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Relato autobiográfico
Sem podermos sair, todos em total isolamento social para cuidarmos de quem
amamos e de nós mesmos. Nunca imaginava que teríamos um surto epidêmico
nestas proporções, o mundo parou, a rotina das pessoas mudou, a maioria das
escolas e universidades passou a ter aulas remotas e o trabalho passou a ser home
office.
A quarentena também serve para refletir sobre uma sociedade capitalista baseada no
consumo, visto que na esteira da pandemia, os profissionais de saúde recomendam
e alertam as pessoas para que fiquem em casa e saiam apenas quando necessário e
comprem apenas o essencial. E assim percebemos que aos poucos, pelo no início da
pandemia, não existiu um consumo desenfreado de produtos e, por isso, não temos
tanta poluição.
Nesse período a escola que trabalhava como auxiliar de educação infantil também
encerrou as atividades presenciais. Fui para a sala de aula no dia 17 com um aperto
no peito, pois é esse um dos lugares que me sinto viva, em que as crianças com seus
abraços me fazem sentir... Não podia mais abraçar e nem ser abraçada.
Precisávamos manter distância. Teríamos somente mais um dia para organizar
algumas coisas, comunicar as famílias e fecharmos a escola… Manhã difícil essa!
Dia 17 de março de 2020, terça-feira. Momento para acolher à distância, não sabia
como e o que falar para os pais e para as crianças que nossas aulinhas tinham que
ser suspensas por conta do vírus. Eu acreditava que seria por pouco tempo, e as
crianças da escola também..., mas o tempo passou e já tinham se passado 3 meses
desde aquele 17 de março.
Em meado de junho nos organizamos para iniciarmos as aulas remotas via WhatsApp,
fizemos um formulário que foi enviado para os pais sobre esse novo método de ensino,
pois queríamos que todas as crianças matriculadas naquele semestre participassem
das aulas. Porém, nem todas as crianças tinham acesso à internet, computador, tablet
ou celular. As ações remotas me levaram a conhecer um pouquinho do contexto de
cada criança, de cada família.
Eu amava e sentia o coração quentinho quando eles mandavam as fotos das tarefas
realizadas, os áudios dizendo que estavam com saudades da escola e das tias. Me
dedicava bastante nos envios das atividades, tentava ser criativa ao máximo para que
eles pudessem aproveitar esse novo método de ensino e também que pudessem
aprender através dele. Pois se trata de crianças e exigem muita atenção e
comprometimento.
Voltei na escola algumas vezes. Encontrei salas vazias e silenciosas, pátio sem gritos,
risos e correria, sala dos professores quase vazia, mas tenho certeza que encontrei
vida pulsando, vidas que acreditam que podem mudar o mundo, mesmo que seja à
distância, mesmo que seja em um novo ritmo. Muita coisa já aconteceu. Outras
deixaram de acontecer. Muitas ainda virão. E eu estou aqui, transbordando de
saudade, mas também de esperança.
As aulas remotas da UFMA tiveram início dia 14 de setembro, foi bem difícil pra mim,
pois um dia antes de iniciar as primeiras aulas do semestre, meu irmão sofreu um
acidente e precisou fazer uma cirurgia de emergência. Eu estava dividida entre assistir
minhas primeiras aulas e saber como tudo iria funcionar ou ajudar minha mãe com
meu irmão no hospital.
Eu pensei em trancar a faculdade durante esse período, pois não conseguia aproveitar
as disciplinas, muito menos me concentrar pois o meu foco naquele momento era
consegui um leito e a cirurgia pro meu irmão. Depois de quase duas semanas de muita
luta e correria meu irmão fez a cirurgia e voltou para casa, me senti aliviada.
O ensino a distância continua sendo um desafio para mim, pois tudo requer um
planejamento cuidadoso para que possamos realizar todas as atividades que nos
propomos a fazer. Acho que nesse processo é importante reconhecer nossos limites
para podermos escolher o número de disciplinas, projetos, pesquisas que
pretendemos fazer ao longo do semestre. Olhando para as nossas condições
materiais, psicológicas e emocionais, que na minha opinião devem ser consideradas.
Aprendi muitas lições de vida com a pandemia. Aprendi que a vida é um sopro e que
devemos mostrar amor e compaixão pelas pessoas que amamos, porque nunca
sabemos o amanhã, devemos nos preocupar com o que realmente importa. Não fui
contaminada pelo vírus, mas tive parentes que se contaminaram e, infelizmente não
estão mais aqui hoje. Me assusta o número de vítimas fatais pelo coronavírus, o Brasil
chega a 572.641 mortes em 20.494.212 casos confirmados. É um número absurdo! E
atrás de cada vítima da covid – 19 estão histórias de amor e a saudade de netos,
esposo (a), filhos...
Também aprendi a ser mais humilde e solidária, durante essa pandemia percebi
inúmeras pessoas que estão sofrendo constantemente, como famílias que moram em
um quarto e vão lutar todos os dias para colocar comida na mesa. Me fica o
questionamento: essas pessoas mais vulneráveis têm condições de ficar em casa?
É preciso ter mais atenção à alimentação durante a pandemia, pois ela mantém a
nossa saúde, previne doenças, controla as doenças instaladas e mantém o
funcionamento do nosso sistema imunológico, é de suma importância comer bem. E
com o início da pandemia, vivenciamos um aumento no consumo de produtos
industrializados como doces, chocolates, biscoitos, fast food, além do consumo de
bebidas com alto teor alcoólico, o que aumenta o risco de várias doenças.
Há muitos relatos de pessoas que falam que estão comendo em excesso por conta
da ansiedade, sobrecarga do trabalho. Nesse período pandêmico, é extremamente
importante planejar a vida para adquirir nutrientes ao corpo, para estar em equilíbrio,
é fundamental para a qualidade de vida da população. E, como vimos, a população
está carente do básico.
Desde o ano passado, o Marcos se faz presente em minha vida, em meus sonhos e
planos. Me dando amor, suporte, força e sempre me incentivando a não desistir dos
meus sonhos. A pandemia, o isolamento social de certa forma bloqueou o nosso
reencontro, porém não impediu o nosso reencontro de almas. O nosso amor era virtual
até o dia 13 de novembro de 2020, a primeira vez que vi ele pessoalmente depois de
tanto tempo, senti borboletas no estômago e meu coração disparou, ali tive a certeza
que o sentimento nunca morreu, estava apenas adormecido. 18 de novembro de 2020
por volta das 20h30 da noite foi um dos primeiros de milhares de abraços que demos.
O amor ainda existe e resiste, pois como diz o trecho bíblico de Coríntios 13:7 “o amor
tudo sofre, tudo crê, tudo suporta”, o amor é incondicional, ainda que não se toque,
não sinta o cheiro, não sinta o sabor do beijo e nem o calor do abraço. O amor é
incondicional com ou sem pandemia.
Bom, finalizo este relato pedindo para que vocês que estão lendo que reservem um
tempo para refletir sobre tudo o que passaram e estão passando. Que (re)considerem
tudo que já passaram. Que deixem de pensar nos maus momentos, mas sim os bons
momentos que este isolamento social e o covid-19 nos proporcionou, especialmente
a mudança. Que pensem naqueles momentos em que muitas vezes pensamos que
não conseguiríamos superar e, depois conseguimos. Com isso, aprendemos a ser
mais fortes.
SILVA ROQUE, Ana Sarah. Efeitos da quarentena. UFSM > CE > Relatos – Educar
e Cuidar, 25 de jun. 2020. Disponível em: <https://www.ufsm.br/unidades-
universitarias/ce/2020/06/25/relatos-educar-e-cuidar-2/>. Acesso em: 26 de jul. de
2021.