Escolar Documentos
Profissional Documentos
Cultura Documentos
16
ATUALIDADES
Índia e Paquistão:
a geopolítica da Caxemira
ATUALIDADES Alessandra de Fatima Alves
1
2
Geopolítica do Oriente Médio
Na qualidade oficial de presidente da OLP e de chefe da Resistência Palestina, proclamo aqui que nós não
queremos derramar uma só gota de sangue árabe ou judeu. Não nos comprazemos na busca de um confronto que
queremos ver terminar desde o aparecimento de uma paz justa... Vim, trazendo numa das mãos o ramo de oliveira
e na outra o fuzil de um combatente da liberdade. Não deixem o ramo de oliveira tombar de minha mão.
ARAFAT, Yasser. In: O problema palestino. Coimbra: Centelha, 1976.
Esta aula de Atualidades abordará o Oriente Médio pela óptica da regionalização geopolítica, isto é, apesar
do Oriente Médio constituir uma unidade, mostraremos um desenrolar geo-histórico pautado em duas linhas para-
lelas: a questão da Palestina e os conflitos no golfo Pérsico, que tem como esteio o petróleo.
3
de, em 1917, o ministro das Relações Exteriores da Grã- após o país ter sido atacado por seus vizinhos
-Bretanha, Arthur James Balfour, declarar: árabes.
5. Os árabes controlam 99,9% do território no
Oriente Médio. Israel representa apenas um dé-
Caro lorde Rothschild,
cimo de 1% da região.
Tenho o grande prazer de endereçar a V. Sa.,
6. A história demonstrou que a segurança do povo
em nome do governo de Sua Majestade, a seguinte
judeu apenas pode ser garantida através da exis-
declaração de simpatia quanto às aspirações sio-
tência de um Estado judeu forte e soberano.
nistas, declaração submetida ao gabinete e por ele
aprovada: Há relatos que dizem que judeus e palestinos
”O governo de Sua Majestade encara fa- viviam harmonicamente. No entanto, as imigrações de
voravelmente o estabelecimento, na Palestina, de judeus começaram a aumentar muito nas décadas de
um Lar Nacional para o Povo Judeu, e empregará 1920 e 1930. A partir daí, não tardaram a explodir
todos os seus esforços no sentido de facilitar a re- os primeiros conflitos entre habitantes locais e judeus
alização desse objetivo, entendendo-se claramente
imigrados. Os camponeses palestinos não entendiam
que nada será feito que possa atentar contra os di-
direito aquela chegada repentina e numerosa de ju-
reitos civis e religiosos das coletividades não judai-
deus europeus para a sua terra. Muitos palestinos
cas existentes na Palestina, nem contra os direitos
e o estatuto político de que gozam os judeus em
vendiam suas propriedades aos judeus que chagavam,
qualquer outro país.” sem saber o projeto que estava por trás daquela apro-
Desde já, declaro-me extremamente grato a priação gradual.
V. Sa. pela gentileza de encaminhar esta declaração Os conflitos se intensificaram no início da déca-
ao conhecimento da Federação Sionista. da de 1930, quando os judeus já eram mais de 10% do
Arthur James Balfour
total de habitantes da Palestina. O movimento sionista
havia constituído exércitos clandestinos para proteger
as colônias judaicas.
Este documento ficou conhecido como Decla- Diante das hostilidades, a Grã-Bretanha tentou
ração Balfour. Estruturado e contando com o apoio intervir. Para restringir o fluxo migratório de judeus sio-
explícito da Grã-Bretanha, o movimento sionista tinha nistas, elaborou, em 1922, um documento intitulado o
como passo seguinte organizar a migração de judeus Livro Branco, mas que não surtiu o efeito desejado.
europeus para a Palestina. Essa migração foi ainda mais Essa migração de judeus se intensificou ainda
facilitada pelo fato de a Grã-Bretanha ter saído grande mais na época da ascensão nazista na Alemanha, pois,
vencedora da Primeira Guerra Mundial e a Palestina es- naquele contexto de perseguições e mortes, as migra-
tar então sob seu mandato. ções só poderiam aumentar. Recrudesceu a revolta po-
O povo judeu baseia suas reivindicações pela pular dos árabes, que ficavam cada vez mais inconfor-
Terra de Israel em alguns fatores: mados com a absorção gradativa de suas terras pelos
1. A Terra de Israel foi prometida por Deus aos ju- judeus, e a Grã-Bretanha se perdia na armadilha que
deus. Esta é a antiga terra dos patriarcas e pro- armou em prometer uma terra já habitada e que não
fetas bíblicos. lhe pertencia.
2. Desde que os judeus foram exilados pelos ro-
manos, a Terra de Israel nunca foi estabelecida A criação do Estado de Israel
como um Estado.
3. O Estado de Israel foi criado pelas Nações Uni- Com o fim da Segunda Guerra Mundial, o cená-
das em 1947. É um Estado democrático, moder- rio da bipolaridade é de importância fundamental para
no e soberano. a compreensão do nascimento e da existência de Israel.
4. Toda a Terra de Israel foi comprada pelos judeus Se não fosse o apoio dos Estados Unidos, o país dificil-
ou conquistada por Israel em guerras de defesa, mente teria continuado a existir. Israel foi peça funda-
4
mental na geoestratégia estadunidense para o Oriente Os palestinos e os jovens países árabes não
Médio no pós-guerra. aceitaram a partilha, considerando-a uma interferência
indevida.
Partilha da Palestina proposta pela ONU (1947) Quando a Grã-Bretanha antecipou sua retirada
da Palestina para o dia 15 de maio de 1948, o líder
judeu David Bem Gurion proclamou a independência
de Israel. Os países árabes imediatamente declararam
guerra ao novo Estado.
5
3. Jerusalém é a terceira cidade sagrada na religião A medida causou um grande impacto na Inglaterra,
muçulmana, local de elevação do profeta Mao- França e Israel que, então, iniciaram uma guerra contra
mé aos Céus. o Egito. No desenrolar do conflito, os egípcios foram
4. O Oriente Médio é dominado por árabes. Ou- derrotados, mas os Estados Unidos e a União Soviética
tras religiões ou nacionalidades não pertencem interferiram, obrigando os três países a retirarem-se dos
à região. territórios ocupados. Ao final, o canal de Suez voltava,
5. Todos os territórios árabes que foram coloniza- definitivamente, para o Egito, mas com o direito de na-
dos tornaram-se Estados completamente inde- vegação estendido a qualquer país.
pendentes, exceto a Palestina.
6. Os palestinos tornaram-se refugiados.
Guerra dos Seis Dias (1967)
Guerra de Suez (1956) A guerra dos Seis Dias foi mais um desdobra-
mento dos conflitos entre árabes e judeus. Ela recebeu
Teve como objetivo garantir o acesso dos oci- esta denominação devido ao efetivo contra-ataque isra-
dentais (principalmente franceses e ingleses) ao co- elense à ofensiva árabe, promovido pelo Egito.
mércio oriental, antes realizado pelo contorno do sul O presidente Nasser, buscando fortalecer o mun-
da África. O controle das operações realizadas no do árabe, tomou medidas importantes: deslocou forças
canal ficou sob o domínio inglês e continuou mesmo árabes para a fronteira com Israel; exigiu a retirada de
após a independência do Egito. No entanto, em 1952, representantes militares da ONU mantidos na região
um golpe de Estado, realizado pelo revolucionário Ga- desde 1956; e ameaçou fechar a navegabilidade do Es-
mal Abdel Nasser, pôs fim ao regime monárquico do treito de Tiran aos israelenses.
rei Faruk. A liderança de Nasser no governo egípcio No entanto, a reação israelense a essas medidas
revelou uma política de caráter nacionalista, buscando foi rápida e decisiva: atacou o Egito, a Jordânia e a Sí-
a modernização do Estado por meio da reforma agrá- ria, encerrando o conflito num curto espaço de tempo
ria, do desenvolvimento da indústria e de uma melhor – 5 a 10 de junho (6 dias) de 1967. Israel dominava as
distribuição de renda. A luta contra o Estado de Israel,
forças aéreas e, por terra, contava com forças blinda-
entretanto, não deixou de ser alimentada.
das comandadas pelo general israelense Moshé Dayan.
O resultado da guerra aumentou consideravelmente o
Estado de Israel: foram conquistadas áreas do Egito,
Faixa de Gaza, península do Sinai, região da Jordânia,
a Cisjordânia, o setor oriental de Jerusalém, partes per-
tencentes à Síria e às colônias de Golan.
A guerra dos Seis Dias fortaleceu o Estado de
Israel e agravou o nível de tensão entre os países beli-
gerantes. Consolidada a vitória, Israel lançou um novo
expediente: a colonização do territórios ocupados. Ju-
deus de várias partes do mundo seriam convocados a
ocupar terras “disponíveis” na Palestina. As colônias se
multiplicaram, principalmente na Cisjordânia, mas tam-
bém em Gaza, Golã e Sinai. A península do Sinai foi de-
volvida aos egípcios em 1979, num acordo em separado
entre o primeiro-ministro israelense Menachem Begin e
Numa atitude de combate ao colonialismo an- o presidente egípcio Anuwar Sadat.
glo-francês, Abdel Nasser nacionalizou o canal de Suez A ONU condenou a ocupação através da reso-
e proibiu a navegação de navios israelenses no local. lução 242, que exigia o estabelecimento das fronteiras
6
anteriores à guerra. Essa resolução passaria a ser o guia israelenses diante dos árabes, cuja força se restringia no
das reivindicações palestinas dali em diante. No entan- campo da ameaça, enquanto Israel agia. Outras guer-
to, Israel não cumpriu a resolução. ras de menor expressão ocorreram, praticamente todas
vencidas por Israel. A guerra do Yom Kippur teve um
desfecho diferente, mas a vitória árabe foi apenas políti-
ca, pois, no aspecto militar, Israel demonstrou mais uma
vez sua superioridade.
Foi a quarta guerra árabe-israelense. Síria e Egi-
to atacaram Israel de surpresa, mas a reação israelense
mais uma vez forçou os árabes a um imediato cessar-
-fogo. No entanto, nessa guerra os árabes se utilizaram
de um novo recurso: interromperam o fornecimento de
petróleo aos países alinhados com Israel, provocando a
crise mundial do petróleo.
Intifada (1987-1993)
A década de 1980 foi bastante tensa em Isra-
el e nos territórios ocupados. Sob domínio estrangeiro
desde 1967, os palestinos passaram a conviver com
forças israelenses, com constantes toques de recolher.
A perseguição às principais organizações de resistência
aumentou. Houve o fechamento de sindicatos, comitês
Nações Unidas, 22 de novembro de 1967 e escolas, além de muitas aldeias e campos de refugia-
O Conselho de Segurança (...), enfatizando dos palestinos, que foram tornando o clima cada vez
a inadmissibilidade da aquisição de território de mais tenso.
guerra e a necessidade de trabalhar por paz justa A criança palestina aprendeu a odiar o soldado
e duradoura na qual cada Estado na região possa israelense desde cedo, pois vê nele seu ocupante opres-
viver em segurança (...), afirma a aplicação dos se- sor. É essa criança que, ao crescer, somada o ingredien-
guintes princípios: te de fanatismo religioso, vai engrossar as fileiras dos
I. Evacuação das forças armadas israelenses dos homens-bomba que proliferaram no Oriente Médio nos
territórios ocupados no recente conflito; anos de 1990.
II. Encerramento de todas as reivindicações ou Outro fato é a orientação que as mães palesti-
estados de beligerância e respeito pelo reconhe- nas seguem de ter o máximo possível de filhos, com o
cimento da soberania, integridade territorial e in- objetivo de interferir na balança demográfica regional.
dependência política de cada Estado da região e
Nesse contexto, em 1987, os palestinos viram surgir um
de seu direito a viver em paz dentro de fronteiras
fato novo que lhes traria grandes ganhos políticos: a
seguras e reconhecidas (...)
intifada, a rebelião das pedras.
Adaptado do Centro de Informação
das Nações Unidas no Brasil, 1988. “Intifada“ quer dizer “levante“, e foi exatamen-
te isto que ocorreu: uma rebelião conduzida por mu-
lheres e crianças que viviam sob ocupação em Gaza e
Guerra do Yom Kippur (1973) na Cisjordânia, cujas armas eram basicamente paus e
pedras. Configurou-se uma situação inusitada, pois os
A guerra dos Seis Dias e, mais ainda, os anos soldados israelenses, muito bem armados, tiveram que
subsequentes demonstraram a superioridade militar dos enfrentar esse exército diferente.
7
paz, como mostra a visita a Jerusalém do então presi-
dente egípcio, Anwar Sadat, em novembro de 1977.
O presidente dos EUA na época, Jimmy Carter
(1977-1981), capitalizou em cima desse espírito e con-
vidou Sadat e o então premiê israelense, Menachem
Begin, para conversas em Camp David.
8
acordo direto entre israelenses e palestinos, representa- o reconhecimento do “direito de retornar” dos refugia-
dos pela OLP (Organização pela Libertação da Palesti- dos palestinos.
na). Sua importância é que resultou no reconhecimento O fracasso de Camp David foi seguido pelo se-
mútuo entre Israel e a OLP. gundo levante palestino, conhecida como Intifada.
9
A proposta foi precedida de um comunicado, em
junho de 2002, de George W. Bush, que propunha fases
para pôr a segurança antes de um acordo final:
Fase 1: Declaração dos dois lados apoiando a
solução de dois Estados. Palestinos poriam fim
à violência e agiriam contra os que estivessem
“engajados no terror”, criariam uma Constitui-
ção e fariam eleições; israelenses parariam de
construir assentamentos ou ampliar os já exis-
tentes e conteriam ações militares.
Fase 2: Criação de um Estado palestino, em As negociações de 2007 foram interrompidas, após a ofensiva israelense
em Gaza.
conferência internacional, com “fronteiras pro-
visórias”.
Fase 3: Conversas finais.
Geopolítica do golfo Pérsico
O Mapa da Paz não foi implementado, mas se-
gue sendo um ponto de referência para as negociações. O motivo pelo qual o golfo Pérsico se conver-
teu num dos pontos mais importantes da Terra é bem
Acordo de Genebra (2003) claro: a região guarda aproximadamente 3/4 de todo
o petróleo existente no Planeta. O petróleo – a “mola
Revisa os conceitos do Mapa da Paz em que a do capitalismo” – foi, é e será ainda por pelo menos
segurança e a confiança precederiam um acordo políti- algumas décadas a principal fonte energética existente.
co. O maior compromisso de Genebra era que os pales- É claro que a compreensão do cenário geopolíti-
tinos desistissem de seu “direito de retorno” em troca co do golfo, do Iraque e da Arábia Saudita transcende o
de praticamente toda a Cisjordânia. Israel desistiria de aspecto econômico: contam também o aspecto religio-
grandes assentamentos, como Ariel, mas manteria ou- so e o caráter multiétnico.
tros perto da fronteira.
Os palestinos teriam sua capital em Jerusalém Revolução islâmica (1979)
Oriental, mas Israel manteria a soberania sobre o Muro
das Lamentações, na Cidade Velha. A partir de 1977, o xá iraniano Mohamed Reza
Pahlevi passou a sofrer uma forte crise interna em seu
Annapolis, EUA (2007) país, em função de uma série de reformas por ele implan-
tadas e não aceitas pela maioria de muçulmanos xiitas.
O premiê israelense, Ehud Olmert, e o presidente O xá baseou seu poder no petróleo e estimulou
da Autoridade Palestina, Mahmoud Abbas, participaram a entrada de empresas transnacionais no Irã, enten-
de negociações com o Quarteto e mais de uma dúzia de dendo a adoção de hábitos ocidentais como “moder-
países árabes. nização”. Essa ocidentalização acelerada produziu
Mas o Hamas, que ganhara as eleições parla- uma forte resistência do clero iraniano. Os grupos de
mentares em Gaza, em 2006, e dominara no ano se- oposição se multiplicaram e as manifestações, que co-
guinte a região não estava representado e disse que meçaram nas escolas secundárias em 1977, se gene-
não se comprometeria com nenhuma decisão tomada ralizaram, em 1978.
em Annapolis. Os distúrbios foram evidentes, culminando com
Após um comunicado conjunto, Olmert e Abbas a fuga do xá para o exterior, em janeiro de 1979. Ainda
tiveram reuniões regulares para acordar questões de no final de janeiro de 1979, retornou do exílio o líder
fronteira, mas as negociações foram interrompidas pela religioso aiatolá Ruhollah Khomeini, que anunciou a
ofensiva militar israelense em Gaza, no final de 2008. criação da República Islâmica do Irã, em 10 de fevereiro.
10
Saddam Hussein invadiu três ilhas do Irã, no es-
treito de Ormuz, e, no dia 22 de setembro de 1980, ocu-
pou a zona ocidental do Irã, para tentar reconquistar o
seu território através de acordo. O que na verdade o Ira-
que queria era causar instabilidade no governo islâmico
iraniano de Teerã e juntar territórios ricos em petróleo.
Desde o princípio do conflito, o Iraque não con-
seguia alcançar a vitória, pois o seu ataque encontrava
forte resistência. Sempre que as tropas iraquianas con-
Mohamed Reza Pahlevi Ruhollah Khomeini quistavam um território, o Irã recuperava. O Iraque só
manteve o poder sobre Khorramshahr. Com esta situa-
O consumo de álcool foi proibido, as mulheres ção, o Iraque resolveu propor um cessar-fogo ao Irã, que
foram obrigadas a cobrir o rosto em público (xador), não aceitou a proposta.
filmes ocidentais foram banidos. Esse retorno obriga- Desse modo, o que favoreceu o Iraque foi o país
tório à doutrina e aos costumes originais e a busca poder contar com o apoio de grandes potências, como
de uma maior fidelidade aos textos sagrados, com o EUA e URSS. Isso garantiu ao Iraque uma condição de
apoio do Estado, ficaram conhecidos como fundamen- continuar lutando contra o Irã. Apesar disso, em meados
talismo islâmico. dos anos 1980, o Iraque perdeu o apoio desses países,
O fundamentalismo islâmico fortaleceu-se no Irã pois foi acusado de ter utilizado armas químicas contra
e visava expandir-se para outros países do Oriente Mé- o Irã.
dio. Essa intenção gerou reações tanto de alguns países Em 1988, a ONU obrigou os países a um cessar-
da região quanto das superpotências. Por outro lado, -fogo. O Iraque aceitou a proposta, mas o Irã não parou
encontrou acolhida nas forças políticas que se opunham de atacar o Iraque. Porém, no dia 15 de agosto de 1988,
a governos pró-ocidentais e queriam fundar Estados foi concedido o acordo de paz entre os dois países. O
guiados pelas leis islâmicas, principalmente a partir da que levou o Irã a aceitar o acordo foi que a sua econo-
década de 1990. mia estava totalmente agravada.
Nesta guerra não houve vencedores, ambos os
países só tiveram perdas. As suas economias foram de-
Guerra Irã-Iraque (1980-1988) sestruturadas, não houve mudanças nos domínios terri-
toriais políticos e muitas vidas foram perdidas no conflito.
Em 22 de setembro de 1980, teve início o confli-
to entre o Irã e o Iraque, apresentando como causa ime-
diata a partilha das águas do estreito do Chatt-el-Arab.
Outros motivos ainda podem ser lembrados,
como o desejo do Iraque de recuperar terras perdidas
para o Irã, em 1975; a questão do separatismo curdo,
que sempre foi um ponto de desacordo entre os dois
países; a preocupação do governo de Bagdá com a evo-
lução do islamismo xiita em seu território; e o ódio pes-
soal de Khomeini contra o Iraque, de onde foi expulso
em seu exílio. Este conflito, que até o final de 1985 não apre-
No ano de 1980, o líder do Iraque, Saddam Hus- sentava expectativa de término a curto prazo, apresen-
sein, não cumpriu um tratado firmado em 1975, que tou desdobramentos paralelos, como: diminuição da
cedia ao Irã, aproximadamente, 518 km2 de seu territó- produção de petróleo do Irã; venda de peças de museus
rio, e o Irã, em permuta, cessaria a assistência militar à tradicionais do Irã para financiar o conflito; possibilida-
minoria curda no Iraque que lutava pela independência. de da venda de aviões Super-Standard e mísseis Exocet
11
da França para Bagdá; ameaças de fechamento do es- Como primeira crise internacional de considerá-
treito de Ormuz por parte do Irã, impedindo o comér- veis proporções do pós-Guerra Fria, a guerra do Golfo
cio do petróleo de todo o golfo Pérsico para o restante promoveu a aproximação dos EUA com a Síria e com
do mundo; bombardeamento de refinarias, oleodutos, a União Soviética, sendo que, pela primeira vez, as
áreas de exploração e terminais petrolíferos, que provo- duas potências encontravam-se lado a lado numa dis-
caram grandes vazamentos de petróleo no Golfo, ame- puta internacional. Além disso, países outrora aliados
açando a vida de outros países como o Kuwait e Catar; do Iraque, como a Arábia Saudita, subitamente passa-
bombardeamento de petroleiros de outras bandeiras ram para o outro lado, condenando veementemente as
em pleno golfo Pérsico, que iam em busca do petróleo ações de Saddam.
do Irã ou do Iraque; e aumento da frota estadunidense Quanto mais sérios tornavam-se os desdobra-
no mar da Arábia, tentando evitar ataques a petroleiros mentos da crise, mais firmemente a opinião pública
e o fechamento do estreito de Ormuz. internacional exigia o uso de medidas enérgicas para
decretar-se uma solução. Inúmeras tentativas diplo-
Guerra do Golfo (1991) máticas não deram em nada, e os Estados Unidos
lançaram então um ultimato: caso o Iraque não se
Ao final do conflito armado que travara durante retirasse do Kuwait até o dia 15 de janeiro de 1991,
oito anos com o Irã, o Iraque acumulava uma fortuna o uso da força seria autorizado. Em 17 de janeiro,
em dívidas com credores externos: mais de 80 bilhões uma coalizão, liderada pelos EUA e formada por 28
de dólares. A economia iraquiana dependia essencial- países, iniciou o ataque.
mente do petróleo e, com seus preços em baixa, o país
viu-se impossibilitado de saldar ao menos parte do que
devia, além de não poder aumentar os recursos que fi-
nanciavam seu programa armamentista.
Em julho de 1990, o ditador governante do
país, Saddam Hussein, acusou o vizinho Kuwait de for-
çar as baixas internacionais no preço do petróleo para
aumentar suas cotas de venda. Além disso, evocando
antigas rixas territoriais, o Saddam reivindicava partes
do território do Kuwait, que declinou de todas as exi- A sofisticada tecnologia de que dispunham arra-
gências iraquianas e, por isso, foi invadido em agosto. sou as tropas iraquianas e destruíram muitos pontos do
As consequências da ação iraquiana foram imediatas: país, ainda que Saddam tenha causado alguma devas-
o então presidente dos EUA, George Bush, enviou tro- tação na Arábia Saudita e em Israel, países que bom-
pas para o golfo Pérsico e impôs um boicote econômi- bardeou regularmente durante o conflito armado. Em
co ao Iraque. fins de fevereiro, as forças chegaram ao Kuwait e não
Tamanho alvoroço deu-se por causa da gran- encontraram resistência iraquiana. Bush anunciou a vi-
de importância econômica dos países do golfo, que tória e o cessar-fogo. Para agravar ainda mais sua situa-
são os maiores produtores e exportadores de petróleo ção, após o término das hostilidades o Iraque entrou em
do globo. Uma crise de proporções na região pode- processo de guerra civil. Todavia, apesar do aparente
ria levar a incidentes de consequências devastadoras sucesso, a guerra deixou um saldo apavorante: mais de
para a economia mundial. Com as sanções ocidentais 150 mil iraquianos foram mortos (cerca de 10 mil civis);
em resposta às suas ações, Saddam não pestanejou: a capital Bagdá foi destruída; inúmeros poços de petró-
anexou unilateralmente o Iraque e aprisionou todos os leo foram incendiados e a fumaça e os derramamentos
estrangeiros ali presentes, para poder barganhar mais oriundos dessas ações constituem-se no pior acidente
tarde sua libertação. Tudo isso levou a acontecimentos ambiental da história da humanidade. O número de
interessantes. mortos da coalizão não chegou a 150.
12
Guerra do Iraque (2003) Pouco depois da invasão, a coalizão multinacio-
nal criou a Autoridade Provisória da Coalizão, baseada
A invasão do Iraque, em 2003, comandada pelo na Zona Verde, como governo de transição do Iraque
general Tommy Franks, começou em 20 de março, com até ao estabelecimento de um novo governo. Citando
o nome de código “Operation Iraqi Freedom“ (Opera- a resolução nº 1.483 (de 22 de maio de 2003) do Con-
ção Liberdade do Iraque) para a ofensiva estadunidense. selho de Segurança da ONU e as leis da guerra, a APC
O nome de código da ofensiva britânica foi “Operação revestiu-se de autoridade legislativa, executiva e judi-
Telic“. As forças da coalizão cooperaram com as forças cial, desde 21 de abril de 2003 até à sua dissolução em
28 de junho de 2004.
curdas peshmerga no norte. Aproximadamente, outras
A APC foi originalmente liderada por Jay Garner,
40 nações, designadas “a coalizão dos interessados“
antigo oficial estadunidense, mas a sua indicação durou
(coalition of the willing), participaram fornecendo equi-
apenas um breve período. Depois de Garner se demitir,
pamento, serviços e segurança, tal como forças espe-
o presidente Bush indicou Paul Bremer como chefe da
ciais. As forças militares iniciais da coligação eram de
APC, o qual serviu no cargo até a dissolução da Autori-
cerca de 180 mil, dos quais 98% eram estadunidenses
dade, em julho de 2004. Outro grupo criado na prima-
ou britânicos.
vera de 2003 foi o Grupo de Pesquisa do Iraque, que
O exército de Saddam foi rapidamente ultrapas-
foi uma missão de descoberta de fatos, enviada após a
sado, apesar de a sua tropa de paramilitares, os Fedayin
invasão pelas forças multinacionais para encontrar pro-
de Saddam, terem colocado uma resistência desafiadora.
gramas de armas de destruição massiva desenvolvidos
Em 9 de abril, Bagdá caiu nas mãos das forças dos EUA.
pelo Iraque. Consistia numa equipe internacional de 1,4
A infantaria estadunidense cercou os ministérios abando-
mil membros organizada pelo Pentágono e pela CIA
nados do partido Baath e derrubaram uma enorme está-
para procurar supostos armazéns de armas de destrui-
tua de ferro de Saddam Hussein, terminando com o seu
ção massiva, tal como agentes biológicos e químicos,
domínio de 24 anos no Iraque. No entanto, generaliza-
e qualquer programa de investigação de apoio ou in-
ram-se pilhagens de instituições governamentais e uma
fraestruturas que pudessem ser usadas para desenvol-
grande desordem, pouco tempo depois de as forças de
ver armas de destruição massiva. Em 2004, o relatório
Saddam Hussein, incluindo os Fedayin, se desmembraram Duelfer do Grupo de Pesquisa do Iraque concluiu que o
em grandes proporções na cidade. Iraque não tinha nenhum programa de armas de des-
Em 13 de abril, Tikrit, a cidade natal de Saddam truição massiva viável.
e a última cidade a ser tomada pela coalizão, foi ocu- No contexto das informações dos serviços secre-
pada pelos fuzileiros da Task Force Tripoli. Talvez para tos que levaram às invasões contra os membros do par-
a surpresa de muitos, a resistência foi pequena. Dois tido Baath ligados à insurgência, Saddam Hussein foi
dias depois, os membros da coalizão declararam que a capturado em 13 de dezembro de 2003, perto de Tikrit,
guerra estava efetivamente terminada. na operação Red Dawn. A operação foi conduzida pela
Estima-se que aproximadamente 9,2 mil com- 4ª divisão de infantaria do exército estadunidense e por
batentes iraquianos foram mortos nessa fase inicial da membros da Task Force 121.
guerra. Além destes, o Projeto de Contagem de Vítimas Com a captura de Saddam e uma queda do nú-
do Iraque (Iraq Body Count Project), incorporando re- mero de ataques dos insurgentes, alguns concluíram que
latórios subsequentes, declarou que, no fim da fase de as forças multinacionais estavam a ter sucesso na luta
maiores combates, até 30 de abril, morreram 7.299 ci- contra a insurgência. O governo provisório começou a
vis, fundamentalmente pelas forças aéreas e terrestres treinar novas forças de segurança iraquianas para defen-
estadunidenses. derem o país e os Estados Unidos prometeram 20 mi-
De acordo com a CNN, o governo dos EUA repor- lhões de dólares de crédito na forma de futuros ganhos
tou que tinham morrido 139 militares estadunidenses petrolíferos para a reconstrução. Mais valias resultantes
em combate até 1 de maio. No mesmo período, morre- do petróleo foram também usadas para reconstruir esco-
ram 33 britânicos. las e infraestruturas elétricas e de refinação de petróleo.
13
Pouco depois da captura de Saddam Hussein, de atentados e destruições por grupos cujo objetivo é
elementos deixados de fora da Autoridade da Coalizão a desorganização da sociedade existente e a tomada
Provisória começaram a agitar-se pelas eleições e pela do poder“.
formação de um governo iraquiano interino. O mais pro- Então por que as colonizações – que no passa-
eminente foi o clérigo xiita grande aiatolá Ali al-Sistani. do, em busca de domínio, destruíam povos, saqueavam
A Autoridade da Coalizão Provisória opôs-se à autori- nações e se apossavam de seus recursos naturais em
zação de eleições democráticas naquele momento, pre- busca de poder – nunca foram vistos como vilões pela
ferindo, em vez disso, entregar o poder a um governo história, tampouco como terroristas?
iraquiano interino ou “de transição“. Devido a uma luta
interna pelo poder no interior do novo governo, o movi- A situação na Síria
mento de resistência à ocupação intensificou-se.
EUA, colonização e
Oriente Médio
14
-Zarqawi, em 2004. Tudo começou quando Al-Zarqawi Dentro do califado, as regras são rígidas e se-
declarou lealdade a Al-Qaeda, originando a Al-Qaeda guem a sharia. Os combatentes, que são entre 30 mil e
do Iraque, ou da Mesopotâmia, composta por sunitas, 50 mil, sendo 12 mil vindos de outros locais, como Euro-
que representam a minoria da população iraquiana. pa (França e Bélgica), África do Norte (Tunísia), América
Os sunitas permaneceram representados no po- (Canadá e EUA), Ásia (Paquistão, Afeganistão e Arábia
der, durante a ditadura de Saddan Hussein, pelo Partido Saudita), recebem salários, o que é uma grande inova-
Baath. Os jihadistas sunitas insurgentes tornaram-se os ção perante outros grupos fundamentalistas, como a
principais combatentes à invasão dos EUA no Iraque. Al-Qaeda, o que ajuda o grupo a conseguir mais com-
Com a morte de Al-Zarqawi em 2006, a Al-Qa- batentes jihadistas.
eda do Iraque organizou a criação do “Estado Islâmico O petróleo é a principal fonte de recurso econô-
do Iraque (ISI – sigla em inglês para Islamic State in mico, pois, segundo a Organização Council on Foreign
Iraq), o que já demonstrava a intenção de se distanciar Relations (CFR, sediada em Nova Iorque, nos EUA, vol-
da influência da Al-Qaeda e de criar um território. tada para a política internacional), o EI consegue co-
O grupo fundamentalista passou a ser combatido mercializar 48 mil barris por dia (44 mil dos campos
pelas tropas estrangeiras, pelo governo iraquiano e pelos sírios e 4 mil dos iraquianos), além do gás natural.
sahwa, conselho de tribos sunitas que se posicionaram Outras fontes de renda correspondem à retirada
contra os métodos brutais do grupo. A participação das de dinheiro dos bancos nas cidades que são ocupadas,
tribos sunitas ficou conhecida como o Despertar Sunita. da pilhagem, da extorsão e da cobrança de impostos
Em 2014, o Estado Islâmico do Iraque e do Le- nas regiões que controla na Síria e no Iraque. Há suspei-
vante (ou da Síria), ou ISIS, passou a se chamar Estado tas sobre a contribuição de pessoas da Arábia Saudita e
Islâmico (EI ou IS, em inglês, Islamic State). Também foi do Catar para financiar o EI, inimigo dos xiitas.
proclamado sobre os territórios controlados do Iraque O Estado Islâmico utiliza a internet para divulgar
e da Síria o califado, que representa um território sob suas ações, difundir suas propostas e fazer recrutamen-
a forma de um governo monárquico e totalitário, co- tos, conseguindo, assim, aliciar mais simpatizantes para
mandado pela sharia e pelas tradições e costumes dos sua causa.
primeiros séculos do islã. No início de 2014, Barack Obama anunciou a
A adoção do nome Estado Islâmico tem a ver formação de uma coalizão de aproximadamente 50 paí-
com o abandono da geopolítica do grupo de ser apenas ses, envolvendo principalmente nações do Ocidente e do
associado aos territórios da Síria e do Iraque. O intuito Oriente Médio, que passou a realizar ações militares em
do EI é estabelecer o domínio de um grande território bombardeios contra posições do EI na Síria e no Iraque.
que inclua o mundo árabe muçulmano no Oriente Mé- Em 2016, importantes ações militares realizadas
dio e no norte da África. principalmente pela Rússia, EUA e França provocaram
ao EI a perda de controle sobre territórios e cidades.
Características do Estado Islâmico
Apesar de não conseguir dominar Bagdá, o EI Pesquisar
passou a controlar várias cidades ao norte do Iraque,
perseguindo infiéis, cristãos, xiitas, tribos sunitas do §§ A guerra da Palestina: da criação do Es-
Despertar Sunita e os yazidis, que possuem entre 50 mil tado de Israel à nova Intifada (livro); autor:
e 500 mil membros. Por ser uma comunidade fechada André Gattaz
étnico-religiosamente, fica difícil enumerar exatamente §§ Promessas de um novo mundo (documentá-
sua população; é vista como herege pelos membros do rio); direção: Justine Arlin, Carlos Bolado e B.Z.
EI, que assassinam os homens que se recusam à con- Goldberg (2001) – ambientado em Israel e nos
versão religiosa e levam as mulheres para serem noivas territórios ocupados, mostra a tensa realidade
jihadistas, as quais acabam sofrendo violência sexual ou do cotidiano local a partir da visão de crianças
são vendidas como escravas. palestinas e judias.
15
ATUALIDADES
Índia e Paquistão:
a geopolítica da Caxemira
Alessandra de Fatima Alves
16
C H
ATUALIDADES
16