricardo que a mi-
na 1, mais pobre, tem de ser e pode ser explorada porque o va'/or de mer-
cado subiu para 2 libras. Uma vez que o capital de 60 exige 20 trabalha-
doreS; e estes agora custam 40 libras, teremos a composição do capital
vIB.ta no Quadro A, p. 574, a saber, 60c + 4úv, e o valor que os 20 traba·
lhadores produzem é sempre igual a 60; daí o vaJor totaJ de 120 para o
produto obtido com o capital de 100, qualquer quê seja sua produtivida-
de. Aí a taxa de lucro = 20%, e a taxa de mais-valia = 50%. Em tonela-
das, o lucro = 10. Temos agora de ver como III e II mudam em virtude
dessa variação do valor de mercado e da intromissão de I, que determina
a taxa de lucro.
III, embora lavre a terra mais fêdil, com 100 horas só pode empre-
gar 20 trabalhadores que lhe custam 40 libras, uma vez que um capital
constante de 60 exige 20 trabalhadores. Por isso, o número de trabalha-
dores que um capital de 100 emprega cai para 20. E o valor totaJ real de
seu produto é agora 120. Mas, uma vez que o valor individua] da tonela-
da produzida por Ili é 1 9/15 libra, quantas toneladas produzirá? 75, pois
120 dividido por 24/15 (19/15 libra)= 75. O número de toneladas que
produz decresce porque o mesmo capital só lhe permite empregar menos
trabalho, e não mais (conforme afirmação errônea e reiterada de Ricardo,
oriwida de ter ele sempre em vista apenas a quantidade do trabalho ne·
cessária para produzir o mesmo produto, e não, a única coisa importante,
qt11Jnto trabalha vivo pode ser empregado na nova composição do capi-
tal). Mas, III vende essas 75 toneladas por 150 (em vez de 120, o valor de-
las), e assim sua renda sobe para 30 libras.
Para II, o valor do produto também é 120 etc. Contudo, uma vez
que o valor individual da tonelada = l 11/J3 produz 65 toneladas (pois
120 dividido por 24/13 (111/13) = 65. Em suma, obtemos aí o Quadro
A da p. 574. Mas, uma vez que aí precisamos de novos títulos para n0$o
propósito, refaçam.os o Quadro onde entra agora l e o valor de mercado
se eleva a 2 horas.

878
VTR VTM VM VI VD
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Cla.UI? Capital Tonela- Valor to- Valor to- Valor de Valor individual Valor diferencial
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10
30
10
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~~ so o
00 ~ ,.e 600 +40v 20 20 20 10 o
-.,J
\O is. ti 40 20
Passemos agora aos novos casos propostos 140 • [Antes de mais nada,
a classe que só chega a dar lucro; chamemo-la lb. Com capital de 100
só produz 43 7/11 toneladas.
O valor da tonelada sobre para 2 l /2 libras. A composição do capí·
tal = 54 6/llc + 45 5/1 lv. ·Valor do produto = 109 1/11 libras. Com
45 5/11 libras pagam-se 18 2/11 homens. E uma vez que o valor da jorna-
da de trabalho de 20 homens = 60 libras, o da jornada de 18 2/11 ho·
roens = 54 6/11. Em conseqüência, o valor do produto = 109 l /11. A ta-
xa de lucro = 9 l/111ibras = 3 7 /11 toneladas. A taxa de mais·wdia:::: 20%.
111, li e 1, com l 00 libras, uma vez que tem a mesma. composição
orgânica de lb e tem de pagar o mesmo salário, também só podem empre-
gar 1 82/11 homens, que produzirão um vaior di 54 6/11, em CQnseqüên-
cía, como Ib, mais-valia de 20% e taxa de lucro de 9 1/11 %. Como em lb,
o valor total do produto aí é 109 1/11 libras.
Mas UI, uma vez que nele o valor individual da tonelada = 1 3/5
libra, produz (ou seu produto =) 109 1/11 libras dividido por 1 3/5 ou por
24/15 = 68 2/11 toneladas, Além disso, a diferença entre o valor indivi-
dual e o valor de mercado da tonelada é de 2 1/2 libras - l 3/5, ísto é, 2 li-
bras e 10 xelins - l librae 12 xelins= 18 xelins. Temos, então, para 68 2/11
toneladas, 18 (68 + 2/11) xelins= 1 227 3/11 xelins= 61. libras e 7 3/11
xelins. Em vez de vender seu produto por 109 1/11 libras, III o venderá
por 170 libras e 9 1/11 xelins. E esse excedente é igual ã renda de III. Em
toneladas, essa renda = 24 6/11.
II, com o valor individual da tonelada= 1 11/13 libra,produz 109 1/11
dividido por 1 11/13, o que dá 59 1/11 toneladas. Ein II, a diferença entre
o valor de mercado e o valor individual é de 2 1/2 libras - 1 11/13, o que
corresponde a 17/26 libra. Para 59 1/11 toneladas, essa diferença dá 38 7/11
libras. E isso é a renda. O valor total de mercado:;; 147 8/11 libras. Em to-
neladas, arenda = 15 5/11.
=
Por fim, em 1, uma vez que o valor individual da tonelada 2 libras,
109 1/11 libras correspondem a 54 6/11 toneladas. A diferença entre o
valor individual e valor de mercado = 2 1/2 libras - 2 libras= 10 xelins.
Temos então para 54 6/11 toneladas: (59 + 6/11) 10 xelins = 590 xe-
lins + 60/11 xelins = 27 libras+ 5 5/11 xelins. Por conseguinte, valor to·
tal de mercado= 136 libras e 7 3/11 xelins. Em toneladas, o valor da ren·
da= 10 10/11.
140. Ver neste volume pp. 870..873.

880
Vflt \ITM VM Vl VD

a.... ~ tlJ
<:apito! to11ellida• Vakl< to-
ui real
Valor IOIU de metoado "'lllor de
m..r~do par "ª'°'
dlYidualÍll·
por
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ci1I po1 o o
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l:DMWla tonelada ronelad"


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L L L L L o

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S4 6/ll,.+ 45 S/ll, IS 2/11 20 'Hill 18 2/11 3 7/11 38 7/ll L=38L 128/11 X IS S/I J
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Vejamos por fim o último caso: nele, segundo Ricardo, o lucro cessa,
de todo e não há mais--valia.
O valor do produto aí sobe a 3 libras, de modo que, ao se emprega-
rem 20 homens, o salário deles será 60 libras, igual ao valor que produzem.
Composição do capital: soe + 50v. Empregam-se então 16 2/3 lwmens.
Se o valor produzido por 20 homens = 60 libras, o produzido por
16 2}3 = 50 libras. O salário absorve portanto o valor inteiro. O trabalha-
dor continua a receber 1 tonelada. Valor do produto = 100 libras, e o
número de toneladas produzidas é portanto de 33 1/3, das quais metade
só repõe o valor do capital constante e metade, o do capital variável apenas.
Uma vez que em Jil o valor individual da tonelada = 1 3/5 libra
ou 24/15, quantas toneladas produzirá III? 100 dividido por 24/15, isto é,
62 1/2 toneladas, cujo valor = 100 libras. Mas a diferença, em libras, entre
o valor de mercado e o valor individual""" 3 - 1 3/5-= 1 6/15 ou 1 2/5. Isto
multiplicado por 62 1/2 toneladas dá 87 1/2 libras. Por conseguinte, o valor
total de mercado= 187 1/2 libfas. Em toneladas, a renda= 29 1/6.
Em II, o valor individual da tonelada = 1 11/13 ~bras. Por conse-
guinte, em libras, o valor diferencial= 3 - 11,1/13 =·l 2/13. Uma vez que
aí o valor individual da tonelada= 1 11/13 ou 24/13 libra, o capital de 100
produz (100 dividido por 24/13) 54 1/6 toneladas• .Multi.plicada aquela di·
ferença por esse número de toneladas, temos 62 libraS e 10 xelins. E o valor
de me1cado do produto = 162 libras e 10 xelins. Em toneladas. a ren-
da= 20 Sj6 toneladas.
Em I, o valor individual da tonelada= 2 libras. Po1 conseguinte, va-
=
lor dife1encial = 3 - 2 1 libra. Uma vez que aí o valor individual da to-
nelada = 2 libras, produzem-se, com capital de 100 libras, 50 toneladas.
Isso dá wna dife1ença de 50 libras. O valor de mercado do produto = 150
libras~ em toneladas, renda= 16 2/3.
Chegamos agora a lb, que até agora não deu renda. A1 o valor indi-
vidual = 2 1/2 libras, por conseguinte, valor diferencial = 3 - 2 1/2 li-
bras = 1/2 libra ou 1O xelins. E aí, uma vez que o valor .individual da tone·
lada = 2 1/2 ou 5/2 libras, o capital de 100 libras produz 40 toneladas. Des·
tas, o valor diferencial = 20 libras, e desse modo o valor total de merca-
do""' 120 libras. E em toneladas, a renda""' 6 2/3.

882
Ordenemos agora o 59 caso, em que, segundo Ricardo, o lucro desa-
parece.
5. Quinto caso:

VTR VTM VM VI VD
Classe Capi- Tonela- Valm Valor Valor Valor índi- Valordife·
tal das total total de de me1· vid11al por rencial por
real me1cado cado por tonelada tonelada
tonelada
L L L L L L
Ili lOO 621/2 100 187 1/2 3 1 3/5 1 2/5
1( 100 541/6 100 162 1/2 3 111/13 1 2/13
I 100 50 100 150 3 2 1
lb 100 40 100 120 3 2 1/2 1/2
Ia 100 33 1/3 100 100 3 3 o

Composição Número Taxa de Troca Salário Renda Relida


do capital de traba- mais-valia de
lltadores Incro
% % L
50c +50v 16 2/3 o o 16 2/3 87 1/2 29 1/6
50c + SOv 162/3' o o 16 2/3 62 1/2 20 5/6
soe+ 50y 16 2/3 o o 16 2/3 50 16 2/3
50c + 50v 16 2/3 o o 16 2/3 20 6 2/3
SOc + SDv 16 2/3 o o 16 2/3 o o

Na págína seguinte ordenarei os 5 casos numa só tabela143 •

141. Tabela encartada pp. 884 e 885 deste vol11mé.

883
t!OUENÇIA DA REMOA FIJNDIARtA SEGUNDO RICARDO IREIIFlCADA)
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e) Conversão de parte do lucro e de parte do capital
em renda da terra. A magnitude da renda da terra
varia conforme a quantidade do trabalho ·
empregado na agricultura.

Se começarmos examinando o Quadro E na página precedente 142 ,


veremos que a situação está muito clara na classe Ia, a última. O salário
aí devora o produto todo e o valor inteiro do trabalho. Não há mais·valia,
em conseqüência, nem lucro nem renda da terra. O valor do produto é
igual ao valor do capital adiantado, de modo que os trabalhadores, que
aí estão de posse de seu próprio capital, podem de contínuo reproduzir
seus salários e as condições do trabalho, e nada mais. Nessa última classe
não se pode di.1.er que a renda devora o lucro. Não existe renda nem lucro,
por não haver mais-valia. O salário devora a mais·valia, em conseqüência
o lucro.
Nas outras 4 classes, a situação, à primeira vista não está absoluta-
mente clara. Se não existe mais·valia, como pode existir renda? E por ci·
ma, em nada se alterou a produtividade do trabalho nos tipos de solo lb,
I, li e 111. A inexisténcia de mais.valia tem portanto de ser mera ilusão.
Ademais, outro fenômeno se revela não menos inexplicável à pri-
meira vista. A renda em toneladas ou em trigo de UI é de 29 l /6 tonela-
das ou quarters, enquanto no Quadro A, onde só se cultivava o solo 111, não
existia renda, empregavam-se 21 17/23 trabalhadores .:._ quando agora só
se empregam 16 2/3 trabalhadores - e o lucro {que absorveu a mais valia
inteira) montava apenas a 19 1/46.
A mesma contradição se manifesta em II; sua renda. no Quadro E,
é de 20 5/6 toneladas ou quarters, quando, no Quadro B, seu lucro que
absorYeu a mais-valia toda {empregavam-se então 20 40/63 trabalhadores,
em vez dos 16 2/3 atuais) só montava a 12 113/i26 toneladas ou quarters.
Do mesmo modo em 1: sua renda no Quadro E monta a 16 2/3 tone-
ladas ou quarters, quando no Quadro e seu lucro absorvia a mais-valia in-
teira e atingia apenas 10 toneladas (empregavam-se 20 trabalhadores em
vez dos atuais 16 2/3).
Por fim, Ih: sua renda no Quadro E monta a 6 2/3 toneladas ou
quarters. quando seu lucro no Quadro D, onde o lucro absorvia a mais-

142. Página precedente segundo o manuscrito; cor.responde ao encarte nas pp.


884 e 885.

886
vália inteira, atingia apenas 37/11 toneladas ou quarters {empregava 18 2/11
traba1hadores, em vez dos 16 2/3 atuais).
Mas, agora, está claro que o valor de mercado, ao ultrapassar ova·
lor individual dos produtos de III, II, 1, e Ib, pode sem dúvida alterar a
repartição do produto, deslocando-o de uma classe. de participantes para
outra; contudo, de modo algum pode aumentar o produto que represen·
ta a mais-valia acima do salário. Uma vez que não variou a produtividade
dos tipos diversos de terra e ainda a do capital, como é possível que os
solos III a Ib se tomem ma.is produtivos em toneladas ou quarters, com a
entrada no mercado do solo menos fértil ou da mina tipo la?
O problema se resolve como segue:
Se a jornada de trabalho de 20 homens for ígual a 60 libras, a de
16 2/3 produz.irá 50 libras. E uma vez que, na classe de solo III, o tempo
:de trabalho contido em l 3/5 ou 8/5 libra se configura em 1 tonelada
ou 1 quarter, 50 libras representam 31 1/4 toneladas ou quarters. Daí
saem 16 2/3 toneladas ou quarters para salário, e assim ficam 14 7/12 to·
neladas para mais-valia.
Ademais, por ter o valor de mercado da tonelada subido de 1 3/5
ou 8/5 libra para 3 libras, bastam do produto, isto é, das 62 1/2 toneladas
ou quarters, 16 2/3 toneladas ou quarters para repor o valor do capital
constante. -Em contrapartida, quando a própria tonelada ou quarter que
III produzia determinava o valor de mercado, que por isso era igual ao va·
lar individual, eram necessárias 31 1/4 toneladas ou quarters para repor
um capital constante de 50 libras. Dessas 31 1/4 toneladas ou quarters,
dessa parte alíquota do produto então necessária para repor o capital
quando a tonelada valia 1 3/5 libra, exigem-se agora apenas 16 2/3. Ficam
assún disponíveis e se transferem para renda 31 1/4 - 16 2/3 toneladas
ou quarters. lsto é, 14 7 /12 toneladas ou quarters.
Se somannos a maís-valia de 14 7 /12 toneladas ou quarters - pro·
duzida em III por 16 2/3 trabalhadores com capital constante de 50 ll·
bras - à porção do produto de 14 7/12 toneladas ou quarters, a qual ago-
ra, em vez de repor o capital constante, apenas aparece na forma de pro-
duto excedente, o total de produto excedente atingirá 28 14/12 tonela-
das ou quarters = 29 2/12 = 29 1/6 quarters ou toneladas. E a rigor isso
é a renda em toneladas ou trigo de Ili no Quadro E. Resolve-se de idên-
tica maneira a contradição aparente na magnitude da renda em toneladas
ou trigo das classes II, 1, lb ao Quadro E.
Revela-se portanto que a renda diferencial - que surge nos meJho.
res tipos de solo, em virtude da diferença entre valor de mercado e ova·

887
Jor individual dos produtos neles produzidos - em sua ecnfiguraçiio ma·
teria/ de renda em produto, produto excedente e de renda em toneJa4as
ou em mgo no exemplo acima, se compõe de dois elementos e provêm
de duas transformações. Primeiro: o produto excedente que representa
o tràbalho excedente dos -trabalhadores, a mais-valia, passa da forma de
lucro para a de renda e por isso transfere-se para o dono da terra e não
para o capitalista. Segwido, parte do produto, a qual antes, quando o pro-
duto do melhor tipo de solo ou de mina se vendia pelo próprio valor, era
necessária para repor o valor do capital constante, libera-se agora, quando
cada parte alíquota possui maior valor de mercado, e aparece na forma
de produto excedente, cabendo por isso ao dono da terra e não ao ca-
pitalista.
Dois processos formam a renda em produtns, desde que seja ren·
da diferencial: conversão do produto excedente em renda e não em lu-
cro e conversão de uma parte altquota do produto, antes destinada are·
por o valor do capital constante, em produto excedente e por isso em
renda. Esta circunstância de parte do produto se transmutar em renda,
e não em capital, passou despercebida a Ricardo e a todos os seus suces·
sores. Só vêem a conversão do produto excedente em renda; não repa-
ram na transmutação de parte do produto antes destinada ao ~pital (e não
ao lucro), em produto excedente.
O valor nominal do produto excedente assim cónstituído, ou da
renda diferencial, é detenninado (conforme a suposição feita) pelo va-
lor do produto obtído na pior terra ou mina. Mas esse· valor de merca-
do apenas ocasiona a distribuição diferente desse pródutoi não o gera.
Aqueles dois elementos aparecem em todo lucro-suplementar, quan-
do, por exemplo, em virtude de nova maquinaria etc., se vende produto
produzido mais barato por valor de mercado maior que seu próprio va-
lor. Parte do trabalho excedente do trabalhador, em vez de aparecer na
fonna de lucro, surge na de produto suplementar (lucro suplementar).
E pane do volume de produtos que, no caso de o produto se vender por
seu próprio valor menor, seria necessário para repor o capital constante
do capitalista, libera-se agora, nada tem para repor, torna-se produto ex-
cedente e por isso expande o lucro. -

* * *
(De passagem: quando falamos da lei da queda da taxa de lucro
no curso do desenvolvimento da produção capitalista, entendemos então
por lucro o total da mais-valia de que se apodera, de inicio, o capital in·

888
dustrial, não importa como o tenha de repartir depois com o capitalis-
ta prestamista Guro) e com o dono da terra (renda). Aquí portanto taxa
mais-valia
de lucro = .Ne~e sentido, a taxa de lucro pode cair,
capital adiantado
embora o lucro industrial, por exemplo, suba em relação ao juro ou více-
versa. Se o lucro = L, o lucro industrial= L ', o juro = J e a renda (rent) = R,
será L = L' + J + R. E é claro que, seja qual for a magnitude absoluta de
L, podem L', J e R subír ou cair em sua relação recíproca, sem depender
da magnitude de L ou da ascensão e queda de L. A ascensãÓ, em termos
correlativos, de V, J e R é mera repartição diferente de L por pessoas di-
versas. O exame ulterior das circunstâncias que geram essa repartição de
L, que não é idên,tica à ascensão ou queda do próprio L, não é matéria
para tratar aqui e sim no estudo da concorrência entre os capitais. Mas,
a circunstância de R poder subir a nível que ultrapasse o próprio L, su·
posto que este se divida apenas por L' e J, é, como já se expôs, aparência
decorrente de parte do produto, ao subir o valor deste, liberar-se e conver-
ter-se em renda, em vez de se reconverter em capital constante.

* *
Em toda essa expos1çao admitiu-se que o produto encarecido (se·
gundo o valor de mercado) não entra na composição do capital constan-
te, mas só no salário, no capital variável. A primeira ocorrência, se hou-
vesse, diz Ricardo, faria a taxa de lucro cair ainda mais e subir a renda,
E o que cabe investigar.
Até agora supomos que o valor do produto tem de repor o valor
do capital constante; ou seja, as 50 libras do caso acima. Por conseguin-
te, se 1 tonelada ou quarter custa 3 libras, não se exigem para essa repa-.
sição de valor tantas toneladas ou quarters quantas as necessárias quan-
do a tonelada ou quarter só custa l 9/15 libra etc. Admitamos, porém,
que o carvão ou o trigo, ou seja qual for o produto da terra, o produto
produzido pelo capital agrícola, na sua própria forma mo.teria/, entre na
formação do capital constante. Digamos, constitua a metade dele. Nes-
te caso, é claro que, seja qual for o preço do carvão ou do trigo, um ca-
pital constante de grandeza definida, ísto é, que determinada quantida-
de d.e trabalhadores põe em movimento, precisa sempre, para ser reposto,
de uma parte alíquota definida do produto global, em sua fonna física,
uma vez que, de acordo com a suposição, fica irzaltemda a composição
do capital agrícola no tocante às quantidades relativas de trabalho acumu-
lado e de frabalho vivo.

889
Se, por exemplo, do capital constant_e, metade consiSte em carvão
ou trigo e metade em outra mercadoria, o capital constante de 50 libras
é constituído por 25 de outras mercadorias e 25 libras (ou 15 5/8 quár-
ters ou toneladas de trigo ou carvão), desde que o valor da tonelada= 8/5
ou 1 3/5 libra. E não importa como varie o valor de mercado da tonela·
da ou do quarter, 16 2/3 trabalhadores precisam de um capital constante
de 25 libras+ 15 5/8 quarters ou toneladas, pois continua a mesma a na-
tureza do capital constante e também o número proporcional de trabalha·
dores exigidos para movimentá-lo.
Se o valor da tonelada ou do quarter subir para 3 libras, como no
Quadro E, o capital constante necessário para os 16 2/3 trabalhadores
será 25 libras+ 3 (15 + 5/8) libras= 25 libras+ 45libras+15/8= 71 7/8
libras. E os 16 2/3 trabalhadores, uma vez que custam 50 libras, reque-
reriam um dispêndio total de capital de 71 7/8 libras+ SO libras= 121 7/8
libras.
O capital agrícola, com a mesma composição orgânica, terá variado
na correlação dos valores.
Sua composição será 71 7/8c + 50v (para 16 2/3 trabalhadores).
Na base 100, 58 38/39c + 41 l/39v. Algo mais que 13 2/3 trabalhadores
(desprezada a fração 1/117). Uma vez que 16 2/3 trabalhadores movi-
mentam 15 S/& quarters ou toneladas de capital constante, 13 79/117
trabalhadores movimentarão 12 32/39 toneladas ou qúarters = 38 6/13
libras. E o resto do capital constante = 20 20}39 libras consistírá.em ou-
tras mercadorias. De qualquer modo, será sempre mister tirar do produ-
to 12 32/39 toneladas ou quarters, destinadas a repor 'a parte do produ-
to na qual entram fisicamente. Uma vez que o valor ,que 20 trabalhado-
res produzem = 60 libras, o que os 13 79/117 produzem= 41 1/39. Mas
o ·salário no quadro E, do mesmo modo, atingiria 41 1/39 libras. Assim,
não há mais-valia.
O número total de toneladas será 51 11/13, 143 e delas: 12 32/39
são de novo reproduzidas; 13 79/117 se destirulm aos h:abalhadores, e
6 98/117, a 3 libras a tonelada, cabem à parte restante do capital cons-
t~te. Ao todo, portanto, 33 1/3. Para a renda ficam 17 37/39.

143. O total de 5111/13 toneladas calcula-se da seguinte maneira; se 16 2/3 tta-


balliadores da classe IIl do quadro E (ver encarte entre as pp. 452 e 4$3 deste volu-
me) produzem 62 1/2 toneladas, 13 79/117 trabalhadores· produzll:ão com igual
. . 13 79/117 X 621/2
produtividade ;:::: 51 11/39 toneladas, o que se aproxima bas-
16 2/3
tante daquele total

890
Para abreviar a coisa, tomemos o caso mais extremo e mais favo-
rável a Ricardo. Aquele em que o capital constante, como o variável, ape·
nas consiste no produto agrícola cujo valor sobe a 3 libras por quarter
ou tonelada, e por isso a classe Ia domina o mercado.
A composição tecnológica do capital não varia, isto é, mantém.se
constante a razfío entre o trabalho vivo ou o níímero de trabalhadores
representado pelo capital variável (uma vez que se supõe invariável a jor-
nada normal) e a quantidade exigida de mei.os de trabalho, que agora, se-
gundo supomos, consiste em toneladas de carvão ou quarters de trigo, pa·
ra dado níímero de trabalhadores.
Uma vez que na COiqposição primitiva do capital, de 60c + 40y, com
a tonelada ao preço de ~ libras, 40v representavam 20 trabalhadores ou
20 quarters ou toneladas, e 60c, 30 toneladas; e uma vez que esses 20
trabalhadores em III produziam 75 toneladas, 13 1/3 produzem (e 40y =
13 1/3 toneladas ou trabalhadores, se a tonelada = 3 libras) 50 tonektdas
e movimentam um capital constante de 60/3 = 20 toneladas ou quarters.
E mais: uma vez que 20 trabalhadores produzem um valor de 60
libras, 13 1/3 produzirão 40 libras.
Uma vez que o capitalista tem de pagar 60 libras por 20 toneladas,
e 40 pelos 13 1/3 trabalhadores, e estes só produzem valor de 40 libras,
o valor do produto é igual a 100 libras; dispêndio = 100 libras. Mais-valia
e lucro= O.
Todavia, uma vez que não variou a produtiVidade de III, os 13 1/3
homens produzirão, como se disse, 50 toneladas ou quarters. O dispên·
dia físico de toneladas ou quarters, porém, montará apenas a 20 para
o capital constante e 13 l/3 para o salário, isto é, a 33 1/3 toneladas. As
50 toneladas deixam portanto um produto excedente 16 2/3, e isso cons-
titui a renda.
Mas que representam essas 16 2/3 toneladas?
Desde que o valor do produto = 100 libras e o próprio produto =
50 toneladas, o valor da tonelada produzida será 2 Jibras = 100/50. E en-
quanto o produto material for maior que o necessário para reposição fí·
sica do capital, o valor individual da tonelada, aínda de acordo com esse
estalão, tem de ficar menor que o correspondente valor de mercado.
O arrendatário tem de pagar 60 libras para repor 20 toneladas, e
contabiliza as 20 toneladas a 3 libras cada, pois esse é o valor de merca·
do da tonelada, que se vende por esse preço. Do mesmo modo tem de
pagar 40 libras pelos 13 1/3 trabalhadores ou pelas toneladas ou quar-
ters que _paga aos trabalhadores. Assim, estes recebem apenas 13 1/3 to-
neladas.

891
Mas, na realidade, se considerarmos, a classe III, as 20 toneladas
só custam 40 libras, e as 13 1/3 apenas 26 2/3, Contudo, os 13 1/3 tta·
balhadores produzem valor de 40 libras, mais-valia portanto de 13 l /3 li·
bras. A 2 libras por tonelada, isso equivaJe a 6 4/6 ou 6 2/3 toneladas.
E uma vez que em Ili as 20 toneladas custam apenas 40 libras, fica
excedente de 20 libras= 10 toneladas.
Assim, as 16 2/3 toneladas de renda = 6 2/3 toneladas de mais-valia
que se converteu em renda, acrescidas de toneladas referentes a capital
que se transmutou em renda. Mas, por ter o valor de mercado da tonela-
da subído a 3 libras, as 20 toneladas custam ao arrendatário 60 libras e as
13 1}3, 40 libras, enquanto as 16 2/3 toneladas se revelam renda= 50 libras,
como excedente do valor de mercado sobre o valor do produto.
Na classe II, quantas toneladas fornecem 13 l /3 trabalhadores?
Aí 20 trabalhadores produzem 65 toneladas; por conseguinte, 13 1/3,
43 1/3 toneladas. Como acima, o valor do produto= 100. Mas, das 43 1/3
toneladas 33 l /3 são necessárias para repor o capital. Restam como pro-
duto excedente on renda 43 1/3 - 33 1/3 ==: 10 toneladas.
Essa renda de 10 se explica assim: em II, o valor do pro duto = 100
libras, o produto é de 43 l /3 tcmeladas, e portanto o valor da tonelada =
t 00/43 l /3 :;; 24/13 libras. Os 13 1 /3 trabalhadores custa.m portanto
30 10/13, e ficam para mais-valia 9 3/13 libras. Além .disso, as 20 tone-
ladas de capital constante custam 46 2/13 libras, e da~ 60 que por elas
se pagam ficam 13 11/13 libras. Somadas à mais-valia, temos 23 1/13 lí-
bras, o que está correto a rígor.
Só na classe Ia - onde na realidade são necessários fisicamente, pa-
ra repor capital constante e sa,lário. 33 1/3 toneladas'ou quarters, o pro-
duto global portanto - não há de fato mais-valia nem produto excedente
nem renda, Quando isso não ocorre, quando o produto é maior que o
necessário para reposição física do capital, sucede conversão de lucro
(mais-valia) e de capital em renda. Esta última conversão se dá quando
parte do produto, a qual para valor baíxo terla de repor o capital, se li-
a
bera, ou quando cabe à renda parte do produto qual se teria converti·
do em capital e mais-valia.
Mas, ao mesmo tempo, vê-se que o encarecimento do capital cons-
tante, por ter encarecido o produto agrícola, reduz de muito a renda:
por exemplo, a renda de lII e li no Quadro E, de 50 toneladas = 150
libras, na base do valor de mercado de 3 libras, reduz-se a 26 2/3 tonela-
das, isto é, â metade quase. Essa redução é necessária, visto que decres.
ce o número de trabalhadores empregados com o mesmo capital, por dois

892
motivos: primeiro, porque sobe o salário, ou seja, o valor do capital va-
riável; segundo, porque se eleva o valor dos meios de produção, do capi-
tal constante. Em si mesma, a alta do salário exige que das 100 libras me-
nos se possa despender em trabalho, e portanto relativamente (não se
alterando o valor das mercadorias que entram no capital constante) me·
nos em capital constante, e assim as 100 libras em conjunto representam
menos trabalho acumulado e menos trabalho vivo. Mas, além disso, a ele-
vação do valor das mercadorias que entram no capital constante faz que,
em virtude de não variar a relação tecnológica entre trabálho acumulado
e trabalho vivo, seja menor a quantidade de trabalho acumulado que se
possa empregar pela mesma quantia e em conseqüência também a de tra-
balho vivo. Mas, uma vez que o produto total, com produtividade invariá-
vel da terra e dada composição tecnológica do capital, depende da quan-
tidade de trabalho empregado, ao decrescer este, a renda tem também
de decrescer.
Isto se evidencia quando o lucro é suprimido. Enquanto este exis·
tir, a renda pode crescer, apesar do decréscimo absoluto do produto em
todas as classes, o que mostra o quadro à p. 681 144 • Enfim, é claro que,
ao existír apenas a renda, o decréscimo do produto e, por conseguinte,
do produto excedente tem de recair sobre a própria renda. Antes de mais
nada, isso ocorrerá mais rapidamente se o valor do capital constante acres-
cer com o do capital variável.
Mas, se abstraímos desse caso, o quadro da página 681 mostra que
o aumento da renda diferencial, com fertilidade decrescente da agricul-
tura, é sempre acompanhado, também nas melhores classes de terra, por
quantidade decrescente do produto global em relação ao capital adianta-
do de determinada magnitude, de 100 por exemplo. Ricardo não tinha
noção disso. A taxa de lucro diminui porque o mesmo capital, digamos
100, movimenta cada vez menos trabalho e paga mais caro esse trabalho,
e assim acumula excedente cada vez menor. Mas o produto real, dada a
produtividade, depende, como a mais-valia, do número dos traba1hadores
empregados pelo capital. Ricardo não se dá conta disso. Nem da maneira
como se forma a renda, quer pela conversl'io da mais-valia em renda, quer
pela do capital em mais-valia. Sem dúvida, essa conversão de capital em
mais-valia é apenas aparente. Se em III etc. o valor de mercado fosse de-
tenninado pelo valor do produto, cada partícula de produto excedente
representaria mais-valia ou trabalho excedente. Ricardo, ademais, só tem

144. Ver encarte pp. 884 e 885.

893
em vista que, para produzir a mesma massa ·de produtos, é mister empre-
11;ar mais trabalho, mas não repara o que é decisivo para a detenninação
da taxa de lucro e da quantidade do produto produzido, a saber, que com
a mesma quantidade de citpital se emprega quantidade sempre decrescente
de trabalho vivo, e que parte cada vez maior deste é trabalho necessário
e parte cada vez menor, trabalho excedente.
Depois de tudo isso impõe-se dizer que, mesmo que se considere
como renda (rent) apenas a renda diferencial, Ricardo não progrediu em
face de seus predecessores. Nessa questão cabe-lhe o importante mérito
apontado por Quincey, a formulação cientlfica do problema. Ao solucio-
ná·lo, aceita as idéias anteriores.
Diz Quincey:·
"Ricardo inovou a teoria da renda, reduzindo-a à questão de saber se
a renda de fato invalida a lei do valor" (p. 158, Th. de Quincey, The
Lo~ of Pol. Econ. 1 Edimbutgo e Londres, 1844).

À página 163 da mesma obra prossegue Quincey:


''Renda é aquela parte do produto da terra (ou de outro fator da pro-
dução), a qual se paga ao dono da teua pelo uso de suas forças diferen-
ter, medidas por comparação com fato1es semelhantes que operam
no mesmo mercado."

E mais, à página 176:


Objeta-se a Ricardo que os proprietários de I não o cederão de giaça.
Mas, no período (nesse período mitológico) em que só se cultiva l,
"não se pode ter fonnado uma classe separada de po~seíT.O$ e ª"enda-
tdrio1, distinta da cúme dos proprietdrlos da terra". - _.

Segundo Quincey, portanto, essa é a lei da "propriedade da terra",


enquanto não existe propriedade da terra no sentido moderno.
Passemos agora a citações elucidativas de Ricardo.

d) Comprovação histÓrica da elevação da taxa de


lucro com alta simultânea dos preços dos
produtos agrícolas. Possibilidade de acrescer a
produtividade do trabalho na agricultura.

[Antes, ainda esta obseivação sobre a renda diferencial: Na realidade,


a seq'ilência ascendente e a descendente se alternam, se entrecruzam e se
entrelaçam.

894
Mas de modo algum se diz que, se em curtos períodos isolados ( oo.
mo o de 1797 a l 813) é forte o domínio da seqüência descendente, a taxa
de lucro tem por isso de cair (desde que esta seja determinada pela taxa
de mais-valia). Ao contrário, acredito que, naquele período, a taxa de lu·
cro na Inglaterra subiu por exceção, apesar da forte ascensão dos preços
do trigo e dos produtos agrícolas em geral. Não conheço um estatístico
inglês que não participe do ponto de vista da alta da taxa de lucro duran-
te aquele período. Certos economistas, como Çhalíners, Blake e outros
elaboraram teorias apoiadas naquele fato. De antemão, tenho de acres.
centar que é tolice procurar explicar a alta dos preços do trigo naquele
período pela desvalorização monetária. Nínguém que tenlia estudado a
história dos preços das mercadorias durante aquela época pode partici-
par dessa opinião. Além disso, a alta dos preços começa muito antes e
atinge alto nível, antes de surgir qualquer depreciação monetária. Ao sw·
gir esta, é mister apenas deduzi~la. Se se pergunta por que subiu a taxa de
lucro, apesar da ascensão dos preços do trigo, encontra-se a explicação
nas seguintes circunstâncias: prolongamento da jornada de traba1ho, a
conseqüência imediata da nova maquínaria introduzida; barateamento
das mercadorias fabricadas e coloniais que entram no consumo dos tra-
balhadores; queda dos salários (embora suba o salário nominal) abaixo
de seu nível médio tradicional (reconhece.se essa ocorrência naquele pe·
ríodo; J. P. Stirling - que aceita no conjunto a teoria ricardiana da renda
da terra - em The Philosophy of Trade etc., Edimburgo.1846, procura
demonstrar que a conseqüência imediata de um encarecimento penna-
nente do trigo, o qual não seja detenninado lºr elementos sazonais alea-
tórios, ê sempre redução do salário médio 14 ); por fim - urna vez que,
em virtude de empréstimos e de despesas do governo, a procura de capi·
tais cresceu mais rápida que a oferta - elevação do preço nominal das
mercadorias, com o que o fabricante recupera segmento da parte do pro·
duto paga em forma de renda etc. ao dono da terra e a outros detentores
de renda fixa. Não cabe tratar dessa circunstância agora que estamos exa-
minando as relações fundamentais, e assim temos em vista apenas 3 clas-
ses, os donos das terras, os capitalistas e os trabalhadores. Contudo, em
condições apropriadas, ela desempenha na prática importante papel, se-
gundo mo~trou Blake. t 45 ]

145. Stiding, The phi1osophy of trade; or, autlines of a theary of profitsand price ... ,
E-Oimburgo,1846,pp. 209,210.
146, Da questão aí aludida OCl}..POU-Se Marx no manuscrito de 1857/58 (ver Grun-
drisse der Kritík der palitishen Okonomle. Berlim, 1953, pp. 672-674), realizando
excertos da obra de W. Blake, Observations on the effect!J pFOduced by the expendi-
ture af govunment duríng the restriction of cash payments, Londres, 1823, e fonnu-
lando comentários.

895
[Mr. Rallett de Brighton expôs "trigo semental" na exposição de 1862147 •
"Mr. Hallett acentua que espigas de tri!o. como cavalos de raça, têm
de recebei os cuidados pertinentes, em ve-z de serem cultivadas, como
de ordinário se faz, de qualquer jeíto, sem se levar em conta a teoria
da seleção natural Vejamos alguns exemplos notáveis que ilustram o
que o cultivo aceitado pode fazer mesmo pelo trigo. Em 1SS7, Mr.
Hallett plantou os grãos de uma espiga de trigo mouruco de primeira
qualidade, a qual tinha, a rigor, 4 3/8 polegadas de comprimento e
contínha 4 7 grãos. Das pequenas colh.eitas resultantes dessa seleção
voltou· a escolhei em 1858 a mais bela espiga com 6 l/2 polegadas e
79 grãos, e isso se repetiu em 1859, com melhor espiga, dessa vez com
7 3/4 polegadas e 91 grãos. No ano seguínte, 1860, o tempo foi ruim
para a cultu.ta do tdgo, que se xecusava a crescer com maior abundân-
cía e melhor qualidade; mas, um ano depois, em 1861, a melhor espiga
atingíu 8 3/4 polegadas de oomp1imento, e soZinha encerrava não me-
nos de 123 grãos. Assim, o trigo em cinco anos quase duplicou o tama-
nho e triplicou a produtividade em número de grãos. Esses 1esultados
foram atingidos com um sistema que Hallett ehama de 'sistema natu-
ral' de cultÍVar trigo, cons.istente em plantar os grãos isolados, à distân·
cía de 9 polegadas um do outro em todas as direções, de modo a pro-
porcionar, a cada um, espaço bastante para desenvolvimento pleno•..
Afuma que a produção de trigo na lnglate.rra pode sei duplicada com
a adoção do 'trigo semental' e do 'sistema natural' de cultivo. Obser_.
va que de grãos avulsos, plantados na época própria, apenas um em
cada pé quadrado de terra, obteve plantas com 23 espigas em méclía
e cexca de 36 grãos em càda espiga. Nessa base, o produto de um acre,
ealculado a rigo1, importava em l 001 880 espigas de trigo, quando,
com o modo costumeiro, com o dispêndio de sementesc ·mais de vinte
vezes maior, a colheita só chegava a 934 120 espigaS; com peida, por-
tanto, de 6 7 760 espigas ... "]

e) A queda da t.axa de lucro segundo Ricardo e sua


teoria da renda.
"Com o progresso da sociedade, o preço natural do trabalho tem sem·
pie tendência a subir, pois uma das principais mercadorias por que se
determina o preço natural do trabalho propende a ficar mais cara, em
virtude da dificuldade maior de produzi-la. Entretanto, os melhorarnen·
tos da agricultura e a descoberta de novos mercados donde é possível
importar alimentos podem por algum tempó atuar contra a tendência
ascendente do preço dos gêneros de Primeira neces.sidade e mesmo fa-
zex cair o preço natural deles; assim, os mesmos fatores exercerão os
efeitos correspondentes no preço natura! do trabalho. ·
O preço natuial de todas as mercadorias, excetuados produtos primá-
rios e trabalho, tende a cair com o progresso da riqueza e da população;
pois, emboia elas acresçam em valo1 real em virtude da elevação do

147. Exposição mundial cm Londres, ínaugu1ada em 19 de maio de 1862, onde se


exibiam produtos agrícolas e industriais, obras de :u:te e conquístas científicas.

896
preço natural das matérias-prima.s de que são elaboradas, esse acrésci·
mo é mais que compensado pelos melhoramentos da ma.quinaria, pela
me1hor divisão e distribuição do tzabalho e pela melhor preparação
científica e ttcntca dos prodr.uores." (Ricardo, On the principies of
political economy, and taxation, pp. 86, 87 .)
''Ao cxescer a população, os meios de subsistência terão ascensão cons·
tante de preço, porque mais trabalho será neeessário para pi:aduzi·los ...
O salário em dinheiro, em vez de cair, subirá, mas não o sufieiente para
pennítir ao trabalhador comprar tantos bens e gêneros como o fazia
antes da a!ta de p1eço naquelas me1cadorias... Embora o trabalhador
na realidade fique assim pior pago, essa elevaÇão de Mliirio redu:itó
necessariamente o lucro do fabricante, pois este não vendetá as merca-
dorias a Preço maís alto, ape8lll" de ter aumentado o diipêndio de pro·
duzi·las ...
Parece então que a mem'la cautt1 que eleva a renda - a dificuldade cres-
cente de obter quantidade adicional de alimentos com a mesma quanti-
dade relafil'a de trabalho - ttlmblm eleva o salário; por ísso, se não va-
riar o valor do dinheiro, tanto a renda qu:antó o salário terão, com o
p1ogressso da ríqueza e da população, tendência ascendente (l.c., pp.
96, 97).
Todavia, entre a alta da renda e a do salário há esta diferença essencial.
À alta do valo1 monetário da renda acompanha participação acrescida
no pxoduto; a renda do dono da tena não só é maior em dinheiro, mas
também em trigo ... Sexá menos risonho o destino do trabalhador: rece-
berá maís salário em dinheiro, sem dúvida, mas esse salário dimínuil'á
em tcigo e pioruá tanto sua dísponfüilldade de trígo quanto sua situa·
ção geral, pox encontrar dificuldade maior em manter a taxa de merca-
do do salátio acima da respectiva taxa natural" (l.c., pp. 91, 98).
"Suposto que trigo e mercadorias fabricadas se vendam sempre a pre·
ços invariáveis, os lucros subirão ou cairão na razão da queda ou alta
do salário. Mas admitamos suba o preço do trigo, por ser necessário
maís trabalho para produzi-lo: essa causa não elevuá o preço daquelas
mereadorias fabrieadas em cuja produção não se requer quantidade
adícíonal de trabalho... Se, roma é absolutamente certo, o salário su·
bit com a alta do trigo, os lucros dos fabricantes cairão necessariamen-
te" (1.c., p. 108).
Todavia, poder-se-á perguntar, "se o arTendatârio pelo menos não rece-
be a mesma taxa de luero, embora pague urna quantia adiciona! em sa·
lírio? Por certo que não: pois terá de pagar, como o faz o fabricante,
um acréscimo de sa.lárío a todo trabalhador que emprega, e ainda será
obrigado ou a pagar renda oti a empregtJr trabalhadores adicíonais para
obter o mesmo produto. E a alta no preÇQ dos produtos pi:jmá.rios só
corresponderá a essa renda ou a essa adição de trabalhadores e não o
compensará pela alta do salário" (1.c., p. 108).
"Mostramos que, em estódíos primitivos da sociedade, a participação
do dono da terra e do trabalhador no valor do produto da terra era
pequena, e que crescerá na razão do progresso da riqueza e da dificul·
dade de obter alimentos" (Lc., p. l 09).

Bis aí uma singular fantasia burguesa, a dos "estádios primitivos da


sociedade", Nesses estádios, o trabalhador ou é escravo ou camponês que
se sustenta com o próprio trabalho etc. No primeiro caso, o trabalhador

897
junto com· a terra pertence ao senhorio; no ~gundo, é senhorio de si mes-
mo. Nos dois casos não há capitalista entre dono da terra e trabalhador.
Rícardo considera como fenômeno pertencente "aos estádios primitivos
da sociedade" o que apenas é o resultado final da produção capitalista -
a subordinação da agricultura a essa produção e da( a transformação dos
escravos ou camponeses em assalariados e a intro:mlssão do capitalista en·
tre o dono da terra e o trabalhador.

"Auim, a tendência natural do lucro é para cair, pois, com o progresso


da wciedade e da riquez.a, a quantidade adicional necessária de alimen-
tos s6 pode ser obtida com o sacrifício de quantidade cada vu maior
de trabalho. Essa tendência ou, por assim dizer, pavits:ção do lucro é
felizmente reprimida com frequência por melho.ramentos das máquinas
ligadas à produçã!:l de meios de subsistência essenciais e ainda pelas
descobertas da ciência agrícola, que nos possibilitam libentt parte da
quantidade de Wibalho antes llllcessária e portanto baixar o preço dos
bens de primeira necessidade" (1.c., pp. 120, 121).

Na passagem seguinte, sem rodeios, Ricardo diz que entende por ta-
xa de lucro a taxa de mais-valia:

"Embora se produza ivilor maior, os produtores. consomem proporção


maior do que resta desse valor depois de se pagar a renda (rent), e isso -
e só isso - regula o lucro" (1.c., p. 127).

Isto é, tirada a renda, a taxa de lucro é igual ao excedente do valor


da mercadoria sobre o valor do trabalho pago durante, a prodÚção ou so-
bre a parte de seu valor a qual os produtcres consomem. Ricardo aí só
chama de produtores os trabalhadores. Admite que"eles geram o J)(llor
produzido. Define então a mais-valia como a parte do valor a qual eles
mesmos criam, produzindo-a para o capitalista.~
Mas, se identifica taxa de mais-valia oom taxa de lucro e ao mesmo
tempo admite, como o faz, ser de magnitude dada a jornada de trabalho,
a tendência a cair da taxa de lucro só se pode explicar pelas causas que fa-
zem cair a taxa de mais-valia. E isto só é possível; dada a jomada de traba-

• Sobre a or.igem da mais-valia:


"Na forma de dinheúo .•. o capital não produz lucro; na forma de materiais,
mágUinas e alimentos, por que se pode trocar, produz renda (revenue)" (l.c.,
p. 267). "O capital do acionV;ta nunca se pode tornar produtivo,.de fato níio
~ capital Caso ele venda seus papéis e emp1egue produtivamente o dinheiro
recebido em troca, só pode fuê-lo, retirando de· emprego produtivo o capital
do comprador de seus papéis" (1.c., p. 289, nota). (Nota de Marx.)

898
lho, se houver ascensão permanente da taxa de salário. E essa ascensão s6
pode ocorrer se houver elevação permanente do valor dos bens vitalmen-
te necessários. E só é possível essa elevação se houver deterioração cons·
tante da agócultura, isto é, admitindo-se a teoria ricardiana da renda da
terra. Uma vez que Ricardo identifica taxa de mais-valia com taxa de lu·
cro, e uma vez que a taxa de mais-valia só pode ser calculada na base do
capital variável, do capital despendido em salário, supõe Ricardo, como
A. Smith, que o valor do produto Wtal - após a dedução da renda (rent)
se reparte em salário e lucro, entre trabalhadores e capitalistas. Isto é, faz
a falsa suposíçlo de o capital adiantado todo consistir apenas em capital
variável. Assim, por exemplo, depois da passagem acima, prossegue:

"Quando tenas pobres sio objeto de cultivo~ ou quando se despendem


mais capítal e mais trabalho na terra velha, com menor rendimento, o
efeito resultante tem de ser duradouro. Do produto, proporção maior
dai:Juela parte que fi~ para ser dividida, depois de se pagar a renda da
te:aa, entre os donos do capital e os trabalhadores, caberá a estes" (Lc.,
pp.127, 128)

Continua a passagem:

"Cada trabalhador pode ter e provavelmente terá quantidade absoluta


menor; mas, uma vez que se empregam ma.is trabalhadores em relação
ao produto todo que o an:endatário retém, o salário absorveci o valor
de proporção maior do produto total e por isso o valor de proporção
menor se destinará ao lucro" (1.c., p. 128).

E pouco acima:

"A quantidade restante do produto da terra, depoís de pagos o traba·


lhador e o dono da terra, pertence necessariamente ao arrendatário e
representa o lucro de seu capital" (l.c., p. 110).

Ao final do capítulo (capítulo VI) "On Profits", diz Ricardo que sua
idéia sobre a queda do lucro permanece verdadeira mesmo se se admitir -
o que é falso - que os preços das mercadorias subam com alta no salário
em dinheiro.

''No capítulo sobre salário esforçamo-nos por mostrar que o preço em


dinheiro das mercadorias não subirá com eleVtJção do salário... Mas, se
não fora assim, se os preços das mercadorias sempre fossem elevados
por salários altos, não seria menos verdadeira a ptoposição de os salá·
rios altos atingirem fatalmente os empregadorei; de trabalho, tirando-

899
'lhes porção do lucro real. Admitamos que o chapelelro, o fabúcante
de. meias e o de calçados paguem, C4ld.a. um, 10 hõras adicionais desa-
lá.rio para produzir determinada quantidade das suas mercadorias, e que
o prc90 dos chapéus, das meias e dos sapatos subiu de quantia suficien-
te para o fabricante recuperar as 10 libras: sua :/tu.ação não seria me·
lhor do que 11 que teria se não houvesse ocorrido essa alta. Se o fabri-
cante de meias as vendesse por 110 libras em vez de 100, seu lucro se-
ria precisamente o mesmo montante anterior de dinheiro. Mas, uma
vez que na troca pela mesma quantia obtém menos um décimo de clta-
péus, sapatos, assim corno de todas demais mercadorias, e que, com a
soma anterior de su11s resenlfls" (isto é, com o mesmo capital), "pode
empregar menos trabalhadores aos salários acrescidos e comprar menos
matérias-primas aos preços aumentados, sua situação não seria melhor
que aquela em que o montante de seu lucro em dinheiro tivesse real-
mente diminuído e para tudo tivesse permanecido o preço anterior"
(l.c., p. 129).

Ricardo, que, fora essa passagem, em sua exposição sempre acentua-


va apenas a circunstância de se ter de pagar, em terra pior, mais trabalha-
dores para se obter a mesma quantidade de produto, acentua agora por
fim a circunstância decisiva para a taxa de lucro, a de se empregdTem com
o mesmo montante de capital menos t:rabalhadores com salários acresd-
dos, Quanto ao resto, não está de todo certo. O preço dos chapéus etc.,
se aumenta de 10%, sobe também para o capitalista; o dono da terra, po-
rém, terá de ceder mais de sua renda. Digamos que sua r.endá subiu de 10
libras para 20. Todavia, com 20 libras recebe relativamente menos chapéus
etc. do que com 10:
Diz Ricardo com total acerto:

"Em fase de progresso da sociedade, o produto líquido da terra está


sempre decrescendo em relllção ao produto bruto" (l.c., p. 198).

Com isso quer dizer que a renda não sobe em fase de progresso da
sociedade. A razão real é que, em fase de progresso da sociedade, o capi-
tal variável decresce em relação ao constante.
O próprio Ricardo reconhece que, com o ·progresso da produção,
o capital constante aumenta em relação ao variável, mas apenas na forma
de crescimento do capital fixo em relação ao circulante.

"Em países rieos e poderoso~. onde grandes capitais se empregam em


maquina.ria. uma brusca mutação no comércio motivará maiores difi-
culdades que em países m;ús pobres, onde te]f1tivamente há montante
muito menor de capital fi;.:o e muito maior de capital circulante, e por
conseguinte a força humana reali:za mais trabalho. Remar capital ck·

900
culante de emprego onde esteja comprometido rufo é tão difícil quan-
to retiru capital fixo. Muitas veies é impassível desviar para outra ati·
vídade a maquinaria que tenha sido construída paia detetminada indús-
tria. Mas, a roupa, o alimenta e habitação do trabalhador num empre-
go podem servír pua sustentá-lo noutro"

(capital circulante aí só abrange capital variável, o despendido em salário),

"ou o mesmo trabalhador pode receber o mesmo alimento. a mesma


roupa e a mesma habitaçã.o, embora mude de emprego. Mas aquele é
um mal a que uma nação rica tem de se submeter, e queixar-se disso não
seria mais .razoável que o lamento de um rico mercador pelos ríscos
marítimos a que seu navio se expõe, quando a cabana de seu pobre
vizinho está livre de todos os azares dessa natureu" {l.c,, p. 311).

O próprio Ricardo se refere a ·uma causa da elevação da renda, de to-


do independente da alta do preço dos produtos agrícolas:

"O capital que se mcorpora à terra, não importa o montante, terá de


pe1tence1, ao extinguir-se o arrendamento, ao dono da terra e não ao
arrendatário. A compensação que o dono da terra receba por esse capí-
tal, seja qual for, ao arrendar de novo sua terra, Opt1recel'á T1JJ forma de
renda. Entretanto, nenhuma renda será paga se, com detenninado ca·
pital, se obtiver do exterior mais trigo da que se pode colher neS&a ter-
ra em nosso país" (1.c., p. 315, nota).

Sobre o mesmo assunto diz Ricardo:

"Em parte anterior desta obra assinalei a diferença que existe entre a
renda propriamente dita e a compensação paga ao proprietário da tena
sob aquela designação pelas vantagens que o dispêndio de seu capital
proporciona -ao arrendatário. Mas não caracterizei bastante a diferença
que resulta das maneiras diferentes como se pode aplicar esse capital.
Desde que parte desse capital, uma vez despendida no melhoramento
de uma fazenda, se liga indissoluvelmente à terra e tende a aumentar
sua força produtiva, a remuneração paga por seu uso ao dono da terra
possui a rigor a natureza da renda e está sujeita a todas as Leis da renda.
O melhoramento, tanto faz que se faça às custas do dono da tena ou
do urendatário, não se empreenderá se não houver, antes de mais na-
da, grande probabilidade de o ganho dele deconente ser pelo menos
igual ao lucro que se pode obter com o emprego de outro capital de
igual magnitude. Mas, uma vez empreendido, o ganho resultante passu-
rd sempre a ponuir plenamente a natureza da renda e ficará sujeito a
todas as variações da renda. Alguns desses dispêndios só beneficiam a
terra por tempo limitado e não lh.e trazem aumento duradouro de for-
ça: produtiva. Se são aplicados em edifícios e em outros melhoramen·
tos perecíveis, exigem xenovação constante, e por isso não tra2:em para
o dono da tena elevação permanente da rerula real" (1.c., p. 306, nota).

901
Diz Ricardo:

"Em todos os países e em todos os tempos, o lucro depende da quanti~


dade de trabaJho exigída para produzir os bens necessários aos trabalha-
dores, na terra ou com o capital, que não dá renda (rent)" (1.c., p. 128).

De acordo com isso, o lucro do arrendatário na terra, na pior terra


que, segundo Ricardo, não paga renda, regularia a taxa geral de lucro. O
raciocínio é este: o produto da terra pior se vende por seu valor e não pa-
ga renda. Assim, vemos aí exatamente quanta mais-valia fica para o capi-
talista, depois de deduzida a parte do valor do produto a qual é irero
equivalente para o trabalhador. E o valor excedente é o lucro. Isto se apóia
no pressuposto de ser o preço de custo idêntico ao valor, de o produto
se vender pelo valor, por se vender pelo preço de custo.
Isso é um erro histórico e teórico. Mostrei148 que onde existe pro-
dução capitalista e propriedade da terra, a terra ou a mina da classe pior
não pode pagar renda, por vender o produto abaixo do valor individual
quando vende o trigo pelo valor de mercado (que não é determinado por
aquele). Pois o valor de mercado chega apenas para cobrir seu preço de
custo. Mas, que é que regula esse; preço de custo? A taxa de lucro do ca-
pital não agrícola, na determinação da qual também entra ~m dúvida o
preço do trigo, por mais longe que esteja de determiná-la sózinho. A afir-
mação de Ricardo só seria correta se valores e preços de custo fossem idên-
ticos. Também no domínio histórico - como a produção capit,alista apa-
rece antes na manufatura e depois na agricultura - o lucro in:dustrial de-
tennina o agrícola e não ao contrário. O certo é apenas que nessa terra
que paga lucro e nenhuma renda; que vende seu produto pelo preço de
custo, a taxa de lucro média aparece, se configura tangível, mas de mo-
do nenhum os lucros médios se regulam por esse meio, pois teríamos en-
tão problema bem diferente.
A taxa de lucro pode cair, sem subirem a taxa de juro e a de renda.

"Das explicações sobre o lucro do capital depreende-se que nenhuma


acumulação de capital causard baixa duradoura do lucro* , a não ser
que haja uma causa permanente de elevação do salário... Se os bens

148. Ver neste volume pp. 723 e 724.

* Ricardo entende aí por lucro a porção que o capitalista tira da mais-valia - e certo
que o lucro - possa cair com a acumulação. (Nota de Marx.).

902
necessários ao trabalhador puderem ser constantemente aumentados
com a mesma facilidade, não poderá haver olteroção permanente na
toxo de lucro ou na de salário" (diga-se, na taxa de mais-valia e nova-
lor do trabalho), "seja qual for o montante que atinja a acumulação
de capital. Mas Adam Smith atnõui sempre a queda do lucro à acumu-
lação do capital e à concorrência daí resultante, sem jamais aludir à
dificuldade crescente em prover de alimentos o número suplementar
de trabalhadores que o capital adicional empregará" {1.c., p. 338, 339).

Tudo isso só seria verdadeiro se lucro = mais-valia.


Assim, segundo A. Smith, a taxa de lucro cái com a acumulação
de capital, em virtude da concorrência crescente entre os capitalistas; se-
gundo Ricardo, em virtude da deterioração crescente da agricultura (en-
carecimento dos meios de subsistência essenciais). Refutamos o ponto
de vista ricardíano, que só estaria certo se taxa de mais-valia se identifi-
casse com taxa de lucro, e portanto se a taxa de lucro só pudesse cair se
subisse a de salário (suposta invariável a jornada de trabalho). O ponto
de vista de Smith se fundamenta na idéia de o valor se compor (idéia erra-
da, por ele mesmo refutada) de salário, lucro e renda (rent). Segundo ele,
a acumulação de capitais força a baixa dos lucros arbitrários, para os quais
não há medida imanente, por meio da redução dos preços das mercado-
rias; de ·acordo com esse modo de ver, os lucros são meros acréscimos
nominais aos preços.
No plano teórico, Ricardo sem dúvida tem n12.ão ao sustentar con-
tra Smith que a acumulação dos capitais não altera a determinação do
valor das mercadorias; mas Ricardo comete grave erro quando procura
contestar A. Smith sustentando ser impossível superprodução num país.
Ricardo nega a pletora de capital, que depois dele se tomou axioma per-
manente da economia inglesa.
Primeiro, não repara que na realidade onde se enfrentam capitalis-
ta, trabalhador, dono da terra, prestamista, possuidor de rendas fixas do
Estado etc., e não apenas capitalista e trabalhador, a queda dos preços
das mercadorias que prejudica tanto os capitalistas industriais quanto
os trabalhadores, beneficia as demais classes.
Segundo, não vê que, ao invés de operar numa escala arbitrária, a
produção capitalista, quanto mais se desenvolve, é tanto mais forçada a
produzir numa escala que nada tem a ver com a procura imediata, e que
depende da expansão constante do mercado mundial. Recorre ao postu-
lado absurdo de Say, como se o capitalista não produzisse diretamente
para o lucro, para a mais-valia, e sim para o consumo, o valor de uso - pa-
ra seu próprio consumo. Não repara que a mercadoria tem de se conver-

903
ter em dinheiro. A procura dos trabalhadores não basta, uma vez que o
lucro decorre justamente da circwtstância de 'ser a procura dos trabalha·
dores menor que o valor do respectivo produto, e o lucro é tanto maior
quanto menor relativamente for essa procura. Tampouco basta a pr9cura
dos capitalistas entre si. A superprodução não gera baix.a permanente do
lucro, mas permanece ocorrencia periódica. Segue·lhe subprodução etc.
A superprodução provém justamente de a massa do povo nunca pc:ler
consumir mais que a quantidade média dos bens vitalmente necessários,
não crescendo portanto seu consumo em correspondência com a produ·
tívidade do trabalho. Este capítulo todo, porém, se relaciona com a con-
CO'TTência entre os capitais. De nada vale tudo o que Ricardo diz sobre o
assunto (trata-se do capítulo XXI "Effects of Accumulation on Profits
and lnterest").

"Só há um caso, e passageiro, em que a acumulação de capital com


alimentos a baixo preço pode ser aoorupanhada por queda de lucro;
é o que se dá quando os fundos destinados a manter o trabalho aumen-
tam muito ma.is rapidamente que a população; os salário~ então subi-
rão e os luctos baixarão" (Lc., p. 343).

Sobre a relação entre lucro e juro, Ricardo, em tom irônico, observa


contra Say:

"Say admite que a taxa de juro depende da taxa.de lúcro; mas não se
segue daí que a taxa de lucro dependa da taxa de juw. Uma é a causa;
a outra, o efeito, e é impossível que uma circunstância qualquer as fa-
ça trocar de posição" (l.c., p. 353). ·

Todavia, as mesmas causas que fazem cair o lucro; podem fazer su-
bir o juro e vice-versa. 149

149. A observação de Ricardo sobre o ponto de vista de Say no tocante à relação


entre lucro e juro repete-a Marx na p. 736 do manuscrito, mas coloca-a entre parên-
teses por não pertencer à matéria então objeto de exame, e contesta as palavras finais
de Ricardo, "é impossível que uma circunst.ância qualquer as faÇa trocar de posição''.
com a obsenração: "1$$0 é positivamente errado eru certas circunst.ânCÍal!".
Marx mostra a poss.i"bllidade de a taxa de lucro e a de juro se moverem em dixe-
ções opo5tas. Diz.ele: "Se consideJal11los os ciclos em que &e move a indústria moder-
na. .. , verificamos que em xegra a baixa do juro corresponde aos pedodos de prosperi-
dade ou de lucros extraordínáJ:ios; a alta do juro, à transição da prosperidade para o
revet5o dela, e o máximo do juro até ao exttemo limite da usura, à crise" (ver O Capi·
tal, DlFEL,, lino 3, vol 5, cap. XXII, pp. 413-426). ·

904
"Say reconhece que o l'U$IO de produção é o fundamento do preço, e
não obstante afirma, em vácil:l5 partes de seu lívro, que o preço é de-
terminado pela relação entre procura e oferta" ( l .c., p. 4 l l ).

Ricardo deveria ter ent:'}ndído daí que o custo de produção difere mui-
to da quantidade de trabalho empregada para produzir uma mercadoria.
Ao invés disso, prossegue:

"O verdadeiro e último regulador do valor relativo de duas mercadorias


quaisquer é o custo de sua produção" (Lc.).
"E quando A. Smith diz que 'os preço$ das mercadorias, ou o valor do
ouro e da prata comparados com outras mercadorias, dependem da re-
lação entre a quantidade de trabalho - necessária para levar ao mer·
cado eerta quantidade de ouro e prata - e a necessàda para levar até
lá certa quantidade de qualquer outra espécie de mercadoria'. não con-
corda ele com opinião acima?" (Isto é, a opinião de os preços não se-
rem detenninados por salário nem por lucro.) "A quantidade de tra-
balho não se altera, seja o lucro alto ou baixo, seja baixo ou alto o
salário. Como podem entâb lucros alrm elevar os preços?" (I.c., pp.
413, 414).

Na passagem citada. A. Smith entende por preços apenas: a expressãO


monetária dos valores das mercadorias. Que estes e o ouro e a prata por
que se trocam são detenninados pelas quantidades relativas de trabalho
exigidas para produzir essas duas espécies de mercadorias (de um lado,
mercadorias e, do outro, ouro e prata), de modo nenhum contradiz.que
"lucros altos podem elevar" os preços reais das mercadorias, istO'·'é, seus
preços de custo. Sem dúvida, não todos os preços de uma vez, como pre-
tende Smith. Mas, com elevação dos lucros, parte das mercadorias se apre·
çará acima de seu valor, mais do que se fossem baixos os lucros médios,
enquanto parte caírá abaixo de seu valor, com menor amplitude. 150

150. Macx 1etoma aí ao estudo da influência do comércio exterior, sobretudo


do comércio colonial, sobre a taxa de lucro média. Conforme expõe, o ponto de vis-
ta de Smith sobre o assunto é mais claro que o de Ricardo (ve1 este volume, pp. 807,
808 e 866-868 e O Ozprtal, DIFEL, livro 3. vol S, pp. 272-275).

905
Capítulo XVII
Teoria Ricardiana da acumulação.
Sua crítica. Desenvolvimento das crises em
decorrência da forma fundamental do capital.

1. Erro de Smith e Ricardo, de não levar em conta o


capital constante. Reprodução das diferentes partt';S
desse capital.
Começamos comparando certas proposições de Ricardo muito disper·
sas ao longo de sua obra:

"... todos os produtos de um país são consumidos; mas faz a maior


diferença imaginável a circunstáncí.a de serem co.ríSUmidos pelos que
reproduzem ou pelos que não reproduzem outro valor. Quando a!ir-
mamos que renda (rewmue} se poupa e adicivna ao Cllpital, queremos
dizer que a porção da renda, a qual qualificamos de adicionadD ao ca-
pital, é comumida por trabalhadores produtiJJOt e não por improduti-
vos." (A. Srníth faz esta mesma dístinção.) "Nio há maior erro que o
de supor que o capital re acresce pelo não consumo. Se o preço do tra·
balho subisse tanto que, apesar do acréscimo do capital, não se pudes·
se empregar mais trabalho, dÍiía que esse acréxdtrló de capital ainda 9e·
ria consumido improdutivamente" (1.c., p. 163, nota).

Aí portanto apenas a questão do consumo por trabalhadores ou não,


como aparece em A. Smith e outros. Mas há também a questão do conru-
mo industrial das mercadorias que constituem capital constante, consu·
midas como instrumentos ou material de trabalho, ou de modo que, por
meio desse consumo, se convertam em instrumentos ou material de traba-
lho. De saída é falsa, isto é, unilateral, a ídéia de ser acumulação de capi-
tal igual à conversão de renda em salário, igual à acumulação de capital
variável. Isso leva ao tratamento errado de todo o problema.

907
Antes de mais nada, é mister estabelecer ,uma idéia clara da reprodu-
ção do capital constante. Consideramos aqui a reprodução anual ou o ano
como medida da duração do processo de reprodução.
Grande parte do capital constante - o capital fixo - entra no pro-
cesso anual de trabalho sem entrar no processo anual de formar valor.
Não se consome. Não precisa, portanto, reproduzir-se. Conserva-se - e
com seu valor de uso também seu valor de troca - porque entra no pro-
cesso de produção e permanece em contato c::om o trabalho vivo. Num
país, quanto maior, neste ano, essa parte do capital, tanto maior será pro-
porcionalmente sua mera reprodução formal (conservação) no ano seguin-
te, desde que o processo de produção se renove, prossiga e se mantenha
em curso, ainda quando na mesma escala apenas. Consertos e coisas do
gênero, necessários para manter o capital fixo, se incluem em seus custos
originais de trabalho. E nada têm de comum com a conservação no sen-
tido empregado acima.
Segunda parte do capital constante se consome durante o ano na
produção das mercadorias. Abrange, do capital fixo, a porção toda que
durante o ano entra no processo de fonnar valor, e, do capital constan-
te, a porção toda consistente em capital circulante, em matérias-primas
e matérias auxiliares.
Nesse segundo segmento do capital constante é mister distinguir:
Grande parte do que aparece num ramo de produção como capi-
tal constante - meios de trabalho e materiais de trabalho - é o produ-
to simultâneo de um ramo paralelo de produção. O fio, por exemplo,
faz parte do capital constante da tecelagem; é o produto aa fiaÇão, o qual
no dia anterior ainda estava talvez sendo elaborado. ,.Quando falamos
aqui de simultaneidade queremos dizer durante o mesmo ano. As mes-
mas mercadorias, em diferentes fases, percorrem durante o mesmo ano
diferentes ramos de produção. Saem de um ramo como produto, entram
noutro como mercadoria que constitui capital constante. E como capi-
tal constante são todas consumidas durante o ano, entre na mercadoria
apenas seu valor, caso do capital fixo, ou também seu valor de uso, ca-
so do capital circulante. Enquanto a mercadoria produzida numa esfera
de produção entra noutra esfera para ser consumida como capital cons-
tante, além dessa seqüência de esferas de produção onde entra a mesma
mercadoria, os diferentes elementos ou as diferentes fases dela se pro-
duzem simultaneamente, uns ao lado dos outros. De contútuo, durante
o mesmo ano, ela é consumida numa esfera como capital constante e pro-
duzida noutra paralela como mercadoria. As mesmas mercadorias que

908
são assim consumidas durante o ano, são do mesmo modo também pro-
duzidas de contínuo durante o mesmo ano. A máquina se desgasta na
esfera A. Ao mesmo tempo é produzida na esfera B. O Capital constan-
te que se consome durante o ano nos ramos que produzem os meios de
subsistência é simultaneamente produzido noutras esferas de produção,
de modo que durante o ano ou no fim do ano se renova fisicamente. Tan-
to os meios de subsistência quanto essa parte do capital constante são
produtos do novo trabalho, em atividade durante o ano.
Mostrei antes 151 como a parte do valor do produto dos ramos onde
se produzem os meios de subsistência, a parte que substitui o capital cons-
tante desses ramos, constitui a renda (revenue) dos produtores desse ca-
pital constante.
Mas o capital constante tem ainda uma parte que é consumida du-
rante o ano, sem entrar como componente nos ramos que produzem os
meios de subsistência (mercadorias consumíveis). Por isso, tampouco
pode ser reposta por esses ramos. Aludimos à parte do capital constan-
te - dos instrumentos de trabalho, das matérias-primas e matérias auxi-
liares - a qual se consome a si mesma industrialmente na criação, na pro-
dução do capital constante, da maquinaria, das matérias-primas e auxilia-
res. Essa parte, como vimos, 152 realiza a reprodução física com o pro-
duto do próprio ramo de produção (caso das sementes, do gado e, em
parte, do carvão), ou por meio de troca de porção dos produtos dos di-
ferentes ramos que geram capital constante. Ocorre então troca de ca-
pital por capital.
A existência e o consumo dessa parte do capital constante, além
de aumentar o volume dos produtos, acresce o valor do produto anual.
Do produto anual, a [JOrção de valor que se iguala ao valor dessa parte
do capital constante consumido, readquire ou retira do produto anual,
em forma ffsica, a parte deste que tem de efetuar a reposição material
do capital constante consumido. Por exemplo, o valor dos grãos semea-
dos determina a parte do valor da colheita (e em conseqüência a quanti-
dade de grãos), a qual tem de ser restituída à terra, à produção, como
capital constante. Essa parte não seria reproduzida sem o trabalho de no-
vo adicionado durante o ano; mas, na realidade, é produzida pelo trabalho
do ano anterior ou trabalho pretérito e - desde que a produtividade do
trabalho não varie - o valor que acrescenta ao produto anual resulta não

151. Ver volume l, pp. 103-119 e 216-224.


152. Ver volume 1, PP- 119-131, 167-178 e 224-231.

909
do trabalho do presente ano e sim do ano precedente. Num país, quanto
maior foi proporcionalmente o capital constante emp1egado, tanto maior
será essa parte do capital constante consumida na produção do capital'
constante e que, além de-se corporificar em maior volume de pro-dutos,
acresce o valor desse volume. Esse valor portanto é não só o resultado
do trabalho do ano em curso, mas também do trabalho do ano anterior,
do ttabalho pretérito, e não reapareceria. como não haveria o produto
em que se incorpora, sem o trabalho anual imediato. Se essa parte do
capital constante cresce, crescerá não só o volume anual de produtos,
mas também seu va'/or, mesmo quando o ttabalho anual não varie. Esse
crescimento é uma fonna de acumulação de capital, que é essencial en·
tender. E nada pode estar mais longe desse entendimento que esta pro·
posição ticardiana:

"O trabaJho de um milhão de homens em manufaturas p1oduzirá sem·


pre o me!ll'rlo valor, mas nem sempre a mesma riqueza" (1.e., p. 320).

Esse milhão de homens - admitindo-se dada a jornada de traba.


llio - produzirão quantidades bem diferentes de mercadorias, segundo a
produtividade do trabalho; além disso, divergirá muito o valor dessas quan-
tidades, conforme se produzam elas com muito ou pouco capital cons-
tante, lhes seja portanto aciescentado muito ou pouco v.alor oriundo de
trabalho do ano anterior, de ttabalho pretérito.

2. Valor do capital constante e valor do produto.

Ao tratar da teprodução do capital constante, antes de mais nada


e no tocante a todos os problemas estabelecemos, para simplificar, a su·
posição de ser invariável a produtividade do trabalho e em c.onseqüência
o método de produção. O capital constante a repor - em dada escala de
produção - expressa-se fisicamente em detenn.inada quantidade de pro-
duto. Se a produtividade não varia, também não varia o valor dessa quan-
tidade. Se ocorrerem mudanças na produtividade do trabalho, as quais
possam reproduzir a mesma quantidade com maior ou menor custo, com
mais ou menos trabalho, ocorrerão também mudanças no valor do ca-
pital constante, as quais atingem o produto excedente depois de dedu-
zido o capital constante.
Sejam necessários para semeadura, por exemplo, 20 quarters de
trigo a 3 libras = 60 libras. Um quarter, se se reproduzir com menos 1/3

910
de trabalho, só custará 2 libras. Como dantes, terão de ser tirados do pro·
duto 20 quarters para semeadura; mas, sua cota no valor do produto glo-
bal é apenas de 40 libras. Para repor o mesmo capital é então mister por-
ção menor do valor e porção menor do volume do produto global, em-
bora, como dantes, tenham de ser restituídos à terra, c001 a semeadura,
20 quarters de grãos. 153
Se numa nação o capital constante consumido por ano for de 10
milhões, noutra, de 1 milhão, e o trabalho anual for de 1 milhão de ho-
mens = l 00 milhões de libras, o valor do produto será 110 milhões na
primeira, e 101 milhões apenas na segunda. Nesse caso, será possível, ou
melhor, indubitável que a mercadoria individual na nação I será mais ba-
rata que na II, pois esta produzirá com o mesmo trabalho quantidade
bem menor de mercadoria, muito menor que a diferença entre lO e l.
Na verdade, em cotejo com a nação ll, parte maior do valor do produto
da l - e portanto porção maior do produto global - se destina a repor o
capital. Mas o produto global também é.muito maior.
No tocante a mercadorias manufaturadas sabe·se que na Inglaterra
l milhão de trabalhadores fabricam produto muito maior, mas ainda pro-
duto de valor muito maior que na Rússia por exemplo, embora a merca-
doria individual seja muito mais barata. Todavia, na agricultura parece
não existir a mesma relação entre nações capitalistas desenvolvidas e as
relativamente não desenvolvidas. O produto das nações atrasadas é mais
barato que o das capitalistas desenvolvidas, segundo o preço monetário.
Não obstante, o produto da nação desenvolvida parece produzido por
muito menos trabalho (durante o ano) que o da nação atrasada. Na Jn.
glaterra, por exemplo, menos de 1/3 dos trabalhadores se empregam na
agricultura, e na Rússia, 4/5; na primeira, S/l5, e na segunda, 12/15. Es-
ses números devem ser tomados à letra. Na Inglaterra, por exemplo, há
grande número de pessoas na indústria não agrfcom - na construção de
máquinas, no comércio, transportes etc. - ocupadas com a produção e
a distribuição de elementos da produção agrícola, o que niio se dá na Rús·
sia: Não se pode determinar diretamente a proporção das pessoas empre-
gadas na agricultura de acordo com o nú.mero de indivíduos nela de iJne-

l 53. Esse exemplo baseia-se na hipótese de 20 quarters de trigo empregados como


semente, com produtividade acrescida de trabalho, proporcionarem colheita 50% maior
que a anterior. A colheita, digamos, se antes era de 100 quarters, é agora de 150, com
o dispêndio da mesma quantidade anterior de trabalho. Mas e~ ISO quarters cl1$tam
o mesmo que os precedentes 100 quarters, isto é, 300 IJ'bras. Antes, a stimente repre-
sentava (tanto da quantidade quanto do valor dos quarters) 20%, e agora, 13 1/3%.

911
diato empreg~dm. Em países de produção capitalista têm participação
indireta na produção agrícola muitas pessoas ·que nela se integram nos
países menos desenvolvidos, A diferença, porém, parece maior do que é.
Mas essa diferença é muito importante para o conjunto da civiliµção
do país, mesmo quando collsista apenas em que grande parte dos produ·
tores empenhados na agricultura não tenha participação direta nela, te·
nha sido arrancada do idiotismo da vida rural e pertença à população
industrial.
Assím, de início deixemos de lado esse aspecto. Além disso, exclua·
mos a circunstância de a máíoria dos povos agrícolas serem forçados a
vender seu produto abaixo do valor, enquanto em países de produção
capitalista desenvolvida o produto agrícola atinge seu valor. Em todo
caso, entra no valor do produto do agricultor inglês urna parte do valor
do capital constante, a qual não se incorpora no valor do produto do agri-
cultor russo. Admitamos seja essa parte do valor igual à jornada de tra-
balho de 1O homens. E que um trabalhador inglês ponha em movimen·
to esse capital constante. Falamos da parte do capital constante do pro·
duto agrícola a qual não é reposta por novo trabalho, o que sucede, ·por
exemplo, com os instrumentos agr!colas. Se são necessários 5 trabalha-
dores russos pa1a se obter o mesmo produto que 1 trabalhador inglês pro-
duz com o emprego de capital constante, e se o capital constante aplica·
=
do pelos russos ';:: l, o produto inglês = 1O + 1 11 jomaQas de trabalho,
e o dos russos = 5 + 1 = 6. Se o solo russo tiver fertijidade tão superior
à do solo inglês, que. sem capital constante ou com capital constante 10
vezes menor, produza tanto trigo quanto o inglês oom çapital éonstante
10 vezes maior, será de 11 : 6 a ràZão entre os yalores de iguais quantida·
des de trigo inglês e de trigo russo, Se o quarter de trigo russo for vendi-
do por 2 libras. o inglês sê-lo-á a 3 2/3 libras, pois 2 : 3 2/3 = 6 : 11. O
preço em dinheiro e o valor do trigo inglês seria portanto muito mais ai~
to que o russo, mas o inglês seria produzido com menos trabalho, uma
vez que o trabalho pretérito que re-aparece tanto no volume quanto no
valor do produto não custa acréscimo de novo trabalho. Isso ocorrerá
sempre se o inglês empregar menos trabalho direto que o russo, mas o
capital constante maior que emprega - e que nada llie custa, embora algo
lhe tenha custado e tenha de ser pago - não eleva a produtividade do tra·
balho a nível que compense a fertilidade natural do solo russo. Os preços
monetários do produto agrícola podem por isso elevar.se mais em países
de produção capitalista que em menos desenvolvidos, embora na reali-.
dade e!Wl produto custe menos trabalho. Contém quantidade maior de

912
trabalho imediato + trabalho pretérito, mas esse trabalho pretérito nada
custa. O produto seria maís barato se não interferisse a diferença da fer-
tilidade natural. Isso explicaria também os preços monetários mais altos
dos salários.
Até agora só falamos da reprodução do capital existente. O traba-
lhador repõe seu salário acrescido de um produto excedente ou valor ex-
cedente que constitui o lucro (renda fundiária inclusive) do capitalista.
Do produto anual repõe a parte que de novo lhe serve de salário. O capi-
talista consumiu seu lucro durante o ano, mas o trabalhador criou uma
parte do produto que pode ser de novo consumida corno lucro. Do capi-
tal constante a parte que é consumida na produção dos meios de subsis-
tência é substituída pelo capital constante produzido durante o ano por
novo trabalho. Os produtores dessa nova parte do capital constante rea·
lizam sua renda {relienue) - lucro e salário - na parte dos meios de sub-
sistência a qual se iguala à parte do valor do capital constante consumi·
do na produção desses meios. Por fim, o capital constante que é consu-
mido na produção do capital constante, na produção de maquinaria, de
matérias-primas e matérias auxiliares, 'é reposto em produto ou median--
te troca de. capital oriundo do produto total das diferentes esferas de pro-
dução que produzem capital constante.

3. Condições necessárias para a acumulação de capital.


Amortização do capital fixo e seu papel no processo
de acumulação.
Em que aspectos então o acréscimo do capital, sua acumulaçíio, dí·
fere da reprodução, da conversão de renda {revenue} em capital?
Para simplificar' o problema, admitamos não varie a produtivida-
de do trabalho, não ocorram mudanças no método de produção, conti·
nue a mesma portanto a quantidade de trabalho necessária para produ·
zir a mesma quantidade de mercadorias, e por isso custe o acréscimo de
capital o mesmo trabalho que a produção de igual magnitude de capital
no ano anterior.
Fração da mais-valia tem de se transfonnar em capital, em vez de
ser consumida na qualidade de renda {revenue). Parte dessa fração tem
de se converter em capítal constante e parte em variável. E a proporção
em que ela se divide nessas duas diferentes partes depende da pressupos-
ta composição orgânica do capital, uma vez que não se altera o método

913
de produção, nem o valor proporcional das duas partes. Quanto mais de-
senvolvida é a produção, tanto maior será o segmento da mais-valia - que
é transfonnado em capital constante - comparado com o segmento que
se converte em capital variável.
De início, é mister portanto converter em capital variável segmen-
to da mais-valia (e do respectivo produto excedente em meios de subsis-
tência); isto é, comprar novo trabalho. Isto só é possível quando aumen-
ta o número de trabalhadores ou se prolonga a jornada de trabalho. Este
último caso ocorre quando, por exemplo, parte da população obreira só
estava empregada por metade ou 2/3 da jornada normal, ou também quan-
do, por períodos de maior ou menor duração. se efetua o prolongamento
absoluto da jornada, o qual tem de ser pago. Todavia, não se podem con-
siderar essas ocorrências meio constante de acumulação. A população
trabalhadora pode crescer quando pessoas gue eram há pouco trabalha-
dores improdutivos se transformam em trabalhadores produtivos, ou quan-
do segmentos da popwação que antes não trabalhavam, como mulheres
e crianças, indigentes, são absorvidos pelo processo de produção. Agora,
poremos de lado esse caso. Por fim, crescimento absoluto da população
trabalhadora, ligado ao crescimento da população em geral. Para a acumu-
lação ser um processo contínuo, pennanente, é condição necessária esse
crescimento absoluto da população (embora ela <liminua em relação ao
capital constante). População crescente se revela fundamente> da acumu-
lação como processo pennanente. Mas isso supõe um salário médio que
permita crescimento constante da população trabalhadora e nãó sua mera
reprodução. A produção capitalista já cuida das ocorrên.cias imprevistas
ao fazer trabalhar em excesso uma faixa da população trabalhadora e ao
manter outra de prontidão como exército de reserva em indigência par-
cial ou completa.
Mas que se dá com o outro segmento da mais-valia o qual tem de
se converter em capital constante? Para simplificar o problema, omita·
mos o comércio exterior e consideremos uma nação isolada. Exemplifi~
quemos. Seja a mais-valia produzi.da por um empresário de tecelagem de
linho = 10 000 libras, das quais a metade ele quer transfonnar em capi·
tal, isto é, 5 000 libras. Destas seja 1/5 despendido em salário, de acor-
do com a composição orgânica do capital da tecelagem mecânica. Abstraí-
mos aí da rotação do capital com a qual talvez lhe baste uma soma por
5 semanas; em consonância vende seu produto e assim recupera da cir-
culação o capital para salário. Admitimos que tenha de manter em reser-
va no banco 1 000 libras para salário (de 20 homens) e de as ir gastando

914
em salário durante o ano. Ficam então 4 000 libras para se converter em
capital constante. Terá primeiro de comprar fio, em quantidade que 20
homens possam tecer durante o ano. (Estamos sempre excluíndo a rota-
ção da parte circulante do capital.) Ademais, terá de aumentar os teares
de sua fábrica e de adicionar talvez uma nova máquina a vapor ou ampliar
a antiga etc. Mas, para adquirir essas coisas, terá de encontrar no merca·
do fio, teares etc. Terá de transformar suas 4 000 libras em fio, teares,
carvão etc., isto é, de comprá-los. Mas, para comprá-lós, é mister que es-
tejam disponíveis. Uma vez que supomos que a reprodução do capital
antigo ocorreu nas condições antigas, o industrial de fiação despendeu
seu capital todo para fornecer a quantidade de fio exigida pela tecelagem
no ano anterior. Como satisfará ele então a procura adicional de fio com
uma oferta adicional?
O mesmo se dá com o fabricante de máquinas, que fornece os tea-
res etc. Produziu apenas novos teares suficientes para cobrir o consumo
médio que se dá na tecelagem. Mas o empresário da tecelagem, desejoso
de acumular, encomenda 3 000 libras de fio e 1 000 libras em teares, car·
vão (é a mesma a situação do produtor de carvão) etc. Ou de fato dá ao
industrial de fiação 3 000 libras, e 1 000 hbras ao fabricante de máqui-
nas, ao produtor de carvão etc., a fim de converterem para ele esse di-
nheiro em fio, teares e carvão. Terá, portanto, de esperar até o final des-
se processo, antes de poder começar com sua acumu1a.ção, sua produção
adicional de linho. Esta será a interrupção 1.
Mas o industrial da fiação com as 3 000 libras encontra-se na mes-
ma situação do empresário da tecelagem com as 4 000, com a diferença
de logo deduzir seu lucro. Pode achar um número adicional de fiandeiras,
mas precisa de fibra de linho, fusos, carvão etc. Do mesmo modo, o pro-
dutor de carvão precisa de nova maquinaria ou instnunentos, além de no-
vos trabalhadores. E o fabricante, de máquinas, a quem cabe fornecer
os novos teares, fusos etc., de ferro etc., fora trabalhAdores adicionais.
Todavia, a pior situação é a do plantador de linho, o qual só no próxi-
mo ano poderá fornecer a quantidade adicional de fibra etc.
A fim de que c:i empresário da tecelagem possa converter parte de
seu lucro em capital constante sem dificuldades e interrupções, e para
a acumulação ser um processo contínuo, é mister que ele encontre no
mercado uma quantidade adicional de fio, de teares etc. Ele, o empre-
sário da fiação, o produtor de carvão etc., se encontram no mercado fi-
bra de linho, fusos, máquinas, só precisam empregar mais trabalhadores.

915
Uma parte do capital constante considerada consumida no cálculo
anual e que entra como desgaste no valor do' produto não é consumida
na realidade. Exemplifiquemos com uma máquina que dure 12 anos e
custe 12 000 libras; assim, o desgaste médio, a contabilizar todo ano, se·
rá de 1 000 libras. Então, uma vez que no produto entram por ano 1 000
horas, reproduz-se, no fim de 12 anos, o valor de 12 000 libras esterli·
nas, e pode-se comprar a esse preço uma nova máquina do mesmo tipo.
Os consertos e remendos necessários durante os 12 anos vão para a con-
ta dos custos de produção da máquina e nada têm a ver com nosso pro-
blema. Mas a realidade diverge efetivamente daquela computação de mé-
dias. A máquina talvez opere no segundo ano melhor que no primeiro.
Contudo, não é mais utilizável depois de 12 anos. E o que se dá com uma
besta com vida média de 1 O anos, mas que nem por isso se extingue em
1/10 todo ano, embora tenha de ser reposta p<?r outro indivíduo no fim
de 1O anos. Sem dúvida, no curso do mesmo ano, detenninado número
de máquinas etc. sempre chega à fase em que _têm ,de ser substituídas por
novas máquinas. Todo ano, portanto, determinada quantidade de velhas
máquinas etc. é de fato reposta fisicamente por novas. E a isso correspon-
de a produção média anual da maquinaria etc. Está disponível o valor
para pagá-las, oriundo das mercadorias de acordo com o tempo de repro-
dução (das máquinas). Mas permanece o fato de grande parte do valor
do produto anual, do valor que por este se paga todo ano, ·ser na verda-
de necessária para repor a velha maquinaria depois de 12 ános, por exem·
pio, e não ser, cada ano, absolutamente necessária para a repo~íção físi-
ca de 1/12 dela, o que na realidade é mesmo inexeqüível: Esse ·fundo po-
de ser em parte utilizado para pagar salário ou comprar matérias-primas,
antes de ser vendida ou paga a mercadoria que se lanÇa de contínuo na
circulação, mas dela não volta de imediato. Todavia, isso não pode ocor-
rer durante o ano inteiro, poís as mercadorias que perfazem a rotação du·
rante o ano realizam seu hlor todo, isto é, têm de realizar o salário ne-
la.s contido, as matérias-primas, a maquinaria consumida e pagar a mais-
valia. Por isso, onde se emprega muito capital con.stante, em oonseqüên·
eia também muito capital fixo, a parte do valor do produto a qual subs·
titui o desgaste do capital fixo forma um fundo de acumulação, e quem
o aplica pode investi-lo em novo capital ftx.o (ou ainda em capital circulan-
te), sem nada deduz.ir da mais-valia para essa parte da acumulação (ver
MacCulloch). 154 Esse fundo de acumulação nao se encontra em estádios
154. A expressão "ver MacCulloch" adicionou-se a Marx depois, a lápis. Em ca.rta
a Engels, de 20 de agosto de 1862, apresentou pela primeíra ve:i a idéia da utilização
do fundo de amortização para fins de acumulação. Em sua correspondência com

916
.de produção e em nações onde não existe grande capital füw. Este é um
ponto importante. E um fundo para a introdução contínua de melhora-
mentos, ampliações etc.

4. Dependência recíproca dos ramos de produção no


processo de acumulação. Conversão imediata de
parte da mais-valia em capital constante na
agriculrura e na indústria de construção de máquinas.

Passemos à questão que desejamos tratar aqui. O capital total em-


pregado na construção de máquinas, mesmo que fo5Se apenas suficiente
para repor o desgaste anual da maquinaria, produziria muito mais maqui-
naria que a necessitada por ano, pois o desgaste em parte só existe no pla-
no ideal e na realidade só tem de ser reposto fisicamente depois de certo
número de anos. O capital assim aplicado, por isso, fornece por ano um
volume de ~áquinas que está disponível para novas aplicações de capital
e antecipa essas novas aplicações. Por exemplo, o construtor de máqui-
nas começa a produção de sua fábrica este ano. Durante o ano fornece
12 000 libras de máquinas. Assim, durante os 11 anos seguintes, com a
reprodução simples das máquinas por ele produzidas, só teria de produzir
1 000 libras, e mesmo essa produção anual não seria consumida todo ano.
E menos aínda, se ele empregasse todo o capital. Para este se manter em
operação e apenas reproduzir-se de contínuo todo ano, é mister expan-
são ininterrupta nos i:amos índustriais que utilizam essas máquinas. (E ex-
pansão maior se ele me!miHcumula.)
Acumulação constante nos demais ramos é necessária, portanto,
para o ramo de produção de máquinas, mesmo quando o capital nele in-
vestido apenas se reproduz. Essa acumulação, por isso, sempre acha um
de seus elementos disponíveis no mercado. Há então num ramo de pro-
dução um estoque permanente para acumulação, para novo consumo
industrial adicional por outros ramos, mesmo quando naquele só se re-
produza o capital existente.

Engels refere-se a essa carta em 24 de agosto de 1867 e comunica que achl1ra depois
em MacCulloch algumas indicações sobre o assunto (MacCulloch, The principies of
political economy .. ., Edimburgo, 1825, pP. 181, 182). Marx retoma essa questão
nas páginas 777 e 781 do manuscrito (ver volume 3, cap. XIX, seções 12 in fine e 15
in fine).

917
Para as S 000 líbras de lucro ou mais-valia que o empresário da te-
celagem converte em capital, há dois casos possíveis, desde que se admi-
ta encontre ele no mercado a mão-de-obra que tem de comprar com) 000
das 5 000 libras, para converter o capital de S 000 libras em capital ade-
quado ãs condições de sua esfera de produção. Essa parte da mais-valia
capitali2.ada se converte em capital variável e se gasta em salário. Mas, pa-
ra empregar esse trabalho precisa ele de fio, de maquinaria adicional (a não
ser que prolongue a jornada de trabalho; nesse caso, haverá apenas des-
gaste mais rápído da maquinaria, redução de seu período de reprodução,
mas ao mesmo tempo se produzirá montante maior de mais-valia; e se
o valor da maquinaria tiver de repartir-se, na base de período mais curto,
pelas mercadorias produz.idas, quantidade bem maior de mercadorias es-
tará sendo produzi.da, de modo que, apesar do desgaste mais rápido, parte
menor do valor das máquinas entra no valor ou no preço da mercadoria
avulsa. Nesse caso não se tem de despender de imediato novo capital para
a própria maquinaria. ~ mister apenas repor o valor da maquinaria um
pouco mais rápido. Mas as matérias auxiliares exigem nesse caso o adian·
tamento de capital adicional) e matérias au_xiliares adicionais. Ou o do-
no da tecelagem acha no mercado ~uas condições de produção, e essa com-
pra de mercadorias se distingue de outras apenas porque ele adquire mer-
ca.dorias para o cansumo industrial e não para o conrumo individual; ou
não as encontra, e então tem de encomendá-las (como, por exemplo, no
caso de máquinas de nova estrutura), tal como se dá quando tem de en-
comendar, para consumo individual, artigos que não existem Iio merca·
do. Se a matéria-prima (fibra de linho) só fosse produiida mediante en-
comenda (como, por exemplo, anil, juta etc. produzidos pelos campo-
neses indianos por encomenda e com adiantamentos de comerciantes
ingleses), seria impossível, no mesmo ano, para o dono da tecelagem, a
acumulação no próprio negócio. Em contrapartida, admitamos conver-
ta o dono da fiação as 5 000 libras em capital, e o dono da tecelagem não
acumule: os fios fica:rã'o invendáveis, embora todas as suas condições de
produção estejam disponíveis no mercado; as S 000 libras se transformam
de fato em fios, mas sem se converterem em capital.
(O crédito, e aqui não nos cabe ir adiante em seu exame, pemúte
que o capital acumulado não se aplique no ramo onde é produzido, mas
onde tem a melhor oportunidade de obter lucro, Todavia, todo capita-
lista preferirá empregar sua acumulação, o mais possível, no próprio ne-
gócio, Se o empregar em outro ramo, tomar-se-á prestamista e, em vez
de lucro, só embolsará juros, a não ser que se lance em especulações. Mas

918
aqui falamos da acumulação média, que, só a título de exemplo, consi-
deramos empregada num ramo particular.)
Se, por sua vez, o plantador de linho tivesse ampliado sua produ-
ção, isto é, acumulado, e não o tivessem as indústrias de fiação, tecelagem,
construção de máquinas etc., teria ele armazenado linho supérfluo e pro-
vavelmente produziria menos no ano seguinte.
(Por enquanto omitimos por completo o consumo individual e con-
sideramos apenas o relacionamento recíproco entre, os produtores. Se
existe esse relacionamento, esses produtores, primeiro, fonnam, uns para
os outros, mercado para os capitais que têm de repor reciprocamente;
os trabalhadores empregados de novo ou que aumentam sua ocupação
constituem mercado para parte dos meios de subsistência; e uma vez que
a majs..valia acresce no ano seguinte, o~ capitalistas podem cnnsumir par-
te crescente da renda {revenue), e assim até certo ponto criam mercado uns
para os outros. Com tudo isso, grande parte do produto anual aínda po-
de permanecer invendável.)
Cabe agora formular assim a questão: suposta a acumulação geral,
isto é, admitindo-se que se acumula mais ou menos em todos os ramos,
o que é de fato condição da produção capitalista e também a motivação
do capitalista na qualidade de capitalista (além disso, é uma. necessidade
para a produção capitalista progredir), como amontoar dinheiro é a for-
ça que impulsiona o entesourador quais são as candições dessa acumu-
lação geral, e a que se reduz essa acumulação? Ou, uma vez que o dono
da tecelagem de linho pode representar o capital em geral, quais são as
condições para que possa reconverter em capital, sem dificuldades, as
5 000 libras de mais-valia e prosseguir sempre com o processo de acumu-
lação todos os anos?- Acumular as 5 000 libras esterlinas significa apenas
converter em capital esse dinheiro, esse montante de v.tlor. As condições
para acumular capital são portanto as mesmas paro produzi-lo na ongem
ou reproduzí-lo em geral.
E essas condições eram: parte do dinheíro comprava trabalho, e par-
te, mercadorias (matérias-primas, maquinaria etc.) que podiam ser consu-
mUJas industrialmente por esse trabalho. [Muitas mercadorias só podem
ser consumidas industrialmente, como máquinas, matérias-primas, semi-
fabricados etc. Outras, como casas, cavalos, trigo, cereais (donde se obtêm
aguardente, amido etc.) etc. podem ser objeto de consumo industrial ou
individual.] Para ser possível comprar essas mercadorias, é mister encon-
trá-las 'no mercado - na fase intermediária em que a produção acaba e
o consumo ainda não começou, nas mãos do vendedor, na fase de circula-

919
ção - ou poderem elas ser obtidas por encomenda (ou serem produzíveís,
quando se trata de construir novas fábricas etc.). Estavam disponíveis,
postulado estabelecido na produção e reprodução do capital, em virtude
da divisão do trabalho realizada em escala social na produção capitalista
(distribuição do trabalho e dei capital pelos diferentes ramos), em virtu-
de da produção e da reprodução simultâneas, paralekzs, ocorrentes por
todo o campo econômico. Essa era a condição do mercado, da produ-
ção e da reprodução do capital. Quanto maior o capital, quanto mais de-
senvolvida a produtividade do trabalho e em geral a escala da produção
capitalista, tanto maior o volume das mercadorias que se encontram na
'transição da produção para o consumo (individual e industrial), em cir-
cukzçiio, no mercado, e tanto maior, para cada capital particular, a certe-
za de encontrar prontas no mercado suas condições de reprodução. E isso
é tanto mais assim, visto que todo capital particular, de acordo-com a
natureza da produção capitalista, ( I) opera numa escala que não é de-
terminada por procura indi'\>idual (encomendas etc., necessidades parti-
culares), e sim pelo empenho de o mais possível realizar muito trabalho
e em conseqüência trabalho excedente e fornecer maior quantidade pos-
sível de mercadorias com dado capital; (2) procura ocupar no-mercado
a maior faixa possível e suplantai, e excluir seus competidores. Concor-
rência entre os co,pftals. -
(Quanto mais se desenvolverem os meios de transporte, tanto mais
se pode reduzir o estoque no mercado.)

"Onde produção e consumo são relativamente grandes, é natural que


num dado momento haja no mercado wn excedente relativamente
avultado na fase intermédia que vai do produtor'para o consumidor,
a não se.e que a velocidade com que as coisas se vendem cresça tanto
que neutralize o que de outro modo teria sido a conseqüência da pro·
dução acrescida" {pp. 6 e 7, An Inquily into those Princi'ple11, respecting
the Nature of Demand and the necessity o/Conrumption, kltely advocated
by Mr. Malthusetc., Londres, 1821).

A acumulação de novo capital só pode ooorter nas mesmas condi-


ções requeridas para a reprodução do capital já existente.
(Não tratamos aqui do caso em que se acumula mais capital do que
se pode empregar na produção, por exemplo, na forma de dinheiro que
jaz ocioso no banco. Daí os empréstimos ao exterior etc., em suma, os
investimentos especulativos. Nem consideramos o caso em que é impossí-
vel vender o volume das mercadorias produzidas, nem crises etc. Isso per-
tence ao capítulo da concorrência. Só nos cabe investigar aqui as fonnas

920
do capital nas diferentes fases de seu processo, supondo sempre que as
mercadorias se vendem por seu valor.)
O dono da tecelagem pode reconverter. em capital as 5 000 libras
de mais·valia, se, além do trabalho, encontra disponíveis no mercado ou
pode obter por encomenda 1 000 libras de fio etc.; para isso é mister que
haja um produto excedente em mercadortas que entram em seu capital
constante, sobretudo consistente naquelas que precisam de período mais
longo de produção e que não podem aumentar de volume com rapidez
ou de maneira alguma dentro do ano, como as matérias-primas, a fibra
de linho, por exemplo.
(Entra em jogo aí o capital mercantil, que mantém disponíveis em
armazéns estoques para consumo crescente, individual ou industrial, o
que é a[JellaS umaforma da intennediação e por isso não se enquadra aqui,
mas no exame da concorrência entre os capitais.)
Assim como a produção e reprodução do capital existente num
ramo supõe produção e reprodução paralelas noutros ramos, a acumula-
ção ou formação de capital adicional num ramo supõe formação simul-
tânea ou parale'/a de produção adicional nos outros ramos. E mister por-
tanto que ao mesmo tempo, em todos os ramos que suprem capítal cons-
tante, acresça a escala de produção (em correspondência com a partici-
pação média que a procura detennina e que cada ramo particular tem
no acréscimo geral da produção), e fornecem capital constante todos os
ramos que não elaboram o produto acabado para o consumo individual.
O mais importante nesse contexto é o aumento da maquinaria (instru-
mentos), matérias-primas, matérias auxiliares, uma vez que, se existirem
essas precondições, todos os outros ramos que delas dependem, forneçam
eles produtos semi-acabados ou acabados, só terão de mobllizarmaiS trabalho.
Assim, para haver acumulação parece ser necessária superprodução
constante em todos os ramos.
E mister esclarecer um pouco maís o assunto.
Agora, a segunda questão essencial:
A mais-valia, aqui a parte do lucro (renda fundiária inclusive; se o
dono da terra quer acumular, converter renda fundiária em capital, é sem--
pre o capitalista industrial quem captura a mais-valia, mesmo quando o tra-
balhador converte parte de sua renda em capital) a qual se converte em ca-
pital, consiste apenas em novo trabalho adicionado durante o t1ltimo ano.
Pergunta-se agora se essç novo capital se despende por completo em sa-
lário, trocando-se apenas por novo trabalho.

921
Está a favor de uma resposta positiva, a circunstância de todo valor
ter sua origem no trabalho. Na origem, todo capital constante é tanto
produto do trabalho quanto o e.apitai variável. E aí parece presenciarmos
de novo o capital originar-se direto do trabalho.
Em contrário: a formação adicional de capital ocorreria em piores
condições de produção que a reprodução do capital velho? Recuaria a ní·
vel inferior do modo de produção? E o que teria de ocorrer, se o novo
valor fosse despendido apenas em trabalho clireto que, sem capital fvco
etc., teria primeiro de produzir esse capital, do mesmo modo que na ori-
gem o próprio trabalho teria primeiro de produzir seu capital constante.
Isso é puro disparate. Mas é o pressuposto de Ricardo etc. Examinar o
assunto mais a fundo.
A primeira pergunta é esta:
Pode o capitalista converter parte da mais-valia em capital, empre-
gando-a de imediato como capital, em vez de vendê-la, ou antes, de ven-
der o produto excedente em que ela se corporifica? A resposta afirmati-
va já significa que a totalidade da mais-valia a converter-se em capital não
se transforma em capital variável ou não se despende em salário.
Isso está, desde o início, claro na parte do produto agrícola forma-
da por grãos ou gado. Porção de grãos pertencentes ao segmento da co-
lheita o qual representa o produto excedente ou a mais-valia _do arrenda·
tário, e do mesmo modo porção de gado, em vez de serem.vendidas, po-
dem servir logo de condição de produção, como semente ou besta de car-
ga. O mesmo se dá com parte dos adubos que se produzem na 'Própria
fazenda e ao mesmo tempo circulam como mercadorias no comércio,
isto é, podem ser vendidos. O arrendatário pode recon~erter logo, den-
tro do próprio ramo, em condição de produção e portanto de imediato
em capital, a porção do produto excedente a ele destinada, na qualidade
de mais-valia, de lucro. Não se despende essa porção em salário, em capi·
tal variável. E retirada do consumo individual, sem ser consumida produti-
mmente no sentido de Smith e Ricardo. E objeto de consumo industrial,
mas na qualidade de matéria-prima e não de meio de subsistência, seja
de trabalhadores produtivos, seja de improdutivos. Mas os grãos tanto
servem de meio de subsistência para trabalhadores produtivos etc., quan-
to de matéria auxiliar para o gado,,de matéria-prima para aguardente, ami-
do etc. Por sua vez, o gado (de corte ou de carga), além de servir de meio
de subsistência, provê para grande número de indústrias de matérias-primas,
tais como peles, couros, gorduras, ossos, chifres etc., e supre força moto-
ra seja para a própria agricultura, seja para a indústria de transporte.

922
Em todas as indústrias onde o tempo de reprodução se estende além
de um ano, como em grande parte da pecuária, da atividade madeireira
etc., mas cujos produtos ao mesmo tempo têm de ser de contínuo repro-
duzidos, acumulação e reprodução coincidem quando o novo trabalho
adicionado, que representa trabalho pago e trabalho não pago, tem de se
acumular em produção física até o produto ficar em condições de venda.
(Não se trata aqui de acumulação do lucro anualmente adicionado de
acordo com a taxa geral de lucro - isso não é acumulação real, mas sim-
ples método de contabilizar - e sim da acumulação do trabalho total
que se repete durante vários anos, amontoando-se portanto em produto
para logo se reconverter em capital. Em contrapartida, a acumulação do
lucro nesses casos não depende da quantidade do novo trabalho adicionado.)
O mesmo se dá com as culturas destinadas ao comércio (forneçam
elas matérias-primas ou matérias auxiliares). As sementes, a porção do
produto dessas culturas a qual pode ser de novo empregada como adu..
bo etc. representam uma parte do produto total. Essa parte, se fosse in-
vendiível, em nada alteraria a circunstância de constituir, logo que de no·
vo exec~te o papel de condição de produção, parte do valor total e como
tal capital constante da produção nova.
Isso resolve uma questão fundamental - a das matérias-primas e
meios de subsistência (alimentos), enquanto são na realidade produtos
agrícolas. Aí portanto coincidência direta entre acumulação e reprodu-
ção em escala maior, de modo que parte do produto excedente, de ime-
diato na própria esfera de produção, toma a servir de meio de produção,
sem se trocar por salário ou por outras mercadorias.
A segunda questão fundamental é a maquiriaria. Não a máquina
que produz mercadorias, mas a maquinaria que produz máquinas, o ca-
pital constante da indústria que produz máquinas. Dada essa maquinaria,
é mister apenas o trabalho para fornecer as matérias-primas da indústria
extrativa, o ferro etc., destinados à produção de recipientes e máquinas
e com estas se obtêm as máquinas para trabalhar as próprias matérias-
primas. A dificuldade de que se trata aqui é a de evitar um círculo vicio-
so de suposições. Isto é, para se produzir mais maquinaria, é mister mais
material (ferro etc., carvão etc.), e para produzir este é necessário mais
maquinaria. Em nada altera a situação admitirmos que os industriais de
máquinas de construir máquinas e os fabricantes de máquinas (que em-
pregam as máquinas de construir máquinas) formam a mesma categoria.
Até aí está claro: parte do produto excedente se corporifica em máquinas
de construir máquinas (pelo menos depende do construtor de máquinas

923
corporificá-la assim). Elas não precisam ser vendidas e podem.voltar fisica·
mente para a produção. na qualidade de capital constante. Temos aí por-
tanto segunda categorla do produto excedente que de imediato (ou. por
meio de troca no mesmo ~o de produção) entra na nova produção
(acumulação), na qualidade do capital constante, sem ter passado pelo
processo de uma conversão prévia em capital variável.
Saber se parte do valor excedente pode converter-se de imediato
em capital constante reduz-se, antes de mais nada, a saber se parte do
produto excedente - em que o valor excedente se corporifica - pode
tomar a entrar na própria esfera de produção diretamente, na qualidade
de condição de produção, sem ser antes vendido.
Eís a lei geral:
Onde parte do produto, e por isso também do produto excedente
(isto é, do valor de uso em que se corporlfica o valor excedente), de ma-
neira direta, sem intermediação, pode retornar à esfera de produção don-
de saíu - como meio de trabalho ou material de trabalho - é possível
e necessário que a acumulação nessa esfera de produção se apresente de
modo que parte do produto excedente, em vez de ser vendida, se reincor·
pore diretamente (ou mediante troca com outras empresas especializadas
do mesmo ramo que realizem acumulaçãó semelhante), como «andição
da reprodução, e assim coincidam ai de imediato acumulação, é reprodu-
ção em maior escala. Tem de coincidir por toda parte, mas não dessa ma·
neira direta.
Isso estende-se a uma parte das matérias auxiliares. PÓr exemplo,
o carvão anualmente produzido. Pode-se utilizar parte do próprio produ-
to excedente para de novo produzir carvão, isto é, o produtor pode em-
pregá-la diretamente, sem qualquer mediação, corno capital constante
para produzir em maior escala.
Nas zonas industriais há produtores de máquinas· que constroem
fábricas inteiras para as empresas industriais. Admitamos que l /10 seja
produto excedente ou trabalho não pago. E claro que tanto faz que esse
1/10, o produto excedente, se configure em fábricas produzidas para ter-
ceiros e a estes vendidas ou numa fábrica que o industrial constrói para
si, vende a si mesmo. Aí está em jogo apenas a espécie de valor de uso em que
se materializa o trabalho excedente, se ele pode, na qualidade de condi-
ção de produção, reentrar na esfera de produção do capitalista a quem
pertence o valor excedente. E outro exemplo da importância do destino
do valor de uso para a determinação das formas econômicas.

924
Do produto excedente e portanto da mais-valia, já temos aí parte
considerável que diretamente pode e tem de ser convertida em capital
constante, para se acumular como capital, e sem a qual nenhuma acumu-
lação de capital pode ocorrer.
Segundo, vimos que, onde está desenvolvida a produção capitalis·
ta - isto é, a produtividade do trabalho, o capital constante, sobretudo
a parte do capital constante constituída de capital fiXo -, a mera repro·
dução do capital fixo em todas as esferas, e a reprodução paralela do ca·
pital constante que produz capital fixo, forma um fundo de acumulação,
ou seja, fornece maquinaria, capital constante para produção em esca·
Ia ampliada.
Terceiro, permanece a questão: pode uma parte do produto exce-
dente reconverter-se em capital (capital constante) por troca (negociada)
entre o fabricante, digamos, de maquinaria, instrumentos de trabalho etc.
e o produtor de matéria-prima, ferro, carvão, metais, madeira etc., isto é,
mediante troca de diversos componentes do capital constante? Se, por
exemplo,. o produtor de ferro, carvão, madeira etc. compra maquinaria
ou instrumentos do construtor de máquinas, e este compra metal, ma·
d.eira, carvão etc. do produtor primário, reporão eles o capital constan-
te ou formarão novo mediante troca dos componentes recíprocos do res-
pectivo capítal constante. A questão agora é: até onde isso ocorre com
o produto excedente?

5. Conversão _da mais·valia capitalizada em capital


constante e variável.
Tínhamos visto antes 155 que, na reprodução simples do capital pre!}o
mp<>sto, a parte do capital constante desgastada na reprodução do capi·
tal constante é substituída mediante reposição física direta ou mediante
troca entre os produtores do capital constante, troca de capital por ca·
pital, e não de renda por renda, nem de renda por capital. Ademais, o
capital constante que se desgasta ou se consome industrialmente na pro-
dução de artigos consumíveis - artigos que entram no consumo indivi·
dual - é reposto por novos produtos da mesma espécie, que resultam

155. Ver vo1nme 1, pp. 119-131, 167-178 e 224·231.

925
de novo trabalho adicionado, se reduzem portànto a renda (salário e lu-
cro). Em concordância, nas esferas que produzem artigos consumíveis,
o segmento da massa de produtos - segmento igual à parte do valor que
nelas repõe o capital constante - representa renda (revenue) dos produ-
tores do capital constante, enquanto, ao contrário, a parte da massa de
produtos nas esferas que produz.em capital constante, a qual representa
novo trabalho adicionado e por isso constitui a renda (reuenue) dos pro-
dutores desse capital constante, configura o capital constante (capital
de reposição) para os produtores dos meios de subsistência. Isso portan·
to supõe que os produtores do capital constante trocam o respectivo pro-
duto excedente (aqui no sentido do que sobra depois de deduzida a par-
te que se iguala ao capital constante deles) por meios de subsistência e
consomem o valor dele individualmente. Esse produto excedente con-
siste em:
(1) salário (ou o fundo reproduzido de salário), e essa porção tem
de ficar destinada (pelo capitalista) para dispêndio em salário, para con-
sumo índivídual portanto (e suposto o mínimo de salário, o trabalhador
só pode mesmo converter o salário recebido em meios de subsistência);
(2) lucro do capitalista (renda fundiária inclusive). Se esse segmen-
to tem magnitude suficiente, parte dele pode ser objeto de COJlSUmo in·
dividual e parte, de consumo industrial. E neste último ca~, ocorre tro·
ca de produtos entre os produtores de capital constante, a· qual não cor-
responde mais à fração do produto representadora do capital c9nstante
a repor de maneira recíproca, e sim a uma fração do produto e:Xcedente,
renda (trabalho de novo adickmado) que se transforma _diretamente em
capital constante e assim aumenta o volume do capital'constante e am-
plia a escala em que este se reproduz.
Por conseguinte, também nesse caso, parte do produto excedente
efetivo, do trabalho de novo adicionado durante o ano, se converte di·
retamente em capital constante, sem antes se ter convertido em capital
variável. Isso evidencia mais uma vez que o consumo industrial do pro·
duto excedente - ou a acumulação - de maneira nenhuma é idêntico
ao dispêndio da totalidade do produto excedente em salário de trabalha-
dores produtivos.
Pode-se imaginar que o fabricante de máquinas venda (parte de)
sua mercadoria ao industrial, digamos, de tecidos. Este lhe paga em di-
nheiro. Com esse dinheiro compra ele ferro, carvão etc., em vez de meios
de subsistência. Entretanto, considerando-se o processo global, é claro
que os produtores dos meios de subsistência não podem comprar, para

926
repostçao, maquinaria ou matéria-prima, se os produtores das reposições
de capital constante não lhes comprarem meios de subsistência, se essa
circulação não for, em substância, troca entre meios de subsistência e
capital constante. A dissociação dos a.tos de compra e venda pode sem
dúvida gerar transtornos e complicações muito grandes nesse proc.esso
de compensação.
Um país, se não pode por si mesmo fabricar à. quantidade de ma-
quinaria que lhe permita acwnular capital, oompra·a no exterior. O mes·
mo se dá, se não pode por si mesmo produzir o volume necessário de meios
de subsistência (correspondentes a salários) e de matérias-primas. Ao en-
trar em e.ena o comércio internacional, fica logo evidente que parte do
produto excedente - desde que destinada â acumulação - não se coo·
verte em salário e sim em capital constante diretamente. Mas então per·
dura a idéia de que lá no exterior o -dinheiro assim gasto é todo despen-
dido em salário. Vimos que isso não é nem pode ser assim, mesmo quan-
do abstraímos do oomércio exterior.
A proporção em que o produto excedente se reparte em capital
constante e em capital variável depende da composição média do capí·
tal, e quanto mais desenvolvida a produção capitalista, tanto menor será
relativamente a parte que constitui o dispêndio direto em salário. A idéia
de o produto excedente, por ser mero produto do trabalho de novo adi·
clonado durante o ano, transformar-se apenas em capital variável, des-
pender-se apenas em salário, corresponde em suma à falsa concepção de
o valor reduzir-se de maneira exclusiva a renda (revenue) - salário, lucro
e renda (rent) -, por ser o produto mero resultado ou materialização do
trabalho, a concepção errada de Smith e Ricardo.
Grande parte do capital constante, o capital fixo, pode entrar dire·
to no processo de produção de meios de subsistência, matérias-primas
etc.; ou servir quer para abreviar o processo de circulação, como as fer-
rovias, estradas, canais, telégrafos etc., quer para armazenar e estocar rner·
cadorias, como docas, depósítos etc.; ou pode aumentar a fertilidade do
solo, mas só depois de longo período de reprodução, como obras de ni·
vela.mento, drenagem etc. As conseqüências diretas para a reprodução
de meios de subsistência etc. diferirão muito conforme se aplique numa
dessas espécies de capital fixo parte maior ou menor do produto excedente.

927
6. Problema das crises (observações preliminares).
Destruição de capital pelas crises.

Suposta a produção ampliada do capital constante - isto é, produ-


ção maior que a necessária para repor o capital precedente e portanto
para produzir a quantidade anterior de meios de subsistência -, nã"o ha-
verá mais dificuldades para a produção ampliada ou acumulação nas esfe-
ras que empregam maquinaria, matérias-primas etc. Se está disponível o
necessário trabalho adicional, encontrar-se-ão no mercado todos os meios
para formar novo capital, para converter o dinheiro suplementar daquelas
esferas em novo capital.
Mas, antes de mais nada, o processo global da acumulação se reduz
a produção ampliada que, por um lado, corresponde ao crescimento natu-
ral da população e, por outro, constitui fase imanente dos fenômenos
que se manifestam nas crises. O estalão
1
dessa produção excedente é o
próprio capital, a escala existente das condições de produção e o afã sem
limites·do capitalista para enriquecer, para capitalizar, e de.modo nerihum
o consumo que é de início reprimido, uma vez que a maior parte da po-
pulação, a população trabalhadora, só pode expandir seu cons~mo den-
tro de limites muito estreitos; adernais, à medida que se .desenvolve o ca·
pitalismo, a procura de trabalho decresce relativamen(e, embora com
crescimento absoluto. Além disso, os ajustamentos são 'todos casuais e a
proporção do emprego dos capitais nos ramos particulares se ajusta por
meio de um processo contínuo, mas a própria continuidade desse pro-
cesso supõe por igual a desproporção constante que ele tem de nivelar
de maneira ininterrupta e muitas vezes violenta.
Aquí só temos de examinar as formas por que passa o capital nas
fases diversas de seu movimento. Não se analisam portanto as condições
efetivas nas quais se dá o processo real de produção. Supomos sempre
que a mercadoria se vende pelo valor. Não consideramos a concorrencia
entre os capitais, nem o sistema de crédito, nem a constituição real da so-
ciedade, que de maneira nenhuma consiste apenas nas classes dos traba-
lhadores e dos capitalistas industriais, e onde portanto consumidores e
produtores deixam de ser idênticos. A primeira categoria, a dos consumi-

928
dores (cujas rendas, em parte, são secundárias, derivadas do lucro e do
salário, e não prímárias), é bem mais ampla que a segunda, e por isso o
modo como despende sua renda e o tamanho dela engendram modifica-
ções muito grandes no orçamento econômico e no processo de circulação
e de reprodução do capital. Todavia, no estudo sobre o dinheiro 156 , já
verificamos que este, tanto na forma em geral diferente da forma natural
da mercadoria, quanto na forma de meio de pagamento, encerram a pos-
sibilidade de crises; e o estudo da natureza geral do capital evidencia ainda
mais essa possibilidade, mesmo sem se prosseguir na pesquisa das relações
reais que constituem precondíções do processo efetivo de produção.
O ponto de vista (na verdade de James Mill) que Ricardo tomou
de empréstimo ·ao monótono Say (e a que voltaremos ao tratar dessa fi.
gura lastimável), de ser impossível superprodução ou pelo menos pletora
geral do mercado baseia-se na proposição de se trocarem produtos por
produtos 157 ou, como diz. Mill, no ..equillbrio metafísico entre vendedo-
res e compradores". 158 o que levou ao axioma de a procura ser determi-
nada apenas pela produção ou de ser a procura idêntica à oferta. A mesma
idéia transparece na expressão predileta de Ricardo, de ser possível o em-
prego produtivo de qualquer montante de capital em qualquer país.

"Say", diz Ricardo, cap. XXI, Effects of Accumulatíon on profits and


interest, "mostrou... da maneira mais satisfatória que não há soma d~
capital que não se possa empregar num país, porque só a produção li-
mita a procura. O homem s6 produz com o propósito de consumir ou
vender, e só vende com o objetivo de comprar outra mercadoria que
lhe sej~ de utilidade ímediata ou contribua para produção futura. As--
sim, ao produzir, toma-se necessariamente ou consumidor das próprias
merca.dorias ou comprador e consumidor w mercadorias alheias. Não
cabe que ele fique mal informado por muito t6mpo a respeito das mer-
cadorias que pode produzir com mais vantagem, para alcançar o obJeti-

156. Ver Zur Kritik der politischen 6konomie, MEW, Band 13, pp. 77, 78, 118,
122e123.
157. Say, 'J'ralt~ d'h:onomie politique, 2il edição, volume 11, Paris, I81't, p. 382:
"Produtos só se trocam por produtos." Essa fórmula repete-a Ricru:do quase literal-
mente. Mai:x criticou essa idéia neste volume, pp. 499-505.
158. Marx alude aí às observações de James Mill sobre o equilíbrio eonstante en-
tre produção e consumo, entre oferta e procura, entre a soma das vendas e a soma
das compras (James Mill, Element:I of political economy, Londres, 1821, pp. 186-
195). Essa concepção, que James Mill expõe pela primeira vez no folheto Commerce
defendeà ... , publicado em Londres, 1808, examínou-a Mux em Zur Kritik der polí-
tischen Okonomie, Berlim, 1859 (ver MEW, Band 13, p. 78).

929
vo em vista, a saber, a posse de outros bem. Por isso, não é provável que
realize produção inintenupta" (por certo, não se trata aí da vida eterna)
"de uma mercadoda para a qual não haja procura" {pp. 339, 340).

Ricardo, que sempre se esforça por ser coerente, repara que aí seu
ás, Say, o está bmlando. Observa numa nota a propósito da passagem acima:

Está o que segue de todo coerente com o princípio de Say? 'Quanto


maior a abundância dos capitais disponíveis em relação às possibilida·
des de ernpregá·los, tanto mais cairá a taxa de juros para empréstimos
de capital' (Say, vol. li, p. l 08). Se num país ;e pode aplicax capital
de qualquer magnitude, como se pode falar de sua demasia em relação
às possibilidades existentes de empregá-lo7" {Lc., p. 340, nota).

Uma vez que Ricardo se apóia em Say, criticaremos mais tarde as


proposições de Say ao tratar desse próprio impostor.
Agora, de passagem, observamos: na reprodução, como na acumula-
ção de capital, não se trata somente de repor a mesma massa de valores
de uso que forma o capital, na escala anterior ou em escala ampliada (ca.
so da acumulação), mas de repor o valor do capital adiantado com a taxa
de lucro normal (maiS-valia). Se caírem portanto os preços de mercado
das mercadorias (de todas ou da m'aioria, tanto faz) muito abaixo dos
respectivos preços de custo, contrair-se-á o mais possível a reprodução
do capital, A acumulação, porém, paralisa-se ainda mais. Mafs.valia amon·
toada na forma de dinheiro (ouro ou bilhetes) só com prejuízo se conver-
teria em capital. Fica por isso ociosa, entesourada nos bancos ou na for-
ma de moeda escritura!, o que em nada altera a natureza da
situação. A
mesma paralisação poderá surgir de causas opostas, quando faltarem as
precondiçiies reais da reprodução (corno no caso do encarecimento dos
cereais, ou porque não se acumulou capital constante físico suficiente).
Ocorre paralisação na reprodução e, por isso, no fluxo da circulação. Com-
pra e venda se imobilizam reciprocamente, e capital desocupado aparece
ria forma de dinheiro ocioso. O mesmo fenômeno (e isso em regra prece-
de as crises) pode suceder quando a produção do capital excedente se dá
com muita rapidez e a reconversão dele em capital produtivo aumenta
tanto a procura de todos os componentes deste, que a produção real não
pode acompanhá-la, e daí subirem os preços de todas as mercadorias que
entram na formação do capital. Nesse caso, a taxa de juro cai muito, por
mais que se eleve o Jucro, e essa queda da taxa de juro motiva os mais
audaciosos empreendimentos lucrativos. A estagnação da reprodução
induz o decréscimo do capital variável, a diminuição do salário e a que-

930
da da quantidade de trabalho empregado. Isso, por sua vez, reage sobre
os preços e os faz cair de novo.
Nunca esquecer que o objetivo direto da produção capitalista não
é o valor de uso. mas o valor de troca e em es~ial incremento da mais-
valia. Este é o motivo que impulsiona a produção capitalista, e é um pri-
mor de concepção a que, para escamotear as contradições da produção
capitalista, omite-lhe a base e faz dela uma produção dirigida para o con-
sumo únediato dos produtores.
Ademais, o processo de circulação do capital não se conclui num
dia, mas se estende por período que se prolonga até o capital voltar à
forma da partida; esse período coincide com o decurso de tempo em que
os preços de mercado se nivelam aos preços de custo; durante ele ocorrem
grandes transtornos e mudanças no mercado; sucedem variações na pro-
dutividade de trabaJho e em conseqüência no valor real das mercadorias.
Considerando-se tudo isso, fica bem claro que, do ponto de partida - o
capital pressuposto - até à volta dele depois de um desses períodos têm
de se dar grandes catástrofes, amontoar-se e desenvolver-se elementos
da crise, que de maneira nenhuma se eliminam com a pobre proposição.
de se trocarem produtos por produtos. A compt1Tação do valor num pe-
ríodo com o valor das mesmas mercadorias em período ·posterior, o que
Bailey 159 considera devaneio escolástico, constitui ao contrário o princí-
pio fundamental do processo de circulação.
Quando se fala de destruição de capital por crises, há duas coisas
a distinguir.
À medida que estagna o processo de reprodução e que o processo
de trabalho se restpnge ou pára de todo em certos pontos, destrói-se ca-
pital real Não é capital a maquinaria que não se utiliza. O trabalho que
não se explora equivale a produção perdida. Matérlas-prúnas que jazem
ociosas não são capital. Edifícios (e também nova maquínarla construida)
que para nada servem ou permanecem inacabados, mercadorias que apo-
drecem em depósito, tudo isso é destruição de capital. Tudo isso se reduz
a paralisação do processo de reprodução e a que as condições de produ-
ção existentes não exercem na realidade as funções de condições de pro-
dução, não são postas em atividade. Então seu valor de uso e valor de tro-
ca vão para o diabo.
Mas, no segundo significado, destruição de capital por crises é de·
preciação de valores, que os impede de renovarem depois, na mesma es·

159. .Bailey, A critical dissertation on the nahne, 'fTUMsure, and causes of vu.Iue... ,
Londr«, 1825, pp. 71-93.

931
cala, o processo de se reproduzirem corno capit.al. E a queda ruinosa dos
preços das mercadorias. Com ela não se destroem valores de uso, O que
um perde, o outro ganha. Os valores operantes como capital ficam impos-
sibilitados de se renovar como capital nas mesmas mãos. Os velhos capi-
talistas quebram. Se o valor das mercadorias que um deles vendia para
reproduzir seu capital era de 12 000 libras, que incluíam 2 000 de lucro,
e se elas _caíram para 6 000. não pode esse capitalista, com as 6 000 libras,
pagar as dívidas que contraiu, nem recomeçar o mesmo negócio na mes-
ma escala, mesmo que nenhuma dívida tivesse, uma vez que os preços
das mercadorias voltam a se elevar aos preços de custo delas. Destrói-se
assim capital e.e 6 000 libras, embora o comprador des.sas mercadorias,
por tê-las adquirido pela metade do preço de custo, possa com a .reanima-
ção dos negóci.Ós prosseguir muito bem e ter até obtido lucro. Grande
parte do capital nominal da sociedade, isto é, do valor de troca do capi-
tal existente, é destruída de uma vez para sempre, embora essa própria
destruição, por não atingir o valor de uso, incentive muito_ a nova repro-
dução. Este é também o período em que os banqueiros se enriquecem
às custas do industrial. A qúeda do capital meramente fictício, dos títu-
los do governo, das ações etc. - desde que não leve o Estado e as socie·
d.ades anônimas à bancarrota, e não 'gere, com o abalo do créditQ dos ca·
pítalistas industríais que detêm aqueles papéís, o estorvo geral' da repro-
dução ·- resulta em simples transferência de riqueza de urna mão para
outra e terá em geral influência favorável na reprodução, se_ considera-
mos que os novos-ricos que colhem na baixa tais ações ou papéis; em re-
gra empreendem mais que os antigos detentores.

7. O absurdo de negar a superprodução de mercadorias


e ao mesmo tempo reconhecer a pletora de capital.
Ricardo, quando tem conhecimento real, é sempre coerente. Assim,
para ele, a proposição de ser impossível superprodução (de mercadorias)
é idêntica ã proposição de ser impossível pletora ou .superabundância
de capital.•

• Aí é mister distinguir. Quando Smith explica a queda da taxa de lucro pela


supti:abundância. de capital, pela acumulação de capital, refere-se a efeito permanente,
o que é falso. Em contrapartida, superabundância transitória de capital, superprodu-
ção, ctise são outra coisa. Não há cri.<ieS permanentes. (Nota de Marx.)

932
"Num país, não é possível então acumular-se soma alg\lma de capital
que não se possa empregar produtivamente, até que subam tanto os
salários, poI causa da alta dos meios de subsistência essenciais, e em
eonseqüêncía sobre tão pouco para o lucro do capital, que cesse o in-
centivo para a acumulação" (l.c., p. 34-0), "Daí se infere ... que não há
limites para a procura, nem para o emprego de capital, desde que este
proporcione lucro, e só há uma rai>;io suficiente para queda do lucro -
alta do salário, seja qual for a abundância de capital. Pode-se acrescen-
tar ainda que a única causa eficiente e duradoura da elevação dos sa-
lários é a dificuldade crescente de provei o número cada vez maior de
trabalhadores com alimentos e meios de subsistência essenciai>" (l.r..,
pp. 347, 348).

Que teria Ricardo dito então da estupí~z de seus sucessores, que ne·
gam a superprodução numa fonna (a de superabundância de metcadorias
no mercado), mas a admitem e ainda fazem dela ponto fundamental de sua
doutrina, na outra forma, a de superprodução, pletora, superabundância
de capital?
Nenhum economista digno de menção do período pós-ricardiano
nega a pletora de capital. Ao contrário, todos explicam as crises por meio
dela (quando não alegam causas creditícias). Todos portanto adn:iitem a
superproduçãô numa forma, embora a neguem na outra. Assim resta ape
nas saber como se relacionam as duas formas de superprodução, a forma
em que é negada e aquela em que é admitida.
O próprio Ricardo, a bem dizer, nada conhecia de crises, de crises
gerais do mercado mundial oriundas do próprio processo de produção.
Podia explicar as crjses .de 1800 a 1815, alegando o encarecímento do
trigo em virtude das más colheitas, a depreciação dos bilhetes de banco,
a depreciação das mercadorias coloruais etc., pois, em conseqüência do
bloqueio continental; o mercado se contraíra à força, por motivos polí-
ticos e não ec.onômicos. -Para explicar as crises posteriores a 1815, tinha
também atgumentos: um ano r_ulin de escassez de cereais; queda dos pre-
ços dos grãos, por terem cessado de atuar as causas que segundo sua pró-
pria teoria tinham de empurrar para cima os preços dos cereais, no perío-
do da guerra e do isolamento em que a Inglaterra ficou do Continente;
a transição da guerra para a paz e as "súbitas mudanças" daí oriundas
"nos canais de coméicio". (Ver em seus Principies, capítulo XIX: On
sudden Changes tn the Channels of Trade.)
Os fenômenos históricos posteriores, em particular a quase regular
periodicidade das crises do mercado mundial, nlfo permitiram aos sucesso·
res de Ricardo a negação dos fatos ou a ínterpretação deles como casuais.
Em vez disso - excetuados os que 1udo explicam pelo crédito, para de-

933
pois explicar que eles mesmos terão de supor antes a superabundância
de capital - inventaram a deliciosa diferençà entre pletora de capital e
guperproduçfio. Em oposição a esta úJtima, ativeram-se às frases e às boas·
razões de Ricardo e Smith, enquanto procuram deduz.ir da pletora de
capital fenômeno_s que de outro modo lhes são inexplicáveis. Wilson, por
exemplo, explica certas crises pela pletora de capital ftX.o; outros, pela
pletora de capital circulante. A pletora de capital, considerada em si mes-
ma, é sustentada pelos melhores economistas (como Fullarton) e já se tor-
nou preconceito tão corrente que a própria expressão reaparece axiomá-
tica no compêndio do sábio Herr Roscher 160
Trata-se portanto de saber que é pletora de capital, e em que se dis-
tingue da superprodução.
(Por certo, a justiça manda que se diga que outros economistas, co-
mo Ure, Corbet etc., qualificam a superprodução de estado regular da in·
dústrla em grande escalo., dentro dos limites do mercado interno. Ela por-
tanto só leva a crises em certas circunstâncias, quando o mercado externo
também se contrai.)
Segundo esses economistas, capital = dinheiro ou mercadorias. As-
sim, superprodução de capital = superprodução de dinheiro ou de merca-
dorias. Contudo, acham eles que os dois fenômenos nada têm em comum.
E disso não excluem sequer superprodução de dinheiro, pqis este para
eles é mercadoria, de modo que o fenômeno todo se reduz â superprodu-
ção de mercadorias, que admitem com uma denominação e negam com a
outra. Se ainda se diz que há superprodução de capital fixo ou de.circulan-
te, está subjacente aí que as mercadorias não são consideradas na defmi-
ção elementar, mas segundo a definição de capital. E C<?,m isso mais uma
vez admite-se, em contrapartida, que na produção capitalista e no tocan-
te a seus fenômenos - superprodução por exemplo - não se tratá apenas
da relação simples em que o produto se revela mercadoria, como tal se
qualifica, mas também de detenninações sociais do produto, pelas quais
ele é mais que mercadoria e desta ainda difere.
Em suma: a expressão pletora de capital, em vez de superprodução
de mercadoria - desde que não seja mera evasiva ou leviandade irresponsá-
vel, que considera o me1;mo fenômeno existente e necessário quando se
chama A, mas o nega quando se chama B, e desde que na realidade cor-
responda a escrúpulos e cuidados apenas com a designação do fenômeno

160. Roschet, Die Gnmdlagen der Nationalõkoncmie••..• 3!1 edição, Stuttgan e


Augsbutgo, 1858, pp. 36g..370.

934
e oão com o próprio fenômeno, ou ao intuito de fugir ã dificuldade de
explicar o fenômeno, que se nega numa fonna (nome) contrária aos pre-
conceitos e se admite em forma vazia de sentido -, a transição da expres-
são "superproduçiib de mercadorias" para a expressão "pletora de capi-
tal", excluídos aqueles aspectos, constitui de fato um progresso. Em que
consiste este? Em que os produtores se confrontam não como simples
possuidores de mercadorias e sim como capitalistas.

8. Ricardo nega a superprodução geral. A possibilidade


da crise decorre das contradições internas da
mercadoria e do dinheiro.
Ainda algumas passagens de Ricardo:

"Seríamos levados a pensar ... que Adam Smith inferiu que somos im·
pelidos" (o que se dá na realidade} "a produzir um excedente de ce·
seais, de artigos de lã e de ferragens, e que o capital que os produziu
não podia ter outro empsego. Mas ~empre é questão de escolha a ma-
neira corno se empregará o capital e po1 .isso nunca pode haver, por
espaço prolongado de tempo, excedente de mercadoria alguma; é que,
se houvesse, a mercadoría cairia abaixo de seu preço e o capital seria
transferido para outra aplicação mais lucrativa" (pp. 341, 342, nota).
"Produtos afio sempre comprados por produtos ou por serviços; dinhei-
ro é apenas o meio por que se efetua a troCJJ."

(Isto é, dinheiro é mero meio de circulação, e o próprio valor de tro-


ca é simples forma fugaz da troca de produtos por produtos - o que ê falso.)

"Pode-se produzir demais dada mercadoria, da qua! haja ta! supe1abun·


dância no mercado que não se recupere o capital nela aplieado. Ma1. isso
não pode ocorrer com todas as mercadorias" (1.c., pp. 341, 324). "Se
essa produçãó acren:ida e a procura dela deco"ente baixarão ou não o
lucro depende apenas da alta dos salários, e a alta dos salários, salvo sua
ocorrência em período curto, da facilidade de p1oduzír os alimentos e
artigos de consumo necessários do trabalhador" (l.c., p. 343). "Quan-
do comerciantes empregam seu capital em comércio externo ou trans·
porte internacional, é sempre por escolha e nunca por necessidade. E
porque nesses :ramos seu lucro será algo maior que no comércio inter·
no" (p. 344 ).

No tocante às crises, todos os que expõem o movimento real dos


preços, ou todos os experientes que escrevem em dados momentos da cri·
se, com razão ignoraram a charlatanice fantasiada de teoria e acharam

935
satisfatória a idéia de que o verdadeiro na teoria - a saQer, a impossibi-
lidade de superabundância no mercado etc. - era errado na prática. Na
realidade, a repetição regular das crises rebaixou as charlas de Say etc. a
uma fraseologia empregada apenas em tempos de prosperidade e lançada
ao mar em tempos de crise.
Nas crises do mercado mundial as contradições e antagonismos da
produção burguesa se revelam contundentes. Em vez de investigar em
que consistem os elementos conflitantes que se patenteiam na catástro-
fe, os apologistas se contentam em negar a própria catástrofe e, em face
de sua periodicidade regular, em insistir em que a produção, se acatasse
as lições dos compêndios, nunca chegaria à crise. A apologética então con-
siste em falsificar as mais simples relações econômicas e especialmente
em se aferrar à unidade em face da contradição.
Se, por exemplo, compra e venda - ou o mo ..imento da metamor-
fose da mercadoria - configura a unidade de dois processos, ou antes o
decurso de um processo por meio de duas fases opostas, sendo na essência
portanto a unidade de ambas as fases, esse movimento é também na es·
sência a separação delas e a afirmação recíproca de independência. Mas,
uma vez que estão interligadas, a afinnação de independência das fases
vinculadas só se pode po.tentcar d<; maneira violenta. como processo des-
trutivo. E justamente na crise que sua unidade se manifesta, a unidade
de elementos opostos. A independência recíproca assumida:· pelas duas
fases conjugadas e complementares destrói-se à força. A: crise portanto
revela a unidade dos elementos que passaram a ficar independentes uns
dos outros. Não ocorreria crise se não existisse essa unldade Uítema de
elementos que parecem comportar-se com recíproca indiferença. Mas
não, diz o economista apologético. Por haver a unidade'; não pode haver
crise. O que significa apenas que a unidade dos contrários exclui a con·
tradição.
Para se demonstrar que a produção capitalista não pode conduzir
a crises gerais, negam-se todas as condições e formas distintivas, todos
os princípios e diferenças específicas, em suma, a própria produção ca·
pitalista, e na realidade se demonstra que, se o modo capitalista de pro·
dução, em vez de ser uma forma especificamente desenvolvida, peculiar,
da produção social, fosse um modo de produção anterior a suas rnanifes·
rações iniciais mais rudimentares, não existiriam os conflitos e contradi-
ções que o caracterizam, nem portanto sua eclosão nas crises.
"Produtos", diz Ricardo de acordo com Say, "sempre se trocam por
produtos ou por serviços; dínheiro é apenas o meio por que se efetua
a troca."

936
Aí, primeiro, a mercadoria, que encerra a oposição entre valor de
troca e valor de uso, se transfonna em mero produto (valor de uso), e em
conseqüência a troca de mercadorias, em simples troca de produtos, de
meros valores de uso. Recua·se ã era anterior à produção capitalista e mes-
mo à anterior à produção simples de mercadorias, e nega-se o fenômeno
mais intrincado da produção capitalista - a crise do mercado mundial -,
escamoteando-se a primeira condição da produção capitalista, a saber,
que o produto tem de ser mercadoria, de se representar por isso em di-
nheiro e passar pelo processo de metamorfose. Usa-se, em vez da expres-
são trabalho assalariado, o termo "servíçcs ... palavra com que de novo se
omite a característica específica do trabalho assalariado e de seu valor de
uso· - a saber, acrescer o valor das mercadorias pelas quais se troca, produ-
zir mais-valia - e. em conseqüência a relação parti_cular por meio da qual
dinheiro e mercadoria se convertem em capital. "Serviço" é o trabalho
sob o aspecto exclusivo de valor de uso (coisa acessória na produção capi-
t:Íllista), do mesmo modo que na palavra "produto" se suprime a natureza
da mercadoria e a contradição nela contida. Então é coerente conceber o
dinheiro como simples mediador da troca de produtos e não como forma
essencial- e necessária de existência da mercadoria, que tem de se apresen·
tar como valor de troca - trabalho social geral. Uma vez q_ue, por meio
da conversão da mercadoria em simples valor de uso (produto) se elimina
a natureza do valor de troca, é possível, com a mesma facilidade, negar,
ou antes ter de negar, no processo da metamorfose da mercadoria, a exis-
tência do dinheiro como forma essencial - independente da forma origi·
nal - da mercadoria.
Aí portanto escamoteiam·se as crises, deixando-se de lado ou negan-
do-se os primeiros requisitos da produção capitalista: a existência do pro.
duto como mercadoria, a bifurcação da mercadoria em mercadoria e di·
nheiro, os daí oriundos elementos da dissociação na troca das mercadorias,
enfmt, a relação do dinheiro ou mercadorias com o trabalho assalariado.
Aliás, não são mais felizes os economistas (como J. St. Mill, por exem·
plo) que procuram explicar as crises com essas meras possibilidades da
crise, encerradas na metamorfose das mercadorias, como a dissociação
entre compra e venda. Esses elementos que explicam a possibilidade da cri-
se nem de longe elucidam sua realidade; deixam de elucidar por que as fa.
ses do processo entram em conflito tal que sua unidade interna só pode im·
por-se por meio de uma crise, de um processo violento. Aquela dissocia·
ção aparece na crise; é sua forma elementar. Explicar a crise por essa for·
ma elementar significa explicar a existência da crise, expressando-a na mais
abstrata forma de sua existência, isto é, explicar a crise pela crise.

937
"Um ser humano", diz Ricardo,161 ''só. produz se tiver o propósito de
corisumir ou vender, e só vende se tiver' .o p1opósito de comprar outra
mercadoria que de imediato lhe seja útil ou contríbua para produção
futura. Ao produzir, torna-se por isso necessariamente o consumidor
de seus próprios bens" (goods) "ou o comprador e consumidor das
mercadorias de outra pessoa. Não se pode admitir que, durante prolon-
gado eYpaço de tempo; não esteja informado sobre as mercadorias que
pode produzir com mais vantagem, para atingir seu propósito, a saber,
o posse de outros bens, e por isso nio é provável que de continuo"
(continually} "produza uma mercadoria para a qual não há procura"
(l.c., pp. 339, 340).

Palavrório pueril que fica bem para Say, mas não para Ricardo. Antes
de mais nada, nenhum capitalista produz para consµxnir o produto. E quan-
do falamos da produção capítalista, o certo é dizer que "ninguém produz
com o propósito de consumir seu produto", mesmo se emprega partes
dele no consumo industrial. E aqui se trata do consumo indívidual. Esque-
ceu-se antes que o produto é mercadoria. Agora, esquece-se até a divisão
socíal do trabalho. Em condições em que os seres humanos produzem
para si mesmos, não há na realidade crises, mas tampouco há produção
capitalista. Nunca ouvimos dizer que os antigos, com sua produção escra-
vista, conhecessem jamais crises, embora, entre eles, também falissem
produtores isolados. A primeira parte da alternativa é disparate; por igual
a segunda: um homem que produz não tem a opção de qu~rer' ou não
vender. Tem de vender. Nas críses entra justamente a circunStâncía de não
poder ele vender ou de ter de vender abaixo do preço de custo ou mes-
mo com perda positiva. De que lhe serve·- e de que portanto·:.ws·serve -
que tenha produzido para vender? Trata-se justamente de ·iaber o que es-
torva essa boa intenção.
E mais:

"só vende se tiver o propósito de. comprar outra mercadoria que de iJne-
díato lhe seja útil ou contribua para produção futura."

Que agradável panorama das relações burguesas! Ricardo esquece


até que alguém pode vender para pagur, e que essas vendas forçadas de-
sempenham nas crises papel de importância considerável. A intenção ime-
diata do capítalista ao vender é reconverter sua mercadoria ou melhor
seu capital-mercadoria em capital-dinheiro e assim realizar seu lucro. Aí,
o consumo - a renda {revenue) - não é absolutamente o elemento orien·

161. Vez neste volume p. 929.


tador do processo, embora o seja, sem dúvida, para quem vende mercado-
rias apenas para convertê-Ias em meios de subsistência. Mas isso não é a
produção capit.alista, onde a renda {revenue)1 62 se patenteia resultado e
não objetivo detenninante. Cada um, antes de mais nada, vende para ven-
der; isto é, para converter mercadoria em dinheiro.
Durante a crise uma pessoa pode sentir grande satisfação por ter
venà.ido sem a preocupação de compra imediata. Por certo, o valor rea-
lizado, para operar por sua vez como capital, terá sem dúvida de passar
pelo processo de reprodução, isto é, de trocar-se por trabalho e mercado--
rias. Mas a crise é justamente a fase de estorvo e interrupçao do processo
de reprodução. E esse estorvo não pode ser explicado pela circunstância
de não ocorrer em tempos onde não reina crise. Não há dúvida que nin·
guém .. continuaria produzindo uma mercadoria para a qual não há pro-
cura" (pp. 339, 340), mas ninguém discute hipótese tão banal. Antes
de maís nada, o objetivo da produção capitalista não é apossar-se de ou-
tros bens, e sim apropriar-se de valor, de dinheiro, de riqueza abstrata.
Nesse raciocínio de Ricardo está subjacente a idéia do "equilíbrio
metafísico entre as compras e vendas", de James Mill, 163 antes por mim
apresentada, equilíbrio que só considera a unidade - e não a separação -
dos processos de compra e venda. Daí também a afinnação de Ricardo
(de acordo com James Mill):

"~ possjvel produzir-se demais determina.da me1cadoria, e ha.ver dela


no mercado superabundância tal que não se xecupere o capital nela
aplicWo; mas isso não pode ocorrer com relação a todas as mercad.o-
1ias" (pp. 341, 342).

O dinheiro é não só "o meio por que se efetua a troca" (p. 341),
mas também o meio por que a troca de produto por produto se dissocia
em dois atos, um do outro independentes, além de distantes no tempo e
no espaço. Em Ricardo, aquela falsa concepção do dinheiro decorre de
apoiar-se apenas na determinação quantitativa do valor de troca, a saber,
valor de troca = dada quantidade de trabalho, e esquecer, em contrapar-

162. Ver volume 1, p. 22, nota 9.


163. Ver neste volume p. 929, nota 158.

939
tida, a determinação qualitativa, isto é, que o trabalho índividual tem de
se configurar em trabalho sodal geral, abstrato, o que só se dá por meio
de sua alienação (alienation). *
:E um expediente ínfeliz afirmar que só mercadorias isc'fadas e não
todas as mercadorias podem apresentar ''superabundância no mercado",
e que por conseguinte a superprodução só pode ser parcial. Antes de mais
nada, se observamos a natureza da mercadoria, nada se opõe a que todas
as merc.adorias sejam superabundantes no mercado e todas se cotem abaixo
do respectivo preço. Agora trata-se precisamente da riuão da crise, isto é,
da possibilidade de haver superabundância de todas as mercadorias com
exceção do dinheiTo. Existir, para a mercadoria, a necessidade de se confi-
gurar em dinheiro significa apenas a existência dessa necessidade para to-
das as mercadorias. E a dificuldade de passar por essa metamorfose, se
existe para uma mercadoria isolada, pode existir para todas. A natureza
geral da metamoxfose das mercadorias, a qual abrange tanto a dissociação
quanto a unidade da compra e venda, em vez de excluir, ao contrário,
encerra a possibilidade de uma oferta excessíva geral.
Ademais, está sem dúvida subjacente ao raciocínio de Ricardo e a
raciocínios semelhantes: não só a relação entre compra e venda. mas tam·
bém a relação entre oferta e procura; a qual só teremos de tratar ao estu-
dar a concorrência entre os capitais. Como diz Mill, se compra é venda
etc., procura é oferta, e oferta, procura; entretanto, elas tarµ.bém se dis-
sociam e podem assumir independência recíproca. Em dado momento,
a oferta de todas as mercadorias pode ser maior que a procura de- todas
as mercadorias, enquanto a procura da mercadoria universal, o tÍinheiro,
o valor de troca, é maior que a procura de todas as merca~()rias particula-
res, ou enquanto a motivação de converter a mercadoria em dinheiro, de
realizar seu valor de troca, predomina sobre a motivação de reconverter
a mercadoria em valor de uso.
Entendida de maneira mais ampla e mais concreta, a relação entre ofer-
ta e procura abrange a relação entre produção e consumo. Aí teria de novo
de ser sustentada a unidade desses dois fatores, subsistente em si e precisa-
mente na crise impondo-se à força contra a dissociação e aoposiçiio que tam-
.bém existem entre eles e aín da constituem características da produção burguesa .

.. (Ricardo, ao considerar o dinheiro meio de d.Iculaç.ão e nada rnaís, está por


mesmo vendo nl) valor de troca mera forma transítórla, em suma, algo apenas
iSSI)
fonnal na produção burguesa ou capitalista; esta, portanto, não é para ele modo de
produção com especificidade definida, e sim o modo de produção pura e simples-
mente.) (Marx.)

940
No tocante à oposição entre superprodução parcial e universal, des-
de que se trate apenas de sustentar a primeira para descartar a segunda,
cabe observar o seguinte:
Primeiro: uma inflação geral de preços em todos os artigos da pro·
dução capitalista precede, em regra, às crises. Por isso, todos participam
do c01apso subseqüente e todos estão congestionando o mercado aos pre·
ços que tinham antes do colapso. O mercado pode absorver uma quanti-
dade de mercadorias a preços decrescentes que caiam abaixo dos preços
de custo, quantidade que não poderia abs01ver aos preços anteriores. A
superabundância das mercadorias é sempre relativa; isto é, superabun-
dância a certos preços. São ruinosos para o produtor cu comerciante os
preços a que as mercadorias são então absorvidas.
Segwulo: Para uma crise (e também para a superprodução) ser ge-
ral, basta que atinja os artigos dominantes do comércio.

9. A errada concepção Ricardiana da relação entre


produção e consumo nas condições do capitalismo.

Vejamos mais de perto corno Ricardo raciocina para descartar uma


oferta excessiva geral no mercado:

".f po5sível produzir-se demais determinada mercadoria, e havei: de-


la no mercado superabundância tal que não se recupera o capital ne-
la aplicado; mas isso não pode ocorrer com relação a todas. as merca·
darias. A proéwa de tdgo é limítada pelas bocas que irão comê-lo, a
de sapatos e casacos pelas pessoas que irão usá-los; todavia, embota
urna comunídade ou parte dela possa te1 tanto trigo e tantos cllapêus
e sapatos quantos pode ou deseja consumir, o me$mo não se pode di·
zer de toda mercadoria produzida por meios IUJ.turais ou artl.fu::iais. Al·
guns consumiriam mais vinho iC tivessem a capacidade de obtê-lo. Ou-
tros que têm vinho suficiente desejarão aumentar os móveis que pos-
suem ou melhorar-lhes a qualidade. Outros desejarão embelezar seus
jardins ou ampliar su11s casas. O desejo de fazer todas essas coisas ou
algumas delas está arraigado em todo cotação humano. Para isso nada
é necessário além dos meios, e só o acréscimo de produção pode pro-
porcioná-los" (l.c., pp. 341, 342).

Pode haver arrazoado mais pueril? Desenvolve-se assim: de uma


mercadoria particular pode-se produzir mais do que consumir, mas isso
não se estende a todas as mercadorias ao mesmo tempo. E que as neces-

941
sidades que as mercadorias satisfazem não têm limites, e não se satisfa-
zem todas as necessidades ao mesmo tempo. Ao contrário. A satisfação
de uma necessidade faz emergir outra em estado latente, por assim dizer.
Desse modo, nada se exige âlém. dos meios de satisfazer essas necessida-
des, e esses meios podem ser obtidos mediante acréscimo da prodlj\:ão.
Por conseguinte, não é possível superprodução geral.
Para que tudo isso? Em fases de superprodução grande parte da na-
ção (sobretudo da classe trabalhadora) dispõe menos que nunca de ce-
reais, sapatos etc., para não falarmos de vinhos e móveis. Se só pudesse
sobrevir superptodlj\:ão depois de todos os membros da nação terem sa-
tisfeito pelo menos as necessidades mais prementes, nunca teria podido
ocorrer, em todo o decurso da história da sociedade burguesa, uma su-
perprodução geral ou mesmo uma parcial. A círcunstància de um merca-
do, por exemplo, estar congestionado de sapatos ou tecidos ou vinhos
ou produtos coloniais significará que 4/6 da naçãó tenham por ventura
supersaturado suas necessidades de sapatos, tecidos etc.? Afinal que tem
a superprodução a ver com as necessidades consideradas de maneira in-
condicional? Ela só se defme em face das necessidades com poder aqui-
sitivo. Não se trata de superprodução absoluta, superprodução em si con-
frontada com a necessidade absoluta ou com o desejo de. possuir as mer-
cadorias. Nesse sentido não existe superprodução parciai nem geral, e
uma não se opõe mesmo à outra.
Mas, dirá Ricardo, quando há muitas pessoas que precísam de sa-
patos e tecidos, por que não se empenham na aquisição dos meios de obtê-
los, produzindo algo com que compraI sapatos e tecidos? Não seria ainda
mais simples dizer: por que não produzem para si sapatos e tecidos? E o
que é ainda mais estranho na superprodução: os verdadeiros produtores
das mesmas mercadorias que congestionam o mercado carecem delas,
Não se pode dizer aí que deveriam produzir as coisas para obtê-las, pois
as produziram e apesar disso não as obtiveram. Tampouco se pode dízer
que determinada mercadoria congestiona o mercado porque ninguém
precisa dela. Assim, se mesmo a superprodução parcial não se pode expli-
car pela circWJstància de as mei:..cadorías que congestionam o mercado
super;saturarem as necessidades a que se destinam, tampouco se pode
descartar a superprodução universal alegando a circunstância de existi~
rem necessidades, necessidades insatisfeitas para muitas das mercadorias
que estão no mercado.

942
Recorramos ao exemplo do fabricante de tecido. 164 Enquanto a re-
produção prosseguia ininterrupta - por conseguinte também o estádio
~essa reprodução no qual o produto como mercadoria, mercadoria ven-
dável, o tecido, se reconverte em dinheiro de acordo com o valor -, os
trabaJhadores, digamos, que produzem o tecído também consumiam par-
te dele, e com a ampliação da. reprodução, isto é, com a acumulação, con-
sumiam mais tecido, ou mais trabalhadores eram empregados para produ-
zi-lo, os quais eram ao mesmo tempo consumidores de fração dele.

10. A crise, uma possibilidade que se torna realidade.


A crise, revelação de todas as contradições da
economia burguesa.

Antes de dar um passo adiante, vejamos o seguinte:


A dissocíação entre o processo de produção (imediato) e o processo de
circulaçãa também evidencia e desenvolve mais a pmsibflidade da crise, a
qual aparecia na mera metamorfose da mercadoria. 165 Quando os dois
processos não se convertem um no outro com fluidez, mas se afirmam
independentes um do outro, sobrevém a crise.
Na metamorfose da mercadoria, a possibilidade da crise assim se
configura:
Primeiro, a mercadoria que tem existência real como valor de uso e
ideal, no preço, como valor de troca, tem de se converter em dinheiro.
M - D. Resolvida essa dificuldade, a venda, não há mais dificuldade para
compra, D - M, uma vez que de ímediato se pode trocar dinheiro por
tudo. 'E mister pre.:>supor o valor de uso da. mercadoria, a utilidade do
trabalho nela contido, do contrário não é de modo algum mercadoria.
E mais: pressupõe-se que o valor individual da mercadoria = valor social
dela, ísto é, que o tempo de trabalho nela materializado = tempo de tra-
balho socialmente necessário para produzi·la. A possibilidade da crise,
desde que se revele na forma simples da metamorfose, só decorre por-
tanto disto: as diferenças de forma - as fases - por que passa a merca-

164. Marx refere-se aí a uma variedade de tecido (morim, cuja matéria-prima é o


algodão) e, no exemplo mencionado (Vi.U' pp. 914 e 915), a outra variedade (tecido
de linho). Essa distinção não tem importância pano problema em exame.
165. Marx tem aí em mente o capítulo A metamorfose da mercadoria. em Zur
Kritik der politischen okonomie, 1. Hcft, Berlim, 1859 (ver MEW, Band 13, pp. 69-79).

943
doria em seu movimento são, primeiro, fonnas e fases .necessariamente
complementares; segundo, apesar dessa wúdade íntrínseca necessária,
são por igual partes e formas independentes do processo, contrapostas
em sua existência, discrepantes no tempo e no espaço, separáveis e se-
paradas uma da outra. A· possibilidade da crise reside apenas na disso-
ciação entre compra e venda. E apenas na sua fonna que a mercadoria
tem aí de passar pela dit1culdade. lntrapassa-a logo que assume a forma
de dinheiro. Ademais, isso também se reduz à circunstâncía de compra
e venda não coincidirem. Se a mercadoria - como na troca direta - não
pudesse retomar da circulação na forma de dinheiro ou procrastínar sua
reconversão em mercadoria, se compra e venda coíncidissem, deixaria
de haver, de acordo com as suposições feitas, a possibilidade de crise.
Pois se admite que a mercadoria é vakJr de uso para outros possuidores
de mercadorias. Na forma de troca direta só não se pode permutar a mer-
cadoria se não é valor de uso ou não existem valores de uso do outro la-
do para se trocarem por ela. Isto é, somente nestas duas condições: se um
lado produziu coisa inúh1, ou se o outro lado nada tem de útil, equiva-
- lente para trocar por valor de uso daquele. Nos dois casos não haverá ne-
nhuma permuta. Mas, desde que haja permuta, suas fases não se dissociam.
O comprador será vendedor, o ve~dedor, comprador. Assim, desaparece
a fase crítica, oriunda da forma de troca - a troca que é circulação -, e
quando dizemos que a forma simples da metamorfose encerra a poi;;sibi-
lidade da cdse, expressamos apenas que nessa própria forma está a possi-
bilidade da ruptura e da dissociação de fases que na essência são comple-
mentares.
Mas isso se estende ainda ao conteúdo. Na troca direta, o produ-
tor dá ao grosso da produção o destino de satisfazer as- próprias necessi-
dades ou - ao se desenvolver mais a divisão do trabalho - de satisfazer
necessidades dos co-produtores, dele conhecidas. O que se tem de trocar
como mercadoria é sobra, e não é fundamental a circunstância de se tro-
car ou não essa sobra. Na produção de mercadorias, a conversão do pro-
duto em dinheiro, a venda, é conditio sine qua non. Cessa a produção
imediata para as próprias necessidades. Então, se não se vende, surge a
crise. A díficuldade de transformar a merl'Jldoria - o produto particular
do trabalho individual - em dinheiro, o oposto dela, em trabalho social,
geral e abstrato, está nisto: dinheiro não se apresenta como produto do
trabalho índivídual, e quem vendeu, e portanto possui a mercadoria na
forma de dinheiro, não é por sua vez forçado a comprar logo, a recon-
verter o dinheiro em produto particular do traba1ho individual Na tro-
ca direta não há essa contradição: não pode haver vendedor sem compra-

944
dor, nem comprador sem vendedor. Aquela dificuldade do vendedor - na
suposição de sua mercadoria ter valor de uso - decorre somente da faci-
lidade do comprador em adiar a reconversão do dinheiro em mercadoria.
A dificuldade de transformar a mercadoria em dinheiro, de vender, pro-
vém apenas de a mercadoria ter de se transformar em dinheiro, sem o di-
nheiro ter de imediato de se converter em mercadoria, e de compra e ven-
da portanto poderem dissociar-se. Dissemos que essa forma abrange a
possibilidade da crise, isto é, a possibilidade de elérnentos em conexão
recíproca, inseparáveis, se desvincularem e serem por isso, forçados a se
juntar pe1a força que se opõe à sua independência mútua. Ademais, crise
é apenas a imposição violenta da unidade das fases do processo de pro-
dução, as quais se tomaram independentes uma da outra.
Possibilidade geral e abstrata da crjse sígnífica apenas a [onna mais
abstrata da crise, sem conteúdo, sem o impu1so pertinente a esse conteú-
do. Compra ·e venda podem separar-se. Constituem portanto crise em es-
tado potencial e sua coincidência contínua sempre a ser, para a mercado-
cia, elemento critico. Mas uma pode converter-se na outra com fluidez.
Assim, a forma mais abstrata da crise (e poc isso a possibilidade formal
da críse) é a metamorfose da própria mercadoria, a qual, como movimen-
-to desenvolvído, contém a contradição - encerrada na tJnidade da mer-
cadoria - entre valor de troca e valor de uso e ainda entre dinheiro e mer-
cadoria. Mas o meio por que essa possibilidade de crise se toma a crise
não se contém nessa própria forma; esta implica apenas em que existe
a forma para wna crise.
E isso é o importante quando observamos a economia burguesa.
As crises do mercado mundial têm de sec concebidas como a convergên-
cia real e o ajuste· à força de todas as contradições da economia burgue-
sa. Os diversos fatores que convergem nessas crises têm portanto de ser
destacados e descritos em toda esfera da economia burguesa, e, quanto
mais nesta nos aprofundarmos, têm de ser detectadas novas característi-
cas desse conflito, e ainda é mister demonstrar que as formas mais abs-
tratas dele são interativas e se contêm nas mais concretas.
Podemos portanto dizer: em sua primeira forma, a crise é a metamor-
fose da própria mercadoria, a dissociação da compra e venda.
Em sua segunda forma, a crise é a função do dinheiro como meio
de pagallÍento, e então o dinheiro figura em duas fases diferentes, sepa-
radas no tempo, em dois papéis diversos. As duas formas ainda são de
todo abstratas, embora a segunda seja mais concreta que a primeira.
Assim, ao observarmos o -processo de reprodução do capital (o qual
coincide com a circulação dele) cabe, antes de mais nada, demonstrar

945
que aquelas formas apenas se repetem ou antes só aí adquirem um con·
teúdo, um fundamento que Thes permite se manifestarem.
Observemos o movimento que o capital leva a cabo, a partir do
momento em que deixa o processo de produção como mercadoria, -para
voltar a surgir dele como mercadoria. Se omitimos agora todas as caracte-
rísticas do conteúdo, o capital-mercadoria todo e toda mercadoria ísola·
da em que ele se configura tem de passar pelo processo M - D - M, a me-
tarnorfose da mercadoria. A possibilidade geral de crise encerrada nessa
forma - a diSsociação da compra e venda - está portanto contida tam-
bém no movimento do capital, desde que este seja também mercadoria
e apenas mercadoria. Da conexão entre as metamorfoses das mercado-
rias resulta além disso que uma mercadoria se converte em dinheiro por·
que outra se reconverteu da fonna dinheiro em mercadoria. Assim, a dis-
sociação da compra e venda aparece aí de modo que à conversão de um
capital, da forma mercadoria para a forma dinheiro, tem de.corresponder
a reconversão de outro capital, da forma dinheiro para a fonll.a mercado-
ria; a primeira metamorfose de um capital tem de corresponder à segun·
da do outro, e a saída de um capital do proce5$0 de produção, à volta
do outro a esse processo. A circunstância de se encadearem e se entrela·
çarern os processos de reprodução- ou circulação de diferentes capitais,
embora casual, é uma imposição da divisão de trabalho, e assim já se. am·
plia a definição do conteúdo da crise.
Mas, segundo, no tocante à possibilidade de crise oriunda da for-
ma de dinheiro como meio de pagamento, o capital já se revela funda-
mento muito mais real para a efetivação dessa possibilidade. Por exem·
pio, o fabricante de tecido tem de pagar a totalidade do capital constan-
te cujos elementos são fornecidos pelo empresário da fiação, pelo plan-
tador de linho, pelo fabricante de máquinas, pelo produtor de ferro e de
madeira, pelo minerador de carvão etc. Estes, enquanto produzirem ca-
pital constante que só entra na produção do capital constante sem en·
trar na mercadoria final, o tecido, repõem reciprocamente suas condi·
ções de produção por meio da troca de capital. Ac:lmitamos, então, que
o fabricante de tecido vende seu produto pela quantia de 1 000 libras
ao comerciante, sacando sobre este uma letra de cârilbio, de modo que
o dinheiro assume a flgura de meio de pagamento. O fabricante por sua
vez negocia a letra com o banqueiro, seja lhe pagando uma dívída ou des-
contando a letra. Com o saque de uma letra de câmbio, o cultivador de
linho vendeu ao fabricante de fio; o fabricante de fio, ao de tecido; o
fabricante de máquinas, ao de tecido; o fabricante de ferro e o madei-

946
reiro, ao fabricante de máquinas; o minerador de carvão, ao fabricante
de fio, ao de tecido, ao de máquinas, ao de ferro e ao madeireiro. Além
disso, os produtores de ferro, carvão, madeira e o plantador de linho se
pagaram reciprocamente com letras de câmbio. Se o comerciante não
pagar, o fabricante de tecido não poderá pagar sua letra de câmbio ao
banqueiro.
O plantador de linho sacou sobre o fabricant~ de fio; o fabrican-
te de máquinas, sobre o de tecido e o de fio. O dê fio ·não pode pagar
porque o de tecido não pode pagai; ambos não pagam ao fabricante de
máquinas, e este não paga ao fabricante de ferro, ao madeireiro e ao mi·
nerador de carvão. E por sua vez todos eles, que não realizam o valor de
sua mercadoria, não podem substituir a parte que repõe o capital cons·
tante. Surge assim crise geral. Isso nada mais é que o desenvolvimento
da possibilidade da crise no caso do dinheiro como meio de pagamento,
mas aí já vemos, na produção capitalista, uma conexão entre os crédi-
tos e obrigações recíprocas, entre as compras e vendas, quando a possi-
bilidade pode converter-se em realidade.
Seja como for, não existe crise se compra e venda não se mantêm
em oposição mútua, não tendo por isso de se ajustar à força, e se o di-
nheiro exerce a função de meio de pagamento de modo que os créditos
se liquidam, isto é, não se realiza a contradição existente no dinheiro co-
mo meio de pagamento; se essas duas formas abstratas da crise, portan-
to, não se patenteiam na realidade. Não pode haver crise sem compra e
venda se desvincularem e entrarem em conflito, sem aparecerem as con-
tradições contidas no dinheiro como meío de pagamento, isto é, sem a
crise se patentear ao mesmo tempo na forma simples - na contradição
entre compra e venda,. na contradição do dinheiro como meio de paga-
mento. Mas temos aí meras formas - possibilidades gerais das crises, por
isso também formas, formas abstratas da crise real. Nelas aparece a existência
da crise em suas formas mais simples e em seu conteúdo mais simples, até
onde a própria. forma é seu conteúdo mais simples. Mas ainda não é con-
teúdo com funilamento concretizado. A circulação simples do dinheiro
e mesmo a circulação do dinheiro como meio de pagamento - e ambas
já existiam muito antes da produção capitalista sem terem sucedido cri-
ses - podem realizar-se e se realizam sem crises. Assim, essas formas sozi-
nhas não podem explicar por que desvelam sua face crítica, por que a
contradição potencial nelas contida se patenteia contradição em ato.
Vê-se por aí a enorme sandice dos economistas que, depois de não
terem conseguido escamotear o fenômeno da superprodução e da crise,

947
se contentam ,em dizer que se encerra naquelas formas a possibilidade de
sobrevirem crise9; que, por conseguinte, é casuàl não ocorrerem elas, e as-
sim sua própria ocorrência se evidencia mera casualidade.
As contradições na circulação de mercadorias, ainda desenvolvidas
na circulação de dinheiro - e em conseqüência as possibilidades de cri·
se - reproduzem-se por si mesmas no capital, pois na realidade, só na ba-
se do capital, ocorre circulação desenvolvida de mercadoria e de dinheiro.
Mas agora trata-se apenas de acompanhar o desenvolvimento ulterior
da crise potencial - a crise real só pode configurar-se a partir do movi·
mento real da produção capitalista, da concorrência e do crédito - en-
quanto provém das determinações de forma próprias do capital, as quais
lhe são peculiul'es e não se encerram em sua mera existência de mercado-
ria e de dinheiro.
Em si, o simples processo de produção (imediato) do capital nada
de novo pode acrescentar af. Para existir pura e simplesmente, supõem-se
as condições. Por isso, na primeira seção sobre o capital - sobre o proces-
so de produção imediato - não sobrevém novo elemento de crise. Consi-
derado em si, está contido no processo de produção, porque este se apro-
pria de mais-valia e por isso a produz. Mas este fato não pode evidenciar-
se no próprio processo de produção, pois neste não cabe a realização do
valor reproduzido nem da mais-valia.
Essa realização só pode aparecer no processo de circula'ção, que em
si é ao mesmo tempo processo de reprodução.
Importa aí observar ainda que temos de descrever o prncess9 de cir·
culação ou o processo de reprodução, antes de descrever o,capital pronto
e acabado - capital e lucro -, uma vez que temos de explicar como o
capital produz e, ademais, como é produzido. O moviménto real, porém,
parte do capital existente; o movimento real é o que se faz na base da pro-
dução capitalista desenvolvida, que parte de si mesma e pressupõe a si
mesma. O processo de reprodução e as subseqüentes propensões à crise
nele desenvolvidas terão aqui descrição incompleta e necessitam de tra-
tamento complementar no capítulo "Ozpital e lucro'~ 166
O processo gJobal de circulação ou o processo global de reprodu-
ção do capital é a unidade de sua fase de produção e de sua fase de cir-
culação, um processo que abrange dois processos como fases suas. Aí
reside nova possibilidade desenvolvida ou forma abstrata da crise. Po_r
isso, os econonústas que negam a crise insistem na unidade dessas duas

166. Marx refere-se à parte de suas pesquisas que culiminou na elabo;ração do livro
3 de O Capital.

948
,, fases. Se elas, sem serem uma unidade, fossem apenas separadas, seria
impossível justamente uma restauração violenta de sua unidade, ou seja,
uma crise. Se fossem apenas uma unidade, sem estarem separadas, não
haveria a eventualidade de as dissociar à força, o que também é crise. Esta
é a restauração violenta da unidade entre elementos guindados à indepen-
dência e a afinnação violenta de independência de elementos que na es-
sência formam uma unidade.

11. Das formas da crise.


Juntar à p. 716 167 •
Em conseqüência:
1. A possibilidade geral das crises se estabelece no próprio proces-
so de metamorfose do capital e de dois modos: no tocante ao dinheiro
na função de meio de circulação, compra e venda podem dissociar-se; no
tocante ao dinheiro na função de meio de pagamento, em dois papéis
distintos, o de medida dos valores e o de realização do va'for, esses dois
papéis podem romper a conjunção que os liga. Se o valor tiver mudado
no interva'fo, a mercadoria no momento de sua venda não valerá o que
valia no momento em que o dinheiro serviu de medida dos valores e por-
tanto das obrigações recíprocas, e a obrigação não pode ser preenchida
com o produto da venda da mercadoria nem se saldar assim toda a série
das transações que retroativamente dependem dessa única operação. Se
não se puder vender a mercadoria ao menos num determinado período,
embora seu "Valor não tenha "Variado, o dinheito não poderá funcionar
como meio .de pagament_o, uma vez que tem de servir como tal em pra~o
detenninado, -pressuposto. Uma vez que af a mesma soma de dinheiro
funciona para uma série de transações e operações recíprocas, há insol-
vência não só num ponto, mas em muitos. Daí a crise.
Estas são as possibilidades formais da crise. A primeira é possível
sem a ültima - isto é, crises são possíveis sem crédito, sem o dinheiro
funcionar como meio de pagamento. Mas a segunda não é pos.sível sem
a primeira, isto é, sem compra e venda se desconjuntarem. Mas no últi-
mo caso dá-se a crise porque ·a mercadoria é invendável e ainda porque
não é vendável em determinado espaço de tempo; a crise resulta, e deri-
va seu caráter, da impossibilidade de se vender a mercadoria e também

167. Págína do manuscrito.

949
da não realízação de toda uma série de pagamentos que se apóiam na ven-
da dessa determinada mercadoria nesse prazo determinado. Esta é a for:-
ma especifica das crises monetdrias.
Assim, a crise, se sobrevém porque compra e venda se desconjun-
tam, desenvolve.se como crise monetária, desde que o dinheiro se tenha
desenvolvido como mei.o de pagamento, e essa segunda forma das crises
fica em evidência logo que surge a primeira. Por isso, na pesquisa da ra-
zão por que a possibilidade geral da crise se torna realidade, na pesquisa
das condições da crise é mera superfluidade tratar da forma das crises
oriundas do desenvolvimento do dinheiro como meio de pagamento. Jus-
tamente por esse motivo gostam os economistas de apresentar essa fonna
evidente como causa da crise. (No que o desenvolvimento do dinheiro
como meio de pagamento se relaciona com o desenvolvimento do crédi-
to e c.'.e suas hipertrofias, é mister sem dúvida estudar as causas deste, o
que não cabe aqui.)
2. Desde que as crises decorram de variações de preço e de revolu-
ções de preço que não coincidam com as variaç5es de valbr das mercado...
rias, não é possível explicá-las na análise do capital em geral, pois nesta
valbres e preços das mercadorias se ,pressupõem idênticas.
3. A possibilidade geral das crises é a metamorfose formal do pró-
prio capital, a dissociação da compra e venda no tempo e no' espaço. Mas
esse processo nunca é a causa da crise, pois é apenas a fonna mais geral
da crise, isto é, a própria críse em sua expressão mais geral Não se pode
dizer que a forma abstrata da crise é a causa da crise. Quem pergunta por
sua causa, quer saber precisamente por que sua forma abstrata, a forma
de sua possibilidade, passa da possibilidade para a realidade.
4. As condiç6es gerais da crise, contanto que independentes das
flutuações de preços (estejam estas ligadas ou não ao sistema de crédi·
to) distintas das flutuações de valor - têm de ser explicáveis a partir
das condições gerais da produção capitalista.
(Pode surgir crise: (1) na reconversão em ai.pital produtivo; (2) em
virtude de variações no valbr dos elementos do capital produtivo, em par-
ticular das matérias-primas, por exemplo, quando se reduz o volume da
colheita de algodão. Em conseqüência, sobe seu valor. Aqui não nos ca-
be ainda tratar de preços e sim de valbres).
Primeira fase. Reconversão de dinheiro em capital. Supõe-se deter-
minado nível da produção ou reprodução. Aqui se pode considerar o ca·
pital fixo dado, invariável, sem entrar no processo de formação do valor.
Uma vez que a reprodução da matéria-prima não depende apenas do tra-

950
balho nela empregado, mas também da produtividade ligada às condições
naturais, pode cair o próprio volume, o volume do produto da mesma
quantidade de trabalho (em virtude de estações ruins). Sobe assim o valor
e cai o volume da matéria-prima ou se alteram as proporções em que o di·
nheiro terá de se converter nos divmos componentes do capital, para
continuar a produção na escala anterior. Ter-se-á de gastar mais em maté-
ria-prima, fica menos para tra/Jallw e não é possível absorver a mesma
massa anterior de trabalho. Primeiro, é Fisicamente impossfvel, por causa
da escassez de matéria-prima. Segundo, porque parte maior do valor do
produto tem de se transformar em matéria-prima, e portanto fica menos
para se converter em capital varidvel. Não se pode repetir a reprodução na
mesma escala. Parte do capital fixo °fica inativa, parte dos trabalhadores
é despedida. Cai .a taxa de tubo, porque o valor .do capital constante su-
biu em relação ao do variável e se emprega menos capital variável. As de·
duções fixas - juro e renda fundiária - de antemão fixadas para taxa
de lucro e exploração do trabalho invariáveis, permanecem as mesmas e
em parte não podem ser pagas. Daí a crise. Crise de trabalho e crise de
eapitaL Eis aí portanto transtorno do processo de reprodução por eleva·
ção do ·valor de parte do capital constante a ser reposta por segmento
do valor do produto. Além disso, o produto encarece, embora caia a taxa
de lucro. Se esse produto entra como meio de produção em outros ra·
mos, esse encarecimento causa o mesmo transtorno na reprodução deles.
Se entra como meio de subsistência no consumo geral, entrará também,
ou não, no consumo do tra/Jalhador. No _primeiro caso, os efeítos corres-
pondem a transtorno do capital wzriável do que se falará mais tarde. Mas,
desde que entre no consumo geral, pode em conseqüência (se não cair
seu consumo) dinúnuír a proCUTa de outros produtos; daí ficar inibida,
para est.es a reronverilío em dinheiro pelo valor que lhes corresponde, e
assim estorvar-se a outra face de sua reprodução, não a reconversão de
dinheiro em capital produtivo e sim a reconversão de mercadoria em di-
nheiro. Em todo caso caem o montante de lucro e o montante de salário
naquele ramo e em conseqüência pane das rendas necessárias para haver
a venda de mercadorias de outros ramos de produção.
Mas essa falta de matéria-prima pode surgir também sem haver in-
fluência das estações ou da produtMdade natural do trabalho que forne-
ce a matéria-prima. E que, se se despender parte excessiva da mais-valia,
do capital excedente em maquinaria etc. desse ramo, as matérias-primas,
embora bastem para a escala anterior de produção, serão ínsuficientes pa·
ra a nova. Isso decorre de o capital excedente se transformar, de maneira

951
desproporcionada, em seus elementos diversos. g um caso de superprodu-
çiio de azpital fv:o e gera os mesmos fenômenos do primeiro caso. (Ver
página anterior.) 16&
Ou as crises são a _conseqüência de superprodução de capital foco
e daí produção relativa inferior de capital circulante.
Uma vez que o capital fn:o, coino o circulante, consiste em merca·
donas, nada mais ridículo que admitirem a superprodução de capital frxo,
os mesmos economistas que negam a superprodução de mercadorias.
5. Crises decorrentes de perturbações da fase inicial da reprodução.
isto é, estorvo na conversão das mercadorias em dinheiro ou interrupção
da venda. Quantp às crises da primeira espécie, 169 a crise resulta de inter·
rupções no refluxo dos elementos do capital produtivo.

12. Contradições entre produção e consumo nas


condições do capitalismo. A superprodução dos
artigos principais de consumo converte-se na
superprodução geral.

Antes de tratar das novas formas de crise, 170 recapituh~remos Ricar-


do e voltaremos ao exemplo acima.
Enquanto o fabricante de tecido (motim) reproduz· e acumula, seus
trabalhadores compram parte de seu produto, nele despe11dem parte de
seu salário. Já que ele produz, têm os trabalhadores meios, ,de comprar
168, Depois deste parágrafo começa a página 86là do caderno XIV do manuscri-
to, e dela está arrancado o canto superio1 esquerdo, Po1 ísso/ das primeiras nove li·
nhas da texto só restaram partes do Lado direito de seis linhas, e desse modo não é
ponível restaurar o text-O pru: completo, mas sim supo.r que Mar" fala aí de crises
decon:entes "de revolução no valor do capital variável". O "encarecimento dos mews
de subsistênda neceislirios'', provocado po1 má colheita por exemplo, acaneta alta
dos gastos para os trabalhadores que "são postos em movimento pelo capital variá-
vel", "Ao mesmo tempo essa alta" leva a que decresça a procura de "todas as outras
mercadoriJU, de todas as mercadorias que não entram no consumo" dos trabalhado·
1es. Assím, é impossível "vendê.lils pelo \'11101; a ptimeitafaJe de sua reprodução" trans·
torna-se, isto é, a conversão da meccadorla em dinheiro, Em conseqüência, o encareci·
mento dos meios de subsistência ocasiona a "crise em outros ramos" de pxodução.
As du$8 últimas linhas do canto danificado da página parecem resumir as refie·
xões precedentes: as crises podem resultar do encat:ecimento das matérias-primas,
"entrem essas matérias-primas eomo material no capital constante ou como meios
de subsistência" no oonsumo dos trabalhadores.
169. As oriundas do encarecimento das matérias-primas.
170. As breves observações de :Marx sobre as formas da crise estio no caderno XIII
(p. 770a do manuscrito) e caderno XIV (pp. 947-950). Essas observações foram
encaixadas na seção precedente deste capítulo, pp. 949-952, conforme a indicação
de Man.: "Juntar à p. 716" do manuscrito, o que está mencionado neste volume, p. 949.

952
porção do produto do fabricante, dão·Ihe em parte os meios de vendê-lo.
O trabalhador só pode comprar - constituir procura - quando se trata de
mercadorias que entram no consumo individual; é que não é ele mesmo
quem explora seu trabalho, e assim não possui as condições de efetuá-lo -
os meios e os materiais de trabalho. Isso já bloqueia portanto a maior par-
te dos produtores (os próprios trabalhadores, onde se implanta a produ-
ção capitalista), na função de consumidores, de compradores: não adquí·
rem eles matérias-primas nem meios de trabalho; compram apenas meios
de subsistência {mercadorias que entram de imediato no consumo indivi·
dual). Por ísso, nada mais ridículo que falar de identidade entre produto-
res e consumidores, uma vez que, para grande número de ramos - para
todos os que não fornecem artigos de consumo imediato - os que parti·
cipam da produção estão, em regra, absolutamente excluídos da compra
de seus próprios produtos. Nunca são de imediato consumidores ou com-
pradores dessa grande parte de seus próprios produtos, embora paguem
parte do valor deles nos artigos de consumo que compram. Aí se eviden-
cia também a ambigüidade da palavra consumidor e a falsidade de iden·
tificá-la com a palavra comprador. Industrialmente são a rigor os traba·
Ihadores que consomem a maquinaria e a ·matéria-prima, gastam-na no
processo de trabalho. Mas não a gastam para si. Por isso não são compra-
dores delas. Para eles não são valores de uso, mercadorias, e sim condi-
ções objetivas de um processo do qual eles mesmos são as condições sub-
jetivas.
Pode-se, porém, dizer que seu empregador os representa no ato
de comprar meios e materiais de trabalho. Contudo, no mercado, repre·
senta-os em condições diferentes daquelas em que se representariam a si
mesmos. Tem de vend~r um volume de mercadorias que configura a mais·
valia, trabalho não pago. Os trabalhadores só teriam de vender volwne
de mercadorias que reproduzisse o valor adiantado à produção - o valor
dos meios de trabalho, do material de trabalho e do salário. Por isso, o
empregador precísa de mn mercado maior que o admissível para eles.
Além disso, depende dele - e não deles - avaliar se as condições de mer-
cado são bastante favoráveis para começar a reprodução.
Assím, mesmo quando não se estorva o processo de reprodução,
são eles produtores sem ser consumidores de todos os artigos que não
têm de ser objeto de consumo individual e sim industrial.
Para negar as crises, nada portanto mais absurdo que afirmar que
consumidores (compradores) e produtores (vendedores) são idênticos
na produção capitalista. Estão por completo separados. Só no decurso

953
do processo de reprodução pode patentear-se essa identidade no tocan-
te a um entre 3 000 produtores, isto é, no tocante ao capitalista. Ao re-
vés. Também é falso afirmar que os consumídores são produtores. O do~
no da terra (a renda fundiária) não produz, contudo consome. O mes-
mo se dá com todos os intermediários financeiros.
A importância das frases apologéticas destinadas a negar a crise
reside apenas em provarem sempre o contrário do que pretendem. Para
negar a crise, afirmam unidade onde existe oposição e contradição. Por
conseguinte, sua importância, como se pode dizer, está somente em pro-
varem que, se na realidade não existissem as contradições que suprimem
na imaginação, também nffo existiria. crise. Mas, de fato, existe a crise
porque existem aquelas contradições._ Toda razão que apresentam eontra
a crise é uma contradição esconjurada, portanto, uma contradição real,
uma razão da crise. O desígnio de exorcizar contradições é ao mesmo tem-
po a expressão de contradições realmente existentes, que de acordo com
esse piedoso desejo nlio devem existir.
O que os trabalhadores, com efeito, produzem é mais-valia. E-lhes
licito consumir enquanto produzem mais-valia. Ao cessar de produzi-la,
cessa seu consumo por cessar sua produção. Mas. de modo algum têm di-
reito de consumir por produz.ir equivalente a seu consumo. Ao contrá-
rio, logo que produzem apenas esse equivalente, cessa .seu rorisumo, não
têm equivalente para consumir. Já se suspende ou se reduz seu trabalho,
já se rebaixa seu salário, seja como for. Neste caso - se a escala de pro-
dução permanece a mesma - não consomem equivalente a·sua.produção.
Mas então lhe faltam os meios não por não produzir o sufiCiente e sim
por receber demasiado pouco de seu produto. ,
Se portanto se reduz a relação apenas àque]a entre consumidores e
produtores, esquece-se que o assalariado que produz e o capitalista que
produz se distinguem por serem duas espécies bem distintas de produto-
res, e estamot excluindo os consunúdores que nada absolutamente produ-
zem. De novo se nega a oposição, abstraindo-se de uma contradição real-
mente existente na produção. A mera relação entre assalariado e capita-
lista compreende:
(1) que a maioria .dos produtores (os trabalhadores) não são consu-
midores (compradores) de parte bem grande de seu produto, a saber, os
meios de trabalho em. materiais de tntbalho;
(2) que a maioria dos produtores, os trabalhadores, só podem con-
sumir equivalente a seu produto enquanto produzam mais que esse equi-
valente - o valor excedente ou o produto excedente. Têm de ser sempre

954
produtores excedentes, de produzir acima de suas necessidades, para po-
derem ser consumidores ou compradores dentro dos limites delas.
Para essa classe de produtores, portanto, a unidade entre produ·
ção e consumo se revela falsa logo à primeira vista.
Diz Ricardo que o único limíte da procura é a própria produção,
e esta é limitada pelo capita1;111 na realidade isso significa que, retiradas
as falsas suposições, a produção capitalista encontra, sua medida apenas
no capital; mas neste se inclui também a força de trabalho (por ele com-
prada), incorporada ao capital como uma de suas condiçães de produção.
O que se quer justamente saber é se o capítal como tal é também o limi-
te do eonsumo. Em todo caso, ele o é negativamente, quer dizer, não
se pode consumir mais do que se produz. Mas a questão é se ele o é posi-
tivamente, se se pode e se tem de eonsumir tanto quanto se produz, na
base da produção capitalista. A frase de Ricardo, submetida a uma aná-
lise correta, diz justamente o contrário do que subentende, ou seja, que
a produção não se efetua levando em conta os limites existentes do con·
sumo, mas que só o próprio capital a limita. E isso é por certo caracte-
rístico desse modo de produção.
De acordo com o pressuposto, portanto, cottons (tecidos de algo-
dão) abarrotam o mercado, de modo que são em parte ou de todo inven-
dáveis ou só vendáveís muito abaixo de seu preço. (Por ora pretendemos
dizer valor, uma vez que no exame da circulação ou do processo de repro-
dução estamos ainda ocupados com o valor, sem nos envolver até agora
com o preço de custo e menos ainda com o preço de mercado.)
Na análise toda fica, aliás, evidente: é inegãvel que em ramos isola·
dos se pode produzir: a mais e por isso de menos em outros; crises par-
ciais, por ronseguinte, podem surgir de produção desproporcionada ( con-
tudo, a produção proporcionada resulta sempre da produção despropor·
cionada na base da concorrência), e uma forma geral dessa produção des-
proporcionada pode ser superprodução de capital fixo ou superprodução
de capital circulante.• Para as mercadorias se venderem por seu valor, a
condiçã'o é conterem apenas o tempo de trabalho socialmente necessário,
e do mesmo modo, para um ramo inteiro de produção do capital, a con-
dição é aplicar-se nesse ramo particular apenas a parte necessária da tota-
lidade do trabalho da sociedade, somente o tempo de trabalho exigido

171. Ver neste volume pp. 929, 930, 932 e 933.


• (Quando foram inventadas as rríáquínas de fiar, ocorreu superprodução de
fio em relação a teddos. Cessou essa desproporção logo que se introduziram teares
mecânicos na tecelagem.) {Marx.)

955
para satisfazér a necessidade social (procura),' Se se aplicar mais, mesmo
que cada mercadoria isolada encerre apenas o tempo de trabalho social-.
mente necessário, o conjunto conterá mais que o tempo de traballio so-
cialmente necessário; da mesma maneira, a mercadoria isolada tem valor
de uso, mas o conjunto das mercadorias, segundo os pressupostos estabe-
lecidos, perde parte de seu valor de uso.
Todavia, não falamos aquí da crise quando é conseqüência da pro-
dução desproporcionada, isto é, da desproporção na repartição do tra-
balho social pelos diversos ramos de produção. Só cabe falar dessa ma·
téría ao se tratar da concorrência entre os capitais. Já se· disse que alta
ou baixa do valor de mercado em virtude dessa despropórçâo tem por
conseqüência retírar-se capital de um ramo e transferir-se para outro, mi-
grar capital de um ramo para outro. 172 Contudo, esse nivelamento já su-
põe como precondição o contrário de si mesmo e pode incluir portanto
crise, e a própria crise pode ser formada da nivelação. Ricardo e outro~
admitem essa espécie de crise.
Ao tratar do processo de produção vimos 173 que todo o afã da pro-
dução capitalista visa apoderar-se da maior quantidade possível de traba·
lho excedente, de materializar po:c;tanto a maior quantidade possível de
tempo de trabalho imediato com dado capital, seja por meio do prolon-
gamento da jornada de trabalho ou da redução do tempo de trabalho ne·
cessário mediante o desenvolvimento da produtividade do· trabalho, com
o emprego da cooperação, da divisão do trabalho, da maquinaria etc'.; em
suma, produzir em grande escala, produzír em massa, portantó. Assim,
está na natureza da produção capitalista produzir sem atender aos limi-
tes do mercado.
No estudo da reprodução supomos, de início, que o método de pro--
dução permanece invariável, e assim permanece durante certo tempo com
acréscimo da produção. O volume das mercadorias produzidas aumenta
aí por se aplicar mais capital e não por se tornar este mais produtivo. Mas
o mero acréscimo quantitativo do capital redunda ao mesmo tempo em
aumento de sua produtividade. Quando esse acréscimo quantitativo é
conseqüência do desenvolvimento da produtividade, esta, ao revés, de no-
vo se desenvolve se se stipõe base capitalista mais larga, ampliada. Aí su·
cede interação. Por isso, a reprodução em base mais ampla, a acumulação,

172. Ver neste volume, pp. 637-641.


173. Marx alude aos cadernos I-V do manuscrito de 1861/63, sobretudo às seções
neles contídas sobre a produção da mais-valia ab$oluta e a da mais-valia relativa.

956
se na origem se configura apenas em ampliação quantitativa da produ-
ção - utilizando-se mais capital nas mesmas condições de produção-, sem-
pre se patenteia, em certo ponto, qualitativamente corno produtividade
maior das condições em que se dá a reprodução. Daí acréscimo do volu-
me de produtos além da proporção simples em que aumentou o capítal
na reprodução ampliada, na acumulação.
Voltemos ao nosso exemplo dos tecidos (morlm).
A paralisação do mercado congestionado de tecidos estorva a re-
produção do fabricante de tecidos. Essa perturbação atinge, antes de mais
nada seus trabalhadores. Esses então passam a ser consumidores em pro-
porção menor, ou até o deixam de ser; dessa mercadoria - tecidos - e de
outras mercadorias que entravam em seu consumo. Sem dúvida necessitam
de tecidos, mas não os podem comprar porque não dispõem dos meios;
estes lhes faltam porque não podem continuar a produzir, e não podem
continuar a produzir porque se produziu demais, porque tecidos de algo-
dão em excesso congestionam o mercado. De nada lhes pode adiantar
o conselho de Ricardo "de aumentar a produção" ou "de produzir outra
coisa". Representam agora parte da superpopulação transitória, da super·
produção de trabalhadores, no caso produtores de tecidos de algodão,
pois há superprodução desses tecidos no mercado.
Mas, além dos trabalhadores diretamente ocupados pelo capital in·
vestido na tecelagem de algodão, essa paralisia na reprodução dos tecidos
de algodão atinge muitos outros produtores. Os de fios, os comerciantes
de algodão (ou plantadores de algodão). construtores de máquinas (produ-
tores de fusos e teares etc.), produtores de ferro, de carvão etc. Todos
eles também teriam a reprodução estorvada, urna vez que a reprodução
dos tecidos de algodão -é condição de sua própria reprodução. Isso ocor-
reria mesmo que não tivessem produzido demais, ou seja, além da me·
dida que a indústria têxtil algodoeira exigia e justificava na prosperida-
'de. Todos esses ramos estorvados têm em comum a circunstância de con-
sumirem sua renda (salário e lucro, este desde que consumido como ren-
da e não acumulado) não nos próprios produtos, mas sim nos produtos
das esferas que produzem artigos de consumo, entre os quais figuram
tecidos de algodão. Assim caem o consumo e a procura desses tecidos,
justamente por haver quantidade exces.siva deles no mercado. E também
a procura de todas as outras mercadorias em que, corno artigos de con-
sumo, se gasta a renda daqueles produtores indiretos de tecidos de algo.
dão. Limitam-se, contraem-se seus meíos de comprar tecidos de algodão
e outros artigos de consumo, por haver demasiada abundância deles no

957
mercado. Isso ainda se estende às outras mercadorias (artigos de consu-
mo). Surge agora de súbito superprodução relativa delas por se terem
contraído os meios de coi:nprá-las e em conseqüência sua procura; Mes-
mo que nessas esferas não se produzisse demais, há nelas agora superpro-
dução.
Se a superprodução ocorreu não só em tecidos de algodão, mas tam-
bém em linhos, sedas e artigos de lã, compreende-se como a supeiprodu-
ção desses poucos artigos indutores gera maior ou menor superprodução
(relativa} geral no mercado todo. De um lado, superabundância de todas
as condições de reprodução e de todas as espécies de mercadorias enca-
lhadas no mercado. Do outro, capitalistas insolventes e massas de traba-
lhadores desprovidos de tudo, na indigência.
Essa :ugumentação, contudo, desenvolve-se em duas direções. Se é
fácil entender que a superprodução em alguns artigos de consumo indu-
tores tem de acarretar o fenômeno da superprodução mais ou menos ge-
ral, nem por isso se entende como pode ocorrer a superprodução nesses
artigos. Pois o fenômeno da superprodução geral decorre da dependên-
cia não só dos traba1hadores diretamente ocupados nessas indústrias, mas
também de todos os ramos industriais que produzem para os produtos
delas os elementos requeridos, o capital constante nos diver:s_os estádios.
Para esses últimos ramos, a superprodução ê efeito. Mas,. donde provém
ela no caso daqueles ramos industria.is? Pois os últimos CÓntinuam a pro-
duzir quando os primeiros prosseguem produzindo, e com essa ,continui-
dade parece assegurado um crescimento geral da renda e, em eonseqüên·
eia, o de seu próprio consumo.

13. Atraso do mercado em relação à produção crescente.


Concepção Ricardiana da procura ilimitada e do
emprego ilimitado do capital.

Se se responder que a produção em acréscimo contínuo (amplia-se


todo ano por duas razões: primeiro porque o capital empregado na pro·
dução está sempre awnentando; segundo porque se toro.a ele cada vez
mais produtívo; durante a reprodução e a acumulação somam-se de con-
tínuo pequenos melhoramentos, que acabam mudando toda a escala de
produção. Acumulam-se os melhoramentos, há um desenvolvimento cumu-
lativo das forças produtivas) necessita de um mercado em ampliação oons-

958
tante, e que a produção cresce com mais rapidez que o mercado, ter.se-á
apenas expressado de outra maneira o fenômeno a explicar, isto é, em sua
configuração real e não em sua forma abstrata. O mercado expande-se
ma.is lentamente que a produção, ou no ciclo _que o capital percorre du-
rante sua reprodução - um ciclo em que não se reproduz simplesmente
e sim em escala ampliada, não descreve um círculo e sim urna espiral-,
surge um momento em que o mercado se revela estreito demais para a
produção. Isto se dá no fim do ciclo. Significa apenas; o mercado está
congestionado. Patenteia-se a superprodução. Se a expansão do mercado
tivesse seguido o mesmo ritmo da produção, não haveria nele superabun-
dância, superprodução.
Todavia, basta admitir-se que o mercado tem de acrescer com a
produção, para, em contrapartida, admitir-se mais- uma vez a possibilida-
de de superprodução, pois o mercado tem um espaço geograficamente
definido, o mercado interno evidencia seus limites em confronto com o
mercado que, além de interno, é externo, e este, por sua vez, patenteia-
se limitado em confronto com o mercado mundial, por si mesmo capaz
de expandir-se, mas, por sua vez, limitado a cada momento. Admitir por-
tanto que o mercado tem de se ampliar para não ocorrer superprodução,
é admitir também que ela pode suceder, pois é então possível - uma vez
que mercado e produção são dois fatores com autonomia recíproca - que
a expansão de um rião corresponda à do outro, que os limites do merca-
do não se dilatem com rapidez bastante para a produção, ou que esta pos-
sa com rapidez ultrapassar novos mercados, novas expansões do merca-
do, e assim o mercado acrescído se revela por igual uma barreira como
antes o mais estreito.
Por isso, Ricardo, coerente, nega a necessidade de uma ampliação
do mercado junto com ampliação da produção e crescimento do capital.
O capital todo disponível num país pode também aplicar-se com vanta-
gem nesse país. Por isso, polemiza contra A. Smith, que, se sustentou
seu ponto de vista (de Ricardo), ao mesmo tempo o contestou com seu
costumeiro instinto racional. Smith ainda não conhece o fenômeno da
superprodução, das crises dela oriundas. O que conhecia eram meras cri-
ses de crédito e de dínheiro, que espontaneamente aparecem oom o sistema
de crédito e bancário. Na realidade vê na acumulação do capital acrésci-
mo absoluto da riqueza geral e do bem-estar da nação. Ademais, na mera
expansão do mercado interno dirigida para o mercado externo, o colonial
e o mundial, vê prova de urna superprodução por assim dizer relativa (po-
tencial) (lo mercado interno. Vale a pena transcrever a contestação que lhe
faz Ricardo:

9S9
"Se comerciantes empiegam seus capitais em comércio exterior ou em
nansporte marítimo internacional, sempre o fazem por livre escolha e
nunca por nece.s.sldade. Fazem-no porque nesses ramos seu lucro setá
algo maior que nos negócios internos, Adam Smith observou com acer-
to 'que o desejo de alimentos é limitado em todo ser humano pela pe-
quena capacidade do es_tômago"'

(A. Smith aí comete o grave equívoco de excluir os artigos de luxo


de agricultura),

" 'mas o desejo de comodidades e ornamentos do$ edifícios, de vestuá-


rio, carruagens e móveis parece não ter run
nem limite determinado'.
A natureza portanto" (piossegue Ricardo) "limitou ·necessariamente o
montante de capital que a qualquer tempo pode ser empregado com lu-
cro na agricul.tura,"

[E por isso que há povos que exportam produtos agrícolas? Como se,
a despeito da natureza, não se possa empregar na agricultura capital de to-
da espécie, para se produzir na Inglaterra, por exemplo, melões, figos, uvas
etc., flores etc., aves e caça etc. E como se as matérias-primas da indústria
não fossem produzidas por capital agrícola1 (Ver, por exemplo, o capital
que os romanos empregavam apenas em piscicultura)],

"ma& ela não ertabeleceu limites" (como se a natureza tivesse algo a


ver com a coisa) 'l20 montante do capital que podé ser empregado pa-
ra a obtenção 'de comodidades e ornamentos' da vida. Obtet essas frui-
ções na maior abundância é o objetivo em mira, e as pessoas só porque
o comércio exterior ou o transporte marítÚno intemacionâi o alcançam
melhor. neles se empenham, de preferência a produzir no país as mer-
cadorias requeridas ou sucedâneos delas. Contudo, se ciicunstâncias
peculiares nos impedirem de empenhu capital em comê.reio exterior
ou em transporte maritimo internacional, convém empregá-lo no país,
embora com menor ~antagem. E enquanto não há limite ao desejo
'de comodidades e ornamentos dos edifícios, de vestuários, de carrua·
gens e de móveis', não pode haver limite para o capital que se pode em·
pregar paro obtê-los. exceto aquele que reduz nossa capacidade de man-
ter o:r trabalhadores destinados a produ:l..fM.
Adam Smith, entretanto, fala do transporte marítimo internaciona:
como se não fosse exercido por livre escolha. mas por necessidade; co-
mo se o capital nele empenhado ficasse inerte se a$Sim não fosse em-
pregado, como se o capital no comércio interno pudesse transbordar
se não ficasse restringido a determinado montante. Segundo ele, 'quan-
do o capital de um país qualquer se eleva a tal ponto que não pode ser
todo empregado para suprir o consumo e para manter o trabalho pro-
du tiflO desse determinado pais' (o próprio Ritatdo grifa essa passagem),
'a pane excedente flui natural.mente para o transporte marítimo inter-

960
nacional e se emprega noutros países par.t prestar os mesmos serviços'. ..
Mas não poderia essa parte do tlabalho produtivo da Grã-Bretanha se
aplicar na produção de outro gênero de mercadorias, para se comprar
com elas algo objeto de procura major no país? E se isso não fosse
possível, não poderíamos empregar esse trabalho produtivo, embora
com vantagem menor, p:u:a elaborar aqueles bens, objeto de procura
inte.tna, ou pelo menos sucedâneos dele.s'? Se precisássemos de veludo,
não poderíamos tentar produz.í·lo e, caso não o conseguíssemos, não
poderíamos produzir mais tecidos ou outro objeto desejável?
Produzimos meicadorias e com elas compramos outras no exterior por
recebermos quantidade maior" (a diferença qualitativa não e:idstel)
"que a que podemas produzir no país. Privem-nos desses fornecimen-
tos externos, e Jogo passaremos a fabricá-los para nós mesmos.. Mas essa
opinião de Adam Smith diverge de todas as suas doutrinas geraís sobre
a matéria. 'Se um país estiangeiio' " (Ricudo cita agora Smith) "'nos
pode ºfornecer uma mercadoria mais barato do que nós mesmos pode-
mos produz.i-la, é melhor comprá-la deles com fração do produto de
nossa própria atividade industrial, exexcida de maneira que nos dá van-
tagem. A atividade das industrías em geral do pais, por estar sempre
em proporção com o capital neliJ empregado' " (Ricardo também grifa
esta frue) - em propotçiio muito vuiável -, '"não diminuirá pot isso,
mas apenas lhe ca.beiá achar o caminho em que se pode lançar com a
mwor vantagem.'
E ainda: 'Aqueles que dispõem de mais alimentos do que podem oonsu·
mir, estão sempre prontos a trocar o excedente ou, o que dá na mesmo,
o preço dele por comodidades de outra natureza. Depois de satisfeita$
as necessidades limitadas, o que 1esta se emprega para satisfazer aque-
les deseios ínEaciáveir, de&ejos que parecem ultrapassar todos o:s limi-
tes. Para obtex alimentos, os pobres $il esforçam por satisfazer as extra·
vagâncias dos ricos, e para os conseguir de maneira mais segura compe-
tem uns com os outros na barateza e na qualidade do trabalho. O nú-
mero de ~rabalhadores sobe com a quantidade maior de alimentos ou
com o melhoramento e o cultivo crescente do solo; e como a natUJ:e.o
za de sua atividade pmnite a mais extrema subdivisão dos trabalhos,
a quantidade dos materiais que pode transformar aumenta em propor-
ção muito maior que seu número. Daí surge uma procura por toda
espécie de n.atetlaJ que o e~pírito inventivo pode tornar útil ou belo
em construções, vestuários, carruagens e móveis; pelos fósseis e mine.
111is contidos nas entranhas da terra, pelos metais nobres e pelas pedras
preciosas:
"Dessas premissas infere-se que não hd limites à procura nem barreiras
ao emprego do capital, enquanto este proporciona lucro, e que, por
mais abundante que se torne o capital, não !Já outra raüo suficiente
para a queda do lucro a não ser a alta dos salários. Ademais, pode-se
acrescentar que a única causa suficiente e constante da elevação dos sa-
lários é a dificuldade crescente de prover de alimentos e meios de sub-
sistência o número ascendente dos trabalhadores" (Lc., pp. 344-348).

961
14. A contradição entre o desenvolvimento irresistível
das forças produtivas e a Jimitação do consumo
redunda em superprodução. O caráter apologético
da teoria da impossibilida4e da superprodução geral.

A palavra superproduçáb em si mesma induz a erro. Sem dúvida não se


pode em absoluto falar de superprodução de produtos - no sentido de o
volume dos produtos ser excessivo em relação às necessidades deles - en·
quanto as necessidades mais prementes de grande segmento da sociedade
não são satisfeitas ou são satisfeitas apenas as mais imediatas. Ao contrá-
rio, nesse sentido temos de dizer que na base da produção capitalista sem-
pre se produz de menos. O limite da produção é o lucro do capitalista e
de maneira nenhuma a necessidade dos produtores. Mas superprodução
de produtos e superprodução de mercadorias são coisas de todo diferentes.
Segundo Rkardo, a forma de mercadoria não importa ao produto, e mais,
a circulação das mercadorias só formalmente difere da troca dé produtos,
o valor de troca aí é mera forma efêmera do intercâml!io material, e o
dinheiro portanto mero meio fonnal de circulação; -esse ponto de vista
reduz-se de fato a seu pressuposto de que o modo de produção burguês
é o modo absoluto, em conseqüência o modo de produção sem determi-
nação característica mais precisa, sendo por· conseguinte sua especifici-
dade puramente formal. Assim, Ricardo também não' pode admitir que
o modo de produção burguês contenha limite para o livre desenvolvimen-
to das forças produtivas, limite que vem à tona oas crises e em outras ma-
nifestações como a superproduçiio - o fenômeno fundamental das crises.
Das proposições smithianas que cita, aprova e repete, Ricardo viu
que os desejos desmedidos pelos diferentes valores de uso sempre se sa·
tisfazem na base de uma situação onde a massa dos produtores fica mais
ou menos restringida a_ "alimentos" e aos outros "meios de subsistência",
ao neussário, e que essa massa enorme fica portanto mais ou menos ex-
cluída do conswno da riqueza - desde que este ultrapasse o domínio do
necessário.
Sem dúvida, é o que sucede e em grau ainda maior na Antigüidade,
com a produção escravista. Mas os antigos não pensavam em transformar

962
o produto excedente em capital. ou pelo menos só o faziam em escala di·
minuta. (A difusão entre eles do entesouramento em sentido estrito evi·
dencia quanto produto excedente ficava em completa ociosidade.) Trans·
formavam grande parte do produto excedente em despesas improdutivas
como obras de arte, religiosas ou públicas. A produção se destinava me-
nos ainda a desencadear e desenvolver as forças produtivas materiais - di-
visão do trabalho, maquinaria, aplicação das forças naturais e da ciência
na produção privada. De modo geral nunca iam de fato além do trabalho
artesanal. A riqueza que criavam para consumo particular era por isso re·
lativamente pequena e só parecia ser grande por se ter acumulado em pou-
cas mãos, que aliás não sabiam o que fazer dela. Na Antigüidade, se não
havia superproduç!io, havia superronsumo_ dos ricos que na fase decaden·
te de Roma e da Grécia degenerou em dissipação desvairada. No meio
estavam os poucos povos comerciantes que viviam em parte às custas de
todas aquelas nações em substância pobres. O que constitui a base da su·
perprodução moderna é, de um lado, o desenvolvimento incondicional
das forças produtivas e, portanto, a produção em massa apoiada na mas-
sa de produtores confinados no domínio dos meros meios de subsistên-
cia, e, do outro, os limites impostos pelo lucro do capitalista.
Toda argumentação de Ricardo etc. contra a superprodução etc.
baseia-se em considerarem a produção burguesa como modo de produ·
ção onde oão existe diferença entre compra e venda - troca direta de
produtos -, ou como produção social, como se a sociedade, de acordo
com um plano, repartisse os meios de produção e forças produtivas no
nível e na medida do requerido para satisfazer suas diferentes necessída-
des, e assim se desloca para cada ramo de produção a cota exigida do ca·
pital social para satisfazer a necessidade a que ele corresponde. Essa ficção
origina-se sobretudo da incapacidade de conceber a forma específica da
produção burguesa, o que, por sua vez, decorre do preconceito que se
aferra à produção burguesa como a produção por excelência. E como o
sujeito que acredita em deternúnada religião e considera a sua a religião
por excelência, e as demaisJalsas.
Ao revés, caberia antes perguntar: como, na base da produção capi·
talista - onde cada um trabalha para si e o trabalho específico tem de se
configurar ao mesmo tempo em seu oposto, trabalho abstrato, geral e, nes·
sa forma, trabalho social - pode ser possível que surjam as necessárias
compensações e correspondências entre os diferentes ramos de produção,
suas dimensões e as proporções entre eles, a não ser mediante superação
contínua ·de wna desarmonia constante? Isso ainda se adnúte quando se

963
trata d.os .nivelamentos da concorrência, p~is estes supõem haver algo a
ajustar, e que portanto a harmonia sempre resulta apenas do movimento
que supera a desannonia existente. .
Ricardo, por isso,_ admite a superabundância para mercadorias iso-
ladas~ Supõe-se impossível apenas uma superabundância simultânea, ge-
ral do mercado. Por isso, não se nega a possibilidade da superprodução
num ramo particular qualquer da produção. A impossibilidade conside-
rada da superprodução refere-se à simultaneidade do fenômeno em todos
os ramos e por isso à congestão geral do mercado (a expressão não deve
ser interpretada literalmente, pois a superprodução, em momentos em
que é geral, em vários ramos é sempre mero resultado, conseqüência da
superprodução dos artigos comerciais indutores; é sempre relativa, super-
produção por haver súperprodução noutros ramos).
A apologética transforma isso no contrário. Há superprodução dos
artigos comerciais indutores, os únicos nos quais se revela a superprodu-
ção ativa - são em geral os artigos que só podem ser produzidos em mas-
sa e industrialn'l.ente (inclusive na agricultura) -, por haver superprodu-
ção nos artigos em que se manifesta superprodução relativa ou passiva.
Por isso, existe superprodução apenas porque a superprodução não é uni-
versal. A relatividade da superprodução - a circunstância de a superpro-
dução efetiva em algumas esferas gerar superprodução em ·outras - fica
assim expressa: não há superprodução universal, porqui:, se a superpro-
dução fosse universal, todos os ramos de produção manteriam entre si a
mesma relação; assim, superprodução universal equivale a: p~_odução pro-
porcionada, o que a superprodução exclui. Com isso quer-se argumentar
contra a superprodução universal. E como uma superprodução universal
no sentido absoluto não seria superprodução, mas tão-só desenvolvimen-
to maior que o habitual da força produtiva em todos os ramos de produ-
ção, pretende-se que não exista a superprodução efetiva, que justamente
não é essa superprodução que não chega a existir, anulando-se a si mesma.
Embora a efetiva só exista por não ser a universal.
Essa mísera sofística, examinada mais a fundo, reduz-se a isto: se
ocorre, digamos, superprodução de ferro, tecidos de algodão, de linho,
seda, artigos de lã etc., não se pode, por exemplo, sustentar que se pro-
duziu carvão de menos, e sucede por isso aquela superprodução; pois tal
superprodução de ferro etc. inclui superprodução similar de carvão, co-
mo por exemplo a superprodução de tecido, a de fio. (Possível seria su-
perprodução de fio em relação a tecido, de ferro em relação a maquinaria
etc. Isso seria sempre superprodução relativa de capital constante.) A ques-

964
tão portanto não pode ser a subprodução dos artigos cuja superprodução
está implícita, por entrarem como elemento, matéria-prima, matéria aUJti-
liar ou meios de produção nos artigos (a "mercadoria que se pode produ-
zir em excesso e da qual pode ha.ver no mercado tal superabundância que
não se recupere o capital nela despendido" 174) cuja superprodução posi-
tiva é justamente o fato a explicar. Trata-se, ao contrário, de outros arti-
gos que pertencem diretamente a esferas de produção não subsumidas
aos artigos comerciais indutores, produzidos em excésso segundo o pres-
suposto, ou que não fazem parte das esferas cuja produção, por constituir
a produção intermédia para aqueles art~gos indutores, tem pelo menos
de avançar tanto quaÍl.to a das fases finais do produto, embora não houves-
se obstáculo para que ela tivesse avançado mais e tivesse ocorrido uma
superprodução dentro da superprodução. Por exemplo, embora se tenha
de produzir carvão bastante para manter em movimento todas as indús-
trias onde o carvão é condição necessária de produção, isto é, esteja a
superprodução de carvão embutida na superprodução de ferro, fio etc.
(embora só se produzisse carvão de modo proporcionado à produção de
ferro e fio), é também possível que se produzisse mais carvão que o ex!-
gido pela-superprodução de ferro, fio etc. Isso não só é possível, mas mui-
to provável. E que a produção de carvão e fio e das demais esferas que
provêem apenas a condição ou a fase preliminar do produto a concluir
noutra esfera, não se governa pela procura imediata, pela produção ou re-
produção imediatas, e sim pelo grau, medida e proporção em que elas
se estão expandindo. E claro que nesse cálculo pode haver um erro para
mais. Em conseqüência, nos outros artigos como por exemplo pianos,
pedras preciosas etc. não se produziu bastante, houve subprodução. (Tam-
bém há sem dúvida superprodução em que ·o excesso do~ artigos não-
indutores não resulta de superprodução, mas, ao contrário, a subprodu-
ção é causa da superprodução, como por exemplo más colheitas de tri-
go ou de algodão etc.)
O absurdo daquela sofística se patenteia quando colocada na mol-
dura internacional, como o fizeram Say 175 e outros depois dele. Assim,
por exemplo, a Inglaterra não produziu a mais e sim a Itália produziu a
174. Ver neste volume pp. 935, 939 e 941.
175. Marx alude às observações de Say em Letters a Mr. Malthus, Paris-Londres,
1820, p. 15. Say diz aí que as mercadorias inglesas saturaram o mercado italiano por-
que era insufieiente a produção de mercadorias iWianas. Essas observações cita-as a
publicação anônima An inquiry into those principies..• , Londres 1821, p. 15, e Marx
as recolhe em seu caderno de exeertos XII, p. 12. Ver no volume I, p. 250, a crítica
de Marx à tese de Say: "A parada nas vendas de vários produtos decorre da escassez
de vários outros".

965
menos. Se a Itália tivesse (1) capital suficiente para repor o capital inglês
para ela exportado na fonna de mercadorias, e (2) empregado seu caP,ital
de modo a produzir os artigos peculiares requeridos pelo capital inglês
para repor a si mesmo e também à renda (revenue) dele decorrente, não
ocorreria superprodução. Por conseguinte, o fato da superproduçiio real
que existe na Inglaterra, em relação à produção real na Itália deixaria
de existir, para existir apenas o fato da subproduçáo imaginária na Itália,
imaginária por se pressupor um capital e um desenvolvimento das for-
ças produtivas, na Itália inexistentes, e ainda a precondição, por igual
utópica, de se ter aplicado esse capital, inexistente na Itália, como seria
necessário para se complementarem oferta inglesa e procura italiana, pro-
dução inglesa e italiana. Noutras palavras, isso significa apenas: não se da·
ria superprodução 8e procura e oferta se correspondessem; se o capital
se repartisse em todos os ramos de produção em proporção tal que a pro-
dução de um artigo implicasse o consumo do outro, seu próprio consu-
mo, portanto. Não haveria superprodução se não houvesse superprodu-
ção. Mas, uma vez que a produção capitalista só pode expandir-se à solta
em certos ramos e em dadas condições, seria de todo ímpossível produ-
ção capitalista se a produção tivesse de se desenvolver em todos. os ramos
de maneira simultânea e propotcionada. Por ocorrer superpr()d~ção abso·
luta naqueles ramos, ocorre também superprodução relativa nos ramos
onde não se produziu em excesso.
Assim, aquela explicação da superprodução num domínio pela sub-
produção em outro significa apenas que não haveria sup~rprodução se
houvesse produção proporcional, ou se procura e oferta se ·correspondes-
sem, ou se todos os ramos contivessem iguais possibilidades de produção
capitalista e de sua ampliação - divisão do trabalho, maquinaria, expor-
tação para mercados distantes etc., produção em Il\llSSa -, se todos os
países que comerciam entre si possuíssem capacidade igual de produção
(e precisamente produção diversa e complementar). Sucede, portanto,
superprodução porque não se materializam todos esses desejos irrealizá-
veis. Ou de maneira ainda mais abstrata: não haveria superprodução num
domínio se houvesse superprodução em todos os domínios. Mas o capi·
tal não é bastante grande para produzir em excesso de maneira tio uni·
versal, e por isso ocorre superprodução parcíal.
Observemos a quimera mais a fundo:
Admite-se que em cada ramo pál'ticukrr pode suceder superprodu-
ção. A única circunstância que poderia impedir a superprodução simul·
tânea em todos os ramos é, segundo se alega, o fato de mercadoria se tro·

966
car por mercador.ia; assim, recorre-se às condições pressupostas na troca
direta de produtos. Mas tal escapatória logo se aniquila porque o comér-
cio não é troca direta de produtos, e por isso o vendedor de uma mer-
cadoria não é necessariamente ao mesmo tempo o comprador de outra.
Todo esse subterfúgio baseia-se em suprimir o dinheiro e a circunstância
de não se tratar da troca de produtos e sim da circulação de mercadorias,
para a qual é essencial a dissociação da compra e venda.
(A circulação do capital encerra em sí mesma possibilidades de per-
turbação. Na reconversão do dinheiro em suas condições de produção,
por exemplo, trata-se de tcansfonnar o dinheiro de novo nos mesmos
valores de uso (segundo a espécie), e aínda - o que é essencial para se
repetir o processo de reprodução - de se poderem obter de volta esses
valores de uso l! seu valor precedente (abaíx:o deste é naturalmente me-
lhor). Des~es elementos de reprodução, a parte considerável consistente
em matérias-primas pode ter os preços elevados por duas razões: primeiro,
se QS instrumentos de produção, em dado prazo,· aumentam com mais
rapidez que aquela em que é possível obter matérias-primas; segundo, even-
tos resultantes da natureza variável das sazões. Por isso, as condições me·
teorológícas (o tempo) desempenham, conforme observa com acerto
Tooke 176 • papel tão importante na indústria moderna. (Isso se estende
aos meios de subsistência em relação aos salários.) A reconversão do di-
nheiro ern mercadoria pode esbarra~ em dificuldades e gerar possibilidades
de crise, do mesmo modo que a transformação da mercadoria em dinhei-
ro. Quando se estuda a circulação simples, e não a do capital, não se en·
contram essas dificuldades.) (Há ainda wna série de fatores, condições,
possibilidades de crise, que só podem ser estudados examinando-se situa-
ção mais concreta; sobretudo a competição entre os capitais e o crédito.)
Nega-se a superprodução de mercadorias, mas admite-se a super-
produção de capital. Ora, o próprio capital consiste em mercadorias ou,
se consiste em dinheiro, de qualquer modo tem de se reconverter em mer·
cadorias para poder funcionar como capital. Que significa portanto super-
produç./io de capital? Superprodução das quantidades de valor destinadas
a gerar mais-valia (ou, segundo o conteúdo material, superprodução de
mercadorias destinadas à reprodução) - isto é, reprodução em escala exa-
gerada, o que é o mesmo que superprodução incondicional.

176. Th. Tooke, A hisroTy of prices, and of the s.tate of che circulatlon, volumes
INI. Londres, 1838-1857. Tookc fala sobre as condições do tempo em vários trechos
de sua obra, sobretudo na parté primeira do volume lV, que apareceu em l 848.

967
Ma.is a fundo, ísso significa apenas que se prod'l.iz demais com o obje-
tivo de enriquecimento, ou parte excessiva do produto não se destina a
consumir-se como renda (revenue) e sim a fazer mais dinhe'iro (acumular·
se); não a satisfazer as necessídades particulares de seu proprietário 'e sim-
ª gerar-lhe a riqueza social abstrata, dinheiro e mais poder sobre trabalho·
alheio, capítal, ou seja, aumentar esse poder. E o que diz. um lado. (Ricar-
do nega isso. 177 ). E como é que o outro lado explica a superprodução das
mercadorias? Com a circunstância de a produção não ser bastante diver-
sificada, de detenninados objetos de consumo não terem sido produzi-
dos em quantidades satisfatórias. E claro que não se trata aí do consumo
industrial, pois o fabricante que produz tecido de linho em excesso cau-
sa por isso acréscimo necessário da procura de fio, maquinaria, trabalho
etc. Trata-se portanto do consumo privado. Produziu-se tecido de linho
em excesso, mas talvez laranjas de menos. Antes não se admitia a existên·
eia do dinheiro, para não se configurar a dissociação entre compra e ven-
da. Agora não se admite a existência de capital, para transformar o capi-
talista em gente que efetua a simples operaç~o M-D·M e produz para o
consumo individual, não como capitalista, com o objetivo de enriquecer,
de reconverter parte da mais-valia em capital. Mas díz.er que existe ~pi­
tal demais significa apenas que demasiado pouco se consome e se pode
consumir como renda (revenu{:) nas condições dadas. (Sismondi.)1'18 Por
que então o produtor de tecido exige do produtor de c~reais que consu-
ma mais tecido, ou o segundo exige do primeiro que co~suma mais cereais'!
Porque o próprio produtor de tecido não realiza parte maior de sua renda
(mais-valia) em tecido, e o agricultor, em cereais? Para cada um em parti-
cular, admite-se que a isso se opõe a necess.idadê de ca-pitaliiar (sem se con-
siderar os limites das necessidades). Mas não para todos tomados em conjunto.
(Aqui abstraímos por completo do fator das,crises consistente em
serem as mercadorias reproduzidas mais barato do que foram produzidas.
Daí depreciação das mercadorias disponíveis no mercado.)
Todas as contradições da produção burguesa se patenteiam coleti-
vamente nas crises gerais do mercado mundial, e de maneira dispersa, iso-
lada, parcial nas crises restritas (restritas no conteúdo e na extensão).

177. Ver neste volume pp. 932-934.


178. Sismondi explica a crise como "a desproporção crescente entre a produção
e o consumo" (Nouveaux príncipes d'économie polítique ou de la riche:rlitl da.n ses
rapports avec la population, Paris, 1827, p. 371). Marx, em Miséria da Filosofia, diz
q_ue, segundo Sismondi, "a renda" (irn:ome) "decresce m1 proporção em que aumenta
a produção,. (ver MEW, Band 4, p. 71). Marx reexamina as idéias de Sismondi, desta-
c.ando tanto os elementos valiosos como as carências funda.mentais, no volume 3 des-
ta tradução, cap. IX, seção 12.

968
A superprodução tem por condição, de maneíta específica, a lei
geral da produção do capital: produzir na medida das forças produtivas
(isto é, da possibilidade de desfrutar a maior quantidade possível de tra·
balho com dada quantidade de capital), sem considerar os limites exis-
tentes do mercado ou as necessidades solvíveis,· e efetuar isso por meio
da ampliação constante da reprodução e da acumulação, fazendo em c.on-
seqüêncía a reconversão constante da renda (revenue) em capital, en-
quanto, em contraposição, a massa dos produtores ·fica limitada e tem de
ficar limitada ao nível médio de necessídade de acordo com a natureza
da produção capitalista.

15. Idéias de Ricardo sobre os diferentes tipos de


acumulação de capital e sobre as conseqüências
econômicas da acumulação.

No capitulo VIII "On Taxes" diz Ricardo:

"Quando a produção anual de um país ultnpassa o consumo anual,


diz-se que aumenta seu capital. Quando o consumo anual não é pelo
menos repo«o pela produção anual, diz.se que diminui seu capital.
O capital, por isso, pode aumentar mediante aeréscimo da produção
ou mediante decréscimo do consumo improdutivo" (pp. 162, 163).

Por "consumo improdutivo., entende Ricardo aí, como diz na no-


ta referente ao trecho citado (nota à p. 163), consumo por trabalhadores
improdutivos, "por aqueles que não reproduzem outro valor". Assim,
aumento da produção anual significa aumento do consumo .industrial
anual. Este pode aumentar pelo acréscimo direto dele mesmo, nã'o se al-
terando ou mesmo crescendo o consumo não industrial, ou pela redução
do consumo não industrial.

"Quando dizemos.., reza a nota, "que a renda (re11enue) se poupa e se


adiciona ao capital, entendemos que o segmento da renda, o qual se
considera adicionado ao capital, é consumido por trabalhadores pro-
dutivos e não por trabalha.dores improdutivos."
Mostrei 119 que a conversão de renda em capital de modo algum
significa o mesmo que conversão de renda em capital variável, ou dispên~
dio dela em salário. Mas, para Ricardo, o significado é o mesmo. Na· mes·
ma nota diz Ricardo:

"Se o preço do trabalho subir tanto que, apesar do acréscimo do ca-


pital, não se possa empregar mais trabalho, direi que esse acréscímo
de capital é consumido improdutivamente."

O consumo da renda por traballladores produtivos não é portanto


o que toma esse consumo "produtivo", mas o consumo por trabalhadores
que produzem mais-valia. Em conseqüência, o capitai só aumenta quan-
do comanda mais trabalho.
Capitulo VD "On Foreign Trade":
"Há dois meios de acumular capital: pode ser poupado em conseqüên-
cia de rendii acrescida ou de consumo reduzido. Se meus lucro1; wbltem
de 1 000 libras para 1 200 sem se alterarem minhas despeSM, acumulo
por ano 200 libras mais que antes. Se economizo 200 libras de minhas
despesas enquanto meus lucro~ continuam 01 memws, haverá o mes·
mo efeito; adicionarei 200 libras por ano a meu capital" (p. 135).
"Se, eom a introdução de maquinaria, a generalidade das mercadorias
em que te despendi4 renda cair de 20% em valor, ficarei de fato capa-
citado a eoonomizw: como se minha renda acrescesse··de 20%. Mas a
taxa de lucro, num caso, fica es~cioná.tia; no outro; aumenta de 20%.
- Se com a entrada de metcadorias esttangeíras mais baratas posso
economizar 20% de minhas despesas, o efeito será preeisamente o mes·
mo da baixa ocasionada pela maquinaria, da despesa de prúdução de-
las, mas os lucros não subirão" (p. 136). ·

(Quer dizer, nlio subirão se as mercadorias mais baratas não entram


no capital variável nem no constante.)
Assim, com dispêndio invariável de renda, acumulação decorrente
de alta da taxa de lucro (mas a acumulação depende tanto da taxa, quan-
to do montante do lucro); com taxa invariável de lucro, ac..'Umulação resul-
tante de despesas reduz.idas, mas aí Ricardo supõe que ela ocorre em virtu-
de de bai:atearem (seja pela maquinaria, seja pelo comércio estrangeiro)
as "mercadorias em que se despendia renda" (revenue).
Capítulo XX "Vitlue and Riches, theú' distinctive Properties':

"A riqueza" (o que para Ricardo significa valores de uso) "de um país
pode aumentar de duas mane.iras: pelo emprego de porção maior da ren-

179. Ver neste volume pp. 907-927.

970
da para manter o trabalho produtivo, o que não só acres<..-e a quantidade,
mas também o 11t1lor da massa de mercadorias; ou, sem emprego de quan-
tidade adicional de trabalho, por tornar-se mais produtiva a mesma
quantidade - o que acrescerá a abundância rna1 não o valor da$ mer-
cadorias. ·
No primeiro caso, um país não só fica:rá tico, mas aumentará o valor de
sua riqueza. Tornar-se-á rico pela parcimônia, reduzindo suas despesas
em objetos de luxo e fruição, e empregando essas economia.I na repro·
duçiio.
No segundo caso, não haverá necessariamente despesas reduzidas em
objetos de luxo e fruição, nem quantidade acrescida de trabalho pro.
dutiro empregado, mas com o mesmo trabalho produzir-se-á mais; a
dqueza crescerá, mas não o valor. Desses dois modos de aumentar a ri·
queza, o último tem de ser pxeferido, uma vex que produz o mesmo
efeito sem que os indivíduos se privem de fru:ições ou as reduzam, o
que nunca pode deixar de estar presente no primeiro. Capital é aquele
segmento da riqueza de um pa(s o qual se emprega com vistas à produ-
çáo futura e pode acrescer como a riqueza. Um capital adicional será
por igual eficaz para produzir riqueza futura, quei obtido por meio
de aperfeiçoamento na habilidade técnica e na maquinaria, quer obti-
do por meio do emptego reprodutivo de mair ,.enda; pois a riqueza sem-
pre depende da quantidade de mercadorias produzidas, sem se levar
em conta a facilidade com que se pôde conseguir os in$trumentos.em-
pregados na produção. Certa quantidade de roupa.<: e alimentos susten-
tará e empregará o mesmo número de pessoas, e por isso conseguirá
que se faça a correspondente porção de trabalho, seja aquela quantida-
de produzida pelo trabalho de 100 ou 200 pessoas. Mas seu valor dupli-
cará se 200 pessoas tiverem sido empregadas para produ:zi-la" (pp. 327,
328).

Primeira formulação de Ricardo:


A acumulação aumenta com a despesa invariável, se a taxa de lucro
subir,
ou com taxa d~ lucro invaríâvel, se a despesa diminuir (em valor)
em virtude de baratearem as mercadorias em que se consome a renda {re-
venue).
Agora faz uma formulação antinômica:
Cresce a acumulação, acumula-se o capital em volume e valor, se par-
te maíor da renda se retira do consumo individual e se aplica no consumo
industrial, mais trabalho produtivo se põe em movimento com a parte
assím poupada da renda. Nesse caso, acumulação originária da parcimônia.
Ou a despesa permanece a mesma, não se emprega quantidade maior
de trabalho produtivo, mas o mesmo trabalho produz mais, tem produti-
vidade maior. Os componentes do capita] produtivo, matérias-primas, ma-
quinaria etc. (há pouco eram as mercadorias em que se despende a renda;
agora são as mercadorias empregadas como instrumentos de produção)
são produzí.das com o mesmo trabalho, em quantidade maior, em me-

971
lhor qualidade e por isso a menor custo. Nesse caso, a acumulação não
depende de subir a taxa de lucro, nem de parte maior da renda. em virtu·
de da parcimônia, transformar-se em capital, nem de parte menor da rên·
da se despender de maneira improdutiva por baratearem as me1cadorias
em que se gasta a renda; Depende de o trabalho tomar-se roais produtivo
nos ramos de produção que produzem os elementos do próprio capital,
de baratearem, portanto, as mercadorias que entram no processo de pro·
dução como matéria-prima, instrumento etc.
Se aumentou a produtividade do trabalho com a produção maior
de capital fixo em relação ao capital variável, subirá tanto o volume quan·
to o valor da reprodução, uma vez que parte do capital .fixo entra na re·
produção anual. Isso pode ocorrer ao mesmo tempo com o crescimento
da população e o acréscimo do número de trabalhadores empregados,
embora esse número decresça proporcionalmente, confrontado com o
capital constante que movimenta. Ocorre assim crescimento tanto de
riqueza quanto de valor, e movimenta-se volume maior de trabalho vivo,
embora o trabalho se tenha tornado mais produtivo e tenha diminuído o
volume de trabalho em relação ao volume das mercadorias produzidas.
Por fim, não se alterando a produtividade do trabalho, capital variável
e constante podem aumentar de; acordo com o ritmo anual do acrésci·
mo natural da população. Nesse caso também se acumula capital em vo-
lume e em valor. Esses últimos pontos, Ricardo não os leva ~rrí conta.
No mesmo capítulo diz Ricardo:

"O trabalho de um milhão de homens na manufatW:a produzirá sem·


pre o mesmo valor, mas nem semp1e riqueza igual.ª

(Eno grave. O valor do produto de um milhão de homens depende


tanto de seu trabalho quanto do valor do capital com que trabalham; se-
rá portanto muito diferente, conforme a quantidade das forças produti-
vas pcoduzidas com que ttabalham.)

"Com a invenção de máquinas, com o aciéscimo da habilidade técní·


ca, com a melhor divisão do trabalho e oom a descoberta de novos
mercados onde se possam fazer trocas mais vantajosas, um milhão de
homens podem produzit, em dado nível de desenvolvimento da socie-
dade, 'bens necessários, bens úteis ou agradáveis', em quantidade duas
vezes ou três vezes maioi do que ter.iam podido produz.ir noutro nível,
mas nem por isso adícioruu:ão alguma coisa ao valor"

(por certo que Sim, uma vez que seu trabalho pretéríto entra na nova re-
produção em escala muito maior),

972
"pois todas as coisas sobem ou descem de valo1, conforme a facilidade
ou dificuldade de produzi-las ou, em outras palavras, na proporção da
quantidade de trabalho empregada para produzi-las."

(Cada mercadoria individualmente considerada pode baratear, mas


aumentará o valor da totalidade acrescida de mercadorias.)

"Admitamos que o trabalho de certo número de homens produza l 000


pares de meia e que, com nova maquinaria, o mesmo número de homens
possa produzir 2 000 pares, ou continuar a produzir l 000 pares acres-
cidos de 500 chapéus: o valor dos 2 000 pares de meia, ou dos 1 000
pares de meia junto com os SOO chapéus, não será maior nem menor
do que o dos 1 000 pares de meia antes da nova ~aquinaria, pois esses
volumes resultarão da mesma quantidade de trabalho."

(Atenção, se a nova maquinaria introduzida nada custar.)

"Mas, apesar disso, o valor do volume geral de mercadorío:; será reduzi-


do; pois, embora o valor da quantidade produ:r.ida, aumentada em con-
seqüência do melhoramento, seja exatamente o mesmo da quantidade
menor que teria sido produzida se não tivesse havido melho=ento,
haverá além disw um efeito sobre as mucadorius ainda não consumi-
.das, produzidar antes do melhoramento. Reduz·se o valor dessas mer-
cadorias, porquanto, peça por peça, se rebaixam ao nível das produzi-
das com todas as vantagens do melhoramento; e a sociedade terá mon-
tante mewr de valor, não obstante a quantidade acrescida das merca·
dorias, a riqueza aumentada e os meios de fruição adicionados. Com
o aumento constante da facUid,ade da produção diminui de continuo
o vak>1 de dil'ersas mercadorÜl1 produzidas antes, embota dessa manei-
ra acresça a riqueza nacional e ainda a capacidade de produ\i:o futura"
(pp. 320·322).

Ricardo fala aí da depreciação que um desenvolvimento progress)vo


da produtívidade exerce, provoca nas mercadorias produzidas em condi·
ções mais desfavoráveis, estejam elas ainda disponíveis no mercado ou
desempenhem o papel de capital no processo de produção. Mas de modo
nenhum se segue daí que "o valor do volume geral de mercadorias será re·
duzido'", embora diminua o valor de parte desse volume. Aquela conse-
qüêncía só ocorre (1) se, em virtude dos melhoramentos, o valor das má-
quinas e mercadorias recém-introduzidas se coloca em nível inferior ao da
depreciação ocasionada nas mercadorias antes existentes da mesma espécie;
(2) se se omite que, com o desenvolvimento das forças produtivas, também
acresce de maneira constante a variedade dos ramos de produção, isto é,
iníciam-se aplicações de capital que antes absolutamente não existiam.

973
Na marcha do desenvolvimento, a produção tanto barateia quanto se diver·
sifica.
Capitule IX ''Taxes on raw produce ·:

"No tocante à terceira objeção contta impostos incidentes sobre produ.


tos primários, ou seja, à idéia de que a alta de saJário e a baixa de lucro
desencorajam a acumulação e atuam da mesma maneira que a pobreza
natural do solo, esforcei-me noutra parte desta obra por mostrar que
se podem fazer poupariças efeti.,,Yis tanto 1111s despesas quanto na produ-
ção; tanto por redução no Palór das mercadorias quanto por alta na
taxa de lucro. Com alta de meu lucro de 1 000 para l 200 libras, en-
quanto os preços não va1'iam, aumenta meu poder de acrescer meu
capital por meio de poupanças, mas não quanto aumentada se meu
lucro coritinuasse inalterado, enquanto as mercadorias baixassem tan-
to de preço que com 800 libras eu obteria tanto quanto antes com
1 000 libras" (pp. 183, 184).

O valor global do produto (ou antes da parte do produto a qual se


reparte entre capitalista e trabalhador) pode depreciar-se, sem cair a renda
(income) líquida, segundo o montante do valor. (Pode ainda subir em
proporção.) E o que se vê em:
Capitulo XXXD ''Mr. Malthus 's Opinions on Rent ".

"Mas a argumentação toda de Malthus se apóia ,em base frágil. Supõe


que, em virtude do decréscimo da renda (iricome} bruta do país, tem
de diminuir também a renda (income) líquÍda, e na.mesma.proporção.
Um dos objetivos de sua obra foi demomtrar que, cóm toda queda
do valor real dos artigos essenciais, caem os !iabÍlios, e que os lucros
do capital aumentam; noutras palavras, que de qualquer valor anual
dado porção menor se.tá paga à classe trabalhadora, e porção maior
àqueles cujos fundos empregaram essa classe. Admitamos que o valor
das mercadorias produzidas numa manufatura particular seja 1 000
libras, a ser dividido entre o patrão e os empregados, na proporção de
800 libra$ para empregados, e 200 para o patrão; se o valor dessas me.r-
cadoilas cair para 900, e 100 h1mu foiem poupadas dos salários, de
maneira nenhuma será prejudicada a renda líquida do patrão, e assim
poderá -ele pagar o mesmo montante de impostos com a mesma faci-
lidade com que pagava antes da 1edução do preço" (pp. 511, 512).

Capitulo V "On Wages':


"Apesar da tendência de os sa.láiios se nivelarem pela taxa natural, po-
de a taxa de mercado, numa sociedade em desenvolvimento, ficar aci-
ma daquela por período indefinido. eque basta que se efetive o im-
pulso que um capítaJ acrescido dá à nova pcocura de ú:abalho, para que
outro acréscimo de capital esteja produzindo o mesmo efeito. E assim,
se o acréscimo de <.-apitai for gradual e Constante, a procura de traba-
lho pode dar um estím~lo constante ao actéscimo de população" (p. 88).

974
Segundo o prisma capitalista, tudo aparece invertido. A magnitude
da população trabalhadora e o grau da produtividade do trabalho deter·
minam tanto a reprodução do capital quanto a da população. Ali a coisa
aparece ao revés: o capital detennina a população.
Capítulo IX "Tuxes on Raw Produce':

"A acumulação de capital produz naturalmente concorrência aguçada


entre os empregadores de txabalbo, e alta conseqüente do preço do tra-
balho" (p. 178).

Isso depende da proporção em que aumentam os diver.:os componen-


tes do capital, com a acumulação deste. O capital pode acumular-se e a
procura de trabalho dinúnuir em tennos absolutos ou relativos.
Segundo a teoria da renda fundiária de Ricardo, a taxa de lucro ten-
de a cair com a acumulação do capital e com o crescimento da população,
em virtude de subir o valor dos artigos essenciais, de se tornar a agricultu·
ra menos produtiva. Por isso, a acumulação tende a frear a si mesma, e a
lei do decréscimo da taxa de lucro - pois a agricultura se torna menos pro-
dutiva à medida que a indústria se desenvolve - é urna fatalidade penden-
te sobre a produção burguesa. Em contraposição, A. Snúth alegra-se com o
decréscinio da taxa de lucro. A Holànda é seu arquétipo. Esse decresci·
mo, excetuados os maiores capitalistas, força a maioria dos capitalistas
a viverem não de juros e sim de seu capital industrial. Estímula assim a pro-
dução. Nos discípulos de Ricardo, o horror a essa tendência funesta assu-
me formas tragicômicas.
Cotejamos a seguir as passagens de Ricardo referentes ao assunto.
Capftul.o V "On-Wages·~
"Em difei:entes estádios de desenvolvimento da sociedade, a acumula-
ção de capital ou dos meios de empregar trabalho é mais ou menos
rápida, e em todos O$ casos tem de depender da produtividade do tra-
balho. Essa produtividade atinge o nível ma.is alto quando há abundân·
eia de tena fértil: em ta.is períodos, a acumulação é muitas vezes tão
rápida que a obtenção de trabalhadores não pode ter a mesma veloci·
dade que a de capital" (p. 92). "Calculou-se que, nas circunstâncias
favoráveis, a população pode dobrar em vinte e cinco anos; mas. nes-
sas circunstâncias favozáveis, a totalidade do capital de um país pode·
1á dobrar em pezíodo menor. Nesse caso, os sa.látíos, dui:ante o perío-
do todo, tenderão a subir, porque a procun de trabalho terá acrésci-
mo ainda mais rápido que a oferta. Nas novas colônias, onde se intro-
duzem as artes e conhecimentos de países que os possuem com refü1a-
mento muito avançado, é provável que o capital tenda a aumentar mai.~
rápido que os sares humanos; e se a carência dos trabalhadores não for

975
suprida po.r países mais populosos, essa tendência aumentará de mui-
to o preço do trabalho. À medida que aquelas terras se tornam popu·
losas e nelas se cultiva solo de pior qualidade, diminui a tendência a'
acréscimo de capital, pois o produto que robra, depois de satii/eitas
az necessidades da população existente, tem necewzriamente de estar
em proporção c_om a facilidade de produção, quer dizer, com o núme-
ro menor de peswas empregadas nu produção. Embora, então, seja
mais pt"ovável que, na~ condições mais favoráveis, a capacidade de pre>-
dução seja aínda maiot" que a da população, isso não continuará assim
por muito tempo; pois, sendo a terra limitada em quantidade e dífe.·
tenciada em qualidade, com cada porçãç acrescida de capital nela em-
pregada, decai a taxa de pt"odução, enquanto a capacidade da popula-
ção continua sempre a mesma" (pp. 92, 93).

(A última assertiva é invençil.'o clerical. A capacidade da população


decresce junto com a capacidade da produçã'o ).
Observar aí primeiro que Ricardo adlníte que "acumulação de ca-
pital em todos os casos tem de depender da produtividade do trabalho",
de modo que o primordial é o trabalho e não o capital.
Ademais, a crer-se em Ricardo, em países já há muito povoa'dos,
industrialmente desenvolvidos, existem mais que nas colônias pessoas
empregadas na agricultura, quando sucede na realidade o contrário. Em
relação ao mesmo produto emprega a Inglaterra, por exemplo, menos tra-
balhadores agrícolas que qualquer outro país, novo ou V!llho. Sem dóvi·
da, segmento maior da população não agrícola participa indiretamente
na produção agrícola. Mas, mesmo isso está longe de· ocorrer na propor-
ção em que é maior a população diretamente ligada à agricuJtura nos paí·
ses menos desenvolvidos. Admitamos na Inglaterra. mesrriÓ seja o trigo
mais caro, os custos de prodúção maiores. Emprega-.se mais capital. Se é
menor a quantidade de trabalho vivo que entra ná produção agrícola, é
maior a de trabalho pretérito, Mas a reprodução desse capital, em virtude
da base de produção já existente, custa menos trabalho, embora seu va-
lor seja reposto no produto.
Capitulo VI "On Profits•:
Antes, ainda algumas observações. A mai.s-valia depende, conforme
vimos, não só da taxa de mais-valia, mas também do número dos traba·
lhadores simultaneamente empregados, isto é 1 da ~itude do capital
variável.
A acumulação por sua vez não é determinada diretamente pela ffl)CIJ
de mais-valia e sim pela proporção da mais-valia .com o montante total
do capital adiantado, ou seja, pela taxa de lucro, e mais ainda pelo nwn·
tante global do lucro. Conforme vimos, esse montante, quando diz respei-

976
to à totalidade do capital da sociedade, é idêntico ao montante global
da mais-valia, mas, para os capitais particulares nos diferentes ramos, po-
de divergir muíto do montante de mais-valia que eles produzem. Se con-
sideramos a acumulação do capital em sua totalidade, o lucro é igual à
mais-valia
mais-valia, e a taxa de lucro =---·-, ou seja, a taxa de lucro é igual
capital
à mais-valia calculada para cada 100 de capital.
Dada a taxa de lucro (em percentagem), o montante total de lu-
cro depende da rnagr.itude do capital adiantado, por conseguinte tam·
bém a acumulação, desde que determinada pelo lucro.
Dada a soma do capital, o montante global de lucro depende do
r.ível da ~axa de lucro.
Por isso, capital pequeno com alta taxa de· lucro pode proporcio-
nar lucro global maior que capital maior com taxa de lucro baixa.
Admitamos;
1
Capital Taxa de lucro Lucro total
%
100 10 10
100 :X 2 = 200 10/2 ou 5 10
100 X3 = 300 10/2 ou 5 15
l 00 X 1 1/2 = 150 5 7 1/2

11
100 lO 10
2X100 = 20Ó 10/2 1/2 = 4 8
=
2 l /2 X 100 250 4 10
3 X 100 = 300 4 12

III
500 10 50
5000 1 50
3 ººº
10000
1
1
30
100

Se o multiplica.dor do capital e o divisor da taxa de lucro forem


iguais, isto é, se a magnitude do capital cresce na mesma proporção em
que decai a taxa de lucro, o lucro não varia. l 00 a 10% dão 1O, e 2 X 100

977
se
a 10/2% ou 5% dão por igual 10. Noutras palavras: a taxa de lucro de-
cresce na mesma proporção em que o .capital se acumula (cresce), fica
invariável o montante global de lucro.
Se o decréscimo da taxa de lucro for mais rápido que o apréscimo do
capital, diminuirá o montante do lucro. 500 a 10% dão lucro total de 50.
Mas o sêxtuplo, isto é, 6 X 500 ou 3 000 a 10/10% ou 1%, dá apenas 30.
Por Illl'l, se o capital ~ oom mús rapidez do que decresce a ta-
xa de lucro, o montante do lucro sobe, embora a taxa de lucro dinúnua.
Assim, 100 a lucro de 10% dá lucro global de 10. Mas 300 (3 X 100) a
4% (quando a taxa de lucro diminuiu portanto 2 1/2 vezes) dão lucro
global de 12.
Agora, as asserções de Ricardo.
Capitulo VI "On Profits".

"A tendência natural do /ut:To pOrtanto é cair, pois, com o progresso


da sociedade e da riqueza, obtém-se a quantidade adicional de alimen-
tos requerida com o sacrifício de cada vez mais trabalho. Essa tendên-
cia, essa gravitação, por assim dizer, do lucro é por felicidade detida
eom freqüência pelos mellloramentos em maquina.ria, relacionados
com a produção dos artigos essenciais, e também pelas descobertas
agronômicas, o que nos possibilita liberar porçào de trabalh.o antes exi·
gida e em conseqüência baíxar o pxeço dos bens de primeira necessi-
dade do trabalhador. Todavia, a alta. do preço dos m~jos de subsistên-
cia e a do sa.lá.rio têm limites; pois, logo que os salâ:rios sejam .iguais...
a 720 Jibras, a receita total do arrendatário da terra, a acumulação te·
râ de acabar, pois nenhum capital poderd dar fucro algum, nem -p<:Jde-
râ haver procu71'.l de trabalho adicional, e em conseqüência a popula-
ção terá atingido s-eu nível máximo. Na verdade, bem, antes dessa fase,
a taxa muito baixa de lucro terti paralisado toda acum111açiio, e o produto
quase todo do país, depois do pagamento dos tJ:abalhado1es, será pro·
prledade dos donos das terras e dos coletores de dfaímos e tributos"
(pp, 120, 121).

Imagina assim Ricardo o "crespúsculo dos deuses" do mundo bur·


guês, o Dia do Juízo.

"Bem antes dessa sítuação de preços se ter tornado permanente, não


haverá motii;o para acumulação, poir ninguém acumula a não $er com
o propósito de emprego produtivo de sua acumulação, e em come-
qüência essa situação de preços nunca poderá oeorxer. Do me$111o mo-
do que o rrabalhador não pode viver sem !/O.lário, o arrendatário e o fa-
bricante não podem viver sem lucro. Sua motivação para acumular se
enfraquece com cada decréscimo do lucro, e CeSSllJ'tÍ de todo quando
seus lucros forem tão baixos a ponto de não permitir comprtnsação
adequada pa1a seus esforços e para o risco que têm necessariamente
de asmmir ao fazerem o emprego produtivo de seu capital" (p. 123).

978
"Mais uma vez tenho de observar que a taxa de lucro cairá Com muito
mais rapidez... pois sendo o valor do produto o que especifiquei nas
circunstância$ supostas subirá muito o valor do capital do arrendatárío,
por consistir necessariamente em muitas das mercadorias que subiram
de valor. Antes de o trigo poder subir de 4 libras para 12, o vo.lor de
troca do capital do arrendatiirio provavelmente duplicará e valerá 6 000
líbras em vez de 3 000. Se seu lucro fosse 180 libras, ou 6% do capital
original, nessa ocasião o lucro não ultrapassaria na realidade uma taxa
de 3%, pois 6 000 llb.ras a 3% proporcionam 180 libras; e nesS11r condí·
ções noPO arrendo.tário só poderia entrar na agricultura com 6 000 li·
&rosno bolso" (p. 124).
"Esperaríamos também que, embora diminua a taxa de· lucro do capi·
tal em conseqtiêncía da acul?Wlação de capital na terra e da alta do sa·
lário, ainda aumente o montante global dos lucros. Assim, se supomos
que, com acumulações repetidas de 100 000 libra~, a taxa de lucro cai
de 20 por cento para 19, 18, 17, deelínando sempre, seria de esperar
que o montante total de lucro recebido pelos donos sucessivos do ca-
pital subisse sempre; que seria maior com o capital de 200 000 libras
que com o de 100 000 e maior ainda eom o de 300 000, desse modo
continuando a aumentar com todo acréscimo de capital, embora de-
cresça a taxa. Eslill progreasão, contudo, só é verdadeira durante certo
tempo. Assim, 19% de 200 000 libras é mais do que 20% de 100 000
libras; 18% de 300 000 libras é mais do que 19% de 200 000; mas, de-
pois de o capital se ter acumulado num montante bem grande e de os
luetos terem caído, a acumulação posterior diminui o global dos lucros.
Admitamos portanto seja a acumulação 1 000 000 de libras, e o lucro
de 7%; o montante global de lucro será de 70 000 libras; se for feita
uma adição de 100 000 libras de capital ao milhão, e o lucro cair para
6%, os donos do capital receberão 66 000 libras -ou menos 4 000 libras,
embora o, montante global do capital tenha aumentado de 1 000 000
de libras para 1100 000.
Todavia, não pode haver acumulaçiio de Cllpital, enquanto o capital
ainda proporcionar um lucro qualquer, sem proporcionar acréscimc
de produto e também acréscimo de valor. Com o emprego de 100 000
libras de _capital adicional, nenhuma parte do capital antigo se toma
menos produtiva. Tem de crescer o produto da terra e do trabalho
do país e subirá seu valor, em virtude do valor da adição feita à quanti·
dade anterior de produção e ainda em virtude do novo valor dado ao
produto total da teua, com a dificuldade acrescida de produzir sua
última porção. Mas, quando a acumulação de capital se toma muito
grande, não obstante o valor acrescentado, será este distribuído de
modo que valor menor que antes será incorporado aos lucros, enquan·
to aumentará o destinado à renda fundiáría e salários" (pp. 124 a 126).
"Embora se produza valor maior, porção maior do que resta desse va-
lor, depois de ser paga a renda fundiária, consomem-na os produtores,
e é isso - e apenas isso - que determina o lucro. Enquanto a tetta dá
frutos abundantes, os salários podem ter alta temporáda, e os produ·
tores podem consumir mais que sua proporção costumeiia; mas o estí-
mulo que assim se dará ao aeréscimo da população submeterá rapida-
mente o~ trabalhadore:; a seu con$U»IO usual. Mas q_uando se empreen-
de o cultivo de te.rras pobres, ou quando se dispendem mais capital e
trabalho em terras velhas com menor rendimento de produtos, o efei·

979
to tem de ser permanente" (p. l27). "Os efeitos da acumulação serão por-
tanto diferentes nos diversos países e dependerão sobretudo da fertilida-·
de da terra. Por mais extenso que seja um país onde as ten:as são de pobre
qualidade e onde se proíbe a importação de alimentos, grandes reduções
na taxa de lucro e o ,rápido aumento da renda fundiária acompanham as
mais moderadas acumulações de capital; e, ao contrário, um país pequeno
porém fértil, especialmente se permite a livre importação de alimentos,
pode acumular grande montante de capital sem decréseimo considerável
da taxa de luc~o e sem grande alta na renda fundiária" (pp. 128, 129).
Em virtude também de impostos (cap. Xll "Land-Tax"), ocon:e "que
não sobra produto excedente bastante para incentivar os esforços da-
queles que us.ualmente aumentam o capital do Estado com suas pou-
panças" (p. 206).
"Sô há um caso" (cap. XXI "Effects of accumulation on profits and
interest") e de caráter temporário, no qual queda da taxa de lucro po-
de acompanhar a acumulação de capital com preço baixo de alimentos;
é quando os fundos para a manutenção do trabalho aumentam com
muito mais rapidez que a população; os salários estarão então altos,
e os lucros, baixos. Se todo mundo renunciasse ao uso de artigos de
luxo e se concentrasse na acumulação, poder-se-ia produzir uma quan-
tidade de meios de subsistência para .os quais não haveria consumo
imediato. Para essas mercadorias limitadas em número poderia sem
dúvida existir ruperabundância geral, e em conseqüência poderia não
haver procura de quantidade adicional de tais mercadorias, nem lucros
relativos a emprego de mais capital. Os seres humanos, .se cessassem de
consumir, cessariam d~ produzir" (p. 343).

Até aqui vimos o que diz Ricardo sobre acumulaçãó e sobre a lei da
queda da taxa de lucro. :

980
Capítulo XVIII
Ricardo: Temas diversos e conclusão
(John Barton)

A. Renda bruta e renda líquida.


Renda (income, revenue) líquida, por oposição à renda bruta (que é
igual ao produto total ou ao valor do produto total), é a forma em que
originalmente os fisiocratas concebem a mais.-valia. Consideram como
única forma dela a renda fundiária, uma vez que vêem no lucro industrial
mera modaJidade de salário; deveriam concordar com eles os economistas
posteriores que dissimulam o lucro com o véu do salário de superinten-
dência do trabalho.
Assim, renda líquida é na realidade o excesso do produto (ou de
seu valor) acima da parte que repõe o capital adiantado, constante e va-
riável. Por isso, consiste apenas em lucro e renda fundiária, e esta por sua
vez é uma porção destacada do lucro e que cabe apenas a uma classe dis·
tinta da capitalista.
O objetivo direto da produção capitalista não é a produção de merca-
doria e sim de mais-valia ou de lucro (na forma desenvolvida), não de pro-
duto, mas de produto excedente. Desse ponto de vista, o próprio traba-
lho só é produtivo enquanto gera lucro ou produto excedente para o ca-
pital. Se o trabalhador não o gera, seu trabalho é improdutivo. A massa
de trabalho produtivo aplicado só interessa ao capital enquanto por in-
termédio dele - ou na proporção dele, aumenta a massa de trabalho ex-

981
cedente. Só nessa medida é necessário ..o que chamamos de tempo de tra-
balho necessário. Desde que não tenha esse resultado, é supérfluo. e tem
de ser suprimido.
E objetivo permanente da produção capitalista criar mais-valia má-
xima ou produto excedente máximo com o mínimo de capital adianta-
do; na medida que não obtenha esse resultado com trabalho em excesso
dos trabalhadores, tende o capital a procurar produzir dado produto com
o mínimo possível de dispêndio, com economia de força e de custos. E as-
sim a tendência econômica do capital ensina a humanidade a economizar
suas forças e a alcançar o objetivo produtivo com o gasto mínimo de meios.
Nessa concepção, os próprios trabalhadores aparecem como aquilo
que são na produção capitalista - simples meios de produção, não um
fim em si mesmos, nem o objetivo da produção.
A renda {incvme) líquida não é determínada pelo valor do produ-
to total e sim pelo excesso do valor do produto total acima do valor do
capital adiantado, ou pela magnitude do produto excedente em relação
ao produto total. Se aumenta esse excedente, atinge-se o objetivo da pro·
dução capitalista, embora decresça o valor ou, junto com o valor, a quan-
tidade total do produto.
Ricardo revelou essas tendências de maneira coerente. e sem pieguis·
mos. Daí vociferarem contra ele os filisteus filantrópicos.. ·
Ao observar a renda {income) líquida, Ricardo de novo comete
o erro de reduzir o produto total a renda {revenue) - salário, lucro e ren·
da fundiária (rent) -, e de abstraír do capital constante a repor. Mas aqui
omitiremos isso.
Capítulo XXXII "Mr. Malthus's Opinions on rept ':

"Importa distinguir claramente entre renda bruta e renda líquida, pois


todos os impostos têm de sei pagos da renda Hquida de uma sociedade.
Admitamos que todas .as mercadorias do país, todos os cereais, oodas
as matérias-primas, todos os manufaturados etc. que sejam levados ao
mexcado no decurso de um ano tenham valor de 20 milhões, e que,
para se obter esse va!o1, seja exigido o trabalho de certo número de
trabalhadores, cujos bens de consumo absolutamente necessádos re-
querem um dispêndio de 1 O milhões. Diria que a renda btuta dessa
sociedade é de 20 milhões, e a líquida, 10 milhões. Dessa suposição
não se segue que os trabalhadores só 1ecebam 10 milhões por seu tra·
balho; podem receber 12, 14 ou 15 milhões, e nesse caro terão 2, 4 ou
5 milhões de renda líquida. O resto se repartirá entre donos das tenas
e capitalistas; mas o total da renda líquida não excederá de 10 milhões.
Suponhamos que essa sociedade pague 2 milhões em impostos; sua
renda líquida se reduzirá a 8 milhões" (pp. 512, 513).

982
E no capítulo XXVI diz Ricardo:

"Que vantagem teria um país em empregil.l grande quantidade de tia-


balho prndutivo, se, empregando essa quantidade ou menor, a renda
fundiálía. líquida e o lucro juntos não se alteram? O produto total da
te"ª e do trabalho de todo pats redivide em três partes: uma se desti-
na a sal.ária, outra a luc10 e a terceira a renda fundiária."

(Isso está errado, pois esqueceu-se a parte destinada a repor o capi-


tal, excluídos os salários, empregado na produção.)

"Só das !luas últimas partes podem ser feitas deduções pan impostos
ou para poupanças; a primeira, se mod~11da, consiite sempre nas de:rpe-
$11t necl!$!/lirias de produção. "

(A propósito dessa assertiva observa o próprio Ricardo em nota


à p. 416:

"Talvez haja aí exagero de expressão, pois em geral se destina ao trabalha·


dor, $0b o título de salárto, mais do que as despesas de produção abso-
lutamente necessárias. Neste caso, o tiabaJ.ha.dor recebe parte do produ-
to líquido do país e pode economiz.á-la ou gastá-la; ou essa parte pode
.capa.citá-lo a contribuir paia a defesa do pafa. ")
"Para um investido1 com um capital de 20 000 líbias, cujos lucros forem
de 2 000 libtas por ano, tanto faz que seu capital empregue cem ou mil
trabalhadores e que a mercadoria produzida se venda por 100 000 ou
20 000 libras, desde que, em todos os casos, seu lucro não fique abai-
xo de 2 000 libras. Não t o mesmo o interesse re11l da nação? Desde
que a renda líquida real, a renda fundiária e o lucro não variem, tanto
faz que a nação possua 1O ou 12 milhões de habitantes. Su.a capacida-
de de manter esquadras e exércitos e toda espécie de trabalho improdu-
tivo tem de estar na propoxçâo da renda. líquida e não d.a bruta. Se
cinco milhões de homens puderem produzir a quantidade de roupas
e alimentos necessária para de:.: milhões, a renda líquida consistirá em
roupas e alimentos para cinco milhões. Será vantajoso para o país pre-
cisa? de sete milhões de homens para a produção dessa mesma renda
líquida, Isto é, empregar sete milhões para produzir roupas e alimen-
tos bastantes para doze milhões? Os alimentos e roupas de cinco mi-
lhões ainda serão a renda líquida. O emprego de maior número de ho-
mens não nos capacitará a acrescentar um só homem a nosso exército
e a nossa. annada, nem a contribuiI para impostos com um guinéu a
ma.is" (pp. 416, 417).

Para entender melhor a doutrina de Ricardo, é mister acrescentar as


seguintes passagens:
"De um preço de cereais 1el.atívamente baixo 1esulta sempre esta van·
tagem, a de sei mais pro~·ável que a divisão da produção vigente acres·

983
ça o fundo para manter o trábalho, uma vez que sob o título de lucro,
mais caberá à classe produtiva, e· menos, sob o nome de 1enda fundiária,
à c/aase intprodutiWJ" (p. 317).

Aí só os capitalistas industriais constituem classe produtiva.

"Renda fundiária é criação de valor ... ffia5 não de riqueza. Se, em virtu-
de da dificuldade de produz.ir uma porção qualquei de trigo, o preço
dele subir de 4 para 5 libras por quarter, um milhão de quarteis valerá
5 milhões de libras em vez de 4 ... A Sociedade possuirá valor maio.r, e
nesse sentido renda fundiária é criação de valm, Mas esse valor é nomi-
nal, ao não adicio1131 coisa alguma à riqueza, isto é, aos meios de sub-
sistência, às coisas cômodas e às agradáveis da sociedade. Como dan·
tes, te.remos precisamente a mesma quantidade de mercadorias e não
mais, e o mesmo milhão de quarte:rs de trigo; contudo, o efeito de ser
o ttigo cotado a S libras por quarter, em vez de 4, é o de tran$feriT uma
porção do valor do trigo e das mercadorias, das mãos dos donos ante·
riores para as dos proprietários das terras. Assim, 1enda fundiáría é cria-
ção de valor, mas não de riqueza; 114da adiciona aos recunrosde um pafs"
(pp. 485, 486).

A.dnitamos p:u:- se imp)ltar trigo estrangeiro, caia seu preço,


<:pie,
e desse modo decresça de um mílhão a renda fundiária. Ricardo diz que
por isso aumentarão as rendas monetárias dos capitalist.as, e prossegue:

"Mas pode.se diier que a renda do capít:ilista, não, a·cre$Crá e que o


milhão deduzído da renda (rent) do dono dll terra servírá pau pagar
salário adicional aos trabalhadores: Assim se~do, a situação da so-
ciedade melhorará, e eles poderão suportar ós mesmos ônus em dinhei·
ro com mais facilidade que antes. Isso provará apenas o que é ainda
mais desejável, isto é, que a nova distribuição beneficia principalmen-
te as condições de outra classe, e de longe a mais importante claase da
sociedade. Tudo o que reeebem acima de 9 milhões constitui parte da
renda (income) liquida do país, e não pode ser despendido sem lhe
acrescer a renda (rewmue), a prosperidade ou o poder. Distribua-se por-
tanto à vontade a renda líquida. Dê-se Úm pouco mais dela a uma elas·
se e um pouco menos a outra, mas nem. pw isso ·ela diminuirá; ainda
se produzírá quantidade maior de mercadorias com o mesmo traba-
lho, embora decresça o montante do valor monetiúio bruto dessas mer·
cadorias. Mas a renda lincome) monetária líquida do país, e$$e fundo
eom que se pagam os impostos e se obtêm as coisa& agradáveis, será
muito mais adequada que antes para manter a popubção atual, pau
prover suas cilmodídades e lux.o, e para suportar qualqueJ montante
dado de tributação" (pp. 515, S 16).

9&4
B. Maquinaria: Influência das. máquinas na
situação da classe trabalhadora, segundo
Ricardo e Barton

1. As idéias de Ricardo

a) A expulsão de trabalhadores de suas atividades pelas


máquinas segundo Ricardo.

Capítulo J (SeçãrJ V) "On Value':

"Admitamos ... se possa empregar uma máquina num tamo particular


qualquer para realizar o trabalho de cem homens no decw:ro de um
ano, a qual só dure um ano. Admitamos ainda que a máquina custe
5 000 hbras e sejam de S 000 libras os salários pagos por ano a cem tra-
balhadores; é eYÍdente que, para o fabricante, tanto faz c0mp1ar a má-
quina ou empregar os homens. Mas imaginemos que o uabalho enca--
reça e em conseqüência os salários de cem homens por ano ascendam
a 5 500 libras; é ób'li.o então que o fabricante não hesitará maís; in·
teressar·llle:á comprar a máquina para executar trabalho por S 000
libras. Mas não subirá a máquína de preço, não valerá também 5 500
Ubras, em virtude do enClllecimento do trabalho1 Subiria de preço. se
niio hou11esse capital empregado em $Jla construção, nem lucro a ptlg(f1'
a seu ccnstrutor. Se a máquina por exemplo fosse o produto do ttaba-
lho de cem homens, que nela uabalharam um ano, cada um com salá-
rio de 50 libras, e em conseqüência seu preço fosse 5 000 libras, esse
preço subiria para 5 500 libras, com a alta daquele saláiio pata 55 li·
bras. Mas isso não pode ocorrer. Ou empregam-se menos de cem ho-
mem para produzi·la, ou ela não poderá ser vendida por 5 000 horas,
pois é mister tíra.r dessas 5 000 libras o lucro do capital que empregou
os homens. Admitamos então que só foram empregados 85 homens
ao custo de 50 libras cada um, ou seja, de 4 250 libras por ano, e que
as 750 libras que a venda da máquina produz acima dos salários adian-
tados constituam o lucro do construtor da máquina. Se o salário subir
de 10 por cento será o construtor obrigado a empregar um capital adi-
cioll/11 de 425 libras e por isso empregará 4 675 libras em vez de 4 250,
e desse capital só obterá lucro de 325 libras se continuar a vender a má-

985
quina por 5 000. Mas este é precbamente o caso de todos os fabrican~s
e capitalistas: a alta do salário a'tinge-os a todos. Se por isso o constru-
tor aumentar o preço das máquinas em conseqüência da alta do salário,
quantidade ex:traordináría de capital será empregada na construção
deías, até que seu preço proporcione a taxa comum de lucro. Vemos
portanto que máquinas não sobem de preço em v.irtude de altado salirio.
Todavia, o fabricante que, numa alta geral de salário, pode recorrer a
uma máquina que não aumente os custos de produção de sua merca-
doria desfrutará de vantagens especiais se puder manter inalterado o
preço de suas mercadorias; mas ele, romo já vimos, será obrigado a
baixar o preço de suas mercadorias, ou capital fluirá para seu ramo
até seus lucros caÍiem ao nível geral. À!' máquinas portanto beneficiam
o povo em geral; etses 11Kentes mudos &W sempre o produto de muito
menos trabalha do que a que despedem, mesma quando thn o memio
valor monetdrio" (pp. 3840).

Essa idéia está certa. Ao mesmo tempo responde àqueles que acre-
ditam que os trabalhadores despedidos pelas máquinas encontram empre·
go na própria fabrícação delas, ponto de vista pertinente a uma· época
em que a oficina mecânica ainda se baseava de todo na divisão do traba-
lho e ainda não se chegava a empregar máquinas para construir máquinas.
Seja o salário anual de um trabalhador 50 libras; o de 100 será 5 000
libras. Se esses 100 trabalhadores forem substituídos por uma máquina
que também custe 5 000 libra.S, essa máquina tem de ser o. produto de me-
nos de 100 trabalhadores. E que encerra, além de trabalho pago, traba-
Jho não pago, que constitui justamente o lucro do fabricante. Se fosse
o produto de 100 trabalhadores, conteria apenas trabalho pago. Se a ta-
xa de lucro fosse de 10%, das 5 000 libras cerca de 4 545 répresentariam
o capital adiantado e cerca de 455 o lucro. A. 50 libras, 4 545 só represen-
tariam 90 9/10 trabalhadores.
Mas o capital de 4 545 libras não representa apenas capital variável
(o diretamente despendído em salário). Representa também o desgaste
do capital fixo empregado pe!o construtor da máquina e a matéria-prima.
A máquina que custa 5 000 libras e substitui 100 homens cujos salários
montam a 5 000 libras, representa portanto o produto de bem menos
que 90 homens. Também só pode ser empregada com vantagem se ela
(ou pelo menos a sua fração que todo ano entra. com juros no produto,
isto é, no valor deste) é o produto (anual) de muito menos homens que
os que substitui.
Cada elevação do salário aumenta o capital variável que tem de ser
adiantado, embora o val.or do 'PfOdUto (uma vez que o número de traba·
lhadores que o capital variável movimenta permanece o mesmo) - desde
que esse valor seja igual a capital variável+ trabalho excedente - não va-
rie; não se altera o valor produzido pelo capital variável.

986
b) Ricardo: Influência dos aperfeiçoamentos da produção
sobre o valor das mercadorias; Concepçã-0 errônea do fundo
de trabalho disponível para trabalhadores despedidos.

Cap(tukJ XX "Value and riches, their different Properties".


Os fatores naturais nada acrescentam ao valor das mercadorias; ao
contrário, reduzem-no. Justamente por isso acrescem a mais-valia, o in·
teresse exclusivo dos capitalistas.

"Contradizendo a opinião de ruiam Smith, Say, no capítulo quarto,


fala do valor que dão às mercadorias os fatores naturais como o sollJ,
o ar, a P1eUão atmosfézica etc., que às vezes substituem o trabalho
do homem e às vezes com ele cooperam na produção. Mas esses fato-
res natw:ais, embora aumentem muito o valor de uso. nunca adicio-
nam valor de troca, do qual fala Say, a uma mercadoria; logo que, em·
pregando máquinas ou os conhecimento! das ciências naturaz's, le'Va·
mos os fatores naturais a realizar o trabalho que antes era feito pela
força humana, há uma queda correspondente no valor de troca desse
trabalho" (pp. 335, 336).

A máquina custa trabalho. Os fatores naturais, considerados de per


si, nada custam. Não podem portanto acrescentar valor ao produto; ao
contrário, reduzem-lhe o valor, ao substituir capital ou trabalho, traba·
Jho imediato ou acwnulado. As ciências naturais, - sem ajuda de maqui-
naria ou apenas com a mesma máquina feita antes (talvez ainda mais ba..
rata como no caso pa caldeira a vapor, de muitos processos químícos
a
etc.) -. ao ensinarem substituição do trabalho humano por fatores na·
turais, nada custam ao capitalista (nem à sociedade) e barateiam as mer·
cadorias de maneira absoluta.
Depois da pa~agem citada acima, prossegue Ricardo:

"Se dez pessoas movem um moinho de trigo, e se se descobrir que, com


a ajuda do vento ou da água, se pode economizar o trabalho dessas dez
pessoas, a farinha, que é em parte produto do trabalho executado pe1o
moinho,- cairá de va.101 de imediato, na proporção da quantidade de
trabalho economizada; e Q sociedade rtc(JTÓ mais rica com os mercado-
TÍllS que o trabalho dos dez homens poderá produzir, pois de 111Qneira
nenhuma diminuem os fundos destinados a mantê-los" (p. 336).

De início, a sociedade ficaria mais rica por cair o preço da farinha.


Ou consümiria mais farinha, ou gastaria o dinheiro antes destinado à fmi-

987
nha noutra mercadoria já existente ou criada, uma vez que se liberou no-
vo fundo de consumo.
Desse segmento da renda (revenue} despendido antes em farinha e
agora liberado para qualquer outra aplicação, por se ter reduzido o pre·
ço da farinha, pode-se dizer que era "destinado'' - pela economia total
da sociedade - a detenninada coisa e que agora se liberou dessa "desti-
nação"_ E como se novo capital se tivesse acumulado. E assim o empre·
go de maquinaria e de fatores naturais libera capital e capacita "neces&-
dades" antes "latentes" a se satisfazerem.
Em contraposição, é errado falar dos "fundos ·destinados a man-
ter" os dez homens que perderam o emprego em virtude da nova inven-
ção. E que o primeiro fundo economizado ou criado pela invenção é o
segmento da renda (revenue) com o qual a sociedade pagava antes fari-
nha e que agora economiza por ter caído o preço da farinha. Mas o se-
gundo fundo que se economiza é o que o moleiro pagava antes aos dez
homens agora despedidos. Esse "fundo" na realidade, como observa ru.
cardo, de maneira nenhuma se reduz com a invenção e com a demissão
dos 1O trabalhadores. Mas não tem conexão natural alguma com os 1O
trabalhadores. Estes podem ficar na miséria, morrer de fome etc. O cer-
to apenas é que l O homens da nova geração, que deveriam substituir os
da anterior na tarefa de movimentar o moinho, têm de ser absorvidos
agora por outro emprego, e desse modo aumenta a :população relativa
(sem se levar em conta o crescimento médio da população),_ pois o moi·
nho passou a ser acionado por força natural, e os 10 ·homens que, nou-
tras condições, teriam de movimentá-lo são agora empregados para pro..
duzir outra mercadoria. A invenção de máquinas e o· emprego de fatores
naturais liberam assim capital e homens (trabalhadores) e geram com o
capital liberado braços disponíveis (braços livres, como diz Steuart 18º),
possibilitando que se criem novas esferas de produção ou que antigas
se ampliem e se acionem em escala maior.
O moleiro, com o capital que lhe ficou disponível, construirá novos
moinhos ou emprestá-lo-á se ele mesmo não puder despendê-lo como capital.
Mas não há de modo nenhum um fundo "destinado" aos dez ho-
mens desempregados. Voltaremos a esta suposição absurda 181 : a de que,

180. Stcuart, An inquiry into the principies of political economy, vol. I, Dublin,
1770, p. 396. Marx cita essa pllSSllgem no manuscrito econômico de 1857/58 (ver
Gnmdrisse der Kritilc der polití&chen okonomie, Berlim, 1953, p. 666). Ver também
volume 1 desta tradução, p. 23, e O Capital, DIFEL, livro 3, vol. 6, p. 901.
18L Ver neste volume pp. 993-998. ·

988
se a introdução de máquinas (ou de fatores naturais) não reduziu a quan·
tidade dos meios de subsistência que se podem converter em salátio (há
em parte redução na agricultura quando se põem cavalos em lugar de se·
res humanos, ou quando a pecuária substituí o cultivo de cereais), o fun·
do assim liberado tem necessariamente de ser gasto como capital vatiável
(corno se não fosse possível exportação de meios de subsistência, ou não
se pudessem despender meios de subsistência com trabalhadores impro·
dutivos, nem o salário subir em certos ramos etc.) e até de ser gasto com
os trabalhadores que foram despedidos, As máquinas criam· sempre popu·
lação relativa, um exército de reserva de trabalhadores, o que muito acre:.-
ce o poder do capital.
Na nota à p, 335, ainda contr~ Say observa Ricardo:

"Adam Smith, que definiu riqueza como a abundâncía de meios de


subsistência, de cnisas úteis e de coisas agradáveis para a vida humana,
teria admitido que mdqufnas e fatores naturais podem trazer aclésci·
mo enorme à riqueza de um país, mas não que adidonemalgoaova-·
/or dessa riqueza. "

Na verdade, os fatores naturais nada adicionam ao valor, desde que


não enccintrem circunstâncias em que dêem oportunidade à criação de
renda (rent). Mas, as máquinas sempre adicionam ao valor existente seu
fJTÓprio valor e, desde que sua existência (l) facilita a conversão ulterior
de capital circulante em füm e permite reali.z.ar-se essa conversão em esca-
la sempre crescente, aumentam não só a riqueza, mas também o valor
que o trabalho pretérito adiciona ao produto do trabalho anual, (2) ao
possibilitarem o crescimento absoluto da população e com ele o da quan·
tidade do trabalho anual. acrescem de outra forma.o valor do produto anual.

e) Probidade de Ricardo ao rever suas idéias sobre o emprego


das máquinas. Mantém suposições errôneas na nova
formulação do problema.

Dlpltulo XXXI "On Machinery ".


Esse capítulo, que Ricardo adiciona à terceira edição demonstra a
probidade que marca a distinção essencial que o separa dos economistas
vulgares.

989
"Sinto-me tanto mais obrigado a expor minha opinião sobre essa ques·_
tãon (isto é, "a influência das máquinas nos interesses das difer\:ntes
classes sociais"), "poxquanto ela passou por coll!liderâvel mudança em vir-
tude de novas reflexões. Embora não me ocorra ter jamais publicado
alguma coisa referente a máquinas da qual tenha de me retratar, con-
tudo apo~j por outras vias" (como ~lamentar'1) 182 "doutrinas que
agora acho eaõneas. Por ~' é para mim um dever submeter a exame
meus pontos de vista atuais, oom as razões para sustentá-los" (p. 466).
"Desde que pela primeira vez voltei minha atenção para questões de
economia política, tenho opinado que emprego de maquinaria em qual-
quer ramo de produção, se economiza trabalho, favorece o bem geral
e que só o acompanham aqueles inconvenientes que, na maioría dos
casos, aparecem no deslocamento de capital e trabalho, de uma apli-
cação para outra."

(Esses inconvenientes são bastante grandes para os trabalhadores


quando, como se dá na produção modema, são perpétuQs.)

"Pareceu-me que os donos da teaa, uma vez que mantivessem as mes--


mas rendas (1"ents} monetárias, seriam beneficiados pela redução dos
preços de algumas das mercadorias em que se despendem aqúelas ren·
das (rents), reduçã"o de preço que mio poderia deixar de ser a conse·
qüência do emm-e~ de maquinaria. O capitalista, pensava eu, era afinal
beneficiado precisamente da mesma maneira, Na verdade, o que in·
venta a máquina, o que primeiro a aplica, fruirá vaniagem adicional
ao fazer grandes lucros durante algum tempo; mas, à medida que a
máquina cair no uso getal, o preço da mercadoria produzida, em vir-
tude dos efeitos da competição, baixará ao nível dô- custo- de produ-
ção, quando o capitalista obterá o mesmo lucro monetário de antes
e participará apenas da vantagem geral como conswnidot, ficando ca-
pacitado a dispor, com a mesma reqda (revenue) monetária, de quan-
tidade adicional de bens úteis e agradáveis. A ,classe dos traba1hadore!f
também, achava eu, era por igual bemJficiada pelo emprego da maqui-
naria, pois teriam os meios de comprar mais mercadorias com o mes-
mo sa.lárío monetário, e - pensava -- não haveria redução de salário,
pcrque o capitalista te1"ia o pcder de procura e de emprego da mesma
quantidade ante1ior de trabalho, embora fosse forçado a empregá-lo
para p1oduzir mercadoria nova ou em todo caso diferente. Se, com
maquinaria aperfeiçoada e empregando-se a mesma quantidade de txa-
baJho, a quantidade de meias pudesse ser quadruplicada e apenas do.
brwe a procura delas, haveria trabalhadores que te1iam de deixar o
ramo de meias; mas como o capital que O.f empregava continuava a

182. O mais provável é que Ricardo aí se refira a seu discurso n_a Câmara dos Co-
muns, em 16 de dezembro de 1819, sobre a proposta de William De Crespigny, de
constituir urna comissão especial a fim de examinar o plano de Robert Owen para
eliminar o desemprego e melhorar a situação das classes inferi.ores.
Naquele discurso disse Ricardo que não se podia negar que "as máquínas não re·
duútam a procura de trabalho" (ver The works and correspondence of David Rícu-
do, edit. por Píero Straffa, vol. V, Cambridge, 1952, p. 30).

990
existir e como era interesse daquele: que o detinham emrnegá-lo pro·
dutivamente, pareceu-me que esse capital se aplicaria na produção de
outras m etc.ado.rias úteis à sociedade, para as quais não podia deixar
de haver procura... E como achei entãp que haveria a mesma procura
anterior de trabalho e que os saláiios não seriam mais baixos, penseí
que a classe trabalhadora, por igual com as .outras classes, participaria
da vantagem deco.nente do barateamento geral d~ mercado.rias, oriun·
do do emprego de m:lquinas. Essas eiam minhas opiniões, e contínuam
Inalteradas no tocante ao dono da terra e ao capitalista; mas estou con-
vencido de que a substituição de trabalho humo.no por máquinas traz
muitll4 pezes grande prejuízo .Q classe do~ trabalhadores" {pp. 466 a 468).

Primeiro que tudo, parte Ricardo da suposição errada de a maquina-


ria introduziMe sempre em esferas de produção onde já existe o modo de
produç!ro capitalista. Mas, na origem, o tear mecânico substitui o tecelão
manual,. a máquina de fiar Jenny, o fiandeiro manual, a máquina de cei·
far, a de debulhar e a de semear, possivelmente o pequeno lavrador inde-
pentlente e assim por diante. Aí ocorre o afastamento do trabalhador, e
ademais seu instrumento de produção cessa de ser capital (no sentido
rlcardiano). Essa depreciação completa e absoluta do velho capital surge
também. quando a maquinaria revoluciona a manufatura fundada até en-
tão na simples divisão do trabalho. Aí seria tolice dizer que o "velho ca-
pital" continua a proporcionar a mesma procura anterior de trabalho.
O "capi~" que era empregado pelo tecelão manual e pelo fiandei-
ro manual etc. cessou "de existir".
Mas, para simplificar a pesquisa, admitamos que a maquinaria seja
apenas introduzida (sem dúvida não se trata aqui do emprego da maqui-
naria em novos ramos) em esferas onde já eXiste produção capitalista (ma-
nufatura) ou na oficina já baseada na máquina, acentuando-lhe o caráter
automático, ou utilizando.se máquinas aperfeiçoadas que permitam a dis-
pensa de parte dos trabalhadores até então empregados ou o emprego da
mesma quantidade anterior de trabalhadores, mas com a obtenção de pro-
duto maior. Este último é o caso mais favorável, sem dúvida.
Para diminuir a confusão releva distinguir duas coisas: (1) o fundo
do capitalista que emprega maquinaria e despede trabalhadores; (2) o
fundo da sociedade, dos consunúdores das mercadorias desse capitalista.
Observaçlies sobre fl ). No tocante ao capitalista que introduz a má-
quina, é errado e absurdo dizer que ele pode despender em salário o mes-
mo montante anterio1 de capital. (Mesmo quando toma emprestado, aque-
la asserção continua errada, não para ele, mas para a sociedade.) Converte
seu capital em maquinaria e noutros itens do capital fixo, em matérias
auxiliares de que não precísava antes, e a parte maior dele em matéria-

99]
prima, se adnútimos que com número de trabalhadores reduzido produz·
mais mercadorias e portanto precisa de mais matéria-prima. Em seu r_amo
díminuiu a pmporção do capital variável, isto é, do capital despendido em
salário, com o capital constante. E essa proporção reduzida permanecerá
(e até se acentuará ainda o- decréscimo do capital variável em relação ao
constante, em virtude de se desenv.olver a produtividade do trabalho com
a acumulação), mesmo quando seu negócio na nova escala de produção.
se amplie tanto que ele possa empregar de novo todos os trabalhadores
despedidos, e possa até empregar mais trabalhadores que antes. (A pro-
cura de trabalho crescerá em seu negócio com a acumulação do capital,
mas em ritmo menor que aquele em que o capital se acumula, e seu ca-
pital nunca mais será, em absoluto, o mesmo agente anterior de procura
de trabalho. Mas resulta de imediato que parte dos trabalhadores é lança-
da no olho da rua.)
Mas, dirão, a procura de trabalhadores continuará indiretamente
a mesma, pois aumentará a procura deles para construção de máquinas.
Mas o próprio Ricardo já mostrou que a maquinaria nunca custa tanto
trabalho quanto o que substitui. E possível que as horas de trabalho nas
oficinas mecânicas sejam prolongadas por algum tempo e nenhum homem
a mais possa nela ser de início empregado. A matéria-prima - aJgodão,
por exemplo - pode vir da América e da China, e para ·os ingleses des-
pedidos do trabalho em nada importa que aumente a procura de negros
ou de cules. Mas, mesmo supondo-se que a matéria-prima se produza no
interior do país, mais mulheres e crianças se empregarão na agricultura,
mais cavalos etc., talvez se produza mais desse produto e menos de ou-
tro. Mas não haverá procura dos trabalhadores despedidos, uma vez que
também na agricultura se efetiva o mesmo processo que gera superpopu-
lação relativa permanente.
Vê-se logo que não é provável que a introdução de maquinaria li-
bere, no primeiro investimento, capital do fabricante. Este apenas lhe
dá outra aplicação cujo resultado imediato, segundo o próprio pressu-
posto, é a dcnússão de trabalhadores e a conversão de parte do capital
variável em constante.
Observações sobre (2). Em virtude de baratearem as mercadorias
produzidas pela máquina, libera-se renda (revenue) para o público, an-
tes de mais nada; capital de imediato - só na medida em que o artigo
fabricado entra como elemento de produção no capital constante. (Se
entrar no consumo médio dos trabalhadores, a conseqüência, segundo

992
diz o próprio Ricardo, será redução dos salários reab 183 também nos ou-
tros ramos industriais.) Parte da renda liberada se gasta em tal artigo: seu
barateamento toma-o ace~ível a novas classes de consumidores (neste
caso, aliás, não se despende no artigo renda liberada), ou os velhos con-
sumidores consomem mais do artigo que barateou, por exemplo, 4 pares
de meias de algodão em vez de um par. Outra porção da renda assim li·
berada pode servír para ampliar a indústria onde se introduz a maquina-
ria, ou para fonnar novo ramo onde se produz mercadoria diferente, ou pa-
ra acrescer um ramo antes existente. Qualquer que sejá a destinação, a renda
assim liberada e reconvertida em capital, antes de mais nada. mal chegará
para absorver aquela parte do acréscimo demográfico a qual aflui todo ano
para cada ramo e fica nas circunstâncias do momento bloqueada por aque·
la indústria. Mas também é possível que parte da renda liberada se troque
por produtos estrangeiros ou seja consumida por trabalhadores improdu-
tivos. Mas não há de modo algum conexão necessária entre a renda que fi-
cou liberada (livre) e os trabalhadores que ficaram despojados (livres) de
renda.
Contudo, a absurda suposição básica subjacente em Ricardo é a se-
guinte:
Não se libera o capital do fabricante que-introduz; maquinaria. Ape-
nas recebe outra destinação, ou seja, wna aplicação em que não se conver-
te como dantes em salárío para os trabalhadores que foram despedidos.
Em parte se transforma de variável em constante. Parte dele, mesmo que
se libere, será absorvida por esferas onde os trabalhadores despedidos não
podem trabalhar e que no máximo constituem refúgio para os substituintes.
Mas a renda liberada - desde que sua disponibilidade não se anule
por consumo maior do artigo que barateou ou desde que não se troque
por meios de subsistência estrangeiros -, ao ampliar os ramos antigos
ou ao abrir novos, dá apenas a necessária válvula de escape (se dá) àquela
parte a empregar do acréscimo anual da população, a qual no momento
encontra fechado aquele ramo onde se introduziu maquinaria.
Mas o absurdo subjacente em Ricardo é este:
Os meios de subsistência antes consumidos pelos trabalhadores des-
pedidos continuam, porém, a existir e estão, como dantes, no mercado.
Ademais, seus braços também se encontram no mercado. Temos portan-
to de um lado meios de subsistência (e por isso meios de pagamento) pa·
ra trabalhadores, capital variável em potência; do outro, trabalhadores
desempregados. E existe ainda o fundo para pô-los em movimento. E em
conseqüência encontrarão emprego.
ts3: Sobre o conceito ricardíano de "salários reais" ver neste volume pp. 833,
834, 836, 837, 848, 854, 855 e 869.

993
S possível que até um economista como Ricardo nos venha com essa
charla arrepiante?
De acordo com ela, um ser humano em condições e com vontade
de trabalhar nunca poderá passar fome na sociedade burguesa se há meios
de subsistência no mercado, na sociedade, para lhe pagar por uma ocupa-
ção, seja qual for. E primordialmente esses meios de subsistência de mo-
do nenhum se contrapõem àqueles trabalhadores como capital.
Admitamos sejam 100 000 trabalhadores de súbito despedidos por
máquinas. Antes de mais nada, não há dúvida alguma que os produtos
agrícolas disponíveis no mercado, os quais em média bastam para o ano
todo e antes. eram consumidos por aqueles trabalhadores, continuam no
mercado. Se não houvesse procura deles - e se ao mesmo tempo não fos-
sem exportáveis - t qual seria a conseqüência'! Uma vez que a oferta ~ve­
ria t:rescido em relação à procura, teriam queda de preço, e o consumo, em
conseqüência, aumentaria, embora 100 000 trabalhadores morram de fo.
me. Nem sequer tem de cair o preço. Talvez se importem menos ou se ex-
portem mais meios de subsistência.
Ricardo constrói a fantasia de ser o mecanismo social burguês tão
bem regulado que, se 10 homens, por exemplo, forem despedidos do tra·
balho, seus meios de subsistência - agora liberados - têm de ser consu-
midos de qualquer modo por esses mesmos 10 homens,ou do contrário
não poderão ser fornecidos a ninguém, como se não -estivesse rastejando
sempre no chão dessa sociedade uma massa de desempr_egados parciais
ou totais. E como se o capital consistente nos meios de liubsjstência fosse
grandeza fixa.
Se o preço de mercado do trigo caí~e em virtude de procura de-
crescente, o capital existente em trigo dimínuiria (éomo capital-dinheiro)
e trocar-se-ia por parte menor da renda (revenue) monetária da socieda-
de, desde que não fosse exportável. E ainda por cima o que se dá com os
produtos acabados. Durante os muitos anos em que os tecedores a mão
iam sendo dizimados pela fome, cresceram enormemente a produção e a
exportação dos tecidos de algodão ingleses. Ao !llesmo tempo (1838-1841)
subiam os preços- dos alimentos. E aqueles tecelões só tinham farrapos
para se vestir e nãü dispunham de alimentos suficientes para sobreviver.
A produção artificiàl constante de uma superpopulação, só abso:rvida
nas fases de prosperidade febril, é uma das condições necessárias da pro-
dução para a indústria moderna. Nada se opõe a que parte do capital·
dinheiro fique ociosa e sem emprego, ao mesmo tempo que -baixam os
preços dos meios de subsistência em virtude de superprodução relativa,
e os trabalhadores desempregados pelas máquinas são dizimados pela fome.

994
Sem dúvida, a longo prazo - o que porém favorece mais os sucesso-
res dos que foram despedidos que a estes mesmos - o trabalho liberado
em conjunto com a parte liberada da renda (revenue) ou do capital tem
de achar saída num novo ramo ou na expansão dos antigos. Formam-se
constantemente novas ramificações de esferas de trabalho mais ou me·
nos improdutivas, onde se despende renda de maneira direta. Ademais,
temos a formaçlfo de capital fixo (ferrovias etc.). indutora de trabalho
de superintendência, de fabricação de artigos de luxo etc., de comércio
exterior, que diferencia cada vez mais os objetos em que se despende ren-
da (revenue).
Por isso, de acordo com seu prisma, Ricardo admite que a intro-
dução da maquinaria só prejudica os trabalhadores quando diminui o
produto bruto {e em conseqüência a renda bruta). caso sem dúvida pos-
sível na agricultura em grande escala - a introdução de cavalos que subs-
tituem os trabalhadores. no conswno dos cereais, a conversão do cultivo
de cereais em criação de ovelhas etc.; mas absurdo maior é estender essa
possibilidade à indústria propríamente, que de modo algum restringe o
mercado de seu produto bruto ao mercado interno. (Aliás, quando par-
te dos trabalhadores é dizimada pela fome, parte pode alimentar-se me·
lhor, vestir-se melhor, e também os trabalhadores improdutivos e os es·
calões intermediários entre traba1hador e capitalista.)
Em si mesmo é errado dizer que, por natureza, o aumento (ou a
quantidadé) dos artigos que entram na renda (revenue) constitui fundo
para os trabalhadores ou forma capital para eles. Desses artigos parte é
consumida por trabalhadores improdutivos ou por não trabalhadores, par-
te pode sair da forn:ta em que serve de salário - da sua forma primária -
e por meio do comércio exterior converter-se em forma em que entra na
renda dos ricos ou serve de elemento para produzir capital constante.
Resta uma fração que os próprios trabalhadores despedidos consumirão
nos asilos de trabalho, na cadeia, ou na forma de esmola, de fwto ou como
salário da prostituição de suas filhas.
Adiante compararemos sumariamente as passagens onde Ricardo
desenvolve sua fantasia. O impulso para essa exposição, como ele mesmo
diz, recebeu da obra de Barton, que é mister por isso examinar após ci-
tar aquelas passagens.
l! por si mesmo evidente que, para se empregar todos os anos nú-
mero determinado de trabalhadores, é necessário produzir anualmente
determinada quantidade de alimentos e de outros meios de subsistência.
Na agricultura em grande escala, pecuária etc., é possível que a renda If.

995
quida (lµcro e renda fundiária) acresça, enquanto diminuí a renda bruta,
a massa dos meios de subsistência, destinados à manutenção dos, tr.aba·
lhadores. Mas não é disso que se trata aqui. A massa dos arti~os que en-
tram no consumo pode aumentar ou - para utilizar a expressão ricardia·
na ·-dos artigos que entram.na renda· bruta, sem que por isso acresça des-
sa massa o segmento que se convert~ em capital variável. Este pode até di-
minuír. Aumenta então, por via da forma de renda (revenue), o consu-
mo dos capitalistas, dos donos das terras, de seus servidores, das classes
improdutivas, do estado e dos escalões intermediários (comerciantes) etc.
Na origem, Ricardo partiu do pressuposto, que lhe está subjacen-
te (e em Barton), de ser toda acumulação de capítal = acréscimo do c:api-
tal variável, daí a procura de trabalho aumentar diretamente na mesma
proporção em que ·o capital se acumula. Mas essa idéia é falsa, uma vez
que se altera, com a acumulação do capital, a composição orgânica, e a
parte constante aumenta em progressão mais rápida ql.te a parte variável.
Esse fato, contudo, não impede que tenha a renda (revenue) crescimento
constante, em valor e em quantidade. Mas, por isso, não é na mesma pro-
porção que se despende em salário grande parte do produto global. Au-
mentam as classes e subclasses que não vivem diretamente do trabalho,
com nível de vida melhor que ó anterior, e também acresce o número dos
trabalhadores improdutivos.
Não trataremos da renda (revenue) do capitalista que transforma par-
te de seu capital variável em maquinaria {e por í~o em todos os ramos de
produção onde a matéria-prima constitui elemento do processo de criar
valor, aumenta a matéria·p~ em relação ao trabalho aplicado), uma
vez que essa renda, primeiro que tudo, nada tem a, ver com a questão.
Seu capital de fato absorvido no processo de produção e sua renda;· antes
de mais nada, existem na forma dos produtos, ou melhor, das mercado-
rias que ele mesmo produz, em fio por exemplo, quando é fabricante de
fios. Parte de~s mercadorias {ou do dínheiro por que as vende) conver·
te ele em maquinaria, matérias auxiliares e matérias-primas (depois de in-
troduzir as máquinas), em vez de despendê-la como dantes em salários
dos trabalhadores, e assim convertê-la indiretamente em meios de subsis-
tência dos trabalhadores. Com algumas exceções na agricultura, produzi-
rá de suas mercadorias mais que antes, embora seus trabalhadores des-
pedülos tenham ce~ado de ser consumidores e portanto compradores
de seus próprios artigos. o que eram na fase anterior. Agora existem mais
dessas mercadorias no mercado, embora, para os trabalhadores lançados
no olho da rua, tenham deixado de existir ou não existam mais no mes-

996
mo volume anterior. Por isso, antes de mais nada, no tocante a seu pró-
prio produto, mesmo quando entra no consumo dos trabalhadores, seu
acréscimo não está em contradição com a ctrc!lllstância de parte ter ces-
sado de existir como capital para os trabalhadores. Parte maior (do pro·
duto global), em contrapartida, tem agora de repor a fração do capital
constante constituída por maquinaria, matérias auxiliares e matérias-pri-
mas, ou tem de se trocar por quantidade maior que a anterior, desses in·
gredientes da reprodução. Se o aumento das mercadorias por meio de
máquinas estivesse em contradição oom o decréscimo de procura antes
existente para essas mercadorias produzidas por essas máquinas (a saber,
a proCW'll dos trahalhaík>res despedidos), não seria possível na maioria
dos casos a introdução delas. O volume das mercadorias produzidas e a
porção delas que se reconverte em salário não têm, primeiro que tudo,
nenhuma relação determinada ou conexão necessária entre si, quando
examinamos o próprio capital, no tocante a segmento que é reconverti-
do em maquinaria em vez de o ser em salário.
Na sociedade em geral ocorrerá reposição da renda (revenue) ou an-
tes expansão dos limites dela, antes de mais nada no artigo que a maqui~
naria barãteou. Essa renda pode ser como dantes despendida como ren-
da, e logo que parte maior dela se transforma em capital, já existe o acrés·
cimo de população, além da superpopulação por artifício gerada, para
absorver da renda o segmento que se transforma em capital variável.
Á primeira vista, portanto, resta apenas isto: a produção de todoo
os demais artigos, sobretudo nos ramos que produzem os destinados ao
consumo dos trabalhadores - apesar de os 100 homens serem despedi·
dos etc. - está na mesma escala anterior; com toda certeza, no momen-
to em que eles são despedidos. Desde que os trabalhadores despedidos
representavam portanto procura desses artigos, a procura diminui, em·
bora a oferta continue a mesma. Asshn, se essa lacuna não for preenchl-
da, ocorrerá queda de preço (ou em vez de cair o preço, pode ficar so-
bra maior no mercado para o ano seguinte). Se o artigo não for ao mes·
mo tempo de exportação, e perdurar a carência da procura, dimiriuirâ
a reprodu'ção, mas não necessariamente o capital aplicado no ramo. Tal·
vez se produzam mais carne ou gramíneas comerciais ou comestíveis de
luxo, menos trigo ou mais aveia para cavalos etc., ou menos casacos de
fustão e mais sobrecasacas burgueses etc. Mas não seria de modo algum
necessário que ocorresse qualquer uma dessas conseqüências, se, por exem-
plo, em virtude de baratearem os artigos de algodão, os trabalhadores em·
pregados tivessem mais para despender em alimentos etc. A mesma quan·

997
tidade de mercadorias - e também daquelas que entram no consumo.
dos trabalhadores - pode ser produzida e até mais. embora menos _capi~
tal, parte menor do produto total, se converta em capital variável, se des·
penda em salário. ·
Também não é verdade que parte do capital dos produtores daque-
les artigos se tenha liberado. Na pior hipótese terá diminuído a procura
de sua mercadoria, e por isso a reprodução de seu capital se dá com di-
ficuldade, com baixa de preço dessa mercadoria. Assim, sua própria ren-
da (revenue} baixaria temporariamente, como ocorre em toda queda dos
preços das mercadorias. Mas não se pode dizer que uma. parte qualquer
de suas mercadorias enfrentava como capital os trabalhadores despedi-
dos e que agora, ao mesmo tempo que eles, fica "liberada". O que os en·
frentava como capital era uma parte da mercadoria ora produzida por má-
quinas, parte que lhes afluía como dinheiro e que eles trocavam por ou-
tras mercadorias (meios de subsistência), que em relação a eles não se com-
portavam como capital, mas ao dinheiro deles se contrapõem como mer-
cadoria. Esta é portanto uma relação de outra natureza. O arrendatário
etc., cuja mercadoria compravam com seu salário, não os enfrentava co·
mo capitalista nem os empregava corno trabalhadores. Para ele deíxaram
de ser compradores, o que lhe' pode acarretar - se não houver a compen-
sação de outras circunstâncias - depreciação momentânea· do capital, mas
não libera capital para os trabalhadores despedidos. O; capital que os em-
pregava "ainda existe", porém não mais em forma em que se reduza asa-
lário (a não ser indiretamente, em proporção ínfima).
Do contrário, toda pessoa que, por um azar qualquer, deixa de ter
dinheiro liberaria necessariamente capital para seu próprio emprego.

d) Conseqüências da introdução das máquinas para a dasse


trabalhadora, segundo Ricardo.

Por renda (reveizue} bruta entende Ricardo a parte do produto que


repõe o salário e a mais-valia (lucro e renda fundiária); por renda líquida,
o produto excedente ~ mais-valia. Aí, como em toda a sua economia.
esquece que parte do produto bruto tem de repor o valor da maquinaria
e da matéria-prima, em suma, do capital constante.
E de interesse a exposição subseqüente de Ricardo, tanto por vá-
rias observações intercorrentes, quanto por ser ela, mutatis mutandis, de

998
importância prática para a agricultura em grande escala, em pmicular
para a criação de ovelhas, e assim evidenciar de novo os limites da pro-
dução capitalista. O fun que a determina não é produzir pura os produ.
tores (trabalhadores); seu fim exclusivo é a renda liquida (lucro e renda
fundiária), mesmo que alcançada às custas do volume da produção - ãs
custas do volume produzido de mercadorias.

"Errei por supor que sempi-e que aumenta a renda liquida de uma sir
cieda.de, também aumenta a renda total; mru: agora tenno motivos bas·
tantes para me convencer de que pode acrescer o fundo donde or do·
nos dai; terras e os capitalistas retiram rua renda, e ao mesmo tempo
decreicer o fundo de que depende fundamentalmente a clane traba-
lhadora. Daí, se e~tou certo, rew1ta que a mesma causo que pode au-
mentar a renda líquida do país, pode ao mesmo tempo gerar popula·
çiio excedente e deteriorar a.situa?o do trabalhador" (p. 469).

Antes de mais nada cabe observar que Ricardo admite aí que causas
que favorecem· a riqueza dos capitalistas e dos donos das terras "podem
gerar população excedente': e assim o excesso de população representa
aí o resultado do próprio processo de enriquecimento e do desenvolvi-
mento das forças produtivas, condicionador desse processo.
Quanto ao fundo donde os capitalistas e donos das terras tiram
sua renda (revenue), e àquele donde os trabalhadores tiram a sua, o pro-
duto global é, antes de tudo, a fonte comum. Dos produtos que entram
no consumo dos capitaHstas e dos proprietários das terras, grande parte
não entra no consumo dos trabalhadores. Contudo, auase todos. de fa-
to mais ou menos todos os produtos que entram no consumo dos traba-
lhadores, também entram no dos proprietários das terras e dos capitalis·
tas, no de seus serviçais e parasitas, inclusive cães e gatos. Não se pode
conceber que existam aí dois fundos fixos, segregados por natureza. O
importante é a cota proporcional que cada uma das partes retira desse
fundo comum. O objetivo da produção capitalista é gerar, com dado mon-
tante de riqueza, a maior quantidade possível de produto excedente ou
de mais-valia. Alcança-se esse objetivo porque o capital constante cres·
ce em velocidade relativamente maior que o variável ou porque com o
mínimo possível de capital variável movimenta-se o máximo possível de
capital constante. Por conseguinte, em sentido muito mais geral que o
entendido aí por Ricardo, a mesma causa gera acr~scímo do fundo don-
de capitalistas e proprietários das terras retiram sua renda (revenue}, redu-
zindo o fundo donde os trabalhadores retiram a deles.

999
Daí não se segue que o fundo donde os trabalhadores tiram sua
renda diminua em termos absolutos; mas sim que decresça em termos
proporcio111lis, em relação à produção total deles. E só isto importa ·para
detennlnar a cota de que se apropriam, da riqueza por eles mesmos criada,

"Admitamos empregue um capitalista capital no valor de 20 000 li-


bras e com estas realize empreendlmento conjunto de arrendatário e
de fabricante de meios de subsistência; que desse capital aplique 7 000
libras em capital fixo, isto é, em edifícios, implementas etc., e as res-
tantes 1:3 000, em capital circulante, pan manter os trabalhadores. Se-
jam os lucros de 10%, e em conseqüência todo ano o capital recupe1e
o ~tado original de eficiência e dê um lucro de 2 0()0 libras.
Todo ano, o capitalista inicia suas operações aanazenando alimentos
e outros meios de sub$istência no valor de 13 000 libras, e vende tudo
isso no dec-0ner do ano a seus próprios trabalhadores por essa soma
de dinheiro; durante o mesmo período paga-lhes o mesmo montante
de dinheiro em salários. No fim do ano, os trabalhadores lhe restituem
alimentos e outros meios de subsistência no valor de 15 000 libras, das
quais ele mesmo consome 2 000 libras ou destas dispõe segundo mais
lhe agrade ou satisfaça."

(A natureza da mais-valia está expressa aí de maneira bem palpável.


A passagem está nas pp. 469, 47,0.)

"No tocante a esses produtos, o produto bruto para esse ano é de 15 000
libras, e o produto Iíquído, 2 000. Admitamos agóra que no ano seguin-
te o capitalista empregue metade de seus homens para const.ruil: uma
máquina, e metade para produzir alimentos e outros meios de subsis-
tência como de costume. Mas que se daria então ne'sse nóvo ano?
EnqUJnto se constrói a máquina, só se obtém metade da quantidade
usual de alimentos e outros meios de rubsistência, com metade ape-
nas do valor da quantidade antes produzida. A máquina valerá 7 SOO
libras, e os alimentos e outros meios de subsistência, 7 SOO horas; o
capitalista por isso disporá de capital da mesma magnitude anterior,
pois, além daqueles dois va101es, terá capital fixo no valor de i 000
hl>ras, o que no todo pmaz 20 000 horas de capital e 2 000 de lucro.
Depois de deduúr esta quantía para as pr6prias despesas, terá um car
pltal circulante nio superior a 5 500 libras, para executar suas opera-
ções rubseqiientes. Seus meios de empregàr trabalho se reduzi.tão assim
de 13 000 Ubus para 5 SOO libras, e em c.onseqüência tomaNe-á SU•
ph'fluo o trabalho todo que ante1 era etn[)7egádo lJO' 7 500 libras."

[Mas isso também ocorrerá se, por meio da máquina que custa 7 500
libras se produzir quantidade de produtos tão grande quanto a que se pro-
duzia ames com um capital variável de 13 000. Supondo-se que o desgas-
te da máquina seja de 1/10 por ano, de 750 libras, o valor do produto se-

1000
rá agora 8 250 libras; antes era 15 000 libras ( onútido o desgaste do capi-
tal fixo original, de 7 000 libras, sobre cuja reposição .Ricardo nada diz).
Daquelas 8 250 libras, 2 000 serão lucro, como das 15 000 libras de antes.
O arrendatário levará vantagem no seu consumo, por via da renda, dos ali-
mentos e outros meios de subsistência. Terá ainda a vantagem de ficar
habilitado a reduzir o salário dos trabalhadores por ele empregados, e
porção de seu capita] variável se liberará. E essa porção que, até certo
ponto, pode1á empregar novo trabalho, mas só porq\le terá caído o sald·
rio real dos trabalhadores mantidos. Assim paite dos despedidos poderá -
às custas dos mantidos - empregar-se dé novo. Mas a circunstância de o
produto ser tão gi:ande quanto o anterior, de nada adiantará aos trabalha-
dores despedidos, Se o salário permanecer o mesmo, nenhuma porção do
capital variável ficará disponível. O produto de 8 250 libras representa a
mesma quantidade de meios de subsistência, inclusive alímentos, obtidos
antes com IS 000 libras; esse fato não faz subir seu valor. O arrendatário,
para repor tanto o desgaste da máquina quanto seu capital variável, terá
de vendê-los por 8 250 libras. Se esse barateamento de alimentos e de ou-
tros meios de subsistência não tiver acarretado baixa geral de salário ou
baixa nos compo.llentes que entram na reprodução do capital constante,
aumentará a renda da sociedade, mas só na medida que se despenda em
alimentos e outros meios de subsistência. Viveria melhor parte dos traba·
lhadores improdutivos e produtivos etc., eis tudo. (Poderiam também eco-
nomizar, o que sempre corresponde a ação futura.) Os trabalhadores des-
pedidos ficariam coroo dantes no olho da roa, embora continuasse a exis-
tír a mesma possibilidade ffsica anterior de sustentá-los. Ademais, o mes-
mo capital precedente se1ia aplicado na reprodução. Mas do produto (cujo
valor caíu), parte que antes existia na forma de capital, exi&te agora na
de renda.]

"Com a ajuda da máquina e após deduções para repar.í.·la, a quantida-


de de trabalho reduzida que o capitalista pode empregar tem de produ-
zir, por certo, valor de 7 SOO libras; tem de repor o capital circulante
com um lucro de 2 000 libras sobre o capital todo. Mas, se isso ocorre,
se a renda líquida não diminui, que importa ao capitalista ter a renda
bruta o valor de 3 000, 10 000 ou 15 000 libras?

(Absolutamente certo. A renda brll!a não tem a menor ímportância


para o capital. Interessa-se apenas a renda líquida.)

"Nesse caso, embota o produto líquido não tenha menor valor e seu
poder de oomprar mercadorias aument11 . muito, o valor do produto
bruto rerá caído de 1 S 000 libra~ para 7 500. E como o poder de sw;.

1001
tentar uma populllção e de empregar trabalho dépende sempre do pro-
duto bruto de uma n11ção e não do lfquido,"

[Daí a preferência de A. Snüth pelo produto bruto, combatida por


Ricardo. Ver capitulo XXVI "On Gross and Net Revenue'~ qúe Ricardo
abre com estas palavras:

"Adam Smith constantemente exagei:a as vantagens que um paÍ5 conse-


gue de uma grande renda bruta em relação às que o"btém de uma gra.n-
de Ienda líquida" (p. 415).]
"haverd nece~riJZmente decréscimo da procura de trabalho, a popula-
ção tornar-se-d demasiada, e a sítuação da classe trabalhadora seiá de
sofrimento e pobreza."

(A mão-de-obra se torna excessiva porque diminui a proeura de tra-


balho, e essa proeura decresce em conseqüência do desenvolvimento da
produtividade do trabalho. Aquela passagem em Ricardo, p. 471.)

"Mas, uma vez que o poder de retirar economias da renda para acres-
cer o capital tem de depender da capacidade da renda lfquida p:uà sa-
tisfazer as necessidades do capitalista, é inevitável que este, com as
mesmas necessidades" (mas ~'UaS necessidades aumentam), "em face
da redução do preço das mercadorias oriunda da introdução de maqr.â·
mula, tenha maiore:; poSJif!ilidades de poup®ça, maior facilidade para
converter renda em capital. " , -

[De acordo com isso, prímeíro, transforma-se em renda, transfere-se


para renda parte do capital - não em valor. mas em valor de úso, nos ele-
mentos materiais em que consiste - a fim de que mais' tarde parte da ren-
da se reconverta em capital. Por exemplo, quando se,. despendiam 13 000
libras em capital variável, parte do produto no montante de 7 500 libras
entrava no consumo dos trabalhadores que o arrendatário empregava, e
essa parte do produto constituía parte de seu capital. Em virtude da in-
trodução de maquinaria, produzir-se-á, por exemplo, de acordo com nos·
sa suposição, tanto produto quanto antes, mas seu valor só chega a 8 250
libras e não às_ 15 000 anteriores. E desse produto que barateia, fração
maior entra na renda (revenue) do arrendatário ou na dos compradores
de alimentos e outros meios de subsistência. Agora consomem eles como
renda a fração do produto, a qual antes os trabalhadores (os despedidos)
do arrendatário consumiam por certo como renda, mas ele consunüa in·
dustrialmente na fonna de capital. Em corueqüência desse crescimento da
renda (revenue) - surgido porque se consome como renda a fração ~o pro·

1002
duto consumida antes como capital - fonna-se novo capital e renda se
~oonverteem capital.]

"A cada acréscimo de capital empregará ele mais trabalhadores"

(em todo caso, não na razão do acréscimo do capital, não em toda a exten·
são desse acréscímo. Comprará talvez mais cavalos, ou guano, ou novos
implementos),

"e pox isso t:mpregar-se-á mais tarde parte das pessoas que no 1nfcio fo-
ram despedidas. E caso a produção acrescida pelo emprego da mtiqui·
N1 se torne tão grande que forneça na forma de produto liquido quan-
tidade de ahmentos e outros meio~· de subsistência tio grande quanto
a que existia. tmtes na de produto bruto, haverá a mesma capacidade
para empregar a população toda, e po.c isso não havezá necessariamen-
te" (mas é possível e provável que haja) "uma população excedente"
(pp. 469-472).

Nas últimas linhas diz Ricardo portanto o que observei acima. Para
a renda transformar-se dessa maneira em capital, capital se converte antes
em rendâ. Ou como expressa Ricardo: pdmeiro, o produto líquido aumen-
ta às custas do produto bruto, para parte do produto líquido se reconver-
ter então em produto bruto. Produto é produto. Líquido ou bruto, tanto
faz (embora a antinomia possa incluir o acréscimo do excedente sobre as
despesas, isto é, do produto liquido, apesar do decréscimo da totalidade
do produto, isto é, do produto bruto). O produto vem a ser bruto ou lí-
quido conforme a forma determinada que toma no processo de produção.

"Tudo que desejo p1ovar é que redução do produto bruto pode acom·
panha.r a invenção e emprego de máquinM; o que, sempre que suce-
da, sera prejudicial à classe trabalhadora, pois vários serão d.espedí -
dos de suas fileiras, e a população ficará excessíw:r em relação aos fwi-
dos destitUldos a empregá-la" (p. 4 72).

Mas, o mesmo pode ocorrer e na maioria dos casos ocorrerá, ainda


quando o produto bruto não varie ou aumente; só que a parte que antes
operava como capital variável está sendo consumida agora como renda.
E desnecessário examinar aqui o exemplo absurdo que Ricardo
apresenta nas páginas seguintes (472 a 474), do fabricante de tecidos que
reduz sua produção por ter nela introduzido maquinaria.

1003
"Se estas idélas estão corretas, infere·se que:
(1) a invenção e o emp1ego útil de maquinaria levam sempre a acrésci-
mo do produto líquido do pais, embora não possam aumentar nem au-
mentem, excluindo-se um intervalo insigníficante, o valor desse produ-
to lfquido" (p. 474).

(elevarão sempre esse valor, sempre que diminuam o valor do trabalho);

(2) acréscimo do produto líquido de um país é compatível com o de-


ctéseimo do produto bruto, e os motivos para empregar maquinaria são
sempre suficientes para assegurar esse emprego, se ela aumentar o produ·
to líquido, embora possa e freqüentes ve:i;es faça diminuír a quantidade
e também o valor do produto bruto (p. 474);
(3) a opinião reinante na classe trabalhadora, de o emprego de máquinas
prejudicar freqüentes ve.zes seus inte1esses, não se funda em preconcel·
tos e erro, 'mas é compatível com os púncípios corretos da economia
poiítica (p. 4 74);
(4) caso os meios de produção aperfeiçoados, em conseqüência do empre-
go de máqu.inas, aumentem o produto líquido de um país a tal ponto
que não diminua o produto bruto (tenho sempre em vista a quantidade
de mercadorias e não o v,ior), melhorará a situação de todas as classes.
O proprietário da terra e o capitalista serão beneficiados nio por acrés·
cimo de renda fundiária e de lucro, mas pelas vantagens resultantes do
dispêndio da mesma renda fundiária e do mesmo lucro em mercadorias
de valor bastante rebaixado"

(essa frase contraria a doutrina toda de Rícardo, para a qual a baixa dos
meios de subsistência necessários, e em consequência dos salários, eleva
os lucros, ao passo que a maquinaria, que permite extrair-sé ~ais da roes·
ma área de terra com menos trabalho, tem de reduzir a rendà fundiária),

"enquanto a situação da classe trabalhadora terá melhora substancial;


primeiro,pela procuro acrucída de empregados domégtícos"

(bn1hante resultado esse da maquinaria: a transformação em criados de gran·


de parte dos homens e mulheres da classe trabalhadora);

"segundo, um produto líquido tão abundante incentivará as poupanças


na renda, e terceiro, pela baixa de todos os artigos de consumo em que
serão despendidos os salários" (em conseqtl.ência de5sa baixa, os salá-
dos serio reduzidos) (pp. 474, 4 75}.

Toda essa apologética burguesa da maqUinaria não nega:


(1) que a maquinaria, ora aqui, ora ali, mas de maneira constante, tor-
na supérflua parte da população, lança no olho da rua parte da população

1004
trabalhadora. Gera superpopulação (daí rebaixa de salário em alguns ram1os,
aqui ou ali), não por crescer a população mais depressa que os meíos de
subsistência e sim porque o crescimento rápido dos meios de subsistência,
em virtude da maquinaria, perrníte empregar mais maquinaria e por isso
reduzir a pror:ura imediata de trabalho. Não por diminuir o fundo social,
mas porque, em virtude de seu crescimento, decresce relativamente a par-
te dele que se despende em salário.
(2) Menos ainda nega tal apologética a sujeição dos próprios trabalha-
dores que lidam com as máquinas e a .miséria dos trabalhadores manuais
ou artesãos que elas lançam ao desemprego e à ruína.
O que ela sustenta - e em parte acerta - é primeiro que, em virtude
da maquinaria (em geral do desenvolvimento da produtividade do trabalho)
a renda líquida (lu'cro e renda fundiãria) cresce tanto que o burguês precisa
de mais empregados domésticos que antes; se antes tinha de despender
mais de seu produto em trabalho produtivo, agora pode gast.ar mais em
trabalho improdutivo, ou seja, aumentam os criados e outros trabalhado-
res que se situam na classe improdutiva. E uma bela perspectiva essa trans·
formação_ progressiva em criados, de parte dos trabalhadores. E para estes
como é consolador que, em virtude do crescimento do produto liquido,
mais esferas se abram para o trabalho improdutivo que vive às custas de
seu produto e cujo interesse em explorá-los coincide mais ou menos com
o das classes diretamente exploradoras.
Segundo: que, em virtude do estímulo dado à acumulação na nova
base, que exige menos trabalho vivo em relação ao pretérito, também
os trabalhadores despedidos, reduz.idos à indigência, ou pelo menos o
grupo que os substjtui, emergente da população acrescida, são absorvi-
dos pela expansão das ·atividades na própria indústàa de máquinas ou
em ramos industriais intermédios que essa expansão tomou necessários
e fez surgir, ou em novos domínios de ocupação abertos pelo novo capi-
tal e que satisfazem novas necessidades. Esta é outra magnífica perspecti-
va; a classe trabalhadora tem de suportar todos os "transtornos tempo-
rários" - desemprego, deslocamento de aplicação de trabalho e capital,
mas nem por isso acaba o trabalho assalariado; este ao contrário se re-
produz em escala cada vez maior, aumenta em termos absolutos, embo·
ra diminua em relação ao capital total crescente que o emprega.
Terceiro: que o consumo se refina em virtude da maquinaria. A
circunstância de baratear a subsistência imediata permíte ampliar o do-
mínio da produção de luxo. E assim abre-se para os trabalhadores ter·
ceira perspectiva, deliciosa: para obter os meios de subsistência, na mes"

1005
ma quantídade, o mesmo número de trabalhadores capacitará as classes
mais altas a expandir, refmar e diversificar o domínio de suas fruições,
e desse modo a aumentar a rutura econômica, social e política que sepa·
ra os trabalhadores dos que lhes estão acima. Maravilhosas perspectivas
para o trabalhador, resultados muíto apetecíveis do desenvolvimento da
produtividade de seu trabalho.
Ademais., mostra ainda que é do interesse das classes trabalhadoras

"que a maior parte possível da renda se desloque das despesas em arti·


gos de luxo para as destinadas à manutenção de criados" (p. 476). Pois,
quer· compre móveis ou mantenha criados, efetivo com isso procura
de determínado montante de mercadorias e ponho em movimento
num caso -qua5e tanto trabalho produtivo quanto no outro; mas no
segundo caso acresço "a procura anterior de trabalhadores, e esse acrés-
cimo surge apenas porque escolhi esse modo de despender minha ren-
da" (pp. 475, 476).

O mesmo se aplica à manutenção de grandes esquadras e exércitos.

"Seja a renda despendida des5a ou daquela maneira, empregar.se;i na


produção a mesma quafitidade de trabalho, pois é mister para produ-
zir os alimentos e roupas dos soldados e dos matinheiros a .mesma quan·
tidade de trabalho relativa à produção dos artigos mais suntuários.
Mas no caso de guerra haverá procura adicional de homens para exér·
cito e marinha, e em conseqüência uma guerra, financiada pela renda
e não pelo capital de um país, é favorá\.-el ao crescím,ehto da popula·
ção" (p.477).
"Há outro caso que v;ale registrar, em que é possível elevar o montan.
te da rendo IÚ[uida de um país e até da renda bruta, cotn redução da
procura de ttabalho, o que se dá quando o trabalho de ca~·alos substi-
tuí o do ser humano. Se empregax cem pessoas em minha fazenda e
verificar que os alimentos despendidos com cinqüenta delas podem
ser transferidos para o sustento de cavalos que me dão um rendímen·
to superior em produtos agrícolas, depojs de descontar o juro do ca·
pital que a compra dos cavalo~ exige, ser-me-á vantajoso substituir os
seres humanoK por cavalos, e em oonseqUêncía assim farei. Mas isso
contraria os interesses dos traba.lhado~es. e é evidente - a não ser que
a renda (inrome/ por mim obtida acresça ·a ponto de me capacitar a
empregar tanto os trabalhadoies quanto os cavalos - que a população
se tornará exces.riva e a situação do trabalhador terá uma piora geral.
~ incontestável que o trabalhador de maneira nenhuma pode1á emp,re-
gar-se na agrieultura" (pox que não, se aumentou a área da agricultu-
ra'!). "Mas se o produto agrícola aumentar com a substituição de seres
humanos por cavalos, poderá o trabalhador obter emprego na indús-
tria ou oomo criadon (pp. 477, 478).

São duas tendências que se entrecruzam sem cessar: prbneiro, em-


pregar trabalho o menos possível para produzir quantidade igual ou maior

1006
de mercadorias, e magnitude igual ou superior de produto líquido, de mais-
valia, de renda líquida; segundo, empregar o maior número possível de tra·
balhadores (embora o menor possível em relação à quantidade das rner-
cadorla.s por eles produzídas), pois, dado um nível de produtividade, a
magnitude da mais-valia e do produto excedente aumenta com a quanti·
dade do trabalho empregado. lhna tendêncla. lança os trabalhadores no
olho da rua e toma a população excessiva; a outra reabsorve-os e aumen-
ta em termos absolutos a escravatura assalariada, e assim está o trabalha·
dor seguindo sempre seu fadário flutuante e dele nunca se livr11. Daí o tra-
balhador considerar hostil a si mesmo, e com ratão, o desenvolvimento da
produtividade de seu próprio tiabalho; em contraposiçao, o capitalista
o trata sempre como um elemento a afastaJ" da produção. É com essas
contradições que lida Ricardo nesse capitulo. Esquece de acentuar: o cres-
cimento constante das classes de permeío, situadas entre trabalhadores,
de um lado, e capitalistas e proprietários das terras, do outro; vivem elas
diretamente da renda (rewmue) em escala cada vez maior e em grande
parte~ sobrecarregam a base trabalhadora e aumentam a segurança e o
poder socíais das dez mil famílias de cima. A burguesia erige a perpetua-
ção da escravatura assalariada por meio da aplicação das máquinas em
"apologia" destas.

"Antes observei também que o acréscimo da renda (ineome) líquida,


medido em mercadorias, e que sempre decorre de maquinaria aperfei·
çoada, leva a no~·a~ poupanças e à acumulação. Essas póupança:r, é mis-
ter lembrar, são anuoix e necessariamente criam logo um fundo, muito
maior que a renda (revenue) bruta que se perdeu no início em virtude
da invenção da mdquitlll. Então, a procura de trabalho será tão grande
quanto antes, e a situação das pessoas melhorará ainda mais coro as
poupanças mai9.res que a renda liquida mais alta lhes permitirá fazer"
(p. 480).

Primeiio perde-se renda bruta e ganha-se renda líquida. Depoís, par-


te da renda líquida acrescida transforma-se de novo em capital e por isso
em renda bruta. Assim, tem o trabalhador de aumentar constantemente
o poder do capital, para obter, depois de pesados transtornos, a permissão
de repetir o processo em escala mais ampliada.

"Com cada acréscímo de capital e população, os a.limentos em geral


encarecerão por se tomar mais difícilp1oduzHos" {pp. 478, 479).

1007
E logo prossegue Ricardo:

"Por encarecerem os alimentos, elevam-se os sahírios, e toda alta de


salário tende a fazer o capital poupado empregar mdquiNJs em pro·
porção maior que a anterior. Maquinaria e ttabalho estão em concor-
rência permanenté, e aquela, com freqüência, não pode SC1' empxegada
até que o trabalho encareça" (p. 479).

A máquina é assim meio contra a alta do salário.

"Para elucidar o princípio, cstabeled que máquinas melhores são des·


cobertas de súbito e têm ampla utilização. A vezdade todavia é que es-
sas invenções ocorrem pouco a pouco e atuam antes no sentido de
determinar o emprego do capital poupado e acumulado, do que no
de deslocar capital de suas aplicações atuais" {p. 4 78).

Na realidade, não é tanto o trabalho liberado, mas é antes a nova ofer~


ta de trabalho - a parte do acréscimo populacional destinada a &ubstituí-
lo - que encontra novos campos de emprego, abertos pelas novas acumulações.

''Na América e em muitos outros países onde o ser humano pode obter
alimentos com facilidade, nem de longe há tão grande tcntaçfo de em·
pregar mãquinas" (nenhures tem elas tanto emprego em massa, inclusi·
ve, por assim dizer, para fim domésticos, como na América) "como na
Inglatena, onde os alimentos são caros e produzi-~mi custa muito tra·
balho."

(Quão pouco o emprego da maquinaria depende do·preçó dos a1ímen-


tos - pode porém depender da escassez relativa da força de trabalho, co-
mo na América, onde a pequena população relativa se estende por espa-
ços imensos - é o que mostra justamente a América, que-proporcionalmen-
te emprega muito mais máquinas que a Inglaterra, onde há sempre popula-
ção excedente. Assim lemos no Standard, 19 de setembro de 1862, num
artigo sobre a Exposição 184 :

"O homem é um animal que faz máquinas ... Se consideramos o ameri-


cano ser humano típico, a defuúçiio é ... perfeita. Um dos pontos car·
deiais do sistema de um americano é não fazei com as mãos nada que
possa fazer com máquina. Tem máquina para quase tudo; para balouçar
um berç.o ou confeccionar um ataúde, para ordenhar uma vaca ou des-
bravar uma f101esta, para pregai um botão ou apurar a eleição de um
presidente. Inventou uma máquina para poupar o esforço de mastigar

184. Exposiçio mundial inaugurada em 19 de maio de 1862, em Londres.

1008
alimenros... A extrema escassez de mao-de-obra e daí seu alto valor"
(apesar do baixo valor dos alimentos), "assim como certa sagacidade
inata estimularam esse espírito inventivo... A$ máquinas produtidas
na América são, de modo geral, de valor mais bai.,,;o que as feitas na
Inglaterra. No conjunto são antes expedientes para poupar trabalho
que ínvenções para executar o que antes era impossível." {E os navios
a vapor?)... "na Exposição, na seção dos Estados Unidos está exposta
a máquina de descaroçar algodão de Emery. Depois de introduzido o
plantio de algodão nos Estados Unidos, as colheitas se mantiveram mui-
to pequenas, durante muitos anos, não $Õ porque a procura era bastan·
te limitada, mas também porque, em virtude da dificuldade de limpar
o algodão com trabalho manual, deixavam elas de ser remuneradas,
Todavia, quando Eli Whitney inventou o descaroçador de algodão, hou-
ve acréscimo imediato da mperfícíe cultiJ1t1da, e esse aCiéscimo agora
tem prosseguido quase numa progressão aritmética. De fato, não é exa·
gerar muito dizer que Whltney criou a indústria algodoeira. Com mo-
dificações mais ou menos importantes e úteis, seu descaroçador per·
maneceú em uso desde então; e até a invenção do aperfejçoamento
e complemento atuais, o descaroçador primitivo de Whitney era tão
bom quanto a maioria dos pretensos substitutos. A máquina atual, que
traz o nome da fuma Emery, de Albany, Estado de Nova Iorque, sem
dúvida suplantará quase por completo o descatoçador Whitney, em
que se baseia. t simples e mais eficíente. Fornece o algodão mais lim-
po e ainda em camadas de chumaço, que, ao deixarem a máquina, já
estão prontas pua prensar e embalar... No pavilhão americano há pou-
co mais que máquinas: a ordenhadora.... dispositivo de mudar com:io
de transmi!são.. ., a máquíM de COl'dar e fiar cânhamo, que com· uma
única operação, a partir diretamente do fardo, enrola o tio ... Máquinas
para fabricar sacos de papel: oorta as folhas, e faz as operações de co-
lax e dobrar, aprontando 300 sacos por minuto... O espremedor de
roupas Hawe$, que e$pteme a água da roupa por meio de dois rolos
de botracha, deixando-<>s quase secos; economiza tempo e não preju-
dica o tecido... máquinas de encadernar.. ., máquinas de fabricar sapa-
tos. Sabe-se que há muito tempo as gáspeas neste país têm sido feitas
por máquinas, mas vêem-se aqui mlÍqUínas para fixar a sola, outras pa·
ta coitar· a sola segundo o modelo, e outras ainda para aparar os sal·
tos ... Máquinas de quebrar pedras, muito potente e engenhosa; sem dú-
vida terá amplo emprego para calcetar estradas e triturar minérios.•.
Um sistema de sinais marítimos de Mr. W. H. Ward de Auburn, Nova
Iorque... llláquíMs de· colher e segar são uma invenção americana e go-
zam na Inglatena uma preferência geral crescente. A de Me Connick,
a melhor... A bomba de compressão, de Hansb.row, p1emíada com me-;
dalha na Califórnia, é a mellior da exposíção pela simplicidade e pela
eficíência..• Com a mesma força lança mais água que qualquer outra
bomba do mundo... Máquinas de costw:a... "]
"A causa que eleva o salário não é a mesma que eleva o valor das má-
quinas, e por isso com cada acréscimo de capital, proporção maior des-
te se emprega em maquinaria. A procum de trabalho continuará a cres·
cer com o aumento do capital, mas não n.a proporção desse aumento;
a razão será necessiiriarnente decrescente" (Ricardo, 1.c,. p. 4 79).

1009
Na última frase, expressa Ricardo a lei correta do crescimento do ca-
pítal, embora seus argumentos sejam muíto unilaterais. Acrescenta uma
nota donde se infere que nesse domínío segue Barton,. em cuja obra far!!-
mos por isso uma incursão sumária.
Antes, porém, uma. observação. Em pas~gem anterior, ao tratar do
dilemà de despender a rendà (revenue) em criados ou em artigos de luxo,
diz Ricardo :

"Em ambos os casos, a rernia líquida fica a mesma e também a bruta,


mas d11'erem as mercadorias em que a primeira se C<Jnverterá"
(p. 476).

Por ígual, o prnduto bruto pode ser o mesmo em valor, mas "dife-
rirem as mercadorias" - de maneira muito sensível para os trabalhadores -
"em que se converterá", segundo tenha de repor mais capital variável ou
constante.

2. Idéias de Barton

a) O decréscimo relativo da procura de trabalho t}O processo


de acumulafão do capital, segunda Barton. Stia concepção
unilateral do efeito da composição cwgânia:i do_ capital
nesse processo.

Título da obra de Barton:


John Barton, Observations on the circumstanca which influence the
coniiition of tM Labouring Classe.s of Society, Londres, l 817.
Antes de mais nada reuniremos as poucas proposições teóricas que se
encontram em Barton.

"A procura de trabalho depmde do acréscimo do capital circulante e


não do fixo. Se fosi;e verdade que 11 proporção entre essas duas espécies
de Cllpital é inWJriável em todos os tempos e em todoi os pafses, infe-
rir-se·ia dai nem dúvida que o número dos trabalhadotes empregado1
está 1lll razão da riqueza do Estado. Mas não ·parece provável que tal
coisa exista. Ã medida que se cultivam as ciências naturais e se expande
a civilização, o capita./ fixo acresce cada vez mais em relação a.o circuúm-
te. O ninnta.nte de capital fixo empregado na p1odução de uma peça
de musselina britânica é pelo menos cem, talvez mil vezes maíot que

1010
o empregado na p1odução de uma peça similar da musselina indíana,
e a pioporção de capital circulante empregado é cem ou mil vezes me·
nor. J!. fácil de entender que, em certas circunstâncias, a totalidade das
poupanças anuais de um povo industrioso pode se1 adícionada ao capi-
tal fixo, e nesse caso não terão elas efeito no sentido de acrescer a pro-
cura de trabalho" (l.c., pp. 16, 17).

(A respeito dessa passagem observa Ricardo em nota à p. 480:


"Não é fácil de e<;nceber, penso, que haja circunstáncias em que o acrés·
cimo de capital não siga acréscimo de trabalho; o máximo que se pode·
dizer é que a proporção da procura seni decrescente. Penso que Barton,
na publicação mencíonada acima, apresentou uma visão correta de al·
guns dos efeitos de um montante cresc.ente de capital fixo sobre as
condições das classes trabalhadocas. Seu ensaio contém muitas infor-
mações valiosas.")

A passagem acima de Barton é mister agregar a seguínte:


''Capital fixo, uma vez formado, cessa de influenciar a procura de- tra·
balho" (incorreto, pois necegsita de reprodução, embora em interva-
los e pouco a pouro), "mas, durante a formação, dá emprego a tantas
pessoas quanto um montante igual de capital circulante ou de renda"
(p. 56).

E mais:

"A procura de trabalho depende absolutamente do montante global


de renda e de capital circulante" (pp. 34, 35).

É indiscutível que Barton tem grande mérito.


A. Snúth acredita ·que a procura de trabafuo cresce na razão díreta
da acumulação do capital. Malthus infere a superpopulação da círcuns·
tãncia de o c-.i.pítal não se acumular (não se reproduzir em escala crescen-
te) com a mesma r.t.pidez da população. Barton foi o primeiro a salíentar
que os diferentes componentes orgânicos do capital não crescem nomes-
mo ritmo da acumulação e do desenvolvítnento das forças produtivas, e
que no processo desse crescimento, ao contrário, do capital a parte que
se reduz a salário diminuí proporcionalmente à parte (chama-a de capi·
tal fixo) que em refação à sua magnitude acarreta variação apenas insig-
nificante na procura de trabalho. Por isso foi o primeiro a formular a im-
portante proposição: "o número de trabalhadores empcegados" não "es-
tá em proporção à riqueza do Estado", e é maior, segund9 essa propor-
ção, num país industrialmente subdesenvolvido que num desenvolvido.

1011
Ricardo, na terceira edição de seus Principies, capítulo XXXI ..On
Machinery" - depois de ter, nas edições anteriores, seguido nesse ponto,
ainda sem reservas, a linha smíthiana - aceita a correção de Barton, e
na formulação unilateral dele. O único ponto em que avança - e isso é
importante -- é que, além de diZer como Barton que a procura de traba-
lho Tufo cresce em proporção e-0m o desenvolvimento da maquinada, afir-
ma que a própría máquina "torna a popuUição excessiva", gera portanto
ruperpopulação. Só que erra ao limitar esse efeito ao caso ocorrente ape-
nas na àgricultura, relativo ao acréscimo do produto líquido às custas
do produto bruto, e que ele também estende à indústria. Mas com isso
desfaz-se o cerne de toda a teoria absurda da população .e sobretudo o va-
zio refrão dos economistas vulgares de terem os trabalhadores de se esfor-
çar para manter sua multiplicação abaixo do nível da acumulação do ca-
pital. Da exposição de Barton e Ricardo infere-se, ao contrário, que de-
ter desse modo o crescimento da população trabalhadora, reduzindo a
oferta de trabalho e em conseqüência elevando seu preço, apenas acele-
rará o emprego de maq_uínaria, a conversão de capital circulante em fixo,,
e assim a população, por artifício, tomar-se-á excessiva; e esse exces.so exis-
te em regra não em relação à quantidade dos meios de subsistência, mas
dos meios de emprego, da procura real de trabalho.
O erro ou falha de Bartor\. consiste em conceber a diferenciação or·
gâníca ou composição do capital na forma em que aparece no processo
de circulação - a de capital fixo e a de circulante -, diferença já desco-
berta pelos fisiocratas, desenvolvida a seguir por A. Smith- e depois de-
le convertida em preconceito dos economistas: preconceito, utna vez que
só vêem essa díferença - que lhes foi legada - na composição orgânica
do capital. Essa diferença oriunda do processo de circulação tem influên-
cia importante na reprodução da riqueza em geral e portanto no segmen-
to desta que constitui o fundo do trabalho. Aqui, porém, não é isso o
decisivo. O capital fixo - maquinaria, edifícios, animais reprodutores
etc. - distingue-se do circulante diretamente, não por nenhum relacio-
namento com o salário, e tão-só pela maneira como circulam e se repro-
duzem.
A relação direta dos diferentes componentes do capital com o tra-
balho vivo não está unida aos fenômenos do processo de circulação, não
decorre daí, mas do processo imediato de produçálJ, e é a relação entre
capital constante e variável; a diferença entre estes se baseia apenas no
relacionamento com o trabalho vivo.
Assim diz Barton. por exemplo: a procura de traball10 oão depen-
de do capital fixo, mas só do círculante. Mas parte do capital circulan-

1012
te - matérias-primas. e matérias auxi1iares - não se troca por trabalho
vivo, como tampouco maquinaria etc. A matéria-prima etc., em todos
os ramos industriais onde ê elemento que entra no processo de formar
valor, constituí - desde que do capital fixo só levemos em conta a par-
te que se incorpora à mercadoria - o segmento mais importante da por-
ção do capital não despendida em salário. Outra parte do capital circulan-
te, isto é, do capital-mercadoria, consiste em artigos de consumo que en-
tram na renda da classe não produtiva (quer dizer, que não é a classe tra-
balhadora). Por conseguinte,· o crescimento dessas dú.as partes do capi-
tal circulante não tem sobre a procura de trabalho mais influência que
o do capítal frxo. Ademais, do capital circulante, a parte que se reduz
a matêrlas-primas e a matérias auxfüares acresce em proporção igual
ou ainda maior que a parte do capital fixada em maquinaria etc.
Ramsay dá um passo à frente na base da dístin ção de Barton. Atin·
ge nível melhor, mas prende-se ao modo bartoniano de ver as coisas. Na
realidade reduz a diferença a capítal constante e variável, mas continua
a chamar o capital constante de fixo e neste inclui as matérias-primas
etc., e o capital variável, de circulante, embora exclua deste todo capí-
tal circulante que não seja diretamente despendido em salário. Voltare-
mos ao assunto mais tarde, quando chegarmos a Ramsay. Mas isso mos-
tra a necessidade do desenvolvimento do que é essencial.
Apreendida a diferença entre capíta1 constante e capital variável,
a qual provém apenas do processo imediato de produção, da relação dos
diferentes componentes do capital com o trabalho vivo, patenteia-se tam-
bém que ela em si mesma nada tem a ver com a magnitude absoluta dos
artigos de consumo produzidos, embora muito com a maneira como es·
tes se realizam. Tociavia, essa maneira de realizar a renda bruta em mer·
cadorias diferentes não é, como quer Ricardo e insinua Barton, a causa
e sim o efeito das leis imanentes da produção capitalista, as quais levam
a uma proporção decrescente, em cotejo com o montante global do pro-
duto, daquela parte que forma o fundo destinado à reprodução da classe
tràbalhadora. Se grande parte do capital consiste em maquinaria, maté-
rias-primas, matérias auxfüares etc., segmento menor da totalidade da
classe trabalhadora será empregado para reproduzir os meios de subsis·
tência que entram no consumo dos trabalhadores. Mas esse decréscimo
relativo na reprodução do capital variável não é a causa do decréscimo
relativo na procura de trabalho, mas ao contrário seu efeito. Do mesmo
modo: dos trabalhadores empregados para produzir artigos de consumo
que em geral entram na renda, parte maior produz os que se incorporam
ao consumo, constituem o dispêndio de renda dos capitalistas, proprie-

1013
tários das terras e seus dependentes (estado, igreja etc.). e parte menor,
artigos destinados à renda dos trabalhadores. Mas isso é também efeito
e não causa. A situação se modificaria logo depois de mudançà na rela-
ção social entre trabalhadores e capitalistas, de revolução nas condições
dominantes da produção capitalista. "Difeririam as mercadorias em que
se converteria" a renda, para usarmos a expressão de Ricitrdo.
Nas condições físicas por assim dízer da produção, nada hã que
force a existência daquela situação. Os trabalhadores, se tiverem o do-
mínio, o direito de produzir para si mesmos, em pouco tempo e sem gran-
de esforço porão o capital (para usarmos a frase dos economistas vulga-
res) no nível de suas necessidades. A diferença gigantesca é esta: os meios
de produção existentes como capítal se contrapõem aos trabalhadores,
e por isso estes só podem empregá-los enquanto necessários para aumen-
tar a maís-valía e o produto excedente para seus patrões, quer dizer, os
meios de produção empregam os trabalhadores; na posição oposta, co-
mo sujeitos, os trabalhadores empregam os meios de produçao - como
objeto - a fim de produzir riqueza para sí mesmos. Sem dúvida pressu-
põe-se então que a produção capitalista já terá desenvolvido as forças
produtivas do trabalho até o nível necessário em que essa revolução po-
derá ocorrer.
[Tomemos o exemplo de 1862 (outono atual). A indigência dos
trabalhadores desempregados de Lancashíre. Em contrapartida, no mer-
cadq financeiro de Londres "a díficuldade de achar aplicáção· para o di-
nheiro", o que quase exigiu a founação de sociedades fraudulentas, uma
vez que era difíci conseguir 2% para o dinheíro. Segu}ldo a teoria de Ri·
cardo - uma vez que há de um lado capital em Londres e, do outro, tra-
balhadores desocupados em Manchester - "deveria ter surgido novo cam-
po de emprego".]

b) O movimento dos salários e o crescimento da população


segundo Barton.

Barton explica ademais que acumulação de capital só lentamente


foz subir a procura de trabalho, a não ser que a população tenha ante;
crescido tanto que a taxa de salário seja baixa.

"A proporção que o salário, num dado tempo, mantém com o produ·
to total do trabalho determina a aplicação numa" {fixa) "ou nouua
forma .. (circulante) (p. 17).

1014
"t que, se caír o salário enquanto não se altera o preço das mercado·
rias, ou subir o preço das mercadorias -enquanto o salário não varia,
acresce o lucro do empregador, o que o leva a empregu mais trabalha·
dores. Em contraposição, se os salários subirem em relaçio às merca-
dorias, o industrial manterá a menor quantidade possível de trabalha-
dores e procuraiá fazer tudo por meío de máquinas" (pp. 17, 18).
"Temos provas suficientes de que a POlJUlação, durante a primeira me-
tade do último século, com elevação graduai de salário, aumentou mui-
to mais lentamente do que na segunda metade, quando o ereço real
do tzabalho caíu com rapidez" (p. 2S).
"Alta de salário, poi si mesma, nunca aumenta a população trabalha-
dora; queda de salário pode fazê·la às vezes aumentar com muita ra·
pídez. Digmios que as exigências doo ingleses desçam ao nível das dos
irlandeses. Então o fabricante empregari mais trabalhadores na pro-
p,orção em que diminui o dispêndio de mantê-los" (Lc., p. 26).
'O que desencoraja o c.asamento 6 muito mais a dificuldade de achar
emprego que o nível insuficiente do saláriC>" (p. 27).
"Admite-se que todo acréscímo de riqueza tende a ci:ía:r nova procllt1l
de trabalho; mas, uma vez que o trabalho 6 de todas as mercadorias
a que exige mais tempo para ser produzida" ·

(pelo mesmo motivo a taxa de salário pode manter-se por longo prazo
abaixo da média, porque de todas as mercadorias é a mais difícil de se
retirar do mercado para se ajustar ao nível da procura efetiva),

"é o trabalho, de todas as mercad<>rias, aquela cujo preço mais sobe


em virtude de dada ascensão da procura; e uma vez que cada elevação
de salário produz redução décupla de lucro, é claro que o aumento
do capltai sá pode ter efeito lento no aentido de acrescer a procura
efetiva de trabalho, a não ser que seja precedido por acréscimo tal de
população que mantenha baixa a taxa de salário" (p. 28).

Barton estabelece aí várias proposíções:


Primeira: não é a alta de salário que por si mesma aumenta a popula-
ção trabalhadora; ao·contrário, uma queda de salário pode fazê-la cresrer
com muita fadlidade e rapidez. Prova: na primeira metade do século XVIII,
elevação gradual do salário, crescímento lento' da população; em contrapo·
sição, na segunda metade do século xvm, grande baixa do salário, cresci·
mento acelerado da população trabalhadora. Causa: o que impede os casa-
mentos não é a taxa insuficiente do salário e sim a dificuldade de conse-
guir emprego.
Segunda: mas a facilidade de obter emprego está na razão inversa
da ta:X.a de salário. ll que o capital se converte em ciiculante ou fixo, isto
é, no que emprega e no que não emprega trabalho, na razão inversa da alta
ou da baixa do salário. Se o salário é baíxo, é grande a procura de traba·
lho porque para o empregador passa a ser lucrativo utilizar muito traba·
lho, e com o mesmo capital circulante pode empregar mais trabalho. Se o

1015
salário é alto, o industrial mantém o menor número possível de trabalha-
dores e procura fazer tudo por meio de máquinas.
Terceira: por si só, a acumulação de capital aumenta apef!as lenta-
mente a procura de trabalho, pois cada elevação dessa procura faz subir
com rapidez a mão-de-obra, se escassa, e cair o lucro em escala 10 vezes
maior que a da ascensão do salário. A acumulação só pode ter efeito pró-
prio sobre a procura de trabalho se a precede grande acréscimo da [JOPU·
lação trabalhadora, é muito baixa por isso a taxa de salário e ainda a dei-
xa baíxa uma ascensão deste, porque a procura absorve mais mão-de-obra
desocupada do que compete por trabalhadores em pleno emprego.
Tudo isso, até certo ponto, está correto para a produção capitalis·
ta em pleno desenvolvimento. Mas não expJica o próprio desenvoiyimento.
E por isso a própria demonstração histórica de Ba.rton contradiz o
que ele pretende provar.
Primeira metade do século XVlll: salários em ascensão gradual, po-
pulação em crescimento lento, nenhuma maquinaria e pouco capital fixo
noutras formas, em relação à segunda metade do século.
Segwida metade do século XVIII, em contraposição: salário em
declínio constante, aumento espantoso de população e de maquinaria.
Mas foi justamente a maquinaria que tomava excessiva a população exis-
tente e assim reduzia o salário; em contrapartida, de novo ·a absorvia em
virtude do rápido desenvolvimento do mercado mundial; ora a tomava
excessiva, ora a absorvia, enquanto ao mesmo tempo acel~rava extraordi-
nariamente a acumulação do capital e aumentava o rYU?ntanté do capital
variável, embora este caísse em relação ao val9r global do produto e ainda
em relação ao número de trabalhadores que el]lpregawa. Na primeira me·
tade do século xvm. ao contrário, ainda não existia a indústria em gran-
de escala, mas sim a manufatura fundada na divisão do trabalho. A parte
componente principal do capital continuava a ser a despendida em capi-
tal variável, em salário. Mas a produtividade do trabalho se desenvolveu
vagarosamente em relação ao que ia ocorrer na segunda metade do século.
A procura de trabalho, e portanto o salário, subiu quase em proporção
com a acumulação de capítal. A Inglaterra ainda era uma nação essencial·
mente agrícola, e uma indústria doméstica (fiação e tecelagem) muito di-
fundida, movimentada pela população agrícola, continuava a existir e mes-
mo desenvolver-se. Ainda não podia :;urgir um proletariado que brota em
abundância, nem havia milionários industriais. Na primeira metade do sé-
culo XVIII predominou relativamente o capital variável e, na segunda, o
fixo; mas para este é necessário grande massa de material humano. Um

1016
aumento de população precede sua introdução em grande escala. Mas
o curso global dos fatos contradiz a exposição de Barton, até onde se
evidencia ter ocorrido aí mudança geral no método de produção; as leis
correspondentes à indústria em grande escala não são idênticas às perti-
nentes à manufatura. Esta .constitui apenas fase de desenvolvimento pa·
ra se chegar àquela.
Interessa apresentar alguns dos dados históricos de Barton, tanto
por se referirem ao movimento dos salários, quanto ao dos preços de tri-
go. comparando a primeira metade do século XVIII da Inglaterra com
a segunda.

"O quadro seguinte mostra" ("os salários subiram de meados do sé-


culo XYll até meados do. século XVlll, pois o p.?eço do trígo nesse
período caiu nada menos que 35%") '\:t relaÇiio dot salários dos traba-
lhadores agr(co/ar com o preço do trigo durante os últimos 70 anos"

(Convenções utilizadas pelo tradutor na apresentação do quadro


abaixo: X= xelí(mXns);P = peni ou pence)

'"Período Salário Preço do Salário em quartilhos


semanal trigo por (pints)
quarter de trigo
1742-1752 6XOP 30XOP 102
1761-1770 7X6P 42X6P 90
1780-1790 8XOP 51X 2P 80
1795-1799 9XOP 70X8P 65
1800-1808 IIXOP 86X8P 60"

(pp. 25, 26.)

"De um quadro do número das leis aprovadas em cada sessão legislativa


a partir da Revolução e referenles ao cercamento das terras, apresenta-
do no Relatório da CâmMa dos Lordes sobre as leis dos pobres" (t816?),
"vê-se jue 123 dessas leis surgiram nos 66 ano5 de 1688 a 1754, e .3 315
nos 69 85 anos de 1754 a 1813. O progresso da cultura do solo quase
2S •·ezes mais rápido neste período que no anterior. Mas, nos p.?imeiros
66 anos, cultiva-se cada vn mais trigo para exporta~o, de maneira inin-
terrupta, enquanto na maior parte dos últimos 69 1 anos se consumia
tudo o que antes era exportado. e ao mesmo tempo se importava quan-
tidade crescente e por fim muito grande para nosso próprio consumo ...

J85. De 17 54 a 1813 são S9 anos e não 69 como diz Barton.

1017
O crescimento da população no -primeiro período; compa.rado co:m o
do segundo, ainda mais lento do que parece índicai o progresso da
cultura da tena" (pp. 11. 12). .
"Em 1688, a população da Inglaten:a e do Pais de Gales, segundo Gre·
gory King, que a estimou pelo número das casas, era de 5 1/2 milhões.
Em l 780, segundo Malthus, era 7 700 000. Acréscimo, portanto, de
2 200 000 em 92 anos; nos 30 anos seguintes teve acréscimo superio.r a
2 700 000. Mas o mais provável é que a maío& pa_rte do primeiro aczés-
cimo tenha ocorndo de 1750 a 1780" (p. 13). -

De acordo com boas fontes, Barton calcula que:

"em 1750, o núrne.ro de habitantes eia 5 946 000, o que perfaz um


acréscimo, a partir da Revolução (1688), de 446 000 ou 7 200 por
ano" (p. 14). _
"Segundo a emmativa mais baixa, a população cresce nos últimos ano$
com rapidez 10 vezes maior do que há um século. Mas é impossível
acreditar que a acumulação do capital se tenha lfecuplicado" {p. 14).

A segunda não é quanto de meios de subsistência se produz por


ano, e sim a grandeza do segmento de trabalho vivo que entra na produ-
ção anual de capital fixo e de circulante. E o que determina a magnitude
do capital variável em relação ao çonstante.
Barton explica o acréscimo impressionante de população em quase
toda a Europa nos últimos 50 a 60 anos, pela produti'Vidade acrescida
das minas americanas, uma vez que a abundância de metais preciosos ele-
vou os preços das mercadorias mais que os salários, que por isso baixaram
na reaUdade. E assim ascendeu a taxa de lucro (pp. 29 a 3,5). '

1018
Aditamentos
l. Formulação inicial da tese sobre a concordância
COf.?.Stante entre a oferta e a procura na agricultura.
Rodbertus e os economistas práticos do século XVIII.

A doutrina de que os cereais produzem sua própria procura etc. 186 ,


formulada "ocasionalmente.. por Smith - mais tarde repetida com sole-
nidade por Malthus em sua teoria da renda fundiária e em parte por este
convertida em base de sua teoria da população - está expressa de manei·
ra bem concisa nestas palavras:

"O.~ cereais são ou não escassos em proporção ao consumo. Se há mais


bocas, haverá mais cereais, porque haverá mais braços para lavrar a ter-
ra; e se houver mais cereais, haverá mais bocas porque a abundáncfa
aumentará a população" (p. 125, John ArbuthMt, An Inqu.il'y illto the
Connectíon between the present Price of l'rovísions, and the Size of
FtJrms etc. Ey a Farmer, Londres, 1773).

Por isso

"nunca se pode cultivar demais o sol.o" (p. 62).

186. Ver neste volume pp. 785 e segs.

1021
Rodbertus imagina que as sementes etc. não entram na rubrica de
capital segundo o cálculo do arrendatário, 1117 e essa fantasia é contestada
pelas centenas de estudos que aparecem no século xvm (sobretudo a par·
tir da década dos 60), parte deles de autoria dos próprios agricultores.
Mas, em contraposição, seria correto dizer que o arrendatário contabili·
za a renda fundiária. Arbuthnot a inclui nos custos de produção (e ela
pertence aos custos de produção do arrendatário).

"Se o preço dos c.ereais estiver próximo do que deve ser, o que só pode
seJ detenninado pela relação vigente entre o valor da te"ª e o valor do
dinheiro" { l .c., p, 13 2).

A partir do momento em que o capital se apodera da agricultura, o


próprio capítalista agricultor vê na renda fundiária mera dedução do lucro
e entende que a mais-valia toda é, na essência, lucro:

"O velho método de calcular o lucro do arrendatário pelas três rendas


frents} (sistema de parceria). Na infância da agricultura havia reparti-
ção conscienciosa. e igual d.a p1opriedade tal como é praticada agoJa em
putes do mundo menos esclarecidas... Um arranja terra e capital, o ou·
txo, expe1iêncía e trabalho; mas, num bom solo bem cultiyado, a renda
(rent) hoje é o objetivo menor: em relação à roma qu11 um homem pode
inverter como capital e no dispêndio anual de seu trabalho, tem de se
calcular o juro do dinheiro ou a renda (income}" (p: 34 ).

2. N athan iel Forster e a hostilidade entre os donos


das terras e os empresários.

"Os donos das terras e os empres4rfos estão sempre em discórdia., e uns


com inveja dos ganhos dos outros" (p. 22, nota. Nathaniel Forster, An
Enquiry ínto the Causes of the Present High Price of Pro11ittons etc.,
Londres, 1767).

187. Ver neste voiume pp. 47 B-48'7.

1022
3. Ponto de vista de Hopkins sobre a relação entre
renda fundiária e lucro.

Na visão ingênua de Hopkins (conferir a passagem), renda da terra


é a forma original da mais-valia, e dela deriva o lucro.
Diz a passagem:

"Quando os ... produtores etam ao mesmo tempo agricultores e manu-


fatores, a renda fundüíria .recebida pelo dono da terra valia 1O libras.
Admitamos que, dessa renda, metade tenha sido paga. em produtos
agrícolas e metade em manufaturas"; isso poderia continuar "depois
da divisão dos produtores em dual! cwses - a de agricultores e a de
manufatores. Todavia, na prática, aos cultivadores da terra parecera
mais adequado pagai' a renda fundiária e adidoná·J.a a seu produto, ao
trocá-lo pelo produto do trabalho dos manufatores, de modo a dividÍI
o pagamento em proporções equitativas entre as duas cla..<;res e a fica-
1em iguais, em cada setor, salário e lucro" (p. 26, Tu. Hopkins, Enquiries
relative to the Laws which regu.late Rent, Profit etc., Londres, 1822).

4. Melhoramentos na agricultura segundo Carey,


Malthus e James Deacon Hume.

"Observar-se-á que sempre consideramos o proprietário e o arrendatá·


rio uma só e mesma pe8roa ... É o que se dá nos Estados Unidos" (p. 97,
H. C. Carey, The Past, the Present, and. the Future, Filadélfia, 1848).
"O homem vai sempre de um solo pob1e para um melhor; depois, re·
gressa pelo caminho percorrido a.o primitívo solo pobre, revolve a mar-
ga e a greda, e assÍJn po1 diante, em sucessão ininterrupta... e a cada
passo em seu caminho vai crlaru1o melho1 máquina 188 " (pp. 128, 129 ).

188. Máquina aí quer dizei solo.

1023
"O capital pode ser empregado com mais proveito na agricultura que
em máquinas, poiJ; estas encerram apenas capacidade igual, enquanto
aquela encerra capacidade superior" (l.c.).
"O ganho de uma máquina a vapor" (que transforma lã em pano etc.)·
"é o salário menos o prejuí:z:o do desgaste da máquina. O trabalho em-
pregado paia melhorar a terra produz salários + ganho do melho.ramen·
to da máquina'' (l.c.). Por itso "um pedaço de terra que rende 100 li-
bras por ano é vendido" mais caro que uma máquina a vapor que gera
o rnesq10 rendimento anual (p. 130). "O comprador de um pedaço
de teaa sabe que este lhe pagará salários e juros + acréscimo de valor
pelo uso. O comprador da máquina sabe que esta lhe dará salários e
juros, menos o decréscimo de seu valor pelo uso. Um compra máquina
que melhora com o uso ... O outro, máquina que deteriora com o uso ...
Num ca~o. máquina em que se pode apUcar novo capital e t.tabalho com
rendimento sempre cruscente, noutro, máquina que não comport;I
esse gênero de aplicação" (p. 131 ).

Mesmo os melhoramentos na agricultura, que geram custos de pro-


dução reduz.idos e afinal queda dos preços, mas no início - enquanto os
preços ainda não tenham caído - alta temporária do lucro agrícola, qua-
se nunca deixam,

''por fim, de aumentar tJ renda fundiária. O capital acrescido, empte•


gado em conseqüência da :oportunidade de obtei gi:andes fücros tem·
poráríos, raras vezes ou núnca pode ser de todo removido da terra, ao
expil:arem os arrendamentos em curso; e ao renovar esse.s arrendamen-
tos, o proprietário sente o benefício daí oriundo, no aumento de suas
rendas {rentsj" (Malthus, lnttuiTy into the Nature and:Progress of Rent
etc., Londres, l 81.S, p. 26).
"Se até prevalecerem os preçôli altos mais recentes, a terra,arável em
geral só dava renda (rent) pequena, sobretudo pela necessidade reco-
nhecida de pousios freqüentes, as rendas. terão de ser de novo reduzi·
das, a fím de possibilitar volta ao mesmo sistema",{p. 72, J. D. Hume,
Tfiougths on the Corn·Laws etc., Londres, 1815).

5. O crescimento da produtividade do trabalho


agrícola, segundo Hodgskin e Anderson.

"À medida que a população aumenta, uma superfície decrescente bas·


ta para prover o ser humano e-0m alimentos" (p, .69, The Natural and
Artificial Right af Property contrasted etc., de Hodgskin (anônimo),
Londres, 1832).

(Antes expressou Anderson a mesma idéia. 189 )


-----
189. Ver neste volume p. 575.

1024
6. Diminuição da taxa de lucro.

O lucro do capital maior que opera com mais capital constante (ma-
quinaria, matéria-prima) - estando o trabalho vivo aplicado em propor-
ção menor com a totalidade do capital -, se repartido por essa totalida-
de, tem taxa menor que a do lucro menor com o trabalho vivo que está
em proporção maior com o capital total. O decréscimo relativo do capi-
tal variável e o acréscimo relativo do constante, embora ambos aumentem,
é apenas outra expressão da produtiviàade acrescida do trabalho.

1025
Adendos
Tabela de pesos, medidas e mo~das
ingleses *

PESOS

tonelada = {hund.redweights)
20 quintais

quintal
= 1016,05 kg
{hund.redweight) = 112 libras 50,8023 kg
libra = 16 onças 453,592 g

MEDIDAS

aere = 4 roods == 4 046,7 m2


jatda =
3 pés 91,439 cm
quatter
(medida de capacidade) = 8 busbels 291 1 aproximadamente
bushel =
8 galões = 36,360 1
galão = 8 quartilhos (pints) 4,545 1
quattilho (pint) =
1/8 de galão == 0,568 1
MOEDAS

libra (esterlina) - 20 xelins


xelim 12 pence
pêni = 4 fartbings
farthíng 1/4 de péni
guinéu 21 xelins
coroa 5 xelins

• Na tabela não se levam em conta as adaptações atuais na Inglaterra ao sistema métrico.

1029
Índice onomástico·

ABRAHAM A SANTA CLAAA, ver MEGERLE, Hans Ulrich


ANDERSON, James 468 521 545-548 552-556 560 562 574.579 588
590 593 595 667-669 672 674 704 750 1025
ARBUTHNOT, Jolm 1023

BAILEY. Samuel 556 597 602 604 831 833 931


BANFIELD, Thomas Charles 458
BARTON, John 981 985 995 996 1010-1022
BASTIAN, Adolf 555
BLAKE, William 895
BUCHANAN, David 468 594 818 819 824

CAREY, Henry Charles 467 587 599 742 1024


CHALMERS, Thomas 670 895
COBBETI, William 552 555
CONSTANCIO, Francisco Sol.ano 832
CORBBT, Thomas 636 670 934

DARWIN, Charles Robert 549 552


D'AVENANT (DAVENANT), Charles 542 560
DE QUINCEY, Thomas 855 856 894
DOMBASLE, Christopher-Joseph-Alexandre Mathieu de 459

EMERY, Charles Edward 1009

FORSTER, Nathaniel 1023


FOURIER, François-Marie-Charles 660
FULLARTON, John 934

HALLETI, Frederic Francis 896


HANSBROW 1009
HENRIQUE VII 668
HERBERT, Claude-Jacques 552
HODGSKIN, Thomas 1025
HOPKINS. Thomas 468 488 557 567-569 571 1024
HÜLLMANN, Karl Dietrich 665

1030
HUME. David 556
HUME, James Deacon 834 1024 1025

KING, Gregory 1022


KIRCHMANN, Julius Hermann von 449 581

LUlS XIV 568


uns x:v 568
LUIS XVI 568

MAL'IHUS, Thomas Robert 465 468 500 545-554 574 568 569 595
599 622 630 654 761 826 829 854 974 1011 1022 1023 1024
1025
MCCULLOCH (MACCULLOCH), John Ramsay 546 553 556 576 623
624 916
MCCORMICK (MACCORMICK), Cyrus Hall 1009
MEGERLE. Ha.ns Ubich (ABRAHAM A SANTA CLARA) 552
MILL, Jarnes 582 623 929 939 940
MILL,John Stuart 481 554 937

NEWMAN, Francis William 458 471 750

OPDYKE, George 468


OVIDIO, Naso, Publius 555

PETIY, Sir William 54 2 560


PROUDHON, Piem~}oseph 452 589

QUESNAY, François 478


QUJNCEY, Thomas de, ver DE QUINCEY, Thomas

RAMSAY, Sir George 1013


RJCARDO, David 452 453 461 465-468 476 477 489 498 505 507
518 520 521 525-527 533 534 536-539 545 546 548-557 560
562·564 570 580-589 593-634 636.644 646-648 651 658 666-
679 683 701 703-705 721 727 728 734.747 749-753 755-770
782 783 788 792-794 797 805-811 816-819 822-838 840 842
845-870 872-878 882-891 893 894 896-907 910 922 927-930
932-942 952 955-965 968-996 998-1014

1031
RODBERTUS, Johann Karl 449 450 455- 459-461 478 479 484 488·
498 500 502 503-507 509 511-515 516-525 527 531 532 536~
538 543 545 556 558-560 580-590 609 667-671 674 773 1023
ROSClIER, Wilhelm Georg Friedrich 553-556 563 564 641 934

SAY, Jean Baptiste 563 597 599 646 809 831 832- 903 904 929 930
936 938 965 989
SISMONDl, Jean-Charles-Léonard Simonde de 549 81 O 968
SMim, Adam 461 536 556 580 581 584 593 594 597-599 601 602
631 640 642 643 646-666 669 670 672 675-676 678 737 738
742 746 -747 749 761 764-805 807 819 828-832 834-835 837
845 846 848 a51 854 866-868 899 903 907 922 n1 932.935
959-962 975 987 989 1002 1012 1021 '
STEUART (STEWART), Síc James 545 546 552 556 662 988
STIRLING, Patrick James 467 895
STORCH, Heinrich Friedrich von (Andrej Karlowítsch) 530 722

TOOKE, Thomas 546 967


TORRENS, Robert 623
TOWNSEND, Joseph 547 552

URE, Andcew 934

WADE, John 453


WAKEFIELD, Edward Gibbon 670 729 831
WAI.LACE, Robert 552
WARD, W, H. 1009
WEST, Sit Edward 468 546 554 567 675
WHITNEY, Eli 1009
WILSON, James 934

YOUNG, Arthur 568

1032
Índice analítico.

AÇÕES 765 932


ACUMULAÇÃO DO CAPITAL 907 926·928 976 977
conversão de renda(revenue) em capital 913 914 921 922
forma capitalista da reprodução ampliada 924
crescimento da população, base da - 568 569 914 928 972
condiçóes necessárias da - 920-925
processo contínuo 914 915
e acumulação do trabalho 923
e produtividade do trabalho 971 972 992
e a composição orgânica do capital 910 913 914 972 992 996
e consumo 926
e crédito 918
e crises 928 930 931
e situação da classe trabalhadora 992 993 '999-1001
e lucro 971 976 977
e \Jsura 662
Sm.ith e a - 903 907 959 1011
idéias vulgares sobre - 971
ver fundo de acumulação
ADIANTAMENTOS DE CAPlTAL 455 456 473 578 579
AGRICULTIJRA
condicionamento da produção pela natureza 453 651 675 676
peculiaridades do processo de produção e de reprodução da - 454-
456 495 496
diferenças entre a - e a indústria 452 454 455 486 487 495 523
524 526 531 532 731
intensiva e extensiva 514 765
bases científicas da - 540 541
pré-capitalista 453 476 477 540
desenvolvimento do capitalismo na - 451 488 493-496 540 541
668-671 674 898
atraso da agricultura em relação à indústria no capitalismo 453
454 524
composição do capital na - 454 505 524 674 726 761 762 808
823-826
reposição nela do capital constante 486 487 541 542

1033
e produção de mais-valia absoluta 454·
lucro suplementar na - 455 503 508 524-526 530-532 557 576
577 671 827
na Alemanha 587 588 590 668 669
na Inglaterra 454 478 548 569 570 583 587 588 590 668-672
733 762 763 790 792 896 911 912 976
ver fertilUiade do solo, produtos agricolas, trabalhador agricola, tra-
balho agrícola ·
AGROQUIMICA 458 491 540 541 590
verqufmica
ALEMANHA
condições agrárias (cotejadas com as inglesas) 587 58~ 590 668-671
economia política na - 555 556
ALIENAÇÃO (ENTFREMDUNG) 84 7
AMERICA 658 793 992
ver Estados Unidos
AMORTIZAÇÃO DO CAPITAL FIXO 490 491
e valor das mercadorias 452 864
ver fundo de amortização
ANTAGONISMO DE CLASSES
no capitalis.mo 582 583 847 850 ·1005 1006
ANTIGUIDADE 453
APOLOG~TICA 548-551 935 936 953 954 1004-1006
exploração apologética da ciência 551 552 555 556
ARRENDAMENTO 471 472 .533 534 826 827
como difere da renda fundiária 502 527 732 733 ~27
extraído do salário ne~ssário 471 472 502
e paiceria agrícola 459
ARRENDATÁRIOS
capitalistas 451 540 582 583 586-588 765 766 809 810 826
827
pequenos 471 533 826
ARTES 541 963
ARTESÃOS
desemprego dos - pelas máquinas 1005
na escravatura 963
AUSTRÁLIA 729 730
ÁUSTRIA 451

1034
BANCARROTA 932
BANCOS 930 959
BANQUEIRO 554 555 920 946
BELGICA 458 790
BILHETES DE BANCO 930
BURGUESIA
radical contra a propriedade privada da tena 477 758 759
Ricardo, defensor da - industrial 550 551

CAMPO
idiotísmo da vida camponesa 912
desenvolvimento da produção_ capitalista no - :i93
exploração do - pela cidade 661-665
superpopulação relativa no - 451
CAMPONESES
nas colônias 729 730
CAPITAL
relação de produção 473 474 823
mercadoria 946
o processo gerador do - 477 534 585-587 730 731 898 902 903
oposição entre - e trabalho assalariado 832 833 847
razão hístórica do - 83 7
tendência a economizar 982
e desenvolvimento da produtividade do trabalho 958 959
fictício 932
e renda (revenue) 863 913 914
individual, parte do capital global da sociedade 463 464 500 502
864
circulante
e capital fixo 562 563 627 628 1012 1013
reprodução do - -· 908
ausência do capital fixo ou circulante em certos ramos industriais
457 478 479 494 495 523 563
e superprodução 955
fonnas do - - segundo os fisiocratas 1012-1014

*Quando se usam dois. travessões (-· -), servem eles pani representar epígrafe
que possuí um travessão, ou, quando a epígmfe não tem travessão e depende do títu-
lo anterior, serve o prinleho travessão para representar esse título, e o segundo, aquela.

1035
constante 846 84 7
e capital variável 992 996 997 1012
reprodução do - - 908-910 924-926
elementos do - - 455 456 493-495
valor e valor de uso do - - 846
peculiaridades da reposição do - - na agricultura 486 487 541
542 590 922 923
reposiçlfo do ··- - em forma física em ramos não agrícolas 486
889 890 909 916 923 924
e processo de formação do valor 846 847 909 910
participação do - - no valor da mercadoria.e na formação do pre~
ço de produção 606 607
desvalorização do - - oriunda da produtividade crescente do tra-
balho 847 910 911
transmutação de componentes do - - em renda fundiária 888
889 892
Ricardo ignora o - - 605 606 614 805 806 845 857 899 927
970 982 998
fixo
forma do capital na circulaÇão 627 628
parte do capital constante 494 495
produto da indústria 494
reprodução do - -462 627 908 1012
e capital circulante 562 563 627 628 1012 1013.
e valor da mercadoria 642 -643
superprodução do - - 951 952 955
ausência do - - e do circulante em certos ramos industriais 457
478 479 494 495 523 563
produtivo 568 950-952
produtor de juros
na agricultura 826
e acumulação de capital 918
ver crédito
variável 84 7 84 8
e capital constante 992 996 997 1012 1013
decréscimo absoluto e relativo do - - 991 992 1013
composi;ão do -
segundo o valor; variação do valor dos componentes do capital 706·
718 950 951

1036
técnica 712 713 717 718 889-891
orgânica 706- 718
barômetro do desenvolvimento da produção capitalista 527 846
847 899
reflete o estádio da produtividade do trabalho 450 451 462 539
681 726 847 1026
influência da - - no montante e taxa da renda fundiária 681-683
em distintos ramos de produção 523 524 718 726 761 762
808 816 823 824 826
agrícola 454 455 505 524 726 727 734 735 744 808 823
824 826
e os economistas burgueses 832 833 852
ver acumulafiio do capital, adiantamentos de Cfl[Jita~ amortização do
capital rzxo, migração de capita~ produtMdade do capital
CAPITALISTA
agente de produção 4 77 582 583 649 650 758 759
na qualidade de proprietário da terra 450 477 730-734 769 770
793
apropria-se da mais-valia 582 759 805 888 889
exploração da classe trabalhadora pela classe capitalista 463 464
relaçiio do -com classes improdutivas 477
como vê a origem do lucro 501 502 613
nas concepções de economistas burgueses 697 698 852 898
CAPITAL MERCANTIL
intermedí.ário entre produção e consumo 921
e estoques de mercadorias 921
CATEGORIAS DIALETICAS
conteúdo e forma 945-94 7
essência e fenômeno 502 536 537 597-599 601
possibilidade e realidade 838 937 943-950 966 %7
CATEGORIAS ECONÔMICAS 596-598 601 792
CIDADE
e campo 661-665
Cl~NCIA
bases científicas da índústda moderna e da agricultura 540
valor da - 987
e barateamento das mercadorias 987 988
CIRCULAÇÃO
fase intermediária entre produção e consumo 919 920

1037
e reprodução 945-949
processo de - e processo de produção 943 948 949
CIRCULAÇÃO DE MERCADORIAS 948
CLASSES
na sociedade capitalista 895 903 928 929 1007
e repartição da mais-valia 463 464 474 475 502 507 508 582
631 864
improdutivas 477 488 582 583 758 759 954
no sistema fisiocrátíco 595
ver burguesia
CLASSE TRABALHADORA
condições de existência da - 1006 1007
reprodução da -1013 1014
COLÔNIAS
dois tipos de - 729-731
escravatura nas - 730 866
propriedade fundiária nas - 729-731 734 737 740-742 745 793
866
como se desenvolve o modo capita1ista de produção nas -6 70 730 731
lucro extra nas - 806-808 866-868 905
formação de preços nas - 730
ver teoria cokmial
COLONIZAÇÃO 729-731 739-742 793
COMERCIO EXTERIOR
e produção de mercadorias 854
e taxa de lucro 806 807 866-868 905
e produto excedente 927
COMPRA E VENDA
no processo de produção e de reproduçao capitalista 513 514 927
coincidem na troca imediata 944 966 967
sua dissociação e as crises 920 927 930 936-941 944-950 952 953
966 967
consideradas idênticas na economia política burguesa 925 936 937
940 949 963 966 967
COMUN1SMO
relações de produção 1014
propriedade no - 534
produção e satisfação das necessidades 963 1014
condições agrárias no - 534 536
desenvolvimento da humanida~e e do indivíduo 549

1038
CONCORRSNCIA
entre países capitalistas 450 451
entre distintos ramos de produção 459-465 473 474 501 502 558
618-620 637-640 643 698 725 726 747 762 782 783 865·
867
dentro de um ramo de produção 526 558 585 636-640 699 733-
735
entre os.capitalistas 474 475 500-502 636 637 793 920 956
entre os trabalhadores 866
entre os compradores e vendedores 636 637
e repartição proporcional da produção capitalista 637-641 955 956
e formação da taxa geral de lucro e dos preços de produção 461-464
473-475 500 618 619- 637-640 643 725 726' 747 748 762
782 783
e formação do vaJor de mercado e do preço de mercado 526 635-039
699 733.735
configuração invertida das relações econômicas na - 502 537 597
598 648 665 666 697 698
CONDIÇÕES DE PRODUÇÃO
veT condições de trabalho
CONDIÇÕES DE TRABAIHO
naturais 474 475-477 675 676
objetivas e subjetivas 568
propriedade do capital 474 583 584 847
dissociadas dos produtores no capitalismo 847
CONSERTOS
ver trabalhos de repflTtlfÕO
CONSTRUÇÃO E FABRICAÇÃO DE MÁQUINAS 923-927 986
CONSUMO
individual e produtivo (industrial) 906 911-922 926 951-953
em condições capitalistas 928 929 938 939 962 968 969
dos trabalhadores 904 999 1000
das classes dominantes 1005 1006
e produção 919 920 952-955
contradição entre produção e -no capitalismo 952-958
e acumulação 926
e superprodução 903 904
no comunismo 1O14

1039
CONTABILIDADE
italiana 480
capitalista 585 586
CONTEúDO E FORMA 944-948
CONTRADIÇÕES
do modo capitalista de produção 453 549 582 928-931 935 936
940 944-951 953 955 967-969
CREDITO
resultado e condição da produção capitalista 641
ver dinheiro de crédito, sistema de crédito
CRISES ECONÔMICÁS
resultado da produção capitalista 928-969
processo Violento de ajustar contradições existentes 928 935 936
940 941 945 949 956 968 969
e desproporções da produção capitalista 928 929 950-952 955 963
964
e problemas de venda 938-941 944-949 952
possibilidade e realidade das -937 938 943-950 966 967
formas abstratas das - 928 929 944 950
e dissociação de compra e venda 927 930 931 936 937 940 944-
950 966 967
e destruição do capital 931 932
e vaiiações de valor 930 932 949 951 967
e variações de preço 930 93l 941 950 968
e alta das matérias-primas 950 951 967
e alta dos meios de subsistência 951-953
e crédito 930-933 946-950
e acumulação do capital 928 930
e reconversão do dinheiro em capital produtivo 950-952 967
e a bancarrota dos capitalistas e do .Estado 932 958
periodicidade das - 904 933 936
concepções burguesas das - 903 904 929 930 932-940 947-950
952-954 959 962-968
ver superprodução
CUSTO DE PRODUÇÃO 473 503
causas de redução do - 572 578 579
e movimento do preço 461 462 473
no sentido de preço de produção 630 826
economistas vulgares e - 563 564 646 905
ver preço de produção

1040
DARWINISMO
contra o malthusianísmo 552
DEPRECIAÇÃO MONETÁRIA 564 565 571 895
DINHEIRO
expressão do trabalho social geral 944
valor do - 631-634
e possibilidade das crises 929 950-952 967 968
funções do -
medida dos valores 949
meio de circulação 949
meio de pagamento 929 945-950
meio de entesouramento 930
de crédito 930
na economia política burguesa 556 597 631 632 868 937 939
940 962
ver depredação monetária
DINHEIRO DE CREDITO 930
DIREITO
do árrendatário 534
DISTRIBUIÇÃO
do trabalho e do capital entre os ramos de produção 920
proporcional dos meios de produção e das forças produtivas 956 957
do valor 565 582 583 848 849
da mais-valia 463 464 4 74 475 502 507 508 582 63 l 864 888
889
da mais-valia extra 465
do lucro 888 889
DIVIDA PÜBLICA 895
DMSÃO DO TRABALHO
e satisfação das necessidades 944
na agricultura 491 492
Snúth 664
DIZIMEIROS 551

ECONOMIA DE FORÇA E DE CUSTOS


tendência do capital 982
ECONOMIA POLmCA
ciêncía 597 598
burguesa 597-599 669

1041
cará~er
apologético da - - 548-551 935-937 953 954. 964 1004-
1006 '
modo de ver não histórico 453 466 584 589 939
métodos errôneos de abstração 536 537 581 582 600 601 605-
607 622 623 639 791 782 783 805 868 869
empirismo e escola.rucísmo da - - 622 623 837
c14ssica 536 537 580 581 596-599 601 602 701 702
desenvolvimento da teoria do valor-trabalho 596-598 601 673
763 764
ver economia vulgar, escola ricardiana, fisiocratas, malthusúmismo,
método da economia polftica burguesa, Ricardo, Smith
ECONOMIA VULGAR 555 556 869 870 935 936
caráter de plag:iâria da - 545 546 548 549 551 552
dissimula a relação entre capital e trabalho assalariado 935.937
identifica valor de uso com valor, oferta com procura, compra com
venda, produção com consumo 929 936 937 940 949 953-955
963 966 967
a favor do esbanjamento 547
e as relações entre salário e preço 551 624
e renda fundiária 467 468 525 563 564 574 595 774
e crises 903 904 929 930 932-936 940 947 948 962-968
e custo de produção 563 564 646 905
e lucro 903 904 981
ver apologética, malthusianismo
EMPRESTIMOS 555 765 766 895 g10 991
ENTESOURAMENTO
dinheiro, meio de - 930
ESCOCIA 553 733 751 793
ESCOLA RICARDIANA
solução escolástica das contradições na teoria de Ricardo 623 837
838 858
método de investigação da - 622 836-838 858
e renda da terra e propriedade fwidíária 582 583
dissolução da -830 831
ESCRAVIDÃO
produção e consumo na - 962 963
e propriedade da terra 897 898
e preço do trabalho escravo 655
ausência de cri.ses na - 938

1042
nas colônias 730 869
ESS~NCIA E FENÔMENO 502 536 537 597-599 601
ESTADO
e regulamentação do tempo de trabalho 454 866 869 870
e nacionalização da terra 477 534 582 583
ESTADOS UNlDOS 454 475 527 729 730 739-741 793
ESTATl'STICA 662 727 728 895
ESTOQUE DE MERCADORIAS
e acumulação 917
e desenvolvimento dos meios de transporte 920
armazenamento e conservação 927
e esfera de circulação 919"9!1
EXPLORAÇÃO
dos trabalhadores assalariados pelo capital 463 464 869 870
EXPORTAÇÃO DE CAPITAL 920

FERTILIDADE DO SOLO 720 721


natntal e artificial 569 570 572 573 576-579 588·590
limites à - 452 738 739
e desenvolvimento das forças produtivas 454 526 572 573 577
578 589 590 668-670 749 750
e renda fundiária 452 476 671 672 724 725
mais-valia relativa e absoluta 465
os proprietários da terra se apropriam dos resultados de maior - 534
578 579 803
e a lei de Storch 530 572 722
FEUDALISMO
propriedade fundiária feudal 475
papel do proprietário da terra na produção 477 583 584
ver Idade Média
FISIOCRATAS
característica geral de seu sistema 785
classes no sistema fisiocrático 595
e trabalho produtivo 791
concepções dos - sobre mais-valia 98 I
renda fundiária, úníca fo1ma de mais-valia 593-595 981
e lucro 981
analisam o capital e o modo de produção capitalista 581 1012
idéias dos - em economistas posteriores 593 594

1043
crítica das idéias dos - 593-595
FORÇA DE TRABAUIO
mercadoria 829 830
valor da - 83 2
custos de produção e repiodução dela 836 837
a economia política burguesa confunde - com trabalho 83 2 833
835 836
ver condições de trabalho, divisão do trabalho. jornada de trabalho,
processo de trabalho, produtividade do trabalho, tempo de traba-
lho, trabalho, trabalho assalariado, tra/Jalho excedente
FORÇAS PRODUTIVAS
desenvolvimento das - no capitalismo 550 958 959 962 963
e incremento da produção 973
FORMA MERCADORIA DOS PRODUTOS 492 493 495 496 936 937
FUNDO DE ACUMULAÇÃO 916 917 924 925
FUNDO DE AMORTIZAÇÃO 916 917
FUNDO DE CONSUMO 999 1000
FUNDO DO TRABALHO 993.995 999 1000 1012

GUERRA 549 825


GUERRA DA SECESSÃO 758

HISTÓRICO (O) E O LóGICO 704 902


HOMEM
desenvolvimento da individualidade do - no processo histórico 549

IDADE MEDIA
Impostos 665
capital usurário 662
ver feudalismo
IGREJA 551
WPOSTOS
diretos e indiretos 665
e taxa de lucro 816"819
INDIA 450 838
INDÚSTRIA
capital fixo, produto da - 494
e agricultura 452 453 524
extrativa ver minerafiíc

1044
moderna
base científica - - 540
de transformação
seqüência das fases de produção 481
ausência do capital constante em alguns ram0s 457 478 523
INDÚSTRIA DOMJ!STICA 1016
INDÚSTRIA DE TRANSPORTES
ausência de matérias-primas na - 4 78 495 523
e redução do processo de circulação 927
e volume do estoque de mercadorias 920
INGLATERRA 587 588 670 671
com~o da prpdução capitalista 488 1016
classes 4 71 918
situação dos trabalhadores 451 458 632 654 758 759 840 1008
1014
comércio eX'terior 564 933
dinheiro e crédito 658
indóstria 665 868 1008 1009
colônias 670 729
lei dos cereais 548 550 553-555 667
agricultura e condiçõ.es agrárias 454 478 548 569 570 583 587
588 590 668-672 733 762 763 790 792 810 896 911 912
976

JORNADA DE TRABALHO
e força de trabalho 839 840
e mais-valia absoluta 450 451 837
e introdução de novas máquinas 895
prolongamento da - 840
JURO
e taxa de lucro 657-659
Smith e o - 657-659
ver taxa de juro

LEI
geral da produção do capital 969
acumulação do capital na produção capitalista 919 920

1045
tendência a cair da taxa de lucro
expressão do desenvolvimento da produtividade do trabalho no
capitalismo 869 1025
e desenvolvimento da composição orgânica do capital 869 1026
fatores que se opõem a essa tendência 541 542 840
no sistema de Ricardo 742 805 868-870 896-904 975-978
segundo Smith 868 869 904 932 975
"rendimento decrescente do solo" 465-467 520 521 525 564 565
595 674 728 738 739 741 742 766 767 869 899
adversários dessa lei na economia política burguesa 521 547 548
574 575 589 590 667 668 1025
LEI DA MAIS-VALIA
leis que determinam o montante de mais-valia 480 841 842
LEI DO VALOR 673
vigência da - no capitalismo 470 471 489 490 595 596 606 607
621-623 763 764
e troca entre capital e trabalho assalariado 829-831
sua vigência entre diferentes países 632
LEIS DOS CEREAIS NA INGLATERRA 548 550 553.555 667 668
LETRAS 946 947
LONDRES 458 1014
LUCRO
fonte do - 725 726 806 807 811
forma transmutada da mais-valia 747 805 806
objetivo imediato da produção capitalista 763-766
e acumulação do capital 971 972 976 977
taxa e montante do - 807-809 813-815 858
repartição do - 888 889
conversão de partes do lucro em renda fundiária 888 892
relações entre -, renda fundiária e juro 888 889
médio
modificação da mais-valia 466 467 472 473 615 616 621-623
e lei do valor 606 607 621-623
suplementar 455 503 508 524-526 531 557 576 577 671 827
na indústria 452 526 527 534 539 671
na agricultura 466 467 503 508 524-527 534 557 576 577
671 676 677 759
e valor de mercado 637 671

1046
conversão do produto excedente e de parte do capital constante em
--888
nas colônias 806-808 866-868 905
industrial
seu papel regulador 902
concepções de - da economia politica burguesa
mais-valia identificada com lucro 842
concepções apologéticas 903 904 981
e os fisiocratas 981
segundo Smith e Ricardo 580 581 652-654 663 664 805 806
847-849 854 857-905
ver ta:xade lucro
LUCRO COMERCIAL 807 866-868 905

MAIS-VALIA 473 615 616 976 977


objetivo da produção capitalista 903 904 948
não se entende a mais-valia sem se entender antes o valor 622
e produtividade do trabalho 450 451 517 518 696 697 838
absoluta 450 451 518 837 869
.na agricultura e na indústria 454 455
relativa 450 465 518 838 869 870
apoia-se no desenvolvimento da produtividade do trabalho 450
477 697 838
extra 451 452 464 465
taxa de - 806-808 814 840-842
fatores que influenciam seu nível 517 518 625 806-808 814
839-842
magnitude da - 621 622 841 842
fatores que a determinam 461-463 480 491 518 697 725 726
806 808 837-842 857
e salário 451 708-710 839 840
lucro, forma transmutada da - 74 7 805 806
apropriação imediata da - pelos capitalistas participantes diretos da
produção 582 759 805 888 889
conversão da -em capital 913 914 921-925
conversão da - em renda fundiária 888 892
realização (conversão em dinheiro) da - 468 469
repartição da -463 464 474 475 502 507 508 582 631 864
confusão da - com suas formas transmutadas 842

1047
fisiocratas e - 593-595 981
Ricardo ·e - 466 602 606 607 624 646 805-858 864 865 869
898 899 902 903 1000
Rodbertus e -449 450 496-498 504-517 522 523 558
Smith e - 652 662 663 837
MALTIIUSIANISMO
Malthus, plagiário 546 547 548 549 551 552
hostil ao povo 547 551 552
teoriadapopulação 546-548 551-552 574 575 654 1011 1021
defesa de grupos parasitários 547 550-552 554
apologia da miséria dos produtores 548 550-552
"lei do rendlmento decrescente do solo" 465-467 520 521 525
564 595 738 739 741 742 869
e as contradlções da sociedade capitalista 552
crítica da teoria do valor de Ricardo 622 623
teoria da renda fundiária 1020
e a econonúa política burguesa 547 552 574 575 1025
refutado pelo darwinismo 552
MANUFATURA
forma de divisão do trabalho 1016
itinerário do desenvolvimento paraa indústria em grande escala 1016
1017
revolucionada pelas máquinas 991
MAQUINAS/MAQUINARIA
valor e produtividade das - 985 986
e valor da mercadoria 989
sua reposição física 916 923 924
e domínio tecnológico do capital sobre o trabalho 989 1005 1006
e aceleração da acumulação do capital 1016
influência da variação de valor das - na composiçã'o orgânica do capi-
tal e na taxa de lucro 988 989
e produtividade do trabalho 450 451 513
e desemprego dos artesãos 1005
revolucionam a manufatura 991
e acréscimo da população 988 989 997
e aumento das camadas sociais improdutivas 1004 1005
e prolongamento da jornada de trabalho 895
repercussões do emprego capitalista das - na classe trabalhadora 451
986 988-995 997 1004 1005 1016
ver construçiib e fabricação de máquinas

1048
MATI!RIAS AUXILIARES 924
MA TERIAS-PRIMAS
produto da agricultura 494 512 513
influência da variação do valor das - sobre a composição orgânica do
capital 541 542 811 812 951
influência da variação do valor das - sobre a taxa de lucro 508 811
812 867 868 950 951
alta de - e crises 950 951 967
MECÂNICA 540
MEIOS DE PRODUÇÃO
elemento do capital constante 455 456
MEIOS DE SUBSIST:êNCIA
valor dos - 848
e capital variável 1O13
e reprodução da força de trabalho 770 836 837
MERCADO
fase de circulação da mercadoria 919 920
e escala da produção capitalista 920 958 959
saturação do - 451 958 959
e flutuações de preços 720-723 750 752
interno 934 959 995
ver valor de mercado, preço de merazdo
MERCADO DE DINHEIRO 584
l\.fERCADO MUNDIAL 854 903 933 959 960 1016
MERCADORIA 450 936 937
precondição e resultado da produção capitalista 495 496 695 842
854937
duplo caráter da - 937 942-945
e dinheiro 937 940 944
condições de produção e realização da - no capitalismo 944 945
ver estoque de mercadorias, forma mercadoria dos produtos, produfiío
de mercadorias, troca de mercadorias, valor da mercadoria
METAMORFOSE DA MERCADORIA 936 937 940 943·946
METAMORFOSE DO CAPITAL 946 950
M.ETODO DA ECONOMIA POLITICA BURGUESA
método de investigação de Smith e Ricardo 536 537 580 581 583
584-586 596-603 605·607 622-624 639 640 646-650 659 660
666 701 778 779 781-784 805 806 842 868 869
método dos economistas da escola rlcardiana 623 836-838 858
método da economia vulgar 778 779 858

1049
MIGRAÇÃO DE CAPITAL 637-641 651 652 956
MINERAÇÃO 480
produtividade do trabalho na - 681 682.
processo de reprodução na-494 495
não se emprega matéria-prima na - 457 4 78 4 79 523 563
renda fundiária na - 678-683 768 769 793-795
MODO DE PRODUÇÃO
capitaliua
característica geral 582 583 920 936
pressupostos e condições fundamentais do - - 477 534 730 731
936 937
fonna mercadoria dos produtos, base do - - 493 495 496 936 937
coerção para extrair trabalho excedente 837 838
contradições do - - 453 549 581-583 928-931 936 937 940 944-
949 953-957 968 969
limita o livre desenvolvimento das forças produtivas 962 963
estádio prelimínar do desenvolvimento do - - 587 588
como se desenvolve na agricultura 488 493 495 496 668 669 898
como ·se desenvolve nas colônias 670 730 731
submissão de todas as esferas da produção material do - - 495 496
e a dupla qualificação dos camponeses'e artesãos 778
emprego do trabalho escravo no - - 730
a economia política burguesa, expressão teórica do - - 4 70 582-584
668 669
forma única e eterna para os econonústas burgueses 453 466 584
589 939
ver feudalimw, comunismo, escravidãQ
MOEDA ESCRITURAL
ver dinheiro de crédito
MONOPOLIO
do capital 525
da propriedade fundiária 525 531 532 595 596 759 774

NACIONALIZAÇÃO DA TERRA 477 534 582 583


NATUREZA
elemento de produção 557 675 676
ci>ndições naturais de produção 453 4 74-476 675 676- 967
propriedade privada das forças da - 583
forças naturais e modo capitalista de produção 9~7-989

1050
NECESSIDADES
e nível da produtivídade do trabalho 450 451 838 839
sociais 838 839
solvíveis 942 969
satisfação das - 944 963
no comunismo 1014

OBJETO DE TRABALHO
elemento do capital e elemento do processo de trabalho 455 456
OFERTAEPROCURA 460 461 563 564 702-704 929 940 941
ver procura
OURO (E PRATA) 630-632 728

PAUPERISMO 914
PAUPERIZAÇÃO
diminuição da cota da classe traballiadora no fundo de consumo 999
1000
PECUÁ)UA 672 726 773 785-788 989 995 996
PERfODO DE PRODUÇÃO
ver tempo de produçüo
PERIÕDO DE TRABALHO
ver tempo de trabalho
POPULAÇÃO
crescimento da - trabalhadora e salário 914 1014-1017
crescimento da - e produtividade do trabalho 975 976
fonte de novas forças de trabalho 975 988 989
e acumulação de capital 568 569 914 928 972
agrícola e nível de desenvolvimento do país 911 912 976
ver mperpopulação relativa, teoria da população
POSSIBILIDADE E REALIDADE 838 937 943-950 966 967
PRATA
veroto'O
PREÇO
e valor 451 461 694-698 762 763
e depreciação monetária 564 565 571 895
flutuações de - 720-723 750 752
'dos produtos agrícolas 451 452 531-533 558 593 594 639 640
727 728 745 763

105I.,
comportamento dos preços dos cereais na Inglaterra 548 556 564-
566. 571-575 667 840 895
Smith e "preço natural" 746-749 779-784 794
PREÇO DA TERRA
renda fundiária capitalizada 735
PREÇO DE MERCADO 526 558 636-638 763 764
e preço de produção 625 626 666 747 748
e valor de mercado 634-639 699-703
PREÇO DE MONOPÓLIO 470 763
e lei do valor 470 525 595
dos produtos agrícolas 595 596 818 819
e renda fundiária 464 465 774 780 818 819
de produtos urbanos na Idade Média 745
PREÇO DE PRODUÇÃO (PREÇO DE CUSTO, PREÇO MEDIO)
resultado da concorrência entre.os ramos de produção 461464 473-
475 '500 558 618 619 637-640 643 725 726 747 762 782
783
conseqüência e resultado da produção capitalista 762
e valor 463 464 468 488 489 502 503 560-563 615 616 621
622 625 626 643-646 666 673 674 707 725 726
e preço de mercado 558 625' 626 666 700 747-748
e renda fundiária 747-749
e flutuações do salário 818-827
caráter histórico do - 536 674 763
valor identificado com - na economia política burguesa,-459461
468 560 561 563 585 596 607 630 639 640 645 646 648
666 673 674 728 747-749 759 760 767 805 818 826 857
865 902
ver custo de produção
PREÇO DO SOLO
ver preço da terra
PROCESSO DE FORMAÇÃO DO VALOR
e processo de trabalho 455 456 481 512 515 516 542 627 628
846 908
PROCESSO DE TRABALHO
e processo de formação do valor 455 456 481 512 515 516 542
627 628 846 908
PROCURA
de força de trabalho 928
ver oferta e procura

1052
PRODUÇÃO
e troca 461 462
e necessidades 963
e consumo 919 920 952-955
e mercado 903 904 919 920 958 959
e reprodução 490492
material 495
subprodução 962 965 967
capitalista
objetivo deternúnante da - - 903 904 931 938 939 948 956
. 981 982 999
e desenvolvimento das forças produtivas 549 550
acumulação do capital, lei da - - 919 920
ver custo de produção, meios de produção, superprodução, tempo de
produção
PRODUÇÃO DE MERCADORIAS 889-891 944
no capitalismo 854
PRODUJ'IVIDADE DO CAPITAL
e coerção para extrair trabalho excedente 837 838
PRODUTIVIDADE DO TRABALHO
absoluta e relativa 450 451
conceituação capitalista 4 77
no capitalismo 550 664 956 958 959 963 1006
e valor da mercadoria 694-697
e mais-valia 450 451 477 517 518 696 697 838
e taxa de lucro 870 1025
aumento da -; fatores que a elevam 973-975
e composição orgânica do capital 450 451 462 539 681-683 727
847 1026
e acumulação do capital 956 972 992
e emprego de máquinas 450 451 513 541 542 990-992
e salário 450 451 505 506 697 838
na agricultura 452454 477 512 513 526 539-542 728
na indústria 453 477 539-542
PRODUTO
confronto do produto total das diferentes nações 911-913
forma mercadoria dos produtos no capitalismo 493 495 496 936
937
PRODUTO EXCEDENTE 923 924

1053
e comércio exterior 926
Ricardo e - 746 849 858
PRODUTOS AGIUCOLAS
formação de preços dos - 451 452 531-533 558 639 640 727
728 745 763
causas das elevações de preço dos - 564 571-574
PROPRIEDADE
das condições de trabalho (dos meios de produção) 4 74
capitalista 474 583 584 847
privada da terra, primeira condição do desenvolvimento do capital
476 477 534 583 730 731
no comunismo 534
ver propriedade da terra
PROPRIEDADE DA TERRA 589
diferentes formas de - 475 476 477 534 584 897 898
e modo de produção capitalista 476 477 582-584 668 669 673
674 729 739
renda fundiária, forma econômica da - 451 4 71 525 589 596 673-
677 726 729 761 766 774 792-827
fonte de renda. mas niio de xalor 475 476
e formação de valor na agricultura 531 532 557 558 639 640 673-
675 729 744 745 763
dissociação entre - e trabalho, primeira condi#o do desenvolvimento
do capital 476 477 534 730 731
existência nominal da - 472 534 668 669 729 733 734 737 738
748 764 765 768-770 792-793 796 826 827
nas colônias 729-731 734 737 740-742 745 793 866
negação da - na economia política burguesa 548 582 583 796
na teoria de Ricardo 525 526 534 548 582 669 737-739 745
809 810
ver nacionalização d.a terra
PROPRIEDADE PRIVADA
ver propriedade, propriedade da terra
PROPRlETÁRlOS DA TERRA
caráter ímprodutivo dos - no capitalismo 477 488 582 583 759
954
interesses opostos entre os industriais e os - 550 551 553-555
758 759
apropriam-se do lucro suplementar da agricultura 455 503 6 76 6 77
759

1054
apropriam-se dos resultados da fertilidade acrescida do solo 534 577-
579 803
e arrendatários capitalistas 582 583 588
os fisiocratas e os· - 797
na Antigüidade e na Idade Média 4 77 583
PROTECIONISMO 548 553 554

QUIMICA
base científica da agricultúra 540
influência dos processos químicos no tempo de produção 610

RELAÇÕES DE PRODUÇÃO
no comunismo 1O14
capitalistas·
como relacionamento entre compradores e vendedores 952-955
econon;iistas burgueses. e - - 936 937
RELIGIÃO
construções religiosas na Antigüidade 963
RENDA (REVENUE-, INCOME)
fo"ntes originais da - 475 476
líquida e bruta 981 984 998 999
derivada 516 929
dos trabalhadores improdutivos 995 1001
dos capitalistas 508
e capital 512 863 913 914 925 926
liberação de··- 992 993 997 1001
Ricardo e - 981-984 998 999
Smith e - 58í 858 927
RENDA DA TERRA
produto necessário da produção capitalista 453 527 536 791
forma especial de mais-valia 451 452 470 471 510 574-576 791
805 981 1021
forma do lucro suplementar 455 503 508 524-526 557 576 577
·671 743 827
forma econômica da propriedade da terra 451 471 525 589 596
673-677 726 729 761 766 774 792 827
capitalizaçã'.o da - 735
caráter histórico da - 534 536 582-584 674 823-827
condições diversas em que aparece a - 451 475 476 524 525 532
533

1055
determinação da - pelo solo mais fértil (lei de Storch) 530 571 572
722
montante e taxa da - 467 476 503-505 520 521 533-535. 538-
540 542 543 560 681-683 688 689 705 706 746 760 '
global 700 ·703 722 723
cálculoda-452 513 542 543
primordial e ~erivada 672-675 679 ·700 ,701 726 761 767 773
787-789 796 797
na indústria e em imóveis 471 508 796 797
na mineração 678-683 793 794
e juros 569 570 574 774
absoluta 532 557 572 672 673 684 685 688 689 698 699 722
723 728 729 759 825 826
expressão da propriedade privada da terra 451 469 470 525 596
673 674 726 729 761 766 826 827
condições de existência da - - 471 473 475 476 524 525 531
532 534 557 596 728 729 731 738 759-761 763 808
826 827
caráter histórico da - - 536 674 824-826
a lei do valor 683 688 765 706
Ricardo nega a - - 525 560 561 595 596 672 674 7o4 705
744 826
teoria da - de Anderson 521 545-548 553-556 574-579 667 668
füiocratas e - 593-595 981
Ricardo e - 465-468 520 521 525-527 534 536 546-548 553-557
560 561 564 565 575-583 594-596 667 668 672-679 704
727 728 738 739 741-745 825
Rodbertus e -479 495 503·507 516 517 520-525 531 536 583
584 585-591 625
Smith e - 580 581 652-654 749 761 764 766-769 773-803
concepções vulgares da - 467 468 525 563 564 574 595 774 1023
ver renda diferencia~ arrendamento, arrendatários
RENDA DE MONOPOLIO 464 465
RENDA DIFERENCIAL 557 572 671 684 685 699 700 719 720 722
723 759
causas da - 536
formação da - 887 888 892 893
e lucro suplementar 671 739
montante e taxa 476 525 526 686 687

1056
na transição de melhores para piores solos e vice·versa 672 704 705
739-742
e fertilidade artificial do solo 578 579
e preço dos produtos agrícolas 745
e renda fundiária absoluta 525 527 567 672 738 739
e nacionalização da terra 534 582 583
e comunismo 536
e Ricardo 525 560 561 595 596 673 674 701 704 705 744
RENDA DIFERENCIAL 1
e diferenças de fertilidade dos solos cultivados 452 476 525 526
671 701 702 738 739
RENDA DIFERENCIAL II
formação da -476 526 743 762 764 765
e propriedade da terra 826
RENDA FUNDlAR.IA
ver rendo da terra
RENDA NACIONAL
ver renda (repenue, income)
REPARTIÇÃO
ver distribuição
REPRODUÇÃO
unidade de produção e circulação 490 491 495 496 946 948 949
abrange reposição do valor e reposição material dos produtos 889
890 930
tempo de - 908 909
problemas da realização do processo de - 920 921 930
da força de trabalho 829 835-837
do capítal fixo 462 627 908 1012
do capital eonstante 908-911 924-926
do capital circulante 908
e produtividade do trabalho 975
e crises 928-931 945 946
natural na agricultura 495
simples 917 925
conceituação 913
e acumulação 916 91 7 925
ampliada 916·918 924 925
acumulação do capital, forma capitalista da - - 919 921 923-925
_e incremento da produtividade do trabalho 956

1057
RESIDUOS 458
REVOLUÇÃO FRANCESA
posição de Malthus contra a ··- 550
REVOLUÇÃO SOCIALISTA 1014
RICARDO
papel de -- na lústória da economia política 598 599 669
crítico de Adam Smith 601 631 666 761-771 807-830 903
959 960
representante do capital industrial 550 585 586 670
catacterlstica geral do sistema de - 583 584 598
contradições na teoria 466 606 607 679 764 765_ 835 836
861 862 1007 1008
modo de ver não lústórico 939 962 963
carências no método de investigação 537 580 581 583 584
596-600 605-607 622-624 639 640 646 701 805 806 842
868 869
probídade científica de Ricardo 548-551 556 557 989 990
teoria do 1alor de -
coerência na determinação do valor pelo tempo de trabalho 563
580 581 596-598 60L 625 827-830
falhas na - - 596-605 632 633 830-833 864 86~ 939 940
incompreensão da especificidade do efeito da lei do valor no capi-
talismo 829 835 842 864 865 ·
variações "dos valores relativos" das mercadorias 562 ~63 606-
621 625 626
teoria monetária de - 556 597 63 l 632 809 868 936 937 939
940 962
teoriadamai~1aliade - 602 805-856 859 898 899 1000
sem análise da origem da mais-valia 837 838 840
desenvolvimento da mais-valia relativa 837 838 845 848 849
mais-valia identificada com lucro 466 602 606 607 624 646
805 807 809 837 857 864 865 871 898 899 903
relações entre capital e trabalho ai!salariado 832 833
expulsão de trabalhadores por máquinas 985 986
teoria do salário de - 6 07 608 6 ll 612 83 5-841 848-85 6
confusão de trabalho com força de trabalho 835-837
valor do trabalho e salário 832-837 848-851 854 855 868 869
992 993 1000
relações entre salário e valor da mercadoria 551 624-631 823
848 849

1058
teoria do lucro (teoria do lucro médio e dos preços de produção)
de - 806 847 853 854 857-905
taxa geral de lucro 606 607 611-615 618-620 622 624 626
628 652 806-808 858 864 865
queda da taxa de lucro 805 868-870 896-904 975-980
razão inversa entre lucro e salário 505 506 624 840 848 849
razão inversa entre lucro e renda 507 869
rnigr~ão do capital 640 641 651 670 81 O 865
valor identificado com preço de produção 459-461 468 560 561
563 585' 596 606 607 630 639 646 648 666 672-674
728 746-749 759 760 767 805 818 826 858 864 865 902
conjetwas sobre diferenças entre preço de produção e valor da mer-
cadoria 615-617 623 624 629 630 -767
valor de mercado identificado com preço de mercado 467 636-
639 865
influência das flutuações de salário sobre os preços de produção
607 608 611 612 624-631
teoria da renda de - 465 467 468 525 537 538 546 548 560-
563 582-589 595 596 625 634 636-638 646 667-679 683
701 702 704-706 733-772 782-784 803 805 811 818-827
893 894
e propriedade da terra 525-527 534 548 582 583 669 737-
739 745 809 810
capital segundo -
natureza do capital 852
pesquisa das formas de capítal na circul~ão 606 608-611 627
805 900 901
exclusão do capital constante 605 606 614 805 806 845 846
858 899 927 966 982 998
acumulação do capital 581 903 904 907-980 996
concepções de -sobre a produtividade do trabalho 477
na agticultura 476 674 728 749 750 870 899 902 975
976
caráter improdutivo dos proprietários das terras 582 583
comércio exterior 806 807
renda (revenue) bru,ta e renda líquida 981-984 998 999
comércio colonial e sistema colonial 658 669 670 737-743 866-
868
nega a superprodução 903 929 932 933 935 938-941 962 963

1059
crítica·das idéias de - por economistas burgueses 549 587 588 596
597 599 602 604 605 622 623 670 671 742 743 831 837
os adversários sentimentais 549 81 O
os que o criticam do ângulo do modo de produção prê-caPitalista
583 584 585-588 668 669
estrutura da obra de - On the principles ofpolítica/ economy 599-602
ver escola ricardiana
RÚSSIA 454 911

SALÁRIO
natureza do - 811
forma do valor da força de trabalho 747_ 748
e valor da mercadoria 450 848 986
e mais-valia 451 708 709 839-841
e lucro 505 506 709
e preço de produção 818-827
e produtividade do trabalho 450 451 505 506 697 838
diferenças de nível do - entre trabalhadores industriais e trabalhado-
res agrícolas 451
diferenças nacionais de - 45 f
eausas de variação do - 825 1014-1017
queda do - abaixo do nível tradicional 451 454 895:
Ricardo 551 607 608 611 612 623-631 822 832;.837 847-851
853-855 868 869 992 993 1000 1001
Smith e o mínimo de 652 653 661 662
e preço segundo os economistas vulgares 551 624
SISTEMA DE CREDITO 640 .641 959
SMITif
sucessor dos fisiocratas 593 594 785·791 797
caracterfstica geral do siúema de - 580 597 598 647 648
contradições teóricas 536 537 597 598 652 653 655-657 778
779 781-783 828-830 835
dicotomia do método de investigação de - (exotérico e esotérico)
536 537 597 598 601 647-650 659 660 665 666 778
782·784
elementos teóricos vulgares 778 779 903
teoria do valor de -
definições diferentes do valor 536 537 631 647 648 656 663
747 775-780 797-802 828 829 834 835

1060
negação da vígência da leí do valor no capitalismo 622 623 S28
829 834
"preço natural" 746-749 779-784 794
idéias contraditórias sobre a medida dos valores 835
lucro, renda (rent) e salário, fontes do valor 536 537 630 631
647-649 652 653 656-660 665 666 775 776 779 782 783
801 802 903
red~ão do valor do produto anual a renda (revenue) 581 650
846 857 927
teoria da mafs...valia e do lucro de -
natureza e origem da mais-valia 652 662 663
valor qualificado de trabalho, e mais-valia, de trabalho excedente
837
compreensão científica do lucro 580 652 653 663 664
queda da taxa de lucro 868 869 903 932 975
migração do capital 651 652
fonnação do preço de prod~ão 650-652
valor identificado com preço de produção 459-461 648 649 665
666 747-749 767 775
teoria da população de - 654 785 786
teoria colonial de - 658 670 737 738 742
e acumulação do câpital 903 907 959 1011
e o salário (mínimo de salário) 652 653 661 662
e divisão do trabalho 664
e renda da terra 580 581 593 594 652 654 672 676 678 749
761 764.766 768 769 773-803
e os ínteresses das diferentes classes 803 804
e as crises 959
e capital circulante 1012
crítica das idéias de - por economistas burgueses 597 598 666 670
737 738 747 782-784 845 1012
idéias smitlúanas, fonte de confusões para os sucessores 584 631
640 641 642 646-648
SOLO
ver terra
SUBSTÂNCIA DO VALOR 560 596 597 604 605
SUPERPOPULAÇÃO RELATIVA 914 994 999 1006 1007
conseqüência do emprego capitalista das máquinas 988 989 992
no-campo 451 992

1061
SUPERPRODUÇÃO
no capitalismo 942 962 963 969
fenômeno fundamental das crises 962
e subprodução 962 963-965
e saturação do mercado 958 959
do capital fixo 951 952 955
do capital circulante 955
de mercadorias e capital 932 933 967 969
e situação da classe trabalhadora 903 942 958 962
caráter periódico da - 903 904
relativa 958 964 966
parcial e geral 939 942 957 959
Ricardo nega a - 903 929 932 933 935 938-941. 962 963
ver crises econJJmicas

JAXADEJURO 572 573


· e taxa de lucro 657-659
TAXA DE LUCRO 455 456 517 518
fatores que influenciam o nível da - 456 458 587 819 820 823
858 895
individual e média 468 469 807 862 866-869 905
em ramos diferentes da produção capitalista 455 456 743 744 806
807 866-869 905
e valor dos diversos componentes do capital individual 45.6 458 624
706 709-712 717 807 813-815 823
e taxa de mais-valia 857 858
e taxa da renda fundiária absoluta 705 706 718·720 770 771 819
820
e taxa de juro 657-659
média 747 864 865
origem da - - 459-464 473 474 479 480 492 493 500 502
607 608 613-616 618-620 629 630 637-639 643 725 726
747 762 782 783
e taxa de lucro individual 468 469 807 862 866-.869
ver lei (tendência a Ctlir da taxa de lucro)
TEMPO DE PRODUÇÃO
e tempo de trabalho 462 609 61 O
influência dos processos químicos no -610

1062
TEMPO DE TRABAlliO
e tempo de produção 462
necessário 453 454
individualmente necessário 561
TEORIA COLONIAL
de Smith e Ricardo 658 -669 670 737·743 793 866 867
de Wakefield 729
TEORIA DA POPULAÇÃO
de Malthus 546-548 551 552 575 654 1011 1012 1021
de Smith 654 785
TERRA
força produtiva 773
o solo como produto de um processo histórico-natural 676
cultivo de novos solos 571·573 577 578
valor da - e renda fwidiária 560 563 564
nacionalização da - 477 534 582 583
condição original do trabalho 476 477
objeto de trabalho 455 456
ver fertilidade do solo, preço da terra, propriedade da temi, Proprietá-
rios da terra, renda da terra
TfrULOS 765 932
TRABALHADOR AGRlCOLA 451 976
TRABALHO
base natural do - 476 477
substância do valor 561 596 597 604 605
simples e complexo 449 450 816
abstrato ·
forma de trabalho social 604 605 939 940 963
e concreto 939 940
vivo e materializado 829-831 852 909 91 O 923
necessário
sociahnente necessário 471 472 561 955 956
produtivo
conceituação de - - 54 l 982
ver condições de trabalho, divisão do trabalho, força de trabalho,
jornada de trabalho, processo de trabalho, produtividade do tra·
balho, tempo de trabalho, trabalho agr(cokl., trabalhiJ assalariado,
trabalho excedente

1063
TRABAlHOAGRfCOLA 453 454 513 749 750
ver trabalhador agrícola
TRABAUIO ASSALARIADO
base da produção capitalista 829
reprodução ampliada do - 1005-1007
TRABALHO DAS CRIANÇAS 840 914
TRABALHO DAS MULHERES 840 914
TRABALHO EXCEDENTE
base da produção capitalista 714
coerção para extrair - 837 838
e produtividade do trabalho 838
e trabalho simples e complexo 816
TRABALHOS DE REPARAÇÃO 908 916
TROCA
entre capital e trabalho assalariado 829-831
de capital por capital 909 925 926
de renda por capital 512 926
e produção 461 462
e circulação 944
TROCA DE MERCADORIAS 829-831
TROCA DE PRODUTOS 944 962 966 967
VALOR 468 580 581 622 623 694-696 827-829 939
individual e de mercado 634-638 699-703 943 944
e preço 461 763
distribuição do - 565 582 583 848 849
identificado com valor de uso na economia política 9urguesa 581 582
busca de medida invariável do - na economia política burguesa 798
834
Malthus e o -, ver em malthusianismo
Ricardo e o-, ver em Ricardo
ver lei do valor, mais-valia, processo de f onnação ck> Vfilor, substância
ck> valor, valor de troca, valor de uso
VALOR DA MERCADORIA
Smith e o -- 581 650 857 927
VALOR DE MERCADO 526 558 597 625 634-638 671 699 700 701-
703 734 735 955 956
limites das flutuações do - 699 702 703
e valor índivídual 634-638 699· 703 722 723 943 944
e preço de mercado 634-639 699- 703

1064
e lucro suplementar 637 671
e renda fundiária absoluta 699 702 722 723 748
e renda diferencial 699 700 722 723
e repartição do produto excedente 887
e oferta e procuta 702-705
na teoria da renda de Ricardo 595 625 634-639 673 702 734 735
VALOR DE TROCA 939 940
base e objetivo da produção capitalista 939 940
e preço 695
destruição do - nas crises 931 93 2
VALOR DE USO 943
importância econômica do - 924
e produtividade do trabalho. 512 513 695
no processo de produção 568
valor e - segundo os economistas burgueses 581 582
VALOR EXCEDENTE
ver mais-valia

1065
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