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Resumo
A trajetória das representações de Luiz Carlos Prestes em imagens produzem uma linha distinguível de
transformações que passeiam pelas mudanças técnicas e conjunturais pelas quais ele passou e participou. Estas
transformações trazem em si também elementos de permanência de processos de longa duração e suas
renovações, assim como novidades que se adéquam a demandas conjunturais de união da imagem com agências
de discursos específicos.
O artigo pretende recolher indícios e debater possibilidades de investigação das representações de Prestes de
forma pictográfica de fotográfica tentando assim contribuir para ampliar os horizontes da investigação em torno
desta importante figura pública da República no século XX.
Palavras chaves: Prestes; pictografia, fotografia, imagens.
Introdução
Se pretende analisar a imagem enquanto ideia que busca uma emoção e que tenta nos
colocar diante do domínio a partir de elementos criados pós nós mesmos e que nos permita
iniciar a crítica da imagem e das linguagens, inclusive as inseridas nas imagens, na política
(GINZBURG, 2014, p.6).
Quais os ecos as imagens ecoam? (GINZBURG, 2014, p.51).
As barbas do capitão
Figura 5: J. M. Flagg, “Eu quero você Figura 6: D. Moor, “VOCÊ se alistou como
para o Exército dos Estados Unidos”, voluntário?”, cartaz de recrutamento do
cartaz de recrutamento, Estados Unidos, Exército Vermelho, Rússia, 1920.
1917. (GINZBURG, 2014, p.73) (GINZBURG, 2014, p.73)
O Cavaleiro da Esperança
Com todo poder simbólico embutido na construção das imagens de Prestes nos anos
1920 o que poderia produzir uma transformação tão radical na representação iconográfica de
Luiz Carlos Prestes?
A barba, com toda a tradição simbólica a ela relacionada, as representações militares,
como líder rebelde, a própria utilização da técnica de representação iconográfica que remetia
aos cartazes de Lorde Kitchener tudo se transforma nas representações fotográficas de Prestes
utilizadas pelo PCB já dos anos 1930 em diante.
À presença firme do herói rebelde que trazia as vestes e o rosto de um revolucionário
se impõe uma face imberbe, vestida no terno do cotidiano urbano, das cidades, da vida de
metrópoles erguidas pelo trabalho de um proletariado que precisava de outros símbolos para
resistir e se organizar.
O Capitão Rebelde ainda era Cavaleiro da Esperança, mas trazia nas faces a
representação de quem vivia o cotidiano da normalidade do sistema, resistindo a ele, mas não
mais montado no lombo do cavalo produzindo revolução.
A tradição aqui é nova, uma nova forma de produção de imagem, não mais a
produção gráfica, a gravura pintada com técnicas artísticas de longa duração, mas a novidade
da fotografia, o registro moderno, urbano, veloz, naturalista.
A fotografia registra um homem novo, o novo homem produzido pela revolução e
disciplina leninista, organizado por um partido que se exigia reconstruir nos marcos da
legalidade (REIS, 2014, p.224).
A nova face do Cavaleiro da Esperança saia da prisão para liderar uma nova fase da
luta política no país, identificado não mais como um símbolo vivo de uma rebeldia que saia
das franjas do tenentismo, que não o permitiu entender a diferença entre os grandes e ricos
proprietários de terras dos pequenos e pobres trabalhadores rurais (REIS, 2014, p. 123).
O novo homem marxista precisava ser a face que combateria o liquidacionismo e
alinharia junto a Vargas um processo de união nacional (REIS, 2014, p.224).
A posição política favorável à democracia, à justiça social, à paz e à ordem (REIS,
2014, p.226).exigia uma face que desviasse das construções pictóricas triunfantes e que
exalavam o rompimento com a ordem social.
O Cavaleiro da Esperança agora precisava parecer um filho dileto da urbanidade
democrática do pós-guerra.
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Considerações finais
A análise dos processos de representação imagética de Prestes contemplam
elementos de percepção de tradições antigas, de longa duração, renovadas e partir de novas e
modernas técnicas de produção pictórica e também das transformações necessárias produzidas
pelas demandas de representação ocorridas pelos grupos detentores de mecanismo de difusão
de discursos específicos (CHARTIER, 2002,p.17).
Assim como nas representações textuais produzidas por A Federação, as
representações pictóricas e fotográficas de Prestes sofrem transformações que são
representativas tanto da historicidade da técnica quanto das transformações conjunturais que
Prestes presenciou e fez parte.
A presença de uma iconografia produzida em torno da imagem de Prestes Rebelde
exigia uma nova face, uma transformação a partir da ,mudança de necessidades políticas e
conjunturais do PCB, partido ao qual Prestes se ligou e tornou-se liderança, nas novas e
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específicas condições históricas que fizeram de Prestes não mais um líder rebelde, mas um
líder político de um sistema que aquele momento abria uma oportunidade de disputa
democrática pelo poder.
A transformação conjuntural também, se refletiu numa alteração do espectro de
utilização da arte de representação imagética.
Sai a produção artística que mantém as tradições de longa duração das
representações e entram as novas técnicas de produção de imagem a partir do uso da
fotografia.
Prestes deixa de ser representado por um processo técnico que remete às pinturas
antigas e à renovação delas a partir de técnicas de propaganda, ele agora é retratado,
capturado por modernas lentes, aparelhos que se pretendem capturadores da realidade.
O Capitão ao se tornar o Cavaleiro da Esperança, mas um cavaleiro vestido de
cavalheiro de uma urbanidade que se move nas marchas de um progresso técnico veloz, deixa
de ser representado para ser fotografado, deixa de ser um ícone pictórico para ser uma
imagem capturada, uma fração do real organizada e demonstrada em papel.
A representação de Prestes torna-se uma reprodução de Prestes. O Cavaleiro da
esperança simboliza a ordem demonstrada, real, concreta, mais que um produto de rebeldias
que são gravadas a partir do trabalho coletivo e que remete à tradição do uso da arte, ele agora
é, seu rosto é perceptível como o vemos no cotidiano, não mais como uma imagem produzida
para simbolizá-lo.
A agência da imagem, que tem consigo uma vontade só perceptível na produção da
arte pictórica e uma sedução praticamente inerente a ela, que confere a ela uma personalidade
própria (MITCHELL, 2015, p.181), se torna uma agência do fotografado e dos objetivos
produzidos em torno do representado pela imagem tal como ele é (CHARTIER, 2002, p.21).
Na transição do Capitão Prestes a General Prestes e daí a Cavaleiro da Esperança se
deram muitas mudanças na forma como Prestes foi representado seja de forma textual seja
imagética, mas todo o processo teve em si elementos de profunda mudança na forma como as
técnicas de produção de uma construção da imagem de Luiz Carlos Prestes.
Em cada transformação Prestes adquiria uma faceta duradoura e marcante, que
participava de processos de transformações produzidas em operações simbólicas e em
processos de transformação técnica.
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FONTES
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A FEDERAÇÃO: O Federalismo Assisista. Porto Alegre, 10 jan. 1924. Página 1.
A FEDERAÇÃO. Porto Alegre, 12 jan. 1924. Página 1.
A FEDERAÇÃO: A qualificação eleitoral e a Licção que ella encerra. Porto Alegre, 06
mar. 1924. Página 1.
A FEDERAÇÃO. Porto Alegre, 06 mar. 1924. Página 4.
A FEDERAÇÃO: As simulações do regenerador. Porto Alegre, 08 mar. 1924. Página 1.
A FEDERAÇÃO: As vicissitudes de um comediante. Porto Alegre, 10 mar. 1924.
A FEDERAÇÃO: Cheque ao rei. Porto Alegre, 10 mar. 1924.
A FEDERAÇÃO: Medo ou ameaça? Porto Alegre, 10 mar. 1924.
A FEDERAÇÃO: Levante militar na fronteira missioneira. Porto Alegre, 04 nov. 1924.
Página 1.
A FEDERAÇÃO: O Levante militar na fronteira missioneira. Porto Alegre, 29 nov. 1924.
A FEDERAÇÃO: O levante na fronteira missioneira. Porto Alegre, 01 dez. 1924.
A FEDERAÇÃO: Roubalheira e Cynismo. Porto Alegre, 02 dez. 1924. Página 1.
A FEDERAÇÃO: Buenos Ayres, Centro internacional de vendedores de munições. Porto
Alegre, 02 dez. 1924. Página 1.
A FEDERAÇÃO: Vigoroso discurso do deputado Getúlio Vargas. Porto Alegre, 05 dez.
1924. Página 1.
A FEDERAÇÃO. Porto Alegre, 15 de dez. 1925.Páginas 10,11 e 12.
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A FEDERAÇÃO: Edital. Porto Alegre, 29 mar. 1927. Página 4.
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REFERÊNCIAS
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GINZBURG, Carlo. Medo, reverência, terror: Quatro Ensaios de iconografia política.
São Paulo, Companhia das Letras, 2014.
LEAL, Elisabete da Costa. O Calendário Republicano e a Festa Cívica do Descobrimento
do Brasil em 1890: versões de história e militância positivista. História (são Paulo), São
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<http://www.scielo.br/pdf/his/v25n2/03.pdf>. Acesso em: 10 jun. 2018.
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PRESTES, Anita L. LUIZ CARLOS PRESTES: Patriota, revolucionário, comunista. São
Paulo: Expressão Popular, 2006.
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REIS, Daniel Aarão. Luís Carlos Prestes: Um revolucionário entre dois mundos. São
Paulo, Companhia das Letras. 2014.