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A Tristeza - 悲 – Bei

Elisabeth Rochat de la Vallée *

Traduzido por Fernando Assis de Carvalho

A TRISTEZA NORMALMENTE EXPERIMENTADA

Tristeza e aflição, antes de serem patológicas, são reações, sentimentos


normais e desejáveis. A tristeza devora interiormente frente à morte de um pai.
Não se deve negá-la, nem a impedir, mas sim, exprimi-la:

“Quando retiramos a urna funeral (para preparar o enterro) o filho chorava, se


lamentava et saltava um número de vezes indeterminado. Sob o peso da dor e
da tristeza do seu Coração, dentro da penível agitação de seu espírito (yi 意),
nos abraços da tristeza e da aflição (bei ai 悲哀), ele despiu o braço esquerdo e
saltava, na intenção de acalmar seu Coração (an xin 安 心 ) e de reduzir seu
fôlego (xia qi 下 氣 ) colocando seus membros em movimento’’ 
(Liji, Memórias sobre decoro e cerimônias, S. Couvreur, tradução revisada)

Observamos que o colocar do corpo em movimento impede que a respiração


se bloqueie no peito, o que facilitará o retorno à normalidade.
Podemos também dizer que as manifestações exteriores da tristeza associam
esta última com os movimentos e gritos rituais. A diminuição de suas
manifestações, sempre, segundo as prescrições rituais, leva também à
diminuição da tristeza ao mesmo tempo, porque nos autorizam a estar menos
tristes e porque a ligação estabelecida entre a tristeza e suas manifestações
incita naturalmente uma redução comum.
Se o luto e a tristeza são normais, eles não devem durar. Em três anos
(frequentemente 25 meses, primeiro mês do terceiro ano contado por um ano
inteiro), devemos retomar a vida normal:

“Um filho, à morte de seu pai, chorava sem interrupção durante três dias; em
três meses ele não tirou nem a faixa e nem o cinto de cânhamo; durante um
ano (ele chorava manhã e noite) com um profundo sentimento de tristeza (bei
ai 悲哀 ); seu sofrimento (opressivo, you 憂) durou três anos. Os testemunhos
de enfermidade estavam, assim, reduzindo. A dor decrescia com o tempo, os
sábios antigos haviam determinado como sua manifestação deveria diminuir
gradualmente. Por isso, então, a duração do luto foi fixada em três anos e a
liberdade não foi deixada aos mais sábios para prolonga-la, nem aos menos
sábios de reduzi-la.” (Liji, Mémorias sobre decoro e cerimônias, S. Couvreur II,
p.704, tradução revisada)

A tristeza avançando até a angústia é, assim, o sentimento próprio que


experimentamos frente à morte, aquele que deve se sentir o “filho devoto” à
morte de um parente, e primeiramente de seu pai. É o luto conduzido, o
sentimento que acompanha a partida definitiva do vivo que transmitiu a vida. O
Livro dos Ritos é abundante em considerações sobre a tristeza e a angústia;
ele descreve as manifestações físicas, as alterações da aparência, as atitudes
do luto da alma; ele mostra como o grito, choro, saltos de dor são maneiras de
fazer a tristeza ser suportável, de diminuir a angústia intensa pelo movimento
dado ao corpo e como todo o processo deve ser, em Três anos, para trazer de
volta a paz no Coração do angustiado.

Desde já, observamos o quanto a tristeza e a angústia carregam golpes


repetitivos ao sentimento profundo de existir, à vivacidade que procura se
exprimir e surgir, a se desprender continuamente. Observarmos um luto de um
pai, mas sempre por três anos. Seguir o luto, de um tempo passado, seria um
excesso; a recusa da realidade, tenha sido ela dolorosa, agrava o sofrimento e
destrói a saúde. Carregar o luto de si mesmo, experimentar o sentimento de
perda da vida sendo que vivemos ainda é uma perversão grave. A vida se
vinga e a morte é gerada do próprio luto, pois nós abalamos o interno,
atacamos o centro da vitalidade, viramos as costas à razão.

A TRISTEZA, SENTIMENTO DO PULMÃO

A tristeza 悲 bei: o Coração 心 que (se) recusa 非: o virar de costas da pessoa


para ela mesma no seu Coração, como uma presa à contradição, à negação,
possivelmente à negatividade. O esgotamento que resulta desta luta estéril
destrói o sopro na região do Coração e do Pulmão. A oposição rompe a
comunicação que emana do Coração e corta a alegria da vida; o bloqueio se
torna fraqueza, dor, desolação.

“Quando as essências e os sopros anexam o pulmão há tristeza (bei 悲 ).”


(Suwen 23)

A tristeza corresponde ao Pulmão e é a perversão do movimento do metal.


Este último tem o corte das espadas e das foices que cortam cabeças ou
ceifam os cereais. Ele é também o ritmo que marca o fim da expansão yang e o
começo do retorno ao yin. O metal é condensação e concentração a fim de
trazer as riquezas da vida ao interno. Na tristeza, ele se torna compressão que
tritura o Coração, incomodando também a circulação do sangue, o qual a
qualidade diminui e que expande os Espíritos; esta obstrução aniquila
igualmente os líquidos e os sopros do Pulmão.

“Quando há tristeza os sopros são destruídos (xiao 消). [...]


Quando há tristeza, o sistema relacional próprio do Coração (xin xi 心繫) está
fechado, o pulmão se dilata e suas folhas se levantam; o Aquecedor Superior
não garante mais suas comunicações; reconstrução (nutrição) e defesa (ying
wei 營衛) não se difundem mais; os sopros quentes estão no centro. É assim
que os sopros são destruídos.” (SuWen 39)

É o oposto da alegria que permite a reconstrução, assim como a defesa de se


propagar facilmente. O contrário, a tristeza aperta o Coração; o que não é uma
metáfora, pois o exagero na concentração própria do Metal aperta as vias pelas
quais o Coração se comunica. O sistema relacional próprio do Coração é
primeiramente o de conectar o Coração com os outros órgãos, conexão
imaterial e espiritual, mas que se torna visível pela circulação sanguínea, em
especial pelas artérias que partem do Coração. Os sopros do Pulmão, tomado
pela tristeza, bloqueiam as passagens e a circulação de sangue e sopros, ao
invés de assegurar suas propagações até os confins do corpo. Os sopros
bloqueados no peito geram o calor; calor que destrói os sopros.

Podemos acrescentar que o Coração não podendo mais comunicar pelo


sangue e pelos sopros, não pode mais propagar a luz de sua razão, dar
inspiração à mente, manter dentro da realidade da existência.

TRISTEZA E CHORO

A mesma situação descrita anteriormente explica também o fluxo de lágrimas,


eventualmente acompanhado de catarro, que acompanha a tristeza.

“Os líquidos corporais (jin ye 津液) dos cinco Zang e dos seis Fu sobem até se
infiltrar no olho; se o Coração é tomado pela tristeza e os sopros os anexaram
(o ocupam indevidamente todo o conjunto, bing 并 ), o sistema relacional do
próprio Coração (xin xi 心系) se fecha; o sistema do Coração também se fecha,
o Pulmão se eleva e quando ele se eleva os líquidos ye extravasam no alto.
Como no sistema do Coração e do Pulmão não podem estar constantemente
elevados, ora eles se levantam, ora eles abaixam, é por esta razão que
tossimos e que as lágrimas caem.” (Lingshu 36) [1]

O mecanismo é simples: a tristeza comove o Coração pela perversão dos


sopros do Pulmão-Metal. O bloqueio dos sopros no peito faz o Pulmão se
dilatar e impede de preencher sua função de abaixar os líquidos no tronco; os
sopros, impedidos de descer pelo calor que reina no peito, ecoa para cima,
impulsionando os líquidos para o exterior. Estes líquidos saem pelo olho, às
vezes também pelo nariz, orifício próprio do Pulmão; os sopros e líquidos
podem também fazer como uma bola na garganta e emitir sons que são os do
pranto.

O derramar das lágrimas é, além disso, conectado ao cérebro, órgão rico em


essências e em fluidos preciosos e densos, e em comunicação com os orifícios
da face (olho, nariz, orelha). O cérebro é percorrido pelo meridiano conectado
ao Fígado, e o olho, o orifício próprio do Fígado, é também, o local de contato
do meridiano ligado ao Coração.

A irregularidade dos sopros do Pulmão explica também a tosse ou soluços,


assim podem ser pegos por aquele que é esmagado de tristeza.

A TRISTEZA E O CORAÇÃO

Bem sendo o sentimento próprio do Pulmão, pela especificidade do movimento


dos sopros que ele induz, a tristeza é frequentemente associada ao Coração, o
qual o impede a expressão livre e feliz. A tristeza é, então, o oposto da
felicidade, da alegria que se manifesta pelo riso.
No SuWen, cap. 62, lá onde o excesso dos sopros do Coração se traduzem por
um riso incontrolável, a insuficiência destes mesmos sopros se traduz pela
tristeza. Ou mesmo:

“Quando os sopros do Coração estão em vazio, há a tristeza (bei 悲); quando


eles estão em plenitude, rimos sem poder parar.” (Lingshu 8)

Examinando os pares dos caracteres que exprimem os sentimentos, relevamos


de forma habitual, a alegria fazendo par com a raiva e, paralelamente, a
felicidade fazendo par ora com a tristeza (bei 悲), ora com a aflição (ai 哀).

O caractere para aflição (ai 哀 ), representa os gritos, gemidos e lamentações


que saem da boca 口  daquele que revestiu os hábitos 衣  especiais do luto. A
aflição sentida à perda de um ente querido; a dor do luto, publicamente
manifestada.

Tristeza e aflição são opostos à alegria de viver, a alegria do Céu, próprio a


toda a vida humana que se aceita e se possui. A tristeza torna uma recusa da
vida. Em um sentido patológico, os movimentos e reações que implicam a
tristeza se opõem àqueles que implicam uma alegria excessiva, possivelmente
delirante.

A tristeza aparece regularmente como o sentimento que alguém experimenta


quando os sopros do Coração estão bloqueados ou sem força para circular.

“Dor de cabeça devido a um refluxo (ou queda, jue 厥 ) onde as circulações


(mai) na cabeça são dolorosas, o Coração está triste (bei 悲 ), temos a
tendência a chorar (shan qi 善泣)...” (Lingshu 24)

Podemos compreender que o Fígado possui os sopros em contracorrente em


subida, onde as circulações do sangue e sopros, congestionados, tornam-se
dolorosas. Mas, ao mesmo tempo, ele impede o Pulmão de descer e induz um
bloqueio em seu nível. O Coração não se beneficia mais do impulso fornecido
pelo Fígado para o ajudar a fazer circular, mas sofre do bloqueio; resultando na
tristeza. A tendência a chorar é forte pois a contracorrente advinda do Fígado
faz pressão sobre os líquidos dos olhos.

Quando falamos do bloqueio dos sopros, da dificuldade em fazer circular o


sangue, da agressão levada ao Coração e da falta de comunicação deste
último, demonstramos, na verdade, a disfunção daquele que deve proteger o
Coração e de o fazer comunicar com o resto da pessoa: o Xinbaoluo ( 心包絡)
ou proteção (bao 包) e conexões (luo 絡) próprias ao Coração (xin 心)[2].

Assim, quando descrevemos uma situação onde os perversos atingiram o


Coração, falamos na verdade de uma situação onde o Xinbaoluo é atingido,
quer dizer, uma situação onde o sistema de conexões próprios ao Coração é
incomodado, impedido de completar sua tarefa.
“Quando os perversos estão no Coração, o convalescente tem cardialgias com
uma tendência a estar triste (xi bei 喜 悲 ); às vezes ele cai do avesso sem
conhecimento. ” (Lingshu, 20)

Os sopros perversos fazem pressão sobre a região do Coração. A tristeza aqui


não é um sentimento devido a um luto ou um evento real; ela é o resultado da
mudança induzida na mente, a sensibilidade, quer dizer, o Coração, pelo
bloqueio dos sopros.

Se este bloqueio se agrava, as comunicações são completamente fechadas; o


Coração, as consciências, a faculdade de estar consciente, não estão mais
presentes no nível dos órgãos dos sentidos e se perde a compreensão.

Ao contrário, a tristeza compromete a boa distribuição do sangue, impede as


proteções e conexões do Coração (Xinbaoluo) de comandar regularmente as
circulações sanguíneas (xue mai 血 脈 ). Os efeitos podem atingir diferentes
partes do corpo, como o baixo ventre onde o útero coleta o sangue, onde o
Intestino Delgado guarda separado os líquidos corporais e o sangue
controlando seu fogo.

“Quando a tristeza e a aflição (bei ai  悲哀) são intensas, as proteções vitais e


suas conexões (bao luo 胞絡) se rompem (jue 絕); estando rompidas, os sopros
yang (yang qi 陽 氣 ) se agitam no interior (nei dong 內 動 ). Quando isso
desencadeia, o coração faz descer sob forma de hemorragia uterina et
frequentes hematúrias. ” (Suwen, 44)

O Suwen, cap.39, nos mostrou a tristeza fazendo obstáculo às circulações que


partem do peito e como os sopros, bloqueados, desaparecem, destruídos pelo
calor. No Suwen, cap.44, as conexões próprias às proteções vitais se
interrompem sob a pressão dos sopros e os sopros yang, aprisionados, se
excitam e criam a agitação. O sangue sai dos seus canais, e mesmo do corpo,
sob a pressão do calor.

A expressão “as conexões próprias às proteções vitais” (bao luo 胞 絡 ), pode


ser entendida aqui de diversas maneiras:

- É o Xinbaoluo (心包絡), os envelopes que protegem o Coração e as redes de


conexões que emanam para religar todo o ser ao Coração, centro da vitalidade
consciente e mestre da circulação regular do sangue. O calor excessivo da
região do Coração atrapalha o padrão de circulação que ele dá ao sangue; a
manifestação se faz no nível do orifício interior anterior.

- É o meridiano extraordinário Chongmai que dá a o primeiro padrão de


organização da circulação do sangue no ser em formação e que se espalha no
peito.

- São os trajetos dos sopros ligados ao útero, lá, onde uma nova vida se
agasalha e se protege, uma ligação com os Rins nas mulheres.
O que quer que seja, há um mau reflorescimento dos sopros, obstrução e calor
provocando um esfacelamento no interior; a defesa e as comunicações do
Coração são mal garantidas; os Rins estão implicados e o Fígado também.

O Fígado está implicado em diversas denominações: ele acumula o sangue,


quer dizer que ele regula a quantidade de sangue a guardar em reserva ou a
liberar no corpo, por um esforço muscular, para a menstruação... etc. Ele dá o
impulso para as circulações e emissões até a sua saída do corpo; nesta
denominação, ele participa na regulação dos orifícios inferiores. Privado de
essência, de yin, por contrabalancear seu mal dinamismo, o Fígado perde a
paciência, gera um calor que produz circulações erráticas no baixo ventre. O
Intestino Delgado, associado ao Fogo, é particularmente sensível a este calor;
ele pode perturbar seu funcionamento e provocar hematúrias. O Coração pode
igualmente transmitir este calor ao Intestino Delgado.

A TRISTEZA E O FÍGADO

Já vimos o Fígado implicado em diversas patologias ligadas à tristeza. Ele é


apresentado seja como a principal causa da tristeza, seja como a função
afetada por isso; que o Pulmão-Metal domina o Fogo-Madeira no ciclo de
dominação (ke) não é estranho a esse fato.

“Em caso de tristeza (bei 悲), os sopros do Pulmão montam (colidindo sobre os


do Fígado).” (Suwen 19)

Como no Lingshu, cap.24, analisado anteriormente, a agitação do Fígado,


produzida pelo vento, induz uma contracorrente de sopros que incomodam e
enfraquecem as comunicações do Coração e faz com que sintamos facilmente
tristes.

Mas a tristeza atinge o Fígado também, porque a desaparição dos sopros,


tolhidos internamente, priva o Fígado do dinamismo necessário a seu bom
funcionamento.

“Quando o Fígado está preso pela tristeza e a aflição (bei ai 悲 哀 ), nos
emocionamos no centro, então, se produz um ataque aos Hun. Os Hun
atingidos, perdemos a razão (kuang 狂 , loucura) e nos tornamos esquecidos;
ficamos sem essência (jing 精 ); estando sem essência, não podemos mais
garantir os padrões; é a situação onde o aparato yin se contrai, onde a
musculatura se crispa, onde as costelas de ambos os lados não podem mais
se levantar. Os pelos se tornam quebradiços e damos todos os sinais de uma
morte prematura. Se morre no outono” (Lingshu 8)

A tristeza se opõe ao impulso da felicidade em direção ao florescimento que é


próprio do Fígado. A tristeza é uma recusa; ela contradiz nosso próprio desejo
de ir adiante. Por que você está tão triste? Porque você não tem o gosto do
esforço espontâneo que faz o movimento vital.

A tristeza se torna uma inversão da vitalidade. Ao invés de espalhar seus


galhos e suas folhas em todas as direções, esta planta na primavera que eu
sou, retorna contra si mesmo sem ímpeto; veja como agora eu ataco o meu
interior.

O efeito produzido é inconfundível. As almas Hun, que são a inteligência e a


sensibilidade, reflexão e imaginação, contrariadas em sua liberação e livre
movimento, se aterroriza e se esquece. Uma loucura que vai até a fúria. A raiva
é associada ao esquecimento, pois não se pode mais fazer um retorno à
própria memória, até a destruição da personalidade.  

O Fígado se esvaziando de sua substância, não há nada mais para segurar os


Hun para voltar à razão. O sangue não oferece mais uma ligação de expressão
aos Hun, pois ele está desnaturado pela agitação e por que o contato com o
Coração é difícil pelo bloqueio dos sopros. As essências que se exprimem no
sangue do Fígado acabam por faltar.

A falta das essências, em relação com o Fígado, perturba a retidão da


realização da vida que depende da fidelidade dos Hun à inspiração das
Consciências.

A Vesícula Biliar, o aspecto mais yang, o mais masculino do Fígado é


implicado, pois ele não assume mais a retidão e a exatidão das condutas.

A normalidade se torna desorientação; os sopros corretos não podem mais se


livrar das essências deficientes; o centro é abalado, o padrão não possui mais
uma base.

Alguns dirão que o yang do Fígado e da Vesícula Biliar, muito forte, torna-se
inflamação, fogo que vira em direção ao Pulmão-Metal, para lhe causar danos
pela inversão do ciclo de dominação (ke); bela expressão da involução quando
se retorna contra si mesmo suas forças vivas ao invés de desenvolvê-las.

O sangue não seguindo mais sua via e as comunicações com o Coração


estando interrompidas, como os Hun poderiam receber a iluminação das
Consciências do Coração para se conformar e as seguir fielmente?

Os Hun não estando mais inspirados, a perda do sangue diminuindo as


essências, o cérebro se enfraquece, as essências não se resplandecem mais
com a presença das Consciências para o bom funcionamento dos orifícios
superiores. A inteligência e a claridade que estão em dependência dos Hun,
consequentemente os fenômenos da loucura e do esquecimento. Esta loucura
é furiosa (kuang 狂), pois é um calor e uma agitação yang.

O Fígado controla a atividade muscular; quer dizer que ele dá o dinamismo e o


vigor que cria a força do movimento ao mesmo tempo que ele libera a
quantidade de sangue requerida pelo músculo afetado pelo esforço. Se as
essências secaram no nível do Fígado, não há mais sangue suficiente para
irrigar os músculos; crispação e nódulos se manifestam. O espaço central no
baixo-ventre, na região do períneo é percorrido pelo meridiano do Fígado que
sustenta a musculatura dos órgãos genitais; ele se contrai e se retrai, não
podendo mais se desenvolver.
As costelas são percorridas pelos meridianos do Fígado e da Vesícula Biliar. A
imobilização desta região é uma consequência da retração do aparelho genital
e da crispação muscular. É também a região de localização do Fígado e o sinal
de que o dano está agora em seu ponto extremo de involução.

Os efeitos devastadores da tristeza que nascem no interno e mudam a vida a


partir do seu centro culminam, finalmente, como é o caso por todas as
emoções, perturbando duravelmente e fortemente o ser em direção à morte.

A morte é o outono, a estação onde o yang cede frente ao yin, onde o


movimento do retorno a si deve ser iniciado. O desconforto já instalado se
redobra de efeitos do ambiente yin que a estação do outono traz com ela.
Morre-se no outono e a qualquer período tendo a natureza do outono. Morre-se
quando tudo está se recolhendo – mas não temos mais florescimentos, nem
essências. Morre-se na colheita dos sopros – mas eles são aniquilados – e ao
abrigo das consciências – mas eles não são mais guardados pelas essências
deficientes ou confortadas pelos Hun atingidos.

Tristeza e raiva

A tristeza pode gerar a raiva seguindo um processo simples. A tristeza bloqueia


as circulações dos sopros, o que exerce uma pressão sobre o Fígado,
atrapalhando seu dinamismo. O bloqueio dos sopros do Fígado causa um calor
reativo que vai esquentar o sangue e excitar o yang, induzindo uma situação de
raiva. É uma evolução que se observa por exemplo nos casos de luto intenso,
onde a pessoa se coloca com raiva contra o ente querido que está morto sem
nenhuma razão particular.

[1] Um texto similar se encontra no Lingshu cap.28.


[2] Algumas vezes indevidamente traduzido como pericárdio. Seu meridiano, O
Jueyin da mão, é um dos dois meridianos ligados ao Coração, aquele que tem
a mesma qualidade de sopros que o meridiano do Fígado, Jueyin do pé. O
outro meridiano do Coração é o Shaoyin da mão.

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